sensacionalismo na tv: interesse pÚblico...

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FACULDADES INTEGRADAS PROMOVE DE BRASÍLIA CURSO DE BACHARELADO EM JORNALISMO SENSACIONALISMO NA TV: INTERESSE PÚBLICO X INTERESSE DO PÚBLICO Aluna: Pollyana Cabral Porto Orientadora: Ana Maria Fleury SeidlPinheiro BRASÍLIA 2013

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FACULDADES INTEGRADAS PROMOVE DE BRASÍLIA CURSO DE BACHARELADO EM JORNALISMO

SENSACIONALISMO NA TV: INTERESSE PÚBLICO X INTERESSE DO PÚBLICO

Aluna: Pollyana Cabral Porto Orientadora: Ana Maria Fleury SeidlPinheiro

BRASÍLIA

2013

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Pollyana Cabral Porto CURSO DE BACHARELADO EM JORNALISMO

SENSACIONALISMO NA TV: INTERESSE PÚBLICO X INTERESSE DO PÚBLICO

Trabalho de Conclusão de Curso

apresentado como requisito do curso

de Comunicação Social com

habilitação em Jornalismo, para

obtenção do título de Bacharelsob a

orientação da professora Ana Maria

Fleury Seidl Pinheiro.

BRASÍLIA

2013

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RESUMO

O sensacionalismo na TV ocupa uma grande parte na grade da programação

televisiva atual. Programas com características sensacionalistas estão cada dia mais

presentes no cotidiano das pessoas, explorando dramas humanos, transformando

notícias em verdadeiros espetáculos de interesse do público. No telejornalismo, a

preocupação e a função é informar acontecimentos de interesse público, mesmo

assim são apresentados diversos modelos que exploram o sensacional. Os

sucessos de audiência apresentados pelos telejornais de estilo sensacionalista

agradam o público, que acredita que muitas vezes podem resolver os problemas da

sociedade. Este artigo científico tem o objetivo de demonstrar que nos dias de hoje,

na era da convergência midiática, as matérias telejornalísticas são em sua maioria

de interesse do público e que mesmo o telejornalismo sério, dito não-

sensacionalista, muitas vezes usam uma forma de sensacionalismo mais branda. O

estudo visa mostrar a presença do sensacionalismo no jornalismo televisivo, a

predominância deste na cobertura de fatos policiais, acontecimentos inusitados,

crimes bárbaros e hediondos. Sabe-se que o objetivo da mídia ao empregar o estilo

sensacionalista é o aumento da audiência, independente da questão ética. Diversos

programas televisivos exploram o sensacionalismo, por exemplo, o Cidade Alerta, da

TV Record; Brasil Urgente, da Band; até mesmo programas de entretenimento como

Programa do Ratinho, no SBT; e o TV Fama, na TV Record usam sensacionalismo

em sua programação. A metodologia utilizada foi à revisão bibliográfica. Autores

como Danilo Agrimani. Guy Debord, Edgard Morin e Muniz Sodré embasam

conceitos sobre o tema.

Palavras-chave: sensacionalismo, interesse público, interesse do público.

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ABSTRACT

Sensationalismin theTVoccupiesa large portionofthe gridcurrenttelevision

programming. Programswithsensationalfeaturesare increasinglypresentin daily life,

exploring human drama, making newsinreal spectaclesofpublic interest. Intelevision

news, the concernand the functionis to informevents ofpublic interest, are

neverthelesspresentedseveralmodelsthat explorethe sensational. The

successesofthe hearingpresented byTV news-style sensationalistplease thepublic,

whichbelievesit can oftensolve the problemsof society. Thisresearch paperaims

todemonstrate thattoday, in the age ofmedia convergence, theTV newsmaterialsare

mostlyof interest to thepublic andevenserioustelevision journalism, saidnon-

sensationalist, often usea formof sensationalismmilder. The studyaims to showthe

presenceof sensationalismintelevision news, the predominance ofthe coverage

ofpolicefacts, unusual events, barbaricandheinouscrimes. It is known thatthe

purposeof the mediatoemploysensationaliststyleis to increasethe audience,

regardless of the ethical issue. Severaltelevision programsexploitsensationalism, for

example, theCityAlert, TV Record, BrazilUrgent, theBand, evenentertainment

programsasProgramMouse,SBT, andTVFame, RecordTVusingsensationalismin their

schedule. The methodology usedwastheliterature review. Authors such

asDaniloAgrimani.GuyDebord, EdgardMorinandMunizSodréunderpinning conceptson

the subject.

Keywords:sensationalism, publicinterest, publicinterest.

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1. INTRODUÇÃO

Na sociedade atual o acesso à informação é uma necessidade, porém muito

se tem a dizer em relação à quantidade e qualidade das informações que chegam

até a população. Desde a chegada da televisão ao Brasil há 63 anos, grande parte

da sociedade busca informações neste meio de comunicação de massa. Estas vão

desde questões simples e básicas do cotidiano, acontecimentos de todo o mundo,

até análises sociais e políticas mais detalhadas. Para Sodré (2001, p.16), “a

imprensa vem assegurar a transmissão de informações sobre a vida cotidiana, mas

também amplia, em novas formas a centralização do poder e o disciplinamento do

cidadão”. A TV é um veículo de comunicação que além de ser fonte de informação,

conhecimento e distração, une pessoas de classes sociais diferentes, por terem a

possibilidade de verem a mesma notícia, isso torna um vínculo entre elas.

“A face brasileira é a face televisiva”... “Pode-se pensar o Brasil a partir da

televisão! Sim. sem dúvida. E talvez não haja mais possibilidade de pensar o Brasil

sem pensar a TV” (BUCCI, 2000, p.8). Sabe-se que não é de hoje que a televisão

faz parte da vida do ser humano, milhões de pessoas têm a TV como sua única

fonte de informação. Segundo o Censo de 2010, aparelhos de televisão estão em

mais de 95% dos domicílios brasileiros. E através desse poderoso veículo de

comunicação são transmitidos variados modelos de programas e telejornais. A TV

faz parte da nossa cultura, portanto, independente de qual seja, a informação está

presente 24h por dia.

Num país como o Brasil, em que a TV redefiniu o espaço público e reconfigurou a própria face da nacionalidade, a presença dos meios de comunicação é um fator incontornável para os educadores. Em números aproximados, há cerca de 40 milhões de lares com televisão no Brasil, o que corresponde a quase 90% do total. Isso, para uma população que lê pouco, dá à TV uma condição de monopólio da informação, ou seja, a TV monologa sem que outros meios lhe façam contraponto (BUCCI, 2000, p. 9).

A partir dos anos 80, a televisão ficou mais popular e com isso possibilitou um

modelo diferente de telejornal que se destaca pelo apelo ao cotidiano violento vivido

nas cidades do Brasil. Diariamente diversas emissoras de televisão exibem

programas jornalísticos que informam e formam opiniões na sociedade. Alguns

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telejornais apresentam aspecto de apelo sensacionalista, buscam provocar

sensações nos telespectadores, não se preocupam com o papel ético no modo de

fazer jornalismo, mas garantem grande audiência e uma grade horária fixa na

programação das emissoras.

Usando a credibilidade conquistada junto ao público, esses telejornais reúnem

o sensacional, o diferente e uma enorme carga emotiva. Prendem a atenção do

público que cada vez mais espera o desfecho de uma barbárie. O sucesso desse

modelo de telejornalismo sensacionalista, dessa mídia espetáculo, permite ressaltar

as diferenças entre o interesse público e o interesse do público.

Hoje o telejornalismo realiza coberturas mais intensas da atualidade, a rede

Record apresenta o programa “Câmera em Ação” que a cada semana mostra a

rotina dos policiais. A programação jornalística exibe imagens de tudo o que

acontece de dentro de uma viatura minutos antes de uma prisão. O “Câmera

Record” é uma programa jornalístico temático com uma hora de duração, que traz

grandes documentários pautados em assuntos de interesse da população geral. O

Brasil Urgente, da Band, tem como destaque o apresentador Datena, que faz de sua

apresentação um show em formato de telejornal. O extinto Linha Direta, que fazia

parte da grade de jornalismo da Globo, levava ao ar uma mistura de elementos do

jornalismo e simulações dramatúrgicas. Na verdade a maioria dos veículos de

comunicação: jornais impressos, rádios ou páginas da internet ao anunciar uma

tragédia ganha enorme repercussão. Imagens e comentários alimentam a

indignação e a revolta da sociedade que passa a fazer parte do acontecimento e

sente como se assim pudesse lutar contra toda a violência.

As mídias tornam-se uma ameaça de denúncia aos criminosos e às

autoridades que não cumprem seu papel. Além de constituírem-se em indústria do

espetáculo, os meios de comunicação de massa passam a ser um instrumento

contra a impunidade. É preciso aceitar que os padrões de jornalismo e suas funções

são passiveis de mudanças. O jornalismo sensacionalista pode desenvolver a

função implícita de contribuir para a solução de crimes bárbaros, posicionando-se

contra a impunidade.

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Este artigo apresenta subsídios para o entendimento de como o telejornal

consegue passar emoção e ao mesmo tempo obedecer aos critérios de

noticiabilidade, do interesse público, do interesse do público, da ética para cumprir a

principal característica do veículo que é informar com atenção à responsabilidade

social e à realidade jornalística.

O objetivo do trabalho é mostrar que mesmo o jornalismo voltado ao interesse

do público, pode cumprir papel social de mobilização da sociedade por justiça. Para

melhor desenvolver o assunto, restringiu-se ao que é exibido em telejornais. Este

artigo faz observações sobre as coberturas sensacionalistas de um crime hediondo

nos telejornais, sobre a demanda do público da mídia, a diferenciação do que é

“interesse do público” e “interesse público” no telejornal.

2. METODOLOGIA

Este artigo foi realizado a partir de uma revisão bibliográfica sobre o tema,

sensacionalismo na TV, fazendo uma abordagem de um crime hediondo. Os

principais livros utilizados foram: A TV aos 50 anos: criticando a televisão brasileira

no seu cinquentenário, de Eugenio Bucci; Espreme que Sai Sangue, de Danilo

Angrimani; A Ética Jornalística e o Interesse Público, de Francisco Karam, entre

outros.

O artigo de revisão bibliográfica tem como característica relatar o

conhecimento explícito disponível sobre um determinado tema, mediante análise e

interpretação da produção científica existente e de informações já publicadas. O

artigo de revisão começou a ser produzido na última década do século XIX,

apresentando o resultado de pesquisa de revisão de literatura.

A revisão bibliográfica consiste no levantamento de dados encontrados na

literatura já existente. Foi realizada uma análise de um amplo acervo literário (livros,

revistas científicas, teses, sites) relativo ao tema abordado. A escolha desta

metodologia se deu pela mesma oferecer meios que auxiliam na discussão do tema.

