pobreza e desigualdade social: um olhar para o aluno...

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Trabalho de Conclusão de Curso 1 POBREZA E DESIGUALDADE SOCIAL: UM OLHAR PARA O ALUNO PARTICIPANTE DO PROGRAMA BOLSA FAMÍLIA NO MUNICÍPIO DE NAVIRAÍ/MS Ana Paula da Silva Nogueira 1 Resumo: Este trabalho tem como principal objetivo analisar em que medida a educação escolar pode contribuir para melhorar a situação de pobreza das famílias que utilizam o Programa Bolsa Família, a partir da visão dos professores envolvidos neste processo. Percebe-se pelo histórico do programa, que os seus participantes são aquelas pessoas que se encontram em sérias dificuldades, ou seja, na pobreza ou extrema pobreza, cuja sobrevivência dos mesmos é muito precária. Sendo assim, nos questionamos se o programa ajuda as crianças que estão na escola a construir um futuro, uma identidade emancipatória, onde a mesma é capaz de, com o tempo, sair daquela situação inicial e progredir tanto no social quanto intelectualmente. Para o desenvolvimento da pesquisa realizamos entrevistas com professores de uma escola pública de Naviraí/MS. A partir dos dados coletados percebemos que o programa incentiva os pais dos alunos a colocarem os mesmos na escola, mas, isto não é suficiente, pois, precisa-se propiciar o desenvolvimento integral dos alunos. De forma que possam desenvolver seu potencial e superar a situação de pobreza. Uma mudança de postura tanto dos professores quanto dos alunos é necessária para que a educação contribua critica e verdadeiramente para estes objetivos. Palavras-chave: Bolsa Família. Aluno. Escola. Educação. 1 INTRODUÇÃO O presente estudo tem por finalidade verificar as contribuições da educação e da escola para os alunos beneficiários do PBF, por meio de uma entrevista semiestruturada com professores que trabalham com estes alunos na séries finais do ensino fundamental. Este assunto foi abordado, pois precisamos ver se há ou não um elo entre o PBF e a educação escolar, ou se há somente o fator remuneração pelo fato do aluno ter frequência no programa. O Programa Bolsa Família foi: 1 Professora graduada em Letras (FINAV/MS), Especialista em Metodologia da Educação Infantil e Series Iniciais do Ensino Fundamental, docente efetiva na Escola Estadual Eurico Gaspar Dutra (Naviraí/MS). E- mail:[email protected]

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Trabalho de Conclusão de Curso

1

POBREZA E DESIGUALDADE SOCIAL: UM OLHAR PARA O ALUNO

PARTICIPANTE DO PROGRAMA BOLSA FAMÍLIA NO MUNICÍPIO DE

NAVIRAÍ/MS

Ana Paula da Silva Nogueira1

Resumo: Este trabalho tem como principal objetivo analisar em que medida a educação escolar

pode contribuir para melhorar a situação de pobreza das famílias que utilizam o Programa Bolsa

Família, a partir da visão dos professores envolvidos neste processo. Percebe-se pelo histórico

do programa, que os seus participantes são aquelas pessoas que se encontram em sérias

dificuldades, ou seja, na pobreza ou extrema pobreza, cuja sobrevivência dos mesmos é muito

precária. Sendo assim, nos questionamos se o programa ajuda as crianças que estão na escola a

construir um futuro, uma identidade emancipatória, onde a mesma é capaz de, com o tempo,

sair daquela situação inicial e progredir tanto no social quanto intelectualmente. Para o

desenvolvimento da pesquisa realizamos entrevistas com professores de uma escola pública de

Naviraí/MS. A partir dos dados coletados percebemos que o programa incentiva os pais dos

alunos a colocarem os mesmos na escola, mas, isto não é suficiente, pois, precisa-se propiciar

o desenvolvimento integral dos alunos. De forma que possam desenvolver seu potencial e

superar a situação de pobreza. Uma mudança de postura tanto dos professores quanto dos alunos

é necessária para que a educação contribua critica e verdadeiramente para estes objetivos.

Palavras-chave: Bolsa Família. Aluno. Escola. Educação.

1 INTRODUÇÃO

O presente estudo tem por finalidade verificar as contribuições da educação e da escola

para os alunos beneficiários do PBF, por meio de uma entrevista semiestruturada com

professores que trabalham com estes alunos na séries finais do ensino fundamental. Este assunto

foi abordado, pois precisamos ver se há ou não um elo entre o PBF e a educação escolar, ou se

há somente o fator remuneração pelo fato do aluno ter frequência no programa. O Programa

Bolsa Família foi:

1 Professora graduada em Letras (FINAV/MS), Especialista em Metodologia da Educação Infantil e Series Iniciais

do Ensino Fundamental, docente efetiva na Escola Estadual Eurico Gaspar Dutra (Naviraí/MS). E-

mail:[email protected]

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[...] desenvolvido pelo Governo Federal que visa ajudar as famílias que vivem

em situação de pobreza e/ou extrema pobreza a superarem essa situação. A

iniciativa do Programa visa estimular a geração de renda e a permanência das

crianças na escola, para criar condições de crescimento econômico e social a

médio e longo prazo. (Bolsa Família, 2016, s/p).

O público alvo do programa são aquelas pessoas carentes que necessitam de uma real

ajuda para conseguir sair desta situação. O programa vem com a finalidade de auxiliar estas

pessoas a deixarem esta condição de miséria, assim como ajudar suas crianças a frequentarem

a escola, pois percebe-se que sem uma devida educação, não é possível e fica muito mais

complicado mudar sua condição inicial.

