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FACULDADE BOA VIAGEM - DEVRY-BRASIL CENTRO DE PESQUISA E PÓS-GRADUAÇÃO EM ADMINISTRAÇÃO MESTRADO PROFISSIONAL EM GESTÃO EMPRESARIAL Luciana Rosas de Melo Maia O ESTÁGIO SUPERVISIONADO NA CONSTRUÇÃO DAS COMPETÊNCIAS DO GRADUANDO EM DIREITO NA ATIVIDADE DE ADVOCACIA Orientadora: Profa. Dra. Hajnalka H. Gati RECIFE, 2015

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FACULDADE BOA VIAGEM - DEVRY-BRASIL

CENTRO DE PESQUISA E PÓS-GRADUAÇÃO EM ADMINISTRAÇÃO

MESTRADO PROFISSIONAL EM GESTÃO EMPRESARIAL

Luciana Rosas de Melo Maia

O ESTÁGIO SUPERVISIONADO NA CONSTRUÇÃO DAS COMPETÊNCIAS DO

GRADUANDO EM DIREITO NA ATIVIDADE DE ADVOCACIA

Orientadora: Profa. Dra. Hajnalka H. Gati

RECIFE, 2015

Luciana Rosas de Melo Maia

O ESTÁGIO SUPERVISIONADO NA CONSTRUÇÃO DAS COMPETÊNCIAS DO

GRADUANDO EM DIREITO NA ATIVIDADE DE ADVOCACIA

Dissertação apresentada ao Programa de Mestrado

Profissional em Gestão Empresarial, do Centro de

Pesquisa e Pós-Graduação em Administração, da

Faculdade Boa Viagem/Devry Brasil, sob orientação da

Profª. Dra. Hajnalka H. Gati, como pré-requisito para

obtenção do título de Mestre em Gestão Empresarial.

Recife, 2015

Catalogação na fonte - Biblioteca da Faculdade Boa Viagem, Recife/PE

M217e Maia, Luciana Rosas de Melo

O estágio supervisionado na construção das competências do

graduando em Direito na atividade de advocacia / Luciana Rosas de

Melo Maia. – Recife: FBV | DeVry, 2015.

123 f.

Orientador(a): Hajnalka H. Gati. Dissertação (Mestrado) Gestão Empresarial -- Faculdade Boa

Viagem | Devry.

Inclui anexo e apêndice.

1. Competências. 2. Estágio supervisionado. 3. Práticas

jurídicas. I. Título. DISS 658[15.1]

Ficha catalográfica elaborada pelo bibliotecário: Jadinilson Afonso CRB-4/1367

2015

Dedico o presente trabalho aos meus pais, que

passaram por essa vida de forma tão breve, mas

tempo suficiente para me ensinar o valor da família, e

me deixaram três irmãos maravilhosos que são

bênçãos na minha vida.

E aos meus filhos, por quem sou perdidamente

apaixonada e são minha razão de viver.

AGRADECIMENTOS

Agradeço primeiramente a Deus, porque em toda sua onipotência e mesmo tendo mil coisas

para fazer, olha por mim, é misericordioso, e todas as vezes que pensei em desistir, pelas

inúmeras dificuldades que se colocaram no meu caminho, Ele esteve do meu lado.

Agradeço ao meu querido painho, Valdênio, que me acompanhou, torceu, chorou, xingou e me

ajudou em tudo nesse mestrado, enfim esteve sempre presente fisicamente ou espiritualmente

em todos os momentos; e à minha mainha, D. Nara, que me deu forças para levantar, quando

tudo parecia destruído, quando o projeto parecia não ter fim, quando as viagens pareciam

perigosas, quando todos os empecilhos resolveram aparecer para que eu não conseguisse

terminar, por estar sempre no meu coração.

Agradeço ao meu querido marido, Henrique, por me mostrar que sou capaz de fazer o

impossível. Agradeço aos meus amados filhinhos, Bhrenda, Amanda e “Riquinho” que

representam para mim o ar que eu respiro. Ouvir cada palavra de carinho, de incentivo, de boa

noite, cada vez que me fizeram companhia, cada abraço, cada beijoca melecada, cada “acredita

mainha que você vai conseguir”, por tudo isso vale a pena correr para casa.

Agradeço aos meus irmãos Adriana, Heddylamarr e Júnior, que fazem parte de mim, pessoas

maravilhosas, com quem posso sempre compartilhar alegrias, tristezas, anseios, angústias, e

mesmo de olhos fechados sei que estão do meu lado, conseguem demonstrar a cada dia o

verdadeiro significado da família.

Agradeço à minha irmã de coração, Patrícia Lapa, minha Pat, por me mostrar que nem sempre

os textos são escritos por dois autores, às vezes são apenas sobrenomes. Por ter partilhado cada

minuto, cada alegria, cada dificuldade, cada lágrima, cada sorriso, de uma forma tão especial,

que apenas tinha conhecido nos meus laços familiares. Por ter me dado às duas mãos, e também

às duas filhas, Bi e Lala, que são incríveis.

Agradeço às minhas companheiras de viagem, Ana Júlia, Kilma e Samara, que boas risadas

durante nossos caminhos.

Agradeço à minha orientadora, professora Hajnalka, carinhosamente “Rói”, por toda sua

dedicação e paciência ao longo dessa caminhada. À professora “Dorinha” pelo carinho e à

professora Ivanilde, por tão boas colocações e direcionamento da pesquisa.

“O Senhor é o meu pastor e nada me faltará” (Salmo

23, Bíblia).

RESUMO

Este trabalho analisa o aprendizado construído durante o estágio supervisionado na formação

de competências direcionadas ao exercício da advocacia. O objetivo é identificar com base na

percepção dos alunos matriculados na disciplina de estágio supervisionado, do semestre 2014.2,

no Núcleo de Práticas Jurídicas de uma Instituição de Ensino Superior do Agreste

Pernambucano, de que maneira o atual modelo do estágio prepara o aluno para o exercício da

advocacia, no que diz respeito à adequada atuação técnico-jurídica, conforme competências

traçadas pelo Ministério da Educação. Para o desenvolvimento da pesquisa foi realizado um

estudo de caso de um grupo de estudantes matriculados na disciplina de Estágio Supervisionado

Civil, do período especificado que esteve em contato com a comunidade através do Escritório

Modelo, analisando-se qualitativamente o conteúdo das entrevistas realizadas com os discentes,

no fim do período letivo. Finalmente, com a interpretação dos dados coletados, percebe-se o

desenvolvimento de atividades práticas na construção do conhecimento, que são direcionadas

à construção de competências específicas, proporcionando aos alunos experiências únicas, que

permitem o querer mais, retirando-os do papel de meros expectadores, mesmo com as

limitações apresentadas pelos núcleos de práticas.

Palavras-chave: Competências. Estágio Supervisionado. Prática jurídica.

ABSTRACT

This paper analyzes the learning built during the supervised internship in skills training directed

to the practice of law. The objective is to verify, in the perception of the students, how the

practical activities, half 2014.2, during the period they are in the nuclei of legal practices,

influence the development of the skills necessary for professional practice of law, according to

guidelines set by the Board of Higher Education of the National Council Education. For the

development of the research, it was performed the phenomenological study of a group of

students enrolled in the course of Civil Supervised Internship, which for half a year was in

contact with the community through the Office Model qualitatively analyzing up the content of

the interviews with the students at the end of the school year. Finally, with the interpretation of

the collected data, we can see the development of practical activities in the construction of

knowledge, which are aimed at building specific skills, providing students with unique

experiences that allow them to want more, removing them from the role of mere viewers, even

with the limitations presented by the core practices.

Keywords: Skills. Supervised internship. Law Practice.

LISTA DE FIGURAS

Figura 1 – Categoria I – Estágio supervisionado......................................................................64

Figura 2 – Categoria II – Competências alcançadas.................................................................65

Figura 3 – Categoria I – Unidade de registro – Unidade de contexto.......................................66

Figura 4 – Categoria I - Expectativas dos alunos ingressantes do estágio ...............................69

Figura 5 – Categoria I – Competências traçadas pelo MEC ....................................................71

Figura 6 – Categoria II – Competências alcançadas.................................................................73

Figura 7 – Unidade de registro – Da redação das peças processuais .......................................82

Figura 8 – Da relação com os clientes ......................................................................................88

Figura 9 – Assistência e atuação em audiências e sessões .......................................................92

LISTA DE GRÁFICOS

Gráfico 1 – Percentual de alunos aprovados e reprovados no estágio supervisionado 2014.2.55

Gráfico 2 – Estrutura do estágio supervisionado 2014.2..........................................................56

Gráfico 3 – Caracterização dos sujeitos da pesquisa................................................................58

Gráfico 4 – Descritivo dos alunos participantes da pesquisa...................................................59

LISTA DE QUADROS

Quadro 1 – Quantidade de registros dos termos nos portais de periódicos..............................23

Quadro 2 – Competências e significados.................................................................................39

Quadro 3 – Alunos do estágio supervisionado 2014.2.............................................................55

Quadro 4 – Categorias da pesquisa...........................................................................................62

Quadro 5 – Etapas da pesquisa.................................................................................................63

Quadro 6 – Expectativas dos alunos ingressantes do estágio...................................................63

Quadro 7 – Conhecimento das competências traçadas pelo Ministério da Educação..............67

Quadro 8 – Da redação das peças processuais..........................................................................71

Quadro 9 – Da relação com os clientes.....................................................................................75

Quadro 10 – Assistência e atuação em audiências e sessões....................................................83

LISTA DE SIGLAS

MEC Ministério da Educação

PROCON Fundação de Proteção e Defesa do Consumidor

SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ................................................................................................................... 17

1.1 Contextualização do problema ........................................................................................ 17

1.2 Pergunta de Pesquisa ....................................................................................................... 21

1.3 Objetivos ............................................................................................................................ 21

1.3.1 Objetivo geral ................................................................................................................. 21

1.3.2 Objetivos específicos ...................................................................................................... 22

1.4 Justificativas ...................................................................................................................... 22

1.4.1 Justificativa teórica........................................................................................................ 22

1.4.2 Justificativa prática ....................................................................................................... 23

2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA ...................................................................................... 25

2.1 O ensino jurídico no Brasil ............................................................................................. 25

2.1.1 Os paradigmas conservadores ...................................................................................... 25

2.1.2 A implantação dos cursos jurídicos no Brasil ............................................................ 27

2.2 A crise do ensino jurídico no Brasil ............................................................................... 28

2.2.1 A crise da advocacia no Brasil ..................................................................................... 32

2.3 Competências no ensino jurídico ................................................................................... 37

2.3.1 Ensino superior em Direito x competências traçadas pelo MEC ............................. 40

2.3.2 A influência da OAB na formação dos profissionais de advocacia .......................... 44

2.4 Estágio supervisionado aspectos históricos e a implantação nos cursos de Direito .. 48

3 METODOLOGIA ............................................................................................................. 52

3.1 Delineamento da Pesquisa .............................................................................................. 52

3.1.1 Locus .............................................................................................................................. 53

3.1.2 Sujeitos da pesquisa ...................................................................................................... 54

3.1.3 Instrumentos de coletas de dados ................................................................................ 59

3.1.4 Análise das entrevistas ................................................................................................. 60

3.1.5 Desenho da pesquisa ..................................................................................................... 62

3.1.6 Limites e limitações da pesquisa .............................................................................. 63

4 A EXPERIÊNCIA DOS ALUNOS DO ESTÁGIO SUPERVISIONADO DE UMA

INSTITUIÇÃO DE ENSINO SUPERIOR .......................................................................... 64

4.1 Divisão das categorias ...................................................................................................... 64

4.2 Categoria I – Estágio supervisionado ............................................................................ 66

4.2.1 Subcategoria – Expectativas dos alunos ingressantes do estágio ............................. 66

4.2.2 Subcategoria – Conhecimento das competências traçadas pelo Ministério da

Educação ................................................................................................................................ 71

4.3 Categoria II – Competências alcançadas ....................................................................... 73

4.3.1 Subcategoria – Da redação das peças processuais ..................................................... 75

4.3.2 Subcategoria – Da relação com os clientes ................................................................. 82

4.3.3 Subcategoria – Assistência e atuação em audiências e sessões ................................. 88

5 CONCLUSÕES E SUGESTÕES ...................................................................................... 93

5.1 Conclusões ........................................................................................................................ 93

5.2 Recomendações à instituição de ensino ......................................................................... 96

REFERÊNCIAS .................................................................................................................... 97

APÊNDICE A - Questionário de caracterização do participante ................................... 101

APÊNDICE B - Roteiro da entrevista ............................................................................... 102

ANEXO A - Leis históricas .................................................................................................. 103

ANEXO B – Portaria nº 1.886, de 30 de dezembro de 1994 ............................................. 106

ANEXO C – Resolução n. 09/2004 - Conselho Nacional de Educação ........................... 110

ANEXO D - Regulamento do estágio supervisionado ...................................................... 115

17

1. INTRODUÇÃO

1.1 Contextualização do problema

A dificuldade de associação entre a formação teórica e a prática tem sido objeto de debate ao

longo de vários anos, nos mais diversos ramos profissionais. Durante o período de graduação,

em que o aluno desenvolve inicialmente seu estudo profissional, as instituições de ensino

jurídico oferecem nas grades curriculares o estágio supervisionado, como um possível meio de

desenvolver a interação entre o aprendizado teórico com a aplicação prática do conteúdo.

A dificuldade de trazer os conhecimentos teóricos a uma realidade prática encontra-se presente

na atividade forense, e tal ponto é abordado quando se fala na construção do ensino jurídico

brasileiro, como preleciona Neves (2005, p. 11), situação que preocupa o mundo acadêmico.

Nas palavras de André-Jean Arnauld,

[...] é difícil ser categórico quando cuidamos de pensar o futuro. Podemos

sempre, sem muito nos aventurar, levantar hipóteses; tais hipóteses se

reportam tanto à constatação de fatos contemporâneos quanto a lições do

passado. [...] A lacuna entre o ensino do direito e a vida jurídica é tamanha

que os jovens advogados só vêm a aprender de fato a atividade

advocatícia na sua experiência prática. (grifo nosso) (ARNAULD, apud

OLIVEIRA, 2004, p.21)

Um dos apontes à existência de tal lacuna é o fato de ser o curso de Direito entendido como

essencialmente teórico, pautado em regras que estão escritas e às quais a população deverá

submeter-se. Todavia, vislumbra-se que tal conhecimento não pode ser meramente teórico, pois

ele toma por base a realidade social, que é dinâmica, devendo este ser construído sempre em

equiparação à evolução da própria humanidade.

A necessidade de diálogo entre a teoria e a prática é resultado da idealização de um ensino

jurídico planejado, a fim de abrigar os diferentes tipos de atividades humanas. Não é suficiente

ao aluno de direito apenas a transmissão de dados, teorias, regras e normas, em uma aula

meramente transmissiva de conteúdos. O abismo existente entre a teoria e a prática nos diversos

cursos de graduação é real, estando presente também no ensino jurídico e o processo de

construção do conhecimento junto ao graduando muitas vezes apresenta-se de forma arcaica, o

que é preocupante.

É necessário que o aluno consiga reunir todo o conhecimento e transforme em realidade prática,

sabendo dirigir-se aos tribunais, tornando-se apto à redação de peças processuais que devam

18

instruir processos desde o primeiro grau até instâncias superiores. Frise-se, todavia, que o

conhecimento técnico do aluno, não importando qual escolha ele faça, dentro das oportunidades

que o curso de Direito lhe oferece, deve ser guiado por ditames éticos, levando-se em

consideração valores, costumes, maturidade, respeito e dignidade.

A reflexão sobre esses temas reporta à própria noção de Universidade que, segundo Morin, tem

uma dupla função: “adaptar-se à modernidade científica e integrá-la; responder às necessidades

fundamentais de formação, mas também, e sobretudo, fornecer um ensino metaprofissional,

metatécnico, isto é, uma cultura” (2000, p. 81).

A Universidade tem que adaptar-se às necessidades da sociedade, bem como realizar sua função

de conservação, transmissão e construção do conhecimento. Todavia, essa transmissão de

patrimônio cultural através do ensino sofre mudanças com a evolução da sociedade e muitas

vezes o aprendizado meramente técnico tem-se demonstrado insuficiente na garantia ao aluno

da atuação profissional adequada, como a construção de peças processuais bem redigidas, que

delimitem com justiça o direito das partes, o acompanhamento dos processos nas diversas

instâncias e a própria assistência jurídica dirigida às partes. A essas atividades devem estar

associados parâmetros éticos, voltados à pacificação social (MORIN, 2000).

O aprendizado é direcionado ao desenvolvimento de pessoas qualificadas para a realização de

determinadas atividades (FLEURY; FLEURY, 2001), ou seja, a construção de competências tem

sido objeto das normas publicadas pelo Ministério da Educação – MEC. A atual Resolução de

n. 9, do Conselho Nacional de Educação, publicada em 29 de setembro de 2004, preceitua em

seu artigo 4º., quais são as competências que se espera serem atingidas pelo graduando, que se

direcionam à formação do profissional jurídico:

Art. 4º. O curso de graduação em Direito deverá possibilitar a formação

profissional que revele, pelo menos, as seguintes habilidades e competências:

I - leitura, compreensão e elaboração de textos, atos e documentos jurídicos

ou normativos, com a devida utilização das normas técnico-jurídicas;

II - interpretação e aplicação do Direito;

III – pesquisa e utilização da legislação, da jurisprudência, da doutrina e de

outras fontes do Direito;

IV – adequada atuação técnico-jurídica, em diferentes instâncias,

administrativas ou judiciais, com a devida utilização de processos, atos e

procedimentos;

V - correta utilização da terminologia jurídica ou da Ciência do Direito;

VI - utilização de raciocínio jurídico, de argumentação, de persuasão e de

reflexão crítica;

VII - julgamento e tomada de decisões; e,

19

VIII - domínio de tecnologias e métodos para permanente compreensão e

aplicação do Direito.

Vislumbra-se ao longo da história do ensino jurídico brasileiro a construção de tais diretrizes

que se traduzem em competências. Antes da atual Resolução n. 09, por muitos anos vigorou a

Portaria 1.886/94, que aliada à Comissão de Especialistas do Ensino Jurídico, também do MEC,

inicialmente traçou o perfil do que se esperava ao graduando em Direito e entre tais perspectivas

destacava-se já o domínio técnico-jurídico e prático, para uma aprendizagem autônoma e

dinâmica.

[...] O perfil desejado para o formando de direito segundo a Comissão funda-

se numa formação geral e humanística, com capacidade de análise e

articulação de conceitos e argumentos, de interpretação e valoração dos

fenômenos jurídico-sociais, paralela a uma postura reflexiva e visão crítica

que proporcione o trabalho em equipe (OLIVEIRA, 2000, p. 50).

A formação do aluno é voltada para um perfil diferente, não mais mero reprodutor de teorias,

mas detentor de habilidades que o torne capaz de desenvolver de forma adequada suas

atividades profissionais. Este estudo é direcionado à desenvoltura do aluno no que diz respeito

à construção de tais competências, devidamente indicadas no artigo 4º, da Resolução citada,

através do estágio oferecido nos cursos de Direito ao corpo discente, no que diz respeito às

atividades de advocacia.

No presente estudo, foi feita uma breve análise sobre a construção do conceito de competências,

que, segundo os autores Joaquim Dolz e Edmée Ollagnier, “em uma primeira acepção bastante

geral, a noção de competência designa a capacidade de produzir uma conduta em um

determinado domínio” (2004, p. 10).

Importante também a percepção dos paradigmas presentes na construção do conhecimento na

área acadêmica. A fragmentação do todo, com o ensino sendo dividido em áreas, com a

aplicação dos paradigmas conservadores newtoniano-cartesiano. A forte influência de referidas

acepções ainda nos dias atuais (BEHRENS, 1999).

A atividade desempenhada pelo aluno de Direito nos Núcleos de Práticas Jurídicas, permite o

contato do discente com a comunidade e isso lhe proporciona experiências únicas. É o momento

em que aquela pessoa que está construindo o conhecimento jurídico tem a oportunidade de

transmiti-lo ao papel, para promover a busca dos direitos de pessoas que, muitas vezes,

encontram-se à margem da sociedade, esquecidas pelo Estado.

20

A experiência do estágio, se bem sucedida, pode proporcionar ao aluno uma ampliação do seu

olhar, ultrapassando as verdades aparentes. Tal atividade torna possível ao discente atuar em

diversas áreas, desenvolver um olhar crítico para o mercado de trabalho, ainda aprender a

observar, problematizar e buscar soluções para os diversos casos apresentados pela sociedade

no campo jurídico.

Normalmente, as atividades de estágio oferecidas pelas instituições de ensino superior

direcionam-se ao cotidiano forense no que diz respeito ao exercício de advocacia. É importante

que o aluno tenha contato com a comunidade, possibilitando-lhe desenvolver habilidades

inerentes às atividades judiciais e extrajudiciais. O profissional de advocacia deve ter um

domínio técnico amplo, todavia, é comum encontrar, no mercado de trabalho, profissionais do

Direito que exercem ditas atividades de forma irregular, cometendo erros grosseiros,

reiteradamente. Essa é uma realidade que existe há anos, registrando-se alguns posicionamentos

radicais quanto a esse contexto como o da Excelentíssima Ministra Eliana Calmon1, a qual

apresenta entendimento no sentido de que:

Não se pode conceber que um jovem bacharel seja capaz de, recém-saído da

faculdade, com pouquíssima experiência e maturidade profissional, judicar

nos Tribunais Superiores, cujos recursos e demandas contêm grande

complexidades técnica (CALMON, 2004).

Acrescenta, ainda, que:

Talvez ninguém melhor do que os magistrados para dar o testemunho da baixa

qualidade das peças processuais que chegam aos Tribunais, assoberbando e

emperrando o trabalho e desperdiçando o tempo dos julgadores. E, pelo

despreparo técnico, são os advogados tentados a ingressar em uma faixa de

atuação cada dia mais próspera (CALMON, 2004).

Tal aspecto apresenta-se também preocupante quanto ao ingresso na Ordem dos Advogados do

Brasil que, com a publicação da Lei 8.906/94, determina em seu artigo 8º, provimentos que

delimitam regras ao Exame da Ordem, teste aplicado ao bacharel em Direito, que possibilita a

inscrição deste no órgão da classe, habilitando-o ao exercício da advocacia, incluindo neste

1 Eliana Calmon Alves, nascida em Salvador, na data de 5 de novembro de 1944, é uma jurista brasileira. Trata-

se da primeira mulher a compor o Superior Tribunal de Justiça, no qual ocupou o cargo de ministra no período

de 1999 a 2013. Também foi corregedora-geral de Justiça e diretora-geral da Escola Nacional de Formação e

Aperfeiçoamento de Magistrados ministro Sálvio de Figueiredo.

21

exame uma etapa que exige do bacharel a resolução de casos práticos através da construção de

peças processuais.

Verifica-se assim, no estágio, no momento acadêmico de formação do conhecimento, através

do ensino jurídico, a necessidade de preparar o aluno para o ingresso em mercado, e é nesse

momento que surge a problemática abordada com o presente trabalho, que é direcionado à

pesquisa realizada no ambiente acadêmico de uma instituição de ensino superior, localizada na

região do agreste de Pernambuco. Referido centro institucional oferta aos alunos, estágio

supervisionado por professores orientadores, que são advogados militantes nas mais diversas

áreas, permitindo ao aluno o desenvolvimento da atividade profissional em núcleos que se

direcionam ao atendimento da comunidade carente da cidade de Caruaru.

O estágio, como parte da formação do graduando em Direito, é base para o desenvolvimento

da pesquisa realizada no presente estudo, que aborda a pergunta de pesquisa e os objetivos a

seguir descritos.

1.2 Pergunta de pesquisa

Com base na percepção dos alunos matriculados na disciplina de estágio supervisionado, do

semestre 2014.2, no Núcleo de Práticas Jurídicas de uma Instituição de Ensino Superior (IES)

do Agreste Pernambucano, de que maneira o atual modelo do estágio prepara o aluno para o

exercício da advocacia, no que diz respeito à adequada atuação técnico-jurídica, conforme

competências traçadas pelo Ministério da Educação?

1.3 Objetivos

Os objetivos apresentados a seguir representam o que se pretende alcançar com este estudo,

contemplando os três pilares principais da pesquisa, que são: teoria e prática, estágio

supervisionado, competências.

1.3.1 Objetivo geral

Identificar com base na percepção dos alunos matriculados na disciplina de estágio

supervisionado, do semestre 2014.2, no Núcleo de Práticas Jurídicas de uma Instituição de

Ensino Superior (IES) do Agreste Pernambucano, de que maneira o atual modelo do estágio

22

prepara o aluno para o exercício da advocacia, no que diz respeito à adequada atuação técnico-

jurídica, conforme competências traçadas pelo Ministério da Educação.

1.3.2 Objetivos específicos

Analisar as competências a serem desenvolvidas na formação de alunos da graduação

do curso de Direito, segundo Resolução Normativa de n. 9, do Conselho Nacional de

Educação, publicada em 29 de setembro de 2004;

Identificar as expectativas dos alunos ingressantes no estágio supervisionado do

semestre 2014.2, acerca das competências que esperam formar para a prática

profissional da advocacia;

Avaliar o alcance dessas expectativas, na percepção dos mesmos alunos, no momento

de conclusão do estágio.

1.4 Justificativas

O presente trabalho possui relevância conforme justificativas teórica e prática abaixo indicadas,

sendo construídas a partir da pesquisa bibliográfica, e dos dados encontrados em sites

reconhecidos academicamente e percentuais apresentados pela Ordem dos Advogados do

Brasil.

1.4.1 Justificativa teórica

Atualmente, o mercado de trabalho tem se mostrado cada vez mais exigente, a sociedade precisa

de profissionais bem formados que dominem competências, habilidades distintas, que possam

associar conhecimentos teóricos e aplicá-los ao desenvolvimento de atividades práticas, com

rapidez e eficiência na tomada de decisões.

O ensino jurídico encontra o desafio imediato de passar por uma reformulação das políticas

pedagógicas, devendo ser estabelecidos novos paradigmas, no intuito de transpor com o

tradicional modelo positivista, não havendo que falar-se mais em simples reprodutores de

conceitos. Devem, agora, “formar profissionais humanistas dentro de uma abordagem

interdisciplinar aptos a compreender e mensurar os fenômenos jurídicos e suas implicações

sociais, utilizar as técnicas e aliar a teoria à prática.” (MARTINS, 2005, p.3)

23

A preocupação na formação dos ditos profissionais com diretrizes delineadas demonstra-se na

Resolução n. 09/2004, do Ministério da Educação, quando delimita habilidades e competências

que deverão ser alcançadas pelos graduandos em Direito. O interesse em torno do alcance das

competências tem sido frequente nos mais variados tipos de profissões.

Quando a discussão é no ensino jurídico, todavia, apesar da relevância do tema, vislumbram-se

ainda poucas pesquisas com resultados concretos, sendo primordial a análise sobre a

contribuição do estágio supervisionado para o desenvolvimento de tais competências.

Quadro 1 - Quantidade de registros dos termos nos portais de periódicos

TERMO PESQUISADO SCIELO CAPES

Teoria e prática em educação 144 2731

Teoria e prática no ensino superior 24 696

Teoria e prática no ensino jurídico 00 70*

Estágio no ensino superior 00 407*

Estágio no ensino jurídico 00 29*

Estágio supervisionado no ensino jurídico 00 00 Fonte: Elaboração própria. Acesso em: 22 fev. 2015.

* Em virtude do critério de busca, o quantitativo de artigos e teses identificados mediante pesquisa eletrônica no

portal da CAPES e SCIELO, não contempla somente textos que se relacionem exatamente com o conteúdo desta

pesquisa.

1.4.2 Justificativa prática

Os resultados desta pesquisa interessam aos que fazem parte do mundo jurídico, tendo em vista

a realidade atual dos cursos de Direito. Em 2013, novas regras sobre o estágio obrigatório foram

tema de debate aos que fazem parte do Ministério da Educação (MEC), que suspenderam

inclusive as autorizações de novos cursos, em março daquele ano.

São mais de 1200 (um mil e duzentas) faculdades aqui no Brasil, que possuem, entre seus

cursos, o de Direito. Isso significa pouco mais de oitocentas mil matrículas. Tal número

representa um quantitativo superior ao que fora encontrado em todo o restante do mundo

(SARDINHA e COELHO, 2014).

