acórdãos sta acórdão do supremo tribunal administrativo ... · decreto-lei n.º 43/98, de 3 de...

13
Acórdãos STA Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo Processo: 0406/12 Data do Acordão: 29-10-2014 Tribunal: 2 SECÇÃO Relator: PEDRO DELGADO Descritores: CONTRIBUIÇÃO ESPECIAL PRINCÍPIO DA NÃO RETROACTIVIDADE DA LEI LEI FISCAL INCONSTITUCIONALIDADE Sumário: I - A contribuição especial criada pelo Decreto-Lei nº 43/98, de 3 de Março incide sobre a valorização dos prédios resultante da sua utilização como terrenos para construção provocada pela realização de obras públicas nas áreas adjacentes, sendo devida por aqueles que obtiverem o direito de construção e, por consequência, aquele benefício. II - O facto tributário gerador ou constitutivo da contribuição especial criada pelo Decreto-Lei nº 43/98, de 3 de Março, é o aumento de valor dos prédios ou terrenos, resultante da possibilidade da sua utilização como terrenos para construção ou reconstrução urbana, nas freguesias cujas acessibilidades foram excepcional e substancialmente melhoradas com as obras públicas cuja realização está na base da edição daquele diploma legal. II - Não é inconstitucional, por violação do princípio da não retroactividade da lei fiscal, a norma do artigo 1.º, n.º 2 e artigo 2.º do Regulamento da Contribuição Especial, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 43/98, de 3 de Março, enquanto ficciona como data de aquisição do prédio, para efeitos do cálculo do valor sujeito a contribuição, 1 de Janeiro de 1994, sendo o licenciamento de construção ou de obra, requerido em data posterior à entrada em vigor daquele diploma legal. Nº Convencional: JSTA000P18104 Nº do Documento: SA2201410290406 Data de Entrada: 16-04-2012 Recorrente: FAZENDA PÚBLICA Recorrido 1: A...., LDA Votação: UNANIMIDADE Aditamento: Texto Integral Texto Integral: Acordam na Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo 1 – A Fazenda Publica, interpôs recurso para o Tribunal Central Administrativo Norte da decisão proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto de 19 de Abril de 2010, que julgou procedente a impugnação judicial Página 1 de 13 Acordão do Supremo Tribunal Administrativo 10-11-2014 http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/32dc0a49250cd3d2...

Upload: others

Post on 28-Mar-2021

1 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

Page 1: Acórdãos STA Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo ... · Decreto-lei n.º 43/98, de 3 de Março, no montante global de € 21.205,88, em aplicação da declaração de inconstitucionalidade

Acórdãos STA Acórdão do Supremo Tribunal AdministrativoProcesso: 0406/12Data do Acordão: 29-10-2014Tribunal: 2 SECÇÃORelator: PEDRO DELGADODescritores: CONTRIBUIÇÃO ESPECIAL

PRINCÍPIO DA NÃO RETROACTIVIDADE DA LEILEI FISCALINCONSTITUCIONALIDADE

Sumário: I - A contribuição especial criada pelo Decreto-Lei nº 43/98, de 3 de Março incide sobre a valorização dos prédios resultante da sua utilização como terrenos para construção provocada pela realização de obras públicas nas áreas adjacentes, sendo devida por aqueles que obtiverem o direito de construção e, por consequência, aquele benefício.II - O facto tributário gerador ou constitutivo da contribuição especial criada pelo Decreto-Lei nº 43/98, de 3 de Março, é o aumento de valor dos prédios ou terrenos, resultante da possibilidade da sua utilização como terrenos para construção ou reconstrução urbana, nas freguesias cujas acessibilidades foram excepcional e substancialmente melhoradas com as obras públicas cuja realização está na base da edição daquele diploma legal. II - Não é inconstitucional, por violação do princípio da não retroactividade da lei fiscal, a norma do artigo 1.º, n.º 2 e artigo 2.º do Regulamento da Contribuição Especial, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 43/98, de 3 de Março, enquanto ficciona como data de aquisição do prédio, para efeitos do cálculo do valor sujeito a contribuição, 1 de Janeiro de 1994, sendo o licenciamento de construção ou de obra, requerido em data posterior à entrada em vigor daquele diploma legal.

