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Trabalho de Conclusão de Curso A ESCOLA COMO ESPAÇO PARA GARANTIA DE CIDADANIA Gisele da Rosa Antônio Resumo: Esta pesquisa objetivou verificar junto à Escola Municipal Professora Marlene Noronha Gonçalves, situada em Três Lagoas/MS, a utilização de estratégias que promovam a cidadania do aluno, bem como estimulem a sua participação de forma ativa na sociedade em que se insere, partindo-se do pressuposto de que a educação, enquanto responsável pela aprendizagem dos mais diversos segmentos na vida do sujeito, pode, de fato, colaborar para a construção de condições mais efetivas de cidadania dos mesmos, a partir da sua instrumentalização. A pesquisa foi realizada a partir do contato e de entrevistas semiestruturadas com profissionais da Coordenação Pedagógica e docência e Escola. Palavras-chave: Estratégias. Educação. Cidadania. Efetivação. 1. INTRODUÇÃO Esta pesquisa objetivou verificar junto à Educação, suas possibilidades de colaboração para a garantia de cidadania do aluno, de forma que fosse possível identificar estratégias utilizadas pela Escola Professora Marlene Noronha Gonçalves para este fim. Haja vista as grandes dificuldades e desigualdades vivenciadas pelos indivíduos nesta sociedade, e juntamente com estas, as situações de sofrimento e falta de condições dignas de sobrevivência, acredito ser crucial pensar neste momento de que forma tem se estimulado e concretizado a condição de cidadão deste sujeito, enquanto possuidor de direitos, e a quem se deveria garantir o mínimo para uma vida digna e satisfatória. Contudo, refletir as condições de preparo do mesmo para o seu exercício de cidadania, se trata de uma questão complexa e delicada, pois, muito além de observar as condições de sua família e responsável neste papel, nos implica verificar como a Escola tem tratado deste assunto, uma vez que, representante do Estado e responsável por muito no que se refere a aprendizagem e ao desenvolvimento de seu aluno, significativamente pode colaborar neste processo, de desenvolvimento do cidadão de direitos, agregando-o conhecimento e autonomia perante os processos de vida enquanto ser humano.

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Trabalho de Conclusão de Curso

A ESCOLA COMO ESPAÇO PARA GARANTIA DE CIDADANIA

Gisele da Rosa Antônio

Resumo: Esta pesquisa objetivou verificar junto à Escola Municipal Professora Marlene

Noronha Gonçalves, situada em Três Lagoas/MS, a utilização de estratégias que promovam a

cidadania do aluno, bem como estimulem a sua participação de forma ativa na sociedade em

que se insere, partindo-se do pressuposto de que a educação, enquanto responsável pela

aprendizagem dos mais diversos segmentos na vida do sujeito, pode, de fato, colaborar para a

construção de condições mais efetivas de cidadania dos mesmos, a partir da sua

instrumentalização. A pesquisa foi realizada a partir do contato e de entrevistas

semiestruturadas com profissionais da Coordenação Pedagógica e docência e Escola.

Palavras-chave: Estratégias. Educação. Cidadania. Efetivação.

1. INTRODUÇÃO

Esta pesquisa objetivou verificar junto à Educação, suas possibilidades de colaboração

para a garantia de cidadania do aluno, de forma que fosse possível identificar estratégias

utilizadas pela Escola Professora Marlene Noronha Gonçalves para este fim.

Haja vista as grandes dificuldades e desigualdades vivenciadas pelos indivíduos nesta

sociedade, e juntamente com estas, as situações de sofrimento e falta de condições dignas de

sobrevivência, acredito ser crucial pensar neste momento de que forma tem se estimulado e

concretizado a condição de cidadão deste sujeito, enquanto possuidor de direitos, e a quem se

deveria garantir o mínimo para uma vida digna e satisfatória.

Contudo, refletir as condições de preparo do mesmo para o seu exercício de cidadania,

se trata de uma questão complexa e delicada, pois, muito além de observar as condições de

sua família e responsável neste papel, nos implica verificar como a Escola tem tratado deste

assunto, uma vez que, representante do Estado e responsável por muito no que se refere a

aprendizagem e ao desenvolvimento de seu aluno, significativamente pode colaborar neste

processo, de desenvolvimento do cidadão de direitos, agregando-o conhecimento e autonomia

perante os processos de vida enquanto ser humano.

