direitos do nascituro: divergÊncias sobre o inÍcio...

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Curso de Direito Artigo de Revisão DIREITOS DO NASCITURO: DIVERGÊNCIAS SOBRE O INÍCIO DA PERSONALIDADE CIVIL DA PESSOA HUMANA NO DIREITO BRASILEIRO UNBORN RIGHTS: DIFFERENCES ON CIVIL PERSONALITY OF THE BEGINNING OF THE HUMAN PERSON IN THE BRAZILIAN LAW.EFFECTIVENESS OF RESTORATIVE JUSTICE A COMMUNICATIVE APPROACH Lincon Ribeiro de Freitas Lemes¹, Kadidja Barros² 1 Aluno do Curso de Direito 2 Professora Especialista do Curso de Direito Resumo O presente artigo aborda os direitos da personalidade como proteção integral do ser humano em toda a sua essência é uma construção jurídico-teórica recente. A metodologia consistiu na pesquisa bibliográfica, utilizando-se de obras sobre o tema, tomando como abordagem o método dedutivo e tendo como resultados identificar os reais direitos do nascituro e os entendimentos doutrinários. Palavras-chave: Direito Civil; Constitucional; Concepção, Sucessão e o Nascituro. Abstract This article discusses the personality rights as full protection of the human being in all its essence is a new legal and theoretical construction. The methodology consisted of bibliographical research , using works on the subject, taking as approach the deductive method and with the results identifying the real rights of the unborn and the doctrinal understandings. Keywords: Civil Law; constitutional; Design, Succession and the Unborn. Contato: [email protected] Introdução Os direitos da personalidade como proteção integral do ser humano em toda a sua essência são uma construção jurídico-teórica recente. Atualmente o código civil define que o indivíduo para ter personalidade deve nascer com vida, permanecendo seu direito de pessoa humana. No entanto o ser humano já possui vida a partir da concepção, surgindo um conflito entre os doutrinadores e os legisladores. Contudo esse conflito tem a necessidade de rever tal conhecimento entre os autores bibliográficos e juristas. Para uma análise mais profunda, são apresentadas as teorias concernentes ao início da personalidade jurídica do ser humano, dando maior enfoque a teoria concepcionista, sobre a qual será embasada, visando resguardar os direitos do nascituro de forma concreta e incontroversa, desde o momento da concepção. O enfoque específico é abranger o estudo da teoria concepcionista, juntamente com a da personalidade condicional e a natalista amparada nos princípios norteadores da legislação pátria, tal como na Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, Código Civil de 2002, além de legislação esparsa que versa sobre o tema, em especial a Lei dos Alimentos Gravídicos, defendendo os direitos do nascituro, especialmente quanto aos alimentos, que devem ser resguardados desde o momento da concepção, eis que titular de direitos e obrigações, no mesmo patamar das garantias concedidas às crianças já nascidas. Contudo, pretende-se demonstrar uma melhor interpretação acerca do artigo 2º do Código Civil de 2002, colaborando para o entendimento de que o início da personalidade civil e jurídica do ser humano se dá no momento da concepção, ao contrário do que sustentam os doutrinadores da teoria natalista e da teoria da personalidade condicional. Os princípios norteadores da legislação brasileira, sob a ótica da teoria concepcionista, foram subsídios valiosos na tutela dos direitos do nascituro, de modo a colaborar para os estudos do presente tema. No que tange a problemática com o surgimento da personalidade civil, apesar de positivado no artigo 2º do atual Código Civil Brasileiro, configura-se como assunto cercado por divergências e discussões, vez que o referido dispositivo trata do tema de maneira vaga e, até mesmo, contraditória. É uma regra equívoca o código dizer que o nascituro não é uma pessoa, e que adquire personalidade somente se nascer vivo. Porém, o nascituro é ou não considerado pessoa? 1. Evoluções Históricas O pensamento filosófico grego contribuiu de forma significativa para teoria dos direitos da personalidade, o direito natural ordem superior criada pela natureza e o positivo (leis estabelecidas pelos homens), sendo o homem a origem e razão de ser da lei e do direito como se

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Curso de Direito Artigo de Revisão DIREITOS DO NASCITURO: DIVERGÊNCIAS SOBRE O INÍCIO DA PERSONALIDADE CIVIL DA PESSOA HUMANA NO DIREITO BRASILEIRO UNBORN RIGHTS: DIFFERENCES ON CIVIL PERSONALITY OF THE BEGINNING OF THE HUMAN PERSON IN THE BRAZILIAN LAW.EFFECTIVENESS OF RESTORATIVE JUSTICE A COMMUNICATIVE APPROACH Lincon Ribeiro de Freitas Lemes¹, Kadidja Barros² 1 Aluno do Curso de Direito 2 Professora Especialista do Curso de Direito

Resumo O presente artigo aborda os direitos da personalidade como proteção integral do ser humano em toda a sua essência é uma construção jurídico-teórica recente. A metodologia consistiu na pesquisa bibliográfica, utilizando-se de obras sobre o tema, tomando como abordagem o método dedutivo e tendo como resultados identificar os reais direitos do nascituro e os entendimentos doutrinários. Palavras-chave: Direito Civil; Constitucional; Concepção, Sucessão e o Nascituro.

Abstract

This article discusses the personality rights as full protection of the human being in all its essence is a new legal and theoretical construction. The methodology consisted of bibliographical research , using works on the subject, taking as approach the deductive method and with the results identifying the real rights of the unborn and the doctrinal understandings.

Keywords: Civil Law; constitutional; Design, Succession and the Unborn.

Contato: [email protected]

Introdução

Os direitos da personalidade como proteção integral do ser humano em toda a sua essência são uma construção jurídico-teórica recente.

Atualmente o código civil define que o indivíduo para ter personalidade deve nascer com vida, permanecendo seu direito de pessoa humana. No entanto o ser humano já possui vida a partir da concepção, surgindo um conflito entre os doutrinadores e os legisladores. Contudo esse conflito tem a necessidade de rever tal conhecimento entre os autores bibliográficos e juristas.

Para uma análise mais profunda, são apresentadas as teorias concernentes ao início da personalidade jurídica do ser humano, dando maior enfoque a teoria concepcionista, sobre a qual será embasada, visando resguardar os direitos do nascituro de forma concreta e incontroversa, desde o momento da concepção.

O enfoque específico é abranger o estudo da teoria concepcionista, juntamente com a da personalidade condicional e a natalista amparada nos princípios norteadores da legislação pátria, tal como na Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, Código Civil de 2002, além de legislação esparsa que versa sobre o tema, em especial a Lei dos Alimentos Gravídicos, defendendo os direitos do nascituro, especialmente quanto aos alimentos, que devem ser resguardados desde o momento da concepção, eis que titular de direitos e

obrigações, no mesmo patamar das garantias concedidas às crianças já nascidas.

Contudo, pretende-se demonstrar uma melhor interpretação acerca do artigo 2º do Código Civil de 2002, colaborando para o entendimento de que o início da personalidade civil e jurídica do ser humano se dá no momento da concepção, ao contrário do que sustentam os doutrinadores da teoria natalista e da teoria da personalidade condicional. Os princípios norteadores da legislação brasileira, sob a ótica da teoria concepcionista, foram subsídios valiosos na tutela dos direitos do nascituro, de modo a colaborar para os estudos do presente tema.

No que tange a problemática com o surgimento da personalidade civil, apesar de positivado no artigo 2º do atual Código Civil Brasileiro, configura-se como assunto cercado por divergências e discussões, vez que o referido dispositivo trata do tema de maneira vaga e, até mesmo, contraditória. É uma regra equívoca o código dizer que o nascituro não é uma pessoa, e que adquire personalidade somente se nascer vivo. Porém, o nascituro é ou não considerado pessoa?

1. Evoluções Históricas O pensamento filosófico grego contribuiu

de forma significativa para teoria dos direitos da personalidade, o direito natural ordem superior criada pela natureza e o positivo (leis estabelecidas pelos homens), sendo o homem a origem e razão de ser da lei e do direito como se

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segue no decorrer da evolução histórica (CALIMAN, 2009, p. 89).

Nascituro no Direito Grego - Os gregos, desde a antiguidade, tinham uma posição significantemente maleável quanto ao nascituro, pois o consideravam como portador de capacidade jurídica, assim, considerando-lhe pessoa e lhes garantindo direitos (CALIMAN, 2009, p. 90). Bem como entende William Pussi (2008, p. 109), os gregos deram importantes contribuições para a ciência embrionária. A começar por Hipócrates, considerado por muitos o Pai da Medicina, que trouxe estudos para esclarecer como o embrião humano se desenvolve, feitos com ovos de galinhas. Ainda, o tratado de embriologia escrito por Aristóteles, no qual dissertou sobre o desenvolvimento do pinto e de outros embriões, sendo esse considerado pelos embriologistas como o Pai da Embriologia. Assim, diante de tamanha extensão dos estudos realizados pelos filósofos gregos em torno da ciência da embriologia, é que, chegaram a conclusão de que o embrião humano já pode ser considerado pessoa.

Nascituro no Direito Romano - O entendimento quanto à aquisição da personalidade jurídica do nascituro no Direito Romano é bem mais exigente. Para os Romanos, o nascituro não tinha personalidade, esta era adquirida apenas com o nascimento com vida, diga-se de passagem, não apenas nascer com vida, o requisito era além desde, apresentar forma humana, o que garantiria que a criança continuaria a viver pelo fato de ter aparência perfeita, ocorrendo o contrário, não era considerado pessoa (CALIMAN, 2009, p. 89-90). Ademais, era necessário que o feto estivesse separado do corpo da mãe, caso contrário seria considerada parte do corpo dela, e não outra pessoa. Ainda, não era admitido que o feto fosse gerado por escrava, tendo em vista que escravos não eram considerados pessoa, da mesma forma, estendia-se o raciocínio aos seus filhos (CALIMAN, 2009, p. 88).

Desta forma, para os romanos, a personalidade se inicia com o nascimento com vida, se enquadrando na Teoria Natalista.

Nascituro no Direito Estrangeiro/Direito Português - A antiga legislação portuguesa, a saber, o antigo Código Civil Português de 1867, adotava o posicionamento no qual para o início da personalidade jurídica era necessário o nascimento com vida, tendo como requisito a completude do novo ser, ou seja, a “figura humana” (Art. 6º). Acrescentando, ainda, que os direitos reconhecidos por lei ao nascituro dependeriam do nascimento (Art. 6º), o que sustenta opção pela teoria da personalidade condicional (PAGANINI, 2008, p. 78). Diante o atual Código Civil Português de 1966, estaria

evidenciado que a teoria adotada seria a natalista, constatando que a personalidade do nascituro se adquire com a vida, bem como determina seu art. 1º.

Contudo, deixa margem para o entendimento de que o código teria adotado de forma expressa a teoria da personalidade condicionada, tendo em vista que só admite direitos ao nascituro após seu nascimento com vida.

No Direito Alemão - Assim como acontece no Direito Brasileiro, no Direito Alemão também há diversas teorias em que a doutrina alemã se pauta a discutir com afinidade e profundidade o tema quanto ao surgimento da personalidade jurídica do nascituro. É perceptível, que tais teorias foram instrumentos de inspiração para a doutrina brasileira, bem como se pode notar na obra de Pontes de Miranda (1954), que debate com afinidade as teorias alemãs, fazendo pontos de referencia com o direito brasileiro. Todavia, tendo em vista que o objetivo do presente trabalho não é elencar tais teorias do direito alemão e sim trazer uma rápida conclusão quanto ao início da personalidade da pessoa na citada legislação, é de se saber, para o Código Civil Alemão, que o início da capacidade jurídica dos seres se dá com o nascimento.

Direito Francês - O nascituro adquire personalidade jurídica com o nascimento com vida, esta, tendo que ser viável (maturidade fetal mínima e aptidão para viver) (PUSSY, 2008, p. 89). Ou seja, caso a criança nasça morta, não adquire personalidade. Assim, entende-se pela adoção da Teoria Natalista.

Direito Italiano - No Código Civil Italiano de 1942, seu art. 1º prevê que a aquisição da capacidade jurídica se inicia com o nascimento, disponibilizando-lhe os direitos que a lei reconhece em favor do nascituro àquele evento. Ademais, dispensa-se o elemento viabilidade tido como requisito no direito francês, tendo em vista a dificuldade de diferenciar o nascido viável do não viável, quando a vida perdurasse por pouco tempo (RESCIGNO, 1994, apud CHINELATO E ALMEIDA, 2004, p. 108).

