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20º SEMESTRE DE DEBATES FGV SAÚDE Acreditação das Operadoras de Planos de Saúde O Futuro do Consultório Médico 21º SEMESTRE DE DEBATES FGV SAÚDE Judicialização na Saúde DRG - Classificação em Grupos Homogêneos de Diagnóstico Saúde Corporativa e Gestão de Benefícios 22º SEMESTRE DE DEBATES FGV SAÚDE Limitações das Tabelas Simpro e Brasíndice e Novos Modelos de Pagamentos de Materiais e Medicamentos na Saúde Suplementar Desafios e Oportunidades na Logística Hospitalar 23º SEMESTRE DE DEBATES FGV SAÚDE Saúde Sustentabilidade: Impacto na Gestão de Recursos Naturais Perspectivas do Setor Privado da Saúde e os Planos Populares Cure to Care: Modelos inovadores de atenção ao idoso Revista do FGV Saúde da FGV EAESP | Volume 17 | Janeiro a Dezembro dos anos de 2015 e 2016 | ISSN: 2316-6657 https://fgvsaude.fgv.br/ Debates FGV Saúde

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20º SEMESTRE DE DEBATES FGV SAÚDEAcreditação das Operadoras de Planos de Saúde

O Futuro do Consultório Médico

21º SEMESTRE DE DEBATES FGV SAÚDE Judicialização na Saúde

DRG - Classifi cação em Grupos Homogêneos de DiagnósticoSaúde Corporativa e Gestão de Benefícios

22º SEMESTRE DE DEBATES FGV SAÚDELimitações das Tabelas Simpro e Brasíndice e Novos Modelos de

Pagamentos de Materiais e Medicamentos na Saúde SuplementarDesafi os e Oportunidades na Logística Hospitalar

23º SEMESTRE DE DEBATES FGV SAÚDESaúde Sustentabilidade: Impacto na Gestão de Recursos Naturais

Perspectivas do Setor Privado da Saúde e os Planos PopularesCure to Care: Modelos inovadores de atenção ao idoso

Revista do FGV Saúde da FGV EAESP | Volume 17 | Janeiro a Dezembro dos anos de 2015 e 2016 | ISSN: 2316-6657 https://fgvsaude.fgv.br/

Debates FGV Saúde

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CoordenadoresAna Maria Malik

Comitê AssessorAlberto José Niituma Ogata, Álvaro Escrivão Junior, Daniela Camarinha, Enio Jorge Salu, Evandro

Penteado Villar Felix, Kelly Cristina Rodrigues, Laura Maria Cesar Schiesari, Luciano Eduardo Maluf Patah, Luiz Tadeu Arraes Lopes, Márcio Vinícius Balzan, Maria Laíz Athayde Marcondes Zanardo,

Mariana Baleeiro Martins Carrera, Walter Cintra Ferreira Junior, Wilson Rezende Silva

OrganizadoresAna Maria Malik

Cinthia Costa

ApoioLeila Dall’AcquaMariana Moura

Projeto EditorialCris Tassi Design Gráfi co

EdiçãoMaria Teresa Fontes Marques

AgradecimentosO FGV Saúde agradece aos debatedores e moderadores que compartilharam sua experiência com a

comunidade acadêmica e público geral dos Debates FGV Saúde realizados nos anos de 2015 e 2016.

Agradecemos ao patrocinador, Hospital Sírio-Libanês e aos parceiros SindHosp (Sindicato dos Hospitais, Clínicas e Laboratórios do Estado de São Paulo) e Fehoesp (Federação dos Hospitais, Clinicas e

Laboratórios do Estado de São Paulo) que nos apoiaram na realização dos Debates.

A revista reproduz as apresentações dos palestrantes dos debates realizados em 2015 e 2016, na FGV EAESP. Distribuição de circuito interno. Os

textos assinados são de responsabilidade de seus autores e não refl etem, necessariamente, a opinião da revista.

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Sumário

Ponto de Vista 7 Ana Maria Malik FGV EAESP / FGV Saúde

20º SEMESTRE DE DEBATES FGV SAÚDE

Acreditação das Operadoras de Planos de Saúde

João Boaventura Branco de Matos 9 Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS)

Helton Cassemiro Marcondes 11 Unimed-BH

Marcos Aurélio Lima de Oliveiras 15 INMETRO

O Futuro do Consultório Médico

Marcio Vinicius Balzan 17 FGV Saúde

Thomaz Srougi 18 Dr. Consulta

Antonio da Silva Bastos Neto 21 Hospital Israelita Albert Einstein

21º SEMESTRE DE DEBATES FGV SAÚDE

Judicialização na Saúde

Hamilton Hourneaux Pompeu 26 Tribunal Regional do Trabalho

Lenir Santos 27 Instituto de Direito Sanitário Aplicado (IDISA)

João Baptista Galhardo Júnior 31 Tribunal de Justiça de São Paulo

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DRG - Classificação em Grupos Homogêneos de Diagnóstico

Denise Schout 36 FGV Saúde

Alexandre Holthausen Campos 37 Hospital Israelita Albert Einstein

André Alexandre Osmo 42 Hospital Sírio-Libanês

Saúde Corporativa e Gestão de Benefícios

Luiz Tadeu Arraes Lopes 49 FGV Saúde

Adriano Mattheis Londres 51 Qualicorp

Fábio Patrus Mundim Pena 56 Hospital Sírio-Libanês

22º SEMESTRE DE DEBATES FGV SAÚDE

Limitações das Tabelas Simpro e Brasíndice e Novos Modelos de Pagamentos de Materiais e Medicamentos na Saúde Suplementar

Marcio Vinicus Balzan 60 FGV Saúde

Adriano Leite Soares 61 Unimed do Brasil

Claudio Tafla 64 MAPFRE Saúde

Desafios e Oportunidades na Logística Hospitalar

Priscila Laczynski S. Miguel 70 FGV Celog

Fernando Andreatta Torelly 73 Hospital Sírio-Libanês

José Henrique Germann Ferreira 78 Hospital Israelita Albert Einstein

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23º SEMESTRE DE DEBATES FGV SAÚDE

Saúde Sustentabilidade: Impacto na Gestão de Recursos Naturais

Mario Monzoni 83 FGV Ces

Antonio Carlos Cascão 84 Hospital Sírio-Libanês

Evangelina Vormittag 89 Instituto Saúde e Sustentabilidade

Perspectivas do Setor Privado da Saúde e os Planos Populares

Walter Cintra Ferreira Junior 94 FGV Saúde

José Cechin 95 Federação Nacional de Saúde Suplementar (FenaSaúde)

Mario Scheffer 102 Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo

Cure to Care: Modelos inovadores de atenção ao idoso

Martha Oliveira 108 Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS)

Fernando Fagundes 113 Prevent Senior

Ricardo Soares 114 Pátria Investimentos

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da revista é um consolidado dos eventos ocorridos nos anos de 2015 e 2016. Revisitando os temas discutidos naqueles

semestres, mesmo passados 03, 04 anos, notamos que alguns dos temas permane-cem atuais e outros tiveram pouca evolução. No entanto, chama a atenção quantos desafios ainda temos.

Ponto de Vista

ESTE NÚMERO Ana Maria Malik

FGV EAESP / FGV Saúde

O primeiro semestre de 2015 discutiu a Acreditação das Operadoras de Planos de Saúde na visão de uma operadora, de uma entidade acreditadora e da agência regulado-ra. Ainda foi discutido o Futuro do Consultório Médico, tendo em vista os modelos de negócios em crescimento, à época: o Dr. Consulta e as Unidades Avançadas do Hospital Israelita Albert Einstein.

No segundo semestre do mesmo ano, três advogados especialistas no assunto, den-tre eles dois juízes de direito, debateram sobre a Judicialização na Saúde. Meses de-pois, foi discutido o DRG - Classificação em Grupos Homogêneos de Diagnóstico com a participação de palestrantes representando dois hospitais com experiências no assunto. A Judicialização está cada vez mais presente na realidade da gestão e da políti-ca de saúde, enquanto que DRG permanece algo mais discutido do que implantado na realidade nacional. O último debate de 2015 discutiu a Saúde Corporativa e a Gestão de Benefícios, uma necessidade crescente das empresas e uma temática cada vez mais debatida. Nesse debate foram apresentadas a visão de um hospital e de uma adminis-tradora de benefícios,

Em 2016, o primeiro debate se referiu às Limitações das Tabelas Simpro e Brasín-dice e Novos Modelos de Pagamentos de Materiais e Medicamentos na Saúde Suple-mentar. Este foi um evento com bastante procura, o que chamou nossa atenção para o quanto o tema ainda é de interesse para as operadoras de planos de saúde. Nesse debate tivemos como palestrantes representantes de duas modalidades de operadora (uma seguradora e uma cooperativa). No final do primeiro semestre de 2016, recebemos gestores e especialistas para discutir os Desafios e Oportunidades na Logística Hospi-talar, moderado pela coordenadora do Centro de Estudos em Logística e Supply Chain, o FGVCelog da FGV EAESP, Profa. Priscila Laczynski S. Miguel. No segundo semestre, foi debatido Saúde Sustentabilidade: Impacto na Gestão de Recursos Naturais. Nesse debate o Hospital Sírio-Libanês contou as iniciativas do hospital para a sustentabilida-de e seu interlocutor foi a diretora executiva do Instituto de Sustentabilidade. O evento foi moderado pelo coordenador do Centro de Estudos em Sustentabilidade da FGV EAESP, o FGVCes, Prof. Mário Monzoni.

Editorial

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Os dois últimos eventos do semestre trouxeram as Perspectivas do Setor Priva-do da Saúde e os Planos Populares, assunto que desde a época é bastante polêmico. Recebemos para esse debate um representante da academia e um representante das seguradoras. No mês seguinte, foi abordado Cure to Care: Modelos inovadores de atenção ao idoso. Para esse evento foram convidados o responsável pelo Projeto Idoso Bem Cuidado na Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), um representante de plano de saúde cuja população alvo são os maiores de 49 anos e o representante de um banco de investimento com uma experiência voltada para a saúde do idoso.

Esperamos que este número da revista venha a fomentar novas discussões, sendo útil como consulta para aqueles que se interessam pelos temas trazidos. Mesmo que com discussões de 3 anos atrás as questões continuam atuais. Eventualmente podem ter mudado os argumentos e os dados mais recentes, mas assim é sempre bom lembrar o que os principais atores do setor diziam há tão pouco tempo.

Boa leitura!

Ana Maria MalikFGV EAESP - FGV Saúde

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Matos explica que o primeiro passo importante no sentido da busca pela qua-lidade do setor foi a edição do programa de qualificação de operadoras, isso em 2006, com a Resolução Normativa (RN) n.º 139, instituído sob o âmbito da Dire-toria de Gestão da ANS. “Depois, se vocês tiverem a oportunidade, quem ainda não conhece, consulte no site da ANS os da-dos sobre os resultados do programa de qualificação de operadoras.1”

Cinco anos depois, continua, é divul-gada a RN 267, da Diretoria de Desenvol-vimento, que institui o programa de qua-lificação de prestadores. E nesse mesmo ano (2015), em novembro, o objeto da presente discussão, foi instituído o pro-grama de acreditação de operadoras pela Diretoria de Operações.

Matos explica que está falando da ori-gem do trabalho para que se entenda que durante algum tempo na ANS essas ações foram difusas, “quer dizer, contribuições muito importantes que vieram no sentido de prover qualidade para o beneficiário, mas ações desenvolvidas por diferentes áreas da agência”.

moderador João Boaventura Branco de Matos ini-cia com a explicação sobre o trabalho que está sendo desenvolvido na ANS e que ele considera

um passo importante, “que envolve logicamente o assunto que iremos tratar aqui, a acreditação de operadoras”.

A FALA DO

Segundo Matos, em dezembro de 2014 todos esses programas ficaram sob a égide da Diretoria de Desenvolvimento. Foi criada a gerência de estímulo à ino-vação e avaliação da qualidade que reúne todos esses programas. E explica que a ideia de reunir todos é exatamente tra-balhar a qualidade de uma forma ampla, integrada, visando à qualidade do setor; algo muito importante. Matos diz que faz parte da agenda da ANS integrar to-dos esses programas, fundamentalmente com o objetivo final de entregar para o beneficiário o melhor nível de qualidade possível.

Programa voluntário Em seguida, Matos fala sobre o pro-

grama de acreditação instituído pela RN 277, dizendo tratar-se de um processo voluntário de avaliação. E pergunta: por que tem o programa de acreditação se tem o de qualificação? Sua resposta é que o programa de qualificação é obrigatório, é feito independentemente da vontade da operadora. O programa de acreditação

Acreditação das Operadoras de Planos

de SaúdeMODERADOR:

João Boaventura Branco de Matos

Agência Nacional de Saúde Suplementar

(ANS)

Debate 26/03/2015

20º SEMESTRE DE DEBATES FGV SAÚDE

1. http://www.ans.gov.br/prestadores/qualiss-programa-de-qualificacao-dos-prestadores-de-servicos-de-saude

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não. Nele a operadora manifesta o dese-jo e procura uma entidade acreditadora que, por intermédio da Coordenação Ge-ral de Acreditação do Instituto Nacional de Metrologia, Qualidade e Tecnologia (Inmetro), realiza o processo avaliativo e outorga, se for o caso, homologa, na Diretoria de Desenvolvimento da ANS, a certificação da operadora no Inmetro.

Matos conta que atualmente a agên-cia tem quatro entidades acreditadoras: o A4, o CBA, a DNV e a Isopoint. E que são estes acreditadores que estão hoje no mercado sob a égide da aprovação do In-metro. Quatro operadoras foram acredi-tadas. Quatro operadoras com nível 1 e uma operadora com nível 3.

Processo de discussãoNessa linha de integrar as iniciativas

de qualidade dentro da ANS, continua Matos, foi feita uma comparação quan-do ele assumiu a Diretoria de Desenvol-vimento em 2014. “No final desse ano, passamos a fazer um outro processo de discussão dos programas existentes, o que, aliás, estamos fazendo até agora e vamos continuar fazendo”, ressalta. E, nesse processo de avaliação, continua, a primeira pergunta feita foi: onde houve erros e onde houve acertos?

Matos explica que quando se olha, por exemplo, o Índice do Programa de Qualifi-cação (IDSS), que é obrigatório, é possível visualizar o índice médio das operadoras acreditadas. Elas têm 0.84, em um índice que varia de 0 a 1. Segundo ele, é um ní-vel consideravelmente elevado em relação à média; trata-se de uma média aritmética simples, mas é uma média do setor.

Ele explica que foram cruzadas as bases de dados da agência e criado um indicador que é a proporção de benefici-ários que têm pelo menos um hospital, pelo menos dois, pelo menos três hospi-tais que são acreditados. E aí, diz ele, vem novamente a verificação de que a média das operadoras acreditadas é significativa-mente superior à do setor como um todo.

Matos diz que a agência está no ca-minho certo por que o resultado colhido com o processo de acreditação de ope-radoras aponta para, de um modo geral, aquelas que de fato têm qualidade. “Isso é muito bom”, enfatiza, explicando que há uma oportunidade de melhoria impor-tante “e queremos trabalhar nessa opor-tunidade. Para isso, queremos ouvir to-dos os principais atores do setor, porque é como podemos ampliar esse processo”.

É evidente, segundo Matos, que, de um universo de cerca de mil operadoras de planos de saúde hoje, não se tem, “e não é o nosso desejo ter”, a totalidade dessas operadoras acreditadas. Ele ex-plica que a acreditação é um diferencial, “mas avaliamos que quatro operadoras ainda é um número muito baixo”

Matos diz saber que é preciso ter a ca-pacidade de dialogar e ver em que medi-da se pode ampliar ou até em que medida isso já está sendo ampliado, “porque nós, reguladores, às vezes, sofremos pela im-paciência dos tempos de reação do mer-cado regulado, que não ocorrem no tem-po que gostaríamos”.

Ele conta que “lá atrás”, lembra que estava entrando na agência pelo primeiro concurso, quando foi divulgado o pro-grama de qualificação de operadoras. A expectativa que se tinha, conta, era que rapidamente seria possível comparar, cruzar dados, etc. Mas ressalta que não foi assim: “Primeiro não divulgávamos as informações; depois passamos a divul-gá-las em quatro faixas; depois em cinco faixas. Só em 2011 é que começamos a divulgar o índice que cada operadora ob-tinha”, conta.

Matos garante que a agência tem a consciência também de que se trata de um processo e hoje, se existem quatro, talvez isso seja, em certa medida, a ponta do ice-berg, porque há muitas operadoras que possivelmente hoje estão no processo de acreditação. “Mas isso é um anúncio que faço aos senhores: que futuramente nós estaremos ouvindo todos os atores no sen-tido de ampliar esse processo”, conclui.

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Segundo Marcondes, a Unimed-BH hoje tem aproximadamente 1,2 milhão de clientes. Dentre esses, grande parte é de contratos corporativos, ou seja, com empresas. 93% desses clientes consi-deram a Unimed-BH uma operadora de saúde confiável. São realizadas 2 milhões de consultas agendadas pela internet. Em 2014, 124 mil clientes foram acompanha-dos pelo menos em um dos programas de promoção e prevenção à saúde.

Ele continua dizendo que a coope-rativa conta com 5.593 médicos coope-rados e 368 serviços de saúde contratu-alizados. São realizadas 24 milhões de consultas médicas. Um total de R$ 2,75 milhões transferidos aos médicos e aos serviços de saúde; R$ 3,25 milhões em receita operacional; 973 mil beneficia-dos em ações de responsabilidade so-cial do Instituto Unimed; 1,2 milhão de exames e terapias complementados por ano; 3.945 colaboradores para apoiar na operação; 8 milhões de internações nos serviços de saúde, sendo que 82% são realizadas em hospitais acreditados e certificados dentro da rede, tanto em hospitais próprios, quanto contratuali-zados. E foram 2 milhões de atendimen-tos pré-hospitalares por ano. Em 2014, a Unimed-BH investiu R$ 39 milhões em programas de incentivo à acreditação e

gestão de risco assistencial para os pres-tadores de serviços.

Esse contexto, diz Marcondes, de-monstra, inclusive, o interesse da Unime-d-BH em promover a qualidade, não só interna, como também para a rede pres-tadora.

E explica que a cooperativa atua na região metropolitana de Belo Horizonte, uma área de 34 municípios, nos quais estão distribuídos seus serviços de saúde próprios, que é um dos requisitos da RN n.º 277, tendo em vista a distribuição ge-ográfica da rede prestadora. “Nosso obje-tivo é ter uma distribuição de acordo com a necessidade dos nossos beneficiários.”

Relevância estratégicaMarcondes explica que a Unimed-BH

possui oito pilares estratégicos para su-portar os números apresentados: engajar os cooperados: ter a liderança para desen-volver as pessoas; trabalhar com a susten-tabilidade e inovação como uma forma de inclusive gerar novos resultados; buscar eficiência operacional; fazer com que os serviços próprios sejam uma estratégia complementar de acesso a serviços de saúde à rede prestadora; gerar a seguran-ça e crescer de uma forma sustentável; e, por último, o pilar da qualidade.

Helton Cassemiro Marcondes expli-ca que sua fala tem o objetivo de compartilhar a experiência da Uni-

med-BH com a implantação da Resolução Normativa N.º 2771 da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS). Para tanto, diz ele, irá falar um pouco da Unimed-BH em números, do contexto estratégico, da relevância estratégica de estabelecer a acredita-ção na cooperativa, do projeto implantado para ter sucesso no projeto de acreditação, dos principais benefícios para os processos e de alguns resultados. E terminará falando sobre a pontuação e dos próximos passos, considerando que a melhoria contínua tem que acontecer “e não significa que nós estamos num berço esplêndido. Temos diversos desafios ainda para vencer”, garante.

O PALESTRANTEPALESTRANTE

Helton Cassemiro Marcondes

Unimed-BH

Acreditação das Operadoras de Planos de Saúde - Debate 26/03/2015

1. A Resolução Normativa nº 277 da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), de 4 de novembro de 2011, institui o Programa de Acreditação de Operadoras de Planos Privados de Assistência à Saúde, com o objetivo de incentivar a melhoria continuada na qualidade assistencial da saúde suplementar.

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Para aprimorar o modelo de gestão, Marcondes diz que a Unimed-BH come-çou, desde 2011, um movimento implan-tando a ISO 90012 como abordagem de processo. “Implantamos e certificamos a Unimed em 36 processos e 12 gestões”, conta ele, dizendo que se evoluiu e am-pliou essa certificação, favorecendo a busca pela qualidade em todas as gestões. Esse processo, diz ele, começou em 2012 e continuou em 2013 porque o desafio era conseguir a acreditação em 2014.

Marcondes conta que, para conseguir todos os resultados relacionados à acredi-tação, foi dada uma abordagem de projeto ao desafio: “Já tínhamos levantado a ban-deira da qualidade, do gerenciamento de risco e precisávamos levantar a bandeira da acreditação”, diz, explicando que por isso foi desenvolvido um projeto que se chamou “Acreditação da operadora com a abordagem forte de gestão por proces-sos”. Era preciso implementar a acredita-ção, diz ele, considerando as necessida-des de alteração dos processos internos “e para isso estabelecemos uma estratégia para implantar de forma consistente to-dos os 147 requisitos da acreditação”.

Ele ressalta que vale salientar que a estratégia de implantação levou em con-sideração os aspectos de pontuação de cada um dos requisitos da RN n.º 277. E explica dando um exemplo: para atingir 10 pontos, o requisito tem de estar im-plantado há mais de 12 meses e também ter um percentual de conformidade aci-ma de 90%. No caso de 5 pontos, o per-centual de conformidade vai de 60% a 89%, com a implantação de 6 a 11 meses. E, no caso de zero, ou seja, o requisito implantado com menos de cinco anos e com uma conformidade abaixo de 5%.

Considerando esse aspecto e a quan-tidade de requisitos, os 147, diz Mar-condes, era preciso saber inicialmente o quanto se estava próximo ou distante da aplicação de cada requisito. Por isso, en-fatiza, a responsabilidade de realizar um diagnóstico inicial que deu um retrato de

onde a Unimed-BH estava em relação à RN n.º 277 e qual o esforço para conse-guir implementar todos os requisitos de forma efetiva.

Baseado no diagnóstico, Marcondes explica que foi feito um planejamento com uma estratégia de capacitação e uma estratégia de comunicação que favoreces-sem a implantação dos requisitos e que promovessem a movimentação neces-sária de todas as áreas para que os 147 requisitos fossem estabelecidos de forma consistente.

Hora da avaliação Depois da fase de implantação, Mar-

condes conta que foi feita uma pré-avalia-ção, considerando o quanto se conseguiu evoluir. E em seguida veio a auditoria da acreditação que culminou na acreditação da Unimed-BH.

Para Marcondes, se for colocada essa estratégia no tempo, como o tempo para a acreditação é um momento extrema-mente valioso e necessário para a avalia-ção, havia um cenário que foi formado principalmente no final de 2012 e teve o primeiro ciclo encerrado em fevereiro de 2014. Então em 2012 foi feito o diag-nóstico, posteriormente o planejamento e uma etapa rápida de implantação de requisitos. “E, para implantar os requi-sitos, nós tínhamos vários desafios, que vou compartilhar com vocês mais para a frente”, conta Matos.

Em julho de 2013, diz ele, foi realiza-da a pré-avaliação e depois ajustou-se a implantação de julho a agosto. Nos dias 12, 13, 14 e 15 de fevereiro de 2014 veio a auditoria e conseguida a acreditação.

DesafiosMarcondes diz que gostaria de com-

partilhar as dificuldades da Unimed-BH em estabelecer todos os requisitos da RN n.º 277. Elas existiram, mas foram pos-síveis de serem enfrentadas, resolvidas,

2. É um conjunto de normas de padronização para um determinado serviço ou produto. O ISO 9001 tem como objetivo melhorar a gestão de uma empresa e pode ser aplicado em conjunto com outras normas de funcionamento, como normas de saúde ocupacional, de meio ambiente e de segurança.

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segundo ele: “Buscamos até soluções externas ou em alguns casos na própria operadora, por meio de compartilhamen-to de informação”.

O primeiro dos desafios, continua Marcondes, era ter assertividade no diag-nóstico e fazer uma interpretação correta dos requisitos. Estudando o assunto e acompanhando as palestras da ANS, con-seguiu-se uma interpretação suficiente para promover uma adequada implanta-ção dos requisitos.

O segundo desafio foi realizar o pla-nejamento considerando a estratégia para pontuação e tempo de implantação.

O terceiro, a capacitação conforme a conceituação definida inicialmente, con-tando com treinamentos presenciais e outro online.

O quarto desafio era a pré-avaliação e auditoria realizadas pelo mesmo orga-nismo acreditador. “Só que nós não con-seguimos fazer isso, por falta de dispo-nibilidade na época, então fizemos com organismos diferentes”, conta Marcon-des, informando que as diferenças entre o organismo acreditador e o que realizou a auditoria foi muito grande, mas com-plementar.

Enquanto a norma ISO 9001 tem uma abordagem que ele chama de “generalis-ta” -- ou seja, é preciso fazer a medição e o monitoramento do processo, mas não se fala basicamente como e nem o quê --, a RN 277 é mais prescritiva.

O quinto desafio, cita Marcondes, foi incorporar requisitos nos processos da operadora por meio de uma abordagem sistêmica. Ele explica que a RN n.º 277 prescreve alguns requisitos no caso de autorização e até indica um prazo de 72 horas para a resposta. No caso da Unime-d-BH, a autorização é um processo trans-versal que perpassa por várias gestões. “Então, tínhamos que promover a im-plantação desses requisitos considerando todos os envolvidos”, ressalta.

Ele conta que foi muito interessante quando houve a auditoria da acreditação, porque os auditores ficaram um pouco assustados com o número de pessoas en-volvidas para responder apenas a um re-quisito: “A sala estava repleta de pessoas.

Para determinados requisitos foi necessá-rio agruparmos de 15 a 20 participantes, que foram extremamente importantes”, lembra.

Por último, diz Marcondes, o sexto desafio, que foi mobilizar todos os cola-boradores com frequentes comunicações internas para demonstrar o benefício, convencer internamente que estávamos avançando num sistema integrado de gestão e que a consequência seria a va-lorização do colaborador e também o be-nefício para o cliente e para o cooperado.

A seguir, Marcondes elenca os prin-cipais benefícios obtidos com a acredita-ção, de acordo com cada dimensão.

Dimensão 1 - Programa de Melhoria da Qualidade (PMQ):

• Fortalecer o sistema integrado de ges-tão pela incorporação de 147 requisi-tos da acreditação;

• Avançar na formalização dos proces-sos devido aos requisitos que solici-tam procedimento documentado.

• Designar um médico para o programa de melhoria da qualidade também foi extremamente importante para forta-lecer internamente a visão assisten-cial e a preocupação assistencial que os nossos processos têm de refletir

• Basear o planejamento e a execução de atividades no plano anual de tra-balho.

Dimensão 2 - Qualidade e Desempe-nho da Rede Prestadora:

• Aqui Marcondes diz que havia um processo chamado Avaliar qualifi-cação do prestador e, por meio dos requisitos da RN n° 277, ganhou-se expertise, principalmente no planeja-mento e na cobertura de visitas para avaliar a qualidade do prestador.

• Não havia auditoria pré-hospitalar, que foi implantada em virtude da acreditação, complementando um ponto extremamente importante para acompanhamento do desempenho as-sistencial dos nossos prestadores in-ternamente.

• A incorporação de incentivo para a melhoria constante dos arquivos mé-

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dicos mantidos pela rede prestadora foi um requisito incorporado.

• Fortalecer as práticas para desenvol-vimento da qualidade da rede pres-tadora com foco na segurança do paciente foi ação reforçada na Uni-med-BH.

Dimensão 3 - Suficiência de rede, acesso e autorizações:

• Por meio da abordagem da RN n.º 277, o processo foi fortalecido princi-palmente com a abordagem sistêmica e a maior integração das áreas envol-vidas.

• Criou-se uma ferramenta baseada na lógica da RN n.º 277 para fazer uma avaliação se em determinado local tí-nhamos ou não suficiência de rede.

Dimensão 4 - Satisfação dos benefi-ciáriosAqui, Marcondes explica que há anos eram feitas pesquisas com o Institu-to Datafolha buscando a satisfação e a percepção do nosso beneficiário em relação à qualidade dos serviços, mas com a implantação da acreditação fo-ram aprendidas três coisas:

• Seleção da população com base nas reclamações e solicitações dos bene-ficiários;

• Incorporação da avaliação da facilida-de para marcação de consultas, com novos atributos a serem pesquisados;

• Ampliação da mensuração de satisfa-ção dos beneficiários em alguns ca-nais de atendimento que antes não eram contemplados.

Dimensão 5 - Programa de promoção e prevenção à saúde

• Melhor gestão dos programas por meio de estabelecimento de indica-dores e de uma pesquisa específica avaliando a satisfação do beneficiário em relação aos programas.

• Foco no beneficiário em relação aos programas foi fortalecido. O bene-ficiário ganhou mais autonomia, até mesmo podendo inscrever-se nos programas.

• Melhorar as interfaces, inclusive dos

processos e das gestões responsáveis por esses programas.

• Melhoria também do programa de cessação de tabagismo por meio da ampliação da faixa etária.

• Fortalecimento dos registros neces-sários para demonstrar a interface do programa com o beneficiário, princi-palmente dentro dos programas.

Dimensão 6 - Estrutura e operação: • Revisão de processos, principalmen-

te relacionados à movimentação de rede.

• Consolidação de uma política docu-mentada para a proteção e confiden-cialidade das informações clínicas dos beneficiários.

Dimensão 7 - Gestão de pessoas, tecnolo-gia, estratégia, parcerias e terceirizações: • Incorporação da avaliação de satis-

fação do colaborador em relação aos programas de qualidade de vida no trabalho.

• Busca da acreditação por um bom planejamento, colocando a acredita-ção como meta global e reforçando a aplicação dos requisitos de planeja-mento da RN n.º 277.

• Avanço na gestão de fornecedores, melhorando principalmente os con-tratos, inserindo cláusula de confi-dencialidade, inclusive em casos de rescisão.

ResultadosA RN n.º 277, explica Marcondes, tem

uma régua que vai de 0 a 100 e a acredi-tação começa a partir de 70 pontos, com nível 3 até 80, nível 2 até 90 e nível 1 até 100. No diagnóstico, ele conta que havia uma pontuação próxima a 70 “e mesmo assim sabíamos que o trabalho seria in-tenso, árduo e que tínhamos um propó-sito bem firme, principalmente devido ao incentivo da alta direção da Unimed-BH”, conta. E, depois da auditoria externa, foi conseguida uma pontuação próxima dos 100 pontos, que permitiu a acreditação no nível 1.

E ser acreditado, ressalta Marcondes,

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favorece num resultado expressivo em relação ao Índice de Desempenho da Saú-de Suplementar (IDSS) da ANS, que em 2013 subiu para 0,89.

Como próximos passos, Marcondes cita melhorar a abordagem de processos; implantar um workflow de aprovação de documentos, inclusive para favorecer ainda mais a gestão de registros e formali-

zação dos processos; evoluir numa abor-dagem de sistema integrado de gestão, sempre fortalecendo planejamento, pro-jeto e processo. Para quê? Para manter o que nós já conseguimos e alcançar novos resultados. Além do mais, contribuir com o fortalecimento do sistema Unimed com bons exemplos e favorecer todo o sistema na busca pela acreditação.

PALESTRANTE

Marcos Aurélio Lima de Oliveira

Instituto Nacional de Metrologia, Qualidade e

Tecnologia – Inmetro

Acreditação das Operadoras de Planos de Saúde - Debate 26/03/2015

Lima de Oliveira inicia sua palestra explicando que o In-metro é muito mais que um

programa para dizer se determinado produto é bom ou ruim: “O produto principal que o Inmetro oferece à sociedade é credibilidade, confiança”, ressalta. Portanto, continua, se houver alguma participação do Inmetro é porque se quer prever confiança. “E é importante destacar que temos uma atuação muito forte na área da saúde, na parceria com a Agência Nacional de Saúde (ANS), em que credibilidade e confiança são também os principais ‘produtos’”, destaca.

MARCOS AURÉLIO

Oliveira explica que, todos os anos, o Inmetro contrata uma empresa para fazer pesquisa da marca e, ao longo dos últimos seis, sete anos, 83% da socieda-de brasileira diz conhecer o Inmetro. E, desses que conhecem, 89% confiam na marca. “Ou seja, manter a credibilidade da nossa marca é o nosso maior desafio”, ressalta.

O palestrante explica ainda que o In-metro é um órgão ligado ao Ministério de Indústria e Desenvolvimento, e está loca-lizado em Xerém, no Rio de Janeiro, em uma área de 200 mil metros quadrados. Neste espaço, há 42 prédios e entre eles está o campo laboratorial, toda a área da metrologia (metrologia legal; metrologia científica e industrial), normalização e

qualidade. O Inmetro é um dos regula-mentadores federais na área de conformi-dade e regulamentação técnica (33 agên-cias no Brasil).

Oliveira continua sua palestra expli-cando que a metrologia científica indus-trial é que estabelece os padrões na área da indústria e das ciências. A metrologia legal é toda a área que envolve medição com impacto na saúde ou numa relação de consumo. “Todos os produtos que chamamos de premedidos são obrigados a atender a uma regulamentação metro-lógica”, ressalta, explicando que o órgão regulamentador metrológico é o Inmetro, responsável por estabelecer esses regu-lamentos. O instituto é também o ponto focal do Brasil para as normas técnicas

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instituídas pela Organização Mundial do Comércio (OMC).

Ele informa que o Inmetro está cres-cendo muito na área de inovação e de-senvolvendo vários produtos para a in-dústria brasileira no sentido de conseguir melhorar a competitividade no Brasil.

Acreditação de operadoras Oliveira conta que, quando o Inmetro

começou a elaborar a RN n.º 2771 junto com a ANS, foi verificada uma divergên-cia de terminologia porque o que o ins-tituto chama de certificação, o setor de saúde chama de acreditação.

Ele explica então que acreditação para o Inmetro é o reconhecimento de compe-tência técnica; é verificar se determina-do serviço ou produto tem competência para exercer aquela atividade, que é di-ferente da acreditação no setor da saúde. “Não significa que estamos delegando ao laboratório acreditado, por exemplo, utilizar o nosso nome e executar alguma atividade”, diz ele, ressaltando que o In-metro não delega competência, “apenas reconhece tecnicamente que determina-da instituição é competente para exercer aquilo que está solicitando”.

Explicando como funciona o proces-so, Oliveira diz que as entidades procu-ram pelo Inmetro e solicitam o regramen-to. “Nós avaliamos a competência técnica para poder atuar como acreditadoras, mas é a ANS que as homologa para atuar com operadoras de planos de saúde”, diz. E ressalta que essas entidades podem ser públicas ou privadas, “mas não pode, evi-dentemente, haver conflito de interesse”.

Ele esclarece que uma entidade que queira ser acreditada pelo Inmetro para acreditar operadoras de planos de saúde, tem de cumprir regras “e 90% delas estão na norma; o resto são parâmetros especí-ficos estabelecidos pelo Inmetro”.

Como é o processoOliveira explica que, quando há a so-

licitação de acreditação, é feita uma aná-lise crítica da entidade que está solicitan-do: “Definimos a equipe de avaliação, o período de avaliação, é feita a análise da documentação e marcamos uma visita”. E, para validar a acreditação, os auditores do instituto junto com a ANS participam da primeira avaliação, para testemunhar a performance da equipe que está execu-tando a avaliação. “Se ela realmente cum-pre com os requisitos estabelecidos por nós e pela ANS é concedida a acredita-ção”, esclarece.

Ou seja, diz ele: “O dono desse ne-gócio é a agência; nós apenas damos o suporte para eles”. A responsabilidade do instituto é fazer a acreditação, monitorar e supervisionar para que se mantenha a credibilidade do programa que foi desen-volvido pela ANS em parceria com o In-metro.” Hoje nós temos quatro entidades acreditadas pelo Inmetro e homologadas pela ANS”, diz Oliveira.

Em seguida, o palestrante cita uma conversa que teve antes de sua apresen-tação com João Boaventura, da ANS, e comentaram que, de mil operadoras, apenas quatro acreditadas. “É um núme-ro bem pequeno.” E aí surgem as per-guntas, diz ele. Por que só quatro? O que temos que fazer? Como temos que fazer? Oliveira diz que as respostas não cabem somente ao Inmetro, à ANS mas a todo o sistema.

Concluindo, ele diz que o objetivo de sua palestra foi passar aos assisten-tes a experiência do Inmetro, a relação construída com a ANS, o desenvolvi-mento desse programa e dizer que as ex-periências do Inmetro, seja no Brasil ou fora dele, são exatamente no sentido da melhoria. “O Inmetro está à disposição da ANS e da FGV sempre que for neces-sário”, garante.

1. A resolução normativa nº 277 da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), de 4 de novembro de 2011, institui o Programa de Acreditação de Operadoras de Planos Privados de Assistência à Saúde, com o objetivo de incentivar a melhoria continuada na qualidade assistencial da saúde suplementar.

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Balzan explica que o evento pretende discutir com os palestrantes as iniciativas que motivaram o Hospital Israelita Albert Einstein a trabalhar com as clínicas avan-çadas, e o Dr. Consulta, com unidades avançadas. Tratam-se de dois modelos, enfatiza: “O primeiro, as policlínicas. E o segundo, o Dr. Consulta. A população que utiliza o Dr. Consulta talvez não te-nha condições de procurar as estruturas do Einstein, por exemplo”.

Em sua opinião, diz o moderador, o Dr. Consulta pode vir a ter algum pro-blema de financiamento no futuro, “mas vejo uma oportunidade de atendimento compartilhado com operadora de plano de saúde para indicações de cirurgias, procedimentos e exames de alto custo”. Segundo ele, conforme resolução do Conselho Federal de Medicina (CFM) e orientação da Agência Nacional de Saú-de Suplementar (ANS), a operadora não pode se negar a autorizar nenhum exame

inicia sua fala comentando que par-ticipou de um congresso na Facul-dade de Medicina da Pontifícia Uni-

versidade Católica (PUC), e na ocasião disse que entendia que o consultório médico de especialidades, no modelo que é hoje, vai se extinguir. “Só não apanhei porque as pessoas respeitaram os meus cabelos brancos”, brinca ele, para depois explicar que ainda hoje quem sai da faculdade tem aquela impressão de que vai para um consul-tório, o mundo vai chegar à porta dele e ele vai se dar bem. “Nós estamos vendo que não é isso o que acontece hoje. Não é isso o que as operadoras de planos de saúde, que são os maiores compradores de serviços na área médica, têm buscado. Não é esse o interesse”.

O MODERADOR

ou procedimento porque o médico não é do seu corpo clínico.

“Mas fico com algumas perguntas quando analisamos tanto o modelo do Dr. Consulta, quanto o do Einstein. No caso do Dr. Consulta, eu até entendo que o pacien-te não vai exigir muito exame porque sai 100% do bolso dele. E no Einstein é uma população com conhecimento diferente, que pode pagar por isso. Então fico pensan-do como é trabalhada a questão da medi-cina defensiva, vingativa e comissionada”.

Na explicação, Balzan diz que o ter-mo defensivo é porque o médico pede tudo para resguardar-se de um possível problema com a justiça. Quanto ao vin-gativa: “Já que a operadora não paga bem e você me pagou pouco pela consulta, eu vou pedir tudo o que eu posso”. E a comissionada: “Estou aqui dentro e ga-nho R$ 10 a hora, mas ganho R$ 30 por consulta; então atendo dez consultas por hora e pronto. Já fiz o meu diferencial”.

O Futuro do Consultório Médico

MODERADOR:

Marcio Vinicius Balzan

FGV Saúde

Debate 10/06/2015

20º SEMESTRE DE DEBATES FGV SAÚDE

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Então, ele pergunta: Como é que eu tra-balho essas questões, sendo que o ambula-tório facilita o acesso e o consumo em saú-de? E como garantir essa resolubilidade? Como medir? Eu atendo uma necessidade do cliente, teoricamente fazendo aqueles exames que são necessários àquela patolo-gia e quem me garante que realmente eu estou trabalhando bem? Estou acertando?

O que gostaria de deixar registrado, diz, são pontos muito interessantes para discutir no futuro, principalmente a his-tória do consumo em saúde com as ne-cessidades que foram levantadas aqui. “Se não me engano, em 1978, Olavo Setúbal em um debate na Fundação Getulio Var-gas do Rio de Janeiro, estava preocupado sobre onde colocar o cliente bancário. A mensagem dele era assim: o cliente não

tem que ficar no banco. E hoje pratica-mente não vamos ao banco”.

E, associando a essa história, Balzan diz que não temos todos os especialistas em todos os lugares. Temos que usar a tecnologia, treinar outros profissionais da saúde, orientando um exame de ul-trassom ou o que seja, para poder ajudar a população mais distante, sendo que os médicos, em sua maioria, estão concen-trados em grandes centros, principal-mente na região Sul-Sudeste.

Então, de novo, ressalta, precisamos rever o nosso modelo de atenção, princi-palmente neste mundo que está em eter-na transformação com a tecnologia. Te-mos de nos aliar à tecnologia para poder levar maior resolubilidade nas questões de saúde da população.

Falando sobre o tema de sua palestra, o Dr. Consulta, ele explica que nada mais é do que um veículo para que pacientes consigam ter acesso à medicina qualifica-da e para que médicos consigam exercer a medicina de forma digna.

Srougi conta que vem de uma família de médicos: “Meu pai é médico, meu ir-mão é médico e sempre convivi com isso e os vi sempre trabalhando muito”. No geral, diz ele, os médicos “ralam” muito e a população continua sofrendo para re-ceber atendimento. “É um desbalancea-mento que sempre me chamou a atenção. Coincidência ou não, estudei políticas públicas e, por isso, acho que sempre tive um olhar diferente para problemas. E tal-vez eu seja um pouco mais idealista”.

começa dizendo estar muito honra-do com o convite para participar do evento. E confessa: “Eu não enten-

do muita coisa de saúde. Entendo o que alguém poderia entender em cinco anos. Saúde é uma área muito complexa”.

O PALESTRANTEPALESTRANTE

Thomaz Srougi

Dr. Consulta

O Futuro do Consultório Médico - Debate 10/06/2015

Em determinado momento de sua vida, continua o palestrante, ele resolveu tentar aplicar na área da saúde o que co-nhecia do setor privado e percebeu que o problema da saúde era grande. “Eu te-nho uma convicção: acho que o trabalho de Organizações Não Governamentais (ONGs) e o trabalho do governo são im-portantíssimos, mas sempre me pergun-tei se o setor privado não teria condições de fazer o trabalho que o governo faz em alguns segmentos de forma mais eficien-te”. Com essa ideia, ele explica que resol-veu olhar para a saúde e fazer uma apos-ta. Segundo ele, não conhecer o mercado da saúde em profundidade foi uma vanta-gem. Ele não tinha nenhum vício. “Tudo o que fiz, tudo o que me propus a fazer

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e continuo tentando fazer, nada mais é do que me espelhar em outros setores”, explica. E, de alguns desses setores, ele trouxe práticas de gestão e, tentou cercar--se de profissionais com conhecimento técnico e assistencial. “E, com base nisso, propus-me a dedicar-me a esse negócio e percorrer algumas etapas”.

Etapas de desenvolvimento Falando especificamente sobre o Dr.

Consulta, Srougi explica que a primeira etapa de desenvolvimento foi de criação de um conceito: “Vamos abrir uma clí-nica! Não gastaremos muito tempo com planilhas. Abrimos uma clínica geral e vamos testar, buscar informações”, ex-plica, dizendo que todo dia recebia informações sobre, quantidade de atendimen-tos, especialidades, preço, como o paciente os conhe-ceu, satisfação ou não. “Era muito rudimentar, mas aos poucos, fomos entendendo quais eram as demandas, as aflições e tentando melhorar o nosso conceito, a nossa proposta de valor”.

A segunda etapa, con-tinua o palestrante, foi va-lidar o que o Dr. Consulta conseguiria oferecer, uma proposta de valor para uma quantidade muito grande de pessoas, com mercado realmente gigante e em que existiam muitas pessoas sem acesso. A terceira etapa foi eventualmente lapidar custos e despesas e reestruturar modelos de incentivo para que se conseguisse fa-zer sobrar alguma coisa.

