polÍticas pÚblicas para a educaÇÃo superior no brasil...
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POLÍTICAS PÚBLICAS PARA A EDUCAÇÃO SUPERIOR NO BRASIL PÓS 1990:
UMA ANÁLISE CRÍTICA
Paula Roberta Miranda1
RESUMO: Este trabalho propõe uma análise sobre a implementação das políticas públicas de
expansão do ensino superior no Brasil a partir de 1990, em especial Prouni, Fies e Parfor. Tomamos
como referência a década de 1970 até os dias atuais, explicitando o novo modelo de gestão adotado,
sobretudo, com a reforma do Estado e suas implicações no que se refere ao acesso à educação
superior. Os procedimentos envolveram a análise dos documentos Cf/88, a LBD/96 e PNE/2001 na
elaboração de políticas públicas. Os índices mostram que o número de jovens que concluem seu curso
de graduação ainda é pequeno se comparado com outros países, como por exemplo, o Chile e os
Estados Unidos, com 27 e 43% respectivamente, enquanto no Brasil, esse índice não passa de 12%. As
análises confirmam que as políticas públicas propagadas nesse novo discurso que se intitulam ações
afirmativas estão em articulação com os interesses e princípios neoliberais se configurando como
discriminação positiva e não com a perspectiva de transformação oriunda das lutas populares que
compuseram o cenário sócio-econômico brasileiro de 1980.
PALAVRAS-CHAVE: Educação Superior; Política Pública. Gestão Democrática.
INTRODUÇÃO
A sociedade contemporânea tem passado por profundas transformações de caráter
social, político, econômico, cultural e educacional. Tais transformações são oriundas das
mudanças que ocorrem no mundo do trabalho e tem norteado a elaboração de políticas
públicas sociais, especialmente as educacionais, em destaque as do ensino superior.
A educação superior, como política pública, por estar engendrada no interior desse
processo, também está afeta a todas essas mudanças, significando que sua implementação,
compreendida aqui como democratização do acesso, está sujeita aos mesmos condicionantes.
Assim, este texto tem como objetivo discutir questões afetas ao ensino superior
público no Brasil, em especial as reformas preteridas nesse nível de ensino sem desvencilhar-
se das questões mais amplas da sociedade, considerando as atuais problemáticas políticas e
econômicas que se impõe na atualidade, bem como desvelar as influências a que estão
suscetíveis pelas determinações imperativas globais.
Na sociedade contemporânea, a escola é a principal responsável pela inserção dos
sujeitos na cultura letrada. Espera-se que a educação básica crie as condições para que todos
1 Universidade Estadual de Maringá. [email protected]
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os indivíduos possam participar, de forma autônoma, de uma sociedade na qual a grande
maioria das atividades cotidianas depende da capacidade de se informar e processar esse
conhecimento a fim de escrever, comunicar-se, relacionar-se, planejar-se, reivindicar, dentre
outras.
A Educação Superior é a última etapa da Educação. No Brasil, até muito
recentemente, este nível de ensino era destinado aos jovens das camadas mais abastadas da
população. Durante o período ditatorial, as políticas governamentais suprimiram a expansão
do Ensino Superior, estimulando o aumento das instituições privadas. Contrariamente, as
instituições públicas e gratuitas acolhiam os jovens pertencentes à classe alta, uma vez que
haviam realizado sua escolarização anterior em instituições privadas, de boa qualidade.
Um dos princípios norteadores da educação nacional é a gestão democrática que,
legalmente, foi implementada a partir da Constituição Federal de 1988, estabelecendo que a
educação é direito público, subjetivo, dever do Estado, da família e da sociedade. Destaca
ainda a gratuidade do ensino público em todos os níveis, o acesso a outros níveis de ensino
(superior) segundo a capacidade de cada um, a indissociabilidade entre ensino, pesquisa e
extensão na educação superior, a autonomia das universidades, entre outros decretos e
portarias que a regulamentam.
A CF/88 fora uma Lei que expressava uma bandeira de luta que já vinha sendo
empunhada desde o início da década 1980, o qual tinha como princípios fundamentais a
autonomia, a descentralização e o acesso e permanência das camadas menos abastadas na
escola, inclusive o acesso ao ensino superior. No entanto, os dados oficiais tem nos mostrado
que o acesso e permanência neste nível de ensino em universidades públicas têm crescido
pouco, se comparado com instituições superiores privadas, fato que tem sido impulsionado a
partir da consolidação das políticas neoliberais, entre elas, a privatização.
