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Acórdãos STA Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo Processo: 0360/13 Data do Acordão: 02-07-2014 Tribunal: 2 SECÇÃO Relator: PEDRO DELGADO Descritores: RECURSO EXTRAORDINÁRIO REVISÃO SENTENÇA CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DECISÃO INSTÂNCIA RECURSO Sumário: I - Quanto aos pressupostos processuais do recurso de revisão de sentença, no que não se encontrar previsto no artigo 293º do CPPT, haverá que recorrer à legislação subsidiaria indicada no art. 2º do Código de Procedimento e Processo Tributário. II - Não prevendo o regime de recursos no processo o judicial tributário a possibilidade de revisão de uma decisão interna, transitada em julgado, por ser inconciliável com uma decisão definitiva de uma instância internacional de recurso que seja vinculativa para o Estado Português, atenta a relevância desta ausência normativa e a natureza de tal omissão, impõe-se encontrar regulamentação adequada nas normas do Código de Processo Civil sobre interposição processamento e julgamento dos recursos jurisdicionais, no caso, e concretamente, no preceituado pelo artº 771º, al. f) do Código de Processo Civil, na redacção do decreto-lei 303/2007. III - Resulta do disposto na al. f) do artº 771º do Código de Processo Civil, que o legislador pretendeu estender o recurso de revisão não só aos casos em que decisão interna seja inconciliável com uma decisão do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem, como também aos casos em que se verifique inconciabilidade com qualquer decisão definitiva de uma instância internacional de recurso vinculativa para o Estado Português. IV - Um acórdão proferido pelo TJUE no âmbito de processo por incumprimento movido contra Portugal assume carácter vinculativo para o Estado Português e pode ser invocado como fundamento de recurso revisão ao abrigo da nova al.f) do artº 771º do Código de Processo Civil na redacção do decreto-lei 303/2007, verificados que sejam os demais pressupostos, nomeadamente a inconciabilidade com decisão interna transitada em julgado. V - O recurso extraordinário de revisão configura um verdadeiro processo novo, que tem essencialmente a natureza de uma acção que visa a mudança da ordem Página 1 de 24 Acordão do Supremo Tribunal Administrativo 21-07-2014 http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/6a28dd0dd1513bc7...

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Acórdãos STA Acórdão do Supremo Tribunal AdministrativoProcesso: 0360/13Data do Acordão: 02-07-2014Tribunal: 2 SECÇÃORelator: PEDRO DELGADODescritores: RECURSO EXTRAORDINÁRIO

REVISÃOSENTENÇACÓDIGO DE PROCESSO CIVILDECISÃOINSTÂNCIARECURSO

Sumário: I - Quanto aos pressupostos processuais do recurso de revisão de sentença, no que não se encontrar previsto no artigo 293º do CPPT, haverá que recorrer à legislação subsidiaria indicada no art. 2º do Código de Procedimento e Processo Tributário.II - Não prevendo o regime de recursos no processo o judicial tributário a possibilidade de revisão de uma decisão interna, transitada em julgado, por ser inconciliável com uma decisão definitiva de uma instância internacional de recurso que seja vinculativa para o Estado Português, atenta a relevância desta ausência normativa e a natureza de tal omissão, impõe-se encontrar regulamentação adequada nas normas do Código de Processo Civil sobre interposição processamento e julgamento dos recursos jurisdicionais, no caso, e concretamente, no preceituado pelo artº 771º, al. f) do Código de Processo Civil, na redacção do decreto-lei 303/2007.III - Resulta do disposto na al. f) do artº 771º do Código de Processo Civil, que o legislador pretendeu estender o recurso de revisão não só aos casos em que decisão interna seja inconciliável com uma decisão do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem, como também aos casos em que se verifique inconciabilidade com qualquer decisão definitiva de uma instância internacional de recurso vinculativa para o Estado Português.IV - Um acórdão proferido pelo TJUE no âmbito de processo por incumprimento movido contra Portugal assume carácter vinculativo para o Estado Português e pode ser invocado como fundamento de recurso revisão ao abrigo da nova al.f) do artº 771º do Código de Processo Civil na redacção do decreto-lei 303/2007, verificados que sejam os demais pressupostos, nomeadamente a inconciabilidade com decisão interna transitada em julgado.V - O recurso extraordinário de revisão configura um verdadeiro processo novo, que tem essencialmente a natureza de uma acção que visa a mudança da ordem

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jurídica definida em decisão transitada em julgado. VI - Ainda que a decisão revidenda a que respeite haja sido proferida em processo instaurado anteriormente a 01/01/2008, o recurso extraordinário de revisão interposto após essa data segue o regime resultante do D.L. nº 303/2007, de 24/08, podendo ter como base o fundamento constante da al.f) do artº 771º do Código de Processo Civil.

Nº Convencional: JSTA000P17739Nº do Documento: SA2201407020360Data de Entrada: 05-03-2013Recorrente: STICHTING PENSIOENFONDS ABP E OUTRORecorrido 1: FAZENDA PÚBLICAVotação: UNANIMIDADE

Aditamento:

Texto Integral

Texto Integral: Acordam na Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo

1 – Stichting Pensioenfonds ABP e Stichting Pensionfonds Zorg en Welzijn melhor identificadas nos autos, vêm recorrer para este Supremo Tribunal da decisão do Tribunal Tributário de Lisboa que indeferiu o pedido de recurso de revisão da sentença proferida no processo nº 2014/06.8BELSB, sentença essa que julgou improcedente a impugnação por eles apresentada contra o IRC retido na fonte sobre os dividendos auferidos das participações sociais, detidas em sociedades residentes em território português referente aos anos de 2003 e 2004.

Termina as suas alegações de recurso, formulando as seguintes conclusões: «A) Por sentença datada de 29 de Outubro de 2008, o Douto Tribunal a quo julgou totalmente improcedente a impugnação judicial apresentada pelas ora Recorrentes, nos termos da qual se solicitava a restituição do IRC retido na fonte suportado em Portugal nos anos de 2003 e 2004 sobre os dividendos por si auferidos decorrentes de participações sociais detidas em sociedades residentes em território português;B) No dia 6 de Outubro de 2011, o TJUE proferiu um acórdão no âmbito de acção por incumprimento movida pela Comissão no processo C-493/09, nos termos do qual julgou a legislação nacional — a legislação que serviu de base à decisão recorrida proferida em primeira instância - incompatível com o direito comunitário, por violação do princípio da não discriminação e da liberdade de