Srougi cita o papel do governo e das ONGs. “Já participei de ONG, sei como é difícil levantar dinheiro, depender de do-ações. Não é sustentável. E as ONGs têm um papel importante para um grupo pe-queno de pessoas, mas eu nunca vi uma ONG bolar uma ação social e aplicá-la em escala”.

O Brasil, segundo ele, possui pro-blemas gigantes no mundo todo: saúde, educação, infraestrutura, transporte, po-luição, desmatamento... Existem muitas

ONGs por aí querendo ajudar e os pro-blemas continuam crescendo. “Assim, pelo menos para mim, ficou muito claro, que precisamos de algo diferente, preci-samos romper paradigmas, conhecer o que realmente funciona olhando dados; sair do achismo e perceber que precisa-mos pensar de forma diferente”. E saúde, ressalta o palestrante, é uma área muito delicada, com ideologias e muita paixão. “Mas, de maneira muito pragmática, não obrigamos ninguém a usar o Dr. Consul-ta, mas o vemos como uma alternativa”.

Srougi ressalta que o Dr. Consulta se propõe a desenvolver um serviço, “mas não somos caridade”. Ou seja, é preciso cobrar alguma coisa, diz ele, informando que o lucro é todo reinvestido no negócio

para que se possa crescer de forma au-tossustentável. “Cada vez que resolvo o problema de alguém, eu realizo um lucro e esse lucro é reinvestido para resolver o problema de mais duas pessoas”, explica, dizendo que esse conceito, bem traba-lhado, permite crescer e chegar onde se quer, propiciando solução para um pro-blema social relevante, solução em esca-la, fugindo da dinâmica da ONG.

Hoje o Dr. Consulta envolve, além das consultas (35 especialidades), exa-mes de laboratório, exames de imagem e pequenos procedimentos de baixíssima complexidade dentro da clínica. Srougi informa que não trabalham com planos de saúde. “Vocês sabem melhor do que eu que planos de saúde representam 25% da população e que 75% não têm condi-ções”, diz ele, opinando que esse gap vai aumentar no atual cenário macroeconô-

“Especialização na área da saúde tende a levar a uma melhor utilização dos ativos que você emprega para prestar atendimento”

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mico. Por isso, continua, ele e sua equipe se propuseram a tentar desenvolver um modelo que levasse alívio para quem não tem plano de saúde e trouxesse um am-biente melhor para o médico.

Segundo o palestrante, o Dr. Consul-ta, hoje, possui sete consultórios. E que demorou três anos para conseguir validar o modelo de negócio. “E o meu objetivo foi sempre muito simples: eu queria mon-tar um negócio que fosse de alto impac-to, que melhorasse a qualidade de vida das pessoas, que fortalecesse o Brasil”. E mais: queria montar um negócio numa grande oportunidade, do ponto de vis-ta econômico, um grande mercado, um negócio que fosse replicável e escalável e que gerasse lucro. “Ao longo de três anos, validamos cada um desses atributos. E ainda temos grandes desafios pela frente, mas o fato é que a população está dando a resposta, eles querem usar. A proposta de valor é positiva”.

Tecnologia para baixar custosE para baixar custos, diz Srougi, não

tem muito segredo: “Acho que é uma per-gunta que fica na cabeça de todos. Eu não sabia. Mas, olhando para trás e tentando entender um pouco do que nós fizemos -- e acho que já começando a fazer um link com este evento --, tem um pedaço im-portante disso que é a tecnologia, o papel da tecnologia na área da saúde”, diz ele, explicando que no início do Dr. Consul-ta ele nunca imaginou que fosse investir em tecnologia, mas, ao longo do tempo, ficou muito claro o papel da tecnologia para melhorar a experiência do pacien-te dentro do Dr. Consulta, para agregar mais valor para o paciente, para engajá--lo, informá-lo, trabalhar prevenção, etc. “Tecnologia é um driver importantíssimo para baixar custo”, ressalta.

Outro driver que o palestrante cita é a especialização, contando que isso apren-deu na prática: “Especialização na área da saúde tende a levar a uma melhor utili-zação dos ativos que você emprega para prestar atendimento”, diz. E melhor utili-zação, explica, é melhor margem, melhor rentabilidade. “Não tem muito segredo.

Eu não carrego custos de serviços que não utilizo dentro de um serviço básico. Eu não tenho alta complexidade”, diz o palestrante, ressaltando que a opção foi focar num pedaço da cadeia de valor da saúde. “E muita gente me falava que não íamos dar certo. Que precisaria ser uni-versal o atendimento”. “Tudo bem”, ad-mite, “seria ótimo se fosse universal, mas eu estou propondo-me a prover um diag-nóstico e acho que isso já tem um grande valor”, diz com orgulho. E diz que foram resolvidos os problemas de 90% das pes-soas que procuram o Dr. Consulta e que, se não tivesse valor, as pessoas não esta-riam usando.

Especialização, diz Srougi, é mui-to importante, mas com integração. É importante ter um olhar macro da saú-de, mas é preciso especializar-se. “E não podemos esquecer de integrarmo-nos a outros prestadores de serviços de saúde. Obviamente é muito melhor para o pa-ciente porque ele tem continuidade”. E esta é uma grande dificuldade, é um gran-de desafio para o setor da saúde. Integrar informações, integrar exames para pres-tar um atendimento holístico ao paciente.

Atributos necessáriosPara ter conseguido chegar onde che-

gou com o Dr. Consulta, Srougi explica que são necessários dois atributos: prin-cipalmente, uma equipe de profissionais qualificados -- médicos, enfermeiros, técnicos de enfermagem, recepcionis-tas, time de gestão -- e processos muito bem desenhados, lapidados e executados. “Processos, talento, tecnologia e especia-lização na cadeia de valor. Esses foram os atributos que nos trouxeram até aqui”.

Falando em tecnologia, Srougi faz nova confissão, dizendo que é algo de que entendo pouco. Mas também diz que acha preciso encará-la de forma diferente. E pergunta: por que o consultório existe? Como ele surgiu? Em que situação social, econômica surgiu o consultório médico? E como essa situação mudou hoje em dia? Em termos de custo, tecnologia, o que as pessoas querem, o que o médico pode oferecer? Eu acho que o consultó-

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rio médico tende a desaparecer. Por que a gente não pode fazer telemedicina? “Faz total sentido. Conseguiríamos atender muita gente em Manaus, no meio da flo-resta com acesso à internet”.

E mais perguntas: Pode-se fazer cirur-gia robótica? Pode. Por que eu não pos-so fazer consulta médica? Continuando, o palestrante comenta que, obviamente, cada especialidade tem a sua particulari-dade, mas, em sua opinião, se não forem quebrados paradigmas e algumas ideo-logias preconcebidas, não será possível

conseguir resolver o problema da saúde, que custa muito caro. “Eu imagino que o consultório médico tende a desaparecer porque é caro bancar essa estrutura”, diz Srougi. E explica que, na verdade, para muitas especialidades, o paciente nem precisaria estar ali. Ele precisa receber uma informação e entender o que tem de fazer para mudar alguma coisa; um tra-tamento. “Enfim, de novo, é a visão de alguém que não entende muito ainda, mas eu tendo a acreditar nisso”, diz, con-cluindo sua palestra.

PALESTRANTE

Antonio da Silva Bastos Neto

Hospital Israelita Albert Einstein – HIAE

Sociedade Beneficente Israelita Brasileira

Hospital Albert Einstein - SBIBAE

O Futuro do Consultório Médico - Debate 10/06/2015

do palestrante foi organizada em quatro eixos: o contexto da saúde, as forças de mudan-

ça e implicações no modelo assistencial e ambulatorial; as alternativas estratégicas que o Einstein (Hospital Israelita Albert Einstein – HIAE) adotou para esse tema; o papel do médico em relação a um cenário que requer mudanças, quebra de paradigmas. E, no final, fez algumas considerações.

A APRESENTAÇÃO

Falando de início sobre os gastos de saúde, Bastos Neto comenta que é conhe-cido de todos o crescimento exponencial dos gastos, o comprometimento do Pro-duto Interno Bruto (PIB). “Nos Estados Unidos, os gastos com saúde estão pró-ximos dos 20%”, diz ele. E o Brasil está indo para o mesmo caminho, mas numa situação de subfinanciamento. E um as-pecto importante é que algumas tendên-cias vêm acontecendo e terão impacto di-reto na organização dos serviços.

Outro aspecto também já conhecido é o envelhecimento da população, mas também se pode falar, diz Bastos Neto, sobre o envelhecimento dos prestadores de serviços: “As gerações que chegam no mercado têm uma visão diferente, valores diferentes, e isso gera um certo conflito

em que quem é, por exemplo, da minha idade, que é da década de 60 e tem o hábi-to de falar que o jovem não quer nada com nada e acha que vai transformar o jovem num velho da década de 60. Isso não vai acontecer”.

A questão da epidemia do mau estilo de vida é outro aspecto que cita, falan-do sobre o sedentarismo, os maus hábi-tos alimentares, que têm causado uma situação em que os pacientes adquirem múltiplas comorbidades, o que muda um pouco a maneira de tratar para alcançar efetividade.

Outra questão é a revolução da in-formática, segundo ele. “Em países de-senvolvidos, a utilização da informática é uma iniciativa que é de governo e tem grandes metas. Por que? Porque a falta

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da informação bem estruturada, a falta de informação disponível no tempo real gera duplicidades, ineficiências e au-mento de custo”. Ao mesmo tempo, diz Bastos Neto, os pacientes estão cada vez mais bem informados. A informação é pública e democratizada. Isso tem uma série de impactos também no atendimen-to ao paciente.

Mas ele destaca que as tecnologias, que historicamente têm um crescimento muito grande, envolvem custos altíssimos. “Nós estamos agora na fase do incidenta-lomas. São problemas de saúde descober-tos por um acaso e que, após um milhão de exames, não era nada. Um incidenta-loma. Quanto isso gera de ineficiência, de custo e de insatisfação do paciente?”.

A patologia e não só a doençaFalando sobre o momento atual, o

palestrante comenta que estamos passan-do por uma série de mudanças quando a característica do cuidado precisa ser di-ferente. Não dá mais para somente tratar a doença. É necessário olhar a patologia, olhar o paciente do ponto de vista mul-tidisciplinar, trabalho em equipe, troca de experiências”. E isso, enfatiza, para o médico, é uma situação nova, porque ele não foi formado para trabalhar dessa maneira. E, com isso, há uma quebra de paradigma que precisa ser feita, questio-nando o modelo tradicional do médico super-herói, que faz diagnósticos bri-lhantes. Hoje o modelo é mais baseado num time multiprofissional.

Falando sobre o paciente, Bastos Neto explica que um aspecto que não pode ser esquecido é o comportamento do paciente pela democratização da in-formação.

Segundo ele, cada vez mais os pacien-tes, em situações de baixa complexidade, escolhem aquilo que eles querem: “Não tem mais aquela coisa de que eu vou ligar para o médico porque estou com uma fe-bre, não estou me sentindo bem”, diz ele, ressaltando que isso tem uma implicação muito séria porque tem desviado o flu-xo dos pacientes dos consultórios para as unidades de pronto-atendimento. “É um

fenômeno mundial, em que essas unida-des, que têm um custo altíssimo, não con-seguem ser sustentáveis para atender gripe numa estrutura de porte incompatível”.

A Associação Nacional de Hospitais Privados (ANAHP), informa o palestran-te, fez uma pesquisa em 2013 comparan-do o atendimento no pronto-socorro e no consultório, na perspectiva do paciente. O que foi colocado como positivo em relação ao pronto-socorro: 24 horas de funciona-mento; atendimento a todas as situações, inclusive urgência e emergência; cobertu-ra da fonte pagadora; exames com resul-tados imediatos definição de especialista.

Em relação aos consultórios, Bastos Neto diz que os pacientes consultados avaliam como pontos positivos: maior tempo para o atendimento, dá para con-versar e ter mais atenção do médico; o diagnóstico tende a ser mais preciso; e eles são indicados por amigos e familiares a esses médicos, ou seja, o médico não é um desconhecido para eles. Do ponto de vista negativo do consultório: é preciso agendar a consulta, o que demora meses dependendo do médico; os exames são realizados externamente; dificuldade em saber quem é o especialista. E no pronto--socorro é exatamente o oposto.

O palestrante informa ainda que per-guntaram aos pacientes o que precisa-ria para que deixassem de ir no pronto--socorro e irem para um consultório. E aqui, diz ele, dá para chegar a algumas conclusões; se o consultório tradicional vai desaparecer ou não e quais são as es-tratégias para que se viabilize um aten-dimento adequado para as necessidades que os pacientes têm e para o mundo em que vivemos. Menor prazo de marcação de consultas, maior disponibilidade de médicos, resultados mais rápidos, estru-tura ambulatorial semelhante a hospitais e maior cobertura dos planos de saúde. “Essa é a visão dos pacientes de diferen-tes planos de saúde e que frequentam hospitais afiliados à ANAHP”.

Citando as diretrizes estratégicas e os objetivos organizacionais do HIAE, Bas-tos Neto fala sobre a expansão das ati-vidades e que dentre elas está criar uma rede de unidades avançadas que permi-

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tam o atendimento dos pacientes mais próximos de onde estejam localizados, experimentando novos conceitos como ambulatórios satélites, mais abrangen-tes, e sistemas integrados de prestação de serviços, cobrindo promoção, prevenção, diagnóstico, tratamento e reabilitação nas diversas fases da vida do ser humano sob a marca Einstein.

Ou seja, explica, nesse momento, na estratégia, a instituição enxergou-se como um sistema de saúde e a expansão das suas atividades em unidades avança-das permitiria maior capilaridade, maior captação de pacientes, conquista de no-vas regiões, mas também foco nas neces-sidades do paciente.

Para isso, foram feitas análises de ris-cos do ponto de vista sociogeográfico, de mercado, contexto da saúde, ameaças; análises epidemiológicas, que tipo de po-pulação tinha na região; análise de riscos assistenciais, qual seria o risco para o pa-ciente e para a instituição ter uma unida-de avançada sem leito de internação; uma análise econômico-financeira, obviamen-te, e também pesquisa com diferentes stakeholders.

Um aspecto importante em relação à estratégia do hospital, segundo Bastos Neto, é que, na expansão, o modelo uti-lizado é o conceito de ‘hub and spoke’. Ele explica o que isso significa: “O hub

do computador é uma central que recebe vários cabos e distribui. A estratégia foi montada no sentido de ter uma unidade central no Morumbi, como hospital, com toda a complexidade, e as unidades avan-çadas, cada uma com um mix de serviços”.

O papel do médico Neste momento, Bastos Neto começa

sua fala sobre o papel do médico, citando que, em 2013, o Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo (Cre-mesp) publicou a Demografia Médica no Brasil e fornecendo alguns dados: 400 mil médicos no Brasil com projeção de 500 mil. A relação em 2013 era de dois médicos para mil habitantes. Em 2015, vai chegar em 2,41. Segundo o palestran-te, há uma distribuição irregular (Figu-ra 1): 55% dos médicos atuam no SUS; 40% deles têm menos de 39 anos; 60 mil têm mais de uma especialidade; e 180 mil não têm residência médica. Ele enfatiza ainda um dado que considera significa-tivo: mulheres e jovens recém-formados têm escolhido mais especialidades bási-cas. “Há algum tempo ouvimos falar que ninguém queria fazer pediatria, ninguém queria fazer clínica médica, mas esse sen-so demonstra uma situação um pouco di-ferente”. De acordo com o Departamento de Informática do Sistema Único de Saú-

Figura 1.

Fonte: CFM; Pesquisa Demografia Médica no Brasil, 2013.

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de (Datasus), em dados de abril de 2015 existiam 131.434 consultórios médicos privados no Brasil.

Em seguida, ele pergunta: “Como li-dar com o médico?”

Para ilustrar, ele explica que a Figu-ra 2 mostra que, no status quo, no topo da pirâmide estão os líderes, aqueles que propõem mudanças, que são influen-ciadores, que mobilizam e sustentam as melhorias. Os contribuidores são aqueles que dedicam um tempo para o hospital. Eles participam de um comitê e têm ex-pertise diferenciada. E há os cooperado-res. “Na realidade, dentro da estratégia, a ideia é aumentar o número de líderes, aumentar os contribuidores e transfor-mar os resistentes em cooperadores. E esses cooperadores são aqueles médicos que fazem as coisas direito”.

Aqui, o palestrante faz outra pergun-ta: “Será que nós engajamos os médi-cos?” E mostrando outra figura, a Figura 3, ele explica que existem quatro fato-res principais no engajamento: “Primei-ro você pergunta para o médico se ele pretende ficar na organização por mais de três anos; depois se a organização o inspira a fazer o melhor; se ele tem von-tade, desejo de fazer um grande esforço para que a organização tenha sucesso; e,

por último se recomendaria a organiza-ção aos colegas médicos como um gran-de lugar para fazer medicina. E aí tem ferramenta para isso”.

Estrutura de pilaresBastos Neto continua sua palestra,

agora abordando o programa de relacio-namento médico no Einstein, explicando que é estruturado em pilares que estão alinhados à missão e visão da SBIBAE (Sociedade Beneficente Israelita Brasilei-ra Hospital Albert Einstein – SBIBAE). “Está baseado em parâmetros de qualida-de, volume de prática, ensino e pesquisa e responsabilidade social, segmentado por indicadores (em torno de 74)”, informa, ressaltando que, como uma maneira de reconhecer o seu momento profissional, os médicos são classificados de special a premium. Special é o médico que tem um relacionamento recente com a instituição e premium é aquele que já tem uma his-tória construída, que tem qualidade men-surada na sua prática. “Eu queria reforçar que o pilar ‘volume de prática’ não é re-ceita. Alguns médicos falam ‘vocês só dão espaço para quem traz dinheiro’. Isso não é verdade”, enfatiza Bastos Neto.

A base desse programa, segundo ele,

Figura 2.

The IdealThe Status Quo

Cooperators

Cooperators

Contributors

Contributors

LeadersLeaders

Resisters

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envolve desenvolvimento do médico, que é avaliado na sua prática, recebe feedback. Há uma relação de meritocracia, constru-ção de parceria e transparência que é uma premissa para que isso aconteça. E, a cada ano, o ciclo renova-se. “Mas é um exer-cício que envolve métricas para definir qual é o privilégio e entendam privilégio como ‘eu tenho uma relação bem estru-turada, com uma métrica bem adequada e o hospital tende a conceder benefícios e algumas participações de equipes de re-taguarda e de referenciamento médico’”, diz Bastos Neto, informando que hoje são 7.500 médicos cadastrados no hospital.

Bastos Neto diz ainda que o Einstein trabalha com os pilares da segmentação para o corpo clínico: qualidade, volu-me da prática, ensino e pesquisa e res-ponsabilidade social. “O corpo clínico é avaliado por equipe multiprofissional e essa avaliação vai desde o preenchimen-to de prontuários, adesão aos protocolos até a participação em ações de ensino e pesquisa. Tudo aquilo que está dentro da estratégia e que é importante é avaliado”, enfatiza.

Ao término de sua fala, Bastos Neto faz algumas considerações para discus-são: a escalada crescente de custo com hospitalização continuará incrementan-do um volume de consultas e procedi-mentos ambulatoriais; o paciente é um consumidor de serviços e não deve ser tratado como paciente, já que possui suas prioridades e exige maior conveniência dos serviços, transparência e eficiência; a utilização de serviços de saúde de baixa complexidade é guiada pela conveniên-cia; os usos de tecnologias móveis ten-dem a promover uma ruptura do modelo tradicional de atendimento; estratégias de crescimentos tradicionais são incom-patíveis com a sustentabilidade; relacio-namento com médicos e adoção de polí-ticas de engajamento são essenciais para as mudanças necessárias; a prática médi-ca dentro de consultórios institucionais agrega maior valor para o paciente e o médico, considerando que a organização confere recursos que facilitam. “E, infe-lizmente, hoje o modelo é muito ‘medi-cocêntrico’, o que eu acho que atrapalha o país e dificulta o acesso”.

Figura 3.

Four Primary Factors in Organisational Engagement

Defining the Engaged Medical Staff Organisation

Doctors self-identify as part of the organisation and are personally motivated to help it succeed

I am likely to be practicing at this

organisation three years from now

I am willing out put in a great deal of effort to help this

orgaisation succeed

This organisation inspires me to

perform my best

I would recommend this organisation to other clinicians as a

great place to practice

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Hamilton Hourneax Pompeu agra-dece de início o convite que lhe foi feito e explica que será discuti-

do um assunto especialmente polêmico e que tem despertado a atenção crescente, tanto da comunidade jurídica como da comunidade médica, em razão das muitas implicações que causa, especialmente no cenário econômico em relação às questões políticas que são colocadas em xeque.

O MODERADOR

Judicialização na Saúde

MODERADOR:

Hamilton Hourneaux Pompeu

Tribunal Regional do Trabalho

Debate 25/08/2015

21º SEMESTRE DE DEBATES FGV SAÚDE

A judicialização das questões em saú-de, diz ele, tem sido um fenômeno cres-cente nos últimos anos, ganhou muita força a partir da Constituição de 1988, que traz uma disposição de que a saúde é um direito de todos e dever do Estado. “Então, por conta disso, e por conta de algumas modificações processuais, tor-nou-se mais fácil o acesso dos indivídu-os à Justiça cada vez mais reivindicando questões referentes à saúde”, explica, enfatizando que isso foi num crescente muito grande, até que atingiu níveis de difícil administração.

Por conta disso, informa, o Conse-lho Nacional de Justiça começou a tomar algumas iniciativas visando a estimular, sem obrigar, mas de maneira frequente e progressiva, os tribunais estaduais e fe-derais a que se aparelhassem de alguma maneira, criando núcleos de atenção téc-nica para auxiliar os magistrados a enten-derem um pouco melhor essas questões relativas à saúde, antes de simplesmente decidirem em caráter liminar, com todas as implicações do seu cumprimento e com decorrente gasto bastante grande.

Segundo Pompeu, o estímulo foi sen-do implementado inicialmente visando à questão da saúde pública, mas depois foi visto que tinha que ser estendido à saúde suplementar, que também vinha regis-trando número crescente de processos. “E não é interessante a ninguém deses-truturar o sistema de saúde suplementar porque a consequência seria uma deses-truturação indireta do Sistema Único de Saúde (SUS)”, alerta, explicando que os dois mecanismos, na verdade, estão in-tegrados e têm de caminhar de maneira equilibrada e em paralelo., “cada um, ló-gico, dentro da sua própria sistemática”.

Por conta disso, continua, essas mes-mas iniciativas também passaram a fo-car as questões da saúde suplementar, a ponto de os tribunais editarem súmulas e recomendações aos juízes para terem um pouco mais de cautela em relação às de-cisões que vêm sendo tomadas. “Eu acre-dito que o dr. João Baptista Galhardo Ju-nior vai poder posicionar-nos um pouco, de maneira atualizada, com relação à ins-talação do núcleo de atenção técnica em São Paulo, noticiada há alguns meses e

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que causou alguma polêmica em razão da sua composição. Sinceramente, não sei se esse núcleo já está atuante, mas acho que dr. João vai poder dizer-nos isso de forma mais clara.”

O moderador anuncia que a apre-sentação será iniciada com Lenir Santos, doutora em saúde pública pela Universi-dade Estadual de Campinas (Unicamp); coordenadora do curso de especialização do Instituto de Direito Sanitário Aplicado (Idisa); advogada especializada em gestão e direito público; especialista em Direito Sanitário pela Universidade de São Paulo (USP); palestrante, conferencista; e auto-ra de diversas obras nessa área.

Em seguida, informa, virá o contra-ponto com a palestra do dr. João Baptista, que é juiz de Direito do Estado de São Paulo desde 1990; mestre em direito pela Universidade Estadual Paulista (Unesp); membro do comitê estadual do Conselho Nacional de Justiça; e assessor da presi-dência do Tribunal de Justiça de São Pau-lo da seção de direito criminal. “E que, eu sei, tem uma experiência interessante com mediação anteriormente à judiciali-zação que, até mesmo, ganhou um prê-mio em 2007 por essa prática: o Prêmio Innovare, muito importante para as ações inovadoras dentro do Judiciário”, diz Pompeu terminando sua fala.

PALESTRANTE

Lenir Santos

Instituto de Direito Sanitário Aplicado

(IDISA)

Judicialização na Saúde - Debate 25/08/2015

Lenir Santos explica, no início de sua fala, que irá tratar de um tema que é sempre polêmico: a judicialização

na área da saúde.

A PALESTRANTEEla explica que esteve na última jor-

nada que o Conselho Nacional de Justi-ça (CNJ) promoveu nos enunciados no campo da judicialização, em São Paulo e lembra que saiu de lá bastante preo-cupada porque toda a discussão foi, na realidade, um aperfeiçoamento da judi-cialização.

Se a judicialização não é uma coisa boa para a área da saúde, continua Lenir, para o Sistema Único de Saúde (SUS), todos os aperfeiçoamentos também não o são “e acabamos pensando se esse caminho real-mente é o melhor ou se o caminho é atacar as causas da judicialização”.

Segundo ela, fala-se o tempo todo da judicialização e muito pouco na desjudi-cialização, nas medidas para consegui--la. “E é preciso encontrar esse caminho porque a judicialização tem sido extre-

mamente crescente, onerosa”, enfatiza, ressaltando que nem assim aumenta o financiamento da saúde: “Até seria sau-dável se aumentasse, mas desestrutura o financiamento, o planejamento, a maneira como vão ser aplicados os recursos”.

Serviços inadequados Lenir continua dizendo que, se olhar-

mos do ponto de vista do governo, o Exe-cutivo, o Legislativo -- porque as políticas públicas também precisam ser discutidas --, veremos que a causa número um ou a causa principal da judicialização é a inade-quação dos serviços de saúde em relação às necessidades da população.

E isso inclui, segundo ela, a prestação de serviço, a má gestão, a aplicação dos re-cursos muitas vezes. “E temos também vá-

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cuos legislativos que acabam fazendo com que a judicialização não se resolva e, pelo contrário, se intensifique.”

Existem as causas do Executivo, do baixo financiamento: “Não adianta que-rermos enfeitar; o financiamento na saúde é baixo”.

Lenir diz que quando se fala em volu-me de dinheiro, pode-se até ficar surpreso: “Nossa, a União coloca R$ 100 bilhões”. Parece muito, diz ela, mas na verdade é in-suficiente porque é preciso ver o tamanho do público que tem que ser atendido e o campo em que se está.

A palestrante informa que o Brasil hoje gasta per capita por volta de R$ 1 mil com saúde, cálculo de 2014, quando teria que, no mínimo gastar, pelo menos, R$ 2 mil reais. “Então nós temos realmente in-suficiência de financiamento. Temos má gestão”, salienta Lenir, ressaltando que a consequência são serviços inadequados às necessidades das pessoas. “Além de vácuos legislativos importantíssimos que realmente acabam trazendo muitos em-baraços para as pessoas, para o governo, para o Executivo.”

Escolhas e limites Lenir explica que em todos os países

que garantem saúde de maneira igualitária e universal, há limites. Fazem escolhas, “e têm que fazer escolhas porque jamais se pode incorporar uma tecnologia na área da saúde se não tiver dinheiro para bancar para todos aqueles que vão precisar da-quela tecnologia”, enfatiza.

Mas ela explica que o princípio da igualdade aqui já sofre interferência por-que se está incorporando uma tecnologia cujo acesso não vai ser possível garantir a todos. E, num país de profundos apadri-nhamentos, vamos ter certamente aquelas pessoas que estão mais privilegiadas e a desigualdade sempre se aprofundando.

Então Lenir explica que, quando cita “todos”, na verdade não são todos. Quem está fazendo um diagnóstico e tem uma te-rapia prescrita no âmbito de plano de saú-de não tem que buscar complemento do SUS. O SUS não complementa o setor de plano de saúde ou o setor de seguro saúde.

E “tudo” não é real, diz ela. “Não é possível. Não será possível. A área da saú-de é um mundo de tecnologias”, expli-ca, ressaltando que estas são crescentes, onerosas. E uma tecnologia não suprime a outra: “Sempre acabam ficando diver-sas tecnologias para a mesma terapêutica, acrescendo custos”.

Lenir diz que em sua visão é um vácuo legislativo não ter sido definida a integrali-dade da assistência à saúde. E, segundo ela, o Legislativo pode fazer audiências públi-cas, ouvir a sociedade, ouvir os conselhos de saúde. Os 5.570 municípios têm conse-lhos de saúde. Os Estados têm conselhos de saúde. E existe o Conselho Nacional de Saúde (CNS). “Vamos fazer um pacto Esta-do-sociedade”, conclama. “E definir o que vamos garantir para todos. E aquilo que a gente garantir realmente tem que ser para todos e ser de qualidade e quantidade.”

As regiões de saúde A palestrante fala agora sobre o sis-

tema de saúde brasileiro, em sua opinião bastante desorganizado muitas vezes. E cita um exemplo: a questão da região de saúde, artigo 198 da Constituição, que faz a definição do SUS. Explicando, Lenir diz que o SUS resulta da integração de ações e serviços dos entes federativos em rede e em regiões de saúde. E que hoje existem em torno de 400 regiões de saúde no país, que não são verdadeiras regiões de saúde capazes de atender 95% das necessidades da população.

Ou seja, diz ela, estamos com 27 anos de SUS e ainda patinamos com a questão de organizar as regiões de saúde, as redes de saúde, as referências e as responsabi-lidades com financiamento quando um município de maior porte garante serviços para munícipes que não são seus.

Para ela, o município não tem que ga-rantir nada que seja da sua obrigação para munícipes que não são seus: “Quando ele faz isso, ou o Estado ou a União tem que arcar com o financiamento desses servi-ços”, diz ela, explicando que isso no SUS é algo que já está bastante estruturado, ou seja, fazer essas transferências de recur-sos da União para Estados e municípios.

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Cuidar da saúde é competência das três esferas do governo, que são solidárias em tudo aquilo que você tenha que fazer dentro daquele campo”, explica, salientando que o SUS não se organiza assim.

“Pode não ser do jeito que a lei determina, mas existe e a gente precisa desses aperfei-çoamentos.”

Outro problema, segundo Lenir, é o acesso, em que sempre a Atenção Básica é quem ordena todas as referências. As fi-las... “Eu falo que no SUS nós estamos na pré-fila, porque fila pressupõe uma ordem. E muitas vezes uma pessoa vai procurar serviços, volta e não sabe quando vai ser aten-dida”, explica. Para ela, mes-mo que esta seja 100ª pessoa, tem que ter uma ordem, uma expectativa de quando vai ser atendida. “Assim, nós temos realmente muitos problemas do ponto de vista de orga-nização administrativa do SUS.”

Responsabilidades federativasA outra questão que Lenir cita, comen-

tando que é um “grande nó” no campo da judicialização, são as responsabilidades fe-derativas na região de saúde. Esse tem sido um problema seriíssimo, diz ela, porque o Judiciário trabalha com o conceito de res-ponsabilidade solidária todas as vezes em que a competência é comum. “Então, cui-dar da saúde é competência das três esfe-ras do governo, que são solidárias em tudo aquilo que você tenha que fazer dentro da-quele campo”, explica, salientando que o SUS não se organiza assim.

A própria Constituição no artigo 198, continua Lenir, define que o SUS se or-ganiza em rede, em região de saúde, e os serviços são hierarquizados no sentido de complexidade tecnológica. “Então isso já mostra que ninguém faz tudo sozinho”, enfatiza. E mais: nem pode ser responsá-vel financeiramente, porque vai arrebentar o município. Lenir informa que 70% dos municípios no Brasil têm menos de 20 mil habitantes. “Então imagina você acionar o município para cobrir o alto custo.”

Ela ressalta que alto custo já está de-finido que é da União. “Isso é algo que já deveria estar assentado.” Ações judiciais, quando se tratam de medicamento ou de procedimento de alto custo, deviam ir,

inclusive, para a justiça federal e contra a União, “porque isso já está pactuado, não há dúvidas”. Mas Lenir ressalta que ninguém cuida disso e muitas vezes con-dena-se o município a arcar com um me-dicamento ou um procedimento de alto custo, que ele nem vai fazer, vai ter que mandar fazer.

“As responsabilidades na área da saú-de, eu sempre falo, são sistêmicas”, diz Lenir, citando que o artigo 7º da Lei n.º 8.080 -- que trata da organização, do fun-cionamento do SUS, quando define a inte-gralidade da assistência à saúde – em seu inciso II diz que é um conjunto articulado e contínuo de ações em serviços para to-dos os níveis de complexidade dentro do sistema. “Não diz que cada ente faz. Por-que o SUS é sistêmico; um está ligado com o outro”, salienta Lenir.

Jornada pública e privadaUm outro problema que existe, conti-

nua a palestrante, é a dupla jornada mé-dica. Quando há dupla jornada, uma no público, outra no privado, se acaba fatal-mente tendo pessoas que são atendidas no privado e que serão receitadas ou ter re-comendação de determinada terapêutica. “E a pessoa vai acabar indo muitas vezes buscar o complemento no setor público”, diz ela.

Segundo Lenir, isso é algo que o De-creto n.º 7.508, no tocante ao medicamen-to, tem uma determinação de que tem que ser prescrito para quem está em tratamen-to no SUS, por médico do SUS e que este-ja no ambiente de trabalho do SUS. “Mas

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essas exigências não têm sido observadas pelo Judiciário”, salienta.

Saúde é muito mais do que assistên-cia, ressalta, tanto que o privado não pode atuar na área de vigilância, não pode atu-ar na área de regulação, não pode atuar na área de controle. O privado só tem autorização para atuar num determinado segmento da área da saúde. E com isso, diz ela, as coisas ficam muito mistura-das porque não se cumpre o dever que está no artigo 197 da Constituição, que se refere aos serviços públicos e privados. Esse dispositivo não especializa quando diz que são de relevância pública as ações e serviços de saúde. É público e privado. “O artigo não especializou que são os pú-blicos, nem que são os privados. E que compete ao poder público a fiscalização, a regulamentação e o controle.”

Então, diz Lenir, imagine o tamanho do poder que o poder público tem e o do dever de regulamentar, fiscalizar e contro-lar os serviços públicos e os serviços pri-vados. “E as coisas acabam não acontecen-do dessa maneira”, destaca.

Citando ainda outro problema, Lenir fala sobre o poder médico interferindo nas escolhas públicas fundamentadas, tema que com frequência está sob julgamento do Judiciário. O poder público, segundo ela, tem o poder de escolher entre duas terapias que têm o mesmo resultado, “e deve escolher aquela que é mais barata, é óbvio, porque o Estado tem que garantir saúde para 200 milhões de pessoas e tem que fazer escolhas para enfrentar o custo, que é oneroso”.

Coletivo sobre o individualOutro problema sério, aponta Lenir,

é tratar do caso individual, porque o ape-lo emocional e sentimental da doença é pesado. “Mas não podemos nos pautar por isso, porque estamos falando de um direito social, de uma área em que não se pode garantir assistência para um se for prejudicar inúmeras pessoas”, ressalta, dizendo que é preciso olhar o coletivo,

olhar o todo. É o individual sobrepondo--se ao coletivo.

Outra questão, continua Lenir, é a “briga” que há quando determinadas pa-tologias querem incorporar um certo me-dicamento e a outra patologia quer incor-porar outro medicamento. “Fica patologia versus patologia, sem se saber para que lado se vai. Não tem dinheiro para tudo. Não é possível ter”, enfatiza Lenir.

Há um ativismo judicial muito grande hoje, diz Lenir, dizendo que não defende isso, mesmo achando que o Judiciário é fun-damental, mas esse poder, diz ela, precisa ter um olhar, principalmente na área da saú-de, mais cauteloso “porque nós sabemos a quantidade de coisas que está por trás”.

O grande problema, segundo Lenir, é que os nossos gestores da saúde, as nos-sas autoridades, as mais altas autoridades públicas, o nosso Legislativo, o Judiciário, todo mundo tem plano de saúde: “Quer dizer, quem acaba gerindo o SUS não usa o SUS. Quem acaba decidindo se vai dar esse medicamento ou esse procedimento não usa o SUS”.

E temos o setor privado que atua na área da saúde, continua a palestrante, ci-tando em especial a indústria farmacêutica: “Que não é boazinha, em hipótese alguma. De jeito nenhum. Ela quer lucro”, diz ela, ressaltando que é algo absolutamente legí-timo, “desde que seja um lucro mais res-ponsável. E nem sempre é”. Quer dizer, não podemos achar que estamos lidando num meio em que as pessoas sempre têm um sentimento humanitário. Não é verdade. Sabemos que não é. Lenir diz que leu num artigo do Avram Noam Chomsky1 que a in-dústria farmacêutica não quer mais vender remédio para doente. Ela quer vender re-médio para saudáveis. “Ou seja, já quer um outro mercado”, diz Lenir.

Gastos desorganizadosEm seguida, a palestrante fala sobre o

desperdício de recursos na área da saúde: “O medicamento é concedido, o Execu-tivo não fiscaliza, não verifica. Continua

1. Linguista, filósofo, cientista cognitivo, comentarista e ativista político norte-americano.

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entregando; a pessoa muda de casa”, cita, explicando que há casos já apurados de pessoas que acabam vendendo medica-mentos, que são muitas vezes muito caros, devido à falta de fiscalização das liminares da Justiça.

Luz no fim do túnel? pergunta Lenir. Sua resposta: melhoria do serviço. “Au-mentar o orçamento, porque o financia-mento é baixo. A gestão. A compreensão do SUS por todos”, diz ela, destacando que é preciso entender o que é esse sis-tema, como ele se organiza. “Nós precisa-mos preencher esses vácuos legislativos e ter coragem de discutir padrão de integra-lidade”. Ou seja, enfatiza: “Não vamos dar tudo para todos”.

Lenir enfatiza que temos que respei-tar a organização constitucional e legal do SUS. Também melhorar as defesas judi-ciais “que, muitas vezes, por parte do Exe-cutivo, são péssimas”. E mais, diz Lenir: precisamos, antes da judicialização, fazer

mediação sanitária administrativa. “Isso é fundamental”, enfatiza.

O SUS envolve, a seu ver, uma ques-tão de pertencimento. Ou seja, ou todos os brasileiros acham que o SUS pertence a eles ou sempre vamos entender que o SUS é para as pessoas pobres. Não é para todos. “Ou o SUS é para todos e vamos lutar por isso”, ressalta.

Quem ganha com isso? pergunta Le-nir, explicando que, todas as vezes em que o todo é prejudicado em favor de alguns, estamos deixando de garantir igualdade com justiça e aprofundando as desigual-dades sociais. E cita que no artigo 3º da Constituição, dentre os objetivos da Re-pública, está o de diminuir a desigualdade social.

Por fim, Lenir conclui dizendo que a judicialização foi feita para promover justiça, “mas na saúde, muitas vezes, tem promovido mais desigualdade do que real-mente igualdade”.

PALESTRANTE

João Baptista Galhardo Junior

Tribunal de Justiça de São Paulo

Judicialização na Saúde - Debate 25/08/2015

João Baptista Galhardo Junior ini-cia dizendo que sua proposta não é evidentemente fazer uma palestra

e nem mesmo ensinar nada: “Ao contrário, acho que eu é que aprendo muito quando assumo esses desafios de enfrentar um auditório tão seleto porque no feedback, na troca de ideias, eu levo muita coisa para minha vida profissional, e minha vida pesso-al”, explica.

O PALESTRANTE

Falando sobre a demanda no Judiciá-rio, Galhardo Junior cita dados: o Brasil tem 200 milhões de habitantes e 100 mi-lhões de processos em andamento.

E esse interesse alto em “brigar”, diz ele, vem muito do movimento histórico brasileiro durante a ditadura, quando ninguém podia falar nada, menos ain-da pleitear. “E de repente vem uma bri-lhante Constituição, e ela é realmente brilhante, para um país que ainda tem

muito a fazer, a acrescentar para sua so-ciedade”, enfatiza.

O palestrante enfatiza que o brasilei-ro descobriu que tem direito à saúde, in-dependentemente para quem vai pedir, se é para o município, Estado ou para a União. E mais: independentemente da condição social. “Mas, não raras vezes, o sujeito vem sendo atendido pelo plano de saúde até quando o plano fala: ‘Opa, a partir daqui eu não vou mais porque o

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seu contrato não sei o quê’, o cara pen-sa: ‘Há dois caminhos aqui; ou eu brigo com o plano, ou eu brigo com o gover-no. Quer saber, eu vou brigar com o go-verno porque o governo tem obrigação de me dar saúde, independentemente da minha condição social’”.

Galhardo Junior pergunta, o que é afinal a saúde? Tirando da literatura especializada (Organização Mundial de Saúde), ele cita “saúde é um estado de completo bem-estar físico, mental e so-cial, não meramente a ausência de doen-ça ou enfermidade”.

Ainda, para Piédrola Gonzalo1: saúde é um estado de bem-estar físico, mental e social, com capacidade de funciona-mento e não apenas ausência de enfer-midade ou doença.

Galhardo Junior explica, que hoje se deferem algumas liminares que não têm nada que ver com saúde; são questões de assistência social. Então, diz ele, o pro-blema já começa exatamente nesse con-ceito no que é afinal saúde num país que tem tanta divergência e tanta diferença social e territorial, de gênero, de classe social, de costumes, até de forma de se alimentar, etc.

E o fato é que, continua o palestran-te, num dado momento alguém olhou para esse painel, 200 milhões de habi-tantes, 100 milhões de processos, todo mundo litigando e os orçamentos, es-pecialmente dos municípios, não dando conta de cumprir as determinações ju-

diciais. “Porque nós sabe-mos que a maior parte das demandas batem na porta do município, porque é o que está mais próximo”.

Galhardo Junior con-ta, que o ministro Gilmar Mendes, quando presidia o CNJ (Conselho Nacio-nal de Justiça) promoveu uma audiência pública para discutir a questão da judicialização da saú-de, quando vários ato-res envolvidos com esse processo, do jurídico ao mercado da saúde, foram chamados para debater o assunto.

E nessa audiência, o que se concluiu foi que temos que debater mais

fortemente este problema e pensar em alguns mecanismos de atuação em con-junto. Para isso foi criado um grupo com a junção de membros do Judiciário, do Ministério Público, advocacia, defenso-ria, procuradorias e membros da área da saúde. Todos, sentados numa mesma mesa e tentando buscar uma alternati-va para essa situação da judicialização da saúde. E aí Galhardo Junior informa que surgiram duas recomendações – as de n.ºs 31 e 36 do CNJ, que orientam os tribunais no sentido de criar núcleos de apoio técnico e de mediação.

Galhardo Junior explica que essas re-comendações dizem que os tribunais, os juízes, as varas, enfim, o Judiciário como um todo, celebrem convênios que obje-tivem oferecer apoio técnico, composto por médicos, farmacêuticos indicados pelos comitês do CNJ para auxiliar na formação de um juízo de valor.

1. Acadêmico da Real Academia Nacional de Medicina da Espanha, falecido em 1996.

Hoje se deferem algumas liminares que não têm nada que ver com saúde; são questões de assistência social. Então, diz ele, o problema já começa exatamente nesse conceito no que é afinal saúde num país que tem tanta divergência e tanta diferença social e territorial, de gênero, de classe social, de costumes, até de forma de se alimentar, etc.

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Critério de urgência Galhardo Junior conta que quan-

do foi para a Vara da Fazenda Pública, pensou que ia julgar imposto, prescrição de IPTU (Imposto Predial e Territorial Urbano) ... Ele conta que em certo mo-mento atendeu um advogado com um mandado de segurança e disse: “Doutor, eu estou aqui para pedir uma câmara hi-perbárica para o meu cliente porque ele sofreu um acidente de moto e eu preciso dessa liminar hoje. São 80 sessões”. Mas a verdade é que ele nunca tinha ouvido falar na tal da câmara hiperbárica.

Continuando a história, ele diz que sentou à sua mesa e viu que tinha um ou-tro mandado de segurança de uma senho-ra de quase 80 anos que pedia uma limi-nar do medicamento Ranibizumabe. Aí pensou: “Meu Deus, o que é isso aqui?”.

E aí ele diz que descobriu que o Ra-nibizumabe é um medicamento para de-generação macular que mataria a senhora se ele não desse a liminar naquela hora.

