politicas energéticas gas
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Artigo apresentado no VII CBPE que trata de uma analise das diferentes politicas energéticas ligadas ao gas de 5 paises sul-americanos: Argentina, Brasil, Chile, Bolivia e Venezuela através do método SWOT.TRANSCRIPT
AS POLÍTICAS ENERGÉTICAS SUL-AMERICANAS:
PROBLEMAS REGIONAIS E LÓGICAS NACIONAIS1
BRUNA LE PRIOUX
Doutoranda pelo IHEAL – Instituto de Altos Estudos da América Latina da Universidade de
Paris 3 – Sorbonne Nouvelle, membro do laboratório CREDAL – Centro de Pesquisa e
Documentação da América Latina.
RESUMO
Ao final desta primeira década do século 21, o contexto mundial relacionado à energia
pode ser resumido da seguinte maneira: aumento da preocupação com as mudanças
climáticas e o efeito estufa, cuja principal causa é a utilização massiva de energias fósseis;
sentimento de vulnerabilidade energética, já que os principais produtores de
hidrocarbonetos não são considerados politicamente fiáveis, além do aumento do consumo
dos chamados países em desenvolvimento e da ideia da possibilidade de aproximação do
fim das reservas de petróleo; e em razão do fator acima citado, uma intensa especulação
no mercado mundial resultou no aumento dos preços do barril de petróleo e do gás a partir
de 2005.
Visto este clima de vulnerabilidade, de dependência e de consciência ambiental, cada país
tenta se adaptar à sua maneira a tais mudanças. Além de soluções locais, os países sul-
americanos têm um histórico de tentativas de integrações regionais ligadas à energia, o
que pode se apresentar como um complemento das políticas nacionais.
É por esta razão que esta pesquisa se interessou pelo estudo das políticas energéticas de
alguns dos principais países produtores e consumidores de energia na América do Sul,
suas escolhas e sua atuação nos âmbitos regional e internacional. Assim, a questão
principal do artigo procura analisar de que maneira as políticas energéticas nacionais
influem sobre a atuação energética regional de alguns dos países da América do Sul.
Para responder a essa questão, apontamos como objetivos: (1) diagnosticar quais são os
potenciais e as desvantagens energéticas de cada país; (2) levantar conceitos
relacionados às questões energéticas; e (3) relacionar as duas etapas anteriores para
análise das relações das interações energéticas na América do Sul.
1 Artigo apresentado no VII Congresso Brasileiro de Política Energética, realizado no FEA-USP entre os dias 8 e 10 de setembro de 2010.
A seleção dos países estudados é a seguinte: Brasil, Argentina e Chile, pelo peso de suas
economias na América do Sul e pelo consumo intenso de produtos energéticos, bem como
a Bolívia e a Venezuela, pelas suas reservas e seus excedentes energéticos.
O estudo dos sistemas energéticos nacionais se deu através da análise SWOT (acrônimo
de “forças, fraquezas, oportunidades e ameaças”, em inglês), havendo assim um
diagnóstico sintético dos potenciais e das desvantagens energéticas de cada país.
A partir daí, cruzamos esses dados com conceitos como desenvolvimento sustentável,
interdependência e governança energética, a fim de tecermos relações entre políticas
energéticas nacionais e regionais.
O resultado desse cruzamento de fatores mostra que as necessidades de cada sistema
energético nacional intervêm de maneira decisiva na sua atuação em favor ou não de uma
integração regional.
As políticas energéticas nacionais são fatores importantes a serem levados em conta
quando se estuda uma dada integração regional. De fato, as vantagens e as deficiências
energéticas nacionais emergem no cenário regional, demonstrando que as
interdependências estão sujeitas às lógicas e às estratégias nacionais.
Portanto, o efeito da integração energética é insatisfatório na América do Sul devido à falta
de convergência nas políticas nacionais. As vantagens de uma integração, ou seja,
aumentar o comércio, assegurar o abastecimento e diminuir a instabilidade dos preços,
são neutralizadas sem esta coordenação entre os países.
ABSTRACT
The international energy context in the first decade of the 21st century can be described by
the following points. First, the growing concerns with climatic changes and the greenhouse
effect, which the main cause is the massive use of fossil fuels. Second, the energy
vulnerability, due to the mistrust in the main hydrocarbon producers, to the increasing
consumption from the so-called developing countries and to the idea of a possible end of oil
reserves. And third, as a consequence of the least factor, an intense speculation in
international market has increased the prices of oil barrel and gas since 2005.
In this context, each country tries to adapt to their way of such changes. Beyond local
solutions, South American countries have historic attempts of regional integration through
energy, which can be presented as a complement of national policies.
This research focuses on the study of the gas energy policy of some producers’ and
consumers’ countries in South America, their choices and procedures in the national and
international scope. Thus, the main goal of this article is to analyze how national energy
policies affect the regional energy action of these South American countries.
In order to answer this question, our goals are: (1) diagnosing the energy potentialities and
disadvantages of each country; (2) identifying concepts related to energy questions; and (3)
relating the two past steps to analyze the energy interaction in South America.
The countries selected to this research are: Brazil, Argentina and Chile, due to their
economic magnitude in South America and their intense energy consumption; and Bolivia
and Venezuela, due to their energy reserves and surplus.
The study of national energy systems was made through SWOT analysis (Strengths,
Weaknesses, Opportunities and Threat), in order to have a synthetically diagnosis about
the energetic potentials and disadvantages of each country. Thereafter, we intersect this
data with concepts as sustainable development, interdependence and energy governance,
to relate the national and international energy policies.