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circulação de capitais;C) O Acórdão proferido pelo TJUE é incompatível com a decisão proferida pelo Tribunal a quo, tendo sido este o fundamento do recurso de revisão apresentado pelas ora Recorrentes ao abrigo do disposto na alínea f) do artigo 771.º do CPC;D) Na óptica do tribunal recorrido, o recurso não deverá ser atendido porquanto não se enquadra em nenhum dos fundamentos previstos no artigo 293°, número 2 do CPPT, sendo que o artigo 771° do CPC não se mostra aplicável aos presentes autos;E) Na óptica das ora Recorrentes, a admitir-se uma tal interpretação, baseada, exclusivamente, na forma processual adoptada, viola de forma frontal o quadro constitucional em vigor, máxime os princípios da tutela jurisdicional efectiva, da igualdade e da prevalência do direito comunitário sobre o direito interno;F) A aplicação do artigo 771° do CPPT decorre do princípio da unicidade do sistema jurídico, uma vez que as normas do CPPT são anteriores ao novo regime de recursos instituído no CPC por via do DL. n.º 303/2007, de 24.08, qual veio a introduzir um novo fundamento para o recurso de revisão por via da introdução da alínea f) no artigo 711° daquele diploma;G) Sendo o CPC de aplicação subsidiária ao CPPT nos termos do artigo 2° deste último diploma, vedar a sua aplicação aos processos de natureza tributária redundaria numa aplicação não uniforme do direito e retiraria coerência e coesão ao nosso sistema jurídico, o que se mostraria, aliás, contrário ao quadro constitucional em vigor;H) Admitir-se que processos que dirimam questão de direito materialmente idênticas possam estar submetidos a regimes processuais distintos, negando nuns casos o acesso ao recurso de revisão com os fundamentos alargados do CPC — na jurisdição tributária - e admitindo-o noutros casos — na jurisdição administrativa em matéria tributária por força da remissão operada pelo artigo 154° do CPTA - redundaria numa denegação ou restrição ilegítima do acesso aos tribunais e do princípio da tutela jurisdicional efectiva;I) Com efeito, caso as ora Recorrentes, para tutelar o mesmo direito e pretensão, se tivessem socorrido da acção administrativa especial regulada pelo CPTA - o que poderia suceder caso tivessem optado por formular um pedido de restituição do imposto suportado em Portugal com fundamento numa norma convencional, ao invés de

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solicitarem a anulação do acto tributário por via da reclamação prévia prevista no artigo 132° do CPPT — parece inequívoco que poderiam socorrer-se do recurso de revisão com os fundamentos previstos no artigo 771° do CPC;J) Permitir-se a um sujeito passivo socorrer-se do recurso de revisão com fundamento na alínea f) do artigo 771° do CPC na eventualidade de ter seguido uma via processual regulada pelo CPTA e negar essa mesma pretensão a um sujeito passivo que tenha seguido, para a mesma questão material controvertida, o regime da impugnação judicial prevista no CPPT constitui uma solução jurídica que não pode ser acolhida pelos nossos Tribunais por colocar em causa os princípios da igualdade, da tutela jurisdicional efectiva, do acesso aos Tribunais e da aplicação uniforme do Direito Comunitário na nossa ordem jurídica;K) Por outro lado, conforme amplamente defendido pela nossa Doutrina e com acolhimento jurisprudencial, o recurso de revisão não é verdadeiramente um recurso, mas ao invés uma nova acção, que dá lugar a uma nova instância e a um novo processo, pelo que, a data relevante para efeitos de aplicabilidade no tempo do disposto na alínea f) do artigo 771.º do CPC, deve ser a da interposição do recurso de revisão e não a da propositura da acção em que foi proferida a decisão objecto do recurso, o que se invoca para os devidos efeitos legais, mormente para efeitos de revogação da decisão ora recorrida;L) A aplicação da alínea f) do artigo 771° não se cinge aos casos em que a decisão nacional transitada em julgado seja incompatível com a decisão proferida no próprio caso concreto, vide em sede de recurso da decisão proferida pela instância nacional para o Tribunal Europeu dos Direitos do Homem, porquanto é o próprio legislador a admitir no preâmbulo do Decreto-Lei n.º 303/2007 que “são ampliados os casos em que é admissível o recurso extraordinário de revisão, de forma a permitir que a decisão interna transitada em julgado possa ser revista quando viole a Convenção Europeia dos Direitos do Homem ou normas emanadas dos órgãos competentes das organizações internacionais de que Portugal seja parte”;M) Parece claro que o legislador pretendeu estender o recurso de revisão, sempre que a decisão transitada em julgado seja inconciliável com decisão jurisdicional incompatível com a Convenção Europeia dos Direitos do Homem, ou com qualquer decisão ou norma emanada por

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um órgão internacional a que Portugal esteja vinculado;N) Entre o primado do caso julgado material de uma decisão interna e a aplicação uniforme do direito comunitário, tal como interpretado por uma instância internacional, é evidente que deverá prevalecer este ultimo, sob pena de falta de coerência do sistema jurídico nacional e vício de inconstitucionalidade, por directa violação do artigo 8.° da CRP;O) É evidente no caso sub judice a identidade da causa de pedir e do regime jurídico entre as duas decisões, assim se evidenciando, sem necessidade de maiores considerações, a natureza inconciliável da decisão proferida pelo tribunal a quo com o Acórdão proferido pelo TJUE no processo n.º C-439/09, o que se invoca para os devidos efeitos legais;P) Conforme defende JOSÉ LEBRE DE FREITAS in Código de Processo Civil Anotado, Volume 3°, “Exige-se que haja uma contradição ou insusceptibilidade de conciliação entre a decisão revidenda e a decisão definitiva de uma instância internacional de recurso vinculativa para o Estado Português”.Q) A manutenção na ordem jurídica nacional da sentença proferida pelo Douto Tribunal a quo implicaria a consolidação de uma decisão inconciliável com a interpretação vinculativa do TJUE sobre o Direito Comunitário, o que justifica a sua revisão excepcional ao abrigo da alínea do artigo 771° do CPC;R) A decisão proferida pelo TJUE assume carácter vinculativo para o Estado Português, uma vez que nos termos do artigo 220.° do Tratado de Roma, o TJUE garante “o respeito do direito na interpretação e aplicação do presente Tratado”;S) Acresce que a decisão proferida pelo TJUE decorre de processo por incumprimento movido contra Portugal, pelo que a referida decisão tem efeito erga omnes, estendendo os seus efeitos para além do caso em que foi proferido, o que não deixa de constituir mais um elemento interpretativo à disposição deste Tribunal;T) Não ignorando que este meio processual constitui um recurso de natureza amplamente excepcional, entendem as Recorrentes que o mesmo tem pleno cabimento no caso em apreço, uma vez que violaria as mais elementares regras de um Estado de direito que se pudesse manter na ordem jurídica uma decisão proferida por um Tribunal interno materialmente desconforme com a interpretação vinculativa do mesmo quadro legal por parte do TJUE;

