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Trabalho de Conclusão de Curso 1 O DESAFIO DE UMA EDUCAÇÃO PARA TODOS: A IMPORTÂNCIA DO ASSISTENTE SOCIAL NO MEIO EDUCACIONAL Rosana Faria de Oliveira 1 RESUMO: Este trabalho visa contribuir para as reflexões referentes à importância do profissional de Serviço Social trabalhar em conjunto com os profissionais da Educação. Este sujeito poderá contribuirá para a vida escolar das crianças e participação das famílias, através de visitas domiciliares, despertando elas para a vida escolar do seu filho, realizando a mediação entre escola e família já que encontramos nesse cenário, crianças fragilizadas, muitas em situação de vulnerabilidade, além de inúmeras negligências familiares. A escolha metodológica pautou-se em uma revisão bibliográfica, cujo desenvolvimento foi dado através de estudos de pesquisas de cunho qualitativo, com entrevistas aos sujeitos in loco, esse artigo visa contribuir no sentido de auxiliar a escola e todo o corpo envolvido, para que juntos possam somar na formação das crianças inseridas nesse contexto, estendendo assim também para os familiares representados pelas mesmas. Palavras – chave: Família, Escola, Serviço Social. 1 INTRODUÇÃO A motivação para a realização desta pesquisa partiu da vivência do nosso trabalho no Centro de Educação Infantil e a minha formação que é em Serviço Social, na instituição trabalhava como secretária e percebia a dificuldade da escola em estabelecer vínculos e buscar a parceria com a família das crianças, assim comecei a compreender que outro profissional poderia tornar essa comunicação escola/famílias mais efetiva, dessa forma, comecei a pesquisar sobre os ganhos que um projeto político que desenvolvesse o trabalho do Assistente Social na instituição poderia contribuir para a efetivação do oferecimento de uma educação para todos. Através do trabalho do Assistente Social em colaboração com a instituição educativa será possível desenvolver um trabalho com as crianças que ali estão inseridas provenientes de famílias vulneráveis, ou seja, famílias que possuem seus vínculos fragilizados, de um meio precarizado, o que acaba culminando em muitas incapacidades perante a vida social. 1 Graduada em Serviço Social – Atuo como Auxiliar de Cartório Eleitoral.

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Trabalho de Conclusão de Curso

1

O DESAFIO DE UMA EDUCAÇÃO PARA TODOS: A IMPORTÂNCIA DO

ASSISTENTE SOCIAL NO MEIO EDUCACIONAL

Rosana Faria de Oliveira1

RESUMO: Este trabalho visa contribuir para as reflexões referentes à importância do profissional de

Serviço Social trabalhar em conjunto com os profissionais da Educação. Este sujeito poderá contribuirá

para a vida escolar das crianças e participação das famílias, através de visitas domiciliares, despertando

elas para a vida escolar do seu filho, realizando a mediação entre escola e família já que encontramos

nesse cenário, crianças fragilizadas, muitas em situação de vulnerabilidade, além de inúmeras

negligências familiares. A escolha metodológica pautou-se em uma revisão bibliográfica, cujo

desenvolvimento foi dado através de estudos de pesquisas de cunho qualitativo, com entrevistas aos

sujeitos in loco, esse artigo visa contribuir no sentido de auxiliar a escola e todo o corpo envolvido, para

que juntos possam somar na formação das crianças inseridas nesse contexto, estendendo assim também

para os familiares representados pelas mesmas.

Palavras – chave: Família, Escola, Serviço Social.

1 INTRODUÇÃO

A motivação para a realização desta pesquisa partiu da vivência do nosso trabalho no

Centro de Educação Infantil e a minha formação que é em Serviço Social, na instituição

trabalhava como secretária e percebia a dificuldade da escola em estabelecer vínculos e buscar

a parceria com a família das crianças, assim comecei a compreender que outro profissional

poderia tornar essa comunicação escola/famílias mais efetiva, dessa forma, comecei a pesquisar

sobre os ganhos que um projeto político que desenvolvesse o trabalho do Assistente Social na

instituição poderia contribuir para a efetivação do oferecimento de uma educação para todos.

