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AVM Faculdade Integrada Pós-Graduação Presencial de Direito Penal e Processo Penal A FUNDAMENTAÇÃO DAS DECISÕES DOS JURADOS NO TRIBUNAL DO JÙRI ARTIGO CIENTÍFICO ALAN LEITE MACHADO JUNIOR ORIENTADOR: JEAN ALVES RIO DE JANEIRO (RJ) 2015 ALAN LEITE MACHADO JUNIOR DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO AUTORAL

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AVM Faculdade Integrada Pós-Graduação Presencial de Direito Penal e Processo Penal

A FUNDAMENTAÇÃO DAS DECISÕES DOS JURADOS NO TRIBUNAL DO JÙRI ARTIGO CIENTÍFICO ALAN LEITE MACHADO JUNIOR

ORIENTADOR: JEAN ALVES RIO DE JANEIRO (RJ) 2015 ALAN LEITE MACHADO JUNIOR

DOCUMENTO PROTEGID

O PELA

LEI D

E DIR

EITO AUTORAL

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AVM Faculdade Integrada Pós-Graduação Presencial de Direito Penal e Processo Penal

A FUNDAMENTAÇÃO DAS DECISÕES DOS JURADOS NO TRIBUNAL DO JÙRI ARTIGO CIENTÍFICO

Apresentação de monografia à AVM Faculdade Integrada como requisito parcial para obtenção do grau de especialista em Direito Penal e Direito Processual Penal Por: ALAN LEITE MACHADO JUNIOR

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AGRADECIMENTOS

Aos amigos de turma da pós-graduação, ao

meu estagio, e a os funcionários da Candido

Mendes.

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DEDICATÓRIA

Dedico essa conclusão, ao meu pai, mãe e amigos que apoiaram a realização dessa

pós no intuito do meu crescimento profissional.

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Resumo A Constituição da República de 1988, que assegura o Estado Democrático de Direito, preceitua em seu at. 93, IX, que todas as decisões dos órgãos do poder judiciário serão públicas e que serão fundamentadas todas as decisões, sob pena de nulidade. O Código de Processo Penal, em seu art. 485, prevê o sistema da íntima convicção, no qual os jurados não são obrigados a fundamentar seu voto. O presente estudo não se prende em avaliar vantagens ou desvantagens de ordem meramente prática, mas, sim, em analisar se a decisão proferida pelos jurados no Tribunal do Júri é compatível com o princípio constitucional da motivação das decisões judiciais, mostrando a vulnerabilidade deles ante influências exercidas pelos discursos em plenário e pela mídia. Palavras chave: Tribunal do Júri, Sigilo Votações, Motivação Decisões, Garantismo.

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Sumário Introdução. Capítulo 1 – A instituição do Júri 1.1. Breve histórico do Júri Popular no Brasil. 1.2. Do Direito Comparado. 1.3 A discriminação do Júri no Brasil. Capítulo 2 – Princípio da motivação das decisões judiciais: 2.1. O dever de fundamentar a decisão. 2.2. Da Democracia Garantista e da necessidade de julgamentos motivados. Capítulo 3 – A influência do discurso e da mídia nas decisões dos jurados. 3.1. Os discursos no Tribunal do Júri. 3.2. O Direito Penal do autor versus o Direito Penal do fato no Júri. 3.3. A influência da mídia. Capítulo 4 – Voto médio. 4.1. Breve análise no âmbito do Processo Civil. 4.2. Voto médio como técnica de decisão dos órgãos colegiados. Capítulo 5 – Da colisão de princípios - sigilo das votações X motivação das decisões. Capítulo 6 – Casos Importantes de Júri no Brasil 6.1. Caso Richthofen 6.1.A. Júri 6.2. Caso Eliza Samudio 6.2.A. Júri 6.3. Caso Isabella Nardoni 6.3.A. Júri Conclusão. Referencias.

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INTRODUÇÃO: A Constituição da República de 1988, que assegura o Estado Democrático de Direito, preceitua em seu at. 93, IX, que todas as decisões dos órgãos do poder judiciário serão públicas e que serão fundamentadas todas as decisões, sob pena de nulidade. O Tribunal do Júri, implantado no ordenamento jurídico brasileiro no período ditatorial, sobre a égide da Constituição de 1937, traz em si marcas desse período. O Código de Processo Penal, em seu art. 485, prevê o sistema da íntima convicção, no qual os jurados não são obrigados a fundamentar seu voto. A discussão sobre a fundamentação das decisões é ampla, baseando-se no preceito constitucional citado e em uma filtragem constitucional das normas processuais à luz do advento da Carta Magna de 1988. O tema escolhido, a necessidade de fundamentação das decisões dos jurados no Tribunal do Júri: uma análise à luz do princípio constitucional da motivação das decisões judiciais traduz a importância de se avaliar o procedimento adotado em plenário, na resposta dada aos quesitos pelos jurados. Este trabalho tem como finalidade defender a instituição do Tribunal do Júri brasileiro, analisando sua condição histórica, seus princípios e o seu significado na sociedade. Será feita uma abordagem crítica do atual sistema, confrontando-o com os postulados fundamentais do júri, constatando disparidades e propondo mudanças. Inicialmente, o presente estudo fará uma abordagem histórica do instituto no ordenamento jurídico brasileiro, analisando os modelos adotados em outros países e enfocando a discriminação que o Júri sofre no Brasil. Em seguida, será analisado o princípio constitucional expresso no marco teórico, da motivação das decisões judiciais, enfocando o dever de se fundamentar as decisões, passando por uma abordagem da democracia garantista e da consequente necessidade de julgamentos motivados.

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O terceiro capítulo tratará das influências que sofrem os jurados em suas decisões, analisando os discursos dos tribunais, o chamado direito penal do autor versus o direito penal do fato no júri, e, principalmente, a influência que a mídia exerce. No quarto capítulo, será feita uma sucinta descrição do chamado voto médio utilizado nos tribunais superiores, que poderia servir de modelo para o Júri. Finalizará este artigo uma abordagem do princípio do sigilo das votações em confronto com o princípio constitucional da motivação das decisões. O Júri, instituto democrático que é, visa justamente a propiciar que a sociedade, através de uma análise sensível de um crime doloso contra a vida, possa expressar a moralidade social por meio da mais legítima sociabilidade do convencimento, termo utilizado pelo doutrinador italiano Nicola Framarino Dei Malatesta (1911) que estabeleceu tal princípio, qual seja, a decisão dos próprios pares. O presente estudo não se prende em avaliar vantagens ou desvantagens de ordem meramente prática, mas, sim, em analisar se a decisão proferida pelos jurados no Tribunal do Júri é compatível com o princípio constitucional da motivação das decisões judiciais, mostrando a vulnerabilidade deles ante influências exercidas pelos discursos em plenário e pela mídia.

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1 – A INSTITUIÇÃO DO JÚRI. 1.1. Breve histórico do Júri Popular no Brasil.

O Tribunal do Júri foi disciplinado no ordenamento jurídico brasileiro pela primeira vez em 18 de junho de 1822, com competência limitada ao julgamento dos crimes de imprensa, tendo como origem o Direito francês. Por ter surgido nessa época, o caráter de representatividade desse Tribunal começou a ser questionado, pois em período de escravidão somente os cidadãos que podiam ser eleitos podiam ser jurados, ou seja, a classe dominante. Com a Constituição Imperial, de 25 de março de 1824, passou a integrar o Poder Judiciário como um de seus órgãos, tendo sua competência ampliada para julgar causas cíveis e criminais. Alguns anos depois, foi disciplinado pelo Código de Processo Criminal, de 29 de novembro de 1832, o qual lhe conferiu ampla competência, só restringida em 1842, com a entrada em vigor da Lei número 261. A Constituição de 1891 manteve o Tribunal do Júri como instituição soberana. A Constituição de 1937 silenciou a respeito do instituto, o que permitiu ao Decreto n. 167, de 05 de janeiro de 1938, suprimir essa soberania, permitindo aos tribunais de apelação a reforma de seus julgamentos pelo mérito. A Constituição da República democrática de 1946 restabeleceu a soberania do Júri, prevendo-o entre os direitos e garantias constitucionais. A Constituição de 24 de janeiro de 1967 também manteve o Júri no capítulo dos direitos e garantias individuais, e a Emenda Constitucional n. 01, de 17 de outubro de 1969, manteve a instituição no mesmo capítulo, mas restrita ao julgamento dos crimes dolosos contra a vida, o que fez reaparecer a discussão sobre sua relevância na sociedade. Na atual Carta Magna, é reconhecida a instituição do Tribunal do Júri com a organização que lhe der a lei, assegurados como princípios básicos: a plenitude do direito de defesa, o sigilo nas votações, a soberania dos veredictos e a competência mínima para o julgamento dos crimes dolosos contra a vida. Na Constituição atual o Júri encontra-se disciplinado no art. 5º, XXXVIII, inserido no Capítulo dos Direitos e Garantias Individuais, sendo uma garantia constitucional da própria soberania popular. Sua finalidade é a de ampliar o direito de defesa dos réus, funcionando como uma garantia individual dos acusados pela prática de crimes dolosos contra a vida e

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permitir que, em lugar de juiz togado, preso a regras jurídicas, sejam julgados pelos seus pares. Como direito e garantia individual, não pode ser suprimido nem por emenda constitucional, visto que verdadeira cláusula pétrea, núcleo constitucional intangível. Tudo por força da limitação material contida no art. 60, § 4º, IV, da Constituição Federal. O quórum para deliberação do julgamento é de maioria simples, o que gera criticas por enfraquecer o real interesse social, fazendo com que a sentença não seja verdadeira expressão democrática, como seria no caso de maioria absoluta, por exemplo. Os jurados que o integram representam a sociedade da qual fazem parte, decidindo em nome dela, sendo uma expressão eminentemente democrática, pois os pares decidem de forma independente e justa. 1.2. Do Direito Comparado.

O funcionamento arquétipo do Júri surgiu na era clássica, mas o instituto somente se consolidou como figura jurídica a partir da Magna Carta Inglesa, que serviu de modelo para o mundo. Sem dúvidas, o fato de ter tido um berço inglês fez com que a instituição tenha mais prestígio nos países do Common Law, principalmente nos Estados Unidos. A ideia de formação do Júri com 12 jurados surgiu na Inglaterra, onde ainda é tido como figura central, apesar de ser restringido ao julgamento de menos de cinco por cento dos casos criminais. Ficam sujeitos apenas os crimes de homicídios, o de estupro e, ainda, aqueles considerados graves. O veredicto na Inglaterra não é condicionado à unanimidade. Admite-se a maioria de 10 x 2 ou 11 x 1, pelo menos. Caso o corpo de jurados não chegue a um acordo, unânime ou por maioria, o juiz poderá desonerá-los da função. Nos Estados Unidos, o julgamento de todos os crimes é feito pelo Júri e são processados no estado em que os crimes são cometidos. Com a 6ª Emenda Constitucional americana, ficou estabelecido que em todos os processos criminais, o acusado terá direito a ser julgado por um júri imparcial do local onde o crime foi cometido. A jurisprudência consolidou a ideia de funcionamento com doze jurados e um juiz presidente. Observa-se nos EUA a ocorrência de dois tribunais do Júri: o grand jury e o petit