Por fim, entende-se que os juristas italianos filiam-se a teoria natalista e a teoria da personalidade condicional, por enfatizarem o nascimento como condição ao programo dos direitos (PAGANINI, 2008, p. 78).

Direito Espanhol - O Código Civil Espanhol promulgado em 1889 tomou rumos diferentes dos demais ordenamentos jurídicos europeus do sistema romano-germânico, não acompanhando a origem romana comum que serviu de base à estes, tendo em vista haver sido mantida a orientação presente em sua legislação extravagante (RAÓ, Vicente, 1981, apud CHINELATO E ALMEIDA, 2004, p. 203).

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Em seu art. 30 está traçada a condição para a aquisição da personalidade, qual seja, que o feto tenha figura humana, isto é, não seja um monstro, fixando, ainda, um tempo mínimo de vinte e quatro horas de vida fora do útero (GONÇALVES, 2009, p. 54). Ainda, traz também a hipótese de, em caso do nascimento de filhos gêmeos, a lei espanhola prioriza o filho primogênito (CALIMAN, 2009, p. 102).

Nascituro no Direito Brasileiro: O tema nascituro no Direito Brasileiro ainda enseja uma das mais acirradas polêmicas do atual ordenamento jurídico. Sabendo disso, será analisado com clareza e objetividade a temática pertinente quando aos direitos do nascituro com a discussão doutrinária, assim como quanto às teorias adotadas.

Legislação civil de 1916 e demais comandos legais o já revogado Código Civil de 1916 (Lei 3.071/16) trazia em seu art. 4º, quanto ao início da personalidade jurídica, a seguinte descrição:

A personalidade civil do homem começa com o nascimento com vida, mas a Lei põe a salvo desde a concepção os direitos do nascituro dispositivo originado no projeto revisto por Beviláqua.

Todavia, percebe-se que o citado código não recepciona o requisito da viabilidade, assim como em alguns outros ordenamentos, bastando, tão-somente, a manifestação de sinais inequívocos de vida (PAGANINI, 2008, p. 88-89).

Diante o disposto no referido art. 4º, tendo

em vista a afirmação de que o nascituro é titular de direitos, mas que, porém, não é considerado pessoa, visto que a personalidade só começa com nascimento com vida, os doutrinadores ao analisarem o Código Civil de 1916, entendem que a teoria adotada seria a natalista. A preocupação quanto à proteção dos direitos do nascituro estende-se também no âmbito do direito internacional. Vale ressaltar o que dispôs o Pacto de São José da Costa Rica (1969), ao qual aderiu o Brasil por meio do Decreto n°. 678/1992, este, expressamente prevê a proteção à pessoa desde o momento de sua concepção (grifo nosso).

Art. 3º. Direito ao Reconhecimento da Personalidade Jurídica.

Assim como no Art. 4º. Direito à Vida.

Toda pessoa tem o direito de que se respeite sua vida. Esse direito deve ser protegido pela lei e, em geral, desde o momento da concepção.

Ninguém pode ser privado da vida arbitrariamente.

No Direito Processual Civil, em relação à

participação do nascituro como integrante da relação processual, o assunto é discutido com uma problemática, tendo em vista, o fato de o nascituro poder ser parte ativa ou passiva no processo judicial.

A rigor, a capacidade para ser parte está atrelada à aquisição de personalidade. Ademais, no que alude a representação do nascituro, poderá haver uma substituição processual dos representantes naturais do nascituro em caso de colisão de direitos. No caso, o representante substitutivo será o Ministério Público (CALIMAN, 2009, p. 67).

Percebe-se assim, ainda na legislação processual civil, no que tange à Investigação de Paternidade, existe a possibilidade de realização de exame de DNA, que ocorre por meio da coleta de material genético da placenta da mãe, durante a gestação, ressalte-se, procedimento este que não acarreta danos, nem à mãe nem ao feto.

Seguindo na legislação, também há proteção à criança mesmo antes do nascimento, na Declaração dos Direitos da Criança de 1959, o que conduz a uma certa equiparação do nascituro à criança já nascida. Destacando em seu preâmbulo a seguinte descrição: “Considerando que a criança, em decorrência de sua imaturidade física e mental, precisa de proteção e cuidados especiais, inclusive proteção legal apropriada, antes e depois do nascimento”.

Assim sendo, a Constituição Federal de 1988, traz uma série de direitos e garantias extensíveis ao nascituro, dentre os quais, destacam-se as disposições relativas: a igualdade de todos perante a lei, assim como a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade (Art. 5°, caput); o reconhecimento da instituição do tribunal do Júri para julgamento de crimes dolosos contra a vida, dentre eles, o crime de aborto (Art. 5°, inc. XXXVIII); a garantia de licença à gestante, sem prejuízo do emprego e do salário, com duração de cento e vinte dias (Art. 7°, inc. XVIII).

No tocante ao Direito do Trabalho, existe

proteção constitucional ao nascituro, como já mencionado acima. Havendo benefícios previdenciários para garantir a proteção da mulher grávida, tais como o auxílio maternidade, que garante à mulher o pagamento de salário mesmo estando afastada do emprego – e sem prejuízo deste –, visto sua impossibilidade ao trabalho.

O Código Civil de 2002 é o diploma legal brasileiro em que se encontra o maior número de

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disposições a respeito do nascituro, dentre as quais: a cláusula geral do início da personalidade jurídica fixando seu termo inicial no momento do nascimento com vida, garantindo ainda a proteção aos direitos titularizados pelo nascituro (Art. 2); o direito de receber doação (Art. 542); o direito ao reconhecimento de paternidade (Art. 1.609); à representação (Art. 1.690); o direito à curatela (Art. 1779); o direito à sucessão testamentária no caso da prole eventual, em que a doutrina e a jurisprudência estendem esta possibilidade ao nascituro (PUSSI, 2008, p. 56); e ao recebimento de alimentos (Art. 1.694 e seguintes).

Diante do exposto, cabe agora, em capítulo próximo, analisar o início da personalidade jurídica da pessoa no ordenamento Jurídico Brasileiro, bem como as correntes doutrinárias que sustentam suas respectivas justificativas quanto à possibilidade ou não de o nascituro ser sujeito de direitos. 2 Conceituando Personalidade

Há no Ordenamento Jurídico Brasileiro, na doutrina e na jurisprudência pátria, uma relevância dos direitos da personalidade, conforme preceitua o estudioso, Gonçalves:

São os direitos da personalidade, cuja existência tem sido proclamada pelo direito natural, destacando-se, dentre outros, o direito à vida, à liberdade, ao nome, ao próprio corpo, à imagem e à honra (2012, p. 184).

Ainda, neste contexto, os direitos da personalidade são ditos subjetivos, se aplicando-se a todos, e que por intermédio destes, aplicam-se a defesa de direitos como à vida, integridade, honra, privacidade, autoria, imagem e outros, segundo o estudioso, (VENOSA, 2006, 78-79).

Por outro lado, a doutrinadora Maria Helena Diniz, conceitua o direito da personalidade como:

[...] direitos comuns da existência, porque são simples permissões dadas pela norma jurídica, a cada pessoa, de defender um bem que a natureza lhe deu, de maneira primordial e direta (2011, p. 118).

Vislumbra-se em nossa Carta Magna, em seu art. 5º, X, a proteção dos direitos da personalidade:

X - são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação.

Já no Código Civil, há especificado um capítulo à garantia dos direitos da personalidade, em seus artigos. 11º ao 21º, com a proteção

dispensada ao nome e à imagem até o direito de se dispor do próprio corpo para fins científicos e altruísticos.

Destarte, que os direitos da personalidade podem ser conceituados como sendo os que tratam da pessoa e de sua dignidade, por intermédio dos quais o indivíduo pode defender a sua integridade física, intelectual e moral, para o estudioso (VENOSA, 2006, p. 79). Podem ser entendidos também como um espaço dado a cada pessoa humana para que ela possa promover o seu desenvolvimento, sem que tal espaço sofra intervenções de particulares ou do próprio Estado, como afirma o doutrinador (RIBEIRO, 2011, p. 62).

Já no que diz respeito no tocante ao vocábulo pessoa, em sentido jurídico, é sinônimo de sujeito de direito e quer significar todo “ente capaz de exercer direitos e submeter-se a deveres na órbita jurídica, ou seja, é aquele que poderá compor o pólo ativo ou passivo de uma relação jurídica” (FARIAS; ROSENVALD, 2006, p. 96).

Na concepção de Pablo Stolze (2014, p. 190), essa relação de capacidade e personalidade tem um caráter examinador no que tange às relações com o Estado, que ingressam de maneira positiva no campo das liberdades públicas, que são consagradas no Direito Constitucional.

Há ainda, neste contexto, segundo o mesmo doutrinador, duas noções, quanto ao conteúdo, sendo no primeiro plano que há um direito da personalidade que situam-se acima do direito positivo, que são considerados inerentes ao homem, que são conhecidas de maneira erga omnes, por meio de normas positivas como forma de reconhecer direitos e protegê-los.

Ver-se que no segundo plano, que diz respeito ao conteúdo, a diferença é consequência do parâmetro anterior, visto que o surgimento de novas liberdades públicas, pertencentes a categorias transindividuais, não se coaduna com o caráter individual dos direitos da personalidade.

A ideia de personalidade, assim, está intimamente relacionada com a noção de pessoa, razão pela qual os animais, as coisas inanimadas e as entidades místicas ou espirituais, tais como deuses, almas e santos, não são reconhecidas como sujeitos de direito perante o ordenamento jurídico brasileiro.

Nas palavras de Caio Mário da Silva Pereira:

Se a todo homem, e aos entes morais por ele criados, a ordem jurídica concede personalidade, não a confere, porém, a outros seres vivos. É certo que a lei protege as coisas inanimadas, porém em atenção ao homem que delas

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desfruta. Certo, também, que os animais são defendidos de maus-tratos, que a lei proíbe, como interdiz também a caça na época da cria (2004, p. 215).

Entretanto, no que diz respeito às pessoas naturais, a personalidade jurídica trata-se de atributo reconhecido a todos os seres humanos indistintamente, sem qualquer diferenciação quanto a sexo, raça, cor, idade, estado de saúde ou nacionalidade e independentemente da consciência ou da vontade do indivíduo, como preceitua o artigo 1º do Código Civil, in verbis: “toda pessoa é capaz de direitos e deveres na ordem civil.

Segundo a lição de Arnaldo Rizzardo: O sentido de „toda pessoa‟ é pessoa no aspecto físico, como todo ser humano dotado de inteligência, abrangendo homens e mulheres, independentemente de raça, cor, credo religioso, tendência política, nacionalidade e outras notas particularizadoras, normais ou não [...]. Não se faz qualquer distinção, exceto quanto aos estrangeiros, restritamente aos direitos políticos e algumas limitações no direito civil, como a aquisição de propriedade imóvel, e na participação em certas atividades industriais e societárias, especialmente as de natureza bélica (2011, p. 138-139).

Por sua vez, todo ser humano é dotado de personalidade jurídica e está apto a ser titular de direitos e obrigações, na medida em que aquela é predicado indissociável de sua natureza.

Por outro lado, nem toda pessoa é capaz e pode exercer seus direitos ou praticar atos jurídicos pessoalmente, porque padece de limitações orgânicas ou psicológicas. Em outras palavras, “para ser „pessoa‟ basta que o homem exista e, para ser „capaz‟, o ser humano precisa preencher os requisitos necessários para agir por si, como sujeito ativo ou passivo de uma relação jurídica” (DINIZ, 2007, p. 115).

Como assevera Caio Mário da Silva Pereira:

Não depende esta [a personalidade] da consciência ou da vontade do indivíduo. A criança, mesmo recém-nascida, o deficiente mental ou o portador de enfermidade que desliga o indivíduo do ambiente físico ou moral, não obstante a ausência de conhecimento da realidade, ou a falta de reação psíquica, é uma pessoa, e por isso mesmo dotado de personalidade, atributo inseparável do homem dentro da ordem jurídica,

qualidade que não decorre do preenchimento de qualquer requisito psíquico e também dele inseparável (2004, p. 214).

Por esta razão, a personalidade não pode ser negada ao indivíduo nem mesmo abdicada ou recusada por este, seja a título oneroso ou gratuito. Trata-se de um atributo inerente à condição humana e sua ausência implicaria, por óbvio, a inexistência da pessoa, o aniquilamento do ente físico suscetível de direitos e obrigações para o mundo jurídico.