Com essa quantidade de cursos existentes em nosso país, o número de advogados atuando em

mercado poderia passar o número de três milhões, todavia, temos pouco mais de oitocentos mil

inscritos que, entre outros motivos, deparamo-nos com o alto índice de reprovação no exame

de Ordem, o que significa um dado preocupante, no que diz respeito à preparação desses alunos

como profissionais ingressantes em mercado de trabalho (Conselho Federal da OAB, 2014).

24

Vislumbra-se, a partir da publicação da Lei 8906/94, uma nova postura da Ordem dos

Advogados do Brasil, para permitir o ingresso em seus quadros. É com a publicação da citada

lei que passa a vigorar o atual Exame de Ordem, que nada mais é do que a aplicação de uma

prova em duas fases, uma objetiva e uma prática, as quais visam mensurar o nível de

conhecimento teórico e prático dos bacharéis em Direito. A aprovação em tal exame significa

a permissão para ingressarem na Ordem e passarem a exercer a atividade de advocacia.

25

1 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

2.1 O ensino jurídico no Brasil

Entender a história da implantação do ensino jurídico em nosso país, ajuda-nos a vislumbrar de

forma mais clara o caminhar daqueles que estão envolvidos com a educação em proporcionar

aos alunos a associação entre teoria e prática na formação dos profissionais em Direito.

2.1.1 Os paradigmas conservadores

Inicialmente é necessária uma breve abordagem sobre os paradigmas da prática pedagógica,

que se desenvolveram a partir dos paradigmas científicos, tendo estes, exercido influência no

ensino de uma forma geral.

O conceito de paradigma encontra-se relacionado ao modelo ou padrão que deve ser seguido

para que haja o estudo de fenômenos e da realidade. Envolve o aprender a aprender, com normas

que servem para o desenvolvimento da construção do conhecimento futuro (BEHRENS, 2005).

Ao longo da história, por um bom período o avanço científico foi discreto e pouco significativo.

Até que em meados do século XVI, surgiram grandes gênios que passaram a influenciar no

pensamento da época. Nomes como Galileu Galilei, mestre da dedução teórica, Francis Bacon,

o criador do empirismo da investigação, René Descartes, criador da geometria analítica e Isaac

Newton, criador dos princípios da mecânica. Nessa época viu-se surgir o paradigma

Newtoniano-Cartesiano, a partir do método científico racional dedutivo defendido por

Descartes, que defendia o dualismo da natureza, dividia matéria e pensamento, corpo e alma.

O método de Descartes foi consolidado por Newton, surgindo assim tal paradigma (MORIN,

2007).

O paradigma Newtoniano-Cartesiano tem um grande valor histórico e ainda hoje influencia

todos os campos do conhecimento científico. A referida ideia, parte do pressuposto de que, para

se conhecer o todo, é preciso fragmentá-lo em seus componentes e estudar cada um deles

separadamente. A união e o entrelaçamento das partes fragmentadas resultariam no todo

(MORIN, 2007).

Esse posicionamento acabou por influenciar o mundo pedagógico, marcando profundamente o

século XX:

26

...as escolas repartiram o conhecimento em áreas, as áreas em cursos, os cursos

em disciplinas, as disciplinas em especificidades. A repartição foi tão

contundente que levou os professores a realizarem um trabalho docente

completamente isolados em suas salas de aula. Outro fator relevante de

influência deste paradigma na ação docente é a busca da reprodução do

conhecimento. Caracterizada pela fragmentação, a prática pedagógica propõe

ações mecânicas aos alunos, provocando um ensino assentado no escute, leia,

decore e repita (BEHRENS, 2005, p. 36).

No início do século XXI, um nova valorização sobre a importância da educação para o

desenvolvimento da sociedade, como uma necessidade básica para viver-se com plenitude

assim como pessoa e como cidadão, começou a surgir. Refletir sobre a educação, significava

pensar sobre as possibilidades de mudanças dos paradigmas conservadores que vinham até

então caracterizando a prática docente, a simples reprodução do conhecimento já não se

mostrava suficiente à aprendizagem, passando a surgir um posicionamento crítico sobre a

docência (BEHRENS, 1999).

A figura do professor severo que conhecia o conteúdo, mas não permitia interrupções, opiniões

diversas, posicionamentos críticos, já não mais se mostrava eficiente, o paradigma cartesiano

de apenas se oferecer conhecimento aos alunos sem nenhum tipo de interferência, não mais

surtia os efeitos esperados. Competência na docência já não mais era sinônimo de autoritarismo.

Necessitava-se de uma prática pedagógica inovadora, para transformar os alunos em seres

conscientes, críticos e reflexivos em suas áreas de atuação, podendo compreender e refletir

sobre o conhecimento e não apenas aceitar. As universidades não podiam mais ter essa visão

arcaica, carecendo o modelo atual de imediata revisão, face aos novos conceitos de competência

da época moderna (DEMO, 1993).

Surgem paradigmas inovadores, que não mais pensam na fragmentação do todo para estudo,

mas o estudo interdisciplinar, a produção do conhecimento por um trabalho coletivo e

compartilhado, de interconexão, de reaproximação das partes do todo. É a abordagem holística,

pautada em paradigmas emergentes, com uma nova visão do mundo. Esse novo paradigma faz

com que seja necessário repensar o papel da escola, pois esta é a grande articuladora do saber

(BEHRENS, 2005).

Vislumbra-se que o curso de Direito continua sendo muito influenciado pelos paradigmas

conservadores, da fragmentação do todo, dividido em áreas, uma parte teórica e outra prática,

que se encontram distintas, individualizadas. O paradigma newtoniano-cartesiano foi absorvido

desde a época da implantação dos cursos jurídicos no Brasil, no ano de 1827, através de Carta

27

de Lei e ainda encontra-se presente nas universidades atuais, conforme será abordado nos

próximos pontos (BEHRENS, 2005).

2.1.2 A implantação dos cursos jurídicos no Brasil

O diploma fundador do ensino jurídico no Brasil foi sancionado por Pedro I, através da Carta

de lei publicada em 11 de agosto de 1827. A citada Carta determinava a criação de dois cursos

de Direito no país, um em São Paulo e o outro em Olinda. Entre outros assuntos, foram

denominados de “Lentes proprietários” aqueles responsáveis pela regência das Cadeiras2 à

época implantadas pela Carta, que no artigo 5º. determinava a implantação de uma Cadeira de

teoria e prática do processo (VENANCIO FILHO, 2005).

A criação dos cursos jurídicos surgiu em um momento em que se tornava premente a

consolidação de uma elite dirigente para o país. Com a independência brasileira proclamada,

necessitava-se agora de uma independência cultural. Até então, a formação jurídica era um

privilégio de poucos, bacharéis formados pela Universidade de Coimbra, e trazer aos filhos dos

proprietários de terras a oportunidade de cursarem o ensino superior aqui mesmo no Brasil, sem

a necessidade de deslocamento do continente, mostrava-se de grande relevância. (OLIVEIRA,

2004)

Inicialmente o objetivo dos cursos de Direito era “formar homens hábeis para serem um dia

sábios magistrados e peritos advogados de que tanto se carecia e outros que pudessem vir a ser

dignos deputados e senadores para ocuparem os lugares diplomáticos e mais empregos do

Estado.” (VENANCIO FILHO, 2005, p. 31). Mantendo assim uma essencial função política,

na tentativa de alinhar o pensamento daqueles que ocupavam os principais cargos de direção

do país.

De acordo com a legislação da época, o curso tinha a duração de cinco anos e, no último período,

o aluno se dedicava ao aprendizado da prática, a fim de entender o andamento do processo

adotado pelas leis do Império. A lei determinava que fossem adotados os Estatutos do Visconde

de Cachoeira3, que determinava já a necessidade do estudo do Direito ser ao mesmo tempo

prático e teórico (VENANCIO FILHO, 2005).

2 Denominação dada para as disciplinas ministradas em sala de aula. 3 Tratavam-se de estatutos criados pelo Visconde de Cachoeira, José Luís de Carvalho e Melo, nascido

na Bahia, em 06 de maio de 1774; formou-se em direito na Universidade de Coimbra e exerceu várias

28

Iniciava-se naquela época a preocupação de trazer ao aluno o ensino prático como meio de

entender a aplicação do que fora fixado na teoria, em busca da formação de consumados juristas

brasileiros. Sobre esse tema, os Estatutos determinavam a simulação do cotidiano forense

trazendo aos estudantes lições de casos práticos, assinalando que:

Depois de explicado e expedido tudo quanto há relativo a estas partes do

processo, (o professor) não se contentará só com esta teoria, e pois que o fim

da instituição desta cadeira é fazer versados na prática do foro os estudantes,

reduzirá com exatidão a ela a maior parte de suas lições. Para este fim nomeará

dentre os estudantes, os dois contendores, autor, réu, escrivão e advogado, em

primeira instância e escolhendo uma questão que lhe parecer mais apropriada,

fará que o advogado do autor proponha a ação, e deduza o libelo, o do réu a

contrariedade, ou exceção que convier, e seguidos os termos, que a lei

prescreve para as audiências, e passando-se às provas no tempo competente,

arrazoarão a final os dois advogados, e o Juiz proferirá a final a sua sentença

(VENÂNCIO FILHO, 2005, p. 33).

Acreditar que a educação é uma das principais forças que trazem inovação na sociedade, foi o

pilar para a reforma do ensino livre que teve início no ano de 1870. Ao lado da consciência

livre, da abolição, da emancipação feminina, entre outros, surgiu a ideia da liberdade de ensino.

Passaram a ser valorizados aqueles que faziam parte do ensino superior, na função de formar

ilustres cidadãos a quem cabia acelerar a marcha histórica do país (VENÂNCIO FILHO, 2005).

2.2 A crise do ensino jurídico no Brasil

Os cursos jurídicos no país também foram marcados por constantes reformas do ensino. Em

1869 houve a reforma do ensino livre, este que concebia a liberdade de ensino sem qualquer

limitação. Nesse contexto, se contrapunha a ideia de universidade que, durante o Império,

desenvolveu-se na perspectiva da perpetuação das estruturas de poder vigentes, com

características conservadoras (NEVES, 2005).

No ensino livre, propagava-se que não poderiam prevalecer nas faculdades o regime de faltas

ou sabatinas, já que tais instituições eram frequentadas por alunos que já dispunham de um

espírito culto, e assim, saberiam discriminar o que seria mais conveniente aos seus interesses.

Deveriam os alunos estudar com quem quisesse e onde lhes fosse mais cômodo e depois

prestariam as provas determinadas por lei. (VENÂNCIO FILHO, 2005).

funções na vida pública, sendo deputado e depois senador por sua província natal, no início do século,

participou da elaboração da Constituição do Império, vindo a falecer no Rio de Janeiro, em 06 de julho

de 1826.

29

Nessa época, o estágio supervisionado era caracterizado como o exercício da atividade prática

do processo que era adotado pelo Império, sendo realizada junto com a teoria. No ano de 1891,

esse estágio recebeu a denominação de Prática Forense, e assim permaneceu até o ano de 1962.

O divórcio entre teoria e prática era premente, nos cursos jurídicos, demonstrando-se cristalino

no centenário da implantação dos cursos jurídicos (OLIVEIRA, 2004).

Apenas por volta de 1930 inicia-se uma abordagem à crise do ensino jurídico. Um dos temas

abordados era a divisão entre teoria e prática que se apresentava de tal forma ao ponto de haver

sido publicado o Decreto n. 19.851, em 11 de abril de 1931, que determinava a divisão dos

cursos jurídicos em doutorado e bacharelado, sendo o primeiro exclusivamente teórico e o

segundo destinado a uma formação mais acadêmica, voltado à profissionalização do aluno

(OLIVEIRA, 2004).

Um aspecto que merece destaque no que diz respeito à referida crise, é o fato de ser o ensino

jurídico eminentemente pautado numa construção do ensino voltado para o aprendizado dos

códigos. Ao ingressar no curso de Direito tem o aluno diversas disciplinas nas quais o aluno

“aprende” o que determina o Código Civil, o Código Penal, os Códigos processuais e a

Consolidação das Leis Trabalhistas. Tais disciplinas poderiam ser simplificadas em teorias

gerais, e com a opção da área de atuação, o aluno aprofundaria a construção do conhecimento

apenas em determinadas áreas (ALMEIDA, SOUZA e CAMARGO, citados em GHIRARDI e

FEFERBAUM, 2013).

Existindo um ensino mais voltado na reflexão de teorias e uma abordagem maior em problemas

reais e atividades práticas dentro da área escolhida pelo aluno, lhe daria a oportunidade de

dentro da própria graduação ter um ensino mais aprofundado. Dessa forma, poderíamos ter um

profissional apto a atender as demandas sociais, por estar bem instrumentalizado em sua área

de preferência, não apenas pela construção do conhecimento teórico pautado na legislação, mas

também por meio dos estudos práticos e aplicados, por exemplo, com recurso à jurisprudência

e a casos simulados. (ALMEIDA, SOUZA e CAMARGO, citados em GHIRARDI e

FEFERBAUM, 2013).

A essência dos cursos jurídicos traz a necessidade do método misto de ensino, utilizando-se

tanto a teoria quanto a prática, já que o Direito é considerado uma ciência notavelmente prática

quanto ao fim, todavia não deixa de ser teórica quanto ao modo de estudar e de saber. Sendo

30

assim, não há benefícios na utilização de métodos exclusivamente práticos ou teóricos. O ideal

seria realmente unir a teoria com a prática. (VICENTE FILHO, 2005)

Por volta de 1950, iniciam-se as discussões sobre novos meios de ensinar o Direito, partindo da

distinção entre a didática tradicional e a nova didática:

A primeira parte do pressuposto que se o discente conhece as normas e

instituições, conseguirá, com seus próprios meios raciocinar perante as

controvérsias. A nova didática é aquela na qual o estudante deve repetir o

esquema fundamental de que o conflito de interesses e a controvérsia entre

dois indivíduos são fatos necessários para que surja, como resposta, a norma

jurídica. (OLIVEIRA, 2004, p. 40/41)

O ensino jurídico se encontrava em um processo de perda de credibilidade. Em 1962, a

denominada Prática Forense, passou a integrar o conteúdo do Direito Judiciário Civil e do

Penal. Até então não haviam ocorrido grandes alterações desde a implantação dos cursos

jurídicos no Brasil, continuavam a serem apresentadas as mesmas falhas encontradas no início

dos cursos, desde o Império, acrescentando-se a outras que passaram a surgir. As mudanças

mais significativas foram a proliferação de faculdades e seu acesso pela classe média e a forte

substituição do paradigma jusnaturalista fortemente encontrado na implantação de tais cursos

pelo paradigma positivista e a tentativa de formação em cursos essencialmente

profissionalizantes (RODRIGUES, 1988).

Durante o período da ditadura militar, a situação tornou-se bem pior. Os cursos jurídicos

passaram a ter a função de meros reprodutores de ideias pré-concebidas e não uma formação

do aluno preocupado com o cenário mundial. Em 1972, foi publicada e passou a vigorar no

Brasil a Resolução n. 3, do Conselho Federal de Educação, trazendo um novo currículo aos

referidos cursos, o que prevaleceu até a edição da Portaria n. 1886/94, do Ministério da

Educação (BITTAR, 2001).

Os cursos estavam voltados para um enfoque técnico: aos alunos não se incentivava a

construção de uma visão crítica que entendesse o fenômeno jurídico em si. Todavia, a sociedade

não trazia uma realidade estagnada, os fenômenos sociais evoluíam e passaram a apresentar-se

de forma complexa, que passou a exigir uma nova conduta dos operadores jurídicos em especial

dos advogados, fazendo-se necessários saberes mais abrangentes.

Iniciaram-se movimentos sociais por um acesso maior à justiça e não ao Judiciário em si. Os

valores essencialmente privados transformavam-se em necessidades coletivas, exigindo do

31

profissional do Direito um perfil diferente, mais crítico. Determinava a Resolução n. 03/72, que

a Prática Forense agora fosse realizada através de um estágio supervisionado, em um estudo

voltado para os problemas brasileiros, entretanto essa prática de fórum era equivocadamente

vista dentro de uma sala de aula (BITTAR, 2001).

O Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil demonstra preocupação na busca de

soluções para a situação de crise dos cursos de Direito no país, através de reuniões, congressos,

debates entre operadores da área e professores de tais cursos. Uma das conclusões constatadas

pelo órgão, ao longo de tais eventos, foi que o ensino jurídico não permitia ao aluno de Direito

o desenvolvimento de padrões que direcionassem o pensamento deste aluno a raciocinar a

sociedade em uma dimensão totalizadora e sim em caráter individualista (OLIVEIRA, 2004).

Um ponto que merece destaque é a dificuldade vivenciada pelos operadores jurídicos no

aprendizado das práticas forenses. Inicialmente a barreira do ‘saber de erudição’, que deveria

ser substituído por um saber pautado no ‘Direito achado na rua’, pois a grande falha não estava

em questionar se o curso era teórico ou prático, mas na falta de conjugação da teoria e da prática

(AGUIAR, 1994).

Havia a necessidade de aplicação do conhecimento teórico à atividade prática dentro de um

contexto social, que refletisse a realidade. Inserir o aluno na prática forense de casos reais, seria

papel da Universidade que não deveria atuar simplesmente como centro de reprodução do

conhecimento, mas igualmente como pólo de produção de novos conhecimentos, como

investigação, pesquisa, descoberta e invenção. (MORIN, 2000)

O modelo de ensino que apresentava uma separação clássica entre os muros da Universidade e

a prática jurídica, encontrava-se ultrapassado, não mais apresentava a eficácia esperada.

Iniciava-se a busca de novos resultados, o objetivo era que os alunos na graduação adquirissem

uma ampla e crítica percepção da realidade jurídico-social. Habilidades que conseguissem

fundir consciência e experiência, conteúdo e método, teoria e prática, com o objetivo de renovar

o pensamento daqueles que faziam parte da Universidade (MORIN, 2000).

O ensino das normas jurídicas não faz sentido na construção de um aprendizado exclusivamente

teórico, entender a lei, mas não saber aplica-la a um caso prático, à realidade social, não faz

sentido. Uma abordagem significativa é a necessidade de reflexão quanto ao ensino jurídico

voltado para áreas específicas. O que se tem atualmente é o aluno graduando em Direito, que

32

ao terminar o ensino superior, inscreve-se de imediato num curso de especialização, que muitas

vezes pouco acrescenta, para ter um pouco de domínio em determinadas áreas. (ALMEIDA,

SOUZA e CAMARGO, citados em GHIRARDI e FEFERBAUM, 2013).

Possibilitar ao aluno a escolha de áreas específicas lhe possibilitaria um encontro maior com a

realidade social de assuntos determinados. Se o conteúdo teórico muitas vezes demonstra-se

imenso, deparando-se professor e aluno com um tempo muito curto para tantas teorias,

sobrando ao aluno curto espaço de tempo para atividades práticas voltadas à aplicação de tais

teorias, especializar as grades de ensino, poderiam funcionar como solução para proporcionar

ao aluno esse encontro com a realidade, podendo dessa forma associar de forma mais tranquila

teoria e prática forenses. (ALMEIDA, SOUZA e CAMARGO, citados em GHIRARDI e

FEFERBAUM, 2013).

As atividades práticas seriam colocadas à disposição do aluno em diversas áreas, não se

limitando apenas ao estudo de jurisprudências, o que muitas vezes é o contexto vivido nas

instituições de ensino, mas ainda além, através de atividades práticas reais ou simuladas.

Tarefas voltadas ao aprendizado das mais diversas rotinas profissionais dos mais variados

ramos do Direito, em primeiro grau e instâncias superiores. Estudo detalhado de peças

processuais e atos do judiciário praticados em todas as instâncias. (ALMEIDA, SOUZA e

CAMARGO, citados em GHIRARDI e FEFERBAUM, 2013).

2.2.1 A crise da advocacia no Brasil

A situação apresentada no ensino jurídico reflete-se na atuação dos profissionais jurídicos no

mercado de trabalho. Inicialmente, é importante fazer uma breve análise sobre o que seria crise

na advocacia. A palavra crise reporta-se ao prenúncio de uma quebra de ordem, de situações

que fogem ao controle, de reações destruidoras, podendo assumir dimensões operatórias que

atingem o funcionamento de um sistema, de forma geral (AGUIAR, 1994).

Um dos aspectos mais importantes da crise é exatamente a sua transitoriedade, seja mantendo

a estrutura, seja rompendo-a. A dinâmica dos elementos levará a uma superação das

contradições. Outro ponto que merece ser abordado é que tal fenômeno também depende de

pontos de vista: o que pode ser crise para alguns, pode não ser crise para outros. Diante de tais

características, a primeira análise a ser feita é questionar se a advocacia está nela inserida e

identificar a forma pela qual vem sendo tratada (AGUIAR, 1994).

33

Aqueles que defendem a existência de uma suposta crise, reclamam, opõem-se, protestam, mas

ainda fazem parte de um percentual mínimo da população brasileira. Outro ponto que merece

destaque é a ausência de estrutura para que se promovam alterações a esse quadro de crise,

tendo em vista que ainda há uma parte da população que muitas vezes é beneficiada com a

lentidão do judiciário e a falta de habilidade dos advogados, entre outros fatores, que

influenciam tal crise.

Um dos aspectos de tal fenômeno é a análise sob o ponto de vista de crise no âmbito estrutural

ou no âmbito operacional:

A crise pode assumir uma dimensão somente operatória. Nesse caso, a

estrutura não é atingida e só o funcionamento de um sistema está sendo

comprometido. A estrutura se mantém, mas suas relações com o exterior

apresentam graves problemas. Pode também a crise se abater sobre a estrutura

de um sistema, sobre a própria natureza das relações internas de seus

componentes. Aí estamos perante uma crise estrutural, que incide sobre a

própria natureza da ordem ou sistema (AGUIAR, 1994, p. 17).

Quando se analisa a questão da estrutura do Judiciário, vários são os pontos que vêm sendo

analisados ao longo da história da justiça brasileira. Inicialmente, a resolução dos conflitos

apresenta-se em um aspecto essencialmente privado, é a época que prevalece “a vingança

privada”, o “olho por olho, dente por dente”, forma denominada de autotutela. Prevalecia o

mais forte, o mais astuto, o mais esperto. O Estado não interferia nas decisões, era a época de

institutos como o “pater famílias”, o mais elevado estatuto familiar com origem na Roma

Antiga, que permitia ao pai de família ter poder absoluto sobre todos que faziam parte daquele

núcleo familiar, inclusive de vida e morte sobre essas pessoas (CINTRA; DINAMARCO;

GRINOVER, 2014).

Aos poucos, o Estado muda esse cenário e toma para si o poder de resolução dos conflitos. Essa

atividade, que atualmente é denominada de jurisdição, traz significativas mudanças.

Inicialmente, o Estado apresenta-se de forma tímida nas decisões, surgindo a figura do pretor,

representante estatal que tinha apenas uma pequena participação na solução do litígio. Depois

do período arcaico e do clássico, passou o pretor a conhecer ele próprio do mérito dos litígios

entre os particulares, proferindo a decisão final, trazendo efetivamente para si a atividade de

exame e solução dos conflitos, gerados pelas insatisfações individuais ou coletivas (CINTRA;

DINAMARCO; GRINOVER, 2014).

34

Evidente que essa evolução não se deu de forma linear. De maneira progressiva, a história é

construída através de marchas e contramarchas, marcada por diversas vezes de retrocessos e

estagnações, constituindo a descrição acima de um brevíssimo resumo no sentido de chegar ao

Estado todo o poder/função de dirimir conflitos e pacificar a sociedade. Com o fortalecimento

agora do Poder Público e o objetivo de ser alcançado o bem-comum, passa o Estado a

preocupar-se com entraves que começaram a surgir, dificuldades tais que passam a

proporcionar a deficiência do ente estatal na sua função jurisdicional (CINTRA;

DINAMARCO; GRINOVER, 2014).

Surge então a crise estrutural. Era a estrutura em si que se apresentava falha, o acesso ao

Judiciário e, consequentemente, à justiça não estava muitas vezes ao alcance da população em

geral. O processo, instrumento pelo qual funciona a jurisdição, passou a ser extremamente

formal, com duração excessiva e com um custo relativamente alto para a sociedade. Surgem

então as formas alternativas de pacificação dos conflitos, tais como a criação dos Juizados

Especiais, o incentivo à conciliação, as Câmaras de Arbitragem, também as de mediação.

Estrutura que, infelizmente, ainda continua deficiente para atender de forma adequada a

população brasileira.

Frise-se, todavia, que igualmente preocupante é a crise operacional:

Uma crise operacional pode ser assustadora por um lado, mas profundamente

alentadora por outro. O não-funcionamento de um poder ou serviço sempre

prejudica alguns e beneficia outros. A eficácia, às vezes, é sinônimo de

prejuízo e a competência pode levantar problemas anteriormente

insuspeitados. Assim a incompetência, a lentidão, o atraso conceitual podem

se constituir em úteis instrumentos de exercício de poder, de manutenção de

interesses e de manutenção de um entendimento discutível da norma posta.

(AGUIAR, 1994, p. 20)

Na Constituição Federal de 1988, o legislador passou a determinar em seu artigo 133: “O

advogado é indispensável à administração da justiça, sendo inviolável por seus atos e

manifestações no exercício da profissão, nos limites da lei.” (BRASIL, 1988) Passa a

determinar a presença do advogado quando da propositura das ações em defesa dos cidadãos, a

fim de permitir a todos o acesso à justiça, em busca de solução aos conflitos gerados pelas

insatisfações individuais.

Nos anos 90 várias reflexões e debates foram realizados, muitos pelo Conselho Federal da

Ordem dos Advogados do Brasil, que promoveu inclusive a publicação de um livro no qual, a

35

partir de uma base de dados formulada por um diálogo promovido com professores das mais

diversas áreas do ensino jurídico, elaborou um diagnóstico da situação dos cursos de Direito no

país. O livro “OAB Ensino Jurídico: diagnóstico, perspectivas e propostas”, publicado em 1992,

delineou uma visão da crise no mundo jurídico, que surgia como consequência de falhas

encontradas na graduação (NEVES, 2005).

A crise na advocacia brasileira é algo presente já há vários anos, lacunas encontradas na

formação destes profissionais, que vão desde características humanistas até mesmo ao domínio

das habilidades técnicas. Ditames éticos voltados a esses profissionais são atualmente

conceituados e descritos no Código de Ética da Advocacia, constituído pelo Conselho Federal

da Ordem dos Advogados do Brasil, a partir das atribuições que lhe foram conferidas pela Lei

8906/94.

Tais regras, todavia, não são suficientes para garantir uma atuação correta, pautada em aspectos

de honestidade, lealdade, honra e decoro. A classe de advocacia incialmente foi vista na

sociedade como uma categoria de profissionais inatingíveis pelas camadas mais pobres, apenas

tinham acesso à defesa de interesses com a representação por advogados particulares, aqueles

que detinham o poder econômico.

Os mais necessitados da interferência jurídica em seu favor, acabavam sendo prejudicados, sem

um profissional do direito à sua disposição. “Ter um advogado” sempre foi algo caro, de custo

elevado. Assim, a justiça não era para os pobres, nem os pobres eram para os advogados. Tal

profissional era formado por pessoas que faziam parte da elite, e eram formados para a elite

brasileira. Foi assim na época do Império, situação que se perpetuou na época dos grandes

engenhos, da burguesia e reflete-se na sociedade atual.

Já antes da atual Constituição Democrática, o legislador se preocupou com o acesso à justiça

de toda a sociedade e, em 1950, publicou a Lei 1060, que concede assistência judiciária aos

necessitados:

Art. 2º. Gozarão dos benefícios desta Lei os nacionais ou estrangeiros

residentes no país, que necessitarem recorrer à Justiça penal, civil, militar ou

do trabalho.

Parágrafo único. - Considera-se necessitado, para os fins legais, todo aquele

cuja situação econômica não lhe permita pagar as custas do processo e os

honorários de advogado, sem prejuízo do sustento próprio ou da família

(BRASIL, 1950).

36

O problema é que as defensorias públicas passaram a funcionar de forma muito precária e a

assistência judiciária gratuita direcionada à população menos privilegiada economicamente

ainda não é suficiente para garantir à parte um profissional de advocacia. Esse pode ser

pontuado como um dos aspectos da crise de advocacia, diretamente ligado à estrutura judiciária

(AGUIAR, 1994).

