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Conexão Comunicação e Cultura Revista de Comunicação da Universidade de Caxias do Sul - v Revista de Comunicação da Universidade de Caxias do Sul - v Revista de Comunicação da Universidade de Caxias do Sul - v Revista de Comunicação da Universidade de Caxias do Sul - v Revista de Comunicação da Universidade de Caxias do Sul - v. 6, n. 11, jan./jun. 2007 . 6, n. 11, jan./jun. 2007 . 6, n. 11, jan./jun. 2007 . 6, n. 11, jan./jun. 2007 . 6, n. 11, jan./jun. 2007

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Revista de Comunicação da Universidade de Caxias do Sul - vRevista de Comunicação da Universidade de Caxias do Sul - vRevista de Comunicação da Universidade de Caxias do Sul - vRevista de Comunicação da Universidade de Caxias do Sul - vRevista de Comunicação da Universidade de Caxias do Sul - v. 6, n. 11, jan./jun. 2007. 6, n. 11, jan./jun. 2007. 6, n. 11, jan./jun. 2007. 6, n. 11, jan./jun. 2007. 6, n. 11, jan./jun. 2007

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CONEXÃOCONEXÃOCONEXÃOCONEXÃOCONEXÃOCOMUNICAÇÃO E CULTURACOMUNICAÇÃO E CULTURACOMUNICAÇÃO E CULTURACOMUNICAÇÃO E CULTURACOMUNICAÇÃO E CULTURA

Conselho EditorialConselho EditorialConselho EditorialConselho EditorialConselho EditorialProf. Dr. Antonio Hohlfeldt

(PUC/RS)Prof. Dr. Bernard Miège

(Universidade Stendhal Grenoble 3)Prof. Dr. César Ricardo Siqueira Bolaño

(UFS/SE)Profa. Dr. Cida Golin

(UFRGS)Profa. Dra. Cicilia Maria Krohling Peruzzo

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(PUC/RS)Profa. Dra. Heloísa Pedroso de Moraes Feltes

(UCS/RS)Profa. Dra. Kenia Maria MenegottoPozenato

(UCS/RS)Profa. Dra. Lucia Santaella

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(USP/SP)Prof. Dr. Muniz Sodré

(UFRJ)Prof. Dr. Pierre Fayard

(Poitiers – França)Profa. Dra. Solange Medina Ketzer

(PUC/RS)Prof. Dr. Rudimar Baldissera

(UFRGS)Profa. Dra. Vania Beatriz Merlotti Herédia

(UCS/RS)

Parecerista Parecerista Parecerista Parecerista Parecerista ad hocProfa. Dra. Susana Gastal

EditoraEditoraEditoraEditoraEditoraProfa. Ms. Marlene Branca Sólio (UCS/RS)

FUNDAÇÃO UNIVERSIDADEFUNDAÇÃO UNIVERSIDADEFUNDAÇÃO UNIVERSIDADEFUNDAÇÃO UNIVERSIDADEFUNDAÇÃO UNIVERSIDADEDE CAXIAS DO SULDE CAXIAS DO SULDE CAXIAS DO SULDE CAXIAS DO SULDE CAXIAS DO SUL

Presidente:Nestor Perini

Vice-Presidente:Roberto Boniatti

UNIVERSIDADE DE CAXIAS DO SULUNIVERSIDADE DE CAXIAS DO SULUNIVERSIDADE DE CAXIAS DO SULUNIVERSIDADE DE CAXIAS DO SULUNIVERSIDADE DE CAXIAS DO SUL

Reitor:Prof. Isidoro Zorzi

Vice-Reitor:Prof. José Carlos Avino

Pró-Reitor de Planejamento eDesenvolvimento Institucional:Prof. João Ignacio Pires Lucas

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Pró-Reitor de Pós-Graduação e Pesquisa:Prof. José Clemente Pozenato

Pró-Reitor de Extensão:Prof. Alexandre Viecelli

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Chefe de Gabinete da Reitoria:Profa. Cleodes Maria Piazza Julio Ribeiro

Coordenador da Educs:Renato Henrichs

CONSELHO EDITORIAL DA EDUCSCONSELHO EDITORIAL DA EDUCSCONSELHO EDITORIAL DA EDUCSCONSELHO EDITORIAL DA EDUCSCONSELHO EDITORIAL DA EDUCS

Prof. Dr. José Clemente PozenattoProf. Dr. Jayme Paviani

Prof. Dr. José Luiz PiazzaProf. Dr. Luis Carlos Bombassaro

Prof. Dr. Flávio Gianetti Loureiro ChavesProf. Dr. José Mauro Madi

Prof. Dr. Paulo Fernando Pinto BarcellosProf. Dr. Gilberto Henrique Chissini

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© dos autoreswww.ucs.br/cchc/deco/conexao

Revisão: Ivone Justina Polidoro Franco

Editoração eletrônica: Formato Artes Gráficas

EDUCS – Editora da Universidade de Caxias do SulRua Francisco Getúlio Vargas, 1130 – CEP 95070-560 – Caxias do Sul – RS – BrasilOu: Caixa Postal 1352 – CEP 95001-970 – Caxias do Sul – RS – BrasilTelefone / Telefax: (54) 3218 2100 – Ramais: 2197 e 2281 – DDR: (54) 3218 2197Home page: www.ucs.br – E-mail: [email protected]

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)Universidade de Caxias do Sul

UCS - BICE - Processamento Técnico

C747 Conexão – comunicação e cultura / Universidade de Caxias doSul. Vol. 1, n. 1 (jan. 2002). – Caxias do Sul, RS: Educs,2007.

Vol. 6, n. 11 (Jan./Jun. 2007)SemestralISSN 1677-0943

1. Comunicação Social. 2. Jornalismo. 3. Publicidade – Pro-paganda. 4. Relações Públicas. I. Universidade de Caxias do Sul.

CDU: 659

Índice para o catálogo sistemático:

1. Comunicação Social 6592. Jornalismo 0703. Publicidade – Propaganda 659.14. Relações Públicas 659.4

Catalogação na fonte elaborada pela BibliotecáriaRose Elga Beber - CRB 10/1369.

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!" APRESENTAÇÃO

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## HISTÓRIA, IMAGINÁRIO E MENTALIDADES:DELINEAMENTOS POSSÍVEISJosé D’Assunção Barros

$# A LEITURA DO TEMPO NO ESPAÇO: UMA REFLEXÃOSOBRE A CULTURA E A MEMÓRIA NA MÍDIAMagda Rodrigues da Cunha

%% DO FORT-DA DA ARTE AO CORPO-OBRA. [É POSSÍVELUMA ESTÉTICA DA CLÍNICA? HAVERÁ UM CORPO-OBRA?]Marcio Pizarro Noronha

&# CORPOS AUTORIZADOS: COMUNICAÇÃO PODER E TURISMOEuler David de Siqueira e Denise da Costa Oliveira de Siqueira

'' COMUNICAÇÃO E TURISMO:POSSIBILIDADES DE CONHECIMENTOMary Sandra Guerra Ashton

#!' TECNOTOTEMISMO: IDENTIDADES MÚLTIPLAS E NOVA SUBJETIVIDADELauren Ferreira Colvara

#() EL PÚBLICO EN LOS NOTICIEROS TELEVISIVOSMabel Grillo

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AAAAARTIGOSRTIGOSRTIGOSRTIGOSRTIGOS

#$# A EMERGÊNCIA DE GÊNEROS NO CINEMA BRASILEIRO: DOPRIMEIRO CINEMA ÀS CHANCHADAS E PORNOCHANCHADASBernadette Lyra

#*# VIGÍLIA E INTELIGÊNCIA ESTRATÉGICA: FERRAMENTASMETODOLÓGICAS PARA A DEFINIÇÃO DE ESTRATÉGIASDE RELAÇÕES PÚBLICASAna Cristina Fachinelli, Jane Rech,Olivar Maximino Mattia e Vanessa Roveda

#') COMUNICAÇÃO ORGANIZACIONAL E PRESSUPOSTOSDA COMUNICAÇÃO INTEGRADA: A EXPERIÊNCIA EMUMA UNIVERSIDADE NA IMPLEMENTAÇÃO/REESTRUTURAÇÃO DO JORNAL INSTITUCIONALCassiana Maris Lima Cruz

(## IDÉIAS SOBRE TECNOLOGIA, INTERAÇÕESCOMUNICATIVAS E ECONOMIA MIDIÁTICAÁlvaro Benevenuto Júnior

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Falar em cultura e imaginário, hoje, é “dar a cara pra bater”. Em meio a umcaleidoscópio de teorias, visões, mundos, o que deve prevalecer? Qual é ouonde está a verdade? Ela existe?

Ao convidar a comunidade acadêmica a discutir o tema, pelo viés da comunica-ção, a idéia era justamente esta: provocar autores a nos mostrarem algumasdas “imagens de seus caleidoscópios”. Dar espaço a pesquisadores, para que,mesmo arriscando-se, nos mostrassem algumas das opções, no leque de possi-bilidades com que nos confrontamos, para “olhar este nosso mundo”.

Para conversar um pouco com nossos leitores, retardando seu encontro com osarticulistas aos quais somos imensamente gratos por terem atendido a nossaconvocação, vamos a três ponderações: a primeira delas é trazer, para a noçãode imaginário, as lentes de Lacan. A segunda é pedir a Morin seus óculos, eentão poder olhar para a noção de cultura, e a terceira, com a qual os leitores játiveram um encontro, é apelar para o bom humor de Dali, que, com o desdo-bramento de um mesmo quadro (“Rapariga à janela”, de 1925, e “Jovem virgemauto-sodomizada”, de 1954), nos mostra que a verdade está onde e como acolocamos.

Como o tempo contemporâneo (para não cair na armadilha dos muitos conceitosque se encarniçam na disputa de levá-lo à pia batismal) se caracteriza pela multi-plicidade de facetas, pela complexidade (Morin) e por apontar sempre novas einúmeras possibilidades, parece coerente que a um movimento de imersão notecnológico se contraponha, entre outros, um olhar na direção da subjetividade,do inconsciente. Eles aparecem como pratos de uma mesma balança, a provocaro equilíbrio pela disputa/tensão. Das três categorias lacanianas, o imaginário é

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aquele que nasce da constituição da imagem do corpo. Como o real é sempre daordem do impossível, o imaginário se constituirá a partir do engodo, da identi-ficação, da imagem. Nada mais coerente, portanto, do que admitir o quanto asociedade contemporânea se fundamenta nesse registro, valora-o e olha/de-senha o mundo de mãos dadas com ele. Morin alerta: “Toda sociedade com-porta indivíduos genética, intelectual, psicológica e afetivamente muito diversos,aptos, portanto, a pontos de vista cognitivamente muito variados.”1 E está jus-tamente nesse confronto a possibilidade de trincar o determinismo cultural eestimular dúvidas, incertezas, novas buscas/descobertas.

Assim, encerrar-se numa visão míope de determinismo tecnológico ou, pelo con-trário, lançar maldição eterna à tecnologia são posturas que, com certeza, nosimpedem de olhar na direção do horizonte, dando-nos conta de que somos pro-dutos e produtores de novas socialidades, de novas formas de relação, de novosusos para “velhos objetos”, mas também de velhos usos para “novos objetos”.É importante aceitarmos a premissa de que o imaginário é o oxigênio de todasas culturas.

Marlene Branca SólioMarlene Branca SólioMarlene Branca SólioMarlene Branca SólioMarlene Branca SólioEditora

11111 MORIN, E. O método 4. 3. ed. Porto Alegre: Sulina, 2002. p. 33.

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José D’Assunção BarrosJosé D’Assunção BarrosJosé D’Assunção BarrosJosé D’Assunção BarrosJosé D’Assunção Barros22222

RESUMORESUMORESUMORESUMORESUMO

Este artigo – voltado para as discussões estabelecidas desde a segunda metade do século XXentre as possíveis interações entre História, cultura e imaginário – busca desenvolver um paralelocomparativo entre história das mentalidades, Psicoistória e história do imaginário, esclarecendoalguns aspectos relacionados a essas modalidades da História e discutindo a historiografiapertinente a cada um desses campos. O artigo remete à obra recentemente publicada pelo autordeste texto, cujo principal objetivo é o de elaborar uma visão panorâmica das diversas modalidadesda História nos dias de hoje.

Palavras-chave: Palavras-chave: Palavras-chave: Palavras-chave: Palavras-chave: História do imaginário. História das mentalidades.Imaginário político. Imagem.

ABSTRACTABSTRACTABSTRACTABSTRACTABSTRACT

This article – directed to the discussions that have been established since the second half of thetwenty century around the possible interactions between History and imaginary – attempts toelaborate a comparative parallel between history of mentalities, psicohistory and history of imagi-nary, clarifying some aspects related to these fields of History and discussing the historiographerproduction concerning to which one of these modalities. The article refers to a recently publicizedwork of the author of this text, witch principal subject was to elaborate a panoramic view of thevarious fields in which ones the historical knowledge is divided nowadays.

Key wordsKey wordsKey wordsKey wordsKey words: History of imaginary. History of mentalities. Political imaginary. Image.

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mundo contemporâneo tem se mostrado, desde primórdios do séculoXX, cada vez mais, um espaço a ser percebido e vivenciado por meio deimagens e amparado por suportes que vão dos mais modernos meios de

comunicação aos recursos computacionais. Em meio ao desenvolvimento deáreas do conhecimento que vão das ciências da comunicação aos saberes “psi”,neste novo mundo de possibilidades imagísticas, os discursos visuais e oscircuitos da imaginação passaram a desempenhar um papel tão significativocomo os discursos verbais no que se refere à produção de um conhecimentosobre a vida humana. Na verdade, o visual e o verbal são discursos que cada vezmais, enfaticamente, se entrelaçam. Mais do que isso, o imaginário – comportandoaqui não apenas as imagens visuais, mas também as imagens mentais e oníricas,o universo simbólico e os modos de representação – atualiza um fator que nãopode ser mais ignorado por nenhum campo do saber inserido no âmbito dasCiências Sociais, das Ciências Humanas e das Ciências da Comunicação. AHistória – enquanto área de saber que estuda especificamente “o homem notempo”, a partir de todas as dimensões de sua vida social – não constituicertamente exceção.

É assim que, dentro de uma fascinante profusão de campos intradisciplinaresque têm revelado um sensível enriquecimento dos estudos históricos no quese refere ao interesse por novos objetos e por novas abordagens, a historiografiada segunda metade do século XX assistiu precisamente à emergência de cam-pos do saber historiográfico que passaram a valorizar o universo mental dosseres humanos em sociedade, os seus modos de sentir, o imaginário por eleselaborados coletivamente. A modalidades já tradicionais como a História Política,a História Econômica ou a História Social, os novos historiadores propuseramacrescentar a história das mentalidades, a psicoistória, a história do imaginário.Teremos aqui campos que com alguma freqüência se interpenetram no queconcerne aos seus objetos, às suas fontes privilegiadas, às suas abordagense aportes teóricos, às suas conexões com outros saberes e aos seus padrõesde interdisciplinaridade. Contudo, cada um desses campos conservasingularidades e aspectos que nos permitem separá-los entre si como espaçosintradisciplinares bem diferenciados.

O objetivo deste artigo será o de clarificar as diferenças e similitudes entre essescampos historiográficos que têm atentado mais enfaticamente para o estudodos padrões mentais, dos modos de sentir e dos imaginários coletivos nos váriosperíodos históricos, o que implica que abordemos mais particularmente a históriadas mentalidades, a psicoistória e a história do imaginário.

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Será bastante oportuno iniciar esta discussão crítica com um examedos aspectos que têm permitido identificar essa modalidade historiográficaque se mostrou polêmica desde os seus primórdios: a história das mentalidades.Essa nova modalidade da História, que tem precursores já na primeira metadedo século XX, mas que, rigorosamente, começa a se delinear como um novoespaço de ação para os historiadores na segunda metade do século, propunha-se a enfocar a dimensão da sociedade relacionada ao mundo mental eaos modos de sentir, ficando, a partir daí, sob a rubrica de uma designaçãoque tem dado margem a grandes debates que não poderão ser todos por-menorizados aqui.3

Terá certamente contribuído para esta polêmica o fato de que os historiadoresdas mentalidades foram os primeiros a se interessar por determinados temasnão convencionais, desbravando certos domínios da História que os historiadoresainda não haviam pensado em investigar. Assim, Robert Mandrou propôs-se aestudar a longa persistência de certos modos de sentir que motivaram a práticada feitiçaria e sua repressão, no livro Magistrados e feiticeiros na França doséculo XVII (MANDROU, 1979); Jean Delumeau impôs a si a tarefa de examinarum complexo de medos de longa duração que haviam estruturado o modo desentir do homem europeu durante muito tempo, e cuja lenta superação permitiua passagem para o mundo moderno (DELUMEAU, 1989); Philippe Ariès (1981) eMichel Vovelle (1982) empenharam-se dedicadamente a analisar historicamenteos sentimentos do homem diante da morte.

De certo modo, por força dos novos e imprevisíveis objetos que traziam à tonacom bastante audácia – e em virtude de sua tendência dedicar anos de umexaustivo trabalho intelectual a temas que deles fizeram verdadeiros especialistasem objetos historiográficos até então considerados insólitos – os historiadoresdas mentalidades vieram a constituir uma espécie de vanguarda da tendência daNova História da segunda metade do século XX em se tornar uma espécie de“história em migalhas”, para utilizar aqui a famosa expressão que deu um títuloao impactante livro de François Dosse sobre a passagem dos Annales para a

33333 Alguns artigos panorâmicos podem ser esclarecedores a respeito deste campo histórico: (1) Le Goff(1988, p. 68-83); (2) Ariès (1990, p. 154-176); (3) Darton (1990, p. 225-255).

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Nova História (DOSSE, 1994).4 Foram eles que primeiro exploraram certos temasque – a princípio recebidos pelos demais historiadores como estranhos ou exóticos– logo encontrariam um curioso lugar editorial entre uma multidão de outroscampos temáticos que posteriormente marcariam, através de uma miríade denovas especialidades relativas aos “domínios” históricos, a tendência àfragmentação que parecia deixar definitivamente para trás as antigas ambiçõesde realizar uma “história total”.

Devido à sua exploração ousada de certos temas até então incomuns, a históriadas mentalidades produziu, no seu nascedouro, uma forte estranheza que logodespertaria acirradas polêmicas. Mas é muito importante ter em vista que ahistória das mentalidades não pode ser definida essencialmente com base nessesnovos domínios historiográficos que ela passou a privilegiar em um primeiromomento. Mesmo porque, posteriormente, esses mesmos domínios tambémforam retomados por outros campos da História que pouco ou nada têm a vercom a história das mentalidades.

Rigorosamente, qualquer tema pode ser trabalhado a partir dos vários enfoquesque classificaremos aqui como relacionados às “dimensões” sociais (a política,a economia, a cultura, as mentalidades, o imaginário, e assim por diante).5

Assim, uma história da morte pode ser trabalhada pela história demográfica,pela história política, pela econômica, e não apenas pela história dasmentalidades. Em contrapartida, temas já tradicionais como o do “nacionalismo”ou o da “religião” podem ser igualmente examinados da perspectiva de umahistória das mentalidades. Não são, portanto, domínios privilegiados peloshistoriadores das mentalidades que definem o tipo de história que fazem, mas

44444 Na verdade, a expressão “história em migalhas” chegou a ser referida de maneira afirmativa (nãodepreciativa) por Pierre Nora – organizador de uma coletânea de artigos da Nova História francesa. PierreNora enunciou a expressão em uma entrevista concedida a um jornal francês em 1974, e com ela anunciavaa consolidação de uma moda que passava a privilegiar as curiosidades, os temas exóticos ou pelo menos oestudo de objetos muito particularizados em contraste com os antigos projetos de produzir uma grandehistória total.

55555 Em O campo da história: especialidades e abordagens, propõe-se um esclarecimento dos critérios a partirdos quais são pensados e repensados os vários campos e modalidades da História. Ao lado das abordagens,que se referem aos métodos e modos de fazer, e dos domínios, que se referem a campos temáticosprivilegiados pelos historiadores, as dimensões correspondem àquilo que o historiador traz para primeiroplano no seu exame de uma determinada sociedade: a política, a cultura, a economia, a demografia, e assimpor diante. Apenas para exemplificar com um exemplo de cada uma dessas modalidades, a história oralseria uma abordagem, a história das mulheres seria um domínio, e a história cultural seria uma modalidadehistoriográfica relacionada a uma dimensão. (BARROS, 2004).

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sim a dimensão da vida social para a qual os seus olhares se dirigem: o universomental, os modos de sentir, o âmbito mais espontâneo das representaçõescoletivas e, para alguns, o inconsciente coletivo.

A verdadeira polêmica que envolve a história das mentalidades é teórica emetodológica. Apenas para registrar alguns problemas pertinentes a esse campohistoriográfico que se consolida a partir da década de 60, mencionaremos aquias questões fundamentais que devem ser refletidas pelo historiador que ambicionatrilhar esses caminhos de investigação. Existirá efetivamente uma mentalidadecoletiva? Será possível identificar uma base comum presente nos “modos depensar e de sentir” dos homens de determinada sociedade – algo que una “Césare o último soldado de suas legiões, São Luís e o camponês que cultivava assuas terras, Cristóvão Colombo e o marinheiro de suas caravelas?” Essasimagens, extremamente oportunas, foram celebrizadas por Lucien Febvre.

Abraçando a perspectiva teórica de que existem de fato mentalidades coletivas, ohistoriador deve ampliar a sua concepção documental. Conforme assinala FrançoisFuret (1991, p. 93), se o historiador das mentalidades pretende alcançar níveismédios de comportamento, não pode se satisfazer mais apenas com a literaturatradicional do testemunho histórico, que é inevitavelmente subjetiva, não re-presentativa, ambígua. Assim, como veremos adiante, ocorreu um casamento felizentre a história das mentalidades (um campo histórico que se refere a uma “di-mensão”) e a História Serial (um campo histórico que se refere a uma “abordagem”).A revalidação dos estudos de natureza qualitativa, ao lado da abordagem serial,não esteve, contudo, alheia a outros historiadores das mentalidades – como nocaso de Vovelle, historiador marxista das mentalidades que defende, em importanteartigo de 1982, o uso das duas abordagens como igualmente válidos para captara dimensão mental de uma sociedade. (VOVELLE, 1987, p. 31).

Para resumir três ordens de tratamento metodológico que os historiadores dasmentalidades têm empregado na sua ânsia de captar os modos coletivos de pensare de sentir, poderemos registrar precisamente: (1) a abordagem serial; (2) a eleiçãode um recorte privilegiado que funcione como lugar de projeção das atitudes coletivas(uma aldeia, uma prática cultural, uma vida), ou, finalmente; (3) uma abordagemextensiva de fontes de naturezas diversas. Nesse último caso, enquadra-se a obraO homem diante da morte, de Philippe Ariès. Nessa ambiciosa obra, lança-se mãodos mais diversos tipos de fonte – desde os escritos de todos os tipos (obrasliterárias, textos hagiográficos, poemas, canções, crônicas oficiais, testemunhosanônimos) até as fontes iconográficas e os objetos da cultura material. Vovelle

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denomina a essa utilização de um universo de fontes tão heterogêneos, percorridomais ou menos livremente, de técnica “impressionista”. (1987, p. 51).

Ele mesmo já utiliza a segunda ordem de procedimentos a que atrás nos re-feríamos: de modo geral, prefere a abordagem serial. Em sua tese de 1978sobre a Piedade barroca e descristianização (VOVELLE, 1978), examinou comprecisão e método milhares de testamentos provençais – sempre de forma maciçae procurando enxergar serialmente padrões e deslocamentos de padrões quedenunciassem as variações das atitudes diante da morte na longa duração por eleescolhida. Quando examina fontes iconográficas, afasta-se da abordagem qualitativalivre para avaliar topicamente a recorrência e a ruptura de certos modos de repre-sentar, às vezes medindo espaços no interior da representação iconográfica equantificando elementos figurativos. Se vai às fontes da cultura material, à arqui-tetura funerária, por exemplo, faz medições das distâncias que separam túmulos ealtares. Sua abordagem é, portanto, sistemática, cuidadosamente preocupada coma homogeneidade das fontes e com o seu lugar preciso dentro da série.

A derradeira ordem de tratamentos metodológicos corresponde à já mencionadaeleição de um recorte privilegiado que funcione como lugar de projeção das atitudescoletivas ou de padrões de sensibilidade. Pode ser um microcosmo localizado ouuma vida, desde que o autor os considere significativos para a percepção de umamentalidade coletiva mais ampla.

Febvre, precursor distante dos estudos de mentalidade, havia tentado precisamen-te essa via. Já em 1942, em sua famosa obra sobre Rabelais, o historiador francêsse propunha – a partir da investigação de um único indivíduo – identificar ascoordenadas de toda uma era. (FEBVRE, 1962). A abordagem é criticada por CarloGinzburg – historiador mais habitualmente classificado na interconexão de umahistória cultural (dimensão) com uma Microistória (abordagem).6 Ao contrário deFebvre, Ginzburg opta por instrumentalizar o conceito de “mentalidade de classe”em sua obra O queijo e os vermes. (1989, p. 34). Nesse último caso – em quetoma como documentação principal os “registros inquisitoriais” do processo deum moleiro italiano perseguido pela Inquisição no século XVI – Ginzburg mantém-

66666 A microistória corresponde a uma modalidade da História que procura empregar uma nova escala deobservação no exame das sociedades históricas. Elegendo como campo de observação um determinadolocus bem circunscrito – uma vida anônima, uma prática social localizada, uma comunidade – a microistóriaalmeja conhecer através da gota-d’água algo do oceano inteiro. Para utilizar uma metáfora comum entre osmicroistoriadores, abandona-se aqui o “telescópio” em favor do “microscópio”, o olhar panorâmico edistanciado em favor do olhar detalhista e aproximador.

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se atento à questão da “intertextualidade”, isto é, ao diálogo que o discurso domoleiro Menocchio estabelece implicitamente com outros textos e discursos.

Dessa forma, embora ambos os historiadores partam de um estudo de casoindividual, a abordagem tornou-se distinta. Ressalte-se, no tratamento historio-gráfico levado adiante por Ginzburg, a já mencionada preocupação em identificaros vários registros dialógicos presentes em uma mesma fonte – preocupaçãoque se coaduna muito intimamente com um dos setores da chamada novahistória cultural. Assim, para além do discurso externo do próprio Menocchio,visível na superfície de suas fontes, o historiador italiano toma por objeto amultiplicidade de discursos que o constituem; e, além disso, evita a pretensãode reconstituir uma “mentalidade de época”. Sua metodologia funda-se emuma análise dialógica e intensiva das fontes. Seu enfoque, como se disse, émais propriamente cultural.

Uma nova história cultural, aliás, vem fortalecendo cada vez mais uma alternativapara o tratamento de certos temas que até então foram campos privilegiadospelos historiadores das mentalidades. Ainda assim, é preciso reconhecer que ahistória das mentalidades, sobretudo através dos historiadores franceses daNovelle Histoire, proporcionou uma significativa abertura aos novos modos defazer a História, inclusive deixando sua margem de influências na historiografiabrasileira da década de 80. É verdade que, para o caso da maioria dos nossoshistoriadores, ela raramente foi uma influência única e linear, aparecendo habi-tualmente combinada a outras influências e entrelaçada com outras subespe-cialidades da História.

Apenas como um exemplo entre outros possíveis, a historiadora Laura de Melo eSouza – autora de obras que vão de Os desclassificados do ouro (1993) atéInferno atlântico (1982) – reconhece em seu trabalho uma influência importanteadvinda de historiadores das mentalidades como Geremek e Mandrou,7 masacrescenta que suas influências ou inserções mais importantes referem-se àetnoistória e à história da cultura, neste último caso a partir das obras de Ginzburg.(MORAES; REGO, 2001, p. 377). Já João José Reis – autor do já clássico A morteé uma festa (1991) – reconhece a importância para o amadurecimento de seutrabalho da leitura dos historiadores franceses das mentalidades que estudaram

77777 O historiador polonês Bronislaw Geremek é autor de Os marginais parisienses nos sécs. XIV e XV; de Apiedade e a forca e de outras obras importantes.

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as atitudes diante da morte (ARIÉS, VOVELLE), mas situa sua principal coordenadaem uma história social da cultura inspirada no historiador marxista EdwardThompson. (MORAES; REGO, 2001, p. 329-330).

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Será oportuno discutir, em seguida, um campo ou subespecialidade da Históriaque por vezes se torna muito próximo da história das mentalidades: a psicoistória.Esse campo mostra-se definido ou atravessado por preocupações oriundas daPsicologia e por conceitos de diversos tipos, desenvolvidos no interior dessecampo do saber. O historiador das mentalidades Jean Delumeau, por exemplo,lança mão, em alguns momentos, de conceitos elaborados por Wilhelm Reich eErich Fromm.

Reich e Fromm desenvolveram noções que ainda poderão ser utilizadasfuturamente pelos historiadores. O primeiro envidou esforços no sentido deestabelecer a conceituação de um “caráter social”, que se constituiria a partir deuma interação entre a ideologia e o inconsciente, aqui representado por certospadrões e alternativas de comportamento que seriam interiorizadas pelosindivíduos que vivem em sociedade.8 Além disso, Reich chama a atenção para opapel da família na formação do tipo caráter individual que sustentaria a ordempolítica e econômica da sociedade. (REICH, 1969).9 Conseqüentemente, sugereque deveríamos examinar a estrutura da família e suas práticas de criação dosfilhos em uma época histórica para compreender como as realidades econômicassão traduzidas em política, ética e religião. Dito de outra forma, seria possívelanalisar as principais forças sociais presentes em determinada sociedade emfunção da situação familiar típica e da estrutura do caráter, o que toca pelos doislados no projeto de alguns dos historiadores das mentalidades que estudaram afamília e a criança, como Áries (1981).

88888 A idéia de que a ideologia torna-se psicologicamente internalizada ou fixada na estrutura de caráter doindivíduo aparece em Psicologia de massas do Fascismo. (REICH, 1933).

99999 É verdade que, em Reich, esse projeto permanece muito incipiente, já que, ao invés de empenhar-se emuma análise sistemática das diferentes estruturas históricas da família e de criação dos filhos, ele, grossomodo, reduz sua análise a dois tipos históricos básicos: o “patriarcado autoritário” e o “matriarcado tolerante”,fixando-se em 4000 a. C. a transição de um modelo a outro. Em todo caso, desconta-se o fato de que Reichnão era historiador e nem tinha a erudição histórica de um Fromm.

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Aprimorando o conceito de “caráter social”, Erich Fromm também se expressaem termos de um “filtro condicionado socialmente”.10 O “filtro social” seriaconstituído por uma série de elementos, como a linguagem, a lógica e os tabussociais, mas também por toda uma série de hábitos enraizados, de atitudesautomatizadas e de impulsos que dão origem a práticas culturais diversas. Éinteressante comparar o conceito de caráter social em Fromm com a noção de“mentalidade de época” que seria desenvolvida depois, no fim da década de60, por alguns historiadores franceses ligados à Novelle Histoire. Para Fromm,o caráter social corresponderia a “um núcleo da estrutura do caráter que éinerente à maioria dos membros da mesma cultura, diferentemente do caráterindividual que varia entre as pessoas da mesma cultura”. (FROMM, 1959,p. 78). Ou seja, existiria em qualquer sociedade uma estrutura única de caráterque seria específica e comum à maioria dos grupos e classes que fizessemparte desta sociedade.

Por outro lado, em outra oportunidade, Fromm reconhece a noção de que diferentesclasses dentro da sociedade tenham um determinado caráter social sob cujabase diferentes idéias podem se desenvolver e adquirir força. (FROMM, 1964,p. 279). Para além disso, é importante ressaltar a adaptação de todas essasnoções aos princípios fundamentais do materialismo histórico, dos quais esseteórico, ligado à Escola de Frankfurt, parte primordialmente. Para Fromm, “ocaráter social é elo entre a estrutura econômico-social e as idéias e ideais queganharam difusão na sociedade”, e sua influência exerce-se nas duas direções:da base econômica às idéias e das idéias à base econômica – o que se sintonizacom a flexibilização do determinismo histórico que foi encaminhada por diversosautores marxistas importantes do século XX. (FROMM, 1963, p. 93).

Reich e Fromm, para não falar em Freud, são apenas dois dos muitos autoresque têm exercido alguma influência nos historiadores, ainda poucos, os quaistêm buscado constituir um campo novo a partir da interconexão entre Históriae Psicologia. Seria essa exploração mais sistemática de diversificadas noçõese conceitos desenvolvidos no âmbito da Psicanálise o que poderia distinguirmais propriamente a psicoistória (ou a psicologia histórica) da história dasmentalidades, já que o terreno em que ambas se movimentam seria, a princípio,o mesmo.

1010101010 O conceito de “filtro socialmente condicionado” é introduzido por Fromm para se referir à formação deum “inconsciente social” mais amplo. (FROMM, 1963, p. 125).

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Vale lembrar, para citar um exemplo, que tem influenciado mais incisivamente oshistoriadores da atualidade, que o sociólogo-historiador (e médico) Norbert Eliastambém percorreu caminhos similares ao examinar a interiorização de certosmodos de agir e de sentir que passam a condicionar os indivíduos em sociedade.Embora sem indicar Freud como interlocutor, o sociólogo alemão vale-se pordiversas vezes de noções oriundas do campo da Psicanálise – como as das“pulsões” – para embasar, já em 1939, seu mais célebre trabalho: O processocivilizador (1990). Trata-se de uma cuidadosa análise social que objetiva mostrarcomo a interiorização de certos hábitos é o contraponto psicossocial de umprocesso civilizador que foi se produzindo desde o período medieval, e que seinstala gradualmente no Ocidente a partir de poderes centralizados em torno dosmodernos estados nacionais.

Em diversos aspectos, O processo civilizador tem ligações muito definidas com Asociedade de corte (1986),11 obra anterior em que Elias já havia estabelecidoclaramente os parâmetros do tipo de sociologia histórica que pretendia propor. Aidéia é examinar, explica ele na introdução dessa última obra, não os indivíduosdo passado histórico tomados como únicos em si mesmos e como possuidoresde uma expressiva liberdade para agir no mundo histórico (tendência que Eliassugeria ser a dos historiadores alemães de seu tempo), mas a rede deinterdependências e condicionamentos que inscreveriam todos esses sereshumanos em sociedade. Isso explica, aliás, a atualidade da obra de Elias: nodecurso do século XX foi se afirmando cada vez mais uma historiografia que seopunha precisamente ao historicismo criticado pelo sociólogo alemão, tanto noque se refere ao surgimento da vertente francesa, inaugurada pela chamadaEscola dos Annales, como por meio dos novos desenvolvimentos historiográficosinscritos no materialismo dialético. Assim a sociologia histórica proposta porElias – diretamente preocupada com as determinações que impõem um limiteaos destinos pessoais – foi sendo identificada cada vez mais com uma Históriaque avançou na mesma direção nas suas inúmeras modalidades.

É interessante constatar, aliás, que mesmo no período pós-Annales e pós-No-velle Histoire, marcado por novos desenvolvimentos como a microistória, umaobra como A sociedade de corte continua a mostrar-se sintonizada com algunsdos mais recentes caminhos historiográficos. O que se faz nesta obra, senão

1111111111 Embora a sua primeira publicação somente tenha ocorrido em 1969, essa obra é anterior a O processocivilizador, já contando com uma edição praticamente definitiva em 1933.

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tomar um universo microrrecortado – a corte dos reis de França entre Francisco Ie Luís XIV com todo o seu sistema ritualizado pela etiqueta – para, a partir daí,examinar a rede de relacionamentos e imposições de comportamento que passama constranger os indivíduos, produzindo, de um lado, estratégias daqueles quesão obrigados a se movimentar nesse sistema, e, de outro, automatismos aserem decifrados pelos sociólogos e historiadores? O que se faz nesta obra,ainda, senão uma tentativa de apreender a sociedade do Antigo Regime a partirdessa formação social mais específica que é a “corte principesca”, oferecendoàqueles que puderem decifrá-la as chaves para compreender padrões decomportamento que se difundem para a sociedade mais ampla?

Para utilizar um comentário pertinente de Roger Chartier, que tomaria mais tardea obra de Elias como um dos modelos de sua história cultural, é possível dizerque o que o sociólogo alemão está propondo é precisamente “estabelecer asleis de funcionamento das formas sociais a partir de um exame minucioso deuma de suas atualizações históricas”. (CHARTIER, 1990, p. 91-119). Trata-se,então, de dar uma tríplice utilidade a este estudo de caso: por um lado utilizando-o para compreender certos aspectos do Antigo Regime; por outro, aproveitando-o para investigar, a partir das comparações com que Elias enriquece o livro, seuma formação social como a “corte” produziria efeitos similares em outrassociedades; por fim – e é este o aspecto que nos interessa mais especificamentenesta seção em que estamos abordando a psicohistória – Elias propõe-se aexaminar a função da corte em um processo de civilização que transformaradicalmente a economia psíquica dos homens entre os séculos XII e XIII.

O objetivo central de O processo civilizador também se enquadra perfeitamentenesse campo intradisciplinar que poderia ser definido como uma psicoistória, ounesses interstícios situados entre a História e a Psicologia (e que Elias pretendiainscrever no interior do campo sociológico). Trata-se de investigar, nessa obra de1939, a variação das normas de agressividade no tempo e de examinar comoessas normas se refinam (ou civilizam-se) de modo a transferir um controle queantes era exercido de fora para um espaço intra-individual e intersubjetivo onde oindivíduo entroniza as regras e interdições sociais até que passa a agirautomaticamente, de maneira autocoativa. Dito de outro modo, o que Elias estáestudando nesse livro é a formação de um psiquismo específico no homemocidental, que está precisamente ligado a motivações socioistóricas.

Na verdade, o enquadramento de O processo civilizador em um campo que poderiaser definido como uma psicoistória é autorizado pelo próprio Elias, já que no

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segundo volume dessa obra ele reclama precisamente a constituição de umaciência humana que ainda não existia, e que poderia ser chamada “psicologiahistórica”, vindo essa a ocupar o vazio produzido pelo abismo que separa umaHistória não-psicologizada de uma Psicologia que recusa a si mesma pensarhistoricamente seus objetos. (ELIAS, 1990):

Exatamente porque o psicólogo pensa não-historicamente, porque aborda as es-truturas psicológicas dos homens de nossos dias como se fossem algo semevolução ou mudança, os resultados de suas investigações de pouco servem aohistoriador. E porque, preocupado com o que chama de fatos, evita problemaspsicológicos, o historiador pouco tem a dizer ao psicólogo (p. 234).

É esse diálogo de surdos, onde psicólogos e historiadores habitam constelaçõesteóricas separadas por anos-luz de incompreensão mútua, o que Elias propõe-sea superar. A Psicologia Social Histórica, tal como a define o sociólogo alemão emoutro passo de O processo civilizador, deveria produzir estudos simultaneamentepsicogenéticos e sociogenéticos. E é isso o que Elias realiza efetivamente comsuas obras.

Elias foi, na verdade, um crítico contumaz da Psicanálise enquanto campo de sa-ber até então redutor e habitualmente tendente à não-historicização. Criticou-lhe –além da a-historicidade – a utilização dos conceitos de Ego, Id e Superego paraidentificar compartimentos separados da mente humana, propondo, ao contrário,uma atenção especial às relações entre esses três conjuntos de funções psico-lógicas. Seu objetivo era investigar as relações entre os sentimentos controladospelos indivíduos humanos e aquelas agências controladoras da psique, mas cha-mando a atenção para o fato de que a estrutura média ou habitual dessas agênciascontroladoras (ego, superego) vai se transformando no decurso de um processocivilizador como aquele que foi sendo produzido socialmente no Ocidente, na medidaem que se sofisticava e se transmudava a rede de interdependências humanas.Introduzir simultaneamente uma abordagem social e uma profunda consciênciahistórica no âmbito da Psicologia foi a sua pedra de toque.

Da mesma forma, Elias foi crítico arguto da historiografia alemã de sua época,seja a associada àquele tipo de história das idéias que almejava investigar opensamento humano desencarnado de sua sociedade, seja a historiografiaque, a título de examinar a sociedade nas suas relações concretas, acabavapor abstrair essa sociedade de um universo mental que constitui parte funda-mental de sua própria vida. Romper o isolamento injustificável entre essesdois tipos de História, e reinstaurar o diálogo de uma História simultaneamente

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mental e concreta com a disciplina Psicologia – esse foi um dos seus projetosmais pessoais, vindo a se constituir em uma contribuição decisiva para essecampo que rigorosamente nem começou ainda a se formar, mas que desde jápoderemos chamar psicoistória.

Os maiores riscos que rondam a psicoistória envolvem, de um modo ou de outro,os chamados “perigos do Anacronismo”. O que é Anacronismo? Em primeirolugar, é preciso considerar que o historiador, ao examinar uma determinadasociedade localizada no passado, está sempre operando com categorias de seupróprio tempo (mesmo que ele não queira). Daí aquela célebre frase de BenedettoCroce, que dizia que “toda história é contemporânea”. Isso quer dizer que mesmoa História Antiga e a História Medieval são histórias contemporâneas, porquefeitas pelos historiadores de nosso tempo (e voltadas para leitores de nossotempo). Há uma tensão muito delicada que envolve essa inarredável característicado trabalho historiográfico: por um lado, o historiador deve conservar a consciênciade que trabalhará com as categorias de seu tempo (as únicas que lhe serãopossíveis), mas de outro deverá evitar que essas categorias deturpem as suaspossibilidades de compreender os homens do passado, que tinham as suaspróprias categorias de pensamento e de sensibilidade. Por exemplo, os métodosque um historiador emprega serão sempre métodos seus, desenvolvidos na suaprópria época: ele poderá empregar os recursos da análise semiótica, somentedesenvolvidos recentemente, para examinar fontes da história antiga ou me-dieval; e poderá elaborar novos conceitos, somente tornados possíveis no seutempo, para iluminar uma época anterior à sua.

Não há o menor problema nesses usos. Aliás, é precisamente o uso de novastécnicas, conceitos e modos de ver uma realidade passada o que assegura quea História de uma determinada época deverá ser sempre recontada. A questãodo anacronismo é muitas vezes mal-interpretada. Não tenho por que meconstranger de utilizar a expressão “ataque cardíaco” para uma morte dessetipo, ocorrida na Antiguidade greco-romana ou na Idade Média somente porqueos homens de então se referiam a esses males como “mal súbito”.

O que não posso é dizer que um determinado grupo de mulheres daquela época,dadas suas atitudes de resistência ao controle masculino em um tempo em queessas resistências não eram esperadas, fossem “feministas”. O erro, nessecaso, está em que estou lhes atribuindo uma categoria de pensamento quesomente surgiu nas mulheres do século XX – à luz de uma equivalente conquistade direitos políticos e de obtenção de espaço social e profissional – e transferindo

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isso para uma época em que o discurso feminista simplesmente não existia. Odiscurso feminista é datado e, na verdade, inseparável das condições de seusurgimento e perpetuação. Se quero tentar compreender as mulheres daAntiguidade e da Idade Média que resistiram à sociedade misógina de sua época,devo tentar perceber como elas viam o mundo, através de que categorias depensamentos, a partir de que práticas e representações. Devo examinar, alémdisso, a excepcionalidade ou não do comportamento deste ou daquele grupo,que sentido os componentes desse grupo atribuíam aos seus próprios discursos.Devo refletir longamente sobre as suas palavras (que certamente não incluirão aexpressão “porco chauvinista”). Metaforicamente falando, deverei sintonizar,nesse caso, essa singular estação que é a mulher antiga ou a mulher medieval,sempre com a consciência de que deverei apreender um idioma estrangeiro,diferente do meu.

Muitas vezes, alguns historiadores de nosso tempo, que aprendem desde cedona academia que o maior pecado para um historiador é o do anacronismo, quaseparecem se sentir tentados a mandar confeccionar um manto medieval paradepois se encerrarem nos seus gabinetes de estudo com uma roupa apropriadapara iniciar uma investigação sobre a ordem medieval dos templários. Não é issoo que os libertará dos riscos do anacronismo, e nem um eventual horror a utilizarcategorias teóricas contemporâneas na hora de analisar uma fonte histórica. Seassim fosse, a própria discussão sobre a possibilidade de diálogo entre a Históriae a Psicologia, ou entre a História e a Semiótica para citar um outro campo depossibilidades, seria inviável, já que não existiam esses campos de saber naquelasépocas mais remotas (e já que, rigorosamente, a própria História não existia damaneira como hoje concebemos esse campo do conhecimento).

O que o historiador não deve fazer, com vistas a evitar os riscos do anacronismo,é inadvertidamente projetar categorias de pensamento que são somente suas edos homens de sua época nas mentes das pessoas de uma determinadasociedade ou de um determinado período. Para compreender os pensamentosde um chinês da época dos mandarins, terei de me avizinhar dos códigos que(tanto quanto me for possível perceber) regeriam o universo mental dos chineses.Esse exercício de compreender o “outro chinês” é que tem que ser feito. Masnão é a análise que tem de ser chinesa.

Compreendido isso, poderemos retornar agora aos problemas do diálogo entreHistória e Psicologia. Febvre, em um texto visionário, deixou registrado um alertaque poderemos reproduzir literalmente aqui, já que diz tudo:

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Muito já dissemos para mostrar que, se evitarmos projetar o presente, o nossopresente, no passado; se rejeitarmos o anacronismo psicológico, o pior de todos, omais insidioso e o mais grave; se pretendermos esclarecer todas as atitudes dassociedades e, inicialmente, suas atitudes mentais, pelo exame de suas condiçõesgerais de existência – é evidente que não poderemos considerar como válidas, paraesse passado, as descrições e constatações de nossos psicólogos, operando sobredados que nossa época lhes fornece. É também evidente que uma psicologia históricaverdadeira só será possível pelo acordo, negociado claramente, do psicólogo com ohistoriador. Este orientado por aquele. Mas aquele claramente tributário do primeiro, eobrigado a procurá-lo, para criar suas condições de trabalho. Trabalho em colaboração.Trabalho em equipe, para falar mais claramente. (1953, p. 207-215).

A psicoistória, enfim, mostra-se um campo promissor, que requer naturalmenteos seus cuidados. Uma última tentação a evitar nos trabalhos que poderiam serenquadrados pela psicoistória é a de pretender psicanalisar os homens dopassado, como se pudessem “deitar-se no divã de um hipotético historiadorpsicanalista”.12 Naturalmente, sabe-se que o processo psicanalítico, pelo menosno sentido freudiano, necessita ser construído a partir de um discurso interativocom o “outro” – o que seria impossível no caso dos atores sociais do passadoque nos chegam por meio das fontes.

Para citar um último conjunto de historiadores que têm investido na conformaçãode uma ainda incipiente psicoistória, poderemos registrar que também entre oshistoriadores ligados à herança dos Annales começaram a surgir, no fim do séculoXX, algumas contribuições importantes. Desses, talvez o mais entusiasmadocom as possibilidades de diálogo com a Psicanálise seja Alain Besançon, que jáem 1974 escreveu um texto sobre o inconsciente para a obra coletiva da NovaHistória coordenada por Pierre Nora e Jacques Le Goff. (1988, p. 234). Fora docircuito francês, o grande marco nas tentativas de repensar as relações entreHistória e Psicanálise está registrado na obra Freud para historiadores (1985),de Peter Gay (1989). E a sua própria série de obras sobre os padrões de afetividadee sexualidade na época vitoriana dá uma idéia dos caminhos possíveis a partirdesse diálogo. (GAY, 1988).

1212121212 Essa imagem foi utilizada ironicamente por Le Roy Ladurie, que também dialoga eventualmente com ateoria psicanalítica (LADURIE, 1974, p. 284).

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Os novos objetos que audaciosamente os historiadores das últimas décadas doséculo XX passariam a explorar, tal como se disse, não se tornaram de modoalgum monopólios da historiografia das mentalidades. Ainda explorando oscaminhos da cultura e também o universo mental das sociedades, poderemosdelimitar agora as bases de um campo que pode ser definido como uma históriado imaginário – investimento historiográfico que começa por abrir mais umaalternativa à investigação daqueles objetos historiográficos que até então haviamsido seara, praticamente exclusiva, da história das mentalidades.

A história do imaginário estuda essencialmente as imagens produzidas por umasociedade, mas não apenas as imagens visuais, como também as imagens verbaise, em última instância, as imagens mentais. O imaginário será aqui visto comouma realidade tão presente quanto aquilo que poderíamos chamar “vida concreta”.Essa perspectiva sustenta-se na idéia de que o imaginário é também reestruturanteem relação à sociedade que o produz. Assim, basta lembrar como um exemploentre outros que, na Idade Média, muitos se engajaram nas Cruzadas menos porrazões econômicas ou políticas (embora estas sejam sempre evidentes) do queem virtude de um imaginário cristão e cavaleiresco. O imaginário mostra-se, dessaforma, uma dimensão tão significativa das sociedades humanas quanto aquiloque corriqueiramente é encarado como a realidade efetiva.

A elaboração de um conceito (ou de uma noção) de imaginário para as CiênciasHumanas deve muito a Cornelius Castoriadis, cuja obra de referência é A instituiçãoimaginária da sociedade (1982), e a historiadores como Le Goff e Duby.13 Nãodevem ser desprezadas as contribuições antropológicas, como as de GilbertDurand em As estruturas antropológicas do imaginário (DURAND, 1989), emborao historiador deva estar atento a um tratamento por vezes a-histórico quetransparece nesse livro. Todavia, como registro de um repertório milenar deimagens, devidamente interconectadas, essa obra é imprescindível.

A noção de imaginário é polêmica. Por um lado, ela conserva interfaces com anoção de “representação” e, em algumas situações, os campos originados poresses dois conceitos se invadem reciprocamente. Le Goff destacava que “o

1313131313 Um marco para o delineamento de uma história do imaginário é o prefácio de Le Goff para a suacoletânea de textos relativos a essa especialidade historiográfica (1980).

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imaginário pertence ao campo da representação, mas ocupa nele a parte da traduçãonão reprodutora, não simplesmente transposta em imagem do espírito, mas criadora,poética no sentido etimológico da palavra”. (LE GOFF, 1980, p. 12). Para o historiadorfrancês, como aliás para Castoriadis em sua obra pioneira sobre A invençãoimaginária da sociedade, o imaginário não pode ser examinado como algo estático.De certo modo, marca-se aqui uma distância em relação à noção de “mentalidade”,que evoca uma idéia maior de imobilidade ou de permanência em uma duraçãomais longa. Mas a isso voltaremos oportunamente.

Por ora, consideraremos o imaginário como um sistema ou universo complexo einterativo que abrange a produção e circulação de imagens visuais, mentais everbais, incorporando sistemas simbólicos diversificados e atuando na construçãode representações diversas. De acordo com essa definição, existe uma interfacepossível do imaginário não apenas com o campo das “representações”, mastambém com o âmbito dos “símbolos”. Nesse sentido, deveremos lembrar queé possível se falar em “simbólico” apenas quando um objeto, uma imagem ouuma representação são remetidos a uma dada realidade, idéia ou a um sistemade valores que se quer tornar presente (a espada como símbolo da justiça). Umaimagem, portanto, pode se ver revestida de significado simbólico, conformeveremos adiante com o exame de algumas imagens apropriadas politicamente.

A noção de imaginário, de qualquer modo, é complexa e aberta a sentidosdiferenciados, o que não impede que tenha gerado uma dimensão historiográficaimportante. Para encontrar uma obra precursora no campo da historiografia, devemosir ao clássico de Johannes Huizinga, escrito em princípios do século XX e traduzidopara o português com o título O declínio da Idade Média (1978). Nessa obra, ohistoriador holandês circula livremente entre as imagens visuais e verbaisperceptíveis através da produção cultural das sociedades franco-flamengas de finsda Idade Média, antecipando, em décadas, um campo histórico que somentepassaria a receber uma atenção mais sistemática dos historiadores a partir dadécada de 70. Suas fontes são constituídas tanto de textos literários como deobras iconográficas. Adicionalmente, Huizinga também toca na questão dedeterminados modos de sentir que seriam comuns a todos os homens medievais,o que o coloca também como um precursor da história das mentalidades.

Tal como se disse, os primeiros domínios históricos a serem percorridos pelamoderna história do imaginário coincidiram de certa forma com aqueles quecomeçaram a ser desbravados pelos historiadores das mentalidades na décadade 60. Ginzburg, por exemplo, ocupou-se de recuperar um imaginário das práticas

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de feitiçaria em Os andarilhos do bem (1991). Todavia, embora existam algunsobjetos em comum, a história do imaginário guarda alguma distância em relaçãoà história das mentalidades.

Essa última está muito associada à idéia de que existe em qualquer sociedadealgo como uma “mentalidade coletiva”, que para alguns seria uma espécie deestrutura mental que somente se transforma lenta, às vezes dando origem apermanências que se incorporam aos hábitos mentais de todos os que participamda formação social (apesar de transformações que podem estar se operandorapidamente nos planos econômico e político).

A história do imaginário não se ocupa propriamente dessas longas durações nosmodos de pensar e de sentir, mas da articulação das imagens visuais, verbais ementais com a própria vida que flui em uma determinada sociedade. Foi o que LeGoff pretendeu fazer em sua obra O nascimento do purgatório (1990), em quebusca investigar a mútua interação entre o imaginário religioso medieval e asociedade que o produziu.

Por outro lado, nota-se que, em geral, os historiadores das mentalidades estãosempre no encalço de algo que, grosso modo, é bem mais abstrato do que asimagens bem definidas investigadas pelos historiadores do imaginário. A históriadas mentalidades busca captar modos coletivos de sentir (a história de umsentimento como o “medo”), padrões de comportamento e atitudes recorrentes(os complexos mentais e emocionais que estão por trás das crenças e práticasda feitiçaria, as atitudes do homem diante da morte). Já a história do Imagináriovolta-se para objetos mais definidos: um determinado padrão de representações,um repertório de símbolos e imagens com a sua correspondente interação navida social e política, o papel político ou social de certas cerimônias ou rituais, arecorrência de determinadas temáticas na literatura, a incorporação de hierarquiase interditos sociais nos modos de vestir, a teatralização do poder.

Uma pequena comparação de casos poderá contribuir para clarificar a questão.Na História do medo no Ocidente, de Delumeau, procura-se captar um complexode medos que faziam parte da constituição da mentalidade coletiva do homemocidental, considerando-se um período de longa duração que tem seus primórdiosna Idade Média e que o autor examina até o século XVIII.

Habituados a um mundo rural fechado em redes senhoriais e controles privados,que somente conheceria uma reintensificação do comércio a partir do século XII

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e que, mesmo nesse processo de reurbanização, será um mundo de cidadesmuradas e de castelos fortificados ou acostumados desde a mais tenra infânciaa partilhar a vida diária entre as permanências pagãs e um sobrenatural religiosocristão; assaltados outras vezes pela peste e pelas invasões de povos que lhespareciam bárbaros, os homens medievais desenvolveram uma série de medosque eram partilhados pela totalidade social. Apesar das transformações políticase sociais a partir do século XIII, os homens da Baixa Idade Média e do princípiodo período moderno haviam herdado permanências seculares, que só poderiamser alteradas em ritmos muito lentos ou então sob estímulo de alguns dosacontecimentos traumáticos do princípio dos tempos modernos.

Para resumir o complexo de medos ocidentais rastreados por Delumeau, pode-remos mencionar o medo do mar, o medo do desconhecido, o medo da noite, omedo das florestas não-desbravadas que constituíram verdadeiras fronteirasinternas ainda nos tempos feudais, o medo dos leprosos e da Peste Negra, esobretudo o medo do “outro” – que podia se voltar contra os judeus, contra osmuçulmanos, contra as bruxas ou contra os simples forasteiros. Medo, por fim,do Diabo – a quem os vários “outros” eram constantemente assimilados.

Esses medos só a custo foram sendo vencidos quando o homem ocidental co-meçou e continuou a desbravar as suas florestas internas, quando se lançou àsgrandes viagens oceânicas, ou à aventura do intercâmbio com povos os maisdiversos, ou mesmo quando começou a decifrar racionalmente uma naturezaque até então lhe parecera enigmática e mesmo assustadora. Os desbravadoresque se lançavam a outras terras como Marco Polo, como os alquimistas quequeriam decifrar o mundo natural e sobrenatural, como os novos comerciantesde longo curso, como os cruzados ou como os missionários, eram pessoas queenfrentavam e lutavam contra esses vários medos coletivos.

A caminhada para a modernidade aparece, assim, como uma trajetória de supe-ração desses medos seculares, talvez em direção a novos medos a serem inven-tados de acordo com as circunstâncias histórico-sociais. Essas longas perma-nências no âmbito dos modos de sentir – produtoras de medos coletivos que emalgumas ocasiões eram manipulados pelos donos do poder – são tratadas porDelumeau como mentalidades.

Em que objetos está interessado o historiador nesse caso? Busca compreenderos medos coletivos que aparecem aqui como “modos de sentir” a serem parti-lhados por todos e que, além de ocuparem uma longa duração, estendem-se por

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todos os espaços – não a uma pequena aldeia, ou sequer à França, mas aoOcidente cristão. Mais ainda, esses modos de sentir atravessam as classes,passam a se insinuar na análise do historiador como elementos constituintes daestrutura mental dos homens de toda uma época.

Um historiador do imaginário estaria menos interessado nesses modos coletivosde sentir do que nas imagens socialmente produzidas, mesmo que em algunscasos essas imagens sejam produzidas por padrões coletivos de sentimento ede sensibilidade.

Quando um autor como Claude Kappler escreve a sua obra sobre Monstros,demônios e encantamentos no fim da Idade Média (KAPPLER , 1994) – portantoabordando um recorte análogo e objetos muito próximos dos de Jean Delumeau –está muito particularmente interessado nas imagens e nos seus usos, no inventáriode fenômenos prodigiosos que assaltam a imaginação dos homens medievais, natipologia de monstros que se espalha pelos seus bestiários e que têm algo a dizersobre o contexto social em que foram produzidas, nas visões cosmográficas apartir das quais eram estabelecidas representações da Terra e do Universo, trazendoo Paraíso para um ponto qualquer no Oriente ou no topo do mundo.

