revista tela viva - 146 - janeiro/fevereiro 2005

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Mercado O limite da publicidade e os caminhos para o crescimento, segundo Octávio Florisbal Futuro Depoimentos de Fernando Bittencourt, Luis Erlanger, Claudia Quaresma e emissoras afiliadas televisão, cinema e mídias eletrônicas ano 14_#146_janeiro/fevereiro2005 GLOBO, 40 ANOS Em entrevista exclusiva, Roberto Irineu Marinho revela a visão estratégica do maior grupo de mídia do País EDIÇÃO ESPECIAL

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Revista Tela Viva - 146 - janeiro/fevereiro 2005

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MercadoO limite da publicidade e os caminhos para o crescimento, segundo Octávio Florisbal

FuturoDepoimentos de Fernando Bittencourt, Luis Erlanger, Claudia Quaresma e emissoras afiliadas

televisão, cinema e mídias eletrônicas ano 14_#146_janeiro/fevereiro2005

Globo, 40 anosEm entrevista exclusiva, Roberto Irineu Marinho revela a visão estratégica do maior grupo de mídia do País

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(editorial)

Rubens GlasbergAndré MermelsteinSamuel PossebonManoel FernandezOtavio JardanovskiGislaine GasparVilma Pereira (Gerente), Gilberto Taques (Assistente Financeiro)

Sandra Regina da Silva

Fernando Lauterjung

Edianez Parente, Julia Zillig, Lizandra de Almeida (Colaboradora)

Carlos Eduardo Zanatta (Chefe da Sucursal)

Carlos Edmur Cason (Edição de Arte)Claudia GIP (Arte)Rubens Jardim (Produção Grá­fica)Geraldo José Nogueira (Editoração Eletrô­nica)

Almir Lopes (Gerente), Ivaneti Longo (Assistente)

Marcelo Pressi Claudia G.I.P.

0800 145022 das 9 às 19 horas de segunda a sexta-feira

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Ipsis Grá­fica e Editora S.A.

Diretor e EditorDiretor EditorialDiretor Editorial

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Gerente de Marketing e Circulação Administração

Editora de Projetos Especiais

Editor Tela Viva News

Redação

Sucursal Brasília

Arte

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RedaçãoE-mail

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Impressão

Esta edição é uma homenagem a um grande projeto empre-sarial, mas não é uma apologia incondicional da TV Globo no seu 40º aniversário. É um trabalho jornalístico, uma análise

do estágio atingido pelo maior grupo brasileiro de produção audiovisual. Não ignoramos o poder e a influência política da Globo. Há os que a enaltecem e os que a demonizam. Fato é que não há como não reconhecer os méritos da existência de um grupo de comunicação como a Globo no Brasil, assim como não se pode deixar de olhar, sempre, para os efeitos colaterais de tanto poder de influência sobre a vida das pessoas. É uma discussão que vem de longe, em que não temos contribuição inovadora e relevante a dar. Preferimos fornecer elementos objetivos sobre a Globo para os que se interessam pelo seu futuro e o impacto que terá na maneira do brasileiro se divertir, se formar e informar; na definição de políticas públicas; mas também (e principalmente) nas decisões que transcendem o âmbito nacional. Procuramos res-saltar questões como:

n A contradição entre a globalização inexorável da produção/distribuição do conteúdo audiovisual e os interesses/soberania nacional. Ou seja, como conviver e ao mesmo tempo sobreviver econômica e culturalmente junto aos grandes grupos internacionais de mídia.

n Como administrar o poder de compra das grandes operadoras internacionais de telecomunicações num mundo de convergência tecnológica e de multiplicidade de plataformas de conteúdo.

n Monopolização, cartelização, hegemonia e pulverização da produção.

n Liberdade de iniciativa empresarial e o direito ao livre acesso à informação.

São assuntos recorrentes quando se fala da Globo e do Brasil e que devem ser objeto de reflexão de todos.

por Rubens Glasbergg l a s b e r g @ p a y t v . c o m . b r

A Globo, o Brasil e os brasileiros

Tela Viva é uma publicação mensal da Editora Glasberg - Rua Sergipe, 401, Conj. 605,

CEP 01243-001. Telefone: (11) 2123-2600 e Fax: (11) 3257-5910. São Paulo, SP.

sucursal Setor Comercial Norte - Quadra 02 Bloco D - torre B - sala 424 - CEP 70712-903.

Fone/Fax: (61) 327-3755 Brasília, DFJornalista Responsável Rubens Glasberg (MT 8.965)

Não é permitida a reprodução total ou parcial das matérias publicadas nesta revista,

sem autorização da Glasberg A.C.R. S/A

FOTO DE CAPA: NANdO NEVES

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Ano 14 _146_ jan-fev/04

scanner 8figuras 14making of 60artigo 62 O audiovisual diante da globalização

produtoras 64 Grifa, sob a bandeira da Mixer

case 66 O documentário “Andes-Amazônia”

carreiras 70 A arte de vestir personagens

upgrade 72agenda 74

(índice)

Especial Globo 40 anos 16Entrevista exclusiva com Roberto Irineu Marinho

Para crescer, a saída é exportar 32Os passos tecnológicos rumo ao futuro 42Conteúdo, o maior acerto 46O peso das afiliadas 50

telavivanewswww.telaviva.com.br

Acompanhe as notícias mais recentes do mercadoEnvie suas críticas, comentários

e sugestões para

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Acordo entre hermanos

O Brasil e a Argentina ratificaram o interesse de ambos países de manter e ampliar o acordo de distribuição de produtos audiovisuais que se encontra em vigor. A decisão foi tomada na Reunião de Alto Nível de Consultas Bilaterais Brasil-Ar-gentina, realizada no dia 25 de janeiro, no Centro de Estudos do BNdES, no Rio de janeiro. Além disso, os dois países mostraram interesse também em reativar o antigo acordo de co-produção audiovisual e estimular projetos e programas relacionados com a diversidade cultural.

Presidida pelo secretário- geral do Ministério das Relações Exteriores, embaixador Samuel Pinheiro Guimarães (foto), e com a presença do assessor especial para políticas internacionais da Presidência da República, Marco Aurélio Garcia, a reunião tratou da ampliação da agenda bilateral que está sendo desenvolvida pelos dois países. Participaram ainda da reunião o secretário do Audiovisual, Orlando Senna, representando o Ministério da Cultura, e representantes da Casa Civil e dos ministérios da Ciência e Tecnologia, das Minas e Energia, dos Transportes, das Comunica-ções, da Fazenda, da Agricultura, da defesa e do desenvolvimento da Indústria e Comércio Exterior.

Curta no multiplexA rede Cinemark e a Associação Brasileira de Documentaristas (ABd) selecio-

naram os quatro vencedores do concurso Frame a Frame, que reuniu vídeos de curta-metragem produzidos somente no Estado São Paulo. No total, 58 trabalhos de gêneros variados foram inscritos. Os quatro curtas-metragens vencedores serão exi-bidos nas salas da rede Cinemark em São Paulo, em sessões gratuitas e exclusivas, em data a ser divulgada. São eles: “dia d”, de Céu d’Ellia; “Guernica”, de Marcelo Ricardo Ortiz; “desencontro”, de Paula Fabiana; e “diS cOn NeC tEd”, de Marcelo Garcia.

Comercial agrárioA TGd Filmes, de Porto Alegre, produziu para a

duda Propaganda os filmes da campanha do Pronaf, do Ministério do desenvolvimento Agrário. A campanha apresenta a aplicação dos incentivos em benefício da agricultura familiar no Brasil. A TGd produziu três filmes, de um minuto cada, rodados em três partes do País — Rio Grande do Sul, Santa Catarina e Bahia. Os comer-ciais, que têm veiculação nacional, mostram produtores familiares das áreas de triticultura, fruticultura e caprino-cultura, como exemplo de negócios que foram impulsio-nados pelas facilidades de crédito viabilizadas pelo ministério.

A equipe da TGd, encabeçada por Chico deniz, selecionou entre diversas pro-priedades as que melhor exemplificavam a conquista desses agricultores.

Sucesso no desktopA Pinnacle comemorou no início de

2005 a marca de mais de 140 mil produtos vendidos no Brasil. O aumento de vendas corresponde às expectativas da empresa para este ano: comercializar uS$ 320 milhões em todo o mundo, sendo uS$ 200 milhões apenas da divisão de consumo. Para o Brasil, a previsão é vender cerca de uS$ 3 milhões, o que representa 40 mil placas de captura.

durante o segundo trimes-

tre do ano fiscal de 2005, que com-preende para a empresa os meses de outubro a dezembro de 2004, a Pinnacle Sys faturou com suas vendas cerca de uS$ 86 milhões, o que significa um aumento de aproximadamente 7%

em relação ao mesmo período do ano ante-rior. Apenas na América Latina, a Pinnacle vendeu no segundo trimestre fiscal cerca de uS$ 5 milhões — aprox-imadamente 50 mil placas de captura.

FuSãO NA PONTE AéREAA PAuLISTA SAMBI FILME E A CARIOCA PROdIGITAL uNIRAM OPERAçõES. A META dA

FuSãO É A FORMAçãO dE uM NOVO NúCLEO dE PuBLICIdAdE NA CAPITAL CARIOCA. EquIPAMENTOS, ESPAçO FíSICO E PROFISSIONAIS SERãO dISPONIBILIzAdOS PELA

PROdIGITAL. ESTE NOVO NúCLEO SERá BATIzAdO COMO SAMBI PROdIGITAL. OS dIRETORES dE CENA FIxOS dA SAMBI ROdRIGO FERRARI E A duPLA MARCELO NEGRI E RICARdO BIANCO,

A PARTIR dE AGORA, ATuARãO TAMBÉM NO RIO dE jANEIRO. EM BREVE, A PROdIGITAL MONTARá uM NúCLEO dE

PROduçãO EM SãO PAuLO, COMPARTILHANdO O ESPAçO FíSICO dA SAMBI.

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A Ancine divulgou no início de fevereiro um “Sumário Gráfico” da atuação da agência em 2004. Na apresentação do documento, o diretor-presi-

dente da Ancine, Gustavo dahl (foto), afirma que desde a sua criação, com a MP 2228-1, em 2001, a agência está implantada, mas não está pronta. O documento lembra que em 2005 será realizado um concurso público para provimento de 70 cargos efetivos, o que deverá potencial-izar a atuação da agência. Assim, o quadro de funcionários da Ancine, que hoje é de 233 pessoas, chegará a 362, contra apenas 86 em 2003.

Os números mostrados no sumário apontam para uma queda no investimento no setor audiovisual através de incentivos. Os investimen-tos baseados em incentivos fiscais mostraram variação negativa nos últimos dois anos. Foram alocados na produção audiovisual por estes mecanismos R$ 123,268 milhões em 2003, contra R$ 116 milhões em 2004.

Os dois mecanismos da Lei do Audiovisual apre-sentaram queda de arrecada-ção, sendo que o Artigo 1º caiu de R$ 50,515 milhões em 2003 para R$ 37 milhões em 2004. já o Artigo 3º da mesma lei apresentou uma queda menos significativa: de R$ 41,893 milhões em 2003 para R$ 39 milhões em 2004. Além disso, não houve investimen-tos através de conversão da dívida pública em 2004, um mecanismo que arrecadou apenas R$ 2,18 milhões no ano anterior.

Em compensação, os investimento através da Lei Rouanet saltaram de R$ 19,616 milhões em 2003 para R$ 25 milhões em 2004. Vale lembrar que esse incentivo é o mais usado pelas empresas estatais para investimento no audiovisual, usando muito pouco o Artigo 1º da Lei do Audiovisual.

Os investimentos, através do Artigo 39 da MP 2228-1, também apresentaram um salto: de R$ 9,064 milhões em 2003 para R$ 15 milhões em 2004.

A arrecadação da Condecine também cresceu em 2004, chegando a R$ 25 milhões, contra R$ 19,524 mil-hões no ano anterior. O orçamento da Ancine, também apresentado no sumário, foi de R$ 20,951 milhões em 2004, contra R$ 8,236 milhões em 2002 e R$ 15,992 mil-hões em 2003. Foram emitidos no ano passado 1,004 mil Certificados de Produto Brasileiro, cerca de quatro vezes o número do ano anterior.

Sumário 2004

Guia de Festivais A Associação Cultural Kinofo-

rum aproveitou a realização do primeiro evento audiovisual do ano — a 8ª Mostra de Cinema de Tiradentes — para lançar a sexta edição do Guia Brasileiro de Festivais de Cinema e Vídeo. O Guia compila 96 festivais brasileiros e mais de cem eventos internacionais que interessam ao produtor brasileiro. O lançamento aconteceu no dia 24 de janeiro e a partir deste mês de fevereiro o conteúdo e os locais onde se pode adquirir o Guia estão disponíveis no site da Kinoforum: www.kinoforum.org.

“Olhar Digital” na Rede TV! dia 20 de fevereiro estréia na Rede TV! o programa “Olhar

digital”, dirigido por Wharrysson Lacerda e apresentado por Marisa Lacerda. Produzido pela Actual Filmes, trata-se de um programa jornalístico semanal (domingos, às 17h), com duração de 30 minutos, cujo foco é o universo da tecnologia. “Ele vai abrir espaço para um assunto que faz parte do nosso dia-a-dia, com linguagem mais acessível”, explica Thereza Cavalcanti, produtora executiva da Actual.

Cada programa vai mostrar as informações, os bastidores de produtos tecnológicos, desde o celular, computador, aparelho de som, geladeira, até serviços eletrônicos de bancos, carros etc. O ob-jetivo é ajudar o telespectador a decidir pela melhor opção na hora da compra. já na sua estréia, todo o conteúdo do programa estará disponível no site www.olhardigital.com.br, onde o telespectador, além de poder se aprofundar no tema, poderá entrar em contato com a produção e participar de próximas pautas.

Patrocinado pela Intel (há outras cotas disponíveis), “Olhar digital” terá dois formatos de publicidade, que serão comercial-izados pela Actual. O tradicional comercial nos intervalos do pro-grama exibido na Rede TV! e também no website, que pretende ser um espaço para lançamento e exposição de produtos.

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Em dezembro, por ordem do presidente Lula, a proposta de criar uma Agência Nacional do

Cinema e do Audiovisual (Ancinav) voltou à mesa de projetos. A idéia original previa que a agência regularia não só o cinema, mas também a televisão e todas as demais mídias no que diz respeito ao conteúdo audiovisual. depois dos bombardeios de setores da indústria e, principalmente, da pressão de alguns ministérios (notadamente Fazenda, justiça, Comunicações e desenvolvimento), decidiu-se que era necessário embasar a nova agência com uma lei que a respaldasse, como é a Lei Geral de Telecomunicações para a Anatel. A idéia dessa lei até estava nos planos do Ministério da Cultura, mas apenas depois que a agência fosse criada, por uma lei menor, intermediária, mas já com todos os seus poderes. Agora a ordem das coisas se inverteu, e a pergunta é que fim levarão a Ancinav e a Lei de Comunicação.

O discurso oficial diz que o presidente Lula entendeu a complexidade da questão e acha que é preciso uma lei mais ampla, uma Lei de Comunicação, que sustente a agência. Agência esta que, ainda segundo o discurso do governo, sairá logo do papel, tornando-se uma “Ancine ampliada” desde já, mas pronta para receber a função de reguladora da televisão e das novas mídias assim que a lei permitir. Lei, aliás, que não tem prazo para ficar pronta. Mas, afinal, o discurso oficial reflete a inteira verdade? depende de onde se colhe esse

interfere na velocidade e nos caminhos que a proposta seguirá. Apenas olhando-se a história, seria possível dizer categoricamente que não, a TV não vai deixar nenhuma proposta de Lei de Comunicação andar, ainda que essa seja uma vontade do presidente

da República. Mas a história presente é diferente. Basta ler a entrevista de Roberto Irineu Marinho nesta edição. A TV brasileira, pelo menos a Globo, seu principal expoente, tem novas preocupações em mente, e uma legislação para o setor de comunicação pode ajudar a resolver certos temores.

A única novidade efetiva a ser esperada no curto prazo é em relação à versão “enxuta” do projeto

da Ancinav, se é que de fato ela irá logo ao Congresso, como prometido. A idéia é melhorar a Ancine atual ampliando os mecanismos de fomento e criar imediatamente compensações para que a indústria invista na própria indústria. Mecanismos como isenções e estímulos diferenciados, com o aval do Ministério da Fazenda. É mais ou menos o que quer, entre outros, a ala “industrial” do audiovisual, representada pelo Fórum do Audiovisual e do Cinema (FAC), o que já diminui bastante o índice potencial de atritos da idéia.

discurso. O Ministério da Cultura, patrono da primeira discussão sobre a Ancinav e da primeira proposta, entende que até março manda o projeto da agência para o Congresso e que imediatamente começa a discutir a tal Lei de Comunicação Social, com a colaboração de vários ministérios.

O Ministério das Comunicações, por seu turno, desconversa sobre a Ancinav, mas diz informalmente que está discutindo desde já uma Lei de Comunicação Social. Só não se sabe como vai ficar essa discussão na hipótese (iminente no fechamento desta edição) de uma troca de ministro. Ainda mais sendo a principal candidata Roseana Sarney, cuja família tem vínculos históricos e comerciais com o setor de radiodifusão. O Ministério da Fazenda também acha que é necessária uma Lei de Comunicação Social, e foi um dos defensores desta idéia junto a Lula na fatídica reunião que colocou o projeto da Ancinav em novos rumos. A Secom, do ministro Luiz Gushiken, não estava até janeiro exatamente organizada para enfrentar esse debate. E a Casa Civil, aliada do Ministério da Cultura, decidiu ficar mais atenta aos impactos políticos de uma proposta tão inovadora e polêmica, e recomendou às demais pastas ministeriais que tirassem o pé do acelerador.

Por fim, resta saber se a televisão e o setor de mídia como um todo querem uma Lei de Comunicação Social, o que

E a Ancinav, sai?

Celebridades e camisinhaTantas foram as celebridades que aceitaram o convite da Academia de Filmes para

participar da campanha do Ministério da Saúde de uso de camisinha no Carnaval deste ano que a produtora teve de deixar alguns de stand-by. O filme, produzido em forma de clipe, foi dirigido por Oscar Rodrigues Alves e envolveu 36 celebridades, entre cantores, atores e personalidades. A criação foi de Flavio Waiteman, Luciano Toaldo e Victor Afonso, da Master Comunicação, e o jingle foi da jamute áudio.

Iniciativa da Lei de Comunicação ficou para Eunício Oliveira, que pode estar deixando o Minicom para Roseana Sarney, mais afi-nada com a radiodifusão.

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Produtores na NatpeA representação da programação independente brasileira na Natpe (o principal evento de

compra e venda de conteúdo audiovisual dos EuA, que aconteceu em janeiro em Las Vegas) se fez sobre a bandeira “Brazilian TV Producers”. É assim que o estande da ABPI-TV — Associação Brasileira das Produtoras Independentes de Televisão — foi listado entre os expositores da feira,

como único representante do País no pavilhão ex-positor, que neste ano não teve o tradicional estande da TV Globo. As produtoras Grifa Mixer, Moonshot, Prodigo, Made to Create, destiny Interl., Mixer e TV Pinguim foram negociar alguns de seus programas prontos, mas com foco maior em projetos de co-produção.

Todas as produtoras nacionais sentiram forte demanda por parte do mercado por programação já pronta. Mas, de maneira geral, as produtoras inde-pendentes brasileiras ainda não têm volume sufici-

ente para atender a este novo mercado dos EuA, já que todas estão prioritariamente em busca de parcerias para viabilizar co-produções. Apesar de não terem sido propriamente fechados negócios, muitas portas se abriram para todos os expositores brasileiros presentes ao encontro. Após a Natpe, uma missão da ABPI-TV seguiu para o Canadá, onde haveria reuniões com produ-toras daquele país para análise de projetos de co-produção, uma vez que há um acordo firmado entre os dois governos que incentiva as iniciativas no campo audiovisual.

A Thomson promoveu no final de janeiro, nos Estados unidos, o já tradicional encontro pré-NAB com jornalistas da mídia especializada de todo o mundo. No evento, foram apresentados novos produtos e as estratégias da empresa. O que mais surpreendeu foi o anúncio da entrada ainda este ano no mercado “Pro AV”, de empresas que usam o audiovisual como ferramenta profissional (apresentações corporativas, educação à distância, igrejas etc.), mas que não fazem necessariamente parte da mídia tradicional.

A empresa, usando as marcas Thomson, Grass Valley, RCA e Technicolor, produz equipamentos para broadcast e produção profissional, medidores e set-top boxes e ainda presta serviços de laboratório e finalização de filmes. A entrada no setor Pro AV, com a criação da nova marca GV Pro Line, segundo a empresa, acontece por dois grandes motivos. Em primeiro lugar, aumentar sua área de

atuação buscando novos mercados. Além disso, usar a nova área como uma espécie de incubadora de tecnologia para outros setores.

Segundo o diretor de desenvolvimento de mercado da Thomson Broadcast, Scott Murray (foto), o mercado Pro AV é maior que o broadcast e a produção audiovisual profissional de mídia. Além disso, segundo Murray, houve uma inversão no

caminho tradicional para o uso de novas tecnologias. No passado, as tecnologias de ponta levavam anos

até chegar aos mercados consumer. Atualmente a tecnologia empregada no uso corporativo tem evoluído para o mercado broadcast. um exemplo usado foi a tecnologia dos monitores flat panel, que só chegou ao mercado audiovisual após já estar

difundida no mercado corporativo.Segundo o vice-presidente de marketing estratégico

e desenvolvimento de negócios da Thomson, jeff Rosica, a empresa também deverá apresentar novos produtos com

suporte ao formato HdV ainda este ano, embora não abra se existirá uma nova linha de produtos. O que ainda não está claro é se o HdV será usado apenas na linha Pro AV ou também para a linha broadcast.

NOVOS MERCADOS

FITTIPALdI NA TELAEMERSON FITTIPALdI É A ESTRELA dO COMERCIAL dA BATERIAS MOuRA ASSINAdO PELA O2 dOIS FILMES.

O COMERCIAL MOSTRA, dE MANEIRA BEM-HuMORAdA, O PILOTO E uM “dIRETOR dE COMERCIAL” dISCuTINdO A MELHOR FORMA dE dIVuLGAR A NOVA BATERIA INTELIGENTE MOuRA. CRIAdO PELA

AGêNCIA uM, O FILME FOI dIRIGIdO POR TOCHA ALVES, COM A PARTICIPAçãO dO ATOR E COMEdIANTE SíLVIO MATTOS — NO PAPEL dO dIRETOR. A TRILHA SONORA FOI COMPOSTA POR KITO, SAxOFONISTA

dA BANdA FuNK COMO LE GuSTA. O COMERCIAL SERá VEICuLAdO duRANTE uM ANO EM CAdEIA NACIONAL dE TV, TV A CABO, CINEMA, MídIA ALTERNATIVA E INTERNET.

Prêmio internacionalA filial brasileira da marca de rou-pas diesel foi a grande premiada do MCM Awards, uma série de prêmios que a marca internac-ional oferece para suas melhores ações de comunicação em todo o mundo. A produtora Canvas 24p levou o prêmio de melhor filme, um clipe feito com o dj america-no Moby, em uma festa da diesel no Rio de janeiro. O filme tem cerca de três minutos e empolgou o público de Berlim, onde foi feita a premiação. Com direção de Wiland Pinsdorf, o filme con-correu com trabalhos feitos no japão, França e Canadá.

