bolsa familia e o desempenho escolar dos alunos...

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Trabalho de Conclusão de Curso BOLSA FAMILIA E O DESEMPENHO ESCOLAR DOS ALUNOS BENEFICIÁRIOSDA E.M CARLOS VILHALVA CRISTALDO (CAMPO GRANDE MS) Adriana da Silva Lages 1 Maria do Socorro Sales Felipe Bezerra 2 RESUMO: O presente artigo tem como finalidade avaliar de que forma as condicionalidades do PBF tem impactado no desenvolvimento dos estudantes beneficiários de uma escola municipal localizada na periferia de Campo Grande/MS. Como objetivo específico buscou-se conhecer os dados da rede de beneficiários, a percepção dos professores orientadores educacionais e coordenadoras no tocante ao desempenho escolar dos alunos beneficiários. A metodologia consistiu na aplicação de questionários distintos para cada função direcionados a sete sujeitos que participam diariamente da vida escolar dos alunos beneficiários do Programa Bolsa Família. Palavras-chave: Bolsa Família. Desempenho Escolar. Condicionalidades. Frequência. 1 INTRODUÇÃO Na Constituição Federativa do Brasil de 1988 considera os direitos sociais como garantias fundamentais à educação, à saúde, ao trabalho, à moradia, ao lazer, à segurança, à previdência social, à proteção, à maternidade e à infância, à assistência aos desamparados na forma da Lei. Desta maneira, o Estado tem o dever de proporcionar condições de vida por meio de políticas afirmativas, considerando o desenvolvimento da cidadania como preceito para a construção de um país mais justo quanto a erradicação da fome e miséria. Segundo o Ministério do Desenvolvimento Social e Agrário (MDSA) as condicionalidades do PBF estão entre os pontos mais polêmicos do programa. Visando cumprir a frequência escolar e os cuidados com a saúde, o Programa busca garantir a permanência e a manutenção dos estudantes na escola por meio da implementação de 1 Graduada em Serviço Social pela Universidade Anhanguera/Uniderp Campo Grande MS. E-mail: [email protected]. 2 Graduada em Pedagogia pela Universidade Estadual do Ceará (UECE) e Mestre em Educação pela Universidade Federal do Mato Grosso do Sul (UFMS). E-mail: [email protected].

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Trabalho de Conclusão de Curso

BOLSA FAMILIA E O DESEMPENHO ESCOLAR DOS ALUNOS

BENEFICIÁRIOSDA E.M CARLOS VILHALVA CRISTALDO

(CAMPO GRANDE – MS)

Adriana da Silva Lages1

Maria do Socorro Sales Felipe Bezerra2

RESUMO:

O presente artigo tem como finalidade avaliar de que forma as condicionalidades do PBF tem

impactado no desenvolvimento dos estudantes beneficiários de uma escola municipal

localizada na periferia de Campo Grande/MS. Como objetivo específico buscou-se conhecer

os dados da rede de beneficiários, a percepção dos professores orientadores educacionais e

coordenadoras no tocante ao desempenho escolar dos alunos beneficiários. A metodologia

consistiu na aplicação de questionários distintos para cada função direcionados a sete sujeitos

que participam diariamente da vida escolar dos alunos beneficiários do Programa Bolsa

Família.

Palavras-chave: Bolsa Família. Desempenho Escolar. Condicionalidades. Frequência.

1 INTRODUÇÃO

Na Constituição Federativa do Brasil de 1988 considera os direitos sociais como

garantias fundamentais à educação, à saúde, ao trabalho, à moradia, ao lazer, à segurança, à

previdência social, à proteção, à maternidade e à infância, à assistência aos desamparados na

forma da Lei. Desta maneira, o Estado tem o dever de proporcionar condições de vida por

meio de políticas afirmativas, considerando o desenvolvimento da cidadania como preceito

para a construção de um país mais justo quanto a erradicação da fome e miséria.

Segundo o Ministério do Desenvolvimento Social e Agrário (MDSA) as

condicionalidades do PBF estão entre os pontos mais polêmicos do programa. Visando

cumprir a frequência escolar e os cuidados com a saúde, o Programa busca garantir a

permanência e a manutenção dos estudantes na escola por meio da implementação de

1Graduada em Serviço Social pela Universidade Anhanguera/Uniderp Campo Grande – MS. E-mail:

[email protected]. 2 Graduada em Pedagogia pela Universidade Estadual do Ceará (UECE) e Mestre em Educação pela

Universidade Federal do Mato Grosso do Sul (UFMS). E-mail: [email protected].