Nessa seara aduz o doutrinador, Cristiano Chaves de Farias e Nelson Rosenvald: Conforme vem sendo exposto, na necessária perspectiva civil-constitucional, a personalidade não se esgota na possibilidade de o titular ser sujeito de direitos, mas, por igual, relaciona-se com o próprio ser humano, sendo a consequência mais relevante do princípio da dignidade da pessoa humana (2006, p. 98).

Para a pessoa natural, de acordo com o artigo 2º do Código Civil, a personalidade jurídica tem início no nascimento com vida e acompanha o ser humano durante toda a sua existência até a morte, seja esta natural ou presumida.

Destarte, a despeito do que dispõe a legislação, no direito brasileiro, três correntes doutrinárias ainda procuram definir e demarcar o início da personalidade, e, por conseguinte, determinar a condição jurídica do nascituro, quais sejam: a natalista, a da personalidade condicional e a concepcionista.

A despeito da controvérsia em torno da personalidade jurídica do nascituro, a doutrina é unânime em reconhecer que o concebido não tem capacidade e, por isso, não pode fazer valer seus interesses pessoalmente. Com efeito, os direitos que lhe são taxativa ou plenamente assegurados pelo ordenamento jurídico devem ser defendidos ou protegidos por seus pais ou, excepcionalmente, por um curador.

Nas conforme aduz, Benedita Inêz Lopes Chaves:

[...] sob o ponto de vista jurídico e físico, o nascituro não pode agir por si mesmo e, como a lei lhe concede direitos, os quais têm que ser defendidos, claro que terá que ter um representante legal para, em seu nome, agir” (2000, p. 93).

Disseminou-se, assim como os filhos já nascidos, o nascituro está sujeito ao poder familiar dos pais, que são seus representantes legais e, desde a fusão dos gametas, têm o dever de resguardar os direitos do filho concebido. Contudo, na falta do pai e no impedimento da

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mãe, o nascituro será representado por um curador nomeado judicialmente, a quem incumbirá zelar por seus interesses, nos termos do artigo 1.779, caput, do Código Civil, in verbis:

Artigo 1.779 CC. Darse-á curador ao nascituro, se o pai falecer estando grávida a mulher, e não tendo o poder familiar.

Ainda sob o tema, aduz, Rodolfo Pamplona Filho e Ana Thereza Meirelles Araújo, afirma que: Em caso de falecimento do pai e perda do poder familiar pela mulher grávida, deve-se nomear curador ao que está por nascer para a defesa de seus interesses (art. 1.779 do CC e arts. 877 e 878 do CPC) até o seu nascimento com vida, quando lhe será nomeado tutor (art. 1.728 do CC). Se não houver perda do poder familiar, os direitos do nascituro serão resguardados pelos seus representantes legais – seus pais (2007, p. 42).

Registre-se que os estudiosos, são categóricos em afirmar que a personalidade é adquirida no momento da sua concepção, o que será exaustivamente discutido neste trabalho científico no decorrer dos capítulos seguintes.

Conforme, mencionado no capítulo anterior, a despeito do que dispõe a legislação, no direito brasileiro, três correntes doutrinárias ainda procuram definir e demarcar o início da personalidade, e, por conseguinte, determinar a condição jurídica do nascituro, quais sejam: A NATALISTA, a da PERSONALIDADE CONDICIONAL e a CONCEPCIONISTA. Além de comentários relativos á ADPF que tramita no Supremo Tribunal Federal (grifo nosso).

Não obstante quando da análise dos direitos que antecedem o nascimento, tem-se que não há uma unanimidade na doutrina e na jurisprudência acerca do tratamento jurídico do nascituro. Em especial quanto da interpretação do artigo 2° do Código Civil em vigor, que tutela os direitos da personalidade. Advindo dessa divergência três teorias sobre o tema, justamente pelo fato de se comporem no que diz respeito a esses direitos do nascituro, ficando evidenciado que a teoria Natalista é a mais adequada para a realidade do nosso Ordenamento Jurídico sendo ela a maior protetora quando se refere aos direitos tutelados em favor do Nascituro.

2.1 Teorias Teoria Natalista

Segundo a teoria natalista, o nascituro não tem vida independente, nem mesmo existência própria. O feto nada mais é do que parte das vísceras maternas, haja vista que “na fase gravídica, a mãe e o filho nascituro chegam a manter um órgão comum a ambos, que é a placenta” (SEMIÃO, 2000, p. 42).

A personalidade jurídica, assim, tem como termo inicial o nascimento com vida e, durante o período compreendido entre este e a concepção, o feto é tido como mera spes hominis (Tradução: Esperança de vir a ser humano.

No mesmo sentido, para o doutrinador Caio Mário da Silva Pereira, “o nascituro não é ainda uma pessoa, não é um ser dotado de personalidade jurídica. Os direitos que se lhe reconhecem permanecem em estado potencial” (2004, p. 217).

Aduz a doutrinadora, Benedita Inêz Lopes Chaves:

A primeira delas, a natalista, entende que, antes do nascimento, o feto não é considerado ser humano, não tendo, portanto, personalidade jurídica, existindo apenas uma expectativa de personalidade, razão pela qual se pune o aborto provocado, resguardando a lei os direitos do nascituro, para quando do nascimento com vida. Argumentam os seguidores desta corrente que a opinião dos adeptos da teoria concepcionista é insustentável, porque o ser humano, ainda não separado do ventre materno, não tem existência própria, fazendo parte das vísceras maternas e, se o nascituro fosse considerado pessoa, além de sujeito de direitos seria também sujeito passivo de obrigações (2000, p. 25).

Portanto, segundo os natalistas o nascituro trata-se de mera expectativa de pessoa e, como tal, possui meras expectativas de direitos, razão pela qual apenas é considerado pessoa a partir da concepção para aquilo que a lei, taxativamente, considera ser-lhe juridicamente proveitoso.

Conforme aduz, Sérgio Abdalla Semião, adepto da teoria natalista:

Sustentam os natalistas que, caso os direitos do nascituro não fossem taxativos, como entendem os

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concepcionistas, nenhuma razão existiria para que o Código Civil declinasse, um por um, os seus direitos. Fosse ele pessoa, todos os direitos subjetivos lhe seriam conferidos automaticamente, sem necessidade da lei decliná-los um a um. Dessa forma, essa seria a verdadeira interpretação sistemática que se deve dar ao Código Civil Brasileiro (2000, p. 41).

A proteção dispensada ao nascituro,

com efeito, não implica o reconhecimento de personalidade jurídica ao não nascido. Como mencionado pelo estudioso William Artur Pussi, “não se trata de salvaguardar os direitos naturais e reais, mas, de verdadeira expectativa, que em direitos subjetivos se transformará se o concebido vier a adquirir personalidade” (2008, p. 82).

Aduz, Silvio Rodigues:

Nascituro é o ser já concebido, mas que ainda se encontra no ventre materno. A lei não lhe concede personalidade, a qual só lhe será conferida ser nascer com vida. Mas, como provavelmente nascerá com vida, o ordenamento jurídico desde logo preserva seus interesses futuros, tomando medidas para salvaguardar os direitos que, com muita probabilidade, em breve serão seus (2003, p. 36).

Neste contexto, mesmo sentido é o

entendimento de Sílvio de Salvo Venosa:

O fato de o nascituro ter proteção legal não deve levar a imaginar que tenha ele personalidade tal como a concebe o ordenamento. O fato de ter ele capacidade para alguns atos não significa que o ordenamento lhe atribuiu personalidade. Embora haja quem sufrague o contrário, trata-se de uma situação que somente se aproxima da personalidade. Esta só advém do nascimento com vida. Trata-se de uma expectativa de direito (2004, p. 162).

O nascimento com vida verifica-se, pois, “no instante em que principia o funcionamento do aparelho cardiorrespiratório, clinicamente aferível pelo exame de docimasia hidrostática de Galeno” (GAGLIANO; PAMPLONA FILHO, 2006, p. 89).

Segundo, Perreira:

Outrossim, “subordinando a personalidade ao nascimento com vida, não cabe indagar de que maneira se processa a concepção: se por via de relações sexuais normais, se devido a inseminação artificial ou se mediante processos técnicos de concepção extra-uterina” (2004, p. 221).

Ainda, segundo, ele:

Finalmente, cumpre observar que a teoria natalista, segundo grande parte da doutrina, foi a acolhida pelo ordenamento jurídico pátrio, porquanto consta expressamente do artigo 2º do Código Civil que “a personalidade civil da pessoa começa do nascimento com vida; mas a lei põe a salvo, desde a concepção, os direitos do nascituro” (2004, p. 221-222).

Já para Viana:

Assim, perante o direito brasileiro, “nascendo com vida, a criança recobre-se de personalidade, torna-se sujeito de direitos, adquirindo-os e transferindo-os. Se é natimorto, não adquire personalidade, não recebendo nem transmitindo direitos” (2004, p. 125).

Já no que diz respeito a essa Teoria Natalista, o Ministro Marco Aurélio, tem o seguinte, entendimento:

É Constitucional a interrupção geração de feto anencéfalo, por se tratar de um natimorto.

Essa opinião foi exaurida no momento de seu voto na ADPF 54, que após ser exaustivamente debatida em plenário do STF. Ele é adepto da Teoria Natalista.

Sendo este o mesmo entendimento do estudioso, Cristiano Chaves de Farias:

Segundo ele, a personalidade civil, somente é adquirida pelo nascimento com vida e ao nascituro não se reconhece direitos. Assim sendo essa teoria é a chamada natalista (2011, p. 283).

Nesse sentido, depois de verificar tais argumentos, anteriores, não será diferente quanto à teoria da personalidade condicional. Teoria da Personalidade Condicional

Para os adeptos da teoria da personalidade condicional, o nascituro, desde a concepção, é dotado de direitos e personalidade

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jurídica, sobre os quais, entretanto, pende condição suspensiva, consistente no nascimento com vida.

Assim, embora a existência do ser humano seja admitida desde a concepção, o nascituro trata-se de uma pessoa virtual, na medida em que o efetivo reconhecimento de sua personalidade jurídica está necessariamente subordinado e vinculado ao eventual nascimento com vida.

Nas palavras de Washington de Barros Monteiro: “o nascituro é pessoa condicional, a aquisição da personalidade acha-se sob a dependência de condição suspensiva, o nascimento com vida” (2007, p. 66).

Conforme Rodolfo Pamplona Filho e Ana

Thereza Meirelles Araújo: A teoria da personalidade condicional sustenta a personalidade do nascituro (ou seja, desde a concepção) sob a condição de que nasça com vida. Sem o implemento da condição – nascimento com vida – não haverá aquisição da personalidade. Conclusivamente, a aquisição de certos direitos (como os de caráter patrimonial) ocorreria sob a forma de condição suspensiva, ou seja, se o não nascido nascer com vida, sua personalidade retroage ao momento da concepção. Assim, o feto tem personalidade condicional, pois tem assegurada a proteção e gozo dos direitos da personalidade, mas, somente gozará dos demais direitos (os de cunho patrimonial) quando nascer com vida, ou seja, quando restar implementada a condição capaz de conferir a sua personalidade plena (2007, p. 39).

Destarte, durante a gestação, o nascituro, conquanto seja tutelado pela lei, tem personalidade jurídica condicional, eis que somente a proteção e o gozo dos direitos personalíssimos lhe são assegurados, porque absolutos, incondicionais e garantidos a todos os seres humanos desde a concepção. Os direitos de cunho patrimonial, por sua vez, apenas serão efetivamente adquiridos quando verificado o nascimento com vida ou, em outras palavras, quando implementada a condição suspensiva.

Para a estudiosa, Maria Helena Diniz:

Poder-se-ia até mesmo afirmar que na vida intra-uterina tem o nascituro e na vida extra-uterina tem o

embrião, concebido in vitro, personalidade jurídica formal, no que atina aos direitos da personalidade, visto ter carga genética diferenciada desde a concepção, seja ela in vivo ou in vitro, passando a ter personalidade jurídica material, alcançando os direitos patrimoniais e obrigacionais, que se encontravam em estado potencial, somente com o nascimento com vida, se nascer com vida adquire personalidade jurídica material, mas se tal não ocorrer nenhum direito patrimonial terá (2007, p. 196).