Nº Convencional: JSTA000P18104Nº do Documento: SA2201410290406Data de Entrada: 16-04-2012Recorrente: FAZENDA PÚBLICARecorrido 1: A...., LDAVotação: UNANIMIDADE

Aditamento:

Texto Integral

Texto Integral: Acordam na Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo

1 – A Fazenda Publica, interpôs recurso para o Tribunal Central Administrativo Norte da decisão proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto de 19 de Abril de 2010, que julgou procedente a impugnação judicial

Página 1 de 13Acordão do Supremo Tribunal Administrativo

10-11-2014http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/32dc0a49250cd3d2...

Page 2: Acórdãos STA Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo ... · Decreto-lei n.º 43/98, de 3 de Março, no montante global de € 21.205,88, em aplicação da declaração de inconstitucionalidade

deduzida pela sociedade A………., com os demais sinais dos autos, contra as liquidações de contribuição especial prevista pelo DL nº 43/98, de 3 de Março, relativas ao ano de 2003, no montante global de 21.205,88 €, reportando-se €11.517,19, ao processo de avaliação nº 348/00 e € 9.688,69 ao processo de avaliação nº 350/00.

Terminou as suas alegações de recurso, formulando as seguintes conclusões: «A. Vem o presente recurso interposto da douta sentença que julgou procedente a impugnação deduzida contra as liquidações de Contribuição Especial, nos termos do Decreto-lei n.º 43/98, de 3 de Março, no montante global de € 21.205,88, em aplicação da declaração de inconstitucionalidade com força obrigatória geral do diploma,B. na medida em que ocorreu aplicação retroactiva do diploma, por violação do disposto no artigo 103º, n.º 3 da CRP.C. Assim, com a ressalva do devido respeito, que é muito, não pode a Fazenda Publica conformar-se com o doutamente decidido, por considerar ter havido erro de julgamento na subsunção dos factos ao direito aplicável.D. Os actos tributários de liquidação controvertidos têm na sua origem o resultado das avaliações efectuadas nos termos do Decreto-lei nº 43/98, de 03 de Março, a duas parcelas de terreno destinadas à construção nos Processos de Avaliação nº 348/00 e nº350/00-, no âmbito dos pedidos de licenciamento requeridos durante o ano de 1999 e dos respectivos Alvarás de Licença de Construção nº 424/00 e n.º 426/00, emitidos em 24/03/2000, pela Câmara Municipal da Maia.E. Com efeito, a Contribuição Especial - a qualificar como imposto - foi criada pelo citado Decreto-lei nº 43/98, de 03 de Março, em cujo Preâmbulo se diz da sua relação com os investimentos efectuados ou a efectuar para a realização da CRIL, CREL, CRIP, CREP, respectivos acessos e da travessia ferroviária do Tejo e troços ferroviários complementares bem como as extensões do metropolitano de Lisboa e a concretização de sistemas ferroviários ligeiros, os quais valorizariam substancialmente os prédios rústicos e os terrenos para construção envolventes, justificando tal valorização a criação da dita contribuição.F. O artigo 3º do Regulamento da Contribuição Especial, define a respectiva incidência pessoal: «a contribuição é devida pelos titulares do direito de construir em cujo nome

Página 2 de 13Acordão do Supremo Tribunal Administrativo

10-11-2014http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/32dc0a49250cd3d2...

Page 3: Acórdãos STA Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo ... · Decreto-lei n.º 43/98, de 3 de Março, no montante global de € 21.205,88, em aplicação da declaração de inconstitucionalidade

