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A DIVERSIDADE DA GEOGRAFIA BRASILEIRA: ESCALAS E DIMENSÕES DA ANÁLISE E DA AÇÃO DE 9 A 12 DE OUTUBRO 1117 4 REGIÃO METROPOLITANA DO CARIRI-CE E O PROCESSO DE “METROPOLIZAÇÃO INSTITUCIONAL” NO BRASIL FRANCISCA FERNANDA BATISTA DE CASTRO 1 VIRGÍNIA CÉLIA CAVALCANTE DE HOLANDA 2 Resumo: O trabalho que ora apresentamos visa compreender a dinâmica do atual quadro metropolitano brasileiro, tamanha a sua complexidade quanto ao processo de institucionalização de suas unidades territoriais. Neste sentido, buscamos refletir a respeito da recente Lei instituída Estatuto da Metrópole, a partir de um estudo de caso da realidade sul cearense, no tocante a Região Metropolitana do Cariri. Sendo assim, pautada em um levantamento bibliográfico, documental e trabalho de campo, esta pesquisa busca contribuir com o debate acerca do quadro metropolitano brasileiro, bem como, examinar a dinâmica urbana da Região Metropolitana do Cariri. Palavras-chave: Estatuto da Metrópole; Institucionalização; Região Metropolitana do Cariri; Unidades Territoriais. Abstract: The work presented here, seeks to understand the dynamics of the current Brazilian metropolitan framework, such as its complexity to the process of institutionalization of its territorial units. In this sense, we seek to reflect on the recent instituted Law - Statute of the metropolis, from a case study of Ceará south reality regarding the metropolitan area of Cariri. Thus, based on a literature review, documentary and field work, this research seeks to contribute to the debate about the Brazilian metropolitan framework and examine the dynamics of urban Metropolitan Region of Cariri. Key-words: Status of Metropolis; institutionalization; Metropolitan Region of Cariri; Territorial unit. 1 Introdução O quadro institucional metropolitano brasileiro vem crescendo de maneira muito acelerada, principalmente nas duas últimas décadas, de modo que, até março de 2015 o país contava com 78 unidades territoriais urbanas institucionalizadas. Disso resulta uma crescente demanda por estudos comparativos, no intuito de entender a complexidade desse processo. A metropolização compreendida por Lencioni (2005) como uma verdadeira metamorfose do processo de urbanização, vê no seu estágio contemporâneo, a expansão de inúmeros arranjos metropolitanos que não dispõe de elementos socioespaciais e econômicos, capazes de serem efetivados como tal, de modo que mais da metade da população brasileira, isto é, 112,1 milhões de pessoas, vivem nesses espaços distribuídos em 1.328 municípios nas 24 unidades da federação (OBSERVATÓRIO DAS METRÓPOLES, 2015). 1 Acadêmica do programa de pós-graduação em Geografia da Universidade Estadual do Ceará. E- mail: [email protected] 2 Orientadora. Professora do programa de pós-graduação em Geografia da Universidade Estadual do Ceará. E-mail: [email protected]

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A DIVERSIDADE DA GEOGRAFIA BRASILEIRA: ESCALAS E DIMENSÕES DA ANÁLISE E DA AÇÃO

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REGIÃO METROPOLITANA DO CARIRI-CE E O PROCESSO DE “METROPOLIZAÇÃO INSTITUCIONAL” NO BRASIL

FRANCISCA FERNANDA BATISTA DE CASTRO1 VIRGÍNIA CÉLIA CAVALCANTE DE HOLANDA2

Resumo: O trabalho que ora apresentamos visa compreender a dinâmica do atual quadro

metropolitano brasileiro, tamanha a sua complexidade quanto ao processo de institucionalização de suas unidades territoriais. Neste sentido, buscamos refletir a respeito da recente Lei instituída – Estatuto da Metrópole, a partir de um estudo de caso da realidade sul cearense, no tocante a Região Metropolitana do Cariri. Sendo assim, pautada em um levantamento bibliográfico, documental e trabalho de campo, esta pesquisa busca contribuir com o debate acerca do quadro metropolitano brasileiro, bem como, examinar a dinâmica urbana da Região Metropolitana do Cariri.

