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Curso de Direito Artigo Original APLICABILIDADE DO PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA NOS CRIMES MILITARES APPLICABILITY OF THE PRINCIPLE OF CRIMES IN MILITARY INSIGNIFICANCE Wendell Araújo Gomes 1 , Pedro Antônio Ribeiro de Andrade 2. ¹ Aluno do Curso de Direito. ² Professor Especialista em Direito Penal Militar. Resumo Introdução: O presente artigo, requisito parcial para conclusão de curso, tem por premissa abordar aplicabilidade do princípio da insignificância nos crimes militares. A adoção desse princípio, pacificamente adotado no direito penal comum, encontra forte residência de parte, minoritária, da doutrina e da jurisprudência quando se tratam de crimes militares. O fato das instituições militares, estruturadas nos pilares da hierarquia e disciplina, responsáveis pelo seu regular funcionamento, destinadas à defesa da pátria e guarda da constituição, protegem bens jurídicos inexistentes em outra esfera jurídica, gera certo temor na sua aplicação. Não obstante esse receio em adotar o princípio da insignificância no meio castrense, constatou-se que adotando uma postura cautelosa e observando os vetores traçados pelo Supremo Tribunal Federal, referido princípio tem total aplicabilidade às normas penais militares. Dado tal contexto, o presente artigo visou compreender as razões que levam parte, minoritária, da doutrina e da jurisprudência, em não raras as vezes, não aplicar o princípio da insignificância nos crimes militares. Palavras-Chave: Direito Penal Comum; Direito Penal Militar; Princípio da Insignificância; Abstract Introduction: This article, of course completion is premised on addressing the applicability of insignificance principle for military crimes. The adoption of this principle, peacefully adopted in ordinary criminal law, is strong house doctrine and case law when dealing with military crimes. The fact of military institutions are structured on the pillars of hierarchy and discipline, responsible for the smooth functioning of the institutions, it generates fear in their application. Despite the fear in their adoption in the middle castrense found that adopted a cautious stance and observed vectors set by the Supreme Court, said total insignificance principle applicability to military criminal law. Therefore the study aimed to evaluate the reasons that lead part, minority, doctrine and case law, not in rare cases do not apply the principle of insignificance for military crimes. Keywords: Common Criminal Law; Military Penal Law; Principle of Bickering; Contato: [email protected] Introdução O Direito Penal Militar diferencia-se do Direito Penal comum em vários pontos fundamentais. As diferenças entre as matérias ocasionam debates no campo acadêmico, doutrinário e jurisprudencial, uma vez que, não rara às vezes, princípios e entendimentos usados e aplicados ao Direito Penal Comum não são utilizados pelo Direito Penal Militar. O universo militar é tão peculiar, com suas leis, regulamentos e Código Penal Militar próprio, que princípios, direitos fundamentais, consagrados na Constituição Federal e adotados no Código Penal Comum são, por muitas vezes, relativizados e em muitas ocasiões inaplicáveis, quando submetidos ao crivo militar. Os regulamentos, o Código Penal Militar, as leis que exigem até mesmo o sacrifício da própria vida 1 em prol da pátria, os princípios da hierarquia 1 Parafraseando o Decreto nº 88.513/1983. Art. 171, v - o com- promisso é realizado pelos recrutas, perante a Bandeira Nacio- nal desfraldada, com o braço direito estendido horizontalmente à frente do corpo, mão aberta, dedos unidos, palma para baixo, repetindo em voz alta e pausada, as seguintes palavras: "IN- CORPORANDO-ME À MARINHA DO BRASIL (OU AO EXÉR- CITO BRASILEIRO OU À FORÇA AÉREA BRASILEIRA) - e da Disciplina, elevados a principio constitucional (art. 142 da CF), aos quais estão submetidos os militares, definem com exatidão as diferenças entre o direito penal militar e outras áreas do direito. As dicotomias entre o Direito Penal Militar, e o Direito Penal Comum ocorrem, principalmente, em razão da proteção atribuída ao bem jurídico- penal por cada ramo da justiça. Não se pode negar que para aplicar os princípios consagrados no Direito Penal Comum, dentre eles o princípio da insignificância, antes de qualquer coisa, é imprescindível conhecer a legislação penal militar e o bem jurídico-penal, por ela tutelado. Nesse interim, o cerne da controvérsia, se dá em verificar se os princípios da insignificância, da intervenção mínima ou demais princípios PROMETO CUMPRIR RIGOROSAMENTE - AS ORDENS DAS AUTORIDADES - A QUE ESTIVER SUBORDINADO - RES- PEITAR OS SUPERIORES HIERÁRQUICOS - TRATAR COM AFEIÇÃO OS IRMÃOS DE ARMAS - E COM BONDADE OS SUBORDINADOS - E DEDICAR-ME INTEIRAMENTE AO SERVIÇO DA PÁTRIA - CUJA HONRA - INTEGRIDADE - E INSTITUIÇÕES DEFENDEREI - COM O SACRIFÍCIO DA PRÓPRIA VIDA";

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Curso de Direito Artigo Original

APLICABILIDADE DO PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA NOS CRIMES MILITARES

APPLICABILITY OF THE PRINCIPLE OF CRIMES IN MILITARY INSIGNIFICANCE

Wendell Araújo Gomes

1, Pedro Antônio Ribeiro de Andrade

2.

¹ Aluno do Curso de Direito. ² Professor Especialista em Direito Penal Militar.

Resumo

Introdução: O presente artigo, requisito parcial para conclusão de curso, tem por premissa abordar aplicabilidade do princípio da insignificância nos crimes militares. A adoção desse princípio, pacificamente adotado no direito penal comum, encontra forte residência de parte, minoritária, da doutrina e da jurisprudência quando se tratam de crimes militares. O fato das instituições militares, estruturadas nos pilares da hierarquia e disciplina, responsáveis pelo seu regular funcionamento, destinadas à defesa da pátria e guarda da constituição, protegem bens jurídicos inexistentes em outra esfera jurídica, gera certo temor na sua aplicação. Não obstante esse receio em adotar o princípio da insignificância no meio castrense, constatou-se que adotando uma postura cautelosa e observando os vetores traçados pelo Supremo Tribunal Federal, referido princípio tem total aplicabilidade às normas penais militares. Dado tal contexto, o presente artigo visou compreender as razões que levam parte, minoritária, da doutrina e da jurisprudência, em não raras as vezes, não aplicar o princípio da insignificância nos crimes militares. Palavras-Chave: Direito Penal Comum; Direito Penal Militar; Princípio da Insignificância;

Abstract

Introduction: This article, of course completion is premised on addressing the applicability of insignificance principle for military crimes. The adoption of this principle, peacefully adopted in ordinary criminal law, is strong house doctrine and case law when dealing with military crimes. The fact of military institutions are structured on the pillars of hierarchy and discipline, responsible for the smooth functioning of the institutions, it generates fear in their application. Despite the fear in their adoption in the middle castrense found that adopted a cautious stance and observed vectors set by the Supreme Court, said total insignificance principle applicability to military criminal law. Therefore the study aimed to evaluate the reasons that lead part, minority, doctrine and case law, not in rare cases do not apply the principle of insignificance for military crimes. Keywords: Common Criminal Law; Military Penal Law; Principle of Bickering;

Contato: [email protected]

Introdução

O Direito Penal Militar diferencia-se do Direito Penal comum em vários pontos fundamentais. As diferenças entre as matérias ocasionam debates no campo acadêmico, doutrinário e jurisprudencial, uma vez que, não rara às vezes, princípios e entendimentos usados e aplicados ao Direito Penal Comum não são utilizados pelo Direito Penal Militar.

O universo militar é tão peculiar, com suas leis, regulamentos e Código Penal Militar próprio, que princípios, direitos fundamentais, consagrados na Constituição Federal e adotados no Código Penal Comum são, por muitas vezes, relativizados e em muitas ocasiões inaplicáveis, quando submetidos ao crivo militar.

Os regulamentos, o Código Penal Militar, as leis que exigem até mesmo o sacrifício da própria vida

1 em prol da pátria, os princípios da hierarquia

1 Parafraseando o Decreto nº 88.513/1983. Art. 171, v - o com-

promisso é realizado pelos recrutas, perante a Bandeira Nacio-nal desfraldada, com o braço direito estendido horizontalmente à frente do corpo, mão aberta, dedos unidos, palma para baixo, repetindo em voz alta e pausada, as seguintes palavras: "IN-CORPORANDO-ME À MARINHA DO BRASIL (OU AO EXÉR-CITO BRASILEIRO OU À FORÇA AÉREA BRASILEIRA) -

e da Disciplina, elevados a principio constitucional (art. 142 da CF), aos quais estão submetidos os militares, definem com exatidão as diferenças entre o direito penal militar e outras áreas do direito.