Além disso, é necessário saber que tipo de saber estas pessoas possuem, pois de acordo

com Christian Laville (1999), temos o saber espontâneo, que é aquele que se adquire através

das experiências vividas pela pessoa, sem nenhuma instrução ou ensinamento.

O homem pré-histórico elaborava seu saber a partir de sua experiência e de

suas observações pessoais. Quando constatou que o cheque de dois sílices, ou

da rápida fricção de duas hastes secas, podia provocar uma faísca ou uma

pequena chama capaz de queimar folhas secas, havia construído um novo

saber: como acender o fogo. Esse saber podia ser reutilizado para facilitar sua

vida. Pois aqui está o objetivo principal da pesquisa do saber: conhecer o

funcionamento das coisas, para melhor controla-las, e fazer provisões

melhores a partir daí. (LAVILLE, 1999.p. 17).

Ao falarmos em educação e tipos de saberes que estes alunos trazem da sua vivencia,

precisamos perceber que existem saberes diferentes, nenhum saber é mais ou menos que o

outro, mas sim diferente e cada um com a sua potencialidade (FREIRE, 1996). Segundo Young

(2007), há dois tipos de conhecimento:

Um é o conhecimento dependente do contexto, que se desenvolve ao se

resolver problemas específicos no cotidiano. Ele pode ser prático, como saber

reparar um defeito mecânico ou elétrico, ou encontrar um caminho num mapa.

Pode ser também procedimental, como um manual ou conjunto de regras de

saúde e segurança. O conhecimento dependente de contexto diz a um

indivíduo como fazer coisas específicas. Ele não explica ou generaliza; ele

lida com detalhes. O segundo tipo de conhecimento é o conhecimento

independente de contexto ou conhecimento teórico. É desenvolvido para

fornecer generalizações e busca a universalidade. Ele fornece uma base para

se fazer julgamentos e é geralmente, mas não unicamente, relacionado às

ciências. É esse conhecimento independente de contexto que é, pelo menos

potencialmente, adquirido na escola e é a ele que me refiro como

conhecimento poderoso. (YOUNG, 2007, p. 1296).

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O primeiro tipo de conhecimento que o educando traz é aquele que veio de casa, do

nosso convívio familiar e social, ou seja, são as nossas vivencias que nos possibilitam a

compreender determinado contexto em que estamos inseridos, e com isso poder articular uma

saída para aquela situação.

Este tipo de conhecimento deveria ser utilizado como base para o aprendizado do

conhecimento poderoso, ou seja, aquele que é ensinado na escola (YOUNG, 2007). Este tipo

de saber possibilitaria aos que o absorvessem o começo para um grande passo educacional,

onde o mesmo passaria a fazer parte de um ensino transformador, que visa o real sentido da

educação e não somente uma transmissão vazia de conteúdo, que são postas aos alunos de forma

arbitrária e nada convidativa.

No decorrer do trabalho teremos como alguns de nossos objetivos analisar o conceito

de educação e suas relações com a realidade social; apresentar como funciona o PBF; analisar

em que medida a educação escolar pode contribuir para melhorar a situação de pobreza das

famílias que utilizam o Programa Bolsa Família a partir da visão dos professores envolvidos

neste processo; e debater sobre o papel da escola e do professor na sociedade. Com estes

objetivos em mente, iremos discorrer, sobre a relevância da educação escolar e o papel do

professor na formação do aluno e na superação da pobreza.

Para tanto, realizaremos entrevistas com 3 professores da Educação Básica, dos anos

finais do Ensino Fundamental de uma escola pública de Naviraí, MS, buscando identificar suas

visões e concepções acerca da escola, do ensino e da pobreza. A escola selecionada possui 369

alunos no Ensino Fundamental do 1º ao 5º ano, 307 alunos no Ensino Fundamental do 6º ao 9º

ano e 254 alunos no Ensino Médio da 1ª a 3ª série, no período matutino, contando a seu serviço

em torno de 40 professores que atuam na docência.

Do total de alunos do Ensino Fundamental, contabilizando 9 turmas dos anos finais, 31

alunos são beneficiários do programa bolsa família. Sendo assim, a pesquisa será realizada com

uma porcentagem dos professores, totalizando 03 docentes, que ministram aula para estes

alunos neste segmento. Os docentes participantes da pesquisa têm contato diário com estes

alunos, podendo assim ter uma visão de como é o comportamento e aprendizagem deles.

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2 A FUNÇÃO SOCIAL DA EDUCAÇÃO ESCOLAR: CURRÍCULO PARA

TRANSFORMAÇÃO OU EMPOBRECIMENTO?

Ao falar em educação, observa-se o contexto geral, onde seu princípio se configura

desde o início do ciclo da vida, quando estamos em casa, passando pelos primeiros passos até

a vida adulta. Entende-se por educação todo processo que visa algum aprendizado ou saber.

Educação é um termo muito amplo e é a palavra usada para definir o

comportamento e o conhecimento de um indivíduo. A educação é algo que o

ser humano pode adquirir ao longo dos anos, estudando, conhecendo e se

aprimorando. Ela também pode ser diferente de acordo com a região, pais,

cultura, sociedade e meio ambiente no qual o indivíduo esta inserto. Existe

um tipo de educação que é universal, onde ela pode ser considerada padrão.