Palavras-chave: Estatuto da Metrópole; Institucionalização; Região Metropolitana do Cariri;

Unidades Territoriais. Abstract: The work presented here, seeks to understand the dynamics of the current Brazilian

metropolitan framework, such as its complexity to the process of institutionalization of its territorial units. In this sense, we seek to reflect on the recent instituted Law - Statute of the metropolis, from a case study of Ceará south reality regarding the metropolitan area of Cariri. Thus, based on a literature review, documentary and field work, this research seeks to contribute to the debate about the Brazilian metropolitan framework and examine the dynamics of urban Metropolitan Region of Cariri.

Key-words: Status of Metropolis; institutionalization; Metropolitan Region of Cariri; Territorial unit.

1 – Introdução

O quadro institucional metropolitano brasileiro vem crescendo de maneira

muito acelerada, principalmente nas duas últimas décadas, de modo que, até março

de 2015 o país contava com 78 unidades territoriais urbanas institucionalizadas.

Disso resulta uma crescente demanda por estudos comparativos, no intuito de

entender a complexidade desse processo.

A metropolização compreendida por Lencioni (2005) como uma verdadeira

metamorfose do processo de urbanização, vê no seu estágio contemporâneo, a

expansão de inúmeros arranjos metropolitanos que não dispõe de elementos

socioespaciais e econômicos, capazes de serem efetivados como tal, de modo que

mais da metade da população brasileira, isto é, 112,1 milhões de pessoas, vivem

nesses espaços distribuídos em 1.328 municípios nas 24 unidades da federação

(OBSERVATÓRIO DAS METRÓPOLES, 2015). 1 Acadêmica do programa de pós-graduação em Geografia da Universidade Estadual do Ceará. E-

mail: [email protected] 2 Orientadora. Professora do programa de pós-graduação em Geografia da Universidade Estadual do

Ceará. E-mail: [email protected]

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No Ceará atualmente, temos a Região Metropolitana de Fortaleza – RMF,

consolidada no cenário nacional, estando inclusa no rol das primeiras RMs

institucionalizadas na década de 1970 e a Região Metropolitana do Cariri –

(RMCariri)3 que foi institucionalizada recentemente pela lei Complementar Nº

78/2009. Localizada no Sul do estado do Ceará, composta por 9 municípios, a

RMCariri é destaque no cenário regional, exercendo uma polarização que vai além

das fronteiras do estado do Ceará.

Para discutir essas questões estruturamos o texto em três partes: primeiro,

será abordada a questão institucional vigente no Brasil, com ênfase no processo

histórico-político de suas regiões metropolitanas; segundo, procuramos fazer uma

reflexão no tocante ao Estatuto da Metrópole, visto que, pretendemos analisar os

limites e avanços desta Lei que foi sancionada em janeiro de 2015, visando

contribuir com o quadro metropolitano brasileiro, e por fim, buscamos explanar os

desafios impostos à problemática sul cearense, isto é, a RMCariri e sua dinâmica

urbana atual.

2 – O processo de institucionalização de Regiões metropolitanas no Brasil

A dimensão histórica aponta dois momentos divergentes no que concerne a

questão institucional metropolitana brasileira. O primeiro da década de 1970 refere-

se à institucionalização das primeiras RMs, durante os governos militares, que por

sua vez, tinha como finalidade responder aos anseios do regime autoritário. O

segundo, após a constituição de 1988, quando foi delegado aos estados federados o

poder de instituir novas RMs. Com esta modificação o Brasil vem sofrendo um

verdadeiro processo de “metropolização institucional” de modo que até março de

2015, 71 RMs foram institucionalizadas em todo o país. Esse “boom” quantitativo de

unidades territoriais no Brasil intensificou-se a partir do início do século XX,

especialmente entre os anos de 2005-2015.

3 O uso da denominação RMCariri está de acordo com a tese de doutorado do Professor Ivan Queiroz

– URCA, visto que a sigla RMC, já é utilizada ao se fazer referência a grandes centros metropolitanos como Curitiba e Campinas, sendo assim, optou-se por usar RMCariri quando se referir ao aglomerado urbano caririense.

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Em um esforço de examinar as características institucionais e políticas da

multiplicação do processo de institucionalização de RMs no Brasil, Mansur (2014)

avaliou as legislações estaduais visando contrapor os critérios utilizados pelos

governos, com aqueles utilizados por estudos de referencia nacional quanto ao

debate metropolitano. A autora faz uso os critérios adotados pelos estudos do

IBGE/REGIC, IPEA e Observatório das Metrópoles, para verificar em que medida as

regiões institucionalizadas se configuram ou não como fenômenos metropolitanos.