Outro dispositivo legal é a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, lei n.
9.394/1996, que reserva à Educação Superior um conjunto de princípios que indicam as
orientações, normatizações, para esse nível de ensino. Porém, mesmo com todo aparato legal,
o número de jovens que conseguem chegar ao topo da pirâmide educacional e daqueles que
concluem seu curso de graduação ainda é pequeno se comparado com outros países, como por
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exemplo, o Chile e os Estados Unidos, com 27 e 43% respectivamente, enquanto no Brasil,
esse índice não passa de 12%.
Buscaremos nesse texto, fazer uma análise crítica do processo de implementação de
políticas públicas para o acesso e democratização do ensino superior no Brasil, sobretudo na
conjuntura em que se efetivaram as políticas neoliberais a partir de 1990, bem como do
contexto em que se efetivaram tais ações governamentais. As análises permitem compreender
que as políticas públicas propagadas nesse novo discurso estão em articulação com os
interesses e princípios neoliberais e não com a perspectiva de transformação oriunda das lutas
populares, que compuseram o cenário sócio-econômico brasileiro de 1980.
Outrossim, para essa reflexão, tomaremos como recorte histórico o contexto social
político e econômico da década de 1970 até os dias atuais, explicitando o novo modelo de
gestão em que se inserem tais políticas, sobretudo, a partir de 1990. A metodologia que
subsidiará este artigo está fundamentada no Materialismo Histórico e Dialético. De acordo
com Marx (19--, v.2), os critérios encontrados no materialismo histórico e dialético nos
permite compreender o objeto de estudos em suas múltiplas determinações. Isso porque, do
ponto de vista teórico-metodológico, a lógica dialética pressupõe um movimento que remete o
objeto de estudo à sua totalidade histórica e às relações que aí se estabelecem. Parte-se do
pressuposto de que a realidade não se apresenta de forma estática, fechada. Tudo está em
constante movimento e esse processo se dá de forma contraditória.
Concluiremos esse artigo, enfatizando os enfrentamentos que devem ser realizados na
universidade pública, quando se prima pela formação humana emancipadora.
CONTEXTO INTERNACIONAL, REDEMOCRATIZAÇÃO BRASILEIRA E A
GESTÃO DEMOCRÁTICA
A conjuntura internacional dos últimos trinta anos do século XX foi marcada por
grandes transformações econômicas, sociais, políticas e culturais que podem ser descritas a
partir de alguns aspectos: globalização econômica, reestruturação produtiva e implementação
de políticas neoliberais. O desmonte do Estado de Bem Estar Social, instalado na Europa a
partir do final da Segunda Grande Guerra e o aparecimento de Estados neoliberais na Europa
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e nos Estados Unidos a partir dos anos de 1970, fazem parte desse grande conjunto de
mudanças.
A crise provocada pelo esgotamento das possibilidades do pacto entre capital e Estado,
instituído pelo Estado de Bem Estar Social, para viabilizar a acumulação capitalista, propiciou
e, de certa forma justificou a implantação de políticas e de Estados Neoliberais na Europa e
nos Estados Unidos, a partir dos anos de 1970.
Nas análises de Moraes (2001), as décadas de 1970 e 1980 foram palco e predomínio
da disseminação dos ideais neoliberais na Europa e América Central. No Brasil, segundo
Boito Jr (2001) esse processo ocorreu um pouco mais tarde, sobretudo a partir dos anos de
1990, devido ao fato de a nação brasileira estar saindo de um período ditatorial. As
reivindicações desse período estavam na consolidação pela garantia de direitos civis e sociais,
entre eles o acesso e permanência das camadas populares na escola. O discurso neoliberal
propagou os princípios da democracia e do acesso aos direitos sociais universais, sobretudo
no que diz respeito ao discurso da universalização do ensino, já que a dinâmica da produção
capitalista necessitava de trabalhadores capacitados. Cabe destacar que o caráter nocivo desse
modelo político-econômico só pôde ser desvelado com a implementação de suas propostas
privatistas.
Os anseios do novo momento social visavam o aumento do controle público sobre o
Estado e, mesmo que tais anseios não tenham sido alcançados, é mister lembrar que a gestão
democrática nos mais diversos níveis e sistemas de ensino tornou-se a principal “bandeira” na
luta dos movimentos educacionais, inaugurando um novo ciclo de discussões e propostas
acerca dos encaminhamentos administrativos das escolas e universidades brasileiras.