Trabalho de Conclusão de Curso

projetos voltados para o desenvolvimento de habilidades e competências essenciais para a

obtenção de uma qualificação e, consequentemente, rompendo com o ciclo da pobreza.

Conforme o PBF:

Na área da educação, todas as crianças e adolescentes entre 6 e 15 anos

devem estar devidamente matriculados e com frequência escolar mensal

mínima de 85% da carga horária. Já os estudantes entre 16 e 17 anos devem

ter frequência de no mínimo, 75%. (BRASIL, 2011).

As condicionalidades atuam diretamente processo de inclusão social de modo que

através da educação, o beneficiário rompa com o ciclo da pobreza. Fato que contribui de

forma positiva para o bom desempenho do aluno, pois muitos alunos vão à escola

compreendendo de forma educativa a função das condicionalidades, buscando atendê-las

como respostas à perspectiva de aprendizagem. Contudo há registros de que a frequência

obrigatória não cumpra exatamente a função educativa, mas esteja disposta em uma realidade

que obriga a presença, mas não contribui para o desempenho escolar como deveria.

Neste sentido, o presente artigo tem como finalidade avaliar de que forma as

condicionalidades tem impactado no desenvolvimento dos estudantes beneficiários. Ao

constatar a trajetória dos desempenhos nas avaliações externas houve um determinado

avanço, bem como, na frequência escolar após o recebimento do Programa Bolsa Família

(PBF). Para este processo investigativo buscamos conhecer os dados da rede de beneficiários,

a percepção dos professores e orientadores educacionais de uma escola localizada em Campo

Grande/MS, no tocante ao desempenho escolar dos alunos beneficiários.

O estudo de caso pode ser um ponto de partida da pesquisa qualitativa e que tanto os

métodos quanto as técnicas podem se adequar ao objeto de estudo. Desta maneira, o estudo se

baseia na pesquisa qualitativa a partir das condicionalidades, do desempenho e

acompanhamento escolar, tendo como base a E.M. Carlos Vilhalva Cristaldo situada na Rua

Pádua Gazal nº 13, no bairro Jardim Aeroporto – Campo Grande/MS.

Com o procedimento metodológico, foi necessário analisar os dados e cumprimento

das condicionalidades do PBF; conhecer o cumprimento das condicionalidades no âmbito

escolar e social; e compreender a contribuição a melhoria do desempenho escolar por meio

das condicionalidades.

A escola está localizada em um bairro periférico da cidade, onde a maioria das casas

em torno da escola foi construída pelo Governo Municipal por meio de programas

Trabalho de Conclusão de Curso

habitacionais em parcerias com o governo federal. A escola possui cerca de 1.300 alunos

matriculados, sendo 550 beneficiários do PBF, correspondendo a quase 50% do total.

Próximo à escola encontra se o Centro de Referência de Assistência Social

(CRAS)/Jardim Aeroporto, que atende os alunos com o desenvolvimento de projetos sociais

como dança, reforço escolar entre outros. O atendimento a estas crianças beneficiárias do

PBF pelo CRAS visa preencher o espaço de tempo ocioso, enquanto não estão na escola. Um

dos requisitos para a participação nas atividades do CRAS é o comprometimento com os

estudos, no qual é exigido o cumprimento da frequência escolar regularmente, a cada dois

meses, por meio de uma declaração da escola para continuar sendo atendidos pelo CRAS.

O trabalho constitui-se na pesquisa bibliográfica e documental, utilizando

questionários direcionados aos coordenadores escolares e professores e orientadoras que

trabalham diretamente com os estudantes e estabelecem relação diretamente com a escola,

buscando conhecer o elo da escola e o cumprimento das condicionalidades. Os sujeitos da

pesquisa são Coordenadora, Orientadoras e Professores do 6º ao 9º do período matutino da

Escola Municipal Carlos Vilhalva Cristaldo em Campo Grande/MS. São avaliados 4

Professores, 1 Coordenadora e 2 Orientadoras Educacionais selecionados a partir do trabalho

conjunto com os beneficiários do PBF.