É verdade que Kappler trabalha também com a perspectiva de uma longapermanência medieval, e por isso dialoga, em um de seus capítulos, com ahistória das mentalidades. Mas isso é circunstancial ao seu objeto – já que,conforme veremos, as imagens, as cosmovisões e os símbolos podem serproduzidos também por circunstâncias políticas, por necessidades sociais e atélocais, por artimanhas da poesia e da literatura, por arquitetura política pensadaou intuída, ou podem mesmo ser ocasionadas por grandes eventos que caemcomo raios na vida das sociedades. Durante o período Nazista, na Alemanha doséculo XX, por exemplo, um rico imaginário foi construído em poucas décadasem torno da suástica, da imagem do super-homem de raça pura, da simbologiado Reich e do papel do Führer no centro ou no topo desse imaginário político, umimaginário que aflora repentinamente, mesmo que recolhendo materiais secularescomo as idéias pan-germanistas e as hostilizações anti-semitas.

Mas deixemos por ora os demônios do século XX e voltemos aos de Kappler – aoseu imaginário de monstros, demônios e encantamentos da Idade Média. Queesse historiador está embriagado de imagens nas suas motivações historiográficasfica bem claro nas primeiras frases de seu trabalho. Ele nos conta que a idéia deseu livro germinou da contemplação das pinturas de Jerônimo Bosch – pintor

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renascentista que muitas vezes contrasta com seus contemporâneos pela profusão,em seus quadros, de um imaginário iconográfico riquíssimo onde abundam osmonstros, os seres fantásticos, os prodígios, as referências a um sobrenaturalmágico. Enquanto Delumeau está fascinado pela persistência de um modo desentir, Kappler está fascinado pelos modos de imaginar, de representar, de viverentre imagens visuais e verbais construídas pelos homens medievais.

Alguns talvez considerem a obra de Kappler sobre os monstros medievais umtanto descritiva, como se o seu objetivo principal fosse apenas o de inventariarum vasto universo de imagens que hoje causam estranhamento ou curiosidade.Descrever a imagem pela imagem é uma das tentações da história do imaginário.Mas convenhamos: uma história descritiva pode ser elaborada em qualquer umadas dimensões que estamos estudando: um historiador econômico pode se limitara descrever os ciclos e as flutuações de preços em um determinado período, eum historiador demográfico pode reduzir o seu trabalho à apresentação de curvasdemográficas e de dados sobre uma população de determinado local e época. Ahistória descritiva (como a história factual, que é a sua contrapartida entre oshistoriadores que se comprazem em narrar uma seqüência de eventos), pode sersempre confrontada com uma história-problema. Problematizações interessantespodem ser elaboradas em todas as dimensões e domínios historiográficos, comos mais diversificados métodos e abordagens.

O historiador do imaginário começa a fazer uma história problematizada quandorelaciona as imagens, os símbolos, os mitos, as visões de mundo a questõessociais e políticas de maior interesse – quando trabalha os elementos do ima-ginário não como um fim em si mesmos, mas como elementos para a compreensãoda vida social, econômica, política, cultural e religiosa. O imaginário deve fornecermateriais para o estabelecimento de inter-conexões diversas. Estão aí as obrasde Le Goff mergulhando nas estruturas sociais através das imagens do Purgatório,ou de Duby compreendendo a visão tripartida da sociedade através do imagináriodo feudalismo.

Esse contraste entre a busca de modos de sentir mais abstratos (medo, pavorda morte, afetos) e a intenção de decifrar a profusão de imagens visuais, verbaise mentais pode esclarecer algumas das fronteiras e dos pontos de contato entrea história das mentalidades e a história do imaginário. Com base no que até aquidiscutimos (pois a questão não se resume a isso, postulamos que a famosaobra em que Marc Bloch estuda Os reis taumaturgos (1993) é muito mais umaprecursora da história do imaginário do que de uma história das mentalidades.

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O que Bloch está examinando, nesse caso, é a persistência de um determinadoimaginário régio, de uma determinada crença popular em um aspecto muitoespecífico e delineado que seria a capacidade dos reis franceses e ingleses deduas dinastias medievais de curarem com um simples toque as “escrófulas”(sintomas visíveis de doenças pouco conhecidas na época). Bloch decifraprecisamente a imagem do “rei taumaturgo” e a sua apropriação política,investigando rituais e simbologias que com ela estariam relacionados. Não é,portanto, um modo genérico de sentir o que ele busca rastrear, mas a história deuma crença muito bem delineada e atrelada aos universos político e social de suaépoca, com base em um imaginário que tem uma história e que foi se entranhandona maneira medieval de conceber uma realeza que dialoga com a sacralidade.

De modo geral, a diferença entre história das mentalidades e história do imaginárioacaba por produzir uma tendência a abordagens distintas. Não raro, chega-se àsmentalidades de maneira indireta, freqüentemente através de indícios, de detalhesque são reveladores de atitudes coletivas e de modos de sentir comuns a todauma sociedade. Já o imaginário pode ser, muitas vezes, apreendido por umaanálise mais direta do discurso, seja um discurso verbal, seja visual, empregando,para tal, desde análises topológicas até recursos semióticos (e também métodosiconográficos e iconológicos para o caso das imagens visuais).

A independência de uma história do imaginário em relação a uma história dasmentalidades propriamente dita não impede que alguns historiadores tenhamatuado na articulação entre essas duas dimensões, como foi o caso do historiadordas mentalidades Vovelle, que, em um mesmo trabalho historiográfico buscou,perceber tanto os padrões de sensibilidade do homem diante da morte como asformas simbólicas que os acompanham.

Vale a pena registrar essa interconexão entre mentalidades e imagináriopercorrida com sucesso pelo historiador francês. O ponto de partida é umahipótese que se sustenta no conceito de mentalidade como estrutura de longaduração: teria ocorrido no Ocidente europeu do século XVIII (entre 1730 e1770) uma mudança radical na sensibilidade coletiva diante da morte e,na verdade, na sensibilidade religiosa em sentido mais amplo, uma vez que apartir desse período assiste-se ao que o historiador francês chama uma “des-cristianização”. (VOVELLE, 1981).

Partindo de uma história das mentalidades, calcada em uma hipótese que encaraa sensibilidade religiosa e mortuária do homem ocidental como uma estrutura de

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longa duração que se desgasta mais aceleradamente a partir do século XVIII,Vovelle chega a uma história do imaginário tanto pelo seu enfoque nas imagens,nos símbolos e nas representações como pelo tipo de fontes iconográficas quepostula serem indispensáveis para a percepção de certos aspectos dasrepresentações coletivas. (VOVELLE, 1981, p. 46). Dessa forma, abordando tantoa iconografia dos cemitérios (imagens visuais) como as comunicações fúnebres(imagens produzidas no âmbito da escrita), Vovelle revela o caminho percorrido:

Todo um trabalho de decifração se impõe a partir de indícios frágeis. Escrutinando osex-votos, o pesquisador medirá pacientemente a superfície, respectivamente do es-paço celeste de aparição e da cena terrestre; analisará, também, o gestual e o jogodos olhares pelo qual se estabelece a ligação entre os dois universos. Analisando asrepresentações do purgatório em sua evolução, sublinhará as mutações caracte-rísticas de um panteão de intercessores que, paulatinamente, vai se despovoandodo século XVII ao século XVIII. (1981, p. 42).

Vovelle revela-se um verdadeiro mestre em suas investigações sobre a religio-sidade e a morte – um mestre capaz de perceber o imaginário seja nos objetosde cultura material, seja nas fontes iconográficas, seja em documentação escritacomo os testamentos. Examina altares e retábulos, mede o tamanho de velas!Avalia as imagens verbais registradas nos epitáfios, seja para perceber asfórmulas estereotipadas que indicam permanências, seja para surpreenderaquele detalhe revelador, aquela lenta emergência de novas imagens verbais adenunciar simultaneamente a presença de um novo imaginário e de uma novasensibilidade diante da morte.

É preciso maestria para elaborar historiograficamente essas conversões dainformação visual em imagem mental, da informação escrita em imagem vi-sual, ou para fazer a passagem do discurso contido nas fontes de culturamaterial para o discurso verbal, e vice-versa. É a mesma maestria que nosrevela Ladurie, historiador que circula com a mesma desenvoltura entre umahistória da cultura material, uma história das mentalidades e uma história doimaginário, conhecendo os segredos da conversão de um desses campos nooutro. Para justificar esses elogios, será bastante reproduzir um pequeno trechode suas fontes – documentos inquisitoriais que registram os depoimentos deréus acusados de pertencerem à heresia cátara – e os subseqüentes comen-tários do historiador, hábil em perceber, em um pequeno extrato textual, todoum universo que abrange desde traços da cultura material de uma pequenacomunidade até os traços de sua “utensilhagem mental”, para utilizar umaexpressão de Febvre que Ladurie encampa conceitualmente:

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[texto da fontetexto da fontetexto da fontetexto da fontetexto da fonte]: “Um dia [conta Guillemette Clergue, cujo marido é violento] euprecisava de pedir emprestados alguns pentes para pentear o canhâmo e fui, paraesse efeito, à casa de meu pai. E, quando aí cheguei, encontrei o meu irmão quetirava o esterco de casa. E perguntei ao meu irmão:— Onde é que está a senhora minha mãe?— E que lhe quereis? replicou ele.— Quero alguns pentes, disse eu.— A nossa mãe não está aqui, concluiu o meu irmão. Foi à água. Só voltará daqui aum bom bocado. Não acreditei no meu irmão e tentei entrar em casa. Então, o meu irmão pôs o braçodefronte da porta e impediu-me de entrar.”

[comentário do historiadorcomentário do historiadorcomentário do historiadorcomentário do historiadorcomentário do historiador]: “Texto notável! A porta é estreita; foi barrada por umsimples braço de homem: a porta cheira a esterco; Alazais Rives, a mãe, é aguadeirada domus do seu homem, como todas as outras. Isto não impede que esta mamãmuito vulgar tenha o direito ao título de Senhora (“minha senhora”!) por parte de suafilha Guillemette Clergue. Esta família é, por outro lado, um ninho de escorpiões; oslaços são no entanto ritualizados. O irmão trata por vós a irmã, o que não o impedede ser brutal para com ela.” (LADURIE, 1983, p. 252).

A partir de um registro verbal, aparentemente tão despretensioso, Ladurie traz àtona a materialidade das habitações, os seus cheiros, a labuta diária das mulheresoprimidas pelos maridos, a contradição entre a simplicidade dessas vidas e aformalidade respeitosa com que se tratam. Enfim, recupera-se, em um instantâneonotável, o material e o mental que se entrelaçam em torno das relações sociaisrigidamente hierarquizadas e ritualizadas. As imagens irrompem através daverbalidade e chegam a exalar cheiros e concretudes materiais prontamentepercebidas pelo historiador.

Voltemos, contudo, aos esforços de explicitar os limites existentes entre o enfoqueda história das mentalidades e o enfoque da história do imaginário. Ressalvadosos significativos e eloqüentes exemplos de Vovelle e Ladurie, o encontro entrehistória do imaginário e história das mentalidades não é, em todo caso, obrigatório,sendo pertinente considerá-los como dois campos específicos. Se um circuito doimaginário social pode se formar lentamente, a partir de longas permanências ede uma dimensão mais diretamente derivada dos modos automáticos de pensare de sentir – ou a partir das mentalidades, como diriam os historiadores queenfocam essa dimensão social – pode se dar também que um circuito imaginárioseja produzido por necessidades ou por motivações políticas. Nesse caso, veremosque combinações da história do imaginário com outros campos são perfeitamentepossíveis (por exemplo, entre uma história do imaginário e uma história política).Da mesma forma que existe um “imaginário religioso”, cada sociedade desenvolve

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também o seu “imaginário político”, como aquele que Ernst Kantorowicz estudou emOs dois corpos do rei (1998). A idéia presente na Inglaterra e na França do AntigoRegime de que o “rei não morre jamais”, ou de que a própria sociedade constitui um“segundo corpo do rei”, pode estar, segundo o historiador polonês, interconectadacom um imaginário cristão e ao mesmo tempo com determinadas motivações políticas,percebendo-se aqui uma rede de múltiplas interações a ser decifradas pelo historiador.

Em muitos casos, um circuito de elementos do imaginário social pode ser produzidoou apropriado por circunstâncias políticas ou, tal como já mencionamos, mesmopor uma arquitetura do poder. Também não são raros os casos em que o imaginárioencontra um leito em determinadas condições sociais, ou que se adapte a certasmotivações políticas. Na Espanha medieval do século XIII, os sábios e juristas dorei Afonso X elaboraram a imagem de que “o rei é a cabeça, o coração e a almado reino”. Esse imaginário tem muito a ver com a maneira medieval de concebera sociedade como um organismo (que teria no rei a sua cabeça), mas tem a vertambém com uma determinada maneira de governar. Por que não somente acabeça, órgão que comanda de cima ou o coração, órgão que rege a vida dedentro ou a alma, que está em toda a parte? O que está por trás dessa hábilestratégia de unir essas três imagens em uma única metáfora?14 Um estudoinserido na história do imaginário elabora perguntas dessa ordem.

Cada sociedade, ou cada sistema político, pode produzir do governante umimaginário que lhe seja mais apropriado. À estruturação do poder absolutista francêsno século XVII, por exemplo, adaptou-se com muita eficácia a imagem do Rei-Soldifundida por Luís XIV. Outrossim, a história nos oferece inúmeros imagináriosrégios: o rei taumaturgo, o rei-sábio, o rei santo, apenas para citar alguns.

Os horizontes abertos por uma busca da compreensão do imaginário políticosão, na verdade, inúmeros. Os modos como o poder é representado – por exemplo,em termos de “centro” e de “periferia” – ou como a estratificação social, mate-rializa-se em imagens como a de um espectro de alturas em que as classessociais mais favorecidas são chamadas “classes altas”... Eis aqui algumasimagens sociais e políticas que podem passar a fazer parte da vida de umasociedade. Duby, por exemplo, buscou recuperar precisamente o imaginário queestá por trás dos padrões de organização da sociedade feudal em As três ordensou o imaginário do feudalismo (1971).

1414141414 Essa questão é discutida em Barros (1999).

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Mas a história do imaginário também pode seguir por outros caminhos. Existe oestudo mais direto das imagens visuais, perceptíveis, por exemplo, nas iconografiasou das imagens verbais empregadas na literatura – não propriamente para perceberum fundo mental que as sustenta, como no caso dos já mencionados exemplos deVovelle, mas para estudar essas imagens visuais e literárias em si mesmas. Nesseponto, a história do imaginário partilha seus objetos com uma “história das imagens”propriamente dita ou com uma “história das representações”, que são, na verdade,“domínios da história” (ou seja, campos temáticos à disposição do historiador). Sãodomínios que, naturalmente, também podem ser partilhados por uma história cul-tural. Vale ressaltar que, nesse caso, o estudo das imagens abre-se a metodologiaspróprias, que vão desde os métodos da iconografia temática iniciada cedo por autorescomo Emile Mâle, até o célebre “método iconológico” de Erwin Panófsky (1991),passando pelas abordagens semiológicas da imagem.

O importante no estudo de imagens, como fontes históricas, é buscar metodologiaspróprias com a atenção de que existe uma diferença clara entre o discurso visual e odiscurso escrito. Deve-se evitar, naturalmente, aquela tentação ou até mesmoinocência de se utilizar a fonte iconográfica como mera ilustração que confirma o queo historiador já percebeu através do discurso escrito de outra fonte trabalhada para-lelamente. A imagem visual (é o que queremos ressaltar), tem por si mesma algo aser dito. É preciso fazê-la falar com as perguntas certas ou, para utilizar uma metáforade Vovelle, arrancar da imagem certas “confissões involuntárias”. (1981, p. 70).

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Diante do que aqui foi colocado, será possível delimitar melhor os espaçoshistoriográficos que correspondem a esses campos aparentemente tão próximosda historiografia. Apesar de se constituírem a partir de dimensões que guardamentre si alguma proximidade – o imaginário e o universo mental dos homensinseridos em sua vida coletiva – o que a história das mentalidades traz paraprimeiro plano são modos de pensar e de sentir que, em princípio, corresponderiama processos de longa duração, e que podem se expressar ou não em imagensmentais, verbais ou visuais. A história do imaginário, por seu turno, traz a primeiroplano certos padrões de representação, certas potências da imaginação que seconcretizam em imagens visuais, verbais ou mentais, mas que não neces-sariamente se formam em processos de longa duração (embora isso possa acon-tecer). O imaginário, conforme se salientou, pode ser objeto de uma arquiteturapolítica, ser interferido por ela – pode ser gerado rapidamente sob determinadascircunstâncias; pode ainda ser produzido a partir da representação artística e

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gerar suas próprias conexões. O imaginário nem sempre surgirá como umadimensão coletiva (embora isso possa ocorrer), o que já se dá necessariamentecom aquilo que foi chamado mentalidades pelos historiadores que acreditam napossibilidade de identificar um significativo substrato mental comum entre oshomens de uma mesma época ou pelo menos de um mesmo setor da sociedade.Mas teremos aqui, de qualquer modo, campos conceituais que ainda estão porse definir – e que ainda geram cada um deles as mais diversificadas polêmicasentre os historiadores.

Para concluir esse grande paralelo entre as modalidades da História que atentammais particularmente para os universos mental e imaginário, e também para ocampo das sensibilidades humanas, e que têm explorado através de abordagenshistóricas os labirintos da psicologia e da imaginação humana, será oportuno lembrarque a psicoistória, a história das mentalidades e a história do imaginário deixaramcertamente a sua marca em uma historiografia contemporânea que buscou, apartir do século XX, inserir-se em uma perspectiva interdisciplinar. Contudo, asreflexões e preocupações encaminhadas por essas modalidades históricas, bemcomo seus investimentos metodológicos e seus aportes teóricos, estão aindalonge de se esgotar à altura desse novo milênio que a pouco se iniciou. O universomental dos homens, considerados em sua vida social, bem como sua produção deimagens de todos os tipos e de diversificados padrões de sensibilidade, constitui,certamente, ainda, um enigma que possivelmente nunca será decifrado, mas que,em todo caso, sempre atrairá o interesse dos historiadores.

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Mágda Rodrigues da CunhaMágda Rodrigues da CunhaMágda Rodrigues da CunhaMágda Rodrigues da CunhaMágda Rodrigues da Cunha11111

RESUMORESUMORESUMORESUMORESUMO

Investigar as relações que se estabelecem em uma sociedade midiatizada é pesquisar cada vez asdiferentes camadas e marcas deixadas pela história das mídias. História essa que permanece ouse modifica, de acordo com as tramas da cultura. O que este artigo propõe é a possibilidade de lerhoje, por intermédio da reinvenção e reacomodação das mídias, as marcas que vêm sendo deixadassob influência da cultura que, por sua vez, também se reinventa a cada nova mudança, em diálogocom os diferentes horizontes históricos. As características que atualmente se evidenciam, de umasociedade individualista, também marcam as formas de comunicar, por intermédio de conteúdospersonalizados. A solidão, que muitos atribuem aos navegadores na internet, é a mesma que,numa trama muito complexa, possibilita a existência de uma sociedade em escala global. Cultura,memória, tempo e espaço são as categorias que este texto elege como base de reflexão, parapensar os motivos de uma comunicação individualizada e em rede simultaneamente.

Palavras-chavePalavras-chavePalavras-chavePalavras-chavePalavras-chave: Cultura. Memória. Tempo. Espaço. Comunicação.

ABSTRACTABSTRACTABSTRACTABSTRACTABSTRACT

To investigate the relations in a society influenced by the media is to search each time the differentlayers and marks left for the history, that remains or modifies in accordance with the culture. Thisarticle considers the possibility to read today, for intermediary of the reinvention of the medias, themarks that are being left under influence of the culture that, in turn, is reinvented in each newchange, in dialogue with different historical horizons. The characteristics of an individualist society,also marks the forms to communicate, for intermediary of personalized contents. The solitude, thatmany attribute to the navigators in the Internet, is the same that, in a very complex tram makespossible the existence of a society in global scale. Culture, memory, time and space are the catego-ries that this text chooses as reflection base, to think reasons of an individualized communicationand in net simultaneously.

Key wordsKey wordsKey wordsKey wordsKey words: Culture. Memory. Time. Space. Communication.

11111 Jornalista. Professora na Famecos – Faculdade de Comunicação Social da PUCRS no curso de Jornalismo eno Programa de Pós-Graduação em Comunicação. Mestre em Comunicação Social. Doutora em Letras.

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A afirmação de Marc Augé (2006, p. 101), no texto intitulado Sobremodernidade:do mundo tecnológico de hoje ao desafio essencial do amanhã, será o eixo dareflexão proposta neste texto. Entende-se que o atual momento histórico, assimcomo um palimpsesto,2 é a evidência de uma história midiática que começou hámuito tempo, influenciada pelas adaptações da cultura, gerando uma outra relaçãocom o tempo e o espaço e com a própria memória, influenciando diretamente acomplexa identidade dos sujeitos.

O fio condutor desta reflexão é o pensamento de Augé em diálogo com outrosautores. Inserem-se, nesse contexto, alguns fatos históricos da mídia, comoevidência da construção que chega hoje a uma sociedade marcada pela individua-lização e que produz, por intermédio dessa mesma mídia, conteúdos perso-nalizados.

Trabalha-se com a hipótese de que, ao percorrer alguns momentos significativosda história da consolidação das mídias, pode-se localizar evidências sobre aexacerbada individualização em que chega hoje a sociedade. Não se pode, noentanto, afastar a hipótese de que as mídias vêm se constituindo em respostaàs exigências dos diferentes horizontes históricos, deixando suas marcas nacultura e na memória.

Augé (2006, p. 100) constata a existência de dois paradoxos, quando são abordadostemas como globalização, uniformização e até homogeneização. Essa planetalização,segundo ele, convive com reivindicações de singularidade, de identidade local comformas e escalas muito diferentes umas das outras. “[...] no conjunto, cada umpode constatar felizmente que o mundo não está definitivamente sob o signo dauniformidade e, ao mesmo tempo, inquietar-se diante das desordens e das violênciasgeradas pela loucura identitária.” De acordo com a observação antropológica,ressalta Augé (2006), que está sempre contextualizada, hoje em dia, inclusive nosgrupos mais isolados, o contexto sempre é planetário.

22222 Palimpsesto tem origem no grego e denomina o pergaminho raspado e reutilizado, mas que mantém asmarcas da escritura anterior. Trata-se de prática muito antiga, mas freqüente no século VII pelas dificuldadesdo comércio de papiro egípcio e depois pela escassez de pergaminho.

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Esse contexto planetário é muito bem descrito por Lévy (2001) ainda no início doséculo XXI. Os planetários dirigem os mesmos carros, pegam os mesmos aviões,desembarcam nos mesmos hotéis, têm as mesmas casas, os mesmos telefones,televisores, computadores ou cartões de crédito.

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O autor afirma que a população atual começa a construir a sociedade civil mundial.E quem são essas pessoas? Lévy (2001) afirma que são artistas, escritores,cineastas, músicos, professores, funcionários internacionais, jogadores de futebol,alpinistas, navegadores solitários, comerciantes, comissários de bordo,consultores, investidores de capitais, militantes em associações internacionais.Cotidianamente, seja qual for a finalidade, devem olhar, comunicar e talvez agiralém das fronteiras.

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O autor completa que nunca uma geração viajou tanto, seja por trabalho ouprazer. O turismo se torna a maior indústria mundial. A imigração ocorre em largaescala sejam pobres atraídos pelo trabalho ou ricos em busca de melhorescondições fiscais. A população planetária é móvel, não nômade, pois os nômadesnão tinham nem terras nem cidades. Móveis, passando de uma cidade a outra,de um bairro a outro da megalópole mundial. As pessoas vivem nas cidades oumetrópoles que se relacionam umas com as outras ou no campo, em casas quesão como navios em pleno mar, conectados com todas as redes.

Os planetários reúnem budistas americanos, programadores indianos, ecologistasárabes, pianistas japoneses, médicos sem fronteiras. Graças à internet, dão aconhecer, em escala planetária, o que têm a oferecer.

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Esse contexto, defende Augé (2006), está presente na consciência de todos,interfere desigualmente, mas em todos os lugares, de maneira sensível nasconfigurações locais, modificando as condições de observação. Há, segundoele, três movimentos complementares: o passar da modernidade, o que chama“sobremodernidade”, o passar dos lugares, chamados por ele de “não-lugares”,e o passar do real ao virtual.

Sem ser distintos uns dos outros, privilegiam pontos de vista diferentes, deacordo com o pensamento. O primeiro dá ênfase ao tempo, o segundo, ao espaço,e o terceiro, à imagem. Augé (2006, p. 101) cita Jean Starobinski para quemessa acumulação, a adição das distintas temporalidades, configura a modernidadedo lugar, conforme a citação que abre este artigo, aqui repetida. “Este ideal deacumulação corresponde a certo desejo de escrever ou de ler o tempo no espaço:o tempo passado que não apaga do todo o tempo presente, e o tempo futuro quejá se perfila.”

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Para dialogar com esse ideal, traz-se aqui o pensamento de Santaella (2003)que utiliza uma divisão das eras culturais em seis tipos de formação: culturaoral, cultura escrita, cultura impressa, cultura de massas, cultura das mídias ecultura digital. Salienta que tais divisões são pautadas na crença de que osmeios, desde o aparelho fonador até as redes digitais atuais, mesmo sendomeros canais de transmissão de informação, são capazes não só de moldar opensamento, “mas também de propiciar o surgimento de novos ambientessociais”. (p. 13).

É possível evidenciar a cultura em situação de diálogo com os diferentes períodoshistóricos de surgimento e desenvolvimento das mídias.

A autora destaca outro aspecto importante no que diz respeito a essa divisão deeras culturais. Não são períodos culturais lineares, com o desaparecimento deuma era para surgimento de outra. Há sempre um processo cumulativo decomplexificação, “uma nova formação comunicativa e cultural vai se integrandona anterior, provocando nela reajustamentos e refuncionalizações”. (SANTAELLA,2003, p. 13). Afinal, de acordo com esse pensamento, a cultura comporta-sesempre como um organismo vivo, inteligente, com poderes de adaptação impre-visíveis e surpreendentes.

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Com o “agigantamento” dos meios de comunicação de massa, no século XX,foram crescendo as dificuldades para se estabelecer distinções claras entre opopular, o erudito e o massivo. Até o fim do século XIX, não era tão complicadoquanto hoje determinar as formas, os códigos e os gêneros da cultura. A partirda Revolução Industrial, esse cenário se complicou com o aparecimento de meiostécnicos de produção cultural. Entretanto, entende a autora, não obstante o poderde que se revestem, contra todos os prognósticos, os meios de massa nãolevaram as formas mais tradicionais de cultura, a cultura superior, erudita, e asculturas populares ao desaparecimento. Provocaram recomposições nos papéis,cenários sociais e até mesmo no modo de produção dessas formas de cultura,assim como “borraram” suas fronteiras, mas não apagaram sua existência.

Entende-se, no presente artigo, que nessa recomposição de papéis e diluição defronteiras, confirma-se a idéia de um palimpsesto, onde se enxergam as marcasmais antigas “borradas” na base das novas. Falar em permanência ou desapa-recimento de mídias é desconsiderar, muitas vezes, o que realmente se mantém:a demanda social por comunicar. O que se evidencia ao investigar a História éuma reinvenção permanente dos meios usados para comunicar. Confirmando aidéia de um palimpsesto, a sociedade se comunica hoje em formatos desenvolvi-dos por ela mesma, numa construção baseada em perguntas e respostas queresultaram no aperfeiçoamento dos meios.

A explicação, entende Santaella (2003), está no fato de que a cultura humanaexiste num continuum, ela é cumulativa, não no sentido linear, mas de interaçãoincessante de tradição e mudança, persistência e transformação. O entendimentode que uma novidade não termina com a outra, mas gera transformações, confirmao objetivo deste texto, de investigar os meios e as camadas culturais nas quaisestão inseridos, considerando a possibilidade de ler cada um deles por intermédiodas marcas históricas. Os meios e suas adaptações ou reinvenções influenciame são influenciados pela cultura e transformam-se a partir dos suportes tecno-lógicos moldados pela própria cultura, mantendo as diversas linguagens em suabase de existência. A tecnologia que dá suporte à produção cinematográfica,exemplifica Santaella (2003), pode mudar, mas não muda a linguagem que foiinventada pelo cinema.

Considerando esse tempo lido no espaço, Augé (2006) traz o pensamento deBenjamin que vê, na arquitetura das passagens parisienses, um prefiguração dacidade do século XX. Por acúmulo, essa imagem do espaço corresponde a umaprogressão, a uma imagem do tempo como progresso. O autor cita ainda o pen-

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samento de Max Weber que, para evocar a modernidade, fala sobre o desencantodo mundo, apresentando três características: a primeira é o desaparecimentodos mitos de origem, dos mitos de fundação, de todos os sistemas de crençaque procuram o sentido do presente da sociedade em seu passado. Há tambémo desaparecimento de todas as representações e crenças que, vinculadas aessa presença do passado, submetiam a existência e, inclusive, a definição doindivíduo de seu meio. O homem do Século das Luzes é o indivíduo dono de simesmo, de quem a razão corta os laços supersticiosos com os deuses, com aTerra, com sua família, que afronta o porvir e se nega a interpretar o presentebaseado em magia ou bruxaria.

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Augé (2006) propõe a utilização do conceito de sobremodernidade, para pensara coexistência das correntes de uniformização e dos particularismos. O autorafirma que se trata de uma lógica do excesso, mensurada a partir de três excessos,segundo sua proposta: o excesso de informação, o excesso de imagens e oexcesso de individualismo. O excesso de informação dá a idéia de que a Históriase acelera. Cada dia tem-se a informação do que acontece nos quatro cantos domundo.

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Essa superabundância, segundo Auge (2006, p. 104), é proporcional à capa-cidade de esquecimento, uma vez que um acontecimento, que chama a atençãodurante alguns dias, desaparece repentinamente das telas, logo, das memórias.Isso até o dia em que ressurge repentinamente. “Um certo número de aconteci-mentos tem, assim, uma existência eclíptica, esquecidos, familiares e surpreen-dentes ao mesmo tempo.” Augé (2006) cita aqui exemplos como a Guerra doGolfo, a crise irlandesa, os atentados no País Basco ou as matanças na Argéliae reflete que o aparecimento do ciberespaço marca a prioridade do temposobre o espaço, desenhando a idade do imediatismo e do instantâneo, onde acomunicação se produz na velocidade da luz, resultando em um domínio dotempo que reduz o espaço.

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Mitchell (2006) investiga o fato de a sociedade estar entrando em uma era na qual avida se desenrola cada vez mais no ponto de intersecção do mundo físico e real como da virtualidade e das interconexões eletrônicas. Reflete sobre a importância doslugares e das relações que interferem na memória. Suas obras mais recentes abordamtemas referentes à reconfiguração dos lugares de moradia e das relações sociais.Lugares e memórias, conforme Casalegno, em texto de apresentação de entrevistacom Mitchell, sempre representaram dois paradigmas fundamentais na configuraçãodas comunidades, na evolução das culturas e das relações entre as pessoas.

O autor fala de uma memória baseada em algo transmitido pelo contato face aface e que se torna uma memória de grupo e que realmente mantém a comunidadee a cultura juntas. É nesse ponto que a arquitetura começa a se transformar norepositório da memória, e fisicamente, todos os prédios importantes, prédiosreligiosos estão inscritos. Mitchell (2006) afirma que, no século XX, o rádio e atelevisão entram nesse contexto e atualmente a rede começa a se tornar crucial.Nenhum dos meios desaparece, mas novos entram.

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A preservação da memória e as estratégias para essa conservação também sãodestacadas por Mitchell que apresenta o exemplo das gravações e as mudançastecnológicas em conseqüência disso. Segundo ele, originalmente, a memóriahumana era a única mídia, e essa é a tradição oral, transmissão direta de umamemória humana para outra. O desenvolvimento da escrita e as tecnologias deimpressão e gravação cumpriram esse papel, agora desempenhado em largaescala pela gravação digital eletrônica. A diferença fundamental em gravar mídiaeletrônica, na opinião do autor, é que não há necessidade de transferir fisicamenteos artefatos da memória. Está junto com as telecomunicações “nessa espantosa”maneira que induz esse tipo de condição de memória portátil.

Virilio (2006) também reflete sobre o assunto, trazendo a memória “vivida”, memóriado que ocorre no momento, como um elemento novo oferecido pelas tecnologias

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de comunicação. Isso, segundo ele, traz um paradoxo, pois a televisão ou a internete outras tecnologias promovem a idéia de uma memória do instante presente. “Écomo se houvesse um efeito de lupa não sobre um objeto, mas sobre um instanteno tempo: um efeito de dilatação.” (p. 93). Nessa perspectiva, o autor entendeque as tecnologias funcionam para a memória como um telescópio. Virilio acreditaque a internet e as tecnologias de informação permitirão ver o que se passa nomais curto espaço de tempo, o que se passa na comunicação. Nesse ponto desua reflexão, o autor define que essa é uma memória que diz respeito à comunidade,pois não há memória por si. Memória, conforme o seu pensamento, é umalinguagem, um utensílio de comunicação. Não há memória que não seja coletiva.

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Augé (2006) afirma que o terceiro termo que define a sobremodernidade consistena individualização passiva, diferente do individualismo conquistador do idealmoderno. Trata-se de uma individualização de consumidores, cujo aparecimentoestá relacionado com o desenvolvimento dos meios de comunicação. Conformeo pensamento do autor, a relação com os meios de comunicação pode geraruma forma de passividade, na medida em que expõe cotidianamente os indivíduosao espetáculo de uma atualidade efêmera, uma forma de solidão na medida emque os convida à “navegação solitária” e na qual toda telecomunicação abstrai arelação com o outro, substituindo com o som ou a imagem o corpo a corpo. Augé(2006) entende isso como uma forma de ilusão, na medida em que deixa acritério de cada um a elaboração de pontos de vista, opiniões em geral bastanteinduzidas, mas percebidas como pessoais. O autor salienta que não descreveuma fatalidade, mas um conjunto de riscos, de tendências.

Reflete, também, sobre a individualização dos destinos ou dos itinerários e sobrea ilusão da livre-escolha individual, o que, segundo ele, se desenvolve a partir domomento em que se debilitam as cosmologias, as ideologias e as obrigaçõesintelectuais com as quais estão vinculadas. Augé (2006, p. 107) cita que “omercado ideológico se equipara a um self-service, no qual cada indivíduo podeprover-se com peças soltas para ensamblar sua própria cosmologia e ter asensação de pensar por si próprio”. Passividade, solidão e individualização seencontram em várias dimensões, inclusive religiosas, segundo Augé (2006).

O pensamento de Lipovetsky (2004) que, de sua parte, adota o conceito de“hipermodernidade”, torna-se pertinente nesta reflexão. O autor descreve a

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hipermodernidade baseada numa sociedade hiperindividualista, onde se investeemocionalmente naquilo que é mais próximo, nos vínculos fundados sobre asemelhança e a origem em comum. De acordo com esse pensamento, na atualsociedade nasce toda uma cultura hedonista e psicologista que incita à satisfaçãoimediata das necessidades, enaltecendo o “florescimento” pessoal. Na comunica-ção, essas características apontam para uma tendência à produção individualizadaou personalizada de informação, seja no âmbito da publicidade, seja no do jornalismoou mesmo dentro da lógica em que todos produzem para todos.

Alguns conceitos, porém, devem ser relacionados para reflexão em torno dessemomento individualista e a conseqüente produção de conteúdos: o conceito e aorigem da personalização ou individualização, a história das mídias e sua presençaneste contexto, tornando-se evidências do processo, na medida em que os hábitosde leitura dessa audiência ou a cultura construída interfere diretamente.

Nesse ponto, faz-se importante buscar aspectos da História que evidenciam aconstrução do processo, especialmente no relacionamento das audiências comas mídias. Todavia, torna-se relevante na mesma medida refletir sobre o tipo deisolamento que hoje muitos autores propõe como resultado das relações com osmeios de comunicação social.

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Cinco séculos depois do nascimento da imprensa, o rádio tenta fazer com a voz,essa forma tão primitiva de comunicação, o que antes só podia ser feito com aimpressão: armazená-la, repeti-la e transmiti-la a grandes distâncias. Os trêsinventos que transformam o uso da voz humana, o telefone, o rádio e o gravador,são, em um primeiro momento, concebidos como melhorias no sistema telegráfico.A informação de Pool (1992) aponta para o âmbito social do rádio, pois, se ofonógrafo, o telefone e o rádio são, em princípio, concebidos como um aperfeiçoa-mento da telegrafia, o telefone e o rádio são meios irmãos.

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A radiodifusão substitui o bar da esquina, a reunião na igreja, a banda local ou oconcerto. No início do século XX, os sociólogos descrevem uma civilização ur-

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bana em expansão. As grandes cidades, as fábricas, a mobilidade geográfica, aburocracia e os meios de comunicação criam, segundo eles, uma sociedademarcada pela ausência de personalidade e produtos pouco diferenciados, e orádio se inclui nessa descrição. O telefone é diferente, sendo um invento contraa fácil generalização.

Tanto o telefone quanto o rádio têm profundos, ainda que diferentes, efeitos sobrea ecologia da atividade humana. Os processos de mudança urbana, por exemplo,que começam no início do século, florescem nos anos 20, com o início da radio-emissão. A coincidência das transmissões e da rápida urbanização é uma questãofortuita, mas significa que o rádio se converte em um meio de entretenimento paraa primeira geração de habitantes classificados como imigrantes lançados aoanonimato de novas cidades. Não conhecem seus vizinhos imediatos e nempertencem a qualquer grupo organizado com sua própria tradição cultural. Paraessas pessoas, o rádio deve proporcionar muito do que seus pais e avós lheshaviam dado nas festas ou férias no interior, em reuniões religiosas semanais.

O rádio, segundo Pool (1992), é um excelente substituto da vivência comunitária.As radionovelas ou shows de variedades, ainda que ruins, são melhores do que asapresentações no teatro do bairro realizado por grupos itinerantes. As cadeias derádio oferecem a possibilidade nacional de poder escolher. Melhor ou pior, o rádioé diferente, por estar em casa. É ideal para a granja isolada ou para o igualmenteisolado ambiente urbano, onde os vizinhos são estranhos. É uma atividade indi-vidual ou familiar e não compartilhada com a comunidade ou a igreja.

Por volta de 1930, revela Roberts (2001), a maioria das pessoas que possuemreceptores sem fio (e são milhões) deixa de acreditar que é preciso manter asjanelas abertas para permitir que as ondas de transmissão as alcançassem. Asociedade convive com a tecnologia, e ela não causa mais estranhamento. Orádio não contradiz, mas é assimilado, dentro de um contexto interessado emconviver com o conforto. Transmissões de rádio em larga escala já acontecemem todos os principais países.

Observando esse período da História, verifica-se que a possibilidade de registrotorna-se eletrônica, confirmando o pensamento de Mitchell que salienta a idéiade acumulação de possibilidades para chegar ao formato atual. Registra-se,também, uma mudança nos hábitos de consumo dos meios que começam a sedesenhar como individuais. Traz-se aqui o rádio por ser o primeiro meio eletrônicode massa. Todavia, o rádio só vai transformar em eletrônica uma tendência já

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existente com a leitura e ele mesmo, com a consolidação da televisão, vai setornar ainda mais individual.

Nos anos 60, o rádio da família é destronado pela televisão. A transmissão deimagens por ondas é conhecida desde os anos 30, mas a curta distância e emcaráter experimental. O transistor na televisão também permite a redução do peso,do volume e do preço. O ingresso do rádio e da televisão no universo domésticoconstitui mutação social de primeira importância, segundo Prost (1992). O espe-táculo familiar da tevê é complementado pela escuta individual do rádio. Juntos,esses dois momentos de comunicação podem ocupar grande parte do tempo davida privada. A informação passa a ser dominada pelo rádio e pela tevê. A imprensajá não impera e ocupa as lacunas dos meios audiovisuais, com informações maisaprofundadas, especializadas ou locais. As ondas prevalecem sobre a imprensa,porque são mais rápidas e podem chegar a todos os lugares e pessoas.

O consumo individualizado também é descrito por Chartier (1998, p. 13) quandoaborda a história do livro e dos próprios jornais. Se o texto era lido por alguémalfabetizado, para muitos analfabetos, em uma fase inicial da propagação da escrita,ele passou, depois de um certo período para um consumo individualizado nasbibliotecas, em voz baixa ou somente pelo correr dos olhos. Nos séculos XVII e XVIII,um jornal não tem uma estrutura diferente daquela do livro. Quando adquire umgrande formato e uma distribuição ampla, ocorre uma atitude mais livre, ele écarregado, dobrado, rasgado, lido por muitos, mas individualmente. O leitor da tela,descreve Chartier, de certa forma, assemelha-se ao leitor da Antiguidade. O textoque ele lê corre diante de seus olhos. “Ele é simultaneamente esses dois leitores.”

A solidão referida por Augé e por tantos outros autores merece reflexão. Trata-sede uma navegação solitária, mas em rede. Nunca tantas comunidades seconstituíram por intermédio da possibilidade proporcionada pela tecnologia digi-tal. Em tudo isso há uma conjunção de fatores, como citado por Castells (2003).Três processos se uniram, inaugurando uma nova estrutura social predominante-mente baseada em redes: as exigências da economia por flexibilidade adminis-trativa e por globalização do capital, da produção e do comércio; as demandasda sociedade, em que os valores da liberdade individual e da comunicação abertatornaram-se supremos; e os avanços extraordinários na computação e nastelecomunicações possibilitados pela revolução microeletrônica.

Na comunicação social, o conceito de individualização ou personalização deconteúdos, ainda não descrito claramente, começa a ser desenhado em um

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horizonte que viveu durante muitos anos baseado na segmentação de informações,relacionada aos meios convencionais, com finalidades especialmente comerciais.As tecnologias digitais oferecem a possibilidade de personalizar, chegando ao extre-mo da individualização. Os meios, acostumados a falar para as grandes massas, ainformar as grandes audiências, a exemplo do que foi descrito sobre o rádio e atelevisão, encaram um paradoxo: a demanda por uma informação individual.

Personalização em comunicação entende-se como a possibilidade de o públicointeragir sobre a forma e o conteúdo do jornal, para consumir unicamente o quequer e como quer, dentro dos limites da própria tecnologia. Incluem-se aí as notícias,o recebimento de um jornal a la carte, o recebimento de newsletters ou mensagenscom fins publicitários. Mas outras questões começam a ter destaque em relaçãoao comportamento dos meios habituados a uma produção massiva, especialmentequanto à impressão em larga escala ou mesmo a radiodifusão.

A energização das redes provocada pela internet leva a recepção, até então tratadaapenas como tal, a se apropriar de possibilidades tecnológicas narrativas, gerandoiniciativas hoje evidenciadas especialmente pelos blogs e comunidades virtuais.Isso resulta em uma personalização de conteúdos e coincide ou responde a umatendência de individualização exacerbada, que não começou agora, mas vem sendolapidada no coração da história do desenvolvimento das mídias. Registrar, preservara memória, comunicar, ocupar o espaço da cidadania global, ler o tempo no espaço,todos esses são fatores que coexistem no atual contexto. Pode-se afirmar quetanto para as tecnologias de comunicação, como para a identidade dos sujeitos,nunca um horizonte histórico reuniu, em continuum, tantas marcas de tantosperíodos. A memória do passado é também vivida e observada.

O território em que vive a humanidade atualmente é como descreve Augé (2006):

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A reflexão aqui realizada não pode, considerando o contexto e a própria reinvençãopermanente da cultura, propor conclusões. Não é novo dizer que cada vez maissurgem perguntas e não respostas. Os questionamentos de Lucien Sfez (2006)soam adequados para um fechamento baseado em perguntas e dúvidas a respeitodas tendências.

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Que imaginação deveríamos evocar para conseguir pensar o mundo no qual nãoseríamos mais uma variedade de sujeitos pensantes individuados, tampouco umúnico sujeito fusionado, agindo e pensando por concerto (como no caso da BiosferaII), mas uma parte de um número ilimitado de cópias sobre as quais teríamosdificuldade de reconhecer o original? Será que, nesse caso, ainda seríamos su-jeitos? Ou seria preciso encontrar palavras e outras definições para uma identidadeque apenas dificilmente poderia ser identificada enquanto uma única e mesma?Para essas unidades errantes, será que se poderia falar ainda de um sujeitosocial? Ou, então, as mediações tecnológicas conseguiriam criar um novo sujeitoplanetário, fazendo da reprodução tecnológica a própria essência de sua iden-tidade? (p. 80).

Investigar as relações com os meios é sim estudar um palimpsesto, é ler otempo no espaço. A reinvenção é permanente numa sociedade que busca construirformatos apropriados. Nessa trajetória, muitos deles soam como individualistasou têm uso individualizado. Mas aqui prefere-se entender como personalizado,considerando cada parte da audiência ou cada leitor como único, integrado emum processo de produção de um para um, mas também de todos para todos. Apercepção de um tempo que se acelera e insere muitos em um mesmo circuitopode também ser a soma dos vários tempos individuais, do tempo de cada um,em uma lógica que privilegia o formato de rede.

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RESUMORESUMORESUMORESUMORESUMO

O artigo traça o parentesco entre arte e clínica com uma questão central acerca da estéticada clínica (psicanálise, estética psicanalítica). O artigo apresenta um ponto de vista teóricoacerca do FORT-DA (Freud) e seus desenvolvimentos na história e teoria da arte e avança nadiscussão conceptual acerca dos termos corpo, arte, clínica. A idéia do FORT-DA retorna àsquestões do corpo-arte (arte do corpo), do aparecer/desaparecer, do jogo. Em seguida, propõeuma interpretação da pintura de Francis Bacon.

Palavra-chave: Palavra-chave: Palavra-chave: Palavra-chave: Palavra-chave: Estética. Arte. Corpo. FORT-DA. Francis Bacon.

ABSTRACTABSTRACTABSTRACTABSTRACTABSTRACT

This article traces a relationship between art and clinic with a central question about Theclinic’ aesthetics (psychoanalysis, psychoanalytical aesthetics). The article presents a theoreticpoint of view about Freud´s FORT-DA and its developments in art, History and theory andadvances in the conceptual quarrel regarding the terms body, art, clinical. The idea of FORT-DA retakes the questions of the body-art, appear/disappear, game. Afterwards proposes ainterpretation about Bacon’s painting.

Key wordsKey wordsKey wordsKey wordsKey words: Aesthetics. Art. Body. Fort-da. Francis Bacon.

11111 Dr. em Antropologia pela USP. Dr. em História pela PUCRS. Prof. e Pesquisador nos PPG em Música (EMAC)e História FCHF/UFG. Coordenador do Grupo Pesquisa Diretório CNPq – Interartes: PROCESSOS E SISTEMASINTERARTÍSTICOS E ESTUDOS DE PERFORMANCE. Pesquisador na Funape/UFG. Professor convidado para oano de 2008 da Universidade Nacional de SALTA na Argentina. Professor das disciplinas de Análise daCriação Contemporânea (Mestre em Música), História e Teoria Interartes: do romantismo ao pós-modernismo(Mestre e Doutor em História) e no Seminário de Pesquisa: Arte e Psicanálise. Coordenador do GT Intertexto,Interartes e Hibridismo (Abralic, 2007). Coordenador do GT Estudos Interartísticos e Interculturais Musicais:história plural e comparada das artes (Anppom, 2007). Coordenador do S.T. CLIO E AS MUSAS (III ENCONTROINTERNACIONAL DE HISTÓRIA ANPUH-GOIÁS). Membro de diversas associações científicas e grupos de traba-lho e pesquisa no campo das ciências humanas, artes e terapêuticas de viés psicanalítico. E-mail:[email protected]

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É possível uma estética da clínica? Haverá um corpo-obra? Duas questões devasta extensão e que servirão como guias na construção deste texto, que sevolta especialmente para um tipo especial de clínica que, em sua própriadenominação, inclui a tarefa da arte, em seu ofício – da arteterapia, da gestalt-terapia, da musicoterapia. Pensar seu lugar, o que seja essa clínica que temfundamentos em uma estética e em relações com objetos, ferramentas einstrumentos capazes de passar de estados subjetivos particulares a estadossubjetivos compartilhados, tal como nas manifestações artísticas propriamenteditas. Nesses termos, operamos com uma forma de relação clínica que pretendeintegrar subjetividade e estética – viver a subjetivação em sua potência deestetização parece ser um conteúdo latente dessas clínicas que se deslocamem direções múltiplas.

O foco encontra-se, num ponto de vista especial, do objeto-problema CORPO e osmodos como esse é tratado, nas vias psicanalítica e artística, afetando aconstrução do objeto do estudo clínico e das práticas terapêuticas que incluemformas, manifestações e relações estéticas. A psicanálise aqui será observadasob a égide de um olhar oblíquo – de atravessamento – sendo atingida a partir docorpo e do corpo-obra. O tema do corpo-obra visa a ressaltar a particularimportância da experiência clínica e suas afinidades com a experiência e asformas do pensamento-fazer artístico. Assim, entendo aqui que a relação clínicanão só desenvolve uma particular epistemologia dos objetos psíquicos comotambém se deixa atravessar por formas transicionais ou por movimentos doinforme que fazem nascer a obra de arte do sujeito na clínica e seu corpo glorioso.Como amálgama de flutuações e materializações, a clínica deve arregimentaresse princípio de funcionamento radical, no qual a inclusão da arte não deveestar restrita às formas do discurso comentado de obras e filmes por conta dospacientes. Obrar a subjetividade como enfrentamento dos grandes lugares daclínica – a arte e a morte. (M’UZAN, 1978).

As duas perguntas do título “É possível uma estética da clínica? e Haverá umcorpo-obra?” levam em conta, por um lado, a existência de um grupo de clínicasque se fazem valer da presença de relações e de objetos artísticos na instauração-construção do campo clínico e de suas demandas específicas e, por outro, aquestão do corpo na arte e do corpo-obra-de-arte. Esse não será representadosomente pela presença do artista (o corpo do artista vivo, presente/ausente,metaforizado), mas estará centrado na existência de um jogo relacional entre

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obra e corpo, entre feitura (obrar) e matéria (corpo), modo particular de fazeracontecer uma cena e aparecer um objeto, meio e modo de fazer trânsitos entreo mundo dos objetos (e das relações de objeto), de presentificar os restos (e asrelações de abjeção) e de resistir à morte, nas formas fantasmáticas, da aura.

Desse modo, nossas perguntas podem ser investigadas por dois vastos tópicos:o primeiro diz respeito ao tema da arte e clínica (e vice-versa). O segundo trata docorpo e do corpo-obra. Entre eles, um encontro marcado na proposta de umateoria do corpo-obra no campo clínico e o modo como esse processo de construçãopode ser também um modo de dar forma e de sustentar a relação terapêutica,entendendo que o sujeito se estrutura esteticamente – estética do desejo eético-estética, relações entre arte e clínica.

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II. 1. II. 1. II. 1. II. 1. II. 1. As relações entre arte e clínica podem ser traçadas de modos muito diferen-tes. Por conta de uma historiografia do problema, podemos elencar o quanto aPsicologia e a Psicanálise dedicaram-se ao problema da arte, das relações entrearte e campo psíquico, dos contatos e confrontos entre uma psicologia dagestalt, uma psicanálise da arte – desde suas origens, em Freud, bastante limitadapelo próprio autor, ao entendimento de fundo lacaniano da obra-de-arte enquantolugar do analista, diante da qual somos todos analisandos. (Lacan/Magno).2

Não apenas Freud e sua dobra lacaniana fazem da arte alvo e centro de suaspreocupações e atuações teóricas e clínicas. Essas relações podem estar dirigidasa um modelo de estudos voltado para a clínica psicanalítica e para os trânsitosentre a biografia do artista e a terapêutica. Ampliam-se para o domínio do sonhoe do sonho acordado, traçando o campo de vizinhança entre a arte e a teoria dafantasia (fantasma).

Gombrich, um dos mais importantes historiadores e teóricos da arte, traça as relaçõesentre arte e chiste, demonstrando, através do chiste, que a arte é um jogo quedepende da própria estrutura da linguagem no qual se joga, ou seja, tal como numchiste é preciso um entendimento prévio da estrutura e do contexto da “piada” para

22222 Refiro-me aqui aos seguintes textos: LACAN, Jacques. O seminário: a ética da psicanálise. Rio de Janeiro:J. Zahar Editor, 1991; MAGNO, M.D. Psicanálise & Política. Rio de Janeiro: A Outra Editora, 1986.

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que se possa rir ou para que se possa apreender o sentido no vasto campo lacunarinstalado pelo chiste. Assim, nos termos desta teoria da arte, que vincula a Históriaà Psicanálise, há um inconsciente da obra que deve ser investigado.3

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Psicanalistas como Jones (teoria do simbolismo), Segal e Winnicott (enfatizandoo teórico dos objetos transicionais e os estudos do jogo), dentre outros, tambémproduziram importantes contribuições ao campo da reflexão artística e nas relaçõesentre arte e psiquismo. Michel de M’Uzan (1978) designa que o personageminterior e suas metamorfoses assemelham-se à plasticidade do lugar do analista.

Desse modo, podemos reunir algumas dessas posições da Psicanálise e da artenos seguintes conjuntos:• a arte como dimensão do inconsciente do artista;• a arte como dimensão do inconsciente moldado, configurado e estruturado

pela sintaxe formal da linguagem; e• a arte (e a obra) como lugar do analista.

Contemporaneamente, essa problemática expande-se para os domínios dasrelações entre arte, estética e poética para e no campo das clínicas e suasteorizações – as metarreflexões nascidas na/da clínica – na contemporaneidade.

33333 Refiro-me especialmente ao ensaio: GOMBRICH, E. H. Verbal wit as a paradigm of art: the aesthetictheories of Sigmund Freud. In: WOODFIELD, Richard. The essential Gombrich. London: Phaidon Press Limited,1996. p. 189-210.

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Essas inflexões acabam por confluir num conjunto vocabular que nos permitepensar na estética e na ética do desejo (Lacan), na ético-estética (Deleuze eGuattari) e na poética na clínica contemporânea (Safra).

Hoje, temos uma tarefa ainda mais ampla, a de reconhecer possíveis matrizesna Psicanálise para uma clínica que tem também em seus fundamentos umaestética e um conjunto de relações com objetos, ferramentas e instrumentoscapazes de passar de estados subjetivos particulares a estados subjetivoscompartilhados, tal como nas manifestações artísticas propriamente ditas. Vivera subjetivação em sua potência de estetização parece ser um conteúdo latentedessas clínicas contemporâneas que se deslocam em direções múltiplas.

Para pensar tal empreendimento, vou privilegiar os textos de Freud (1987), Lacan,Regnault (2001), Magno, França (1997) e M’Uzan (1978). No âmbito da reflexãoartística, concentrando essa interface numa escolha contemporânea da teoria da arteem torno do enunciado do FORT-DA (Freud),4 vou atravessar do campo clínico para ocampo da teoria da arte e reconhecer a matéria na qual se tece o FORT-DA da arte.

II. 2. II. 2. II. 2. II. 2. II. 2. François Regnault (2001), num conjunto de quatro conferências proferidasem Madrid, entre os anos de 1992 e 1993, nos lembra que o método da Psica-nálise é justamente o de estabelecer um intenso vai e vem dos textos metapsi-cológicos, do arsenal conceitual, das reflexões passíveis de serem denominadasteóricas e da presença marcante da experiência, advinda do campo clínico-analítico(a clínica psicanalítica). Portanto, não haveria uma fala em psicanálise que pudesseser exclusivamente de ordem teórica, deixando de ser o que ela é, em seuexercício, se assim o fosse.

Nesses termos, a Psicanálise tem afinidades com as lógicas particulares dasciências que privilegiam os estudos de caso, o trabalho de campo, a etnografia,a descrição. Segundo o autor, nada do que é feito, de dentro do campo daPsicanálise, para seu ordenamento epistemológico – um saber acerca do saberpsicanalítico – pode prescindir da clínica – nos termos lacanianos d’A Coisa. Noestatuto dessa disciplina, portanto, não haveria uma metalinguagem – teórica –capaz de ser aplicável ao caso, pois não há um discurso sobre, mas um discursodentro da prática e que está integralmente comprometido com ela. A partir de edentro de cada caso, descrições e conceitos se extendem promovendo afirmações

44444 FORT-DA, termo utilizado por Sigmund Freud, num jogo de palavras que designam uma brincadeira infantilde “aparecer/desaparecer”. O termo será detalhadamente explicado no decorrer do próprio artigo.

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conflitivas e contornáveis entre os casos e as teorizações. Não um texto exclusi-vamente de teoria, mas teorizações que se expandem a partir dos efeitos doscasos. “A psicanálise, por sua dialética do caso clínico, é então o campo noqual o singular e o universal coincidem sem passar pelo particular. Isso não écomum em filosofia, exceto talvez em certos momentos hegelianos.”(REGNAULT, 2001, p. 10).

Eis a questão da clínica enunciada. E dela o seu tipo de saber, um saber que faza travessia do singular ao universal. Nessas inter-relações, fazemos coincidir aproblemática de Hegel a Lacan: no modo como a arte é, também, uma produçãodo singular que faz passagem ao universal. Assim, os próprios trânsitos entre aarte e a clínica encontram-se aqui enunciados, nos modos como estamos a nosorientar em torno das questões da arte e do estilo, do estilo e da interpretação (edo estilo na interpretação), numa antifilosofia (arte da desenvoltura em relaçãoàs doutrinas).5

No dizer de Maria Inês França, a Psicanálise constitui-se em prática teórica, oque nos faz lembrar essa pretensa definição contemporânea para as artes, elaspróprias enquanto práticas teóricas. Carregadas no seu limite por uma experiência,a do analista na clínica e a do artista em qualquer forma de ateliê, estão emvizinhança quando falamos ou pensamos nas estruturas da sublimação, tomadasde Hegel, apontadas por Freud (arte, ciência e religião) e, posteriormente, rea-presentadas por Lacan.

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55555 Nesses termos, as leituras de Fabio Herrmann fazem grande metáfora ao termo de Freud-Lacan-Regnault:a antifilosofia. Por esse termo, entende-se a capacidade de o analista trafegar e navegar entre os conceitos,“uma arte de desenvoltura em relação às doutrinas, amealhando, picotando aqui e ali algum achado filosófico,e deixando o resto”. (REGNAULT, 2001, p. 11). O que se apreende aqui é a plasticidade, o senso pragmático,a catarse (a condução dos afetos como estado de arte).

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A orientação geral para o tema da sublimação e para as três grandes formaçõesque tratam desta questão – arte, ciência, religião (Freud) – podem ser aindacontaminadas pelo tratamento que foi dado por Lacan ao tema, incluindo aí, nocerne do problema, as relações entre arte, ciência e filosofia (Lacan).