As dicotomias entre o Direito Penal Militar, e o Direito Penal Comum ocorrem, principalmente, em razão da proteção atribuída ao bem jurídico-penal por cada ramo da justiça.

Não se pode negar que para aplicar os princípios consagrados no Direito Penal Comum, dentre eles o princípio da insignificância, antes de qualquer coisa, é imprescindível conhecer a legislação penal militar e o bem jurídico-penal, por ela tutelado.

Nesse interim, o cerne da controvérsia, se dá em verificar se os princípios da insignificância, da intervenção mínima ou demais princípios

PROMETO CUMPRIR RIGOROSAMENTE - AS ORDENS DAS AUTORIDADES - A QUE ESTIVER SUBORDINADO - RES-PEITAR OS SUPERIORES HIERÁRQUICOS - TRATAR COM AFEIÇÃO OS IRMÃOS DE ARMAS - E COM BONDADE OS SUBORDINADOS - E DEDICAR-ME INTEIRAMENTE AO SERVIÇO DA PÁTRIA - CUJA HONRA - INTEGRIDADE - E INSTITUIÇÕES DEFENDEREI - COM O SACRIFÍCIO DA PRÓPRIA VIDA";

aplicados ao Direito Penal Comum, sem adaptação ao Direito Castrense.

Não obstante a natureza do bem jurídico-penal militar, fundamentais ao bom funcionamento das instituições militares, o Direito Penal Militar continua sendo a ultima ratio.

Essa proteção imediata contidas em todas as normas militares não pode servir de subterfugio para o direito penal militar, se aplicado para todo em qualquer crime de bagatela, mesmo tratando-se de militar.

O Supremo Tribunal Federal, ao traçar os requisitos objetivos para aplicação do princípio da insignificância, não delimitou quais seriam os crimes passiveis de proteção. Não foram especificadas quais infrações de bagatela, se patrimoniais, contra a administração, se crimes comuns ou militares, de modo a afirmar, sem analisar o caso concreto, que esse princípio seria insuscetível de aplicação à determinada conduta.

Os requisitos são os vetores para verificar se a conduta praticada adequa-se a concessão de tal princípio, independentemente da sua natureza.

A mínima ofensividade da conduta do agente; nenhuma periculosidade social da ação, o reduzidíssimo grau de reprovabilidade do comportamento e inexpressividade da lesão jurídica provocada, em uma análise mais criteriosa não distinguem crimes militares de crimes comuns, de maneira inviabilizar a aplicação do princípio da insignificância naqueles crimes.

Não se pode negar que a periculosidade social da ação ou o reduzidíssimo grau de reprovabilidade do comportamento, quando comparados ao direito penal militar não são os mesmo para o direito penal comum. Isso gera certa controvérsia quanto à aplicabilidade do princípio da insignificância no direito penal militar.

Diante dessas características geradoras de inúmeras discussões no mundo jurídico e acadêmico, discutir-se-á aplicação do Princípio da Insignificância no Direito Penal Militar.

Resultados

Almeja-se, com o resultado desse artigo, comprovar a aplicabilidade, com a devida cautela, do princípio da insignificância nos crimes militares.

Apesar desse princípio não ter aceitação pacífica ramo da justiça militar, espera-se demonstrar que a intervenção mínima do Direito Penal deve ocorrer, também, na seara militar.

Por fim, pretende-se, aferir se de fato, as instituições militares, com seus rigorosos regulamentos disciplinares, necessita do Direito Penal Militar para processar e julgar infrações de pequena monta, insuscetíveis de lesar materialmente o bem jurídico vislumbrado pelo legislador.

Discussão.

1. A Justiça Militar da União.

Com a chegada da família Real Portuguesa no Rio de Janeiro, formando-se o Reino Unido de Brasil e Portugal, por iniciativa de D. João VI, em Abril de 1808 é criada a Justiça Militar.

No atual ordenamento constitucional, a Justiça Militar tem como órgãos integrantes da sua estrutura o Superior Tribunal Militar, os tribunais e Juízes Militares, com competência para processar e julgar crimes militares definidos em lei.

Nos termos da lei de organização da justiça militar da união (Lei nº 8.457/92), ainda compõem a sua estrutura os conselhos de justiça e as auditorias de correição.

A última instância da justiça militar é formada por quinze ministros vitalícios, nomeados pelo Presidente da República, sendo três dentre oficiais-generais da Marinha, quatro dentre oficiais-generais do Exercito e três dentre oficiais-generais da Aeronáutica

2.

Os outros cinco Ministros são civis, escolhidos pelo Presidente da República, dentre brasileiros maiores de trinta e cinco anos, sendo três dentre advogados de notório saber jurídico e conduta ilibada, com mais de dez anos de efetiva atividade profissional e dois escolhidos entre membros do Ministério Público e juízes auditores.

Observa-se que a composição do Superior Tribunal Militar caracteriza-se pela sua formação em “escabinato” (mescla entre ministros civis e militares), permitindo que os militares sejam julgados por seus pares.

Nota-se, ainda, que os ministros militares devem ser brasileiros natos, por serem oficiais das forças armados.

Sobre esse assunto leciona Paulo Adib Casseb

3, da seguinte maneira;

De acordo com o Art. 123, da CF, o Superior Tribunal Militar possui composição mista, com dez militares e cinco civis. É sempre bom lembrar que, à luz da Constituição de 1988, os ministros militares, por serem oficiais, serão necessariamente brasileiros natos, em razão do disposto no art. 12, § 3º, CF, mas os civis podem ser natos ou naturalizados, afinal o art. 123 prescreve, tão somente, que os ministros civis serão brasileiros. Ora, o termo brasileiro compreende um gênero, abrangendo natos e naturalizados. Como a Constituição não distinguiu, não cabe à lei tratar diferentemente natos e naturalizados, conforme vedação expressa no seu art. 12, § 2º.

Em primeira instancia a justiça militar

2 Art. 123 da Constituição Federal de 1988.

3 CASSEB, Paulo Adib et. al, Direito Militar, Doutrina e Aplica-

ções. RJ: Elsevier, 2011. p. 93.

compõe-se de auditorias militares, dividas em 12 circunscrições judiciárias militares, mais uma auditoria de correição.

Compete às auditorias, por meio de seus conselhos permanentes e especiais, processar e julgar crimes militares praticados pelos integrantes das forças armadas, bem como os civis quando incorrerem na pratica de alguma infração militar. v

Cabe aos conselhos permanente, formado pelo Juiz-Auditor, por 04 oficiais militares, por um membro do ministério público e por um membro da defesa, processar e julgar militares que não sejam oficiais, pela pratica de crimes definidos na legislação militar.

Aos conselhos especiais, constituídos por juiz-auditor, quatro juízes-militares, pelos membros do ministério público militar e pela defesa, compete processar e julgar oficiais, com exceção dos oficiais-generais, cuja competência cabe ao Superior Tribunal Militar.

Quanto à Auditória de correição, presidida por juiz-auditor corregedor, com jurisdição em todo o território nacional, as atribuições são de fiscalização e orientação judiciária administrativa da justiça militar.

2. Direito Penal Militar

O conceito de Direito Penal Comum e Direito Penal Militar são muito próximos, chegam a se assemelhar em alguns pontos. Ambos os ramos de direito público são compostas por um conjunto de princípios, regras e leis destinadas a definir fatos criminosos e aplicar as devidas sanções penais quando as suas normas forem ultrajadas.

Os doutrinadores Robson Coimbra e Marcello Streifinger

4 define o Direito Penal Militar

como:

O conjunto de normas jurídicas que têm por objeto a determinação de infrações penais, com suas consequentes medidas coercitivas em face da violação, e ainda, pela garantia dos bens juridicamente tutelados, mormente a regularidade de ação das forças militares, proteger a ordem jurídica militar, fomentando o salutar desenvolver das missões precípuas atribuídas ás Forças Armadas e às Forças Auxiliares.

Denota-se, que o Direito Penal Militar, assim como o Direito Penal Comum, guardam semelhanças, uma vez que protegem bens jurídicos de salutar importância na sua respectiva área de proteção.

