revista debates 17

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  • 7/21/2019 Revista Debates 17

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    1Set/Out 2013 - revista debates empsiquiatria

    Publicao destinada exclusivamente aos mdicos w w w . a b p . o r g . b

    Ano 3 n5 Set/Out 2013ISSN 2236-918X

    REVISTA DEBATES EM

    ARTIGOSTranstorno Disfrico Pr-Menstrual: um breve panorama

    Estimulao transcraniana por corrente contnua (ETCC)em Psiquiatria: reviso da literatura

    Moradias assistidas para pacientesdependentes quimicos: realidade ou utopia?

    Induo de episdio manaco com sintomas psicticos durantetratamento para depresso maior com

    Estimulao Magntica Transcraniana de repetio:relato de caso e possveis fatores de risco

    Transtornos do Humor e Sistema Nervoso Autnomo:Um Modelo de Interao

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    3Set/Out 2013 - revista debates empsiquiatria

    ARDP continua a srie de artigos sobre a psiquiatria e sade mental feminina comuma reviso sobre o transtorno disfrico pr-menstrual, de Renata Demarque, JoelRenn Jr e colaboradores. Enquanto muitas mulheres em idade reprodutiva sofremem algum grau de sintomas pr-menstruais, somente uma pequena porcentagem tem aforma mais grave, que causa acentuado prejuzo na vida da mulher e daqueles com quem

    convive. importante para o psiquiatra reconhecer e tratar este transtorno.Pedro Shiozawa nos traz uma oportuna reviso sobre estimulao transcraniana porcorrente contnua (ECC), uma nova proposta teraputica para o tratamento de vriostranstornos psiquitricos, tendo como principal indicao a depresso e esquizofrenia, comresultados bastante promissores. O autor apresenta tambm a ECC como uma abordagemque pode auxiliar na diminuio de sinais e sintomas de abstinncia de drogas. A tcnica daECC tambm brevemente revista.

    A psiquiatria social contemplada aqui com uma discusso sobre a assistncia a dependentesde lcool e drogas com histrias de abandono, encarceramento, e falta de apoio social paraa vida em sobriedade, fatores que os tornam vulnerveis recada. Alessandra Diehl eRonaldo Laranjeira nos oferecem uma anlise sobre as moradias assistidas para pacientes

    dependentes qumicos, que tm como objetivo promover um servio de cuidadosposteriores a dependentes qumicos que no necessitam seguir institucionalizadas, masque se beneficiariam de uma estrutura com maior suporte de tratamento. Os autoresconsideram esse modelo um importante recurso teraputico a ser somado aos meios jexistentes para o tratamento da dependncia de lcool e outras drogas.

    A sesso de relatos de caso da RDP vem prestando um servio de atualizao clnica muitoapreciada pelos nossos leitores. Neste nmero Guilherme Abdo relata um caso de induode episdio manaco com sintomas psicticos durante tratamento para depresso maiorcom estimulao magntica transcraniana de repetio. Ele nos chama a ateno parapossveis fatores de risco.

    Finalmente, uma breve e instigante reviso sobre a participao do sistema nervoso autnomo

    nos transtornos do humor apresentada por Guilherme Wazen e Moacir Godoy, como ummodelo integrado do adoecimento mental. O assunto ainda no muito divulgado entreos psiquiatras nacionais, e apresenta o quadro clnico dos transtornos mentais como sendosignificativamente influenciado pela desregulao de sistemas de sinalizao e ativao defeedbacks compensatrios no organismo. Dessa maneira, os sintomas de humor se fazemacompanhar por um cortejo autonmico, endcrino, alteraes do ciclo sono/viglia querefletem tanto o estgio quanto a progresso da doena, assim como as caractersticasindividuais peculiares, que conferem a heterogeneidade apresentao clnica.

    Os editores

    ////////////// EDITORIALOPINIO

    ANTNIO GERALDO DA SILVA

    EDITOR

    JOO ROMILDO BUENO

    EDITOR

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    4 revista debates empsiquiatria- Set/Out 2013

    DIRETORIA EXECUTIVA

    Presidente:Antnio Geraldo da Silva - DF

    Vice-Presidente:Itiro Shirakawa - SP

    1 Secretrio:Luiz Illafont Coronel - RS

    2 Secretrio:Mauricio Leo - MG

    1 Tesoureiro:Joo Romildo Bueno - RJ

    2 Tesoureiro:Alfredo Minervino - PB

    SECRETRIOS REGIONAIS

    Norte: Paulo Leo - PANordeste:Jos Hamilton Maciel Silva Filho - SECentro-Oeste: Salomo Rodrigues Filho - GO

    Sudeste:Marcos Alexandre Gebara Muraro - RJSul:Cludio Meneghello Martins - RS

    CONSELHO FISCAL

    Titulares:Emmanuel Fortes - ALFrancisco Assumpo Jnior - SPHelio Lauar de Barros - MG

    Suplentes:Geder Ghros - SC

    Fausto Amarante - ESSrgio amai - SP

    ABP - Rio de JaneiroSecretaria Geral e Tesouraria

    Av. Rio Branco, 257 13 andar salas 1310/15 CentroCEP: 20040-009 Rio de Janeiro - RJ

    elefax: (21) 2199.7500Rio de Janeiro - RJ

    E-mail: [email protected]: [email protected]

    //////////// EXPEDIENTEEDITORES

    Antnio Geraldo da SilvaJoo Romildo Bueno

    EDITORES ASSOCIADOS

    Itiro ShirakawaAlfredo MinervinoLuiz Carlos Illafont CoronelMaurcio LeoFernando Portela Camara

    CONSELHO EDITORIAL

    Almir Ribeiro avares Jnior - MGAna Gabriela Hounie - SPAnalice de Paula Gigliotti - RJCarlos Alberto Sampaio Martins de Barros - RSCarmita Helena Najjar Abdo - SPCssio Machado de Campos Bottino - SP

    Csar de Moraes - SPElias Abdalla Filho - DFrico de Castro e Costa - MGEugenio Horcio Grevet - RSFausto Amarante - ESFernando Portela Cmara - RJFlvio Roithmann - RSFrancisco Baptista Assumpo Junior - SPHelena Maria Calil - SPHumberto Corra da Silva Filho - MGIrismar Reis de Oliveira - BAJair Segal - RSJoo Luciano de Quevedo - SC

    Jos Alexandre de Souza Crippa - SPJos Cssio do Nascimento Pitta - SPJos Geraldo Vernet aborda - RSJosimar Mata de Farias Frana - ALMarco Antonio Marcolin - SPMarco Aurlio Romano Silva - MGMarcos Alexandre Gebara Muraro - RJMaria Alice de Vilhena oledo - DFMaria Dilma Alves eodoro - DFMaria avares Cavalcanti - RJMrio Francisco Pereira Juruena - SPPaulo Belmonte de Abreu - RSPaulo Cesar Geraldes - RJ

    Sergio amai - SPValentim Gentil Filho - SPValria Barreto Novais e Souza - CEWilliam Azevedo Dunningham - BA

    CONSELHO EDITORIAL INTERNACIONAL

    Antonio Pacheco Palha (Portugal), Marcos eixeira (Portugal), Jos Manuel Jara(Portugal), Pedro Varandas (Portugal), Pio de Abreu (Portugal), Maria LuizaFigueira (Portugal), Julio Bobes Garcia (Espanha), Jernimo Siz Ruiz (Espanha),Celso Arango Lpez (Espanha), Manuel Martins (Espanha), Giorgio Racagni(Italia), Dinesh Bhugra (Londres), Edgard Belfort (Venezuela)

    Jornalista Responsvel:Lucia Fernandes

    Projeto Grfico, Editorao Eletrnica e Ilustrao:Lavinia GesProduo Editorial: Luan ComunicaoImpresso: Grfica Editora Pallotti

    mailto:[email protected]:[email protected]
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    5Set/Out 2013 - revista debates empsiquiatria

    //////////////////// NDICESET/OUT 2013

    6/artigoTranstorno Disfrico Pr-Menstrual:

    um breve panoramapor RENATA DEMARQUE, JOEL RENN JR, HEWDY LOBO

    RIBEIRO, JULIANA PIRES CAVALSAN, RENAN ROCHA,AMAURY CANTILINO, JERNIMO DE ALMEIDA MENDES

    RIBEIRO, GISLENE VALADARES,ANTONIO GERALDO DA SILVA

    14/artigoEstimulao transcraniana por corrente contnua(ETCC) em Psiquiatria: reviso da literaturapor PEDRO SHIOZAWA, CAROLINA MARAL,

    MAILU ENOKIBARA DA SILVA, MARIANA MONTEIROSALDANHA ALTENFELDER SANTOS, FERNANDA XAVIER

    PIOVESAN, ADA PELLEGRINELLI,ANDR RUSSOWSKY BRUNONI, QUIRINO CORDEIRO

    20/artigoMoradias assistidas para pacientesdependentes qumicos: realidade ou utopia?

    por ALESSANDRA DIEHL eRONALDO LARANJEIRA

    28/relatoInduo de episdio manaco com sintomas psicticos

    durante tratamento para depresso maior comEstimulao Magntica Transcraniana de repetio:

    relato de caso e possveis fatores de riscopor GUILHERME LOZI ABDO, LUCIANA

    SARIN, MARCO AURLIO ANDRADE,MARINA O. ROSA, JOS ALBERTO DEL PORTO e MOACYRALEXANDRO ROSA

    32/comunicao breveTranstornos do Humor e Sistema

    Nervoso Autnomo: Um Modelo de Interaopor GUILHERME LUIZ LOPES WAZEN,

    MOACIR FERNANDES DE GODOY

    * As opinies dos autores so de exclusiva responsabilidade dos

    mesmos

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    6 revista debates empsiquiatria- Set/Out 2013

    TRANSTORNO DISFRICO PR-MENSTRUAL:UM BREVE PANORAMAPREMENSTRUAL DYSPHORIC DISORDER:BRIEF REVIEW

    ResumoEnquanto muitas mulheres em idade reprodutiva sofrem emalgum grau de sintomas pr-menstruais, usualmente envolvendomudanas de humor e queixas somticas, somente uma pequena

    porcentagem tem a forma mais severa, conhecida como transtor-no disfrico pr-menstrual, que causa acentuado prejuzo na vidadesta mulher e, consequentemente, na vida das pessoas com quemconvive.