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U) A questão cuja apreciação jurisdicional se requer a este mui douto Tribunal, à luz inclusive dos princípios constitucionais acima invocados, consiste em determinar se se mostra admissível no caso concreto — ou mesmo em abstracto — que seja recusada a revisão de sentença por força duma interpretação literal do regime de recursos à luz do regime original previsto no artigo 293° do CPPT;V) Dito de outro modo: não tendo tido o legislador nacional o cuidado de articular o artigo 293° do CPPT com o regime consignado no artigo 771° do CPC, será de admitir-se ainterpretação do tribunal recorrido e recusar a revisão de sentença em todos os processos judiciais abrangidos pela jurisdição tributária com fundamento em sentença superveniente proferida pelo TJUE que seja materialmente inconciliável com decisão proferida por um órgão jurisdicional nacional?W) Note-se que a admitir-se uma tal interpretação, não estaria em causa, apenas, a pretensão das ora Recorrentes mas de todo e qualquer sujeito passivo destinatário de qualquer decisão judicial que venha a ser mais tarde tacitamente revogada por uma decisão do TJUE de efeitos erga omnes, o que sucederá sempre que esteja em causa uma acção por incumprimento do Estado português;X) Tudo resumido, estabelecendo o CPC um meio de revisão extraordinário de decisões já transitadas em julgado que se impõe na ordem jurídica sempre que as mesmas se mostrem inconciliáveis com decisões de instâncias internacionais é evidente a sua aplicação ao caso ora em análise, o que motivará a procedência do presente recurso, requerendo-se a este Venerando Tribunal que se digne revogar a decisão ora recorrida e, consequentemente se digne ordenar a revisão da sentença proferida a 29 de Outubro de 2008 em sede dos autos de impugnação judicial acima melhor referidos, ao abrigo do disposto na alínea f) do artigo 771.° do CPC, em virtude de a referida decisão se mostrar inconciliável com o acórdão proferido pelo TJUE no dia 6 de Outubro de 2011, no âmbito do processo C-493/09, tudo com as devidas consequências legais.

2 – A recorrida, Fazenda publica não apresentou as contra alegações.

3 - O Exmº Procurador Geral Adjunto emitiu parecer, com a seguinte fundamentação:«A recorrente acima identificada vem sindicar a sentença

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do Tribunal Tributário de Lisboa, exarada a fls.87/91, em 28 de Novembro de 2012.A sentença recorrida indeferiu pedido de recurso de revisão de decisão proferida em 29 de Outubro de 2008, em processo de impugnação judicial, ao abrigo do estatuído no artigo 771.°/f) do CPC, no entendimento de que não se verificam os pressupostos de tal recurso, taxativamente fixados no artigo 293.°/2 do CPPT.A recorrente termina as suas alegações com as conclusões de fls. 134/138, que, como é sabido, delimitam o objecto do recurso, nos termos do estatuído nos artigos 684.°/3 e 685°-A/1 do CPC, e que aqui se dão por inteiramente reproduzidas.A recorrida não contra-alegou.A nosso ver, o recurso não merece provimento.A autoridade do caso julgado não é absoluta nem necessária, filiando-se em considerações de utilidade e oportunidade que podem aconselhar o sacrifício daquela autoridade para evitar os superiores dano e perturbação que adviriam de uma sentença intoleravelmente injusta.A definição desses casos excepcionais, em que o princípio da segurança cede ao princípio da justiça é questão de política judiciária positivada, no que concerne ao processo judicial tributário, no artigo 293.º do CPPT (sobre a questão ver código de processo Civil, anotado, volume VI, página 337, professor Alberto dos Reis).Ora, nos termos do estatuído no artigo 293.º/2 do CPPT, apenas existem três fundamentos de recurso de revisão:1. Falsidade de documento declarada por decisão transitada em julgado;2. Documento novo que o interessado não tenha podido apresentar no processo e que seja suficiente para a destruição da prova feita;3. Falta ou nulidade da notificação do requerente quando tenha dado causa a que o processo corresse à sua revelia (Código de Procedimento e de processo Tributário, anotado e comentado, 6ª edição 2011, IV volume, páginas 543/555, Juiz conselheiro Jorge Lopes de Sousa).A recorrente invoca como fundamento do recurso de revisão a incompatibilidade da sentença revidenda com o acórdão do TJUE, de 6 de Outubro de 2011, proferido no processo C-493/09, posteriormente, fundamento esse que não tem apoio no artigo 293.º do CPPT.Entende a recorrente que é de aplicar subsidiariamente o disposto no artigo 711.º/1 do CPC, na redacção do DL 303/2007, de 24 de Agosto, pelo que o fundamento invocado teria apoio legal.

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Todavia, mesmo que se aceitasse a aplicação subsidiária do artigo 771.º do CPC, à semelhança do que acontece na jurisdição administrativa, por via do estatuído no artigo 154.° do CPTA, o certo é que o fundamento invocado, no caso concreto, em análise, não é fundamento de recurso de revisão.De facto, como muito bem refere a sentença recorrida, invocando os acórdãos do Tribunal da Relação de Lisboa de, 28 de Maio de 2009 — P. 1204/06 e do Tribunal da Relação do Porto — P. 978/04 (ambos disponíveis no sitio da internet www.dgsi.pt), ao recurso extraordinários de revisão de decisão proferida em processo iniciado antes de 1 de Janeiro de 2008, aplica-se o regime anterior ao introduzido pelo DL 303/2007, de 24 de Agosto, mesmo que o recurso seja interposto após 31 de Dezembro de 2007, pois que a revisão não abre um novo processo, antes constitui uma forma de desenvolvimento do mesmo processo, da mesma acção.Ora, o artigo 771.º do CPC, na redacção anterior ao DL 303/2007, não contemplava o fundamento invocado pela recorrente como fundamento de recurso extraordinário de revisão.E não se venha dizer que com esta interpretação restringe, ilegitimamente, o direito de acesso aos tribunais e o princípio da tutela jurisdicional efectiva.Veja-se que, como o decorre da análise dos autos, a recorrente interpôs recurso de revista, per saltum, para o STA, onde suscitou a incompatibilidade das normas em causa com o Direito Comunitário, tendo, até, solicitado o reenvio prejudicial para o TJUE, caso o STA entendesse não dispor de todos os elementos para decidir a questão (fls. 400/431 dos autos).Tendo a STA decidido que não era o tribunal competente, em razão da hierarquia, para conhecer do recurso, uma vez que o recurso não tinha por fundamento exclusivamente, o certo é que a requerente, podendo fazê-lo (artigo 18.°/2 do CPPT), não requereu a remessa dos autos ao TCAS, tribunal competente (fls. 521/528 dos autos).Portanto é certo que à recorrente foi garantido o direito de acesso aos tribunais e à tutela jurisdicional efectiva, nos termos do estatuído no artigo 20.° da CRP.Por outro lado, o caso julgado “…como qualquer outro princípio, pode sofrer compressões, desde que constitucionalmente, justificadas. Assim, determina o n.º 6 do artigo 29.º da CRP que tenha direito a revisão de sentença [nas circunstâncias prescritas na lei] os cidadãos

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injustamente condenados pela prática de um crime; e dispõe o n.º 3 do artigo 282.° que os defeitos das declarações de inconstitucionalidade com força obrigatória geral possa, por decisão do tribunal, não ressalvar, os casos julgados «quando a norma respeitar a matéria penal, disciplinar ou de ilícito de mera ordenação social e for de conteúdo mais favorável ao arguido».Fora destas circunstâncias, decorrerá ainda do artigo 20.º da CRP, e do valor de justiça que nele vai inscrito, a necessária existência, nomeadamente, em processos cíveis de um qualquer meio processual de ultrapassagem do caso julgado. Contudo, e como se disse no Acórdão n.º 319/2005, descontada a supressão pura e simples da existência desse meio processual, ao legislador ordinário sempre assistirá um apreciável grau de liberdade na conformação concreta dos pressupostos.Ora, um dos modos que pode revestir essa configuração traduz-se precisamente na tipificação das situações em que legalmente admissível o recurso excepcional de revisão de sentença.Por através deles se estabelecer um equilíbrio entre valores constitucionais igualmente dignos de tutela, os concretos pressupostos de que a lei faz depender a admissibilidade do recurso de revisão só podem ser sindicados pelo Tribunal Constitucional segundo um critério de evidência ou de desrazoabilidade manifesta.”(do acórdão do TRIBUNAL CONSTITUCIONAL nº 408/2010, disponível no sitio da internet www.tribunalconstitucional.pt).A sentença recorrida não merece, pois, censura.Termos em que deve negar-se provimento ao recurso, mantendo-se a sentença recorrida na ordem jurídica.»