Contudo, a primordial diferença entre esses ramos da justiça consiste na natureza dos bens jurídicos protegidos. Como se destacará, há bens jurídicos, quando violados, que somente ganham guarita no Direito Penal Militar.

4 NEVES, STREIFINGER. Cicero Robson Coimbra. Marcello.

Manual de direito penal militar. 2 ed. São Paulo; Saraiva, 2012. P 91.

2.1. Crime Militar.

Quanto à definição de crimes militares, estabeleceu há uma classificação em razão da matéria; (ratione materiae) da pessoa (ratione personae); do lugar (ratione loci); do tempo (ratione temporis) e da lei (ratione legis).

Nos termos da legislação castrense são considerados crimes militares, em tempo de paz, as hipóteses definidas no art. 9º, incisos I, II e III, com suas respectivas alíneas. Portanto, o Código Penal Militar, se vale do critério em razão da lei (ratione legis), para definir o que seria um crime militar.

Urge salientar, que os demais critérios poderão estar presentes, concomitantemente, com o critério ratione legis, em razão da lei.

Nessa esteira, para definir um crime militar, submetendo à justiça castrense, se faz necessário analisar, simultânea, a norma violada, tipificada como crime no Código Penal Militar, (ratione legis), com umas das hipóteses do Art. 9º, incisos I, II e III.

Ricardo Henrique5, citado por Célio Lobão,

definir crime militar como;

A infração penal prevista na lei penal militar que lesiona bens ou interesses vinculados à destinação constitucional das instituições militares, às suas atribuições legais, ao seu fundamento, à sua própria existência, e no aspecto particular da disciplina, da hierarquia, da proteção à autoridade militar e no serviço militar.

Em miúdos, trançando um conceito objetivo, considera-se crime militar aquela conduta que o Código Penal Militar prevê como crime e se enquadra em alguma previsão do art 9ª do Código Penal Militar.

Os crimes militares, também, são classificados em crimes propriamente militares e impropriamente militares. A distinção entre essas duas categorias de crimes militares, pode-se afirmar que ocorre em razão da alocação da norma.

São considerados crimes propriamente militar aqueles previstos, exclusivamente, no Código Penal Militar. Por seu turno, são denominados crimes impropriamente militares aqueles previstos tanto no Código Penal Militar, como no Código Penal Comum.

Quanto à primeira categoria não há maiores dúvidas, uma vez que são crimes definidos somente no Código Penal Militar, sendo rotulados pela doutrina como crimes puramente militares.

Oportuno destacar, que a maioria dos crimes puramente militares são praticados por militar, salvo algumas exceções, dentre elas o

5 GIULIANI, Ricardo Henrique Alves. Direito Penal Militar. Porto

Alegre; Verbo Jurídico. 2009. p. 34.

crime de insubmissão, (Art. 183 do CPM), a despeito de encontrar definição unicamente no Código Penal Militar, pode ser praticado por civil.

3. O Princípio da Insignificância e a Análise da Tipicidade Penal

Para melhor compreensão do Princípio da Insignificância, se faz necessário, primeiramente, abordar, de uma maneira mais detalhada a tipicidade penal.

Abordando a tipicidade formal e material, elementos que compõem o fato típico, se consegue visualizar em qual momento o princípio da Insignificância incide na estrutura do crime.

A tipicidade formal significa o encaixe perfeito da norma abstrata, criada pelo legislador a conduta praticada pelo agente.

Rogerio Greco6 cita, a fim de elucidar a

tipicidade formal, o seguinte exemplo:

Figurativamente, poderíamos exemplificar a tipicidade formal valendo-nos daqueles brinquedos educativos que têm por finalidade ativar a coordenação motora das crianças. Para essas crianças, haveria “tipicidade” quando conseguissem colocar a figura do retângulo no lugar que lhe fora reservado no tabuleiro, da mesma forma sucedendo com a esfera, a estrela e o triângulo. Somente quando a figura móvel se adaptar ao local a ela destinado no tabuleiro é que se pode falar em tipicidade formal; caso contrario não.

O conceito de Tipicidade segundo defende Fernando Capez

7:

É a subsunção, justaposição, enquadramento, amoldamento ou integral correspondência de uma conduta praticada no mundo real ao modelo descritivo constante da lei (tipo lega). Para que a conduta humana seja considerada crime, é necessário que se ajuste a um tipo legal. Temos, pois, de um lado, uma conduta da vida real e, de outro, o tipo legal de crime constante da lei penal. A tipicidade consiste na correspondência entre ambos.

Contudo, apenas a respectiva moldagem da norma abstrata, prevista na lei, ao comportamento do agente não é suficiente para ocasionar o surgimento da tipicidade penal, de modo a implicar a atuação do Direito Penal.

Além da tipicidade formal, é imprescindível verificar, para que se possa falar em tipicidade penal, a caracterização da tipicidade material.

A tipicidade material consiste em analisar se a violação da normal, além de ocasionar a tipicidade formal, fora capaz de causar lesão ou perigo de lesão aos bens juridicamente protegidos pela norma.

6 GRECO, Rogério. Curso de Direito Penal, Parte Geral. 11.

Ed. Rio de Janeiro: Impetus, 2009, p. 158 7 CAPEZ, Fernando. Curso de Direito Penal, volume 01, parte

geral: 16. Ed. São Paulo: Saraiva. 2012. p. 531.

Rogério Greco8, analisando a tipicidade

destaca a necessidade da soma da tipicidade formal e material da seguinte maneira:

para que se possa falar em tipicidade penal é preciso haver a fusão da tipicidade formal ou legal com a tipicidade conglobante (que é formada pela antinormatividade e pela tipicidade material). Só assim o fato poderá ser considerado penalmente típico.

Com base nessa analise, Rogério Greco9, destaca que:

se não há tipicidade material, não há tipicidade conglobante; por conseguinte, se não há tipicidade pena, não haverá fato típico; e como consequência lógica, se não há fato típico, não haverá crime.

Portanto, especificamente, na tipicidade material é que se afere se houve dano significativo ao bem jurídico protegido pela norma, de modo a aplicar o Princípio da Insignificância.

4. O Princípio da Subsidiariedade da Fragmentariedade e da Mínima Intervenção do Direito Penal.

O legislador, com o intuito de abarcar o maior número possível de condutas humanas, criou tipos penais amplos, permitindo, com isso, que todo comportamento humano, que se amoldasse aos tipos penais abstratos, fosse considerado formalmente típico.

Nessa acepção, a adequação formal às normais penais seria o necessário para mover a máquina pública, com todo o seu aparato e punir condutas causadoras de mínima ou nenhuma lesão aos bens jurídicos tutelados pela norma penal.

Dito em outras palavras, para a configuração do crime, bastaria uma adequação entre os fatos praticados pelo agente e o tipo penal elaborado pelo legislador.

Sobre o tema em testilha, segundo leciona o saudoso Luiz Silva

10;

O legislador penal, em sua função legiferante, descreve abstratamente a conduta típica, procurando colocar em seu arcabouço o maior número possível de atos humanos.

Assevera-se, que a amplitude e alcance das normas penais não constitui uma falha do legislador ao criar as normas penais. Sua intenção fora proteger o bem jurídico de uma maneira ampla, uma vez que, seria impossível para ele descer a mínimos detalhes, abordando todos os atos capazes de lesionar o bem jurídico visado pelo Direito Penal.

8GRECO, Rogério. Curso de Direito Penal, Parte Geral. 11. Ed.

Rio de Janeiro: Impetus, 2009, p.162. 9GRECO, Rogério. Curso de Direito Penal, Parte Geral. 11. Ed.

Rio de Janeiro: Impetus, 2009. p. 66 10

SILVA, Ivan Luiz da. Princípio da Insignificância no direito

penal: 1 ed. Curitiba: Juruá, 2005, p. 77

Aliás, caberá ao interprete da norma penal, guiado pelo princípio da mínima intervenção do Estado, verificar se a conduta praticada tem o condão e a força necessária para ferir materialmente o bem almejado pelo legislador no momento da criação da norma.

Assim, o Direito Penal, diante do seu caráter fragmentário e subsidiário, os quais são vetores imprescindíveis à análise do princípio da insignificância, que decorre do da intervenção mínima, deve intervir apenas quando houver violação material aos bens juridicamente relevantes e visados pelo legislador.

Ademais, com base no princípio subsidiariedade, o legislador penal somente criminaliza aqueles fatos que os demais ramos do direito não conseguiram proteger.