Além da existência de certa discrepância entre a dinâmica da metropolização

e a institucionalização de RMs, os três estudos identificam apenas 12 áreas

metropolitanas consolidadas no Brasil, e alguns outros núcleos urbanos em vias de

se destacar como metrópoles. Partindo desse pressuposto a autora afirma que:

Tendo por base o fenômeno metropolitano, o reconhecimento e institucionalização de uma região metropolitana deveria minimamente ter como critérios: (a) a identificação dos espaços de dinâmica metropolitana; (b) os critérios para ser e pertencer a uma região metropolitana; (c) possuir e estruturar conselho gestor; (d) a criação e manutenção dos fundos de funcionamento dos serviços de escala regional; (e) identificação das funções-comuns a partilhar, logo, quais serviços pertenceram ao escopo metropolitano e (e) reconhecimento das assimetrias entre as municipalidades, identificando as formas de participação nas atribuições e no fundo de financiamento (MANSUR, 2014, p. 72).

Segundo a autora a análise feita sobre as legislações estaduais revela que os

objetivos adotados pelos estados se mostram quase idênticos, na medida em que

propõe unificar a organização, o planejamento e a execução de funções públicas de

ordem comum. Disso resulta um quadro institucional diverso e contraditório visto que

a maior região metropolitana do país – São Paulo com 19 milhões de habitantes é

883 vezes maior que a menor região metropolitana brasileira, localizada no sul do

estado de Roraima com pouco mais de 21 mil habitantes.

A vista disso, o universo oficial das unidades territoriais urbanas cresce na

maioria das macrorregiões brasileiras, de modo que, alguns estados como o de

Santa Catarina na região Sul e Paraíba na região Nordeste, vem sendo

considerados verdadeiros “estados metropolitanos”, com 11 e 12 RMs

respectivamente, sendo que, o primeiro possui apenas um, dos seus 295 municípios

a margem da então “metropolização institucional” conforme podemos observar na

tabela abaixo.

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Unidades Urbanas Institucionalizadas até março 2015

Norte Nordeste Sul Sudeste Centro-oeste

Belém (PA) Capital (RR) Central (RR) Gurupi (TO) Macapá (AP) Manaus (AM) Palmas (TO) Santarém (PA) Sul do Estado (RR)

Agreste (AL) Aracaju (SE) Araúna (PB) Barra de Santas Rosa (PB) Caetés (AL) Cajazeiras (PB) Campina Grande (PB) Cariri (CE) Esperança (PB) Feira de Santana (BA) Fortaleza (CE) Grande São Luiz (MA) Guarabira PB) Itabaiana (PB) João Pessoa (PB) Maceió (AL) Médio Sertão (AL) Natal (RN) Palmeira dos Índios (AL) Patos (PB) Recife (PE) Ride Petrolina/Juazeiro Ride Teresina/Timon Salvador (BA) São Francisco (AL) Sertão (AL) Sousa (PB) Sudoeste Maranhense (MA) Vale do Mamanguape (PB) Vale do Paraíba (AL) Vale do Piancó (PB) Zona da Mata (AL)

Alto Vale do Itajaí (SC) Apucarana (PR) AU do Litoral Norte (RS) AU do Sul (RS) Campo Mourão (PR) Carbonífera (SC) Cascavel (PR) Chapecó (SC) Contestado (SC) Curitiba (PR) Extremo Oeste (SC) Florianópolis (SC) Foz do Rio Itajaí (SC) Lages (SC) Londrina (PR) Maringá (PR) Norte/Nord Catarinense (SC) Porto Alegre (RS) Serra Gaúcha (RS) Toledo (PR) Tubarão (SC) Umuarama (PR) Vale do Itajaí (SC)

AU de Jundiaí (SP) AU de Piracicaba Baixada Santista (SP) Belo Horizonte (MG) Campinas (SP) Grande Vitoria (ES) Rio de Janeiro (RJ) São Paulo (SP) Sorocaba (SP) Vale do Aço (MG) V. do paraíba e Litoral Norte (SP)

Goiânia (GO) Ride DF Vale do Rio Cuiabá (MT)

9 32 23 11 3

Total: 78

Tabela 1 – Unidades territoriais urbanas brasileiras Fonte: Observatório das metrópoles (2015)

Sob a constituição federal foram institucionalizadas 62 RMs, dentre elas 51

entre os anos de 2005-2015 (Observatório das Metrópoles, 2015). Esses números

apontam certa fragilidade e deficiência institucional, posto que, os elementos

socioespacias em alguns casos, são desprezados em prol de interesses políticos.