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jury. O primeiro corresponde ao juízo de pronúncia brasileiro e trata-se apenas de critério de admissibilidade para o julgamento no júri propriamente dito. O segundo é o órgão que irá julgar efetivamente o réu, avaliando a responsabilidade e as circunstâncias do crime. Nas Cortes Federais, o réu tem faculdade de abrir mão do direito ao julgamento pelo Júri. Para isto, é necessário que tenha sido aconselhado pelo seu advogado e que haja a concordância da promotoria e do juiz. Nos Tribunais de Júri Estaduais também existe essa possibilidade, mas com diferentes restrições que variam em cada estado. O Júri americano é uma verdadeira garantia fundamental do cidadão previsto pela Constituição Federal. Os juízes e promotores são eleitos ou nomeados pelo Poder Executivo, não existe concurso público de admissão, o que privilegia a participação do cidadão leigo na administração da justiça e reflete o caráter democrático do juiz, sendo uma consubstanciação da soberania do povo com expressão judiciária. Na Constituição brasileira, existe uma maior garantia do Júri do que nos EUA, uma vez que é irrenunciável o direito de ser julgado por um Júri popular. Com relação ao modelo francês, sua introdução foi feita a partir da Revolução Francesa e visou a retirar da magistratura o poder de julgar, repassando-o para o povo. Isto porque a esfera jurídica no antigo regime era completamente tomada pelo autoritarismo do Império, necessitando mudar o poder de julgar. Após várias modificações, o Júri francês firmou-se como escabinato, ou seja, 3 magistrados e 9 jurados. Nesse sistema, denominado Cour d’ Assises, cada magistrado e cada jurado respondem a cada questão, secretamente, na forma sim ou não, entregando o voto ao presidente. A Cour d’ Assises também delibera sobre a pena a ser aplicada ao acusado, necessitando para a aplicação da pena máxima o mínimo de oito votos. Não obtido o número mínimo de votos, a pena fica limitada há 30 anos. Em geral, a decisão para aplicar uma pena está vinculada ao quórum de maioria absoluta. Não alcançado o quórum de maioria absoluta, será descartada a pena a que se chegou e será aberto outro escrutínio, sucessivamente, até que se chegue a este quórum. Mostra-se, assim, muito clara a conotação democrática da instituição do Júri no modelo francês.

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1.3 A discriminação do Júri no Brasil. Desde sua criação, o Júri causou polêmica no que tange à sua representatividade e, principalmente, quanto à capacidade dos jurados para decidir questões consideradas pelos juristas como de alta capacidade técnica, que os juízes de fato ou leigos não tinham capacidade de obter. A discussão sobre a justeza dos veredictos emanados dos julgamentos do Tribunal do Júri desponta, principalmente, quando é julgado um crime que tenha repercussão social. Não faltam críticos e censores ao júri, alguns por ignorância, outros por interesse ou má-fé, e muitos mal informados sobre os critérios orientadores das decisões dos jurados e os mecanismos de funcionamento da instituição, ou por um conhecimento incompleto do fato, de seus antecedentes, de sua motivação, de suas circunstâncias, de seus protagonistas. Isto se observa, em especial, nos processos em que há larga publicidade de seu andamento e dos incidentes que mais podem provocar a excitação da opinião pública. Se o crime teve, direta ou indiretamente, uma conotação política, se foi cometido em desafronta subitânea e aparentemente excessiva a brios morais ofendidos e, sobremodo, se teve origem ou motivo essencial em uma paixão amorosa, logo se formam correntes de opinião, influenciadas e conduzidas pelos noticiários. A discriminação do Júri, e, por consequência, dos jurados, tem uma relação muito íntima com o que se pode chamar de cientificismo, ou seja, usar a ciência ou colocar algo como científico para dar status de verdadeiro e digno. O julgamento proferido pelos jurados não teria esse status de pureza, de cientificidade. Afinal, os jurados, sendo leigos, julgam segundo seu senso comum, sendo influenciados pela retórica simples. Percebe-se, assim, como a ciência, detentora do discurso da verdade, passa a ter a função de legitimar, ideologicamente, o judiciário togado, classificando o Júri como um tribunal que profere decisões que não sejam científicas. 2 – PRINCÍPIO DA MOTIVAÇÃO DAS DECISÕES JUDICIAIS. 2.1. O dever de fundamentar a decisão. Segundo o art. 381, III, do Código de Processo Penal, a sentença conterá a indicação dos motivos de fato e de direito em que se fundar a decisão. Já o art. 93, IX, da Constituição Federal, estabelece que todos os julgamentos dos órgãos do

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Poder Judiciário serão públicos e, fundamentadas todas as decisões, sob pena de nulidade. É pela motivação que se aprecia se o juiz julgou com conhecimento de causa, se sua convicção é legítima e não arbitrária, tendo em vista que interessa à sociedade e, em particular, às partes, saber se a decisão foi acertada ou não. E, somente com a exigência da motivação, da fundamentação, se permitiria à sociedade e às partes a fiscalização da atividade intelectual do julgador no caso decidido. Até o final do século XVII, era comum o juiz sentenciar sem fundamentar sua decisão. A obrigatoriedade da motivação dos atos judiciais tornou-se efetiva apenas em 1774, com Fernando IV, na Pragmática, sendo orientação ao art. 3º da Ordennance Criminelle, de Luís XVI, em 1788, das leis revolucionárias de 1790 e da Constituição francesa de 1795. Se durante o século XIX o princípio foi inserido como postulado básico nos processos de codificação, no século XX, adquiriu status constitucional.

Segundo Portanova (2001, p. 125), trata-se, portanto, de uma imposição do princípio do devido processo legal em que se busca a exteriorização das razões de decidir, a interpretação da lei e dos fatos da causa, visto que, do ponto de vista mais jurídico, a motivação permite aferir a vinculação do juiz à prova.

Assim, é na forma de argumento que a prova aparece na fundamentação da sentença, quando o juiz procura justificar sua decisão perante as partes, os tribunais e a comunidade jurídica.

Conforme Lauria Tucci e Cruz Tucci (1999,p. 29), o escopo imediato da motivação da sentença é demonstrar ao próprio juiz, antes mesmo do que às partes, a ‘ratio scripta’ que legitima seu ato decisório.

A obrigatoriedade de fundamentação dos pronunciamentos jurisdicionais deve ser entendida como uma das garantias do cidadão inerentes ao próprio conceito de Estado Democrático de Direito.

Para Ferrajoli (2002,p.113), o valor fundamental do princípio se expressa por sua natureza cognitiva e não protestativa, antigarantista, vinculando a decisão na esfera jurídica à estrita legalidade e, na esfera fática, à prova das hipóteses acusatórias. A motivação permite a fundamentação e o controle das decisões tanto em direito, pela violação da lei ou defeitos de interpretação ou de subsunção, como em fato, por defeito ou insuficiência de provas ou por inadequada explicação do nexo entre convicção e provas.

Por esta razão, se afirma que a fundamentação deve cumprir determinados requisitos, materiais e processuais. Um deles é o da motivação fática e legal do juízo de condenação ou absolvição, em que a correspondência dos argumentos da

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sentença com a lei e o material probatório colhido em processo público e contraditório é garantia formal de controle do arbítrio judicial. Privilegiando a fundamentação, e em razão da necessidade de regrar o cálculo da pena, com a reforma de 1984, o Código Penal adotou um modelo criterioso no art. 68, que estabelece o método trifásico para fixação da pena. Todavia, junto à forma, o conteúdo dos argumentos também deve ser predeterminado, fundamentalmente pela opção do Direito Penal da modernidade em instituir o direito penal do fato, excluindo valorações de cunho eminentemente morais. O controle do que pode ou não ser objeto de valoração é imprescindível, pois a subjetivação das hipóteses pode gerar uma verdadeira perversão do processo, tornando-o inquisitivo, dirigido não mais à comprovação de fatos objetivos, mas para a análise do acusado, o que degradaria a verdade processual. O princípio constitucional do art. 93, IX, da Constituição não traça uma regra de caráter meramente procedimental, e a falta de fundamentação, formal ou substancial, das decisões jurisdicionais acarreta sua nulidade. 2.2. Da Democracia Garantista e da necessidade de julgamentos motivados. A estrutura atual do modelo do Júri brasileiro fere alguns postulados fundamentais da Carta Magna, além de suplantar uma das máximas da processualística, qual seja, a ampla defesa. Há um comprometimento deste princípio constitucional basilar do processo moderno que pode ser verificado na ausência de fundamentação das decisões dos jurados. O próprio sistema de apreciação de provas prevê no princípio da persuasão racional, ou do livre convencimento, que o juiz forma livremente o seu convencimento, porém, dentro de critérios racionais que devem ser explicitados. Ele é acolhido no direito pátrio no âmbito penal, no art. 155, do CPP, que diz que o julgador formará sua convicção pela livre apreciação das provas. No sistema do devido processo legal, o termo persuasão racional significa convencimento formado com liberdade internacional, mas sempre apoiado na prova constante dos autos e acompanhado do dever de fornecer a motivação dos caminhos do raciocínio que conduziram o juiz à conclusão.

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No Júri, os jurados não são vinculados às provas, podendo desconsiderar todas e julgar com base no seu convencimento, motivados apenas por razões meta jurídicas, já que este princípio se refere, em tese, a juízes togados e não aos de fato, não tendo, inclusive, de dizer o porquê de suas decisões. Assim, o réu fica impedido de saber as razões de sua condenação, ou absolvição, e exercer seu direito de defesa. O apego indiscriminado às formalidades do processo pode levar, muitas vezes, à inobservância de garantias fundamentais e gerar uma divergência entre a normatividade constitucional e a efetividade dessas garantias.

No entendimento de Ferrajoli (2002,p.113), se trata de um entendimento garantista que, prevendo um processo penal eminentemente protetivo, preconiza a uniformidade entre as garantias constitucionais e as estatais. Assim, seria obtida a efetividade de um estado Democrático de Direito garantista e protetor.

É necessário romper com o formalismo para que seja obtida a efetividade dessas garantias e enxergar o processo como um instrumento para efetivação dos direitos, e, não, como um fim em si mesmo.

Mezzomo (2003,p.04) salienta que para se alcançar a efetividade da tutela, o processo e a jurisdição devem ser vistos sob a ótica dos consumidores do direito, ou seja, da sociedade a quem é dirigida.

