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Acórdãos STA Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo Processo: 01428/14 Data do Acordão: 07-01-2015 Tribunal: 2 SECÇÃO Relator: ARAGÃO SEIA Descritores: EXECUÇÃO VENDA IMÓVEL VALOR DIREITO DE RETENÇÃO Sumário: I - O Direito de retenção, enquanto direito real de garantia, caduca com a venda do imóvel em execução, nos termos do disposto no artigo 824º, n.ºs. 2 e 3 do Código Civil, mas transfere-se para o produto da venda, embora com a sua função de garantia, para efeitos de ser pago o crédito correspectivo com preferência sobre os restantes credores, nos termos legais; II - O facto de o imóvel ter como base de licitação um valor inferior ao presumível valor de mercado, só por si, não viola os direitos dos credores exequentes e reclamantes, uma vez que o valor que o imóvel atinge no decurso do leilão, esse sim, corresponde ao valor máximo que os eventuais interessados pretendem oferecer pelo imóvel, considerando as concretas condições em que o mesmo se encontra. III - Nada na lei impõe que as vendas no âmbito das execuções fiscais se façam pelo presumível “valor de mercado”, antes pretendeu o legislador, com os instrumentos consignados na lei, que os bens possam ser vendidos em condições objectivas de concorrência e pelo mais elevado valor possível. Nº Convencional: JSTA000P18428 Nº do Documento: SA22015010701428 Data de Entrada: 02-12-2014 Recorrente: A... Recorrido 1: AT - AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA Votação: UNANIMIDADE Aditamento: Texto Integral Texto Integral: Acordam os juízes da secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo: A………………, inconformado, recorreu da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Viseu (TAF de Viseu) datada de 10 de Outubro de 2014, que julgou improcedente a reclamação que este tinha deduzido contra o despacho do Senhor Chefe de Finanças de Tarouca, que determinou a realização das diligências necessárias à entrega efectiva do imóvel objecto da venda nº Página 1 de 15 Acordão do Supremo Tribunal Administrativo 19-01-2015 http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/7a21037aaf36072b...

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Acórdãos STA Acórdão do Supremo Tribunal AdministrativoProcesso: 01428/14Data do Acordão: 07-01-2015Tribunal: 2 SECÇÃORelator: ARAGÃO SEIADescritores: EXECUÇÃO

VENDAIMÓVELVALORDIREITO DE RETENÇÃO

Sumário: I - O Direito de retenção, enquanto direito real de garantia, caduca com a venda do imóvel em execução, nos termos do disposto no artigo 824º, n.ºs. 2 e 3 do Código Civil, mas transfere-se para o produto da venda, embora com a sua função de garantia, para efeitos de ser pago o crédito correspectivo com preferência sobre os restantes credores, nos termos legais;II - O facto de o imóvel ter como base de licitação um valor inferior ao presumível valor de mercado, só por si, não viola os direitos dos credores exequentes e reclamantes, uma vez que o valor que o imóvel atinge no decurso do leilão, esse sim, corresponde ao valor máximo que os eventuais interessados pretendem oferecer pelo imóvel, considerando as concretas condições em que o mesmo se encontra.III - Nada na lei impõe que as vendas no âmbito das execuções fiscais se façam pelo presumível “valor de mercado”, antes pretendeu o legislador, com os instrumentos consignados na lei, que os bens possam ser vendidos em condições objectivas de concorrência e pelo mais elevado valor possível.

Nº Convencional: JSTA000P18428Nº do Documento: SA22015010701428Data de Entrada: 02-12-2014Recorrente: A...Recorrido 1: AT - AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRAVotação: UNANIMIDADE

Aditamento:

Texto Integral

Texto Integral: Acordam os juízes da secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:

A………………, inconformado, recorreu da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Viseu (TAF de Viseu) datada de 10 de Outubro de 2014, que julgou improcedente a reclamação que este tinha deduzido contra o despacho do Senhor Chefe de Finanças de Tarouca, que determinou a realização das diligências necessárias à entrega efectiva do imóvel objecto da venda nº

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2690.2013.8, designado para o efeito a data de 8 de Outubro de 2014.