Assim, a discussão da institucionalidade de RMs no Brasil é atribuída e relacionada

a uma perspectiva de desenvolvimento regional e não ao quadro metropolitano, isto

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é, o processo politico-institucional é priorizado em detrimento do socioespacial e sua

definição vem sendo conferida por força de uma lei. (FIRKOWISKI, 2012).

Neste sentido, a autora elenca os principais desafios quanto ao quadro

institucional brasileiro entre eles, destacam-se:

Distinguir o que é efetivamente metropolitano daquilo que, embora receba a denominação de região metropolitana, não pode ser assim reconhecida; propor politicas públicas que contemplem as várias realidades urbanas existentes na atualidade do país e seus diferentes níveis de complexidade; Estimular a discussão de critérios nacionais para a criação de regiões metropolitanas, de modo a evitar disparidades irreconciliáveis; fortalecer o reconhecimento de recortes supramunicipais para a solução de problemas comuns, entre os quais as aglomerações urbanas, também previstas na Constituição Federal (FIRKOWISKI, 2013, p. 49).

Distinguir o que é daquilo que não é metropolitano no Brasil atualmente

envolve uma grande complexidade, uma vez que, é necessário considerar as

especificidades regionais que abrangem esses espaços. Nesse caso, os “critérios

únicos” que devem ser adotados segundo a autora podem não contemplar as

dimensões continentais do nosso país, em razão da vasta heterogeneidade aqui

existente, como destaca Queiroz, (2013). Ademais, concordamos com Firkowiski,

(2013) quando esta aponta a necessidade de analisar, dentre outros, aspectos a

inter-relação das cidades a partir de duas dimensões fundamentais: a centralidade e

a região de influência.

A vista disso é partilhado por um grande número de autores a existência de

lacunas na legislação, responsáveis pelas diferenças seja qualitativa e/ou

quantitativamente entre RMs. Como proposta de suprir este vácuo legislativo foi

sancionado o Estatuto da Metrópole, projeto que se converteu na Lei 13.089, a qual

nos propomos refletir na próxima sessão desse texto.

3 – Estatuto da Metrópole e sua contribuição a metropolização brasileira

Submetido à câmara dos deputados em 05/05/2004, o projeto de Lei (PL

3.460/2004) Estatuto da Metrópole foi aprovado pelo congresso nacional e

sancionado em 12/01/2015 pela lei federal nº 13.089/2015. Visando instituir

diretrizes para a política nacional de planejamento regional urbano (PNPUR) e criar

o sistema nacional de planejamento e informações regionais urbanas (SNPRU),

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esse projeto, traz como justificativa a inexistência de um arcabouço institucional que

ampare a “questão metropolitana” no Brasil (MOURA & FIRKOWSKI, 2015).

No artigo 1º a lei 13.089/2015 explicita que:

Esta lei, denominada Estatuto da metrópole, estabelece diretrizes gerais para o planejamento, a gestão e a execução das funções públicas de interesse comum em regiões metropolitanas e em aglomerações urbanas instituídas pelos Estados, normas gerais sobre o plano de desenvolvimento urbano integrado e outros instrumentos de governança interfederativa, e critérios para o apoio da União e ações que envolvam governança interfederativa no campo do desenvolvimento urbano com base nos incisos XX, do art. 21, IX do art. 23 e I do art. 24 no § 3 do art. 25 e no art. 182 da constituição federal.

É importante salientar que no artigo 2º da nova Lei os termos aglomeração

urbana, metrópole e região metropolitana, recebem definição legal, uma vez que, a

metrópole é vista como espaço com continuidade territorial, que em razão de sua

relevância política e socioeconômica, tem influência regional sobre um espaço que

configure no mínimo a área de influência de uma capital regional, de acordo com os

critérios estabelecidos pelo IBGE. Enquanto a região metropolitana é uma

“aglomeração que configure uma metrópole” (inciso VII, art. 2º).

Assim sendo, a definição de região metropolitana deve ser reduzida a

aglomeração urbana, quando essa não estiver de acordo com tais critérios para

efeito de políticas públicas. Ressalta-se que a Lei aplica-se também as

microrregiões instituídas pelo estado.