Outro ponto que deve ser tratado e que repercute na dinâmica interna dos advogados é o

domínio técnico dos operadores jurídicos. A ausência de tal habilidade pode repercutir em uma

grande crise operacional, causando repercussão social e preocupação quanto ao andamento

regular dos processos que compõem o Judiciário.

Segundo Roberto A. R. de Aguiar (1994), o que muitas vezes constata-se é que alguns

profissionais ligados a grandes empresas, pessoas jurídicas, ou com clientes, pessoas físicas,

que detêm uma situação econômica privilegiada, apresentam um maior domínio técnico e têm

mais facilidade de acesso ao conhecimento e às fontes de consulta. Enquanto que aqueles que

se encontram ligados às organizações populares não possuem essa mesma facilidade de acesso

ao conhecimento.

Infelizmente isso acaba ocasionando um efeito cruel, aqueles que detêm o poder têm seus

interesses sempre bem defendidos e os dominados sofrem com a falta de domínio técnico de

seus constituídos. Resultando assim na radicalização de dominação e no aumento da

desigualdade de classes, desacreditando-se o Direito como instrumento eficaz na busca de

decisões justas e pacificação social.

Ainda, segundo esse autor, nos cursos jurídicos os operadores do Direito, destacam-se por

estarem voltados à reprodução de normas, seguir o que determinam as leis, pouca importância

tem o aspecto empírico, o fato ocorrido e o sujeito envolvido são identificados pelo texto

escrito, há uma pequena valoração ao conjunto de experiências vividas. No ensino jurídico,

normalmente, é a leitura da lei, jurisprudência ou doutrina, suficientes para a análise dos casos

concretos (AGUIAR, 1994).

Muitas vezes, esse posicionamento quanto ao empírico é frequente entre discente e também ao

corpo docente, o que acaba retirando do profissional jurídico a possibilidade que teria se

buscasse a concepção de justiça pautada no rigoroso estudo dos dados. Ter estudantes como

simples reprodutores de normas, sem conseguir conectar à realidade social, torna a própria

37

atuação destes em mercado falha, impossibilitando-os ao domínio técnico jurídico dos

elementos que compõem o fato real, sendo ineficientes desde a construção das peças

processuais até na atuação da defesa de seus clientes em juízo.

E o que fazer para trazer essa realidade aos estudantes, à sala de aula, aos cursos de graduação?

Possibilitar ao estudante o aprendizado que torne possível conectar a teoria exposta e

transmitida em sala de aula à prática forense, ao dia a dia do advogado, eliminar o abismo

existente na dicotomia teoria x prática, tem sido o desafio de muitos professores e operadores

do ensino jurídico.

2.3 Competências no Ensino Jurídico

A sociedade está em constante evolução e apresenta um mercado de trabalho cada vez mais

exigente, necessitando de profissionais detentores de habilidades e competências diferenciadas,

que os tornem eficientes nos desempenhos de suas atividades. Ao desenvolvimento desse tipo

de profissional, imprescindível uma aprendizagem moderna, eficaz, que proporcione ao aluno

a construção de saberes diversos.

O perfil desejado para os formandos em Direito, agora, funda-se em uma graduação que os

torne capazes de análise e articulação dos conceitos e argumentos, interpretando e valorizando

os fenômenos jurídico-sociais, com uma postura reflexiva e crítica, proporcionando-lhe o

trabalho em equipe. Segundo Neisser Freitas,

[...] a educação deve ser trabalhada na expressão de formar cidadãos críticos

e conscientes que, em decorrência desta percepção, possam em uma primeira

etapa se pensarem enquanto seres de cultura e agentes transformadores

buscando assim mudarem-se a si próprios e, em seguida, influenciarem as

pessoas e o meio em que vivem (FREITAS, 2000, p. 2).

Traçar ao profissional de Direito um contorno voltado à uma estrutura interdisciplinar, já que o

estudo dos dispositivos legais não pode ser de forma isolada, trazendo relação com todo o

contexto social, que ultrapassam as barreiras do Direito em si, não podendo ser desprezado o

conjunto coordenado, é uma preocupação do Ministério da Educação. Passando assim a delinear

em suas portarias e resoluções, como objetivo dos cursos de Direito, a formação do aluno

pautado em competências (PAIVA; LAGE; SANTOS; SILVA, 2009).

Mas o que seriam competências? Segundo Gimeno Sacristán:

38

Há uma grande tradição de planejamentos, práticas e realização de

experiências educacionais que utiliza o conceito de competência para

denominar os objetivos dos programas educacionais, entender e desenvolver

o currículo, dirigir o ensino, organizar a aprendizagem das atividades dos

alunos e enfocar a avaliação dos mesmos (SACRISTÁN, 2011, p. 13).

O tema tem chamado atenção, entrando para a pauta de debates acadêmicos e empresariais,

sendo associado a diferentes instâncias de compreensão, seja no nível de pessoas, como

competências do próprio indivíduo, das organizações e dos países, no que diz respeito à

formação de competências nos sistemas educacionais.

De acordo com o professor Vasco Moretto: competência é um conjunto de habilidades

harmonicamente desenvolvidas e que caracterizam, por exemplo, uma função/profissão

específica: ser arquiteto, médico ou professor de química. As habilidades devem ser

desenvolvidas na busca das competências. (MORETTO, 2008)

Segundo Maria Tereza Leme Fleury e Afonso Fleury, o conceito de competência poderia ser:

Competência é uma palavra do senso comum, utilizada para designar uma

pessoa qualificada para realizar alguma coisa. O seu oposto, ou o seu

antônimo, não implica apenas a negação desta capacidade, mas guarda um

sentimento pejorativo, depreciativo. Chega mesmo a sinalizar que a pessoa se

encontra ou se encontrará brevemente marginalizada dos circuitos de trabalho

e de reconhecimento social (FLEURY; FLEURY, 2001, p. 2).

Os debates iniciais sobre competência surgiram na década de 70, do século XX, nos Estados

Unidos, sob a perspectiva da construção de um conceito que a diferenciava de aptidões,

habilidades e conhecimentos. Foi ela pensada como um agrupamento de capacidades humanas

direcionados ao desempenho de determinadas atividades, justificando-se tal desempenho em

atitudes pautadas na inteligência e na personalidade daquela pessoa. A maioria dos estudos

americanos não tomava por base o indivíduo, mas o alinhamento das competências no

desempenho das atividades estabelecidas pelos cargos, funções ou ocupações existentes nas

organizações de um modo geral (FLEURY; FLEURY, 2001).

Igualmente na França, no mesmo período, surgiram discussões a respeito da qualificação e da

constituição de uma formação profissional adequada, iniciando-se assim os debates sobre

competência. Era premente verificar a existência de insatisfação com o desempenho no

mercado de trabalho, tendo por foco principal as atividades ligadas às indústrias, por isso

buscavam os franceses alinhar o ensino com as necessidades existentes nas empresas

(FLEURY; FLEURY, 2001).

39

Desta forma, direcionando o ensino, aumentava-se a capacitação dos funcionários e suas

chances de concorrência no mercado de trabalho da época. O objetivo principal era identificar

o eixo entre competências e saberes. A construção do conceito de competência na França dos

anos 90, do século XX, ia além do simples significado de qualificação. Tinha por foco três

mutações essenciais apresentadas no mercado de trabalho da época: os incidentes, tudo que

ocorria de maneira imprevista, não programada, os quais muitas vezes ultrapassavam a

capacidade de resolução dos operadores; a comunicação, que era feita entre os sujeitos e seus

companheiros e o serviço, a capacidade de atendimento adequado ao cliente externo ou interno

da organização.

No Brasil, o conceito é construído a partir de discussões acadêmicas pautadas na literatura

internacional. A competência do ser não é considerada um estado, não seria um conhecimento

específico, mas um construto que é formado por três eixos, a pessoa em si, a sua formação

educacional e a sua experiência profissional.

Competência propriamente dita pode ser considerada como um agrupamento de aprendizagens

sociais e comunicações nutridas pelo indivíduo. O ser passa a desenvolver um agir responsável,

sabendo mobilizar, integrar e transferir conhecimentos em determinado contexto profissional.

Essencial para a construção desse agir é trazer a comunicação na rede de conhecimento, não se

identificando conceitos isolados. É o saber agir, com a mobilização de recursos e a integração

de saberes múltiplos e complexos, com uma visão estratégica (FLEURY; FLEURY, 2001). Tais

saberes podem ser descritos no quadro a seguir:

Quadro 2 – Competências e Significados

COMPETÊNCIA SIGNIFICADOS

Saber agir Saber o que faz e por quê.

Saber julgar, escolher, decidir.

Saber mobilizar Saber mobilizar recursos de pessoas, financeiros, materiais, criando sinergia

entre eles.

Saber comunicar

Compreender, processar, transmitir informações e conhecimentos,

assegurando o entendimento da mensagem pelos outros.

Saber aprender

Trabalhar o conhecimento e a experiência.

Rever modelos mentais.

Saber desenvolver-se e propiciar o desenvolvimento dos outros.

Saber comprometer-

se Saber engajar-se e comprometer-se com os objetivos da organização.

Saber assumir

responsabilidades

Ser responsável, assumindo os riscos e as consequências de suas ações, e

ser, por isso, reconhecido.

Ter visão estratégica Conhecer e entender o negócio da organização, seu ambiente, identificando

oportunidades e alternativas.

Fonte: PAIVA; LAGE; SANTOS E SILVA, 2011.

40

O desenvolvimento dos saberes acima descritos, tornou-se importante à formação do bom

profissional. Tais saberes interessam ao mercado de trabalho e devem ser devidamente

construídos no período de aprendizagem daquele ofício. O levantamento destes influencia

inclusive nos planejamentos estratégicos.

O construto competência, quando direcionado a planejamentos, apresenta alguns traços

definidores. Inicialmente é direcionado àqueles que não aceitam as aprendizagens acadêmicas

tradicionais que não tenham por objetivo agregar capacitação ao sujeito, sendo apenas

memorizadas e avaliadas, perdendo-se na memória. Um segundo ponto é o foco em uma

aprendizagem mais precisa, que tende a ser útil, representada normalmente pelas experiências

de formação profissional, sendo o domínio de habilidades, capacidades e competências,

primordial no sentido de formação. Finalmente, outro aspecto relevante para este tipo de ensino

por competências é a apresentação de planejamentos cuja funcionalidade é a meta

(SACRISTÁN, 2011).

É trazer o conhecimento ao mundo real, à sociedade de fato, em toda a sua dinâmica,

direcionando essas habilidades, tornando-as funcionais. De nada adianta a antiga e tradicional

prática de aprendizagem, se não é possível ao aluno conjugar o dito saber teórico às atividades

práticas que devem estar presentes no cotidiano do mercado de trabalho.

2.3.1 Ensino superior em Direito x competências traçadas pelo MEC

Após a publicação da Resolução n. 3/72 do Conselho Federal de Educação, a qualidade do

ensino jurídico continuou sendo motivo de debates nacionais, prosseguindo com a criação da

Portaria n. 15, de 29 de janeiro de 1993, que criou a Comissão de Especialistas de Ensino de

Direito da Secretaria de Ensino Superior do Ministério da Educação e do Desporto. O principal

objetivo dessa portaria era o acompanhamento detalhado do ensino superior, promovendo um

processo constante de avaliação e melhorias à qualidade deste. (NEVES, 2005)

Os componentes da citada comissão, proporcionaram seminários que tinham por objetivo trazer

o debate e a busca de soluções para a elevação da qualidade do ensino jurídico, envolvendo

órgãos como a Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura - UNESCO

e a Ordem dos Advogados do Brasil - OAB. Com a realização de vários seminários, encontros

e debates, a comissão resolveu estabelecer parâmetros para a elevação da qualidade de ensino,

propondo, finalmente, a alteração nos currículos dos cursos jurídicos.

41

A resposta à dita proposta veio com a publicação da Portaria n. 1.886, de 30 de dezembro de

1994, revogando a Resolução n. 03/72, do Conselho Federal de Educação. Várias mudanças

aconteceram, um grande avanço na reforma curricular, o que não significava uma efetiva

melhoria, pois novos caminhos haviam sido traçados, todavia não havia garantia que seriam

trilhados.

Uma das mudanças mais significativas foi o estágio de prática jurídica passar a fazer parte do

currículo obrigatório dos cursos de Direito. A atividade prática em um estágio supervisionado

passava a ser essencial para a obtenção do grau de bacharel em Direito. As atividades práticas

que, em muitas faculdades, eram realizadas através de simulações do cotidiano das secretarias

dos fóruns, em salas de aulas, agora seriam realizadas de forma simulada ou real, com

supervisão e orientação dos professores nos Núcleo de Prática Jurídica de cada faculdade

(BRASIL, 1994).

Aos cursos de Direito também passou a ser obrigatória e não facultativa, ministrar aulas sobre

as disciplinas de Filosofia Geral e Jurídica, Ética Geral e Profissional, Sociologia Geral e

Jurídica, Economia e Ciência Política. E finalmente o trabalho de conclusão de curso, a

monografia final, que passou a ser obrigatória a sua produção e defesa perante uma banca

examinadora (BRASIL, 1994).

A Portaria n. 1.886/94 anunciava um novo perfil ao bacharel em Direito. O que era desejado

passava a ser um profissional pautado numa formação geral e humanística, com capacidade de

análise e articulação de conceitos e argumentos, capaz de interpretar e valorar fenômenos

jurídicos-sociais, trazendo ainda uma postura reflexiva e com uma visão crítica que

proporcionasse a colaboração para que fluísse o trabalho em grupo (Ministério da Educação,

1995).

O bacharel em Direito era uma peça do quebra-cabeça, um componente de um grande grupo

que deveria estar voltado para a busca de soluções aos conflitos surgidos em sociedade, a fim

de alcançar o topo da pirâmide, que era a pacificação social na realização de justiça. A Comissão

de Especialistas de Ensino de Direito, criada em 1993, como acima descrito, foi mais além:

traçou ao aluno de Direito objetivos que deveriam ser alcançados através de um curso de Direito

novo, reformulado, repensado, proporcionando ao bacharel a aptidão de uma aprendizagem

autônoma e dinâmica, qualificando-o para a vida, o mercado de trabalho e o desenvolvimento

da cidadania (NEVES, 2005).

42

Foi descrito, pela primeira vez, um ensaio para a construção de um esboço de competências que

deveriam ser alcançados pelo graduando, com a reunião das seguintes características:

(i) permanente formação humanística, técnico-jurídica e prática, indispensável

à adequada compreensão interdisciplinar do fenômeno jurídico e das

transformações sociais; (ii) conduta ética associada à responsabilidade social

e profissional; (iii) capacidade de apreensão, transmissão crítica e produção

criativa do direito a partir da constante pesquisa e investigação; (iv)

capacidade para equacionar problemas e buscar soluções harmônicas com as

demandas individuais e sociais; (v) capacidade de desenvolver formas

judiciais e extrajudiciais de prevenção e solução de conflitos individuais e

coletivos; (vi) capacidade de atuação individual, associada e coletiva no

processo comunicativo próprio ao seu exercício profissional; (vii) domínio na

gênese, dos fundamentos, da evolução e do conteúdo do ordenamento jurídico

vigente; e (viii) consciência dos problemas de seu tempo e de seu espaço

(OLIVEIRA, 2004, p. 51).

As diretrizes traçadas pelo Ministério da Educação tentaram combater os problemas apontados

na crise do ensino jurídico: o tipo de aula, a visão positivista, a análise da norma sem qualquer

desenvolvimento de um senso crítico, a ausência de conjugação da teoria com a prática, a falta

de contato com a realidade social, tentou-se um resgate da autonomia do estudante. A

preparação do bacharel, agora, tinha uma nova roupagem, proporcionando ao aluno uma

capacidade de reflexão crítica numa formação humanística.

O esboço de competências acima descrito deveria ser alcançado pelo desenvolvimento de um

conjunto de habilidades, que seriam:

(i) leitura, compreensão e elaboração de textos e documentos; (ii)

interpretação e aplicação do Direito; (iii) pesquisa e utilização da legislação,

da jurisprudência, da doutrina e de outras fontes do Direito; (iv) correta

utilização da linguagem – com clareza, precisão e propriedade - , fluência

verbal e escrita, com riqueza de vocabulário; (v) utilização de raciocínio

jurídico, de argumentação, de persuasão e de reflexão crítica; (vi) julgamento

e tomada de decisões; e (vii) domínio de tecnologias e métodos para

permanente compreensão e aplicação do Direito. (OLIVEIRA, 2004, p. 52)

Inicialmente, os traços definidos para o perfil do profissional do Direito pela comissão tinham

por principal objetivo definir os objetivos necessários a serem abordados na prova a ser aplicada

no Exame Nacional de Cursos, atualmente Exame Nacional de Desempenho dos Estudantes -

ENADE. No que se refere às habilidades, a comissão dividiu estas em competências e

habilidades gerais e habilidades específicas. (ALMEIDA, SOUZA e CAMARGO, citados em

GHIRARDI e FEFERBAUM, 2013).

43

Atualmente, encontra-se em vigor a Resolução CNE/CES n. 9, de 29 de setembro de 2004, do

Conselho Nacional de Educação da Câmara de Educação Superior, que institui as Diretrizes

Curriculares Nacionais do Curso de Graduação em Direito e dá outras providências. O artigo

4º., de tal Resolução preceitua que:

Art. 4º. O curso de graduação em Direito deverá possibilitar a formação

profissional que revele, pelo menos, as seguintes habilidades e competências:

I - leitura, compreensão e elaboração de textos, atos e documentos jurídicos

ou normativos, com a devida utilização das normas técnico-jurídicas;

II - interpretação e aplicação do Direito;

III – pesquisa e utilização da legislação, da jurisprudência, da doutrina e de

outras fontes do Direito;

IV – adequada atuação técnico-jurídica, em diferentes instâncias,

administrativas ou judiciais, com a devida utilização de processos, atos e

procedimentos;

V - correta utilização da terminologia jurídica ou da Ciência do Direito;

VI - utilização de raciocínio jurídico, de argumentação, de persuasão e de

reflexão crítica;

VII - julgamento e tomada de decisões; e,

VIII - domínio de tecnologias e métodos para permanente compreensão e

aplicação do Direito.

O perfil do profissional jurídico mudou: não devem mais ser ministradas nas Faculdades aulas

magistrais ou estilo coimbrã, a visão positivista dos fenômenos jurídicos não tem mais sentido.

Um estudante crítico, humanista e com o domínio das competências acima descritas é o que se

espera dos bacharéis em Direito e, para tanto o Ministério da Educação traça competências, a

serem alcançadas a partir de mudanças que já vêm sendo implantadas nas Faculdades de

Direito.

O presente trabalho tem como objetivo analisar de que forma o estágio supervisionado

influenciaria na construção de tais competências, possibilitando ao aluno encaixar-se nesse

novo perfil de profissional do Direito, capaz de dominar determinadas habilidades que possam

garantir-lhe a atuação adequada no exercício de sua profissão.

2.3.2 A influência da OAB na formação dos profissionais de advocacia

A Ordem dos Advogados do Brasil tem seu início entrelaçado ao movimento da Independência

do Brasil. Em seguida a tal fato histórico, vários debates na Assembléia Constituinte foram

realizados, que tinham como objetivo a fundação dos cursos jurídicos. Em 1827, foram

instaurados no Brasil os primeiros cursos jurídicos.

44

No mesmo período, nascia a ideia de criação de uma entidade que reunisse a classe da

advocacia. Surgia então o Aviso de 7 de agosto de 1843, do Governo Imperial, que aprovou os

estatutos elaborados por uma comissão de advogados, nos seguintes termos:

Sua Majestade o Imperador, deferindo benignamente o que lhe foi apresentado

por diversos advogados desta Corte, manda pela Secretaria do Estado dos

Negócios da Justiça aprovar os Estatutos do Instituto dos Advogados

Brasileiros, que os Suplicantes fizeram subir à sua Augusta presença, e que

com estes baixam, assinado pelo Conselho Oficial Maior da mesma Secretaria

de Estado; com a cláusula, porém, de que será também submetida à Imperial

Aprovação o regulamento interno de que tratam os referidos estatutos. Palácio

do Rio de Janeiro, em 7 de agosto de 1843.

Honório Hermeto Carneiro Leão (história da OAB).

Era criado um órgão de classe aos bacharéis em Direito do país. Isso significava um avanço

enorme e uma distinção. Os primeiros passos para a criação da Ordem, já que inicialmente a

previsão dos estatutos era a criação apenas de um Instituto dos Advogados Brasileiros. O

Estatuto possuía em seus primeiros artigos a determinação de criação do referido instituto,

passando a fazer parte deste, todos os bacharéis de direito, que deveriam se inscrever dentro de

um determinado prazo, sendo-lhes atribuído um número específico.

A finalidade primordial do instituto era organizar a Ordem dos Advogados do Brasil, o que não

era uma atribuição simples. No ano de 1848, foi encaminhado à Câmara dos Deputados a

deliberação do intuito estatutário. Finalmente, em 1851, o projeto foi aprovado pelo Senado,

mas detido na Câmara. Após, várias reuniões, defesas e tentativas de criação da Ordem dos

Advogados do Império foram feitas, todavia infrutíferas. Já na proposta dizia-se que a

advocacia constituía múnus, encargo, dever, público, devendo ser exercida por cidadãos

brasileiros. Entretanto, apesar de todo o esforço, o império se extinguiu sem a criação da Ordem.

Houve então a proclamação da República, e novas tentativas ocorreram. Em 1915, era latente

nos discursos oficiais a decepção dos membros do Instituto, que já há mais de setenta anos

tentava cumprir o objetivo para o qual foi criado, que era constituir a Ordem dos Advogados

do Brasil, sem qualquer êxito até então. Somente em 18 de novembro de 1930, com a Revolução

ocorrida nesse mesmo ano, e a instalação do Governo Provisório, foi criada a Ordem dos

Advogados do Brasil pelo artigo 17 do Decreto 19.408. E na data de 14 de dezembro de 1931,

através do Decreto 20.784, o Governo Provisório aprovou o seu primeiro Regulamento.

A Ordem dos Advogados era um órgão de seleção e disciplina, voltado para o aperfeiçoamento

moral, não proporcionando benefícios aos seus integrantes, mas um regime de árduas

45

obrigações. Deveria ser constituída por advogados, que a ilustrassem no mundo social, por isso

não era uma corporação fechada, pois recebia e também excluía aqueles que não apresentassem

uma conduta ilibada que trouxesse prestígio à categoria. Lutavam pela realização de uma

Democracia Liberal e vínculos morais. (história da OAB)

No ano de 1934, foi criado o primeiro Código de Ética da Ordem. Desde então, dito órgão tem

desempenhado sua função de vigília em favor da classe e da sociedade brasileira, em questões

voltadas ao âmbito político e também no âmbito social. No ano de 1958, a Ordem dos

Advogados realizou sua primeira conferência nacional, e apresentou a seguinte temática em

discussão: “A advocacia e o ensino jurídico: problema da multiplicação das Faculdades de

Direito”. Já nesse período, o órgão de classe preocupa-se com o tipo de profissional que seria

formado nas instituições de ensino até então existentes.

Mas sua participação efetivamente no ensino jurídico tornou-se concreta apenas a partir de

1994, com a publicação da Lei 8.906, que continua em vigor nos dias atuais, traduzindo-se no

então conhecido Estatuto de Advocacia da Ordem dos Advogados do Brasil que, no inciso XV,

do artigo 54, determina:

Art. 54. Compete ao Conselho Federal:

[...]

XV - colaborar com o aperfeiçoamento dos cursos jurídicos, e opinar,

previamente, nos pedidos apresentados aos órgãos competentes para criação,

reconhecimento ou credenciamento desses cursos;

A Ordem preocupa-se com a qualidade do ensino jurídico, o período de formação inicial do

futuro bacharel é considerado essencial para o direcionamento dele na sua vida forense. Dito

órgão promoveu, ao longo dos anos, debates, discussões, seminários e até mesmo a publicação

de livros que trazem como tema central o interesse na elevação da qualidade de ensino, tentando

identificar as principais falhas e trazendo esboços de possíveis soluções para referida situação.

Além da sua atuação na implantação dos cursos jurídicos, opinando, discutindo, traçando

diretrizes, a Ordem dos Advogados vai mais além, com a publicação do atual Estatuto de

Advocacia, a Lei 8906/94, somente podem compor tal órgão os advogados devidamente

inscritos. E como dito em ponto anterior, o advogado, conforme preceitua a Constituição

Federal de 1988, é figura indispensável à administração da justiça, trazendo ao advogado a

capacidade postulatória, ou seja, o poder de representação das partes perante o judiciário

brasileiro (CINTRA; DINAMARCO; GRINOVER, 2014).

46

Significa dizer que a propositura das ações em juízo só poderá ocorrer mediante a outorga de

poderes que é feita ao advogado através do instrumento de mandato, denominado de

procuração. Salvo raríssimas exceções, na qual a parte pode ingressar sozinha com as ações

perante o judiciário brasileiro, quais sejam, na Justiça do Trabalho, em primeiro grau, nos

Juizados Especiais, nas causas até vinte salários mínimos, as ações de alimentos e a impetração

de habeas corpus; todas as outras ações deverão as partes serem representadas por advogados.

(ARAÚJO JÚNIOR, 2012)

Desta forma, ao terminar o curso, o bacharel em Direito não pode exercer as atividades de

advocacia, somente após a sua devida inscrição na Ordem. Antes de 1994, a inscrição era feita

através da análise de requisitos que eram especificados de forma autônoma pelos Conselhos

Seccionais, unidades da Ordem dos Advogados do Brasil, localizadas nos estados brasileiros.

Infelizmente, o país encontrava-se em um período de crise no ensino jurídico, como descrito

nos tópicos anteriores, e profissionais despreparados eram colocados no mercado de trabalho.

Os Conselhos Seccionais, para existir, precisam da presença dos advogados. Então, o que

muitas vezes acontecia era que em alguns lugares nos quais os conselhos necessitavam de

inscrições, os critérios para o ingresso na Ordem eram muito simples e acabavam recebendo

em seus quadros profissionais que não possuíam capacidade para o exercício adequado da

advocacia. Tal situação passou a trazer reflexos na atuação de ditos profissionais e a crise

operacional, demonstrada em tópico anterior, tornou-se algo preocupante.

Os erros grosseiros passaram a ser frequentes, falhas reiteradas que muitas vezes passaram a

comprometer a pretensão de direito da parte. Peças processuais redigidas de forma inadequada,

absurdos jurídicos, ausência de conhecimento, um abismo entre teoria e prática era apresentado.

Frases do tipo: “na prática a teoria é outra”, piadas com as petições, tornaram-se cotidianas.

Situação preocupante, crise no ensino, crise na advocacia, a pergunta pairava, se tais bacharéis

estiveram em sala de aula e não conseguem colocar em prática aquilo que supostamente havia

sido transmitido na forma teórica, por que a prática não correspondia à teoria? A resposta estava

no fato de não ser a teoria boa, ou seja, não correspondia ao fenômeno? Como mensurar o

ensino reproduzido nas graduações? (AGUIAR, 1994)

47

Vislumbrando o referido contexto social é que o legislador determina no artigo 8º. da Lei

8906/94, que a partir de então, para a inscrição como advogado é necessário que se obedeça aos

seguintes requisitos:

Da Inscrição

Art. 8º Para inscrição como advogado é necessário:

[...]

IV - aprovação em Exame de Ordem;

Com a publicação da lei, torna-se necessária agora para a inscrição na Ordem, a aprovação em

Exame de Ordem. O próprio estatuto determina a publicação de provimentos que determinarão

as coordenadas e os requisitos para a realização de tal exame. Publica-se então o Provimento

81/1996, que traçava as diretrizes do Exame de Ordem, determinado que este ocorreria em duas

fases, sendo a primeira composta de questões objetivas elaboradas a partir das disciplinas

obrigatórias da grade curricular do curso; e uma segunda fase que tinha caráter prático-

profissional na qual o aluno seria submetido a questões abertas, e à produção de uma peça

processual que fizesse parte da vida forense do advogado (Ordem dos Advogados do Brasil,

1996).

Vários outros provimentos foram publicados, revogando os anteriores, omissões foram

encontradas, fraudes foram realizadas, como o exame não era unificado alguns candidatos

faziam-no em estados que tinham um menor número de inscritos que nesses Conselhos as

provas de ingresso eram mais simples, na tentativa de atrair bacharéis, proporcionando assim

sua própria manutenção. Todavia, após a aprovação, é permitido ao candidato promover a sua

inscrição em qualquer Conselho Seccional do país, desde que ali seja estabelecido o domicílio

profissional do graduando.