No âmbito das reformas democráticas do Estado Brasileiro, pode-se destacar a esfera
Legislativa, no qual imbuído dos ideais democráticos, José Sarney inicia o processo de
redemocratização do país pela esfera do Legislativo, uma vez que a forma de se garantir
mecanismos e conteúdos democráticos e na forma da lei. Em outubro de 1988, promulga-se a
Carta Magna, consolidada no âmbito dos direitos civis e sociais. No entanto, cabe esclarecer
que a promulgação da Constituição de 1988 foi delineada em meio aos profundos debates
correntes que buscavam mudanças mais efetivas no campo educacional.
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Nessa ambiência, convém destacar que todo processo legislativo apresenta-se num
espaço de disputa e interesses antagônicos, portanto, a lei expressa a síntese dessas disputas
que nem sempre corresponde aos interesses de uma classe majoritária, qual seja, a popular.
A REFORMA DO ESTADO BRASILEIRO E A INFLUÊNCIA DOS ORGANISMOS
INTERNACIONAIS NA REFORMA DA EDUCAÇÃO SUPERIOR BRASILEIRA
Historicamente, a Reforma Universitária traduz um dos grandes estandartes do
movimento estudantil, consagrado pelos estudantes de Córdoba (Argentina) ainda em 1918,
os quais pleiteavam um novo projeto de universidade que pusesse fim com o caráter elitista e
antidemocrático do ensino superior na América Latina, como também a ampliação do acesso
das camadas populares e a vinculação das instituições com as demandas sociais locais e
regionais. Esse movimento foi ressignificado durante o governo militar com seu pretensioso
projeto de Brasil potência, na primeira reestruturação no ensino superior de 1968 (RIBEIRO,
1978).
Do decorrer da década de 1960, o movimento de Reforma Universitária se fortaleceu
no país, período em que o projeto de Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB) já
tramitava no congresso. Vários encontros e seminários foram realizados pela União Nacional
dos Estudantes (UNE) sobre o tema, desenvolvendo um projeto estudantil brasileiro para a
transformação do ensino superior.
Sem prescindir da crítica acerca da realidade nacional que estava alinhada ao
capitalismo, via-se na LDB uma concepção liberal-burguesa que não atendia às prioridades
nacionais e mantinha a estrutura elitista e antidemocrática da universidade brasileira
(PELEGRINI, 1998, pp. 32-34).
Nesse contexto, a década de 1960 foi palco de inúmeras manifestações em defesa da
ruptura de um modelo institucional autoritário e elitista nas universidades brasileiras, as quais
passaram a lutar contra os recém-firmados acordos MEC-USAID. Nesse contexto,
objetivando conter os anseios estudantis, o governo militar dá início ao processo de
reestruturação universitária, fato que resultou na lei n° 5.540/68, ou “Lei da Reforma
Universitária”, apresentando como principal alteração a substituição do sistema de cátedras,
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unificação dos vestibulares por região, tornando-os classificatórios; a criação do sistema de
créditos, permitindo a matrícula por disciplinas; a institucionalização de cursos básicos; e a
expansão da pós-graduação, visando a formação de pesquisadores de alto nível.
Ao olharmos as reformas propugnadas por esse governo por um viés crítico,
percebemos que as mesmas tinham como pano de fundo a contenção de gastos e o aumento da
produtividade do corpo docente, facilitando o controle administrativo e ideológico interno. A
unificação do vestibular, que para os alunos poderia democratizar o acesso, foi promovida
para controle da demanda e preenchimento de cursos pouco procurados. Posteriormente, pelo
decreto 477, institucionalizou-se as bases para a massificação da educação universitária,
ampliando o número de alunos e a consequente diminuição do nível dos cursos. Com a
repressão instaurada pós 1968, os estudantes pouco a pouco deixam o enfoque educacional e
passam a lutar contra a repressão. Com a desarticulação da UNE no início da década de 1970,
o governo entra espaço favorável às novas adequações do ensino superior na década de 1980
sob os auspícios das novas tendências mundiais.