Nos termos de Regnault (2001), não se trata apenas de reconhecer a monu-mentalidade das grandes formações; é preciso traçar um ziguezague entre elas, umaaposta “barroca” (Lacan) para fazer avançar a Psicanálise e a sua clínica.6

Já vimos como a arte e a Psicanálise tratam da mesma questão: a do singular. Eisso pode nos fazer passar numa zona intermediária entre a inexistência de umaestética da Psicanálise, do modo como existe uma ética da Psicanálise, e aexistência de uma estética em Psicanálise, ou uma estética à moda psicanalítica,freudiana, lacaniana, dentre outras (REGNAULT; FRANÇA).

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Nas leituras de França, uma estética precede uma ética, enquanto uma inquietanteestranheza presentificada na função do Belo. Nos termos da autora, partindo daleitura de Das Unheimliche,7 o Belo é uma operação de formação de um duplo,mostrando o enigma do semelhante e do familiar como sendo uma terrível ameaçapara além do jogo de espelhos. Portanto, o Belo é o sinal gêmeo do Horror – omais Belo que o próprio Belo.8

66666 A aposta barroca é central na leitura do Seminário 20, mais, ainda, de Jacques Lacan.

77777 FREUD, Sigmund. O estranho. In: FREUD, S. Obras psicológicas completas de Sigmund Freud: ediçãostandard brasileira. 2. ed. Rio de Janeiro: Imago, 1987. Primeira reimpressão: 1988. p. 233-273. v. XVII.

88888 Nos termos de França, esta articulação entre o Belo e o Horrível é o ponto da irrupção do imaginário nosimbólico, fazendo presente o Real e desvelando, na Beleza, a imagem da morte e a relação do ser com afinitude. Eis o tema central de Antígona, na leitura de Lacan, no seminário sobre a Ética na Psicanálise. Paraele, a Beleza de Antígona, ressaltada durante todo o texto, é justamente o modo do qual podemos falardessa relação resplandecente com a morte. Ficamos cegos diante de tanta beleza e estamos, ao mesmotempo, diante de uma surpresa e de uma angústia, pois o excesso de beleza só revela a condicionante dadecrepitude e da morte mais e mais ressaltadas. Assim, o prazer da beleza – prazer de imagem, de objeto –se faz acompanhar de uma forma de angústia e de indeterminação da imagem, como se o excesso fosse jáa distorção que emblematizará, na ausência do objeto, a presença e a marca da morte.

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Por essa terminologia, na ausência de uma estética da Psicanálise, haveria umaestética psicanalítica, que põe o Belo, na estética do desejo, num lugar asseme-lhado ao do Sublime, para as estéticas clássicas.

O Sublime kantiano pode estar mais próximo do Belo freudiano, pois da beleza,nos termos das teorias renascentistas e clássicas, fala-se de uma forma deharmonização e regularização de opostos. A verdade seria resultante do velamentodo horror, causando sistematização da experiência e configuração da realidadenum mundo ordenado. Para Freud, tal como para a estética do Sublime, o problemada verdade incita a pensar no deslocamento que o Belo faz do Horror, para sefazer o lugar de um engodo, de um equívoco.9

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Nesse cruzamento, a função da sublimação exercida pela arte é condizente coma função de sublimação exercida pela clínica. Em ambas, faz-se referência àCoisa. E que Coisa é essa?

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Se Ela desliza entre os significantes, a melhor forma de representá-la é o Vazio.Assim, em cada momento, podemos colocar algo no seu lugar. Quando estamospróximos do Real, a Coisa é o Vazio, e o Vazio a representa. Quando estamos ao ladoda arte, temos aí, algo posto em cena, no seu lugar, como sendo a sua representação.

99999 Talvez, se possa pensar na concepção de barroco para Lacan e da fórmula da arte enquanto lugar doengodo – trompe l’oeil. Veja-se O Seminário mais ainda.

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Portanto, na Psicanálise, a arte é um modo de representação do Vazio.10

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Ao fim, não há também uma Psicanálise aplicada ao estudo da arte. O que há éestado de arte na Psicanálise. O que há é um estilo na clínica. A arte precede aclínica.

E o que pode fazer a clínica (psicanalítica) na arte e com a arte?

O que pode fazer a arte, portanto, na clínica e para a clínica?

No que diz respeito à primeira questão, Freud sempre manteve reservas empsicanalizar o artista através da arte e restringiu ao máximo sua abordagem aoato e ao processo de criação.

No que diz respeito à segunda, Lacan conduziu a arte para fazer avançar apsicanálise.

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Nesses termos, ao estudar arte, estamos compreendendo as relações que seestabelecem entre o visível, o legível e o audível, todos eles suportados imagi-

1010101010 Nos estudos das interfaces, encontram-se pontos de aproximação entre esta concepção do Furo e doinconsciente como sendo um Real furado – no qual tudo é travessia – com as filosofias orientais. Maria LuizaRamos aponta para estas relações entre a psicanálise lacaniana e as abordagens do sentido nas filosofiasdo extremo oriente, afirmando uma relação intertextual entre Lacan e os místicos (Zen-budismo, Bhagavadgitae o misticismo cristão). Ela estabelece as redes de leitura entre os Upanixades e o Estágio do Espelho eentre o método da análise e a didática do zen-budismo. Veja-se RAMOS, M. L. Interfaces: literatura, mito,inconsciente, cognição. Belo Horizonte: Ed. da UFMG, 2000. 296 p. (Coleção Humanitas)

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nariamente no corpo. As artes não se definem aqui segundo gêneros ou segundoas classificações e sistemas artísticos. Na Psicanálise, com ênfase aqui paraLacan, as artes estão marcadas pelo VAZIO (o modelo do vaso) e pela ANAMOR-FOSE (o modelo do crânio). No vazio, estamos no templo e na arquitetura primitiva,no vaso d’AAAAA Oleira CiumentaOleira CiumentaOleira CiumentaOleira CiumentaOleira Ciumenta, de Claude Lévi-Strauss. É em torno do vazio e dasua organização que se obra. Na anamorfose, um jogo barroco quer reinstaurar osentido da arte, nos termos de uma arte contemporânea das ciências.

Nos termos de França (1997), a arte, enquanto desconstrução do ideal da estéticaclássica, promove com a criação um laço entre os sujeitos desejantes. Nessestermos, o Belo faz um laço social. Com a atividade sublimatória, o vazio do qualse falava torna-se um modo de articulação do modo como apresentamos nossaspaixões no registro pulsional. No amor, no ódio e na ignorância – as paixõeshumanas – o aprendizado permanente de lidar com o não-sentido é o que permiteao sujeito a invenção de um lugar criativo e de potencialização do desejo.

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III. 1. Lendo em FreudIII. 1. Lendo em FreudIII. 1. Lendo em FreudIII. 1. Lendo em FreudIII. 1. Lendo em Freud

Se as questões que trazem o tema das relações entre arte e clínica psicanalítica,do ponto de vista da Psicanálise, concentram-se na abordagem da angústia doato criador e da autocriação do sujeito, numa invenção da vida em face da de-crepitude e do desaparecimento, a arte e suas reflexões teóricas têm se debruçadonos textos da Psicanálise como modo de enfrentar os objetos artísticos dosséculos XX e XXI. Grande parte da bibliografia atual que estuda as relações entrearte e Psicanálise tem na famosa descrição freudiana do FORT-DA um dos seusmotes de iniciação. Essa questão, inicialmente restrita ao campo dos estudosfreudianos, após as derivações Freud-Lacan, ganha importância no cenário deuma teoria da arte propriamente dita.

Assim, quero me deter em alguns desses momentos exemplares e identificar aspossíveis correlações entre o FORT-DA, uma teoria da visão e uma teoria daencenação.

Inicialmente, retomemos o texto de Freud.

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Em Além do princípio de prazerAlém do princípio de prazerAlém do princípio de prazerAlém do princípio de prazerAlém do princípio de prazer, Freud descreve a situação do seu próprio neto,com dezoito meses de vida. Seu contexto de leitura diz respeito a uma passagemque faz alusão às brincadeiras infantis.

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Vemos aqui como o autor revela sua preocupação inicial com uma relação teóricaentre a economia libidinal e seu bom funcionamento através da brincadeira,recebendo o brinquedo e o brincar a função de produção de prazer.

Em seguida, continuando o pensamento de Freud:

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Nesse ponto, Freud estabelece a relação entre o jogo e a questão da linguagem.No seu entendimento, o FORT-DA designava uma situação de “ir embora” e de“estar ali (retornar)”, como num vai-e-vem. O prazer do menino era medido peloprocedimento repetitivo – característica do jogo – entre desaparecer e reaparecer.

O jogo era, então, visto como iniciativa cultural e de simbolização dos modosda ausência e da presença da figura materna que, além dos cuidados físicos(alimentação, o grande seio) implicava também um estado entre o cuidado e oolhar que se depositava da mãe em direção ao filho e do filho na procura damãe. O menino reencenava a situação vivida, representando-a na forma dojogo do carretel.

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Note-se aqui a complexidade da observação e da análise do caso isolado. Freudchama a atenção para o fato de que o jogo, na maioria das vezes, não tinhacomo garantia o retorno do objeto. Portanto, na grande maioria das situações emque o carretel sumia, ele não retornava. A criança, então, estava se impondo,

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enquanto agente ativo, um padrão de desaparecimento do seu objeto de prazer.Substituía o lugar de objeto dado a si por estar sofrendo com a saída ativa damãe – era a mãe que ia e vinha – por um jogo, no qual, ela própria, designava amãe enquanto objeto destinado a ser retirado da cena ou retornar a ela, conformeo movimento promovido pela criança.

A criança ritualizava a saída de cena da mãe através do objeto e, através do me-canismo constituído, restituía a si o objeto e o prazer advindo de uma certeza simbólicada volta da própria mãe. Assim como o carretel, a mãe também retornaria sempre.Mas não apenas isso. A criança tomava a si o poder – simbólico – de mandar a mãee o objeto embora e de trazê-los de volta quando lhe fosse aprazível.11

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1111111111 Penso que aqui devemos levar em conta o quantum de tempo no qual o jogo se estabelece, como meiode realização de diferentes tempos do afastamento do objeto materno e o desenvolvimento dos níveis deresistência infantil. Assim, não há um único modo de se jogar esse jogo, no qual o que importa não são aduração e as distâncias temporais entre o desaparecimento e o retorno do objeto, mas uma dimensãosubjetiva e flutuante. É por isso que não designa descontinuidade de raciocínio e de lógica simbólica do jogodo FORT-DA, a descontinuidade de apreensão temporal.

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Como dissemos, o jogo inicialmente observado por Freud, do ponto de vista deuma economia, é também aventado como da ordem de uma política. Em ambas,estamos diante de uma representação. Representação simbólica de objeto, naeconomia, e, representação relacional de poder, na política. Freud deixa em aberto,apesar de preponderar em si o raciocínio da economia, o jogo entre essas duasforças, correlacionando-as e colocando-as, cautelosamente, lado a lado.12

Qual o motivo que nos fez tomar esse pequeno caso acima descrito por Freudcomo sendo paradigmático para pensar as artes, enfatizando aqui suas origensnum jogo (simbólico e relacional) e designando uma função visual e uma funçãode encenação.

Ao que parece, o próprio Freud sugere essa relação entre o menino e os artistas,terminando o caso com a representação teatral trágica, onde o espectador élevado a buscar prazer em experiências penosas encenadas, designando que“um sistema de estética com uma abordagem econômica a seu tema geral”(FREUD, 1988, p. 29) deve prevalecer.13

Nessa articulação entre economia (libidinal, simbólica), política (forças, relações)e estética, estamos diante das páginas de uma estética psicanalítica que se

1212121212 Em sua análise, Didi-Huberman (1998) lembra que o exemplo do jogo infantil encontra-se no contexto deuma análise sobre a guerra e uma metáfora do sujeito em busca da sobrevivência, no aprendizado de pornovamente em cena o “pior”, ou seja, brincar e fazer troça com os elementos mais desprezíveis, tomandocomo objeto de jogo e de cena aqueles elementos em geral desconsiderados ou vistos como inferiores erepulsivos, fazendo do jogo um meio de preservação psíquica da própria existência.

1313131313 Didi-Huberman afirma: “Que o carretel só é ‘vivo e dançante ao figurar a ausência, e só ‘joga’ ao eternizaro desejo, como um mar demasiado vivo devora o corpo do afogado, como uma sepultura eterniza a mortepara os vivos. Talvez só haja imagem a pensar radicalmente – metapsicologicamente – para além do princípiode prazer: Freud, como se lembram, terminava sua passagem com uma alusão ao ‘jogo do luto’ (Trauerspiel,a tragédia) e apelava a ‘uma estética guiada pelo ponto de vista econômico’. Ora, não importa a idéia queFreud fizesse então da atividade artística em geral, devemos igualmente sublinhar a crítica da imitação queacompanhava toda sua reflexão: ‘Explicar um jogo por um instinto de imitação é formular uma hipóteseinútil’. Talvez só haja imagem a pensar radicalmente para além do princípio de imitação. É talvez no momentomesmo em que se torna capaz de desaparecer ritmicamente, enquanto objeto visível, que o carretel se torna

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volta para dois lugares, privilegiadamente: uma teoria da encenação e daídecorrente uma noção de representação e uma teoria do campo visual, do olhare do jogo entre olhares, nas relações sujeito e objeto.

III. 2. III. 2. III. 2. III. 2. III. 2. Arte, teoria da encenação e a noção de representação

A representação é um elemento central no processo de criação. Fórmula expressapor Freud no JOGO DO FORT-DA. Representar, em Freud, designa o ato de pôr emcena.

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O que está posto em cena é o modo mesmo como se situa no mundo um serdesejante, constituindo a realidade do ser diante da ausência do seu objeto dedesejo. A criança, ao jogar, elabora o trauma da perda e encontra para ela umasaída positivada – criadora (no jogo).

Nos níveis mais elevados da criação, denominamos isso de inspiração criadora,como forma de compreender uma experiência mítica do real, gerando não apenas

uma imagem visual. O símbolo, certamente, o ‘substituirá’, o assassinará – segundo a idéia de que ‘osímbolo se manifesta primeiro como assassinato da coisa’ –, mas ele subsistirá num canto, esse carretel:num canto da alma ou num canto da casa. Subsistirá como resto assassinado do desejo da criança.” (DIDI-HUBERMAN, 1998, p. 83). A imagem deve ser vista aqui como emblema ou como alegoria que designa umaposição intermediária entre o objeto real – em desaparecimento – e a abstração da ordem simbólica – quetambém faz desaparecer a imagem. A ordem imaginária ficaria, assim, numa espécie de zona de suspensão.Não se está falando da imagem enquanto cópia do real – por imitação. Para Didi-Huberman, em sua recuperaçãopara a Teoria da Arte da leitura de Freud, a imagem surge justamente condicionada pelo desaparecimento doobjeto real. A imagem surge no lugar da ausência dos objetos, visando a eternizar o desejo de um certoobjeto perdido e apenas reencontrado num outro plano, numa passagem do real ao imaginário. Nessaeconomia freudiana, não existem duas coisas no mesmo lugar. Perde-se o objeto, ganha-se a imagem.Posteriormente, uma nova passagem indica que o imaginário deverá ser subsumido no simbólico, por efeitosde ordem. O símbolo virá para dizer algo a respeito de todo e qualquer objeto perdido, ele virá para dar ordemao acontecimento do plano real. Para tanto, ele deverá enfrentar a coisa e a imagem, mas nessa economiapsíquica, as coisas se deslocam, e objetos perdidos e imagens apagadas acabam por permanecer comotraços ou restos. Nada é controlável pelo modelo. Nem mesmo a boneca – imagem e semelhança do huma-no – pode ser contida numa figuração corporal. Sempre se procura outro algo – Baudelaire diz que queremosver a alma e por isso destruímos nossos brinquedos. Por isso, busca-se sempre outra imagem capaz deconvocar o jogo dos objetos perdidos.

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uma descrição ou um comentário do mundo desse ser de desejo, mas tambémprovocando três estados definidos como:

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O que M’Uzan identifica na criação é uma supressão, uma ultrapassagem ouuma valorização da zona intersticial entre o mundo exterior e a realidade do eupsicossomático, a realidade e o sujeito, enfim, o surgimento de uma relaçãoprovocadora de um estranhamento diante dos limites e das fronteiras agoraolhados enquanto tal, a partir de uma localização intermediária entre exterior-interior, uma espécie de espaço indefinido.

Aparentemente, durante o processo de constituição narcísica, após o momentodo narcisismo primário, que se põe o problema de pôr algo em cena, algo nolugar de, como representando algo para alguém. É nesse momento que saímosem busca dos objetos exteriores e temos de suportar as tensões (pulsionais).Jogado nesse espaço indefinível, debatendo-se nos encontros com o real, o sujeitoé submetido a novos aspectos e a novas exigências da pulsão que, em seusmovimentos constantes, permite promover o surgimento da representaçãocriadora. Cada momento da criação desvela, assim, sua condição traumática.

III. 3. Teoria do olhar

Por outro lado, tomando a situação do objeto – o carretel do FORT-DA –, estamosdiante de um aparecer-desaparecer, de um desvelar-velar, de um jogo de esconde-esconde, onde algo não se deixa alcançar pelo olhar. E isso coloca em questãouma teoria do olhar e do jogo entre olhares.

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Diferentes autores, teóricos da arte ou psicanalistas interessados nos termosda visão e do olhar, da função escópica, estão atraídos pelas condicionantesenunciadas no FORT-DA.

Vejamos alguns exemplos. Em Didi-Huberman, trata-se do “desaparecimento deseu carretel com um invariável o-o-o-ó prolongado, depois saudando seu reapa-recimento, escreve Freud, ‘um alegre Da!’ (‘Ah! Aí está!’). Faço alusão a issoapenas para sublinhar de novo o quadro geral em que nosso problema se coloca:quando o que vemos é suportado por uma obra de perda, e quando disto algumacoisa resta. (DIDI-HUBERMAN, 1998, p. 79-80).

Estamos diante de um objeto – o carretel – apresentado em sua singularidadevisual, de objeto concreto e visível. Seja uma moeda, uma pedra ou um carretel,os objetos permitem o desenvolvimento de um estranhamento e da marca dapresença da alteridade que arrasta consigo o poder da fantasia e da identificaçãona ordem do imaginário.

Num texto de divulgação, o psicanalista e teórico da arte, Darian Leader, afirma que

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Leader e Didi-Huberman estão a nos colocar diante do problema de um jogoentre olhares, no qual estamos cindidos – “viscondes partidos ao meio”, comodiria o escritor italiano Italo Calvino. Para esses autores, o ato de ver é umaabertura, uma fenda que se imprime num jogo de aparecer e desaparecer, noqual somos aquele que vê o objeto sumir e retornar (sujeito) e somos aquele queé visto, não pelo objeto, mas por aquilo (aquele ou aquela) a que o objeto designa,um terceiro termo, abrindo a relação sujeito-objeto para uma compreensão deque “somos vistos pelo que nos olha”. Vemos através de e com um objeto quedeve designar uma perda e, numa partida como essa, resta um.

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O jogo do que está posto em cena – tal como vimos no tópico acima – é sustentadonum objeto mínimo e numa imagem visual que se configura aos olhos do sujeitocomo um resto do movimento completo de desaparecer e de reaparecer. O que seentende disso é que, em face do jogo repetitivo – movimento de intervalos varian-tes –, fixa-se o menor denominador comum ao olhar da criança. Fixa-se uma imagemno desaparecimento da coisa. E quando a coisa retorna, ela volta como o resto daimaginária14 que se estabilizou, escavada que foi na interioridade do sujeito.15

Partindo de Lacan, Huberman e Leader, esses afirmam que o objeto visual émais algo que remete àquilo que não vemos do que àquilo que vemos. O carretelsomente é objeto visual no instante em que desaparece e se constitui visualmenteem nossa mente. Seu desaparecimento físico instala a imagem dentro de nós.Mas o que não podemos ver? O nosso próprio ato de ver não nos é dado a ver, omodo como somos vistos por outros. Ou seja, não podemos ver como somosolhados. O que vemos não é o que nos olha. Então, somos constituídospsiquicamente por uma exterioridade que nos olha e que nos liga, relacionalmente,e nos afeta, através do olhar do outro. Desde o começo de nossa própria presençaobjetal no mundo, somos olhados.

Leader afirma de modo direto: “O que vemos e para onde olhamos dependerá,em parte, do que outrem vê e para onde olha. No exato momento de vir aomundo, antes num sentido de se poder ‘ver’ qualquer coisa, somos o objeto doolhar de outrem. (LEADER, 2005, p. 11).

1414141414 Aqui, os termos imaginário, imaginação e imaginária podem indicar algumas confusões. Há uma íntimaassociação entre eles, e o seu envolvimento revela muito das migrações e das interfaces entre a teoriapsicanalítica e a teoria da arte. No sentido dado aqui ao termo, a tópica do imaginário acaba exatamente por se configurar numa ordem imaginária e nas formações figurais do tipo das imaginárias, que seria umaoutra maneira de dar tratamento ao tema dos arquétipos, mantendo a filiação à leitura proposta, tanto noque tange aos aspectos da psicanálise quanto aos aspectos da teoria da arte. Trata-se ainda de pensar nasprovocações pensantes do tipo alegórico e das formas figurais que acabam por tecer relações do tipo dafantasia e da fantasmática. As imaginárias se constituem como sendo estes conjuntos de figuras(emblemáticas) que são capazes de reunir e reapresentar o fantasma. Trata-se ainda de pensar o modocomo estas figuras da Imaginária Religiosa – geralmente lembradas pelos conjuntos de santos e pelos ex-votos – são modos de fixação de emblemas do si mesmo. No caso específico da arte dos ex-votos há umaassociação direta entre promessa, resto do real e a feitura de uma imagem que deve servir de resistência,de emblema, de sinal protetor, pois deve existir enquanto promessa e retorno, enquanto conquista (de umpedido agora alcançado) e enquanto perda (de um pedaço de si que deve ser um emblema de si). Então,estamos diante de conjuntos organizados e, ao mesmo tempo, vestigiais, como numa espécie de cova deescavação arqueológica, onde nos deparamos com conjuntos fragmentários (fragmentos apresentados emcamadas, designando temporalidades distintas). Em outros textos, tenho procurado associações entrepensamento teológico, teoria da arte e estudos da psicanálise.

1515151515 Didi-Huberman fala mesmo de uma arqueologia do símbolo.

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Portanto, ao colocar em cena (representar), estamos diante também de um jogoque nos ensina a nossa condição de sermos objeto do olhar de um outro. Eenquanto olhamos para as coisas perdidas imaginariamente constituídas emnossa mente, fazemos imagem de nós mesmos e fazemos a imagem através docorpo-imagem – como na fase do espelho.

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Em geral, pensamos que o corpo é um real ao qual acedemos e do qual e no qualnos constituímos. Na Psicanálise, somos constituídos enquanto corpo e enquantoforma através do olhar e da imagem, do olhar do outro (do que nos olha) e daimagem espelhada (quando nos olhamos no espelho e, inicialmente, nosimaginamos um outro dentro do espelho). Traçamos a idealização nessa imagemque irá nos acompanhar e resistimos ao corpo real, acessível através da alucina-ção – da dor, do sofrimento, do êxtase físico. Assim, somos um outro, um outro noespelho e um outro aos olhos dos outros. E, nessa fixação emblemática, buscamosuma eternização na imagem. Buscamos o emblema que sempre revigorará o objetoperdido que somos e que apenas encontramos na esquina da imaginária.

Por outro lado, a figurabilidade abre a superfície da imagem que nos olha paraalém do que é visível (aparente). A imagem não é apenas o traçado de um pontode vista ideal. A vidência não é somente uma prova, uma evidência. Diante dasuperfície imaginária, o objeto visual tangencia e se realiza como um deslocamentode sentidos. A vista pode se abrir em múltiplas vistas. O pano pode aceder amuitas dimensões e organizações plásticas.

O que vemos não será medido pelo real do corpo, mas pela condicionante dojogo do ir e do vir, estabelecendo um lugar e uma temporalidade. Nesse ponto,estamos acedendo ao momento da projeção e ao movimento do lançamento –projetar e lançar o objeto longe para lhe dar um conteúdo, fazê-lo imagem efundar o sujeito neste afastamento da coisa, integrando a imagem visual comocondição constitutiva do sujeito.

Não vemos o que se encontra no real, apenas podemos ver aquilo que é preenchidono seu desaparecimento. Isso configura a definição de objeto aurático. O que se

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Como o carretel, o quadro de Mona Lisa desaparecido do Museu do Louvre,constitui um olhar. O olhar recai na ausência do objeto – do carretel, do quadro –e dela passa a constituir a aura em torno do desaparecimento.

Passando pelo roubo da Mona Lisa ou pelas leituras do minimalismo norte-americano, Leader e Didi-Huberman terminam por reforçar a idéia de que a arte éum desejo de ser visto ou de que algo seja visto – seja colocado em cena, nosetting, pois ser visto é entrar na dinâmica do entrelaçamento de olhares,apreender que nossa constituição subjetiva, inconsciente, é co-dependente doolhar de outrem e, mais ainda, da incorporação do modo como somos olhados.

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Somente há constituição subjetiva do ato de ver quando esse aparece cindido emdois, pelo que vemos e pelo que nos olha (como somos vistos), na assinatura dascoisas. Devemos aprender a ver de “olhos bem fechados” – parafraseando Kubrick– para que possamos ser remetidos mais uma vez ao vazio constitutivo daquiloque ultrapassa a percepção carnalizada do mundo; para, ao ultrapassar o quevemos, adentrar no campo fantasmático de ver o invisível como modalidade dovisível vendo, assim, com nossos olhos, todos os olhos dos quais fomos olhados.

O visível indica mais do que o plano óptico – impressionista –, uma potênciavisual,

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Uma teoria da visão seria então uma teoria dos vestígios. No passado, intimamenteligada à aura religiosa e reapresentada, no mundo moderno, através da obra dearte.16

A diferença entre qualquer imagem e o vestígio é designada como a diferençaentre uma ordem do visual visível (da percepção) e a de uma visão daquilo quenão se vê, visão de traços daquilo que foi desaparecido, arruinado. Assim, acisão entre o visual e o visível, na Psicanálise, nos ensina que, ao ver, nãoapenas estamos diante de objetos, corpos e matérias, estamos diante de umatentativa de recuperação, num corpo objetal qualquer, daquilo que ao ser dadopor perdido nunca teria existido antes, um objeto inexistente e procurado emobjetos substitutos, formalizado num objeto qualquer, vazado a ponto de sercapaz de nos mostrar um vazio – a obra de arte.

Para finalizar este tópico, reconhece-se que a arte é dada então como objeto dogozo, objeto inútil, finalidade sem fim (kantiano). Não há simplesmente prazer,pois não há uso que a sustente (jogo da finalidade sem fim, objeto inútil). Nogozo, estamos diante do vazio. O gozo remete a uma filosofia do amor, tal comoanunciou Santo Agostinho. Somente podemos gozar do amor por ser esse semfinalidade, sem utilidade. Somente podemos gozar da arte como gozamos dosignificante de Deus.

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1616161616 Em outro texto, tratando especificamente do conceito de composição, tomo a questão posta por Didi-Huberman, retraçando as relações entre Hegel, Freud, Benjamin e Lacan. Vejam-se os textos: ENSAIO DECOMPOSIÇÃO: Entre o conceito e a sensação em literatura e arte modernas. Veja-se o site do II EncontroInternacional de História (Anpuh-Goiás. Disponível em: www.anpuhgo.br. Numa versão mais recente com otítulo COMPOSIÇÃO: TRAJETO CONCEITUAL E A RETOMADA DA PERSPECTIVA DA SENSAÇÃO-EXPERIÊNCIA NOESTUDO DAS RELAÇÕES INTERARTÍSTICAS. (Encontro Regional Abralic 2007, SP, USP. Disponível em:www.abralic.org.br). Além desses, o texto integra um livro editado pela EdUFU, em outubro de 2007.

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Se a arte associa-se ao gozo, como lugar do vazio, o que será este corpo – corpo,objeto, matéria – que se põe aqui como sendo seu significante? O que podemospensar neste lugar? Para falar desse corpo e de um corpo-obra, vou eleger umartista em sua singularidade, ao qual tenho dedicado grande parte da minhaatenção e leitura. O método diz respeito ao modo de fazer da clínica – do singularao universal. A passagem diz respeito ao inconsciente da obra enquanto incons-ciente da cultura e ao modo como a obra é, ela própria, o lugar vazio do analista,plasticamente preenchido, na linguagem, por todos nós, seus analisandos, artistae público. O artista escolhido é Francis Bacon.

Tomamos de início, uma entrevista de Bacon a Michel Archimbaud, em 1991,quando o pintor afirma que já não faz a pintura pelos outros, mas faz a pintura parasi mesmo. Ele revela uma atenção particular a esse modo de compreender a pinturacomo um ofício e uma fabricação. Ao pintar, ele fabrica a obra e desenvolve umaatitude de fabricação de si – uma reflexão sobre o si mesmo (Foucault).

Ao fabricar a obra como lugar existente, ele vai preenchendo a tela – como poderiaser também a folha de papel, o espaço sonoro, etc. – com seus depósitos e seusresíduos, para deixar na imagem o seu próprio rastro, o seu vestígio.

Esta reflexão é um tipo de pesquisa artística e artefatual que se dá no âmbito eno cerne do visível, para constituir um objeto visual que se possa oferecer comoevidência (formal) e vidência (residual) do modo como um aparecer implica tambémum desaparecer.

O alvo, ou o objeto eleito, é o corpo humano e o seu rosto.17 O rosto é a condiçãodo retrato, modo de constituição de um regime de signos que visa a presentificaruma identificação de um sujeito – seja do retrato pintado de um cortesão, sejade um nobre, seja de um político, seja numa fotografia identificatória policial,numa 3x4, numa foto de passaporte.

17 Para esta pesquisa, o pintor procura pranchas coloridas à mão que tratam do corpo enquanto objeto daciência médica (um exemplo é o tema das doenças bucais, pranchas com bocas abertas mostrando diversosexames e patologias da boca) e reúne a ela fotogramas e outras imagens retiradas do mundo contemporâneo(por exemplo, imagens do filme O Encouraçado Potemkim, na cena da escadaria). O artista desenvolve umapesquisa sobre o corpo a partir da boca aberta, um tecido cutâneo interno, cruzando-a com as imagens dosgritos, outras bocas abertas, que aparecem na arte, no cinema e em outras imagens circulantes na cultura.De Deleuze a Cuir, observa-se que é o corpo que escapa através da boca que grita, bem como é o corpo quegrita quando a boca encontra-se fechada.

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Bacon toma o retrato como sendo uma impossibilidade de mostrar o sujeito e oidentifica como objeto visual que está no lugar de, um substitutivo para umaperda. O retrato é um traço de uma imagem perdida de si mesmo. Desse modo,na imagem do retratado, o que se faz passar é o vestígio do rosto perdido ouarruinado pela diferença existente de um instante a outro. Já não somos o quefoi retratado.

O retrato então passa à condição de carne, e o rosto, tomado em suas relaçõescom os exercícios encontrados nas pranchas de anatomia e de fisiologia, umobjeto visual capaz de mostrar essa perda ou esse deslocamento contínuo etemporal do próprio objeto, em suas mudanças fisionômicas e em suas alteraçõesda máscara da face.

O artista, segundo o historiador da arte Raphaël Cuir, está interessado no corpocomo objeto a ser investigado – retratado, oferecido como objeto visual – pelapintura (arte) e, ao fazer isso, abre-se para um jogo corpo-pintura que nada maisé do que um jogo entre um visível sensorial-perceptual (corpo) e a produção deum objeto visual capaz não apenas de ser uma observação (raciocínio do desenho)ou um comentário de uma observação (raciocínio do ready-made), mas um objetocarnal-pictórico, um corpo-obra.

Num auto-retrato de 1976, Cuir descreve o modo como Bacon pinta o própriorosto tomando como base as pranchas de anatomia e patologia. Contrariamenteao uso da imagem, pela via da apropriação de imagens científicas de observação(lógica do desenho de observação) ou de imagens prontas, desenvolvidas pormeio dos aparatos técnicos (lógica do ready-made). Bacon propõe a construçãode um sistema representacional carnal-pictórico, uma carne da pintura, que sejauma tradução do Horror,18 em cuja centralidade estão a figura humana e asconstantes transformações a que somos submetidos no processo vital. (CUIR,2000). No sistema visual do Horror assistimos ao Belo da destruição e, portanto,podemos ver e sermos vistos através de uma face da dissolução do si mesmo;podemos enxergar uma face da morte integralmente vivida.

Segundo Guin, cabe à representação artística figurativa baconiana excitar asterminações nervosas e impedir que se faça uma associação entre o figurativo eo narrativo ou o meramente ilustrativo – um problema da pintura.

18 O Horror aqui deve ser remetido ao mais Belo que o Belo e à noção de inquietante estranheza de Freud,tal como foi enunciado no início deste texto.

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Como faz isso? Tratando a pintura como um acidente. Acidentes são aconteci-mentos felizes ou infelizes que preenchem nossa existência trazendo consigo aruptura da continuidade existencial. A pintura é um acidente do desenho, e oóleo é o acidente da pintura. A pintura é um acidente cujo evento principal é ainvenção da tecnologia do óleo19 e para a qual se enunciarão e encadearãooutras séries acidentais – no modo como o artista encontra, acidentalmente,entre as imagens médicas e a arte pictórica, um ponto de contato para a ima-ginação da beleza e do Horror – como vimos acima, o mais belo que o belo.

Acidentes são pontos de descontinuidade e de contato, como no livro de J. G.Ballard adaptado para o cinema (Crash) e no filme homônimo (Crash, ganhadordo Oscar de 2006).20

A cada instante do movimento da fabricação da obra, há um desvio provocadopor algum acidente, por algum acontecimento, no ato de pintar.

Assim, a superfície fica tomada de fatos. Uma memória cumulativa de cada trechonos permite pensar no raciocínio do palimpsesto e num acontecimento que se dáentre trechos da pintura e entre as diferentes imagens que ali estão acumuladas.

Em geral, essas transformações são representadas na imagem plana pelo acúmulode ângulos diferentes, numa soma de todas as imagens em uma única imagem,causando ao espectador uma sensação de deformidade – o Horror.

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19 Pierre Guin (2000) lembra que o óleo é um meio fluido e, por isso mesmo, capaz de produzir outrasformas além das que foram propostas pelo artista. Desse modo, a subjetivação encontra-se com a maquinariade produção. Não é apenas da ordem imaginária que se está falando. Quando se apresenta a imagem de umretrato ou de um corpo humano em pose/no congelamento de um movimento ou mesmo no movimento,estamos diante de diferentes vistas – perscrutação do olhar que voyeuriza o objeto exterior – e estamosdiante de um ato de pintar que impõe ao sujeito uma maleabilidade, a plasticidade do meio, no contato entreo meio e a superfície deslizante e operante da tela. Nos termos do psiquismo, estamos diante de um real,uma volta do real em torno de um nó, que faz ver a outrem ou a outra Coisa. O que aparece não é apenas oretrato ou o auto-retrato – a imagem de si – mas o deslocamento dessa imagem que deve suportar suacondição existencial metamorfoseante em direção à decrepitude – uma face da morte. Nesses termos,podemos mesmo pensar numa certa anamorfose do retrato no quadro, nos termos de que fala Lacan.

20 Crash é um livro de ficção científica de J. G. Ballard. Foi adaptado para o cinema com o título Crash(traduzido como Crash – Estranhos Prazeres), com direção de Cronenberg (1996). Crash (traduzido comoCrash – No Limite), 2005, ganhador do Oscar de 2006, direção de Paul Haggis.

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O que se pode apreender dessa arte e aprender com ela? O que ela nos podeensinar a respeito do corpo? O corpo pintado – o rosto, o retrato – não é apenasa resultante de uma estética gestual e de uma estética que privilegia o meiofílmico (estética do cinema). O corpo desordenado em gestos é também o corpoem deslocamento enquanto imagem no cinema. O corpo é apresentado por Ba-con como o espaço intermediário, entre um fotograma e outro de um filme. Ocorpo é um palimpsesto pessoal, tomado por trechos e por traços.

Nesse deslocamento, o que se anuncia no entreimagens fixadas por Bacon é ummomento destinado à contemplação da destruição do corpo físico, como se ohumano tivesse, também, ele já passado, entre as imagens, sumindo em algumamancha ou zona colorida, massa de distorção.

Dessa maneira, quando o corpo é a obra, na esfera clínica, podemos sustentaralgumas possibilidades de relação e de interpretação: o corpo-obra permiteinvestigar e transitar por entre o mundo dos objetos (e das relações de objeto),presentificar os restos (e as relações de abjeção) e simbolizar a morte – a obrade arte enquanto fantasma permite, por meio da forma aurática, resistir à morte.

A manipulação dos meios e dos materiais não visa apenas à produção de umarepresentação de objeto exterior ao que está sendo produzido. Assim, um retratoou uma canção não deve ser tomado tão simplesmente como representação dosconteúdos socialmente reconhecidos do retrato e da canção. Um objeto podeser, também, a representação de uma relação e, nesses termos, pode ser umíndice de apresentação da relação terapêutica e do setting instalado.

O trânsito para a dimensão do corpo-obra permite a instalação de um lugar-signficante na clínica e um modo de apreensão da estética enquanto modo deestruturação subjetiva.

O tema do corpo-obra visa a ressaltar a particular importância da experiênciaclínica e suas afinidades com a experiência e as formas do pensamento-fazerartístico. Assim, entendo aqui que a relação clínica não só desenvolve uma par-ticular epistemologia dos objetos psíquicos, como também se deixa atravessarpor formas transicionais ou por movimentos do informe que fazem nascer a obra

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de arte do sujeito na clínica e seu corpo glorioso. Como amálgama de flutuaçõese materializações, a clínica deve arregimentar esse princípio de funcionamentoradical, no qual a inclusão da arte não deve estar restrita às formas do discursocomentado de obras e filmes por conta dos pacientes.

Obrar a subjetividade é tarefa preponderante e diz respeito ao enfrentamentodos grandes lugares da clínica – a arte e a morte. (M’UZAN, 1978).

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Denise da Costa Oliveira de SiqueiraDenise da Costa Oliveira de SiqueiraDenise da Costa Oliveira de SiqueiraDenise da Costa Oliveira de SiqueiraDenise da Costa Oliveira de Siqueira22222

RESUMO

O corpo é lugar de intervenção da sociedade e da cultura sobre o indivíduo, espaço de controleamplamente reproduzido pela mídia. Meios de comunicação, os cartões-postais do Rio de Janeirodurante anos mostraram mulheres de biquíni nas praias da cidade. Em 2005, foi aprovado umprojeto de lei que regulamenta a veiculação, exposição e comercialização de postais com imagensfemininas, com intuito de inibir o turismo sexual no estado. O ato de proibir e controlar taisimagens levou a esta discussão sobre as múltiplas e complexas relações entre comunicação,turismo e estado. Neste trabalho, temos como objetivo refletir sobre como o Estado busca exercero controle sobre a mídia cartão-postal. Para tal, recorremos à abordagem de Foucault acerca doscorpos dóceis e a de antropólogos sobre o corpo no universo da cultura. Esse referencialfundamentou a análise do ato do estado em sua relação com a mídia e o corpo.

Palavras-chave:Palavras-chave:Palavras-chave:Palavras-chave:Palavras-chave: Comunicação. Corpo. Representações sociais. Poder. Turismo.

ABSTRACTABSTRACTABSTRACTABSTRACTABSTRACT

The body is a space of intervention of society and culture over the individual, space of controlreproducted by media. As a kind of media, the post cards of Rio de Janeiro during years showedwomen in bikini in the city beaches. In 2005, it was approved by the State a law project thatregulates the exhibition and commercialization of post cards with women images with the objectiveof inhibiting the sexual tourism in the state. The act of forbidding and controlling those imagesserved as a starting point for this argumentation about the multiple and complex relations amongcommunication, tourism and state. In this paper we have as objective to reflect about how theState searches to control the post card media. For this, we appeal to Foucault’s notion of docilebodies and the one of anthropologists about body in the universe of culture. These principlesbased the analysis of the state act in its relation with the media and the body.

Key words: Key words: Key words: Key words: Key words: Communication. Body. Social representations. Power. Tourism.

11111 Professor Adjunto III e Pesquisador no Programa de Mestrado em Ciências Sociais e no curso de Graduaçãoem Turismo do Instituto de Ciências Humanas da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF). Mestre eDoutor em Sociologia pela IFCS/UFRJ. Graduado em Ciências Sociais pela IFCH/UERJ.22222 Professora Adjunta na PPGC/UERJ no curso de Especialização em Jornalismo Cultural e em curso degraduação. Doutora em Comunicação pela ECA/USP. Graduada em Comunicação pela IFCS/UERJ. Autora deCorpo, comunicação e cultura: a dança contemporânea em cena (Autores Associados, 2006) e de A ciênciana televisão: mito, ritual e espetáculo (Annablume, 1999).

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“Um corpo disciplinado é a base de um gesto eficiente.”(FOUCAULT, 1989, p. 139)

“Quando são feitas e impostas as regras?” (BECKER, 1977a, p. 86)

Complexos, contraditórios, híbridos, exóticos: assim são os lugares turísticos.Muitos desses lugares, pelo menos como representações sociais imagéticas,são encontrados somente em bancas de jornais, anúncios publicitários, boîtes eagências de turismo. Como informação ou representação, fragmentos de lugaresturísticos são destacados, recortados do cotidiano a fim de encantar turistas.Assim sendo, antes mesmo que o turista chegue a seu destino, muito provavel-mente já teve contato com imagens dele. Longe de o turismo se reduzir à viagemou ao deslocamento de uma sociedade para outra, começa a se manifestar nolocal em que o turista vive e constrói seu imaginário.

Contudo, não é só o turista que entra em contato com as imagens de lugaresturísticos. Ao andar pelas ruas do Rio de Janeiro, por exemplo, turistas e moradoresda cidade deparavam-se com cartões-postais mostrando cenas de jovens debiquíni nas praias ao lado de outros com imagens de favelas, da Passarela doSamba, da Praça da Apoteose, do Palácio do Catete, do Monumento aos Pracinhas,do Cristo Redentor, do Maracanã, do Morro do Corcovado, do Pão-de-Açúcar e daBaía de Guanabara. Destacados de revistas e jornais de todos os tipos, os postaisganham a atenção dos passantes, expostos em mostradores que podem sermanipulados, na entrada das bancas de jornais.

Como cidade litorânea, no Rio de Janeiro não é difícil observar-se mulheres emtrajes de banho nas praias quase todos os dias do ano. Isso faz parte, até certoponto, do cotidiano da cidade, mas não significa que, ao longo das estações doano e dos dias da semana, os sentidos e significados de ir à praia sejam osmesmos. O corpo feminino bronzeado nas praias ganha expressão máxima noverão e nos fins de semana quando em oposição aos outros dias da semana eàs estações do ano.

Retratado em cartões-postais, o corpo feminino se torna uma espécie de re-presentação da cidade e é facilmente associado ao turismo sexual, à promiscui-dade da mulher carioca ou brasileira, assim como a uma possível ausência de

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regras e normas que atestem sua civilidade. Tal corpo seria visto, então, comolivre, liberto das amarras ético-morais da civilização, corpo “natural”, em estadoselvagem, autêntico, original, sem regras inscritas nele próprio. De acordo comesse ponto de vista, seria nos trópicos, lugar exótico e caliente, que o turistaestrangeiro encontraria a mulher em seu estado quase natural. A proximidadecom a praia, com a paisagem natural, talvez reforce essa imagem.

Para aqueles que saem de sociedades nas quais o meio ambiente natural foiquase ou totalmente destruído, visitar locais como o Brasil pode significar encontrocom aquilo de que se está distante: a natureza em toda sua potencialidade, sejasob a forma do contato com florestas, rios, cachoeiras, praias ainda selvagensou sob a forma da mulher carioca ou brasileira, representada como quente esensual. Na realidade, sabe-se que não há nada de “natural” em comportamentos,gestos e formas de ser da mulher carioca ou brasileira.

Marcel Mauss, em seu artigo “As técnicas corporais” (1974), mostrou que ocorpo é tanto fruto da cultura, da Psicologia, como da natureza. Em outras palavras,o corpo deveria ser visto em sua totalidade concreta como fato social total. Damesma forma, Gilberto Freyre (1986) assinalou, em Modos de homem e modasde mulher, que não é a natureza, mas a sociedade que intervém construindo umcorpo com formas próprias. Turista-antropólogo, o francês Stéphane Malysseconstatou sobre as imagens do Rio de Janeiro que

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Tal representação do Rio de Janeiro como cidade do corpo foi, em parte, construídatendo o estado como avalista que divulgou a idéia do Rio Cidade Maravilhosa,instituiu os concursos de Escolas de Samba, organizou e divulgou os desfiles deCarnaval e, na década de 80, patrocinou a construção da Passarela do Sambaou Sambódromo. Carnaval e praia foram amplamente empregados para construiruma certa imagem da cidade – inclusive na propaganda do estado. Nesse tipo deimagem – ou nessa estratégia de comunicação – o corpo feminino pouco vestido

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à praia ganhou destaque na construção das simbologias sobre o turismo no Riode Janeiro. Ainda hoje, o corpo feminino nas praias – principalmente aquelascom um maior apelo turístico, como Ipanema e Copacabana, na Zona Sul dacidade – torna-se o objeto de capas de jornais e revistas quando o tema é achegada do verão.

Na contramão da representação Rio-praia-Carnaval-mulheres nuas, em 2005, aAssembléia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro aprovou por unanimidade oProjeto de Lei 2813/05, que “proíbe a veiculação, exposição e venda de postaisturísticos que usem fotos de mulheres, em trajes sumários, que não mantenhamrelação ou não estejam inseridas na imagem original dos cartões-postais”.3 Oprojeto da deputada estadual Alice Tamborindeguy abre espaço para uma reflexãosobre as relações entre corpo, estado, turismo e mídia. Pelo documento, apenaspostais representando mulheres na “cena original” da praia podem ser veiculados,expostos e vendidos. Fotos produzidas, com modelos em imagens construídasprofissionalmente agora são caracterizadas como infração.

Tal projeto de lei levou a algumas reflexões que procuramos expor e que valemum adendo explicativo: são essas reflexões que nos interessam discutir nesteartigo. Não nos propomos a estudar a questão do turismo sexual – sua análiseimplicaria outro formato e outra abordagem. Atemo-nos às questões decomunicação, de construção de sentidos e significados por meio das imagensdo corpo feminino e à tentativa de reconstrução e regulação de tais imagens peloestado. Não é porque o turismo sexual reconhecidamente explicite problemassociais de variadas ordens que não se deva estudar ou analisar a forma retóricacomo o estado lida com ele. Mesmo porque, no caso analisado, a construção daimagem relacionada ao apelo sexual foi construída, em parte, como estratégiade comunicação do próprio estado. Assim, não se busca aqui desqualificar a lei,mas análisá-la de um determinado ponto de vista, o que permite apontar suascontradições.

Dessa forma, de acordo com o projeto de lei em questão, imagens de mulheresproduzidas intencionalmente para figurar em cartões-postais são proibidasenquanto fotos de mulheres tão nuas quanto as primeiras podem ser exibidas,veiculadas e comercializadas porque constariam da “cena original”. Do ponto devista de quem percebe a imagem, no entanto, não há diferença, pois também

33333 Ementa do Projeto de Lei 2.813/05. Disponível em: http://alerjn1.alerj.re.gov.br. Acesso em: 9 maio 2006.

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cabe ao observador atribuir sentidos e significados às imagens. Assim, qualquerpessoa que visse imagens de mulheres de biquínis nos jornais da cidade e empostais dificilmente saberia identificar a diferença de intenção. Ao mesmo tempo,o argumento da deputada nos leva à seguinte questão: Quem na praia não está“representando”? Ser ou estar banhista nas praias é também representar opapel de banhista.

A ação do estado leva a pensar sobre como imagens quase idênticas podemassumir sentidos diversos. A classificação das imagens será, então, um ato deinterpretação. Como distinguir corpos que fariam parte “original da paisagem” ecorpos que foram ali colocados, ou seja, que foram profissionalmente produzidos?Ou ainda, como distinguir natureza e cultura nos corpos? O estado se propôsessa difícil tarefa e, assim, parece acreditar que pode decidir sobre os sentidose significados dessas imagens. O interessante é que ao mesmo tempo em queproíbe determinadas imagens em postais, autoriza outras que passam a gozarde uma legitimidade pelo fato de o estado interpretar que elas fazem parte docontexto original. Então, mais do que simplesmente ver um estado que proíbe,destacamos um que autoriza e legitima certos corpos em determinadas paisagens.

Tomando a situação como exemplo, este artigo busca fazer uma reflexão sobrealgumas das múltiplas relações entre estado, turismo e cultura, expressas porintermédio dos sentidos e significados dos cartões-postais agora proibidos porlei. Para tal, utilizamos como referencial a abordagem de Foucault (1989) acercados corpos dóceis; a de antropólogos, como Mauss, sobre o corpo no universoda cultura e a de Howard Becker, sobre as regras e sua imposição, uma vez quea proibição dos postais apelativos no Estado do Rio de Janeiro oferece apossibilidade de se pensar o que faz com que uma infração seja, em algummomento, tornada pública mobilizando os recursos necessários para que asregras sejam impostas. Esse referencial fundamentou a reflexão e análise do atodo estado levando à (des)construção de uma relação entre estado, mídia e corpo.A partir de uma amostra aleatória de matérias veiculadas pela mídia logo após aaprovação do projeto de lei, buscamos pensar o turismo como sendo decisi-vamente atravessado pelas questões políticas e ideológicas.

Mais do que tomar os cartões-postais como expressões de natureza utilitarista,instrumental e individual, os pensamos como signos, repletos de significados,de informações, tanto para quem os produz quanto para quem os vê, portanto,meios de comunicação, suportes de mensagens. Ao escrever sobre o corpofeminino à praia, quase nu, agora proibido de ser representado nos postais,

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propomos pensar como esse espaço é entrecortado por interesses, visões demundo, ethos e se configura, acima de tudo, como um espaço relacional, cujosignificado aparece na relação mais do que nas partes.

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Política e cultura possuem uma longa história em comum. No pensar de CliffordGeertz, uma das “coisas que quase todo mundo conhece, mas não sabe muitobem demonstrar é que a política de um país reflete o modelo de sua cultura”.(1978, p. 206). Noções como sociedade civil, soberania, estado, corpo político,cidadão, indivíduo, liberdade, direito natural, vontade geral e moral foram funda-mentais à emergência da noção de cultura. (HELL, 1989). Tal noção foi construídaparalelamente à conformação do campo político, principalmente entre os séculosXVII e XIX.

A política é uma obra da cultura, afirma Victor Hell, que escreve também: “Umdos princípios da cultura é o de constituir o lugar de interferências entre múltiplasatividades políticas e econômicas, entre outras; falar de cultura é incluir de certaforma a política e a economia em seus propósitos”. (1989, p. 12). É à culturaque nos referimos ao estudar a forma como o estado, através da iniciativa de umempresário moral (BECKER, 1977b), proíbe postais com imagens apelativas demulheres. Mas também tratamos de poder, de quem o exerce, com que meios eem nome de quem. Nesse sentido, tomamos as definições propostas por Geertz:

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A justificativa apresentada pela deputada estadual para aprovar o projeto de lei2.813/05 referente aos postais – disponível na página da Assembléia Legislativana Internet4 – começa reforçando estereótipos naturalizados tais como a exaltaçãodas qualidades tropicais do País, o reconhecimento da beleza das praias,montanhas e mulheres e termina com as possibilidades econômicas: “Toda essafama atrai turistas, que deixam nos cofres das cidades milhares de dólares,

44444 Disponível em: http://alerjln1.alerj.re.gov.br. Acesso em: 9 maio 2006.

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contribuindo para o nosso crescimento”5 . Parece ser um apelo à razão econômica,mais do que tudo, a explicação que realmente pesa na construção da justificativa,sendo o restante da argumentação complemento.

A autora do projeto segue reconhecendo o valor do turismo como indústria e“propulsor do desenvolvimento” do Estado do Rio de Janeiro. Tal desenvolvimentoseria prejudicado

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Assim, segue a justificativa: “Ao colocar nos cartões-postais dos pontos turísticosrecortes de figuras femininas em trajes sumaríssimos, geralmente de costas,estas pessoas prestam um desserviço ao nosso País”.7 Por desserviço pode-seentender é que assim como o turismo é indústria e traz capital, o turismo sexualprejudica a imagem, logo afasta outros capitais: tanto em termos de dinheirodireto quanto em termos de construção de imagem, o que afasta verbasindiretamente.

Como instância do estado, a Assembléia Legislativa e seus membros podemexercer poder, coibir, proibir, mandar. Assim, referindo-se ao chamado “turismosexual”, o documento explicita: “Este Projeto de Lei visa a reprimir este tipo deiniciativa”.8 E segue: “Precisamos proteger nossas meninas. E o primeiro passopara isso é proibir que se veicule e se exponha imagens de mulheres e meninasneste tipo de cartão-postal”9 [sic]. A justificativa se encerra qualificando o textocomo “Projeto de Lei em favor das mulheres brasileiras”.10

A iniciativa tem implícito um discurso de cunho moral e de aspecto cultural. Nãoutiliza como argumento, por exemplo, que é nítido que a imagem das mulheresna praia, sem mostrar seus rostos, apenas ressaltando suas nádegas, nãorepresenta a maior parte da população urbana carioca e menos ainda a população

55555 Projeto de lei 2.813/2005. Disponível em: http://alerjln1.alerj.re.gov.br. Acesso em: 9 maio 2006.66666 Projeto de Lei 2.813/2005.77777 Idem.88888 Idem.9 Idem.10 Idem.

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feminina brasileira. Representa um grupo social, não toda a sociedade. Mas,quando veiculados tanto pela mídia de massa quanto pelos cartões-postais quecirculam no mundo, aqueles corpos são mostrados como sendo o corpo da mulherbrasileira, sem pluralidade, sem outras possibilidade de diferença. Tal imagemfoi amplamente utilizada pela indústria turística em sua publicidade assim comopelo estado em sua propaganda de Brasil.

O corpo e suas imagens são um lugar também de memória. Segundo Clastres, aforma como a sociedade se inscreve nos corpos nos mostra como se dá opertencimento do indivíduo ao grupo social assim como também permite “avaliara resistência pessoal”. (1990, p. 129). As marcas inscritas no corpo são história,memória de experiências e, sendo visíveis, tornam-se identificáveis, comunicativas,reconhecíveis, informativas. Afinal, não se pode esquecer nem se tornar indiferenteàquilo que não se pode apagar. Se o corpo é marcado, cortado, pintado, queimado,torturado, é porque se quer que ele comunique. Conforme Clastres,

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Olhares menos atentos poderiam classificar tais práticas como primitivas, sel-vagens, irracionais e desprovidas de sentido. Aqui, como em todo comportamentohumano, há sentidos e significados em jogo. Toda ação e comportamento sociaissomente ganham sentido quando compreendidos a partir da totalidade de umalógica simbólica. (SAHLINS, 1981). Da mesma forma, “nenhuma prática se realizasobre o corpo, sem que tenha, a suportá-la, um sentido genérico ou específico.Não há razões para se supor que as pessoas a elas se submetam a contragostoou sem conformidade intelectual”. (RODRIGUES, 1983, p. 64).

Os penitentes, os que se oferecem em sacrifício pelos outros, os soldados, osbombeiros, aqueles que imaginamos sofrerem castigos cruéis e dolorosos, deum modo geral, aceitam a situação e se conformam com a forma como a sociedadeatua sobre seus corpos. Em outra mão, pessoas que se submetem a tratamentosfísicos com vistas a modificar sua aparência também aceitam os “sacrifícios”impostos com vistas a alcançar o que é socialmente mais bem-aceito. Nessesentido, o corpo escarificado, deformado, mutilado, amputado revela um valorcoletivo hierárquico. Assim, os homens

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Dos corpos marcados pela tortura nas sociedades indígenas guaranis passamospara o corpo marcado e transposto para os postais das praias cariocas. O corpomoralmente aceito e valorizado na praia, dentro dos padrões de forma e cor,revela a natureza coercitiva do fato social, o poder da coletividade que encontraali, em um espaço dito “democrático”, toda sua expressão de violência. A presençaou ausência do corpo feminino bronzeado de biquíni nas praias cariocas implicaestar diante de relações sociais de poder. Como parte do fenômeno social total(MAUSS, 1974), o poder pode assumir várias formas e modelar diferentementeos lugares, inclusive os turísticos. (GIDDENS, 1991).

Mais do que tomar os lugares turísticos como produzidos pelas ações sociais desujeitos orientados por seus próprios interesses individuais – o que nos levaria aadmitir que a ordem social se constrói por meio das ações individuais - osconcebemos como sendo possíveis por meio de um eficaz poder simbólico. É opoder político que autoriza, sanciona e legitima a presença de corpos, seja demulheres ou de homens, nus ou vestidos, de frente ou de costas, nas praias ouna cidade, de dia ou de noite.

Surgem, então, questões acerca da forma como o estado, por meio do poderlegislativo do Rio de Janeiro e do projeto que proibiu o cartão-postal demulheres seminuas nas praias – projeto proposto por uma mulher e votadounanimemente – ao mesmo tempo em que interdita o corpo de biquíni nospostais, autoriza e sanciona o corpo, especificamente as nádegas, em outrosespaços. Na Praça da Apoteose, parte integrante da Passarela do Samba,encontra-se uma obra de arquitetura monumental que representa nádegasestilizadas. Se tal parte do corpo feminino está proibida nos postais, comopensar que no ponto central da Passarela do Samba, lugar turístico há maisde vinte anos, visto em todo o mundo, as nádegas reinem absolutas, atraindoa atenção de turistas e foliões que brincam seu Carnaval? Por que essas nãoinduziriam ao turismo sexual? Talvez porque trata-se de nádegas localizadasfora da praia, que não são de carne e osso e que aparecem em um espaçoritual próprio à sua exibição: o espaço burocratizado, racionalizado,profissionalizado e midiatizado do Carnaval carioca?