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2. CIDADANIA: UMA INTRODUÇÃO AO CONCEITO

Caracterizando-se por considerável relevância e complexidade, o conceito de

cidadania nos leva à reflexão à medida em que auxilia na compreensão da busca de uma

concretização mais efetiva de direitos. Cabe destacar a transformação do mesmo ao longo do

tempo, uma vez que, desde o seu início já não se fazia presente a igualdade para os cidadãos,

mas sim a exclusão social de acordo com a cor, raça e gênero principalmente, acentuando

desta maneira, a desigualdade entre as classes. Com o tempo, refletindo-se além do

estabelecimento de direitos e deveres, passou-se a buscar a garantia da integridade da

dignidade do sujeito, por meio da sua integração e interação com o meio social, de forma que

se constituísse participante de sua comunidade, e ainda que, lhe fosse proporcionada sua

autonomia. Para além da cidadania em termos de igualdade, passou-se a buscar também, o

direito ao desenvolvimento das suas subjetividades, com a observação e o respeito da

variedade de culturas (BARANOSKI; LUIS, 2016).

De acordo com Baranoski e Luis (2016) esta luta pela cidadania persiste por anos, e

perpassa as relações políticas e econômicas que se estabelecem na sociedade e que estão em

constante movimento, demandando de forma dinâmica e frequente a reavaliação do conceito,

e das suas condições de efetivação. São estas relações que definirão como e em qual

proporção a igualdade entre os sujeitos será exercida, sendo este exercício dependente de uma

participação ativa do indivíduo na sociedade em que se insere. Contudo, para que esta

participação seja satisfatoriamente atuante, torna-se necessário o compromisso do próprio

país com a responsabilidade de informar e ensinar a estes sujeitos sobre os seus direitos,

produzindo a igualdade de oportunidades para uma prática de cidadania mais real e próxima

da idealizada em normas legislativas, a fim da redução dos impactos causados pelas

desigualdades sociais tão presentes.

Pode-se entender que o termo, que já passou por várias reconstruções, já significou

simplesmente o direito ao voto, porém, é sabido que para que se torne presente a cidadania,

são necessárias condições básicas, que possibilitem o exercício do termo, como as

econômicas, políticas, sociais e culturais, cabendo lembrar da posse essencial de deveres e

direitos, para esta condição (COVRE, 1991). Sobre a complexidade para o entendimento do

assunto, a autora explana:

A cidadania está relacionada ao surgimento da vida na cidade, à capacidade

de os homens exercerem direitos e deveres de cidadão. Na atuação de cada

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indivíduo, há uma esfera privada (que diz respeito ao particular) e uma

esfera pública (que diz respeito a tudo que é comum a todos os cidadãos)

(COVRE, 1991, p. 18).

Ambrosini (2012, p. 44), baseado em algumas teorias por ele defendidas, trata a

seguir, também, de aspectos existentes nesta relação entre as particularidades e coletividades

que influenciam o desenvolvimento da cidadania do indivíduo, como se pode perceber:

O processo histórico, que se efetivou na modernidade, compreendeu muito

bem o aspecto da autonomia individual do sujeito em sua vida privada.

Exemplo disso é a constituição do conceito de sociedade civil, onde reúnem-

se todas as particularidades do homem singular (religião, profissão,

propriedade), garantindo a independência do sujeito em sua vida particular.

Porém, o que não se levou a cabo, e que Kant preconizou, foi o aspecto

coletivo da emancipação humana. Não basta estabelecer os direitos

individuais dos cidadãos, é necessário que a sociedade garanta o exercício

público e racional desses mesmos cidadãos. A filosofia de Kant fundamenta

muito bem o conhecimento e a ética a partir do sujeito racional e autônomo,

e também propõe a ideia de uma sociedade livre e emancipada, mas não

chega a construir uma teoria da ação para se atingir coletivamente este ideal.