A eficácia dos direitos patrimoniais

eventualmente atribuídos ao nascituro ainda no ventre materno fica, pois, subordinada ao evento futuro e incerto do nascimento com vida, momento em que a personalidade jurídica passa a existir em sua plenitude, ainda que o recém-nascido venha a falecer instantes depois.

Segundo a lição de Flávio Tartuce: A teoria da personalidade condicional é aquela pela qual a personalidade civil começa com o nascimento com vida, mas os direitos do nascituro estão sujeitos a uma condição suspensiva, ou seja, são direitos eventuais. Como se sabe, a condição suspensiva é o elemento acidental do negócio ou ato jurídico que subordina a sua eficácia a evento futuro e incerto. No caso, a condição é justamente o nascimento daquele que foi concebido (2007, p. 89-90).

Em síntese, a teoria da personalidade condicional, como assevera William Artur Pussi, “sustenta o início da personalidade do nascituro a partir da concepção, com a condição de nascer com vida. Ou seja, uma vez que se verifique o nascimento com vida, a pessoa é como tal considerada desde o momento da concepção” (2008, p. 87).

Já para o Ministro Gilmar Mendes, em seu voto na ADPF 54, sendo ele adepto da Teoria Condicional:

Ele vê o aborto de anencéfalo como mais uma excludente de antijuridicidade, uma vez que interpreta ser essa a decisão extraída da própria opção do legislador que, ao excepcionar as

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hipóteses de aborto necessário e aborto humanitário, expressou os valores e bens jurídicos protegidos – saúde física e psíquica da mãe –, justamente os bens ameaçados na gravidez de feto portador de anencefalia.

Entretanto, nas palavras do doutrinador Cristiano Chaves de Farias:

Desde a sua concepção o nascituro já possui os direitos da personalidade, estando os direitos patrimoniais, decorrentes de herança, legado ou doação, esse é chamada personalidade condicional (2011, p. 285).

Para que seja evidenciada essa condição faz-se necessário o nascimento com vida, segundo o próprio estudioso, justamente pelo fato de que os direitos patrimoniais estão condicionados.

Teoria Concepcionista A referida teoria possui influência no direito

francês, e sustenta que a personalidade jurídica tem início com a concepção, momento em que se origina um novo ser humano dotado de existência própria e biologicamente distinto do organismo materno. Como aduz Benedita Inêz Lopes Chaves, “[...] a criança concebida é um ser humano, capaz de sensações e sentimentos e o nascimento não é um começo, mas um passo” (2000, p. 32).

De acordo com Reinaldo Pereira e Silva: São as pessoas em ato, enquanto realidade estruturante do direito, a razão de ser de sua dinâmica intersubjetiva, e se a pessoa humana, pela “natureza das coisas”, é o próprio ser humano, ao concepto, que não é objeto relacional em hipótese alguma, não se pode desconhecer o atributo da personalidade desde a concepção, ou seja, a aptidão jurídica para figurar como verdadeiro e atual sujeito de uma relação de direito. Mesmo porque, na perspectiva realista, quem é pessoa em sentido ontológico é também pessoa em sentido jurídico. Assim, o ser humano desde o início de sua existência é o fundamento natural do direito, e a juridicidade não é senão uma dimensão constitutiva de sua pessoa, já que o homem, também por natureza, tem sempre algo a

reivindicar em termos de justiça (2002, p. 221-222).

Deste modo, para os concepcionistas, o nascituro possui personalidade jurídica e deve ser reconhecido como pessoa e sujeito de direito, porquanto não se pode atribuir direitos a quem não é pessoa.

Conforme a lição de Sérgio Abdalla Semião:

Segundo a escola concepcionista, a personalidade civil do homem começa a partir da concepção, ao argumento de que tendo o nascituro direitos, deve ser considerado pessoa, uma vez que só a pessoa é sujeito de direitos, ou seja, só a pessoa tem personalidade jurídica. Falar em direitos do nascituro é reconhecer-lhe qualidade de “pessoa”, porque, juridicamente, todo titular de direito é pessoa. “Pessoa”, em linguagem jurídica, é exatamente o sujeito ou o titular de qualquer direito (2000, p. 35).

Em outras palavras, “ao receber proteção

jurídica, inclusive quanto à vida, o nascituro é sujeito de direitos e obrigações como pessoa, até porque esta é o centro receptor daqueles. Inexistindo pessoa, inocorre direito. O elemento subjetivo do fato jurídico é a pessoa” (MONTEIRO ROCHA, 2007, p. 56).

Com efeito, desde a concepção, o nascituro é titular de direitos personalíssimos e patrimoniais, que lhe são amplamente assegurados e protegidos pelo ordenamento jurídico pátrio e não se restringem àqueles expressamente enumerados pelo Código Civil.

Para o doutrinador, William Artur Pussi:

Diante disso, emerge como certo que os direitos do nascituro não poderiam ser atribuídos como sendo, unicamente, restritos aos descritos no Código Civil. Isto, diante da grande diversidade de fatos e eventos sociais, assim como da evolução médica, que venha a expandir a necessidade básica de proteção aos direitos fundamentais do nascituro (2008, p. 144).

Logo, “não há que se falar em expectativa

de direitos para o nascituro, pois estes não estão condicionados ao nascimento com vida, existem independentemente dele” (PAMPLONA FILHO; ARAÚJO, 2007, p. 39).

Como aduz, Silmara Juny Chinelato:

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A terceira corrente doutrinária é por mim denominada concepcionista ou verdadeiramente concepcionista, para diferenciar-se da Teoria da Personalidade Condicional. Sustenta que a personalidade começa da concepção e não do nascimento com vida, considerando que muitos dos direitos e status do nascituro não dependem do nascimento com vida, como os Direitos da Personalidade, o direito de ser adotado, de ser reconhecido, atuando o nascimento sem vida como a morte, para os já nascidos (2007, p. 56-57).

Não se discute, pois, a titularidade dos

direitos conferidos ao nascituro durante a gestação, faltando a este tão somente capacidade para exercê-los por si só. Referida capacidade limitada, no entanto, não lhe retira a personalidade, que decorre naturalmente de sua condição humana, mas apenas o qualifica como absolutamente incapaz, nos termos do artigo 3º do Código Civil.

Posto que o nascituro possa, desde a concepção, figurar como sujeito de direitos e obrigações, os efeitos de alguns dos direitos patrimoniais que lhe são reconhecidos, como a herança, o legado e a doação, dependem, necessariamente, do nascimento com vida (FARIAS; ROSENVALD, 2006, p. 184).

O nascimento sem vida atua, portanto, como condição resolutiva dos direitos patrimoniais materiais, extinguindo-os e fazendo desaparecer a sua eficácia, na qual está compreendida, inclusive, a sua transmissibilidade. Nas palavras de Silmara Juny Chinelato, “a posse dos bens herdados ou doados ao nascituro pode ser exercida, por seu representante legal, desde a concepção, legitimando-o a perceber as rendas e os frutos, na qualidade de titular de direito subordinado à condição resolutiva” (2007, p. 57).

Para os adeptos da teoria

concepcionista, a aquisição da personalidade jurídica independe do modo como se dá a concepção, se no ventre materno, através de relações sexuais, ou in vitro, mediante técnicas de reprodução assistida. Isto porque, para Maria Helena Diniz, “embora a vida se inicie com a fecundação, e a vida viável com a gravidez, que

se dá com a nidação, entendemos que na verdade o início legal da consideração jurídica da personalidade é o momento da penetração do espermatozóide no óvulo, mesmo fora do corpo da mulher” (2009, p. 36).

Por fim, cumpre observar que a teoria concepcionista foi recepcionada pelo Pacto de São José da Costa Rica, decorrente da Convenção Americana de Direitos Humanos de 1969, ao estatuir, em seu artigo 4º, I, que “toda pessoa tem direito de que se respeite sua vida. Esse direito deve ser protegido pela lei e, em geral, desde o momento da concepção. Ninguém pode ser privado da vida arbitrariamente”.

Com efeito, conforme a parte da doutrina, conforme Antônio do Rêgo Monteiro Rocha, “acolhido constitucionalmente o Pacto de São José pelo art. 5º, § 3º, da Constituição Federal, imprescindível é a sua aplicação sistêmica perante o art. 2º da novel codificação civil, interpretando-se que o nascituro adquire personalidade civil a partir da sua concepção” (2007, p. 58).

Para o Ministro, Ricardo Lewandoswsky: O STF não pode utilizar-se da técnica da

interpretação conforme no caso, uma vez que impedido pela univocidade das palavras e da vontade, explícita e deliberada, do legislador em não afastar a punibilidade da interrupção da gravidez de feto anencéfalo.

Idem afirma que isso seria extrapolar as

competências do Congresso, quando ao Supremo é dado apenas atuar como legislador negativo, ele é adepto da teoria concepcionista.

O capitulo, tratou das Teorias, já declinada e suas divergências doutrinárias no que diz respeito aos estudiosos do tema, em ato continuo, no capitulo seguinte, abordar-se-á o tema dos Direitos do Nascituro. 3. Direitos do Nascituro

O nascituro, embora não seja reconhecido como pessoa pelo ordenamento jurídico brasileiro, que adota a teoria natalista para determinar o início da personalidade, tem seus direitos ressalvados e tutelados desde a concepção. Assim, além dos direitos da personalidade, que lhe são inerentes e decorrem de sua natureza humana, asseguram-se ao nascituro outros direitos expressamente previstos em lei, nos quais se incluem o direito à filiação, à curatela, de receber doação, de suceder e, finalmente, o direito a alimentos.

Conforme asseveram Rodolfo Pamplona Filho e Ana Thereza Meirelles de Araújo:

Desta forma, independente [sic] da atribuição da personalidade somente

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a seres que nasçam com vida, o ordenamento jurídico reconheceu a necessidade da tutela do nascituro, fazendo tanto no campo das relações civis (garantindo a ele uma série de direitos), quanto no âmbito penal (criminalizando e proibindo o aborto, ressalvadas as exceções legais) (Meirelles, 2007, p. 40).

Os direitos do nascituro, segundo os

natalistas, são taxativos e restringem-se àqueles que são especificamente previstos no sistema jurídico. Como já mencionado, o não nascido, enquanto mera expectativa de pessoa, “goza apenas da proteção previamente demarcada e expressamente especificada no texto da lei” (SEMIÃO, 2000, p. 70).

Distinto, para os concepcionistas e, também, para os adeptos da teoria da personalidade condicional, o nascituro, porque tem personalidade desde a fusão dos gametas, possui a mesma condição jurídica do ser humano nascido e, por isso, desfruta de ampla proteção legal e tem reconhecido todo e qualquer direito, personalíssimo ou patrimonial, ainda que não previsto expressamente pela legislação.

Consoante com o doutrinador, William Artur Pussi:

Ademais, [os natalistas] sustentam que aceitar a doutrina natalista importa reconhecer ao nascituro, como dito anteriormente, apenas expectativas de direito e restrita aos casos expressamente previstos pelo código. Dessa forma, a aplicação da norma jurídica deve ser sempre restrita e, em decorrência, só haverá proteção ao nascituro nos casos expressamente previstos em lei como, por exemplo, a doação, sucessão testamentária e punição ao aborto. De modo inverso, ao considerar o nascituro já como pessoa, impõe-se que a norma civilista seja estendida de modo amplo, como regra geral (Pussi, 2008, p. 88).

No mesmo sentido é a lição de Silmara

Juny Chinelato:

da posição por nós assumida de que o nascituro é pessoa, desde a concepção, advém a conseqüência de que outros direitos lhe podem ser atribuídos, est modus in rebus, além

dos expressamente previstos pelo Código” (Chinelato, 2000, p. 238).

De qualquer forma, seja por meio da

interpretação restritiva da teoria natalista, seja através da não taxatividade perfilhada pelos adeptos das teorias da personalidade condicional e concepcionista, assegurar direitos desde o surgimento da vida intrauterina, “pressupõe concluir pela proteção primordial do direito à vida do não nascido, já que este é pressuposto para a existência e gozo dos demais direitos a serem usufruídos” (PAMPLONA FILHO; ARAÚJO, 2007, p. 41).

3.1 Direito à Filiação

O nascituro, desde a concepção, momento em que se estabelecem as relações de parentesco, goza do status de filho e, por conseguinte, dos direitos inerentes a esse estado. Assim, mesmo antes do nascimento com vida, o pai pode reconhecer voluntariamente o filho nascituro, conforme prescrevem os artigos 26, parágrafo único, do Estatuto da Criança e do Adolescente e 1.609, parágrafo único, do Código Civil, in verbis:

o reconhecimento pode preceder o nascimento do filho ou ser posterior ao seu falecimento, se ele deixar descendentes.