Através do trabalho do Assistente Social em colaboração com a instituição educativa

será possível desenvolver um trabalho com as crianças que ali estão inseridas provenientes de

famílias vulneráveis, ou seja, famílias que possuem seus vínculos fragilizados, de um meio

precarizado, o que acaba culminando em muitas incapacidades perante a vida social.

1 Graduada em Serviço Social – Atuo como Auxiliar de Cartório Eleitoral.

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Ao longo do tempo que estava na secretaria da escola, presenciamos vários tipos de

negligência no âmbito familiar que interferia diretamente no comportamento das crianças na

instituição.

Presenciávamos constantemente o abandono, que se materializava no descaso com as

obrigações dos pais com os seus filhos, como cuidados com a higiene pessoal e alimentação

das crianças, até os casos de negligências emocionais, negligência médica, negligência física e

entre outras.

O Estatuto da criança e do adolescente – ECA (Lei Nº 8.069, de 13 de Julho de 1990),

preconiza que a criança e o adolescente devem ser vistos como sujeito de direitos e deveres,

esses mesmos tem direito a conviver com a família e sociedade, não deve sofrer qualquer tipo

de negligência e discriminação que possam por em situações de risco e humilhação.

Os artigos 3º e 5º do ECA, evidenciam, alguns direitos das crianças para que seu

desenvolvimento seja garantido, além de prever punições caso sejam negligenciadas, ressaltam

obrigações gerais assumidas pelo país:

ARTIGO 3º - A criança e o adolescente gozam de todos os direitos

fundamentais á pessoa humana, sem prejuízo da proteção integral de que trata

essa Lei, assegurando-se-lhes, por lei ou por outros meios, todas as

oportunidades e facilidades, a fim de lhes facultar o desenvolvimento físico,

mental, moral, espiritual e social, em condições de liberdade e de dignidade.

ARTIGO 5º - Nenhuma criança ou adolescente será objeto de qualquer forma

de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão,

punido da forma da lei qualquer atentado, por ação ou omissão, aos seus

direitos fundamentais. (BRASIL, 1990, p. 25).

A Constituição Federal (1988) e a LDB (1996) estabelecem a educação como direito

subjetivo de todos os brasileiros, tiveram suas redações alteradas a partir da Lei nº 12.796 de

04 de abril de 2013 que definiu a educação obrigatória dos 4 aos 17 anos de idade tornando

assim garantida a oferta gratuita de vagas para toda a população nessa faixa etária. A legislação

brasileira estabelece, ainda, como finalidade da educação básica a formação básica do cidadão.

No entanto, ainda existe o desafio de oferecer uma educação de qualidade para todas as

pessoas, uma vez que a realidade vivenciada não é a mesma apresentada na legislação brasileira,

nos deparamos diariamente com crianças que não possuem seus direitos básicos garantidos.

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Além da negligência já citada, muitas crianças ainda sofrem inúmeros tipos de violência

por parte dos seus responsáveis, como: maus tratos, abandono, violência física e moral, e que

julgamos o mais importante, a ausência do afeto/do amor, cada vez mais notável nas famílias e

consequentemente nos filhos.

O governo também é falho, ao não oferecer as crianças uma educação digna, de

qualidade. Ao contrário, temos presenciado, escolas “lotadas” com número de alunos excedidos

pela capacidade que a sala comporta, falta de recursos pedagógicos e condições precárias para

professores e recriadores trabalharem.

Por mais que há um grande distanciamento no que a legislação apresente para a realidade

concreta, precisamos acreditar que o direito tem poder transformador, que ele é maior do que

qualquer cena que presenciamos de negligência.

A metodologia adotada para o desenvolvimento da pesquisa teve cunho qualitativo, pois

segundo Minayo (2009, p.21).