A conquista da cidadania não se trata de um processo estático, simples ou rápido.

Mas diz, sim, de uma sequência de batalhas travadas ao longo do tempo, que perduram, de

forma dinâmica, complexa e singular, até os dias de hoje. Embora esteja preconizada como

dever obrigatório do Estado para com o sujeito, na realidade, muito se percebe a distância

entre as propostas, e o que se concretiza, sendo isto evidenciado pela desigualdade vivenciada

e percebida nesta sociedade, que muito sofre com a falta de condições mínimas e dignas para

viver. Estimular o exercício da cidadania é oportunizar a superação da precariedade das

condições de vida dos sujeitos, além de fortalecer a sua autonomia e independência no que se

refere ao seu próprio livre-arbítrio.

3. DIREITOS HUMANOS E CIDADANIA

A partir da Declaração Universal dos Direitos Humanos, de 1948, todas as pessoas

devem ter seus direitos garantidos e baseados na liberdade e igualdade, cabendo à cada

pessoa a responsabilidade pelo controle de sua própria vida; direito à condições satisfatórias

de educação, saúde e lazer; o direito à livre expressão de pensamento, consciência ou

religião; à instrução; à segurança pessoal; remuneração justa, enfim, de forma que seja

proporcionada a sua dignidade humana, bem como de sua família, dentre outros.

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Em Covre (1991), nota-se também, a exposição de deveres constituintes da cidadania

do sujeito, e que são referentes à: sua própria colaboração para efetivação dos direitos de

todos, no sentido de buscar permanentemente a sua concretização, por meio de: cumprimento

de regras estabelecidas coletivamente; participação do governo, tendo como exemplo o voto

consciente; exigência de ações do mesmo no que se refere à população, e aquilo que promete

garantir, entre outros. Contudo, são percebidas neste contexto, uma série de dificuldades para

a prática efetiva da cidadania, de forma que uma delas, consiste no jogo de interesses

existente por parte de quem detém o poder, e as escassas possibilidades para garantia destes

direitos e cidadania do povo.

A autora então, sugere a Constituição pertencente a cada país, como ferramenta para

reivindicação de direitos, e acredita nesta e na apropriação por parte do sujeito dos seus

espaços, como únicas possibilidades de enfrentamento político e, consequentemente, uma

prática efetiva da cidadania, o que segundo a mesma, definir-se-ia como instrumento crucial

para o estabelecimento de uma sociedade melhor. Assim sendo, a cidadania se concretiza

através das conquistas também batalhadas pelo próprio indivíduo, posto que estas lutas, lhe

promoveriam não apenas o alcance de condições básicas para sua existência, mas o

abarcamento desta na sua totalidade, considerando então, a função da vida humana no

Universo.

É possível observar cidadania além de um conjunto de direitos e deveres, como uma

construção que tem por finalidade o estabelecimento de condições favoráveis à garantia de

dignidade à vida do sujeito, envolvendo este processo, tamanha complexidade, que, deve ser

entendida de modo que todos os indivíduos passem por processos de aprendizagem, à medida

em que, se concretizem estratégias claras para promoção da cidadania, considerando que esta

deve estar baseada na justiça, democracia, na igualdade, equidade, e participação dinâmica de

todos os agentes envolvidos a sociedade. Isto denota a relevância da educação neste contexto,

e quão grandiosa pode ser a sua contribuição para vivências mais democráticas (BRASIL,

2007). Tida a cidadania como condição essencial ao ser enquanto sujeito, é preciso

considerar:

Convém, por isso, lembrarmos que a existência da cidadania como situação

histórica supõe, necessariamente, um complexo de condições políticas,

sociais, econômicas e culturais. Por exemplo, se uma sociedade não garante

que todas as pessoas tenham as mesmas oportunidades de acesso ao bem-

estar, à cultura e à educação em sentido amplo, tal sociedade apresenta

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déficits enormes de democratização de sua estrutura social e política. Isso

contamina, de forma nociva, o convívio cívico do corpo social, pois o hábito

de conviver com a injustiça, o desrespeito e a desigualdade torna todos(as)

os(as) habitantes de uma nação embrutecidos(as) e insensíveis à dor do

outro (PINZANI E REGO, 2016).

