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Page 1: Artigo _ Planejamento Tributário (limites) 2

OS LIMITES DO PLANEJAMENTO TRIBUTÁRIO: PARÂMETROS, PERSPECTIVAS, PROPOSTAS E ESTUDO DE CASOS.

Filipe Augusto de Souza1

RESUMO: Busca-se, com este artigo, apontar perspectivas e propostas para distinção do planejamento tributário lícito (elisão) do planejamento tributário ilícito (evasão; sonegação). É realizada, assim, uma reflexão sobre a importância dos mecanismos de reação contra comportamentos abusivos; sofisticados; artificiosos. Abordar-se-á, ainda, a aplicação da perspectiva econômica e prevalência da substância sob a forma. Por fim, será realizada uma análise sistemática dos julgados proferidos pelo CARF (Conselho Administrativo de Recursos Fiscais).

PALAVRAS-CHAVE: Limites, Planejamento Tributário, Evasão, Elisão, Propostas, Perspectivas.

ABSTRACT: One search’s, with this article, point prospects and proposals for distinguishing legitimate tax planning (avoidance) of illegal tax planning (avoidance, evasion). It is performed thus a reflection on the importance of mechanisms of reaction against abuses; sophisticated, artful. It will address also the implementation of the economic outlook and prevalence of substance in the form. Finally, there will be a systematic analysis of trial rulings by CARF.

KEY WORDS: Limits, Tax Planning, Evasion, avoidance, Proposals, Perspectives.

SUMÁRIO: 1. Introdução. 2. Desenvolvimento. 2.1. Elisão, Evasão-sonegação e Elusão. 3. Formas de reação contra comportamentos abusivos. 3.1. Simulação. 3.2. Fraude à Lei. 3.3.Prevalência da substância sob a forma. 4. O art. 116, parágrafo único, do CTN. 5. Considerações finais. 6. Referências bibliográficas.

1 Advogado. Professor e Coordenador do Núcleo de Prática Jurídica da FASPI. Cursa o Programa de mestrado em Direito Público stricto sensu da PUC - Minas.

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1. INTRODUÇÃO

O presente artigo pretende traçar algumas perspectivas e parâmetros acerca

da divergência existente entre os limites do planejamento tributário. Essas

perspectivas e parâmetros não esgotarão a controvérsia, mas apenas fomentarão

novos debates sobre esse tema ainda repleto de questionamentos.

O planejamento tributário como atividade lícita (elisiva) constitui não apenas

um direito, mas um dever de garantir segurança jurídica2 na gestão das atividades

empresariais do sujeito passivo da obrigação tributária. Nesse sentido, o contribuinte

passa a ter um poder-dever de planejar e em contrapartida respeitar os limites que

possui de gerir suas atividades e seus negócios em busca da menor onerosidade

tributária possível, dentro da zona de licitude que o ordenamento jurídico lhe

assegura.

Destafeita será demonstrada a necessidade de uma gestão eficiente (lícita)

das atividades do contribuinte, isto é, a adoção da via negocial3menos onerosa.

Entretanto, noutros termos, a escolha tomada não pode ser abusiva “anormal”.

Segundo Sanches (2006) deve a escolha adotada primar pelo business purpose test

(teste do legítimo propósito negocial) 4.

Com razão adverte Sanches (2006, p.10) que o sujeito passivo (contribuinte)

“[...] sem uma gestão eficiente das suas relações tributárias, ficará impossibilitada de

competir em pé de igualdade com os seus concorrentes5”.

Demonstrar-se-á, ainda, a controvérsia existente entre (autonomia privada e

limites às escolhas do contribuinte6) no sentido de que a função do

aplicador/interprete “[...] consiste em saber – diante de determinada situação,

2 Alberto Xavier e BECKER defendem que no direito tributário deve-se prevalecer o princípio da tipicidade fechada, sendo que o Fisco não pode desconsiderar os negócios jurídicos formulados por meios lícitos “disponíveis”, sob pena de ferir o princípio da legalidade e segurança jurídica.3 Expressão utilizada pelo autor J.L. Saldanha Sanches.4 Importante destacar a aplicação do business pupuse test no caso Gregory v. Helvering. 5 Importantes as considerações trazidas acerca da necessidade do planejamento tributário lícito por Carol Goman apud Andre Mendes Moreira, senão vejamos: "Globalização é uma atitude – um modo de se pensar o mundo como um mercado único, ao invés de uma coleção de mercados nacionais (...). Globalização é uma estratégia de negócios – um plano para desenvolver e transferir inovações para subsidiárias ao redor do mundo, para competir e colaborar internacionalmente, e para gerenciar operações multinacionais coordenadas por uma missão global (...). Globalização é um desafio gerencial – um processo que inclui a montagem de equipes em todo o mundo, adaptação de produtos e serviços para diversas preferências nacionais, comunicação com uma força de trabalho multinacional, e desenvolvimento de estratégias de carreira com uma visão global. (MOREIRA apud CAROL )6 Marco Aurélio Greco adverte que o uso da liberdade individual deve ser conjugado com o efeito prático do negócio realizado, isto é “ [...] a intenção objetiva dos negócios, de caráter externo e manifestada pelos atos praticados a qual não se confunde com a intenção subjetiva do negócio (de caráter interno do agente)”. Cfr. GRECO, Marco Aurélio. Planejamento Tributário, Dialética, São Paulo: Dialética, 2008, p.119.

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operação concreta ou conjunto delas – se os efeitos jurídicos tributários que o

contribuinte pretende extrair são ou não oponíveis ao Fisco ”. (GRECO, 2008,

p.112) destaquei.

A temática tonar-se mais complicada, quando o contribuinte adota formas

jurídicas com alto grau de complexidade, que ofusque averiguar a real intenção do

contribuinte (mera evitação ou fraude fiscal) 7. Para Sanches (2006, p.26) “[...] a

partir de certo grau de complexidade, a fronteira entre a construção artificiosa e a

fraude esbate-se obrigatoriamente”. E prossegue: “[...] dolosa ou não dolosa, com

aparente fundamento legal ou sem ele - do imposto devido, as decisões do

contribuinte têm necessariamente de poder ser apreciadas pela Administração

Fiscal.” (SANCHES, 2006, p.26).