A tendência mais moderna da processualística preconiza que a legitimidade do processo frente à ordem constitucional e aos princípios consagrados no Direito Processual torna imprescindível que se forneça ao réu pleno conhecimento do processo que se lhe move, garantindo plena defesa técnica. Na fundamentação da sentença é que se pode avaliar se esta representa o reflexo do conteúdo do processo. De nada adianta garantir-se a participação ativa do réu e uma defesa técnica altamente competente, cujo resultado, baseado em um substrato probatório sólido e conclusivo, indique uma absolvição, se os jurados não estão obrigados a se aterem aos autos e à lógica. Verifica-se, outrossim, que a ausência de motivação na conclusão das respostas dos quesitos do Tribunal do Júri, no que diz respeito a condenar ou absolver o réu, reduz a defesa deste a nada, tornando o inciso XXXVIII, alínea a, do art. 5º da CR, dispositivo inócuo, fragilizando o próprio sistema penal. A instituição do Júri é um dos reflexos mais vivos no Brasil da forma de governo democrática e garantista. O direito dado aos cidadãos de julgar seus pares naqueles crimes que invocam uma grande reprovação social, na verdade, é um poder de

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decidir, soberanamente, sobre a viabilidade de se aceitar ou não um réu ao corpo social, com fundamento na reprovabilidade de sua conduta. Imperioso, assim, que tal instituição seja preservada, alterando ou substituindo dispositivos que ferem a própria ordem garantista. O Júri não pode ser abolido, reflexo que é da democracia garantista e secularizada, contudo, é fundamental o respeito à ampla defesa através da motivação das decisões dos jurados. 3 – A INFLUÊNCIA DO DISCURSO E DA MÍDIA NAS DECISÕES DOS JURADOS. 3.1. Os discursos no Tribunal do Júri. O ritual do júri tem seu momento maior nos debates entre acusação e defesa, durante o qual a sorte do acusado será decidida. Os mais variados tipos de discursos e recursos retóricos são utilizados no plenário. Existem tantas formas e maneiras de atuação quanto são os protagonistas do espetáculo. Há julgamentos, como o que condenou o José Rainha, líder do Movimento dos Sem Terra (MST), a 26 anos de prisão, em que um dos advogados, assistente da acusação, chegou a se ajoelhar e chorar. Identifica-se dois tipos de recursos de que se valem os debatedores em plenário, os quais, mesmo separáveis, são apresentados conjuntamente, na maioria das vezes. O primeiro é o discurso como manifestação oral persuasiva, utilização da retórica, da contundência ordinária, do apelo emocional, dentre outros. O segundo é a interpretação cênica, teatral, irreverente, gesticular. Para ele, os réus são uma minoria, fracos ante seus pares, o que leva os debatedores a explorar ao máximo seus discursos. Ocorre que todas as argumentações e contra-argumentos desenvolvidos pelos que debatem acabam, muita das vezes, por obscurecer o fato de que eles possuem um terreno comum em suas discussões, que se define não apenas por regras legais, mas, também, por normas sociais que eles mesmos reforçam. Assim, tanto o promotor de justiça quanto o advogado de defesa usam discursos semelhantes, diferenciados somente no que tange à caracterização do réu e da vítima. Os discursos no processo do júri produzem, desse modo, uma mediação que (re) adequa, amolda, a dimensão dos acontecimentos. O filtro de uma linguagem formalizada transforma e reduz as chances do réu a apenas duas interpretações, ambas, provenientes de um terreno comum e que serão, ainda, reduzidas na decisão. Esta será a escolha da apresentação mais coerente com o modelo que os

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julgadores visualizam para a sociedade em que vivem e um atestado de aprovação dos procedimentos escolhidos por essa mesma sociedade. 3.2. O Direito Penal do autor versus o Direito Penal do fato no Júri. No âmbito da dogmática jurídica, criou-se uma distinção informal entre o chamado direito penal do autor, ou da vontade, e direito penal do fato. De acordo com o primeiro, defende-se, acusa-se e julga-se o indivíduo não pelo fato criminoso que cometeu, mas pelo que ele representa, de forma efetiva, no seio da sociedade na qual está inserido. Ou seja, é o papel social do acusado que definirá a maneira como será tratado, julgado. Nos julgamentos do Tribunal do Júri, mostra-se clara a prevalência das teses do Direito Penal do autor, uma vez que o Direito Penal brasileiro é inserido em uma sociedade altamente desigual, em que se o indivíduo tiver bons antecedentes, for bom pai de família, trabalhador, enfim, se enquadrar segundo os padrões de normalidade estabelecidos pela sociedade dominante, terá maiores possibilidades de ser absolvido do que outro considerado desviante. Tenta-se enquadrar homens e mulheres dentro de regras idealizadas, para, assim, comprovar sua maior ou menor adesão a elas. Dessa operação é que depende a condenação ou absolvição dos acusados ante o júri. Nota-se, dessa forma, que a punição é da conduta social do acusado e da vítima, e não do crime cometido. Outro fator que vem ao encontro a tal assertiva advém das manchetes divulgadas pela imprensa, que acabam por fazer um pré-julgamento dos envolvidos, já pré estabelecendo sua adequação, ou não, aos padrões da normalidade daquela sociedade.

Não se pode perder de vista a lição de Ferrajoli (2002,p.115), para quem delinquente não é aquela pessoa que, segundo as circunstancias, opiniões ou contingentes relações de força, podem ser etiquetadas como imoral, perigosa, infiel ou inimiga, mas a que é identificada como responsável por um delito.

Nesse contexto, os operadores do direito, principalmente no Júri, ao utilizarem-se da retórica do direito penal do autor, além de escamotearem o direito penal do fato, acabam por, implicitamente, corroborar com a desigualdade social. Assim, levando-se em conta a circunstância de os acusados serem em sua maioria provenientes das camadas mais pobres da sociedade, pode-se concluir que, quando levados a julgamento frente a um corpo de jurados formado basicamente pelas camadas mais altas, estarão em face de uma verdadeira luta de classes, que acaba por ser escamoteada no plenário de julgamento pelos discursos.

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3.3. A influência da mídia. Atualmente, uma importante característica se assinala não somente no sistema penal brasileiro, mas nos dos demais países que derivam do capitalismo tardio, é sua especial vinculação com a mídia. A contaminação do ambiente forense, imperceptível para muitos leigos, acarreta uma verdadeira legitimação do sistema penal pela imprensa. Historicamente, esta legitimação se comprova pela defesa do poder punitivo exercido pela burguesia, ao fortalecer teorias como a do positivismo criminológico, que buscava impingir aos infratores uma inferioridade biológica, que decorreria de sua natureza, como os operários e anarquistas. Nos dias atuais, se nota claramente pelo enfoque que dispensam às guardas municipais contra camelôs e flanelinhas, ou pela complacência com as mortes acidentais nas violentas incursões policiais pelas favelas. O compromisso da imprensa, de propriedade de grandes grupos econômicos, com o movimento neoliberal é a chave da compreensão da vinculação entre a mídia e o sistema penal, o que torna essa legitimação incondicional. Como consequência, há constante fortalecimento e propagação de algumas crenças e silêncio proposital sobre informações que as desmintam, fundamentada na própria ideia de pena, encarando-a como rito sagrado de solução de conflitos, mesmo que descabida de legitimidade. O prestígio da equação se houve delito tem que se aplicar pena, gera consequências graves. A primeira é que se conduz a certos hábitos mentais, tais como se a desgraça sobreveio, é certo que houve infração. Basta uma simples passada de olhos pelas manchetes dos jornais do Brasil para que se verifique tal fato, como em dezembro de 2001, quando ocorreram fortes temporais no estado do Rio de Janeiro, com um saldo trágico de dezenas de mortos, vindo estampadas nas primeiras páginas “Ministério Público busca responsáveis pelas mortes” O Globo (2001,p. 11). Imprime-se, assim, a ideia na sociedade de que se houve mortes, é certo que houve homicídio. A segunda consequência reside no incômodo e tensão, segundo enfoque da mídia, gerado pelos procedimentos legais para atestar a ocorrência e autoria do delito e responsabilizar penalmente o infrator. Princípios processuais penais como o estado de inocência, devido processo legal, plenitude de defesa e outras garantias do estado democrático de direito, acabam sendo flexibilizados por juízes e promotores

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devido à forte pressão que sofrem em compatibilizar, no curso do processo e na sentença, a opinião pública com as normas jurídicas. Não raro o jornalismo abandona sua função de narrativa fidedigna e passa a investigar ou promover reconstruções dramatizadas dos casos, o que gera alcance e repercussão muito superiores à reconstrução processual, caracterizando verdadeiros juízes paralelos. Em se tratando do Tribunal do Júri, tal influência é facilmente notada, levando-se em conta a grande publicidade de certos julgamentos e o grau mínimo de conhecimento jurídico dos jurados, o que os leva a serem alvos fáceis das opiniões da imprensa. Prova irrefutável se encontra nos casos de foragidos cujos crimes são exibidos em programas na televisão, na maioria das vezes sem a menor preocupação com a apuração processual da verdade dos fatos, que traduzem um julgamento do acusado pela opinião pública, sem direito de defesa, e que na maioria das vezes será referendado pelos jurados. A questão criminal na mídia está muito distante da mera suposição, ainda que não totalmente errônea, de que o sangue sempre aumenta as vendas. Seu discurso visa a ser um instrumento de análise dos conflitos sociais e das instituições públicas, com fundamento numa ética simplista e numa história ficcional, causando a impressão na população de ser o politicamente correto. Enunciados secundários como “a impunidade aumenta o número de crimes”, “nas drogas é como uma escada, passa-se das mais leves para as mais pesadas”,“penas mais leves dissuadem”, não alcançam constatação empírica, por serem indemonstráveis. Necessitam, então, de um respaldo científico, selecionando os especialistas segundo suas opiniões coincidam ou dissintam daquelas crenças, sendo estas meras complementações da notícia. Uma observação puramente quantitativa de alguns noticiários revela a importância estratégica da criminalização das relações sociais: mais da metade da edição sobre o país é criminal ou judicial. Outro ponto que é importante de ser analisado é o da multiplicação de programas chamados pelas emissoras de variedades, que adotam cada vez mais formas judiciais. Exemplos não faltam como a “vara de família” do “Programa do Ratinho” (2005), exibido pela emissora SBT, em que são frequentes exames de DNA; e do “tribunal do júri” do programa “Linha Direta” (1999), da Rede Globo, no qual a presunção de

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inocência e o direito a um julgamento justo eram simplesmente desprezados no caso de réus ainda não sentenciados. O Brasil encontra-se fora do modelo convencional do trial by media , onde não mais se influencia um tribunal, mas realiza-se diretamente o próprio julgamento. O que dizer de casos como o da estudante que matou os pais junto com o namorado e o irmão deste, que ao ter sua liberdade provisória concedida de acordo com as regras do sistema penal, causou enorme apelo público, tendo grande divulgação pela mídia, que tratou a decisão da Justiça como um ato inadmissível, errôneo, atentatório à moral e à sociedade, quando na verdade se tratava de um direito legalmente garantido da ré. Ou dos efeitos que produzem no próprio julgamento que será feito pelo júri de uma cidade de interior. 4 – VOTO MÉDIO. 4.1. Breve análise no âmbito do Processo Civil. O termo voto médio é utilizado no Processo Civil, ao tratar da parte referente aos recursos, especificamente, os embargos infringentes. Este tipo recursal é cabível contra acórdãos não unânimes proferidos no julgamento de apelação e ação rescisória. Sempre que houver dissenso ensejador de embargabilidade apurado na conclusão do acórdão, não fazendo a lei qualquer exigência no sentido de que divergência conste em declaração de voto vencido, ele é a medida cabível. A sentença pode possuir vários pontos, se ela apreciar um pedido e um único juiz diverge, na totalidade, os embargos terão completa amplitude. Se, porém, a sentença for dividida em capítulos, entendidos estes como os pedidos que podem ter sido acumulados no processo, o voto vencido haverá de ser confrontado considerando cada ponto dela, possibilitando a verificação da desconformidade do voto vencido e seu respectivo alcance. Isto porque, havendo mais de um capítulo na sentença, o voto divergente pode ser total quanto a alguns capítulos e parcial quanto a outros. Tema de grande complexidade pode ocorrer no caso dos votos do tribunal serem totalmente dispersos, não se obtendo maioria no julgamento, dificultando-se a averiguação da divergência. Por exemplo, em uma ação de cobrança, o autor pede 100, o juiz monocrático concede 100 e o tribunal decide da seguinte forma: 1º juiz 80; 2º juiz: 50; 3º juiz: 30.

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Não há, assim, unanimidade e, tampouco, maioria. Nesse caso é que surge a dúvida de como interpor os embargos infringentes. No Brasil, não há uma diretriz uniforme para situações como esta, ficando a questão afeta à Lei de Organização Judiciária e aos Regimentos Internos dos Tribunais.

O processualista Barbosa Moreira (1985,p.25) propõe o critério de dividir-se a divergência em quantitativa e qualitativa. Quanto à primeira, há duas orientações: o sistema da continência, que consiste na verificação de qual das quantidades fixadas nos diferentes votos se acha contida no menor número de pronunciamentos suficientes para compor a maioria; e o cálculo da média aritmética.

