pobreza e desigualdade na infÂncia: o caso da...
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POBREZA E DESIGUALDADE NA INFÂNCIA: O CASO DA ESCOLA MUNICIPAL
ELPÍDIO REIS EM CAMPO GRANDE/MS.
Sandra de Souza Briltes Otero
RESUMO:
Anualmente muitas escolas públicas recebem crianças em situação de vulnerabilidade, com um histórico de vida que está relacionado à pobreza. Esse artigo tem como objetivo verificar a relação entre a educação e pobreza, buscando investigar através de um estudo de pesquisa com professores e alunos do 9º ano as desigualdades sociais na infância no âmbito da escola municipal Elpídio Reis.
Palavras chave: Pobreza. Criança. Escola. Desigualdade social.
INTRODUÇÃO
A escola tem uma função de extrema importância na vida do educando, que é mediar o
processo de aprendizagem, preparando o indivíduo para conhecer criticamente a sociedade e
tentar transformá-la, tornando-a menos desigual e injusta, mesmo diante das condições de
pobreza e desigualdade que permeiam o atual momento histórico e social.
O objetivo desse artigo é averiguar os aspectos da pobreza e a desigualdade na infância
da Escola Municipal Elpídio Reis em Campo Grande/MS. Os objetivos específicos são:
constatar como os professores e alunos que ali trabalham e estudam percebem a situação de
pobreza dentro do ambiente escolar e levantar opiniões de professores e alunos sobre ações que
podem ser desenvolvidas para melhorar a condição dos alunos em situação de pobreza e
desigualdade social na escola Municipal Elpídio Reis.
O vínculo profissional, como docente do Ensino Fundamental da disciplina Educação
Física, na Escola Municipal Elpídio Reis, desde 2013, conduziu à delimitação espacial da
pesquisa. A metodologia partiu de levantamento bibliográfico, entrevistas estruturadas com os
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professores e os alunos do 9º ano e análise teórica das respostas coletadas através do
questionário.
Inicialmente, o artigo descreverá a estrutura física da Escola Municipal Elpídio Reis e
adjacências. Em um segundo plano, como a pobreza influencia no ensino e na infância, baseado
em teóricos como Amartya Sen. e Robert W. Connell.
A escola é o lugar de aprender, de ensinar, das trocas de informações e experiências de
vida e, para tal, precisa ser referência na vida de uma criança e estar preparada para receber os
estudantes. A escola Elpídio Reis se mostrou visualmente um local aconchegante, com boa
infraestrutura, compatível com as necessidades educacionais, conforme Figura 1.
Figura 1- Frente da escola Municipal Elpídio Reis
Fonte: A autora (2016).
O tema abordado contribuirá para um maior entendimento sobre a pobreza, levando
professores e alunos a uma reflexão e conscientização da desigualdade social, na Escola
Municipal Elpídio Reis.
Por se situar no bairro Mata do Jacinto, que segundo o Projeto Político Pedagógico da
Escola é considerado um bairro de classe média baixa, existem crianças tanto dessa classe
social quanto crianças pobres, dependentes do Programa Bolsa Família e em situação de
desigualdade. Optou-se nessa pesquisa por utilizar-se do perfil das crianças 9º ano da E.M
Elpídio Reis, para analisar a inserção de crianças pobres na escola e entender como a escola as
recebe.
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1 SOBRE A ESCOLA MUNICIPAL ELPÍDIO REIS: ESTRUTURA
ORGANIZACIONAL E FÍSICA
A E.M Elpídio Reis é composta por mil e trezentos alunos, cinquenta professores e uma
equipe de quinze profissionais de apoio, são eles: merendeira, bibliotecária, auxiliares de
serviços diversos (profissionais da limpeza ou zeladores), secretários escolares e guardas
municipais.
A estrutura física da escola é vinte e três salas de aulas, uma biblioteca, uma sala de
professores, uma sala de recurso, uma secretaria, uma sala de informática, uma sala de
supervisão, uma sala de orientação, uma sala de direção, uma sala de monitores, um laboratório
de ciências, uma sala de educação física, uma cantina, uma área de serviço, uma quadra coberta,
um vestiário masculino, um vestiário feminino, um vestiário masculino adaptado, um vestiário
feminino adaptado, dezessete banheiros, um palco, três áreas de convívio com parques infantis
e uma área de estacionamento.
