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SERVIÇO SOCIAL ________________________________________________________ ANDRÉIA REGINA LOPES DE SOUSA CENTRO DE REFERÊNCIA DE ASSISTÊNCIA SOCIAL CRAS DO MUNICÍPIO DE ASSIS CHATEAUBRIAND - PR: PROJETOS “EMBALANDO O BERÇO” E “NÓS E NOSSOS FILHOS” – A VISÃO DOS USUÁRIOS TOLEDO 2014

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  • SERVIO SOCIAL

    ________________________________________________________

    ANDRIA REGINA LOPES DE SOUSA

    CENTRO DE REFERNCIA DE ASSISTNCIA SOCIAL CRAS DO MUNICPIO

    DE ASSIS CHATEAUBRIAND - PR: PROJETOS EMBALANDO O BERO E

    NS E NOSSOS FILHOS A VISO DOS USURIOS

    TOLEDO

    2014

    http://www.unioeste.br/

  • ANDRIA REGINA LOPES DE SOUSA

    CENTRO DE REFERNCIA DE ASSISTNCIA SOCIAL CRAS DO MUNICPIO

    DE ASSIS CHATEAUBRIAND - PR: PROJETOS EMBALANDO O BERO E

    NS E NOSSOS FILHOS A VISO DOS USURIOS

    Trabalho de Concluso de Curso apresentado ao

    Curso de Servio Social, Centro de Cincias

    Sociais Aplicadas da Universidade Estadual do

    Oeste do Paran UNIOESTE, como requisito

    parcial obteno do grau de Bacharel em Servio

    Social.

    Orientadora: Profa. Ms. India Nara Smaha

    TOLEDO

    2014

  • ANDRIA REGINA LOPES DE SOUSA

    CENTRO DE REFERNCIA DE ASSISTNCIA SOCIAL CRAS DO MUNICPIO

    DE ASSIS CHATEAUBRIAND - PR: PROJETOS EMBALANDO O BERO E

    NS E NOSSOS FILHOS A VISO DOS USURIOS

    Trabalho de Concluso de Curso apresentado

    ao Curso de Servio Social, Centro de

    Cincias sociais aplicadas da Universidade

    Estadual do Oeste do Paran UNIOESTE,

    como requisito parcial obteno do grau de

    Bacharel em Servio Social.

    BANCA EXAMINADORA

    _________________________________________

    Orientadora Profa. Ms. India Nara Smaha

    Universidade Estadual do Oeste do Paran

    _________________________________________

    Profa. Ms. Ane Brbara Voidelo

    Universidade Estadual do Oeste do Paran

    ________________________________________

    Profa. Ms. Cristiane Carla Konno

    Universidade Estadual do Oeste do Paran

    Toledo, 07 de novembro de 2014.

  • Dedico este trabalho minha famlia.

  • AGRADECIMENTOS

    Em primeiro lugar agradeo a Deus, pelo dom da vida e por seu infinito amor.

    Aos meus pais Joaquim Augustinho de Sousa e Leonice de Ftima Lopes de Sousa,

    meus exemplos e minha fortaleza, pelos seus esforos e dedicao, por me incentivarem a

    nunca desistir e sim a continuar a lutar sempre. Agradeo a eles de todo meu corao por tudo

    o que fizeram e continuam fazendo por mim. As minhas irms e meus familiares que mesmo

    com a distancia e dificuldades, sempre me incentivaram a continuar.

    Agradeo aos meus avs maternos Sebastiana e Antnio e meus avs paternos

    Mariana e Jos Augustinho pelo carinho recebido e pelo grande incentivo.

    Ao Diego que alm de namorado, um grande amigo, o qual sempre foi compreensivo

    me auxiliando sempre que possvel e me incentivando desde o incio.

    As minhas amigas Andria Guimares, Camila Koeche e Alcione Alves, pessoas que

    aprendi a amar e a construir laos eternos. Obrigada pelos momentos de estudos, brincadeiras

    e cumplicidade. Agradeo pela pacincia, pelo sorriso, pelo abrao, pela mo que sempre

    esteve estendida quando necessitei. Esta caminhada no seria a mesma se no fosse vocs

    minhas amigas.

    Agradeo aos docentes do curso de Servio Social da Unioeste que dividiram

    conhecimentos e puderam colaborar para que mais pessoas pudessem olhar o mundo com

    outros olhos e lutar para transform-lo em um lugar mais igual para todos. Especialmente as

    professoras Ane Brbara e Cristiane por aceitarem a participar da minha banca.

    A voc professora India Nara por ter aceitado orientar-me. Obrigada pela pacincia

    durante o processo de construo deste trabalho, pela dedicao e me mostrar o percurso para

    chegar ao final. Obrigada por partilhar seus conhecimentos, e tenha certeza que o resultado do

    que dividiste comigo no est somente nas palavras que compe este trabalho, mas est

    registrado na construo terica e postura tica que terei como futura profissional.

    Ao meu supervisor de campo Ederson dos Santos Izeli, pela compreenso e pelos ricos

    conhecimentos e experincias transmitidas. A assistente social Maria Ap. Tamparowisk e a

    psicloga Silvana por me incentivarem acerca da temtica e por me propiciarem as

    informaes necessrias para a concluso desta pesquisa.

    Agradeo a todas as mulheres do municpio de Assis Chateaubriand, que se depuseram

    a participar das entrevistas para a realizao deste trabalho. Enfim, agradeo a todas as

    pessoas que passaram em minha vida e deixaram ensinamentos, lembranas e que

    contriburam de diferentes maneiras para a realizao deste trabalho e concluso deste curso.

  • "Quando a gente muda, o mundo muda com a gente,

    e agente muda o mundo com a mudana da mente,

    na mudana de atitude no h mau que no se

    mude, nem doena sem cura, na mudana de

    atitude a gente fica mais seguro, na mudana do

    presente a gente molda o futuro..."

    (Gabriel o Pensador).

  • SOUSA, Andreia Regina Lopes. Centro de Referncia de Assistncia Social CRAS do

    Municpio de Assis Chateaubriand - PR: Projetos Embalando o bero e Ns e nossos

    filhos a viso dos usurios. Trabalho de Concluso de Curso (Bacharelado em Servio

    Social). Centro de Cincias Sociais Aplicadas. Universidade Estadual do Oeste do Paran

    Campus Toledo, 2014.

    RESUMO

    No atual contexto da Poltica de Assistncia Social brasileira, em seu nvel de Proteo Social

    Bsica, tem-se como importante ferramenta o Centro de Referncia de Assistncia Social

    (CRAS), que significa um avano para a poltica e o seu reconhecimento enquanto direito.

    Contudo, compreende-se que esta unidade estatal assim como a Poltica de Assistncia Social

    possuem limites que so estruturais ao modo de produo capitalista. O presente Trabalho de

    Concluso de Curso (TCC) tem como temtica a Poltica de Assistncia Social. O interesse

    pela temtica surgiu no decorrer do perodo de realizao do Estgio Supervisionado I e II em

    Servio Social realizado no CRAS do municpio de Assis Chateaubriand - PR, nos anos de

    2013 e 2014. O trabalho tem como problema central a pergunta: Por que algumas mulheres

    usurias dos servios do CRAS do municpio de Assis Chateaubriand que frequentaram o

    projeto Embalando o bero no frequentam o projeto Ns e nossos filhos?. Diante deste

    questionamento delimitou-se como objetivo geral da pesquisa analisar os motivos que

    levaram as mulheres que frequentaram o projeto Embalando o bero no perodo de junho de

    2012 a junho de 2013 no frequentarem o projeto Ns e nossos filhos, ambos oferecidos

    pelo equipamento CRAS. Como objetivos especficos definiu-se: a) apresentar a legislao

    que ampara a aplicao da Poltica de Assistncia Social no Brasil; b) sistematizar por meio

    dos documentos a implantao do CRAS do municpio de Assis Chateaubriand e c) apresentar

    os projetos Embalando o bero e Ns e nossos filhos. Para atingir tais objetivos, a pesquisa

    pauta-se na abordagem qualitativa, com carter exploratrio. A construo do referencial

    terico d-se a partir do levantamento bibliogrfico e documental com pesquisa de campo.

    Para a pesquisa de campo foi utilizada a tcnica da entrevista e como instrumento o

    formulrio de entrevista com questes semiestruturadas. O Universo dessa pesquisa

    compreende todas as mulheres cadastradas no projeto Embalando o bero no perodo

    estabelecido. Os resultados da pesquisa apontam que h evaso no projeto a partir de

    justificativas plausveis dos sujeitos tendo em vista a condio de vida dessas famlias, como

    trabalho, filhos e demais atividades domsticas. No entanto para alm dessas justificativas,

    observou-se que esses sujeitos ainda se encontram em processo de negao da Poltica de

    Assistncia Social como um direito, o que tambm justifica a evaso do projeto.

    Palavras Chave: Poltica de Assistncia Social, CRAS e Assis Chateaubriand.

  • LISTA DE SIGLAS

    BE Benefcios Eventuais

    BPC Benefcio de Prestao Continuada

    CF Constituio Federal

    CNAS Conselho Nacional de Assistncia Social

    CMAS Conselho Municipal de Assistncia Social

    CRAS Centro de Referncia de Assistncia Social

    CIT Comisso Integradora Tripartite

    CEAS Conferncia Estadual de Assistncia Social

    CEP Comit de tica em Pesquisa

    DIEESE Departamento Intersindical de Estatstica e Estudos Socioeconmico

    FEAS Fundo Estadual de Assistncia Social

    IPARDES Instituto Paranaense de Desenvolvimento Econmico e Social

    LOAS Lei Orgnica de Assistncia Social

    MDS Ministrio de Desenvolvimento Social e Combate a Fome

    NOB Norma Operacional Bsica

    NOB/SUAS Norma Operacional Bsica/ Sistema nico de Assistncia Social

    NOB/RH/SUAS Norma Operacional Bsica de Recursos Humanos do Sistema nico de

    Assistncia Social

    PNAS Poltica Nacional de Assistncia Social

    PNAA Programa Nacional de Acesso a Alimentao

    PAIF Programa de Ateno Integral a Famlia

    PROVOPAR Programa de Voluntariado do Paran

    SAS Secretaria de Assistncia Social

    SEDS Secretaria de Estado da Famlia e Desenvolvimento Social

    TCC Trabalho de Concluso de Curso

    UNIOESTE Universidade Estadual do Oeste do Paran

  • SUMRIO

    RESUMO ................................................................................................................................... 6

    LISTA DE SIGLAS .................................................................................................................. 7

    INTRODUO ........................................................................................................................ 9

    1 POLTICAS SOCIAIS: DEBATES E EMBATES PARA IMPLANTAO E

    IMPLEMENTAO DA POLTICA DE ASSISTNCIA SOCIAL ........................... 11

    1.1 SERVIO SOCIAL: UMA DAS PROFISSES QUE VISAM RESPONDER AS

    DEMANDAS DA POLTICA DE ASSISTNCIA SOCIAL............................................14

    1.2 A POLTICA DE ASSISTNCIA SOCIAL PS CONSTITUIO FEDERAL DE

    1988.. ................................................................................................................................... 18