[...] a pesquisa qualitativa responde as questões muito particulares. Ela se

ocupa, nas ciências sociais, com um nível de realidade que não pode ou não

deveria ser quantificado ou seja, ela trabalha com o universo dos significados,

dos motivos, das apurações, das crenças, dos valores e das atitudes.

Para a recolha dos dados aplicamos um questionário inicialmente à gestora escolar e

depois realizei uma entrevista semiestruturada com as famílias das crianças que apresentam

uma evasão escolar maior. A pesquisa contemplou a fase exploratória, trabalho em campo e por

fim a análise e tratamento do material empírico e documental.

2 O ASSISTENTE SOCIAL E A EDUCAÇÃO: NOVAS POSSIBILIDADES

O profissional do Serviço Social inserido na Educação tem contato direto não só

com o corpo docente da escola, mas com toda a comunidade em si que atuará no enfrentamento

das expressões da questão social, fazendo com que as famílias das crianças representadas nessa

pesquisa possam fazer de fato parte do processo de ensino-aprendizagem, colaborando assim

no processo da democratização da educação.

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Trabalho esse que poderá contribuir e facilitar no enfrentamento de inúmeras questões

sociais seja elas representada por dificuldade do ensino-aprendizagem, violência, evasão

escolar entre outros. Pensando nisso a articulação do profissional do serviço social (O

Assistente Social) com as famílias e o corpo escolar é primordial.

A própria legislação brasileira faz referência à necessidade de mudanças no campo

educacional, com a inserção de outros profissionais e políticas públicas integradas. A lei 13.257,

de 8 de março de 2016 que define o Marco legal para a primeira infância evidencia a

importância de política públicas intersetoriais para a consolidação do direito e da proteção da

criança.

Foi criada para estabelecer a implementação de políticas públicas voltada para a

primeira infância das crianças até os 6 anos de vida, no qual será criada uma série de programas,

serviços e demais iniciativas voltadas ao desenvolvimento integral das crianças.

Essa lei recente evidencia que para garantir o direito das crianças pequenas é necessário

um atendimento em várias instancias, a educação sozinha não é suficiente assim como a saúde

também não, dessa forma a integração entre os diversos serviços ajudaria a garantir a proteção

e o direito dessas crianças. Nessa perspectiva ressaltamos o trabalho do Assistente Social

cooperando com a educação, de acordo com Santos (2009, p.16) o trabalho do Assistente social

poderá contribuir para a efetivação dos direitos básicos uma vez que ele:

[...] dispõe de possibilidade para o desvelamento de sua profissão, por meio

da efetivação dos direitos sociais mediante o atendimento disponibilizado ao

público de aluno bolsistas e demais, como também as suas famílias, as quais

na sua maioria são oriunda de situações de risco pessoal ou social.

A participação do Assistente Social poderá ocorrer em reuniões com os pais

principalmente as que acontecem no término de cada bimestre, podendo ser palestrados vários

assuntos.

O trabalho do Assistente Social no meio educacional se dará através da proteção social,

no qual tem como uma das suas competências, segundo a Lei 8.662 de 07 de Junho de 1993:

I – elaborar, implementar, executar e avaliar políticas sociais junto a órgãos

da administração pública, direta, empresas, entidades e organizações

populares;

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II – elaborar, coordenar, executar e avaliar planos, programas e projetos que

sejam do âmbito de atuação do Serviço Social com participação da sociedade

civil;

III – encaminhar providências, e prestar orientação social a indivíduos, grupos

e à população;

Uma possibilidade de atuação deste profissional seria a realização de projetos

desenvolvidos ao longo dos anos letivos, com a interação do Assistente Social e a comunidade

escolar colaborando assim na democratização da educação. A seguir pontuamos alguns temas

que poderiam ser discutidos ao longo do projeto:

Prevenção à violência;

Prevenção ao uso de álcool e drogas;

Importância da presença dos pais na vida escolar dos seus filhos;

Empoderar as famílias sobre os direitos humanos;

Orientação social á indivíduos, grupos e famílias;

Fomentar o trabalho com a rede intersetorial.