    Ajudar o clnico a melhor reconhecer, entender e tratar este trans-torno o objetivo deste artigo.

    Palavras-chave:transtorno disfrico pr-menstrual, serotonina,fisiopatologia

    AbstractWhile most women of reproductive age suffer from some degree

    of premenstrual symptoms, usually involving mood changes andsomatic complains, only a small percentage have the more seve-re form, known as premenstrual dysphoric disorder, which causesmarked impairment in the patients life and in the life of her family.

    Tis paper will help the clinician to recognize, understand andtreat this disorder.

    Keywords: premenstrual dysphoric disorder, serotonin, patho-physiology

    ARTIGO DE REVISO

    INTRODUO

    Em Dezembro de 2012, a Associao Psiquitrica America-na aprovou a 5 edio do Manual Diagnstico e Estatsti-co de ranstornos Mentais (DSM-V). A partir de ento, fezhistria a respeito da Sade Mental da Mulher, movendo

    o ranstorno Disfrico Pr-Menstrual (DPM) do DSM-IV R Apndice B (Conjuntos de Critrios e Eixos Propostos para EstudosAdicionais) para a categoria de ranstornos Depressivos no DSM--V1.

    Desde o tempo de Hipcrates, mdicos, filsofos e cientistas jdescreviam a relao entre menstruao, crebro e comportamen-

    to. Entretanto, sempre houve grande dificuldade em delimitar oDPM numa categoria do DSM, devido ao medo de patologizarsintomas fsicos e psquicos pr-menstruais normais experimenta-dos pela maioria das mulheres em alguma fase da vida reprodutivaou at mesmo sugerir que todas so comprometidas pelo ciclomenstrual1.

    Por muitos sculos, a menstruao teve uma conotao extre-mamente negativa na vida das mulheres: havia um senso comumde que elas eram mais instveis e incompetentes, resultando emexcluso de importantes oportunidades na educao, empregos eposies de influncia2.

    O perodo pr-menstrual um momento de vulnerabilidade

    para o aparecimento de sintomas fsicos e psquicos, o que nosignifica que o gnero feminino seja menos competente e capazque o masculino. Segundo a estimativa de pesquisas epidemiol-gicas, em torno de 75% das mulheres em idade reprodutiva experi-mentam alguns sintomas atribudos fase pr-menstrual do ciclo,mas a maioria destas mulheres capaz de administr-los atravsde mudanas no estilo de vida e terapias conservadoras, diferen-temente do DPM3.

    O DPM apresenta prevalncia de 2 a 8% e, embora possamexistir os sintomas fsicos, as queixas psquicas so mais relevantes,

    por RENATA DEMARQUE1, JOEL RENN JR2, HEWDY LOBORIBEIRO3, JULIANA PIRES CAVALSAN4, RENAN ROCHA5,AMAURY CANTILINO6, JERNIMO DE ALMEIDA MENDESRIBEIRO7, GISLENE VALADARES8, ANTONIO GERALDO DASILVA9

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    7Set/Out 2013 - revista debates empsiquiatria

    RENATA DEMARQUE1, JOEL RENN JR2, HEWDY LOBO RIBEIRO3

    1 Psiquiatra do Programa de Sade Mental da Mulher (ProMulher) do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clnicas daUniversidade de So Paulo (USP), So Paulo.

    2 Mdico Psiquiatra. Diretor do Programa de Sade Mental da Mulher (ProMulher) do Instituto de Psiquiatria do Hospital dasClnicas da Universidade de So Paulo (USP), So Paulo. Doutor em Psiquiatria pela FMUSP. Membro fundador da International

    Association for Womens Mental Health. Mdico do Corpo Clnico do Hospital Israeli ta Alber t Einstein SP.3 Psiquiatra Forense, Psicogeriatra e Psicoterapeuta pela Associao Brasileira de Psiquiatria. Psiquiatra do ProMulher do

    Instituto de Psiquiatria da USP.

    causando graves prejuzos na vida destas mulheres4,5. Perante talprevalncia estatstica, fato que o DPM acomete uma minoria e inapropriado generalizar que todas as mulheres so comprome-tidas pelo ciclo menstrual6.

    DPM incluso nesta nova categoria do DSM-V um avanopara a Sade Mental da Mulher e trar benefcios, como maiorcredibilidade s mulheres que possuem o diagnstico, possibili-dade de melhores cuidados clnicos, pesquisas mais confiveis equem sabe, maior aprovao de medicamentos pela Food andDrug Administration Neuropharmacology Advisory Comittee6.

    TDPM: um diagnstico de excluso

    Diagnosticar DPM no uma tarefa fcil, pois os critrios soabrangentes e no h exames laboratoriais ou fsicos que sejamconfirmatrios7,8,9. rata-se de um diagnstico realizado atravsde uma completa anamnese, exame fsico e excluso de outrascausas9. Descartar que a paciente no esteja apresentando apenasuma exacerbao de doena clnica ou de um transtorno psiqui-trico preexistente determinante para que o adequado diagns-tico seja feito2,9.

    O DPM acomete mulheres no perodo reprodutivo, geralmen-te entre 25 e 35 anos, e se caracteriza pela recorrncia cclica, du-rante a fase ltea, de sintomas somticos, comportamentais e dehumor em primeira instncia, sendo ansiedade, labilidade afetiva,sintomas depressivos, tenso, irritabilidade, ira, distrbios do apeti-te e do sono os mais frequentes3,10. Esto relacionados diretamentes fases do ciclo pr-menstrual e podem durar, tipicamente, decinco a quinze dias. Em geral, pioram com a proximidade da mens-truao e cessam de forma imediata ou logo a seguir ao incio dofluxo menstrual2,3,10.

    Para o diagnstico, os sintomas devem estar presentes duran-te a maioria dos ciclos menstruais no ltimo ano e ser severo o

    suficiente para causar impacto no funcionamento dirio na vidadesta mulher. O preenchimento de dirios prospectivos, por pelomenos dois ciclos menstruais consecutivos, muito utilizado e degrande valia4.

    Os sintomas so to severos que no se restringem relao doindivduo consigo mesmo, mas por refletirem tambm no relacio-namento interpessoal e complexo da sociedade, seja promovendodeteriorao transitria nos contatos familiares, seja predispondoao nmero de incidncia de delitos, acidentes e baixa produtivida-de no trabalho11.

    TDPM: uma entidade clnica nica?

    Ainda existem questionamentos sobre o diagnstico do DPMcomo uma entidade clnica distinta de outros transtornos de hu-mor e de transtornos ansiosos12,13. Isso porque, alm de ser alta ataxa de comorbidade entre o DPM e outros transtornos psiqui-tricos, ele apresenta muitos sintomas tambm presentes no epi-sdio depressivo maior, transtorno afetivo bipolar e transtornosansiosos13. Vide abela 1

    Indicativos de Transtorno Disfrico Pr-menstrualcomo entidade clnica nica

    Incio e alvio dos sintomas esto intimamente ligados fase ltea do ciclo

    menstrual

    Componente gentico do DPM parece ser distinto de outros transtornos de

    humor

    Sintomas desaparecem com a cessao do funcionamento ovariano normal

    Maior especificidade por medicaes que agem no sistema serotoninrgico e

    rpido incio de resposta ao tratamento

    Eficcia teraputica mesmo com administrao intermitente da medicao

    Resposta com doses baixas e rpida recorrncia dos sintomas na interrupo

    do tratamento

    abela 1. Renn Jr e Demarque (2012)13

    ETIOPATOGENIA: multifatorial

    1. Hormnios e Neurotransmissores

    Hormnios: por uma sensibilidade cerebral s flutuaes hor-

    monais normais presentes no ciclo menstrual, algumas mulheresesto mais sujeitas a alteraes de humor no perodo pr-menstru-al14. Estas mulheres, mesmo com nveis adequados dos hormniosgonadais, teriam maior propenso a alteraes no sistema nervosocentral, principalmente na via serotoninrgica. Investigaes a res-peito da neuromodulao central pelos hormnios gonadais sobreos neurotransmissores e os sistemas circadianos que influenciamo humor, o comportamento e a cognio esto sendo realizadaspara maior elucidao desse processo.

    A funo ovariana um dos fatores biolgicos de grande re-levncia neste transtorno, uma vez que a disforia pr-menstrual

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    por RENATA DEMARQUE1, JOEL RENN JR2, HEWDYLOBO RIBEIRO3, JULIANA PIRES CAVALSAN4, RENANROCHA5, AMAURY CANTILINO6, JERNIMO DE ALMEIDAMENDES RIBEIRO7, GISLENE VALADARES8, ANTONIOGERALDO DA SILVA9

    ARTIGO DE REVISO

    no acontece na puberdade, na menopausa e nos casos de oofo-rectomia bilateral. Desde 1980 o fator responsvel por provocaros sintomas pr-menstruais tem sido atribudo progesteronaproduzida pelo corpo lteo15. Parece haver uma relao entre asconcentraes sricas de alopregnanolona (metablito ativo cen-tral da progesterona) e a gravidade dos sintomas pr-menstruais,porm pode ser apenas que mulheres com DPM sejam mais sen-sveis alopregnanolona, independente dos seus nveis sanguneosabsolutos2.

    Flutuaes de estrognio e progesterona causam efeitos impor-

    tantes na neurotransmisso do sistema nervoso central, especifica-mente nas vias serotonrgicas, noradrenrgicas e dopaminrgicas.No hipotlamo, o estrognio induz uma flutuao diria dos nveisde serotonina, enquanto que a progesterona aumenta seu meta-bolismo.

    H pouca evidncia consistente sobre o envolvimento de outrosfatores endcrinos, incluindo hormnios tireoidianos, testostero-na, cortisol, prolactina, melatonina, aldosterona e endorfinas2,15.

    Serotonina:dados recentes16 sugerem que as mulheres comtranstornos de humor no perodo pr-menstrual possuem nveisde serotonina diminudos, que podem estar associados aos sinto-

    mas de irritabilidade, humor deprimido, impulsividade e nuseas17

    .A resposta efetiva dos inibidores seletivos da recaptao da se-rotonina (ISRS) tambm uma forte evidncia do envolvimentodesse neurotransmissor. Cerca de 60% das pacientes com DPMrespondem ao tratamento com ISRS, logo, a serotonina de manei-ra isolada no a nica varivel etiolgica em todas as pacientes9,12.