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Produtor e diretor de cinema e publicidade, ator de teatro, organizador de eventos. Talvez o termo produtor cultural defi-

na melhor as múltiplas áreas de atuação de Emanoel Freitas, que hoje também está à frente do Festival de Belém do Cinema Brasileiro, mas ainda assim não abrangeria todas as atividades que ele exerce. Para quem começou a trabalhar por livre e espontânea vontade aos sete anos de idade, a agenda lotada de hoje não causa espanto.Adoro contar essa história. Eu tinha sete anos e fui a uma feira de automóveis com meu tio. Vi várias pessoas fan-tasiadas como personagens da Disney e pensei: ‘é isso o que eu quero ser!’ Então fui falar com o produtor e pedi para tra-balhar com ele. Ele me deu um cartão, pediu para eu ligar depois, mas dali a pouco veio falar que o figurante do Pato Donald tinha faltado. Me fantasiei e fui trabalhar. Meu tio cansou de me procu-rar e foi embora, depois voltou com a família inteira. Quando vi aquilo, percebi que vinha bronca. Então fiquei lá, fan-tasiado, até o final. Daí fui para casa e disse que tinha arrumado um emprego e que ia trabalhar. Meus pais foram con-tra, eu não precisava, mas depois que me comprometi a continuar estudando eles aceitaram. durante quatro anos, Emanoel viajou por todo o Pará com a companhia de anima-ção de festas. Aos 11 anos, decidiu que ia alçar vôo sozinho. Pegou todo o dinheiro que tinha guardado e pediu para um amigo que ia à disneyworld para com-prar as fantasias para que ele tocasse seu próprio negócio. Ao comunicar ao chefe sua decisão, recebeu uma contra-pro-posta tentadora: a empresa o contrataria como terceirizado, pois não se interes-sava em manter a divisão de animação

rearticular o Crava — Coletivo de Realizadores de Audiovisual da Amazônia, movimento que existiu na década de 70 e andava desmo-bilizado. Como fazia teatro, com-ecei a participar e fui eleito para a primeira diretoria, que organizou o 1º Encontro de Profissionais de Cinema e Vídeo Rumo ao Pólo Amazônico, em maio de 1997. Conseguimos então uma parceria com a Sudam, que rendeu quatro episódios do pro-grama “Lendas Amazônicas”, exibido pela GNT. Em final de 98, o Festival de Cinema da Amazônia aconteceu em Belém, e Emanoel foi eleito presidente da Associação Brasileira de documentaristas (ABd) da região Norte. No ano seguinte, começou a articular a criação de leis estaduais e municipais de incentivo ao cinema e daí surgiu o Prêmio Estímulo da Prefeitura de Belém. Foi quando teve a oportunidade de produzir curtas-metragens, o que vem fazendo em paralelo com a produção de comer-ciais e as atuações no teatro. Em janeiro, Emanoel ainda estreou na direção de cinema, com o curta “Era uma Vez Carol”, produzido com o edital do Ministério da Cultura para curtas de temática infanto-juvenil.E nos últimos anos ainda encontrou tempo para se graduar em Gestão e Produção de Eventos, fazer um curso de especialização e um MBA em gestão empresarial. Como comecei no teatro, como artista, percebi que o artista

precisa se preparar, ter noção de gestão empresarial, para con-seguir dar conta de

seu trabalho. O produto cultural já tem seu marketing, mas o artista precisa ter uma empresa que funcione como empresa. Afinal, o produtor cultural acaba funcionando como um empre-iteiro, por conta da burocracia. Os dois trabalham com dinheiro público, pre-cisam prestar contas.

Lizandra de Almeida

de festas. O negócio prosperou tanto que, ao completar 14 anos, Emanoel já era dono de seu próprio buffet, que organizava fes-tas de aniversário completas e empregava a família inteira. Nessa época, o diretor Hector Babenco se preparava para filmar “Brincando nos Campos do Senhor” (1991) em Belém. A produção abriu inscrições para figurante e Emanoel se inscreveu. Foi sele-cionado e pouco depois já era o assistente de produção responsável por toda a figu-ração. Foi quando teve o primeiro contato

com o cinema nacional.já envolvido com o teatro, pegou todo o din-heiro que ganhou e investiu na montagem de um espetáculo infantil. O projeto rendeu um contrato de patrocínio de cinco anos com a companhia aérea Taba, que contratou o grupo para montar esquetes a bordo, em vôos pelo Brasil. Em 1995, produtores de audiovisual da região Norte começaram a tentar

Artista e empresário desde pequeno

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EMANOEL FREITAS

o ARTISTA PRECISA SE PREPARAR, TER Noção DE GESTão EMPRESARIAl, PARA CoNSEGuIR DAR CoNTA DE SEu TRABAlho.

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Mudança na Recorddennis Munhoz deixou a presidência da Rede Record, cargo que ocupou por dois anos, e passa a se dedicar ao seu escritório de advocacia. Em seu lugar na emissora assumiu Alexandre Raposo (foto). O profissional tem 11 anos de trabalho no comando de emissoras da rede, tendo sido diretor geral de algumas delas, como TV Itapoan/BA e Record Rio/Rj. Segundo a assessoria de imprensa da Record, a mudança foi uma decisão dos acionistas da rede.

Personalidade cinematográfica O secretário do Audiovisual do Ministério da Cultura, Orlando Senna (foto), recebeu em Tiradentes (MG) o Prêmio Personalidade do Cinema Brasileiro 2004, também atribuído ao ministro da Cultura, Gilberto Gil, que o rece-berá em outra ocasião, ainda sem data defi-nida. O prêmio foi criado este ano por asso-ciações cinematográficas regionais, como Abraci (Rio), Apaci (SP), Aprocine (Brasília) e APCN (Norte e Nordeste). Segundo a cineas-ta Tetê Moraes, vice-presidente da Abraci, a intenção é reconhecer a contribuição do secretário e do ministro para o fortalecimen-to da produção audiovisual independente brasileira. Representado por troféu criado pelo artista plástico mineiro dos Anjos, o Prêmio Personalidade do Cinema Brasileiro pretende destacar anualmente duas persona-lidades da área do audivisual.

Novo talento na Companhia de CinemaA Companhia de Cinema acaba de contratar johnny Araújo. O diretor começou sua carreira na jx Plural, há 12 anos, onde atuou como montador de julio xavier até 1997, quando se tornou um dos diretores de cena da produtora. desde então, dirigiu filmes para clientes como Kasinsky (W/Brasil), Flying Ice (Eugênio), Suggar (W/Brasil), Click 21 (Carillo Pastore), entre outros. Para o mercado internacional, dirigiu Rum Barceló para a agência zugbi Miami. Além disso, o diretor já ganhou sete prêmios no Video Music Brasil. Entre eles os de “Melhor Clipe do Ano”, em 2003 e 2004, sendo que em 2003 também levou o de “Melhor direção em Videoclipe”, pro-duzidos para o músico Marcelo d2. Este ano, johnny Araújo começa a filmar seu primeiro longa-metragem, que tem roteiro escrito por Chorão, vocalista da banda Charlie Brown jr.

Reforço na OmnicomO diretor associado Edson Cappellano, o Capê, reassumiu o departamento comercial da Omnicom Imagem e Comunicação, de Marco Fabio Cataldi, o Caco (centro), e josé Roberto Vaz Guimarães, o Teto. Com sede em São Paulo e filiais equipadas em Recife e Florianópolis, o objetivo da produtora é aperfeiçoar o departamento, principal-mente no segmento de vídeo empresarial. Nos últimos três anos, Capê vinha atuando como diretor de cena da produtora, que faturou uS$ 1,5 milhão em 2004 e prevê crescimento de 15% para 2005. Além dessa mudança, a Omnicom contratou Renata Oliveira Lopes (na foto, à direita), ex-CL-A e Intermeio, para o departamento de relações públicas; e Cássia Maurício (à esq.), que tem sete anos de experiência na área de direção e roteiro, para o atendimento aos clientes no pós-venda. Elas receberão a consultoria técnica e artística de duda Fratino, editor e coordenador de edição.

Contratação na BandO apresentador Otaviano Costa fechou no final de janeiro contrato com a Band. Ele começou na “nova casa” no dia 4 de fevereiro, integrando a cobertura do Carnaval (Band Folia), direto de Salvador.

Mixer reforça timeA equipe da Mixer reforçou seu time com vários profissionais neste início de ano. Fefo de Souza (1), que deixa a Casablanca depois de oito anos, é o novo supervisor de efeitos especiais da produtoras (veja matéria na página 64). A área de mídias interativas e criação digital, pela qual responde a Rdigital Mixer, ganhou dois reforços. julia Nogueira (2) é a nova produtora e será responsável pelo fluxo de informações e pela coordenação de produção dos projetos. débora Carvalho (3) assume o atendimento da área de mercado de computação gráfica e web.

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Gigante atentoO grupo Globo saiu da uTI financeira e colocou a casa em ordem, mas sabe que ainda tem muitos desafios a enfrentar. Empresas de telefonia e grupos de mídia internacionais são os principais focos de atenção.

No dia 26 de abril de 1965 a história da televisão, da mídia e, por que não, até da política brasileira começou a mudar.

Naquele dia, nascia a TV Globo, uma aventura que o jornalista e empresário de mídia Roberto Marinho resolvia levar adiante já com mais de 60 anos de idade. Em 1971, antes portanto de chegar aos 70, pôde ver a sua aventura assumir a liderança entre todas as emissoras de TV brasileiras, posição em que permanece até hoje.

Em 2005, 40 anos depois, a Globo não é mais a mesma. Não porque sua

proteger destas ameaças passa por uma divisão clara de tarefas entre teles e grupos de mídia, divisão essa que poderia, na visão do grupo, vir até mesmo por meio de regras legais.

Aliás, quando se fala em regras, a Globo tem uma visão clara sobre o modelo institucional brasileiro. É “espetacular”, segundo Roberto Irineu, pelo menos no que diz respeito à TV aberta. O que falta são regras aplicáveis para as empresas de telecomunicações e aos grupos estrangeiros de mídia no que se refere ao conteúdo. “já que a legislação permitiu ‘vender o corpo’, que é a

por Rubens Glasberg e Samuel Possebong l a s b e r g @ p a y t v . c o m . b r | s a m u c a @ p a y t v . c o m . b r

audiência tenha caído, a concorrência de outras redes crescido, ou sua importância política e econômica diminuído. O que mudou foram as preocupações. Na entrevista a seguir, Roberto Irineu Marinho, presidente do grupo Globo, mostra especial atenção ao desafio de manter protegido o espaço conquistado pela Globo como produtora de conteúdo nacional. O avanço das empresas de telecomunicações nos territórios antes restritos às empresas de mídia e a chegada de grandes grupos de comunicação multinacionais são questões de “soberania nacional”, segundo suas próprias palavras. O desenho que a Globo imagina para se

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Globo40 anos

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infra-estrutura, tem que ‘preservar a alma’, que é o conteúdo”, diz o presidente do grupo Globo.

A polêmica mais recente foi o projeto de criação da Ancinav, que vinha acompanhado de uma proposta de reforma do arcabouço legal do audiovisual e que, definitivamente, não agradava ao maior grupo de mídia brasileiro. E assim como em outros episódios em que propostas polêmicas de regulamentação do setor audiovisual estavam fora de sintonia com a Globo, também este foi engavetado, o que mostra o inegável peso da emissora da família Marinho nas questões envolvendo a comunicação social no Brasil. Importância, aliás, que conscientemente fez o grupo Globo esperar algumas semanas antes de anunciar o default de suas dívidas, em 2002. Temia que a repercussão do fato pudesse interferir no resultado das eleições presidenciais daquele ano.

Nesta entrevista, a história do grupo Globo não foi repassada em detalhes, por uma opção da própria reportagem. Preferiu-se focar os desafios presentes e futuros, daí a ausência de temas sempre controvertidos, como a relação do grupo com a política.

A TV Globo admira sua própria produção, orgulha-se de um método de trabalho baseado em “talentos”, “investimentos” e “riscos”, ressalta que é nessa fórmula que está o segredo de seu sucesso e da preferência da audiência. A Globo faz questão de separar sua hegemonia sobre o mercado de um alegado monopólio, que ela assegura não ter. A Globo se vê como uma opção do telespectador, como uma “opção pela qualidade”, e por isso não é simpática à idéia de sofrer restrições do ponto de vista concorrencial. Ou seja, não acha que a audiência conquistada deva sofrer limitações, como sofrem outros mercados quando existe excessivo predomínio de um player.

O grupo Globo como um todo

TELA VIVA - A liderança da Globo se deve apenas às suas próprias competências ou faltou concorrência?

ROBERTO IRINEu MARINHO - Sempre fomos uma empresa de televisão que reinvestiu a maior parte de seus lucros, praticamente tudo, em seu próprio negócio, em talentos e em tecnologia. Corremos riscos, investimos na criação de um padrão de qualidade cultural, artístico, do texto, da linguagem, da interpretação, da cenografia, do figurino, da luz e por aí vai. Esse esforço em fazer um produto para atender ao gosto dos brasileiros e o reinvestimento constante fez com que a TV Globo se tornasse o que é. Se a história das outras televisões tivesse sido igual, provavelmente a concorrência teria sido muito maior. Como a história não foi essa, acho que a cada dia nos distanciamos mais.

E a rede de afiliadas, que peso tem?

O primeiro produto em rede foi o jornal Nacional em 1969. Até então nossos programas eram distribuídos apenas no Rio, São Paulo e Belo Horizonte. Os dois primeiros afiliados foram a TV Triângulo, em Minas, e a RBS, na época TV Gaúcha, no Sul (cobrindo Rio Grande do Sul e Santa Catarina). Essa foi a rede original, cobrindo os cinco estados. Mas essa rede foi crescendo e foi fundamental ao longo dos anos seguintes até atingir a cobertura de toda a população brasileira. quando você se propõe a ser uma emissora de massa, chegar a todos é fundamental, e a rede de afiliadas é o caminho. Elas levam o nosso sinal ao Brasil todo e nos aproximaram das comunidades, fazendo jornalismo local e ações comunitárias. E são também muito importantes para o mercado

tem passado também por momentos complicados nos últimos anos. Roberto Irineu descreve esses momentos de forma emocionada. Na entrevista, comoveu-se ao falar do momento em que o grupo optou por não pagar seus compromissos e partir para a renegociação. Também se emocionou ao descrever como naquele momento a família se viu obrigada a vender boa parte de seu patrimônio para tentar contornar a crise, decisão hoje vista como “burrice” pelo próprio Roberto Irineu, como quando venderam, em 2002, participações em emissoras de televisão afiliadas de pequeno e médio porte.

depois de dois anos de negociação com os credores, apenas agora a Globo (como grupo) sai da uTI. Não que a TV Globo em si tenha sido pesadamente afetada. Ela faturou sozinha no ano passado perto de R$ 3,5 bilhões (R$ 1,68 bilhão até junho de 2004, segundo o último balanço público) e não perdeu

audiência, muito pelo contrário. Mas a TV Globo era a principal garantidora das dívidas do grupo, que totalizavam uS$ 1,34 bilhão. Após o acerto com os credores, a dívida deve cair para perto de uS$ 800 milhões, com prazo até 2012 para pagar. O grupo teve no total receita líquida no primeiro semestre de 2004 de R$ 2,251 bilhões e EBITdA de R$ 614 milhões, o que permite estimar um EBITdA de uS$ 400 milhões, por ano, para a dívida de uS$ 800 milhões depois dos acertos.

um grande desafio da TV Globo é ter, até 2012, esse compromisso de pagamento com os credores, e (pelo histórico de default) não terá facilidade de acesso a capital. Não pode, portanto, se dar ao luxo de perder mercado, fato que se soma aos interesses de preservação da “soberania nacional” quando fala em garantir a grupos nacionais o conteúdo veiculado sobre os diferentes meios. >>

uMA MídIA dE MASSA quE TEM CAPACIdAdE dE ATINGIR A TOdOS OS BRASILEIROS AO MESMO TEMPO, quE CHEGA A 160 MILHõES dE PESSOAS, ISSO NãO É ALGO quE POSSA SER SuPERAdO.

publicitário, porque oferecem condições para que pequenos anunciantes em todo o Brasil tenham acesso à televisão.

Qual é o peso comercial dos mercados regionais e do mercado nacional para a TV Globo em termos de faturamento?

Cerca de 25% da receita total da rede vêm de anunciantes locais. Em torno de 75% vêm de anunciantes nacionais, divididos em 40% de veiculação spot e 35% de veiculação nacional.

Para manter a liderança, a Globo pretende continuar correndo riscos ou será mais conservadora?

Ela deve continuar assim, assumindo riscos, como é e sempre foi. Está na nossa essência. A gente tem que sempre surpreender.

Vocês vêem algum indício de que o formato que a Globo ajudou a criar e consolidar, tanto do ponto de vista

artístico quanto do ponto de vista de grade de programação, esteja se mostrando cansado?

Estamos batendo recordes de audiência desde que foi criado o mecanismo de aferição de audiência com o “people meter”. Em 2003 e 2004 tivemos as maiores audiências desde 1997. Isso na medição das 7h à meia-noite. Mas em todos os horários nossa audiência é crescente.

O fato de ter tanta audiência não amarra a Globo do ponto de vista de criatividade, inovação?

Mas é exatamente o fato de sermos criativos que nos dá essa grande audiência.

Se vocês já estão dando o que as pessoas gostam, a tentação de

Huck e do Serginho Groisman. Futebol também é algo que não tinha espaço fixo, e agora tem. A grade da Globo tem como segredo justamente esta mobilidade, para que continue agradando. A estrutura de novela, jornal e depois outra novela realmente existe há muito tempo, mas é um hábito: as pessoas se encontram para ver a novela e o jornal. E queremos ser esse ponto de encontro.

Internet, celular, computador etc. mudam o hábito de consumo de informação e entretenimento das pessoas. Como a Globo responde a isso para não perder a audiência desta geração “online”?

Temos participado do surgimento e do desenvolvimento de todas as novas alternativas de distribuição. Não temos restrição em relação a isso. Todo veículo tem futuro se entregar o que o público quer com competência. A tecnologia em si não basta para nada. Ela não cria fascinação, a não ser para os fanáticos por tecnologia. Tem que ter conteúdo. E a escolha do usuário vai ser pelo melhor.

Vocês pretendem trabalhar outros formatos?

Sim, de forma integrada. É o que chamamos de “cross-media”. uma mídia não substitui a outra no nosso entendimento. Elas se estimulam e se complementam. Sempre foi assim, desde o rádio.

A TV aberta vai perder para outras mídias a importância que tem hoje na distribuição de conteúdo?

Eu acho que isso será muito difícil. uma mídia de massa que tem capacidade de atingir a todos os brasileiros ao mesmo tempo, que chega a 160 milhões de pessoas, isso não é algo que possa ser superado. Ela só será superada se não tiver competência e capacidade para continuar administrando seus fatores de sucesso: seus talentos, sua capacidade de se auto-renovar.

Nem deixará de ser um hábito

manter tudo como está é muito grande, não?

As pessoas gostam de coisas novas, não podemos repetir sempre a mesma coisa. A Globo sempre tenta se superar. Para falar de dois exemplos mais recentes: a minissérie “Hoje é dia de Maria” veio com uma linguagem, uma tecnologia completamente inovadora e com grande audiência. “Mad Maria” também envolveu uma equipe de 400 pessoas no meio da selva, o que é um risco imenso que se comprovou valer à pena. Também não é verdade quando se diz que nosso formato é sempre o mesmo. Mudamos a nossa grade todos os anos, sempre apresentamos algo diferente. Hoje temos “reality shows”, o que não existia cinco anos atrás; também não tínhamos programas de entrevistas como os do jô Soares, da Ana Maria Braga, do Luciano

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AS PESSOAS ACHAM quE PARA COMPETIR COM A GLOBO É PRECISO ACABAR COM A GLOBO. NãO É POR Aí. É Só FAzER MELHOR.

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cultural...A TV aberta é espelho e vitrine da

sociedade. Falo da TV Globo. quando a gente olha para os EuA, por exemplo, a coisa é diferente. As televisões abertas americanas parecem ter perdido espaço e a estima do telespectador. Talvez isto explique o maior crescimento da TV por assinatura, no mercado americano. A TV aberta só perde espaço quando perde eficiência.

Essa força da TV aberta talvez seja a razão de outras formas de distribuição não terem se massificado. Veja o caso da TV paga. Em sua última entrevista (à revista PAY-TV, em outubro de 2001), você até brincou dizendo que para a TV paga crescer era preciso jogar uma bomba na Rede Globo...

É claro que aquela frase foi uma brincadeira. Mas no fundo as pessoas realmente acham que para competir com a Globo é preciso acabar com a Globo. Não é por aí. É só fazer melhor. A TV por assinatura na Argentina, por exemplo, teve grande sucesso com os canais estrangeiros porque a TV aberta lá era muito ruim na época. Aqui os mesmos canais estrangeiros tiveram pouca repercussão, quase nenhuma, porque a TV aberta é ótima e os canais nacionais oferecidos pela TV paga também são. quando um canal agrega alguma coisa ao espectador, ele faz sucesso. É só pegar a lista dos dez canais mais assistidos na TV paga brasileira: são quase todos canais feitos por brasileiros. Globo News é bem feito, SporTV é bem feito, por isso têm audiência. A Globosat tem a melhor oferta de canais da TV por assinatura do País, com padrão de qualidade internacional. Não tem jeito, é assim que funciona. Hoje os estrangeiros lideram nos segmentos onde faltam brasileiros como nos canais infantis e nos canais de seriados.

quando brincava com a frase “joga uma bomba na Globo”, o que eu dizia é que havia duas soluções: ou se nivela por baixo, destruindo o que é bom, ou se tenta competir com produção de qualidade, correndo-se o risco de investir para ser o melhor.

As novas mídias que surgem, pelo menos do ponto de vista publicitário, acabam crescendo justamente em cima das mídias que estão mais ultrapassadas, como jornais e revistas. Isso se vê, por exemplo, no mercado de TV paga, que em termos de mercado publicitário cresceu sobre as mídias impressas e não sobre a TV aberta.

Não tenho certeza de que este seja o comportamento padrão. A única coisa que nós aprendemos é que nas crises o anunciante procura concentrar sua verba naqueles veículos que considera mais eficientes. É assim no mundo inteiro, e sem dúvida no Brasil a TV aberta é o melhor veículo e a Rede Globo é, dentro das TVs, a mais eficiente, por isso a Globo cresce nas crises. Nos últimos anos, o que houve foi um encolhimento das outras mídias em benefício da TV aberta . Voltando o mercado a crescer, como está acontecendo este ano, acho que as outras mídias voltarão a ter uma participação maior. No nosso planejamento estratégico, reduzimos a participação prevista para a TV aberta no bolo total da publicidade, e estimamos pequenos crescimentos de todas as outras mídias nessa participação. Achamos que elas voltarão a crescer porque o País crescerá, só isso.

E o crescimento de outras formas de marketing e comunicação, que não envolvem compra de espaço de mídia, isso afeta a televisão?

Estão realmente crescendo algumas formas “non-advertising” de investimento em comunicação. São novas formas das empresas se comunicarem com os seus públicos, tirando alguma verba da publicidade tradicional. Mas não prevemos nada no horizonte que assuste ou inviabilize qualquer um dos veículos de comunicação que dependem essencialmente de publicidade.

O modelo da TV aberta está baseado na publicidade, que é um mercado já consolidado. Não terá mais grandes saltos. Ou seja, cresce ou se retrai com a economia. Esse mercado, que já está tomado, tem espaço para quantas empresas, na sua opinião?

Evidentemente, esse mercado hoje

tem espaço para cinco redes iguais. Mas ele já foi muito maior e está voltando a crescer. Há espaço no mercado para uma concorrência maior entre as empresas de televisão. As redes podem se diferenciar. Algumas, é claro, devem competir nos mesmos mercados. umas devem ter estratégias mais globais. Outras mais segmentadas. As que optarem pelo modelo de massa disputarão com a Globo a preferência da população. É o papel deles tentarem e é o nosso papel competir com quem tentar.

Concorrência é muito bom porque estimula a melhoria de qualidade. E independentemente de concorrência, sempre tivemos uma motivação, uma espécie de concorrência interna, que nos faz melhorar sempre. Se você olha a TV Globo de 20, 15, dez anos atrás, você vai ver que em todos os aspectos a nossa TV melhorou progressivamente.

A Rede Globo deve ter, hoje, mais da metade da verba de publicidade do Brasil. é isso?

Não. Nem todas as televisões abertas juntas têm tal participação. Mas procuramos oferecer ao mercado publicitário o melhor retorno, a melhor relação custo benefício para o seu investimento.

mercado sempre terá papel decisivo. Até agora muito se falou em colocar conteúdo em celular. já nos pediram para colocar nossas novelas, filmes. Mas não é assim. Cada mídia tem uma linguagem, e o que falta ainda é identificar o produto e a linguagem exata para cada uma. Fizemos isso muito bem em várias mídias, mas ainda não se fez, nem nós oferecemos, uma boa linguagem e um bom formato para celular. Espero que sejamos nós os primeiros a fazê-lo e estamos trabalhando nisso.

