universidade de lisboa - populismo residual entre · 2019-02-22 · campanha para as legislativas...
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Populismoé residual entrenós e assimdeve continuarRodeados de populismo por todos os lados, os partidos portugueses continuama constituir uma exceção na Europa, dizem os especialistas. E mesmo as forçasmais à esquerda abrandaram a postura antissistema.
ÂNIA ATAÍ[email protected]
A política portuguesa é, por nor-ma, tradicional e pouco dada à in-tegração de elementos disruptivos.Esta assunção estende-se ao por-quê de Portugal se mostrar, até à
data, imune à vaga que tomouconta de vários países europeus: os
partidos populistas, mas também a
adoção da retórica populista peloslíderes dos partidos mainstream. E
a menos de oito meses das eleiçõesnão se prevê que o cenário mude,segundo os especialistas ouvidos
pelo Jornal Económico."A campanha para as eleições le-
gislativas deverá ser marcada porforte antagonismo entre os candi-
datos, porque querem marcar a sua
posição e distanciar-se uns dos ou-tros, o que pode potenciar algumaretórica populista", explica Susana
Salgado, investigadora do Institu-to de Ciênciais Sociais da Univer-sidade de Lisboa. "Mas não se an-tevêem discursos de rutura com o
sistema propriamente dito".
Segundo um estudo recente dos
investigadores do Instituto Portu-
guês de Relações Internacionais(IPRI) Marco Lisi e EnricoBorghetto, o nível de populismonos manifestos dos partidos queapontam como os tradicionais -PS, PSD e CDS-PP - é residual,tendo-se mantido em cerca de 3%
mesmo durante a crise económica."O PS, o PSD e o CDS conti-
nuam a utilizar uma linguagemsem qualquer tipo de elemento po-pulista", referiu Marco Lisi, em de-
clarações ao Jornal Económico."Em Portugal, não se verificou[um aumento da presença do dis-
curso populista] . Constatámos queo pico foi em 201 1 , provavelmenteassociado ao clima e contexto es-
pecífico das eleições e do períodode ajuda externa", realçou.
A presença mais significativa de
discurso populista encontra-se nosmanifestos do Bloco de Esquerda(BE) e do PCP, nomeadamente na
campanha para as legislativas de
2011: uma média de 23,6%, con-cluem os dois investigadores. Noentanto, o peso do discurso popu-lista cai em ambos os partidos nas
eleições de 2015 - no BE para 4,3%e no PCP para 18,6%.
O nível de populismonos manifestos dos
partidos que apontamcomo os tradicionais,PS, PSD e CDS-PP,manteve-se durantea crise em cerca de 3%Pronto para emergirAinda assim, aquela que tem sido a
exceção na Europa pode não sereterna e está dependente não ape-nas do contexto, mas também dos
líderes partidários. Este tipo de re-tórica é muito contextuai", subli-nha Marco Lisi. "Um determinadolíder pode adotar mais um discur-
so populista e deixá-lo nas eleições
seguintes, tal como pode acontecero contrário: num outro contexto,com outros líderes, ser adotado".
A opinião é partilhada por Susa-
na Salgado, que salienta que apesarde não haver um número expressi-
vo de partidos populistas em Por-tugal, tal não significa que "de ummomento para o outro não surjamalternativas populistas, que consi-
gam convencer mais eleitores".Esta conquista pode ser através de
um discurso antissistema, antieli-tismo ou exclusão.
"Em Portugal, como em muitos
países onde os partidos populistastêm sido bem-sucedidos, estãoreunidas muitas das condiçõespara a emergência e sucesso de po-pulismos", acrescenta, exemplifi-cando com fatores como uma crisede representação política, senti-mento de desigualdade e injustiçasocial ou corrupção.
Susana Salgado sublinha que a
"radicalização da comunicação po-lítica" ocorre geralmente "em mo-mentos de intensa competição",tais como eleições, mas tambémem resposta "a agendas de oponen-tes que são populistas",
"A Polónia oferece um excelente
exemplo. A agenda anti- imigraçãodos partidos populistas condicio-nou todo o debate político e o pró-prio discurso dos outros partidospolíticos", exemplifica a investiga-dora. Mas destaca também as dife-
renças em relação à Grécia, Espa-nha e França.