    Estudos mostram uma possvel alterao da sensibilidade doreceptor 5H1A em mulheres com disforia pr-menstrual18. Entre-tanto, as evidncias apontam para mecanismos mltiplos envolvi-dos nesse transtorno. Diversos sintomas assemelham-se no ape-nas a quadros depressivos, mas tambm a quadros compulsivos eat mesmo psicticos.

    cido Gama Amino-Butrico (GABA): o principal neu-rotransmissor inibitrio na patognese da DPM, no entanto, aimportncia e influncia do GABA ainda indefinida. Estudos en-contraram nveis plasmticos de GABA reduzidos durante a faseltea em mulheres com DPM9.

    2. Circuitaria cerebralSegundo Berman et al19, DPM parece estar associado com uma

    diminuio da perda de substncia cinzenta cerebelar com a ida-de. Apesar de este mecanismo ser incerto, o efeito acumulado de

    sintomas cerebelares pode estar envolvido.Segundo Baller et al4, a memria de trabalho anormal em pa-

    cientes com DPM, principalmente por ativao do crtex dorso-lateral pr-frontal, est relacionada gravidade do transtorno, aossintomas, idade de incio e impacto da doena. Estes resultadoscorroboram a teoria de que disfuno do crtex dorsolateral pr--frontal representa fator de risco para DPM.

    3. Alteraes genticasH evidncias de que o DPM seja um transtorno hereditrio 9,

    logo, a pesquisa por genes pode ser importante para o melhorentendimento da sua fisiopatologia. Steiner et al18 identificaramrelao entre polimorfismo do gene transportador de serotoninae severidade dos sintomas no DPM, enquanto Huo et al20 identi-ficaram variao do alelo em ESR1, um gene do receptor alfa estr-geno em mulheres com DPM.

    4. Fatores ambientais e socioculturaisCausas ambientais podem estar relacionadas DPM, entre

    elas, ressalta-se o papel da dieta. Alguns alimentos parecem terimplicao no desenvolvimento dos sintomas, como chocolate,cafena, sucos de frutas e lcool. As deficincias de vitamina B6 e

    de magnsio tambm so consideradas. Porm, at o momento, opapel desses nutrientes na causa ou no tratamento no foi devi-damente confirmado11.

    De uma perspectiva psicolgica, mulheres com sintomas pr--menstruais possuem estratgias menos eficazes para lidar com oestresse. De uma perspectiva biolgica, foram encontradas respos-tas desreguladas cardiovasculares e neuroendcrinas a estressoreslaboratoriais em mulheres com DPM2,12.

    OPES DE TRATAMENTO

    At o momento, nenhuma interveno especfica foi efetivapara tratar todas as pacientes, mas muitas opes esto dispon-veis9.

    O DPM tem etiologias biolgicas e psicossociais mltiplas, eseu tratamento dever refletir a severidade dos sintomas e preju-zos apresentados. Na maioria das vezes, o envolvimento de umaequipe multidisciplinar integrada poder ser necessrio2.

    A paciente dever entender o processo pelo qual est passandoe, conforme os sinais e sintomas predominantes, algumas medidasgerais podero ser teis para aliviar os quadros moderados, comoa atividade fsica e a prtica de esportes e de atividades relaxantes11.

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    A maioria dos estudos sistemticos tem avaliado a eliminaodas flutuaes hormonais e supresso da ovulao ou a correoda desregulao dos neurotransmissores com medicamentos anti-depressivos ou ansiolticos11.

    1. Tratamento HormonalPlula Anticoncepcional OralSegundo Vigod e colaboradores2, a associao de etinilestradiol

    (0,02mg) com drospirenona (3mg) administrada diariamente por24 dias, com intervalo de 4 dias, somente deve ser feita em mulhe-

    res com DPM que desejam anticoncepo, pois h riscos, comotrombose venosa profunda, embolia pulmonar e hipertenso ar-terial13.

    GnRHUma forma de supresso da ovulao o uso de agonistas do

    GnRH, que tem ao de downregulationsobre os receptores deGnRH no hipotlamo, levando diminuio da produo de FSHe LH pela glndula pituitria, resultando em nveis diminudos deestrognio e progesterona11. Por levar a uma menopausa farmaco-lgica, GnRH agonistas so reservados para pacientes com sinto-mas severos que no responderam a outros tratamentos. Com a

    menopausa-like, a paciente poder apresentar sintomas fsicos epsquicos deste perodo9.

    Estes frmacos so menos eficazes nas alteraes do humor doque nos sintomas fsicos. Alm disso, esto associados a risco decardiotoxicidade e osteoporose2,11,13.

    2. PsicofrmacosAlgumas mulheres no respondem a tratamentos no farma-

    colgicos e outras tm indicao imediata de tratamento medi-camentoso, devido gravidade do quadro. Medicaes serotoni-nrgicas, especificamente inibidores seletivos da recaptao daserotonina, tornaram-se o principal tratamento com estabelecida

    segurana e eficcia2.At o momento, apenas trs psicofrmacos foram aprovados

    pela Food and Drug Administration (FDA) para o tratamento doDPM: a Fluoxetina, a Sertralina e a Paroxetina. Estes medicamen-tos, todos ISRS, tiveram seu uso aprovado tanto para uso contnuocomo intermitente2,5,11.

    A dose de Fluoxetina utilizada na maioria dos trabalhos foi de20mg/dia, podendo variar at 60mg/dia. No entanto, dosagensmaiores provocaram maior ndice de abandono do tratamentoem virtude dos efeitos colaterais13.

    Segundo Halbreich e colaboradores, em estudo duplo cego

    randomizado, a sertralina atuou melhor nos sintomas psquicose comportamentais do que nos fsicos. Sua posologia varia entre50 a 200mg/dia. A Paroxetina tem sido usada com uma dosageminicial de 12,5mg/dia5.

    ambm h evidncias de efetividade com o uso de fluvoxami-na, citalopram, clomipramina, venlafaxina e duloxetina.

    3. Psicoeducao e tratamentos comportamentaisGrupos de psicoeducao tm ajudado no melhor entendimen-

    to e aceitao da menstruao, mas no tm alterado o resultado

    final do tratamento2

    .Atravs de uma reviso sistemtica, Lustky et al21avaliaram a efi-ccia da terapia cognitivo comportamental no DPM. Concluramque, apesar da terapia cognitiva comportamental oferecer algumbenefcio, a magnitude dos efeitos muito menor quando compa-rada com psicofrmacos e tcnicas de relaxamento2.

    4. Vitaminas e Mineraisentativas de associar deficincias de vitaminas e minerais ao

    DPM tm sido inconclusivas. Nveis normais de magnsio sricoe vitaminas A, B6 e E tm sido observados9.

    Existem algumas evidncias de que a vitamina E possa modular

    a produo das prostaglandinas. Sua suplementao bloquearia adiminuio do cido gama-linolico, reduzindo sintomas doloro-sos. Entretanto, segundo Chuong e Dawson22, no existe diferenaentre o placebo e a vitamina E.

    Nveis sricos de Clcio podem estar diminudos na fase pr--menstrual2.

    CONSIDERAES FINAIS

    O sofrimento e os prejuzos apresentados pelas pacientes comDPM justificam a importncia de se poder fazer um diagnsti-

    co preciso e que indique o tratamento mais adequado para cadamulher.

    As investigaes a respeito da fisiopatologia parecem corrobo-rar as teorias de sensibilidade e desregulao do sistema serotoni-nrgico a partir de flutuaes dos hormnios sexuais. A inibiodestas flutuaes e o aumento da disponibilidade de serotonina nafenda sinptica parecem ser os tratamentos mais efetivos.

    JULIANA PIRES CAVALSAN4, RENAN ROCHA5, AMAURY CANTILINO6

    4 Psiquiatra do Programa de Sade Mental da Mulher (ProMulher) do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clnicas daUniversidade de So Paulo (USP), So Paulo.

    5 Mdico Psiquiatra. Coordenador do Servio de Sade Mental da Mulher das Clnicas Integradas da Universidade do Ex tremoSul Catarinense (UNESC).

    6 Diretor do Programa de Sade Mental da Mulher da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE). Professor Adjunto doDepartamento de Neuropsiquiatria da UFPE.

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    ARTIGO DE REVISOpor RENATA DEMARQUE1, JOEL RENN JR2, HEWDYLOBO RIBEIRO3, JULIANA PIRES CAVALSAN4, RENANROCHA5, AMAURY CANTILINO6, JERNIMO DE ALMEIDAMENDES RIBEIRO7, GISLENE VALADARES8, ANTONIOGERALDO DA SILVA9

    Referncias

    1. Epperson CN. Premenstrual Dysphoric Disorder andthe Brain. Am J Psychiatry. March 2013; 170: 248-252.

    2. Vigod SN, Frey BN, Soares CN, Steiner M. Approach toPremenstrual Dysphoria for the Mental Health Practitio-ner. Psychiatr Clin North Am. 2010; 33: 257-72.

    3. Carvalho VCP, Cantilino A, Carreiro NMP, S LF, SougeyEB. Repercusses do transtorno disfrico pr-menstrualentre universitrias. Rev. Psiquiatr RS. 2009; 31 : 105-111.

    4. Baller EB, Wei SM, Kohn PD, Rubinow DR, Alarcon G,Schmidt PJ, Berman KF. Abnormalities of dorsolateralprefrontal function in women with premenstrual dys-

    AgradecimentosAgradecemos Associao Brasileira de Psiquiatria pelo apoio eesforos empregados na divulgao da Sade Mental da Mulher.

    Correspondncia:Joel Renn Jr

    Rua eodoro Sampaio, 352 conj 127CEP 05406-000 So Paulo SP

    [email protected]

    Recomendao de leitura complementar:Renn Jr J, Ribeiro HL. ratado de Sade Mental da Mulher. SoPaulo, Atheneu, 2012.