    1.2.1 A descentralizao da Poltica de Assistncia Social ................................................. 31

    2 O MUNICPIO DE ASSIS CHATEAUBRIAND E A POLTICA DE

    ASSISTNCIA SOCIAL .................................................................................................... 36

    2.1 CENTRO DE REFERNCIA DE ASSISTNCIA SOCIAL CRAS NO

    MUNICPIO DE ASSIS CHATEAUBRIAND: ESPAO EM CONSTRUO ............. 39

    2.2 PROJETOS, AES E SERVIOS RELACIONADOS A PROTEO SOCIAL

    BSICA NO CRAS DO MUNICPIO .............................................................................. 45

    2.2.1 Projetos Embalando o beroe Ns e nossos filhos .............................................. 46

    3 DOS PROCEDIMENTOS METODOLGICOS ANLISE DOS DADOS:

    MAIOR APROXIMAO COM O TEMA ..................................................................... 50

    3.1 ANLISE DOS DADOS DA PESQUISA: O QUE FALAM OS SUJEITOS .................. 53

    3.1.1 Apresentao dos sujeitos da pesquisa ........................................................................ 53

    3.2 AS ENTREVISTADAS RESPONDEM SOBRE OS PROJETOS EMBALANDO

    O BERO E NS E NOSSOS FILHOS ...................................................................... 56

    3.3 POLTICA DE ASSISTNCIA SOCIAL NA COMPREENSO DOS USURIOS ...... 58

    3.3.1 EIXO 1: A concepo da Poltica de Assistncia Social ............................................. 58

    3.3.2 EIXO 2: A representao do Assistente Social no CRAS do municpio de

    Assis Chateaubriand...................................................................................................... 63

    CONSIDERAES FINAIS ................................................................................................. 66

    REFERNCIAS...................................................................................................................... 69

    APNDICES ........................................................................................................................... 75

    ANEXOS.................................................................................................................................. 82

  • 9

    INTRODUO

    A Poltica de Assistncia Social brasileira tem seu marco na Constituio Federal de

    1988 (CF/1988), onde a partir desta obtm pela primeira vez o carter de poltica pblica,

    tornando-se um direito no contributivo e dever do Estado garanti-la a quem necessitar. A

    partir da CF/1988, a Poltica de Assistncia Social aponta para o distanciamento da lgica do

    favor e da caridade geralmente ligada a Igreja e instituies filantrpicas.

    A partir desse marco a Poltica de Assistncia Social ganha novos

    redimensionamentos, tendo como base a criao da Lei Orgnica de Assistncia Social

    (LOAS) em 1993 visando o enfrentamento da pobreza, a universalizao dos direitos sociais,

    e estabelecendo uma relao integrada com outras polticas setoriais.

    Contudo, embora a Assistncia Social tenha ganhado status de poltica pblica de

    direito ao cidado e dever do Estado, o perodo histrico no foi muito favorvel. As dcadas

    de 1980 e 1990 so marcadas no Brasil pelo avano do neoliberalismo, modelo este de Estado

    que subordinam as Polticas Sociais aos ajustes econmicos, com a proposta de um Estado

    mnimo para o social e mximo para o capital, se constituindo um entrave para o

    reconhecimento da Poltica de Assistncia Social como direito. Mediante a esse contexto,

    somente em 2004 com a constituio da nova Poltica Nacional de Assistncia Social

    (PNAS), e o Sistema nico de Assistncia Social (SUAS) em 2005, que a Assistncia Social

    teve possibilidade de ampliao na direo da universalizao dos direitos socioassistenciais.

    No atual contexto da Poltica de Assistncia Social brasileira, em seu nvel de Proteo

    Social Bsica destinada a populao que vive em vulnerabilidade social, tem-se uma

    importante ferramenta para o acesso a essa poltica, sendo este o Centro de Referncia de

    Assistncia Social (CRAS), que deve ser localizado em reas de vulnerabilidade social,

    possuindo a funo da oferta pblica do trabalho social com famlias e indivduos tendo como

    carro chefe para suas aes o Programa de Ateno Integral a Famlia (PAIF).

    No municpio de Assis Chateaubriand - PR, o CRAS oferta por meio do PAIF servios

    para famlias e indivduos em situao de vulnerabilidade social, buscando realizar o

    atendimento integrado famlia no conjunto das necessidades bsicas promovendo o acesso

    aos direitos sociais. Destaca-se aqui entre os projetos que so realizados no CRAS do

    municpio, os projetos Embalando o bero e Ns e nossos filhos.

    Diante disso, a pesquisa tem como temtica a Poltica de Assistncia Social. Para

    responder ao problema da pesquisa, qual seja: Por que algumas mulheres usurias dos

    servios do CRAS do municpio de Assis Chateaubriand que frequentaram o projeto

  • 10

    Embalando o bero no frequentam o projeto Ns e nossos filhos? elencou-se como

    objetivo geral: analisar os motivos que levaram as mulheres que frequentaram o projeto

    Embalando o bero no perodo de junho de 2012 a junho de 2013 no frequentarem o

    projeto Ns e nossos filhos, ambos oferecidos pelo CRAS. Para atender a esta meta foi

    eleito como objetivos especficos: a) apresentar a legislao que ampara a aplicao da

    Poltica de Assistncia Social no Brasil b) sistematizar por meio dos documentos a

    implantao do CRAS do municpio de Assis Chateaubriand e; c) apresentar os projetos

    Embalando o bero e Ns e nossos filhos. O interesse em realizar tal pesquisa deve-se a

    alguns fatores: primeiro, o interesse em estudar a Poltica de Assistncia Social, surgiu da

    vivncia desta acadmica ao se inserir no campo de Estgio Supervisionado em Servio

    Social I e II, no CRAS do municpio de Assis Chateaubriand durante o perodo de 2013 a

    2014; segundo, por estar envolvida no projeto Ns e nossos filhos oferecido pelo CRAS do

    municpio e terceiro por perceber a dificuldade de algumas mulheres que frequentaram o

    projeto Embalando o bero, em continuarem frequentando o projeto Ns e nossos filhos

    considerando que este uma continuao do primeiro.

    Com o intuito de tornar mais clara a apresentao dos contedos deste trabalho, bem

    como as formas adotadas para se chegar a sua exposio, apresenta-se a organizao dos

    captulos: no primeiro captulo apresenta-se um breve histrico acerca do processo que

    originou as Polticas Sociais, com enfoque na Poltica de Assistncia Social ps Constituio

    Federal de 1988 considerando o avano dos ideais neoliberais e alguns documentos que a

    normatizam a partir da exposio de aspectos centrais de algumas legislaes que amparam a

    aplicao da Poltica de Assistncia Social, bem como apontamentos da Poltica de

    Assistncia Social no estado do Paran, a partir do contexto de descentralizao. No segundo

    captulo buscou-se apresentar o processo de implantao da Poltica de Assistncia Social no

    municpio de Assis Chateaubriand - PR, tendo como enfoque principal a institucionalizao

    do CRAS. Para isso foi necessrio revisar algumas leis municipais que amparam a construo

    da Poltica de Assistncia Social no municpio, alm de Atas do Conselho Municipal de

    Assistncia Social (CMAS) no perodo compreendido entre 2006 a 2012.

    E no terceiro captulo, busca-se apresentar os procedimentos metodolgicos da

    pesquisa e o resultado da pesquisa de campo, as entrevistas sistematizadas, separadas por

    eixos para facilitar a compreenso do leitor. Para finalizar o trabalho, apresenta-se as

    consideraes finais.

  • 11

    1 POLTICA SOCIAL: DEBATES E EMBATES PARA IMPLANTAO E

    IMPLEMENTAO DA POLTICA DE ASSISTNCIA SOCIAL

    As Polticas Sociais1 foram construdas historicamente, mais precisamente na evoluo

    do capitalismo, estando relacionadas ao processo de formao do Estado como tambm das

    lutas de classes a partir de um contexto onde a classe trabalhadora comea a reivindicar por

    seus direitos e consequentemente por maior interveno estatal. Porm, para entender como as

    Polticas Sociais funcionam no Brasil necessrio saber por que ou para que foram criadas.

    Assim, cabe contextualizar que o Estado neoliberal, capitalista-burgus e democrtico,

    (modelo atual) passou por inmeras mudanas ao longo da histria como transformaes

    sociais, econmicas, culturais e polticas. Tem como marco inicial a passagem do feudalismo2

    para o capitalismo, pois at ento, quem detinha todo o poder da terra e domnio dos

    camponeses eram os senhores feudais.

    Com a migrao do homem do campo para as cidades em busca de trabalho tem-se um

    aumento considervel da misria, uma vez que esses trabalhadores so obrigados a viver em

    condies mnimas de vida, pois com o crescimento das cidades so obrigados a viver em

    pequenos cortios que no garantem nenhuma condio digna de vida. Associado a esse fator

    tem-se a expanso do comrcio, segundo Netto e Braz, a terra comea a ser objeto de

    transio mercantil e a prestao de trabalho comea a ser paga atravs do dinheiro o que

    consequentemente possibilita uma maior movimentao do comrcio. no interior dessas

    relaes que um grupo social comea a ganhar importncia crescente: o dos

    comerciantes/mercadores, representantes do capital mercantil [...] movidos por um nico

    objetivo, o lucro [...]. (NETTO; BRAZ, 2010, p.70, grifo dos autores).

    A partir dessas relaes, a sociedade divide-se em duas classes antagnicas: de um

    lado a burguesia que detm os meios de produo e a acumulao privada do capital e de

    outro a classe trabalhadora que vende sua fora de trabalho e explorada. Esses e outros

    fatores contriburam para que houvesse o enfraquecimento do modelo feudal, possibilitando a

    mudana para o modo de produo capitalista com uma nova forma de poder poltico, voltado

    1 [...] Enquanto interveno do Estado burgus no capitalismo monopolista, a poltica social deve constituir-se

    necessariamente em polticas sociais: as sequelas da questo social so recortadas como problemticas

    particulares (o desemprego, a fome, a carncia habitacional, o acidente de trabalho, a falta de escolas, a

    incapacidade fsica etc) e assim enfrentadas [...]. (NETTO, 1992, p.28, grifos do autor). 2 O feudalismo encontrou-se plenamente estruturado na Europa por volta do sculo XI, com suas caractersticas

    principais inteiramente definidas: uma classe dos produtores diretos, os servos, que j ento gerava um excedente

    agrcola significativo, expropriado pelos senhores feudais, classe parasitria dedicada especialmente caa e a

    guerra. Mas, paralelamente, mantinha-se a produo para a troca (isto produo de mercadorias), centrada no

    trabalho artesanal [...]. (NETTO; BRAZ, 2010, p.69).