Em conformidade com a doutrinadora,

Silmara Juny Chinelato:

[...] a permissão do reconhecimento antecipado da prole tem como fundamento o temor do pai de morrer antes de nascer o filho, de achar-se por outro motivo (interdição, loucura etc.) impedido de fazê-lo após o nascimento e a incerteza da mãe escapar com vida do próprio parto, sobrevivendo-lhe o filho (Chinelato, 2000, p. 210).

O reconhecimento voluntário poderá ser feito através de escritura pública, testamento ou por manifestação direta e expressa perante o juiz, uma vez que o outro meio enumerado na legislação é o reconhecimento no próprio registro do nascimento. Nas palavras de Fabrício Zamprogna Matiello: “antes de o filho nascer, o reconhecimento acontece através de escritura pública ou de testamento, pois, por óbvio, não há como lavrar termo de um que ainda não se verificou” (Matiello, 2005, p. 1.050).

Tal qualmente, tem cabimento contra o pai ou, sendo este falecido, contra seus herdeiros

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e legatários, o reconhecimento forçado ou compulsório do nascituro, por meio da ação de investigação de paternidade, cuja legitimidade ativa cabe apenas ao filho, representado pela mãe gestante, haja vista que “o vínculo paternidade-filiação é de natureza personalíssima” (CHAVES, 2000, p. 86-87).

Ainda segundo, Silmara Juny Chinelato, partidária da teoria concepcionista:

A nosso ver, cabe o reconhecimento forçado, obtido por meio de investigação de paternidade [...]. A finalidade é impedir a variação do satatus familiae do concebido, bem como a prestação de alimentos, além de outros, como a vocação hereditária para a sucessão legítima. Uma vez fixado que o nascituro é pessoa, desde a concepção, não há obstáculo legal para o ajuizamento da ação, pela mãe, representando o filho nascituro (Chinelato, 2000, p. 213).

A despeito dos adeptos da teoria natalista, o direito ao reconhecimento da paternidade não é assegurado ao nascituro, mas, em verdade, a quem o reconhece, ante a ausência de previsão legal expressa em favor do não nascido. 3.2 Direito de Adoção do Nascituro

Em termos de legislação sobre o tema adoção’, a Lei n° 3.071 de 1° janeiro de 1916 - Código Civil - foi de suma importância, pois deu um tratamento legal e jurídico a um instituto que enfrentava certa resistência à época. O Código Civil de 1916 no Capítulo V do Título V - Das Relações de Parentesco - regulamentava a adoção em seus artigos 368 a 378 e, especialmente quanto à adoção do nascituro havia uma regra específica, prevista no artigo 372:

“Sem embargo, não cabe a adoção sem a devida autorização do adotado ou de seu representante legal, caso este seja incapaz ou nascituro" (grifo nosso).

Evidencia que o codex civilista não fazia qualquer distinção entre a adoção de pessoa e adoção do nascituro, pois dizia somente que não se pode adotar sem o consentimento do adotado ou de seu representante legal se for incapaz ou nascituro. Ou seja, para se adotar aquele que ainda não nasceu a única exigência que a lei fazia era a anuência expressa do representante legal deste.

Registre-se que tal consentimento não poderia estar viciado, isto é, deveria estar livre de qualquer coação, erro ou dolo, pois se assim estivesse a adoção não produziria os seus

efeitos, pois o consentimento era um requisito essencial da adoção. É mister ressaltar que a inserção do termo ‘nascituro’ na redação do dispositivo legal supramencionado se deu com a a edição da Lei n° 3.133, de 08 de maio de 1.957 – Código de Menores.

Ao contrario de a Constituição Federal de 1988 (publicada em 05 de outubro de 1.988) e, posteriormente, a regulamentação pela Lei n° 8.069/90 (publicada em 13 de julho de 1.990) - Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) - operaram profunda modificação no Instituto da Adoção. Deixavam de existir, quando se tratava de adotando criança e adolescente, a classificação e os efeitos distintos até então vigentes: adoção civil, adoção simples e adoção plena. A nova normatização da adoção defluiu dos princípios constitucionais e do regrado no artigo 227, § 5º, da CRFB: “ A adoção será assistida pelo Poder Público, na forma da lei, que estabelecerá casos e condições de sua efetivação por parte de estrangeiros”.

Para o estudioso, Madaleno Rolf (2013, p. 657), não há previsão legal, nem tampouco no Código Civil, revogado pela Lei n. 12.010 de 2009, havendo, pois novos rumos para o tema, justamente pelo fato de que dever haver uma maior discussão o que deve ser objeto de outro artigo com a temática, quanto a exclusão ou não da adoção do nascituro.

Não obstante a temática da Adoção, no artigo 8° do Eca, menciona que o Estado, proporcionar apoio alimentar a mãe, assim como em casos de adoção de nascituro.

Art. 8º É assegurado à gestante, através do Sistema Único de Saúde, o atendimento pré e perinatal. § 4o Incumbe ao poder público proporcionar assistência psicológica à gestante e à mãe, no período pré e pós-natal, inclusive como forma de prevenir ou minorar as consequências do estado puerperal. § 5o A assistência referida no § 4o deste artigo deverá ser também prestada a gestantes ou mães que manifestem interesse em entregar seus filhos para adoção.

Sendo, portanto, essa condição igualitária para a mãe, cujo filho já tenha nascido ou em caso de nascituro.

Já a ilustre doutrinadora Rosângela de Morais Souza, quando comenta as alterações trazidas pela Carta Magna no campo da adoção aduz que:

(...) a adoção ainda possuía o cunho de solução dos problemas do adotante, ou seja, de dar filhos ao casal que não os tivesse biologicamente e, para a perpetuação do nome da família,

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distinto dos dias atuais, quando predonima o caráter humanitário e protetor do direito da criança e do adolescente, fazendo da adoção um dos institutos mais nobres do mundo (1992, p. 45).

No mesmo sentido são as palavras de Sônia Maria Monteiro:

O instituto da adoção recebeu profundas modificações em obediência ao princípio contido no art. 227, §6° da Constituição Federal; o legislador promoveu a fusão das três espécies de adoção exitentes: a simples e a plena, do Código de Menores e a adoção do Código Civil, tornando-a una e irrevogável, quando se trata de criança e de adolescente (1997, p. 45).

Por conseguinte, o Estatuto da Criança e do Adolescente, aponta a existência entre pais e filhos um vínculo de natureza civil, ou seja, que é regulado em lei, conforme se extrai do caput do seu artigo 39, que assim institui: " A adoção de criança e de adolescente reger-se-á segundo o disposto nesta Lei." Ademais, o Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei n° 8.069/90) prevê algumas restrições e regras no que tange à adoção lato sensu:

A idade mínima para se adotar é de 18 (dezoito) anos, sendo irrelevante o estado civil. Sendo os adotantes casados, ou se estiverem vivendo em concubinato, basta que um deles possuam mais de 18 (dezoito anos) anos de idade, comprovando, no entanto, a estabilidade da família (artigo 42, §2°, ECA); O menor a ser adotado deve ter no máximo 18 (dezoito) anos de idade, salvo quando já convivia com aqueles que o adotarão (artigo 40, ECA), caso em que o limite máximo de idade é de 18 (dezoito nosso) anos; O adotante, isto é, aquele que vai adotar, deve ser pelo menos 16 (dezesseis) anos mais velho que a criança ou adolescente a ser adotado (artigo 42, §3°, ECA). Os ascendentes (avós, bisavós) não podem adotar seus descendentes; irmãos também não podem; A adoção depende da concordância, perante o magistrado e o membro do Ministério Público, dos pais biológicos, salvo quando forem desconhecidos, ou destituídos do pátrio poder, proibindo-se o consentimento via mandato (artigo 45, caput e § 1, ECA);

Tratando-se de adotando adolescente, isto é, maior de 12 (doze) anos de idade, a adoção depende de seu expresso consentimento (artigo 45 § 2); Antes da prolação da sentença da adoção exige-se o cumprimento do chamado período de convivência entre adotante e adotado, durante um prazo estipulado em juízo pelo magistrado (artigo 46, caput e §§, ECA), podendo ser dispensado se a criança tiver menos de um ano de idade ou se já estiver sob a responsabilidade do(s) adotante(s) por tempo suficiente; Somente será deferida quando apresentar reais vantagens e fundar-se em motivos legítimos. (artigo 43, ECA).

Para a doutrinadora Silmara J.A. Chinelato e Almeida, a não previsão da adoção do nascituro no atual sistema normativo configura um verdadeiro retrocesso (tão combatido pela jurisprudência em diversas ocasiões – princípio da vedação ao retrocesso). Esta falta de expressa previsão legal quanto à possibilidade da adoção do nascituro é que leva a atual discussão existente no âmbito doutrinário e jurisprudencial, pois elevadíssimos autores vendo levantadas teses divergentes baseadas em princípios e regras constitucionais, bem como nas teorias civis que tutelam os direitos da personalidade, e por consequente os direitos do nascituro. A título de exemplo, a supramencionada autora sustenta que é defensável a tese no sentido de que é cabível a adoção do nascituro, que destarte, incluir-se-á entre seus direitos não taxativos (2000, p. 134).

CIVIL. PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. ADOÇÃO PÓSTUMA. VALIDADE. ADOÇÃO CONJUNTA. PRESSUPOSTOS. FAMILIA ANAPARENTAL. POSSIBILIDADE. (...) A existência de núcleo familiar estável e a consequente rede de proteção social que podem gerar para o adotando, são os fins colimados pela norma e, sob esse prisma, o conceito de núcleo familiar estável não pode ficar restrito às fórmulas clássicas de família, mas pode, e deve, ser ampliado para abarcar uma noção plena de família, apreendida nas suas bases sociológicas. Restringindo a lei, porém, a adoção conjunta aos que, casados civilmente ou que mantenham união estável, comprovem estabilidade na família, incorre em manifesto descompasso com o fim perseguido pela própria norma, ficando teleologicamente órfã. Fato que ofende

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o senso comum e reclama atuação do interprete para flexibilizá-la e adequá-la às transformações sociais que dão vulto ao anacronismo do texto de lei. O primado da família socioafetiva tem que romper os ainda existentes liames que atrelam o grupo familiar a uma diversidade de gênero e fins reprodutivos, não em um processo de extrusão, mas sim de evolução, onde as novas situações se acomodam ao lado de tantas outras, já existentes, como possibilidades de grupos familiares. (...) Nessa senda, a chamada família anaparental - sem a presença de um ascendente -, quando constatado os vínculos subjetivos que remetem à família, merece o reconhecimento e igual status daqueles grupos familiares descritos no art. 42, §2, do ECA. Recurso não provido. (REsp 1.217.415/RS, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 19/06/2012, DJe 28/06/2012).

Ademais, não somente é possível a adoção de nascituro, como aduz o julgado, como testamento e adoção, por força dos seguintes dispositivos:

Art.2° do CC – A personalidade civil da pessoa começa com o nascimento com vida; mas a lei põe a salvo, desde a concepção, os direitos do nascituro; Art. 542 do CC – A doação feita ao nascituro valerá, sendo aceita pelo seu representante legal; Art. 1.609, parágrafo único do CC – O reconhecimento pode preceder o nascimento do filho ou ser posterior ao seu falecimento, se ele deixar descendentes; Art. 1.779 do CC – Dar-se-á curador ao nascituro, se o pai falecer estando grávida a mãe, e não tendo o poder familiar; Art. 1.798 do CC – Legitimam-se a suceder as pessoas nascidas ou já concebidas no momento da abertura da sucessão; Art. 1.799 do CC – Na sucessão testamentária podem ainda ser chamados a suceder: I – os filhos, ainda não concebidos, de pessoas indicadas pelo testador, desde que vista estas ao abrir-se a sucessão; Art. 877 do CPC – A mulher que, para garantia dos direitos do filho nascituro, quiser provar seu estado

de gravidez, requererá ao juiz, que ouvido o órgão do Ministério Público, mande examiná-la por um médico de sua nomeação.

Isto porque o Estatuto da Criança e do Adolescente foi omisso a respeito, sendo a matéria regulada pelo Código Civil e, com a Lei 10.406/2002, a adoção do nascituro passou a ser plena, ou seja, sem possibilidade de revogação, e realizada por sentença judicial, e não mais por escritura pública.

