o centro - n.º 69 – 05.06.2009

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DIRECTOR JORGE CASTILHO | Taxa Paga | Devesas – 4400 V. N. Gaia | Autorizado a circular em invólucro de plástico fechado (DE53742006MPC) ANO IV N.º 69 (II série) 29 de Maio de 2009 1 euro (iva incluído) Telef.: 309 801 277 Rua da Sofia, 95 - 3.º - 3000-390 COIMBRA Imagens evocam Crise Académica FOI HÁ 40 ANOS PÁG. 11 EM COIMBRA NOVA “LINGUAGEM” PÁG. 22 PÁG. 5 Diário de Torga “traduzido” para sms Romaria do Espírito Santo renovada PÁG. 23 e 24 HOJE É DIA MUNDIAL Renováveis são aposta no sector da energia PÁG. 12 a 13 CELEBRA-SE NA PRÓXIMA SEGUNDA-FEIRA, 1 DE JUNHO Dia Mundial da Criança As crianças são o futuro de cada País, são o futuro da Humanidade. Em Portugal o número de crianças está a diminuir de forma muito preocupante, sobretudo no interior do País. Em contrapartida em São Tomé (imagem) o elevado número de crianças faz ter esperança no porvir

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Versão integral da edição n.º 69 do quinzenário “O Centro”, que se publica em Coimbra. Director: Jorge Castilho. 5.06.2009. Visite-nos em www.ismt.pt, www.youtube.com/youtorga, http://torgaemsms.blogspot.com, http://diarioxii.blogspot.com, http://torgaemsms2.blogspot.com, http://mapastorga.blogspot.com/ ~~~~~~~~~ Site oficial de Dinis Manuel Alves: www.mediatico.com.pt Encontre-nos no twitter (www.witter.com/dmpa) e no facebook (www.facebook.com/dinis.alves). Outros sítios de DMA: www.youtube.com/mediapolisxxi, www.youtube.com/fotographarte, www.youtube.com/tiremmedestefilme, www.youtube.com/camarafixa, http://videos.sapo.pt/lapisazul/playview/2, http://videos.sapo.pt/lapisazul/playview/3 e em www.mogulus.com/otalcanal Ainda: www.mediatico.com.pt/diasdecoimbra/ , www.mediatico.com.pt/redor/ , www.mediatico.com.pt/fe/ , www.mediatico.com.pt/fitas/ , www.mediatico.com.pt/redor2/, www.mediatico.com.pt/foto/yr2.htm, www.mediatico.com.pt/manchete/index.htm , www.mediatico.com.pt/nimas/ www.mediatico.com.pt/foto/index.htm , www.mediatico.com.pt/luanda/, www.slideshare.net/dmpa , www.panoramio.com/user/765637

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Page 1: O Centro - n.º 69 – 05.06.2009

DIRECTOR JORGE CASTILHO

| Taxa Paga | Devesas – 4400 V. N. Gaia |Autorizado a circular em invólucrode plástico fechado (DE53742006MPC)

ANO IV N.º 69 (II série) 29 de Maio de 2009 � 1 euro (iva incluído)

Telef.: 309 801 277Rua da Sofia, 95 - 3.º - 3000-390 COIMBRA

ImagensevocamCriseAcadémica

FOI HÁ 40 ANOS

PÁG. 11

EM COIMBRA NOVA “LINGUAGEM”

PÁG. 22PÁG. 5

Diáriode Torga“traduzido”para sms

Romariado EspíritoSantorenovada

PÁG. 23 e 24

HOJE É DIA MUNDIAL

Renováveissão apostano sectorda energia

PÁG. 12 a 13

CELEBRA-SE NA PRÓXIMA SEGUNDA-FEIRA, 1 DE JUNHO

Dia Mundial da Criança

As crianças são o futuro de cada País, são o futuro da Humanidade. Em Portugal o número de crianças está a diminuir de forma muito preocupante,sobretudo no interior do País. Em contrapartida em São Tomé (imagem) o elevado número de crianças faz ter esperança no porvir

Page 2: O Centro - n.º 69 – 05.06.2009

2 29 DE MAIO DE 2009EDITORIAL

Director: Jorge Castilho(Carteira Profissional n.º 99)

Editor/Propriedade: AudimprensaNIF: 501 863 109

Sócios: Jorge Castilho e Irene Castilho

ISSN: 1647-0540

Inscrito na DGCS sob o n.º 120 930

Composição e montagem: AudimprensaRua da Sofia, 95, 2.º e 3.º - 3000-390 Coimbra

Telefone: 309 801 277 - Fax: 309 819 913

e-mail: [email protected]

Impressão: CORAZEOliveira de Azeméis

Depósito legal n.º 250930/06

Tiragem média: 5.000 exemplares

Aos Assinantes do “Centro”Como tem sido bem evidente nas notícias vindas a público, o sector da comunicação socialé um dos mais afectados pela crise que se abateu sobre toda a sociedade, sobretudo pelo brutaldecréscimo nos investimentos publicitários.Perante isto, até os grandes grupos de comunicação social estão a fazer despedimentosem massa, para além de haver muitos jornais regionais que se viram já obrigadosa suspender a publicação.Aqui no “Centro” estamos a fazer um enorme esforço para superar as dificuldades.Mas esse esforço só será bem sucedido se conseguirmos receitas de publicidade e se os nossosAssinantes tiverem a gentileza de proceder ao pagamento da respectiva assinatura anual- que se mantém em 20 euros desde o início do jornal.Se quer que esta tribuna livre possa manter-se, muito agradecemos que nos envie o pagamentoda sua assinatura - uma verba que representa apenas o equivalente a cerca de 5 cêntimos por dia,menos de 40 cêntimos por semana!Outra forma de ajudar este projecto independente é conseguir-nos novos Assinantes,por exemplo entre os seus familiares e amigos (veja a página ao lado).

Contamos consigo!

Jorge [email protected]

Celebra-se hoje, 29 de Maio, o DiaMundial da Energia.

E na próxima segunda-feira, 1 deJunho, o Dia Mundial da Criança.

Esta coisa dos “dias disto e daqui-lo” tem um efeito positivo, que é o deser pretexto para iniciativas diversaspara celebração das datas, muitas dasquais se destinam a chamar a aten-ção do público para realidades e pro-blemas que, nos restantes 364 dias doano, quase sempre são ignorados.

Também os órgãos de comunicaçãosocial – alguns deles, pelo menos –dedicam espaço e tempo a estas efe-mérides, assim contribuindo para lan-çar alertas, apontar exemplos, denun-ciar situações anómalas.

O “Centro” é um dos que tenta as-sumir esse papel de serviço público,divulgando trabalhos sobra os temasem apreço, fazendo-se eco de aspec-tos que reputa importantes e/ou inte-ressantes.

Ora a verdade é que estas duas efe-mérides bem merecem destaque, ta-manha é a sua importância no presentee para o futuro.

Invertendo a ordem cronológica,deve falar-se primeiro das Crianças,porque tantos problemas existem comelas relacionados e porque são elas ofuturo da Humanidade.

E há tantas, na maior parte dos paí-ses do Mundo, a sofrer precocemen-te, a ser tratadas com negligência pe-los próprios pais – em alguns casospor ignorância, noutros por delibera-da incúria.

Para já não falar de situações verda-deiramente criminosas, que vão desde

A energia e as criançaso trabalho escravo até à prostituição for-çada, da venda como mercadoria até aotráfico para utilização de órgãos!

Importa, por isso, denunciar as si-tuações abusivas, diligenciar no sen-tido de formação dos pais, criar es-truturas de apoio à infância.

Mas exige-se, de igual modo, queaumentem os apoios sociais para quemtem filhos, de molde a tornar a mater-nidade e a paternidade menos proble-máticas, com menores custos para osprogenitores e até com estímulos paraque os jovens adultos se decidam ater mais filhos e a tê-los mais cedo.

Porque o que está a suceder, desdehá vários anos, é que o índice de na-talidade tem vindo a baixar de formadrástica, os casais têm menos filhos ede cada vez os têm numa idade maisavançada. A população portuguesa sónão está ainda mais reduzida porqueas pessoas estão a viver mais tempo.

Ora a gravíssima situação em queo País está mergulhado só deveráagravar ainda mais este problema danatalidade. Caso não sejam criadosmais e melhores apoios, é natural (e écompreensível!) que os jovens casaisadiem o seu desejo de ter filhos, porestarem receosos de não disporem decondições para lhes proporcionar tudoaquilo de que eles carecem.

E até mesmo a rectaguarda familiar,até há pouco constituída, sobretudo,pelos avós, que davam uma preciosaajuda nos mais diversos domínios, estátambém profundamente afectada pelacrise, não podendo prestar o auxílioque desejaria.

Esta uma realidade que não podeser escamoteada, ignorada ou disfar-

çada, pois isso acarretará terríveisefeitos para o futuro do País.

Graves consequências, não só parao País mas para todo o Mundo, terátambém a forma desregrada comocontinuam a consumir-se, em todo oMundo, os combustíveis fósseis, exau-rindo as reservas que a Natureza foigerando ao longo de milhões de anos.

Neste domínio, é justo referir queem Portugal se tem vindo a fazer ummeritório esforço no sentido de esti-mular o recurso às energias renová-veis, desde a solar à eólica, passandopela hídrica.

Aliás, recentemente surgiram alician-tes apoios do Estado (benefícios fis-cais, subsídios e linhas de crédito bo-nificado) a quem queira optar por estetipo de energias alternativas.

Deve reconhecer-se, repito, que nes-ta área Portugal está na linha da fren-te, até mesmo a nível mundial.

Mas tal não deve ser razão paradescurar esta matéria. Porque aindahá muito a fazer, quer em medidas defundo, a tomar pelas diversas entida-des públicas e privadas, quer nos pe-quenos gestos do dia-a-dia, que cadaum de nós deve adoptar no seu com-portamento, transformando em rotinageneralizada o que hoje é quase umaexcepção.

Dou a seguir apenas alguns exemplosfáceis de adoptar, e que, para além debeneficiarem não só a nós próprios, maso porvir de toda a Humanidade, têm ain-da a vantagem de representar uma sig-nificativa poupança, numa altura em queo Mundo tenta enfrentar uma das maio-res crises de sempre.

Eis as sugestões: a adopção de lâm-

padas amigas do ambiente; a aquisi-ção de aparelhos eléctricos com me-nores consumos; desligar todos os apa-relhos (televisores, videos, computa-dores, etc.) em vez de os deixar nomodo “stand by”; desligar os carre-gadores de telemóveis e outros das to-madas, quando não estão a ser utili-zados; fechar as torneiras enquanto seescovam os dentes ou, no duche, en-quanto se ensaboa o corpo; utilizar asescadas em vez dos elevadores, sem-pre que possível (porque até faz bemà saúde, pois é um bom exercício paraquem leva uma vida sedentária); nãousar o automóvel para pequenos per-cursos ou quando existem transportespúblicos eficientes; apagar as luzessempre que elas não são necessáriase acendê-las apenas quando tal se jus-tifica; não abusar dos aparelhos de arcondicionado e de outros equipamen-tos para aquecer ou arrefecer as re-sidências e os locais de trabalho; ins-talar painéis solares para o aquecimen-to de água; aproveitar os apoios paraa instalação, em residências e outrosedifícios, de painéis fotovoltaicos emini-eólicas para produzir energia.

Continuemos a aproveitar, cada vezmais e cada vez melhor, os recursosnaturais com que o nosso País foi ba-fejado – o sol luminoso durante grandeparte do ano, o vento que sopra por todoo País, os cursos de água que corremao longo do nosso território, as ondasdo mar na nossa extensa costa.

E sensibilizemos as nossas crianças,em casa e nas escolas, para a neces-sidade de poupar água e energia.

Assim estaremos a zelar pelo futu-ro das gerações vindouras – e essa éuma responsabilidade comum, de queninguém deve alhear-se!

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329 DE MAIO DE 2009 COIMBRA

Temos uma excelente sugestãopara uma oferta a um Amigo, a umFamiliar ou mesmo para si próprio:uma assinatura anual do jornal“Centro”

Custa apenas 20 euros e ainda re-cebe de imediato, completamentegrátis, uma valiosa obra de arte.

Trata-se de um belíssimo trabalhoda autoria de Zé Penicheiro, expres-samente concebido para o jornal“Centro”, com o cunho bem carac-terístico deste artista plástico – umdos mais prestigiados pintores portu-gueses, com reconhecimento mesmoa nível internacional, estando repre-sentado em colecções espalhadas porvários pontos do Mundo.

Neste trabalho, Zé Penicheiro,com o seu traço peculiar e a incon-fundível utilização de uma invulgarpaleta de cores, criou uma obra quealia grande qualidade artística a umprofundo simbolismo.

De facto, o artista, para represen-tar a Região Centro, concebeu umaflor, composta pelos seis distritos queintegram esta zona do País: Aveiro,Castelo Branco, Coimbra, Guarda,Leiria e Viseu.

Cada um destes distritos é repre-sentado por um elemento (remeten-do para o respectivo património his-tórico, arquitectónico ou natural).

A flor, assim composta desta for-

ma tão original, está a desabrochar,simbolizando o crescente desenvolvi-mento desta Região Centro de Portu-gal, tão rica de potencialidades, de His-tória, de Cultura, de património arqui-tectónico, de deslumbrantes paisagens(desde as praias magníficas até às ser-ras imponentes) e, ainda, de gente hos-pitaleira e trabalhadora.

Não perca, pois, a oportunidade dereceber já, GRATUITAMENTE ,esta magnífica obra de arte (cujas di-mensões são 50 cm x 34 cm).

Para além desta oferta, o beneficiá-rio passará a receber directamente em

sua casa (ou no local que nos indicar),o jornal “Centro”, que o manterásempre bem informado sobre o que demais importante vai acontecendo nes-ta Região, no País e no Mundo.

Tudo isto, voltamos a sublinhá-lo,por APENAS 20 EUROS!

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Para tanto, basta cortar e preen-cher o cupão que abaixo publicamos,e enviá-lo, acompanhado do valor de20 euros (de preferência em chequepassado em nome de AUDIMPREN-SA), para a seguinte morada:

AUDIMPRENSAJornal “Centro”

Rua da Sofia. 95 - 3.º3000–390 COIMBRA

Poderá também dirigir-nos o seu pe-dido de assinatura através de:

� telefone 309 801 277� fax 309 819 913� ou para o seguinte endereço

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Para além da obra de arte que des-de já lhe oferecemos, estamos a pre-parar muitas outras regalias para osnossos assinantes, pelo que os 20 eu-ros da assinatura serão um excelenteinvestimento.

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A Baixa de Coimbra vai surgir ama-nhã (sábado, dia 30) muito animada ecolorida.

Trata-se do “Mercado de Flores ePlantas”, que decorre pelo terceiro anoconsecutivo, e que se espera atinja êxitoainda maior do que nas anteriores edi-ções, atendendo ao Uma iniciativa doDepartamento de Cultura da CâmaraMunicipal de Coimbra, que se esperaconstitua uma boa surpresa não só paraos conimbricenses, mas também para osmuitos turistas que nesta altura do anovisitam a cidade.

Flores e plantas vão aliar-se à doçariatradicional, estabelecendo-se, assim, umfeliz casamento entre sabores e aromas,num espectáculo de cor que será aindavalorizado pela música.

A vertente gastronómica da Regiãoserá apresentada por vários grupos fol-clóricos e etnográficos da região de Co-imbra, contando ainda com a colabora-ção dos Associação dos Orizicultores.

Entre as 10h00 e as 17h30 o Mercadode Flores e Plantas, trará um colorido

Mercado de Flores e Plantas anima ruas de Coimbradiferente à Baixa, através dos arranjosflorais e plantas (ornamentais, odorífe-ras, de várias formas e texturas, medici-nais), da mostra de produtos biológicosque estarão espalhados desde a Praça 8de Maio à Rua Visconde da Luz, frutoda participação de dezenas de floristas aque também se associam mais de umadezena de grupos folclóricos da Região,que enriquecem a festa não só com ar-ranjos florais, mas com a gastronomiatradicional de Coimbra.

A programação integra ainda momen-tos de animação ao longo de todo o dia.Assim, entre as 10h30 e as 12h30, desfila-rá a Fanfarra dos Bombeiros Voluntáriosde Brasfemes; às 13h30, o Grupo de Con-certinas da Lousã; às 15h30 o Grupo Ei-ranças fará uma intervenção, com músicae cantares, em torno das tradições ligadasàs flores – “Maias” – com a recriação dotradicional Baile da Rosa e da Espiga.

A iniciativa – que engloba também oConcurso “Melhor Arranjo Floral”, en-cerrará com nova actuação do Grupo deConcertinas da Lousã, a partir das 17h00.

Imagem da anterior edição do “Mercado de Flores e Plantas”que amanhã voltará a animar a Baixa de Coimbra

AROMAS, SABORES E MÚSICA MISTURAM-SE AMANHÃ NA BAIXA DA CIDADE

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4 29 DE MAIO DE 2009INTERNACIONAL

Fiodor Lukyanov *

A política mundial acaba de fazer umaespiral e muitos políticos de novo falamsobre um total desarmamento nuclear. OPresidente dos EUA, Barack Obama, emquem é costume agora depositar todasas esperanças do planeta, pretende per-suadir o Congresso a ratificar o Tratadosobre proibição de testes nucleares, darmuita atenção ao regime de não prolife-ração, proceder a uma redução dos ar-senais e, em perspectiva, aspira a ver onosso mundo livre de armas nucleares.

A ideia de um mundo desnucleariza-do, proclamada há muitos anos por Ro-nald Reagan, e proposta como um ob-jectivo político concreto por Mikhail Gor-batchev, com o fim da «guerra fria» de-sapareceu da agenda mundial. Muitosacreditavam que o tema ficou definitiva-mente no passado, assim como a con-frontação ideológica e o frente-a-frenteentre as duas superpotências.

Mas em Janeiro de 2007 quatro ex-políticos – os secretários de Estado Ge-orge Schultz e Henry Kissinger, o secre-tário da Defesa William Perry e o sena-dor William Nann – avançaram com umainiciativa, secundada por Barack Oba-ma. E, naturalmente, Mikhail Gorbatchevfoi o primeiro a dar-lhe todo o seu apoio.Sob a presidência do ex-presidente sovi-ético já se realizaram dois foruns «Supe-rar a Ameaça Nuclear» – um em Bos- * in revista A Rússia na Política Global

Um Mundo desnuclearizadoton, em Dezembro de 2007, e o segundoem Roma, no passado mês de Abril.

O assunto tem criado muita animaçãoe entusiasmo na Europa e na Américado Norte, mas passa quase despercebi-do na Rússia. Mais ainda, vários políti-cos russos fazem declarações cépticasquanto à possibilidade de redução radi-cal das armas nucleares.

As iniciativas visando a um desarma-mento nuclear são jogadas invencíveisdos que as propõem. É difícil objectarcontra uma recusa de usar a arma maisdestructiva inventada pelo homem.

Os apoiantes do «zero global» repor-tam-se à cimeiraURSS-EUA realiza-da em Reiquejavique(Islândia) em Outu-bro de 1986, ondeMikhail Gorbatcheve Ronald Reaganquase acordaram umprazo (1996) parauma completa des-truição das armasnucleares. De facto,Moscovo e Wa-shington estavammuito perto de umtratado que inicial-mente parecia im-possível. Mas surgiuum obstáculo – odesejo categórico deRonald Reagan denão desistir da Inici-ativa de Defesa Es-tratégica (o escudoanti-míssil norte-americano).