Alegou, tendo concluído como se segue:1- O reclamante e agora recorrente no âmbito da venda supra referida informou, por diversas vezes, que exerce o direito de retenção sobre o imóvel em questão, possuindo-o por força da falta de pagamento do preço da empreitada que celebrou com a executada B………………, Ldª e referente ao preço dos serviços prestados e dos bens aplicados na fracção/imóvel em questão e nela incorporados;2- Não obstante o órgão tributário decidiu manter e ordenar a venda supra referida não fazendo constar da mesma, que sobre o bem incidia o direito de retenção invocado pelo reclamante, pelo que a omissão de publicitação da venda com tal ónus ou encargo, impediu a expurgação do direito do reclamante, o que, por si só, é causa de nulidade da venda em causa;3- Notificado para proceder à entrega das chaves, o reclamante não o fez e informou a AT e o adquirente porque razão o não fazia, estando a exercer um direito legal que lhe concede a posse sobre o imóvel em causa e o direito de manter essa posse até que o seu crédito lhe seja integralmente ressarcido;4- Assim, não estando o adquirente, nem a AT, em condições de lhe oferecer o pagamento integral do seu crédito, o mesmo não abriu mão do seu direito de retenção sobre o bem, por tal configurar um esvaziamento do próprio conceito jurídico/legal desse direito;5- Manteve o órgão de administração fiscal a sua decisão de manter a referida entrega, disso tendo notificado o recorrente, razão pela qual o recorrente reclamou do referido ato do senhor chefe.6- Decidiu o Tribunal recorrido manter a decisão daquele órgão, razão pela qual o recorrente apresenta o presente recurso na medida em que entende que o entendimento recorrido enferma de violação clara e inequívoca da lei, uma vez que tal entendimento configura um esvaziar de conteúdo o próprio direito de retenção, que lhe foi concedido por Lei e é reconhecido por todos;7- Além do mais, o despacho reclamado, faz ainda interpretação ilegal e inconstitucional das normas constantes dos art°s 754° e 761° do Código Civil, por contrário à Lei e à Constituição, ferindo os princípios da igualdade, legalidade e proporcionalidade, configurando ainda uma forma de expropriação ilegal na esfera jurídica do recorrente;8- Desde logo, porque é precedido de falta de resposta aos requerimentos que o reclamante dirigiu e anteriores à venda;9- Porque a venda é precedida de publicitação enganosa e

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errada, porque omissa quanto ao direito de retenção invocado pelo reclamante e, aliás, reconhecido pela executada e pela própria AT;10- Ao ordenar-se a entrega do bem sem a prévia resposta a tais requerimentos o Exm° Sr. chefe de Finanças, decidiu em violação da Lei e da Constituição da República Portuguesa;11- Acresce e como resulta do processo executivo o reclamante apresentou reclamação de créditos peticionando o reconhecimento do seu crédito bem como o direito de retenção sobre o bem até ser paga a totalidade do seu crédito;12- Apesar do órgão de administração fiscal ter conhecimento do direito do reclamante não se coibiu de ordenar a venda do bem, tendo atribuído ao bem para venda, um valor manifestamente insuficiente, em confronto com o valor reclamado pelo reclamante e garantido pelo direito de retenção.13- Considerou, erradamente na óptica do recorrente, quer o serviço de Finanças, quer a Senhora Juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal de Viseu que, “o direito de retenção invocado pelo reclamante, caducou, transferindo-se o crédito de que o mesmo é titular para o produto dessa venda, seja ele ou não suficiente para satisfazer integralmente esse crédito” - vide página 12 da sentença recorrida.14- Não se aceita tal entendimento, por ser ilegal e inconstitucional, ou seja, que o direito do reclamante tem de ser afastado e cai, independentemente do valor da venda do bem, contrariamente ao que é e sempre foi o espírito do próprio direito de retenção, aliás, primordial e contemporâneo à criação do nosso Código Civil.15- Ora, como se pode constatar dos elementos dos autos, o valor atribuído ao bem e pelo qual o mesmo foi vendido, é substancialmente inferior ao crédito do reclamante, garantido pelo direito de retenção e, também inferior ao valor real e de mercado desse bem, que é mais próximo do valor reclamado.16- O direito do reclamante só caducava, ou melhor, no entendimento da jurisprudência, só será transferido para o produto da venda se, em função da referida venda, ficasse garantida a quantia integral para satisfação do crédito do reclamante.17- Não tendo o produto da venda sido suficiente para acautelar o crédito garantido ao reclamante, não caducou o seu direito de retenção sobre o bem, pois, ele existe até satisfação integral do seu crédito.18- Não se aceita o entendimento do Tribunal no sentido que independentemente do valor da venda o titular do direito de retenção perde sempre o seu direito e apenas poderá pagar-se (neste caso parcialmente) através do produto da venda.19- Resulta da lei e do seu espírito que a extinção do direito