Um exemplo: quando falamos, por favor, obrigado, desculpa e etc. Esses são

alguns termos usados na educação padrão de comportamento e tratamento

para com outras pessoas. É também a adequação do ser humano na sociedade

em que vivi, integrando fatores como os costumes, cultura, tradições, etc. A

educação dada na escola usa conhecimento e outras técnicas, e é chamada

como “educação escolar”. (LUIS, 2007-2015, s/p).

Vemos que o nosso cotidiano está cheio de aprendizados, pois a cada momento vivido

em sociedade nos leva a um novo patamar, onde cada nova etapa é um obstáculo a ser vencido

e com isso vai se formando um conceito de educação pura e simples.

A educação se divide em duas formas no mínimo, uma formal e outra não formal. A

educação formal é aquela transmitida por instituições de ensino que visam transmitir os

conhecimentos que fazem com que o sujeito possa se tornar um ser ativo e social, detentor de

tais conhecimentos que lhe possibilitem uma interação e construção de sua vivencia em

comunidade. Seu papel é o de repassar a estes educandos o que é de máximo conhecimento de

todos, ou seja, o que aqueles que detêm este conhecimento sabem. As regras são essenciais

neste processo, pois através delas se cria um padrão a ser seguido e esmerado.

O ensino formal é aquele que é trabalhado nas escolas e instituições de ensino.

Normalmente ele tem um calendário e um currículo previamente definido,

como ocorre na educação fundamental e ensino médio, cursos técnicos e

superiores, entre outros. (LUIS, 2007-2015, s/p).

A educação informal é aquela que conseguimos com a nossa vivência e interação com

o outro, que independe de regras, um aprendizado geral, que nos possibilita a comunicação

social.

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A escola, tendo um papel fundamental de ser a responsável pela formação instrucional

dos educandos, vem caminhando ao longo do tempo para possibilitar da melhor forma possível

este objetivo. Com isso a escola:

É um local ou instituição concebida e direcionada para o aprendizado

intelectual dos alunos, sejam elas crianças, adolescentes, jovens e adultos. A

escola é um local físico onde se aprende e onde se ensina, fazendo trocas de

conhecimento, experiências e promovendo o desenvolvimento do educando.

No Brasil, o termo “escola” é usado para identificar as instituições

educacionais direcionadas para crianças e adolescentes, mas na verdade são

todas as instituições, podendo ser públicas ou privadas. O conceito de escola

está totalmente ligado ao de educação e ensino, porquanto não poderia existir

uma escola sem educadores encarregados do ensino dos alunos. (LUIS, 2007-

2015, s/p)

A escola seria o local onde aprendemos certo tipo padrão de conhecimentos. Mas, no

caso dos conteúdos e a forma deles serem abordados, pois, a forma de aprendizado é única e

insubstituível para cada um. Como se sabe cada pessoa tem seu ritmo e forma de aprendizado,

assim como seu tempo para assimilar da melhor forma possível. Por isso,

A educação deveria servir como mecanismo de libertação do homem. Esse,

por meio da educação formal, deveria colaborar para o desenvolvimento do

país e, acima de tudo, usufruir dos resultados. Porém, tem-se uma educação

que serve como veículo de transmissão das ideias da classe dominante, cujo

papel é muito importante na perpetuação das condições sociais já existentes.

(TURIBIO, 2012.s/p).

Com isso a educação tem como objetivo transmitir novos conhecimentos as pessoas que

a procuram, pois, as mesmas precisam ter conhecimento dos saberes específicos, daqueles

conhecimentos que fazem parte da base do país, que condicionam estas pessoas ou não a terem

as devidas oportunidades, seja no âmbito pessoal ou profissional.

Observa-se que o ensino em si precisa de mais valorização não só no campo financeiro,

o que seria muito útil, mas no campo profissional, semântico, geral. Em todas as áreas do

ensino, o mesmo deveria ser visto como algo promissor, possibilitando novos caminhos e novas

oportunidades, mas é visto como um obstáculo para quem quer alcançar um futuro melhor. É

posto como obrigação para todos, e como na maioria das vezes o que é imposto não é agradável,

fica neste impasse. As tentativas são válidas para se ter um melhor ensino e com isso um

objetivo amplo para melhorar sua qualidade e estrutura.

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A escola busca estabelecer um objetivo em comum, que é disseminar os saberes

necessários para que as pessoas possam ter uma base de conhecimentos construídos

historicamente pela humanidade. Pois, precisa ter conhecimento do que já aconteceu para se

poder ter uma opinião sobre o assunto. E isso só acontece por meio do conhecimento

proporcionado pelo aprendizado, pela disseminação de ideias e o ato de refletir sobre as

mesmas.

A adequação das metodologias utilizadas faz-se necessária para um melhor

aproveitamento do que se é ensinado. Isso não quer dizer que o que temos hoje seja ótimo ou

péssimo e sim mais um caminho para se chegar a um ponto em comum que possa ser utilizado

por todos.

Ao nos depararmos com o ambiente escolar, este sendo um dos maiores vínculos de

socialização, pois, é onde se concentra um grande número de pessoas que dependem da

interação social para conseguir algum proveito educacional, vemos que o mesmo é um grande

círculo que proporciona ou tenta, uma real introdução destas pessoas na vida real. Pois se

somente ficar no simples fato de só ouvir e copiar não proporciona um ensino de qualidade nem

um aprendizado real.

Como diz SACRISTÁN e GÓMEZ (1998, p 13):

A educação, num sentido amplo, cumpre uma iniludível função de

socialização, desde que a configuração social da espécie se transforma em um

fator decisivo da hominização e em especial da humanização do homem. A

espécie humana, constituída biologicamente como tal, elabora instrumentos,

artefatos, costumes, normas, códigos de comunicação e convivência como

mecanismos imprescindíveis para a sobrevivência dos grupos e da espécie.