Este tem papel fundamental no trabalho acadêmico, pois é através da revisão que

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você situa seu trabalho dentro da grande área de pesquisa da qual faz parte,

contextualizando-o.

Conforme Severino (2002) “[...] o papel das revistas científicas é

fundamentalmente a comunicação dos resultados dos trabalhos de pesquisa à

comunidade científica e à própria sociedade como um todo.” Tem o propósito de

registrar, preservar e disseminar as informações disponibilizadas por seus artigos,

obedecendo a intervalos de tempo específicos.

A pesquisa bibliográfica, caracterizada como coleta de dados, busca construir

um conhecimento que apoiará o desenvolvimento da pesquisa. “Dessa forma, a

pesquisa bibliográfica não é mera repetição do que já foi dito ou escrito sobre certo

assunto, mas propicia o exame de um tema” (MARCONI; LAKATOS, 1991a, p. 183).

O tema abordado faz parte do interesse geral, tanto para a sociedade, como

também tem importância acadêmica, pois se trata de um assunto que é vivido e

compartilhado por todos no dia a dia. Neste artigo serão apresentados conceitos de

sensacionalismo; telejornalismo; interesse público e do público, telejornalismo

policial, crimes hediondos.

3. SENSACIONALISMO

Muitas vezes o termo sensacionalismo resume-se na postura editorial

adotada por alguns meios de comunicação. Estes se caracterizam pelo apelo

emotivo, por despertar sensações e pelo uso de imagens fortes na abordagem de

um fato jornalístico. Entretanto, atualmente, o conceito tem sido deturpado ao ser

usado de forma irresponsável pelo senso comum, pois a qualquer exagero ou

engano midiático é atribuído à matéria sensacionalista, de jornalismo antiético, ou

seja, como se toda abordagem desse tipo fosse sensacionalista. Na TV,

especificamente, indica audácia e irreverência e, muitas vezes, inversão da

realidade, no que diz respeito à emissão.

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De acordo com o “Dicionário de Comunicação” (BARBOSA, RABAÇA, 2002),

sensacionalismo é:

Estilo jornalístico caracterizado por intencional exagero da importância de um acontecimento, na divulgação e exploração de uma matéria, de modo a emocionar ou escandalizar o público. Esse exagero pode estar expresso no tema (no conteúdo), na forma do texto e na apresentação visual (diagramação) da notícia. O apelo ao sensacionalismo pode conter objetivos políticos (mobilizar a opinião pública para determinar atitudes ou pontos de vista) ou comerciais (aumentar a tiragem do jornal)(...) Qualquer manifestação literária, artística etc., que explore sensações fortes, escândalos ou temas chocantes, para atrair a atenção do público.

A definição de Barbosa e Rabaça tende a ser mais clara, direta e objetiva que

as teorias de outros pesquisadores, mais ainda assim usam palavras imprecisas

como exemplo “pode”, ao considerar as possíveis causas e consequências de

jornalismo sensacionalista.

Mais conhecidos como natureza popular, os programas sensacionalistas

adotam uma linha editorial repleta de exageros na divulgação das notícias, utilizam o

apelo ao entretenimento, às denúncias, à violência e a super-exposição das pessoas

envolvidas em crimes, esses detalhes confirmam a prática do sensacionalismo na

imprensa.

Ao mencionar o termo sensacionalismo, fala-se da questão da imparcialidade

e do equilíbrio. Ambos são conceitos muito discutidos no campo do jornalismo, e

estão embasados no conceito de objetividade. Arendt (1992) se refere à

imparcialidade no sentido de “isenção do interesse pessoal no pensamento e no

julgamento”. Porém, a imparcialidade nesse sentido parece impossível, “quem

informa narrará sempre um fato de um determinado ponto de vista: daí a

impossibilidade de se falar propriamente em uma conduta imparcial”

(MORETZSOHN, 2007). A maioria dos teóricos da comunicação social aceita, hoje

em dia, que a realidade não pode ser transmitida exatamente como aconteceu,

desde que o exercício da linguagem é subjetivo e na transmissão de um fato sempre

está latente o olhar do observador. Segundo Fausto (1991), " a linguagem apresenta

uma característica particular, na medida em que ela visa representar a presença de

um real às expensas da ausência dele mesmo".

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O sensacionalismo é uma forma de expressão da notícia que exagera na

carga emocional e apela para um discurso que prioriza a espetacularização. Para

Angrimani (1995) sensacionalismo nasce quando a notícia recebe um tratamento

sensacional, ganhando dimensões exageradas que não respeitam os limites da

realidade.

Todas essas definições convergem para alguns pontos comuns. Sensacionalismo é tornar sensacional um fato jornalístico que, em outras circunstâncias editoriais, não mereceria esse tratamento. Como o adjetivo indica, trata-se de sensacionalizar aquilo que não é necessariamente sensacional, utilizando-se para isso de um tom escandaloso, espalhafatoso. Sensacionalismo é a produção de noticiário que extrapola o real, que superdimensiona o fato. Em casos mais específicos, inexiste a relação com qualquer fato e a “notícia” é elaborada como mero exercício ficcional (ANGRIMANI, 1995, p. 16).

Segundo Angrimani (1995), a linguagem comum empregada pelos

sensacionalistas busca aproximar-se da fala, muitas vezes sem respeito às normas

gramaticais. O autor fala ainda que o sensacionalismo utiliza uma linguagem

coloquial exagerada com uso de gírias e palavrões, bem diferente do noticiário

comum, que possui uma linguagem mais sofisticada e elegante. “A linguagem

editorial precisa ser chocante e causar impacto. O sensacionalismo não admite

moderação” (ANGRIMANI, 1995, p. 40).

Ainda dentro do ponto de vista jornalístico, a linguagem sensacionalista não pode ser sofisticada, nem o estilo elegante. A linguagem utilizada é a coloquial, não aquela que os jornais informativos comuns empregam, mas a coloquial exagerada, com emprego excessivo de gíria e palavrões. Como se verá adiante, a linguagem sensacionalista não admite distanciamento, nem a proteção da neutralidade. É uma linguagem que obriga o leitor a se envolver emocionalmente com o texto, uma linguagem editorial “clichê” (ANGRIMANI, 1995, p. 16).

A forma de transmitir a informação, a linguagem utilizada e o modo de

produção das matérias são as diferenças entre o jornalismo tradicional e o

jornalismo sensacionalista. No sensacionalismo a estratégia utilizada é para

envolver emocionalmente o público que sente uma aproximação com o interlocutor.

3.1. SENSACIONALISMO NA TELEVISÃO

Ligia Lana (2007) afirma que desde a década de 90, quando surgiram na

televisão brasileira programas de apelo popular, mais conhecidos como

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sensacionalistas, foram atribuídas características de origem dramática. “O destaque

das histórias de pessoas comuns, a preocupação com a realidade dos quadros

apresentados e a exploração da intimidade” (ARAÚJO, 2007 apud LANA, P.15).

O dramático como traço fundamental do telejornalismo no programa é construído com a busca incessante pela proximidade da realidade. Não basta relatar o crime, é necessário aproximar-se do acusado, ver seu rosto, ouvir sua voz, é preciso ver também de perto a cena do evento, mesmo que deserta, os objetivos encontrados, a arma usada, ver e ouvir a vítima. (LANA, 2007, p. 36).

De forma equívoca e sem cuidados éticos, sociais, é cada vez mais comum

programas televisivos que fazem o uso do espetáculo para projetar o real. Inúmeros

são os programas que atuam dessa forma, os jornais sensacionalistas fazem o uso

do extraordinário, do polêmico, de carga emotiva e apelativa para noticiar fatos de

baixa projeção social, transformando a notícia em algo sensacional e espetacular.

3.2. TELEJORNALISMO SENSACIONALISTA

O sensacionalismo no telejornal espetaculariza a notícia, com uma linguagem

coloquial e opinativa, repleta de gírias e palavrões, assume flexibilidade e

dinamismo, diferente do formato tradicional de telejornalismo. Nele, a narração é

feita exatamente do local onde os fatos ocorreram, os repórteres ficam ao vivo

colhendo informações, o apresentador tem contato direto com a direção do

programa, o que lhe possibilita pedir repetições de imagens ou focalizar em

determinado ponto, muita expressão facial e gestos.

A narrativa (sensacionalista) transporta o leitor; é como se ele estivesse lá (...), sentindo as mesmas emoções. Essa narrativa delega sensações por procuração, porque a interiorização, a participação e o reconhecimento desses papeis, tornam o mundo da contravenção subjetivamente real para o leitor. A humanização do relato faz com que o leitor reviva o acontecimento como se fosse ele o próprio autor do que está sendo narrado (ANGRIMANI, 1995, p. 17).

O sensacionalismo no telejornalismo existe há um bom tempo e a audiência

sempre foi um dos pontos positivos para a sua constância. Segundo Patias (2006), o

sensacionalismo no telejornalismo teve origem nos EUA na década de 80 e no

Brasil, um pouco antes, na década de 60.

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O gênero, no seu estilo e forma, tende a explorar o extraordinário, o anormal, o fait divers, utilizando-se da linguagem do espetáculo e imagens chocantes que prendem a atenção do público, criando grande expectativa, mas perde o seu impacto inicial logo que a história é mostrada e consumida pelo telespectador (PATIAS, 2006, p. 81).

Não é só a violência que é retrata por esse tipo de telejornal, ele lida também,

com conteúdos corriqueiros e familiares. As características desse tipo de telejornal

possibilitam ao apresentador ser uma espécie de advogado, promotor e juiz. Na

maioria das vezes, mostra uma pessoa que se preocupa com os mais necessitados,

que sabe exatamente o que fazer para acabar com os problemas sociais. E o que

não pode faltar é a participação social, o espelhamento de vivência do que está

sendo apresentado. Como sempre o forte apelo emocional é o atrativo, o

acontecimento fica em segundo plano, ressaltando o empenho representado pelo

apresentador.

Segundo Debord (2003) as condições modernas de produção deram origem à

sociedade do espetáculo, em que “tudo o que era vivido se esvai na fumaça da

representação” (DEBORD, 2003, p.13).

Traquina (2005) afirma que a realidade no jornalismo, é contada como em

uma novela, fragmentada, “perante a tirania do fator tempo”. Os jornalistas veem nos

fatos histórias e, dessa forma, constroem as notícias. “(...) o jornalismo é um

conjunto de “estórias”, „estórias‟ da vida, „estórias‟ das estrelas, „estórias‟ de triunfo e

tragédia” (TRAQUINA, 2005, p.21).