Quanto à qualitativa, que é a que interessa a este trabalho, assinala o autor que uma das orientações é a de que o juiz aderir a uma das duas correntes mais numerosas, a fim de que uma delas se torne a corrente majoritária. Pode, ainda, haver a convocação de outros juízes para que seja possível o desempate e, por último, a realização de novas votações, até que só restem duas soluções, em que será adotada a que tiver maior número de votos. Segundo explicação do ex-presidente do STF, ministro Nelson Jobim, em reportagem ao Jornal do Brasil, de 25/11/2005, o ''voto médio'' é aquele que mais beneficia o acusado quando uma liminar em mandado de segurança ou habeas corpus é concedida, em parte, mas em pontos diferentes. O mais importante é que a liminar tenha sido ''deferida''. Só então, o colegiado decide qual a linha que mais favorece o processado. 4.2. Voto médio como técnica de decisão dos órgãos colegiados. O voto médio é uma das técnicas de decisão utilizadas por órgãos colegiados, cujo fim maior é cumprir com a própria função jurisdicional, qual seja, proferir julgamento/decisão final sobre questão controvertida posta em juízo. Tratando-se de órgão colegiado, certo é, que diversas correntes de pensamento podem se manifestar quando da elaboração da decisão. A unanimidade nesta situação não passa de exceção adstrita a questões jurídicas de menor complexidade. A ficção da vontade única, materializada na decisão final, ou acórdão, no caso, decorre da aplicação de técnicas previamente definidas. Em determinadas situações, a unanimidade, dificilmente alcançada, a maioria absoluta ou a maioria relativa podem não se fazer presentes em julgamento colegiado, pelo menos em primeira análise.

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Nestas situações, em que, aparentemente, cada um dos componentes do órgão julgador manifesta sua própria opinião, interpretando os fatos e aplicando o direito à sua própria forma, surge a opção de aplicação do critério do voto médio, visto que ao julgador, individual ou coletivo, não é conferido o beneplácito da omissão. Deve julgar, sob pena de não cumprimento da função jurisdicional. Assim, motivado de um lado pelo que se pode comparar a uma espécie de estado de necessidade jurisdicional, obrigação de proferir decisão sobre a causa, deve o julgador convergir as diversas opiniões conflitantes ou apenas diversas, dos diversos julgadores, em apenas uma, que refletirá a decisão do colegiado. O caminho encontrado para isso é o utilizado “voto médio”, que em termos amplos, extrai a essência comum do julgado, afastando as opiniões exacerbadas, sejam mínimas ou máximas, em prol da opinião média, num exercício de ficção consensual. Tal raciocínio, aceito e utilizado nos julgamentos colegiados nos Tribunais brasileiros, poderia ser transplantado para o Júri, constituindo-se em forma de conformar as opiniões díspares dos jurados, uma vez afastados os óbices à fundamentação pelos mesmos. Se é certo que o critério do voto médio não seria a única solução possível, no sentido de realizar na prática a necessidade de fundamentação das decisões dos jurados, o que se pretende demonstrar aqui é a existência de formas aptas a ensejar a aplicação prática do que aqui se defende, necessidade de fundamentação das decisões no Júri, afastado-se da retórica dogmática sem confluência com a realidade. Apenas dessa forma, com a superação de obstáculos transponíveis, é que, efetivamente, assegurar-se-á no ordenamento jurídico brasileiro a realização ampla dos princípios garantistas e do Estado Democrático de Direito. 5 – DA COLISÃO DE PRINCÍPIOS- SIGILO DAS VOTAÇÕES X MOTIVAÇÃO DAS DECISÕES. O sigilo nas votações é o princípio informador específico do Júri, a ele não se aplicando o disposto no art. 93, IX, da Constituição Federal, que trata do princípio da publicidade das decisões do Poder Judiciário e visa a impedir o conhecimento da fonte de cada voto por pessoas estranhas à sala secreta. Trata-se de uma garantia tendente a proteger a integridade dos jurados, pois nenhuma pessoa alheia à câmara saberá de quem foram os votos prós ou contra a condenação.

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O grande empecilho encontrado para que se autorize a fundamentação das decisões está na garantia do sigilo das votações. Para se obter as mudanças almejadas, seria fundamental que este sigilo fosse flexibilizado. A solução mais acertada seria aquela que buscasse resguardar o próprio texto constitucional. É fundamental que antes de se propor alterações nas normas constitucionais, fossem esgotadas todas as outras possibilidades. A motivação, antes entendida como garantia processual, como mecanismo de controle da legalidade da decisão, agora é entendida como garantia de ordem política, da própria jurisdição. O Tribunal do Júri é um órgão jurisdicional colegiado de primeiro grau, cujos atos integram os atos judiciais subjetivamente complexos, ou seja, aqueles que emanam de dois ou mais órgãos e, portanto, devem estar submetidos ao mandamento constitucional da fundamentação de suas decisões judiciais. A breve motivação dada pelos jurados em seu voto, não se limitando a dizer sim ou não, não pode ser vista como uma afronta às cláusulas pétreas, pois o sigilo que resguarda a garantia constitucional ainda seria mantido, pois a sala continuaria sendo secreta.

Conforme ensinamento de Streck (2001,p.103), as garantias realmente essenciais e que, por isso, têm legitimados seu caráter pétreo, em verdade, são a existência da instituição do júri, a soberania dos veredictos e o próprio sigilo mantido na estrutura secreta da câmara.

A motivação das decisões do júri se faz ainda mais necessária ante a constatação de que os jurados, influenciados pela retórica dos discursos e pela mídia, acabam julgando contra, ou esquecendo, as provas, levando ao execrado direito penal do autor. Os discursos produzidos em plenário e a força das informações emitidas pela mídia acabam por (re) amoldar a dimensão dos acontecimentos, o que deixa o réu em uma situação, na maioria das vezes, desfavorável. Na estrutura atual, percebe-se uma colisão entre a necessidade de fundamentação, albergada pelo princípio da ampla defesa e entre o sigilo das votações. Não obstante, pela linha de raciocínio traçada, não há afronta a garantia preconizada pelo sigilo, sendo possível uma modificação deste para salvaguardar a ampla defesa, que está ameaçada pelo sistema em vigor.

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A motivação que se propõe não ficaria prejudicada pela falta de qualificação técnica, pois isto não impede que os jurados profiram um julgamento coerente. Ademais, o que pretende o instituto do júri não é uma aplicação técnica pelos jurados, mas um julgamento conforme a reprovabilidade social da conduta, justamente porque será a sociedade que terá de arcar com o ônus de ter um criminoso em seu seio. 6 – CASOS IMPORTANTES DE JURI NO BRASIL 6.1. CASO RICHTHOFEN

Assassinato dos Richthofen chocou o Brasil em 2002

Quando: 31 de outubro de 2002, em São Paulo

Ocorrência: Manfred e Marísia von Richthofen, assassinados em casa enquanto dormiam

Resultados: Suzane e Daniel Cravinhos condenados a 39 anos e 6 meses de reclusão; Christian Cravinhos condenado a 38 anos e 6 meses de reclusão. Os irmãos Cravinhos estão no semiaberto, enquanto Suzane está detida em regime fechado

O assassinato de Manfred e Marísia von Richthofen a mando de sua filha, Suzane, então com 18 anos, chocou o Brasil em 2002. Cometido logo após o segundo turno das eleições daquele ano, chegou a rivalizar com o assunto nos noticiários. Suzane, uma jovem de classe alta, namorava Daniel Cravinhos, mas seus pais não aprovavam a relação. Por isso, ela tramou com seu namorado e o irmão dele, Cristian Cravinhos, o assassinato dos pais.

Na noite de 31 de outubro, Suzane e Daniel convenceram Andreas von Richthofen, irmão mais novo de Suzane, então com apenas 15 anos, a acompanhá-los em uma Lan House. O casal deixou o garoto no local e disse a ele que iriam comemorar o aniversário de namoro em um motel. Na saída da Lan House, eles encontraram Cristian e foram de carro até a mansão da família Richthofen – que estava com os sistemas de segurança desligados, medida tomada por Suzane dias antes, na preparação para o crime. No carro, que pertencia a Suzane, já estavam as barras de ferro que seriam utilizadas para matar os pais da garota.

Suzane entrou em casa e ligou as luzes para que os irmãos seguissem ao quarto de Manfred e Marísia. Ao chegarem lá, Daniel golpeou e matou o pai de Suzane de forma instantânea com um golpe na cabeça, enquanto Cristian precisou dar repetidos golpes em Marísia, e por fim usou um saco de lixo para estrangulá-la. Suzane, enquanto isso, pegou o dinheiro que os pais guardavam em uma pasta de

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couro e orientou os Cravinhos a abrirem o cofre e espalharem as joias e um revólver que estavam no quarto do casal para simular um roubo.

Depois, os três seguiram com seu plano. Cristian foi deixado na casa da sua avó, onde morava, e Suzana e Daniel seguiram para um motel, em que ficaram por uma hora e meia, para forjar um álibi, e chegaram a pedir uma nota fiscal com essa intenção. Em seguida, buscaram Andreas na Lan House e foram até à casa de Daniel para deixá-lo lá, antes de Suzane e Andreas voltarem à residência dos Richthofen. Lá, ela disse ter estranhado ver as portas abertas: os dois entraram em casa, mas logo voltaram para a rua. Ela ligou para Daniel, que foi até o local e chamou a polícia. Os policiais que primeiro atenderam a ocorrência disseram ter estranhado a reação de Suzane ao caso e, depois de percorrerem a casa, confirmaram que Manfred e Marísia estavam mortos.

A polícia começou as investigações e, a partir dos depoimentos de Andreas, Suzane e Daniel, desconfiou da garota e do seu namorado, que apresentavam um comportamento incomum na delegacia – trocando carícias e beijos, algo que chamou a atenção dos policiais que participavam do caso. Com as explicações confusas de Suzane e Daniel, eles tiveram que dar novos depoimentos e acabaram confessando o crime, incriminando também Cristian Cravinhos.

6.1.A. JURI

Primeiro dia

No primeiro dia de julgamento (17 de julho de 2006), surgiram polêmicas e novas versões para os fatos. Os três acusados depuseram. Em seu depoimento, Suzane afirmou que não tinha conhecimento do plano para matar seus pais, concebido e executado única e exclusivamente pelos irmãos Cravinhos. Ela também disse que estava "muito maconhada" quando o crime ocorreu, que conduziu os irmãos para a casa sem saber que seus pais iriam ser assassinados, e que só se deu conta do ocorrido ao chegar em casa com seu irmão Andreas. Afirma ainda que Daniel era excessivamente ciumento. Fez menção a uma vez em que ela fez uma viagem à Alemanha e foi obrigada a gastar muito com cartões telefônicos, apenas para manter contato com o namorado. Quando Suzane voltou, Daniel disse a ela que não poderia ficar longe dela por tanto tempo e que tinha tentado se matar por causa da ausência de sua namorada. Suzane declarou ter dado a Daniel presentes caros custeados com o dinheiro dos pais. Segundo Suzane, ela presenteava Daniel com DVDs, TVs e bens caros. 'Ele sempre estava com dinheiro na carteira. Mas era sempre o meu dinheiro', declarou a filha das vítimas do assassinato. Suzane ainda declarou que no clube de aeromodelismo onde ela e seu irmão Andreas conheceram Daniel, ela ficou sendo conhecida como "a galinha dos ovos de ouro da família Cravinhos".