Refletir a cidadania e o direito à sua prática nos proporciona condições mais amplas

para a garantia de direitos, uma vez que, nos torna conhecedores das condições dignas e

preconizadas pelas políticas as quais deveríamos ter o acesso propiciado. Conhecer estas

premissas nos mune para a luta por uma vida mais digna, partindo-se do pressuposto de que

tal conhecimento e informação instrumentalizam o sujeito para a conquista dos direitos dos

quais se torna consciente, além do potencial deste processo de oferta de uma perspectiva

melhor de vida, bem como a sua qualidade, o que consequentemente também o fortalece

neste processo de reivindicação e conquista de direitos. Além de concretizar um de seus

direitos, por meio do exercício cidadão, o sujeito tem acesso à outros, que sem dúvida, lhe

serão positivos e somarão em suas vivências.

4. EDUCAÇÃO E A FORMAÇÃO DO ALUNO CIDADÃO

A partir desta ideia, presenciam-se questionamentos pertinentes sobre quais papéis

tem desempenhado a escola na vida de seus alunos, uma vez que, por um lado, valoriza-se a

aprendizagem de conteúdos disciplinares e curriculares, e por outro, não se tem visto um

olhar voltado também para o processo de formação ética e moral dos seus alunos, sendo

entendido que, desta forma, não abrange, enquanto instituição pública constituída para formar

as próximas gerações, a sua função de construção da cidadania. Neste contexto, entende-se

que a escola ainda deve se pautar em padrões de convivência que concretizem a democracia,

a inclusão e a qualidade do ensino. Ressalta-se que tais valores não passam pela questão do

ensino em si necessariamente, bem como não são inatas, mas são desenvolvidos nas relações

e experiências do indivíduo, conforme elas se dão (BRASIL, 2007). Portanto, é possível

notar:

A Declaração Universal dos Direitos Humanos, por conter o consenso da

comunidade internacional sobre os direitos considerados fundamentais o ser

humano, pode ser um guia de referência para a análise dos conflitos de

valores vivenciados em nosso cotidiano e para a elaboração de programas

educacionais que objetivem uma educação em valores. Se quisermos,

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portanto, promover uma educação ética e voltada para a cidadania, devemos

partir de temáticas significativas do ponto de vista ético (como é o caso

daquelas contidas na DUDH), propiciando condições para que os alunos e

alunas desenvolvam sua capacidade dialógica e desenvolvam a capacidade

autônoma de tomada de decisão em situações conflitantes do ponto de vista

ético/moral (BRASIL, 2007).

Desta maneira, é significativo considerar o que preconiza a Lei nº 9.394, de 20 de

dezembro de 1996, que estabelece as diretrizes e bases da educação nacional, uma vez que,

em seu texto, por vezes, é percebida a preocupação com a formação de cidadania do aluno,

nesta relação entre o mesmo e a educação. A partir desta, em suas disposições mais gerais, e

também na etapa voltada para o Ensino Médio, pode-se reafirmar que, a educação, aliada ao

Estado e à família, deve colaborar para a formação do aluno, de forma à prepara-lo para que

exerça a sua cidadania, dispendendo-se de seus instrumentos, metodologias e mesmo

conteúdos curriculares, para o alcance desta construção como uma de suas grandes

finalidades (BRASIL, 1996).

Entendendo que muitas vezes o indivíduo sequer conhece os seus direitos, condição

significativa para a garantia de sua cidadania, salienta-se a relevância de compreender a

questão que segue:

- De que forma a Escola pode colaborar para a ampliação do acesso à cidadania dos

seus alunos? – É interessante neste sentido apresentar, de forma breve e apenas para auxílio

na reflexão desta problemática, a importância atribuída por Freire (1987), ao conceito

entendido como emancipação. Em sua definição, o autor compreende o constructo como a

constituição ou a ampliação da capacidade do sujeito de reinvindicação e luta por condições

mais dignas no que se refere ao seu bem-estar físico, mental e psicossocial, o que de fato,

também possibilita as suas condições de cidadão. Onde cabe refletir se a Escola tem

colaborado de fato para esta emancipação defendida pelo autor, ou se, se mantém executando

a prática da “educação bancária” definida pelo mesmo, como aquela que apenas manipula e

oprime o sujeito, mantendo-o inerte e às margens desta sociedade, que é econômica e

socialmente favorável à uns, porém, não a todos. - ;

- São utilizadas estratégias para este fim?