Verifica-se que durante vários anos, tonificavam-se apenas dois critérios para

distinção da elisão-lícita da evasão-ilícita. Primeiro, o critério cronológico8 “[...] no

sentido de que os atos do contribuinte que implicasse a redução da carga tributária

deveriam ser realizados antes da ocorrência do fato gerador [...]. O segundo, a

ilicitude “ no sentido de que o efeito deveria resultar de negócios jurídico lícitos”.

(GRECO, 2008, p.113). No entanto, ainda conforme Greco (2008) subentendido a

este modelo estava também o requisito de que as condutas não poderiam ser

simuladas, sendo que “ [...] a existência de simulação contaminaria o caso e retiraria

a proteção jurídica aos efeitos buscados, que decorreria do ordenamento não fora

7 Esta verificação conforme será abordado adiante será imprescindível para o Fisco aplicar a “multa agravada. Senão vejamos a posição do CARF:Ementa PIS – DECADÊNCIA – Inaplicável a regra disposta no parágrafo 4º., art. 150, do CTN, nos casos da ocorrência de dolo, fraude ou simulação; situação em que o termo inicial da contagem do prazo decadencial dá com base no inciso I, artigo 173, do mesmo diploma legal (CTN). PIS – FALTA DE APRESENTAÇÃO DE DOCUMENTOS E LIVROS FISCAIS – BASE DE CÁLCULO – Na ausência absoluta de livros fiscais e documentos que serviriam para apuração da base de cálculo do tributo, é licito ao fisco, por intermédio de convênio de mútua cooperação, em conformidade com o art. 199 do CTN, solicitar informações ao fisco estadual para conhecer a receita de vendas do contribuinte. MULTA AGRAVADA – Restando provado nos autos o intuito doloso do contribuinte, tentando com isso escusar-se ao pagamento do tributo devido, cabível é o agravamento da multa de ofício. Recurso Voluntário Negado. (Nº Recurso: 142304, Número do Processo: 10120.005936/2003-75 Turma 1ª Câmara Turma: 1ª Câmara, disponível em http://carf.fazenda.gov.br/sincon/public/pages/ConsultarJurisprudenci. jsf).Destaquei.8 Em posição igual defende SACHA CALMON “ [...] Na evasão ilícita os meios são sempre ilícitos (haverá fraude ou simulação de fato, documento ou ato jurídico. Quando mais de um agente participar dar-se-á o conluio). Na elisão os meios são sempre lícitos porque não vedados pelo legislador; (b) também, o momento da utilização desses meios. Na evasão ilícita a distorção da realidade ocorre no momento em que ocorre o fato jurígeno-tributário (fato gerador) ou após sua ocorrência. Na elisão, a utilização dos meios ocorre antes da realização do fato jurígeno-tributário, ou como aventa Sampaio Dória, antes que se exteriorize a hipótese de incidência tributária, pois, opcionalmente, o negócio revestirá a forma jurídica alternativa não descrita na lei como pressuposto de incidência ou pelo menos revestirá a forma menos onerosa. (COÊLHO, Sacha Calmon Navarro, p. 174).

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esta patologia do negócio jurídico”. (GRECO, 2008, p.113).

Entretanto, conforme será demonstrado ao longo desta pesquisa, a

Administração Fiscal, não deve pautar exclusivamente pelos critérios cronológico e

ilícito, devendo utilizar-se de outros parâmetros: perspectiva econômica, simulação,

fraude à lei, norma geral anti-abuso;substância econômica, business purpose test –

a fim de desconsiderar negócios jurídicos artificiosos “engenhosos”. (SANCHES,

2006).

Em suma, o grande entrave seria distinguir as condutas adotadas pelo

contribuinte (condutas elisivas ou evasivas) e em quais situações a opção do

contribuinte está protegida de desconsideração pelo Fisco. E segundo Greco (2008)

essa verificação da eficácia das condutas desencadeadas pelo sujeito passivo, deve

ser realizada, mediante a averiguação “caso a caso” da “via” adotada.

Enfim, a problemática está em torno de saber se essa liberdade do

contribuinte justifica qualquer atuação artificiosa. Segundo Greco (2008, p.117) “ [...]

seja a liberdade de iniciativa (CF/88, artigo 1º , IV e artigo 170, caput), seja na livre

concorrência (artigo 170, IV) seja nas puras liberdades do artigo 5º, encontra-se na

liberdade de cada um organizar sua vida [...]”. Contudo, deve-se impor limites a

essas liberdades, desconstituindo os negócios jurídicos voltados a enganar o Fisco e

reduzir a carga fiscal.

A controvérsia é estritamente fática: O Fisco deve analisar (caso a caso) a

operação adotada pelo contribuinte, e constatar se existe montagem (formulação

engenhosa) que o ordenamento jurídico impõe limites (restringe).

O estudo buscará, ainda, trazer as novas perspectivas do CARF (Conselho

Administrativo de Recursos Fiscais) e STA (Superior Tribunal Administrativo

português). Cabe destacar que não é nosso objetivo cercar todas as formas de

evitação fiscal abusiva “redução indevida dos encargos tributários”, eis que isso

extrapolaria a finalidade deste artigo, ademais, seria necessário um melhor

aprofundamento.

Após os contornos iniciais desenvolvidos, passa-se pelo estudo sistemático

dos conceitos de elisão, evasão e elusão. Posteriormente, esclareceremos os

problemas dos mecanismos de reação contra comportamentos abusivos e algumas

perspectivas apontadas pelo direito português.

2. DESENVOLVIMENTO.

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2.1. ELISÃO, EVASÃO; SONEGAÇÃO, ELUSÃO.

