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Revista Primeiro Plano nº20

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NESTA EDIÇÃO...>>

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>>Atitude 2 Minhocasa

Entrevista 6

Com MARCUS RISSEL Diretor da regional Sul da Natura

Resíduo não é lixo 12 O desafio de agregar valor aos materiais, reduzir custos e envolver a sociedade na discussão

Fazer com que cada pessoa saiba exatamente o quanto de resíduos produz e como reaproveitá-los. Essa é uma das propostas da Minhocasa, uma iniciativa única no país que apresenta soluções simples e práticas para a destinação adequada de

resíduos orgânicos. A ideia é transformar em adubo natural de excelente qualidade o resíduo orgânico produ-

zido nas casas e empresas por meio de sistemas inovadores de minhocul-tura, compostagem e biofertilização, projetados para grandes e pequenos

espaços em áreas urbanas e rurais.

Atuando desde 2004, a iniciativa começou por pessoas impelidas pelo sonho de criar alternativas sustentá-veis viáveis. Do sonho individual veio a ação, através do Instituto Coopera e, a partir de 2008, criamos a micro empre-

sa Seiva Nativa. Trouxemos às cidades a minhocul-tura, que, ao menos os adultos, conheceram bem desde sua infância. As minhocas são acondicio-nadas num kit Minhocasa de acordo com cada ne-cessidade. A idéia já nos rendeu reconhecimento e prêmios nacionais. É assim, com nossa solução acreditamos que estamos fazendo a nossa parte para um mundo mais sustentável.

Cesar Cassab Dannawww.minhocasa.com

>> ATITUDE

AÇÃO SIMPLES E INOVADORA

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>> EXPEDIENTE>> Os artigos e reportagens assinados não representam, necessariamente, o ponto de vista das organizações parceiras e da revista Primeiro Plano. A divulgação do material publicado é permitida (e incentivada), desde que citada a fonte.

Diretor: Odilon Luís Faccio

Direção de Redação: Maria José H. Coelho (Mte/PR 930- JP)

Editora chefe Alessandra Mathyas (MTe/SC 755-JP)

Redação Alessandra Mathyas e Valéria Cunha

Edição de Arte Cristiane Cardoso (Mte/SC 634-JP)

Capa Maria José H. Coelho

Foto da capa Cleber Tomas/Univali

Fotografia Sérgio Vignes

Secretaria e Distribuição Lilian Franz

Colaboradores: Rosa Maria Castilhos Fernandes, Ana Lúcia Suárez Maciel, Gilmar Gomes, Cássio Luciano Becker, Olivier Genevieve

Parceiros Institucionais Departamento Intersindical de Estatísticas e Estudos Socioeconômicos (Dieese) • Fundação Vale do Rio Doce (FVRD) • Instituto de Manejo e Certificação Florestal e Agrícola (Imaflora) • Instituto Observatório Social • Instituto Ethos de Empresas e Responsabilidade Social • Rede de Tecnologia Social (RTS) • Universidade do Vale do Itajaí (UNIVALI)

A Revista Primeiro Plano é uma publicação do Instituto Primeiro Plano.

Edição nº20 - janeiro 2011 www.primeiroplano.org.br

A sociedade brasileira tem um grande desafio no século XXI: conciliar crescimento econômico à igual-dade social preservando o meio natural. Essa tarefa árdua, sabe-se, não é só do Brasil, mas de todos os países preocupados com o seu futuro. Muitas das pedras a serem utilizadas na construção desse ca-minho já estão em prática e requerem um esforço concentrado de todos os setores da sociedade.

Um exemplo é a nova Política Nacional de Resí-duos Sólidos, que ficou em debate no Congresso Na-cional por mais de duas décadas e que teve, nos últi-mos dias de 2010, a sua regulamentação decretada. O que não quer dizer que o assunto esteja resolvido.Os conflitos com essa nova legislação e as perspec-tivas sustentáveis que ela desenha são o tema da matéria de capa desta edição.

Em outras seções, o tema lixo é reapresentado sob a forma de arte, educação e poesia, além de

EDITORIAL

R. João Pinto, 30, Ed. Joana de Gusmão, s 803 • 88010-420 - Florianópolis - SC - Brasil • Fone: 55 (48) 3025-3949 • [email protected]

exemplos bem sucedidos na gestão de resíduos, como vem sendo realizado no Arquipélago de Ga-lápagos e na capital da Inglaterra.

Mais uma vez, contamos com a parceria do Curso de Fotografia da Univali Florianópolis na produção e composição das imagens sobre o tema principal da edição e também pautaram o ENSAIO.

Este número traz ainda em MEU MUNDO uma entrevista com o ator Kadu Moliterno, que fala da importância da solidariedade e da consciência am-biental. Mostra também os princípios que norteiam a atividade da gigante de cosméticos Natura e suas apostas na biodiversidade brasileira, relata os resul-tados da COP 16 realizada no México e apresenta soluções inteligentes para um mundo cada vez mais antenado na sua pegada ecológica.

Um excelente ano e boa leitura!

Opinião 30 Por CLEMENTE GANZ LÚCIO Sustentabilidade ambiental e o trabalho de reciclagem

Planeta Arte 32 A arte do lixo

Ensaio 36 Lixo

Incluir 40 Caminhos das tecnologias sociais

Agenda global 46

Opinião 49 POR OLIVIER GENEVIEVE A sustentabilidade do setor sucroalcooleiro

Meu Mundo 50 Kadu Moliterno

Em destaque 52

Opinião LE MONDE 55 Por SILVIO CACCIA BAVA Primeiras impressões

Soluções 56

Saideira 58 Tudo vira lixo

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ENTREVISTA

6 PRIMEIROPLANO . Janeiro 2011

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A essência dos produtos é a sustentabilidade

Natura é uma gigante do setor de cosméticos no mundo. Líder de mercado no Brasil, conta com 4821 colaboradores no país e outros 1440 na Argentina, Chile, México, Peru, Colômbia e França. A força de vendas da companhia é for-

mada por mais de 1,1 milhão de consultoras, sendo 941,9 mil no Brasil e 177,7 mil no exterior. Em 2009 a empresa fechou o por-tfólio com 685 produtos, 103 deles correspondendo a lançamen-tos e relançamentos apresentados no decorrer do ano passado. O grande destaque da Natura é a importância que a companhia dá à sustentabilidade em todas as suas atividades e a valorização da biodiversidade brasileira. Nesta entrevista, o Diretor da Regio-nal Sul da Natura, Marcus Rissel, fala dos projetos e dos com-promissos sociais de uma empresa antenada no novo milênio.

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MARCUS RISSELDiretor da

Regional Sul da Natura

PP: Quais são os produtos que demandam uma cadeia produtiva natural e que comunidades envolvem?

Marcus Rissel: Na Natura, desde sem-pre temos a preocupação com o desen-volvimento sustentável, não apenas na produção dos nossos produtos, mas em todas as nossas atividades. Não quere-mos apenas ter produtos sustentáveis, com baixo impacto ambiental. Quere-mos e trabalhamos para que toda a nos-sa empresa seja sustentável. A Natura é reconhecida no Brasil e no mundo por sua busca constante em permear a sus-tentabilidade ao dia a dia dos negócios.

O uso sustentável da biodiversidade brasileira constitui uma de nossas prin-

cipais plataformas de inovação. O lança-mento da linha Natura Ekos, em 2000, marcou o primeiro passo nessa direção. Os produtos da linha utilizam ativos da biodiversidade brasileira, extraídos de maneira sustentável para produzir perfu-mes, xampus, sabonetes, cremes. Dentre os ativos utilizados nesta linha, podemos citar andiroba, castanha, buriti, camo-mila, maracujá, mate verde, pitanga e cacau. A linha utiliza 14 ativos da biodi-versidade brasileira, cujo fornecimento e repartição de benefícios geraram, ao longo desses anos, mais de R$ 8,5 mi-lhões em recursos. Dessa forma, Natura Ekos apoia o desenvolvimento social, o fortalecimento da economia e o cuidado com o meio-ambiente nas comunidades.

Em 2010, inauguramos o maior projeto de sustentabilidade da marca: os novos sabonetes de murumuru, cupuaçu, mara-cujá e cacau, com 20% a 50% de óleo da biodiversidade brasileira, extraídos de ativos comprados de oito novas co-munidades. Com isso, passamos a bene-ficiar mais 263 famílias e dobramos os recursos financeiros revertidos por ano.

PP: As matérias primas citadas são da Amazônia. Há projetos similares em outras regiões do país?

Marcus Rissel: Nosso compromisso com o desenvolvimento sustentável e a valorização da biodiversidade brasi-leira também envolve comunidades da região Sul do país. Uma delas é o Tur-

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ENTREVISTA

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vo, localizada na região Centro-Sul do Paraná. A parceria com a Cooperativa de Produtos Agroecológicos Florestais e Artesanais do Turvo (Coopaflora) co-meçou em 2004 e envolve atualmente 40 famílias. O primeiro ativo fornecido pela Coopaflora foi a pitanga, planta na-tiva da região. Com o tempo, a diversi-dade dos insumos adquiridos no Paraná aumentou. Hoje, vem da comunidade, além da pitanga, carqueja, camomila, capim-limão, hortelã, funcho e melissa. Os ativos são utilizados em produtos da linha Ekos e nos chás da linha Frutífera.

PP: Quais projetos a Natura desenvolve na área de responsabilidade social junto à sociedade e colaboradores?

Marcus Rissel: Nossa trajetória é per-meada pelo compromisso de estabele-cer, manter e valorizar relações pautadas

pela ética, transparência e diálogo aberto e permanente com todos os públicos de interesse, desde colaboradores, consulto-res, acionistas e comunidades do entorno até o consumidor final. Em 2009, entre os públicos beneficiados por nossos investi-mentos em responsabilidade corporativa que registraram elevação mais significa-tiva estão: consultoras e consultores, com aumento nos investimentos em educação e capacitação; e sociedade, especialmen-te pelo crescimento dos investimentos em patrocínios e projetos de parceiros da sociedade civil. Em meio ambiente, novamente, tivemos como destaque os projetos de compensação das emissões de gases de efeito estufa (GEE), selecio-nados pelo Programa Carbono Neutro.

O Programa Crer Pra Ver é um dos nossos projetos de destaque. Criado em 1995, destina todo o dinheiro arrecada-do com a venda de produtos exclusivos

Cupuaçu, um dos ativos utilizados da

linha Ekos

“Os produtos da linha Ekos utilizam ativos da biodiversidade brasileira, extraídos de maneira sustentável, para produzir perfumes, xampus, sabonetes, cremes.”

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da linha para investimentos em projetos educacionais desenvolvidos em escolas públicas. Em 2009, ampliamos a ação do programa com o Projeto Trilhas, que for-nece tecnologia educacional para apoiar o trabalho de professores e diretores de escolas públicas que atendem crianças de quatro a seis anos. Não podemos dei-xar de citar também o Movimento Natu-ra, que tem como objetivo conscientizar e mobilizar nossos consultores e consul-toras em ações e projetos por meio dos quais possam atuar como agentes de transformação social. Em 2009, tivemos 13 projetos nas diferentes regiões do Brasil, envolvendo 45.467 consultoras e consultores: adesão ao Programa Crer Pra Ver, Água de Viver, A Mata Atlântica é Aqui, Reciclagem de Produtos Natura, Mulheres da Paz, Papo de Responsa, ações de autoestima e de geração de renda em comunidades populares, entre outros.

PP: Quais os critérios da empresa para o investimento em patrocínios?

Marcus Rissel: Dentro das nossas políticas de apoio e patrocínios, in-vestimos em iniciativas voltadas para três temas principais: a valorização da cultura brasileira, o desenvolvimento sustentável e o fortalecimento da so-ciedade civil. Com o Natura Musical, lançado em 2005, já patrocinamos mais de 130 projetos em todo país. O programa valoriza a diversidade da música brasileira e dá oportunidade aos talentos que temos no país. Em 2009 algumas iniciativas de destaque que contaram com o nosso apoio fo-ram o Grupo Cultural AfroReggae, o incremento do Banco do DNA de Espécies da Flora Brasileira, realiza-do pelo Jardim Botânico do Rio de Janeiro, e a exposição Mulheres do Planeta. Apoiarmos iniciativas como

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Carlinhos Brown no Natura Musical, investimento na cultura brasileira

“Com o Natura Musical, lançado em 2005, já patrocinamos mais de 130 projetos em todo país.”

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essas também é uma forma de nos tornamos protagonistas das transfor-mações positivas da nossa sociedade.