Significa dizer que, sua atuação é mais restrita e imprescindível aos bens e interesses de maior relevância para sociedade. Aliás, a sua intervenção deve ser mínima, em fatos e circunstância que dispensam o rigor das normas penais.

A propósito, o estudioso Alberto Jorge Correia de Barros Lima

11 preceitua que:

A intervenção mínima é decorrente do principio constitucional expresso da dignidade humana (CF, art. 1º, III) e da determinação impositiva do Art. 3º, IV, da Constituição Federal, concernente à efetivação do bem de todos por meio da obrigatória ação dos Poderes Públicos. Em um Estado Democrático de Direito, que tem como alicerce a Dignidade Humana e como objetivo o bem de todos, não se podem permitir criminalização de comportamentos arbitrariamente, ao livre talante de quem que seja, ainda que em nome de uma suposta maioria e de suposto interesses emergenciais. Ademais, por imperativo, direitos fundamentais expressamente garantidos pelo art. 5º, caput, da Constituição Federal, somente podem ser privados ou restritos se estritamente necessários para a tutela de direitos de fundamental importância.

Sobre a origem da intervenção mínima Cleber Masson

12, destaca;

No campo penal, o princípio da reserva legal não basta para salvaguardar o indivíduo. O Estado, respeitada a previa legalidade dos delitos e das penas, pode criar tipos penais iníquos e instituir penas vexatórias à dignidade da pessoa humana. Para enfrentar esse problema, estatuiu a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, de 1789, em seu art. 8º, que a lei somente deve prever as penas estritamente necessárias. Surgia o princípio da intervenção mínima ou da necessidade, afirmando ser legitima a intervenção penal apenas quando a criminalização de um fato se constitui meio indispensável para a proteção de

11

LIMA, Alberto Jorge C. de Barros. Direto penal constitucional; a imposição dos princípios constitucionais penais. São Paulo; Saraiva, 2012. p.136. 12

MASSON, Cleber. Direito Penal Esquematizado – Parte Geral – Vol. 1. 8ª ed. rev. Atual. E ampl. Rio de Janeiro: Foren-se; São Paulo: Método, 2014, p.314.

determinado bem ou interesse, não podendo ser tutelado por outros ramos do ordenamento jurídico.

Ainda, sobre a intervenção mínima, André Estefam

13, aborda que;

A intervenção mínima surgiu com a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, como modo de garantir que a intervenção estatal no plano individual deva se dar apenas quando estritamente necessário. No Brasil, deriva do princípio da dignidade da pessoa humana e do fato de o art. 5º, caput, da CF declarar a inviolabilidade da liberdade, da vida, da segurança e da proporcionalidade.

Quanto ao princípio da subsidiariedade, observa-se que a interferência do Direito Penal, somente, ocorrerá quando os demais ramos do Direito e as outras ferramentas administrativas do Estado se mostrarem insuficientes na proteção dos bens juridicamente tutelados. Como bem destaca Cleber Masson

14;

Em outras palavras, o Direito Penal funciona como um executor de reserva, entrando em cena somente quando outros meios estatais de proteção mais brandos, e, portanto, menos invasivos da liberdade individual não forem suficientes para a proteção do bem jurídico tutelado. Caso não seja necessário dele lançar mão, ficará de prontidão, aguardando ser chamado pelo operador do Direito para, ai sim, enfrentar uma conduta que coloca em risco a estrutura da sociedade.

Portanto, nem toda conduta, aparentemente ilícita, importará na atuação do Direito Penal para reprimi-la. Apenas comportamentos que atentam, significativamente, contra bens e valores fundamentais ao regular funcionamento do Estado serão o objeto de sua proteção.

Com relação ao princípio da fragmentariedade o doutrinador Andre Estefam

15,

sustenta que:

Trata-se, na verdade, de uma característica do direito penal, mencionada por alguns autores também sob a forma de principio, estabelecendo que as normas penais somente devem-se ocupar de punir uma pequena parcela, um pequeno fragmento dos atos ilícitos, justamente aquelas condutas que violem de forma mais grave os bens jurídicos mais importantes.

Nessa esteira, conforme abordado, com o posicionamento dos saudosos doutrinadores, lastreados pelo princípio da intervenção mínima do Estado, somente em ultima hipótese (última ratio), deve Estado recorrer ao direito Penal para solucionar um conflito de interesse ou resguardar bens juridicamente relevantes para a sociedade.

Destaca-se, com supedâneo no principio da

13

ESTEFAM, André. Direito Penal, 1; parte geral. 3ª. Ed. São Paulo; Saraiva, 2013, p. 384. 14

MASSON, Cleber. Direito Penal Esquematizado – Parte Geral – Vol. 1. 8ª ed. rev. Atual. E ampl. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2014, p.323. 15

ESTEFAM, André. Direito Penal, 1; parte geral. 3ª. Ed. São Paulo; Saraiva, 2013, p.385.

subsidiariedade, que o Direito Penal somente deve atuar quando todos os outros ramos do direito forem exauridos, e se mostrarem insuficientes na proteção dos bens juridicamente protegido pela norma.

Dessa forma, entende-se que o Direito Penal não deve insurgir contra todo e qualquer relação, principalmente aquelas de ínfima lesão a bens juridicamente tutelados.

Por essa razão, torna-se vital uma modulação entre a severidade da conduta causada ao bem, e a forte intervenção do Direito Penal.

5. Princípio da Insignificância

A origem do Princípio da Insignificância tem algumas discussões, em razão das considerações de Claus Roxin terem sido desenvolvidos sobre a concepção da máxima latina minimis non curat praetor, brocardo romanístico, segundo ensina Ivan Luiz da Silva

16, “onde o praetor, regra geral,

não se ocupava das causas ou delitos de bagatela, aplicando o brocardo; mínima non curat praetor”.

O doutrinador Ivan Luiz da Silva17

delineado sobre a origem desse princípio, destaca que;

[...] Não obstante a formulação contemporânea do Princípio da Insignificância, não há como se ocultar que sua origem se encontra no antigo brocardo romanístico mínima non curat praetor, ou de minimis non curat praetor ou, ainda, de minimis praetor non curat, como aparece mencionado em numerosos autores que desde o século XIX o invocam e pedem sua restauração [....].

Não obstante esse apontamento, em relação à origem desse princípio, no qual o (praeto) um magistrado deveria desprezar casos insignificantes para cuidar das questões realmente inadiáveis, (minimis non curat praetor), foi o jurista alemão, no ano de 1964, responsável em desenvolver tal princípio.

Ainda, quanto à origem Principio da Insignificância, Cleber Masson

18 faz os seguintes

apontamentos;

O principio da insignificância ou da criminalidade de bagatela surgiu no Direito Civil, derivado do brocardo de minimus non curat praetor. Em outras palavras, o Direito Penal não deve se ocupar de assuntos irrelevantes, incapazes de lesar o bem jurídico legalmente tutelado. Na década de 70 do século passado, foi incorporado ao Direito Penal, pelos estudos de Claus Roxin. Esse princípio, calcado em valores de politica criminal, funciona como causa de exclusão da tipicidade,

16

I SILVA, Ivan Luiz da. Princípio da Insignificância no direito penal: 1 ed. Curitiba: Juruá, 2005, p. 87 e 88. 17

SILVA, Ivan Luiz da. Princípio da Insignificância no direito penal: 1 ed. Curitiba: Juruá, 2005, p. 87 18

MASSON, Cleber. Direito Penal Esquematizado – Parte

Geral – Vol. 1. 8ª ed. rev. Atual. E ampl. Rio de Janeiro: Foren-se; São Paulo: Método, 2014. p. 268, 269.

desempenhando uma interpretação restritiva do tipo penal.

Portanto, independentemente do seu nascedouro, o Principio da Insignificância, adotado pela jurisprudência brasileira, tornou-se uma excludente supralegal da tipicidade penal, afastando a tipicidade material e, por conseguinte, a própria tipicidade penal.

Claus Roxin desenvolveu o princípio da Insignificância, como uma importante ferramenta para solucionar e diminuir os impactos gerados pela abstratividade das normas penais.

Com base nesse princípio, condutas previstas no ordenamento jurídico não seriam consideradas típicas, analisando-se apenas o enquadramento da norma ao fato praticado. (tipicidade formal).

Como já abordado, para a configuração da tipicidade seria indispensável que, além da tipicidade formal, os bens juridicamente tutelados pela norma penal tenham sofrido algum perigo, de modo configurar um dano material (tipicidade material).