 A classificação das condutas do contribuinte de evitar/reduzir a carga fiscal

sempre trouxe divergência na doutrina e jurisprudência. Trata-se de saber se a

conduta adotada pelo contribuinte é lícita (a conduta não é passível de

desconsideração pela Administração Fiscal) ou ilícita (passível de desconsideração

pela autoridade fiscal e frustrado o objetivo do planejamento). Entretanto, essa

aparente clareza, gera diversas divergências na doutrina e jurisprudência.

Nesse sentido, encarando a controvérsia, iniciemos pela definição pacífica de

que a evasão refere-se ao comportamento do contribuinte que realiza o fato gerador

da obrigação tributária e esquiva-se do pagamento do tributo (comportamento ilícito);

o contribuinte engana o Fisco e desrespeita os preceitos legais.

Nas palavras de Godoi (2007-b, p.237) não resta dúvida de que “[...] a evasão

tributária, quando acompanhada de simulação, ocultações, falsificações e outras

figuras dolosas, configura sonegação e por isso é castigada pelo direito penal9 de

diversos países”.

Diferentemente da evasão fiscal está o instituto da elisão tributária. Esse

comportamento trata-se das condutas lícitas/válidas10 realizadas pelo contribuinte,

anteriores à incidência tributária, que objetivam afastar a concretização da norma de

incidência (Lei), seja excluindo o contribuinte da norma de incidência ou reduzindo o

valor do tributo a ser pago (comportamento lícito; planejamento lícito11).

Exemplificando o tema Godoi (2007-b, p.237) destaca algumas situações de

elisão tributária: “[...] o contribuinte que deixa de investir suas economias na bolsa de

valores e passa a investir no mercado imobiliário para afastar a incidência de um

novo imposto sobre operações financeiras; ou o contribuinte que deixa de consumir

determinado produto [...]”.

Assim, como já referido, a elisão fiscal consiste no comportamento lícito,

voltado a evitar ou diminuir a incidência tributária. Quando o contribuinte emprega

meios indiretos para tanto, há, contudo, simulação. De fato, tal liberdade, não pode

9 Conforme a Lei Nº 8.137, de 27 De Dezembro de 1990. (Dos Crimes Contra a Ordem Tributária).10 Expressão utilizado pelo ilustre Marco Aurélio Greco.11 Cfr. Heleno Tôrres apud Marciano Seabra de Godoi (2007-b,p.242) .O conceito de elusão do autor é o seguinte: "elusão tributária consiste em [o contribuinte] usar de negócios jurídicos atípicos ou indiretos desprovidos de 'causa' ou organizados como simulação ou fraude à lei, com a finalidade de evitar a incidência de norma tributária impositiva [...]”.

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ser ao ponto de o contribuinte/planejador adotar condutas que objetivam a qualquer

custo reduzir o montante do tributo a ser pago.

Existem algumas condutas adotadas pelo contribuinte que não estão no

campo da elisão tributária e da evasão. Essas condutas, nomeadas de elusivas,

objetivam enganar o Fisco, distorcendo a realidade.

Importante são os ensinamentos de Godoi (2007-b, p. 238), os quais

apontam que:

Para distinguir e combater esse tipo de conduta, nos países da família romano-germânica o legislador tributário lança mão de institutos seculares como a fraude à lei (Alemanha, Holanda, Espanha) ou o abuso do direito (França). Já nos países anglo-saxões, são geralmente os tribunais que desenvolvem técnicas para conter aquelas práticas. Esse fenômeno, que não se confunde com a evasão, é conhecido como “tax avoidance” nos Estados Unidos e Grã-Bretanha, “elusione fiscale” na Itália, “elusión tributaria” na Espanha.

Em suma, quando mencionamos essas condutas que visam enganar,

estamos falando do instituto da elusão (elisão-artificiosa12). Trata-se das condutas

voltadas a esconder o real objetivo do planejador (reduzir a carga fiscal).

Segundo Godoi13 o comportamento adotado pelo contribuinte divide-se em:

Elisão, Evasão e Elusão, vejamos:

[...] dividem os comportamentos dos contribuintes que resistem aos tributos em três campos: elisão/economia de tributos (lícita, eficaz), evasão tributária (ilícita e sujeita a multas e sanções penais) e elusão tributária (ineficaz ou incapaz de atingir sua finalidade de economia fiscal). As condutas consideradas elusivas são identificadas e combatidas por diversos países do mundo mediante doutrinas criadas na prática dos tribunais (nos países anglo-saxões), ou mediante a aplicação de institutos seculares do direito civil (abuso do direito, fraude à lei) que passam a ser incorporados por normais gerais antiabuso ou antielusão promulgadas pelo Poder Legislativo. (GODOI, 2007-b, p.240).

Nessa ordem de idéias, existe uma pequena fronteira, separando os institutos

elisão e elusão-artificiosa. Segundo ponderação de Godoi (2007-b) essa zona de

sombria,14somente se justifica, pela existência do princípio segundo o qual o

contribuinte possui liberdade de optar pela via menos onerosa. E prossegue Godoi

12 Em posição distinta: Hugo de Brito Machado conceitua evasão com comportamento lícito do contribuinte. Já a elisão caracterizaria a utilização de formas ilegítimas para ladear “contornar” “reduzir” a carga fiscal. 13Em sentido contrário defende BECKER, Alfredo Augusto. Teoria Geral do Direito Tributário, São Paulo: Noesess, 2007, p.142-143 – enfatizando que só existem duas vias para o contribuinte: elisão (lícita) e o da evasão (ilícita). 14 Expressão utilizada pelo autor Marciano Seabra de Godoi.

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(2007-b, p.239) “[...] Ou seja, os agentes econômicos são livres para efetuarem o

chamado planejamento fiscal, cujo objetivo é encontrar formas de fazer negócio que

possam provocar o menor ônus tributário possível”.

Contudo, é necessário impor limites as “liberdades” adotadas pelo

contribuinte, sob pena de ferir o objetivo da lei (arrecadar/distribuir). É necessário,

assim, no exercício da fiscalidade (atuação do Fisco) desconsiderar planejamentos

desprovidos de propósito negocial “sem substância econômica”.