Paralelamente, e posto que as aquisições adaptativas da espécie as

peculiaridades do meio não se fixam biologicamente nem se transmite através

da herança genética, os grupos humanos põem em andamento mecanismos e

sistemas externos de transmissão para garantir a sobrevivência nas novas

gerações de suas conquistas históricas. Este processo de aquisição por parte

das novas gerações das conquistas sociais – processo de socialização –

costuma denominar-se genericamente como processo de educação.

Com isso podemos também perceber que o processo educacional, nada mais é que o

processo que o ser humano passa para começar sua socialização. Ou seja, ser social e ser

educado faz parte do mesmo processo. Educado na questão de adquirir ferramentas que lhe

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proporcionem um real sentido social, onde cada indivíduo produz seu próprio meio de

socialização, possibilitando assim um ato de comunicação com o outro.

Por outro lado, a escola não é a única instancia social que cumpre com esta

função reprodutora; a família, os grupos sociais, os meios de comunicação são

instancias primarias de convivência e intercâmbios que exercem de modo

direto o influencia reprodutor da comunidade social. No entanto, a escola,

ainda que cumpra esta função de forma delegada, especializa-se precisamente

no exercício exclusivo e cada vez mais complexo e sutil de tal função. A

escola, por seus conteúdos, por suas formas e por seus sistemas de

organização, introduz nos alunos/as, paulatina, mas progressivamente, as

ideias, os conhecimentos, as concepções, as disposições e os modos de

conduta que a sociedade adulta requer. Dessa forma, contribui decisivamente

para a interiorização das ideias, dos valores e das normas da comunidade, de

maneira que mediante este processo de socialização prolongado a sociedade

industrial possa substituir os mecanismos de controle externo da conduta por

disposições mais ou menos aceitas de autocontrole. (SACRISTÁN e

GÓMEZ,1998, p 14)

O ser humano é ser social a partir do momento em que nasce e participa da sociedade

em que vivemos, ou seja, se torna social com as vivencias a que está se expondo. Ou seja, a

comunidade em que se está inserido também o ajuda a entrar no processo de socialização que

a própria comunidade exige.

À escola em si cabe um dos papeis de transmitir o que é próprio da sociedade e aceito

como tal, vista muitas vezes como a burocracia em pauta, que preza a transmissão de conteúdo

sem contextos, pois isso é o que a sociedade exige ou espera deste tipo de ambiente.

Uma noção ultrapassada deve ser mencionada, quando se vê a escola como um meio

para se chegar ao fim, no qual este fim seria a inserção destes alunos na comunidade local e o

seu ingresso no mercado de trabalho. Então cabe a escola estabelecer as regras mínimas a serem

seguidas para que estes objetivos possam ser alcançados. Sendo assim:

Preparar para a vida pública nas sociedades formalmente democráticas na

esfera política, governadas pela implacável e as vezes selvagem lei do

mercado na esfera econômica, comporta necessariamente que a escola assuma

as vivas contradições que marcam as sociedade contemporâneas

desenvolvidas. O mundo da economia, governado pela lei da oferta e da

procura e pela estrutura hierárquica das relações de trabalho, bem como pelas

evidentes e escandalosas diferenças individuais e grupais, impõe exigências

contraditórias aos processos de socialização na escola. O mundo da economia

parece requerer, tanto na formação de ideias como no desenvolvimento de

disposições e condutas, exigências diferentes as que demanda a esfera política

numa sociedade formalmente democrática na qual todos os indivíduos, por

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direito, são iguais perante a lei e as instituições. (SACRISTÁN e

GÓMEZ,1998, p 15)

E nessas contradições vive a escola, que tenta ao seu melhor modo, construir um amplo

leque de conhecimentos, para possibilitar ao maior número de alunos que ela conseguir atingir,

uma oportunidade de inserção na sociedade, para que os mesmos se socializem e alcancem o

seu objetivo de utilizar o ambiente escolar como uma ferramenta de lançamento para um futuro

melhor, conseguindo assim um processo de construção de saber e aprendizado que vai mais

além do que acertar uma pergunta ou errá-la.

2.1 O PAPEL DO PROFESSOR

Ao falar sobre o profissional da educação, precisa-se levar em consideração todo o

contexto histórico e social do país, do local onde está inserido. Afinal, tudo que ocorre ao nosso

redor reflete nas nossa ações. O fato de se querer ser um educador, exige muito mais que

vocação e amor, exige uma gama infinita de estudos, reflexões e cobranças. Pois se tornar um

professor exige criticidade e praticidade (FREIRE, 1996). Segundo Libâneo (2011.s/p):

O professor é o mediador do conteúdo transmitido, ele deve propor atividades

que conduzam o educando para a condição de sujeito ativo da própria

aprendizagem no processo de transmissão e assimilação do conhecimento, o

professor precisa estar atento aos aspectos cognitivos e subjetivos do aluno

para desenvolver o aprendizado e torná-lo mais significativo.