    No h conflitos de interesseFonte de Financiamento Inexistente

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    7 Mdico Psiquiatra. Especialista em Psiquiatria pela Associao Brasileira de Psiquiatria. Pesquisador do Grupo de Psiquiatria ranstornos Relacionados ao Puerprio, pela Universidade Federal de Cincias da Sade de Porto Alegre (UFCSPA). Professor

    Associado do Centro de Estudos Jos de Barros Falco (CEJBF). 8 Mdica Psiquiatra pela Associao Brasileira de Psiquiatria.Mestre em Farmacologia e Bioqumica Molecular. Membro fundador do Servio de Sade Mental da Mulher do HC-UFMG, do

    Ambulatrio de Acolhimento e ratamento de Famlias Incestuosas (AMEFI, HC-UFMG), da Seo de Sade Mental da Mulherda WPA e da International Association of Womens Mental Health.9Psiquiatra. Especialista em Psiquiatria e Psiquiatria Forense

    pela ABP-AMB- CFM. Doutoramento em Biotica pela Universidade do Por to CFM. Psiquiatra da Secretaria de Sade doDistrito Federal SES-DF. Diretor Cientfico do PROPSIQ. Presidente da ABP-2010/2013.

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    ARTIGO DE REVISOpor PEDRO SHIOZAWA1, CAROLINA MARAL1,MAILU ENOKIBARA DA SILVA1, MARIANA MONTEIROSALDANHA ALTENFELDER SANTOS1, FERNANDA XAVIERPIOVESAN1, ADA PELLEGRINELLI1,ANDR RUSSOWSKY BRUNONI2, QUIRINO CORDEIRO1

    ResumoA estimulao transcraniana por corrente contnua (ECC) uma nova proposta teraputica em rpido desenvolvimento nosltimos anos, parecendo ser uma tcnica promissora para o tra-tamento de vrios transtornos psiquitricos. Esta consiste na apli-cao de uma corrente eltrica direta no crebro, que flui entredois eletrodos relativamente grandes (ctodo e nodo). Durantea ECC, uma corrente eltrica de baixa intensidade aplicadaatravs do couro cabeludo, penetrando no crnio e chegando aocrtex cerebral e podendo modificar o potencial de repouso damembrana neuronal, e, por conseguinte, modulando a taxa dedisparo neuronal. O maior nmero de estudos tem se concentra-

    do no tratamento da depresso e esquizofrenia, com resultadosbastante promissores. No caso do uso de drogas, a ECC tambmparece ser uma abordagem que pode auxiliar na diminuio desinais e sintomas de abstinncia. Em outras situaes, a ECC apa-rece ainda com resultados preliminares. Assim, o presente artigoconsiste em reviso sistemtica da literatura sobre o uso da ECCpara o tratamento dos transtornos psiquitricos.

    Palavras-chave: terapia por estimulao eltrica/mtodos, psi-quiatria, depresso, doena de Alzheimer, tabagismo

    Summaryranscranial direct current stimulation (tDCS) is a new thera-

    peutic approach for the treatment of various psychiatric disorders.Tis consists in applying on the brain a direct electric current thatflows between two relatively large electrodes (cathode and ano-de). During tDCS, an electric current of low intensity is applied bypenetrating the scalp and skull reaching the cerebral cortex andmay modify the resting membrane potential of neurons, and the-refore modulate neuronal firing rate. Te largest number of studieshas focused on the treatment of depression and schizophrenia,with very promising results. In the case of drug use, tDCS also se-ems to be an approach that can help to reduce the craving. Inother situations, tDCS presents still very preliminary results. Tus

    ESTIMULAO TRANSCRANIANA POR CORRENTE CONTNUA(ETCC) EM PSIQUIATRIA: REVISO DA LITERATURA

    TRANSCRANIAL DIRECT CURRENT STIMULATION (TDCS) INPSYCHIATRY: LITERATURE REVIEW

    this article is to systematically review the literature on the use oftDCS for psychiatric disorders.Keywords: electric stimulation therapy/methods, psychiatry,

    depression, Alzheimers disease, nicotine dependence

    1. Introduo

    A

    estimulao transcraniana por corrente contnua(ECC) consiste na aplicao de uma corrente eltri-ca direta de fraca intensidade no crtex cerebral, pormeio de dois eletrodos (ctodo e nodo), relativamen-

    te grandes, com ao menos um deles posicionado na superfciecraniana. A corrente que chega ao crebro no induz potencial deao, mas modula a atividade neuronal de uma forma polaridade--dependente por modificar o potencial de repouso da membrananeuronal. De modo geral, a estimulao andica aumenta a excita-bilidade cortical, enquanto a estimulao catdica diminui, no en-tanto a direo da polarizao depende da orientao dos axniose dendritos do campo eltrico induzido. Embora a polarizao sejamais intensa nas reas adjacentes aos eletrodos, os efeitos funcio-nais do ECC podem se estender para alm das reas cerebraisestimuladas, atravs de conexes entre distintas redes neuronais[1] [2] [3].

    Dentre as tcnicas de neuromodulao no invasivas, a ECCest entre as mais simples, necessitando apenas de um aparelhogerador bateria capaz de produzir uma corrente eltrica de fluxoconstante de at 2mA. O aparelho ligado a dois eletrodos posi-cionados em esponjas (de geralmente 35cm) banhadas em solu-o salina. Os eletrodos so posicionados sobre o couro cabeludo,atravs de uma faixa de borracha. Por sua simplicidade tcnica, aECC possui baixo custo, um atrativo para locais com menos re-cursos, aps sua eventual aprovao para o uso clnico [3].

    A variao dos parmetros da ECC pode induzir diferentes efei-tos fisiolgicos ou adversos. Dentre os fatores que precisam ser de-

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    PEDRO SHIOZAWA1, CAROLINA MARAL1, MAILU ENOKIBARA DA SILVA1,MARIANA MONTEIRO SALDANHA ALTENFELDER SANTOS1, FERNANDA XAVIER PIOVESAN1,

    ADA PELLEGRINELLI1, QUIRINO CORDEIRO1

    1Laboratrio de Neuromodulao Clnica, Centro de Ateno Integrada Sade Mental (CAISM) daIrmandade da Santa Casa de Misericrdia de So Paulo

    finidos antes da estimulao encontram-se o tamanho e posicio-namento dos eletrodos, a intensidade e durao da estimulao,bem como o intervalo entre as sesses [4].

    A realizao de estudos placebo com tDCS so relativamentefceis, pois, com exceo de leve prurido local, raramente rela-tada alguma sensao relacionada ao tratamento [3]. Dessa for-ma, nos ltimos anos, numerosos estudos foram publicados comtDCS, demonstrando resultados clnicos positivos em transtornospsiquitricos e sobre a cognio [5] [6].

    2. Mtodo

    A presente reviso sistemtica foi realizada de acordo com osembasamentos do Cochrane group, de acordo com as recomen-daes do PRISMA Statement [7] .

    Reviso da LiteraturaFoi realizada reviso sistemtica da literatura, utilizando-se os

    bancos de dados do Medline e Embase. Foram utilizados comotermos de pesquisa: ranscranial stimulation OR tDCS ORBrain Polarization OR Electric Stimulation OR Electric Polari-

    zation OR non invasive brain stimulation OR NIBS OR trans-cranial magnetic stimulation OR tDCS OR MS. O perodo doestudo compreendeu da primeira data disponvel at 16/06/2013.

    Critrios de ElegibilidadeOs critrios de incluso dos artigos foram os seguintes: artigos

    originais, estudos pr-clnicos, estudos de interveno, cartas erelatos de casos escritos em ingls, espanhol e portugus. Comocritrios de excluso, adotaram-se: artigos de reviso, comentrios,bem como outras situaes que no aquelas de interveno tera-putica para os transtornos psiquitricos.

    Construto de ValidadeA fim de otimizar a anlise dos dados, os artigos selecionados

    contemplaram os seguintes quesitos: estudos em psiquiatria; inter-venes especficas (ECC).

    Coleta de dadosAps a seleo dos artigos, procedeu-se com a coleta de dados

    de modo sistemtico, atentando-se para: aspectos gerais (autor,ano, tipo de estudo), dados demogrficos (sujeitos, sexo, idademdia), dados tcnicos (variaes da tcnica) e aspectos clnicos(diagnstico, desfecho primrio e vises).

    3. Resultados

    ETCC em DepressoA justificativa para a utilizao de estratgias de neuromodu-

    lao no invasiva para a depresso baseada nas propriedadesdesta tcnica sobre a regulao da excitabilidade cortical. Na de-presso, h disfuno cortical em especial na poro dorso lateraldo crtex pr-frontal do hemisfrio cerebral esquerdo [8].

    Recentemente, diferentes ensaios clnicos abertos utilizaram ECCem sesses teraputicas dirias para o manejo de sintomas depressi-

    vos. eoricamente, a estimulao andica do crtex pr-frontal dor-so lateral esquerdo induziria efeitos excitatrios nesta rea cerebral,que estaria hipoativa em pacientes deprimidos [9] [10].

    Os resultados de diferentes ensaios clnicos so, no entanto,heterogneos. Atualmente, oito estudos clnicos, envolvendo umtotal de 259 pacientes, foram publicados na literatura. O primeiroensaio clnico randomizado com ECC para depresso foi realiza-do em 2006 [18], com resultados favorveis tcnica. No inciode 2012, Kalu e colaboradores [11] publicaram uma meta-anlisede sete ensaios clnicos randomizados sobre a eficcia da ECC nadepresso. Os autores observaram um tamanho de efeito clnica eestatisticamente significativo para a ECC ativa comparada com

    a simulada (g de Hedges de 0,743, IC 95% entre 0,21 a 1,27). Valenotar que todos os estudos clnicos randomizados conduzidos atesta meta-anlise eram fase II, sendo divergentes em alguns pa-rmetros, como o nmero total de sesses, posio do ctodo ecorrente.

    Mais recentemente, outro estudo, um ensaio clnico randomi-zado placebo controlado, fatorial com 120 pacientes deprimidos,demonstrou que a ECC ativa (1) superior interveno simula-da; (2) potencializa/ potencializada pelo antidepressivo sertralina,em associao e (3) to eficaz quanto a sertralina, quando ambasso comparadas em monoterapia. De maneira geral, os resultados(1) podem ser generalizados a contextos maiores, ou seja, a ECCativa superior ECC simulada, enquanto que os referidos resul-tados (2) abrem caminho para futuros estudos para explorar efei-tos sinrgicos de ECC com antidepressivos [12].