Assim, o Princípio da Insignificância consiste em afastar do âmbito do Direito Penal comportamentos que são incapazes de ultrajarem os bens jurídicos protegidos pela norma.

Destaca o doutrinador Ivan Luiz da Silva19

, em sua obra sobre o princípio da insignificância, que:

a teoria do Principio da Insignificância em matéria criminal, cujo objetivo é excluir do âmbito penal as condutas que não apresentam um grau de lesividade mínimo para a concreção do tipo legal, evitando, assim, que a sanção penal seja imensamente desproporcional ao dano causado pela ação formalmente típica.

Em relação à necessidade de lesão, com certa gravidade aos bens tutelados pela Direito Penal, de maneira a gerar uma tipicidade material, Damásio de Jesus

20, destaca que;

Ligados aos chamados “crimes de bagatela” (ou “delitos de lesão mínima”), recomenda que o Direito Penal, pela adequação típica, somente intervenha nos caos de lesão jurídica de certa gravidade, reconhecendo a atipicidade do fato nas hipóteses de perturbações jurídicas mais leves (pequeníssima relevância material). Esse princípio tem sido adotado pela nossa jurisprudência nos caso de furto de objeto material insignificante, lesão insignificante ao fisco, maus-tratos de importância mínima, descaminho de dano de pequena monta, lesão corporal de extrema singeleza etc.

Observa-se que a criação desse princípio fez com que a severidade do Direito Penal não recaia sobre condutas, apenas, formalmente típica

19

SILVA, Ivan Luiz da. Princípio da Insignificância no direito penal: 1 ed. Curitiba: Juruá, 2005, p. 78. 20

JESUS, Damásio. Direito Penal. vol 1; parte geral. 31. ed. – São Paulo; Saraiva. 2010. p. 52.

- subsunção entre o fato e a norma, mas naquelas que tenha lesionado materialmente o bem jurídico tutelado pela norma.

Com supedâneo no princípio da insignificância, tornou-se imprescindível, verificar na legislação brasileira, com base em posicionamento doutrinário, se a conduta violadora da norma penal teve a capacidade de lesar materialmente, de modo a causar lesão ou perigo de lesão aos bens resguardados pelas normas.

Com efeito, segundo destaca os ensinamentos de Cleber Masson

21,

“em síntese o princípio da insignificância tem força suficiente para descaracterizar, no plano material, a própria tipicidade penal [...]”.

A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal

22, a respeito do princípio sobre análise,

também, se posiciona no sentido de excluir o próprio fato típico, quando reconhecido a aplicação do princí pio da insignificância com o seguinte entendimento;

“o princípio da insignificância tem o sentido de excluir ou de afastar a própria tipicidade penal, ou seja, não considera o ato praticado como um crime, por isso, sua aplicação resulta na absolvição do réu e não apenas na diminuição e substituição da pena ou não sua não aplicação”.

Aliás, a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, ao aplicar o princípio da insignificância, afastando a reprimenda penal, traçou vetores ou requisitos de ordem objetiva que autorizam a aplicação sua aplicação.

O Supremo Tribunal Federal definiu que é indispensável que a conduta preencha os seguintes vetores: mínima ofensividade da conduta do agente; nenhuma periculosidade social da ação; reduzidíssimo grau de reprovabilidade do comportamento e a inexpressividade da lesão jurídica provada.

Destaca-se, que o valor da res furtiva, constitui, apenas, uns dos vetores traçados para aplicar o princípio da bagatela, razão pela qual, o princípio da insignificância não insurgira considerando tão-somente o valor do bem.

Nesse contexto, conclui-se que além da natureza ínfima do bem, o ato praticado deve ter preenchido todos os requisitos traçado pelo Supremo Tribunal Federal de forma cumulativa.

6. O Princípio da Insignificância nos crimes militares.

21

MASSON, Cleber. Direito Penal Esquematizado – Parte Geral – Vol. 1. 8ª ed. rev. Atual. E ampl. Rio de Janeiro: Foren-se; São Paulo: Método, 2014, p.274. 22

FEDERAL, Supremo Tribunal.

http://www.stf.jus.br/portal/glossario/verVerbete.asp?letra=P&id=491. Acesso em: 01 de Dez. 2014.

A hierarquia23

e hisciplina24

, pilares fundamentais ao regular funcionamento das instituições militares, são bens jurídicos consagrados pela Carta Magna de 1988, e principal objeto de proteção do Direito Penal Militar.

O bom funcionamento dessas instituições, baseadas na hierarquia e disciplina, constitui bem jurídico protegido por todas as normas penais militares.

Mesmo que de maneira indireta e independentemente da norma penal mediata, p. ex. patrimônio, a própria vida, os pilares da hierarquia e disciplina, sempre estarão sob o escopo do Direito Penal Militar.

Considerando essa natureza das normas militares, assevera-se que os tipos penais militares, em sua grande maioria, protegem concomitantemente dois bens jurídicos, quais sejam os bens mediatos, ex. patrimônio, integridade física, e o regular funcionamento das instituições militares, como bem imediatos.

Em uma primeira análise, constata-se que aplicação do Princípio da Insignificância, nesse universo, requer uma cautela superior àquelas utilizadas pelo direito penal comum, diante do relevante aspecto do bem jurídico-penal militar.

A respeito da proteção da regularidade das instituições Robson Coimbra Neves

25 assevera

que;

Ao menos ela, sempre estará no escopo de proteção dos tipos penais militares, levando-nos a concluir que em alguns casos teremos um bem jurídico composto como objeto de proteção do diploma penal castrense. É dizer, e. g., o tipo penal do Art. 205, sob a rubrica “homicídio”, tem como objetividade jurídica, em primeiro plano, a vida humana, porém não se afasta de uma tutela mediata da manutenção da regularidade das instituições militares. Tal conotação afasta, em vários casos, uma postura simplesmente minimalista, focando-se primeiro o bem jurídico imediato da norma.

Portando, segundo o doutrinador, no âmbito do Direito Penal Militar, qualquer que seja o bem principal protegido pela norma castrense, sempre ocorrerá, mesmo que de maneira indireta violação ao regular funcionamento das instituições

23

. A hierarquia militar é a ordenação da autoridade, em níveis diferentes, por posto e graduações. Art. 7º do Decreto nº 4.346/2002. Aprova o Regulamento Disciplinar do Exercito (R-4) e dá outras providencias. 24

A Disciplina militar é a rigorosa observância e o acatamento integral das leis, regulamentos, normas e disposições, tradu-zindo-se pelo perfeito cumprimento do dever por parte de todos e de cada um dos componentes do organismo militar. Art. 8º do Decreto nº 4.346/2002. Aprova o Regulamento Disciplinar do Exército (R-4) e dá outras providencias. 25

NEVES, STREIFINGER. Cicero Robson Coimbra. Marcello. Manual de direito penal militar. 2 ed. São Paulo; Saraiva, 2012. p 67.

militares.

Essa constatação ocasiona inúmeras discussões, fomentando a dúvida sobre a aplicabilidade do princípio da bagatela na seara castrense.

Parte da doutrina entende que adotá-lo, analisando somente o bem jurídico imediato resguardado pela norma, poderá comprometer regular o funcionamento das instituições militares.

Nos ensinamentos de Robson Coimbra e Marcello Streifinger

26, destacam que:

Tomando por base a complexidade do bem jurídico-penal militar, cumpre evidenciar que o interprete não pode ou não deve deixar-se inebriar por posturas minimalistas sem se acautelar de reconhecer a regularidade da instituição como um bem jurídico tutelado pela norma, ainda que seja de forma mediata.

Observar-se, que a discussão quanto à aplicação do princípio da insignificância nas infrações militares gira entorno das consequências que esse princípio pode gerar ao regular funcionamento das instituições militares, por ser um bem jurídico mediato contido nas normas militares.

Portanto é imprescindível analisar de uma maneira criteriosa, se a aplicação do princípio da insignificância pode incide em crimes militares.

Diante dessa constatação, corrente minoritária da doutrina advoga no sentido de que é inconcebível a aplicação do princípio da insignificância no âmbito do Direito Penal Militar.

Os apontamentos de Jorge César de Assis

27 definem com respeitável preponderância,

os motivos que guiam parte da doutrina, em entender pela inaplicabilidade desse princípio no direito castrense, ou quando, não raras às vezes, utiliza-lo hipóteses muitos restritas.