seja emitido o alvará de licença de construção ou de obra» E o artigo 1º a incidência real: ela incide «sobre o aumento de valor dos prédios rústicos, resultante da possibilidade da sua utilização como terrenos para construção urbana» - n.º 1 - e ainda «sobre o aumento de valor dos terrenos para construção e das áreas resultantes da demolição de prédios urbanos já existentes situados nas áreas referidas no número anterior» - nº 2.G. Por sua vez, determina o artigo 2º: «1 - Constitui valor sujeito a contribuição a diferença entre o valor do prédio à data em que for requerido o licenciamento de construção ou de obra e o seu valor à data de 01 de Janeiro de 1994 corrigido por aplicação dos coeficientes de desvalorização da moeda constantes da portaria a que se refere (...), correspondendo, para o efeito, à data de aquisição a data de 01 de Janeiro de 1994 e à de realização a data da emissão do alvará de licença de construção ou de obra».H. Esta última norma, ainda que relativa à determinação da matéria colectável, define o valor sobre que recai o imposto: de que valor se trata, que verbas entram na sua composição, não se limitando apenas a estabelecer o processo daquela determinação.Estamos, assim, perante uma norma de incidência real, ou seja, um dos elementos essenciais do imposto.I. Diz-nos a melhor doutrina, que se trata de um facto tributário complexo, formado «por uma pluralidade de elementos materiais, juridicamente unificados numa unidade objectiva» - cfr. Cardoso da Costa, in Curso de Direito Fiscal, pág. 242.K. E ainda que se trata de um facto tributário balizado por dois elementos essenciais: o valor do prédio à data em que for requerido o licenciamento da construção ou obra e o seu valor em 01 de Janeiro de 1994 - cfr. Alberto Xavier, in Manual de Direito Fiscal, vol. 1, págs. 251/252.L. É certo que o nº 1. in fine, do artigo 2º define como «data de realização» a «da emissão do alvará de licença de construção ou de obra», certamente por influência do CIRS que tributa - categoria G - as mais-valias, nos arts 9º e 10º do código, na base da diferença entre os valores de realização e de aquisição.26. Tal dispositivo normativo é, todavia, inócuo para o efeito. Neste sentido, Acórdão do STA de 18/05/05, Proc. 0318/0527. Na verdade, a Contribuição Especial incide «sobre o aumento de valor» e, o «valor sujeito» a imposto concretiza-se na diferença referida de que um dos elementos é o valor do prédio à data em que for requerido

Página 3 de 13Acordão do Supremo Tribunal Administrativo

10-11-2014http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/32dc0a49250cd3d2...

Page 4: Acórdãos STA Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo ... · Decreto-lei n.º 43/98, de 3 de Março, no montante global de € 21.205,88, em aplicação da declaração de inconstitucionalidade

o licenciamento da construção ou da obra.M. Assim sendo, cremos que esse elemento, como todos, tem de situar-se no domínio de vigência da lei nova para que esta se lhe possa aplicar.N. Ora, datando os pedidos de licenciamento da construção de 1999 e tendo os respectivos alvarás sido emitidos em 24.03.2000 -. alíneas g) e h) do Probatório -, após a entrada em vigor do Decreto-lei nº 43/98, de 3 de Março, ocorrida a 08/03/1998, cremos ser devida a Contribuição Especial instituída por este diploma, que, in casu, incide sobre a valorização dos terrenos ocorrida entre 1 de Janeiro de 1994 e a data daqueles pedidos.O. Nestes termos, e pelos fundamentos expostos, a liquidação do imposto foi conforme à lei e aos princípios constitucionais consagrados na LGT - artigo 12º, e na CRP - artigo 103º, n.º3P. Sem necessidade de mais considerações, entende a Fazenda Pública que a douta sentença recorrida contende com a aplicação dos dispositivos legais elencados, pelo que,Q. Ressalvado o devido respeito, deve ser revogada a sentença recorrida com todas as consequências legais.R. E, o acto tributário de liquidação permanecer na sua estabilidade e vigência no ordenamento jurídica.

2 – Não foram apresentadas contra alegações.

3 – Tendo o recurso sido interposto para o TCA Norte, este tribunal veio por acórdão exarado a fls. 169/178 dos autos, a declarar-se incompetente em razão da hierarquia, para conhecer do presente recurso que tem por fundamento exclusivamente matéria de direito e declarou competente para esse efeito, o Supremo Tribunal Administrativo.

4 – Remetidos os autos a este Tribunal, o Exmº Procurador-Geral Adjunto emitiu fundamentado parecer a fls. 186/187 dos autos, que, na parte mais relevante, se transcreve:«O recurso merece manifesto provimento.De facto, a sentença recorrida fez uma incorrecta interpretação e aplicação à factualidade apurada nos autos do citado acórdão do Tribunal Constitucional.Efectivamente, o acórdão 63/2006 do TC declarou a inconstitucionalidade, com força obrigatória geral, das normas dos artigos 1º/1 e 2º do RCE anexo ao DL 43/98, na interpretação segundo a qual, sendo a licença de

Página 4 de 13Acordão do Supremo Tribunal Administrativo

10-11-2014http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/32dc0a49250cd3d2...