PP: Como vê o crescimento da empresa e o reconhecimento dos seus clientes em função da adoção de práticas sustentáveis no cotidiano e na confecção de seus produtos?

Marcus Rissel: Atualmente, o con-sumidor da Natura está muito mais consciente sobre temas que envolvem a sustentabilidade e sobre como esse engajamento pode fazer diferença no presente e futuro de todos nós. Ao lon-go da nossa história, procuramos rea-lizar negócios baseados num modelo de gestão que promova o crescimento econômico e a perpetuação da empre-sa e que, ao mesmo tempo, reconhe-ça os impactos ambientais e sociais.

Com os resultados financeiros positi-vos que obtivemos no último ano e nosso crescimento constante (fechamos o ano de 2009 com uma receita líquida de R$ 4,9 bilhões, sendo 18,6% maior que a obtida no mesmo período de 2008), po-demos afirmar que estamos no caminho certo de nossa estratégia de negócios

e que nossos consumidores compar-tilham da mesma filosofia que nós e, por isso, consomem nossos produtos.

Também em 2009, o market share da Natura em seu mercado-alvo no Brasil cresceu de 21,4% em 2008 para 22,5%. Conquistamos bons resultados em re-lação à aceitação de nossa marca, que continuou a manter altos índices: segun-do a pesquisa de imagem Brand Essen-ce / Ipsos, a avaliação global alcançou 81% e a preferência de nossos consu-midores atingiu 46%, 30 pontos per-centuais superior ao segundo colocado.

Visando aperfeiçoar o monitora-mento da qualidade das relações com nossos públicos, no ano passado, in-corporamos ao indicador de lealdade, que anteriormente era medido ape-nas pelo grau de satisfação, dois no-vos índices de avaliação: a intenção de continuar o relacionamento com a companhia, e a intenção de reco-mendar a Natura. Junto aos consu-midores, atingimos 46% de lealdade. Ampliamos, ainda, a nossa presença no Brasil, chegando a 3,5 milhões de novos domicílios, que vieram se so-mar aos mais de 20 milhões de lares onde a marca Natura já está presente.

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“O consumidor da Natura está muito mais consciente sobre temas que envolvem a sustentabilidade e sobre como esse engajamento pode fazer diferença no presente e futuro de todos nós.”

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>>>>RESÍDUO

Acordo setorial: ato de natureza contratu-al firmado entre o poder público e fabrican-tes, importadores, distribuidores ou comer-ciantes, tendo em vista a implantação da responsabilidade compartilhada pelo ciclo de vida do produto;

Ciclo de vida do produto: série de etapas que envolvem o desenvolvimento do produ-to, a obtenção de matérias-primas e insu-mos, o processo produtivo, o consumo e a disposição final;

Coleta seletiva: coleta de resíduos sólidos previamente segregados conforme sua constituição ou composição;

Controle social: conjunto de mecanismos e procedimentos que garantam à socieda-de informações e participação nos proces-sos de formulação, implementação e ava-liação das políticas públicas relacionadas aos resíduos sólidos;

Ecoeficiência: compatibilização entre o fornecimento, a preços competitivos, de bens e serviços qualificados que satisfa-çam as necessidades humanas e tragam qualidade de vida e a redução do impacto ambiental e do consumo de recursos na-turais a um nível, no mínimo, equivalente à capacidade de sustentação estimada do planeta.

Geradores de resíduos sólidos: pessoas físicas ou jurídicas, de direito público ou privado, que geram resíduos sólidos por meio de suas atividades, nelas incluído o consumo;

Gestão integrada de resíduos sólidos: conjunto de ações voltadas para a busca de soluções para os resíduos sólidos, de forma a considerar as dimensões política, econômica, ambiental, cultural e social, com controle social e sob a premissa do desenvolvimento sustentável;

Logística reversa: instrumento de desen-volvimento econômico e social caracteriza-

ENTENDA OS cONcEITOS

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esde agosto de 2010 o setor produtivo nacio-nal está preocupado com as mudanças que toda a sociedade brasileira –

indústria, comércio, serviços, adminis-trações públicas - deverá adotar com a aprovação da Política Nacional de Resí-duos Sólidos. A proposta ficou 21 anos em tramitação no Congresso Nacional e os especialistas dizem que a redação fi-nal é o que de mais moderno existe no mundo atualmente, resultado de um am-plo processo de negociação entre os se-tores interessados. “Essa lei que estamos construindo não irá resolver os proble-mas do passado, mas evitar que eles se aprofundem no futuro”, explica Wal-

Resíduo não é lixo

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do por um conjunto de ações, procedimen-tos e meios destinados a viabilizar a coleta e a restituição dos resíduos sólidos ao setor empresarial, para reaproveitamento, em seu ciclo ou em outros ciclos produti-vos, ou outra destinação final ambiental-mente adequada;

Padrões sustentáveis de produção e consumo: produção e consumo de bens e serviços de forma a atender as neces-sidades das atuais gerações e permitir melhores condições de vida, sem com-prometer a qualidade ambiental e o aten-dimento das necessidades das gerações futuras;

Reciclagem: processo de transformação dos resíduos sólidos que envolve a alte-ração de suas propriedades físicas, físico-químicas ou biológicas, com vistas à trans-formação em insumos ou novos produtos,; Rejeitos: resíduos sólidos que, depois de esgotadas todas as possibilidades de tra-tamento e recuperação por processos tec-nológicos disponíveis e economicamente viáveis, não apresentem outra possibilida-de que não a disposição final ambiental-mente adequada (aterros ou recuperação energética);

Responsabilidade compartilhada pelo ciclo de vida dos produtos: conjunto

de atribuições individualizadas e enca-deadas dos fabricantes, importadores, distribuidores e comerciantes, dos con-sumidores e dos titulares dos serviços públicos de limpeza urbana e de manejo dos resíduos sólidos, para minimizar o volume de resíduos sólidos e rejeitos ge-rados, bem como para reduzir os impac-tos causados à saúde humana e à quali-dade ambiental decorrentes do ciclo de vida dos produtos,

Reutilização: processo de aproveita-mento dos resíduos sólidos sem sua transformação biológica, física ou físico-química,;

Política Nacional de Resíduos Sólidos busca resolver um problema ambiental grave no país, agregar valor aos materiais, reduzir custos e envolver toda a sociedade na discussão de consumo e produção de lixo. O desafio é enorme, proporcional à desinformação da população.

frido de Assunção Ataide, especialista na área que assessorou os parlamentares relatores da proposta no Congresso Na-cional.

Entre as principais determinações da nova política estão a logística rever-sa (fabricante tem que dar destinação correta aos resíduos do seu produto)e a proibição de lixões (os que ainda existi-rem deverão ser transformados em aterros sanitários). Também veda a importação de qual-quer tipo de resíduo e obriga que

CHRISTOPHER ALISSON/UNIVALI

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>> RESÍDUO

reciclagem se não tem mercado e o poder público é o maior comprador do país”.

A visão sistêmica na gestão dos resíduos sólidos é outro princípio que visa considerar as variáveis ambiental, social, cultural, econômica, tecnoló-gica e de saúde pública, com respeito às diversidades locais e regionais. De-senvolvimento sustentável, coopera-ção entre os segmentos da sociedade, responsabilidade compartilhada pelo ciclo de vida do produto, ecoefici-ência e o reconhecimento do resíduo sólido reutilizável e reciclável como um bem econômico e de valor social, gerador de trabalho e renda e promo-tor de cidadania são outros princípios que norteiam a lei.

RegulamentaçãoSegundo Walfrido Ataíde, muitas em-presas e instituições alegam não tomar atitudes de encaminhamento adequado de seus resíduos por conta da insegu-rança jurídica, impasse entre os órgãos de fiscalização e normatização e outras entidades, como o Conama – Conselho Nacional de Meio Ambiente. “Com a PNRS, partimos de um ambiente sem lei para a segurança jurídica. O artigo 2°

estados e municípios elaborarem um plano de coleta seletiva e destinação ade-quada dos resíduos. Esse último ponto, aliás, não será uma obrigatoriedade so-mente do poder público. Mas empresas de médio porte, condomínios, escolas, comércio e todos os espaços de grande concentração populacional deverão se-guir um Plano de Gestão de Resíduos, o qual será monitorado e fiscalizado pelos órgãos ambientais competentes. A socie-dade terá até 2015 para se adequar total-mente à nova lei, cujas regulamentações finais foram publicadas no fim do ano, pela Presidência da República. A lei não se aplica aos rejeitos radioativos, que são regulados por legislação específica.

Os principais princípios da PNRS são da prevenção e da precaução. A lei esta-belece penalidades para o poluidor e pre-vê incentivos ao cidadão engajado, como mecanismos de recompensa ao protetor (poluidor-pagador e protetor-recebedor). Também prioriza que as compras públicas sejam de materiais recicláveis ou conten-do reciclados na sua composição. Isso é importante pois, segundo Ricardo Lopes Garcia, do Departamento de Meio Am-biente da Federação das Indústrias de São Paulo (Fiesp),”não adianta incentivar a

• Planos de resíduos sólidos;

• Coleta seletiva;

• Logística reversa;

• Acordos setoriais;

• Educação ambiental;

• Incentivos fiscais, financeiros e creditícios;

• Sistemas de informações ambientais (Sinir, Sinisa, CTF);

• Licenciamento ambiental.

Instrumentos do Plano Nacional de Resíduos Sólidos

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dá poder de lei a todas as normas que já existiam”, explica.

A afirmação de Ataíde ameniza uma das grandes preocupações do setor pro-dutivo: a regulamentação da lei. Havia um temor, por parte do setor produtivo, de que “o governo definisse as metas ao setor produtivo com base na produção. Tem que ser de forma progressiva e de acordo com as variáveis do produto. Além disso, a indústria da reciclagem não está preparada para a demanda que virá”, comenta Wanderley Coelho Bap-tista, analista de políticas e indústria da Confederação Nacional da Indústria (CNI) . Para ele, Walfrido Ataíde respon-de: “Não tenham medo, a regulamenta-ção não mudou o princípio da lei. Esta diz o que fazer; aquela, como fazer. Não há surpresas. E a indústria estará prepa-rada se houver planejamento”. O decreto presidencial que regulamenta a lei foi publicado no Diário Oficial da União em 23/12/2010.

Ainda assim há vários pontos da lei que entraram na pauta das preocupações prioritárias das indústrias. A começar pela logística reversa. De acordo com Ricardo Lopes Garcia, especialista em meio ambiente da Fiesp, não é possível

LIxO BOM

A Empresa AGE, de São José/SC, que há 20 anos atua com gestão ambiental, elaborou, a partir da sua experiência junto a empresas, uma proposta para as prefeituras darem a destinação adequada e ainda aproveitar o potencial energético e econômico dos seus resíduos. Intitulado LIXO BOM, o programa glo-bal de Gestão de Resíduos Sólidos Municipais pre-vê o processamento total dos resíduos orgânicos e não-orgânicos, sem a necessidade de destinação de qualquer resíduo para aterros. Pode ser elaborado e desenvolvido em parceria com a administração públi-ca local, através do modelo de projetos PPP (Parceria Público-Privadas ou mesmo concessão co-mum), em concordância com a legislação e regulamentação federal. A proposta inclui logística e planejamento do recebimento/recolhimento de resíduos - inclusive entu-lhos da construção civil, eco-pontos e pro-grama de coleta seletiva com recompensa individual/residência do “lixo” domiciliar. www.agetec.com.br

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>> RESÍDUO

punir uma empresa se o consumidor fi-nal não fizer a sua parte de devolver o resíduo a quem forneceu (comércio, in-dústria). Além disso, segundo Garcia, somente seis itens têm regulamentação de logística reversa. Atualmente já há normatização para recolhimento e en-caminhamento de pilhas e baterias, em-balagens de agrotóxicos e pneus. Mas resíduos e embalagens de óleos lubrifi-cantes, lâmpadas fluorescentes, de va-por de sódio e mercúrio e de luz mista e produtos eletroeletrônicos e seus com-ponentes carecem de regulamentação, ainda que sejam pauta de grupos de tra-balho no Conama. “Como está, 60% dos resíduos sólidos urbanos não estão na PNRS. Ela pune quem tem CNPJ e não a pessoa que produz o resíduo. O con-sumidor hoje está fora do processo mas é ele quem tem responsabilidade sobre os seus resíduos”, comenta Garcia. Ele lembra ainda que os produtos oriundos de contrabando são um problema à parte. “Quem vai reciclar? Por isso a respon-sabilidade pelo gerenciamento, ao nosso ver, é do poder público”.