“A nosso sentir, e com a devida venia, o Supremo Tribunal Federal não vem atentando para os valores específicos vigentes na caserna – a disciplina e a hierarquia, cuja importância está estampada na própria Constituição Federal (art. 142). Também tem olvidado que ‘a sociedade militar é peculiar. Possui modus vivendi próprio. Esta peculiaridade exige sacrifícios extremos (a própria vida), que é mais do que simples risco de serviço das atividades tidas como penosas ou insalubres com um todo. Para condições tão especiais de trabalho, especial também será o regime disciplinar, de modo a conciliar tanto os interesses da instituição como os direitos dos que a ela se submetem. A rigidez do regime disciplinar e a severidade das sanções não podem ser confundidas como supressão de seus direitos’. Em

26

NEVES, STREIFINGER. Cicero Robson Coimbra. Marcello. Manual de direito penal militar. 2 ed. São Paulo; Saraiva, 2012. p. 68. 27

DE ASSIS, Jorge Cesar. Comentários ao Código Penal

Militar: comentários, doutrina, jurisprudência dos tribunais militares e tribunais superiores. 6ª ed. Curitiba: Juruá, 2008.

razão das omissões acima referidas, as decisões do STF não têm levado em conta que ‘qualquer que seja o bem jurídico evidentemente protegido pela norma, sempre haverá, de forma direta ou indireta, a tutela da regularidade das instituições militares, o que permite asseverar que, ao menos ela estará sempre no escopo de proteção dos tipos penais militares, levando-nos a concluir que em alguns casos teremos um bem jurídico composto como objeto de proteção do diploma penal castrense’. Daí o perigo de se tentar traduzir em conceitos jurídicos experiências que são vitais na caserna”. (destacou-se)

A respeito do tema, a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal vem oscilando em alguns julgados.

Em diversas oportunidades, a Corte Suprema não tem reconhecido a aplicabilidade do princípio da insignificância nos crimes militares. Isso decorre, na maioria das vezes, da ausência dos vetores, ou requisitos por ela traçado ou diante das características do bem jurídico-penal militar.

Em recente decisão, a Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal decidiu pela não incidência do princípio da Insignificância, no crime de furto pelas seguintes razões, expostas nos acórdãos nos expostos:

Ementa: HABEAS CORPUS. PENAL. TENTATIVA DE FURTO PRATICADA POR MILITAR EM AMBIENTE MILITAR. ART. 240, C/C ART. 30, II, DO CPM. EXTINÇÃO PREMATURA DA AÇÃO PENAL. AUSÊNCIA DE DOLO. QUESTÃO A SER DECIDIDA PELO JUIZ NATURAL DA CAUSA. INVIABILIDADE DE ANÁLISE DE FATOS E PROVAS NA VIA DO HABEAS CORPUS. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. NÃO INCIDÊNCIA. ORDEM DENEGADA. 1. A jurisprudência desta Corte firmou entendimento no sentido de que a extinção da ação penal, de forma prematura, pela via do habeas corpus, somente se dá em hipóteses excepcionais, nas quais seja patente (a) a atipicidade da conduta; (b) a ausência de indícios mínimos de autoria e materialidade delitivas; ou (c) a presença de alguma causa extintiva da punibilidade, o que não se verifica no caso. 2. Não há como avançar nas alegações postas na impetração, que, a rigor, pretende o julgamento antecipado da ação penal, o que configuraria distorção do modelo constitucional de competência. Caberá ao juízo natural da causa, com observância ao princípio do contraditório, proceder ao exame das provas colhidas e conferir a definição jurídica adequada para os fatos que restarem comprovados ou, se for o caso, absolver o paciente. Além disso, pelos elementos indiciários colhidos até então é inviável o deslinde da controvérsia relativa à tese de ausência do animus furandi, o que, de resto, demandaria o revolvimento de fatos e provas em sede de habeas corpus. 3. Segundo a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, para se caracterizar hipótese de aplicação do denominado “princípio da insignificância” e, assim, afastar a recriminação penal, é indispensável que a conduta do agente seja marcada por ofensividade mínima ao bem jurídico tutelado, reduzido grau de reprovabilidade, inexpressividade da lesão e nenhuma periculosidade social. 4. Nesse sentido, a aferição da insignificância como requisito negativo da tipicidade envolve um juízo de tipicidade conglobante, muito mais abrangente que a simples

expressão do resultado da conduta. Importa investigar o desvalor da ação criminosa em seu sentido amplo, de modo a impedir que, a pretexto da insignificância apenas do resultado material, acabe desvirtuado o objetivo a que visou o legislador quando formulou a tipificação legal. Assim, há de se considerar que “a insignificância só pode surgir à luz da finalidade geral que dá sentido à ordem normativa” (Zaffaroni), levando em conta também que o próprio legislador já considerou hipóteses de irrelevância penal, por ele erigidas, não para excluir a tipicidade, mas para mitigar a pena ou a persecução penal. 5. Num juízo de tipicidade conglobante, que envolve não apenas o resultado material da conduta, mas o seu significado social mais amplo, certamente não se pode admitir a aplicação do princípio da insignificância a determinados crimes, não obstante o inexpressivo dano patrimonial que deles tenha decorrido. 6. No caso, a ação da conduta supostamente praticada pelo paciente assume especial reprovabilidade, pois se aproveitou da confiança da vítima, que deixara seu bem na unidade militar, durante a noite, para locupletar-se da coisa que pertencia a um colega de farda. Nesse contexto, o crime de furto, embora crime militar impróprio, atinge, não só o patrimônio material da vítima, mas vulnera, sobretudo, a disciplina militar, traduzida na rigorosa observância e no acatamento integral das leis, regulamentos, normas e disposições que fundamentam o organismo militar (CF, art. 142). Precedentes. 7. Ordem denegada. (destacou-se).

28.

Nesse mesmo sentido, também, se posicionou a Primeira turma dessa Corte Maior, através do acórdão de relatoria do Ministro Marco Aurélio, ao não aplicar o princípio da insignificância, tomando por base os pilares da hierarquia e disciplina:

CRIME MILITAR – PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. O fato de ter-se em jogo, nos crimes militares, princípios próprios às Forças Armadas – hierarquia e disciplina – afasta a teoria da insignificância. Precedentes: Habeas Corpus nº 81.734-3/PR, relator Ministro Sydney Sanches, com acórdão publicado no Diário da Justiça de 7 de junho de 2002; e Habeas Corpus nº 91.759-3/MG, relator Ministro Menezes Direito, com acórdão veiculado no Diário da Justiça de 30 de novembro de 2007

29.

Nesse ínterim, a jurisprudência do Superior Tribunal Militar, também, reiteradamente vem decidindo, em casos concretos, pela inaplicabilidade do princípio desenvolvido pelo doutrinador alemão Claus Roxin, quando os princípios da hierarquia e disciplina são fragilizados pela infração penal.

Nesse sentido, segue o aresto do Superior Tribunal Militar sobre o tema em discussão:

28

FEDERAL, Supremo tribunal, Habeas Corpus nº 122537,

Relator (a): Min. TEORI ZAVASCKI, Segunda Turma, julgado em 02/09/2014, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-212 DIVULG 28-10-2014 PUBLIC 29-10-2014. 29

FEDERAL, Supremo Tribunal, Habeas Corpus nº 98253, Relator (a): Min. MARCO AURÉLIO, Primeira Turma, julgado em 02/12/2010, DJe-071 DIVULG 13-04-2011 PUBLIC 14-04-2011 EMENT VOL-02503-01 PP-00138 RTJ VOL-00224-01 PP-00460.

APELAÇÃO. MPM. FURTO PRIVILEGIADO (CPM, ART. 240, §§ 1º E 2º). MILITAR EM SERVIÇO. SUBTRAÇÃO DE NOTEBOOK PERTENCENTE A COLEGA DE FARDA NO INTERIOR DA OM. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. NÃO INCIDÊNCIA. DOLO. FURTO DE USO. INEXISTÊNCIA. DEVOLUÇÃO DA RES FURTIVA. ATENUAÇÃO. A incidência do Princípio da Insignificância esbarra na expressividade do valor da res furtiva, na ofensa aos princípios basilares da hierarquia e disciplina, além da quebra de confiança. Improcedência da tese de furto de uso, pois o próprio Acusado admitiu que havia subtraído o material, levando o superior hierárquico até o local onde estava escondido o bem. A devolução da res furtiva, antes de instauração da Ação Penal, não tem o condão de descaracterizar a prática delituosa, mas apenas de atenuá-la, sendo certo que a norma não faz restrição quanto ao tipo de devolução. Apelo parcialmente provido

30. (destacou-se).