    Brunoni e colaboradores estudaram 31 pacientes hospitalizados,sendo 14 com depresso bipolar e 17 com depresso unipolar.odos os pacientes foram submetidos a protocolo especfico deECC com cinco sesses de 20 minutos de durao e estimulaoandica sobre o crtex pr-frontal dorso lateral esquerdo. Ambosos grupos apresentaram melhora dos sintomas depressivos, semefeitos adversos significativos e com manuteno da melhora aps

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    um ms de seguimento [13].As pesquisas sobre depresso com uso de ECC tm se mul-

    tiplicado e motivado diferentes grupos em ensaios mais amplosa fim de determinar a efetividade desta modalidade teraputicasobra a depresso, transtorno mental que impacta sobremaneirao cenrio funcional, familiar e social dos pacientes.

    ETCC em EsquizofreniaEm 2012, Brunelin e colaboradores [14] realizaram um ensaio cl-

    nico com 30 pacientes esquizofrnicos com alucinaes auditivas

    persistentes refratrias medicao, que receberam estimulaoativa versus simulada. Os pacientes receberam 20 minutos de es-timulao por ECC, com 2mA de intensidade, duas vezes ao dia,por cinco dias consecutivos na semana, sendo que o nodo foiposicionado sobre o crtex pr-frontal dorso lateral esquerdo e octodo sobre o crtex tmporo-parietal esquerdo. As alucinaes

    auditivas verbais foram robustamente reduzidas em 31% aps ouso de ECC em relao ao placebo. rs meses de seguimentorevelaram a manuteno do efeito sobre as alucinaes.

    Em 2013, Andrade publicou o primeiro relato na literatura sobreo uso seguro e eficaz de sesses de ECC para o tratamento dealucinaes auditivas na esquizofrenia. Nesse estudo, as aplicaesvariaram de uma a duas vezes ao dia, domiciliares, de 30 minu-tos de durao, e com 1 a 3mA, por quase trs anos. Aps umasemana de estimulao, as melhoras cognitivas e psicossociaisfuncionais puderam ser observadas, bem como a atenuao das

    alucinaes [15]. Resultados semelhantes sobre o cenrio alucina-trio foram encontrados por Shiozawa e colaboradores em umpaciente portador de esquizofrenia super-refratria (resistente adoses mximas de clozapina). Os autores demonstraram melhorade alucinaes visuais e auditivas aps protocolo de estimulaocom 2mA, 20 sesses, nodo -F3, ctodo P3/Oz, com manuteno

    ARTIGO DE REVISOpor PEDRO SHIOZAWA1, CAROLINA MARAL1,MAILU ENOKIBARA DA SILVA1, MARIANA MONTEIROSALDANHA ALTENFELDER SANTOS1, FERNANDA XAVIERPIOVESAN1, ADA PELLEGRINELLI1,ANDR RUSSOWSKY BRUNONI2, QUIRINO CORDEIRO1

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    da estabilidade em um ms de seguimento clnico [16].Considerando-se subpopulaes especficas, Mattai e colabora-

    dores [17] estudaram 40 crianas com diagnstico de esquizofre-nia atravs de um ensaio clnico, duplo cego, placebo controlado.O protocolo de estimulao constou de 20 sesses distribudasem 10 dias com 2mA de corrente. Dois grupos de intervenoativa foram estudados quanto segurana: (1) nodo-Fp1/Fp2 ectodo extra ceflico e (2) nodo extra ceflico e ctodo-3/4. Osautores demonstraram segurana da tcnica para esta populaoespecfica.

    Outro caso recentemente publicado na literatura envolve o re-lato de uma paciente de 63 anos com diagnstico de esquizofre-nia catatnica. A paciente foi submetida a 10 sesses distribudasem duas semanas consecutivas de ECC, com corrente de 2,0 mAde intensidade por 20 minutos (nodo sobre o crtex pr-frontaldorso lateral esquerdo e ctodo sobre o direito). Aps um ms detratamento, ela progressivamente comeou a melhorar em relaoao contato social e verbal, bem como quanto autonomia nasatividades dirias. Aps quatro meses de seguimento, a pacientemanteve-se assintomtica [18].

    Em 2011, Vercammen e colaboradores sugeriram que a ECCandica, quando realizada sobre o crtex pr-frontal dorso late-

    ral esquerdo, reverteria os dficits de aprendizagem de associaoprobabilstica em pacientes com esquizofrenia. Embora a ECCandica no tenha conseguido melhorar a pontuao no desem-penho do teste de toda amostra, uma maior variao no grupoda estimulao ativa em relao ao do placebo sugeriu que umsubconjunto de pacientes poderia responder ao tratamento [19].

    Desfechos neurofisiolgicos tambm foram avaliados utilizan-do-se a aplicao da ECC na esquizofrenia, este fato pode, nofuturo, auxiliar na melhor compreenso da patofisiologia do trans-torno. Hasan e colaboradores [20] investigaram a plasticidadecortical de potenciao de longo prazo (LD - long term depo-tentiation), aps diminuio da excitabilidade pela ECC catdica,

    e encontraram sua associao com alteraes na conectividadecerebral inter-hemisfrica. ais resultados do suporte a achadosanteriores, confirmando a relao existente entre diminuio daneuroplasticidade e alteraes na conectividade cerebral inter--hemisfrica em pacientes com esquizofrenia. O presente estudolevantou a hiptese que receptores N-metil D-aspartato (NMDA)disfuncionais, bem como alteraes na modulao da transmissodopaminrgica poderiam explicar seus achados.

    ETCC em Uso de DrogasAbuso de drogas e dependncia qumica tambm so objetos

    de estudo com ECC. A abordagem da regio dorso lateral docrtex pr-frontal mostrou resultados positivos em estudos envol-vendo o desejo por lcool, tabaco e maconha. Considerando-sedependncia qumica, existem algumas hipteses de que a ECC,atravs do aumento espontneo de disparos neuronais em umagrande rea cortical, poderia induzir um efeito de desfocagem, au-mentando a atividade em redes alternativas e consequentementeocasionar reduo da resposta da rede especfica, relacionada aossinais e sintomas de abstinncia pelas drogas. Parece ainda quesesses cumulativas de ECC induzem a neuroplasticidade em pa-

    cientes com dependncia qumica, diminuindo ainda mais os sinaise sintomas de abstinncia pelas drogas [21] [22].Fregni e colaboradores realizaram um estudo randomizado,

    cross-over placebo-controlado, com 24 indivduos tabagistas quereceberam ECC andica no crtex pr-frontal dorso lateral es-querdo e direito, quando expostos a estmulos que desencadea-vam sinais e sintomas de abstinncia droga, atravs da manipula-o do cigarro e da exposio a um vdeo de fumar. Notou-se quea estimulao do crtex pr-frontal dorso lateral em uma sessode ECC, tanto esquerda quanto direita, reduziu significativa-mente os sinais e sintomas de abstinncia ao cigarro nos pacientesdo grupo ativo em comparao com o grupo placebo [23].

    O estudo foi realizado com a realizao de uma sesso de ECCem crtex pr-frontal dorso lateral para avaliar sinais e sintomasde abstinncia em usurios crnicos de maconha. Os autores ob-servaram diminuio dos sinais e sintomas de abstinncia, apenasquando o nodo estava posicionado no crtex pr-frontal dorsolateral direito [24].

    ETCC em outros Transtornos PsiquitricosApenas um relato de caso foi encontrado no transtorno ob-

    sessivo-compulsivo, no qual o ECC no melhorou os sintomasdo paciente. No entanto, uma diminuio do desbalano entre oshemisfrios esquerdos e direito foi verificada, assim como melhora

    dos sintomas depressivos e ansiosos do paciente [25].Outro relato de caso foi realizado em paciente com transtorno

    afetivo bipolar, que apresentava fase de mania aguda. Como os re-sultados positivos para o tratamento de pacientes que apresentamfase de depresso esto relacionados com a estimulao andicasobre o crtex pr-frontal dorso lateral esquerdo, o referido relatode caso, como se tratava de paciente em fase de mania, decidiurealizar a estimulao inversa, ou seja, na mesma regio cerebral,porm do lado direito. Com isso, resultado positivo foi alcanadono tratamento do paciente em fase de mania.

    ANDR RUSSOWSKY BRUNONI2

    2 Centro de Pesquisa Clnica, Hospital Universitrio, Universidade de So Paulo.

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    4. Consideraes Finais

    A ECC tem sido uma ferramenta teraputica progressivamenteestudada para o tratamento de pacientes com distintos transtor-nos psiquitricos. Os resultados de diferentes estudos clnicos tmmostrado evoluo clnica favorvel para pacientes submetidos ECC, com nfase para pacientes com depresso e esquizofrenia.Resultados promissores tambm so encontrados em casos dedrogadio. Nas demais condies clnicas, os resultados ainda sopreliminares. Ensaios clnicos mais amplos so necessrios para o

    estabelecimento mais correto desta tcnica no cenrio da psiquia-tria atual.

    ARTIGO DE REVISOpor PEDRO SHIOZAWA1, CAROLINA MARAL1,MAILU ENOKIBARA DA SILVA1, MARIANA MONTEIROSALDANHA ALTENFELDER SANTOS1, FERNANDA XAVIERPIOVESAN1, ADA PELLEGRINELLI1,ANDR RUSSOWSKY BRUNONI2, QUIRINO CORDEIRO1

    Correspondncia:Quirino Cordeiro

    Centro de Ateno Integrada SadeMental (CAISM) da Irmandade da Santa

    Casa de Misericrdia de So PauloRua Major Maragliano, 241 - So Paulo-SP

    CEP: 04017-030.E-mail: [email protected]

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    ARTIGO DE REVISO

    MORADIAS ASSISTIDAS PARA PACIENTESDEPENDENTES QUMICOS: REALIDADE OU UTOPIA?

    HALFWAY HOUSE FOR ADDICTION PATIENTS: REALITYOR UTOPIA?