Page 5: Acórdãos STA Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo ... · Decreto-lei n.º 43/98, de 3 de Março, no montante global de € 21.205,88, em aplicação da declaração de inconstitucionalidade

construção requerida antes da entrada em vigor deste diploma, seria devida a contribuição especial por este instituída, que, assim, incidiria sobre a valorização do terreno ocorrida entre 1 de Janeiro de 1994 e a data daquele requerimento, com fundamento em violação do princípio da não retroactividade dos impostos, consagrado no artigo 103º/3 da Constituição da República Portuguesa.Ora, no caso em análise, como resulta do probatório, a licença de construção foi requerida em 1999, portanto, após a vigência do DL 43/98, pelo que não tem aqui aplicação o citado acórdão do TC.Como se refere no citado acórdão do TC “não levanta qualquer problema de retroactividade a ponderação da data de 1 de Janeiro de 1994, nos termos do art. 2. º, n.º 1 do RCE, pois a qualquer contribuição de melhoria subjaz a consideração de que ocorreu uma vantagem económica particular, o que só pode ser aferido por referência a uma situação patrimonial pretérita”.Ora, ocorrendo o facto tributário, ou seja, o pedido de licenciamento e consequente emissão de alvará, em 1999 e 2000, respectivamente, é certo que não ocorre qualquer violação do princípio da irretroactividade dos impostos.Nesse mesmo sentido já se pronunciou o Tribunal Constitucional (Acórdão nº 579/2011, disponível no sítio da Internet www.tribunalconstitucional.pt).Assim a sentença recorrida não pode deixar de ser revogada.A recorrida, além da questão apreciada na sentença recorrida colocou mais duas questões, cujo conhecimento ficou prejudicado, em função do decidido e que são:1. Inconstitucionalidade orgânica e formal do DL 43/98.2.Inconstitucionalidade material do DL 43/98, por violação do princípio da igualdade, enquanto princípio postulante da capacidade contributiva e enquanto proibição do arbítrio.Parece-nos que, salvo melhor juízo, em função do estatuído nos artigos 726º e 715º/2 do CPC, este STA deve conhecer dessas questões em substituição do Tribunal recorrido.Em função da factualidade apurada, não sindicada (artigo 684º-A/2 do CPC), não há qualquer razão para julgar violado o princípio da igualdade, nas vertentes referidas, pois a recorrida não prova factos dos quais se possa inferir essa violação.Quanto à alegada inconstitucionalidade orgânica afigura-se-nos que a mesma não se verifica.De facto, o DL 43/98 foi emanado ao abrigo da LOE para 1997, pelo que só caducou em 31 de Dezembro de 1997,

Página 5 de 13Acordão do Supremo Tribunal Administrativo

10-11-2014http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/32dc0a49250cd3d2...

Page 6: Acórdãos STA Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo ... · Decreto-lei n.º 43/98, de 3 de Março, no montante global de € 21.205,88, em aplicação da declaração de inconstitucionalidade

por força do disposto no artigo 165º/5 da CRP.Embora a promulgação e a referenda do DL em causa tenham ocorrido em 12 de Fevereiro de 1998 e 18 de Fevereiro de 1998, respectivamente, o certo é que foi aprovado em Conselho de Ministros em 30 de Dezembro de 1997, pelo que “existe,” para o efeito de considerar respeitado o prazo de autorização legislativa, conforme jurisprudência do Tribunal Constitucional (Acórdão nº 227/1991, disponível no sítio da internet www.tribunalconstitucional.pt).Termos em que deve ser dado provimento ao presente recurso jurisdicional, revogar-se a sentença recorrida, e, em substituição do tribunal recorrido, julgar improcedentes a alegada inconstitucionalidade orgânica e material por violação do princípio da igualdade, com consequente manutenção na ordem jurídica da liquidação sindicada.»

4 – Colhidos os vistos legais, cabe decidir.