5 – Colhidos os vistos legais, cabe decidir.

6- Resulta dos autos a seguinte factualidade com interesse para a discussão da causa:a) Por sentença de 29 de Outubro de 2008, no processo nº 2014/06.8BELSB, o Tribunal Tributário de Lisboa julgou improcedente a impugnação deduzida por STICHTING PENSIOENFONDS ABP, Fundo de Pensões constituído ao abrigo do direito Holandês, sedeado em Oude, Lindestraat, 70, 6411 EJ, Heeen, Holanda, e STICHTING PENSIOENFONDS VOOR DE GEZONDHEID, GEETELIJKE EN MAATSCHAPPELIJK BELANGEN, (PGGM) Fundo de Pensões igualmente constituído ao abrigo do direito Holandês, sedeado em Kroostweg Noord,

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149, 37041 DV Zeist, Holanda, contra o acto de indeferimento tácito da administração tributária (AT) relativamente à reclamação graciosa deduzida a propósito das retenções na fonte de IRC sobre dividendos respeitantes aos exercícios dos anos de 2003 e 2004, no montante de 866 057,46 € no que concerne ao primeiro impugnante ABP, e no montante de 356 365,04 € no tocante ao segundo impugnante PGGM ( fls. 339 e segs. dos autos apensos).b) Em 5 de Dezembro de 2011 os recorrentes interpuseram recurso de revisão da sentença referida em a) ao abrigo do disposto no artº 771º, nº 1, al. f) do Código de Processo Civil, na redacção que lhe foi dada pelo decreto-lei 303/2007, invocando inconciabilidade com o Acórdão proferido pelo TJUE no processo nº C-439/09 (fls. 5 e segs. dos presentes autos).c) Os recorrentes juntaram cópia autenticada do Acórdão do TJUE proferido em 06.10.2011, no processo C-439/09 (fls. 46 e segs. dos presentes autos)d) A decisão recorrida, que consta de fls. 87 e segs., indeferiu o recurso de revisão “uma vez que não se verifica nenhum dos fundamentos taxativamente previstos no nº 2 do artº 293º do Código de Procedimento e Processo Tributário”.

7- A questão objecto do presente recurso consiste em saber se incorreu em erro de julgamento decisão recorrida, de fls. 89 e segs., que não admitiu o recurso de revisão da sentença proferida em 29 de Outubro de 2008, no processo nº 2014/06.8BELSB, por considerar que não se verifica nenhum dos fundamentos taxativamente previstos no nº 2 do artº 293º do Código de Procedimento e Processo Tributário e por considerar excluída a aplicação ao caso em apreço do fundamento de recurso previsto na alínea f) do artº 771º do Código de Processo Civil na redacção que lhe foi dada pelo decreto-lei 303/2007.

A sentença recorrida, conhecendo desde logo da questão da admissibilidade do recurso concluiu que o fundamento invocado - inconciabilidade com o Acórdão proferido pelo TJUE no processo nº C-439/09 - não se enquadra em nenhuma das situações previstas no artº 293º do Código de Procedimento e Processo Tributário.

De igual modo, quanto à suscitada questão da aplicação do fundamento previsto na al. f) do artº 771º do Código de Processo Civil na redacção que lhe foi dada pelo decreto-

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lei 303/2007, julgou a decisão sindicada que o nº 1 do artº 11º do decreto-lei 303/2007 determina que as suas disposições legais não se aplicam aos processos pendentes à data da sua entrada em vigor e que tendo o citado diploma entrado em vigor em 01.01.2008, encontrando-se pendente a impugnação nº 2014/06.8BELSB desde 31.07.2006, não seria aplicável a nova redacção do preceito, mas sim a anterior, que não previa aquele fundamento de revisão de sentença.

Contra o assim decidido insurgem-se os recorrentes defendendo, em síntese, que a interpretação acolhida pela decisão recorrida, baseada exclusivamente na forma processual adoptada, viola de forma frontal o quadro constitucional em vigor, maxime os princípios da tutela jurisdicional efectiva, da igualdade e da prevalência do direito comunitário sobre o direito interno.E que a aplicação do artigo 771° do CPPT decorre do princípio da unicidade do sistema jurídico, uma vez que as normas do CPPT são anteriores ao novo regime de recursos instituído no CPC por via do DL. n.º 303/2007, de 24.08, qual veio a introduzir um novo fundamento para o recurso de revisão por via da introdução da alínea f) no artigo 711º daquele diploma.No desenvolvimento de tal argumentação sustentam que o recurso de revisão não é verdadeiramente um recurso, mas ao invés uma nova acção, que dá lugar a uma nova instância e a um novo processo, pelo que, a data relevante para efeitos de aplicabilidade no tempo do disposto na alínea f) do artigo 771.º do CPC, deve ser a da interposição do recurso de revisão e não a da propositura da acção em que foi proferida a decisão objecto do recurso.

8. Apreciando

8.1 Dos requisitos de admissibilidade do recurso de revisão de sentença. O recurso de revisão, nos processos a que se aplica o regime de recursos jurisdicionais previsto no Código de Procedimento e Processo Tributário, encontra-se regulado no artº 293º do Código de Procedimento e Processo Tributário.Trata-se de um recurso extraordinário que tem como pressuposto que a decisão revidenda já tenha transitado em julgado (por contraposição aos recursos ordinários,

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que visam evitar o trânsito em julgado das decisões desfavoráveis).

De acordo com o disposto no artº 293º, nº 2 do Código de Procedimento e Processo Tributário apenas é admitida a revisão em caso de decisão judicial transitada em julgado declarando a falsidade do documento, ou documento novo que o interessado não tenha podido nem devia apresentar no processo e que seja suficiente para a destruição da prova feita, ou de falta ou nulidade da notificação do requerente quando tenha dado causa a que o processo corresse à sua revelia.Como se viu a decisão recorrida, conhecendo desde logo da questão da admissibilidade do recurso concluiu que o fundamento invocado - inconciabilidade com o Acórdão proferido pelo TJUE no processo nº C-439/09 - não se enquadra em nenhuma das referidas situações taxativamente previstas no artº 293º do Código de Procedimento e Processo Tributário.Mas a recorrente invoca a aplicação subsidiária do artigo 771º, al. f) do Código de Processo Civil sustentando que tal decorre do princípio da unicidade do sistema jurídico, uma vez que as normas do CPPT são anteriores ao novo regime de recursos instituído no CPC por via do DL. n.º 303/2007, de 24.08, o qual veio a introduzir um novo fundamento para o recurso de revisão por via da introdução da alínea f) no artigo 711° daquele diploma.