Outro ponto de conflito foi a perda de sua virgindade: enquanto ela afirmava tê-la perdido com Daniel Cravinhos, Daniel disse que ela a perdeu com seu namorado anterior. Segundo o jornal Folha de S.Paulo, esta discussão é relevante porque desta forma pode cair por terra a principal tese da defesa de Suzane, a de que Daniel exercia um fascínio irresistível sobre isso.

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Cristian , por sua vez, também apresentou novas informações: segundo ele, apenas seu irmão Daniel teria matado Manfred e Marísia. Cristian teria assumido esta responsabilidade por achar que, desta forma, Daniel passaria menos tempo preso. O réu também insistiu que Daniel e Suzane estavam convencidos a cometer o crime, apesar de suas tentativas de dissuadi-los; de acordo com ele, Suzane teria dito: "Quero matar meus pais hoje". Segundo a promotoria, Cristian poderia perder o benefício da redução da pena por ter mudado a versão dos fatos. Já Daniel afirmou, entre outros, que a mentora do crime foi Suzane von Richthofen. De acordo com ele, era de conhecimento geral o péssimo relacionamento entre sua ex-namorada e seus pais. Daniel sustentou que Suzane sofria agressões físicas e verbais, além de abusos sexuais (fato que Suzane negou: ela classificou sua família como "normal, do bem"). Por isso e pela herança, Daniel afirmou que Suzane estaria convencida a matar seus pais. Ele também afirmou ter sido "usado" pela ex-namorada para dar cabo de seu plano.

A defesa dos irmãos Cravinhos acusou Suzane de "mentirosa" e pediu uma acareação entre os três acusados, pedido acatado pelo juiz Alberto Anderson Filho. Esta acareação poderia esclarecer pontos cruciais, como quem foi o mentor e qual o real papel de Suzane no crime – há controvérsias, por exemplo, se ela teria ou não visto o corpo dos pais.

Segundo dia

A parte principal do segundo dia de julgamento (18 de julho de 2006) foi o depoimento de Andreas, irmão de Suzane. A primeira pessoa a ser ouvida, Andreas Albert von Richthofen, afirmou que nem ele e nem a irmã foram vítimas de abusos ou maus tratos por parte dos pais, ao contrário do que disse Daniel Cravinhos. O rapaz classificou a relação de Suzane com Manfred e Marísia como normal, sem conflitos excepcionais. Ele também disse ter sofrido "chantagem emocional" para que escrevesse um bilhete dizendo que perdoava a irmã, e que na verdade não a perdoou; afirmou não acreditar em seu arrependimento e nem em sua intenção de desistir da herança, e disse que ele e Suzane foram influenciados por Daniel Cravinhos a usar maconha. Andreas também admitiu se sentir ameaçado pela irmã: "Dizem por aí que ela é psicopata. Eu não sei, mas de uma pessoa assim a gente pode esperar qualquer coisa".Andreas revelou ainda que não consegue fazer uso do dinheiro porque Suzane está complicando o processo. Outra mentira de Suzane teria sido sobre a arma usada no crime. Em seu depoimento, ela disse que a arma era do irmão, o que Andreas negou. Ele disse apenas que Suzane pediu que ele jogasse o objeto fora.

A convite do Ministério Público, foi ouvida também a delegada de polícia Cíntia Tucunduva Gomes. Ela desmontou a versão apresentada no dia anterior pelos irmãos Cravinhos de que apenas Daniel teria golpeado as vítimas: para ela, as agressões foram simultâneas, pois seria impossível que um dos dois tivesse sido atacado sem que o outro esboçasse reação. Gomes também ressaltou a frieza de Suzane, que se portou de modo desapaixonado desde o princípio – após confessar o crime, Suzane teria penteado os cabelos e perguntado ao então namorado se estava bonita, antes de ser fotografada e fichada no DHPP (Departamento de Homicídios e Proteção à Pessoa).

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Foram ouvidos ainda: Fábio de Oliveira (agente penitenciário) e Hélio Artesi (pai de uma ex-namorada de Cristian ), que atestaram o bom comportamento dos irmãos Cravinhos; Ivone Wagner, que testemunhou que Suzane tratava mal sua mãe; e o policial militar Alexandre Boto, que "estranhou" a atitude de Suzane ao chegar à casa dos von Richthofen para verificar o que havia ocorrido.

Terceiro dia

No terceiro dia de julgamento (19 de julho de 2006), os advogados de Suzane tentaram manobra para incluir novos documentos nos autos do processo: leia a seção relativa à Herança. A mãe dos réus Cristian e Daniel Cravinhos, Nadja Cravinhos de Paula, prestou um depoimento carregado de emoção. Ela ressaltou o arrependimento e profunda vergonha que os filhos estariam sentindo, apesar de pedir aos jurados punição para todos: "Cada um tem que pagar pelo que fez, e não pelo que não fez." Afirmou que perdoou a todos, que os pais de Suzane eram agressivos quando bebiam e que de fato abusavam sexualmente da garota, que Andreas era influenciado em demasia por Suzane, e que Cristian não tinha mais problemas com drogas, pois teria largado dez anos antes.

Reforçando a linha de defesa montada pelo advogado dos filhos, Nadja declarou que Suzane não perdeu a virgindade com Daniel e que Manfred e Marísia bebiam muito e "eram extremamente agressivos" entre eles e com os filhos. Nadja disse que, quando Suzane tinha que ir para o sítio com os pais, entrava em pânico. "Não sei se ela se fazia de vítima, fazendo dele (Daniel) um instrumento", contou a mãe dos Cravinhos. Cristian e Daniel choraram bastante durante o depoimento.

Horas depois, Cristian - acredita-se que influenciado pelo depoimento da mãe - mudou seu próprio depoimento, confessando ter golpeado Marísia von Richthofen até a morte. Ele atribuiu a concepção do plano a Suzane: ela os teria convencido a participar do crime alegando que, com os pais, "não tinha vida", e que Manfred a teria tentado estuprar quando ela tinha 13 anos. Entretanto, manteve as declarações de que teria batido a porta do carro e pisado com mais força, na tentativa de acordar o casal e lhes dar alguma chance de reação. Disse também que, mortos Manfred e Marísia, Suzane o teria acalmado, dizendo: "Você não me tirou nada. Você me deu uma nova vida". Ao final do depoimento, Cristian chorava muito e foi abraçado pelo pai. O julgamento foi suspenso por alguns minutos e os jurados retirados do plenário.

Depôs também Fernanda Kitahara, ex-colega de faculdade de Suzane. Ela confirmou que Suzane e Andreas usavam maconha, e que a droga era comprada por Daniel. Disse que sabia de desentendimentos entre Suzane e os pais, ressaltando um caráter controlador por parte deles: "Ela tinha horário pra voltar pra casa, saindo comigo ou com o namorado" - com isso Suzane teria, por várias vezes, mentido aos pais para encontrar Daniel. Também disse que Suzane era, em sala de aula, quieta e sem amigos, graças ao ciúme exacerbado de Daniel, e contou que Suzane lhe disse que o namorado era perseguido pelo espírito de um amigo, o "Nego" ou "Negão". Este afirmava que a acusada teria de escolher entre os pais e o namorado.

Quarto dia

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O quarto dia de julgamento (20 de julho de 2006) começou com a exibição das imagens da perícia realizada no corpo de Marísia. A perita Jane Belucci fez uso de fotografias para esclarecer a dinâmica dos eventos, e a natureza das fotos, tais como a do rosto desfigurado de Manfred, causou desconforto geral. O laudo do IML (Instituto Médico Legal) concluiu que a mãe da ré morreu por traumatismo crânio-encefálico, causado por "instrumento contundente", com vários golpes. De acordo com a análise, a mãe de Suzane teve uma morte agônica, mantendo-se viva por algum tempo. Enquanto essas imagens eram mostradas, os réus Suzane, Daniel e Cristian permaneceram de costas para o telão, sem em nenhum momento olhar para fotos.

O dia foi reservado ainda para a leitura de depoimentos das testemunhas (ainda na fase processual do caso) e para a exibição da reconstituição do filme e de uma série de reportagens acerca do crime, além dos depoimentos dos acusados. Daniel e Cristian choraram copiosamente durante a exibição de suas encenações, e pediram para serem retirados do plenário. Suzane não foi vista chorando, apesar das declarações em contrário de seus advogados, e também abandonou o plenário — para o promotor Roberto Tardelli, entretanto, arrependimento e desespero não diminuem a pena. Os réus divergiram sobre quem ficou responsável por desarrumar a biblioteca da casa na simulação de roubo, e sobre o momento em que pegaram uma garrafa de água para jogar nas cabeças das vítimas.

Também foram lidas cartas de amor trocadas por Suzane e Daniel. Enquanto o rapaz se emocionou a ponto de ser retirado do plenário, Suzane demonstrou constrangimento e desconforto (especialmente nos trechos em que ela chama Daniel de "meu maridinho" e outros apelidos similares, que arrancaram risos do público), mantendo sua cadeira afastada das dos irmãos.

Para o promotor Tardelli, o comportamento dos réus ressalta a "frieza" de Suzane e o "descontrole emocional" de Daniel. A promotoria disse que iria tentar provar que o crime foi inteiramente planejado, que nenhum dos acusados foi induzido. Para isto eles pretendem lembrar, entre outros, que logo após o crime Daniel e Suzane protagonizavam cenas de amor na delegacia, enquanto Cristian foi a um churrasco, viajou e comprou uma moto.

Quinto dia

No último dia de julgamento (21 de julho de 2006), foram realizados os debates entre acusação e defesa e, após a decisão do Ministério Público de se abrir mão do tempo reservado para réplica, os jurados se reuniram para decidir o futuro dos réus. A advogada Gislaine Jabur tentou convencer os jurados a derrubar as qualificadoras colocadas pelo Ministério Público contra Cristian e Daniel: ela alegou que Cristian não podia ser acusado de duplo homicídio, já que ele matou apenas Marísia; disse que não houve motivo torpe, já que ele não tinha rancor das vítimas; alegou, por fim, que não houve motivo cruel (o laudo do Instituto Médico Legal (IML) atesta que Marísia morreu por traumatismo craniano, e não pela toalha colocada em sua boca). Quanto a Daniel, Gislaine lembrou que, desde a reconstituição do crime, o réu afirmou ter tentado acordar Manfred após tê-lo golpeado, sacudindo seu braço e passando uma toalha por seu rosto. Os advogados também argumentaram que as

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acusações de fraude e furto não procediam, já que Cristian teria ficado com o dinheiro e as joias a pedido de Suzane.

Os promotores Roberto Tardelli e Nadir de Campos Júnior pediram ao júri a condenação dos réus. A promotoria acusou a defesa de Suzane de preconceito social, quando esta afirmou que a "menina milionária", que vivia alheia à realidade num mundo de conforto material, e que não tinha motivos para cometer um crime, foi facilmente convencida por Daniel a fazê-lo, já que ele, vindo de uma família mais humilde e tendo um histórico de criminalidade e uso de drogas, tinha maior propensão a cometer um crime.

Ao ser acusado pelo promotor de justiça Nadir de Campos Júnior, Daniel Cravinhos teve uma crise de choro e foi abraçado pelo irmão Cristian. Ambos foram retirados do plenário. Suzane, por sua vez, permaneceu no plenário de cabeça baixa, sem esboçar reação.

Os quatro homens e três mulheres que compuseram o júri se reuniram por volta das 22h, no fórum da Barra Funda (zona oeste de São Paulo). Eles responderam a um questionário em que julgavam se cada um dos réus era culpado em 12 itens. As respostas possíveis eram sim e não. No caso dos irmãos Cravinhos, as questões eram, entre outras, se houve motivo torpe, se o meio usado foi cruel, se houve possibilidade de defesa das vítimas, e se havia atenuantes. No caso de Suzane, em seis perguntas os jurados deviam decidir se ela agiu ou não sob coação dos irmãos Cravinhos. Com base nos questionários, o juiz Alberto Anderson Filho, presidente do 1° Tribunal do Júri, estabeleceu e divulgou a sentença.

