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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI PRÓ-REITORIA DE PESQUISA, PÓS – GRADUAÇÃO, EXTENSÃO E CULTURA – PROPPEC CENTRO DE EDUCAÇÃO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS, POLÍTICAS E SOCIAIS – CEJURPS PROGRAMA DE MESTRADO PROFISSIONALIZANTE EM GESTÃO DE POLÍTICAS PÚBLICAS – PMGPP AÇÃO GOVERNATIVA DO COMITÊ DE GERENCIAMENTO DA BACIA HIDROGRÁFICA DO RIO ITAJAÍ: AS REPRESENTAÇÕES SOCIAIS DOS PROBLEMAS HÍDRICOS POR PARTE DOS MEMBROS DO COMITÊ VIVIANE ODEBRECHT LÓPEZ IGLESIAS ITAJAÍ (SC) 2005

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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI PRÓ-REITORIA DE PESQUISA, PÓS – GRADUAÇÃO, EXTENSÃO E CULTURA – PROPPEC CENTRO DE EDUCAÇÃO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS, POLÍTICAS E SOCIAIS – CEJURPS PROGRAMA DE MESTRADO PROFISSIONALIZANTE EM GESTÃO DE POLÍTICAS PÚBLICAS – PMGPP

AÇÃO GOVERNATIVA DO COMITÊ DE GERENCIAMENTO DA BACIA HIDROGRÁFICA DO RIO ITAJAÍ: AS REPRESENTAÇÕES SOCIAIS DOS

PROBLEMAS HÍDRICOS POR PARTE DOS MEMBROS DO COMITÊ

VIVIANE ODEBRECHT LÓPEZ IGLESIAS

ITAJAÍ (SC)

2005

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AÇÃO GOVERNATIVA DO COMITÊ DE GERENCIAMENTO DA BACIA HIDROGRÁFICA DO RIO ITAJAÍ: AS REPRESENTAÇÕES SOCIAIS DOS

PROBLEMAS HÍDRICOS POR PARTE DOS MEMBROS DO COMITÊ

VIVIANE ODEBRECHT LÓPEZ IGLESIAS

Dissertação apresentada à Banca Examinadora no Mestrado Profissiona-

lizante em Gestão de Políticas Públicas da Universidade do Vale do Itajaí –

UNIVALI, sob a orientação da Prof. Dra. Neusa Maria Sens Bloemer, como exigência

parcial para obtenção do título de Mestre em Gestão de Políticas Públicas /

Profissionalizante.

ITAJAÍ (SC) 2005

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A meu pai (in memorian).

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- Que quer dizer "cativar"? - É uma coisa muito esquecida, disse a

raposa. Significa "criar laços”. - Criar laços? - Exatamente, disse a raposa. Tu não és

ainda para mim senão um garoto inteiramente igual a cem mil outros garotos. E eu não tenho necessidade de ti. E tu não tens também necessidade de mim. Não passo a teus olhos de uma raposa igual a cem mil outras raposas. Mas, se tu me cativas, nós teremos necessidade um do outro. Serás para mim único no mundo. E eu serei para ti única no mundo... (Antoine de Saint-Exupéry)

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AGRADECIMENTOS

Como na fábula do Pequeno Príncipe de Antoine de Saint-Exupéry, ao

longo de nossa trajetória criamos laços e somos por eles responsáveis. Essa sem

dúvida é a grande beleza da vida: o amor e a amizade que “cativamos”.

Esta dissertação certamente não teria se concretizado sem o apoio dessas

pessoas:

A meu marido, pelo amor, incentivo e apoio em todas as horas;

Aos meus filhos Renata, Patrícia, Fernanda e Alexandre, meu amor eterno;

Aos meus netos Raphael e Gabriel, que me fazem sentir criança todos os

dias, meu amor incondicional;

Aos meus genros Rapha, Fabiano e Emanuel, pelo carinho e paciência;

À Marlene, minha “irmã” do coração, por todos esses anos de amizade;

Meus agradecimentos a meus familiares, que nos últimos meses apesar da

falta de convívio próximo sempre me presentearam com seu amor e compreensão;

Aos amigos e colegas do mestrado, meus agradecimentos pela amizade e

troca de idéias.

Agradeço também aos professores do curso de mestrado por terem

socializado seus conhecimentos. Em especial agradeço aos professores Dr.Julian

Borba, Dra. Maria José Reis, Dr. Sérgio Luís Boeira, Dr .Flávio Ramos MSc. Sérgio

Saturnino, por me brindarem com textos referentes ao tema desta pesquisa;

Meu agradecimento especial à minha orientadora Prof. Dra. Neusa Maria

Sens Bloemer, que além de ter mostrado um “caminho” com seu amplo

conhecimento, superando a rigidez da academia nos possibilitou tranqüilidade nos

momentos difíceis; carinho e paciência quando não conseguíamos avançar, e,

sobretudo, generosidade em compartilhar conosco nossas angústias, nos fazendo

lembrar que além do mestrado somos responsáveis por todos aqueles que

“cativamos” em nossa caminhada.

Ao Juliano, à Thaís e ao Ivanor, pelo carinho e compreensão.

E, finalmente, a todos que de alguma maneira contribuíram para que essa

dissertação se tornasse realidade, meus sinceros agradecimentos.

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RESUMO

IGLESIAS, Viviane Odebrecht López. Ação Governativa do Comitê de Gerenciamento da Bacia Hidrográfica do Rio Itajaí: as representações sociais dos problemas hídricos por parte dos membros do Comitê. 2005, 145f. Dissertação (Mestrado profissionalizante em Gestão de Políticas Públicas) – CEJURPS – Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI.

A presente dissertação tem como objetivo analisar o potencial democrático e os limites para a democratização do Comitê de Gerenciamento da Bacia Hidrográfica do Itajaí, localizada no Vale do Rio Itajaí, em Santa Catarina. A partir de uma revisão bibliográfica sobre as questões ambientais no que diz respeito às leis ambientais, buscou-se compreender como se insere a Bacia do Vale do Itajaí nesta legislação. Utilizou-se, para tal, dados quantitativos para a composição do contexto da Bacia e dados qualitativos para a captação das percepções dos representantes do Comitê. Foram analisadas as representações sociais dos representantes que compõem o Comitê sobre os aspectos referentes aos recursos hídricos, sobre a sua participação e a constituição do Comitê, bem como sobre a atuação do próprio Comitê em defesa da área ambiental. Com tal propósito analisa-se, assim, o potencial democrático e os limites para a democratização do Comitê de Gerenciamento da Bacia do Itajaí, tomando como referencial teórico as representações sociais preconizadas por Minayo (2000), bem como o conceito de campo social desenvolvido por Bourdieu (1989), e de gestão participativa de Jacobi (2003). Constatou-se, ao final, que o Comitê de Gerenciamento da Bacia do Itajaí embora represente um avanço do ponto de vista democrático, ainda deixa a desejar na medida em que se faz necessário desconstruir práticas clientelistas e relações patrimonialistas presentes nas instituições do Estado e na própria sociedade.

PALAVRAS-CHAVE: POTENCIAL DEMOCRÁTICO, LIMITES PARA A

DEMOCRATIZAÇÃO, RECURSOS HÍDRICOS.

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RESUMEN

IGLESIAS, Viviane Odebrecht López. Acción Gubernativa del Comité de gerenciamiento de la Cuenca Hidrográfica del Río Itajaí: las representaciones sociales de los problemas hídricos por parte de los miembros del Comité. 2005, 145f. Disertación (Maestría profesionalizante en Gestión de Políticas Públicas) - CEJURPS Universidade do Vale do Itajaí - UNIVALI. La presente disertación tiene como objetivo analizar el potencial democrático y los límites para la democratización del Comité de gerenciamiento de la Cuenca Hidrográfica del Itajaí, localizada en el Valle del Río Itajaí, en Santa Catarina. A partir de una revisión bibliográfica sobre las cuestiones ambientales con respecto a las leyes ambientales, se buscó comprender como se inserta la Cuenca del Valle del Itajaí en esta legislación. Se han utilizado, para eso, datos cuantitativos para la composición del contexto de la Cuenca y datos cualitativos para la captación de las percepciones sociales de los miembros que componen el Comité sobre los aspectos referentes a los recursos hídricos, sobre su participación y la constitución del Comité, así como sobre la actuación del propio Comité en defensa del área ambiental. Con tal propósito, se analiza el potencial democrático y los límites para la democratización del Comité de Gerenciamiento de la Cuenca del Itajaí, tomando como referencial teórico las representaciones sociales preconizadas por Minayo (2000), así como el concepto de campo social desarrollado por Bourdieu (1989), y de gestión participativa de Jacobi (2003). Al fin se constató que el Comité de Gerenciamiento de la Cuenca del Itajaí, a pesar de que represente un avanzo desde el punto de vista democrático, aún tiene fallas a la medida que se hace necesario romper con prácticas clientelistas y relaciones patrimonialistas presentes en las instituciones del Estado y en la propia sociedad. Palabras llave: potencial democrático, límites para la democratización, recursos hídricos.

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LISTA DE FIGURAS Figura 1 – Sub-bacias da Bacia do Itajaí.............................................................................. 62 Figura 2 – Bacia do Itajaí com seus principais rios, serras e represas. ................................ 64 Figura 3 – Divisão política da Bacia do Itajaí. ..................................................................... 65 Figura 4 – Destaque da região de Blumenau....................................................................... 79 Figura 5 – Destaque da região de Brusque.......................................................................... 83 Figura 6 – Destaque da Região de Ibirama.......................................................................... 86 Figura 7 – Destaque da região e Itajaí. ................................................................................ 88 Figura 8 – Destaque da região de Ituporanga...................................................................... 90 Figura 9 – Destaque da região de Rio do Sul. ..................................................................... 92

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LISTA DE GRÁFICOS Gráfico 1 – População da Bacia do Itajaí. .......................................................................... 66 Gráfico 2 – Área plantada em hectares dos produtos arroz, fumo e milho nas regiões da Bacia do Itajaí (2000)........................................................................................................... 68 Gráfico 3 – Quantidade em toneladas dos produtos arroz, fumo e milho nas regiões da Bacia do Itajaí (2000)........................................................................................................... 69 Gráfico 4 – Quantidade de rebanho efetivo de aves, bovinos e suínos (2000).................... 73 Gráfico 5 – Porcentagem de saneamento básico por domicílio dividido por região. ............ 76 Gráfico 6 – Número de indústrias e empregos gerados pelas mesmas (2000). .................. 81 Gráfico 7 – Número de indústrias e os empregos gerados pelas mesmas (2000)............... 84 Gráfico 8 – Número de indústrias e os empregos gerados pelas mesmas (2000)............... 87 Gráfico 9 – Número de indústrias e os empregos gerados pelas mesmas (2000)............... 89 Gráfico 10 – Número de indtústrias e os empregos gerados pelas mesmas (2000)............. 91 Gráfico 11 – Número de indústrias e os empregos gerados pelas mesmas (2000)............. 93

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LISTA DE SIGLAS

ABIMÓVEL Associação Brasileira das Indústrias das Indústrias de Mobiliário ACIB Associação Comercial de Blumenau ACII Associação Comercial e Industrial de Itajaí ACIRS Associação Comercial e Industrial de Rio do Sul AMAVI Associação dos Municípios do Alto Vale do Itajaí AMFRI Associação dos Municípios da Foz do Rio Itajaí AMMVI Associação dos Municípios do Médio Vale do Itajaí AMVI Associação dos Municípios do Vale do Itajaí ANAMA Associação Nacional de Amparo ao Meio Ambiente APREMAVI Associação de Preservação da Mata Atlântica do Vale do Itajaí BNDS Banco Nacional de Desenvolvimento Social CASAN Companhia de Águas e Saneamento CELESC Central Elétrica do Estado de Santa Catarina CETESB Companhia de Tecnologia de Saneamento Ambiental CIDASC Companhia Integrada de Desenvolvimento Agrícola de Santa Catarina CNBB A Conferência Nacional dos Bispos do Brasil COBAS Consultoria Brasil-Alemanha e Saneamento Ltda. CONAMA Conselho Nacional do Meio Ambiente COPPE Coordenação de Pós-Graduação e Pesquisa em Engenharia CRAVIL Cooperativa Regional Agropecuária Vale do Itajaí DBO Demanda Bioquímica de Oxigênio DDD Demanda Química de Oxigênio DEOH Departamento de Edificações e Obras Hidráulicas DNAEE, Departamento Nacional de Águas e Energia Elétrica DNOS Departamento Nacional de Obras e Saneamento EMBRAPA Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária EPAGRI Empresa de Pesquisa e Extensão Agrícola de Santa Catarina ETEs Estações de Tratamento de Esgotos EUA Estados Unidos da América FAMAI Fundação de Amparo ao Meio Ambiente de Itajaí FATMA Fundação do Meio Ambiente FIESC Federação das Indústrias de Santa Catarina FINEP Fundação Nacional de Estudos e Pesquisas FMI Fundo Monetário Internacional FUMAN Fundação do Meio Ambiente de Navegantes FURB Universidade Regional de Blumenau GRH Gerência de Recursos Hídricos IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística ICMS Imposto Sobre Circulação de Mercadorias e Prestação de Serviços IEMA. Instituto Estadual de Meio Ambiente e Recursos Hídricos INMETRO Instituto Nacional de Metrologia Normalização e Qualidade Industrial IPA Instituto de Pesquisas Ambientais JICA Japan International Corporation Agency OECF Overseas Economic Cooperation Fund OMS A Organização Mundial de Saúde ONGs Organizações Não-Governamentais ONU Organização das Nações Unidas PIB Produto Interno Bruto PLADE Plano Global e Integrado de Defesa contra enchentes – ecossistema

Bacia Hidrográfica do Rio Itajaí-Açu RV Variedades de Alto Rendimento SAMAE Serviço Autônomo Municipal de Água e Esgoto

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SEGRH Sistema Estadual de Gerenciamento de Recursos Hídricos SEMASA Serviço Municipal de Água, Saneamento Básico e Infra-estrutura SENAI Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial SINTEX Sindicato das Industrias Têxteis TAC Termo de Ajustamento do Fumo UFRJ Universidade Federal do Rio de Janeiro UNICEF Fundo das Nações Unidas para a Infância UNIDAVI Universidade para o Desenvolvimento do Alto Vale do Itajaí UNIVALI Universidade do Vale do Itajaí

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SUMÁRIO

RESUMO .............................................................................................................................. 6

RESUMEN ............................................................................................................................ 7

LISTA DE FIGURAS ............................................................................................................ 8 LISTA DE GRÁFICOS .......................................................................................................... 9 LISTA DE SIGLAS ............................................................................................................. 10

INTRODUÇÃO .................................................................................................................... 13

CAPÍTULO I – A PROBLEMÁTICA DA PESQUISA E A FUNDAMENTAÇÃO

TEÓRICO-METODOLÓGICA.............................................................................................. 15

1.1 A REFORMA DO ESTADO E OS NOVOS ARRANJOS INSTITUCIONAIS .................. 21

1.2 DEMOCRACIA E PARTICIPAÇÃO SOCIAL ................................................................. 27

1.3 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS...................................................................... 34

CAPÍTULO II – A SITUAÇÃO DOS RECURSOS HÍDRICOS NO MUNDO .......................... 37

CAPÍTULO III – LEGISLAÇÃO BRASILEIRA E POLÍTICAS PÚBLICAS DOS RECURSOS HÍDRICOS: DA “HIDRO-TÉCNICA” À CRIAÇÃO DE UMA NOVA INSTITUCIONALIDADE............................................................................................................................................ 49

3.1 A LEI DOS RECURSOS HÍDRICOS E A FORMAÇÃO DOS COMITÊS DE BACIAS .... 57

CAPÍTULO IV – A Bacia hidrográfica do Rio Itajaí-Açu: formação socioespacial, desenvolvimento econômico e suas implicações ................................................................. 61

CAPÍTULO V – Comitê do Itajaí – Histórico e atualidades em sua dinâmica institucional .... 94

5.1 DISTRIBUIÇÃO DOS ASSENTOS NO COMITÊ DO ITAJAÍ......................................... 97

5.1.1 Estrutura de funcionamento do Comitê do Itajaí......................................................... 99

5.1.2 Projeções e ações do Comitê do Itajaí..................................................................... 101

5.1.3 A Semana da Água.................................................................................................. 103

5.1.4 Programa de Recuperação da Mata Ciliar ............................................................... 104

5.1.5 Cobrança da Água ................................................................................................... 105

5.1.6 Projeto Piava .......................................................................................................... 106

5.1.7 Atividades diversas .................................................................................................. 106

CAPÍTULO VI – As percepções dos representantes do Comitê do

Itajaí: consensos e dissensos em relação à gestão dos recursos hídricos ........... 107

Considerações Finais........................................................................................... 130

REFERÊNCIAS ................................................................................................... 132

APÊNDICEs ........................................................................................................ 141

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INTRODUÇÃO

A Lei Federal dos Recursos Hídricos (n. 9.433/1997) (BRASIL, 1999), ao

estabelecer que a água é um recurso finito e fundamental para a existência da vida

no planeta, instituiu as bacias hidrográficas com o objetivo de viabilizar a

implantação de planejamento e gestão dos recursos hídricos.

Os Comitês de Bacias são órgãos normativos e deliberativos com a

responsabilidade de solucionar conflitos relacionados com os recursos hídricos. São

instituições responsáveis pela gestão de uma nova unidade territorial, da qual fazem

parte um diversificado número de atores, de distintos segmentos sociais com

percepções, expectativas e interesses variados, representando os usuários da água,

poder público e sociedade civil.

Partiu-se do pressuposto de que os Comitês de Bacias Hidrográficas

representam uma conquista do processo de modernização ambiental que tem

emergido nos últimos trinta anos, colocando novas demandas para o setor produtivo

e principalmente para o Estado Contemporâneo, o qual, para não perder sua

legitimidade, abandonou o tradicional modelo de gestão tecnoburocrático e

centralizador, para um modelo descentralizado e participativo.

Os Comitês de Bacias, nesse contexto, simbolizam o modo como a

preocupação ambiental se institucionalizou na sociedade e podem ser objetos de

estudo para a constatação ou refutação de hipóteses.

Esta pesquisa é fruto de um processo. Um processo de incursão pessoal por

um tema atual, instigante e que diz respeito à continuidade da vida no planeta. O

interesse pelo tema surgiu durante a realização da disciplina optativa, Tópicos

Especiais em Educação Ambiental no ano de 2002 no Mestrado de Educação na

Universidade do Vale do Itajaí (UNIVALI). As visitas de campo realizadas juntamente

com o Prof. Dr. Antônio Guerra, titular da disciplina, possibilitaram perceber o estado

de degradação ambiental que a interferência humana, sem um planejamento

sustentável, tem causado ao meio ambiente. A reflexão sobre a poluição das águas

da bacia do Itajaí, a dificuldade em conciliar o econômico e a proteção do meio

ambiente foram os principais motivos que me levaram a eleger o tema como objeto

de trabalho.

A escolha pelo Comitê de Bacia do Itajaí, como área de interesse para o

desenvolvimento da pesquisa, surgiu pelo fato de ser esse Comitê considerado

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como modelo para a implementação de outros Comitês, tanto no Estado de Santa

Catarina como em outros Estados da Federação.

O Comitê de Bacia do Itajaí foi instituído em 23/06/1997, de acordo com a

Política Nacional de Recursos Hídricos (Lei 9.433/97) e oficialmente instalado em

março de 1998. Inicialmente, sua criação estava direcionada para a busca de

soluções para a questão das enchentes, entretanto os problemas relativos à

complexidade da bacia mostraram a necessidade de um gerenciamento mais amplo.

É sobre o Comitê desta Bacia, responsável pelo gerenciamento de tais problemas,

que se concentra o foco da análise no presente trabalho.

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CAPÍTULO I

A PROBLEMÁTICA DA PESQUISA E A FUNDAMENTAÇÃO

TEÓRICO–METODOLÓGICA

Muito embora a motivação inicial para a formação do Comitê de Bacia do

Itajaí tenha sido a inexistência de um sistema de contenção das cheias, os

problemas relacionados à água no Vale do Itajaí transcendem a essa problemática e

necessitam de um gerenciamento amplo, integrado e participativo.

Analisar a dinâmica do Comitê significa, portanto observar se efetivamente o

Comitê vêm atuando como espaço de adoção de novas práticas participativas locais,

incentivando a participação social, dando um novo significado às políticas públicas

relacionadas aos recursos hídricos, visto que elas passaram a ter um novo desenho

institucional e uma lógica de maior complexidade.

Nesse sentido, compreender as representações sociais dos membros da

sociedade civil, usuários da água e órgãos públicos, referentes à gestão dos

recursos hídricos circunscritos ao espaço da bacia, enquanto atores sociais e

políticos é de fundamental importância para o entendimento do funcionamento do

Comitê de Bacia do Itajaí.

Para tal empreendimento foram elencados os conceitos de representações

sociais preconizados por Minayo (2000), bem como o conceito de campo social

desenvolvido por Bourdieu (1989), e de gestão participativa de Jacobi (2003).

As representações sociais podem ser compreendidas como a forma que

determinada sociedade elabora e expressa seus pensamentos. Como afirma

Minayo:

Representações sociais é um termo filosófico que significa a reprodução anterior ou do conteúdo do pensamento. Nas Ciências Sociais são definidas como categorias do pensamento, de ação e de sentimento que expressam a realidade, explicam-na, justificando-a ou questionando-a. (MINAYO, 2000, p. 158)

O conceito de representação social tem sido objeto de estudo e debates ao

longo do pensamento sociológico. No período clássico, o conceito de representação

social foi trabalhado por Durkheim (1987) como uma forma de analisar a realidade

coletiva.

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As representações coletivas expressam conhecimentos, sentimentos e

crenças de determinado grupo social. Para Durkheim as representações coletivas,

[...] traduzem a maneira como o grupo se enxerga a si mesmo nas relações com os objetos que o afetam. Ora o grupo está constituído de maneira diferente do indivíduo, e as coisas que os afetam são de outra natureza. Representações que não exprimem nem os mesmos sujeitos, nem os mesmos objetos, não poderiam depender das mesmas causas. (DURKHEIM, 1987, p. XXVI)

Assim pode-se entender que o autor enfatiza a diferença entre

representação social e a individual, salientando a importância do social. Seguindo a

mesma linha de pensamento, Mauss (1979), analisando o ritual oral dos cultos

funerários australianos também reconhece como base das representações o

“substrato social1”. O autor não nega que o sentimento é individual, entretanto,

destaca que ele é um fenômeno simbólico e social traduzindo, portanto

representações coletivas.

Durkheim assim como Mauss evidenciam em suas obras a noção de que o

mundo é feito de representações.

O pensamento de Durkheim sobre representações foi compartilhado por

vários estudiosos e recebeu valiosas contribuições ao longo dos anos. Nesse

sentido as representações coletivas abriram espaço para as representações sociais,

fruto do que Oliveira apontou como “[...] das práticas sociais do grupo e não apenas

do se pensar.” (1999, p.178).

Max Weber elaborou sua concepção sobre representações através de

termos como “idéias”, “espírito”, “concepções”, “mentalidade”, usados muitas vezes

como sinônimos e trabalhou de forma particular a noção de visão de mundo

(MINAYO, 2000, p. 161).

Para Weber os sujeitos é que estabelecem recortes na realidade e se

posicionam de forma a conferir-lhes sentido. Dessa forma, as ações humanas são

sociais e portadoras de sentido (conscientes ou não) e, portanto possuem

significação cultural. “Essa significação é dada tanto pela base material como pelas

idéias, dentro de uma adequação, em que ambas se consolidam mutuamente.”

(MINAYO, 2000, p.161).

1 Termo elaborado por Durkheim.

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17

Apesar de representar um grande avanço não apenas para a Sociologia,

mas também para todas as áreas das Ciências Sociais e Humanas o conceito foi

relegado por muito tempo. Segundo Oliveira (1999), as guerras, conflitos e doutrinas

ideológicas que marcaram o primeiro quartel do século XX, contribuíram para que a

obra de Durkheim fosse praticamente esquecida, e o conceito de representação

considerado um nível das ideologias. Durante este período,

[...] não se questionava a essência das representações, mas seus tipos; não se questionava sua origem e sentido, mas sua falsidade e veracidade. Não se discutia sua operacionalidade nem sua fundamentação teórica, uma vez que seus resultados eram presumidos de antemão. (OLIVEIRA, 1999, p.183).

O conceito de representação teve seu renascimento, conforme Oliveira

(1999), com o interesse da psicologia social européia. O autor cita como expoentes

desta ciência: Serge Moscovici e Gilbert Durand.

Moscovici, representante da psicologia social, foi o responsável pela

mudança do termo representação coletiva para representação social.

Para Moscovici (1978, p. 41) as representações “[...] correspondem, por um

lado, à substância simbólica que entra na elaboração e, por outro, à prática que

produz a dita substância, tal como a ciência ou os mitos correspondem a uma prática

científica e mítica.” Para o autor as representações sociais estão presentes na

realidade e se manifestam nas relações sociais através de palavras, expressões,

produções e na relação com os objetos.

Para Durand apud Oliveira (1999) o mundo pode ser representado de duas

maneiras: através da consciência direta onde o objeto é perceptível ou sensível e

indireta, onde o objeto é ausente, sendo neste caso necessário representá-lo. Nas

duas situações o cerne da questão é de cognição e comunicação, visto que o

objetivo central da representação é de tornar clara a realidade do grupo.

Em Bourdieu as representações sociais encontram-se no epicentro de sua

construção teórica. O autor enfatiza a fala como “expressão das condições da

existência.” (MINAYO, 1998, p. 103).

Ao dar à fala status de porta-voz do pensamento Bourdieu (2001) reveste-a

com potencialidades de revelar condições estruturais, valores, normas e símbolos de

distintos grupos sociais, de acordo com suas condições históricas, econômicas,

sociais e culturais. Nesse sentido, compreender as percepções dos representantes

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do Comitê da Bacia do Itajaí, tendo como marco teórico o conceito de representação

social plasmado por Bourdieu é valorizar a fala desses atores como a forma mais

pura das relações sociais que são estabelecidas pelo grupo que compõe o Comitê.

Para o autor as representações sociais estão intrinsecamente relacionadas com a

prática e posição que o agente ocupa na estrutura social. São, portanto socialmente

construídas.

Considera-se de igual relevância trabalhar com o conceito de campo social,

haja vista que ele possibilita compreender o Comitê de Bacia enquanto espaço de

sociabilidade, de disputas, de interesses específicos, de regras, que são irredutíveis

de outros campos e apenas percebidos por quem partilha do grupo, objetivando a

transformação do campo social.

A noção de campo em Bourdieu também possibilita visualizar o momento

paradigmático de mudança no status da água no Brasil.

Historicamente tratada “[...] exclusivamente como uma questão técnica,

exterior à sociedade, um recurso infinito e de exclusiva competência dos peritos [...]’’

(GUIVANT e JACOBI, 2003, p. 01), a água passou a adquirir uma institucionalidade

própria, sendo objeto de uma nova racionalidade, levando a discussões, conflitos,

gerando um campo da qual participam distintos atores sociais.

Nesse sentido, se delineia um novo campo social: o campo dos recursos

hídricos em que os Comitês de Bacias Hidrográficas ocupam um espaço importante

no processo de democratização da sociedade.

A correlação entre a noção de campo social de Bourdieu e os Comitês de

Bacias começaram a tomar corpo, nesse caso, com a observação de que vários

aspectos da teoria se encaixavam com a prática. O processo de gestão

descentralizada e participativa; a bacia hidrográfica como unidade de gestão

conferindo uma relativa autonomia e a aproximação dos agentes neste espaço com

os mais distintos interesses e prerrogativas eram indicativos de que um novo campo

social estava se delineando: o campo dos recursos hídricos.

Bourdieu plasma o conceito de campo social, como sendo,

[...] um espaço multidimensional de posições tal que qualquer posição atual pode ser definida em função de um sistema multidimensional de coordenadas cujos valores correspondem aos valores das diferentes variáveis pertinentes: os agentes distribuem-se assim nele, na primeira dimensão, segundo o volume global do capital que possuem e, na segunda dimensão, segundo a

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composição do seu capital – quer dizer, segundo o peso relativo das diferentes espécies no conjunto de suas posses. (BOURDIEU, 1989, p.135).

O espaço social corresponde à distribuição dos agentes em posições de

acordo com os princípios do volume do capital que é distribuído em cada posição

ocupada e, pela composição de seu capital, ou seja: capital social, econômico,

cultural e simbólico.

Um campo é um espaço social estruturado, um campo de forças – há dominantes e dominados, há relações constantes, permanentes, de desigualdade, que se exercem no interior desse espaço – que é também um campo de lutas para transformar ou conservar este campo de forças. Cada um, no interior desse universo, empenha em sua concorrência com os outros a força (relativa) que detém e que define sua posição no campo e, em conseqüência, suas estratégias. (BOURDIEU, 1989, p. 57).

Segundo o autor a noção de campo deve ser ao mesmo tempo

compreendida como um campo social multifacetado, onde ocorrem disputas internas

de toda ordem.

As relações que ocorrem no interior de cada campo social são definidas a

partir da realidade objetiva. É na estrutura do campo social, formada por hierarquia,

tradições, instituições e história onde os agentes adquirem um corpo de disposições

que lhes permite agir conforme as possibilidades existentes no interior desta

estrutura, que Bourdieu (1989) definiu como habitus.

Nesse sentido, segundo Bourdieu (1989, p. 61), o habitus pode ser

compreendido como “[...] as estruturas sociais de nossa subjetividade que se

constituem inicialmente por meio de nossas primeiras experiências (habitus

primário), e depois, de nossa vida adulta (habitus secundário).” É a forma como os

agentes internalizam e corporificam as estruturas sociais. Bourdieu alerta que a

internalização destas estruturas podem ser de forma consciente ou inconsciente, e

que as mesmas possuem duas características fundamentais: de “[...] serem um

sistema de disposições duráveis e transponíveis”. Com isto o autor rompe com a

facticidade da imobilidade do ser humano de ser conduzido essencialmente pelo

inconsciente. Para Bourdieu (1989) do encontro do habitus e do campo social é que

resulta o principal mecanismo de produção do mundo social. O habitus é, portanto,

produto da história é o social incorporado. Nesse processo de socialização, o agente

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aprende e assimila como se estruturam e funcionam as relações sociais, as normas

e valores.

A transposição dos conceitos bourdianos para as representações sociais dos

representantes do Comitê de Bacia do Itajaí auxilia no entendimento de que seus

pensamentos, ações, convicções, enfim sua visão de mundo, refletem o “[...] duplo

movimento de internalização do exterior e da exteriorização do interior”, em outras

palavras, como apreenderam, singularizaram e reatualizam suas percepções

(BOURDIEU 1989, p. 51).

Bourdieu (1989) define capital social como o conjunto de recursos atuais ou

potenciais diretamente ligados à posse de uma rede durável de ligações mais ou

menos institucionalizadas de inter-relacionamentos. Nesse sentido, capital social

pode ser compreendido como agregador de recursos, que possibilita o

pertencimento duradouro a determinados grupos ou instituições.

Para o autor o volume do capital social está diretamente relacionado com a

extensão da rede de relações que um agente, grupo ou instituição possa mobilizar.

Desta forma, a acumulação de capital social corresponde a um processo de poder e

de mudanças na correlação de forças.

Para Putnam 2(2002) um dos pioneiros no estudo sobre capital social, os

dilemas das ações coletivas frutos da falta de compromisso entre os atores levam à

imobilidade social. Segundo o autor quando “[...] os atores são incapazes de assumir

compromissos entre si, eles têm de renunciar – pesarosamente, porém

racionalmente – a muitas oportunidades de proveito mútuo.” (PUTNAM, 2002, p.

174).

Putnam (2002) considera que a superação do impasse resultante dos “[...]

dilemas da ação coletiva e do oportunismo contraproducente [...]”, é mais fácil

quando a comunidade herdou um “[...] bom estoque de capital social sob a forma de

regras de reciprocidade e sistemas de participação cívica.” (PUTNAM, 2002, p. 177).