De fato, a logística reversa, a qual se refere a lei, não se aplica a produtos con-trabandeados ou pirateados. A dúvida da

indústria é de quem será a responsabi-lidade por esse tipo de resíduo. Na opi-nião de Garcia, deveria ser do consumi-dor, que optou pelo produto ilegal e não caberia à indústria formalizada no país arcar com os custos do reaproveitamento desses produtos.

Walfrido Ataíde discorda dessa rei-vindicação da indústria pois a lei não obriga a coleta do material ilegal, mas sim autoriza fabricantes, importadores, distribuidores e comerciantes a colaborar na gestão desses produtos. E no decreto de regulamentação foi instituído um Co-mitê Orientador para a Implantação dos Sistemas de Logística Reversa. Ou seja, ainda há espaço para o debate.

Ataíde lembra que quando houve a Eco 92, no Rio de Janeiro, iniciou na Eu-ropa uma mobilização pela redução na quantidade de resíduos e para sua desti-nação correta. “Isso aconteceu há 18 anos e aquele continente ainda não resolveu o problema dos seus resíduos. Mas o assunto já é de conhecimento de toda a sociedade, que recicla voluntariamente”, comenta. Segundo ele, essa consciência é que precisa imperar no Brasil, começando nas famílias, nas escolas, com empresas e poder público incentivando e dando as

• 61,5 milhões toneladas/ano

• 51,4 milhões toneladas/ano são coletadas

• 0,924 kg/hab/dia coletado

• 0,182 kg/hab/dia não coletado

• Do total de municípios, 65% (3.593) têm coleta seletiva. Em 2008, eram somente 405

Produção anual de resíduos no Brasil

Destinação final• 9% - aterros sanitários

• 61% lixões ou aterros controlados

FONTE: WALFRIDO ATAíDE

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condições para que todo o tipo de resíduo tenha uma destinação adequada.

O pensamento é semelhante ao de Paulo Roberto Leite, presidente do Con-selho de Logística Reversa do Brasil. Para ele, “a regulamentação da lei vai atingir o cotidiano das empresas e das pessoas” e todos precisarão se adaptar. Leite lembra que o grande modificador de mercado quando a logística reversa não é espontânea é a legislação. E cita o exemplo da Europa que em 1994 esta-beleceu regras para o retorno de embala-gens para 32 países. Para o especialista, ainda há um preconceito no Brasil com os produtos reciclados e isso acontece porque os produtos não têm rentabili-dade nas etapas da logística reversa. Na sua opinião, as legislações brasileiras responsabilizam sim as empresas pelo retorno dos produtos, mas isso acontece em todos os países, principalmente nos europeus e todos estão se adequando à necessidade de produzir menos resíduos. Para ele, é preciso mudar a visão de que logística reversa é custo para a produção. “Essa legislação priorizou o que é mais perigoso ao cidadão e ao meio ambiente e novos setores virão com aprendizado. Nós costumamos olhar só as dificulda-

PODER PúBLIcO fIScALIzADOR

Desde o final de julho de 2010, o morador da cidade de São Paulo que jogar lixo ou entulho em local proi-bido poderá ser multado em até R$ 12 mil. Antes, a multa era de R$ 500,00. A lei faz parte do conjunto de ações para o combate às enchentes na cidade e foi publicada no Diário Oficial do município. Além da multa, a partir de agora, quem for pego em flagrante também terá o carro usado no transporte do entulho apreendido, o qual só será liberado após o pagamento do valor estipulado pelo município. Em São Paulo a fiscalização da prefeitura conta com apoio das polícias Militar e Civil também ajudarão no trabalho.

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>> RESÍDUO

des, mas elas serão resolvidas”, finaliza Paulo Roberto Leite.

Planos de gerenciamentoPela PNRS, os municípios terão quatro anos (a partir da regulamentação) para encerrar seus lixões e instituir os aterros sanitários, sendo que nestes só poderão ser depositados resíduos sem qualquer possibilidade de reciclagem ou reapro-veitamento. “Não podemos permitir que continue se enterrando riqueza”, desaba-fa Ataíde. A lei prevê que o prefeito que não se adequar a essa nova regra pode até ser preso. Além disso, os municípios terão dois anos para fazer seus Planos de Gestão de Resíduos sob pena de ficarem impedidos de receber qualquer recurso federal para gerenciar lixo.

Outro avanço proposto é que prefei-turas e governos estaduais estão autori-zados a conceder isenções fiscais para incentivar ações de gestão de resíduos sólidos. A Fiesp também questiona que tipo de incentivos serão concedidos, pois o Ministério da Fazenda ainda não pos-sui definição que oriente estados e muni-cípios. O tema ficou em aberto no decre-to de regulamentação, transferindo para o Comitê Interministerial a ser costituído

a definição de informações complemen-tares e a promoção de estudos e medidas para desoneração tributária. De qualquer forma, com essa possibilidade, novas empresas poderão se habilitar para esse tipo de atividade. Afinal, mesmo com a coleta anual estimada em 51,4 milhões de toneladas/ano, 61% desse montante vai para lixões ou aterros controlados, os quais deverão ser encerrados ou substi-tuídos por aterros sanitários. Esses dados são estimativas, pois até o momento o país não tem um cadastro seguro sobre a gestão de resíduos.

Essa lacuna também tem uma solu-ção apresentada pela PNRS. Trata-se do Sistema Nacional de Informações sobre Gestão dos Resíduos Sólidos (Sinir), previsto no artigo 12. Aos moldes da tra-dicional declaração de imposto de renda, esse sistema será aberto, com acesso à internet, para que empresas, governos e prestadores de serviços informem anual-mente sobre a geração e destinação dos seus resíduos. Esse sistema complexo de informações terá um banco de dados sobre meio ambiente, saneamento bási-co, cadastro técnico de atividades po-tencialmente poluidoras ou que utilizem recursos ambientais e de atividades e

As experiências mundiais para dar a desti-nação adequada aos mais diversos tipos de resíduos foram apresentadas na 7ª Con-ferência Internacional Lixo Zero, realizada em outubro, em Florianópolis. Promovida pela Zero Waste Internacional, o encontro reuniu recicladores de quatro continentes e mostrou como ações simples e empreen-dedoras transformam vidas e ambientes. O movimento está crescendo e importantes municípios, como Seattle, Los Angeles e San Francisco, nos Estados Unidos, Capan-nori na Itália, entre outros, têm metas de se tornarem lixo zero até 2030.

Quando um município, empresa ou condomínio entra num projeto Lixo Zero, reaproveitando materiais e os reencami-nhando ao processo de produção industrial, contribui de uma só vez com a economia de recursos naturais e financeiros. Deixa-se de poluir, reduz-se a extração de recursos natu-rais e toda sociedade ganha em economia, desde os consumidores, passando pelas in-dústrias e até as prefeituras, que reduzem os gastos para envio de lixo para os aterros sanitários.

A reciclagem é fundamental para se che-gar a essa meta. Mas a mudança de hábitos de consumo para acabar com o desperdício e reduzir a produção de lixo é o mote des-se crescente movimento. “Somos filhos da Revolução Industrial. Estamos limpando o chão, mas ninguém fechou a torneira. Temos que deixar de ser a sociedade do descarte”, afirma Rodrigo Sabatini, da NovoCiclo, em-presa que organizou o evento no Brasil.

cONfERêNcIA INTERNAcIONAL LIxO zERO

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instrumentos de defesa ambiental. Será, em última instância, um inventário de resíduos e a partir dele, todos os entes da sociedade poderão acompanhar e re-organizar seus planos de gerenciamento, bem como o Estado definir melhor suas políticas públicas para o setor.

Outra inovação da lei é a definição da responsabilidade compartilhada, de-talhada nos artigos 33 a 36. A indústria lembra, no entanto que, por se tratar de uma responsabilidade individualizada e encadeada, se um dos atores não cumprir as suas obrigações, os demais não pode-rão ser responsabilizados. E, novamente, volta à baila a logística reversa. “nosso medo é regulamentar a logística reversa para todo o pós consumo. É colocar no colo da iniciativa privada u ma responsa-bilidade de governo, comenta Wanderley Baptista, da CNI. Pelo decreto, a decisão final será coletiva, envolvendo governo e setores produtivos.

EmpregosA geração de empregos verdes deverá ser outro resultado positivo com a efetivação da PNRS. Como cada grande gerador de resíduos – empresa, comércio, administra-ção pública, condomínios, hospitais, sho-

BOLSA DE RESíDuOS

A Federação das Indústrias de Santa Catarina desen-volveu uma plataforma na web para que as empresas possam negociar seus resíduos. É a Bolsa de Resí-duos da Fiesc – BRFiesc, que está em ope-ração desde 2004. Até o momento foram anunciadas 14 mil toneladas de resíduos, envolvendo todos os estados brasileiros. A iniciativa foi reconhecida em 2005 com o Prêmio CNI de Melhores Práticas do Siste-ma da Indústria.

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>> RESÍDUO

ppings etc – terá que elaborar um plano de gerenciamento de resíduos à luz da nova legislação e de acordo com as definições dos municípios, tal plano deverá ser co-ordenado por um profissional habilitado no setor. Não há necessidade que seja so-mente engenheiro sanitário ou ambiental, mas tecnólogo em gestão de resíduos ou que tenha cursado uma pós-graduação na área. “Só aí já se estima, inicialmente, a

demanda de uns 20 mil postos de traba-lho”, explica Walfrido Ataíde.

Além disso, a PNRS tem 14 artigos que protegem e incentivam os catadores. “Eles não serão mais invisíveis”, afirma Ataíde. Segundo ele, estas duas décadas de debate em torno dessa nova legislação tem um princípio filosófico – transfor-mar o problema em solução, reconhecer que o resíduo é um bem econômico e de valor social, gerador de trabalho e renda e promotor da cidadania. Daí o incentivo à formalização dos mais de um milhão de catadores no Brasil.

Para Dorival Rodrigues dos Santos, do Movimento Nacional dos Catadores, a nova lei transforma essa massa de traba-lhadores em cidadãos que não mais serão vistos como mendigos. “Nós somos orga-nizados por comitês. A indústria da reci-clagem precisa de escala para produção e nós, organizados, temos força junto das firmas”, explica Santos. Ele lembra que desde o Decreto 5940, de 25/10/2006, que instituiu separação dos resíduos re-cicláveis descartados pelos órgãos e en-tidades da administração pública federal direta e indireta e a sua destinação para associações e cooperativas de catadores, a categoria tem se capacitado e ajudado

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Dorival Rodrigues dos Santos, do Movimento Nacional dos Catadores

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muitas administrações públicas também em outras esferas. “As prefeituras têm que nos escutar, têm que ter a visão de quem trabalha com o resíduo no dia-a-dia. Se hoje pararmos nosso trabalho, mesmo com a coleta pública, as cidades terão grandes problemas”, afirma. Santos, no entanto, sabe do grande desafio. Hoje são somente 40 mil catadores registrados e para formalizar os mais de um milhão existentes no país é preciso apostar na PNRS e no compromisso ambiental de toda a sociedade. “Desde abril de 2010, quando criamos o Projeto Cataforte, para valorizar o catador, estamos conseguindo deixar muitas famílias felizes, pois incen-tivamos a auto-gestão do indivíduo e das cooperativas. Tenho receio da onda em-presarial que vem aí que quer eliminar a figura do catador. Mas a PNRS nos dá o direito a esse trabalho”, finaliza.

Segundo Walfrido Ataíde, os catado-res precisam fortalecer as cooperativas. Só assim poderão ampliar renda e conse-guir suprir a demanda que a indústria da reciclagem exige: de muita matéria prima com planejamento e produção. “Se os ca-tadores se organizarem, conforme orienta a lei do cooperativismo, eles conseguirão tirar a figura do atravessador e agregar va-

Dos mais de um milhão de catadores existentes hoje no país, somente 40 mil são registrados

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lor ao seu trabalho. A indústria em geral tende a vir para o resíduo, será forçada a dar conta do seu resíduo, terá que reciclar, afinal, lixo nunca acaba. E no Brasil, os catadores são peça importante nesse pro-cesso”, explica o especialista.

Entrega voluntáriaOutro conceito internacional que foi inserido na PNRS é a entrega voluntá-ria. Em postos específicos, as pessoas levam seus resíduos para a recicla-

gem e podem ser recompensados por isso. Antes mesmo da publicação da lei algumas iniciativas bem sucedidas mostram que esse é um bom cami-nho, mas que para dar certo, precisam da participação efetiva da população. “Não adianta ter um milhão de postos de entrega voluntária se o consumidor final não participar”, comenta Ricardo Lopes Garcia, da Fiesp.