Vocês buscam uma parceria com sociedade, como foi a Telecom Italia no Globo.com, ou é uma parceria de outra natureza?

queremos alcançar os clientes

através de todas as plataformas, mas para isto não precisamos participar acionariamente em redes de telecomunicação. O que queremos garantir é que sempre teremos um relacionamento muito especial com o nosso cliente final. É aí que fazemos diferença.

E a venda será em caráter exclusivo ou para quem quiser comprar?

Isso depende das negociações. O “Big Brother” tem exclusividade, por exemplo, mas vai depender de cada caso.

Como fica a Globo depois da mudança de estratégia na TV por assinatura e da consolidação no DTH?

Não houve mudança na nossa estratégia para a TV por assinatura. Fomos e continuamos a ser fortes em programação e produção de conteúdo nacional. Entramos na distribuição para estimular esse mercado, para que a TV por assinatura crescesse. Se a

Como a Globo vê a relação com as empresas de telecomunicações?

As empresas de telecom são empresas de infra-estrutura que distribuem conteúdos de terceiros. Não vejo lógica em elas serem produtoras de conteúdo. Aliás, no caso específico das empresas de telefonia fixa, isto fugiria ao escopo da autorização a elas concedida.

Acho que é missão das empresas de mídia produzirem conteúdos que atendam às demandas de geração de tráfego das empresas de infra-estrutura e, principalmente, dos usuários que desejarão acessar o conteúdo da sua TV, rádio ou jornal prediletos, através de diferentes plataformas.

Essa divisão de tarefas deve vir com o mercado ou deve vir com alguma imposição de regras?

Não sei. Existem iniciativas parlamentares nesse sentido, mas pessoalmente acredito que essa divisão de tarefas se consolidará pela via do mercado. Eu acho que o estabelecimento de regras nesse sentido tem um papel a desempenhar, mas a realidade de

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AS EMPRESAS dE TELECOM SãO PROVEdORES dE INFRA-ESTRuTuRA quE dISTRIBuEM CONTEúdOS dE TERCEIROS. NãO VEjO LóGICA EM ELAS SEREM PROduTORAS dE CONTEúdO.

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distribuição estivesse consolidada desde o início, esses investimentos não teriam sido necessários. Mantemos uma participação em empresas de distribuição porque esta acabou sendo a forma mais viável para fecharmos os acordos com as empresas de distribuição onde tínhamos posições dominantes ou muito relevantes. Estrategicamente sempre nos posicionamos e vamos continuar a ser empresas de programação, de produção, de entrega, por cabo, por satélite, por qualquer meio. Foi circunstancial o fato de termos estimulado, financiado a distribuição...

E perdido dinheiro...Perder dinheiro não era parte da

estratégia, mas de qualquer maneira fizemos isso para fazer crescer o negócio, e sempre tivemos clareza de que o negócio de TV paga não cresceria tão rápido quanto se projetava. Mas era necessário investir nesse mercado e ajudar a que ele se tornasse realidade no Brasil.

Por outro lado vocês abriram espaço para a News Corp., por exemplo, entrar no mercado e se firmar aqui com 840 mil assinantes, que é o que tem a Sky.

O modelo de parceria com a News sempre procurou garantir a preservação do conteúdo nacional. No satélite, a News é uma empresa de distribuição cujo conteúdo nacional é provido por uma empresa brasileira, a Net Brasil. Há acordos estabelecidos pelos quais a Net Brasil tem a responsabilidade pela programação e fornecimento de todo o conteúdo nacional.

E esse acordo é eterno?Eterno só o “Pai do Céu”...

Bom, esse acordo se mantém enquanto a Globo tiver um percentual na operação superior a 6%. Hoje temos 28%.

Nosso objetivo nos acordos iniciais com a News e na negociação feita agora é coerente com a nossa visão de que uma plataforma estrangeira

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AS ORIGENS DO uNIVERSO GLOBAL

A história da Globo já foi contada e recontada por profissionais que participaram do processo, por historiadores e pesquisadores e pela própria emissora. Os 40 anos da emissora são um marco, mas talvez ele deva ser comemorado de novo daqui a alguns anos, quando se completarão os 40 anos de liderança. “Estamos há cerca de 35 anos na liderança. Assumimos esta posição em alguns mercados em 1969 e já em 1971 tínhamos a liderança definitiva”, explica Roberto Irineu Marinho, presidente do grupo Globo, relatando o início da história da emissora.

Os recursos para começar a levantar o que se tornaria a maior emissora do País vieram, se-gundo Roberto Irineu, do endividamento em níveis absurdos assumidos por seu pai, Roberto

Marinho. A ponto de que se exigisse do único filho emancipado naquele momento (o próprio Roberto Irineu) o reconhecimento de que os atos do pai (já com mais de 60 anos) eram praticados em pleno juízo. “Ele hipotecou todas as empresas, casas, quadros, car-ros, barco, não ficou nada de fora”, diz Roberto Irineu Marinho. “Ao mesmo tempo em que ele colocou esse dinheiro todo, ele exigia profissionalismo de seus funcionários. Acabou descobrindo que era a qualidade que fazia a diferença, foi aumentando a produção brasileira de dramaturgia, substituindo o conteúdo estrangeiro...” E foi nesse momento que a Globo as-sumiu a liderança. “um ano depois do empréstimo, a TV Globo estava em primeiro lugar na audiência em alguns horários e o retorno comercial apareceu. O empréstimo feito pelo meu pai foi pago um ou dois anos antes do previsto.”

O polêmico acordo com o grupo Time-Life, firmado na década de 60 e comentado agora por Ro-berto Irineu, foi importante para a história do grupo, mas não foi o principal fator de sucesso. “A parceria com eles nos possibilitou desenhar uma emissora mais profissional. Eles nos passaram o know-how adminis-trativo, como sistemas de custos e visão empresarial do negócio de televisão”, explica. “Mas a programação

sugerida por eles não tinha nada a ver com o Brasil. Praticamente não acrescentaram nada na nossa programação e produção. E em termos de capital, o que eles colocaram apenas ajudou na construção dos estúdios da emissora do Rio de janeiro. O volume de dinheiro investido foi muito menor do que se pensa. E o retorno que eles tiveram foi extremamente favorável para eles.”

A emissora reconhece que no início tinha como uma das armas para atrair a audiência uma programação de maior apelo popular. Segundo Roberto Irineu, nas origens da TV Globo havia esse tipo de programação. “Alguns programas eram considerados popularescos e de-pois viraram cult, que muitos consideram hoje geniais, como os do Chacrinha e do Silvio San-tos”. A razão, explica, era o foco da emissora. “Programas populares em uma TV de massa são fundamentais. Éramos, e somos até hoje, não uma TV de nicho, mas uma TV de broadcast, que busca atender a população como um todo. Temos de ser capazes de agradar todo o mundo, o que é uma tarefa insana: para manter a audiência que nós temos é preciso fazer um produto que agrade simultaneamente ao público da classe A até a E.” Ao longo do tempo, a Globo reforçou a dramaturgia nacional e aos poucos eliminou os programas que não cumpriam o papel de alcançar todos os públicos.

Outro dado histórico freqüentemente relatado como um fator de sucesso do grupo foi o surgimento de uma rede nacional via satélite, o que teria acontecido com o apoio do governo militar. O governo buscava, com a Embratel, promover a integração nacional, e teria buscado na Globo apoio nessa empreitada. Segundo Roberto Irineu, a Globo não foi a única a ter que seguir essa política do governo, nem foi a única a ter os benefícios. “Existiam outras redes no Brasil, como a dos Associados, que, antes de nós, já tinham fortes centros de produção no Rio e em São Paulo e intercambiavam conteúdos entre esses estados. Nessa época, cada rede tinha seus links terrestres específicos para a transmissão de conteúdos. O nosso cobria Rio, São Paulo e Belo Horizonte”, relembra o presidente do grupo. “quando o governo decidiu criar a Embratel, lembro-me dos protestos da nossa equipe de engenharia que achava inacei-tável a imposição que todas as televisões receberam de usar obrigatoriamente os serviços da estatal.” Segundo Roberto Irineu Marinho, esses serviços eram mais caros do que os utilizados na ocasião, por todas as emissoras. “Mas o serviço oferecido pela Embratel tinha como um dos seus objetivos exatamente levar o conteúdo das TVs a todo o território nacional, e todas as televisões passaram a fazer isto. Não foi uma iniciativa nem uma inovação da TV Globo.”

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Roberto Marinho

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Não disponivel

não deveria ter condições de criar obstáculos à distribuição de conteúdos nacionais e fazer com que a produção internacional se tornasse dominante em relação à produção brasileira.

A defesa do conteúdo nacional é para nós não só uma questão empresarial, mas também assunto relevante para a proteção da nossa identidade cultural e soberania nacional. O fato de a Net Brasil estar estabelecida no Brasil, com sócios brasileiros, dirigida por brasileiros e sujeita às nossas leis é uma proteção desses valores. Nem por brincadeira podemos conviver com a hipótese de uma situação como aquela retratada no filme de james Bond, em que alguém coloca

no satélite só o que quer, só um determinado tipo de mensagem.

O acordo inicial com a News era parte de uma estratégia de parcerias do grupo. Mas a impressão que se tem é de que a Globo ofereceu o mercado, mas ganhou pouco em troca.

Não é verdade. Nossa parceria com a News sempre foi muito boa. Todo mundo diz que o Murdoch é a pessoa mais difícil do mundo, mas do dia em que o conheci até hoje só posso dizer que ele é absolutamente leal. Claro que

E se eles quiserem fazer um Fox News no Brasil, poderiam?

dentro dos princípios legais brasileiros e do modelo de parceria sobre os quais já falamos não há nada contra.

Em síntese, a Sky continuará sendo uma franqueada da Net Brasil?

dentro deste conceito de franqueada, para conteúdo brasileiro, sim. A legislação brasileira

estabelece que todos os sistemas de distribuição de TV por assinatura estrangeiros devem recorrer a empresas nacionais para oferecer programação no Brasil. Pelo nosso acordo na Sky, a Net Brasil será a empresa utilizada, ela será legal-mente responsável pelo conteúdo que disponibilizar. O objetivo da legislação é este. É garantir que haja empresa “ao alcance das leis nacio-nais” que tenha a responsabilidade pelo conteúdo que é ofertado aos brasileiros. Não dá mais para pensar na idéia de existir um vilão, como o do filme do james Bond.

Que, aliás, era uma alusão indireta ao Murdoch, com a imagem de um grande magnata da mídia.

Se era uma alusão a ele, acho que era injusta. Ele não é nada semelhante. Mas aquela é uma fantasia de Hollywood, que coloca um cenário preocupante...

Na hipótese então deste “cenário” de Hollywood vingar, o Brasil estaria protegido, na sua visão?

Em boa medida sim. Não só por causa do nosso acordo específico, mas porque ele é o reflexo do princípio legal geral. Além disso, no nosso caso, a Globo também é membro do board da Sky, e

ninguém é bonzinho negociando, nem é isso que se espera de um negociador, mas ele jamais fez qualquer tipo de deslealdade conosco.

Temos uma ótima parceria que mudou de configuração por envolver alguns investimentos que, pela consolidação do mercado de TV por assinatura, não era mais imprescindível fazermos. Além disto, era cada vez mais impossível acompanharmos os investimentos na mesma proporção que vínhamos fazendo. Mudamos a

proporção societária e agora está tudo certo. Todo o mundo saiu ganhando.

A Globo terá possibilidade de distribuir seu conteúdo pelos veículos da News Corp.?

Isso já estava nos nossos contratos originais, mas agora está mais claro. Temos espaço garantido para colocar novos canais em plataformas mundiais da News. Há ainda questões contratuais a serem ajustadas. Podem ser canais em português, em espanhol ou em inglês. Nosso objetivo é ter a produção brasileira na maior quantidade de países do mundo.

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TEMOS ESPAçO GARANTIdO PARA COLOCAR NO-VOS CANAIS EM PLATAFORMAS MuNdIAIS dA NEWS. NOSSO OBjETIVO É TER A PROduçãO BRASILEIRA NA MAIOR quANTIdAdE dE PAíSES dO MuNdO.

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continuaremos exercendo lá a nossa responsabilidade editorial.

Mas a legislação brasileira protege o conteúdo nacional?

A lei que criou a Ancine nos protege razoavelmente. Mas é preciso que se crie um aparato mais amplo e claro, que evite, por exemplo, a criação de empresas brasileiras de fachada, que na prática são controladas pelos distribuidores internacionais.

Imagino que o modelo que existe no caso da Sky, onde há uma empresa realmente brasileira responsável pela programação nacional, deve ser estendido a todas as plataformas. Acho que não deveria haver espaço para que o capital estrangeiro, dono da infra-estrutura, transmitisse diretamente um conteúdo sem passar por uma empresa brasileira programadora que esteja sujeita às leis brasileiras.

E como se faz com tecnologias em que a princípio não há fronteiras, como a Internet, por exemplo?

No fundo há fronteiras... Claro que a gente consegue ler o Financial Times ou ouvir a BBC pela Internet, e não devem existir barreiras ao acesso, ao conteúdo. Somos contra qualquer forma de censura. Mas na hora que o Financial Times quiser fazer uma edição brasileira, ele deveria estar sujeito à mesma legislação das demais empresas que fazem comunicação social para brasileiros, como as TVs, rádios etc. Não é algo simples, mas é algo importante e que faz sentido.

O grupo Globo acha que seria necessário uma legislação específica para essas questões? Vocês sempre foram refratários a idéias desse tipo, como uma Lei de Comunicação, por exemplo.

A mesma forma de proteção ao conteúdo nacional criada na Sky vale para a Net Serviços, operadora de cabo em que a Globo é sócia e na qual a Telmex tem a perspectiva de se tornar controladora?

Vale, claro, e deveria valer para todo o mundo.

Para a Telefônica também, por exemplo?

Claro, para todo o mundo. Como muitas empresas de infra-estrutura de distribuição são hoje internacionais, é um risco que controlem toda a cadeia de valor da comunicação social, desde a ponta da produção até a entrega ao cliente final. de novo, é uma questão de identidade e até de soberania nacional. Este tema precisa ser enfrentado no Brasil com firmeza, mas sem qualquer traço de xenofobia ou de temor à concorrência saudável.

investimentos feitos. Isto beneficiará as empresas nacionais, estimulando-as a serem cada vez mais competentes. uma empresa de telecom quer conteú-do para aumentar o seu tráfego e seu faturamento. Se a Globo e outras empresas brasileiras produtoras de conteúdo forem capazes de atender à demanda, está ótimo. Todos sairão ganhando.

Como vocês vêem a entrada de sócios estrangeiros em empresas brasileiras de comunicação, como aconteceu com o Grupo Folha e a Portugal Telecom?

No caso do acordo da Folha, não conheço detalhes porque eles não foram publicados. devem estar ainda finalizando as negociações para poder revelar. Mas me parece que não haja qualquer problema. Entraram com 21%. A Constituição fala que pode ser 30%, então está tudo certo.

Vocês seriam refratários a um sócio estrangeiro?

Não seríamos refratários a princípio. Teríamos que avaliar as condições, mas não vejo nesse mo-mento nenhuma vantagem para nós. No caso da Folha, eles devem ter visto uma vantagem.

E em relação à abertura de capital?É diferente. uma coisa é chamar

um sócio para adquirir um grande pedaço. Para fazer isso teria que agregar muito, e não vejo quem agregaria esse valor à nossa em-presa agora.

Nem uma News Corp.?Nem uma News. Não vejo onde

eles agregariam. Outra coisa é abrir capital que pode até ser feito no Brasil mesmo, pulverizando algu-mas ações. É uma hipótese ainda não estudada. Nada contra, nem a favor. Pode acontecer, mas não tenho o que dizer a respeito disso porque não estamos trabalhando com essa hipótese.

arcabouço legal brasileiro, dos princípios constitucionais que garantem liberdade de criação, expressão e comunicação, proib-indo qualquer forma de censura ou con-strangimento aos meios de comunicação. A partir daí, devemos aumentar a proteção ao conteúdo nacional? Sim, porque isso além de estar previsto na Constituição é essencial para o País.

E a regulamentação implicaria novas regras para a televisão?

Pode implicar, dentro dos princípios constitucionais, que garantem a liberdade e a democracia. Se os princípios valerem para todos, está ótimo.

Mas o poder de compra das teles pode causar distorções nesse mer-cado, não?

Pode. Mas com regras claras as empre-sas de distribuição estarão sempre bus-cando os melhores conteúdos nacionais que lhes permitam o melhor retorno dos

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O quE PRECISAMOS REGuLAR MELHOR É A quESTãO dO CONTEúdO: já quE A LEGISLAçãO PERMITIu ‘VENdER O CORPO’, quE É A INFRA-ESTRuTuRA, TEM quE ‘PRESERVAR A ALMA’, quE É O CONTEúdO.

>>

Não somos refratários às leis que regulem o setor. Aliás, temos muitas leis e as cumprimos todas. O que não aceitamos é qualquer lei que afete a liberdade de criação, expressão e co-municação. Isto seria o fim dos meios de comunicação e risco inaceitável para a democracia brasileira. Estamos falando de leis que não interferem em conteúdo. Nos EuA, por exemplo, ne-nhum estrangeiro pode ser 100% dono de uma empresa de telecomunicação.

Mas aqui não dá mais para voltar atrás. Na privatização da Telebrás já se permitiu a entrada de empresas estrangeiras com 100% do capital das teles.

É fato consumado. Minha opinião pessoal é de que isso não foi o melhor para o Brasil. Mas agora essa é a regra do jogo. Então, é necessário separar claramente o que é infra-estrutura, com seus direitos e suas obrigações, e para isso existe a Lei Geral de Tele-comunicações, a Anatel etc. Esses mecanismos são necessários porque o Brasil precisa ter meios para, por exemplo, evitar que, com uma crise na matriz de empresa internacional, se raspe o caixa da subsidiária aqui e se prejudique os serviços que devem ser prestados aos brasileiros. É preciso ter proteção e a solução dada é boa, estamos razoavelmente protegidos. O que precisamos regular melhor é a questão de conteúdo: já que a legisla-ção permitiu “vender o corpo”, que é a infra-estrutura, tem que “preservar a alma”, que é o conteúdo.

Mesmo que isso implique o estabelecimento de regras recicladas para a própria TV aberta, que tem uma legislação antiga? é difícil fazer uma legislação dessas, valendo só para as teles e sem englobar a TV.

O essencial é a preservação do

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A maior crítica que se faz à Globo é ao fato de ela ter praticamente o monopólio da audiência...

É indispensável entender a diferença entre hegemonia e monopólio. O que temos é audiência, que o telespectador elege, segundo a segundo, com o controle remoto. Mas nós temos menos concessões que muitos grupos. A Globo tem apenas cinco concessões.

E mesmo assim vocês conseguem ser o grupo de comunicação hegemônico.

Isso é decorrência da livre iniciativa e da democracia. Enquanto o público puder optar por aquilo que mais lhe agrada, cabe aos grupos concorrerem para agradar ao público. A Globo teria o monopólio se tivesse 50% das concessões ou qualquer vantagem competitiva que não pudesse ser conseguida por outras empresas do mercado. Mas é exatamente o oposto. Tudo o que conseguimos, conquistamos na livre competição do mercado. Temos a preferência na audiência porque trabalhamos para isso, para que as pessoas tenham o que elas querem. Mas o consumidor tem o poder de mudar a todo instante. Está ao alcance da mão, no seu controle remoto. E ele faz isto o tempo todo.

Ainda que a audiência da Globo seja um mérito dela, ou demérito dos outros, isso cria uma distorção de mercado, não? Há casos em que o governo intervém justamente para corrigir esse tipo de distorção, como ocorre em casos de fusões.

Na história da TV Globo nunca houve a fusão de dois grupos fortes para garantir a preferência do público. Ao contrário. Começamos mais fracos que as TVs pré-existentes e fomos conquistando o público dia a dia. Concorremos no Brasil com grupos economicamente muitas vezes mais fortes do que nós, que distribuem seus conteúdos em várias TVs abertas e fechadas. Muitas vezes os telespectadores optaram pelos conteúdos oferecidos por outros

momentos difíceis do cinema a TV manteve ativos os principais roteiristas, diretores e profissionais da área cinematográfica e audiovisual. Sempre tivemos semanas especiais de exibição de filmes nacionais. Fizemos uma parceria com grandes cineastas brasileiros e criamos o Canal Brasil. Criamos a Globo Filmes e em três anos apoiamos a produção de filmes de mais de 25 diretores independentes. Também há os acordos que fizemos com alguns produtores independentes para co-produções e os resultados são ótimos. Aliás, não é verdade quando falam que não damos espaço para co-produções e produções independentes, temos várias parcerias excepcionais.

O problema é que poucos conseguem e muitos querem esse tipo de parceria...

Mas aí não tem jeito. Infelizmente,

não dá para fazer isso com todas as empresas e profissionais talentosos do Brasil. de qualquer maneira, as parcerias estão crescendo, desenvolvendo novos formatos que têm funcionado muito bem. As parcerias que temos com as afiliadas para trazer produção regional para a rede nacional também têm dado certo. Agora temos parceria com os clubes de futebol para desenvolver novos formatos e produtos e também para trazer mais público para os estádios, é um outro caso que eu acredito que teremos grande sucesso. Em resumo, parceria é uma mudança de atitude e que tem que ser feita pensando em ganhos para os dois lados, e temos evoluído muito nesse sentido. Vamos buscar parcerias com as teles e com outras redes de distribuição.

Existe algum critério para fechar

grupos de comunicação e nós perdemos audiência e faturamento. E muitas vezes trabalhamos duro e retomamos a preferência e a audiência.

A exemplo do que ocorre na maior parte do mundo, o que o governo precisa fazer é criar estímulos para que mais grupos de mídia nacionais se fortaleçam e jamais admitir a hipótese de enfraquecer qualquer grupo nacional. Somos uma empresa 100% brasileira que, apesar de comparativamente muito menor do que os grupos mundiais de mídia, consegue competir e garantir a presença de conteúdo nacional para o público.

Mas essa é uma realidade na regulação de outros mercados: o governo pode interferir no mercado para corrigir distorções se entender que elas existem.

Eu não vejo esse tipo de distorção no caso do mercado de informação e entretenimento. Eu acredito sim em competição justa. Se a Globo estivesse

fazendo dumping ou qualquer outra forma de concorrência desleal, deveria ser detida. Mas nós não fazemos nada disso. Aliás, nosso preço e práticas comerciais são absolutamente transparentes.

Trabalhamos seriamente, remunerando bem nossas equipes e pagando todos os encargos e impostos. Não vejo porque alguém possa pensar em impedir a Globo de continuar a trabalhar com qualidade e seriedade e querer nivelar por baixo. Punir uma empresa pelo seu sucesso me parece inaceitável. Não falo como Roberto Irineu, presidente da Globo, mas como cidadão e pai de família. Não poder oferecer o melhor para meus filhos é absurdo.

Parte do setor de cinema pede mais possibilidade de distribuição pela TV aberta. Este casamento é possível?

Ele já existe. Nos momentos áureos do cinema brasileiro ele influenciou a linguagem e a estética da TV. E em

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É INdISPENSáVEL ENTENdER A dIFERENçA ENTRE HEGEMONIA E MONOPóLIO. O quE TEMOS É AudIêNCIA, quE O TELESPECTAdOR ELEGE, SEGuNdO A SEGuNdO, COM O CONTROLE REMOTO.

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parcerias com a Globo? Por exemplo, seguir um determinado padrão de qualidade?

A qualidade é sempre a melhor possível. Aliás, apontando a mira sempre um pouco acima do padrão. Isso se faz com pesquisa, com compreensão do que as pessoas vão querer não hoje, mas amanhã.

Vamos falar um pouco de erros e acertos da Globo.

Se eu começar a falar dos erros vou dar as pistas estratégicas para o futuro. Tivemos muitos erros, felizmente mais acertos do que erros. Mas não vou falar quais foram.

Por exemplo, nunca mais vão montar uma emissora na Itália?

O melhor caminho para a conquista do mercado mundial não é montar emissora em nenhum país estrangeiro. Não repetiremos esse projeto.