O Tribunal do Júri condenou Suzane Richthofen e Daniel Cravinhos a 39 anos de reclusão, mais seis meses de detenção, pelo assassinato do engenheiro Manfred e da psiquiatra Marísia von Richthofen, mortos a pauladas no dia 31 de outubro de 2002, na residência deles, no bairro nobre do Brooklin, em São Paulo. A pena-base foi de 16 anos, mais 4 pelos agravantes, para cada uma das mortes. Ambos tiveram sua pena reduzida em um ano; Suzane por ser à época menor de 21 anos, e Daniel, graças à confissão. Já Cristian Cravinhos foi condenado a 38 anos de reclusão, mais seis meses de detenção. Sua pena-base foi de 15 anos, mais 4 pelos agravantes, também para cada uma das mortes. Ele também teve sua pena reduzida em um ano por ter confessado o crime. Mesmo condenados a quase 40 anos, a lei brasileira só permite que um condenado fique preso por no máximo 30 anos.

A sentença só foi anunciada às 3h da madrugada do dia 22 de julho de 2006, pelo juiz Alberto Anderson Filho, que presidiu o julgamento iniciado no começo da semana, no dia 17, no Fórum Criminal da Barra Funda, na capital paulista. Os condenados ainda podiam recorrer, mas não puderam aguardar em liberdade. Também não podiam ser submetidos a novo júri, pois as penas foram inferiores a 20 anos por homicídio praticado. O advogado de defesa de Suzane Richthofen, Mauro Otávio Nacif, disse que saía "muito triste" do Tribunal e que não iria recorrer do resultado, mas que tentaria reduzir a pena da cliente. (TERRA,2008)

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6.2. CASO ELIZA SAMUDIO

A ex-modelo Eliza Samudio desapareceu em junho de 2010. A jovem tinha 25 anos e pedia judicialmente o reconhecimento da paternidade do filho ao jogador Bruno Fernandes de Souza, na época goleiro e capitão do Flamengo.

Bruno, que conhecera Eliza em maio de 2009 – segundo ele em uma orgia organizada por outro jogador do time –, foi indiciado e preso sob a acusação de ter planejado o assassinato da ex-modelo. De acordo com um dos acusados pelo crime, Eliza teria sido morta por estrangulamento e depois esquartejada e concretada.

Eliza Samudio foi vista pela última vez ao deixar um hotel no Rio de Janeiro em 4 de junho de 2010, quando foi ao sítio de Bruno em Esmeraldas (MG), para buscar um acordo sobre a paternidade de Bruno Samudio, filho dela com o jogador. Vinte dias depois a polícia recebeu uma denúncia de que a modelo havia sido morta no local e que o bebê ainda estaria no sítio.

A criança foi encontrada na cidade Natal de Bruno, Ribeirão das Neves (MG) em 26 de junho depois de Dayanne Rodrigues, mulher de Bruno, a ter entregado para o funcionário Wemerson Marques. Hoje, Bruno Samudio está sob a guarda da vó materna, Sônia Fátima de Moura, que mora em Campo Grande (MS).

A polícia fez buscas no sítio o jogador e encontrou indícios de que Eliza esteve lá, como pertences e roupas femininas. Além disso, foram encontradas no carro de Bruno manchas de sangue que a pericia comprovou serem da vítima. No entanto, o corpo de Eliza ainda não foi encontrado.

O caso chocou a sociedade quando o adoslecente de 17 anos, hoje com 19, Jorge Lisboa Rosa, primo de Bruno, reveleou ter participado do assassinato da jovem. Ela teria sido levada por ele e por Luiz Henrique Romão, conhecido como Macarrão, ao ex-policial Bola, Marcos Aparecido dos Santos, que teria estrangulado a mulher. O corpo teria sido esquartejado e atirado a cães da raça rottweiler. Bruno, Macarrão, Dayanne e mais quatro envolvidos tiveram suas prisões decretadas no dia 7 de julho de 2010, no dia seguinte, Bola também teve prisão decretada. Após o fim do inquérito, a polícia indiciou Bruno por homicídio, sequestro e cárcere privado, formação de quadrilha, corrupção de menores e ocultação de cadáver, assim como os Macarrão, Flávio Caetano de Araújo (Flavinho), Wemerson Marques de Souza (Coxinha), Dayanne Rodrigues, Elenílson Vitor da Silva, Sérgio Rosa Sales e Fernanda Gomes. Bola foi indiciado por homicídio qualificado, ocultação de cadáver e formação de quadrilha.

Durante as audiências Jorge Rosa, que havia revelado a suposta morte de Eliza, negou o depoimento anterior alegando ter feito a confissão sob tortura, ele foi libertado em setembro de 2012 depois de cumprir medidas socioeducativas e hoje é apenas testemunha do caso. Sérgio Sales Rosa, primo do jogador, também mudou o depoimento, ele havia confirmado a presença da modelo no sítio de Bruno, assim como horários de transporte e local de execução da jovem. Sérgio foi assassinado no dia 22 de agosto de 2012.

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Quatro acusados foram libertados em dezembro de 2010: Dayanne, Fernanda, Elenílson da Silva e Wemerson Marques. A polêmica teve altos e baixos, em agosto a polícia voltou a fazer uma busca pelo corpo de Eliza depois de uma denúncia anônima. No mesmo mês a testemunha Cleiton Gonçalves, sofreu um atentado em Ribeirão das Neves e levou dois tiros no ombro, mas não morreu. Além destes fatos, uma carta interceptada em julho pela polícia revelava um pedido de Bruno a Macarrão: que este admitisse a culpa em lugar, mas a defesa lançou uma nova teoria, de que a correspondência mostrava apenas que os dois foram amantes.

6.2.A. JURI

Mais de dois anos após a descoberta do caso Eliza Samudio, em 19 de novembro de 2012, foi iniciado, em Contagem, Minas Gerais, o julgamento de Bruno Fernandes, Luiz Henrique Romão, Marcos Aparecido dos Santos, Dayanne Rodrigues do Carmo Souza, Fernanda Gomes de Castro, Elenilson Vitor da Silva e Wemerson Marques de Souza, acusados de crimes diversos. Marixa Fabiane Lopes Rodrigues foi a júiza. O caso foi a júri popular, composto de seis mulheres e um homem, sete de um total de 25 chamados inicialmente. A promotoria e os advogados de cada réu puderam recusar três jurados. O promotor do caso foi Henry Wagner Vasconcelos de Castro. Entre os advogados de defesa estavam, no primeiro dia de julgamento: Rui Caldas Pimenta (Bruno) e Franscisco Simim (Dayanne e Bruno); Fernando Magalhães, Zanone Oliveira Jr. e Ércio Quaresma (Marcos dos Santos); Leonardo Diniz (Luiz Romão); Carla Cilene (Fernanda); Frederico Franco (Elenilson); e Paulo Sávio Cunha Gimarães (Wemerson).

Antes do início de julgamento, a juíza do caso estabeleceu que nenhum lugar da plateia seria oferecido a populares da região de Contagem; e que ela será destinada a parentes dos envolvidos no caso Eliza Samudio, jornalistas e estudantes de direito. O julgamento também não foi transmitido ao vivo.

Logo no primeiro dia, houve discordância entre advogados de defesa de Marcos Aparecido dos Santos e a juíza. Eles questionaram alguns prazos de defesa estabelecidos pela mesma e abandonaram o julgamento. O réu recusou a indicação de um defensor público e acabou-se por desmembrar o julgamento de Marcos dos Santos. Ércio Quaresma, um dos advogados de Marcos dos Santos afirmou que não trabalharia em um julgamento onde "a defesa é cerceada".

No segundo dia, o goleiro Bruno pediu a destituição de seus advogados de defesa, Rui Pimenta e Francisco Simim. A juíza Marixa Fabiane Rodrigues afirmou que viu como "uma manobra para adiar o julgamento", visto que o goleiro já havia pedido a destituição de Francisco Simim anteriormente, tendo negado o pedido. Após o fato, o julgamento prosseguiu com as testemunhas de acusação.

No terceiro dia, a juíza Marixa Fabiana decidiu adiar o julgamento de Bruno para março de 2013. Segunda ela, o adiamento foi pedido pela defesa do goleiro. O júri continuou para os outros dois réus no processo: Luiz Henrique Romão (Macarrão) e Fernanda Gomes de Castro (ex-namorada do goleiro).

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Ao fim, Bruno foi condenado a 22 anos e 3 meses de prisão por sua participação no sequestro e assassinato de Eliza Samudio.(IG,2014)

6.3. CASO ISABELLA NARDONI

Isabella Nardoni foi encontrada ferida, no dia 29 de março de 2008, após ter sido jogada de uma altura de seis andares, no jardim do edifício London, prédio residencial na rua Santa Leocádia, 138, Zona Norte de São Paulo. No apartamento, que pertencia a seu pai, moravam além dele a madrasta da menina e dois filhos do casal, um de onze meses e outro de três anos. A menina chegou a ser socorrida pelos bombeiros mas não resistiu e morreu a caminho do hospital.

O pai de Isabella teria afirmado em depoimento que o prédio onde mora fora assaltado e a menina teria sido jogada por um dos bandidos. Segundo divulgado pela imprensa ele teria dito que deixou sua mulher e os dois filhos do casal no carro e subiu para colocar Isabella, que já dormia, na cama. O pai da vítima teria descido para ajudar a carregar as outras duas crianças, respectivamente de 3 anos e 11 meses, e, ao voltar ao apartamento, viu a tela cortada e a filha caída no gramado em frente ao prédio. Entre o momento de colocar a filha na cama e a volta ao quarto teriam passado de 5 a 10 minutos, de acordo com o depoimento do pai.

Dias após, a investigação constatou que a tela de proteção da janela do apartamento foi cortada para que a menina fosse jogada e que havia marcas de sangue no quarto da criança.

O caso teve forte repercussão no Brasil, nos dias 30 e 31 de março. Em meio da repercussão, o pai da criança afirmou à polícia no dia 30, que ela havia ficado sozinha no quarto enquanto ele foi buscar os outros filhos. No mesmo dia, a emissora de TV de notícias Globo News revela que a polícia descartou a possibilidade de acidente na morte de Isabella. Segundo um delegado titular da polícia sangue foi encontrado no quarto e um buraco na tela de proteção de uma janela reforçam as suspeitas da polícia de homicídio. A perícia feita pela Polícia Técnico-Científica no domingo, diz que a rede de proteção da sacada, foi cortada propositalmente, só que no quarto dos irmãos da Isabella e não no quarto em que ela foi colocada para dormir.No entanto, uma rádio afirmou que o pai disse à polícia que a menina foi jogada por um assaltante.

O tio da Isabella declarou à imprensa que os pais dela tinham uma "excelente relação" entre a mãe da menina e a família do pai. "Ela (a criança) amava passar os fins de semana com o pai e a madrasta". No entanto, os vizinhos afirmam o contrário, pois as brigas entre Alexandre e Anna eram constantes na presença da Isabella nos fins de semana no apartamento.

Na madrugada do dia 31 de março, Alexandre Nardoni e a madrasta da menina, Anna Jatobá, foram liberados da polícia civil após mais de 24 horas de depoimento. O pai teria descido para ajudar a carregar as outras duas crianças, respectivamente

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de três anos e onze meses, e ao voltar ao apartamento, viu a tela cortada e a filha caída no gramado em frente ao prédio. Entre o momento de colocar a filha na cama e a volta ao quarto, teriam passado de cinco a dez minutos, de acordo com o depoimento do pai. No outro depoimento, uma vizinha do prédio afirma que ouviu gritos de uma menina pedindo socorro, mas não saiu do apartamento.