Para o autor, o capital social se fundamenta nas relações da organização social. Os

principais atributos necessários para o capital social nas relações entre os atores

são confiança mútua, reciprocidade, projeto de futuro compartilhado e trabalho em

2 Muito embora o conceito de capital social de Bourdieu (1983) e Putnam (2000) sejam substancialmente diferenciados, optamos no presente trabalho em utilizarmos as duas concepções por acreditarmos que elas contribuem para a compreensão da dinâmica do Comitê de Bacia do Itajaí. .

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conjunto. Tendo em vista tais atributos o capital social transcende o individual,

ressaltando os interesses coletivos.

Segundo Putnam (2002), o capital social diz respeito ao grau de

associativismo, confiança e cooperação que uma determinada sociedade alcança,

tanto do ponto de vista cívico, como de prosperidade econômica e o acatamento às

normas de comportamento cívico, tais como o pagamento de impostos e os

cuidados com que são tratados os espaços públicos e os “bens comuns”. Enquanto

o capital humano é produto de ações individuais em busca de aprendizado e

aperfeiçoamento pessoal, o capital social tem sua base nas relações entre os atores

sociais que estabelecem obrigações e expectativas mútuas, estimulam a

confiabilidade nas relações sociais e agilizam o fluxo de informações, internas e

externas. Em vez de controles e relações de dominação patrimonialistas, o capital

social favorece o funcionamento de normas e sanções consentidas dando ênfase

aos interesses públicos coletivos. Enquanto as vias convencionais de formar capital

humano estimulam o individualismo, a construção de capital social repercute

favoravelmente na coesão da família, da comunidade e na sociedade.

Para o autor acima citado o a construção de capital social é fundamental

para o exercício da democracia.

1.1 A REFORMA DO ESTADO E OS NOVOS ARRANJOS INSTITUCIONAIS

Ao longo da história societal o Estado assume distintas feições, num

processo cíclico de constantes transformações, com objetivo de se adequar à

dinâmica social. Esse mesmo processo explica como o Estado em sua trajetória tem

revisto sua forma de intervenção na sociedade.

Nas décadas de 1920 e 1930, em decorrência das duas Grandes Guerras e

após a Grande Crise3 de 1929, nos Estados Unidos, o modelo de Estado vigente

3 Após a Grande Crise de 1929, o Estado passa a intervir nas atividades econômicas em muitos países. Nos Estados Unidos, o presidente Roosevelt implementa, em 1933, o New Deal (Novo Acordo). Programa econômico e social que introduz o subsídio desemprego, doença, invalidez, etc. Roosevelt influenciado pelas idéias do economista britânico John Maynard Keynes , que, em 1936, publicou a Teoria Geral do Emprego, dos Juros e da Moeda – livro no qual defende uma política antidesemprego patrocinada pelo governo. Seguindo o modelo norte-americano e as idéias keynesianas, países como Inglaterra (1940), França e Alemanha criam o Estado de Bem-Estar Social (welfare-state), um sistema que garante aos cidadãos saúde, educação e aposentadoria (de longa duração como velhice , invalidez, ou de curta duração, doença desemprego, auxílio maternidade, etc.). As reflexões do texto foram baseadas nas aulas da disciplina “Estado e Políticas Públicas”, ministrada pelo Prof. Dr. Julian Borba e dos debates ocorridos em sala de aula.

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entra em crise, representando um marco para a constituição do Welfare State,

caracterizado por forte intervenção do Estado.

Conforme Pereira (1997), nessa época,

[...] entrou também em crise o Estado Liberal, dando lugar á emergência do Estado Social-Burocrático: social porque assume o papel de garantir os direitos sociais e o pleno-emprego; burocrático, porque o faz através da contratação direta de burocratas. Reconhecia-se assim, o papel complementar do Estado no plano econômico e social. Foi assim que surgiram o Estado do Bem-Estar nos países desenvolvidos e o Estado Desenvolvimentista e Protecionista nos países em desenvolvimento. (PEREIRA, 1997, p.10).

Nesse sentido, em virtude das mudanças sociais, políticas e econômicas

ocorridas na Europa no pós-guerra o estado contemporâneo teve que se adequar às

demandas, passando do Estado Liberal para o Estado Social, ou seja, para a

implantação do que se denominou por Estado de Bem-Estar Social ou Welfare State.

Conforme Arretche (1995) no pós-guerra, tanto a classe operária quanto à

burguesa tinham interesses, ainda que diferenciados nas políticas sociais. Sobre

esse compromisso entre classes opostas, a autora comenta:

No caso específico do Welfare State, fenômeno do pós-guerra nas economias capitalistas avançadas, o enfrentamento histórico das duas classes antagônicas assumiu a forma de um movimento social organizado e de uma resposta da classe capitalista, sob a forma do Estado centralizado. Naquela conjuntura, a do pós-guerra, este enfrentamento histórico da luta de classes implicou a consolidação de um compromisso de classe. (Arretche 1995, p. 34)

O Welfare State, enquanto conjunto de práticas estatais, passou a ser

adotado como concepção e prática básica de Estado em, praticamente, todos os

países ocidentais, independentemente do partido no poder (OFFE, 1984).

Conforme Wilensky apud Arretche (1995, p. 6):

O surgimento de “padrões mínimos, garantidos pelo governo, de renda, nutrição, saúde, habitação educação para todos os cidadãos, assegurados como um direito público e não como caridade (Wilensky & Lebeauux,1965: xii) está associado aos problemas e possibilidades postos pelo desenvolvimento da industrialização. De um lado, os gastos com programas sociais somente são possíveis porque a industrialização permite um vasto crescimento da riqueza das sociedades.(Wilensky & Lebeaux,1965,p.14). A partir da constatação de uma correlação entre as variáveis, crescimento industrial e gastos sociais, o autor considera que a primeira é uma condição necessária

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para a segunda. Dito de outro modo, os programas sociais ou não aparecem ou permanecem insignificantes em sociedades que não produzam um excedente nacional suficiente para financiá-los.

Como lembra Arretche (1995), a gênese das políticas sociais surgiu como

resposta funcional à formação da classe operária, que por sua vez, foi fundamental

para o desenvolvimento do capitalismo. De forma que, o Welfare State resultou

tanto, da pressão do sindicato, como também fruto do pensamento Keynesiano

direcionado a regulamentação da economia e redistribuição do capital.

Como analisam Bobbio et al. (1986), como conseqüência do crescente

aumento da interferência do Estado, houve um acréscimo nas despesas públicas e

na complexidade das estruturas administrativas direcionadas aos serviços sociais.

Esses fatores foram determinantes para que no segundo quartel de 1960, nos

países que adotaram ampla cobertura do seguro social, desenrolasse uma grave

crise fiscal do Estado, que culminou por determinar uma progressiva transformação

do Estado de Bem-Estar Social.

A diminuição da intervenção do Estado em relação às políticas públicas é o

que tem sido popularmente conhecido como “modelo neoliberal”.4

Freitas (2004) considera que o termo “políticas neoliberais” é mais utilizado

do que “modelo neoliberal,”porque o neoliberalismo expressa mais uma ideologia

que postula a proeminência do mercado e da livre competição do que um modelo

econômico global e homogêneo”. (FREITAS 2004, p.121)

O neoliberalismo enquanto ideologia, de acordo com Anderson (2000) surgiu

depois da II Guerra Mundial, como reação teórica e política contrária ao Estado

interventor. O neoliberalismo baseado nas idéias de Friedrich August Von Hayek, da

Grã-Bretanha e Milton Friedman, dos Estados Unidos da América – EUA, tinha como

princípio combater a regulação do mercado por parte do Estado, bem como, das

políticas sociais, de forma a preparar as bases para uma nova fase do capitalismo

com a desregulamentação da economia. Em linhas gerais os teóricos neoliberais

tornaram notório que o Estado tinha apenas uma função: a de garantir através de

seu aparato o livre mercado.

4 Estas informações são fruto de reflexões a partir das disciplinas ”Estado e Políticas Públicas” ministrada pelo Prof. Dr. Julian Borba e “Estado e Governabilidade do Estado Contemporâneo”,ministrada pelo Prof. Dr. Flávio Ramos, e debates ocorridos em sala de aula, durante o curso de Mestrado.

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Entretanto, conforme relata Anderson (2000) o neoliberalismo não encontrou

condições apropriadas para sua aplicação, devido à era de prosperidade que

impulsionou o mundo ocidental depois da Segunda Guerra até a década de 1960.

Mas a partir de 1973, a crise do petróleo e do modelo econômico do pós-guerra

serviu de pano de fundo para que o neoliberalismo se expandisse, alcançando o

apogeu nas décadas de 1980 e 1990, que associado à globalização econômica,

restringiu a atuação do Estado a um limite mínimo. Em contrapartida o setor privado5

advogou para si a responsabilidade de contribuir com as questões sociais, através

das várias instituições a cargo da sociedade civil ou terceiro setor6.

Na América Latina a redução dos gastos sociais na saúde, educação,

previdência bem como, o abandono de políticas agrícolas, industriais, infra-estrutura

e nas áreas de ciência e tecnologia vieram atreladas a processos de privatizações e

globalização econômica. A implantação desse modelo econômico implicou na

aplicação de políticas macroeconômicas que resultaram na perda de conquistas da

população, fruto das lutas sociais historicamente conseguidas: no desemprego,

aumento da violência e as mais distintas formas de exclusão social.

No Brasil, as políticas neoliberais foram efetivamente implantadas na década

de 1990, com o então Presidente Fernando Collor de Mello, que deu início às

privatizações, colocando o mercado a serviço do enriquecimento das empresas

transnacionais. O então presidente iniciou as reformas do Estado, iniciando com a

desregulamentação da economia, abertura do mercado e tentativa (ainda que

frustrante) de minimizar a inflação que tinha na época atingido patamares nunca

vistos na história do País. Esse período é ainda marcado pela retomada dos acordos

com instituições como o Fundo Monetário Internacional – FMI. No governo do

presidente Fernando Henrique Cardoso (1995/2003) foram adotados programas

5 O Estado é considerado por muitos autores como o primeiro setor, teoricamente responsável pelas questões sociais. Em virtude da falência do Estado, o mercado, ou segundo setor, começou a contribuir nas questões sociais através da sociedade civil ou terceiro setor, que é constituído por organizações sem fins lucrativos e não-governamentais, cujo objetivo é de prestação de serviços públicos. Montanõ (2003) classifica essa divisão como sendo de cunho neopositivista e liberal uma vez que ela impede a dinâmica entre estes setores, desconsiderando a historicidade da realidade social. 6 Santos (1999) considera o termo terceiro setor como vago, que não consegue abranger a amplitude do conjunto de organizações sociais que sendo privadas não visam lucro e, por outro lado, tendo como objetivos questões sociais não são estatais .Não há um consenso entre os autores sobre o conceito de terceiro setor Este é amplo e abrange múltiplas definições Pode portanto ser pensado à partir de uma interpenetração entre os três setores, uma vez que é impossível a visualização de seus limites. Sobre este tema ver Pereira (1999), Fernandes (1994).

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neoliberais de ajustes estruturais como as reformas administrativas e previdenciária,

equilíbrio fiscal, privatizações, e o enxugamento do papel do Estado na economia.

Como conseqüência, o Estado ficou vulnerável, sem capacidade para

atender às demandas sociais. A enorme recessão econômica elevou a taxa de

desemprego, aumentando o trabalho informal, flexibilizou os direitos trabalhistas e o

desmonte dos sistemas de seguridade social, saúde, educação, segurança pública e

infra-estrutura. Com a inversão do papel do Estado os direitos historicamente

adquiridos foram sendo transformados em mercadorias. A mercantilização dos

direitos sociais indica tanto uma contração do Estado de direitos como também é

indicativo do retrocesso na construção da democracia e da cidadania (SADER, 1997;

TELLES, 1997).

A reforma do Estado trouxe no bojo de suas propostas, a descentralização e

a participação da sociedade civil na elaboração das políticas públicas e nos espaços

de gestão com atribuições consultivas e decisórias.

O conceito de descentralização tem sido abordado sob diferentes enfoques.

Nesse sentido, o conceito de descentralização não deve ser compreendido sob uma

perspectiva dogmática uma vez que ele está sendo construído a partir de

determinadas concepções, variando conforme o contexto em que está sendo

utilizado bem como da posição político-ideológica de quem o está teorizando e

colocando na prática. Assim, para Abrucio e Costa (1999) a descentralização

representa uma estratégia de ordem gerencial fruto das reformas do Estado frente

às tratativas internacionais.

Bobbio et al (1986) compreendem descentralização a partir de centralização,

ou seja, as duas estão intrinsecamente interligadas e em relação dinâmica, sendo

portanto impossível a existência de ambas de forma pura, por contrariarem, nessa

forma, a própria noção de Estado.

Arretche (1996) aponta para a existência de tendências que associam

descentralização à democracia. Para os mais progressistas a descentralização

representa uma “[...] estratégia pela qual se criariam instituições (ou se conferiria

poder efetivo a elas) que viabilizassem a participação dos cidadãos nas decisões

públicas.” (BORJA APUD ARRETCHE, 1996, p. 46).

Para os liberais, de acordo com a autora acima citada, a descentralização

seria um instrumento que possibilitaria o rompimento com estruturas centralizadas

através do fortalecimento da sociedade civil. Entretanto, a descentralização isolada

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de outros princípios não é condição suficiente para a efetiva democracia, pois como

afirma Arretche “É a concentração de princípios democráticos nas instituições

políticas de cada nível de governo que define seu caráter, e não a escala ou âmbito

das decisões.” (ARRETCHE 1996, p. 48): De forma que a simples transferência de

poder do Estado para outros níveis de governo não garante a descentralização.

No campo dos recursos hídricos a descentralização e a maior participação

da sociedade civil nas instâncias decisórias foi estabelecida pela Lei Federal 9.433

de 08/01/97, que em seu sentido mais amplo, representa a descentralização de

ações contra a concentração de poder. Tal princípio aponta a passagem de um

modelo burocrático e despolitizado de gerenciamento, que menosprezou os

objetivos relacionados ao uso múltiplo das águas e a qualidade, para um modelo

que pretende ser inclusivo e socialmente participativo.

Apesar do cenário político se apresentar como desalentador, a temática

ambiental assumiu importante papel potencializando ações e articulações com o

poder público, para em parcerias pensarem um novo modelo de gestão ambiental.

Um exemplo dessas conquistas foi a legitimação das associações e Organizações

Não-Governamentais – ONGs, que tem entre suas finalidades a proteção ao meio

ambiente e responsabilidades como autoras de ação civil.

A literatura especializada sobre análise de políticas públicas no Brasil,

demonstra como a política ambiental possibilitou novos arranjos institucionais:

É inquestionável que o ”descobrimento“ da proteção ambiental como uma política setorial peculiar levou a transformações significativas dos arranjos institucionais em todos os níveis de ação estatal. Por outro lado, em conseqüência da tematização da questão ambiental, novos atores políticos (associações ambientais, institutos de pesquisa ambiental, repartições públicas encarregadas com a preservação ambiental) entraram em cena, transformando e reestruturando o processo político. (FREY, 2000, p. 217)

Com a promulgação da Constituição de 1988, o direito ao meio ambiente

adquiriu status dos demais direitos e garantias fundamentais, estabelecendo a todos

os cidadãos o direito ao meio ambiente, ecologicamente equilibrado, assim como,

responsabilizando o Poder Público e a coletividade o dever de defendê-lo para as

presentes e futuras gerações (BRASIL, 1988).

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O meio ambiente uma vez conquistado o direito constitucional, tem

mobilizado a sociedade civil, o governo nacional assim como, os organismos

internacionais a adotarem instrumentos de gestão que possibilitem sua preservação.

A conjugação de esforços, no sentido de promover a gestão das águas, de

forma a respeitar os princípios do uso múltiplo, através de um gerenciamento

intersetorial, possibilitou a construção de um novo paradigma dos recursos hídricos.

A água deixa de ser considerada exclusivamente uma questão técnica, exterior à sociedade, um recurso infinito e de exclusiva competência dos peritos. A legislação propõe uma política participativa e um processo decisório aberto aos diferentes atores sociais vinculados ao uso da água, dentro de um contexto mais abrangente de revisão das atribuições do Estado, do papel dos usuários e do próprio uso da água. (GUIVANT e JACOBI, 2003. p. 01)

O paradigma emergente estimula a participação pública dos usuários

governamentais e não-governamentais a fazer parte da construção dos processos

de coordenação, decisão e resolução de conflitos. Sua implementação exige

[...] mais responsabilidade e controle local, mais conhecimento, mais participação, maior capacidade por parte dos usuários, mais uso de tecnologia de informação e dos instrumentos financeiros e mais reforço na educação e fornecimento de valores corretos para o gerenciamento das águas. (GRIGG APUD VICTORINO, 2003, p.17).

1.2 DEMOCRACIA E PARTICIPAÇÃO SOCIAL

Para Bobbio (1997) a democracia tende a se desenvolver quando ocorre,

[...] uma democratização da sociedade civil, através da conquista dos centros de poder da sociedade civil por parte dos indivíduos sempre mais e melhor participantes [...], fazendo com que o poder não seja apenas distribuído, mas, também controlado. (BOBBIO, 1997, p. 61)

A Constituição Brasileira de 1988, conhecida como a “Constituição Cidadã”

estabeleceu em seu artigo Iº, parágrafo único, que “Todo poder emana do povo, que

o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta

Constituição.” Muito embora tenha repetido a moderna concepção de Estado, ela

introduz um novo elemento, que é a idéia de participação popular.

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Os avanços obtidos ao longo do processo de transição de um modelo

autoritário, para o atual modelo participativo, foram resultantes de processos

históricos, frutos de lutas dos movimentos sociais7 e demandas da sociedade que

culminaram na conquista de direitos civis e sociais como deveres do Estado e

efetivados sob a forma de políticas públicas.

Nesse sentido, essa conquista estabeleceu as bases para a democratização

da sociedade, para a participação cada vez mais efetiva dos indivíduos de forma a

garantir que o poder seja distribuído e controlado dentro dos marcos da democracia

participativa.

A participação cidadã ocorre em geral quando surge alguma demanda e esta

passa a ser reivindicada. Nesse sentido, o modelo de participação social adotado no

Brasil nas últimas décadas, foi resultante de um longo processo histórico de lutas

sociais, que culminaram com a redemocratização do País.

A participação da sociedade civil como possível agente de transformação

social é reconhecida por ampla literatura, a exemplo de Jacobi (2002); Dagnino

(2004) e Melucci (1994). Para esses autores, mudanças estruturais na sociedade

são compreendidas como condições fundamentais, para que efetivamente ocorram

reformas na sociedade de forma a diminuir as assimetrias sociais tornando-a mais

igualitária e menos excludente. Nesse sentido, a participação de atores sociais

conscientes e politicamente engajados, representa uma forma de assegurar os

direitos constitucionais e garantir espaço de lutas por transformações que atendam

às demandas da sociedade como um todo e não apenas a interesses isolados.

Para Sell (2003), [...}” seja através de sua ação diante do poder público, seja

através das suas articulações em forma de fóruns, a sociedade civil é vital para a

construção da esfera pública e para a promoção da democracia participativa”. (SELL

2003, p.26), O autor enfatiza que a contribuição da sociedade civil na promoção da

democracia participativa é importante, haja vista, que os atores interagem com o

Estado na busca de soluções para os problemas sociais.

Segundo Jacobi (2002, p. 445-445) apesar da participação social ainda

permanecer mais “no plano da retórica do que na prática”, ela representa a

possibilidade de transcender o instituído rompendo com práticas centralizadoras e

patrimonialistas.

7 Importante contribuição sobre a relação Estado / Movimentos Sociais Urbanos encontra-se na obra de Jacobi (1993).

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Sobre essa questão Martins (1994) aponta que, no Brasil, existe a tradição

de práticas clientelistas que assumem feições variadas. Entretanto, todas tendo por

fundamento a “[...] política do favor, base e fundamento do Estado brasileiro, que

impede a distinção entre o público e o privado.” (MARTINS 1994, p. 20)

A cultura política patrimonialista, historicamente impregnada na formação da

população brasileira remonta à própria colonização do País. Sodré (1999) ao

analisar as idéias de D. Pedro no “Livro da Virtuosa Benfeitoria” considera que:

O notável em todo esse texto é que graças a ele, pode-se tomar contato com uma fonte ideológica do estado patrimonialista português nascente que coloca sem rodeios e com tintas filosóficas, no centro da argumentação, a categoria do favor privilegiado, persistente até hoje como forma social na vida brasileira. (SODRÉ,1999, p.71-72)

Nesse sentido, romper com uma cultura que transformou o aparato estatal

em uma extensão do poder do soberano, e que se consolidou como prática social ao

longo da história brasileira requer sua desconstrução em todas as instâncias.

Para Gohn (2003) na década de 1980, a conquista de canais de participação

popular8 em questões relacionadas à coisa pública colocou os atores sociais em

novas arenas de luta, de forma que, com as novas práticas, também vieram as

limitações, as dificuldades e as exigências. Nessa época o ideal de participação

popular tinha como premissa básica sua incorporação no planejamento

administrativo, “[...] desde que se considerasse o planejamento de forma diversa da

que predominou durante os anos 1970, ou seja, que ele não se realizasse de cima

para baixo nem de fora para dentro.” (GOHN, 2003, p. 54).

Conforme a autora,

Várias dessas dificuldades decorriam de problemas enraizados na própria cultura política nacional, em que predominam valores como o clientelismo; o paternalismo; o método de resolução de negócios públicos por meio de procedimentos diretos, privilegiando interesses particulares; a descrença na eficácia das leis, porque usualmente, elas só são aplicadas aos pobres e fracos como mecanismo punitivo; a mania nacional de uso da “lei de Gerson”, de só levar vantagem; o machismo predominante nos países de cultura luso- espanhola; e a

8 A década de 1980, a despeito da desvalorização da mídia sobre esse período representa um importante marco na constituição de um campo democrático no seio da sociedade civil, formado por movimentos populares; movimentos pluriclassistas; por lideranças sindicais; parlamentares e partidos políticos oposicionistas; por entidades profissionais comprometidas com a democracia e por ONGS. (GOHN, 2003, p. 53).

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valorização das estruturas corporativas, nos aspectos de vícios e privilégios que elas carregam etc. (GOHN, 2003, p. 52-53)

Duas formas de participação se formaram ao longo dos anos 1980, a dos

conselhos populares cujos princípios se fundavam na participação direta, e a dos

conselhos comunitários e outros, que eram articulados pelos poderes públicos, de

acordo com critérios de representatividade subjacente a participação indireta

(GOHN, 2003)

A ascensão política por partidos de oposição às elites tradicionais

brasileiras, em várias cidades e em alguns estados, no final dos anos 1980,

possibilitou

[...] requalificar a temática da participação em outras dimensões, que dizem respeito ao aprofundamento da democracia; à construção de um novo paradigma; às ações coletivas baseadas na categoria da cidadania; e à construção de novos espaços de participação, lastreados não em estruturas físicas, mas em relações sociais novas que se colocam entre o público e o privado, originando o público não- estatal. (GOHN, 2003, p. 53)

De acordo com a autora nos anos de 1990, essas duas formas de

participação iriam se entrecruzar em novas redes associativas, “[...] cedendo lugar a

novas denominações: participação cidadã e participação social.” (GOHN, 2003, p.

56).

A abertura da gestão pública à participação da sociedade civil requer

portanto, o fortalecimento do espaço público e mudanças qualitativas na relação

Estado/ sociedade civil.

Conforme Jacobi (2001) e Gohn (2003) muitos desafios precisam ainda ser

superados, para que haja efetivamente mudanças que possibilitem a transparência e

a efetividade nestes novos espaços de gestão.

[...] um dos maiores desafios de uma proposta ampliada é o de garantir a definição de critérios de representação, de forma a impedir tanto a sua manipulação por grupos guiados por interesses particularizados, como a possibilidade da sua instrumentalização pela administração pública. (JACOBI, 2001, p. 447)

A moderna concepção de participação social traz em sua interioridade a

ampliação da base social e política de forma a proporcionar a inclusão de atores

historicamente segregados a um processo democrático de ampliação da cidadania.

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Na última década o termo participação passou a fazer parte dos discursos

governamentais, agências internacionais de desenvolvimento e ONGs. A imprecisão

no conceito tem sido questionada, principalmente na literatura recente sobre

desenvolvimento sustentável. Autores como Mousse (2001); Jacobi (2003) e Gohn

(2003), assinalam que os responsáveis pela formulação de planos de

desenvolvimento, políticas ou legislações nem sempre explicitam de quem será a

participação, haja vista, que ela não contempla da mesma forma todos os membros

de uma comunidade. Uma outra dificuldade apontada refere-se à tendência em

pressupor que as relações de poder do saber dos técnicos e peritos, se diluiriam

magicamente no contato com os setores leigos (JACOBI, 2003).

No Brasil, a participação dos cidadãos na definição das políticas públicas

está sendo implementada de forma mais efetiva, através dos conselhos e do

orçamento participativo. Atualmente, o repasse de recursos federais para estados e

municípios se dá via Conselhos, de forma que sua constituição tornou-se condição

legal para esses repasses.

De acordo com Moreira apud Tatagiba (2002),

[...] os conselhos, são órgãos concebidos para influir constitutivamente na vontade normativa do estado, mediante o exercício de competências conferidas pelas respectivas leis criadoras, que devem trazer as linhas definidoras de seu campo de atuação. Não podem os conselhos deliberar sobre matérias que extrapolem os setores das políticas sociais sob sua responsabilidade, nem sobre questões que extravasem o âmbito da esfera de governo onde foram criados e das atribuições que lhes foram conferidas [...] os conselhos constituem-se em instancias e caráter deliberativo, porém não executivo; são órgãos com função de controle, contudo não correcional das políticas sociais, á base de anulação do poder político. O conselho não quebra o monopólio estatal da produção do Direito, mas pode obrigar o Estado a elaborar normas de Direito de forma compartilhada [...] em co-gestão com a sociedade civil. [...] Os conselhos devem se deter, também sobre medidas que visam ao reordenamento institucional dos órgãos da administração pública responsável pela execução das políticas sociais dentro de seu campo específico de intervenção [...] se tais medidas implicarem alterações de competência privativa do chefe do Executivo, ou de seus auxiliares diretos, dependerão de homologação por essas autoridades públicas. Tudo o mais que tenha caráter de adequação ou reorientação e que expresse o exercício de competência prevista na lei de sua criação não necessita de homologação (execução feita às deliberações dos conselhos de saúde [...]. (MOREIRA APUD TATAGIBA, 2002, p. 65)

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Diversos autores têm apontado os desafios para a implementação desses

conselhos. Dentre eles, Gohn (2003) assinala que:

A existência de concepções oportunistas, que não se baseiam em princípios democráticos e vêem os conselhos apenas como instrumentos para operacionalizar objetivos predefinidos tem feito dessa área um campo de disputa e de tensões. (GOHN, 2003, p. 90)

A mesma autora aponta ainda que muito embora a lei federal preconize o

caráter deliberativo a esses Conselhos, na prática, entretanto, vários pareceres

oficiais têm assinalado caráter estritamente consultivo, diluindo, portanto, seu poder

de deliberação ou decisão.

Como se percebe há um longo caminho a ser conquistado para que o direito

garantido na Constituição de 1988 transcenda o instituído e se concretize

materialmente. Nesse sentido, enquanto construção social a democracia precisa ser

reinventada pelos sujeitos da história, na busca de uma “[...] nova qualidade de

cidadania que institui o cidadão como criador de direitos para abrir novos espaços

de participação sociopolítica.” (JACOBI, 2003, p. 443).

Segundo Dagnino (2004) a nova dimensão da cidadania pressupõe por um

lado à presença de cidadãos enquanto sujeitos sociais ativos e, de outro lado, para a

sociedade, um aprendizado de convivência com estes atores que se rebelam contra

a estratificação que lhes foi conferida social e culturalmente

Em relação à gestão dos recursos hídricos Jacobi (2002) aponta que as

experiências de gestão participativas possuem várias potencialidades: “[...] reforçam

o significado da publicização das formas de decisão e de consolidação de espaços

públicos democráticos [...]”, representam um “[...] processo pedagógico e informativo

de base relacional [...]”, bem como “[...] a capacidade de multiplicação e

aproveitamento do potencial dos cidadãos n o processo decisório dentro de uma

lógica não cooptativa.” (JACOBI, 2002, p. 2)

No Brasil, a construção de espaços participativos é bastante recente. A

Constituição de 1988 reconheceu a necessidade de “[...] complementaridade entre a

representação política tradicional e a participação popular diretamente exercida.”

(JACOBI APUD BENEVIDES, 1991, p. 26). Essa conquista possibilitou o surgimento

de atores sociais ativos e, em termos de sociedade, um processo de aprendizado de

cidadania. Em decorrência desse duplo movimento: transição pós-democrática e

pressão da sociedade civil foram sendo criados espaços públicos de interação e

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principalmente de negociação. Nesse quadro de mudanças, a participação social

surge como potencializadora de rupturas e tensões. E as práticas participativas

juntamente com uma “[...] mudança qualitativa de gestão, assumem visibilidade

pública e repercutem na sociedade.” (JACOBI, 2003, p. 275).

Nesse sentido, a reforma do Estado trouxe no bojo de suas propostas, uma

maior participação da sociedade civil na elaboração das políticas públicas e nos

espaços de gestão com atribuições consultivas e deliberativas. Há, entretanto

autores9 que vêem na reforma do Estado, condicionantes do neoliberalismo

compreendido como modelo dominante assentado nas idéias de flexibilidade e

liberalização dos mercados; prioridade ao crescimento econômico e à

competitividade; intervenção mínima do Estado no pressuposto de que o mercado é

eficiente; bem como a privatização dos serviços públicos como água, saúde,

educação, segurança, energia, etc. (SANTOS, 2002).

Uma das principais conquistas da participação da sociedade nos processos

de gestão é a co-responsabilidade no gerenciamento dos bens públicos, o que torna

possível a substituição de antigas e arraigadas práticas de clientelismo e corrupção.

No decorrer do processo de execução do projeto desta pesquisa, com as leituras

realizadas, foram surgindo alguns questionamentos em relação à participação dos

representantes do Comitê de Bacia do Itajaí, enquanto atores sociais e políticos:

Quais as representações sociais dos membros do Comitê frente aos problemas

hídricos? Como conciliam interesses antagônicos no contexto de uma participação

ampliada?

A partir destas considerações teóricas, propõe-se na presente pesquisa

analisar o potencial democrático e os limites para a democratização do Comitê de

Gerenciamento da Bacia Hidrográfica do Itajaí. Para tal, tem-se como objetivos

específicos:

a) compreender a representação social que os membros do Comitê

possuem sobre a questão dos recursos hídricos;

b) identificar as principais dificuldades e obstáculos para uma gestão

participativa;

9 Sobre esse assunto ver Soares (2001), Cunill (1998).

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1.3 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS

A presente trata-se de uma pesquisa qualitativa. Para Minayo (1998), o

universo da pesquisa qualitativa transcende a captação dos fatos e as regularidades

atemporais. Conforme assinala a autora:

Ela se preocupa nas Ciências Sociais, com um nível de realidade que não pode ser quantificado. Ou seja, ela trabalha com o universo de significados, motivos, aspirações, crenças, valores e atitudes, o que corresponde a um espaço mais profundo das relações, dos processos e dos fenômenos que não podem ser reduzidos à operacionalização de variáveis. (MINAYO, 1998, p. 21)

Por ser um enfoque qualitativo buscou-se através de entrevistas semi-

estruturadas (Apêndice 1) coletar informações sobre o que pensam os atores sociais

sobre questões relacionadas ao Comitê e aos recursos hídricos. Essa técnica

possibilita ao investigador uma maior flexibilidade e suscetibilidade de reorientação

das perguntas no decorrer do processo da entrevista.

Para o cumprimento dos objetivos propostos, foram utilizados como recursos

metodológicos, além do levantamento bibliográfico sobre o tema, a análise das atas

de reuniões do Comitê referente ao período de sua criação (1998), até o ano de

(2005)10. Justifica-se a leitura das atas para compreender a necessidade de

reorientação de novos objetivos face à complexidade da bacia.