E conta que o fato é que naquele mo-mento, ele, juiz, precisava de ajuda na elaboração da decisão. Criaram então um mecanismo de consulta, chamada câmara técnica “composta por pessoas imparciais, independentes do acadê-mico, do jurídico, das universidades, e também da saúde pública”. A essa co-missão, conta, ele fazia questionamen-tos, eles reuniam-se diariamente, deba-tendo as questões em análise.

Galhardo Junior explica que a pri-meira pergunta que fazia era: comissão, esse caso é urgente?”. E se a comissão dissesse que é urgente... “Opa, então é liminar, não tem nem o que discutir”. Mas se a resposta fosse que não é urgen-te... “Então dá para conversar”, diz ele, enfatizando que não iam atrás do que é melhor para o gestor, para gastar menos dinheiro. Não é o que é melhor para o plano de saúde, para não ser condenado. Não é o que é melhor para o juiz, para não ter mais processos ou para o advo-gado da parte autora. “É o que é melhor para a saúde do sujeito que está ali ba-tendo na porta do Judiciário, buscando algum pedido de algum direito que ele entende que foi violado.”

E o questionamento à comissão, diz ele, ainda continuava perguntando se a receita trazia como prescrição apenas o princípio ativo, o nome genérico, ou a questão da marca. E naquela época, lembra, muitas receitas vinham com a marca do produto. Neste ponto ele en-fatiza que não está fazendo nenhuma acusação. Se a indicação daquele me-dicamento é conforme a bula ou se é um medicamento experimental, se é off label. Se os medicamentos são for-necidos pelos programas oficiais. Se já houve pedido administrativo, querem que o SUS atenda, mas o sujeito nunca passou pelo SUS. Na verdade, ele nem sequer bateu na porta do SUS adminis-trativamente. “E quantos casos vimos no Judiciário que, se tivesse batido, te-ria sido resolvido sem a necessidade do processo.”

O fato é, diz Galhardo Junior, que essa comissão de especialistas ganhou corpo e ele conseguiu reduzir as deman-das na vara da Fazenda em que atuava. E conta que a presidência do Tribunal de Justiça descobriu isso e levou-o para trabalhar no Tribunal de Justiça de São Paulo.

Lá ele montou o Comitê Estadual da Saúde de São Paulo, do qual é coorde-nador. E explica que é o comitê do CNJ. Conta que foi criado um projeto chama-do de Projeto de Triagem Farmacêutica das Varas de Fazenda Pública. Ele expli-ca que, considerando que todas as va-ras de Fazenda Pública funcionam num mesmo prédio em São Paulo, pensou: por que não pegar esse modelo lá da co-missão que discute os casos e levar para dentro do fórum?

“O fato é que para nossa grande ale-gria e satisfação, com quase três anos de funcionamento, esse projeto conseguiu que 80% das demandas que são encami-nhadas para o centro de triagem sejam re-solvidas através da mediação”, informa. Seja por convencimento do autor de que ele tem alternativa, seja porque o próprio poder público se convence de que é ne-cessário conceder aquele tipo de atendi-mento porque isso vai trazer um benefí-cio para o próprio SUS.

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Benefícios da judicializaçãoAí, diz Galhardo Junior, vale lembrar,

a judicialização não é o melhor dos cami-nhos, “mas foi dela que surgiu o coquetel da Aids”. Foram dela o debate, as ações do Ministério Público na época. Ele ex-plica que é da judicialização que se in-corporou num time rapidíssimo no nosso país o Canabidiol e os efeitos positivos. “Eu não sou médico, mas acho que, de tanto estudar e conhecer o assunto, já es-tou no meu quinto ano”, brinca.

Voltando ao projeto criado, ele dá mais detalhes, explicando que a pessoa vai no cartório ou entra com ação pelo advogado. O juiz, ao mesmo tempo em que está analisando a liminar -- porque às vezes o caso é grave e exige realmente a liminar imediatamente --, se entende que tem um “folegozinho” de 24 horas, 48 horas para dar uma pensada melhor, facilitado pelo processo ser digital, bate lá na porta do setor composto pelos pro-fissionais da área da saúde, do direito, que estão ali interagindo e pergunta se é urgente. E depois, se tem alternativa. E aí, diz o palestrante, vem a resposta, dizendo: “Olha, não só tem alternativa, como nós vamos entrar em contato com o autor do processo e vamos mostrar para ele esse caminho, que é o melhor caminho. Vamos fazer ele entrar no sis-tema, cadastrar ele aqui, acompanhar esse cara”.

Galhardo Junior conta que antes havia casos em que se concedia o medicamento

pela liminar e ninguém acompanhava a pessoa. E que, depois de sua morte, sua família recebia e vendia o medicamento. Mas que hoje há acompanhamento.

Ele conta que essa iniciativa positiva o fez levar a proposta para o CNJ, que está multiplicando a proposta. “E, como foi dito, nós acabamos -- eu digo nós, o Tribunal de São Paulo, porque ninguém faz nada sozinho; muita gente ajudou -- ganhando um prêmio Innovare, que é o reconhecimento de uma boa prática

dentro do Judiciário.”

A hora da decisão Galhardo Junior ressal-

ta que é difícil para o juiz decidir. Ele quer dormir, quer ter a consciência tran-quila. E vê um relatório médico que sustenta que aquilo é necessário, é ur-gente e é o único caminho. “Dificilmente ele vai negar essa liminar porque há um embasamento técnico, ao menos inicial, para deci-dir”, explica. No entanto,

continua, se ele, ao mesmo tempo, tem um apoio técnico de entidades impar-ciais, instituições imparciais e pessoas imbuídas de boa vontade que querem resolver, não o problema do juiz, não o problema do advogado, não o problema do gestor, mas querem dar uma saú-de melhor ao cidadão e, com isso, uma saúde melhor a este país, o juiz busca essa alternativa. “Não duvidem, ele vai decidir pelo caminho da mediação e da solução do conflito e não através da li-minar, tentando com isso fazer com que essa sociedade fique menos doente ou cure-se”, enfatiza.

O palestrante diz que gosta sempre de mencionar um artigo que saiu na re-vista Veja, em 2012, do médico america-no Ezequiel Emanuel, que foi quem fez a base do Obama Care e que quase levou o Obama a perder a reeleição. “E no meu ponto de vista o Obama está certo; co-brar mais de quem pode; cobrar menos de quem não tem tantas condições, mas

“E no meu ponto de vista o Obama está certo; cobrar mais de quem pode; cobrar menos de quem não tem tantas condições, mas cobrar, e com isso construiu um sistema de atenção melhor”, opina.

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cobrar, e com isso construiu um sistema de atenção melhor”, opina.

E voltando à entrevista da Veja com o doutor Ezequiel Emanuel, ele conta que foi perguntado como é possível decidir que uma vida humana tem mais valor do que a outra. A pergunta foi colocada pensando na decisão individual, sem pensar no co-letivo. E que o médico respondeu: “Existe sim um princípio ético de igualdade, se-gundo o qual todas as vi-das humanas têm o mesmo valor e merecem o mesmo tratamento”. E Galhardo Junior diz concordar com isso. Mas enfatiza que o problema é que não há so-mente um princípio ético. Existe uma lista enorme de outros princípios. “Para ser ético quando se trata de saúde e da população de um país, é preciso salvar o maior número possível de vidas e não pensar em salvar apenas uma vida”, ressalta, citando que ou-tro princípio estipula que é preciso salvar pacientes com mais anos de vida pela frente.

E conta que foi feita outra pergunta ao médico: o que um governo deve oferecer à população em termos de assistência mé-dica? A resposta foi que nenhum sistema público de saúde do mundo consegue so-lucionar todos os problemas e atender a to-das as pessoas. E que o Estado tem o dever de fornecer a assistência básica de forma eficiente, ou seja, prover hospitais, prover hospitalização em casos graves, estabelecer programas de prevenção, dar vacinas.

E aqui, o palestrante abre um parênte-se, dizendo que o Brasil tem bons exem-plos nessa área. E cita a poliomielite. “É um exemplo magnifico. Eu me lembro, minhas filhas, que já são grandes agora, quando elas eram pequenas, o dia da go-tinha era uma festa”, conta, enaltecendo o marketing positivo em relação a isso. E emenda que se conseguiu erradicar a doença no Brasil.

Voltando ainda à entrevista, Galhar-do Junior diz que o médico Ezequiel Emanuel acrescentou que o problema é que as pessoas olham o tratamento que os ricos conseguem ter e acham que o governo tem a obrigação de fornecer a mesma qualidade e diversidade. Nunca foi assim e nem nunca será, diz o médi-co. “E, para saber se o governo cumpre a sua obrigação em relação à saúde, de-ve-se perguntar o que ele tem garanti-do para os pobres na questão da saúde pública.”

O problema é que não há somente um princípio ético. Existe uma lista enorme de outros princípios. “Para ser ético quando se trata de saúde e da população de um país, é preciso salvar o maior número possível de vidas e não pensar em salvar apenas uma vida”

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começa sua fala explicando que o evento abordará a classificação de grupos homogêneos de diagnósti-

co, segundo a gravidade, comorbidade e complicação do doente.

DENISE SCHOUT

DRG - Classificação em Grupos Homogêneos de Diagnóstico

MODERADOR:

Denise Schout

FGV Saúde

Debate 20/10/2015

21º SEMESTRE DE DEBATES FGV SAÚDE

Segundo ela, se olharmos pela pers-pectiva de associar ao processo de classi-ficação de custos, “que é também algo de que temos falado muito”, existe pouca coisa mais amadurecida ou pelo menos mais homogênea em relação aos custos que se atrelem a processos de atendi-mento, ou melhor, a nichos de grupos diagnósticos. Isto é, continua Denise, um conjunto de pacientes com caracte-rísticas similares e para os quais se gasta uma quantidade de recursos e certo ní-vel de envolvimento em relação de de-dicação de recursos humanos também específico.

Isso também abre espaço para uma discussão de remuneração ou de mudan-

ça do modelo de remuneração, explica, olhando muito mais para o processo as-sistencial, para a governança do negócio, para a governança clínica, do que para o procedimento, ou para o faturamento, ou para a tabela de procedimento ou remu-neração, seja para honorário, seja para procedimento.

Denise comenta ainda que outro de-safio é ter serviços de arquivo médico muito estruturados; ter registro clínico bem preenchido; resumo de alta bem afi-nado, bem desenhado; extração das infor-mações em todos os pontos, de onde essa informação é gerada para o prontuário.

Bom evento a todos!

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PALESTRANTE

Alexandre Holthausen

Hospital Israelita Albert Einstein

DRG - Classificação em Grupos Homogêneos de Diagnóstico - Debate 20/10/2015

Alexandre Holthausen começa sua fala explicando que irá se concen-trar no desenvolvimento da plata-

forma do DRG - Classificação em Grupos Homogêneos de Diagnóstico do Hospital Israeli-ta Albert Einstein e nos resultados preliminares até a implantação definitiva.

O PALESTRANTE

Ao olhar para o problema de saúde mundial, diz ele, vemos que ele aconte-ce igualmente em todos os países, mas existem coisas muito semelhantes. Exis-te uma tendência de migrar de um mo-delo que era de fee for service, depois fee for performance e agora estamos tentan-do agregar valor ao tratamento e parar de olhar simplesmente o atendimento intra-hospitalar e começamos a olhar o doente como um todo, tentando evitar que ele vá para o hospital. E, quando ele for para o hospital, tentar evitar que vol-te. O sistema de saúde na forma presente está montado de um jeito que torna o fee for value mais difícil.

Holthausen cita que um artigo pu-blicado na Harvard Business Review de 2013 sugere um grupo de estratégias que podem facilitar o “conserto”, como eles mesmos dizem, do sistema de saúde. “E eles listam como uma das medidas ne-cessárias, a medida de desfechos e cus-to para cada paciente”, diz, explicando que todas as características, para que elas funcionem, precisam da construção e habilitação de uma plataforma de tec-nologia. “Então é muito difícil fazer isso com caneta e papel; é preciso tecnologia para fazer esse tipo de análise. ”

Em seguida, o palestrante pergun-ta: quais seriam, na nossa realidade, as vantagens de medir performance e de medir custo? Segundo ele, passaríamos a conhecer melhor o perfil nosológico da instituição. “Essa é uma preocupa-ção bastante antiga”, diz ele, explicando que, antes mesmo de começar o DRG, já havia 4.6, 4,7 diagnósticos por pacien-tes, mas isso não era suficiente. ” Nós

continuávamos classificando pacientes por diagnóstico. ”

Segundo Holthausen, se por um lado o DRG consegue avaliar grupos de pa-cientes, “nós conseguimos avaliar ao contrário; alas com relação aos seus do-entes, processos com relação a aqueles pacientes”, explica.

Negociação Holthausen em seguida aborda a ne-

gociação com os financiadores, dizendo que esse vaivém entre fonte pagadora e com o próprio médico em hospitais de corpo clínico aberto é sempre difícil se não houver argumentos e dados. “Quan-do nós optamos por iniciar esse processo do DRG, pensamos muito nisso”, conta.

Um ponto interessante, segundo ele, é o aperfeiçoamento de produtos já exis-tentes e a criação de produtos e pacotes. “Nós temos muito receio de criar paco-tes, sem dominar a informação”, diz e pergunta: Será que não estamos perden-do ao criar esse pacote?

E aí desenha-se um modelo que seria o ideal, que se pode entender como con-ceitual, em que haveria a coleta de 100% das saídas. Essa coleta seria em tempo real, explica, porque, se imaginarmos que em algum momento isso vai virar uma ferramenta de cobrança, não pode-mos esperar seis meses para ter o resul-tado; por exemplo, fazer uma análise de grupos de pacientes que foram acumula-dos na retrospectiva.

Para o palestrante, deveria haver um sistema de autopreenchimento que faci-litasse a vida de todo mundo: “E esses

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campos deveriam estar ligados a uma plataforma de análise que dispensasse conversões, interpretações, algo sempre muito problemático”, ressalta. Segundo Holthausen, deveria haver um sistema validado de registro e processamen-to. Um algoritmo de classificação ou agrupamento validado e comparável a benchmarkings de relevância e que per-mitisse ter associação entre desfechos clínicos e econômicos que estivessem disponíveis e associados. E, por fim, que isso fosse rápido e simples. “Como eu disse, um modelo conceitual, ideal, mas nem sempre possível de ser atingido. ”

Holthausen conta que foram investi-gadas ferramentas disponíveis no Brasil e fora dele, de diferentes fornecedores, num processo que resultou na do APR--DRG (All Patients Refined) da 3M. E explica porque: “O primeiro motivo é que o sistema expande o conceito do AP-DRG, que é uma ferramenta tipica-mente usada para cobrança; é bem difícil usar para outra análise, embora isso seja feito”, explica, informando que na Euro-pa, por exemplo, até 2010 era usada pre-dominantemente para custos, mas hoje estão abandonando custo e começando a usar para análise de qualidade. “Jus-tamente porque a APR-DRG tem outras variáveis que permitem essas funções”, diz ele. E uma delas é a severidade da doença.

Segundo ele, uma coisa importante para entender os dados que vão apare-cer. Quando se fala em severidade para alguém da área da saúde, pensa-se em gravidade, ou seja, em doença mais grave do que outra doença. “E, nesse sistema, severidade de doença está relacionada com consumo de recursos”, explica. Para gravidade, continua, existe outra ferra-menta que é risco de mortalidade, Risk of Death (ROD). “Toda vez que eu falar em severidade da doença, significa tempo de permanência, dinheiro, custo ...”

Interesse da empresaContinuando em sua explanação,

Holthausen diz que a demo da ferra-menta pareceu convincente. A empresa

estava disposta a incorporar várias ne-cessidades locais, incluindo as exigên-cias do Sistema Único de Saúde (SUS), de envio de informações mensalmente, o que foi incorporado no sistema, além do idioma.

Ele conta ainda que foi adquirido um sistema de prontuário eletrônico chama-do Cerner, que é gigantesco e começa a funcionar no próximo ano. E era preci-so incorporar esse conceito de DRG ao novo sistema. Uma série de processos internos, que não eram pouco, diz. E muitos deles foram montados ao longo dos anos; uma colcha de retalhos. “Eles tinham soluções, know-how e aplicati-vos para obstáculos pré-agrupamento, então parece simples pegar uma tabela de Excell cheia de pacientes, cheia de diagnósticos e colocar dentro de uma ferramenta para que ela faça a análise, mas não é tão simples assim”, ressalta, dizendo que a empresa já tinha tido ex-periências em vários países com diver-sos sistemas diferentes e, por causa dis-so, acabamos escolhendo esse sistema.

O palestrante explica em seguida que o APR-DRG possui as variáveis de idade, sexo, diagnóstico principal e diagnós-ticos secundários; comorbidades que estavam presentes na admissão, e elas entram na lista de diagnóstico secundá-rios; procedimentos cirúrgicos e invasi-vos. No caso de neonatos, até 28 dias, o peso do recém-nascido e o tempo de gestação. Total de horas com ventilação mecânica, condições de alta e condições de entrada. “Começamos a olhar essas características e vimos que o sumário de alta que existe na nossa instituição tinha absolutamente todas elas, exceto o tem-po de ventilação mecânica, que ficava em outro ponto do prontuário”, conta.

Então, continua Holthausen, deci-diu-se pegar o sumário de alta que era uma ferramenta ainda em papel, trans-formá-lo numa ferramenta eletrônica e integrar com o sistema DRG, depois com o Serviço de Arquivo Médico e Estatísti-ca (Same) e o SUS.

Antes de entrar nessa jornada, ele conta que foram analisar como estavam as diferentes áreas e aproveitar para dar

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uma olhada em como andava a célula de custo, a célula de receita, enfim, tudo aquilo que pudesse ter influência direta ou indireta na montagem do programa e tudo aquilo que fosse potencialmente influenciável, quando o DRG estivesse em funcionamento.

Segundo ele, foi feita análise de 16 mil saídas. “Nós sorteamos quatro me-ses não consecutivos de um ano, fizemos entrevistas com diversos profissionais do hospital e acompanhamos in loco vários processos”, conta, dizendo que a conclu-são é que a coleta de dados era predomi-nantemente estatística ou censitária e que acabava caindo na mão de pessoas que ti-nham a responsabilidade de transformar aquilo em dados de utilidade clínica, uti-lidade assistencial para a gestão.

Holthausem diz que existe uma he-terogeneidade muito grande nos dados de origem.

Necessidade de especialistasHolthausen diz que não havia a par-

ticipação de especialistas na codificação, mas que hoje há um grupo treinado para isso, “e o faz muito bem”. Ele explica que a codificação, muito distante do mé-dico, não era associada à lógica clínica. Então nós tínhamos, de um lado, codifi-cadores muito bons e, do outro lado, o detentor da lógica clínica; e não tinham uma associação direta”, explica, citando que um lado bom era que já havia infor-mações coletadas sistematicamente em todas as saídas.

Segundo Holthausen, muitas vezes o processamento de dados, mesmo com toda a sofisticação, para aquilo que se precisava, era ainda rudimentar, tanto do ponto de vista de processos, quanto do ponto de vista de aplicativos dispo-níveis. Por isso, explica ele, que estão migrando com um conjunto de variá-veis para a avaliação de complexidade que era um tanto arbitrário e não havia verdadeiramente uma validação clínica e econômica dessas variáveis de complexi-dade. “Isso fazia com que os resultados fossem pouco comparáveis tanto interna como externamente”, explica.

Holthausen a seguir aborda outras limitações encontradas: o prontuário era em papel e continua sendo; deixará de ser em 2016. Ele diz ainda que não havia uma plataforma de codificação, de pós-processamento: “Nós não tínhamos vigilância ou auditoria especializada, voltada especificamente para esse tipo de análise”, conta.

Projeto piloto Assim, continua Holthausen, foi de-

senhado um plano que em curto prazo incluiu a 3M e um delineamento do pro-jeto. Foi criado um projeto piloto, com 33 mil pacientes. Depois passou-se a um processo de educação dos médicos e dos codificadores; também à troca de formulários ou ajuste de formulários es-pecíficos; à implantação de aplicativos intermediários da 3M; e à implantação do APR-DRG propriamente dito e do pós-processamento.

No momento, diz o palestrante, es-tamos migrando para um processo que vai acabar culminando com a auditoria médica e financeira. “E mais na frente nós vamos ter que migrar esse sistema para dentro do Cerne”, explica.

No projeto piloto, segundo ele, fo-ram analisadas 33 mil saídas e que foram ignorados os problemas de codificação, custo e de receita. Ele explica que havia origem para diagnóstico, o CID-10 da Organização Mundial da Saúde (OMS) e a tabela SUS em português, ambos para procedimentos, e esses dados tinham que ser transformados na CID-9 dos Es-tados Unidos, que envolve diagnóstico e procedimentos.

Foi então feito um processo de tra-dução automatizado de idioma e depois os consertos foram feitos. E um mapea-mento, o De/Para, que também foi au-tomatizado. Uma vez feito esse mape-amento, foi corrigido item por item. O objetivo, diz Holthausen, era simples-mente identificação de barreiras e saber se o DRG funcionava, digamos, lato sen-su. “E deixamos claro que isso era uma prova de conceito e que não deveríamos usar esses dados para gestão hospitalar,

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embora muitos tenham sentido cócegas ao ver os resultados”, conta.

No dia 10 de agosto, continua o pa-lestrante, foi feita a implantação defini-tiva e agora são dois meses de funciona-mento com a coleta em tempo real de 8 mil casos.

Corpo clínico giganteHolthausen admite que há limitações.

O corpo clínico, por exemplo, é gigan-tesco; são 7.500 médicos e desses só mil são contratados. E no meio dos 7.500, há médicos que vão no hospital duas vezes por ano. Assim, diz ele, durante o pro-cesso, todo mundo recebeu e-learning, e-mail, comunicado. E foram oferecidos facilitadores para ajudar a implementar o sistema.

Depois da implementação do proje-to, conta, foram feitas várias modifica-ções e continuam sendo feitas para ga-rantir que a qualidade vá melhorando.

Segundo ele, o CID-10, especialmen-te no Brasil, precisa de uma moderniza-ção: “O nosso CID-10 tem só uma casi-nha depois do ponto e tem muita doença importante que precisa de mais uma ca-sinha para codificarmos adequadamen-te”, explica, dizendo que a tabela SUS até recebeu elogios do pessoal da 3M. “Eles não encontram sistemas assim na maioria dos países, mas ainda assim ela é bastante limitada”, ressalta. A tabela Tuss (Terminologia Unificada da Saúde Suplementar) e tabela SUS são diferen-tes, segundo ele. Elas conversam mal. “Muitos já tentaram e ninguém conse-guiu fazer um De/Para dessas duas tabe-las. O ideal seria um mix entre as duas, mas não temos isso. ”

O SUS tem aberto algumas oportu-nidades, diz ele. Passou-se a ter certos códigos de procedimentos que são gené-ricos e que, portanto, não vão para o Si-gtap (Sistema de Gerenciamento da Ta-bela de Procedimentos, Medicamentos e OPM do SUS), não significam cobrança. “Mas eles não cobrem muita coisa”, res-salta, explicando que há vários procedi-mentos que simplesmente não existem, “e nós temos feito acertos para evitar

que a codificação acabe recebendo um procedimento que não foi aquele que o paciente teve de verdade, porque isso só piora. Antes não tínhamos nada, agora temos, mas com erros. Isso é pior”, en-fatiza.

Um exemplo como exercícioComo exemplo, Holthausen apre-

senta o caso de uma colecistite aguda e uma colecistectomia videolaparoscópi-ca. É um DRG cirúrgico, severidade de doença 1, variando de 1 a 4; e um risco de mortalidade de 1, variando de 1 a 4. O sistema apresenta o peso relativo de 0,8997.

Ele explica que a média desse núme-ro é 1 nos Estados Unidos e 1 significa um gasto de mais ou menos US$ 9.200. Isso são números de 2014. “Esses dados nos dão uma noção do consumo de re-cursos”, explica dizendo que o caso ci-tado, por exemplo, representaria 90% do custo médio das internações nos Estados Unidos.

Holthausen diz que o tempo de per-manência esperado é de 2,29 dias e o tempo de permanência real desse pa-ciente foi de 27 dias. E ele dá o limite inferior e superior de permanência. En-tão esse paciente estaria completamente fora desse limite.

Para melhorar esse exercício, conti-nua, foram acrescentados insuficiência cardíaca e diabetes. E o que acontece é: um a ser dois, e dois, o peso sai de 0,90 para 1,16. “Então nós tivemos um acréscimo de 26% a mais ou a menos em termos absolutos no custo. E o tempo de permanência que era 2,29, passa para 3,47. Um dia e alguma coisa na média é bastante tempo”, ressalta.

Holthausen continua sua fala citando que existe uma outra coisa interessante nesse sistema que é permitir informar o PNA (presente na admissão), o que sig-nifica que esse paciente já veio para o hospital com insuficiência cardíaca. Se não for informado o PNA (sim/não), significa que o paciente desenvolveu in-suficiência cardíaca dentro do hospital e isso passa a ser uma complicação.

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Se for subtraído o DRG da alta, cal-culado por ocasião da alta com o DRG, menos o DRG que foi calculado a par-tir dos dados da internação, o resultado dessa subtração é complicação. “Então começamos a explorar esse tipo de pos-sibilidade também”, explica.

Coleta de dados reais Holthausen apresenta alguns dados

reais de pacientes coletados em tempo real no sistema e diz que escolheu al-guns DRGs com frequência maior, al-guns cirúrgicos, alguns clínicos, crian-ças, partos, etc.

E passa aos dados: uma pneumonia, por exemplo; de 153 pneumonias, 89 ti-nham severidade da doença, 1, 53, se-veridade 2; nove, severidade 3; e dois, severidade 4. “Agora passamos a ter uma nova forma de analisar a complexidade; o mesmo diagnóstico em quatro cate-gorias distintas”, diz, explicando que pode fazer a mesma análise, por exem-plo, para risco de mortalidade: “A nossa mortalidade hospitalar é 0,97%, olhando o hospital como um todo”, diz, emen-dando que será preciso acumular muito mais dados para fazer alguma interpre-tação útil com relação à mortalidade, “e ainda assim nós vamos ter de fazer para algumas doenças que têm taxa de morta-lidade mais alta: sepse, câncer gástrico, insuficiência respiratória, entre outras”.

Mas ele ressalta que o que se come-çou a ver é que já para os DRGs mais fre-quentes, com dois meses de atividades, começa a ter uma classificação bastante interessante. Naturalmente é um hos-pital que tem menos casos complexos, “mas, ao invés de simplesmente olhar o diagnóstico e dizer se é complexo ou não, começamos a separar esses casos”, explica.

Holthausen dá outro dado que consi-dera importante: havendo duas doenças ou dois DRGs -- apendicectomia e co-lestectomia laparoscópica --, a severida-de de doença 1 da apendicectomia não significa a mesma coisa que a severidade de doença 1 da colestectomia laparos-cópica. Cada DRG tem o seu próprio

significado com relação à severidade de doença e ao risco de mortalidade. Então essa análise tem que ser feita intra-DRG; e não se pode comparar diferentes DRGs.

Holthausen explica que é possível analisar complexidade e custo, comple-xidade e performance do médico, com-plexidade e remuneração a partir da operadora, por exemplo. “Nós temos um pacote no hospital para colecistectomia laparoscópica e esse pacote não leva em conta a severidade da doença”, conta, explicando que esses pacientes foram divididos por severidade de doença, “e acabamos vendo que, para severidade de doença 1, nós tínhamos margem; para a severidade de 2, empatava; e para seve-ridade de doença 3, tínhamos prejuízo. Então eu acabo fazendo um pacote erra-do para a pessoa errada”, diz ele.

No futuro, segundo o palestrante, talvez se possam ter pacotes de colecis-tectomia laparoscópica SOE 1, que cus-ta tanto. Colecistectomia laparoscópica SOE 2, o pacote custa mais um pouqui-nho. E assim vai para outras condições.

Holthausen diz que todos esses exer-cícios que apresentou precisam de vali-dação em longo prazo. “Por ora, eles são só isso mesmo, exercícios”, ressalta. Para ele, antes de abordar uma operadora e di-zer “vamos sentar para negociar”, é pre-ciso ter certeza de que isso realmente faz sentido.

E mais: é preciso ser rápido e confi-ável: “É possível estabelecer produtos, avaliar performance por área, por médi-co, por unidade, por tipo de diagnóstico. Isso vai nos levar ao uso mais racional de recursos”, destaca.

Ele conta que foi inaugurado um se-gundo hospital público, o hospital da Vila Santa Catarina, perto do aeroporto de Congonhas, onde o DRG já está fun-cionando. E lá foi bem mais fácil, se-gundo ele. Primeiro, porque o hospital acabou de começar e segundo porque só trabalham médicos contratados, o que torna tudo mais simples. “Em breve va-mos começar a ver desempenho de DRG no hospital privado, no hospital público e se tem ou não diferença. ”

Obrigado.

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Considerando o quadro de custos crescentes na saúde, diz ele, claro que uma das questões que elevam o custo é o aumento da idade; a pirâmide vai cres-cendo e com isso acumulam-se as doen-ças degenerativas (Gráfico 1), as doenças crônicas, as intervenções mais caras.

O Gráfico 2, diz Osmo, é bastante in-teressante porque mostra o que represen-ta uma internação. “Claro que poderão ser várias, no desenvolvimento de uma doença crônica do indivíduo”, ressalta.

Uma coisa bastante interessante tam-bém, diz o palestrante, é verificar que não é só doença crônica, mas é o acúmu-lo de doenças. Após os 50 anos, explica, podemos observar que há um acúmulo bastante grande de duas, três, quatro do-

André Alexandre Osmo inicia sua fala explicando que tentará trans-mitir um pouco do que aprendeu

nos últimos dois anos trabalhando diretamente com a questão da classificação na im-plantação do DRG (Classificação em Grupos Homogêneos de Diagnóstico) no Hospital Sírio-Libanês.

O PALESTRANTEPALESTRANTE

André Alexandre Osmo

Hospital Sírio-Libanês

DRG - Classificação em Grupos Homogêneos de Diagnóstico - Debate 20/10/2015

enças num mesmo indivíduo (Gráfico 3). “E podemos ver no Gráfico 4 como isso se manifesta do ponto de vista de custos. Quando nós temos duas, três quatro do-enças, o custo aumenta até 40% em re-lação ao indivíduo que tem uma única doença.”

Segundo Osmo, a análise do reflexo da comorbidade do acúmulo de patolo-gias no mesmo indivíduo é fundamen-tal para entender e manejar os custos. E pergunta: quais são os determinantes dos custos hospitalares?

“Lembrem que, dentro dos determi-nantes, existem tantos fatores indivi-duais, quanto fatores médicos e de as-sistência, quanto os fatores estruturais”, ressalta. Pergunta novamente: e o DRG?

Gráfico 1.

Pirâmide populacional brasileira em 2010 (em barras) e projeção para 2025 (linhas)

Fonte: Elaboração Anahp a partir de dados do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística)

Homens Mulheres

Faixa Etária

80 anos ou mais75 a 79 anos70 a 74 anos65 a 69 anos60 a 64 anos55 a 59 anos50 a 54 anos45 a 49 anos40 a 44 anos35 a 39 anos30 a 34 anos25 a 29 anos20 a 24 anos15 a 19 anos10 a 14 anos

5 a 9 anos0 a 4 anos

201020.590.597 idosos

(10,8% da população)Homens: 9.156.111

Mulheres: 11.434.486

202534.476.034 idosos

(16,2% da população)Homens: 14.980.693

Mulheres: 19.495.380

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Gráfico 2.

Fonte: Eugênio Vilaça Mendes, 2001, citando Edwards, Hensher & Werneke (1999)

SEVERIDADE DA DOENÇA

INTERNAÇÃO HOSPITALARDESCOMPENSAÇÃO

MODERADA OU GRAVE

DESCOMPENSAÇÃO LEVE

Estado de Equilíbrio

TEMPO

PSO

Gráfico 3.

Distribuição de doenças crônicas por faixa etária no Brasil

Fonte: Elaboração Anahp a partir de dados do PNAD (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicilios) – Suplemento Saúde (2008)

Gráfico 4.

* Equal to more than 100% due to roundingSOURCE: MEDICAL EXPENDITURE PANEL SURVEY, 1998 and “health Plans Begin to Address Chronic Care Management”, Managed Care, december 2003 …

Mais da metade dos gastos de saúde é em favor das pessoas com múltiplas condições crônicasPercentual das despesas de saúde em número de condições crônicas *

População

Não Crônica 56% 22%

23% 21%

44% 78%

11% 18%

5% 15%

3% 12%

2% 14%

10% 40%

Crônica

Com 1 efermidade

Com 2 efermidades

Com 3 efermidades

Com 4 efermidades

>= 5 efermidades

% População % Custo com saúde

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Por que hoje ele é muito importante? Resposta: é porque ele consegue dar um suporte melhor de análise e de acompa-nhamento dos custos hospitalares e, con-sequentemente, dos preços daí um even-tual instrumento de remuneração. “Mas é importante também dizer que o DRG é um poderoso instrumento também de análise epidemiológica hospitalar e do produto hospitalar”, ressalta o pales-trante.

Princípios da classificação por DRGFalando da classificação por DRG,

Osmo diz que um primeiro princípio é a necessidade do registro do cuidado do paciente. Segundo ele, para conseguir ter um bom sistema de classificação, é preci-so que os médicos, enfermeiros, que to-das as pessoas do hospital escrevam, re-gistrem adequadamente, ou no papel ou de preferência no meio eletrônico, todos os diagnósticos, tudo o que acontece com o doente. “Aqui já temos um problema que não é do Brasil, é do mundo, mas é um problema importante, que tem que ser considerado”, alerta.

E explica: os sistemas hospitalares vão transferir isso para um banco de dados do próprio hospital, se o hospital for informatizado. A partir daí produz--se aquilo que chamamos de CMBD, ou seja, Conjunto Mínimo Básico de Dados. E explica que CMBD são os dados que necessários para caracterizar o DRG e agrupar esses pacientes, e que envolve: idade; sexo; diagnóstico principal; diag-nósticos secundários; complicações; co-morbidades; status da alta; peso do re-cém-nascido, se houver, se for hospital pediátrico; duração de ventilação mecâ-nica; hemoterapia; procedimentos diag-nósticos completos.

No Brasil, explica Osmo, isso envol-ve um pequeno problema. Segundo ele, usa-se aqui o CID-10 para diagnóstico e a grande maioria dos hospitais brasileiros hoje codificam os pacientes somente com um diagnóstico, o principal. E nos Esta-dos, embora não todos, é preciso enviar para o ministério uma codificação para o sistema CIHA - Comunicação de Infor-

mação Hospitalar e Ambulatorial. E até o próprio sistema só permite a entrada de um diagnóstico principal. “Com isso já matamos todos os diagnósticos secundá-rios, as comorbidades”, enfatiza.

Em relação aos procedimentos, Osmo diz que há ainda mais problemas: “Os Es-tados Unidos usam uma tabela própria de procedimentos que eles chamam de CID-9 Clinicamente Modificado, CID-9-CM”, explicando que, na verdade, ele tem o nome de CID-9, mas é uma tabela de pro-cedimentos validada pelo sistema de saú-de americano e única em todo o Estado. Ele está evoluindo hoje pra CID-10-CM, que não será uma coisa fácil.

Osmo explica que o DRG operava, até recentemente, do ponto de vista de diagnóstico, com o CID-9 para diagnós-tico, e com CID-9-CM para procedimen-tos. “Ora, o Brasil utiliza hoje CID-10, há muito tempo”, diz o palestrante, emen-dando que os EUA passaram agora, a par-tir de outubro, a usar obrigatoriamente o CID-10 para este tipo de diagnóstico. Eles já usavam para mortalidade, para outras finalidades, mas passou agora também por decreto e por decisão governamental usar o CID-10 diagnóstico e estão transi-cionando para a tabela de procedimentos CID-10-CM.

O DRG americano, explica Osmo, é baseado no CID-9 “e nós usamos o CID-10, portanto, aí já tem uma pequena ne-cessidade de adequação, que não é coisa de outro mundo. O grande problema é a tabela de procedimentos”, diz.

No Brasil, diz Osmo, é utilizada para a área pública a tabela SUS, que é mu-tável; em cada mês ela é atualizada, vul-garmente chamada de SIGTAP - Sistema de Gerenciamento da Tabela de Procedi-mentos, Medicamentos e OPM do SUS. “Além de ser mutável mensal, o que já é uma complicação, você tem que ficar atu-alizando o sistema todo mês.”

Na área privada, continua, há um sem número de tabelas, que começam das diversas AMB – Associação Médica Brasileira, CBHPM - Classificação Bra-sileira Hierarquizada de Procedimentos Médicos, evoluindo agora para a tabe-la TUSS - Terminologia Unificada em

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Saúde Suplementar, que também é uma tabela relativamente recente. Esses da-dos, explica o palestrante, vão para um agrupador que, no final das contas pro-duz um DRG, que tem que mandar esses dados para algum sistema que vá fazer a análise, porque senão o DRG sozinho não adianta nada. “Então, o importante é que isso vá para algum sistema de aná-lise”, ressalta.

E pergunta: o que sai dessa caixinha preta chamada APR-DRG? Resposta: pri-meiro saem as grandes categorias diag-nósticas. Os pacientes são classificados em 25 dessas categorias; isso é o APR--DRG. Depois cada DRG é dividido em quatro subclasses de severidade: menor, moderada, maior e extrema. E quatro classes de risco de mortalidade: menor, moderada, maior, extrema. O que faz com que haja 1.256 subclasses, que são as combinações entre os DRGs, que são 314, que ele produz. E esse número de DRGs depende muito do tipo de sistema que é utilizado; tem alguma variabilidade entre sistemas europeus e outros. Esse é o sistema padrão APR-DRG.

Apresentando o Gráfico 5, Osmo explica que em azul é o que aconte-ce quando se usa o DRG. Há numa li-nha um gráfico de custos e na outra o do tempo de permanência. O LOS quer dizer tempo de permanência em inglês. Quando se faz simplesmente um gráfi-

co direto, resulta um tipo de curva que é a curva preta. Quando se usa o DRG, faz-se com que esses pacientes com tem-po de permanência dentro de uma faixa semelhante sejam agrupados, o que cha-mamos de inliers.

No Gráfico 6, cruzam-se cinco hos-pitais americanos, custo versus o tem-po de permanência versus a severidade, mostrando que onde nós temos menor severidade, menor tempo de permanên-cia, temos menor custo. O que é óbvio, porém este óbvio hoje nós temos alguma dificuldade de demonstrar, se pegarmos o nosso hospital e quisermos produzir es-ses dados.

A Figura 1 é um exemplo de como se utiliza a questão da severidade e o risco, com exemplo de uma colecistite.

DRG no Sírio-LibanêsOsmo fala agora do Hospital Sírio-Li-

banês, onde a implantação do DRG co-meçou com um piloto, com uma análi-se inicial de 34 mil internações. E com os padrões normais e comuns a todos os hospitais. Segundo ele, hoje a maioria dos hospitais quer um procedimento e um diagnóstico por internação. “Depois que nós produzimos essa primeira roda-da, fizemos outro piloto recodificando um grupo de todos esses pacientes”, con-ta. Então de um pequeno grupo foi tirada

Gráfico 5.

costs/ revenues

short-stay outliers

deductions

inliers long-stay outliers

DRG

total costs of case

surcharges

LOSlower LOS threshold upper LOS threshold

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Debates FGV Saúde | Volume 17 | jan/dez. 2015-201646

Figura 1.

uma amostra do mesmo grupo, “e reco-dificamos todos eles para ver o impacto que isso tinha na modificação dos DRGs e principalmente a modificação do índi-ce de severidade e da probabilidade de morte”, explica. E na terceira fase já foi a implantação definitiva do sistema que já está no ar desde janeiro de 2015.

Osmo conta que foi verificado na fase 1, comparando com os dados da média dos Estados Unidos -- que é aquela fase 1 em que se usava um diagnóstico e um

procedimento em que havia uma gravi-dade muito diferente. Ele explica que o Hospital Sírio-Libanês é, classicamente, de alta complexidade.

E apresentando o Gráfico 7, ele ex-plica que na cor laranja, vê-se que está quase tudo concentrado na severidade da doença de classe 1, que é de baixa complexidade. E praticamente nada na 4 que seria de altíssima complexidade. “E por que isso foi importante para nós? Para mostrar que não adianta usar DRG

Gráfico 6.

Data Source: 3M APR DRG Classification System utilizing MEDPAR 2007 data

Hospital E

Hospital D

Hospital C

Hospital A

Hospital B

3

4

5

6

$7.000 $11.000 $15.000 $19.000

00 ,2 0,40 ,6 0,81 1,2

Média do tempo de permanência hospitalar ajustado pela severidade e custo

Custo

Impacto dos Diagnósticos Secundários na classificação por Severidade da Doença e Risco de Mortalidade

SOI = 3Maior Severidade

da doença

ROM = 1Menor risco

de mortalidade

ROM = 2Risco moderado de mortalidade

SOI = 3Maior Severidade

da doençaColecistite

AgudaPeritonite

Necessidade de padronização da análise da morbidade hospitalar com o uso de sistema de classificação adequados - DRGs

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se não tivermos um bom sistema de de-codificação”, diz ele, ressaltando que um bom sistema de codificação, além da qualidade da codificação, é a quantidade dos números de códigos que têm que ver tanto com o diagnóstico principal como com os diagnósticos secundários como a comorbidade. E mesma coisa com os procedimentos.

O Gráfico 8 mostra a distribuição das dez principais categorias diagnósticas. Os diversos DRGs no sentido da severidade da doença.

O Gráfico 9, segundo ele, é possível ver de forma mais simples como mudou o resultado da mesma amostra, com a va-riação da severidade que aumentou 53%, 54% na classe 4, que é de alta severidade

Gráfico 7.

Severidade da Doença (SDD) – Comparação da média dos EUA e a média do HSI – Fase 1

HSL Fase1 Média EUA

4

3

2

1

0,00% 10,00% 70,00%50,00%

40,06%74,22%

38,55%21,65%

17,92%3,83%

3,47%0,30%

30,00%20,00% 80,00%60,00%40,00%

Gráfico 8.

Distribuição por MDC - jan 13 a jun 15 - HSL

ENDOCRINE, NUTRITIONAL & METABOLIC DISEASES & DISORDERS

DISEASES & DISORDERS OF THE EAR, NOSE, MOUTH & THROAT

DISEASES & DISORDERS OF THE HEPATOBILIARY SYSTEM & PANCREAS

DISEASES & DISORDERS OF THE NERVOUS SYSTEM

DISEASES & DISORDERS OF THE KIDNEY & URINARY TRACT

DISEASES & DISORDERS OF THE RESPIRATORY SYSTEM

DISEASES & DISORDERS OF THE SKIN, SUBCUTANEOUS TISSUE & BREAST

DISEASES & DISORDERS OF THE CIRCULATORY SYSTEM

DISEASES & DISORDERS OF THE MUSCULOSKELETAL SYSTEM & CONN TISSUE

DISEASES & DISORDERS OF THE DIGESTIVE SYSTEM

2394

2671

3432

3794

4115

4141

4363

5144

5563

7908

0 1000 3000 60002000 50004000 7000 8000 9000

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Gráfico 9.

ou mais complexo, e reduziu-se quase a muito pouco da classe 1. “Assim, mos-trando aquilo que a gente estava queren-do comprovar, que, de fato, a questão da codificação e da quantidade de códigos e procedimentos é fundamental para que se possa desenvolver um bom resultado do sistema”, ressalta.

Osmo informa que o sistema utiliza-do para classificação do DRG pertence à

3M. E que o sistema produz relatórios em um BI – Business Intelligence em que já começa a criar as análises e os gráficos.

Para terminar, diz Osmo, sabe-se que esse caminho não é muito fácil, mas é possível, importante, “e eu acho que não tem volta. Eu acho que é um cami-nho que o Brasil vai ter de trilhar, tanto na área privada, quanto na área pública”, conclui.