Assim como os demais meios de comunicação, a televisão por meio do

telejornalismo sofre intervenções diretas do mercado. A lei da oferta e procura

influencia na produção de conteúdos e na forma de informar os acontecimentos.

Toda a mobilização é voltada para o mercado de consumo, os telejornais

sensacionalistas tornam-se um meio de divulgação, circulação e venda de

mercadorias.

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3.3. TELEJORNALISMO POLICIAL SENSACIONALISTA

O telejornalismo policial sensacionalista se destaca na divulgação dos crimes

bárbaros que provoca manifestações da sociedade. A principal matéria prima desse

telejornalismo sensacionalista são os crimes hediondos e, atualmente, tem sido

presença frequente nos noticiários.

O assunto preponderante no telejornalismo policial é a violência, sendo assim,

as matérias são repletas de apelo sensacionalistas. Usam as vitimas e seus

familiares emocionados, a narrativa descritiva, as tomadas de câmera aproximadas,

a repetição de cenas fortes, são elementos que oferecem uma carga dramática e

exagerada ao espectador que é informado detalhadamente do ocorrido.

Ao abordar um crime com sensacionalismo, deixa evidente a indignação da

sociedade com comportamentos brutais, o senso comum do que é considerado certo

ou errado, a solidariedade e a necessidade do público em agir por justiça. Então,

pode-se dizer que o sensacionalismo principalmente no telejornalismo policial,

informa, forma, denuncia, registra, autentica valores humanos, conscientiza e

estimula a repercussão no público de massa.

Numa sociedade de massa, essa função de desmascaramento público está institucionalizada pelo mass media. Imprensa, rádio e jornal expõem divergências relativamente bem conhecidas do público e como regra, essa revelação obriga a certo grau de ação pública contra o que particularmente foi tolerado (LAZARSFELD, MERTON, in Lima, 2005, p.117).

Para Lana (2007), os telejornais policiais possuem características ao mesmo

tempo de programa de auditório e reality show. Ela critica a denominação de

telejornal policial por ser restritiva aos temas e propõe renomear os programas

populares, muitas vezes, considerados sensacionalistas, de telejornais dramáticos.

Bem diferente do telejornalismo tradicional, pois este aproxima o expectador da vida

cotidiana, dos crimes, desastres e acidentes, além de ressaltar relações complexas

da vida social.

Em todas essas emissões, perpassam os dramas, os desastres cotidianos, alguns mais próximos da subjetividade de indivíduos

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comuns, outros da violência cotidiana das cidades ou ainda da extravagância e do pitoresco de acontecimentos diversos. Interessam a esses programas selecionar ou construir situações dramáticas e comoventes, experiências que provoquem a emoção dos telespectadores (LANA, 2007, P. 16)

4. CRIME HEDIONDO

Sabe-se que crimes hediondos são crimes profundamente repugnantes, de

práticas violentas, que ofendem de forma grave e acentuada os valores morais

legítimos, como o sentimento comum de piedade e de respeito à dignidade humana.

E por isso causam revoltas à sociedade.

No Poder Legislativo, os crimes hediondos são entendidos como crimes que

merecem a maior reprovação do Estado. No Brasil encontram-se expressamente

previstos na Lei nº 8.072, da Constituição Federal. Portanto, são crimes que o

legislador entendeu merecerem maior punição por parte do Estado.

Um exemplo de abordagem sensacionalista de um crime hediondo e com

enorme participação popular foi o caso da criança, Isabella Nardoni, em 29 de março

de 2008. A menina Isabella Nardoni¹, decinco anos, foi jogada pela janela do

apartamento no sexto andar de um prédio em São Paulo, tendo como acusados o

pai e a madrasta no assassinato. A brutalidade do crime chocou e abalou a

população e as frequentes coberturas repletas de sensacionalismo mobilizaram a

população por justiça.

Segundo a versão apresentada pelo pai² de Isabella, Alexandre Nardoni,

assim que retornou de uma visita à casa da sogra com a família, subiu somente com

Isabella que estava sonolenta. Ele, disse que levou a menina até o quarto dela e

ligou a luz, depois trancou a porta e voltou à garagem para ajudar a esposa,

Carolina Jatobá, madrasta de Isabela a subir com os outros dois filhos. E somente

quando voltou ao apartamento viu a tela de proteção rompida e a criança não estava

mais em seu quarto havia caído no chão do jardim.

¹O artigo refere-se ao Anexo 1 e se encontra na página 26. ² O artigo refere-se ao Anexo 2 e se encontra na página 33.

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Na delegacia ambos acusaram uma terceira pessoa já que não existia outra

possibilidade. Quem seria capaz de jogar uma criança com apenas cinco anos por

uma janela de um edifício? Em análises feitas pelos médicos legistas foram

encontrados ferimentos feitos antes da queda.

O corpo da criança foi enterrado no dia 31 de março de 2008, os legistas

coletaram provas que foram utilizadas na investigação do caso, muitas divergências

apareceram, sendo assim, a prisão temporária do casal foi decretada pela Justiça.

Pouco tempo depois o casal foi liberado, mas com o depoimento da mãe de

Isabella, e realização de nova perícia, o casal teve a prisão preventiva decretada.

Alexandre Nardoni e Anna Carolina Jatobá voltaram a ser presos.

O assassinato de uma criança em que poderiam estar envolvidos o pai e a

madrasta apresentou características que favoreceram a prática do sensacionalismo,

pois, notícias com práticas de crueldade são matéria prima de primeira linha para

coberturas sensacionalistas. Por isso, diariamente numerosos casos de

assassinatos bárbaros são abordados e expostos pelas mídias, principalmente

televisivas.

A repercussão que o caso teve na sociedade foi enorme, por conta das

frequentes coberturas das mídias. Os meios de comunicação abordaram

diariamente e constantemente o caso, notícias e informações detalhadas foram

divulgadas desde o dia em que aconteceu o crime até o julgamento³ dos acusados.

Entrevistas com a mãe, familiares, vizinhos, professores e outros eram relatadas

praticamente diariamente.

Mesmo cinco anos depois é possível encontrar em uma página do site da

Globo a cronologia dos fatos ocorridos

(http://g1.globo.com/busca?q=Isabella+Nardoni). O site disponibiliza, em arquivo,

além das reportagens, fotos e vídeos que foram exibidos pela emissora. Na última

busca feita somente no site da Globo no dia 22 de maio de 2013, foram encontrados

2189 resultados, 68 vídeos, 1750 notícias e 360 fotos.

³ O artigo refere-se ao Anexo 3 e se encontra na página 34.

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Com a enorme repercussão e a brutalidade de caso, o sensacionalismo na

divulgação dos fatos ocorridos chamou a atenção da população e manifestações

populares constantes aconteceram em lugares diferentes. Em todo o mundo

pessoas se sensibilizaram com o caso, principalmente nas redes sociais, onde as

pessoas podem revelar sua indignação, protestar, homenagear e pedirem justiça.

A cobertura exaustiva produz algo como se fosse uma novela, que pode ser

acompanhada em qualquer emissora, em diferentes horários. Ao ponto de provocar

uma enorme mobilização nacional pedindo justiça.

Para Marcondes Filho (1989), as notícias da imprensa sensacionalista

sentimentalizam as questões sociais, criam penalização no lugar de

descontentamento. A cobertura sensacional dos fatos sociais negativos teria assim o

efeito de continuidade desses fatos.

O Caso Isabella Nardoni é apenas um exemplo de como a mídia pode fazer

coberturas sensacionais e parciais para atender a interesses comerciais e elevados

índices de audiência. E ao mesmo tempo ajudar na comoção, na mobilização social.

Existem vários outros casos que recebem este tipo de tratamento, muitas vezes,

ainda mais sensacionalistas.

No site Observatório da Imprensa, o jornalista Alexandre Garcia, da TV Globo,

disse em entrevista gravada, que acredita que a cobertura da imprensa sobre o caso

Isabella pode determinar o resultado das investigações. "A própria quantidade de

câmeras, microfones, de repórteres, de luzes de certa forma provoca uma excitação

que influencia o promotor, os peritos, os policiais, a delegada, as testemunhas e isso

pode alterar um pouco os fatos". Garcia recordou uma regra da rede de TV

americana CBS, observada no início da carreira, se o jornalista perceber que a sua

presença está alterando os fatos, deve retirar-se. Uma das funções da mídia, entre

outras, é fazer pensar. Mas, neste caso, ninguém quer pensar – prefere-se acusar,

julgar e encerrar o assunto. Mas o interesse da sociedade é fazer justiça. Fazer

justiça é uma das maneiras de encerrar este ciclo de crueldade pelo qual pouca

gente está realmente se importando.

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Foi aprovado por unanimidade na Câmara dos Deputados em Brasília, um

projeto de lei que restringe o benefício da liberdade provisória para os presos

condenados por crimes hediondos. Este projeto havia sido apresentado no início de

2006, mas a votação só foi retomada por conta da comoção e inúmeras

manifestações causadas com a morte do menino João Hélio no Rio de Janeiro. Por

isso é importante enfatizar que matérias de interesse do público, mais conhecidas

como sensacionalistas auxiliam as mobilizações sociais.

5. INTERESSE PÚBLICO X INTERESSE DO PÚBLICO

Não é de hoje que a mídia é chamada de quarto poder, aquele que regula,

fiscaliza, dissemina, impõe, manipula e forma opiniões. Mais conhecida como

indústria do espetáculo e da diversão, a televisão divulga informações de interesse

do público, muitas vezes carregadas de sensacionalismo. Este termo acaba sendo

julgado como pejorativo por estar associado ao jornalismo de baixo valor ou de baixa

credibilidade.

Ao analisar a solicitação dos espectadores de mídia, existe diferenciação do

que é “interesse público” e “interesse do público”. O interesse público consiste

principalmente, no jornalismo de informações indispensáveis ao contexto sócio-

político-econômico que envolve o telespectador, ou seja, é o que devemos saber,

são as informações relevantes à vida da população. Já o interesse do público está

associado ao sensacionalismo, ou seja, consiste em tudo o que desperta a

curiosidade do espectador é o que a massa quer saber e por isso dá audiência. Na

verdade, o interesse do público é o que tem estimulado a indústria comunicativa.

As informações ganham caráter de interesse público quando afetam

diretamente a vida das pessoas, mesmo as que não estão diretamente envolvidas

com as informações passadas. Para Thompson (1995), foi com o desenvolvimento

da comunicação de massa que surgiram os acontecimentos públicos, que tem

origem dentro do domínio público e tornam-se acessíveis aos espectadores até

mesmo os que não estão presentes no local onde ocorreu o fato divulgado. Ou seja,

é a percepção dos atos públicos que faz nascer o interesse público.