Os sujeitos da pesquisa compõem-se dos representantes das categorias:

usuários da água; sociedade civil e órgãos públicos membros do Comitê de Bacia do

Itajaí. No total foram entrevistados 11 representantes, sendo que dois são ex-

integrantes do Comitê. Foi entrevistado também o superintendente da Fundação do

Meio Ambiente de Navegantes – FUMAN e coordenador municipal da campanha

Semana da Água 2005, lançada pelo Comitê. Os entrevistados foram:

� representante das Indústrias de Carnes e Derivados do Estado de Santa

Catarina e vice-presidente do Comitê;

� representante da Companhia de Águas e Saneamento – CASAN;

� representante do Serviço Municipal de Água, Saneamento Básico e Infra-

estrutura – SEMASA;

10 Até agosto de 2005, só estavam disponíveis no site do Comitê as atas referentes aos anos de 1997 a 2004.

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� representante da Central Elétrica do Estado de Santa Catarina –

CELESC;

� representante da Câmara dos Vereadores;

� representante da Empresa de Pesquisa e Extensão Agrícola de Santa

Catarina – EPAGRI;

� representante do Sindicado Rural;

� ex-representante do Sindicato da Pesca;

� ex-representante da Fundação de Amparo ao Meio Ambiente de Itajaí –

FAMAI;

� representante da Associação Nacional de Amparo ao Meio Ambiente –

ANAMA;

� representante da UNIVALI.

Em 2004 e 2005 tive a oportunidade de participar de três reuniões do Comitê

que foram realizadas na cidade de Itajaí. O Comitê tem sua sede na cidade de

Blumenau, entretanto realiza suas reuniões de forma itinerante em diferentes

cidades localizadas no âmbito da bacia.

Para o trabalho de pesquisa muitos foram os entraves e dificuldades para

realizar as atividades propostas, dentre os quais salientam-se: a falta de interesse

dos representantes para participar da pesquisa; dificuldades para contatá-los,

agenda de reuniões do Comitê publicada através do site, desatualizada, assim como

dificuldade em agendar as entrevistas devido às atividades laborativas de alguns

representantes.

A coleta de dados 11foi realizada nos meses de agosto, outubro e dezembro

de 2004, e abril, maio e junho de 2005. No decorrer da coleta dos dados, foram

respeitados os preceitos éticos em relação aos sujeitos pesquisados, instituições e

resultados apurados, mantendo-se o anonimato dos informantes.

Para a realização da pesquisa de campo foi encaminhado ao Comitê de

Bacia do Itajaí ofício apresentando os objetivos desta pesquisa. Depois da

apresentação e defesa pública da dissertação o conhecimento produzido nesta

pesquisa será devolvido às suas bases. A disponibilidade, abertura e confiança dos 11 Dentre as inúmeras dificuldades apresentadas durante o período de coleta de dados, a mais significativa foi a nosso ver, a forma quase dogmática e praticamente exclusiva com que é tratado o Comitê do Itajaí.Neste sentido, o Comitê do Itajaí enquanto espaço descentralizado e aberto a participação popular e a produção do conhecimento tem sido equivocadamente utilizado como “laboratório experimental particular”, por pessoas que exercem importantes funções junto ao Comitê e a universidade local.

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entrevistados depositados nesta pesquisadora, faz com que se respeitem suas

idéias, convicções, enfim, suas condições de pessoas que se constituíram

historicamente e lhes ofereçam o conhecimento e reflexões somente possíveis de

serem produzidos a partir do saber originado em suas vivências.

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CAPÍTULO II

A SITUAÇÃO DOS RECURSOS HÍDRICOS NO MUNDO

No último quartel do século XX as conquistas da humanidade ultrapassaram

barreiras até então pensadas como intransponíveis.

O homem no final do século XX e início do XXI ultrapassou limites espaciais,

geográficos, políticos, econômicos, físicos e biológicos, alcançando o apogeu, em

pesquisas científicas sobre o genoma humano e nas comunicações.

O novo milênio encontra-se desta forma, sob o signo da crise de concepções

e paradigmas nos campos da ciência, da cultura e da própria sociedade, abrindo

assim, um vasto campo de possibilidades, caracterizando esse período como o das

grandes revoluções tecnológicas e científicas.

Marcadamente, o século XX, é considerado ainda como aquele em que a

humanidade passou a viver sob o signo da globalização, da economia on line, da

dissolução de fronteiras, e até mesmo da própria autonomia nacional.

No atual momento histórico de inflexão da modernidade, o mundo vivencia

um processo de transição, em que todas as instituições construídas na primeira

modernidade passam por profundas transformações.

Instituições como o Estado-Nação baseado na soberania de suas

instituições políticas sobre um território e uma cidadania definida por tais instituições,

são analisadas cada vez mais como construções obsoletas da primeira

modernidade.

Entretanto nas fendas desse construto histórico, começam a florescer novas

formas de relações políticas, sociais e ambientais, com a participação da sociedade

na defesa da biodiversidade e na busca de um modelo civilizatório mais eqüitativo,

socialmente justo e ecologicamente sustentável.

Nesse sentido, é também o tempo em que se intensificaram as lutas para se

equacionar um dos grandes desafios contemporâneos: o de promover a gestão dos

recursos hídricos de forma a propiciar o crescimento econômico com eqüidade

social, garantindo a atual e as gerações futuras o acesso a estes recursos.

Na última década importantes teóricos sociais contemporâneos como Beck

(2002) e Anthony Giddens (1991) consideraram o conceito de risco12, principalmente

12 Para um estudo mais aprofundado ver Beck (2002) e Giddens (1991).

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os ambientais e tecnológicos como peças fundamentais para o entendimento das

características, limitações e transformações do projeto da modernidade.

Historicamente a água tem sido objeto de apropriações tanto econômico,

cultural, quanto político. Entretanto apesar de sua essencialidade, apenas nas

últimas décadas do século XX e início do XXI, é que a água começou a ser discutida

de forma quase hegemônica, dominando os meios acadêmicos, de comunicação de

massa e da política nacional e internacional, como um alerta de que o acesso à

água potável nos próximos anos será uma questão crucial para a sobrevivência

humana.

A água é um dos elementos vitais para a existência de todas as espécies de

vida no planeta. Apesar de sua essencialidade para a vida ela ainda é tratada com

descaso como se esse recurso por ser renovável fosse inesgotável.

A água doce existente no mundo tem sofrido impactos provenientes de

fatores como o crescente aumento de consumo gerado por processos e técnicas

agrárias e industriais, crescimento demográfico e diversas formas de poluição e

degradação ambiental. Nesse sentido, a disponibilidade de água doce que garanta o

desenvolvimento da vida no planeta está qualitativamente e quantitativamente cada

vez mais comprometida.

A situação é tão drástica e os prognósticos da qualidade desses recursos de

tal gravidade, que políticas específicas de gestão da água vêm sendo instituídas, por

países e organismos internacionais, na busca de uma aliança de todos aqueles que

compreendem a necessidade de trabalhar para a conservação da qualidade da

água, administrando de forma a contemplar seus múltiplos usos e atender a

demanda de forma socialmente justa.

No Brasil, a promulgação da Lei 9.433/97, também conhecida como a Nova

Lei dos Recursos Hídricos, trouxe a possibilidade de se construir e consolidar

políticas mais incisivas e abrangentes, incorporando essa nova dimensão em suas

diretrizes.

A água doce não obstante ser de fundamental importância para o bem-estar

e o desenvolvimento humano, assim como o de todos os ecossistemas, é também

um recurso natural fundamental para o desenvolvimento socioeconômico. Os

recursos hídricos não se encontram distribuídos de maneira uniforme no mundo.

Apesar de ser um elemento presente em cerca de 70% da superfície terrestre,

aproximadamente 97% é constituída de água salgada. Os restantes 2,5% são de

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água doce, sendo que três quartos encontram-se no estado sólido sob a forma de

gelo nos hemisférios polares13.

Conforme previsão da Organização das Nações Unidas – ONU, estima-se

que em 2025 dois terços da população mundial sofrerá com a escassez de água.14

As estimativas indicam que ainda em meados deste século, cerca de dois bilhões de

pessoas em 40 países sofrerão com a escassez de água. Dowdeswell (1996)

considera que estes números podem chegar a sete bilhões de pessoas.

Dowdeswell (1996) analisa que as razões para a escassez de água doce

decorrem do aumento da demanda populacional sobre os recursos de água potável,

o alto nível de contaminação e a demanda para satisfazer a vertiginosa expansão

industrial e agrícola. A situação é paradoxal, uma vez que durante o século XX, o

consumo mundial aumentou nove vezes, enquanto a provisão de água doce

existente na natureza permaneceu relativamente constante.

Conforme a autora, a escassez, terá conseqüências mundiais: “Las

consecuencias de esta escassez se harán sentir sobre todo en las regiones costeras

en rápido crescimento así como en las megalópolis en el mundo en desarrollo.”

(DOWDESWELL, 1996, p. 3).

Ao longo dos anos as diferentes formas de poluição e deterioração do meio

ambiente, causadas pela implementação progressiva de atividades econômicas sem

a realização de um planejamento sustentável, tem contribuído de forma sistemática

para impactar a qualidade de água doce na natureza.

Conforme dados da ONU (2002) o significativo adensamento nas cidades, o

desperdício da água, a impermeabilização dos solos, a poluição dos corpos de

água15 e a degradação da capacidade produtiva dos mananciais, são indicativos de

um estresse sobre os recursos hídricos.

Atualmente, mais de 50% da população mundial vive em áreas urbanas.

Conforme estudos realizados em 2002 pela Coordenação de Pós-Graduação e

Pesquisa em Engenharia – COPPE da Universidade do Rio de Janeiro, e pesquisa

divulgada em 2003, pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE, o

Brasil perde cerca de 46% da água que é coletada, num total de aproximadamente

5,8 bilhões de metros cúbicos por ano, suficientes para abastecer países como a

13 Departamento de Informação Pública da ONU, DPI/2293B, dez./ 2002. 14 Ibidem. 15 Corpo d’água – expressão utilizada para indicar qualquer rio, córrego, riacho, fonte, lago, lagoa, aqüífero ou brejo.

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França, Suíça, Bélgica e o Norte da Itália juntos, por aproximadamente um ano.

Enquanto a Europa tem índices de perdas em torno de 10%, no Brasil, a perda de

água por vazamentos, roubos, etc., está muito acima da média de países

desenvolvidos e de outros em desenvolvimento.

No Brasil, a cultura do desperdício, aliada aos escassos investimentos em

pesquisas e tecnologias tem contribuído para agravar ainda mais a disponibilidade e

a qualidade da água própria para consumo.

O “Documento de Introdução-Plano Nacional de Recursos Hídricos”

(BRASIL, 2004, p.17), confirma a falta de investimentos e a precariedade do setor

haja vista que ”[...] os sistemas de coleta, tratamento e distribuição de água do País,

parte importante deles antigos e com sérios problemas de manutenção, acumulam

perdas que variam entre 40 a 60% do total de água tratada.” Conforme dados da

ONU constantes no Plano Nacional de Recursos Hídricos (2004) atualmente, cerca

de um bilhão de pessoas no mundo encontram-se alijadas do acesso regular de

água doce, assim como mais de um terço da população mundial não possui sistema

de saneamento básico. Estima-se que aproximadamente cinco milhões de pessoas

morrem todos os anos vítimas de doenças relacionadas à veiculação hídrica, ou

seja, água contaminada.

A Organização Mundial de Saúde – OMS, revela que no Brasil cerca de 65%

das doenças são causadas pela falta de saneamento ambiental nas cidades.

De acordo com estudos realizados em 2002, pela COPPE/UFRJ, estima-se

que 60% das internações em hospitais públicos são causadas por doenças

relacionadas à veiculação hídrica.

De acordo com Novaes (2003) a taxa de mortalidade infantil mundial,

relacionadas ou agravadas pela falta de saneamento chegou a 2,2 milhões de

casos, no ano de 2000.

De acordo com o ‘’Documento de Introdução ao Plano Nacional de Recursos

Hídricos” (BRASIL, 2004) estima-se que, no Brasil, cerca de 90% dos esgotos

domésticos e 70% dos efluentes industriais são lançados in natura nos rios,

córregos, nascentes, lagoas e oceanos, constituindo-se em um veículo de

proliferação de doenças infecciosas e parasitárias, além de promover intensa

degradação ao meio ambiente.

Costa (2003) analisando a situação dos recursos hídricos brasileiros alerta

que:

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[...] praticamente todos os rios que cruzam as áreas urbanas do país apresentam elevados índices de poluição, provocando graves problemas de saúde para as populações carentes, causando danos ambientais e elevando os custos do tratamento das águas para os usuários a jusante. (COSTA, 2003, p.2).

Novaes (2003) aponta que, atualmente, são despejados nos cursos de água

“[...] mais de dois milhões de toneladas diárias de lixo (doméstico, industrial, químico,

rural)”.(NOVAES 2003, p. 01) Deste total, os esgotos sanitários domésticos

contribuem com aproximadamente 1.500 km3/dia. Segundo estimativas baseadas

nos dados do autor acima citado, calcula-se que cada litro de esgoto polua sete litros

de água, perfazendo um total de 12 mil km3 diários de água contaminada.

Castro (1998) analisa os impactos negativos decorrentes da falta de acesso

aos serviços de água e saneamento. Conforme o autor a carência desses serviços

impede às pessoas de participarem plenamente da vida social, pública e econômica

de sua comunidade.

No es possible ejercer los derechos de um ciudadano pleno cuando no se disfrutam de las mínimas condiciones de vida, cuando la salud de las famílias es dizimada por enfermedades prevenibles, y cuando una parte sustancial del tiempo, de la energia física y del ingresso disponibles deben emplearse en una actividade tan básica como la obtencion de agua. (CASTRO, 1998, p.10).

Como se percebe a água entrou na arena mundial não apenas para

questionar os valores: econômico, estético, ou cultural, mas acima de tudo seus

componentes éticos e sociais, fundamentais para o pleno exercício da cidadania e

da soberania dos povos.

O Brasil detém uma das maiores redes hidrográficas do planeta, além de

possuir uma das maiores reservas de águas subterrâneas. Entretanto toda esta

relativa riqueza hídrica não se encontra distribuída de maneira uniforme no território

brasileiro.

A distribuição regional diferenciada dos recursos hídricos no território

brasileiro revela contrastes e distintas realidades geográficas, econômicas, sociais e

culturais engendradas dentro de um mesmo país.

Enquanto que a Amazônia concentra cerca de 70% dos recursos hídricos do

País, com uma população em torno de 7% da população brasileira a região Sudeste

concentra 42% da população com apenas 6% da reserva hídrica.

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Costa (2003) pondera que a bacia Amazônica é a região de maior

abundância de recursos hídricos do País. Apesar de contar com baixa densidade

populacional e ausência de concentrações humanas de grande porte, já são

detectados problemas, ainda que pontuais, de contaminação por esgotos

domésticos, principalmente nas cidades de Belém e Manaus, pela extração de

minerais como o mercúrio utilizado nos garimpos e o desmatamento florestal com a

conseqüente erosão e perda das camadas férteis do solo.

O autor alerta ainda que na região brasileira, a jusante da bacia, já é

possível detectar sinais de poluição decorrentes de atividades desenvolvidas nos

países de montante16, como por exemplo, o “[...] mercúrio, utilizado nos garimpos,

além de agroquímicos conservativos amplamente utilizados nas plantações de

coca.” (COSTA, 2003, p. 10).

Apesar de contar com rico cenário natural o Brasil enfrenta sérias

dificuldades em gerenciar seus recursos hídricos. A falta de planejamento e de

cuidados com os recursos hídricos não se resume ao seu uso para determinadas

atividades como na geração de energia ou da agricultura intensiva, mas também se

reflete nas diversas formas de poluição e degradação do meio ambiente.

A preocupação com as questões de planejamento e gestão dos recursos

hídricos foi apresentada num documento divulgado pelo secretário de recursos

hídricos do Ministério do Meio Ambiente no Fórum Mundial da Água em Haia17 em

2000. Este documento18 traz um panorama dos recursos hídricos até o ano 2025,

apresentando uma séria preocupação com relação às questões de planejamento e

gestão dos recursos hídricos.

As evidências sugerem que se medidas em curto, médio e longo prazo não

forem consideradas como prioridades, abordando a questão da água de forma

integrada, e com a participação de distintos grupos sociais e organismos nacionais e

16 Termo que se refere a uma área geográfica ou um ponto que fica acima de outro ao se considerar um fluxo d’água. O contrário é jusante (glossário do Documento de Introdução ao Plano Nacional de Recursos Hídricos, 2004). 17O Fórum Mundial da Água tem como objetivo discutir as ações tomadas por diversos países para implantar o manejo integrado dos recursos hídricos, assim como a busca de soluções que possibilitem à comunidade internacional atingir os objetivos da Declaração do Milênio realizada em 2000, em Nova Iorque, durante a 55ª Sessão das Nações Unidas e os da Cúpula Mundial sobre Desenvolvimento Sustentável, realizada em 2002 em Johanesburgo. O I Fórum realizou-se em 1997, em Marraquech, Marrocos e o II Fórum em Haia, Holanda, em 2000. O III Fórum Mundial da Água ocorreu simultaneamente em três cidades japonesas (Kyoto, Shiga e Osaka) em 2003. 18 Documento disponível em: http:www.ambientebrasil.com.br. Acessado em: 12 mar. 2004.

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internacionais, a provisão de água para grande parte da população mundial estará

seriamente comprometida.

Savedoff apud Castro (2003) considera que face à preocupante situação

mundial de escassez de água doce, em longo prazo, foram implementadas políticas

que priorizam medidas para combater os fenômenos de desertificação e poluição

que afetam os recursos hídricos e combatem a ineficiência da distribuição de água

nas zonas rurais e industriais.

Dentre o conjunto de medidas adotados por governos e instituições

multilaterais, a abertura da gestão da água ao setor privado surgiu,

[...] como esperança de que as empresas privadas ajudassem na gigantesca tarefa de atualizar, manter e expandir os serviços hídricos nomeadamente levar água e condições sanitárias salubres aos pobres e contribuir para o esbatimento das desigualdades sociais. (BANCO MUNDIAL, 200419).

A mercantilização da água tem sido objeto de análises e debates dos mais

acirrados e controvertidos.

No Brasil, a Conferência Nacional da Terra e da Água de 2004, que teve a

participação de milhares de pessoas e numerosas organizações da sociedade civil,

elaborou proposição ao governo para,

Garantir água e energia, dois bens estratégicos para a nossa soberania, sob controle e a serviço do povo brasileiro, acabando com a privatização e mercantilização destes bens e assegurando o direito á água e energia a toda população, especialmente a das regiões mais carentes. (MANIFESTO DA TERRA E DA ÁGUA 2004).20

Entretanto em 21/03/05, o Conselho Nacional de Recursos Hídricos aprovou

a proposta de resolução que introduz a cobrança pelo uso de recursos hídricos no

País. Na prática isso reflete a transformação do que deveria ser considerado como

patrimônio hídrico, e ser tratado como um bem inalienável de toda a sociedade, em

mercadoria, disponível apenas para aqueles que detêm capital econômico.

Nesse sentido, acredita-se que a água necessita ser gerenciada

democraticamente, de forma integrada dentro de um planejamento sustentável,

ancorado por políticas que respeitem a multiciplidade de seus usos. Que possa

19. O relatório do Banco Mundial encontra-se disponível em: http:www.obancomundial.org. Acessado em: 12 mar. 2004. 20 Disponível em: http:www.consciencia.net. Acessado em: 20 nov. 2004.

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assegurar a oferta de maneira eqüitativa, garantindo aos estratos sociais mais

vulneráveis economicamente o pleno acesso a esse recurso, e não conforme

princípios mercadológicos.

Como salienta Silva (2005) na década brasileira da água21 “[...] a taxa de

manutenção deixa de existir, a idéia de uso racional sustentável se fortalece, os

recursos hídricos se transformam em mercadoria e o Estado transfere

responsabilidades para a iniciativa privada.” (SILVA,2005, p.49).

Segundo Bava (2005), no Brasil, o processo de privatização dos serviços de

água e esgoto teve início em 2002, quando foi leiloada a Manaus Saneamento,

responsável por 96% das atividades da Companhia de Saneamento do Amazonas.

A empresa transnacional francesa Suez-Lyonnaise pagou cerca de R$ 180 milhões,

sendo que 50% desses recursos foram financiados pelo Banco Nacional de

Desenvolvimento Social – BNDS. Em apenas 14 meses de funcionamento, a

empresa recuperou os investimentos através das tarifas pagas pela população.

Castro (2003, p. 200) analisa que apesar dos crescentes esforços realizados

principalmente a partir da década de 1970,

[...] a batalha para desenvolver sistemas de gestão da água capazes de preencher o objetivo internacional de fornecer a cada indivíduo no planeta, água suficiente e de serem, em simultâneo, ecologicamente sustentáveis, economicamente viáveis e politicamente legítimos está á ser perdida em muitos países.

Conforme o autor nos países da América Latina e no México, os serviços de

abastecimento de água e de esgotos sanitários, assim como outras categorias de

direitos sociais, não têm recebido a devida atenção.

Castro (2003) considera que melhorar o acesso a e as condições sanitárias

de higiene é crucial para o pleno exercício da cidadania. Analisa também a

necessidade de se pensar na implantação de sistemas de gestão de água que

sejam social e ambientalmente sustentável, além de serem econômica e

democraticamente justificados.

21 A Década Brasileira da Água foi instituída através do Decreto Presidencial de 22 de março de 2005 pelo Presidente Inácio Lula da Silva. O ato apóia a resolução das Nações Unidas que definiu o período 2005-2015, como o Decênio Internacional para a Ação – Água, fonte de Vida, bem como atende a sugestão do Conselho Nacional dos Recursos Hídricos e demonstra a disposição do governo federal de priorizar os assuntos relativos à água e a construção do Plano Nacional de Recursos Hídricos (Disponível em: www.sulambiental.com.br. Acessado em: 25 ago. 2005.

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Atualmente, os recursos hídricos dada sua extrema sensibilidade frente à

exploração intensiva, necessitam de uma nova racionalidade, de uma nova cultura

de consumo, em que o cuidado, poupança, compartilhamento, democracia, não

sejam apenas simples palavras de retórica, mas, sobretudo, uma prática vivida na

cotidianidade.

Barlow & Clark (2003, p. 17), analisam o desmatamento florestal e a retirada

da mata ciliar como fatores determinantes para a “[...] falta de proteção e

manutenção da qualidade da água.”

Conforme os autores a destruição das matas ciliares e a poluição dos

mananciais afetam os rios e, comprometem drasticamente os lençóis freáticos. Os

autores alertam que a má distribuição da água contribui para aumentar a

desigualdade e a submissão social.

Um exemplo paradigmático dessa situação ocorre em regiões como o semi-

árido nordestino, onde o controle sobre a população é realizado pelos políticos

locais, através do fornecimento de água potável com os chamados carros-pipa.

Percebe-se, portanto, que a má distribuição de água acaba por servir aos

interesses particulares de grupos detentores de poder que se prevalecem do status,

para usurpar e excluir cidadãos de seus direitos fundamentais.

Castro (1998) considera a existência de

[...] redes de poder que se forman en torno al control del agua tanto al interior de las ciudades, así como también en las vinculaciones que estas mantienen con su entorno, constituyen un elemento central en cualquier modelo explicativo del acceso de la población a los servicios de agua. (CASTRO, 1998, p. 20)

Seguindo essa linha de pensamento, não se pode desconsiderar que na

questão da escassez da água, há também um forte jogo de poder que envolve

desde políticos locais até grandes empresas e agências internacionais.

Conforme o acordo firmado entre os 147 líderes mundiais presentes na

Cúpula Mundial sobre Desenvolvimento Sustentável22, realizado em Johanesburgo

em 2002, a sociedade contemporânea tem nesse primeiro quartel do século XXI, o

desafio de reduzir a porcentagem de pessoas que carecem do fornecimento regular

de água potável e do acesso ao sistema de saneamento apropriado.

22 Maiores informações da Cúpula Mundial sobre Desenvolvimento Sustentável que ocorreu em 2002 em Johanesburgo encontram-se disponível em: http://www.ecologie.gov.fr. Acessado em: 10 dez. 2004, e http://www.ambofrance.org.br. Acessado em: 10 dez. 2004.

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Longe de ser um problema exclusivo de países em desenvolvimento, a água

entrou, a partir do segundo quartel do século XX, na arena política nacional e

internacional como prioridade, chamando a atenção para uma nova consciência: a

de que o acesso à água doce enquanto recurso indispensável à vida e ao

desenvolvimento sustentável, necessita ser considerada enquanto um bem social

que transcende barreiras geográficas, econômicas e políticas. Por esse motivo

torna-se imprescindível procurar formas de tornar mais transparente a relação

existente entre política e cidadania, qualidade do ambiente e bem-estar humano,

entre equidade na distribuição dos recursos ambientais e igualdade de

oportunidades para todos.

O ideal de desenvolvimento sustentável exprime através dos seus princípios

a importância desse desafio. Um desafio que não pode ser inseparável dos ideais de

democracia e de justiça social. E que, portanto, passa pela participação da

sociedade civil nas instâncias decisórias, rompendo definitivamente com o processo

de decisões monolíticas e unilaterais predominantes em quase todos os países da

América Latina (VIOLA, et al.1996; JACOBI, 2003).

Nesse sentido, a participação da sociedade civil no planejamento de

políticas públicas direcionadas a sustentabilidade dos recursos hídricos, pode ser

considerada um fator importante para minimizar os impactos causados pela,

industrialização, agricultura e o crescente processo de urbanização que modificam o

curso natural dos rios, poluem suas águas, gerando problemas em regiões

consideradas estratégicas em quantidade e qualidade de água doce.

No Brasil, a situação dos recursos hídricos é preocupante. Vários segmentos

da sociedade civil se mobilizam contra o consumo desordenado de água e a

poluição das nascentes causadas pela ausência de esgotos domésticos e

industriais.

A Conferência Nacional dos Bispos do Brasil – CNBB23, teve como tema da

Campanha da Fraternidade de 2004, “Água Fonte de Vida”, com objetivo de

contribuir para que haja um debate em nível nacional para modificar artigos na Lei

dos Recursos Hídricos, incluindo no debate a fragilidade sobre a legislação para a

água da chuva e a gestão destes recursos.

23 Material disponível em: http://cnbb.org.br. Acessado em: 12 dez. 2004.

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O Relatório da Defensoria das Águas24 intitulado O Estado Real das Águas

no Brasil – 2003/2004, divulgado pela CNBB, alerta que nos últimos 10 anos,

quintuplicou a contaminação das águas dos rios, lagos e lagoas em todo o País. O

relatório foi elaborado em parceria com a Universidade Federal do Rio de Janeiro –

UFRJ, a partir do mapeamento de 35 mil denúncias de agressões ao meio ambiente

e de ações civis públicas transitadas em sentença.

De acordo com o estudo as principais fontes responsáveis pela

contaminação do meio ambiente são resultantes de material tóxico, provenientes das

atividades industriais e agroindustriais. O estudo fez o mapeamento de 20 mil áreas

contaminadas no Brasil, que expõem a população de entorno a sérios riscos de

saúde.

O documento alerta para a escassez de água para o consumo humano nos

próximos 10 anos, previstos, principalmente, para as regiões metropolitanas de São

Paulo, Rio de Janeiro e Belo Horizonte e que atingirá mais de 40 milhões de

pessoas (RELATÓRIO DA DEFENSORIA DAS ÁGUAS 2003/2004).

Em Santa Catarina, a qualidade da água doce pode ser considerada séria

não apenas nos centros urbanos, mas também nas áreas rurais, pelo lançamento de

efluentes industriais, uso excessivo de agrotóxicos, dejetos da suinocultura, esgotos

sanitários lançados nas redes hidrográficas de toda a região, erosão do solo

causada pelo desmatamento e retirada da mata ciliar.

O Relatório da Defensoria das Águas alerta também para a crescente

contaminação das águas do mar pelo despejo de esgotos domésticos e industriais,

na região costeira do País. Há 10 anos se verificava vestígios de poluição, pela

emissão de esgotos a cinco quilômetros da costa. Atualmente, se percebe que a

poluição já atingiu 50 quilômetros da costa. Há indícios de sério comprometimento

dos ecossistemas marinhos decorrentes da poluição dos mangues e faixa litorânea.

(RELATÓRIO DA DEFENSORIA DAS ÁGUAS 2003/2004).

A naturalização da escassez, da contaminação e dos conflitos de uso, tende

a criar no imaginário coletivo, a sensação de que não há nada que possa ser feito,

impedindo que se perceba que esta situação é passível de mudanças.

Nesse sentido, os Comitês de bacias, ONGs, órgãos públicos e distintos

segmentos da sociedade civil vêm somando esforços na discussão sobre a água,

24 Relatório disponível em: http://defensoriadaagua.org.br. Acessado em: 23 out. 2004.

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ressaltando problemas locais e de âmbito nacional, apontando suas conseqüências,

ressaltando a importância da água na economia e principalmente discutindo a

essencialidade da água para a sobrevivência de todas as espécies no planeta.

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CAPÍTULO III

LEGISLAÇÃO BRASILEIRA E POLÍTICAS PÚBLICAS DOS

RECURSOS HÍDRICOS: DA “HIDRO-TÉCNICA” À CRIAÇÃO DE UMA NOVA

INSTITUCIONALIDADE

O Código das Águas de 1934 (Dec. 24.643), foi o primeiro instrumento legal

a definir o direito de propriedade e de exploração dos recursos hídricos para o

abastecimento, a irrigação, a navegação, os usos industriais e a geração de energia.

Conforme Cedraz (2004) a crescente necessidade de iluminar as cidades,

assim como substituir os motores a vapor pelos elétricos nas indústrias fez com que

técnicos, políticos e cientistas buscassem meios de disciplinar racionalmente o uso

das águas. Diante dessa demanda o jurista Alfredo Valadão, juntamente com uma

equipe técnica elaborou o anteprojeto da Legislação do Código das Águas.

O trabalho foi iniciado em 1906, e concluído em 1908. Entretanto apenas em

1934 o Código foi promulgado, sob a denominação de “Código das Águas”.

Apesar de ser conhecido como um dos textos modelares do direito positivo

brasileiro, incorporando quase todos os dispositivos contidos nas leis consideradas

mais modernas da atualidade, percebe-se que sua atuação ficou restrita ao âmbito

técnico, priorizando os aspectos da quantidade, beneficiando os grandes usuários

de água, as hidroelétricas.

Constata-se, portanto, que a primeira regulamentação dos recursos hídricos

no Brasil, priorizava o aproveitamento da água para a produção de energia, de

acordo com o modelo de desenvolvimento do País: inicialmente, o fortalecimento do

setor agrícola e, posteriormente, a industrialização.

Cardoso (2003) ao realizar estudo sobre leis nacionais e internacionais em

relação aos recursos hídricos aponta que Pagnoccheschi faz o seguinte relato sobre

o período anteriormente citado:

Quando da promulgação do Código das Águas, em 1934, as atribuições e competências sobre os recursos hídricos eram afetas ao Ministério da Agricultura (MA). Isso, de certa forma, refletia a prioridade do uso dos recursos hídricos no país, considerado à época como vocação eminentemente agrícola. Posteriormente, a partir da década de 50, essas competências encontraram nicho específico no âmbito do setor elétrico, mais especificamente no Ministério das Minas e Energia (MME). A razão dessa mudança estava relacionada com a estratégia governamental de promover a infra-estrutura necessária para a expansão do parque industrial brasileiro, iniciada

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na região Sudeste do país. No setor elétrico, as atribuições governamentais sobre recursos hídricos subordinaram-se, mais concretamente ao Departamento Nacional de Águas e Energia Elétrica (DNAEE), órgão da administração direta vinculado ao MME, com rebatimento em todo o território nacional. [...] Embora coubesse ao MME a responsabilidade do cumprimento do Código das Águas e, por extensão, da gestão de recursos hídricos no nível nacional, outros setores, que se valiam daqueles recursos como insumo a suas atividades, resistiam a essa hegemonia, por entender que se tratava de uma administração tendenciosa. O resultado foi o início do processo de fragmentação da administração dos recursos hídricos, problema do qual o país ainda se ressente. (PAGNOCCHESCHI, 2003, p. 34).