8.2 A primeira questão a dirimir é, pois, a de saber se há lugar a aplicação subsidiária do Código de Processo Civil no que respeita aos fundamentos do recurso extraordinário de revisão de sentença em processo judicial tributário.A resposta deverá ser afirmativa.

No caso em apreço os recorrentes invocam como fundamento do recurso de revisão o acórdão do TJUE de 6 de Outubro de 2011 ( proferido no processo C-493/09), alegando a inconciabilidade com a decisão proferida pelo tribunal a quo em 29 de Outubro de 2008 (fls.339/349), integrando tal fundamento na previsão da alínea f) do artº 771º do CPC, na redacção dada pelo DL nº 303/2007 de 24 de Agosto, conjugado com o regime estabelecido no artº 293º do CPPT.

O referido acórdão do Tribunal de Justiça, que se encontra junto a fls. 46 e segs. dos presentes autos, foi proferido no âmbito do processo C-493/09 e tinha por objecto uma

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acção por incumprimento nos termos do artigo 258.° TFUE, instaurada pela Comissão Europeia, contra a República Portuguesa em que a Comissão pedia ao Tribunal de Justiça que declarasse que, ao tributar os dividendos auferidos por fundos de pensões não residentes a uma taxa superior à que incide sobre os dividendos auferidos por fundos de pensões residentes no território português, a República Portuguesa não cumpriu as obrigações que lhe incumbem por força dos artigos 63.° TFUE e 40.° do Acordo sobre o Espaço Económico Europeu, de 2 de Maio de 1992.

No âmbito daquela acção por incumprimento o Tribunal de Justiça decidiu que ao reservar o benefício da isenção de imposto sobre as sociedades apenas aos fundos de pensões residentes no território português, a República Portuguesa não cumpriu as obrigações que lhe incumbem por força dos artigos 63.° TFUE e 40.° do Acordo sobre o Espaço Económico Europeu, de 2 de Maio de 1992.

O quadro jurídico considerado no referido Acórdão foi o decorrente do artº 16º do EBF (Que corresponde ao artigo

14.º, na redacção do EBF que se encontrava em vigor previamente à republicação do mesmo pelo Decreto-Lei n.º

108/2008, de 26/06) e o dos arts. 4.°, n.º2, 80.º, n.º 4, alínea

c), 88.º, n.os1, alínea c), 3, alínea b), e 5, 11º e 12º todos do CIRC (redacção em vigor até 2009)

Quanto à questão decidenda julgou o Tribunal de Justiça que, «para que o IRC não incida sobre os dividendos distribuídos a fundos de pensões por sociedades estabelecidas em território português, esses dividendos devem preencher dois requisitos. Por um lado, devem ser pagos a fundos de pensões que se constituam e operem em conformidade com o direito português. Por outro, esses dividendos devem ser distribuídos a título de partes sociais que tenham permanecido na titularidade do mesmo fundo de pensões, de modo ininterrupto, durante um período mínimo correspondente ao ano anterior à data da sua colocação à disposição ou que tenham sido mantidas durante o tempo necessário para completar esse período.(30) Daqui decorre que, devido ao primeiro requisito previsto pela regulamentação nacional em causa, o investimento que pode ser efectuado numa sociedade portuguesa por um fundo de pensões não residente é menos atractivo do que o investimento que poderia ser realizado por um fundo de pensões residente. Com efeito,

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apenas no primeiro caso os dividendos distribuídos pela sociedade portuguesa são onerados a uma taxa correspondente a 20%, a título de IRC, mesmo que sejam provenientes de partes sociais que tenham permanecido na titularidade desses fundos durante um período mínimo correspondente ao ano anterior à data da sua colocação à disposição. Esta diferença de tratamento tem por efeito dissuadir os fundos de pensões não residentes de investir em sociedades portuguesas e os aforradores residentes em Portugal de investir nesses fundos de pensões.(31) A referida diferença de tratamento não existe todavia quando os dividendos pagos por uma sociedade residente são provenientes de partes sociais que não tenham permanecido na titularidade do mesmo sujeito passivo durante o ano que precede a data da sua colocação à disposição. Com efeito, por força do artigo 88.º n.º 11, do CIRC, a isenção prevista no artigo 16.º 1, do EBF não é aplicável nestas condições, de modo que o IRC incide sobre estes dividendos independentemente do local de residência do fundo de pensões ao qual são pagos.(32) Nestas condições, há que concluir que, no que respeita à tributação dos dividendos pagos por sociedades estabelecidas em território português a título de partes sociais detidas por um fundo de pensões durante mais de um ano (Sublinhado nosso.), a regulamentação controvertida constitui uma restrição à livre circulação de capitais proibida, em princípio, pelo artigo 63º TFUE.»

Já a sentença proferida pelo Tribunal Tributário de Lisboa (fls. 339 e segs.), chamada a pronunciar-se sobre questão idêntica – desconformidade dos arts. 80º do CIRC (Na

redacção então em aplicável e que vigorou até 31/12/2009.) e do artº 14º do EBF (Na redacção do EBF que se encontrava em

vigor previamente à republicação do mesmo pelo Decreto-Lei n.º

108/2008, de 26/06.) com os artigos 12º e 56º do Tratado de Roma - e no âmbito do mesmo quadro jurídico, decidiu em sentido oposto ao entendimento defendido pelo TJUE, tendo concluído pela inexistência de qualquer diferença de tratamento conferida pela legislação nacional sobre tributação de dividendos, afirmando que, “(...) a isenção prevista para os dividendos distribuídos a Fundos de Pensões estabelecidos e domiciliados em Portugal se circunscreve aos que se constituam e operem de acordo com a legislação nacional (...) e funcionem nos termos legalmente previstos (...).E, no caso trazido pelas impugnantes, estes pretendem a isenção dos dividendos obtidos enquanto entidades a

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operar na área de investimentos financeiros em sociedades portuguesas, (...), o que configura questão evidentemente diversa e que, por isso, não pode ter o acolhimento pretendido em termos da isenção reclamada por falta de previsão legal.Não se vislumbra, assim, um comportamento discriminatório da AT para com os impugnantes (...).“Prosseguindo nesta argumentação o Tribunal Tributário de Lisboa acaba por concluir que “(...) a invocada violação das liberdades de estabelecimento e circulação de capitais não se vislumbra, atenta a diversidade de situações comparativas trazidas ao autos pelos impugnantes, devendo, no caso em apreço, reafirma-se, a tributação efectuar-se nos termos da aludida CDT celebrada entre Portugal e a Holanda, não se partilhando da tese de que tal solução seja violadora da proibição de discriminações em razão da nacionalidade e da proibição das restrições aos movimentos de capitais, previstas nos arts. 12º e 56º do Tratado de Roma.Nestes termos, não pode o Tribunal declarar a desconformidade dos artigos 80° do Código de IRC e do art.° 14º do EBF, com os artigos 12º e 56º do Tratado de Roma, conforme peticionado pelos impugnantes, tendo que improceder a impugnação nesta parte.”