Ranking Descrição do DRG SDD1 % SDD2 % SDD3 % SDD4 %TOTAL

1Colecistectomia laparoscópica

936 91,50% 73 7,10% 14 1,40% 1023

2Procedimentos cardiovasculares percutâneos

727 71,80% 235 23,20% 50 4,90% 1 1012

3 Pneumonia 496 51,50% 401 41,60% 56 5,80% 10 953

4Procedimentos de Mastectomia

936 98,60% 12 1,30% 1 0,10% 949

5Procedimentos de tieróide, paratireoide

667 92,90% 47 6,50% 3 0,40% 1 717

6Procedimentos do rim e vias urinárias sem presença de malignidade

662 92,30% 46 6,40% 9 1,30% 717

7Procedimentos de Mama exceto mastectomia

541 76,50% 163 23,10% 3 0,40% 707

8Infecções dos rins e trato urinário

377 56,50% 251 37,60% 37 0,55% 2 665

9Procedimentos de ouvido, nariz e garganta

589 92,80% 45 7,10% 1 0,20% 635

10Procedimentos do sistema reprodutivo masculino e outros relacionados

13 2,20% 572 96,30% 9 1,50% 594

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inicia sua apresenta-ção falando sobre uma das capas da Business

Week que mostra um fumante que trabalha numa empresa americana. Esse indivíduo foi, no contexto americano, dispensado pela empresa por ser fumante e por conse-quência onerar o plano de saúde da empresa. Esse cenário é rígido, é oneroso, enfatiza Arraes, e, devido à legislação americana, a empresa é passível de escolher o risco que ela quer segurar.

LUIZ TADEU ARRAES

Saúde Corporativa e Gestão de Benefícios

MODERADOR:

Luiz Tadeu Arraes

FGV EAESP / FGV Saúde

Debate 16/11/2015

21º SEMESTRE DE DEBATES FGV SAÚDE

Por outro lado, continua, quando se fala de gestão de benefícios, são co-locadas todas essas variáveis dentro do contexto da empresa para tentar dimen-sionar e gerenciar o risco dela. O que hoje, por si só, não significa muito, diz, salientando que esse que é o problema. “E é importante nós observarmos por-que não significa muito.”

A Fortune, diz ele, publicou uma reportagem informando que parte da General Motors estava sendo assumida pelo governo americano para não haver muitas demissões. Entretanto, o gover-no dizia que assumia a empresa, mas não assumia o plano de saúde. “Por aí vocês veem a questão de como é a saúde priva-da”, diz Arraes.

E cita em seguida a capa de maio/2015 da Revista Exame, que fala sobre “Quan-to custa a saúde”, sendo que há dez anos a mesma revista teve como capa “Por que os hospitais são tão caros”? O as-sunto é recorrente, diz Arraes.

Para ele, existe um contexto, impor-tante de observar, que é uma caracte-rística desse nosso início de século. Na verdade, os custos em saúde não fogem da forma como outros preços de outros mercados são também quantificados. “O que significa que sempre se vê o risco futuro. E tenta dimensionar em cima do risco futuro uma margem, que chama-mos de volatilidade”, explica, ressaltan-do que essa volatilidade não é influen-ciada na saúde nem pela tecnologia e

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tampouco pela globalização. “Em resu-mo, os custos da saúde privada no Brasil respeitam mais ou menos os custos que os laboratórios farmacêuticos possuem.”

Continuando sua fala, Arraes mostra que hoje existem em torno de 200 pes-quisas sobre câncer. Para cada pesquisa, um custo de US$ 250 milhões. E cada pesquisa, para o lançamento de um pro-duto, dura dez anos. E, dessas pesquisas todas, só uma vai chegar no mercado. “Ou seja, uma paga por todos os outros fracassos”, citando que, para se ter uma noção, o portfólio da Pfizer há dez anos não era o mesmo de hoje devido às pa-tentes expiradas.

O que se vê hoje na saúde, e prin-cipalmente na saúde privada brasileira, diz Arraes, é que a Lei n.º 9.656 de 98 foi alterada pensando na concorrência de mercado como uma solução. “Então temos um mercado imperfeito, que é o mercado de saúde privada, inspirado por uma lei que vê na saúde americana uma saída para os problemas de custo.”

Segundo Arraes, sabe-se muito bem que hoje no Brasil o governo apostou num modelo de mercado de ganhos por uma livre concorrência que não existe. Não há concorrência entre operadoras, entre laboratórios, entre clínicas, como uma solução competitiva para a área da saúde privada.

Ele cita outra capa da Business Week que mostra o caso da morte de um pa-ciente nos Estados Unidos por câncer. Ele custou US$ 618 mil e a maior parte dos custos foram de processos adminis-trativos, não só das operadoras, mas do governo, necessários para que houvesse reembolso.

Em resumo, ressalta Arraes, além de tudo, há um custo de processos grande. “E tem, por exemplo, um custo de de-senvolvimento de produtos, ou seja, me-dicamentos que cada vez ficam mais ca-ros, como está na capa dessa revista em que você vê um medicamento que custa US$ 307 mil para ser administrado. ” E isso tudo, segundo ele, está sendo pago com um custo de turismo médico -- no qual o Brasil está começando a inserir--se mundialmente --, que exige hotelaria

cara, exige instrução de colaboradores em matéria de idiomas, de atendimento caro, diferente da cultura do nosso país, mas que todos os grandes hospitais de São Paulo já estão começando acostu-mar a gerenciar.

Em sua visão, o termo operadoras unifica juridicamente os participantes privados do sistema, mas que, juridica-mente, não responde à situação de cada um. E exemplifica: a Unimed continua sendo uma cooperativa. As seguradoras continuam sendo seguradoras. As assis-tências médicas continuam sendo assis-tências médicas, assim como os planos administrados e autogestões.

E pergunta: um dos problemas que a Unimed Paulistana teve foi justamen-te por quê? “Esse termo unificado gera problemas fiscais, como foi o caso da cooperativa Unimed, que teve, ao longo de anos, batalhando na Receita Federal para não pagar um imposto que ela não pagava antes”, diz Arraes, explicando que as assistências médicas trazem uma forma de visão de custos diferentes de uma seguradora. Ele explica que uma seguradora tem que se adequar à Basi-leia 1 e Basileia 2, mesmo sendo uma operadora e ter custos de seguradora de reserva técnica. “Então você tem planos administrados, autogestões com proble-mas trabalhistas também envolvidos ju-ridicamente”, explica.

Ou seja, continua Arraes, o contexto econômico da saúde suplementar brasi-leira hoje está passando pela última fase dele que é justamente aquela em que você tem os grandes grupos econômicos de private equities, de internacionaliza-ção de compra de hospitais. E este ano acabou de cair a última barreira de le-gislação a respeito disso. Resumindo, ele diz que é uma consolidação de merca-do hospitalar suplementar da ponta dos hospitais, da ponta dos planos médicos.

Em meio a esse cenário todo, se-gundo Arraes, ficam as empresas que não têm escala o bastante, mesmo que tenham 20 mil vidas, 30 mil vidas, “por-que, pensando bem, você analisar um risco de 30 mil vidas, peitar um prêmio que não se pode alterar por um ano, é

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um risco demasiado grande para uma operadora”.

O palestrante enfatiza esse é o dilema em que a saúde suplementar se encontra hoje no país: um quadro em grande par-te motivado por uma legislação que não previu todas as performances, todas as variáveis que poderiam ter acontecido no mercado, mas também porque o mercado mudou nesses anos todos. Mudou de per-fil, teve um momento de grande expan-são econômica nesses últimos dez anos. Então aumentou o prêmio, teve muita carteira de trabalho assinada, teve mui-to registro em carteira. “Agora, com essa

crise econômica, é que nós vamos ver até que ponto esse modelo vai aguentar o es-tresse que as demissões vão trazer para o mercado, com diminuição de prêmio e possivelmente aumento dos riscos”.

De qualquer forma, ressalta, essa é uma introdução geral. Não é o apocalip-se. E explica que o sistema está aí desde 1998, “mas ele sem dúvida desafia a nos-sa visão inovativa, nossa visão de gestão de benefícios e nossa visão obviamente de como esse processo todo vai ser feito por parte das empresas e por parte de to-dos os integrantes do sistema”.

Obrigado.

PALESTRANTE

Adriano Mattheis Londres

Qualicorp Corretora de Seguros

Saúde Corporativa e Gestão de Benefícios - Debate 16/11/2015

Adriano Mattheis Londres iniciou sua fala com uma breve apresen-tação da Qualicorp, explicando que

se trata de uma empresa relativamente nova, nascida em 1997, hoje com 5 milhões e 200 mil usuários e que trabalha com todas as operadoras e entidades de classe. No segmento de consultoria e gestão de benefícios, pelo qual Londres é responsável, são 3.500 empre-sas clientes e, dessas, em torno de 200 são de médio e grande porte. As demais são de pequeno e médio portes.

O PALESTRANTE

A Qualicorp tem R$ 1,6 bilhão de fa-turamento bruto e envolve 15 milhões de consultas; mais de meio milhão de internações; 57 milhões de exames; 5.2 milhões de atendimento via call center; e 485 mil pacientes ativos sob gestão de saúde1. São números bastante expressi-vos, diz Londres.

A principal unidade de negócios da Qualicorp é o segmento de planos coleti-vos por adesão e consultoria e gestão de benefícios.

Londres explica que existem três transições fundamentais na saúde: demo-

gráfica, epidemiológica e tecnológica. “E todas elas custam. Estamos vivendo mais e viver mais custa mais. Isso traz uma mudança na pirâmide epidemiológica e na pirâmide social”, ressalta.

Nos últimos anos, continua, tem-se acompanhado a incorporação de novas tecnologias, que na área da saúde é com-plementar e não substitutiva. São transi-ções importantes, bem-vindas, mas que mudam um pouco a realidade da saúde e, em sua opinião, são pouco refletidas na forma como se vem prestando o serviço saúde.

1. Indicadores de atendimento e de gestão dos planos de saúde contratados e/ou administrados pela Qualicorp, considerando-se todos os segmentos de atuação – indicadores de 2014.

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Foco no hospitalEnquanto isso, existem ainda alguns

modelos equivocados de saúde. “Não temos sequer um modelo assistencial. O que se tem hoje é um modelo focado em hospital, ou seja, foco é na doença e não na saúde”, diz Londres, destacando, porém que, por outro lado, não deixa de ser uma forma de entender onde existem oportunidades de utilizar melhor os re-cursos disponíveis, gerando mais eficiên-cia e menos desperdício. Aliado a isso, há um modelo de remuneração desalinhado.

Londres conta que uma vez, quando estava no Hospital do Coração, pediram--lhe para escrever um texto – “e o que eu vou dizer reflete-se na cadeia como um todo” -- sobre a relação entre operadora de serviço, operadora de planos de saúde e prestadoras de serviços de saúde. Ele começou a pensar que, em vez de dizer a mesma coisa, seria um pouco provocativo, de uma maneira intuitiva, tentando enten-der porque não há mudança no quadro. E chegou a algumas conclusões que não têm nenhum embasamento científico, mas que iria dividir a ideia, “e acho que ela traduz um pouco dessa nossa inércia”.

A primeira questão, Londres chama de três Cs. “O primeiro C é que a gente não se confia. Há 20 motivos para eu não comprar uma Ferrari; o primeiro é que eu não tenho dinheiro; os outros 19 não im-portam. Há 20 motivos para não inovar e fazer algo diferente; o primeiro é que não confiamos um no outro; os outros 19 não importam”. Londres revela achar que existe bem pouca confiança de fato e ela não virá por decreto, não virá por instru-ção normativa ou resolução normativa: “Virá por duas partes que se confiam e es-tão dispostas a despirem-se dos seus pa-radigmas e pensar de maneira diferente”.

Importância do médicoO segundo aspecto, o segundo C, é

competência, diz ele, explicando que brinca dizendo que todo mundo sabe dizer que está muito ruim; que vivemos

quase o apocalipse e todo mundo já leu o livro de Michael Porter2. Mas o que falta para colocarmos isso em prática? Primei-ro, continua Londres, que não é tão sim-ples assim e segundo é que falta de fato algum grau de competência para que se faça isso. “E acho que isso passa por en-volver e trazer aquele que deveria ser um protagonista importante nesse processo de mudança que é o médico”.

O palestrante ressalta que empresas que não entenderem o papel que os médi-cos podem exercer na saúde corporativa de seus colaboradores terão dificuldade. O médico tem um papel bastante impor-tante fora de uma visão corporativista, enfatiza. “Claro que há médicos e médi-cos, hospitais e hospitais, operadoras e operadoras, mas um bom médico tem um papel importante a desenvolver na busca de um sistema mais sustentável. ”

O terceiro C, diz Londres, é a conjun-tura. “Eu brinco que, numa casa em que chove dentro, a telha provavelmente está quebrada, mas, se parar de chover, a gen-te esquece que é um problema estrutural. Até que a conjuntura muda e mostra que o problema estrutural não foi resolvido”.

O que acontece na saúde suplementar do Brasil, segundo ele, é o que acontece na economia brasileira. Isto é, não foram feitas as mudanças estruturais antes por vários motivos e uma delas foi que as coi-sas iam bem.

Londres continua sua fala ainda fa-lando sobre a mudança da conjuntura, dizendo que a crise econômica chegou, como colocado antes, então a conjuntura mudou e essa é a realidade: a inflação da saúde! Duas vezes, duas vezes e meia a inflação média-consumidor.

Para ele, se olharmos a margem ope-racional das operadoras de planos de saúde, podemos afirmar que elas têm prejuízo. O grande ganho das operadoras é financeiro. “E acho que não está bom para ninguém. A verdade é essa”, enfatiza e explica que se trata de uma realidade que se enxerga, via dados do IESS3, a par-tir de balanços realizados, que são enca-

2. Repensando a saúde - estratégias para melhorar a qualidade e reduzir os custos. Porter, Michael E. Teisberg, Elizabeth Olmsted

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minhados à Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS).

E os impactos sobre o patrocinador? pergunta. E responde: dois terços desse segmento é feito de planos corporativos. “E o que tem acontecido? A empresa, em função da realidade atual do país, pro-cura cortar gastos em planos de saúde. Pela primeira vez, em muito tempo, eu já escutei algumas empresas pergunta-rem se precisam continuar oferecendo benefícios de saúde”, conta Londres. E, segundo sua visão, esse custo tem se tor-nado insustentável. E mais empresas es-tão repassando um pouco desse custo até onde podem para o colaborador, seja para contribuir, dividir um pouco do financia-mento, seja para procurar contribuir para uma utilização mais consciente. “Fazer com que quem usa, pense com a cabeça de quem paga é sempre salutar. Sentir um pouco no bolso acho que sempre ajuda. ”

E o fato é que os planos têm perdido, continua Londres, informando que só em setembro/2014 perderam 64 mil vidas. “Este ano será o primeiro em que, em 15 anos de regulamentação, o país vai termi-nar com menos beneficiários de planos de saúde do que começou o ano. E talvez no próximo ano aconteça a mesma coisa.”

Dois exemplosLondres diz que trouxe a sua palestra

dois casos reais de empresas com que tra-balhou e cita que poderia ter trazido 20 casos e não mudaria muito. Um dos casos é uma indústria de médio porte do Rio de Janeiro que me trouxe a seguinte questão no ano retrasado (2012): a empresa tem uma sinistralidade muito próxima do seu limite técnico, aquilo que está previsto no contrato. E estão apresentando reajuste de 20%. “Minha capacidade de repassar isso é de 5%”, diz ele. E faz algumas perguntas: qual o futuro desse mercado? Até quan-do as empresas conseguirão suportar esses aumentos? A empresa pode simplesmente deixar de dar plano de saúde?

Continuando, Londres explica que a indústria deu a ele e sua equipe uma

missão neste ano (2015): redução de RS 1 milhão no custo do plano de saúde sob o risco de parar de dar o benefício.

A segunda a ser citada é uma empre-sa muito grande que teve um aumento de 25% no plano de saúde que oferece. Novamente, muito além de sua capacida-de. “E o vice-presidente falou exatamente assim: “De coração aberto eu pergunto; o que a gente pode fazer para mudar esse quadro? Quais os hospitais de melhor resultado em cada especialidade? Como divulgar para o meu público os hospitais de menor custo e melhores resultados? ”

Londres enfatiza que o que ele tem procurado, em todas as empresas, é:• Nós não temos a bala de prata; ela não

existe. Se você está nos contratando para ter a bala de prata, não nos con-trate.

• Se você não mudar o seu papel, não vai chegar onde quer. As empresas têm que entender que precisam dei-xar de ser apenas os financiadores, meros pagadores de boletos, e assu-mir a sua parte, aquilo que cabe na sua responsabilidade de gestão.

E qual é a importância do corretor no cenário atual? pergunta. Como resposta, ele diz que irá contar um pouco do que tem sido feito. Explica então que o corre-tor, no seu início, era um vendedor e cui-dava de fazer a gestão, seja do benefício do seguro de vida, do automóvel que seja.

Conforme foi aumentando a deman-da, aumentando os desafios, mais se tem que gerar de valor agregado. E isso vale para qualquer corretora, enfatiza. “Eu falo que hoje, e falo sem o menor constrangi-mento, o corretor na área da saúde está para a empresa como o político está para o eleitor. Há uma enorme desconfiança porque muito foi prometido e nem tan-to foi entregue”, diz Londres, destacando que, para ele, o desafio das corretoras é reposicionarem-se. “Modestamente, te-mos procurado fazer isso; reposicionan-do-se porque o desafio é entregar valor, senão não preciso de você como even-tualmente não preciso da operadora. ”

3. IESS – Instituto de Estudos de Saúde Suplementar

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Em defesa do cliente Relacionamento, isso é importante,

continua Londres. Ou seja, defender o interesse do cliente junto à operadora, seja numa negociação, seja numa auto-rização excepcional, seja numa interme-diação de acesso. “Não é à toa que foi criada uma resolução normativa para exatamente garantir prazos máximos de atendimento. E não deveria ser um serviço diferenciado, mas é”, enfatiza, explicando que ajudar a empresa muitas vezes é colocar em prática aquilo que é o seu plano estratégico, no que se refere à gestão de benefícios.

Outra questão importante, diz ele, é o conhecimento técnico regulatório. E justifica dizendo que as normas da ANS mudam todo dia. “Agora vem o novo rol de procedimentos e o desafio de decodi-ficar esse tema para o cliente, aquilo que envolve benefício pós-emprego, que é um tema extremamente palpitante e recor-rente, por exemplo.” E a atuação técnica, cita, de forma que se possa instrumenta-lizar o cliente a partir das informações, gerando para ele não só um diagnóstico, mas também as diversas oportunidades de atuação na melhor gestão do benefí-cio. “Como eu falei, não há uma bala de prata, mas há muito que pode ser feito a partir da identificação do comportamen-to de custos das empresas-clientes.”

E, por fim, continua Londres, a saúde corporativa. E aqui, segundo ele, o desa-fio é fazer uma transição de geração de custo para valor. “Isto é, o cliente perce-ber valor no que a gente faz”, ressalta, ex-plicando que historicamente as empresas, quando enfrentavam um reajuste alto no

plano de saúde, faziam o chamado tom-bamento: eu saio dessa operadora e vou para a próxima. Deixo a bomba aqui e vou para a próxima. Só que, se a empresa não fizer nada, ela não mudou a deman-da dos seus colaboradores por serviço. O que acontece no ano seguinte a gente já sabe, o problema volta.

CoparticipaçãoA segunda onda, diz Londres, é um

pouco do que se vive hoje. “E eu chamo de onda da dor. ” Para ele, se a empresa não tem capacidade de continuar con-

seguindo custear o seu benefício, ou ela faz um downgrade do benefício (tinha um plano nacio-nal, vai para um plano regional; tinha um plano apartamento, vai para o plano enfermaria; tinha um plano seguradora, vai para outro plano de outra modalidade de operado-ra) ou começa a também envolver ou chamar o co-

laborador para participar mais do custeio (coparticipação). Londres explica que isso pode trazer alguma mudança do ponto de vista de utilização, se forem introduzidos alguns mecanismos de regulação.

Mas, de fato, enfatiza, o que tende a ser mais sustentável é a gestão dos bene-fícios, a terceira onda. São as empresas entenderem que elas têm um papel nesse processo e que não passa simplesmente por trocar de operadora, ou aumentar a coparticipação aqui, ou reduzir o reem-bolso. Mas conhecer fundamentalmente a sua população, interagir com ela e po-der com isso promover a saúde, preve-nir doenças, montar programas. “Se for um hospital, ter centro de referência. Há muito que pode ser feito.”

A seguir, Londres cita a questão da regulação. E, de novo, coparticipação, reembolso ou assistencial. “Por exem-plo, sou uma empresa que tem um nú-mero grande de mulheres, tenho uma utilização enorme de ginecologista fora da rede, absenteísmo”, diz e pergunta:

“Como eu falei, não há uma bala de prata, mas há muito que pode ser feito a partir da identificação do comportamento de custos das empresas-clientes.”

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por que não ter um ambulatório dentro da empresa? Por que não ter um médi-co dentro da empresa? Vai custar menos, diz ele, vai se saber qual é o médico, não vai estar solto na rede. Por que não se faz isso? “Nós temos que provocar. Na hora em que você provoca a empresa a assumir a sua responsabilidade, ela te provoca a encontrar soluções. E esse é sem dúvida um dos caminhos.”

O palestrante explica que, quando fala em regular, não é só o administrativo, mas eventualmente buscar uma porta de entrada um pouco mais ordenada e orga-nizada. “Não no sentido obviamente de cercear acesso, mas de buscar aquilo que efetivamente é melhor para o indivíduo. ”

Modelagem de risco é o tema que ele cita em seguida, explicando que ele tem provocado muitas empresas, estimulado a refletirem seriamente a mudar para o modelo de pós-pagamento. Teoricamen-te, sai mais barato assumir o próprio ris-co, diz ele, mas enfatiza que há o desafio de vencer esse preconceito que existe. “Isso não envolve montar megaestrutu-ra, mas sim simplesmente você assumir o próprio risco. E eventualmente se bene-ficiar de tudo aquilo que você vê agregar num movimento como este.”

Londres informa que há sete insti-tuições que estão caminhando nessa di-reção, refletindo e se perguntado: “Se o risco é meu, por que não o trazer para mim?”. Isso envolve modelagem de risco.

E, por fim, diz Londres, há uma ou-tra variável que é redesenhar. Redesenhar conforme a necessidade da empresa. “In-felizmente alguns precisam reduzir cus-tos, outros querem repensar a contribui-ção, enfim, querem repensar um pouco o benefício pós-emprego e o passivo que se traz.”

Pensando no cliente hospital, Londres diz que existem muitos e pode-se afirmar que ele tem uma vantagem sobre todos os outros: pode inclusive internalizar parte do seu sinistro. Ou seja, se o resultado está ruim, para que mandar a conta do colaborador que está internado dentro de casa para a operadora? “Quanto mais as instituições se comprometem com ações efetivas de gestão de regulação, mais elas

contribuem para ter melhor utilização do seu recurso”, explica Londres.

Ele informa que aplica a Variação do Custo Médico-Hospitalar (VCMH) para o cliente, porque ele pode ser diferen-te do VCMH da operadora. E VCMH é a variável de preço: o parto está custando mais caro.

E cita a demanda, explicando que aumentou a quantidade de consultas, de internações ou nova coberturas. “Basica-mente são esses os três ofensores”, diz.

Pronto-socorro: porta de entradaLondres diz em sua palestra que pron-

to-socorro sempre vai ser útil como porta de entrada, mas com certeza não na propor-ção como ele é utilizado hoje, pois aumenta a variação do custo médico-hospitalar.

E você tem vários motivos para isso, diz ele, citando quatro: “porque eu não tenho um médico para chamar de meu; porque se deixa para ir ao médico no final de semana; e porque eu não consigo agen-dar; me botam para daqui a três semanas. E quarto: porque eu vou conseguir fazer o exame lá no próprio pronto-socorro”, diz. E enfatiza que isso custa mais caro porque as instituições naturalmente têm que cumprir os seus protocolos de quem dá entrada pelo pronto-socorro. “Mas olha o tamanho do desperdício e da ine-ficiência quando essa porta de entrada é utilizada para aquilo que não precisa. ”

Londres diz que se trata de só um exemplo do que se vê na carteira inteira, crescendo e trazendo um ônus desneces-sário para as empresas. “E nós provoca-mos as empresas dizendo: será que você não tem uma oportunidade de porta de entrada dentro de casa, dependendo do tamanho da sua organização? ”

Londres explica que o tem procura-do fazer é provocar, pensar um pouco de forma diferente. “Estamos vivendo um momento de crise econômica em que o desemprego está aí descolado do custo da saúde, quantidade de vidas nas empresas diminuindo. E, ou a gente senta na calça-da e chora, ou para, pensa e diz: ‘Quem sabe eu tenho uma oportunidade’”.

Obrigado

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Sobre a lógica do indivíduo, diz Pena, há fragmentação do cuidado, bai-xa adesão a comportamentos saudáveis, entre outros. E explica que acompanha um indicador pelos dados de utilização do plano, considerando as mulheres que deveriam fazer exames periódicos. O re-sultado é que só 30% fizeram exame de mamografia, só 36% fizeram o Papani-colau. E para um período de dois anos, isso aumenta para 50%. Então, 50% das mulheres (público elegível) ficaram sem fazer, em pelo menos dois anos, exames de controle.

O Recursos Humanos (RH) do hospi-tal, segundo ele, paga o plano, terceiriza a gestão, e não entende do que está fa-lando. É um megadesafio, continua Pena, porque o RH não sabe o que fazer e as empresas não têm pessoal qualificado, mesmo num hospital, porque é um ou-tro setor. Para ele, o RH não sabe muito e a medicina do trabalho também passa ao largo. Seja na empresa ou mesmo no hospital, falta conhecimento, falta com-petência mesmo, falta expertise.

Só para dar um exemplo, diz ele, “o nosso comitê de saúde tem oito pessoas”. Desde epidemiologista, um consultor es-

Mundim Pena o nome do programa “Cuidando de Quem Cuida” do Hospital Sírio-Libanês, explicando que tem como

missão não somente oferecer um plano aos colaboradores e terceirizar a gestão da saúde, mas de fato assumir a responsabilidade e tentar fazer alguma coisa para mu-dar esse sistema, que está falido. “Olhando como pagador, não temos dúvida: vamos ter que fazer alguma coisa. Mas também vemos do lado do usuário, do prestador, do médico e é assustador. Essa conta não fecha”, diz ele, enfatizando que é preciso olhar com um pouco mais de responsabilidade. A própria medicina do trabalho tem um papel fundamentalmente preocupado com a legislação e a conformidade legal e não com a gestão da saúde.

FÁBIO PATRUSPALESTRANTE

Fábio Patrus Mundim Pena

Hospital Sírio-Libanês

Saúde Corporativa e Gestão de Benefícios - Debate 16/11/2015

pecífico para entender como é que fun-ciona o mercado do lado das corretoras, a própria corretora, a operadora, uma pes-soa só para mexer em protocolos, um mé-dico de família, um médico do trabalho. “São muitas pessoas para juntar conheci-mento, para tentar entender mais ou me-nos o que é que nós estamos fazendo e qual seria o caminho.”

Como referência de custo, diz Pena, o plano de saúde está perto de 10% da folha de pagamento, algo em torno de R$ 50 milhões para um resultado questionável.

O palestrante explica que se saiu de R$ 200 per capita para quase bater os R$ 300. E essa curva parece continuar cres-cendo. “Se não mexermos nela, isso fica-rá insustentável. Essa conta sozinha vai subir mais do que o reajuste de qualquer crescimento, ou seja, não consegue man-ter uma produtividade razoável.”

Pena explica que seu plano de voo é uma referência do modelo de saúde cor-porativa que integra, na verdade, a saúde ocupacional. “Começamos falando de se-gurança no trabalho. Não se pode esque-cer disso”, enfatiza.

Para ele, é mais fácil pensar separa-damente: saúde ocupacional faz um tan-

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to, saúde corporativa faz a outra coisa, e trabalhamos com dois espaços. “O nosso desafio é juntar essa coisa verdadeira-mente; juntar esses processos, colocar esses dois para compartilhar os momen-tos que têm de um lado e do outro; tanto quando o paciente vem com algum agra-vo, quanto quando vem para um exame periódico.” Continua, é a saúde ocupa-cional, os programas de saúde corpora-tivo, e evoluindo para planos persona-lizados, participação ativa do usuário e quem sabe um dia chegar na gestão inte-gral da saúde corporativa.

Historicamente, diz o palestrante, havia uma medicina do trabalho bem consolidada. Qualidade de vida já era um tema bastante forte, bem valorizado. A questão da segurança no trabalho nas pesquisas de engajamento está acima de 90%, ou seja, é percebida como uma real preocupação da instituição. E em 2014 começou-se a trafegar um pouco mais nessa seara.

Trabalho em conjunto O primeiro movimento chave, diz

Pena, foi a parceria com a área médica. Não só a área médica, mas o corpo clínico do hospital e também a área de relaciona-mento médico.

O RH está junto com a superinten-dência de novos negócios, continua o pa-lestrante. No comitê de saúde, segundo ele, juntou-se a multiplicidade de exper-tises para lidar com esse tema e em cada reunião aprendeu-se algo novo.

Voltando ao início do piloto, diz o pa-lestrante, começou em setembro de 2014 com o lançamento formal do programa “Cuidando de Quem Cuida”. “Quando paramos para fazer as contas, vimos que, na prática, o que não foi feito de procedi-mentos que passaram pela nossa segunda opinião, mais o custo razoável daquilo que foi feito, resultou num ganho impor-tante que justificou todo o projeto”, in-forma Pena.

Já em 2015, segundo ele, seguiu-se com a formalidade da medicina do traba-lho, os processos de segurança. E buscou--se a certificação pela Occupational Health

and Safety Management System OHSAS - 18000 . Houve novos programas de pre-venção, diz Pena, e começou-se a traba-lhar com mais informações. “Trouxemos um Business Intelligence - BI para tentar cruzar informações de medicina do traba-lho, afastamento e utilização”, explica.

Em dezembro deste ano de 2015, anuncia, será dado um passo importante que é a migração do pré para o pós. “Dei-xaremos de pagar um valor fixo e passare-mos a pagar o sinistro total”, diz ele, expli-cando que, na prática, já se está com risco: “Ou pagamos em 12 meses ou pagamos mês a mês. Mas aquela conta é minha e nós temos passado por negociações”.

Na prática, diz ele, é só uma questão de tempo: “Se o seu reajuste for muito alto, no máximo você vai pagar em dois anos ou vai ter de fazer algum aporte complementar, alguma cláusula lá na frente que você vai pagar se não chegar. No final, você está pagando a conta”.

Quadro atual Falando sobre o que é o programa

hoje, Pena inclui os aspectos da promo-ção da saúde, prevenção, o próprio am-bulatório de atenção primária e a parte assistencial.

Sobre a promoção da saúde, começa lá na qualidade de vida: “Se você não criar uma cultura de que valoriza o colabora-dor, ele não vai aderir mais para a frente. Ele vai achar que você está simplesmente cerceando-o”, diz Pena, enfatizando que essa confiança foi sendo construída já de muito antes do início do projeto com as ações de qualidade de vida e de promo-ção: “Fizemos eventos corporativos e tal-vez o mais significativo seja o estúdio de treinamento funcional. Ele é flexível, isto é, consigo indicar ao colaborador ioga, dança e a própria academia funcional que tem dado muito certo”.

Do ponto de vista da prevenção, con-tinua o palestrante, existe o programa de gestantes em parceria com a própria Qualicorp, para acompanhar a evolução do pré-natal. É o Previna. Foi feito o ma-peamento de toda a rede de ginecologis-tas do entorno e os que as colaboradoras

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mais procuram, para que pudessem fazer a mamografia no hospital via próprio am-bulatório de saúde, mantendo esse víncu-lo com o médico original.

Existe ainda o Pega Leve, um progra-ma específico de comportamento alimen-tar para jovens. “É uma parceria, um pro-jeto que caiu no nosso colo, e já estamos com cerca de 80 jovens fazendo parte re-gularmente.”

E mais o Passaporte para Saúde, que é um acompanhamento também feito por equipe multiprofissional, com educador físico e nutricionista. O médico monitora regularmente para reeducação alimentar, acompanhamento de peso, etc.

Destaque para examesO ambulatório de saúde, vale desta-

car, diz Pena, é uma importante mudan-ça: “Nós temos uma equipe de médico de família, médico do trabalho, psicólo-go, nutricionista, enfermeiro de atenção primária e estamos fundindo essas duas áreas. Ou seja, o exame periódico vira o exame clínico”.

E se a pessoa vier para fazer uma con-sulta assistencial, por qualquer motivo de agravo, uma tosse, uma cólica, o que for, ao retornar, se ela estiver bem, isso vira também um Atestado de Saúde Ocupa-cional - ASO e já completa o exame pe-riódico.

O desafio aqui, segundo Pena, é construir esses protocolos de forma consistente para de fato aproveitar esse momento em que o colaborador tem uma consulta sem perder de vista o ris-co ocupacional, que é relevante também. “Às vezes, achamos que não. Eu faço só saúde da família, mas o risco ocupacio-nal, que é a parte legal, precisa ser con-templado. Só o médico do trabalho sabe exatamente como lidar com determina-do risco”, diz ele.

Pena cita que há ainda a endocrino-logista que entrou no acompanhamento dos programas de obesidade, principal-mente quando havia indicação de cirur-gia de obesidade, de gastroplastia.

E, dentro disso tudo, diz ele, campa-nhas: “O tempo todo, mostrando que de

fato nos importamos e que a nossa preo-cupação é genuína. A aderência do cola-borador é imediata porque ele sabe que o nosso objetivo único é assistência de boa qualidade”, diz o palestrante.

Falando ainda de campanha o tem-po todo, Pena diz que não é muito difícil porque a marca Sírio ajuda. Mas como se sensibiliza o colaborador para a causa é a chave da coisa. “Porque o pior, na per-cepção dele, ainda está por vir, na hora que, em tese, fecharmos a rede”, diz ele. E explica: “Se para descredenciar a rede, tem que ser própria, nós vamos fazer rede própria. Se ninguém consegue descre-denciar, vai ser na rede própria que nós descredenciamos”, esclarece. E ressalta que, se não for muito bem feito, e com esse amadurecimento da relação com o colaborador, ele pode não entender mui-to bem isso. “E nós estamos construindo esse caminho para dar o passo final, que é justamente a rede própria.”

Pena informa que têm sido feitos em torno de 800 mil atendimentos/mês den-tro do próprio hospital. E que não é um volume inexpressivo. “O nosso sinistro é em torno de 3,5% e já conseguimos tirar da rede em torno de 20% desse sinistro, que são os casos de alto custo”, diz ele, esclarecendo que entende estar o progra-ma mais ou menos pronto para dar um passo como pós-pago ou rede própria, “porque o alto custo, de alguma forma, já está vindo para nós”.

Em 197 indicações de cirurgia orto-pédica, informa o palestrante, 27% vie-ram pela operadora. “E o interessante no-tar é que, das que vieram encaminhadas pela operadora, somente 44% teve cirur-gia confirmada.”

E quanto ao custo? pergunta. “Tam-bém é muito cedo para dizer. Mas, en-quanto der para mostrar alguma coisa, nós vamos mostrar. Mas o fato é que essa volatilidade, como estamos tirando boa parte de alto custo, tende a cair. Vamos ver se isso se confirma”, explica. Para ele, é importante dizer que uma coisa é tirar o sinistro da rede e trazer para o hospital, será “caiu o sinistro”. “Lógico, é esperado que caia mesmo. Só que a conta é: se eu colocar o sinistro interno

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per capita e o sinistro da rede, como é que essa conta fica?”

Pena pergunta: se estivesse com esse sinistro na rede, quanto provavelmente seria o reajuste, já que é zero de nego-ciação que se tem com as operadoras? Segundo ele, quem consegue uma nego-ciação boa com a operadora me conta, ou ele teve um reajuste de 80% e conseguiu baixar porque 80% era impagável e a ope-radora vai ter que assumir parte do preju-ízo ou então é zero.

“Como nós já estávamos na faixa do zero porque bateu 20, 25% de reajuste, então é zero de negociação. Você tem que pagar os 25%”, explica, ressaltando que, se esse sinistro estiver na rede, essa conta estaria perto de RS$ 10 milhões de aporte. “E aí fazendo uma conta com o aporte que eu tive que pagar e o custo que eu tive, em tese eu economizei aí RS$ 2.8 milhões, que é em torno de 6, 7% do sinistro. Essa é a última menção ao Triple Aim.”

Pena diz que estão sendo fechadas parcerias em várias regiões de São Paulo para especialidades como oftalmologia, otorrinolaringologia, fisioterapia, psico-logia entre outros, mas para isso estamos qualificando essa rede.

Irá haver uma empresa parceira para aconselhamento médico, quase que um direcionamento médico. E que isso vai ser o ponto de contato nos horários não comerciais, para direcionar a popula-ção para o melhor atendimento, seja no pronto-socorro, seja com especialistas. E eventualmente até uma agenda direta-mente com os especialistas para atender aos colaboradores que demandem um aconselhamento médico por telefone.

O registro eletrônico de saúde é fun-damental, diz Pena, explicando que foi recentemente contratada a Everis para fazer essa parceria com o hospital. E a grande mudança, pensando no futuro, é exatamente a rede própria administrada no modelo de pós-pago, entrando em vi-gor daqui a um mês.

União de expertises Pena enfatiza que, para um processo

de aprendizado, é preciso integrar ex-pertises. Todo mundo entende muito de alguma coisa. Segundo ele, as corretoras entendem muito do mercado da operação de saúde, os hospitais entendem muito de modelo assistencial, os epidemiologis-tas entendem muito de BI e conseguem cruzar essas informações, “mas é preciso juntar essas expertises senão não avan-çaremos porque poucos entendem desse contexto global”.

O ônus, continua Pena, ainda está na maior parte sobre a empresa e sobre os beneficiários. “Não que os demais não es-tejam preocupados. Estão preocupados, mas eu acho que precisa de mais compro-metimento. A operadora precisa compro-meter-se mais; os prestadores precisam comprometer-se mais.”

É lógico que a ansiedade é por re-sultados mais rápidos, mas tem que ter paciência, insiste Pena, tem que persistir, tem que acreditar em algumas diretrizes e apostar nelas porque o tempo de res-posta é mais longo. “É complexo, é quase que pousar em Marte porque mudar esse padrão cultural é difícil”, diz, explicando que o usuário não percebe valor quando se muda, a operadora não está muito pre-ocupada e o prestador faz mau uso disso para poder ganhar mais.

Então quebrar essa cadeia de interes-ses, ganhando em cima de um modelo do jeito que está é muito complicado, mas é fundamental trazer o colaborador. Se o colaborador apostar no projeto, você consegue avançar.

E aí, claro, diz o palestrante, a área de novos negócios está junto. “Falamos igual a uma empresa de equipamentos: eu não vendo mais equipamentos, eu vendo soluções’”, diz Pena, destacando que então quem sabe o hospital deixe de vender cirurgia e passe a vender solu-ções para uma determinada população, que inclui a atenção primária e even-tualmente seja possível ajudar a montar a medicina do trabalho dessas outras empresas.

Enfim, diz ele, se está apenas come-çando, o sistema é complexo. “A cada dia aprende-se alguma coisa nova. ”

Obrigado.

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Debates FGV Saúde | Volume 17 | jan/dez. 2015-201660

Márcio Vinícius Balzan, inicia sua fala destacando que o atual cená-rio de dificuldades que estamos en-

frentando do Brasil, envolvendo, inclusive, a sustentabilidade do nosso sistema de saú-de, se depara com o alto preço de materiais e medicamentos e das órteses e próteses.

O MODERADOR,

Limitações das Tabelas Simpro e Brasíndice e Novos Modelos de Pagamentos de Materiais e Medicamentos na Saúde Suplementar

MODERADOR

Márcio Vinícius Balzan

FGV Saúde

Debate 27/04/2016

Balzan é enfático ao dizer que não dá mais para suportar, na relação com a operadora de plano de saúde, a práti-ca dessa margem de preços. Ele destaca a disparidade de preços de OPME entre regiões, como será apresentado pelos palestrantes.

Essa discussão, diz ele, perpassa pelo

22º SEMESTRE DE DEBATES FGV SAÚDE

modelo de remuneração, incorporação de novas tecnologias e judicialização da saúde.

Balzan comenta que os palestrantes convidados apresentarão dados do setor, estudos e opinião de gestores que estive-ram à frente de importantes operadoras de planos de saúde.

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jan/dez. 2015-2016 | Volume 17 | Debates FGV saúde 61

PALESTRANTE

Adriano Leite Soares

Unimed Brasil

Limitações das tabelas Simpro e Brasíndice e novos modelos de pagamentos de materiais e medicamentos na saúde suplementar - Debate 27/04/2016

Adriano Leite Soares inicia-se com explicação sobre o que é a Unimed. Trata-se, diz ele, de um sistema coo-

perativo regido pela confederação Unimed Brasil, responsável pelas regras do sistema; pela confederação regional, Mercosul, responsável pelos Estados do Sul do Brasil e por parte do Mercosul; e uma Central Nacional, responsável pelas operadoras locais.

A PALESTRA DE

Soares informa ainda que são 176 Unimeds, consideradas pela Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) como de pequeno porte, interiorizado e distribuído. Tais unidades atendem em 84% do território nacional, com maior concentração na região Sudeste, onde há o maior poder econômico. A maior concentração é dentro do Estado de São Paulo, responsável pelo terceiro Produto Interno Bruto (PIB) da América Latina.

Hoje são 50 milhões de beneficiários na saúde suplementar, diz Soares, o que corresponde a 24%, 25% da população. E, pela primeira vez na história da saú-de suplementar, ele enfatiza que houve redução do número de beneficiários. E a razão é, logicamente, a crise econômica e política que o Brasil passa. Soares con-ta que houve muitas demissões no setor industrial, com redução também de em-presas, o que impactou na clientela da Unimed.

Segundo Soares, o sistema Unimed começou com 2.700 operadoras de pla-nos de saúde e hoje, atuantes, são 974 operadoras, tirando a odontológica. O sistema corresponde a 30% das operado-ras no Brasil.

Soares aborda então, particularmente, o que define como “inflação médica”, di-zendo que, segundo todos sabem e disso reclamam, é muito maior que a inflação brasileira e muito maior que os reajustes dos planos pessoa física. Então, continua o palestrante, as operadoras enfrentam essa inflação médica, tanto de valores que acrescem, quanto de volume, como também de rol de procedimentos que a cada dois anos sofre alterações e judicia-

lização. Soares aponta ainda outro fator que aumenta muito os custos: o envelhe-cimento da população. E diz que é algo que preocupa, porque a expectativa de vida do brasileiro aumentou em dez anos e tende a aumentar mais, até em progres-são geométrica. E aí, diz Soares, se for-mos olhar também a sinistralidade das operadoras, iremos verificar que também vem aumentando.

OPMESegundo Soares, um dos fatores mais

importantes na questão do custo, é a OPME (Órteses, Próteses e Materiais Es-peciais). Ele informa que a remuneração hospitalar representa 30%, 40% do custo de uma operadora. E, desses 30%, 40%, 15% é OPME. Soares salienta que é preci-so mudar o modelo regulatório, o modelo assistencial. O modelo que o Brasil optou, diz ele, é muito semelhante ao americano, do assistencialismo especializado, que tem uma relação custo-benefício muito complicada. O sistema europeu, baseado na prestação de atenção primária e enca-deamento da saúde, seria melhor, segun-do sua visão.

Soares foi enfático ao falar do sistema existente hoje, de pagamento por proce-dimento (fee for service). Diz que irá levar a saúde suplementar à falência. E que por isso é preciso haver mudanças, alteração na forma atual, “porque senão não vai mais existir hospital; não vão mais exis-tir operadoras”, diz ele, explicando que, no Brasil, os hospitais que não prestam atendimento à saúde pública brasileira têm no máximo 8% de particulares, se-

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Debates FGV Saúde | Volume 17 | jan/dez. 2015-201662

gundo dados da Associação Nacional de Hospitais Privados (Anahp). E ninguém se sustenta com 8%, enfatiza. 92% são pa-gos por operadora. Ou seja, ressalta Soa-res, é um quadro que se não for alterado através de uma união dos envolvidos não será possível que todos sobrevivam.