No dia 1º de abril, o jornal Folha de S.Paulo publicou que os primeiros laudos do Instituto Médico Legal apontavam indícios de asfixia anteriores à queda da menina. Os legistas teriam duvidado até mesmo de que a menina tivesse caído, por conta do baixo número de fraturas em seu corpo.

Edifício London, zona norte de São Paulo.

Nesse dia, os dois advogados do pai e da madrasta, ficaram por cerca de três horas no distrito policial para acompanhar o caso. Após isso, um dos advogados revelou pela imprensa que a madrasta teria perdido as chaves pouco dias antes do crime: "(A perda das chaves) é um fato novo que não vejo problema de tornar público", disse o advogado. Os advogados disseram que cabe à polícia apontar provas que incriminem seus clientes e não a eles. Eles pediram à imprensa para que poupem o pai e a madrasta, pois eles estariam "sofrendo muito e poderiam sofrer ainda mais" com o assédio.No mesmo dia, os peritos disseram que Isabella caiu de lado e fraturou o pulso. Ela tinha marcas no pescoço e manchas no pulmão. O delegado responsável disse que a morte será investigada como homicídio, pois a tela de proteção da janela foi cortada. Havia marcas de sangue no quarto da criança, o que, segundo o delegado, reforça a tese de que ela foi agredida antes de ser jogada.

No dia 2 de abril, Ana Carolina Oliveira saiu na companhia do namorado após prestar depoimento. Após o depoimento dela, o delegado titular disse que vai solicitar nova perícia no carro e no apartamento do pai da menina: "No dia dos fatos, o perito com pressa, muita gente em cima, pode ter passado alguma coisa despercebida", disse o delegado, que quer descobrir qual objeto serviu para cortar a tela de proteção da janela por onde a garota teria sido jogada. No entanto, o titular confirma que dois depoimentos relatam gritos de uma criança em desespero. Segundo as testemunhas, "Para, pai. Para, pai". Estes depoimentos foram depois descartados pela polícia pois o momento da ocorrência dos mesmos não se encaixava na cronologia do crime. Uma das vizinhas que declarara ter ouvido esse grito, Geralda Afonso Fernandes, testemunhou pela defesa. . O titular esclareceu que só solicitará novos depoimentos do pai e da madrasta quando avançar nas investigações. "Não adianta voltar a ouvi-los sem nada novo porque ficará aquela coisa repetitiva", disse. O delegado afirma que há três pontos que, em sua opinião, estão mais nebulosos: a ausência de arrombamento na casa, o fato de que não faltava nada entre os pertences do casal e, finalmente, nenhum indício de que alguém estranho tenha estado no prédio são intrigantes. Calil Filho admitiu também a possibilidade de a madrasta da menina, Anna Carolina Trotta, não ter ficado esperando no carro, como o relatado pelo pai em depoimento à polícia.

Após a decretação da prisão do pai e a madrasta como principais suspeitos, a polícia realizou na noite, uma perícia complementar no apartamento e no prédio.

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Perto de o caso completar 30 dias e da conclusão do Inquérito pela Polícia, importa saber quem teria adulterado o local do crime, para tentar transformá-lo de cena de homicídio em cena de latrocínio. O promotor designado para o caso, que tem acompanhado as investigações desde o início, afirmou que as provas indicam "claramente" que a cena do crime foi adulterada. "Tentou-se maquiar a versão verdadeira. Tentaram remover as manchas de sangue e até conseguiram remover algumas, mas os equipamentos de perícia modernos captaram a alteração", explicou, afirmando que essa remoção quase prejudicou a perícia. Em depoimento, o pai de Alexandre, o advogado tributarista Antonio Nardoni e sua filha, Cristiane Nardoni, negaram ter limpado a cena do crime.

Consta no boletim de ocorrência a informação de que Nardoni teria dito aos policiais militares que atenderam ao caso que a porta do apartamento estava arrombada e de que ele teria visto uma pessoa fugindo após a tragédia. Já no depoimento, afirmou que a porta estava trancada e não mencionou a existência de outra pessoa. A averiguação dos peritos garantiu que não havia nenhum sinal de arrombamento no apartamento, muito menos de furto.

Os muros do condomínio eram baixos e de fácil acesso e, na época, havia apenas um prédio em construção e um terreno baldio nos arredores. A hipótese de que o invasor fosse morador do prédio não averiguado.

O Pedreiro Gabriel Santos Neto que trabalhava na obra vizinha ao prédio que foi cenário do crime disse à Folha de S.Paulo que a construção teria sido arrombada na mesma noite. Posteriormente desmentiu o fato e não pôde mais ser encontrado para testemunhar no julgamento. O repórter Rogério Pagnan a quem este fato foi afirmado testemunhou no julgamento.

Fernando Neves, tenente e comandante da Força Tática da área, chefiou as buscas ao suposto ladrão e dias depois detalhou a operação: "Foi feita uma varredura minuciosa nos mínimos detalhes, foi feito cerco no quarteirão, nós travamos elevadores, ninguém entrou, ninguém saiu e varremos todo prédio". Alguns meses depois este tenente matou-se quando um mandado de busca e apreensão era realizado no seu apartamento, pois era alvo de uma investigação de pedofilia. Interceptações telefônicas autorizadas pela justiça descobriram que ele tentava um encontro com uma menina de 5 anos, a mesma idade de Isabela. Os registros oficiais do caso mostram que já havia policiais na área antes de o tenente chegar e este estaria em outro local a serviço, quando recebeu a ocorrência, via rádio, do caso Isabella. Algumas fontes dizem que o tenente teria sido o primeiro a chegar, mesmo sem ter sido chamado.

A origem do sangue também precisa ser melhor esclarecida, já que a perícia encontrou gotas de sangue na entrada do apartamento, no chão do quarto dos irmãos de Isabella e na tela da janela de onde a criança teria sido jogada. “O sangue era visível, tanto que o delegado notou assim que chegou, mas o pai omitiu isso no depoimento”, afirmou Cembranelli.

As manchas de sangue não puderam ser identificadas como sendo de Isabela, bem como a data da criação das mesmas não pode ser precisada. A defesa alegou que o

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reagente utilizado pela polícia para detectar essas manchas também reage com vestígios de alguns alimentos como cenoura, nabo, banana e alho.

Em depoimento à polícia, Nardoni disse que passou o sábado na casa do sogro e chegou ao apartamento por volta das 23h30. O promotor afirmou que o porteiro do apartamento do pai de Anna Carolina ainda será ouvido para esclarecer o tempo de permanência do casal no local. “O laudo toxicológico indicou que não houve a ingestão de alguma bebida alcoólica ou uso de drogas pelo casal naquele dia”, esclareceu.

A primeira pessoa que viu a criança no gramado foi o porteiro. Ele teria relatado que escutou um forte barulho e quando olhou, a menina já estava no chão. Um morador do primeiro andar também teria escutado um estrondo e visto Isabella da sacada. Ele teria sido o primeiro a acionar o resgate, que demorou cerca de 13 minutos. Este mesmo morador disse, durante a reconstituição do crime, na quinta, dia 27 de março, que Alexandre ficou de joelhos e encostou o ouvido direito no coração da menina. Também disse que falou para Alexandre não tocar na menina para não prejudicar o estado dela. Por 34 minutos os paramédicos tentaram reanimá-la.

A perícia constatou, que Isabella foi lançada pelos pulsos, e que a marca de suas mãos ficaram logo abaixo da janela, como a marca de seus joelhos. Segundo o promotor Francisco Cembranelli, Isabella teria sido "delicadamente" derrubada do 6° andar. Isso, na opinião de Cembranelli, refuta a versão apresentada pelo casal. "Se fosse um monstro, como dizem os indiciados, certamente não se preocuparia e arremessaria a menina de qualquer lugar e de qualquer jeito. Ela foi jogada do quarto dos irmãos, cuidadosamente introduzida no buraco da rede de proteção e delicadamente teve as mãos soltas", afirmou. Segundo o promotor, se Isabella tivesse sido arremessada da janela de seu quarto, ela teria sofrido danos físicos ainda maiores por conta do piso de granito. Já abaixo da janela do quarto dos irmãos, há um gramado;

O médico Paulo Papandreu defendia a tese de que a menina caiu de forma acidental em seu livro "Caso Isabella: verdade nova". Em 2009 a mãe de Isabela conseguiu impedir judicialmente a circulação do livro e processou o autor pedindo indenização. Esta crítica também foi sustentada pelo médico legista George Sanguinetti no livro "A morte de Isabella Nardoni - Erros e Contradições Periciais", que também foi proibido pela justiça de São Paulo. George Sanguinetti ficou famoso por ter contestado a perícia de PC Farias e, mesmo ridicularizado à época, teve sua tese reconhecida quase uma década depois.

Ana Carolina Oliveira disse ao programa Fantástico: "Eu e ele (Alexandre), tínhamos uma relação distante. Mas ela (Isabella) tinha um amor incondicional por esse pai", disse, acrescentando que a menina de cinco anos nunca falou mal do pai. ”Nunca Isabella deu algum sinal, e nunca falou nada sobre o pai. Eu não sei o que aconteceu aquele dia. Fico muito triste em saber que minha filha sofreu, mas o que aconteceu a gente ainda vai descobrir."

O rascunho do laudo 1.081, que será feito pelo médico Laércio de Oliveira Cesar com o auxílio de dois colegas, reforça a tese que a menina Isabella, de 5 anos, foi asfixiada por esganadura ou sufocamento e teve um osso da mão esquerda

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quebrado, provavelmente por meio de uma torção, e havia sinais de que essa fratura ocorreu quando a garota estava viva. Além disso, foi encontrada pequena hemorragia no cérebro. “Isso é comum nos casos do que chamamos de síndrome de criança espancada”, disse um legista. No corpo, havia um machucado no antebraço direito, como se ele tivesse enganchado na tela de proteção da janela ou como se ela tivesse tentado se agarrar. Por fim, havia um corte na cabeça, provavelmente também anterior à queda.

O perito George Sanguinetti, em seu livro “A morte de Isabella Nardoni - Erros e Contradições Periciais” destaca que o fato de os ferimentos terem ocorrido quando a menina estava viva não significa que o foram antes da queda, já que a menina veio a falecer mais de 50 min após a queda. Assim sendo, é muito mais óbvio que todos os ferimentos decorreram da queda, não havendo qualquer base científica ou razoabilidade em se afirmar que houve uma agressão anterior à queda. A asfixia decorreu das lesões no aparelho respiratório de Isabella decorrentes da queda, não havendo igualmente base científica ou sinais externos característico (Marcas de dedos na garganta) que embasem a tese de tentativa de esganadura. As especulações da perícia policial foram cruciais para embasar a tese de coautoria da madrasta, desqualificando-a como testemunha.

No dia 18 de abril, o casal Alexandre Nardoni e Anna Carolina Jatobá são indiciados pela Polícia Civil no 9º DP, pelo assassinato da Isabella de Oliveira Nardoni, por homicídio, no dia em que a Isabella completaria seis anos de idade, pelo artigo 121 do Código Penal Brasileiro.

Em 7 de maio de 2008 O juiz Maurício Fossen, da 2ª Vara do Tribunal do Júri da capital paulista aceitou a denúncia do Ministério Público de São Paulo contra o casal Alexandre Nardoni e Anna Carolina Jatobá e decretou a prisão preventiva do pai e da madrasta de Isabella.