Aliás, a Lei 12.010/2009 revogou todos os dispositivos do Código Civil referentes à adoção de criança e adolescente, estabelecendo, contudo, que a adoção de maiores de 18 anos dar-se-á pelo CC (art. 1.619), “seguindo, no que couber, as regras do ECA’’, ou seja, a adoção de pessoas maiores de 18 será feita na Vara de Família, por sentença judicial e sem revogação, seguindo as novidades do ECA trazidas pela Lei n° 12.010/2009.

Destarte, a adoção do nascituro, caso aceita pela jurisprudência, será regida pelo Código Civil, analogia feita com a adoção de pessoas maiores de 18 anos (art. 1.619, CC). 3.3 Direito de Curatela

A despeito da controvérsia em torno da personalidade jurídica do nascituro, a doutrina é unânime em reconhecer que o concebido não tem capacidade e, por isso, não pode fazer valer seus interesses pessoalmente. Com efeito, os direitos que lhe são taxativa ou plenamente assegurados pelo ordenamento jurídico devem ser defendidos ou protegidos por seus pais ou, excepcionalmente, por um curador.

Nas palavras de Benedita Inêz Lopes Chaves:

[...] sob o ponto de vista jurídico e físico, o nascituro não pode agir por si mesmo e, como a lei lhe concede direitos, os quais têm que ser defendidos, claro que terá que ter um representante legal para, em seu nome, agir” (Chaves, 2000, p. 93).

Destarte, assim como os filhos já nascidos, o nascituro está sujeito ao poder familiar dos pais, que são seus representantes legais e, desde a fusão dos gametas, têm o dever de resguardar os direitos do filho concebido. Contudo, na falta do pai e no impedimento da mãe, o nascituro será representado por um curador nomeado judicialmente, a quem incumbirá zelar por seus interesses, nos termos do artigo 1.779, caput, do Código Civil, in verbis: “dar-se-á curador ao nascituro, se o pai falecer estando grávida a mulher, e não tendo o poder familiar”.

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Aduz, Rodolfo Pamplona Filho e Ana Thereza Meirelles Araújo:

"Em caso de falecimento do pai e perda do poder familiar pela mulher grávida, deve-se nomear curador ao que está por nascer para a defesa de seus interesses (art. 1.779 do CC e arts. 877 e 878 do CPC) até o seu nascimento com vida, quando lhe será nomeado tutor (art. 1.728 do CC). Se não houver perda do poder familiar, os direitos do nascituro serão resguardados pelos seus representantes legais – seus pais (Pamplona, 2007, p. 42).

Apesar de que, conste expressamente do dispositivo legal que o nascituro somente receberá curador na hipótese de falecimento do pai durante a gravidez de mulher que não tenha condições de exercer o poder familiar, de acordo com Ricardo Fiuza, Joel Dias Figueira Júnior e Regina Beatriz Tavares da Silva, “dar-se-á, também, curador ao nascituro quando: 1. pai desconhecido ou mãe interdita ou fora do poder familiar; 2. pai e mãe interditos; 3. pai e mãe fora do poder familiar (menores ou por decisão judicial, na forma do artigo 1.638)” (Fiuza, 2008, p. 1.942).

A curatela tem caráter patrimonial e terá

lugar apenas quando o nascituro receber algum bem, em virtude de herança, legado ou doação. O curador nomeado, no entanto, além de resguardar eventuais direitos patrimoniais do infans conceptus, tem como dever, igualmente, “zelar para que [o nascituro] nasça com vida, impedindo que a gravidez seja interrompida” (PELUSO, 2008, p. 1.927).

O nascimento com vida põe fim à curatela especial do nascituro, momento em que, permanecendo a mãe impossibilitada de exercer o poder familiar, nomear-se-á um tutor à criança recém-nascida (DINIZ, 2009, p. 1.258).

Ressalte-se que, de acordo com parte da doutrina, a curatela do nascituro representa o acolhimento, pela legislação civil, da teoria concepcionista, na medida em que só a pessoa, porque dotada de personalidade jurídica, é passível de receber curador para os seus interesses.

[...] Esse reconhecimento da possibilidade de nomeação de um curador para o nascituro também acaba amparando a teoria concepcionista, ou seja, de que o nascituro é pessoa humana. Na verdade, ao admitir a curatela do

nascituro, o Código Civil dá a ele o tratamento como absolutamente incapaz, enquadrado na hipótese do inc. I do art. 3° (menor de 16 anos). Em outras palavras, o nascituro é tratado como menor, a ser representado pelo seu curador, que irá administrar, a título de exemplo, eventuais interesses patrimoniais futuros daquele. Somente pessoas humanas podem estar sujeitas a curatela (TARTUCE, 2007, p. 102).

Em sentido oposto, para a teoria natalista, não se pode representar pessoa que ainda não existe, razão pela qual incumbe aos pais ou ao curador tão somente defender, vigiar e proteger as expectativas de direitos expressamente conferidas por lei ao nascituro, para o caso de eventual nascimento com vida. Como assevera Sérgio Abdalla Semião, “[...] cabe ao curador ou mesmo aos pais que geraram o nascituro praticar apenas atos provisórios em prol de uma pessoa prestes a constituir-se e que a lógica deduz como futuro sujeito de direitos, no sentido jurídico do termo” (2000, p. 91). 3.4 Direito de Receber Doação

Entre os direitos expressamente reconhecidos pelo ordenamento jurídico ao nascituro, insere-se o direito de receber doação, previsto no artigo 542 do Código Civil, que dispõe: “a doação feita ao nascituro valerá, sendo aceita pelo seu representante legal (Grifo Nosso).

A aceitação necessária para aperfeiçoar o contrato deve ser manifestada pelo representante legal do nascituro, isto é, por qualquer dos pais que tenha o poder familiar ou, no caso de impedimento destes, por curador, seja ou não especialmente nomeado para o ato.

Nas palavras de Cesar Peluso:

Ocorre que o direito eventual que lhe assiste [ao nascituro] para a aquisição de direitos patrimoniais (extensivo à transmissão causa mortis, art. 1.798 do CC) é suficiente para permitir a validade do negócio jurídico de doação em período anterior ao nascimento, mas posterior à concepção. [...] A menção à aceitação do representante legal significa que a anuência deste se insere no plano de validade. Ou seja, sem a concordância do curador [ou dos pais] do nascituro, mesmo que o nascimento se produza com vida, não haverá a doação pela falta da

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representação (Peluso, 2008, p. 521).

Igualmente, para a validade do negócio jurídico, no momento da lavratura do instrumento de doação, seja este público ou particular, o nascituro deve existir, estar concebido, porquanto “os pais não podem aceitar doação feito à prole eventual, a não ser sob a forma de fideicomisso convencional” (CHINELATO, 2000, p. 232).

Os efeitos da doação feita ao nascituro, no entanto, mesmo para os partidários da teoria concepcionista, ficam condicionados ao nascimento com vida. Assim, se o concebido nascer sem vida, embora aceita a doação, esta “será considerada inexistente, como se nunca tivesse ocorrido e o bem volta a incorporar o patrimônio do doador” (MATTOS, 2008, p. 112).

O entendimento é muito lógico: se a expectativa de pessoa não nasce com vida, a conseqüência óbvia é que a doação será considerada como se nunca tivesse sido conferida, já que o nascituro que não nasce com vida não pode ser sucedido hereditariamente, e, assim, o bem em vez de transferir-se para os seus herdeiros, voltará ao patrimônio do doador ipso facto, operando os mesmos efeitos, como se fora uma verdadeira “cláusula resolutiva expressa”, tudo por pura lógica jurídica (SEMIÃO, 2000, p. 93).

Não obstante seja o negócio jurídico

condicional, depois de aceita a doação, o representante legal do nascituro poderá entrar na posse do bem doado e perceber-lhe os frutos, guardando-os, mas sem poder usufruí-los. Caso o nascituro nasça sem vida, no entanto, de acordo com Sérgio Abdalla Semião, “os frutos e produtos dos bens a ele doados reverter-se-ão, ipso facto, ao doador, posto que tais bens nunca deixaram de ser dele e os pais – ou o curador do nascituro – foram meros guardiões, tanto do bem quanto de seus frutos e produtos” (Simião, 2000, p. 102). 3.5 Direito de Suceder

A condição para herdar, seja na sucessão legítima ou na testamentária, é a existência do herdeiro ao tempo da morte do de cujus.

Assim, somente as pessoas vivas ou já concebidas no momento da abertura da sucessão podem ser herdeiras ou legatárias e, por isso, têm legitimidade para invocar a titularidade da herança, conforme dispõe o artigo 1.798 do Código Civil, in verbis: “legitimam-se a suceder as pessoas nascidas ou já concebidas no momento da abertura da sucessão”.

O nascituro, por conseguinte, pode ser chamado a suceder tanto na sucessão legítima como na testamentária, desde que exista como ente concebido ao tempo da abertura da sucessão. Nas palavras de Silmara Juny

Chinelato, para que o nascituro tenha direito sucessório, “[...] é necessário que, no momento da morte do de cujus, ele já viva e ainda viva. Aplica-se a regra geral da coexistência necessária do hereditando e do herdeiro; deve este sobreviver àquele” (CHINELATO, 2000, p. 235).

A eficácia da vocação hereditária do nascituro, no entanto, está condicionada ao nascimento com vida, momento em que se aperfeiçoa o direito sucessório e a herança passa a integrar o patrimônio do recém-nascido, inclusive com seus frutos e rendimentos. De acordo com Rodolfo Pamplona Filho e Ana Thereza Meirelles Araújo “[...] o nascimento com vida é condição do direito à herança do nascituro. Em caso de natimorto, não há que se falar em direito sucessório por inexistência do implemento da condição” (Meirelles, 2007, p. 42).

Destarte, nascendo sem vida o nascituro, não há aquisição de direitos e “o sucessor imediato herda a partir do falecimento do inventariado, momento mortis, e também o seu direito retrotrai” (CHINELATO, 2000, p. 235).

Segundo a lição de Carlos Roberto

Gonçalves:

Nascendo com vida, a existência do nascituro, no tocante aos seus interesses, retroage ao momento de sua concepção, como já proclamava o Digesto (Livro I, Tít. V, frag. 7): “nasciturus pro iam nato habetur quoties de eius commodis agitur” (o nascituro é tido como nascido no que se refere aos seus interesses). Os direitos que lhe são assegurados encontram-se em estado potencial, sob condição suspensiva. Para resguardá-los pode a mulher que o está gerando requerer ao magistrado competente a nomeação de um curador: o curator ventris (curador ao ventre). (Gonçalves, 2007. p 52).

No entanto, se porventura nascer morto o

feto, não haverá aquisição de direitos, como se nunca tivesse existido. Com isso, nem recebe nem transmite direitos. Nesse caso, a herança ou quota hereditária será devolvida aos herdeiros legítimos do de cujus, ou ao substituto testamentário, se tiver sido indicado, retroagindo a devolução à data da abertura da sucessão (Gonçalves, 2007, p. 51-52).

Assim como acontece na doação, o nascituro, através de seu representante legal, seja este qualquer dos pais ou curador, pode

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entrar na posse dos bens herdados, percebendo-lhes os frutos.

O nascimento sem vida, no entanto, implica a devolução de todos os frutos e produtos percebidos aos herdeiros legítimos ou ao substituto testamentário, porque o direito sucessório do nascituro é condicional e, como assevera Benetida Inêz Lopes Chaves, “se o concebido nascer morto, não existiu herdeiro, porque o natimorto não foi pessoa” (Chaves, 2000, p. 81). 3.6 Legado

Segundo as vertentes doutrinárias, qualquer pessoa, parenta ou não, natural ou jurídica, simples ou empresária, pode ser contemplada com legado. Podem ser objeto do legado coisas corpóreas, imóveis, móveis, e semovente.

Devota-se de uma coisa certa e determinada deixada a alguém, denominada legatário, em testamento ou codicilo. Difere da herança, que é a totalidade ou parte ideal do patrimônio do de cujus. Herdeiro nomeado não se confunde, pois, com legatário.

Vale ressaltar que o nascituro goza de tal prerrogativa, uma vez que tal bem pode ser deixado por alguém por testamento ou codicilo. 3.7 Proteção á vida.