Marciano Seabra de Godoi destaca alguns parâmetros/propostas para conceituar a elusão tributária, senão vejamos:

[...] 1. o manifesto artificialismo das configurações ou formalizações jurídicas adotadas pelo contribuinte (abuso de forma, abuso das possibilidades de configuração que o direito positivo oferece, fraude à lei), 2. a completa inexistência de um motivo não-tributário que possa explicar ou justificar a escolha do contribuinte por aquelas formas jurídicas artificiosas e 3. a vulneração que seria promovida nos propósitos da lei e do sistema tributário, caso pudesse prevalecer o esquema montado pelo contribuinte. (GODOI, 2007-b, p.240).

Assim sendo, a elusão atrela-se, essencialmente, aos atos desencadeados

com o principal objetivo de driblar a norma de incidência tributária – uma conduta

essencialmente artificiosa (às escuras; voltada a esconder o real objetivo do

planejador).

Verifica-se que no Brasil, a corrente dominante na doutrina, somente adota

duas formas de ação do contribuinte: elisão-lícita e evasão-ilícita15. Nesse sentido,

esta corrente, considera que inexistindo simulação ou outras fraudes da espécie, a

conduta do contribuinte não será passível de desconsideração16.

Com efeito, essa corrente considera que não ocorrendo simulação ou outras

fraudes, a conduta do contribuinte será intocável, mesmo que “[...] o contribuinte

tenha adotado formas jurídicas manifestamente artificiosas para atingir resultados

práticos completamente distanciados daqueles para os quais as tais formas jurídicas

foram criadas pelo direito positivo”. (GODOI, 2007-b, p.242).

15 Nesse sentido, BECKER, Alfredo Augusto. Teoria Geral do Direito Tributário, São Paulo: Noeses, 2007, p.143.16 No Brasil esta corrente majoritária (Alberto Xavier) que consagra os princípios da “reserva absoluta de lei em sentido formal”, “tipicidade fechada” e “ proibição de tributar mediante analogia”, tornado desta forma inexeqüível e inconstitucional qualquer reação (abuso do direito ou a fraude à lei) conta operações de planejamento.Cfr. Godoi, Marciano Seabra de. Uma Proposta De Compreensão e Controle Dos Limites Da Elisão Fiscal No Direito Brasileiro. Estudo De Casos. In: YAMASHITA, Douglas (Org.). Planejamento tributário à luz da jurisprudência. São Paulo: LEX, 2007, p. 237-288.

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Outro ponto preocupante refere-se a essa posição majoritária da doutrina

brasileira, que considera inconstitucional qualquer reação contra operações de

planejamento tributário que não forem desconsideradas pelos institutos do abuso de

direito ou fraude à Lei. (GODOI, 2007-b).

Esclarecedores são os ensinamentos de Godoi (2007-b,p.242) criticando esse

engessamento que “[...] não aceita nem mesmo discutir as bases ou os termos

mediante os quais figuras como a fraude à lei e o abuso do direito”.

Ademais, a doutrina clássica afirma que não se pode desconsiderar valores

ditos supremos: segurança jurídica, tipicidade cerrada e aplicação literal17/mecânica

da lei.

Importante colacionar algumas conclusões do ilustre doutrinador Marco

Aurélio Greco, vejamos:

Em suma, não basta ser lícito, a licitude é preliminar. Além de ser lícito precisamos ser atendidos com outros requisitos para a operação ser aceitável na perspectiva da produção de efeitos perante o Fisco. O grande debate não é sobre legalidade ou ilegalidade, é sobre eficácia e ineficácia. [...]” “Não é possível responder em abstrato que determinada conduta está ou não protegida. A resposta dependerá das circunstâncias do caso concreto. (GRECO, 2008, p.124).

Os ultra-formalistas consideram, este deslocamento para o caso concreto,

uma “insegurança jurídica” e “subjetividade”. Segundo Greco (2008) dependendo

das circunstâncias os atos do contribuinte podem ser protegidos ou não pelo.

Por fim, é através dessa análise do caso concreto, que o Fisco consegue

desconsiderar atos artificiosos (elusivos) “desprovidos de qualquer substância

econômica e/ou propósito negocial”. Nesse ínterim, não há que falar em uma

17 Em posição contrária defende a seguinte ementa: RECURSO DE REVISTA - ISSQN – PROFISSIONAL AUTÔNOMO – BAIXA JUNTO AO CADASTRO MOBILIÁRIO MEDIANTE A COMUNICAÇÃO, FORA DO PRAZO REGULAMENTAR, DO ENCERRAMENTO DAS SUAS ATIVIDADES – PRESUNÇÃO DE OCORRÊNCIA DE FATOS GERADORES – PROVIMENTO DO RECURSO DE REVISTA – REFORMA DA DECISÃO RECORRIDA – CONFIRMAÇÃO DO ACÓRDÃO DIVERGENTE. O fato de o contribuinte não ter procedido à baixa no Cadastro Municipal, deixando de comunicar, no prazo legal, o encerramento de suas atividades, não autoriza o Fisco a cobrar imposto apenas com fundamento na presunção de ocorrência do fato gerador. Depreende-se dos artigos 113, § 1º, 114 e 142 do Código Tributário Nacional que é do agente fiscal o ônus de provar a ocorrência do fato gerador do ISSQN, para efeito de constituição do lançamento tributário, sendo fase integrante do procedimento a verificação de sua ocorrência. - Diante da ausência de comprovação da prestação de serviços, após a data em que o Recorrente alega ter encerrado as suas atividades como autônomo, mister o provimento do presente Recurso de Revista, para a reforma do Acórdão nº 7.344/3ª, confirmando-se, em consequência, a decisão consubstanciada no Acórdão nº 7.195/2ª, colacionado pelo Recorrente e determinante da divergência em questão. (Recurso de Revista nº 135. Processo nº 01.108963.03.73. Recorrente: Walter Antônio Godoi De Faria. Rel. Dr. Mauro Heleno Ladeira de Oliveira. Redator. Acórdão Nº 8.404/P, Junta de Recursos Fiscais da Prefeitura Municipal de Belo Horizonte).