A entrada no setor de TV por assinatura foi um erro?

Não, foi um acerto. Foi um acerto estratégico em geral. Tivemos dificuldade porque apostamos numa estabilidade do mercado brasileiro que não aconteceu e numa oferta de crédito que desapareceu. O erro foi operacional, a estratégia estava correta.

Mesmo que isso tenha colocado a Globo em uma complicada situação financeira, com a suspensão do pagamento da dívida e tudo o mais?

É um processo muito duro e violento, é verdade.

Como foi o dia de declarar o default para vocês?

Muito triste, muito difícil. Eu particularmente me senti muito mal. É algo que não faz parte das regras e valores com que estamos acostumados a trabalhar. Nunca atrasamos deliberadamente um dia sequer o pagamento de nossos funcionários. Sempre pagamos os nossos fornecedores e impostos em dia, renegociando é claro quando foi

o valor dos nossos bonds despencou de 80% para 40% do valor de face.

Acharam que vocês perdiam a capacidade de gerar mais caixa?

Não, acharam que estávamos malucos, foi isso que passamos para o mercado. quando nos viram vendendo a participação nas emissoras e colocando dinheiro na holding o papel caiu muito mais. quando declaramos o default o valor de negociação dos bonds finalmente subiu. Foi o jeito de dizerem que estávamos fazendo a coisa errada e depois a coisa certa. Se pegarmos os dados de mercado, o histórico, vamos ver exatamente a variação de nossos papéis em função dessas tentativas. A confiança na nossa capacidade de arcar com os compromissos caía enquanto estávamos fazendo o possível para pagar e passou a subir quando assumimos nossa incapacidade e começamos a renegociar. Claro que isso a gente consegue ver hoje, com a observação histórica, mas na verdade o mercado indicava os nossos erros. deveríamos ter buscado a renegociação antes, com um caixa maior, com ativos que eram valiosos na nossa estratégia e para a nossa família. Mas o importante é que fizemos uma renegociação que foi muito benéfica para a empresa e para os nossos credores. A evolução dos nossos bonds, que hoje são negociados a 100%, reafirma isto.

utilizar o patrimônio pessoal foi o que o seu pai fez quando montou a Globo...

E ele ainda havia hipotecado. Nós tivemos que vender coisas muito rentáveis. uma emissora de TV pequena é mais rentável do que uma grande. E ainda vendemos em um ano péssimo, com o mercado retraído. O aprendizado, no final das contas, foi o seguinte: nas dificuldades, é melhor chamar logo os credores e estabelecer uma relação de parceria com eles, como depois fizemos. Buscar uma solução sólida e duradoura em que todos saiam ganhando é o que deve ser feito. Acho que foi o que conseguimos.

necessário, mas sempre bilateralmente. Então tomar a decisão do default foi uma decisão difícil. Ainda que isso faça parte da vida e das possibilidades de um banco, isso não fazia parte da nossa vida.

A família Marinho sempre investiu tudo o que tinha aqui. Antes de entrar em default, vendemos um monte de ativos que tínhamos para colocar aqui e tentar resolver a situação, tentando adiar o default. Ainda assim não foi possível evitá-lo.

é fácil fazer engenharia para trás, mas por que não anunciaram o default antes de vender os ativos, como as participações em algumas afiliadas etc.?

Erramos, foi burrice... E não foi só a venda de participações em afiliadas. Vendemos fazendas, a casa de meu pai em Angra dos Reis, muita coisa querida da família. Erramos! É fácil falar isso agora. Tínhamos as análises, sabíamos da situação da empresa, mas acreditávamos que seria possível adiar o problema ou mesmo passar por ele sem ter que chegar ao limite. Em abril (o default foi em outubro de 2002), quando pagamos uS$ 200 milhões de um vencimento e anunciamos que queríamos fazer um pré-IPO para capitalizar a empresa, >>

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E a questão da ajuda do BNDES, como foi?

Não foi uma ajuda, e é bom deixar isso bem claro. Nunca houve tentativa de ajudar a reestruturação da Globo via BNdES. Nem nós pedimos, nem nunca precisamos. O projeto do BNdES, que foi bombardeado por pessoas no mínimo desinformadas, era um plano de desenvolvimento da mídia. Todos os setores econômicos no Brasil têm projetos desse tipo no BNdES, da indústria de cigarros à de laticínios. Só a mídia não tem. E isto é grave porque o BNdES é o único financiamento de longo prazo existente no Brasil. Para se obter financiamento no BNdES é preciso dar garantias, mostrar um plano de negócios, eles são profissionais, técnicos, corretos. quem pega dinheiro no BNdES paga e paga caro por isso, mesmo comparado com

taxas no exterior. Nada é de graça. Se você tinha um jornal e queria ir ao BNdES pegar um financiamento para aumentar a gráfica, ou uma TV e queria montar um estúdio, não podia. Então as associações de jornal e TV contrataram a Maria Silvia Bastos para fazer um projeto que visava abrir três linhas de créditos específicas: para investimentos de longo prazo, para compra de papel para impressão de jornal e para refinanciamento de dívidas. Só que fazendo todos os cálculos, o programa pedido ao BNdES era de R$ 4 bilhões a R$ 5 bilhões. dividindo pelos três programas, daria perto de R$ 1,5 bilhão para cada linha. Supondo que só a Globo fosse atendida, o que é uma hipótese ridícula, não resolvíamos nem um terço do nosso problema e ainda ficaríamos amarrados ao BNdES de uma forma que não conseguiríamos acertar mais nada com os credores internacionais. Então, não era um programa para atender a Globo, era um programa para atender os pequenos jornais

clientelismo e as formas de coação à liberdade de expressão que os modelos centralizadores tendem a criar. É uma estrutura de Estado que garante o processo democrático.

E o projeto da Ancinav?Não gostamos da minuta,

achávamos que havia mecanismos incompatíveis com a Constituição Brasileira, mas todo o debate se deu em cima de minutas. O que é fundamental é que exista uma grande agência de fomento da cultura brasileira, do audiovisual nacional, como existe em outros países. O que não se pode, quando se fala em cultura, é querer cerceá-la. Ela precisa é ser estimulada.

Como financiar o desenvolvimento do audiovisual onde é necessário? Em geral os investimentos vêm do próprio setor.

Nem sempre, às vezes é dinheiro do governo. Há modelos com participação na receita das emissoras, mas nestes casos elas são as mais beneficiadas por esses recursos. Há modelos baseados numa loteria, como na Inglaterra. Nos EuA, não há mecanismos de incentivo e eles dominam a mídia no mundo. Seja por conta da qualidade, seja por conta da escala, dos custos, o fato é que isso está acontecendo. Na Itália não há mais dramaturgia porque no horário nobre deles está a programação dos EuA. Na França, com toda a proteção ao conteúdo nacional, quatro dos dez programas mais vistos são norte-americanos. Na Inglaterra, seis dos dez programas mais vistos são americanos. No Brasil, nenhum. Então, imagine a vontade que as empresas americanas têm de dominar o conteúdo aqui. E é essencial que a Globo e cada vez mais emissoras brasileiras façam programa-ção nacional. Enfraquecer a Globo e não criar mecanismos adicionais de fortalecimento da produção nacional como um todo é abrir o mercado para o conteúdo estrangeiro. qual é o melhor modelo para o País? É uma opção que temos que fazer.

e emissoras. Por isso, a Abert apoiava o programa. Por isso, a ANj também apoiava.

Mesmo assim a proposta foi suspensa indefinidamente...

Porque todo mundo achava que era para beneficiar a Globo, e não era. Achavam que sem o BNdES nós quebraríamos, e não só não quebramos como ficamos em uma situação melhor para negociar. A nossa renegociação com os credores nunca passou pela ajuda do governo. Nunca houve essa hipótese, nunca pedimos isso. Foi uma besteira dita por quem não sabe como as coisas acontecem. Não nos afeta essa história não ter ido adiante. É uma pena para os pequenos, que realmente precisavam de ajuda.

Como vocês vêem a situação de grupos radiodifusores que vivem com fontes de receita e financiamento que

não são de mercado? Por exemplo, os grupos religiosos?

Eles atendem os segmentos deles e não vejo nada errado desde que estejam dentro da lei, com os aportes sendo feitos dentro da lei, com os impostos sendo pagos corretamente e com as demonstrações financeiras transparentes, nada contra.

Não é mais difícil concorrer com o dízimo sagrado?

É mais difícil, mas se estiver dentro da lei não posso reclamar. Claro que é preciso estar atento se as licenças estão corretas, se o dinheiro tem origem comprovada, mas até hoje não se provou nada errado contra ninguém.

Como a Globo avalia o governo em relação ao setor de radiodifusão?

A estrutura legal brasileira, sobretudo a Constituição no que se refere à liberdade dos meios de comunicação social, é um modelo para o mundo. Acho espetacular, é sábio e deve ser preservado. As decisões relevantes sobre a mídia dependem de mais de um Poder da República, dificultando o

NuNCA HOuVE TENTATIVA dE AjudAR A REESTRuTuRAçãO dA GLOBO VIA BNdES. NEM NóS PEdIMOS, NEM NuNCA PRECISAMOS.

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diretor geral da Rede Globo de Televisão, Octávio Florisbal divide sua semana entre São Paulo e Rio

de janeiro, onde acompanha de perto, respectivamente, o mercado publicitário que sustenta a emissora e o seu coração artístico/produtor.

Em relação às receitas que sustentarão o grupo nos próximos anos, o executivo não tem dúvidas. “As redes de TV aberta têm no mercado de publicidade sua maior fonte de receita e não vejo como isso possa mudar de forma consistente no curto e no médio prazo. Eu diria que cerca de 90% das receitas da Rede Globo são de projetos realmente vindos da publicidade.” quanto à previsão de expansão das fontes de receitas, Florisbal diz que as receitas adicionais no curto e médio prazo são ancilares, complementares. Há, explica, algum tipo de possibilidade de projetos conjuntos entre TV aberta e TV fechada, como a emissora faz com alguns canais Globosat; além da possibilidade de explorar alguma plataforma como o cinema, mas que ainda é muito incipiente; ou de Internet banda larga, que tem um potencial grande. O mesmo, diz Florisbal, ocorre com o celular, que parece ter um potencial mais próximo, “mas que também vai depender muito de poder aquisitivo para poder ter celular de última geração — o que está sempre circunscrito àqueles três ou quatro milhões de domicílios assinantes de TV fechada, Internet, revista”, completa.

Em relação ao mercado internacional, Florisbal aponta três

no mercado americano de língua espanhola ou no europeu, onde a parte artística e de produção seria de responsabilidade nossa através de parcerias com produtoras locais. Temos um grupo de trabalho que busca um formato. Iniciamos com textos brasileiros e talvez seja mais fácil começar com remakes de novelas, minisséries que já realizamos, em que estes textos seriam atualizados e adequados por nossos autores, com produção artística nossa e onde os parceiros de outros países entrariam com

direções. A primeira, a venda “avulsa” de programas, tem um limite e a Globo já está próxima a ele, com vendas hoje em 60 países. A segunda, o canal internacional da Globo, está presente em 48 países, com foco na população brasileira e de língua portuguesa, e se aproxima dos 250 mil assinantes, número que ele acredita que pode ser dobrado em cinco anos.

A próxima frente no mercado internacional será a de co-produções. “Temos detectado que cada vez mais os países querem ter uma produção, principalmente de dramaturgia, própria. Então, temos aí uma oportunidade, seja

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Crescimento passa pela exportaçãoO diretor geral da Globo, Octávio Florisbal, lembra que o bolo da publicidade nacional enfrenta limitações da própria economia, e fala sobre audiência, TV digital e programação.

por Edianez Parente e Rubens Glasberge d i a n e z @ p a y t v . c o m . b r | g l a s b e r g @ p a y t v . c o m . b r

“CAdA VEz MAIS OS PAíSES quEREM TER uMA PROduçãO, PRINCIPALMENTE dE dRAMATuRGIA, PRóPRIA. ENTãO, TEMOS Aí uMA OPORTuNIdAdE”, dIz FLORISBAL

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as facilidades locais, com o mix de elenco local para dar maior caracterização e com captações nesses locais”, diz o executivo. Segundo Florisbal, a Globo pensa em ter um núcleo específico no Projac para produções internacionais, que não necessariamente teriam de ser exibidas na Globo. “É uma oportunidade interessante para os nossos autores, diretores e elenco, dentro de um planejamento, nas folgas das produções nacionais”, completa.

uma outra via de expansão é colocar no exterior mais canais, uma nova Globo News, um canal de esportes ou um canal de variedades. É possível explorar este crescimento, diz Florisbal, não só em cobertura via satélite, mas também em alguns mercados via cabo, como México ou Argentina. um mercado também promissor é a áfrica de língua portuguesa, como Angola e Moçambique, com potencial de crescimento importante. O canal internacional da Globo tem 40 mil assinantes em Angola, com possibilidades de crescimento, à medida que houver um crescimento da economia ali. No japão, outro mercado promissor, deve haver uma mudança, com o canal internacional passando a cobrir o mercado japonês e o outro canal que existe hoje exibindo outros produtos de conteúdo da Globo e de canais Globosat.

A receita do canal internacional é basicamente de assinaturas. Começa a crescer com publicidade no mercado americano, na Europa e áfrica. “Pretendemos crescer muito na Europa, pois agora há um feed com fuso horário local (só os telejornais vão em tempo real). Pensamos que com isso poderemos crescer muito nos mercados com grande presença de brasileiros e portugueses (Alemanha, Inglaterra, França, Espanha, menos Portugal, onde temos acordo com a SIC). Os anunciantes são pequenos empresários locais ou grandes

mais preocupada em ter uma programação mais completa. O SBT, que já teve todos os gêneros, está mais concentrado em infantil, novelas (tem um acordo com a Televisa), programas de auditório e não tem uma grade tão completa, avalia; a Bandeirantes está mais centrada em jornalismo, filmes, retomando a parte de esportes. E a Rede TV! trabalha mais com programas de auditório, programas de estúdio.

“Acho que é por aí que as coisas vão caminhar para cada um adequar sua grade à receita publicitária. No curto e médio prazo, Record e SBT são as que tendem a fazer maior concorrência à Globo, por trabalharem com mais gêneros e gêneros que geram mais receita publicitária (dramaturgia, jornalismo, shows)”, afirma.

Futebol“Há na área de esportes,

especificamente no futebol, na medida em que ele venha a ser organizado e revitalizado, possibilidades de parcerias como temos firmado com o Clube dos 13. Procuramos agora firmar acordos com a CBF, para explorações novas na área de promoções, de

empresas brasileiras com interesse em falar com esse mercado (bancos, companhias aéreas, turismo, serviços etc.)”, completa Florisbal.

Brasilquanto à realidade brasileira,

o executivo avalia que o mercado publicitário teria quase que dobrar de tamanho para sustentar com uma certa qualidade cinco redes, porque a TV aberta tem uma participação muito significativa

das verbas de mídia (mais de 60%, segundo o projeto Intermeios). O mercado como um todo teria de crescer, a partir da economia, para sustentar de uma forma adequada estas redes. “Olhando para o conjunto, se o mercado publicitário pudesse crescer 50% nos próximos três anos, talvez houvesse espaço para duas, três redes, com produção nos principais gêneros (dramaturgia, shows, jornalismo, esporte, infantil). Talvez outras duas ou três pudessem trabalhar mais em nichos (música, filmes, programas mais popularescos). Não existe mercado para cinco redes se elas quiserem s er completas na sua grade, abrangendo todos os gêneros de programação”, diz Florisbal.

Em relação aos concorrentes, ele avalia que a Record é a rede que está >>

Gravação de “Senhora do Destino”: produzir custa caro e não existe mercado para as cinco redes se elas quiserem abranger todos os gêneros. “Cada um vai adequar sua grade à receita publicitária”, diz Florisbal .

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outras plataformas, de interatividade, de arenas. Vamos explorar isso de uma forma mais profissional, pois há ainda um filão a ser perseguido”, afirma o executivo da Globo.Com o Clube dos 13 para o Brasileirão, a emissora tem uma parceria na exploração de arena (placas e promoções nos estádios) e agora, com o novo contrato que vigora de 2006 a 2009, pretende trabalhar em outras plataformas. Há acordo para explorar Internet banda larga e conteúdo em celular, vendendo pacotes, gols, melhores momentos, interatividade. A Globo pretende também ampliar a parte de transmissão para o telespectador.

“Na medida em que resgatamos e valorizamos o futebol (e o próprio governo está interessado em resolver o problema econômico dos clubes), isso tende a se transformar num bom negócio como é em outros países. Imaginamos que no futuro possamos fazer alguma coisa com as federações para os campeonatos estaduais para fazer estas explorações promocionais de arena, Internet, celular, camisas, licenciamentos etc. Tem um grande mercado — na Europa os grandes clubes praticamente pagam a aquisição de jogadores com a venda

que passa pela Globo; é muito mais uma direção dos acionistas, da família Marinho.”

Rentabilidade x qualidadeEm relação às operações da Globo,

Florisbal comenta as mudanças de gestão pelas quais a empresa passou recentemente. “A questão começou a ser abordada em 1998, com a Marluce (dias da Silva). Estabeleceu-se um formato de gestão mais participativa, com mais autonomia, mais autoridade e responsabilidade buscando resultados comuns. um dos focos foi: como manter os níveis de audiência, os padrões de qualidade?”

Ele explica que os custos podem variar muito e são crescentes: de direitos de filmes, direitos esportivos, de produção, de elenco. Vem-se procurando, conta Florisbal, dar um foco muito grande em manter as audiências, a qualidade, mas trabalhando fortemente em aumentar a produtividade e reduzir custos. “Acredito que nesse período conseguimos equacionar esta questão, porque as nossas audiências cresceram; a nossa qualidade de produção tem se mantido, seja na dramaturgia, novelas, minisséries, jornalismo, esporte, com cobertura cada vez mais ampla, seja em outros programas mais segmentados; temos buscado no mercado publicitário a nossa participação técnica, que é essa audiência no target versus participação nas receitas; temos tido um controle muito justo; nos últimos anos nós conseguimos reduzir mais ou menos de 25% a 30% nossos custos de produção, aumentando a nossa rentabilidade. Isso fez com que nos últimos anos a gente voltasse a ter aquela relação de receita/despesa e resultado operacional voltados para os patamares internacionais. Hoje nós temos um EBITdA, uma margem operacional sobre receita líquida nos padrões internacionais, ou seja, acima de 25%. Vamos procurar manter sempre”, conta o executivo.

dos produtos dos clubes.” No Brasil, diz Florisbal, se enfrenta dois problemas: a relativa falta de poder aquisitivo e a pirataria. O primeiro se resolve em longo prazo. O segundo, através de algumas iniciativas do governo, das federações, com comunicação e sensibilização das torcidas para comprarem os uniformes oficiais para se converter em recursos para os clubes.

Em relação à presença no restante da América Latina, Florisbal vê um espaço mais limitado. “Grupos como Televisa e Cisneros, pela facilidade da língua espanhola, acabaram se aproximando mais do mercado hispânico. Olhando a AL como um todo, vemos que há uma certa concentração. O Brasil representa mais ou menos um terço do PIB latino-americano e mais ou menos a mesma coisa em termos de investimento publicitário. Com o México, somado, vai a dois terços; somando a Argentina, que em algum momento vai retomar a sua economia, os três juntos têm cerca de 70% do PIB; os demais são geograficamente menores, com população e PIB menores. A nossa visão é que tais mercados são hoje de difícil penetração. Então, vamos continuar atuando como temos feito, através da venda de produtos já acabados, e não através de exploração local e de parcerias locais — isso pelo menos no curto e no médio prazo não é uma decisão

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Negócios da Globo no futebol agora incluem comercialização de múltiplas plataformas, das placas de estádio aos celulares. Os desafios ainda são a pirataria e o baixo poder aquisitivo da população.

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brasileira venha a crescer e esse mercado se torne cada vez mais importante, certamente haverá uma tendência a esses custos crescerem, diz Florisbal. A maneira de enfrentar é ter um controle muito próximo dos custos, dos processos, diz. “Com o mercado mais ativo certamente os próprios concorrentes da TV Globo poderão fazer pressão, sobre o nosso

elenco, sobre autores, sobre diretores, questões ligadas ao mercado de trabalho, reforma trabalhista, sindicatos etc. A gente tem de estar preparado para enfrentar.”

Programação e audiênciaPara o ano do 40º aniversário, a

Globo montou uma programação diferenciada. “A nossa estratégia é ter essas minisséries grandes no início do ano — uma de 40 episódios e outra de oito — para este período até o final de março, quando a linha de shows está de férias. E, a partir de abril, voltando a linha de shows, o que temos feito é uma experiência de temporadas, o que permite que um determinado programa na linha de shows tenha férias no meio do ano, dê mais oxigênio para atores, autores e diretores, e se coloca um produto novo ali. Por exemplo, a

Rio), com 20 m de pé direto, com uma área de 2,5 mil m2, onde foi pintado um ciclorama para cenário. “Como era um projeto diferente, num horário mais tarde, achávamos que a audiência seria menor do que alcançou.”

Ele explica o conceito por trás da formatação da grade da emissora: “A nossa estratégia de programação, que surgiu no início da Rede Globo, por uma sensibilidade do Walter Clark, do Boni e de outros companheiros da época, é de criar um conceito de programação horizontal. São programas que vão de segunda a sexta, segunda a sábado, e que, à medida que você atende ao telespectador e cria um vínculo e um hábito de audiência, você passa a ter aquela audiência constante durante todos os dias da semana. Isto é o inverso das programações verticais, que se vêem na TV americana, onde cada dia há programas diferentes, o que dá oportunidade ao telespectador de mudar do jeito que ele quer e é muito mais difícil você criar um hábito. Esta estratégia de programação horizontal foi estabelecida pela Globo lá atrás que era composta por duas novelas — inicialmente era uma novela, um jornal e um novela — e depois cresceu para duas novelas, um jornal e uma novela, e hoje você tem também ‘Malhação’ (que é uma soap opera), do ponto de vista de dramaturgia. depois, estendemos para outros gêneros, com o ‘Vale a Pena Ver de Novo’ à tarde, o ‘Vídeo Show’, os programas jornalísticos da hora do almoço. Eles também são de segunda a sábado; os programas jornalísticos de manhã também são de segunda a sexta, e no fim de noite você tem telejornal, jô Soares. Enfim, esta programação horizontal, pelas nossas pesquisas, se mantém muito adequada, sendo de interesse e de agrado do telespectador.”

Em relação à audiência, Florisbal sustenta que o total de aparelhos ligados da TV brasileira tem crescido. “Claro que é difícil comparar períodos diferentes com medições diferentes. t

‘Grande Família’, que é um produto de muito sucesso, tem duas temporadas — do primeiro semestre (abril a junho) e depois volta para a segunda temporada no segundo semestre”, explica Florisbal. Às sextas-feiras volta o “Carga Pesada”, após o “Globo Repórter”. No meio do ano, entra uma minissérie de dez capítulos, “Carandiru”, de Hector Babenco. “Ficou bastante interessante. Vamos apresentar o

filme de longa-metragem na ‘Tela quente’ e depois, durante dez episódios, vamos contar a história de cada personagem, anterior à chegada ao presídio”, conta. Trata-se de uma co-produção, da mesma forma que foi feito com a O2, com “Cidade dos Homens”, que terá sua quarta temporada em 2005.

A tecnologia e a infra-estrutura permitem hoje realizações antes impensáveis, conta Florisbal. Ele diz que “Mad Maria” não poderia ser realizada há 20 anos, pelo custo absurdo que seria, e nem haveria tecnologia para isso. Agora, explica, conseguiram produzir a série com um custo médio por episódio igual ao que teve “um Só Coração”, no ano passado, ou a “A Casa das Sete Mulheres”. “Hoje é dia de Maria” também ficou dentro dos padrões, até pela solução criativa de produção que foi encontrada pela área artística, que foi a idéia de se criar um domo (foi usada a esfera-palco do Rock in

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Os investimentos em tecnologia e infra-estrutura permitiram a realização de séries como “Mad Maria”, impensável 20 anos atrás. Em 2005, emissora lança “Carandiru”, em dez capítulos.