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Por dar maior destaque ao interesse do público, a mídia televisiva tem sido

alvo de críticas. Ao analisar o interesse público (informações relevantes para o

funcionamento da sociedade) como algo ideal e trabalhar somente com esse tipo de

informação os veículos poderiam levar os telespectadores a buscarem outra mídia

que suprisse a necessidade por informações curiosas.

Acima de tudo, seria essencial determinar se os mass media e os gostos das massas estão necessariamente ligados num círculo vicioso de padrões em decadência ou se uma ação apropriada por parte dos diretores dos mass media poderia levar ao aperfeiçoamento cumulativo do gosto de suas plateias. (LAZARFELD, MERTON, in Lima, 2005, p. 124)

Apesar de ser extremamente importante para a sociedade de massa e para

os veículos de comunicação que tem que primar pela qualidade do serviço prestado,

o jornalismo de interesse público não dá a audiência almejada para as empresas. E

por não despertar a atenção do público, este jornalismo acaba não sendo capaz de

estimular as manifestações sociais com a mesma eficácia que o jornalismo

sensacionalista.

Há quem confunda interesse público com interesse do público, mas são

expressões diferentes, que significam e explicam coisas diferentes. Os veículos de

comunicação de massa de sucesso popular sabem bem o que interessa ao público,

até por extinto de sobrevivência produzem matérias jornalísticas com estilo

sensacionalista.

De acordo com Dewey (2003), para que uma ação adquira a natureza de

interesse público, ela deve afetar a vida de pessoas além daquelas que estão

diretamente envolvidas, deve incidir de alguma forma em sua condição de vida e

ação.

Para que uma matéria seja de interesse público, ela deve ser analisada sob

dois aspectos, pela função e pelo que produz. Para esclarecer melhor podem-se

citar exemplos de alguns programas televisivos, como o Programa do Ratinho, TV

Fama, dentre outros, todos cumpre um importante papel no entretenimento, há o

interesse do público, mas não interesse público.

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Já as matérias de interesse público cumprem o papel de reforçar os valores

humanos e sociais, demonstrando o que é certo ou errado, e completando as

matérias de interesse do público.

De acordo com Guareschi (2007), “uma relação de cumplicidade e confiança

é estabelecida com o público, conferindo poder a mídia, sendo que esse poder é

legitimado pelo próprio público, através da audiência”.

Atualmente os telejornais têm-se utilizado de diversos recursos para prender

a atenção da audiência, o público fica a cada dia mais segmentado, aumenta a

variedade de programas de acordo com diferentes gostos e interesses. Isso resulta

em tornar os telejornais em espetáculos.

Para Sodré (2001, p. 16), a “imprensa vem assegurar a transmissão de

informação sobre a vida cotidiana, mas também amplia, em novas formas, a

centralização do poder e o disciplinamento do cidadão”.

Tendo em vista que, o interesse do público tem função de inserir informações

e curiosidades na sociedade e este termo, está diretamente associada ao jornalismo

sensacionalista, pode-se presumir que, as matérias do jornalismo sensacionalista

podem cumprir, de alguma forma, um dever social.

6. DISCUSSÃO

Sabe-se que a linguagem sensacionalista está diretamente ligada a

momentos emocionais e as frequentes abordagens de alguns crimes bárbaros. Ela

faz com que as pessoas se mobilizem pedindo justiça. Diante da repetição da

veiculação dos fatos ao noticiar e divulgar as matérias de interesse do público acaba

sendo capazes de impulsionar lutas sociais provenientes de ações populares, que

pressionam o poder a tomarem providências no caso e a punir os culpados.

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Desde a sua origem, a imprensa esteve presente em regulamentações sociais

e denúncias de poder, constituindo um poderoso instrumento de luta. Segundo

Sodré (2001, p.27), “a imprensa brasileira, por exemplo, tem uma tradição de lutas

políticas memoráveis – da abolição da escravatura à derrubada do Estado Novo”.

Com o desenvolvimento de novos meios de comunicação e sua disseminação pelas

camadas populares, a influência da mídia nas transformações sociais parece ter

aumentado.

Os meios de comunicação, principalmente a imprensa, durante vários séculos exerceram um papel importante na denúncia dos abusos do poder, dos atropelos e discriminação de muitos governos e sociedades autoritárias. A história da imprensa foi, até certo ponto, marcada por essas lutas em prol da democracia e da liberdade de expressão de todos os cidadãos (GUARESCHI, 2007, p. 14)

Mesmo que alguns autores defendam o contrário, as matérias de interesse do

público são capazes de ampliar a participação popular nas questões sócio-políticas,

além de reforçar valores humanos e culturais, assim o jornalismo sensacionalista

cumpre a função social de contribuir com o desenvolvimento da sociedade. Mesmo

que as coberturas de crimes bárbaros contenham exageros e apelos às emoções

que sensibilizam telespectadores, levando-os a se mobilizar, seja em manifestações,

seja em correntes de opinião.

Em busca de audiência, a televisão visa agradar ao público, exibindo o que

despertaria atenção da massa. Para isso, ela aproveita do gosto popular para fazer

de sua programação um espetáculo, uma forma de divertimento a ser consumida

como mercadoria, característica fundamental da cultura de massa (MORIN, 2007).

Caso a abordagem da violência de crimes bárbaros fosse superficial e rápida, a

mídia passaria uma imagem de conivente com a dura realidade, como se o ocorrido

fosse algo comum que não devesse ser destacado. Ao abordar com frequência, a

televisão cumpre a função de expor o que é certo ou errado, através de um exagero

que gera lucro. Ela noticia casos bárbaros com frequência, escancara sua

inconformidade e, ao fazer isso, deixa a massa telespectadora inconformada da

mesma maneira, acabando por movê-la em torno dessa questão. E a mobilização

social, a partir da opinião pública, é ampliada em busca de justiça e solução de um

crime que é incompatível com a moral predominante da sociedade.

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Segundo Bucci (2000), a televisão tem um texto direto e chamativo, com o

poder de usar imagens fortes, que causam sensações mais afloradas nos

telespectadores. Tendo em vista que o interesse do público tem função na regulação

e na educação da sociedade, e este termo é associado ao sensacionalismo, pode-se

presumir, portanto, que as matérias do jornalismo sensacionalista também poderiam

cumprir, de alguma forma, um dever social.

A frequência na abordagem de alguns crimes bárbaros pode ser capaz de

impulsionar lutas sociais provenientes de ações populares, pressionando o poder a

tomar providências no caso e a punir os culpados. É possível dizer que essa atitude

dos cidadãos seja reflexo da insistência da mídia.

Toda a informação da comunicação social seja impressa, radiofônica ou

televisiva, obedece a critérios de seleção e de destaque. Há notícias que são dadas,

outras que são omitidas; há umas a que se dá destaque a outras não. É o interesse

público que define a informação, que seleciona o que é notícia e a destaca, que

uniformiza de algum modo o conteúdo informativo dos diferentes órgãos de

comunicação. Ora por mais amplo que seja o sentido de interesse público, por mais

vulnerável que seja a interesses particulares, ele tem uma faceta formativa. A

informação representa sempre uma integração dos receptores de informação na

vida política, social, econômica e cultural da sociedade a que pertencem.

(RODRIGUES apud TRAQUINA, 1993, p. 2).

Caracterizadas pelo sensacionalismo, as matérias de interesse do público se

tornam relevantes num contexto onde a sociedade age e participa, essa tendência

tem gerado resultados positivos. As reportagens cumprem o interesse público

quando informam com qualidade e ética, quando mostram o que o povo quer saber

e o interesse econômico quando a mídia lucra.

A participação ativa dos espectadores pode ser vista tanto em correntes de

opinião quanto em ações efetivas. O fato noticiado se torna pauta de discussão do

público, o que é como ocorreu, quem são os culpados, as vítimas, o que deve ser

feito, dentre outros. “As discussões locais servem para reforçar o conteúdo da

propaganda de massa” (LAZARSFELD, MERTON, in Lima, 2005, p.130) As opiniões

são compartilhadas e discutidas e, numa reação em cadeia, o inconformismo quanto

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ao crime é generalizado, podendo gerar atitudes efetivamente concretas dos

espectadores, que refletem a ética determinada na sociedade.

Ao acusar uma mídia de sensacionalista, não se leva em consideração a

importância do público no que é exibido pela TV, tanto no que é abordado, quanto

na capacidade de alteração dos fatos, pois se há sensacionalismo, é porque há

quem o consome.

Pode-se dizer que a discussão em torno do tema é bastante complexa. Mas

de uma maneira geral, as matérias de interesse do público, consideradas muitas

vezes como jornalismo de baixo valor; divulgam, mobilizam, fiscalizam, alertam e

não deixam o assunto cair no esquecimento. Cumprindo assim, um importante papel

social.

7. CONSIDERAÇÕES FINAIS

A sociedade reconhece e legitima os veículos de comunicação e massa como

autoridades. A curiosidade despertada pelo estilo sensacionalista, em especial a TV,

que têm alcance massivo e extremo poder, estimula a participação social da

população em causas políticas e sociais. Pode-se dizer que a mídia torna-se uma

espécie de denunciadora, na verdade, uma ameaça aos crimes e às autoridades

que não cumprem o seu papel, ou seja, ela informa, forma, dissemina, apura,

verifica, descreve, critica, constitui e transforma as matérias sensacionalistas em um

instrumento contra a impunidade.

Como foi citado anteriormente, é preciso aceitar que os padrões e funções do

jornalismo são passíveis a mudanças. Assim como a evolução do mundo, as

manifestações jornalísticas também devem adaptar-se ao novo, caso contrário a

capacidade oferecida pelo jornalismo estaria restringida.

Por isso, adaptando-se à demanda de interesse do público, o jornalismo

sensacionalista pode desenvolver a função implícita de contribuir com a sociedade

posicionando-se contra a impunidade principalmente quanto aos crimes bárbaros.

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AGRADECIMENTOS

Agradeço, em primeiro lugar, a Deus, pela presença em minha vida, pela força e

coragem durante toda esta longa caminhada. Aos meus pais, irmãos e a toda minha

família que, com muito carinho e apoio, não mediram esforços para que eu

chegasse até esta etapa de minha vida. À professora Ana Seild pela paciência,

dedicação e incentivo na orientação que tornaram possível a conclusão deste

trabalho. Ao professor e coordenador do curso, pelo convívio, pelo apoio e pela

compreensão e a todos os professores do curso, que foram tão importantes na

minha vida acadêmica.

PORTO, Pollyana Cabral.