Há 23 anos, as ini-ciativas partiam doKremlin, enquanto aCasa Branca estavatoda incrédula, sus-peitando sempre deuma armadilha nas

propostas e compromissos do dirigentesoviético. Hoje em dia, os impulsos ema-nam de Washington, e Moscovo é a par-te que desconfia. Mas essa inversão dospapéis não altera a essência do proble-ma. Não é por acaso que as condiçõesde desarmamento nuclear, apresentadashá dias pelo Presidente Dmitri Medve-dev, se assemelham aos «escolhos» sur-gidos na cimeira de Reiquejavique.

Trata-se, antes de tudo, da questão denão colocação das armas nucleares noEspaço e proibição de criar unilateral-mente sistemas anti-mísseis. No entan-to, tal como antes, os EUA não queremter as mãos atadas.

Mais uma circunstância que complicatudo: o desequilíbrio nas armas conven-cionais inverteu-se. Antes, a NATO tevemedo da supremacia soviética em tro-pas blindadas, artilharia, etc. Hoje a Rús-

sia considera as armas nucleares comoa principal garantia nas condições de umagigantesca supremacia dos EUA nas ar-mas convencionais.

Moscovo aceita as conversações comWashington como mais um acto da mes-ma interminável peça. Por um lado, as-sim é. Por outro, as decorações globaisda peça têm mudado radicalmente des-de os tempos em que a peça atraía mui-ta atenção do público.

Para os EUA recomeçar o diálogocom a Rússia é importante no plano bi-lateral, e também para demonstrar asua boa vontade e tentar salvar o Tra-tado de não proliferação das armas nu-cleares, que, aliás,ameaça a ruir.

A morte deste Tra-tado significa nãoapenas maiores ame-aças aos EUA, comotambém um sério gol-pe na liderança nor-te-americana nomundo. Como é sa-bido, o reforçodesta liderançacontinua a consti-tuir o principal ob-jectivo da Adminis-tração de BarackObama. Pois é nascondições de proli-feração das armasnucleares (porexemplo, um even-tual teste de bombanuclear iraniana), setorna ainda maisineficaz a supervi-são global norte-americana.

A lógica dos parti-dários de um totaldesarmamento é aseguinte: as duas po-tências nuclearesvão dar um exemplo e os restantes paí-ses nucleares seguirão o mesmo cami-nho. Mas, na prática, nada, absolutamen-te nada, obriga a Índia, o Paquistão e Is-rael a fazerem o mesmo! Ou o Irão arever as suas ambições!

Hoje em dia muitos países aspiram ater armas nucleares por razões aliás muitodiversas. Para alguns é importante tergarantias da sua soberania. A Históriarecente demonstra: se um regime possuiarma nuclear, então ninguém o ataca (aCoreia do Norte). Não ter arma nuclearsignifica não ter garantias contra umainvasão armada (o Iraque).

Muitos países têm receio dos vizinhospouco amistosos. E estes receios não sãorelacionados com o comportamento doKremlin e da Casa Branca. Situaçõesassim existem na Ásia Meridional e Ori-ental, assim como no Médio Oriente.

Entre os primeiros, por muito estra-nho que possa parecer, encontra-se aRússia. Quanto ao arsenal nuclear, Mos-covo está no topo acessível apenas aosEUA. A arma nuclear é a única esferaem que Moscovo e Washington se en-contram em pé de igualdade. Mas, psi-cologicamente, e não só, a Rússia nãotem o estatuto elitista da ex-URSS.

As reduções radicais dos arsenaisnucleares, que Barack Obama pretendepropor, não convêm à Rússia e um pro-gresso neste campo só pode ser gradu-al. Por outras palavras, quanto maior fora iniciativa, tanto menor será o grau deprobabilidade da sua realização.

A arma nuclear tem sido um dosmais temíveis símbolos do sec. XX-XXI, mas, como é reconhecido pormuitos, ajudou, até agora, a prevenirgrandes guerras.

Hoje em dia, constata-se uma certadiminuição do medo perante a arma dedestruição em massa. A possibilidadedo seu uso não parece muito grande,embora não seja excluída de modo tãocategiórico como há uns trinta anos.Por outro lado, na medida da sua proli-feração, a arma nuclear deixará de serum meio de garantia da estabilidadeestratégica.

Contudo, é preciso sempre ter emmente que na História da Humanidadeainda não existiram armas, que uma vezinventadas, nunca eram usadas contra ohomem.

Mikhail Gorbatchev Barack Obama

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529 DE MAIO DE 2009 COIMBRA

A tradição da Romaria do Espírito Santo,em Coimbra, tem já alguns séculos. Exis-tem mesmo referências a que até o próprioLuís de Camões por ela terá passado, en-volvendo-se em escaramuças suscitadaspelo seu ardor de conquistar donzelas. Ob-viamente que poderá ser especulação po-pular, uma vez que não há consistentes ele-mentos históricos que sustentem este epi-sódio.

A verdade é que ele surge narrado nocélebre filme com o nome do épico, realiza-do por Leitão de Barros com argumento deAfonso Lopes Vieira (e que foi o primeirofilme português a concorrer ao Festival deCannes, em 1946).

Mas deixemos os aspectos cinéfilos evoltemos à realidade. A Romaria do Espíri-to Santo é a mais popular de Coimbra, sen-do ponto de passagem obrigatória da popu-lação da cidade.

Até há algumas décadas, a Romaria es-praiava-se por uma vasta área de terra ba-tida, junto à Igreja de Santo António dosOlivais.

Era famosa, sobretudo, pelas tendas ondese vendiam objectos de barro – desde asbilhas para a água fresca até às assadeirase aos vasos para plantas, passando pelospífaros e campaínhas de barro que faziamas delícias da miudagem (e davam cabo dosouvidos a que mestivesse perto...).

Com as obras que ali foram sendo feitas(nomeadamente a abertura da avenida An-tónio Portugal e o arranjo do próprio Largodos Olivais), a área disponível para a Ro-maria ficou substancialmente reduzida.

Por outro lado, também a evolução doshábitos de consumo veio mudar o tipo deobjectos ali comercializados, tal a como aaglobalização.

Deste modo, e embora ainda haja as ten-das onde se vendem objectos de barro (quasetodos produzidos nas tradicionais olarias doMinho), a verdade é que a Romaria tem umcarácter verdadeiramente internacional,onde se vêem comerciantes e produtos ori-ginários de vários continentes – de África àÁsia, passando pela América do Sul.

PRESIDENTE DA JUNTADOS OLIVAISTENTA FAZER “MILAGRES”

De forma a aproveitar o espaço disponí-vel, o Presidente da Junta de Freguesia dosOlivais, Francisco Andrade, vem fazendo,ano após ano, verdadeiros “milagres” paraque a Romaria ganhe diversidade e, simul-taneamente, dignidade.

Assim, na edição deste ano FranciscoAndrade reduziu o espaço de cada um dos“stands” e tendas, de molde a aumentar o

UMA TRADIÇÃO RENOVADA NO LARGO DOS OLIVAIS

Romaria do “Espírito Santo”atrai população de Coimbra

respectivo número.Fez também maiores exigências relati-

vamente à forma como as estruturas ali fo-ram montadas.

E tentou atrair maior número de produ-tos artesanais portugueses, incluindo os daRegião Centro, de molde a valorizar um sec-tor que, em edições anteriores, quase fora“engolido” pela quantidade de artigos vin-dos de outros países.

Neste último aspecto, contudo, o Presi-dente da Junta de Freguesia admite que nãofoi tão bem sucedido como desejaria, pois aresposta dos artesãos nacionais não foi tãosubstancial como ele desejava.

Isto apesar do convite aos artesãos por-tugueses estar a ser anunciado há um ano.

CULTURA E LAZERMAS TAMBÉM GASTRONOMIA

Outra das preocupações do autarca temsido a de que a Romaria do Espírito Santoassocie a cultura ao lazer, sem esquecer agastronomia tradicional.

Assim, ali podem ser encontradas as fa-mosas “farturas”, produzidas por dois fabri-cantes à vista de todos, e servidas em ou-tras tantas esplanadas, onde é muito agra-dável passar uns momentos de descontrac-ção, acompanhando aquela especialidadecom uma bebida agrdável.

Igualmente a bela sardinha assada mar-ca presença num restaurante instalado jun-to ao Largo, que proporciona outras opçõesda gastronomia tradicional portuguesa.

Para a miudagem, as diversões mecâni-cas que tanto as atraem.

E para todos alguns espectáculos demúsica e folcore, com um programa cuida-do que, por si só, justifica uma visita ao Lar-go dos Olivais.

SALVAGUARDADOS MONUMENTOS

Deve ainda referir-se a preocupação, esteano ainda maior, de não “abafar” os monu-mentos existentes no local.

Assim, o acesso à escadaria da Igrejaficou este ano sem tendas ou expositores,para lhe não roubar a beleza que tanto im-pressiona os milhares de turistas nacionaise estrangeiros (entre estes últimos o maiornúmero é de italianos) que ali acorrem paraconhecer o local onde Santo António (deLisbos, de Pádua, mas também de Coim-bra) estudou e iniciou a sua actividade reli-giosa (recorde-se, a propósito, que há pou-cos anos foi mesmo descoberta a que terásido a cela habitada pelo santo padroeiro deLisboa).

Também a capelinha existente no meiodo Largo tem em volta um espaço livre, deforma a poder ser devidamente apreciadapelos visitantes.

ESTREIA DO CORODOS OLIVAISNO PROGRAMADO FIM-DE-SEMANA

Como aciam se refere, a Romaria temsido valorizada com um diversificado progr-ma cultural e recreativo.

Para este fim-de-semana, destacam-seas seguintes iniciativas:

Sábado (dia 30) - 21h00 – Música ao vivopara dançar. Uma inovação curiosa, tantomais que haverá prémios para os melhoresdançarinos na modalidade de tango e valsa.

Domingo (dia 31), 21h00 – Actuação doCoro Misto da Freguesia de Santo Antóniodos Olivais. Trata-se da apresentação pú-blica deste Coro, constituído por meia cen-tena de cantores de várias idades e ambosos sexos, que tem sido muito acarinhado pelaJunta de Freguesia.

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6 29 DE MAIO DE 2009CRÓNICA

A OUTRA FACEDO ESPELHO

José Henrique Dias*

[email protected]

* Professor universitário

Começou por dizer estou tão preocupada, logo sal-tou no seu habitual galope de palavras para assuntos dodia a dia, coisas de somenos, das que passam obrigato-riamente pela sensibilidade feminina, do exercício prag-mático da maternidade, como o ir às compras e carre-gar pesos. Aquela dor que a vinha incomodando e lheretirava o prazer de uma conversa que adivinhara es-fusiante, quero eu dizer, a que evidentemente me ape-tecia, neste egoísmo másculo de contornar dificuldadespara instaurar mecanismos de sedução, instalou-se ra-pidamente na mesa do chá de jasmim que partilháva-mos, nota disfórica das suas preocupações e temoresexponencializados.

Costumava brincar e chamava-lhe provocatoriamen-te hipocondríaca, tiritava o medo de acentuar a incon-veniência, mas não resultava, muito pelo contrário acei-tava com ar gaiato um, pois sou e depois?, para logorecompor um ar grave, quase sisudo, ia mesmo a dizerameaçador, vincar de seguida meio sorriso e eu, a par-tir dele, desse quase sorriso, apenas esboço, eu ficavapreso nos jardins floridos que sublinhavam as promes-sas dos seus lábios, que eram de tudo, a par com aluminosidade do seu olhar enternecido, o vínculo de so-noridade carminada de projectos de fim de tarde queàs vezes aconteciam.

Era um eterno fascínio, marca indelével que vinhado fundo das remotas recordações, de um outro tempo,quando nos conhecemos, sei eu já lá bem quando, só seme puser a fazer contas e atar factos, talvez então con-siga saber de nós o que fomos esquecendo, depois queela num fim de tarde, sempre fins de tarde, como estede agora, me avisou, com a solenidade possível, a partirde agora, ficas a saber, estou aberta ao que possa acon-tecer. Acabou por acontecer. Outro.

Também, verdade seja aqui notificada, não seria di-fícil. Uma mulher como ela não teria nunca de esperarmuito para interessar um candidato a marido. Isto é, acompanheiro. Ou talvez nem isso. Sempre me explicouque não estava disposta a uma vida a dois. Ter alguémpara partilhar a recusa da solidão, isso sim, uma com-panhia para uns cinemas, uns espectáculos, mesmo oocasional de uma tagarelice de amigos num bar arra-baldino, mas o dia a dia, a ocupação do seu espaço,para isso, dizia como agora é uso, já dei. Para essepeditório já dei, acentuava.

Dito de outra maneira, vacinara-se contra o viver adois em permanência, como antigamente se dizia decasa e pucarinho.

Conhecemo-nos na faculdade. Uma vez, ao cair danoite, depois de uma aula de… já não sei, vai lá tantotempo, como podia saber?, apenas retalhos alinhava-dos na memória como aqueles tapetes artesanais defeira de apresentações, estivemos no laboratório e dis-cutimos depois alguns problemas de manipulação deprodutos, o FSA, faça segunda arte do tempo das re-ceitas magistrais, ou talvez tenha sido, deixem lá ver,problemas de farmacognosia.

Discutimos, isto é, transformámos em álacre taga-relice a nossa paixão pelos estudos farmacêuticos, ou-sávamos então lutar contra alguma mediocridade ins-talada e aspirávamos a ser mais do que meros vende-dores de produtos industriais de bata branca atrás deum balcão, com o nome estampado em tabuleta de di-rector técnico, se a vida nos corresse bem, e não esti-véssemos condenados a trabalho nominal por conta deoutrem, com salário fixo e descontos para a segurança

Receitas magistrais

social, com apetites de uma vez por outra, fixadas asbulas dobradas no interior das caixinhas dos medica-mentos, sentenciar umas nótulas à margem das pres-crições, como fazem com toda a segurança os chama-dos técnicos, marçanos tirocinados no abrir e fechargavetas de rodinhas de etiquetagem alfabeticamenteorganizadas.

Foi isto que há dias me disse um amigo magistrado,na companhia de um pediatra, depois de uma jornadadomingueira de footing ou talvez melhor de futing, senão optarmos por corrida em circuito predeterminado.Uma vez discutimos isso, e logo o meu amigo dos tribu-nais, zelador do património linguístico, argumentavafuribundo, também não escrevemos futebol?

Voltando ao que vinha a contar. Quando acabámoso curso, logo a convidaram para assistente e não de-morou estava no topo da carreira, passado uns dois outrês anos na Suiça, num centro de investigação, en-quanto eu me contentei com o destino de boticário debairro periférico. De bata branca e tabuleta, atrás deum balcão por conta de uma velha senhora que ador-mecia sentada à secretária do armazém, também es-critório, a conferir as receitas e organizar as listas pararecuperação das comparticipações.

Não obstante o tempo e a distância, nunca nos per-demos. Fui sabendo do que fazia em jantares combina-dos e cada vez mais difíceis, assisti aos conflitos quelevaram ao fim do seu casamento com um economistaque dirigiu um departamento bancário e teve uma pas-sagem conturbada por um governo durante uma legis-latura que não chegou ao fim, acompanhei o desveloque votava à educação da filha, solidarizei-me activa-mente em momentos trágicos como o daquele dia emque perdeu os pais num acidente de viação, tornei-medefinitivamente melhor confidente do que amante.

É evidente, julgo que é evidente, que se percebe quehouve entre nós muito mais do que as palavras parecequererem dizer. Houve de facto. Um dia, finais de Agos-

to, encontrámo-nos por acaso numa esplanada de Vila-moura, foi uma festa, estás óptimo, gritava excitadíssi-ma, tu sempre linda, fui dizendo, até porque era verda-de, parecia que queríamos engolir o tempo perdido eacabámos a noite em sua casa, pé ante pé, bico calado,para não acordarmos os netos que estavam de fériascom ela e a empregada que os organizava e lhe poupa-va um ror de trabalhos.

Foi então, recuperada alguma fantasia das ambiva-lências e do desempenho possível, ultrapassada a casados sessenta ia já uns anitos, que me falou das suaspreocupações. Estávamos deitados lado a lado, de mãodada, como se não houvesse tempo, quando notei queum demorado silêncio fez deslizar um cristal de lágrimaque logo tentou secar com o indicador rápido.

A dor, aquela dor de que me falara vagamente noinício, que encontrarão quando comecei a registar damemória o que me escorreu das palavras murmuradasno cá dentro de mim, era a sua grande frustração porum amor impossível, não realizado, que traduziu numafrase dolorida, amor que não posso ter…

Ouvi agora soar ao longe, no sino da velha torre, aeternidade de doze badaladas. A noite cansa-se nosmeus joelhos. Está frio. Este frio que ficou sempre emmim e não sei como aquecê-lo, depois que a perdi notempo, sei lá eu bem quando, se acaso é verdade quealguma vez nos encontrámos.

Estou incorrigível. Foi isso que me disse o meu netoquando veio aqui ao lar, no domingo, ao fim da tarde, eme surpreendeu a escrever bilhetinhos para uma se-nhora do andar de baixo, sempre muito cuidada, muitodigna e elegante nos gestos e palavras, que à hora doalmoço sorriu para mim e baixou depois os olhos, aopassar pela minha mesa.

Quem me dera poder passear com ela em Vilamou-ra. Há quanto tempo que não me levam lá. Pensandomelhor, acho mesmo que nunca fui a Vilamoura.

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729 DE MAIO DE 2009 NACIONAL

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Por Sertório Pinho Martins

… notícias do meu país à deriva, numfim-de-linha adivinhado de tantos sonhosdesfeitos à flor das águas mornas de umdestino português que nos persegue, esó deixa mágoas por sarar. A política tor-nou-se de repente um sítio onde não es-tar e um registo gordo de cumplicidadespodres e de caminhos bloqueados no es-paço ressequido de uma pátria à flor-das-águas que não sabemos para onde vai!Pergunto à gente que passa porque vaide olhos no chão – e a resposta lê-se emcada rosto assustado com o dia de ama-nhã: só ouço silêncio, que é tudo o que agente que passa tem para me dar, maisangustiada com o vazio de dias incertose com medo de errar nas escolhas doschefes de clã que controlam a sua pátriabaloiçando à flor de águas mornas e ba-tidas pelo vento do silêncio e da espe-rança adiada.

E o vento não me diz nada, nem temnada de novo para mim. Fico entre asgentes que estão na margem da vida aolhar um rio triste que corre sempre parao mesmo mar, e que gostariam de serbarco dessa viagem – mas que têm sem-pre de ficar, pregadas na cruz de um

Pergunto ao vento que passadestino português que as continuará aperseguir. E só persiste o silêncio dasmágoas por sarar. Não há nada de novopara dizer, nem notícias que me abram

uma nesga de esperança, nem uma luzi-nha que alumie o destino português queme persegue.

E a noite continua a crescer por den-tro dos homens deste país à deriva, em-brenhados em disputas mortais para rou-bar um pouco de sombra aos que conti-nuam a sonhar na margem do rio triste.E cresce a mancha escura de gentesconformadas e que vão vivendo em pas-so forçado, olhando por cima do ombropara não errar nas escolhas que não pe-

diram.E pergunto ao trevo de quatro folhas,

que foi esperança de tantos amores de-sunidos, a saber notícias do meu país à

deriva. Desfolho, uma vez, mil vezes,digo-lhe que morro nesta terra de nin-guém – e o trevo nada me diz! Nem ovento, nem o trevo, nem a pátria à flor-das-águas, sabem do meu país perdidona margem do rio triste que corre sem-pre para o mesmo mar.

Mas poderá o sonho de uma luzinha ede uma nesga de esperança, sair de umacandeia nascida da própria desgraça domeu país à deriva? E se o sonho quiserser realidade, quem o semeia e dele faz

canções que ecoem no vento do silêncioe da esperança adiada? Mesmo numanoite mais triste que o nosso tempo desolidão, será que a gente resiste e chegaao lado de lá do rio que corre semprepara o mesmo mar?