A determinação de diretrizes gerais de planejamento, gestão e execução de

políticas públicas em regiões metropolitanas e aglomerações urbanas, instituídas

pelos estados proposta pelo Estatuto da Metrópole, progride à medida que criam-se

bases de legitimação funcional da condição do que vem a ser um aglomerado

urbano metropolitano, contudo, além de alguns avanços é possível constatar limites

e desafios da referida Lei. Neste sentido, Ribeiro, (et al, 2015) indica certa

insuficiência para criar condições institucionais e políticas que respondam ao desafio

metropolitano brasileiro visto que, para o autor:

Em primeiro lugar, os legisladores focaram a atenção na regulação das funções de interesse comum e na governança interfederativa em geral. Em segundo, no desenho da lei, não houve uma preocupação em tratar da complexidade e da diversidade da rede urbana brasileira. Ao desconsiderar as especificidades que caracterizam o fenômeno metropolitano, o Estatuto da Metrópole assume como escopo da sua abrangência as atuais Regiões

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Metropolitanas constituídas com base nas imprecisas e equivocadas definições das leis estaduais. Apesar de um esforço e de um avanço conceitual, o Estatuto, de certa forma, legitima as imprecisões e equívocos gerados por estas leis ao não considerar a possibilidade de revisá-las. (RIBEIRO et al, 2015, s/p).

Ainda segundo o autor, os critérios para a delimitação da região de influência

de uma capital regional contidos na nova Lei implicaria em assumir que o Brasil não

conta com as 78 unidades territoriais que apresentamos no inicio desse texto. Da

mesma forma, lamenta não haver na Lei um meio de rever o atual quadro

metropolitano, o levando a concordar com Firkowski (2012) quanto à adoção dos

“critérios nacionais” para a institucionalização destas áreas.

Atentas ao processo institucional brasileiro, MOURA & FIRKOWSKI, (2015)

elencam alguns aspetos “dúbios ou equivocados” referente à Lei. A vista disso, as

autoras apontam que foi dado apenas um primeiro passo adiante, em razão da nova

Lei disciplinar a institucionalização e a governança de unidades territoriais urbanas

nos estados, penalizando autoridades de diferentes escalões pelo descumprimento

de seus dispositivos.

Sobre os critérios propostos no art. 6, MOURA & FIRKOWSKI, (2015)

consideram superados, haja vista a sua aplicação ocorrer mediante critérios

exclusivamente demográficos e recomendam maior clareza quanto aos objetivos na

elaboração dos critérios técnicos de referência nacional. Destacam ainda o cap. 3 do

art. 2º referente à conceituação, uma vez que, neste artigo deveria haver abertura

para outros tipos de morfologia além das (RM, AU, MR).

Em consonância com os autores, pensamos que a referida Lei surge como

um avanço no que tange à organização do espaço metropolitano brasileiro. Todavia,

acreditamos que essa necessita passar por alguns ajustes e adequações,

principalmente referente à gestão democrática, tendo em vista a sua necessidade de

uma efetiva contribuição com esses espaços.

4 – A Dimensão urbana da Região Metropolitana do Cariri

Através da Lei Complementar Nº 78, de 29 de junho de 2009 (DOE

07/03/2009), foi sancionada a segunda região metropolitana do Estado do Ceará.

Oficializada por iniciativa do Governo do Estado a partir de uma proposta de

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desenvolvimento regional a RMCariri, é composta por 9 municípios - Juazeiro do

Norte, Crato, Barbalha, Jardim, Missão Velha, Caririaçu, Farias Brito, Nova Olinda e

Santana do Cariri e possui uma população de aproximadamente 600 mil habitantes,

segundo estimativa do (IBGE, 2013).

Observadora atenta do atual processo de “metropolização institucional” que

vem ocorrendo no país nas últimas décadas Firkowski (2012) afirma que no Brasil é

possível verificar duas dimensões distintas quanto as suas RMs. Uma primeira

relacionada à dinâmica urbana regional, com grandes cidades que desempenham

papel de comando na rede urbana, e outra que se relaciona apenas a escala

estadual, esta última, segundo a autora muitas vezes inadequada quanto à

classificação de metropolitana.

Salientamos que a RMCariri, se apresenta como destaque no cenário

regional, devido aos serviços ofertados, o que lhe permite uma polarização que vai

além das fronteiras do estado do Ceará, atingindo também os estados vizinhos de

Piauí, Pernambuco e Paraíba, segundo (REGIC, 2008), ou seja, além da sua

dinâmica urbana ultrapassar as escalas do estado do Ceará, este aglomerado

possui lugar de destaque em todo sertão nordestino.