A palestra de Soares continua com abordagem dos diferentes modelos de pagamentos. Ele explica que nem to-dos servem a todos os sistemas. E cita o modelo por Grupos Clínicos Ajustados (DRG), que está sendo implantado no sistema Unimed. Segundo Soares, a apli-cação está de início apenas nos hospitais Unimed (114 no Brasil) para primeiro “aprender em casa”, ajustar o processo e depois expandir para os demais hos-pitais.

Citando dados históricos dos Estados Unidos, traduzido em gráfico apresenta-do, Soares explica que os resultados mos-trados indicam o quanto reduz a atenção quando se compartilha o risco (Gráfico 1). Ou seja, se houver mais eficiência, há maior ganho, há economia. Em caso con-trário, ganha-se menos e o gasto é pro-porcional a esse processo. E Soares enfa-tiza que essa relação tem de existir entre operadora e prestador, quer seja hospital, quer seja laboratório.

Para Soares, os princípios básicos de remuneração passam por ser eficiente e fácil. Ele ressalta que a grande vantagem do pacote como modelo de pagamento é ser fácil; não é necessário auditor, por-que o já foi combinado o valor para de-terminado procedimento (ex.: cesárea, parto normal). Se o prestador foi mais eficiente, diz ele, mérito dele, melhor para ele.

O que não pode, continua Soares, é um stent farmacológico custar R$ 6 mil em um Estado e R$ 18 mil em outro. “Não tem logística e acondicionamento que faça esse preço”, diz, ressaltando que o sistema Unimed é muito interessante nesse processo, pois permite aplicar pro-jetos pilotos em determinadas unidades antes de implantar no sistema inteiro ou de sugerir para um prestador.

Cases Soares passa então, em sua palestra, a

detalhar alguns cases que considera inte-ressantes dentro do sistema Unimed.

Unimed Noroeste/RS Aqui, ele explica que se trata do Pro-

grama de Valorização do Cooperado, em

Gráfico 1 - Variação do custo médio da internação hospitalar nos EUA – 1973 a 2012

Fonte: Abramge, com base em dados do Centers for Medicare & Medicaid Services

Antes do DRG:12,4% Após implantação do DRG: 4,1%

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que a remuneração é por performance, associada a indicadores de qualidade (efetividade clínica, eficiência técnica), satisfação dos clientes e capacitação do profissional.

Unimed Vitória Remuneração hospitalar baseada em

taxas e diárias com composição semi-glo-bal. Ou seja, diz Soares, não existe mais taxa para utilização de bisturi elétrico, taxa para aspirar, etc. E por-que semiglobal? pergunta, explicando que no sistema Unimed o médico é coope-rado, não pode receber pelo hospital. Desta forma, o ho-norário do médico é sepa-rado dessa cobrança, o que traz maior previsibilidade nos gastos.

Unimed Belo HorizonteA Unimed BH, além de

estar implantando o DRG, também tem um processo de diária incluindo todos os insumos e procedimentos. Soares conta que a im-plementação do DRG começou em 2012 e hoje está em processo de adoção no seu hospital e em hospitais terceirizados.

Soares explica ainda que existem ou-tros três procedimentos sistêmicos, im-plantados via Unimed Brasil. O primei-ro procedimento sistêmico, segundo ele, começou em 2009 e chama-se Comitê Técnico Nacional de Produtos Médicos (CTNPM). Soares diz que o procedimen-to começou para equalizar no Brasil o preço daquele stent que ele próprio citou anteriormente. Esse stent, diz ele, tem de custar o mesmo valor em todo o Brasil, respeitando o Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) e a lo-gística. Mas o preço desses dois compo-

nentes não pode variar três vezes de um lugar para outro, ressalta. E enfatiza: o preço é o mesmo.

Conforme Soares, a responsável pela compra centralizada para os hospitais Unimed é a Central de Compras de Medi-camentos do Sistema Unimed (Compra-Med). Ele conta que essa central compra, por exemplo, um bilhão de soros fisioló-gicos e sai distribuindo para os hospitais de tempos em tempos. E assim é que con-segue preços menores.

Outra providência que está sendo tes-tada, continua o palestrante, é a Tabela Nacional Unimed de Materiais e Medica-mentos (TNUMM), que unifica todos os códigos e os nomes de materiais e medi-camentos dentro do Brasil. Ele explica que um dos pontos que pelo qual tem se empenhado é para acabar dentro do sis-tema com a utilização da tabela Brasín-dice e Simpro. “Brasíndice e Simpro são tabelas de preço, nada mais. ”

Finalizando sua fala, Soares informa que o caminho adotado é que qualquer atendimento de Unimed para Unimed só é pago com base na tabela única do sistema, acrescido de custo de logística, de custo de oportunidade. E atualmente, informa So-ares, são 32 mil itens de medicamentos e 124 mil itens de materiais nesse processo.

No sistema Unimed o médico é cooperado, não pode receber pelo hospital. Desta forma, o honorário do médico é separado dessa cobrança, o que traz maior previsibilidade nos gastos.

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Evolução da medicina. Este é o pri-meiro aspecto citado por Claudio Tafla em sua palestra. Segundo ele, é impor-tante falar sobre as Órteses, Próteses e Materiais Especiais (OPME), mas não se pode fechar os olhos para a evolução da medicina.

O termo OPME, diz ele, será cada vez mais substituído por Dispositivo Médico Implantável -- órtese e prótese implantá-vel por meio de procedimento médico ou odontológico invasivo, bem como mate-riais utilizados como instrumental espe-cífico para sua implantação.

Tafla continua, citando reportagem de 2016 de Michael Rawllins, diretor da agência britânica Nice, órgão de decisão do Reino Unido para incorporação de tecnologias. Conforme Tafla, Rawllins diz claramente aquilo que ele, Tafla, tem tentado dizer para todo mundo o tempo todo: que existe uma população para gerir; e necessidades que vão des-de aspirinas até órteses e próteses mais complexas. E isso tudo, enfatiza, precisa encaixar no bolso daqueles que pagam, “porque nós não somos fonte pagadora”. Tafla diz reforçar essa visão todas as ve-zes em todos os lugares onde fala e acha que começou a ser entendido. Diz ainda que as operadoras recebem dinheiro de alguém, quer seja pessoa física ou pes-soa jurídica, para viabilizar para eles o melhor que podem fazer em termos de negociação e de saúde.

E, dentro dessa lógica de oferecer o melhor, diz ele, é preciso contemplar tudo que há dentro do budget. E, para fa-zer isso, as operadoras precisam tomar determinadas decisões.

expressas são de minha inteira responsabilida-

de pessoal e não falo por entidades, empresas ou nenhuma associação ou sociedade.”

“TODAS AS OPINIÕESPALESTRANTE

Claudio Tafla

Mapfre Saúde

Limitações das tabelas Simpro e Brasíndice e novos modelos de pagamentos de materiais e medicamentos na saúde suplementar - Debate 27/04/2016

Abordando a saúde suplementar, Tafla alerta ser esse um cenário em que tem havido um decréscimo constante de operadoras de planos de saúde, até por-que o sistema de saúde suplementar tem sido pautado muito pela eficiência. Cada vez mais é exigido das operadoras maior nível de eficiência. E esse alto nível, se-gundo ele, transparece na forma como a operadora contrata e na forma como ge-rencia. Tafla explica que a única forma de uma operadora manter-se viva num siste-ma tão complexo como o brasileiro ou é optando por uma regionalização e captu-rando uma determinada região; ou tendo ferramentas de informação, de tecnologia de informação, que possam prover infor-mações em tempo real, para que se possa gerenciar melhor sua população.

Órteses e prótesesFalando especificamente do cenário

das órteses e próteses, Tafla diz ser fun-damental citar que 45% de tudo aquilo que é utilizado acontece na região Su-deste. E pergunta: por que se concen-tram nessa região as solicitações? Por-que também se concentra na região a população que é atendida pelos planos de saúde, responde. É uma população mais ocupada nessa região e é onde as tecnologias estão mais afeitas. Deveria ser assim? pergunta. “Não, não deveria.” Tafla opina que, se medicina é medicina em qualquer lugar, deveria haver uma distribuição. E essa distribuição deveria acompanhar a população e não o poder que a população tem de bancar ou não determinada tecnologia.

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jan/dez. 2015-2016 | Volume 17 | Debates FGV saúde 65

Uma coisa que assusta bastante, diz Tafla, é que em torno de 8 mil novos produtos por ano são incorporados nos Estados Unidos. E no Brasil temos 14 mil catalogados; há um delay em relação àquilo que eles já têm. Ou seja, existe uma ultrademanda de produtos que ain-da entrarão no mercado e que vão obri-gar a fazer de certa forma um tipo de gi-nástica matemática, “que não seja aquela realizada por outros na região central do país”, que faça com que se consigam pa-gar esses produtos dentro do ano fiscal, do ano contábil.

E para que a plateia tenha uma ideia do ranking das solicitações, diz ele, logi-camente as empresas mais conhecidas são aquelas que detêm a maior quantidade de novas tecnologias sendo incorporadas, dispositivos médicos no país (Tabela 1). Mas, também, há no Brasil outras refor-mulações de necessidades que fazem com que esse filtro seja diferente.

Tafla prossegue, abordando a existên-cia da Comissão de Incorporação de Tec-nologias do Ministério da Saúde (Citec) e da Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no SUS (Conitec). Ele explica que são entidades que, de certa forma, não estão diretamente relaciona-das ao sistema de saúde suplementar, mas cujas normas também são adotadas por esse sistema. “Por que eu estou di-zendo isso?”, pergunta. E explica: o que a Conitec diz como incorporável ou não incorporável não afeta diretamente, não serve como lei para o sistema de saúde suplementar. Porém, quando diz que não é incorporável, é possível utilizar essa de-finição como regra diretriz.

E, dentro desse princípio do que impacta e do que deve ser prescrito ou não, continua Tafla, de 2012 a 2015, de todas as 419 demandas de incorporação que foram feitas à Conitec, efetivamente incorporadas foram 176. Segundo ele, al-

Empresas País Vendas Participação (%)

1 Johnson & Johnson EUA 25,8 7,9

2 Siemens Alemanha 17,5 5,4

3 Medtronic EUA 16,2 5,0

4 Roche Suíça 10,2 3,1

5 General Electric EUA 9,7 3,0

6 Abott Laboratories EUA 9,6 3,0

7 Covidien EUA 9,4 2,9

8 Philips Holanda 9,1 2,8

9 Stryker EUA 8,3 2,6

10 Boston Scientific EUA 7,6 2,3

11 Novartis Suíça 6,5 2,0

12 Becton Dickinson EUA 6,5 2,0

13 B. Braun Melsungen Alemanha 6,4 2,0

14 Baxter International EUA 5,9 1,8

15 St. Jude Medical EUA 5,6 1,7

16 Essilor Internacional França 5,3 1,6

17 3M EUA 4,8 1,5

18 Danaher EUA 4,7 1,4

19 Olympus Japão 4,4 1,4

20 Terumo Japão 4,3 1,3

Total Vinte Maiores 177,8 54,7

Total 325,3 100,0

Fonte: Evaluate Pharma (2012)

Tabela 1 – Maiores empresas de dispositivos médicos (em bilhões de U$)

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Debates FGV Saúde | Volume 17 | jan/dez. 2015-201666

gumas se perderam no caminho, algumas eram tão basicamente inconsistentes que não deveriam ser analisadas, que não de-veriam passar por crivo de análise, e ou-tras que o Brasil não teria condições de absorver dentro do cenário econômico nacional.

O mais interessante, diz Tafla, é a des-proporção: 419 solicitações para inclusão e 25 de exclusão. Dessas 25, somente 22 foram excluídas. “Essa é uma briga dos gestores de saúde o tempo todo; qualquer confecção de rol”, diz o palestrante. E não é só pela inclusão daquilo que tem que ser incluído, mas também pela exclusão daquilo que não serve mais e que é utilizado constantemente. Esse talvez até seja um dos motivos do encarecimento da saúde, ressalta.

A seguir, Tafla cita um texto, deno-minado Medical Device Innovation – “Is Better” Good Enough?1, que diz ser o ob-jetivo das operadoras, como gestoras de um sistema de saúde, quer seja suple-mentar, quer seja público, não é o de co-locar limite ou de decidir quem é que vai receber ou não implantes, mas evidenciar se aqueles implantes vão ter algum tipo de resultado aplicável economicamente dentro do sistema. Se aquilo tem eficiên-cia e traz algum tipo de economia. Se não

trouxer, ressalta, provavelmente vai cau-sar algum tipo de impacto negativo no que já existe de demandas não atendidas.

Abordando a legislação em outros países, Tafla diz que o mundo tem evo-luído de acordo com as diretrizes de cada uma das agências reguladoras de cada país. Alguns são mais assertivos, como o Nice e o NHS (National Health Service). Eles acabam usando valores financeiros para incorporação ou não incorporação.

“Chuva de leis”No Brasil, continua Tafla, o que

tem sido feito como em qualquer ou-tra área, são leis. “É uma chuva de leis, regulamentações e tudo o mais que acaba inviabilizando, inclusive, a análise.” E,

segundo ele, se fôsse-mos analisar o prin-cípio de cada lei, que muitas vezes são con-flitantes, “cada uma fala uma coisa e na hora do vamos ver aca-ba ficando uma coisa mal definida”.

Tafla informa que a última diretriz foi lançada, e que fala da questão dos dispositi-vos médicos implantá-veis, tem muito pouco tempo e aborda a in-corporação com cons-ciência e eficiência, as-pectos que, conforme

Tafla, podem ser discutidos, “mas a mi-nha consciência e a minha eficiência pro-vavelmente não vão ser uma coisa muito alinhada para todo mundo”. Segundo o palestrante, é preciso haver diretrizes claras, que não têm saído de dentro das leis, têm saído de dentro de cada ope-radora. Explicando melhor, ele diz que cada operadora passa a ter o seu proto-colo de conduta. E ele diz querer deixar claro que operadoras não fazem, mas se-guem protocolos. E, dentro dos protoco-

1. Suter LG, Paltiel AD, Rome BN, et al. Medical device innovation--is “better” good enough?.  N Engl J Med. 2011;365(16):1464–1466. doi:10.1056/NEJMp1109285

“É uma chuva de leis, regulamentações e tudo o mais que acaba inviabilizando, inclusive, a análise.” E, segundo ele, se fôssemos analisar o princípio de cada lei, que muitas vezes são conflitantes, “cada uma fala uma coisa e na hora do vamos ver acaba ficando uma coisa mal definida”.

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los, seguem os seus próprios de conduta. “Então, para cada guideline, para cada diretriz de utilização, temos o nosso pro-tocolo de conduta de como liberar”. Mas não se discute se aquilo está certo ou não está certo, enfatiza.

Esse procedimento por parte das ope-radoras, diz Tafla, tem como motivo o im-pacto econômico, que ele pretende mos-trar de duas formas à plateia. De início, refere-se às taxas, “o custo Brasil que todo mundo conhece” e que acaba impac-tando um produto que sairia a R$ 4 mil de uma fábrica e che-ga a custar até R$ 13 mil, um pouquinho mais de três vezes do preço de fábrica. Mas isso não é o pior, ressalta. O pior é um produto que sai por R$ 2 mil ou US$ 2 mil, ou 2 mil x de um lugar e acaba chegando para a operadora, em termos de conta, por 18 mil. Por que acontece isso? pergunta. Resposta: por várias ques-tões. Outra pergunta: o que impacta na qualidade do produto ou da entrega de um produto? Sua resposta é que quem deve julgar é quem paga.

Tafla aborda em seguida a influência que fatores como comissão do vendedor, comissão do médico, margem do dis-tribuidor e margem do hospital têm na

qualidade do produto. E refere-se então a um estudo da Associação Brasileira de Planos de Saúde (Abramge) (Gráfico 1) e que foi entregue “em um debate bem acalorado” dentro da Agência Nacional de Saúde Suplementar no momento da discussão desse tema. E que também foi levado para o Congresso na discussão da CPI de próteses.

Tafla continua sua palestra contando que recebeu uma solicitação de cirurgia de bucomaxilo, cujo valor seria de R$ 170 mil, mas que saiu por R$ 50 mil. E, segundo ele, são coisas que não dão para explicar. E se essa informação é passada ao paciente pior ainda, diz ele, “porque o paciente vai imaginar que nós economi-zamos, que ele deve estar com areia em algum lugar. E não é verdade”.

Segundo o palestrante, é preciso haver diretrizes claras, que não têm saído de dentro das leis, têm saído de dentro de cada operadora.

Fonte: Apresentação da Ambrage ao GTI-OPME, 2015.

2.096

18.362

6.201

13.000

13.000

335

3770

2324

3500

3900

1462

520 16.900

Custo do Produto

Seguro, Frete,

Desembaraço

Custo Operacional – equipamentos,

instrumentação

Tributos sobre venda

Comissão vendedor

Margem Distribuidor

Comissão Médico

Preço de Venda

Hospital

Margem Hospital

Tributos Preço Venda

Operadora

Gráfico 1 – Exemplo de margens agregadas ao longa da cadeia de logística de prótese de joelho (em R$)

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Ele enfatiza que o debate deve ser pautado na parte técnica, científica, mas que também se deve fazer algum tipo de esforço no sentido de criar limites de ganhos, limites que façam sentido para todos.

JudicializaçãoTafla cita ainda a necessidade de con-

siderar os impactos de ações judiciais, cujos resultados são dissociados da reali-dade e acabam causando um amparo para as pessoas que, se não entrarem por um lado, vão entrar por outro lado do cami-nho errado. Diz Tafla que, se essas pes-soas não aceitarem a orientação errada de determinados profissionais, ou se conse-guirem fugir desses, vão acabar entrando em outro. “E é isso que estamos tentando melhorar nesse sistema”, ressalta.

Ele ressalta que existe uma demanda crescente jurídica. E cita, por exemplo, reportagens a respeito do ressarcimento SUS: R$ 709 milhões no último ano. Na comparação com os primeiros dez anos de ressarcimento SUS, diz ele, a cifra não che-gou a R$ 14 milhões. Em 2012 ou 2013, foi para R$ 50 milhões, depois subiu para R$ 125 milhões e agora está chegando a R$ 700 milhões. “É fonte de renda. E pacote fechado, porque é questionável o que chega por lá”, enfatiza.

Segundo Tafla, de cada dez ações, nove são ganhas pelo beneficiário. E diz que existe “essa luz no fim do túnel” que é teoricamente conseguir, através das ques-tões jurídicas e de lei, fazer entender que existem necessidades de normativas para que o grosso do problema não aconteça. Tafla diz que isso não resolve o problema, mas ajuda a encontrar um caminho.

Ele considera também importante abordar o modo como as operadoras con-seguem avaliar o aspecto da judicializa-ção. Ele explica que as empresas têm dois critérios básicos: o impacto no budget e o Icer, que é o índice de custo efetividade incremental. Após verificar o impacto no budget, continua Tafla, é analisado se a nova tecnologia é melhor ou pior do que a existente e, em sendo melhor ou no míni-mo igual, se é mais barata.

Mas a Conitec não vê dessa maneira, segundo Tafla, esclarecendo que essa comissão tem um processo de avaliação de incorporação de tecnologias comple-tamente diferente, e não parte somente dessas duas premissas. E pior do que isso, enfatiza. Cada vez mais a comissão tem se especializado na não-conformidade des-sas duas tecnologias. Conforme Tafla, a Conitec utiliza algo que todos gostariam de usar, que é a história do mundo real. Mas pergunta como se incorporar algu-ma coisa depois de análise de estudo de mundo real se não existe um mundo real para ser analisado aqui dentro do país. E acrescenta: “Porque mundo real é o meu mundo real”. E que não vai trabalhar com dados da Lituânia, da Eslovênia ou da Croácia, porque não têm nenhuma cor-relação com a regra brasileira. E assim, diz ele, tomadas determinadas decisões daquilo que precisa ser básico para uma incorporação sob os critérios deles. O que para as operadoras, segundo Talfa, não interfere em nada.

Uma saída das operadoras, explica o palestrante, é tentar comprar direto, o que muitos hospitais bloqueiam. As em-presas tentam fazer uma negociação com os fornecedores por escala. Quem tem mais escala, quem tem mais tamanho, quem tem mais força consegue funcionar dessa maneira. Só que aí, diz ele, a com-pra feita dessa maneira envolve uma taxa.

Tafla diz que seu desejo é que o pro-cesso de compra fosse completamente terceirizado. Que não é seu interesse to-car esse processo. Pode ficar com o hos-pital, diz ele, pode ficar com o delivery, pode ficar diretamente com a indústria. “Vocês se resolvam. Vocês negociem”, diz, ressaltando que quer simplesmente que a cotação venha com auditoria, regu-lação, compra e logística, com pagamen-to em performance, pacote ou captation, e com cumplicidade e comprometimento. “Se vier dessa maneira, eu aceito”, diz. E comenta que, se alguém se propuser a fazer isso de forma idônea e cumprir na prática, ele aceita. E enfatiza que nesse ponto está falando pela maioria das ope-radoras que, segundo ele, querem é sair dessa negociação. Porque acabam entran-

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do nessas negociações por serem as gran-des linhas dos custos médicos. E aí a ope-radora tem de entrar por critérios óbvios; porque é ali que ela vai conseguir fazer a melhor gestão econômica de sua carteira.

Indo nessa linha lógica, diz Tafla, se fosse ter um parceiro para fazer essa com-pra, ele diria: “Vou pagar para você por informação e desfecho”. Faz todo o resto e verá os critérios de segurança, de efi-ciência, de preço (Figura 1).

Finalizando sua fala, Tafla explica a Figura 2 (abaixo) que apresenta a linha de custo; quanto mais custo para cima, mais saúde para o lado. E define a pre-

MODELO PASSADO MODELO ATUAL

PreçoPreço

Segurança

Eficácia

Informações e Desfechos

Eficácia Segurança

Fonte: Stefan Sellinger – Estratégia da Roche

Figura 1 – Estratégica em saúde com foco no resultado

missa como lógica: se tem mais custo e mais saúde, é preciso avaliar muito bem. Mas, se realmente é menos custoso e traz mais saúde, “nós implantamos para on-tem”. Da mesma forma, diz ele, se ele custa mais caro e traz menos saúde, não há jeito nem de considerar viável: “Não adianta, não vou nem analisar”, esclare-cendo que essas são as grandes artima-nhas traiçoeiras, em que às vezes se cai, de querer pagar menos por alguma coisa que traz menos saúde, e isso acaba cus-tando mais caro. E cita o exemplo de um beneficiário que vai fazer a terceira cirur-gia em menos de um ano.

Figura 2 – Decisão

Decisão+ Custo

+ Saúde

Esqueça

Cuidado

Avalie e Estude

Implemente(e para ontem)

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S. Miguel inicia sua fala explicando que a logística hospitalar

ou logística em saúde é uma área que tem crescido muito em termos de oportunidades, de desafios, com uma série de particularidades, especificidades dentro da área de saú-de, principalmente dentro de hospitais.

PRISCILA LACZYNSKI

Desafios e oportunidades na logística hospitalar

MODERADOR:

Priscila Laczynski S. Miguel

FGV Celog

Debate 15/06/2016

22º SEMESTRE DE DEBATES FGV SAÚDE

E esse tipo de evento, afirma Priscila, ajuda a explicar ou a tentar entender o que pode ser feito, tanto como especialista em logística, supply chain, como quem está dentro do ambiente, quem está vivendo o dia a dia na saúde. “Nada melhor do que vocês que vivem esse dia a dia para falar dessas especificidades”, ressalta.

Priscila informa em seguida que irá falar brevemente sobre cadeia de supri-mentos e sobre logística. E explica que para entender o que é logística, é preciso entender o que é uma cadeia de supri-mentos, que, conforme afirma, nada mais é do que uma série de organizações que fazem transações entre elas. E essas or-ganizações estão comprando materiais de outras organizações. Estão armazenando, estocando, transportando esses materiais entre uma entidade e outra, e estão entre-gando isto para outro agente, que pode ser outra organização, como pode ser um paciente. Especificamente, no caso da saúde, diz ela, um paciente do hospital.

Portanto, continua Priscila, uma ca-deia de suprimentos é um conjunto de

organizações que estão se relacionando. Elas podem fazer transações que aconte-çam uma única vez, explica. E essa tran-sação pode ser uma venda de serviço ou produto para outra empresa, como pode ser um consumidor final ou um paciente.

Responsabilidades Conforme Priscila, a logística é a ges-

tão das atividades dessas organizações e dentro da própria organização. É a res-ponsável pelo controle, planejamento e gestão de materiais, de serviços, de infor-mações e também de dinheiro, diz. E o motivo, esclarece, é porque a área movi-menta uma série de produtos que têm que entrar; compra produtos; armazena; faz a gestão do inventário; transporta e entre-ga ao destinatário. E, ao mesmo tempo, transportando, a área está movimentando todo esse material. E aqui ela pergunta: se eu estou comprando de alguém, eu pre-ciso devolver o quê? Resposta: dinheiro. Devolver, passar a pagar isso para alguém ou devolver um tipo de informação.

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Em seguida, Priscila aborda o con-ceito da cadeia em saúde, explicando que há duas perspectivas de visão: uma delas é a que normalmente olha do lado da indústria, que é a cadeia da indústria farmacêutica, por exemplo. Nesse caso, continua Priscila, os fornecedores são a indústria de embalagem; o princípio ativo; pode-se incluir farmoquímica; ou produtos químicos que se estão com-prando para transformar e produzir um remédio.

Na outra ponta, de quem vai comprar, continua Priscila, estão redes de farmá-cia, distribuidores, hospitais, órgãos pú-blicos, ou seja, há uma série de entes nes-sa cadeia farmacêutica e, entre eles, está o hospital que, por outro lado, tem uma cadeia de suprimentos, que pode ser vista de uma outra forma, diz ela, explicando que essa cadeia se torna extremamente complexa porque envolve um conjunto infinito de agentes. E que não são empre-sas grandes como na cadeia da indústria farmacêutica, salienta, explicando que a indústria farmacêutica compra de uma outra indústria farmacêutica um produto pronto.

No caso do hospital, diz Priscila, com-pra-se, remédio, leito e oferece-se servi-ço. E aí eu começo a entrar nas particula-ridades, diz ela, citando, por exemplo, o fornecedor de serviços. Quem é ele? São os médicos. Então, continua, os médicos vão fazer parte da cadeia de suprimentos do hospital. Da qual, aliás, o paciente também faz parte. E pergunta: o que o paciente compra? O paciente compra um tratamento, compra um diagnóstico, res-ponde, salientando, entretanto, que esse paciente não tem a mesma expectativa de quando compra um remédio na far-mácia. E Priscila explica que na farmácia se compra uma caixinha do remédio que está ali, isto é, o consumidor já sabe que remédio é.

Mas no hospital, continua ela, o pa-ciente tem expectativa de tratamento e espera melhorar, mas também espera que o médico o atenda bem. E mais que isso, enfatiza: ele espera ser bem atendido a partir da recepção do hospital. Enfim, ex-plica, há uma expectativa do paciente em

relação ao tratamento que vai ser dado de forma geral no hospital. E essa expectati-va, diz Priscila, pode ser realizada, como também pode ser frustrada.

Abordando agora os serviços do hos-pital, Priscila explica que, como na cadeia há um número infinito de pacientes, há também um número infinito de serviços que se precisa prestar dentro da logística hospitalar, dentro do hospital.

Logística hospitalarPriscila explica que a área da logísti-

ca, particularmente no hospital, começa pela atividade de aquisição, de algum produto ou serviço. E que todos os pro-cessos envolvidos nessa atividade estão sob responsabilidade da área de logís-tica. E os colaboradores, explica, são os laboratórios, os fornecedores de equipa-mentos, os fornecedores de serviços de limpeza, outros fornecedores e os distri-buidores, porque muitas vezes compra-se de um distribuidor, explica Priscila, afir-mando que esse fornecedor pode estar no Brasil ou no exterior. O caminho então, diz Priscila, é selecionar fornecedores, comprar determinada quantidade de um produto e recebê-lo dentro do hospital.

Aí vem, continua Priscila, outra ati-vidade da logística hospitalar, que é o re-cebimento, processo que envolve muitos aspectos, ressalta. E cita que de imediato é saber onde irá guardar o produto rece-bido. Para isso, enfatiza, é preciso saber quanto será comprado, onde e quem irá controlar esses aspectos. E, nesse ponto, diz ela, vem a atividade da armazenagem. A questão de controle de todo o estoque dentro do hospital. E comenta: se for um hospital com uma única unidade, tudo bem; o estoque será mantido dentro des-sa unidade. Mas, e no caso de haver mais de uma unidade? pergunta Priscila. E nesse caso, diz ela, há opções estratégicas a escolher. Fazer um estoque centraliza-do; guardar todos os produtos principais dentro de uma única unidade; ou manter estoques menores em cada um dos hos-pitais. São alternativas válidas, mas cuja escolha quem fará é a área da logística, ressalta. E a decisão, salienta, precisa

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considerar que será necessário movimen-tar esse material dentro do hospital, fazer a distribuição para os solicitantes.

Priscila cita ainda outra atividade da logística hospitalar, que é o processo de tratamento de tudo que será descartado no hospital. O que se fará, por exemplo, com aquela seringa que não será mais usada. E, por fim, diz Priscila, a logística fica como uma área de suporte dentro do hospital atendendo a outros usuários. Não trata com o cliente final, esclarece, mas com o cliente interno. E ressalta: tudo isso para atender o paciente.

Custos da atividade A seguir, Priscila aborda em sua fala

os custos que estão envolvidos na lo-gística hospitalar. E cita dados de 2015 que mostram ser de 23% a 24% o total de custos de um hospital que estão rela-cionados com a atividade de logística, o que ela avalia ser uma participação gran-de nos custos. Mas, salienta, custo não é tudo a considerar. É preciso criar valor para ter uma boa logística hospitalar.

Priscila cita a hipótese de reduzir custos em logística hospitalar, mas o que isso envolve?, pergunta. Considerando que a regra fundamental é garantir que um insumo esteja na hora certa, no lu-gar certo, ela questiona o que significa-ria não ter o insumo. É muito pior, diz ela. Ou seja, é possível haver redução de custo, mas aí não se atende a clientela. E mais: Priscila liga o bom trabalho da logística ao fator segurança dentro do hospital. E cita, por exemplo, saber de onde vem o material que se está com-prando; que material está sendo usado; se o material está sendo trabalhado da forma correta. E pergunta: será que uma boa logística trabalha com nível de ser-viço? Será que é deixar o paciente mais feliz? Para ela, essas são questões muito importantes, são desafios que precisam fazer parte da logística na área de saúde.

Relação com médicosEm seguida, ela aborda mais um as-

pecto importante da área da logística

hospitalar, que é a relação com os médi-cos. Para ela, trata-se de um desafio na área de logística. E o motivo, explica, é que cada médico tem as suas preferên-cias, escolhe os seus materiais, os seus produtos, a marca de que mais gosta. Mas isso, pergunta Priscila, significa que é preciso ter no hospital 150 itens que são iguais? Para responder à questão, Priscila explica que, numa indústria, se compra um item, talvez de dois for-necedores, para produzir uma caixinha de suco. No caso da logística hospitalar, continua, é preciso atender à preferência dos médicos e isso faz com que a padro-nização de itens seja, na logística hospi-talar, um desafio.

Trata-se de relacionar a questão de especialização versus padronização de insumos, diz Priscila. E ressalta que atualmente, dentro da logística de in-dústria, se fala muito de compras estra-tégicas. Ou seja, já não se trabalha mais com o critério de menor custo, mas sim de escolher alguns fornecedores que são estratégicos e com quem se irá desenvol-ver um relacionamento mais próximo. E isso desobriga cotação a cada vez que for comprar com três fornecedores. Ela ressalta que esse modelo de compra é antigo, e a indústria não mais o pratica.

Mas Priscila pergunta até que ponto está sendo aplicado nessas instituições o conceito de compra estratégica. E abor-da ainda a própria questão da estrutura organizacional nos hospitais: quem faz, quem cuida da logística? É preciso saber, continua, se a logística está realmente com as pessoas certas cuidando da área ou se está escolhendo quem “está ali no canto, sobrando na organização”. E isso, ressalta, não é uma particularidade do hospital; acontece na logística de qual-quer organização.

Para ela, é essencial haver uma boa gestão da informação. Considerando principalmente que existem hoje vários tratamentos, vários procedimentos que estão cada vez mais tecnológicos; ou seja, o ritmo da transformação é rápido. Então, salienta, é preciso alinhar a ca-deia de suprimentos para ir nesse sen-tido da gestão de informação. E ressalta

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ainda que é preciso garantir que área de logística esteja trabalhando com a mes-ma estratégia que a empresa. Seja ela re-dução de custos ou atendimento.

E, por fim, Priscila fala sobre o grau de maturidade na logística. Diz ela que existem diferentes graus de maturidade na área, em qualquer função, quer seja na indústria, quer seja em serviços. Ban-co, varejo, não é uma particularidade de hospital, mas são trabalhados diferentes níveis de maturidade. E cita que existem hospitais que estão adotando as melho-

res práticas de logística, tanto aqui no Brasil como lá fora. Mas também, salien-ta, há hospitais que ainda estão traba-lhando num grau muito básico da logís-tica.

E como fazer para avançar? pergun-ta. Será que a exigência de uma nova prática, de uma nova certificação vai fa-zer com que se avance?

Bem, diz Priscila, é melhor deixar quem entende realmente de logística hospitalar nos contar o que tem sido fei-to nos respectivos hospitais.

PALESTRANTE

Fernando Andreatta Torelly

Hospital Sírio-Libanês

Desafios e oportunidades na logística hospitalar - Debate 15/06/2016

Andreatta Torelly inicia sua palestra contando que, durante dez anos, foi gerente de Logística do Hospital de Clínicas de Porto Alegre, onde apren-

deu a conhecer hospital. E o motivo, diz ele, é que quem trabalha em logística de hospital compra desde o pão do refeitório até a ressonância magnética. Ou seja, é um profissional que está obrigado a conhecer a operação do hospital. E para ele esse aprendizado foi muito importante porque, a partir daí, é que assumiu um cargo de direção, tanto no HCPA quanto no Hospital Moinhos de Vento.

FERNANDO

Ele explica que tinha visão estratégica do hospital, mas sabia exatamente como funcionava todo o processo de logística, que é aproximadamente 20% a 25% da despesa, mas na receita é mais de 50%. En-tão hoje, ressalta, se um gestor em saúde não entende de logística, ele não entende de hospital. Porque 50% da receita está re-lacionada à transação que envolve toda a questão de materiais e medicamentos.

E algo que considera importante é que quem entende de logística conheça o conceito da microgestão. E diz que se tem apresentado como alguém que cada vez mais é apaixonado pela microgestão, que é fazer funcionar o hospital na sua operação, nas suas rotinas e no dia a dia.

O palestrante explica que sua apre-sentação trará essa visão do macro até chegar no processo de logística. E diz em seguida que sempre teve a ideia de que os preços em São Paulo eram melhores do que os preços em Porto Alegre, por-que a capital paulista tem o poder eco-nômico. E diz ter constatado que muitos laboratórios e fornecedores que vendem o material perto da Argentina, que têm de enfrentar estradas completamente su-cateadas do Brasil, muitas vezes vendem lá por um preço menor do que vendem na capital econômica do país. E a razão, diz ele, é que, como tem mais dinheiro em São Paulo, para ser competitivo em polos de menor economia, o fornecedor é mais

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agressivo. E como o fornecedor trabalha com o custo médio nacional, certamente parte do que ele dá de menor preço em alguns polos de menor poder econômico, ele cobra depois no grande polo de poder econômico. Então, esclarece, há aí uma percepção de várias negociações, tentan-do trazer preços de São Paulo a preços de Porto Alegre, o que parece uma coisa completamente impossível de acontecer, mas acontece.

Nos últimos anos, continua Torelly, o Brasil viveu um grande desenvolvimento econômico e social. Melhoraram as con-dições sociais da população. E, em dez anos, o número de brasileiros com pla-nos de saúde passou de 25 milhões para 50 milhões. Os hospitais todos ficaram lotados e todo mundo achou que era competente. Mas da mesma forma que os restaurantes estão lotados, os aviões es-tão lotados, porque aumentou o número de clientes.

O mercado tornou-se atrativo ao capi-tal internacional, explica o palestrante. E pergunta: então, que crise é essa em que o capital tem interesse de vir aqui para ter uma atividade lucrativa na saúde? No seu entender, diz ele, isso mostra que exis-te um potencial muito grande, esclarece. “A legislação mudou. O ambiente con-correncial mudou e mudará ainda mais. E o modelo de gestão tem que mudar”, salienta.

Torelly explica que alguns conceitos para ele são importantes. Por exemplo, competição versus colaboração. E diz que a competição na área hospitalar tem que ser por quem atende melhor o pa-ciente. Poderia haver um grande centro logístico dos principais hospitais de São Paulo, opina, uma grande colaboração entre a estrutura hospitalar, reduzindo custos de forma extremamente signifi-cativa. E diz que não haverá reconheci-mento dos pacientes para quem tem o melhor centro de almoxarifado, melhor centro de logística, ou por quem compra melhor. Mas sim pela melhor assistên-cia, pelos melhores médicos, pela me-lhor experiência do paciente. Por isso, diz ele, é que defende a colaboração do segmento nesse processo.

Rede BrasilO palestrante relata que tem traba-

lhado pessoalmente com vários gestores hospitalares para criar a Rede Brasil, que é rede de hospitais de natureza filantró-pica, hospitais que possuem na sua his-tória a formação por comunidades, que possuem CNPJs separados, mas que na área de logística possam trabalhar como se fosse uma rede, para trazer 30% de re-dução de custo no segmento filantrópico. Com isso, é possível colaborar e contri-buir, salienta, e tornar a Rede Brasil uma das maiores redes de compra do país, re-duzindo custos. Caso contrário, haverá perda de lucratividade, de produtividade e, daqui a pouco, não será possível pagar bons salários, e não haverá investimen-tos. “Daqui a dez anos, talvez a excelência na medicina e na saúde esteja nos gran-des grupos econômicos que estão se for-mando no país com o aporte e apoio do capital internacional”. E alerta: a ameaça é não entender o que está acontecendo.

Então, continua Torelly, para assegu-rar a manutenção dos ganhos, os forne-cedores tenderão a transferir as perdas de margem para os hospitais com menor poder de negociação. Assim, quando os grupos se tornarem mais fortes e mais po-derosos, quem fizer parte vai pagar pelo seu preço e pelo que diminuiu no preço do grupo forte e poderoso. “Os pequenos serão mais pequenos e os grandes serão mais grandes”, diz.

Citando a publicação da Anahp, ele diz que há uma informação sobre o nú-mero médio de leitos por hospital. E diz que, enquanto na Espanha o número mé-dio é 190 leitos, no Brasil é 71. E, se a mé-dia é 71, metade dos hospitais brasileiros têm menos de 50 leitos.

E, em sua visão, o quadro é que esses hospitais vão conseguir comprar direta-mente do fabricante, estão comprando da distribuidora da cidade, que compra da distribuidora da capital, que compra da distribuidora nacional, que compra do fa-bricante. “E não sabe porque eles vivem uma grande crise financeira”, diz. E a ra-zão, esclarece, é que vivem porque estão pagando bitributação, tri, e estão pagan-do margens também dentro desse proces-

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so, tirando dinheiro da riqueza do hospi-tal e botando na cadeia de suprimentos.

Para Torelly, a grande discussão em saúde hoje é o que é valor para o pacien-te. E esse valor é o que se entrega, diz ele. É o resultado sobre o custo para entregar esse resultado. E diz não ter dúvida ne-nhuma de que daqui a cinco ou dez anos a operadora dos planos de saúde vai re-munerar com base no valor do que se en-trega para o paciente e não com base em tabelas. En-tão, salienta o palestrante, é um grande desafio enten-der essa questão do custo.

E com isso muda o mo-delo médico-assistencial, continua Torelly, dizendo que todos os dias se dis-cute medicina baseada em valores, desfecho clínico, procedimentos diferencia-dos, protocolos médicos, pacotes privados, pacotes com operadoras, diárias compactadas, colocar para dentro das diárias materiais e medicamentos, cobrar seringa fora da diária. Ele cita que tem hospital somando quantas seringas o paciente utilizou para poder cobrar da operadora isso. “É um negócio que não tem mais como geren-ciar desta forma” alerta.

Importância da logísticaAqui, Torelly aborda novamente a

questão da logística e de sua importância, dizendo que identificou alguns pontos que entende serem importantes nos desa-fios e nas oportunidades.

O primeiro que cita é o fortalecimen-to do relacionamento direto com os fabri-cantes. Para ele, os hospitais devem criar uma cadeia produtiva e se relacionar di-retamente com quem fabrica o produto. E explica o caso, por exemplo, das órteses e próteses, dizendo ter certeza de que, em toda questão que envolveu as OPME no Brasil, 100% da venda era feita por dis-tribuidor e não diretamente para os fabri-cantes que possuíam regras de complian-ce. Os distribuidores, nesse caso, não

possuíam, explica, e, ao não possuir, eles estavam próximos de um sistema corrup-to que gerou tudo isso e que acabou na máfia da prótese. E Torelly diz ser muito ruim começar o ano de 2015 com os te-lejornais mostrando a máfia da prótese, criminalizando médicos e criminalizando hospitais. E principalmente é ruim, afir-ma, porque todo mundo sabia que aquilo era verdade. “Isso é compliance”.

Continuando, Torelly cita como ne-cessária a revisão do papel dos distribui-dores, dos operadores logísticos que, se-gundo ele, são importantes, mas têm de trabalhar a serviço do laboratório. Têm de apoiar a logística, mas não podem ser intermediários na relação diretamente com o fabricante. Conforme o palestran-te, existem hospitais que só compram materiais de distribuidores, de operado-res logísticos, porque não conseguem fa-zer um planejamento para poder colocar um pedido no laboratório para entregar em 30, 60, 90 dias. E o resultado, diz, é que toda semana ligam para o distribui-dor, que faz a entrega do material. E mais, continua. Existem laboratórios que não aceitam vender para grandes hospitais e terceirizam a sua venda para distribuido-res. E, muitas vezes, esses distribuidores praticam preços superiores em outros lugares onde o laboratório vende direto. É uma situação que Torelly define como completamente inadequada. Para ele, o operador logístico tem de estar dentro do processo, mas ser remunerado pelo labo-

Para ele, o operador logístico tem de estar dentro do processo, mas ser remunerado pelo laboratório e não pelo hospital. Até porque, lembra, o hospital gostaria que o laboratório entregasse o material da melhor forma possível.

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ratório e não pelo hospital. Até porque, lembra, o hospital gostaria que o labo-ratório entregasse o material da melhor forma possível.

Outra questão importante para ele é o processo de logística interna. E cita o exemplo do Hospital Sírio-Libanês, que tem um projeto de automatização, lide-rado pela chefe da farmácia e pelo diretor de suprimentos de logística do hospital, com a utilização da robótica dentro da farmácia. Ele explica que se trata de um processo que, na maioria dos hospitais, é manual. Mas, automatizado, evita perdas e, principalmente, erro do medicamento para o paciente.

A seguir, o palestrante aponta outro aspecto que considera importante abor-dar: o processo de logística não termina quando a medicação é entregue para o paciente. Mas continua até a operadora pagar a conta, diz ele, explicando que a maioria das glosas das operadoras são por-que o processo de suprimentos não está negociado, o medicamento está fora da ta-bela, a OPME foi autorizada por um preço e está sendo paga por outro preço. Então, salienta Torelly, o profissional de logística tem de entender toda a estrutura comer-cial da organização, envolvendo desde a matéria-prima à fábrica, toda a logística de transporte à chegada no hospital, a lo-gística interna, a entrega do medicamento,

o faturamento da conta, processamento da conta, a entrega da conta para a operadora e o dinheiro no caixa do hospital. Ele diz que, pela sua experiência, a maioria dos hospitais tem índices de glosas grandes exatamente pela não padronização das ta-belas de materiais, medicamentos, órtese e prótese. É um quadro em que a operado-ra tem um preço e no hospital tem outro preço registrado. “E aí se perdem valores financeiros bem significativos”, alerta.