Sendo assim com a inserção desse profissional no meio, contribuirá para a proteção

social, organizará as demandas existentes nas mais diversas áreas, como: saúde, segurança,

assistência social além de garantir o exercício da cidadania tanto da criança como da sua família,

por meio da disponibilidade de informação e formação e acompanhamento das relações

estabelecidas entre escola e comunidade.

2.1 Família e escola: caminhos e desafios na efetivação do direito a educação

Com o intuito de revelar as condições que as crianças vivem no espaço escolar,

identificar as famílias que hoje necessitam de acompanhamento profissional e verificar se o

ensino ofertado está sendo de qualidade e o suficiente, foi aplicado um questionário ao gestor

do Centro de Educação Infantil – Recanto Feliz.

O Centro de Educação Infantil foi criado pelo Decreto de nº 10, de 26.01.2009. Sendo

essa a única unidade escolar da educação infantil que atende creche e pré-escola no município.

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Atualmente a escola conta com um quadro de 30 funcionários. O prédio não é próprio e

sim alugado, sua estrutura física é bem simples, muitas coisas ainda precisam se adequar. Por

ser a única unidade escolar que atende o público infantil e devido à infraestrutura não

possibilitar o atendimento a muitas crianças, a instituição em seu regimento interno aprovado

em 13/03/2015, estabelece a quantidade de crianças por sala, ao relacionar as quantidades

estabelecidas no documento e as crianças matriculadas, praticamente todas as salas de aula estão

com número excedente de crianças.

Segue o quadro do quantitativo de crianças por sala e a quantidades de crianças

matriculadas:

QUANTIDADE DE CRIANÇAS CONFORME

O GUIA DE OPERACIONALIZAÇÃO

QUANTIDADE DE CRIANÇAS

MATRICULADAS ATUALMENTE

Berçário I (atende faixa etária de 4 meses a 1 ano)

08 crianças

12 crianças

Berçário II (faixa etária de 1 anos a 2 anos)

08 crianças

16 crianças

Maternal I - matutino (faixa etária de 2 anos a 3

anos)

08 crianças

12 crianças

Maternal I - vespertino (faixa etária de 2 anos a 3

anos)

08 crianças

15 crianças

Maternal I - matutino (faixa etária de 2 anos a 3

anos)

08 crianças

12 crianças

Maternal I - integral (faixa etária de 2 anos a 3

anos)

08 crianças

22 crianças

Maternal II - matutino (faixa etária de 3 anos a 4

anos)

15 crianças

18 crianças

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Trabalho de Conclusão de Curso

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Maternal II - vespertino (faixa etária de 3 anos a 4

anos)

15 crianças

20 crianças

Maternal II - integral (faixa etária de 3 anos a 4

anos)

15 crianças

22 crianças

Pré I - matutino (faixa etária de 4 anos a 5 anos)

20 crianças

22 crianças

Pré I - vespertino (faixa etária de 4 anos a 5 anos)

20 crianças

22 crianças

Pré I - integral (faixa etária de 4 anos a 5 anos)

20 crianças

23 crianças

Pré II - matutino “A” (faixa etária de 5 anos a 6

anos)

20 crianças

20 crianças

Pré II - matutino “B” (faixa etária de 5 anos a 6

anos)

20 crianças

19 crianças

Pré II - matutino “C” (faixa etária de 5 anos a 6

anos)

20 crianças

19 crianças

Pré II - matutino “D” (faixa etária de 5 anos a 6

anos)

20 crianças

21 crianças

Em entrevista com a diretora do Centro de Educação Infantil, fomos informadas que na

unidade escolar hoje tem 283 crianças, dessa boa parte pertencem ao Bairro Silvino de Barros

que hoje é o bairro que está concentrado o maior número de famílias em situação de

vulnerabilidade e beneficiários do programa Bolsa Família (PBF).

A diretora da unidade escolar tem experiência na educação infantil há quinze anos, ao

ser indagado sobre o regimento escolar e a proposta pedagógica, disse que a unidade possui os

documentos.