Pese embora esta questão nem sequer tenha sido ponderada na decisão recorrida – que afastou desde logo a aplicação subsidiária do artº 771º, al. f), do Código de Processo Civil - admite-se, pois, que, em tese, e pelo menos no plano decisório, o Acórdão do TJUE pode constituir fundamento do recurso extraordinário de revisão, porquanto, numa primeira análise, se afigura inconciliável com a sentença proferida pelo Tribunal Tributário de Lisboa em 29 de Outubro de 2008.

Ponto é saber se tal acórdão pode ser invocado como fundamento de recurso por aplicação subsidiária da al.f) do artº 771º do Código de Processo Civil na redacção então em vigor ( artº 696º, al. f) na actual redacção).

Como vimos, o artº 293º do CPPT não prevê tal a possibilidade. No que concerne a legislação subsidiária, dispõe o nº 5 referido normativo que, no que não está previsto neste artigo, a revisão segue os termos do processo em que foi proferida a decisão revidenda.Sobre o conteúdo desta norma esclarece Jorge Lopes de

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Sousa, no seu Código de Procedimento e Processo Tributário anotado, 6ª edição, Áreas Editora, vol. IV, pag. 545, que, como se deduz desta referência aos “termos do processo”, a mesma reporta-se apenas à tramitação do recurso não abrangendo, assim, as matérias que não se enquadram neste conceito, designadamente os pressupostos processuais.Assim, quanto aos pressupostos processuais do recurso de revisão de sentença, sublinha Lopes de Sousa (Ob. citada, Vol.IV, pag. 545; Também neste sentido, Recursos Jurisdicionais em Contencioso Fiscal, de Jorge de Sousa e Simas Santos, ed. Rei dos Livros, pag. 495.) que, “no que não se encontrar previsto neste artigo, haverá que recorrer à legislação subsidiaria indicada no art. 2º do Código de Procedimento e Processo Tributário, que, atenta a natureza da matéria e a ordem por que vem feita a indicação desta legislação, serão, em primeiro lugar, as normas sobre processo nos tribunais administrativos e tributários e, depois, o Código de Processo Civil ”.Também assim entendemos. Com efeito, de acordo com o artº 2º do CPPT são de aplicação supletiva ao procedimento e processo judicial tributário, de acordo com a natureza dos casos omissos, sucessivamente:- as normas procedimentais e processuais consagradas nos outros códigos e leis tributárias - as normas sobre organização e funcionamento da administração tributária - as normas sobre organização e processo dos tribunais administrativos e tributários - o Código de Procedimento Administrativo.- o Código de Processo Civil .

Por outro lado também o CPTA (artº 154º) contém uma remissão expressa para o bloco normativo do Código de Processo Civil enquanto regime subsidiariamente aplicável ao recurso de revisão de sentença. Ora, não prevendo o regime de recursos no processo o judicial tributário a possibilidade de revisão de uma decisão interna transitada em julgado por ser inconciliável com uma decisão definitiva de uma instância internacional de recurso que seja vinculativa para o Estado Português, atenta a relevância desta ausência normativa e a natureza de tal omissão, impõe-se encontrar regulamentação adequada nas normas do Código de Processo Civil sobre interposição processamento e julgamento dos recursos jurisdicionais, no caso, e concretamente, no preceituado pelo artº 771º, al. f) do Código de Processo Civil

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De facto, o artº 293º, que não constava na redacção inicial do Código de Procedimento e Processo Tributário, foi aditado pelo artº 68º da lei nº 3-B/2000 de 4 de Abril, diploma que aprovou o Orçamento de Estado de 2000 e é muito anterior à reforma do regime de recursos em processo civil operada pelo Decreto-lei 303/2007. Ora este decreto-lei 303/2007 de 24.08 veio introduzir um novo fundamento de revisão de sentença relativo à inconciabilidade da decisão revidenda com uma decisão definitiva de uma instância internacional de recurso que seja vinculativa para o Estado Português - a nova al.f) do artº 771º do Código de Processo Civil na redacção então em vigor (artº 696º, al. f) na actual redacção). De acordo com o anteprojecto de revisão do regime de recursos em processo civil a inclusão desta nova alínea no artigo 771.° teve como fonte o artigo 46.° da Convenção Europeia dos Direitos do Homem (Convenção) que estabelece que os Estados que tenham ratificado a Convenção se obrigam a respeitar as sentenças definitivas do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem (TEDH) nos litígios em que foram partes e a Recomendação n.° 2/2000, de 29 de Janeiro, do Comité dos Ministros do Conselho da Europa que afirma que os Estados contratantes são encorajados a “examinar os seus sistemas jurídicos nacionais com vista a assegurar-se que existem meios adequados para o reexame de um caso, incluindo a reabertura do processo, nas situações em que o Tribunal constatou uma violação da Convenção (...)”.A norma visava resolver o problema decorrente do facto de o nosso ordenamento não considerar a decisão do TEDH como um facto novo susceptível de possibilitar a revisão da decisão interna transitada em julgado (Cf. texto

do anteprojecto in Reforma dos Recursos em Processo Civil, Trabalhos Preparatórios, ed. Almedina/Ministério da Justiça, pag. 187. Também, neste sentido, Armindo Ribeiro Mendes, Recursos em Processo Civil, Reforma de 2007, Coimbra Editora, pag. 199 e Luís Correia de Mendonça/Henrique Antunes, Dos Recursos, ed.

Quid Juris, pag. 354. ).O certo porém é que na exposição de motivos que acompanhou a proposta de lei de autorização da reforma dos recursos em processo civil (Reforma dos Recursos em

Processo Civil, Trabalhos Preparatórios, ed. Almedina/Ministério

da Justiça, pag. 273.), se refere que se pretendeu ampliar os casos em que é admissível o recurso extraordinário de revisão, de forma a adequar o respectivo regime não só “à Convenção Europeia dos Direitos do Homem” mas também, “às normas emanadas dos órgãos competentes

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das organizações internacionais de que Portugal seja parte”.Sendo que na redacção final que veio a vingar não há qualquer referência expressa à Convenção Europeia dos Direitos do Homem, tendo o legislador optado por uma fórmula mais abrangente em que se admite que a decisão transitada em julgado possa ser objecto de revisão quando “seja inconciliável com decisão definitiva de uma instância internacional de recurso vinculativa para o Estado Português”.Como sublinha Cardona Ferreira (Guia dos Recursos em