Checagem de medicação Neste ponto, o palestrante explica

que, em sua visão, deveria ser obrigató-rio nos hospitais um processo que considera dos mais importantes: a checagem na beira do leito da medicação que está sendo dada ao paciente. E o mo-tivo, explica Torelly, é porque chega um téc-nico de enfermagem, o enfermeiro prepara a medicação, e vai le-var para o paciente. E pode acontecer de ele dar a medicação de um paciente para o outro, o que seria evitado se houvesse um sistema que lê todo esse pro-cesso: vai identificar se

o medicamento que está com o lote ade-quado não está vencido; se foi prescrito para aquele paciente, naquela dose; e se ele está recebendo a medicação correta. Parece simples, diz Torelly, mas cita que pelo menos 90% dos hospitais no Brasil não possuem esse tipo de sistema. E ain-da ressalta que tal sistema não pode ser montado com a visão do custo, pois tra-ta-se da segurança do paciente.

Outro desafio que acha importante encarar é o de fortalecer os comitês de padronização de novos materiais e medi-camentos para que haja competitividade e garantia de qualidade. Infelizmente, no Brasil, diz ele, os medicamentos e mate-riais estão disponíveis, mas não têm a qua-

Infelizmente, no Brasil, diz ele, os medicamentos e materiais estão disponíveis, mas não têm a qualidade necessária. E alerta para o fato de que ter registro na Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) não garante que tenha qualidade. Ou seja, é preciso haver comitês internos, com especialistas, para poder atuar em favor da qualidade.

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lidade necessária. E alerta para o fato de que ter registro na Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) não garante que tenha qualidade. Ou seja, é preciso haver comitês internos, com especialistas, para poder atuar em favor da qualidade.

Em seguida, o palestrante aborda a necessidade de criar competição entre fornecedores, buscando sempre novos produtos, com no mínimo dois fornece-dores para cada produto estratégico do hospital de alto impacto. Outro aspecto importante, continua Torelly, é discutir muito a incorporação de novas tecnolo-gias. Segundo ele, hoje a indústria traz o material novo, os hospitais compram, cobram da operadora e ela diz: “Ninguém combinou comigo e eu não vou pagar”. Por isso, não só a indústria, mas também as operadoras têm de ser envolvidas nes-se processo, ressalta.

OPME Órteses e próteses. É o tema a seguir

abordado por Torelly. E, para ele, trata--se de um capítulo à parte, porque, na maioria dos hospitais, o comprador mais incompetente é o que compra órtese e prótese. E explica o funcionamento de compra desses itens na maioria dos con-vênios: na maioria dos convênios, é rece-bida uma margem de 10% a 20% sobre o preço de compra. E quanto pior o hospital comprar, maior vai ser o valor financeiro que irá receber. E o que está acontecendo, explica Torelly, é que existem operadoras que já estão comprando próteses, tirando dos hospitais esse processo.

E o motivo, salienta, é porque são mais competentes. Porque conseguem comprar melhor do que os hospitais. Mas ele alerta que, se as operadoras avançarem muito nesse aprendizado, daqui a pouco irão comprar remédio, vão comprar equi-po. E os hospitais precisam lembrar que 50% de suas receitas vem da compra de materiais, salienta Torelly. Para ele, os hospitais têm a obrigação de criar tabe-las de referência de órtese e prótese com-prando por preços que são os melhores preços possíveis. E diz ainda entender que a compra de um item estratégico no

hospital tem que ser assinada pelo CEO (chief executive officer) da organização.

Torelly conta que, em todas as reuni-ões com operadoras em que comparece, fala-se em migrar a margem de medica-mentos para diárias e taxas. E explica o funcionamento dessa migração com um exemplo hipotético: um hospital compra um equipo de bomba de infusão por R$ 70 e cobra R$ 800 da operadora. E isso, salienta, em nenhum debate público há condições de defender se é adequado. Continuando o exemplo, ele diz que numa diária hospitalar em que o custo é R$ 500, a operadora paga R$ 300. Ou seja, diz ele: um engana de um lado e o outro engana do outro lado. E é algo que se tornou tão público, que ninguém mais tem constrangimento em falar. “Só que isso não é sustentável”, ressalta.

Falando de uma experiência realiza-da pelo Hospital Moinhos de Vento com a Unimed de Porto Alegre -- a partir da edição da Resolução n.º 3 da Câmara de Regulação do Mercado de Medicamentos (CMED) --, Torelly explica que foram criadas tabelas de referência de medica-mentos hospitalares desvinculando do Brasíndice e definindo um indexador possível de colocar num orçamento e sa-ber, porque o Brasíndice podia aumentar 0, diminuir ou aumentar 30%. Ele explica que toda a parte da margem dos medica-mentos foi para as diárias. E mais: o valor das dietas, que é um dos itens mais difí-ceis de precificar num hospital, saiu da conta e foi incluído nas diárias. E o mes-mo ocorreu com valores da fisioterapia. Torelly conta que na época todo mundo achou que era um negócio completamen-te maluco porque gerava muitos riscos. Só que, segundo ele, foi criada uma for-ma de se proteger que é incluir no con-trato com a Unimed um reajuste com dia e indexador definidos. Então, esclarece, não tem negociação de reajuste de diárias e taxas, até porque as diárias e taxas es-tavam com materiais dentro. O resultado é que semestralmente é aplicado o rea-juste em diárias e taxas pelo Índice Na-cional de Preços ao Consumidor (INPC), explica. E ressalta: sem negociação. O re-sultado é a recomposição frequente dos

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que se apresentam, não só para a área de logística, mas para a gestão de suprimen-tos, foram o tema inicial da palestra de

José Henrique Germann Ferreira, que listou três principais desafios.

OS DESAFIOSDEBATEDOR

José Henrique Germann Ferreira

Hospital Israelita Albert Einstein

Desafios e oportunidades na logística hospitalar - Debate 15/06/2016

O primeiro, diz ele, é a política de compras da instituição, em que se tem de equilibrar a agilidade de fornecimento e o controle e também a questão de preços. Em função disso, diz ele, utiliza-se o mo-delo clássico, que é a matriz de compras (Figura 1), em que, num eixo, está a cri-

ticidade do item e no outro a facilidade ou dificuldade de o item ser encontrado. Aquele de baixa criticidade é fácil de ser achado, explica. É comprado de qualquer fornecedor, é um commodity. Mas aquele que é crítico já é difícil de ser adquiri-do e, para tanto, diz Ferreira, é preciso

serviços hospitalares e participação em materiais e medicamentos.

E aí aconteceu algo com relação às dietas, lembra Torelly. Algo que ele con-sidera ter sido “bacana”. E explica: quan-do a dieta era cobrada na conta, gerando receita, existia uma forma de controlar e acompanhar. Quando virou item de des-pesa, passou a ser olhada de modo dife-rente. E aí, conta o palestrante, houve médicos que disseram que seria preciso avaliar se não estava sendo oferecida die-ta por muito tempo para o paciente; até porque ele tem que ter alta, então tem que voltar para uma dieta normal porque na casa dele vai ser assim. E Torelly diz que isso nunca passou pela sua cabeça, que alguém poderia estar recebendo uma dieta a mais; talvez por não ter uma visão de controle de forma adequada, diz.

Torelly aborda ainda as ações que fo-ram implementadas no projeto de parce-ria, estabelecendo uma forma de paga-mento diferente, em que a Unimed, todo dia 5, deposita um faturamento completo para o hospital, independentemente da entrega de contas, e a cada quatro me-ses faz-se um acerto de contas. E com isso, salienta, é possível brigar pela glo-sa, porque há tempo para isso e a conta

não gera caixa. Segundo o palestrante, com a migração de margem assegurou-se um reajuste automático em pagamento e também um caixa adequado. E o resulta-do para o hospital foi muito bom, expli-ca, porque consegue-se mais previsão de fluxo de caixa e diárias mais adequadas. E para a Unimed também, porque conse-guiu ter orçamento, diz Torelly, explican-do que hoje não tem como montar um orçamento numa operadora porque parte dos materiais são regulados pela revista Simpro que pode aumentar amanha 40%.

Concluindo sua fala, o palestrante re-fere-se, com orgulho, ao fato de fazer parte do Hospital Sírio-Libanês, instituição com 451 leitos, diz ele, e indiscutivelmente um dos grandes hospitais do Brasil, uma refe-rência nacional, pela diferenciação da qua-lidade do atendimento e do corpo clínico e da sua estrutura. Ele informa que o hospi-tal está ampliando sua atuação, com duas unidades de oncologia em Brasília, na Asa Sul e a outra no Lago Sul, com radioterapia e quimioterapia. E um centro de diagnós-tico por imagem também em Brasília. E o desafio agora, salienta, é levar essa com-petência de processos para o SUS. Trata-se de um grande desafio, admite, mas afirma acreditar ser isso possível.

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Distribuição é o terceiro desafio ci-tado por Ferreira, explicando que no hospital em que atua há basicamente duas grandes entradas de itens de ma-teriais, medicamentos, alimentos e na farmácia central. Os medicamentos, por exemplo, chegam direto na farmá-cia e de lá vão para o sistema de distri-buição, que são cinco. E ele já adian-ta que, com o advento do robô, irão ganhar agilidade. E comenta que viu o trabalho de um robô num hospital, cujo rendimento, das 5 h da manhã até 21 h, resultava no suprimento de 540 leitos.

Ferreira explica ainda que os cin-co canais de distribuição a que se refere são três farmácias satélites, eletrônicos (Pyxis) e farmácias das unidades.

A outra questão que está embutida neste desafio, continua o palestrante, é todo o fluxo que envolve a distribuição (Figura 2). Os alimentos não-perecíveis vão para o depósito e os perecíveis dire-tamente para o consumo. Falando sobre os materiais funcionais, ele explica que passam pelo depósito e depois vão direto para o paciente. Já os medicamentos pas-sam pela farmácia central, vão por dife-rentes canais de distribuição para chegar nos pacientes e nas áreas afins. E, por fim, o material consignado cai na distribui-ção, diretamente ao paciente, ao centro cirúrgico.

ter um relacionamento estratégico com o fornecedor. Isso sempre considerando a possibilidade de atingir o equilíbrio entre a agilidade e o controle, ressalta.

Ferreira explica à plateia que traba-lha com 2.353 fornecedores. Destes, oito concentram 20% das compras do hospi-tal; 372 concentram 65% das compras; e os demais fornecedores estão no platô da curva; 83% que fornecem 15% para o hospital. “Essa concentração é que passa a ser difícil na gestão”, ressalta ele.

Outro desafio que o palestrante cita como necessário de enfrentamento é o es-toque. Ele explica que em sua instituição há 80,1 mil itens cadastrados, mas ape-nas cerca de 18,8 mil apresentaram con-sumo efetivo em 2015. Deste total, 41,1% são de itens consignados. Segundo ele, a questão é o número de variabilidade dentro da prática assistencial, dentro do hospital. E para isso, afirma, necessita-se de uma figura muito importante, que é o médico.

Continuando os dados, o palestrante explica que os itens gerenciados no hos-pital são aproximadamente 21 mil, e es-tão distribuídos como itens consignados. E que também há, entre eles, os itens de alto valor agregado como Órteses, Pró-teses e Materiais Especiais (OPME), que até hoje, na maioria dos hospitais, entra neste modelo de relacionamento com o fornecedor.

Dilema na Elaboração da Política de Compras

Figura 1 – Matriz de Compras

Agilidade

Controle

Para atingir e manter este equilíbrio, o primeiro passo é uma adequada definição da Política de Compras, devidamente alinhada com as características dos produtos,

fornecedores e com o Nível de Serviço do Hospital

Fonte: elaborado pelo palestrante

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Há 40 anosNa década de 80, continua Ferreira,

quando começou a trabalhar em admi-nistração, o funcionamento era: em todo dia 26 de junho, os hospitais reuniam-se com as operadoras e faziam o reajuste do ano. E então faziam a transposição para o reajuste do ano seguinte ou o restante do período. Esse reajuste, explica ele, foi gradativamente sendo pressionado pelas operadoras para ser cada vez menor. E qual foi a escapatória que os hospitais ti-veram?, pergunta. Resposta: foi trabalhar material e medicamentos, que hoje são responsáveis por mais de 50% da receita na maioria dos hospitais. Naquela época não era assim, afirma. Cobrava-se muito mais por serviços do que por material e medicamento, que, no máximo, significa-vam talvez 15%, naquela época.

Agora, entretanto, ele afirma que se tem procurado o caminho inverso. Ou seja, as operadoras pressionam para que haja a, assim chamada, transposição da margem e que se possa trabalhar mais com diárias, taxas, serviços de um modo geral do que com material e medicamen-tos. Mas Ferreira salienta que essa busca ainda está em forma de desafio.

E, segundo ele, o que dificulta este processo é que não existe confiança no mercado que seja suficiente para manter

isso gradativamente sendo transportado para o recebimento de serviços. Sim, en-fatiza, existem casos de sucesso. Mas são ainda experiências pontuais que se dão um a um, ou seja, é um hospital ou uma pequena rede de hospital com uma úni-ca operadora. Mas num mercado como o geral, que tem uma infinidade de ope-radoras e uma infinidade de hospitais, ele salienta que chegar neste modelo vai ser muito mais difícil. E já avisa que é preciso começar a trabalhar. E cita a As-sociação Nacional de Hospitais Privados (Anahp), que tem um papel fundamen-tal nisto.

O palestrante aqui relembra quando fez seu doutorado, em que sua tese abor-dou um grupo de compras da Anahp, reunindo oito hospitais. Atualmente, a in-tenção é passar para 13 hospitais, segun-do ele, ressaltando que esse caminho veio acontecendo ao longo do tempo, mas que não passou, na verdade, em seu entender, de um sistema de troca de informações e não de compras. Diz ele que o grupo de compras troca informações, mas não tro-ca experiências de comprar; a Anahp não compra. Mas ele acredita que uma solução seria que a entidade passasse a comprar e distribuir. Seria a intermediária do proces-so, até mesmo porque pertence aos hospi-tais. Tanto do ponto de vista de materiais

Figura 2 – Operação logística

Alimentos Não Perecíveis

Materiais Funcionais

Materiais Médico-Cirúrgico

Medicamentos

Consignados

Alimentos perecíveis

Depósito Francisco Morato (1)

Laboratório Morumbi (1)

Farmácia Central Morumbi (1) e

Dose Unitária (1)

Refeitório Morumbi (1)

Dispensa

Farmácias Satélites Morumbi (18)

CD Pyxis (1) + Pyxis (26) Morumbi

Farmácias Unidades Externas (16)

Pacientes e Áreas Fins

Fonte: elaborado pelo palestrante

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e medicamentos, como do ponto de vista de investimentos.

Ferreira diz aos presentes que podem ter certeza de que, se ele tiver necessida-de de comprar cinco tomógrafos para essa rede de 13 ou de 15, ou de 20 hospitais, conseguiria um preço muito competitivo. “Mas eu tenho que comprar”, diz. E afir-ma que a Rede Brasil tem de fazer este patrocínio para que se possa ter uma en-tidade que compre, independentemente dos hospitais. E, segundo ele, não precisa nem saber para qual hospital vai porque é uma informação não precisa circular. O que interessa é comprar bem. Assim, con-tinua Ferreira, é capaz que se consiga ter sucesso. E salienta que é preciso ter um pouco mais de coragem e um pouco mais de assertividade nesse assunto.

E mais: procurar chegar no equilíbrio e na sustentabilidade, passar de uma casa de comércio para uma casa de valor. E, para ele, médicos, fornecedores, hospi-tais e operadoras, embora não diga que em conjunto, têm de ser os agentes de mudança desse desafio maior que é esse da cadeia de suprimentos.

Prática médicaFerreira diz que, em sua visão, os

médicos têm alguns desafios que são o respeito a sua prática. Buscar atender, trabalhar dentro de protocolos definidos com redução de variabilidade e medicina baseada em evidências. E trabalhar resul-tados.

Na hora em que os médicos se ali-nham com os interesses do hospital, enfa-tiza, é que o sucesso, a efetividade daqui-lo que está sendo feito de fato acontece. E o motivo, diz, é porque o hospital tem de olhar o médico como o seu melhor ativo, como o seu melhor negócio. E vice-versa. Na hora que os dois tiverem este compor-tamento e esta confiança, afirma Ferrei-ra, será possível conseguir ter resultados bem melhores.

Falando do lado dos hospitais, ele diz que pensa também ser o ponto principal ter indicadores de resultados para serem publicados. E hoje não se tem, diz ele, ci-tando, por exemplo, o Canadá, onde se

compra no jornaleiro o relatório de como estão os resultados clínicos dos hospitais. Aqui não existe isso, diz ele. E trata-se de segurança do paciente, ressalta.

Para ele, os hospitais têm de passar também a inverter um pouquinho, isto é, não tratar só da doença, mas tentar trabalhar um pouco a questão da saúde. A instituição hospitalar tem de ser pro-motora da saúde, enfatiza, explicando que não quer ser “hospitalocêntrico”, mas “já sendo”. Ele diz acreditar que esta função de promover a saúde cabe também aos hospitais. São instituições que precisam sair dos seus muros, afir-ma, e influenciar as vidas dos pacientes, nas suas casas, nas suas decisões relacio-nadas à saúde deles.

Abordando em seguida a relação com os fornecedores, Ferreira ressalta que pre-cisa ser ética. E cita o compliance como a forma pela qual se está chegando na ética. Em sua visão, é preciso ter regras sobre o que pode ou não pode, para que a ética possa voltar ou pelo menos acontecer na relação entre os fornecedores e os médi-cos. Mesmo que os fornecedores sejam distribuidores, diz.

Com relação às operadoras, Ferrei-ra diz acreditar que precisam começar a trabalhar também na questão do conhe-cimento dos resultados clínicos. Ele acha que, no momento em que um hospital apresentar um resultado clínico que seja evidente, que consiga provar e mostrar como chegou nesse resultado, a operado-ra tem de valorizar isso. E tem de passar a pagar serviços; a pagar valor; a pagar os resultados obtidos por determinado hos-pital. E diz ele que, se tais resultados não vão estar no jornaleiro como deveriam estar, pelo menos para as operadoras eles deveriam ser apresentados. O palestrante explica que está começando alguma coisa que foi fruto dos processos de acredita-ção, que agora está fazendo pouco mais de 20 anos. E que após esse tempo pas-sou-se a mostrar essa questão, ou seja, a importância dos resultados clínicos, que não é só uma relação comercial.

Para ele, essa busca de resultados tem de ser uma preocupação das opera-doras, porque quando fornecem aos seus

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pacientes, aos seus beneficiários, é isso o que têm de propagar: “Tenho tanto de sobrevida nisso; os meus resultados clí-nicos são apresentados dessa maneira; os meus hospitais fazem isso”, diz Ferrei-ra. E, para ele, a operadora pode até, no futuro, chegar a talvez ter o seu próprio corpo clínico.

A Omint, cita ele, fez uma certa ex-periência nesse sentido e obteve muito bons resultados. Mas, como falta con-fiança no mercado, acabou ficando muito tímido, avalia. E ressalta que só a Omint fazia isso. A Lynx tentou começar a fazer, informa, mas acabou não dando certo. Foi comprada e ficou por isso mesmo. Então hoje, muito timidamente a Omint faz alguma coisa, mas não é o que fazia antes, explica Ferreira. E faz questão de ressaltar que o alinhamento estratégico, a seu ver, tem de envolver médicos, forne-cedores e hospitais. Na hora em que isso acontecer, diz ele, todos voltados para o mesmo lado, quem sabe se tenha um re-sultado muito melhor.

Questões vitaisComeçando a concluir sua fala, Fer-

reira coloca alguns pontos que considera essenciais. Por exemplo, reduzir variabi-lidade; usar bem; que os elos da cadeia revejam todas as suas margens, pois não dá para comprar por R$ 30 e vender por R$ 800. E o principal: foco nas necessida-des do paciente sempre.

Quanto à questão do modelo de re-muneração, Ferreira diz que é preciso, como já adiantou anteriormente, passar de um modelo do fee for service – em que quanto maior o custo para a operadora, maior a margem para o hospital -- para uma situação de produtos e serviços que devem ser o núcleo de venda do hospi-tal. Ele diz que hospital vende serviço; não é casa de comércio. E acredita que se isso existir no bojo de negociação, será possível chegar na qualidade baseada em valor; porque, por enquanto, diz ele, é baseada em cifrão.

Para finalizar, Ferreira faz alguns co-mentários. Fala sobre a indústria farma-

cêutica, que tem sete meses de estoque; e os hospitais e o restante da cadeia jogam isso para nove ou dez, o que gera um des-perdício e, obviamente, fica mais caro. O custo dessa obsolescência, informa ele, gira em torno de 6% a 8% do que é plane-jado pelas indústrias e afeta o preço final do produto, obviamente. “Não tem como não afetar”, afirma.

E, citando as empresas farmacêuti-cas, Ferreira diz que não estão imunes a estes desafios de níveis de atendimento, que são muito ruins, pensa ele, porque estão hoje em apenas 93%, o que, segun-do acha, é nível baixo. Em termos de for-necimento de serviço, não é um bom ín-dice, enfatiza, salientando que é preciso melhorar esse resultado.

Dentro da cadeia de suprimento do setor de saúde, diz ele, o desafio é en-frentar uma complexidade crescente para poder atender às necessidades das pato-logias e às expansões geográficas do pró-prio país. Outro ponto que ele cita é que a vigilância, salientando que está acon-tecendo uma intensificação da vigilância dos órgãos reguladores.

E há também, segundo Ferreira, o desafio de tecnologia de informação, de integração. “Muito difícil de conseguir isso”, diz. Ninguém conseguiu isso até agora de uma forma muito expressiva, afirma, que é conseguir integrar toda a informação, desde o fornecedor até o ponto final.

O palestrante informa ainda que hoje, mais ou menos, R$ 200 bilhões são des-perdiçados devido a erros de ineficiência com medicamentos e materiais. E o erro de medicação é responsável por R$ 115 bilhões de custo. E Ferreira é enfático: “Isso é uma vergonha!”. Para ele, não dá para pensar que isso existe, mesmo que seja em nível mundial, valores desta na-tureza. A gestão de estoque, afirma, traz um custo absurdo, de R$ 65 bilhões. No Brasil, anualmente, segundo Ferreira, cerca de R$ 1 bilhão em medicamentos são desperdiçados. E por que? “Nós com-pramos mal, controlamos mal, temos um armazenamento inadequado e distribuí-mos pessimamente esse material.”

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moderador, começa contando que leu no jornal Folha de São Paulo uma matéria no Cader-

no de Ciências intitulado “Degelo pode causar ressurgimento de vírus e bactérias”. Ele explica que a reportagem fala sobre um caso de antraz1 no norte da Rússia, que está acontecendo por causa do aquecimento global, fenômeno que, na Rússia, tem ocorrido de uma maneira mais intensa do que no resto do mundo. E detalha então que houve degelo do permafrost, que é a camada de solo permanente coberta pelo gelo. E o resultado é que uma criança morreu e 23 contraíram o antraz. Trata-se de um vírus desaparecido há 75 anos, explica, e a preocupação é que o descongelamento de locais onde animais tinham sido enterrados tragam de novo essa ameaça. Ele ressalta que talvez a preocupação seja até maior porque, se o aquecimento continuar, irá trazer vírus e bactérias da Idade do Gelo.

MARIO MONZONI,

Saúde e sustentabilidade: impacto na gestão de

recursos naturais

MODERADOR:

Mario Monzoni

FGV Ces

Debate 18/08/2016

23º SEMESTRE DE DEBATES FGV SAÚDE

Monzoni continua sua fala, contan-do que no Brasil vários jornais chega-ram a noticiar o impacto das mudanças climáticas no Zika, dengue e etc. por causa de um aumento de temperatura e, portanto, da possibilidade de trazer o aumento dessas doenças. É o que eles chamam de mudança na ecologia dos vetores, diz. Segundo ele informa, a Organização Mundial da Saúde (OMS) estima que, de 2030 a 2050, um delta, 250 pessoas vão morrer em adição por causa da mudança climática, em parti-cular por má nutrição, malária e diar-reia. E aí, ressalta, se tem um elemento importante que são os grupos vulnerá-

veis, especialmente idosos e crianças. Do ponto de vista econômico, estima-se que serão gastos cerca de US$ 2 a US$ 4 bilhões no combate a essas doenças. E ressalta a vulnerabilidade dos países em desenvolvimento.

Monzoni diz estar se referindo a mu-danças climáticas, mas as más consequ-ências para a água, tem impacto direto na ocorrência de diarreia. E também há, emenda ele, o problema da poluição do ar, que podem causar doenças cardio-vasculares; respiratórias. Falam até de refugiados climáticos, de ilhas que vão desaparecer, enfim... muitas questões en-volvidas, diz ele.

1. Carbúnculo ou antraz é uma infeção causada pela bactéria Bacillus anthracis.

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Citando o Brasil, Monzoni diz que há uma política nacional sobre mudança no clima, são 11 planos setoriais e um deles é o de saúde. Nesse caso, acrescenta, a po-lítica trata de questões de vigilância, de atenção, reeducação, pesquisa. E a ideia é que todas as questões que tratam de clima, em particular de adaptação às mudanças climáticas, sejam incorporadas com riscos e vulnerabilidades nas políticas, nos pla-nos, nos programas de saúde. E, ainda no tema, ele continua, parafraseando: “Saúde e sustentabilidade estão unidos, até que a morte os separe”. Ou seja, diz ele, é uma maneira diferente de dizer a mesma coisa. E enfatiza que faz todo sentido porque, em geral, as pessoas falam que a insustentabi-lidade vai acabar com a espécie humana. Mas ele opina que sua visão não é essa; acha que, pelo menos nos próximos dois séculos, isso não vai acontecer.

Mas o que se coloca, diz ele, é que os humanos estão comprometendo a qualidade da vida no planeta, e aí a re-lação entre saúde e sustentabilidade está completamente envolvida. E, para ele, se quisermos mudar esse quadro, temos que alterar o modo de produção e consumo.

E diz que dá para fazer isso de várias ma-neiras, não excludentes. Segundo ele, há pessoas que entendem que isso se dá ou dará somente no campo individual, quan-do o indivíduo perceber e tiver consciên-cia sobre o impacto desse modo de pro-dução na qualidade de vida. Mas na outra ponta, continua, existe quem entenda que a tecnologia vai resolver tudo.

E aí, citando a FGV, afirma que, por estar dentro de uma escola de administra-ção pública e administração de empresas, entende que é preciso considerar estraté-gias e práticas empresariais. E cita o caso do Hospital Sírio-Libanês, que será apre-sentado e tratará sobre esse tema.

Monzoni salienta que a busca deve ser um estabelecimento de excelência das organizações, das empresas com os seus públicos de interesse -- sejam fornecedo-res, comunidade, colaboradores, investi-dores, consumidores, clientes --, e tam-bém o meio ambiente, seja na questão de gestão e políticas públicas. E anuncia que o evento irá focar em como a gestão em-presarial pode endereçar essa questão de sustentabilidade num contexto de saúde ou vice-versa.

palestra de Antonio Carlos Cascão será a susten-tabilidade com foco em recursos naturais. E conta que a questão começou a chamar a sua atenção

no início deste século, quando houve o apagão. E confessa que virou um entusiasta do tema e, a partir daí, passou a tentar entender um pouco e avaliar o que acontecia dentro de um hospital.

O TEMA DADEBATEDOR

Antonio Carlos Cascão

Hospital Sírio-Libanês

Saúde e sustentabilidade: impacto na gestão de recursos Naturais - Debate 18/08/2016

Os hospitais, diz Cascão, normal-mente, têm um grande legado e um ciclo de vida muito longo. E cita o primeiro prédio do Hospital Sírio-Libanês, que data da década de 30 e que recebeu, ao longo do tempo, novos edifícios que fo-ram incorporados com tecnologias que

hoje são um legado. São tecnologias de períodos quando não eram ainda discuti-das, lembra. Quando não havia a preocu-pação atual com o meio ambiente, com o impacto de alto consumo de energia, de água. Então, salienta, o legado dessas ins-tituições é muito grande.

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E, para ele, é importante avaliar esse legado porque, a partir de um determina-do momento, algumas instituições passa-ram a ter, dentro de suas estratégias, um foco muito preciso, uma diretriz para a questão do uso racional e consciente de energia e de água. E, voltando para o caso específico do Sírio-Libanês, Cascão expli-ca que o hospital passou por um processo de duplicação, em que foram considera-dos parâmetros de consumo e de uso de recursos a partir de uma determinada di-retriz. Existiam, até então, segundo ele, ações pontuais, mas sem pensar num plano estratégico, num plano diretor de como trazer, incorporar tecnologias e fa-zer com que isso seja perenizado e real-mente mudar o patamar de consumo e de uso desses recursos.

Em 2009, conta, quando começou efetivamente o plano de expansão, hou-ve uma diretriz dentro do projeto estabe-lecendo que deveria ser construído um “edifício verde”, baseado nos princípios do Leed (Leadership in Energy and Envi-ronmental Design) e que buscasse a cer-tificação Gold, que era o segundo nível de certificação. O primeiro é o diamante, que possui um custo quase que inviável e por isso é muito difícil de obter, ressalta.

Ar-condicionadoNo ano de 2013, continua o pales-

trante, começou a abertura do novo hos-pital com a implantação do projeto. E ele cita que um dos pontos altos e focais do plano diretor foi o ar-condicionado, do qual o hospital é um grande consu-midor. O sistema representa, num hos-pital desse porte, um consumo da ordem de 40% da energia consumida, informa Cascão. E explica que, para esta expan-são, foi implantada uma central térmi-ca da ordem de 3 mil TRs. E esclarece que hoje a demanda média anual é de 1.400 TRs. E com uma eficiência, que é o chamado COP, o coeficiente de perfor-mance, dessa central de 74 kW/TR. Tudo embasado num sistema de automação e ainda considerando a água de reuso para as torres de resfriamento para o sistema de condensação.

Continuando, Cascão cita o índice de 74 kW/TR, dizendo que a situação an-terior era 1.2 ou um pouco mais de 1.2 kW/TR., ou seja, para produzir a mesma quantidade de frio, para trocar calor e ge-rar o condicionamento do ambiente, gas-tava-se quase o dobro de energia. E a con-sequência disso, salienta, é que o hospital dobrou de tamanho e consumiu a mesma quantidade de energia, o que ele conside-ra um resultado muito importante. E re-lata que essa redução já ocorreu também em outro hospital no qual atuou.

Nas questões do sistema de energia, continua o palestrante, conseguiu-se uma queda de tensão menor que 2% e passa a explicar o que significa garantir um nível de tensão como esse dentro do sistema de distribuição. Segundo ele, um hospital desse porte tem quilômetros e quilômetros de barramentos e de fios que o percorrem. E a queda de tensão limi-tada a 2% evita perdas significativas em converter energia térmica em energia elétrica. Porque, na medida em que essa queda de tensão é maior, explica, se está aumentando essa perda. Cascão ressalta também a economia de energia signifi-cativa decorrente. E cita os sistemas de iluminação que, no caso específico des-se novo edifício, ficou com 6,6 watts por metro quadrado.

Ele diz ainda que, considerando os edifícios construídos há mais tempo, com tecnologias de 10, 15, 20 anos atrás, têm em média níveis de instalação da ordem de 20 watts a 25 watts por metro quadra-do. Ou seja, para garantir uma iluminação com o mesmo nível de conforto, com a mesma quantidade de lúmens projetados num ambiente de trabalho, o consumo é quatro vezes maior de energia. E hoje, enfatiza, que projetos mais recentes, estão chegando a taxas da ordem de 5 watts por metro quadrado. Num projeto de 2013, conta, chegou-se a 6,6 watts. Nos mais re-centes, o consumo está em 5 watts.

Sistema solar de aquecimentoO item a seguir abordado por Cascão

é o sistema de aquecimento de água, com utilização do equipamento solar. E, para

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ele, esse equipamento é importante do ponto de vista de mostrar a responsabi-lidade ambiental. A contribuição dele na quantidade de calor gerado para o volu-me de água quente que o hospital con-some não é relevante, é marginal, expli-ca, mas a importância de ter um sistema desses dentro do processo é fundamental porque mostra que o caminho tem que ser esse. Apesar dessa contribuição mar-ginal da ordem de 10% a 15% da geração de calor por luz solar.

Citando equipamentos que funcio-nam 24 horas por dia, como elevadores, escadas rolantes, motores de alta eficiên-cia, que consomem alto nível de energia, é um quadro que pode ser bem melhorado se houver especificação de motores com alta eficiência, com variadores de frequ-ência e que geram uma efetiva economia de energia. E falando dos sistemas pneu-máticos, ele explica que o Sírio-Libanês é o primeiro hospital do Brasil a implan-tá-los. Teve entrada recente em operação para o transporte de resíduos, exceto os infectantes, e de roupas, explica o pales-trante, ressaltando que, dessa forma, a movimentação deixa de ser por elevado-res e passa a ser por sistema de transporte pneumático, de baixíssimo consumo de energia, que vai gerar ganhos fantásticos.

Outra coisa que ele considera possí-vel de verificar por meio de indicadores é a utilização de elementos de fachada de alto desempenho, como vidros que evi-tam a propagação de calor para dentro do edifício e coberturas verdes. E cita parede verde feita em São Paulo, a maior até en-

tão, com 1.200 metros quadrados, loca-lizada na Avenida Nove de Julho, e que utiliza água de reuso para irrigação.

Com relação à utilização de disposi-tivos sanitários e limitadores de evasão, o palestrante explica que, de chuveiros com 30 litros por minuto, com tecnolo-gia, chegou-se a 9 litros por minuto. E conta que já está em teste um novo sis-tema que baixa para 5 litros por minuto. Considerando bacias sanitárias, Cascão diz que o consumo é da ordem de 15 li-

tros a 20 litros por aciona-mento, do qual, aliás, não se tem controle. São as chamadas válvulas hidras, antigas, de 6 litros. Mas já está em teste, segundo ele, a nova geração de bacia de 2 litros por acionamento.

Economia não tem limites

Cascão diz que o que deseja passar à plateia com suas informações é que

a preocupação ambiental e o desenvol-vimento de tecnologias para deixar os edifícios mais eficientes e consumindo menos recursos naturais é uma avenida que está só no começo. Não tem limites, ressalta, porque há muito ainda a desen-volver e cada dia aparecem novas opções. E diz que, quando vê uma central de água gelada, com máquinas com potências da ordem de 800 kW, de mil kW que, num determinado momento, consumiam 1,2 a 1,3 kW para produzir uma tonelada de refrigeração, e hoje prometem 0,45, 0.48 produzindo a mesma quantidade, trata-se de uma diferença brutal e que decidida-mente impacta no resultado final.

Ainda falando sobre a nova edifica-ção do Sírio-Libanês, ele cita algo que vê como inovação do ponto de vista de edifí-cios dentro de São Paulo: sistema de reu-so de água, considerando a segregação do efluente cinza (que vem de chuveiros e lavatórios) desde a origem. Ele conta que houve, desde o início, exigência, no pro-jeto, de separação desse efluente cinza, o que se conseguiu com tubos de quedas e

Outra coisa que ele considera possível de verificar por meio de indicadores é a utilização de elementos de fachada de alto desempenho, como vidros que evitam a propagação de calor para dentro do edifício e coberturas verdes.

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coletas, independente dos das bacias sa-nitárias, com destino para uma estação de tratamento de efluentes.

Ele explica ainda que esse efluente cinza representa hoje em torno de 10% da água consumida pelo hospital, e que antes era jogada no esgoto, mas que agora passa por um tratamento e volta para o proces-so. Não é água potável, mas é perfeitamen-te disponível para ser utilizada em bacias sanitárias. Hoje praticamente 100% dessa água está nas torres de resfriamento, que são os grandes consumidores de água do hospital, explica Cascão. E salienta que o ar-condicionado não consome só energia, consome muita água. No momento que está produzindo, as torres estão trocando calor, e na evaporação muita água é jogada para a atmosfera.

Além da ETE (estação de tratamento de esgoto), Cascão informa que o hos-pital possui uma ETA (estação de trata-mento de afluentes) que faz a captação de água de chuva e também encaminha essa água para o reuso.

Retorno rápidoE comentando sobre o retorno

(payback1) dessas tecnologias em eco-nomia, Cascão diz que é muito rápido. E explica que no momento em que se faz um estudo de viabilidade e se verifica que o retorno virá em três ou quatro meses, é comprada e implantada a tecnologia e paga em seis meses. Com a economia ge-rada, diz ele, é que se vai pagando as par-celas, “E a partir daí você incorpora isso dentro do seu processo”.

Abordando agora o sistema de auto-mação, Cascão explica que, num grande edifício como o do Sírio-Libanês, que tem 170 mil metros quadrados, para ter efi-ciência no sistema, para ter perenidade, para garantir que tudo isso que foi im-plantado esteja respondendo, é funda-mental que haja sistema de supervisão e automação para monitoramento de tudo. E no hospital, informa, são sete pontos de monitoração. Tais pontos, continua o palestrante, são traduzidos em sensores e

sondas que estão medindo vazão, medin-do consumo de energia distribuído em vários setores de tal forma que permite fazer benchmark. E cita um exemplo: ao se comparar o que está sendo consumin-do de água num determinado andar, com uma determinada taxa de ocupação ou paciente/dia, com outro andar, consegue--se ter uma percepção clara, em tempo real, e perceber com alarmes se houve um desvio de consumo num determinado an-dar. Ele explica que, há alguns anos, era possível perceber isso quando recebiam conta de água ou de energia. E o motivo do gasto de muita água num dado mês não dava para conhecer, porque existiam milhares de pontos. Hoje, porém, o resul-tado é em tempo real.

Todo o conforto decorrente do uso das tecnologias que citou, Cascão remete à responsabilidade do sistema de automa-ção, que, segundo ele, exige inteligência, gestão, parametrização, e traz estabilida-de naqueles parâmetros preconizados. E isso ele diz considerar extremamente im-portante. O benchmarking e a literatura, afirma, dizem que esses sistemas podem proporcionar, dentro de um determinado conjunto de coisas, economias da ordem de 15% a 20%. E diz que no Sírio-Libanês já conseguiram economias comprovadas de 6%, e enfatiza, que ainda há muito para aprender. Mas faz parte, diz ele: “Te-mos que aprender, que buscar, entender; desenvolver práticas de gestão em cima disso”. E emenda, dizendo que a tecnolo-gia está disponível, mas precisa de gestão, de inteligência para fazer essa análise crí-tica e achar a melhor forma de avançar.

Além das ações que buscam eficiência do ponto de vista do uso do recurso, Cas-cão explica que existem outras que não interferem nesse tipo de eficiência, mas sim no tipo que envolve o uso do custo da operação. E para isso o hospital ado-tou a geração na ponta que, com o siste-ma de diesel trouxe uma economia de 8% no gasto com energia, não no consumo. É diferente, enfatiza Cascão. E esse resul-tado, conta ele, foi conseguido em 2015, quando houve transformação da usina,

1. Também conhecido como período de recuperação do investimento (PRI).

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que é era de 7 megawatts, num sistema bi-fuel, bicombustível. Até então, explica o palestrante, a usina só consumia óleo diesel com redução de custo de energia, mas como consequência aumentou de forma sistemática a emissão de CO2 com a queima de diesel. Com a mudança para o sistema bicombustível, passaram a ro-dar a usina com 70% de gás natural e 30% de diesel, e por consequência conquis-tou-se mais uma redução no sistema.

Essa mudança de combustível, segun-do Cascão, reduziu ainda mais o custo, em 10%, “que não é pouco dinheiro”. E juntando com os 8%, resulta-se em 18%, o que equivale, segundo ele, a uma redu-ção de custo de R$ 1,5 milhão por ano. E mais: com consequente redução de partí-culas de 90%.

Mercado livreQuase ao fim de sua palestra, Cascão

aborda o sistema do mercado livre, ado-tado também no hospital. E explica que se trata de grandes consumidores terem a opção de comprar energia da Câmara de Comercialização de Energia Elétrica (CCEE), com custo menor estabelecido em contrato de longo prazo, o que resul-tou em uma redução da ordem de 30% no custo da energia. Ou seja, enfatiza, sa-ímos de um custo médio de R$ 550 por megawatt/hora para algo próximo de R$ 385 por megawatt/hora.

E, para encerrar, ele expõe os resul-tados dessas mudanças. Em 2013, a cen-tral de água gelada tinha 80 mil metros quadrados, com demanda média anual de 900 TRs e consumo médio de 1.36 kW/TR. Em 2016, dobrou-se tamanho

a central e o consumo de frio do prédio não dobrou. Não foi para 1.800 TRs, mas para 1.400 TRs. E o efeito, diz ele, são justamente aquelas coberturas verdes que mencionou anteriormente e são os vidros especiais que deixam o edifício mais efi-ciente do ponto de vista térmico.

Ele informa ainda que aquela central que consumia 1.36 kW/TR, em 2013, passou a consumir 0.83 kW/TR, em 2014. Em 2016, com o sistema de su-

pervisão automatizada, o consumo está em 0,74 kW/TR. Ela consome hoje praticamente a metade da energia que consumia no passado para produzir a mesma quantidade de frio, o que é extremamen-te significativo, salienta.

O indicador de con-sumo de energia do sis-

tema, ou seja, de todas as fontes que abastecem o hospital, segundo Cascão, vinha em 2012 com um consumo de 1.339 megajoule por metro quadrado. Em 2013, o indicador piorou, passando para 1.478 megajoule, o que ele atri-bui ao período da obra, quando gran-des equipamentos estavam consumin-do energia. Depois, em 2014, quando começaram a abrir os primeiros leitos no primeiro andar, houve uma redução de 12%. Em 2015, 26% de redução. Ou seja, saíram de 1.339 megajoule por metro quadrado para 950.

Atualmente, segundo o consumo já está maior porque foi incorporada mui-ta tecnologia, alguns equipamentos de grande porte, ressonâncias magnéticas, tomógrafos, grandes consumidores. Ele cita que uma ressonância magnética, por exemplo, consome o equivalente a 30 apartamentos.

No consumo de água, houve redução de 3,10 m³/m² para 1,68 m³/m². E já está sendo trabalhado um esforço para fechar na faixa de 1,5m³/m². A emissão de CO2, diz ele, em 2013 foi de 0,12 toneladas por metro quadrado, caiu para 0,11 em 2014, e hoje está em 0,7. É uma redução da or-dem de quase 50%.

Uma ressonância magnética, por exemplo, consome o equivalente a 30 apartamentos.

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PALESTRANTE

Evangelina Vormittag

Instituto Saúde e Sustentabilidade

Saúde e sustentabilidade: impacto na gestão de recursos naturais - Debate 18/08/2016

Vormittag inicia com uma explicação so-bre o que vai discorrer. Explica Evangelina que irá trazer à plateia o tema da saúde

e da gestão de recursos. E conta que fez o curso de gestão e sustentabilidade na FGV e que foi numa fase muito transformadora de sua vida, quando deixou de ser patologista. E que, durante o curso, acabou idealizando o Instituto Saúde e Sustentabilidade, uma Or-ganização da Sociedade Civil de Interesse Público (OSCIP). São 65 associados fundadores, informa, dentre eles alguns colegas de turma e professores.

EVANGELINA

O instituto, continua Evangelina, foi fundado em 2008 e atua com soluções para os impactos da urbanização em saú-de, envolvendo diversos atores. E, talvez por ser uma organização não-governa-mental, acredita que foi possível trazer todos para a mesma mesa. Falando sobre os eixos de atuação do instituto, ela ex-plica que, há coleta, organização e tradu-ção do conhecimento científico para uma linguagem acessível. Ou seja, dissemi-nam a informação e mobilizam a socieda-de, explica Evangelina, emendando que o instituto tem forte atuação em políticas públicas. E diz também que o instituto, desde o início, toca o projeto Observató-rio de Sustentabilidade Urbana, em que o ar foi escolhido como foco. E informa que existe um interesse imenso sobre o tema, tanto nacional, como internacio-nalmente.

Falando sobre como uma empre-sa pode atuar nos desafios da saúde e sustentabilidade -- além de apenas cen-trar na gestão e redução de consumo --, Evangelina cita que um aspecto da rela-ção entre cidade e meio ambiente rara-mente abordado é a qualidade de vida do homem. Então, o instituto trabalha com vários temas e sempre urbanos, porque são os efeitos da urbanização em saúde, mas sempre com foco no homem ou na saúde humana. E, segundo ela, ao mes-mo tempo em que ele é um protagonista em termos de consumo e produção, cau-

sando destruição e poluição dos recursos, ocorre, também em consequência, efeito sobre sua saúde.