Compreendido com. KILDARE Gonçalves Carvalho. O primeiro direito do homem consiste no direito à vida, condicionador de todos os demais. Desde a concepção até a morte natural, o homem tem o direito à existência, não só biológica como também moral. (A Constituição estabelece como um dos fundamentos do Estado à dignidade da pessoa humana, art. 1º, III). (2007. p. 52-53).

O legislador santificou a vida como algo sublime garantindo a todos o direito de viver em paz, tipificando como crime qualquer ameaça a tal garantia de sorte que aquele que tirar a vida de alguém de forma arbitraria responde por crime previsto na legislação em vigor.

O nascituro goza de proteção legal especificadas nos artigos 124 ao128 do código penal. De tal sorte que qualquer atentado a sua vida constitui crime. Ou seja, a vida intrauterina esta protegida.

3.8 Direito a Alimentos Consagrado pelo artigo 1.694 do Código

Civil, direito a alimentos, deriva das relações de parentesco e visa a garantir a subsistência daqueles que não dispõem de recursos para viver nem podem prover suas necessidades com seu próprio trabalho, abrangendo tudo aquilo que se mostra necessário para a garantia de uma existência com dignidade.

Semelhantemente, porque a vida humana deve ser preservada e promovida pela ordem jurídica desde a concepção, o nascituro, do mesmo modo que o ser humano já nascido tem o direito a alimentos, que lhe são devidos por qualquer um que o tenha concebido, a fim de atender às necessidades pré-natais (VENOSA, 2004a, p. 163).

Explica Flávio Tartuce:

Os alimentos são prestações devidas a quem não pode provê-las pelo próprio trabalho, estando fundamentados em relação de parentesco, casamento ou união estável, nos termos do art. 1.694 do atual CC. O pagamento dos alimentos visa à pacificação social, estando amparado nos princípios da dignidade da pessoa humana e da solidariedade familiar, ambos de índole constitucional. Ao se reconhecer o pagamento de alimentos ao nascituro, temos a consagração de sua dignidade, o que é um caminho sem volta. Dessa forma, não temos dúvida de que o nascituro tem direito a esses alimentos [...] (Tartuce, 2007, p. 100-101).

Orienta-se de igual forma, o entendimento

de William Artur Pussi: “indiscutível, mesmo para aqueles que defendem a teoria natalista, que o nascituro tem direito a alimentos. Afinal, é certo que, mesmo antes de nascer, existem despesas que são destinadas à própria sobrevivência do nascituro” (2008, p. 424).

Nesse sentido, o direito a alimentos, visa assegurar a manutenção e a sobrevivência do nascituro no ventre materno, possibilitando o desenvolvimento regular do feto, com vistas ao nascimento com vida. Em outras palavras, “[...] ao nascituro são devidos, como direito próprio, alimentos em sentido lato – alimentos civis – para que possa nutrir-se e desenvolver-se com normalidade, objetivando o nascimento com vida” (CHINELATO, 2000, p. 243).

A luz da Jurisprudência Pátria vislumbra-

se:

TJ-RS - AGRAVO DE INSTRUMENTO AI 70046650941 RS (TJ-RS) DATA DE PUBLICAÇÃO: 18/01/2012 Ementa: DISSOLUÇÃO DE UNIÃO ESTÁVEL. ALIMENTOS GRAVÍDICOSLEI Nº 11.804 /08. DIREITO DO NASCITURO. PROVA.

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POSSIBILIDADE. ADEQUAÇÃO DO QUANTUM. 1. Havendo indícios da paternidade apontada, é cabível a fixação de alimentos em favor do nascituro, destinados à gestante, até que seja possível a realização do exame de DNA. 2. Os alimentos devem ser fixados de forma a contribuir para a mantença da gestante, mas dentro das possibilidades do alimentante e sem sobrecarregá-lo em demasia. 3. Os alimentos poderão ser revistos a qualquer tempo(...). Rel.Des. Alinaldo Faria de Souza – DJES 13.01.2006.

Tal entendimento aduz serem possíveis os alimentos gravídicos a qualquer tempo, neste particular, fora no momento da Dissolução de União estável, que havendo indícios quanto a paternidade admite-se o deferimento do pedido.

Já nos termos do artigo 2º da Lei n. 11.804/08, os alimentos devidos pelo futuro pai ao nascituro e percebidos pela gestante ao longo do período de gravidez, também chamados de alimentos gravídicos, devem compreender, na proporção dos recursos de ambos os pais, todas as despesas decorrentes da gestação, desde a concepção até o parto, “inclusive as referentes à alimentação especial, assistência médica e psicológica, exames complementares, internações, parto, medicamentos e demais prescrições preventivas e terapêuticas indispensáveis, a juízo do médico além de outras que o juiz considere pertinentes”.

Assevera Silmara Juny Chinelato:

Incluem-se nos alimentos a adequada assistência médico-cirúrgica pré-natal, em sua inteireza, que abrange as técnicas especiais (transfusão de sangue, em caso de eritroblastose fetal, amniocentese, ultra-sonografia) e cirurgias realizadas em fetos, cada vez mais freqüentes, alcançando, ainda, as despesas com o parto (Chinelato, 2000, p. 243).

Após o nascimento com vida, os alimentos

gravídicos convertem-se em pensão alimentícia em favor da criança recém-nascida, até que esta ou o pai solicite a sua revisão, conforme preceitua o artigo 6º, parágrafo único, da Lei n. 11.804/08.

Portanto, o pagamento de alimentos ao nascituro, em última análise, objetiva promover a solidariedade familiar e a paternidade responsável, pois, conforme a lição de Pablo

Stolze Gagliano e Rodolfo Pamplona Filho, “não é justo que a genitora suporte todos os encargos da gestação sem a colaboração econômica do seu companheiro reconhecido” (Gagliano, 2006, p. 95).

3.9 Direito à vida

O direito à vida, indubitavelmente, é o mais importante e precioso dos direitos da personalidade, do qual decorrem a existência e o sentido de todos os outros. Sem ele, nada existe, razão pela qual a garantia de sua inviolabilidade representa, em última análise, a existência de uma cláusula geral de proteção da personalidade humana, com o propósito de impedir a limitação e o esgotamento dos demais direitos a ela inerentes.

Com efeito, embora não esteja previsto expressamente entre os direitos da personalidade elencados no Código Civil, o direito à vida é proclamado no artigo 5º, caput, da Constituição Federal e “decorre do ordenamento jurídico como um todo, e dos princípios mais elementares de tutela do ser humano, repousando naquilo que denominamos direito natural” (VIANA, 2004, p. 174). A vida humana, portanto, não se trata de concessão jurídico-estatal, mas de um bem anterior ao Direito e ao Estado, dotado de valor inestimável, que, como tal, deve ser respeitado e assegurado pela ordem jurídica.

Por isso, o direito à vida é protegido antes mesmo do nascimento e “[...] estende-se a qualquer ente trazido a lume pela espécie humana, independentemente do modo de nascimento, da condição de ser, de seu estado físico ou de seu estado psíquico” (BITTAR, 2006, p. 70).

A inviolabilidade da vida humana manifesta-se, pois, na punição do aborto, do homicídio e do induzimento, instigação ou auxílio ao suicídio; na proteção conferida aos direitos do nascituro; no direito a alimentos e, inclusive, no reconhecimento constitucional da importância do planejamento familiar.

Segundo a lição de Marco Aurelio da Silva Viana:

Por isso não se admite o suicídio, pune-se o homicídio, disciplina-se os alimentos, e se admite o pagamento do equivalente pecuniário aos sucessores do falecido. Protege-se o nascituro desde o nascimento, não se permite a doação de bens sem reserva do necessário à sobrevivência do doador, não se admite o aborto senão em situações peculiares, o que evidencia a existência do direito à vida. Até

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mesmo o planejamento familiar se insere nesse universo (2004, p. 174).

Contudo, o direito à vida não se trata,

assim, de direito da pessoa sobre si mesma, mas sim de direito ao respeito à vida do próprio titular e de todos os componentes da coletividade, conferindo-lhes a prerrogativa de exigirem comportamentos negativos uns dos outros, a fim de proteger um bem que lhes é essencial e indisponível.

Finalmente, ressalte-se que não se garante ao indivíduo tão somente o direito de existir. O direito à vida, do modo como consagrado na ordem jurídica brasileira, está subordinado ao princípio da dignidade humana, devendo ser assegurada a todo ser humano uma existência digna e de qualidade, com o mínimo de recursos indispensável à sua obrevivência. 3.10 Proteções pré-natais

Para o estudioso, VÁLTER KENJI ISHIDA.A a proteção pré-natal, define que a criança e o adolescente, como sujeitos de direito, desfrutam de direitos fundamentais.

Os referidos direitos estão consagrados no estatuto da criança e do adolescente e na Constituição Federal de 1988. Sendo uma medida protetiva para garantir a criança um desenvolvimento saudável e harmonioso, garantindo a ela o direito à vida, à saúde e educação.

Segundo a doutrina, é dever de toda a família oferecer condições dignas e um ambiente sadio e instruí-las para que possa crescer longe das drogas e do crime.

Conforme o Estatuto da Criança e do Adolescente em seu artigo 8o:

‘’É assegurado à gestante, através do Sistema Único de Saúde, o atendimento pré e perinatal.

§ 1º A gestante será encaminhada aos diferentes níveis de atendimento, segundo critérios médicos específicos, obedecendo-se aos princípios de regionalização e hierarquização do Sistema. § 2º A parturiente será atendida preferencialmente pelo mesmo médico que a acompanhou na fase pré-natal. § 3º Incumbe ao poder público propiciar apoio alimentar à gestante e à nutriz que dele necessitem. § 4o Incumbe ao poder público proporcionar assistência psicológica à gestante e à mãe, no período pré e pós-natal, inclusive como forma de prevenir

ou minorar as consequências do estado puerperal’’

A norma do Estatuto da Criança e do Adolescente é clara em relação á proteção do nascituro.

Nesse sentido, se resume tais afirmações com a apresentação do seguinte quadro esquemático:

a) o nascituro é titular de direitos personalíssimos (como o direito à vida, o direito à proteção pré-natal etc); b) pode receber doação, sem prejuízo do recolhimento do imposto de transmissão inter vivos; c) pode ser beneficiado por legado e herança; d) pode ser-lhe nomeado curador para a defesa dos seus interesses (arts. 877 e 878, CPC); e) o Código Penal tipifica o crime de aborto;

Entretanto, defende-se que o nascituro tem

direito a alimentos, por não ser justo que a genitora suporte todos os encargos da gestação sem a colaboração econômica do seu companheiro reconhecido (grifo nosso).

Após as etapas anteriormente

desenvolvidas se faz necessário trazer maiores esclarecimentos quanto ao exame de DNA. 3.11 DNA

Considerado como um dos maiores avanços científicos e largamente empregados na área jurídica, o exame de DNA, se tornou de suma importância para a real solução das inúmeras ações de investigação e negatória de paternidade das varas de família. Esse exame atinge níveis de certeza absoluta na identificação e determinação da paternidade biológica.

APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO DE PATERNIDADE – PROVA –EXAME DE DNA – CREDIBILDADE – ALIMENTOS PROVISIONAIS – ART.7º DA LEI Nº8.560/1992 – SENTENÇA MANTIDA. 1. O exame genético – DNA- é uma prova científica incontestável, fruto do avanço da ciência e capaz de determinar com precisão e absoluta certeza a paternidade, sendo que repercute diretamente no convencimento do julgador.2. A sentença de procedência da ação de investigação de paternidade pode condenar o réu em alimentos provisionais ou definitivos. Independente de pedido expresso na

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inicial. Art.7º da Lei nº 8.560/1992. Recurso improvido.(TJES-AC012.03.009047-1-3ªC.Cív.- Rel. Des. Alinaldo Faria de Souza – DJES 13.01.2006).

O DNA, cientificamente conhecido como ácido desoxirribonucléico é o material genético que compõe os genes, armazenando e transmitindo as características hereditárias dos pais para os filhos. Conforme estudos de Gregor Mendel em 1866, cada ser humano herda 50% de informações genéticas do pai e os demais 50% da mãe. Desta forma o DNA de cada pessoa é único, salvo no caso de gêmeos univitelinos.

(...) o monge Gregor Mendel planejou e executou uma série de experiências relativamente simples, a partir das quais deduziu muitos princípios da genética atual. Ele trabalhava com ervilhas que cultivava em canteiros do jardim de seu mosteiro, em Brunn, na Checoslováquia.