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garantido pela retenção apenas se extingue pela entrega da coisa ou pelo pagamento integral do crédito.20- Nos autos executivos em apreço ficou demonstrado - o que o órgão fiscal sabia ab initio, mesmo antes de ordenar a venda em causa - que atendendo ao produto da venda, o mesmo era substancialmente inferior ao crédito do reclamante, pelo que tinha aquele órgão perfeita noção desde início que o reclamante não veria o seu crédito satisfeito ainda que o seu crédito seja graduado em primeiro lugar entre os credores, como a lei impõe.21- Ao efetivar-se a entrega pretendida quer pelo órgão de administração fiscal quer pelo Tribunal recorrido, o reclamante fica desprovido, para não se dizer esbulhado, da sua garantia, o direito de retenção sobre o bem, de forma completamente atentatória dos seus direitos protegidos pela lei e pela própria Constituição.22- O entendimento recorrido não pode prevalecer sob pena de completa desvirtualização do próprio Instituto.23- Se o direito de retenção é aquele que permite ao seu titular reter o bem até ver satisfeito o seu crédito, como pode agora, sem mais, dar-se um novo sentido ou interpretação àquele preceito, para que se entenda que, afinal, o direito só subsiste enquanto o bem não for vendido independentemente do valor auferido com a sua venda.24- O recorrente nunca se opôs à entrega do bem, sempre se opôs à perda do seu direito, pois que, se o bem tivesse sido vendido no mínimo pelo valor da dívida reclamada pelo recorrente, sobre a qual assenta o seu direito de retenção, o recorrente não colocava qualquer entrave à referida venda e adjudicação.25- Pretende o órgão fiscal esbulhar o recorrente do seu direito, direito este garantido até ao crédito daquele, crédito este que não foi igualado pelo produto da venda - como o órgão fiscal tinha perfeito conhecimento.26- Não resultando do produto da venda a salvaguarda do direito do reclamante, nunca por nunca, poderá ver transferido o seu direito de retenção sobre o bem imóvel para o produto da venda deste, pelas razões já atrás referidas.27- Ao pensar-se doutra forma é aceitar retirar ao direito de retenção - legal e constitucionalmente consagrado - todo o seu efeito desvirtuando assim o seu conceito e aplicação jurídico-legal.28- No caso presente, o reclamante e detentor do direito de retenção do imóvel, além de não ter qualquer posse sobre o produto da venda - já que ele estará nas mãos da AT - e por isso deixa o aqui recorrente de ser possuidor/detentor do bem sobre o qual exerce o seu direito de retenção -, assim se esfumando o efeito útil do direito, também deixa de ter o direito de