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Relatou que tem vários problemas relacionados à negligência familiar que vão desde a

falta de cuidados como higiene básica até aquelas em que o filho (a) sofre de fato o abandono

dos pais, ficam doentes e só “tomam providências” quando a escola assim exige.

Com relação às crianças beneficiárias do programa bolsa família, na escola tem 98

crianças contempladas com tal benefício, destas há casos de faltas e abandono, porém as

mesmas não são de idade de pré-escola, são do berçário e maternal (etapas da creche), faltam

muito, na verdade constantemente, se a escola quer saber o motivo tem que estar sempre

entrando em contato.

Acredito que as faltas exageradas e o abandono escolar ocorrem na faixa etária de 0 a 3

anos, uma vez que nesta etapa não é exigido um percentual de presença e/ou um número de

faltas permitidas, além disso, há pais que não vêem a educação infantil como importante para

o desenvolvimento integral de seus filhos.

Na entrevista a diretora mencionou duas famílias em especial que faltam muito. As

crianças têm idade na faixa de 0 a 03 (três) anos. Foi relatado que o procedimento da escola é,

após 15 faltas consecutivas, entram em contato. A mãe de ambas as famílias relatam que “a

criança” não comparece a unidade sempre por estar doente, mas o que se percebe segundo a

diretora, é que os pais não querem ter responsabilidade com as crianças, que acham conveniente

“mandar” a criança para a escola quando lhe convêm, quando precisam, quando está um clima

bom para acordar cedo.

Também revelou que há outros fatores por trás das faltas, até disse que segundo relatos

de algumas pessoas que essas crianças não frequentam a escola como deveria em virtude dos

pais usarem substâncias entorpecentes e outros.

Ressaltamos que as faltas das crianças de zero a três anos acontecem por não pertencer

ao critério para receber os benefícios do programa bolsa família, acho relevante mencionar e

salientar que deveria acrescentar a frequência na educação infantil como critério para aqueles

que são beneficiários. Dessa forma contribuiria muito para o desenvolvimento da criança, uma

vez que a diretora relatou prejudicar o ensino-aprendizagem da mesma.

Com relação à qualidade do ensino, pontuou outros itens que prejudicam o ensino, que

vão desde a falta de material como livros didáticos apropriados a idade, o pouco que possuem

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não é o suficiente para trabalhar com o número de crianças matriculadas da escola (283

crianças), e também há falta de equipamentos como armários, ventiladores, equipamentos

tecnológicos, material didático e até mesmo utensílios de cozinha.

A escola recebe anualmente um valor que vem do Fundo Nacional de Desenvolvimento

da Educação, que contribui para sanar algumas dificuldades, mas que é muito limitado diante

de toda a demanda que há no espaço escolar.

2.2 Relatos dos sujeitos

Através da visita realizada no Centro de Educação Infantil, a diretora informou quais

eram as crianças beneficiadas pelo programa Bolsa Família, dentre essas, foi mencionada duas

famílias cujas crianças faltam muito, diante disso elas selecionadas para participar da pesquisa,

uma vez que são famílias pertencentes à Bolsa Família, são de baixa renda e por terem um

número elevado de faltas.

Foi confeccionado um questionário para ambas as famílias, que foram devidamente

respondidos, as famílias entrevistadas foram denominadas como Família I e Família II.

Família I: A responsável pela mesma é a mãe, os pais são separados, na casa moram

três pessoas (responsável e 2 filhos), moram em casa cedida, tem como principal meio de

transporte uma bicicleta.

Quanto à escolaridade, a mãe possui apenas ensino fundamental incompleto, no

momento da entrevista relatou que não pretende concluir seus estudos, quando indagada sobre

a frequência dos seus filhos na educação infantil, disse que quando eles não comparecem a

escola é por estarem doentes.

Essa realidade faz com que somente:

[...] por serem pobres, têm dificuldade de ter voz, isto é, de formular, organizar

e, sobretudo, expressar suas necessidades, transformando-as em demandas por

justiça. A pobreza os joga, sem piedade, no mundo dos “incapacitados”.