    ResumoIndivduos dependentes de lcool e drogas com histrias de aban-dono, encarceramento, e falta de apoio social para a vida em sobrie-dade so particularmente mais vulnerveis recada quando no en-contram a prestao de servios de longo prazo baseados no reforocomunitrio e que apoiam a sobriedade. Neste contexto, a Moradia

    Assistida tem como objetivo promover um servio de cuidados pos-teriores a dependentes qumicos que no necessitam seguir institu-cionalizadas, mas que se beneficiariam de uma estrutura com maiorsuporte de tratamento. Os moradores geralmente desenvolvem forteslaos psicolgicos e sociais e tm sido referidos como famlias alter-nativas, evocando, assim, o conceito antropolgico de parentesco fic-

    tcio. Os resultados tanto quantitativos quanto qualitativos sugeremvrios desfechos positivos deste modelo desde diminuio de custosde tratamento a longo prazo, maior taxa de manuteno da recupe-rao at a maior individuao e aquisio de valores outrora perdi-dos com a fase da adico ativa. Assim sendo, este modelo mostra-seum importante recurso teraputico a ser agregado na construo darede de equipamentos j existentes para o tratamento da dependn-cia de lcool e outras drogas.

    Palavras-chaves: residncia teraputica, dependncia de substn-cias, tratamento.

    AbstractAddicted individuals to alcohol and drugs with stories of aban-

    donment, incarceration, and lack of social support for life in sobrietyare particularly vulnerable to relapse when they dont find the care

    provision of long-term based on the community reinforcement andsupport sobriety. In this context, the Halfway House aims to promoteaftercare service to addicts who need not follow institutionalized, butwho would benefit from a structure with greater support treatment.Residents often develop strong social and psychological ties that havebeen referred as alternative families, evoking the anthropologicalconcept of fictive kinship. Te both results, quantitative and qualitati-

    ve, suggest that this model has several positive outcomes since redu-ced treatment costs in long-term, higher maintenance in recovery togreater individuation and acquisition of values previously lost at acti-ve addiction stage. Tus, this model shows an important therapeuticresource to be added in the construction of the existing network equi-

    pment for the treatment of alcohol and other drugs.Keywords: halfway house, substance related disorder, treatment

    INTRODUO

    Diminuir os altos custos gerados pelos tratamentos da

    dependncia de lcool e outras drogas tem se torna-do um importante paradigma para gerenciadores desade que fornecem fundos ou financiam os cuidados

    nesta rea. Uma das estratgias adotadas em muitos pases, inclu-sive no Brasil, tem sido o aumento dos servios ambulatoriais queso menos caros e uma diminuio do tratamento hospitalar que,em geral, podem ser mais caros que os primeiros.1

    Apesar da crescente popularidade, os programas de tratamen-to em regime ambulatorial, tais como os Centros de AtenoPsicossocial em lcool e Drogas (CAPS-AD) e o Ambulatrio deEspecialidades em Psiquiatria (AME), tm a limitao de no se-rem capazes de controlar o ambiente de vida social e de moradia

    da grande maioria dos pacientes que necessitam desta superviso.Estes modelos de tratamento so particularmente limitados emtermos de resposta s necessidades dos pacientes sem-teto, porexemplo, que enfrentam obstculos constantes sua sade e se-gurana, bem como a sua sobriedade. Em reas urbanas, onde ahabitao com custo baixo restrita, uma grande proporo depacientes que frequentam os programas de tratamento ambulato-rial citados acabam por ficarem desabrigados em situao de ruaou residir em ambientes de vida destrutivos que no do suporte recuperao. 2,3

    Indivduos dependentes de lcool e drogas com histrias de

    por ALESSANDRA DIEHL1eRONALDO LARANJEIRA2

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    abandono, encarceramento, e falta de apoio social para a vida emsobriedade so particularmente mais vulnerveis recada quandono encontram a prestao de servios de longo prazo baseadosno reforo comunitrio e que apoiam a sobriedade. 2,3

    A falta de ambientes seguros para uma vida social de suportepara manuteno da recuperao dos pacientes no ps-alta; tantode regimes intensivos de cuidados hospitalares quanto de clnicascomunitrias de tratamento; deve ser uma preocupao impor-tante na prestao de cuidados a este pblico. Isto porque j exis-te uma variedade de estudos cientficos mostrando que quanto

    maior a oferta de um ambiente de vida social de suporte para amanuteno da sobriedade melhores sero os resultados alcana-dos com o tratamento.1,2,3,4

    Neste sentido, as chamadas halfway houses, sober housesou moradias assistidas representam um importante recurso te-raputico a ser agregado na construo da rede de equipamentos

    j existentes para o tratamento da dependncia de lcool e outrasdrogas. Mais adiante neste texto sero descritos maiores detalhesa respeito deste modelo de ateno que, de uma maneira geral,funcionam como residncias para um grupo de pessoas que ten-tam manter a abstinncia de lcool e drogas em um ambiente deapoio mtuo.4,5

    Os estudos indicam desfechos positivos com relao aos trata-mentos oferecidos pelas diversos tipos de Moradias Assistidas, en-tre estes resultados destacam-se: 1) menores taxas em admissesem servios de desintoxicao, 2) menor dependncia a serviosde assistncia pblica, 3) menor envolvimento com o sistema cri-minal, 4) estabelecimento de vnculo empregatcio aps a alta daresidncia, 5) tendncia a menor nmero de admisses em hospi-tais de emergncia, 6) menores custos mdicos e legais ao serviopblico, 7) sistema mais humanitrio, 8). sistema de baixo custo,9) maior tempo de manuteno da abstinncia 10) aumento daadeso ao regime ambulatorial 6,7,8

    Os moradores geralmente desenvolvem fortes laos psicolgi-

    cos e sociais e tm sido referidos como famlias alternativas, evo-cando, assim, o conceito antropolgico de parentesco fictcio. Osresultados qualitativos sugerem que o parentesco criado entre osmoradores pela troca de vrios tipos de apoio, e pela incorporaode outros residentes, os incentivam para uma maior individuao eaquisio de valores outrora perdidos com a fase da adico ativa.9

    O Brasil tem escassa tradio no desenvolvimento deste tipode modelo de tratamento para dependentes qumicos, devendoser estimulado ampliao e avaliao dos recursos implantadossendo necessrios mais esforos para ajudar os pacientes ambula-toriais a estabelecer um ambiente de vida que fornece suporte

    manuteno da sobriedade. 2,3

    O presente artigo tem por objetivo conduzir uma reviso narra-tiva sobre moradia assistida para dependentes de lcool e outrasdrogas como uma organizao de servio possvel de ser imple-mentado para este pblico junto rede de cuidados j existentesno Brasil.

    UM BREVE HISTRICO SOBREA EVOLUO DAS MORADIASASSISTIDAS PARA DEPENDENTES

    DE LCOOL E DROGASOs primeiros modelos de Moradias Assistidas para dependentes

    qumicos comearam em 1830 e foram executados por institui-es religiosas americanas. Estes hotis secos ou casas de hos-pedagem no estavam a princpio evolvidos com o Movimentode emperana, mas buscavam outras alternativas para as pessoassuperarem as presses sociais para o beber. Estas moradias ten-diam a ser geridas por proprietrios de terras que tinham fortesconvices pessoais sobre a sobriedade. Ao contrrio de muitasmoradias assistidas contemporneas, os moradores nesta pocaem geral tinham pouca participao no funcionamento da insta-

    lao e os operadores de atendimento frequentemente incentiva-vam a frequncia em servios religiosos. 10,11

    Aps a Segunda Guerra Mundial muitas reas metropolitanastiveram um significativo incremento populacional. Juntamentecom um mercado de habitao pouco disponvel veio tambmde forma mais difundida os problemas relacionados ao consumodo lcool. Ao mesmo tempo, surge a era da recuperao atravsda autoajuda, principalmente com a fundao e disseminao dosAlcolicos Annimos (AA). 10,11,12

    Na cidade de Los Angeles por exemplo, membros em recupera-o do AA abriram casas chamadas de dcimo segundo passopara atender a crescente necessidade de ambientes de recupera-

    o longe de locais onde o viver estava repleto de lcool e drogas.Os gestores destas casas encorajavam fortemente a participaoem reunies de AA para facilitar a recuperao dos moradores. Asoperaes da moradia ficavam geralmente sob a responsabilidadedo coordenador da residncia ou do proprietrio da mesma. 10,11,12

    A necessidade de moradias assistidas aumentou durante a d-cada de 1970 e continua at os dias de hoje em vrios locais domundo cuja experincia tem sido replicada. Um dos fatores quecontriburam para a necessidade de mais moradias assistidas foi adesinstitucionalizao dos hospitais psiquitricos sem a oferta dehabitao adequada baseado do modelo de comunidade e o de-

    ALESSANDRA DIEHL1

    Psiquiatra, Especializao em Dependncia Qumica (UNIFESP) e Sexualidade Humana (USP). Psgraduanda da Universidade Federal de So Paulo (UNIFESP) / Departamento de Psiquiatria.