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ANEXOS

Anexo 1

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http://casoisabellaoliveiranardoni.blogspot.com.br/search/label/Cronologia%20do%2

0Crime

Relembre o caso Isabella Nardoni

Os últimos minutos da noite de 29 de março de 2008 (sábado) foram

marcados por um crime que chocou todo o Brasil. A pequena Isabella Oliveira

Nardoni (5 anos de idade)foi jogada da janela do sexto andar de um prédio de classe

média (Edifício London), na Vila Mazzei, na zona norte de São Paulo. A criança

estava sob os cuidados do pai Alexandre Alves Nardoni (29 anos)e da madrasta

Anna Carolina Trotta Jatobá (24 anos) quando o crime ocorreu.

Isabella passava o fim de semana com o pai, estava com o casal desde sexta

feira. Na noite de sábado voltavam de uma visita à casa da sogra de Alexandre

Nardoni.O carro da família foi estacionado na garagem do Ed.London às 23h:36m

(comprovado posteriormente pelo registro do aparelho de GPS instalado no

veículo).Isabella foi jogada cerca de 10 minutos depois da chegada do casal.

Eram 23 horas 49 minutos e 59 segundos quando o resgate foi solicitado por um

vizinho do primeiro andar, alertado pelo porteiro do prédio que escutou o som do

corpo de Isabella impactando com o solo e a avistou caída no jardim. O porteiro

conta que estava na guarita quando ouviu um barulho do lado de fora. Assim que viu

a menina caída no gramado interfonou para o morador Antônio Lúcio Teixeira,

professor de 61 anos, sem mexer na criança. Enquanto relatava ao professor o que

havia acontecido, o porteiro conta que apareceu o pai da menina, poucos instantes

após a queda. O porteiro afirma que o pai desceu gritando que alguém havia

invadido o apartamento, cortado a tela de proteção e jogado a filha pela janela.

Anna Jatobá desceu minutos depois, no apartamento ela telefonou para o pai e para

o sogro. Suas ligações foram efetuadas ao mesmo tempo em que o sub síndico

ligava para o resgate, no instante após a queda da criança. Em nenhum momento o

casal ligou para o resgate.

Os primeiros policiais a chegar no local trabalhavam no Batalhão de

Corregedoria de polícia e encontraram Isabella com sinais de vida. Outras viaturas

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chegaram algum tempo depois. Eles iniciaram uma varredura completa pelo prédio e

pelas regiões vizinhas, em busca do possível invasor. Percorreram todos os

andares, entraram em apartamentos, verificaram até porta malas dos carros e as

ruas próximas ao prédio.

Neste mesmo local Isabella recebe os primeiros socorro aplicados pelos

paramédicos da Unidade de Resgate, acompanhada de perto pela mãe Ana

Carolina de Oliveira, que chegou ao local após ter sido avisada pela madrasta Anna

Jatobá. Isabella é encaminhada para a Santa Casa de Misericórdia. Alexandre

segue para o hospital sem a mulher Anna Jatobá, que fica no prédio. Também vão

para o hospital a mãe de Isabella, Ana Carolina Oliveira, e alguns outros familiares.

Minutos depois, a notícia: Isabella Oliveira Nardoni estava morta. Médicos legistas

percebem no corpo de Isabella ferimentos que são suspeitos de terem acontecido

antes da queda.

Policiais que estiveram no local informam que havia um buraco na tela da

janela e marcas de sangue pelo apartamento, mas a porta não havia sido

arrombada. Estes foram os primeiros sinais que chamaram a atenção dos policiais

do 9º DP, no Carandiru.

O casal Alexandre Nardoni e Anna Jatobá passa a madrugada dando

depoimentos na delegacia, eles são assistidos pelo advogado Ricardo Martins,

inusitadamente contratado desde a noite do crime já com poderes para defende-los

até o julgamento.A perícia chega ao apartamento na mesma madrugada, pouco

depois do crime ter acontecido, e continua os trabalhos ao amanhecer.

Durante o trabalho pericial desenvolvido no caso Isabella foram utilizados

equipamentos avançados, com tecnologia para detectar manchas de sangue,

vestígios humanos, utilizaram técnicas para calcular altura e posição de onde caíram

as gotas de sangue, altura de quem cortou a tela, fotografaram a fachada do prédio,

fizeram cálculos e análises para determinar se Isabella foi jogada e como foi jogada,

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recolheram material de diversos vestígios de sangue para exames de DNA, entre

outros procedimentos aplicados .

30/03/2008

Nos noticiários o caso começa a ser divulgado. A tragédia inexplicável, até

então um mistério, faz a população se emocionar.

Os peritos do IML que analisam o cadáver de Isabella encontram marcas no

pescoço, manchas no pulmão, constatam que ela caiu com a língua projetada para

fora da boca, o que indica um quadro de asfixia.Em todo o país há um clima de

indignação e perplexidade. Famílias se comovem, se identificam, anseiam por mais

notícias esclarecedoras sobre o caso.Os depoimentos do casal continuam durante o

dia, eles também compareceram ao IML onde doaram materiais (sangue e urina)

para exames toxicológicos e exames de lesão corporal. São liberados no início da

noite. Eles saem acompanhados por familiares, com os rostos cobertos, se

escondendo dos repórteres.

20/04/ 2008

Alexandre Nardoni e Anna Carolina Jatobá dão entrevista ao Fantástico, na

TV Globo, dizem ser inocentes, mas não falam de forma objetiva sobre a noite do

crime, não respondem as perguntas sobre evidencias encontradas e não são

confrontados em nenhum momento.

22/04/2008

No Jornal da Globo, o colunista Arnaldo Jabor resume o sentimento

estupefato e indignado de toda uma nação diante do crime e toda as reações do pai,

madrasta e a família paterna.

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Caso Isabella: a dor da falta de sentido (Arnaldo Jabor)

Tentei não ler sobre a morte de Isabella. Também evitei, na época, os

detalhes do assassinato do menino João Hélio. Na minha profissão, há que

selecionar horrores. Mas não consegui. Vi o desfecho do caso da menina morta em

São Paulo.

A tragédia não é só das vítimas, mas nós também sofremos para entender o

mal incompreensível. Cresce aos poucos uma pele de rinoceronte em nossa alma;

com o coração mais duro, ficamos mais cínicos, mais passivos diante da crueldade.

Como escreveu Oswaldo Giacoia Jr.: "O insuportável não é só a dor, mas a falta de

sentido da dor, mais ainda, a dor da falta de sentido."

Como entender que um pai e uma madrasta possam ter ferido, estrangulado e

atirado uma menininha de cinco anos pela janela? Como entender a cara sólida e

cínica que eles ostentam para fingir inocência? Como não demonstram sentimento

de culpa algum? Ninguém berra? Ninguém chora? Como podem querer viver depois

disso? Como essa família toda - pais, mães, irmãos - se une na ocultação de um

crime? Como o avô pôde dizer, com cara-de-pau, que "se meu filho fôsse culpado

eu denunciaria?" Que quer esta gente? Preservar o bom nome da família? Mas são

parentes ou cúmplices? Como podem os advogados de defesa posar de gravata e

terninho e cara limpa, falando de uma "terceira pessoa"? Sei que eles responderiam:

"Todos têm direito de defesa...". Mas como é que eles têm estômago?

A polícia deu um show de bola pericial no caso Isabella, mas dá para sentir

que nossa estrutura penal está muito defasada com este espantoso crescimento da

barbárie. Como se pode tolerar que um sujeito que foi condenado na semana

passada somente a 13 anos por ter esquartejado a namorada, alegando "legítima

defesa", possa ficar em liberdade "até esgotar todos os recursos que a lei prevê",

como disse o STJ? Como entender que aquele jornalista Pimenta Neves, que

premeditou o assassinato da namorada com dois tiros pelas costas e na cabeça,

condenado já há seis anos, esteja em liberdade ainda, na boa? E aquele garoto que

matou pai e mãe nos Jardins, em São Paulo, e a família rica conseguiu esconder

tudo?

As leis de execução penal têm de ser aceleradas, as punições têm de ser

mais temíveis, mais violentas, mais rápidas. Há um crescimento da crueldade acima

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de qualquer codificação jurídica. Esta lentidão, este arcaismo da Justiça é visível

não só nos chamados "crimes de classe média", como também na barbárie que

galopa nas periferias. O Elias Maluco, lembram?,aquele que matou o Tim Lopes

com golpes de espada, estava em liberdade condicional, pois a lei concede isso ao

"cidadão". Que cidadão?

O conceito de cidadania tem de ser revisto. Cidadania é merecimento. Surgiu

na miséria do País uma raça de sub-humanos, sub-bichos que todos os dias

degolam, esquartejam, botam no microondas e são "cidadãos", "tão ligados?". Qual

será o nome dessa coisa informe que a miséria está gerando? É uma mistura de lixo

e sangue, uma nova língua de grunhidos, mais além da maldade, uma pura

explosão de vingança. Não se trata mais de uma perversão do humano, mas de uma

perversão do animal em nós.

"Ah, a lei é igual para todos...", dizem os juristas de terno brilhante e

bochechas contentes. Sim, tudo bem. Mas há novas formas de crime que têm de ser

estudadas e antigos direitos e penas têm de ser revistos. Os pensadores da Justiça

continuam a tratar os crimes como "desvios da norma", praticados por cidadãos

iguais. Tem que acabar o tempo dos casuísmos, das leniências, das chicanas.

Vivemos trancados num racionalismo impotente diante desse bucho indomável da

miséria, do alien que se forma como um monstro boçal nas ruas e periferias. Com o

congestionamento de fatos tragicamente insolúveis, no beco sem saída da

sociedade, vejo se formar um desejo crescente pelo horror, pela crueldade, quase

que uma fome de catástrofe. Não falo dos analfabetos desvalidos e loucos, mas os

assassinos de classe média já têm o prazer perverso de fazer o inominável.

E este casal de pedra, estes monstros? Será que vão se defender em

liberdade, esgotando "todos os recursos da lei", como o esquartejador com "justa

causa" ou o assassino daquela menina morta pelas costas, livre e solto? Serão

condenados a dez aninhos com atenuantes e macetes? Que acontecerá com eles,

depois de estrangularem e jogarem a filha pela janela?

A lei tem de ser mais temida, mas rápida, mais cruel. Esse vazio da Justiça

explica o sucesso de filmes como "Tropa de Elite" e até fantasias de linchamento em

todos nós. Vejam as portas da cadeia onde estavam os dois assassinos. E, por fim,

por que tantos crimes contra as crianças? O caso do João Hélio, crianças

decapitadas na Febem, crianças jogadas em pântano em Minas, crianças no lixão,

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aquela psicopata em Goiás que contratava meninas pobres para torturar, e mais:

pedofilia, espancamentos, tudo...

As crianças são fontes inconscientes de terror, de Heródes a Édipo e Moisés.