Era bonito que o amanhã fosse umacordar sem deriva, sem ventos de si-lêncio e sem o rio triste que leva na tor-rente as minhas mágoas por sarar. Masnão basta haver alguém que diz ‘não’:porque em volta tudo continua entregueaos chefes de clã que controlam a mi-nha pátria à flor-das-águas, baloiçandonuma modorra de destino português queme persegue na noite dos trevos que nãosabem notícias do meu país.

A política é cada vez mais um sítioonde não estar, nesta pátria ressequida eexausta de ser terra de ninguém e baldiode todos. O vento cala a desgraça, nadame diz do meu país perdido no seu negrodestino português – e não basta haveralguém que resiste : a memória é curta,a culpa é solteira e a alma humana nãopassa de um velho catavento a rangerpor cima de uma pátria que continuamosa não saber para onde vai, com tantagente a passar de olhos no chão.

A política é cada vez maisum sítio onde não estar,nesta pátria ressequidae exausta de ser terra de ninguéme baldio de todos

O Presidente da Câmara de Coimbradefendeu ue a escolha da cidade parasede do reino português por D. AfonsoHenriques visou contornar as disputasentre os homens do norte e do sul do ter-ritório.

“A escolha é feita com a clara inten-ção de superar a oposição cultural entreo Norte e o Sul, e porque deste modo seconsegue a unidade política capaz deaglutinar, na diferença e no respeito porela, regiões de características várias”,sublinhou Carlos Encarnação, na cerimó-nia evocativa dos 900 anos do nascimentodo primeiro rei de Portugal.

Na sua opinião, “todas as razões o im-punham”, também pelo facto de ser a“cidade mais importante do Condado

D. Afonso Henriques nasceu há 900 anosPortucalense, pelo número dos seus ha-bitantes, pela importância económica,social e militar, e pelo seu dinamismocultural”.

Segundo Carlos Encarnação, igual-mente a Coimbra ficaram ligados os “fac-tos mais simbólicos do seu caminho”.

É a Coimbra – acrescenta - que re-gressa em cortejo triunfal depois da Ba-talha de Ourique, que é considerado omomento do “alçamento do rei pelosseus”.

“Antes de Coimbra, era o sonho, asede e o desejo. Em Coimbra nasceu oEstado Português”, afirmou Carlos En-carnação, recordando que foi em Coim-bra, no Mosteiro de Santa Cruz, que D.Afonso Henriques quis que ficassem

depositados os seus restos mortais.Monsenhor Leal Pedrosa, represen-

tando do Bispo de Coimbra na cerimó-nia, realçou que existem uns “laços pro-fundos” entre D. Afonso Henriques, acidade e o Mosteiro de Santa Cruz, emcuja igreja decorreu a cerimónia.

Se D. Afonso Henriques foi o funda-dor e protector do Mosteiro de Santa Cruz,também os monges crúzios muito o apoi-aram e desenvolveram um importantepapel na sociedade de então, em Coim-bra, na região centro e no país, realçou.

“Foi notável o apoio e a protecção queo primeiro rei deu a este mosteiro, mastambém notável foi o apoio e a ajuda queos monges lhe deram. Não é fácil imagi-nar e avaliar a importância da acção dos

frades crúzios, nos aspectos religioso, cul-tural, artístico e até no aspecto político”,sublinhou.

Para Leal Pedrosa, o Mosteiro de San-ta Cruz “foi durante muito tempo a gran-de escola do país, e também como que oberço da Universidade de Coimbra”,dada a ligação que houve nos primórdiosdesta instituição de ensino.

As comemorações dos 900 anos donascimento de D. Afonso Henriques, que

decorreram em Coimbra no passadodia 23, compreenderam uma cerimónia deinvestidura dos novos membros da Ordemdos Templários e uma homenagem no tú-mulo do Rei, com a deposição de floresperante Guarda de Honra de militares daBrigada Ligeira de Intervenção.

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8 29 DE MAIO DE 2009OPINIÃO

FÉRIAS NA CABINA DE VOTO

Quando o Presidente da Repúblicaapelou aos cidadãos para que não fos-sem de férias no fim-de-semana das elei-ções europeias, cheguei a pensar que,tomado pelo espírito europeu, CavacoSilva estivesse a falar na qualidade dePresidente de outro país da União Euro-peia. No nosso, o pedido vai fazendo cadavez menos sentido: os desempregados,por definição, não têm férias; para os tra-balhadores da Qimonda e da Auto-Eu-ropa, em princípio, a opção de tirar féri-as não será prudente; e os precários, ostemporários e os endividados, provavel-mente, não têm o desafogo financeiro queas férias, mais ou menos, requerem. Omais provável é que não haja assim tan-ta gente de férias no dia 7 de Junho. In-felizmente, também não é provável quehaja muita gente a ir votar.

O problema é que os cidadãos, na al-tura das eleições europeias, costumamfazer férias da democracia. Quase seismilhões de pessoas votaram nas últimaslegislativas, mas apenas cerca de trêsmilhões foram às urnas nas últimas eu-ropeias. Ou as agências de viagens ofe-recem pacotes menos apelativos nos fins-de-semana das eleições nacionais, ou osportugueses não se interessam especial-mente pelas eleições europeias - o quenão deixa de ser uma atitude estranha.A opinião geral dos cidadãos sobre ospolíticos é má, pelo que não se compre-ende que desdenhem da oportunidade demandar 24 deles lá para fora. Quandose esperava que houvesse longas filas àporta das secções de voto, os portugue-ses preferem ficar em casa. Vá lá umapessoa compreender o eleitorado. (...)

Ricardo Araújo PereiraVisão

TUDO ETERNO

Deitava-me na relva dos canteiros eficava horas a olhar o céu entre as árvo-res. De início parecia imóvel e depoisenchia-se de vida, aproximava-se e afas-tava-se consoante as folhas tremiam eeu espantado que as folhas tremessempor não existir vento. O coração dema-siado rápido dos pássaros assustava-me,impedindo-me de lhes tocar. Insectos in-compreensíveis, cheios de patas e ante-nas, joaninhas que essas sim, entendia, osuspiro de papel de seda das roseiras, eueterno, a China eterna, o cão invisível que

ladrava ao longe eterno, tudo eterno.Ladrava uma espécie de tosse, contraquem? O pombal por fora verde, pordentro poeirento e escuro, a que falta-vam tábuas. Sinos às vezes, para alémdo muro baldios, quintas, um burro a ajo-elhar-se. Os comboios eternos tambémou então foi o mundo que parou por faltade corda. Estive tuberculoso, lembro-mede não comer, de atirar para o chão osbrinquedos que me traziam, não lembromais nada acerca disso. Sonhos em quequeria fugir sem conseguir correr, todospassavam por mim e eu parado. Se nãohá nem um sopro qual o motivo dos bra-ços da trepadeira oscilarem? A maiorparte das coisas não tinha nome nemprecisava dele. Porque carga de águatemos nome, nós? No outro lado da ruaum homem sai de uma porta, some-senoutra. Eu a escrever isto e ele a sair deuma porta e a sumir-se noutra: se calhara outra engoliu-o dado que não o vejomais. (...)

António Lobo AntunesVisão

MONUMENTOSE COLONIALISMO

A New 7 Wonders Portugal, SA estáa lançar um concurso com vista a elegeras “7 Maravilhas de Origem Portuguesano Mundo”. Os resultados serão conhe-cidos no próximo dia 10 de Junho. Esta-mos, pois, no mundo dos negócios e domediatismo, e os critérios por que se pau-ta este mundo têm pouco a ver com abusca da verdade ou da justiça. Têmantes a ver, neste caso, com os lucrosque podem ser obtidos com a explora-ção da história, da obtenção de direitosde exploração do conceito “7 Maravi-lhas”, da publicidade, da promoção doturismo, etc. Perante isto, pode estranhar-se o incómodo e o protesto que este con-curso tem vindo a suscitar no espaço delíngua oficial portuguesa, envolvendo so-bretudo investigadores que se dedicamao estudo do império colonial portuguêsou ao estudo dos países independentesque emergiram do fim do império e edu-cadores que, neste espaço, procurampassar às novas gerações uma visão com-plexa da história que, longe de ser pas-sada, continua a afectar as suas socie-dades e as suas vidas.

O incómodo e o protesto têm razõesfortes e a principal é que este concursoimplica não apenas com a História dePortugal, mas também com a história dospaíses que estiveram sujeitos ao coloni-alismo português, e fá-lo de modo a ocul-tar, precisamente, o colonialismo, ou seja,o contexto social e político em que essesmonumentos foram erigidos e o uso quetiveram durante séculos. O olhar que éorientado para ver a beleza da arte e daarquitectura dos monumentos é igual-mente orientado para não ver o sofrimen-to inenarrável dos milhões de africanosque, entre o século XV e o século XIX,sacrificaram a vida para que muitos des-ses monumentos tivessem vida, quer os

monumentos onde foram compradoscomo “propriedade móvel” quer os mo-numentos que foram construir no outrolado do Atlântico. (...)

Boaventura Sousa SantosVisão

A CRISE DA JUSTIÇA

Custa-me abordar este assunto, peloseu especial melindre. Mas, em consci-ência, não posso deixar de o fazer. A cri-se da Justiça está aí, é uma evidênciaincontornável. Não pode deixar de preo-cupar os cidadãos responsáveis.

A Justiça, em demasiados casos, nãofunciona, nomeadamente quando envol-ve políticos mediáticos ou desportistasigualmente mediáticos. Os juízes não seentendem com os procuradores e estesnão se entendem com os responsáveisda Polícia Judiciária. Há a sensação deque disputam, entre si, para apareceremnas televisões, como vedetas. Não re-sistem a responder a perguntas dispara-tadas ou mal intencionadas e nem sem-pre o fazem com o bom senso que seriade esperar.

Assim sendo, perdem a distância - tãonecessária à profissão que exercem - edesacreditam as magistraturas. Parecenão perceberem que o silêncio é de ouroe a palavra, em certas circunstâncias,lhes é bastante inconveniente. O quecontribui, com alguma frequência, parao descrédito da Justiça, nos espíritos dostelespectadores, que nas suas casas, numcontexto diferente, os vêem, escutam,avaliam. E não gostam...

Ora, o bom funcionamento da Justiçaé essencial aos Estados de Direito, comoo nosso. Sem um Estado de Direito efi-caz e que mereça o respeito dos cida-dãos não há Democracia. A questão é,portanto, muito séria e não pode ser ig-norada pelos órgãos de soberania: Pre-sidente da República, Governo, Parla-mento - e, portanto, por todos os parti-dos, numa Democracia pluripartidáriacomo a nossa.

Há quem reclame novas reformas le-gais. Não penso que seja a solução. Aquestão não é de lei, mas antes dos com-portamentos dos juízes, dos procurado-res e dos dirigentes da Polícia Judiciária.E nestas profissões, como em todas, pa-gam os bons pelos transgressores... (...)

Mário SoaresVisão

EUROPEIAS MAS POUCO

A campanha para as eleições euro-peias está na rua e não é expectável nemque traga grandes novidades nem quealtere muito os previsíveis resultados.Está dito e redito que tais resultados te-rão mais a ver com a política interna doque com as opções específicas quanto àEuropa, com maior penalização do PSnestas eleições do que nas legislativas,dado não se pôr a questão da alternativade Governo do País. Decerto também

por isso, as questões europeias não es-tão a ter o devido peso, enquanto se en-fatizam questões, mesmo questiúnculas,incidentes, episódios, meramente inter-nos e amiúde irrelevantes.

Creio que isto contribuirá para aumen-tar ainda mais a abstenção, não obstanteos enormes gastos de campanha, que naactual situação a generalidade dos por-tugueses não compreende ou até não“perdoa”. Gastos, inclusive, em enormescartazes com “mensagens” que em re-gra não querem dizer nada, não conquis-tarão sequer um voto e em alguns casospodem ser mesmo caricatos - como o doCDS, com uma foto de Nuno Melo, empose de imperador romano ou super-homem, clamando: “Não andamos a brin-car aos políticos!” (...)

José Carlos VasconcelosVisão

MULTILATERALISMO

Os numerosos sectores de responsa-bilidade da ONU, que estão desprovidosde meios para acudir às exigências quecrescem de gravidade, exigem uma con-tinuada atenção dos seus funcionários, aqual não tem faltado, com recurso a umasúplica que se multiplica, e se traduz emimplorar a atenção dos governos para aurgência de assumirem uma intervençãopartilhada.

O secretário-geral, Ban Ki-moon,parece ter chegado à formulação dasíntese das preces, agora que a “tur-bulência financeira pode desencadearuma catástrofe humana” ao discursarna Universidade de Princeton (17 deAbril): a conclusão foi que “é neces-sário um novo mul- tilateralismo paraenfrentar a crise económica mundial”.Usando uma fórmula paliativa, afirmouque “o reforço das Nações Unidas fazparte da solução”, mas de facto aquiloque a importante mensagem significaé que poucas, se algumas, das suasestruturas existentes se revelam ade-quadas para responder às exigênciasface às quais se vai afundando a or-dem mundial. No que respeita ao eixoessencial de uma ordem efectiva, queé a segurança, o multilateralismo foisempre limitado pela distribuição do di-reito de veto, e a responsabilidade pelapaz possível da Carta foi de facto as-sumida, precariamente, pela Ordemdos Pactos Militares que durou até àqueda do Muro de Berlim.

Para além do verdadeiro vazio de so-luções, ou pelo menos proposta delas,para esta questão essencial, o apelo aomultilateralismo tem em vista assegurara estabilidade económica e financeiramundial, lançar uma ofensiva contra apobreza, restabelecer a paz e a estabili-dade, responder às alterações climáticas,melhorar a saúde no mundo, lutar contrao terrorismo e garantir o desarmamentoe a não proliferação. (...)

Adriano MoreiraDiário de Notícias

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929 DE MAIO DE 2009 OPINIÃO

OS MILAGRES

(...) Por causa dos milagres exigi-dos para uma canonização, pergun-tam-me frequentemente se acreditoem milagres. Respondo que só acre-dito nos milagres do amor. Quanto aos“milagres” no sentido estrito - aque-les que Deus faria sobrenaturalmen-te, suspendendo as leis da natureza -,mantenho razoável cepticismo. “En-tão, não acredita que Deus podetudo?” Não, não acredito, pois a mai-or parte das vezes fala-se da omnipo-tência divina de modo infantil. Deusnão pode, por exemplo, fazer com quedois mais dois sejam cinco nem co-meter suicídio.

A razão do meu cepticismo é, po-rém, mais funda. Acredito em Deusinfinitamente bom e poderoso, criadordos céus e da terra, como diz o Cre-do. Se acredito em Deus criador apartir do nada - sublinhe-se que a cri-ação não se opõe ao evolucionismo -,creio nele enquanto continuamentecriador. Deus não está fora do mundo- ele é infinitamente presente ao mun-do. Ora, os milagres pressupõem queDeus está fora do mundo e que, devez em quando, de modo arbitrário,vem ao mundo, interrompendo as leisda natureza. Porque acredito queDeus está dentro e não fora, pois éForça criadora infinita, não acreditonos tais milagres.

Porque creio nos milagres do amor,pergunto muitas vezes porque é queainda não foi canonizado o PadreAmérico, modelo de amor cristão, emgenerosidade sem limites, inteligentee eficaz, no quadro de uma pedagogiapara a liberdade e autonomia. (...)

Anselmo BorgesDiário de Notícias

QUEM TEM MEDODE MARINHO PINTO?

Não pode deixar de causar perple-xidade os ataques de que Marinho Pin-to (ou Marinho e Pinto) tem sido alvo.Ele não fala baixinho, não sussurra,não vive dos seus próprios venenos, eem nada contribui para garantir a qui-etude das águas palustres. Vai-nos re-velando, com estremecedor vozeirãoe gestos a condizer, que muitos com-ponentes da sociedade portuguesa,criminais e legais, estão imbricadosuns nos outros. E tem exigido que se-jam submetidas a controlos reais al-gumas veneráveis instituições e suasactividades peculiares.

Não me parece que Marinho Pintohaja sido tocado pela desonestidade,pela indecência, pela indignidade, oumovido por interesses cavilosos. Que-rem-no brunido, direitinho, ajeitado,dentro da esquadria: um artesão for-mal da aplicação das leis e seu com-placente vigilante. Ele é, definitiva-mente, o contrário dessa banalizaçãoprecaucionista que atingiu todo o te-

cido social e garantiu a instauração daindiferença, do abandono cívico e, fi-nalmente, da coisificação do medo.

As velhas classificações foram re-cuperadas do pó dos armários ideoló-gicos: populista, esquerdista radical,chavezista; e apontado, acriticamen-

te, à execração popular, entre malici-osas meias-frases, silêncios ambíguose sorrisos equívocos. O homem falaalto e grosso, enfrenta situações peri-gosas porque, nitidamente, está a me-xer em áreas historicamente inamo-víveis e diz-nos de uma justiça, na suaopinião “miserável” e desprovida dos“valores mais elementares.” (...)

Baptista BastosDiário de Notícias

ESPINHO NA EDUCAÇÃO

Não temos nada que “relativizar ascoisas”, Senhora Ministra da Educa-ção. O caso da professora da escolade Espinho que dava aulas a criançasde 12 anos da forma como a grava-ção ilustra não pode ser minimizado,porque é invulgarmente grave.

Dito de maneira mais clara, ou aprofessora é desequilibrada e deveestar longe de crianças e a ser trata-da em qualquer psiquiatria, ou a pro-fessora, ano após ano, é consideradapronta para o ensino, e então deve serseveramente punida e o conselho exe-cutivo da escola igualmente penaliza-do, por encobrimento do comporta-mento da docente e por incapacidadepara proteger crianças.

Tenho ouvido e lido nos últimos diasa intenção de castigar a criança quegravou a arenga sinistra da professo-ra, por não ser permitido aos alunos a

utilização nas aulas de gravadores eoutros instrumentos similares. Eu es-pero e desejo que ninguém cometaessa injustiça. A criança que gravouo que estava a acontecer na aula de-via ser louvada, não punida, porque àsvezes não há outra forma de chegar-

se à verdade. (...)

Emídio RangelCorreio da Manhã

A COMISSÃO

Algo de muito errado se está a passarno Banco de Portugal, nas grandes comonas pequenas coisas.

A actuação da Comissão Parlamen-tar de Inquérito ao caso BPN é, a todosos títulos, digna de elogio público. NumPaís atávico, a Comissão foi pró-activa;num País de improvisos, fez o seu traba-lho de casa, preparou-se; num País emque qualquer dificuldade justifica um adi-amento, superou os muitos que lhe sur-giram, incluindo a falta de cooperaçãoda supervisão.

Esta Comissão Parlamentar restituiuaos olhos do cidadão um pouco da confi-ança de que a Assembleia da Repúblicaé deficitária e isto num momento em queas Instituições em geral parecem derro-car e as referências se esfumam umasatrás das outras (com poucas excepções,que também as há). Vivemos tempos emque nenhuma ordem normativa parecevaler para muitos que foram chamadosa grandes responsabilidades.

Ao contrário, o papel desempenhadopelo Banco de Portugal não deixa de serprofundamente lamentável: das sempreoptimistas mas erradas previsões econó-micas, ao falhanço enquanto instituiçãode supervisão, até à recusa de coopera-

ção devida à Assembleia da República(ao recusar-se a facultar documentaçãoà Comissão de Inquérito).

É evidente que algo de muito erradose está a passar com o Banco de Portu-gal, nas grandes como nas pequenas coi-sas: não são só as previsões económi-cas, nem o brutal falhanço na supervi-são – e o BPN está longe de ser o únicocaso, como é público –, há ainda a muitodesastrada tentativa de aumento das re-munerações dos seus órgãos dirigentese aqui, com franqueza, não havia mes-mo necessidade. Mas ninguém se inco-moda ou parece incomodado, muito me-nos os próprios. (...)