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Com o flagrante, havia um tipo de medição, depois o caderno tinha outra, e daí veio o people meter, que é mais recente. Se pegarmos o people meter, que foi inaugurado pelo Ibope em 1997, vamos ver que de 97 para 2004 basicamente em todos os mercados, por incrível que pareça, houve um aumento do total de aparelhos ligados — o que mostra a força da TV aberta, face à TV paga e às novas mídias.” No caso da Globo, conta, a audiência cresceu em quase todos os horários, o que mostra, segundo ele, que a estrutura de grade horizontal é muito forte e continua muito válida. “Claro que temos de inovar. E as inovações ficam para outros horários, como o de shows, onde experimentamos. Como, por exemplo, o ‘Big Brother’ brasileiro, que é avaliado pela Endemol como o de maior sucesso no mundo, pela nossa capacidade de adequar ao gosto

que são bons. “Temos de reformular esta faixa. Neste caso específico, estamos trabalhando para ter um novo ‘Sítio do Picapau Amarelo’ no final de abril, em que a área artística, com muita propriedade, em cima de pesquisas, chegou à conclusão de que teria de mudar um pouco, voltar a ser um sítio mais do Monteiro Lobato,

com uma história contínua.”Ele conta também que a Globo

está trabalhando num novo projeto para a xuxa na área artística e de produção, para que o programa dela passe a atender (“ele atendia muito bem às crianças de quatro até oito anos”) crianças de oito a 13 anos (que estão mais no horário de 11h ao

brasileiro. Ou como nós fazemos com o ‘Fama’, que é um programa para revelar novos talentos na música.”

A Globo fechou em janeiro um novo contrato com a disney, que retorna para a emissora depois de vários anos. O objetivo, primeiramente, são os longas-metragens, e também aproveitar a parte de produtos infantis. utilizar as séries e minisséries

é mais difícil, diz Florisbal, pela falta de espaço na grade.

Em relação à perda de audiência no horário matinal, quando predomina a programação infantil, o executivo admite que há uma disputa grande com o SBT, que conseguiu consolidar uma audiência infantil, que vai de 9h30 até meio-dia. No cabo, diz, também há os canais infantis,

PARA RECuPERAR A AudIêNCIA INFANTIL A GLOBO APOSTA NO “SíTIO”, NA REFORMuLAçãO dO PRO-GRAMA dA xuxA E EM MAuRíCIO dE SOuzA.

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meio-dia). “queremos também inserir conteúdos brasileiros como os de Maurício de Souza — com quem temos acordo, e discutimos outra possibilidade de ter um programa voltado para a educação, para crianças de quatro a sete anos, usando a ‘Turma da Mônica’, num projeto apoiado pelo governo e que incluiria a rede educativa. Está em discussão e, se tiver sucesso, seria para o final do ano, um programa de 20 minutos para a faixa das 9h30 ao meio-dia.”

TV digitalSegundo Octávio Florisbal, a

discussão mais importante em relação à implantação da TV digital terrestre no Brasil é a do modelo econômico, e não a tecnológica, como vem sendo feito até agora.

“No Brasil, mais de 90% dos domicílios recebem TV via ar. Se formos implantar a TV digital, seja em alta definição ou de múltiplos sinais, e fazer com que ela cresça ao sabor do mercado, vai demorar muito, porque o aparelho digital de high definition (HdTV) vai custar uS$ 1 mil, ou uS$ 2 mil, o set-top mais outro tanto; portanto, a população com capacidade econômica de comprar vai estar circunscrita aos mesmos que assinam TV paga, Internet, revistas etc. Por outro lado, as redes vão ter grande dificuldade em investir, vão ter de investir em tecnologia e certamente o que vão aferir com receita de publicidade e com interatividade vai ser muito pouco, porque o mercado vai estar muito restrito. A grande questão é: como desenvolver um modelo que possa se expandir mais rapidamente, fazer com que 10, 15 milhões de domicílios consigam acessar a TV digital, em Hd, seja como for, através de aparelhos que tenham um custo acessível?”, pergunta o executivo.

A solução, para ele, viria através de parcerias entre governo, emissoras, anunciantes e fabricantes. O governo, através do BNdES, poderia, segundo

podem ser produzidos aqui. de qualquer forma, completa, teriam de se sentar juntos, o governo, a indústria, fabricantes, redes de TV, comércio, para ver como montar essa equação.

“durante um tempo a TV analógica e a TV digital terrestre vão conviver juntas. E há um agravante: os setores da economia que mais investem em publicidade na TV aberta são aqueles que trabalham com grandes volumes, como produtos de limpeza, higiene pessoal, bancos de varejo, serviços, indústria automobilística e de produtos populares, que quando falam é para 20, 30, 40 milhões de domicílios. Imaginando que a TV digital e HdTV vão começar aos poucos, quem talvez vá se interessar primeiro por ela são aqueles setores que trabalham com nichos de mercado. É o banco que trabalha com private, a indústria automobilística de luxo, cartões de crédito diferenciados, eletroeletrônicos de alto custo. Enfim, setores que não estão tão habituados a investir em TV — o que é um grande desafio. Não será fácil para as emissoras agregarem novas receitas de publicidade, enquanto ela não estiver difundida. Na hora em

ele, criar uma linha de financiamento para a indústria tentar desenvolver um modelo de televisor, de set-top box adequado e de baixo custo para a população. “Teria de se pensar numa ação nas grandes redes distribuidoras, nas Casas Bahia, Ponto Frio etc., para que pudessem criar um crediário em que o usuário compraria aquele equipamento pagando em 24 meses, numa condição privilegiada, para que essa penetração pudesse se dar de forma mais rápida”, diz. do lado das redes, que terão de fazer investimentos pesados para colocar a TV digital em pé, Florisbal diz que teria que se fazer como aconteceu com a TV em cores, ao se sair dos grandes mercados para os médios e pequenos. Ou seja, ter a TV digital em HdTV primeiro nas grandes capitais, num segundo momento nas grandes cidades do interior e médias, para depois seguir para as pequenas, de forma que as redes pudessem ir tendo um retorno de mercado publicitário. Os anunciantes, afirma, se sentiriam mais estimulados a criar e produzir comerciais em HdTV, nos quais se poderia experimentar mais interatividade, e com isso ter receitas que ajudariam a amortizar esses investimentos que certamente as redes vão ter de fazer. E o governo teria de criar algum tipo de facilidade e de algum tipo de isenção para equipamentos que tenham de ser importados, que não

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“dISCuSSãO MAIS IMPORTANTE dA TV dIGITAL É A ECONôMICA. OS GRANdES

ANuNCIANTES dE VAREjO Só ENTRAM quANdO TIVER 30, 40 MILHõES dE dOMICíLIOS.”

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que houver 20 milhões de domicílios com TV digital, um banco popular, uma marca de detergente, um varejo popular vai querer utilizar um comercial de HdTV para sensibilizar mais. Mas enquanto não houver uma massa, uma escala, ninguém vai querer pagar por isso”, conclui Florisbal.

Em relação à opção entre transmitir HdTV ou multicast (múltiplos sinais digitais em definição standard), o executivo diz que, pelas limitações da economia brasileira e do mercado publicitário, faria mais sentido o high definition com uma quantidade mínima de horas por semana, do que ter multicast. Porque, explica, se hoje o mercado já é insuficiente para atender bem às cinco redes nacionais, se cada rede dessas puder ter mais cinco sinais, não existiria mercado publicitário para sustentar essa quantidade de

TV digital, tem de ter uma caixinha que as pessoas possam comprar, que o varejo possa financiar em 12 prestações —, queremos que em vez de pegar a banda C analógica, o telespectador passe a pegar a banda C digital e, em vez de pegar o sinal da rede, ele pegue o sinal da nossa afiliada que está na sua região. Porque aí se carrega o conteúdo regional, com uma série de facilidades. A banda C não é comercializada. Não haveria nenhuma perda. Há eventos que já são codificados, como boxe, Fórmula 1, por exigências contratuais. Hoje o sinal da rede já é digital e codificado para as afiliadas. E há o sinal analógico para a banda C. Trata-se de uma preocupação que temos de resolver em médio prazo. Esperamos que com a implantação do digital essas coisas sejam recebidas em conjunto”, conclui.

conteúdo necessária — “ou vai se fazer muita porcaria”, completa. “Sem um set-top box de baixo custo para chegar rapida-mente à classe C, como é que o comércio, o anunciante vê isso?”, pergunta. “E a interatividade, como é que ela vai se dar? A interatividade em TV merece um grande aprendizado por parte do telespectador, que hoje é passivo na sua grande maioria. Ele senta para relaxar. Mudar essa cultura para ele começar a interagir, durante o comercial para que faça uma compra, responda a uma pesquisa, é uma mudança de hábito que não se faz da noite para o dia.”

Banda Cquanto ao sinal da Globo que

é hoje recebido apenas através de antenas parabólicas, Florisbal diz que a intenção é que no futuro a banda C passe a ser digital e receba os sinais regionais. “Na medida em que a gente possa — porque o problema é o mesmo da

A TV Globo produz em torno de 2,5 mil horas de conteúdo por ano. Para garantir o fluxo de trabalho

necessário, a emissora conta com um departamento de engenharia de proporções monumentais: cerca de dois mil funcionários lotam as cinco emissoras pertencentes ao grupo, entre técnicos e engenheiros, “vários deles com Phd”, orgulha-se o diretor de engenharia, Fernando Bittencourt. Seu departamento é responsável pela operação da emissora e da rede e pela escolha dos equipamentos e sistemas usados na emissora, através de testes que costumam deixar os fornecedores de cabelos em pé.

O desafio tecnológico da Globo no momento, no que diz respeito à tecnologia, é abandonar gradativamente o uso de fitas. Isso

substituir a fita, Bittencourt aposta mais na gravação em memória em estado sólido. “O sistema é melhor, pois não há partes móveis e é portanto menos sujeito a falhas. Mas deve levar alguns anos para ficar economicamente viável. O cartão de memória ainda é muito caro”, afirma.

Sem desconsiderar as novas tecnologias de substituição da fita, Bittencourt acredita que a tendência é que as matérias jornalísticas gradualmente passem a ser enviadas diretamente através de links de microondas, satélite e até pela Internet para os servidores centrais. É justamente o conceito usado nos kits correspondência desenvolvidos na casa. Atualmente, cerca de 15 correspondentes estão equipados com o kit.

A Internet, aliás, poderá ser usada até pelas afiliadas, para enviar conteúdo à cabeça de rede, afirma Bittencourt. “As afiliadas enviarão suas matérias em baixa resolução, para o editor nacional escolher aquelas que quer usar e pedir a versão em alta resolução.” E isso poderá ser feito misturando redes IP dedicadas com a Internet.

quanto à digitalização da transmissão, Bittencourt é categórico: “queremos a adoção de um padrão que trabalhe simultaneamente com HdTV, múltipla programação, portabilidade e mobilidade. qual é o padrão, não importa. Pode até ser o brasileiro”. Vale lembrar que, nos últimos anos, os padrões americano

deve acontecer primeiramente com o jornalismo, que exige mais agilidade de produção, explica Bittencourt. Mesmo já tendo produções de entretenimento gravadas diretamente em servidor, como o “Big Brother Brasil”, a transição nessa área deve levar mais tempo. “A dramaturgia exige mais qualidade e, por isso, storages (sistemas de armazenamento) mais caros”, explica.

Simultaneamente à transição para o tapeless, deve ser feita também a digitalização do arquivo da Globo, com armazenamento em servidores e catalogação.

Em relação à captação de imagens, a Globo já conta no jornalismo com algumas câmeras Sony xdCam, que gravam em discos ópticos com tecnologia Blue-Ray. Mas, quanto à tecnologia que deve

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O futuro já começouum perfil do departamento de engenharia da Globo e seus planos para entrar na TV digital e explorar as novas janelas.

por André Mermelstein e Fernando Lauterjunga n d r e @ t e l a v i v a . c o m . b r | f e r n a n d o @ t e l a v i v a . c o m . b r

BITTENCOuRT: dESAFIO ATuAL É A MIGRAçãO PARA uM SISTEMA TOTALMENTE TAPELESS, COM OS CONTEúdOS CIRCuLANdO EM REdES dE dAdOS.

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e europeu vêm trabalhando para tentar cumprir as exigências dos radiodifusores brasileiros. Mesmo assim, até o momento, só o padrão japonês atende essas demandas.

Alta definiçãoEm relação à produção, Bittencourt

afirma que muitos programas já são captados em HdTV e começam agora a ter todas as fases da produção em alta definição. Todo novo equipamento da Globo, pelo menos na produção de entretenimento e teledramaturgia, é HdTV. “Hoje os preços estão muito próximos, e vale a pena investir logo num equipamento HdTV”, afirma. quanto às tecnologias que estão chegando para baratear a produção em alta definição, Fernando Bittencourt é reticente. Para ele, as câmeras semiprofissionais, como as HdV, não têm robustez para o volume de trabalho de uma emissora. “Temos câmeras com 12 anos de uso, enquanto os equipamentos semiprofissionais duram no máximo dois anos. No final, fica mais caro”, resume ele.

O diretor de engenharia da Globo acredita que a TV digital, e principalmente a HdTV, valorizará o conteúdo da emissora. “O HdTV permitirá que as pessoas vejam a qualidade da produção, e nós já produzimos com essa qualidade há tempos. Hoje os televisores não mostram a diferença entre a boa e a má captação”, garante Bittencourt. Segundo ele, os cenários e a maquiagem usados nas produções da Globo já têm qualidade suficiente para o HdTV, “será necessário só um maior cuidado com os detalhes da produção, como maquiagem e cenários, já que as imperfeições se sobressaem mais no Hd”.

Para garantir que a programação atual poderá ser usada no futuro, além dos novos equipamentos HdTV, tudo é produzido usando o enquadramento nos aspectos 4:3 e 16:9.

Segundo Bittencourt, quando a TV digital finalmente chegar no Brasil,

com a uSP, PuC, Mackenzie e uma cadeira na universidade Federal do Rio de janeiro. Outra ação importante da emissora na formação de seus engenheiros é um programa de estágios em emissoras internacionais, no qual envia contratados da Globo para empresas como a japonesa NHK.

uma área da engenharia da Globo, formada por cerca de 15 profissionais, é responsável pela pesquisa e desenvolvimento de novas tecnologias, sistemas e equipamentos, utilizada quando não existe um produto no mercado para suprir determinadas necessidades da emissora. Entre as novidades desenvolvidas por essa equipe estão o sistema usado na produção do “Big Brother Brasil” e o kit correspondência, para os correspondentes internacionais do jornalismo da Globo. Para o “Big Brother” foi desenvolvido um sistema de servidor com um “logger”. Enquanto várias câmeras captam tudo o que acontece nos vários ambientes da casa onde estão confinados os participantes do reality show, um grupo de profissionais vai “logando” (classificando) as cenas, discriminando os nomes dos personagens envolvidos

toda a produção da Globo já será digital e pronta para HdTV, sendo necessário apenas a troca do transmissor. Enquanto o padrão de TV aberta não é definido, os testes devem começar através do cabo. “Com a digitalização da Net, devem começar os testes de interatividade com conteúdo da Globo.”

quanto à transmissão móvel e portátil, Bittencourt diz que alguns produtos já são adequados para qualquer mídia, mas outros deverão ser adaptados para uma tela menor, como a dos celulares e dos handhelds.

EscolaA engenharia garante não apenas

fluxo da produção, mas também o tão aclamado “padrão Globo de qualidade”. Com pesquisas que se desenvolvem ao longo dos 40 anos da emissora, a história da engenharia da Globo se confunde com a história da TV brasileira e aponta as tendências tecnológicas, às vezes antes dos próprios fabricantes de equipamentos.

Segundo Bittencourt, mais de 90% do pessoal do departamento de engenharia é selecionado ainda no início da carreira e treinado na própria emissora. “A maioria dos funcionários entrou na empresa como estagiário”, conta. Além disso, o departamento de engenharia mantém um relacionamento com universidades e escolas especializadas, tendo parcerias

>>Desde sua inauguração, em 1995,

o Projac opera 100% digital. Equipamento da área de entretenimento já é todo preparado

para HDTV.

cada ação. Com isso, no momento da edição do programa, é possível buscar cenas no servidor usando palavras-chave como os nomes dos participantes ou algumas ações (procurar por todas as cenas onde os personagens beijam-se, por exemplo). já o kit correspondência utiliza uma câmera e um computador portáteis para enviar o conteúdo gravado através de conexões rápidas com a Internet, usando o formato de arquivos MPEG-4.

PassadoO departamento de engenharia

da TV Globo passou por quase todas as grandes revoluções da história da televisão, tendo começado suas operações após apenas uma das grandes mudanças, a chegada do videotape (na época, a fita magnética quadruplex). Sua primeira importante transição foi para a TV em cores, em 1969. A adoção de um padrão inédito no mundo, o Pal-M, afetou tanto a produção quanto a recepção de TV no Brasil. “Estudar esse padrão exclusivo demandou muitos esforços durante todo o período de transição” (cerca de oito anos), diz Fernando Bittencourt. Foi necessária uma interação entre a engenharia da Globo e os fabricantes para se chegar à versão final dos equipamentos que operam em Pal-M. “Os equipamentos eram desenvolvidos especialmente para nós”, conta.

O segundo período de transição foi a chegada das câmeras e dos VTs portáteis, no início da década de 70. As fitas u-Matic para o jornalismo e as de uma polegada (1”), para a produção de teledramaturgia. Nos dois casos, as mudanças foram radicais.

No jornalismo, permitiu a transição da película para o meio eletrônico. Até a chegada das câmeras portáteis, toda a produção jornalística que não era ao vivo era filmada em cinema, revelada nos laboratórios da emissora e editada na moviola para só então ser levada ao ar, diretamente da película. “O prédio da Globo tinha laboratórios, com vários tanques de revelação”,

na década de 70, foi a computação gráfica. E a Globo foi uma das pioneiras no uso dessa tecnologia na televisão. Como ainda não existiam softwares comerciais, a engenharia da emissora desenvolvia tudo internamente. Sob a responsabilidade do engenheiro josé dias, foram desenvolvidas várias ferramentas para criação de vinhetas e até de cenários virtuais, ainda bem primitivos. A criação desde o início ficou a cargo de Hans donner. “josé dias, na parte técnica, e Hans donner na artística criaram a linguagem audiovisual usada até hoje na televisão”, diz Bittencourt.

depois chegou a vez da digitalização da produção. Ainda no final dos anos 70 começou a edição não-linear, que permitia usar mais efeitos, com o uso de várias camadas, e trouxe uma edição muito mais ágil e visualmente mais sofisticada à televisão. já a captação digital chegou à Globo em 1995, com a inauguração de seu novo centro de produção de teledramaturgia em jacarepaguá, o Projac. “Foi inaugurado já com um sistema completamente digital.” Mais tarde, começaram a trocar o sistema de captação do jornalismo, “mas ainda restam alguns equipamentos analógicos”, diz o diretor.

lembra o diretor. As matérias que entravam no ar à noite eram produzidas no máximo na manhã anterior, caso fosse um conteúdo muito importante. A mudança tecnológica trouxe agilidade e flexibilidade.

Na mesma época, chegaram os transmissores portáteis de microondas, permitindo fazer matérias ao vivo. Mudou-se o processo de fazer jornalismo, o que causou certa resistência em alguns profissionais que estavam acostumados com a dinâmica da tecnologia anterior. A transição levou de três a quatro anos. “Até que o Boni (então diretor geral da Globo) um dia mandou acabar de vez com aqueles tanques de revelação”, conta Bittencourt.

já a história da transição para os equipamentos portáteis na produção de teledramaturgia se confunde com a história da própria televisão mundial, já que o VT de 1” foi desenvolvido pela Sony para suprir as necessidades das novelas da emissora. “Fomos os primeiros no mundo a produzir cenas externas em vídeo gravado em VTs portáteis”, garante Bittencourt. Isso porque, na maior parte do mundo, a produção de entretenimento era feita em película, ou em estúdio. Assim, a Globo conseguiu desenvolver unidades móveis de produção mais compactas.

Outra novidade, que chegou ainda

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O departamento de engenharia também é um laboratório onde são desenvolvidas soluções exclusivas, como a utilizada para a marcação de cenas no “Big Brother Brasil”.

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“Nossa convicção nesses 40 anos da Globo é a de que o caminho que tomamos há dez

anos, com a montagem do Projac, estava certa. A opção pelo conteúdo é o grande acerto.” É assim que Luis Erlanger, diretor da Central Globo de Comunicação (CGCOM), a área da Globo responsável por toda a comunicação externa, analisa os caminhos da emissora, definida por ele como, sobretudo, uma grande, gigante produtora.

Os números são eloqüentes: em 2004 a Globo produziu 2,546 mil horas de programação, ou 3,494 mil episódios, de novelas, humorísticos, jornalismo, documentários e outros (veja box abaixo).

É tanta coisa que mesmo o megacomplexo de produção da emissora, o Projac, não dá conta de tudo. Surpreendentemente, a Globo é uma grande cliente de produção independente, até para produtos “da casa”, como chamadas e vinhetas. Claro, não é a produção independente no sentido “clássico”, desejada por quem espera ver na telinha uma diversidade maior de conteúdos e pontos de vista. É muito mais uma terceirização de produtos da própria emissora. Ainda assim, a Globo mantém um cadastro de mais de 220 produtoras, sendo

como a ‘Globeleza’ virtual e muitas outras coisas”, completa. Ele ressalta também, que além dos terceirizados, muitos produtos também são feitos de forma independente, sob supervisão estrita da emissora, e que essa tendência deve seguir. É o caso de alguns quadros do “Fantástico”, como os de denise Fraga e Regina Casé, ou os dirigidos por jorge Furtado. “Você pode observar que na Globo não tem mais reprise. quando há espaço na grade, abrimos para novas idéias, formatos. Não fazemos mais porque não tem horário, o dia tem só 24 horas”, diz Erlanger.

Em relação à participação da Globo na produção de cinema e à presença dos filmes nacionais na programação da emissora, Erlanger diz que há um erro de

60 delas ativas, quer dizer, produzindo para a emissora. “Em 2004, por exemplo, produzimos 60 filmes com mensagens de cidadania (campanhas sobre direção responsável no trânsito, dengue ou AIdS, por exemplo), dos quais 90% foram feitos por independentes”, conta Erlanger.

Economicamente seria melhor produzir internamente, diz o diretor, mas não há capacidade ociosa. “O filme dos 40 anos foi feito pela Conspiração. A abertura da ‘Padroeira’ foi feita fora, assim

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Opção pelo conteúdodiretor da CGCOM fala da relação da Globo com o cinema, produção independente e o “merchandising social”.

“NA GLOBO NãO Há MAIS REPRISES. quANdO Há ESPAçO NA GRAdE ABRIMOS PARA NOVAS IdÉIAS E FORMATOS”, dIz ERLANGER.

uSINA DE PRODuçãO

Horas produzidas 2.524 2.451 2.522 2.546

Episódios 3.236 3.317 3.440 3.494

Fonte: CGCOM

2001 2002 2003 2004

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comunicação. “As pessoas acham que ganhamos dinheiro com a Globo Filmes, mas não ganhamos. Fizemos porque queremos estar presentes em tudo. Nosso elenco, atores, diretores, queria fazer cinema também.” Ele conta que a Globo verificou em pesquisas que o povo não via cinema nacional, porque considerava tecnicamente ruim e os jovens se identificavam mais com a linguagem do cinema americano. Então decidiram investir nesta área. “O domenico de Masi (sociólogo italiano) diz que a decadência do cinema italiano começou com a decadência da RAI (TV italiana). As pessoas começaram a ver os enlatados americanos e se desacostumaram com a linguagem local. É bom para a cultura nacional que a Globo esteja bem”, completa.

quanto à presença do filme nacional na grade, Erlanger explica que o problema é de janela. O filme no horário nobre, diz ele, tem que ser um blockbuster, tem que ter um espectro amplo de audiência, para manter o share da emissora no horário. “Não há no mercado brasileiro filmes assim disponíveis, só Hollywood tem.” Ainda assim, diz ele, a emissora criou o “Intercine Brasil”, uma faixa em horário mais avançado, onde pode-se experimentar mais.