Na tentativa de combater ditas fraudes, o Exame de Ordem atualmente é unificado, primeiro

foram unificadas as datas de aplicação das provas, a partir de 2009 também foi unificado o

conteúdo da prova. Inicialmente alguns estados não aderiram à unificação, todavia logo em

seguida anuíram à unificação, hoje as questões são iguais em qualquer lugar do país (Ordem

dos Advogados do Brasil, 2014).

Uma “peneira” foi feita. Muitos terminam a graduação e fazem a inscrição em tal exame, mas

apenas um pequeno número é aprovado. Uma seleção onde não existem concorrentes, o

bacharel não está concorrendo com ninguém, apenas consigo mesmo, basta que alcance a nota

48

mínima 5 (cinco), na primeira fase e 6 (seis) na segunda, e ingressa no quadro da advocacia.

Uma questão, entretanto, preocupante, é o altíssimo índice de reprovação dos candidatos.

Essas e outras questões têm sido tema de discussão, debates e seminários, e nos esboços de

diagnósticos apresentados, com a publicação das portarias e resoluções do Ministério da

Educação. Uma especial atenção tem sido direcionada às atividades práticas, inclusive definidas

como obrigatórias no curso de Direito, através do estágio supervisionado.

2.4 Estágio supervisionado: aspectos históricos e a implantação nos cursos de Direito

A prática jurídica sempre foi incentivada no Brasil, desde a implantação dos cursos jurídicos,

conforme especificado no artigo 1º., da Carta de Lei que criou os cursos jurídicos e traçou as

diretrizes a serem obedecidas por estes:

Dom Pedro Primeiro, por Graça de Deus e unânime aclamação dos povos,

Imperador Constitucional e Defensor Perpétuo do Brasil: Fazemos saber a

todos os nossos súditos que a Assembleia Geral decretou e Nós queremos a

lei seguinte:

Art. 1.º - Criar-se-ão dois Cursos de Ciências Jurídicas e Sociais, um na

Cidade de S. Paulo, e outro na de Olinda, e neles no espaço de cinco anos, e

em nove cadeiras, se ensinarão as matérias seguintes:

1.º ANO – 1ª cadeira – Direito Natural, Público, Análise da Constituição do

Império, Direito das Gentes, e Diplomacia.

2.º ANO – 1ª cadeira – Continuação das matérias do ano antecedente. 2ª

cadeira – Direito Público Eclesiástico.

3.º ANO – 1ª cadeira – Direito Pátrio Civil. 2ª cadeira – Direito Pátrio

Criminal com a Teoria do Processo Criminal.

4.º ANO – 1ª cadeira – Continuação do Direito Pátrio Civil. 2ª cadeira –

Direito Mercantil e Marítimo.

5.º ANO – 1ª cadeira – Economia Política. 2ª cadeira – Teoria e Prática do

Processo adotado pelas leis do Império. (VENÂNCIO FILHO, 2005, grifo

nosso)

Ao longo da história, vislumbra-se avanços e retrocessos quanto à construção do ensino prático

aos alunos de Direito, tanto pelas próprias características do curso em si, que muitas vezes

demonstrou sua aversão ao empírico, dificultando a conjugação da teoria com a realidade

prática social. Canotilho (2003), chega mesmo a especificar a existência de duas orientações

fundamentais, encontradas nos cursos jurídicos, uma seria a orientação profissional e a outra a

orientação acadêmica. Na orientação profissional o objetivo central seria fornecer um saber

direcionado ao serviço do jurista prático e das suas necessidades, enquanto que na segunda

49

orientação, a acadêmica, o objetivo é proporcionar um discurso no plano dos conceitos, da

construção, da argumentação.

Um grande marco no ensino jurídico encontrado nas Universidades brasileiras foi a criação da

Portaria 1886/94 pelo Ministério da Educação, que trouxe a obrigatoriedade das atividades

práticas a serem desenvolvidas pelos alunos de forma simulada ou real, com supervisão e

orientação do Núcleo de Prática Jurídica de cada faculdade. (AGUIAR, 1994).

O estágio supervisionado nos cursos jurídicos, assim como nos diversos tipos de graduação,

tem por objetivo principal, uma vez que é uma atividade teórico-prática, envolver a totalidade

de ações/disciplinas que compreendem o currículo do curso. Torna-se necessária a associação

entre o ensino e a realidade, constatada a partir de qualquer enfoque assumido, a fim de se

possibilitar a unidade da teoria e da prática.

Uma primeira reflexão que merece destaque quando se fala no corpo docente do estágio é a

preparação destes professores, nos mais diversos tipos de cursos de graduação. Não há

efetivamente nos cursos de Direito ou mesmo nos de pedagogia, este que tem a finalidade

específica de preparar o docente, uma preocupação no que tange à formação do professor a fim

de prepará-lo especificamente ao estágio supervisionado (PICONEZ, 2007).

Ainda a forma complementar que é conferida à prática acadêmica, também denominada estágio

supervisionado, colocando-se uma teoria no início dos cursos e a prática relativa a esta no final

do curso, constitui a maior evidência da dicotomia existente entre teoria e prática. As

orientações do estágio supervisionado muitas vezes são dirigidas na forma de atividades

simuladas, programadas e não daquelas que surgem a partir do cotidiano dos debates e dúvidas

surgidas entre professor e aluno, na sala de aula.

No ensino jurídico as atividades práticas passaram a ser desenvolvidas, a partir de 1994, nos

Núcleos de Práticas Jurídicas. Os estabelecimentos de ensino de todo o Brasil passaram por

reformas em sua estrutura física, agora não mais seria admissível o simples estudo em sala de

aula do cotidiano forense. Os alunos, devidamente supervisionados, seriam colocados à

disposição da comunidade para propositura de ações reais.

Atividades práticas que eram direcionadas não só à atividade de advocacia, devendo abranger

o cotidiano do magistrado e dos membros do Ministério Público. Atos que iam desde simples

50

orientações até à propositura e acompanhamento de casos reais. Conforme descrito na Portaria

1886/94:

Art. 10. O estágio de prática jurídica, supervisionado pela instituição de ensino

superior, será obrigatório e integrante do currículo pleno, em um total mínimo

de 300 horas de atividades práticas simuladas e reais desenvolvidas pelo aluno

sob controle e orientação do núcleo correspondente.

§ 1º o núcleo de prática jurídica, coordenado por professores do curso, disporá

de instalações adequadas para treinamento das atividades profissionais de

advocacia, magistratura, Ministério Público, demais profissões jurídicas e

para atendimento ao público.

§ 2º As atividades de prática jurídica poderão ser complementadas mediante

convênios com a Defensoria Pública e outras entidades públicas, judiciárias,

empresariais, comunitárias e sindicais que possibilitem a participação dos

alunos na prestação de serviços jurídicos e cai assistência jurídica, ou em

juizados especiais que venham a ser instalados cai dependência da própria

instituição de ensino superior.

Art. 11. As atividades do estágio supervisionado serão exclusivamente

práticas, incluindo redação de peças processuais e profissionais, rotinas

processuais, assistência e atuação em audiências e sessões, visitas a órgãos

judiciários, prestação de serviços jurídicos e técnicas de negociações

coletivas, arbitragens e conciliação, sob o controle, orientação e avaliação do

núcleo de prática jurídica.

Art. 12. O estágio profissional de advocacia, previsto na Lei 8.906, de

04/07/1994, de caráter extracurricular, inclusive para graduados, poderá ser

oferecido pela Instituição de Ensino Superior, em convênio com a OAB,

complementando-se a carga horária efetivamente cumprida no estágio

supervisionado, com atividades práticas típicas de advogado e de estudo do

Estatuto da Advocacia e da OAB e do Código de Ética e Disciplina.

Parágrafo único. A complementação da carga horária, no total estabelecido no

convênio, será efetivada mediante atividades no próprio núcleo de prática

jurídica, na Defensoria Pública, em escritórios de advocacia ou em setores

jurídicos, públicos ou privados, credenciados e acompanhados pelo núcleo e

pela OAB.

Art. 13. O tempo do estágio realizado em Defensoria Pública da União, do

Distrito Federal ou dos Estados, na forma do artigo 145, da Lei Complementar

nº 80, de 12 de janeiro de 1994, será considerado para fins de carga horária do

estágio curricular previsto no artigo 10 desta Portaria. (BRASIL, 1994)

O início de tais atividades, essencialmente quando direcionadas àquelas referentes aos atos de

advocacia, não foram, em um primeiro momento, bem vistas pelos membros da Ordem dos

Advogados do Brasil, que começou a questionar se os citados núcleos, que ofereciam ao público

em geral assistência advocatícia gratuita, não estaria na verdade tomando fatia de mercado.

Outra discussão é sobre as atividades de magistratura e promotoria desenvolvidas nos citados

núcleos. A maioria na verdade direcionava os alunos apenas ao atendimento à comunidade,

desenvolvendo exclusivamente atividades de advocacia, não possibilitando ao aluno vislumbrar

51

a execução de atos direcionados a outros ramos do Direito, que surgem nesse enorme leque de

oportunidades profissionais que possibilita o referido curso.

As Diretrizes Curriculares Nacionais, ditadas na Resolução nº 9, de 29 de setembro de 2004,

prevê soluções à implantação do estágio supervisionado de modo a tornar o aluno apto a

transformar o conhecimento teórico adquirido na universidade, em soluções para casos práticos

do cotidiano. A interdisciplinariedade dos assuntos, torna-se necessária à construção da

aprendizagem prática do graduando, todavia, o que parece é que os cursos de Direito fazem

menos do que poderiam e deveriam fazer. (ALMEIDA, SOUZA e CAMARGO, citados em

GHIRARDI e FEFERBAUM, 2013).

E mesmo sendo as ações desenvolvidas nos Núcleos de Práticas Jurídicas, muitas vezes

dirigidas exclusivamente à prática de advocacia, até onde essas atividades auxiliam,

diferenciam ou possibilitam a adequada atuação técnico-jurídica do aluno de Direito, em

diferentes instâncias, administrativas ou judiciais, com a devida utilização de processos, atos e

procedimentos?

52

3 METODOLOGIA

Serve o presente capítulo para apresentar a metodologia que foi utilizada no desenvolvimento

desse estudo em função do objetivo geral que é identificar com base na percepção dos alunos

matriculados na disciplina de estágio supervisionado, no Núcleo de Práticas Jurídicas de uma

Instituição de Ensino Superior do Agreste Pernambucano, de que maneira o atual modelo do

estágio prepara o aluno para o exercício da advocacia, no que diz respeito à adequada atuação

técnico-jurídica, conforme competências traçadas pelo Ministério da Educação.

Demonstram-se o delineamento da pesquisa, o conjunto das técnicas, abordagens e processos

que serão utilizados para investigar o problema levantado.

3.1 Delineamento da pesquisa

Este estudo é baseado no método estudo de caso e no que diz respeito aos seus objetivos é uma

pesquisa exploratória e descritiva.

O tema pesquisado tem uma abordagem qualitativa, já que segundo Gil (2010), é um estudo no

qual se tentou entender o fenômeno através de uma análise que toma por base a percepção do

sujeito. Tal método objetiva a construção de novos conceitos, esclarecimento de fatos, atitudes

e comportamento do ser humano.

No presente estudo, as perguntas respondidas na entrevista, foram designadas a extrair a

essência das experiências de alunos, a percepção destes, quando da realização do estágio

ofertado pela instituição de ensino. Desta forma, o estudo de caso mostra-se adequado para a

realização da pesquisa tendo em vista que contribui para a investigação empírica de um

fenômeno social, estudando-se o conjunto das variações produzidas de modo natural em um

determinado meio (YIN, 2014).

Tomando por base, Malheiros (2011), esta pesquisa é um estudo exploratório e, ao mesmo

tempo, descritivo. Diga-se exploratório porque tem a intenção de conhecer sobre um universo

pouco pesquisado: como o estágio supervisionado nos cursos de Direito, com pessoas que

tiveram (ou têm) experiências práticas com o problema pesquisado e análise de exemplos que

estimulem a compreensão.

53

É uma pesquisa descritiva, já que a intenção é descrever as características de um fenômeno.

Também por intencionar o aprofundamento de informações sobre os constructos e a relação

que eles mantêm (GIL, 2010).

Os sujeitos escolhidos no caso em questão foram os estudantes de Direito matriculados

exclusivamente no estágio supervisionado, no semestre 2014.2, oferecido pelo Núcleo de

Práticas Jurídicas, nas atividades direcionadas à advocacia cível.

A coleta de dados foi composta por: aplicação de questionário e após, entrevista por pauta e

análise do conteúdo. As entrevistas por pauta e a análise do conteúdo deram subsídios para uma

abordagem qualitativa do estudo e a aplicação de questionário individualizou o sujeito de

pesquisa (CAREGNATO e MUTTI, 2006).

A pesquisa foi apresentada de forma sequencial, com todas as etapas que demonstraram um

desenho metodológico que foi desenvolvido de forma a permitir a compreensão e melhor

conclusão do trabalho realizado.

A seção acima abordou um delineamento central da pesquisa, nas próximas seções serão

apresentados de forma específica o quadro metodológico desta.

3.1.1 Locus

Definido o tipo de pesquisa, necessário se fez especificar o local, o cenário em que esta ocorreu

(STEBAN, 2010). No presente estudo, o locus utilizado foi o núcleo de práticas jurídicas cíveis

que funciona em uma instituição de ensino superior do Agreste Pernambucano.

Tal núcleo foi instalado no ano de 2007, recebendo os alunos do curso de Direito ingressantes

no ano de 2004, ou seja, a primeira turma da instituição, locus do estudo, na época faculdade,

hoje Universidade.

Inicialmente as atividades desenvolvidas foram direcionadas ao atendimento da comunidade

carente, oferecendo aos usuários de forma gratuita atividades de advocacia, realizadas por

estagiários supervisionados por professores.

Ao longo dos anos outras atividades de estágio supervisionado foram instaladas na citada

instituição, tais como uma unidade estadual do PROCON, órgão de Proteção ao Consumidor,

uma Câmara de Mediação e Arbitragem, do Tribunal de Justiça de Pernambuco, além das

54

atividades do Escola Legal, de orientação e pacificação nas escolas da comunidade local e a

instalação de um Núcleo Penal. O estágio desenvolvido, nas mais diversas áreas, é todo baseado

em fatos reais.

Ao citado estudo interessaram apenas as atividades que se relacionaram à prática de advocacia.

Desde o atendimento ao cliente, com a produção de peças processuais adequadas até a

propositura e acompanhamento dos processos.

3.1.2 Sujeitos da pesquisa

Fizeram parte da pesquisa os alunos matriculados no estágio supervisionado na área cível,

especificamente o escritório modelo de advocacia, oferecido pela instituição, no segundo

semestre de 2014, ou seja, 2014.2.

Não interessaram ao estudo os alunos matriculados no estágio que ocorreu na Câmara de

Mediação e Conciliação, que funciona nas instalações da faculdade, porque este tem suas

atividades direcionadas à resolução dos conflitos pela mediação, que nem sempre precisa ser

direcionada por pessoas que praticam essencialmente atividades de advocacia. Igualmente não

fizeram parte desta pesquisa os alunos que realizaram estágio na unidade do PROCON, órgão

de proteção ao consumidor, do estado Pernambuco, instalada na instituição ora indicada, pois

em tal unidade os alunos têm a oportunidade de auxiliar o consumidor e tentar a resolução do

conflito através de procedimentos administrativos, não sendo ditas atividades especificamente

direcionadas à prática da advocacia forense.

O escritório modelo, que funciona na instituição pesquisada ofereceu os sujeitos da pesquisa,

já que neste ambiente se encontram os alunos que praticam atividades direcionadas

exclusivamente aos atos da profissão de advocacia.

Dados importantes foram coletados antes da seleção dos sujeitos. No que se refere ao número

de alunos ingressantes e concluintes do estágio supervisionado 2014.2, conforme dados

fornecidos pela secretaria da instituição de ensino pesquisada, encontramos os números que

seguem no quadro abaixo:

55

Quadro 3 – Alunos do estágio supervisionado 2014.2

AGOSTO

DE 2014 146 alunos matriculados no estágio supervisionado*

DEZEMBRO

DE 2014

112 alunos concluintes do estágio supervisionado*

34 alunos reprovados no estágio supervisionado*

Fonte: Elaboração própria

O gráfico abaixo demonstra o percentual de alunos reprovados na disciplina, que integra a grade

curricular da graduação, com a aplicação de avaliações periódicas.

Gráfico 1 – Percentual de alunos aprovados e reprovados no estágio supervisionado 2014.2.

Fonte: Elaboração própria.

*observação – os números se referem ao quantitativo total de alunos ingressantes e concluintes do

estágio supervisionado, em todas as áreas cíveis oferecidas pela instituição pesquisada.

Segundo dados coletados na secretaria da instituição pesquisada, em agosto de 2014, o número

de alunos matriculados na disciplina de estágio supervisionado, conforme gráfico acima, foi de

146, dos quais 31 direcionaram suas atividades à resolução dos problemas sociais através da

mediação, 23 alunos realizaram estágio na unidade do PROCON instalada na faculdade, 12

tiveram autorização para a realização do estágio externo e 80 fizeram seu estágio no escritório

modelo de práticas jurídicas.

O gráfico a seguir demonstra que a maior parte dos alunos foi direcionada ao estágio realizado

no escritório modelo de práticas jurídicas da faculdade:

Aprovados77%

Reprovados23%

Alunos Estágio 2014.2

56

Gráfico 2 – Estrutura do estágio supervisionado 2014.2

Fonte: Elaboração própria.

A seleção dos sujeitos ocorreu inicialmente pelas respostas dos questionários, que foram

aplicados aos 80 alunos matriculados no escritório modelo. O questionário foi composto por

perguntas direcionadas a características pessoais, que pudessem identificar idade, ano de

ingresso no curso de direito e atividades realizadas pelo aluno, tais como estágio diverso

daquele ofertado pela instituição.

Entre os 80 alunos que receberam o questionário, 53 foi o número de respondentes. Através da

coleta dos dados ali descritos foi possível identificar o perfil de tais sujeitos:

Gráfico 2 – Caracterização dos sujeitos da pesquisa.

Fonte: elaboração própria

0 20 40 60 80

Câmara de Mediação

PROCON

Estágio Externo

Escritório Modelo

Estágio Supervisionado 2014.2

Estágio Supervisionado 2014.2

0 10 20 30 40 50

Mais de 30 anos = 13

De 21 a 30 anos = 36

Menos de 21 anos = 4

Homens = 24

Mulheres = 29

Início curso em 2011 = 35

Antes de 2011 = 18

Direito desejo pessoal = 50

Exerce trabalho remunerado = 31

Participa estágio externo = 17

Resultados

Resultados

57

Percebe-se que o perfil dos alunos os quais responderam o questionário possui características

específicas. É um grupo formado, em sua maioria, por pessoas jovens que optaram pelo curso

de Direito como um desejo pessoal. Vislumbra-se que mesmo a maior parte exercendo

atividades externas, ditos alunos optaram por cursar a disciplina de estágio dentro do Núcleo

de Práticas na busca de conhecimentos a serem formados com a ajuda dos professores. A

segurança de estarem em contato com a comunidade, devidamente amparados pela presença do

docente e de toda a estrutura do setor.

Diante das respostas é possível também notar que boa parte do grupo é formado por pessoas

que iniciaram o curso no ano de 2011, ou seja, estão dentro da expectativa de terminarem a

graduação em Direito no prazo legal de quatro anos. Verifica-se ainda que poucos tiveram

contato com experiências práticas externas, já que dezessete, participam ou participaram de

estágios em outros ambientes que não fosse o ofertado pela instituição. No que se refere a

gênero, configura-se o grupo bem equilibrado, apontando estudantes dos dois sexos em

equivalência.

Após essa fase, iniciou-se outra seleção, em busca dos alunos que interessavam a essa pesquisa,

quais sejam, apenas os alunos que estavam realizando como única e exclusiva atividade de

estágio, aquela ofertada pela instituição. Ainda na seleção dos sujeitos, não se mostraram

adequados à pesquisa os alunos que estavam cursando o estágio supervisionado em área diversa

do escritório modelo de advocacia cível. Sendo assim, foram dispensados os alunos que

estavam realizando estágio supervisionado na Câmara de Mediação e na unidade do PROCON

dessa instituição, o que finalizou um grupo composto por 36 pessoas, dos quais 06 (seis) foram

entrevistados, tendo em vista a saturação, as respostas começaram a ficar repetitivas sem

justificativa para ouvir novos participantes.

Os 06 (seis) participantes entrevistados foram escolhidos aleatoriamente. Tendo a pesquisadora

entrado em contato com cada um dos 36 (trinta e seis) alunos respondentes do questionário, que

se enquadravam no perfil adequado aos sujeitos da pesquisa. Cada um deles se colocou à

disposição para responder a entrevista. Estas foram realizadas de forma individual, e tantas

quantas foram necessárias até o momento em que houve saturação.

A saturação foi identificada quando não houve mais a necessidade de inclusão de novos

participantes, pois os dados obtidos passaram na visão do pesquisador a apresentarem-se

repetitivos. Não se vislumbraram novas informações ou fatos relevantes que justificassem a

58

ouvida de novos participantes, para o enriquecimento e aperfeiçoamento da reflexão realizada.

Constatada a saturação interromperam-se as entrevistas, para a captação de informações. Foram

levados em consideração alguns critérios: a limitação empírica dos dados coletados, a

integração desses dados com fundamentação teórica desenvolvida na pesquisa e a interpretação

teórica de quem analisa os dados, fechando todos esses pontos ao problema pesquisado,

atingindo assim os objetivos buscados (FONTANELLA, RICAS e TURATO, 2007).

O gráfico abaixo demonstra o quantitativo da amostragem até se chegar no equivalente ao

número de entrevistados que se deu a saturação.

Gráfico 3 – Descritivo dos alunos participantes da pesquisa.

Fonte: Elaboração própria

Os sujeitos foram selecionados, tendo em vista quem poderia nos fornecer as melhores

informações para a pesquisa, de acordo com a pergunta e os objetivos específicos desta. A

escolha foi feita após a aplicação do questionário, quando se tornou possível identificar quais

eram os alunos que realizavam estágio de advocacia cível, exclusivamente no ambiente

acadêmico, ou seja, apenas no Núcleo de Práticas Jurídicas da instituição de ensino pesquisada.

Buscou-se na população uma parte dela que interessou à pesquisa. (BOCCHI, MONTI e SPIRI,

2008).

Número de alunos

0

10

20

30

40

50

60

70

80

Escritório civilSelecionados

Entrevistados

Número de alunos

Número de alunos

59

Em pesquisas qualitativas, têm-se verificado que um número inferior a doze é ideal para a

saturação, quando da análise do conteúdo de entrevistas. Apresentando-se tal número como

equilibrado no que diz respeito à abrangência e profundidade. (THIRY-CHERQUES, 2009).

3.1.3 Instrumentos de coleta de dados

Neste item são expostas as maneiras escolhidas para coletar os dados por meio de instrumentos

e processos, bem como são apresentadas as formas de analisar os dados.

A coleta de dados foi realizada inicialmente através da aplicação de questionário que teve por

objetivo central a identificação de critérios relevantes à pesquisa do citado grupo, e após,

entrevista e análise dos dados. A entrevista permitiu uma análise dos dados que deram subsídios

para análise qualitativa do estudo.

Segundo Gil (2010), o questionário é uma importante técnica que consegue reunir informações

sobre conhecimentos, interesses, expectativas, comportamentos, entre outros aspectos.

Importante no caso em questão, já que foi através do questionário que a amostra foi delimitada.

Para Malheiros (2011), a entrevista pode ser conceituada como um tipo de procedimento que é

utilizado na investigação para a coleta de dados, sendo possível que a análise destes, ajudem na

identificação e muitas vezes no tratamento de problemas sociais. No presente estudo foi

utilizada a entrevista estruturada, de forma individual e presencial, pois o objetivo era

identificar qual a percepção dos alunos.

A possibilidade de aplicação de mais de um instrumento de coleta de dados, quais sejam o

questionário e a entrevista, possibilitou uma melhor compreensão do fenômeno estudado, a fim

de responder de forma significativa o problema de pesquisa anteriormente indicado (BOCCHI,

MONTI e SPIRI, 2008).

A aplicação do questionário foi feita durante a realização do estágio supervisionado ofertado

pelo Núcleo de Práticas, e o diálogo da entrevista, ocorreu apenas após a conclusão do estágio,

tendo sido gravado, e posteriormente houve a transcrição. Segundo Malheiros (2011, p. 196), a

entrevista “tem sido uma das técnicas mais utilizadas para coletar dados não somente na

educação, mas em quase todas as ciências humanas e sociais”.

60

A entrevista ocorreu durante os meses de dezembro de 2014 e janeiro de 2015, momento em

que se encerraram as atividades do estágio supervisionado, período adequado para identificar-

se a maneira pela qual o estágio havia influenciado na construção das competências.

3.1.4 Análise das entrevistas

No presente estudo, a análise dos dados colhidos com as entrevistas foi através da técnica

denominada por análise de conteúdo. Vislumbra-se, desta forma, deduzir sobre a construção do

conhecimento voltado para o desenvolvimento técnico jurídico, como competência traçada pelo

Ministério da Educação, segundo os aspectos apresentados pelos entrevistados, levando-se em

consideração suas experiências pessoais durante a realização do estágio supervisionado

(BARDIN, 1979).

A análise dos dados por meio de análise do conteúdo permitiu a identificação da presença ou

ausência de determinadas características em fragmentos de mensagens (CAREGNATO e

MUTTI, 2006). Sendo possível a análise das palavras nos textos produzidos pelas entrevistas

coletadas junto aos alunos do núcleo de práticas.

A análise de conteúdo é definida por Laurence Bardin (1979, p. 42), como,

um conjunto de técnicas de análise das comunicações, visando obter, por

procedimentos, sistemáticos e objetivos de descrição de conteúdo das

mensagens, indicadores (quantitativos ou não) que permitam a inferência de

conhecimentos relativos às condições de produção/recepção (variáveis

inferidas) destas mensagens.

Alguns significados são essenciais para serem alcançado no material qualitativo, para atingi-

los têm sido desenvolvidas algumas técnicas a serem utilizadas na análise de conteúdo, tais

como a análise da expressão do entrevistado, a análise de relações, a análise temática e a análise

da enunciação. Para Bardin (1979), não existe nada pronto para aqueles que pretendem utilizar

a análise de conteúdo como método em suas investigações. Ela determina que existem algumas

regras básicas, que possibilitam o investigador reinventar a cada momento uma maneira de

analisar os dados.

Buscou-se no presente estudo alcançar na análise do conteúdo, o cumprimento das três fases,

especificadas por Bardin (1979) a saber: 1 - pré-análise; 2 - exploração do material; 3 -

tratamento dos resultados, a inferência e a interpretação. Sendo entendido por pré-análise a

análise superficial dos dados, nesse momento há uma breve leitura dos dados, fazendo a escolha

61

dos documentos, para serem submetidos aos procedimentos analíticos. E, por último nesta fase,

realizar-se-á a preparação do material, no presente estudo, que foram utilizadas as entrevistas

gravadas, transcritas na íntegra, o que possibilitou a manipulação do material para posterior

análise.

Terminada a pré-análise, iniciou-se a exploração do material, que consistiu numa fase de

dedicação, de operações de codificação, enumeração, classificação e agregação, em função de

regras previamente formuladas. Nesta fase foi realizado o recorte, a enumeração e a

classificação das categorias, identificadas no material coletado após a transcrição das

entrevistas realizadas com os alunos. Por fim, ocorreu o tratamento dos resultados obtidos, a

inferência e a interpretação. Nesse estudo, em que foi selecionada a análise de conteúdo

qualitativo, os resultados brutos foram tratados de maneira significativa e válida (BOCCHI,

MONTI e SPIRI, 2008).

Na pesquisa aqui realizada, pretendeu-se atingir as fases acima indicadas, alcançando-se os

objetivos previstos nesta pesquisa, ou até mesmo resultados inesperados.