A escola foi planejada e estruturada para funcionar como escola integral, com rampas
de acesso aos portadores de necessidades especiais e banheiros adaptados. A escola deve ser
pensada, como um espaço que receberá todas as pessoas de forma igualitária e inclusiva,
abrangendo não só o conhecimento, mas também a parte de acessibilidade, tanto que a escola
Elpídio Reis se estruturou de forma a atender as crianças especiais. A figura 02 mostra a rampa
de acesso para deficientes físicos ou com pouca mobilidade.
Figura 2 – Rampa em frente à Escola Municipal Elpídio Reis
Fonte: A autora (2016).
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Atualmente atende crianças da Educação Infantil ao 9º ano do Ensino Fundamental,
distribuídos em períodos matutino e vespertino, com idade entre 04 a 14 anos. A clientela é
composta por residentes da região da Mata do Jacinto e bairros vizinhos, os quais, em sua
maioria, segundo o PPP da escola possui a casa própria quitada.
Quanto à situação socioeconômica, os pais são assalariados com renda familiar entre
01 a 04 salários mínimos que, de acordo com os critérios estabelecidos pelo Instituto Brasileiro
de Geografia e Estatística - IBGE são considerados Classe Média Baixa. Um dado importante
observado durante o trabalho de campo 30% (porcentagem significativa) dos alunos mora com
apenas um dos progenitores, sendo que 19% residem com os avós; e a escolarização dos pais é
apenas o primeiro grau completo.
A Escola Municipal Elpídio Reis possui os seguintes níveis de ensino:
a. Educação infantil (Pré-Escola): Possui 05 turmas totalizando 123 alunos;
b. Ensino Fundamental: Dividido do 1º ao 5º ano com 23 turmas totalizando 619 alunos e do
6º ao 9º ano com 18 turmas totalizando 556 alunos.
Diante desse quadro de alunos e professores, analisaremos o perfil de pobreza e desigualdade
entre os alunos do nono ano da escola Elpídio Reis.
2 ESPAÇOS DE POBREZA NA ESCOLA ELPÍDIO REIS
A pobreza pode ser tratada como a falta de renda necessária para atender os meios
essenciais à sobrevivência, tais como: alimentação, moradia, saneamento básico, saúde,
educação e dinheiro, também está relacionada com outras temáticas como violência, fracasso
escolar, vulnerabilidades, que fazem da família um fator de risco para o desenvolvimento e,
como consequência, para o desempenho escolar da criança.
A presença de grande quantidade de crianças pobres na escola não tem passado
despercebida e está relacionada com as diferenças existentes na educação, responsáveis por
efetivar um direito legal que é o acesso à educação, a escola deveria prestar serviços de
qualidade à população, sem nenhuma distinção. Ao longo dos anos a educação passou por
mudanças que permitiu o acesso a escola a uma classe menos favorecida aos vários níveis de
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ensino, possibilitando também a essa classe mais pobre o acesso ao lazer, ao esporte, dentre
outros.
A pobreza pode dificultar a permanência desse estudante na escola, mas não pode
determinar o grau de aprendizagem do educando, tornando-se necessária a providência básica
das necessidades materiais dos estudantes, por meio da transferência de renda e de outros
programas educacionais, da merenda escolar, do uniforme, do transporte, etc.
Infelizmente, hoje nas escolas em geral os alunos são tratados de forma diferenciada,
deixando de lado as culturas e o conhecimento que trazem mesmo antes de chegar à escola e
não se dando importância para a desigualdade social. Dessa forma os alunos não progridem,
na maioria das vezes até desistem de estudar, por desanimarem ou pela necessidade de
trabalhar. Assim, mais uma vez chega-se ao mesmo ponto, no ciclo vicioso, que é a pobreza
ligada à falta de instrução, onde ocorre a exclusão, política, econômica e social, prevalecendo
à pobreza e a desigualdade social.