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reter o bem até satisfação integral do seu crédito. Pois, como se vê, mesmo que se transferisse esse direito para o produto da venda, com a entrega do bem imóvel deixa de ter posse sobre o mesmo e possibilidade de exigir a satisfação integral do crédito para entrega do bem (já que o mesmo foi entregue antes).29- E por isso permanece o recorrente convicto que a decisão em causa é nula, na medida em que a interpretação que ali é feita é contrária à Lei que disciplina o referido estatuto do direito de retenção.30- A interpretação daquelas normas jurídicas feita na decisão recorrida é ainda Inconstitucional por violação dos princípios constitucionais de igualdade e proporcionalidade.31- A pretensa decisão que procura sonegar e esbulhar o reclamante do direito de reter o bem até ser pago integralmente do seu crédito, é ainda inconstitucional na medida em que configura uma verdadeira expropriação ilícita e ilegal por parte da Administração Fiscal, sem tal expropriação revestir e assumir uma das formas constitucionalmente admitidas.32- A pretensão da Administração Tributária configura uma forma de expropriação na medida em que procura retirar ao recorrente o bem sobre o qual detém direito, sem tal expediente configurar uma decisão legal e constitucional.33- Termos em que, Excelências, permanece o recorrente convicto que Vªs Exªs porão termino à pretensão da Administração Fiscal, fazendo uma correta interpretação da matéria de direito aplicável aos presentes autos, nomeadamente, decidindo que o direito de retenção vigora e subsiste enquanto o seu titular não tiver forma de assegurar, de forma legítima a satisfação do seu crédito.34- E, por isso, a decisão proferida pelo Tribunal a quo, após a correta aplicação e interpretação do direito do recorrente, tem de ser revogada e substituída pela devida e que se impõe, no sentido de, reconhecer que, como o faz a executada e a própria AT, se o reclamante é detentor do direito de retenção sobre o imóvel e, se o produto de venda do mesmo não é suficiente para garantir a satisfação integral do seu crédito, há que mantê-lo na sua posse e enquanto legitimo detentor de direito legal de retenção e até que se mostre satisfeito, ou pelo menos garantida a satisfação integral desse seu crédito.Nestes termos, decidindo-se como se requer, devem Vªs Exªs decidir pela revogação da Decisão recorrida, através da correta, legal e constitucional interpretação do instituto do direito de retenção, à luz dos presentes autos, e assim, FARÃO VªS EXªS, A DEVIDA E ACOSTUMADA, JUSTIÇANão houve contra-alegações.

O Ministério Público notificado, emitiu parecer no sentido de que o

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recurso deve improceder. Sucintamente, o Ministério Público entende que o alegado direito de retenção do recorrente caducou com a venda do imóvel em sede de execução transferindo-se para o produto da sua venda, e que efectuada a venda do imóvel em sede de execução, o direito de retenção não confere o direito de não entrega da coisa, mas apenas o de ser pago com preferência sobre o produto da venda.

Cumpre decidir.

Na sentença recorrida deu-se como assente a seguinte factualidade concreta:A) Em 05/09/2012, o Serviço de Finanças de Tarouca instaurou contra a sociedade comercial denominada “B…………….., Lda.”, NIPC …………., com sede na AV.ª ……………., ……………., 3610 - Tarouca, o processo de execução fiscal n.° 2690201201004280, para cobrança coerciva de dívidas provenientes de coimas e encargos de processo de contra-ordenação, no montante de 188,50€- cfr. fls. 1/2 dos autos.B) Ao processo de execução fiscal identificado em A) encontram-se apensos os seguintes processos de execução fiscal:Processo n.° 2690201201004387, instaurado em 11/09/2012, para cobrança coerciva de dívidas provenientes de coimas;Processo n.° 2690201201004670, instaurado em 09/10/2012, para cobrança coerciva de dívidas provenientes de coimas;• Processo n.° 2690201201004694, instaurado em 22/10/2012, para cobrança coerciva de dívidas provenientes de IVA;• Processo n.° 2690201201005251, instaurado em 23/10/2012, para cobrança coerciva de dívidas provenientes de IMI;• Processo n.° 2690201201005448, instaurado em 29/10/2012, para cobrança coerciva de dívidas provenientes de coimas;• Processo n.° 2690201201005839, instaurado em 23/11/2012, para cobrança coerciva de dívidas provenientes de coimas;• Processo n.° 2690201201005979, instaurado em 20/12/2012, para cobrança coerciva de dívidas provenientes de IVA, ascendendo o montante global em dívida a 10.722,04€ - cfr. fls. 4 e 9 dos autos.C) Em 10/04/2013, no âmbito dos referidos processos de execução fiscal, o Serviço de Finanças de Tarouca efetuou a penhora da fração autónoma identificada pela letra “………”, do prédio urbano, em regime de propriedade horizontal, descrito na Conservatória do Registo Predial de Tarouca sob o n.° 3153/20111017 - E - cfr. fls. 5/7 dos autos.D) Em 04/09/2013, o Sr. Chefe do Serviço de Finanças determinou que se procedesse à venda do imóvel mencionado em C), por meio de leilão eletrónico, nos termos do artigo 248.° do CPPT-cfr. fls. 14 dos autos.