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resposta pronta e acabada. O exame da validade e invalidade das condutas do

sujeito passivo será realizado no caso concreto.

3. FORMAS DE REAÇÃO CONTRA COMPORTAMENTOS ABUSIVOS.

Inicialmente é importante destacar que o Brasil tem buscado cada vez mais

diminuir as possibilidades de elisão fiscal, editando normas que proíbam ou

dificultem a economia de tributos. Por isso, é necessário impor parâmetros para

esses limites ao exercício do planejamento fiscal.

Entretanto, o aplicador/interprete da norma de incidência, não pode

considerar válido o planejamento voltado a contornar (burlar) os objetivos da lei

fiscal (arrecadar tributos e distribuir igualmente os encargos de acordo com

capacidade contributiva).

Importante as considerações trazidas pela lição de Heleno Tôrres:

[...] essas hipóteses (de planejamento tributário) prestam-se a usos indevidos, abusivos ou podem apresentar conteúdos ilícitos, mas isso não pode servir a qualquer tomada de posição generalizadora sobre a liceidade ou ilicitude destas. Toda generalização indutiva em matéria jurídica leva à imprecisão. (TÔRRES, 2001, p. 14).

Nessa perspectiva, buscar-se-á avaliar os limites que a lei coloca ao

planejamento tributário, bem como os parâmetros para desconsiderar

comportamentos que objetivem a redução indevida da carga tributária.

3.1. SIMULAÇÃO.

O instituto da simulação18 assume particular importância no direito tributário,

18 O conceito literal de simulação: Refere-se à falta de correspondência com a verdade; fingimento, disfarce, dissimulação. (Dicionário Houaiss).

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que se traduz na divergência dolosa entre a vontade real e a vontade declarada. Ou

seja, existe uma vontade real e uma vontade aparente (mentira).

O enfoque do tema cinge-se no exame da oponibilidade do Fisco perante

condutas simuladas do contribuinte (desprovidas de vontade real) e conseqüente

desconsideração dos negócios jurídicos “falsos”. Essa verificação (exame) é

realizada através do elemento subjetivo “vontade”. Ou seja: demonstrar a vontade

real de praticar o negócio jurídico. (GRECO, 2008).

Para Greco (2008) essa corrente (clássica) o importante é a existência de

duas vontades para comparar (aparente e real). Somente há simulação se houver

duas vontades diferentes. Desta perspectiva “[...] só há prova de simulação se

restar demonstrada existirem duas vontades, uma diferente da outra. Se existir uma

única vontade [...] não existe simulação. (GRECO, 2008, p.183).

Contudo, a vontade não deve ser o único parâmetro para aplicação da

simulação. É necessário verificar a causa do negócio jurídico (propósito negocial) e

examinar se o negócio é realmente simulado. Como bem ressaltado por Greco

(2008, p.183) “[...] Para saber se o negócio jurídico é simulado, temos que verificar

se há compatibilidade entre a sua causa e o próprio negócio celebrado”.

Todas essas considerações mostram que, o instituto da simulação exerce

papel importante na desconsideração de negócios jurídicos “falsos” (engenhosos).

Insta, ainda, lembrar que nossos julgadores, no exame dos planejamentos,

não utilizam os institutos da fraude à lei ou abuso de direito. A desconsideração dos

negócios jurídicos “falsos” é realizada pelos órgãos julgadores através do emprego

massivo da simulação. Nesse sentido, Godoi adverte “[...] os julgadores

normalmente não recorrem a conceitos como fraude à lei ou abuso do direito, e

tampouco se demoram na análise da norma do art.116, parágrafo único do CTN”.

(GODOI, 2007-a, p.278).

O STJ (Superior Tribunal de Justiça) aplica o instituto da simulação para

desconsiderar operações “falsas”:

EMENTA: PROCESSUAL CIVIL. OFENSA AO ART. 535 DO CPC NÃO CONFIGURADA. MULTA DO ART. 538, PARÁGRAFO ÚNICO, DO CPC. INAPLICABILIDADE. INCORPORAÇÃO. APROVEITAMENTO DE PREJUÍZOS. REDUÇÃO DA CSSL DEVIDA. SIMULAÇÃO. SÚMULA 7/STJ. INAPLICABILIDADE. SÚMULA 98/STJ. 1. Hipótese em que se discute compensação de prejuízos para fins de redução da Contribuição Social sobre Lucro Líquido - CSSL devida pela contribuinte. 2. A empresa Supremo Industrial e Comercial Ltda.