(PINZANI e REGO. p. 13, s/n).

A mãe disse que tem conhecimento das condicionalidades do programa, que tem que

pesar, manter as vacinas em dias e os filhos tem que estar na escola.

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Com relação à escola, afirmou que a unidade escolar oferece suporte, pois seus filhos

aprendem lá. Disse que recebe o benefício há dois anos, que é muito bom, realiza várias coisas,

como comprar alimentos, roupas, calçados e etc.

A educação de fato pode mudar uma realidade, pois acredito que uma vez que você a

possui poderá ter autonomia, conforme Rego e Pinzani (p. 57, 2013):

[...] atribuímos autonomia a um sujeito quando ele é capaz de agir conforme

um projeto pessoal de vida boa e de considerar a si e a outros sujeitos como

capazes de estabelecer relações de direitos e deveres... Que é considerado um

grau mínimo já que esta última é uma qualidade que pode ser possuída de

forma maior ou menor: a autonomia de um sujeito se torna maior quanto mais

constrói seu projeto de vida boa de forma independente dos modelos

fornecidos pelo seu ambiente mais próximo.

Com a educação, você pode não somente sonhar, mas concretizar muitas coisas, aqui

me refiro à autonomia, palavra simples, mas de grande expressividade. Através da educação é

que passamos a ter uma consciência crítica, nos transformamos em seres formadores de opinião,

com ela aprendemos a sair do comodismo, podemos ter uma qualidade de vida melhor.

Essa família retratada aqui é exemplo da falta que faz a educação na vida das pessoas,

notamos que a mãe não tem autonomia sobre a sua vida. A educação tem poder transformador

na vida das pessoas e nos dá conhecimento notório de adquirirmos autonomia para a vida.

A mãe disse que mesmo que não seja muito, mas sem ele o que seria? Pois a mãe vive

de “bicos” não tem serviço fixo, atualmente estava como cabo eleitoral, o que a ajudou muito,

afinal estava ganhando R$ 300,00, que serviço como esse não é toda hora que surge, o que

dificulta oferecer uma vida com mais qualidade de vida aos seus filhos.

Também disse que toda a dificuldade que passa, não quer ver se repetindo com seus

filhos no futuro, que quer ver eles formados e com um bom serviço, já que não teve essa

oportunidade.

Família II: A responsável pela família é novamente a figura feminina, sendo a mãe,

reside sozinha na casa com seus três filhos uma adolescente de 13 anos, dois meninos, um de 1

ano e 8 meses e um de cinco anos. Mora em casa alugada, na maioria das vezes para realizar as

tarefas do dia a dia anda a pé, raramente usa uma bicicleta que possui.

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Possui ensino fundamental incompleto. Quando questionada sobre a frequência dos

filhos na escola, a mãe disse que todos frequentam certinho, porém o de idade da educação

infantil falta, pois moram longe e que às vezes “perdem o ônibus”, outras vezes por estar doente.

Com relação ao que o filho aprende, a mãe disse que seu filho brinca muito na escola.

Sendo a mãe a única responsável de manter a casa, suprir as necessidades individuais e

dos filhos, a mesma trabalha limpando casas, que sempre aparece uma ou outra, e assim vai

levando a vida relatou que tem um relacionamento e que essa pessoa a ajuda quando pode. Não

tem renda fixa, mas que quando ganha muito chega a R$ 500,00.

Recebe o benefício do Programa Bolsa Família há quase 3 (três) anos, relata que o

dinheiro que recebe ajuda e muito na criação dos filhos, que com esse recurso consegue comprar

várias coisas como: roupas, calçados, materiais de escola e etc.

Quanto ao futuro, sonha em ter uma vida melhor do que a que tem hoje, quer que seus

filhos vivam bem, que tenham qualidade de vida e que todos seus filhos concluam os estudos.