Apesar de Pagnoccheschi (2003) enfatizar que a subordinação da gestão

dos recursos hídricos ao setor elétrico representou um entrave para sua

administração, não havia na época uma política que contemplasse a unificação

destes recursos. A idéia de uma administração integrada dos recursos hídricos é um

fato recente da década de 1980.

De acordo com Pagnoccheschi,

O setor de irrigação, na época localizado no âmbito do Ministério do Interior (MINTER), um dos que mais reagiu à hegemonia do setor elétrico na matéria articulou a aprovação de determinação presidencial que condicionava à sua administração as concessões de água destinadas àquele uso. Situações como essa passaram a dificultar a administração dos recursos hídricos, bem como a promoção do uso compartilhado da água no caso dos rios considerados de domínio da União. (PAGNOCCHISCH, 2003, p. 34).

Conforme o autor, o setor de irrigação foi um dos que mais se ressentiu com

a mudança, tendo em vista ter perdido o prestígio e o poder para o setor elétrico.

Percebe-se, portanto, que existiam diversificadas formas de administrar os recursos

hídricos no País, assim como, também na distribuição de funções entre os distintos

setores da Administração Pública, tanto dos Estados como na esfera da União.

Conforme Munhoz (2005)

Outra divergência aconteceu com a lei 6.662/79, que retirou do DNAEE a atribuição de outorgar direitos de uso de água para irrigação, passando-a ao Ministério do Interior. Estabeleceu-se assim, um sistema de gestão de águas muito confuso. A atribuição de outorgas de quantidade, distribuídas entre os ministérios do Interior e de Minas e Energia. As questões referentes á qualidade, administradas pelas entidades do Sistema Nacional do Meio Ambiente. E, de sobra, freqüentes conflitos entre os Estados e a União. (MUÑHOZ, 2005, p. 21).

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Nesse sentido, cabe ressaltar que não foi por ausência de uma legislação

específica, que os recursos hídricos não foram adequadamente gerenciados. Muito

embora privilegiasse os setores de navegação e, principalmente o de geração de

energia, o Código de Águas já contemplava os princípios da outorga, a cobrança

pelo uso do domínio público, e a maior parte dos instrumentos de gestão dos

recursos hídricos. Entretanto, apesar de contar com moderno ordenamento jurídico,

o que se percebe é que por não haver uma política única para o setor, á água ficou

por longo tempo à mercê de interesses colidentes.

Muito embora o Código das Águas considerasse a água como objeto

específico de lei, ela era tratada de forma fragmentada, sem ter sido elaborado

mecanismos de regulamentação que a priorizassem como tema único, com uma

institucionalidade própria.

De acordo com Victorino (2003), as mudanças não se efetivaram

provavelmente pela pressão do setor elétrico que não tinha interesse em perder seu

status. O monopólio do setor energético somado à atribuição privativa da União em

legislar sobre os recursos hídricos fez com que somente fosse regulamentado o

capítulo do Código das Águas, atinente aos aproveitamentos hidrelétricos.

Machado (2004) afirma que no Brasil, historicamente, o Estado assumiu a

responsabilidade pela prestação dos serviços públicos e em particular, pelo

abastecimento de água e tratamento de esgotos.

No País, desde a implantação do Código das Águas de 1934, a prestação

dos serviços de abastecimento e tratamento de esgotos passou a ser da

competência da União, que de acordo com o diploma legal, poderia realizá-los

diretamente ou indiretamente, através de concessões às empresas privadas

prestadoras de serviços.

Apesar de serem caracterizados como serviços de utilidade pública de responsabilidade estatal, com o conseqüente estabelecimento de um caráter monopolista, o mercado de água, em uma sociedade cujo modelo de produção de bens se organiza nos moldes da produção capitalista, não consegue evitar a penetração do viés econômico. (MACHADO, 2004, p. 03).

Guivant e Jacobi (2003), consideram que:

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[...] além do Estado, a gestão dos recursos hídricos era realizada por sistemas peritos. Por estas características, identificam o Código de Águas como hidro-técnico, o que equivale dizer, que referente aos recursos hídricos, o Estado e os peritos ou técnicos é que detinham o poder de “comando e controle”.(GUIVANT E JACOBI, 2003, p.3)

O antigo modelo de gestão restringia os problemas, essencialmente à área

técnica, “[...] desconsiderando quase por completo a interação, a complexidade,

abrangência e a importância do fator água, como as estruturas e processos sociais,

econômicos e políticos.” (VICTORINO, 2003, p. 4).

Mesmo quando executados pelo Estado os serviços de saneamento básico

eram atribuídos às unidades da federação: estados e municípios, que por sua vez

repassavam às empresas públicas, o fornecimento de água e tratamento sanitário.

Os conflitos relacionados às múltiplas competências no processo de gestão

das águas brasileiras, somado aos problemas decorrentes da poluição, escassez e

deterioração da qualidade das águas, em muitas regiões do País fizeram com que

usuários se mobilizassem, enviando reivindicações aos governos estaduais e

federal. Sobre esta questão Victorino ressalta que:

Não cabe aqui julgar os méritos ou deméritos dos planos para os esgotos ou dos planos para o abastecimento (não obstante todos demonstrarem a capitulação frente aos interesses do capital), mas qualificar o momento de surgimento de outras vozes, de outros interesses e de outros valores no processo social. Estas novas pressões tornaram-se mais relevantes na medida em que ocorreram dentro de um regime político marcado pelo autoritarismo, iniciando a construção de tendências de fissuras na hegemonia do bloco burocrático-empresarial ligado aos usos dos recursos hídricos. (ViCTORINO, 2002, p. 26).

Costa (2003) corrobora tal pensamento, enfatizando que os conflitos

decorrentes do uso das águas passaram a suscitar discussões entre distintos

setores: usuários, nos meios acadêmicos, tecno-científicos, profissional, bem como

de distintas unidades político-administrativas em plena ditadura militar.

A preocupação com a poluição das águas, que já era tema de debates

desde a primeira Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente realizada

em Estocolmo em 1972, passou a exercer influência direta na política nacional

brasileira.

Conforme Muñhoz (2005) no Brasil, o início dos debates em nível mundial

sobre o meio ambiente, somado à falta de regulamentação do Código das Águas

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possibilitou aos Estados legislarem no controle sobre a poluição das águas,

ocupando os espaços vazios deixados pela União.

Na década dos anos setenta, especialmente após a Conferência das Nações Unidas sobre o Ambiente, em Estocolmo (1972), os Estados começaram a legislar sobre o controle da poluição das águas, vinculando o assunto á proteção da saúde e do meio ambiente. Na realidade, esta era uma forma de contornar a exclusividade federal para legislar sobre águas e de tentar deter a atitude predatória das empresas, incluídas as da União, identificadas como representativas da ideologia do crescimento econômico a qualquer custo, alvo da comunidade ambientalista nacional e internacional. (MUÑHOZ, 2005, p. 21).

Alemanha, França, Holanda, Inglaterra, Espanha, Israel e o Vale do

Tenesse nos Estados Unidos25 que já tinham passado por intensos processos de

produção agrícola, industrialização e urbanização, conseqüentemente causando

fortes impactos sobre suas reservas de água doce, buscavam desde a década de

1970, desenvolver tecnologias, sistemas de gestão, instituições políticas e legislação

específica que possibilitassem reverter o quadro de poluição de seus rios e de suas

reservas de água doce. Essas experiências serviram como referências no debate

internacional sobre recursos hídricos.

A Alemanha, particularmente pode ser considerada como o berço da gestão

de bacias. Na região do Ruhr, os Estados e o Governo Federal delegaram o controle

sobre o abastecimento de água aos agentes de bacia. Em outras partes do país,

consórcios e associações de municípios atuam sobre os serviços de água, esgoto e

o lixo industrial e urbano.

A França por sua vez em 1964, adaptou o sistema alemão, dividindo as

águas do país em seis grandes bacias hidrográficas. O modelo francês, estruturado

em Comitês de Bacias e uma Agência de Água, foi adaptado e implementado no

Brasil através da Política Nacional de Recursos Hídricos, instituída pela lei n 9.433

de 8 de janeiro de 1997, representando um marco institucional no País, ao

incorporar princípios e normas para o gerenciamento dos recursos hídricos.

O sucesso dessas experiências serviu de parâmetros para outros países que

enfrentavam os mesmos problemas relacionados aos seus recursos hídricos.

25 Para uma análise sobre a experiência internacional do processo de gestão das águas em relação às leis brasileiras ver Machado (2004) e Cardoso (2003).

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A preocupação com os problemas relacionados à degradação ambiental

começou a tomar força e a crescer mundialmente, formando novas forças

sociopolíticos que, como analisadas por Viola et al. (1996):

[...] constituem o movimento ambientalista global cujos valores e propostas vão se disseminando pelas estruturas governamentais, as organizações não governamentais, os grupos comunitários de base, a comunidade científica e o empresariado.(VIOLA ET AL. 1996, p. 28)

Assim foram se construindo as bases de uma nova visão, sustentada por

informações, estudos e experiências internacionais que serviram de arcabouço para

a construção de políticas voltadas à proteção do meio ambiente e em especial dos

recursos hídricos.

Nesse sentido, Machado (2004) depois de analisar comparativamente a

legislação de oito países incluindo a do Brasil, chega ao seguinte resultado:

Embora a Alemanha, a França e a Holanda tenham se destacado na organização de sistemas eficientes de gestão das águas e do meio ambiente, é possível afirmar com segurança que, com ligeiras adaptações, encontramos os mesmos princípios, diretrizes e instrumentos de gestão dos recursos hídricos e ambientais na maior parte dos países do Primeiro Mundo estando o Brasil em sintonia com os mesmos. (MACHADO, 2004, p. 48).

Conforme o autor apesar das diferenças entre os países, os princípios sobre

a gestão dos recursos hídricos são basicamente comuns a todos, sendo que o

Brasil, em particular, na década de 1990, passou a incorporá-los.

A Conferência Internacional de Água e Meio Ambiente realizada em Dublin

em 1992, é considerada um marco haja vista, que pela primeira vez se buscou

estabelecer parâmetros comuns internacionais para o gerenciamento das águas.

Cardoso (2003) aponta que o Relatório da Conferência de Dublin em

relação à água, estabeleceu diretrizes para a realização de ações em nível local,

nacional e internacional, tendo por base quatro princípios:

Princípio Nº 1 – A água doce é um recurso finito e vulnerável, essencial para sustentar a vida, o desenvolvimento e o meio ambiente. Já que a água sustenta a vida, o gerenciamento efetivo dos recursos hídricos demanda uma abordagem holística, ligando desenvolvimento social com o econômico e proteção dos ecossistemas naturais. Gerenciamento efetivo liga os usos da terra aos da água nas áreas de drenagem ou aqüífero de águas subterrâneas.

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Princípio Nº 2 – Gerenciamento e desenvolvimento da água deverá ser baseado numa abordagem participativa, envolvendo usuários, planejadores e legisladores em todos os níveis. A abordagem participativa envolve uma maior conscientização sobre a importância da água entre os legisladores e o público em geral. Isto significa que as decisões são tomadas no menor nível possível com participação total do público e envolvimento de usuários no planejamento e implementação de projetos de água.

Princípio Nº 3 – As mulheres formam papel principal na provisão. Gerenciamento e proteção da água.Este papel de pivô que as mulheres desempenham, como provedoras e usuárias da água e guardiãs do ambiente diário não tem sido refletido na estrutura institucional para o desenvolvimento e gerenciamento dos recursos hídricos. A aceitação e implementação deste princípio exige políticas positivas para atender às necessidades específicas das mulheres e equipar e capacitar mulheres para participar em todos os níveis dos programas de recursos hídricos, incluindo tomada de decisões e implementação, de modo definido por elas próprias.

Princípio Nº 4 – A água tem valor econômico em todos os usos competitivos como bem econômico. No contexto deste princípio, é vital reconhecer inicialmente o direito básico de todos os seres humanos do acesso ao abastecimento e saneamento a custos razoáveis. O erro no passado de não reconhecer o valor econômico da água tem levado ao desperdício e usos deste recurso de forma destrutiva ao meio ambiente. O gerenciamento da água como bem de valor econômico é um meio importante para atingir o uso eficiente e eqüitativo, e o incentivo á conservação e proteção dos recursos hídricos. (DECLARAÇÃO DE DUBLIN, 2004).

As diretrizes e recomendações da Conferência de Dublin foram discutidas e

acatadas na Conferência da ONU sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento

(CNUMAD), em 1992, no Rio de Janeiro, também conhecida como Eco-92,

passando a serem incorporadas pela Agenda 21, cujo capítulo 18 se refere

exclusivamente à proteção da qualidade e do abastecimento dos recursos hídricos e

a aplicação de critérios integrados para o desenvolvimento, manejo e utilização dos

recursos hídricos. Apesar das dificuldades da política brasileira em operacionalizar a

implementação da Agenda 21, é inquestionável que o debate sobre a água teve

avanços significativos.

A Lei Federal 9.433 de 1997, marcou uma nova concepção na política

nacional de recursos hídricos introduzindo uma visão baseada em princípios

discutidos em nível global, nas últimas décadas, fruto da mudança de paradigmas,

principalmente relacionados ao meio ambiente e à participação da sociedade civil na

gestão democrática e participativa dos bens públicos.

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Muñhoz (2005) fala sobre esses fundamentos que ao longo dos anos foram

objeto de debates em diversos fóruns em todo o Brasil:

A Lei das águas de 1997 é o produto de quase quatorze anos de trabalho de discussões. Suas origens remontam aos debates havidos durante o Seminário Internacional de Gestão de Recursos Hídricos, organizado pelo Departamento Nacional de Águas e Energia Elétrica – DNAEE, em Brasília, em 1983 e às primeiras reuniões dos Órgãos Gestores de Recursos Hídricos, em 1984. Nestes encontros debatia-se o gerenciamento dos recursos hídricos e registravam-se algumas contestações a atuação do DNAEE. Atuação que alguns estados consideravam centralizadora em grau não compatível com o princípio federativo, por uma parte; e setorial, beneficiadora do setor elétrico, por outra.

As diversas ações que aconteceram no período 1983-1988, resultaram no mandato constitucional para criar o Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos. [...] Audiências públicas em diversos lugares do país, foram promovidas para discutir o projeto. [...] Trata-se, pois de uma lei que tem o mérito de ter sido concebida e plasmada através de um processo de discussão amplo, com possibilidades de participação da sociedade, embora não suficientemente aproveitadas.

Contribuições importantes foram feitas pela Associação Brasileira de recursos Hídricos – ABRH, que a partir de 1987, vem discutindo os aspectos político-institucionais do gerenciamento dos recursos hídricos. [...] O resultado de todo o processo de discussão foi uma lei avançada e moderna, coerente com os princípios básicos da declaração de Dublin sobre Recursos Hídricos e Desenvolvimento Sustentável (1992) e que atende as recomendações contidas na Agenda 21, principal instrumento programático resultante da CNUMAD/RIO-92. (MUÑHOZ, 2005, p.14-15).

O somatório de todos estes esforços foram fundamentais, no sentido de que,

suas considerações e conclusões foram adotadas na Constituição de 1988,

resultando na Lei 9.433/97 que instituiu a Política Nacional de Recursos Hídricos e o

Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos (COSTA E SANTOS,

1999).A nova lei outorgou legitimidade e pode ser considerada como impulsionadora

de uma nova racionalidade, conferindo ao campo dos recursos hídricos uma nova

redefinição de seu papel, não apenas na esfera das políticas públicas, mas de toda

a sociedade, criando um novo paradigma, uma nova institucionalidade.

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57

3.1 A LEI DOS RECURSOS HÍDRICOS E A FORMAÇÃO DOS COMITÊS DE

BACIAS

No documento intitulado Agenda 21 brasileira, no capítulo 18, a água é

reconhecida como elemento fundamental para a manutenção da vida, considerando-

a também como a matéria-prima mais utilizada em todas as atividades humanas.

Essa dualidade de atribuições apresenta desafios constantes, que exigem a

formulação e implementação de políticas eficientes na gestão dos recursos hídricos

em todo o território nacional.

A Lei Federal dos Recursos Hídricos 9.433/97, conhecida como Lei das

Águas, instituiu a Nova Política de Recursos Hídricos do País, estabelecendo um

moderno arranjo institucional baseado na organização da gestão integrada e o

compartilhamento do uso da água.

Dentre os instrumentos de gestão definidos por esta lei estão os planos de

recursos hídricos, que se constituem em planos diretores feitos com objetivo de

servirem de diretrizes para a implementação das políticas e gerenciamento dos

recursos hídricos.

De acordo com sua área de atuação podem ser concebidos como Plano

Nacional de Recursos Hídricos, Plano Estadual de Recursos Hídricos, ou Plano de

Bacias Hidrográficas. Os planos de recursos hídricos embasados em uma avaliação

das disponibilidades hídricas, devem também “[...] incorporar os planos de usos

setoriais, compatibilizando as demandas por saneamento, irrigação, energéticas, de

transporte, turismo e recreação, o controle e a proteção das águas.” (BRASIL,

AMBIENTE, 2004, p, 39).

Uma das grandes transformações ocorridas a partir da promulgação da lei

9.433/97, é que ela envolve uma politização da sociedade civil na gestão dos

recursos hídricos (GUIVANT e JACOBI, 2003).

Em linhas gerais a nova política pressupõe,

[...] ações e instrumentos a serem utilizados para garantir a existência da água doce e concede certa flexibilidade aos Estados para organizarem-se internamente. Amparados pela atual Constituição Federal de 1988, os Estados brasileiros passaram a deter a dominialidade das águas doces e a competência para elaborar seus próprios modelos, de acordo com as especificidades locais. (YONG, 2004, p. 07).

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58

A Lei 9.433 de 08/01/97, em seu sentido mais amplo representa a

descentralização de ações, contra a concentração de poder. O texto da lei aponta

alguns princípios básicos que já fazem parte da legislação de países que avançaram

na gestão de seus recursos hídricos, como França, Inglaterra, Espanha e outros.

Esses princípios apontam a bacia hidrográfica como unidade de planejamento:

� o respeito pelos usos múltiplos;

� a água como bem finito e vulnerável;

� o reconhecimento do valor econômico da água e o processo de gestão

descentralizada e participativa.

De acordo com o primeiro princípio, a bacia hidrográfica representa o espaço

de planejamento e gestão das águas, compatibilizando as diversidades

demográficas, sociais, culturais e econômicas das regiões. São consideradas ainda

como “[...] espaços de negociações sociais, defesas da cidadania e promoção do

desenvolvimento sustentável.” (SILVA, 2004, p.14).

No Brasil, a gestão de recursos hídricos conforme a divisão geográfica de

bacias hidrográficas e com a participação pública ainda é bastante recente.

Os Comitês são instituições responsáveis pela gestão de uma unidade

territorial da qual faz parte um diversificado número de atores, de distintos

segmentos sociais, com percepções, expectativas e interesses variados.

Os Comitês de Bacias Hidrográficas são entidades colegiadas que possuem

atribuições normativas, consultivas e deliberativas. Contam com o aval do Poder

Executivo, para seguirem diretrizes traçadas pelo Conselho Estadual de Recursos

Hídricos. São considerados como verdadeiros parlamentos das águas,

representando espaços de discussão e decisão.

Esses colegiados são constituídos por representantes dos usuários da água,

de entidades da sociedade civil e dos governos, estadual, e federal.

Conforme a Lei Nacional n. 9.433/97 é de competência dos Comitês de

Bacias Hidrográficas, no âmbito de sua atuação:

� promover o debate das questões relacionadas aos recursos hídricos e

articular a atuação das entidades intervenientes;

� arbitrar em primeira instância administrativa, os conflitos relacionados

aos recursos hídricos;

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59

� aprovar e acompanhar a execução do Plano de Recursos Hídricos da

Bacia e sugerir as providências necessárias ao cumprimento de suas

metas;

� propor ao Conselho Nacional e aos Conselhos Estaduais de Recursos

Hídricos as acumulações, derivações, captações e lançamentos de

pouca expressão, para efeito da isenção da obrigatoriedade da outorga

de direitos de uso dos recursos hídricos de acordo com os seus

domínios;

� estabelecer os mecanismos de cobrança pelo uso de recursos hídricos e

sugerir os valores a serem cobrados;

� estabelecer critérios e promover o rateio de custos de obras de múltiplo

uso, de interesse comum ou coletivo.

Nesse sentido, de acordo com o artigo V, compete aos comitês a cobrança

pelo uso da água através de seus braços executivos as Agências da Água das

bacias responsáveis pela decisão e alocação dos recursos arrecadados.

De acordo com Jacobi (2003) esta novidade institucional “[...] rompe com

práticas profundamente arraigadas de planejamento tecnocrático e autoritário,

conferindo poder às instituições de bacias descentralizadas.” (JACOBI, 2003, p, 270)

O mesmo autor aponta uma maior participação da sociedade como um dos

grandes avanços obtidos por este modelo. Ressalta ainda que:

Os avanços, complexos e desiguais, revelam que essas engenharias institucionais promovem a superação das assimetrias de informações e a afirmação de uma nova cultura de direitos, criando condições efetivas para multiplicar experiências de gestão participativa. Essas experiências, por sua vez, fortalecem a capacidade de critica e interveniência dos setores de baixa renda, mediante um processo pedagógico e informativo de base relacional, assim como a capacidade de multiplicação e aproveitamento do potencial dos cidadãos no processo decisório dentro de uma lógica não cooptativa. (JACOBI, 2003, p. 270)

Deste modo, o processo de avaliação da performance institucional dos

Comitês é uma tarefa de suma importância – considerando que esses por

representarem um processo inovador na política brasileira, ainda encontram

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60

dificuldades e limitações para gerenciar de modo democrático os conflitos

provenientes dos usos múltiplos das águas.

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61

CAPÍTULO IV

A BACIA HIDROGRÁFICA DO RIO ITAJAÍ-AÇU: FORMAÇÃO SOCIOESPACIAL,

DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO E SUAS IMPLICAÇÕES

A Bacia Hidrográfica do Rio Itajaí de acordo com o Zoneamento Ecológico-

Econômico do vale do Itajaí, elaborado pela Secretaria do Estado do

Desenvolvimento Urbano e Meio Ambiente (SANTA CATARINA, 1999) é

considerada a maior da vertente atlântica do Estado de Santa Catarina com uma

área estimada em cerca de 15.100 Km2 o que corresponde a 16,15% do território

catarinense. Localiza-se na unidade fisiográfica Litoral e Encostas de Santa

Catarina, entre as coordenadas 26º 27’ e 27º 53’ de latitude Sul e 48º 38’ e 50º 29º

de latitude Oeste. É composta pela junção de sete sub-bacias: Hercílio, Itajaí do

Oeste, Itajaí do Sul, Itajaí-Mirim, Itajaí-Açu, Benedito e Luís Alves (figura 1).

Divide-se, paisagisticamente, em três compartimentos naturais, que

determinaram a forma de ocupação espacial, a cultura e o desenvolvimento

econômico de cada região. São eles: o Alto Vale, o Médio Vale e o Baixo Vale.

O relevo do Alto Vale é caracterizado por patamares que possibilita a

agricultura do tipo semi-intensiva em grandes extensões. O médio vale possui um

relevo acidentado e o baixo vale onde se localiza a foz do rio Itajaí apresenta

extensas áreas de várzeas e planícies sedimentares entremeadas por morros.

Toda a bacia situa-se na região de floresta pluvial de costa atlântica

conhecida como mata Atlântica. A área coberta com vegetação primária e

secundária está estimada em cerca de 50%, representando um bom índice se

comparado a outras regiões do Estado, entretanto, apenas 2% de sua área é

reflorestada.

Em relação ao solo, desde a época da colonização até os dias atuais,

ocorreram importantes modificações. A cobertura de vegetação primária deu lugar à

utilização do solo para povoamento, agricultura, e posterior urbanização. Seibert

(1997) ao realizar estudo sobre a rede urbana do Vale do Itajaí constatou que em

conseqüência do desenvolvimento da Colônia Blumenau e da industrialização do

Vale, a ocupação territorial da região levou à “[...] formação de uma rede urbana nos

moldes tradicionais com municípios- pólo, exercendo sua centralidade em relação à

sua hinterlândia de base predominantemente agrícola.” (SEIBERT,1997, p. 100)

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62

Figura 1 – Sub-bacias da Bacia do Itajaí.

Fonte: Comitê de Gerenciamento da Bacia do Itajaí.

O modelo agrícola adotado na região desde a colonização, baseado,

inicialmente, no desmatamento e queimadas, a falta de controle das erosões e, a

partir do segundo quartil do século XX, com a introdução dos adubos químicos e

agrotóxicos, reduziu drasticamente a cobertura florestal e a fertilidade dos solos.

Na região da bacia predomina o clima subtropical denominado mesotérmico

caracterizado por ser úmido, quente e chuvoso. Os meses de maior precipitação vão

de setembro a março. As enchentes periódicas são consideradas um dos maiores

obstáculos desde a época da colonização.

A região da bacia é caracterizada por ser uma região montanhosa e

ricamente entrecortada por rios e ribeirões. Na região do planalto, os rios Itajaí do

Oeste e Itajaí do Sul se encontram na região do município de Rio do Sul, formando o

rio Itajaí-Açu, considerado o maior rio da Bacia Atlântica do Estado de Santa

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Catarina. Os afluentes do Baixo Vale do Itajaí-Açu são o rio Luís Alves e o rio Itajaí-

Mirim (figura 2).

O rio Itajaí possui 200 Km de extensão. Divide-se em Alto Itajaí-Açu, com 26

Km de extensão, incluindo em sua área as nascentes dos rios Itajaí do Sul e Itajaí do

Oeste até Salto dos Pilões. Seu curso apresenta-se sinuoso e com pequena

declividade na altura das regiões de Rio do Sul e Lontras.

O Médio Itajaí possui 93 Km de extensão e seu percurso vai de Salto dos

Pilões entre os municípios de Lontras e Ibirama até Salto Weissbach em Blumenau.

Apresenta nos primeiros 12 km forte declividade. Em suas margens localizam-se as

cidades de Apiúna, Ascurra, Indaial e parte de Blumenau.

O Baixo Itajaí-Açu possui aproximadamente 80 Km de extensão, tem menos

declive e sinuosidade. Inicia em Salto Weissbach, indo até sua foz no Oceano

Atlântico. Atravessa as cidades de Blumenau, Gaspar, Ilhota, Navegantes e Itajaí.

A bacia do Itajaí tem como seus principais divisores de águas ao norte as

Serras da Moema e do Jaraguá, a oeste a Serra Geral e a Serra dos Espigões e ao

sul as Serras dos Faxinais e do Tijucas. Possui ainda a Serra do Itajaí considerado

importante remanescente florestal da mata Atlântica.

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Figura 2 – Bacia do Itajaí com seus principais rios, serras e represas.

Fonte: FURB/IPA.

A Bacia do Itajaí encontra-se distribuída na área que compõe 47 municípios:

Agrolândia, Agronômica, Alfredo Wagner, Atalanta, Aurora, Braço do Trombudo,

Dona Ema, Chapadão do Lageado, Ibirama, Imbuia, Ituporanga, José Boiteux,

Laurentino, Lontras, Mirim Doce, Petrolândia, Pouso Redondo, Presidente Getúlio,

Presidente Nereu, Rio do Campo, Rio do Oeste, Rio do Sul, Salete, Santa

Terezinha, Taió, Tombudo Central, Vitor Meirelles, Blumenau, Pomerode, Indaial,

Ascurra, Gaspar, Timbó, Rio dos Cedros, Rodeio, Benedito Novo, Apiúna, Brusque,

Guabiruba, Botuverá, Doutor Pedrinho, Ilhota; Itajaí, Luís Alves e Navegantes. Além

destes municípios, também se encontram localizados na bacia partes dos municípios

de Bom Retiro, Itaiópolis, Papanduva, Monte Castelo e Massaranduba (figura 3).

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65

Figura 3 – Divisão política da Bacia do Itajaí.

Fonte: Adaptado do Comitê do Itajaí.

A região da bacia hidrográfica do Itajaí abriga uma população estimada em

945.720 habitantes, de acordo com dados do IBGE (2005), sendo que 80% desse

total residem em áreas urbanas e 20% em áreas rurais (gráfico 1)

O adensamento em áreas urbanas aliadas à concentração e ampliação de

atividades industriais elevam consideravelmente, a demanda hídrica, tanto no que se

refere ao abastecimento público, como na diluição de efluentes domésticos e

industriais.

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66

80%

20%

População Urbana

População Rural

Gráfico 1 – População da Bacia do Itajaí.

Fonte: IBGE.

Para se compreender o processo de transformação ambiental que vem

ocorrendo ao longo da bacia torna-se necessário que se entendam os aspectos

ligados às pressões exercidas em seu ambiente físico. Por esse motivo apresentam-

se dados que mostram atividades de impacto sobre os recursos hídricos nas regiões

que fazem parte da bacia do Itajaí.

No que se refere à qualidade de água, estudos preliminares26 apresentados

por Amaral et al. (2004), Silva (2004), entre outros, indicam a presença de teor de

compostos organo-halogenados27, muito acima do máximo permitido, nas águas do

rio Itajaí-Açu, conforme monitoramento realizado pelos pesquisadores desde a

cidade de Timbó até a foz, passando pela cidade de Blumenau e rio Itajaí-Mirim até

sua desembocadura no oceano Atlântico.

Esses mesmos autores consideram que a grande quantidade de fertilizantes

utilizadas nas lavouras, a falta de um sistema de monitoramento para

acompanhamento da qualidade da água, a retirada da mata ciliar, a ocupação

urbana e industrial sem que haja atenção especial em relação aos cursos d’água, o

lançamento de efluentes domésticos e industriais, dragagem de sedimentos para

construção civil, ocupação irregular das margens, excesso de atividades

impactantes, falta de fiscalização e práticas errôneas na agricultura contribuem para

26 Comunicação Científica apresentada no I Encontro de Pesquisadores da Área Ambiental de Itajaí em 2004. 27 Organo-halogenados são substâncias resultantes de resíduos domésticos e industriais.

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poluir e degradar as águas da bacia hidrográfica do Itajaí. Tendo por base os dados

apresentados pelos pesquisadores já mencionados, optou-se por apresentar dados

referentes à produção agrícola, pecuária, saneamento e industrias. Outrossim,

salienta-se que os problemas da bacia são múltiplos e complexos, dessa forma não

se restringem apenas aos acima elencados.

Dentre os problemas apontados por estudiosos sobre a Bacia do Itajaí

observa-se que muitos estão relacionados ao processo de ocupação do solo e de

sua utilização econômica.

A Secretaria de Desenvolvimento Regional do Estado agrupou os municípios

em regiões:

� Região de Blumenau: abrange os municípios de Blumenau, Indaial,

Timbó, Pomerode, Gaspar, Rio dos Cedros, Benedito Novo, Dr. Pedrinho

e Rodeio;

� Região de Itajaí: compreende os municípios de Itajaí, Navegantes,

Piçarras, Ilhota, Luís Alves e Penha;

� Região de Ibirama: Ibirama, Dona Ema, Vitor Meireles, Presidente

Getúlio, Witmarsum, José Boiteaux, Lontras, Apiúna, Presidente Nereu,

Ascurra;

� Região de Ituporanga: Ituporanga, Petrolândia, Imbuia, Aurora, Atalanta,

Alfredo Wagner, Chapadão do Lageado, Agrolândia, Vidal Ramos,

Itaiópolis;

� Região de Brusque: Brusque, Botuverá, Guabiruba;

� Região de Rio do Sul: Rio do Sul, Agronômica, Tombudo Central, Braço

do Trombudo, Laurentino, Pouso Redondo, Rio do Oeste, Taió, Mirim-

Doce, Salete, Rio do Campo e Santa Terezinha.