Paula Teixeira da CruzCorreio da Manhã

ELOGIO DAS REVOLUÇÕES

Duzentos e vinte anos depois de 1789,o corpo da Revolução ainda mexe. Ape-sar de François Mitterrand ter convida-do Margaret Thatcher e Joseph Mobu-tu para confirmarem o seu enterro,aquando das cerimónias do bicentená-rio. E porque esse ano das comemora-ções foi também o da queda do Murode Berlim, Francis Fukuyama anunciouo «fim da história», ou seja, a eternida-de da dominação liberal exercida sobreo mundo e o encerramento, a seu ver,do parêntesis revolucionário. Mas a cri-se do capitalismo está de novo a abalara legitimidade das oligarquias no poder.O ar está agora mais ligeiro, ou maispesado, segundo as preferências. Alu-dindo «aos intelectuais e artistas queapelam à revolta», o diário Le Figaromostrou-se desolado: «François Furetparece ter-se enganado: a RevoluçãoFrancesa não terminou» [1].

No entanto, como muitos outros, o his-toriador em questão não se poupou aesforços para esconjurar a lembrança daRevolução e para que as tentações seafastassem dela. Outrora consideradaexpressão de uma necessidade histórica(Marx), de uma «nova era da história»(Goethe), de uma epopeia encetada pe-los soldados do Ano II cantados por Vic-tor Hugo – «E víamos marchar os so-berbos maltrapilhos nesse mundo des-lumbrado» –, dela já se mostrava ape-nas o sangue que tinha nas mãos. DeRousseau a Mao, uma utopia igualitária,terrorista e virtuosa, teria espezinhado asliberdades individuais, parido o gélidomonstro do Estado totalitário. Depois, a«democracia», voltando a sentir-se se-nhora de si, vencera – jovial, pacífica, demercado. Também ela herdeira de revo-luções, mas de uma outra espécie, à in-glesa ou à americana, mais políticas doque sociais, «descafeinadas» [2]. (...)

[1] Le Figaro, Paris, 9 de Abril de 2009.[2] «Em suma, o que a sensibilidade liberal

exige é uma revolução descafeinada, uma revolu-ção que não tenha o sabor da revolução», resumeSlavoj Zizek em Robespierre: entre vertu et terreur,

Stock, Paris, 2008, p. 10.

Serge HalimiLe Monde Diplomatique

Marinho Pinto

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10 29 DE MAIO DE 2009SEGURANÇA arte em café

O Secretário de Estado Adjunto e da Administração In-terna, José Magalhães, presidiu ao encerramento do II Fó-rum Distrital de Segurança, que decorreu nos dias 26 e 27de Maio, na Casa da Cultura de Coimbra, numa iniciativado Governo Civil de Coimbra.

Na sua intervenção, o Secretário de Estado considerouque “vale a pena pensar a segurança a nível distrital”, elembrou que “nunca podemos esquecer que a segurança évivida à escala onde vivemos e trabalhamos”. Perante umaplateia onde se encontravam representantes de todas asforças de segurança do Distrito de Coimbra, José Maga-lhães destacou a estratégia do Ministério da AdministraçãoInterna assente na “união de esforços”, considerando umamais-valia o sistema de coordenação aprovado com a revi-são da lei de segurança interna, que “passou pela nomea-ção de um secretário-geral em funções de coordenaçãosistémica”. “O caminho da coordenação é possível e dáresultados concretos”, afirmou.

O governante revelou que no próximo dia 3 de Junho irádefender na Assembleia da República a proposta de lei“para criar a plataforma para o intercâmbio de dados einformações criminais”. Trata-se de uma ferramenta infor-mática nova, que vai permitir a partilha de informações, quem ciclo infernal desgastante” que desafia a autoridade doEstado de Direito Democrático. A nova versão do diploma,segundo José Magalhães, é uma resposta do Estado a “umciclo infernal de capturas e libertações em ‘porta giratória’que importa ser parado”.

DOIS DIAS DE DEBATEE TROCA DE EXPERIÊNCIAS

O Governador Civil de Coimbra, Henrique Fernandes,ao explicar o objectivo do II Fórum Distrital de Segurança,disse que este debate, em que participaram especialistasdiversos, visou “contribuir para o aprofundamento da de-mocracia, livre, justa e segura”. “A segurança de pessoas ebens, que é na essência o motivo deste Fórum, está intima-mente ligada ao próprio exercício da liberdade, nos diversosdomínios da vida social”, afirmou, concretizando que “apartilha de informação entre os organismos e forças desegurança, a sua difusão pela sociedade civil e, muito emespecial, a afirmação pública do esforço meritório que oshomens e mulheres que fazem, todos os dias, a segurançaempreendem - a publicidade dos bons exemplos! - conduzi-rão, necessariamente, a um maior sentido de auto-protec-ção e à instituição de uma verdadeira cultura de prevençãoe segurança”.

Organizado a partir da actividade desenvolvida pelo Ga-binete Coordenador de Segurança Distrital, o encontro, coma participação de todos os organismos e forças de seguran-ça que integram aquele gabinete, pretendeu contribuir parao esclarecimento público e para a divulgação de boas prá-

AFIRMA EM COIMBRA O SECRETÁRIO DE ESTADO JOSÉ MAGALHÃES

Nova Lei das Armas será travãopara “um ciclo infernal desgastante”

ticas em matéria de segurança, reforçando a confiança doscidadãos no sistema e fomentando uma ideia de responsa-bilidade colectiva, neste domínio, em que o contexto escolaré um palco privilegiado.

Ao longo de dois dias, foram vários os painéis de grandequalidade a que a assistência, composta por elementos dasforças de segurança e estudantes, puderam assistir. No dia26, decorreu o painel da Polícia de Segurança Pública quereflectiu sobre a sinistralidade rodoviária do Concelho deCoimbra e confrontou o público com a ideia de que o perigonão reside nas grandes vias de trânsito nos excessos develocidade nas auto-estradas, mas que as cidades são, elaspróprias, uma fonte de riscos, em matéria de sinistralidaderodoviária, que merece atenção.

Seguidamente, a Polícia Judiciária apresentou os extra-ordinários desafios que o avanço da ciência, em especial nodomínio da internet, nos impõe. Há um mundo de oportuni-dades de desenvolvimento e progresso associado à inter-net, mas que se faz acompanhar de riscos, nem semprefáceis de calcular e que colocam particularmente os jovens

em situação de vulnerabilidade.No mesmo dia, da parte da tarde, a Guarda Nacional

Republicana explicou o modo de actuação no âmbito doPrograma Escola Segura e como o contexto escolar podetambém ser uma fonte de perigos, em que os jovens, maisuma vez, são potenciais vítimas de ameaças externas, nemsempre fáceis de controlar.

Seguiu-se o painel apresentado pelo Serviço de Estran-geiros e Fronteiras, sobre Imigração e Segurança, que rom-pendo alguns preconceitos, até algumas mistificações dasociedade portuguesa, projectou a assistência para umaabordagem de face humana do fenómeno da imigração,para uma filosofia de abertura regulada, de entusiasmo pe-las oportunidades e atenção quanto às eventuais ameaças,que não são, definitivamente, uma marca distintiva da popu-lação imigrante.

Já no dia 27, destaque para a Autoridade para a Segu-rança Alimentar e Económica, que explicitou a sua missão,que protege os cidadãos e as empresas, todos os dias, ga-rantindo melhores condições de segurança em muitos com-portamentos da vida quotidiana.

O Secretário de Estado José Magalhães troca impressõescom o Governador Civil Henrique Fernandes

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1129 DE MAIO DE 2009 REPORTAGEM

Há 40 anos a crise académica de 1969 irradiou daUniversidade de Coimbra à cidade e ao país. Agora vol-tou à rua, numa arrojada mostra por locais onde o con-fronto com o regime estive mais aceso.

Até ao final do corrente ano grandes painéis, comfotografias de figuras humanas em escala real recordamaquele momento da história estudantil e de Portugal em18 pontos da cidade, trazendo-o à memória de alguns, oudado notícias daquele tempo a outros.

“Quisemos estender esta exposição até ao final doano com o objectivo de ficar aqui uma marca histórica.Passar a palavra para a sociedade civil, para os turistas,da importância que este momento teve nas lutas estu-dantis, e no futuro do nosso país, para que isso não sejaefectivamente esquecido”, explicou à agência Lusa opresidente da Associação Académica de Coimbra(AAC), Jorge Serrote.

Cada local apresenta um painel informativo sobre osacontecimentos mais marcantes que ali se desenrolaram,em português e inglês, não descurando os turistas que ele-gem a universidade como um pólo incontornável da visita.

“A Crise saiu à rua – Um olhar sobre a Academia deCoimbra em 1969” é uma mostra organizada pela Associ-ação Académica de Coimbra (AAC) em colaboração coma empresa municipal Turismo de Coimbra, que procuraevidenciar os principais momentos dessa luta estudantil.

O objectivo é recriar todo o ambiente vivido na Aca-demia, mas também na cidade, com recurso a figuras efotografias da época à escala humana e diversos ele-mentos sonoros e visuais com uma forte carga drama-túrgica.

“O que quisemos foi, não só dar uma noção dos mo-mentos marcantes, na universidade, e nos espaços físi-cos da universidade, mas também na cidade, por ondeforam acontecendo episódios marcantes”, explicou o di-rigente estudantil.

É precisamente no Pátio da Universidade que se en-contra o centro interpretativo do movimento mais mar-cante da academia coimbrã. Nele se dá a conhecer aCrise Académica e a sua contextualização política, des-de a fundação da AAC, em 1888, até ao 25 de Abril de1974.

Os restantes 17 núcleos expositivos encontram-se im-plantados nos espaços onde mais se fez sentir o movi-mento estudantil, desde a Via Latina, Largo D. Dinis e a

Evocação na rua da Crise Académica de 1969

Sala 17 de Abril, até ao Largo da Portagem, passandopela Praça da República, a antiga sede da PIDE/DGS,o edifício da Associação Académica de Coimbra, aAvenida Sá da Bandeira e a Baixa.

Na antiga sede da PIDE, onde actualmente funcio-na um centro de saúde, podem-se ouvir os sons dointerrogatório e dos gemidos de um estudante a sertorturado.

Nas Escadas Monumentais, um antigo jipe das for-ças policiais, e imagens de agentes da autoridade acavalo dominam o núcleo expositivo, onde a fotos degrupos de estudantes, com faixas com reivindicações,impõem a sua força.

Nas escadas do Quebra-Costas, na descida daAlta Universitária, para a Baixa, também os agen-tes a cavalo se impõem por entre magotes de tu-ristas que diariamente as percorrem. Na Baixa nãofoi esquecido um expositor horizontal em forma deflor, alusivo à “Operação Flor”, de mobilização dos

habitantes da cidade.Segundo Jorge Serrote, com esta exposição a geração

actual de dirigentes pretendeu evidenciar o ideário que vemmarcando a AAC ao longo das décadas, e transmitir amensagem de que “infelizmente algumas causas ainda sãoactuais”, como é o caso do Regime Jurídico das Institui-ções de Ensino Superior (RJIES), que representa “um re-trocesso de 40 anos” em termos de autonomia dos estabe-lecimentos e da participação estudantil

“Queremos honrar esta centenária instituição, continu-ar a lutar, a transmitir os seus valores no nosso dia-a-dia,apesar de algumas causas serem diferentes, embora ou-tras sejam idênticas, infelizmente. A força, e a garra, paradefender os estudantes, é que continua a ser a mesma”,concluiu.

(Fotos de Paulo Abrantes)

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12 29 DE MAIO DE 2009DIA MUNDIAL DA CRIANÇA

UM EM CADA DEZ MUNICÍPIOS TEM MENOS DE 500

Interior de Portugalestá a ficar sem crianças

Um em cada dez municípios portu-gueses tem menos de 500 crianças.Para combater a desertificação, háautarcas que dão 200 euros mensaispor cada bebé que nasce e se ofere-cem para pagar os estudos. Mas asescolas continuam a encerrar.

Dados provisórios do Instituto Na-cional de Estatística (INE) indicam que89 dos 308 municípios têm menos demil crianças e, deste número, 28 nãochegam sequer a ter meio milhar dehabitantes entre os zero e os 14 anos.

Em Ribeira de Pena, um concelhocom 901 crianças, o presidente da Câ-mara ficou chocado quando um pro-fessor sugeriu que podia dar as aulasem casa. A escola primária de Maci-eira tinha apenas dois alunos e a au-tarquia decidiu encerrar a escola, as-sim como outras cinco da freguesia deSalvador e outras quatro de Cerva.

“Havia escolas com três ou quatroalunos, o que é mau para a socializa-ção das crianças e para a motivaçãodos professores. Por isso falei com

os pais e professores e comecei a fe-chá-las”, recorda o presidente da Câ-mara, Agostinho Pinto.

O autarca não sabe de cor quantasprimárias já encerrou, mas garanteque há outras três a funcionar quedeverão estar vazias no próximo anolectivo. Os meninos de S. Eulália, San-ta Marinha e Canedo vão passar parao Centro Escolar de Cerva.

De acordo com os dados do INE,relativos a 2007, Ribeira de Pena tem901 crianças entre os zero e os 14 anos.Agostinho Pinto garante que existemmais e lembra que “houve um aumen-to de 20 por cento da natalidade”.

Em 2005, a autarquia lançou umprograma de incentivo: dar 200 eurosmensais por cada filho nascido atéfazer dois anos de idade. Neste mo-mento, garante, estão a ser apoiadas123 famílias, num projecto que repre-senta um custo de 135 mil euros parao município.

“Não conheço Câmara nenhumacom um programa como o nosso”, diz

orgulhoso, lembrando que Ribeira dePena decidiu também “suportar na to-talidade” o material escolar das cri-anças do 1.º ciclo. Mas, para o autar-ca, o programa “ainda não surtiu oefeito que esperava”.

Para o presidente da AssociaçãoNacional dos Municípios Portugueses,Fernando Ruas, a desertificação é um“drama” que precisa de políticas na-cionais de apoios e não apenas de me-didas locais, que “são importantes masnão conseguem ser determinantes”.

A discriminação positiva da cargafiscal, a distribuição igualitária dosgrandes investimentos e a atracção deempresas para o interior são algumasdas medidas que Fernando Ruas gos-taria de ver tomadas pelo Governocentral. Tudo para inverter a tendên-cia das aldeias desertas.

“Sem crianças, não há escolas, nãohá necessidade de casas para os pro-fessores e todos os serviços associa-dos à Educação, como as papelarias,acabam por sofrer por arrastamento”,

lembrou, apontando o interior alente-jano e as Beiras como os casos maisdramáticos. É na Beira Interior quese encontra o município com menoscrianças: com uma população de pou-co mais de 3500 pessoas, Vila Velhade Ródão tem apenas 235 habitantesentre os zero e os 14 anos.

Mas é no Alentejo que se nota maisesta carência. Dos 28 municípios na-cionais com menos de 500 crianças,dez são desta zona do país. Alter doChão, por exemplo, tem 408 criançasaté aos 14 anos, de acordo com o INE.

O responsável do sector da AcçãoSocial de Alter do Chão, FernandinoLopes, lembra o caso da freguesia daCunheira, com apenas três criançasno pré-escolar: “Aberto das 08:00 às18:00, o Jardim de Infância tem umaeducadora e duas auxiliares para to-mar conta das três crianças”.

O Dia Mundial da Criança assina-la-se no próximo dia 1 de Junho.

Sílvia Maia (Lusa)

Em São Tomé o número de criançasestá a aumentar substancialmente

Nos países ditos desenvolvidos o índice demográfico diminuide forma preocupante. É o que sucede em Portugal, onde a taxade natalidade tem diminuído de maneira muito sensível, sobretudoem todo o interior do País.Em contrapartida, há países que podem, nesse aspecto, encarar ofuturo com grande confiança, pois neles esse problema não existe.

É o caso, por exemplo, de São Tomé e Príncipe (onde foi obtida aimagem acima).Um País onde às espantosas belezas paisagísticas e riquezada luxuriante flora, se alia uma população muito jovem, ondepredominam as crianças, o que permite aquela antiga colóniaencarar o seu futuro com optimismo.

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1329 DE MAIO DE 2009 DIA MUNDIAL DA CRIANÇA

Andam sozinhas nas ruas do bairro ou pela mão dos ir-mãos mais velhos. São crianças portuguesas que a Unicefdecidiu ajudar na esperança de lhes encontrar um futuromelhor.

Não existem estradas no Bairro Seis de Maio, na Ama-dora. Só becos e ruelas estreitas onde os mais pequenosdescobrem sempre novas brincadeiras. Mas é no CentroSocial Seis de Maio que passam a maior parte do tempo.

Muitos chegam ali sozinhos, porque os pais tiveram desair de casa de madrugada. “Há mães que trabalham emserviços de limpeza e, por isso, saem de casa às cinco ouseis da manhã”, explica Rosa Maria Coutinho. Os filhosficam entregues aos irmãos mais velhos ou aos avós, mastambém há muitos deixados ao abandono. Têm sorte emviverem num bairro pequeno onde toda a gente se conhe-ce. Mas azar por passarem por tantas dificuldades.

O Centro Social Seis de Maio, criado pela Comunidadedas Irmãs Missionárias Dominicanas do Rosário, acolhe di-ariamente mais de 120 crianças na creche, pré-escolar eactividades de tempos livres.

A Unicef (Fundo das Nações Unidas para a Infância) dáapoio àquela instituição promovendo actividades de forma-ção familiar, como a prevenção de acidentes domésticos, etentando envolver mais os pais na vida dos filhos. “É preci-so que percebam a importância de estarem presentes navida dos filhos”, sublinha.

No entanto, reconhece Rosa Maria Coutinho, “não é fá-cil chegar às famílias e aos pais”. E ultimamente as coisasparecem mais complicadas.

O desemprego atingiu muitas das famílias do bairro e issorepercute-se na forma como as crianças são tratadas: “Temhavido mais casos de negligência”.

“Há um esforço de todos, mas já começam a aparecersituações de sobrevivência ao nível da alimentação. A situ-ação económico-financeira dos pais também tem levado acasos de abandono de crianças, que são deixadas já no fi-nal da recta”, lamenta Rosa Maria Coutinho, lembrandohistórias de “instituições que têm de dar banho às crian-ças” porque os pais se demitiram da tarefa.

“Quando a família não tem garantidos os recursos quelhes permitem a sua sobrevivência o desânimo instala-se”,explica a assistente social, que acredita na boa vontade dospais e no desejo de querer dar o melhor aos filhos.

O outro programa apoiado pela Unicef é no Bairro doCondado, em Chelas, onde os problemas são semelhantes,com o desemprego a assombrar a vida de muitos. O CentroSocial e Paroquial São Maximiliano Kolbe recebe actual-mente 150 crianças e há mais de duas décadas que contacom o apoio da Unicef.

Rosa Maria Coutinho já conta histórias de jovens quepor ali passaram e hoje têm um projecto de vida consolida-do. “Uma das animadoras do Centro andou cá quando erapequenina”, recorda, sublinhando que “as crianças portu-guesas têm situações complicadas mas não tem nada a vercom o que se passa noutros cantos do mundo”.

HÁ VÁRIAS INSTITUIÇÕESDE APOIO ÀS CRIANÇAS

Refira-se que a UNICEF tem representantes em diver-

UNICEFapoia criançasde bairrosproblemáticos

sos outros pontos de Portugal, incluindo Coimbra e Região Centro, com muitos elementos,sobretudo voluntários, que igualmente desenvolvem muita acções de apoio a crianças mais des-protegidas.