Ou seja, para que o professor consiga fazer estas inferências e ajudar na construção do

saber destes alunos, ele precisa se preparar primeiro, ter uma boa formação que o possibilite

enxergar no educando, maneiras diferentes de instiga-lo ao devido conhecimento. Mas, para

isto acontecer precisa também ser instigado a ver isto ocorrer. Então tudo começa com o ensino,

é como se fosse uma roda, início e fim sendo construídos de forma paralela para que no final

possa se ter o real objetivo que se quer alcançar, o de se possibilitar maneiras diversas de ensino

e criticidade. “O ensino deve envolver conceitos pertinentes a realidade do educando porquê

dessa maneira ele consegue associá-lo ao seu cotidiano, assim ficará internalizado e não apenas

memorizado, é preciso ensinar a pensar criticamente” (LIBÂNEO,2011, s/p), mas para que isto

ocorra é preciso investir no pessoal responsável por tão árdua tarefa.

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Árdua, pois o trabalho com pessoas não é fácil, pois sabe-se que cada um tem um

pensamento e uma forma de agir e interagir. Mas quando se coloca várias pessoas em um

mesmo ambiente, com o mesmo propósito, precisa-se qualificar aquele profissional para

conseguir atender a demanda tão diversa. Qualificar o profissional é o início para que se comece

um trabalho promissor. Afinal conseguir transmitir seu conhecimento para um número de

pessoas diversas é um talento e tanto.

O professor então, tem um grande papel na sociedade, precisa de todo recurso que o

Estado possa fornecer, para melhor prepará-lo para o que o espera no ambiente escolar.

Ambiente multidisciplinar que engloba multi conhecimentos e experiências.

3 O PROGRAMA BOLSA FAMÍLIA

Um dos objetivos do Programa Bolsa Família é auxiliar as famílias que se encontram em

situação de pobreza e extrema pobreza, tentando assim minimizar as consequências destrutivas

que estas situações causam nas pessoas, tirando muita das vezes sua dignidade e autoestima.

É um programa de transferência direta de renda, direcionado às famílias em

situação de pobreza e de extrema pobreza em todo o País, de modo que

consigam superar a situação de vulnerabilidade e pobreza. O programa busca

garantir a essas famílias o direito à alimentação e o acesso à educação e à

saúde. Em todo o Brasil, mais de 13,9 milhões de famílias são atendidas pelo

Bolsa Família. (CAIXA, 2016, s/p)

Os objetivos do programa visam:

Combater a fome e promover a segurança alimentar e nutricional; Combater

a pobreza e outras formas de privação das famílias; Promover o acesso à rede

de serviços públicos, em especial, saúde, educação, segurança alimentar e

assistência social. (CAIXA, 2016, s/p)

Estes objetivos são voltados para que as pessoas que se encontrem neste nível de

dificuldade, possam estar sendo assistidas por este programa, visando a possibilidade concreta

da melhoria inicial desta família. Um dos seus pontos fortes é a questão de acesso e permanência

na escola destes educandos, onde o controle de tal informação se dá por meio do ato da

matricula e do controle da frequência escolar deste aluno.

Um dos critérios abordados pelo programa além do acesso e permanência na escola, é a

questão da saúde como uma das condições a serem seguidas para que o auxílio/benefício

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continue sendo adquirido. Com isso o programa além de ter o controle de quantos alunos entram

e permanecem na escola, através do controle feito pelos gestores escolares, onde os mesmos

preenchem as tabelas com a porcentagem de frequência que o aluno do PBF possui naquele

mês, também passa a ter conhecimento do bem estar destas pessoas através do acompanhamento

médico (ZIMMERMANN, 2006).

Com estes critérios o governo passa a ter mais contato com estas famílias e uma noção

bem mais real do que acontece com as mesmas, pois mesmo não querendo se expor em relatar

sua real situação, coisa esta que pode gerar desconforto e certa humilhação nestas famílias, as

mesmas são obrigadas a se submeterem a estas condições se quiserem continuar a receber o

benefício.

No âmbito do Programa Bolsa Família, as condicionalidades se justificam

pelo contexto histórico de desigualdades vivenciadas pelas famílias em

situação de pobreza. São compromissos assumidos pelas famílias do PBF e,

em especial, pelo poder público, a fim de que este contribua para elevar a

efetivação do direito à educação e à saúde dessas famílias. Na área de

educação, as condicionalidades previstas são a matrícula e a frequência

escolar mínima de 85% para crianças e adolescentes entre 6 e 15 anos e de

75% para jovens de 16 e 17 anos. Na área de saúde, as condicionalidades

consistem no acompanhamento do calendário vacinal e do crescimento e

desenvolvimento das crianças de até sete anos e do pré-natal das gestantes.

Conforme determina o Decreto n°5.209, de 17 de setembro de 2004, a

manutenção do benefício depende do cumprimento das condicionalidades,

cabendo às diversas esferas de governo garantir o acesso pleno aos serviços

públicos de saúde, educação e assistência social, por meio da oferta desses

serviços, de forma a viabilizar o cumprimento das contrapartidas por parte das

famílias beneficiárias do Programa. Além disso, o Decreto 5.209 garante que

não podem ser penalizadas com a suspensão ou cancelamento do benefício as

famílias que não cumprirem as condicionalidades previstas, quando não

houver a oferta do respectivo serviço ou por força maior ou caso fortuito.

(AGATTE; ANTUNES. 2016. p. 37 e 38)

Quanto a frequência escolar, questão esta geradora de vários conflitos entre educadores

e não educadores, é mais uma condição a ser respeitada para se ter/continuar com o benefício.

O que se questiona nesta condição é que não basta simplesmente colocar o aluno em sala de

aula, se o mesmo não tem as mínimas condições de acompanhar a turma. Precisa-se ter um

maior controle deste aluno e um programa ou projeto que o auxilie a entrar neste mundo

educacional em iguais condições para o aprendizado dos conhecimentos transmitidos pela

educação escolar.