Evangelina informa que, segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), a urbanização, a poluição e a mudança climática são os grandes desafios de saú-de nesse século. As doenças mudaram, a mortalidade mudou, as pessoas vivem hoje, a maioria, em cidades. No Brasil 85%, no mundo, 60%. E em 20 anos se-rão 80%, diz ela. E está em jogo, enfatiza, a questão da necessidade da preservação da espécie humana, além de outras ques-tões de saúde, outras questões de meio ambiente. Todos esses aspectos estão in-cluídos nos Objetivos de Desenvolvimen-to Sustentável (ODS)1, informa Evangeli-na, explicando que a seguir vai falar do tema que escolheu: mobilidade urbana.

Esse sistema, afirma, é responsável pelo aquecimento das cidades, pelas formações das ilhas de calor, a ponto de chegar a ter 6, 8 graus de diferença entre periferia e outros locais na cidade. Além disso, continua a palestrante, a mobili-dade urbana também é responsável pela grande pavimentação das ruas e do solo, o que, em grandes eventos de chuva, pro-voca enchentes e deslizamentos. Mas não é só, diz Evangelina, citando ainda outra questão envolvida, que é o tempo de deslocamento, muito grande. E cita que o tempo médio de deslocamento para o trabalho é de 57 minutos. E há casos,

1. Os ODS fazem parte das 17 metas globais estabelecidas pela Assembleia Geral das Nações Unidas na Resolução 70/1 “Transformando o nosso mundo: a Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável”. Os ODS abrangem questões de desenvolvimento social e econômico, incluindo pobreza, fome, saúde, educação, aquecimento global, igualdade de gênero, água, saneamento, energia, urbanização, meio ambiente e justiça social.

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claro, de quem leve três, quatro horas até o trabalho, salienta.

O instituto e o ar Outro ponto importante a considerar,

dentro da mobilidade urbana, é a poluição do ar, diz ela, explicando que por esse mo-tivo é que o Instituto Saúde e Sustentabi-lidade tem trabalhado com o ar. Segundo Evangelina, o ar tóxico está relacionado às duas primeiras causas de mortalidade no mundo: doença cardiovascular e câncer de pulmão. A terceira causa, salienta, é a violência. Outro motivo para a escolha de trabalho com o ar, explica, é que esse elemento se tornou agente carcinogênico comprovadamente, já faz parte das subs-tâncias carcinogênicas.

Evangelina cita que, no início de 2016, a Organização Mundial de Saúde mostrou que há 8 milhões de mortes no mundo por conta da poluição do ar: 3,6 milhões por causa do ar externo, e o res-tante por causa do ar indoor2. Ou seja, ressalta, o ar já passou a ser líder ambien-tal por causa de morte, mais do que as doenças infecciosas provocadas por veto-res e mais do que a água insalubre. E as populações mais vulneráveis, informa a palestrante, são as crianças e idosos.

No Brasil, segundo Evangelina, em re-lação às leis, o ar é muito negligenciado, em comparação com os outros recursos. E cita que apenas 1,7% das cidades têm monitoramento do ar, ou seja, não há um

diagnóstico real sobre poluição. Quan-to às leis existentes, ela cita o Programa Nacional de Mudança do Clima, que, na cidade de São Paulo, não foi cumprida, já que obrigava, até 2018, que os veículos de transporte fossem movidos a combus-tível limpo ou renovável.

Viver em São Paulo é como fumar quatro cigarros por dia, afirma Evangeli-na. E diz mais: que a poluição e o tráfego já são juntos a primeira causa de infarto do coração em relação a todos os riscos evitáveis. Explicando o que são esses ris-cos, Evangelina diz que são aqueles que não são de constituição própria, como pressão alta e diabetes. E, em sua visão, esse é um dado importante, porque 80% dos efeitos nocivos da poluição do ar é ligado ao sistema cardiovascular. E aler-

ta: todo mundo acha que é respiratório primeiro, mas não é; 20% é respira-tório, câncer de pulmão; 30% é cardiovascular.

Monitoramento do arEm seguida, Evan-

gelina aborda um estu-do feito pelo Instituto Saúde e Sustentabilidade cujo resultado mostra que no Brasil há 250 es-tações de monitoramen-

to de ar. Na Europa são 7.500 estações, diz ela. E, nos EUA, 10 mil estações. Em 2006, continua Evangelina, foi publica-do um guia de qualidade do ar pela OMS que definiu quais seriam os padrões de qualidade do ar. Em relação ao material particulado que é a poeira, que entra pela árvore brônquica e chega até o alvé-olo, pela OMS a média anual deve ser 20 microgramas e, por dia (em 24 horas), 50 microgramas. Entretanto, salienta, o Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama), vinculado ao Ministério do Meio Ambiente, define que média anual é de 50 microgramas e, por dia, 150 mi-crogramas. Portanto, enfatiza, se o Bra-sil apresentar uma concentração de 120

2. Poluição indoor: qualidade do ar nos ambientes internos

Viver em São Paulo é como fumar quatro cigarros por dia, afirma Evangelina. E diz mais: que a poluição e o tráfego já são juntos a primeira causa de infarto do coração em relação a todos os riscos evitáveis.

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microgramas, não será considerado que o ar está poluído. Haverá a informação de que o ar está adequado, quando ele já está mais que o dobro, teoricamente, do que preconiza a OMS. Então, ressalta, a informação não é acessível e, por conta desse padrão alto, não há também uma gestão para atingir um nível de emis-são de poluentes e concentração menor como é preconizado pela OMS.

Evangelina conta que participou de uma reunião no Conselho Nacional do Meio Ambiente para a mudança de pa-drão da qualidade do ar. Segundo relata, eram ao todo 25 pessoas e apenas 5 delas estiveram “do lado da saúde e da socie-dade”, querendo atendimento ao padrão OMS: três ONGs, o Ministério Público Federal e o Ministério da Saúde. Do ou-tro lado, o Ministério do Meio Ambiente, todos os órgãos ambientais e a indústria, que entendiam que o padrão da OMS ti-nha de ser atendido, mas em etapas. E não colocaram prazo.

Ela conta então participou de um rá-pido estudo, que durou dois meses, para mostrar o que aconteceria em 15 anos caso fosse mantido o padrão do índice conside-rado poluidor pelo Brasil. O resultado: em 15 anos haveria 250 mil mortes, 1 milhão de internações e gasto público de R$ 1,6 bilhão em valores de 2011.

Em relação à mudança do clima nas cidades, a palestrante explica que há uma outra questão muito importante. Na COP 213, a Organização Mundial de Saúde resolveu posicionar-se e declarou que a proteção da saúde deve ser uma priori-dade para o investimento na mitigação de gases efeito estufa. Motivo: traz be-nefícios imediatos para a saúde e para a economia.

Evangelina enfatiza que, com a im-plementação de intervenções comprova-das para reduzir as emissões de poluen-tes climáticos de curta duração, como a emissão de veículos e padrões deficiente, é possível esperar salvar cerca de 2,4 mi-

lhões de vidas e até reduzir o aquecimen-to global.

Em seguida, a palestrante explica que as ações mais importantes nesse quadro são principalmente nas áreas de transpor-te, energia e consumo de carne. E salien-ta que algumas delas podem ser provi-denciadas pelo cidadão comum: redução do uso do automóvel privado em zonas urbanas; aumento de uso do transporte ativo; geração de energia de fontes reno-váveis, ou seja, de outras fontes de baixo carbono ao invés de combustíveis fósseis; redução do consumo de produtos de ori-gem animal em centros urbanos, porque o consumo desses produtos leva ao au-mento de produção de gás efeito estufa, seja no transporte, na agricultura ou uso do solo.

Falando agora sobre consumo de energia, Evangelina explica que o passa-geiro de automóvel consome sete vezes mais energia do que um ônibus e 25 ve-zes mais que um passageiro de metrô. E cita um estudo, do qual participou, que atende ao que preconiza a OMS, que é medir -- como gestão de saúde ou gestão ambiental de infraestrutura --, o impacto de uma ação, de uma intervenção na ci-dade, em saúde. E conforme Evangelina o estudo mostra a inserção e implemen-tação progressiva do biodiesel 4 (B) à mis-tura do diesel e o impacto na saúde e nos gastos. Na época, conta, havia o B5 (5% do biodiesel misturado ao diesel) e o es-tudo mensurou o impacto do B7 (7%) -- aumentar 7% na mistura ao diesel -- e do B20, 20%. O B20 já foi aprovado, infor-ma, mas ressalta: se tivesse havido mu-dança do B5 para o B7, seriam evitadas 2,1 mil mortes, que saltariam para 13 mil evitadas, se fosse o B20. No mesmo sen-tido, enfocando internações por doenças relacionadas à poluição, Evangelina ex-plica que se evitariam cerca de 4.500, que com o B20 saltariam para 28 mil, com salto de economia de R$ 10 milhões para R$ 65 milhões.

3. Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas de 20154. O biodiesel é um combustível para ser utilizado nos carros ou caminhões com motores diesel, feito a partir das plantas (óleos vegetais) ou de animais (gordura animal). Ele é um substituto do diesel, biodegradável, de queima limpa, produzido de recursos domésticos, renováveis.

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Benefícios da mobilidade ativa A seguir, Evangelina fala sobre as-

pectos da mobilidade ativa que é o cami-nhar o andar de bicicleta e mais a adição de motores de baixa emissão. A prática dessas ações pode reduzir sedentarismo, obesidade, além de diminuir ocorrência de doenças cardíacas e isquemia cerebral em 10% a 20%, de câncer de mama de

12%, demência em 8%, e depressão em 5%. Resumindo, enfatiza a palestrante, é enorme a lista de benefícios decorrentes do incremento da mobilidade sustentável à saúde: redução de doenças crônicas; in-farto, Acidente Vascular Cerebral (AVC); câncer; diabetes; obesidade; uso de me-dicamentos; melhoria da saúde mental; aumento do capital social; socialização; inclusão na comunidade; sentimento de pertencimento; redução de acidentes de trânsito; redução de custos em saúde; au-mento da equidade no sistema de saúde; e redução de emissões de GEE (gases de efeito estufa) no setor transportes.

E, referindo-se ao que as empresas da área de saúde podem fazer para contri-buir, ela salienta que, embora qualquer empresa, de qualquer setor possa dar contribuição, as do setor da saúde podem fazer mais, porque têm conhecimento e devem ser exemplo para todos os públi-cos com quem se relacionam. E ainda tra-zer a possibilidade de melhoria de quali-dade de vida e redução de efeitos sobre a saúde considerando qualquer questão ambiental.

No Brasil, segundo Evangelina, 36% das empresas adotam o modelo de tra-balho em casa, segundo dados de 2015.

E confessa que até se surpreendeu por-que achou que fosse uma porcentagem menor. Ela explica que está falando do home office, mas poderia ser transporte compartilhado dentro da empresa. E diz que existem empresas que fazem isso, existem aplicativos. Mas poderia ser tam-bém a empresa fornece um dos modais de transporte para os seus colaboradores,

por exemplo, para chegar até a estação mais próxi-ma do metrô, evitando que as pessoas usassem carro. E Evangelina co-menta que é interessante ver que os colaboradores atualmente entendem que um motivo de estresse de trabalho vem da mobili-dade urbana.

Informa a palestrante que, de acordo com uma pesquisa exclusiva da

PWC em parceria com a FGV, com 113 companhias que representam 1,6 milhão de empregados, uma das principais as-pirações é buscar formas alternativas de trabalhar, junto com mudança por remu-neração e um sistema de promoção base-ado em meritocracia. Ou seja, ressalta: dá para perceber o quanto isso é importante para o funcionário em termos de qualida-de de vida e motivação.

Em seguida, ela cita outra pesquisa, cujo resultado aponta que 60% dos fun-cionários não têm motivação e engaja-mento em relação ao trabalho. E 24% não têm nada, ou seja, pode-se dizer que é um engajamento negativo. Então, continua Evangelina, isso é muito importante levar em conta, até porque quase 70% desses funcionários têm entre 30 e 40 anos. A maioria com filhos pequenos, emenda. E ressalta que uma boa parte das empresas não percebe esse tipo de demanda dos seus funcionários em termos de política retenção de talento.

Aqui, Evangelina cita uma pesquisa da Harvard apresentada em um evento da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp): o Shine - Sustainability and Health Initiative for NetPositive Enter-prise. Esse programa, explica ela, envol-

60% dos funcionários não têm motivação e engajamento em relação ao trabalho. E 24% não têm nada, ou seja, pode-se dizer que é um engajamento negativo.

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ve pensadores, pessoas inovadoras que pensam na mudança do mundo, tanto em relação à saúde, quanto à questão de sustentabilidade. E a iniciativa do Shine, enfatiza Evangelina, ajuda as empresas em todos os setores a medir e acelerar as formas como ajudam o mundo a tornar--se um lugar mais sustentável. Cria uma visão ousada para as empresas, que levam benefício à saúde de todos, em todas as decisões de negócios. E mais, diz ela: o projeto trabalha para que as empresas meçam seus impactos positivos sobre o bem-estar das pessoas e do planeta e, ao mesmo tempo, ajuda a identificar novas oportunidades para criar uma mudança positiva. E o impacto positivo, ressalta Evangelina, pode incluir esforços para elevar o bem-estar através de locais de trabalho saudáveis ou melhorar a saúde do planeta pelo auxílio da conservação e regeneração dos recursos naturais.

Segundo a palestrante, quem trouxe o projeto para o Brasil foi a Associação Brasileira de Qualidade de Vida (ABQV), cujo trabalho Evangelina enaltece e reco-menda à plateia para que conheça, ressal-tando que envolve todas as questões de meio ambiente e, a depender, da empresa, também o que tem mais que ver com a estratégia.

E, citando o caso da empresa Philips, Evangelina explica que se trata da adoção de um conceito de workplace innovation, que estimulou a integração das pessoas, do uso de tecnologia de ponta, que é a expertise da empresa. Ela explica que a tecnologia foi usada para aproximar os colaboradores e permitir que tivessem melhor qualidade de vida. E ressalta: qualidade de vida aliada à sustentabilida-de das atividades. Evangelina diz que a Phillips tem como meta ser empresa lí-der de saúde e bem-estar, e que o Brasil foi um dos sete países escolhidos para implementação do conceito; o único da América Latina. E, dentro do conceito, continua a palestrante, há reforço no foco em sustentabilidade, inovação e mobili-

dade. E explica que este último fator foi escolhido porque melhoria da qualidade de vida e tem como principal expectativa a prática destes princípios.

Evangelina conta que a Phillips tinha seus colaboradores espalhados em oito andares e que conseguiu juntar todos em quatro andares apenas, com sucesso nos resultados. Então, enfatiza ela, trata-se do desejo de proporcionar o bem-estar a funcionários, clientes e parceiros e esti-mular a consciência e responsabilidade sócio-ambiental, “atuando de maneira competitiva e com respeito aos valores da empresa”.

A questão de inovação nas áreas, con-tinua Evangelina, foi utilizada no proje-to da Phillips, e cita, principalmente, de arquitetura, iluminação e tecnologia de ponta. Por exemplo, cita, houve signifi-cativa redução no gasto com energia elé-trica. Houve promoção do uso consciente do squeeze para consumo de água em vez do copinho plástico; reduziu-se a impres-são de papel; opção de uso da escada, em vez do elevador. E a possibilidade de horários flexíveis e home office em gran-de quantidade, diz ela, explicando que pouquíssimos funcionários da Philips têm uma estação de trabalho fixa, o que melhorou toda a comunicação, a relação entre os trabalhadores.

Terminando sua palestra, Evangeli-na enfatiza a importância do conceito de saúde, de sustentabilidade, principal-mente considerando a cidade. Está aí o Zika Vírus, diz ela, um grande desafio para a saúde, que tem muito a ver com a questão do aquecimento global.

E no combate ao vírus ela cita as di-ficuldades de organizar uma cidade, fazer a gestão em termos de resíduos, consi-derando os lixos abertos, a pobreza, as moradias muito precárias, a questão de educação.... Enfim, enfatiza, há uma sé-rie de questões que dificultam o combate ao Zika. E salienta que se precisa discutir mais o que a empresa pode fazer nesse sentido.

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debate Walter Cintra Fer-reira Junior inicia sua fala citando que os planos po-

pulares são uma questão que surgiu recentemente com a posse do então ministro da Saúde, Ricardo Barros, que propôs à Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) o lançamento de planos populares de saúde, inclusive como uma maneira de aliviar o Sistema Único de Saúde (SUS). E é uma proposta que tem causado bastante polêmica no setor, salienta Ferreira Jr. Segundo ele, o meio acadêmico tem sido procurado com alguma frequência para falar desse assunto e ele acha ser oportuno debatê-lo. E não só sobre os planos populares em particular, ressalta, mas também o que está acontecendo nesse setor da saúde.

O MODERADOR DE

Perspectivas do setor privado da saúde e os planos populares

MODERADOR:

Walter Cintra Ferreira Junior

FGV EAESP / FGV Saúde

Debate 29/09/2016

23º SEMESTRE DE DEBATES FGV SAÚDE

Ferreira Jr. explica que se trata de um setor que vinha de vários anos de cresci-mento de beneficiários de planos de saú-de, mas que, desde 2015, perdeu mais de 1,6 milhão de beneficiários. E isso, ressal-ta, depois de uma história crescente, ano após ano, inclusive de 2008 para 2009, época da crise econômica, que também foi classificada como uma pequena marola.

Conforme Ferreira Jr., evidentemen-te é um setor totalmente dependente de como se comporta o nível de emprego bra-sileiro. Atualmente, a alta taxa de desem-prego, reflete em vários setores, inclusive o de saúde. Segundo ele, atualmente pou-co mais de ¼ da população brasileira tem algum plano de assistência médica. Nas capitais, enfatiza, essa taxa de cobertura é um pouco maior, em média 43%. São Pau-lo é a que tem mais cobertura: em torno

de 60% da população tem algum plano de saúde.

A maior parte de beneficiários de pla-nos médicos e hospitalares, continua Fer-reira Jr., é vinculada a planos coletivos empresariais, ou seja, possui benefício pela empresa em que trabalha. “E isso ex-plica o porquê da diminuição do número de beneficiário”, acrescenta.

Outra coisa interessante, diz ele, é que esses planos coletivos têm uma regulação diferenciada em termos de reajustes das mensalidades. Anualmente, explica, elas são reajustadas com base na sinistralidade desses planos. Já os planos individuais e familiares, para serem reajustados depen-dem de uma autorização do governo. E é por essa razão que hoje, afirma, pratica-mente não se oferece mais plano individu-al e familiar nesse mercado.

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Cooperativas médicasOs beneficiários de planos de assis-

tência médica, segundo o moderador, estão concentrados principalmente em operadoras do tipo cooperativas médicas e medicinas de grupo. E a taxa de cober-tura dos planos médicos e hospitalares é maior na população de 60 anos ou mais; são 29,2%, seguidos da faixa etária de 20 a 59 e de 0 a 19. Ferreira Jr. Informa que a única faixa etária que não apresentou queda na taxa de cobertura entre junho de 2006 e junho de 2016 foi a de 60 anos ou mais. E segundo ele isso já mostra a importância do próximo debate, que é o cuidado com o idoso.

Para ele, o mercado de planos de saú-de está em consolidação. No decorrer dos últimos dez anos, o número de operado-ras com planos médicos hospitalares caiu significativamente, informa, citando que, em março de 2016, havia 806 operadoras com beneficiários e 965 operadoras médi-co hospitalares com registro na ANS. Em 2006, os números eram de 1.488 operado-ras de planos de saúde; em dezembro de 2015, houve queda para 965.

No que diz respeito à questão da sinis-tralidade, informa Ferreira Jr., em março de 2016 as operadoras médico hospitala-

res obtiveram R$ 37,2 bilhões de receita em contraprestações e pagaram R$ 30,4 bilhões de despesas com assistência mé-dica. Com esse resultado, a sinistralidade atingiu 81,6%, que altíssima para o setor, salienta. Ou seja, diz ele, a cada R$ 100, os beneficiários dos planos médico-hospita-lares que pagaram mensalidade em março de 2016, R$ 81,60 voltaram para eles na forma de assistência direta à saúde, infor-ma, ressaltando que esses dados são do Instituto de Estudos de Saúde Suplemen-tar (IESS) e da ANS.

Nesse contexto, diz ele, os planos po-pulares de saúde surgem como uma for-ma de aliviar o SUS. A dúvida que fica, esclarece, é que, aparentemente, ou não aparentemente, isso vai contra a perspec-tiva da ANS de aumentar a cobertura dos planos de saúde e não de reduzir, como ficou implícito na proposta de um plano popular que teria um custo menor e, por-tanto, teria necessariamente uma cobertu-ra menor.

Concluindo, Ferreira Jr. Anuncia os debatedores -- José Cechin e Mário Schef-fer --, que irão falar sobre como o setor de planos de saúde vê a conjuntura atual e a opção de ser uma saída, para o setor priva-do ou para o SUS.

PALESTRANTE

José Cechin

Fenasaúde

Perspectivas do setor privado da saúde e os planos populares - Debate 29/09/2016

inicia sua fala abordando as pers-pectivas do setor privado da saú-de, o quadro atual e alguns dados

numéricos. Ao final de sua palestra, informa ele, será abordada a questão do plano, que nasceu como “popular” quando o ministro anunciou pela primeira vez e hoje se chama “acessível”.

O PALESTRANTE

Cechin explica em seguida que o Fe-nasaúde é composto por um conjunto de 18 grupos empresariais, com 23 operado-ras que respondem por 40% do número de beneficiários das receitas do setor e das despesas com assistência à saúde. E falando de planos médicos, continua, no

mercado da saúde são 48,5 milhões de beneficiários, sendo 80% coletivos e 20% individuais. Nos coletivos, aproximada-mente 2/3 são empresariais e o restante são coletivos por adesão, com taxa de 25%. E ainda existe, diz ele, um conjunto respeitável de planos antigos, contratados

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antes da lei dos planos. E, finalmente, ele cita as 1.310 operadoras, 1.112 com os beneficiários (o restante não tem benefi-ciários) e 839 médico-hospitalares.

Conforme Cechin, caiu muito o nú-mero de operadoras em atividade no Brasil: eram 2.700 e agora são 800. E a maior parte dessas empresas que fecha-ram nunca tiveram beneficiários, explica, salientando que o encolhimento do nú-mero de operadoras não é na maior parte por fusões e aquisições e sim a atuação da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) que regularmente fecha operado-ras. E só não fecha mais, acrescenta, por-que não tem capacidade operacional. Mas ressalta que ainda há muitas operadoras atuando no vermelho e que a rigor não teriam tecnicamente condições de esta-rem operando.

Continuando a falar sobre o Fena-saúde, Cechin explica que dele fazem parte 23 empresas como associadas, de

18 grupos, das 839 que operam com pla-nos hospitalares. E que aí estão também incluídas as odontológicas no meio do caminho. Segundo o palestrante, há con-juntos muito heterogêneos de operado-ras. E ressalta que fala sobre operadoras com solidez financeira, com reservas adequadas, com provisões, que buscam dar uma boa atenção à saúde dos seus clientes.

Fornecendo dados, Cechin diz que na Fenasaúde houve arrecadação de R$ 64,3 bilhões e R$ 62,9 bilhões de despe-sa, sobrando, portanto, R$ 1,4 bilhão. E, olhando o setor como um todo, a receita é de R$ 156,7 bilhões e a despesa R$ 155,7 bilhões. Sem considerar o R$ 1,4 bilhão da Fenasaúde, restam R$ 400 milhões ne-gativos no conjunto das operadoras que não são associadas (Quadro 1)

Cechin explica ainda que, em 2015, foram feitos 1,4 bilhão de procedimentos na saúde suplementar: 200 milhões de

Modalidade Junho 2016 Últimos doze meses terminados no 2T16

Operadoras¹ Beneficiários² Receita(R$ bilhões)³

Despesa total(R$ bilhões)4

Sinistralidade5 (%)

FenaSaúde6 23 28,8 64,3 62,9 82,9

Seguradora especialidade em saúde

8 7,6 34,7 34,1 86,2

Medicina de Grupo 10 12,2 27,9 27,4 81,3

Odontologia de grupo 5 8,9 1,7 1,3 43,2

Mercado6 1.112 70,4 156,7 155,7 82,3

Cooperativa médica 303 18,7 51,9 51,2 83,1

Medicina de grupo 270 21,3 44,6 43,6 79,6

Seguradora especializada em saúde

9 7,7 34,7 34,2 86,1

Autogestão 163 5,1 18,1 19,4 94,5

Filantropia 55 1,2 2,4 3,6 79,0

Odontologia de grupo 203 13,4 2,5 2,1 41,9

Cooperativa odontológica

109 3,2 0,7 0,7 61,9

Fontes: Documento de informações periódicas das operadoras de planos de assistência à saúde – DOPS/ANS – Extraído em 13/9/16. Sistema de informações de beneficiários SIB/ANS – Extraído em 12/9/16.

Notas: ¹Quantidade de operadoras com registro ativo e com beneficiários. ²Quantidade em milhões. ³Considera as operadoras que divulgaram o resultado de receita de conta prestação, inclusive Adminis-tradoras de Benefício. 4Considera as operadoras que divulgaram os resultados de despesas assistencial, administrativa, com comercialização e impostos, inclusive Administradoras de Benefício. 5Razão entre despesa assistencial e receita de contraprestações. 6Considera 1.112 operadora em atividade e com beneficiários em Jun/16.

Quadro 1 – Estrutura do setor de saúde suplementar

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consultas, 700 milhões de exames e 8 mi-lhões de internações. E ressalta que não gosta de fazer comparação entre o Siste-ma Único de Saúde (SUS) e o de saúde suplementar porque são mundos diferen-tes. Entretanto, acha necessário salientar que a produção assistencial de 2015 na saúde suplementar foi de 8 milhões de in-ternações, o que dá uma taxa percentual de 15,9%. Já no SUS, diz ele, a taxa é de 7,5%, ou seja, metade. E pergunta: será que a população que depende do SUS tem morbidade tão menor? E responde que, para ele, essa diferença mostra a enorme desigualdade que há na sociedade brasi-leira. E cita ainda que, nas internações cirúrgicas, se está falando de uma taxa de 6,5% na saúde suplementar e 4,6% no SUS. Das cirurgias, de 6% para 2,9%; e, nas cirurgias bariátricas, de 12,9% para 0,7% no SUS (Quadro 2).

Nesses dados, esclarece o palestrante, não estão incluídas as ressonâncias mag-néticas e as tomografias computadoriza-das, em que o Brasil, e ele admite dizer isso com pesar, é campeão mundial na taxa de realização. Ou seja, deve, portan-to, haver nesse processo um conjunto de desperdício enorme. E salienta que não se trata só de desperdício financeiro. Ele comenta que não é médico, mas lê arti-

Quadro 2 – Produção assistencial em 2015

gos médicos. E vê que há prejuízo para a saúde das pessoas, que se submetem desnecessariamente a uma tomografia, uma radiação igual à de Fukushima ou de Chernobyl. Para quê?, pergunta. “E as pessoas têm a ilusão de que isso é bom.”

Adesão aos planosEm seguida, Cechin explica que a

maior taxa de cobertura por faixas etárias no Brasil está entre as mulheres octoge-nárias. Em seguida, vêm as mulheres com idade entre 30 e 40 anos, normalmente associada à idade mais ativa. Além disso, cita que entre os jovens a taxa de cobertu-ra é menor porque têm relativamente bai-xo risco. Portanto, diz ele, há uma anti--seletividade na adesão a planos de saúde que é muito forte nos planos individuais e nos coletivos por adesão. Nos empresa-riais muito menos porque, obviamente, o plano empresarial é feito para todos.

Continuando, o palestrante ressal-ta que gosta sempre de falar de custos, porque é um ponto que motiva essa pro-posta de planos populares (Quadro 3). E salienta que o cenário econômico e finan-ceiro do Brasil é um quadro que deve nos impressionar, citando que o aumento da despesa per capita de toda a saúde suple-

Procedimentos Saúde Suplementar SUS¹

Qtd (1.000) Taxa Qtd (1.000) Taxa

Internações (%) 7.924 15,9 11.637 7,5

Clínica (%) 3.221 6,5 7.155 4,6

Cirúrgica (%) 3.333 6,7 4.482 2,9

Cirurgia bariátrica² (10.000) 48 12,9 7 0,7

Laqueadura tubária³ (10.000) 11 7,5 34 9,7

Densitometria óssea (1.000) 2.151 43,1 541 3,5

Holter de 24 horas (1.000) 1.137 22,8 214 1,4

Mamografia4 (%) 5.143 40,3 4.505 15,4

Fontes: Sistema de Informações Hospitalares do SUS (SIH/SUS). Sistema de Informações Ambulatoriais (SAI/SUS). Extraído em 27/9/16. Mapa Assistencial ANS – 2016. Projeção da População do Brasil por sexo e idade simples: 2000-2060 – DataSUS. Extraído em 27/9/16. Sistema de Informação de Beneficiários – SIB/ANS. Extraído em 27/9/16.

Notas: ¹Considerada a população dependente do SUS. ²faixa etária de 16 até 69 anos, conforme regra de liberação do SUS. ³Mulheres na faixa etária de 25 a 60 anos, conforme a regra de liberação do SUS. 4Mulheres na faixa etária + 35 anos, conforme a regra do SUS.

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mentar é mais que o dobro do IPCA. E, se olharmos apenas planos individuais, a despesa cresceu muito (Quadro 4).

Falando sobre reajuste de planos, Cechin diz que o que move várias ins-tituições a proporem controle desses re-ajustes por meio de projetos de lei é a comparação entre reajuste da ANS com inflação e IPCA. Mas ele ressalta que é preciso considerar os propulsores das despesas e ver se algo pode ser feito. Me-didas que possam conter essa escalada das despesas. E salienta que se trata de algo que não acontece só no Brasil, mas no mundo todo, citando, por exemplo, os EUA, onde, de 1960 até 2015, a inflação acumulada foi de 700%. Mas a variação da despesa médico-hospitalar, nesse mes-mo período, atingiu 7.000%. Ou seja, diz Cechin, uma taxa anual que é pelo menos o dobro, de aumento do custo da saúde, comparada com a inflação. Nesse período houve três anos em que a inflação coin-cidiu com o aumento das despesas, infor-ma o palestrante.

E, diante desse quadro de crescimento de despesas, explica ele, as operadoras fa-zem um esforço grande para diminuir as despesas e voltar frações cada vez maio-

res para a atenção aos beneficiários. E estamos falando de grandes contratantes, grandes empregadores, ressalta, citan-do um estudo feito por uma consultoria de benefícios, cujos resultados mostram que, em 2015, 12% da folha de pagamen-to das empresas é com o benefício saúde.

Custo de internaçõesAlém dos já citados, diz Cechin, ou-

tro fator que ele chama de propulsor dos custos são as internações. E, dentre elas, as maiores variações ocorreram em ma-teriais e medicamentos. E ele acrescenta que são variações enormes de preços en-tre regiões do Brasil e até mesmo no ex-terior, o que indica poder de monopólio na distribuição. E mais: há pagamentos de comissões; indicações cirúrgicas ques-tionáveis; judicialização; substituição de materiais econômicos por mais dispen-diosos, sem efeitos perceptíveis nos des-fechos clínicos; e formas de pagamento que induzem quantidade em vez de re-sultado.

Um item que é muito importante, diz Cechin, foi apresentado em um estu-do americano (Quadro 5), que mostra o

Mercado Bilhões R$ (%)

Receita 156,7 100,0

Despesa Total 155,7 99,3

Despesa Assistencial 129,0 82,3

Despesa Administrativa 18,6 11,9

Despesa com Comercialização 5,2 3,3

Impostos 2,8 1,8

Resultado Operacional 1,0 0,7

Despesa Assistencial

Despesa Administrativa

Despesa com Comercialização

Impostos

Resultado Operacional

156,7 129,0 18,6 5,2 2,8 1,0

Receita Despesa Assistencial

Despesa Administrativa

Impostos Resultado Operacional

Despesa com Comercialização

Quadro 3 – Resultado operacional do mercado nos últimos 12 meses (2015/2016)

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desperdício na saúde: 20% a 49%. Consi-derando o índice intermediário, 35% de todo o gasto seria desperdiçado. “Esta-mos falando de quase US$ 3 trilhões e, considerando 35%, é quase US$ 1 bilhão de desperdício, causando mal a muitas pessoas. ”

De maneira geral, continua Cechin, a avaliação dos consumidores, das pessoas que têm planos de saúde, é boa. E cita que, em pesquisas feitas pela ANS com a pergunta para seus beneficiários: “Você indicaria o seu plano para seu amigo?”, a resposta é positiva.

Falando do plano denominado acessí-vel, Cechin aponta que houve falhas gra-ves na comunicação. Por exemplo, cita ele, falar que plano popular alivia o SUS. “Plano popular não alivia nem desalivia o SUS”, diz ele. Ou seja, plano popular não interfere no SUS. E explica porque: a dotação do SUS é orçamentária, e dispu-tada entre os ministros que habitam a Es-planada dos Ministério em Brasília. E os recursos para a saúde dependem da força

política do ministro da área, da sua gana de pleitear recursos, que serão sempre ilimitados. Para Cechin, o cenário é pes-simista, mas, tenha ou não tenha plano, salienta, não muda o quanto o governo poderá colocar nos planos de saúde. Por-tanto, não muda quantas pessoas o SUS poderá atender, acrescenta.

E, citando notícias de jornais, ele diz ver que há um grande conjunto de pes-soas não visíveis, que não estão ali, que estão aguardando procedimentos médi-cos por longo tempo. Alguns têm plano de saúde, diz ele, ou seja, têm essa vál-vula de escape com padrões até bastante rígidos de prazos de atendimento estabe-lecidos em portaria com penalidades se-veras para quem descumpre.

Para o palestrante, quando o minis-tro pensa em plano de saúde, ele tem que olhar para esse conjunto de pessoas. E não para aquele 1,6 milhão que perderam seus planos, maioria deles planos empre-sariais. O objetivo é dar uma alternativa a esse conjunto, salienta. Segundo ele, o

Quadro 4 – Variação da despesa assistencial per capita, reajuste ANS, IPCA1 e VCMH (IESS)2

Ano Reajuste ANS IPCA¹Despesa

assistencial percapita²

VCMH³

2007 5,76 3,00 17,01 8,3

2008 5,48 5,04 9,60 10,25

2009 6,76 5,53 8,89 12,50

2010 6,73 5,26 4,95 8,05

2011 7,69 6,51 10,89 12,35

2012 7,93 5,10 13,03 15,75

2013 9,04 6,49 10,16 15,35

2014 9,65 6,28 13,94 16,00

2015 13,55 8,17 12,30 18,80

2016 13,57 9,28 16,92 18,56

(%)Acumulado2007-2016

115,39 74,74 158,74 228,46

Fontes: Sistema de informações de beneficiários - SIB/ANS/MS - Tabnet - Extraído em 6/6/16. IBGE - Sis-tema Nacional de Índices de Preços ao Consumidor IPCA - Extraído em 6/6/16. ANS - Índice de reajuste anual autorizado para planos de saúde individuais ou familiares contratados a partir de janeiro de 1999. Extraído em 6/6/16.

1. Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo2. índice de Variação de Custos Médico-Hospitalares do Instituto de Estudos de Saúde Suplementar

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Eliminating Waste in US Health Care, Donald M. Berwick e Andrew D. Hackbarth, The Journal of the American Medical Association. V.306, N. 14, 2012.Fonte: Apresentação 21º Congresso Abramge e 12º Congresso Sinog – Pedro

Quadro 5 – Desperdício nos Estado Unidos da América em 2011

Desperdício nos EUA (2011)U$ 910 bilhões

Ou 34% do gasto total

Falta de coordenação do

atendimento

3,8%

14,1% 14,4%

19,4%21,1%

27,2%

Sobrepreço Tratamento excessivo

Falha no Atendimento

Fraudes e Abusos

Burocracia Administrativa

ministro esteve certo quando disse: “Se essas pessoas puderem comprar planos, esse dinheiro que vem não vai subtrair ao SUS, não vai somar ao SUS”.

E o ministro, diz Cechin, falou tam-bém em reduzir cobertura. Mas, para ele, isso não é possível, porque a sociedade rejeita. E cita que, por exemplo, não dá para imaginar a cobertura de fígado e ex-cluir a de coração. Ninguém tem condi-ções de fazer esse tipo de escolha. Então, acrescenta, a cobertura tem de ser CID 10, para todas as doenças.

Para o palestrante, é preciso olhar para a frente e ver que possibilidades tem o governo de alocar mais dinheiro para o SUS, de elevar esse percentual de 3,9% de gasto público para 6%, 7%, que é o que a comunidade europeia coloca em área de saúde. Mas ele pergunta: Que possi-bilidades existem? E sente dizer que são possibilidades nulas. E ressalta não estar dizendo isso por causa da regra de ajuste fiscal, mas pelas circunstâncias.

Plano acessívelConforme Cechin, um plano aces-

sível não existe ainda. Ele explica que existe um grupo de trabalho encarrega-do de montá-lo, de propor. Mas salienta que pode esse grupo de trabalho chegar à conclusão de que um plano acessível é inviável. Entretanto, ressalta, é preciso desenhá-lo, ver se é atrativo para as pes-soas e se é economicamente viável para as operadoras.

O plano acessível é um produto am-bulatorial e hospitalar, diz Cechin, con-tando que, em outras épocas, chegou a pensar em um modelo que fosse apenas ambulatorial, sem alta complexidade. Mas depois de muita análise, ele e seu grupo concluíram que as pessoas prefe-ririam buscar as clínicas populares em vez de pagar R$ 70, R$ 80 por um plano desses para ter apenas consultas, hemo-gramas e exames relativamente simples. Ou seja, não há viabilidade comercial, afirma.

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Então, pergunta Cechin, como se pode ter um plano popular que cubra todas as doenças? Em resposta, ele diz que é pre-ciso olhar para o desperdício existente, e aqui já citado. Aliás, explica, era como o Bill Clinton1 pensava em financiar a re-forma quando encarregou a esposa dele para propor um plano lá na primeira cam-panha. E foi como o Barack Obama1 dis-se que iria financiar o plano Obama Care quando o lançou.

Os números, de fato, são grandes, gigantescos, salien-ta. Então, diz ele, que tal atuar nos custos e termos uma rede hierarquizada e as pessoas terem o seu primeiro atendimento feito por médico clínico geral, que a operadora não necessariamente vincule -- “você tem que ser ligado a fulano de tal”. Não, diz ele. O que deve existir é um conjun-to de clínicos gerais; vá a eles. Até porque, segundo o que dizem, em torno de 80%, 90% dos problemas de saúde são resolvidos com o clínico geral. Portanto, usa-se uma infraestrutura que não é tão dispendiosa quanto o pronto-socorro ou o hospital, salienta Cechin.

Ele explica ainda que existem tam-bém os fatores moderadores: franquia e coparticipação, sistemas que ainda não foram alvo de algum estudo exaustivo, completo. Ele conta que pediu a seus as-sessores levantarem um estudo desse tipo e o grupo achou dezenas de artigos, des-de 1980, e nenhum deles afirmou que o estado de saúde de quem tem plano com coparticipação e franquia é pior compa-rado com planos de quem não tem. Esses sistemas eliminam o desperdício, salienta Cechin. Dispensam a pessoa de fazer um exame que a prejudica e prejudica o bol-so. “Eu acho que um plano desses tem que ter protocolos clínicos muito claros, o que pode e o que não pode”, ressalta.

Para o palestrante, não há como ter

um plano em que os custos de alguma forma não são repassados. E diz afirmar isso com muita precaução, porque, ten-do sido governo por muito tempo, sabe que é uma medida ruim repassar custos porque põe o empresário numa posição confortável. Então, diz Cechin, tem que ter repasse de custos com algum ente no meio do caminho que mostre a necessi-dade de ter produtividade.

É preciso ter segunda opinião obri-gatória para casos complexos, sugere. E acredita ser importante pensar também nos prazos de atendimento, ressaltando que também aqui fala com precaução. Para ele, os prazos não podem ser unifor-mes no Brasil todo, pois há regiões que ficam longe, às vezes 500 km, do médi-co mais próximo. Para Cechin, é muito pesado exigir nessas regiões os mesmos prazos que se exigem em São Paulo, ou no Rio de Janeiro, que têm estrutura.

Finalizando sua fala, Cechin diz ser de opinião de que há motivos sim para pensar e tentar desenhar um produto acessível porque há milhões de pessoas que desejam, cuja renda não alcança o plano de saúde de hoje. E é preciso saber se há jeito de tornar os planos mais ba-ratos, eliminando desperdício, conside-rando os fatores que ele abordou em sua palestra.

1. Presidente dos Estados Unidos da América de 1993 a 20012. Presidente dos Estados Unidos da América de 2009 a 2017

Cechin diz ser de opinião de que há motivos sim para pensar e tentar desenhar um produto acessível porque há milhões de pessoas que desejam, cuja renda não alcança o plano de saúde de hoje.

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Scheffer, o tema de sua pales-tra, planos populares, poderia ser colocado dentro de um

grande quebra-cabeça e talvez as peças que faltem nesse jogo sejam traduzidas numa pergunta: Para onde caminha o sistema de saúde brasileiro?

SEGUNDO MÁRIODEBATEDOR

Mário Scheffer

Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo

Perspectivas do setor privado da saúde e os planos populares - Debate 29/09/2016

Há algum tempo, diz ele, o cenário do setor tem sido de subfinanciamento crô-nico do Sistema Único de Saúde (SUS), situação agravada no início de 2015 com a emenda constitucional 861, que alterou para pior a base de cálculo do orçamento da União para a saúde. Ele citou também a PEC 2412 que pode adicionar uma dra-maticidade a essa crise sanitária e a esse possível desmonte do SUS. E ressalta es-tar se referindo não só ao congelamento dos gastos sociais, inclusive com saúde, mas à proposta de desvinculação do or-çamento da saúde. Haverá redução do gasto público, explica, do valor per ca-pita com saúde e uma certa desobrigação dos governos de aportarem recursos para a saúde.

Mercado sem leiAssim, forma-se um cenário em que

os planos populares surgem. Aliás, lem-bra Scheffer, esses sistemas já foram pra-ticados ou já foram propostos outras ve-zes. Antes de 1998, conta, era totalmente um mercado sem lei, sem regulação, e o que imperava eram produtos populares com uma segmentação assistencial, limi-tes de internação, inclusive em Unida-

des de Terapia Intensiva (UTI), exclusão de doenças crônicas, infecciosas, câncer AIDS, transplantes. Segundo ele, era mui-to comum os módulos opcionais em que o indivíduo ou família comprava o mó-dulo de oncologia, de diálise, de cardio-logia. A pessoa entrava e tinha uma inter-corrência no hospital, uma hemodiálise, por exemplo, e isso não era coberto. “Es-tourava no prestador muitas vezes a arcar com esses custos”, explica.

O efeito adverso disso, diz ele, era uma intensa judicialização, denúncias nos órgãos de defesa do consumidor e na mídia, e significava um reembolso direto das famílias, uma desassistência. Sche-ffer conta que essa regulação chegou em 98 com muitas lacunas, com muitos problemas e até hoje paga-se um pre-ço muito caro por essa legislação ruim, “mas felizmente ela colocou a questão da cobertura mínima obrigatória”. E, no mesmo ano, continua o palestrante -- na época ainda não tinha a ANS --, o Con-selho de Saúde Suplementar (Consu) fez o mesmo rol de procedimentos, que depois passou a ser reeditado e atualiza-do pela ANS, estipulando as coberturas mínimas.

Imediatamente depois da lei, con-

1. EMENDA CONSTITUCIONAL Nº 86, DE 17 DE MARÇO DE 2015 - Altera os arts. 165, 166 e 198 da Constituição Federal, para tornar obrigatória a execução da programação orçamentária que especifica.2. Proposta de Emenda Constitucional 241, a PEC do Teto de Gastos Públicos, que pretende regular pelos próximos 20 anos a forma como o Estado brasileiro aplica seus recursos.