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E) Em 29/11/2013, o reclamante apresentou o requerimento constante de fls. 24/25 dos autos, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido.F) Em 05/12/2013 através do ofício n.° 814, de 02/12/2013, o Serviço de Finanças de Tarouca notificou o reclamante, na pessoa do seu mandatário judicial nos termos seguintes:Em resposta ao seu pedido de suspensão da execução em epígrafe, informa-se de que o direito de retenção, sendo um direito real de garantia, não suspende o procedimento de venda, mas confere ao credor o direito à satisfação dos seus créditos com preferência sobre os demais credores (art. 759º do C. Civil), o que será tido em conta quando, nos termos do at° 245 do CPPT, se proceder à verificação e graduação de créditos;No caso de se concretizar a venda, o bem é adjudicado e entregue ao adquirente livre de encargos ou ónus, nos termos do art° 260º do CPPT e 824, n° 2 do C. Civil,- cfr. fls. 26/27 dos autos.G) Em 10/12/2013, o reclamante apresentou o requerimento constante de fls. 28 dos autos, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido.H) O edital de venda tem o seguinte teor:

-cfr. fls. 15 dos autos.

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I) Em 05/12/2013, o imóvel identificado em C) foi adjudicado, pelo valor de 44.300,00 € ao proponente C……………….. - cfr. fls. 35 dos autos, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido.J) Em 29/01/2014, o referido C………………, na qualidade de adquirente apresentou requerimento dirigido ao Sr. Chefe do Serviço de Finanças de Tarouca a solicitar a realização das diligências necessárias para a entrega do imóvel adquirido - cfr. fls. 38 dos autos, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido.K) Através do ofício n.° 120, de 26/02/2014, o reclamante foi notificado para proceder à entrega das chaves do imóvel vendido a fim se serem entregues ao adjudicatário - cfr. fls. 48/50 dos autos, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido.L) Em resposta ao ofício mencionado em K), em 12/03/2014, o reclamante apresentou o requerimento constante de fls. 55/56 dos autos, com o seguinte teor:Processo executivo n° 2690201201004280N° de Venda 2690.2013.8A………………., casado, residente no …………, freguesia de …………., concelho de Lamego, com o contribuinte fiscal número ……………., tendo sido notificado da informação prestada, vem, para que dúvidas não restem, informar que não prescinde do direito de retenção invocado em relação ao prédio em causa e que manterá esse mesmo direito enquanto não for ressarcido, na íntegra, do valor reclamado a título de créditos sobre a executada, como lhe é, aliás, conferido pelos art°s 757º e 759° do Código Civil, o que equivale a dizer que, contrariamente ao que foi anunciado na publicação da venda e é dito na informação antecedente, o bem em causa não pode ser entregue ao adquirente proponente livre de encargos ou ónus, já que, o exponente, a tanto se opõe, por força do seu direito de retenção sobre o imóvel, que mantém e manterá, como se alegou, até ressarcimento integral do seu crédito.Deste requerimento, por razões de clareza, boa-fé e rectidão processual, vai ser dado conhecimento ao adquirente proponente.M) Em 07/07/2014, foi emitida a informação constante de fls. 57/59 dos autos, da qual se extrai o seguinte:[...]