Processo Civil, 5ª edição, Coimbra Editora, pags. 344/345.), trata-se de uma norma adequada ao espaço europeu e à cada vez maior relevância dos tribunais internacionais, designadamente da união europeia e do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem.Por outro lado, acrescenta aquele autor, a referida alínea f) é também muito importante porque elimina qualquer dúvida quanto à possibilidade de se inovar quanto à decisão de um Tribunal português face à Jurisprudência internacional a propósito, não obstante os Tribunais internacionais não estarem em posição formalmente hierárquica quanto aos Tribunais nacionais.Também sobre este fundamento de recurso refere Armindo Ribeiro Mendes (Recursos em Processo Civil, Reforma de 2007, pag. 196) que esta inovadora al. f) “ visa permitir a reapreciação de decisões transitadas em julgado, em função de decisões de tribunais internacionais(Sublinhado nosso.), sobretudo do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem.Parece pois claro, para além de decorrer expressamente do texto da referida al. f) do artº 771º do Código de Processo Civil, que o legislador pretendeu estender o recurso de revisão não só aos casos em que decisão interna seja inconciliável com decisão do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem, como também aos casos em que se verifique inconciabilidade com qualquer decisão definitiva de uma instância internacional de recurso vinculativa para o Estado PortuguêsOra uma decisão proferida pelo TJUE no âmbito de um processo por incumprimento movido contra Portugal assume carácter vinculativo para o Estrado Português, como decorre do artº 260º, nº 1 do TFUE (ex-artigo 228.º TCE).Nos termos desta norma se o Tribunal de Justiça da União Europeia declarar verificado que um Estado-Membro não cumpriu qualquer das obrigações que lhe incumbem por

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força dos Tratados, esse Estado deve tomar as medidas necessárias à execução do acórdão do Tribunal.E o Tribunal de Justiça tem, na sua jurisprudência, adoptado a posição de que uma condenação pronunciada pelo Tribunal Comunitário numa acção por incumprimento tem força de caso julgado para todos os órgãos do Estado em causa, de forma que uma jurisdição nacional não poderá, em caso algum, pôr-se em oposição à apreciação jurídica do Tribunal.Como referem João Mota de Campos e João Luís Mota de Campos, no seu Manual de Direito Comunitário, pags. 459/461 (6ª Edição, Wolter Kluwer/Coimbra Editora.), dessa jurisprudência do TJ pode concluir-se que:“a) A autoridade de caso julgado do acórdão proferido numa acção por incumprimento que reconheceu a infracção atinge todos os órgãos do Estado, impondo-se não apenas ao poder executivo mas também ao poder legislativo e aos tribunais em geral. Nesta conformidade, o acórdão comporta para as autoridades nacionais a obrigação incondicional de não mais aplicar as normas internas e de eliminar os comportamentos nacionais declarados pelo Tribunal de Justiça como incompatíveis com o Direito Comunitário.O que significa, mais concretamente, que:b) Os órgãos que participam no exercício do poder legislativo ficam obrigados a modificar essas normas de modo a conformá-las às exigências da ordem jurídica comunitária;c) As autoridades que participam no exercício do poder executivo ou administrativo têm a obrigação de não aplicar qualquer disposição nacional que viole uma norma do direito comunitário;d) Os tribunais dos Estados em causa têm o dever de assegurar, no exercício da sua função jurisdicional, o respeito da decisão do Tribunal de Justiça — o que é expressão do princípio geral de que incumbe às jurisdições nacionais, tribunais comuns do Direito Comunitário, «assegurar a protecção jurídica que deriva, para os sujeitos de direito, dos efeitos directos das disposições do Direito Comunitário»;e) O Estado-membro em causa tem não só o dever de revogar as disposições internas que o Tribunal reconheceu serem contrárias à ordem jurídica comunitária mas também o de reparar os efeitos ilícitos que da aplicação dessas disposições tenham eventualmente resultado;f) Por seu turno, os particulares têm o direito de não mais acatar as disposições internas declaradas incompatíveis

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com o Direito Comunitário.E para obviar às consequências dessa falta de acatamento bastar-lhes-á invocar em sua defesa as disposições do direito comunitário (quaisquer que elas sejam), pois o tribunal nacional é obrigado a tomá-las em conta, por força do princípio da primazia do direito comunitário, para excluir a aplicação das normas internas que se lhes oponham;g) Por outro lado, as autoridades nacionais devem — no caso de a simples recusa de aplicação de uma disposição nacional contrária ao direito comunitário não bastar, ou não ser adequada para assegurar o pleno efeito do direito comunitário — tomar todas as disposições e organizar os meios apropriados para alcançar essa finalidade, designadamente, facultando aos particulares o acesso a vias processuais adequadas a salvaguardar todos os direitos decorrentes da norma comunitária violada e, designadamente, o recurso a uma acção de indemnização contra o Estado, necessária para obter a reparação dos prejuízos decorrentes do incumprimento.»Temos pois por assente que uma decisão proferida pelo TJUE no âmbito de processo por incumprimento movido contra Portugal assume carácter vinculativo para o Estado Português e que a autoridade de caso julgado do acórdão ali proferido atinge todos os órgãos do Estado, impondo-se não apenas ao poder executivo mas também ao poder legislativo e aos tribunais em geral.Assim quando, como no caso subjudice, esteja em causa uma decisão interna transitada em julgado que seja inconciliável com a interpretação vinculativa do Direito Comunitário emanada por acórdão proferido pelo Tribunal de Justiça numa acção por incumprimento, tal acórdão constitui facto novo susceptível de possibilitar a revisão da decisão interna.Perante o exposto concluímos que o acórdão do TJUE proferido no processo C- 493/09, enquanto decisão definitiva de uma instância internacional de recurso vinculativa para o Estado Português, pode ser invocado como fundamento de recurso revisão ao abrigo da nova al.f) do artº 771º do Código de Processo Civil na redacção do decreto-lei 303/2007.Procede assim, nesta parte, a alegação da recorrente.

8.3. Ainda sobre a aplicação subsidiária do fundamento de revisão de sentença previsto na al.f) do artº 771º do Código de Processo Civil, mas já numa perspectiva de aplicação da lei no tempo, julgou a decisão sindicada que, ainda que se admitisse a aplicação subsidiária do Código

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de Processo Civil ao caso em apreço, o nº 1 do artº 11º do decreto-lei 303/2007 determina que as suas disposições legais não se aplicam aos processos pendentes à data da sua entrada em vigor pelo que, tendo o citado diploma entrado em vigor em 01.01.2008, encontrando-se pendente a impugnação nº 2014/06.8BELSB desde 31.07.2006, não seria aplicável a nova redacção do preceito, mas sim a anterior, que não previa aquele fundamento de revisão de sentença.

A questão passa por saber qual a natureza do recurso extraordinário de revisão de sentença.

Com efeito se se considerar que se trata de uma nova acção, ou novo processo, como defende a recorrente, aplicar-se-á o regime dos recursos constante do DL. 303/2007, de 24.8, já que o presente recurso de revisão foi intentado em 6 de Dezembro de 2011.