  • 12

    a atender aos interesses da burguesia e assegurar a manuteno do poder das classes

    dominantes sobre a massa dos trabalhadores. (NETTO; BRAZ, 2010).

    De acordo com os autores acima, com a evoluo deste novo modelo de sociedade3

    que se caracteriza por diversas transformaes, fundando-se na explorao do trabalho, o

    Estado guiado pelos interesses da classe dominante, ou seja, a burguesia. Com a

    intensificao do capitalismo no Brasil (perodo da Revoluo Industrial em 1930), tem-se um

    grande aumento das desigualdades sociais que so resultantes dessa contradio entre capital

    e trabalho4, evidenciando-se assim as expresses da questo social5 explicitando a fome, a

    falta de moradia, a violncia, o desemprego, entre outras.

    Segundo Netto, a questo social6 parte constitutiva do desenvolvimento do

    capitalismo, [...] diferentes estgios capitalistas produzem diferentes manifestaes da

    questo social [...] sua existncia e suas manifestaes so indissociveis da dinmica

    especfica do capital [...]7. (NETTO, 2001, p.45).

    Assim, enquanto parte constitutiva das relaes sociais capitalistas, sendo

    indissocivel do processo de acumulao e dos rebatimentos desse processo diante a classe

    trabalhadora, a questo social apreendida como conjunto das expresses das

    desigualdades sociais e para seu enfrentamento requer reivindicao por parte da classe

    trabalhadora diante as necessidades postas, como tambm a interveno do Estado.

    (IAMAMOTO, 2001). Ainda segundo a autora, a questo social tem seu incio no carter

    3 importante ressaltar que, segundo Netto e Braz (2010), o capitalismo ao longo de sua existncia constitudo

    pela mobilidade e transformao. Sua evoluo resultado da intercorrncia do desenvolvimento das foras

    produtivas, de alteraes na economia, de inovaes tecnolgicas e organizacionais e de mudanas polticas e

    culturais que envolvem as classes sociais. Capital relao social, mutvel, transformvel. movimento,

    dinamizado pelas suas contradies. 4 Para que os donos dos meios de produo tenham cada vez mais lucro os trabalhadores devem trabalhar

    dobrado, com menores salrios e em condies cada vez mais precrias. 5 Antes de 1930, portanto, a questo social no aparecia no discurso dominante seno como fato excepcional e episdico, no porque no existisse j, mas porque no tinha condies de se impor como questo inscrita no

    pensamento dominante. (CERQUEIRA FILHO, 1982, p. 59). 6 A expresso questo social permanece entre aspas, pois: [...] uma das resultantes de 1948 foi a passagem,

    em nvel histrico-universal, do proletariado da condio de classe em si a classe para si. As vanguardas

    trabalhadoras acenderam, no seu processo de luta, a conscincia poltica de que a questo social est

    necessariamente colada sociedade burguesa: somente supresso deste conduz supresso daquela. A partir da,

    o pensamento revolucionrio passou a identificar, na prpria expresso questo social, uma tergiversao

    conservadora, e a s empreg-la indicando este trao mistificador (NETTO, 2001, p. 44-45). Partilhando da

    ideia de Netto, utilizada aspas na expresso questo social, para indicar a anlise da questo social na

    perspectiva crtica, diferenciando-a do pensamento conservador. 7 Segundo Braz e Netto (2010), o capitalismo passa por diferentes estgios. Apresenta-se como estgio inicial o

    capitalismo comercial ou mercantil que comea com a acumulao primitiva e vai at a acumulao de

    mercadorias mediante o estabelecimento da manufatura, perodo datado entre o sculo XVI at meados do sculo

    XVIII. Na segunda metade do sculo XVIII ingressa-se um novo estgio, o capitalismo concorrencial ou

    conhecido tambm como liberal ou clssico que vai at o ltimo tero do sculo XIX, marcado pelas amplas

    possibilidades de negcios que se abriam para os pequenos e mdios capitalistas. Entre os fins do sculo XIX e

    os primeiros anos do sculo XX, tem-se o grande capital, conhecido como capital monopolista. Com a fuso

    dos capitais monopolistas industriais e os bancrios constitui-se o terceiro estgio capitalista, o imperialista.

  • 13

    coletivo da produo, inseparvel do surgimento do trabalhador livre [...] que depende da

    venda de sua fora de trabalho como meio de satisfao de suas necessidades vitais [...].

    (IAMAMOTO, 2001, p.17) encontrando-se desta forma intimamente ligada ao avano do

    capitalismo o qual possui suas bases na explorao da mo-de-obra visando acumulao do

    capital.

    Diante desses fatores, surgem vrios movimentos e reivindicaes por parte da classe

    explorada, ou seja, a classe trabalhadora, por melhores condies de vida e trabalho. Assim,

    com o objetivo de controlar essas reivindicaes, buscando responder as expresses da

    questo social, atender os interesses do capitalismo e tambm como estratgia de trazer a

    massa para o seu lado, controlando-os e mantendo a ordem, o Estado cria as Polticas Sociais,

    fragmentadas e setoriais. (NETTO, 1992).

    Partilhando da ideia de Vieira, que expe que a Poltica Social pode ser entendida

    como [...] uma maneira de expressar as relaes sociais cujas razes se localizam no mundo

    da produo [...] (VIEIRA, 1992, p. 22), refletir sobre Poltica Social significa pensar no

    contexto das relaes da sociedade capitalista e na relao contraditria entre capital e

    trabalho. Segundo o autor, A poltica social aparece no capitalismo construda a partir das

    mobilizaes operrias sucedidas ao longo das primeiras revolues industriais. (VIEIRA,

    1992, p.19), ou seja, a Poltica Social no desligada dos reclamos populares, e

    consequentemente por interveno do Estado, que por vezes possibilita um reconhecimento

    formal de direitos, mas no podendo ser compreendida como uma iniciativa prpria do Estado

    e sim por presses advindas da classe trabalhadora.

    Destarte, as formataes das Polticas Sociais devem ser pensadas no contexto das

    transformaes econmicas, polticas e sociais mediante o desenvolvimento do capitalismo,

    em linhas gerais consistem em estratgia governamental se exibindo em formas de relaes

    jurdicas e polticas. (VIEIRA, 1992).

    Nesta mesma direo, Pastorini elucida que as Polticas Sociais so produto concreto

    do desenvolvimento capitalista, de suas contradies, da acumulao crescente do capital e,

    portanto, um produto histrico e no natural e linear. Para a autora, [...] as polticas sociais

    participam da reproduo da estrutura poltica, econmica e social [...]. (PASTORINI, 1997,

    p.90), sendo produto das lutas de classes e da correlao de foras presentes na sociedade

    capitalista.

    Em sntese, de um lado, as Polticas Sociais surgem a partir das demandas postas pela

    classe trabalhadora diante das desigualdades sociais advindas do rebatimento das expresses

    da questo social, ou seja, da contradio entre capital e trabalho. De outro, surgem como

  • 14

    interesse do Estado, a partir de intervenes fragmentadas e necessrias para sua manuteno,

    fortalecendo o controle e dominao do capital, mas que ao mesmo tempo levantam questes

    de interesse da classe trabalhadora, como o acesso aos direitos sociais.

    Assim, antes de se apresentar o processo de construo da Poltica de Assistncia

    Social, inserida no contexto das Polticas Sociais, faz-se necessrio uma breve

    contextualizao do Servio Social como profisso que surge no movimento de implantao

    das Polticas Sociais no Brasil, passando a ser reconhecida como profisso que atua junto s

    Polticas Sociais e que se insere em diversos espaos dessas polticas sendo um deles na

    Poltica de Assistncia Social. importante lembrar que so nos espaos de insero dos

    profissionais, predominantemente no campo das Polticas Sociais, que estes tm a

    possibilidade de construo da atuao como profissionais na luta pela consolidao da

    cidadania, bem como, o protagonismo da populao usuria dessas polticas, como sujeitos de

    direitos.

    1.1 SERVIO SOCIAL: UMA DAS PROFISSES QUE VISAM RESPONDER AS

    DEMANDAS DA POLTICA DE ASSISTNCIA SOCIAL

    A atuao do profissional assistente social8 inserido tanto no espao pblico estatal ou

    privado, na atualidade tem como base o Cdigo de tica Profissional e a Lei que Regulamenta

    a profisso9, ambos de 1993, as quais comportam os direitos e deveres dos profissionais,

    dando direo tica e legal. Os profissionais trabalham na defesa dos interesses da classe

    trabalhadora para o acesso aos direitos e na tentativa de possibilitar a autonomia aos sujeitos

    visando uma sociedade justa.

    Historicamente o Servio Social brasileiro como profisso resultante das relaes

    histricas, sociais, polticas, econmicas e culturais. A emergncia da profisso est ligada ao

    desenvolvimento capitalista que marcado por conflitos de classes resultantes da contradio

    8 O/a assistente social ou trabalhador/a social atua no mbito das relaes sociais, junto a indivduos, grupos, famlias, comunidade e movimentos sociais, desenvolvendo aes que fortaleam sua autonomia, participao e

    exerccio de cidadania, com vistas mudana nas suas condies de vida. Os princpios de defesa dos direitos

    humanos e justia social so elementos fundamentais para o trabalho social, com vistas superao da

    desigualdade social e de situaes de violncia, opresso, pobreza, fome e desemprego. (BRASIL, 2010). 9 O cdigo de tica aprovado em 1993 pela resoluo do CFESS define os princpios ticos fundamentais da

    profisso, tendo como valores a liberdade; a defesa dos direitos humanos; a equidade e a justia social; a

    universalizao do acesso a bens e servios relativos as polticas sociais; ampliao da cidadania; garantia dos

    direitos civis, polticos e sociais; defesa da democracia; competncia e qualidade dos servios prestados;

    aprimoramento intelectual; garantia do pluralismo, uma nova relao com os usurios e articulao com outras

    categorias. (BRASIL, 2011). A Lei que Regulamenta a Profisso, tambm aprovada em 1993 pelo CFESS,

    dispe sobre o exerccio profissional, suas competncias, suas atribuies privativas e os fruns que visam

    defender e disciplinar o exerccio da profisso, o CFESS e o CRESS. (BRASIL, 2011).

  • 15

    entre capital e trabalho. Assim, compreendendo que a questo social como j foi

    apresentada anteriormente, expressa o conjunto de desigualdades da sociedade capitalista

    madura, o Servio Social tem nela base para sua formao como profisso. De acordo com

    Iamamoto (2001), o Servio Social uma profisso que se desenvolve a partir da contradio

    burguesa para intervir na questo social.

    A origem da profisso no Brasil est marcada mais precisamente no perodo de 1930,

    onde h a intensificao da questo social a partir do processo de industrializao que

    marcado pelo crescimento das cidades devido ao xodo rural, ou seja, os trabalhadores rurais

    saem do campo para as cidades em busca de trabalho nas indstrias. Diante desse fator, h o

    crescimento da classe operria urbana e consequentemente o aumento das expresses da

    questo social.