Na bacia do Itajaí a produção agrícola é bastante expressiva, principalmente

na produção de arroz, cebola,milho e fumo. De acordo com informações do site

www.comiteitajai.org.br entre 1970 e 1990 houve um acréscimo significativo de área

plantada nas sub – bacias de Rio do sul e Ibirama com a intensificação do uso do

solo e “práticas agrícolas não sustentáveis.”28

Conforme a Secretaria do Estado de Planejamento Orçamento e Gestão/

Secretaria do Desenvolvimento Regional, referente ao ano de 2002, as áreas

28 Não há uma definição sobre o que consideram como práticas agrícolas não-sustentáveis.

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68

plantadas e as produções agrícolas nas regiões produtoras apontam para os

seguintes dados:

7.187

27

4.473

305

334

420

10738.425

9.770

5.696

0

65

394

10.799

23.610

19.700

11.058

12.639

20.475

793

0

10.000

20.000

30.000

40.000

50.000

60.000

Blumenau Brusque Ibirama Itajaí Ituporanga Rio do Sul

Arroz Fumo Milho Cebola

Gráfico 2 – Área plantada em hectares dos produtos arroz, fumo e milho nas regiões da Bacia do Itajaí (2000).

Fonte: Adaptado do IBGE.

Em Santa Catarina a cultura do arroz irrigado tem grande importância tanto

no aspecto social quanto econômico. Conforme Noldin et al. (2003), na safra de

arroz referente a 2002/2003, foram cultivados cerca de 134 mil hectares em mais de

60 municípios, envolvendo, aproximadamente, oito mil famílias de agricultores. A

safra teve uma produção estimada em mais de um milhão de toneladas e o valor

bruto avaliado em R$ 600 milhões. O Estado de Santa Catarina destaca-se como

referência entre todos os Estados brasileiros por apresentar a maior produtividade

média (7,5t/ha). Em relação aos municípios que fazem parte da bacia os dados mais

significativos (gráfico 2) apontam que foram plantados 7.187 hectares de arroz na

região de Blumenau, na região de Itajaí 5.696 hectares e 11.058 hectares na região

de Rio do Sul. Essas mesmas regiões apresentaram uma produção estimada em

57.368 toneladas na região de Blumenau (gráfico 3), 44.771 toneladas na região de

Itajaí e 83.510 toneladas na região de Rio do Sul.

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69

57.36853

12.565

1113690

2120 8.002

16.929

38.937

44.7710163

2.72122.064

106.556

316.800

83.510

50.582

80.004

11.090

0

50.000

100.000

150.000

200.000

250.000

300.000

350.000

400.000

450.000

Blumenal Brusque Ibirama Itajaí Ituporanga Rio do Sul

Arroz Fumo Milho Cebola

Gráfico 3 – Quantidade em toneladas dos produtos arroz, fumo e milho nas regiões da Bacia do Itajaí (2000).

Fonte: Adaptado do IBGE.

De acordo com a EMBRAPA (2005), para o cultivo do arroz irrigado a água

se constitui em um dos principais insumos, tendo em vista que ela é utilizada desde

o preparo do solo, ao suprimento para a planta se desenvolver, para controle de

plantas daninhas, doenças, controle de alguns insetos causadores de pragas na

plantação, assim como, também age como facilitador na disponibilidade de

nutrientes.

A água utilizada nas plantações de arroz irrigada é proveniente da captação

de rios e riachos, e conduzidas até às lavouras através de bombeamento ou por

gravidade. Estudos realizados por Noldin et al. (2003) apontam que o consumo de

água nas lavouras de arroz irrigado é de aproximadamente oito mil metros cúbicos

por hectare, considerando todo o ciclo de cultivo, que leva cerca de quatro a cinco

meses. A precipitação pluvial corresponde em torno de 20% a 40% daquele total.

Em relação ao impacto ambiental decorrente da plantação de arroz irrigado

Noldin et al. (2003) aponta para a ocorrência de três fatores: a instalação de

lavouras próximas às margens dos rios sem a observância das faixas de proteção

com vegetação ciliar, que compromete as margens, facilitando a erosão e o

assoreamento dos rios. A aplicação de agrotóxicos sem que sejam adotadas as

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70

medidas corretas na sua utilização. A drenagem das quadras de arroz na fase do

preparo do solo e depois da semeadura em lavouras com taipas baixas que faz com

que a argila em suspensão seja levada para os rios, acarretando problemas na

captação para consumo doméstico bem como, assoreamento do leito dos

mananciais.

Em 2003, o Ministério Público de Santa Catarina e diversas entidades

relacionadas com a atividade assinaram um termo de ajuste de conduta para fazer o

licenciamento ambiental previsto na legislação federal (Resolução n. 237/97 do

Conselho Nacional do Meio Ambiente – CONAMA) (CONAMA, 2004).

Referente à produção de fumo, os dados mais significativos (gráfico 2)

apontam para a região de Ibirama com uma área plantada de 8.425 hectares e uma

produtividade (gráfico 3) de 16.929 toneladas; a região de Ituporanga com uma área

de 10.799 hectares e 22.064 toneladas produzidas e região de Rio do Sul com

12.639 hectares e 50.582 toneladas produzidas referente à safra 2002.

Em relação a fumicultura, Boeira e Guivant (2003, p. 61) apontam para três

fatores que contribuem para a degradação ambiental: o uso de agrotóxicos “[...] já

que atinge também o solo, as águas e até a camada de ozônio (no caso do brometo

de metila).” A queima de árvores utilizadas para a secagem das folhas do fumo, já

que toda “[...] queima de árvore gera poluição, que as queimadas – tradicionais entre

os fumicultores – também reduzem a biodiversidade e que as matas nativas não são

garantidas pelo reflorestamento.” Conforme Boeira (2005), em 1998, 59,1% dos

fumicultores do Vale do Itajaí, utilizavam árvores nativas da Mata Atlântica. Em

recente vistoria nas áreas de coleta de fumo da região do Vale Norte a Associação

de Preservação da Mata Atlântica do Vale do Itajaí – APREMAVI, verificou que ainda

não está sendo cumprido o Termo de Ajustamento do Fumo – TAC

No Estado de Santa Catarina o milho é considerado a cultura mais

importante tanto em relação à área plantada quanto ao volume da produção. O milho

é o principal insumo da pecuária, suinocultura e avicultura.

O cultivo do milho tem sido altamente beneficiado pela tecnologia e

inovações de pesquisa agrícolas e considerado um dos principais beneficiados da

chamada revolução verde.

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71

Conforme a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária – EMBRAPA

(2005) a revolução verde29 representou um processo de transformação na

agricultura a partir dos anos 1950, pelo uso de novas tecnologias e de um conjunto

de práticas e insumos agrícolas que permitiram um aumento brutal na produção

agrícola de países não-industrializados. O Brasil, a Índia e a China foram alguns dos

principais países que receberam o pacote tecnológico, montado a partir das

sementes de Variedades de Alto Rendimento – RV e de um conjunto de

procedimentos e insumos agrícolas necessários para garantir aos novos cultivares

as condições necessárias para atingirem graus elevados de produtividade.

Em relação à bacia do Itajaí os dados do IBGE relativos à safra de milho de

2002, apontam (gráficos 2 e 3), que a região de Blumenau plantou 4.473 hectares,

obtendo uma produção de 12.565 toneladas, a região de Brusque 420 hectares e

uma produção de 2.120 toneladas, Ibirama com 9.770 hectares e 38.937 toneladas,

Itajaí com 65 hectares e 165 toneladas, a região de Ituporanga com 23.610 hectares

e uma produção de 106.556 toneladas e a região de Rio do Sul com 20.475 hectares

e 80.004 toneladas.

O município de Agronômica, que faz parte da região de Rio do Sul, e que

tem como principal atividade agrícola a produção de fumo, possui a maior

produtividade do mundo em arroz irrigado por hectare .

Santa Catarina é considerado o maior produtor de cebola do Brasil.

Produtores de cebola do Alto Vale do Itajaí podem perder espaço no mercado

consumidor nacional em virtude do uso excessivo e desnecessário de agrotóxicos.

De acordo com a notícia, a EPAGRI alerta que vem sendo utilizados vários produtos

de forma clandestina sem o receituário de engenheiros agrônomos e sem nota fiscal,

inviabilizando o levantamento da quantidade de agrotóxicos utilizados em cada safra

(A NOTÍCIA, 2005).

Em diferentes graus todos os agrotóxicos apresentam um potencial relativo

de toxidade ao ser humano. Nesse sentido, existe uma tabela de classificação

toxicológica para cada produto sendo:

29 Em relação à Revolução Verde destacam-se duas vertentes: aqueles que defendem-na como responsável pela redução dos problemas da fome em diversos países em desenvolvimento, em virtude do aumento da produção de alimentos e, aqueles que questionam os efeitos sociais, econômicos e ambientais. Entre esses efeitos salienta-se o aumento das despesas com o cultivo, endividamento dos agricultores, dependência dos países, do mercado, lucratividade de grandes empresas, a monocultura, esgotamento do solo, dependência de fertilizantes, perda da biodiversidade, erosão e poluição.

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72

� classe I: extremamente tóxico – faixa vermelha;

� classe II: altamente tóxico – faixa amarela;

� classe III: medianamente tóxico – faixa azul;

� classe IV: pouco tóxico – faixa verde.

Na região da bacia a produção da cebola aponta (gráficos 2 e 3) para os

seguintes dados: região de Ituporanga 19.700 hectares plantados em 2002 e

316.880 toneladas produzidas. Na região de Rio do Sul os dados apontam para a

plantação de 793 hectares e uma produção estimada em 11.090 toneladas. A alta

produtividade da cebola está diretamente relacionada com a utilização incorreta de

agrotóxicos.

O uso abusivo de agrotóxicos é uma prática que pode trazer sérios

prejuízos à saúde do usuário, uma vez que os efeitos tóxicos agem de forma aguda

(principalmente após a exposição ao produto), e crônica (semanas, meses ou anos

após a exposição). Além dos danos à saúde a utilização errada e irresponsável de

agrotóxicos resulta em danos ambientais como a contaminação do solo, recursos

hídricos, intoxicação de animais e espécies de vegetais que não eram alvo do

produto.

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73

0

500.000

1.000.000

1.500.000

2.000.000

2.500.000

3.000.000

Blumenau Brusque Ibirama Itajaí Ituporanga Rio do Sul

Aves Bovinos Suínos

Gráfico 4 – Quantidade de rebanho efetivo de aves, bovinos e suínos (2000).

Fonte:Adaptado do IBGE.

Em relação à avicultura (gráfico 4), percebe-se que os municípios de

Blumenau, Itajaí e Rio do Sul apresentam os maiores índices de criação de aves.

Conforme Palhares (2005) a produção de aves em escala comercial pode impactar a

água de forma quantitativa e qualitativa29. Os impactos quantitativos estão

relacionados ao manejo da água no interior das granjas, onde o vazamento de

torneiras, bebedouros, mangueiras, uso incorreto de equipamentos, manejo de

lavagem inadequado, dimensionamento dos galpões e sistemas de ventilação

incorretos são fatores que aumentam o consumo de água. Os impactos quantitativos

estão relacionados com a incorreta disposição dos resíduos no solo, sem uma

compatibilização adequada entre as características do solo e as características dos

resíduos. O excesso de nutrientes pode atingir os recursos hídricos subterrâneos e

superficiais poluindo esses corpos d’ água.

Muito embora a suinocultura apresente dados signitivamente inferiores em

relação à criação de aves, os dejetos provenientes da criação de suínos

representam de acordo com a EMBRAPA (2005), um poder poluente de quatro a

30 Para maiores detalhes ler linha de pesquisa da Embrapa Avicultura Industrial. ‘’Água e Avicultura", de Júlio César Pascale Palhares. Disponível em: http://www.aviculturaindustrial.com.br/site/dinâmica. Acessado em: 25 de jul. 2005.

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74

cinco vezes maior que o do homem. Cada matriz de ciclo completo produz em média

100 litros por dia de dejetos. Este total é composto por esterco, urina, desperdícios

de água de bebedouros ou de limpeza, resíduos de rações, etc. A EMBRAPA aponta

ainda que o lançamento indiscriminado desses dejetos, em rios, lagos e solo podem

causar doenças à população, além de degradar o meio ambiente através de

poluição dos corpos de águas e saturação dos solos pela presença de componentes

químicos nos dejetos.

De acordo com o “Documento de Introdução Plano Nacional de Recursos

Hídricos” (BRASIL, 2004) a quantidade necessária de água para produzir 1 kg de

carne bovina corresponde a 20.000 litros. Em relação ao gado leiteiro, dados da

EMBRAPA (2005) avaliam que são necessários 62,5 litros por cabeça/dia. Nesse

sentido, mesmo com um número relativamente baixo de criação de bovinos a

quantidade de água utilizada é bastante significativa.

A seguir apresentarem-se dados relacionados ao abastecimento de água,

esgoto e coleta de lixo, de acordo com os municípios que fazem parte da bacia.

Em relação ao saneamento de acordo com Bava (2005), as estimativas do

Ministério das Cidades apontam a necessidade de aproximadamente R$ 178 bilhões

para universalizar os serviços de água e esgoto até o ano de 2020, em todo o País.

Conforme Bava (2005), historicamente, os investimentos em saneamento básico são

bastante desanimadores. Calcula-se que na década de 1970, os gastos foram na

ordem de 0,34% do Produto Interno Bruto – PIB; nos anos 1980, foi de 0,28%; nos

anos 1990, foi de 0,13%. Em 2003, os gastos giraram em torno de R$ 60 milhões,

em 2004, dos R$ 818,8 milhões autorizados apenas R$ 53,6 foram pagos até o final

do ano, e os R$ 454,7 milhões programados e não liberados foram desviados para

pagamento dos juros da dívida pública. Em Santa Catarina e, particularmente, as

regiões que compõem a bacia do Itajaí também refletem os problemas decorrentes

da falta de investimentos no setor.

Os índices apurados pela Pesquisa Nacional de Saneamento Básico

realizada pelo IBGE (2005), apontam que no setor de saneamento o País avançou

modestamente nos últimos 10 anos. Segundo dados da pesquisa de 1989 a 2000, o

número de municípios com algum tipo de serviço sanitário cresceu 10%, passando

de 47,3% para 52,2%.

Desde a época da colonização o desenvolvimento urbano e, posteriormente,

industrial, ocorreu ao longo dos rios face à disponibilidade de água para

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75

abastecimento e possibilidade de utilizar o rio como corpo receptor dos dejetos. Com

o aumento populacional e de atividades industriais, agrícolas e da pecuária, a

quantidade que os rios que compõem a bacia recebem de dejetos colocam em risco

o abastecimento de água da próxima cidade ribeirinha.

Como exemplo dessa situação, pode-se citar a região de Gaspar, onde a

água coletada para abastecimento deixou de ser extraída do rio Itajaí-Açu em virtude

do alto grau de poluição. Para suprir a demanda o município vem abastecendo-se

com água dos ribeirões, gerando conflitos com os rizicultores que necessitam dessa

água para suas plantações (FRANK, 2004).

A cidade de Itajaí localizada na foz do rio Itajaí-Açu também reflete essa

realidade. A captação de água para suprir a demanda tem enfrentado dificuldades,

conforme o diretor do SEMASA em Itajaí, decorrente da salinidade da água (cunha

salina). A salinidade da água do ponto de captação resulta da falta de vazão do rio

Itajaí-Mirim e a subida de vazão do rio Itajaí-Açu. Esse fenômeno vem ocorrendo em

virtude de desvios ao longo dos rios, assoreamento e poluição.

Conforme Locatelli (2003), a análise da qualidade da água dos rios que

compõem a bacia do Itajaí indicam que em muitos pontos a Demanda Bioquímica de

Oxigênio – DBO, é bastante elevada, indicando excesso de matéria orgânica. O

autor aponta ainda a alta turbidez da água bem como, a presença de elevado índice

de clorofórmios fecais.

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76

80,9

9

10,9

5

96,2

5

77,0

5

19,2

2

96,2

7

53,7

3

5,78

60,8

86,4

3

28,8

95,4

3

34,3

6

8,03

44,9

2

59,1

8

10,7

2

71,2

8

0

10

20

30

40

50

60

70

80

90

100

Blumenau Brusque Ibirama Itajaí Ituporanga Rio do Sul

Agua Esgoto Lixo

Gráfico 5 – Porcentagem de saneamento básico por domicílio dividido por região.

Fonte: Adaptado do IBGE (2000).

Dados do IBGE visualizados no gráfico 5, apontam que a região de

Blumenau contava até o ano de 2000, com 10,95% de esgotos sanitários, Brusque

19,22%, Ibirama 5,78%, Itajaí 28,8%, Ituporanga 8,03% e a região de Rio do Sul

com 10,74%. Na maioria das regiões os domicílios que possuem rede de esgoto

estão conectados ao sistema de drenagem pluvial, que pode comprometer o meio

ambiente e a saúde pública.

Frank (2004) assinala que o levantamento realizado pela Procuradoria da

República, em Blumenau, mostrou que a maioria dos municípios não fiscaliza a

implantação de fossa séptica, filtro e sumidouro. Conseqüentemente, todo o esgoto

está sendo lançado in natura nos rios, no solo, e no mar, comprometendo a

qualidade de água consumida pela população, trazendo graves conseqüências para

a saúde pública, uma vez que as doenças relacionadas com a veiculação hídrica

como o tifo, malária, diarréias, esquistossomose, etc. são as principais causas de

mortalidade infantil.

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77

Como se percebe, os investimentos relacionados ao saneamento básico no

âmbito da bacia são precários e necessitam de medidas urgentes por parte do Poder

Público e da mobilização da sociedade civil para exigir o gerenciamento dos esgotos

nos municípios.

Uma análise mais detalhada dos dados apresentados no gráfico 5, permite

identificar que muito embora onde os resultados se mostram positivos, como é o

caso do abastecimento da água, na verdade apresenta problemas relacionados,

tanto pelo desequilíbrio da distribuição, que não é uniforme, quanto pelo fator

poluição. Atualmente, o tratamento da água para torná-la potável dentro dos padrões

exigidos necessita, segundo o diretor do SEMASA em Itajaí, de toneladas de

produtos químicos.

A Pesquisa Nacional de Saneamento Básico (2000) indicou uma melhora

substancial em relação à destinação final do lixo31 doméstico no Brasil. Segundo o

IBGE (2005) a melhora na destinação do lixo deve-se:

� à maior conscientização da população;

� à atuação do Ministério Público na assinatura dos termos de ajustamento

de conduta com as prefeituras;

� ao programa Criança no Lixo, Nunca Mais, do Fundo das Nações Unidas

para a Infância – UNICEF e o apoio dos governos estaduais.

Em relação à coleta de lixo nas regiões que compõem a bacia do Itajaí

destacam-se as regiões de Blumenau com 96,25% dos domicílios servidos com o

sistema, a região de Brusque com 96,27% e Itajaí com 95,43%.

A seguir apresentam-se dados sobre algumas atividades industriais

desenvolvidas na bacia do Itajaí. Salienta-se, entretanto, que há um desequilíbrio

entre a produção de conhecimentos sobre a poluição proveniente da agricultura e os

demais setores.

Em relação às atividades industriais os municípios de Itajaí, Blumenau, Rio

do Sul e Brusque são considerados pólos de desenvolvimento na economia regional,

contribuindo com 28%do PIB total de Santa Catarina (FRANK e BOHN, 2003).

31 Entende-se que aterro sanitário é aquele que possui coleta e tratamento do chorume (líquido produzido na decomposição do lixo orgânico), e para gás metano gerado pelos resíduos, enquanto o aterro controlado pode ser um lixão, periodicamente, coberto com terra ou entulho.

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78

As indústrias geralmente se concentram nos centros urbanos trazendo

problemas ambientais. As tipologias industriais mais impactantes são as

provenientes do setor petroquímico, químico, refinarias e metalurgia. Substâncias

como organoclorados, pesticidas, ácidos, cádmio, sintéticos, esgotos industriais, são

produzidos por estas empresas e muitas outras tipologias aqui não mencionadas.

Ressalta-se, porém que essas substâncias e muitas outras são empregadas por

outras modalidades industriais ao longo do processo produtivo.

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79

REGIÃO DE BLUMENAU

Figura 4 – Destaque da região de Blumenau.

Fonte. ICEPA/SC.

Na região de Blumenau as atividades que mais se destacam estão

relacionadas à área de vestuário e artefatos de tecidos, indústrias metalúrgicas,

construção civil e mobiliário.

A construção civil é a área que gera o maior volume de resíduos urbanos e a

maior em consumo de recursos naturais. Estudos mostram que do total explorado de

recursos naturais, a construção civil consome de 20% a 50% (DOMINGOS, 2003).

A industrialização do Vale do Itajaí teve início por volta de 1880, com as

primeiras indústrias do ramo têxtil nas cidades de Blumenau e Brusque. O processo

de industrialização teve origem com a presença de mão-de-obra especializada na

região, iniciada pelos imigrantes europeus em diferentes épocas.

Essas primeiras unidades fabris foram realizadas por iniciativas de artesãos

e operários de origem européia que emigraram de diversas regiões da Alemanha,

em virtude das transformações políticas e econômicas ocorridas no século XIX na

Europa (MAMIGONIAN,1965).

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80

O Programa de Recuperação Ambiental da Bacia Hidrográfica do Rio Itajaí-

Açu, indica que o setor industrial que mais polui a bacia é o setor têxtil.

O setor têxtil-vestuarista do Vale do Itajaí, distribui-se entre 32 municípios,

sendo que aproximadamente 80% das empresas localizam-se nos municípios de

Blumenau, Brusque, Timbó, Pomerode, Indaial, Gaspar. Dados da Federação das

Indústrias de Santa Catarina – FIESC (2000), apontam que existem na região cerca

de 374 empresas das quais 130 pertencem ao ramo têxtil e 244 ao ramo de

vestuário. Muitas dessas empresas de médio e grande porte exercem inclusive

atividades nos dois setores. No município de Blumenau, o setor têxtil conta com

ações coordenadas da Associação Comercial de Blumenau – ACIB e o Sindicato

das Industrias Têxteis – SINTEX, além de apóio técnico da Universidade Regional

de Blumenau – FURB e do Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial – SENAI

(CAMPOS et al., 2000).

A Companhia de Tecnologia de Saneamento Ambiental – CETESB

(SANTOS, 1996), mostra que, praticamente, todas as indústrias têxteis pesquisadas,

lançavam seus efluentes industriais nos rios e ribeirões da bacia sem que houvesse

tratamentos específicos. Baseada em dados da Fundação do Meio Ambiente –

FATMA (1993), a autora assinala que “[...] esses dejetos eram compostos de carga

química e de corantes tensoativos, metais pesados, sais, sendo os corantes

compostos muito pouco biodegradáveis.” (SANTOS, 1996, p. 1).

Diante da gravidade da situação, a FATMA, de acordo com a legislação

estadual, implementou em 1992, o Programa de Recuperação Ambiental da Bacia

Hidrográfica do Rio Itajai-Açu, para induzir as empresas poluidoras a instalarem

estações de tratamento de efluentes em suas unidades, e dessa forma, receberem a

Licença Ambiental de Operação32. Desde o lançamento do programa realizado com

85 empresas, até o levantamento de dados coletados pela FATMA em maio de

1996, “[...] a carga orgânica despejada na bacia passou de 1.336.809 em

equivalência de habitantes para 371.126 hab., representando uma redução de

72,24%.” (SANTOS, 1996, p. 3).

Na análise de Mais (2003) apesar das grandes indústrias têxteis localizadas

no âmbito da bacia, terem implantado estações de tratamento de efluentes, visando

32 As Licenças Ambientais: Prévia, de Instalação e de Operação – são destinadas a estabelecimentos e atividades que utilizam recursos ambientais, potencialmente poluidoras ou capazes de provocar degradação ambiental.

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81

tornar seus produtos ecologicamente corretos e, assim, garantir espaço no exigente

mercado externo, as ações efetivas de controle da poluição industrial representam

ainda um percentual bastante reduzido.

O setor têxtil é um dos maiores consumidores de água. O consumo gira em

torno de 120 litros de água por metro de tecido produzido, em alguns casos

chegando a 230 mil litros por hora (FIESC, 2005) Em média os tecidos recebem de

três a oito lavagens durante seu processo de produção.

1.59198

33.6521.464

33239

6.300441

6.700409

4.975165

1.34283

2.381145

7.155334

0 5.000 10.000 15.000 20.000 25.000 30.000 35.000

B. Novo

Blumenau

D. Pedrinho

Gaspar

Indaial

Pomerode

R. Cedros

Rodeio

Timbó

Nº Empregos Nº Estabelecimentos

Gráfico 6 – Número de indústrias (1) e empregos (2) gerados pelas mesmas (2000).

Fonte: Rais – Relatório Anual das Informações Sociais / Ministério do Trabalho

Os dados mais expressivos apontam que, em 2000, o município de

Blumenau contava com 1.464 indústrias de diversos setores, gerando 33.652

empregos, Timbó com 334 indústrias e 7.155 empregos e Indaial com 409 empresas

e 6.700 empregos (gráfico 6). Esses empregos atraem migrantes que necessitam de

condições habitáveis que vão desde a infra-estrutura, a moradia, exigindo-se

inclusive a expansão de estabelecimentos educacionais.

De acordo com a Pesquisa de Informações Básicas Municipais de 2001,

divulgada pelo IBGE (2005), Blumenau é a cidade catarinense com o maior número

de casas em favelas. São 5.914 residências aglomeradas em 16 favelas. Este

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82

indicador social revela um fator que se repete com outros municípios catarinenses e

em especial os que são focos da presente pesquisa. A migração de mão-de-obra,

geralmente sem qualificação, de outras cidades, e até de outros estados, em busca

de trabalho, para regiões pólos de desenvolvimento industrial exige que os centros

receptores providenciem a infra-estrutura necessária. O êxodo rural também

representa uma parcela significativa dessa população que migra para os centros

urbanos em busca de trabalho. A ocupação irregular acaba sendo inevitável e,

geralmente ocorre em áreas de preservação permanente (margens de rios e

encostas) ou áreas consideradas de risco sujeitando-se às cheias e deslizamentos,

com prejuízos sociais e econômicos graves.

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83

REGIÃO BRUSQUE

Figura 5 – Destaque da região de Brusque Fonte: ICPA/SC.

Na região de Brusque33 as atividades industriais estão concentradas na

produção de minerais não metálicos, madeira e mobiliário e principalmente no setor

vestuário e artefatos de tecidos.

33 Na região de Brusque os municípios de Nova Trento, Major Gercino, São João Batista, Tijucas e Canelinha não fazem parte da bacia do Itajaí.

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84

454

33

14.350

832

1.156

109

0 2000 4000 6000 8000 10000 12000 14000 16000

Botuverá

Brusque

Guabiruba

Nº Empregos Nº Estabelecimentos

Gráfico 07: Número de indústrias(1) e os empregos(2) gerados pelas mesmas– 2000 Gráfico 7 – Número de indústrias (1) e os empregos gerados pelas mesmas (2000).

Fonte: Rais – Relatório Anual das Informações Sociais / Ministério do Trabalho

O município de Brusque contabilizava, em 2000, 832 indústrias as quais

geravam 14.350 mil empregos (gráfico 7).

As indústrias de modo geral utilizam a água de distintas formas, tanto pela

incorporação ao produto, lavagens de tecidos como no caso do setor têxtil, de

máquinas, tubulações e pisos, para resfriamento de maquinários e geradores de

vapor, ou seja, diretamente nas etapas do processo industrial ou incorporadas aos

produtos, além do esgoto sanitário dos funcionários. As águas tornam-se

contaminadas por resíduos do processo industrial ou por perdas de energia térmica,

resultando nos chamados efluentes industriais. Esses ao serem lançados nos corpos

receptores podem causar poluição hídrica, caso não tenham passado por um longo

processo de tratamento que vai desde o início da cadeia produtiva até o sistema de

tratamento de efluentes líquidos. Os custos de investimentos do processo

operacional geralmente são altos, fator este que inviabiliza sua implantação por

empresas de pequeno e médio porte.

Até a década de 1980, a indústria madeireira exerceu forte papel na

economia de toda a região do Vale do Itajaí, sendo a principal responsável pela

devastação de diversas espécies nobres das florestas.

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85

Dados do Instituto Nacional de Metrologia Normalização e Qualidade

Industrial – INMETRO (2005) apontam que a União Européia estabeleceu valores

limites de substâncias tóxicas para a importação de produtos madeireiros como

madeira serrada, compensados e móveis. Dentre as substâncias utilizadas na

conservação das madeiras e móveis o cádmio, o mercúrio, o chumbo e o cromo

dentre outras, são altamente nocivas e impactantes ao meio ambiente.

Segundo dados da Associação Brasileira das Indústrias das Indústrias de

Mobiliário – ABIMÓVEL34 (2005) o Brasil é o 9º país exportador de móveis para os

Estados Unidos da América. O setor moveleiro representa um mercado que

movimenta aproximadamente US$ 75 bilhões por ano. Vale ressaltar, também, que,

nos últimos cinco anos, as exportações brasileiras de móveis para os EUA obtiveram

um incremento de cerca de 294%. Os americanos são grandes importadores de

madeira serrada e de compensados brasileiros, tanto os produzidos com espécies

nativas, como o ipê, imbuia, jatobá, e outras, quanto de pinus e, mais recentemente,

de eucalipto.

Apesar das restrições ambientais impostas por países desenvolvidos para a

entrada de produtos que não sejam ecologicamente corretos, a FIESC constatou

que a demanda por espécies nativas ainda representa 20,82% do total de madeira

consumida no Estado. Segundo a EPAGRI (2003), as árvores nativas crescem de

três a quatro metros cúbicos por hectare/ano, enquanto que o pinus cresce em

média 30 metros cúbicos por hectare/ano. É crescente o posicionamento de

empreendedores do setor por monoculturas destinadas à produção de madeira e

fibra para celulose. Em regiões onde esse modelo foi implementado revelam

conseqüências desastrosas, tanto para as pessoas, tendo em vista fatores como

perda de territórios, de recursos e de postos de trabalho, quanto para o meio

ambiente, resultando em impactos na água, nos solos, na biodiversidade e na

paisagem.

34 A versão completa deste documento encontra-se disponível em: Erro! A referência de hiperlink não é válida.: 27 jul. 2005.

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86

REGIÃO IBIRAMA

Figura 6 – Destaque da Região de Ibirama.

Fonte: ICEPA/SC.

O município de Ibirama apresenta uma vegetação diversificada, com

variados tipos de madeiras nativas como canela, pindabuna, óleo, sassafrás,

canharana, figueira, peroba, etc, todas de grande valor econômico, utilizadas por

indústrias madeireiras35.

De acordo com a ONG SOS Mata Atlântica, os remanescentes florestais do

estado de Santa Catarina pertencem em sua maioria, a propriedades privadas,

especialmente ao setor madeireiro (SOS MATA ATLÂNTICA, 1992).

Na região de Ibirama as atividades industriais estão relacionadas com o

beneficiamento de madeira e mobiliário, vestuário e artefatos de tecidos, fecularias e

metalúrgicas. Em relação as fecularias estudos recentes mostram o impacto

ambiental causado pelos resíduos líquidos nos cursos d’água por indústrias que

utilizam raízes de mandioca como matéria-prima.

35 Disponível em: http://www.ibirama.sc.gov.br/. Acessado em: 27 jul. 2005.

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87

De acordo Anrain apud Prado e Pawlowsky36 (2003), em Santa Catarina a

poluição gerada por indústrias que processam a mandioca para a obtenção da

fécula é intensa, tendo em vista que durante o processo é produzido efluentes com

Demanda Química de Oxigênio – DDD, em torno de 2.500 mg O2/L. equivalente à

poluição causada por 460 habitantes/dia. Outro problema igualmente relevante

causado por este tipo de resíduo é a presença de glicosídeos potencialmente

hidrossolúveis a cianeto. Durante o processamento da mandioca a água utilizada

carreia grandes quantidades de glicossídeo, fazendo com que o líquido residual

contenha altas concentrações tóxicas de cianeto.

1.46549

1.26261

35329

3.132121

20518

78446

1.95276

11

19413

15515

0 500 1.000 1.500 2.000 2.500 3.000 3.500

Apiúna

Ascurra

D. Emma

Ibirama

José Boiteux

Lontras

P. Getúlio

P. Nereu

V. Meireles

Witmarsum

Nº Empregos Nº Estabelecimentos

Gráfico 8 – Número de indústrias (1) e os empregos gerados pelas mesmas (2000).

Fonte: Rais – Relatório Anual das Informações Sociais/Ministério do Trabalho.

Em relação ao número de indústrias percebe-se (gráfico 8) que o município

de Ibirama se sobressai com 121 indústrias e 8.132 empregos, seguido pelo

município de Presidente Getúlio com 76 indústrias e 1.952 empregos.