Mas não é só a UNICEF. Existem muitas outras instituições que dão um notável apoio acrianças de famílias carenciadas ou que nem sequer têm família.

Em Coimbra, por exemplo, podemos referir, entre outras, a Comunidade de São Francisco deAssis, a Casa de Infância Doutor Elísio de Moura, a Casa do Gaiato, a APPACDM (Associa-ção Portuguesa de Pais e Amigos do Cidadão Deficiente Mental), a APPC (Associação Portu-guesa de Paralisia Cerebral).

E há obras semelhantes em muitas outras localidades da Região Centro.Mas todas estas instituições lutam com dificuldades, até porque nos momentos de crise, como

aqueles que agora se vivem, normalmente diminuem os donativos que são imprescindíveis paraapoiar um número de cada vez maior de crianças carenciadas.

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14 29 DE MAIO DE 2009EDUCAÇÃO/ENSINO

A Via Latina na Universidade de Co-imbra foi seleccionada como um dos 28melhores projectos de 2009 na área dopatrimónio cultural europeu, anunciou hádias a Comissão Europeia em Bruxelas.

A repartição entre sete “grandes pré-mios” e 21 “prémios” será divulgada du-rante uma cerimónia oficial de entregados galardões no Teatro Antico de Taor-mina, na Sicília (Itália), em 5 de Junho.

Estes prémios distinguem “realizaçõesexcepcionais” no domínio da conserva-ção, da investigação e da educação, bemcomo contribuições exemplares no âm-bito da preservação do património.

Cada um dos vencedores dos gran-des prémios receberá um montante de10.000 euros.

A Via Latina, erigida na segunda me-tade do século XVIII, facilita o acessoentre o Paço Reitoral, a Sala dos Cape-los e o edifício dos Gerais e é, junto coma Torre da Universidade, uma das refe-rências monumentais do paço das Esco-las da Universidade de Coimbra.

PATRIMÓNIO CULTURAL EUROPEU: PRÉMIOS SERÃO DIVULGADOS A 5 DE JUNHO

Via Latina na Universidade de Coimbraé um dos melhores projectos

A finalidade dos prémios é promovercompetências de alto nível e elevadaqualidade na prática da conservação eincrementar os intercâmbios transfron-teiriços na área do património.

Os prémios visam igualmente inspirarnovos esforços e projectos relacionadoscom o património em toda a Europa.

Os Prémios do Património Cultural daUnião Europeia / Prémios Europa Nostraforam lançados conjuntamente em 2002pela Comissão Europeia e por EuropaNostra para assinalar iniciativas de relevono sector do património cultural europeu,em categorias que incluem restauro deedifícios e respectiva adaptação a novosusos, recuperação da paisagem urbana erural, interpretações de sítios arqueológi-cos e conservação de colecções de arte.

São também atribuídos prémios a pro-jectos de investigação, educação e sen-sibilização relacionados com o patrimó-nio cultural e a contribuições exempla-res de indivíduos ou organizações no do-mínio da conservação do património.Aspecto da “Via Latina” e da velha Torre da Universidade de Coimbra

A candidatura da Universidadede Coimbra a património da hu-manidade vai deixar uma marcaque não será inferior à do EstadoNovo na cidade universitária, afir-mou no passado dia 22 um dos seusresponsáveis.

“Há um ‘campus’ universitá-rio informal, novo, a partir docasco histórico da cidade. Hátodo um conjunto de edifíciosque vão marcar a Alta e a ima-gem da cidade”, salientou Antó-nio Filipe Pimentel, Pró-Reitor daUniversidade para as questões dopatrimónio e coordenador da can-didatura à UNESCO.

Numa sessão no renovado Mu-seu Nacional de Machado de Cas-tro, sublinhou que “a marca vai fi-car generalizada”, realçando que“o casco histórico não nasceu deum jacto” mas é o resultado de transfor-mações e de incorporações ao longo dosséculos.

António Filipe Pimentel, igualmentedirector do Instituto de História da Arteda Universidade de Coimbra, disse quetambém nesta intervenção contemporâ-nea “há uma marca ideológica, que não

AFIRMA PRÓ-REITOR ANTÓNIO PIMENTEL

Candidatura da Universidade à UNESCOnão deixará marca inferior à do Estado Novo

é menor que a do Estado Novo ou a Pom-balina”.

Quer a do Estado Novo, quer a Pom-balina destruíram para apagar o passadomas a de hoje “é anti-autoritária, de par-ticipação de todos na construção da po-lis”, considerou.

No entendimento do especialista, há

hoje em qualquer intervenção uma res-ponsabilidade acrescida, “que vem daevolução da história, da ciência, da his-tória da arte” mas “há uma escassa cul-tura cívica e o desafio colocado é o doenvolvimento das instituições”.

“A candidatura à UNESCO é um actocontemporâneo em relação ao patrimó-

nio. É um meio para encontrar fu-turo para o passado”, afirmou, re-alçando que para a reabilitação dopatrimónio é necessário fazer re-gressar a vida e fruição à zonada Alta universitária.

Isso passa por fazer retornaros estudantes à zona e criar no-vos espaços de animação e defruição. Uma das intervençõesprevistas é a instalação de umaresidência universitária nos pisossuperiores da actual Faculdade deMedicina, após a sua transferên-cia para as proximidades dos Hos-pitais da Universidade de Coim-bra (HUC).

“É uma candidatura à UNES-CO que não tem modelo. O quese candidata é a instituição, a Uni-versidade de Coimbra mas na suamaterialidade. É uma escola, etem de ser exemplar”, concluiu.

A candidatura da Universidade deCoimbra a Património da Humanidade émais abrangente que o actual ‘campus’universitário da Alta, devido à sua “rela-ção umbilical” com a cidade. O projectoestá em fase de conclusão e a formali-zação à UNESCO deverá ocorrer no fi-nal do corrente ano.

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1529 DE MAIO DE 2009 EDUCAÇÃO/ENSINO

* Professora e dirigente do SPRC

Por vezes, o real parece surreal, de talforma é flagrante a sua falta de racionali-dade ou o seu carácter inverosímil; comose os que o vão desenhando fossem imbu-ídos do espírito lúdico que animou os sur-realistas, inventores dos cadavre exquis,criações colectivas em que o criador nãotinha em conta tudo o que já existia e des-prezava a causa ou as conclusões dos seusactos, preocupado com o seu elementoparcelar e o seu próprio estilo e privilegi-ando os automatismos e as associaçõesinconscientes.

Essa riqueza estilística e onírica que tantoenriquece a arte, se aplicada ao governodas instituições e das pessoas, rapidamen-te se aparenta com a loucura, provocandosurpreendentes e, por vezes, grotescasevoluções na história.

Muitas das notícias que têm vindo a pú-blico no âmbito da educação fazem pensarque se vive num permanente espírito deblague, do mais duvidoso gosto, configu-rando um cadavre exquis desmembradoe retorcido.

A ocupar a tela temos o concurso deprofessores, o qual, entre muitos atrope-los, assenta a fractura dos docentes emtitulares e professores - os primeiros impe-didos, na prática, de mobilidade e os se-gundos encurralados num futuro que é umbeco sem saída e todos cada vez mais des-protegidos; o voluntariado dos professoresreformados, uma tentativa, à Chico-esper-to, de evitar a contratação; uma propostada Confap de permanência, dos alunos doprimeiro ciclo, de doze horas na escola, a

Surrealismo políticoqual se substituiria às muitas outras insti-tuições e medidas que deveriam existir parasuprir a acção das famílias carenciadas egarantir efectivas condições de conciliaçãoda vida laboral e da vida familiar; a mesmaConfap, na voz do seu iluminado presiden-te, a assegurar que apenas assim será ga-rantida a sobrevivência da escola pública,com o límpido argumento de que “Esta coisade despejar a matéria e depois esperar que,em casa, os pais tenham literacia suficien-te e computadores para ajudar os filhos aperceber as matérias tem que acabar, por-que o mundo mudou e as escolas têm quese adaptar” - quando o que parece estarem causa não é a tosca imagem que estesenhor tem da docência como acto de“despejar”, mas sim a falta de tempo e dedisponibilidade que as famílias têm para es-tar com os filhos; o relatório da OCDE queafinal era encomenda do ME aos mesmosestrangeiros que, conjuntamente com a tec-nologia, continuam a fazer de nós provin-cianos pessoanos, pela adoração cega quedespertam; o mesmo relatório que sugeriaabolir os chumbos no primeiro ciclo por-que “Às vezes, a retenção é a desculpapara quem ensina mal”, o que é um exce-lente exemplo de profunda capacidade depensar a realidade e de fundamentar asdecisões - só é pena que não se possa aca-bar de vez com os professores, já que oproblema das estatísticas do sucesso fica-ria automaticamente resolvido; a odisseiado Magalhães, com a angústia das crian-ças e dos pais pelo atraso na sua distribui-ção e a ausência de debate fundamentadosobre os seus efeitos ao nível da aprendi-zagem da leitura e da escrita; a mesma

odisseia com o censurado carnaval deTorres Vedras e a nova língua portuguesa,o magalhanês; e, para acabar em festa,uma região preocupada com os bolos comcreme nas escolas, “Nas festas de aniver-sário podem levar um bolo com creme, masdaquele que se tira facilmente depois deserem apagadas as velas” - não é que nãoentenda as preocupações dietéticas, maseu, que me arrepio com esta tendência nor-mativa do pormenor existencial, que sofroa vitória do lobby, sim, que só pode seracção de grupos de pressão, do fiambre(ainda por cima de baixa estirpe) e do queijode batata nas escolas, não consigo deixarde imaginar a desilusão daqueles meninosque sopram a vela e vêem o monstro que,de faca em riste, purifica o bolo, rapando-lhe o creme que se estava a rir para eles.

Sendo este creme uma triste metáforade tudo o que nos vem sendo tirado daboca, só nos resta esperar pelas eleiçõesque se aproximam e então, em bom ma-galhanês, bamos a procurar os cadáve-res que empestãm o ar, tirar-los dasbocas das urnas e dar-lhes um bom xutode vês ou, indo até à DREN, em margari-demoreirês: sendo certo que muitos do-centes não aceitam o uso dos alunosnesta atitude inaceitável, acompanha-remos de muito perto a defesa do car-naval, dos bolos amordaçados e do fi-ambre a rir para a população. E quemnão perceber nada, não se aflija, é a istoque se chama surrealismo político; depoisdo apogeu da política do cadavre exquiso morto já não brinca e até cheira mal.

Isabel Dias *

O Processo de Bolonha, para uniformi-zar o ensino superior na Europa, não estaráaplicado até 2010, como assumido por 48países da Europa, segundo um relatório apre-sentado num encontro de ministros europeusdo sector, realizado recentemente em Lo-vaina, na Bélgica.

Os ministros do Ensino Superior dos 48países que aderiram ao processo de Bolo-nha reuniram para discutir a aplicação da-quele sistema, já praticamente concretizadoem cinco países, incluindo Portugal.

O relatório do Grupo de Acompanhamen-to ao Processo de Bolonha afirma que hou-ve progressos desde a cimeira de Londres,há dois anos, mas destaca que, contudo,“nem todos os objectivos do processo deBolonha serão conseguidos até 2010”.

“O prazo limite para completar a imple-mentação do Processo de Bolonha no ensi-no superior em 2010 parece ter sido dema-siado ambiciosa”, realça o relatório, acres-

Processo de Bolonha:Europa não cumprirá prazo de 2010

centando que “ainda há um largo númerode países que estão a começar ou ainda nãoiniciaram a implementação ao nível institu-cional [de Bolonha], pelo que a completaimplementação de uma moldura de qualifi-cações nacionais irá levar algum tempo”.

Como razões para este atraso, o relató-rio adianta que foram sendo acrescentadasnovas acções e actividades às intenções ini-ciais do processo e ainda que os países ini-ciaram o processo de reforma em temposdiferentes, segundo a sua adesão ao com-promisso.

O relatório alerta que, apesar de na legis-lação dos países parecer que não existemobstáculos, “num grande número de paíseso progresso não é tão significativo comopoderia parecer”.

Na generalidade dos países há falhas re-lacionadas com a aprendizagem fora do sis-tema formal de educação, pouca participa-ção de estudantes nos relatórios (muitas

vezes participam apenas como observado-res) e falta de implementação do sistemade créditos. Apenas uma minoria de paísestem sistemas de monitorização do progres-so da aplicação de Bolonha.

Aos governos, os relatores sugerem queconsigam a plena execução dos objectivosde Bolonha e que promovam estes princípi-os como relevantes para o emprego e parao acesso ao nível de ensino seguinte. Pe-dem ainda que adoptem medidas para atransparência das qualificações, um siste-ma de créditos, a aprendizagem ao longo davida, maior mobilidade dos estudantes e in-dicadores fiáveis para medir o progressosocial da aplicação dos programas.

Às instituições é sugerido uma coopera-ção regional mais dinâmica e criação deáreas de ensino superior que ajudem a re-gião a adaptar-se a desafios e a um ambi-ente político, económico, social e tecnológi-co global em permanente mudança.

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16 29 DE MAIO DE 2009SAÚDE

MassanoCardoso

Décios Junos Brutos

Realçar a importância da memória éuma perda de tempo. Todos a conhecem,a não ser que já não a tenham! De vezem quando, a minha teima em pregarpartidas ao não permitir que recorde osnomes das pessoas, sobretudo quandonão as vejo há algum tempo. Ainda porcima tenho que confessar que, desde queme conheço, nunca fui dotado para me-morizar nomes.

Esta curta reflexão surgiu devido a umepisódio que ocorreu há dias. Estava sen-tado num restaurante, quando, no cantooposto, vislumbrei duas pessoas conhe-cidas. Cumprimentei-as com um sorrisoacompanhado de um aceno de cabeça,mas fiquei bloqueado quanto aos nomes.Fiz um esforço terrível e nada! Ao fimde alguns segundos, graças a associa-

ções, lá consegui recordar o nome damais nova, mas quanto ao senhor nãoconsegui. Sabia que tinha o nome cá den-tro, mas não o encontrava. Fiz esforços,recordei-me de conversas, de certosacontecimentos, de vivências e sei lá quemais, mas do nome nada. Onde parariao raio do nome? Graças às tecnologias,agarrei no telemóvel, liguei-me à inter-net, coloquei palavras-chaves sobre osenhor e passados uns segundos apare-ceu no écran o seu nome. Uff! Que sen-sação de alívio! Já pude almoçar maistranquilamente.

Claro que este episódio obrigou-me arefletir sobre a memória e despertou vá-rias ideias. Uma delas tem a ver com aestranha sensação de que lemos, lemos,e pouco ou nada fica da leitura. Olhopara trás, e, na grande maioria dos ca-sos, não consigo recordar dos nomes dosautores, dos títulos dos livros, das coresdas capas, dos seus conteúdos, de algu-mas frases interessantes, chegando aoponto de os confundir, de os trocar, en-fim, uma terrível “amnésia”. Chegueimesmo a pensar que se conseguisse “re-ter” apenas um por cento do que leioseria uma vantagem do arco-da-velha.Ninguém tivesse pena de mim. Só que-ria um por cento, mas nem isso. A outratem a ver com técnicas de estimulaçãoe de treino da memória, algumas prati-cadas na escola primária, técnicas pri-márias que contrastam com técnicasmais sofisticadas, como a arte da mne-mónica desenvolvida desde a antiguida-de. De repente, lembrei-me de duas obrasa este propósito: o livro “O homem quesabia tudo”, cujo autor já não me lem-bro, que retrata, de forma romanceada,a vida e a obra de Giovanni Pico DellaMirandola. Fiquei surpreendido com opensamento deste humanista, e seduzi-do com a sua verdadeira memória de ele-fante, que chegou a memorizar obras in-teiras, facto que lhe dava particular van-tagem nos seus debates. A outra foi o“Tratado de Magia”, de Giordano Bru-no (deste lembro-me perfeitamente),onde estão, também, descritas algumas

técnicas que permitem reter ideias, omodo de as recordar e associá-las. Queinveja! Como se não bastasse estas re-cordações, lembrei-me do efeito amné-sico do rio Lethes e, como estava a al-moçar, associei-me a outro almoço (lem-bro-me, perfeitamente, de ter comido umótimo arroz de pato!) em que tinha parti-cipado meses antes na cidade de Vianado Castelo. No hotel, situado lá no alto, ecujo nome não me recordo, fiquei de bocaaberta perante a tapeçaria de AlmadaNegreiros a retratar a chegada das hos-tes romanas à beira do rio Lima. Diz alenda que a paisagem era de tal mododeslumbrante ao ponto dos soldados seterem recusado a passar para a outramargem, porque julgavam estar peranteo famoso rio do esquecimento. À medi-da que ia lendo, fiz um esforço dos dia-bos para decorar o nome do comandan-te. Na altura ainda consegui reter o nomemas, passados estes meses, já não con-sigo. Do Almada Negreiros lembro-me,assim com da encantadora tapeçaria querelata o episódio em que o comandanteatravessa o rio e, da outra margem, co-meça a chamar os soldados um por um,através do seu nome, provando que nãotinha ficado sem memória. Fui pesquisaro nome do comandante e disse: Ah! Pois!Agora já me lembro (depois de ler!) eraDécios Junos Brutos!

Para terminar, quero agradecer aoescritor alemão Patrick Suskind, o autorda célebre obra, que todos já ouviramfalar, “O Perfume”, que, num pequeno

livro (“Um Combate e outras históri-as”), com quatro pequenos ensaios, quecustou 1,5 euros, foi de uma grande aju-da. Um desses ensaios chama-se “Am-nésia in Litteris”, os outros já me es-queci. Neste ensaio, o autor relata a suaexperiência, a sua frustração sobre osesquecimentos, as trocas e as baldrocasprovocadas pela “falta de memória”. Fi-quei deliciado com a beleza, a franque-za, o humor e a profundidade do autor.Ao mesmo tempo tranquilizou-me, porque,afinal, também “sofro” do mesmo fenó-meno ou “doença”. Suskind afirma que,quando lemos um livro, a nossa consciên-cia, ao impregnar-se dos seus conteúdos,modifica-se de tal ordem que é incapazde fazer uma auto crítica, ou seja, sepa-rar-se dos efeitos, dos conteúdos, da be-leza, da alegria, da tristeza, de todas asvivências e pensamentos dos outros. Afi-nal somos o que somos e somos aquiloque lemos, mesmo que nos esqueçamosdos seus conteúdos, dos seus autores, dostítulos, das frases mais impressionantes,enfim, praticamente de tudo.

O mais certo é que daqui a algum tem-po já não recordar o nome do ensaio deSuskind, de o trocar com outro autor, denão me lembrar desta pequena crónica,mas sinto-me mais confortável pelo fac-to da minha consciência se ter modifica-do sem ter tido consciência de tal.

Claro que nunca serei um, como é queele se chamava? Deixa-me cá ver já oescrevi aqui algures: Ah! claro, DéciosJunos Brutos!

Patrick Suskind

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1729 DE MAIO DE 2009 SAÚDE

A Liga dos Amigos dos Hospitais da Universidade de Coimbra (LAHUC)apresentou a 15 de Maio um documento em defesa do Serviço Nacional deSaúde numa conferência de imprensa em que também estiveram presentesAntónio Arnaut, que criou o SNS quando era Ministro dos Assuntos Sociais,e Dulce Mendes, viúva do Prof. Mário Mendes, então Secretário de Etadoda Saúde e que teve uma participação muita activa na criação do SNS.

O documento intitula-se “Declaração de Coimbra” e pode ser assinadoem papel e na internet até ao próximo dia 15 de Setembro de 2009.