A análise de conteúdo, segundo Caregnato e Mutti (2006), ocorre pela análise de categorias

temáticas. Preocupando-se com o sentido embutido no texto analisado, e as possíveis diferenças

existentes entre um texto e outro. A análise por categorias temáticas, de cunho subjetivo e

qualitativo, implica no desenvolvimento de uma pesquisa onde o aspecto eminentemente

sensível do autor do presente estudo, a fim de possibilitar a codificação de segmentos, que se

ligam a categorias, possibilitando a compreensão do texto. Tais categorias serão constituídas a

partir do objetivo geral desta pesquisa.

Para fazer parte das categorias, as seguintes perguntas foram respondidas: “- Como as

categorias estão relacionadas? - As categorias permitem ligações quando se recorre aos dados?

- Quais as conclusões podem ser desenhadas?” (BOCCHI, MONTI e SPIRI, 2008). A intenção

nas respostas a tais perguntas é descobrir as relações entre as categorias e encontrar

alinhamentos ou temas comuns que permeiam os dados.

Identificadas as categorias foram elaborados relatórios, que resumiram os conjuntos de

significados identificados em cada uma das unidades de análise, o que segundo Moraes (1999)

é imprescindível para validação da pesquisa e seus resultados.

62

Com o objetivo de construir resposta à problemática proposta, foram interpretados os

significados captados, atingindo assim a terceira fase indicada por Bardin (1979), com a

interpretação dos dados e sendo retiradas as inferências possíveis, compreendendo-se o

conteúdo das informações.

Após ouvidas e transcritas as entrevistas, foram realizadas várias leituras a fim de identificar o

conteúdo que atendia à pesquisa. A partir da análise dos dados, por meio de análise de conteúdo,

foi possível identificar a presença ou a ausência de determinadas características,

(CAREGNATO e MUTTI, 2006). Referida identificação viabilizou a definição das categorias,

que nada mais são do que uma forma do pensamento, dos conceitos, um reflexo da realidade,

podendo ser entendido, como sínteses do saber (BARDIN, 1979). Assim partimos das seguintes

categorias:

Quadro 4 – Categorias da pesquisa

CATEGORIA I

Estágio Supervisionado

Expressões e relatos que

vislumbrem o contato com a

prática da advocacia forense

CATEGORIA II

Competências Alcançadas

Percepção sobre as

competências desenvolvidas ao

longo do estágio

Fonte: Elaboração própria

Frise-se por fim que, sendo delimitadas as categorias, estas foram preenchidas até que se chegou

ao ponto da saturação pelo preenchimento dos dados. Esta pesquisa foi realizada prezando pela

qualidade dos dados, através de transcrições legíveis; gravações claras, dentre outros, no que

diz respeito à natureza da informação, foram claras e concisas, com uma quantidade de

informação útil obtida de cada sujeito participante (BARDIN, 1979). Ocorrendo

homogeneidade interna e externa, processou-se a análise do conteúdo.

3.1.5 Desenho da Pesquisa

Tendo em vista o que fora demonstrado, essencial que o presente estudo tenha sido planejado

em etapas a fim de tornar-se possível a pesquisa realizada. Levando-se em conta o método

escolhido, os resultados que se pretende alcançar, bem como os instrumentos de coleta de dados

e a forma de análise das informações reunidas, este trabalho foi realizado nas seguintes etapas:

63

Quadro 5 – Etapas da pesquisa

FASE ATIVIDADES REALIZADAS

1ª. Aplicação do Questionário a fim de identificar os grupos

2ª.

Realização de entrevistas ao grupo amostral de alunos no final do semestre, quando foi

possível investigar os resultados percebidos por eles em relação à construção do

conhecimento específico no que diz respeito às competências traçadas pelo Ministério da

Educação nas atividades da advocacia.

3ª.

Análise e interpretação dos dados coletados, considerando as suposições formuladas

previamente e ao longo do desenvolvimento da pesquisa, trazendo ao final sugestões que

possam contribuir para a prática da advocacia compreendida na formação de competências.

Fonte: Elaboração própria.

3.1.6 – Limites e limitações da pesquisa

O limite imposto pela pesquisadora foi de entrevistar apenas os alunos que desenvolveram

atividades voltadas àquelas direcionadas ao cotidiano forense da advocacia cível, vinculados

exclusivamente ao estágio supervisionado ofertado pela Instituição de Ensino Superior ora

pesquisada, até ocorrer a saturação. Desta forma, apenas fizeram parte da pesquisa os alunos

que estiverem matriculados em estágio supervisionado, no núcleo de práticas jurídicas, nas

atividades cíveis de advocacia, ou seja, no escritório modelo.

A limitação encontrada pela pesquisadora foi a falta de disponibilidade dos participantes para

responderem a entrevista. Não porque esta se apresentasse longa ou cansativa, mas por estarem

os alunos de férias após a conclusão do estágio 2014.2, e residirem a maior parte em cidades

diversas daquela em que se localiza a instituição de ensino. Tendo sido dispendido um longo

lapso temporal para a realização desta fase da pesquisa, o que não poderia ser diferente já que

as entrevistas só poderiam ser aplicadas ao final do semestre, com o fim do estágio.

64

4 A EXPERIÊNCIA DOS ALUNOS DO ESTÁGIO SUPERVISIONADO DE UMA

INSTITUIÇÃO DE ENSINO SUPERIOR

O presente capítulo foi construído a partir da análise do conteúdo das entrevistas com os alunos

que participaram do estágio supervisionado oferecido por uma instituição de ensino superior da

cidade de Caruaru, estado de Pernambuco. Buscou-se refletir sobre as seguintes categorias:

estágio supervisionado e competências alcançadas a partir das respostas dos alunos

entrevistados.

4.1. Divisão das categorias

A figura a seguir demonstra a primeira categoria que foi formada diante das respostas dos

entrevistados:

Figura 1 – Categoria I – Estágio supervisionado

Fonte: Elaboração própria

Na primeira categoria foram relacionados os trechos das entrevistas que apresentaram

características do estágio supervisionado, o primeiro contato com as atividades práticas de

advocacia. Buscou-se entender quais eram os planos que tinham traçado para si ao ingressarem

no núcleo de práticas jurídicas. Entender a percepção dos alunos a respeito do que esperavam

alcançar e se o caminho a ser trilhado os levaria à construção de competências, de habilidades

específicas, que lhes possibilitassem o desempenho da profissão de forma adequada.

Já na segunda categoria, buscou-se identificar, segundo o relato dos alunos, a percepção destes

para o desenvolvimento das competências. O que para eles foi proveitoso? O que conseguiram

Categoria I

Estágio supervisionado

Expressões e relatos quevislumbrem o contato com aprática da advocacia forense

65

atingir? As expectativas iniciais haviam sido alcançadas? Foi oportunizado aos alunos na

entrevista, inclusive, sugerirem melhorias, do ponto de vista deles, à instituição, para que o

estágio ocorresse de modo a permitir uma aprendizagem adequada e que pudesse atingir os

objetivos traçados pelo Ministério da Educação.

As categorias mostraram-se suficientes à interpretação, identificação e análise das

características ali encontradas, permitindo a inferência do conteúdo descrito. Abaixo segue o

descritivo da segunda categoria:

Figura 2 – Categoria II – Competências alcançadas.

Fonte: Elaboração própria.

Para não possibilitar a identificação dos alunos entrevistados, não foram registrados nesta

pesquisa os nomes, ou quaisquer elementos que possibilitassem a individualização destes.

Sendo assim, denominaremos de “A1”, e os números subsequentes até 6 (seis). Cada um deles,

a partir do enquadramento no perfil da amostra, foi convidado a participar da entrevista, que

ocorreu em horário e local escolhidos pelos próprios entrevistados, a fim de eliminar qualquer

elemento inibidor ao aluno e assim deixá-lo à vontade e tranquilo nas respostas.

Antes também, de se submeterem à entrevista, foi-lhes entregue o termo de consentimento, o

qual, leram e assinaram, permitindo a realização da pesquisa. Não houve a recusa por nenhum

dos alunos selecionados, de responderem às perguntas que lhes foram feitas.

As vivências registradas nas entrevistas dos seis alunos foram trabalhadas por categorias,

organizadas em quadros, que se encontram como apêndices desta pesquisa. Houve o registro

de cinco quadros, que se encontram divididos em três colunas: Coluna 1 (Categoria), Coluna 2

Categoria II

Competências alcançadas

Percepção dos alunos sobre ascompetências desenvolvidasao longo do estágio

66

(Unidade de Registro); e Coluna 3 (Unidade de Contexto). A análise de conteúdo aconteceu a

partir da unidade de registro, tendo em vista o que foi dito em cada entrevista.

4.2 Categoria I – Estágio supervisionado

A análise realizada na categoria I, permitiu dividir as respostas em dois quadros, os de números

7 e 8, devidamente expostos nos itens 4.2.1 e 4.2.1. Foram apresentadas as respostas das

entrevistas com os seis participantes, organizando-as em subcategorias com os elementos

caracterizadores daquela unidade. Nesses quadros, buscou-se estruturar o conteúdo da

entrevista que permitiu compreender a visão dos entrevistados sobre as questões relacionadas

ao início das atividades do estágio supervisionado.

Abaixo segue a demonstração da categoria I e das subcategorias que foram possíveis ser

percebidas, quando da análise:

Figura 3 – Categoria I – Subcategoria – Unidade de contexto

Fonte: Elaboração própria

4.2.1 Subcategoria – Expectativas dos alunos ingressantes do estágio

No quadro 7 são transcritas os trechos das entrevistas que interessam à categoria formada a

partir das expectativas dos alunos ingressantes do estágio:

Categoria I

Expectativas dos alunos

ingressantes do estágio

Estágio Supervisionado

Conhecimento das competências

traçadas pelo Ministério da

Educação

67

Quadro 7 - Categoria I: Expectativas dos alunos ingressantes do estágio C

AT

EG

OR

IA I

(C

I)

Est

ágio

su

per

vis

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AT

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OR

IA

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stág

io

UNIDADES DE CONTEXTO

Entrevistadora: Quais atividades você esperava desenvolver/participar no

estágio supervisionado?

A1- Bem, veja só, eu esperava fazer atendimento ao público, realização de

peças, acompanhar os processos e participar de audiências.

A2 - Bom, as atividades que eu pretendia desenvolver no estágio seria

acompanhar um processo do início ao fim, redigir peças e acompanhar o cliente

no fórum são essas atividades que praticamente a gente pretende aprender no

estágio supervisionado.

A3 - Bom, primeiramente, eu tinha a intenção de chegar lá e que a minha

expectativa era chegar lá e colocar em prática tudo que eu tinha visto na teoria,

de aprender a redigir, a colocar em prática mesmo tudo aquilo que eu tinha

visto na teoria, em todas as áreas, nas áreas cíveis, na área penal, que eu ainda

não paguei, mas colocar em prática todos os aprendimentos das cadeiras

específicas.

A4 - O que a gente fazia, eu esperava atender clientes, redigir as peças com a

ajuda dos professores e acompanhar nas audiências, quando era preciso.

A5 - Eu esperava, com o estágio, uma orientação de como abordar e iniciar

uma conversa com o cliente, ser orientado na maneira de como fazer essas

perguntas ao cliente, ser orientado também na elaboração das peças

processuais e o acompanhamento de audiências.

A6 - Bem, eu acho que o que eu esperava era ver na prática o que eu estava

vendo há três anos na teoria, esperava ir para audiências, atender os clientes e

fazer as peças.

Fonte: Elaboração própria

Das entrevistas transcritas e apresentadas no quadro 6 foi possível apreender dos conteúdos

selecionados e elencados acima, que os alunos entrevistados, apesar de não conhecerem de

forma adequada as competências traçadas pelo Ministério da Educação, publicadas através da

Resolução n. 09, do Conselho Nacional de Educação, em 29 de setembro de 2004, as

expectativas ali descritas se relacionam diretamente com o que deverá ser desenvolvido por eles

ao longo do curso de Direito.

Expressam suas expectativas indicando o conhecimento que pretendiam construir com o

ingresso no estágio supervisionado. Alguns dos entrevistados demonstraram uma ansiedade

maior que os outros quando se referiram às atividades que iriam ser desenvolvidas com o

atendimento à comunidade. Foi realizada, conforme nos indica Bardin (1979) uma análise,

buscando-se a inferência através dos dados e características encontrados nas mensagens, cujos

significados se traduzem após a observação, apresentação, leitura, discussão e interpretação do

conteúdo. É o sentido por trás do discurso aparente que se pretende desvendar.

68

De acordo com as respostas apresentadas, foi possível verificar a expectativa dos entrevistados

em associar a teoria à atividade prática, com o início do estágio supervisionado, conforme se

constata no trecho da entrevista abaixo transcrita:

A3... eu tinha a intenção de chegar lá e que a minha expectativa era chegar lá

e colocar em prática tudo que eu tinha visto na teoria, de aprender a redigir, a

colocar em prática mesmo tudo aquilo que eu tinha visto na teoria, em todas

as áreas, nas áreas cíveis, na área penal, que eu ainda não paguei, mas colocar

em prática todos os aprendimentos(sic) das cadeiras específicas.

A ansiedade e a inquietação dos alunos entrevistados são compreensíveis, nesse primeiro

momento em que entram em contato com a atividade prática, tendo em vista que a dicotomia

entre teoria e prática nos cursos jurídicos é algo presente, demonstrando-se desde a época da

implantação dos cursos jurídicos (OLIVEIRA, 2004).

A presença do paradigma newtoniano-cartesiano é facilmente detectada pelo discurso inicial

dos alunos, o pensamento de dividir o conhecimento em áreas, o trabalho isolado dos

professores em sala de aula, a fragmentação do todo (BEHRENS, 2005), encontra-se no

cotidiano da sala de aula, justificando a ansiedade pelo contato com a prática.

Percebe-se, das respostas, que os alunos antes de iniciar o estágio esperam nesse momento de

aprendizado, o contato com a atividade de advocacia judicial e também atividades

extrajudiciais, assim como o atendimento ao cliente, esse primeiro momento com a parte, as

perguntas a serem feitas, a percepção do que compreender e o que trazer ao processo. Fica clara,

tal intenção nas respostas dos entrevistados, em especial do A5, ao dizer que:

“... Eu esperava com o estágio, uma orientação de como abordar e iniciar uma

conversa com o cliente, ser orientado na maneira de como fazer essas

perguntas ao cliente, ser orientado também na elaboração das peças

processuais e o acompanhamento de audiências.”

Vislumbra-se, ainda, dos relatos acima indicados, que a intenção dos alunos ao participar do

estágio supervisionado é a participação também em atividades judiciais, tais como a

participação em audiências e o acompanhamento dos clientes no ambiente forense. Nesse

momento o aluno passa a direcionar seus estudos em uma área mais específica, já que a

instituição disponibiliza no Núcleo de Práticas Jurídicas, um setor apenas para atividades cíveis,

proporcionando um ensino direcionado à reflexão de teorias e uma abordagem maior em

problemas reais e atividades práticas dentro de uma única área (ALMEIDA, SOUZA e

CAMARGO, citados em GHIRARDI e FEFERBAUM, 2013).

69

Senão veja-se o que descreve o A1: “... Bem, veja só, eu esperava fazer atendimento ao público,

realização de peças, acompanhar os processos e participar de audiências.” Pelo que se percebe

das entrevistas, a expectativa no desenvolvimento de atividades judiciais é presente em todos

os relatos:

A2 - Bom, as atividades que eu pretendia desenvolver no estágio seria

acompanhar um processo do início ao fim, redigir peças e acompanhar o

cliente no fórum são essas atividades que praticamente a gente pretende

aprender no estágio supervisionado.

Ao participar das entrevistas, foi possível verificar a ansiedade dos alunos, no que diz respeito

às expectativas que tinham ao ingressar no estágio, a experiência prática parecia para eles algo

novo pelo qual estavam esperando há tempo.

Percebe-se ainda que a expectativa deles é direcionada à atividade prática diretamente assistida

pelos professores. A4 – “O que a gente fazia, eu esperava atender clientes, redigir as peças

com a ajuda dos professores e acompanhar nas audiências, quando for preciso”.

A imagem do professor como educador, apoiador, pessoa que está do lado para ensinar os

passos iniciais da atividade prática do aluno, é presente no discurso dos alunos. Repetindo-se

os ditames dos paradigmas conservadores, onde o dono da verdade era o professor e os alunos

não apresentavam autonomia para construir o conhecimento sem a presença dele.

A palavra “acompanhar” encontra-se quase que em todas as respostas, demonstrando o interesse

do aluno em fazer parte de um mundo real, o conhecimento de sala de aula já não mais se mostra

suficiente.

A1- Bem, veja só, eu esperava fazer atendimento ao público, realização de

peças, acompanhar os processos e participar de audiências.

A2 - Bom, as atividades que eu pretendia desenvolver no estágio seria

acompanhar um processo do início ao fim, redigir peças e acompanhar o

cliente no fórum são essas atividades que praticamente a gente pretende

aprender no estágio supervisionado.

A4 - O que a gente fazia, eu esperava atender clientes, redigir as peças com a

ajuda dos professores e acompanhar nas audiências, quando era preciso.

A5 - Eu esperava, com o estágio, uma orientação de como abordar e iniciar

uma conversa com o cliente, ser orientado na maneira de como fazer essas

perguntas ao cliente, ser orientado também na elaboração das peças

processuais e o acompanhamento de audiências.

70

A ideia de repensar a prática pedagógica como um todo, e não de forma fragmentada, não

dividindo o conhecimento teórico e o prático, a aprendizagem da sala de aula sem transformar

tais conhecimentos em realidade prática; é necessária. O aluno traduz a importância de tal ideia

na expectativa de acompanhar o cliente, de acompanhar o processo, de acompanhar as

audiências, de fazer parte do mundo real, e não mais do conhecimento fragmentado e isolado

que lhe é transmitido em sala de aula (BEHRENS, 2005).

Um avanço significativo para a compreensão do Direito como um todo, com disciplinas

interligadas e não isoladas, sem dúvida, foi a criação do estágio supervisionado, que nem

sempre existiu nos moldes atuais. Inicialmente, a figura do professor acompanhava o aluno,

tentando transmitir conhecimentos práticos na própria sala de aula, os alunos não tinham

contato com casos reais. Tal inovação surgiu com a publicação da Portaria n. 1.886, de 30 de

dezembro de 1994, quando os Núcleos de Práticas Jurídicas foram criados e os alunos, através

da supervisão dos professores orientadores, iniciariam a prática forense.

O artigo 11, da referida portaria, descrevia as atividades que seriam desenvolvidas no estágio,

incluindo a redação de peças processuais e profissionais, a assistência e atuação em audiências

e sessões e a prestação de serviços jurídicos de uma forma geral, com o atendimento e

acompanhamento da parte. Em 2004, o Conselho Nacional de Educação, publica as

competências que devem ser alcançadas pelos graduandos, as quais se refletem também nas

atividades a serem desenvolvidas no estágio, entrelaçando tais habilidades com o plano de

objetivos a serem alcançados, na busca de um profissional apto ao mercado de trabalho.

No relato das entrevistas percebe-se que as atividades descritas na Portaria 1.886/1994, são

identificadas na fala dos próprios alunos como sendo aquelas que estes buscam alcançar. Tais

atividades fazem parte das habilidades e competências descritas pelo Ministério da Educação,

que traçam por objetivo o desenvolvimento de um profissional capaz de refletir, questionar,

criticar, argumentar, enfim tornar-se apto às exigências do atual mercado de trabalho,

realizando assim um atendimento adequado ao cliente, produzindo peças processuais de

qualidade e finalmente mostrando-se capazes de realizar atos da atividade processual civil de

forma competente, como a atuação em audiências.

A figura abaixo demonstra a categoria vislumbrada neste ponto, buscando-se responder a

problemática de pesquisa do presente trabalho.

71

Figura 4 – Categoria I - Expectativas dos alunos ingressantes do estágio

Fonte: Elaboração própria

O próximo ponto da pesquisa foi dedicado a entender o alcance do conhecimento dos alunos

entrevistados sobre as competências que são traçadas pelo Ministério da Educação para o

graduando em Direito.

4.2.2 Subcategoria – Conhecimento das competências traçadas pelo Ministério da

Educação

No quadro 8 é possível identificar a transcrição das entrevistas que trouxeram informações à

subcategoria que tem por objetivo descrever o conhecimento dos alunos sobre as competências

traçadas pelo Ministério da Educação.

Quadro 8 - Conhecimento das competências traçadas pelo Ministério da Educação

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UNIDADES DE CONTEXTO

Entrevistadora: Você tem conhecimento das competências traçadas pelo

Ministério da Educação, para os graduandos no curso de Direito?

A1 - Como assim? Que competências? Não sabia não.

A2 - Não tô sabendo dessas competências não.

A3 – Olha professora, eu conheço sim essas competências, assim, eu não sei

exatinho o que elas dizem, mas já ouvi falar sim.

A4 – Não professora, nunca ouvi falar.

A5 – Não sei nem o que é isso.

A6 – Bem... Já ouvi falar nisso sim, mas não sei ao certo.

Fonte: Elaboração própria

Estágio supervisionado

72

Apesar de parecerem os alunos interessados na aprendizagem, a resposta negativa a tal pergunta

foi frequente, pois demonstraram total falta de conhecimento das referidas competências. O

estágio é realizado por alunos em períodos já mais avançados, entender-se-ia desta forma que

seria razoável o posicionamento destes em terem consciência daquilo que se espera ao

terminarem o curso de Direito.

A ausência de conhecimento dos alunos sobre ditas competências nas respostas é evidente: A1

– “Como assim? Que competências? Não sabia não”; A4 – “Não professora, nunca ouvi falar”;

A5 – “Não sei nem o que é isso”.

É sabido que a construção de competências é uma exigência da própria sociedade que está em

constante evolução e o mercado de trabalho encontra-se cada dia mais competitivo. Os

graduandos têm que começar a se destacar em mercado por serem cidadãos críticos e

conscientes de que são agentes transformadores, interpretando e valorizando os fenômenos

jurídico-sociais, com uma postura reflexiva e crítica (FREITAS, 2000).

Vislumbra-se, todavia, que as três atividades básicas que são relatadas no teor das entrevistas:

o atendimento ao cliente, a redação de peças processuais e o acompanhamento em audiências,

correspondem às atividades responsáveis pela construção das competências descritas pelo

Ministério da Educação, quando se busca a atuação do profissional de advocacia.

Verifica-se assim, que mesmo os alunos não tendo o conhecimento do conjunto de habilidades

específicas e harmonicamente desenvolvidas, que caracterizam uma profissão, (MORETTO,

2008), que estão elencados na Resolução n. 09/04, as suas expectativas quanto às atividades

que seriam produzidas no estágio supervisionado acabam se identificando com os parâmetros

de competências ali traçados.

Importante ainda salientar que, a ausência de interesse dos alunos em buscar referido

conhecimento, mais uma vez demonstra a presença do paradigma newtoniano-cartesiano, a

posição do aluno em ser mero espectador, para memorizar, assimilar e reproduzir as

informações trazidas pelo docente. Na sociedade atual, há cada vez menos espaço para o

profissional que é fruto desse contexto de submissão, é necessário que o aluno indague, critique,

busque informações (BEHRENS, 1999).

A iniciativa do aluno na busca do conhecimento permite-lhe usufruir de forma adequada aquilo

que lhe é proporcionado. O núcleo de práticas existe essencialmente para atender o aluno, o

73

reflexo social é uma consequência, mas o objetivo central é o aprendizado. Os professores, os

auxiliares, a estrutura, enfim tudo foi criado para que o aluno tenha a oportunidade de unir seu

conhecimento teórico à atividade prática.

Muitas vezes é possível identificar que o personagem principal, que é o aluno, não demonstra

interesse, não busca, apenas se contenta com o que lhe é ofertado, como sujeito passivo e

receptivo, no trato pedagógico. Isso provavelmente será refletido em sua postura na atividade

profissional, o que significa um posicionamento medíocre de mero repetidor de leis, sem o

questionamento muitas vezes necessário para a busca de soluções justas aos casos apresentados

no cotidiano do advogado.

Enxergar a realidade forense como algo que pode ser modificado, faz parte do perfil do aluno

que teve uma educação universitária, não pautada em paradigmas conservadores, que aliam a

competência ao autoritarismo, mas numa construção de conhecimento com práticas

pedagógicas inovadoras.

A figura a seguir demonstra o que se buscou compreender na análise da referida subcategoria.

Figura 5 – Categoria I – Competências traçadas pelo MEC – APÊNDICE D

Fonte: Elaboração própria

Mais adiante, na análise da próxima categoria descrita neste capítulo, é possível verificar a

ligação de tais atividades com as competências descritas na Resolução indicada.

4.3 Categoria II – Competências alcançadas

A próxima figura demonstra a organização que foi dada à categoria II:

Estágio Supervisionado

74

Figura 6 – Categoria II – Competências alcançadas

Fonte: Elaboração própria.

Esta segunda categoria foi criada a partir das competências traçadas pelo Ministério da

Educação, com a publicação da Resolução de n. 9, do Conselho Nacional de Educação, de 29

de setembro de 2004. Estruturamos o conteúdo das entrevistas em três unidades de registros, a

partir da frequência com que certas características se verificaram.

A percepção dos elementos caracterizadores permitiu o agrupamento dos conteúdos tornando

possível uma interpretação dos dados, a fim de se buscar respostas aos objetivos específicos

desta pesquisa, tendo em vista a base teórica anteriormente explanada, para que se

desenvolvesse a presente análise de conteúdo.

A unidade de contexto indicada é apenas uma das possíveis formas de agrupamento das

respostas que indicam as características que surgem com frequência e permitem a compreensão

da visão dos entrevistados sobre o assunto. Após diversas leituras dos relatos apresentados pelos

alunos que participaram desta entrevista, tornou-se possível a inferência e a interpretação,

atingindo-se a última fase da análise de conteúdo, segundo o que determina Bardin (1979).

Nas unidades de registro foram delineadas as competências traçadas pelo Ministério da

Educação. Já quanto às unidades de contexto analisadas, as respostas tiveram como

características as atividades que se espera serem desenvolvidas no estágio supervisionado,

conforme o artigo 11, da Portaria 1.886/94, quando da implantação dos Núcleos de Práticas

Competências alcançadas segundo a percepção dos alunos

entrevistados

Leitura, compreensão e elaboração de textos, atos e documentos jurídicos ou normativos, com a devida

utilização das normas técnico-jurídicas;

Pesquisa e utilização da legislação, da

jurisprudência, da doutrina e de outras

fontes do Direito;

Adequada atuação técnico-jurídica, em

diferentes instâncias, administrativas ou

judiciais, com a devida utilização de processos, atos e procedimentos;

Correta utilização da terminologia jurídica ou

da Ciência do Direito;

Interpretação e aplicação do Direito;

Domínio de tecnologias e métodos para

permanente compreensão e aplicação do Direito.

75

Jurídicas nos cursos de Direito no Brasil, quais sejam, redação de peças processuais, relações

com os clientes e assistência e atuação em audiências e sessões, atualmente replicadas no

regulamento interno da instituição de ensino pesquisada.

4.3.1 Subcategoria – Da redação das peças processuais

No quadro abaixo buscou-se demonstrar a transcrição de trechos das entrevistas realizadas com

os alunos que trouxeram informações sobre a subcategoria pesquisada, qual seja, a redação das

peças processuais, atividade desenvolvida pelo discente no Núcleo de Práticas ora pesquisado.

Quadro 9 – Da redação das peças processuais

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UNIDADES DE CONTEXTO

Entrevistadora: Após a conclusão do estágio supervisionado, você se sente preparado para a

realização da atividade de advocacia, no que diz respeito à adequada atuação técnica jurídica,

quanto à produção de peças processuais?

A1 - Não me sinto completamente preparado, queria mais aulas de prática, elas foram essenciais

para melhorar os meus conhecimentos, [...] nos métodos de realização das peças, queria mais

tempo no estágio.

A2 - Bom, após a conclusão do meu estágio, eu não me sinto totalmente preparado, para

acompanhar essa produção de peças processuais, [...] porque eu percebo que faltou algum detalhe

nesse estágio. Também ficou só na petição inicial, não vi contestação, recurso.

A3 - Bom, é, tive um conhecimento, uma base, mas eu não me sinto plenamente capacitada para

fazer isso sem ser assistida, sem ser supervisionada, eu tenho a teoria, tenho uma base de como

deve ser feita, mas não me sinto segura para fazer isso sem uma supervisão. Foi bem sucedido o

estágio, mas ele deixou a desejar no quesito tempo, né? Durabilidade. Foi muito pequeno o espaço

de tempo.