Bem como defende Mendonça (2016), deve-se refletir sobre a escola como um espaço

de construção dos seus alunos, onde os mesmos tenham acesso à informação e

instrumentalização em relação aos direitos que deveriam ser garantidos, sendo que muitos ao

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menos tem consciência de que eles existem. Entretanto, não é o que se percebe na prática,

posto que, muitas vezes este espaço acaba por causar a reprodução de realidades difíceis e a

limitação de indivíduos que são submetidos a diversas vulnerabilidades.

Sendo assim, convém a realização de levantamentos e estudos de campo pertinentes

na área que se refira à educação e cidadania, observando o significativo potencial desta

relação para a melhoria da qualidade de vida dos indivíduos, e que nos permitam a promoção

de transformações sociais por meio de ações baseadas nestes estudos, tendo em vista a grande

vulnerabilidade observada em relação às pessoas nesta sociedade. Estas iniciativas permitirão

levantar algumas hipóteses a respeito da contribuição que a escola tem oferecido aos alunos

no que se refere à sua cidadania. Busca-se então pensar esta relação a partir do pressuposto de

que para que se desenvolva maior autonomia e senso crítico é preciso que o indivíduo seja

estimulado e direcionado para uma percepção mais ampla em relação a situação social do seu

país, e a sua própria realidade, podendo-se considerar as estratégias escolares como

ferramentas primordiais neste processo, seja por meio do esclarecimento, das informações

e/ou orientações prestadas (AMBROSINI, 2012). Em Brasil (2007), notam-se ideias que

reforçam os pensamentos expostos acima:

Dessa maneira, tanto em seu projeto político-pedagógico como em seu

planejamento institucional, a escola precisa considerar a realização de

projetos e ações que, ao mesmo tempo, promovam o acesso aos bens

culturais exigidos pela sociedade contemporânea e garantam uma formação

política aos jovens de modo a lhes permitir participar da vida social de

forma mais crítica, dinâmica e autônoma.

Embora sejam conhecidas muitas das dificuldades dos ambientes educacionais em

lidar com seu fluxo, como por exemplo: a quantidade considerável de alunos por turma; a

peculiaridade que cada um apresenta; a falta de recursos e materiais; a falta de capacitação de

alguns profissionais; a sua remuneração que muitas vezes é insatisfatória e geradora de

desmotivação, entre outros, ainda assim, é primordial que este sistema mantenha-se

comprometido com a efetivação de direitos dos seus alunos, a começar pelo incentivo, e à

construção sistemática de rotinas geradoras do exercício de cidadania, às muitas crianças e

adolescentes (quando adultos também) que passam pelo processo de escolarização.

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5. A ESCOLA

Este projeto propôs-se a verificar possibilidades de colaboração da Escola para a

concretização da cidadania do seu aluno, a medida em que se utiliza - ou não – de estratégias

para formação do aluno enquanto cidadão, em sua rotina diária, visando trabalhos

continuados que pratiquem o conceito, fortalecendo-o na comunidade. O Projeto foi realizado

na Escola Pública Municipal Professora Marlene Noronha Gonçalves, situada à Rua Manoel

Faria Duque, Nº 2142, Bairro Jardim Maristela, Três Lagoas/MS.

Próximo à Escola estão situados, principalmente, uma Unidade Básica de Saúde, um

Centro de Referência de Assistência Social e uma Creche, que atendem à população de suas

proximidades. Segundo o Censo 2014, a Escola oferece Educação Infantil e Ensino

Fundamental, conta com aproximadamente dezesseis salas de aula, 940 alunos

aproximadamente, 69 funcionários, e com uma estrutura aparentemente adequada, pois além

de possuir salas e espaço propícios para o trabalho dos profissionais, se constitui também em

Laboratório de Informática, Quadra de Esportes, banheiro adequado a alunos com deficiência

ou mobilidade reduzida – sendo as vias da Escola e dependências também acessíveis à este

público - salas de leitura, e Apoio Escolar para algumas disciplinas.