2 O PBF E A ORGANIZAÇÃO DA ESCOLA

O processo histórico do PBF teve início a partir das discussões no âmbito da

Organização das nações Unidas (ONU) que convocou 191 nações que integram o sistema da

ONU sobre o desenvolvimento dos países mais pobres. Nessa conferência, foram traçados

oito objetivos principais a serem alcançados até 2015: erradicar extrema pobreza e a fome;

atingir o ensino básico universal; promover a igualdade de gêneros; reduzir a mortalidade

infantil; melhorar a saúde da mulher; combater o HIV/AIDS, malária e outras doenças;

promover o desenvolvimento sustentável; e estabelecer uma parceria mundial para o

desenvolvimento das nações com índices elevados de pobreza.

Até a década de 1980, mais precisamente, um dos principais problemas da educação

básica brasileira era a falta de escolas e as altas taxas de abandono escolar, causadas pelas

necessidades das famílias de que seus filhos trabalhem. Para estimular a presença das

crianças nas escolas o governo desenvolveu desde a década de 1990 um amplo programa de

subsídios ás famílias de baixa renda.

Trabalho de Conclusão de Curso

As estatísticas não sustentam a hipótese de que a necessidade de trabalhar é o que

afasta as crianças da escola, pois o mais provável é que elas abandonam porque não

conseguem acompanhar o ritmo escolar, visto que são vítimas de um processo de exclusão

que afeta, sobretudo, as crianças de origem social mais pobres. E como as bolsas só são

destinadas às famílias com crianças que estão na escola, fica difícil saber se a criança vai à

escola por conta da bolsa ou é a presença dela que garante a bolsa. (SCHWARTZMAN,

2006).

Em outro artigo, Schwartzman (2009):

mostra que o PBF não deveria estar pautado em condicionalidades, mas

apenas garantir a transferência de renda aqueles que se encontram em

situação de pobreza, uma vez que essas condicionalidades se encontram

desconectadas da política educacional para melhoria da qualidade de ensino.

Mas é possível perceber que PBF ao garantir a permanência dessas crianças na

escola possibilitam o desenvolvimento de habilidades e competências essenciais para a vida

social, de modo a usufruir de melhores condições sociais, melhores remuneração no mercado

de trabalho rompendo, desta maneira, com o ciclo da pobreza. (ARROYO, 2013).

O PBF consiste na ajuda financeira às famílias pobres com renda mínima de 85,00

mensais para atender as necessidades básicas das famílias, entre as quais inclui

condicionalidades relativas a manutenção do beneficiário na escola. Esta talvez seja a

diferença principal quanto a perspectiva dos programas assistencialistas comuns na década de

1990. Desde sua implementação, o valor foi ajustado ao longo dos anos, sendo em 2016 a

referência a renda per capita de até R$ 85,00.

Durante a gestão de Fernando Henrique Cardoso foram criados programas

desarticulados e praticamente com aspectos assistencialistas. Tais programas foram

aperfeiçoados, na gestão do governo Lula mediante, pela Medida Provisória n° 132, de 20 de

outubro de 2003, e posteriormente com a Lei nº 1083, de 9 de janeiro de 2004, que unificou

os projetos de transferência de renda com o objetivo de melhorar a funcionalidade e ampliar o

alcance.

Os benefícios de transferência de renda unificados foram relativos a quatro

programas do governo federal: Bolsa Escola, Bolsa Alimentação, Cartão Alimentação e

Auxílio Gás que estavam sob a responsabilidade de diversos órgãos e tinham configurações

distintas que não contribuíam para a eficácia dos objetivos propostos.

Trabalho de Conclusão de Curso

Segundo o Relatório de Desenvolvimento Humano (2004) disponibilizado pelo

Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) destaca que no ano de 2002,

11 milhões de crianças morreram antes de completar um ano de vida, devido a desnutrição,

dificuldades no acesso a saúde e condições de precárias de vida. Esta conclusão também é

reflexo das condições de vida de grande parte da população mundial, que exigem o

desenvolvimento de políticas sociais compensatórias e eficientes para que a sociedade como

um todo produza condições de vida coletiva para todos. (PNUD, 2004).