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formalmente incorporou Suprarroz S/A (posteriormente incorporada pela recorrente). Aquela acumulava prejuízos (era deficitária, segundo o TRF), enquanto esta era empresa financeiramente saudável. 3. O Tribunal de origem entendeu que houve simulação, pois, em realidade, foi a Suprarroz que incorporou a Supremo. A distinção é relevante, pois, neste caso (incorporação da Supremo pela Suprarroz), seria impossível a compensação de prejuízos realizada, nos termos do art. 33 do DL 2.341/1987. 4. A solução integral da lide, com fundamento suficiente, não caracteriza ofensa ao art. 535 do CPC.5. Não há controvérsia quanto à legislação federal. 6. A contribuinte concorda que a incorporadora não pode compensar prejuízos acumulados pela incorporada, para reduzir a base de cálculo da CSSL, nos termos do art. 33 do DL 2.341/1987. Defende que a empresa com prejuízos acumulados (Supremo) é, efetivamente, a incorporadora. 7. O Tribunal de origem, por seu turno, não afasta a possibilidade, em tese, de uma empresa deficitária incorporar entidade financeiramente sólida. Apenas, ao apreciar as peculiaridades do caso concreto, entendeu que isso não ocorreu. 8. Tampouco se discute que, em caso de simulação, "é nulo o negócio jurídico simulado, mas subsistirá o que se dissimulou, se válido for na substância e na forma" (art. 167, caput, do CC). 9. A regularidade formal da incorporação também é reconhecida pelo TRF. 10. A controvérsia é estritamente fática: a recorrente defende que houve, efetivamente, a incorporação da Suprarroz (empresa financeiramente sólida) pela Supremo (empresa deficitária); o TRF, entretanto, entendeu que houve simulação, pois, de fato, foi a Suprarroz que incorporou a Supremo. 11. Para chegar à conclusão de que houve simulação, o Tribunal de origem apreciou cuidadosa e aprofundadamente os balanços e demonstrativos de Supremo e Suprarroz, a configuração societária superveniente, a composição do conselho de administração e as operações comerciais realizadas pela empresa resultante da incorporação. Concluiu, peremptoriamente, pela inviabilidade econômica da operação simulada. 12. Rever esse entendimento exigiria a análise de todo o arcabouço fático apreciado pelo Tribunal de origem e adotado no acórdão recorrido, o que é inviável em Recurso Especial, nos termos da Súmula 7/STJ. 13. Aclaratórios opostos com o expresso intuito de prequestionamento não dão ensejo à aplicação da multa prevista no art. 538, parágrafo único, do CPC, que deve ser afastada (Súmula 98/STJ). 14. Recurso Especial parcialmente conhecido e, nessa parte, provido. (STJ, RESP Nº.: 946.707 - RS (2007/0092656-4), Rel. Min. Ministro Herman Benjamin. 25-9-2009).

Outro não é o entendimento do TRF 4º Região:

INCORPORAÇÃO. AUTUAÇÃO. ELISÃO E EVASÃO FISCAL. LIMITES. SIMULAÇÃO. EXIGIBILIDADE DO DÉBITO. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ.1. Dá-se a elisão fiscal quando, por meios lícitos e diretos o contribuinte planeja evitar ou minimizar a tributação. Esse planejamento se fundamenta na liberdade que possui de gerir suas atividades e seus negócios em busca da menor onerosidade tributária possível, dentro da zona de licitude que o ordenamento jurídico lhe assegura. 2. Tal liberdade é possível apenas anteriormente à ocorrência do fato gerador, pois, uma vez ocorrido este, surge a obrigação tributária. 3. A elisão tributária, todavia, não se confunde com a evasão fiscal, na qual o contribuinte utiliza meios ilícitos para reduzir a carga tributária após a ocorrência do fato gerador. 4. Admite-se a elisão fiscal quando não houver simulação do contribuinte. Contudo, quando o contribuinte lança mão de meios indiretos para tanto, há simulação. 5. Economicamente inviável a operação de incorporação procedida (da superavitária pela deficitária), é legal a autuação. 6. Tanto em razão social,

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como em estabelecimento, em funcionários e em conselho de administração, a situação final - após a incorporação - manteve as condições e a organização anterior da incorporada, restando demonstrado claramente que, de fato, esta "absorveu" a deficitária, e não o contrário, tendo-se formalizado o inverso apenas a fim de serem aproveitados os prejuízos fiscais da empresa deficitária, que não poderiam ter sido considerados caso tivesse sido ela a incorporada, e não a incorporadora, restando evidenciada, portanto, a simulação. 7. Não há fraude no caso: a incorporação não se deu mediante fraude ao fisco, já que na operação não se pretendeu enganar, ocultar, iludir, dificultando - ou mesmo tornando impossível - a atuação fiscal, já que houve ampla publicidade dos atos, inclusive com registro nos órgãos competentes. 8. Inviável economicamente a operação de incorporação procedida, tendo em vista que a aludida incorporadora existia apenas juridicamente, mas não mais economicamente, tendo servido apenas de "fachada" para a operação, a fim de serem aproveitados seus prejuízos fiscais - cujo aproveitamento a lei expressamente vedava. 9. Uma vez reconhecida a simulação deve o juiz fazer prevalecer as conseqüências do ato simulado - no caso, a incorporação da superavitária pela deficitária, conseqüentemente incidindo o tributo na forma do regulamento - não havendo falar em inexigibilidade do crédito fiscal. 10. Esta Turma tem-se orientado no sentido de estabelecer a condenação em verba honorária no patamar de 10% sobre o valor atribuído à causa, atualizado, salvo hipótese em que tal valor afigure-se exorbitante ou ínfimo, o que não ocorre no caso em tela. 11. Inexistindo omissão, contradição e nem obscuridade no julgado, é indevida a utilização dos declaratórios, que configuram-se, portanto, protelatórios, ensejando a fixação de multa no percentual de 1% sobre o valor atribuído à causa, nos termos dos artigos 18 e 538 do CPC. (TRF, Apelação Cível Nº 2004.71.10.003965-9/RS, Rel. Des. Federal Dirceu De Almeida Soares. 06-09-2006)

Destafeita, considerando o exposto, verifica-se que o instituto da simulação

exerce função primordial na desconsideração de negócios jurídicos “falsos” –

desprovidos de motivo “propósito negocial.