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Uma possível resposta a esse dilema talvez esteja na forma como Carnaval,estado e Igreja, juntos, aparecem para romper dualidades exploradas por DaMattaem A casa e a rua (1987). Em vez de operar com dois pólos dicotômicostradicionais como até então se fizera no pensamento social brasileiro, talvezseja necessário pensá-lo como uma tríade. Estudando o Carnaval, a ordem e areligiosidade como ritual, DaMatta, encontrou um

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Assim, o corpo seminu mostrado na Passarela do Samba não representaria umproblema posto que figura no lugar e no momento permitidos pelo ritual de inversãoque caracteriza o Carnaval. No Carnaval, durante o momento em que asconvenções aplicadas e em vigor durante todo o ano são momentaneamentesuspensas, não vemos problema em corpos nus ou seminus se movimentandopela Avenida e sendo exibidos mundialmente via TV. Afinal, o tempo e o espaçosão apropriados e reinventados por sujeitos e grupos segundo lógicas simbólicasbastante distintas. Quanto ao cartão-postal, está à venda o ano todo em bancasde jornal, o que pressuporia um rompimento com a própria ordem das coisas. Éinteressante notar que estamos nos referindo ao corpo que aparece em umespaço urbano e que “a cidade é já a realidade da concentração da população,dos instrumentos de produção, do capital, dos prazeres, das necessidades”.(MARX; ENGELS, 1984, p. 64). Também é importante pensar o cartão-postalcomo utilizando código que talvez seja lido de forma distinta por “locais” e porpessoas de origem cultural distinta daquela dos cariocas ou brasileiros, como osturistas estrangeiros.

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Em Vigiar e punir, história da violência nas prisões, Foucault escreve que o corpo,além de estudado do ponto de vista da biologia, da saúde, da doença, tambémse inscreve em um universo político. Assim, “o corpo também está diretamentemergulhado num campo político; as relações de poder têm alcance imediatosobre ele; elas o investem, o marcam, o dirigem, o supliciam, sujeitam-no atrabalhos, obrigam-no a cerimônias, exigem-lhe sinais”. (1989, p. 28).

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A relação política do corpo pode começar com vistas a uma utilização econômica,como força de produção investida de relações de poder e dominação. Dessaforma, “o corpo só se torna força útil se é ao mesmo tempo corpo produtivo ecorpo submisso”. (1989, p. 29). Em uma época em que a sexualidade é ampla-mente discutida e explorada pela mídia, pela publicidade e gera um setor eco-nômico com diversas ramificações, o corpo muitas vezes aparece como do-minado pelas relações de poder econômico e político. Não são somente insti-tuições como hospitais, prisões, escolas e quartéis que agora disciplinam oscorpos. A praia, os postais e suas representações aparecem na cena contem-porânea como les nouveaux lieux onde o corpo, assim como o sujeito e suasubjetividade, são submetidos ao poder disciplinador. Afinal, como explica Hall,em sua leitura sobre Foucault,

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O discurso sobre sexualidade, longe de operar apenas como pólo de repressãosexual, de moral, informa sobre a esfera do legítimo e do autorizado, dasestratégias que se montam como discursos com o objetivo de fazer aparecer umobjeto de conhecimento. Por meio da investida do sexo como elemento simbólico,pode-se operar a sua regulamentação e controle. Como recursos estratégicos,os discursos sobre o controle populacional, as doenças venéreas, a procriação,os costumes e a moral do sexo tratam de manter o indivíduo e seu corpo dentrode fronteiras legitimadas pela ciência e pelo Estado. Ao se elaborar um discursocientífico sobre a sexualidade, o que se quer é evitar que a apropriação da naturezavia cultura esteja sujeita a desvios e disfunções.

O corpo feminino presente nos cartões-postais não é somente um objeto e lugarde intervenção e de demarcação da sociedade por parte dos aparatos discursivossobre a sexualidade. Parafraseando Foucault (1989), seria o corpo “objeto ealvo de poder”. A investida da regulamentação política por parte do estado sobreos postais em que aparecem mulheres seminuas nas praias cariocas torna claraa forma de controle sobre o corpo e o sexo quando se afirma que, o que está emrisco é a saúde e a moral das mulheres e meninas cariocas e brasileiras. É deum corpo que, quer apareça muito, quer pouco vestido, poderia escapar, masnão escapa ao controle dos dispositivos de que se está a tratar. Tal controle

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também se estende ao campo do lazer, do qual grandes contingentes popu-lacionais usufruem desigualmente. Assim, o próprio turismo é, de fato, um novoespaço de intervenção da disciplina burocrata estatal.

O pensamento de Foucault representou um dos marcos no descentramento dosujeito em relação aos grandes sistemas filosóficos que o viam como uma unidadeintegrada, racional, consciente, coerente e acabada. (HALL, 1999). A partir deentão, a própria construção da identidade do sujeito e de seu corpo torna-semuito mais problemática.

Refletindo sobre a relação poder e corpo, Foucault constrói o conceito de corpo dócil,sujeito a uma tecnologia política do corpo: um saber e um controle que levam a umasujeição que não é obtida pela violência ou ideologia, que pode ser tecnicamentepensada. Segundo o autor, a tecnologia política do corpo seria uma espécie de“microfísica do poder posta em jogo pelos aparelhos e instituições, mas cujo campode validade se coloca de algum modo entre esses grandes funcionamentos e ospróprios corpos com sua materialidade e suas forças”. (1989, p. 28).

Praia e corpo feminino, muitas vezes confundidos como objetos naturais ou maispróximos da natureza, são investidos de uma gramática também política: estãosujeitos a códigos precisos de comportamentos legítimos e autorizados. A praiae o corpo – a primeira, lugar público, ideologicamente visto como democrático oude todos, e o segundo, que se acredita poder mostrar-se e expressar-se livrementena praia – pela forma como aparece, atestam como o poder se faz presente.Aparecer de biquíni, na praia, de dia, longe de ser uma quebra das regras de umpoder que se quer contrapor, é justamente reconhecê-lo como autorizado elegítimo. Ao proibir determinadas imagens, o estado, via Poder Legislativo, tratade um corpo dócil, “que pode ser submetido, que pode ser utilizado, que podeser transformado e aperfeiçoado”. (FOUCAULT, 1989, p. 125).

Contemporaneamente, ir às praias urbanas é ato investido de regulação e vigilânciada parte de uma gama bastante ampla de especialistas que versam sobre onde,quando, como e por que o corpo deve aparecer no espaço da praia ou em repre-sentação nos postais. Na praia encontramos policiais, assegurando que os in-divíduos terão sua segurança garantida; com eles, encontramos a guarda muni-cipal, fiscalizando o cumprimento preciso dos códigos de posturas municipais;não menos presentes estão os bombeiros salva-vidas, guardando a segurançade banhistas no mar. Além desses, médicos, sobretudo dermatologistas e infec-tologistas, nutricionistas, biólogos e sanitaristas, atestam o melhor horário para

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se permanecer na praia, o que deve ou não ser ingerido, quais as ameaçasinfectocontagiosas que rondam os banhistas e o que fazer para se prevenir.

Dessa forma, analisar o investimento político do corpo e a microfísica do podersupõe um “corpo político como conjunto dos elementos materiais e das técnicasque servem de armas, de reforço, de vias de comunicação e de pontos de apoiopara as relações de poder e de saber que investem os corpos humanos e ossubmetem fazendo deles objetos de saber”. (FOUCAULT, 1989, p. 31). Enfim, éde corpos dóceis que se está a tratar, afinal, o poder que regula e disciplina éacompanhado de um saber que o instrui.

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Howard Becker, em As regras e sua imposição, leva a cabo uma discussão à qualrecorremos para pensar a forma como a criação da regra e sua imposição se deramno caso de cartões-postais. Becker (1977) parte de uma pergunta bastante geral eque interessa a este trabalho: “Quando são feitas e impostas as regras?” (1977,p. 86). Quando regras são feitas a fim de punir infratores, pergunta-se: Quem asimpõe? Geertz adianta a resposta da seguinte maneira: “As idéias – religiosa, moral,prática, estética – como Max Weber, entre outros, nunca se cansou de insistir, devemser apresentadas por grupos sociais poderosos para poderem ter efeitos sociaispoderosos: alguém deve reverenciá-las, celebrá-las, impô-las.” (1978, p. 209).

Toda imposição se origina de uma iniciativa. A iniciativa é, para Becker, a variável-chave no estudo da imposição de regras. Contudo, a dimensão pública e as forçaspresentes nas organizações também são muito importantes na imposição das regras.Analisando o caso dos postais, em linhas gerais, a autora da lei, deputada AliceTamborindeguy, tomou a iniciativa, tornando-a pública ao mesmo tempo em queutilizou a estrutura organizacional da Assembléia Legislativa a fim de impor as regrasque proíbem que o cartão-postal veicule jovens seminuas nas praias. Conforme Becker,

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Em matéria publicada pela Folha Online (“Lei proíbe cartões-postais com mu-lheres seminuas no Rio”, 18/11/05), observa-se a concordância entre os

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argumentos da deputada Alice Tamborindeguy e os do secretário estadual deTurismo da época, Sérgio Ricardo de Almeida. Ambos defendiam o valor dasimagens turísticas da cidade e do Estado do Rio de Janeiro que seriam man-chadas pelo que consideram ser um forte apelo para o turismo sexual na cidadee no estado.

Conforme Becker, é a partir dos valores que regras concretas e específicas sãodeduzidas. Os valores seriam como premissas a fundamentar as regras. Nocaso dos postais, há um conjunto de valores tais como a proteção da mulherbrasileira e de sua imagem, proteção da imagem da cidade do Rio de Janeirocomo a Cidade Maravilhosa e a do Brasil que não poderiam ser relacionadas aoturismo sexual.

Becker enfatiza, no entanto, que não é a existência da regra que garante a suaimposição. Há uma seqüência que, guardando-se as devidas proporções, segueum padrão comum à criação de regras e à sua imposição. Segundo o sociólogo,vai-se do geral para o específico. Em outras palavras, em primeiro lugar, parte-sede um valor geral; em segundo lugar, deduzem-se regras particulares que, emterceiro lugar, serão aplicadas a atos e pessoas específicos (1977). Contudo,sem o papel do empresário moral, ou seja, aquele a quem interessa pessoalmentea aplicação de uma regra, nada aconteceria. Analisando o caso da criação deuma regra e sua imposição para uma lei federal sobre o uso da maconha nosEUA, Becker buscou mostrar que “onde quer que as regras sejam criadas eaplicadas, deveríamos estar atentos para a possível presença de um indivíduoou grupo que toma a iniciativa”. (1977, p. 107). Finalmente, segundo o autor,

onde quer que as regras sejam criadas e aplicadas, deveríamos encontrarpessoas tentando atrair o apoio de grupos coordenados e usando os meiosde comunicação disponíveis para desenvolver um clima favorável de opinião.Onde não se desenvolve tal apoio, podemos esperar o fracasso da iniciativa. Eonde quer que as regras sejam criadas e aplicadas, esperamos que os processosde imposição sejam moldados pela complexidade da organização, repousan-do sobre uma base de acordos compartilhados em grupos mais simplese resultando de manobras e barganhas políticas numa estrutura complexa.(1977, p. 107).

Chamamos a atenção para o fato de que a imposição “ocorre quando alguémtrila o apito, tornando a imposição necessária, ao ver alguma vantagem emfazê-lo”. (BECKER, 1977, p. 87). Contudo, como escreveu Galbraith (1986), a

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todo acúmulo de poder surgem outras fontes em oposição. É a dialética dopoder. Assim, a imposição de uma regra pode gerar posições contrárias a ela.Tal oposição pode gerar ações ou desinteresse, indiferença. A indiferença talvezseja a causa de grande parte das regras que são apresentadas, mas nãoobedecidas. No Brasil, é a situação das leis que “não pegam”. A matéria“Turismo sexual”, do jornalista Pedro Torre, tem como tema a discussão sobreo Projeto de Lei 2.813/05 e adota uma posição pouco crédula ao começar daseguinte forma: “Sobre esse assunto já manifestei minha opinião por vá-rias vezes, sempre com a idéia que dificilmente ‘pegará’, se transformandoem outra lei que não servirá para nada” (03/12/2005). Disponível em: http://sierramar.com.br/noticias/visualizar.asp?Cod=10 ). Tal matéria reflete boaparte do posicionamento da imprensa em relação ao assunto. E mesmo lidandocom um tipo de discurso que buscaria uma atitude objetiva, a imprensa expressarepresentações, visões de mundo.

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O corpo, como manifestação cultural, é também lugar de dimensão política. Aida à praia informa sobre o conjunto de possibilidades acerca de como oespaço social é traçado ou desenhado e sobre qual corpo e como tal corposerá mostrado nesse lugar. Longe de ser um campo desprovido de interessese conflitos, a praia é também espaço onde inúmeros atores e grupos disputamo poder. Seja o poder de autorizar quem irá comercializar toda sorte dealimentos e bebidas, de produtos para o corpo (protetor solar, bonés, viseirase óculos de sol) ou quais imagens da praia serão representativas da culturabrasileira em um determinado tipo de mídia, a saber, os cartões-postais.Assim, há, nos códigos culturais, instituições sociais que legitimam e autorizama aparição de corpos que estão de acordo com determinados padrões moraisde beleza e estética.

Nesse sentido, ao investir sob forma de lei contra as imagens de mulheres debiquíni nos postais, o estado expõe determinadas contradições. Ele pode levar apensar que proibir essas imagens implica combater dura e eficazmente o problemada prostituição e do turismo sexual, uma vez que não tem podido dar conta daprostituição nas areias da praia ou nas boîtes da orla da Zona Sul, assim como,em instância maior, da exploração de menores e do tráfico de mulheres. Asimagens tornam-se, então, alvo da investida daquilo que Becker chamou“empresário moral” e de trilar o apito (1977b).

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Aqui se explicita uma forte questão de comunicação, importante para discutir atemática: expor mulheres seminuas em um postal é, também e fundamentalmente,uma estratégia de comunicação que visa a construir um imaginário. Em determi-nado momento, esse imaginário corroborou as teses que o estado quis construir.Na atualidade, parece não mais contribuir para o que o estado considera adequado.Aqui, os postais se apresentaram como a ponta desse processo de desconstruçãoda imagem construída. Isso porque imagens não são selecionadas, editadas eveiculadas sem intenções ou interesses de diversas ordens. Ao exibir ou proibir,existem inúmeras intenções e interesses em jogo.

O projeto de lei apresentado à Assembléia do Estado do Rio de Janeiro apontaalgumas questões implícitas: reconhece o País como espaço de belezas “naturais”– praia, montanha e mulheres; reconhece o valor econômico do turismo; apontapara a vinculação da imagem construída da mulher na praia carioca com o turismosexual, mas também aponta para a questão da regra e de sua imposição, com apossibilidade de desobediência a uma lei cujo empresário moral precisou trilar oapito a fim de conseguir chamar a atenção para uma situação específica. Oestado reconhece o País onde a natureza é bela e exuberante, inclusive enfatizandoa beleza da mulher brasileira. Contudo, justamente por associar a beleza damulher a uma natureza selvagem indômita, o estado admite que é preciso protegê-la. Ao fazer isso, faz reconhecer que está também presente nesse espaço “natu-ral” que é a praia, mas que sabemos, antes de tudo, que é político. Ao mesmotempo, o que presenciamos nas praias, mais do que a expressão livre e autônomade sujeitos dotados de liberdade, implica observar uma série de dispositivosprescritivos de condutas, códigos e comportamentos cujo corpo se coloca comoalvo central da circunscrição legal ou moral.

Mais de um ano depois da promulgação da lei, ainda era possível observar, emalgumas bancas de jornais da Zona Sul carioca, a presença de postais do tipoagora proibido. Em inúmeras outras bancas que antes exibiam os postais, nãose observava mais esse tipo de mídia. Observamos uma lei que chama a atençãosobre como, onde e por que o corpo de mulheres jovens é veiculado pela mídia.Ao proibir os postais com mulheres que não estejam fora da cena original, oestado abre, por outro lado, a possibilidade de que outras imagens, desde queinseridas na paisagem original, exibam corpos de mulheres seminuas. Nessesentido, nos meses que antecedem o verão carioca e principalmente o Carnaval,inúmeros jornais exibem imagens em que corpos de mulheres seminuas aparecemno contexto de uma cena “autêntica e original”, mostrando a todos que sãonádegas autorizadas pelo estado.

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RESUMORESUMORESUMORESUMORESUMO

Este artigo propõe uma abordagem teórica acerca da noção de comunicação, conforme Maffesolie sua inter-relação com a noção de Turismo desenvolvida por De La Torre, com o objetivo decompreender os novos valores comportamentais observados na atividade turística, sustentadospelo compartilhar. Para tanto, o trabalho busca a reflexão e o diálogo como uma possibilidade deconhecimento por meio da relativização e do estilo proposto por Maffesoli para a SociologiaCompreensiva.

Palavras-chavePalavras-chavePalavras-chavePalavras-chavePalavras-chave: Comunicação. Turismo. Compartilhar. Valores comportamentais.

ABSTRACTABSTRACTABSTRACTABSTRACTABSTRACT

The purpose of this article is the theoretical approach about the notion of communication accordingto Maffesoli and its interrelation with the concept of Tourism developed by De La Torre with theobjective of understanding the new behavioral values observed in the touristic activity, sustained bysharing. In order to do this, this work seeks the reflection and the dialog as a possibility of knowl-edge through relativization and the style proposed by Maffesoli for the Comprehensive Sociology.

Key words:Key words:Key words:Key words:Key words: Communication. Tourism. Sharing. Behavioral values.

11111 Este trabalho faz parte da revisão bibliográfica para a Tese de Doutorado pela PUCRS.

22222 Doutora e Mestre em Comunicação Social. Pós-Graduada e Bacharel em Turismo pela PUCRS. Autora deensaios publicados na área e organizadora de dois livros. Professora e Pesquisadora na Feevale, no Grupode Desenvolvimento Regional. E-mail: [email protected]

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O turismo como temática de pesquisa vem conquistando um significativo espaçono campo da investigação científica. Muitas das abordagens favorecem umavisão mais voltada para a economia; no entanto, o que se propõe neste artigo éobservar o turismo como um fenômeno social que move milhões de pessoasmotivadas, principalmente, pela busca de novas experiências diferentes daquelasvividas no cotidiano.

Essa intensa e crescente mobilidade social, descrita pelo fenômeno turístico,assume características diversas, variando conforme o período histórico no qualse acha inserida, bem como insinua comportamentos distintos daquelesobservados até há poucas décadas.

Nesse contexto, a contribuição de Maffesoli, ao desenvolver a noção decomunicação, sublinhando o compartilhar, torna-se relevante para explicar osnovos valores comportamentais observados na sociedade pós-moderna, bemcomo a sua relação com o turismo.

Por sua vez, o turismo, sustentado por De La Torre, revela a importância dasinterações sociais. Elas acontecem durante a atividade turística e podem encontrarsentido no compartilhar proposto por Maffesoli. Desse modo, a comunicação e oturismo, apesar de suas características próprias e singulares, podem se mostrarcomplementares, conforme os princípios da Sociologia Compreensiva.

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A comunicação é lida por Maffesoli como uma interação e, como tal, é recarregada,constantemente pelos sujeitos, de acordo com a necessidade de estar junto.Conforme o autor, apenas o que se vive junto pode ser compartilhado, assim“comunicar é servir-se daquilo que se tem em comum”. (MAFFESOLI, 1995,p. 82). A comunicação favorece a percepção do coletivo, delineando, dessamaneira, uma nova ordem social, valorizando a interação, banalizando o eu,cedendo lugar ao plural e, desse modo, conhecer uma tal emoção em comum.

A noção de comunicação celebra o compartilhar. “A sociedade é formada por umconjunto de relações interativas, feito de afetos, emoções, sensações que cons-tituem, strito sensu o corpo social.” (MAFFESOLI, 1996, p. 73). A comunicação,

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enquanto interação, acontece quando se pode comungar um afeto. Assim, acorrespondência do sentimento, do sensível, não trata do número de vezes oudo número de pessoas, mas sim, da essência, da paixão.

Dessa forma, a comunicação é realimentada pela necessidade de socializaçãoinerente à natureza humana e pode ser demonstrada de várias maneiras. Assim,“as refeições, as festas, as procissões são, sabidamente, um modo de dizer oprazer de estar junto” (MAFFESOLI, 1996, p. 85), são formas de pôr em comumos afetos e celebrar essa comunalização.

Portanto, a ordem do singular cede lugar à efervescência da massa, na medidaem que metamorfoseia o individual para explodir no outro, vislumbra-se a oposiçãoao hedonismo. Maffesoli3 apresenta questões inquietantes referentes à novaconstituição da socialidade. Para o autor

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Não se trata de fazer distinção entre o bem e o mal, mas de vivê-lo na pulsaçãodo hoje, numa ondulação que aceita e celebra ora Dionísio, ora Apolo.

“Vive-se uma forma de estar-junto, que não está voltada para o longínquo oupara uma sociedade perfeita, mas que se dedica a organizar o presente.”(MAFFESOLI, 1995, p. 17). A sociedade assume uma postura, essencialmente,presenteísta e, com ela, o peso ou a leveza da velocidade do aqui e agora.

Ao compartilhar sentimentos, emoções, afetos pressupõe-se comungar com outraspessoas e, por meio dessa ação, de fazer parte, estar vivendo o mesmo sentimentocom os outros, dá-se início e continuidade ao processo de integração e evoluçãosocial, sugerido por Maffesoli como entrar em correspondência com os outros, oque se vive junto e não é medido, mas apenas vivido.

Dessa forma, a comunicação se dá a partir do experimentar junto, exalta ocorresponder, o viver em comum uma experiência prazerosa ou infeliz, pouco

33333 Anotações de palestra proferida por Maffesoli: “O retorno das emoções sociais” – UFRGS, 17/10/2005, em Metamorfoses da cultura contemporânea.

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#!( importa, só é relevante o sentido coletivo da ação. Para Maffesoli (1996, p. 83)

“há no ar uma afetividade que tende a explodir e contaminar todos os setores davida social”. A afetividade ultrapassa o conceitual, já que é, essencialmente,sensível. Fala-se aqui do que não é quantificável, a paixão, a emoção.

Maffesoli faz referência à comunicação tátil, que tem por objetivo, simplesmente, ocontato, o participar junto. Tende a uma uniformização na maneira de vestir, de falar,dos esportes ou apenas freqüentar locais cotidianos, como numa espécie de eco,com grau zero de conteúdo, acentuando, unicamente, a importância do coletivo.

Nesse caso, forma-se um novo sujeito, rompendo-se com o princípio deindividuação, tirando-se de circulação o egocêntrico, “seja por uma Comunicaçãoverbal, seja por uma Comunicação não-verbal, está em interação com o outro”.(MAFFESOLI, 1995, p. 80). Adicionalmente, a questão estética complementaessa noção de que a comunhão é o fundamento para a geração de movimentosde atrações e de repulsões.

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O compartilhar redefiniu a necessidade de comunicação na sociedade. As com-ponentes sociais, que determinam tais desejos, são universais. Elas se verificamem qualquer parte: compartilhar experiências (positivas ou negativas), conquistas,conhecimentos, cultura ou integrar-se a elas livremente entre os infinitos agentessociais, que neles transitam. Sem isso, se (des)configuram alguns aspectos docenário típico dos contextos pós-modernos da sociedade contemporânea.

Maffesoli (2001, p. 113) considera que “a Comunicação, ao mesmo tempo,verbal e não-verbal, constitui uma vasta rede, que liga os indivíduos entre si”.Nesse sentido, deve-se acrescentar que não apenas a verbalização tem estatutode laço social, mas as situações silenciosas devem ser incluídas como ativos dacomunicação, atendo-se a uma perspectiva orgânica de grupo, seja na linguagemcorporal, seja nos ruídos das músicas.

Assim, a profusão de imagens pode provocar a cultura dos sentimentos por meiodos elementos que fazem parte dos atrativos turísticos. Podem ser elementosdas cidades, as linhas arquitetônicas, as ruas, o entorno natural, dotado deelementos, como os cheiros, as texturas, os sons.

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A comunicação pode se dar, ainda, através das cores, uma vez que “constituemestímulos para a sensibilidade humana, influindo no indivíduo, para gostar ounão de algo, para negar ou afirmar, para se abster ou agir”. (FARINA, 2000,p. 112). A reação das pessoas em relação à cor é particular e subjetiva, estandoligada a vários fatores que fazem parte da vida de cada um. “As cores são umarealidade sensorial [...], atuam sobre a emotividade humana, produzem umasensação de movimento, uma dinâmica envolvente.” (FARINA, 2000, p. 101).

Assim, assumem um papel relevante na condução das imagens, associadas àexperiência, vivida pelo agente do processo comunicacional. Elas são elementoscomplementares à forma, dão consistência à mensagem compartilhada e facilitama continuidade da correspondência por se constituírem em elemento comum aosque interagem em seu processo, tanto no plano físico quanto no imaginário.(CHEVALIER; GHEERBRANT, 1997).

É no conceito do compartilhar que se encontra a função expressa na origemetimológica da comunicação: tornar comum a todos – fazer algo comum,conhecimento compartilhado. Está na origem dos sistemas sociais a organizaçãourbana, através da qual se otimiza o processo comunicacional.

Para o qual “comunicar-se é servir-se daquilo que se tem em comum”. O contextoé essencialmente pluricausalista, polissêmico, plural, ele favorece a percepçãodas coisas em massa e permite, portanto, compreender as massas e tambémos diversos movimentos que as animam. (MAFFESOLI, 1995, p. 82).

O compartilhar das experiências, enquanto vividas, constitui-se em elementoque merece atenção em relação ao Turismo. Na medida em que as pessoassentem-se motivadas a “estar-junto”, forma-se a cadeia motora dos deslocamentoshumanos (buscar algo em outro lugar e no outro). O comungar do vivido, noinstante em que é vivido, é que desperta a curiosidade e o desejo de experimentarjunto e, ao mesmo tempo, que/com os outros, resultando em atratividade turística.

A comunhão constitui-se no elemento principal da atratividade turística, umavez que as pessoas, simplesmente, vivem, surge a necessidade da interação.O Turismo permite essa comunhão, na medida em que os sujeitos compartilhamas suas vivências, estão juntos, comungando em torno de um mesmo objeto,fazendo parte, experimentando uma tal emoção em comum. Desse modo,possibilita-se a formação da cadeia motora de atração de públicos aos locaisturísticos.

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O Turismo é um fenômeno social que dá conta de inúmeras atividades e quemantém relevantes interações com o meio. Por conta disso, sua prática seapresenta como um brinde ao estar junto, ao mesmo tempo em que pode explicaras transformações observadas nos novos valores comportamentais descritos naatualidade e observados na atividade turística. Assim, a noção de Turismo écomplexa e abrangente.

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Apreende-se que essa manifestação do comportamento humano são movi-mentações, ou seja, indivíduos que se trasladam de um local para outro e quepromovem intensas relações sociais. Essa tensão, provocada pelo movimentode indivíduos, pode ter reflexo em todos os níveis formadores da sociedade,sejam eles econômicos e sociais, sejam culturais e ambientais.

As transformações provocadas pelo fenômeno turístico se estendem por inúmerasáreas das atividades que mantêm relações diretas ou indiretas com o Turismo, razãopela qual torna-se relevante compreender os vetores que lhe são característicos, bemcomo as interações que acontecem nos seus campos de abrangência.

Para De La Torre (1997, p. 101) “posto que o Turismo é um fenômeno eminentementesocial, por derivar de deslocamentos humanos, teve, desde o seu início, uma estreitainterdependência nas relações de interação com outros fenômenos sociais”.

Portanto, o Turismo pode ser identificado a partir das repercussões sociais quese estabelecem através da diversidade de ações, entre elas, as advindas doaumento de mobilidade social. Conforme De La Torre (1997, p. 101), o Turismo,“na atualidade, transforma os moldes tradicionais de conduta tanto dos homenscomo das coletividades”.

A mobilidade social, até então motivada por causas políticas e econômicas, passaa encontrar razões de outra ordem, como a espiritual, a emotiva e a intelectual.

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Cria-se, assim, uma nova demanda por lazer na atualidade, reforçada pelasoportunidades que se abrem com os avanços tecnológicos mais recentes. Esseincremento vigoroso dos deslocamentos, por razões não econômicas, associadasao Turismo, leva a novos padrões e formatos nas regras estabelecidas para oconvívio social.

Nesse cenário de intensa mobilidade, entram em cena os atrativos turísticos,que figuram como elementos responsáveis pela motivação do deslocamento daspessoas, da sua residência para outra localidade, em busca de coisas, para vere fazer. Portanto, são os responsáveis por atrair visitantes para determinadoslocais, com o objetivo de transformar a experiência de visitação a um lugar emuma experiência singular, prazerosa e de significado diferenciado. (FERRI;RUSCHMANN, 2000).

Desde épocas mais remotas, a curiosidade em conhecer outros locais movemilhares de pessoas. Esse movimento vem crescendo de forma acelerada – oTurismo movimentou 842 milhões de turistas no mundo durante o ano de 2006,um crescimento de 4,5% em relação aos 808 milhões de 2005 (OMT – O GLOBO,20/01/07)4 – gerando a criação de uma indústria de atrativos, que vem agindocomo motor dos deslocamentos.

Essa busca incessante por ver e fazer, enfim, por interatividade, formata osatrativos na atualidade. A oferta se direciona a atender ao olhar dos viajantes.Assim, tanto os atrativos turísticos naturais como os atrativos culturais, bemcomo o estudo das demandas, tornam-se relevantes para análises referentes aoTurismo e à sua relação com a comunicação. Nesse sentido, deve-se dar atençãoàs formas de representação simbólica, que cada atrativo turístico terá noinconsciente das pessoas, ao procederem à escolha de seus destinos.

A comunicação, por sua vez, pode contribuir para (re)definir os novos valorescomportamentais observados na atividade turística. Os traços presenteístas quepermeiam as noções de Turismo e de comunicação são reforçados na medidaem que o estar junto exige uma ação presente: aqui e agora.

44444 OMT – Organização Mundial do Turismo. Em entrevista, o secretário-geral da OMT Francesco Frangiallidisse que é “uma fase histórica de crescimento contínuo ao longo dos três últimos anos, já que o númerode turistas aumentou em 150 milhões, e estão ocorrendo crescimentos muito importantes em váriasregiões”. Dados disponíveis em O Globo, 20/01/07.

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#!* O compartilhar das experiências observado no Turismo é formador da socialidade e,

portanto, motor dos deslocamentos humanos em busca do outro (lugar). A ação évoltada para o presente, para o instante em que é vivido, exaltando unicamente oque é vivido em comum, compartilhado. O comungar da experiência se transforma nofator da atratividade turística, bem como estabelece uma relação de simbiose entreas noções de Turismo e de comunicação. Portanto, mostram-se complementares,redefinindo novos padrões comportamentais para o convívio social.

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Para além da epistemologia da comunicação, Maffesoli apresenta novas formasde compreender aquilo que é do senso comum. Mesmo os elementos (trans)for-madores da socialidade, considerados muitas vezes banais, são objeto de estudoda Sociologia Compreensiva proposta por Maffesoli.

Abrangente na sua totalidade, a Sociologia Compreensiva, também chamadaSociologia do Lado de Dentro, ocupa-se em explicar os pormenores da vida detodos os dias por meio de cinco pressupostos enunciados por Maffesoli (1985).Possui, como uma de suas características, a universalidade e a subjetividadenas questões do cotidiano, do mundo das idéias; elementos essenciais na des-crição conceitual, que envolvem a reflexão deste estudo.

O objeto da Sociologia Compreensiva é o estudo abrangente dos processos deevolução das sociedades, contemplando o cotidiano e a subjetividade, atravésda análise integrada dos momentos e dos movimentos sociais. “O essencial seencontra na invariabilidade do homem em sociedade, no retorno do idêntico, nasgrandes constantes da condição humana.” (MAFFESOLI, 1985, p. 10).

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Esse artigo se ocupou em compreender e explicar os novos valores comporta-mentais, descritos no Turismo e sustentados pelo compartilhar, como um dosdeterminantes do movimento social observado na atualidade. Por meio desseexercício, houve a possibilidade de dar uma nova compreensão ao fenômenosocial, representado pelo Turismo, a partir da análise de um de seus elementosmais contemporâneos, como é o caso da comunicação.

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A comunicação caracterizou-se, em sentido verbal e não verbal, na medida emque se verificou o compartilhar dos sentimentos, das paixões, dando início aoprocesso de interação, com base na comunhão de afetos, para o bem ou para omal, valorizando o mundo dos signos. Através da realimentação constante dacomunicação, por intermédio dos símbolos, é delineada uma nova maneira decomunhão, na qual o destaque ao coletivo entra em sinergia com o que é vividoenfatizando o presente.

No Turismo se verificou a presença desses valores constitutivos da sociedade,como ingredientes importantes para ligar pessoas e como fundamento naturalda socialidade. A prevalência das práticas comuns e tradicionais promoveidentificação desses elementos no âmbito sociológico, naquilo que orienta aordenação dos fenômenos sociais, como é o caso do Turismo, que conduz àprodução de sentido.

Por outro lado, o estudo mostrou que o Turismo desempenha um papel relevantena sociedade, uma vez que realimenta o processo de comunicação, enquantocontribui para reforçar a sua identidade. O Turismo e a comunicação seapresentam, dessa maneira, complementares.

Assim, a leitura do Turismo e sua relação com a comunicação pode ser umacontribuição para o estudo dos comportamentos sociais, inscritos nas idéias deMaffesoli e da Sociologia Compreensiva na busca pela investigação, a partir docotidiano, para traçar o perfil das representações da sociedade.

Desse modo, foi possível promover o diálogo entre a noção de Turismo e decomunicação, respeitando as características do método, as particularidades dosteóricos, Maffesoli e De La Torre, e estabelecer os níveis de convergência entreambos. Logo, descartou a perspectiva positivista, já que teve como objetivo aobservação e o acompanhamento do processo que relaciona a vida à represen-tação como uma possibilidade de conhecimento.

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CHEVALIER, Jean; GHEERBRANT, Alain. Dicionário de símbolos. Rio de Janeiro: J. Olympio,1997.

DE LA TORRE, Óscar. El Turismo: fenómeno social. México: Fondo de Cultura Económica,1997.

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#!& FARINA, Modesto. Psicodinâmica das cores em comunicação. São Paulo: E. Blücher,

2000.

FERRI, Cássia; RUSCHMANN, Dóris. Turismo: visão e ação. Revista Científica do Mestradoem Turismo e Hotelaria, Itajaí: Univali, ano 2, n. 4, p. 9-17, fev. 2000.

MAFFESOLI, Michel. O conhecimento comum. São Paulo: Brasiliense, 1985.

_____ . A contemplação do mundo. Porto Alegre: Artes e Ofícios, 1995.

_____ . No fundo das aparências. Petrópolis: Vozes, 1996.

_____ . Sobre o nomadismo, vagabundagens pós-modernas..... Rio de Janeiro: Record,2001.

_____ . O retorno das emoções sociais. Anotações da Palestra proferida por Maffe-soli – Salão de Atos da UFRGS – “Metamorfoses da cultura contemporânea”, 17/10/2005.

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RRRRRESUMOESUMOESUMOESUMOESUMO

A formação da subjetividade, com um recorte específico para a reconstrução da identidadeatravessada pelas tecnologias de comunicação, será o foco deste artigo. Ao procurar a “evitação dedesprazer” ou produção de prazer, o indivíduo produz contextos e conexões para que assim haja umsentimento de pertencimento, de conexão a um sentido de identidade individual e grupal. A articulaçãoentre essa identidade, a cultura e os meios de comunicação é uma relação construída e eliciadapela procura de uma zona de conforto e/ou fuga do sofrimento. Teoriza-se, assim, sobre a formaçãode novos tabus e totens sob a regência das tecnologias de comunicação, ao que há de se chamar:tecnototemismo. O tecnototemismo seria o rompimento com o passado e suas leis, seria oestabelecimento de uma cultura do prazer e da satisfação, de um hedonismo crônico para a obtençãoda transcendência do ser. Esse processo é promovido pelas tecnologias de comunicação. As regrase o mundo passam a ser determinados pela máquina. As verdades são produzidas por essa, mesmoque operada pelo homem. Há a crença de que com o saber são possíveis transformações,desenvolvimento, crescimento e, sobretudo, o controle do mundo à sua volta. Produz-se a angústiada perda do poder que é deslocada para o ritual do rompimento de barreiras, da transcendência doser, da imaterialidade, da virtualização. Caberia pensar no parcelamento da subjetividade emidentidades múltiplas e fugazes, uma completa abstração do social e um reforço no uso de aparatostecnológicos que esse indivíduo experimenta ao trocar de identidade, novas peles, novas texturasde fantasia e, principalmente, na realização de suas fantasias num contexto virtual, e não, objetivo,o faz mergulhar em si próprio.

Palavras-chavePalavras-chavePalavras-chavePalavras-chavePalavras-chave: Comunicação. Identidade. Subjetividade.

ABSTRACTABSTRACTABSTRACTABSTRACTABSTRACT

The formation of the subjectivity with a specific clipping for (re) the construction of the identitycrossed for the communication technologies will be the focus of this article. When looking for the“avoidance of displeasure” or production of pleasure the individual produces contexts and connec-

1 Psicóloga pela Faculdade de Ciências e Letras de Assis (Unesp). Mestre em Comunicação Midiática pelaFaculdade de Arquitetura, Artes e Comunicação (Unesp/Bauru). Pesquisadora no Grupo Mídia e Sociedade(CNPq). E-mail: [email protected]

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identity. Therefore, the joint between this identity, the culture and the medias are a constructedrelation provoked for the search of a zone of comfort or escape of the suffering. It articulates, thus,on the formation of new taboos and totens under the regency of the communication technologies,which have to call: tecnotemism. The tecnototemism would be the disruption with the past and itslaws, would be the establishment of a culture of the pleasure and the satisfaction, of a chronichedonism for the attainment of the to exceed a of the being. This process is promoted by thecommunication technologies. Therefore, if the culture if characterizes for definitive limits, and thephenomenon after-humanist considers the disruption of the norms as revolutionary action, has aninversion of values, where the machine dominates the man in a tecnototenic relation. The rules andthe world start to be definitive for the machine. The truths are produced by these, exactly thatoperated for the man. The belief that with knowing is possible transformations, development, growthand, over all the control of the world its return. They produce the anguish of the loss of the powerthat is dislocated for the ritual of the disruption of barriers, of the to exceed of the being, of theimmateriality, of the virtualization. It would be fit to think about the parcelamento of the subjectivityin multiple identities and fugitive, a complete abstraction of the social one, and a reinforcement ofthe use of technological apparatuses where this individual tries when changing of identity, newskins, new textures of fancies, and mainly to carry through its fancies in a virtual context and notobjective, it makes it to dive in proper itself.

Key wordsKey wordsKey wordsKey wordsKey words: Communication. Identity. Subjectivity.

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a teoria psicanalítica, supõe-se que o indivíduo, para sua formação, tendaa explorar o mundo a sua volta, tentando resolver as interrogações quenele habitam elaborando respostas com a menor tensão desagradávelpossível.

Ao procurar esta “evitação de desprazer” (FREUD, 1920, p. 17), ou produçãode prazer, o indivíduo produz contextos e conexões socioistóricas para queassim haja um sentimento de pertencimento, de contingência ligada a umsentido de identidade individual e grupal. Portanto, a articulação entre essaidentidade, a cultura e os meios de comunicação é socialmente construída,no sentido da procura de uma zona de conforto ou de fuga do sofrimento, noentanto, o sentido é variável conforme a situação e é atribuído pelo indivíduoem sua existência.

A formação da subjetividade, com um recorte específico para a formação daidentidade atravessada pelas tecnologias de comunicação, será o foco desteartigo. Teoriza-se sobre a formação de novos tabus e totens sob a regência dastecnologias de comunicação, ao que há de se chamar: tecnototemismo. Dessaforma, problematiza-se a questão da formação de uma nova subjetividade

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atravessada por essas tecnologias, que, nos campos da filosofia e da comuni-cação, são identificadas como um movimento “pós-humanista”.2

As indagações propostas aqui partem de um paradoxo aparente, em que essestabus têm origem nas tecnologias que são instrumentos para a realização doprazer, da projeção, conseqüentemente, de uma não-regra. No entanto, percebe-se um movimento de estabelecimento de tabus pós-modernos, em que se formauma “religião da máquina”, isto é, um tecnototemismo.

O sujeito depende não da emissão das informações, mas da forma como elassão elaboradas na constituição de subjetividade. É nesse ponto da produção desentido e de identidade que se insere a problemática dos meios de comunicação,pois essas tecnologias de comunicação se tornam instrumentos de articulaçãoda subjetividade, em que identidade e cultura passam por modificações,institucionalizações, onde os discursos são construídos.

A revolução tecnológica não alterou apenas os hábitos cotidianos, mas criouuma nova cultura: a tecnocultura. Possibilitou ao homem a ilusão e o poder dasuperação do seu ser. Estabeleceram-se relações totêmicas, tais quais as detribos australianas descritas por Freud (1913) em Totem e tabu, em que a ordemtotêmica estabelecida vigorava na organização da família. O tabu criado dentroda dinâmica das relações totêmicas vem com a carga da negação, do proibido,das regras a serem obedecidas.

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22222 O pós-humanismo atesta a transcendência das fronteiras que se iniciam da espécie, do gênero e até mesmode seu reino, já que, de certo modo, podem resultar da combinação do concreto e do imaginado. Tudo issorepousa na idéia da superação dos limites impostos pelo estado natural. Como enuncia a já célebre frasecunhada por Donna Haraway em seu Manifesto Ciborgue, aqui lidamos com “o prazer da confusão de fronteiras”(2000). Para Haraway, Ciborgue é criatura tanto do nosso imaginário como da nossa realidade cotidiana, quesimboliza o rompimento, já em curso, das fronteiras tradicionalmente estabelecidas na cultura ocidental, comoas de gênero (homem/mulher) ou de natureza (orgânico/inorgânico).

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Entende-se que há o estabelecimento de um totem, criação de um “[...] lugarseguro de refúgio em que a alma podia ser depositada, fugindo assim aos perigosque a ameaçavam”. (FREUD, 1913, p. 143). E esse lugar seguro seria a tecnologia,por isso o tecnototemismo. O gozo e a fantasia têm prioridade em relação àmoral e à ética nesse novo espaço, pois o indivíduo consegue escapar da realidadeobjetiva se projetando nessa virtualidade de desejos. Ao totem são atribuídascaracterísticas de salvação das frustrações do cotidiano e de materialidade dosdesejos, que, na atualidade, são atribuídos às tecnologias de comunicação, aexemplo da TV com a materialidade das imagens, e da internet com a possibilidadede transcendência corporal por meio da imersão na virtualidade.

Quais são os graus de valores que devem ser atribuídos à tecnologia na formaçãosubjetiva da criança? Quais seriam as relações desse tecnototemismo nessasubjetividade? E como isso se refletirá na idade adulta? Como fica esse indivíduoem conflito com uma realidade virtual em que não há castração ou frustração eum cotidiano cheio de obstáculos para a realização de seus desejos?

A virtualidade ganha um peso maior do que aquele que provém do mundo objetivo;há um fracionamento desse ser pós-moderno, um esvaziamento de seus desejos,pois consegue realizá-los nesse supermercado de desejos.

O tecnototemismo é o rompimento com o passado e suas leis, é o estabelecimentode uma cultura do prazer e da satisfação de um hedonismo crônico. É aconsolidação de uma cultura narcísica regida pela tecnologia: o grande oráculo,já que os meios de comunicação são capazes de responder às angústias do sere dela (comunicação).

A finitude do ser e a dor relacionadas à repressão dos desejos são solucionadascom o apertar de um botão. Se houver angústia é só mudar de canal, mudar dechat, inventar uma nova identidade na internet. As desgraças e os infortúniosexpostos por esses meios de comunicação acontecem com os outros, e osentimento de compensação é recorrente com a referência da desgraça alheia. Édada à máquina essa capacidade de governabilidade da identidade, das emoções,da abricolage de desejos.

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A idéia de sociedade é quase apagada, e o universo social emerge como umagregado fragmentário de indivíduos num vazio sem restrições históricas emateriais. O projeto individualista teorizado por Velho (1994) é a manifestaçãode um projeto de sociedade moderno que toma forma. Na sociedade tradicional,temos a história e a memória do grupo em primeiro plano, os mitos e asnarrativas reforçam o sentimento de pertencimento dos indivíduos àquelaunidade. Em contraste, na sociedade moderna, a ideologia individualista épredominante, assim como há exposição a múltiplas experiências, contradiçõese segmentações. O indivíduo se torna avesso à idéia de uma organização so-cial, que implicaria uma limitação da realização dos desejos, das possibilidadesmáximas de cada um.

Entende-se que o “projeto” é a nova subjetividade imbricada diretamente com aidéia de indivíduo, que é o reforço ideológico do individualista. O indivíduo torna-se o protagonista da sociedade moderna, em que a centralidade está nainstauração do significado, força constitutiva de modelos, paradigmas e con-figurações culturais – elemento básico de negociação da realidade. Nessa ne-gociação simbólica, o que importa não é a informação em si, mas a sua elaboração,o significado atribuído.

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Estamos diante da manifestação de uma cultura tomada pelo excesso para supriro vazio do ser na pós-modernidade, numa realidade em que os ideais estãodifusos, e o individualismo parece ser a única causa possível para a proteção deum ego fragilizado. Se a cultura se caracteriza por determinados limiares, e ofenômeno pós-humanista propõe o rompimento das normas como açãorevolucionária, tem-se uma inversão de valores, em que a máquina domina ohomem, uma relação tecnototêmica.

As regras e o mundo passam a ser determinados pela máquina. As verdades sãoproduzidas por ela, mesmo que operada pelo homem. O desejo pela verdade,pela informação para dominar, o poder e o saber são coisas há muito ansiadaspelo homem, com a crença de que com o saber são possíveis transformações,desenvolvimento, crescimento e, sobretudo, o controle do mundo a sua volta.Então, a angústia da perda do poder é deslocada para o ritual do rompimento debarreiras, da transcendência do ser, da imaterialidade, da virtualização.

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tema que já aparecia, ao menos embrionariamente, em filmes futuristas. Todo odiscurso pós-humanista pode ser articulado em duas alternativas básicas: aextensão das capacidades do corpo ou a simples e pura ultrapassagem daslimitações corporais (nas fantasias de digitalização da consciência). O que sepercebe é a exaltação do individualismo e das medidas anti-sociais, em que acélebre frase de Sartre: “O inferno são os outros” faz todo sentido. Não hánecessidade desse outro, da possível frustração, é o triunfo da vontade, dodesejo individual.

O desejo de rompimento dos limites e a transposição das fronteiras impostaspela realidade é o que se tem chamado pós-humanismo, que tem como um dostraços identificadores básicos o desejo de rompimento dos limites, deatravessamento das fronteiras. O limite já não é mais o corpo; o pensamentoganha materialidade conjuntamente com a fantasia.

O prazer da ruptura, provindo de um desdobramento virtual do ser, do poder, éincentivado a todo instante pela sedução das tecnologias de comunicação, pelamídia e por suas correntes de pensamento: cibercultura, que teoriza não mais ohomem e a máquina, mas um Ciborgue – a conjunção do homem com a máquina,inventando uma tecnocultura apoiada nesse pós-humanismo.

Freud, no início de Além do princípio do prazer (1920), assinala com certa ironiateorias como as citadas acima que conseguiriam falar sobre o prazer e o desprazerde forma “sistemática”:

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Segundo Freud (1920), essa possível dominância do princípio do prazer na vidamental viria da expressão do aparelho numa tentativa de constância. Portanto,essa proposta de uma consciência livre de amarras do corpo, principalmente doespaço e do contexto, em que os indivíduos se constroem, se reconstróicontinuamente alterando a noção de identidade e subjetividade, não seria umagrande falácia? Ou um desencontro de discurso na emergência dessa novasubjetividade tecnototemizada? Projetar características extraordinárias e receberfantasias prontas. O ser humano não é mais instigado a criar os seus desejos,eles já estão prontos e pulam para dentro da sua sala pela TV. Mas são convidadosa participar de uma gama infinita de sonhos que se materializam aos seus olhos.Vivenciam esses desejos pasteurizados ao se projetarem em um espaço infinitoem que se tem todas as possibilidades em um clicar ou digitar de caracteres.

A questão é compreender como esse indivíduo era/é tecido pelas tramas dessecontexto tecnológico, em que é ao mesmo tempo ativo e criativo nesse processo.Trata-se de entender como essa subjetividade se forma, como há de configuraressa identidade, atravessada pelos meios de comunicação. Assim, ao se observara relação do sujeito com os meios de comunicação, tem-se a oportunidade delidar com uma esfera “existencialista” e tensionar os campos empírico e teóricocom a investigação da identificação de operações de práticas discursivas ecotidianas específicas.

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Hall (2000) indica que para pensar no sujeito moderno e na sua identidade, épreciso pensar no que aconteceu à concepção de sujeito, que sofreu uma sériede rupturas, das quais ele indica cinco pensadores e suas teorias que contribuíramdiretamente para avanços na teoria social e nas ciências humanas. São eles: 1º)Karl Marx e seu anti-humanismo teórico; 2º) Sigmund Freud e a descoberta doinconsciente; 3º) Ferdinand Saussure e a afirmação que a língua é um sistemasocial; 4º) Michel Foucault e a genealogia do sujeito moderno; e por último, 5º) ofeminismo tanto como crítica teórica quanto como movimento social.

Desses cinco indicativos, a opção foi se centrar no aprofundamento do diálogoentre Foucault e Freud, pois cada um traz à cena perspectivas para se pensar naquestão do poder, uma vez que, ao lidar com a criança e seu desenvolvimentopsicossocial, utiliza-se Freud. E a justificativa para Foucault é seu pensamento seroriginário da psicanálise e seus questionamentos sobre o poder e a interpretação.

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e##* Caberia pensar se esse parcelamento da subjetividade em identidades múltiplas

e fugazes, em uma cultura apoiada em um tecnototemismo, não levaria o sujeitoa um niilismo pós-moderno em sua idade adulta: uma completa abstração dosocial, pois, se durante o seu desenvolvimento foi exercida uma ação contraditória,de afastamento do convívio objetivo do social e um reforço do uso de aparatos,esse indivíduo experimenta, ao trocar de identidade, novas peles e, principalmente,realizar suas fantasias num contexto virtual e não objetivo. Essas novas texturasde fantasia, que o fazem mergulhar em si próprio numa atitude beirando a psicosepor alguns instantes, provavelmente, se refletirão quando chegar à idade adulta.

Uma das implicações desse recorte é o lugar da formação da identidade. SegundoCanclini (1999), existe o movimento de “dissolução das monoidentidades”, poisa metrópole cria padrões de uniformidade, remodela hábitos locais e os subordinaa estilos “modernos”, é a homogeneização do consumo e da sociabilidade,propiciada pelo formato comum com que esses serviços se organizam no trabalhar,vestir e distrair.

O pensamento de Hall (2000) sobre as identidades acrescenta ao debate, pois,dentro de uma teoria social, o autor postula que há o surgimento de novasidentidades que fragmentam o indivíduo moderno. Essa seria uma crise deidentidades por tendências demasiadamente recentes e ambíguas, na qual essefenômeno social não oferece afirmações conclusivas ou julgamentos seguros. Oque converge com as inferências feitas por Canclini (1999), vai além, pois Hall(2003) faz a indicação de três identidades: sujeito do iluminismo; sujeito sociológico;e sujeito pós-moderno. Aqui, interessa o sujeito pós-moderno, que é o sujeito queassume identidades diferentes em momentos diferentes, identidades que não sãoconfiguradas ao redor de um “eu” coerente. A identidade unificada é uma fantasia,e as significações e representações culturais se multiplicam. Assim, confronta-semultiplicidade desconcertante e cambiante de identidades possíveis.

Portanto, a identidade cultural moderna para Hall (2003) é formada por meiodo pertencimento a uma cultura “nacional” e que tem sido amplamente des-locada pelo processo de mudança que é a globalização; dessa forma, as de-finições de identidade ficam contestadas no cotidiano. E Canclini (1999) endossaa questão quando define a globalização como a passagem das identidadesmodernas ao “incômodo” de pós-modernas e incita o questionamento ao indagarcomo os indivíduos representam para si mesmos os atos com os quais sereconhecem como se reconhecem como sujeitos, isto é, suas estruturas esuas experiências subjetivas.

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Ambos os autores fazem referência a Foucault e a seus conceitos de genealogiado sujeito moderno, poder disciplinar, tecnologias do eu, entre outros. Essesauxiliariam a compreender e a contextualizar o sujeito moderno. Foucault descreveo poder disciplinar como tendência das modernas formas de controle social (1987)para articular, em obra posterior (2006), o poder disciplinar como força monolíticaplenamente instalada, o que leva à correlação entre os campos do saber, os tiposde normatividade e as formas de subjetividade; isso é o que o leva a analisar osujeito, as relações estabelecidas com o “eu” (indivíduo) e como esse se reconhececomo sujeito, chave da problemática da identidade colocada por Hall e Canclini.

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As tecnologias do “eu” e as estéticas da existência são as estilizações deliberadasda vida cotidiana; são as tecnologias envolvidas que aparecem mais sob a formade práticas de auto-produção, de modos específicos de conduta, constituindo oreconhecimento do indivíduo enquanto sujeito inserido em uma sociedade. Seriamessas as técnicas que envolvem uma aplicação do poder e do saber que“individualiza” ainda mais o sujeito, pois, quanto mais coletiva e organizada for anatureza da instituição em que o sujeito está inserido, maiores serão o isolamento,a vigilância e a individuação do sujeito. (FOUCAULT, 1987).

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Hall (2000) e Canclini (1999) teorizam sobre a desterritorialização do nacional ecomo ela afeta a formação da identidade social, que é formada e transformadano interior das representações. Entendendo o social como um sistema derepresentações culturais, isto é, simbolicamente no indivíduo, isso explicaria oseu poder de gerar o sentimento de identidade e lealdade.

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A prática discursiva postulada por Foucault (2005) seria a construção dos sentidosque influenciariam e organizariam tanto as ações quanto as concepções doindivíduo em relação a ser sujeito. É a reconceptualização de sujeito; pensá-loem sua nova posição numa tentativa de rearticular a relação entre sujeitos epráticas discursivas é a questão da identificação como campo semântico, a buscada compreensão por meio dos repertórios discursivo e psicanalítico sem serestringir a nenhum deles. (HALL, 2000, p. 105). Tudo isso são indicações deum novo significado porque o termo identificação torna-se estratégico e posicional,segundo Hall (2000):

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Entender como as identidades se reconstroem, problema proposto por Canclini(1999) e Hall (2000) para investigação, é olhar para como se apropriam deelementos de várias sociedades combinando-os e transformando-os em processode hibridização intercultural. Que tipo de TV poderia narrar a heterogeneidade e acoexistência de vários códigos em um mesmo grupo e até mesmo em umindivíduo? Levar em conta os diversos repertórios e mediações na reelaboraçãoda identidade? Levar em conta os diversos modos que recompõem os desiguaiscircuitos de produção, comunicação e apropriação da cultura?

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Questiona-se a construção da identidade dentro de uma estrutura de poder eexclusão, isto é, o ponto de encontro entre discurso e prática. Nessa pesquisa,esse processo é visto como a recepção e a mediação, a descrição dessespontos e a junção deles com o sujeito e suas estruturas de significação. Portanto,a observação desse conjunto de práticas e rituais simbólicos indicaria como aprática discursiva incide sobre certos valores e normas de comportamento.Todo esse processo é observável pelo que acontece na ritualidade de ver TVcom as crianças.

Ao tomar a Fase Fálica, como ponto de partida, que se dá na faixa etária dos 4aos 6 anos,3 encontramos características muito significativas. A criança tende aestar autocentrada, isto é, em um movimento egocêntrico, vê as coisas sob suaprópria perspectiva e não imagina que haja outro ponto de vista. Mesmo quandoesse se apresenta, a criança lhe dá um significado próprio que combine com orepertório que ela possui, não é por teimosia ou porque não tenha compreendido,mas a sua visão, a sua interpretação, impera.

3 3 3 3 3 Ao se tratar do universo televisivo,as empresas que medem a audiência, como o Ibope,a Datafolha e aMultiFocus, bem como as emissoras de televisão, consideram que a idade de 4 anos marca o início da “vida dotelespectador”. Por isso a delimitação inicia nessa fase, sem perder de vista a importância das fases anterioresa serem estudadas com mais aprofundamento no andamento da pesquisa.

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e#(! Durante a fase denominada por Freud como Fase Fálica, a criança começa a

fazer importantes distinções no mundo a sua volta. Começa a perceber o mundoalém do núcleo familiar, inicia o estabelecimento do tabu, isto é, as regras sociais.A aventura pelo mundo externo (social) se inicia.

Nesse período, tem-se um indivíduo que, bem ou mal, enfrentou várias experiênciasdas fases anteriores em um nível individual, e que agora necessita colocá-las à prova:modelar suas fantasias e estruturar seu Ego, seu Eu-social para viver na coletividade.É a organização da afetividade para que o corpo atinja uma relação consigo mesmo euma relação com o outro e com o mundo. A criança, nessa fase, primeiramente faz, edurante sua ação, elabora o acontecimento; elabora as regras e os valores.

Os mecanismos de identificação e projeção estão em pleno funcionamento,exatamente os dois mecanismos mais explorados e utilizados pela TV na capturada atenção do público.

É comum a criança atribuir vida a todos os seres, inclusive a objetos inanimados(animismo), como também o artificialismo, isto é,atribuir origem artesanal humanaa todas as coisas. Seu raciocínio ainda é primitivo. Se a criança vê duas coisasacontecerem ao mesmo tempo, supõe que uma coisa é causa da outra.

Por isso, a identificação, em conjunto com a formação do Superego, organiza osvalores dessa criança, isto é, seus tabus, edificando assim seus totens. Aassimilação do mundo que se dá por meio da identificação é a aquisição ou rejeiçãodo que é visto, sentido e percebido no mundo externo. E com o Superego emformação, essa criança coloca à prova os valores introjetados em relação às normasexternas. Aquilo que ela sente como justo e valorizado será conquistado pela suaconsciência moral, isto é, irá ser incorporado ao tabu, às suas normas sociais.

Todo esse processo descrito é organizado em nível de fantasia e mensagenstransmitidas, tornando difícil separar o peso dos fatores da realidade e os da fanta-sia. Esse é o guia por toda a teoria freudiana de como se constituem os afetos dosindivíduos e como esses entram em relação com a externalidade (social).

Será que suas percepções do mundo externo são corretas? Haverá interferêncianesse processo por parte das tecnologias de comunicação? E como isso seprocessa? É impossível prever o número de fatores que possam interferir noprocesso, como também o que a criança carrega das fases anteriores de seudesenvolvimento.