O acompanhamento do Programa é feito inicialmente pelo sistema do Cadastro

Único (CadÚNICO)3, instrumento de cadastro que permite que os municípios se organizem

para identificar famílias em situação de vulnerabilidade social.

Outro instrumento é criado para fornecer apoio técnico e financeiro aos municípios

na gestão do PBF é o Índice de Gestão Descentralizada do Programa Bolsa Família para os

municípios e Distrito Federal (IGD-M/PBF), criado em 2007. Trata-se de um índice numérico

que avalia a quantidade e a atualização das informações sobre o cumprimento das

condicionalidades nas áreas de educação e saúde por parte das famílias beneficiárias.

(BRASIL, 2016).

O PBF é considerado um dos principais programas de combate a fome no mundo4.

Segundo o Ministério de Desenvolvimento Social e Combate à Fome (MDS), atual

Ministério do Desenvolvimento Social e Agrário (MDSA), a partir o ano em que foi lançado

o PBF, o valor dos benefícios concedidos passou de R$ 570 milhões em 2003 para R$ 7.526

milhões em 2006. (BRASIL, 2007).

Hoje, o modelo de transferência de renda brasileiro foi exportado como um exemplo

de sucesso para inúmeros países que atravessavam problemas semelhantes aos nossos, sendo

recomendado pelo Programa das Nações Unidas para a Infância e a Juventude (UNICEF) e

demais instituições multinacionais importantes como Branco Mundial. Em estudo sobre o

desempenho de programas de transferências de renda condicionada de renda em vários

países, o Banco Mundial considerou que o Bolsa Família possui o melhor nível de

focalização, visto que 94% das transferências chegam aos 40% mais pobres (WETZEL,

2013).

3Instituído pelo Decreto 3.877, de 24 de Julho de 2001. 4O PBF recebeu em 2013 o prêmio internacional pelo combate à pobreza e na promoção dos direitos sociais da

população vivente na pobreza, por meio da Associação Internacional de Seguridade Social (ISSA). Evento

realizado na Suíça. (BANCO MUNDIAL, 2013).

Trabalho de Conclusão de Curso

A situação de pobreza foi percebida, descrita e analisada de múltiplas formas desde

concepções mais individuais e liberais as quais insurgem percepções mais críticas e

imparciais, que incitam por sua vez perspectivas prescritivas e juízo de valores. (DUARTE,

2012). Contudo, reconhece-se que a pobreza é um fenômeno social complexo

multidimensional e relativo que permite diferentes formas de conceitualização e

interpretação. Defini-la acarreta sempre a escolha de certos elementos a serem privilegiados

em detrimento de outros. Dentre suas dimensões é comum focar no elemento renda para

definir quem é ou não pobre.

Sabe-se que os estudantes beneficiários devem cumprir a carga horária mínima de

85% da frequência mensal, ao mesmo tempo e possuir notas satisfatórias, portanto,

questiona-se se estes estudantes conseguem ter melhores notas do que os alunos que não

recebem o benefício ou se o ingresso na escola e a sua permanência oferecem por si só

possibilidades de maior mobilidade social se não for levado em conta a qualidade do ensino

oferecido.

De qualquer forma, compreende-se que há uma grande diversidade de realidades que

se misturam por todo território nacional e, que a realidade de uma escola específica não por si

só não pode ser considerada como fonte exclusiva para certificar um fenômeno.

2.1 A Escola e as Condicionalidades do PBF

O PBF consiste em um plano de políticas sociais baseado em três eixos: garantia de

renda, acesso aos serviços públicos e inclusão produtiva. O CadÚNICO compartilha estas

informações com o Plano Brasil sem Miséria (PBSM), pelo qual destacam-se: a quantidade e

a idade das pessoas, a renda per capita, a localização e os requisitos para a definição de

“grupo especial” (gestantes, lactantes e crianças/jovens até 17 anos). Tais elementos devem

representar a realidade dos beneficiários e fornecer subsídios para o cumprimento das

condicionalidades.

As condicionalidades são os compromissos assumidos pelas famílias beneficiárias

que abrangem o setor da educação e da saúde. Na educação a frequência escolar é o requisito

basilar para o cumprimento pelo qual o beneficiário em idade escolar deve ter o mínimo dos

85% da presença em sala de aula. Na área da saúde refere-se ao calendário de vacinas e ao

acompanhamento desde a gestação até aos sete anos de idade.