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N) Sobre a informação referida em M) recaiu despacho do Sr. Chefe do Serviço de Finanças, com o seguinte teor:

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[despacho reclamado] - cfr. fls. 60 dos autos.O) O reclamante foi notificado, na pessoa do seu mandatário judicial, do despacho a que se alude em N) em 09/07/2014 - cfr. fls. 65/66 dos autos.P) A presente reclamação deu entrada no Serviço de Finanças de Tarouca em 23/07/2014-cfr. carimbo aposto a fls. 1 dos autos.Nada mais se deu como provado.

Há agora que apreciar o recurso que nos vem dirigido.Da leitura atenta do corpo das alegações do recurso que nos vem dirigido e respectivas conclusões, podemos surpreender que estas conclusões abrangem um leque de diferentes questões que não são tratadas no corpo das alegações.No corpo das suas alegações o recorrente insurge-se contra a sentença recorrida, que manteve o despacho reclamado, invocando apenas duas questões e que são as questões basilares:- o valor base da venda do imóvel ser inferior ao seu crédito e também ao valor real de mercado (e consequentemente o valor real pelo qual a venda foi efectuada ser muito inferior ao valor garantido pelo direito de retenção –“Não tendo o produto da venda sido suficiente para acautelar o crédito garantido ao reclamante, não caducou o seu direito de retenção sobre o bem, pois, ele existe até satisfação integral do seu crédito.”);

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- ao efectuar-se a venda, e impondo-se ao titular do direito de retenção a entrega do bem, este “…deixa de ter posse sobre o bem e possibilidade de exigir a satisfação integral do crédito para entrega do bem (já que o mesmo foi entregue antes e a terceira pessoa)”; Conclui, assim, o recorrente que o entendimento da sentença recorrida, e respectivo despacho reclamado, que não atendeu a estas razões faz uma interpretação do disposto nos artigos 754º e 761º do CPC, contrária à Lei Fundamental, configurando uma expropriação ilícita e ilegal por parte da AT, sem tal expropriação revestir e assumir qualquer uma das formas constitucional e legalmente admitidas. Incorre, portanto, na violação dos princípios da igualdade e da proporcionalidade.

Vejamos, então.Que ao empreiteiro assiste legalmente o direito de retenção sobre a obra (imóvel) por si realizada, para pagamento do respectivo preço, trata-se de questão já suficientemente escalpelizada tanto na jurisprudência como na doutrina, não havendo, actualmente, vozes discordantes sobre esta matéria, cfr. acórdão do STJ, datado de 29/01/2014, recurso n.º 1407/09.3TBAMT.E1.S1.Que esse direito, enquanto direito real de garantia, caduca com a venda do imóvel em execução, nos termos do disposto no artigo 824º, n.ºs. 2 e 3 do Código Civil e que se transfere para o produto da venda, embora com a sua função de garantia para efeitos de ser pago o crédito correspectivo com preferência sobre os restantes credores, também já o decidiu este Supremo Tribunal, entre outros, no acórdão datado de 18/06/2013, recurso n.º 01339/12.Partindo destas premissas, facilmente podemos chegar à conclusão que se decidiu acertadamente na sentença recorrida as questões colocadas pelo recorrente no corpo das suas alegações.