3.1.1 SIMULAÇÃO ABSOLUTA E RELATIVA.

O cerne deste tópico será distinguir os institutos da simulação (absoluta e

relativa), vejamos: A simulação relativa,1920 ocorre quando as partes, tendo celebrado

19 Por exemplo: Um contrato de compra e venda cujo preço declarado na escritura é diferente do que foi pago pelo comprador ao vendedor (simulação relativa).20Ementa: DECADÊNCIA – SIMULAÇÃO – Nos casos em que comprovada a simulação relativa, correta a aplicação da penalidade qualificada. A contagem do prazo decadencial se dá no primeiro dia útil do exercício seguinte ao que o lançamento poderia ter sido realizado. Não mais se antecipa a contagem para a data da entrega da declaração, tendo em vista que a mesma constitui-se mero cumprimento de obrigação acessória, não se tratando, portanto, de medida indispensável ao lançamento. OPERAÇÃO ÁGIO – SIMULAÇÃO RELATIVA – As operações estruturadas, realizadas em prazo ínfimo, de aporte de capital com ágio, capitalização e alienação, constituem-se em simulação relativa, cujo ato verdadeiro dissimulado foi a alienação das ações. Seu único propósito foi evitar a incidência de ganho de capital. MULTA ISOLADA – A falta de recolhimento de antecipações impõe a exigência de multa isolada. Em face da retroatividade benigna, fica reduzido o percentual para 50%. Argüição de decadência rejeitada. Recurso voluntário parcialmente provido. (Nº Recurso 145921, Número do processo: 10940.002633/2004-28: Turma: 1ª Câmara Contribuinte)

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um determinado negócio jurídico, tinham a intenção de celebrar outro. A simulação

absoluta,21 ocorre quando as partes não pretendem realizar nenhum negócio jurídico

(detrás do ato simulado, nenhum ato existe). Nessas situações, verifica-se a

dificuldade de aplicação/interpretação da simulação. Portanto, o aplicador não

utilizará de critérios objetivos “mecânicos” - restando à averiguação do “elemento

subjetivo”.

Ademais, atualmente nosso órgão administrativo de recursos22 (CARF) adota

o conceito amplo de simulação para inibir práticas engenhosas de redução indevida

da carga fiscal.

Outro ponto que merece destaque é a distinção entre simulação-elusão e

simulação-evasão. Segundo Godoi (2007-a) a jurisprudência dos órgãos

administrativos tem feito um exame dos efeitos econômicos das operações

desencadeadas pelos planejadores. Esse diagnóstico da operação é feito através da

distinção entre a simulação-elusão da tradicional simulação-evasão : A simulação-

elusão, refere-se ao comportamento do contribuinte que atende todas as solicitações

do Fisco. Já a simulação-evasão o contribuinte esconde dados e possui o manifesto

intuito de fraudar o fisco. (GODOI, 2007, p.282). Essa distinção é feita para fins de

aplicação da multa agravada prevista para a simulação-evasão-sonegação.

3.2. FRAUDE A LEI.

Primeiramente é importante destacar as dificuldades práticas de distinguir os

institutos da simulação e fraude à Lei. Essa dificuldade opera-se porque ambos os

institutos objetivam “desconsiderar” os atos simulados ou em fraude à lei.

Ocorre que a distinção dos institutos far-se-à mediante á análise da vontade

do planejador. Ou seja: na fraude a Lei, o agente contorna a lei e frustra o objetivo

prático da lei. A simulação, conforme acima abordado, opera-se pela divergência

entre a vontade real e a vontade declarada (o agente oculta à violação da lei).

E mais: O agente que age em fraude à lei objetiva burlar a norma imperativa e

21 Um contrato de locação em que nenhum não existe locação (simulação absoluta),22 Foi através do julgamento do Acórdão CSRF/01-02.107 que se passou a utiliza-se o conceito amplo de simulação. Cfr. GODOI. Marciano Seabra de. Dois Conceitos de Simulação e suas consequencias para os limites da elisão fiscal. In: ROCHA, Valdir de Oliveira (Org.). Grandes questões atuais do Direito Tributário. São Paulo: Dialética, 2007, v. 11, p. 272-298

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altera a situação para fugir da lei, procurando livrar-se de seus efeitos. Nessa ordem

de idéias “[...] o comportamento em fraude à lei se dá debaixo do preceito legal. O

agente cumpre a norma, mas a utiliza para contornar a outra.” (GRECO, 2008, p.91).

Segundo Sanches (2006, p.102): “A fraude à lei é considerada ilícita por ser

contrária a ordem pública e por em causa a ordem dos valores sobre os quais

repousa o ordenamento jurídico”.

E prossegue Sanches enfatizando que somente os efeitos fiscais são

declarados ineficazes na fraude á lei:

[...] a sanção contra a fraude fiscal não é a nulidade do negócio jurídico ,mas a ineficácia dos efeitos fiscais obtidos de forma fraudulenta, A sanção jurídica para o comportamento lesivo esgota-se na desconsideração dos efeitos fiscais, refletindo a preocupação do legislador em reduzir a intromissão administrativa nas decisões do sujeito passivo [...](SANCHES,2006,P.104).

Temos, por isso, que o sujeito passivo, ao manipular as normas, frustra a

correta distribuição dos encargos tributários e impossibilita o cumprimento de

objetivos constitucionais.

3.3. PREVALÊNCIA DA SUBSTÂNCIA SOB A FORMA.

O instituto da prevalência da substância sob a forma cumpre papel

fundamental na invalidade/ineficácia de negócios jurídicos manipulados.

Ademais, a diferença entre os institutos da substância sob a forma e fraude à

lei é meramente aparente.

A respeito da manipulação23 da formas legais disponíveis Sanches (2006,

p.115) assevera que “[...] a distinção de forma e substância é trazida para o centro

de aplicação da lei, parte-se desta dicotomia para impedir que da pura manipulação

da forma resulte a possibilidade de frustração dos fins prosseguidos pela ordem

jurídica”.

Nesse sentido, a construção de formas jurídicas “errada rotulagem do

23 Sanches (2006, p.115) exemplifica uma manipulação das formas legais: “Chamar doação a um pagamento de trabalho independentemente ( A doa 100.000 euros a B, sabendo-se que esse B prestou serviços a A e que nada neste negócio revela animus donandi) não atribui a este pagamento o regime fiscal das doações. Nada impede que a Administração de o qualificar como remuneração se a tal conclusão conduzirem a circunstâncias que rodearem este negócio jurídico”.

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contrato” confere a possibilidade da Administração Fiscal pode reagir

“desconsiderar” os efeitos do contrato e implementar nova qualificação para o

contrato “manipulador”.