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O que se espera de um país, onde o lema é “Brasil, uma pátria educadora”, é que os

educandos sejam capazes de terem as mínimas condições para conseguirem dar prosseguimento

nos seus conhecimentos e aprimorá-los. A questão da frequência em si, auxilia a pelo menos

que as famílias comecem a ter uma noção de que os filhos precisam e necessitam estar dentro

do ambiente escolar. Este é um primeiro passo muito importante para mudar suas realidades,

mas não é o único. Já que se quer mudança nestas condições vividas por estas famílias, precisa-

se uma maior conscientização do papel da escola, ambiente este que vem proporcionar uma

chance de mudança a todos, mesmo que para isto passe por alguns percalços, como falta de

recursos, de oportunidades, de interesse por parte dos educandos e educadores

4 O ENSINO E O PROGRAMA BOLSA FAMÍLIA EM UMA ESCOLA PÚBLICA DE

NAVIRAÍ/MS

Realizou-se a pesquisa em uma escola da rede estadual de ensino, contando a seu serviço

em torno de 40 professores que atuam na docência, sendo que destes, 30 lecionam para o Ensino

Fundamental II. Do total de alunos do Ensino Fundamental, anos finais, 31 alunos são

beneficiários do programa bolsa família.

Sendo assim, a pesquisa será realizada com professores que ministram aula para estes

alunos neste segmento, exatamente 7º anos B e C, totalizando 03 docentes, pois as mesmas

trabalham em ambas as séries. As professoras participantes da pesquisa serão nomeadas da

seguinte forma: Professora A, Professora B e Professora C.

A professora A, tem 28 anos trabalhando como docente. A professora B, tem 6 anos

trabalhando nesta área e a professora C, 5 anos. Todas são graduadas e ministram aulas na sua

área de formação.

Ao falarmos sobre educação escolar e o papel da escola na sociedade percebe-se que a

professora A vê a educação como um “conjunto de normas, onde leva o educando a aprender

seguir regras e o educador a mostrar os melhores caminhos a serem seguidos”; a professora B:

“estabelecer regras, impor limites, trabalhar conceitos, valores” e a professora C: “é um direito

que o cidadão tem para integrar-se ao mundo do conhecimento e através dele mudar a própria

vida e a vida do outro.

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Quanto ao papel da escola, segundo a professora A seria o de: “preparar o educando

para um bom desempenho na sociedade, orientando ele a ser crítico e ter argumentos que

venham convencer sobre determinados assuntos em questão.”

Isso relata a visão da professora A sobre o papel do professor perante a sociedade e

também como a educação é vista pela mesma. Segundo a professora B o papel da escola seria

de:

Mediar a construção de conhecimentos, ajudar na formação de um indivíduo,

prepara-lo para a vida e convívio em sociedade, mas o papel principal é o da

família, pois quando o papel da família é falho, a escola não consegue fazer o

papel de mediador. E na fase adulta esse cidadão, está cada vez mais distante

de viver em sociedade, pois viver em sociedade é ter que cumprir regras.

(Professora B)

A educação em questão é tratada como normas a serem postas a estes alunos e com isso

mostrar aos mesmos o que eles precisam saber e ter conhecimento para poder interagir em

sociedade. Para a professora C “o papel da escola é o de oferecer o melhor a seus educandos:

melhores condições, melhores ambientes e professores.”

O papel do professor na formação do aluno, segundo a professora A seria o de: “orientar

o educando para um bom desempenho em sociedade”. Onde o aluno teria condições de interagir

em grupo, expondo e construindo argumentos plausíveis e necessários. Esta orientação seria

uma mediação da construção do saber deste aluno, que aprimoraria seu conhecimento pondo e

prática o que lhe foi ensinado. E na concepção da professora B seria: “transmitir conhecimentos

e aprendizados, onde o professor pode ser um diferencial da realidade da vida desse aluno, esse

professor pode ser referência, pois o aluno vê nele atitudes, realidades, falhas na família”. Para

esta, seu papel seria de mediador e formador de opiniões e conhecimentos e também modelo a

ser seguido pelo aluno, já que o mesmo encontra falhas na sua família e encontra na escola um

campo diferente do que lhe é familiar. Para a professora C, seu papel também é mediar no

processo de aprendizagem, e que o mesmo é insubstituível neste ciclo.

Aprofundando o tema, entra-se na questão da pobreza, se a mesma tem alguma relação

com a educação escolar propriamente dita. De acordo com a professora A: “não, pois depende

do interesse do educando, não importando sua classe social e sim seu empenho em adquirir os

conhecimentos transmitidos.” Ou seja, a pobreza para ela é algo que não interfere no processo

de ensino aprendizagem, pois, o professor em questão ensina da mesma forma para todos e se

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o aluno tem interesse em aprender, de alguma forma ele irá conseguir assimilar o conteúdo.

Afinal, segundo as entrevistadas se vermos que um aluno que está em condições de pobreza

aprende bem e um que tem condições financeiras boas, não aprende, isso se torna questão de

empenho de cada um e não o fato de ter ou não mais condições do que outro. Já a professora B,

diz que:

Sim, essa falta que ele tem em casa, de tempo, atenção, subsídios, ele carrega

para a escola e isso interfere diretamente na educação, pois ele não vê sentido

e no aprendizado ele não assimila o que lhe é proposto.

A professora C diz que: “a pobreza limita economicamente alguns quesitos, porém não

se torna um impedimento para a aquisição do processo educativo.”