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O problema não está na fantasia, mas na volta à realidade, na opressão docotidiano assolado por questões materiais. O totem tecnológico ganha força exa-tamente nesse ponto porque promove esse descolamento, essa experiênciaintensa, seja vivendo a vida do outro fictício, como na novela, um alguém qualquercomo ele, no caso do Big Brother, seja o seu próprio alterego, em sessões debate-papo pela internet.

A convergência entre essas diferentes esferas (a subjetiva e a objetiva) aponta àpresença não apenas de um imaginário totemizado pelos meios de comunicação,mas de uma necessidade maior, talvez por conta da globalização, de uma trans-cendência corporal.

Nessa consciência projetiva, destacam-se as fantasias de expansão, de realizaçãodos desejos e de construção de uma vida em sua virtualidade. A consciência jánão será mais limitada pelos entraves do espaço, mas poderá se projetar li-vremente pelo infinito de uma fantasia provocada pela virtualidade. Daí que ototem dessa tecnologia se impõe, refugia esse indivíduo em uma ação narcísicade realização desmedida de novas identidades em busca de prazer. As fantasiasse tornam reais com uma realização virtual em que a consciência pode expe-rimentar sem aparentes riscos ou entraves.

A identidade passa a ser fruto de um processo de construção intencional e,desse modo, os indivíduos teriam total liberdade de criação, de reelaboraçãode sua experiência existencial. Os indivíduos, assim, não mais ficam enclau-surados a uma única identidade;eles passam a ser criadores de si mesmos,com suas próprias regras, com tabus que provêm desse tecnototemismo, pro-duzindo uma tecnocultura hedonista em que prazeres e satisfações podem seralcançados a todo momento.

À medida que esse desejo se manifesta e,conseqüentemente, se realiza pelamobilidade da criação e pelos tabus que se colocam para que hajam definiçõespara que assim o gozo se prolongue, diretrizes para que as identidades fugazesnão se esvaziem rapidamente e assim criem o desprazer. Por isso a inversão devalores. A tecnologia começa a dominar quem deveria ser dominado por ummecanismo projetivo de “divinização” em que a tecnologia é responsável pelatranscendência desse indivíduo, pela sua capacidade de catarse e de fantasia.Atenta-se para a problemática que isso traz ao desenvolvimento infantil que seforma nesse contexto.

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11111 Agradezco a Belén Acosta su colaboración en la visualización y registro del material noticioso televisivo.

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En el primer capítulo de su obra ¿Por qué estudiar los medios? Roger Silverstonenos invita de manera convincente a hacerlo menos por lo inusual o lo catastróficoque ellos nos acercan y más por lo que replican cotidianamente de aquello quepasa “por sentido común”, pues, nos dirá, “los medios dependen de él”(2004:21).Si seguimos esta recomendación y pensamos en cuáles son las cuestionesimportantes que básicamente están encastradas en el sentido común rápidamentesurgen el lugar y el momento en el que estamos y compartimos con quienes nosrodean. Es que una de las asunciones del sentido común más comprometedoraspara nuestras prácticas cotidianas es aquella que nos habilita para lasclasificaciones espaciotemporales de la situación en la que nos encontramos.Es más, en algunas situaciones se puede deducir nuestra lucidez de la capacidadque tengamos para identificarlas.

Por lo general nuestras experiencias cotidianas transcurren en el ámbitodoméstico, en el laboral, en sitios de esparcimiento, etcétera, pero casi siempreen un espacio local que administrativamente lo contiene, ese espacio que paranosotros es el lugar. Pero cuando durante nuestra vida diaria interactuamos conlos medios definimos sucesivamente marcos espaciotemporales diversos quenos posicionan en una plataforma con anclaje móvil. Como integrantes de suspúblicos los acompañamos imaginariamente en los traslados que sus contenidosnos ofrecen. Y, en la espesura de la experiencia cotidiana, pocas veces estamosalertas para reconocer los poderes que actúan como fulcro de esos movimientos.Cuando los medios producen y reproducen las clasificaciones espacio temporalesque organizan nuestras identidades, las instituciones dominantes de la vida so-cial no están detrás ni delante de ellos, muchos menos a su costado, están allí.

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#($ Como están, hay que decirlo, en medio de todas las instancias con poder

clasificatorio, es decir con poder.

Así, la imprenta, que surgió casi al mismo tiempo que los estados nacionales,acompañó con su capacidad multiplicadora los ejercicios cotidianos de lasnacientes sociedades nacionales y, fundamentalmente, de sus estados, paradotar de sentido a las fronteras nacionales. Por entonces, una nueva y poderosaclasificación espacial reorganizaba los límites y, al mismo tiempo, conmovía lasidentificaciones de las comunidades tribales: eran las naciones.2

Hoy, después de doscientos años, tanto las comúnmente denominadas TICScomo los medios electrónicos de comunicación, fundamentalmente la televisión,son interpretados como vehículos del debilitamiento de todas las fronterastradicionales, entre ellas, las nacionales. En otros artículos he tratado de mostrarque los medios locales, ubicados en “el interior”, o las transmisiones locales decadenas nacionales o transnacionales, juegan un poderoso papel de reproducciónde las identificaciones con lo local, con el propio lugar.3 Al mismo tiempo, lasgrandes cadenas mediáticas, siguiendo el curso transnacional de la economía,ensanchan el alcance de sus producciones, amplían sus públicos y mercados ymovilizan imágenes y fuentes lejanas de interpelación identitaria generandotambién segmentos de públicos y lealtades transnacionales. En este trabajotrataré de mostrar que la nación todavía constituye un espacio de interacciónmediática diferenciado, que aparece reeditado diariamente en los noticierostelevisivos nacionales y sostendré una hipótesis: la participación del público enesos espacios es un operador de particularización de tendencias mundiales deldiscurso informativo televisivo.

22222 En Latinoamérica los estados llevaron adelante un papel activo – en lo militar, pero también en loeconómico y lo ideológico – de diferente manera y con diferentes grados de “éxito” según los países, poraglutinar e igualar hacia adentro al mismo tiempo que combatían con las fuerzas colonizadoras europeas.Ver, por ejemplo, Alimonda, H. (1982) “Paz y Administración- Orden y Progreso. Notas para un estudiocomparativo de los estados oligárquicos argentino y brasileño”. Revista Mexicana de Sociología. UNAM.Nro.4; Ozlak, O. (1986) “Formación histórica del estado en América Latina: elementos teórico-metodológicospara su estudio”. CEDES. Bs. As. y “La formación del estado argentino (1997). Planeta. Buenos Aires;Trindade, H. (1986) La construcción del estado nacional en Argentina y Brasil (1810-1900). En RevistaMexicana de Sociología. UNAM. Nro.11. Por otra parte, Anderson., B. (1993) da cuenta de la importanciade la imprenta y de los nacientes medios en la construcción del sentido de lo nacional.

33333 Grillo, M (2004) “Lo local y lo nacional como espacios de identificación espacial en la interacciónmediática”. En Antonelli, M (ed) Cartografías de la Argentina de los ’90. Cultura mediática, política ysociedad. Ferreyra Editor. Córdoba.

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John Thompson (1999) denomina espacio de interacción mediática al ámbitoque se genera a partir de la relación que se produce entre la producción de losmedios de comunicación y los públicos hacia los cuales llega su alcance. Pero,ocurre que en las interacciones mediáticas no siempre se generan espacios, ennumerosas oportunidades se reproducen rutinariamente aquellos cuyos sentidoshan sido construidos en procesos sociohistóricos específicos. Uno de ellos es elespacio nacional.

Autores como Billig (1995), Waisbord (2007) y Schlesinger (1993, 2007), entreotros, han analizado y destacado la necesidad de estudiar los vínculos entre losmedios y las naciones.4 Especialmente por su papel en la vida cotidiana al ofrecery reeditar experiencias colectivas con producciones entretejidas en deixisnacionales.

Schlesinger (2007) discute la idea que posiciona a los medios cumpliendo unpapel reproductor del espacio de lo nacional. La considera una visión unilateralen la medida que concibe a la nación “desde adentro” e ignora las redes derelaciones en las que se encuentran hoy los estados nacionales. En el mismosentido, para Massey (2005) ver el espacio constituido desde adentro esconcebirlo como ruptura, discontinuidad o fragmentación; es como si las “culturaslocales” brotaran de la tierra, dice. No se ven como producto de la interacción y,desde esta perspectiva, las naciones eran de una manera propia hasta que laglobalización derribó “fronteras naturales”.

No obstante, visto el problema desde la teoría de la identidad, en el marco de lacual nos interesa ubicar el papel de los medios, la mirada “desde adentro”,indica los procesos de autogeneración y “la mirada de los otros, que incluye laspropias miradas desde y hacia los otros” constituyen los de heterogenación.Ambos procesos son complementarios al momento de producirse las identi-ficaciones de los grupos sociales (Boutinet, 1978).

En síntesis, desde la teoría de la identidad, el espacio no es solamente unasuperficie objetiva en la cual se mueven líneas imaginarias hacia adentro y hacia

44444 En el artículo citado de Silvio Waisbord -“Los medios y la reinvención de la nación”- el autor presentauna selección actualizada de trabajos que vinculan el papel de los medios en lo que el autor llama “lacoordinación cultural” del espacio nacional.

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que en la experiencia de los grupos sociales adquiere sentidos. Puesto en estostérminos, el problema se inscribe en los debates acerca del papel de los medios,especialmente la televisión, en procesos de identificación con espacios históri-camente constituidos como lugares, esto es como espacios de identificación(Giddens, A. 1993; Morley, D. 2005). Consideramos que las discusiones sobreel poder de los medios para anclar los públicos a sus lugares, fortaleciendoprocesos de identificación y diferenciación crecientes, o desanclarlos, promoviendosu desterritorialización, están agotadas si se plantean en esos términos gen-erales. Partimos del supuesto que afirma la posibilidad de ocurrencia de ambosprocesos, tanto de manera diferenciada como complementaria según diferentesmomentos, lugares e instancias de la vida social. Debemos aportar muchos másresultados empíricos para poder comprender mejor la multiplicidad y combinaciónde estas posibilidades.

Pero, más allá de estos debates, lo cierto es que en el complejo contextosocio-histórico -que intenté exponer sin grandes omisiones pero de manerasintética porque ha sido suficientemente retomado en la literatura corriente- lonacional permanece como un espacio de producción de sentidos. Todavía re-presenta el ámbito de la racionalidad organizadora que trascendiendo la se-guridad del vecindario permite la expansión imaginativa de la vida social sinresultar insondable y, por eso, amenazante. Es una frontera amplia pero depertenencia contenedora que aún constituye una estación plausible para laplataforma mediática. En la televisión, por ejemplo, refracta cotidianamente enlos noticieros nacionales.

Los noticieros televisivos de alcance nacional nos recuerdan una y otra vez,diariamente, cuál es el afuera y el adentro del espacio que alberga el nosotrossocial institucionalizado de lo que nos ocurre día tras día. Nos interpelan desdeesa instancia asediada por la cotidianeidad de lo local, próximo, denso e inex-cusable, y los variados, dispersos y desordenados flujos noticiosos de lo global.Desde el punto de vista comunicativo, este doble asedio del que hablamos esexplicitado por Schlesinger de la siguiente manera: “es importante plantearsepreguntas sobre el impacto de los cambios transnacionales y globales en lo quesiguen siendo en gran medida sistemas de comunicación ligados al Estado-nación”. Para el autor la pregunta debe girar sobre las implicancias de estossistemas comunicativos definidos principalmente en ese marco “para la posibilidadde una esfera pública supranacional como para nuevas formas de comunicaciónsurgidas de la auto-organización de la sociedad civil” (2007:79).

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Desde esta perspectiva la exploración del papel de los espacios de producción yconsumo eminentemente nacional, como son los noticieros televisivos, pareceinteresante en la medida que, tal como han sostenido autores como Habermas(1994) y Garnham (1998), los derechos ciudadanos continúan estando vinculadosa estados nacionales específicos.

Winocur contrapone esta perspectiva sobre el espacio de lo nacional y el espaciopúblico, como ámbito apropiado para la participación ciudadana con la propuestade Keane. En sus términos, para este autor “se ha vuelto obsoleto el ideal deuna esfera pública unificada (…) en lugar de ello, figurativamente hablando, lavida pública ha sufrido una refeudalización” (…) en el sentido de “la conformaciónde un complejo mosaico de esferas públicas de diversos tamaños que se traslapane interconectan y que nos obligan a reconsiderar radicalmente nuestros conceptossobre la vida pública y sus términos asociados tales como opinión pública,bienestar público y la diferenciación público-privado” (1997:56).

Nuevamente, debemos replantear la cuestión desde la perspectiva de los actoressociales involucrados, es decir de aquellos que ocupan e interactúan con losmedios generando espacios en el marco de condiciones históricas compartidas.Desde esta esfera hablar de niveles micro o macro, no aporta a la comprensiónde la significación que las interacciones adquieren y los procesos de identificaciónespacial que interpelan. En otras palabras, la identificación del espacio nacionalcon un espacio público denominado mesoesfera no permite comprender mejor elpapel de lo nacional y las prácticas ciudadanas en su marco, aunque pueda darcuenta de fragmentaciones asentadas en prácticas, intereses y estilos situacio-nales específicos.

No obstante, consideramos que en un punto Winocur acierta en su discusión delas ideas de Garnham (1986). Este autor define el espacio público desde unaperspectiva normativa como “un espacio para definir una política racional yuniversalista” que sólo sería posible con unos medios independientes del mercado.Para Winocur (ibid) en cambio “El problema en estas nuevas condiciones noreside en cuestionar el papel y la legitimidad de los medios en la generación denuevos espacios públicos sino en preguntarse hasta que punto las transforma-ciones que introdujeron en la vida pública la empobrecen o si, por el contrario,ofrecen nuevos desafíos para pensar la relación entre lo público y lo privado ytambién las posibilidades de intervención de los ciudadanos en la definición ydiscusión de los temas de interés colectivo en la agenda mediática”. Y, desdenuestra perspectiva, sobre el empobrecimiento de la vida pública es poco lo que

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#(& puede decirse en la medida que excepto en situaciones excepcionales de revuelta

y conflicto generalizado, la historia de las sociedades modernas no da cuenta deuna participación permanente, cotidiana y directa de la población – constituidaen ciudadanía- en los espacios públicos.

Los puntos de contacto entre algunas prácticas sociales y determinados procesoscomunicativos mediáticos suelen ser analizados poniendo el acento en el papelque cumplen los medios en movilizar algunas cuestiones no sustanciales, mera-mente expresivas o espectaculares de esas prácticas. Estas perspectivas ubicanlos procesos de interacción mediática como productores deformantes de prácticasque natural o esencialmente son de otra manera. En nuestros trabajos tratamosde evitar tanto esta visión de lo social – espontaneísta, en la medida que leotorga una existencia natural sin mediaciones históricas particulares – como laque evoca momentos históricos en los cuales se manifestaba en estado deactiva pureza. Por ello, en lugar de preguntarnos cómo los medios “empobrecen”la vida social, nos cuestionamos directamente por los modos y la intensidad desu intervención en procesos sociales específicos. Esto es: los medios constituyenhoy lo social junto a otras instituciones y lo que intentamos averiguar en nuestrasinvestigaciones es la participación del proceso comunicativo que promueven enmanifestaciones específicas de la vida social.

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Los medios de comunicación han sido considerados desde ampliaciones delespacio público, en la medida que favorecen la participación, el reconocimiento yla visibilidad (Macé, 1997) hasta instrumentos a favor de su eliminación, entanto reemplazan el debate racional propio de la esfera pública por un “espectáculofascinante o ilusión fantasmal” (… ) “por las imágenes y los simulacros de realidad”(Jay, M.; 2003).

Es indudable que una cuestión clave para abonar una u otra posición escomprender la significación que asume la participación de los integrantes delpúblico en los espacios generados por los medios. Si bien es verdad que losmedios se constituyen en la actualidad en espacios privilegiados para la visibilidadpública de actores sociales diversos también lo es que esas intervencionescontribuyen a la “polifonía de la controversia” animadora del mercado que mediosy públicos constituyen (Billing; 1997). Winocur (2002) pone el acento en lascapacidades y los intereses de los interactuantes. Dice que los participantes en

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los espacios de los medios han adquirido experiencia en esa práctica y ello lesha permitido desarrollar habilidades histriónicas para desempeñarse con soltura“al aire”. Todos han aprendido cuáles son las reglas de cada medio: lo que sepuede o no decir, la manera para expresarlo y qué estrategias discursivas debenusarse para impactar al auditorio en cada caso. Agrega que el público no esperaque se le solucionen sus problemas y al medio tampoco le interesa averiguar quédesenlace tuvieron las historias, salvo que ameriten convertirse en una novela porentregas. Lo que importa a ambos es publicitar y ser observados. Para los primerossignifica volverse “visibles” en la escena pública, para los segundos, historias quevenden. En definitiva, para Winocur, se da una transacción de intereses. Ya hemosdicho que podríamos coincidir con Winocur, tanto en adjudicar a los participantesla intención de buscar visibilidad en el espacio mediático como en el desarrollo dela capacidad histriónica que han logrado, pero lo que no surge de nuestrasobservaciones es que quienes participen en los medios no esperen solucionar susproblemas o al menos, sumar adherentes, lograr efectos directos en las institucionesdel Estado u obtener reconocimiento público de sus necesidades. Los integrantesdel público que estudiamos consideran que estar en los medios siempre es unaalternativa válida para ser oídos y solucionar problemas; incluso, dan cuenta deexperiencias exitosas en ese sentido (Grillo et alt., 2003).

En esta instancia de nuestras indagaciones sobre el problema consideramosque el público en pantalla integra una estrategia de tratamiento de la noticia porparte de la televisión en la medida que consigue movilizar procesos de identi-ficación en el público, favorece el contacto y anima la pantalla. Pero, más allá deestos intereses que persiguen las producciones televisivas, lo cierto es que, almismo tiempo, amplia el espacio de participación del público y colabora en dotarde visibilidad y reconocimiento a sus necesidades y carencias.

Entiendo que los ciudadanos dan a conocer sus intereses y opiniones en unámbito que ya está mediado por el noticiero y la participación en los espaciospúblicos que promueven los noticieros son insumos producidos por el mismoespacio5 . Digamos entonces que los espacios mediáticos no son espacios-escenarios como las plazas, los teatros o las salas de debate barriales o de las

55555 Marletti (2001) destaca el papel de las rutinas profesionales, como puede ser concebida la actividadque despliegan los periodistas al hacer intervenir al público en los espacios mediáticos, en laautorreferencialidad de los medios. Entiende la autorreferencialidad en el sentido que le da Luhmanncomo la capacidad de un sistema de seleccionar del ambiente aquello que mantiene en la complejidad lapropia identidad.

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#)! casas de gobierno. Estos escenarios mediáticos “vienen a casa” para que

participemos y lo hacen en un doble sentido: por un lado, efectivamente salen anuestro encuentro en el lugar que estemos y, por otro, cada participación de unciudadano en la televisión abre la posibilidad de nuevas intervenciones a otraspersonas y permite la identificación de integrantes del público6 . El noticierotelevisivo es un escenario demandante y disponible; en este sentido, acuerdocon Winocur que se da una transacción de intereses entre el medio y quienesintervienen en sus espacios.

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Para Verón (2005) el discurso de la información es el que tiene por objeto laactualidad y para avanzar en su comprensión debemos reconocer su articulacióncon la red tecnológica de los medios y las prácticas del periodismo y por otro consu único destinatario genérico que es el ciudadano habitante de un país – puedeser de una región – que es construido como un predestinatario, esto es comoalguien con quien se comparten y confirman creencias comunes. 7 El periodismocuenta la actualidad, pero esa actualidad integra diegéticamente sentidos producidosdesde una multiplicidad de relatos que recortan el mismo espacio nacional.

Charaudeau agrega una cuestión fundamental para la comprensión del modo y laposibilidad de circulación de este discurso a partir de la relación que se estableceentre medios y públicos. Para este autor : “la instancia mediática televisiva seencuentra en una posición de bisagra doblemente orientada: referencial, cuandoestá orientada al mundo exterior que muestra, refiere y comenta, y de contactocuando contempla al telespectador al que intenta interesar y conmover, al quereclama e interpela. (…) La dirección, lugar por excelencia de la articulación entre

66666 Lazarsfeld y Merton afirmaban, en un artículo escrito en 1948, que podría darse un fenómeno quedenominaron “disfunción narcotizante” en el sentido de que la recepción de estos mensajes transformenlas energías disponibles para “una participación activa en un saber pasivo”. No obstante, los propiosautores sostenían entonces que no se conoce mucho cómo puede operar este fenómeno y que estudiarlo“es una de las tareas que aún se presentan al estudioso de las comunicaciones masivas.” (1978:35) Nohemos avanzado demasiado.

77777 Verón afirma así el sentido de pertenencia común que sostienen los recortes espaciales compartidos enlos discursos informativos. Agrega que el público del discurso de la información difícilmente seaparadestinatario – objeto de persuasión – o antidestinatario – con el que se polemiza-.

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el mundo exterior, el estudio y el telespectador es la que garantiza la puesta enescena.” (2003: 233) Desde nuestro interés analítico, esto quiere decir que losnoticieros deben ser creíbles y, al mismo tiempo, mantener su público. Por esto,deben seguir los cánones de construcción de la verosimilitud sin perder de vistaque necesitan lograr y mantener una audiencia. Tanto el contacto como laverosimilitud son dimensiones centrales para mantener las interaccionespromovidas por los noticieros televisivos; sus estrategias desde la puesta enescena deben ser exitosas al momento de articular la producción discursiva consu reconocimiento por parte del público.8

Como sostiene con claridad Eliseo Verón (2005), para comprender la complejidaddel vínculo de los medios con sus públicos hay que entender que los medios sonactores de un mercado económico y están sometidos a dos lógicas que hastahoy han sido relativamente divergentes. Una, es la función primaria del contratoque es crear y conservar sus receptores y la otra, es de dotar de valor a esecolectivo para vendérselo a los anunciantes. Pero, en tanto la relación con losanunciantes es sólo un problema de marketing, vende o no vende, su anclaje enun grupo de receptores depende de variables demográficas, económicas, políticasy culturales variadas y muchas veces sutiles. Ahora bien, desde la producción delos noticieros televisivos nacionales estas dos lógicas aparecen imbricadas enel momento en que reproducen estilos discursivos idiosincráticos y diferenciadoresparticulares, propios de sus lugares de producción y atentos a esas variablesexpuestas por Verón, así como están sometidos a procesos crecientes deracionalización de la producción televisiva informativa que muestra tendenciascomunes en numerosos países del mundo (2005:194).

Con respecto a esas tendencias, en un artículo aparecido en diciembre de 2005en Le Monde Diplomatique, Marc Endeweld da cuenta de algunas de estastransformaciones comunes en noticieros televisivos franceses muchas de lascuales responden a tendencias mundiales. Una de ellas es la creciente ficciona-lización en la construcción de las noticias promovida especialmente por lasagencias de noticias internacionales9 , otras son: el aumento del espacio a ser-vicios para la vida cotidiana – tiempo, salud, tránsito, seguridad –, el aumento de

88888 Para Verón el desafío principal de la investigación en la comunicación mediática es en la actualidadtratar de comprender lo que llama sistema productivo, es decir la articulación entre producción yreconocimiento (2005:222).

99999 Describe el tratamiento dado a la información del huracán Katrina, ocurrido en Estados Unidos en esemismo año.

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#)( la importancia de los periodistas estrellas como marca o imagen de los espacios

noticiosos y de las propias emisoras, el aumento de los relatos en offacompañados por imágenes editadas muchas veces de archivo, la generación dela información desde el noticiero según su conveniencia operativa antes que labúsqueda de la información relevante y el aumento de la importancia del ritmo, atal punto que el tiempo medio de los reportajes es de un minuto cuando hacediez años era de un minuto y medio10 . Pero una de las tendencias más comunesen los noticieros televisivos del mundo es la reducción del tiempo dedicado a lasnoticias internacionales y el crecimiento de la importancia del factor noticioso dela proximidad.

Para Waisbord (2007) “La debilidad de la cobertura internacional de noticiasofrece probablemente una explicación parcial de las razones por las cuales losmedios fracasan en cubrir las expectativas cosmopolitas. (…) Típicamente losmedios de comunicación recurren a narrativas e historias culturales que resuenanen las audiencias domésticas, antes que a un mejor entendimiento de los desar-rollos y los contextos. Sin embargo no parece ser una cuestión principalmentede limitaciones de los marcos noticiosos y de las prácticas periodísticas: a lainversa que las naciones, el cosmopolitismo carece de medios de comunicaciónaliados deseosos de convertirse en vehículos de las culturas trans-post-nacionales.(…) Como advierte Schlesinger “no deberíamos esperar demasiado del potencialde los medios audiovisuales para configurar identidades en un contextotransnacional” pues están mejor equipados para, y deseosos de, sostener iden-tidades nacionales (En Waisbord, 2007:48).

Algunos de los factores que tendencialmente se introducen en la producción denoticias televisivas en el mundo constituyen, desde nuestra perspectivas,condiciones homólogas y contiguas a la intervención del público en la pantalla,de manera tal que este factor puede considerarse una estrategia desde la cualanalizar particularidades nacionales de los noticieros. De mejor manera, podemosdecir que consideramos al tratamiento dado al público en la pantalla como unoperador particular productivo de tendencias universalizantes de la producciónde la información televisiva. Estas tendencias afines son: aumento de la impor-tancia de cuestiones atinentes a la vida cotidiana, como la prestación de servicios–salud, tránsito y, con gran fuerza, seguridad-, el aumento del valor de la proximidad

1010101010 Mi propia experiencia indica que hace alrededor de treinta años atrás, cuando me desempeñaba comoredactora de un noticiero televisivo, esta duración media de los reportajes era de 2 minutos y medio; tresminutos era el tiempo máximo.

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y la creciente importancia del ritmo en la continuidad expositiva, complementadaspor las necesidades de aprovechamiento por parte del público del espacio queposibilitan los medios para publicitar sus demandas. Especialmente cuando “…seprodujo una adaptación de las instituciones de las democracias industriales alos medios y los medios se han transformado en los mediadores insoslayablesde la gestión de lo social” (Verón, E. 2005: 224).

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En trabajos anteriores hemos tratado de dar cuenta de dimensiones significativasde la intervención del público en programas televisivos a partir del ámbito deproducción de esos espacios. Así, mostramos el modo en el que noticieros localesconstruyen sus audiencias en términos de vecindario a diferencia de los noticierosnacionales (Grillo, 2004; Rusconi, 2004); analizamos la significación de estasintervenciones en entrevistas realizadas a los integrantes del público (Grillo, 2005;Tonello, 2003), exploramos la potencialidad de espacios mediáticos comoescenario de transacciones de diversa índole (Milani, 2004) y nos detuvimosespecialmente en aquellas vinculadas a la condición ciudadana del quienesintervenían identificando su construcción como demandante y consumidor deservicios públicos (Grillo 2005; 2006).

Posteriormente comenzamos a estudiar el tratamiento de las noticias con partici-pación del público en noticieros nacionales de Argentina Brasil y Chile. Hasta elmomento han surgido con claridad dos cuestiones que seguimos analizando:una es el lugar diferencial que ocupa el público participante en la construcción dela noticia y otra es el estilo de tratamiento. Mientras en los noticieros de Chile yde Brasil la actuación del público en la pantalla aparece como consecuencia delhecho que se considera noticia, en el argentino el público interviene constituidoen el hecho noticioso, es la causa de la información y eje alrededor del cual seconstruye el hecho que despertó su actuación (Giussano, 2006). En términosgenerales encontramos que mientras en el noticiero de Brasil el público compartesu intervención con reporteros, informantes del poder público, expertos y otrasfuentes variadas de información en vivo, todo alrededor de temas (o “historias”)de integración, y en el chileno los escenarios oscilan claramente entre aquellosespecíficos y variados que ocupan los participantes con otros propios del poderpúblico –ministerios, oficinas, sedes oficiales- o político, en el noticiero argentinosu presencia, como testigo, informante o actor principal es casi excluyente (Grillo,

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el. W2"#a52*/,"%'"2,&"',(*/*%$,&"(%2%4*&*4,&

#)$ 2006). Por otra parte, el noticiero brasileño organiza una puesta en escena

compleja en la que se hace evidente la presencia de un organizador ausente peronecesario. Como contrapartida, la puesta en escena informativa del noticieroargentino Telenoche se construye siguiendo una modalidad fluida – comoespontánea-; la pantalla aparece ocupada – en el sentido de tomada y pormomentos invadida- por “los hechos noticiosos”. Entre estos hechos están,obviamente, las manifestaciones, los cortes de calles y las escenarios barrialescon voces que reclaman por salarios, subsidios, seguridad o servicios, noticiastodas en las cuales la participación del público en la pantalla es una constante.El espacio informativo televisivo se convierte así en una réplica mediatizada delespacio público de calles, plazas, rutas y vecindarios.

Estos antecedentes nos han llevado a postular la hipótesis de que el público enpantalla – en tanto variante mediática del pueblo en la plaza y las calles- seconstruye en el noticiero argentino como una estrategia eficaz de articulaciónentre la realidad a la que remite, la construcción que hace de ella y la relaciónque establece con su público. Dicho de otro modo, el público en pantalla en elnoticiero argentino es un articulador productivo de los tres espacios que enpalabras de Charaudeau son el espacio externo público, el espacio interno deinterpretación y el de la relación de esta instancia con el público. (2003:233)

Desde esta mirada y a partir de los antecedentes citados tratamos de abonarmás profusamente nuestras sospechas acerca del papel de la intervención delpúblico en la pantalla en el noticiero argentino explorando aspectos más detalladosdel tratamiento dado a ese recurso noticioso. Para ello, presentaremos algunosresultados de un análisis descriptivo de los noticieros de mayor circulación emitidosdurante una semana de los noticieros de mayor circulación de Argentina que esTelenoche de Canal 13, de Brasil, el Jornal Nacional de la Rede O‘Globo y deChile, 24 Horas Central de la Televisión Nacional de Chile11 . Los datos quetenemos muestran los porcentajes de noticias con participación del público encada noticiero, el tiempo promedio de esas notas, la cantidad de tiempo efectivodel público en la pantalla, el tipo de público que participa, según sea ciudadanocomún o especialista, el papel del reportero que entrevista y la dramatización dela actuación por parte del público interviniente.

1111111111 Luego de visualizar e interpretar los lineamientos generales que presentan los noticieros de los trespaíses sobre material grabado de veinte emisiones por noticiero de cada país, correspondientes al mes dejunio de 2006, resolví efectuar este análisis de contenido pormenorizado del material de una semana, apartir de categorías emergentes de ese visionado previo.

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* No se incluyeron las intervenciones de candidatos políticos, funcionarios, legisladores o gobernantes.Sí, las de profesionales o especialistas en temas específicos vinculados al material noticioso.

Si bien el noticiero argentino muestra un porcentaje menor en el total de notas conpúblico en la pantalla que el de Chile, no obstante, presenta un porcentajenotablemente mayor de tiempo efectivo ocupado por el público. Si sumamos aesta observación, los mayores porcentajes tanto de la presencia del ciudadanocomún frente al especialista, como de los tiempos en los cuales las personas queintervienen lo hacen dramatizando sus actuaciones y los reporteros mantienen unarelación de complicidad con los entrevistados vemos que todo organiza unaconfiguración que permite seguir trabajando la idea que venimos sosteniendo acercadel papel que cumple la intervención del público en la pantalla del noticiero argentino.

Creemos que es en las formas, en las modalidades de construcción, en losestilos de enunciación o de tratamiento donde debemos seguir analizando lasdiferencias. Ellas exponen, como lo sostiene White, la moral que trasunta losdeseos (1992:33-35).12

Porcentaje de noticias c/público *

Porcentaje de tiempo ocupado porpúblico en pantalla sobre tiempomedio de las notas.

Presencia del ciudadano comúnsobre el especialista.

Promedio en segundos por nota decomplicidad del reportero sobretiempo de participación del reportero(complice-distante-negocia-ausente)

Tiempo promedio por nota en el queel público dramatiza su intervención

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70%

69 %

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20 %

33,33 %

38%

59 %

27º

7%

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45%

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20º

4 %

TelenocheArgentina

Jornal NacionalBrasil

24 HsTele. Nac. Chile

1212121212 En un estudio anterior que efectué comparando material relevado en 1993 del mismo noticiero brasileñoy de canal 9 de Argentina, que en ese momento eran los de mayor audiencia, observaba ya un estilodiferente en la relación que proponían los reporteros con los entrevistados en los noticieros de ambospaíses. Entendía entonces, que el estilo de los reporteros argentinos reproducían una moral común quemás allá del contenido, sigue estrategias manipulatorias para la igualación. A partir de la clasificaciónefectuada por Todorov (1987) de las modalidades de tratamiento del otro; resumía esa modalidad seguidaen el noticiero argentino como aquella que concibe al otro como creyente. (Grillo, 1995)

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#)* Verón (2005) plantea también la necesidad de realizar las comparaciones a partir

de las modalidades, pues en ellas se sostiene el contacto. Afirma que losmecanismos de competencia en el mercado de los medios tienen comoconsecuencia que el contrato con el público sea fundamentalmente enunciativo,es decir que no sea del plano del contenido sino “en el de las modalidades deldecir”, pues productos muy parecidos entre sí sólo pueden diferenciarse en lasestrategias ocupadas del contacto.

Entonces, la pregunta central que demanda nuestra interpretación en adelanteserá identificar las reinversiones tecnológicas, sociales e históricas que producenoperatividad en la intervención del público en pantalla para fundar y mantener elcontacto cuando se informa por televisión en las sociedades estudiadas.

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Bernadette LyraBernadette LyraBernadette LyraBernadette LyraBernadette Lyra11111

RESUMORESUMORESUMORESUMORESUMO

A noção de gênero é uma das mais importantes da doxa da história e da teoria do cinema. Oobjetivo deste artigo é examinar a emergência de gêneros no cinema produzido no Brasil, desdeos primeiros filmes até a chanchada e a pornochanchada. Em primeiro lugar, enfatizando umaperspectiva institucional. Em segundo, considerando a noção genérica como um pacto entre ossistemas de produção e difusão de filmes e os espectadores. E, finalmente, analisando tanto asmarcas reveladoras dos elementos que regulam a formação do próprio discurso cinematográficono País, quanto as formas que atravessam a identidade daquilo que, institucionalmente, se constituiem cinema brasileiro.

Palavras-chave:Palavras-chave:Palavras-chave:Palavras-chave:Palavras-chave: Instituição cinematográfica. Gêneros. Filmes brasileiros.

ABSTRACTABSTRACTABSTRACTABSTRACTABSTRACT

The notion of genre that’s the essentials from history and from theory cinema. The aim of thispaper is examine the emergence of the genres into the Brazilian cinema, from the first films tochanchada and the pornochanchada. At first, enhancing an institucional perspective. Secondly,considering the generic notion like a pact among the filmmaker, the mode of diffusion and theviewers. In addition, analysing both the marks revealing from the elements what regule the train-ing of the discours cinematographic and the forms what cross the institucional identity of theBrazilian cinema.

Key words:Key words:Key words:Key words:Key words: Cinematographic institution. Genres. Brazilians films.

11111 Doutora em Cinema pela Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo (ECA/USP),Pós-Doutorado pela Université René Descartes, Paris V, Sorbonne. Atualmente, é coordenadora do Programade Mestrado em Comunicação e Professora Titular na Universidade Anhembi Morumbi. Parecerista daFapesp, CNPq e Capes. Líder do Grupo de Pesquisa Forma, Imagem na Comunicação Contemporânea(UAM/CNPq). Publicou livros e artigos teóricos sobre o cinema. É escritora de ficção com romances econtos publicados no País e no Exterior. E-mail: [email protected]

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A noção de gênero, talvez, esteja desgastada pelo tempo e pelo uso. Mas, nempor isso, deixa de ser uma das mais importantes na teoria e na história docinema. Retomá-la para investigar a emergência genérica no cinema brasileiropode tornar-se um desafio intrigante.

De modo mais comum, os estudos de gênero costumam ser delineados emcontraposição aos estudos de autor. Essa oposição se dá, principalmente, emtorno daquela necessidade de agrupamento, nascida na tradição semiológica:“A obra de um cineasta não é a única unidade textual sistemática maior do queum filme. Há também o que se chama ‘gênero cinematográfico’: burlesco, filmenoir, comédia musical etc.” (METZ, 1971, p. 93).

O princípio de classificação estruturalista, que contrapõe as especificidades degrandes conjuntos, permite que esses conjuntos se desdobrem em diversosesquemas. Nesse sentido, Thomas Schatz propõe a seguinte equação: “A críticade gênero tenta estabelecer um conjunto de formas cinemáticas, enquanto acrítica de autor celebra certos cineastas que trabalham, efetivamente, no quadrodessas formas gerais.” (1980, p. 8).

De modo geral, ao privilegiar essa idéia de conjuntos classificatórios, muitasanálises que se dedicam às questões do gênero cinematográfico resultam textuaise têm por motivo certas repetições e reiterações dos temas, tramas e narrativaspara nomear os gêneros. Para além dessa idéia, alguns pesquisadores estãopreocupados com uma espécie de ontologia dos gêneros:

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Há que mencionar, ainda, que certas vertentes advogam o retorno dos estudosdos gêneros fílmicos ao âmbito da historicidade. Tom Gunning, por exemplo, recorreao Formalismo Russo em seus estudos sobre o cinema primitivo, exemplificandoos gêneros delineados pelos filmes dos primeiros tempos pela “articulação entreos planos, em termos de tempo e espaço”. (GUNNING, 1984, p. 105). Mas,

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#$$ Desse modo, o cinema, em seus primórdios, foi tido como um meio de replicação

da realidade objetiva, ou seja, como um meio de reprodução técnica das imagensem movimento da realidade. A “recriação do mundo real” funda ontologicamenteo cinema.

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Porém, desde muito cedo, empresários e produtores do entretenimentodescobriram que o cinema poderia substituir o teatro e o circo no imaginário dopúblico.

Essa descoberta, talvez, tenha se dado na noite de 28 de dezembro de 1895,quando Georges Méliès, um empresário e prestidigitador do pequeno teatroRobert Houdin, em Paris, compareceu ao salão do Grand Café, convidado para aprimeira sessão do Cinematógrafo dos Irmãos Lumière.

Emmanuelle Toulet reproduz o que Méliès sentiu:

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De imediato, Méliès compreendeu a função espetacular do cinema, vislumbrandoo mundo imaginário que se abria na tela. 3

33333 Louis Lumière, com a ajuda do irmão Auguste, inventou o aparelho que permitia a reprodução técnicadas imagens em movimento, mas, ao mesmo tempo, inventou o cinema. Assim, o cinema é uma invençãocientífica, nascida da vontade de domínio do homem sobre a realidade, seguindo o mito do realismointegral e o sonho de uma recriação do mundo à sua própria imagem. A reprodução automática da realidade,preocupação científica que animou a invenção do cinema no fim do século XIX, difere da arte do espetáculoque ganhou amplitude com o cinema de Méliès.

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Em função desse imaginário fantasioso, Méliès dedicou-se à criação e à realizaçãodos procedimentos que, até hoje, fazem parte do arsenal da realização: trucagens,sobre impressões, movimentos mais lentos e muitos outros jogos cinema-tográficos.

A forma de espetáculo concebida por Méliès, muito cedo, encontrou empresáriosque iriam cercá-la de meios.4

No início, eram apenas complementos de espetáculos de vaudeville, assistidoscada vez mais por uma multidão em que predominava uma platéia composta deoperários e trabalhadores de escassa renda. Porém, logo, a classe média seinteressou pelo cinema. Os filmes, então, ocuparam salões que ficavam lotadoscom todo tipo de gente disposta a se divertir ou se maravilhar com as imagensem movimento projetadas na tela.

Assim, o cinema, rapidamente, revelou sua função de festa e prodígio.

À medida que o mercado de produção e distribuição que se iniciava exigia umaintensificação programática a fim de atrair o público e mantê-lo interessado, asformas materializadas daquela “recriação do real” logo se diversificavam epassavam a incluir, além das famosas “vistas” de Lumière, fatos de repercussãosocial, paisagens de lugares distantes, óperas, dramas e comédias tirados depeças teatrais, espetáculos mágicos e circenses.

Esses motivos, ao mesmo tempo que se multiplicavam, foram sendo repetida-mente utilizados pelas produtoras e distribuidoras que os organizavam emcatálogos para os programas de exibição.

Dessa maneira, a indústria de filmes ia se construindo entre a diversidade e aprevisibilidade, baseada em dois pólos: inovar para sobreviver e repetir paragarantir um padrão.

44444 É claro que, ao lado dessa função de espetáculo de divertimento, o cinema muito cedo revelou, paraalguns realizadores, as possibilidades de exercer uma função política e ideológica em que se proclamavaa ideologia politizada do meio e até se teorizava sobre ela, como é o caso do americano David Wark Griffith(Nascimento de uma nação, 1915, e Intolerância, 1916) e do soviético Seguei Eisenstein, em seus filmese escritos. Além disso, também muito cedo, começavam as preocupações com a transformação ideológicado cinema em uma “arte”. Nos primórdios do século XX, na França, os irmãos Laffitte chegam a fundar asociedade Le Film d´Art, esperando dar ao cinema um toque de “nobreza artística”, inexistente até então.

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#$* Constituiu-se, assim, a experiência cinematográfica. Do ponto de vista institucional,

a existência de uma noção de gênero se deve a esse tipo de experiência, queengloba a repetição e a inovação.

Embora no âmbito da estética a idéia do “novo” seja motivo de desacordo entreaqueles que a atribuem aos valores pregados pelo romantismo e aqueles que avêem como um modo politizado de tornar um produto cultural acessível, nivelando“alta cultura” e “cultura de massa”, um filme de gênero sempre depende dessa“combinação de novidade e familiaridade. As convenções do gênero sãoconhecidas e reconhecidas pelo público e tal reconhecimento já é, por si só, umprazer estético”. (BUSCOMBE, 2005, p. 315).

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O cinema no Brasil começa sob o signo da perspectiva industrial e da importaçãode modelos. Em torno desses dois eixos gira toda a produção, realização e difusãode filmes no País, nas primeiras décadas do século XX.

Quanto ao primeiro, é fato que a primeira geração de produtores e distribuidores defilmes a atuar nas cidades brasileiras estava mais interessada na rentabilidade comercialdo cinema, não se podendo falar em idéias organizadas com uma determinada finalidadeque não aquela de investir e lucrar com o novo meio de entretenimento.

Quanto ao segundo, é relevante considerar a chegada de imigrantes que aquiaportavam em busca de trabalho e o seu direcionamento para a indústria deentretenimento.

Muitos desses imigrantes tinham facilidades de ida e vinda e contatos deixados emseus lugares de origem e podiam estar em dia com a disseminação do cinema pelomundo. Foram eles que se encarregaram de formar um público de espectadores noBrasil, trazendo do estrangeiro as projeções luminosas sobre uma tela branca.5

55555 Exemplar é o caso de Pascoal Segreto, um italiano que, aos 28 anos de idade, era empresário doPantheon Ceroplástico, um museu de cera que se apresentava em vários logradouros do Rio de Janeiro,por volta de 1896. Acostumado a investir no mundo dos espetáculos, Segreto introduziu o primeirocinematógrafo permanente no Brasil: o Salão de Novidades. Antes dele, o público havia já visto oKinetographo, trazido pelo empresário português Aurélio da Paz Reis, que estreou em 15 de janeiro de1897; o Cinematographo Edison, apresentado pelo prestidigitador espanhol Enrique Moya; o Animatographo,do professor italiano Vittorio di Maio e o Cinematographo Lumière, apresentado pelo francês Henry Picolet.

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Além disso, a precária situação econômica de grande parte da população do Paísimpedia o investimento de empresários, técnicos e profissionais na área. Nossasindústria e tecnologia, quase inexistentes, também se mostravam incapazes defabricar máquinas de cinema.

Todos esses fatores contribuíram para atrair a atenção dos centros produtores edifusores do cinema no mundo, que demonstraram um especial interesse pelomercado brasileiro.

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Quanto à realização de filmes em nosso país, ela parece ter se iniciado tambémdentro do princípio ontológico de reprodução do real que guiava as primeirasproduções de Lumière, bem como a de tantos realizadores europeus e americanos.

Em 19 de junho de 1898, Afonso Segreto faz o registro da baía de Guanabara, debordo do navio Brésil que o trazia da França. O jornal A Gazeta de Notícias, doRio, no dia 20 de junho de 1898, noticia o fato aos leitores:

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A partir dessa primeira “vista”, se inicia uma diminuta produção em que os filmeseram pequenos, feitos com tecnologia precária, destinados à exibição nas salasde divertimento que apareciam, principalmente, no Rio de Janeiro.

Logo, as vistas e as paisagens que se multiplicavam começaram a dividir oespaço com filmes que recheavam o universo de interesse dos habitantes do Rioe de outras cidades. Registros de casos policiais famosos, melodramas, filmes

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carnavalescos, ao mesmo tempo que forneciam ao público uma diversidade deescolha dentro de um panorama comum a todos, consolidavam-se na sucessãodessas mesmas escolhas.

Sempre atento às tendências dos filmes estrangeiros que faziam sucesso naépoca, o próprio Segreto produziu filmes ligeiros, como Beijos de amor e Umcolegial numa pensão, os quais reproduziam cenas cômicas da vida cotidiana.

O ano de 1908 marcou o início de uma fase áurea do cinema brasileiro, com umaprodução intensa. A demanda do público se tornava cada vez maior com aascendência de uma classe burguesa urbana e uma intensa população demigrantes. Os espectadores já então se tinham habituado ao novo entretenimento,exigindo a ampliação do número de salas exibidoras e a variação dos filmes.Nessa época, romancistas, dramaturgos e caricaturistas começaram a seinteressar em escrever para o cinema.

Grande parte da instalação dessa fase se deveu à participação de proprietáriosdas salas de exibição, os quais resolveram investir na produção cinematográfica.6

A pesquisadora Anita Simis registra 963 produções nesse período, no País.“Grande parte desses filmes eram de curta metragem, sendo vários delesdocumentários e tomadas de vistas e um quarto de ficção produções, 763 eramfilmes curtos, como documentários e tomadas de vistas (768) e um quarto deficção (240)”. (SIMIS, 1996, p.72).

Construíam-se estúdios e neles eram realizadas películas que iriam competircom as fitas estrangeiras exibidas. Mas, em geral, os realizadores continuavamseguindo os modelos genéricos vindos “de fora” e que obtinham sucesso.Proliferavam os documentários; as vistas; os filmes falantes e os cantantes,sincronizados com o som de fonógrafos; os filmes sacros; os chamados “filmeslivres”, proibidos para mulheres e crianças; as comédias e os policiais. Estesúltimos se destacavam entre os modelos narrativos.

66666 Quanto às salas de exibição, nos primeiros tempos do nosso cinema, eram inexistentes. Depois, poucoa pouco, foram surgindo salas esparsas, funcionando em circos, teatros, pavilhões eventuais e mesmoem locais de consumação de bebidas e comidas, como os cafés-concerto e, quase sempre restritas aoscentros mais adiantados, como Rio e São Paulo.

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As comédias, sobretudo aquelas que repassavam repetidamente um “estar” cínicoda realidade brasileira, caíam no gosto do público. Tornavam-se o gênero maispopular de cinema.

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A introdução do fator “brasileiro” se constitui em dado mais que importante nagênese genérica dos filmes, ao lado da vontade industrial e da importação demodelos.

A primeira comédia de enredo foi Nhô Anastácio chegou de viagem (1908), deJulio Ferrez, filme de menos de quinze minutos, produzido por Arnaldo Gomes deSouza e Marc Ferrez.

Nhô Anastácio chegou de viagem mantinha, com humor e alguma ironia, um fionarrativo que ainda não havia sido explorado e pode-se afirmar que trazia umcaipirismo bem brasileiro.

O primeiro policial foi Os estranguladores (1908). O filme era a adaptação deuma peça teatral contando uma rebuscada história de dois assassinatos em 40minutos – tempo demasiado para os filmes da época – que alcançou grandesucesso – mais de 800 exibições – tendo sido produzido pela Photo-CinematografiaBrasileira, sociedade do cinegrafista português Antonio Leal com o ex-comercianteJosé Labanca.

Nessa vertente policial, também em 1908, foi produzido O crime da mala, pelaempresa Francisco Serrador, no qual se reconstituía o assassinato de Elias Farah,por Miguel Traad, que esquartejou a vítima e tomou um navio com intenção dejogar os pedaços do cadáver no mar, mas acabou sendo preso. O filme apresentauma mistura de fato ocorrido com ficção, com registros autênticos dos locais docrime e do julgamento do assassino. A união de imagens encenadas com imagensdocumentais resulta em uma fórmula que começa a dar o tom em algumasproduções brasileiras, tais como Noivado de sangue, Um drama na Tijuca e Amala sinistra, sendo este último uma versão do mesmo crime da mala.

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#%! Esses dois tipos de filme repetiam ou criticavam o cotidiano dos habitantes das

cidades, em especial do Rio de Janeiro, em ritmo de crescimento, aumento dapobreza e implantação de valores sociais, incitando o voyeurismo do público queia ver, no cinema, os fatos urbanos domésticos, pitorescos ou violentos.

Paz e amor (1910), de Alberto Botelho, é uma comédia que já mesclava fragmentosde outros gêneros.7 O título se referia a uma frase do Presidente Nilo Peçanhaque, ao assumir o cargo, teria dito aos repórteres: “Farei um governo de paz eamor.” No filme, que era dividido em quatro partes, cinco quadros e duasapoteoses, eram criticados os acontecimentos da campanha civilista, os políticosnacionais e os costumes da cidade.

Nesse período, os filmes que aqui chegavam ou aqueles que aqui eram produzidostinham duas possibilidades de distribuição: ou eram exibidos nas salas de projeçãodas grandes cidades ou ficavam destinados à exibição ambulante. “Pelo paísafora seguiam cinegrafistas itinerantes registrando coisas e projecionistasexibindo-as, bem como ao material importado de séries de filminhos de diversasproveniências.” (FINGUERUT, 1986, p. 3).

Em 1915, veio morar em São Paulo o italiano Vittorio Capellaro, responsávelpela produção dos primeiros épicos e de adaptações literárias no País. E, em1919, Gilberto Rossi e José Medina produziram, também em São Paulo, Exemploregenerador, filme considerado de bom padrão técnico e artístico.

Assim, o grosso da produção fílmica que, de 1912 a 1922, situava-se no Rio deJaneiro, alastrou-se para outros estados. A atividade produtiva causou osurgimento de revistas especializadas em cinema, bastante lidas na época, emespecial Para Todos, Selecta e Cinearte Esta última abriu um caminho para quese pensasse nas possibilidades do uso do cinema com fins de educar a juventudebrasileira, através de gêneros “educativos”.

Mas, desde 1911, com a chegada da primeira leva de capitalistas norte-americanos interessados em investir em cinema no Brasil, os filmes estrangeiroscomeçaram a tirar espaço das produções feitas no Brasil, fato que foi seintensificando, causando progressiva regressão na produção local de tal forma

7 7 7 7 7 Pode-se dizer que Paz e Amor é um filme verdadeiramente precursor da identidade genérica daschanchadas.

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que, ao fim da década de 10, a produção cinematográfica brasileira entrava emcrise e passava a sobreviver com a ajuda da filmagem de jornais e documentáriosque, então, se transformavam em um gênero básico para o mercado exibidor.

Por alguns anos, o cinema brasileiro sobreviveu quase exclusivamente doscinejornais e dos filmes de cavação, um tipo de filme encomendado ou vendidoàs figuras proeminentes ou ricas que neles apareciam.

A anulação da farta fase produtiva pode ser creditada a alguns fatores que afetaramo mercado cinematográfico no País. Um desses fatores, a dificuldade em importarmaterial, por ocasião da Guerra de 1914, prejudicou em muito a produção fílmica.Além disso, os Estados Unidos se aproveitaram do envolvimento da Europa noconflito para intensificar uma política agressiva de exportação de produtoscinematográficos para países como o Brasil.

Não deixa de ser interessante que, por essa ocasião, o técnico americanoWilliam S. Jansen juntou-se a comerciantes brasileiros para fundar uma empresacinematográfica, a Brasil Film, depois denominada Sociedade Anônima Omega Film.

A Omega Film pretendia produzir filmes baseados em autores literários, comédiase dramas históricos dentro de um modelo que apresentasse a novidade do aspectobrasileiro a ser exportado para os Estados Unidos.

Em junho de 1919, a produtora mostrou seu filme Urutau em sessão paraconvidados e jornalistas. O filme tratava de uma pretensa lenda indígena, apoiando-se em uma mistura narrativa repleta de exotismo, cercada de pretensas matas,cachoeiras, plumagens e modo “selvagem” de vida. Foi veementemente louvadopela crítica como sendo um dos grandes esforços já feitos, no Brasil, para implantara arte e a indústria do cinema, dentro de propostas para educar, divertir eengrandecer o povo brasileiro.

Apesar do entusiasmo com que foi recebido pelos comentaristas, o filme nuncaestreou comercialmente. E, com a volta de Jansen à América do Norte, a OmegaFilm foi extinta, tendo o filme desaparecido juntamente com o produtor.

A chegada da tecnologia do som a Hollywood modificou o cinema em todo o mundo.

Em 6 de outubro de 1927, estreava, nos Estados Unidos, o primeiro filme falado ecantado: O cantor de jazz (The jazz singer), produzido e realizado pela Warner Bros.

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#%( A Warner Bros ocupava um lugar relativamente à parte entre as grandes produtoras

pelo modo como aplicava seus recursos econômicos e, desde muito, haviacomeçado a investir na adaptação de um dispositivo de sincronização sonorapara seus filmes. Em julho de 1928, a companhia lançava The lights of NewYork, o primeiro filme falado de gangster.

Entre nós, o fim da era do cinema mudo intensificou o trabalho de importação defilmes americanos. Porém, estimulado pelo sucesso de Barro humano (1929),Adhemar Gonzaga conseguia já recursos para fundar um grande estúdio, a Cinédia,pioneira em filmes musicais, na esteira dos filmes musicais hollywoodianos quea tecnologia sonora havia deslanchado.

Instalada no bairro carioca de São Cristóvão, a Cinédia era dotada de parâmetrostécnicos, bem-equipada e tinha nítida inspiração nos estúdios de Hollywood,desenvolvendo uma produção regular, com palcos simultâneos, equipamentosde qualidade e pessoal contratado em regime permanente.

A exemplo dos americanos, os filmes cantados e dançados brasileiros da décadade 30 operavam sob a forma de backstage musical da época.8

No backstage a estrutura narrativa se alicerça em uma história que apenas serve depretexto para que danças e canções sejam encenadas. Foi essa forma fílmica quepermitiu, rapidamente, uma vinculação dos musicais, no Brasil, com o rádio e com aindústria fonográfica, atuando, especialmente dentro de um modelo carnavalesco.

Na Cinédia foram produzidos A voz do carnaval, em 1933, e Alô, Alô, Brasil,1935, dirigido pelo norte-americano Wallace Downey, representante dos discosColumbia em São Paulo. Em sua realização, esse filme contava com uma imensaconstelação de estrelas do rádio e do mercado fonográfico.

Em 1936, a Cinédia lançava um filme carnavalesco que alcançou enorme sucesso,Alô, Alô, Carnaval. E em 1939, era produzido Banana da terra, filme em queCarmen Miranda se despedia do cinema no País.

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88888 Em oposição ao backstage musical, o integrated dance musical busca integrar os números de dança aoprocesso diegético do filme, expressando situações da narrativa e integrando-se a elas.

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De repente, em determinado momento (talvez por volta da década de 40), portodo o País, ouvia-se a palavra chanchada.

“Não se sabe ao certo quem primeiro a empregou entre nós, mas tudo indicaque, antes de se estabelecer por aqui, ela tenha feito baldeação na Argentina.”(AUGUSTO, 1989, p. 17).

O nome chanchada serve a um cinema em que tudo se faz sobre a necessidadede negociar com o público e não de educá-lo ou de instruí-lo. E, sobretudo, sobrea necessidade de adaptar os gêneros fílmicos a uma “brasilidade” que nadatinha de cópia dos modelos estrangeiros.9

Os espectadores das chanchadas ansiavam por filmes populares e alegres, semse importar que fossem ou não profissionalmente bem-acabados ou quecontivessem refinadas mensagens.

Pode-se dizer que o espírito da chanchada locou-se no Brasil, desde a chegadado espetáculo cinematográfico, quando se consolidou a tradição de uma produçãodestinada a entreter certo tipo de público, anteriormente voltado para o circo e oteatro. Desse modo, a popularização dos filmes se fez sentir desde os primeirosmomentos, apesar dos protestos daqueles que pretendiam uma cultura mais“artística” para o País.10

99999 Alguns críticos mais radicais afirmam que as chanchadas eram cópias de modelo hollywoodiano.Naturalmente que, para alguns, cópias inferiores. No entanto, a fórmula de Carnaval no Fogo (1949),apontada como cópia dos filmes da dupla Jerry Lewis e Dean Martin, foi pensada antes da primeiracomédia de Lewis e Martin, Amiga da onça (My friend Irma), produzida em 1949 e lançada no Brasil algumtempo depois que Alinor Azevedo e Watson Macedo já tinham terminado Carnaval no Fogo.

1010101010 Os intelectuais sempre temeram o entretenimento, pois sabiam bem que este ameaçava a fragilidadecultural. O entretenimento vinha ocupar um lugar dos sentidos que a razão e a mente tentavam cooptar. Oentretenimento vinha substituir o sublime pelo divertido. Desmerecer o entretenimento era, portanto, umaquestão de poder.

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#%$ Não é coincidência que o desprezo de um certo tipo de intelectualidade pe-

las chanchadas seja o mesmo que as elites culturais, por longo tempo, mantiverama respeito do entretenimento das massas. Afinal, um dos dogmas da cultura eruditaera que a arte exigia esforço para ser apreciada, sobretudo esforço intelectual, masque o entretenimento não fazia exigência alguma ao intelecto.

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As chanchadas se constituíram sobre uma coletânea de gêneros já reconhecidossem maiores dificuldades pelos espectadores brasileiros, mesclando melodrama,drama romântico, aventura, policial e, sobretudo, musicais e comédia.

Em suas relações com o cinema no Brasil, as chanchadas constituem uma topografiaque se afirma não como um lugar de proveniência e fim de algo, mas uma terra deconvergência para todas as orgias do imaginário cinematográfico, repletas de deusas,personalidades do mundo social e político, indígenas, faraós, gangsters, bailarinas,figuras bíblicas, personagens teatrais, enfim, uma desmesurada gag cultural embaladapor músicas carnavalescas e por adaptações populares de peças eruditas.