Sanches ressalta a importância forma adotada pelo contribuinte:

A forma adotada é, pois, sempre relevante ainda que não se tenha de ser determinante para as conseqüências fiscais dessa mesma forma: o negócio jurídico artificioso oculta, debaixo de uma forma escolhida por motivos e interesses destituídos de tutela jurídica [...]

Nesse norte, a dicotomia existente entre forma e substância não é tão

simples. É necessário desprezar a aparência e ater-se a substância econômica do

ato praticado pelo contribuinte. (SANCHES, 2006).

4. O ART. 116, PARÁGRAFO ÚNICO, DO CTN

Até a edição da Lei Complementar nº 104/2001, que introduziu o art. 116,

parágrafo único, do CTN, permitia-se qualquer contribuinte formular livremente seus

negócios jurídicos, desde que utilizasse meios lícitos e antes da ocorrência do fato

gerador.

Ocorre que, o parágrafo único do art. 116 do CTN, pouco inovou no

ordenamento jurídico, já que não impediu o planejamento tributário lícito. Ao

contrário, apenas confirmou a nulidade dos negócios jurídicos “falsos”.

Verifica-se, ainda, que o business purpose test assume fundamental

importância no direito fiscal. Esse propósito negocial, traz indícios de que os

negócios realizados pelo contribuinte são coerentes às finalidades a que se

pretende, ou seja, não tendo sido utilizado com a única e exclusiva finalidade de

economizar tributos.

Nesse sentido, valiosos os ensinamentos trazidos pelos ilustre julgadores do

acórdão nº 107-07.596 , do CARF, afastando a evasão fiscal quando amparados

pelo legítimo propósito negocial, vejamos:

INCORPORAÇÃO ÀS AVESSAS – GLOSA DE PREJUÍZO – IMPROCEDÊNCIA. A denominada ‘incorporação às avessas’, não proibida pelo ordenamento, realizada entre empresas operativas e que sempre estiveram sob controle comum, não pode ser tipificada como operação simulada ou abusiva, mormente quando, a par da inegável intenção de não

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perda de prejuízos fiscais acumulados, teve por escopo a busca de melhor eficiência das operações entre ambas praticadas.

Portanto, verifica-se a inutilidade do dessa norma (art.116, parágrafo único,

do CTN). Resta clara que a desconsideração de negócios jurídicos, pela autoridade

fiscal, depende de um procedimento especial (lei ordinária). Nesse sentido, a norma

trouxe uma arma (instrumento de desconsideração) sem munição para a

administração fiscal (Fisco).

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS.

Ultrapassados os contornos iniciais, é importante apontar, que para um

exame apurado dos limites do planejamento tributário é necessário realizar um

diagnóstico do caso concreto, e, assim, desconsiderar negócios jurídicos “falsos” –

desprovidos de motivo “propósito negocial”. Nessa perspectiva, para verificação

desses limites é necessário implementar alguns parâmetros para desconsiderar

negócios falsos, artificiosos, engenhosos.

Como se viu no transcorrer da presente pesquisa o aplicador/interprete não

pode ficar engessado em resultados certos e acabados, é necessário diante do caso

concreto “caso a caso” examinar as peculariedade e apontar o resultado

(validade,invalidade). Temos, por isso, que os limites do planejamento tributário

deve ser examinado com os olhos voltados aos motivos que ensejaram a opção do

contribuinte. É preciso verificar se a finalidade do planejador é simplesmente: “única”

e exclusiva de economizar tributos.

Outro papel importante dos limites do planejamento tributário refere-se à

desconsideração “nulidade” dos efeitos fiscais inerentes às manipulações das

formas jurídicas. Não pode, por isso, pretender o interprete desconsiderar os efeitos

“reais” do negócio jurídico.

No centro disto tudo, como está sendo reafirmado em diversos julgados do

CARF, está à utilização dos instrumentos de reação contra comportamentos

abusivos “artificiosos” (através de conceitos pautadas na essência do negócio

“substância econômica”, perpectiva econômica, propósito negocial).

Ainda, assim, verifica-se que alguns doutrinadores clássicos insistem em

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primar pela aplicação literal e mecânica dos dispositivos legais. Entretanto, sob a

perspectiva do Estado Democrático de Direito, é chegado a hora dos negócios

desprovidas de qualquer substância serem passíveis de “nulidade”, e, assim,

cumprir a finalidade maior do Direito Tributário: Distribuição igualitária dos encargos

fiscais.

6. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS.

BECKER, Alfredo Augusto. Teoria Geral do Direito Tributário, São Paulo: Noeses, 2007.

GODOI, Marciano Seabra de.Dois conceitos de simulação e suas conseqüências para os limites da elisão fiscal. In: ROCHA, Valdir de Oliveira (Org.). Grandes questões atuais do Direito Tributário. São Paulo: Dialética, 2007-a, v. 11, p. 272-298

GODOI, Marciano Seabra de.Uma proposta de compreensão e controle dos limites da elisão fiscal no direito brasileiro – estudo de casos. In: YAMASHITA, Douglas (Org.). Planejamento tributário à luz da jurisprudência. São Paulo: LEX, 2007-b, p. 237-288.

GRECO, Marco Aurélio. Planejamento fiscal e interpretação da lei tributária, São Paulo: Dialética, 1998.

GRECO, Marco Aurélio. Planejamento Tributário, Dialética, São Paulo: 2008. 2.ed.

MACHADO, Hugo de Brito. A Norma Antielisão e o Princípio da Legalidade - Análise Crítica do Parágrafo Único do Art. 116 do CTN. O Planejamento Tributário e a Lei Complementar 104. São Paulo: Dialética, 2001, p. 115.

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REIS, Elcio Fonseca. O Princípio da Boa-fé e o Planejamento Tributário. Quartier Latin, 2008.

SANCHES, J.L. Saldanha, Os Limites do Planeamento Fiscal, Coimbra Editora, 2006;

TÔRRES, Heleno. Direito Tributário Internacional - planejamento tributário e operações transnacionais. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2001.

XAVIER, Alberto. Direito Tributário Internacional. São Paulo: Almeida, 2009. 2º Ed.