Trabalho de Conclusão de Curso

Na área da saúde são cobradas as vacinas e os procedimentos de pesagem, medição e

realização de exames periódicos especialmente para as crianças até sete anos de idade. As

gestantes devem realizar o pré-natal e ir as consultas na unidade se saúde e, sobretudo

acompanhar a sua saúde e do bebê após o parto, participar das atividades educativas

promovidas pelas equipes de saúde. Quanto à agenda escolar é necessário que os adolescentes

até quinze anos cumpram frequência obrigatória de 85% já para os alunos com dezesseis e

dezessete a frequência a ser preenchida é de 75%. (BRASIL, 2016).

Observa-se que apesar dos descumprimentos frequentes recaírem sobre as famílias,

ou seja, por desatenção às condicionalidades pode-se compreender que há algum obstáculo

que impede que a escola repasse a frequência escolar dos alunos como devido. Assim,

compreende-se que a rigidez do monitoramento não deve se limitar a um procedimento

administrativo e meramente mecânico, sem possibilitar o contato direto com os problemas,

apontando para a falta de debate e articulação dos gestores local no que tange ao

acompanhamento das condicionalidades.

Em 2008 no estado do Mato Grosso do Sul havia cerca de 107 mil famílias

beneficiadas pelo Bolsa Família. Conforme informações do MEC a frequência escolar

correspondia a 84% dos alunos beneficiários frequentaram as salas de aula. (BRASIL, 2016).

3 ORGANIZAÇÃO PEDAGÓGICA COMO CONDICIONALIDADE

DETERMINANTE

As informações constantes no Cadastro Único visam fornecer instrumentos de ação

do poder público, identificar as vulnerabilidades sociais, encaminhar as famílias para a

assistência social quando necessário e proporcionar desenvolvimento educacional.

Contudo, para o recebimento do benefício as famílias devem atender as

condicionalidades do Programa, que sua principal contribuição consiste em induzir o

comportamento das famílias que recebem o benefício para manter constante seus filhos, ou

dependentes, frequentes na escola. Importa, neste sentido, que se estabeleça uma relação

entre a presença da criança na escola e o seu desenvolvimento educacional.

Segundo Agatte e Antunes (2014), pode-se compreender que o entendimento das

condicionalidades do PBF na educação também implica no desprendimento de custos pelas as

famílias em situação de pobreza, pois estas se sentem na obrigação de manter seus filhos na

escola, mesmo que suas condições implique que seus filhos ajudem nas despesas da família.

Trabalho de Conclusão de Curso

O valor da bolsa deve, portanto, subsidiar parte da manutenção do estudante na escola, de

modo que a família compreenda a importância da escola como instrumento de saída das

condições de vida precária. Assim,

[...] ao transferir a renda e condicioná-la ao acesso à educação e à

saúde, por exemplo, pretende-se, por meio do recurso transferido,

reduzir o custo imediato das famílias pobres e, como resultado,

garantir maiores níveis de educação e saúde. (AGATTE E

ANTUNES, 2014, p. 37).

A exigência da frequência escolar é um dos principais parâmetros do PBF na escola.

Contudo representa uma contradição quando se observa que mesmo com a frequência em dia,

o estudante pode não possuir rendimento escolar necessário. Conforme Entrevistado a

frequência do aluno não representa a vontade de estudar, pois “[...] o aluno pode vir todos os

dias e todos os dias não ter vontade de estudar mesmo sendo motivado” (ENTREVISTADO

1). Desta maneira a cobrança pela frequência muitas vezes parece preencher uma necessidade

de controle do que propriamente um acompanhamento pedagógico.

Segundo Jaccoud (2016):

Para o controle das condicionalidades existem os coordenadores estaduais e

municipais da educação, assistência social e saúde que acompanham

regulamente e evolução dos números relativos ao PBF. A atuação dos destes

é importante para manter a articulação dos dados de frequência nas 160 mil

escolas brasileiras que possuem pelo menos um beneficiário. Para o autor,

esta proporcionalidade de atendimento talvez justifique a simplificação das

condicionalidades.