Um exemplo que foi premiado pelo Ins-tituto Ethos como uma tecnologia social de relevância foi a troca de material reciclável por desconto na fatura de energia. A ação foi desenvolvida pela Companhia Ener-gética do Ceará (Coelce), do Grupo Neo Energia. Com a metodologia desenvolvida, através de um chip pessoal dado ao titular da fatura, nenhuma entrega voluntária fica sem recompensa. Se o valor da bonificação for superior à fatura, o crédito será feito na fatura do mês seguinte.

No outro extremo do país, em Floria-nópolis/SC, a Novo Ciclo também desen-volveu o Espaço Recicle, onde os bônus do material reciclável são creditados em um cartão-fidelidade e estes podem ser trocados por brindes disponíveis no pró-prio espaço. Na capital catarinense, são coletadas mensalmente 14 mil toneladas e somente 5% disso é reciclado.

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Lixo zeroPartindo de um conceito internacional de que é possível sim dar a destinação correta a todo o resíduo e assim tornar a sociedade lixo zero, a Novo Ciclo de-senvolve um programa para empresas e condomínios. Os condomínios adeptos do programa, que dura em média dois anos, estão satisfeitos. O investimento, em vista do benefício social e ambiental, é pequeno: R$ 15 mensais por unidade (apartamento ou sala comercial). No en-tanto, o valor ainda é o maior impeditivo para que essa gestão de resíduos seja fei-ta em uma escala maior. Mesmo assim, Rodrigo Sabatini, coordenador da Novo Ciclo, está confiante na proposta. “Te-mos que ter a orientação de que é proi-bido descartar, temos que encaminhar de volta ao sistema produtivo, limpo e organizado”.

Energia do lixoUma alternativa ambiental para as mi-lhares de toneladas de lixo que ainda irão para aterros – mesmo que sanitá-rios – e para tratamento dos lixões que terão que ser fechados é o aproveita-mento energético do metano produzido nesses locais. Já há boas iniciativas no Brasil sobre isso.

No Espaço Recicle, bônus pelo material reciclável são creditados em um cartão-fidelidade e podem ser trocados por brindes

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>> RESÍDUO

No Rio de Janeiro, por exemplo, des-de 2003 funciona a Central de Tratamen-to de Resíduos Nova Iguaçu, que foi a primeira do mundo certificada para o Mecanismo de Desenvolvimento Limpo (MDL), vendendo créditos de carbono. Nessa central, toda a energia utilizada para uso interno é produzida no local e o excedente passa por um processo de queima controlada para o gás não ser li-berado na atmosfera.

É também do Rio de Janeiro o maior empreendimento de biogás para redução de emissão de gases do efeito estufa: a Usina de Biogás do Aterro Metropolita-no de Jardim Gramacho. Esse era o an-tigo lixão da capital fluminense. Agora, produz cerca de 160 milhões de metros cúbicos de biogás por ano. Isso equiva-le ao consumo de gás natural das resi-dências da cidade do Rio. Esse projeto também está se consolidando como o

maior do mundo em crédito de carbono de aterro sanitário e a estimativa é obter dez milhões de créditos de carbono em 15 anos de operação.

Em São Paulo há outros dois exem-plos do uso do biogás,mas para geração de energia em centrais térmicas. Uma dessas usinas está no Aterro Sanitário Municipal Bandeirantes, no município de Perus. Nela há 24 grupos geradores com motores do tipo ciclo Otto, com uma capacidade de geração total de 22 MW. É considerado o maior projeto do mundo de geração elétrica exclusivamente com biogás de resíduos urbanos. A outra cen-tral térmica está no Aterro Sanitário São João, na zona leste da capital paulista. Nesse a capacidade de geração é de 22 MW. Esses quatro exemplos apenas em duas região metropolitanas brasileiras dão a dimensão do potencial energético da biomassa urbana.

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Na América Latina, há bons exem-plos de gestão de resíduos. No Equador, o Arquipélago de Galápagos é um deles. Rodeado por mais de 45 mil quilômetros quadrados de reserva marinha, o arqui-pélago, cujo nome oficial é Colombo, é formado por 13 grandes ilhas vulcânicas, seis ilhas pequenas e 107 rochas e ilho-tas. Galápagos, que está na lista de Patri-mônios da Humanidade desde 78, é hoje um dos poucos lugares do mundo onde a natureza é soberana. O respeito à terra, ao mar, às espécies e à evolução é exigi-do e percebido no primeiro segundo que

Preservação de GalápagosPor Valéria Cunha

gESTÃO DE RESÍDUOS NA AMéRIcA lATINA

qualquer pessoa desembarca na ilha de Baltra. O ser humano é apenas um mero espectador frente a um dos maiores espe-táculos de cores, formas e sons exibidos pela natureza.

Mas para que se chegasse a um está-gio tão elevado, ao ponto de ser retirado da lista de locais em perigo da UNES-CO - Organização das Nações Unidas para Educação, Ciência e Cultura - em julho de 2010, foi necessário o empenho de grandes empresas em prol da preser-vação do Arquipélago. A Metropolitan Touring, uma das maiores empresas de

METROPOLITAN TOURING

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turismo do Equador, foi pioneira em eco-turismo na região. Seu trabalho desde o princípio foi baseado em um turismo ecologiamente responsável, com o com-promisso de preservar um sítio especial e valorizar a natureza equatoriana. Em 1997, a Metropolitan criou a Fundação Galápagos. Desde então vem desenvol-vendo ações que têm melhorado defini-tivamente a delicada situação pela qual passavam aquelas ilhas.

A Fundação Galápagos foi responsá-vel pela criação e, ainda é hoje, o órgão que gerencia o Parque Ambiental Fabri-cio Valverde, na cidade de Puerto Ayora, na Ilha de Santa Cruz. Lá cerca de 18 mil pessoas vivem e fazem do lugar o município mais populoso do Arquipéla-go. Entre vários projetos está um centro de reciclagem de resíduos sólidos, criado dentro do parque. O local é regido por meio de um acordo de cooperação en-tre o Parque Nacional de Galápagos, o Município de Santa Cruz e a Fundação Galápagos. Para preservar as áreas do Arquipélago, o lixo reciclável é separado nas ilhas e enviado ao continente para a reciclagem. Hoje, o projeto já está sendo aplicado também na Ilha Isabela.

O processo acontece da seguinte for-ma: o material reciclado (papel, pape-lão) é separado na casa de moradores de Puerto Ayora e os materiais vão para o centro, onde passam por uma esteira e pela triagem. Após esse processo, os re-ciclados são enviados a uma empresa no continente que prossegue com o proces-so de reciclagem. No mesmo centro há máquinas de moagem de vidro e mate-riais plásticos. Após ser moído, o plás-tico é levado ao continente e vendido a

FONTE: METROPOLITAN TOURING

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• 34,603.55 kg de plásticos

• 78,979.10kg de vidros

• 116,888.69kg de papelão

• 26,448.72kg de papel

• 1,208.80kg de baterias

• 18,687.17kg de outros materiais

Num total de: 276,816.03kg

EM 2010 fORAM REcIcLADOS

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>> RESÍDUO

uma empresa especializada. Já o vidro é utilizado, após passar pela máquina ade-quada, para produção de pedras de pavi-mentação (onde são colocadas num chão de cimento).

Devido à localização de Galápagos, em ilhas vulcânicas onde a camada de solo é muito fina, a absorção do lixo é imediata, causando um acúmulo de resí-duos, muitas vezes não visíveis, mas pre-

judiciais ao meio. Um grave problema. Mas a consciência local é verdadeira e sabe-se por todos os cantos que quanto menos lixo é produzido, maior é o tempo de vida daquelas áreas.

E todo cuidado tem uma lógica. Um sinal de alerta foi disparado quando o Arquipélago começou a ganhar espaço como destinos de férias. O número de turistas que começaram a entrar na ilha disparou. Hoje é limitado e todos eles incansavelmente lembrados que não se pode descartar nenhum objeto ou pro-duto que possa ser nocivo àquele meio. Além do desejo de se preservar o que até a última década era intocável, as espécies sentem qualquer alteração no meio onde sobrevivem. As focas, por exemplo, que reconhecem seus pais pelo cheiro, sen-tem-se abandonadas ao aspirar um odor estranho; os pássaros, distraídos com afagos, podem abandonar seus ninhos, deixando os ovos expostos.

Quando não havia o processo de reci-clagem, o material era enterrado na ilha o que causava grande impacto ambiental para a região. Até agora, mais de 17.000 litros de óleos queimados e 6.000 kg de filtros de óleo têm sido enviados para o

Saiba mais:www.fundaciongalapagos.org/1_project_4.htm

www.galapagosvoyage.com/en/founda-tion-about-us.html

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continente. Em 2006 a Câmara Munici-pal de Santa Cruz implementou o siste-ma integrado de resíduos sólidos em que consiste distribuir aos moradores latas de lixo de cores diferentes para identifi-car os materiais recicláveis (verde: lixo orgânico; azul: recicláveis; e preto para o restante). Essas latas são levadas ao centro onde ocorre a triagem e posterior-mente encaminhadas à reciclagem.

O município de Puerto Ayora tam-bém conta com uma área destinada para a compostagem dos resíduos sólidos no Parque ambiental. Após seis meses aquele resíduo torna-se adubo. Há tam-bém um cinturão de seleção de materiais recicláveis que são separados pelo pes-soal do Equador Galápagos Foundation (os projetos da composteira e do cinturão seleção são desenvolvidos com a ajuda europeia). Mas o que tem auxiliado no êxito dos sistemas de gestão de resíduos é a integração com os moradores através de iniciativas de educação ambiental. São projetos desenvolvidos pelo Parque Nacional de Galápagos em parceria com o município de Puerto Ayora.

Além de projetos de educação am-biental e reciclagem de resíduos sólidos,

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a Fundação Galápagos realiza também a Limpeza dos ecossistemas costeiros (como mangues) das ilhas. Grande quan-tidade de lixo vem flutuando através do oceano e chega à costa das ilhas. Galápa-gos, por ser um arquipélago, é o habitat de diversas espécies e muitas delas só existem nesse local. O lixo que vem de outras regiões afeta os animais, como as tartarugas marinhas, as garças e os leões

marinhos. Com o apoio dos pescadores e da comunidade, mais de 75 mil kg de resíduos já foram recolhidos das costas (depois esses materiais são encaminha-dos para a reciclagem). Todo mês de se-tembro a International Coastal Cleanup Day realiza ações na região, único local onde a limpeza subaquática é realizada. O evento envolve os membros da comu-nidade de forma voluntária.

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>> OPINIÃO>>

lixo é inerente a atividade humana. A am-pliação da sociedade de consumo, pelo au-mento da produção de bens e serviços, ele-va a quantidade de lixo. Historicamente, o lixo tem sido considerado apenas como algo que não tem valor e que, por isso, deve

ser colocado para fora de casas, empresas e lojas. Tornou-se um grande e complexo problema ao degradar rapidamente e por um longo tempo o meio ambiente e a qualidade de vida, com efeitos inclusive sobre as questões relacionadas às mu-danças climáticas.

A concepção de uma economia sustentável coloca o trata-mento dos resíduos como uma questão estratégica, seja para responder ao desafio da poluição, seja para enfrentar o esgo-tamento das matérias primas, insumo para a produção. Nesse novo ambiente a questão do lixo e dos que trabalham com ele está começando a ser olhada e tratada de outra forma. As sociedades começam a definir responsabilidades para as em-presas e consumidores no tratamento do lixo que geram, bem como descobrem valor econômico no lixo gerado que, recicla-do, transforma-se em insumo no processo produtivo.

Nesse novo ambiente que se configura em muitas socieda-des, o trabalho realizado na cadeia da reciclagem ganha plena acepção ecológica e a figura do catador de lixo tem o desafio de começar a ser vista como a de um agente ambiental.

Há pesquisas que indicam que 80% do que é reciclado hoje no país chega aos locais de reciclagem por meio dos catadores, que fizeram do lixo uma forma de obter o sustento, alternativa encontrada por milhares de pessoas para sobreviver diante do desemprego e da exclusão social.