Pedro Demo no livro Pobreza Política define a pobreza e o ser pobre: [...] não é apenas
ser pobre e sim deixado de lado, desapropriado de sua própria dignidade sem o que lhe e de
direito por lei (Demo, 2006, p.43).
Ainda sobre o conceito de pobreza Sen (1999) comenta:
A pobreza pode ser definida como uma privação das capacidades básicas de um indivíduo e não apenas como uma renda inferior a um patamar pré-estabelecido. Por “capacidade” entendem-se as combinações alternativas de funcionamentos de possível realização. Portanto, a capacidade é um tipo de liberdade: a liberdade substantiva de realizar combinações alternativas de funcionamentos ou a liberdade para ter estilos de vida diversos. Por exemplo, uma pessoa abastada que faz jejum por sua livre e espontânea vontade pode ter a mesma realização de funcionamento que uma pessoa pobre forçada a passar fome extrema. Porém a primeira pessoa possui um "conjunto capacitário” diferente do da segunda. A primeira pode escolher comer bem e ser bem nutrida de um modo impossível para a segunda (SEN, 1999, p. 409).
A pobreza não pode ser considerada vagamente somente como ausência de meios de
sustento, ela está vinculada a distribuição de renda, causada pela falta de emprego.
Segundo o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada - IPEA a renda per capita que
está relacionada à pobreza é de ½ salário mínimo, que impossibilita uma condição digna à
família e deixa de suprir suas necessidades básicas. Os programas sociais são baseados em uma
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realidade de pobreza absoluta e tem como alvo, principalmente, auxiliar aos que estão abaixo
da linha da pobreza, com enfoque principalmente na alimentação, moradia, saneamento, e
utilizam-se do auxílio da escola para buscar minimizar a pobreza das famílias.
Na infância ocorrem diversas mudanças físicas e emocionais, que têm influência tanto
positiva como negativa na vida da criança, para que ocorra um bom desenvolvimento de
habilidades na infância, a criança deverá ser estimulada a conhecer e vivenciar experiências
que definirão o seu desenvolvimento amplamente.
A Primeira Infância que vai de zero a seis anos compreende o período da vida que
envolve a gestação, o nascimento e os primeiros seis anos de vida, sendo essencial na formação
da pessoa, na construção do seu interior, e suas relações com o meio que vive.
Conforme previsto na Constituição Federal e pelo artigo 53 no Estatuto da Criança e do
Adolescente – ECA é direito de todas as crianças, mesmo em situação de pobreza, o acesso à
escola e ao conhecimento de forma igualitária:
Art. 53. A criança e o adolescente têm direito à educação, visando ao pleno desenvolvimento de sua pessoa, preparo para o exercício da cidadania e qualificação para o trabalho, assegurando-se lhes:
I - igualdade de condições para o acesso e permanência na escola. (ECA, 2016).
A situação de pobreza leva a criança a uma condição de desigualdade em relação ao
ambiente em que vive, excluindo a mesma de uma condição de igualdade, deixando a criança
vulnerável, dependente somente do apoio de ações do governo para subsidiar a família em
situação de pobreza. Medidas de distribuição de renda tem se mostrado ineficazes para uma
real mudança social, para mudar realmente situação das famílias, essas deveriam ser
substituídas por ações de médio a longo prazo.
Crianças em condição de desigualdade, geralmente, não têm acesso aos recursos
essenciais, materiais básicos como alimentação, moradia, saneamento básico, considerados o
mínimo para sua sobrevivência, gerando divisões, e conflitos interiores, relevantes em sua vida.
A desigualdade na escola traz para a criança reflexos marcantes em sua vida, um deles é
relacionado diretamente com a educação e com o aprendizado, deixando a criança a mercê de
um sistema que não garante a ela o acesso, a permanência e nem qualidade do ensino.
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No entanto, mesmo diante de tantas desigualdades no meio educacional, ainda é fato
que a educação é um dos caminhos para resolver ou amenizar as reais situações que existe e
persiste na sociedade, investir em educação traz esperanças reais de mudanças quando de fato
se reconhece que a pobreza está inserida no contexto escolar.