36 A versão completa deste documento encontra-se disponível em: http://www.brasilalimentos.com.br. Acessado em: 25 jul. 2005

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88

REGIÃO ITAJAÍ

Figura 7 – Destaque da região e Itajaí. Fonte: ICEPA/SC.

Na região de Itajaí37 predominam atividades industriais relacionadas com a

metalurgia, madeira e mobiliário, vestuário e artefatos de tecidos, produtos

alimentícios, bebidas e álcool etílico, a pesca e atividades portuárias.

A atividade industrial está, inevitavelmente, associada em níveis de

degradação do ambiente, uma vez que não existem processos de fabricação

totalmente isentos de poluição. A periculosidade das emissões industriais varia de

acordo com o tipo de indústria, matérias primas utilizadas, processos, produtos e

substâncias fabricadas, visto conterem componentes que afetam os ecossistemas.

37 Na região de Itajaí os municípios de Camboriú, Balneário de Camboriú, Itapema, Porto Belo e Bombinhas não fazem parte da bacia do Itajaí.

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89

84081

6.808420

90965

1.35979

4484111321

0 1000 2000 3000 4000 5000 6000 7000

Ilhota

Itajaí

Luiz Alves

Navegantes

Penha

Piçarras

Nº Empregos Nº Estabelecimentos

Gráfico 9 – Número de indústrias (1) e os empregos gerados pelas mesmas (2000).

Fonte: Rais – Relatório Anual das Informações Sociais/Ministério do Trabalho.

Em relação ao número de indústrias e empregos gerados pelas mesmas no

ano de 2000, o gráfico 9, na região de Itajaí, aponta como dados mais significativos

o município de Itajaí com 420 indústrias e 6.808 empregos e a cidade de

Navegantes com 79 indústrias e 1.359 empregos.

As regiões de Itajaí e Navegantes são conhecidas nacionalmente e

internacionalmente pelos produtos relacionados com a atividade pesqueira.

Levantamento realizado pela UNIVALI38 em 2001, apontou para o potencial de

reaproveitamento de resíduos das 30 mil toneladas/ano que são produzidos pelas

industrias de pescado39 da região, uma vez que, 70% dos resíduos são absorvidos

na produção de farinha de peixe e o restante despejado de forma irregular em aterro

sanitário ou lançado no rio Itajaí-Açu, provocando graves problemas ambientais.

38 A versão completa deste documento encontra-se disponível em: http://www.estadao.com.br/ciencia/aplicada. Acessado em: 25 jul. 2005. 39 Esse indicativo refere-se unicamente aos dejetos produzidos pelas 22 empresas de manipulação de pescado nas cidades mencionadas. não estando computadas as indústrias enlatadoras de produtos relacionados com atividades pesqueiras.

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90

REGIÃO ITUPORANGA

Figura 8 – Destaque da região de Ituporanga. Fonte: ICEPA/SC.

Na região de Ituporanga as atividades industriais estão relacionadas,

principalmente, com minerais não metálicos, metalúrgicas, madeira e mobiliário,

vestuário e artefatos de tecidos, produtos alimentícios, bebidas e álcool etílico.

Segundo o relatório anual de 2004 da Companhia Siderúrgica Nacional, nas

indústrias metalúrgicas que desenvolvem programas ambientais e, que investem em

tecnologias de redução de riscos, o índice de água gasto por tonelada de aço

produzido é de 40m3. Nessas mesmas unidades, a cada 640 kg de resíduos 0,3%

são incinerados ou dispostos em aterros licenciados. Tendo em vista a falta de

dados das indústrias sediadas na bacia do Itajaí estima-se um mínimo 0,5% de

resíduos despejados no rio Itajaí, o que representa 32 Kg por tonelada de aço

multiplicados pela produção das 22 indústrias metalúrgicas da região.

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91

84661

4816

18514

981500196

73378

31

11915

16213

0 200 400 600 800 1000

Agrolândia

A. Wagner

Atalanta

Aurora

C. do Lajeado

Imbuia

Ituporanga

L. Leal

Petrolândia

V. Ramos

Nº Empregos Nº Estabelecimentos

Gráfico 10 – Número de indústrias (1) e os empregos (2) gerados pelas mesmas (2000).

Fonte: : Rais – Relatório Anual das Informações Sociais/Ministério do Trabalho.

Na região de Ituporanga, o município de Agrolândia possui 61 indústrias que

geram 846 empregos. Enquanto que o município de Ituporanga apresenta um total

de 78 indústrias e 733 empregos (gráfico 10).

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92

REGIÃO RIO DO SUL

Fonte: ICEPA/SC

Figura 9 – Destaque da região de Rio do Sul.

Fonte: ICEPA/SC.

Como destaque industrial da Região de Rio do Sul está o setor da Indústria

Alimentícia que tem 92 estabelecimentos cadastrados. Em relação à poluição

ambiental causada por esse setor se destacam os despejos líquidos provenientes da

lavagem dos equipamentos, pisos e paredes, higiene dos funcionários, descargas da

caldeira e lavador de gases. As águas pluviais não têm acesso ao sistema de

tratamento, ocasionando a poluição das águas, salvo os estabelecimentos que

mantêm a água num circuito fechado para ser reciclada e reutilizada, e que se bem

executado, pode-se estabelecer um desperdício de 1%, que equivale a 150 litros de

efluentes por dia por indústria, na melhor das hipóteses.

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93

16716

42613

44337345

74562

35419

45049

5.528336

1.88232246

1.57399

34939

0 1000 2000 3000 4000 5000 6000

Agronômica

B. Trombudo

Laurentino

Mirim Doce

P. Redondo

R. do Campo

R. do Oeste

R. do Sul

Salete

S. Terezinha

Taió

T. Central

Nº Empregos Nº Estabelecimentos

Gráfico 11 – Número de indústrias (1) e os empregos (2) gerados pelas mesmas (2000).

Fonte: Rais – Relatório Anual das Informações Sociais/Ministério do Trabalho.

Em relação à região de Rio do Sul observa-se no gráfico 11, que a cidade de

Rio do Sul se destaca com 336 indústrias que geram 5.528 empregos.

Em síntese, na região da Bacia do Itajaí encontram-se implantadas um

expressivo número de indústrias, de diversos segmentos, que através do

lançamento de seus efluentes poluem a bacia, causando desequilíbrio ao meio

ambiente.

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94

CAPÍTULO V

COMITÊ DO ITAJAÍ – HISTÓRICO E ATUALIDADES EM SUA DINÂMICA

INSTITUCIONAL

A região do Vale do Itajaí, historicamente, tem sofrido com problemas

relacionados às enchentes. Frank (1995) aponta que as 67 enchentes ocorridas em

Blumenau desde a época da colonização do Vale do Itajaí até o ano de 1990

ocorreram em um espaço relativo a cada período de 20 anos.

Frank (1995), considera que o agravamento das enchentes está intimamente

relacionado com a degradação ambiental, decorrente da expansão da colonização

em toda a bacia do Itajaí:

As discussões e ações na busca de soluções para o problema reportam à

própria história de Blumenau. De acordo com Frank e Bohn (2003), os jornais de

1923, já traziam artigos publicados sobre a necessidade da existência de um

sistema de alerta das cheias. Em 1929, o engenheiro Otto Rohkohl, Cônsul alemão

em Blumenau, propõe a criação da S.A. Contra Enchentes, instância que contava

com o apoio financeiro dos usuários da água, empresas e instituições locais para

tratar exclusivamente do problema. Por ter sido o pioneiro em pensar uma forma

aglutinadora de esforços em prol da defesa contra as enchentes o Comitê do Itajaí

lançou o prêmio Otto Rohkhol “para dar reconhecimento público a pessoas e

entidades que se destacaram em ações de educação, pesquisa, manejo,

desenvolvimento tecnológico e saneamento, sempre voltadas ao uso sustentável da

água”.(Comitê do Itajaí)

Depois das enchentes de 1957, por decreto do presidente da República

Juscelino Kubitschek foi designada a criação de um grupo de trabalho, com objetivo

de realizar estudos necessários de acordo com as metas do Projeto Nacional para

acelerar o desenvolvimento econômico da região. O grupo elaborou um projeto que

propunha a proteção do vale contra as inundações com ênfase no potencial

hidrelétrico da região. Para alcançar os objetivos propostos o grupo previa a

construção de barragens, retificação dos rios e a construção de usinas

hidroelétricas.

Após as enchentes da década de 1960, os debates em torno do projeto

acima mencionado resultaram na construção das três barragens de contenção de

cheias na bacia do Itajaí. A barragem Oeste localizada em Taió, foi construída em

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95

1973, a Sul em Ituporanga em 1975, e a Norte no município de José Boiteux teve

sua construção iniciada em 1992. A construção das três barragens fazia parte do

projeto de medidas estruturais intensivas de contenção de cheias.

Inicialmente, acreditou-se que a solução para o problema das enchentes

seria minimizada, com a construção das três barragens que foram executadas sob a

responsabilidade do Departamento Nacional de Obras e Saneamento – DNOS.

Entretanto, esta estratégia não se mostrou suficiente para conter ou diminuir os

efeitos das grandes enchentes de 1983 e 1984.

Segundo Frank e Bohn (2003) na segunda metade de 1983, um grupo de

professores da FURB, respaldados pela instituição criou o “Projeto Crise” de acordo

com um conjunto de medidas não-estruturais.

A intenção materializada através da execução do Projeto teve como

propósito construir um sistema de suporte para a defesa civil, gerando informações.

Em 1984, o Departamento Nacional de Águas e Energia Elétrica instalou uma rede

telemétrica de cinco estações de chuva e nível. Com a criação do Instituto de

Pesquisas Ambientais – IPA, o Projeto Crise teve respaldo institucional e,

simultaneamente, agregou novos projetos, o que possibilitou aumentar o

conhecimento sobre o fenômeno das cheias relacionando as atividades econômicas

na região, estudos sobre a evolução urbana e sua relação com a gestão de áreas

inundáveis e a discussão sobre os possíveis arranjos institucionais para o

gerenciamento das enchentes. Além dos projetos apoiados pela FURB, nessa

ocasião, abriu-se uma linha de crédito especial para pesquisadores da Universidade

Federal de Santa Catarina para realizar estudos de impacto sócio-ambiental sobre o

Vale do Rio Itajaí Açu, financiado pela Fundação Nacional de Estudos e Pesquisas –

FINEP40.

O governo do Estado de Santa Catarina depois das enchentes de 1984,

elaborou o Plano Global e Integrado de Defesa Contra as Enchentes para a Bacia

do Itajaí, que de acordo com Frank e Bohn (2003, p. 41) se caracterizava por ser

“[...] uma proposta mais ampla e menos participativa.” Conforme a autora foi a partir

desse plano que o Conselho da Reconstrução aprovou a proposta de Organização

do Sistema de Recursos Hídricos do Estado de Santa Catarina (Resolução CER n.

40 Entre os relatórios produzidos veja-se Werner et al. (1987), entre outros.

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96

30/85) que contemplava a formação de comitês de bacia, priorizando, inicialmente, a

Bacia do Itajaí.

Gómez (2004) citando Frank e Bohn (2003) assinala, que a ACIB lançou em

outubro de 1984, uma campanha nacional de conscientização para o problema das

enchentes no Vale do Itajaí, representando uma importante conquista para o

movimento de defesa contra as cheias, tendo em vista que a Associação financiou a

vinda para Blumenau de jornalistas dos principais órgãos de comunicação do País

com objetivo de sensibilizar a opinião pública e pressionar o governo federal para a

liberação de recursos financeiros com a finalidade de concluir às obras da barragem

Norte41.

Frank (1994) pontua que, em 1986, foi firmado um acordo de cooperação

técnica entre o Departamento Nacional de Obras e Saneamento – DNOS e a Japan

International Corporation Agency – JICA. O projeto elaborado pela JICA consistia na

elaboração de um plano diretor de controle das enchentes para o Vale do Itajaí a

partir de medidas estruturais intensivas.

Em 1990, com a extinção do DNOS, o projeto JICA como ficou sendo

conhecido, foi incampado pelo governo Estadual que elaborou o Plano Global e

Integrado de Defesa contra enchentes – ecossistema Bacia Hidrográfica do Rio

Itajaí-Açu – PLADE, visando a obtenção de recursos externos para as obras de

contenção de cheias previstas pelo projeto JICA. Entretanto, o plano não foi

implementado, mas foi avaliado em um seminário em 1994, que foi organizado pela

comunidade da região. Frank e Bohn (2003) assinalam que o PLADE priorizava

medidas estruturais intensivas enquanto as discussões do seminário apontavam a

necessidade de medidas estruturais extensivas e de medidas não estruturais

(ULLER, 2001).

A extinção do DNOS em 1990, marcou não apenas a interrupção da

barragem Norte, mas de várias atividades relacionadas à manutenção e controle das

cheias.

41 Esta barragem teve sua construção interrompida por diversas oportunidades, por ter sido implantada em Terras Indígenas, gerando muita polêmica em torno da sua interferência no modo de vida do grupo Xokleng que ali se encontra. Sobre este assunto ver os trabalhos de Aspelin (1982); Santos (1984) entre outros.

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97

A população de Blumenau depois da enchente de 1992, em mobilização nas

ruas de Blumenau, reivindicou o término da conclusão da Barragem Norte42, que

ocorreu ainda no mesmo ano.

Conforme Gómez (2004) a manutenção e operação das barragens, com o

fim do DNOS, ficaram a cargo do governo estadual, sendo que a União repassaria

80% dos recursos financeiros. O acordo foi estabelecido entre o Ministério da

Integração Regional e o Governo do Estado de Santa Catarina, com a intervenção

do Departamento de Edificações e Obras Hidráulicas – DEOH. O acordo estava

estabelecido por um prazo de cinco anos, entretanto, deixou de ser cumprido um

ano após ter sido firmado. A extinção do DEOH pelo governo Fernando Henrique

Cardoso fez com que a situação se agravasse ainda mais, de tal forma, que os

municípios atingidos pelas cheias pressionaram o governo federal a assumir a

responsabilidade pela manutenção das barragens (FRANK, 2003). Em maio de

1995, conforme relata Bohn (1999) foi realizada uma reunião promovida pela ACIB,

que resultou na formação do grupo de trabalho pró-comitê composto por

representantes da Associação dos Municípios do Alto Vale do Itajaí – AMAVI,

Associação dos Municípios do Médio Vale do Itajaí – AMMVI, Associação dos

Municípios da Foz do Rio Itajaí – AMFRI, ACIB, Associação Comercial e Industrial

de Rio do Sul – ACIRS, Universidade para o Desenvolvimento do Alto Vale do Itajaí

– UNIDAVI, UNIVALI e FURB, com objetivo de construir as bases para a criação de

um Comitê de Bacia Hidrográfica.

Em 1996, foi encaminhado ao Conselho Estadual de Recursos Hídricos o

pedido de criação do Comitê do Itajaí, sendo aprovado em 23/06/1997. O Decreto

Estadual n. 2.109, publicado em 05/08/1997, instituiu efetivamente o Comitê.

O Regimento do Comitê do Itajaí foi formulado bem como, sua composição,

com base na Política Nacional de Recursos Hídricos (Lei n. 9.433 de 08/01/1997) e

em conformidade com a Lei Estadual 9.718/1991. Oficialmente o Comitê foi instalado

em março de 1998.

5.1 DISTRIBUIÇÃO DOS ASSENTOS NO COMITÊ DO ITAJAÍ

42 Recentemente, a Folha de São Paulo, publicou que esta barragem apresenta risco porque teve seu sistema operacional destruído pelo grupo indígena Xokleng. A reação deste grupo indígena é uma resposta ao não atendimento de suas reivindicações ao processo das terras ocupadas por esta obra. (FOLHA DE SÃO PAULO,13/11/2005, p. c.1).

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98

Cumprindo determinação da Lei 9.433/1997 o regimento interno do Comitê

do Itajaí (Cap. III, Art. 5 constante em sua íntegra no site www.comitedoitajai.org.br,)

é constituído por 50 membros titulares e seus respectivos suplentes, representando

os usuários da água, da população da bacia e órgãos da administração estadual e

federal que atuam na bacia e que estão relacionados com os recursos hídricos

(Apêndice 2)

De acordo com a Lei Estadual 9.748, de 19 Lei Estadual 9.748, de 1994

foram destinados 40% dos assentos a representantes dos usuários da água, 40% a

representantes da população da bacia, e 20% a representantes dos órgãos dos

governos estadual e federal que atuam na bacia.

Até o ano de 2003, os assentos eram distribuídos previamente por

instituições. Naquele ano foi proposta e aprovada alteração no regimento

relacionada à sua composição. O Comitê adotou, então, a distribuição dos assentos

por setores, assumindo como critérios para distribuição das vagas aqueles previstos

na legislação estadual.

A partir da alteração realizada (Cap. III, Art. 6) a categoria dos usuários da

água possui 40% dos assentos, equivalendo a 20 representantes e respectivos

suplentes, dos seguintes segmentos:

I. Abastecimento de água e diluição de efluentes urbanos;

II. Drenagem e resíduos sólidos urbanos;

III. Hidroeletricidade;

IV. Captação industrial e diluição de efluentes industriais

V. Agropecuária e irrigação, inclusive psicultura;

VI. Navegação e atividades portuárias pertinentes;

VII. Lazer, recreação e outros usos não-consuntivos, como mineração e

transporte rodoviário.

Os representantes da população que também correspondem a 40% dos

assentos, possuem 20 representantes distribuídos de acordo com os segmentos,

conforme pode ser conferido no (Cap. III, Art. 7):

I poder executivo municipal (6 representantes);

II poder legislativo municipal (4 representantes);

III associações comunitárias, entidades de classe e outras instituições não-

governamentais (5 representantes);

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99

IV universidades, instituições de ensino superior e de pesquisa e

desenvolvimento tecnológico e associações especializadas em recursos

hídricos (4 representantes);

V comunidade indígena (1 representante).

A categoria órgãos públicos (Cap. III, Art. 7) possui 20% dos assentos.

Conta com 10 representantes e respectivos suplentes, que são eleitos entre os

órgãos da administração pública estadual e federal.

5.1.1 Estrutura de funcionamento do Comitê do Itajaí

De acordo com o Cap. IV, Art. 6, constante no estatuto, disponível no site

www.comiteitajai.org.br, a estrutura do Comitê segue a seguinte organização:

a) Assembléia Geral – formada pelos representantes usuários da água, da

população da bacia e órgãos da administração estadual e federal que

atuam na bacia e que estão relacionados com os recursos hídricos;

b) Presidência – composta por um presidente e um vice-presidente,

eleitos entre os representantes em Assembléia Geral para um mandato

de dois anos, sendo permitida a recondução;

c) Comissão Consultiva – composta por nove membros (três

representantes de usuários da água, três representantes da população

da bacia e três representantes dos órgãos públicos), eleitos entre os

membros do Comitê, também por um período de dois anos, sendo

permitida a recondução, desde que 50% de seus membros sejam

substituídos. A função da Comissão Consultiva é de apoiar a

Presidência. A distribuição regional dos membros é obrigatória, devendo

ser três representantes do Alto Vale, três do Médio Vale e três da região

da Foz do Rio Itajaí;

d) Secretaria Executiva – coordenada por um Secretário Executivo

eleito em Assembléia Geral, podendo ser reeleito ou contratado pela

Agência de Água, desde que homologado em Assembléia Geral. A

função da Secretaria Executiva deverá ser exercida pela Agência da

Água, tão logo esteja adequadamente em funcionamento;

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100

e) Diretoria – formada por 12 membros eleitos em Assembléia Geral

também por um período de dois anos. A diretoria é composta pela

presidência, secretaria executiva e comissão consultiva, que se reúnem

ordinariamente uma vez por mês e extraordinariamente sempre que

houver convocação solicitada pelo Presidente;

f) Câmaras Técnicas – efetivadas em 25/09/2004, muito embora já

estivessem previstas, segundo a alteração do regimento. Podem ser

órgãos permanentes ou temporários, subordinados ao Comitê.

Em caso de necessidade de preenchimento de vagas, tanto na diretoria

como no quadro de representantes, seja por desistência ou em função da troca de

cargos públicos, é realizado novamente processo de indicação e votação em

Assembléia Geral.

O Comitê do Itajaí tem sua sede estabelecida na FURB e conta com apoio

técnico, financeiro e institucional dessa entidade. Representa ainda um importante

campo de pesquisa para o IPA da FURB. Participam da secretaria do Comitê uma

bolsista da FURB com 20 horas, um funcionário da instituição com 40 horas, um

funcionário contratado pela Agência da Água, além da secretária executiva do

Comitê que também é professora daquela Universidade.

A Agência da Água do Vale do Itajaí é a entidade executora da gestão da

água nos 50 municípios que compõem a bacia. É o braço executivo do Comitê. Tem

sua sede localizada na FURB junto à secretaria do Comitê. Entre as funções da

entidade está o estudo de consumo para definir preços que serão cobrados pela

utilização da água em todos os estágios, além da elaboração de propostas para

controle de quantidade e qualidade dos recursos hídricos na bacia do Itajaí.

A atribuição mais urgente da Agência já está em andamento, trata-se da elaboração

de um cadastro de usuários, com informações detalhadas sobre o volume e o fim a

que se prestam os recursos hídricos em todo o Vale do Itajaí, para se definir um

modelo de cobrança.

Os objetivos e competências do Comitê do Itajaí estão em conformidade

com o previsto pela Lei Federal 9.433/97. Entretanto, percebe-se no regimento do

Comitê do Itajaí43 alguns objetivos específicos relativos ao problema das enchentes:

43 Disponível em: Erro! A referência de hiperlink não é válida. Acessado em: 14 de abr. 2005.

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101

o de promover a integração das ações na defesa contra eventos hidrológicos que

possam oferecer riscos à saúde e a segurança da população, bem como, prejuízos

financeiros e sociais; combater e prevenir as causas e efeitos adversos da poluição;

das inundações; estiagens; erosão do solo e do assoreamento dos corpos d’água

nas áreas urbanas e rurais; apoiar e incentivar a criação e implementação de

unidades de Conservação na Bacia do Itajaí.

Além do apoio da FURB o Comitê conta com alguns convênios em execução

e, outros, em fase de negociação, dentre os quais podem-se salientar os firmados

com a AMFRI; com a Associação dos Municípios do Vale do Itajaí – AMVI; AMAVI;

Associação Comercial e Industrial de Itajaí – ACII; ACIB; ACIRS; Cooperativa

Regional Agropecuária Vale do Itajaí – CRAVIL; Serviço Autônomo Municipal de

Água e Esgoto – SAMAE; e CELESC. Alguns desses convênios foram solicitados

para reembolsar à FURB e cobrir as despesas da Secretaria e para dar continuidade

a alguns projetos, ficando a Agência da Água do Itajaí, enquanto órgão responsável,

para alocar esses recursos.

Há um convênio com a Petrobrás no valor de R$ 3 milhões proveniente da

premiação ao Projeto Piava, destinado à recuperação da mata ciliar.

A Bunge Alimentos destinou verba no valor de R$ 50 mil para o Programa da

Semana da Água de 2005, orçado inicialmente em R$ 100 mil. A empresa Souza

Cruz também foi contatada, mas a oferta de R$ 4,5 mil, considerada muito baixo, foi

recusada, tendo em vista que havia sido estipulado que as cotas de patrocínio para

divulgação e confecção de cartilhas e folders não seriam pulverizadas.

Encontra-se em fase de tramitação o pedido de convênio junto à Gerência

de Recursos Hídricos44 – GRH no valor de R$ 43 mil para a compra de

equipamentos.

5.1.2 Projeções e ações do Comitê do Itajaí

Dentre as ações concretas apontadas por Frank e Bohn (2003, p. 227) do

Comitê do Itajaí no período de 1996 a 2002, estão um Workshop realizado em 1997,

sobre os sistemas de contenção e previsão de cheias. Participaram do seminário

órgãos municipais e estaduais de defesa civil, de meteorologia e abastecimento de

44 A Gerência de Recursos Hídricos é um setor do Instituto Estadual de Meio Ambiente e Recursos Hídricos – IEMA.

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102

água. Como resultado desse encontro foi impetrada uma ação civil contra a União e

contra o Estado de Santa Catarina, para assegurar que esses entes cumpram a

manutenção das barragens.

Em 1998, o Comitê do Itajaí promoveu viagem de estudos a países

europeus, para que um grupo de representantes do Comitê, composto por técnicos,

empresários e lideranças políticas pudessem conhecer técnicas modernas de

prevenção de cheias. A viagem conhecida como Missão Europa é classificada por

Frank e Bohn (2003) como ação estratégica e educativa. As autoras apontam como

resultado da Missão Europa o Workshop realizado em 1999, intitulado Pacto para

prevenção e controle de enchentes no Vale do Itajaí. O acordo que resultou desse

seminário foi aprovado pelo Conselho Estadual de Recursos Hídricos, em março de

2000, sendo utilizado como plano provisório da bacia. (MAIS, 2001). O pacto teve

como objetivo definir as diretrizes para o plano de prevenção e controle de

enchentes no Vale, servindo de instrumento para subsidiar as negociações do

Governo do Estado com o Overseas Economic Cooperation Fund – OECF.

Por contemplar diretrizes que subsidiam as ações do Comitê consideram-se

relevantes transcrevê-las, pois serão importantes para a compreensão sobre a

dinâmica do Comitê.

Frank e Bohn (2003) assinalam as seguintes diretrizes:

a) gerenciar a rede de drenagem;

b) atingir, em cinco anos, no mínimo 35% de cobertura vegetal por

município;

c) manejar adequadamente os cursos d’água;

d) aumentar o conhecimento e convivência com as cheias;

e) usar e manejar adequadamente o solo em atividades agropecuárias;

f) implantar e adequar os planos diretores municipais;

g) controlar a rede de drenagem;

h) gerenciar as águas pluviais;

i) estabelecer mecanismos de cooperação e parcerias.

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103

Percebe-se uma mudança de foco em relação ao Projeto JICA. Enquanto

aquele restringia as ações apenas a medidas estruturais intensivas, o pacto para

prevenção e controle de enchentes no Vale do Itajaí contempla apenas uma, ou

seja, a linha ‘g’ que prevê o controle da rede de drenagem. Conforme Frank e Bohn

(2003), as diretrizes traçadas pelo pacto compreendem ações como:

1. implantar reservas legais, recuperar e manejar a mata ciliar,

implementar florestas comerciais, criação de unidades de

conservação (parques e reservas) para manter e enriquecer a

cobertura florestal atual a fim de alcançar o objetivo da diretriz b;

2. retirada de entulhos, evitando novas deposições, manutenção do

curso de água na sua configuração original, uso múltiplo das

estruturas hidráulicas existentes, estudo da viabilidade de pequenas

retenções nas microbacias, observância da legislação em projetos de

construção de açudes, lagoas e tanques, em conformidade com a

diretriz c;

3. planejar propriedades agrícolas considerando a aptidão do solo e

limitações legais, utilizar práticas conservacionistas, mecânicas e

vegetativas, integrar e realocar estradas vicinais e corredores,

subsidiando desta forma a diretriz e;

4. aumentar a cobertura na área urbana, restringir áreas urbanas

impermeabilizadas, implantação e adequação de sistemas de

drenagem pluvial, manutenção dos sistemas de drenagem

implantados, destino adequado do lixo e entulhos, implantar medidas

de retenção e infiltração de águas pluviais, em conformidade com a

diretriz h.

Dentre as linhas de ações decorrentes do pacto criadas pelo Comitê do Itajaí

destacam-se, a “Semana da Água”, instituída em 1999, e o “Programa de

Recuperação da Mata Ciliar”, aprovado em 2001, a seguir, ambos objeto de nossos

comentários.

5.1.3 A Semana da Água

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Instituída pelo Comitê do Itajaí desde 1999, a Campanha da Cidadania pela

Água no Vale do Itajaí denominada Semana da Água é uma “campanha de caráter

educativo, de envolvimento comunitário e de preservação ambiental”45 conforme

consta no site do Comitê www.comiteitajai.org.br. Esta se realiza uma vez ao ano, no

mês de setembro, envolvendo os municípios que compõem a Bacia. Tem como

principal objetivo conscientizar a população, especialmente as crianças sobre a

importância da conservação da água.

A Semana da Água, atualmente, faz parte do calendário de eventos dos

municípios que fazem parte da Bacia bem como, de eventos sobre Meio Ambiente

na região. Integra o plano de ensino das escolas particulares, estaduais e

municipais.

A coordenação geral da Semana da Água é de responsabilidade da

Secretaria Executiva do Comitê, com auxílio de coordenações regionais dos

municípios de Itajaí, Blumenau, Brusque, Ibirama, Ituporanga, Taió, Timbó e Rio do

Sul.

Anualmente, o Comitê do Itajaí elabora e distribui cartilhas e folders

educativos e explicativos para as instituições da Bacia, sugerindo temas para

discussão.

5.1.4 Programa de Recuperação da Mata Ciliar

Aprovado pela deliberação n. 6 do Comitê do Itajaí em 10 de maio de 2001,

tem como objetivos principais de acordo com Frank (2001):

[...] recuperar a mata ciliar em pelo menos um trecho de rio ou ribeirão em todos os 47 municípios da Bacia Hidrográfica do Itajaí, perfazendo no mínimo 900 Km da mata ciliar em recuperação em três anos;

[...] dar início à capacitação dos municípios para a recuperação e a preservação dos recursos hídricos, fazendo com que esta prática se incorpore às administrações municipais. (FRANK, 2001, p. 65)

O Instituto de Pesquisas Ambientais da FURB, é o responsável pela

coordenação executiva do Programa. A coordenação geral é realizada por seis

pessoas quatro vinculadas à FURB, uma à Companhia Integrada de

45 Disponível em: www.comiteitajai.org.br. Acessado em 20 jun. 2005.

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105

Desenvolvimento Agrícola de Santa Catarina – CIDASC, e uma à EPAGRI. Até

agosto de 2002, o Programa de Recuperação da Mata Ciliar havia sido

implementado em dez municípios46, alcançando um total de 41,89 Km de matas

ciliares reflorestadas, envolvendo 105 proprietários de áreas rurais.

5.1.5 Cobrança da Água

O processo de cobrança da água, segundo relata Cardoso (2003), se

fundamenta no princípio de valorização da água, enquanto bem econômico.

Representa um instrumento que tem como objetivo assegurar o uso racional da

água, bem como, conseguir recursos para financiar programas, que levem à

melhoria da qualidade e quantidade das águas. Aos Comitês de Bacias cabe a

responsabilidade de estipular os valores da cobrança conforme o princípio do

poluidor-pagador, que significa pagar de acordo com o nível de poluição despejado

nos corpos de água. A autora ainda diz que a cobrança da água é um instrumento

que vai desempenhar papel estratégico na definição das relações de poder que

ocorrem dentro dos Comitês.

Na bacia do Itajaí a cobrança da água estava prevista para 2003, de acordo

com estimativas realizadas em 2001, quando foi instituída a Agência da Água. O

cronograma para o início da cobrança pelo uso da água faz parte dos requisitos

primordiais para a implementação da Agência. O modelo de cobrança e cadastro

dos usuários está sendo elaborado pela Consultoria Brasil-Alemanha e Saneamento

Ltda. – COBAS, com apoio financeiro da Agência GTZ da Alemanha.

Maçaneiro (2003) relata que a proposta do modelo de cobrança foi

amplamente discutida em março de 2002, com todos os grupos representados no

Comitê, recebendo aprovação de setores industriais, geração de energia elétrica e

abastecimento público, mas que foi motivo de protesto por parte do setor rural. O

assunto ainda foi motivo de discussões mais amplas, mas, atualmente, sua

continuidade depende de complementação na legislação do Sistema Estadual de

Gerenciamento de Recursos Hídricos – SEGRH.

46 Os municípios contemplados com o Projeto até agosto de 2002 foram: Blumenau, Braço do Trombudo, Ibirama, Mirim Doce, Presidente Getúlio, Presidente Nereu, Petrolândia, Vitor Meirelles, Vidal Ramos e Trombudo Central

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106

5.1.6 Projeto Piava

O Projeto Piava é uma proposta elaborada e desenvolvida pelo Comitê,

visando desenvolver e implantar nos municípios da Bacia uma política de proteção

da água, através de ações educativas, do fortalecimento de relações participativas e

do desenvolvimento de ações que possam reverter o quadro de degradação das

pequenas bacias hidrográficas47.