    Em meio a este cenrio, o Servio Social [...] surge como parte de um movimento

    social mais amplo de bases confessionais, articulado necessidade de formao doutrinria

    [...] para uma presena mais ativa da Igreja Catlica [...]. (IAMAMOTO, 2000, p.18, grifo da

    autora) na sociedade. A profisso no s se origina no interior do bloco catlico como em um

    momento em que a Igreja se mobiliza para recuperar seus interesses e privilgios, buscando

    sua reafirmao normativa na sociedade por meio de uma ao missionria e evangelizadora.

    Possuindo suas bases na Igreja, configura-se inicialmente um carter missionrio a

    atividade profissional, que tem suas aes voltadas justia e a caridade10, sua gnese

    atribuda ao misto entre a caridade tradicional e o apostolado social, tornando-se agentes para

    a resoluo dos problemas sociais, que no so considerados como desigualdades advindas

    da contradio entre capital e trabalho, mas sim como algo natural de cada indivduo.

    (IAMAMOTO, 2011).

    Neste contexto, a partir das grandes mobilizaes da classe trabalhadora em virtude da

    intensificao das expresses da questo social que atravessa toda a sociedade, a Igreja, o

    Estado e as classes dominantes so obrigados a se posicionarem. Desse modo, cabe ao Estado

    oferecer algumas protees especialmente queles que precisam de amparo, e a Igreja, cabe

    tarefa de recristianizao da sociedade, sendo estas aes realizadas pelo Servio Social.

    Assim, vinculando-se a essas atividades, [...] o Servio Social surge da iniciativa de grupos e

    fraes de classes dominantes, que se expressam a travs da Igreja [...]. (IAMAMOTO,

    2000, p.19). No entanto, mediante o crescimento das lutas sociais dos trabalhadores, as aes

    10 A origem no seio do bloco catlico e na ao benvola e caridosa de senhoras e moas da sociedade; o

    embricamento da teoria e metodologia do Servio Social com a doutrina social da Igreja e com o apostolado

    social deixaram marcas profundas na profisso e que ainda se fazem presentes tanto na concepo de

    profissionais quanto da sociedade.

  • 16

    de carter assistencial, religioso e filantrpico desenvolvidas pela Igreja se mostram

    insuficientes para atender as expresses da questo social.

    Diante disso, h a necessidade de uma maior interveno por parte do Estado se vendo

    obrigado a incorporar alguns dos interesses da classe trabalhadora, mas buscando controlar

    esse movimento e atender os interesses do capitalismo. Para uma maior interveno, vrias

    instituies sociais11 so implantadas pelo Estado e que requerem profissionais

    especializados12. O Estado necessita de categorias tcnico-profissionais especializadas para

    executar as Polticas Sociais, bem como para mediar a relao conflituosa entre capital e

    trabalho.

    O Servio Social passa a constituir-se numa das engrenagens de execuo das Polticas

    Sociais, deixando de ser somente um mecanismo de distribuio de caridade privada das

    classes dominantes. No entanto, mantm sua ao educativa e doutrinria de enquadramento,

    voltando-se aos segmentos mais carentes da populao, segundo Iamamoto, [...] o servio

    social se dedicar aqueles segmentos mais carentes, cujo comportamento se torna mais

    desviante em face de um padro definido como normal [...]. (IAMAMOTO; CARVALHO,

    2011, p.329, grifos dos autores).

    So prticas educativas e organizativas que desconhecem os antagonismos de classe,

    so tratamentos de cunho doutrinrio e moralizador, entendendo que os problemas estavam

    nos indivduos e no na sociedade. [...] Atuando atravs de entidades filantrpicas privadas e

    atravs do Estado, o Servio Social orienta-se para uma individualizao da proteo legal,

    entendida como assistncia educativa adaptada aos problemas individuais [...].

    (IAMAMOTO, 2000, p.20, grifo da autora). Conforme explicita a autora, A profisso no se

    caracteriza apenas como nova forma de exercer a caridade, mas como forma de interveno

    ideolgica na vida da classe trabalhadora, com base na atividade assistencial [...].

    (IAMAMOTO, 2000, p.20).

    De fato, a institucionalizao do Servio Social amplia suas possibilidades de

    interveno para alm dos trabalhos de ao social, de seu carter de misso de apostolado

    doutrinrio, de recristianizao das massas populares e de aes caridosas, no entanto, h um

    11 A primeira grande instituio nacional de assistncia social foi a Legio Brasileira de Assistncia (LBA)

    criada em 1942. No mesmo ano criado o Servio Nacional de Aprendizagem Industrial (SENAI). Em 1946

    oficializado o Servio Social da Indstria (SESI). Em 1946, surge a primeira grande instituio que atua sobre os

    habitantes das grandes favelas, a Fundao Leo XIII. Essas so algumas das primeiras instituies que

    requerem o trabalho do servio social. (IAMAMOTO; CARVALHO, 2011). 12 A partir da, amplia-se o mercado de trabalho para o Servio Social se institucionalizando e legitimando como

    profisso inserida na diviso social e tcnica do trabalho, se tornando uma categoria assalariada. O Estado

    necessita de categorias tcnico-profissionais especializadas para executar as Polticas Sociais, bem como para

    mediar a relao conflituosa entre capital e trabalho. (IAMAMOTO; CARVALHO, 2011).

  • 17

    longo caminho a ser percorrido para uma desvinculao com essas prticas assistencialistas,

    com carter missionrio e moralizador.

    Em meio a esse processo, o Servio Social comea a reavaliar o seu fazer profissional,

    dando inicio a um processo que percorre por vrios movimentos13 que marcam a histria da

    profisso na busca de ruptura com o tradicionalismo, com o conservadorismo, com aes

    benemerentes as quais marcam a profisso at os dias de hoje. Compreende-se que todo esse

    processo de inteno de ruptura com o Servio Social tradicional, possibilitou imprimir uma

    direo ao pensamento e a ao da profisso, com a incorporao de novos princpios tico-

    poltico, mas que ainda existem muitos desafios, sendo um deles a viso assistencialista que

    se tem da profisso, ainda existem muitas divergncias a respeito do trabalho do assistente

    social, sendo muitas vezes vinculado aquele profissional que trabalha com os pobres, ou

    aquele que faz caridade e que ajuda os necessitados.

    O Servio Social buscou fortalecer seu projeto poltico profissional, o qual visa a

    defesa dos direitos sociais, a cidadania, a ampliao da democracia, entre outros. Assim, por

    meio de organizaes e debates, a categoria profissional redimensiona sua interveno e seu

    projeto materializou-se no Cdigo de tica da Profisso de 1993, na Lei que Regulamenta a

    Profisso e nas Diretrizes Curriculares da Associao Brasileira de Ensino e Pesquisa em

    Servio Social (ABEPSS). com esse direcionamento que a profisso ocupa, na atualidade,

    diferentes espaos como planejamento, execuo e avaliao das Polticas Sociais. Entre esses

    espaos, um espao que teve a incorporao de um grande nmero de profissionais nos

    ltimos anos a Poltica de Assistncia Social nas diferentes esferas de governo.

    O assistente social pode atuar na Poltica de Assistncia Social como gestor,

    coordenador e/ou tcnico, atividades estas que possibilitam o profissional imprimir sua viso

    de homem e sociedade e trabalhar na perspectiva do acesso ao direito e no mais na via da

    benesse e da caridade. Entendendo que historicamente o Servio Social vem desenvolvendo

    suas aes em situaes sociais de restrio e/ou violao de direitos, as Polticas Sociais so

    mediaes fundamentais para essa interveno. Para Yazbek, Martinelli e Raichelis (2008),

    diante desses fatores, o trabalho do assistente social [...] pode produzir resultados concretos

    13Movimentos estes que se concretizam em vrios encontros e documentos formulados pelos profissionais na

    tentativa de uma mudana, de romper com a essncia conservadora que se tem a profisso, na busca de uma

    emancipao, de um novo referencial terico-metodolgico, tcnico-operativo e tico-poltico. Destacam-se os

    congressos de Arax (1967) com o tema teorizao do Servio Social, o de Terespolis (1970) com o tema

    metodologia do Servio Social, o de Sumar e Alto da Boa Vista (1978) com o tema cientificidade do Servio

    Social e o de Belo Horizonte (1980), a construo de uma alternativa global ao tradicionalismo que foi o ponto

    de partida para a inteno de ruptura13. (NETTO, 2009).

  • 18

    nas condies materiais, sociais e culturais da vida de seus usurios, em seu acesso a direitos

    e usufruto de polticas sociais [...]. (YAZBEK; MARTINELLI; RAICHELIS, 2008, p.7).

    Assim, realizada esta breve contextualizao do surgimento da profisso, que perpassa

    por vrios movimentos at se chegar a uma profisso que prima pela garantia dos direitos

    distanciando-se de prticas conservadoras e assistencialistas, mas que atualmente ainda

    encontram desafios perante esse reconhecimento, considerando sua gnese como tambm o

    atual cenrio capitalista globalizado permeado de interesses da hegemonia neoliberal, o

    prximo item apresentar o processo de construo da Poltica de Assistncia Social,

    considerando esta um espao de atuao do profissional do assistente social.

    1.2 A POLTICA DE ASSISTNCIA SOCIAL PS CONSTITUIO FEDERAL DE 1988

    No contexto das Polticas Sociais, situa-se a Poltica de Assistncia social como uma

    das polticas setoriais efetivadas pelo Estado. Assim como as Polticas Sociais, seu

    surgimento encontra-se na tenso entre capital e trabalho se constituindo num espao de

    correlao de foras antagnicas presentes na sociedade capitalista.

    Historicamente, a Assistncia Social no Brasil esteve ligada a noo de proteger e

    ajudar os mais pobres atravs de trabalhos filantrpicos, voluntrios e solidrios, com aes

    de carter emergencial e pontual. Sua vinculao histrica a essas prticas faz com que

    atualmente existam algumas distores, conferindo-lhe um perfil limitado, pois ao longo da

    histria tem sido estruturada como uma estratgia do Estado no enfrentamento das expresses

    da questo social, construdas sob algumas distores, se evidenciando pelo trabalho

    filantrpico e solidrio para com a sociedade, atribuindo a Assistncia Social uma interveno

    com carter de ajuda. (YAZBEK, 1996).

    Diante dessas caractersticas, a dcada de 1980 foi muito significativa para o campo

    das Polticas Sociais no Brasil, em especial para a Assistncia Social. Couto (2006), ressalta

    que,

    A dcada de 1980 foi protagonista de um debate profundo sobre esta

    sociedade. Todo movimento que foi gestado na sociedade brasileira, na sada

    da ditadura militar, um movimento de resistncia forma de organizao

    do estado brasileiro e da sociedade para dar conta das expresses da questo

    social. (COUTO, 2006, p. 6).

    um perodo marcado por transformaes no panorama econmico, poltico e social

    do pas que resulta na nova Constituio da Repblica Federativa do Brasil de 1988

  • 19

    (CF/1988), que significou a conquista de vrios direitos sociais at ento no reconhecidos.