Ao analisar a desigualdade social, na escola, pode-se perceber que a sociedade é
dividida em grupos, os que têm uma situação estabilizada por serem criados em famílias que
possuem uma casa, um trabalho podendo com isso manter uma situação melhor em relação às
outras crianças e os que não as têm, que dependem de assistências provindas do governo.
Partindo dessa realidade a escola é colocada, como parte dessa mudança de conceito, a partir
de seu papel na sociedade, que é formar cidadãos e não reproduzir uma sociedade da
desigualdade. Sobre a relação escola e desigualdade Dubet (2003) menciona que “[...] não é a
escola que realiza as grandes operações de distribuição dos alunos, são as desigualdades sociais
que comandam diretamente o acesso às diversas formas de ensino” (Dubet, 2003, p. 32).
A desigualdade social e escolar também está vinculada a forma da transmissão do
conteúdo escolar, com as dificuldades em acompanhar e, consequentemente, de aprendizagem,
transformando o estudante em refém do meio, onde passa a ser rotulado e discriminado pela
condição de pobreza e de déficit cognitivo.
Na Constituição Federal e o Estatuto da Criança e do Adolescente - ECA consta que a
educação básica é obrigatória e gratuita, possibilitando e ofertando a criança à oportunidade de
uma boa condição social, ainda assim diante dessa realidade amparada pela lei, inúmeras
crianças que têm acesso à escola, concluem o Ensino Médio apresentando déficits de
aprendizagem.
A escola por ser considerada democrática e ter como um dos princípios a igualdade,
tem por obrigação acolher e formar o cidadão e não o excluir do meio social.
A educação não depende somente do sistema educacional, ela conta com outros fatores
que agregam à deficiência de aprendizagem, como, por exemplo, o contexto histórico da
criança, a estrutura familiar, a forma como essa criança é aceita no meio familiar socialmente
e psicologicamente e como ela se vê nesse contexto.
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3 O PAPEL DA ESCOLA NA VIDA DA CRIANÇA
A escola tem papel fundamental no desenvolvimento e na aprendizagem de uma
criança, sendo uma ponte entre a criança e a sociedade, entretanto, a criança quando chega à
escola já traz consigo uma bagagem de vida familiar e social, e muitas vezes busca, na escola,
suprir a carência afetiva, deixada pela família onde os pais, muitas vezes por estar trabalhando,
tem pouco tempo disponível para esse indivíduo. Assim, a escola assume mais uma
responsabilidade, pois, em sua interação com o meio escolar, a criança passa a criar laços
afetivos com os que o cercam e, dessa forma, a escola promove então proteção e segurança
para o aluno. Com base no Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil (RCNEI
Brasil, 1998, p.21):
A criança é um ser social que nasce com capacidades afetivas, emocionais e cognitivas. Tem desejo de estar próxima às pessoas e é capaz de interagir e aprender com elas de forma que possa compreender e influenciar seu ambiente. Ampliando suas relações sociais, interações e formas de comunicação, as crianças sentem-se cada vez mais seguras para se expressar.
Na maioria dos casos, a falta de estrutura familiar é um dos fatores que potencializam
o déficit na aprendizagem, passando a escola a assumir o papel que deveria ser da família.
Os professores erram ao rotular e julgar os alunos pela única história que se conhece
deles, não se preocupando em verificar ou analisar em que contexto social a criança está
inserida, não importando se os alunos estão aprendendo ou não, ou a condição social posta.
Percebe-se isso no currículo que é aplicado nas escolas, que apenas preza por
conhecimentos globais sem levar em conta as especificidades locais, onde os ritmos de
aprendizagem são homogêneos e as avalições são classificatórias e excludentes, que transfere
para os estudantes a responsabilidade dos resultados, não levando em conta a história individual
de cada aluno. Fazer um diagnóstico dos alunos, percebendo e respeitando o conhecimento
vivido por cada aluno é de suma importância para o reconhecimento individual de cada
membro do grupo.