Em papel encontra-se disponível na LAHUC e na internet pode ser assi-nada em:

www.peticao.com.pt/declaracao-de-coimbraA petição começou a ser assinada em suporte papel pelos intervenientes

na sessão.Mais informações emwww.lahuc.com

APRESENTADA EM COIMBRA

Petição em favordo Serviço Nacionalde Saúde

Decorreram na passada semana as “IXJornadas da Delegação Centro da Funda-ção Portuguesa de Cardiologia e VI Reu-nião da Associação Portuguesa de Preven-ção e Reabilitação Cardiovascular

Na Quinta das Lágrimas, em Coimbra,no passado dia 21, durante a cerimónia inau-gural deste evento, Polybio Serra e Silva,um dos Presidentes da iniciativa, deu a se-guinte “Uma vista de olhos pelo Programa”,nos seguintes termos:

“Não obstante ser cada vez mais rara,em eventos deste tipo a Cerimónia Inaugu-ral, entendendo nós que a Promoção daSaúde deve ser da responsabilidade de cadaum, muito embora com o apoio médico, notocante à prevenção da doença, e não sen-

APELO DA DELEGAÇÃO CENTRO DA FUNDAÇÃO PORTUGUESA DE CARDIOLOGIA

“Dê a mão ao coração”do este apoio possível sem o auxilio das en-tidades oficiais, parece-nos pertinente a nos-sa Abertura Solene

Diz-nos a experiência que, numas Jorna-das voltadas, principalmente, para o Médi-

co de Família, os casos clínicos, quer decuidados primários quer secundários, sãosempre um momento alto, permitindo, peladiscussão que levantam, um indiscutível gan-ho cientifico, não só para os Clínicos Geraiscomo para os outros Especialistas, tendo,este ano, um valor acrescido pelo facto de,neste evento, termos envolvido, como públi-co -alvo, também Enfermeiros, Especialis-tas e Internos de várias outras Especialida-des e, até, alunos de Medicina e Enferma-gem.

Parece-nos, igualmente, que nada melhor,para dar a mão ao coração, do que co-meçar por saber como escolher o tipo deprevenção até porque de pequenino se tor-ce o pepino, como iremos ver nas quatrointervenções subordinadas a este tema emque é realçada a adaptação do coração dacriança ao desporto.

E se o colesterol, mais do que um factorde risco, parece ser a causa da aterosclero-se, será importante saber quais os objecti-vos a atingir, principalmente quando em pre-sença de diabetes e dislipidemia.

Como é indiscutível que, contrariar a oci-osidade, a má alimentação, o hábito de fu-mar e, duma maneira geral, o comportamentopouco saudável, é indispensável para darvida aos anos, daí a necessidade de educarpara não tratar.

Como pretendemos, nestas Jornadas,seguir o “continuum” que é a vida humana,resolvemos acompanhá-lo desde o diagnós-tico pré-natal das cardiopatias congénitas atéà reabilitação cardíaca do velho; naturalmen-te que, mesmo dois dias de trabalho, são umtempo muito acanhado para tão longo per-curso.

Na impossibilidade de arranjar espaço

temporal para Comunicações livres, que po-deriam solucionar o problema, resolvemosprivilegiar os Posters, se subordinados aotema das Jornadas. A selecção dos 25 apre-sentados e a discussão dos 10 melhores irá,não só permitir, naturalmente, complemen-tar os assuntos versados, como dar oportu-nidade à participação de mais oradores.

Pareceu-nos importante, também, prog-nosticar a doença cardiovascular global, re-cordando os aspectos da aterosclerose einflamação e das arritmias e insuficiênciacardíaca, não deixando de chamar a aten-ção para o facto de, muitas vezes, em ter-mos de tratamento, se estabelecer uma certaconfusão entre suplementos alimentares e

terapêutica farmacológica.Por entendermos que os Núcleos estão

para as Delegações, como estas para a Fun-dação mãe, sempre com a ideia de que aFundação Portuguesa de Cardiologia é umasó, embora com os seus braços estendidospara o resto do país, resolvemos dar a pala-vra aos Núcleos, num espaço suficiente parapoderem informar-nos do que já fizeram edo que pretendem realizar, entregando a pre-sidência, a moderação e os comentários aeste Painel, a elementos com responsabili-dade dentro da Instituição.

A comunhão com a APRECOR levou-nos, naturalmente, a ponderar como evitara morte súbita de causa coronária, enca-rando os factores desencadeantes da doen-ça coronária, a reperfusão coronária e o usodos CDI na presença da MS, bem como osdesfibrilhadores automáticos externos, na suaredução.

Preocupamo-nos, quase a terminar, coma reabilitação cardíaca - programa multidis-ciplinar, em que realçamos o interesse doexercício e da componente psíquica, na re-abilitação cardíaca e os dados e experiên-cia do Hospital Geral de Stº António.

Finalizamos, o que ainda não é muito vul-

gar mas virá a sê-lo num futuro próximo,com um caso clínico em directo, por tele-consulta em cardiologia, em que teremosoportunidade de, em tempo real, comentare discutir a patologia do coração de umacriança do Hospital Agostinho Neto de CaboVerde.

Um Jantar surpresa , original, depois doencerramento deste Evento, será o pontofinal destes dois dias de trabalho das IX Jor-nadas da Delegação Centro da FundaçãoPortuguesa de Cardiologia e VI Reunião daAssociação Portuguesa de Prevenção e Re-abilitação Cardiovascular, em que a alta cra-veira dos Conferencistas é o garante do Es-tado da Arte dos temas versados”.

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18 29 DE MAIO DE 2009A PÁGINA DO MÁ[email protected]

Mário Martins

SUSAN BOYLE NA FINALA escocesa de Blackburn festará na

final do programa “Britains Got Talent”.No domingo, Susan Boyle cantou

“Memories” e foi a primeira a ser apu-rada, pelo voto dos telespectadores.

Susan mostrou-se desta vez algo in-segura, talvez mesmo nervosa, mas ra-pidamente se recompôs e, mais uma vez,fez levantar o público.

A grande final é no sábado, a partirdas 20h00, no ITV1, canal disponível viasatélite nos 28,2 graus Este (frequência10 758, vertical).

Tentarei não falhar.(publicado em 26 de Maio)

A PROPAGANDAE A REALIDADE

Encontrei esta frase no “Twitter”:«Choque tecnológico é anunciar bué debanda super-larga quando para entregaro IRS a banda é super-lenta».

Aqui ao lado, ao cima da página, ocontador informa que o meu familiar estáà espera do cartão de contribuinte há 403dias!!! No país do Simplex.

Ou seja: uma coisa são as palavrasdos políticos, outra coisa é a realidade.

(publicado em 26 de Maio)

SIC NA CAMPANHADE RANGEL

Ricardo Costa, director-geral adjuntoda SIC, acompanhou hoje a campanhade Paulo Rangel (PSD) e disso acabade dar conta no telejornal das 20h00.

Espanto! Ricardo Costa acaba de afir-mar que uma bandeira da Europa com12 estrelas está desactualizada, porquelhe faltam 15 estrelas.

E terminou mais ou menos assim apeça jornalística:

«Tal como esta bandeira está desac-tualizada, também a campanha do PSDestá desactualizada...».

Nem queria acreditar!Ricardo Costa tem a obrigação de

saber que o número de estrelas da ban-deira que identifica a Europa nada tem aver com o número de países que fazemparte da União Europeia.

A bandeira não está desactualizada.Aquela é que é a bandeira – e ponto fi-nal.

Mas se Ricardo Costa não sabe, bas-ta ir ao “site” da Europa.

O que lá está escrito é esclarecedor:«Esta é a bandeira da Europa, símbolonão só da União Europeia, mas tambémda unidade e da identidade da Europa emsentido mais lato. O círculo de estrelasdouradas representa a solidariedade e aharmonia entre os povos da Europa. Onúmero de estrelas não tem nada a vercom o número de estados-membros. Asestrelas são doze porque tradicionalmen-

te este número constitui um símbolo deperfeição, plenitude e unidade. Assim, abandeira mantém-se inalterada, indepen-dentemente dos alargamentos da UE.»

Se a afirmação de Ricardo Costa nãotem como base o desconhecimento, en-tão a situação é mais grave.

(publicado em 24 de Maio)

NÃO VI, PACIÊNCIA...Toca o telemóvel.- Vê depressa a TVI! É cá uma “cena”!Rodei o botão e... estava mesmo a

terminar a entrevista de Manuela Mou-ra Guedes a António Marinho Pinto.

Vi para aí uns 20 segundos.Volta a tocar o telemóvel.- Ó pá, nunca tinha acontecido nada

disto nestes anos todos depois do “25 deAbril”. Foi cá uma coisa!...

Tenho pena de não ter visto.Mas são 21h30 (quando escrevo es-

tas linhas) e estou a trabalhar desde as8h00. Há dias assim.

(publicado em 22 de Maio)

SÓCRATES PELA PORTADAS TRASEIRAS

O primeiro-ministro foi hoje vaiado pelosalunos de uma escola de Artes em Lisboa.

No final da visita, Sócrates e comitivasaíram pela porta das traseiras.

Começa a ser um hábito...(publicado em 22 de Maio)

“O” LOPES (*)Há pormenores esclarecedores. Na

Quadratura do Círculo, António Costareferiu-se ao procurador Lopes da Mota- aquele nosso brilhante presidente doEurojust - como “o” Lopes da Mota. Oartigo definido não constituiu lapso freu-diano. Mota foi secretário de Estado deum governo de Guterres onde Costa tam-bém pontificava. A mulher de Mota é suavereadora - imagine-se - da cultura, emLisboa, e dá pelo nome de Rosália Var-gas (Lopes da Mota). Grande Lopes. O“nosso” Lopes. “O” Lopes.

(*) Sucinto e esclarecedor.Texto de João Gonçalves no “Portugal

dos Pequeninos”;publicado em 22 de Maio

ACREDITE SE QUISER (*)Notícias surpreendentes lá de fora: o

primeiro-ministro belga, Yves Leterme,propôs hoje (19/12/08) a demissão detodo o Governo, na sequência de acusa-ções de alegadas (alegadas, imagine-se!)pressões sobre a justiça. Leterme negaqualquer pressão sobre o poder judiciá-rio e apenas admite ter feito “contactos”;Michael Martin, presidente da Câmarados Comuns, anunciou hoje (19/05/09) ademissão, após acusações de alegada-mente (alegadamente, pasme-se) terconsentido alegados (só alegados) abu-sos nas despesas de representação dealguns deputados; dois membros da Câ-mara dos Lordes foram hoje (20/05/09)suspensos (suspensos, a democracia in-glesa está maluca!) por alegadamente(outra vez só alegadamente) terem acei-tado dinheiro para votar projectos de lei.

Nenhum deles foi, pasme-se de novo,condenado por sentença transitada emjulgado, e mesmo assim, pasme-se aindamais, tiraram consequências políticas dealegações fundamentadas que os visa-vam. Então e aquela coisa da “presun-ção de inocência”? As democracias bel-ga e inglesa têm que comer muita papaMaizena para chegarem aos calcanha-res da nossa...

(*) Manuel António Pina,no “Jornal de Notícias” de hoje;

publicado em 21 de Maio

ROTUNDA DA ESTRADADE EIRAS NA SIC

A mais famosa (e mais alterada) ro-tunda de Coimbra, a Rotunda da Estra-da de Eiras, que eu elegi com a “Obrado ano 2008” na cidade, teve hoje hon-ras de “directo” na SIC.

Foi no programa “Nós por cá” e con-tou com depoimentos de diversos utiliza-dores da famosa rotunda.

Engraçado, engraçado, foi ouvir umtécnico da Câmara Municipal de Coim-bra a dizer que a autarquia está aberta anovas alterações na rotunda (que já foialterada, pelo menos, quatro vezes!!!) e,acima de tudo, justificar a construçãocom a instalação nas imediações doINEM e de uma superfície comercial.

Sempre me pareceu, aliás, que o “cul-pado” da construção da rotunda foi... o“Minipreço”.

(publicado em 20 de Maio)

FUTURO DOS JORNAISAcabei de ler esta frase no Twitter:

«Só não vê quem não quer: o futuro dosjornais impressos depende da imediataadaptação aos novos parâmetros da in-formação.»

Concordo.(publicado em 20 de Maio)

«EU PERCEBO QUE VOCÊANDE ENJOADO...»

Dois excertos de (mais) um texto bri-lhante de João Miguel Tavares no “Diá-rio de Notícias”.

«Caro leitor: eu percebo que você andeenjoado. Eu próprio, semana após sema-na, sento-me em frente do computadorpara escrever mais um texto para estapágina e a mão está sempre a fugir-mepara Alcochete. Mas será que a culpa éminha? Por amor de Deus: depois daque-le tio, agora sai-nos um primo vestido deBruce Lee, a treinar artes marciais notemplo de Shaolin e a chamar pelo nomede Wu Guo, “o guerreiro profundo”? So-bre o que é que querem que eu escreva,se nem a família Adams é tão divertida?»

«Lamento muito, mas o caso Freeporttransformou-se numa tragicomédia na-cional, que põe ao léu uma Repúblicagrotesca, sem princípios, sem carácter ecompletamente disfuncional. Sobre o quehei-de eu escrever, se a vergonha já seestende desde aqui até à China»

(publicado em 19 de Maio)

POLÍTICA SEM POESIA (*)Este fim-de-semana li a notícia de um

homem que pediu para ser preso. Já ti-nha feito a experiência e queria regres-sar. A polícia recusou. Inconformado,partiu os vidros da esquadra e acaboudetido.

Este caso lembra-me o profissional dapolítica (que gosta de fingir ser outra coi-sa) Manuel Alegre. Em voz trovejante,clama que se sente tolhido porque o PS jánão é de esquerda. Mas, tal como o ho-mem que tudo faz para regressar à pri-são, Alegre não é capaz de sobreviver forado oxigénio do partido que fez dele gente– quando parece ficar com um pé do ladode fora, Alegre, afinal, está a tentar me-ter-se ainda mais para dentro. Teatralida-des à parte, Alegre está no bolso de Só-crates porque não é suficientemente ale-grista para as expectativas que procriou.

(*) Carlos Abreu Amorim, jurista;publicado em 19 de Maio

JANTARES POLÍTICOSUm deputado socialista tenta explicar,

na SIC Notícias, que a nova lei de finan-ciamento dos partidos é um texto notá-vel, que ajudará à transparência.

A politóloga que está presente no pro-grama não se mostra convencida e ar-gumenta com argúcia.

Ela poderia ter apresentado umexemplo como este: o partido promo-ve uma festa de angariação de fun-dos, com bilhete de entrada a 10 eu-ros (inclui jantar de lombo de porcoassado, vinhos e café). No entanto, umpromotor lá da terra, apenas por vai-dade pessoal (obviamente...), decidepagar, em vez de 10 euros, 5.000 eu-ros. É proibido? Não.

(De acordo com as palavras do depu-tado socialista, creio que lhe deverá serentregue um “talão de caixa”).

No final, estará tudo certo: a verba dopromotor aparecerá diluída na receita dojantar. (Ao mesmo tempo, alguns doscomensais poderão comer à borla, que acoisa não se notará. E o “tipo das con-tas” terá até a possibilidade de apresen-tar uma “contabilidade criativa”.)

PS - Cada vez mais me apetece sairdaqui. Portugal está mesmo transforma-do num sítio mal frequentado.

(publicado em 14 de Maio)

PS ANDA A PINTAR PRÉDIOS«Pintaram os bairros, mas esquece-

ram-se de vos dizer que o dinheiro é doEstado, é do PS»

(Elisa Ferreira, durante visita a umbairro social, no “Jornal de Notícias”)

Informo a senhora eurodeputada queo meu prédio, já “velho” de 15 anos, estáa precisar de pintura. Se o PS ainda ti-ver dinheiro disponível, a rapaziada docondomínio agradece.

(publicado em 10 de Maio)

SEGUE-SE O PADREKROHN...

O turco que tentou assassinar o Papahá 28 anos pediu a nacionalidade portu-guesa.

Só falta o pedido do padre Krohn.(publicado em 14 de Maio)

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1929 DE MAIO DE 2009 MÚSICA

Distorções

José Miguel [email protected]

PARA SABER MAIS:

http://www.sxsw.com/Phoenix - “Wolfgang AmadeusPhoenix” (Ghettoblaster)

Inicia-se amanã (sábado, dia 30), no Café Santa Cruz,o ciclo “Noites da Canção de Coimbra 2009”, com aprimeira actuação a cargo do Quarteto de Guitarras deCoimbra Æminium, a partir das 21h30.

Trata-se de uma iniciativa do Departamento de Cul-tura do Município de Coimbra, que desde 2002 tem vin-do a promover as Noites da Canção de Coimbra “paradivulgar a Canção Tradicional Urbana (popular e aca-démica), de influências regionais e locais, cuja expres-são mais genuína é a Serenata de rua” – como refere oVereador da Cultura, Mário Nunes.

A desenvolver entre os meses de Maio a Setembro,em algumas terças-feiras e alguns sábados, as actua-ções incluídas neste projecto iniciam-se sempre às21h30, “promovendo vários grupos de Fado que inte-gram a nova geração e que, assim, têm oportunidadede divulgar um repertório exclusivamente de raiz coim-brã, através de uma linguagem musical que tem levadoo nome da Cidade aos quatro cantos do mundo”.

São, nesta edição, dezasseis os grupos participantes,numa iniciativa que, há muito, ultrapassou as fronteirasda Galeria Almedina (local que, originalmente, acolhiaas, inicialmente designadas “Noites de Fado de Coim-bra”), percorrendo, assim, outros espaços da cidade,como sejam: além da referida Galeria Almedina, o CaféSanta Cruz, o Pátio da Inquisição, o Adro da Igreja deSanta Cruz, o Quebra-Costas, a Rua D. João III (ou oDolce Vita, nos casos em que as condições atmosféri-cas não permitam aos grupos actuar no exterior), oTerreiro de Santa Clara-a-Nova, a escadaria da Igreja

ESPECTÁCULOS SEMANAIS ATÉ SETEMBRO

“Noites da Canção de Coimbra 2009”

de Santo António dos Olivais e as Escadas de S. Tiago.Como sublinha o vereador, “trata-se de um projecto

que se socorre da beleza e do enquadramento arqui-tectónico e patrimonial dos espaços onde decorrem osespectáculos, até porque as ‘Noites da Canção de Co-imbra’ se dirigem, maioritariamente, aos turistas quevisitam a cidade nesta época”.

Além dos grupos de Fado participam, ainda, dois gru-pos de etnografia e folclore – Grupo Etnográfico doBrinca, Eiras e o Grupo Folclórico da Casa do Pessoalda Universidade de Coimbra.