A década de 1980 foi considerada o período de reabertura política do país, mas,
também, o período em que o Brasil firmou vários acordos técnicos e financeiros com o BM e
FMI. Logo, o discurso que embasava a reforma universitária era o da flexibilização do
sistema de ensino superior, estimulando o desenvolvimento do setor privado, a vinculação do
ensino ao mercado, e a criação de novos modelos institucionais que atendessem às demandas
do mercado de trabalho e do setor produtivo, propostas que demarcavam a separação entre
ensino e pesquisa e abriam margem para a desoneração do poder público quanto ao
financiamento das instituições.
Os governos da nova democracia – Collor de Mello e Itamar Franco (90-94) dão início
ao processo de inserção da economia brasileira na economia mundial e globalizada, aderindo
às novas estratégias econômicas baseadas no modelo Tatcher (Inglaterra). Porém, é durante a
gestão do sociólogo Fernando Henrique Cardoso que esse processo tem sua total
consolidação, a partir do fortalecimento de alianças com gestores internacionais já firmadas
desde 1980, com o BM e FMI. A partir desse momento, os organismos internacionais passam
a intervir diretamente na economia e na educação brasileira levando o Brasil a compartilhar
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das novas estratégias econômicas e políticas traçadas pelos países centrais por meio de
acordos técnicos e financeiros.
A educação, enquanto fenômeno social não ficou de fora das mudanças do contexto
social e econômico mundial, passando a ser considerada o ponto fulcral para a inserção dos
países em desenvolvimento na atual conjuntura produtiva e competitiva. Assim, o papel e a
função da educação assumem novos contornos exigidos pelo atual momento político e
econômico ocasionando uma onda de reformas em todos os níveis de ensino com o objetivo
de ajustá-las às novas exigências do mercado.
Assim, buscando atender às condicionalidades desses organismos, o Brasil
impulsionou seu processo de reforma educacional pelo Legislativo, a partir da elaboração do
Plano Decenal de Educação, cujas propostas foram desencadeadas pelos ajustes estruturais,
por meio das políticas de focalização, descentralização e equidade.
Nesses termos, as reformas são implementadas com objetivos determinados pelos
organismos internacionais que tem como objetivo e crescimento econômico e, para isso,
traçam diretrizes para alinhar a educação à empresa. Nessa perspectiva, a gestão da educação
assume os contornos da gestão empresarial, logo, os conteúdos por ela ensinados também de
adequam às novas exigências do mercado vigente.
Gentilli & Frigotto (2002) colabora nessa discussão ao afirmar que se trata da visão
mercadológica da educação. Trata-se de transferir a educação da esfera políticas para a esfera
do mercado, negando sua condição de direito social e transformando-a em possibilidade de
consumo individual. Trata-se de ver a educação submetida às regras do mercado e não como
um direito de todos.
Com o objetivo de ajustar a educação à nova realidade social e econômica do mundo,
vários documentos são elaborados. No plano internacional, documentos elaborados pela
CEPAL e UNESCO traças as metas que os países em desenvolvimento devem alcançar, bem
como as reformas necessárias.
No que se refere ao Ensino Superior, as reformas propugnadas pelos governos
Fernando Henrique Cardoso e Luís Inácio Lula da Silva, em sintonia com os Organismos
Internacionais, em destaque o BM, atenderam às diretrizes contidas no documento La
ensenãnza superior: las leciones derivadas de la experiência (1995), que determinava a
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privatização desse nível de ensino, sobretudo às nações que encontravam dificuldades em
implementar políticas de expansão no Ensino Fundamental.
Os ajustes estruturais realizados durante a década de 1990 para o ensino superior dão
mostras de que as instituições superiores foram pouco a pouco se adequando às políticas
neoliberais que se impôs na América Latina sob a influência de organizações internacionais
como o Banco Mundial e o Fundo Monetário Internacional. Neste período, a função do
Estado começou a ser vagarosamente voltada à regulação do sistema de ensino superior, para
a qual se estabeleceram diversas manobras como a criação do Programa de Avaliação
Institucional das Universidades Brasileiras (PAIUB) e do Exame Nacional de Cursos, mais
conhecido como Provão; a legalização da lista tríplice nas votações para reitor e a garantia da
prevalência docente nas instâncias deliberativas das universidades; a criação de novas
modalidades institucionais de ensino superior; entre outros.
No plano legal, o Plano Nacional da Educação – Pne (2001) criado pelo governo
Fernando Henrique Cardoso, consolida a política educacional neoliberal, designando os
rumos da educação superior para década seguinte. Em tese, o Plano atrelava o
desenvolvimento do sistema ao incentivo ao setor privado, à ampliação de vagas pela
diversificação de modalidades de cursos, à criação de políticas de compensação para egressos
do ensino público e minorias (negros, índios), à extensão dos mecanismos de avaliação, etc.