5- Em sede factual apurou-se na primeira instância a seguinte matéria de facto com relevo para a decisão da causa:a) Por escritura pública celebrada em 03/07/1996, a impugnante declarou comprar a B……… e outros, que, por sua vez, declararam vender pelo preço global de Esc. 190.000.000$00, os prédios situados na freguesia de ……… , do concelho da Maia, melhor identificados na dita escritura pública e cuja cópia consta de fls. 13 a 16 dos autos, dando aqui por reproduzido o seu teor.b) Na sequência da avaliação daqueles terrenos para efeitos de tributação em sede de contribuição especial, foi apurado como valor de um dos prédios €326.400,00, correspondente ao processo n.º 350/00, reportando-se ao ano de 1999.c) Por sua vez, o valor reportado a 01/01/1994 foi fixado em €255.742,94.d) A Administração Tributária apurou uma matéria colectável de €32.295,62, resultante da diferença entre os valores referentes nas alíneas b) e c).e) Em consequência, efectuou a liquidação da contribuição especial a que se reporta o Decreto-Lei n.º 43/98, no montante de €9.688,69, nos termos que constam de fls. 49 do processo administrativo e que aqui se dão por reproduzidos.f) Procedendo da mesma forma quanto ao outro imóvel, no âmbito do processo de avaliação n.º 348/00, em consequência, efectuou a liquidação da contribuição

Página 6 de 13Acordão do Supremo Tribunal Administrativo

10-11-2014http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/32dc0a49250cd3d2...

Page 7: Acórdãos STA Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo ... · Decreto-lei n.º 43/98, de 3 de Março, no montante global de € 21.205,88, em aplicação da declaração de inconstitucionalidade

especial a que se reporta o Decreto-Lei n.º 43/98, no montante de €11.517, 19.g) A impugnante requereu licenças de construção durante o ano de 1999.h) Em 24/03/2000 foram emitidos os alvarás das licenças de construção referidas na alínea anterior.i) O prazo para pagamento voluntário da contribuição especial referida terminou em 31/10/2003.j) A presente impugnação foi apresentada em 06/11/2003.

6. Do objecto do recurso

Constitui objecto do presente recurso saber se a sentença recorrida ocorreu erro de julgamento ao considerar que, no caso em apreço, a liquidação da contribuição especial criada pelo D.L. nº 43/98 de 3/3, sobre duas parcelas de terreno destinadas à construção, foi efectuada com violação do principio da não retroactividade fiscal (artigo 103º nº3 da Constituição da República)

A decisão recorrida considerou que o Tribunal Constitucional, no seu Acórdão n.º 63/2006, publicado no Diário da República, I Série-A, de 03/03/2006, tinha já declarado a inconstitucionalidade, com força obrigatória geral, da norma constante dos artigos 1.º, n.º 2 e 2.º do Regulamento da Contribuição Especial anexo do Decreto-Lei n.º 43/98, de 3 de Março, na interpretação segundo a qual, sendo a licença de construção requerida antes da entrada em vigor deste diploma, seria devida a contribuição especial por este instituída que, assim, incidiria sobre a valorização do terreno ocorrida entre 01/01/1994 e a data daquele requerimento, com fundamento em violação do principio da não retroactividade dos impostos, consagrado no artigo 103.º, n.º 3 da Constituição da República Portuguesa.Deste modo, em aplicação daquela declaração de inconstitucionalidade com força obrigatória geral, julgou procedente a impugnação, por entender que, no caso vertente, ocorreu aplicação retroactiva do Regulamento da Contribuição Especial anexo ao Decreto-Lei n.º 43/98, de 3 de Março, com violação do disposto no artigo 103.º, n.º 3 da CRP.

Contra este entendimento insurge-se a Fazenda Pública alegando que houve erro de julgamento na subsunção dos factos ao direito aplicável, porque as parcelas de terreno objecto das liquidações controvertidas foram submetidas a

Página 7 de 13Acordão do Supremo Tribunal Administrativo

10-11-2014http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/32dc0a49250cd3d2...

Page 8: Acórdãos STA Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo ... · Decreto-lei n.º 43/98, de 3 de Março, no montante global de € 21.205,88, em aplicação da declaração de inconstitucionalidade

pedido de licenciamento e respectivo alvará de construção em 1999 e 2000 respectivamente, ou seja após a entrada em vigor do DL nº 43/98 de 3/3.Defende assim que a liquidação do imposto foi conforme o dispositivo legal em consonância com os princípios constitucionais, não ocorrendo a violação do princípio da retroactividade dos impostos.