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    clnico dos programas de tratamento da dependncia qumica delonga permanncia tipo residenciais e comunitrios. 2,3

    O resultado foi uma exploso de pessoas em situao de rua. Umareviso do tema revelou que a falta de moradia afetou quase 6 milhesde pessoas de 1987 a 1993. Estimativas conservadoras indicam que40% sofriam de problemas relacionados ao lcool e 15% sofrem deproblemas relacionados a outras drogas de abuso. 11,12

    O sistema Oxford House um dos pioneiros e mais conhecidoscom relao a este tipo de trabalho. rata-se de uma entidade nogovernamental que atualmente compreende mais de 20 residn-

    cias em vrios municpios, fundado em outubro de 1975 em Ma-ryland nos Estados Unidos da Amrica (EUA). A premissa centralda Oxford House encorajar a recuperao e promover moradiapara dependentes do lcool que desejam interromper o uso debebidas e viver em atitude de sobriedade, sendo esta a exignciaprimordial para a participao. 2,3,4

    O sistema sem fins lucrativos gerenciado pelos prprios mora-dores de forma independente e autossuficiente em cada residn-cia, mas apresenta normativas de operaes e tradies criadas apartir de votao democrtica. Mantm quadro no profissional,embora a ajuda de profissionais externos possa ser solicitada emcasos especiais.2,3,4

    O sistema no filiado ao AA, mas encoraja a participao deseus membros em reunies. Estudo que avaliou a questo da espi-ritualidade entre os moradores de uma das Oxford Houses iden-tificou que 76% frequentam as reunies do AA semanalmente,sendo que parece haver uma necessidade importante de forma-o de rede social com semelhantes alm dos muros da residn-cia como essencial na recuperao. Estudo de seguimento de 2anos que avaliou 130 pacientes do sistema Oxford House apontaresultados favorveis na aquisio da abstinncia de substnciaspsicoativas.1,2,3,4

    A experincia prvia dos autores deste artigo foi com a MoradiaAssistida da Unidade Comunitria em lcool e Drogas (UCAD) do

    Jardim ngela. Este servio passou a funcionar no final do ano de1999 e teve durao de 4 anos numa das periferias mais conheci-das da cidade de So Paulo, pelos altos ndices de homicdios (122homicdios por 100 mil habitantes em 1995), alta concentraode bares (1 bar para cada 12 casas) (Laranjeira & Hinkly, 2002) eexcluso social. Contava com o apoio tcnico UNIFESP/UNIAD eSociedade Santos Mtires (ONG com mais de 22 anos de atuaonesta comunidade) e financiamento da secretaria do estado dasade de So Paulo. A hiptese ligava a carncia de espaos paralazer e cultura, bem como a grande densidade de bares com au-mento na violncia e alcoolismo nesta comunidade. O bairro, no

    final dos anos 90, foi apontado pela ONU como a regio mais vio-lenta do planeta. A MA do Jardim ngela tinha capacidade para10 leitos numa casa de 5 cmodos, garagem e lavanderia, ondedependentes do lcool residiam no mximo 30 dias. No perodocompreendido entre outubro de 1999 e Novembro de 2001 esti-veram residindo 130 pacientes.2,3

    A filosofia era a conduo de um servio comunitrio em car-ter de casa temporria suportado principalmente por pessoal noespecializado e ou dependentes do lcool em recuperao, numaatmosfera de promoo de sade atravs da aquisio da absti-

    nncia, resgaste da autoestima e identificao ou fortalecimentode rede social de apoio.2,3

    Os pacientes ficavam 24 horas do dia sob os cuidados de 1 agen-te comunitrio que se revezava em esquema de planto. Os agen-tes ajudavam os residentes durante as refeies (realizadas pelosprprios residentes com auxlio de uma cozinheira tambm emprocesso mais longo de recuperao), na orientao da higienecorporal, fazem companhia, desenvolvem atividades de jogos e la-zer, bem como acompanham as visitas de familiares e telefonemaspara casa. 2,3

    Os residentes recebiam assistncia psiquitrica, psicolgica, deenfermagem e do servio social, com frequncia de duas vezes por

    semana do ambulatrio prximo a esta residncia. Realizavam ati-vidades de artesanato em cermica, praticavam Yga ministradaspor voluntrios da comunidade; realizavam atividades de cultivode horta comunitria, iam missa se assim desejavam, e faziamcaminhadas com agentes durante o incio da manh. 2,3

    O custo dirio por residente na ocasio era em torno de R$20,00 por dia, incluindo refeio, medicaes utilizadas, recursoshumanos e gastos com telefone, gua e luz da moradia. Existia ain-da contribuies de voluntrios da comunidade atravs de alimen-tos e roupas e outros donativos para os residentes. Infelizmenteeste servio no pode ser continuado pelo trmino de convnioe difiiculdades de manuteno da residncia pela falta de verba. 2,3

    A outra experincia dos organizadores tem sido com a MoradiaAssistida da UNIFESP desde abril de 2010. Os dados disponveissobre o perfil dos moradores desta casa indicam que at outubrode 2012 tivemos 23 pessoas residindo neste modelo, sendo suamaioria dependentes de mltiplas drogas, encaminhados de servi-os ligados rede UNIFESP, jovens com mdia de 30 anos (18 a 62anos), com ensino fundamental completo, solteiros e sem vnculoempregatcio, 50% tiveram recada e foram desligados, 25% ain-da seguem residindo na casa, 25% esto em casa em recuperaocom vida independente. O parceiro (SPDM) entra com o paga-mento de aluguel, IPU, gua e luz. Isto d aproximadamente R$

    ARTIGO DE REVISOpor ALESSANDRA DIEHL1eRONALDO LARANJEIRA2

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    6.000,00 por ms. Na diviso das despesas comuns da casa (mate-rial de higiene, manuteno bsica da casa e diarista uma vez porsemana), sai em mdia R$ 120,00 para cada morador.3

    MODELO TERICO E FILOSOFIADAS MORADIAS ASSISTIDASPARA DEPENDENTES QUMICOS

    A Moradia Assistida (MA), tambm chamada de Dry House,

    definida como uma transio mais acessvel entre a hospitaliza-o e o viver em comunidade. O dependente de lcool e outrasdrogas que volta diretamente para casa depois de uma internaoprolongada poder encontrar dificuldades, principalmente porqueas pessoas podem continuar a trat-lo de acordo com a maneiraque ele costumava ser e no de acordo com a pessoa que ele esttentando se tornar.12

    Neste contexto, a MA tem como objetivo promover um serviode cuidados posteriores a dependentes qumicos que no neces-sitam seguir institucionalizadas, mas que se beneficiariam de umaestrutura com maior suporte de tratamento. Dependentes do l-cool e outras drogas se sentiro mais seguros se instalados longe

    dos locais onde consumiam as substncias e dos conflitos e estres-se familiar no adequadamente tratado, os quais so propcios arecadas. Funcionam, portanto, como componente na resoluode uma situao aguda crtica, estabelecendo uma aliana tera-putica entre paciente e seus familiares, educando o paciente emaspectos de sua morbidade e, sobretudo, como encorajador paraadeso teraputica posterior alta do regime de internao. 2,311,14

    Funcionam como um grupo familiar, com 10 a 12 pessoas resi-dindo em uma grande casa, da o modelo terico que melhor seaproxima do conceito de moradia o modelo de famlia ou mo-delo social; dado prtica adotada do viver em famlia com papis,regras e o exercer responsabilidades junto aos demais membros.

    Moradores buscam se auxiliar mutuamente a manterem-se abst-mios do uso de substncias (lcitas ou ilcitas). A identificao entreeles natural e acontece rapidamente, pois todos tiveram um his-trico de uso de drogas e hoje buscam refazer suas vidas, devendohaver um incentivo dos mais antigos para que os novatos na casabusquem serem ativos socialmente, especialmente que voltem aestudar e trabalhar. Os mais novatos buscam inspirar-se nos maisantigos na casa. 2,3

    PARA QUEM O PROGRAMA INDICADO?2,3

    Dependentes qumicos que passaram por algum tipo de pro-grama de desintoxicao e estejam abstinentes do uso de lcool edrogas h pelo menos dois meses.

    Dependentes que estejam em situao de risco de uso no am-biente familiar ou em seu crculo de relacionamentos e busquemum ambiente seguro para fortalecer a sua recuperao.

    Pacientes que esto em risco de ficarem em situao de rua ouj estavam em situao de rua antes da desintoxicao, mas aindatenham algum vnculo familiar a ser resgatado.

    Os candidatos a moradores devem ter um perfil bastante es-pecfico para ser inserido e aderir ao propsito da moradia. Pri-meiramente deve existir o desejo de permanecer abstmio do usode lcool e outras drogas, aceitar ajuda dos outros moradores emanter-se ativo trabalhando ou estudando. importante ressaltarque a Moradia Assistida no o tratamento em si, mas um por-to seguro em um momento em que o dependente qumico aindase encontra vulnervel e necessita dar um passo adiante.

    Moradias Assistidas exclusivas para moradores de rua so mui-

    to necessrias, mas tendem a requerer mais recursos que no so-mente uma equipe mnima, alm de proviso de outros cuidadose ateno especficos para este pblico, tais como alimentao emaior tempo de permanncia.

    QUAIS SO OS OBJETIVOSA CURTO E MEDIO PRAZO?2,3,13

    Oferecer um ambiente seguro e saudvel para que o depen-dente qumico possa refazer seus vnculos sociais, familiares e pro-fissionais.

    O intuito estabelecer uma ponte entre o processo de desin-toxicao e a retomada da vida.

    Dar mais sustentao para que o dependente qumico pos-sa voltar a estudar, trabalhar, retomar o contato com familiares einaugurar novas perspectivas e atividades que no estejam vincu-ladas memria ou aos hbitos relacionados ao uso de drogas.

    A ideia que eles possam completar o programa da Mora-dia Assistida e possam constituir o seu prprio espao, morandosozinhos ou retornando ao convvio familiar mais estruturado efortalecido.

    RONALDO LARANJEIRA22 Psiquiatria, PhD em Psiquiatria pela Universidade de Londres. Professor itular do Departamento de

    Psiquiatria da Universidade Federal de So Paulo. Coordenador da UNIAD (Unidade de Pesquisa emlcool e Drogas) da UNIFESP/ Instituto Nacional de Polticas do lcool e Drogas, do Instituto Nacional

    de Cincia e ecnologia do CNPq (INPAD).

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    ELEMENTOS ESSENCIAIS PARA AORGANIZAO DA MORADIAASSISTIDA PARA DEPENDENTESQUMICOS. 2,3,4,5

    Estas moradias em geral devem ser construdas ou alugadasprximas a departamentos de psiquiatria, CAPS AD, AME ou uni-dades de sade para eventual apoio.

    A coordenao da casa deve ficar a cargo de uma pessoa comnvel superior e formao/capacitao na rea das adices sendoauxiliado nesta atividade por uma equipe mmima.

    A equipe mnima deve contemplar: conselheiros em depen-dncia qumica que se revezam em esquema de planto, assistentesocial e psiclogos tambm com formao/capacitao prvia narea dos comportamentos adictivos, com cargas horrias a seremestabelecidas ao longo da semana. Sugere-se de 12 a 15 horas se-manais.

    Os monitores/conselheiros em dependncia qumica formamuma equipe que deve conviver com os residentes, ajudando-os nomanejo de crises e gatilhos para recada, no reconhecimento depossveis reagudizaes de sintomas, fornecendo orientao e su-perviso das medicaes utilizadas.