A habilidade dessas pessoas para viver e a forma como buscam inserção social são dignas de admiração. Ainda assim,

Sustentabilidade ambiental e o trabalho de reciclagem

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CLEMENTE GANZ LÚCIODieese

cotidianamente eles encaram extremas dificuldades e discri-minação. Aos nossos olhos, muitos são invisíveis. Quando percebidos, é porque empurram uma carroça cheia de entulho ou porque famílias inteiras reviram as latas de lixo. Nesse mo-mento, os sentimentos vão da comoção à rejeição, apesar do importante trabalho que desempenham para o meio ambiente e a sociedade.

A valorização dos chamados empregos verdes, nos quais a reciclagem de materiais se insere, tem crescido e a oferta de postos tende a aumentar. Hoje, Estados Unidos, Alemanha, Holanda e Japão estão entre os países que mais reciclam o lixo. O Brasil não está tão mal em alguns itens: é o primeiro do mundo na reciclagem de alumínio: acima de 1 milhão de lati-nhas por hora, com reaproveitamento de 94% delas; apresenta índices considerados bons para o papelão (77%) e às garrafas PET (50%). Mas por aqui há muitos desafios mais: é preciso trabalhar muito ainda para dar pleno uso a todos os materiais industrializados que descartamos após o uso; é necessário resolver ainda há a questão dos lixões a céu aberto, destino dos resíduos sólidos de quase metade das cidades; e é preciso dar tratamento digno aos trabalhadores que atuam com o lixo, atores indispensáveis, responsáveis pela separação e triagem do material que sai do lixo e que é vendido às indústrias de reciclagem.

O Brasil tem agora uma política de reciclagem dos resíduos sólidos, discute a logística inversa e outras formas de trabalhar contra as mudanças climáticas e a sustentabilidade do plane-ta. É a oportunidade para rever todos os padrões ambientais, sociais e trabalhistas e dar outro tratamento, muito mais dig-no e decente, aos trabalhadores que lidam com o lixo. Quem trabalha na reciclagem do lixo atua para renovar o ambiente e promover qualidade de vida.

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>> PlANETA ARTE

A Arte do lixo

O paulista de 31 anos, Vinícius Basso, dedica sua vida à arte com o que muitos consideram lixo. Quando ainda traba-lhava com seu pai em uma empresa de tratores e implementos agrícolas, notou que todo o material jogado fora poderia ser reutilizado de alguma forma. Daí ao trabalho com esculturas foi um pulo. A primeira inspiração que Vinícius teve, foi quando começou a mudar e transfor-mar seu próprio quarto, fazendo ele todo com correntes e outras peças de ferro. Sua primeira exposição aconteceu quan-

do um padre de sua cidade viu suas pe-ças e se impressionou com tudo o que era feito, e o convidou para expor suas peças dentro da igreja.Adulto, escolheu Florianópolis para vi-ver e do seu atelier já montou exposições em vários países. A última foi na Itália, em dezembro passado. Cada escultura feita tem um estilo di-ferente, todas as peças são exclusivas, nunca uma igual a outra. Todo seu tra-balho pode ser acessado pelo site www.viniciusbasso.com.br

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História e educação

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Desde 2003 a capital de Santa Catarina tem o Museu do Lixo, de responsabilidade da Comcap - Companhia de Melhoramentos da Capital, que faz a gestão dos resídu-os de Florianópolis. Pelo trabalho, tornou-se referência entre as ati-vidades de educação ambiental no Estado. As instalações estão organi-zadas em ambientes diferenciados, montados e decorados com mate-riais reciclados. O espaço recebe em média 5 mil visitantes por ano. Agendamento de visitas:(48) 3338 3031 [email protected]

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INclUIR>>

nicialmente, é preciso refe-rir que tratar de TS significa abordar processos que, con-comitantemente, inserem-se na agenda contemporânea do conhecimento e na mais

antiga das intenções de superação das adversidades na história da humanida-de. Significa tratar das ações concretas e dos resultados alcançados por meio do trabalho de pessoas que resolveram problemas, inspiradas pela sabedoria e mobilização popular e, em algumas si-tuações, com o apoio de pesquisadores.

A TS vem sendo discutida no Bra-sil, nesta primeira década do século XXI, por diferentes atores sociais, tais como organizações da sociedade civil, universidades, integrantes do governo, trabalhadores, entre outros, e vem se constituindo como uma das respostas possíveis para o atendimento das de-mandas sociais. Há, entre esses atores, uma preocupação com a crescente ex-clusão social, a precarização e a infor-malização do trabalho, a violação dos direitos humanos e, também, a cons-tatação acerca dos limites da atual po-lítica de ciência e tecnologia no país.

ITratar da concepção de TS signifi-

ca reconhecer a diversidade de fatores que estão implicados na construção e no desenvolvimento de uma TS; entre eles pode-se citar a transformação so-cial, a participação direta da população, o sentido de inclusão social, a melhoria das condições de vida, o atendimento de necessidades sociais, a sustentabilidade socioambiental e econômica, a inova-ção, a capacidade de atender necessida-des sociais específicas, a organização e sistematização da tecnologia, o diálogo entre diferentes saberes (acadêmicos e populares), a acessibilidade e a apro-priação das tecnologias, a difusão e ação educativa, a construção da cidadania e de processos democráticos, a busca de soluções coletivas, entre outros, que são sustentados por valores de justiça social, democracia e direitos humanos. Com esses tópicos, pode-se afirmar que um dos objetivos da TS é justamente o de reverter a tendência vigente da tec-nologia capitalista convencional, já que as TS se contrapõem a esse modelo em função de reunir as seguintes caracterís-ticas: ser adaptada a pequenos produ-tores e consumidores; não promover o

Caminhos das Tecnologias Sociaisreflexões iniciais

Por Rosa Maria Castilhos Fernandes e Ana Lúcia Suárez Maciel*

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tipo de controle capitalista, segmentar, hierarquizar e dominar os trabalhado-res; ser orientada para satisfação das necessidades humanas (...); incentivar o potencial e a criatividade do produ-tor direto e dos usuários; ser capaz de viabilizar economicamente empreendi-mentos como cooperativas populares, assentamentos de reforma agrária, a agricultura familiar e pequenas empre-sas (NOVAES e DIAS, 2009, P. 18-19).

Tais características demonstram o quanto a TS está voltada para a “produ-ção coletiva e não mercadológica” e, da mesma forma, está “mais imbricada a realidades locais, de modo que pudesse gerar respostas mais adequadas aos pro-blemas colocados em um determinado contexto” (NOVAES e DIAS, 2009, p. 19). Também seguindo a linha concei-tual sobre TS, é importante frisar que as TS sempre consideram as especifici-dades das realidades locais e que estão diretamente relacionadas aos processos de organização coletiva e democrática; acabam, portanto, representando so-luções para a superação de diferentes situações problemáticas de vulnerabi-lidade e exclusão social, incidindo, as-

sim, na melhoria das condições de vida daqueles atores envolvidos com a TS.

Considerando os movimentos e ini-ciativas dos atores sociais que vêm discutindo e disseminando as TS, des-tacamos a criação da Rede de Tecnolo-

gias Sociais (RTS) no Brasil, onde foi gerado o conceito de TS da seguinte forma: “(...) produtos, técnicas ou me-todologias reaplicáveis, desenvolvi-das na interação com a comunidade e que representem efetivas soluções de transformação social” (RTS, 2009). A RTS é uma rede que reúne mais de 786 organizações de todo país e do exterior entre organizações não governamen-tais, centros de pesquisa, cooperati-vas, empresas, escolas de ensino mé-dio, fundações e institutos, sindicatos, universidades e órgãos de governo nos níveis federal, estadual e municipal.

A RTS tem como objetivo ampliar a difusão e a reaplicação de Tecnolo-gias Sociais, possibilitando a inclusão social, a geração de trabalho e renda e a promoção do desenvolvimento lo-cal sustentável. São experiências que permitem a reaplicação e já são usa-das em diversas localidades do Brasil e em outros países. Ações como essas, que incentivam a interação das comu-nidades locais e promovem soluções na vida das pessoas, são apoiadas pela referida rede. As instituições que fa-zem parte dela, até o momento, têm

“AS TECNOLOGIAS

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CONSIDERAM AS

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REALIDADES LOCAIS E

ESTãO DIRETAMENTE

RELACIONADAS

AOS PROCESSOS

DE ORGANIZAçãO

COLETIVA E

DEMOCRáTICA”

Tecnologia social ambientalmente sustentável, aplicada pela Fundação Banco do Brasil, gera renda e melhora a vida de mais de cem municípios do país.

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INclUIR>>

um propósito comum: entender as TS como importantes ferramentas para o desenvolvimento humano e para a for-mação de uma sociedade mais justa. Também pactuam dessa concepção a Fundação Banco do Brasil, entidade que hoje protagoniza um conjunto de iniciativas que promovem a dissemi-nação das TS em diferentes regiões do país e o próprio Ministério da Ciência e Tecnologia; este último reconhece que o objetivo da TS é o de contribuir para a redução do quadro de pobreza, analfabe-tismo, fome e exclusão social por meio da utilização das tecnologias sociais.

A intenção aqui não é a de sistemati-zar Tecnologias Sociais, mas a de apon-tar o quanto as TS, ao serem desenvolvi-das e reaplicadas, promovem a inclusão social de trabalhadores, de zonas rurais ou urbanas, de atores sociais de diferen-tes ciclos de vida, de famílias que se en-contram em situação de vulnerabilidade e de risco social e que, de forma coleti-va, vivenciam experiências que incidem não somente nas suas condições de vida, transformando a si mesmos, como trans-formando o cenário socioeconômico na comunidade na qual vivem e do país.

É diante desse cenário que a defesa das TS, como Política Pública, apresen-ta-se: como uma estratégia promissora para superar os limites do atual mode-lo e padrão de ciência e tecnologia vi-gente no país, bem como uma resposta mais sintonizada com as demandas da sociedade na busca por um modelo de desenvolvimento social que tenha cen-tralidade no processo de inclusão social e, como atores principais, a própria so-ciedade. Atualmente, as TS apresentam

significativo avanço no país, seja pelas organizações que se instituíram na úl-tima década, com vistas à dissemina-ção dos conceitos e práticas, seja pela capacidade de criação delas, por meio das iniciativas populares e da sua rea-plicação em todo o território nacional.

Portanto, o futuro do desenvolvi-mento das TS, em grande parte, en-contra-se relacionado à possibilidade de alterar a atual política de ciência e tecnologia no país e de torná-la uma política pública, tendo em vista que as experiências existentes no território na-cional apontam para a sua efetividade no que se refere à capacidade de gerar respostas inovadoras para a resolução de velhas demandas sociais e, com isso, impacto social nas comunidades, que se beneficiam com tais tecnologias.

No momento histórico atual, dese-nha-se, no cenário brasileiro, uma im-portante luta social em que diferentes segmentos e atores sociais, sobretudo aqueles comprometidos com projetos societários que se contrapõem ao mode-lo excludente vigente, não têm poupado esforços para instituir a TS como uma política pública. As iniciativas de TS se constituem em uma das mais profícuas alternativas de enfrentamento das ex-pressões da questão social, por se tra-tarem de experiências constituídas por meio das iniciativas comunitárias lo-cais, pelo saber popular em articulação com os saberes acadêmicos, por pro-cessos participativos e democráticos e, fundamentalmente, pela capacidade de rupturar com a lógica linear de produ-ção do conhecimento científico, já que a necessidade/demanda social é o fim pri-

A DEFESA DAS TS

COMO POLíTICA

PÚBLICA APRESENTA-

SE COMO UMA

RESPOSTA MAIS

SINTONIZADA COM

AS DEMANDAS

DA SOCIEDADE

NA BUSCA POR

UM MODELO DE

DESENVOLVIMENTO

qUE TENHA

CENTRALIDADE

NO PROCESSO DE

INCLUSãO SOCIAL

E, COMO ATORES

PRINCIPAIS, A

PRóPRIA SOCIEDADE

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meiro da produção do conhecimento, ou seja, o conhecimento é colocado a ser-viço do desenvolvimento social, e a tec-nologia é uma mediação para a garantia dos direitos sociais, e não um meio para ampliar a competitividade do país na oferta de novos bens para o consumo.