O Projeto conta com apoio financeiro da Petrobrás e de parcerias com

diversas instituições que atuam na bacia. A administração do Projeto está a cargo da

Agência de Água do Vale do Itajaí e encaminhado de forma colegiada palas

instituições parceiras, através de uma Câmara Técnica instituída pelo Comitê.

O Projeto Piava pretende atuar para minimizar a degradação física e

melhorar a qualidade da água de pequenas bacias tanto em áreas rurais como em

áreas urbanas.

5.1.7 Atividades diversas

O Comitê vem desenvolvendo além das atividades previstas em suas

diretrizes, intervenções em questões relacionadas à construção da Usina de Salto

Pilão, criação do Parque Nacional do Itajaí, parceria técnica entre os projetos Piava

desenvolvido pelo Comitê e o Micro bacias 2, instituído pelo Governo do Estado,

bem como, atuando junto ao Conselho Estadual de Recursos Hídricos com objetivo

de adequar a Legislação Estadual à Legislação Federal.

No presente capítulo constatou-se que a ênfase no problema das enchentes

na bacia foi socialmente construída, e encontra-se no epicentro, tanto das projeções

e ações do Comitê do Itajaí como, também, nas publicações científicas sobre a

Bacia. As relações de poder se evidenciam, particularmente no que diz respeito aos

atores envolvidos em ensino e pesquisa, bem como, integrantes de diversos setores

da indústria e comércio. No próximo capítulo, tratar-se-á mais especificamente sobre

essas relações de poder no campo dos recursos hídricos.

47 Disponível em: www.comiteitajai.org.br. Acessado em 20 jun. 2005.

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107

CAPÍTULO VI

AS PERCEPÇÕES DOS REPRESENTANTES DO COMITÊ DO ITAJAÍ:

CONSENSOS E DISSENSOS EM RELAÇÃO À GESTÃO DOS RECURSOS

HÍDRICOS

Apresentar as percepções dos representantes do Comitê do Itajaí referente

à gestão dos recursos hídricos, atuação, conquistas e impasses, com o propósito de

compreender o que pensam os atores sociais que integram este mesmo Comitê é o

que se propõe a conferir no presente capítulo.

Esse procedimento tem sido adotado por outros estudiosos como se pode

conferir em o Mito Moderno da Natureza Intocada, em que Diegues (1996) aponta

que em espaços comunitários torna-se necessário analisar o sistema de

representações que indivíduos e grupos fazem de seu ambiente, pois é com base

nelas que eles agem sobre o meio ambiente. Nesse sentido, foram levantadas

algumas questões referentes aos recursos hídricos.

Entre as respostas apareceram algumas falas que lembram o que autores

como Chauí (1994), Müht (1996), Dalbosco (1996), Boeira (1998), apontam como

resultantes da legitimação da racionalidade instrumental48 pela cultura ocidental.

Fornecer qualidade ao produto final depende da água bruta que captamos. Ela é nossa matéria prima. (Representante 1)

Então é nosso interesse em ter água com abundância para gerar, apesar de pouca, mas suficiente para ganhar dinheiro. (Representante 2)

Pelo menos teoricamente, alguns segmentos da sociedade contemporânea

têm buscado superar o dualismo cartesiano da relação sociedade-natureza. A

ruptura do paradigma cartesiano implica em se pensar essa relação como partes

constituintes e constitutivas do mesmo processo civilizacional. Entretanto, na prática,

48 Segundo estes autores o conceito de racionalidade instrumental na cultura hegemônica do Ocidente, como paradigma de conhecimento, teve sua origem na modernidade, mais especificamente com o positivismo, passando a constituir o alicerce sobre o qual a ciência moderna estaria ancorada. A racionalidade instrumental ao dicotomizar a relação homem/natureza introduziu a noção equivocada da natureza como provedora ilimitada de recursos naturais, legitimando o discurso da supremacia do desenvolvimento, o que tem levado a sociedade a cometer agressões ao meio ambiente com conseqüências imprevisíveis para a vida no planeta. Os pensadores iluministas acreditavam que através da razão e da ciência o homem alcançaria a justiça, a igualdade e a felicidade. Entretanto, as análises contemporâneas apontam que a sociedade que se construiu com base nesta racionalidade tem sido individualista, socialmente injusta e excludente.

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108

como se percebe nas falas dos representantes 1 e 2, ainda prevalece à dicotomia e

a supremacia da racionalidade econômica.

Mas há outras preocupações expressas em suas falas:

Sempre fui engajado com as questões relacionadas ao meio ambiente. A água é um recurso fundamental para a manutenção da vida no planeta. (Representante 4)

Tenho grande preocupação com o futuro da água. Se não cuidarmos vai faltar. (Representante 5)

A maneira como os representantes 4 e 5 se referem à água revela também

uma tendência em considerar os recursos hídricos como um compromisso enquanto

engajamento político, apontando a preocupação na preservação destes recursos

para as gerações futuras. No Brasil, essa preocupação começou a tomar corpo na

segunda metade da década de 1970, quando pequenos grupos ambientalistas se

uniram nas principais cidades da região Sul-Sudeste, com o objetivo de denunciar as

empresas causadoras de degradação ambiental. Muito embora o ecologismo ainda

não tivesse “[...] influência no debate global das questões nacionais nem tampouco

nas ações governamentais.” (FERREIRA, 1992, p. 22)

A fala do representante 3 expressa que além de uma preocupação com a

situação de poluição dos recursos hídricos, há necessidade de uma maior

conscientização do problema por parte dos agricultores.

Meu trabalho é junto aos agricultores, minha preocupação é com a qualidade da água, vejo a necessidade urgente de mudança de mentalidades. (Representante 3)

Baquero e Gonçalves (1998, p. 181) no ensaio “Educação e cidadania;

processos sociocognitivos e argumentação”, enfocam que um processo de

conscientização crítica49 deve levar o homem a uma transformação radical na forma

de compreender o mundo e o seu contexto particular, de forma a possibilitar que ele

participe efetivamente na realidade, “[...] visando torná-la mais humana através de

suas ações concretas.” Nesse sentido, a “mudança de mentalidades” citada pelo

representante 3, será eficaz se for pensada a partir dos pressupostos considerados

pelos autores acima mencionados.

49 Paulo Freire (1982) denominou o processo e de desenvolvimento da consciência crítica de conscientização.

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109

Os depoimentos apontam, também, divergências nas falas dos

representantes, o que pode levar a realização de práticas ambíguas.

Os discursos ambíguos podem ser decorrentes da função exercida fora do

comitê, instituição e categoria de usuário que o entrevistado representa, posição que

assume no interior do Comitê, variando conforme a multiplicidade de papéis que um

mesmo ator possa estar desempenhando. Isso fica explícito quando um membro dos

usuários da água e que desempenha importante função no Comitê ora formula sua

compreensão sobre os recursos hídricos de acordo com uma visão preservacionista,

preocupado com a comunidade e com as gerações futuras, ora responde de forma a

atender interesses de um segmento industrial do qual é representante, portanto,

imbuído de uma lógica capitalista.

Como todos sabem a água é de fundamental importância para o ser humano e a preservação da mesma é muito importante para a comunidade. Temos que preservar este bem precioso que temos nas mãos para que as gerações futuras possam usufruí-la. (Representante 6)

Conforme ata50, datada de 14 de abril de 2005, realizada em Rio do Sul, a

fala do mesmo representante assume não mais prioritariamente, o discurso de

membro do Comitê, mas revela outros interesses, no caso, o de classe. De acordo

com o documento, o representante mostra-se disposto a coordenar o Grupo de

Trabalho para verificação de funcionamento das barragens porque “[...] tem

interesse de aproveitamento econômico, pessoal e financeiro”. O mesmo ator em

outro momento da entrevista, quando questionado sobre a importância dos recursos

hídricos deixa claro essa multiplicidade de papéis e dificuldade em priorizar o de

representante do Comitê em detrimento de sua posição profissional e social: “[...]

considero que os recursos hídricos são de fundamental importância tanto para minha

empresa quanto para a sociedade.”

Podem-se constatar contradições nas falas do representante 6, acima

citadas, segundo o qual “[...] não há interesses econômicos ou políticos e, se houver

estas pessoas estão atuando camufladas.” O representante 2, que embora tenha

declarado que acredita que não haja nenhum tipo de interesse, pois, “[...] por

enquanto ninguém demonstrou, pelo menos de maneira clara”, em outro momento

50 Disponível em:www.comiteitajai.org.br. Acessado em: 25 jul. 2005.

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110

da entrevista declara que “[...] é nosso interesse em ter água com abundância para

gerar energia, apesar de pouca, mas suficiente para ganhar dinheiro.”

A maioria dos depoimentos revela o Comitê como sendo um espaço em que

atuam os mais variados tipos de interesses. Assim, questionados sobre o assunto,

os representantes expressaram:

Seria muita idiotice uma pessoa participar assim tão desprovida de tudo. (Representante 7)

Tem muito interesse. Um tem interesse político, o outro participa porque, ah! eu tenho que estar representado. As instituições por sua vez indicam por que tem determinados interesses que na maioria das vezes são conflitantes com os objetivos do Comitê. (Representante 3)

Eu acho que sim. Por exemplo, se hoje um município que tem uma força industrial grande e se começarem a impor medidas de ajustamento de conduta nessa questão da poluição de efluentes, e ter seu próprio tratamento de água, ele não vai concordar em colocar em cheque a questão econômica do município. (Representante 12)

Sem dúvida que sim. Tem interesse pessoal, político e econômico. A questão da cobrança da água foi um exemplo claro disso. O processo começou a emperrar porque bateu nos interesses econômicos e políticos de muita gente lá dentro. (Representante 4)

Tenho certeza que sim. Tem muitos órgãos, empresas e entidades fortes representadas lá dentro cada qual lutando pelos seus interesses. Eu acho que tem um objetivo comum do Comitê que é buscar uma forma de gerenciar a água, por outro lado, cada segmento, ali representado, tem seus interesses e por esse motivo é que estão ali. (Representante 10)

Somos capitalistas. Quem garante que qualquer entidade representante do Comitê não está ali pelo dinheiro ou pelo poder político? (Representante 1)

Os interesses econômicos muitas vezes são confundidos com os interesses

da comunidade e por este motivo podem influenciar em algumas definições do

Comitê do Itajaí. De acordo com Ata51 da Assembléia Geral Extraordinária de

13/08/2005, cujo mote principal era esclarecer os representantes sobre os impactos

ambientais e a construção de um parecer a ser enviado para o Governo do Estado

sobre o projeto de construção da Usina de Salto Pilão, o então presidente do Comitê

51 Disponível em:www.comiteitajai.org.br. Acessado em: 2 jul. 2005.

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concluiu os trabalhos do dia chamando a atenção para o fato de que: “Santa

Catarina não tem energia suficiente para a produção e que isto pode acarretar

aumento de ICMS. Por isto, a usina é bem acolhida, desde que garanta os anseios

da comunidade.” O papel do Comitê para dirimir conflitos econômicos e políticos fica

evidenciado ainda na fala do presidente quando o mesmo admite que:

[...] o papel do Comitê é exatamente o de mediar conflitos entre a comunidade e o Consórcio, sempre atendendo a lei. Nossa função é mediadora, para preparar os nossos parceiros, que de um lado é o Consórcio52 de outro lado é o Estado.

De acordo com o estatuto do Comitê este tem sim, a função de solucionar

conflitos sem, contudo, priorizar os aspectos econômicos ou políticos das partes

interessadas. Como mediador o Comitê deveria se abster de induzir os

representantes a tomar decisões que são contrárias a maioria da população

envolvida. A reunião ocorrida em 25 de setembro de 2002, no Salão da Comunidade

Luterana em Ibirama e que contou com a presença de autoridades do meio

ambiente, empreendedores, ambientalistas além de cerca de 300 pessoas da

comunidade local que se expressaram contrárias ao empreendimento, reflete que

diante de interesses econômicos e políticos a voz da comunidade ainda não

encontra respaldo para suas reivindicações.

Segundo Reis e Bloemer (2001),

[...] não somente as populações removidas das áreas requisitadas para a instalação de hidrelétricas têm sofrido os efeitos socioambientais delas decorrentes. A rigor, a implantação de tais obras, para além de seus beneficiários – entre os quais grupos empresariais e industriais, as empreiteiras e os consórcios de empreendedores –, acaba por criar milhares de outras vítimas, entre elas as populações que permanecem nos espaços alterados. Estas têm igualmente seu patrimônio natural e seu espaço social mutilados. (REIS e BLOEMER 2001, p.13)

O Comitê deveria, portanto, atuar enquanto órgão regulador e fiscalizador

que visa os interesses da comunidade em sua totalidade. Nesse contexto, vale

ressaltar que enquanto representantes do Comitê estes atores deveriam nortear

suas ações, buscando soluções dentro dos princípios da Lei 9.433/97, baseando-se,

52 O consórcio empresarial Salto Pilão é formado pelas empresas CPFL – Geração de Energia, Alcoa Alumínio, Camargo Correa e Votorantim Cimentos, que obtiveram direito, em leilão, por 35 anos de exploração do aproveitamento hidroelétrico.

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112

entre outros, na defesa do uso múltiplo das águas, na igualdade de direitos ao uso

da água por todos os setores da sociedade. Nesse sentido, afastar qualquer

tentativa de hegemonia no seu uso, na garantia da gestão descentralizada e

participativa, na compatibilização entre a gestão dos recursos hídricos e o uso do

solo e na construção de instrumentos que possibilitem que o processo de cobrança

da água seja aplicado de forma socialmente justa. As ações dos representantes

deveriam portanto, ser pautadas para a resolução de conflitos que atendam os

interesses da coletividade.

Muito embora Jacobi (2003, p. 315) afirme que: [...] a lógica do colegiado

permite que os atores envolvidos atuem, a princípio tendo como referência seu rol de

responsabilidades e atribuições no intuito de neutralizar práticas predatórias

orientadas pelo interesse econômico ou político“, percebe-se que na dinâmica do

Comitê do Itajaí ainda prevalece o modelo tradicional de gestão orientado para

interesses específicos.

As motivações que levam os representantes a participarem ativamente do

Comitê são bastante diversificadas. Conforme o discurso da representante abaixo:

Tenho interesse em participar de qualquer coisa que se relacione com o meio ambiente [...] no meu caso é mais por vaidade, quero que se lembrem de mim como uma pessoa informada e não como dona de casa lavando e passando. Só quem é visto é lembrado. (Representante 7)

Esta fala revela o baixo nível de politização do membro do Comitê, que não

se vê como representante da comunidade, mas participa numa condição que

satisfaz apenas a sua pessoa. O representante 7 se posiciona a partir de uma lógica

egocêntrica, revelando falta de consciência social e política, fruto do

enclausuramento do individualismo e da ausência de um aprendizado de cidadania.

Já o representante 1, tem uma visão voltada à preservação ambiental:

Por algumas migalhas invadimos áreas que deveriam ser de preservação permanente. [...] minha maior preocupação é que do jeito que a coisa vai, não vamos ter muito que deixar para os nossos filhos. (Representante 1)

Os representantes 8, 2 e 4 apontam a importância do Comitê para a

sociedade

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Acho que estou motivado porque participo desde a estruturação do Comitê. (Representante 8)

Eu participo do Comitê desde 96, então eu acho que estou motivado porque sei da importância do Comitê para a sociedade. (Representante 2)

Sim, estou motivado porque vejo os avanços obtidos no sentido de ir melhorando a conscientização e a participação da sociedade, principalmente do setor rural. (Representante 4)

A motivação destes atores pode ser compreendida sob dois aspectos:

primeiramente por terem participado desde o início da formação do Comitê poderiam

continuar acreditando em um propósito “idealizado”. As enchentes periódicas que

assolam o Vale do Itajaí, criaram uma aliança, uma sinergia entre autoridades

municipais, associações de classe e pesquisadores principalmente da universidade

local, na busca de ações para fazer frente ao problema, o que conferiu a estes

atores status de autoridade e legitimidade.

Outro aspecto que vale a pena mencionar, refere-se à possibilidade dos

representantes (1, 2, 8 e 4) continuarem motivados por não se sentirem ameaçados

pelas definições tomadas pelo Comitê, uma vez que suas funções laborativas estão

relacionadas a órgãos públicos. Nesse caso, expressam publicamente sua

preocupação com os aspectos ambientais, ou seja, a preocupação do ambiente é

recorrente em seus discursos, porque não há aparentemente, possibilidade de terem

seus interesses prejudicados tal como ocorre com os empresários e outros setores

produtivos.

Se por um lado, têm-se representantes que continuam motivados, essa

posição não é homogênea em relação ao conjunto dos seus membros. Há entre

estes, outros que se apresentam desmotivados apresentando inclusive críticas ao

Comitê:

Hoje apesar de afastado do Comitê percebo que as pessoas estão desmotivadas, a imprensa não divulga mais. [...] havia uma movimentação maior para envolver a comunidade, para integrar os municípios [...] a coisa tomou outro rumo, o Comitê ficou meio compartimentado. (Representante 4)

Me desmotivei quando percebi que os interesses de Blumenau prevaleciam. [...] Não concordei com as viagens da comitiva do Comitê para a Europa, gastaram uma verba que deveria ter sido

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aplicada em educação ambiental, para voltar com projetos que não tinham nada a ver com a nossa realidade. (Representante 9)

Motivação na verdade eu não tenho. Tenho mais é interesse em participar por causa da cobrança da água. (Representante 10)

Olha, não tem como ficar motivado. Eu costumo chamar as reuniões de encontro pornográfico. Porque é um blá, blá, blá em torno de gráficos e de dados que não tem quem agüente. Não é a toa que nas reuniões vão poucas pessoas, elas são tão maçantes, as vezes ficam rodando no mesmo ponto. (Representante 11)

O que se contata nas falas desses entrevistados é uma desmotivação, em

parte, decorrente da multiplicidade de interesses que se apresentam através de seus

representantes no interior do Comitê e, em parte, por pouca prática de lidar

democraticamente com a própria representação. Ou seja, a prática representativa se

apresenta ainda bastante incipiente atrelada a interesses pontuais e específicos.

Na tentativa de compreender as falas destes representantes não se pode

deixar de mencionar que apesar de contar nas duas últimas décadas com normas e

procedimentos democráticos a América Latina e, particularmente, o Brasil, tem

como lastro de sua atualização uma pesada herança antidemocrática. Nesse

sentido, o fim dos regimes ditatoriais deixou no cenário político-social, profundas

cicatrizes. As dificuldades resultantes deste passado recente, somadas a incipiente

democracia e a política neoliberal praticada desde o início dos anos 1990, que

fragilizou a capacidade de intervenção do Estado (via privatizações e terceirizações)

acentuaram ainda mais a exclusão social agravando problemas estruturais “[...] que

se refletem no desemprego crônico, na desconfiança e desencanto com a política e

na situação de incerteza dos cidadãos com seu futuro.” (BAQUERO, 2001, p. 30).

Nesse sentido, vale ressaltar o que Jacobi (2003) considera como um dos

grandes obstáculos encontrados nestes novos espaços colegiados que é a falta de

interesse e apatia na participação, resultante do baixo desenvolvimento da cidadania

e do “[...] descrédito nos políticos e nas instituições.” (JACOBI, 2003, p. 277)

A conjugação desses fatores tem dificultado a construção de práticas

agregativas e relações sociais pautadas no coletivo. Putnam (2002) considera que

regras de reciprocidade e experiências vitoriosas de cooperação no passado servem

de referência às ações futuras. De tal forma, que quanto mais interações recíprocas

na comunidade e redes de engajamento cívico, ao que o autor denomina de capital

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social, maior será a possibilidade de se fortalecer a sociedade como um todo, bem

como revitalizar a democracia num sentido mais social. (BAQUERO, 2001).

Quando questionados sobre o procedimento que os levou a ser candidatos a

representantes no Comitê, os entrevistados em sua maioria relacionaram sua

indicação ao cumprimento de ordem superior:

O meu chefe disse que tinha que indicar alguém, aí perguntou se eu aceitava. Eu disse que sim, claro, eu fui mais de metida. (Representante 7)

Comecei a participar por indicação do meu chefe. (Representante 2)

Fui indicado pela chefia da instituição a qual pertenço. (Representante 3)

Fui indicado pelo meu chefe. A instituição a que pertenço já vinha desenvolvendo alguns trabalhos em parceria com o Comitê. (Representante 1)

Participei desde a estruturação do comitê como convidado. Depois, quando passou a ter eleições eu fui indicado pelo diretor da instituição da qual faço parte. (Representante 8)

A prática da indicação, inviabiliza a verdadeira representação democrática,

expressando a presença e a continuidade de relações clientelísticas e hierárquicas

nas quais, para a análise em pauta, o indicado acaba não tendo autonomia de

expressão, porque é sabedor que sua posição deverá estar em acordo com a do seu

chefe e não necessariamente com a totalidade da instituição que representa.

As falas dos representantes apontam, também, para práticas

antidemocráticas, tendo em vista que o processo de representação não se dá via

eleição por seus pares dentro das instituições a qual pertencem, mas por intermédio

de indicação de chefias.

Diante dessas considerações pode-se assinalar a existência de obstáculos

que dificultam a participação cidadã nestas novas engenharias institucionais. A

história social e política do Brasil parece ter conformado sua cultura associativa,

caracterizada por relações sociais hierárquicas norteadas pelas idéias de mando e

obediência, que sustentadas pelas distintas formas de instituições sociais,

alimentam, reforçam e reproduzem o sentimento das classes socialmente

desfavorecidas de serem subalternas. A cultura de naturalização das desigualdades

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econômicas, sociais, étnicas religiosas de gênero e todas as formas de violência são

condicionantes histórico-sociais que determinaram relações políticas também

hierárquicas, que se consubstanciaram sob a forma do favor, do clientelismo e de

relações paternalistas, bloqueando tanto a prática da representação como a da

participação. (CHAUÍ, 1994; MARTINS, 1994).

A falta de compromisso com a construção de práticas democráticas fica

evidenciada também na fala do representante 5. Segundo o entrevistado “O meu

chefe me convidou para assumir a vaga da câmara dos vereadores porque nenhum

deles quis assumir”. Eleitos para representar os interesses da comunidade, os

vereadores eticamente deveriam participar nos assuntos relacionados com a gestão

da bacia na qual o município que representam faz parte e que reflete problemas que

dizem respeito à vida de todos os munícipes. Diante do distanciamento dos

vereadores em relação às demandas sociais, Frey (1996) considera que a

mobilização e a participação popular, “[...] seja através do orçamento participativo,

seja por meio dos conselhos populares ou por pressão direta em cima dos

vereadores”, tem sido adotadas como estratégias para “[...] introduzir os valores

sociais no processo político.”( FREY ,1996, p. 133).

Quando questionados sobre como são repassados os assuntos debatidos no

Comitê para as instituições as quais pertencem e o envolvimento das mesmas, as

respostas dos entrevistados refletem a desarticulação de alguns setores e o

interesse apenas por assuntos que consideram ser relevante para seus objetivos

institucionais.

O sindicato que eu representava é muito desarticulado, as pessoas só participam quando o assunto diz respeito a elas. Na verdade sobre o Comitê eu nem comentava, porque eu mesmo só participei pra ver o que ele tinha a ver com o nosso setor. (Representante 9)

No nosso sindicato é feito uma ou outra reunião, geralmente quando o pessoal procura é mais para resolver aquela situação que está se agravando. Como exemplo disso posso falar sobre a tal da cobrança da água. Quando o pessoal descobriu que estavam querendo botar mais taxa pra gente pagar, isso aqui (a sede do sindicato) ficou lotado, tinha gente até do lado de fora. Agora que não se falou mais no assunto, eles nem aparecem. (Representante 10)

A instituição da qual faço parte passa por sérias dificuldades. O repasse de informações ainda é um desafio a ser superado. Geralmente os assuntos mais pertinentes são repassados a minha

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chefia e daí por diante segue para os escalões superiores. (Representante 1)

Quando o assunto é relevante é feito uma comunicação via e-mail ou pessoalmente, dirigida ao meu superior. (Representante 8)

Quando é uma coisa pertinente como a questão da cobrança da água nós tivemos uma discussão com vários setores internos da empresa, todos foram envolvidos na discussão. No mais, quando o assunto é relevante é encaminhado internamente pelos escalões. (Representante 2)

Nós repassamos através das pessoas que estão hierarquicamente acima de nós, particularmente os assuntos mais relevantes. (Representante 3)

Na fala dos entrevistados percebe-se a falta de autonomia dos

representantes, a prevalência de formas tradicionais de gestão nas instituições

representadas, bem como revela uma participação ainda caudatária de interesses.

Muito embora Jacobi (2004) considere que a dinâmica do colegiado permita que

haja uma interação mais transparente entre os atores envolvidos, limitando as

oportunidades de abuso de poder, no caso do Comitê do Itajaí percebe-se que ainda

prevalecem relações de poder e interesses de minorias. As práticas clientelistas e

centralizadoras, a tradição estatista, a baixa politização dos atores sociais e a

fragilidade do tecido associativo são condicionantes que dificultam o processo de

formação de uma sociedade refratária a práticas voltadas ao coletivo. O

enfraquecimento do tecido associativo dificulta e enfraquece ainda mais a frágil

democracia brasileira.

Constata-se também que os próprios sindicatos entendem que sua

participação esteja vinculada apenas aos interesses muito pontuais dos

sindicalizados, tais como a taxação da água. Há, portanto, uma hierarquização de

interesses e conseqüentemente desinteresse pela atuação de forma mais ampla e

genérica, visando à administração da Bacia de forma a contemplar sua totalidade.

Isso revela a fragmentação do Comitê com reflexos na sua atuação.

Nesse sentido, constata-se que a representação do Comitê para a

sociedade apresenta as percepções dos representantes e estas são heterogêneas e

refletem o que Jacobi (2003) aponta como um dos obstáculos enfrentado pelos

comitês, ou seja, a divergência entre os atores envolvidos em relação ao processo e

aos objetivos dificulta a busca de soluções mais equânimes.

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Embora se apresente de forma heterogênea quanto a sua atuação, para a

maioria dos entrevistados o Comitê é considerado ainda, como referência, espaço

suprapartidário, como um fórum de debates e conquista da própria sociedade.

Entre os Comitês no Brasil o nosso já é uma referência. (Representante 1)

O comitê do Itajaí representa os interesses da sociedade, sendo ele uma peça fundamental. A sociedade deve questionar as ações tomadas e reivindicar seus objetivos. (Representante 6)

E ele representa uma conquista da sociedade. (Representante 4 e 8)

Acho importante porque ele tem caráter suprapartidário, para se discutir e chegar a medidas que resolvam o coletivo, promovendo políticas que possam ser seguidas por todos de forma igual. (Representante 12)

Representa um fórum de debates, ou seja, um fórum democrático formado por diversos segmentos. (Representante 2)

Eu acho que é a sociedade. Eu entendo o Comitê como uma fotografia do que você tem, que traria representada os interesses conflitantes, mas que é dentro desse jogo democrático que se tem que trabalhar. (Representante 3)

Na percepção destes representantes, o Comitê representa um avanço

democrático, na medida em que abre espaço para explicitar interesses específicos

dos mais diferentes setores da sociedade. Não se pode deixar de reconhecer a

importância de tal instância para uma sociedade que se pretende democrática.

Cunill (1998) enfatiza a importância da ampliação da esfera pública, haja

vista, que ela situa uma demanda à sociedade no sentido de alcançar uma maior

influência sobre o Estado, tanto para limitá-lo quanto para tornar suas ações mais

transparentes. Uma maior autonomia social é para o mesmo autor a possibilidade

de transcender as assimetrias bem como de modificar as relações sociais facilitando

uma maior auto-organização social.

Mas na percepção do representante 9, o Comitê tem a “função de acomodar

as pessoas” e de servir de “trampolim político”. Considera desnecessária a criação

do ComItê, porque segundo ele:

O Estado é que deve fazer o trabalho do Comitê. Se o Estado não está fazendo a parte dele, bota no jornal, faz manifestação pública

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para exigir.É coisa de cidadão. Se eu acho que está errado, eu vou pra rua berrar. (Representante 9)

A fala do representante 9, configura um pensamento que tem por base a

compreensão de poder unicamente nas mãos do Estado, de quem se espera

resultado e soluções para todos os problemas. Pode-se inferir que o representante

9, por seu status de empresário partilha do pensamento desenvolvido por Miliband

apud Marques (1997, p. 73), que aponta, dentro de uma explicação da natureza

clássica do Estado que o “[...] controle e a gestão do Estado estão a cargo da elite

estatal, que tem a mesma composição que a elite econômica.” Nessa perspectiva

segundo Marques (1997) o Estado seria controlado por pessoas que partilham dos

mesmos valores, visões de mundo e representações dos capitalistas.

Ainda em relação à representação do Comitê do Itajaí, o representante 10,

considera ser “um mal necessário”. Em contrapartida o representante 7, aponta a

necessidade de dividir a questão em duas respostas:

Primeiro vou falar da importância do comitê para a sociedade que entende. A sociedade que entende é um grupo que tem uma força política muito grande. São pessoas que tem um grau de instrução e que estão ligados de alguma maneira com o meio ambiente, ou que trabalhe na área ambiental, ou que sejam empresários, usuários da água, mais um usuário consciente. Por outro lado tem a população em geral que não tem idéia que tem alguém, que tem um grupo que ta trabalhando nisso. A importância no final das contas é a mesma, só que a população que não tem conhecimento, que nem sabe o que é um comitê vai ganhar de bandeja do grupo que pensa e trabalha no Comitê. (Representante 7)

A fala do representante 7, pode ser analisada sob duas perspectivas.

Primeiramente, como nesses espaços participativos ainda prevalece o conhecimento

técnico, mostrando uma relação assimétrica de poder existente entre peritos e

leigos.

A supremacia do conhecimento técnico-científico tem sido apontada por

autores como Guivant e Jacobi (2003) como um dos desafios apresentados para a

implementação de práticas participativas. De acordo com esses autores, o problema

está, por um lado, com a visão da população que tem o entendimento de que os

administradores e peritos são detentores de um conhecimento melhor, sobre o que é

recomendável para todos. “Por outro lado, há sérios obstáculos entre os próprios

sistemas peritos para efetivar tal desmonopolização”.(GUIVANT & JACOBI 2003, p.

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15) Para Jacobi (2004) apesar dos avanços da Lei 9433/97 esta apresenta

ambigüidades por abrir espaços de participação da sociedade civil ao mesmo tempo

em que reforça a “[...] importância do corpo técnico-científico e do conhecimento

produzido por eles nas relações de força no interior dos espaços decisórios da bacia,

o que limita o envolvimento da comunidade nas atividades dos comitês”.( JACOBI,

2004, p. 279)

Guha (2000) no artigo “O biólogo autoritário e a arrogância do anti-

humanismo”, expõe como o conhecimento científico tem sido imposto como uma

forma de saber dominante na sociedade ocidental que não respeita os saberes e as

experiências da população local, como pode ser constatado também, na fala do

representante 10, sobre a desconsideração do conhecimento técnico pelo saber e

vivencias dos agricultores:

Chegaram alguns infelizes, fizeram umas contas lá de consumo da água e disseram que nós é que somos os maiores consumidores e poluidores das águas. Não sei de onde tiraram isso, que mostra uma coisa totalmente fora da realidade. Eles nem deixaram a gente explicar como é feito o nosso plantio e o sistema de irrigação e já foram dizendo que somos os culpados. (Representante 10)

Em segundo, mostra claramente a articulação de uma elite que pensa e

decide os interesses de uma parcela da sociedade reforçando a cultura dos “não-

cidadãos”. Nessa perspectiva, o direito à participação social garantido pela

Constituição de 1988, e um dos principais objetivos para a existência do Comitê, não

deixa de ser uma panacéia.