Reconhecendo assim que o aprendizado envolve muito mais que o aspecto cognitivo e
não pode estar desvinculado das experiências culturais e sociais dos sujeitos. A aprendizagem
deve ultrapassar os muros da escola, atingindo outros espaços educativos antes inexplorados
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pela educação formal, sem separar a aprendizagem escolar da aprendizagem das experiências
de vida. Para isso é preciso que a escola deixe de se colocar como o único espaço do
conhecimento, que os educadores se assumam também como educandos e comecem a aprender
com aqueles que, com suas experiências sociais, promovem educação de toda a sociedade,
respeitando assim cada cultura, etnia, gênero, vivência social, ritmo de aprendizagem e forma
de viver e de expressar no mundo.
A cidade é uma forma material da cultura; um complexo dispositivo cultural, de onde
emergem mensagens, significações, onde são construídas e destruídas experiências, onde se
alimentam os relatos, as narrações, onde se formam e transformam as biografias. [...] A cidade
é um currículo, território repleto de velhos e novos alfabetismos. [...] Dizer então que a cidade
é currículo é dizer que a cidade é produto, mas também e mais fundamentalmente é processo,
experiência, construção, projeto e possibilidade de subjetivação e produção de saber.
(BONAFÉ, 2010, p. 1, tradução da autora).
Quando se fala em papel da escola, remete-se essa função ou obrigação a todos que se
comprometeram com a formação social e psicológica da criança no meio escolar, desde o
vigilante até a direção, objetivando o desenvolvimento e a aprendizagem da criança como um
todo. Segundo a Constituição Federal Brasileira sobre a quem compete à obrigação, afirma no
art. 205 que:
A educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho (CONSTITUIÇÃO FEDERAL DO BRASIL, 1988).
Mesmo assim, ainda há contradição entre a realidade das políticas públicas, que não
conseguem oferecer instrumentos para que as pessoas melhorem de fato suas condições sociais
de vida dificultando ainda mais a realidade de desigualdade nas escolas e os escritos nas leis
que regem a educação nacional.
De acordo com as pesquisas realizadas com dez professores do Ensino Fundamental ll,
que lecionam no 9º ano da escola Municipal Elpídio Reis, cada um em sua área de
conhecimento, percebe-se que 85% dos entrevistados possuem a idade média de 30 a 45 anos
e que 15% encontra-se na faixa etária entre 20 e 30 anos de idade. Constatou-se através das
respostas obtidas que boa parte dos professores possui conhecimento sobre tema abordado a
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eles, com as mais diversas formas de analisar sobre a pobreza e a desigualdade social na escola
Elpídio Reis, se mostrando interessados e abertos para troca de ideias, relacionadas ao tema,
gerando uma desconstrução de pensamentos, algo de grande importância para a uma nova
construção de valores.
Quanto à recepção às crianças pobres por parte dos docentes, 85% dos entrevistados
afirma que as crianças são bem recebidas, de forma igualitária, não havendo distinção ou
discriminação no meio escolar, independente da sua classe social. Mostrando assim que uma
boa parte dos professores prioriza um ambiente acolhedor, objetivando um trabalho de
aprendizagem mais prazeroso para crianças.
Sobre tal perspectiva, Reda e Ujiie (2009) afirmam:
Criar um clima propício de aproximação não é tão simples. É preciso um olhar cuidadoso e atento para perceber o que aproxima as crianças. Esse tipo de ação contribui para a consolidação de vínculos afetivos e de vivência. Nesses casos, o que está em jogo é o exercício da convivência, são as pequenas ações que fazem prevalecer à comunhão de uns com os outros, a socialização, enfim a efetivação do processo de adaptação de sucesso. (REDA e UJIIE, 2009, p. 10087).
Acolher bem a criança pobre no ambiente escolar possibilitará ao professor desenvolver
um vínculo afetivo que vai ser de grande importância para um pleno desenvolvimento dessa
criança na escola, em contrassenso a isso, 15% dos entrevistados disseram que os alunos pobres
não são bem recebidos na escola Municipal Elpídio Reis, ou seja, não tem acolhimento.
Quando indagado aos professores se a situação de pobreza influência o cognitivo, 57%
mencionaram que influencia de forma indireta, pois a criança tem o apoio da escola, mas sofre
com a falta de oportunidades, recebe menos estímulo, menos atenção por parte da família,
alimentação inadequada e infelizmente convive com situações de desigualdades que tende
afetar o cognitivo e seu rendimento escolar; 23% disseram que não, mas que a ajuda da família
em casa é essencial para que o aluno desenvolva na escola.