Ou seja, aqui para esta professora a pobreza tem sim relação com a educação, pois

quando a mesma se vivencia por este aluno, e aqui não só a pobreza material, mas a pobreza na

falta de tempo dos pais para com os filhos, seja por motivos nobres, como o fato de precisar

prover o sustento da família, por motivos menos dignos, ou por falta de atenção dada a esta

criança, pois quando isso acontece a educação fica em segundo plano, pois não tem o apoio

familiar e isso se reflete na não concretização do conhecimento básico, seja por falta de interesse

ou de condições mesmo.

Com esta visão da professora, vemos que Tapia (2003, p. 13) vem corroborar com sua

opinião neste assunto.

[...] acreditamos que a maioria destas condições – programas execessivamente

carregados, muitos alunos por sala, falta de materiais adequados, influencia

negativa da família,perspectivas de futuro negativas etc. – escapa ao nosso

controle, o que costuma nos dar uma visão bastante pessimista da

possibilidade de motivar esses alunos.

Ou seja, a realidade do aluno vem interferindo no seu processo de aprendizagem,

pois não tem como acionar uma válvula e deixar fora do ambiente escolar o que nos rodeia e

nossa historia. Isto faz parte do nosso contexto e nos auxilia ou prejudica dependendo das

condições. Segundo Bzuneck, (2001, p. 13.):

Alunos desmotivados estudam muito pouco ou nada, e consequentemente,

aprendem muito pouco. Em última instancia, aí se configura uma situação

educacional que impede a formação de indivíduos mais competentes para

exercerem a cidadania e realizarem-se como pessoas, além de se capacitarem

a aprender pela vida afora.

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Com isso pergunta-se se a pobreza é trabalhada em sala de aula e se entra no

planejamento do professor. Segundo a professora A:

A pobreza em sala de aula não deve ser tratada, pois estaria gerando

discriminação, mas através de palestras esporádicas conscientizar que todos

podemos fazer a diferença na vida das pessoas e sociedade.

Para a professora B: “não é tratada no planejamento, pois não é conteúdo de referencial,

mas as metodologias utilizadas são adequadas de acordo com o nosso público”. Para a

professora C a pobreza deve ser abordada como “forma de esclarecimento aos alunos sobre

forma de superação.” Ou seja, como uma maneira de alertar aos alunos sobre a realidade que

eles tem sim, através da educação, a possibilidade de mudar essa situação.

A pobreza se constitui em um tipo de barreira para o processo de ensino aprendizado,

pois as limitações que ela acarreta nos educandos são visíveis e vão para dentro da sala de aula,

em forma de desinteresse, revolta, tédio, raiva, entre outros fatos, como nos conta a professora

B em sua entrevista.

No entanto, para as professoras, a pobreza não pode ser tratada como assunto de aula,

afinal não está no referencial curricular (2016) que deve ser seguido pelos docentes para fazer

seu planejamento mensal. O que se faz é adequar suas metodologias para que possam abranger

todos os alunos da melhor forma possível. Por isso o assunto em questão não é tratado

diretamente como tema de aula, mas sim, de forma indireta, na forma de ministrar as aulas.

Com isso ve-se que a pobreza está inserida no contexto escolar, mas não é discutida da maneira

como se deve, ou seja:

A ênfase nessa interpretação moralista da pobreza traz consequências para a

escolarização dos(as) pobres. Isso ocorre porque os esforços escolares não

priorizam garantir seu direito ao conhecimento, mas sua moralização. Logo,

os(as) estudantes não receberão aprendizados sobre as ciências e tecnologias

que possam vir a libertá-los(as) do ciclo vicioso da pobreza, mas apenas lhes

será dado o domínio de habilidades mais elementares de ciências e a

alfabetização na idade determinada como "certa" pelo sistema educacional.

Enquanto a pobreza for pensada como uma questão moral, os currículos para

os(as) pobres continuarão sendo pensados para moralizá-los(as), não para

garantir o direito deles(as) ao conhecimento, às ciências e às tecnologias.

Serão currículos pobres de conhecimentos e repletos de bons conselhos morais

de esforço, trabalho, dedicação e disciplina. (ARROYO, 2016, p. 2).

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Esse pensamento acarreta em uma armadilha que é prolongada desde a antiguidade,

onde se é pobre porque quer e não sai dessa condição porque a acomodação é melhor do o

trabalho duro e o estudo que não é fácil.

Sobre o programa bolsa família, foi questionado se na sua opinião ele trazia alguma

melhoria no processo de educação deste aluno e as respostas foram:

Não, porque os alunos beneficiados não demonstram interesse em aprender e

vão até a escola devido a imposição da família, tumultuando o ambiente

escolar. Deveria ser refeito os critérios de participação colocando como

critérios o desempenho do aluno, seu rendimento e até mesmo valores.

(Professora A)

Não. Porque o programa exige somente 75% de presença, não exigindo um

rendimento percentual de notas, aprendizado e não fiscaliza resultado final.

(Professora B)

Para a professora C: “sim, o programa facilita as condições para a permanência do aluno

na escola”. Com isso percebe-se, que a professora concorda que a permanência do aluno em

sala é uma boa contribuição do programa para a educação em si, já que sem o aluno em sala de

aula, não há motivo ou sentido neste processo.