Mais uma vez o Círculo vicioso é visível para essa família, pois nos indagamos como

tal família poderá sair desse cenário de pobreza? Como a mãe que não possui um bom grau de

estudo dará condições de vida melhor pra si e aos filhos no futuro? É difícil acreditar que tudo

isso melhore, se a pessoa não enxergar na educação a chance para mudar a sua realidade logo

adiante.

3 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Nesse trabalho abordamos o desafio de uma educação para todos, também falamos da

importância da inserção do profissional Assistente Social no meio educacional, uma vez que há

inúmeras possibilidades de articulação entre os sujeitos e a rede intersetorial, para garantir uma

educação de qualidade para todos os sujeitos.

A pesquisa não somente revelou como é a realidade da escola aqui escolhida para

realizar o trabalho, assim como buscou conhecer e demonstrar as situações que estão por detrás

das faltas exageradas. O relato da gestora informa que a mesma era sempre avisada que as

crianças faltavam por doença, mas que na verdade, de fato sim elas também faltam quando

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estão doentes, mas por outras vezes faltam por comodismo dos responsáveis, que acabam

perdendo o transporte que passa praticamente em frente a sua casa.

Percebemos, com as entrevistas, que com todo o cenário de pobreza observado e falado,

o benefício do programa bolsa família faz a “diferença” no dia a dia dessas famílias.

Ademais também tivemos contato com o outro lado, as famílias, que nos acolheram tão

bem, que diante da realidade apresentada veio para confirmar o que está disponibilizado no

material de estudo – módulo I POBREZA E CIDADANIA referente ao círculo vicioso, pois

ambas as famílias entrevistadas possuem pouca escolaridade, os lares são providos pela figura

feminina, no caso aqui representado pela mãe. Apresentam dificuldades, uma vez que não tem

renda fixa, fazendo assim com que fiquem excluídas politicamente, economicamente e

socialmente.

Com o estudo destacamos o papel da educação para a superação da desigualdade e

círculo vicioso, uma vez que quando as famílias aqui elencadas não possuem grau de instrução,

estão totalmente na pobreza, faz com que fiquem excluídas.

Somente através da educação, esse cenário poderá ser mudado, a partir de então terão

autonomia sob as suas vidas e esse círculo vicioso será rompido.

Por fim essa pesquisa foi muito importante, pois através do resultado percebemos que

há uma série de fatores que devem ser levados em consideração, quando realizamos contato

com o “outro”, temos que ter a sensibilidade para desenvolver uma escuta atenta, deixando que

os próprios sujeitos falem sobre a percepção que têm da desigualdade crescente em nossa

sociedade.

4 REFERÊNCIAS

BRASIL. Estatuto da Criança e do Adolescente. Brasília, Senado Federal, 1990.

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Trabalho de Conclusão de Curso

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BRASIL, Ministério da Educação Básica. Diretrizes curriculares nacionais para a

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<https://www.google.com.br/?gfe_rd=cr&ei=V5AeWK3JtLV8weSk7GoBw&gws_rd=ssl#q=

lei+8.662+de+07.06.1993>. Acesso em: 22 set. 2016.

LÜDKE, M.; ANDRÉ, M. E. D. Pesquisa em educação: abordagens qualitativas. SP: EPU,

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<http://portal.mec.gov.br/component/content/211-noticias/218175739/18563-crianças-terao-

de-ir-a-escola-partir-d-4-anos-de-idade?Itemid=86>. Acesso em: 22 set. 2016.

PINZANI, Alessandro; REGO, Walquiria. Vozes do Bolsa Família: autonomia, dinheiro e

cidadania. SP: editora Unesp, 2013.

SANTOS, André Michel – Serviço Social na Educação: Reflexões acerca das

contribuições do Assistente Social para o fortalecimento da Gestão Escolar. Porto Alegre:

CMC, 2012.

SCHNEIDER, Glaucia; HERNANDORENA, Maria do Carmo. Serviço social na educação –

Perspectivas e possibilidades. Porto Alegre: CMC, 2012.