Toda escola precisa de ações que venham atender a classe dos menos favorecidos,
buscando sempre uma ideologia de igualdade e inclusão, para que o educando tenha um pleno
desenvolvimento. Quando perguntado sobre essas ações aos professores 71% disseram que,
especificamente, para a criança pobre não havia ou desconheciam ações por parte da escola
para atender as crianças mais pobres, mas que cada professor tinha o cuidado de observar essas
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questões de desigualdades, através do diálogo e por conhecer melhor o aluno e dar maior
atenção à criança que está com dificuldade no estudo ou com problemas de comportamento.
Segundo uma professora de Língua Portuguesa, ações voltadas especificamente para a
classe pobre, já seria considerado uma desigualdade que é um problema que não está ao alcance
direto da escola, mas em longo prazo, já que é da educação, de uma boa formação, que se pode
melhorar as condições econômicas e sociais. Já 29% disseram que sim, que a escola Municipal
Elpídio Reis é uma escola que pensa no aluno em sua totalidade, falando sobre as diferenças
em sala de aula, dividindo o material de forma igualitária, promovendo projetos e ações
comunitárias, mostra pedagógica, abordando temas que conscientizam os alunos a respeito das
desigualdades sociais e como agir diante dela.
Sabendo que a escola é responsável em transmitir o conhecimento de forma plena, foi
perguntado aos professores, o que enquanto profissional da educação, faz para amenizar os
conflitos entre a pobreza e a desigualdade no âmbito da escola Municipal Elpídio Reis, 100%
dos entrevistados disseram que buscam, através de projetos e ações sociais, mobilizar toda a
comunidade escolar, com palestras e debates sobre assuntos de conscientização a igualdade
social, filmes educativos que orientem os alunos sobre respeitar uns aos outros, independente
da classe social, procurando identificar o aluno sem evidenciar, ficando atentas as atitudes dos
alunos para que ao surgirem conflitos possam resolvê-los de maneira acolhedora.
Com a pesquisa realizada com os professores, percebe-se que, de forma geral, eles
desconhecem sobre práticas reais e cotidianas que venha a corroborar com a situação de
pobreza e desigualdade na escola Elpídio Reis e que em suas práticas pedagógicas fazem
intervenções, que tem como objetivo imediato apaziguar situações de desigualdade no âmbito
da escola.
A esse respeito Ortega, (2002:143), afirma que:
O conflito emerge em toda situação social em que se compartilham espaços, atividades, normas e sistemas de poder e a escola obrigatória é um deles. Um conflito não é necessariamente um fenômeno da violência, embora, em muitas ocasiões, quando não abordado de forma adequada, pode chegar a deteriorar o clima de convivência pacífica e gerar uma violência multiforme na qual é difícil reconhecer a origem e a natureza do problema. (UNESCO, UCB, 2002).
Trabalho de Conclusão de Curso 12
No entanto juntamente com a entrevista com os professores foi realizada uma pesquisa
de campo com os alunos do 9º ano, com a faixa etária que variava entre as idades de treze a
dezessete anos, que tinha como objetivo principal indagá-los a respeito de como veem a
situação da pobreza e desigualdade e se já presenciaram qualquer tipo de discriminação social,
foi descrevido por 57% dos alunos que são bem recebidos na escola Elpídio Reis e 33%
disseram que não, que a escola não os acolhe bem. Através das respostas percebe-se que
existem alunos que acham que a escola Elpídio Reis é de fato acolhedora e sem problemas de
questão social, mas outra parte que diz não estarem felizes com a maneira em que são vistos
no ambiente escolar, gerando na criança um conflito interior não somente em decorrência da
idade, mas de um sistema falho que não reconhece que a pobreza e a desigualdade influenciam
na aprendizagem.