Jaccoud (2016) conclui que a relação da frequência como condicionalidade, atua

como motor de intersetorialidade devido a organização localizada e não devidamente

articulada, representativa do regime federativo brasileiro, que caracteriza pela sobreposição

de atribuições e, sobretudo, de realidades extremamente diferentes.

Assim, entende-se que a necessidade de uma organização política-pedagógica

específica ou planejamento para que as condicionalidades adquiram outra perspectiva, que vá

além da fiscalização e do controle.

Trabalho de Conclusão de Curso

De acordo com os relatos nos questionários disponibilizados pelos conjunto dos

professores, o acompanhamento da frequência escola, conforme exige o próprio programa,

apenas a frequência escolar é monitorada.

Para os entrevistados não existe distinção entre beneficiários e não beneficiários,

muito menos a escola proporciona o conhecimento destes estudantes. O que se tem acesso é

uma especificidade ou outra que exige uma verificação sobre o aluno e sua relação com a

escola, quando este pratica algum comportamento que exige avaliação da coordenação.

Segundo Entrevistado 1 a maioria dos beneficiários da escola estudada não tem bons

rendimentos. Segundo dados da secretaria da escola junto a Orientadora Educacional os

alunos que recebem o PBF tem rendimento escolar ou na média (6,0) ou abaixo da média, a

mesma, acredita que isso ocorre devido a falta de comprometimento dos pais no

acompanhamento escolar de seus filhos. Concluem ainda que comparecem na escola somente

quando o benefício é bloqueado. Quanto a reprovação, nem todos os beneficiários do PBF

reprovam mas todos tem baixo rendimento escolar.

É possível reconhecer que outras condicionalidades poderiam fazer parte do rol de

exigências para o recebimento da bolsa, como o acompanhamento da família pela escola,

visto que, existem famílias beneficiárias que se encontram em situação de risco. Condição

que lamentavelmente engrossa os dados estatísticos de violência, bem como, materializa

parte do fracasso escolar.

De modo geral, quando nos referimos a frequência escolar, “Observamos que o PBF

não oferece incentivo para melhorar o desenvolvimento da aprendizagem do aluno, visto que,

não está ligado ao desempenho e sim a frequência”. (ENTREVISTADO 1). Portanto, a escola

enquanto espaço para o desenvolvimento da cidadania e para as aprendizagens significativas,

como define Paulo Freire (1996), utiliza apenas a frequência como instrumento de validação

para condições melhores.

Ocorre a necessidade de a escola acompanhar mais de perto o estudante beneficiário,

embora conte com o apoio da Assistência Social do CRAS. Os casos de faltas além do limite,

a escola recorre ao assistente social para comunicar a possibilidade de evasão do estudante.

Com a posse do caso, o CRAS solicita a presença dos pais ou responsáveis pelo beneficiário,

ou vai ao encontro dos mesmos na residência. A persistência do problema resulta na

comunicação à Secretaria de Educação correspondente para que providencie as medidas

Trabalho de Conclusão de Curso

punitivas com suspensão do valor, cancelamento ou exclusão total dependendo das

especificidades dos casos.

Contudo, mesmo os procedimentos punitivos sejam devidamente aplicados, cabe

ressaltar que, antes de tudo, “A escola busca orientar e incentivar as famílias para fazer um

acompanhamento da frequência e aprendizagem dos alunos” (ENTREVISTADO 2). Que o

PBF tem contribuído para a frequência dos estudantes na escola isso é um fato indiscutível. O

que a maioria das entrevistadas lamentou que o benefício está condicionado à frequência e

não ao rendimento pedagógico do estudante beneficiário.

3.1 A Orientação Educacional como Princípio Educativo do PBF

A educação é um direito humano. Na Constituição Brasileira desde 1988 a educação

figura como direito social (Art. 6º) e também, como direito social (Art. 205 a 2014).

Atualmente fala se muito em promover a inclusão social, pois as análises políticas e

socioeconômicas e descrevem o crescente processo de exclusão de pessoas e grupos dos

benefícios da sociedade.