A4 - Sinto em parte, algumas peças eu tenho mais técnica, só que outras eu ainda sinto dificuldade.

Até porque, lá no núcleo a gente via mais a peça que abre o processo e as outras, né, quase nada.

A5 - Considero que me sinto preparado, no sentido de tudo aquilo que foi abordado e aprendido

no estágio, porém pelo próprio campo do Direito ser muito amplo, inevitavelmente há situações

que você não se sente preparado por não ter vivenciado aquilo no estágio. A fase recursal, por

exemplo, não tivemos contato no estágio, essas peças eu não tenho segurança.

A6 - Na verdade, a gente fica muitas vezes na dúvida de colocar aquilo que a gente viu na teoria,

na prática. Hoje não me sinto totalmente preparado para produzir peças. Acho que o estágio deixa

a desejar, porque o tempo é muito limitado, a gente vê poucos tipos de ação. A gente também não

tem muita oportunidade de pegar processo para ver outras peças.

Entrevistadora: Dentre as suas expectativas, quais foram plenamente atingidas e quais não

foram?

A1 - Bem, acho que conseguir elaborar peças, assim, de forma limitada, [...]

A2 - Bom, a gente tem no núcleo uma visão geral do que é uma peça, do que é a petição inicial,

do que é uma resposta ao réu, [...] a gente também tem uma deficiência em adequar a questão da

lei, de fazer a questão da redação da petição, né! Então essas são as nossas dificuldades devido

ao tempo que a gente tem no núcleo, que eu acredito que seja um tempo curto.

A3 – [...] no requisito de peças, tudo que era exigido, quais os procedimentos que deveriam ser

feitos, sim. [...]

A4 - As que foram atingidas, foi algumas peças que a gente concluiu e os professores seguiram,

realmente foram além, e outras que não foram. Eu esperava aprender mais, eu esperava que os

professores do estágio ensinassem outras coisas mais importantes que não foram citadas, acho

que se a gente tivesse mais tempo no estágio seria melhor, dava para aprender mais peças.

A5 - Pelas expectativas que já deixei expostos, é, posso afirmar, que todas elas foram atingidas,

dentro da limitação que tem o tempo do estágio.

76

A6 – [...] e aí poderíamos ver mais tipos de peças se tivesse mais tempo.

Entrevistadora: De acordo com as suas expectativas o quê, na sua opinião, poderia ser

melhorado no estágio supervisionado?

A1 - Eu acho que o estágio poderia começar em períodos mais cedo. Assim, a gente poderia

acompanhar os trabalhos realizados no núcleo, assim ele poderia fechar o ciclo da causa, como

atendimento, realização da peça e acompanhamento da causa. É muito pouco o tempo, poderia

ser mais e também a disciplina de prática da sala de aula poderia ser na mesma hora, quer dizer

no mesmo tempo que estávamos no estágio. Fonte: Elaboração própria.

No que se refere ao conteúdo relativo à categoria acima especificada, a abordagem desse tópico

foi feita a partir das unidades de registro e de contexto. Cada unidade de registro foi delimitada

pelas competências traçadas pelo Ministério da Educação e as respostas foram agrupadas, após

diversas leituras, de acordo com a identificação de características específicas que correspondem

a uma determinada competência que se reflete em atividades que se espera serem desenvolvidas

no estágio.

Nesse primeiro momento, a atividade específica é a redação de peças processuais. Tal

atividade foi citada quando da interpretação da primeira categoria, no que dizia respeito às

expectativas dos alunos ao ingressar no estágio. Verifica-se, pelo discurso dos alunos, que essa

seria uma das formas de associar-se a teoria à prática. A ansiedade dos alunos nesse ponto

retorna aos momentos históricos do ensino jurídico no Brasil, a luta constante em derrubar

barreiras, como o chamado ‘saber de erudição’, por um saber que tomasse por base o ‘Direito

achado na rua’, a realidade social (AGUIAR, 1994).

A conjugação da teoria e da prática, colocar o aluno em contato direto com a comunidade, nem

sempre foi um padrão adotado pelas Universidades. O modelo clássico era a existência de

muros entre a instituição de ensino e a prática jurídica (MORIN, 2000). Apesar de ser

considerado um modelo ultrapassado, essa ainda é a realidade em alguns aspectos do ensino

universitário. As grades curriculares do curso superior de Direito ainda trazem o estágio

supervisionado no final do curso, sendo tradicional que as grades curriculares apresentem no

início disciplinas eminentemente teóricas.

Vislumbra-se pela resposta dos alunos que o fato do estágio supervisionado ser ministrado

apenas no final do curso acaba por interferir no aprendizado, pois como relata o A1:

Não me sinto completamente preparado, queria mais aulas de prática, elas

foram essenciais para melhorar os meus conhecimentos, [...] nos métodos de

realização das peças, queria mais tempo no estágio.

77

Verifica-se que a competência a ser construída diz respeito ao domínio e compreensão de textos,

à adequada pesquisa e utilização da legislação, da jurisprudência, da doutrina e das outras fontes

do Direito. A redação adequada da peça processual diz respeito à atividade que é considerada

essencial à atividade forense de advocacia. Compreensível estar tal atividade no relato das

expectativas e a reclamação dos alunos em querer mais tempo para tal aprendizado.

A delimitação da peça faz com que o advogado traduza o direito perseguido pela parte, a

ausência de domínio sobre tal competência traz prejuízos muitas vezes irreparáveis às partes,

se autor, este deixa de buscar o que lhe é devido, se réu, torna-se prejudicado pela falha na

defesa, trazendo à parte uma condenação que pode ser injusta. Por isso, fácil constatar nas

entrevistas a apreensão e a ansiedade dos alunos em dominar tal habilidade.

O problema é que, os entrevistados, quando questionados sobre o domínio dessa competência,

as respostas foram quase que unânimes em trazer a limitação de tal aprendizagem, senão

vejamos:

A1 - Não me sinto completamente preparado,[...]

A2 - Bom, após a conclusão do meu estágio eu não me sinto totalmente

preparado, para acompanhar essa produção de peças processuais, [...]

A3 - Bom, é, tive um conhecimento, uma base, mas eu não me sinto

plenamente capacitada para fazer isso sem ser assistida, sem ser

supervisionada, [...]

A4 - Sinto em parte, algumas peças eu tenho mais técnica, só que outras eu

ainda sinto dificuldade.

A5 – [...] inevitavelmente há situações que você não se sente preparado por

não ter vivenciado aquilo no estágio.

A6 – [...] hoje não me sinto totalmente preparado para produzir peças,

acho que o estágio deixa a desejar, porque o tempo é muito limitado, a gente

vê poucos tipos de ação.

O domínio de tal habilidade verifica-se inexistente ao final do estágio supervisionado. Para

alguns a argumentação é o pouco tempo do estágio supervisionado; para outros, a enorme

diversidade de situações que se apresentam no campo do Direito. Frise-se que, conforme a

publicação da Lei 8906/94, lei federal que cria o atual Estatuto da Ordem dos Advogados do

Brasil, é necessário, para o atual exercício da advocacia, a aprovação no exame de ordem, prova

de seleção que deve ser realizado pelos graduandos em Direito, que tenham interesse para

exercer tal profissão. Ocorre que, o próprio estatuto anuncia a publicação de provimentos que

delimitem os parâmetros de tal prova, e passa a ser realizado em todo o Brasil, a partir de 1996,

78

um exame de ordem composto por duas fases, cuja segunda fase, traz como questão a produção

de uma peça processual (BRASIL, 1994).

O legislador vai além, determina a produção de uma petição para o ingresso na Ordem dos

Advogados do Brasil e ainda expressa no artigo 34, inciso XXIV, que se configura infração

disciplinar: “incidir em erros reiterados que evidenciem inépcia profissional”. A penalidade

para a citada infração é a suspensão por prazo indeterminado, só podendo o advogado retornar

às suas atividades após submeter-se novamente à aprovação no exame da Ordem.

Ocorre que, para a produção de tal peça, é imprescindível o aprendizado prático adquirido no

base construída no estágio supervisionado. Entender o que utilizar, qual tipo de ação, quais

argumentos, saber o que ler, os documentos jurídicos necessários, a pesquisa adequada, a

correta utilização da legislação, da jurisprudência e demais fontes do Direito, além da correta

utilização dos termos jurídicos, e a interpretação da norma, são essenciais para a construção da

peça.

Um ponto importante de frisarmos é algo que nos traz o A2 quando se posiciona:

Bom, a gente tem no núcleo uma visão geral do que é uma peça, do que é a

petição inicial, do que é uma resposta ao réu, [...] a gente também tem uma

deficiência em adequar a questão da lei, de fazer a questão da redação da

petição, né, então essas são as nossas dificuldades [...]

Saber o que ler, os documentos necessários, a correta utilização da legislação e demais fontes

do Direito, isso é imprescindível na construção da peça processual, e, para tanto, na vida prática

e até mesmo no exame de ordem, acima indicado para ingresso na carreira da advocacia, o aluno

tem acesso a toda legislação necessária para a correta produção da peça. Muitas vezes, verifica-

se que o aluno tem a resposta na sua frente e não sabe identificá-la. Não saber adequar o caso,

“a questão da lei”(A2), é algo preocupante, que novamente esbarra com os paradigmas

discutidos, onde dois planos distintos de aprendizado são construídos na aprendizagem

(BEHRENS, 2005).

Não existe a legislação e o caso real, de formas distintas. A legislação é criada de acordo com

os casos reais. É a partir da realidade social que o legislador surge, como forma de resposta à

convivência humana, de harmonia e pacificação dos conflitos (CINTRA; DINAMARCO;

GRINOVER, 2014). Verifica-se que muitas vezes o aluno não sabe buscar na legislação, não

79

sabe manusear os diversos códigos, não tem noção do ordenamento jurídico, e essa dificuldade

reflete-se na produção da peça processual.

Um ponto importante foi identificar nas respostas dos entrevistados a sensação de necessidade

e intenção do aluno de mais tempo no estágio. Vários poderiam ter sido os aspectos

demonstrados pelos alunos, como falhas para tal habilidade não ter sido apreendida, tais como

a possível falta de preparo dos professores, a eventual falta de estrutura dos núcleos de práticas,

a repetição dos assuntos tratados nos atendimentos, mas não, o principal fator segundo os

próprios entrevistados, foi o “tempo limitado”.

Entrevistadora - Após a conclusão do estágio supervisionado você se sente

preparado para a realização da atividade de advocacia, no que diz respeito à

adequada atuação técnica jurídica, quanto à produção de peças processuais?

A1 – [...], queria mais tempo no estágio.

A3 – [...]Foi bem sucedido o estágio, mas ele deixou a desejar no quesito

tempo, né? Durabilidade. Foi muito pequeno o espaço de tempo.

A6 – [...], acho que o estágio deixa a desejar, porque o tempo é muito limitado,

a gente vê poucos tipos de ação.

Entrevistadora - Entre as suas expectativas quais foram plenamente atingidas

e quais não foram?

A2 – [...], então essas são as nossas dificuldades devido ao tempo que a gente

tem no núcleo, que eu acredito que seja um tempo curto.

A4 – [...], acho que se a gente tivesse mais tempo no estágio seria melhor,

dava para aprender mais peças.

A5 – [...], dentro da limitação que tem o tempo do estágio.

A6 – [...] e aí poderíamos ver mais tipos de peças se tivesse mais tempo.

Tal posicionamento demonstra-se realmente surpreendente, pois a solução que os entrevistados

apresentam para uma aprendizagem adequada, no que diz respeito ao conhecimento para a

produção de peças processuais é algo que demanda um esforço maior do próprio aluno. O que

eles reivindicam é passar mais tempo no estágio, é sacrificar-se pelo aprendizado tentando

permanecer no ambiente acadêmico. Não se queixam da uniformidade nos atendimento, mas

demonstram interesse em ficar mais tempo nos núcleos em busca de aprendizado.

Saber redigir a peça processual, em qualquer instância e grau de julgamento é primordial para

a atuação do profissional de advocacia. A redação equivocada das petições pode trazer prejuízo

às partes e ao próprio judiciário, pois, acaba tumultuando o feito e contribuindo para a

80

morosidade no andamento processual, assoberbando os tribunais cada vez mais e fazendo com

que os magistrados apenas percam tempo no julgamento de requerimentos equivocados

(CALMON, 2004).

Percebe-se ainda pelos relatos dos entrevistados, que a redação da peça processual realizada

nos núcleos é aquela direcionada à propositura da ação, ou seja, ficam muitas vezes restritos à

produção apenas da petição inicial.

A2 – [...] Também ficou só na petição inicial, não vi contestação, recurso [...].

A4 – [...] Até porque lá no núcleo a gente via mais a peça que abre o processo

e as outras, né, quase nada.

A5 – [...] A fase recursal, por exemplo, não tivemos contato no estágio, essas

peças eu não tenho segurança [...].

A6 – [...] A gente também não tem muita oportunidade de pegar processo para

ver outras peças.

Como a presente pesquisa encontra-se voltada apenas ao estágio supervisionado na área cível,

buscou-se dos alunos, nessa unidade de registro, a construção de peças processuais, que nesse

ramo do Direito são inúmeras. Desde a petição inicial, peça inaugural que serve para a

propositura da ação, passando pela contestação, defesa do réu, pelas peças que constituem os

autos, que podem ser denominadas de petições de andamento do feito e chegando finalmente

às peças recursais.

É possível verificar que os alunos, ao serem colocados em contato com a comunidade, realizam

o atendimento inicial dos clientes, ponto este que será discutido na próxima unidade de

contexto, em tal atendimento a parte fornece-lhe dados para a confecção da petição inicial ou

da contestação, primeira peça do réu nos autos. Todavia, pelo que foi relatado, o estágio

supervisionado acaba não proporcionando ao aluno a oportunidade de acompanhar o processo

até o final ou mesmo na fase recursal.

Pelo que parece, voltamos ao fator “tempo limitado de estágio”, que impossibilita o aluno de

produzir os diversos tipos de peças processuais. Entende-se que, se ao aluno fosse possibilitado

o estágio em um lapso temporal maior, lhe seria dada a oportunidade de acompanhar o processo

com a construção de peças tais como uma réplica, ou alegações finais e os recursos. Traduz-se

dessa forma, uma lacuna significativa aos graduandos, já que tais peças possuem requisitos

próprios, conforme descritos no Código de Processo Civil vigente, lei 5.869/1973.

81

Muitas vezes, tais requisitos são de difícil compreensão, identificar os pontos importantes das

decisões que devem ser questionados, não é tarefa fácil. Preocupante a identificação dessa

realidade nas entrevistas, pois as peças descritas encontram-se presentes tanto no cotidiano do

profissional de advocacia, como fazem parte do contexto de a ser cobrado nas questões do

exame de ingresso na Ordem dos Advogados do Brasil, mostrando-se falho o exercício de tal

profissão sem o domínio dessa atividade.

O interesse dos entrevistados reflete mais uma vez a busca pelo conhecimento prático

simultâneo ao teórico, que torna convidativo o ensino, já que a teoria sem direcionar-se a

planejamentos, com o objetivo, simplesmente de agregar informações ao sujeito, sendo apenas

memorizadas e avaliadas, perde-se na memória. O foco em uma aprendizagem mais precisa, a

qual tende a ser útil, que normalmente é representada pelas experiências de formação

profissional, cuja funcionalidade é a meta, mostra-se mais interessante aos alunos

(SACRISTÁN, 2011).

O objetivo é trazer o conhecimento ao mundo real, à sociedade de fato, em toda a sua dinâmica,

direcionando essas habilidades, tornando-as funcionais. De nada adianta a construção do

conhecimento, se não é possível ao aluno conjugar o dito saber teórico às atividades práticas

que devem estar presentes no cotidiano do mercado de trabalho.

Frise-se ainda que, o interesse dos alunos em tal aprendizado traduz-se também nas sugestões

de melhoria do citado ambiente acadêmico. Conhecer toda a fase processual, iniciar e terminar

o processo, com a redação das peças processuais, parece-nos, pela reflexão das respostas

primordial para o aprendizado dos entrevistados, que sugerem inclusive a antecipação do início

das atividades práticas. Uma sugestão possivelmente coerente é trazida pelo A1, quando diz:

Eu acho que o estágio poderia começar em períodos mais cedo, assim a gente

poderia acompanhar os trabalhos realizados no núcleo, assim ele poderia

fechar o ciclo da causa, como atendimento, realização da peça e

acompanhamento da causa. É muito pouco o tempo, poderia ser mais e

também a disciplina de prática da sala de aula poderia ser na mesma hora, quer

dizer, no mesmo tempo que estávamos no estágio.

O posicionamento do aluno entrevistado ratifica o que se apurou por saturação, a vontade, o

interesse, a busca dos alunos pelo conhecimento prático, sugerindo o empenho em participar de

mais atividades práticas, inclusive com a realização de atividades simultâneas, com o núcleo de

práticas atendendo a comunidade em casos reais e na sala de aula com a disciplina de prática,

na qual é possível vislumbrar-se as atividades simuladas.

82

Figura 7 – Unidade de registro – Da redação das peças processuais

Fonte: Elaboração própria.

A figura acima demonstra as percepções que foram identificadas na análise das entrevistas

descritas.

4.3.2 Subcategoria – Da relação com os clientes

Com a descrição contida no quadro 10, buscou-se demonstrar a transcrição de trechos das

entrevistas realizadas com os alunos selecionados, que continham dados importantes e

significativos à presente pesquisa.

Categoria II -competências

alcançadas segundo a percepção dos alunos

Subcategoria -Competências MEC

Unidade de Contexto - Redação de peças

processuais

83

Quadro 10 – Da relação com os clientes C

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UNIDADES DE CONTEXTO

Entrevistadora: E no que diz respeito às demais atividades desenvolvidas por

este profissional, como o atendimento do cliente e o acompanhamento deste em

audiências?

A1 - Ó, vê, referente ao atendimento, fui orientado pelos professores como que

devia agir, lidar com os clientes.[...]

A2 - Eu acredito no seguinte, que lá no estágio a gente não acompanha os clientes

que aparecem no núcleo do inicio da petição inicial até o final. Não me sinto

seguro para fazer as perguntas ao cliente, e atender bem o cliente. Mas o

acompanhamento acontece assim geralmente a gente faz uma peça, e aí quem

acompanha são os profissionais ou outros estagiários, então a gente não

acompanha o cliente do inicio ao fim,[...]

A3 - Bem como a segunda pergunta, lá tivemos uma base de como isso deve ser

feito, como encaminhar o atendimento, [...], colocar a teoria em prática, só não me

sinto, é, plenamente capacitada para fazer isso ainda sem uma supervisão, ainda

acho que o requisito que fica a desejar é em questão de, teria que ter tido mais

cadeiras de estágio, para ficar plenamente capacitada para desenvolver isso.

A4 - Não tanto, geralmente quando a gente ia atender no estágio, era muito o

professor que fazia as perguntas, porque agente não sabe o que perguntar e quais

os elementos principais no início. É difícil professora, saber qual é a ação, são

muitos tipos, apesar do que, depois ficou mais repetitivo, era muito assunto só de

família, aí quando era isso agente sabia o que perguntar para saber, para fazer a

peça.[...]

A5 - Já referente ao atendimento ao cliente eu considero que me senti bastante

preparado, para o contato inicial, [...]

A6 - Bem, eu me sinto seguro para conversar com o cliente, quebrar a barreira

inicial, sabe como é né professora, às vezes eles chegam lá com vergonha e não

conseguem falar direito sobre o assunto, mas ainda não sei fazer muito bem as

perguntas da ação, [...].

Entrevistadora: Entre as suas expectativas quais foram plenamente atingidas e

quais não foram?

A1 – [...] de forma limitada, e atender o cliente, A2 – [...] de como atender o cliente, isso eu sei fazer, então agente tem essa noção,

só que assim, o tempo é pouco [...].

A3 - Bom, no atendimento ao cliente, sim, os procedimentos de atendimento, [...].

A6 - Pela minha opinião o desenvolvimento não foi totalmente satisfatório, porque

às vezes tinha muita gente para atender um único cliente [...].

Fonte: Elaboração própria

Da rica entrevista com os alunos, foi possível apreender dos conteúdos selecionados e elencados

na coluna 3, do quadro acima, que quanto aos aspectos que se traduzem na relação deste com o

cliente, o estágio exerce um papel importante. Para o aluno, significa o primeiro contato com a

realidade social, ouvir, interpretar, entender, tudo que a parte lhes traz de informações.

84

O código de ética e disciplina da advocacia, criado a partir do que determina o parágrafo único,

do artigo 33, da lei 8.906/94, qual seja, “ Parágrafo único. O Código de Ética e Disciplina

regula os deveres do advogado para com a comunidade, o cliente, o outro profissional e, ainda,

a publicidade, a recusa do patrocínio, o dever de assistência jurídica, o dever geral de

urbanidade e os respectivos procedimentos disciplinares.”, dividido em 66 artigos, dedica um

capítulo inteiro às relações que o advogado deve ter com o cliente. Ali são tratados assuntos

que vão desde simples aspectos técnicos de atendimento ao cliente, até mesmo ao

comportamento do advogado perante as relações estabelecidas com tal cidadão.

Inicia o código de ética em seu capítulo II, intitulado: DAS RELAÇÕES COM O CLIENTE,

com o artigo 8º., que traz a seguinte redação: “o advogado deve informar o cliente, de forma

clara e inequívoca, quanto a eventuais riscos de sua pretensão, e das consequências que

poderão advir da demanda”. A esse, seguem-se mais dezesseis artigos que descrevem aspectos

dessa relação que o advogado deve manter com as partes.

Depreende-se das entrevistas que o contato do aluno com o cliente é muito pequeno,

normalmente assistido pelo professor, ou realizado pelo próprio docente, e o aluno fica como

mero expectador. É comum que os professores reproduzam as metodologias que vivenciaram

no seu processo educativo, paradigmas conservadores que trazem ao aluno essa dependência

do docente, eles não são moldados com base na autonomia, na reflexão autônoma do raciocínio

jurídico, sentem-se ligados e mais que isso, subordinados ao professor, muitas vezes não se

sentindo seguros para desenvolver a atividade sem o acompanhamento destes (BEHRENS,

2005).

Sendo assim, pode-se concluir não ser o suficiente para estabelecer um vínculo de confiança

entre o aluno e a parte, ou mesmo prepará-lo, para o atendimento adequado, conseguindo

identificar do discurso do cliente o que seria necessário e importante para a propositura das

ações.

A2 - Eu acredito no seguinte, que lá no estágio a gente não acompanha os

clientes que aparecem no núcleo do inicio da petição inicial até o final. Não me sinto seguro para fazer as perguntas ao cliente, e atender bem o

cliente. Mas o acompanhamento acontece assim: geralmente, a gente faz uma

peça, e aí quem acompanha são os profissionais ou outros estagiários, então a

gente não acompanha o cliente do inicio ao fim,[...]

A3 - Bem como a segunda pergunta, lá tivemos uma base de como isso deve

ser feito, como encaminhar o atendimento, [...], colocar a teoria em prática, só

85

não me sinto, é, plenamente capacitada para fazer isso ainda sem uma

supervisão, [...].

A4 - Não tanto. Geralmente, quando a gente ia atender no estágio, era muito

o professor que fazia as perguntas, porque a gente não sabe o que perguntar

e quais os elementos principais no início. É difícil professora, saber qual é a

ação, são muitos tipos, apesar do que, depois ficou mais repetitivo, era muito

assunto só de família, aí quando era isso a gente sabia o que perguntar para

saber, para fazer a peça.[...]

Depreende-se do conteúdo da entrevista que o aluno termina o estágio e não demonstra total

segurança em atender o cliente, em fazer as perguntas iniciais, em adequar seu conhecimento

teórico à utilização prática do raciocínio jurídico, à argumentação e à reflexão crítica. Tal

competência, descrita na resolução anteriormente indicada, é uma exigência técnica

imprescindível ao profissional de advocacia. Imaginemos alguém cheio de informações, e em

contrapartida, outrem sem conseguir identificar, codificar, interpretar os referidos dados.

Um exemplo constante é na ação de alimentos, assunto de família, corriqueiro nos núcleos de

práticas jurídicas, quando o aluno se depara com o atendimento, é necessário que tenha o

raciocínio jurídico de interpretar seu conhecimento teórico, de saber que nesses casos as

informações essenciais estão voltadas à comprovação de necessidade e possibilidade. Sendo

assim, desnecessário o conhecimento de aspectos que nada se relacionam com tais parâmetros

e imprescindível a formulação de perguntas que colham referidas informações.

Há, no entanto, de constatar-se que: as perguntas adequadas a serem feitas ao cliente,

configuram apenas um ponto a ser abordado no que diz respeito às relações com o cliente, a

maneira de agir, como persuadir, como conciliar, como argumentar, também são necessários

para entender que tipo de ação deve ser proposta. A habilidade técnica a ser construída, no que

diz respeito ao relacionamento com as partes, percebe-se pelas entrevistas que, ao contrário dos

relatos a respeito da redação das peças processuais, houve significativa evolução no que diz

respeito ao atendimento dessas expectativas.

A1 - Ó, vê, referente ao atendimento, fui orientado pelos professores como

que devia agir, lidar com os clientes.[...]

A2 – [...] de como atender o cliente, isso eu sei fazer, então a gente tem essa

noção, só que assim, o tempo é pouco [...].

A3 - Bom, no atendimento ao cliente, sim, os procedimentos de

atendimento, [...].

A5 - Já referente ao atendimento ao cliente eu considero que me senti

bastante preparado, para o contato inicial, [...]

86

A6 - Bem, eu me sinto seguro para conversar com o cliente, quebrar a

barreira inicial, sabe como é, né professora, às vezes eles chegam lá com

vergonha e não conseguem falar direito sobre o assunto, mas ainda não sei

fazer muito bem as perguntas da ação, [...]

Percebe-se que as expectativas para saber como agir com os clientes, de acordo com o conteúdo

das entrevistas, para os alunos, foram encaradas de forma positiva. Ter a sensibilidade de

atender as pessoas que se dirigem aos núcleos de práticas jurídicas é também essencial ao

desenvolvimento de um profissional sério, íntegro, características que ultrapassam os limites

meramente técnicos do aprendizado.

Desta forma, aspectos construtivos da referida habilidade são identificados, todavia ainda não

foi plenamente atingida, e mais uma vez apontaram o tempo limitado, como principal motivo

para a lacuna nessa aprendizagem. A novidade nesse momento, é que ao contrário da redação

de peças processuais, quando foram quase que unânimes em apontar apenas o elemento tempo,

neste ponto, também outros aspectos foram apontados pelos alunos, tais como a quantidade de

alunos para o atendimento de um único cliente, o acompanhamento do processo exclusivamente

pelo professor, o próprio posicionamento do professor em fazer as perguntas iniciais, deixando-

os muitas vezes como meros expectadores, refletindo assim antigos paradigmas, que já não se

encaixam na realidade atual (BEHRENS, 2005).

A2 - Eu acredito no seguinte, que lá no estágio a gente não acompanha os

clientes que aparecem no núcleo do inicio da petição inicial até o final.[...]

A4 - Não tanto, geralmente quando a gente ia atender no estágio, era muito o

professor que fazia as perguntas,[...]

A6 - Pela minha opinião o desenvolvimento não foi totalmente satisfatório,

porque às vezes tinha muita gente para atender um único cliente [...].

Inicialmente, dentre os assuntos abordados, uma reflexão que deve ser feita é que quando nos

referimos ao corpo docente do estágio, questiona-se como é a preparação destes professores,

para o ingresso, para a orientação que é realizada nos núcleos de práticas? Deverão preocupar-

se apenas com os aspectos técnicos do processo? E quanto à aprendizagem, à construção do

conhecimento, como deve ser a abordagem? O que se constata é que não há nos cursos de

Direito, ou mesmo no curso específico de pedagogia, uma preparação, uma formação, que tenha

por finalidade preparar o docente para o ingresso nos núcleos práticos, direcionando suas

atividades ao estágio supervisionado (PICONEZ, 2007).

87

Poderíamos então adotar a divisão de Canotilho (2003), quando especifica duas orientações

fundamentais, encontradas nos cursos jurídicos, a orientação profissional e a orientação

acadêmica, para entender que o corpo docente dos núcleos de práticas deve ser preparado sob

a égide da orientação profissional? Não há resposta ainda para tal questionamento, apenas

discussões sobre o tema.