Pode-se dizer que a terra das chanchadas está fundamentada sobre o territóriodo cinema brasileiro, mais precisamente sobre as idéias que nele pairam, e seconfigura, ela mesma, em arquipélago enunciativo, feito de associações,aproveitamentos, cópias, montagens, cruzamentos e permutas de outros gêneros,incessantemente em combinação.

Na rede cruzada de fragmentos que vão organizando as histórias, o nome chanchadase confunde com outros, como aquele que viria a designar o lugar produtor de chanchadaspor excelência: a Atlântida, que, no entanto, “não foi o único celeiro da chanchada,apenas o mais antigo e produtivo (62 filmes de ficção e dois documentários em 20anos de atividade) por conseguinte, o mais célebre”. (AUGUSTO, 1989, p. 30).

A Atlântida foi oficialmente fundada em 18 de setembro de 1941, por MoacyrFenelon, Edgard Brasil, José Carlos Burle, Arnaldo de Farias e Alinor Azevedo.11

1111111111 A marca da produtora, a não ser pelo chafariz jorrando água em abundância, em nada lembrava autópica cidade-estado de Atlântida, sonhada por Platão e devorada pelo oceano, cujos habitantes eramsábios e portadores de grandes riquezas.

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Com o nome de Atlântida Empresa Cinematográfica do Brasil S.A., pretendia seruma fonte de produção de filmes brasileiros que, ao lado do apuro técnico, exi-bissem um conceito de identidade cultural do Brasil.

Em seu depoimento ao Museu da Imagem e do Som do Rio de Janeiro, em 5 deagosto de 1969, Alinor de Azevedo conta de que maneira participou da fundaçãoda companhia:

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O Manifesto da Atlântida – que era “propagandista, para inspirar a confiançanos compradores de ações da Companhia”, segundo Alinor – é, possivelmente,a primeira demonstração, no meio cinematográfico brasileiro, de consciência danecessidade de adequar a produção e a proposta de industrialização à realidadeconcreta do mercado.

A Atlântida tentou, desesperadamente, colocar isso em prática. Tomando AlinorAzevedo como exemplo, pode-se ter uma idéia de quanto seus idealizadorespretendiam fazer um cinema engajado, de acordo com seus ideais de cultura epolítica no Brasil, mas tiveram que se render a filmes de entretenimento popularpara continuar industrialmente atuando.12

Era de Alinor o roteiro de Tumulto, o primeiro longa-metragem da Atlântida, quenunca foi filmado. Na produtora, ele fez ainda Asas do Brasil (1947), Luz dosmeus olhos (1947), Terra violenta (1948), todos filmes baseados em nossouniverso sociocultural.

Então, veio uma fase intensa de chanchadas produzidas na Atlântida. Apoiadoem uma idéia de Anselmo Duarte, em 1946, Alinor Azevedo fez o roteiro deCarnaval no Fogo, filme que conseguiu sintetizar o modelo ideal do gênerochanchadesco no Brasil.13

1212121212 Alinor Azevedo era o cérebro da Atlântida. Foi um dos mais importantes roteiristas do País.

1313131313 Na Atlântida, Alinor Azevedo ainda trabalhou em roteiros originais, diálogos e adaptações parachanchadas e outros tipos de filme: Caçula do barulho (1949), Também somos irmãos (1949), Aviso aosnavegantes (1950), A sombra da outra (1949), Não é nada disso (1950), Maior que o ódio (1951).

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#%* O imenso sucesso de bilheteria de outra chanchada, Este mundo é um pandeiro

(1946), escrita por Hélio Soveral, tinha atraído Luiz Severiano Ribeiro o maiorexibidor do País e dono da distribuidora União Cinematográfica Brasileira, quepassou a investir na produtora.

Severiano Ribeiro estava motivado, sobretudo, pela Lei 20.493 (sancionada noinício de 1946), que obrigava todos os cinemas a exibir pelo menos três longas-metragens brasileiros por ano, ou seja, um filme a cada quatro meses.

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A verticalização empreendida pelo empresário foi fundamental para a longevidadee a continuidade das atividades da produtora que passou a contar com umaequipe de realizadores como Watson Macedo, José Carlos Burle e Carlos Manga.Instalou-se, também, um sistema de estrelas e astros, alguns exclusivos daAtlântida, como o casal romântico dos filmes, Eliana e Anselmo Duarte e cômicoscomo Oscarito e Grande Otelo.

Na década de 50, a Atlântida se transformou em uma verdadeira fábrica dechanchadas, obtendo imenso sucesso comercial. Sucediam-se as chanchadasde sucesso como Nem Sansão nem Dalila (1954) e O homem do Sputnik (1959).14

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1414141414 A par das chanchadas, a Atlântida não deixou de produzir filmes “sérios” como já havia produzidoVidas solidárias (1945), de Moacyr Fenelon e Também somos irmãos (1949), de José Carlos Burle. AAtlântida produziu Luz dos meus olhos (1947), onde José Carlos Burle lançou a atriz Cacilda Becker; Terraviolenta (1948), e o policial Amei um bicheiro (1952), de Jorge Ileli e Paulo Wanderley.

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Também a partir de 1950, a experiência cinematográfica dos espectadoresbrasileiros passou a contar com uma indústria cinematográfica disposta a explorarfatos tais como a volta de Getúlio Vargas ao poder, eleito pelo voto direto, asnovidades da industrialização, o êxodo rural e o crescimento das cidades brasileiras.

Nessa década, desenvolve-se o modelo institucionalizado de um ethos cultural brasi-leiro que a política desenvolvimentista do governo fazia questão de acentuar. Carna-val, samba, bons malandros e os olhos verdes da mulata povoam os gêneros fílmicosproduzidos no País, até a irrupção do Cinema Experimental e do Cinema Novo.15

No fim dos anos 60, aparece a pornochanchada, uma forma de cinema que, semal- adivinhada anteriormente aqui e ali, irrompe, finalmente, em decorrência dacrise institucional do cinema no Brasil.

Para muitos, a crise que se apresenta como decorrência de fatos políticos quedesencadeiam violenta censura aos meios de comunicação, propiciou o surgimentoda pornochanchada.

Mas o pesquisador Gelson Santana apresenta uma versão mais bem fundada noaparato institucional do cinema brasileiro, quando remete à própria precariedadeque rege esse meio:

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Esse deslocamento de uma explicação de raiz sociológica (a crise política) paraum dado tecnologicamente ancorado na produção e realização de filmes se tornafundamental, dentro da visão institucional do cinema:

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1515151515 O fim da Atlântida, em 1962, se deve a uma série de filmes mal-sucedidos e ao advento do CinemaNovo e da televisão no País.

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#%& As pornochanchadas, quer as produzidas no Rio, quer as feitas na Boca do Lixo

paulista, eram o tipo de filme com uma produção barata e disposta a produzir umfilme com o lucro imediato de outro filme.16

Na década de 80, com a invasão dos filmes eróticos estrangeiros, a pornochan-chada assumiu um caráter mais explícito:

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Essas formas que materializavam, escancaradamente, o aspecto pornô emergiramdas instâncias externas que, ao longo da história do cinema brasileiro, foramestruturando os atos de produção e difusão, em conjugação com os aspectostécnicos e tecnológicos e com as alternativas estéticas e narrativas dos filmes.

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As formas de produção de chanchadas e de pornochanchadas foram concebidasno triplo cruzamento que moveu a produção de filmes no País, desde seusprincípios: modelos importados, que faziam sucesso entre nós, e eram, já,devidamente conhecidos e reconhecidos pela formação cinematográfica do público;modelos voltados para aproveitamento daquilo que a instituição cinematográficaconsiderava “a nossa cultura”; modelos adaptados à rentabilidade econômicade produção e difusão e às injunções técnicas e tecnológicas existentes no País.

Dessa integração de modelos foi feito o cinema brasileiro de gêneros.

Os gêneros foram emergindo como possibilidades de organização e estruturaçãocinematográficas dentro de nossas possibilidades e precariedades, e foram seorganizando com o fim de garantir as expectativas do público.Gênero no Brasil éa experiência que resulta desse enlace institucional que une a indústria do ci-nema com o modo de combinar as imagens e os sons.

1616161616 O cinema da Boca do Lixo respondia por mais de 50% da produção brasileira da década de 70.

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RESUMORESUMORESUMORESUMORESUMO

O presente artigo pretende, a partir de uma análise das características da sociedade contem-porânea, refletir sobre as novas necessidades das organizações quanto à área de comunicação.Dessa forma, parte-se da investigação de quais são os atributos que o profissional de comunicaçãodeve desenvolver para formular e implantar estratégias eficazes, bem como quais metodologias eprocessos podem auxiliá-lo nessa tarefa. Sendo assim, este trabalho apresenta um estudo sobrea importância da informação para a criação de estratégias e sobre a contribuição que metodologiasde processamento da informação, como a vigília e a inteligência estratégicas, podem gerar paraa atividade de relações públicas.

Palavras-chavePalavras-chavePalavras-chavePalavras-chavePalavras-chave: Novas tecnologias de informação e comunicação. Informação. Vigília estratégica.Inteligência estratégica. Relações públicas.

ABSTRACTABSTRACTABSTRACTABSTRACTABSTRACT

This paper intends, from the analysis of the characteristics of a contemporary society, to reflectabout the new organizational necessities in the field of communication. It refers to the necessaryattributes of the communication professional in order to shape and to establish efficient strate-gies as well as processes and methodologies like Strategic Intelligence.

Key words: Key words: Key words: Key words: Key words: New technologies of information and communication. Information. Strategic Vigil.Strategic Intelligence. Public Relations.

11111 Doutora em Ciências da Informação e da Comunicação pela Université de Poitiers – França. Professora/Pesquisadora no Departamento de Comunicação da Universidade de Caxias do Sul (UCS). E-mail:[email protected].

22222 Doutora em Comunicação Social pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS).Professora/Pesquisadora no Departamento de Comunicação da Universidade de Caxias do Sul (UCS). E-mail: [email protected].

33333 Mestre em Tecnologia da Educação pelo Instituto de Pesquisas Espaciais, Inpe/CNPq de São Paulo.Diretor/Professor/Pesquisador no Centro de Ciências Humanas e da Comunicação da Universidade deCaxias do Sul (UCS). E-mail: [email protected].

44444 Bacharel em Relações Públicas pela Universidade de Caxias do Sul (UCS).

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! grande desenvolvimento das novas tecnologias de informação provocouprofundas modificações no comportamento da sociedade contemporânea,criou novas formas de ação e interação e assim transformou a organização

espacial e temporal da vida social. Thompson5 analisa os principais impactosque os meios de comunicação trouxeram à sociedade contemporânea, destacandocinco pontos principais de repercussões:

1. reorganização do espaço e do tempo: antes dos meios de comunicação, oconceito de simultaneidade pressupunha que, para assistir a um determinadoacontecimento, era necessário estar presente no ambiente-evento. Se isso nãofosse possível, o conhecimento era adquirido através de relatos de outras pessoassobre o fato. Com o desenvolvimento dos meios de comunicação, a interação sedissocia do ambiente, permitindo que indivíduos interajam com situações oupessoas mesmo estando em espaços diferentes;

2. transformação da visibilidade: no momento em que as interações se tornamindependentes do compartilhamento do mesmo ambiente físico, os eventosenvolvendo, tanto os fatos como as pessoas adquirem maior visibilidade. Issoporque há um aumento significativo do número de pessoas que passam a terconhecimento de uma determinada situação. Políticos e líderes sociais tiveramque se adaptar a essa nova visibilidade;

3. a globalização da comunicação: a crescente interconexão entre os diferentespontos do mundo possibilita que atividades aconteçam numa arena que é global.Possibilita também que atividades sejam organizadas, planejadas ou coordenadasnuma escala mundial envolvendo algum grau de reciprocidade e interdependênciasglobais;

4. a alteração da experiência do indivíduo num mundo mediado: o desenvolvimentoda mídia aumentou a capacidade dos indivíduos de experimentarem, através dainteração mediada, experiências que dificilmente aconteceriam na interação facea face. Ou, seja, o conhecimento local do indivíduo é complementado por co-nhecimentos não locais. A compreensão do mundo é, em grande parte, modeladapela mediação de formas simbólicas;

55555 THOMPSON, John B. A mídia e a modernidade: uma teoria social da mídia. 5. ed. Petrópolis: Vozes, 2002.

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5. reinvenção da publicidade: para pensadores de dois séculos atrás, a liberdadede expressão de pensamentos e opiniões só seria garantida na medida em quea imprensa fosse independente do Estado. No entanto, com essa independêncianovas ameaças surgiram, como os fortes interesses comerciais das organizaçõesda mídia, que voltaram a colocar em questão a imparcialidade dos veículos decomunicação.

Todas essas repercussões alteraram significativamente os costumes e a culturada sociedade contemporânea que gradativamente vem se habituando a vivernum mundo interconectado. Isso fica ainda mais evidente quando se analisa oimpacto da internet e o conceito de conectividade ao qual ela remete. A internet,de certa forma, confirma a teoria de Marshall McLuhan6 , sobre a mensagem nãoestar somente embasada em seu conteúdo, mas principalmente, no meio quese utiliza para sua transmissão. Ou seja, a modificação do meio de transmissãojá é um processo transformador de nossa relação com o ambiente.

Castells7 avança um pouco mais nessa lógica afirmando que as novas tecnologiasde informação e comunicação estão acarretando uma revolução tecnológica paraa sociedade. De acordo com ele, os registros históricos mostram que umarevolução é caracterizada pela sua penetrabilidade, ou seja, está permeada emtodos os domínios da atividade humana. No caso da sociedade moderna, asnovas tecnologias têm possibilitado uma troca muito superior de informações econhecimentos, elementos que interferem em todos os aspectos da vida doindivíduo.

Castells8 cita, ainda, as principais características do paradigma da tecnologia dainformação, a fim de descrever essa revolução e diferenciá-la das anteriores. Aprimeira dessas características é que a matéria-prima dessa tecnologia é ainformação, ou seja, são tecnologias que agem sobre a informação, e nãoinformações que agem sobre a tecnologia. A segunda diz respeito ao fato deque, como a tecnologia trabalha sobre a informação, e a informação integratodos os aspectos da vida do indivíduo, todo o seu contexto acaba sendo atingidoconstantemente por ela. A terceira diz respeito à tecnologia da informação

66666 McLUHAN apud NEGROPONTE, Nicholas. A vida digital. 2. ed. São Paulo: Cia. das Letras, 1995. p. 14.

77777 CASTELLS, Manuel. A era da informação: economia, sociedade e cultura. 5. ed. São Paulo: Paz e Terra,2001.

88888 Ibidem, p. 108.

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#*$ possibilitando a formação de redes que incentivam o processo criativo. A quarta

característica trata da flexibilidade da rede, que admite sua reconfiguração,permitindo que a tecnologia acompanhe a velocidade das mudanças. E, finalmente,a quinta indica a convergência de diferentes tecnologias dentro de uma só, ashipermídias.

Dessa forma, a sociedade da informação possui características muito próprias,ou seja, nela o conhecimento e as informações circulam livremente, permitindoseu compartilhamento e, em conseqüência, o aprimoramento constante dastécnicas humanas. Eis a origem da rapidez das mudanças na contemporaneidade:novas tecnologias que possibilitam e incentivam a existência de um ambienteem intenso aperfeiçoamento.

As organizações, segundo Castells, por estarem inseridas em um contexto so-cial, tendem a copiar os modelos de relação presentes no ambiente externo. Poresse motivo, há alguns anos, quando a velocidade das mudanças era mais lenta,o principal objetivo das empresas não era antecipar oportunidades de mudanças,mas sim, preservar o status nas relações já estabelecidas. Inclusive, a mudançaapresentava-se como um risco. O objetivo era crescer quantitativamente nomercado e preservar o espaço até então conquistado.

No entanto, hoje, as organizações encontram-se diante de uma nova realidade.As mudanças não são mais um risco ou uma opção, e sim uma certeza. O contextoestá em constante reconfiguração, e as organizações necessitam acompanharesse ritmo para sobreviver. Dessa forma, as empresas começam a perceber quea vantagem competitiva está na captação de informações que dêem indicaçõesde oportunidades e ameaças. Ou seja, a estratégia de competir globalmenteresulta na capacidade da empresa de captar as necessidades do mercado edesenvolver com rapidez um produto ou serviço que responda a essa demanda.

Lévy9 afirma que quanto mais competitivo for o mercado, mais as organizaçõesprecisam se dedicar, sem cessar, à pesquisa e ao aprendizado para compreender,conceber, produzir, comunicar e vender. O mercado recompensará as empresasque souberem cultivar talentos, semear idéias e investir na sua inteligênciacompetitiva. Dessa forma, as empresas mais competitivas serão as que maissouberem cooperar, tanto internamente quanto com seus clientes.

99999 LÉVY, Pierre. A conexão planetária: o mercado, o ciberespaço, a consciência. São Paulo: Ed. 34, 2001.

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Todas essas alterações nas características do ambiente exigem uma mudançana estrutura e na cultura das organizações. De acordo com Dan Tapscot,10 asempresas, para executarem seu trabalho com sucesso na sociedade da informa-ção, necessitarão adotar uma nova estrutura de trabalho. Isso significa propor oabandono de uma hierarquia fechada para a adoção de uma hierarquia abertaem rede. O quadro! detalha como o autor descreve em tópicos as característicasprincipais dos dois tipos de estrutura:

OrganizaçãoOrganizaçãoOrganizaçãoOrganizaçãoOrganização Hierarquia fechadaHierarquia fechadaHierarquia fechadaHierarquia fechadaHierarquia fechada Hierarquia aberta em redeHierarquia aberta em redeHierarquia aberta em redeHierarquia aberta em redeHierarquia aberta em rede

Estrutura Hierarquia pirâmide Em rede

Orientação Voltada ao interior/fechada Voltada ao exterior/ aberta

Recurso-chave Bens e equipamentos Recursos humanos, informação

Posição Estática, estável Dinâmica, mutante

Pessoal Gestores Especialistas

Modo de funcionamento Recompensa e punição Comprometimento

Tipo de direção Ordens vindas de cima Responsabilidade pessoal

Fundamento das ações Controle Capacidade de agir

Motivação individual Satisfação dos superiores Objetivos a alcançar em equipe

Formação Tarefas específicas Competências estendidas

Base de retribuição Posição hierárquica Resultados obtidos, nível decompetência

Relações Concorrenciais (territórios) Cooperativas (desafioscompartilhados)

Atitude do pessoal Distanciamento Identificação

Exigências principais Gestão sadia Liderança

Quadro 1: Organização fundamentada na informaçãoFonte: Adaptado de Tapscot (1997).

Como se pôde constatar, as sociedades organizadas em rede possuem umaestrutura que permite e incentiva o compartilhamento de conhecimentos e osurgimento de novas idéias, uma estrutura que incentiva o processo criativo. Já

1010101010 TAPSCOT, Don. Economia digital: promessa e perigo na era da inteligência em rede. São Paulo: MakronBooks, 1997.

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#** a organização de hierarquia piramidal parte do princípio de que os indivíduos

pensantes da organização resumem-se a uma pequena cúpula, que define asestratégias e políticas. Esse tipo de organização possui uma posição mercadoló-gica estável, foca seu desenvolvimento nos seus bens e equipamentos, e possuiuma visão mais voltada para seu interior. Cada colaborador tem tarefas específicase se sente responsável somente por elas, porém sendo sempre controlado porseu superior. A recompensa pelo bom trabalho costuma ser a promoção parauma nova posição hierárquica, na qual se exerce maior poder sobre os outros.

Numa organização aberta em rede, o líder tem como objetivo incentivar e auxiliaros colaboradores no desenvolvimento de suas atividades e competências, e nãocontrolá-los, como na organização de hierarquia fechada. Na organização abertaem rede, tem-se um olhar atento voltado ao exterior para, assim, captarinformações que permitam o ajuste com o ambiente; o incentivo é orientado parao desenvolvimento das competências de seus colaboradores, para que se tornemespecialistas na área em que atuam; o comprometimento do funcionário é com acausa da empresa e com a da sua equipe de trabalho. Enfim, na empresa emrede, cada um possui uma visão clara de suas responsabilidades, buscandocompetência suficiente para desenvolvê-las e sendo recompensado pelos seusresultados. Para isso, o trabalho em equipe e o desenvolvimento das habilidadeshumanas constituem-se em elementos fundamentais.

Assim, parece evidente que, no contexto da sociedade contemporânea, a estruturade organização aberta em rede tem maior condição de garantir a adaptação dasorganizações, com vistas à sobrevivência. Até porque, esse modelo é capaz decomportar o desenvolvimento da inteligência organizacional, cujo conceito seráestudado ao longo do capítulo, o que já não ocorre no modelo de hierarquiafechada. Ou seja, as empresas necessitam revisar seus conceitos e escolher ca-minhos que permitam a utilização de toda essa informação que se encontra es-palhada pelos meios, para obterem bons resultados. Afinal, como relata Castells,11

a importância da revolução tecnológica não está na grande quantidade deinformações centralizadas, e sim no uso que se fará dessas informações e dessesconhecimentos para desenvolver a inovação e o aperfeiçoamento constantes.

Nessa lógica, a informação e o conhecimento (quando estáticos) não possuem ovalor em si mesmos. O valor desses elementos se encontra nos conteúdos

1111111111 CASTELLS, op. cit., p. 69.

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dinamizados pelos fluxos que os orientam e no processo de troca e de interaçãode mensagens. A comunicação é o elemento condutor de todo esse processo, eserá através dela que as organizações tornarão possível uma atitude maisconsciente e competitiva diante de seus públicos de interesse nesse contexto.Portanto, o profissional de comunicação, para atuar com competência nasociedade contemporânea, deve possuir uma visão sistemática e estratégica deseu ambiente interno e externo.

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Dessa forma, como defende também Bueno,13 a comunicação passa a integrar oatual processo de gestão e partilha do conhecimento, incorporando sua prática esua filosofia ao chamado capital intelectual das organizações.

A função de relações públicas, dessa forma, apóia-se em metodologias, empesquisas, no desenvolvimento de novas teorias para novas situações e apóia-se, sobretudo, na necessidade de dotar a comunicação de um novo perfil, depassar de uma função tácita para uma função estratégica.

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Fayard14 se refere à estratégia como a arte de saber usar as forças do ambientepara gerar uma determinada situação. De acordo com ele, estratégia consisteem combinar, no tempo e no espaço, meios heterogêneos a serviço de um fim.Para tal combinação, é necessário um conhecimento profundo de si mesmo, dooutro e do ambiente, para, dessa forma, identificar o momento de agir, o melhorlocal de ação, o inimigo, os meios e a forma de como usá-los para atingir umobjetivo.

1212121212 KUNSCH, Margarida Maria Krohling. Obtendo resultados com relações públicas. São Paulo: PioneiraThomson Learning, 1997. p. 146.

1313131313 BUENO, Wilson da Costa. Comunicação empresarial: teoria e pesquisa. Barueri: Manole, 2003.

1414141414 FAYARD, Pierre. O jogo da interação: informação e comunicação em estratégia. Caxias do Sul: Educs,2000. p. 59.

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#*& Ainda segundo Fayard,15 a informação é um dos elementos essenciais da

estratégia e é possível verificar a existência de oito elementos principais, todosinterligados, que são fundamentais para a formulação de uma estratégia eficaz.O primeiro deles é a informação, que aponta para a necessidade de estar atentoàs informações, com o olhar focado naquelas que realmente interessam, paraassim compreender e identificar onde, quando e de que forma agir. Fayard alertaque o valor estratégico de uma informação cresce em proporção inversa à suaprevisibilidade e à sua distribuição em longa escala. A informação mais valiosanão é aquela à que todos têm acesso, pois dessa todos têm consciência, massim aquela que proporciona um diferencial nas ações. Ele ressalta também queo mais importante na questão das informações não é seu acúmulo, mas sim oseu cruzamento e enriquecimento de acordo com os interesses do gestor, para aprodução de um novo conhecimento.

O domínio da informação proporciona o segundo elemento que é a liberdade deação. Quanto mais informação o estrategista possuir, maior será a sua liberdadede ação, pois somente através do conhecimento do contexto é possível identificaros momentos e os locais em que existe liberdade para a ação. No momento emque se tem conhecimento de si e do outro, sabe-se o momento exato, tanto dese lançar quanto de recuar.

Através da liberdade de ação é possível administrar o terceiro elemento: aeconomia dos meios. A partir do momento em que se tem pleno conhecimentodas habilidades e das armas do adversário, é necessário organizar os recursosdisponíveis de forma que se possa tirar o máximo proveito dos meios. Paraexemplificar o princípio da economia dos meios, Fayard propõe que se pense naseguinte situação: um indivíduo participará de uma corrida de cavalos com trêsanimais: um forte, um médio e um fraco. Ele possui pleno conhecimento de seuoponente e sabe que os cavalos do concorrente também são um forte, um médioe um fraco. Esse indivíduo sabe que os cavalos são o seu meio de ganhar acorrida e ele terá que usar os três, assim como seu oponente também terá queusar os três. Como esse indivíduo pode organizar seus cavalos para ganhar acorrida? De acordo com o princípio da economia dos meios, ele sacrificará seucavalo fraco para correr com o forte do seu oponente e perderá uma corrida. Mascolocará seu cavalo médio correr com o fraco do seu oponente, e seu cavaloforte correr com o médio dele. Serão duas vitórias e uma derrota. Ou seja, esse

1515151515 FAYARD, op. cit.

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princípio sugere organizar os meios de forma que se possa tirar um proveitomaior de sua utilização. No entanto, para isso, é preciso ter um conhecimentodos meios que temos para utilizar, e dos meios que o oponente tem. Sem essasinformações torna-se impossível fazer essa combinação.

O quarto elemento diz respeito à formação de um sistema comunicante. É acomunicação que permite a coesão e a organização de duas ou mais partes doorganismo. Para que as partes ajam de forma organizada e coerente com o todo,elas precisam ter as informações e orientações necessárias para cumpriremsuas tarefas. E é através dos canais de comunicação que circulam as orientaçõese as informações, e é através deles que os líderes controlam, monitoram e dispõemsuas equipes e seus meios.

A organização de um sistema comunicante possibilita o quinto elemento, o domínioda interação das vontades. Ele consiste em saber estabelecer uma comunicaçãocom o outro, a fim de fazê-lo realizar as ações desejadas. “Não é o sedutor queconquista, mas o seduzido que sucumbe às suas próprias tendências, às suasexpectativas, às suas esperanças e aos seus sonhos.”16 É induzir o oponente acrer em informações que o levem a realizar ações favoráveis às nossas estratégias.

O sexto elemento é a geoestratégia. Consiste em conhecer o seu ambiente,saber posicionar-se e mover-se nele. É ter um conhecimento do terreno quepossibilite identificar os espaços que o outro ocupa e os que se encontramlivres, assim como, também, entender o espaço que estamos ocupando. Ageoestratégia, metaforicamente, pode ser exemplificada através do jogo de go,onde o objetivo é ocupar os espaços vazios e restringir a movimentação doadversário. “Aquele que vê longe e combina conhecimento, mobilidade e conexõeslongínquas, dispõe de uma potência desmedida em relação ao seu tamanho.”17

A cronoestratégia constitui o sétimo item. Ela cobre a pesquisa e o domínio dotempo e dos ritmos de si mesmo e dos outros. Permite jogar com o tempo eidentificar a hora de agir e de recuar. O autor exemplifica o uso da cronoestratégiaatravés das artes marciais dos samurais. Os samurais usam o interstício dotempo como o momento ideal para atacar o oponente. O interstício se refere aoexato momento em que há uma parada para o início de outro movimento. Por

1616161616 Ibidem, p. 53.

1717171717 Ibidem, p. 45.

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#"! exemplo, quando se joga uma bola para cima, existe um pequeno intervalo de

tempo que a bola fica parada antes de cair novamente. Assim também acontececom nossos movimentos, quando se acaba um movimento e inicia-se outro, háum pequeno intervalo de tempo. De acordo com os samurais, esse intervalo detempo é o melhor momento para atacar o oponente, pois ele não estará preparadopara se defender. Para localizar esse momento exato, é necessário conhecer oritmo de movimentação do inimigo.

O oitavo e último elemento é a decisão. A arte da estratégia consiste em pensarnas interações com os outros atores, sejam elas conflituais ou cooperativas, afim de prever conceitualmente a resolução mais adequada. Porém, de nadaadianta todo o conhecimento do contexto, se não se tomar nenhuma postura,posição a partir disso. A estratégia é constituída de ações com base noconhecimento adquirido.

Os elementos que constituem a estratégia, na visão de Fayard, são interligadose dependentes. De um bom conhecimento da situação e da análise dasinformações, resultam a liberdade de ação, a cronoestratégia e a geoestratégia.Estas, aliadas a uma boa comunicação, permitem que se aja no ambiente, nomomento e na forma mais adequados.

Na visão de Fayard, a informação desempenha uma função muito importante:

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A informação, nesse sentido, serve como um guia para a ação. Ela permite ummapeamento da situação que possibilita pensar a melhor estratégia. Sobre aestratégia no contexto organizacional, Mintzberg e cols.19 identificam e organizamos conceitos segundo diferentes escolas de pensamento. Na análise de taisescolas, percebe-se que também no universo da estratégia orientada para asorganizações a informação é elemento fundamental.

1818181818 Ibidem, p. 27.

1919191919 MINTZBERG, Henry; AHLSTRAND, Bruce; LAMPEL, Joseph. Safari de estratégia: um roteiro pela selvado planejamento estratégico. Porto Alegre: Bookman, 2000.

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Quadro 2: Resumo das características das escolas de estratégiaFonte: Elaborado pelos autores.

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#"( Em um ponto todas as escolas concordam: toda a estratégia, para ser bem-

sucedida, é baseada em um conhecimento profundo da situação em análise.Isso decorre do fato de que a estratégia deve levar em consideração não somenteas condições externas e internas de uma organização, mas também os jogosde interesse, a cognição humana, a cultura empresarial, o processo deaprendizagem e a liderança. No entanto, para a construção desse conhecimento,são necessárias muita reflexão e a busca de informações que a subsidiem. Poresse motivo, considera-se a informação como um elemento-chave na formulaçãode estratégias.

Em matéria de estratégia, as novas mídias aumentaram significativamente asdimensões dos terrenos de manobra, atalhando os caminhos e mobilizando umespaço planetário. Isso reforça não apenas a importância da informação, comotambém a da iniciativa e da ação. Como esclarece Fayard,20 a questão da relaçãoentre informação, comunicação e estratégia é tão velha quanto a humanidade,no entanto, os recursos técnicos disponíveis para lhe fazer frente conhecem hojeuma amplitude inigualável.

As atuais tecnologias digitais desempenham o papel de buscar um padrão comumpara os dados, onde os mesmos são gerenciados com maior facilidade. Assim,a rede permite que se ganhe tempo e precisão.

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De acordo com Fayard, para fazer a diferença, hoje, é necessário primeirointeligência para criar ligações entre as informações coletadas, ou seja, ter umconhecimento combinatório. Em seguida, é preciso aptidão para acelerar umaidéia ou um projeto, porque o tempo se sobrepõe ao espaço e ao ritmo. Uma boaidéia precisa de rapidez.

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2020202020 Ibidem, p. 22.

2121212121 Ibidem, p. 127.

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Na sociedade contemporânea, a informação e a comunicação são elementos-chave para boas estratégias. A informação permite que a empresa tenha subsídiospara uma decisão rápida e consistente. A comunicação permite que essa decisãoseja colocada em ação. E a iniciativa possibilita que a empresa atue com agilidade.

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Conforme Porter e Montgomery,23 as empresas, ao utilizarem a informação paradesenvolver uma vantagem competitiva, reconhecem a necessidade da gestãodas novas tecnologias de informação. Assim, o valor gerado pela empresa émensurado pela totalidade de pacotes de benefícios, de serviços e de informaçõesproduzida pelos serviços ou produtos.

Dessa forma, as novas tecnologias alteram o que o autor denomina “escopocompetitivo”, que nada mais é do que a amplitude que as atividades da empresaalcançam na sociedade:

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2222222222 Ibidem, p. 137.

2323232323 PORTER, Michael E.; MONTGOMERY, Cynthia A. Estratégia: a busca da vantagem competitiva. 7. ed.Rio de Janeiro: Campus, 2002.

2424242424 Ibidem, p. 88.

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#"$ Ao longo da maior parte da história da indústria, o progresso tecnológico afetou

principalmente o componente físico das empresas. Hoje, constata-se a alteraçãodo ritmo da mudança tecnológica. A tecnologia da informação está progredindocom maior velocidade do que as tecnologias de processamento físico.

Além de influenciar o desempenho das atividades individuais, a tecnologia dainformação, através dos novos fluxos, amplia em muito a capacidade da empresade explorar os elos entre as atividades, nos âmbitos interno e externo, pois elapossibilita uma comunicação e uma troca de informações mais constantes ecom um alcance muito maior.

Finalmente, a tecnologia da informação exerce um impacto poderoso sobre o escopocompetitivo. Os sistemas de informação permitem que as empresas coordenemas atividades de valor entre localidades geográficas com grande dispersão. Alémdisso, a tecnologia da informação está criando muitos inter-relacionamentos novosentre as empresas, ao expandir o escopo setorial em que deve competir paraconquistar a vantagem competitiva. Constata-se uma tendência inquestionável nosentido da expansão do conteúdo de informação dos produtos. Esse componente,combinado às mudanças na cadeia de valores das empresas, destaca o papelcada vez mais estratégico da tecnologia de informação.25

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Todavia, a grande quantidade de informações disponíveis nos ambientes dasorganizações somente terá um caráter estratégico a partir do momento em quesoubermos usá-las eficazmente. É preciso estar vigilantes aos acontecimentos,e o alimento básico da vigília é a informação.

Diante dessa preocupação, torna-se evidente a atenção que deve ser dada aosestudos sobre metodologias, processos e ferramentas que possam auxiliar nacoleta e no tratamento dessa grande quantidade de informações.

2525252525 Ibidem, p. 92.

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Para tanto, inicialmente, é necessário desmitificar a definição do termo informação,pois se nota que existe uma dificuldade teórica em esclarecer esse conceito.Informação deve ser diferenciada do dado e do conhecimento. Embora muitasvezes os três conceitos sejam complementares e partem de um mesmo processo,essa diferenciação pode ser útil para uma análise mais profunda. Dados, comodefine Davenport,26 são “observações sobre o estado do mundo”. Por exemplo:“30% da população brasileira é de classe média”. Ou seja, dados são estáticos,não têm vínculo contextual direto e normalmente podem ser quantificados. Sãofacilmente capturados e processados por tecnologias.

Já a informação é contextualizada e exige toda uma análise no seu processamento.Conforme definição de Drucker,27 a informação é um dado dotado de relevância epropósito. Ou seja, a informação depende dos interesses de quem a analisa. Apesarde suas diferenças, dado, informação e conhecimento são elementos de um sóprocesso. Informação é a atribuição de sentido para um dado, e o conhecimento éa informação contextualizada. Essa construção ocorre quando o indivíduo dá auma informação uma interpretação e um significado e consegue considerar assuas implicações em seu contexto. Para detalhar melhor as características dessestrês elementos, observemos o quadro," proposto por Davenport:28

2626262626 DAVENPORT, Thomas H. Ecologia da informação: por que só a tecnologia não basta para o sucesso naera da informação. São Paulo: Futura, 1998.

2727272727 DRUCKER apud DAVENPORT, op. cit., p. 19.

2828282828 Ibidem, p. 18.

Quadro 3: Dado, informação e conhecimento28

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#"* Como se pôde notar no quadro, o envolvimento humano, nesse processo, aumenta

à medida que se passa de dados a informações e a conhecimentos. Por essemotivo, Davenport traz uma abordagem ecológica da informação, na qual propõeuma administração informacional centrada no ser humano.

Por meio da abordagem ecológica, Davenport explica que devemos perder a ilusãodo controle sobre a informação. Nunca conseguiremos satisfazer a necessidadede saber de tudo, isso é impossível. Por esse motivo, é necessário, a partir dosinteresses dos indivíduos, estabelecer prioridades que definirão focos deobservação. Como afirma Drucker, é necessário se perguntar: De que informaçãonecessito? Sob que forma e quando? A quem devo e que tipo de informação?

A abordagem ecológica do processo informacional recomenda, em geral, queinicialmente é preciso integrar os diversos tipos de informação. As informaçõespodem ser não-estruturadas, como o conhecimento; estruturada em papel,registros e documentos; ou estruturada em computador, como as tecnologias dainformação. Um bom gerenciamento da informação deve levar em consideraçãoesses três tipos. Após, é necessário reconhecer e acompanhar as mudançasnos ambientes informacionais e ter ferramentas e metodologias flexíveis. Étambém preciso estar atento aos comportamentos pessoal e informacional dosindivíduos envolvidos no processo.

Levando em consideração esse aspecto da informação, surge a necessidade douso de uma metodologia que auxilie no tratamento das informações, com o objetivode embasar o processo de tomada de decisões, uma metodologia que contribuapara transformar uma grande quantidade de dados em conhecimento estratégico.

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A inteligência estratégica é uma metodologia que teve grande influência daspráticas e dos conhecimentos das inteligências militar e governamental. É umprocesso sistemático e formal que tem o objetivo de reter, a partir de umemaranhado de informações, aquelas que são críticas ao processo decisório.Segundo Tyson,29 ela pode ser definida como um processo ético de coleta,

2929292929 TYSON apud BELLO, Bruno Carneiro de et al. Inteligência: colaborando para competir. In: SIMPEP, 11.,2004, Bauru. Anais... Bauru, 2004. p. 1-12. v. 1.

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tratamento, análise e disseminação da informação sobre os ambientes de inter-esse da empresa, visando subsidiar o processo decisório e alcançar as metasestratégicas da organização, de forma sistêmica e rotineira.

Os principais objetivos da inteligência estratégia são reduzir a incerteza na tomadade decisão, evitar surpresas de mudanças ambientais e obter vantagem com-petitiva pela redução do tempo de reação e melhorar o posicionamento estratégicoda organização.

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Em termos operacionais, o processo de inteligência estratégica passa por váriasetapas. A primeira é fundamentada num trabalho de sensibilização, que consistena sua apresentação para a direção e equipes da empresa, abordando principal-mente quais suas vantagens, qual apoio será necessário e quais as dificuldadesque o processo pode encontrar. Em outras palavras, é a obtenção da compreensão,do apoio e da colaboração da direção e das equipes da organização.

A segunda etapa é a identificação das reais necessidades de informação, parasaber o que coletar e com que propósito. Essa etapa pode ser aplicada atravésde uma entrevista com os principais gestores da organização visando a identificaros focos e as prioridades necessárias de informação, para assim gerar a inteligên-cia adequada. De acordo com Herring,30 normalmente as necessidades deinteligência de uma empresa podem ser enquadradas em três categorias: as quesão úteis para embasar a decisão e a ação estratégica; as antecipativas, quealertam para as mudanças do ambiente; e as que descrevem a situação dospúblicos com os quais a empresa tem um envolvimento. As três devem serlevadas em consideração.

A terceira etapa é a da escolha das fontes de consulta e das ferramentasadequadas para o processamento da informação. É fundamental identificar asfontes de informação externas e internas e qual ferramenta pode auxiliar na suabusca ou no seu armazenamento. Somente então, dentro do foco já determinado,inicia-se a busca das informações de interesse.

3030303030 HERRING apud MILLER, Stephen H.; PRESCOTT, John E. Inteligência competitiva na prática: técnicas epráticas bem-sucedidas para conquistar mercados. Rio de Janeiro: Campus, 2002.

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#"& Após, realiza-se o processamento e a análise das informações. Essa etapa

consiste em interpretar, analisar e filtrar os dados coletados. Esse processamentocomeça com a validação das informações coletadas. É preciso avaliar a confia-bilidade da fonte e da informação e, após, é necessário arquivar e catalogar osdados recolhidos. Para essa tarefa é exigido um conhecimento quanto à naturezado assunto ao qual a informação se refere. Em seguida, faz-se a interpretaçãodas informações com o objetivo de obter um significado dos dados brutos paraguiar a decisão. A interpretação demanda todo um processo cognitivo, e os indi-víduos que dela participarem devem ter um bom entendimento do ambienteorganizacional.

O próximo passo é a comunicação, ou seja, a disseminação da informação aosindivíduos que necessitam dela para realizar seu trabalho. É o processo por meiodo qual o produto do esforço de uma organização em adquirir, processar einterpretar uma informação é disseminado por toda a sua estrutura. Sem umaboa comunicação, todo o processo de busca e análise das informações perdeseu significado. A informação só tem valor se for comunicada para as pessoascertas no momento certo.

Um processo de inteligência estratégica não deve se desviar de seus objetivosprincipais. Ele tem a finalidade de fornecer informação crítica para os tomadoresde decisão. Para tanto, é muito importante que se faça um esforço para identificaros problemas centrais da organização, de modo que o processo de inteligênciapossa contribuir para a criação do conhecimento entre os indivíduos.

Através da análise de diversos casos sobre inteligência estratégica, Miller ePrescott31 definiram alguns pontos sobre os quais deve-se ter atenção redobradana implementação de processos de inteligência. Um dos pontos que mais têmcausado frustração nesses processos é a definição do foco das necessidades deinformação da empresa. Um erro nessa definição coloca a perder todo o processo,pois a informação só possui importância a partir dos interesses do indivíduo ou daorganização. Portanto, sem uma definição precisa dos focos de observação, oprocesso de inteligência poderá produzir somente informações inutilizáveis.

Outro cuidado que deve ser tomado é no momento de comunicar as informações,pois os indivíduos precisam confiar na credibilidade das mesmas. Para tanto, a

3131313131 MILLER, op. cit.

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apresentação de números, entrevistas ou fotos pode oferecer uma compreensãomais rica. Uma boa tática é uma comunicação redundante, pois os indivíduostêm diferentes preferências quanto ao modo como gostam de receber as infor-mações. Vale também lembrar que falhas de âmbito ético comprometerão toda acredibilidade e confiança.

A inteligência estratégica não funciona como um efeito mágico. Ela é um processoevolutivo, construído passo a passo, que envolve a cultura organizacional e suaestrutura social. Por esse motivo, paralelamente, a organização deve desenvolverplanos de conscientização do conceito, do funcionamento e da importância dainteligência estratégica, além de criar incentivos para o envolvimento de todosneste processo.

O diagnóstico de nossa pesquisa mostra que o contrário do que diz o folclorepopular, os mecanismos comportamentais e políticos não são as principaisbarreiras ao fluxo de informações. As principais são os sistemas organizacionaise os diferentes modelos mentais.32

Portanto, a organização deve criar uma estrutura que incentive a interação entreos indivíduos.

E, finalmente, a inteligência estratégica é um processo, e, como tal, deve serperiodicamente avaliada e ajustada conforme as necessidades empresariais.

A estrutura de aplicação da inteligência competitiva pode ser complementadaatravés da vigília estratégica.

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A metodologia de vigília estratégica funciona como um radar de navio, que tempor objetivo alertar sobre os obstáculos que podem surgir no caminho. É umprocesso informacional através do qual a organização realiza uma escuta an-tecipativa dos sinais fracos do seu ambiente, com o objetivo de criar oportunidadese reduzir a incerteza. As informações decorrentes da vigília estratégica não são

3232323232 Ibidem, p. 33.

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#&! informações que vêm à empresa de forma espontânea, são informações que

necessitam ser procuradas.

As informações que constituem os processos de vigília estratégica costumamser antecipativas, qualitativas, incertas e fragmentadas. São antecipativas porquealertam sobre mudanças que estão começando e que podem constituir umaoportunidade ou uma ameaça. Têm o objetivo de alertar com tempo suficientepara uma ação. São qualitativas, pois dão indícios de um futuro próximo; nãosão conclusões de uma análise do passado ou de verificações contábeis. Sãoincertas, pois constituem indícios, pistas, sinais, hipóteses do que pode vir aacontecer. E, finalmente, são fragmentadas. As informações da vigília costumamse apresentar sob a forma de trechos pacientemente coletados, reunidos,interpretados e validados. Isoladamente, cada informação é desconexa,entretanto, quando relacionada a outras adquire um significado.

A vigília é um sistema de monitoramento para determinar o que acontecerá everificar, ao longo do tempo, se as hipóteses levantadas continuam válidas. Elatrabalha com a análise de sinais fracos, que são indicadores de tendências. Avigília é muito importante na construção de estratégias.

Segundo Fachinelli33 , uma célula de vigília segue passos semelhantes aos queconduzem um processo de inteligência estratégica, iniciando pela fase deapropriação do projeto por parte dos gestores da organização.

A segunda fase é o mapeamento dos potenciais. Realizar uma espécie de auditoriainterna, analisando o sistema informacional atual da empresa e suas necessi-dades. Avaliar como a organização tem usado a informação e como seus membroslidam com ela.

A definição do foco de observação constitui a terceira fase, o que implica aidentificação dos fatores críticos de sucesso. Ou seja, identificar as variáveiscujo gerenciamento pode afetar a posição competitiva de uma empresa dentrode um ramo de atividade. São os fatores que devem ser prioritários na observaçãopela sua importância. A vigília deve ter seus focos de observação bem deter-minados para não cair num estado de cegueira estratégica.

3333333333 FACHINELLI, Ana C. Elementos metodológicos de vigília e de inteligência econômica para oprocessamento de informações organizacionais. Conexão, Caxias do Sul: Educs, v. 2, n. 1, dez./2003.

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Após, segue-se com a etapa da formação da rede de especialistas, que auxiliarãona análise da informação. Cada foco de observação consiste num tema deinteresse da empresa, e a cada foco estará ligado um especialista no assuntoem questão. Esse especialista terá como função validar e evidenciar asinformações estratégicas.

Em seguida, definem-se as fontes e os instrumentos de coleta. A vigília tem,basicamente, como fontes de informações: notícias publicadas na imprensa,banco de dados, internet, publicações de agências governamentais e o diálogocom outros indivíduos. De acordo com as fontes de pesquisa, serão definidos osinstrumentos de consulta.

A próxima fase é a de validação das informações. Uma vez recolhidas, asinformações passam pelos especialistas para verificação de sua validade epertinência. E, finalmente, após tratadas, as informações devem ser comunicadasaos diversos membros envolvidos no processo.

Um dos problemas que podem surgir na implementação da célula de vigília é adificuldade de criar significado através das informações coletadas. Após a coletade sinais fracos, o resultado será um conjunto de informações dispersas semgrande significado e em desordem. Para se produzir um significado a partir disso,são necessárias muita análise, criatidade e capacidade para identificar vínculos.

Lesca e Freitas34 sugerem o uso do conceito de PUZZLE para organizar a infor-mação de forma a fazer emergir um significado. Inicialmente, coletam-se os sinaisfracos da área do foco de atenção. Listam-se todas as informações coletadas,resumindo-as em poucas e essenciais palavras. Em seguida, produz-se umadisposição espacial para essas informações, na qual algumas se aproximammais de umas do que de outras. A representação espacial deve ser constituídaem forma de rede. No centro, é colocada a informação principal, que é o foco deobservação. Em torno desse centro, são distribuídas as informações-satélites.Veja-se o exemplo a seguir, apresentado por Lesca e Freitas, na figura 1.

3434343434 LESCA, Humberto; FREITAS, Henrique M. R. Como dar senso útil às informações dispersas parafacilitar as decisões e ações dos dirigentes: o problema crucial da inteligência competitiva através daconstrução de “PUZZLE”. Porto Alegre: Ed. da UFRGS, 1996. (Série Documentos para Estudos, n. 6).

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#&( Informações coletadas relativas à companhia IBMInformações coletadas relativas à companhia IBMInformações coletadas relativas à companhia IBMInformações coletadas relativas à companhia IBMInformações coletadas relativas à companhia IBM

1. IBM@ acentua a separação entre os softwares e os serviços.2. IBM@ coloca a escuta do cliente em prioridade.3. IBM@ coloca as preocupações dos clientes em prioridade.4. O fornecimento de serviços será objeto de um contrato entre IBM@ e

seu cliente.5. IBM@ se orienta para os serviços.6. IBM@ inflete (reorienta) sua estratégia.7. IBM@ se dividirá em muitas sociedades.8. IBM@ decepciona seus clientes.9. IBM@ nomeia um diretor-geral de serviços.10.Centralização: IBM@ planeja controlar todas as suas filiais.11. IBM@ e DE@ se juntam para a gestão das redes.12. IBM@ majoritária na (empresa). Pyrénées Informática

Exemplos de links entre sinais anunciadoresExemplos de links entre sinais anunciadoresExemplos de links entre sinais anunciadoresExemplos de links entre sinais anunciadoresExemplos de links entre sinais anunciadoresreagrupados em torno de um temareagrupados em torno de um temareagrupados em torno de um temareagrupados em torno de um temareagrupados em torno de um tema35

IBM reflete sua estratégia

IBM sedividirá emdiversas

empresas

IBM se reposiciona Desorientação??

Resultado?

IBM “de bem”com o lucro

IBM compra a CGI

IBM se interessapelo mercado

japonês

IBM se orienta para os serviços

Contradição

Golpe surpresa?!IBM e DECse aliam para a

gestão das redesIBM, novo produto dereconhecimento vocal

IBM majoritária na Pyrénées Informática

3535353535 Idem.

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O resultado é a formação de uma rede que é ligada por vínculos. Os vínculospodem ser de diversas origens: vínculo de confirmação – quando uma informaçãoafirma o conteúdo de outra; – vínculo de contradição – quando uma informação éantagônica a outra; – vínculo da causa e efeito – quando uma informação revelaser conseqüência de outra; – vínculo de analogia – quando uma informação ésemelhante a outra; e – vínculo de proximidade – quando as informações sereferem ao mesmo assunto, mas são independentes. O objetivo desses vínculosé produzir um sentido. Percebe-se que, embora a inteligência e a vigília estratégicatenham processos semelhantes, elas possuem abrangência e enfoques um poucodiferenciados. A vigília é focada para as informações antecipatórias e, além daobservação contínua dos focos, também pode ser usada somente para um assuntoem questão. Já a inteligência possui uma natureza mais abrangente e congregatodas as estratégias da empresa. Mas, como afirmam Fachinelli, Mattia e Rech,36

essas duas metodologias “são sob certo aspecto complementares, pois a riquezametodológica da vigília é essencial a toda a criação de inteligência assim comoas intenções estratégias e a interação enriquecem em retorno aos procedimentosde vigília”. Ou seja, ambos os processos se complementam.

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Devido à importância que a informação tem para a atividade de relações públicas,o profissional responsável por essa área pode e deve utilizar metodologias depesquisa e processamento da informação para elaborar suas ações. Devido àcirculação de alta quantidade de informações, proporcionada pelas novastecnologias, metodologias como inteligência e vigília estratégicas podem ser muitoúteis para dotar a atividade desse profissional de um caráter estratégico.

Neste artigo, a definição de Relações Públicas é de que esse profissional exerceuma função política e, portanto, estratégica, na qual ele é o responsável pelaadministração dos interesses da organização com os interesses de seus públicos.Para tanto, o Relações Públicas precisa se basear num profundo conhecimento,

3636363636 FACHINELLI, Ana C.; MATTIA, Olivar, M.; RECH, Jane. A dinâmica da informação na comunicaçãoorganizacional: a perspectiva do hipertexto e da autopoiese. In: CONGRESSO BRASILEIRO DE CIÊNCIASDA COMUNICAÇÃO, 28., 2005, Rio de Janeiro. Anais... São Paulo: Intercom, 2005. CD-ROM. Disponívelem: http://reposcom.portcom.intercom.org.br/bitstream/1904/17608/1/R1647-1.pdf . Acesso em: 30abr. 2006.

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#&$ tanto da empresa quanto de seus públicos, para orientar a execução das ações

que necessitam ser empreendidas com vistas à satisfação dos públicos e objetivosda organização. De acordo com Simões,37 os principais objetivos do profissionalde Relações Públicas é otimizar o processo decisório organizacional nas políticase atividades de relações públicas e estabelecer a integração dos grupos queinterferem nos objetivos da organização. Dessa forma, esse profissional lidacom questões organizacionais bastante amplas e complexas e, para lidar comtais questões, necessita de ferramentas e metodologias que lhe forneçamembasamento informacional.

O Relações Públicas tradicionalmente sempre teve como uma de suas atividadesprincipais o levantamento de informações para a construção do seu diagnóstico.A informação é essencial para a formulação de uma descrição sobre a situaçãoda empresa e as principais características de seus públicos de interesse. Apartir dessa descrição, o profissional elabora as ações mais eficazes para atingiros objetivos pretendidos. Dessa forma, afirma-se que, para construir suasestratégias, o Relações Públicas sempre buscou, anteriormente, munir-se deinformações. A informação e os interesses da organização possibilitam aconstrução de ações e estratégias coerentes com o ambiente.

As relações públicas vêem à busca de informação como fonte para os seusprogramas e estratégias. Tradicionalmente, os profissionais dessa área parasatisfazer essa necessidade de informação, usam a pesquisa como ferramenta.Segundo Lesly,38 a pesquisa em relações públicas tem três funções principais:1. confirmar suposições e palpites a respeito do estado da opinião pública sobre

um assunto, produto ou empresa;2. clarificar questões nas quais há pouca quantidade de informações ou quando

se encontram dados contraditórios;3. reorientar nossos pensamentos ou conceitos a respeito de um problema de

relações públicas.

3737373737 SIMÕES, Roberto Porto. Relações públicas e micropolítica. São Paulo: Summus, 2001.

3838383838 LESLY apud FOCHI, Marcos A. B.; PIROLO, Maria A. M. A pesquisa de opinião: o “ver e o “fazer” doRelações Públicas. In: INTERCOM-Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação eXXIV Congresso Brasileiro da Comunicação, 2001. Disponível em: www.portal-rp.com.br/bibliotecavirtual/relacoespublicas/funcoesetecnicas/0157.pdf. Acesso em: 30 abr. 2006.

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No contexto organizacional, Fortes39 defende a idéia de que as pesquisas emrelações públicas permitem:– conhecer em que extensão os públicos estão informados a respeito da res-

ponsabilidade e dos limites das atividades de uma organização;– saber como pensam e reagem antes de decisões tomadas pelas organizações;– prever qual será a atitude dos públicos em relação a ações que estão sendo

planejadas pela organização;– julgar o que pensam e esperam da organização;– apreciar quais são as necessidades dos públicos e que medidas devem ser

adotadas, a fim de satisfazer essas necessidades;– admitir e delimitar áreas de ignorância dos públicos sobre problemas socio-

econômicos; indagar se estão dispostos a pagar mais por melhores serviços epor melhores produtos de uma organização.

A pesquisa tem sido usada tradicionalmente como uma ferramenta que propor-ciona ao Relações Públicas e às instituições um conhecimento do contexto daorganização, possibilitando a identificação das ameaças e oportunidades doambiente, bem como fornece uma base para a tomada de decisões. Sendo assim,Lesly define a importância da informação para o Relações Públicas:

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A pesquisa tem sido uma ferramenta que muito tem contribuído e auxiliado notrabalho de relações públicas. No entanto, no contexto atual, na era da globali-zação, houve uma mudança de perspectiva diante do uso de informação. Háalguns anos, o principal desafio das organizações era a busca de informação,que era um tanto escassa. Por esse motivo, a pesquisa se tornou uma metodologiamuito popular, pois coleta uma boa quantidade de informações que não estavamdisponíveis anteriormente. Já, hoje, há um novo desafio, que não é mais a es-cassez de informações, e sim, o seu excesso. As novas tecnologias têm dispo-nibilizado uma circulação de informações muito grande, assim como têm facilitadoo acesso às mesmas. Nesse contexto, surge a dificuldade de filtrar as informações

3939393939 FORTES apud FOCHI, op. cit.

4040404040 LESLY apud FOCHI, op. cit.

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#&* que realmente são relevantes à atividade da empresa. Dessa forma, profissionais

que se utilizam do conhecimento do seu ambiente para elaborar suas açõesnecessitam de metodologias para identificar e processar as informaçõesrelevantes. Sendo assim, pode-se observar que metodologias como a inteligênciae a vigília estratégicas podem auxiliar muito dentro desse contexto. Na contem-poraneidade, a inteligência e a vigília estratégicas são, antes de mais nada,processos de triagem da informação.

Hoje, com as novas tecnologias, o Relações Públicas tem à sua disposição no-vas abordagens para a busca e a análise da informação. O acesso à informaçãoestá muito mais amplo, e torna-se imprescindível considerar o uso de novasmetodologias de processamento. O profissional de Relações Públicas tem,atualmente, a oportunidade de ampliar seus instrumentos de busca da informação,para, assim, aumentar a eficácia das suas ações e estratégias.

Não se pretende, aqui, questionar a importância e a eficácia de instrumentostradicionais de pesquisa. Ao contrário, a pretensão consiste em sinalizar que essesinstrumentos podem ser ampliados e enriquecidos com a soma de novas metodologiase processos, como, por exemplo, a vigília e a inteligência estratégicas.

Apesar da facilidade de acesso à informação, estudos41 apontam que 70% dasempresas que encerraram suas atividades, faliram por não possuir conhecimentodo ambiente no qual estavam inseridas. Isso evidencia a dificuldade que asempresas ainda possuem de organizar, processar e usar eficazmente as infor-mações. Evidencia, também, a necessidade que as organizações têm de novasmetodologias para gerenciar a informação.

A inteligência e a pesquisa funcionam de formas um pouco diferenciadas, porémcomplementares. A pesquisa responde a uma necessidade de informação numdeterminado tempo e sobre uma determinada situação ou fato, baseada numaamostra; já a vigília consiste numa observação constante e contínua dos diversosfocos de interesse da empresa, baseada num conjunto de fontes analisadas porespecialistas.

4141414141 Dado apresentado em 2000 por SANTOS, Raimundo Nonato Macedo. Métodos e ferramentas paragestão de inteligência e do conhecimento. Disponível em: www.eci.ufmg.br/pcionline/include/getdoc.php?id=527&article=281&mode=pdf – Acesso em: 16 abr. 2006.

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O uso das novas metodologias pode auxiliar o profissional de Relações Públicasa identificar e processar as informações úteis ao seu planejamento. Além disso,no momento em que o Relações Públicas consegue construir uma análise realistado contexto da empresa como base para o seu trabalho, ele passa a desenvolveruma atividade de nível estratégico. Ou seja, ele passa a dar um sentido estratégicoà informação:

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Nesse contexto, a informação é um elemento-chave na construção de estratégiasde sucesso. O Relações Públicas que desejar exercer uma atividade de nívelestratégico deve ter uma preocupação constante com a busca e o processamentoda informação. Deve encontrar metodologias que o auxiliem a tratar essainformação de forma adequada, as quais lhe forneçam uma orientação das açõesmais apropriadas para o momento e das estratégias que a empresa deve adotar.