PROGRAMA PARA JUNHO

Para o próximo mês de Junho, o programa é o se-guinte:

Dia 2 (terça-feira), no Café Santa Cruz – Grupode Fado Æminium

Dia 6 (sábado), na Galeria Almedina – Grupo AlmaMater

Dia 9 (terça-feira), na Galeria Almedina – GrupoVelha Cabra

Dia 13 (sábado), no Pátio da Inquisição – GrupoCoimbra de Sempre

Dia 16 (terça-feira), no Adro da Igreja de SantaCruz – Grupos Minerva e Verdes Anos

Dia 20 (sábado), nas escadas do Quebra-Costas –Grupo Torre d’Anto

Dia 23 (terça-feira), na Rua D. João III (ouCentro Comercial Dolce Vita) – Grupo Cançãode Coimbra

Dia 27 (sábado), noTerreiro de Santa Clara-a-Nova – Grupo Etnográfico do Brinca e GrupoAlma Mater

Dia 30 (terça-feira), noPátio da Inquisição – Gru-pos Minerva e Verdes Anos

No passado mês de Março, concreti-zei o desejo de ir ao “South By Sou-thwest”, para quem não saiba esteevento tem lugar em Austin, no estadodo Texas e contempla três fases: umaligada ao cinema, outra à interactividadee a música – que foi a parte a que assis-ti. É um festival diferente daquilo queestamos habitudados a ver num festivalde música, não há grandes palcos, nemgrandes áreas e em nada tem a ver comum Rock In Rio ou um Sudoeste. OSXSW é um festival itinerante a ter lugarem espaços existentes na cidade, quersejam bares, tendas, parques de estacio-namento, ou, mesmo, igrejas – onde osClã actuaram. Em apenas 5 dias de festi-val há cerca de 1800 concertos. As no-vas tendências da música são o prato for-te deste evento, que é uma grande atrac-ção quer para editoras, quer para promo-tores ou, simplesmente, curiosos. Mas nãodeixa de haver alguns nomes mais sonan-tes, como seja o caso dos: Metallica (queactuaram integrados no lançamento do

jogo de consola “Guitar Hero Metallica”),Echo & The Bunnymen, Devo e os Pri-mal Scream. A tudo isto juntam-se muitasfestas em que há concertos, bebidas grá-tis e dj-sets, eu fui assíduo na “Fader Fort”patrocinada pela Levi´s.

Por entre tudo o que vi, não poderiadeixar de destacar quatro nomes: os bra-sileiros The Twelves, Tricky, PrimalScream, White Lies (sobre quem vosescrevi na última edição). De tudo o quequeria ver só o actual líder do top´s daspistas de dança, Calvin Harris, faltou àchamada.

Para terem uma ideia da atmosfera

vivida em Austin durante este festival eque tem um pouco do que se por cá sepassa numa Queima das Fitas, com gen-te na rua a conversar de copo na mão,mas com o atractivo adicional de que porali se passeam algumas da maiores es-trelas da música actual. Por exemplo, nodia em que fui ver a actuação dos TheWarlocks, vi o vocalista da banda, Bo-bby Hecksher, numa “roulote” de cachor-ros e ainda me cruzei com Jarvis Co-cker dos Pulp.

Como os concertos decorrem em es-paços mais reduzidos, dada a atmosferamais intimista, leva a que, por exemplo,

o artista decida abraçar todos os presen-tes, como fez o Tricky e eu tive o privilé-gio de ser um dos presentes.

Por fim, resta destacar a presençaportuguesa neste evento com os Clã, RitaRedshoes, David Fonseca e The Legen-dary Tigerman, mas o último foi quemmais se destacou.

Se tudo correr bem o próximo passoserá o Festival de Coachella, que se rea-liza em Indio, em pleno deserto da Cali-fornia, aí sim um festival num formatomais típico de festival de verão e que ri-valiza com o festival dinamarquês deRoskilde o rótulo de maior festival domundo.

Para o fim, a sugestão do disco do mêsque desta vez recai sobre “Wolfgang Ama-deus Phoenix” dos gauleses Phoenix.

Zé Pedro, Tricky e José Miguel Nora no “South By Southwest”

Rita Redshoes e David Fonseca

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20 29 DE MAIO DE 2009OPINIÃO

J.A. Alves Ambrósio

OPINIÃO Angola em Saragoça (à guisa de balanço)

A visita ao pavilhão de Angola em Sara-goça foi, portanto, uma experiência. Umadaquelas experiências que percute, fica gra-vada no mais fundo da consciência, é pontode partida para todo o ser interior: emoção,memória, sentimento, intelecção, prognose...É a minha boa estrela, altaneira, a lembrar asua privilegiada, indomável, existência.

Numa das primeiras operações que mefoi destinada, mal acabado de instalar-mena ZIN

(Zona de Intervenção Norte), o objecti-vo era “reconhecer” a zona da FazendaMaria da Luz, área entre a estrada Luan-da, Caxito, Carmona (Uíge) e o rio Úcua.O nível sócio-cultural do emigrante portu-guês para aquelas paragens era, na genera-lidade, baixo (no Pango Aluquém um médi-co com vagar para ler sobre agronomia decafé conseguia, como “passatempo”, tripli-car ou quadriplicar a produção de “ouronegro”, relativamente ao colono indiferen-ciado). Mas a Maria da Luz foi uma emo-ção tão forte que, não raro, a revejo – e nãoporque esse muito belo nome era também oda minha “madrinha de guerra”, uma aris-tocrata das mais antigas famílias nobres dePortugal, de uma elegância

(interior e exterior, claro), inteligência, iro-nia, presença... admiráveis.

Breve: a Maria da Luz foi para mim aidentidade da guerra, uma dor d’alma quese sente in locco não passível de ser apre-endida por jornais, livros ou qualquer outromeio. Guerra

é guerra, dizem os que por ela passaram.As construções da fazenda estavam todasesventradas.

À horrenda chacina dos nossos compa-triotas, após Fevereiro de 1961, seguiram-se represálias que nada lhe ficaram a dever,com cabeças cortadas e, posteriormente,

espetadas na ponta de estacas que se le-vantavam bem alto perante os nativos. Su-cede é que estes conseguiram o seu objecti-vo, a independência, porque, desde os preli-minares, transferiram a resolução do proble-ma para o Sagrado. E, perante o Sagrado,nenhuma vitória é possível, tudo soçobra.

Nunca cheguei a saber quem era o pro-prietário da Maria da Luz, mas, em Ango-la, os nossos compatriotas deixaram umarealização absolutamente soberba. Aquelaera para eles, uma terra de “sonho” – e osonho apenas pede que o realizem.

Naquele território sentiam que poderiamser tudo quanto o quisessem. Liberto dasIimitações de uma metrópole, acanhada esonolenta, sem letras ou títulos com os quais,de algum modo pudesse triunfar, o colonovivia agora noutro mundo

e aquela era a “sua terra”.Todavia, em Luanda, encontrei uma boa

livraria, a Lello. Outra faceta da existênciado branco era, porém, hedionda: vivia comose apenas a sua comunidade existisse. Onegro era uma coisa, res nullius – exceptopara o trabalho, no qual era atrozmente ex-plorado.

As posições antagónicas e irredutíveisconduziram ao que todos sabem – mas agoraestamos já no pós-guerra. E o pós-guerrasó pode ser um tempo de amor. Antes daeclosão da primeira conflagração mundial,em 1914, ir para a guerra era... uma alegria.Do lado francês havia quem considerasseque ia para umas férias – as primeiras davida. Do lado alemão foram numerosos osartistas que pereceram no conflito – e essasensação de incómodo é, agora, bem forteno museu Franz Marc, em Kochel-am-Seeali mesmo no sul da Baviera. Em Itália, emFevereiro de 1909, no “Manifesto Futuris-ta”, Marinetti apresenta a guerra como umahigiene (o “Manifesto” seria publicado em

Paris no “Le Fígaro”).A Europa revelou uma profunda incom-

preensão pelo que se passara entre 1914 -1918 e estatelou-se de novo, ignominiosa-mente, entre 39 e 45 (o que se tem passadode então para cá mostra que, aos europeus,não foi fácil aprenderem a lição – mas apren-deram algo de muito substancial). Muito paraalém de terem logrado o maior período depaz da História europeia, o que é verdadei-ramente emocionante para mim é que, nes-te momento, um batalhão alemão, em tem-po de paz, esteja aquartelado em solo fran-cês. Soberbo além de todas as palavras –tanto mais que as idiossincrasias dos doispaíses nada, digamos, têm que ver uma coma outra.

Assim como os europeus caminham demãos dadas e cada vez mais terão de fazê-lo lúcida e energicamente, assim tambémos nossos dois países.

É por isso que tanto tenho insistido nasuperação do ressentimento por parte deAngola e no carinho pelo património aí dei-xado, a fortiori património artístico é espiri-tual. Não ter muçulmanos é uma bênçãopara Angola, porque se sabe, pelo menosdesde o século XVI, o que são confrontosreligiosos.

Mas se Angola não deve ter ressentimen-tos, os portugueses que agora para lá se di-rigem a fazer negócio devem ter muito bempresente a consideração devida a quemmatou a fome a tanto compatriota e o queaquela abençoada terra representou/a paraPortugal. Sentimentos de trafulhice e displi-cência são absolutamente inadmissíveis eAngola não deve tolerá-los.

Uma vigorosa comunidade de sentimen-tos está já constituída e isso – precisamente– deve ser ponto de partida para um apro-fundamento cada vez maior.

Tudo o que não seja assim é contra a

natureza das coisas. A força que as liga-ções económicas, comerciais, industriais, fi-nanceiras, afectivas... possuem deve ser tidamuito bem em conta; e uma comunidadebaseada em laços de sangue não carece deinvenção – é vigorosa de séculos.

Passados os conturbados tempos do pós25 de Abril é hoje o momento de, v.g., cons-tituir uma associação de amizade Portugal-Angola. Serei o primeiro a fazer parte dela.

Angola sempre integrou a minha ontolo-gia desde que lá desembarquei em Setem-bro de 1963 e a visita a Saragoça fez explo-dir esse potencial, entre-mentes em letar-gia. Hoje dou-me conta da quantidade deobras que sobre Angola se publicam – ven-dem. Algumas pouco mais são que fotos arecordar – prestando em qualquer dos ca-sos um serviço notável –, outras romancei-am. Uma universidade que, na área do Hu-manismo, tem carências gritantes devia pôraqui os seus olhos. A Imprensa, quotidiana-mente, menciona ligações e outros aspec-tos da realidade; e que um visto para Ango-la demore tanto tempo a obter mostra bema que nível de afecto e grandeza devem seras relações.

O leitor que faz o obséquio de ler-me,que é pessoa inteligente e se sente insepa-rável da sua comunidade, já reflectiu bemnisso? Já lhe mediu o alcance? Não querjuntar-se a mim e a outras pessoas de in-questionável dignidade e responsabilidade,a fim de avançarmos para uma concreçãode grandeza, de fraternidade?

A perenidade das pátrias custa apenas anossa dignidade, a nossa elevação. Vamosfundar a Associação de Amizade Portugal-Angola? Seremos os primeiros com a gran-deza da nossa tranquilidade, e a tranquilida-de da nossa grandeza.

Os nossos dois países e nós bem mere-cemos isso.

Por uma infeliz conjunção de circuns-tâncias,

- talvez encandeado por um exces-so de confiança no seu próprio brilhan-tismo,

- ou demasiado absorvido pela som-bra simplificadora do seu Técnico,

- ou demasiado marcado pelo impera-tivo dos cortes orçamentais,

- talvez demasiado apressado na de-glutição acrítica das alegadas iguariasbolonhesas,

- ou, quem sabe, apenas entediado,

Rui Namorado(professor universitário)

http://ograndezoo.blogspot.com

pela infeliz circunstância de o terem fei-to emigrar para o inóspito ónus da tuteladas Universidades,

o ministro M. Gago fez regredir a par-ticipação dos estudantes na vida das

Universidades até limites tão modestos,que teriam sido admissíveis para ummarcelismo que tivesse sobrevivido, masem que ninguém teria sequer pensadodurante os anos em que Abril ainda pro-

A UNIVERSIDADE EM OBRAS

jectou sobre nós toda a sua força.Por isso, quando ontem nas Escadas

Monumentais apreciei, com nostalgia eesperança, uma reconstituição simbóli-ca de episódios da crise universitária deCoimbra de 1969, deparei com as ima-gens que vos mostro. Eis uma reivindi-cação de há quarenta anos, que o Minis-tro M. Gago conseguiu tornar actual.

Por um inusitado impulso do seu pen-samento enquanto dormia, o sábio, semque disso se apercebesse, foi arrasta-do para uma caverna onde a luz nãoentrava.

De manhã, ao acordar, com a sua pro-verbial lucidez e aguda inteligência, comobjectividade e realismo, afirmou: “Hoje,o sol não nasceu”.

No entanto, inesperadamente, cá fora,a manhã percorria com frescura o seucaminho.

Moralidade: se o teu pensamen-to estiver dentro de um buraco, osteus olhos nada verão.

PONTO DE VISTA

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2129 DE MAIO DE 2009 OPINIÃO

Renato Ávila

POIS...POIS...POIS...POIS...POIS...

Joséd’Encarnação

João PauloSimões

FILATELICAMENTE

Fome de política

Milícia criada pelo Estado Novo em 1936,tinha por objectivo “organizar a resistênciamoral da Nação e cooperar na sua defesacontra os inimigos da pátria e da ordem so-cial”, devendo, para isso, “repudiar e com-bater, em todos os campos, as doutrinas sub-versivas, nomeadamente o comunismo e oanarquismo”. Foi criada e sustentada pelogoverno de Salazar e dirigida por uma Jun-ta Central , directamente nomeada pelo Mi-nistro do Interior.

Não era obrigatório pertencer-se à Le-gião Portuguesa. Era voluntário. Mas umvoluntário quase obrigatório, pois quem nãopassasse por ela, tinha dificuldades em ar-ranjar empregos sobretudo no Funcionalis-mo Público.

Durante o período salazarista e do Esta-do Novo, foram muito estreitas as relaçõesentre a Legião Portuguesa e a polícia polí-tica. Uma maneira de vigiar o Povo e con-trolá-lo. Foi extinta com a Revolução deAbril de 1974.

(Baseado na Nova EnciclopédiaLarousse, volume 14 de 2002

editada pelo Círculo de Leitores)

Teresa foi uma das minhas alunas mais dis-tintas. Chegámos a pôr a hipótese de ela se-guir a carreira universitária, que para isso ti-nha méritos de sobejo. Ficou-se, afinal, peloEnsino Secundário, onde é docente de raromérito, muito querida por todos os seus estu-dantes.

Em jeito de provocação, enviei-lhe a ane-dota que certamente os nossos leitores já re-ceberam: preparava-se o piquenique e haviaenorme quantidade de sacos com um produtoesbranquiçado dentro... É que o responsávelescrevera no papel que comprassem, para ochurrasco, “1ô2 sacos de cal”. E ali esta-vam… 102 sacos de cal! Esquecera-se dacedilha, justificou ele: o que queria escreverera… çal!

E a Teresa retorquiu-me:«O grave...é que isto começa a ser mais

que anedota. É o real!!! Em Agosto vou ten-tar ver se consigo reforma antecipada. Já nãoaguento mais!!! […] O clima está insuportá-vel. Indescritível... Quem é digno epode......sai. Tivesse eu uns anitos a menos.....e saía para bem longe, não me perguntes paraonde.... que também não sei.»

Há fome de política.Em muitas gargantas as palavras quei-

mam como brasas, em muitos coraçõesos sentimentos fervem em cachão.

Tanto que foi calado, acumulado nes-tes anos mornos de defeso eleitoral, depasmadas e pasmantes pasmaceiras par-lamentares, de desencontradas e empo-ladas façanhas, de burlescos e intrigan-tes episódios de arrufos e falcatruas, degritantes inépcias e escandalosas injusti-ças e subserviências.

E a crise foi alastrando qual gota deóleo em cartão, empurrando para a bocao verbo e as emoções.

Seria mister que se tratasse da Euro-pa. Todavia, algo de mais forte, de maisapelativo há muito que se desenhava nasmentes. – as atribulações da ilustre esempre indigente casa lusitana.

A política está na rua. Palpitante. Trepi-dante. A censurar. A exorcizar os males quenos apoquentam. A condenar, ad limine, osseus supostos e forjados responsáveis.

A culpa será sempre do outro, por issomesmo morrerá solteira.

As consciências transformaram-se

em “bunker’s”, super equipados, autosuficientes, assépticos, soturnos e inex-pugnáveis.

Nenhum raio de sol nelas entrará paraas iluminar, aquecer, humanizar.

Em alienado e alienante paroxismo, ex-primem-se enviesados argumentos, for-çam-se deslocadas contradições, inven-tam-se soluções já inventadas, ideias jáconcebidas, disparates já denunciados,numa despiqueirosa azáfama cada vezmais pobre, cada vez mais entrincheirada.

A criatividade não mora, certamente,por aqui.

E o poder, alucinado e tonto de tantochavão, de tanto baldão, surge-nos en-fezado e triste qual Cristo na mão dosalgozes.

Vem daí o grande dilema dos cidadãos.Depositar-lho-ão nas mãos à mesa do

voto e, angustiados, não saberão a quementrega-lo se todos lhe deram tratos de polé.

A política está na rua à conquista dovoto supostamente legimitador do poderdito democrático.

Ninguém ainda disse e, pelos vistos, dirájamais, com a necessária consistência eclareza, o que com ele pretende fazer.

Ninguém ainda clarificou qualquer pro-jecto coerente minimamente sustentado

no concreto sentido da solução dos mag-nos problemas que nos afligem.

As oratórias, prodigamente semeadaspor tudo o quanto soa a auditório, têm-seresumido a um farto e insensato deitarabaixo sem a séria contrapartida de qual-quer alternativa de reconstrução.

Será que as candidaturas em presen-ça ainda não se aperceberam do lasti-mável estado do poder? Do poder judi-cial, do poder legislativo, do poder re-gulador e fiscalizador do estado, do po-der da sua autoridade quanto ao cum-primento da lei e à promoção da segu-rança dos cidadãos?

Será que, ao esgrimirem argumentos econdenações, estão na plena consciênciadas reais disponibilidades económicas dopaís para cumprir anseios e honrar pro-messas demagogicamente empolados?

Será que nestes quatro anos de Go-verno nada houve de aproveitável naeducação, na saúde, na protecção so-cial, na modernização dos serviços edas infraestruturas…?

Será que a crise que enfrentamos sóencontra culpados naqueles que exercemactualmente o poder executivo? Nãoseria muito mais justo que todos quantoso usaram nestes trinta e quatro anos, re-

flectissem sobre as reformas que, porincapacidade ou por táctica omissão,deixaram de fazer?

Esta crise em que estamos mergulha-dos, mais do que económica, é, na suaessência, uma crise de valores. Vemo-laaflorar clamorosamente na vacuidade edemagogia do discurso, no veneno e naligeireza irresponsável dos constantes li-belos acusatórios, nas subserviências earrogâncias, na incoerência e facciosis-mo das análises da generalidade dos pro-tagonistas.

Esta espécie de política soa a falsoquando se baseia numa estéril dialécticaacusatória. Perante os olhos dos cida-dãos perpassa, isso sim, um sôfrego eobsceno apetite de poder.

Estamos todos com muita fome: dejustiça, de segurança, de seriedade, deresponsabilidade.

Delas resulta, inevitavelmente, umaimensa fome de política. Não dessa polí-tica mesquinha niilista e arrasadora feitapor gente pequenina, mas duma política asério – positiva, agregadora, construtiva,motivadora, feita por gente grande dispos-ta, sobretudo, a servir o país e a grei.

Os portugueses merecem-na. Exi-gem-na.

1940– LegiãoPortuguesa

O bloco aqui apresentado, faz parte da série deoito valores desenhados por António Lima e grava-dos por Gujstavo de Almeida Araújo. Impressos naImprensa Nacional Casa da Moeda em folhas de 100selos, circularam de 27 de Janeiro a 19 de Abril de1940 e o bloco até Setembro de 1945.

O objectivo era fazer propaganda à Legião Portu-guesa e também à Mocidade Portuguesa, por inicia-tiva dos CTT. Mas a palavra “Mocidade” foi rejeita-da do selo, ficando só “Legião”.

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22 29 DE MAIO DE 2009REPORTAGEM

São 27.882 palavras, 114.796 caracteres quepretendem provocar a discussão em torno dofuturo da Língua Portuguesa, numa época emque os jovens escrevem cada vez mais, mas tal-vez estejam a escrever cada vez pior

O “Diário XII”, de Miguel Torga, foi integral-mente convertido para “linguagem SMS”. A“proeza” tem a autoria de duas alunas da Licen-ciatura em Comunicação Social doInstituto Superior Miguel Torga(ISMT), de Coimbra.~

Micaela Andreia Neves e MárciaArzileiro, entretanto já licenciadas, nãochegaram a converter a totalidade daobra, tendo a parte sobrante sido en-tregue a duas jovens de 14 anos,Mariana Alves e Laura Sobral, ao tem-po frequentando o 8.º ano da EscolaEB 2 3 Eugénio de Castro.