Várias experiências de hibridação ou cruzamento entre variedades de ervilhas, o levaram a acreditar na existência de partículas ou fatores hereditários existentes nas células sexuais, tanto masculinas como femininas. Essas partículas hoje são chamadas de genes.

A molécula de DNA compõe os cromossomos. A espécie humana possui 46 cromossomos, 22 de origem materna e 22 de origem paterna. A informação genética se dispõe ao logo dos cromossomos em posições denominadas de locos.

A realização do exame de DNA se dá a partir do estudo e análise de alguns locos selecionados. Geralmente são utilizados 15 locos para comprovar ou excluir a paternidade de um indivíduo.

Há diversas metodologias para o estudo da

identificação humana. A mais usual é a análise de marcadores de DNA do tipo STR (Short Tandem Repeats),através da técnica de PCR (Polymerase Chain Reaction).

Os STR são conhecidos como

microssatélites constituídos por sequências de 03 a 07 pares de bases repetidas em tandem e se distribuem por todo o genoma humano, constituindo marcadores polimórficos úteis para a utilização em exames de DNA. A exclusão de uma paternidade é baseado em sérios critérios de incompatibilidade entre os alelos do filho, da mãe e do suposto pai em no mínimo 03 marcadores distintos de DNA.

Neste contexto, o doutrinador, Pablo STOLZE o conceitua como sendo um meio de prova capaz de gerar subsídios definitivos para desate de questões na esfera das demandas investigatórias de paternidade, merecendo,

apenas, obediência a determinados critérios para sua aplicação.

A doutrina por sua vez afirma que tal

instituto é uma garantia prevista no Código Civil e

na Constituição Federal e somente se

desenvolveu graças ao avanço da tecnologia. O

nascituro detém tal garantia, pois o juiz pode

determinar o exame de DNA mesmo antes do seu

nascimento para provar a paternidade e fixar os

alimentos necessários para que possa nascer

saudável.

Cabe ressaltar que a nossa Jurisprudência

Pátria, é taxativa ao admitir o exame de DNA.

APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DE

INVESTIGAÇÃO DE

PATERNIDADE – PROVA –EXAME

DE DNA – CREDIBILDADE –

ALIMENTOS PROVISIONAIS –

ART.7º DA LEI Nº8.560/1992 –

SENTENÇA MANTIDA. 1. O exame

genético – DNA- é uma prova

científica incontestável, fruto do

avanço da ciência e capaz de

determinar com precisão e absoluta

certeza a paternidade, sendo que

repercute diretamente no

convencimento do julgador.2. A

sentença de procedência da ação de

investigação de paternidade pode

condenar o réu em alimentos

provisionais ou definitivos.

Independente de pedido expresso na

inicial. Art.7º da Lei nº 8.560/1992.

Recurso improvido.(TJES-

AC012.03.009047-1-3ªC.Cív.-

Rel.Des. Alinaldo Faria de Souza –

DJES 13.01.2006).

Assim sendo, a Sentença, foi mantida nos

autos supracitados, sendo fundamental para fixação dos alimentos gravídicos. 4 Capacidades Processuais do Nascituro

Como assevera Humberto Theodoro Júnior a capacidade processual,

“consiste na aptidão de participar da relação processual, em nome próprio ou alheio” (2007, p. 87).

Em regra, a capacidade de ser parte no processo pressupõe a personalidade jurídica e confunde-se com aquela exigida para a prática dos atos e negócios jurídicos de direito material.

Contudo, os incapazes, devem ser representados ou assistidos em juízo por seus

21

pais, tutores ou curadores, nos termos do artigo 8º do Código de Processo Civil.

APELAÇÃO CíVEL Nº 583052204, DE BOM JESUS. APELANTE: J.P.A APELADOS: E.W.J.A. E OUTROS INTERESSADO: J.P.(menor representado por sua mãe). RELATOR: Des. ATHOS GUSMÃO CARNEIRO. INVESTIGACÃO DE PATERNIDADE. NASCITURO. CAPACIDADE PARA SER PARTE. Ao nascituro assiste, no plano do direito processual, capacidade para ser parte, como autor ou como réu. Representando o nascituro, pode a mãe propor a ação investigatória, e o nascimento com vida investe o infante na titularidade da pretensão de direito material, até então apenas uma expectativa resguardada. Ação personalíssima, a investigatória somente pode ser proposta pelo próprio investigante, representado ou assistido, se for o caso; mas, uma vez iniciada, falecendo o autor, seus sucessores têm direito de, habilitando-se, prosseguir na demanda. Inaplicabilidade da regra do art. 1.621 do CC. ACORDÃO. Vistos, relatados e discutidos os autos. Acordam, em lª Câmara Cível do Tribunal de Justiça, à unanimidade de votos, conhecer do recurso como agravo de instrumento, e negar provimento ao agravo incidental (art. 527, § 6.°, do CPC), manifestado por E.W.J.A. e outros, o que decidem de conformidade e pelos fundamentos constantes das inclusas notas taquigráficas que integram o presente acórdão. Oportunamente, façam-se as devidas anotações na Diretoria Processual. Custas na forma da lei. Participou do julgamento, além dos signatários, o Exmo. Sr. Des. JOSÉ VELLINHO DE LACERDA. Porto Alegre, 24 de abril de 1984. ATHOS GUSMÃO CARNEIRO, Presidente e Relator - ELIAS ELMYR MANSSOUR.

A respeito ao nascituro, a questão é bastante controvertida. Parcela da doutrina entende que o concebido, porque não é pessoa em sentido jurídico, não tem capacidade para ser parte no processo. Outros, por sua vez, afirmam que o nascituro somente pode figurar no pólo ativo da relação processual. Finalmente, há o

entendimento de que o não nascido pode ser parte ativa e passiva no processo, uma vez que todo exercício de direito implica uma obrigação (MONTEIRO ROCHA, 2007, p. 58).

Para o doutrinador, William Artur Pussi:

Um dos problemas básicos enfrentados pelo nascituro no Processo Civil diz respeito a sua capacidade processual. Afinal, a postura da legislação civil em separar dois momentos distintos, a aquisição de direitos (concepção) e a aquisição da personalidade civil (nascimento), tem gerado, como seria de esperar, muita celeuma (2008, p. 163).

Dessa forma, nos termos do art. 2° do

Código Civil, primeiro o nascituro adquire direitos e somente mais tarde adquire a personalidade civil. Surge a curiosa situação de possuir direitos, sem ter personalidade, no período compreendido entre a concepção e o nascimento.

Diante da peculiar situação apontada, surgiram dúvidas e discussões a respeito da capacidade processual do nascituro como parte no processo, ou seja, o nascituro pode ser parte ativa ou passiva num processo judicial?

Quem não consegue separar as figuras da

capacidade e da personalidade entende que, não tendo o nascituro personalidade, também não pode ter capacidade de ser parte. Para outros o nascituro pode ser parte ativa e, ainda, para uma terceira corrente, pode ser parte ativa e passiva (Pussi, 2008, p. 162-163).

De acordo com a teoria natalista, o nascituro não tem capacidade processual, nem mesmo pode ser representado pelos pais ou pelo curador em juízo, porquanto a capacidade de ser parte no processo, assim como a personalidade jurídica, apenas tem início a partir do nascimento com vida.

Com efeito, ao longo da gestação, as medidas processuais que se fizerem necessárias para garantir e proteger as expectativas de direito reconhecidas ao nascituro serão promovidas, em nome próprio, pelos pais ou pelo curador nomeado ao concebido, uma vez que não se pode representar quem ainda não existe enquanto pessoa.

Nas palavras de Sérgio Abdalla Semião: Destarte, para as pessoas físicas, a

capacidade de ser parte no processo começa do nascimento com vida. As medidas processuais que os genitores ou o curador tomam em prol do nascituro têm o escopo de garantir e de defender, como corolário lógico, as expectativas eventuais

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de direitos que possa ter o infans conceptus e não o representando, como já foi demonstrado ao discorrermos sobre a curatela do nascituro. Aliás, na prática forense, nem se vislumbra uma forma do nascituro ser parte, encabeçando uma petição, mesmo representado, como ocorre com os incapazes e com o espólio, por exemplo, que verdadeiramente são as partes, e figuram na petição inicial ou na contestação, embora representados por quem de direito (Semião, 2000, p. 110-111).

Os partidários das teorias concepcionista e da personalidade condicional, por sua vez, entendem que a ordem jurídica atribui ao nascituro personalidade civil e efetivos direitos desde a concepção, razão pela qual lhe confere também os meios necessários para a defesa desses direitos, mediante a aptidão para participar das relações processuais que lhe digam respeito.

Para Antonio do Rêgo Monteiro Rocha:

Porque o nascituro possui personalidade jurídica – detentor de direitos e obrigações – o código lhe reconhece capacidade. Tendo personalidade jurídica civil, o nascituro e o nascido devem receber tratamento igualitário, possuindo ambos a faculdade de estar nos pólos ativo e passivo da relação processual. [...] Enfim, em qualquer relação processual atinente a seus direitos, o nascituro, como o nascido, têm legitimidade ativa e passiva ad causam (2007, p. 58-59).

Desse modo, embora não possa agir por si

mesmo, porque carece de capacidade e sua existência está restrita ao ventre materno, o nascituro pode ser parte nas ações de seu interesse, exigindo-se tão somente que seja representado pelos genitores ou pelo curador que lhe foi nomeado, da mesma forma que o absolutamente incapaz.

Na lição de Silmara Juny Chinelato:

Há ações para a tutela dos direitos – e não expectativas de direitos – do nascituro. Além da ação de alimentos, por direito próprio, da ação de investigação de paternidade, podem ser interpostas, ainda, medidas cautelares nominadas como o seqüestro dos bens dos quais é donatário ou herdeiro; medidas cautelares inominadas que visem, por exemplo, a impedir a venda de seu ascendente para outro

descendente. [...] Importante ressaltar a legitimidade para ingressar com ação própria para pleitear reparação por danos patrimoniais e morais pela ofensa a seus direitos de personalidade, como a integridade física, a honra e a imagem [...] (Chinelato, 2000, p. 284-285)".

Ressalte-se, por fim, que a capacidade processual do nascituro não se restringe ao pólo ativo da relação processual. O concebido também poderá figurar como parte passiva no processo, sobretudo nas ações que versem sobre os eventuais direitos patrimoniais de que seja titular, como herdeiro ou donatário, na medida em que, de acordo com William Artur Pussi, “todo exercício de direito implica, por via oblíqua e em sentido oposto, uma obrigação” (2008, p. 165). 5. Conclusão

Entende-se por nascituro, o ser humano que foi concebido, mas ainda não nasceu. Contudo, em virtude do desenvolvimento da biotecnologia e do avanço das técnicas de reprodução assistida, o termo designa não só o ente resultante de fecundação in anima nobile, obtida naturalmente ou por meio de inseminação artificial, mas também o embrião humano decorrente de fertilização in vitro, mesmo que se encontre crioconservado.

Por conseguinte, não restam dúvidas de que a teoria concepcionista se apresenta como a mais adequada ao espírito personalista adotado pela Constituição Federal, porquanto promove o respeito e a proteção integral da vida humana em todos os seus múltiplos aspectos e estágios de existência.

Propicia-se ao nascituro o direito à indenização pelo dano moral havido antes do nascimento significa, nesse contexto, corroborar a salvaguarda dos direitos da personalidade que lhe são reconhecidos incondicionalmente desde a concepção, bem como afirmar a tutela do princípio da dignidade da pessoa humana e o reconhecimento do ser humano como núcleo e alicerce da sociedade e da ordem jurídica brasileira.

Finalmente, o próprio postulado constitucional do melhor interesse da criança e do adolescente aponta pela possibilidade de adoção do nascituro, pois o atendimento de situação peculiar em pessoa em desenvolvimento também estaria adstrita à vida intrauterina, que de igual forma deve ser assegurada de maneira que atenda o princípio da dignidade da pessoa humana ao garantir a vida digna inclusive a partir da fecundação, garantindo ao nascituro o direito à vida com o amparo da Lei.

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6. Agradecimentos Primeiramente ao meu criador Jesus, por me proporcionar a realização deste sonho, que é a conclusão da minha faculdade. A todos os meus familiares que me incentivaram chegar ate aqui. A todos os professores, em especial a minha orientadora Kadidja que me conduziu na elaboração do presente artigo. E a todos que fizeram parte direta ou indiretamente desta conquista.

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