A escola e a família assim como outras instituições vêm passando por profundas

transformações, Muitos lares atualmente são chefiados por mulheres que precisam trabalhar

para trazer o sustento para seus filhos. Essas mudanças na família e na sociedade afetam

também na escola. Portanto é fundamental que sem transferir culpas ou responsabilidades a

família e a escola descubram o verdadeiro sentido da harmonia entre elas. As experiências

obtidas através dos relatos dos entrevistados mostram que, mais que frequência dos alunos a

participação dos pais é fundamental para o bom desempenho escolar e social das crianças.

A E.M Carlos Vilhalva Cristaldo foi reestruturada e reerguida a partir de uma

pequena escola visando atender a demanda de alunos crescente a cada ano. A escola atende

no turno integral, matutino e vespertino (1º ao 9º ano) e noturno no EJA. A escola possui

mecanismos de acessibilidade para estudantes especiais, salas de recursos, bibliotecas, quadra

esportivas e salas para desenvolvimento de artes e dança. Atende em 2016 cerca de 1.300

estudantes com 100 funcionários entre administrativos, professores, coordenadores,

supervisores e orientadores educacionais. Regularmente os estudantes representam a escola

em campeonatos e desenvolve projetos envolvendo a comunidade e integração da família na

escola por meio cursos, esporte, música, informática dentre outros.

Trabalho de Conclusão de Curso

Expressos nos questionários, recebemos opiniões de sete pessoas que convivem

diariamente com os estudantes beneficiários. Todas elas relataram ter conhecimento do que é

o PBF, porém algumas ressaltam a necessidade de haver cursos de formação que possam

subsidiar as necessidades na prática do professor que trabalha diretamente com estudantes

beneficiários.

Há um risco de que a escola não tenha orientação pedagógica para acompanhar estes

estudantes, uma vez em que as condicionalidades relacionadas à frequência, embora seja um

instrumento de controle, não representam o desenvolvimento do beneficiário em sua

completude. Desta maneira, todos os sujeitos da pesquisa informaram que a organização

pedagógica é de suma importância para o cumprimento das condicionalidades e que muitas

vezes implica na visitação na residência do estudantes para cobrar justificativas sobre as

faltas, como reforça a Entrevistada 1 “Ligamos, vamos atrás, cobramos a frequência desse

aluno”.

Um dos procedimentos muito comum adotados pela direção das escolas que

possuem beneficiários é o sigilo. Ou seja, o professor trabalha em sala de aula sem conhecer

quem é beneficiário ou não. Para alguns, este procedimento pode ser útil na medida em que o

professor desempenha as funções pedagógicas não destaca determinado estudante dos

demais. Por outro lado, observa-se que alguns professores discordam ao entender que o

conhecimento da especificidade de cada estudante seja essencial para a definição de

procedimentos focais, relativos às necessidades educacionais de cada um.

É neste sentido que faz falta no processo de acompanhamento dos beneficiários, e a

simples verificação da frequência parece desmerecer o estudante pobre. Contudo, os

professores afirmam que não reconhecem os beneficiários, como segue: “Não é perceptível a

diferença entre beneficiário e não beneficiário. Ao meu ver os pais são acomodados na

maioria dos casos e ainda quando os pais encaminham o caso, eles vem na escola questionar”

(ENTREVISTADO 4).

É necessário que os professores cobrem desempenho, sem dúvida, mas é possível

reconhecer que para as famílias o recebimento de uma bolsa/valor se torna mais importante

que a cobrança por desempenho. Fato que diverge das expectativas da própria escola. Pois a

condicionalidade para receber o beneficia é a trequencia e não o desempenho escolar do

beneficiário.

Trabalho de Conclusão de Curso

Segundo relatou a (ENTREVISTADO 3) “Não há incentivo em obter desempenho

escolar satisfatório, não há essa pesquisa, se as notas foram abaixo da média (6,0) o aluno

perdesse o benefício”. Já a (ENTREVISTADO 4) acredita que a condicionalidade da

frequência contribui para o desempenho escolar. Segue: “Sim porque com esse programa

possibilita e obriga que os alunos que tem o PBF tenham frequência escolar”

Quando perguntado aos entrevistados quais condicionalidades seriam importantes

para um bom desempenho escolar a (ENTREVISTADO 1) disse “Acompanhamento

frequente por parte dos pais “

É dever da família a presença no contexto escolar de seus filhos, essa presença

também é reconhecida na Lei das Diretrizes e Bases da Educação:

A educação abrange os processos formativos que se desenvolvem na vida

familiar, na convivência humana, no trabalho, nas instituições de ensino e

pesquisas, nos movimentos sociais e organização da sociedade civil e nas

manifestações culturais. (BRASIL, 1996).