(BRASIL, 2001).
É notório que a universalização da educação nos níveis básico e, especialmente o
superior no Brasil é um problema histórico. Esse quadro tem se agravados ainda mais quando
nos remetemos ao ingresso em instituições superiores públicas, o que faz com que seu caráter
seletivo e excludente logre lugar de destaque no país quando comparado ao setor privado. A
educação superior pública no Brasil apresenta índices muito baixos de ingresso, sobretudo a
partir de 1990, nas quais as instituições privadas contemplam 75% das matrículas e tem suas
bases na justificativa de que uma grande maioria de estudantes egressos da educação básica
pública não conseguem atingir o topo da pirâmide educacional. Paradoxalmente, quem
frequenta as instituições superiores públicas (eleitas como de melhor qualidade) são jovens
que tiveram sua trajetória educacional em escolas privadas. Inversamente, os filhos da classe
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proletária, se veem obrigados a cursar uma faculdade particular se quiserem competir em pé
de igualdade no mercado de trabalho.
Como forma de enfrentar a problemática do processo de expansão e democratização
da educação superior, políticas públicas com vistas ao atendimento de alunos com baixa renda
e capital cultural baixo são acionadas. A consolidação dessas políticas como forma de
democratização do acesso e expansão altera a estrutura do sistema superior de educação que
vem por meio da implementação do Programa Universidade para Todos (Prouni), Lei n.
11.096, de 13 de janeiro de 2005, cuja finalidade é conceder bolsas integrais de estudo e
parciais de 50 e 25%, para alunos de curso de graduação instituído pelo governo popular Luiz
Inácio Lula da Silva. A bolsa é destinada aos alunos que tenham cursado o Ensino Médio
completo em escolas públicas ou em instituições privadas, podendo ser beneficiários
professores da rede pública de ensino, indivíduos com necessidades educacionais especiais e
bolsistas integrais.
Sob a proclamação de uma pseudodemocratização do acesso a este nível de ensino, o
novo discurso que se seguiu foi o de promover o acesso, sobretudo a alunos de escolas
públicas, especialmente negros e indígenas, em instituições públicas estaduais e federais,
trazendo à tona o debate sobre as parcerias público-privadas, com políticas afirmativas, sendo
fortalecido com o lançamento do Plano de Desenvolvimento da Educação (PDE). Sobre estas
últimas, Dourado (2002) as define como políticas focalizadas, haja vista que substituíram as
políticas de caráter universal, destinadas a todos, por políticas destinadas a segmentos
específicos, segundo suas necessidades. Sob esse discurso, estaria sendo promovida a
“equidade”, proclamada pelo discurso neoliberal, diminuindo as desigualdades.
Para Lima (2004) as políticas sociais têm sido utilizadas para amenizar tais
desigualdades, não buscando estabelecer patamares de igualdade, mas a “equidade”,
compreendida no ideário neoliberal como “equivalente”. Sob essa perspectiva, isso significa
“dar para os pobres uma educação pobre”, não atingindo a escola republicana nem a
consolidação da verdadeira cidadania, contribuindo apenas para diminuir as tensões entre
grupos e as classes sociais.
Isto pode ser comprovado quando, na necessidade de consolidação de novo modelo de
educação superior, o governo Lula instituiu, por meio do Decreto n° 6.096 de 24 de abril de
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2007, o “Programa de Apoio a Planos de Reestruturação e Expansão das Universidades
Federais - REUNI”, cujo fundamento estava em “criar condições para a ampliação do acesso e
permanência na educação superior, no nível de graduação”, utilizando-se do “melhor
aproveitamento da estrutura física e dos recursos humanos atualmente existentes” nessas
instituições (AS NOVAS, 2007, pg. 21).
Outra base de sustentação jurídica para a base da Reforma Educacional Superior,
buscando sua expansão foi o Fundo de Financiamento ao estudante do Ensino Superior
(FIES), implementado pela Lei n° 10.260/2001, alterada pela Lei n° 12.202/2010, que, em
consonância com o Prouni, cristalizaram a relação público-privada, financiado com dinheiro
público, sendo, portanto, parte integrante das ações do PDE, do governo Lula.