Uma vez que a RMCariri foi institucionalizada pelo Estado, há um verdadeiro

consenso por parte de muitos pesquisadores quanto a imprecisão de seu caráter

metropolitano. Não obstante, Queiroz (2013) nos apresenta uma leitura divergente,

na medida em que apresenta o CRAJUBAR (Crato, Juazeiro do Norte e Barbalha)

principais cidades do aglomerado, como uma “metrópole fora do Eixo”. Partindo

desse pressuposto, é sugerido um olhar mais atento a natureza e o significado de

certos arranjos urbano-regionais como a RMCariri tamanha são as dimensões

continentais de um país como o Brasil (QUEIROZ, 2013).

Neste sentido, o autor afirma que o estágio atual da dinâmica urbana da

RMCariri em muito se assemelha com a dinâmica das metrópoles contemporâneas.

Para tanto, ele apresenta elementos de um novo dinamismo urbano, principalmente

em Juazeiro do Norte, a partir da diversificação e expansão das atividades

comerciais, atrelado a um potencial econômico e a presença crescente de redes de

varejo internacionais como os grupos Carrefour, Waal Mart e Casino Pão-de-Açucar.

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Muito além da expansão das atividades comerciais, a RMCariri também é

destaque na oferta de serviços de saúde e educação. Em se tratando desse último

ressaltamos a implementação da UFCA – Universidade Federal do Cariri no

município de Juazeiro do Norte, bem como a disseminação de faculdades privadas,

fazendo dele um centro de educação superior, conforme salientado na tabela

abaixo:

Instituições Crato Juazeiro do Norte

Barbalha CRAJUBAR

Universidade Regional do Cariri -URCA

10 07 - 17

Universidade Federal do Cariri – UFCA

1 9 1 11

Faculdade de Medicina de Juazeiro do Norte – FMJ

- 4 - 4

Faculdade Leão Sampaio – FALS - 13 - 13

Faculdade de Juazeiro do Norte –

FJN

- 6 - 6

Faculdade Paraiso – FAP - 7 - 7

Faculdade Católica do Cariri 1 - - 1

Instituto IDJ 4 4 - 8

IFCE 2 3 - 5

Total 18 53 1 72

Tabela 2 – Cursos de Graduação ofertados no CRJUBAR – 2015 Elaboração da Autora.

A tabela considera as modalidades de licenciatura e bacharelado ofertadas

pelas instituições de ensino presencial. Com um total de 72 cursos de graduação

ofertados, este aglomerado recebe cotidianamente um elevado número de

migrações pendulares, fazendo com que a região venha se destacando em razão da

centralidade exercida pelo seu núcleo central - CRAJUBAR. No âmbito da oferta de

serviços de saúde destaca-se não somente o Hospital Regional do Cariri,

implementado em 2011, como também as inúmeras clínicas especializadas,

distribuídas nos municípios de Juazeiro do Norte e Barbalha.

Essa centralidade exercida pelos três principais municípios que compõe a

RMCariri através dos grandes empreendimentos comerciais, ao lado do centro de

educação superior e da rede ampliada de equipamentos de saúde promovem a

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integração sócio territorial e regional do aglomerado, configurando-se segundo

Queiroz (2013) em uma “metrópole emergente”.

Posto isso, não refutamos o dinamismo urbano do aglomerado em questão,

uma vez que nesse conjunto urbano regional é destaque o aumento do consumo,

comércio, migrações pendulares e oferta de bens e serviços característicos do

processo de metropolização do espaço. Por fim, pensamos que os dados desta

pesquisa de mestrado até o momento nos revelam um aglomerado urbano

complexo, com marcas do processo de metropolização e forte poder de atração,

movidos por um processo de integração sócio territorial.

5 – Considerações finais

Equívocos conceituais, interesses econômicos, políticos e partidários são

algumas das razões empregadas para justificar a então “metropolização

institucional” abordada ao longo desse texto. Por conseguinte, a falta de estratégias

e políticas de desenvolvimento regional também são fatores contribuintes.

Em se tratando da RMCariri, a partir dos bens e serviços ofertados, é licito

afirmar a existência de um forte dinamismo econômico, com características de

expressão metropolitana, contudo numerosos desafios emergem principalmente

referente a gestão metropolitana, em razão da não articulação entre os demais

municípios que a compõe, além do núcleo CRAJUBAR.

Ademais, acreditamos que a criação de Regiões metropolitanas é importante

na medida em que promove um planejamento comum para os municípios

integrantes na forma de uma gestão compartilhada, contudo, essas unidades antes

de serem institucionalizadas, devem ser reconhecidas enquanto fenômenos

geográficos.

6 - Referências Bibliográficas

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