A conversão foi efectuada da 3.ªedição revista do Diário XII, compos-to e impresso nas oficinas da Gráficade Coimbra em Julho de 1986. O Diá-rio XII, com 204 páginas, inclui 251 entradas, de17 de Maio de 1973 a 22 de Junho de 1977. 46dessas entradas são constituídas por poemas.

A versão em sms compreende 27.882 pala-vras, 114.796 caracteres (sem espaços), encon-trando-se disponível, na íntegra, em http://diarioxii.blogspot.com

A decisão de avançar com o projecto radicouna detecção, cada vez mais frequente, de incor-recções em textos escritos pelos alunos, errosque muitos dos jovens atribuem aos hábitos daescrita compulsiva de mensagens via telemóvel,Messenger ou outros programas similares, comoo Twitter.

Problema que vai ganhando contornos alar-mantes e que é transversal aos vários ciclos deensino. Com efeito, são cada vez mais os docen-tes que se queixam das dificuldades sentidas nadecifração dos textos escritos pelos alunos.

O problema não é, naturalmente, exclusivode Portugal, com alertas surgindo mundo fora.Ao mesmo tempo, já há quem, como Phil Marso,pretenda transformar a “linguagem SMS” emgénero literário. Isto enquanto se multiplicam asexperiências de conversão de clássicos. Um jo-vem brasileiro decidiu publicar as “MemóriasPóstumas de Brás Cubas”, de Machado de As-sis, em “ddonês”. Em 2005 o serviço de telemó-veis dot.mobile anunciava ter procedido à tra-dução para linguagem SMS das principais obrasda literatura britânica. Projecto que contou coma colaboração de John Sutherland (UniversityCollege London). O académico considerou oprojecto como “uma forma de ajudar os estu-dantes do Reino Unido a rever a matéria para osexames”.

Há outros casos, em Itália, no Japão, na Ín-dia.

JOVENS PREFEREM SMSÀ FALA COM OS COLEGAS

Em Fevereiro deste ano, estudo do InstitutoAllensbach revelava que 52% dos adolescen-tes alemães preferem SMS a conversas com co-legas. A caneta foi trocada pelo teclado, daí anecessidade sentida por responsáveis de esco-las australianas de avançarem com aulas de cali-grafia destinadas aos adolescentes.

O aparente paradoxo reside no facto de tersido a internet a potenciar o “renascimento” da

PROJECTO DESENVOLVIDO NO INSTITUTO SUPERIOR MIGUEL TORGA

“DIÁRIO XII” de Miguel Torga em versão integralpara telemóvel ou Messenger

comunicação escrita entre os mais jovens. Es-creve-se mais, mas escreve-se pior?

“(…) Aquilo que vira do avesso a forma deexpressão tradicional é a legitimação da fala pro-jectada na escrita. A escrita (tradicional) é umtrabalho miudinho, requer tempo para a ponde-ração sobre o material linguístico a seleccionar,ordenação frásica, estabelecimento de elos en-tre tópicos, a que se vem juntar uma competên-

cia gráfica muito regrada (disposição de linhas,marcação de parágrafos, pontuação, etc). Mas oque temos no chat e no e-mail informal é o usooral da língua que, em vez de ter suporte áudio,tem suporte gráfico. Daqui resulta um texto cheiode hesitações, repetições, incongruências, sus-pensões, enriquecido com a indicação do esta-do de espírito e do semblante dos interlocuto-res, através do constante recurso aos smileys [:-) :-( ]e às onomatopeias (“chuacsss”, “grrrr”, “to-ing”), por exemplo.” – sublinha Ana Martins,doutorada em Linguística Portuguesa pela Fa-culdade de Letras da Universidade do Porto,investigadora do Centro de Linguística daquelainstituição de ensino.

PROFESSORES QUEIXAM-SEDOS ERROS RESULTANTESDA “NOVA GRAFIA”

“O problema não são as abreviaturas” – con-sidera Carmen Gouveia. “Não me choca nadacolocar “mm” por “mesmo”, “mto” por “muito”,ou “bjs” por “beijos”... O que “assusta” são asalterações estranhas e não lógicas a estas abre-viaturas, como “ke” ou “k” por “que” (qual é adiferença de usar “q” na mesma situação?) ou (oque é pior) por “c” (“kasa” em vez de “casa”!!!),totalmente ridículas e que deturpam a língua como“xe” por “se” ou “ixo” por “isso”... Já para nãofalar que o k nem sequer faz parte do alfabetousado em Portugal (salvo para nomes estrangei-ros, claro, como Kant e kantiano, etc)” – acres-centa a linguista e docente na Universidade deCoimbra.

“O problema”, conclui a investigadora, “é quevários professores já se queixam (e com razão)de que os alunos começam a dar erros de talmodo estão ‘viciados’ nessa ‘nova grafia”.

O Projecto “TORGA EM SMS”, coordenadopor Dinis Manuel Alves, doutorado em Ciênci-as da Comunicação e docente no ISMT, surgeenquadrado na realidade acima descrita. Preten-de-se provocador da discussão em torno de temaassaz candente e controverso. O cotejo entre aspáginas convertidas em SMS e os escritos origi-nais de Miguel Torga são impressivos, porven-tura um exercício salutar para levar os jovens aperceberem melhor o encanto e os pergaminhosda língua portuguesa.

PROJECTO COMPOSTOPOR QUATRO BLOGS

Ao blog continente da versão integral do“Diário XII” em “linguagem SMS”, juntam-seoutros três. Em http://torgaemsms.blogspot.comdisponibilizam-se dezenas de notícias sobre otema, do mixuguês à taquigrafia, dos etnolets às

palavras em vias de extinção.Este blog agrega ainda mais de uma dezena

de vídeos reportando o tema. Isto para além dadivulgação de sítios cuja consulta se recomen-da, do incontornável Ciberdúvidas da LínguaPortuguesa (http://ciberduvidas.sapo.pt/) aosprogramas “Cuidado com a Língua! (RTP), e“Páginas de Português” (Antena 2).

Outros 38 vídeos surgem publicados no blog“Diário XII”, agregando-se aqui praticamentetodos os vídeos sobre o escritor disponíveis naweb, em páginas diversas. 20 desses vídeos re-portam à iniciativa “Café Entre Torgas”, coorde-nada por Sansão Coelho numa parceria entre oInstituto Superior Miguel Torga e a CâmaraMunicipal de Miranda do Corvo. Entre os vári-os testemunhos divulgados nesses vídeos, re-alce para a comunicação do Padre Dr. ValentimMarques, editor de grande parte da obra de Mi-guel Torga e seu amigo pessoal. Valentim Mar-ques acompanhou Miguel Torga na viagem aAngola e Moçambique, périplo que o poeta de-talha no “Diário XII” (18 de Maio a 12 de Junhode 1973).

BLOG “SÍTIOS” GEOREFERENCIAO ITINERÁRIO DO ESCRITOR

Por seu turno, o blog “Sítios” (http://mapastorga.blogspot.com/) georeferencia o iti-nerário do escritor na edição XII do seu “Diá-rio”. São ao todo 62 mapas e fotos, publicaçãocom recurso ao “Google Maps”.

Miguel Torga indicava sempre o local ondeescrevia os textos seleccionados para o diário.Eis a lista dessas localidades por ordem de in-clusão no livro (para cada localidade indicamosapenas a primeira entrada): Coimbra, Luanda(Angola), Cela (Angola), Santo António do Zai-re (Angola), Lobito (Angola), Moçâmedes (An-gola), Sá da Bandeira (Angola), Nova Lisboa(Angola), Beira (Moçambique), Gorongosa(Moçambique), Tete (Moçambique), CaboraBassa (Moçambique), Ilha de Moçambique (Mo-çambique), Lourenço Marques (Moçambique),Carvoeiro, Aveiro, Figueira da Foz, Boticas, PalaPinta (Carlão), Torrão, Folgosinho (Serra da Es-trela), Coja (Arganil), S. Martinho de Anta, Cur-ral de Vacas (Chaves), Carrazedo do Alvão, Cha-ves, Verin (Espanha), Sousel, Évora, Lisboa, Es-

tremoz, Bofinho (Alvaiázere), Gerês, Falperra,Albufeira, Alte, Monterrey (Verin), Serraquinhos,Pulo do Lobo (Serpa), Vila Real, Bragança, Mi-randa do Douro, Sítio da Nazaré, Castro Labo-reiro, Barragem de Vilarinho da Furna, Sagres,Borba, Juromenha, Portalegre, Elvas, La Alberca(Espanha), Mesio, S. Leonardo da Galafura, Por-to, Bruxelas, Bruges e Londres.

O Diário XII começa e termina emCoimbra, cidade que regista o maiornúmero de entradas (122), o que equi-vale a 48,6% do total. Segue-se a terranatal do escritor, com 20 entradas(8%). Albufeira, com 11, e Gerês, com10 entradas, são os restantes sítioscom entradas na casa das dezenas.Vêm depois Chaves e Luanda, com 5;Bruxelas e Carvoeiro, com 4; Lisboa,Londres, Sá da Bandeira (actual Huí-la, Angola) e Sto. António do Zaire(actual Soyo, Angola), registam trêsentradas cada. Com duas encontra-mos Aveiro, Coja (Arganil), Estremoz,

Gorongosa (Moçambique), Ilha de Moçambi-que, Lourenço Marques (actual Maputo, Mo-çambique), Moçâmedes (actual Namibe, Ango-la), Torrão, Verin (Espanha) e Vila Real.

Uma entrada apenas para as seguintes loca-lidades/sítios: Alte, Barragem de Vilarinho daFurna, Beira (Moçambique), Bofinho (Alvaiáze-re), Borba, Boticas, Bragança, Bruges (Bélgica),Cabora Bassa (Moçambique), Carrazedo do Al-vão, Castro Laboreiro, Cela (Angola), Curral deVacas (Chaves), Elvas, Évora, Falperra, Figueirada Foz, Folgozinho (Serra da Estrela), Jurome-nha, La Alberca (Espanha), Lobito (Angola),Mesio, Miranda do Douro, Monterrey (Verin,Espanha), Nova Lisboa (actual Huambo, Ango-la), Pala Pinta (Carlão), Portalegre, Porto, Pulo doLobo (Serpa), S. Leonardo da Galafura, Sagres,Serraquinhos, Sítio da Nazaré, Sousel e Tete(Moçambique).

De registar ainda três textos escritos no avião– “a voar para Luanda”, “a voar para Moçambi-que”, “a voar para Lisboa”. Miguel Torga selec-cionou, para a décima segunda edição do seudiário 16 textos escritos em Angola, 9 em Mo-çambique, cinco na Bélgica, três em Inglaterra eoutros três em Espanha.

A maior parte dos textos seleccionados porMiguel Torga para o Diário XII foram escritosaos sábados e às quartas-feiras (42 entradas paracada um destes dias da semana). As sextas-fei-ras registam o menor número de textos (29). Quan-to aos restantes dias da semana, temos as se-gundas-feiras com 30 textos, as terças com 34,as quintas com 41 e os domingos com 33.

COMENTÁRIOS DE ESPECIALISTAS

Por último, referência para o blog “TORGAEM SMS – OPINIÕES QUE CONTAM” (http://torgaemsms2.blogspot.com/). A coordenação doprojecto solicitou a vários especialistas opiniãosobre a iniciativa, pedindo-lhes também que sepronunciem sobre os desafios que se colocam àLíngua Portuguesa, tendo por base a generali-zação da “linguagem SMS” entre os jovens.

Os contributos recebidos serão publicadosneste blog.

O primeiro volume do “Diário” foi publicadoem 1941, o último (XVI) em 1993, dois anos antesdo escritor falecer (17.01.1995).

Micaela Neves, Márcia Arzileiro, Mariana Alves e Laura Sobral

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2329 DE MAIO DE 2009 DIA MUNDIAL DA ENERGIA

Uma Universidade de Coimbra ecológica, queproduza a energia que consome, e que adopte asboas práticas de sustentabilidade, dando um exem-plo ao mundo, é o desafio que o constitucionalistaGomes Canotilho lança à instituição.

“Não é um projecto utópico. Se um dos proble-mas é esse, penso que hoje uma universidade não éuma verdadeira universidade se não tiver essas pre-ocupações. Afirmar-se como uma universidade mo-derna mesmo do ponto de vista do funcionamento”,declarou à agência Lusa.

Na sua perspectiva, Coimbra tem condições parase lançar num projecto desta natureza, dada a esca-la dos seus edifícios, as transformações de moderni-zação a que está a ser sujeita, e ao conhecimento eprojectos dos seus centros de investigação.

Reportando-se ao Pólo I da Universidade, na zonahistórica da Alta, Gomes Canotilho salienta que mes-mo que não seja possível instalar painéis solares nacobertura dos edifícios, “o Jardim Botânico poderáter um quilómetro de baterias fotovoltaicas”.

Os novos Pólo II, onde se localizam os edifíciosda faculdade de Ciências e Tecnologia, e o PóloIII, da Saúde, com as faculdades de Medicina eFarmácia, e os hospitais da universidade, são gran-des consumidores, mas oferecem condições para aprodução de energias alternativas.

Se no âmbito das energias alternativas considerahaver condições para a sua produção, ao nível dainvestigação em curso destaca um, de veículos eléc-tricos sem condutor, que poderiam fazer o trans-porte das pessoas para a zona universitária e liber-tar o seu interior dos automóveis.

A intensificação dos meios electrónicos para di-minuir o uso de papel, nomeadamente através darealização de provas escritas em computador por-tátil, é outra das ideias que preconiza.

“Esta era uma boa mensagem para Portugal,para o mundo, do próprio mundo universitário”, euma forma de evidenciar que esta universidade,criada em 1290, “está à frente dos grandes desafi-os do século XXI, que são a inovação, o conheci-mento e a sustentabilidade”.

Uma universidade – salienta – “aberta à evolu-ção da economia, das necessidades, e agora à pró-pria ideia de sustentabilidade. Uma universidade deCoimbra que deve ser também uma universidadesustentável”.

“O que não podemos deixar é de ser é ambicio-sos. Se o que está em causa é o princípio da sus-tentabilidade, de construção de esquemas organi-zativos saudáveis do ponto de vista ecológico, en-tão devemos fazer esse esforço. Gasta-se mais ummilhão de euros? Então devemos gastá-lo, porqueos poupamos imediatamente”, considera.

Confessando que gostaria de ver a instituição

DEFENDE GOMES CANOTILHO

Universidadede Coimbradeve produzira energiaque consome

onde se formou e onde lecciona caminhar no senti-do de uma ideia ecológica, Gomes Canotilho sali-enta que essa ideia “deveria ser levada a sério”,porque as pessoas esperam que sejam os académi-cos, os universitários, os que têm responsabilida-des, os primeiros a responder aos desafios.

“Quando a gente vê um grande desprezo dos pró-

prios universitários relativamente ao problema, al-guma coisa tem de estar mal. Seria uma grandemensagem da Universidade de Coimbra, agora quese está a renovar”, sustenta.

Uma universidade que é amiga do ambiente, aca-ba por chamar outras invenções, outras inovações,conclui.

A Administração da Região Hidrográfica (ARH)do Norte está a analisar 600 pedidos de constru-ção de empreendimentos hidroeléctricos nas regi-ões hidrográficas do Douro, Minho e Lima, Ave/Cávado e Leça, revelou recentemente o presiden-te do organismo, António Guerreiro e Brito.

“Seiscentos é claramente um número incompor-tável para aquilo que são as disponibilidades fisio-cráticas destas três regiões”, sustentou AntónioGuerreiro e Brito.

O presidente da ARH falava no decorrer deum encontro luso-espanhol sobre as “QuestõesSignificativas da Gestão da Água na Região Hi-drográfica do Douro”, que decorreu no Peso daRégua.

Segundo o responsável, a maior parte dos pro-jectos hidroeléctricos em análise são privados edizem respeito a empreendimentos inferiores a 10Megawatts (MW).

Uma “parte significativa” dos projectos está tam-bém relacionada com a reconstrução de infraes-truturas que já existiam, como por exemplo moi-nhos, e que agora se pretende sejam adaptados a

Empreendimentoshidroeléctricos:600 pedidos só na Região Norte

aproveitamentos hidroeléctricos.“É um processo complexo que estamos a resol-

ver”, salientou o responsável.O presidente da ARH garantiu que todos os pro-

jectos vão ser alvo de uma discussão pública e deavaliação da sua viabilidade.

No âmbito do Programa Nacional de Barragenscom Elevado Potencial Hidroeléctrico (PNBEPH),o Governo já seleccionou 10 aproveitamentos aconstruir no continente.

À Região Hidrográfica do Douro correspondemos aproveitamentos hidroelectreicos de Foz Tua,Fridão, Padroselos, Gouvães, Daivões e Alto Tâ-mega.

O investigador da Universidade de Trás-os-Mon-tes e Alto Douro (UTAD), Rui Cortes, afirmou queestes novos empreendimentos, já aprovados, “vãoter um impacto mais significativo na degradação daqualidade da água”.

Como aspecto positivo, Rui Cortes referiu que abarragem do Sabor, já em construção, poderá aju-dar a “diminuir os efeitos de cheia na Régua ou nazona ribeirinha do Porto”.

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24 29 DE MAIO DE 2009DIA MUNDIAL DA ENERGIA

Energia Eólica deverásatisfazer 15%das necessidadesde electricidade em 2010

Segundo informação da Direcção Geral deEnergia e Geologia (DGEG), a produção deenergia eléctrica de origem eólica representacerca de 4% do consumo final de electricidadee é expectável que até 2010 represente 15%.

O continente português possuía 1427 aero-geradores no final de Agosto de 2008, repre-sentando uma potência eólica instalada de 2672megawatts (MW) distribuída por 164 parqueseólicos que começaram a ser instalados emmeados de 1996.

Os dados da DGEG referentes ao final domês de Agosto de 2008 revelavam que Portu-gal Continental possuía uma potência eólica de2672 MW espalhada por 164 parques.

Entre Janeiro e Agosto, a produção de ener-gia foi de 3561 gigawatts-hora (GWh), que equi-valeram a 1999 horas de produção. Em 2001, apotência eólica instalada era de 114 MW, distri-buída por 16 parques com um total de 173 ae-rogeradores. Em 2004, já existiam 441 ventoi-nhas espalhadas por 71 parques, que represen-tavam uma potência de 537 MW.

Os distritos com maior potência eólica insta-

lada são Viseu (478 MW), Castelo Branco(409), Viana do Castelo (302), Coimbra (277),Lisboa (225), Vila Real (171), Santarém (152),Leiria (151) e Braga (144).

Os distritos de Lisboa, Leiria e Castelo Bran-co apresentam uma forte componente eólica,superior a 50 por cento da potência renováveldesses distritos.

A DGEG refere ainda que, de Janeiro aAgosto de 2008, foram licenciados 384 MW depotência eólica.

O total da potência licenciada renovável estáconcentrado no norte do país, principalmentedevido à localização das grandes hídricas e deum número significativo de parques eólicos.

Segundo os dados da DGEG, até Agosto fo-ram licenciados 9653 MW de instalações elec-troprodutoras a partir de fontes de energia re-nováveis, representando mais 21 por cento re-lativamente à potência instalada até àquele mês.

Até esse período, Portugal tinha 7984 MWde capacidade instalada para produção de ener-gia eléctrica a partir de fontes de energia reno-váveis.