De acordo com Weiss (1997): o problema da dificuldade do aluno em aprender pode
estar ligado a fatores tanto internos quanto externos:
Essa insuficiência na aprendizagem escolar pode estar ligada à ausência de estrutura cognoscitiva, que permite a organização dos estímulos e favorece a aquisição dos conhecimentos. Todavia, a dificuldade em aprender pode estar relacionada a determinantes sociais, da escola e do Olhar de professor, própria aluno, ou seja, ligada a fatores internos (cognitivos e emocionais) e a fatores externos (culturais, sociais e políticos) (WEISS, 1997, p. 16).
Quando perguntado se todos os alunos têm o mesmo direito independente da condição
social às respostas foram as mais diversas, 61% disseram que sim, que todos têm o mesmo
direito na escola e 39% descreveu que não, que alguns eram tratados de maneira diferenciada,
com mais vantagens que outros, também disseram que já presenciaram discriminação, mas que
quando isso ocorria os professores agiam para que fosse explicado e resolvido o problema. Foi
observado que os alunos que se mostram insatisfeitos com a maneira que a escola os trata,
relaciona essa atitude ao fato de não aceitarem regras colocadas pela escola, como uniformes,
celulares, disciplina, horário de entrada, atitudes compatíveis com a adolescência.
Um dado importante nessas respostas recebidas dos alunos foi com relação se a criança
em desigualdade social tem um bom desenvolvimento cognitivo, 61% dos alunos disseram que
não, que quando vem do trabalho com fome, ou trabalham a noite, chegam sonolentos,
dificultando a concentração em sala de aula. Essa devolutiva dos alunos tem mostrado que
trabalhar no período da noite, não se alimentar corretamente, perder horas de sono, tem afetado
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no desenvolvimento e no rendimento escolar desses alunos, eles alegam procurar trabalho para
ajudar no sustento de casa e poderem comprar objetos pessoais.
Na última questão os alunos emitiram sugestões para a escola amenizar os conflitos
gerados pela pobreza e desigualdade social entre os alunos. Um dos entrevistados garante: “Em
minha opinião classe social não define caráter, cada um tem o seu desempenho para ter uma
mente brilhante, para ser um grande profissional na sua área escolhida”. Outra entrevistada
sugeriu: “Mais ações de conscientização na escola”. O aluno do 9º ano recomendou: “Mais
momentos cívicos”. Já o aluno de 13 anos indica: “Fazer mais atividades dentro da escola
mostrando que todos são iguais e têm os mesmos direitos”. A aluna complementa: “Criar
projetos para incentivar jovens e crianças, palestras educativas e debates em sala”.
A forma como o aluno vê e reage diante do tema pobreza e desigualdade no ambiente
escolar, mostra que compreende ser sujeito de direitos, mas desconhece de que forma esses
direitos acontecem, sempre colocando em evidência que existe a necessidade de ações,
palestras, atividades contínuas na escola. Reconhecer que o problema existe já e um passo para
que de fato ocorram mudanças significantes.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O artigo teve como objetivo averiguar os aspectos da pobreza e a desigualdade na
infância da Escola Municipal Elpídio Reis em Campo Grande/MS. Durante a pesquisa
realizada na escola, com os professores e alunos do 9º ano pode-se perceber que ocasionou uma
desestabilização de ideias a respeito do tema proposto e que a reprodução da desigualdade
ocorre de forma silenciosa no ambiente escolar, fato evidenciado nas palavras dadas através do
questionário realizado.
O problema da pobreza e da desigualdade social vai muito além do ambiente escolar,
que também espera apoio do estado e de políticas públicas por melhores condições de
igualdade. O trabalho de campo trouxe à tona uma questão muito importante de ordem social,
que é o aluno que trabalha no período noturno, e chega à escola extremamente cansado, sem
alimentação e condições psicológicas para a aprendizagem.
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Assim, evidenciou que na escola a desigualdade social é diariamente reproduzida nas
relações que ocorrem entre professores e alunos, mas que estes se utilizam de ações e
estratégias de curto prazo para uma solução imediata. Espera-se que este estudo se configure
como ponto de partida para que investiguem a reprodução da desigualdade social na escola e
que possam buscar através destas breves reflexões, alternativas para desestabelecer os
conceitos que se encontram no ambiente escolar.
REFERÊNCIAS
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