Efectivamente, a venda efectuada no âmbito do processo de execução fiscal não ofende, tal como alegado, o direito do recorrente tal como ele o configura. Esse mesmo direito, por força do disposto no artigo 824º, n.ºs. 2 e 3 do Código Civil, deixa de incidir sobre o concreto imóvel no qual foram realizados os gastos e passa a incidir sobre o produto da venda desse mesmo imóvel, encontrando-se naturalmente sujeito às regras próprias do concurso de credores e respectiva graduação dos seus créditos. E, como também já se decidiu neste Supremo Tribunal, cfr. acórdão datado de 06-06-2012, recurso n.º 0902/11, o titular do direito de retenção apenas poderá reclamar o seu crédito no âmbito do concurso de credores, desde que munido de título exequível, cfr. artigo 788º, n.º 2 do Novo Código de Processo Civil

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(cfr. artigo 246º do CPPT).Assim, conclui-se, que o facto de o direito do recorrente se transferir para o produto da venda não limita, no essencial, a sua eficácia e amplitude, tanto mais que, a par dos restantes direitos de crédito, e cada um na sua medida, poderá sofrer as restrições necessárias e inerentes à incapacidade de solvabilidade do exequente.De resto, esta solução jurídica encontrada pelo legislador, não se tendo feito na sentença recorrida uma interpretação das normas legais que extravase o seu próprio texto -interpretação literal-, é conforme aos princípios constitucionais da legalidade e da proporcionalidade, uma vez que as regras próprias do processo de execução são todas elas justificadas pela rápida satisfação dos direitos dos credores e pela garantia de que o adquirente não seja confrontado com ónus ou encargos que diminuam os direitos por si adquiridos.

Também o facto de se ter fixado como valor base aquele que resulta das disposições conjugadas do artigo 250º do CPPT, n.ºs 1, al. a) e 4 [1 - O valor base para venda é determinado da seguinte forma: a) Os imóveis urbanos, inscritos ou omissos na matriz, pelo valor patrimonial tributário apurado nos termos do Código do Imposto Municipal sobre Imóveis (CIMI); 4 - O valor base a anunciar para venda é igual a 70 % do determinado nos termos do n.º 1.], não ofende o direito do recorrente.É certo que o valor base pelo qual o bem é posto à venda é, por vezes, inferior aos créditos exequendos e reclamados no seu conjunto, mas tratando-se de vendas por “leilão electrónico”, cfr. art. 248º do CPPT, isto é, tratam-se de vendas que têm como destinatários um número indeterminado de possíveis interessados uma vez que, teoricamente, todos aqueles que tenham acesso à internet podem vir a ser potenciais licitadores, são vendas que melhor poderão atingir valores próximos dos de mercado ou até superiores, considerando que cada um dos licitadores não tem conhecimento das licitações dos restantes.Ou seja, o facto de o imóvel ter como base de licitação um valor inferior ao presumível valor de mercado, só por si, não viola os direitos dos credores exequentes e reclamantes, e, portanto, o valor que o imóvel atinge no decurso do leilão, esse sim, corresponde ao valor máximo que os eventuais interessados pretendem oferecer pelo imóvel, considerando as concretas condições em que o mesmo se encontra.Nada na lei impõe que as vendas no âmbito das execuções fiscais se façam pelo presumível “valor de mercado”, antes pretendeu o legislador, com os instrumentos consignados na lei, que os bens possam ser vendidos em condições objectivas de

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concorrência e pelo mais alto valor possível.

Portanto, a venda ocorrida em execução fiscal que obedece a estas imposições legais não pode considerar-se inválida, não ofendendo, por isso, a lei ordinária nem a Lei Fundamental, antes deverá manter-se na ordem jurídica, improcedendo, assim, nesta parte, o recurso que nos vinha dirigido.

Relativamente às restantes questões colocadas pelo recorrente nas conclusões da sua alegação, não se encontrando fundamentadas no corpo das mesmas alegações, e não se vislumbrando que na sentença recorrida se tenha feito um manifesto errado julgamento quanto às mesmas, também terão que improceder.

Face ao exposto, os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Supremo Tribunal Administrativo acordam, em conferência, negar provimento ao recurso e manter a sentença recorrida.Custas pelo recorrente. D.N.

Lisboa, 7 de Janeiro de 2015. – Aragão Seia (relator) – Casimiro Gonçalves – Francisco Rothes.

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