Em relação ao conteúdo da TV hoje, Erlanger diz que só se ressente de não conseguir mais espaço para a música popular, como já houve no passado. “Fama”, diz ele, foi uma tentativa de sair do formato “parada de sucessos”, mas que ainda falta, na visão dele, uma participação maior da MPB de qualidade na programação, com shows e especiais.

Sem bumboA comemoração dos 40 anos

será intensa, mas com data para acabar, explica o diretor. “Não vamos ficar batendo o bumbo o ano todo em cima da data”. A programação especial começou >>

A GLOBO EM NÚMEROSA TV Globo tem cerca de oito mil funcionários (as afiliadas têm cerca de sete mil), assim divididos:

n 29% Profissionais de TVn 29,2% Recursos jornalísticosn 20,1% Administração e serviçosn 11,4% Elencon 5,6% Negóciosn 4,7% Executivos

n 156 mil m2 de área construída;n Três cidades cenográficas, num total de 160 mil m2;n 32 unidades portáteis de produção para gravações de cenas nas cidades cenográficas;n dez estúdios acusticamente tratados com área total de 8 mil m2;n Seis salas de controle de estúdio, com 26 câmeras;n quatro unidades móveis de produção, com 16 câmeras;n 25 ilhas de edição de vídeo;n dez ilhas de edição de áudio;n 14 estações de computação gráfica;n duas estações de produção de conteúdo para distribuição web;n Acervo de fitas automatizado e robotizado, com capacidade para 250 mil cópias;n Complexo de produção de efeitos especiais (tiros/explosões/maquetes/etc.);n Interligação via fibra óptica e microondas digitais com a Globo Rio;n Fábrica de cenários e de cidades cenográficas com uma

produtividade mensal de 3,186 mil m2 de cenários e 1,1 mil m2 de cidades cenográficas;n Acervo de contra-regra com 39,407 mil peças e de

figurinos com 58,5 mil peças catalogadas e cadastradas via sistema;n 37 mil itens catalogados e cadastrados de peças ceno-

gráficas;n Fábrica de roupas com produtividade mensal de

1,725 mil peças;n Central de geração própria de energia elétrica, com capa-

cidade instalada de 5 MW.n 600 mil m2 de Mata Atlântica preservados, estação própria

de tratamento de esgotos, aproveitamento inteligente da água consumida e sistema de refrigeração menos agres-sivo ao meio ambiente.

n 51% Variedadesn 34% draman 2% Eventosn 11% Infantiln 2% Reality shows

COMPOSIçãO DA PRODuçãO EM 2004

Cidade cenográfica do Projac, no Rio de Janeiro.

no Reveillon e deve ir só até abril, data do aniversário da emissora. No segundo semestre a Globo retoma a campanha sobre cultura brasileira, se posicionando sempre como o mais importante pólo produtor de conteúdo nacional.

“Antigamente”, conta Erlanger, “a Globo mudava de slogan todo ano, e alguns eram memoráveis, como o ‘Globo e você, tudo a ver’. Agora a estratégia é manter uma comunicação fixa. Buscamos os elementos que mais nos caracterizavam, a imagem de líder, de cultura brasileira, de programação não-segmentada, a principal aliada da população nas causas sociais. uma janela na qual as pessoas vêem o mundo, o Brasil e também a si mesmas, como um espelho. daí o slogan atual, ‘A gente se vê por aqui’. A TV é onde as pessoas se encontram.

Infelizmente, até, é a hora de reunião da família”, conta.

um dos assuntos que mais entusiasma Erlanger é o chamado “merchandising social”, a inserção na programação, muitas vezes dentro dos próprios programas, de mensagens de caráter educativo/social. dentro da CGCOM, explica, há um departamento que lê todos os roteiros e sugere uma abordagem social, quando a situação permite. Assim, por exemplo, a novela “Mulheres Apaixonadas” abordou a questão das balas perdidas (violência urbana). A passeata encenada pela lei do desarmamento catalisou, segundo ele, a aprovação da lei no Congresso. O mesmo com o Estatuto do Idoso ou a questão da agressão doméstica, cita Erlanger.

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(especial ) Globo40 anos

EVOLuçãO DA AuDI NCIA

Segunda a domingo, das 7h à 0h

Ano Audiência Share

1998 21 51%

1999 22 51%

2000 21 50%

2001 20 50%

2002 22 54%

2003 23 54%

2004 23 56%

Segunda a domingo, das 18h à 0h

Ano Audiência Share

2002 34 57%

2003 34 59%

2004 37 63%

(pontos)

(pontos)

Não disponivel

Na comemoração dos 40 anos da TV Globo muitas vezes vem à mente a repetida acusação de que a

emissora e a rede por ela formada são as maiores responsáveis pela inexistência de produção regionalizada significativa no País e a conseqüente descaracterização das culturas locais. E os 40 anos se completam justamente quando mais uma vez voltou à pauta do setor a discussão sobre a viabilidade da produção local ou regional na esteira dos debates sobre a criação da Ancinav. Não é por falta de propostas que a polêmica vem se arrastando desde a aprovação da Constituição Federal, em 1988. Sem a regulamentação da regionalização, a televisão cresceu no Brasil e chegou a praticamente todos os lares brasileiros: os censos revelam que há mais domicílios com televisão que com refrigeradores neste País tropical.

Tanto quanto a TV Globo, a rede criada por ela desde o início das operações (a emissora tem afiliadas há 37 anos) é responsável por este sucesso. É a rede que permite à Globo ter presença nacional. A TV Globo é diretamente responsável por apenas cinco geradoras, as “cabeças de rede” no Rio de janeiro, São Paulo, Belo Horizonte, Recife e Brasília. Até 2002, a Globo tinha participação mais efetiva em afiliadas de grandes mercados. Estas participações foram todas vendidas, restando resíduos em algumas delas. Na RPC — Rede Paranaense de Comunicação, controladora de oito geradoras nas principais cidades do Paraná, em que a Globo tinha 50% do capital, a participação foi reduzida para menos de 5%. Outras emissoras no interior de

em âmbito nacional dos espaços publicitários locais. Para a rede, a presença nacional das afiliadas garante a exibição de seu produto acompanhado dos comerciais nacionais em todo o território brasileiro.

Segundo Claudia, o modelo adotado pela Globo é semelhante ao de uma franquia. A afiliada tem horários obrigatórios, em que deve

transmitir o conteúdo da rede nacional, e os optativos, nos quais pode exibir produções locais, na maioria dos casos, jornalismo. Ao todo, conta, são 75 mil horas/ano de produção local, e mais de 90 programas disponíveis. “As afiliadas ocupam cerca de 91% do espaço de que dispõem para a sua produção regional”, diz Claudia.

A engenharia da Globo impõe alguns padrões de qualidade, mas mantém, segundo ela, um certo grau de liberdade, e muitas vezes idéias das afiliadas acabam aproveitadas na rede toda. A integração se dá em vários níveis, além do técnico e comercial. No jornalismo, por exemplo, há uma intensa troca de informações, pautas e materiais entre a rede e as afiliadas. O mesmo vale para a área de entretenimento.

Produção regionalizada“Investimos muito em pesquisa,

que mostram que nas diferentes regiões do País há uma satisfação e aceitação muito grande do telespectador dessa grade que está no ar. A Globo atende bastante às

São Paulo e de Minas Gerais também foram vendidas aos sócios ou a terceiros.

Segundo a diretora da CGAL (Central Globo de Afiliadas e Licenciamento), Claudia quaresma, a separação acionária não afetou em absolutamente nada a relação da Globo com estas afiliadas. A rigor, diz ela, todas as afiliadas, independente de pertencerem ou não à própria Globo, são tratadas igualmente e seguem as mesmas regras e princípios.

Em geral as afiliadas são controladas por fortes grupos de comunicação estaduais que, além das emissoras de televisão, têm emissoras de rádio, jornais, e alguns até mesmo são sócios em empreendimentos de televisão por assinatura, o que lhes permite uma sinergia muito conveniente. Para a afiliada, o contrato, além de garantir a exclusividade na exibição da programação (aliás garantida por lei), também abre a possibilidade de comercialização

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Presença nacional e conteúdo regionalAs 113 afiliadas e cinco emissoras próprias da Globo usam quase todo o espaço que têm para a cobertura regional, e cada vez mais contribuem na programação da rede.

por Carlos Eduardo Zanatta*z a n a t t a @ p a y t v . c o m . b r

(especial ) Globo40 anos

“AS AFILIAdAS OCuPAM 91% dO HORáRIO dISPONíVEL PARA A PROGRAMAçãO LOCAL”, dIz CLAudIA quARESMA.

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demandas regionais de produção local, fortemente calcada em jornalismo e esporte. O que procuramos planejar para os próximos anos é de que maneira nós poderemos expandir a produção regional”, conta Octávio Florisbal, diretor geral da emissora.

Se, por um lado, foi a regionalização do jornalismo, com a obrigatoriedade de cobertura local por parte das afliladas que garantiu o sucesso nacional da rede, por outro lado a Globo tende a manter a produção de teledramaturgia e entretenimento centralizada em São Paulo e no Rio de janeiro. Segundo Florisbal, a dramaturgia, novelas e minisséries, têm de continuar a ser produzidas de forma centralizada, não só pela questão da manutenção do padrão de qualidade, como também dos custos envolvidos, que são insuportáveis no nível local ou regional. “Mas estamos vendo a possibilidade de, ao longo do tempo, poder expandir conteúdos na área de espetáculos, eventos, de cultura regional, de forma a ampliar um pouco mais os espaços regionais. Hoje, atendemos o que estabelece a legislação, mas acreditamos que no futuro isso deveria ter um cruzamento com a economia e o mercado publicitário de cada região”, completa.

No caso da Globo, o principal paradigma da discussão sobre regionalização da produção é o padrão de qualidade das produções da emissora. Este padrão, que não foi obtido “da noite para o dia”, consolidou-se como uma verdadeira linguagem com todas as implicações deste conceito. Ou seja, não se trata apenas de uma transmissão “limpa”, com qualidade técnica resultante do uso adequado das técnicas de captação, edição e transmissão do sinal de televisão (áudio e vídeo) como pode parecer à primeira vista, mas um padrão que se estrutura a partir de elementos de conteúdo (conseqüentemente de ética) e ainda componentes estéticos, estes, também oriundos da utilização intensiva de recursos tecnológicos de primeira linha.

produções veiculadas em nível nacional. Para Simabucuru, a produção da Globo é cara, mas, no caso, os custos são rateados com a exibição nacional, o que evidentemente não acontece com a produção local. Além disso, “não dá para colocar qualquer coisa com produção barata no ar, como, por exemplo, um talk show”.

O diretor de marketing da RPC avalia que às vezes a audiência do horário é baixa, mas o share das emissoras afiliadas à Globo é muito alto mesmo em horários alternativos, o que compensa o investimento. “Muitas vezes os anúncios veiculados durante o programa não o pagam, mas não é isso que interessa. Para nós interessa manter a fidelidade do telespectador, que sabe que terá as informações de sua cidade na nossa emissora, e com qualidade. Temos, ao mesmo tempo, que ser globais e locais, permitindo que nossos telespectadores saibam pela televisão o que acontece no japão e o que acontece na esquina de sua rua. jornalismo nas afiliadas da Globo é um compromisso”, lembra Simabucuru.

Esta também é a posição defendida pela RBS, a maior das afiliadas da Globo com 12 geradoras no Rio Grande do Sul e cinco em Santa Catarina. de acordo com Afonso Antunes da Motta, vice-presidente de

Na opinião de dirceu Simabucuru, diretor de marketing da RPC, uma das dificuldades para aumentar o percentual de produção local é justamente a necessidade de manter o padrão de qualidade das

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Alguns dos 90 programas regionais produzidos pelas afiliadas Globo. Foco em esporte, jornalismo e

assuntos comunitários.

A RBS/Globo é um caso único. A razão do sucesso desta parceria é a qualidade da programação produzida pela Globo e pela RBS que atende plenamente a expectativa dos telespectadores, conforme pode tes-temunhar a audiência. de forma modesta, nós procuramos agregar a programação local à programação global, porque quanto mais globalizada a informação mais interesse existe pela informação de suas próprias cidades, mais se interessam pelas coisas de suas comunidades e que lhe dizem respeito. Nós cumprimos a nossa parte: ter a mesma qualidade para atender a esta complementariedade e sempre na mesma filosofia de respeito à ética atendendo as comunidades onde atuamos.

Afonso Antunes da Motta, vice-presi-dente de TV da RBS

televisão da RBS, a ocupação por parte das emissoras do grupo de praticamente todos os espaços disponibilizados pela Rede Globo para a inserção de programação local é uma exigência do telespectador. Na produção deste conteúdo a RBS, assim como as outras afiliadas, garante a mesma qualidade de produto exibido pela rede em nível nacional: “Não produzimos mais que 12% do total da programação que vai ao ar, mas o que interessa não é o percentual, que é aparentemente pequeno, mas a qualidade do que é produzido”, afirma Motta. Na RBS, todos os programas regionais/locais são patrocinados e se pagam, segundo o VP, mas o mais importante é a fidelização do telespectador, que gosta de ver programas locais na televisão. “Com isso, nós somos reconhecidos como importantes produtores de conteúdo”, comemora Mattos.

Na Rede Matogrossense de Televisão (RMT), para a produção regional, a empresa tem a política de produzir material que possa ser aproveitado pela Rede Globo. Em 2004, houve participação de material produzido pelas emissoras da RMT em sete edições do “Globo Repórter”, sendo que duas edições do programa foram integralmente produzidas pela RMT. Mas a experiência mais interessante da afiliada é a utilização de um break comercial (o terceiro da novela das 21h, no qual deveriam ser exibidos comerciais locais) para a apresentação de um noticiário de três minutos com o resumo dos fatos locais/regionais mais importantes. Na avaliação de Ricardo Miragaia, diretor geral da RMT, vale a pena abrir mão da receita publicitária que o break poderia proporcionar para manter o telespectador, que não assistiu o jornal local das 19h, informado sobre os

seus jornais ou emissoras de rádio. Enquadram-se nesta categoria de afiliadas, entre outras, o conglomerado de comunicação da RBS no Sul do País, as Organizações Rômulo Maiorana no Pará e a Rede Gazeta de Comunicações no Espírito Santo.

Na prática, os fatos que merecem um tratamento nacional também acontecem em lugares distantes das cabeças de rede da Globo, ou seja, é também muito útil para a cobertura jornalística nacional a que a rede se propõe realizar, a existência destes pontos em todo o País, garantindo a presença de uma câmera e um microfone onde o fato acontece. junte-se a tudo isto a necessidade de manter o padrão de qualidade na produção local de interesse nacional, e chega-se à necessidade de organizar o jornalismo em rede. desta necessidade surgiu o treinamento dos jornalistas, repórteres e editores vinculados aos parceiros, treinamento que muitas vezes se deu de maneira bem prática, com a transferência de profissionais das cabeças de rede para as afiliadas.

Foi, portanto, a parceria efetiva das afiliadas que consolidou a rede jornalística que a Globo tanto preza. Atualmente, os parceiros se orgulham de oferecer as notícias produzidas em sua localidade para veiculação na rede nacional, e os mais desenvolvidos têm oferecido até programas inteiros como edições do “Globo Repórter” ou matérias especiais de longa ou média duração veiculadas em programas como “Globo Rural” ou “Fantástico”, e até mesmo para o canal Globo News

últimos acontecimentos de sua cidade ou região. Aliás, Miragaia considera a geração local lucrativa e condizente com as possibilidades comerciais das cidades ou regiões.

JornalismoO primeiro movimento rumo à produção

local veio da necessidade de oferecer aos telespectadores não apenas as informações sobre o que acontecia no mundo ou no País, mas também o que acontecia em sua região ou cidade. Este movimento adquiria mais importância quando o parceiro regional era um produtor de notícias oferecidas em

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(especial ) Globo40 anos

É uma honra ter a Globo como parceira. Não apenas como negócio, mas como a empresa que melhor produz televisão no Brasil. Além disso, todo apoio que neces-sitamos nos é dado através de cursos, palestras e material que nos permite conhecer melhor o nosso mercado e os interesses dos telespectadores. de nosso lado, por pertencer a um grupo forte no Estado, a TV Sergipe é a garantia para a Globo de que a sua imagem está bem representada em nosso Estado.

Sérgio Menezes, diretor comercial da TV Sergipe

Poderia resumir a importância que tem a Rede Globo para a Rede Gazeta lembrando que dois anos antes de recebermos a outorga da geradora em Vitória, meu pai, que montou a emissora, já havia garantido um contrato de afiliação da futura TV Gazeta com a Rede Globo. Meu pai considerava, e eu considero ainda, que para fazer televisão de qualidade no Brasil nada melhor do que associar-se a quem garante essa pos-sibilidade. Fomos a 17ª afiliada da rede, no ar deste 1976. Considero ainda que fazer televisão regional/local mantendo o padrão do que é produzido em nível nacional pela Globo é um outro privilégio, e esta possibilidade eu também agradeço à Globo, por me obrigar a aperfeiçoar cada vez mais o meu produto, num sinal ao mesmo tempo de re-speito ao telespectador que consome nosso conteúdo e ao anunciante que usa nosso veículo para atingir seus clientes. Gostaria finalmente de dizer que no Espírito Santo, pela força e seriedade do nosso trabalho de comunicação, a Gazeta associa prestígio à Rede Globo.

Carlos Fernando Lindenberg Neto, presidente da Rede Gazeta do Espírito Santo

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Não disponivel

Os 40 anos da Rede Globo são uma vitória da determinação, criatividade e arrojo do empresário brasileiro. A TV Anhanguera, parceira de primeira hora do ambicioso projeto do saudoso dr. Roberto Marinho, sente-se profundamente feliz e orgulhosa de participar, como afiliada, deste que é um dos mais bem sucedidos empreendimentos nacionais. O incomparável padrão de qualidade imposto pela Rede Globo na formatação de sua programação, ao lado do extraordinário serviço de integração, valorização e divulgação da cultura nacional, envaidece os brasileiros.

Jaime Câmara Júnior, diretor-presidente da Organização Jaime Câmara,TV Anhanguera de Goiânia

veiculado em televisão por assinatura.A necessidade ou até mesmo a ânsia de oferecer à rede material para veiculação local leva a situações curiosas, como a do Paraná: questionado sobre o fato de ainda não ter um programa rural específico, como acontece em outros estados que também têm forte presença do agronegócio, Simabucuru, da RPC, lembra que as geradoras paranaenses estão entre as que mais contribuem com matérias para o “Globo Rural”, inclusive em suas edições diárias. “O foco no agronegócio do ‘Globo Rural’ deixa pouco espaço para uma produção específica apenas para o Paraná.” de qualquer maneira, o programa rural exclusivo para o Paraná já está no planejamento para 2005 da RPC.

uma outra experiência interessante de valorização da presença local ocorre na TV Tem, do empresário j. Hawilla. A empresa conta com quatro geradoras no interior de São Paulo, mas além destas montou mais sete extensões das geradoras em cidades médias da sua região de cobertura, todas com equipes completas de jornalismo e comercial, estúdio, recursos técnicos, links para envio de matérias ou mesmo entradas

Esporteum segundo movimento de

produção regional, ainda com conteúdo jornalístico, mas incluindo parcela de puro entretenimento, é a cobertura dos eventos esportivos e os fatos em torno de sua realização. No País do futebol, com rivalidades esportivas regionais fortíssimas, este é um “prato cheio” e a audiência é garantida. A maioria das afiliadas utiliza para as notícias locais do esporte (especialmente futebol) o primeiro bloco de notícias do “Globo Esporte”. Mas muitas delas vão além desta “obrigação”: a RPC oferece aos telespectadores do Paraná aos domingos, depois do “Fantástico”, o “Camisa 12”. Na RBS, o segundo grande foco de produção regional é justamente o esporte: futebol de salão, vôlei, basquete, e especialmente o futebol. A TV Anhanguera exibe no final das manhãs de sábado o “Tribo do Esporte”, sobre esportes radicais, dirigido a jovens, tratando de aventura, saúde, turismo, natureza, cotidiano, cultura e comportamento de atletas. Por não ser um Estado com grandes times de futebol, em Sergipe a afiliada da Globo aposta no esporte amador (vela, ciclismo, skate, surf) que divulga no seu “Viva Esporte” (sábados no horário do “Vídeo Show”), que faz, inclusive, transmissões ao vivo. O Espírito Santo assiste o “Estação Esporte”, também sobre esporte amador. No Mato Grosso do Sul, o programa “Ação Radical”, sobre esportes radicais, vai ao ar às 11h do sábado, e sobre o mesmo assunto, no Mato Grosso, o programa “TV Centro América Esporte” vai ao ar após o “jornal Hoje” de sábado. Todas

ao vivo de onde é possível transmitir programação local.

ObrigatórioAtualmente, a rede exige do parceiro

a produção de no mínimo três noticiários regionais/locais: um noticiário de “bom dia” (antes do “Bom dia Brasil”), uma outra edição em torno do meio-dia com nome padrão, que em muitos casos utiliza a sigla do Estado (SE TV, por exemplo) ou em algumas emissoras é simplesmente o “jornal do Almoço”, e uma outra edição com informações locais antes da novela das 19h. Nos conjuntos de geradoras que podem ser caracterizadas como redes regionais estes programas têm sempre uma parte regional transmitida para o Estado todo, e quando a rede regional atinge dois Estados como na Rede Matogrossense de Televisão, no Mato Grosso do Sul e Mato Grosso, ou a RBS, que atende Rio Grande do Sul e Santa Catarina, ou ainda a rede da Organização jaime Câmara, que cobre Goiás e Tocantins, o programa tem duas partes: regional (para cada Estado) e local (específico para a cidade). Os demais horários em que podem ser exibidos noticiários regionais/locais são opcionais.

(especial ) Globo40 anos

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O agronegócio vem impulsionando programas que têm

o campo como tema central.

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Não disponivel

afiliadas têm compromisso com a área esportiva em fornecer os “gols da rodada” para exibição nos telejornais diários ou no “Fantástico”.

Programas ruraisComo conta Luiz Fernando Rocha

Lima, diretor de jornalismo da TV Anhanguera de Goiânia, a cabeça de rede das dez emissoras da Organização jaime Câmara em Goiás e Tocantins, o “jornal do Campo”, produzido e exibido aos domingos pelas emissoras do grupo, existe antes do “Globo Rural” e foi a inspiração da Globo para produzi-lo. O sucesso, inclusive nas áreas urbanas deste tipo de programa é tal, que um “Globo Rural” reduzido é programa diário há algum tempo com cotações de mercado e outras informações do agronegócio, além da previsão detalhada do tempo, utilíssima para o homem do campo.

É certo que estes programas têm aproveitado o crescimento espetacular do setor agrícola, especialmente em alguns estados. A RMT, por exemplo, faz dois programas rurais de 45 minutos nos sábados pela manhã (um para cada Estado) e ainda apresenta um boletim rural de dez minutos no final da manhã antes do bloco local do “Globo Esporte”. No Ceará, a TV Verdes Mares produz e exibe aos domingos o “Nordeste Rural”, com notícias sobre a agricultura daquele Estado. O mesmo ocorre em Sergipe, com o “Estação Agrícola”, programa com 24 minutos de produção no ar antes do “Globo Rural” do domingo.

Comunidade e juventudeAlgumas geradoras fazem o

“Globo Comunidade” ou usam a sigla do Estado para distingui-lo, como o “ES Comunidade” na Gazeta do Espírito Santo. Às vezes o nome é um pouco diferente, como o “Liberal Comunidade”, no Pará. Em todas as afiliadas, o formato e o conteúdo são os mesmos: valorização das experiências de ação comunitária e de solidariedade, com muitas entrevistas e debates. diversas

geradoras têm programas voltados para o público jovem — como o “Plug”, da RPC; o “Em Movimento”, da Gazeta do Espírito Santo; e o “Raddar”, da TV Anhanguera, este, segundo seus criadores, um sucesso de audiência aos sábados (horário do “Vídeo Show”), no ar há quase quatro anos com o objetivo de renovar a linguagem de televisão e oferecer uma visão “goiana” de fatos ou eventos de outras paragens.

Há ainda os programas religiosos, com destaque para as missas católicas aos domingos pela manhã, produzidas nas localidades, e ainda programas curtos com mensagens religiosas de diversos credos no final da madrugada nos dias de semana, como o veiculado na TV Anhanguera. Possivelmente um dos programas religiosos há mais tempo no ar na televisão brasileira é também da TV Anhanguera: “A Hora do Ângelus”, apresentando

mensagens bíblicas às 17h45 durante os dias de semana desde 1963.