PENAL. HABEAS CORPUS. USO INDEVIDO DE UNIFORME MILITAR (CPM, ART. 172). PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. INAPLICABILIDADE NO ÂMBITO DA JUSTIÇA MILITAR. O princípio da insignificância não é aplicável no âmbito da Justiça Militar, sob pena de afronta à autoridade, hierarquia e disciplina, bens jurídicos cuja preservação é importante para o regular funcionamento das instituições militares. (destacou-se). Precedente: HC 94.685, Pleno, Relatora a Ministra Ellen Gracie, DJe de 12/04/11. 2. In casu, o paciente, recruta, foi preso em flagrante trajando uniforme de cabo da Marinha. 3. O crime descrito no art. 172 do Código Penal Militar é de mera conduta e visa à tutela de bens jurídicos importantes e necessários ao regular funcionamento das instituições militares – autoridade, disciplina e hierarquia - pouco importando o cotejo da real intenção do agente com os requisitos de natureza objetiva subjacentes ao princípio da insignificância, a saber: (a) ofensividade mínima da conduta, (b) ausência de periculosidade social, reduzido grau de reprovabilidade do comportamento do agente e (c) a inexpressividade da lesão ao bem juridicamente protegido. 4. Ordem denegada, em consonância com o parecer ministerial.

Nessa esteira, verifica-se que para aplicação do principio da insignificância nos crimes militares, além do valor da res furtiva, a inviolabilidade à hierarquia e disciplina são condições essenciais para a sua incidência, de modo que o regular funcionamento das instituições seja preservado.

Apesar dessas valorosas considerações, da doutrina e da atual jurisprudência sobre o tema, há entendimentos contrários reconhecendo a aplicabilidade do princípio da insignificância no Direito Penal Militar.

O próprio Supremo Tribunal Federal, em outras ocasiões, reconheceu a aplicação do desse princípio nas infrações de furto, peculato e abandono de posto, ficando os arestos exarados da seguinte maneira:

30

MILITAR, Superior Tribunal. Decisão majoritária. Proc: AP –

APELAÇÃO. Ministro Relator Jose Barroso Filho. Num:000074-02.2013.7.03.0203 UF: RS Decisão: 04/09/2014 Cód. 50.

RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. PENAL MILITAR. PROCESSUAL PENAL MILITAR. FURTO. INEXISTÊNCIA DE LESÃO A BEM JURIDICAMENTE PROTEGIDO. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. AUSÊNCIA DE JUSTA CAUSA PARA A PROPOSITURA DA AÇÃO PENAL MILITAR. 1. Os bens subtraídos pelo Paciente não resultaram em dano ou perigo concreto relevante, de modo a lesionar ou colocar em perigo o bem jurídico reclamado pelo princípio da ofensividade. Tal fato não tem importância relevante na seara penal, pois, apesar de haver lesão a bem juridicamente tutelado pela norma penal, incide, na espécie, o princípio da insignificância, que reduz o âmbito de proibição aparente da tipicidade legal e, por conseqüência, torna atípico o fato denunciado. É manifesta a ausência de justa causa para a propositura da ação penal contra o ora Recorrente. Não há se subestimar a natureza subsidiária, fragmentária do Direito Penal, que só deve ser acionado quando os outros ramos do direito não sejam suficientes para a proteção dos bens jurídicos envolvidos. 2. Recurso provido.. (destacou-se)

31.

Nota-se, do paradigma acima exposto, que os mesmos princípios do Direito Penal Comum, são perfeitamente aplicados pela corte maior. Isso demonstra que a singularidade das normas militares não constitui óbice à aplicação do princípio da insignificância.

Em outros dois julgados, o Supremo Tribunal Federal reconheceu a aplicação do princípio da insignificância no processo penal militar, destacando a desproporcionalidade que a reprimenda penal geraria a fatos sem relevância jurídica a norma penal militar.

HABEAS CORPUS. PECULATO PRATICADO POR MILITAR. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. APLICABILIDADE. CONSEQÜÊNCIAS DA AÇÃO PENAL DESPROPORCIONALIDADE.1. A circunstância de tratar-se de lesão patrimonial de pequena monta, que se convencionou chamar crime de bagatela, autoriza a aplicação do princípio da insignificância, ainda que se trate de crime militar. 2. Hipótese em que o paciente não devolveu à Unidade Militar um fogão avaliado em R$ 455,00 (quatrocentos e cinqüenta e cinco) reais. Relevante, ademais, a particularidade de ter sido aconselhado, pelo seu Comandante, a ficar com o fogão como forma de ressarcimento de benfeitorias que fizera no imóvel funcional. Da mesma forma, é significativo o fato de o valor correspondente ao bem ter sido recolhido ao erário. 3. A manutenção da ação penal gerará graves conseqüências ao paciente, entre elas a impossibilidade de ser promovido, traduzindo, no particular, desproporcionalidade entre a pretensão acusatória e os gravames dela decorrentes. Ordem concedida

32. ( destacou-se)

Constata-se do julgado, a seguir exposto, a postura do Supremo Tribunal Federal, em reconhecer a aplicabilidade do princípio sobre analise, apesar da pratica de um crime

31

FEDERAL. Supremo Tribunal. RECURSO EM HABEAS

CORPUS: RHC 89624 RS. Primeira Turma. Relatora: CÁR-MEN LÚCIA, DJU 07-12-2006. Acesso em 01. Dez. 2014. 32

FEDERAL, Supremo Tribunal. HABEAS CORPUS nº 87478

PA. Primeira Turma, Brasília. Relator: EROS GRAU: DJU 23-FEV. 2007. Acesso em 01. Dez. 2014.

propriamente militar, o qual repercute diretamente na regularidade das instituições militares, e nos princípios da hierarquia e hisciplina.

INFORMATIVO 489 - Crime Militar e Princípio da Insignificância - Por falta de justa causa, a Turma deferiu habeas corpus para trancar ação penal promovida contra militar acusado da suposta prática do delito de abandono de posto (CPM, art. 195). Tratava-se, na espécie, de writ impetrado pela Defensoria Pública da União em favor de cabo da marinha que, diante da necessidade de socorrer seu filho que fora internado, em caráter de urgência, para a retirada de rim, afastara-se por algumas horas de seu posto de serviço (vigiava bomba de gasolina fechada a cadeado). No caso, ante o reduzido grau de reprovabilidade da conduta e considerando seus motivos determinantes, aplicou-se o princípio da insignificância e entendeu-se configurada, ainda, causa excludente de ilicitude, qual seja, o estado de necessidade. Ademais, ressaltou-se a jurisprudência da Corte no sentido da aplicabilidade, ao processo penal militar, do aludido princípio da insignificância. Ordem concedida para determinar a extinção definitiva do procedimento penal instaurado contra o paciente, que tramita perante o Juízo da 4ª Auditoria Militar da 1ª Circunscrição Judiciária Militar do Rio de Janeiro. (HC 92910/RJ, Rel. Min. Celso de Mello, 20.11.2007.). (destacou-se).

Observa-se, dos dois julgados que o preenchimento dos vetores, bem com as consequências da severidade que as normas penais causariam ao caso julgado, onerando extremamente fatos irrelevantes ao bem jurídico-penal militar, permitiu a aplicação do princípio da insignificância.

Convergindo com os posicionamentos apresentados, nota-se que o princípio da insignificância, aplicado ao Direito Penal militar, vem regulado de maneira expressa nos crimes de lesão corporal e nos crimes patrimoniais (§1º Art. 240) quando o bem for de ínfimo valor.

O respeitado doutrinador Ronaldo João Roth33 defende;

A possibilidade de o Juiz desclassificar o fato para infração disciplinar também pode ocorrer nos crimes patrimoniais, quando a coisa for de pequeno valor (art.240,§ 1ª e art.250), de tal sorte que, se o CPM prevê expressamente em alguns tipos penais a insignificância, nada impede a sua aplicação nos outros delitos.

Importante observar que além dessa hipótese, a qual afasta do Código Penal Militar condutas sem potencial lesividade para mover a maquina penal, a exposições de Motivos, item 17 do Código Penal Militar, permite, também, que os delitos de lesão corporal, quando for de natureza levíssima, sejam desclassificados para uma infração meramente disciplinar.

Assim define o item 17 da Exposição de Motivos do Código Penal Militar34.

33

ROHT. Ronaldo João et. al, Direito Militar, Doutrina e Aplica-ções. RJ: Elsevier, 2011. 522. 34

CODIGO PENAL MILITAR. Exposição de Motivos.