Ao Jornal Económico, Salvador
Llaudes, investigador do Real Ins-tituto Elcano, explica que a pre-sença do discurso populista em Es-
panha começou a ter uma presençaclara a partir de 2011. "Esta pre-sença a nível político do discurso
populista traduz-se fundamental-mente através do partido Pode-mos. Com um discurso marcada-mente populista e de esquerda,conseguiu ter resultados eleitorais
importantes", disse. No entanto,antecipa que cresça sobretudo nos
partidos à direita. •
SALVADOR LLAUDESInvestigador no RealInstituto Elcano
""É expectável umcrescimento do populismo àdireita em Espanha, mesmonos discursos de partidosmais tradicionais".
MARCO LISIProfessor no departamentode Estudos Políticosda Universidade Novade Lisboa
"O PS, PSD e CDS continuama utilizar uma linguagem semqualquer tipo de elementopopulista".
SUSANA SALGADOInvestigadora no Institutode Ciências Sociais daUniversidade de Lisboa
"Na política nacional emPortugal não tem havido
grande oferta de partidospopulistas e os que têm
surgido não têm sido muito
bem-sucedidos".
EUROPEIAS
Eleições de maiotêm temas férteispara este fenómeno
Retórica populista tende a estar mais presentenas campanhas para as europeiasdo que para as legislativas, dizem especialistas
As campanhas para as eleições eu-
ropeias tendem a ser o terrenomais fértil para a presença dos dis-
cursos populistas, devido aos te-mas abrangidos, e esse cenário de-verá repetir-se neste mês de maio.
É, pelo menos, essa a opinião dos
especialistas ouvidos pelo JornalEconómico.
Marco Lisi, investigador do Ins-tituto Português de Relações In-ternacionais (IPR1), explicou ao
Jornal Económico que, comparan-do com a campanha para as elei-
ções legislativas, "é mais provávelque este tipo de discurso seja ado-tado".
"No caso das eleições europeiasisso é mais fácil acontecer porqueos temas são diferentes. Os parti-dos inclinam-se mais a fazer umdiscurso de protesto, e os partidosantissistema têm sempre maior fa-cilidade em fazer passar uma men-
sagem de sucesso, como aconteceu
em 2014 em Portugal", realçou o
investigador.No entanto, a tónica nesta retó-
rica não é sinónimo de garantia de
sucesso. "E preciso que esteja asso-
ciada a problemas concretos da so-
ciedade, como, por exemplo, a
corrupção, escândalos ou umagrande crise económica. Em se-
gundo lugar, exige uma liderança
forte, capaz de comunicar e de darcredibilidade a esse tipo de mensa-
gens e estabelecer uma ligação for-te e direta com os eleitores", expli-ca Marco Lisi, avançando com
exemplos como o sucesso do Mo-vimento 5 Estrelas, em Itália, oudo Podemos, em Espanha.
Também Susana Salgado, inves-
tigadora do Instituto de CiênciasSociais da Universidade de Lisboa,considerou ser "expectável que emano de eleições aumente [em Por-
tugal] o populismo em geral, espe-cialmente nas eleições europeias".
Para esta investigadora, isso de-
penderá sobretudo de um possível
contágio dos debates nos outros
países, onde os partidos populistase os seus ideais têm mais expres-são.
Também em Espanha - em anode eleições gerais, europeias e re-
gionais - a retórica populista de-verá aumentar. Salvador Llaudes,
investigador do Real Instituto El-
cano, antecipa que serão os temasinternos que deverão ganhar des-
taque. "Teremos muitas eleiçõesao mesmo tempo, o que quer dizer
que se vai falar muito pouco sobre
temas europeus", explica SalvadorLlaudes. "Vai falar-se fundamen-talmente sobre temas nacionais,
sobre posições em relação aos con-flitos internos em Espanha. Vai ser
uma campanha bastante feia. De-verá ter pouco conteúdo e será so-bretudo ideológica".
O investigador espanhol consi-dera que deverá registar-se não
apenas um incremento da narrati-va populista, mas também um re-forço dos resultados eleitorais. "É
provável que o Vox tenha mais
apoio, principalmente nas eleições
europeias, também devido ao sis-
tema eleitoral, que beneficia parti-dos pequenos", conclui. Por outrolado, a esquerda espanhola deverá
ter menos apoio, uma vez que "o
contexto mudou e já não é o de
2014". 9AA