A cultura regionalConhecido como uma das regiões

do País que mais preza sua cultura local — as tradições gaúchas — é certamente no Rio Grande do Sul e em Santa Catarina, através da RBS, que a televisão mais destaca a dimensão específica da cultura local através de suas produções. A programação veiculada pela RBS busca valorizar a culinária, a música, a indumentária e os costumes em geral destes Estados. Aos sábados à tarde, a afiliada exibe o programa de culinária “Anônimos Gourmet”. um outro programa que destaca a cultura regional é um programa de aventura apresentado pelo nadador Fernando Scherer, o xuxa, com cenas gravadas em sítios interessantes nos dois Estados.

Recentemente a RBS produziu uma série de 20 programas contando a história da “Conquista do Oeste”, a saga dos sulistas ocupando a fronteira do País. Curiosamente, a afiliada não vendeu o programa para exibição nas regiões onde foi gravado, mas produziu um dVd do qual vendeu dez mil cópias. Na avaliação de Motta, todos os programas

(especial ) Globo40 anos

Meu sonho era fazer chegar a televisão em Campo Grande. Na época eu contratei um engenheiro “maluco” que acreditava ser possível ir retransmitindo sinal pelo interior de São Paulo, até chegar ao Estado. Em 1964, participei de uma reunião em Tupã com 22 prefeitos da região para convencê-los a apoiar a idéia. Todos, menos o prefeito de Tupã, aceitaram a proposta. Mas sem ele, não seria possível. desistimos da proposta e parti

para o plano B, que era ter uma geradora própria. Entrei com pedido no dentel para ter emissoras em Campo Grande, Cuiabá e Corumbá. Apesar de disputar com os diários Associados, na época fortíssimos, eu ganhei as concessões. Comecei a operar numa época em que praticamente não se usava o videotape, o único que existia era da TV Tupi, caríssimo e fora das minhas possibilidades. Exibíamos filmes com a programação da TV Ex-celsior e da TV Record. Para isso eu mantinha um escritório em São Paulo, que comprava a programação e enviava para Campo Grande. Fiquei sabendo que nos Estados unidos começava a ser produzido um videotape pequeno, do tamanho de uma mala. Fui lá e comprei nove aparelhos. Coloquei dois na Excelsior e

dois na Record, gravando toda a programação que depois eu exibia em Campo Grande. Naquele tempo o meu escritório de São Paulo, além de cuidar do tráfego da programa-ção, servia para vender nossa publicidade em São Paulo. quando surgiu a Rede Globo, em 1970, passei imediatamente para a rede e ela resolveu todos os meus problemas. Além de me fornecer programação, vendia comerciais para nossas emissoras em todo o País e não apenas em São Paulo, o que ampliou o meu raio de ação.

ueze Zahran, presidente da Rede Matogrossense de Televisão - RMT

Credibilidade na venda dos serviços de comunicação, altos índices de audiência e produção de alto nível para todos os pú-blicos. Acima de tudo, ser afiliada da Rede Globo é oferecer ao mercado anunciante maior certeza de resultados e mais informa-ções e serviços à sociedade,

Antonio Vidal, gerente comercial da TV Verdes Mares, Fortaleza

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Não disponivel

que “aparentemente” protegerão a regionalização (referindo-se especialmente ao PL da deputada jandira Feghali, do PC do B/Rj), seria como dar um remédio que matasse o doente. “A Globo, por exemplo, tem 115 afiliadas, grandes e pequenas, com maior ou menor capacidade de produzir. Se for impositivo (a produção regional), a Globo dá um jeito, mas as outras vão quebrar”, afirma.

O problema, diz Erlanger, não é cultural, mas econômico. “Se houver políticas locais de incentivo, a produção vai se desenvolver sozinha”, completa.

* COLABORARAM ANDRé MERMELSTEIN E FERNANDO LAuTERJuNG

produzidos pela RBS buscam valorizar a cultura dos Estados onde a rede opera, utilizando temas de ficção, autores e atores locais.

Na mesma linha de produto, a TV Anhanguera de Goiânia exibe aos sábados às 8h da manhã o programa “Frutos da Terra”, destacando os valores de Goiás e Tocantins, incluindo quadros humorísticos. Na TV Liberal, o programa que atende ao movimento de valorização da cultura local é o “É do Pará”. A TV Sergipe produz integralmente programas especiais que são veiculados para todo o Nordeste. Na festa de São joão de 2004, por exemplo, foram feitos um programa sobre a música de Sergipe e outro sobre as tradições do São joão no Estado. No Espírito Santo, após o “Fantástico”, o programa “Painel de domingo”, além de oferecer o resumo dos acontecimentos locais, apresenta séries especiais dedicadas à cultura regional, destacando-se as séries “Terra de Valor”, “Espírito Santo Solidário” e “Espírito Santo Muito Prazer”, esta última ainda em exibição sobre aspectos turísticos do Estado. O turismo local é também um dos focos da produção regional.

xito do modeloPara André Barroso, da TV Tem, as

emissoras por ele dirigidas são na maior parte do tempo distribuidoras regionais de uma programação nacional, atuan-do também como produtora local/re-gional. “Esse tem sido o modelo que vem garantido a audiência e a viabili-dade ao negócio da televisão comercial do País. É possível e necessário evoluir e explorar ainda oportunidades nesse modelo” avalia Barroso. Enquanto persistirem as atuais condições econômicas e os altíssimos níveis de concentração de renda no País, será difícil aumentar a quantidade de programação local produzida. já Afonso Motta, da RBS, atento à movimentação política sobre o assunto, acrescenta um novo dado à discussão: “Tudo vai depender da manutenção ou alteração do marco regulatório, e também da direção que a Rede Globo queira dar à sua produção regional”.

Segundo Luis Erlanger, diretor da Central Globo de Comunicação (CGCOM), se forem aprovadas as leis

(especial ) Globo40 anos

Nossa parceria com a Rede Globo iniciou-se em 27 de abril de 1976. Ao longo de todo esse tempo a tônica de operação entre essas duas organizações foi a da comple-mentariedade. de nossa parte, um exercício contínuo de produzir e oferecer à Rede Globo conteúdo sobre a nossa região e, dessa forma, integrá-la ao Brasil e ao mundo, e, em contrapartida, receber da Rede Globo uma grade de programação de alto nível e o melhor know-how de televisão do mundo. Essa parce-ria foi decisiva para criar e desen-volver um novo mercado e gerar atratibilidade para anunciantes e telespectadores. Nosso desafio foi construir e implantar televisão em uma região de dimensões conti-nentais, de recursos escassos. O outro desafio dessa relação tem sido assegurar à Rede Globo um padrão de qualidade regional, de produção\exibição capaz de manter e até ampliar os índices médios de audiência obtidos nacionalmente. Essa parceria permitiu ainda o desenvolvimento de um crescente e consistente mercado publicitário, gerando excelentes oportunidades de negócios para anunciantes locais e nacionais. O relacionamento Rede Globo — TV Liberal consolidou um padrão de qualidade e de lingua-gem, reunindo conteúdo nacional e produção local, graças à grande afinidade como empresas focadas exclusivamente em comunicação, um relacionamento fundado na confiança, na admiração e no respeito mútuo, valores sobre os quais nossas atividades foram construídas.

Rômulo Maiorana, presidente da Organizações Rômulo Maiorana, TV

Liberal de Belém do Pará

O sucesso da Rede Globo se baseia em parte na sua produção de qualidade e em parte na grande rede de distribuição mantida pelas afiliadas. Também é causa do sucesso a sólida organização nas relações entre a Globo e as afiliadas, o que possibilita, inclusive, compartilhar empresarialmente

os bons resultados comerciais. A Globo incentiva as afiliadas a manterem padrões de qualidade em todas as dimensões do negócio: pesquisa, tecnologia, inovações, treinamento, ética, atendimento, profissionalismo etc. Todas as

emissoras são levadas a cumprir no mínimo os espaços destinados ao jornalismo local. Cada afiliada é uma extensão da rede junto ao público que atende e ao mesmo tempo é de fato os olhos, a voz e o pensamento dessa população para a qual entrega diariamente seus serviços. A TV Tem é tão importante para a rede quanto esta para a TV Tem. Assim, fazemos diariamente a transferência de conhecimentos, trocamos experiência, adquirimos treinamento e muito mais.André Barroso, diretor-executivo da

TV Tem, interior de São Paulo

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Não disponivel

um personagem criado há vários anos para despertar nojo no espectador tornou-se, ao longo do tempo, uma

figura simpática. Louie, desenvolvido inicialmente em animação 2d na déca-da de 60, é o inseto protagonista dos filmes do inseticida Rodasol em vários países do mundo. A partir de uma pes-quisa de opinião, porém, a agência chegou à conclusão de que precisaria redesenhá-lo para reforçar a imagem do produto, já que o que era para ser um inseto asqueroso atraía a atenção das crianças. “depois que analisamos as versões do personagem em diferen-

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(making of )por Lizandra de Almeida

l i z a n d r a @ t e l a v i v a . c o m . b r

Monstrinho com novo visualtes países, fizemos mudanças no monstri-nho para enfatizar seus aspectos malvado e feio”, diz Rodolfo Patrocínio, responsável pela criação do novo visual do persona-gem.

“Nossa idéia era demonstrar que o bicho provocava doenças, mas isso não era percebido pelo público”, afirma Marcelo Briani, redator do filme. “O novo visual não identifica o tipo de inseto, é um misto de mosca com barata, não se sabe muito bem. Mas mesmo assim, é bem mais realista.” Para conseguir essa nova apresentação, criação e produção optaram pela computação gráfica, por agregar aspectos de realismo ao monstrinho.

Para deixar o inseto com aparência mais repulsiva, o personagem foi redesenha-do, ganhou pêlos e dentes sujos. A ani-

mação 3D foi fundamental para garantir também um gestual mais violento ao

híbrido de mosca e barata.

“Colocamos mais pêlos no corpo, criamos uma face mais enrugada, uma cor cinzenta sombria, dentes sujos e um gestual mais violento”, completa Rodolfo. “Também estudamos vários personagens animados do cinema e assim montamos uma biblioteca de expressões faciais.”

“Reforçamos, inclusive, o rastro de sujeira deixado pelo bicho, a pedido do cliente. Entretanto, temos que mostrar uma cozinha limpa — caso contrário a dona de casa não se identifica com o local. Se mostramos uma cozinha imunda, destruída, as pessoas pensam que aquela não é sua casa”, diz Briani. O filme mostra Louie à frente de uma corrida de baratas. É dada a largada, mas a dona de casa

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Desafio do filme foi achar a locação perfeita, que pudesse ser exibida em vários países sem perder as características de uma casa de classe média em uma rua pacata.

ficha técnica

Anunciante Andreas Stihl MotosserrasProduto Lavadora StihlAgência dCS Criação Marcio Fritzen e Grace Meurer Dir. de Criação Roberto Callage e Regis Montagna Produção TGd FilmesDireção Chico denizFotografia Leopoldo SotoFinalização daniel Griffin e Mauris Hansen Montagem Mauris Hansen Trilha Som Guia

Limpeza impecável

um homem utiliza o produto — uma lavadora Stihl — para limpar sua calçada. Tão limpa fica a calçada que o vizinho tira os sapatos para pas-sar em frente à casa. Simples e direto, o roteiro

desse filme motivou sua indicação como destaque da revista The Reel, de Londres. “Apesar da simplicidade do roteiro e do próprio filme, é preciso ter muito planeja-mento para conseguir sintetizar a história e incluir todos os elementos que tornam o filme universal”, explica o diretor Chico deniz.

O trabalho começou com uma extensa pesquisa de lo-cação. “Precisávamos de uma típica casa de classe média, que também pudesse servir no caso de o filme ser exibido no exterior. Além disso, como o cenário é único, precisava formar uma composição bonita em quadro”, conta deniz. “Todos os elementos deveriam remeter ao imaginário de uma rua pacata, à relação entre os vizinhos, à limpeza.”

A fotografia, então, optou por um enquadramento que revela apenas parte da casa de cada um dos vizinhos, sendo que a calçada a ser lavada aparece em destaque. Com uma câmera fixa, toda a ação se desenrola em dois planos: um da lavagem da calçada, e outro da passagem do vizinho. E a trilha divertida amarra toda a narrativa, que não tem diálogos.

prevenida se defende com o produto, eliminando os insetos em pouco tempo e com toda a eficiência.

Foram dez dias de estudos para as modificações do personagem e outros 45 dias de produção. “Gravamos primeiro o dublador e utilizamos o áudio como guia, além de seguir a sincronia labial. depois desenvolvemos o estilo de andar do personagem, a partir de referências do movimento humano”, explica Rodolfo. Os ângulos de câmera, luzes e lentes tiveram seus parâmetros reproduzidos em computação para que pudessem incidir sobre os personagens virtuais. Para conseguir um melhor efeito visual, as baratas foram animadas individualmente. A demonstração do produto, que encerra o filme, é padrão internacional e reforça a eficácia do inseticida.

Cliente Reckitt BenckiserProduto RodasolAgência Carillo Pastore EuRO RSCGProdutora CineDireção jean BenoitProd. de efeitos digitais digital 21Direção de efeitos Rodolfo Patrocínio

ficha técnica

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(artigo)

O audiovisual no comércio internacional e os debates na OMC

Todavia, o audiovisual, para atingir status de indústria, prescinde de políticas públicas que fomentem todas as atividades da sua cadeia de valor (produção, distribuição e exibição), protejam a “indústria” nacional de práticas comerciais desleais e incrementem a participação no comércio internacional.

No âmbito do comércio internacional, ao se falar dos mecanismos legais de subsídio e proteção das indústrias nacionais, surgem as tradicionais discussões acerca de protecionismo, concorrência desleal e desrespeito às normas da OMC.

Em relação ao audiovisual, a análise e crítica dos mecanismos legais de subsídios e proteção não podem desconsiderar a situação de fato existente em um país emergente em relação à realidade industrial e às práticas comercias dos países desenvolvidos, que hoje controlam significativa parcela da sua cadeia de valor, inclusive fora de suas fronteiras.

durante os debates da Rodada do uruguai, da OMC, foram apresentadas posições antagônicas acerca do tratamento a ser dado ao audiovisual no comércio internacional que, ao final, convergiram apenas no entendimento de que a solução só será alcançada com medidas extremas.

uma primeira corrente defendeu a tese de que os serviços audiovisuais devem ser tratados como qualquer outro produto, sem distinção ou tratamento diferenciado, estando sujeitos às normas aplicáveis às demais atividades comerciais.

por Petrus Barreto*p e t r u s @ v e l o x m a i l . c o m . b r

Não restam dúvidas sobre a significativa importância cultural e comercial do audiovisual, especialmente diante da globalização dos

tempos atuais.Sob o ponto de vista cultural, o

audiovisual representa importante instrumento de preservação e difusão da identidade e diversidade cultural de uma nação, na medida em que resgata, registra, perpetua e dissemina, tanto em seu país de origem como no exterior, o conhecimento, a educação, os costumes, o folclore, a história e os aspectos econômicos, políticos e sociais do povo que retrata.

Sob a óptica econômica, o audiovisual é elevado à condição de atividade industrial de evidente importância estratégica, constatada sua significativa participação na balança comercial de alguns países.

Os avanços tecnológicos vêm impulsionando o desenvolvimento do setor, não só nos processos de difusão de informação, idéias, conhecimento e cultura, mas também na instalação de modernas infra-estruturas nacionais e internacionais de comunicação.

A nova realidade tecnológica, aliada ao fato de ser o audiovisual uma indústria de investimento intensivo e de elevado risco, resulta na busca de novos mercados para distribuição de produtos, gerando, por conseqüência, o incremento de transações comerciais internacionais.

diante desta singular condição, as regulamentações governamentais desempenham um papel essencial, já que as atividades inerentes ao audiovisual não se referem apenas às questões sociais e culturais, mas também às de ordem comercial.

* Sócio do escritório Petrus Barretto Advogados. Especializado em direito do entretenimento, propriedade intelectual e mídia. É professor de direito autoral da FGV-Rj e foi diretor jurídico da Globosat até 1998. Tem entre seus clientes empre-sas como TAP; Panamerica Sports Inc.; Acom Comunicações; Canal Futura; e Editora Senac. É sócio da Imagex, empresa especializada na distribuição de produtos culturais brasileiros para o exterior.

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A manifestação contrária considerou que os serviços audiovisuais são culturais, transmissores das idéias e valores de uma sociedade, tratando-se, portanto, de instrumentos fundamentais de comunicação social na medida em que promovem a identidade cultural, razão pela qual não podem ser tratados como produtos comerciais e, por conseqüência, não devem se sujeitar às regras que disciplinam as atividades comerciais.

O governo brasileiro, em comunicado encaminhado à OMC, manifestou seu entendimento no sentido de que ambas as posições são incorretas.

Por um lado, a argumentação da “exceção cultural” parece não ter levado em conta que os produtos e serviços culturais formam parte de uma indústria de clara importância econômica, na qual o setor audiovisual se apresenta como o segmento mais dinâmico. de outro lado, não é possível negar que o audiovisual desempenha uma importante função na transmissão e difusão de idéias e valores culturais, que é o objetivo fundamental das políticas nacionais de muitos países.

A posição conciliatória brasileira tem por fundamento atender às necessidades dos países emergentes sem pretender ferir as regras de comércio internacional, propondo a promoção da liberação progressiva do setor de maneira a criar oportunidades de acesso aos mercados estrangeiros para os países em desenvolvimento, sem afetar, contudo, a capacidade dos governos de implementar as políticas culturais que acharem apropriadas.

IntervençãoA discussão sobre políticas nacionais

e comércio internacional de serviços audiovisuais carrega consigo algumas questões extremamente sensíveis, como subvenções, centralização do controle dos serviços de distribuição e exibição por alguns países, dumping e protecionismo.

Impossível, neste confronto de tendências e ideologias comerciais, desconsiderar o fato inconteste de que os países emergentes não congregam

condições mínimas que permitam estabelecer uma atividade audiovisual em escala sem contar com políticas públicas que incentivem a criação e manutenção de todo o setor.

Ademais, é importante observar que em relação aos serviços de produção e distribuição, o mercado mundial está sujeito a uma estrutura oligopólica, na qual um pequeno grupo de empresas detém quase que a totalidade dessas atividades.

O resultado da análise dos impactos desse oligopólio, tanto no âmbito do comércio internacional quanto nos mercados nacionais, deve ser objeto de discussão e tratamento por parte dos países membros da OMC, já que sua existência resulta em distorções que afetam sobremaneira toda as atividades ligadas ao audiovisual, mais particularmente às dos países emergentes.

Mas quando o tema em pauta é a estrutura oligopólica hoje existente, impossível não tecer considerações

a respeito dos valores praticados no licenciamento dos produtos audiovisuais.

Em grande parte, tais produtos são licenciados para o exterior, pelas empresas que formam o citado oligopólio, em condição de dumping, ou seja, por preços inferiores aos praticados nos seus países de origem, o que é possível na medida em que considerável parcela dos custos de produção foi recuperada em seus mercados internos.

No que tange ao comércio internacional, cabe aos países membros da OMC analisar a eventual existência de atividades de concorrência desleal e, se constatado o dumping, propor abertura de painel para compelir o Estado Membro a realizar as correções necessárias.

No âmbito interno, os governos

possuem autonomia suficiente para impor medidas tarifárias e alfandegárias que visem proteger sua indústria nacional contra o similar estrangeiro que chega em seu território a preço de dumping, independentemente de se tratar de serviços audiovisuais, aço, aeronaves ou produtos agrícolas. Tais medidas, por terem por objetivo a proteção contra atos de concorrência desleal estrangeira, são legítimas e toleradas pela comunidade internacional.

O governo brasileiro tem se mostrado sensível às questões comerciais relativas aos serviços audiovisuais, atuando e se manifestando no sentido de ampliar e harmonizar o comércio internacional. Todavia, não perdeu de vista a necessidade de existência de políticas públicas internas que criem condições propícias para a criação e desenvolvimento de uma indústria cultural, indispensável para a manutenção e difusão da identidade

do povo brasileiro.A posição brasileira, em tom

conciliatório e coerente, sinaliza a concreta possibilidade de abertura de negociação para o setor audiovisual, preservados os princípios do livre comércio internacional, assim como as necessidades particulares de cada nação para preservação de sua identidade cultural e criação de uma indústria nacional. Talvez este seja um novo tema em discussão no cenário mundial, no qual o Brasil venha a demonstrar sua aptidão para aglutinar forças da comunidade internacional, assim como já o fez na formação do G-20; e para comandar, com sucesso, disputas comerciais na OMC, como no caso dos subsídios às exportações agrícolas dos EuA e da união Européia.

as aTiVidadEs inEREnTEs ao audioVisual não sE REFEREM apEnas às quEsTõEs sociais

E culTuRais, Mas TaMbéM às dE oRdEM coMERcial.

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(produtoras)

Família ampliadaGrifa junta-se à Mixer e completa o portfólio de serviços do grupo.

dentro da tendência de se criar uma empresa que atue em todas as vertentes da produção audiovisual, a Mixer

anunciou no final de janeiro a entrada para o grupo da produtora Grifa, especializada em documentários, especialmente de natureza, com forte foco no mercado internacional.

A Grifa passa a ser uma das “bandeiras” da Mixer, como são a RadarTV, a jodaf, a Luz, entre outras. A Grifa Mixer é uma sociedade meio-a-meio entre o grupo Mixer e a Grifa Cinematográfica, dos irmãos Fernando e Maurício dias. Os diretores da Grifa participarão da “mesa de negócios”, o encontro semanal de todas as bandeiras da Mixer que troca idéias e discute oportunidades de negócios para todas as marcas do grupo. A Grifa tem atualmente oito projetos em fase de produção.

Segundo Fábio Ribeiro, diretor da Mixer, o acordo foi fechado num prazo muito rápido, de um mês, graças à afinidade muito grande entre as empresas. “já havia uma paquera há muito tempo. Sempre admiramos a qualidade do trabalho da Grifa, as pautas dos documentários. Eles fazem coisas que nós gostaríamos de ter produzido”, diz Ribeiro.

“já deu para sentir a sinergia entre as empresas na última Natpe (feira de programação que

mais de 300 horas da Grifa incorporadas.

O grupo Mixer investiu cerca de R$ 2 milhões em tecnologia e equipamentos em 2004, incluindo a compra dos equipamentos da produtora carioca Arte e Fato, adquirida pelo grupo. Para 2005, a maior parte dos investimentos será destinada à nova sede. “A linha principal de aquisições será nas áreas de captação e finalização, e queremos também implantar uma solução de servidor de vídeo em nossa pós-produção”, conta Ribeiro.

Embora cada uma das 12 coordenadorias de produção tenha total autonomia para definir que tipo de equipamento e plataforma utilizará em suas produções, há algumas decisões estratégicas tomadas na Mixer em relação à aquisição de equipamentos, para que haja uma padronização entre as unidades do grupo. Para a pós-produção de TV e documentários, por exemplo, foi adotado o Final Cut, com 12 ilhas atualmente. A publicidade utilizava a plataforma Edit, que foi descontinuada. Hoje a Mixer testa o Smoke e o Avid Adrenaline, mas ainda não fechou uma plataforma única.

Para 2005, a expectativa é de consolidar o crescimento experimentado nos primeiros anos da formação do grupo (em 2004 o faturamento dobrou em relação ao ano anterior). Além das frentes tradicionais, como a publicidade e a TV a cabo, a Mixer planeja o lançamento de dois longas-metragens (um, já definido, será “O Maior Amor do Mundo”, de Cacá

diegues) e um avanço na produção independente para a TV aberta.

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aconteceu em janeiro em Las Vegas, EuA)”, conta Paulo Ricci, que dirige a área de canais de TV da Mixer. “A parceria alia o cuidado da Grifa com a qualidade de produção e a visibilidade da marca Mixer no mercado”, completa.

Casa novaA família não só aumentou, mas

também está de mudança. A partir do final de fevereiro a Mixer passará a ocupar uma área de 1.500 m2 na Vila Olímpia, além de uma outra unidade de 500 m2 na Av. Brig. Luiz Antônio, ambas em São Paulo, e uma unidade no bairro de Laranjeiras, no Rio de janeiro.