A referida Escola está localizada nas proximidades de conjuntos habitacionais

construídos e entregues pela Prefeitura deste município àqueles que se encaixam no critério

de baixa renda, podendo denotar dados interessantes à pesquisa e que se refiram às condições

socioeconômicas destes moradores, muitas vezes geradoras da violação de condições de

cidadania dos sujeitos, e de características do território.

6. METODOLOGIA

Foram aplicados questionários e entrevistas semiestruturadas com duas professoras,

dois alunos de quinto (5º) ano, do período Matutino, e duas coordenadoras pedagógicas da

Escola Municipal Marlene Noronha Gonçalves – situada no município de Três Lagoas/MS.

As entrevistas foram adaptadas a partir das que constituem a pesquisa de Silva (2000), que

buscou estudar alguns aspectos existentes na relação entre a Escola pública e a formação da

cidadania, que foram pertinentes a este trabalho, e que sem dúvidas auxiliaram no seu

desenvolvimento.

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O questionário utilizado com as profissionais da educação é composto pelos quatro

seguintes segmentos: Identificação; Escolaridade; Condições Socioeconômicas, e Experiência

Profissional. As entrevistas são compostas por vinte e duas questões que buscaram alcance de

informações acerca da dinâmica e funcionamento da Escola, rotina destes profissionais,

entendimento dos mesmos em relação aos temas propostos, dentre outros, e por fim, quais

seriam/são as possibilidades de contribuição da Escola para a efetivação de cidadania do

aluno. Já a entrevista aplicada nos alunos é composta por quatro (4) tópicos, que buscam

responder questões referentes à: suas identificações e características; sua relação com a

escola; com a comunidade, e com a sociedade. Responderam aos instrumentos, ao total, seis

participantes, cinco do sexo feminino e um do sexo masculino.

A primeira participante (P1) possui especialização em Psicopedagogia, trabalha na

área da educação há onze anos e seis meses aproximadamente, e o seu cargo é de

Coordenadora Pedagógica. A segunda participante (P2) possui Especialização em Educação

Infantil, trabalha no campo educacional há quinze anos, e o seu cargo também é referente a

Coordenação Pedagógica. A terceira participante (P3) possui Especialização em Gestão

Educacional, exerce atividade laboral referente a educação há vinte e dois anos, e a sua

função é Professora Regente.

7. RESULTADOS E DISCUSSÃO

Quanto aos dados coletados, serão aqui consideradas algumas observações mais

relevantes para a pesquisa, e que auxiliarão na compreensão de possíveis respostas

encontradas pela mesma.

Percebeu-se que, no que se refere à característica diferenciada da escola, para P1 e P2,

a resposta está relacionada ao público mais especificamente, pela sua vulnerabilidade

econômica e social e também pelas dificuldades encontradas para uma participação maior das

famílias junto à Educação. Estas participantes também, mesmo em entrevistas individuais,

concordam sobre o alto índice de evasão escolar, que ainda, é associado pelas mesmas à falta

de cumprimento da família com as suas responsabilidades no ensino do aluno, sendo este fato

potencialmente prejudicial a sua aprendizagem.

Já P3 e P4 demonstraram acreditar que a união e a simplicidade das suas colegas de

trabalho, bem como a sua receptividade, sejam os diferenciais da Instituição, alegando que

tais características tornam o ambiente mais favorável e confortável para o trabalho. As

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mesmas relataram não haver altos índices de evasão escolar, e inclusive, P3 acredita que as

constantes avaliações do aluno realizadas auxiliam no controle da evasão, enquanto P4 o

associa aos benefícios ofertados pelo Governo, Bolsa Família e Bolsa Escola.