Assumido pelo governo federal como importante estratégia para a democratização ao
ensino de qualidade e favorecendo um maior número possível de estudantes a permanência e
conclusão do ensino superior, o FIES tem como objetivo financiar a formação de nível
superior de estudantes impossibilitados de custear totalmente com as despesas de sua
formação. Para isso, devem estar matriculados em instituições privadas de ensino, cadastradas
no Ministério da Educação e Cultura (MEC).
Mesmo com todas essas iniciativas governamentais em função do acesso e
democratização do ensino superior no Brasil, o Grupo Estratégico de Análise da Educação
Superior no Brasil. (DEMOCRATIZAÇÃO, 2012) mostra que ainda não alcançamos a devida
ampliação do ensino superior. Segundo dados “em 2010 havia no país 6,3 milhões de
estudantes nesse nível de ensino, sendo que 74,8% das matrículas estão em instituições
privadas e 25,2% em instituições públicas”. A meta 12 do Projeto de lei 8.035/2011,
estabelece a elevação da taxa bruta de matrícula para 50% e a taxa líquida para 33%, para a
população de 18 a 24 anos, sendo 40% dessas matrículas em universidades públicas.
(DEMOCRATIZAÇÃO, 2012, pg.3).
Como forma inclusive de manter a característica de governos populares e como
prioridade de suas agendas políticas a redução e o combate a pobreza com a distribuição de
“bolsões” que visam a redistribuição de renda, e a extensão de benefícios e proteção a
segmentos em situação de vulnerabilidade e destituição social, os governos de Lula e Dilma
Roussef criaram a política de cotas sociais e raciais, uma vez que a educação, como direito
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inalienável, essencial à liberdade, autonomia e condição ao exercício da cidadania, traz à tona
o discurso de luta por igualdade racial, sexual e de gênero (negros, indígenas, mulheres,
pessoas com deficiência) A contradição que se instaura denuncia, por um lado, uma
discriminação negativa, se considerarmos os privilégios de determinados grupos sociais que
ainda se mantém, e, por outro lado e concomitantemente, essa luta se constitui numa
discriminação positiva.
A implantação do sistema de cotas tem como objetivo permitir que estudantes
brasileiros de escolas públicas, em sua maioria com baixa renda familiar, tenham condições
de ingressar em universidades públicas. Incluídas nas cotas sociais, as cotas raciais são uma
das principais medidas afirmativas adotadas em defesa da população afro-brasileira, que visa
proporcionar a inserção de maior contingente de negros na rede universitária do País. De
acordo com Censo 2010 do Ministério da Educação há historicamente grande desproporção
no número de universitários brancos (31,1%), pardos e pretos (13,4% e 12,8%,
respectivamente).
As cotas raciais são um modelo de ação afirmativa implantado em alguns países para
amenizar as desigualdades sociais, econômicas e educacionais entre raças. A primeira vez que
essa medida foi tomada data de 1960, nos Estados Unidos, com vistas a diminuir a
desigualdade entre brancos e negros.
No Brasil, as cotas raciais ganharam destaque a partir da década de 2000, quando
universidades e órgãos públicos começaram a adotar tais medidas em vestibulares e
concursos. A Universidade de Brasília (UnB) foi a primeira instituição de ensino no Brasil a
adotar a sistema de cotas raciais, em junho de 2004.
Por último, a Lei 12.711 de 2012 decretou:
Art. 1º As instituições federais de educação superior vinculadas ao
Ministério da Educação reservarão, em cada concurso seletivo para ingresso
nos cursos de graduação, por curso e turno, no mínimo 50% (cinquenta por
cento) de suas vagas para estudantes que tenham cursado integralmente o
ensino médio em escolas públicas. Parágrafo único. No preenchimento das
vagas de que trata o caput deste artigo, 50% (cinquenta por cento) deverão
ser reservados aos estudantes oriundos de famílias com renda igual ou
inferior a 1,5 salário- mínimo (um salário-mínimo e meio) per capita
(DEMOCRATIZAÇÃO, 2012, pg. 08).
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De lá para cá, o número de universidades que possuem ação afirmativa baseada em
raças têm aumentado e atualmente já representa a maioria das universidades federais. No
entanto, as universidades têm até 2016 para sua total implantação. Segundo os defensores das
Cotas, com a aprovação da lei, espera-se a correção da distorção existente entre brancos e
negros, dos quais os brancos preenchem 77% das vagas de curso da área da saúde.