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tinua o palestrante, as operadoras atu-aram para tentar desidratar ou mesmo derrubar alguns itens, sobretudo essa da cobertura mais ampliada. E a mate-rialização disso primeiro foi em 2001, no governo Fernando Henrique, com o ministro José Serra, que editou uma me-dida provisória instituindo, planos com as segmentações, com subsegmentações, com exigências mínimas. Eram os tais planos de rede, explica, planos de aces-so, com uma cobertura assistencial con-dicionada à disponibilidade ali da área de abrangência. Mas felizmente, segun-do ele, houve uma grande gritaria e essa medida provisória foi abortada, “mas foi uma tentativa muito parecida com essa ideia desse momento de instituir planos segmentados”.

Passando para o ano de 2003, Scheffer expli-ca que houve uma Co-missão Parlamentar de Inquérito (CPI) dos pla-nos de saúde, mas que não teve prosseguimen-to. Entretanto, explica, o motivo da instalação da comissão foi um relató-rio do Instituto Brasilei-ro de Defesa do Consu-midor (Idec), que tinha como uma das principais questões a subsegmenta-ção ou as exclusões de coberturas ainda pra-ticadas mesmo com a existência da lei.

E em seguida passa para 2013, quan-do, com grande visibilidade, foi divulga-do – “e não sabemos se foi o governo que encomendou ou se foram as operadoras” -- um pacote de estímulos a esse setor. A ex-presidente Dilma Rousseff, explica o palestrante, recebeu essa proposta e discutiu, mas era diferente da proposta atual; sem mexer nas regras de cobertura, mas com subsídio público, com redução de imposto, de tributo, financiamento público para ampliação da rede creden-ciada. Entretanto, ressalta, não “deu em nada”, mas serviu para assinalar essa per-manente intenção do mercado de oferecer

produtos de menor preço ou de cobertu-ra reduzida, ou nesse caso de estímulos e subsídios públicos.

Dados da Pesquisa Nacional de Saúde do Instituto Brasileiro de Geografia e Es-tatística (IBGE) de 2013 ficaram públicos em 2015 e mostram que 60% dos planos de saúde custavam menos do que R$ 200 per capita em 2013. Só 30% custavam mais de R$ 300. E ressalta que, mesmo considerando que esse dado foi coletado pelo IBGE em 2013, se houvesse um rea-juste nos anos subsequentes -- lembran-do que os reajustes são aqueles autoriza-dos pela ANS --, sempre acima do Índice Nacional de Preços ao Consumidor Am-plo (IPCA), mesmo assim não haveria mudanças significativas entre essas faixas de preços.

Scheffer cita ainda outro dado de uma pesquisa encomendada pela Associação da Indústria Farmacêutica de Pesquisa (Interfarma) ao Datafolha, divulgada em 2014, aponta que o valor médio de um plano de saúde era de R$ 200.

Plano barato já existe, continua Sche-ffer. É o plano ambulatorial, o plano só de consulta e exame. E existe desde a regulamentação, mas pouquíssimas pes-soas querem esses planos, ressalta, ci-tando que só 4% dos mais de 50 milhões de usuários adquiriram esse plano. E os empregadores não querem oferecer só o ambulatorial para os seus empregados porque é um benefício reduzido.

Para fugir da regulação mais rigorosa imposta aos planos individuais, houve praticamente uma extinção da oferta de planos individuais no mercado para popularizar um pouco o produto coletivo e torná-lo mais atrativo a preços mais baratos, diz Scheffer,

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O falso coletivoEle cita também produtos mais bara-

tos que envolvem apenas consulta, dan-do como exemplos o Dr. Consulta, Dr. Agora e o Dr. Já, salientando que se trata de um produto bastante disseminado no mercado. Que, aliás, diz ele, é bastante criativo. E explica que, para fugir da re-gulação mais rigorosa imposta aos planos individuais, houve praticamente uma ex-tinção da oferta de planos individuais no mercado para popularizar um pouco o produto coletivo e torná-lo mais atrativo a preços mais baratos, diz Scheffer, expli-cando que basta apresentar um CNPJ e adquirir um plano a partir de duas, três pessoas. São falsos coletivos, diz ele, res-saltando que tais produtos têm causado muitos problemas para quem os adqui-re. Alguns ele define como verdadeiras “arapucas”, porque na primeira sinistra-lidade, no primeiro uso desse plano por algumas condições de saúde, a família, o indivíduo, ou o pequeno coletivo é sur-preendido com reajustes exorbitantes.

Nessa mesma linha dos falsos coleti-vos, Scheffer cita planos bem mais bara-tos que os individuais que são planos de adesão. Não aquela da lei, explica, mas uma adesão dissimulada em que o pró-prio corretor oferece a vinculação a al-guma entidade. E cita mais: planos que, possivelmente, podem ser mais baratos devido ao controle de acesso aos servi-ços. São muito pouco difundidos, diz ele, embora previstos na lei; são os planos de coparticipação e de franquia.

E existem ainda, continua o pales-trante, os planos baratos promocionais.

Estão de acordo com a lei, mas sem su-ficiência de rede. Ele explica que é uma rede diminuta, não só em qualidade, mas em quantidade de hospitais, médicos, la-boratórios. Planos em que há uma longa espera, que geram lotação de pronto-a-tendimento e uma intensa judicialização decorrente.

E falando em judicialização, Scheffer informa que ocorreu uma explosão de ações judiciais contra planos. Conside-rando apenas ações de segunda instân-cia do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, no período de 2010 a 2015, cresceu mais de cinco vezes. E ressalta ser muito mais do que o crescimento da clientela de planos de saúde do Estado de São Paulo.

Segundo ele, o que tem chegado aos tribunais são exclusões de coberturas de toda ordem. Não é apenas aquilo que não está no rol, explica. São restrições e nega-tivas de atendimento a que os juízes têm dado ganho de causa para os usuários em mais de 90% dessas ações, diz ele, citan-

do ainda também as questões de reajustes de mensalidade por faixa etária, por sinistra-lidade.

O palestrante manifesta sua preocupação com o que chama de “quebra das Uni-meds”, que, segundo ele, es-tão com uma dívida de R$ 1,2 bilhão com a União. E a judicialização, diz ele, é citada pela Unimed Brasil como um dos motivos da situação, além do modelo de negócio de co-

operativa, da questão da inflação do setor e da incorporação de tecnologias. Ele res-salta que talvez os planos populares sejam uma forma de capitalizar um setor com problemas de gestão dessa magnitude.

Planos populares lá foraSaindo um pouco do cenário nacio-

nal, Scheffer diz que a proposta de pla-nos populares tem um alinhamento com prescrições internacionais recentes, com documentos do Banco Mundial e da Or-ganização Mundial da Saúde que trazem

Ele ressalta que talvez os planos populares sejam uma forma de capitalizar um setor com problemas de gestão dessa magnitude.

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prescrições diferentes para os países. Se forem ricos e desenvolvidos, explica, po-dem sim ter um sistema universal, um sistema baseado na oferta pública via serviço nacional ou via um seguro so-cial. Mas em países como o Brasil, con-tinua Scheffer, de baixa ou média renda, a prescrição é cobertura universal. “Um sistema de suporte à demanda, incluindo incentivo à aquisição de planos privados no lugar do sistema uni-versal baseado na oferta pública”, esclarece.

No caso do Brasil, salienta o palestrante, a tradução seria, no lugar do SUS constitucional -- na concepção cunha-da de seguridade social, de direito à saúde--, um sistema universalizado garantido por impostos e contribuições sociais, em que as pessoas pudessem acessá-lo de acordo com a sua necessidade de saúde e não com o tamanho de seu bolso, com a sua ca-pacidade de pagamento. Segundo Scheffer, seria um “SUS racio-nado”, a um SUS menor, um SUS com-plementar em relação ao gasto com saúde dos indivíduos, das famílias e de empre-sas que querem aumentar com essa pro-posta de planos populares.

Conforme Scheffer, a posição dos pla-nos de saúde nos países tem sido bem definido pelas nações e cabe ao decidir junto com o debate muito esclarecido com a sociedade qual é o tamanho, qual é o lugar do setor suplementar no siste-ma de saúde nacional. E diz ainda que, com base na literatura, com base nas leis nacionais, as tipologias que existem são planos de saúde que podem ter um papel principal ou primário, como nos Estados Unidos, como principal forma de cober-tura. “Ele pode ser substitutivo; as pes-soas escolhem se querem o público ou o privado”, explica.

Scheffer continua sua explicação, ci-tando que há países que decidem que os planos terão uma função duplicativa. E,

nesse caso, salienta, cobrem todo mun-do que tem direito ao sistema público, que paga imposto. Mas uma parte é as-sistida pelo privado paralelo, só que em nichos de mercado voltado para pessoas com altíssimo poder aquisitivo. Ou ele é suplementar, diz ele, salientando que se trata de um suplementar que cobre o su-pérfluo, isto é, o que não é coberto pelo sistema público: a hotelaria, a estética, o

dentista. Ou então, continua Scheffer, um plano complementar, em que o Estado paga parte da assistência e a outra parte de determinadas situações são respon-sabilidade dos indivíduos. E cita que é o caso da França, onde os planos de saúde são adquiridos para cobrir parte da assis-tência farmacêutica.

Modelo no Brasil O mercado atual nacional, explica

Scheffer, mesmo se for acrescido de pla-nos populares, não tem conexão com ne-nhuma tipologia e com nenhuma expe-riência internacional. E explica porque: além de um per capita baixo em saúde, os gastos privados são muito maiores que os gastos públicos. Ou seja, é um modelo totalmente incompatível com propostas de sistemas universais como o inglês, o canadense, o espanhol, nos quais o SUS se espelhou, salienta.

Scheffer prossegue sua análise do ce-

Ele cita um estudo recente que saiu sobre a União Europeia com 53 países. Em apenas 11 deles, mostrou o estudo, os planos de saúde são responsáveis por mais de 5% das despesas. E no caso do Brasil, salienta Scheffer, 33% dos gastos são privados, inclusive com planos de saúde.

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nário brasileiro, informando que o país tem 8% do PIB com gastos em saúde, mas salienta que só 3,5% são gastos do go-verno; e 47% dos gastos são públicos. “A média na União Europeia é de 73% dos gastos públicos”, informa.

Conforme o palestrante, uma métrica bastante utilizada para identificar a po-sição e o lugar dos planos de saúde nos sistemas é o percentual de gastos com planos de saúde nas despesas totais com saúde. Ele cita um estudo recente que saiu sobre a União Europeia com 53 paí-ses. Em apenas 11 deles, mostrou o estu-do, os planos de saúde são responsáveis por mais de 5% das despesas. E no caso do Brasil, salienta Scheffer, 33% dos gas-tos são privados, inclusive com planos de saúde.

E segue, perguntando à plateia: o que o modelo atual de planos de saúde no Brasil não entrega? Sua resposta: não entrega integralidade, porque não oferta atenção primária, não oferta prevenção nem promoção. Não-equidade, continua Scheffer, o que é muito caro para o se-tor da saúde coletiva, porque fragmenta a assistência pela capacidade de pagar e não pela necessidade de saúde das pes-soas, diz ele. Acrescenta ainda que não cobre os mais vulneráveis que são os por-tadores de doenças crônicas, deficiências, idosos, pessoas de baixa renda, popula-ção rural, minorias e não contribui com a saúde da população, salienta Scheffer. E comenta: “Se é um modelo há tanto tem-po e cobrindo ¼ da população, devería-

mos esperar melhores indicadores”. E continua o palestrante, salientando

que o Brasil, na saúde, tem péssimos in-dicadores e alta prevalência na tripla car-ga de doenças, com epidemias repetidas, com prevalência de transtornos mentais, obesidade, diabetes, hipertensão, uso de álcool e tabaco, vários tipos de câncer, causas externas, saúde materna e infantil, abortos, nascimentos prematuros, cesa-rianas. Ele enfatiza que não há nenhuma contribuição evidente desse setor para melhoria dos indicadores brasileiros de saúde. E isto, ressalta, sem contar, obvia-mente, aquilo que só o SUS faz, por obri-gação, por determinação legal, assistên-cia farmacêutica, vacinação, vigilância, urgência, alta complexidade, etc.

Conforme Scheffer, o setor suplemen-tar brasileiro devia aprender um pouco com a reforma Obama e talvez fazer uma reforma baseada, quem sabe, em alguns princípios que lá têm tido resultados. E repe-te: de novo, lá é um país que optou por ter plano de saúde como a principal forma de organização do seu sistema. Ele explica que há um con-trole do uso de prêmios: de 80% a 85% da receita tem que ser investida em assistência. Segundo ele, é uma mudan-ça da forma de remuneração,

não mais por procedimento, mas por tratamento. Trata-se de uma tributação progressiva, esclarece Scheffer, explican-do que os planos, chamados nos EUA de Cadillacs, são para altíssimos executivos; e são tão sobretaxados que, em parte, diz Scheffer que em sua própria conclusão, autofinanciam planos supostamente mais baratos. “Então, o próprio sistema permi-tiria esse financiamento”, ressalta.

Subfinanciamento do SUSScheffer informa que pesquisou qua-

tro empresas de planos de saúde de Nova York. E o mais barato que achou foi um de US$ 353. Segundo ele, plano de saúde tem que custar caro, assistência em saúde tem que ser cara. E diz que não é por aca-

Conforme Scheffer, o setor suplementar brasileiro devia aprender um pouco com a reforma Obama e talvez fazer uma reforma baseada, quem sabe, em alguns princípios que lá têm tido resultados.

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so que o subfinanciamento do SUS está na raiz dos maiores problemas do sistema de saúde. Para ele, não é possível que um plano de R$ 100, R$ 150 dê alguma ga-rantia para a população.

Conforme o palestrante, existe uma agenda oficial, a regu-latória da ANS, que discute a qualidade, a sustentabilidade do setor, mas ele salienta que existe uma agenda oculta que precisa ser explicitada. Planos po-pulares, segundo ele, é um modelo que veio à tona, mas há outras agendas de segmenta-ção, de desregulamen-tação do setor, de libe-ração do reajuste dos planos individuais, de anistia e redução de multas, o não paga-mento dos ressarcimentos ao SUS. Schef-fer esclarece que o cenário envolve o tem-po todo uma disputa do fundo público em busca de isenções, subsídios diretos e indiretos, de créditos públicos, a questão de financiamento de campanhas. E a por-ta giratória da ANS, que é a ocupação de cargos estratégicos da agência por execu-tivos do setor que depois retomam a suas atividades no mercado.

Para concluir sua fala, Scheffer diz que depois de 28 anos de SUS, o Brasil está numa grande encruzilhada. E expli-ca: primeiro, os planos de saúde sempre ocuparam e sempre ocuparão um espaço muito relevante nos sistemas de saúde. Mas ele ressalta que, desde 98 por exem-plo, o dado do IBGE mostra que esses planos, que ocupavam ¼ da população, passaram, em 98, de 24,5% para 27,9% em 2013.

E ele faz a pergunta: será que o des-fecho tem que ser necessariamente e na-turalmente, encolher, desmontar o SUS, e ampliar esse mercado suplementar por meio de planos populares de forma tão artificial?

Para ele, o Brasil não alcançou um sistema único de qualidade, universal, um sistema de todo mundo, de todos os brasileiros, para pobres e ricos como se vislumbra na Constituição, a exemplo dos sistemas universais como o cana-dense, o inglês, o espanhol. Mas ele acha que não será viável para o Brasil, e se diz convicto disso, um sistema de saúde predominantemente privado ou como uma ampliação do setor privado muito maior do que deveria porque essa esco-lha gerou sistemas caros, excludentes como o americano ou o que se tornou a tragédia na Colômbia.

Ele termina dizendo esperar que o tema da palestra saia dos espaços meno-res para uma discussão em praça públi-ca, sob o olhar atento da sociedade “por-que ele diz respeito à saúde e às nossas vidas”.

O Brasil não alcançou um sistema único de qualidade, universal, um sistema de todo mundo, de todos os brasileiros, para pobres e ricos como se vislumbra na Constituição, a exemplo dos sistemas universais como o canadense, o inglês, o espanhol.

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o tema de sua palestra, Martha Oliveira diz que quer fazer um anúncio. E

informa que nesse dia a Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) liberou o De-talhamento dos Dados do TISS, o D-TISS e as bases de dados do TISS. E diz ainda que espera contar com os presentes para olhar esses dados e ver como está sendo a produ-ção da saúde suplementar.

ANTES DE INICIAR

Cure to Care: Modelos inovadores de atenção ao idoso

MODERADOR:

Martha Oliveira

Agência Nacional de Saúde Suplementar

Debate 10/11/2016

23º SEMESTRE DE DEBATES FGV SAÚDE

Em seguida, Martha inicia sua pales-tra falando sobre o envelhecimento no Brasil, que define como “ultrarrápido”. E esclarece: não só envelhecimento a partir de 65 anos, mas o dos mais velhos, a par-tir de 80 anos. A velocidade com que isso está acontecendo no Brasil é muito maior do que aconteceu nos países hoje já en-velhecidos, diz ela, citando que, em 2030 (Gráfico 1), o gráfico inverte; perde-se totalmente o bônus populacional. “E não nos preparamos para isso”, enfatiza.

Martha diz que uma discussão que tem sido feita é que não são os idosos que têm que se preparar para a realidade do Brasil, mas a sociedade é que tem que se preparar para receber esses idosos, para que eles te-nham qualidade de vida, para que tenham garantia de viver dignamente. Só que, se-gundo ela, foi perdida essa oportunidade e até 2030, é muito pouco tempo. Martha

diz ainda que, além da saúde, que é o que será tratado na palestra, há vários outros aspectos a considerar.

Citando o Gráfico 2, Martha explica que se trata do registro do gasto per ca-pita em saúde e expectativa de vida. E o que acha interessante nesse gráfico é po-der perceber que não basta ter o maior gasto per capita no mundo, se não houver gestão, uma forma de cuidar das pessoas. Para ela, não adianta ter um modelo tão ineficiente, como o dos Estados Unidos, porque, se pensarmos que o modelo bra-sileiro replica o americano, estamos re-plicando a ineficiência só que com gasto menor. Então, ressalta, é possível aumen-tar o gasto obviamente, mas também é necessário melhorar o investimento. E mais: olhando dentro da linha do mesmo gasto, pode-se melhorar também os re-sultados em saúde.

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1,53

0,00 5,00

2016 2050

10,00 15,00 20,00 25,00 30,00

4,19

5,30

6,39

6,87

7,39

7,74

8,42

8,63

9,19

9,20

9,49

9,56

9,69

10,05

10,27

11,04

11,19

11,34

12,25

13,57

13,57

13,57

16,19

16,47

1,67

2,23

3,89

3,79

3,71

4,19

4,23

5,08

4,49

5,41

4,24

3,62

5,06

6,05

5,20

4,44

5,67

5,93

6,67

5,99

6,14

8,34

1,60Turquia

Brasil

Chile

Austrália

Islândia

Noruega

Dinamarca

Suécia

OECD - Total

Bélgica

Canadá

Nova Zelândia

Reino Unido

França

Finlândia

Holanda

Suíça

Alemanha

Itália

Portugal

Espanha

Japão

Estados Unidos

México

Gráfico 1 - Desafios para a saúde suplementar

Fonte: Elaboração própria a partir de dados da OCDE. Disponível em: http://stats.oecd.org/

As transições Para Martha, o Brasil passou por

uma transição epidemiológica, ou seja, a população está adoecendo e morrendo. Conquistou-se o direito de envelhecer, que não é um problema, mas uma solu-ção, uma conquista.

Martha diz ainda que o parque tec-nológico brasileiro é comparável a qual-quer outro no mundo, mas que também houve a transição nutricional, e hoje os brasileiros são mais obesos do que defi-cientes nutricionalmente. Mas ela enfa-tiza que não houve a transição dos ser-viços de saúde, mas que, mesmo assim, os serviços de saúde funcionam como se ainda tivéssemos diarreia. E detalha: são abertos, com uma porta de emergência gigante, onde o paciente entra, faz meia dúzia de exames, sai com uma prescrição e vai embora. Ou seja, sem continuidade; sem antes, sem depois, sem história, sem

memória, sem um contínuo do cuidado. “Continuamos prestando esse serviço como se não tivéssemos feito nada”, diz ela, e aí estarão as consequências que ela irá abordar em sua palestra.

Em seguida, Martha fala sobre a pro-posta para mudança desse quadro que mencionou. E cita a tríade para sustenta-bilidade do setor (Figura 1). E enfatiza que falar de qualidade não é fácil no Brasil. Ela conta que está há dois anos e três meses imbuída dessa missão na ANS, de tentar ter indicadores de qualidade, falar de qua-lidade, ter dados para discutir qualidade, fazer as pessoas pensarem em qualidade.

E salienta que vê dois nichos de pro-blema. Um deles é a dificuldade enorme que se tem para aceitar uma avaliação. A ideia é que é uma intromissão, diz ela. “Nós somos quase deuses excelentes e não precisamos ser avaliados”, afirma, explicando que ainda na escola não se

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Debates FGV Saúde | Volume 17 | jan/dez. 2015-2016110

Gráfico 2 – Correlação da expectativa de vida em países selecionados e gastos per capita em saúde - 2013

Fonte: Elaboração própria a partir de dados da OCDE e do banco mundial para países não-membros da OECD. Disponível em: http://stats.oecd.org/ e http://databank.worldbank.org/data/home/aspx

aprendeu que é preciso avaliação contí-nua, capacitação contínua.

Martha explica que houve na ANS um ano de discussão sobre qualidade. E que após discutir de verdade, “a sério”, mostrando indicadores, a forma de cole-tá-los e o que pode ser feito, chegaram as contribuições para, enfim, ter indica-dores novos.

Continuando, cita o segundo nicho, que é a qualidade ter valor. E ressalta que não se refere a valor financeiro. E ressalta que a qualidade precisa ser vista pelo in-divíduo como um valor, só que, segundo Martha, não é isso que acontece. Então se trata de mudar essa cultura, ou seja, fazer com que a qualidade seja um valor para os cidadãos, para os pacientes, para que isso se torne uma realidade. E informa que a ANS tem vários projetos sobre isso.

Premissas da informação Em seguida, Martha aborda o fator da

informação, tema que, segundo ela, deve ser separado em alguns capítulos. O pri-

meiro, diz, é ter a informação, ter o dado. E ressalta que nem isso se tem de verda-de, com qualidade, com volume. Trata-se de um caminho, diz Martha, que está co-meçando a ser trilhado.

Tendo obtido o dado, continua a pa-lestrante, é o momento de dar transpa-rência ao dado, pois não basta ter o dado; alguém tem que usá-lo. A ação de hoje foi uma “perninha” dessa transparência, diz ela, ou seja: tem-se o dado, que foi organizado, qualificado e tornado trans-parente.

A outra “perninha”, continua Martha, é, a partir desse dado transparente. A par-tir do uso que se faz dele, como isso muda a forma de ação? Porque um dado tem de gerar uma ação, enfatiza, explicando que se assim não for o que se está fazendo é fornecer milhões de informações inúteis. E como transformar esse dado em uma ação? Resposta de Martha: é muito difícil. Para ela, essa necessidade ainda está sen-do criada na área da saúde. E diz que al-gumas áreas da economia fazem isso com uma facilidade enorme. Ou seja, o dado

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Figura 1 - Tríade para sustentabilidade do setor

Fonte: o autor

INFORMAÇÃO MUDANÇA DOS MODELOS

QUALIDADE

SUSTENTABILIDADE E DESENVOLVIMENTO

DO SETOR

Necessidade de mover as engrenagens do sistema!Ex.:

ACREDITAÇÃO, IDSS

QUALISS

Ex.: DADOS INTEGRADOS;D -TISS

Ex.: PROJETO PARTO ADEQUADO; CUIDADO DA SAÚDE DO IDOSO

coletado já é usado em alguma ação no dia seguinte. Mas o setor de saúde ainda está em experiência com essa prática. Ex-perimentando a forma de fazer isso.

Registro eletrônico em saúde é o tema seguinte que Martha aborda. Ela explica que, sem um registro eletrônico em saú-de, não se consegue fazer cuidado de crônicos, sejam eles quais forem; não se consegue, aliás, fazer cuidado de popu-lação nenhuma. E explica: se a cada dia for repetido o exame feito no dia anterior, não existe memória. Segundo Martha, em média, no Brasil hoje, os idosos usam 15 medicações. “Isso no mundo inteiro é um escândalo, mas para nós é normal”, res-salta. Então, continua ela, informação, registro eletrônico em saúde formam um histórico, cuja existência faz toda a dife-rença nos resultados em saúde.

Passando para o tema principal de sua palestra, a mudança de modelo, Martha diz que é preciso mudar o mo-delo assistencial e o de remuneração. O que é hoje utilizado foi, durante 40, 50 anos, moldado por essa forma de atuar, que é em cima de volume e não de resul-tado. Isto é, não importa se algo é bom ou ruim; se terá efeito bom ou ruim; o que importa é o volume. Não há nenhu-

ma relação com o desfecho, com o resul-tado, enfatiza.

E, segundo Martha, esse também é o motivo pelo qual hoje, se tivermos uma doença letal grave, todos morreremos na Unidade de Tratamento Intensivo (UTI) entubados. “Não temos escolha”, diz ela, ressaltando que, mesmo que tenhamos 90 anos, no último dia das nossas vidas, com câncer terminal, estaremos entu-bados, fazendo quimioterapia. Por quê? Pelo mesmo motivo pelo qual temos mui-to mais dermatologistas do que geriatras e clínicos gerais. Só que, se a causa não for tratada, o processo será ficar enxu-gando gelo no efeito.

Na ANS, diz a palestrante, começa-ram a surgir propostas para mostrar que pode ser diferente. E explica que os pro-jetos que irá abordar são só uma forma de provar que é rápido, é possível; e que as ações não são complexas. Pelo contrário, é retornar às ações básicas e ganhar um efeito muito rápido.

Projetos da ANSEm 2005, continua Martha, o Brasil

tinha um índice de 75% de cesariana. Em 2014, 80,2%, e, no geral, 85% de cesaria-na. Ou seja, em dez anos, a opção aumen-

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tou dez pontos percentuais com a agência tentando trabalhar nesse tempo, tentando fazer alguma coisa, sem resultado. Mas com o projeto Parto Adequado, informa Martha, conseguiu em seis meses dimi-nuir para menos do que era em 2005. E a forma foi reconstruir a organização dos serviços. E, depois de reconstruir, finan-ciá-los da maneira correta. E fazendo o óbvio; tendo plantonista. Se uma mulher pode entrar em trabalho de parto a qual-quer momento, é preciso haver alguém de plantão. É preciso também apoio da enfermeira obstetra. É assim no mundo inteiro, ressalta Martha. São profissionais formadas para isso. E mais: é necessário haver um grupo de médicos que trabalhe em equipe.

E cita que houve capacitação de todos os médicos e todas as enfermeiras, além de reformatação do curso de pré-natal. Enfim, diz Martha, foi preciso refazer um arcabouço importante, mas foi mostrado que era possível, que era viável.

Agora a vez é do idoso, avisa a pales-trante. E o motivo é que o idoso, nesse modelo fragmentado, é um dos mais afe-tados. O modelo de atenção que existe na saúde suplementar “mata” o idoso, afir-ma, explicando que esse paciente toma várias medicações, não consegue fazer o tratamento direito e morre. Ou seja, é um modelo letal. ” Precisávamos começar por algum lugar e resolvemos começar por esse”, diz Martha.

Ela explica que a ideia do projeto é muito simples: reorganizar a prestação de serviço com equipe multiprofissio-nal, médico centralizador. E o que pare-ce mais óbvio é o mais difícil: o médico para centralizar o cuidado e conhecer aquele paciente como um todo. Confor-me Martha, é um tipo de profissional que existe no mundo inteiro, cada lugar com um nome diferente. Mas no Brasil ele não existe. Não há um sistema de informação e avaliação funcional. E reafirma Martha que se trata do básico, do o óbvio, mas que fazer isso é muito difícil.

Hoje, continua a palestrante, o pa-ciente idoso está nas emergências. E per-gunta: como reorientar um pouco a in-ternação focada no idoso? Na resposta,

Martha explica que o projeto tem “várias caixinhas” e que está descrito em um li-vro, disponível no site da ANS (www.ans.gov.br).

Segundo Martha, no início, ao pen-sar nesse projeto, imaginou-se que, se no parto eram 40 hospitais e 35 operadoras, no projeto do idoso seriam 15 instituições envolvidos. E houve cem inscritos, infor-ma, dizendo que, desses cem, 68 modelos foram aproveitados porque eram ótimos, bem construídos. E atualmente, informa, estão envolvidas 68 instituições, 14 pres-tadores e 50 operadoras. E tudo isso re-sultado da reorganização da estrutura de como fazer o cuidado, além de considerar também um modelo de remuneração di-ferenciado.

O projeto do idoso, continua Martha, foi acompanhado com indicadores men-sais. A cada 15 dias há reunião por confe-rência, com participação de 200 pessoas. E cita que foi realizado um curso sobre cuidado paliativo com um professor de Harvard, -- “que foi maravilhoso”--; tam-bém um curso de discussão de uso de telemedicina com um professor de Ma-dri. Segundo Martha, essas pessoas estão pensando junto com a agência. Pensando formas diferentes de tratar o problema.

E mais: tratar a causa e não o efeito, diz Martha, salientando que a discussão do cuidar e curar é um pouquinho mais profunda. Vem desde o momento em que alguém decide atuar na área de saúde; en-tra na faculdade e, desde o início, é trei-nado para cuidar. E, se o profissional não cura, acaba ficando frustrado, como se tivesse falhado, analisa Martha. Para ela, o brasileiro tem uma dificuldade enorme em debater sobre a morte. “Ninguém faz seminário de morte”, diz ela. “Todos nós vamos morrer, mas ninguém senta para discutir sobre isso. ”

Como conclusão de sua fala, Martha diz que, na saúde suplementar, não existe estrutura para o cuidado paliativo. Ima-gina-se que o cuidado paliativo é algum tipo de internação. E o motivo, salienta, é porque só sabemos curar se for colo-cando o paciente em um hospital. “E o ambulatório é o mais importante disso tudo” afirma.

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PALESTRANTE

Fernando Fagundes

Prevent Senior

Cure to care: modelos inovadores de atenção ao idoso - Debate 10/11/2016

Fernando Fagundes inicia sua fala explicando que abordará o modo como está sendo enfrentado o en-

velhecimento da população brasileira e tentar definir o que é o envelhecimento. Para ele, é preciso caracterizar muito bem o termo para não ter uma confusão de perfil.

O PALESTRANTE

Segundo Fagundes, quando se fala em idoso versus novo perfil da maturida-de, se está falando em evolução. E expli-ca que na Prevent Senior as pessoas não são consideradas idosas, são chamadas de “maduras”.

Para a Organização Mundial de Saú-de (OMS), diz ele, 65 anos é classificado como idade de uma pessoa idosa. E diz que se for dito isso a alguém, a pessoa se sentirá ofendida. Trata-se de uma ques-tão importante que precisa ser ponderada num mundo que vem amadurecendo. No passado, diz ele, uma pessoa com 60 anos era já considerada idosa. Hoje não, por-que são pessoas extremamente ativas. Na Prevent Senior, a pessoa é tratada como idosa a partir dos 80 anos, quando aí sim ela passa a ter necessidades de pessoas idosas, antes disso não.

Falando sobre o processo de enve-lhecimento, Fagundes o define como complexo e heterogêneo. E que é preci-so entender que existem várias formas de envelhecer. Cada pessoa envelhece de uma forma diferente. Há pessoas de 70 anos, 80 anos, que são extremamen-te “descoladas”, afirma, salientando que algumas são até maratonistas com essa idade. E mesmo colocando prótese conti-nuam praticando atividades físicas.

Para o palestrante, o que se precisa discutir não é o idoso, mas sim o enve-lhecimento, que hoje se dá de forma di-ferente daquela de dez anos atrás. Fagun-des diz que, na atuação na Prevent Senior, que está há 20 anos no mercado, se pode perceber que o perfil de pessoas mais ve-lhas muda a cada cinco anos. Ou seja, muda o perfil do associado da empresa, que tem de adaptar-se a esse novo clien-

te. E detalha que aquele que no passado tinha 50 anos era muito diferente do de hoje. Os de 50, 60 anos atualmente têm até problemas físicos, psíquicos e mentais diferentes hoje.

Fagundes diz que a referência geral, quando se chama uma pessoa de ido-sa ou quando se refere ao idoso, vem à mente uma pessoa frágil. Por isso enfa-tiza que, na Prevent Senior, as pessoas não são consideradas por número, mas como indivíduos. E o fato de ela ser mais madura em idade, não significa que seja idosa. Por isso o tratamento – e aqui ele diz que não se refere ao tratamento clí-nico que é o mais básico de todos, mas sim no aspecto geral de atendimento e assistência, que precisam ser realizados de forma muito diferente do que no pas-sado.

Quando você é jovem, continua Fa-gundes, você procura a cura. E conta que seu filho adolescente, por exemplo, torceu o tornozelo jogando futebol. En-tão, o caso foi levar no ortopedista para diagnóstico e tratamento, cujo resultado foi a cura. Já ele próprio, teve o mesmo problema no pé esquerdo, jogando bola. Então, por decorrência, se continuasse, o pé direito ia se machucar. E obviamente, por causa do direito, teve problema nas costas. E porque teve um problema nas costas, não consegue dormir. E porque não conseguir dormir também não con-segue trabalhar.

Enfim, conclui, é muito diferente quando se trata um adolescente e quando trata alguém mais velho, pois este último tem de ser cuidado pelo processo inteiro. Já seu filho tem que ser tratado por um procedimento específico. Só que a me-

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dicina, ressalta, nos trouxe o tratamento para procedimentos e é por isso que não se sabe como lidar com as pessoas madu-ras porque não se tem conhecimento de trabalho com o processo inteiro de cui-

dados. Em outras palavras, trabalha-se com o ato: ou você cura, ou você cura, mas você não cuida, porque, para cuidar, é preciso seguir processos muito bem de-finidos na cadeia da medicina.

sua fala, Ricardo Soares explica que irá contar um pouco da empresa, o Pátria In-vestimentos. Segundo ele, trata-se de uma

empresa de investimentos, uma private equity, com R$ 20 bilhões sob gestão. E diz que sempre houve interesse em investir em saúde.

NO INÍCIO DEDEBATEDOR

Ricardo Soares

Pátria Investimentos | Residencial Cora

Cure to care: modelos inovadores de atenção ao idoso - Debate 10/11/2016

Soares continua, explicando que, ao olhar para o que chama de “demographi-cs” sobre a população idosa brasileira, a conclusão foi: “Existe um problema aqui, existe uma necessidade que queremos atender”. E aí veio a pergunta de como se daria esse atendimento. Ele cita que, o que a França demorou 120 anos para a população de idosos dela ir de 7% para 14%, no Brasil vai acontecer em 20 anos. E diz ser óbvio que o país não está se pre-parando para isso. E como alguém da ini-ciativa privada que ele é, Soares diz que vê uma oportunidade, já que o governo não está atuando como deveria.

Após terem reconhecido que estava vindo pela frente uma “bomba de enve-lhecimento”, continua Soares, sua equipe visitou mais de cem instituições de longa permanência para idosos, no Brasil, na França, no Canadá, nos Estados Unidos, para entender qual era a oferta e o que estava acontecendo nesse mercado.

O palestrante explica que esse mo-delo foi construído por empreendedo-res que viram a oportunidade, mas e o acesso ao capital? 14%-15% de Selic? “Como é que você investe num modelo que seja sustentável? ” São perguntas que ele faz.

Abordando a estrutura típica existen-te, ele diz que é um médico que vê seus pacientes envelhecendo. Então abre uma clínica, coloca 30 leitos, mas continua com a prática dele, passando a gestão para outra pessoa. Não reinveste o dinheiro e a clínica acaba decaindo sem investimen-to. E Soares informa que apenas 1% das 3.500 casas de repouso e Instituições de Longa Permanência para Idosos (ILPI) no Brasil têm mais de cem leitos.

Continuando, Soares explica que a atividade da Pátria envolve comprar uma empresa, investir nela financeiramente, injetar gestão. Em decorrência, a empre-sa cresce e depois é vendida. Mas ressalta que é devolvido o dinheiro para as pes-soas que investiram nos fundos. Então, afirma, o Pátria está sempre à procura de uma plataforma de investimento. Mas no caso do abrigo a idosos, foi diferente. De-cidiram começar do zero.

Antes de decidir fazerem sozinhos, diz Soares, foram contatadas 200 famílias em cinco cidades brasileiras. E explica que o motivo foi o preconceito existen-te quando se mencionam palavras como “asilo”, “casa de repouso”. Vem sempre a ideia de maus tratos, vem a ideia de cheiro ruim, etc, diz ele. Então, o contato

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com essas 200 famílias teve o objetivo de descobrir se teria algum jeito de quebrar esse preconceito e para entender o cami-nho de dor que as famílias passam hoje.

Cinco pontos consideradosSoares explica em seguida que, quan-

do houve a decisão de fazer o investi-mento em uma casa de repouso, foram considerados cinco pontos.: situação demográfica muito favorável; setor com uma taxa de ocupação muito alta -- to-das as instituições que o Pátria visitou tinha, em média, ocupação em torno de 90%,95% --; segmento muito pujante de locais cobrando R$ 13 mil, R$ 14 mil, sem incluir os cuidados; e segmento de R$ 3,5 mil, mas com qualidade bastan-te duvidosa. Por isso, a decisão de entrar nesse mercado, e cobrando por volta de R$ 5,5 mil para uma família de classe B.

Conforme o palestrante, existe uma barreira de entrada significativa para fa-zer uma unidade grande que tenha um ganho de escala. Uma unidade como essa, explica, precisa ter 150, 170 ou 200 leitos; ou seja, o investimento é grande e não é qualquer um que conseguirá in-vestir. No entanto, continua soares, a margem foi analisada e a conclusão foi de que era atraente. “Obviamente tinha um risco de execução altíssimo”, comenta, explicando que não havia quem soubes-se atuar com a eficiência necessária. Mas, mesmo assim, salienta, foi decidido que o desafio seria encarado.

O passo dado a seguir foi contratar uma equipe. E aqui o caminho foi con-tratar pessoas com formação que com-plementasse a sua própria. E para ajudar no convencimento aos candidatos havia a “grife Pátria”.

Escolha dos imóveis foi a etapa se-guinte. Acabaram encontrando dois que seriam adequados e ao longo do tempo foram sendo construídas métricas, diz Soares, explicando que havia consciên-cia de que o fator localização era fun-damental. Os dois prédios então foram alugados, porque não ia dar tempo de construir, mas hoje, diz ele, já se está construindo.

Voltando à formação da equipe, o pa-lestrante explica que era um problema o fato de a maioria vir de hospitais. E que o desafio era “abrir a cabeça” dessas pessoas para que deixassem de pensar no modelo agudo e pensassem no modelo crônico. E ele explica que não havia estrutura nas unidades para seguir o modelo agudo, porque para isso seriam necessários mais enfermeiros e mais médicos.

Veio então o lançamento da unidade Villa-Lobos. E Soares conta: “Foram três semanas em que eu ficava na unidade e não vinha ninguém”. Aí, “fazendo um milhão de análises”, houve ajuste de po-sição no Google e em 12 meses a unidade estava cheia. São 128 leitos, diz Soares, que abrigam em torno de 90 idosos.

Em 21 de dezembro de 2015, veio a segunda unidade, localizada no Ipiranga. E conta que, para se ter uma ideia do que é a demanda nesse setor, ele ia na obra toda semana e em um dado dia viu pes-soas lá que não conhecia. Não era nem da construtora e nem da sua equipe. Eram pessoas interessadas no serviço.

Uma das unidades, explica o pales-trante, tem uma operação de memory care separada e, que ficam os idosos com de-mência avançada. Não há estrutura para atender casos psiquiátricos, diz ele. E ca-sos de média e baixa complexidade com a questão cognitiva são recebidos. Só que ficam em separado.

A unidade Cora Campo Belo possui 170 leitos, informa Soares. Somados aos do residencial Santa Catarina, são 650 lei-tos. Em 2017, foram abertos mais 1.200 leitos, chegando a 1.850 leitos, principal-mente no Estado de São Paulo. E o plano é ter mais de 6mil, 7 mil leitos no Brasil.

Avaliação multidisciplinarSoares ressalta que existem coisas de

que não se abrem mão nas unidades. E cita que todos os idosos passam por uma avaliação da equipe multidisciplinar na hora em que entram. Um dos motivos é que existem alguns vetos, explica. Outro é para fazer o plano de cuidado do idoso. Segundo ele, o rol envolve 450 atividades e a equipe multi escolhe, dentro delas, o

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que vai ser o plano de cuidado nos próxi-mos seis meses, após os quais esse plano é revisto.

Segundo o palestrante, a idade média da população residente é 86 anos; e 82% são mulheres. Quanto às medicações, to-mam em média oito remédios por dia. E Soares salienta que há um trabalho coor-denado com o médico titular para tentar reduzir essa interação medicamentosa, porque tem uma questão de queda nas unidades.

Ele explica ainda que foi criada uma escala de classificação dos idosos, que é a Barthel modificada1. Ao invés de grau 1, grau 2 e grau 3, diz ele, há seis seg-mentos, de A até F, envolvendo compro-metimento funcional e cognitivo. É dada então uma nota para cada uma dessas es-calas e existe uma série de combinações. E Soares explica que, obviamente, isso determina o número de homem/hora que precisa para cuidar desses idosos e de-termina também o preço. “Uma coisa vai junto com a outra. ” Outra determinante de preço, afirma, é o tipo de acomodação, entre as opções: quarto individual, indi-vidual luxo, conjugado ou um duplo.

Indicadores. Soares cita-os como algo para o qual há “obsessão”, explicando que isso faz parte da cultura da empre-sa. E segundas e quintas são os dias em que esses indicadores são discutidos. Fa-la-se então sobre qualidade assistencial, infecção de vias aéreas, infecção de trato urinário, queda, queda com dano, entre outros. E é feito um levantamento por unidade, considerando as referências in-ternacionais do que é aceitável ou não.

E, conforme Soares, ocorre o mesmo com relação à infraestrutura, ou seja, quantos metros quadrados por leito de área de convivência, por exemplo, em cada unidade. No Villa-Lobos, é 0,61 m2, diz ele, contando que não sabia se isso era muito ou pouco. Mas depois des-

cobriu que é pouco, por isso já se tenta aumentar essa área do Villa-Lobos. No Ipiranga, é 1,3 m2 por leito em área de convivência. “Sem falar no tamanho do quarto, sem falar de tamanho de banhei-ro, etc”...

O palestrante cita algo que surgiu como novidade na história da empresa. Foram procurados por algumas operado-ras para começar a discutir essa questão do crônico, para começar a dar soluções de cuidado, algo que elas estão procuran-do fazer. Ou seja, com a sinistralidade em alta, elas estão procurando respostas, al-ternativas para baixar os custos. “Só que ainda não era a hora, estávamos come-çando a operar; queria primeiro aprender a operar”, conta Soares, explicando que tem algo que é muito tranquilo: não tem glosa. A inadimplência é de 0,2%, expli-ca, salientando que tem o Estatuto do Idoso e o Ministério Público a seu favor. E cita, por exemplo, que, qualquer filho que não paga, de acordo com o artigo 58 do estatuto, é considerado é abandono de incapaz. “Vai para a cadeia em 48 horas”, informa.

Soares explica ainda que já está olhando para a rede de pós-agudo, E diz que já executa uma transição, mas exis-tem muitos idosos que já vêm de hospi-tal, em um modelo de curta permanência, em que fica uma semana, duas semanas e vai para casa. E exemplifica: sai de um hospital, após cirurgia de prótese, e vai fazer fisioterapia. “É só descer de um an-dar, ir para o outro”, diz ele, explicando que todas as unidades têm área de fisio-terapia bastante grande, em que o idoso pode fazer exercícios todos os dias, três vezes por dia, durante 15 dias, e aí vai para casa. É o modelo que é chamado de curta permanência ou transição, explica Soares, ressaltando que estão sendo es-tudados também os outros elos dessa ca-deia: psiquiátrico, retaguarda e transição.

1. A Barthel é uma escala ordinal usada para medir o desempenho em atividades da vida diária. Cada item de desempenho é classificado nessa escala com um determinado número de pontos atribuídos a cada nível ou classificação.

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