6.1 Assiste razão à Fazenda Pública.De facto, e como bem nota o Exmº Procurador-Geral Adjunto neste Supremo Tribunal Administrativo, a sentença recorrida fez, do acórdão do Tribunal Constitucional, uma incorrecta interpretação e uma errada aplicação à factualidade apurada nos autos .Vejamos.Pelo acórdão n.º 63/2006 (publicado no Diário da República, I série A, de 3 de Março de 2006) o Tribunal Constitucional declarou a inconstitucionalidade, com força obrigatória geral, da norma constante dos artigos 1.º, n.º 2, e 2.º do Regulamento da Contribuição Especial, na interpretação segundo a qual, sendo a licença de construção requerida antes da entrada em vigor deste diploma, seria devida a contribuição especial que incidiria sobre a valorização do terreno ocorrida entre 1 de Janeiro de 1994 e a data daquele requerimento.Porém, o caso sub judice tem um enquadramento fáctico diverso. Enquanto que no caso submetido à apreciação do Tribunal Constitucional estava em causa um pedido de licenciamento que tinha dado entrada na Administração em momento anterior ao da entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 43/98, de 3 de Março, a situação objecto do presente recurso ocorreu já na vigência desse diploma.

Com efeito a recorrida requereu as licenças de construção em 1999 e em 24.03.2000 foram emitidos os alvarás das licenças de construção (pontos g) e h) do probatório.Ou seja quer o pedido de licenciamento quer o acto administrativo de licenciamento se verificaram já na vigência do Decreto-Lei n.º 43/98. E isto torna a situação em causa completamente diferente da apreciada no referido Acórdão do Tribunal Constitucional pois que ali se considerou determinante para a decisão de inconstitucionalidade por violação do princípio da irretroactividade da lei fiscal o facto de o licenciamento de construção ou obra ter sido requerido antes da entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 43/98.

Página 8 de 13Acordão do Supremo Tribunal Administrativo

10-11-2014http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/32dc0a49250cd3d2...

Page 9: Acórdãos STA Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo ... · Decreto-lei n.º 43/98, de 3 de Março, no montante global de € 21.205,88, em aplicação da declaração de inconstitucionalidade

Isso mesmo foi sublinhado naquele aresto quando ali expressamente se refere que ““(…A)consideração do princípio da proibição da retroactividade dos impostos – consagrado no artigo 103º, n.º 3, da Constituição portuguesa e fundado, em geral, no princípio da protecção da confiança, inerente à ideia de Estado de direito democrático, e no princípio da capacidade contributiva – justifica a relevância atribuída nos acórdãos fundamento ao acto voluntário através do qual (e ao momento em que) é requerido o licenciamento de construção ou de obra. É que, no momento em que apresentou o requerimento para licenciamento de construção ou de obra – recorde-se, momento anterior ao da entrada em vigor do diploma em apreço –, o titular do prédio não podia contar com a aplicação da Contribuição Especial, pela razão simples de que tal tributo não havia ainda sido criado.”

No caso vertente, como vimos, a recorrida requereu as licenças de construção em 1999 e em 24.03.2000 foram emitidos os alvarás das licenças de construção, portanto ambos os factos ocorreram na vigência do DL nº 43/98.De harmonia com o artigo 1.º do RCE anexo ao Decreto-Lei n.º 43/98, de 3 de Março:«1 – A contribuição especial incide sobre o aumento de valor dos prédios rústicos, resultante da possibilidade da sua utilização como terrenos para construção urbana, situados nas áreas das seguintes freguesias: (...)2 – A contribuição especial incide ainda sobre o aumento de valor dos terrenos para construção e das áreas resultantes da demolição de prédios urbanos já existentes situados nas áreas referidas no número anterior.»Por sua vez, preceitua o artigo 2.º do mesmo RCE:«1 – Constitui valor sujeito a contribuição a diferença entre o valor do prédio à data em que for requerido o licenciamento de construção ou de obra e o seu valor à data de 1 de Janeiro de 1994, corrigido por aplicação dos coeficientes de desvalorização da moeda constantes da portaria a que refere o artigo 43.º do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas, correspondendo, para o efeito, à data de aquisição a data de 1 de Janeiro de 1994 e à de realização a data da emissão do alvará de licença de construção ou de obra.»A contribuição especial aqui em causa foi aprovada pelo Decreto-Lei n.º 43/98, de 3 de Março, com o objectivo de tributar a valorização de que beneficiaram os prédios rústicos e terrenos para construção situados nas zonas envolventes à CRIL, CREL, CRIP, CREP e respectivos

Página 9 de 13Acordão do Supremo Tribunal Administrativo

10-11-2014http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/32dc0a49250cd3d2...