    Em seguida, outro divisor de guas foi a eleio por voto direto (1989), possibilidade de os

    cidados se manifestarem nos diferentes nveis de governo, aps quase trs dcadas de

    interrupo do processo eleitoral democrtico.

    Diante desse cenrio, as Polticas Sociais se apresentam como resultado das relaes

    entre Estado e Sociedade, tornando-se mecanismo para gerenciar estas relaes. Em meio a

    esse contexto de mobilizaes, abre-se um intenso debate sobre a formulao de Polticas

    Sociais, dentre elas a Poltica de Assistncia Social. No entanto, este perodo no pas se

    destaca pelo avano dos ideais neoliberais, onde a conduo central dessa nova ideologia

    um Estado mnimo reduzindo seu papel e suas funes e consequentemente o desmonte dos

    direitos sociais. (ALMEIDA, 1999).

    Uma das caractersticas do neoliberalismo a retomada do molde da solidariedade

    como sinnimo de voluntarismo, com o intuito de repassar a responsabilidade do Estado com

    programas sociais para setores privados e para a sociedade, e assim distanciar-se de suas

    funes e consequentemente dos gastos pblicos. Esse perodo no Brasil, marcado tambm

    pelo processo de reformas estatais14 sendo estas voltadas para o mercado sendo conduzidas

    sob a [...] lgica dos representantes da classe dominante, em seus diferentes segmentos, um

    projeto que coloca em prtica a vontade do capital [...]. (BATISTA, 1999, p.84).

    As Polticas Sociais neste contexto encontram-se limitadas, caracterizadas focalizao

    e pela privatizao. Apresenta-se [...] Uma poltica social residual que soluciona apenas o

    que no pode ser enfrentado via mercado, da comunidade e da famlia [...]. (BEHRING;

    BOSCHETTI, 2009, p.310).

    No entanto, mesmo diante a ofensiva neoliberal, possvel identificar algumas

    conquistas durante o perodo, lembrando que as mesmas foram obtidas a partir de

    organizaes e mobilizaes de expressivos segmentos da sociedade brasileira, que buscavam

    por uma Constituinte livre e soberana. Apresenta-se como avanos ps Constituinte, alm do

    voto direto e da incorporao dos direitos sociais, inovaes relacionadas participao da

    sociedade civil nas decises polticas, sendo possvel construir espaos participativos no que

    tange a formulao e gesto das Polticas Sociais.

    A Poltica de Assistncia Social ao longo desse perodo se redefine. Tem como marco

    a CF/1988, a qual prev a Seguridade Social em seu artigo 194, estabelecendo os direitos para

    Sade, Previdncia Social e Assistncia Social onde pela primeira vez ganha condio de

    14 Sobre o processo de reformas do Estado, ver Batista, 1999.

  • 20

    direito. Ao adquirir a conotao de direito social, a Poltica de Assistncia Social deve superar

    a compreenso de dever moral e de ajuda, prestada tradicionalmente pelas entidades

    filantrpicas ou beneficentes, passando a ser entendida como dever legal de garantia de

    benefcios e servios sociais. Inicia-se um processo com o intuito de torn-la visvel como

    poltica pblica de direito.

    Para Silveira e Colin, a Assistncia Social integrante de um sistema de proteo social

    [...] est voltada ao provimento de condies que enfrentem um conjunto de desigualdades

    de corte scio - econmico e scio - cultural [...]. (SILVEIRA; COLIN, 2006, p.24), se

    distanciando da relao de prestao de favores, de prticas assistencialistas, da moralizao e

    enquadramento dos sujeitos a ordem da sociedade direcionando-se para uma responsabilidade

    estatal.

    No entanto, o carter regulador de interveno do Estado nas relaes sociais

    direciona as Polticas Sociais a [...] polticas casusticas, inoperantes, fragmentadas,

    superpostas, sem regras estveis ou reconhecimento de direitos. (YASBEK, 1996, p.37),

    possibilitando o fortalecimento dos interesses da classe dominante. Mesmo que apresentem

    uma condio ao acesso ao direito, buscando a minimizao das desigualdades, no se

    desvincula dos interesses do Estado, sendo este comit executivo da burguesia.

    Contudo, mesmo diante a esses fatores, a Poltica de Assistncia Social ganha

    visibilidade. Na CF/1988 em seu artigo 203, definido que a Assistncia Social ser prestada

    a quem dela necessitar, sem a relao de contribuio, ou seja, no h necessidade de uma

    contribuio prvia para receber os servios e benefcios de tal poltica. Tem por objetivos,

    I - a proteo famlia, maternidade, infncia, adolescncia e velhice;

    II - o amparo s crianas e adolescentes carentes; III - a promoo da

    integrao ao mercado de trabalho; IV - a habilitao e reabilitao das

    pessoas portadoras de deficincia e a promoo de sua integrao vida

    comunitria; V - a garantia de um salrio mnimo de benefcio mensal

    pessoa portadora de deficincia e ao idoso que comprovem no possuir

    meios de prover prpria manuteno ou de t-la provida por sua famlia,

    conforme dispuser a lei. (BRASIL, 2014, p.34).

    Baseada nestes aspectos, a Assistncia Social torna-se direito, distanciando-se da

    lgica do favor e da caridade, passando a ser direito do cidado e responsabilidade do

    Estado em garanti-la. Entretanto, ainda existem grandes desafios no que diz respeito

    garantia dos direitos sociais e real efetivao da Poltica de Assistncia Social.

    Vale destacar aqui uma das restries desse direito, a Assistncia Social definida como

    poltica no contributiva significa que no h o pagamento de espcie alguma para o acesso a

  • 21

    esse direito e ser prestada a quem dela necessitar, no entanto, quando especificada que ser

    prestada aos necessitados, esta se restringe e torna-se seletiva15 pois destinada somente aos

    desamparados, aos que dela tiverem necessidade por condies de pobreza ou extrema

    pobreza.

    Mesmo garantida constitucionalmente, no governo de Fernando Collor de Mello

    (1989), a Poltica de Assistncia Social tem um retrocesso, pois o presidente vetou a primeira

    verso da Lei Orgnica de Assistncia Social (LOAS), que buscava dar consistncia e

    institucionalizar os avanos previstos na Constituio, com a justificativa de reduzir os gastos

    com a rea social. O Presidente adia a sanso de um instrumento que poderia efetivar a

    aplicao do contedo da CF/1988 no que se referia a Assistncia Social e, em virtude disso, a

    LOAS s foi sancionada no governo de Itamar Franco, atravs da Lei n 8.742 de 07 de

    dezembro de 1993, aps o impeachment de Collor e intensas mobilizaes sociais.

    Assim, a LOAS teve uma forte resistncia da classe dominante e nasce sob a perversa

    tendncia da poltica neoliberal, seu processo de construo foi de tenso e embates, o que

    acarretou em diversas mudanas do projeto de origem. Para Pereira (1996), [...] a LOAS

    um documento que, no obstante o seu carter formal produto de expresses de debates e

    embates polticos nem sempre tranquilos e consensuais. (PEREIRA, 1996, p. 102). O

    contedo da lei construdo sob uma arena de conflitos de interesses, d-se por um lado a

    partir da mobilizao social em busca de garantia de direitos e de outro como estratgia

    poltica.

    Os caminhos foram construdos lentamente e com muitas lutas para a efetivao da

    Assistncia Social como direito. Contudo, mesmo diante de todos esses embates, com a

    promulgao da LOAS, que estabelece normas e regulamenta a organizao da Assistncia

    Social, tal poltica ganha visibilidade. Em seu artigo 1 fica definido que,

    [...] A assistncia social, direito do cidado e dever do Estado, Poltica de

    Seguridade Social no contributiva, que prov os mnimos sociais, realizada

    atravs de um conjunto integrado de aes de iniciativa pblica e da

    15 Considerando que os princpios constitucionais esto cada vez mais sendo desconsiderados, [...] o principio

    da seletividade e distributividade o nico que no est sendo derrudo [...] (BOSCHETTI, 2009, p. 332), mas

    sim materializado e fixado cada vez mais, pois atravs desses princpios que h maior seleo para quem deve

    ou no ser atendido por tal poltica. J o principio da universalidade dos direitos, assim como a uniformidade e

    equivalncia esto sendo gradativamente desmantelados, pois a lgica do capital minimizar cada vez mais o

    acesso a direitos universais e transform-los em aes focalizadas e privatizadas.

    [...] a poltica de assistncia social, por sua vez, no conseguiu superar a histrica focalizao em segmentos

    ditos hoje vulnerveis ou nas chamadas situaes de risco. Sua abrangncia restritiva e os benefcios,

    servios ou programas no atingem mais do que 25% da populao que teria direito [...]. (BOSCHETTI, 2009,

    p.333).

  • 22

    sociedade, para garantir o atendimento s necessidades bsicas. (BRASIL,

    2014a, p.5, grifo nosso).

    Novamente reafirmada como uma poltica que compe a Seguridade Social do pas,

    voltada garantia de mnimos sociais, estando articulada s demais polticas setoriais assim

    como tambm prope a participao da populao. Como lei, a LOAS traz novamente a

    Assistncia Social como direito no contributivo, e neste sentido estabelece-se uma nova

    matriz para a Assistncia Social brasileira, com o compromisso com a defesa dos direitos

    sociais e a superao das formas de excluso.

    No entanto, ao trazer a proviso dos mnimos sociais, a LOAS apresenta outro ponto

    de discusso diante a Assistncia Social no to positivo. Marcelo Garcia argumenta que [...]

    necessrio discutir quais so esses mnimos sociais, pois ao longo de sua trajetria, a

    assistncia social acabou se preocupando muito mais em criar um cardpio de projetos e

    programas do que, de fato, estabelecer os mnimos sociais. (GARCIA, 2011, p.2). Para o

    autor, h a necessidade de ser discutido o que se pode estabelecer como mnimos sociais,

    levando em considerao que a lei nacional, mas as demandas ou necessidades so regionais

    e/ou locais. Considerando o modelo de produo capitalista em que a classe trabalhadora

    vende sua fora de trabalho somente para sobreviver, os mnimos sociais devem constituir um

    conjunto de seguranas sociais nas reas da educao, sade, trabalho, habitao, cultura,

    renda e convivncia, e no somente as necessidades bsicas que muitas vezes se restringem a

    alimentao, ainda de forma precria, para a sobrevivncia, o que implica de fato na

    completude da Poltica de Assistncia Social como um direito social.