Assim, os caminhos das TS são revela-dores da capacidade que a sociedade tem de se organizar em função dos interesses da comunidade, partindo, muitas vezes, da identificação do capital já existente na comunidade, que passa a ser potencia-lizado para o benefício da coletividade. Em alguns casos, esse processo de orga-nização vem acompanhado do trabalho, em parceria, de técnicos e pesquisadores, mas é importante destacar que esse acom-panhamento não é uma condição sine qua non para que se constituam as TS. Na prática, o que se verifica é que muitas experiências de TS necessitam de uma sistematização para que possam ser rea-plicadas em outras comunidades e, com isso, possam contribuir para que haja o incremento de alternativas que auxiliem na superação das condições adversas em que se encontra parcela significativa da população brasileira. O caminho inicial que as TS vêm percorrendo no Brasil tem todas as condições para se constituir em uma referência de inovação e desen-volvimento social, pois parte da própria sociedade que, coletivamente, organiza-se para constituir um novo modelo so-cietário. Talvez por isso seja tão profícuo de valores, desejos e experiências que se alimentam da crença de que é possível fazer mais e melhor, de forma simples, mas compromissada com uma socieda-de mais justa, igualitária e sustentável.

REFERÊNCIASNOVAES, Henrique; DIAS, Rafael. Contribuições ao Marco Analítico Conceitual da TS. In: DAGNINO, Renato (org.). Tecnologia Social: ferramenta para cons-truir outra sociedade. Campinas, São Paulo: IG/UNICAMP, 2009. P. 17-53.

RTS: Rede de Tecnologia Social. Disponível em: http://www.rts.org.br. Acesso em: set. de 2010.

ITS BRASIL: Instituto de Tecnologia Social. Caderno Série Conhecimento e Ci-dadania 1. Tecnologia Social. fev. 2007. Disponível em: http://www.itsbrasil.org.br. Acesso em: set. de 2010.

AUTORASRosa Maria Castilhos Fernandes. Assistente Social. Doutora em Serviço So-cial e Coordenadora de Desenvolvimento Social da FIJO.

Ana Lúcia Suárez Maciel. Assistente Social. Professora da FSS/PUCRS. Dou-tora em Serviço Social. Vice-Presidente da Fundação Irmão José Otão – FIJO – Site: www.fijo.org.br

Fonte: Publicação “Tecnologias Sociais – experiências e contribuições para o desenvolvimento so-

cial e sustentável”, organizada por Rosa Maria Castilhos Fernandes e Ana Lúcia Suárez Maciel

Coperativas de catadores de material reciclável são um exemplo de melhorias nas condições de vida de quem é atendido por programas de tecnologia social.

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stá em voga uma nova ex-pressão para designar algo que é tão antigo quanto o homo sapiens (3). Trata-se da Tecnologia Social cuja definição encontra-se

disponível no sítio www.rts.org.br: “...compreende produtos, técnicas ou me-todologias, reaplicáveis, desenvolvidas na interação com a comunidade e que representam efetivas soluções de trans-formação social.”

Ao contrário do que se possa crer, tec-nologia é um termo que não foi cunhado na Revolução Industrial, pois antes dela já ha-via trabalhadores. O termo tem origem no grego “technos: ofício, profissão” e “logos: saber, estudo, conhecimento”. Denota, as-sim, o saber acumulado dos trabalhadores. Saber esse que é necessariamente social.

A rigor, a tecnologia social não pode ser considerada como um conceito. In-capaz de contribuir para uma leitura da realidade, ela resume-se a uma expressão que, grafada, realça sua própria indefini-ção. O risco de seu uso de forma acrítica pode ampliar ao invés de reduzir o fosso que separa os donos das palavras daqueles que tiveram o direito à palavra usurpado.

Portanto, se todo instrumento, equi-pamento, método ou artefato criado pelo

homo – que tem como objetivo potencia-lizar as ações humanas ou permitir um salto de qualidade na organização social, econômica, política ou cultural – é tec-nologia, então toda a tecnologia é social, pois essas ações só podem ocorrer em sociedade. Ao designar como Tecnologia Social a aplicação de técnicas, de alter-nativas à “tecnologia convencional” di-recionadas para a pobreza, pode-se estar condenando grande parte da sociedade a jamais poder acessar as tecnologias pro-duzidas pela humanidade.

Se a tecnologia produzida nesta so-ciedade interessa a estas camadas sociais (excluídas), é uma pergunta; entretanto, se não interessa, surge outra questão: qual a tecnologia necessária aos excluídos e, no caso da análise deste artigo, aos trabalha-dores da economia popular solidária?

A preocupação aqui é que, no afã de se encontrar a tecnologia para os pobres, esteja-se sacramentando a discrimina-ção ao projetar somente equipamentos de baixo investimento tecnológico ou mesmo arcaicos. Equipamentos que não concorram com a “tecnologia capitalis-ta”. Ao propor tecnologia “pequena”, de baixo custo, com a preocupação de tor-nar os produtos da economia solidária “competitivos”, como têm feito alguns

Tecnologia Social: isso serve para que mesmo?

Gilmar Gomes e Cássio Luciano Becker*

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autores que publicam na RTS, esteja-se determinando que os pobres jamais poderão deixar de ser pobres, pois sua produção não terá escala.

Parece que este não deve ser o foco. Autores como Renato Dagnino (4), Ri-cardo Neder, Henrique Novaes e Ro-drigo Fonseca têm debatido a questão da tecnologia e provocado a discussão sobre qual tecnologia interessa ao de-senvolvimento da economia solidária. A tônica da discussão que estes auto-res trazem diz respeito à busca de uma tecnologia que de fato contribua para potencializar as produções nos empre-endimentos, e isso nada tem a ver com tamanho do equipamento ou com o in-vestimento tecnológico aportado, mas sim com outra tecnologia, adequada às necessidades de uma produção que, no caso em análise – a economia soli-dária - , há que se diferenciar do modo de produção do capital. As máquinas, as técnicas, os equipamentos de que a eco-nomia solidária precisa devem se dife-renciar pelos objetivos que cumprirão, quais sejam: emancipar o homo, gerar desenvolvimento (local, territorial?), e buscar uma relação com o ambiente no caminho da sustentabilidade.

Se, então, trata-se de criação de tecno-logia, espera-se que os centros de pesqui-sa, centros de saber, universidades sejam os projetistas destas novas técnicas. Sabe-se, desde Milton Santos, que o período atual se caracteriza por um número infin-dável de novas técnicas, tecnologias de ponta e invenção do ciberespaço, mas que também nunca foi tão grande o número de pessoas que no planeta estão excluí-das do acesso a essas inovações ou que as acessam de forma subordinada e alienada. Denominou esse período como técnico-científico informacional. Suas marcas são a rapidez da informação nunca vista an-

tes, a contração do espaço-tempo e o res-surgimento das comunidades territoriais (SANTOS: 2000).

A economia solidária é tributária dessa nova fase do capital e, em um movimento contra-hegemônico, reage, criando formas alternativas de produ-ção, comercialização e consumo. A eco-nomia solidária precisa de tecnologias que correspondam a essas formas novas de produção da vida.

A questão a ser enfrentada é que os centros de saber não respondem a essa demanda, e a base dessa negação loca-liza-se na própria incapacidade das uni-versidades de gerar outro conhecimento; o gerado nas universidades é inadequado para atender as demandas deste segmen-to. Essa inadequação está presente no co-

nhecimento produzido e, muitas vezes, ela é levada para as esferas de gover-no e, mesmo quando há preocupação em executar políticas públicas para a economia solidária, esbarra-se nessa questão. Eis por que as políticas públi-cas mostram-se também inadequadas. Dagnino (2009) chama isso de inade-quação cognitiva.

Compete aos militantes do movi-mento da economia solidária, espe-cialmente por meio das Incubadoras Tecnológicas de Cooperativas Popu-lares (ITCPs), desafiar a Universida-de às respostas que são necessárias para a criação dos instrumentos de construção da nova sociedade, pois ela tem todos os elementos para que possa constituí-lo.

REFERÊNCIASDAGNINO, Renato. A tecnologia social e seus desafios. In: LASSANCE JR., Antonio et a. Tecnologia social: uma estratégia para o desenvolvimento. Rio de Janeiro: Fundação Banco do Brasil, 2004. p. 187-216. Disponível em: http://www.ige/unicamp.br/gapi. Acesso em: set. 2010_______. Tecnologia social: ferramentas para construir uma outra sociedade. Campi-nas: IG/UNICAMP, 2009. NEDER, Ricardo T. (Org.) Andrew Feenberg: racionalização democrática poder e tecno-logia. Brasília. Observatório pelo movimento da tecnologia social na América Latina / CDS / UnB / Caps, 2010.NOVAES, Henrique T. (Org.) O fetiche da tecnologia: a experiência das fábricas recupe-radas. São Paulo: Expressão Popular, 2008.SANTOS, Milton. Por uma outra globalização: do pensamento único à consciência uni-versal. Rio de Janeiro: Record, 2000.3 - Expressão que designará o ser humano independentemente de gênero.4 - Renato Dagnino, Henrique Novaes e Rodrigo Fonseca travam uma interessante dis-cussão sobre a temática da tecnologia e sua aplicação nos EES em: Tecnologia Social – ferramenta para construir outra sociedade. Campinas, SP. IG/UNICAMP, 2009.

AUTORES Gilmar Gomes e Cássio Luciano Becker. Integrantes do Núcleo de Economia Alterna-tiva/ITCPS-UFRGS: Incubadora de Cooperativas Populares, programa de extensão da Universidade Federal do Rio Grande do Sul.Fonte: Publicação “Tecnologias Sociais – experiências e contribuições para o desenvolvimento social e susten-tável”, organizada por Rosa Maria Castilhos Fernandes e Ana Lúcia Suárez Maciel

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>> AgENDA glObAl

Conferência das Nações Unidas sobre Mudança do Clima, realizada no México em dezembro de 2010 (COP 16), iniciou

com uma expectativa negativa, dados os poucos avanços que aconteceram em Copenhague no ano passado. Ao contrá-rio da conferência de 2009, neste ano fo-ram poucos os presidentes de países pre-sentes. Ainda assim, no último dia, foi aprovado um pacote chamado “Acordo Cancún”, com uma série de documen-tos que fornecerão as bases dos esforços

para confrontar a mudança climáticas depois que expirar o Protocolo de Kyoto em 2012.

Entre as propostas aprovadas pelos países presentes (a única exceção foi a Bolívia) está a criação de um pacote de US$30 bilhões para 2012 para ações de mitigação aos efeitos do aquecimen-to global, assim como a intenção de se levantar US$100 bilhões em fundos de longo prazo até 2020. Além disso as metas dos países industrializados foram oficialmente reconhecidas num processo multilateral e eles criarão planos e es-

tratégias de desenvolvimento de baixo carbono e formas de alcançá-los, inclu-sive através de mecanismos de mercado. Esses países deverão publicar seus rela-tórios a cada dois anos e para isso, terão que investir em inventários de emissões.

Já os países em desenvolvimento ti-veram suas ações para redução de emis-sões oficialmente reconhecidas. Deve-rão realizar um registro para informar e compatibilizar as ações de mitigação com financiamento e apoio tecnológico fornecido pelos países industrializados. Foi lançado também um conjunto de ini-

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COP 16: Resultados acima da expectativa

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ciativas e instituições para proteger os mais vulneráveis às alterações climáticas e para distribuir o dinheiro e a tecnologia que os países em desenvolvimento preci-sam para planejar e construir seu futuro sustentável.

A COP 16 esboçou as diretrizes para o Fundo Verde do Clima, com um conselho de representação equitativa entre países desenvolvidos e em desenvolvimento. Ele deverá arrecadar US$100 milhões anual-mente para adaptação e mitigação. Foi aprovada também a criação do programa REDD+ (Reducing Emissions from De-forestation and Forest Degradation in De-veloping Countries) para facilitar o fluxo de recursos a comunidades dedicadas à conservação florestal. E os Mecanismos de Desenvolvimento Limpo, criados pelo Protocolo de Kyoto, foram reforçados para traduzir mais investimentos e tecno-logia em projetos de redução de emissões ambientalmente confiáveis e sustentáveis nos países em desenvolvimento. Soma-se a isso a criação do Comitê Executivo de Tecnologia e Centro e Rede de Tecnolo-gia Climática para aumentar a cooperação tecnológica de apoio a ação de adaptação e mitigação.

Outro ponto positivo da COP 16 foi a prorrogação do Tratado de Kyoto para além de 2012, ainda que não te-nha sido definida uma data limite para isso. Nesse ano acontecerá no Brasil a Rio +12, que deverá apontar novos caminhos que o planeta deverá seguir no campo da mitigação e adaptação às mudanças climáticas.

ESPAÇO BRASIL

O estande do Brasil foi um dos mais visitados na COP do México. Em uma parte, reproduziu o ambiente amazônico, com seus sons, cheiros, texturas e sabores. Na outra, reali-zou painéis sobre ações que vêm sendo implementadas no país para mitigação e adaptação, tanto por ini-ciativas de governo quanto de gran-des empresas, como a de celulose e papel, de plásticos, química, de energia e agricultura.