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O Relações Públicas que desenvolve um papel estratégico deve possuir umavisão macro que lhe permita identificar e mapear os principais públicos e focosde interesse da organização. Portanto, é necessário que se desenvolva ummonitoramento dos pontos que podem afetar a estrutura e os serviços de umaorganização. Essa lógica foi confirmada também através do projeto Infocom, apartir do qual novas premissas para o comunicador organizacional apontam paraum profissional que saiba lidar com a mudança e que acompanhe o contextopara continuar a estabelecer uma conexão eficiente com seus públicos.

4242424242 BUENO, op. cit., p. 8.

4343434343 Ibidem, p. 241.

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#&& De fato, pode-se considerar que o objetivo de uma estratégia, principalmente nos

tempos atuais e no contexto organizacional, não é a guerra ou o uso da força. Oobjetivo é que a estratégia possibilite que a empresa atue em harmonia com seuambiente, para atingir seus objetivos. Dentro desse pensamento, o profissionalde Relações Públicas exerce uma atividade de grande valor estratégico, pois elevisa à cooperação mútua entre o sistema organização-públicos, visando à conse-cução da missão organizacional. Ou seja, ele é o profissional que busca a harmo-nia na relação da empresa com seus públicos. Para agir harmonicamente com umpúblico, é necessário ter conhecimento para compreender as necessidades e osdesejos desse público e inteligência para criar formas de respostas.

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Em decorrência dessa função de sintonia e harmonização dos interesses da empresacom seus públicos é tão importante que o Relações Públicas se utilize demetodologias de coleta e processamento da informação. Por esse motivo, tambéma inteligência e a vigília estratégicas são processos que podem fornecer um apoiofundamental à atividade de relações públicas. Essas metodologias permitemmonitorar informações ambientais para responder satisfatoriamente aos desafiose às oportunidades que se apresentam à organização. Elas oportunizam uma buscasistemática de informações de interesse para a construção de uma reação proativadiante das mudanças contextuais. Também possibilitam ao Relações Públicas aconstrução de estratégias coerentes com a realidade e com os objetivosorganizacionais e a prática de uma postura estratégica.

Da mesma forma que as metodologias de busca e processamento da informaçãopodem auxiliar a atividade de relações públicas, elas também abrem espaçopara um novo campo de atuação profissional.

4444444444 SANDI, André Quiroga. Novas competências do Relações Públicas frente às tecnologias de informação.In: XXV CONGRESSO BRASILEIRO DE CIÊNCIAS DA COMUNICAÇÃO, 25., 2002, Fortaleza. Anais... Fortaleza,2005. Disponível em: www.eca.usp.br/alaic/material%20bolivia%202002/congbolivia2002/traba-lhos%20completo%20. Acesso em: 16 abr. 2006.

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A gestão das informações deve estar a cargo do setor de comunicação, emespecial do profissional de Relações Públicas, que trabalha a comunicaçãoorganizacional integrada e deve ser visto como um estrategista, um gerenteinformacional.45

Essa parece ser uma tendência das organizações que vêm sentindo as con-seqüências do acelerado desenvolvimento das novas tecnologias de informaçãoe comunicação.

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As organizações contemporâneas se encontram diante de novos desafios. Aglobalização e a rapidez das mudanças exigem das organizações atitudes ágeise conscientes. O contexto mudou, e as empresas precisam desenvolvermetodologias e processos que permitam sua constante adaptação.

A sobrevivência das organizações empresariais está intimamente ligada à suacapacidade de inovação também na sua gestão. Para tanto, é necessáriohabilidade para gerenciar os recursos informacionais e agilidade de ação. Asorganizações precisam identificar os focos de ameaça e oportunidade no ambientee traçar estratégias de reação a essa situação. Nesse contexto, a informaçãopassa a ter um valor estratégico. Afinal, ela forma a base de conhecimento sobreo qual a empresa se apoiará para pensar suas ações e estratégias.

4545454545 Idem.

4646464646 FACHINELLI; MATTIA; RECH, op. cit.

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#'! No entanto, o grande desenvolvimento das tecnologias de informação e comunicação

produziram uma verdadeira avalanche de dados. O fluxo informacional das redes edos veículos cresceram exponencialmente. Isso traz um novo desafio às organizações,pois a situação da falta de informação foi substituída pelo excesso da mesma.Assim, as empresas necessitam adotar metodologias e processos que possibilitema busca focalizada nos dados de interesse e o tratamento da informação disponível.

A atividade do Relações Públicas também atravessa o mesmo dilema, pois, paracriar ações que busquem a sinergia entre os objetivos da empresa e a expectativade seus públicos de interesse, esse profissional necessita ter uma boa baseinformacional que lhe permita identificar esses interesses, também em constantemodificação.

Dessa forma, partindo do pressuposto de que a informação é fundamental paraa formulação de uma estratégia de sucesso, surge a necessidade do uso demetodologias que facilitem o seu processamento.

Através do estudo da aplicação e das vantagens da inteligência e da vigíliaestratégicas conclui-se que essas metodologias podem contribuir muito para abusca e a análise da informação, pois a inteligência e a vigília são processos quepossibilitam um monitoramento constante das informações de valor estratégicopara a organização.

Sendo assim, essas metodologias contribuem não só para as estratégias doRelações Públicas, mas também para as estratégias macro da organização. Nomomento em que as relações públicas forem a atividade responsável por administraresse processo, passam a atingir um novo patamar de importância para a direçãoda empresa, por exercer uma função essencial e de cunho estratégico.

Com a sociedade contemporânea, surge então uma nova perspectiva de atuaçãopara o Relações Públicas. Esse profissional pode atuar na implementação e nodesenvolvimento de metodologias e processos que permitam gerenciar estrate-gicamente a informação para a produção de conhecimento aplicável tanto dentrode sua função como em outras atividades da empresa.

O profissional de comunicação contemporâneo deve estar atento às demandasda atual sociedade e produzir mecanismos para responder a elas. Por esse motivo,apontamos para a tendência do uso estratégico da informação como um novocampo de atuação para as relações públicas.

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RESUMORESUMORESUMORESUMORESUMO

A gestão da comunicação organizacional precisa considerar a cultura da organização, para que entãoelabore o planejamento estratégico comunicacional. A comunicação, nessa perspectiva, tem importânciafundamental uma vez que se torna o meio condutor pelo qual a organização constrói/desconstrói eperpetua sua imagem. Nesse sentido, este estudo tem por objetivo resgatar as teorias referentes àcomunicação organizacional e os pressupostos da comunicação integrada, bem como relata aexperiência de uma universidade no Rio Grande do Sul quando implementou/reestruturou o jornalinstitucional. O relato demonstra, claramente, que a instituição não possui políticas de comunicaçãodefinidas. Para fins de construção do arcabouço teórico que norteou este estudo, foram consideradosos conceitos produzidos por Kunsch (2003); Bueno (2003), dentre outros pesquisadores do tema.

Palavras-chave:Palavras-chave:Palavras-chave:Palavras-chave:Palavras-chave: Comunicação organizacional. Comunicação integrada. Comunicação emomunicação organizacional. Comunicação integrada. Comunicação emomunicação organizacional. Comunicação integrada. Comunicação emomunicação organizacional. Comunicação integrada. Comunicação emomunicação organizacional. Comunicação integrada. Comunicação emuniversidades.

ABSTRACTABSTRACTABSTRACTABSTRACTABSTRACT

Organizational communication management needs to consider the culture of the organization, in orderto, after that, elaborate the communicational strategic planning. Communication under this perspectivehas fundamental importance, once it becomes the conductive way through which the organization builds/unbuilds and perpetuates its image. Following this, the study aims to rescue the theories referring toorganizational communication and the presuppositions of integrated communication, as well as it re-ports the experience of an university in Rio Grande do Sul state, when they implemented/rearranged theinstitutional journal. The report clearly shows that the institution does not have defined communicationpolicies. In order to build the theoretical structure that lead the study, the concepts produced by Kunsch(2003) and Bueno (2003) were considered, among other researchers on the subject.

Key words:Key words:Key words:Key words:Key words: Organizational communication. Integrated communication. Communication in universities.

11111 Professora/Pesquisadora na Faculdade de Ciências Econômicas, Administrativas e Contábeis daUniversidade de Passo Fundo (UPF). Mestre em Administração pela Universidade Federal de Santa Catarina(UFSC). Doutoranda no Programa de Pós-Graduação em Comunicação Social/PPGCOM pela Pontifícia Uni-versidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS).

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A comunicação organizacional é tema recorrente em agendas de pesquisa dasescolas de Comunicação Social, uma vez que as organizações necessitam ternovas posturas de gestão em função de modificações que ocorreram no ambiente,considerando sobremaneira as três últimas décadas, quanto a fatores de naturezaeconômica, geopolítica e sociocultural. (BUENO, 2003, p. 19).

Sob esse contexto, os novos paradigmas aplicados aos estudos organizacionaise estratégicos apontam que as organizações precisam estabelecer relações emodelos de gestão contemporâneos que contemplem efetivamente a visão sis-têmica (GOLDHABER, 1991; BALDISSERA, 2000) e relacional dos processos admi-nistrativos e da dinâmica institucional.

Todo esse complexo debate está presente já há algum tempo nas Instituiçõesde Ensino Superior (IESs), que enfrentam verdadeiras transformações sejano âmbito de suas concepções filosóficas, no da tecnologia da informação,no dos comportamentos e das aspirações dos educandos, seja no dasociedade em geral. Há, também, de se considerar as modificações no pro-cesso de avaliação das IEs, hoje institucionalizadas por meio do SistemaNacional de Avaliação do Ensino Superior (Sinaes), que, em suas diversasdimensões de análise, tem como idéias centrais, dentre outras, a integraçãoe a participação.

Contemplando esse (re)olhar para as organizações, no contexto da pós-modernidade, é que se considera fundamental abordar a questão da comunica-ção organizacional. Considerada como elemento estratégico, cerne da orga-nização, a comunicação assume a função de “reforçar e preservar a identidadeorganizacional”. (BALDISSERA, 2000, p. 13). É por meio da interação entre osfluxos de informações que as redes de relações estão sistematicamente emprocesso de construção/desconstrução, numa constante organização/reorga-nização e (re)produção.

Portanto, constitui-se objeto deste estudo o resgate de teorias referentes àcomunicação organizacional e os pressupostos da comunicação integrada, bemcomo se relata a experiência de uma universidade no Rio Grande do Sul, naimplementação/reestruturação do jornal – instrumento de comunicação insti-tucional (KUNSCH, 2003), focado em atingir os públicos: alunos, funcionáriose professores.

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Falar sobre comunicação organizacional sem antes abordar a importância dacultura organizacional para a construção da comunicação no âmbito da organizaçãoé interpretá-la de forma fragmentada, desconsiderando uma visão sistêmica.

A cultura organizacional constitui-se no elemento norteador das organizações, poisorienta os comportamentos dos indivíduos que passam, então, a conviver em umaunidade de sociedade empresarial específica, repleta de construções/desconstruçõesdas relações sociais. Como diz Bueno (2003, p. 4), a comunicação “é o espelho dacultura empresarial e reflete, necessariamente, os valores das organizações”.

Baldissera (2000) define cultura organizacional como um conjunto de crenças e valoresespecíficos de uma determinada organização, traduzido por hábitos, mitos, ritos, ta-bus, mentalidade da organização, estilo de direção, comportamentos, criações,rompimentos e recodificações. Para o autor a cultura organizacional representa osaspectos identitários que tornam uma organização única, diferenciando-a das demais.

As organizações necessitam, então, perpetuar esses conjuntos de pressupostosque representam sua imagem e identidade, utilizando-se, dentre outras estratégiasde gestão e da comunicação organizacional. Sendo assim, falar de comunicaçãoé referendar as práticas comunicacionais enquanto acontecimento de cultura.(BALDISSERA, 2000).

Mediante o exposto, pode-se dizer que a comunicação é um processo deconstrução de sentidos. Para tanto, os emissores/receptores participam de umcomplexo jogo de relações interativas, onde realizam intercâmbio de mensagens,de onde emerge um fluxo de informações entre as pessoas que ocupam distintasposições e representam distintas funções. (GOLDHABER, 1991).

Partindo desse contexto, os profissionais que se propõem a planejar e a coordenara comunicação de uma organização, primeiramente, necessitam realizar umesforço para diagnosticar a cultura organizacional (BALDISSERA, 2000), estandoela implícita ou explícita nas redes formais e/ou informais.

A comunicação organizacional, assumindo os aspectos descritos, passa a ser “es-tratégica para as organizações o que significa que se vincula estritamente aonegócio” (BUENO, 2003, p. 7), passando, também, a ser desenvolvida por profissio-nais que conheçam e entendam a organização na perspectiva sistêmica.

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A comunicação organizacional, por apresentar esse caráter de inter-relação acimamencionado, possibilita o conhecimento de informações que permitem a definiçãoou o ajuste de estratégias organizacionais. Nesse contexto, são postos em cir-culação, na cadeia comunicacional, efeitos de sentidos orientados para a obtençãode resultados estratégicos globais, tendo como principal objetivo agregar valorpositivo à imagem da organização. (BALDISSERA, 2000).

Para tanto, é preciso disseminar políticas, crenças e valores da organização,criando, mantendo e desenvolvendo formas de comunicação que contribuam paraa melhor operacionalidade dos sistemas e das atividades. (TORQUATO, 2002).Segundo o autor, a empresa necessita desenvolver harmoniosamente o espíritode equipe, projetar com centros irradiadores de opinião e poder o pensamentoideológico da organização, acompanhar e influenciar o meio ambiente.

Mediante essas considerações, como os gestores podem considerar a comunica-ção nas organizações e de que forma poderão proceder ao planejamento da mesma?

Torquato (2002) fala de quatro dimensões de comunicação na organização: aprimeira dimensão é a da comunicação cultural que abrange os climas internos,onde o gestor deve medir a temperatura do clima organizacional, aferida apartir da cultura interna, arcabouço dos costumes, das idéias e dos valores dacomunidade.

A segunda dimensão destacada pelo autor diz respeito à comunicação administrativaque são todos os elementos de comunicação ligados ao fluxo de informação internaque estabelecem as relações entre setores, chefias e colaboradores.

A terceira dimensão é a comunicação social que envolve atos de comunicaçãoindiretos, unilaterais e públicos. A quarta dimensão é chamada sistema deinformações, tendo por objetivo agregar e gerenciar as informações armazenadasem bancos de dados.

Nessa sistemática de organização da comunicação para as empresas, Torquato(2002, p. 34) atenta para o fato de que as quatro dimensões devem funcionarcomo “uma orquestra”, pois uma dimensão influi na outra, ou seja, as quatroformas de comunicação se afetam significativamente.

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A comunicação organizacional, nessa perspectiva é, portanto, a possibilidadesistêmica, integrada, que reúne as quatro grandes modalidades, cada qualexercendo um conjunto de funções. Torquato (2002) ressalta que para que aeficácia da comunicação aconteça, é necessária uma clara definição de objetivoséticos, capacidade de codificação/expressão, domínio psicológico e capacidadede compreender o meio ambiente.

Para que a comunicação tenha condições de fluir, é preciso considerar como osfluxos ocorrem, pois exercem grande influência sobre a eficácia do processo. É emnível de fluxos, ou seja, nos caminhos que a informação percorre que acontecemos desvios e os degraus que atravessam a comunicação. (TORQUATO, 2002). Asinformações necessitam ser transmitidas considerando os fluxos descendentes,ascendentes, por direções laterais internas e por direções laterais externas.

No fluxo descendente, ou seja, de cima para baixo, o objetivo é que ocorra adifusão dos dados globais, tais como as políticas da organização, dentre outrasinformações, tendo como característica a formalidade. (BALDISSERA, 2000).O fluxo ascendente permite que os dados recolhidos nas bases cheguem atéas instâncias superiores e departamentos interessados. (BALDISSERA, 2000).As comunicações nesse fluxo são mais lentas do que as comunicações entreessas e os níveis superiores. (TORQUATO, 2002). São de caráter muito maisinformal.

Os dados provenientes dos distintos setores são comparados, de maneira asistematizar e uniformizar idéias e informações (BALDISSERA, 2000) no fluxopor direções laterais internas. No fluxo diagonal/por direções laterais externas,o objetivo é que as informações sejam difundidas no meio. (BALDISSERA, 2000).Sendo assim, para que a comunicação possa efetivamente produzir os efeitosdesejados, existe a necessidade de realizar pesquisas, entrevistas, auditorias,reuniões e conversas informais com os diversos públicos da organização.(BALDISSERA, 2000; KUNSCH, 2003). O objetivo dessa busca por informaçõesdeve-se ao fato de que a organização precisa avaliar o grau de satisfação quantoà quantidade e à qualidade das informações recebidas pelos públicos, quanto àcapacidade de estabelecer relações entre os assuntos de interesse para aorganização e quanto ao nível de elaboração crítica com referência aos temasidentificados como de importância para o desenvolvimento organizacional.

A falta de informações sistematizadas para a comunicação e, efetivamente, afalta de um planejamento estratégico de comunicação organizacional fazem com

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relacionamento de ordem pessoal e profissional e, em muitos casos, prejudicara imagem e a lucratividade da empresa.

Baldissera (2000) aponta como possíveis conseqüências para os problemas decomunicação nas organizações: inexistência de um diagnóstico atualizado quedescreva a situação da comunicação organizacional e o perfil do público de interes-se; circulação de informações desencontradas; uso de meios e linguagens nãoacessíveis; uso de codificações frouxas, ocasionando leituras incorretas; a ine-xistência de um fio condutor que funcione como referência para toda a comu-nicação oficial; mensagens muito complexas; dificuldade na construção de me-canismos, ou mesmo a inexistência deles, que permitam avaliar o processo decomunicação e retroalimetá-lo.

Então, planejar a comunicação organizacional é considerar as dimensões de comu-nicação, é considerar os fluxos pelos quais as mensagens são transmitidas,aliando sistematicamente a coleta de informações com os públicos, implemen-tando ações estratégicas, controlando-as e analisando os resultados. No entanto,nada será realizado com eficácia sem um planejamento estratégico, com políticasde comunicação bem definidas.

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Bueno (2003, p. 8) enfatiza que a comunicação organizacional é vista agoracomo “um conjunto de novos atributos que a tipificam como insumo estratégico”.Nessa perspectiva, “caminha para assumir, por inteiro, a chamada comunicaçãointegrada, com uma articulação estreita entre os vários departamentos/áreas eprofissionais que exercem atividades de comunicação nas empresas ouentidades”, complementa o autor.

Embora o conceito de comunicação integrada não seja novo, ainda é possívelobservar “estruturas parciais de comunicação, com serviços fragmentados e semuma política definida”. (KUNSCH, 1992, p. 87).

Trevisan (2003) argumenta que a comunicação integrada necessita de umprocesso de planejamento estratégico, pois requer uma visão acurada e

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abrangente das necessidades comunicacionais da organização para atingir oobjetivo final, que é o de contribuir para a construção das imagens interna eexterna da empresa. Pressupõe a sinergia e a integração entre as diversas áreas,ferramentas e necessidades de comunicação de uma organização.

Kunsch (2003, p. 179) ressalta que a comunicação integrada “precisa ser enten-dida como uma filosofia capaz de nortear e orientar toda a comunicação que égerada na organização, como um fator estratégico para o desenvolvimento orga-nizacional na sociedade”, hoje globalizada. É atribuição dos departamentos decomunicação nas organizações estabelecer as decisões e a condução das práticasde todas as ações de comunicação na organização, complementa a autora. Ainda:enfatiza que “aliada às políticas de comunicação estabelecidas, a filosofia deveránortear os melhores caminhos para o cumprimento da missão e da visão, ocultivo dos valores e a consecução dos objetivos globais da organização”.(KUNSCH, 2003, p. 181).

Nessa perspectiva de filosofia, a comunicação integrada, entendida como umconjunto de diferentes modalidades de comunicação, pressupõe a junção dacomunicação institucional, da comunicação mercadológica, da comunicaçãointerna e da comunicação administrativa, que formam, então, o mix ou compostoda comunicação organizacional. Esse deve formar um conjunto harmonioso,sinérgico, apesar das diferenças e das especificidades de cada setor e dosrespectivos subsetores cuja soma de todas as atividades redundará na eficáciada comunicação nas organizações, a partir de ações estratégicas e táticas decomunicação.

A comunicação institucional, por meio direto da gestão estratégica das relaçõespúblicas, é a responsável pela “construção e formatação de uma imagem eidentidade corporativas fortes e positivas da organização”, ressaltando osaspectos relacionados com “a missão, a visão, os valores e a filosofia daorganização e contribuindo para o desenvolvimento do subsistema institucional,compreendido pela junção desses atributos”. (KUNSCH, 2003, p. 164-165).

Direcionada à divulgação da oferta da organização, a comunicação mercadoló-gica envolve as manifestações comunicativas surgidas a partir de um obje-tivo mercadológico, cuja mensagem persuasiva é elaborada a partir do qua-dro sociocultural do consumidor-alvo e dos canais que lhe servem de acesso,utilizando-se das mais variadas ferramentas, conforme Galindo (1986) apud(KUNSCH, 2003).

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(!! A comunicação interna é um setor planejado, cujos objetivos precisam ser bem

definidos, para que então haja toda a interação possível entre a organização eseus empregados, utilizando as ferramentas da comunicação institucional e atéda comunicação mercadológica (endomarketing). (KUNSCH, 2003). Conforme aautora, à medida que a comunicação interna se desenvolve no conjunto de umacomunicação integrada, tendo políticas globais bem delineadas e programas deação voltados prioritariamente para todo o público interno, poderá ser muitomais eficiente/eficaz.

A comunicação administrativa abrange todos os conteúdos do cotidiano daadministração da empresa, buscando atender às áreas centrais de planejamentoe às estruturas técnico-normativas. (TORQUATO, 2002). Tem como finalidadeorientar, atualizar, ordenar e reordenar o fluxo das atividades funcionais.

Kunsch (2003, p. 180) ressalta que a importância da comunicação integradanas organizações tem seu princípio no fato de “permitir que se estabeleça umapolítica global, em função de uma coerência maior entre os diversos programascomunicacionais, de uma linguagem comum a todos os setores e de um com-portamento organizacional homogêneo”. Atenta, também, para o fato de que,assim, evitam-se sobreposições de tarefas. Sendo assim, o processo deplanejamento de comunicação integrada pressupõe as seguintes etapas:pesquisa e levantamento de dados, briefing, diagnóstico e proposta de umaestrutura integrada. (KUNSCH, 1992).

O desafio consiste, então, em considerar as particularidades das diversas áreasde gestão e os níveis intermediários que se relacionam, estando em constanteinteração. A linguagem necessita ser única e se dirigir para um único sentido,objetivando a integração das ações, dos atos e das atividades da comunicaçãoorganizacional, sem esquecer de considerar a cultura organizacional, suasespecificidades explícitas e/ou implícitas.

Instrumentos da comunicação institucional

Seguindo a proposta de Kunsch (2003) para a comunicação integrada nasorganizações, são considerados como instrumentos de comunicação institucional:as relações públicas, o jornalismo empresarial, a assessoria de imprensa, apublicidade/propaganda institucional, a imagem e a identidade corporativa, omarketing social, o marketing cultural e a editoração multimídia. Em função de

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que o objeto de estudo neste artigo é a implementação/reestruturação de umjornal em uma IES, a seguir contemplam-se elementos da teoria que o ratificamcomo um instrumento de comunicação organizacional.

Para a comunicação institucional, a assessoria de imprensa é uma subárea im-portante nas mediações das organizações com os públicos com que se relacionam.Sob o gerenciamento da assessoria de imprensa, o jornalismo empresarial écompreendido como significativo e pioneiro e, em conjunto com as relações públicase a propaganda, forma o tripé clássico que tem por função organizar os fluxos paradisseminar as informações nas organizações. (KUNSCH, 2003).

Os chamados house-organs, dentre eles o jornal institucional, mantêm-se como“canais importantes de relacionamento da empresa com os diversos públicos,em especial os colaboradores”; no entanto, as organizações “ou não avaliam demodo regular sua eficácia, baseadas em consultas freqüentes aos públicos”,ou, “quando o fazem, adotam uma metodologia caseira” que objetiva legitimar oque vem se fazendo. (BUENO, 2003, p. 14).

A prática organizacional revela que as “publicações empresariais constituem hojeferramenta de primeira grandeza das organizações”, pois o jornalismo empresarial“se apropria da teoria e dos modelos paradigmáticos como área de conhecimentoe do mercado profissional” de acordo com Kunsch (2003, p. 168). Desse modo,tem-se a justificativa para a descrição empírica do jornal institucional – ferramentade comunicação em uma IES.

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As universidades estão claramente inseridas no complexo organizacional(KUNSCH, 1992) e, como tal, tornam-se agentes da realidade organizacional quese produz, se reproduz e se transforma por meio da interação dos diferentesgrupos de indivíduos que as compõem. (CHANLAT, 2000; MORIN, 2001).

A Reforma do Estado, no Brasil, transformou a “educação de direito” em serviço,passando a perceber as universidades como prestadoras de serviço, conferindo-lhes a “idéia de autonomia universitária”, introduzindo o vocabulário neoliberalpara refletir o ensino de graduação, conforme transparece em expressões como“qualidade universitária, avaliação universitária e flexibilização da universidade”.(CHAUÍ, 1999, p. 210).

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(!( Sendo assim, o papel da comunicação no sistema organizacional universitário

passa a adquirir fundamental importância. Objeto cobiçado pelos gestores quena hierarquia possuem poder, a comunicação organizacional pode se transformarem processo de manipulação, tanto de interesses pessoais quanto como trans-missora do pensamento organizacional – missão, visão, valores, filosofia epolíticas que representam a cultura da empresa.

Complementa Kunsch (1992), ao afirmar que não há mais espaço para a con-cepção de serviços parciais de comunicação nas universidades, com atividadesextemporâneas, sem que haja um planejamento integrado e com políticas decomunicação bem definidas.

Scroferneker (2001, p. 78) diz que a ausência de políticas de comunicaçãoclaramente definidas “compromete toda e qualquer proposta de mudança”, poisnormalmente “os segmentos envolvidos – professores, alunos, funcionários –não são comunicados, nem convidados a refletir sobre o significado dessasmudanças e do impacto no seu cotidiano”.

Em pesquisas realizadas, Kunsch (1992) e Scroferneker (2001, p. 82), emmomentos e realidades diferentes, porém complementares, observam que acomunicação nas universidades ainda é incipiente, não sendo tratada como“elemento vital” e como uma “ferramenta estratégica”.

Há de se considerar também que o Ministério da Educação instituiu, através daLei 10.861, de 14 de abril de 2004, o Sistema Nacional de Avaliação da EducaçãoSuperior (Sinaes), que, na dimensão quatro, passa a avaliar nas universidadescomo se estabelece: “A comunicação com a sociedade”, tendo como indicadoresa comunicação interna no âmbito dos canais de comunicação e sistemas deinformações e, ainda, a ouvidoria; e a comunicação externa, no âmbito dos canaisde comunicação e sistemas de informações; e a imagem pública das IESs.

Partindo desse contexto, verifica-se que é premente que as universidades revisemsua concepção de comunicação e a forma como é conduzida, objetivando evitardistorções de condutas e objetivos organizacionais, a partir de um efetivoplanejamento de comunicação integrada com políticas claras.

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Após a apresentação do arcabouço teórico sobre cultura organizacional, comuni-cação organizacional e comunicação integrada, se relatada a experiência de umauniversidade no Rio Grande do Sul quando da implementação/reestruturação doABC Jornal,2 ferramenta de comunicação institucional.

Antes da análise específica do ABC Jornal, vale destacar alguns princípios desociedade para e pela qual a universidade em estudo orienta as suas ações,sendo eles: de uma sociedade humanizadora; da promoção da melhoria daqualidade de vida; da participação de todos a bens e benefícios da cultura, daciência e da tecnologia; da promoção da convivência solidária; da inovação dasrelações interativas; dos valores de igualdade, da democracia e do pluralismo.

Com base nesses princípios, foram definidos: a missão, os objetivos, as políticase as estratégias necessários ao desenvolvimento, referenciais orientadores dasadministrações do período. Os aspectos que norteiam a missão são: a promoçãoe a difusão de conhecimentos; a promoção da melhoria da qualidade de vida; aformação de cidadãos competentes, com postura crítica, ética e humanista; aatuação como agentes transformadores.

Para cumprir essa missão, a instituição estabeleceu como objetivo superior, oufinalidade, a qualidade de vida e o desenvolvimento. Esse objetivo estabelece abusca do desenvolvimento da sociedade por meio da formação de recursoshumanos e do desenvolvimento e da difusão de conhecimentos científicos,tecnológicos e culturais, configurando-se como centro de excelência, com vistasao aprimoramento da sociedade, conforme estabelece o Plano de DesenvolvimentoInstitucional (PDI) neste início de século XXI.

A partir dos princípios norteadores da universidade e da missão, é possívelperceber alguns traços culturais dessa IES, que estão explicitados nos documentosinstitucionais, os quais são de livre-acesso aos públicos. Ainda, a missão dauniversidade, bem como sua história, estão apresentados no site da instituição –ferramenta de comunicação utilizada para todo tipo de informação (intranet), tendocomo principais públicos alunos, funcionários e professores.

22222 ABC Jornal é um nome fictício adotado neste estudo que tem por objetivo preservar a identidade dauniversidade neste relato.

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(!$ O instrumento de comunicação descrito neste artigo é o jornal institucional –

house-organs – na instituição de ensino aqui relatada, sendo uma ferramenta decomunicação que já existe na organização há mais de onze anos. Nesse período,passou por diversas fases. O relato começa a partir da última modificação quantoao formato, ao editorial, aos canais de distribuição, aos públicos, à editoração eà periodicidade.

Em 1998 essa universidade passou por um processo eleitoral. O grupo queassumiu a gestão entendia que havia a necessidade de rever as ferramentas decomunicação. Para tanto, sob a responsabilidade do Setor de Marketing e daAssessoria de Imprensa foi realiza uma pesquisa no período de setembro a outubrodo ano de 1998.

A pesquisa foi direcionada a alunos, funcionários e professores da instituição. Ouniverso considerado foi o campus central e os demais cinco campi da instituição.Foram realizadas 89 entrevistas com professores (erro amostral de 10%); 91entrevistas com funcionários (erro amostral de 9,8%); e com 445 alunos (erroamostral de 4,6%), utilizando o cálculo para uma amostra aleatória simples.(BARBETTA, 1994).

O objetivo da pesquisa foi identificar o grau de satisfação dos públicos em relaçãoao jornal institucional que era veiculado, objetivando coletar informações para que,posteriormente, a gestão tomasse as decisões gerenciais cabíveis. As questõesrelativas às informações versaram sobre os seguintes aspectos: a forma como ospúblicos obtinham informações sobre a universidade – buscando identificar osmeios de comunicação que mais atingiam os entrevistados, considerando cadapúblico pesquisado; se o entrevistado conhecia ou não o atual jornal da instituição;os aspectos editoriais que deveriam caracterizar um jornal universitário, tendo porobjetivo identificar quais os atributos de maior relevância para os públicos; o inte-resse pelos temas de ensino-graduação, assuntos específicos da área, assuntoscientíficos, assuntos culturais, assuntos gerais da universidade, lazer e esporte;hábitos de leitura dos públicos em relação ao jornal da universidade, quanto àquantidade de matérias que habitualmente eram lidas, a aspectos determinantespara a escolha dos temas, à disposição para leitura e à verificação do usuário finaldo jornal; a forma de escolha dos artigos para leitura (folheando o jornal, a partir detítulos interessantes, temas específicos da área, através de autores maisconhecidos; em que locais o jornal era lido); quantas pessoas, em média, liam omesmo exemplar; de que forma os públicos tinham acesso ao jornal; se haviafalhas no jornal e sugestões para melhorá-lo.

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A partir das informações obtidas com os entrevistados, fez-se a análise das mesmase se chegou à conclusão de que o atual jornal tinha muitas falhas, principalmenteno aspecto da linha editorial. Sendo assim, a decisão tomada foi pela reestruturaçãocompleta, incluindo um novo nome para o mesmo. Surge, então, o ABC Jornal,implementado no segundo semestre de 1999, sob a responsabilidade da Assessoriade Imprensa da universidade, com as seguintes características:a) perfil: jornal informativo, com periodicidade mensal, dando visibilidade às

produções científica, acadêmica, institucional e cultural e à inserção comunitáriada universidade. Para isso, busca elementos do jornalismo científico, do noti-ciarismo, da prestação de serviços e da opinião, em formato que visa à profun-didade do conteúdo e à facilidade de leitura, através de aspectos visuais atra-tivos e textos objetivos;

b) público-alvo: além da comunidade acadêmica – alunos, professores e funcioná-rios – o ABC Jornal alcança alunos do Ensino Médio e de cursos pré-vestibulares,entidades de classe e formadores de opinião, com a finalidade de reforçar aimagem da universidade como instituição de inserção comunitária. O jornal serve,ainda, para divulgar a instituição a outras IESs, órgãos de imprensa e gover-namentais, projetando nacionalmente o trabalho desenvolvido pela universidade;

c) formato: revista 25x30, capa e páginas centrais coloridas e demais páginasem preto-e-branco, com tiragem de 8 mil exemplares;

d) conteúdo: o ABC Jornal abrange assuntos de interesse comunitário que de-monstrem o vínculo da universidade com o desenvolvimento regional. Adistribuição do jornal entre alunos do Ensino Médio possibilita sua utilizaçãoem salas de aula e como referencial de temáticas atuais. O ABC Jornal tambémé um espaço para divulgação científica, facilitando a compreensão do leigosobre as pesquisas realizadas e aproximando a comunidade da produçãocientífica da universidade. Acima de tudo é um canal de comunicação dainstituição com a comunidade. Todo o conteúdo do jornal também está napágina da internet.

Percebe-se, nessa construção, que o ABC Jornal contempla aspectos relacionados àmissão e à concepção de universidade que a instituição em análise destaca comorelevantes, elementos esses descritos, portanto, materializados, e que refletem acultura e os pressupostos da mesma. Também há de se considerar que foi realizadapesquisa, ou seja, um questionamento aos públicos internos sobre suas expectativase necessidades de comunicação, para que, então, decisões gerenciais fossem to-madas, considerando os fluxos ascendentes, descentes, por direções laterais internase externas. (BALDISSERA, 2000; TORQUATO, 2002; KUNSCH, 2003). Dessa forma,é possível dizer, com relação aos aspectos relatados, que a instituição contempla o

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(!* arcabouço teórico destacado neste estudo, quanto a como proceder e quanto ao que

considerar para o planejamento da comunicação organizacional. (BALDISSERA, 2000;TORQUATO, 2002; KUNSCH, 2003).

As modificações que o jornal sofreu ao longo desses seis anos foram realizadasa partir da experiência dos jornalistas responsáveis pela elaboração do mesmo,ou seja, não houve nova pesquisa, nem ao menos se utilizou um instrumento decoleta de dados que tenha avaliado o grau de satisfação dos públicos que foramanteriormente pesquisados. O processo de pesquisa foi interrompido, impossi-bilitando a retroalimentação como a teoria sobre a comunicação organizacionalenfatiza. (BALDISSERA, 2000; KUNSCH, 2003).

No planejamento de comunicação de 2006, está prevista a realocação de públicospara o ABC Jornal, passando a atingir somente os funcionários, com linha edito-rial que enfatize assuntos da gestão organizacional e temas mais genéricos re-lativos à universidade.

A agência de publicidade e propaganda – responsável pelo planejamento decomunicação da universidade – justifica a mudança, em função de ter criadouma revista direcionada aos alunos da universidade com perspectiva de ampliara distribuição aos alunos do Ensino Médio e cursos pré-vestibulares.

A agência de publicidade e propaganda argumenta que os professores têm acesso atodas as informações da universidade através da intranet e que está prevista aelaboração de um boletim direcionado a esse público, ampliando a distribuição aosveículos de comunicação da região e do País, formadores de opinião e a outras IESs.

Com a ação de reestruturação do ABC Jornal, verifica-se a fragmentação e dis-persão da comunicação. Assim, a instituição corre o risco de perder uma ferra-menta de comunicação que esteja cumprindo com seus objetivos e com sua funçãoorganizacional. Tal fato pode ser atribuído, hoje, à falta da presença mais intensada Assessoria de Imprensa nas decisões de comunicação, atualmente gerenciadasquase na totalidade pelo Setor de Marketing. Outro aspecto a ser considerado éque a instituição deixa o planejamento da comunicação organizacional com a agênciade publicidade e propaganda. Ratifica-se, então, que a decisão gerencial de realocaros públicos do ABC Jornal não foi tomada tendo como base a pesquisa.

Também, se constata que a instituição não possui políticas claras e definidas decomunicação, fato presente desde que a universidade institucionalizou a Assessoria

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de Imprensa e o Setor de Marketing. O que existe é o planejamento de comunicaçãoanual, desenvolvido pela agência de publicidade e propaganda, implementado apartir de 2003 e que nem sempre é cumprido na íntegra, às vezes só em parte.

Mediante tais constatações, não é surpresa que na rede/fluxo de comunicaçãoinformal, haja o consenso de que existem falhas grandes de comunicação,principalmente no sentido interno. Baldissera (2000), Scroferneker (2001) eKunsch (2003) já alertaram para os riscos que as organizações correm por nãorealizar o planejamento de comunicação, e por não considerar a comunicaçãoorganizacional. Nesse sentido, fica prejudicada toda e qualquer iniciativa quetenha por objetivo implementar um processo de comunicação integrada.

Outro fato a ser mencionado e que está relacionado à cultura organizacional,porém materializado nos documentos formais, mas que afeta diretamente acomunicação organizacional, diz respeito à política institucional que rege asdecisões da instituição, em muitos casos se sobrepondo à concepção deuniversidade proposta. Nesse contexto, é usual que os gestores detentores dopoder utilizem-se das ferramentas de comunicação para fins de promoção dagestão, com objetivos de se perpetuarem no poder. Essa constatação é pontuale hoje se reflete no editorial do ABC Jornal.

Sugere-se que a organização reveja sua concepção de comunicação organizacional,para que efetivamente possa ter uma imagem positiva ao seu público interno,implementando o planejamento estratégico de comunicação que contemple omix/composto da comunicação/comunicação integrada. É importante evidenciarque a comunicação organizacional é que sustenta e reproduz a imagem da empresaperante os públicos com os quais essa se relaciona.

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A comunicação organizacional, no contexto das organizações pós-modernas, paraque possa atingir seus objetivos, necessita, primeiramente, considerar a culturaorganizacional, pressuposto ratificado pelos autores apresentados neste estudo.

É importante para uma organização a integração de suas atividades de comu-nicação – comunicação integrada – em função do fortalecimento de seus conceitosinstitucional, mercadológico e corporativo em seus públicos. Isso poderá acontecerse efetivamente a gestão da comunicação organizacional considerar as dimensões

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(!& e os fluxos que permeiam a construção/desconstrução das relações pessoais e

profissionais nas empresas.

Conforme foi possível observar quanto às decisões estratégicas relacionadas aoABC Jornal, percebe-se que no momento de sua implementação/reestruturaçãoa instituição de ensino considerou alguns dos pressupostos que norteiam a teoriada comunicação organizacional, mas em função de a mesma não ter claramentedefinidas suas políticas de comunicação, os processos anteriormente seguidosacabam se perdendo nesse novo momento de planejamento de comunicação aoqual a instituição se propõe. Sendo assim, corrobora-se com o argumento deBueno (2003, p. 9) quando destaca que a comunicação integrada, ainda hoje,“se constitui em mais um discurso, apropriado pelos especialistas e gestores dacomunicação, do que uma prática efetiva no quotidiano das organizações”.

É importante salientar que não se pode generalizar os dados apresentados nauniversidade que relata a experiência com o ABC Jornal; no entanto, há de seconsiderar que pesquisas realizadas em outras universidades (KUNSCH, 1992;SCROFERNEKER, 2001), demonstram que as IESs têm dificuldade emcompreender a importância da comunicação organizacional. Também se percebeque são incipientes no que tange às práticas comunicacionais – comunicaçãointegrada – praticando-as de forma fragmentada e incompleta, uma vez que nãodesenvolvem um planejamento estratégico de comunicação organizacional, vindoa correr sérios riscos de construção/desconstrução de sua imagem diante dospúblicos com os quais mantêm relações.

Essas são as contribuições gerenciais deste estudo, que podem servir de basepara que a IES em análise reveja os pontos estratégicos da gestão da comunicaçãoorganizacional. As implicações acadêmicas dizem respeito à análise empíricados conceitos teóricos referentes à comunicação organizacional e à implementaçãodos pressupostos da comunicação integrada nas organizações, já conhecidas dacomunidade acadêmica.

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BALDISSERA, Rudimar. Comunicação organizacional: o treinamento de recursos humanoscomo rito de passagem. São Leopoldo: Ed. da Unisinos, 2000. p. 13-39.

BARBETTA, Pedro Alberto. Estatística aplicada às Ciências Sociais. Florianópolis: Ed. daUFSC, 1994.

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MORIN, Edgar. A complexidade e a empresa. In: MORIN, Edgar. Introdução ao pensamentocomplexo. 3. ed. Trad. de Dulce Matos. Lisboa: Instituto Piaget, 2001. p. 123-136.

SCROFERNEKER, Cleusa Maria Andrade. Os (des)caminhos da comunicação naimplantação do programa de qualidade total da universidade brasileira. EducaçãoBrasileira, Brasília, v. 23, n. 46, p. 75-91, jan./jun. 2001.

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Álvaro Benevenuto JúniorÁlvaro Benevenuto JúniorÁlvaro Benevenuto JúniorÁlvaro Benevenuto JúniorÁlvaro Benevenuto Júnior22222

RESUMORESUMORESUMORESUMORESUMO

A tecnologia tem interferido nas mais singelas ações do cotidiano. Da cozinha ao computador, atecnologização da sociedade atual, processo verificado com maior nitidez nas duas últimas décadasdo século XX, transforma o homem em um ser cada vez mais dependente de aparelhos eletrônicose, ao mesmo tempo, de informações que condicionam sua operação (dos manuais de operaçãoaos telejornais). Essa “tecnoocupação” da vida permite análises sobre o resultado da ação docapital sobre a mídia, transformando-a num potencial veículo de consolidação do lucro. Esteartigo pretende seguir por caminhos que propiciem observar o impacto da ação capitalista produtivo-lucrativa, partindo da liberdade e do direito de agir do cidadão, de forma comunicativa e corporativa,apreendendo a tecnologia disponível.

Palavras-chave: Palavras-chave: Palavras-chave: Palavras-chave: Palavras-chave: Tecnologia da comunicação. Economia da Comunicação. Mídia e interação so-cial.

ABSTRACTABSTRACTABSTRACTABSTRACTABSTRACT

Technology interfers with the most simple acts of daily actions. From the kitchen to the computer,the approach to technology in the current society (a process verified with igger clearness duringthe last two decades), transforms man into a great electronic devices dependent and, at the sametime, of the information that conditions its operation (from the operation manual to the news). This“techno-occupation” of life allows us to analyse the results of the action from the capital on themedia, transforming it into a potential vehicle of consolidation of profit. This article intends tofollow the ways that propitiate the bservation of the impact on the productive-lucrative capitalistaction: from the citizen´s freedom and his right to action in a communicative and corporative form,apprehending the available technology.

Key words:Key words:Key words:Key words:Key words: Communication technology. Communication economy. Media and social interaction.

11111 Texto produzido para a disciplina de Comunicação, Política e Cidadania do PPG em Comunicação ePolítica da Universidade de Santa Cruz do Sul (2006-2007).

22222 Doutor em Ciências da Comunicação pela Unisinos. Professor da disciplina Televisão na Universidadede Caxias do Sul (UCS). Pesquisador no CNPq.

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As características das interações sociais contemporâneas estão cada vez maispresas ao uso de aparatos tecnológicos, como indicam, principalmente, estudosrelatados por Silverstone e Hirsch,3 que dirigem o foco de atenção paraexperiências individuais, ocorridas no âmbito da família e do lar, mediadas pelatecnologia disponível no mercado: do forno de microondas ao computador que,conectado, acessa o ambiente das redes. Uma reflexão sobre as transferênciasdos tempos e as mudanças nas características das interações sociais ecomunicativas, a partir da tecnologização da sociedade, é necessária para pensara economia midiática.

O que mudou nos espaços das interações com a inclusão desses aparatostecnológicos? Perguntar isso, num momento em que o cotidiano se caracterizapela ampla possibilidade de comunicação em tempo real com nossos pares, trazum ar de nostalgia.4 As tecnologias de informação inserem-se fácil e rapidamenteno cotidiano social. Primeiramente porque elas, antes mesmo de surgirem, fazemparte de uma histórica atração humana pela novidade e pelo tecnológico. Segundo,porque a busca pela vida plena, pela praticidade que pode ser proporcionadapelos artefatos, igualmente encanta.5

No fim dos anos 60, os artefatos tecnológicos exóticos mais comuns numaresidência de classe média eram: fogão, liquidificador, batedeira, geladeira,bicicletas e um automóvel (geradores de interação social), telefone, receptoresde rádio e TV (geradores de interação comunicativa). Às crianças, um trenzinhoelétrico, um autorama ou uma boneca que falava ou se movimentava bastavapara estabelecer um ambiente de interação social com seus pares.

Esses aparelhos davam conta de certo conforto para preparar a alimentaçãodiária, para propiciar deslocamentos a lugares de lazer e para revigorar os laços

33333 SILVERSTONE, Roger; HISCH, Eric (Eds.). Los efectos de la nueva comunicación: el consumo de lamoderna tecnología en el hogar y en la familia. Barcelona: Bosch, 1996.

44444 Refiro-me aqui à lembrança daquele tempo em que as brincadeiras de rua começavam com a construçãodos brinquedos, seja do carrinho de lomba, do corte dos galhos de eucalipto para fazer as traves da goleiraou das “incursões” na pequena oficina para construir as mobílias em miniatura das bonecas, muito comumnas cidades pequenas, mesmo que estivessem próximas das metrópoles.

55555 BENEVENUTO JÚNIOR, Álvaro; HEBERLE, Antônio. Gestão e funcionamento das interações sociais con-temporâneas. São Leopoldo: Ed. da Unisinos. 2002. p. 1. Mimeo.

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sociais familiares com parentes distantes e para o acesso a noticiários e aoentretenimento da mídia. Exigiam, assim, destinar tempos cotidianos específicospara cada atividade, permitindo a interação social, intrafamiliar nos interstíciosdo fazer de cada uma dessas atividades.6

A hora de preparar a refeição, por exemplo, constituía-se num momento deinteração presencial, ao vivo, entre pais e filhos, vizinhos e, em algum tempo,amigos de diferentes ambientes (escola, trabalho, igreja, viajantes). A definiçãoe a quase-imobilidade desses tempos proporcionavam outros momentos deinteração, como o fim de tarde, quando os vizinhos se encontravam nas calçadaspara conversar sobre o corriqueiro, o cotidiano da vizinhança para, em seguida,encerrar o dia ouvindo o noticiário no rádio e/ou assistindo à televisão, à novelae a programa de variedades ou filme, de temática complexa.7

Isso era possível porque os tempos cronometrados das décadas de 60-70,determinados pela dependência operacional e pelo precário funcionamento dossistemas de aparatos tecnológicos de interação comunicativa,8 tinham “lugaresfixos”, isto é, a hora da escola era uma, o trabalho ocupava duas partes do dia,o lazer/entretenimento vinha logo em seguida.

Localizar as interações dessa época nesses lugares e tempos, definidos poruma lógica de uso de uma tecnologia “rústica” e da preservação dos ambientesprivados e públicos, é definir uma característica de interação presencial, partici-pativa,9 de um espaço público, conforme Habermas.

66666 Inspirada em E. Goffman, a pesquisadora salienta que as “enunciações não se sustentam sozinhas,não fazem sentido isolado. A conversão, “transe socializado”, unio mystica, está assentada emcomplexos jogos de cena que vão sustentar o contato, fundar a troca de palavras, projetar um indivíduoao outro”. (FRANÇA, Vera R. V. Comunicação, sociabilidade e cotidiano: o fio de Ariadne, a palavra darua. In: FAUSTO NETO, Antonio; PINTO, Milton José. O indivíduo e as mídias. Rio de Janeiro: Compós;Diadorim, 1996. p. 101).

77777 MILANESI, Luís. O paraíso via Embratel. São Paulo: Paz e Terra, 1985. p. 87s.

88888 Os eletrodomésticos não tinham timers, controle remoto ou memória artificial, exigindo a presença deseus operadores para sua aplicação. No caso dos aparatos de interação comunicativa, como o telefone,o rádio e a televisão, as operações mais simples eram longas. A exemplo, um telefonema para a cidadevizinha poderia demorar quatro horas para ser completada, porque ela dependia da liberação de linhas atéo destino, além de ser operada manualmente.

99999 França fala que as interações sociais se completam quando há resposta a um estímulo gerador dademanda. (FRANÇA, op. cit., p. 101-102).

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(#$ A partir da segunda metade da década de 70, centralmente nos países em

desenvolvimento, acompanhou-se outro movimento da modernização da economia,com o acelerado processo de multinacionalização da indústria e da fácil mobilidadedo capital. A marca nacional se transformou em multinacional, modificando ostempos da vida dos empregados em função das diferenças de fuso horário.Significa que, ao transferir o controle administrativo para um outro lugar, distante,as definições da temporalidade local das interações foram reorganizadas.

Esse processo aconteceu concomitantemente com o desenvolvimento das no-vas tecnologias de comunicação, fundamentais para administrar instituiçõescontemporâneas, sem locais fixos. Essa transformação incide diretamente nareorganização dos tempos sociais característicos e particulares de cada lugar.Da mesma maneira, interfere no tempo do trabalho, ampliando-o para as 24horas do dia. Muda o tempo da brincadeira, substituindo a ação lúdica deconstrução dos brinquedos pela compra de aparelhos eletrônicos automotivosem oferta no mercado. Muda também o tempo do lar, ao trazer para dentro decasa o conforto dos controles remotos (eletrodomésticos programáveis) e dasopções pré-prontas (alimentos congelados, telentregas, restaurantes, ingressosa espetáculos de arte, etc.), marcas desse outro momento.

A nova configuração do tempo reestruturou o espaço privado, integrando nele asatividades características dos espaços públicos, como a continuação dasatividades profissionais (agora em rede) e as brincadeiras, que deixaram deacontecer nas ruas e praças, se transferindo para a tela de videogames ou decomputadores, muitas vezes, conectados à internet. Muda a característica dasinterações comunicativas, presenciais e participativas. As conversas com pessoasque estavam longe, feitas por cartas e ao telefone, são efetivadas em real time,por meio da conexão com a internet. A referência definidora dos limites entre osespaços públicos e privados dilui(u)-se na calçada da rua e transfere(iu)-se paraa capacidade processadora dos aparatos tecnológicos da comunicação.

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Os novos lugares e as novas formas de interação têm oferecido elementos paraobservar a sociedade contemporânea. Começando pela forma como seestabelecem a gestão e o funcionamento das interações sociais e comunicativas.Num primeiro momento, percebe-se que essas relações são gerenciadas pelamídia. Grosso modo, elas acontecem quando o indivíduo convoca seu par,

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oferecendo situações que permitam o reconhecimento de falas e experiênciasvividas, mobilizando-o a uma outra situação, construída e constituída de falas eexperiências gestadas a partir da nova experiência que visa à construção de umprocesso onde os nexos entre essas experiências10 é permeado pela gestãoindividual.

É importante considerar os contornos do modo de ocorrência dessas duasinterações: no âmbito presencial e no participativo, estando os indivíduosinteragentes mobilizados para a ação num tempo e num espaço concomitantes econcretos, vive-se essa experiência comunicativa ao sabor de interferênciasintemporais e imprevistas conforme a lógica das opiniões imediatas. Ao usar atecnologia de comunicação, que assume o papel de meio, incorpora-se umelemento mediador da experimentação inovadora, a partir de referenciais daalteridade, proporcionando um tempo de reflexão não mais imediato, eliminandoa astúcia do comentário.

Nesse lugar, a convocação do outro acontece por mensagens que passam porum trabalho de montagem-desmontagem-remontagem. Elas, sutil e concretamente,ficam à deriva das condições e das imposições vulneráveis a estratagemacomercial, estabelecidas a partir de parâmetros sociolucrativos, ditados peloscomandos das instituições produtoras da comunicação. A conversa se aproximado sentido da manipulação da mensagem, sem que isso represente julgamentode valor moral ou ético. Significa dizer que essa interação, agora midiatizada,inclui elementos de uma experiência vivida estranha à dos interagentes(espectadores/consumidores) presenciais e imediatos.

A mídia será, nessa hora, a produtora daquilo que cabe ser interpretado comoum terceiro sentido na experiência interacional, revelando importante característicado fenômeno: ao estar atrelada a interesses (econômicos) estranhos aosindivíduos e ao ter alto potencial de circulação e consumo, transforma-se numoutro lugar de sociabilidade, agora comunicativa. “En todas las encuestas enque se pregunta a la gente quién tiene demasiado poder en la sociedade actual,los medios de comunicación aparecen en los primeros lugares.”11 Quer dizerque, se a mídia não “fala” a respeito de algo, esse algo não é concreto.

1010101010 FRANÇA, op cit., p. 102.

1111111111 NEUMANN, Elisabeth Noele. La espiral del silencio: o o o o opinión pública: nuestra piel social. Madrid: Paidós,1996. p. 204.

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(#* O resultado dessa ação no ambiente privado é representado pelas mudanças

nos modos de (re)conhecer o mundo e de experimentar as interações, mudando,inclusive, o agendamento das atividades familiares. Por exemplo: se é anunciadaa previsão de chuva durante um feriado prolongado, os planos de ida à praia sãoadiados. É a simples previsão da condição climática exposta pela mídia, inter-ferindo na rotina de milhares de famílias de uma determinada região geográfica.

Também são resultado da atitude gestora da mídia os comportamentos dosindivíduos diante do estilo de vida e de consumo. A moda, nesse aspecto, é umareferência mais explícita do poder midiático.12 Ao apresentar suas propostas demundo ideal a seus milhares de espectadores/consumidores, potencializado comas transmissões globais através dos satélites e da internet da moda, a mídiaconfirma sua capacidade de gerir as interações contemporâneas, impondo umtipo de funcionamento preestabelecido da sociedade. A mídia aumenta e consolidao fosso entre os grupos sociais, desrespeitando a expressão da multiplicidade.13

O exercício de rascunhar o quadro das novas interações midiatizadas resultanum esboço onde tudo e todos terão como prioridade a circulação pelo ambientevirtual, transferindo para segundo plano as interações presenciais e participativas,como as relatadas no início deste texto. Sem ser apocalíptico, nem integrado,esse rabisco alerta para a necessidade de estudos, debates e divulgação depropostas e de ações que instiguem a busca do equilíbrio nas interaçõespresenciais-participativas em relação às virtuais-participativas.

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Não faz muito tempo que a mídia passou a ser objeto de destaque para aspesquisas, e já são muitas as citações sobre o impacto e os efeitos desse

1212121212 Os seriados vespertinos, como “Malhação”, exibido pela Rede Globo de Televisão desde 1998, nafaixa das 18 horas, é um bom exemplo para essa reflexão. Ali, os personagens – todos adolescentes –adolescentes vivem situações características de sua faixa etária, vestem-se com os lançamentos daindústria do vestuário, usam a gíria presente em outros veículos dirigidos a esse público, criando a imagemde pertinente para a época. Ao mesmo tempo, esses seriados servem como instrumento de campanhaspublicitárias de cunho social, como a prevenção da Aids, combate às drogas, segurança no trânsito. Éinteressante notar que temas polêmicos são evitados, como questões políticas e o debate a respeito dasopções individuais em relação ao gênero.

1313131313 BAUMANN, Zygmunt. Globalização: as conseqüências humanas. Rio de Janeiro: J. Zahar Editor, 1999.

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campo na sociedade. Esses estudos buscam referências em clássicos, a exemplode Aristóteles, quando se aponta a necessidade de ampliar a área do conheci-mento, passa pela Acta Romana, pelas impressões chinesas, de Gutenberg, epelo uso da imprensa na Revolução Francesa para apresentar a mídia, com aqual nós convivemos, como fundante do cotidiano.

Não é estranho saber que alguém é despertado por uma mensagem radiofônicano lugar do canto do galo; ou que começa o dia vendo a programação da televisãoantes mesmo de ouvir o rádio ou o sonido estridente e monótono do despertador.É comum também saber de que há alguém que, antes de qualquer atividadecotidiana, conecta-se à rede.

São sintomas explícitos de que a mídia está dentro da rotina, realizando suaatividade central – e muito pouco percebida – que é a de incentivar açõesindividuais que sustentam a circulação de mercadorias e mantêm a geração delucro do capital. A propósito dessa linha de pensamento, Martín-Barbero e Reyafirmam que “a experiência cultural latino-americana desse fim de século nãopode ser pensada fora das novas estruturas comunicativas da sociedade”,14

indicando que essas estruturas escamoteiam sua interdependência com o capi-tal e o seu propósito de ação único que visa a um objetivo, isto é, ao lucro,mesmo que ele não signifique diretamente ganho financeiro.

A presença da mídia no cotidiano é de tal força que Sodré considera-a como oquarto bios, dotada de tal poder que supera e perpassa as três outras formastradicionais da existência humana: a vida contemplativa, a vida política e a vidaprazerosa.15 Como uma quarta maneira de vida, ela acaba sendo a responsávelpela ordenação do cotidiano.

Na perspectiva de um quarto bios, a televisão se apresenta como a alternativamais comum de meio de ação comunicativa na sociedade atual. Sua aparição,na segunda metade da década de 30, foi acompanhada de variantes econômico-políticas, que permitem resgatar os laços estreitos entre o mercado e a mídia.

1414141414 MARTÍN-BARBERO, Jesús; REY, Gérman. Os exercícios do ver: hegemonia audiovisual e ficção televisiva.São Paulo: Senac, 2001. p. 30.

1515151515 SODRÉ, Muniz. Antropológica do espelho: uma teoria da comunicação linear em rede. Petrópolis:Vozes, 2002. p. 25.