Com estas medidas, compreendidas como ações afirmativas, o governo pretende
eliminar as desigualdades raciais, étnicas, religiosas, de gênero, entre outras, acumuladas
historicamente, garantindo igualdade de oportunidades e tratamento, bem como atenuar as
perdas provocadas pela discriminação e marginalização (BRASIL, 2006).
Outra iniciativa do governo Lula para ampliar o acesso ao ensino superior público foi
a criação da Universidade Aberta do Brasil (UAB), em 2005, voltado ao desenvolvimento da
modalidade da Educação a Distância, cujas metas são a expansão da oferta de cursos e
programas de educação superior no país.
Por fim, destaca-se a criação, em 2009, do Plano Nacional de Formação dos
Professores da Educação Básica (PARFOR), programa emergencial de Apoio à Formação
Docente, cuja finalidade é induzir e fomentar a oferta de educação superior, gratuita e de
qualidade, para professores em exercício na rede pública de educação básica. Integrante das
ações do Ministério da Educação (MEC), o programa é ofertado em colaboração com as
Secretarias de Educação dos Estados e Municípios e das Instituições Públicas de Educação
Superior (IPES), neles sediadas, com fins à melhoria da formação do corpo docente brasileiro.
Esses dados evidenciam o quanto o sistema educacional brasileiro ainda precisa
melhorar para alcançar índices satisfatórios de inclusão e permanência educacional e os
alunos lograrem êxito em todas as etapas e níveis de escolarização.
ALGUMAS CONSIDERAÇÕES
Em face do que discutimos até aqui, é possível perceber a intenção do governo de pro-
mover uma gigantesca reestruturação da educação superior brasileira, sem, no entanto,
garantir satisfatoriamente o acesso e a democratização nesse nível de ensino. Porém, se não
houver uma urgente conscientização da comunidade universitária, no sentido de compreender
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as artimanhas da sociedade capitalista, o rápido processo com que se delineia as políticas
neoliberais dificultará, ainda mais, o acesso e a participação da classe trabalhadora e de
grupos minoritários no processo de construção e apropriação do conhecimento inovador e
crítico.
É fundamental termos a clareza do que apresentam as receitas prontas vindas de cima
para baixo propostas pelos organismos internacionais. A forte influência desses organismos
na educação brasileira, sendo maior influente o BM, que funciona como instituição técnica e
financeira tem sido o principal articulador dos pacotes educacionais.
A gestão democrática para o ensino superior, tão propalada na década de 1980 está
longe de se consolidar em um projeto social hegemônico, isso porque, conceitos como acesso
e permanência na escola foram ressignificados por políticas afirmativas e compensatória
exprimindo um projeto de sociedade excludente e discriminatórias. Esses conceitos foram
incorporados ao capitalismo e o que antes tinha caráter progressista, se torna conservador,
neoliberal. Logo, a democracia que se busca é uma democracia burguesa, neoliberal.
Sabemos que na sociedade de classes, o conceito de democracia nem sempre foi o
mesmo, mas acompanha os contornos exigidos pela sociedade em determinado momento
histórico. O conceito de democracia cunhado pelo capitalismo se configura numa pseudo-
democracia, uma vez que não se aplica a todos, se apresentando apenas no campo das
legislações, na letra da lei e não no contexto da prática social onde as políticas públicas são
elaboradas, vivenciadas, experenciadas e interpretadas.
As políticas públicas, bem como as leis que as precedem são elaboradas num campo
conflituoso, de disputas e embates sociais que se efetivam entre grupos sociais com interesses
antagônicos e que, portanto, a elaboração dessas políticas são sínteses desses embates sociais
que trazem consigo, em maior ou em menor grau, os anseios e os interesses de uma classe,
que nem sempre é o da maioria.
Sendo isso verdadeiro, é possível afirmar que a luta pela gestão democrática na
educação superior também está nessa arena de luta das classes sociais, ou seja, para se tornar
um projeto social hegemônico, precisa ter como base uma concepção dialética da realidade,
aquela que considera a relação intersubjetiva entre o homem e o objeto de conhecimento e que
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compreende o homem como ser histórico, que sofre os condicionantes da realidade, mas que
traz consigo a capacidade histórica de nela intervir.
Assim, a gestão democrática, a exemplo de outros modos de gestão encontra limites e
condicionantes políticos que interferem diretamente na consolidação de um projeto social de
educação que leve em consideração os interesses da maioria e não da minoria, mas que,
igualmente, podem ser recriados na prática social.
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