A respeito do papel da escola como agente de transformação, questionou-se se o

governo investisse em infraestrutura e em educação efetivamente, se por si só seria capaz de

mudar a realidade dos alunos beneficiários do PBF. A maioria dos entrevistados disseram que

a escola por si não é responsável exclusiva pela condição da sociedade, que compartilha a

responsabilidade com o governo primeiramente e a sociedade.

[...] Pois a escola sozinha não consegue. Talvez se fosse divulgada em rede

nacional as famílias se preocupariam mais com o aprendizado dos seus

filhos e não somente envia-los para escola para não perder o benefício.

(ENTREVISTADO 6)

Como relatou o (ENTREVISTADO 6) a escola sozinha não consegue trabalhar no

processo de inclusão social sem a participação da família. Percebe se que a grande maioria

das dificuldades de baixo rendimento escolar faltas e até mesmo mal comportamento vem de

problemas familiares, sendo assim a família tem um papel decisivo tanto na educação formal

e informal de seus filhos, sendo assim frequentar a escola não garante que o aluno aprenderá

os conteúdos ensinados em sala de aula.

Grande parte dos alunos concluem o ensino fundamental e médio sem uma boa

leitura e sem escrever corretamente, este problema bem visível na fala do Entrevistado 7:

“[...] Pois mesmo com o benefício não muda nada. Pois não é cobrado nada. Aprendizagem,

Trabalho de Conclusão de Curso

desempenho, mas sim presença, para nós alfabetizadores essa bolsa não tem função nem

benefício na alfabetização”.

4 CONSIDERAÇÕES FINAIS

O sentido de estudar a pobreza está na sua superação. Ao longo dessa pesquisa

percebemos que o Brasil não é um pais pobre (sexta economia mundial) mas um pais com

muitos pobres (BARROS, HENRIQUES, MENDONÇA, 2000). Reconhecemos que o Brasil

vem enfrentando a pobreza e que o número de pessoas que vivem abaixo da linha da pobreza

vem diminuindo a cada ano, e o Bolsa Família tem parcela deste mérito.

O monitoramento da frequência escolar é de competência dos municípios. Em

Campo Grande – MS esse monitoramento é realizado pela Secretaria Municipal de Educação

(SEMED). De modo geral, as ações desenvolvidas pelo Município tem sido satisfatórias no

controle das condicionalidades.

Infelizmente como relataram os entrevistados a condicionalidade está ligada a

frequência e não ao desempenho do aluno o que torna o processo de aprendizagem difícil,

pois o mesmo se encontra muitas vezes “obrigado” a ir à escola para não perder o benefício.

Por meio das entrevistas percebemos que o PBF sobrecarrega o trabalho dos

responsáveis pelo Programa nas escolas, sobretudo quanto a relação frequência e desempenho

escolar.

O PBF tem alcançado excelentes resultados na condicionalidade frequência, os

entrevistados acreditam que o objetivo em condicionar o benefício a frequência faria que

mesmo em longo prazo o aluno viesse a se interessar pelos estudos mas infelizmente isso não

tem ocorrido. Muitos alunos vão à escola “obrigados” para não perder o benefício. Falta

também um acompanhamento frequente dos pais na vida escolar dos filhos, pois muitos

atribuem exclusivamente à escola a educação de seus filhos se eximindo da responsabilidade.

Compreende-se que seja fundamental que tanto a escola quanto a família descubram

o verdadeiro sentido e a real importância do processo educativo no desenvolvimento social.

5 REFERENCIAS

AGATTE, Juliana Picoli; ANTUNES, Marcos Maia. Condicionalidade de Educação do

Programa Bolsa Família: Concepção e Organização do Acompanhamento. Cadernos de

Estudos – Desenvolvimento Social em Debate. n. 18. Brasília, DF: Ministério do

Trabalho de Conclusão de Curso

Desenvolvimento Social e Combate à Fome; Secretaria de Avaliação e Gestão da

Informação, 2014. p. 36-50.

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