O rei Agamenon matou sua filha Ifigênia para ter tempo bom em uma guerra. Que

dizem os antropólogos dos rituais de matança de inocentes, como foi em Pedra

Bonita, que ficou vermelha do sangue? Em sociedades primitivas, o sacrifício de

animais e o sangue de inocentes servem para afastar doenças, prever o futuro,

saciando o ódio dos deuses. Será que matam nessas crianças de hoje o horror a um

futuro que não há mais?

Lamentamos uma harmonia ainda inexistente e almejamos que ela seja

alcançada. É tão inútil usar as palavras racionalmente, diante da brutalidade deste

"outro País" do crime e da miséria, que caio em desânimo: que adianta ficar os

últimos 17 anos escrevendo em nome de uma "razão"?

E perguntamos, horrorizados: "Por que eles fizeram aquilo?" Resposta: "Por

nada...".

Anexo 2 http://oglobo.globo.com/rio/ancelmo/reporterdecrime/posts/2008/04/04/pai-de-isabella-nao-sossego-enquanto-nao-achar-esse-monstro-96155.asp

Pai de Isabella: Não sossego enquanto não achar esse monstro

Álbum de Família: Isabella e o pai, preso e acusado da morte da menina

É realmente difícil acreditar que um pai seja capaz de matar uma menininha

inocente como essa. Nem mesmo participar de uma conspiração para eliminar uma

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criança de forma tão vil. A gente vive dias maus em que se surpreende a cada

momento com o que o ser humano é capaz. Mas é em nome dessa crença, de

que somos humanos e incapazes de tanta maldade, que me esforço para acreditar

no que escreveu o pai de Isabella Nardoni, jogada do 6o andar de um prédio de

classe média em São Paulo:

Diz Alexandre:

“Eu como pai de três filhos, posso dizer sem dúvida uma coisa, que a Isabella

é o maior tesouro da minha vida. Tenho outros filhos meninos, mas a minha

menininha era a princesa da casa. A Isabella sempre foi muito carinhosa comigo e

com os irmãos dela. Costumava dizer que era a mamãe do meu filho mais novo, o

Cauã, e defendia o do meio, o Pietro, acima de tudo. Quando me dei conta que tinha

perdido a Isabella, senti naquele momento que meu mundo acabou. Não sei como

caminhar. Todos estão me julgando sem ao menos me conhecer, não faria isto com

ninguém muito menos com minha filha.

Amo a Isabella incondicionalmente e prometi a ela, em frente a seu caixão,

que enquanto vivo não sossego, até encontrar este monstro. Tiraram a vida de

minha princesa de uma maneira trágica e não me permitem sentir falta dela, pois me

condenam por algo que não fiz. Minha filha, como os irmãos dela, são tudo na minha

vida, estou sem rumo. Mas confio que Deus me dará forças para vencer esses

obstáculos, mostrando o caminho certo para a justiça. Quero minha filha bem, em

paz e tenho plena certeza e consciência tranqüila do amor que tenho por ela. Pois

por mais que me julguem, só eu e minha filhinha sabemos a dor que estamos

sentindo. E o mais importante é que Isa sabe o pai que fui para ela. Minha mãe está

à base de calmantes por falta do nosso botão de rosa, como ela diz. Meu pai chora

quando lembra dela e quando assiste a cada reportagem. Minha irmã e minha mãe

choram pelo que estão fazendo.

Tenho muito mais a dizer, mas espero que um dia me escutem como um pai

que sofre por sua filha e não como um monstro que não sou. Nós não tínhamos feito

nenhuma declaração ainda porque acreditávamos que o caso seria solucionado.

Nós não somos os culpados e ainda encontrarão o culpado. Dessa forma não

precisaríamos mostrar a nossa imagem porque o nosso sofrimento é muito grande,

só que nos acusam. Queremos mostrar o que realmente estamos sentindo. A

verdade sempre prevalecerá”.

Já a madrasta Anna Carolina Jatobá escreve:

“Sei que a palavra madrasta pesa ao ouvido dos outros, mas para a Isa sei

que eu era a Tia Carol. Amo ela como amo os meus filhos. Tenho minha consciência

tranqüila do carinho que sempre a tratei. Ela adorava me ajudar a cuidar dos irmãos

e até ensinou o mais novo a andar. Ele trocava meu colo para ficar com ela. O Pietro

chamava a Isa todos os dias e só passou a ir a escola quando a Isa estudava lá.

Adorava fazer de tudo para agradá-lo. Ela e o Pietro ligavam sempre para que eu os

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buscasse. Brincávamos ela, eu e o Pietro de musiquinha, ciranda e de casinha. Eu,

o Alexandre e minha sogra fizemos o quarto dela como ela sempre sonhou.

Compramos o baú da HelloKitty. Ela adorava as Princesas da Disney e compramos

um abajur. Mas acima de tudo isso o carinho era o que mais contava. Então o que

tenho a dizer é que a Isabella era tudo para todos nós. Tenho fé que encontraremos

quem fez esta crueldade com nossa pequena. Não tínhamos dado nenhuma

declaração porque acreditávamos que o caso seria solucionado. Somos inocentes e

a verdade sempre prevalecerá”.

Junto com as cartas, datadas de 03 de abril de 2008, foram enviadas a

Roberto Cabrini, da Record, oito fotos que comprovam o relacionamento do casal

com Isabella. A autenticidade destas cartas foram comprovadas pela Record. O

casal se apresentou à polícia e está preso.

Anexo 3

http://oglobo.globo.com/pais/caso-isabella-comeca-julgamento-do-casal-

nardoni-3036383

Caso Isabella: começa julgamento do casal

Nardoni

O GLOBO

SÃO PAULO - Com o sorteio dos sete jurados, começou o julgamento do casal

Alexandre Nardoni e Ana Carolina, às 14h17m, no Fórum de Santana, na zona norte

de São Paulo. Eles são acusados de matar a menina Isabella Nardoni, em março de

2008. Jornalistas foram autorizados a entrar no plenário para acompanhar o sorteio.

A defesa e a acusação têm o direito de, cada um, recusar três jurados sem dar

explicações.

http://oglobo.globo.com/pais/caso-isabella-comeca-julgamento-do-casal-nardoni-3036383#ixzz2Y0na3GR3

Caso Isabella: Confira na íntegra a sentença que

condenou o casal Nardoni

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SÃO PAULO - A assessoria de imprensa do Tribunal de Justiça de São Paulo

divulgou há pouco a sentença que condenou o casal Alexandre Nardoni e Anna

Carolina Jatobá pela morte da menina Isabella Nardoni, em 29 de março de 2008.

Confira abaixo, na íntegra:

VISTOS

1. ALEXANDRE ALVES NARDONI e ANNA CAROLINA TROTTA PEIXOTO

JATOBÁ, qualificados nos autos, foram denunciados pelo Ministério Público porque

no dia 29 de março de 2.008, por volta de 23:49 horas, na rua Santa Leocádia, nº

138, apartamento 62, vila IzolinaMazei, nesta Capital, agindo em concurso e com

identidade de propósitos, teriam praticado crime de homicídio triplamente qualificado

pelo meio cruel (asfixia mecânica e sofrimento intenso), utilização de recurso que

impossibilitou a defesa da ofendida (surpresa na esganadura e lançamento

inconsciente pela janela) e com o objetivo de ocultar crime anteriormente cometido

(esganadura e ferimentos praticados anteriormente contra a mesma vítima) contra a

menina ISABELLA OLIVEIRA NARDONI.

Aponta a denúncia também que os acusados, após a prática do crime de homicídio

referido acima, teriam incorrido também no delito de fraude processual, ao alterarem

o local do crime com o objetivo de inovarem artificiosamente o estado do lugar e dos

objetos ali existentes, com a finalidade de induzir a erro o juiz e os peritos e, com

isso, produzir efeito em processo penal que viria a ser iniciado.

2. Após o regular processamento do feito em Juízo, os réus acabaram sendo

pronunciados, nos termos da denúncia, remetendo-se a causa assim a julgamento

ao Tribunal do Júri, cuja decisão foi mantida em grau de recurso.

3. Por esta razão, os réus foram então submetidos a julgamento perante este

Egrégio 2º Tribunal do Júri da Capital do Fórum Regional de Santana, após cinco

dias de trabalhos, acabando este Conselho Popular, de acordo com o termo de

votação anexo, reconhecendo que os acusados praticaram, em concurso, um crime

de homicídio contra a vítima Isabella Oliveira Nardoni, pessoa menor de 14 anos,

triplamente qualificado pelo meio cruel, pela utilização de recurso que dificultou a

defesa da vítima e para garantir a ocultação de delito anterior, ficando assim

afastada a tese única sustentada pela Defesa dos réus em Plenário de negativa de

autoria.

Além disso, reconheceu ainda o Conselho de Sentença que os réus também

praticaram, naquela mesma ocasião, o crime conexo de fraude processual

qualificado.

É a síntese do necessário.

FUNDAMENTAÇÃO.

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4. Em razão dessa decisão, passo a decidir sobre a pena a ser imposta a cada um

dos acusados em relação a este crime de homicídio pelo qual foram considerados

culpados pelo Conselho de Sentença.

Uma vez que as condições judiciais do art. 59 do Código Penal não se mostram

favoráveis em relação a ambos os acusados, suas penas-base devem ser fixadas

um pouco acima do mínimo legal.

Isto porque a culpabilidade, a personalidade dos agentes, as circunstâncias e as

consequências que cercaram a prática do crime, no presente caso concreto,

excederam a previsibilidade do tipo legal, exigindo assim a exasperação de suas

reprimendas nesta primeira fase de fixação da pena, como forma de reprovação

social à altura que o crime e os autores do fato merecem.

Com efeito, as circunstâncias específicas que envolveram a prática do crime ora em

exame demonstram a presença de uma frieza emocional e uma insensibilidade

acentuada por parte dos réus, os quais após terem passado um dia relativamente

tranquilo ao lado da vítima, passeando com ela pela cidade e visitando parentes,

teriam, ao final do dia, investido de forma covarde contra a mesma, como se não

possuíssem qualquer vínculo afetivo ou emocional com ela, o que choca o

sentimento e a sensibilidade do homem médio, ainda mais porque o conjunto

probatório trazido aos autos deixou bem caracterizado que esse desequilíbrio

emocional demonstrado pelos réus constituiu a mola propulsora para a prática do

homicídio.

De igual forma relevante as conseqüências do crime na presente hipótese,

notadamente em relação aos familiares da vítima.