    Mesmo diante a questes como estas e construda sobre pilares do neoliberalismo16, a

    Assistncia Social passa por um grande processo de construo e de ampliao. No ano de

    1997 aprovada a Norma Operacional Bsica (NOB) atravs da Resoluo n 204/1997 do

    Conselho Nacional de Assistncia Social (CNAS)17 a partir de discusses realizadas entre os

    estados e municpios juntamente com a Secretaria de Assistncia Social. A NOB/1997 foi a

    primeira norma aprovada no mbito da Assistncia Social onde apresenta o sistema

    16 No Brasil, segundo Soares (2000), as propostas neoliberais se do principalmente pelo agravamento da crise

    econmica (dcada de 1980 e 1990) tendo como eixo central combater as inflaes atravs de polticas

    econmicas o que consequentemente resulta em uma recesso sem limites diante do setor social. 17 O CNAS uma instncia implementada em 1995 a partir do artigo 33 da LOAS e que substituiu o Conselho

    Nacional de Servio Social (CNSS), institui-se como rgo superior de deliberao colegiada, vinculado

    estrutura do rgo da Administrao Pblica Federal responsvel pela coordenao da Poltica Nacional de

    Assistncia Social. Sua composio apresentada no artigo 17 da LOAS, sendo a mesma paritria entre governo

    e sociedade civil e tendo seus membros mandato de dois anos. (BRASIL, 2014b).

  • 23

    descentralizado18 e participativo, no sentido de garantir sua eficcia e eficincia, explanando

    uma concepo norteadora da descentralizao da Assistncia Social. (BRASIL, 2005, p.82).

    Ainda como tentativa de afirmar a Assistncia Social como poltica de direito, em

    1998, por meio da Resoluo n 207, aprovada a Poltica Nacional de Assistncia Social

    (PNAS) e a segunda Norma Operacional Bsica da Assistncia Social (NOB/1998),

    ampliando a regulao da Poltica Nacional, conceituando e definindo estratgias, princpios e

    diretrizes para sua operacionalizao. A NOB/1998 buscou ampliar as atribuies dos

    Conselhos de Assistncia Social onde [...] props a criao de espaos de negociao e

    pactuao, de carter permanente, para a discusso quanto aos aspectos operacionais da

    gesto do sistema descentralizado e participativo da Assistncia Social [...]. (BRASIL, 2005,

    p.83). A NOB aparece como instrumento normatizador, que possibilita, por exemplo,

    mecanismos e critrios transparentes de transferncias de recursos entre as esferas de governo.

    As definies legais atinentes regulamentao da Poltica de Assistncia Social, no

    perodo entre 1993 e 1998, esto estabelecidas em trs instrumentos principais, ou seja, a

    LOAS; o primeiro texto da Poltica Nacional de Assistncia Social (PNAS) de 1998 e as

    Normas Operacionais Bsicas NOB/1997 e NOB/1998. Assim, deve-se considerar como um

    grande avano esse processo de difuso e construo da Poltica de Assistncia Social, que a

    torna direito do cidado e dever do Estado, pois esse movimento acontece em um perodo

    mergulhado pelos moldes do Estado neoliberal.

    Em 2003 no governo de Lus Incio Lula da Silva (Lula), tem-se uma continuao e

    at mesmo aprofundamento diante da Poltica Econmica como tambm da Poltica Social, no

    entanto atravs de aes que reafirmam o modelo neoliberal, atendendo aos interesses do

    capital financeiro nacional e internacional. Com ateno na rea da Poltica de Assistncia

    Social, foi criado o Ministrio de Desenvolvimento Social e Combate a Fome (MDS)19 que a

    partir da d incio a alguns programas voltados ao setor social como, por exemplo, o

    Programa Fome Zero que tem como objetivo fornecer segurana alimentar a todos os

    brasileiros, buscando a erradicao da fome no Brasil.

    18

    Para Yazbek (2004), a descentralizao poltico - administrativa na gesto da assistncia social significa

    ampliar os espaos de participao democrtica, contribuindo para a incluso social nas esferas locais, esse

    movimento de descentralizao e participao democrtica possibilita o reconhecimento das particularidades e

    interesses de cada estado e municpio, mas isso claro que no excluindo as responsabilidades do Estado na

    condio geral da poltica. 19 O MDS foi criado em 2004 pelo presidente Lula. Cabe ao MDS coordenar, supervisionar, controlar e avaliar a

    execuo dos programas de transferncia de renda assim como promover o desenvolvimento social e combater a

    fome. Busca garantir a promoo e incluso social visando a cidadania como tambm garantir a segurana

    alimentar e nutricional alm de uma renda mnima e assistncia integral famlia. (BRASIL, 2014c).

  • 24

    Em 2004 criado o Programa Bolsa Famlia (PBF), por meio da Lei n10.836

    propondo a unificao das aes de transferncia de renda do Governo Federal, como o

    Programa Bolsa Escola, Programa Nacional de Acesso Alimentao (PNAA), Bolsa

    Alimentao, Programa Auxlio-Gs e o Cadastramento nico do Governo Federal, destinado

    a famlias que se encontram em situao de pobreza e extrema pobreza. (BRASIL, 2014d).

    No se pode negar que esses programas voltados para a Assistncia Social dinamizam

    tal poltica, mas deve-se lembrar de que no se desvinculam da lgica neoliberal. Diante

    disso, os programas de transferncia de renda20, no Brasil, encontram-se ainda embebidos sob

    a tica do projeto neoliberal, o que automaticamente faz distanciar-se da perspectiva

    universalista da Carta Magna de 1988. O interesse do governo manter o equilbrio

    econmico para garantir o pagamento da dvida e conter o agravamento da pobreza. Mesmo

    porque o valor que a famlia recebe retorna para o mercado, na mesma lgica das primeiras

    indenizaes pecunirias, que eram pagas aos mais pobres na idade antiga na Grcia, para que

    estes pudessem assistir a espetculos e frequentarem o comrcio, participarem da vida

    comunitria, ou seja, uma lgica antiga de fomentar o mercado, mas que no possibilita a

    autonomia/independncia financeira do sujeito em virtude do baixo valor. (GUARINELLO,

    2013).

    Diante desse processo de construo da Poltica de Assistncia Social, onze anos

    depois da promulgao da LOAS, no ano de 2004, aps amplo debate entre os profissionais

    da rea assim como entre os estados, conselhos de assistncia social, secretarias de assistncia

    social, foi consolidada pelo MDS juntamente com a Secretaria Nacional de Assistncia Social

    (SNAS) e o CNAS, a nova Poltica Nacional de Assistncia Social (PNAS/2004) com o

    intuito de proporcionar a materialidade das diretrizes da Assistncia Social, como tambm na

    perspectiva de implantao do Sistema nico de Assistncia Social (SUAS).

    A PNAS [... busca realizar-se] de forma integrada s polticas setoriais, considerando

    as desigualdades socioterritoriais, visando seu enfrentamento [como tambm] ao provimento

    de condies para atender contingncias sociais e universalizao dos direitos sociais.

    (BRASIL, 2004, p.34). Visa dar maior clareza aos problemas sociais presentes na sociedade

    brasileira, assim busca esclarecer as funes da Assistncia Social, sendo elas: a proteo

    20 Conforme explicita Silva, Yazbek e Giovani (2004), os programas de transferncia de renda ganham

    centralidade no Brasil a partir da dcada de 1990. Passam a integrar o sistema de proteo social na busca do

    combate pobreza, [...sendo compreendidos] como aqueles que atribuem uma transferncia monetria a

    indivduos ou famlias, de forma compensatria [...]. (SILVA; YASBEK; GIOVANI, 2004, p.19).

  • 25

    social21 hierarquizada entre proteo bsica e especial22, que subdividida em mdia e alta

    complexidade, prevendo o ordenamento de programas, projetos, servios e benefcios

    socioassistenciais em rede, conforme o nvel de complexidade, bem como a vigilncia social e

    a defesa dos direitos socioassistenciais23.

    Neste trabalho, a ateno est direcionada para a discusso da proteo social bsica.

    Assim, os programas, projetos, servios e benefcios referentes a proteo social bsica

    podem ser definidos como aqueles que do ateno famlia como unidade de referncia,

    onde os vnculos familiares ainda no foram rompidos. Tem como objetivo o fortalecimento

    de vnculos familiares e comunitrios, destinando-se populao que vive em situao de

    vulnerabilidade social24 e [...] prev o desenvolvimento de servios, programas e projetos

    locais de acolhimento, convivncia e socializao de famlias e de indivduos, conforme

    identificao da situao de vulnerabilidade apresentada. (BRASIL, 2004, p, 34). Situao

    esta decorrente da estrutura do poder vigente centrada num modelo econmico que gera

    riqueza para poucos e misria para muitos, resultando no aumento das desigualdades sociais,

    afetando as condies de vida das famlias.

    As aes da proteo social bsica sero executadas de forma direta nos Centros de

    Referncia da Assistncia Social (CRAS), representando a porta de entrada dos usurios da

    21 A proteo social de Assistncia Social se ocupa das vitimizaes, fragilidades, contingncias,

    vulnerabilidades e riscos que o cidado, a cidad e suas famlias enfrentam na trajetria de seu ciclo de vida, por

    decorrncia de imposies sociais, econmicas, polticas e de ofensas dignidade humana. (BRASIL, 2005,

    p.89). 22 De acordo com a NOB/SUAS de 2005, a rede de servios socioassistenciais um conjunto integrado de aes de iniciativa pblica quanto da sociedade, que devem ofertar e operacionalizar benefcios, servios, programas e

    projetos, supondo a articulao entre todas unidades de proviso de proteo social, respeitando a hierarquia de

    proteo bsica e especial e ainda por nveis de complexidade. (NOB/SUAS, 2005). 22 A proteo social especial tem por objetivos prover atenes socioassistenciais a famlias e indivduos que se

    encontram em situao de risco pessoal e social, por ocorrncia de abandono, maus tratos fsicos e/ou psquicos,

    abuso sexual, uso de substncias psicoativas, cumprimento de medidas socioeducativas, situao de rua, situao

    de trabalho infantil, entre outras. (BRASIL, 2004, p.37). Os servios so divididos em Mdia Complexidade,

    sendo estes: servio de orientao e apoio sociofamiliar, planto social, abordagem de rua, cuidado no domiclio,

    servio de habilitao e reabilitao na comunidade das pessoas com deficincia, medidas socioeducativas em

    meio-aberto (Prestao de Servios Comunidade

    PSC e Liberdade Assistida LA). Servios de Alta Complexidade: atendimento integral institucional, Casa

    Lar, repblica, casa de passagem, albergue, famlia substituta, famlia acolhedora, medidas socioeducativas

    restritivas e privativas de liberdade (semiliberdade, internao provisria e sentenciada), trabalho protegido.