Zarur em O ethos da elite: ensaios sobre a unidade nacional brasileira

(2000), analisa que a formação de uma elite brasileira tem raízes históricas que

remontam ao processo de formação social do povo brasileiro. Reis (2000) por sua

vez constatou através de uma pesquisa que a elite brasileira transfere para o Estado

a responsabilidade da desigualdade e exclusão social, se eximindo pela resolução

do problema. Na percepção das elites “[...] é o estado que carece de vontade e não

planeja bem suas ações”. (REIS, 2000, p.148) Nesse sentido, as elites eximem-se

de suas responsabilidades enquanto cidadãos.

Quando perguntados sobre os principais problemas relacionados aos

recursos hídricos na bacia do Itajaí os entrevistados foram unânimes em apontar a

precariedade no tratamento dos esgotos.

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Na minha opinião. O nosso maior problema é a falta de saneamento. (Representante 2)

Nós estamos consumindo água de esgoto. Atualmente eu vejo que a falta de um sistema de tratamento para o esgoto é um dos problemas mais urgentes da bacia. (Representante 10)

Como prioridade o Comitê deveria trabalhar no sentido de pressionar os municípios para implementar o tratamento de esgotos. (Representante 4)

Assim como aqui em Itajaí que somos uma cidade de 170 mil habitantes e que não há tratamento de esgoto os outros 49 municípios também têm a mesma realidade. Assim, eu acho que a prioridade não deveria ser a questão de plantar mudas de mata ciliar, mas de fazer um trabalho integrado para conscientizar o poder público da necessidade da implantação de um moderno sistema de tratamento. (Representante 12)

Pior, o mais urgente pra mim é a falta de tratamento do esgoto doméstico. Pra mim é esse, eu nem sinto os outros. (Representante 7)

Eu não tenho dúvidas disso, acho que o problema da falta de tratamento de esgotos é extremamente sério. (Representante 3)

Acho que o maior problema é o não tratamento dos esgotos pois cada cidade vai contaminando a próxima abaixo. (Representante 6)

Na maioria das cidades da bacia todas as questões de saneamento são precárias. (Representante 1)

O consenso das falas dos representantes em torno da necessidade de

implementação de sistemas de tratamento de esgoto para toda a Bacia do Itajaí

pode estar relacionado com o evento informativo e educativo promovido pelo Comitê

denominado de Semana da Água cujo tema em 2004 e 2005, tem sido a questão do

esgoto

A cartilha da Semana da Água de 2005, que tem como lema “Do rio que

você suja vem a água que você bebe”, publicada pelo Comitê do Itajaí prioriza o

processo de tratamento de esgotos do ponto de vista unitário e condominial. Não

traz dados ou informações sobre o posicionamento do Comitê e trabalhos

desenvolvidos junto aos órgãos públicos no sentido de pressionar os municípios e os

governos estadual e federal, na implementação de sistemas de coleta e tratamento

público de Estações de Tratamento de Esgotos – ETEs.

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Nessa mesma direção se por um lado, a consciência em relação à

necessidade do saneamento se faz presente, não se pode deixar de detectar nessas

falas uma cobrança de atuação efetiva por parte dos órgãos públicos.

O representante 4, critica este tipo de abordagem unilateral do Comitê, que

relega para segundo plano, a obrigatoriedade do Poder Público em arcar com

recursos que viabilizem a construção de um sistema de captação e tratamento de

esgoto.

Saneamento básico não é feito só com fossa e filtro. Hoje em dia quando se tira uma licença pra construção, eles vão lá fiscalizam pra ver se tu estas fazendo o tratamento individual. Mas e eles? O poder público joga a responsabilidade em cima do contribuinte, porque da parte dele não tem retorno não. Fossa e filtro não retêm clorofórmios fecais, ameniza, mas não é o suficiente, isso é só paliativo. O ideal era que construíssem uma rede de captação e um sistema de tratamento de esgoto geral para cada cidade da bacia. (Representante 4)

A falta de saneamento é um problema que não se restringe aos municípios

que compõem a Bacia do Itajaí, mas diz respeito a todos os estados brasileiros.

Conforme dados do IBGE (2005) apenas 20% dos esgotos coletados recebem

tratamento, contribuindo para um impacto negativo na qualidade ambiental das

bacias além de representar riscos à saúde da população. O Estado tem se omitido

nesse grave problema estrutural que é também social e político. O Estado joga a

responsabilidade para os estados e estes por sua vez para os municípios. Nesse

jogo de soma zero quem perde é a sociedade e o meio ambiente. A região da bacia

não é refratária à falta de interesse do poder público em relação à ampliação da rede

de saneamento básico. O jornal A Notícia em 2002, já anunciava que o Ministério

Público determinava que em breve espaço de tempo às prefeituras da região do

Médio Vale do Itajaí deveriam apresentar à Procuradoria da República um projeto

para tratamento do esgoto doméstico com objetivo de diminuir os índices de poluição

do rio Itajaí-Açu. Como se pode perceber já se está em final de 2005, e o problema

ainda continua longe de ser solucionado. Ciclicamente, o assunto falta de

saneamento vem à baila, especialmente próximo ao período de eleições.

Em relação às conquistas alcançadas pelo Comitê os representantes

apontaram a própria existência do Comitê, a conscientização ambiental realizada

principalmente através da Semana da Água, como fator agregador na luta por um

problema que afeta toda a população da bacia e o consenso entre empreendedores

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e ambientalistas. Alguns entrevistados apesar de apontarem o Projeto Piava como

uma conquista do Comitê, questionam a forma como o mesmo foi divulgado.

Eu penso assim: é muito complicado esse projeto porque se por um lado o meio ambiente não tem verba e o Comitê carece de recursos é compreensível que eles usem a lei de responsabilidade ambiental de empresas. Só que no caso do Projeto Piava o que ta sendo divulgado é que é premiação. Aí a coisa muda de enfoque. Tem que restringir a publicidade e não confundir responsabilidade da empresa que polui com prêmio ao projeto tal. (Representante 4)

Quando eu soube o projeto já tinha ganhado o tal prêmio. É difícil entender, porque quando é uma empresa que polui e todo mundo sabe que a Petrobrás é a empresa que mais polui o meio ambiente aí tudo bem, porque vai pra mídia e saí como prêmio. Agora com o agricultor aí a coisa muda. Ele é o vilão da história, principalmente nós os rizicultores. (Representante 10)

Eu analiso sob dois aspectos: o aspecto positivo é que ele pode promover a integração entre os municípios e como aspecto negativo é que ele foi divulgado assim de uma forma muito marqueteira Deveria ter sido divulgado que a empresa polui sim e por isso ela vai compensar patrocinando ações que diminuam os danos ambientais. (Representante 11)

Em relação ao Projeto Piava, durante as entrevistas, as falas de alguns

representantes deixaram evidente que não houve um debate sobre o projeto antes

de ser enviado a Petrobrás. Segundo eles, o projeto apesar de sua relevância é

questionável, porque acabou sendo apresentado como marketing ecológico da

empresa e não como uma forma de compensação ambiental pelos danos causados

ao meio ambiente.

O discurso do representante 10, reflete claramente o pensamento das bases

dos produtores rurais. “Agora, com o agricultor aí a coisa muda. Ele é o vilão da

história, principalmente nós os rizicultores”. Há entre os entrevistados o consenso

de que um dos grandes responsáveis pela poluição dos rios e corpos de água da

bacia do Itajaí são os rizicultores. Isso fica evidenciado na fala do representante 12:

Se tu passas por qualquer rodovia o que tu vê dos dois lados é plantação de arroz irrigado, que demanda uma grande quantidade de água e uso de agrotóxicos, [...] conforme estudos de técnicos sobre o assunto, a rizicultura consome hoje três vezes mais água que a população e devolve essa água ao rio sem nenhum tipo de tratamento. (Representante 12)

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124

Essa visão é amplamente divulgada pelos meios de comunicação,

principalmente aqueles que realizam matérias de âmbito nacional sobre os recursos

hídricos e que acaba sendo considerada como verdade absoluta, sem entretanto

considerar as especificidades regionais.

De acordo com Costa (2003), no Brasil, os sistemas de irrigação são em sua

maioria privados (cerca de 90%), obtendo água diretamente das margens dos rios,

sem armazenamento em barragens. Desde o início do processo de irrigação este foi

desenvolvido por agentes privados, sendo que 50% da área foram viabilizados com

a anuência e o apoio de algum tipo de programa oficial do governo.

No Vale do Itajaí a EPAGRI e a EMBRAPA vêm desenvolvendo, em

parceria, projetos junto aos rizicultores para a conscientização e produção de arroz

irrigado com baixo impacto ambiental. Cabe ressaltar que muitos agricultores

resistem em participar em novos projetos. Dentre várias possibilidades para explicar

o fenômeno, enfocamos a análise de Seibel (1994), que aponta entre os vários

determinantes, a insatisfação dos agricultores catarinenses com os Projetos de

Extensão Rural. A partir de 1975, esses programas começaram a receber críticas

em todo o País, perdendo sua legitimidade junto aos produtores rurais. A Igreja,

sindicatos, ambientalistas, academia e os próprios agricultores consideravam o

modelo desenvolvido até então, socialmente excludente e que fomentava uma

política de uso de agrotóxicos altamente poluentes.

Na literatura especializada não há estudos que avaliam ou que realizam

análises comparativas sobre a poluição nos corpos hídricos resultantes da rizicultura

e dos efluentes resultantes dos processos industriais.

Perguntados sobre as principais dificuldades enfrentadas pelo Comitê alguns

representantes apontaram a resistência de pessoas e instituições que ainda

desconsideram a importância dos recursos hídricos,

A falta de compromisso da grande maioria das entidades que fazem parte da composição do Comitê de entender que lutamos todos por uma causa e não por causas particulares (Representante 1)

O mesmo representante cita como exemplo,

As universidades que deveriam dar exemplo de comprometimento e desapego institucional, se deixam levar por ciúmes bobos,

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concepções infantis e não apóiam projetos brilhantes por não serem o pai da criança53. (Representante 1)

O representante 11, também partilha do mesmo pensamento, citando o caso

de,

Municípios que quando um projeto dá certo, são os primeiros a querer tirar a fruta do pé dizendo que eles é que fizeram, que defenderam a idéia, quando na verdade durante todo o tempo eles foram omissos. (Representante 11)

Os representantes 5 e 7, apontam a “[...] falta de recursos financeiros para o

Comitê se autogerenciar e implementar projetos”. Já para os representantes 3 e 8,

as maiores dificuldades enfrentadas estão relacionadas

[...] à falta de interação com os municípios e o governo do estado e a própria demora em aprovar as leis que regulamentam a Agência da Água. No âmbito federal nós esbarramos também com certas dificuldades.

De acordo com Jacobi (2002) as dificuldades de cooperação entre os entes

municipal e estadual obstruem a ampliação do poder local de gestão que somado à

fragilidade das instâncias participativas, reflete a supremacia e a continuidade dos

“[...] canais informais e da lógica da cultura política tradicional destas

administrações.” (JACOBI, 2002, p. 448).

No que diz respeito às dificuldades o representante 4, atribui ao tamanho da

bacia, a maior do estado.

Há uma diversidade muito grande de culturas de política, não há uma integração entre os municípios, de forma que é muito complicado gerenciar uma bacia com 15.500 km de extensão e que abriga quase um milhão de pessoas. (Representante 4)

O representante 2, diz que:

Uma das maiores dificuldades para o Comitê nesse momento, seria uma enchente. Desde que o Comitê foi criado não deu nenhuma enchente e foi ela que fez a gente se mobilizar, se articular. Então, esse é nosso velho fantasma, até hoje desde que o Comitê foi criado não deu nenhuma enchente forte, isso favoreceu a sobrevivência do Comitê, porque se der uma enchente como a de 1984, as coisas vão se complicar, porque efetivamente as atividades do Comitê não

53 Esta disputa entre instituições não foi foco de nossa análise, até mesmo, por dificuldade em obter informações descomprometidas com os interesses específicos.

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conseguiram reduzir os impactos que uma enchente pode causar. E isso pode significar o fim do Comitê. (Representante 2)

Vale lembrar que o Comitê foi instituído exatamente com o propósito de

colocar em prática, projetos que minimizem o problema das enchentes. O Comitê

têm desenvolvido projetos não-estruturais, ou seja, tem dado prioridade àqueles

voltados para medidas não estruturais como a “Semana da Água”, “Projeto Piava”,

“Recuperação da Mata Ciliar”, etc., cujos resultados são estimados em longo prazo e

pouco ou nada imediatos no controle das enchentes, por exemplo.

Outro aspecto abordado e que também é motivo de dissenso entre os

representantes é a cobrança pelo uso da água, contemplada pelo art. 3 da Política

Estadual de Recursos Hídricos de Santa Catarina.

Para o representante 2, a cobrança da água apesar de representar

[...] uma forma de viabilizar recursos para o Comitê, vai ser também motivo de muitos conflitos.É só começar a ter recursos financeiros que vão aparecer muitos grupos querendo capitalizar politicamente as ações.

As falas dos representantes a seguir apresentam semelhanças em relação à

cobrança da água.

Eu acho um contra-senso essa questão de cobrança da água porque daí nós estamos concordando que o cara polua. (Representante 9)

Pra mim é um disparate porque então, assim, quem polui paga e não tem nenhum benefício para quem não polui? É tudo igual? Então o que eles querem é que se polua bastante. (Representante 12)

O alerta desses representantes quanto às desigualdades de tratamento

dado aos usuários da água ao compreender é que os poluidores ao efetuar

pagamento já foram punidos, mas não estimula nem se premiam aqueles que não

poluem. Ou seja, não há com essa medida uma tentativa de erradicar e corrigir os

tratamentos inadequados ao ambiente, mas, ao que tudo indica o “pagar” é

suficiente. Como alertam os próprios informantes, essa medida pode gerar outros

focos de disputas entre as instituições que passarão a disputar esta arrecadação,

fragmentando e dividindo interesses coletivos.

Um dos representantes considera que o Comitê se precipitou ao discutir

sobre a cobrança da água. Segundo ele:

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Vai chegar uma hora em que a cobrança vai ser aceita, mas tem que amadurecer o processo, chamar a comunidade outra vez, trazer cursos de educação ambiental, mostrar um trabalho integrado, conscientizar até os próprios representantes, porque a coisa começou a emperrar quando bateu de frente com os interesses de grupos dentro do próprio Comitê. (Representante 4)

Esse representante não dispensa, portanto, um planejamento em médio e

longo prazo sobre as ações que o Comitê pretende implementar na Bacia,

envolvendo inclusive a comunidade, tal como, se preconiza para uma sociedade que

se pretende democrática.

Entre as sugestões dadas pelos representantes para melhorar os trabalhos

do Comitê incluem:

Deixar a cobrança da água para um momento em que as ações estejam mais consolidadas, em que as pessoas estejam mais amadurecidas com a própria atuação. (Representante 4)

Buscar parcerias e uma maior conscientização das pessoas que vivem na bacia, talvez o Comitê pudesse começar a se preocupar com a educação lá na escola, na comunidade. (Representante 3)

Execução de projetos de educação ambiental para as comunidades ribeirinhas da bacia. (Representantes 1, 2, 4 e 9)

Aplica-se à questão em pauta a noção de campo social em Bourdieu54(1998)

que ajuda a compreender o Comitê do Itajaí enquanto espaço de sociabilidade, onde

se produzem discursos e práticas específicos, que se constituem a partir da

interação dos representantes dos usuários da água, da população da bacia e dos

representantes dos órgãos da administração estadual e federal.

Nesse sentido, o espaço social é um espaço de relações em que a

correlação de forças entre os distintos agentes se define a partir do volume global e

da posse das diferentes espécies de capital.

No Comitê do Itajaí participam atores que compartilham valores comuns

como a essencialidade da água, a gestão democrática do uso da água, os múltiplos

usos, etc. Assim como também atores que se inserem nesse campo, porque são

indicados, na maioria das vezes por força das instituições as quais pertencem, ou

54 As reflexões que se seguem fazem parte do artigo: “A noção de campo de Bourdieu e as relações de poder nos recursos hídricos” de autoria desta pesquisadora, apresentado no Seminário de Pesquisa do Centro de Educação de Ciências Jurídicas, Políticas e Sociais – CEJURPS na Universidade do Vale do Itajaí, em set. de 2004.

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movidos por interesses particulares como por exemplo, necessidade de projeção

social, intelectual, política, bem como interesses econômicos.

Os representantes do Comitê se diferenciam a partir da distribuição desigual

de capital, que para Bourdieu (1998), corresponde a poder e dominação. Por tratar-

se de relações complementares: deter capital é deter poder que por sua vez implica

na capacidade de dominação. Como exemplo das relações de poder que se

estabelecem pode-se citar a própria formação do Comitê, ou seja, a problemática

das enchentes na região de Blumenau fez com que os atores de diversos

segmentos, como da universidade local, do comércio, indústrias, associações

comerciais se unissem em torno de um problema na busca por soluções. No

tecimento dessas relações interpessoais foram se estabelecendo relações de poder

econômico, de conhecimento técnico-científico, político, cultural, etc., legitimando os

agentes que detêm o máximo de capital social, denominados por Bourdieu (1998)

como agentes dominantes.

Bourdieu (1998) denomina agentes dominantes, aqueles que possuem um

máximo de capital social e que mantêm o monopólio do capital específico, atribuindo

ao campo poder e autoridade, de forma a desenvolver mecanismos que possibilitem

sua conservação enquanto agentes dominantes.

Percebe-se no Comitê do Itajaí, que os agentes dominantes impõem

conhecimentos, valores e princípios constituintes e constitutivos do campo social,

que foram aceitos e compartilhados pelos demais representantes do Comitê. Os

dominados por sua vez são aqueles que detêm menor quantidade de capital social –

definido como um conjunto de “[...] recursos e de poderes efetivamente utilizáveis.”

(BOURDIEU, 1998, p.128), e buscam desenvolver estratégias de subversão,

buscando inverter a ordem estabelecida no quadro do quantum social deficitário ou

desigual.

A principal característica do capital social apontado por Bourdieu é o fato de

a distribuição social ser necessariamente desigual e depender da capacidade dele

ser apropriado por diferentes grupos. Nesse sentido, a acumulação de capital social

pode ser interpretada, como o processo de acumulação de poder dentro do mesmo

campo social.

Ao estabelecer uma correlação com o marco teórico desenvolvido por

Bourdieu (1998) percebe-se que a estruturação do Comitê do Itajaí enquanto campo

social se constitui em um espaço de embates, de disputas entre os atores sociais em

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torno de interesses comuns e específicos e que visam à transformação desse

campo.

Ao mesmo tempo em que existem tensões entre os representantes do

Comitê, observa-se um sentimento de pertencimento ao grupo onde os agentes que

aceitam participar da luta partilham de uma cumplicidade que lhes é imanente,

contribuindo dessa forma para a reprodução de crenças e valores. A posição que

cada membro do Comitê ocupa no campo é que fundamenta a sensação de

pertencimento ao grupo.

Em relação aos representantes do Comitê do Itajaí, pode-se inferir a

existência nesse lócus, de conflitos, decorrentes pelo uso múltiplo das águas, a

outorga, a cobrança pelo uso da água, o embate político em torno do parecer sobre

a construção da Usina de Salto Pilão entre outros assuntos. Observou-se ainda na

dinâmica do Comitê do Itajaí, uma tensão constante principalmente, no que se refere

ao embate entre aqueles que defendem uma visão mais tecnicista no processo de

gestão e aqueles que possuem uma visão mais democrática. A desmotivação de

alguns representantes pelo fato do Comitê dar mais ênfase nas questões técnicas

serve como exemplo de uma ambivalência entre as visões, que tendem a priorizar

sempre um ou outro aspecto da questão.

A fala da representante 7, confirma a racionalidade do monopólio do

conhecimento científico que de acordo com Bourdieu,

O que está em jogo especificamente nessa luta é o monopólio da autoridade científica definida, de maneira inseparável como capacidade técnica e poder social; ou, se quisermos, o monopólio da competência científica, compreendida enquanto capacidade de falar e de agir legitimamente (isto é, de maneira autorizada e com autoridade), que é socialmente outorgada a um agente determinado. (BOURDIEU, 1998, p. 123).

Nesse sentido, a preponderância do discurso técnico-científico reflete

práticas sociais que estão estruturadas no interior da sociedade. Haja vista, que

referente aos recursos hídricos até a década de 1980, o

[...] modelo de gestão referia-se à restrição do assunto à esfera técnica, sendo que raramente a complexidade, abrangência e a importância do fator água eram consideradas em sua interligação com estruturas e processos sociais. (VICTORINO, 2003, p. 14)

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

O presente trabalho teve como objetivo analisar o potencial democrático e os

limites para a democratização do Comitê de Gerenciamento da Bacia Hidrográfica

do Itajaí

Considerou-se, de forma geral que os Comitês de Bacias no Brasil

representam uma conquista da sociedade civil na gestão dos recursos hídricos. A

experiência abre espaço para a articulação de novas formas de relação com o

Estado: maior publicização nas ações estatais e uma abertura à participação social,

conseqüentemente, possibilidade na formação de sujeitos sociais comprometidos

com objetivos comuns na transformação da gestão da coisa pública e na construção

de uma nova institucionalidade.

Em relação ao Comitê de Gerenciamento da Bacia do Itajaí, constatou-se

que o mesmo, muito embora represente um avanço, ainda não conseguiu se efetivar

enquanto espaço democrático. Os obstáculos e os limites para uma gestão

participativa esbarram entre outros entraves, com a baixa politização dos atores

sociais e a fragilidade do tecido associativo. Desse modo a atuação dos

representantes aponta dificuldades em transcender “velhos modelos”, ou seja,

práticas individualistas que não condizem com uma gestão participativa, voltada para

o coletivo.

Se por um lado o Comitê do Itajaí apresenta entre suas diretrizes uma

proposta descentralizada e participativa, na prática constatou-se a centralização de

poder por grupos dominantes, dificultando a autonomia e uma participação mais

consciente dos objetivos coletivos.

Ainda em relação aos objetivos institucionais constatou-se que o Comitê do

Itajaí ainda não conseguiu transcender seu objetivo inicial, qual seja, buscar

alternativas que minimizem as enchentes que historicamente tem assolado o Vale do

Itajaí.

Projetos como a Semana da Água, Recuperação da Mata Ciliar e o Projeto

Piava, são ações importantes para a construção de uma nova racionalidade e a

formação de redes de participação, tendo em vista que são projetos voltados à

educação ambiental, contribuindo na formação de identidades ecológicas, mas ainda

assim são projetos fragmentados que não dão conta dos problemas de poluição na

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totalidade da Bacia que se agigantam, como é o caso da falta de redes de

tratamento sanitário para toda a sua extensão.

Perceberam-se também contradições na própria construção do Comitê. Se

o mesmo foi criado dentro dos marcos de uma concepção descentralizada, ele

apresenta um contra-movimento, ao centralizar a gestão de uma bacia de 15.500

km2 e que abrange 50 municípios. Além do espaço territorial se apresentar como um

obstáculo ao gerenciamento centralizado, há também dificuldades em tentar se

implementar projetos genéricos por eles não contemplarem a diversidade, a

pluralidade e as particularidades regionais.

Nesse sentido, a descentralização do Comitê de Gerenciamento da Bacia do

Itajaí em subcomitês talvez contribuísse para a implementação de projetos mais

diretivos as especificidades de cada município que compõe à bacia .

Uma revisão na atual composição do quadro dos representantes dos

usuários da água, de entidades da sociedade civil e dos governos, estadual, e

federal de forma a contemplar uma participação mais significativa da população,

poderia contribuir para um maior entrosamento entre o saber leigo e o saber técnico,

de forma a dar mais visibilidade à diversidade de interesses, aos conflitos que ficam

subliminares na linguagem técnica e o respeito pelas experiências e saberes de

atores sociais que vivenciam na cotidianidade os problemas relacionados com a

poluição ambiental da bacia.

A busca por parcerias nos diversos segmentos sociais como tem sido

recentemente efetivado, não deve isentar do Estado a sua responsabilidade, ainda

que a política de descentralização dos recursos hídricos delegue aos municípios e à

sociedade civil a obrigatoriedade na busca de soluções para os dilemas sociais.

A participação dos cidadãos nesses espaços colegiados deve ser

compreendida enquanto uma forma de intervenção na vida pública a partir de uma

motivação social real, exercida de forma direta, baseada na institucionalização das

relações entre Estado e sociedade civil. Isso implica na desconstrução de práticas

clientelistas, de relações patrimonialistas entre instituições do Estado e da sociedade

que brotam no segredo atuando de forma contrária aos princípios onde a vida seja

considerada enquanto substantivo e a ética uma prática vivida.

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APÊNDICE 1 – ROTEIRO DE ENTREVISTA

1. O que motivou seu interesse pelas questões relacionadas aos recursos hídricos?

2. Você se sente motivado para participar ativamente do Comitê? Quais razões?

3. Como é realizada em sua instituição a indicação do candidato a membro do

Comitê?

4. Como são discutidos em sua instituição os assuntos debatidos no Comitê?

5. Como você classificaria o envolvimento de sua instituição nos assuntos relacionados ao Comitê?

6. Na sua opinião qual a importância dos recursos hídricos?

7. Em seu ponto de vista o que o Comitê representa para a sociedade?

8. No seu entendimento qual a importância da existência do Comitê do Itajaí?

9. Quais suas expectativas sobre a nova composição da diretoria do Comitê?

10. Em sua opinião existem interesses econômicos ou políticos que influenciam

na atuação do Comitê?Quais?

11. Em sua percepção quais os principais problemas relacionados aos recursos hídricos?

12. No seu entender quais as principais conquistas alcançadas pelo Comitê ao

longo destes seis anos de existência?

13. No seu entender quais as principais dificuldades enfrentadas pelo Comitê?

14. Que sugestões você daria para melhorar os trabalhos do Comitê?

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APÊNDICE 2 – REPRESENTANTES DO COMITÊ

Usuários de Água

ASSENTO ORGANIZAÇÃO

T CASAN - Companhia Catarinense de Águas e Saneamento 1

S CASAN - Companhia Catarinense de Águas e Saneamento

T Serviço Autônomo Municipal de Água e Esgoto de Blumenau - SAMAE 2

S Serviço Autônomo Municipal de Água e Esgoto de Timbó

T SEMASA - Serviço Municipal de Água, Saneamento Básico e Infra-estrutura 3

S Secretaria de Saneamento Ambiental de Indaial - SESAMA

T Consórcio Intermunicipal Serra São Miguel 4

S Serviço Autônomo Municipal de Água e Esgoto de Blumenau - SAMAE

T Centrais Elétricas de Santa Catarina - CELESC 5

S Centrais Elétricas de Santa Catarina - CELESC

T Consórcio Empresarial Salto Pilão 6

S Consórcio Empresarial Salto Pilão

T Cooperativa de Energia Elétrica Santa Maria 7

S Hidrelétrica Sens LTDA

T Sindicato da Indústria de Carnes e Derivados no Estado de Santa Catarina 8

S Industrial e Agrícola Rio Verde

T Sindicato das Industrias de Madeira do Médio e Alto Vale do Itajaí 9

S Sindicato Rural de Ilhota

T Sindicato das Industrias de Fiação, Tecelagem e do Vestuário de Blumenau 10

S FUNPIVI - Fundação de Pscicultura Integrada do Vale do Itajaí

T Associação Empresarial de Blumenau - ACIB 11

S ACIRS - Associação Comercial e Industrial de Rio do Sul

T Associação Comercial e Industrial de Itajaí 12

S Associação Comercial e Industrial de Ibirama

T Sindicato da Indústria da Construção de Blumenau - SINDUSCON 13

S Sindicato da Construção e do Mobiliário de Ibirama

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143

T Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Rodeio 14

S Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Rio dos Cedros

T Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Agronômica 15

S Sindicato Rural de Indaial

T AQUIBI - Associação de Aquicultores de Ibirama 16

S SITRUBA - Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Botuverá

T Cooperativa Regional Agropecuária Vale do Itajaí - CRAVIL 17

S Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Braço do Trombudo

T Secretaria de Saneamento Ambiental de Indaial - SESAMA 18

S CASAN - Companhia Catarinense de Águas e Saneamento

T Eco Adrenalina Rafting 19

S Ibirama Rafting LTDA ME

T Sindicato da Indústria da Extração de Areia de Santa Catarina - SIEASC 20

S Superintendência do Porto de Itajaí

População da Bacia

ASSENTO ORGANIZAÇÃO

T Associação dos Municípios do Alto Vale do Itajaí - AMAVI

S Prefeitura Municipal de Rio do Sul 21

2º S Prefeitura Municipal de Agronômica

T Prefeitura Municipal de Ibirama

S Conselho Municipal do Desenvolvimento Rural - Lontras 22

2º S Prefeitura Municipal de Petrolândia

T AMMVI - Associação dos Municípios do Médio Vale do Itajaí

S Prefeitura Municipal de Brusque 23

2º S Prefeitura Municipal de Gaspar

T Prefeitura Municipal de Blumenau

S Prefeitura Municipal de Doutor Pedrinho 24

2º S Prefeitura Municipal de Guabiruba

T Associação dos Municípios da Foz do Rio Itajaí - AMFRI

S Departamento de Agricultura e Meio Ambiente de Vitor Meireles 25

2º S

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T Consórcio Intermunicipal Salto Pilão

S ANAMMA/SC - Associação Nacional dos Municípios e Meio Ambiente 26

2º S Prefeitura Municipal de Presidente Getúlio

T Câmara de Vereadores de Itajaí 27

S Câmara Municipal de Gaspar

T Câmara Municipal de Ibirama 28

S UCAVI - União de Câmaras e Vereadores do Alto Vale do Itajaí

T Assembléia Legislativa de Santa Catarina 29

S Câmara Municipal de Vereadores de Timbó

T Câmara de Vereadores de Rio do Campo 30

S Câmara de Vereadores de Braço do Trombudo

T Organização dos Proprietários Preservacionistas da Nova Rússia 31

S Organização dos Proprietários Preservacionistas da Nova Rússia

T ACADEMA - Associação Catarinense de Assintência e Defesa do Meio Ambiente 32

S Associação Agroecológica Amigos da Saúde

T Instituto Esquilo Verde 33

S CEMEAR - Centro de Motivação Ecológica e Alternativas Rurais

T ACOL - Associação Comunitária Lontrinhas 34

S ACORS - Associação Comunitária Ribeirão do Salto

T APREMAVI - Associação de Preservação do Meio Ambiente do Alto Vale do Itajaí 35

S Associação Catarinense de Preservação da Natureza - ACAPRENA

T Associação Educacional Leonardo Da Vince - ASSELVI 36

S SENAI - Centro de Tecnologia do Vestuário de Blumenau

T Fundação Educacional Hansa Hammmonia - FEHH 37

S Universidade do Vale do Itajaí - UNIVALI

T Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental - ABES 38

S Universidade para o Desenvolvimento do Alto Vale do Itajaí - UNIDAVI

T Fundação Universidade Regional de Blumenau 39

S Fundação Universidade Regional de Blumenau

T Comunidade Indígena 40

S Comunidade Indígena

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Órgãos Públicos

ASSENTO ORGANIZAÇÃO

T Secretaria de Desenvolvimento Regional de Ibirama - 14ª SDR 41

S Secretaria de Desenvolvimento Regional de Ibirama - 14ª SDR

T Secretaria de Estado do Desenvolvimento Social, Urbano e Meio Ambiente - SDS

42

S Secretaria de Estado do Desenvolvimento Social, Urbano e Meio Ambiente - SDS

T Companhia Integrada de Desenvolvimento Agrícola de Santa Catarina - CIDASC

43

S Companhia Integrada de Desenvolvimento Agrícola de Santa Catarina - CIDASC

T Departamento Estadual de Defesa Civil 44

S Departamento Estadual de Defesa Civil

T Departamento Estadual de Infra-Estrutura - DEINFRA 45

S Departamento Estadual de Infra-Estrutura - DEINFRA

T Empresa de Pesquisa Agropecuária e Extensão Rural de Santa Catarina - EPAGRI

46

S Empresa de Pesquisa Agropecuária e Extensão Rural de Santa Catarina - EPAGRI

T Fundação do Meio Ambiente - FATMA 47

S Fundação do Meio Ambiente - FATMA

T Secretaria de Desenvolvimento Regional de Rio do Sul 48

T Secretaria de Desenvolvimento Regional de Rio do Sul

T Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Renováveis - IBAMA 49

S ANEEL

T FUNAI 50

S FUNAI