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(#& A primeira transmissão experimental de TV nos Estados Unidos, de uma partida

de beisebol, revela uma pista importante do interesse do capital sobre essenovo meio de comunicação, o que se concretizou logo após a implantação dosistema. Na Inglaterra, a primeira transmissão de larga abrangência foi a coroaçãodo rei Jorge IV, em 1937, evento de interesse nacional, mobilizando toda asociedade inglesa. Cinqüenta mil espectadores acompanharam o espetáculo.16

Para melhor entender esses movimentos, é importante ter presente que naquelaépoca o mundo se recuperava da crise da Primeira Guerra e da Revolução Russa,tendo como mola propulsora o investimento na industrialização. Os modelos deprodução em larga escala, a partir da filosofia fordista, incentivavam (e cobravam)o aumento do consumo. Isso somente foi possível com o crescimento da massade trabalhadores assalariados, contratados pela própria indústria, que tambémrecebia investimentos das bolsas de negócios.

No campo da comunicação, o cinema e o rádio eram as indústrias mais rentáveis doentretenimento, criando seus stars systems para trabalhar, indiretamente, na divulga-ção de uma grande quantidade de produtos – de uso pessoal, de cosméticos a cigar-ros, ou de uso coletivo, de aparelhos domésticos, para facilitar a rotina, e automóveis– como forma de garantir a circulação de mercadorias com o intuito de incrementar aindústria e a geração de lucro para o capital. Entretanto, foi a partir da solução da crisegerada pela ascensão do nazismo alemão, na Segunda Guerra, que o mundo retomouo desenvolvimento industrial, e o capital pautou-se pelo desenvolvimento em escalamundial até chegar aos moldes de uma globalização como conhecemos hoje.

A mobilização do capital mundial (1) para recuperar os estragos provocados pelaSegunda Guerra (2) para identificar e fortalecer politicamente o vencedor dasbatalhas e (3) para consolidar as normas de convivência civilizada entre os paísesaliados e derrotados foi acompanhada de atitudes políticas que necessitaram dosmeios de comunicação para ser reconhecidas e apoiadas pelas populações dobloco hegemônico. Não é por acaso que no documento que instala a Organizaçãodas Nações Unidas, “os meios de informação de massa (sic) estão certamenteausentes da sigla, mas a questão de sua relação com a paz e a educação foievocada amplamente desde as suas premissas”.17

1616161616 MATTOS, Sérgio. A televisão no Brasil: 50 anos de história (1950-2000). Salvador: PAS; Ianamá,2000. p. 256.

1717171717 MATTELART, Armand; MATTELART, Michele. História da utopia planetária: da cidade profética à sociedadeglobal. Porto Alegre: Sulina, 2002. p. 330.

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Esse movimento inspirou a forma de pensar as propostas de administração dasmídias, buscando resolver os problemas de alta complexidade para a operação,por exemplo, de uma TV (que envolve questões puramente técnicas, relacionadasao campo das engenharias, artísticas, intelectuais, comerciais e de relacionamentocom os espectadores).18

Enquanto esse movimento em direção à organização de um novo mercadoacontece, os estudos de mídia, que nesse tempo começavam a ser desenvolvidospelas disciplinas: antropologia, sociologia e psicologia, identificaram o fenômenoque Adorno e Horkheimer denominaram Indústria Cultural.19

A proposta de uso da mídia como elemento basilar da luta pela hegemoniaeconômico-política mundial (em especial a televisão) consolida a relação de valordos bens de consumo cultural, provocando um movimento no sentido de estabe-lecer diferenças que permitirão opções de escolha.20

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A variedade dos produtos culturais oferecidos pela televisão, no caso brasileiro,delineia um quadro interessante de análise para entender o seu desenvolvimentoe a sua inclusão na vida social contemporânea. Em seus primeiros dias de funcio-namento, a partir de setembro de 1950, seguindo o modelo radiofônico de pro-dução cultural, a Tupi investiu na exibição de programas de entretenimento (shows,variedades, humor), entremeados por uma edição jornalística, mesmo recebidapor apenas 200 aparelhos instalados no País (leia-se São Paulo).

A aparição da concorrência – a TV Record –, meses depois de sua inauguração,obrigou a emissora a pensar em outras atrações para manter sua grade, queera apresentada durante três ou quatro horas diárias. O teleteatro foi a saídada emissora pioneira para conquistar a audiência da recepção dos 7 mil apa-relhos vendidos no País em novembro de 1951.21 É importante notar, também,

1818181818 Essa diversidade de operações é especialmente tratada por BUSTAMANTE, Enrique. La televisióneconómica: financiación, estrategias y mercados. Barcelona: Gedisa, 1999. p. 14-20.

1919191919 ADORNO, Theodor; HORKHEIMER, Max. Indústria cultural: o iluminismo como mistificação de massas.In: LIMA, Luis Costa. Teoria da cultura de massa. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1978. p. 162.

2020202020 BOLAÑO, Cesar. Indústria cultural, informação e capitalismo. São Paulo: Hucitec; Polis, 2000. p. 204.

2121212121 REIMÃO, Sandra. Em instantes: notas sobre a programação na TV brasileira. São Paulo: Salesianas;Cabral, 1997. p. 21 e MATTOS, op. cit., p. 93-95.

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((! que além dos programas, a audiência era outra preocupação relevante para os

gerentes. O relato de ações para aumentar a audiência através de uma campa-nha incentivando a aquisição de televisores é revelador. O texto veiculadona época era:

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A leitura dessa propaganda revela que a integração dos interesses dos investidoresna televisão brasileira e os interesses da indústria é muito maior do que pareceser. Vale um olhar atento para o texto. A propaganda apresenta a novidade comouma benevolência de um grupo interessado no futuro do País em desenvolvimento,que quer uma sociedade moderna, com acesso aos diversos aparatos tecnológicospara o bem-estar da família nacional. Informa que a parte mais difícil foi cumprida,isto é, o investimento de “milhões de cruzeiros” e convoca os compatriotas aadquirir seus aparelhos receptores para manter a televisão nacional. Num outrosentido, a propaganda cobra, explicitamente, a responsabilidade da audiênciaem manter – por meio da aquisição dos receptores – a sobrevivência da televisão,como se ela estivesse incluída no rol de investidores.

As relações do capital e a comunicação ficam evidentes, pois os produtosapresentados pela TV são os que terão, potencialmente, maior garantia deconsumo. A publicidade e propaganda em larga escala é a ferramenta para fazercircular a produção e aumentar o lucro: o objetivo do capital. Assim também seexplica, além da experiência norte-americana da TV comercial, a inversão damaior parte das verbas publicitárias nesse veículo. “O modelo brasileiro detelevisão [...] depende do suporte publicitário, sua principal fonte de receita.”23

De acordo com o Grupo de Mídia/Meio&Mensagem, há décadas a televisãomovimenta 60% do capital de investimentos publicitários durante o ano.

2222222222 MATTOS, op. cit., p. 96.

2323232323 Ibidem, p. 66.

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Na mesma medida, a integração das indústrias culturais24, num meio decomunicação múltiplo como é a televisão, se estabelece na perspectiva decompletar um círculo de “auto-ajuda” promocional para a circulação da suaprodução simbólica. O grande volume de espectadores da televisão, mesmoatualmente dividida entre as opções tradicionais (transmissão aberta) e ascodificadas (transmissão por assinatura, independentemente de sua natureza),se caracteriza num bom ambiente para a circulação de mercadorias culturais. No“modo de funcionamento da Indústria Cultural nos dias de hoje, o que observa éque não apenas o comercial predomina sobre o desinteressado no que se refereàs decisões de investimentos, mas o próprio sucesso tem-se tornadocrescentemente fator de reconhecimento do produto por uma elite cultural”.25

Eventos especialmente produzidos para atender às necessidades tecnooperacio-nais da televisão, como campeonatos esportivos ou os megashows de cantantesda moda (como o “concerto” da dupla sertaneja Chitãozinho e Xororó no teatrodo Macksoud Plaza, em 1990); e a massificação de “Don’t cry for me Argentina”,na voz de Madonna, no campo da indústria fonográfica, ou a popularização dovôlei e do tênis (modalidades esportivas elitizadas) a partir das transmissões aovivo diante da crise do futebol, são exemplos eficientes para esboçar a auto-ajuda das indústrias culturais. De um lado, respondem à necessidade de circulaçãodas mercadorias, culturais ou não (no caso do esporte, os principais produtosem exibição são os próprios equipamentos característicos de cada modalidade eseus complementos, como vitaminas, bebidas nutritivas, entre outros), e, deoutro lado, contemplam as necessidades de entretenimento da “massa” espec-tadora da TV. Além desses dois movimentos, os espetáculos são reconhecidoscomo produtos utilizáveis no cotidiano pela elite, isto é, pelos próprios detentoresdo capital, que produz os bens.

É também interessante observar a “invasão” do estilo tecnopopsertanejo namúsica popular brasileira, muito explorado pelos videoclipes, a partir da sofis-ticação e da adequação desses eventos à televisão. Ao mesmo tempo, esse

2424242424 Bolaño usa a expressão indústrias culturais para indicar a pluralidade da produção de bens, os suportese as cadeias de mercado. Hoje o plural é mais adequado para cobrir a amplitude da Indústria Culturalproposta por Adorno e Horkheimer.

2525252525 BOLAÑO, op. cit., p. 202.

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((( gênero vai buscar obras no cancioneiro de outros movimentos musicais – como

a MPB, por exemplo – adaptando-os e incluindo-os em suas apresentações.26

No campo da dramaturgia (uma das áreas mais especializadas da televisãobrasileira), as correlações das indústrias culturais parecem não ser tão explícitascomo acontece na música.

Porém, tradicionalmente, essa é uma área de investimento de outros tipos deproduto, como os do setor de higiene, de bebidas, de automóveis e de alimen-tação.27 Na teledramaturgia, há espaço para a publicidade e para a propaganda,sendo que, em alguns momentos, o enredo da novela é a própria peça publicitária,seja ela originária do Estado ou do capital. Exemplos são os merchandising deprodutos de variadas origens que aparecem em cenas importantes da trama, oucitados nos diálogos dos personagens, transparecendo que integram o cotidianodaquela trama e incentivando o espectador a copiar as atitudes de seus perso-nagens favoritos.28

Sobre o merchandising social, dois exemplos merecem atenção: as novelas “Sal-vador da Pátria” e “O rei do gado”, produzidas e exibidas pela Rede Globo nasdécadas de 80-90. Elas experimentaram tramas que abordaram a temática político-social, muito próxima dos contextos daquelas épocas e, com isso, outro tipo depublicidade: a ligada a comportamentos e à ética social.

Em “Salvador da Pátria”, a personagem Sassá Mutema, inspirado no Jeca Tatu,de Monteiro Lobato, é quem cobra, dos políticos e da elite econômica, maiorseriedade no trato das questões administrativas da cidade. Arma as ações eganha a simpatia da população, que acaba elegendo-o prefeito. Essa trama é

2626262626 Aqui vale lembrar, em especial, as apresentações da dupla Leandro e Leonardo cantando “Canção daAmérica”, de Milton Nascimento; de Chitãozinho, Xororó, Leandro, Leonardo, Luciano e Zezé di Camargo,no megashow Amigos, executando “Amigos para sempre”, composta para a solenidade de abertura dosJogos Olímpicos de Atlanta e apresentada pelo trio de tenores Luciano Pavarotti, Plácido Domingues eJosé Carreras ou de Leandro, ao inaugurar sua carreira solo (depois do desaparecimento de Leonardo),cantando “Nas curvas da estrada de Santos”, de Roberto Carlos e Erasmo Carlos.

2727272727 Veja-se, especialmente, os estudos de MELO, José Marques. As telenovelas da Globo: produto deexportação. São Paulo: Summus, 1988; ORTIZ, Renato; RAMOS, José Mário Ortiz; BORELLI, Sílvia. Telenovela:história e produção. 2. ed. São Paulo: Brasiliense, 1991; REIMÃO, op. cit.

2828282828 A esse respeito, Doc Comparato indica que o autor das peças tem que pensar nos produtos quepodem ser apresentados no enredo de sua obra para evitar ao máximo problemas com a recusa dosatores em participar da novela. (COMPARATO, Doc. Da criação ao roteiro. Rio de Janeiro: Campus, 1998).

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apresentada exatamente na época que antecede a primeira rodada das eleiçõespresidenciais, quando o País se pautava pela organização da economia, pelamoralização das instituições públicas e pelo fim dos privilégios oferecidos paraas elites nacionais.

Em “O rei do gado”, o autor chegou ao ponto de misturar realidade com ficção detal forma que até mesmo os políticos dialogaram com as personagens por meiode publicações na imprensa diária.29 Essa atitude ousada da equipe que escreveua novela deu publicidade a uma questão de ordem social importante: em 1997,a sociedade brasileira exigia seriedade e ética no trato da coisa pública e jáhavia iniciado o processo de investigação para reduzir a corrupção revelada peloprocesso de impedimento do presidente Collor de Melo.

Outra relação do capital com a televisão, que merece resgate, é o interesse daindústria eletrônica no veículo. A televisão foi a plataforma dos grandes desafiospara a pesquisa e o desenvolvimento da eletrônica, o que sinaliza a dependênciamútua. Se o sistema rádio representou a largada para a comunicação mundial,experimentando, num primeiro momento, as possibilidades de um sistemarentável – tanto para hardware como para os software –, a televisão consolidoua indústria porque, ao se mostrar mais complexa e mais atrativa do que o rádio(ela dá acesso às imagens), possibilitou também resolver problemas de trans-missão sonora. Isso significa economia e racionalização para o desenvolvimen-to de projetos.

Na mesma intensidade, implica a manutenção e a ampliação de mercado paraos receptores, informação que se constrói pelos dados históricos dos aparelhosde TV em uso no Brasil nesses 50 anos: os 200 aparelhos em 1950 se multipli-caram para 4.584 milhões em 1970, subindo para 30 milhões em 1990 atéchegar a 55 milhões em 2002.30

2929292929 Especialmente a novela “O rei do gado”, de Benedito Ruy Barbosa, exibida a partir de janeiro de 1997,que, na cena do funeral do senador Caxias, contou com a atuação de políticos eleitos para aquela legislatura,além de exibir cenas de discursos proferidos na própria casa legislativa. (HAMBURGER, Esther. Política enovela. In: BUCCI, Eugênio (Org.). A TV aos 50: criticando a televisão brasileira no seu cinqüentenário. SãoPaulo: Fundação Perseu Abramo, 2000. p. 25-48).

3030303030 MATTOS, op. cit., p. 95, sendo os dados de 2002 uma estimativa apoiada nas informações daAssociação Brasileira da Indústria Elétrica e Eletrônica. (Abinee)..... Disponível em: <htpp://www.abinee.com.br>. Acesso em: 2 ago. 2002.

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(($ Hoje, a televisão continua sendo especial para a mobilização da pesquisa no

âmbito da técnica, da política e da economia, especialmente quando se fala emtelevisão digital.

São perceptíveis, no discurso corrente, as possibilidades técnicas que o novomodo de operação do sistema traz. Transmissão simultânea de múltiplos canais,conexão imediata com os operadores, estímulo dos processos de emissão-resposta, diversidade de conteúdos opções de acesso a outras mídias, qualidadede imagem, etc., mas ainda não se debatem as implicações desse avançotecnológico sobre a cultura nacional.

Apesar das diferenças enormes entre as capacidades (e possibilidades) de acessoàs novas mídias percebidas na sociedade brasileira, a televisão contemporânea é,ainda, o bem de comunicação de maior acessibilidade social. Quando concretizara digitalização desse meio, outra barreira (econômico-social) surgirá, transforman-do o meio de comunicação com alto grau de popularidade em um filão de reduzidoacesso. Esse dado pode produzir reflexos inesperados ao mercado da comunicação.

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Observa-se a mídia (e em especial a televisão) como um fenômeno comunicacionalinserido de maneira tão íntima no cotidiano da sociedade – que permite comentárioscomo “se a TV não mostrou, não aconteceu”.31 Percebe-se que ela se transforma,assim, num ambiente especial para a publicização de bens materiais e culturais.

Essa categorização, entretanto, não entra em detalhes a respeito das especificidadesque acontecem nos bastidores da produção midiática, produzindo uma certa névoanum lugar onde começam a se concretizar as relações entre o capital e a mídia.

É sintomático o depoimento de um roteirista de novelas, recolhido em 1982,para entender os meandros das relações econômicas em detrimento das sociais:“Tanto os comerciais quanto o merchandising são regras do sistema capitalista,e é preciso aceitá-los, a não ser que se esteja contra o próprio sistema capitalista.Pessoalmente, eu sou contra, mas vivo dele, porque não sou uma ilha.”32 Como

3131313131 NEUMAN, op. cit., p. 197.

3232323232 GOMES, Dias. Como vender tudo através da televisão. In: MATTELART; MATTELART, op. cit., p. 120.

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Conexão – C

omunicação e C

ultura, UC

S, C

axias do Sul, v. 6, n. 11, jan./jun. 2007

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exemplo, a produção das telenovelas envolve a participação dos intelectuais(autores, diretores de cena e fotografia, de produção), dos artistas, técnicos e,no fim da esteira, dos programadores e difusores. Da mesma forma que a categoriaprodução exige os recortes em subcategorias, a programação e a difusão devemser analisadas com recortes mais específicos para melhor entender essas relaçõesentre o capital e a mídia.

Os estudos sobre essa temática convocam, para o campo da comunicação, aportesdas disciplinas da economia e da sociologia, pois o impacto das ações do mercadosobre o ambiente complexo da televisão não se restringe ao seu cotidianooperacional. Ele resulta numa relação muito estreita com as formas de interaçãocomunicativa individuais e sociais por meio da circulação de bens de consumo eculturais, incidindo na expressão cultural de um povo. Pensar a comunicação sobessa ótica é muito pertinente, especialmente no tempo em que a convergênciadas mídias é uma realidade muito mais próxima do que se pode imaginar. É relevanteobservar as movimentações do mercado para perceber a qualidade dastransformações que estão rascunhadas para o campo da comunicação.

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CCCCCONEXÃOONEXÃOONEXÃOONEXÃOONEXÃO – C – C – C – C – COMUNICAÇÃOOMUNICAÇÃOOMUNICAÇÃOOMUNICAÇÃOOMUNICAÇÃO EEEEE C C C C CULTURAULTURAULTURAULTURAULTURA

RRRRREVISTAEVISTAEVISTAEVISTAEVISTA C C C C CIENTÍFICAIENTÍFICAIENTÍFICAIENTÍFICAIENTÍFICA DEDEDEDEDE C C C C COMUNICAÇÃOOMUNICAÇÃOOMUNICAÇÃOOMUNICAÇÃOOMUNICAÇÃO DADADADADA

UUUUUNIVERSIDADENIVERSIDADENIVERSIDADENIVERSIDADENIVERSIDADE DEDEDEDEDE C C C C CAXIASAXIASAXIASAXIASAXIAS DODODODODO S S S S SULULULULUL

A revista Conexão – Comunicação e Cultura, da Universidade de Caxiasdo Sul, tem como proposta divulgar reflexões inéditas, enfatizando questões re-lacionadas à ética e à comunicação, à história da mídia, às tendências do setorcomunicacional e suas múltiplas facetas, às discussões sobre linguagem e àpossibilidade de diálogos interdisciplinares. Com isso, pretende contribuir paradiscussões relevantes na área, trazendo à tona temas atuais e pertinentes, alémde privilegiar o resgate histórico das práticas de comunicação.

A revista terá periodicidade semestral e poderá abrigar dossiês temáticos, en-trevistas, reprodução de fontes documentais, ensaios fotográficos, além de secçõesfixas de ensaios, artigos e resenhas. O periódico será distribuído impresso em papele online, na página eletrônica da Universidade de Caxias do Sul e na internet.

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SSSSSUMÁRIOSUMÁRIOSUMÁRIOSUMÁRIOSUMÁRIOS DOSDOSDOSDOSDOS NÚMEROSNÚMEROSNÚMEROSNÚMEROSNÚMEROS ANTERIORESANTERIORESANTERIORESANTERIORESANTERIORES

CONEXÃO – COMUNICAÇÃO E CULTURA. V. 1, N. 1, JAN./JUN.CONEXÃO – COMUNICAÇÃO E CULTURA. V. 1, N. 1, JAN./JUN.CONEXÃO – COMUNICAÇÃO E CULTURA. V. 1, N. 1, JAN./JUN.CONEXÃO – COMUNICAÇÃO E CULTURA. V. 1, N. 1, JAN./JUN.CONEXÃO – COMUNICAÇÃO E CULTURA. V. 1, N. 1, JAN./JUN. 20022002200220022002

AAAAAPRESENTAÇÃOPRESENTAÇÃOPRESENTAÇÃOPRESENTAÇÃOPRESENTAÇÃO/ 7/ 7/ 7/ 7/ 7

TTTTTENDÊNCIASENDÊNCIASENDÊNCIASENDÊNCIASENDÊNCIAS / 9/ 9/ 9/ 9/ 9

PLURALIDADE, DIVERSIDADE E ÉTICA NA MÍDIA BRASILEIRA / 11Venício A. de Lima

TTTTTELEVISÃOELEVISÃOELEVISÃOELEVISÃOELEVISÃO/ 17/ 17/ 17/ 17/ 17

HISTÓRIA, ECONOMIA POLÍTICA E TENDÊNCIAS DA TV BRASILEIRA / 19Valério Cruz Brittos

TELEJORNAL: A PERCEPÇÃO DO PÚBLICO BRASILEIRO / 43Kenia Maria Menegotto Pozenato

MERCOSUL EM PAUTA: O FAIT DIVERS NO TELEJORNALISMO BRASILEIRO / 57Fábio Souza da Cruz

CCCCCINEMAINEMAINEMAINEMAINEMA / 79/ 79/ 79/ 79/ 79

RIVERÃO SUSSUARANA, O ROMANCE DE GLAUBER / 81Paulo Ribeiro

IMBECIS OU PATÉTICOS? A REPRESENTAÇÃO DO POVO BRASILEIROEM TERRA EM TRANSE E CENTRAL DO BRASIL / 89Adriana Andrade Braga

RRRRREALIDADEEALIDADEEALIDADEEALIDADEEALIDADE VIRTUALVIRTUALVIRTUALVIRTUALVIRTUAL / 101 / 101 / 101 / 101 / 101

LEMBRANÇAS DOS MÍDIAS MORTOS / 103Suely Fragoso

REAL E VIRTUAL: DA EXISTÊNCIA DE FATO À SIMULAÇÃO / 117Maurício Moraes

CCCCCOMUNICAÇÃOOMUNICAÇÃOOMUNICAÇÃOOMUNICAÇÃOOMUNICAÇÃO VISUALVISUALVISUALVISUALVISUAL / 127 / 127 / 127 / 127 / 127

O HIPERTEXTO COMO METÁFORA / 129Ana Cláudia Gruszynski

A IDENTIDADE VISUAL DAS CIDADES / 139Lara Espinosa

CCCCCOMUNICAÇÃOOMUNICAÇÃOOMUNICAÇÃOOMUNICAÇÃOOMUNICAÇÃO ORGANIZACIONALORGANIZACIONALORGANIZACIONALORGANIZACIONALORGANIZACIONAL / 159 / 159 / 159 / 159 / 159

NOVAS TECNOLOGIAS NA COMUNICAÇÃO ORGANIZACIONAL DA INDÚSTRIA:A NECESSIDADE DE UM COMUNICADOR ESTRATEGISTA / 161Cida Golin, Silvana Padilha Flores e Olivar Maximino Mattia

A ESTRATÉGIA COMO UMA NOVA DIMENSÃO DOS ESTUDOSDE COMUNICAÇÃO E INFORMAÇÃO NO MUNDO ORGANIZACIONAL / 173Ana Cristina Fachinelli

A QUESTÃO DA RECEPÇÃO NO JORNALISMO ORGANIZACIONAL / 193Marlene Branca Sólio

RRRRRESENHASESENHASESENHASESENHASESENHAS / 207 / 207 / 207 / 207 / 207

PARA UMA CRÍTICA DA ECONOMIA POLÍTICA DO CONHECIMENTO / 209César Bolaño

O CURRÍCULO DE COMUNICAÇÃO NO BRASIL / 217Doris Fagundes Haussen

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CONEXÃO – COMUNICAÇÃO E CULTURA. V. 1, N. 2, JUL./DEZ.CONEXÃO – COMUNICAÇÃO E CULTURA. V. 1, N. 2, JUL./DEZ.CONEXÃO – COMUNICAÇÃO E CULTURA. V. 1, N. 2, JUL./DEZ.CONEXÃO – COMUNICAÇÃO E CULTURA. V. 1, N. 2, JUL./DEZ.CONEXÃO – COMUNICAÇÃO E CULTURA. V. 1, N. 2, JUL./DEZ. 20022002200220022002

AAAAAPRESENTAÇÃOPRESENTAÇÃOPRESENTAÇÃOPRESENTAÇÃOPRESENTAÇÃO / 7

CCCCCRUZAMENTOSRUZAMENTOSRUZAMENTOSRUZAMENTOSRUZAMENTOS: L: L: L: L: LITERATURAITERATURAITERATURAITERATURAITERATURA EEEEE I I I I IMPRENSAMPRENSAMPRENSAMPRENSAMPRENSA / 9

O POLEMISTA DO SÉCULO XIX: SER OU NÃO SER BRASILEIRO NO COTIDIANO DA IMPORTAÇÃO / 11Cida Golin

ENTRE O ARCAICO E O MODERNO: A CRÔNICA DE MACHADO E JOÃO DO RIO / 35Antônio Sanseverino

OTTO MARIA CARPEAUX E A MISSÃO EUROPÉIA DA ÁUSTRIA / 55Mauro Souza Ventura

CRÔNICAS E MITOS DE RUBEM BRAGA / 71Flávio Loureiro Chaves

AAAAARTERTERTERTERTE EEEEE C C C C COMUNICAÇÃOOMUNICAÇÃOOMUNICAÇÃOOMUNICAÇÃOOMUNICAÇÃO / 77

ARTE, COMUNICAÇÃO E O TERRITÓRIO INTERMIDIAL DO LIVRO DE ARTISTA / 79Paulo Silveira

CCCCCONEXÕESONEXÕESONEXÕESONEXÕESONEXÕES – A – A – A – A – ARTIGOSRTIGOSRTIGOSRTIGOSRTIGOS / 95

LENDO HISTÓRIAS EM QUADRINHOS NA WEB / 97Ivana Almeida da Silva

COMUNICAÇÃO E INFORMAÇÃO EM ARQUIVOS, BIBLIOTECAS E MUSEUS / 105Luís Carlos Lopes

ENTRE O MERCADO E O PLANO: REFLEXÕES SOBRE A ORGANIZAÇÃO EM REDE / 113Ruy Marcelo de Oliveira Pauletti

A CULTURA DA ESTRATÉGIA NA VIA JAPONESA DA CRIAÇÃO DO SABER / 127Pierre-Marie Fayard

IMPACTOS SOCIAIS E ECONÔMICOS DAS TECNOLOGIAS DA INFORMAÇÃO E DA COMUNICAÇÃO:HIPÓTESES SOBRE A ATUAL REESTRUTURAÇÃO CAPITALISTA / 143César Ricardo S. Bolaño

IDÉIAS SOBRE TECNOLOGIA, INTERAÇÕES COMUNICATIVAS E ECONOMIA MIDIÁTICA / 155Álvaro Benevenuto Jr.

A LÓGICA DO MERCADO NA ORGANIZAÇÃO DO GÊNERO MAGAZINE:UMA RELAÇÃO ENTRE O MAIS VOCÊ E OS SHOPPINGS / 173Najara Ferrari Pinheiro

INCERTEZAS E DESAFIOS DA PÓS-MODERNIDADE / 189Tarsila Maria Pasa Madalena

ORGANIZAÇÕES, IDENTIDADE E MARCA:ARTICULAÇÕES EM TEMPOS DE PÓS-MODERNIDADE / 201Rudimar Baldissera

CONEXÃO – COMUNICAÇÃO E CULTURA. V. 2, N. 3, JAN./JUN.CONEXÃO – COMUNICAÇÃO E CULTURA. V. 2, N. 3, JAN./JUN.CONEXÃO – COMUNICAÇÃO E CULTURA. V. 2, N. 3, JAN./JUN.CONEXÃO – COMUNICAÇÃO E CULTURA. V. 2, N. 3, JAN./JUN.CONEXÃO – COMUNICAÇÃO E CULTURA. V. 2, N. 3, JAN./JUN. 20032003200320032003

AAAAAPRESENTAÇÃOPRESENTAÇÃOPRESENTAÇÃOPRESENTAÇÃOPRESENTAÇÃO / 7

MMMMMÍDIAÍDIAÍDIAÍDIAÍDIA SONORASONORASONORASONORASONORA / 9

LANDELL OU MARCONI: QUEM É O PIONEIRO? / 11César Augusto Azevedo dos Santos

JORNALISMO DE RÁDIO NO BRASIL: INSTANTES PRECURSORES DA PRÁTICA E DO ENSINO / 25Sonia Virgínia Moreira

ISMOS EM CONFLITO: GERMANISMO, AMERICANISMO E NACIONALISMO NASEMISSORAS DE PORTO ALEGRE, NO CONTEXTO DA SEGUNDA GUERRA MUNDIAL / 33Luiz Artur Ferraretto

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RJB-AM: UMA EMISSORA QUE REVOLUCIONOU O JORNAL DO BRASIL / 47Ana Baumworcel

O VALOR DE PERMANÊNCIA DO RÁDIO: UM ESTUDO A PARTIR DA ESTÉTICA DA RECEPÇÃO / 59Magda Rodrigues da Cunha

DIVERGÊNCIAS CONVERGENTES: A NOVA CULTURA RADIOFÔNICA / 79Lilian Zaremba

MEIAS-VERDADES QUE CONTINUAMOS ENSINANDOSOBRE O RADIOJORNALISMO NA ERA ELETRÔNICA / 99Eduardo Meditsch

OUVIDO-REPÓRTER: POR UM RADIOJORNALISMO ACÚSTICO / 111Rodrigo Manzano

HISTÓRIA ORAL E DOCUMENTÁRIO RADIOFÔNICO: DISTINÇÕES E CONVERGÊNCIASNA FORMATAÇÃO DESSA CATEGORIA DE PROGRAMA / 121Carmen Lucia José

A FIDELIDADE DO OUVINTE DE RÁDIO / 133Nair Prata

O SHOW DA VIDA REAL EM AMPLITUDE MODULADA: O BIG BROTHER CHEGA AO RÁDIO / 149Leandro Ramires Comassetto

O RÁDIO ENTRE DUAS LÍNGUAS: A SINTONIA ENTRE O TALIAN E O PORTUGUÊS / 165Maria da Graça M. Guaranha Kreisner

APRENDENDO MÚSICA COM AS MÍDIAS SONORAS / 185Daniel Gohn

CCCCCONEXÕESONEXÕESONEXÕESONEXÕESONEXÕES – A – A – A – A – ARTIGOSRTIGOSRTIGOSRTIGOSRTIGOS / 197

DA EVOLUÇÃO À CO-EVOLUÇÃO SOLIDÁRIA NA TERRA-PÁTRIA: COMUNICAÇÃO, REEDUCAÇÃO E DEVIR / 199Heloísa Pedroso de Moraes Feltes

JORNAIS EM LÍNGUA ITALIANA NA ANTIGA REGIÃO COLONIAL DO RS / 213Kenia Maria Menegotto Pozenato e Loraine Slomp Giron

INTERFACES DO PROCESSO DE PRODUÇÃO DE UM JORNAL ORGANIZACIONAL / 235Marlene Branca Sólio

PERSPECTIVAS DO MUSEU EM DIREÇÃO A UMA CULTURA VIRTUAL / 251Maurício Moraes

CONEXÃO – COMUNICAÇÃO E CULTURA. V. 2, N. 4, JUL./DEZ.CONEXÃO – COMUNICAÇÃO E CULTURA. V. 2, N. 4, JUL./DEZ.CONEXÃO – COMUNICAÇÃO E CULTURA. V. 2, N. 4, JUL./DEZ.CONEXÃO – COMUNICAÇÃO E CULTURA. V. 2, N. 4, JUL./DEZ.CONEXÃO – COMUNICAÇÃO E CULTURA. V. 2, N. 4, JUL./DEZ. 20032003200320032003

AAAAAPRESENTAÇÃOPRESENTAÇÃOPRESENTAÇÃOPRESENTAÇÃOPRESENTAÇÃO / 7

EEEEECONOMIACONOMIACONOMIACONOMIACONOMIA POLÍTICAPOLÍTICAPOLÍTICAPOLÍTICAPOLÍTICA DADADADADA COMUNICAÇÃOCOMUNICAÇÃOCOMUNICAÇÃOCOMUNICAÇÃOCOMUNICAÇÃO EEEEE CULTURACULTURACULTURACULTURACULTURA / 9

MUDANÇAS GLOBAIS NO SISTEMA ECONÔMICO E NAS COMUNICAÇÕES: UMA PERSPECTIVALATINO-AMERICANA PARA A ECONOMIA POLÍTICA DA COMUNICAÇÃO / 11César Bolaño, Guillermo Mastrini e Francisco Sierra

TECNOLOGIA DA INFORMAÇÃO E DA COMUNICAÇÃO, CONFIGURAÇÃO DO ESPAÇO PÚBLICO“GLOBAL” E NOVAS FORMAS DE CONCORRÊNCIA / 29Alain Herscovici

A DIGITALIZAÇÃO DAS INDÚSTRIAS CULTURAIS / 53Luiz A. Albornoz

A ECONOMIA POLÍTICA DA COMUNICAÇÃO E O PAPEL DO RECEPTOR / 67Valério Cruz Brittos

CULTURA POLÍTICA E CULTURA MIDIÁTICA: ESFERA PÚBLICA, INTERESSES E CÓDIGOS / 81Ancízar Narvdez Montoya

O BRASIL NA SOCIEDADE DE INFORMAÇÃO: ESTADOREGULADOR E TELECOMUNICAÇÕES / 103Othon Jambeiro e Fábio Ferreira

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A ESTUPIDEZ HERÓICA DO CAPITAL: MEDIAÇÃO DO TRABALHO E ESTRATÉGIASPARA A CONSTRUÇÃO DE UM NOVO PERFIL OPERÁRIO NO BRASIL / 119William Dias Braga

CCCCCONEXÕESONEXÕESONEXÕESONEXÕESONEXÕES – A – A – A – A – ARTIGOSRTIGOSRTIGOSRTIGOSRTIGOS / 151

ELEMENTOS METODOLÓGICOS DE VIGÍLIA E DE INTELIGÊNCIA ECONÔMICA PARA OPROCESSAMENTO DE INFORMAÇÕES ORGANIZACIONAIS / 153Ana Cristina Fachinelli

CAMINHOS DA ADMINISTRAÇÃO E OS PROCESSOS COMUNICACIONAISNAS ORGANIZAÇÕES / 163Marlene Branca Sólio e Rudimar Baldissera

O CONCEITO DE CULTURA REVISITADO / 177Lúcia Santaella

MEMÓRIA E PÓS-MODERNIDADE: DA MUSEALIZAÇÃO AO PASSADO COMO MERCADORIA / 185Susana Gastal

COMUNICAÇÃO E MUSEUS: O MATERIAL E O SIMBÓLICO / 201Luís Carlos Lopes

CONEXÃO – COMUNICAÇÃO E CULTURA. V. 3, N. 5, JAN./JUN.CONEXÃO – COMUNICAÇÃO E CULTURA. V. 3, N. 5, JAN./JUN.CONEXÃO – COMUNICAÇÃO E CULTURA. V. 3, N. 5, JAN./JUN.CONEXÃO – COMUNICAÇÃO E CULTURA. V. 3, N. 5, JAN./JUN.CONEXÃO – COMUNICAÇÃO E CULTURA. V. 3, N. 5, JAN./JUN. 20042004200420042004

AAAAAPRESENTAÇÃOPRESENTAÇÃOPRESENTAÇÃOPRESENTAÇÃOPRESENTAÇÃO / 7

TTTTTURISMOURISMOURISMOURISMOURISMO / 9

LA FUNCIÓN SOCIAL DEL TURISMO / 11Maribel Osorio Garcia

O ESPAÇO TURÍSTICO TAMBÉM É COMUNICAÇÃO / 23Antonio Carlos Castrogiovanni

RELAÇÕES ENTRE VISITANTES E VISITADOS: UMRETROSPECTO DOS ESTUDOS SOCIOANTROPOLÓGICOS / 31Margarita Barretto

SAÚDE E BEM-ESTAR EM UM MODELO DE AGROTURISMOHOLÍSTICO, ECOLÓGICO E RESPONSÁVEL / 49Yolanda Flores e Silva e Rafael Bremmer Cyrillo

RRRRRÁDIOÁDIOÁDIOÁDIOÁDIO / 61/ 61/ 61/ 61/ 61

TENDÊNCIAS CONTEMPORÂNEAS DA PROGRAMAÇÃO DE RÁDIO: NOS ESTADOS UNIDOS E NA EUROPA / 63Maria del Pilar Martínez-Costa

NAS ONDAS DA FÉ: TRÊS EXPERIÊNCIAS DO RÁDIO EDUCATIVONA AMÉRICA DO SUL, DURANTE A GUERRA FRIA / 89João Batista de Abreu

RÁDIO E SINO: A HORA DO ANGELUS / 105Cida Golin e Bárbara Salvatti

COMUNICAÇÃO ORGANIZACIONAL / 121Maria del Pilar Martínez-Costa

A INTRANET COMO MANIFESTAÇÃO EMERGENTE DA COMUNICAÇÃOORGANIZACIONAL MIDIATIZADA: TÉCNICA E SUBJETIVIDADE / 123Jane Rech

SEMIÓTICA / 139

ARISTÓTELES E PIERCE: PROLEGÔMENOS SEMÂNTICOS OU ORGANOLÓGICOS / 141Luiz Roberto Peel Furtado de Oliveira

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CONEXÃO - COMUNICAÇÃO E CULTURA, V. 3, N. 6, JUL-DEZ. 2004CONEXÃO - COMUNICAÇÃO E CULTURA, V. 3, N. 6, JUL-DEZ. 2004CONEXÃO - COMUNICAÇÃO E CULTURA, V. 3, N. 6, JUL-DEZ. 2004CONEXÃO - COMUNICAÇÃO E CULTURA, V. 3, N. 6, JUL-DEZ. 2004CONEXÃO - COMUNICAÇÃO E CULTURA, V. 3, N. 6, JUL-DEZ. 2004

AAAAAPRESENTAÇÃOPRESENTAÇÃOPRESENTAÇÃOPRESENTAÇÃOPRESENTAÇÃO / 7

CCCCCIBERESPAÇOIBERESPAÇOIBERESPAÇOIBERESPAÇOIBERESPAÇO, , , , , COMUNICAÇÃOCOMUNICAÇÃOCOMUNICAÇÃOCOMUNICAÇÃOCOMUNICAÇÃO EEEEE CRIAÇÃOCRIAÇÃOCRIAÇÃOCRIAÇÃOCRIAÇÃO / 9

FICÇÃO CIENTÍFICA CYBERPUNK: O IMAGINÁRIO DA CIBERCULTURA / 11André Lemos

EXTREMIDADES DO VÍDEO: O VÍDEO NA CULTURA DIGITAL / 17Christine Mello

REALIDADE VIRTUAL E A IMERSÃO EM CAVES / 35Diana Domingues

INTERATIVIDADE IMAGINAL E CRIATIVIDADE VIRTUAL / 51Juremir Machado da Silva

POR UM CINEMA SENSORIAL: O CINEMA E O FIM DA “MOLDURA” / 61Katia Maciel

UMA CARTOGRAFIA DAS POÉTICAS DO CIBERESPAÇO / 73Lúcia Leão

COMPUTADORES VESTÍVEIS: CONVIVÊNCIA DE DIFERENTES ESPACIALIDADES / 93Luisa Paraguai Donati

CIBERESPAÇO E METODOLOGIAS DE CRIAÇÃO / 103Monica Tavares

CIBERESPAÇO E ESTÉTICA MIDIÁTICA: TEMPO, ESPAÇO E INTERCONEXÃO / 129Priscila Arantes

PROCESSOS PERCEPTIVOS E CONSTRUÇÕES SIMBÓLICAS, AGENCIAMENTO DOSUJEITO-“NÓS” E DO SUJEITO-“EU” NA INSTALAÇÃO DES-ESPELHOS DO GRUPO SCIARTS / 143Sandra Rey

POÉTICA DIGITAL INFANTIL: NÃO PODE SER VENDIDA SEPARADAMENTE / 155Sérgio Capparelli e Raquel Longhi

GAMES / 167Mario Maciel e Suzete Venturelli

CCCCCONEXÕESONEXÕESONEXÕESONEXÕESONEXÕES – A – A – A – A – ARTIGOSRTIGOSRTIGOSRTIGOSRTIGOS / 191

NÊMESIS MODERNISTA: COMUNICAÇÃO GRÁFICA NA PÓS-MODERNIDADE / 193Ana Cláudia Gruszynski

AS FABULAÇÕES DA INDÚSTRIA CULTURAL E AS INTERAÇÕES COM O PODER / 211Ana Mery Sehbe De Carli

CONEXÃO - COMUNICAÇÃO E CULTURA, V. 4, N. 7, JAN-JUN. 2005CONEXÃO - COMUNICAÇÃO E CULTURA, V. 4, N. 7, JAN-JUN. 2005CONEXÃO - COMUNICAÇÃO E CULTURA, V. 4, N. 7, JAN-JUN. 2005CONEXÃO - COMUNICAÇÃO E CULTURA, V. 4, N. 7, JAN-JUN. 2005CONEXÃO - COMUNICAÇÃO E CULTURA, V. 4, N. 7, JAN-JUN. 2005

AAAAAPRESENTAÇÃOPRESENTAÇÃOPRESENTAÇÃOPRESENTAÇÃOPRESENTAÇÃO / 7

CCCCCOMUNICAÇÃOOMUNICAÇÃOOMUNICAÇÃOOMUNICAÇÃOOMUNICAÇÃO ORGANIZACIONALORGANIZACIONALORGANIZACIONALORGANIZACIONALORGANIZACIONAL / 9

A COMUNICAÇÃO EMPRESARIAL ESTRATÉGICA: DEFININDO OS CONTORNOS DE UM CONCEITO / 11Wilson da Costa Bueno

REVISITANDO A (RE)CONSTRUÇÃO HISTÓRICA DAS RELAÇÕES PÚBLICAS / 21Cleusa Maria Andrade Scroferneker

DA FRAGMENTAÇÃO À CONVERGÊNCIA – UM PANORAMA DAS POSSIBILIDADESDE TEORIZAÇÃO SOBRE OS PROCESSOS DE COMUNICAÇÃO ORGANIZACIONAL / 31Ana Thereza Nogueira Soares

A INFORMAÇÃO NA COMPREENSÃO DE CONTEXTOS ESTRATÉGICOSPARA A COMUNICAÇÃO ORGANIZACIONAL / 51Ana Cristina Fachinelli, Jane Rech e Olivar Maximino Mattia

ESTUDANDO A COMUNICAÇÃO ORGANIZACIONAL: REDES E PROCESSOS INTEGRATIVOS / 73Ana Maria Córdova Wels

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RELAÇÕES PÚBLICAS: PROCESSO HISTÓRICO E COMPLEXIDADE / 87Rudimar Baldissera e Marlene Branca Sólio

CCCCCONEXÕESONEXÕESONEXÕESONEXÕESONEXÕES – – – – – ARTIGOSARTIGOSARTIGOSARTIGOSARTIGOS / 103

TELEVISÃO DIGITAL E INCLUSÃO SOCIAL: UMA PROPOSTA DE DEMOCRATIZAÇÃOPARA AS NOVAS TECNOLOGIAS EM COMUNICAÇÃO / 105Cosette Castro

CANAIS COMUNITÁRIOS SE ESPALHAM E CRIAM ENTIDADE NACIONAL / 121Álvaro Benevenuto Júnior

AS POLÍTICAS PÚBLICAS DE COMUNICAÇÃO PARA O RÁDIO BRASILEIRO:REGULAÇÃO, DIGITALIZAÇÃO E INTEGRAÇÃO / 135André Barbosa Filho

PSICANÁLISE E CULTURA: FEMININO E MASCULINO / 149Vera Marta Reolon de Oliveira

EEEEESTUDOSTUDOSTUDOSTUDOSTUDO DEDEDEDEDE CASOCASOCASOCASOCASO / 161

TRABALHO DE CONCLUSÃO DE CURSO: AVALIANDO A AVALIAÇÃO DA PESQUISA CIENTÍFICA / 163Maurício Moraes

CONEXÃO - COMUNICAÇÃO E CULTURA, V. 4, N. 8, JUL-DEZ. 2005CONEXÃO - COMUNICAÇÃO E CULTURA, V. 4, N. 8, JUL-DEZ. 2005CONEXÃO - COMUNICAÇÃO E CULTURA, V. 4, N. 8, JUL-DEZ. 2005CONEXÃO - COMUNICAÇÃO E CULTURA, V. 4, N. 8, JUL-DEZ. 2005CONEXÃO - COMUNICAÇÃO E CULTURA, V. 4, N. 8, JUL-DEZ. 2005

AAAAAPRESENTAÇÃOPRESENTAÇÃOPRESENTAÇÃOPRESENTAÇÃOPRESENTAÇÃO / 7

TTTTTEORIAEORIAEORIAEORIAEORIA DADADADADA COMUNICAÇÃOCOMUNICAÇÃOCOMUNICAÇÃOCOMUNICAÇÃOCOMUNICAÇÃO / 11

LOS MEDIOS MASSIVOS EN EL ESTUDIO DE LA COMUNICACIÓN/CULTURA / 13María Cristina Mata

DO INTERCÂMBIO DAS MENSAGENS À PRODUÇÃO DE SENTIDO: IMPLICAÇÕESDE UMA PERSPECTIVA SOCIOCULTURAL NO ESTUDO DA COMUNICAÇÃO / 23Raúl Fuentes Navarro

ACERCAMIENTO DE LA COMUNICACIÓN COMO CULTURA ACADÊMICAY A SUS PROPOSICIONES TEÓRICAS GENERALES / 39Erick R. Torrico Villanueva

?TIENE SENTIDO LA TELEVISIÓN PÚBLICA? FUTURO, PRESENTE Y PASADO / 51Manel Mateu i Evangelista

ELEMENTOS PARA PENSAR A FORMAÇÃO E O ENSINO EM TEORIAS DA COMUNICAÇÃO / 61Jiani Adriana Bonin

A DINÂMICA DA PESQUISA COMO PROCESSOS E INTERAÇÕES COMUNICACIONAIS... REFLEXÕES / 69Pedro Russi Duarte

UNA APROXIMACIÓN TRANS E INTERDISCIPLINARIA DEL CAMPO DE LA COMUNICACIÓN / 81Luis Ignacio Sierra Gutiérrez

DE LA TEORÍA GENERAL DE LA ENUNCIACIÓN A LA ENUCIACIÓN TELEVISIVA / 101Alberto Pereira Valarezo

TEORIA DA COMUNICAÇÃO: INTERCULTURALIDADE, FILOSOFIA, LINGUAGEM E SOCIEDADE / 117Alberto Efendy Maldonado

EEEEENTREVISTANTREVISTANTREVISTANTREVISTANTREVISTA / 131

EVALUCIONES Y PERSPECTIVAS PARA LA COMUNICACIÓN PARA EL DESARROLLO: CONCEPTOS Y EXPERIENCIASDE ÁFRICA Y LATINOAMÉRICA – ENTREVISTA COM O PROFESSOR DOUTOR ROBERT WHITE / 133Juciano de Souza Lacerda e Manuela Rau de Almeida Callou

CCCCCONEXÕESONEXÕESONEXÕESONEXÕESONEXÕES – A – A – A – A – ARTIGOSRTIGOSRTIGOSRTIGOSRTIGOS / 145

SEMIÓTICA E CONTEXTO / 147Mônica Bernardo Schettini Marques

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CONEXÃO - COMUNICAÇÃO E CULTURA - V. 5, N. 9, JAN./JUN. 2006CONEXÃO - COMUNICAÇÃO E CULTURA - V. 5, N. 9, JAN./JUN. 2006CONEXÃO - COMUNICAÇÃO E CULTURA - V. 5, N. 9, JAN./JUN. 2006CONEXÃO - COMUNICAÇÃO E CULTURA - V. 5, N. 9, JAN./JUN. 2006CONEXÃO - COMUNICAÇÃO E CULTURA - V. 5, N. 9, JAN./JUN. 2006

AAAAAPRESENTAÇÃOPRESENTAÇÃOPRESENTAÇÃOPRESENTAÇÃOPRESENTAÇÃO / 7

FFFFFILOSOFIAILOSOFIAILOSOFIAILOSOFIAILOSOFIA EEEEE ÉTICAÉTICAÉTICAÉTICAÉTICA DADADADADA COMUNICAÇÃOCOMUNICAÇÃOCOMUNICAÇÃOCOMUNICAÇÃOCOMUNICAÇÃO / 11

IDENTIFICAÇÕES ENTRE O ETHOS DO TRABALHO E O DO BEM-ESTAR / 13Mayra Rodrigues Gomes

MÍDIA E CIDADANIA / 27Pedrinho A. Guareschi

IMAGENS DE GUERRA, GUERRA DE IMAGENS: A COBERTURA JORNALÍSTICAEM DOIS MOMENTOS DA GUERRA EUA/IRAQUE / 41João Elias Nery e Maria José Guerra

O APAGAMENTO DAS FORÇAS DO DISCURSO PERSUASIVO ANTE ARACIONALIZAÇÃO DAS CONDUTAS: UMA REFLEXÃO SOBRE O PODER DA FALAPOLÍTICA NA SOCIEDADE CONTEMPORÂNEA EM TEMPOS DE CPIs / 61Neusa Demartini Gomes e Geder Parzianello

A FLEUMA INGLESA VERSUS HOMOEROTISMO QUASE EXPLÍCITO / 73José Luís de Carvalho Reckziegel

IMAGEM E CONCEITO: A EXPERIÊNCIA DO PENSAR NOS EMBLEMAS DA RENASCENÇA / 83Luiz Carlos Bombassaro

DIÁLOGO CONSIGO MESMO, VOZ INTERNA DA CONSCIÊNCIA EAÇÃO SIMBÓLICA NO CONTEXTO PEDAGÓGICO/ 97Cláudio Almir Dalbosco

CINCO FERRAMENTAS PARA O ENSINO-APRENDIZAGEM DA FILOSOFIA / 117Gabriele Greggersen

O FILÓSOFO DO SENTIDO E A COMUNICAÇÃO / 139Marialva Barbosa

O VALOR NO COMUNICADOR ORGANIZACIONAL: TANGÊNCIAS ÉTICAS E EPISTEMOLÓGICAS / 151Clóvis de Barros Filho e Arthur Meucci

CCCCCONEXÕESONEXÕESONEXÕESONEXÕESONEXÕES – A – A – A – A – ARTIGOSRTIGOSRTIGOSRTIGOSRTIGOS / 173

HAROLDO E AS GALÁXIAS: UM CASO CONCRETO DE BARROCO / 175Dhynarte Albuquerque Filho

DOMÍNIO DO IRREMEDIÁVEL EM CAIO: PALAVRA/IMAGEM / 197Eulália Isabel Coelho

AMÉRICA: A ANTI-UTOPIA DA IMIGRAÇÃO ITALIANA / 219João Cláudio Arendt e Cinara Ferreira Pavani

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APRESENTAÇÃO / 9

UM DESIGN CONTEMPORÂNEO / 14Wilton Garcia

O PROJETO GRÁFICO DE REVISTAS: UMA ANÁLISE DOS DEZ ANOS DA REVISTA CAPRICHO / 32Ana Cláudia Gruzynski e Sophia Seibel Chassot

LINGUAGEM VISUAL EM DESIGN GRÁFICO IMPRESSO E DIGITAL / 60Gisela Belluzzo de Campos

TININDO, TRINCANDO: O DESIGN GRÁFICO NO TEMPO DO DESBUNDE / 72Jorge Luis Caê Rodrigues

A SÃO PAULO DO ART DÉCO: A MEMÓRIA EM CARTAZ / 104Nara Silvia Marcondes Martins

A ROUPA DO MODERNO: REPRESENTAÇÕES DA MODA NA DÉCADA DE 20 (PELOTAS/RS) / 124Francisca Ferreira Michelon e Denise Ondina Morroni dos Santos

O DESIGN DE MODA COMO POTÊNCIA DE UM EXPERIMENTO / 144Rosane Preciosa

CAMINHO PARA A GESTÃO INTEGRADA DA IDENTIDADE CORPORATIVA / 154Lígia Cristina Fascioni

A GRAMÁTICA DA FORMA COMO METODOLOGIA DE ANÁLISE E SÍNTESE EM ARQUITETURA / 180Gabriela Celani, Débora Cypriano, Giovana de Godoi e Carlos Eduardo V. Vaz

DESIGN ERGONÔMICO: UMA REVISÃO DOS SEUS ASPECTOS METODOLÓGICOS / 198Luis Carlos Paschoarelli e José Carlos Plácido da Silva

CCCCCONEXÕESONEXÕESONEXÕESONEXÕESONEXÕES – A – A – A – A – ARTIGOSRTIGOSRTIGOSRTIGOSRTIGOS / 215

ANÁLISE DE DISCURSO: UMA ABORDAGEM DIALÉTICA / 216Roberto Ramos

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IIIIINSTRUÇÕESNSTRUÇÕESNSTRUÇÕESNSTRUÇÕESNSTRUÇÕES AOSAOSAOSAOSAOS COLABORADORESCOLABORADORESCOLABORADORESCOLABORADORESCOLABORADORES

1. A revista aceita os seguintes tipos de con-tribuição:

1.1. Artigos inéditos (até 30 laudas de 30 linhascom 70 toques, ou 63 mil caracteres,incluindo referências bibliográficas e notas).

1.2. Ensaios bibliográficos (até 12 laudas de 30linhas com 70 toques, ou 25.200 caracte-res, incluindo referências biblio-gráficas enotas): resenhas críticas sobre apenas umlivro ou sobre vários livros tratando de as-suntos correlatos.

1.3. Resenhas bibliográficas (até 4 laudas de 30linhas com 70 toques, ou 8.400 caracteres):pequenas resenhas de livros recentes.

2. A pertinência ou não da publicação seráavaliada pela Comissão Editorial (no quediz respeito à adequação do artigo ao perfile à linha editorial da revista), e por pare-ceristas ad hoc (no que diz respeito ao con-teúdo e à qualidade das contribuições).Serão aceitos, excepcio-nalmente, originaisem Espanhol, Francês e Inglês. A publica-ção desses trabalhos (em língua estrangei-ra) ficará submetida, contudo, à pos-sibilidade de tradução para o Português.

3. Devem ser enviadas três cópias do manus-crito (em espaço duplo e margens lateraisde 3 cm) e o disquete com o texto digitado.Recomenda-se a utilização de processado-res de texto compatíveis com as platafor-mas Windows ou MacIntosh. Os originaisdeven ser enviados à Revista Conexão –Educs (Rua Francisco Getúlio Vargas,1130, CEP 95070-560, Caxias do Sul, RS).

4. Os artigos devem estar acompanhadospor um resumo contendo entre 100e 150 palavras, em Português e em In-glês, além das palavras-chave. Os autoresdevem enviar também seus dados profis-sionais (instituição, cargo, titulação, prin-cipais publicações), bem como endereçopara correspondência (inclusive e-mail, sepossível). Esses dados devem aparecerno final do trabalho.

5. Para a indicação das fontes citadas, optou-se pelo sistema alfabético (autor-data), istoé, os documentos podem ter a indicação:

5.1. Pelo sobrenome do autor, ano, página(esta não-obrigatória)– Quando o nome do autor estiver contidona sentença:Ex.: Nos estudo das probabilidades [...], se-gundo Milone (1993, p. 37), “qualquer afir-mativa pode...”– Quando o nome do autor não estivercontido na sentença:Ex.: “Saudações! Tenho-as até do que mefoi nada...” (PESSOA, 1989, p. 53) – Paraobras do mesmo autor, no mesmo ano:Ex.: (FREIRE, 1954a, p. 27); (FREIRE,1954b, p. 34) ou Freire (1954a, p. 27);Freire (1954b, p. 34).– Para autores com mesmo sobrenome ea mesma data de publicação, acrescentara inicial do nome:Ex.: (VIEIRA, C. 1998, p. 11) ou Vieira C.(1998, p. 11)(VIEIRA, M. 1998, p. 14) ou VIEIRA M.(1998, p. 14)

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– Para autores diversos, no mesmo ano:Ex.: (STEIN; VANELLI, 1986) ou STEIN e VA-NELLI (1986)

5.2. Pela instituição responsávelEx.: Segundo a ABNT (1992) a Norma10.520 é a indicada para citações.

5.3. Pelo título da publicação (caso de autoresdesconhecidos)Ex.: ...em, enquanto a sociedade requeros seus direitos (1997), foram analisadosos critérios...Obs.:1) Para informações adicionais, ver NBR10.520/92.2) A relação bibliográfica completa dasfontes citadas deve estar no final do textoe obedecer à NBR 6.023/2000.3) A obra: MOTTA, Valter; HESELN, Lígia;GIALDI, Silvestre. Normas té-cnicas paraapresentação de trabalhos científicos. 2.ed. ver. atual. aum. Porto Alegre: Missau,2001, subsidia casos não exemplificadosnestas orientações.

6. Ilustrações6.1. Figuras (mapas, diagramas, organogramas,

quadros, fotografias, gráficos, fluxogra-mas, etc.):Devem ter legenda clara e concisa e pre-cedida da palavra figura (letras minúscu-

las, com exceção da 1ª) mais dois pon-tos.Devem ser encaminhadas numeradas, emfolhas separadas, com a devida legenda ea referência à fonte (se reproduzidas),tendo no texto a indicação do local ondedevem ser inseridas.Importante observar que devem estarconfeccionadas de maneira a permitir suareprodução direta.Obs.: quando houver no texto somentequadros, deve-se substituir a palavra Figu-ras por Quadros.

7. Com a publicação da revista, a Educs re-ceberá 10% sobre a tiragem, que será dis-tribuída, como direito autoral, entre auto-res e colaboradores de forma igualitária.

8. Os ensaios bibliográficos e as resenhasdevem apresentar referência completa dasobras analisadas, indicando o número depáginas de cada uma. As resenhas nãodevem receber título, nem conter notas oureferências bibliográficas fora do texto.

9. O envio de manuscrito implica a cessãode direitos autorais e de publicação à Re-vista. Essa não se compromete em devol-ver as colaborações recebidas.

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