Porquanto não se desconheça que em qualquer caso de homicídio consumado há

sofrimento em relação aos familiares do ofendido, no caso específico destes autos, a

angústia acima do normal suportada pela mãe da criança Isabella, Srª. Ana Carolina

Cunha de Oliveira, decorrente da morte da filha, ficou devidamente comprovada

nestes autos, seja através do teor de todos os depoimentos prestados por ela nestes

autos, seja através do laudo médico-psiquiátrico que foi apresentado por profissional

habilitado durante o presente julgamento, após realizar consulta com a mesma, o

que impediu inclusive sua permanência nas dependências deste Fórum, por ainda

se encontrar, dois anos após os fatos, em situação aguda de estresse (F43.0 - CID

10), face ao monstruoso assédio a que a mesma foi obrigada a ser submetida como

decorrência das condutas ilícitas praticadas pelos réus, o que é de conhecimento de

todos, exigindo um maior rigor por parte do Estado-Juiz quanto à reprovabilidade

destas condutas.

A análise da culpabilidade, das personalidades dos réus e das circunstâncias e

consequências do crime, como foi aqui realizado, além de possuir fundamento legal

expresso no mencionado art. 59 do Código Penal, visa também atender ao princípio

da individualização da pena, o qual constitui vetor de atuação dentro da legislação

penal brasileira, na lição sempre lúcida do professor e magistrado Guilherme de

Souza Nucci:

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"Quanto mais se cercear a atividade individualizadora do juiz na aplicação da pena,

afastando a possibilidade de que analise a personalidade, a conduta social, os

antecedentes, os motivos, enfim, os critérios que são subjetivos, em cada caso

concreto, mais cresce a chance de padronização da pena, o que contraria, por

natureza, o princípio constitucional da individualização da pena, aliás, cláusula

pétrea" ("Individualização da Pena", Ed. RT, 2ª edição, 2007, pág. 195).

Assim sendo, frente a todas essas considerações, majoro a pena-base para cada

um dos réus em relação ao crime de homicídio praticado por eles, qualificado pelo

fato de ter sido cometido para garantir a ocultação de delito anterior (inciso V, do

parágrafo segundo do art. 121 do Código Penal) no montante de 1/3 (um terço), o

que resulta em 16 (dezesseis) anos de reclusão, para cada um deles.

Como se trata de homicídio triplamente qualificado, as outras duas qualificadoras de

utilização de meio cruel e de recurso que dificultou a defesa da vítima (incisos III e

IV, do parágrafo segundo do art. 121 do Código Penal), são aqui utilizadas como

circunstâncias agravantes de pena, uma vez que possuem previsão específica no

art. 61, inciso II, alíneas "c" e "d" do Código Penal.

Assim, levando-se em consideração a presença destas outras duas qualificadoras,

aqui admitidas como circunstâncias agravantes de pena, majoro as reprimendas

fixadas durante a primeira fase em mais ¼ (um quarto), o que resulta em 20 (vinte)

anos de reclusão para cada um dos réus.

Justifica-se a aplicação do aumento no montante aqui estabelecido de ¼ (um

quarto), um pouco acima do patamar mínimo, posto que tanto a qualificadora do

meio cruel foi caracterizada na hipótese através de duas ações autônomas (asfixia e

sofrimento intenso), como também em relação à qualificadora da utilização de

recurso que impossibilitou a defesa da vítima (surpresa na esganadura e lançamento

inconsciente na defenestração).

Pelo fato do co-réu Alexandre ostentar a qualidade jurídica de genitor da vítima

Isabella, majoro a pena aplicada anteriormente a ele em mais 1/6 (um sexto), tal

como autorizado pelo art. 61, parágrafo segundo, alínea "e" do Código Penal, o que

resulta em 23 (vinte e três) anos e 04 (quatro) meses de reclusão.

Como não existem circunstâncias atenuantes de pena a serem consideradas, torno

definitivas as reprimendas fixadas acima para cada um dos réus nesta fase.

Por fim, nesta terceira e última fase de aplicação de pena, verifica-se a presença da

qualificadora prevista na parte final do parágrafo quarto, do art. 121 do Código

Penal, pelo fato do crime de homicídio doloso ter sido praticado contra pessoa

menor de 14 anos, daí porque majoro novamente as reprimendas estabelecidas

acima em mais 1/3 (um terço), o que resulta em 31 (trinta e um) anos, 01 (um) mês e

10 (dez) dias de reclusão para o co-réu Alexandre e 26 (vinte e seis) anos e 08 (oito)

meses de reclusão para a co-ré Anna Jatobá.

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Como não existem outras causas de aumento ou diminuição de pena a serem

consideradas nesta fase, torno definitivas as reprimendas fixadas acima.

Quanto ao crime de fraude processual para o qual os réus também teriam

concorrido, verifica-se que a reprimenda nesta primeira fase da fixação deve ser

estabelecida um pouco acima do mínimo legal, já que as condições judiciais do art.

59 do Código Penal não lhe são favoráveis, como já discriminado acima, motivo pelo

qual majoro em 1/3 (um terço) a pena-base prevista para este delito, o que resulta

em 04 (quatro) meses de detenção e 12 (doze) dias-multa, sendo que o valor

unitário de cada dia-multa deverá corresponder a 1/5 (um quinto) do valor do salário

mínimo, uma vez que os réus demonstraram, durante o transcurso da presente ação

penal, possuírem um padrão de vida compatível com o patamar aqui fixado.

Inexistem circunstâncias agravantes ou atenuantes de pena a serem consideradas.

Presente, contudo, a causa de aumento de pena prevista no parágrafo único do art.

347 do Código Penal, pelo fato da fraude processual ter sido praticada pelos réus

com o intuito de produzir efeito em processo penal ainda não iniciado, as penas

estabelecidas acima devem ser aplicadas em dobro, o que resulta numa pena final

para cada um deles em relação a este delito de 08 (oito) meses de detenção e 24

(vinte e quatro) dias-multa, mantido o valor unitário de cada dia-multa estabelecido

acima.

5. Tendo em vista que a quantidade total das penas de reclusão ora aplicadas aos

réus pela prática do crime de homicídio triplamente qualificado ser superior a 04

anos, verifica-se que os mesmos não fazem jus ao benefício da substituição destas

penas privativas de liberdade por restritivas de direitos, a teor do disposto no art. 44,

inciso I do Código Penal.

Tal benefício também não se aplica em relação às penas impostas aos réus pela

prática do delito de fraude processual qualificada, uma vez que as além das

condições judiciais do art. 59 do Código Penal não são favoráveis aos réus, há

previsão específica no art. 69, parágrafo primeiro deste mesmo diploma legal

obstando tal benefício de substituição na hipótese.

6. Ausentes também as condições de ordem objetivas e subjetivas previstas no art.

77 do Código Penal, já que além das penas de reclusão aplicadas aos réus em

relação ao crime de homicídio terem sido fixadas em quantidades superiores a 02

anos, as condições judiciais do art. 59 não são favoráveis a nenhum deles, como já

especificado acima, o que demonstra que não faz jus também ao benefício da

suspensão condicional do cumprimento de nenhuma destas penas privativas de

liberdade que ora lhe foram aplicadas em relação a qualquer dos crimes.

7. Tendo em vista o disposto no art. 33, parágrafo segundo, alínea "a" do Código

Penal e também por ter o crime de homicídio qualificado a natureza de crimes

hediondos, a teor do disposto no artigo 2o, da Lei n° 8.072/90, com a nova redação

que lhe foi dada pela Lei n. 11.464/07, os acusados deverão iniciar o cumprimento

de suas penas privativas de liberdade em regime prisional FECHADO.

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Quanto ao delito de fraude processual qualificada, pelo fato das condições judiciais

do art. 59 do Código Penal não serem favoráveis a qualquer dos réus, deverão os

mesmos iniciar o cumprimento de suas penas privativas de liberdade em relação a

este delito em regime prisional SEMIABERTO, em consonância com o disposto no

art. 33, parágrafo segundo, alínea "c" e seu parágrafo terceiro, daquele mesmo

Diploma Legal.

8. Face à gravidade do crime de homicídio triplamente qualificado praticado pelos

réus e à quantidade das penas privativas de liberdade que ora lhes foram aplicadas,

ficam mantidas suas prisões preventivas para garantia da ordem pública, posto que

subsistam os motivos determinantes de suas custódias cautelares, tal como previsto

nos arts. 311 e 312 do Código de Processo Penal, devendo aguardar detidos o

trânsito em julgado da presente decisão.

Como este Juízo já havia consignado anteriormente, quando da prolação da

sentença de pronúncia - respeitados outros entendimentos em sentido diverso - a

manutenção da prisão processual dos acusados, na visão deste julgador, mostra-se

realmente necessária para garantia da ordem pública, objetivando acautelar a

credibilidade da Justiça em razão da gravidade do crime, da culpabilidade, da

intensidade do dolo com que o crime de homicídio foi praticado por eles e a

repercussão que o delito causou no meio social, uma vez que a prisão preventiva

não tem como único e exclusivo objetivo prevenir a prática de novos crimes por

parte dos agentes, como exaustivamente tem sido ressaltado pela doutrina pátria, já

que evitar a reiteração criminosa constitui apenas um dos aspectos desta espécie de

custódia cautelar.

Tanto é assim que o próprio Colendo Supremo Tribunal Federal já admitiu este

fundamento como suficiente para a manutenção de decreto de prisão preventiva:

"HABEAS CORPUS. QUESTÃO DE ORDEM. PEDIDO DE MEDIDA LIMINAR.

ALEGADA NULIDADE DA PRISÃO PREVENTIVA DO PACIENTE. DECRETO DE

PRISÃO CAUTELAR QUE SE APÓIA NA GRAVIDADE ABSTRATA DO DELITO

SUPOSTAMENTE PRATICADO, NA NECESSIDADE DE PRESERVAÇÃO DA

"CREDIBILIDADE DE UM DOS PODERES DA REPÚBLICA", NO CLAMOR

POPULAR E NO PODER ECONÔMICO DO ACUSADO. ALEGAÇÃO DE EXCESSO

DE PRAZO NA CONCLUSÃO DO PROCESSO."

"O plenário do Supremo Tribunal Federal, no julgamento do HC 80.717, fixou a tese

de que o sério agravo à credibilidade das instituições públicas pode servir de

fundamento idôneo para fins de decretação de prisão cautelar, considerando,

sobretudo, a repercussão do caso concreto na ordem pública." (STF, HC 85298-SP,

1ª Turma, rel. Min. Carlos Aires Brito, julg. 29.03.2005, sem grifos no original).