97º distrito policial onde Anna Carolina Jatobá passou a noite de 8 de maio, logo após a sua detenção.

O casal que estava hospedado no apartamento da mãe de Anna Jatobá optou em se entregar à polícia. Como passava das dezoito horas, a prisão apenas poderia ser efetuada pela polícia sem a colaboração do casal apenas as seis horas da manhã. Porém o casal se entregou.

Após passarem por exame de corpo de delito no Instituto Médico-Legal, Alexandre foi encaminhado para o 13º Distrito de Polícia, na Casa Verde (Zona Norte), onde ficam custodiados detentos com curso superior, e Anna Carolina Jatobá foi enviada para o 97º Distrito Policial, em Americanópolis, na zona sul do município de São Paulo.

Porém na manhã de 8 de maio Anna Carolina Jatobá foi removida do distrito policial e foi transferida para Penitenciária Feminina de Sant'Anna, na zona norte. Porém, em face de ameaças de rebelião por parte das presas, devido a presença de Anna Jatobá, ela foi transferida para a Penitenciária Feminina de Tremembé, a 138 km da capital.

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6.3.A. JURI

No início de 2009, três desembargadores da 4ª Câmara Criminal do TJ decidiram por unanimidade que o casal Alexandre Nardoni e Anna Carolina Jatobá seria levado a júri popular. O primeiro dia de julgamento ocorreu em 22 de março de 2010, cerca de dois anos após a morte de Isabella. O júri foi formado por quatro mulheres e três homens. Defesa e acusação contaram com dezesseis testemunhas no total, sendo onze de defesa, duas de acusação e três em comum. Outras sete testemunhas foram dispensadas.

Após cinco dias de julgamento, o juiz Maurício Fossen fez o pronunciamento, que foi transmitido por diversas redes de televisão ao vivo, somente através de locução. O júri considerou o casal culpado por homicídio triplamente qualificado (pela menina ter sido asfixiada, considerado meio cruel, não ter tido chance de defesa, por estar inconsciente ao cair da janela, e por alteração do local do crime ) e fraude processual. Alexandre Nardoni foi condenado a 31 anos, 1 mês e 10 dias - pelo agravante de ser pai de Isabella - e Anna Carolina Jatobá, a 26 anos e 8 meses, em regime fechado. Pela fraude processual, devem cumprir 8 meses e 24 dias, em regime semi-aberto. Por decisão do juiz, eles não poderão recorrer da sentença em liberdade, para garantia da ordem pública.

O advogado Roberto Podval recorreu da sentença logo após sua leitura pelo juiz Maurício Fossen.

O mesmo juiz, dez dias depois do julgamento, negou o pedido de recurso para um novo julgamento por júri popular e anulação da condenação, argumento defendido pela defesa com base no período anterior do caso à mudança no Código do Processo Penal, que extinguiu o chamado protesto por novo júri. O juiz Maurício Fossen seguiu a interpretação de que a alteração da legislação é aplicável para todos os casos, inclusive os anteriores. (O GLOBO,2012)

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CONCLUSÃO A institucionalização do Tribunal do Júri dentro do ordenamento jurídico brasileiro já demonstra um grande avanço político e social. As fontes em que foi buscado, em verdade, sinalizam com muita propriedade o seu real significado e, principalmente, as condições para que seja um instrumento eficaz, tendo em vista o seu objetivo original. A Constituição Federal de 1988 introduziu-o de uma forma garantista, demonstrando uma perspectiva em conformidade com um governo democrático de direito. Apesar disso, ainda existem alguns entraves que impedem a sua atividade de forma realmente democrática e garantista. A polêmica acerca da manutenção ou extinção do júri vem de longos anos. Seguidamente volta à baila, mormente quando algum julgamento está sendo realizado ou quando o resultado do julgamento popular causa perplexidade nos meios políticos e jornalísticos. Argumentos a favor e contra o júri serão encontrados nos mais variados setores da dogmática jurídica e dos juristas engajados nas diversas teorias críticas do Direito. O que deve ficar claro é que tudo o que foi dito neste trabalho parte da premissa de que a instituição do 26júri pode ser um caminho para a concretização da participação popular nos mecanismos de aplicação da lei. É necessário respeitá-lo e aperfeiçoá-lo, e não mutilá-lo. Em face de o Júri constituir uma garantia do cidadão, incluído como cláusula pétrea no capítulo dos direitos e garantias fundamentais na Constituição brasileira, sua extinção está fora de cogitação. De todo modo, essa discussão não teria sentido sem a necessária crítica ao Tribunal do Júri em seus aspectos ideológicos/políticos e da urgente necessidade da alteração nos seus aspectos formais-estruturais. Nesse sentido, ressalto o que Streck (2001) define como o “calcanhar de Aquiles” do Tribunal do Júri, no confronto com o garantismo jurídico, que é o fato de o jurado decidir por íntima convicção, conflitando com o modelo de Estado Democrático de Direito. A operacionalização dessa regra constitucional dentro processo é medida necessária, sendo um direito dos cidadãos, uma vez que estes devem saber as

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razões, a fundamentação que motivou o julgador a condenar ou absolver um de seus membros. Entretanto, trata-se de um problema de difícil solução, uma vez que a Constituição estabelece a garantia do sigilo das votações, o que implica a impossibilidade imediata de qualquer tentativa de introduzir outros modelos de julgamento popular, como, por exemplo, o escabinato francês ou o português ou até mesmo uma adaptação das fórmulas tradicionais do júri americano ou inglês, onde os jurados discutem entre si buscando um consenso. A Carta Magna estabelece a vedação de emendas tendentes a abolir garantias. Ora, o que não pode ser extinto é o Tribunal do Júri e nem a soberania de seus veredictos. Com uma alteração que visasse a modificar o júri brasileiro, buscando-se, por exemplo, uma adaptação do procedimento utilizado nos tribunais superiores, do voto médio, essas garantias poderiam ser mantidas. Por tudo isso, não pode o júri servir de leito procrustiano das demandas judiciais resultantes de uma sociedade injusta, na qual, lamentavelmente, a cada dia o cidadão perde, 27pouco a pouco, o que resta de sua capacidade de indignação. A instituição deve, sim, ser mudada, arejada, democratizada. A partir do momento que se justifica a existência de um Júri pelo seu caráter democrático, possibilitando o julgamento do réu por seus pares, torna-se fundamental que a essência do conceito de democracia subsista em cada deliberação. A fundamentação das decisões judiciais é a base da garantia de uma ampla defesa em qualquer processo judicial. É nesse ato que se perceberá uma conformidade entre a verdade trazida ao processo e o entendimento conquistado pelo juiz. Pelo exposto, afirma-se que tornar possível a fundamentação das decisões dos jurados é medida que se faz necessária para efetivar as proteções normatizadas em nossa Constituição. Somente assim será realmente possível falar em uma sólida legitimidade democrática.

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REFERÊNCIAS BARBOSA MOREIRA, José Carlos. Comentários ao Código de Processo Civil, v. V, Rio de Janeiro: Forense, 1985. BATISTA, Nilo. Punidos e mal pagos. Rio de Janeiro: Revan, 1990. Mídia e Violência Urbana: Regras do Mercado da Informação sobre violência. Seminário realizado no Hotel Glória, Rio de Janeiro, 1º e 2 de julho de 1993. CUNHA, Gisele Heloísa. Embargos Infringentes. São Paulo: Revista dos Tribunais,1993. CARVALHO, Amilton Bueno de; CARVALHO Salo de. Aplicação da Pena e Garantismo. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2002. CINTRA, Antonio Carlos de Araújo; GRINOVER, Ada Pellegrini; DINAMARCO, Cândido Rangel. Teoria Geral do Processo. São Paulo: Malheiros, 2000. 28 ELUF, Luiza Nagib. A paixão no banco dos réus. São Paulo: Saraiva, 2003. FERNANDES, Antônio Scarance. Processo penal constitucional. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003. FERRAJOLI, Luigi. Direito e Razão: teoria do garantismo penal. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002. GOMES FILHO, Antônio Magalhães. Direito à prova no processo penal. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1997. GRINOVER, Ada Pellegrini; FERNANDES, Antonio Scarance; GOMES FILHO, Antonio Magalhães. As nulidades no processo penal. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2004. MAIEROVITCH, Walter F., “O Júri popular deve ser extinto?”, Folha de São Paulo, São Paulo, 31 de maio de 1997. Editoria: Opinião, seção Tendências/ debates, p 1-3. MARQUES, José Frederico. Elementos de direito processual penal. Campinas: Milenium, 2000. v.5. A instituição do Júri. São Paulo: Saraiva, 1963, V. I.

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NORONHA, E. Magalhães. Curso de Direito Processual Penal. São Paulo: Saraiva, 1982. RANGEL, Paulo. Direito processual penal. Rio de Janeiro: Lumen Júris, 2005. O Juiz Garantista. Disponível em: “http://www.mundojuridico.adv.br/html/artigos/documentos/texto066.htm”. Acesso em: 10 jul. 2009. SILVA, Kédyma Cristiane Almeida. Reforma da instituição do júri a partir de uma visão garantista dos direitos. Disponível em: “http://www.walkinmedia.com.br/fesmp/ftp_out/20_04.pdf”. Acesso em: 10 jul.2009. 29 STRECK, Lênio Luiz. Tribunal do júri: símbolos e rituais. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2001. TUCCI, Rogério Lauria. Tribunal do Júri: estudo sobre a mais democrática instituição jurídica brasileira. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1999.

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ÍNDICE

FOLHA DE ROSTO 2

AGRADECIMENTO 3

DEDICATÓRIA 4

RESUMO 5

SUMÁRIO 6

INTRODUÇÃO 7

CAPITULO 1: A INSTITUIÇÃO DO JÚRI. 9 1.1 BREVE HISTÓRICO DO JÚRI POPULAR NO BRASIL 9

1.2 DO DIREITO COMPARADO 10

1.3 A DISCRIMINAÇÃO DO JÚRI NO BRASIL 11

CAPITULO 2: PRINCIPIO DA MOTIVAÇÃO DAS DECISÕES JUDICIAIS 12

2.1 O DEVER DEFUNDAMENTAR A DECISÃO 12

2.2 DA DEMOCRACIA GARANTISTA E DA NECESSIDADE DE JUGALMENTOS

MOTIVADOS 14

CAPITULO 3: A INFLUÊNCIA DO DISCURSO E DA MIDIA NAS DECISÕES DOS

JURADOS 16

3.1 OS DISCURSOS NO TRIBUNAL DO JÚRI 16

3.2 O DIREITO PENAL DO AUTOR VERSUS O DIREITO PENAL DO FATO NO

JURI 17

3.3 A INFLUÊNCIA DA MÍDIA 18

CAPITULO 4: VOTO MÉDIO 20

4.1 BREVE ANÁLISE NO ÂMBITO DO PROCESSO CIVIL 20

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4.2 VOTO MÉDIO COMO TECNICA DE DECISÃO DOS ORGÃOS COLEGIADOS

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CAPITULO 5: DA COLISÃO DE PRINCÍPIOS – SIGILO DAS VOTAÇÕES X

MOTIVAÇÕES DAS DECISÕES 22

CAPITULO 6 – CASOS IMPORTANTES DE JURI NO BRASIL 24 6.1. CASO RICHTHOFEN 24 6.1.A. JURI 25 6.2. CASO ELIZA SAMUDIO 30 6.2.A. JURI 31 6.3. CASO ISABELLA NARDONI 32 6.3.A. JURI 37

CONCLUSÃO 38

REFERENCIAS BIOGRAFICAS 40

ÍNDICE 42