“Entre os delitos de lesão corporal está a levíssima, a qual, segundo o ensinamento da vivencia militar, pode ser desclassificada pelo juiz para uma infração meramente disciplinar, evitando-se nesse caso o pesado encargo de um processo penal para um fato de tão pequena monta”.

Ainda nos ensinamentos de Ronaldo João Roth

35, o doutrinador aborda com preponderância

como fatos sem lesividade, poderia ser facilmente solucionados pela Administração Militar, destacando que;

“Revela a mens legis do Códex Penal Castrense que fatos de pequena monta não devem ocupar o Judiciário, podendo este remeter a apreciação do fato à Administração Militar, com maior adequação e vigor, pois a infração disciplinar não possui a possibilidade da suspensão condicional da pena e é menos suscetível à prescrição”.

Essa postura do Código Penal Militar, em que pese argumentos contrários, que essas previsões não seriam indícios do princípio da insignificância, denota a preocupação do legislador de 1969 em afastar da esfera penal mínima lesões, facilmente solucionadas no âmbito disciplinar militar.

Assim, essa possibilidade expressa, de desclassificação de um crime para uma infração disciplinar, previstas no Código Penal Militar, indica que na própria legislação castrense há resquícios, dos princípios fragmentariedade, da subsidiariedade e da mínima intervenção do Estado.

Esse entendimento, de certa maneira, fomenta a aplicação do princípio da insignificância no âmbito militar, uma vez que, se a própria norma penal reconhece o caráter insignificante de determinadas crimes, possibilitando desclassifica-la para uma infração administrativa, nada impede, analisando o caso concreto, considerar o crime como ínfimo, deixando a Administração Militar a incumbência de sanciona-lo adequadamente.

Urge salientar, que a Administração Militar por meio do seu rigoroso sistema de punições disciplinares, o qual prevê a penalidades de Advertência; repreensão; impedimento disciplinar; detenção disciplinar e até mesmo prisão disciplinar, na qual o infrator ficará encarcerado e submetido rigores de uma prisão, tem a capacidade de apreciar questões mínimas, sem a necessidade de intervenção do Direito Penal Militar.

Conclusão:

O Direito Penal Militar diferencia-se, em vários aspectos do Direito Penal Comum. Essa nuança do Direito Penal Militar, em relação ao Direito Penal Comum, geram algumas discussões, em particular se os princípios adotados nestes,

35

ROHT. Ronaldo João et. al, Direito Militar, Doutrina e Aplica-

ções. RJ: Elsevier, 2011. 522.

são também aplicáveis naqueles.

Surge então um caloroso debate, se o Princípio da Insignificância, rotineiramente adotado no Direito Penal Comum, teria aplicabilidade no Direito Penal Militar.

Verificou-se, que o principal entrave para aplicar o princípio da insignificância nos crimes militares seria a característica peculiar das normas que regem as instituições militares.

O fato do regular funcionamento das instituições militares, guiadas pelos princípios da hierarquia e disciplina, serem o escopo de proteção das normas penais militares, direciona a parte da doutrina e da jurisprudência a entenderem pela inaplicabilidade do princípio da insignificância nos crimes militares.

A despeito dos respeitosos entendimentos, contrários a aplicabilidade do princípio da insignificância nos crimes militares, não se pode negar que tal princípio tem plena aplicabilidade no universo militar.

Em que pese os saudosos argumentos, que a regularidade das instituições militares, baseadas na hierarquia e disciplina, estaria sendo vilipendiado caso o princípio da insignificância seja adotado na seara militar, não se pode negar que os princípios da subsidiariedade e da fragmentariedade estão presentes também no Direito Penal Militar.

Com base no princípio da fragmentariedade e da subsidiariedade, o Direito Penal Militar não deve ser preocupar com condutas que não causem lesão ou perigo de lesão aos bens resguardados pelos tipos militares.

A despeito da importância do bem jurídico militar, essa qualidade não obsta a aplicação do princípio da subsidiariedade.

O Direito Penal, mesmo sendo Militar, continua sendo a ultima ratio, a derradeira ferramenta militar, autuando, apenas, quando o demais meios disponíveis na seara militar se mostram ineficientes na tutela do bem jurídico.

Portanto, diante do posicionamento doutrinário, considerando as relevantes teses apresentadas, pode-se afirmar ser plenamente aplicável o princípio da insignificância nos crimes militares.

Agradecimentos:

Louvo, primeiramente, ao Senhor meu Deus por me conceder a força necessária, a determinação e a perseverança para terminar mais esta jornada na minha vida.

Dedico essa vitória a toda minha família, em especial a minha amada mãe e a minha namorada, que souberam administrar e suportar o peso da ausência e as renúncias que uma

graduação exige.

Agradeço aos meus amigos, que em inúmeras oportunidades me ajudaram, contribuindo para o êxito dessa vitória.

Agradeço ao meu orientador, professor Pedro, e a todos os docentes do Unicesp, que me

horaram com os seus conhecimentos, tendo em varias ocasiões a complacência, diante das inúmeras dificuldades e anseios, reconhecendo as limitações e exigências impostas por força da graduação.

Referências:

1- BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de Direito Penal. 17. Ed. Revista Ampl. e Atual. De acordo com a Lei n. 12.550: 2011.

2- GRECO, Rogério. Curso de Direito Penal, Parte Geral. 11. Ed. Rio de Janeiro: Impetus, 2009.

3- CAPEZ, Fernando. Curso de Direito Penal, volume 01, parte geral: 16. Ed. São Paulo: Saraiva. 2012.

4- DE ASSIS, Jorge Cesar. Comentários ao Código Penal Militar: comentários, doutrina, jurisprudência dos tribunais militares e tribunais superiores. 6ª ed. Curitiba: Juruá, 2008.

5- GIULIANI, Ricardo Henrique Alves. Direito Penal Militar. Porto Alegre; Verbo Jurídico. 2009

6- JESUS, Damásio. Direito Penal. vol. 1; parte geral. 31. ed. – São Paulo; Saraiva. 2010

7- LIMA, Alberto Jorge C. de Barros. Direto penal constitucional; a imposição dos princípios constitucionais penais. São Paulo; Saraiva, 2012.

8- MASSON, Cleber. Direito Penal Esquematizado – Parte Geral – Vol. 1. 8ª ed. rev. Atual. E ampl. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2014.

9- NEVES, Cicero Robson Coimbra STREIFINGER, Marcello. Manual de direito penal militar. 2 ed. São Paulo; Saraiva, 2012. p.68

10- ROHT. Ronaldo João etal, Direito Militar, Doutrina e Aplicações. RJ: Elsevier, 2011.522.

11- FEDERAL, Supremo tribunal, Habeas Corpus nº 122537, Segunda Turma. Relator (a): Min. TEORI ZAVASCKI, Brasília. DJU 28-10-2014. Disponível: < http://www.stf.jus.br/portal/jurisprudencia/listarJurisprudencia.asp?s1=%28DE+FURTO+PRATICADA+POR+

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12- FEDERAL, Supremo Tribunal, Habeas Corpus nº 98253, Primeira Turma Relator (a): Min. MARCO AURÉLIO, Brasília. DJU14-04-2011. Disponível em:< http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=AC&docID=622009 > Acesso em 01. Dez. 2014

13. FEDERAL. Supremo Tribunal. Recurso em Habeas Corpus: RHC 89624 RS. Primeira Turma. Relatora: CÁRMEN LÚCIA, DJU 07-12-2006. Disponível em < http://www.stf.jus.br/portal/jurisprudencia/pesquisarJurisprudencia.asp > Acesso em 01. Dez. 2014.

14- MILITAR, Superior Tribunal. AP – Apelação UF: RS. Proc: Num: 000074-02.2013.7.03.0203. Cód. 50 Ministro Relator Jose Barroso Filho. DJU 04/09/2014. Disponível em < http://www.stm.jus.br/servicos-stm/jurisprudencia-do-stm. Acesso em 15. Nov. 2014.

15- http://www.stf.jus.br/portal/glossario/verVerbete.asp?letra=P&id=491

16-http://www2.camara.leg.br/legin/fed/decret/1980-1987/decreto-88513-13-julho-1983-438402-publicacaooriginal-1-pe.html. Acesso em 01/12/2014.

17- http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8457.htm. Acesso em 01/12/2014.

18- http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/2002/D4346.htm. Acesso em 01/12/2014.