    Em situaes especiais a equipe mnima tambm pode estarcontemplada por um agente comunitrio de sade.

    Os programas devem ser exclusivos para homens ou para mu-lheres, sendo orientados preferencialmente pela identificao degnero.

    As tomadas de decises e outros assuntos importantes relacio-nados ao convvio na casa e diviso de tarefas so discutidos emreunies semanais com todos os residentes, atravs da realizaode grupos operativos conduzidos por um dos membros da equipemnima.

    Os moradores visitam seus mdicos e equipes de sade em re-gime ambulatorial e o programa deve incentivar fortemente a par-ticipao de grupos de 12 passos e outros grupos de mtua ajuda.Dever estar em acompanhamento mdico e/ou psicoterpico e/ou participando de reunies em grupos de mtua ajuda (AA, NA,etc.), se necessrio utilizando-se de recursos da rede pblica desade (CAPS, UBS).

    A abstinncia total de lcool e outras drogas tais como coca-na, crack, maconha, anfetaminas ilegais estritamente requerido.O modelo no se adequa reduo de danos como meta.

    Exames toxicolgicos e utilizao de bafmetros mediante re-gra e periodicidade a ser definida para cada moradia tambm so

    elementos essenciais a serem contemplados. Mediante recada o morador deve ser desligado da moradia

    assistida imediatamente e encaminhado para outro modelo detratamento, tais como Comunidade eraputica ou re-internaohospitalar.

    Formalizao e assinatura de contrato por escrito contendo asregras e rotinas da moradia assistida.

    O tempo de permanncia na Moradia Assistida dever ser deat seis meses, sendo as excees avaliadas individualmente.

    Os candidatos a moradores devero passar por uma triagem

    com o coordenador da casa antes da admisso mediante contatodo servio de sade encaminhador. necessrio um cadastro/pronturio dos pacientes para evolu-

    o do mesmo no servio, bem como para fins de monitoramentode dados e pesquisas de efetividade.

    COMO PODE FUNCIONAR? 2,4,5

    A viso mais prxima que podemos ter a de uma repbli-ca em que cada residente cuida do seu espao sendo responsvelpelo cuidado do ambiente sempre limpo e organizado de modo

    que no incomode os outros moradores. So necessrios os requisitos mnimos de uma casa, com fogo,

    geladeira, forno micro-ondas, armrios, cozinha, banheiro, cama eenxoval de cama e mesa com lenol e travesseiros, pratos e talhe-res.

    Os moradores tm bem claro que l o lar temporrio e nouma clnica.

    Os moradores dividem as tarefas domsticas e buscam reto-mar suas vidas fora da casa.

    No permitido levar amigos, familiares ou namoradas ou na-morados para dentro da moradia.

    Cada morador dever ter estabelecido horrio de retorno da

    casa. Atrasos ou no, retornos para pernoite devero ser comuni-cados imediatamente ao coordenador com pena de desligamento.

    No ser permitido o uso de qualquer droga dentro da casa.Assim como a troca e venda de objetos e realizao de comrcioentre os moradores.

    A funo da psicologia alm da conduo de grupos ope-rativos, tambm atendimento individual baseado no modelo deerapia Cognitiva Comportamental (CC) para cada moradorobjetivando ajud-lo nas dificuldades encontradas ao longo doprocesso de recuperao.

    No permitido heteroagressiviade entre os moradores, sen-

    ARTIGO DE REVISOpor ALESSANDRA DIEHL1eRONALDO LARANJEIRA2

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    do que possveis desentendimentos verbais devem ser trabalhadosem grupos operativos e manejados junto equipe mnima.

    A experincia dos organizadores tem mostrado que pacientescom comorbidades com transtornos psictico, do tipo esquizofre-nia, com a dependncia de substncias psicoativas, se beneficiamde moradias assistidas com maiores recursos, incluindo equipe deenfermagem. Portanto, inicialmente na construo e amadureci-mento deste projeto recomenda-se a no incluso deste perfil.

    CONCLUSO

    Assim sendo, este modelo mostra-se um importante recurso te-raputico a ser agregado na construo da rede de equipamentos

    j existentes para o tratamento da dependncia de lcool e outrasdrogas.

    CorrespondnciaAlessandra Diehl

    Vida Mental:Rua Dr. Neto de Araujo 320 sala 910

    CEP: 04111-001 - So Paulo- SP

    E-mail: [email protected]

    Fonte de Financiamento e Conflito de Interesse Inexistentes

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    ARTIGO DE REVISO

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    por ALESSANDRA DIEHL1eRONALDO LARANJEIRA2

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    INTRODUO

    AEstimulao Magntica ranscraniana de repetio(EMr) um eficiente tratamento de estimulao sele-tiva que tem sido usada principalmente no tratamentode transtornos de humor, especialmente na depresso

    unipolar. Foi aprovada nos EUA pelo FDA (Food and Drugs Ad-ministration) em outubro de 2008 para tratamento de depressomaior sem resposta a pelo menos um antidepressivo1,2. ambmfoi recentemente aprovada no Brasil, por resoluo do ConselhoFederal de Medicina (1.986/2012), e as indicaes estabelecidas fo-ram depresso uni e bipolar, alucinaes auditivas na esquizofrenia

    e planejamento de neurocirurgia. Diversas revises e meta-anlisestm concludo que a EMr tem efeitos teraputicos na depresso,com poucos efeitos colaterais quando medidas de segurana soadequadamente empregadas3,4. A maior parte dos estudos abertose controlados utiliza a estimulao de alta frequncia (5 a 20 Hz)sobre o crtex pr-frontal dorsolateral esquerdo (CPFDLE)1. Recen-te meta-anlise concluiu que a EMr de alta frequncia superiorao placebo e pode ser to eficaz quanto os antidepressivos dispo-nveis no mercado atualmente5.

    Esta nova modalidade de tratamento tem diversas vantagensem relao a outras formas de neuroestimulao, como a maiorsegurana, baixo ndice de efeitos colaterais e a possibilidade de

    estimular regies do crebro de forma mais focal2.Os efeitos colaterais costumam ser leves e transitrios. Os

    mais comuns so cefaleia, tontura, nusea e dor no local daaplicao6. Entre as reaes mais graves est a mania induzida.H relatos na literatura de mania induzida com uso de baixa(< 1 Hz) e alta frequncia, porm, a maioria dos casos tinha odiagnstico de transtorno bipolar previamente7 e no houvenenhum relato de sintomas psicticos associados.

    Nosso objetivo relatar a induo de episdio manaco comsintomas psicticos durante tratamento para episdio depressivocom estimulao magntica transcraniana de repetio.

    RELATO DE CASORelatamos o caso de uma mulher de 39 anos que apresentava

    sintomas compatveis com depresso maior (DSM-IV). Referia serseu primeiro episdio e se queixava de tristeza, diminuio de in-teresse por suas atividades, fadiga, falta de energia, episdios deirritabilidade, insnia e perda de peso. Havia feito uso de antide-pressivos, como paroxetina e citalopram por 6 meses, sem qual-quer manifestao de sintomatologia maniforme. Quando procu-rou nosso servio para tratamento com EMr, estava em uso debupropiona 300 mg ao dia.

    As sesses de EMr foram realizadas com um estimulador mag-

    ntico Neuro MS (Neurosoft, Ivanova, Russia), o qual aprova-do pela ANVISA para uso clnico no Brasil. Foi estimulado o crtexpr-frontal dorsolateral esquerdo, com frequncia de 10 Hz por 10segundos, com intervalo entre as sries de 20 segundos, durante15 minutos, com intensidade de 100% do limiar motor individual,totalizando 30 sries por dia. A paciente foi submetida a aplica-es dirias por duas semanas (total de 10 sesses), apresentan-do remisso dos sintomas depressivos. Passou a fazer sesses demanuteno, com os mesmos parmetros. Inicialmente 2 sessessemanais por 4 semanas; Depois 1 sesso por semana por 04 se-manas mais 2 sesses quinzenais em seguida. Uma semana apso trmino das sesses, comeou a apresentar humor expansivo,

    aumento das atividades, inquietao psicomotora, presso porfalar, ideias grandiosas e acelerao do pensamento. Durante en-trevista, chamou o mdico de padre, disse que se sentia bem e que

    j havia sido curada. Cantarolava de forma inadequada e danavana frente do entrevistador. Segundo os familiares, a alterao docomportamento comeou de forma gradativa, com idas f requen-tes da paciente a lojas, chegando a fazer compras exageradas. Abupropiona foi descontinuada e introduzida olanzapina 10 mg aodia, associada ao ltio, o qual foi titulado at 900 mg ao dia. Apsduas semanas, houve remisso dos sintomas maniformes. No ha-

    RELATO DE CASOpor GUILHERME LOZI ABDO1,2, LUCIANASARIN1, MARCO AURLIO ANDRADE 1,2,MARINA O. ROSA2, JOS ALBERTO DELPORTO1e MOACYR ALEXANDRO ROSA1,2

    INDUO DE EPISDIO MANACO COM SINTOMAS PSICTICOS DURANTE TRATAMENTOPARA DEPRESSO MAIOR COM ESTIMULAO MAGNTICA TRANSCRANIANA DEREPETIO: RELATO DE CASO E POSSVEIS FATORES DE RISCO.

    INDUCTION OF A MANIC EPISODE WITH PSYCHOTIC SYMPTOMS DURING REPETITIVETRANSCRANIAL MAGNETIC STIMULATION TREATMENT IN A PATIENT WITH MAJORDEPRESSION: CASE REPORT AND POSSIBLE RISK FACTORS.

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    via relato de histria de transtorno bipolar na famlia.Discusso: Assim como os antidepressivos e a eletroconvulso-

    terapia, a EMr est associada ao risco de virada manaca, espe-cialmente em portadores de transtorno bipolar5,8 . H relatos demania induzida em EMr de alta e baixa frequncia em pacientescom depresso uni e bipolar aps estimulao no crtex prefron-tal esquerdo9. A maioria dos relatos de caso publicados referentes mania induzida por EMr incluiu pacientes com depresso bipo-lar tratados com alta frequncia no crtex pr-frontal dorsolateralesquerdo. ambm foi relatado de forma mais frequente histria

    positiva de depresso bipolar e menos frequenteme