Page 10: Acórdãos STA Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo ... · Decreto-lei n.º 43/98, de 3 de Março, no montante global de € 21.205,88, em aplicação da declaração de inconstitucionalidade

acessos, bem como à travessia ferroviária do Tejo e outros investimentos. O valor sujeito a contribuição resulta da aplicação da fórmula prevista no referido artigo 2.º, n.º 1 do Regulamento, o qual resulta da diferença entre o valor do prédio à data em que é requerido o licenciamento de construção ou de obra, e o seu valor à data de 1 de Janeiro de 1994, corrigido por aplicação dos coeficientes de desvalorização da moeda.A contribuição especial incide, pois, sobre a valorização dos prédios resultante da sua utilização como terrenos para construção provocada pela realização de obras públicas nas áreas adjacentes, sendo devida por aqueles que obtiverem o direito de construção e, por consequência, aquele benefício.A capacidade contributiva afere-se pela valorização dos terrenos operada pela realização de obras públicas nas áreas adjacentes e não pela realização da construção, tanto mais que o próprio n.º 1 do artigo 1.º do RCE refere que a contribuição especial incide sobre o aumento de valor dos prédios rústicos resultante da possibilidade da sua utilização como terrenos para construção e não da sua efectiva utilização como tal (Neste sentido Acórdão do

Supremo Tribunal Administrativo de 28.09.2011, recurso 531/11,

in dgsi.pt.).O facto tributário gerador ou constitutivo da referida contribuição especial é assim o aumento de valor dos prédios ou terrenos, resultante da possibilidade da sua utilização como terrenos para construção ou reconstrução urbana, nas freguesias cujas acessibilidades foram excepcional e substancialmente melhoradas com as obras públicas cuja realização está na base da edição daquele diploma legal.

Ora a propósito desta contribuição especial, e num caso em que o requerimento e a consequente emissão da licença ocorreram após a entrada em vigor do DL 43/98 o Tribunal Constitucional já se pronunciou - Acórdão 579/11, de 29.11.2011, in http://www.tribunalconstitucional.pt/ - no sentido da não verificação de qualquer ofensa ao principio na não retroactividade fiscal. Como ficou bem expresso naquele aresto, cuja fundamentação se subscreve, «tendo o requerimento (e a consequente emissão da licença) ocorrido após a entrada em vigor daquele diploma, é afastada a mobilização do parâmetro contido no artigo 103.º, n.º 1 da Constituição. Ao contrário do que entendeu o tribunal recorrido, a data

Página 10 de 13Acordão do Supremo Tribunal Administrativo

10-11-2014http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/32dc0a49250cd3d2...

Page 11: Acórdãos STA Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo ... · Decreto-lei n.º 43/98, de 3 de Março, no montante global de € 21.205,88, em aplicação da declaração de inconstitucionalidade

de 1 de Janeiro de 1994 surge, na estrutura da contribuição especial, como um mero instrumento, relevando enquanto mecanismo operacional de determinação do aumento de valor que é tributável. Como se referiu no acórdão 63/2006, já citado, “a qualquer contribuição de melhoria subjaz a consideração de que ocorreu uma vantagem económica particular, o que só pode ser aferido por referência a uma situação patrimonial pretérita.”9. O aumento de valor não é resultado do normal decurso do tempo verificado entre aquela data – 1 de Janeiro de 1994 – e o momento do requerimento da licença (ou da sua emissão). Este valor resulta de um outro facto, extraordinário e anormal, relacionado com investimentos públicos avultados em acessibilidades de diversa índole, as quais comportam benefícios consideráveis para os terrenos circundantes. A realização desses benefícios, resultantes não do normal decurso do tempo mas das acessibilidades entretanto executadas, que é consumada no requerimento da licença de construção, é que surge como o facto tributário (Sublinhado nosso.) o qual não é, portanto, ao contrário do que entendeu o tribunal recorrido, um facto complexo. Não se visa tributar uma valorização gradual dos imóveis, mas sim a valorização que ocorre no momento em que se efectiva a possibilidade de utilização dos terrenos para o fim de construção urbana, com um valor substancialmente acrescido por via das obras públicas previstas no Decreto-Lei n.º 43/98, as quais tornaram viável tal utilização para a construção ou reconstrução, daí resultando, para o beneficiário da licença, benefícios patrimoniais acrescidos.Como salienta o artigo 1.º do RCE, o facto tributário gerador da obrigação de pagamento da contribuição, é o aumento de valor dos prédios, resultante da realização de determinadas obras públicas. A referência à data de 1 de Janeiro de 1994 não surge, por conseguinte, relacionada com o facto tributário em si mesmo considerado. A sua relevância é exclusivamente instrumental para a determinação do valor acrescido.»