Outro ponto a ser destacado é a quantidade de atendimentos. Se poucos atendimentos se

deparam os alunos com a situação descrita, muitos alunos para acompanharem um único cliente,

na expectativa de obterem aprendizado, se por outro lado, os núcleos de práticas autorizarem

muitos atendimentos, o objetivo principal do aprendizado é alcançado, ou se transformam em

algum tipo de defensoria pública?

Há que se levar em consideração que a expectativa inicial em síntese é o aprendizado, trazendo

os conhecimentos teóricos à realidade prática, um momento em que o aluno se depara com o

mundo real, através do contato com a comunidade. Uma parte carente da população que não

tem condições de acesso à justiça, pagando taxas e honorários advocatícios, um percentual da

sociedade que muitas vezes encontra-se esquecido por todos. O contato inicial com tais pessoas

é uma experiência única, tanto para a construção do conhecimento, quanto para a maturidade

pessoal, do aluno.

Importante ainda destacar que a partir do momento que o Estado toma para si o poder/função

de jurisdição, ou seja, de resolução dos conflitos, devendo manter a paz social, fica obrigado à

prestação de tal serviço. O problema é que ao longo dos anos, o acesso ao judiciário apresenta

entraves, dentre eles a dificuldade econômica, já que o acesso à justiça torna-se extremamente

oneroso. É necessária uma alteração na legislação e aí surgem soluções que apresentam como

proposta a isenção das despesas processuais aqueles declarados pobres na forma da lei e os

núcleos surgem, como uma forma de acesso à justiça ofertando tal isenção (CINTRA;

DINAMARCO; GRINOVER, 2014).

O problema é que não se pode transformar tais núcleos em substitutos à defensoria pública, pois

aí teríamos alunos dedicados à produtividade e não ao aprendizado. É possível dizer que a

quantidade certa de clientes é imprescindível à construção adequada do conhecimento. Apesar

do relevante valor social que deve ser atribuído ao núcleo, o objetivo central de aprendizado

deve ser respeitado.

88

E finalmente quanto ao aspecto do tempo como limitador do aprendizado, segundo os alunos

entrevistados, depreende-se novamente o posicionamento destes em querer mais tempo

dedicado ao estágio. Seja iniciando-se mais cedo na grade curricular, seja no comparecimento

ao núcleo em mais dias por semana, já que atualmente a carga horária obrigatória é de apenas

três horas semanais.

O posicionamento dos alunos neste ponto nos parece um convite à implantação de novos

paradigmas no ensino jurídico, a inquietação, a revolução na informação e a exigência na

produção do conhecimento. A realidade do mercado de trabalho é a busca cada vez maior de

profissionais que tenham capacidade de tomar decisões, que sejam autônomos, que produzam

com iniciativa própria, que saibam trabalhar em grupo, que partilhem suas conquistas e que

estejam em constante formação.

Figura 8 – Da relação com os clientes

Fonte: Elaboração própria.

Percebe-se pela figura acima a atividade que foi identificada na análise dos trechos das

entrevistas realizado nesta subcategoria.

4.3.3 Subcategoria – Assistência e atuação em audiências e sessões

No quadro 11, o objetivo foi demonstrar, no que diz respeito às atividades desenvolvidas quanto à

atuação do aluno em audiências e sessões, como foi percebida pelo aluno a construção de tal

conhecimento, identificando-se esta última subcategoria.

Categoria II -competências

alcançadas segundo a percepção dos alunos

Subcategoria -Competências MEC

Unidade de Contexto - Relação com os

clientes

89

Quadro 11 – Assistência e atuação em audiências e sessões C

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sões

UNIDADES DE CONTEXTO

Entrevistadora: E no que diz respeito às demais atividades desenvolvidas por

este profissional, como o atendimento do cliente, o acompanhamento deste em

audiências?

A1 – [...] Já quanto às audiências, nunca acompanhei nenhuma, uma falha,

pois não temos retorno do trabalho que fazemos.

A2 – [...] Achei ruim também porque não participei de audiências.

A4 – [...] Agora para audiência, isso aí era mais dificuldade do que redigir a

peça, porque só fui em duas e nem sabia o que tava acontecendo.

A5 – [...] já quanto ao acompanhamento em audiências, isso deixou a desejar.

A6 – [...], mas não participei de muitas audiências, por isso, em parte, isso é

relativo, acho que é limitado o tempo para essas atividades também.

Entrevistadora: Entre as suas expectativas quais foram plenamente atingidas

e quais não foram?

A1 – [...] mas achei ruim não ter acompanhado as audiências.

A3 – [...] Mas, como na pergunta anterior no acompanhamento de um cliente

em uma audiência, eu não tive nenhuma oportunidade de ver isso na prática,

de colocar em prática, então as expectativas foram atingidas, mas, é, não

plenamente, elas ficaram a desejar.

Entrevistadora: De acordo com as suas expectativas o quê, na sua opinião,

poderia ser melhorado no estágio supervisionado?

A2 - Bom, uma das coisas que eu acho que deve ser melhorada é a questão do

tempo, eu acho que também nós temos uma disciplina que se chama prática em

sala de aula, e aí, eu acredito que essa disciplina deve ser concomitante, com o

núcleo, [...]e que tenha mais tempo pra que a gente possa saber redigir uma

peça, saber os artigos adequados, acompanhar o cliente até o fórum numa

audiência, e saber como se portar diante de um juiz, que hj a gente tem essa

deficiência.

A4 - Eu acho que poderia ser melhorado o fato de aumentar a quantidade do

estágio, que eu acho que uma vez por semana, em um horário só, é muito

pouco, a carga horária é muito pequena, precisaria de mais tempo no estágio,

e ter mais de um dia de estágio, podia até dividir um dia a gente ficava no

núcleo e no outro a gente ia para o fórum ficar nas audiências.

Fonte: Elaboração própria.

Nessa unidade de registro, chama atenção a uniformidade do discurso. Percebe-se pelo

conteúdo das entrevistas, que quanto ao comparecimento e acompanhamento das audiências e

sessões o estágio parece apresentar lacunas. É relatado pelos alunos que não só não participaram

desses eventos, como também não tiveram a atenção necessária para o desenvolvimento de

forma segura dessa habilidade, que se direciona ao acompanhamento e assistência a serem

proporcionados pelo advogado nas audiências e sessões.

90

A1 – [...] Já quanto às audiências, nunca acompanhei nenhuma, uma falha,

pois não temos retorno do trabalho que fazemos.

A2 – [...] Achei ruim também porque não participei de audiências.

A4 – [...] Agora para audiência, isso aí era mais dificuldade do que redigir a

peça, porque só fui em duas e nem sabia o que tava acontecendo.

A5 – [...] já quanto ao acompanhamento em audiências, isso deixou a desejar.

A6 – [...], mas não participei de muitas audiências, por isso, em parte, isso

é relativo, acho que é limitado o tempo para essas atividades também.

As audiências, segundo a legislação civil vigente, são realizadas em fases processuais que

possibilitem acordos, produção de provas, ouvida das partes, esclarecimentos, justificativas,

enfim atos regidos principalmente pela oralidade. O aluno não vai encontrar nos códigos um

manual prático sobre a conduta nas audiências e sessões, no máximo podem ser vislumbrados

os requisitos básicos, de referido ato processual (CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL, lei

5869/73).

A riqueza de detalhes e atos que ocorrem nas audiências e sessões se traduz em aprendizado ao

aluno, o que acontece de forma adequada quando este se encontra assistido pelo docente, o que

reflete ainda a presença dos paradigmas conservadores, do aluno que não sabe agir de maneira

autônoma (BEHRENS, 1999). Estar presente como simples telespectador muitas vezes causa

dispersão e o ambiente torna-se enfadonho: “A4 – [...] Agora para audiência, [...] só fui em duas

e nem sabia o que tava acontecendo”. Momentos únicos ocorrem durante sessões de julgamento,

durante fases instrutórias, quando o magistrado busca a produção de provas, escuta as

testemunhas, colhe o depoimento das partes, recebe as alegações finais, ouve-se a sustentação

oral, momentos que tornam o ensino único, singularizado.

Durante as audiências, o advogado tem que saber quais perguntas deverá fazer às testemunhas,

às partes, aos informantes, enfim, naquele instante serão colhidas provas que muitas vezes são

responsáveis pela decisão do magistrado. Fazer os questionamentos errados ou deixar de fazer

perguntas importantes pode trazer prejuízos irreparáveis às partes. Além disso, existem também

alguns recursos que podem ser interpostos durante a audiência, requerimentos que podem ser

realizados e alegações que devem ser feitas e ao que se depreende das entrevistas, pouco, ou

quase nada disso foi assimilado pelos alunos entrevistados.

Vislumbra-se que alguns deles sequer compareceram às audiências. E quando questionados a

respeito de sugestões de melhorias, tornou-se perceptível a ansiedade no discurso deles para

91

maior tempo de aprendizagem nos núcleos de práticas, afim de que lhes fosse possibilitado

também o acompanhamento de forma a trazer uma melhor assistência do aluno no

comparecimento às audiências e sessões.

Senão por que tanta luta para a reforma do ensino superior, daquele encontrado nas

universidades, da tentativa de entender que a educação é uma das principais forças que trazem

inovação na sociedade? A busca por um profissional apto a atender de forma adequada a

comunidade, a reflexão das teorias em uma realidade prática, no contato do aluno com as

pessoas, com problemas reais, na procura de soluções justas (ALMEIDA, SOUZA e

CAMARGO, citados em GHIRARDI e FEFERBAUM, 2013), parece-nos pelo conteúdo das

entrevistas o objetivo central no caminho a ser percorrido por esses alunos, cabendo à

instituição de ensino proporcionar-lhes a oportunidade de assim caminhar.

Parece ser esse o contexto abordado pelo teor das entrevistas, a vontade de mudança. O papel

da educação na vida do homem deve ser repensado, os paradigmas mudaram. A visão

conservadora de limitar-se a simples reprodução do conhecimento, não tem se mostrado

suficiente, é necessário que o aluno consiga tomar decisões, agir de forma autônoma, reflexiva

e crítica. Imprescindível uma visão com base no enfoque holístico da situação (BEHRENS,

2005).

Percebe-se do relato dos alunos a importância dos diálogos, que devem ser restabelecidos entre

as disciplinas, vislumbrando-se um modo menos fragmentado de se ver o mundo. Busca-se

agora uma visão de totalidade, de conexão, de interdependência, e ao que parece o momento

das audiências reflete tudo isso, o Direito como um todo, pois é um ato processual que reúne o

direito material, o direito processual a atuação do advogado, a presença dos princípios, as regras

do procedimento, enfim o conhecimento produz-se como um todo.

Outro ponto que merece ser abordado do teor das entrevistas é que o aluno sente a necessidade

de ter disciplinas práticas também em sala de aula, o que na opinião de alguns deles facilitaria

a associação da teoria com a atividade forense.

A1 – [...] e também a disciplina de prática da sala de aula poderia ser na mesma

hora, quer dizer no mesmo tempo que estávamos no estágio.

A2 – [...] eu acho que também nós temos uma disciplina que se chama prática

em sala de aula, e aí, eu acredito que essa disciplina deve ser concomitante,

com o núcleo [...].

92

Novamente a busca de algo completo, sem fragmentação, sem partículas ou divisões, entender

a construção do conhecimento de forma interdisciplinar, com a aplicação do paradigma

holístico, ou também conhecido como emergente, que toma por base a ideia de sistema, de

produção de conhecimento, de interconexão, de trabalho coletivo. Esse perfil do aluno, que

quer mais, que critica, que mantém uma abordagem progressista, que pesquisa, que se inquieta,

enfim o aluno que não se contenta em simplesmente reproduzir e por isso reclama a melhoria

do curso (BEHRENS, 2005).

Importante, todavia, frisar-se que apesar de ser possível detectar nos alunos entrevistados esse

perfil emergente, quando querem melhorias, quando buscam o aprendizado pautado no todo,

em outros momentos, os paradigmas conservadores ainda se encontram presentes, de forma

muito concreta.

Figura 9 – Assistência e atuação em audiências e sessões

Fonte: Elaboração própria.

A figura acima demonstra a unidade de contexto que foi possível perceber nas entrevistas

transcritas, sendo analisada a percepção de ditas competências na busca de resposta à

problemática sugerida no presente estudo.

Categoria II -competências

alcançadas segundo a percepção dos alunos

Subcategoria -Competências MEC

Unidade de Contexto - Assistência e

atuação em audiências e sessões

93

5 CONCLUSÕES E SUGESTÕES

No presente capítulo são apresentadas as conclusões a que chegamos com o presente estudo, as

sugestões e as recomendações para a instituição de ensino pesquisada.

5.1 Conclusões

Nesta seção são apresentadas as conclusões do estudo, relacionando os dados analisados com

os objetivos do estudo, bem como os confrontando com o referencial teórico adotado nesta

dissertação, visando apresentar de que maneira o atual modelo do estágio prepara o aluno para

o exercício da advocacia, no que diz respeito à adequada atuação técnico-jurídica, conforme

competências traçadas pelo Ministério da Educação.

Antes mesmo de descrever as conclusões da pesquisa, vale salientar que a base para construção

desta dissertação surgiu da inquietação quanto à aprendizagem oferecida pelos núcleos de

práticas jurídicas, tendo em vista a aplicação dos novos paradigmas da educação, que tratam a

produção do conhecimento como um todo, uma forma de associar teoria e prática, em confronto

com os paradigmas conservadores, ainda tão presentes nos cursos de Direito. Além disso, a

preocupação com o perfil do profissional de advocacia que ingressa no mercado de trabalho,

cada vez mais exigente, mais concorrido e mais competitivo.

Durante o período de dez anos dedicados ao ensino nos núcleos de práticas jurídicas foi possível

presenciar a busca desses jovens pela aplicação do conhecimento teórico às atividades práticas,

pela vivência forense, pelo contato com a realidade social. Presenciar a ansiedade, o

nervosismo, o encanto demonstrado pelos alunos no atendimento à comunidade.

Para responder à problemática sugerida na presente pesquisa, foram traçados objetivos. O

primeiro deles foi identificar quais competências o Ministério da Educação, através da

Resolução n.09/04, traçou para serem desenvolvidas ao longo da graduação no curso de Direito.

Tal objetivo foi delineado no presente trabalho pelo estudo bibliográfico, descrevendo-se desde

a implantação dos cursos jurídicos no Brasil, com as discussões geradas pela inovação nos

paradigmas até a implantação do estágio supervisionado, como forma de tentar trazer ao aluno

o aprendizado prático.

Após essa fase inicial, buscou-se com essa pesquisa, identificar as expectativas dos alunos

ingressantes no estágio supervisionado, acerca das competências que esperavam formar para a

94

prática profissional da advocacia. Para tanto foi aplicado um questionário inicial e após foram

feitas entrevistas com os alunos que apresentavam o perfil adequado.

Entre os alunos entrevistados, foi possível perceber que o ingresso no estágio supervisionado

para eles era algo muito esperado durante o curso de Direito. Conseguir associar a teoria às

atividades práticas, pareceu para eles, algo de suma importância. Esperavam ansiosamente

participar de atividades práticas, dentre as quais três foram citadas por todos os entrevistados,

a redação de peças processuais e profissionais, a assistência e atuação em audiências e o

atendimento ao cliente, com o seu adequado acompanhamento.

E finalmente, como último objetivo traçado, foi realizada na pesquisa a análise de conteúdo

para entender-se sobre o alcance dessas expectativas, na percepção dos alunos entrevistados,

no momento de conclusão do estágio. Foi possível avaliar que tais expectativas foram

parcialmente atingidas, pois o estágio deixou lacunas, algo que ainda pode ser preenchido, eles

queriam mais e para isso fizeram sugestões, a fim de promover melhorias nessa fase do

aprendizado.

Vislumbra-se do estudo realizado, a presença ainda muito marcante dos paradigmas

conservadores. Os alunos não demonstraram em alguns pontos, autonomia na construção do

conhecimento, a necessidade do acompanhamento do professor, de forma integral em todas as

atividades, percebendo-se inclusive a maior deficiência de aprendizado no que diz respeito ao

procedimento do aluno quando da atuação em audiências, momento que indicaram a ausência

do docente.

Por outro lado, em alguns pontos, percebe-se a influência dos paradigmas inovadores, quando

da conscientização demonstrada pelos alunos na busca do aprendizado, em querer redigir peças

processuais de forma adequada, no interesse em saber o que perguntar ao cliente, na curiosidade

de querer participar de mais audiências. No momento em que foram questionados a respeito do

alcance das expectativas, mostraram-se impacientes, gostariam de ter mais tempo no estágio,

não só em dias da semana, mas também que o estágio começasse mais cedo, a fim de

aprofundar-se no conhecimento.

Essa reflexão sobre o tempo limitado que é ofertado no estágio é o ponto surpreendente da

pesquisa, pois dedicar mais tempo aos núcleos é algo que depende principalmente do aluno para

ter êxito. Podiam direcionar suas críticas ao preparo dos professores, às instalações do núcleo

95

de práticas, à falta de diversidade dos atendimentos, à falta de preparo teórico, entre outros

fatores, mas direcionaram ao pouco tempo do estágio, e demonstraram interesse em mudar essa

realidade.

O ensino direcionado traz capacitação ao aluno e aumenta suas chances de concorrência no

mercado de trabalho, a construção de um conhecimento específico, com foco em atividades

determinadas permite a construção de competências. Essa percepção parece ser identificada no

discurso dos alunos que demonstram a necessidade de aprendizado unindo o conhecimento

teórico à atividade prática desenvolvida no núcleo de práticas.

Ao citarem a construção de peças processuais, o atendimento à comunidade, o

acompanhamento do cliente durante o andamento do processo, a participação em audiências,

os incisos do artigo 4º, da resolução indicada, são compreendidos. O domínio de tais

competências é alcançado pelo desenvolvimento de ditas atividades, perceber se essa

aprendizagem é adequada ou não é importante para o ingresso de profissionais qualificados em

mercado de trabalho.

Os movimentos sociais descritos na presente pesquisa demonstram que não deve ser o objetivo

central dos estudos jurídicos formar bacharéis que apenas decorem a legislação vigente,

entende-se a necessidade de aplicadores do Direito na busca de solução aos conflitos para o

desenvolvimento harmônico da sociedade. Aplicar o conhecimento teórico à realidade social,

proporcionar ao aluno o contato com pessoas reais, trazer um aprendizado voltado à prática

forense, tornou-se uma necessidade.

Entender que o desenvolvimento de tais competências é essencial para o desenvolvimento de

um profissional bem preparado, parece-nos ter sido entendido pelos alunos participantes da

entrevista, mesmo não sendo conhecedores destas. Tanto é que, ao falarem de suas expectativas,

o que aparece nas respostas é exatamente o que se encontra descrito nos incisos do citado artigo.

Verifica-se pela reflexão aos discursos que eles sentem a necessidade de um melhor

acompanhamento na atividade desenvolvida nos fóruns, tais como o acompanhamento dos

processos e a atuação em audiências. Quanto à redação das peças e o atendimento ao cliente,

mesmo que inseguros, demonstram a possibilidade de realizarem. Todavia, quando o assunto é

a atuação em audiências, o relato passa a ser direcionado para a total ignorância sobre dita

atividade.

96

É possível ainda nessa pesquisa constatar o interesse dos alunos no aprendizado oferecido pelos

núcleos de práticas, sugerindo inclusive opções para melhoramento da construção do

conhecimento desenvolvido no referido ambiente. Tal constatação verifica-se pela sugestão dos

alunos em aumentar o tempo de estágio, e ainda na sugestão de um maior número de cadeiras

de prática jurídica na grade curricular do curso, devendo ser ofertadas simultaneamente às

disciplinas teóricas ministradas em sala de aula.

O entendimento dos alunos sobre a necessidade de desenvolver o raciocínio jurídico, a fim de

proporcionar segurança na prática da advocacia forense e que referido objetivo pode ser

alcançado com as atividades ofertadas no núcleo de práticas jurídicas da instituição de ensino

objeto dessa pesquisa, vislumbra-se como um grande avanço à construção do conhecimento. E

parece-nos que essa conscientização foi percebida nas respostas encontradas já que apesar de

todas as lacunas e falhas possivelmente detectadas nos discursos, unânime é também a fala dos

alunos entrevistados em demonstrar a conscientização de querer mais.

5.2 Recomendações à instituição de ensino

Após a realização do presente estudo, para a instituição de ensino foram elaboradas as seguintes

sugestões, a fim de que seja possível propiciar o debate a respeito dos temas abaixo descritos:

A possível inclusão de disciplinas práticas no curso de Direito, desde os primeiros períodos

da graduação em que começam a serem ministradas as disciplinas de direito material e

direito processual cível;

Uma maior carga horária do estágio supervisionado, possibilitando aos alunos mais tempo

no ensino prático, permitindo-lhes o contato com um número maior de peças processuais e

atendimentos;

O acompanhamento dos alunos em salas de audiências é imprescindível, esclarecendo-lhes

os aspectos do procedimento ali utilizado.

A participação dos docentes ligados aos núcleos de práticas em cursos periódicos de

atualização e aperfeiçoamento em didática de ensino, tendo em vista serem pessoas que têm

como principal função a advocacia, e muitas vezes não possuem vivência no ensino

superior.

97

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101

APÊNDICE A - QUESTIONÁRIO DE CARACTERIZAÇÃO DO PARTICIPANTE

Aluno:

Turma:

Período:

Este questionário faz parte de um estudo sobre a formação do aluno do curso de Direito para

o exercício da advocacia, quanto à adequada atuação técnico-jurídica, a partir do estágio

supervisionado. Gostaríamos de contar com a sua colaboração para responder com atenção a

todas as questões, ressaltando a importância de que suas respostas sejam o mais sincera

possível. Todas as informações prestadas serão anônimas.

Idade: ____ anos Sexo: ( ) M ( ) F

Em que ano e semestre você ingressou no curso de Direito?

Ano _______ ( ) 1º ( ) 2º semestre

Cursar Direito partiu de um desejo pessoal? ( ) Sim ( ) Não

Você exerce trabalho remunerado regular (exceto

bolsas e estágios)? ( ) Sim ( ) Não

Você participa ou participou de estágios extracurriculares em seu

curso? ( ) Sim ( ) Não

Em caso de resposta afirmativa, o estágio extracurricular é ou era relacionado ao exercício da

advocacia?

( ) Sim ( ) Não

Ainda no que se refere a estágios extracurriculares, há quanto tempo você

participa/participou destes?

( ) desde o primeiro período do curso

( ) mais de seis meses

( ) menos de seis meses

O estágio supervisionado da instituição de ensino que você frequenta oferece-lhe

oportunidade de acesso em qualquer período?

( ) Sim ( ) Não

Você se sente preparado para atender a comunidade participando de casos reais através do

estágio supervisionado oferecido pela instituição de ensino que você frequenta?

( ) Sim ( ) Não ( ) Talvez

102

APÊNDICE B - ROTEIRO DA ENTREVISTA

(A ser aplicada aos alunos que participarão do estágio supervisionado direcionado ao

desenvolvimento da atividade de advocacia, oferecido pelo Núcleo de Práticas Jurídicas,

período 2014.2)

1. Quais atividades você esperava desenvolver/participar no estágio supervisionado?

2. Você tem conhecimento das competências traçadas pelo Ministério da Educação, para os

graduandos no curso de Direito?

3. Após a conclusão do estágio supervisionado você se sente preparado para a realização da

atividade de advocacia, no que diz respeito à adequada atuação técnica jurídica, quanto à

produção de peças processuais?

4. E no que diz respeito às demais atividades desenvolvidas por este profissional, como o

atendimento do cliente, o acompanhamento deste em audiências?

5. Entre as suas expectativas quais foram plenamente atingidas e quais não foram?

6. De acordo com as suas expectativas o quê, na sua opinião, poderia ser melhorado no estágio

supervisionado?

103

ANEXO A - LEIS HISTÓRICAS

Lei de 11 de Agosto de 1827

Crêa dous Cursos de sciencias Juridicas e Sociaes, um na cidade de S. Paulo e outro na de

Olinda.

Dom Pedro Primeiro, por Graça de Deus e unanime acclamação dos povos, Imperador

Constitucional e Defensor Perpetuo do Brazil: Fazemos saber a todos os nossos subditos que a

Assembléia Geral decretou, e nós queremos a Lei seguinte:

Art. 1.º - Crear-se-ão dous Cursos de sciencias jurídicas e sociais, um na cidade de S. Paulo, e

outro na de Olinda, e nelles no espaço de cinco annos, e em nove cadeiras, se ensinarão as

matérias seguintes:

1.º ANNO

1ª Cadeira. Direito natural, publico, Analyse de Constituição do Império, Direito das gentes, e

diplomacia.

2.º ANNO

1ª Cadeira. Continuação das materias do anno antecedente.

2ª Cadeira. Direito publico ecclesiastico.

3.º ANNO

1ª Cadeira. Direito patrio civil.

2ª Cadeira. Direito patrio criminal com a theoria do processo criminal.

4.º ANNO

1ª Cadeira. Continuação do direito patrio civil.

2ª Cadeira. Direito mercantil e marítimo.

5.º ANNO

104

1ª Cadeira. Economia politica.

2ª Cadeira. Theoria e pratica do processo adoptado pelas leis do Imperio.

Art. 2.º - Para a regencia destas cadeiras o Governo nomeará nove Lentes proprietarios,

e cinco substitutos.

Art. 3.º - Os Lentes proprietarios vencerão o ordenado que tiverem os Desembargadores

das Relações, e gozarão das mesmas honras. Poderão jubilar-se com o ordenado por

inteiro, findos vinte annos de serviço.

Art. 4.º - Cada um dos Lentes substitutos vencerá o ordenado annual de 800$000.

Art. 5.º - Haverá um Secretario, cujo offício será encarregado a um dos Lentes

substitutos com a gratificação mensal de 20$000.

Art. 6.º - Haverá u Porteiro com o ordenado de 400$000 annuais, e para o serviço

haverão os mais empregados que se julgarem necessarios.

Art. 7.º - Os Lentes farão a escolha dos compendios da sua profissão, ou os arranjarão,

não existindo já feitos, com tanto que as doutrinas estejam de accôrdo com o systema

jurado pela nação. Estes compendios, depois de approvados pela Congregação, servirão

interinamente; submettendo-se porém á approvação da Assembléa Geral, e o Governo

os fará imprimir e fornecer ás escolas, competindo aos seus autores o privilegio

exclusivo da obra, por dez annos.

Art. 8.º - Os estudantes, que se quiserem matricular nos Cursos Juridicos, devem

apresentar as certidões de idade, porque mostrem ter a de quinze annos completos, e de

approvação da Lingua Franceza, Grammatica Latina, Rhetorica, Philosophia Racional

e Moral, e Geometria.

Art. 9.º - Os que freqüentarem os cinco annos de qualquer dos Cursos, com approvação,

conseguirão o gráo de Bachareis formados. Haverá tambem o grào de Doutor, que será

conferido áquelles que se habilitarem som os requisitos que se especificarem nos

Estatutos, que devem formar-se, e sò os que o obtiverem, poderão ser escolhidos para

Lentes.

Art. 10.º - Os Estatutos do VISCONDE DA CACHOEIRA ficarão regulando por ora

naquillo em que forem applicaveis; e se não oppuzerem á presente Lei. A Congregação

dos Lentes formará quanto antes uns estatutos completos, que serão submettidos á

deliberação da Assembléa Geral.

105

Art. 11.º - O Governo crearà nas Cidades de S. Paulo, e Olinda, as cadeiras necessarias

para os estudos preparatorios declarados no art. 8.º.

Mandamos portanto a todas as autoridades, a quem o conhecimento e execução da referida Lei

pertencer, que a cumpram e façam cumprir e guardar tão inteiramente, como nella se contém.

O Secretario de Estado dos Negocios do Imperio a faça imprimir, publicar e correr. Dada no

Palacio do Rio de Janeiro aos 11 dias do mez de agosto de 1827, 6.º da Independencia e do

Imperio.

IMPERADOR com rubrica e guarda.

(L.S.)

Visconde de S. Leopoldo.

Carta de Lei pela qual Vossa Majestade Imperial manda executar o Decreto da Assemblèa Geral

Legislativa que houve por bem sanccionar, sobre a criação de dous cursos juridicos, um na

Cidade de S. Paulo, e outro na de Olinda, como acima se declara.