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>> AgENDA glObAl

Em novembro foi landada a quar-ta edição da pesquisa “Edelman goodpurpose®Study 2010”, feita em 13 países com 7 mil consumidores. Intitu-lado “Cidadãos engajados!” (Citizens Engage), esta edição traz na capa o título “Salve a Amazônia”. Segundo o estu-do, 71% dos consumidores em todo o mundo - 79% no Brasil - acreditam que projetos que protejam o meio ambiente podem ajudar no crescimento da econo-mia. “Cidadãos engajados!” (Citizens Engage), com foto de capa escrita “Sal-ve a Amazônia”. Além disso, a pesquisa mostra que “Proteger o meio ambiente” foi considerada a causa número 1 sobre o que os consumidores se preocupam, seguido por “melhorar a qualidade dos cuidados de saúde”.

Dos entrevistados, os consumidores dos mercados emergentes - Brasil, Chi-na, Índia e México - estão mais propen-sos a comprar e promover produtos de marcas que tenham compromissos com boas causas. No caso do Brasil, oito em cada dez consumidores comprariam produtos de empresas consideradas res-ponsáveis social e ambientalmente, uma porcentagem bem mais expressiva do que os consumidores da Europa (54%).

E, assim como cada consumidor deve ter seu compromisso na escolha dos pro-dutos, os entrevistados disseram que as empresas também devem fazer sua parte, colocando o mesmo peso dos seus inte-resses aos interesses da sociedade.Confira o estudo na íntegra: www.edelman.com/insights/

Cidadãos Engajados

“Eu tenho mais confiança numa marca ética e socialmente responsável”

BRASIL ............ 81%chINA .............. 78%MéxIcO ........... 78%íNDIA ............... 77%

MERCADOS EMERGENTES E A EXPECTATIVA DE ENVOLVIMENTO EM BOAS CAUSAS

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OPINIÃO>>

palavra mágica “sustentabilidade” significa para os investidores, um re-torno assegurado; para os produtores, um mercado firme; e, para o consumi-dor, um produto ético. Um sonho. As-

sim, a sustentabilidade ligada a um produto (o açúcar e o etanol, por exemplo) pode ser uma ferramenta do livre comércio: por que impedir a venda e a compra de um produto sendo este sustentável?

De fato, hoje em dia, existem dezenas de iniciativas em cima do setor sucroalcooleiro, todas querendo ga-rantir a famosa sustentabilidade neste mercado. Claro, a multiplicação de iniciativas que queiram garantir a sustentabilidade do setor - 34 eventos nacionais e inter-nacionais para o setor sucroalcooleiro em 2009 - pode tornar complexa a visibilidade da sustentabilidade do mercado. Desses discursos, falta quase sempre o aspec-to social. Como, por exemplo, no Brasil, onde centenas de milhares de bóias frias que podem ser substituídos pela mecanização.

A pergunta é: como assegurar esta famosa sustenta-bilidade? Assegurar como “sustentável” o fato de que não tem trabalho escravo e/ou crianças trabalhando é uma simples falsidade. Simplesmente porque as legis-lações de qualquer país que tenha assinado as conven-ções da OIT – Organizaçao Internacional do Trabalho – tem que incorporá-las. A sustentabilidade vai além do quadro legislativo “óbvio”. A base é permitir um ver-

A sustentabilidade do setor sucroalcooleiro entre mitos e realidade

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OLIVIER GENEVIEVEPresidente da Sucre-ethique

dadeiro diálogo social entre as entidades envolvidas no setor, no qual os sindicatos são uma das peças chaves.

A sustentabilidade é uma visão de longo prazo de um setor globalizado. A dificuldade da susten-tabilidade é em poder agradar os atores econômi-cos, de como impedi-los de explorar a natureza e como eles garantirem o máximo de empregos sus-tentáveis. Alem disso, é obvio que as empresas, por serem atores com fins lucrativos, não têm o papel mais legítimo de garantir a sustentabilidade do se-tor por si mesmo.

Por sustentabilidade, temos que ter por princípio uma remuneração justa dos assalariados, um respeito ao meio ambiente e uma remuneração do capital em longo prazo e não somente em curto prazo. Infeliz-mente ainda não existem critérios oficiais estabeleci-dos pela lei internacional permitindo garantir de fato a sustentabilidade ao setor.

O filósofo e economista francês Saint Simon (1760- 1825) explicava que a sociedade era composta de abe-lhas e vespas. De um lado, pessoas querendo trazer um verdadeiro valor agregado pela sociedade; do outro lado, pessoas querendo somente assegurar uma bóia quente em cima da sociedade.

Temos que torcer por uma verdadeira sustentabilida-de: economicamente livre - por um verdadeiro mundo globalizado, ecologicamente igualitário - sem frontei-ras e socialmente fraternal.

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>> MEU MUNDOKadu Moliterno

“A solidariedade é a base de toda a sociedade”

arlos Eduardo Moliterno ou Kadu, como é carinhosa-mente conhecido pelo pú-blico brasileiro, nasceu em São Paulo no ano de 1952.

Começou a trabalhar cedo como office-boy na companhia de Metrô, mas foi numa agência de publicidade no bairro onde morava que ganhou seu primeiro trabalho de modelo publicitário. A primeira oportu-nidade na TV foi em uma novela da TV Record, e deste então não parou mais de atuar. Acumulou no seu currículo novelas como Selva de Pedra, Água Viva, Brilhan-te, Partido Alto, Pátria Minha, O Dono do Mundo, 4 por 4, Anjo Mau, além de mi-niséries como Memorial de Maria Moura, Anos Rebeldes e Amazônia. Mas foi na

série Armação Ilimitada, onde interpretava Juba, ao lado de André de Biase, o Lula, que ganhou o coração do telespectador, com a mensagem de uma dupla preocupa-da com a natureza e amante dos esportes. Kadu tem uma carreira bem sucedida, três filhos (Kenui, Lanai e Kauai) e um amor à natureza que jamais o abandonou. Para ele a consciência ambiental já foi chamada de ecológica, de preservação e muitos outros termos, todos com o mesmo intuito, salvar a natureza. No entanto o termo utilizado não é o problema, e sim a dificuldade hu-mana de aprender, viver e preservar.

“Quando eu era moleque, lá pelos anos 60, no meu bairro, tinha um lago onde po-díamos mergulhar, além de vários terre-nos com pés de jabuticaba, goiaba, man-

ga, pitanga, amora e até uvas. Jogar bola, brincar de carrinhos, lançar peão, escon-de-esconde, balão e pipa eram nossas brincadeiras mais fantásticas. Eu sei que tive uma infância sadia ao ar livre, num ambiente de tranqüilidade e sem violên-cia. Há pouco estive no bairro que nasci, e só encontrei edifícios enormes. Restam poucas árvores, nenhuma frutífera, o lago só pode ser admirado, jamais desfrutado e o parque onde brincava está cercado por grades pretas. Fiquei angustiado.”

Kadu acredita que a crise ambiental parte do princípio que primeiro o homem tem de sobreviver, para depois pensar no lixo que produz, na água que gasta, na energia que consome. E se a maior parte da população da Terra ainda continuar

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ção de impotência em relação ao futuro do planeta.

Mas como será o futuro para Kadu? O ator que hoje mora no Rio de Janeiro, en-sinou aos seus filhos a sua paixão pela na-tureza, pelo esporte e pelo surf, uma ativi-dade que glorifica os oceanos, com ondas e águas limpas e cristalinas, mas que na verdade está cada vez mais comprometido. ”Aqui no Rio, as praias são impróprias para banho. Só algumas são ainda toleráveis. E pelo rumo natural da vida, no futuro, meus netos vão surfar em piscinas, com direito a dez ondas por R$ 500 reais“, lamenta.

Filiado a uma ONG que chama a aten-ção ao saneamento básico, Kadu Moliterno acredita que para ajudar a melhorar o mun-do é necessário que cada um faça sua parte:

sem direito ao trabalho, educação, saúde e consequentemente consciência políti-ca, não teremos como recuperar a des-truição cada vez maior dos oceanos, das florestas e dos rios.

Há muito Kadu é defensor da Natu-reza. Em 1984, Juba e Lula, (Kadu e Andre de Biase) se associaram ao Gre-enpeace. O seriado produzido pela TV Globo “Armação Ilimitada” foi um dos primeiros programas a levantar a ban-deira da ecologia, da preservação da natureza, do esporte e da aventura. Os dois heróis nacionais, Juba e Lula, pas-saram a defender a natureza, as águas e florestas brasileiras, como a Amazônia. Mas Kadu garante que apesar dos esfor-ços e da consciência, existe uma sensa-

“ comece pelo seu quintal, seu condomínio, sua cidade”. “Eu separo o lixo orgânico, do plástico e do papel. Não desperdiço água no banho e até mesmo quando escovo os dentes procuro não deixar a torneira aberta, nem mesmo enquanto me olho ao espelho“, brinca ele, que continua, “é importante ter consciência do valor de cada jato de água que sai de sua torneira. Isso eu já consegui passar para os meus filhos, e acho que é um dos primeiros passos pra uma qualidade de vida melhor no futuro”.

“A solidariedade é a base de toda so-ciedade. Eu acredito que só com ela po-demos alcançar a erradicação da pobreza e da fome no mundo. Se a pessoa tem fome, como ela vai pensar em preservar o meio ambiente?”, finaliza Kadu.

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>> EM DESTAqUE

Diversidade nas 500 Maiores Empresas do Brasil

Menos de 14% dos cargos de diretoria das 500 maiores em-presas do Brasil são ocupados por mulheres. E, nos demais níveis hierárquicos, a participa-ção feminina também está bem abaixo da porcentagem de mu-lheres na população brasileira, que é de 51%, segundo dados recém-divulgados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Esta-tística (IBGE) no Censo 2010.

Este é apenas um dos seg-mentos estudados pela pesquisa “Perfil Social, Racial e de Gêne-ro das 500 Maiores Empresas do Brasil e suas Ações Afirmativas” 2010. O estudo vem sendo reali-zado desde 2001 pelo Instituto Ethos e pelo Ibope Inteligência, em parceria com a Fundação Getúlio Vargas de São Paulo (FGV-SP), o Fundo de Desen-volvimento das Nações Unidas

Em novembro de 2010, duas jo-vens pesquisadoras brasileiras foram premiadas pelo Ministério Federal de Educação e Pesquisa da Alemanha pelo seu histórico acadêmico em prol da sustentabilidade. Entre os 20 ven-cedores de 12 países do Green Talents 2010 estão as doutorandas Janaína Ac-cordi Junkes, da Universidade Federal de Santa Catarina em Florianópolis e Daniela Morais Leme, da Universidade Estadual Paulista (Unesp) de Rio Claro.

A primeira desenvolve pesquisa, desde a graduação, sobre a destinação de resíduos industriais, como o lodo de estações de tratamento de água potável na fabricação de revestimentos cerâmi-cos. Já o trabalho de Daniela, da Unesp, foca o impacto ambiental do biodiesel em águas e solos. “Foi o reconhecimen-to de todo o meu esforço na avaliação necessária para o tratamento do proble-ma. Estou muito feliz”, disse Daniela.

O Green Talents 2010 recebeu a ins-crição de 234 jovens cientistas de 57 países, entre eles 18 investigadores do Brasil. Os 20 premiados participa-ram, no início de novembro, de evento científico na Alemanha. Também vi-sitaram universidades, instituições e empresas importantes e conheceram projetos inovadores em várias áreas da tecnologia para a sustentabilidade

Brasileiras Green Talents

para a Mulher (Unifem), o Ins-tituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) e a Organização Internacional do Trabalho (OIT). O trabalho verificou ainda a par-ticipação nos cargos por raça, faixa etária, tempo de empresa, nível de escolaridade, pessoas com deficiência e aprendizes. Traz também as políticas e ações afirmativas eventualmente adota-das pelas empresas em favor da diversidade e da equidade, bem como a percepção do principal executivo acerca da situação das mulheres, negros, pessoas com deficiência, pessoas com mais de 45 anos e dos jovens aprendizes.

Este ano, teve o patrocínio da pesquisa é do Instituto Uni-banco e da Phillips do Brasil com apoio institucional da Inter American Foundation(IAF) e da ONG Atletas pela Cidadania.