    (BRASIL, 2004, p.38). 23 De acordo com a NOB/SUAS de 2005, a rede de servios socioassistenciais um conjunto integrado de aes

    de iniciativa pblica quanto da sociedade, que devem ofertar e operacionalizar benefcios, servios, programas e

    projetos, supondo a articulao entre todas unidades de proviso de proteo social, respeitando a hierarquia de

    proteo bsica e especial e ainda por nveis de complexidade. (NOB/SUAS, 2005). 24 O termo excluso social uma construo terica que antecedeu a formulao do conceito de vulnerabilidade

    social, tendo, num primeiro momento, servido de referncia para a caracterizao de situaes sociais limites, de

    pobreza ou marginalidade, e para a consequente formulao de polticas pblicas voltadas para o enfrentamento

    de tais questes. (BRASIL, 2007, p. 11). A vulnerabilidade social decorre por motivos de pobreza, fragilizao

    de vnculos afetivos, entre outros.

  • 26

    Poltica de Assistncia Social ao acesso aos direitos. Os servios prestados no CRAS assim

    como em toda a rede que executa servios da Poltica de Assistncia Social

    [...] devem provocar mudanas significativas nas condies de vida dos

    sujeitos, com respeito s trajetrias e autonomia, na realidade local que esta

    relacionada aos determinantes mais gerais, mas possui peculiaridades e

    potencialidades a serem exploradas, impulsionadas e protagonizadas pelos

    sujeitos de direitos. (SILVEIRA; COLIN, 2006, p.31).

    Compondo ento a proteo social bsica destinada a esta populao, apresentam-se

    alguns programas, projetos e benefcios, cabendo destacar aqui o Programa de Ateno

    Integral a Famlia (PAIF) alm dos Benefcios Eventuais (BE) e Benefcio de Prestao

    Continuada (BPC).

    O PAIF o programa de maior abrangncia da proteo social bsica e segundo o

    MDS, [...] consiste no trabalho social com famlias, de carter continuado, com a finalidade

    de fortalecer a funo protetiva da famlia, prevenir a ruptura de seus vnculos, promover seu

    acesso e usufruto de direitos e contribuir na melhoria de sua qualidade de vida [...].

    (BRASIL, 2014c).

    Outro benefcio que compe a proteo social bsica o BPC institudo pela CF/1988

    em seu artigo 203, onde define como benefcio [...] a garantia de um salrio mnimo mensal

    pessoa portadora de deficincia e ao idoso que comprovem no possuir meios de prover

    prpria manuteno ou de t-la provida por sua famlia, conforme dispuser a lei. (BRASIL,

    2014, p.33). Para acess-lo no necessrio ter contribudo com a Previdncia Social e um

    benefcio individual, no vitalcio e intransfervel. O BPC encontra-se institudo tambm na

    LOAS, em seu artigo 20, onde estabelece que [...] O benefcio de prestao continuada a

    garantia de um salrio-mnimo mensal pessoa com deficincia e ao idoso com 65 (sessenta e

    cinco) anos ou mais que comprovem no possuir meios de prover a prpria manuteno nem

    de t-la provida por sua famlia[...]. (BRASIL, 2014a). reforado ainda pela Lei n

    12.435/2011 e pela Lei n 12.470/2011 que alteram dispositivos da LOAS e pelos Decretos n

    6.214/2007 e n 6.564/2008.

    Ainda como composio dos benefcios e servios da proteo social bsica tem-se os

    Benefcios Eventuais (BE) que so estabelecidos no artigo 22 da LOAS, prestados aos

    cidados e s famlias em virtude de nascimento, morte, situaes de vulnerabilidade

    temporria e de calamidade pblica. Segundo o MDS possuem carter suplementar e

    provisrio, e configuram-se como elementos potencializadores contribuindo com o

    fortalecimento de indivduos e familiares. (BRASIL, 2014c).

  • 27

    De um lado h avanos que apontam para o reconhecimento dos direitos,

    transformando a Assistncia Social em campo de exerccio de participao poltica, mas por

    outro, o Estado envolvido por uma gama de polticas voltadas ao controle da economia coloca

    em andamento processos que desmontam e retraem os direitos e investimentos no campo

    social. (YASBEK, 2004). No entanto, mesmo diante a tais fatores, a Poltica de Assistncia

    Social ganha novos rumos a fim de ser aprimorada.

    A partir da Resoluo n 130, de 15 de julho de 2005, o CNAS aprova a Norma

    Operacional Bsica da Assistncia Social (NOB/SUAS), instituindo de fato o SUAS25. A

    NOB/SUAS 2005 retoma as normas operacionais de 1997 e 1998 e constitui o mais novo

    instrumento de regulao dos contedos e definies da PNAS/2004 que paramentaram o

    funcionamento do SUAS. (BRASIL, 2005, p.85). A proposta do SUAS apresenta-se como um

    avano da Poltica de Assistncia Social, pois busca materializar um modelo de gesto que

    possibilita a efetivao dos princpios e diretrizes da poltica conforme definido na LOAS e na

    PNAS.

    Conforme o texto apresentado na LOAS comentada (2009), o SUAS busca estabelecer

    uma rede de proteo e promoo social buscando a transformao efetiva da assistncia em

    direito, distanciando-se de aes fragmentadas e assistencialistas que historicamente marcam

    a Poltica de Assistncia Social. (BRASIL, 2009). O SUAS26 apresenta novamente,

    reforando a PNAS, a proteo social27, dividida por nveis de complexidade, apresentando

    seus princpios como: a matricialidade sociofamiliar; territorializao; a proteo pr-ativa;

    integrao seguridade social e integrao s polticas sociais e econmicas28.

    Para Sposati (2004),

    A implantao do SUAS exige unir para garantir, isto , romper com a

    fragmentao programtica [...] exige construir referencias sobre a totalidade

    de vulnerabilidades e riscos sociais superando a vertente de anlise

    segregadora em segmentos sociais sem compromisso com a cobertura

    25 Lembrando que foi em 2003 na IV Conferncia Nacional de Assistncia Social realizada pelo CNAS, que

    deliberou-se a implantao do Sistema nico de Assistncia Social (SUAS). 26 Para melhor efetivao dos servios referentes a Poltica de Assistncia Social, o SUAS busca organizar de

    forma descentralizada e participativa os servios socioassistenciais no Brasil, articulando os trs entes

    federativos, ou seja, Unio, estados e municpios. Os eixos estruturantes da NOB/SUAS objetivam selar o pacto

    efetuado entre as trs esferas governamentais e os setores de articulao, pactuao e deliberao, na busca da

    implementao e consolidao do SUAS no Brasil. (BRASIL, 2005). 27 A proteo social de Assistncia Social consiste no conjunto de aes, cuidados, atenes, benefcios e

    auxlios ofertados pelo SUAS para reduo e preveno do impacto das vicissitudes sociais e naturais ao ciclo da

    vida, dignidade humana e famlia como ncleo bsico de sustentao afetiva, biolgica e relacional.

    (BRASIL, 2005, p.90). 28 A descrio de cada princpio encontra-se na NOB/SUAS/2005, no item I.

  • 28

    universal e o alcance da qualidade dos resultados. (SPOSATI, 2004, p.173,

    grifo da autora).

    Apresenta-se como um instrumento que exige uma ao universalizadora diante os

    direitos socioassistenciais distanciado-se de prticas parciais que levam ao desmonte dos

    direitos, assim como preza tambm pela qualidade dos servios oferecidos. A autora elucida

    que a concretizao do SUAS se d a partir de um modelo que busca a universalizao do

    direito a proteo social [...] abandonando ideias tutelares e subalternas, que (sub)identificam

    brasileiros como carentes, necessitados, pobres, mendigos, miserveis, discriminando-os e

    apartando-os do reconhecimento como ser de direito. (SPOSATI, 2004, p.172, grifo da

    autora).

    Neste mesmo sentido, Silveira e Colin, elucidam que o SUAS assim como outros

    instrumentos jurdico-normativos permite,

    [...] impulsionar reordenamentos das redes socioassistenciais para o

    atendimento da populao usuria, na direo da superao de aes

    segmentadas, fragmentadas, pontuais, sobrepostas e assistencialistas por um

    modelo de gesto unificado, continuado e afianador de direitos.

    (SILVEIRA; COLIN, 2006, p.20).

    Para as autoras, o SUAS esta posicionado na intersetorialidade29 com as demais

    Polticas Sociais, ou seja, uma conexo entre as polticas em favor da consolidao dos

    direitos sociais, portanto o redimensionamento dessa rede institui um dos caminhos para

    superar a fragmentao da gesto da Poltica de Assistncia Social.

    Diante desse contexto de reorganizao, criao e execuo de programas, projetos,

    servios e benefcios referentes Poltica de Assistncia Social possvel identificar avanos

    no que tange o setor social, com Polticas Sociais substanciadas pela justia social, buscando a

    equidade e universalidade. No entanto, existem limites, construda nesse movimento de

    interesses de classe, pois as aes assistenciais podem significar ou conduzir tanto para a

    reafirmao do Estado enquanto status quo, quanto um lugar de reconhecimento e de acesso

    aos direitos.

    Dando continuidade ao processo de implementao da Poltica de Assistncia Social,

    tem-se a necessidade de uma normatizao para os recursos humanos nas instituies que

    executam as aes referentes a tal poltica, instalando-se equipes mnimas de trabalho para a

    29 Segundo Inojosa (2001), [...] a intersetorialidade costuma ser identificada como uma articulao de saberes e

    experincia (no movimento do planejamento, da implementao e da avaliao de polticas), cujo objetivo de tal

    articulao alcanar melhores nveis de desenvolvimento social. (INOJOSA, 2001 apud BIDARRA, 2009,

    p.484).

  • 29

    execuo dos servios. Para essa normatizao aprovada, a partir da Resoluo n 269/2006,

    a Norma Operacional Bsica de Recursos Humanos do Sistema nico de Assistncia Social

    (NOB-RH/SUAS). O tema recursos humanos j aparece na PNAS/2004 no sentido de que a

    Poltica de Recursos Humanos constitui eixo estruturante do SUAS, ao lado da

    descentralizao, do financiamento e do controle social.

    Conforme apresenta a NOB/RH/SUAS, fica definido que a equipe de referencia30 do

    CRAS deve se estruturar considerando o total de famlias referenciadas31. Seguindo essas

    definies, as equipes de referncia devem ser responsveis pela organizao e oferta de

    servios, programas, projetos e benefcios de proteo social bsica e especial, tornando-se

    importante para a efetivao da Poltica de Assistncia Social, pois possibilita maior

    qualidade ao atendimento de famlias e indivduos viabilizando a garantia de seus direitos.