Na unidade da Vila Olímpia ficarão a administração, área comercial, produção e pós-produção. Para coordenar a finalização dos filmes que exigem uma pós-produção mais elaborada, com efeitos, foi contratado Fefo de Souza, que assume como VFx (Visual Effects) Supervisor e Smoke Artist. Fefo trabalhou oito anos na Casablanca como VFx Supervisor e Flame / Inferno Artist,

além de uma passagem pela Imaginary Forces, de Los Angeles, empresa especializada em finalização de abertura de filmes. Também participou da elaboração de efeitos em produções hollywoodianas como “Paixão de Cristo” e “Scooby doo 2”.

O prédio da Brigadeiro abrigará a “locadora” interna de equipamentos, que fornece para as empresas do grupo, uma central de casting própria e o arquivo de imagens, que está sendo organizado e que já terá as

“O acordo foi feito em um mês, graças à afinidade que havia entre as empresas.”Fábio Ribeiro, da Mixer

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(case)

Os mistérios do mundo amazônico Código Solar produz documentário sobre expedição na Amazônia e fecha parceria de exibição exclusiva com TV aberta.

O mercado brasileiro de documentários ambientais ganha mais uma importante contribuição. Trata-se

do filme “Andes-Amazônia”, que será produzido pela produtora carioca Código Solar a partir de julho deste ano. O projeto é ambicioso e considerado por Marcelo de Paula, executivo da produtora especializada em conteúdos ambientais que está apenas há três anos no mercado, como um dos mais importantes realizados pela Código Solar. “Esse documentário será o coroamento do nosso trabalho e também da importância da preservação e estudo sobre o meio ambiente brasileiro.”

A produtora descobriu informações sobre a expedição — que tem o mesmo nome do filme — em um boletim eletrônico, de acordo com de Paula. “Através desse informativo, acompanhei os preparativos da expedição e resolvi entrar em contato com eles para me juntar à equipe e propor um trabalho de registro desse conteúdo. Graças ao perfil da Código Solar e da experiência que os profissionais da nossa equipe acumulam em produções ambientais, conseguimos fechar esse trabalho.”

Contratada pela equipe que fará parte da expedição, com os recursos obtidos pelos patrocinadores do

Ministério da Ciência e Tecnologia,

do Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis), e da ANA (Agência Nacional de águas) das universidades federais de Brasília e do Amazonas, além das embaixadas do Brasil, Guiana Francesa, Suriname, Guiana, Venezuela, Colômbia, Equador, Peru, Bolívia e Chile.

A equipe da produtora, composta por seis integrantes, acompanhará todos os detalhes registrados durante os quatro meses de viagem à região da Amazônia, para rodar o documentário, que terá a duração de 60 minutos de imagens feitas com dV-Cam e Mini-dV. “utilizaremos todos os recursos para obter excelentes imagens externas — verticais e horizontais —, desde equipamentos de última geração até recursos de transporte, como helicópteros, barcos e jipes, por exemplo, para dar veracidade ao documentário. Serão mais de cem horas de filmagens”, explica de Paula.

Antes disso, o executivo e sua equipe fazem uma viagem para a região da Amazônia para fazer um reconhecimento de território, antes de iniciar o trabalho com a expedição. “Vamos fazer um sobrevôo na região para checar quais serão as nossas

por Júlia Zilligt e l a v i v a @ t e l a v i v a . c o m . b r

projeto, a Código Solar será responsável pela produção do documentário, de um livro e fotos sobre o trabalho desenvolvido pelos profissionais ao longo da viagem. A empresa intermediou o contato entre as emissoras de TV e a equipe da expedição, e acertou a exibição de seu conteúdo com a TV Globo, para o programa “Fantástico”, em caráter de exclusividade em relação ao restante dos canais abertos. O formato de envio de imagens ainda não está acertado, mas serão exibidas em capítulos. “As imagens da expedição poderão ser mandadas para a emissora ou via satélite, com flashes diretos do que está acontecendo, ou então em pacotes com as melhores imagens decupadas, incluindo roteiro e entrevistas com os pesquisadores e coordenadores da expedição. A linguagem será a de documentários”, explica de Paula.

Além dessa parceria com a TV Globo, a Código Solar está em fase de negociação com o National Geographic Channel para exibição do documentário na TV por assinatura. Além disso, a TVE convidou a

Código Solar para exibir, na íntegra, o documentário no programa “Sexta Independente”, voltado para produtoras que estão começando a atuar no mercado de produção independente.

O enorme interesse é reflexo da grandiosidade do projeto da expedição, que é encabeçado pela Ambi (Organização Sócio-Ambiental e Expedições Científicas), e conta com o apoio do Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais) vinculado ao

“Em locais externos como esse, os riscos para os sets de filmagens, são imprevisíveis.”Marcelo de Paula

“Queremos confirmar informações obtidas através de imagens enviadas via satélite da Amazônia.”Janary Moraes >>

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condições de trabalho e também a questão da iluminação. Em locais externos como esse, os riscos são enormes para os sets de filmagens, são imprevisíveis”.

O projetoO objetivo do documentário

“Andes-Amazônia” condiz com as metas da expedição, que é fazer um mapeamento da Região Amazônica, devido às transformações ocorridas pelas mudanças climáticas. Além disso, pretendem fazer um estudo detalhado sobre o rio Amazonas, sobre as reservas indígenas, áreas naturais e sítios arqueológicos, além de promover a integração regional dos países limítrofes. “Não se tem nenhum conhecimento sobre um projeto feito na região baseado no geoprocessa-mento para a formação de um banco de dados detalhado. queremos

confirmar informações obtidas através de imagens enviadas via satélite da Amazônia, como, por exemplo, sobre a origem andina da sedimentação do rio Amazonas e sua real extensão, que pode consagrá-lo como o maior rio do mundo. Essa expedição é a junção do ‘homem, tecnologia e meio ambiente’”, diz janary Alves de Moraes, coordenador geral de deslocamento e funcionamento da expedição Andes-Amazônia e vinculado à AMBI.

Para gerar tamanho “raio-x” da Amazônia, a Código Solar se junta, ao longo da expedição, a profissionais das áreas de geologia, geografia, geoprocessamento, hidrologia, hidrometria, oceanografia, botânica, engenharia florestal, arqueologia, antropologia, ecologia humana, climatologia, história, entre outras.

“A responsabilidade do trabalho da produtora em retratar essa expedição é imensa. Por isso fornecemos uma

potável disponível no planeta”, enfatiza Moraes.

“A Expedição Científica Andes-Amazonas é, portanto, um instrumento de relevante importância que promete dar sua contribuição significativa para a ampliação dos conhecimentos científico-geológico e histórico-geográfico sobre essa região, cujos resultados científicos e imagens ultrapassarão as fronteiras e alcançarão países e povos dos mais longínquos da Terra”, analisa o coordenador.

ExpectativaAdaptado para a televisão, o

documentário terá linguagem de filme, de acordo com de Paula, e será disponibilizado nas versões em portu-guês, espanhol e inglês. A idéia é fina-lizar o material até dezembro deste ano e realizar sua exibição em 2006. “quero também levar esse documentário para os festivais de cinema.”

Trabalhando em produções na área ambiental desde 1998, Marcelo de Paula já produziu diversos documentários sobre o Parque Nacional de Foz do Iguaçu e sobre o Parque Nacional da Serra dos órgãos, em Teresópolis/Rj. “Eu fui um dos primeiros a registrar imagens do macaco muriqui. A partir disso, foi criado um programa de conservação da espécie no Brasil”, diz.

consultoria de produção em relação à adequação dos veículos, aos meios necessários para o desenvolvimento do trabalho, entre outros. Pois eles mesmos já tinham uma grande preocupação com a questão das imagens”, conta o executivo.

Com o intuito de tornar o trabalho feito pela Código Solar durante a expedição ainda mais eficiente, de Paula contratou profissio-nais multifuncionais. “ Nossa equipe será for-

mada por profissionais de qualidade e com experiência, e principalmente que desem-penham várias funções, como, por exemplo, um editor que também produza imagens.” juntando-se a isso, a produtora montará uma mini-ilha de edição dentro de um dos caminhões que acompanhará o percurso.

“O deslocamento da equipe, acompanhado por um helicóptero, será feito através de veículos especiais dotados com aparelhagem de ponta para o cumprimento da missão, em via terrestre e fluvial, como uma estação móvel climatológica, um laboratório para análises de águas e pré-filtração de sedimentos, além de dois equipamentos de AdCP para medições de vazão, concentração de sedimentos, salinidade e temperatura, que serão feitas nas bacias hidrográficas do Orinoco e da Amazônia, em 63 pontos estratégicos do percurso. Nosso trajeto inclui o Planalto Central, a Costa Atlântica, as montanhas andinas, além dos rios. juntos, eles representam 18% da água

(case)

“A RESPONSABILIdAdE dO TRABALHO dA PROduTORA EM RETRATAR ESSA ExPEdIçãO É IMENSA. POR ISSO

FORNECEMOS uMA CONSuLTORIA dE PROduçãO EM RELAçãO À AdEquAçãO dOS VEíCuLOS, AOS MEIOS

NECESSáRIOS PARA O dESENVOLVIMENTO dO TRABALHO.”

Produção envolverá profissionais das áreas de geologia, geografia, hidrologia, oceanografia, botânica, engenharia florestal, arqueologia, antropologia, ecologia humana, climatologia e história.

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(carreiras)

Com que roupa? A arte de vestir personagens vai além dos conhecimentos da moda e do senso estético. É preciso combinar tudo isso com conhecimentos técnicos, uma boa rede de relacionamentos e muita informação.

Conhecimentos de história — especialmente da moda, fôlego de produtor, gosto para colocar a mão na massa (no caso,

pregar botões, costurar e bordar, entre outras coisas), muita organização, uma extensa rede de contatos e talvez um pouco de habilidade para o desenho. São essas as principais características necessárias ao bom figurinista, uma profissão fundamental em todas as áreas do audiovisual dentro do escopo da direção de arte, mas que como tantas outras atividades não pode ser aprendida em um curso específico. Além disso tudo, disposição para aprender e se informar o tempo todo também é fundamental.

Grande parte dos profissionais que atuam nessa área é autodidata, aprendendo na prática as habilidades necessárias. Alguns vêm do curso de comunicações; outros, mais recentemente, formaram-se em moda. E muitos aprenderam com outros profissionais. Mas nem as faculdades de comunicação (especialmente nos cursos de cinema e rádio e TV) se aprofundam o suficiente em moda, nem a faculdade de moda apresenta as ferramentas necessárias para se trabalhar em produção audiovisual.

Gisela Porto, por exemplo, é formada em jornalismo e se especializou em cobertura de moda, com passagens pelas revistas Vogue, Elle e várias femininas da Editora Abril. quando se mudou do Rio de janeiro para São Paulo, foi chamada para produzir o figurino de um comercial com a atriz Silvia Pfeiffer, e não parou mais. Além de uma remuneração melhor do que a da área editorial, Gisela encontrou uma profissão em que seus interesses convergiam. Hoje

decidiu criar seu próprio curso. Hoje, ela ministra periodicamente oficinas e workshops no Museu de Arte Moderna de São Paulo, e daí aproveitou vários estagiários. Formada em publicidade, Paula começou na TV Cultura e depois fez um curso de desenho de moda em Paris. Também trabalhou em novelas no SBT e depois na TV Record, conta. Recentemente, assinou o figurino do filme “O Príncipe”, de ugo Giorgetti, com quem também vai filmar “Boleiros 2”. Para ela, o conhecimento de desenho — que nem sempre é considerado fundamental — pode ser um bom diferencial. “Muitas vezes na reunião de briefing eu já começo a rabiscar os modelos e saio com

roupa convencional, de acordo com o perfil do programa e do apresentador, até a construção de personagens para um apresentador que sempre estava fantasiado.

depois disso, Regina passou por outros programas de televisão e também por comerciais, filmes institucionais, peças de teatro e, recentemente, foi a figurinista do longa-metragem “Como Fazer um Filme de Amor”, de josé Roberto Torero. A diferença, explica, é o tempo necessário para a produção do trabalho. “A TV e a publicidade em geral trabalham com uma urgência maior. É aí que geralmente colocamos mais a mão na massa, acabamos entrando na parte de costura para que as coisas fiquem com a nossa cara. No longa, você trabalha em cima de um roteiro, cena a cena. É árduo,

trabalha exclusivamente com comerciais.A carreira de Regina de Almeida, por

sua vez, começou na televisão, quando foi contratada para o departamento de figurino da STV, em 1995. Regina respondia pelas roupas dos apresentadores de 17 programas e, por isso, seu trabalho era bem variado: ia desde a escolha de uma

mas temos mais controle. E exige muita organização, porque na tela grande nenhum detalhe pode passar”, afirma.

Paula Iglecio também trabalha em publicidade e cinema e, diante da falta de aprendizes que tivessem o mínimo de noção do que era o trabalho,

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a linha de trabalho aprovada”, explica.

NetworkingO contato direto com celebridades

pode fazer brilhar os olhos de alguns, mas, como define Paula Iglecio, “champagne só no dia da estréia”. “Muitas pessoas têm a ilusão de que a profissão é cheia de glamour, porque atuamos direto com os atores e apresentadores. Mas é um trabalho muito puxado, que não tem nada a ver com isso”, diz Paula. Regina concorda: “As pessoas têm a falsa ilusão do glamour, mas este é um trabalho de relacionamento”.

Para produzir o figurino de qualquer tipo de produto audiovisual, o figurinista pode seguir dois caminhos: o da produção e o da confecção. de acordo com o trabalho, é preciso ir a lojas especializadas e solicitar permutas ou comprar realmente as peças que serão

isso, vamos atrás de peças que já foram vestidas por alguém, foram lavadas, desbotaram naturalmente. Aquela imagem de propaganda de margarina, com todo o mundo engomadinho, está fora de moda.”

Selecionar o figurino mais adequado ou criar roupas novas depende de um profundo trabalho de pesquisa. quando se trata de filme de época, os livros e revistas são fundamentais, assim como outros filmes e fotografias. “Mas tudo deve ser embasado por um bom conhecimento de história da moda. É preciso saber as proporções da década, do período”, informa Paula. E quando a trama se passa no tempo presente, é preciso interagir com os tipos que devem ser reproduzidos. “No seriado ‘Cidade dos Homens’, andei pelas favelas pedindo para ver as roupas das pessoas, o que cada um usava em cada situação. É funda-mental ter um olhar aguçado”, completa.

Além dos conhecimentos conceituais, Paula ressalta que os conhecimentos técnicos de cada meio também são fundamentais. “O trabalho do figurinista tem de ser feito em parceria com o diretor de fotografia. Temos que saber como a luz incide e o resultado disso na televisão ou na película. No teatro, por exemplo, o volume, o 3d, é fundamental. No cinema, os defeitos aparecem mais e não tem como corrigir. Na TV, se for uma série ou uma novela, ainda dá pra remediar no capítulo seguinte.”

Lizandra de Almeida

utilizadas pelos atores. Podem ser lojas de roupas novas ou mesmo brechós. Em outros casos, o figurinista monta uma equipe de aderecistas e costureiras que vai produzir cada uma das peças de acordo com os modelos criados. Aí entra a necessidade de ter contatos para montar uma equipe especializada. “Assim como um marceneiro não é necessariamente um cenotécnico, não é qualquer costureira que trabalha em cinema. É preciso ter o timing certo”, afirma Gisela.

No caso de filmes publicitários e novelas, as lojas que fornecem as peças não recebem crédito. Mas, em geral, o reconhecimento já traz resultados de marketing para a loja, o que mantém a

rede de relacionamentos funcionando. “As novelas criam tendências e ditam a moda. Hoje a Globo coloca os créditos em seu site e muitas vezes vende as peças que apresenta na novela”, explica Regina.

Paula aponta uma diferença fundamental em relação ao tipo de roupa que será utilizado na cena. “Se o diretor quer uma imagem mais realista, é sempre melhor trabalhar

com roupas usadas. Às vezes isso não é possível, porque a peça pode ser frágil ou ter de ser usada muitas vezes. Então temos de reproduzir e envelhecer a roupa. Mas, para mim, a roupa realmente usada sempre fotografa melhor”, conta. “Hoje, na publicidade, essa é uma tendência. Por

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(upgrade)

Portabilidade ao cinema digitalA gravação em memória em estado sólido chega à cinematrografia digital e “desprende” as câmeras do servidor.

AThomson apresentou no mês de janeiro, em um evento para a mídia internacional em Palm Springs, nos Estados

unidos, seu principal lançamento para a cinematografia digital desde o lança-mento da câmera Viper. Trata-se do Grass Valley Venom FlashPak, um equipamento para gravação em memória em estado sólido (flash memory) para a Viper. O equipamento permite gravar até dez minutos de material no formato Film Stream (veja o box), que capta o conteúdo diretamente dos CCds da câmera, sem compressão de cor. usando o formato Hd 4:2:2, pode-se gravar até 18 minutos. O equipamento é compatível também com a câmera Hd multiformato LdK 6000 mk II.

Leve, o Venom permite que a Viper seja usada em cenas externas e em situações mais “extremas”, já que não tem partes móveis. Até então, a câmera Viper exigia o uso de um desajeitado servidor conectado por cabos à câmera, tornando-a um equipamento de difícil uso para tomadas externas. O gravador é acoplado à câmera de maneira semelhante a um magazine de filme acoplado em uma câmera óptica. Assim, ao usar três equipamentos, é possível gravar uma cena em um Venom, ter outro pronto para ser usado, enquanto um terceiro é “descarregado” em um servidor, sendo que o gravador pode trabalhar com vários servidores proprietários ou fabricados por terceiros.

O Venom conta ainda com interface wireless Bluetooth, o que permite que um assistente crie e edite metadados relacionados à cena, para facilitar o gerenciamento do conteúdo gravado. O equipamento será distribuído em julho deste ano e custará a partir de Ä 45 mil.

Venon FlashPak: compatível com as câmeras da Grass Valley LDK 6000 e Viper.

SEM COMPRESSãOO material gravado diretamente dos CCds, no formato Film Stream, à primeira vista apresenta cores puxadas para o verde, necessitando de ajustes em uma mesa de correção de cores. Com uma resolução de 1920 x 1080, o material enviado ao servidor ou ao Venom é um sinal RGB 4:4:4 de 10 bits, sem nenhum tipo de interferência eletrônica. A grande vantagem deste formato é que, apesar da distorção de cor, é possível captar a cena mantendo um contraste mais preciso.

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Popularização do HdVO HdV está se tornando rapidamente um importante

padrão para a aquisição de imagens em alta definição. Após os lançamentos de câmeras profissionais e amadoras usando a tecnologia, é a vez dos softwares se adaptarem ao novo formato. O lançamento de softwares low end que suportam o HdV é uma boa notícia para os usuários profissionais. Em primeiro lugar, porque essas soluções estão cada vez mais próximas das soluções profissionais e são, em muitos casos, satisfatórias para a edição profissional. Além disso, a popularização da tecnologia vem sempre acompanhada da queda nos preços dos equipamentos nela baseada.

A Apple, seguindo essa tendência, anunciou em janeiro o Final Cut Express Hd, uma atualização para seu programa de edição de vídeo avançado para estudantes, entusiastas de vídeo e aspirantes a cineastas, que facilita capturar, editar e dar saída de vídeo de alta definição no formato HdV, usando todas as ferramentas do Final Cut Express. Trata-se do software middle end da

Apple, que também lançou o iMovie Hd (low end) e o Final Cut Pro Hd (high end). Custando no Brasil R$ 990, o Final Cut Express Hd também inclui o LiveType, para criar texto e gráficos animados, e o Soundtrack, para criar trilhas musicais personalizadas.

Com o novo software é possível capturar HdV com qualidade profissional usando a porta FireWire. Não importa se o conteúdo é dV ou HdV, o engine RT Extreme no Final Cut Express Hd permite ao usuário instantaneamente ver

efeitos, filtros, transições e composições multi-stream em tempo real, sem a necessidade de renderização.

O Final Cut Express Hd conta com interface de usuário personalizada, composição em tempo real, 99 trilhas de vídeo, correção de cor e áudio e várias opções de saídas, entre elas dV, HdV, quickTime ou ainda conteúdo para o idVd ou o dVd Studio Pro.

Além disso, todos os projetos podem ser transferidos diretamente para o Final Cut Pro Hd, tornando a versão intermediária dos editores da Apple em uma opção barata para uma segunda ilha de edição.

Três dimensõesA Absolut Technologies lançou no Brasil a série Mirage de projetores da Christie

digital. São quatro modelos (S+2K, S+4K, S+8K, S+14K) para aplicações 3d. Os prin-cipais destaques ficam para a alta resolução de imagens (1400 x 1500 pixels), lentes com íris que propiciam alto contraste e toda a configuração eletrônica uniformizada. Os equipamentos trabalham com projeções 3d passivas (com óculos 3d simples) ou ativas (com óculos LCd).

Todos os modelos são baseados na tecnologia dLP (digital Light Processor), da Texas Instruments, de processadores com microespelhos. Contam com entrada de vídeo digital dVI, são compatíveis com HdTV e dTV, e trazem menus interativos em cinco idiomas. A taxa de brilho varia de 2.000 a 14.000 ANSI Lúmens. Os equipamentos custam entre uS$ 57,6 mil e uS$ 134 mil, mais ICMS.

MultidefiniçãoA Ross começou a distribuir a nova

linha de switchers multi-definição Synergy Md/Md-x. Os novos equipamentos contam com algumas novidades em relação à série standard definition, além da possibilidade de trabalhar com qualquer formato Sd ou Hd, o que faz da nova linha uma boa opção para a migração para a alta definição. Assim como na linha standard definition (Synergy Sd), a família de equipamentos Synergy Md/Md-x oferece modelos com um a quatro níveis de efeito (MLE). Entre eles, está o ultrachrome Advanced Chroma Keyer, e controle para equipamentos como VTR, ddR, mixer de áudio, roteador e servidor.

Nova linha para projeção 3D da Christie vem com menu interativo em cinco idiomas.

(agenda)> MARçO20/03 a 10/04é Tudo Verdade — Festival Internacio-nal de Documentários. São Paulo e Rio de janeiro. Web: www.etudoverdade.com.br.

> ABRIL6 e 7III Tela Viva Móvel — Encontro dos Serviços e Entretenimento Wireless. ITM Expo, São Paulo, SP. Tel.: (11) 3214-3747. E-mail: [email protected]. Web: www.convergeeventos.com.br.

9 e 10MipDoc. Palais des Festivals, Cannes, França. Tel: (33-1) 4190-4440. E-mail: [email protected]. Web: www.mipcomjunior.com.

11 a 15MipTV/Milia. Palais des Festivals, Cannes, França.

Tel.: (33-1) 4190-4567. E-mail: [email protected]. Web: www.miptv.com.

16 a 21NAB 2005. Las Vegas Convention Center, Las Vegas, EuA. Tel.: (1-800) 622-3976. E-mail: [email protected]. Web: www.nabshow.com.

> MAIO4 e 5VI Fórum Brasil de Programação e Produção. ITM Expo, São Paulo, SP. Tel.: (11) 3120-2351. E-mail: [email protected]. Web: www.convergeeventos.com.br.

11 a 22Festival de Cannes. Palais des Festivals, Cannes, França. Tel.: (33-1) 5359-6100. E-mail: [email protected]. Web: www.festival-cannes.org.

> JuNHO17 a 2328º Festival Guarnicê de Cinema. São Luís, MA. Inscrições até 31 de março. Tel.: (98) 3232-3901. E-mail: [email protected]. Web: www.festivalguarnice.ufma.br.

> JuLHO8 a 17Anima Mundi - Festival Internacional de Cinema de Animação. Rio de janeiro, Rj. Inscrições até 28 de março. Tel.: (21) 2543-8860 / 2541-7499. E-mail: [email protected]. Web: www.animamundi.com.br.

20 a 24Anima Mundi - Festival Internacional de Cinema de Animação. São Paulo, SP. Inscrições até 28 de março. Tel.: (21) 2543-8860 / 2541-7499. E-mail: [email protected]. Web: www.animamundi.com.br.

Não disponivel

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