Para Vossa Majestade Imperial ver.

Albino dos Santos Pereira a fez.

Registrada a fl. 175 do livro 4.º do Registro de Cartas, Leis e Alvarás. - Secretaria de Estado

dos Negocios do Imperio em 17 de agosto de 1827. – Epifanio José Pedrozo.

Pedro Machado de Miranda Malheiro.

Foi publicada esta Carta de Lei nesta Chancellaria-mór do Imperio do Brazil. – Rio de Janeiro,

21 de agosto de 1827. – Francisco Xavier Raposo de Albuquerque.

Registrada na Chancellaria-mór do Imperio do Brazil a fl. 83 do livro 1.º de Cartas, Leis, e

Alvarás. – Rio de Janeiro, 21 de agosto de 1827. – Demetrio José da Cruz.

106

ANEXO B - PORTARIA Nº 1.886, DE 30 DE DEZEMBRO DE 1994

Fixa as diretrizes curriculares e o conteúdo mínimo do curso jurídico.

O MINISTRO DE ESTADO DA EDUCAÇÃO E DO DESPORTO, no uso das atribuições do

Conselho Nacional de Educação, na forma do artigo 4º da Medida Provisória no 765, de 16 de

dezembro de 1994, e considerando o que foi recomendado nos Seminários Regionais e Nacional

de Cursos Jurídicos, e pela Comissão de Especialistas de Ensino de Direito, da SESU-MEC,

RESOLVE:

Art. 1º O curso jurídico será ministrado no mínimo de 3.300 horas de atividades, cuja

integralização se fará em pelo menos cinco e no máximo oito anos letivos.

Art. 2º O curso noturno, que observará o mesmo padrão de desempenho e qualidade do curso

no período diurno, terá um máximo diário de quatro horas de atividades didáticas.

Art. 3º O curso jurídico desenvolverá atividades de ensino, pesquisa e extensão, interligadas e

obrigatórias, segundo programação e distribuição aprovadas pela própria Instituição de

obrigatórias Superior, de forma a atender ás necessidades de formação fundamental, sócio-

política, técnico-jurídica e prática do bacharel em direito.

Art. 4º Independentemente do regime acadêmico que adotar o curso (seriado, créditos ou outro),

serão destinados cinco a dez por cento de carga horária total para atividades complementares

ajustadas entre o aluno e a direção ou coordenação do curso, incluindo pesquisa, extensão,

seminários, simpósios, congressos, conferências, monitoria, iniciação currículo disciplinas não

previstas no pleno.

Art 5º Cada curso jurídico manterá um acervo bibliográfico atualizado de no mínimo dez mil

volumes de obras jurídicas e de referência as matérias do curso, além de periódicos de

jurisprudência, doutrina e legislação.

Art. 6º O conteúdo mínimo do curso jurídico, além do estágio, compreenderá as seguintes

matérias, que podem estar contidas em uma ou mais disciplinas do currículo pleno de cada

curso.

107

I - Fundamentais Introdução ao Direito, Filosofia geral e jurídica, ética geral e profissional),

Sociologia (geral e jurídica), Economia e Ciência Política (com Teoria do Estado),

II - Profissionalizante Direito Constitucional, Direito Civil, Direito Administrativo Direito

Tributário. Direito Penal. Direito Processual Civil. Direito Eco cestos! Penal. Direito do

Trabalho, Direito Comercial e Direito Interacional.

Parágrafo único. As demais maternas e novos direitos serão incluídos nas disciplinas se

desdobrar o currículo pleno de cada curso, de acordo coou suas peculiaridades e com

observância de interdisciplinaridade.

Art. 7º A prática de educação física, com predominância desportiva, observará a legislação

específica.

Art. 8º A prática de 4º ano, oro do período lesivo correspondente, o observado o conteúdo

mínimo previsto no ara. 6º, poderá o curto concentrar-se em uma ou mais áreas de

especialização, segundo suas vocações e demandas sociais e de mercado de trabalho.

Art. 9º Para conclusão do curso, será obrigatória apresentação e defesa de monografia final,

perante banca examinadora, com tema e orientador escolhidos pelo aluno.

Art. 10. O estágio de prática jurídica, supervisionado pela instituição de ensino superior, será

obrigatório e integrante do currículo pleno, em um total mínimo de 300 horas de atividades

práticas simuladas e reais desenvolvidas pelo aluno sob controle e orientação do núcleo

correspondente.

§ 1º o núcleo de prática jurídica, coordenado por professores do curso, disporá de instalações

adequadas para treinamento das atividades profissionais de advocacia, magistratura, Ministério

Público, demais profissões jurídicas e para atendimento ao público.

§ 2º As atividades de prática jurídica poderão ser complementadas mediante convênios com a

Defensoria Pública e outras entidades públicas, judiciárias, empresariais, comunitárias e

sindicais que possibilitem a participação dos alunos na prestação de serviços jurídicos e cai

assistência jurídica, ou em juizados especiais que venham a ser instalados cai dependência da

própria instituição de ensino superior.

108

Art. 11. As atividades do estágio supervisionado serão exclusivamente práticas, incluindo

redação de peças processuais e profissionais, rotinas processuais, assistência e atuação em

audiências e sessões, visitas a órgãos judiciários, prestação de serviços jurídicos e técnicas de

negociações coletivas, arbitragens e conciliação, sob o controle, orientação e avaliação do

núcleo de prática jurídica.

Art. 12. O estágio profissional de advocacia, previsto na Lei 8.906, de 04/07/1994, de caráter

extracurricular, inclusive para graduados, poderá ser oferecido pela Instituição de Ensino

Superior, em convênio com a OAB, complementando-se a carga horária efetivamente cumprida

no estágio supervisionado, com atividades práticas típicas de advogado e de estudo do Estatuto

da Advocacia e da OAB e do Código de Ética e Disciplina.

Parágrafo único. A complementação da carga horária, no total estabelecido no convênio, será

efetivada mediante atividades no próprio núcleo de prática jurídica, na Defensoria Pública, em

escritórios de advocacia ou em setores jurídicos, públicos ou privados, credenciados e

acompanhados pelo núcleo e pela OAB.

Art. 13. O tempo do estágio realizado em Defensoria Pública da União, do Distrito Federal ou

dos Estados, na forma do artigo 145, da Lei Complementar nº 80, de 12 de janeiro de 1994, será

considerado para fins de carga horária do estágio curricular previsto no artigo 10 desta Portaria.

Art. 14. As instituições poderão estabelecer convênios de intercâmbio dos alunos e docentes,

com aproveitamento das respectivas atividades de ensino, pesquisa, extensão e prática jurídica.

Art. 15. Dentro do prazo de dois anos, a contar desta data, os cursos jurídicos proverão os meios

necessários ao integral cumprimento desta Portaria.

Art. 16. As diretrizes curriculares desta Portaria são obrigatórias aos novos alunos

matriculados a partir de 1996 nos cursos jurídicos que, no exercício de sua autonomia, poderão

aplicá-las imediatamente.

Art. 16 As diretrizes curriculares desta Portaria são obrigatórias aos novos alunos matriculados

a partir de 1997 nos cursos jurídicos que, no exercício de sua autonomia, poderão aplicá-las

imediatamente. (Nova Redação dada pela Portaria Ministerial n.º 003, de 09 de janeiro de 1996)

109

Art. 17. Esta Portaria entrará em vigor na data de sua publicação, revogadas as disposições em

contrário, especialmente as Resoluções 03/72 e 15/73 do extinto Conselho Federal de Educação.

MURÍLIO DE AVELLAR HINGEL

Publicação no DOU de 04.01.1995

110

ANEXO C - RESOLUÇÃO N° 09, DE 29 DE SETEMBRO DE 2004, CNE/CES

Institui as Diretrizes Curriculares Nacionais do Curso de Graduação em Direito e dá outras

providências.

O Presidente da Câmara de Educação Superior do Conselho Nacional de Educação, no uso de

suas atribuições legais, com fundamento no art. 9º, § 2º, alínea “c”, da Lei nº 4.024, de 20 de

dezembro de 1961, com a redação dada pela Lei nº 9.131, de 25 de novembro de 1995, tendo

em vista as diretrizes e os princípios fixados pelos Pareceres CES/CNE nos 776/97, 583/2001,

e 100/2002, e as Diretrizes Curriculares Nacionais elaboradas pela Comissão de Especialistas

de Ensino de Direito, propostas ao CNE pela SESu/MEC, considerando o que consta do Parecer

CES/CNE 55/2004 de 18/2/2004, reconsiderado pelo Parecer CCES/CNE 211, aprovado em

8/7/2004, homologado pelo Senhor Ministro de Estado da Educação em 23 de setembro de

2004, resolve:

Art. 1º A presente Resolução institui as Diretrizes Curriculares do Curso de Graduação em

Direito, Bacharelado, a serem observadas pelas Instituições de Educação Superior em sua

organização curricular.

Art. 2º A organização do Curso de Graduação em Direito, observadas as Diretrizes Curriculares

Nacionais se expressa através do seu projeto pedagógico, abrangendo o perfil do formando, as

competências e habilidades, os conteúdos curriculares, o estágio curricular supervisionado, as

atividades complementares, o sistema de avaliação, o trabalho de curso como componente

curricular obrigatório do curso, o regime acadêmico de oferta, a duração do curso, sem prejuízo

de outros aspectos que tornem consistente o referido projeto pedagógico.

§ 1° O Projeto Pedagógico do curso, além da clara concepção do curso de Direito, com suas

peculiaridades, seu currículo pleno e sua operacionalização, abrangerá, sem prejuízo de outros,

os seguintes elementos estruturais:

I - concepção e objetivos gerais do curso, contextualizados em relação às suas inserções

institucional, política, geográfica e social;

II - condições objetivas de oferta e a vocação do curso;

III - cargas horárias das atividades didáticas e da integralização do curso;

111

IV - formas de realização da interdisciplinaridade;

V - modos de integração entre teoria e prática;

VI - formas de avaliação do ensino e da aprendizagem;

VII - modos da integração entre graduação e pós-graduação, quando houver;

VIII - incentivo à pesquisa e à extensão, como necessário prolongamento da atividade de ensino

e como instrumento para a iniciação científica;

IX – concepção e composição das atividades de estágio curricular supervisionado, suas

diferentes formas e condições de realização, bem como a forma de implantação e a estrutura do

Núcleo de Prática Jurídica;

X - concepção e composição das atividades complementares; e,

XI - inclusão obrigatória do Trabalho de Curso.

§ 2º Com base no princípio de educação continuada, as IES poderão incluir no Projeto

Pedagógico do curso, oferta de cursos de pós-graduação lato sensu, nas respectivas

modalidades, de acordo com as efetivas demandas do desempenho profissional.

Art. 3º. O curso de graduação em Direito deverá assegurar, no perfil do graduando, sólida

formação geral, humanística e axiológica, capacidade de análise, domínio de conceitos e da

terminologia jurídica, adequada argumentação, interpretação e valorização dos fenômenos

jurídicos e sociais, aliada a uma postura reflexiva e de visão crítica que fomente a capacidade e

a aptidão para a aprendizagem autônoma e dinâmica, indispensável ao exercício da Ciência do

Direito, da prestação da justiça e do desenvolvimento da cidadania.

Art. 4º. O curso de graduação em Direito deverá possibilitar a formação profissional que revele,

pelo menos, as seguintes habilidades e competências:

I - leitura, compreensão e elaboração de textos, atos e documentos jurídicos ou normativos, com

a devida utilização das normas técnico-jurídicas;

II - interpretação e aplicação do Direito;

112

III - pesquisa e utilização da legislação, da jurisprudência, da doutrina e de outras fontes do

Direito;

IV - adequada atuação técnico-jurídica, em diferentes instâncias, administrativas ou judiciais,

com a devida utilização de processos, atos e procedimentos;

V - correta utilização da terminologia jurídica ou da Ciência do Direito;

VI - utilização de raciocínio jurídico, de argumentação, de persuasão e de reflexão crítica;

VII - julgamento e tomada de decisões; e,

VIII -domínio de tecnologias e métodos para permanente compreensão e aplicação do Direito.

Art. 5º O curso de graduação em Direito deverá contemplar, em seu Projeto Pedagógico e em

sua Organização Curricular, conteúdos e atividades que atendam aos seguintes eixos

interligados de formação:

I - Eixo de Formação Fundamental, tem por objetivo integrar o estudante no campo,

estabelecendo as relações do Direito com outras áreas do saber, abrangendo dentre outros,

estudos que envolvam conteúdos essenciais sobre Antropologia, Ciência Política, Economia,

Ética, Filosofia, História, Psicologia e Sociologia.

II - Eixo de Formação Profissional, abrangendo, além do enfoque dogmático, o conhecimento

e a aplicação, observadas as peculiaridades dos diversos ramos do Direito, de qualquer natureza,

estudados sistematicamente e contextualizados segundo a evolução da Ciência do Direito e sua

aplicação às mudanças sociais, econômicas, políticas e culturais do Brasil e suas relações

internacionais, incluindo-se necessariamente, dentre outros condizentes com o projeto

pedagógico, conteúdos essenciais sobre Direito Constitucional, Direito Administrativo, Direito

Tributário, Direito Penal, Direito Civil, Direito Empresarial, Direito do Trabalho, Direito

Internacional e Direito Processual; e

III - Eixo de Formação Prática, objetiva a integração entre a prática e os conteúdos teóricos

desenvolvidos nos demais Eixos, especialmente nas atividades relacionadas com o Estágio

Curricular Supervisionado, Trabalho de Curso e Atividades Complementares.

113

Art. 6º A organização curricular do curso de graduação em Direito estabelecerá expressamente

as condições para a sua efetiva conclusão e integralização curricular de acordo com o regime

acadêmico que as Instituições de Educação Superior adotarem: regime seriado anual; regime

seriado semestral; sistema de créditos com matrícula por disciplina ou por módulos acadêmicos,

com a adoção de pré-requisitos, atendido o disposto nesta Resolução.

Art. 7º O Estágio Supervisionado é componente curricular obrigatório, indispensável à

consolidação dos desempenhos profissionais desejados, inerentes ao perfil do formando,

devendo cada instituição, por seus colegiados próprios, aprovar o correspondente regulamento,

com suas diferentes modalidades de operacionalização.

§ 1º O Estágio de que trata este artigo será realizado na própria instituição, através do Núcleo

de Prática Jurídica, que deverá estar estruturado e operacionalizado de acordo com

regulamentação própria, aprovada pelo conselho competente, podendo, em parte, contemplar

convênios com outras entidades ou instituições e escritórios de advocacia; em serviços de

assistência judiciária implantados na instituição, nos órgãos do Poder Judiciário, do Ministério

Público e da Defensoria Pública ou ainda em departamentos jurídicos oficiais, importando, em

qualquer caso, na supervisão das atividades e na elaboração de relatórios que deverão ser

encaminhados à Coordenação de Estágio das IES , para a avaliação pertinente.

§ 2º As atividades de Estágio poderão ser reprogramadas e reorientadas de acordo com os

resultados teórico-práticos gradualmente revelados pelo aluno, na forma definida na

regulamentação do Núcleo de Prática Jurídica, até que se possa considerá-lo concluído,

resguardando, como padrão de qualidade, os domínios indispensáveis ao exercício das diversas

carreiras contempladas pela formação jurídica.

Art. 8º As atividades complementares são componentes curriculares enriquecedores e

complementadores do perfil do formando, possibilitam o reconhecimento, por avaliação de

habilidades, conhecimento e competência do aluno, inclusive adquirida fora do ambiente

acadêmico, incluindo a prática de estudos e atividades independentes, transversais, opcionais,

de interdisciplinaridade, especialmente nas relações com o mercado do trabalho e com as ações

de extensão junto à comunidade.

Parágrafo único. A realização de atividades complementares não se confunde com a do Estágio

Supervisionado ou com a do Trabalho de Curso.

114

Art. 9º As Instituições de Educação Superior deverão adotar formas específicas e alternativas

de avaliação, interna e externa, sistemáticas, envolvendo todos quantos se contenham no

processo do curso, centradas em aspectos considerados fundamentais para a identificação do

perfil do formando.

Parágrafo único. Os planos de ensino, a serem fornecidos aos alunos antes do início de cada

período letivo, deverão conter, além dos conteúdos e das atividades, a metodologia do processo

de ensino aprendizagem, os critérios de avaliação a que serão submetidos e a bibliografia básica.

Art. 10. O Trabalho de Curso é componente curricular obrigatório, desenvolvido

individualmente, com conteúdo a ser fixado pelas Instituições de Educação Superior em função

de seus Projetos Pedagógicos.

Parágrafo único. As IES deverão emitir regulamentação própria aprovada por Conselho

competente, contendo necessariamente, critérios, procedimentos e mecanismos de avaliação,

além das diretrizes técnicas relacionadas com a sua elaboração.

Art. 11. A duração e carga horária dos cursos de graduação serão estabelecidas em Resolução

da Câmara de Educação Superior.

Art. 12. As Diretrizes Curriculares Nacionais desta Resolução deverão ser implantadas pelas

Instituições de Educação Superior, obrigatoriamente, no prazo máximo de dois anos, aos alunos

ingressantes, a partir da publicação desta.

Parágrafo único. As IES poderão optar pela aplicação das DCN aos demais alunos do período

ou ano subsequente à publicação desta.

Art. 13. Esta Resolução entrará em vigor na data de sua publicação, ficando revogada a

Portaria Ministerial n° 1.886, de 30 de dezembro de 1994 e demais disposições em contrário.

EDSON DE OLIVEIRA NUNES

(DOU Nº 189, 1º/10/2004, SEÇÃO 1, P. 17/18)

115

ANEXO D – REGULAMENTO DO ESTÁGIO SUPERVISIONADO

UNIFAVIP - Centro Universitário do Vale do Ipojuca

Norma 003: Regulamento do Estágio Supervisionado

Art.1º. Considera-se Estágio, para efeito deste Regulamento, a atividade de aprendizagem

profissional, social e cultural, desenvolvida pelo aluno, junto à pessoa jurídica de direito público

ou privado, sob supervisão e coordenação da UNIFAVIP - Centro Universitário do Vale do

Ipojuca.

Art.2º. São objetivos do Estágio:

I - Proporcionar a complementação educacional da formação e a prática profissional do

Estudante, mediante efetiva participação no desenvolvimento de programas e planos afetos à

organização em que se realize o Estágio;

II - Proporcionar ao estudante a aplicação do seu manancial teórico, desenvolvendo atividades

nas diversas áreas do conhecimento, de forma a exercitar a interdisciplinaridade;

III- Oportunizar ao aluno a vivência em situações reais de vida e trabalho que viabilizem a

integração dos conhecimentos teórico-práticos à experiência pessoal, através de contínuo

processo de ação-reflexão-ação;

IV - Facilitar o entrosamento e a inserção do aluno no mercado de trabalho e acesso ao emprego

ou novas funções;

V- Desenvolver, no estagiário, o espírito empreendedor e da livre iniciativa.

Art.3º. O Estágio deve ser supervisionado, quando de caráter curricular, podendo ser

extracurricular, de participação voluntária do aluno.

§ 1º - O Estágio Supervisionado poderá ser realizado a partir da integralização de 50%

(cinquenta por cento) da carga horária prevista para a conclusão do curso no qual o aluno está

regularmente matriculado (salvo disposições em contrário nas Diretrizes Curriculares

Nacionais do curso em questão), proporcionando a oportunidade do desenvolvimento de

atividades correspondentes ao campo profissional do curso, em situações reais e simuladas,

condizentes com os objetivos acadêmicos.

§ 2º - O Estágio, realizado pela ação voluntária do aluno, como forma de buscar

complementação à formação profissional, porém sem atender aos requisitos expostos no §1º,

será considerado extracurricular, caracterizando-se como atividade complementar, tendo sua

pontuação validada no Programa de Experiências -PEX, quando existir.

§ 3º - Em determinados cursos, o Estágio Supervisionado só poderá ser realizado em

organizações que sejam devidamente credenciadas pelos respectivos Conselhos Profissionais.

116

Art. 4º. A matrícula do aluno em Estágio Supervisionado deve ocorrer no período regular de

matrícula, fixado no Calendário Acadêmico.

Art. 5º. O Estágio deve estar apoiado em Termo de Compromisso de Estágio, celebrado entre

o aluno e a organização concedente, com interveniência obrigatória da Instituição.

§ 1º - Pode ser aceito outro tipo de instrumento, desde que isto seja expressamente declarado

pela Diretoria Geral da Instituição e esteja de acordo com a legislação vigente.

§ 2º - De acordo com a Lei Nº 11.788, de 25 de setembro de 2008, a realização de Estágio por

parte do aluno não acarreta vínculo empregatício de qualquer natureza, mesmo que receba bolsa

ou outra forma de contraprestação paga pela organização concedente do Estágio.

§ 3º - A jornada de atividade a ser cumprida pelo aluno no Estágio deve ser compatível com o

Calendário Escolar e com as atividades acadêmicas, não podendo exceder a 6 (seis) horas

diárias.

§ 4º - A Instituição poderá recorrer aos serviços de agentes de integração públicos ou privados,

com e sem fins lucrativos, entre o sistema de ensino e os setores de produção, serviços,

comunidade e governo, mediante condições acordadas em convênio adequado.

Art. 6º. Quando assim previsto no Projeto Pedagógico do Curso (PPC), o Estágio

Supervisionado é atividade obrigatória para conclusão do curso, tendo sua carga horária e tempo

mínimo de integralização estabelecidos no PPC em que o aluno está regularmente matriculado.

§ 1º - A carga horária referida no "caput" deste artigo, também será integralizada pelas horas

destinadas à orientação e às avaliações realizadas pela Coordenação de Estágio.

§ 2º - Cabe à Coordenação do Curso caracterizar as atividades adequadas ao Estágio

Supervisionado.

Art. 7º. O acompanhamento e supervisão de estágio serão programados e realizados pelo

Coordenador de Curso e pelos Professores Orientadores.

§ 1º - Poderão ser realizadas visitas "in loco" para avaliar o trabalho desenvolvido pelo aluno

estagiário, ou serem utilizados outros meios de acompanhamento que forem julgados

adequados.

§ 2º - A critério do Diretor Geral da Instituição, a Coordenação do Curso e a Coordenação do

Estágio poderão ser acumuladas pela mesma pessoa.

Art. 8º. O aproveitamento do Estágio será avaliado pelo Professor Orientador, em conjunto com

o Coordenador de Curso e com o Supervisor Técnico designado pela organização concedente,

mediante análise dos Relatórios apresentados pelo aluno estagiário, por entrevistas com o

Professor Orientador e demais formas de avaliação que forem julgadas necessárias, sendo de

fundamental importância, nesse processo, a participação ativa do Supervisor Técnico.

117

Art. 9º. O aluno será considerado aprovado no Estágio Supervisionado quando obtiver o

conceito "APTO", após a elaboração do Plano de Estágio complementado com os respectivos

Relatórios de Acompanhamento.

Art. 10. O aluno que não obtiver aprovação será considerado "NÃO APTO" e deverá

matricular-se novamente no Estágio Supervisionado, sujeitando-se a todas as exigências

regimentais e acadêmicas.

Art. 11. Não haverá a realização de exame final para o Estágio Supervisionado.

Art. 12. O aluno que trabalhe como empregador, empregado ou autônomo, a critério do

Coordenador de Curso, que analisará a compatibilidade entre as atividades exercidas e os

requisitos acadêmicos, deverá apresentar o Termo de Compromisso de Trabalho

Supervisionado, além de:

I - Quando for empreendedor, cópia do Contrato Social;

II - Quando empregado, cópia da Carteira de Trabalho;

III - Quando autônomo, cópia do Contrato de Prestação de Serviços, bem como uma declaração

da empresa para a qual está trabalhando, sem vínculo empregatício.

Art. 13. O calendário das atividades de Estágio Supervisionado será divulgado semestralmente,

no período de matrícula fixado no Calendário Acadêmico.

Art. 14. Compete ao Coordenador de Curso:

I - Cumprir e fazer cumprir as disposições deste Regulamento;

II - Coordenar, supervisionar e controlar as atividades de estágio;

III - Auxiliar o aluno na obtenção de vagas para estágio, junto às organizações conveniadas

com o apoio do Setor de Carreiras da Instituição;

IV - Elaborar o cronograma semestral das atividades de Estágio;

V - Definir os Professores Orientadores para acompanhamento do Estágio Supervisionado;

VI - Coordenar as atividades de orientação e acompanhamento de Estágio Supervisionado;

VII - Orientar, quanto ao planejamento, execução e avaliação do processo de Estágio, os

Professores Orientadores, os Supervisores Técnicos de Estágio nas organizações concedentes e

os alunos estagiários;

VIII - Elaborar toda a documentação necessária ao desenvolvimento do Estágio;

IX - Manter-se atualizado quanto à legislação vigente, promovendo as alterações que se fizerem

necessárias para a manutenção da legalidade do estágio;

118

X - Manter relacionamento com órgãos, empresas e autoridades, visando ao melhor

desenvolvimento das atividades de estágio;

XI - Encaminhar às organizações conveniadas a programação e ações planejadas, executadas e

avaliadas no decorrer do estágio, objetivando a melhoria dos trabalhos técnicos desenvolvidos

pela Instituição e pelas conveniadas.

XII - Avaliar em conjunto com o Professor Orientador e o Supervisor Técnico da organização

concedente, o desempenho do aluno estagiário no Estágio Supervisionado;

XIII - Promover, juntamente com o Setor Carreiras palestras, visitas, seminários, entre outros,

visando conscientizar os alunos sobre assuntos relacionados aos temas estágio e mercado de

trabalho.

Art. 15. Compete ao Professor Orientador de Estágio:

I - Cumprir e fazer cumprir as disposições deste Regulamento;

II - Orientar o aluno na elaboração do Plano de Estágio, em caso de Estágio Supervisionado e

aprová-lo;

III - Visitar as organizações onde os alunos estão estagiando;

IV - Atender aos alunos estagiários em dias e horários programados pela Coordenação de

Estágio;

V - Acompanhar o desenvolvimento das atividades do aluno estagiário, orientando-o sempre

que necessário;

VI - Avaliar em conjunto com o Coordenador de Curso o desempenho do aluno estagiário no

Estágio Supervisionado;

VII - Discutir os planos de estágio com a Coordenação de Estágio e, em caso de necessidade,

com as organizações concedentes adequando-os às necessidades acadêmicas.

Art. 16. Compete ao aluno estagiário:

I - Cumprir e fazer cumprir as disposições deste Regulamento;

II - Aceitar as alternativas de Estágio Supervisionado apresentadas pela Instituição, caso não

tenha encontrado pelos seus próprios esforços oportunidades de Estágio;

III - Cumprir as cláusulas do Termo de Compromisso de Estágio ou do Termo de Compromisso

de Trabalho Supervisionado firmado com a organização concedente e com a Instituição;

IV - Manter sigilo absoluto sobre as atividades e informações a que se tenha acesso dentro da

organização concedente do Estágio, cumprindo suas normas e regras de conduta;

V - Elaborar o Plano de Estágio na forma de um anteprojeto que será analisado e aprovado pelo

Professor Orientador ou pela Coordenação de Estágio;

119

VI - Desenvolver o trabalho proposto no Plano cumprindo os prazos estabelecidos pelo

Professor Orientador; VII - Comparecer às reuniões convocadas pela Coordenação de Estágio

ou pelo Professor Orientador;

VII - Apresentar os Relatórios final e parciais das atividades desenvolvidas no Estágio, dentro

dos prazos estabelecidos, correlacionando, sempre, os conhecimentos adquiridos ao longo do

curso, exercitando a interdisciplinaridade.

Art. 17. Compete ao Supervisor Técnico de Estágio na organização concedente:

I - Orientar o aluno estagiário na execução do seu trabalho;

II - Colaborar com o Professor Orientador e com o Coordenador de Curso, na tarefa de

acompanhamento, execução e supervisão de estágio;

III - Atestar a frequência do aluno ao estágio;

IV - Realizar avaliação do aluno ao final do Estágio Supervisionado.

V - Visar os relatórios elaborados pelo aluno estagiário.

Art. 18. Este Regulamento poderá ser modificado por proposição do Coordenador de Curso ou

do Diretor Geral, submetendo-se à aprovação do Conselho Superior da Instituição.

Art. 19. Os casos omissos a este Regulamento serão decididos pela Coordenação de Curso.

Norma 003: Regulamento do Estágio Supervisionado - Versão 3 - 07/06/2009