Portanto, diante da hediondez do crime atribuído aos acusados, pelo fato de

envolver membros de uma mesma família de boa condição social, tal situação teria

gerado revolta à população não apenas desta Capital, mas de todo o país, que

envolveu diversas manifestações coletivas, como fartamente divulgado pela mídia,

além de ter exigido também um enorme esquema de segurança e contenção por

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parte da Polícia Militar do Estado de São Paulo na frente das dependências deste

Fórum Regional de Santana durante estes cinco dias de realização do presente

julgamento, tamanho o número de populares e profissionais de imprensa que para

cá acorreram, daí porque a manutenção de suas custódias cautelares se mostra

necessária para a preservação da credibilidade e da respeitabilidade do Poder

Judiciário, as quais ficariam extremamente abaladas caso, agora, quando já existe

decisão formal condenando os acusados pela prática deste crime, conceder-lhes o

benefício de liberdade provisória, uma vez que permaneceram encarcerados durante

toda a fase de instrução.

Esta posição já foi acolhida inclusive pelo Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de

São Paulo, como demonstra a ementa de acórdão a seguir transcrita:

"LIBERDADE PROVISÓRIA - Benefício pretendido - Primariedade do recorrente -

Irrelevância - Gravidade do delito - Preservação do interesse da ordem pública -

Constrangimento ilegal inocorrente." (In JTJ/Lex 201/275, RSE nº 229.630-3, 2ª

Câm. Crim., rel. Des. Silva Pinto, julg. em 09.06.97).

O Nobre Desembargador Caio Eduardo Canguçu de Almeida, naquele mesmo voto

condutor do v. acórdão proferido no mencionado recurso de "habeas corpus",

resume bem a presença dos requisitos autorizadores da prisão preventiva no

presente caso concreto:

"Mas, se um e outro, isto é, se clamor público e necessidade da preservação da

respeitabilidade de atuação jurisdicional se aliarem à certeza quanto à existência do

fato criminoso e a veementes indícios de autoria, claro que todos esses

pressupostos somados haverão de servir de bom, seguro e irrecusável fundamento

para a excepcionalização da regra constitucional que presumindo a inocência do

agente não condenado, não tolera a prisão antecipada do acusado."

E, mais à frente, arremata:

"Há crimes, na verdade, de elevada gravidade, que, por si só, justificam a prisão,

mesmo sem que se vislumbre risco ou perspectiva de reiteração criminosa. E, por

aqui, todos haverão de concordar que o delito de que se trata, por sua gravidade e

característica chocante, teve incomum repercussão, causou intensa indignação e

gerou na população incontrolável e ansiosa expectativa de uma justa

contraprestação jurisdicional. A prevenção ao crime exige que a comunidade

respeite a lei e a Justiça, delitos havendo, tal como o imputado aos pacientes, cuja

gravidade concreta gera abalo tão profundo naquele sentimento, que para o

restabelecimento da confiança no império da lei e da Justiça exige uma imediata

reação. A falta dela mina essa confiança e serve de estímulo à prática de novas

infrações, não sendo razoável, por isso, que acusados por crimes brutais

permaneçam livre, sujeitos a uma consequência remota e incerta, como se nada

tivessem feito." (sem grifos no original).

Nessa mesma linha de raciocínio também se apresentou o voto do não menos

brilhante Desembargador revisor, Dr. Luís Soares de Mello que, de forma firme e

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consciente da função social das decisões do Poder Judiciário, assim deixou

consignado:

"Aquele que está sendo acusado, e com indícios veementes, volte-se a dizer, de tirar

de uma criança, com todo um futuro pela frente, aquilo que é o maior 'bem' que o ser

humano possui - 'a vida' - não pode e não deve ser tratado igualmente a tantos

outros cidadãos de bem e que seguem sua linha de conduta social aceitável e

tranquila.

E o Judiciário não pode ficar alheio ou ausente a esta preocupação, dês que a ele,

em última instância, é que cabe a palavra e a solução.

Ora.

Aquele que está sendo acusado, 'em tese', mas por gigantescos indícios, de ser

homicida de sua 'própria filha' - como no caso de Alexandre - e 'enteada' -aqui no

que diz à Anna Carolina - merece tratamento severo, não fora o próprio exemplo ao

mais da sociedade.

Que é também função social do Judiciário.

É a própria credibilidade da Justiça que se põe à mostra, assim." (sem grifos no

original).

Por fim, como este Juízo já havia deixado consignado anteriormente, ainda que se

reconheça que os réus possuem endereço fixo no distrito da culpa, posto que, como

noticiado, o apartamento onde os fatos ocorreram foi adquirido pelo pai de

Alexandre para ali estabelecessem seu domicílio, com ânimo definitivo, além do fato

de Alexandre, como provedor da família, possuir profissão definida e emprego fixo,

como ainda pelo fato de nenhum deles ostentarem outros antecedentes criminais e

terem se apresentado espontaneamente à Autoridade Policial para cumprimento da

ordem de prisão temporária que havia sido decretada inicialmente, isto somente não

basta para assegurar-lhes o direito à obtenção de sua liberdade durante o restante

do transcorrer da presente ação penal, conforme entendimento já pacificado perante

a jurisprudência pátria, face aos demais aspectos mencionados acima que exigem a

manutenção de suas custódias cautelares, o que, de forma alguma, atenta contra o

princípio constitucional da presunção de inocência:

"RHC - PROCESSUAL PENAL - PRISÃO PROVISÓRIA - A primariedade, bons

antecedentes, residência fixa e ocupação lícita não impedem, por si só, a prisão

provisória" (STJ, 6ª Turma, v.u., ROHC nº 8566-SP, rel. Min. Luiz Vicente

Cernicchiaro, julg. em 30.06.1999).

“HABEAS CORPUS”. HOMICÍDIO QUALIFICADO. PRISÃO PREVENTIVA.

ASSEGURAR A INSTRUÇÃO CRIMINAL. AMEAÇA A TESTEMUNHAS.

MOTIVAÇÃO IDÔNEA. ORDEM DENEGADA.

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1. A existência de indícios de autoria e a prova de materialidade, bem como a

demonstração concreta de sua necessidade, lastreada na ameaça de testemunhas

são suficientes para justificar a decretação da prisão cautelar para garantir a regular

instrução criminal, principalmente quando se trata de processo de competência do

Tribunal do Júri.

2. Nos processos de competência do Tribunal Popular, a instrução criminal exaure-

se definitivamente com o julgamento do plenário (arts. 465 a 478 do CPP).

3. Eventuais condições favoráveis ao paciente - tais como a primariedade, bons

antecedentes, família constituída, emprego e residência fixa - não impedem a

segregação cautelar, se o decreto prisional está devidamente fundamentado nas

hipóteses que autorizam a prisão preventiva. Nesse sentido: RHC 16.236/SP, Rel.

Min. FELIX FISCHER, DJ de 17/12/04; RHC 16.357/PR, Rel. Min. GILSON DIPP, DJ

de 9/2/05; e RHC 16.718/MT, de minha relatoria, DJ de 1º/2/05).

4. Ordem denegada. (STJ, 5ª Turma, v.u., HC nº 99071/SP, rel. Min. Arnaldo

Esteves Lima, julg. em 28.08.2008).

Ademais, a falta de lisura no comportamento adotado pelos réus durante o

transcorrer da presente ação penal, demonstrando que fariam tudo para tentar, de

forma deliberada, frustrar a futura aplicação da lei penal, posto que após terem

fornecido material sanguíneo para perícia no início da apuração policial e inclusive

confessado este fato em razões de recurso em sentido estrito, apegaram-se a um

mero formalismo, consistente na falta de assinatura do respectivo termo de coleta,

para passarem a negar, de forma veemente, inclusive em Plenário durante este

julgamento, terem fornecido aquelas amostras de sangue, o que acabou sendo

afastado posteriormente, após nova coleta de material genético dos mesmos para

comparação com o restante daquele material que ainda estava preservado no

Instituto de Criminalística.

Por todas essas razões, ficam mantidas as prisões preventivas dos réus que haviam

sido decretadas anteriormente por este Juízo, negando-lhes assim o direito de

recorrerem em liberdade da presente decisão condenatória.

DECISÃO.

9. Isto posto, por força de deliberação proferida pelo Conselho de Sentença que

JULGOU PROCEDENTE a acusação formulada na pronúncia contra os réus

ALEXANDRE ALVES NARDONI e ANNA CAROLINA TROTTA PEIXOTO JATOBÁ,

ambos qualificados nos autos, condeno-os às seguintes penas:

a) co-réu ALEXANDRE ALVES NARDONI:

- pena de 31 (trinta e um) anos, 01 (um) mês e 10 (dez) dias de reclusão, pela

prática do crime de homicídio contra pessoa menor de 14 anos, triplamente

qualificado, agravado ainda pelo fato do delito ter sido praticado por ele contra

descendente, tal como previsto no art. 121, parágrafo segundo, incisos III, IV e V c.c.

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o parágrafo quarto, parte final, art. 13, parágrafo segundo, alínea "a" (com relação à

asfixia) e arts. 61, inciso II, alínea "e", segunda figura e 29 todos do Código Penal, a

ser cumprida inicialmente em regime prisional FECHADO, sem direito a "sursis";

- pena de 08 (oito) meses de detenção, pela prática do crime de fraude processual

qualificada, tal como previsto no art. 347, parágrafo único do Código Penal, a ser

cumprida inicialmente em regime prisional SEMIABERTO, sem direito a "sursis" e 24

(vinte e quatro) dias-multa, em seu valor unitário mínimo.

B) co-ré ANNA CAROLINA TROTTA PEIXOTO JATOBÁ:

- pena de 26 (vinte e seis) anos e 08 (oito) meses de reclusão, pela prática do crime

de homicídio contra pessoa menor de 14 anos, triplamente qualificado, tal como

previsto no art. 121, parágrafo segundo, incisos III, IV e V c.c. o parágrafo quarto,

parte final e art. 29, todos do Código Penal, a ser cumprida inicialmente em regime

prisional FECHADO, sem direito a "sursis";

- pena de 08 (oito) meses de detenção, pela prática do crime de fraude processual

qualificada, tal como previsto no art. 347, parágrafo único do Código Penal, a ser

cumprida inicialmente em regime prisional SEMI-ABERTO, sem direito a "sursis" e

24 (vinte e quatro) dias-multa, em seu valor unitário mínimo.

10. Após o trânsito em julgado, feitas as devidas anotações e comunicações,

lancem-se os nomes dos réus no livro Rol dos Culpados, devendo ser

recomendados, desde logo, nas prisões em que se encontram recolhidos, posto que

lhes foi negado o direito de recorrerem em liberdade da presente decisão.

11. Esta sentença é lida em público, às portas abertas, na presença dos réus, dos

Srs. Jurados e das partes, saindo os presentes intimados.

Plenário II do 2º Tribunal do Júri da Capital, às 00:20 horas, do dia 27 de março de

2.010.

Registre-se e cumpra-se.

MAURÍCIO FOSSEN

Juiz de Direito