Sobre quais tem sido as contribuições da escola para a formação dos alunos beneficiários

suas respostas foram:

A escola contribui recebendo e orientando o aluno beneficiário, mas como os

critérios são falhos, os alunos não demonstram interesse em melhorar a

aquisição de conhecimento e ficam assim ‘perdendo tempo’ no ambiente

escolar. Na minha opinião precisa mudar os critérios de participação, exigir

mais interação família, escola e aluno, melhor rendimento escolar, notas, não

é somente a família mandar o filho para a escola, é participar e garantir o nível

de aprendizagem. (Professora A)

A escola recebe esses alunos, efetiva a matricula e os coloca nas salas de aula,

sem nenhum tratamento diferenciado, juntamente com os demais alunos, para

que os mesmos iniciem seus estudos. (Professora B)

Para a professora C a contribuição da escola está na fiscalização que a mesma realiza

sobre a presença e permanência dos educandos no ambiente escolar. Além disso, para as

professoras A e B, o programa em si não influencia no processo de educação, pois como o

programa só exige que o aluno tenha um percentual mínimo de frequência, que são 75%, o

aluno que não tem interesse em estudar, simplesmente vai para a escola como obrigação sem o

mínimo interesse em adquirir uma boa instrução.

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A afirmação de que os alunos não demonstram interesse em estudar, é pelo fato dos

alunos beneficiários das séries em que elas ministram aulas terem este comportamento. Com

isso tornou-se um padrão das salas, onde os alunos não querem aprender e só vão para o prédio

escolar, pois os pais querem receber o benefício, mas estes pais não acompanham o rendimento

de seus filhos, nem quando a coordenação solicita nem em entrega de notas bimestrais.

Segundo as professoras, a contribuição da escola na formação destes alunos, é a mesma

para os alunos que não são do bolsa família, pois os critérios de ingresso na escola são uma lista

de documentos e não o fato de ser aluno beneficiário de um programa ou não. Então a escola

recebe este aluno efetivando sua matricula e o colocando em sala de aula. A partir daí o que

acontece com este aluno, depende muito do que ele quer para si e seu futuro.

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Por meio das entrevistas realizadas com as professoras que lecionam para as series finais

do ensino fundamental, pode-se constatar que a educação escolar e o fato do aluno ser

participante do bolsa família é uma questão a ser pensada profundamente. Pois, de acordo com

suas respostas, os alunos não se mostram mais interessados pelo estudo, do que aqueles que não

participam do programa. Ou seja, o fato deles participarem do programa não os fazem querer

aprender mais ou menos. No que tange estes alunos eles vão para a escola como todas as outras

crianças e tentam se adequar no mundo academico.

No entanto, precisamos retomar a função social da escola e o papel do professor na

formação de nossos alunos. Retomar no sentido de promover mais conscientização por parte de

todos os envolvidos.

A preocupação da escola é a de fazer com que o educando participe do seu

grupo ativa e afetivamente, apropriando-se de valores, crenças,

conhecimentos acadêmicos e referenciais sócio-históricos. Uma apropriação

significativa tanto para si como para o outro, tornando-se uma pessoa

consciente e responsável pela transformação da realidade em que está

inserido. (DESCHAMPS,2012,s/p.)

Isso quer dizer que cabe a escola tentar proporcionar a este aluno um mundo diferente

daquele que ele está acostumado. Pois ao chegar a escola, com toda sua vivencia e bagagem,

ele precisa assimilar que dentro deste ambiente ele será exposto a vivencias opostas, mundos

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diferentes, conhecimentos básicos e triviais, ou mais complexos que o formarão ou tentarão

forma-lo para uma sociedade que a cada dia é mais exigente com seu publico. Pois para aqueles

que não se adequam neste contexto a marginalização está a um estalar de dedos. Por isso há

complexidade em se falar em papel da escola, em se tratando de pobreza ou não, de

desigualdades presentes ou não.

Destaca-se na entrevista que como a única exigência do programa é o percentual de

frequência, que tem de ser no mínimo 75%, para continuar ganhando o benefício, elas não veem

uma melhoria ou um algo a mais nestes alunos. Nenhum interesse em aprender ou mudar de

situação. Também percebem que os familiares destes alunos não fazem nenhum

acompanhamento e com isso percebe-se o fato de os pais simplesmente querem o recebimento

do benefício, ‘mandam’ os filhos para a escola, sem se preocupar com o seu real aprendizado.

A educação escolar, apesar de ter melhorado no decorrer do tempo, ainda precisa de

mais recursos e auxílios para poder dar a base que os educandos precisam. Mas ela é a base de

tudo, pois sem ela não teria um começo para se poder mudar a realidade destas pessoas. A

escola precisa ser vista como um ambiente de mudanças, de experiências que possibilitem a

quem está la dentro a oportunidade de construir novas experiências que o auxiliem a fazer parte

da sociedade. Afinal um dos papeis da escola é introduzir o cidadão na sociedade de forma ativa

e eficiente. “O principal objetivo da escola é formar cidadãos pensantes, críticos, reflexivos e

ativos na sociedade em que estão inseridos.” (SEVERINO; AMARAL; FERREIRA, 2010, p.3)

Então com esta pesquisa observamos que o programa em si leva o aluno para a escola,

para que o mesmo possa ter a oportunidade de ter uma nova visão além do seu campo pessoal.

Mas só isto não é suficiente. Então precisa-se pensar em novas estratégias para incorporar

verdadeiramente este aluno dentro do contexto escolar. É preciso maior comprometimentos dos

próprios professores para a superação da pobreza e das desigualdades. De modo que

precisamos, portanto, repensar o próprio currículo, conteúdos e metodologias de ensino.

O professor tem papel fundamental, pois, é a ferramenta a ser utilizada para se alcançar

os objetivos propostos de inserir um cidadão capaz de conhecer e transformar a sociedade.

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