Quanto ao significado do termo cidadania, P1 e P2 mostraram entendimentos

semelhantes, ao exporem que acreditam em uma visão voltada tanto para direitos, quanto

para deveres, e para o cumprimento pontual destes. P3 acredita no acesso a direitos básicos

como alimentação, educação e moradia, e P4 considera relevante o mérito de cada indivíduo

na busca por seus próprios direitos, mostrando sua crença no fato de que muitas vezes a

acomodação pessoal não permite tal conquista.

Foi bastante interessante observar qual o posicionamento das mesmas em relação ao

conceito de direitos humanos, sendo que: para P1, a sua efetividade é evidenciada apenas

para os criminosos, e de acordo com a sua visão, apenas os “bandidos” fazem uso da sua

proteção e utilidade, pois a mesma acredita que pessoas honestas não fazem proveito de tais

direitos; P2 alega claramente o desconhecimento do conceito, afirmando que o sabe apenas

muito superficialmente, e mencionando a negligência da mídia em não divulgá-lo, atribuindo

a mesma o papel de fazê-lo; P3 não fez diferenciação na conceituação dos temas apresentados

pela questão (cidadania e direitos humanos), e P4 a relaciona com critérios referentes ao

mérito individual na conquista de direitos. As quatro participantes foram unânimes ao se

afirmarem cidadãs.

Quando questionadas sobre o conhecimento de Leis como a Constituição, Plano de

Cargos salariais do Estado e o Estatuto da Criança (ECA), as respostas foram similares e

demonstraram certa limitação no conhecimento das Leis. Embora as participantes tenham

afirmado sobre a disponibilização de outros tipos de documentos pela escola, as mesmas

relataram conhecimento mais próximo apenas do ECA, e P2 acrescentou contato mais

profundo com as Leis e Diretrizes Básicas da Educação (LDB), posto que as mesmas

“amparam a educação”.

Sobre contribuições da Secretaria de Educação para a realização do trabalho na

escola, as participantes deram respostas positivas, mencionando que a mesma oferece cursos

de formação, orientações pedagógicas, promove a viabilização de projetos e capacitações

continuadas. Em relação a autonomia da escola para a execução do trabalho pedagógico, três

participantes afirmaram ser presente a flexibilidade para o desenvolvimento pedagógico,

entretanto, duas destas, enxergam também os limites desta flexibilização, demonstrando que a

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autonomia da escola acontece de forma parcial, e que existem padrões a serem seguidos, e

contudo, a quarta participante relatou não perceber esta autonomia, posto que visualiza

constantemente uma hierarquia e o controle exercido pelo sistema na sociedade.

8. CONSIDERAÇÕES FINAIS

A escola pode colaborar com a efetivação da cidadania de seus alunos, à medida em

que se utiliza de estratégias para este fim, e busca garantir a sua promoção nas rotinas diárias,

por meio de ações colaborativas para este processo, formando alunos mais críticos e

conscientes das suas realidades. Para tal podem ser executadas estratégias e iniciativas

baseadas em conhecimentos e na instrumentalização destes alunos, no que se refere aos

Direitos Humanos.

Contudo, estas estratégias devem demonstrar eficiência na sua concretização, à

medida em que ocorrem de forma organizada, e ainda, que são acompanhadas e avaliadas de

acordo com a realidade do aluno.

Acredita-se que a transformação social tão necessária e desejada por aqueles que se

preocupam com realidades baseadas em equidade, só se fará possível a partir da

conscientização de seus sujeitos, e de seus direitos, para então, uma possível reivindicação

dos mesmos, constituindo-se este no primeiro passo para este processo de luta, e então para a

efetivação da cidadania do aluno.

9. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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BARANOSKI, M. C. R., LUIZ, D. E. C. Cidadania: sistematizando fundamentos teóricos e

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Trabalho de Conclusão de Curso

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MENDONÇA, E. F. Pobreza, Direitos Humanos, Justiça e Educação. Curso de

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PINZANI, A., REGO, W. L. Pobreza e Cidadania. Curso de Especialização Educação,

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possibilidades e limites. Universidade de São Paulo, Faculdade de Educação. Tese de

Doutorado, 2000.