A sentença recorrida, porém, sufragando a jurisprudência dos Acórdãos da Relação de Lisboa de 28.05.2009, processo nº 1204/06.8YLSB e da Relação do Porto de 02.12.2010, processo 978/04.5TBVFR (In www.dgsi.pt ), considera o recurso extraordinário de revisão não como uma nova acção ou um novo processo mas sim como uma forma de desenvolvimento do mesmo processo, já pendente, ainda que tramitado por apenso.

Trata-se de questão controvertida na doutrina e na jurisprudência e que tem evidentes reflexos na resolução do caso subjudice.

Não subscrevemos no entanto a tese acolhida pela primeira instância, antes entendemos que o recurso extraordinário de revisão configura um verdadeiro processo novo, que tem essencialmente a natureza de uma acção que visa a mudança da ordem jurídica definida em decisão transitada em julgado.

O recurso de revisão é um recurso extraordinário que visa impugnar uma decisão transitada em julgado, mediante fundamentos taxativamente indicados na lei.

Como vem sendo afirmado pela doutrina, no recurso de revisão destacam-se claramente dois momentos: o juízo rescindente, que visa afastar a decisão impugnada, e tem por objecto o acertamento da existência de qualquer um dos fundamentos previstos na lei; o juízo rescisório, que

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visa substituir a decisão revogada por uma outra decisão expurgada dos vícios que originaram a revisão (Luís Correia de Mendonça/Henrique Antunes, Dos Recursos, ed. Quid Juris, pag. 354.).

O recurso de revisão é, também, um recurso extraordinário que apresenta estrutura de um processo autónomo, embora na sequência de outro.

Como se esclarece no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 14.01.2014, Recurso 5078-H/1993.L2.1, in www.dgsi.pt, “Se analisarmos o regime jurídico deste recurso, concluiremos que são raras as normas dos recursos ordinários que se lhes aplicam, estando mais perto a sua estrutura de uma acção autónoma – apesar de intimamente ligada a um processo anterior transitado em julgado.

O recurso extraordinário de revisão previsto no art.771º do Código de Processo Civil, na redacção do DL. 303/2007, de 24.8, não integra, formal e estruturalmente a tramitação do processo de que se torna apenso, quando instaurado; a acção vive, sobrevive e finda na maior parte dos casos sem que haja tal recurso, não sendo de considerar um iternecessário da respectiva tramitação, cuja autonomia e fim último é destruir através de um processo declarativo com regras peculiares, com estrutura declarativa e autonomia, o caso julgado com fundamentos taxativamente previstos. É certo que tem uma componente mista (peculiar, sobretudo, se a acção passar a fase rescidente), com uma tramitação própria, mas essa singular tramitação não o descaracteriza como acção autónoma. Com ele inicia-se um processo novo cujo fim último é destruir o caso julgado formado em acção anterior.

Não sendo, sequer enxertado na acção anterior, mas implicando uma petição inicial onde devem ser expostos os fundamentos da revisão, prevendo indeferimento liminar e, só passado esse crivo, uma fase de instrução e decisão; estes elementos, a nosso ver, caracterizam-na como acção autónoma o que não é invalidado pelo facto do objectivo que visa se relacionar com uma decisão judicial anterior.”

Também a Secção de Contencioso Administrativo deste Supremo Tribunal Administrativo, se pronunciou, por diversas vezes, neste sentido.

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Assim no acórdão 30256B, de 25.09.2008 afirmou-se que os recursos extraordinários de revisão «constituem acções novas cujo objectivo é duplo: em primeiro lugar, o verificar a existência de algum vício na decisão transitada ou no processo que a ela conduziu susceptível de ser qualificado como pressuposto legal da sua admissibilidade (juízo rescindente); depois, e sendo a resposta afirmativa, o de substituir a decisão recorrida através da repetição da instrução e de um novo julgamento da acção (juízo rescisório).»

E no Acórdão 765/05, de 29.03.2006, o pleno da Secção de Contencioso Administrativo sublinhou que «os fundamentos relevantes para a procedência deste recurso extraordinário são aqueles que vigoram no momento do proferimento da decisão rescindente, determinando a aplicação imediata da lei nova a todos estes recursos desde que interpostos na respectiva vigência, ainda que as decisões a rever tenham sido proferidas no domínio de lei anterior».

E, na doutrina, refere Miguel Teixeira de Sousa, in Novos Estudos de Processo Civil. pág. 389 que «Deve admitir-se que a lei nova sobre os fundamentos dos recursos extraordinários é de aplicação imediata a todas as decisões e aos recursos delas interpostos. São possíveis por isso duas situações: se a lei nova aboliu um fundamento de impugnação, o recurso extraordinário deixa de ser admissível com esse fundamento; - se a lei nova comporta um novo fundamento, este é aplicável mesmo à impugnação das decisões proferidas antes do início da sua vigência». A posição adoptada quanto à natureza do processo de revisão de sentença como processo autónomo regulado pela lei nova - porque iniciado com a apresentação da pretensão e não como continuação, em recurso jurisdicional, do processo anterior - é também reforçada pela norma do n.º 4 do art.º 772.º do CPC que manda admitir, das decisões proferidas no processo de revisão, os recursos ordinários a que estariam originariamente sujeitas no decurso da acção em que foi proferida a sentença a rever. Não teria sentido que nos trâmites para o juízo rescisório a demandante tivesse todos os recursos de um novo processo e ao mesmo tempo a lei cerceasse a possibilidade de atingir a fase rescisória limitando os recursos na fase rescindente, o que sucederia se se tratasse a avaliação preliminar dos pressupostos da

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revisão como um recurso comum da decisão que se pretende rever, introduzido ainda no mesmo processo em que foi prolatada aquela decisão. Portanto, o CPC autonomiza o processo de revisão como uma nova acção na qual as decisões estão sujeitas aos recursos ordinários que cabem na acção que é objecto do juízo rescisório.”Perante o exposto haveremos de concluir que o pedido de revisão de sentença formulado pela recorrente constituiu um processo novo e autónomo relativamente àquele onde foi proferida a decisão a rever, ainda que com ele relacionado.

E, assim sendo a data relevante para efeitos de aplicação no tempo do novo regime de recursos constante do DL. 303/2007, de 24.8, nomeadamente do disposto na al.f) do artº 771º do Código de Processo Civil, deve ser a da interposição do recurso de revisão - 6 de Dezembro de 2011 – e não a da dedução da impugnação em que foi proferida a decisão decidenda, pelo que não pode manter-se a sentença recorrida que considerou estar excluída, no caso em apreço, a possibilidade de aplicação do fundamento de recurso previsto na al. f) daquele normativo.

Procedem, pois, também aqui, as alegações da recorrente.

9. Decisão

Termos em que, face ao exposto, acordam os juízes da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo em conceder provimento ao recurso e, em consequência, revogar a sentença recorrida, que não admitiu o recurso de revisão, e ordenar a devolução dos autos à primeira instância onde deverão prosseguir os ulteriores termos.

Sem custas.

Lisboa, 2 de Julho de 2014. - Pedro Delgado (relator) - Fonseca Carvalho - Ascensão Lopes.

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