Neste contexto, considerando que: a) a chave da determinação da retroactividade reside na localização do nascimento do imposto, que é o da formação do facto tributário e não qualquer outro momento posterior, como o do acto de liquidação (Como refere a

propósito Jorge Bacelar de Gouveia, in A irretroactividade da norma fiscal na Constituição Português, Estudos de Direito

Página 11 de 13Acordão do Supremo Tribunal Administrativo

10-11-2014http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/32dc0a49250cd3d2...

Page 12: Acórdãos STA Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo ... · Decreto-lei n.º 43/98, de 3 de Março, no montante global de € 21.205,88, em aplicação da declaração de inconstitucionalidade

Público, Vol. I, Principia, 2000, p.278.), b) que o facto tributário gerador ou constitutivo da contribuição especial criada pelo Decreto-Lei nº 43/98, de 3 de Março, é o aumento de valor dos prédios ou terrenos, resultante da possibilidade da sua utilização como terrenos para construção ou reconstrução urbana, nas freguesias cujas acessibilidades foram excepcional e substancialmente melhoradas com as obras públicas cuja realização está na base da edição daquele diploma legal. c) e que as licenças de construção foram requeridas e os alvarás das licenças de construção emitidos, respectivamente em 1999 e 2000, ou seja, na vigência do DL nº 49/98, forçoso é concluir que não se verifica, no caso subjudice, qualquer ofensa ao princípio da não retroactividade da lei fiscal.

A sentença recorrida, que decidiu em contrário, não pode ser confirmada, pelo que procede o recurso.

7. Da impossibilidade de conhecimento em substituiçãoAtento o provimento do recurso e consequente revogação da sentença recorrida, coloca-se a questão da possibilidade de conhecimento, em substituição, das demais questões cuja apreciação foi julgada prejudicada, a saber a inconstitucionalidade orgânica e formal do DL 43/98 e a inconstitucionalidade material do mesmo diploma legal , nomeadamente do “segmento territorial do imposto” na sua aplicação à freguesia de ………. (vide ponto C da petição inicial a fls. 3 v.) por violação do princípio da igualdade, enquanto princípio postulante da capacidade contributiva e enquanto proibição do arbítrio.

Sucede que a sentença de primeira instância não fez qualquer explicitação dos factos que se deviam ter de considerar como relevantes e provados, nomeadamente para apreciação dos fundamentos de impugnação constantes dos arts. 19º a 22º da petição inicial - violação do princípio da igualdade derivada da inclusão da freguesia de ………… no domínio de incidência da contribuição de melhoria, uma vez determinada a exclusão de freguesias próximas em situação no mínimo análoga - fundamentos esses que, tal como o da inconstitucionalidade orgânica e formal, nem sequer apreciou. Também este Tribunal de recurso não dispõe, por sua vez, de base factual para decidir o recurso jurisdicional, uma vez que, face ao alegado pelo recorrente, ele pressupõe

Página 12 de 13Acordão do Supremo Tribunal Administrativo

10-11-2014http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/32dc0a49250cd3d2...

Page 13: Acórdãos STA Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo ... · Decreto-lei n.º 43/98, de 3 de Março, no montante global de € 21.205,88, em aplicação da declaração de inconstitucionalidade

uma realidade de facto que não está pré-estabelecida, nem aqui pode estabelecer-se, por o Tribunal carecer de poderes de cognição em sede de facto.Impõe-se por esse motivo, que os autos baixem à 1.ª instância a fim de que o tribunal recorrido conheça das demais questões que julgou prejudicadas pela solução dada ao litígio.

8. Decisão:

Termos em que, face ao exposto, acordam os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Supremo Tribunal Administrativo em conceder provimento ao recurso e revogar a sentença recorrida, baixando os autos à primeira instância, a fim de ser conhecido do mérito da impugnação, se a tanto nada mais obstar.

Sem custas. Lisboa, 29 de Outubro de 2014. – Pedro Delgado (relator) - Fonseca Carvalho - Ascensão Lopes.

Página 13 de 13Acordão do Supremo Tribunal Administrativo

10-11-2014http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/32dc0a49250cd3d2...