    Posteriormente, aps trs anos da instituio da NOB/RH/SUAS, em 2009, por meio

    da Resoluo n109/2009 do CNAS, aprovada a Tipificao Nacional de Servios

    Socioassistenciais que os organiza por nveis de complexidade do SUAS. Ficam organizados

    como servios da Proteo Social Bsica conforme seu artigo 1 os servios do PAIF; Servio

    de Convivncia e Fortalecimento de Vnculos (SCFV) e Servio de Proteo Social Bsica no

    domiclio para pessoas com deficincia e pessoas idosas32. (BRASIL, 2009a). A Tipificao

    disponibiliza a descrio dos servios como tambm as aquisies dos usurios33 diante dos

    servios oferecidos, alm dos objetivos, ambiente fsico, recursos materiais e materiais

    socioeducativos. Desta forma, todo esse processo de definio dos servios que iro compor a

    rede de proteo social bsica busca contribuir para a reduo da ocorrncia de situaes de

    vulnerabilidade social e dar maior visibilidade aos servios buscando garantir o acesso dos

    usurios.

    Ainda como processo de construo de uma poltica de direito, em 2011 tem-se a

    incorporao da lei do SUAS na LOAS. Essa incorporao se da a partir da Lei

    n12.435/2011 que altera a Lei n 8.742/1993. A lei alterada apresenta mudanas em vrios

    30O SUAS adota o modelo de equipes de referncia, que so entendidas como um grupo de profissionais com

    diferentes conhecimentos, mas que possuem objetivos em comum, estas equipes so responsveis pelos usurios

    dos servios de acordo com o tipo de proteo social, ou seja, proteo social bsica ou especial. (BRASIL,

    2006). 31 O quadro que demonstra a equipe mnima exigida para trabalhar nos CRAS, encontra-se no item IV da

    NOB/SUAS/HR, 2006, p. 19. 32 A descrio dos servios esto na Tipificao Nacional de servios socioassistenciais de 2009, item 3. 33 Segundo a Tipificao, aquisies dos usurios Trata dos compromissos a serem cumpridos pelos gestores

    em todos os nveis, para que os servios prestados no mbito do SUAS produzam seguranas sociais aos seus

    usurios, conforme suas necessidades e a situao de vulnerabilidade e risco em que se encontram.(BRASIL,

    2009a, p.5). Apresenta-se como aquisies dos usurios da proteo social bsica a [...] segurana de acolhida;

    segurana de convvio familiar e comunitrio e segurana de desenvolvimento da autonomia. (BRASIL, 2009a,

    p.8).

  • 30

    artigos de seu texto com o intuito de reorganiz-la. Dentre as inovaes e alteraes34

    introduzidas na lei, apresenta-se, por exemplo, o artigo 20 que trata da concesso do BPC.

    No mesmo ano, a Resoluo n 2/2011 da Comisso Intergestores Tripartite (CIT)35

    dispe sobre o processo e metodologia da reviso da NOB/SUAS/2005. Considerando que a

    Assistncia Social inserida na Seguridade Social e como Poltica Pblica vem passando por

    diversas transformaes a partir da CF/1988, a NOB/SUAS/2005 representou um marco

    fundamental na estruturao da Poltica Nacional de Assistncia Social.

    Em 2012, aprovada pelo CNAS, tem-se a nova NOB/SUAS que expressa os inmeros

    avanos conquistados aps a implantao do SUAS, assim como o processo de priorizao

    das Polticas Sociais. Apresenta a reafirmao da Assistncia Social no pas e a exigncia de

    medidas mais complexas para o enfrentamento de situaes de pobreza e vulnerabilidade

    social, integrando a ampliao do acesso aos direitos.

    Evidencia-se que a NOB/SUAS/2012 contribui para o avano da Poltica de

    Assistncia Social, pois, a criao do Departamento de Vigilncia Socioassistencial permite

    avaliar e monitorar a qualidade dos servios oferecidos pelas entidades que prestam servios

    referente a Assistncia Social. Em geral, o Departamento de Vigilncia Socioassistencial36

    contribui para a Assistncia Social de modo geral, no s para as entidades, pois o

    monitoramento uma das prerrogativas do departamento e, para alm de monitorar a

    qualidade dos servios, realiza tambm diagnsticos socioterritoriais, lembrando que para isso

    necessrio ter um sistema de informao37. (BRASIL, 2012).

    Apresentado o processo de construo da Poltica de Assistncia Social no Brasil,

    compreende-se que foi e tem sido uma difcil tarefa a sua afirmao como direito, pois o

    34 Sobre as mudanas ocorridas foram alterados os artigos 2, 3, 6, 12, 13, 14, 15, 16, 17, 20, 21, 22, 23, 24, 28

    e 36. Dentre as modificaes, referente ao BPC, altera-se o conceito de unidade familiar como tambm a

    definio da pessoa portadora de deficincia, antes considerada aquela incapacitada para a vida independente e

    para o trabalho e agora aquela que tem impedimentos de longo prazo de natureza fsica, intelectual ou sensorial,

    considerando impedimentos de longo prazo o prazo mnimo de dois anos. (BRASIL, 2011). 35 Segundo o MDS, a CIT um espao de articulao e expresso das demandas dos gestores das esferas

    federais, estaduais e municipais. Dentre as suas principais funes esto pactuar estratgias para a implantao e

    operacionalizao da PNAS; estabelecer acordos sobre a implantao dos servios, programas, projetos e

    benefcios, pactuar os procedimentos de transparncia de recursos para cofinanciamento, entre outras. (BRASIL,

    2014c). 36 Dentre as contribuies da Vigilncia Socioassistencial est a possibilidade de ampliao do conhecimento das

    equipes dos servios socioassistenciais sobre as caractersticas da populao e do territrio de forma a melhor

    atender s necessidades e demandas existentes. (BRASIL, 2012). 37 O sistema de informao do SUAS tem como diretrizes I- compartilhamento da informao na esfera

    federal, estadual, do Distrito Federal e municipal e entre todos os atores do SUAS - trabalhadores, conselheiros,

    usurios e entidades; II - compreenso de que a informao no SUAS no se resume informatizao ou

    instalao de aplicativos e ferramentas, mas afirma-se tambm como uma cultura a ser disseminada na gesto e

    no controle social; III - disponibilizao da informao de maneira compreensvel populao; IV -

    transparncia e acessibilidade; V - construo de aplicativos e subsistemas flexveis que respeitem as

    diversidades e particularidades regionais; VI - interconectividade entre os sistemas.(BRASIL, 2012, p. 43-44).

  • 31

    contexto histrico permeado de contradies, onde h uma persistncia muito grande pela

    classe dominante em manter a lgica focalista e fragmentada das Polticas Sociais como um

    todo.

    [...] na rdua e lenta trajetria ruma sua efetivao como poltica de

    direitos, permanece na Assistncia Social brasileira uma imensa fratura entre

    o anncio do direito e sua efetiva possibilidade de reverter o carter

    cumulativo dos riscos e vulnerabilidades que permeiam a vida de seus

    usurios [...]. (YAZBEK, 2004, p.26).

    Assim, no se pode desconsiderar o grande processo que a Poltica de Assistncia

    Social passa no Brasil, tendo como marco a CF/1988, no entanto, mesmo com todas essas

    legislaes que se apresentam a favor de uma poltica de direito, no cotidiano no h esse

    reconhecimento. Tem-se ainda desafios diante da articulao de planejamento e execuo da

    Poltica de Assistncia Social, assim como das Polticas Sociais como um todo, pois deve-se

    considerar um modelo de sociedade voltado a responder as necessidades do capital,

    predominando-se a retrao dos direitos sociais, considerando que o grande investimento por

    parte do Estado concentra-se nas Polticas Econmicas.

    1.2.1 A descentralizao da Poltica de Assistncia Social

    Para se fazer uma breve contextualizao da Poltica de Assistncia Social no estado

    do Paran, evidenciando a dcada de 1980, faz-se necessrio primeiramente apresentar o

    principio da descentralizao, assegurado pela CF/1988, alm das legislaes referentes a tal

    poltica. Diante o principio da descentralizao que se estrutura a Poltica de Assistncia

    Social nas trs esferas de governo, ou seja, federal, estadual e municipal, contribuindo para o

    reconhecimento das particularidades de cada regio do pas.

    Dentre os princpios referentes Seguridade Social, promulgados no artigo 194 da

    CF/1988, os quais devem orient-la e operacionaliz-la, esto: a universalidade;

    uniformidade e equivalncia dos benefcios e servios; a seletividade e distributividade na

    prestao de servios; irredutibilidade; a diversidade das bases de financiamento e o carter

    democrtico e descentralizado da administrao. Os presentes princpios propostos em lei

    deveriam proporcionar a articulao entre as polticas que a compe, formando uma rede de

    proteo ampliada, slida, permitindo [...] a transio de aes fragmentadas, desarticuladas

    e pulverizadas para [...] integrao das aes do Estado e da sociedade, assegurando os

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    direitos da sade, previdncia e Assistncia Social. (BEHRING; BOSCHETTI, 2008, p.

    158).

    Contudo, frente a um Estado neoliberal, a descentralizao estabelecida no como

    uma forma de compartilhamento de poder entre as esferas pblicas, mas,

    [...] como mera transferncia de responsabilidades para entes da federao

    ou para instituies privadas e novas modalidades jurdico -institucionais

    correlatas, componente fundamental da reforma e das orientaes dos

    organismos internacionais para a proteo social [...]. (BEHRING;

    BOSCHETTI, 2008, p.156).

    distorcendo a essncia do princpio constitucional, como princpio que favorea o

    desenvolvimento da Poltica Social e no de transferncia de responsabilidades.

    A descentralizao deveria ser um processo de redistribuio de poder que pressupe,

    principalmente, o [...] deslocamento dos espaos de planejamento e de tomada de deciso de

    uma instncia central para outras, intermedirias e locais, bem como dos recursos (materiais,

    humanos e financeiros) [...]. (PEREIRA, 1996, p. 76-78), possibilitando a operacionalizao

    da poltica, atendendo a necessidades de cada regio do pas.

    Alm da CF/1998, a LOAS ao propor a descentralizao da Poltica de Assistncia

    Social, mesmo diante de algumas modificaes verso original (primeira), significou uma

    evoluo para o campo da Poltica de Assistncia Social, sendo uma delas a diviso de

    responsabilidade entre as trs esferas de governo, onde cada esfera tem a possibilidade de

    realizar aes, programas e projetos que vo de encontro com a realidade de cada regio.

    Em seus artigos 5 e 6, apresenta objetivos de estruturar a organizao da poltica,

    tanto em suas diretrizes quanto na gesto das suas aes. Dispe ainda no artigo 8 que a

    Unio, os Estados, o Distrito Federal e os Municpios, fixaro suas respectivas Polticas de

    Assistncia Social. (BRASIL, 2014d). Em seu artigo 11, apresenta que as aes das trs

    esferas de governo na rea da Poltica de Assistncia Social realizam-se de forma articulada,

    cabendo a coordenao e as normas gerais esfera Federal e a coordenao e execuo dos

    programas, em suas respectivas esferas, ou seja, aos Estados, ao Distrito Federal e aos

    Municpios.

    Neste mesmo sentido, a PNAS/2004 traz a descentralizao como forma de

    transferncia de poder e d