Daniela Morais Leme Janaína Accordi Junkes

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Um dos principais destaques do Rela-tório de Sustentabilidade 2010 da Toyota é a construção da primeira unidade fa-bril da empresa no país com o conceito Ecofactory. Por essa diretriz a fábrica estabelece que 85% dos fornecedores de insumos para abastecer a unidade es-tejam alocados próximo à nova planta, reduzindo assim as emissões com trans-porte de peças e diminuino os riscos de acidentes e os custos da produção. Instalada em Sorocaba/SP, a unidade Ecofactory deverá seguir rígidas me-tas de redução dos índices de emissões de dióxido de carbono e de compostos orgânicos voláteis além de exigentes padrões de reutilização da água pluvial.

Além da nova fábrica, a empresa comemora o primeiro ano de ativida-des da Fundação Toyota do Brasil com significativos resultados e perspectivas de mais melhorias. Suas principais ati-vidades estão focadas na parceria com a Fundação SOS Mata Atlântica e no apoio ao Projeto Arara Azul (www.f u n d a c a o t o y o t a d o b r a s i l . o rg . b r )

No geral, as ações apresentadas no relatório se referem ao cumprimento de importantes metas de redução de emis-sões de CO2, de consumo de recursos naturais e de geração de resíduos ba-seadas no modelo global da empresa.

Toyota Ecofactory

Expectativas ampliadas e maior volume de informações disponibiliza-do aos consumidores e à sociedade em geral representam novos desafios para as empresas. O incremento da competitividade requer harmonizar baixo custo, alto padrão de qualidade e atendimento às demandas sociais e ambientais.

Na econômica do século XXI, altamente dinâmica, as empresas buscam posturas socialmente cor-retas, ambientalmente responsá-veis e economicamente viáveis. Profissionais competentes precisam atualizar-se neste novo paradigma que utiliza modelos organizacionais inovadores e práticas de gestão que integram os interesses da socieda-de com os da empresa.

Essa é a proposta deste livro, que discute conceitos e instru-mentos aplicáveis à gestão socio-

ESTANTE >> Livros

ALIGLERI, Lilian; ALIGLERI, Luiz Antonio, KRUGLIANSKAS, Isak. Gestão socioambiental: responsabilidade e sustentabilidade do negócio. São Paulo: Atlas, 2009. 248 ppR$49,00

ambiental em diferentes tipos de negócio, áreas organizacionais e níveis decisórios. Escrito com lin-guagem simples e didática, utiliza literatura nacional e internacional, complementada com exemplos re-ais de empresas. Os autores, espe-cialistas em Administração, foram ganhadores do Prêmio Ethos-Valor 2008 na categoria “Professores”, artigo de pesquisa.

A obra pode ser adotado como livro-texto para as disciplinas de graduação e pós-graduação que abordem a responsabilidade e a sus-tentabilidade nas áreas da Adminis-tração e da Engenharia, bem como Comunicação Social. Obra relevante também para profissionais e empre-sários interessados em ampliar seus conhecimentos sobre o envolvimen-to das empresas com questões so-cioambientais e a sustentabilidade.

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54 PRIMEIROPLANO . Janeiro 2011

>> >> OPINIÃOEM DESTAqUE

Um novo tempo para a Capital Britânica

A maioria de nós, quando fecha os olhos, consegue imaginar mesmo que não conheça, uma Londres gélida, es-tampada em imagens preto e brancas capturadas por fotógrafos renomados como Cartier Bresson. Ou então, en-quadrada em pinturas magníficas, com tons cinzentos e traçados perfeitos de Claude Monet. Quem sabe, em cenários espetaculares dos famosos e nebulosos filmes do instigativo Sherlock Holmes. A imagem cravada em nossas mentes é real. Em dezembro de 1952, a cidade de Londres, na Inglaterra, registrou um dos mais dramáticos episódios de poluição do ar. O chamado Big Smoke. As tempe-raturas baixas, associadas à emissão dos veículos movidos a diesel, à queima de carvão nas lareiras domésticas e a con-dições meteorológicas desfavoráveis à dispersão da poluição fizeram com que a cidade ficasse envolta por uma densa nuvem de fumaça. Como conseqüência, as concentrações de alguns poluentes atingiram níveis até 10 vezes superiores aos limites máximos. Na semana em que isso ocorreu, e nas duas seguintes, foram registradas cerca de quatro mil mortes.

Este fato evidenciou a capacidade le-tal e geradora de doenças dos poluentes atmosféricos e foi a partir de então que os governos de diversos países começaram a criar e regulamentar políticas ambientais para o controle da poluição do ar. O gran-de número de mortes deu um importante impulso aos movimentos ambientais. Atu-almente, já existem alguns estudos que

servem como indicadores para o desen-volvimento de programas de controle das emissões dos poluentes atmosféricos e que apóiam as políticas públicas voltadas para a saúde nos meios urbanos e industriais.

Hoje, Londres é exemplo em muitas frentes ambientais. Tem uma coleta de lixo bastante eficiente, onde o profis-sional nem toca nos resíduos. Encaixa o suporte no caminhão e faz a transfe-rência. Quando as pessoas não separam adequadamente seus lixos, ganham um aviso, pedindo gentilmente que passem a fazê-lo. A cidade também ganhou, há al-guns anos, restaurantes que utilizam seus produtos de formas sustentáveis. A guer-ra da distribuição de jornais gratuitos no metro ainda é um problema, mas parece já amenizado. No outro dia pela manhã, as toneladas de papel já desapareceram.

Já não é tão difícil, como há alguns anos na Europa, encontrar lixeiras pelas ruas da cidade. O difícil é encontrar pa-péis e latas jogadas ao chão. Os londrinos respeitam seu ambiente e já criaram um mercado para a redução de volume de re-síduos em aterros, facilitando incentivos para a reciclagem. Londres hoje pulsa, corre, tem parques verdes preservados, rios azuis sendo limpos, um entardecer avermelhado fantástico e projetos am-bientais amparados pelo governo, com o foco nas maiores áreas de impacto como produtos, serviços, gestão de resíduos, alimentos, redução da poluição e con-sumo de energia. Enfim, Londres é hoje uma cidade multicolorida e consciente.

FOTOS VALERIA CUNHA/JB CONTEÚDO

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>> OPINIÃO

ual é a cara do governo Dilma? Em que ele será diferente do segundo manda-to de Lula? O que podemos esperar de novo? Estas questões estão na boca de todos e, aos poucos, vamos tendo indica-

ções dos caminhos que poderão ser trilhados. Haverá continuidade na estratégia de desenvolvimen-

to, buscando um lugar mais de protagonista para o Brasil, seja na região, seja na áfrica, seja no cenário global, apro-veitando um período de valorização dos preços das com-modities, valorização esta que deve continuar na razão inversa do aprofundamento da crise financeira. O cenário é positivo para os próximos anos, mas o novo governo já anuncia cortes nos gastos públicos e, possivelmente, uma redução do orçamento federal com políticas sociais. Estas podem ser medidas preventivas, anunciadas na expecta-tiva do recrudescimento da crise financeira internacional, mas se forem efetivadas, significam a perda de direitos de cidadania.

O modelo de desenvolvimento continuará marcado pela dualidade de atender aos pobres e privilegiar os ri-cos. A discussão sobre criação do Ministério da Micro e Pequena Empresa, que afinal acabou não sendo criado agora, copia o modelo de gestão da agricultura, que tem um ministério para a gestão do agronegócio e outro minis-tério para a agricultura familiar e os assentamentos.

A escolha de um técnico de carreira para a presidência do Banco Central é um dos sinais mais efetivos de que o governo procura alinhar seus instrumentos e organismos indutores de uma estratégia de desenvolvimento, supe-rando a visão de que o mercado se autorregula.

O Estado deve assumir um papel mais proeminente como agente indutor de um modelo de desenvolvimento, submetendo o mercado a novos mecanismos de regula-ção, subsidiando certos setores de produtos de consumo de massa, favorecendo o desenvolvimento do mercado interno. Se vier a operar processos de redistribuição de renda, como a reforma tributária, o crescimento do mer-cado interno pode se tornar sustentado.

O compromisso reiterado da presidenta com a meta da erradicação da pobreza sugere uma ampliação dos pro-gramas de transferência de renda e de atenção aos mais pobres. Podemos esperar o fortalecimento de programas e projetos de inclusão social e produtiva, a construção de novas institucionalidades e marcos regulatórios que po-tenciem iniciativas no campo da economia solidária, da criação de políticas públicas de apoio ao pequeno e mi-croprodutor. Ao mesmo tempo, o grosso do financiamento público deve apoiar as iniciativas das empresas brasilei-ras que operam no exterior e fortalecer certos setores de exportação, como o agronegócio e a construção civil de obras públicas.

O sacrifício do meio ambiente, diante das metas de cres-cimento, também pode ser esperado. Tanto para as cidades como para o meio rural, a questão ambiental é subsumida pela lógica do crescimento, desconhecendo as ameaças do aquecimento global e sujando nossa matriz energética com a implantação de usinas termoelétricas e nucleares.

Há espaço para mais mudanças, e o novo governo pa-rece decidido a implementar novas políticas; mas estas mudanças dependem das pressões vindas da sociedade civil, de seus múltiplos atores, ou não acontecem.

Primeiras impressões

* Editor de Le Monde

Diplomatique Brasil e

coordenador geral do Instituto

Pólis

Q Por SILVIO CACCIA BAVA*

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>> SOlUÇõES

O que fazer com as toneladas de fral-das descartáveis? Só nos Estados Uni-dos, segundo a Agência de Proteção Ambiental Americana, elas somam em média por ano 3,8 milhões de toneladas ou 1,5% do total de resíduos do país. A solução está vindo do Reino Unido. A empresa de engenharia britânica Amec está desenvolvendo um sistema para transformar as fraldas descartáveis em combustível diesel sintético. Com isso atacariam dois problemas ambientais atuais: o montante crescente de resíduos humanos e o uso de combustível fóssil. A idéia, no entanto, ainda não é aplicável à produção em larga escala.

Fraldas

Entre os muitos derivados de petróleo, o plás-tico é um dos mais usados pela sociedade. E este também é um vilão ambiental porque, mesmo po-dendo ser reciclado, boa parte vai parar nos ecos-sistemas. E se o plástico pudesse se tornar petró-leo novamente? Parece futurista demais, mas é a proposta que a empresa japonesa Blest está empe-nhada em executar. O equipamento em testes fun-ciona de forma simples: precisa de muito plástico e água. Os resíduos são introduzidos na máquina e passam por um processo de aquecimento, que o derrete e absorve o gás da reação. Em seguida um cano carrega esse gás e o transporta a um recipien-te cheio de água para resfriamento. Como resul-tado final, obtém-se um óleo, que pode ser usado para a fabricação de gasolina, diesel ou querosene. É o processo inverso da composição do plástico.

http://ourworld.unu.edu/en/plastic-to-oil-fantastic

De volta às origens

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Combater incêndios em locais de difícil acesso e que não tenham hidrante. Esse é o foco da tecnologia de-senvolvida pelo Grupo de Análise de Risco Técnico e Ambiental da COPPE/RJ. Utilizando gás carbônico em vez de água para apagar o fogo, a inovação, que pode ser tanto móvel quanto fixa, parece ser ideal para co-munidades situadas em morros ou em periferias, bem como em ambientes que abrigam obras de arte e patri-mônio histórico, como museus, igrejas e bibliotecas. Outra vantagem é que não danifica materiais, poden-do ser manipulado de forma ágil, segura e eficiente. O nome inicial é grande, apesar do uso simples: Sistema de Descarga Baseada em Gás Liquefeito e já começa a ser usado pela Marinha.

Combate ao fogo sem água

Sempre que arquitetos elaboram projetos luminotécnicos esbarram com um problema: a iluminação decorativa é ainda altamente consumidora de energia. Mas, o en-genheiro Marco Guarneri apresentou uma alternati-va: confecciona, de acordo com a necessidade do cliente, produtos em led (altamente econômicos), moldados em resina de poliéster. As lâmpadas, de diversas cores, podem ser instaladas em luminárias já existentes. O material, resistente à água e oxida-ção, também é compatível com painéis solares. Informações: (71) 3362-2829 - [email protected]

Decoração econômicaFO

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SAIDEIRA>>

Vira lixoTudo vira lixoTudo pode virar lixoCarta de amor vira lixoConta pra pagar vira lixoSeja como for tudo pode virar lixoNamorado, gato, tioAté seu pavioTambém pode virar lixoTudo que se acende se apagaFósforo se apagaVela, incêndio, lamparinaO olho da menina até o seuTudo pode se apagarTudo pode se acabarE virar lixo...

Música de Ceumar, composição de Chico César e Suely Mesquita

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