Energy national policies are relevant factors to be considered when a regional integration is
studied. In fact, energy advantages and deficiencies emerge in regional scenario, showing
that the interdependences depend on national logics and strategies.
In this sense, we consider that the effect of energy integration in South America is
unsatisfying because national policies do not converge. The advantages of integration (i.e.
commerce increase, ensuring supplies and reducing price volatility) are neutralized without
this countries’ coordination.
Introdução
Ao final desta primeira década do século 21, o contexto mundial relacionado à
energia pode ser resumido da seguinte maneira (DIRMOSER, 2008):
o Aumento da preocupação com as mudanças climáticas e o efeito estufa, cuja
principal causa é a utilização massiva de energias fósseis;
o Sentimento de vulnerabilidade energética, já que os principais produtores de
hidrocarbonetos não são considerados politicamente fiáveis, além do aumento do
consumo dos chamados países em desenvolvimento e da ideia da possibilidade de
aproximação do fim das reservas de petróleo;
o Em razão do fator acima citado, uma intensa especulação no mercado mundial
resultou no aumento dos preços do barril de petróleo e do gás a partir de 2005.
Visto este clima de vulnerabilidade, de dependência e de consciência ambiental, cada
país tenta se adaptar à sua maneira a tais mudanças.
A América Latina sofreu várias mudanças de gestão energética nos últimos vinte anos.
Nos anos 90, com a onda de privatizações no setor energético, e em todos os setores
tradicionalmente ocupados pelo Estado, uma série de atores privados entra em cena, e o
Estado ocupa uma posição de regulador.
Nos anos 2000, com a chegada das esquerdas ao poder em vários países da América
Latina, o Estado volta a ocupar uma posição mais ativa, mas deve coabitar com outros
tipos de atores: companhias privadas, organizações não-governamentais, organizações
internacionais, etc. É neste momento que podemos falar de governança energética, pois a
tomada de decisão se torna descentralizada. O Estado, antes planificador e aplicador
soberano da política energética, agora deve compartilhar seu poder com outras formas de
governança (mundiais, locais, regionais...).
As políticas energéticas dos países sul-americanos começam a incorporar todas as
preocupações desses atores citados, e tomam como objetivos a proteção do meio
ambiente, a progressão tecnológica, o consumo eficiente, a segurança do abastecimento e
a integração energética nacional e regional.
É justamente neste último ponto que este artigo vai se focalizar: a integração regional.
Assim, nossa intenção nesta pesquisa se resume ao seguinte problema: de que maneira
as políticas energéticas nacionais influem sobre a atuação energética regional de alguns
dos países da América do Sul2?
2 A seleção dos países estudados é a seguinte: Brasil, Argentina e Chile, pelo peso de suas economias na
América do Sul e pelo consumo intenso de produtos energéticos, bem como a Bolívia e a Venezuela, pelas suas reservas e seus excedentes energéticos.
O estudo dos sistemas energéticos nacionais se dará através da análise SWOT3,
havendo assim um diagnóstico sintético dos potenciais e das desvantagens energéticas de
cada país. Devido ao número limitado de páginas deste artigo, a análise SWOT se
concentrará no setor do gás, mas a próxima seção dará um panorama geral de outros tipos
de energia.
1. Panorama do uso de energéticos na América do Sul
A América do Sul se destaca como um grande consumidor de combustíveis líquidos
(gasolina, diesel, querosene, etc.), os quais representam quase 40% do consumo final dos
países do subcontinente. O setor de transportes é um grande consumidor desse tipo de
energia (cerca de 75% do consumo total de derivados de petróleo). A importação desses
combustíveis ocupa um lugar de destaque na balança comercial dos países sul-
americanos, notadamente nos casos do Chile (18% em 2009), da Argentina (8%) e do
Brasil (11%) (SCAVAGE, 2010). Para o Brasil a importação de petróleo e derivados
corresponde ao terceiro grupo de bens e serviços mais importado, depois de máquinas e
equipamentos e bens de consumo (MDIC, 2010).
Com relação à energia elétrica vários intercâmbios binacionais existem, mas a
integração dos mercados elétricos está longe de ser uma realidade. Vários problemas
técnico-operacionais e políticos existem e faltam projetos comuns de geração elétrica.
Tradicionalmente vista como uma integração naturalmente posta em prática devido à
facilidade de interconexão e uma equalização de tarifas mais rápida, a integração elétrica
na América do Sul não confirmou esta disposição.
Apesar das dificuldades, os maiores projetos binacionais de integração envolvem a
energia hidrelétrica, e as usinas de Itaipu (Brasil-Paraguai), Yacyretá (Paraguai-Argentina)
e de Salto Grande (Argentina-Uruguai) são importantes fontes de energia elétrica a todos
os países envolvidos. A grande desvantagem desse tipo de energia é a sua sazonalidade,
e por isso vários projetos de usinas termelétricas foram criados, usando como principal
fonte energética o gás natural (GN).
O gás natural apresenta uma penetração importante em todas as matrizes energéticas
dos países estudados, e a tendência para os próximos anos é o aumento de sua
participação (MME, 2010b). Há uma estrutura importante de conexões bilaterais e projetos
de conexões multilaterais, o que mostra que a rede atual deve aumentar nos próximos
anos.
3 A análise SWOT determina as forças, as fraquezas, as oportunidades e as ameaças em um quadro de
planejamento estratégico e, no nosso caso, para o diagnóstico da energia em alguns países da América do Sul. A análise SWOT teria sido criada por Albert Humphrey, da Universidade de Stanford, nos anos 1960 e 1970, e é hoje utilizada por várias áreas do conhecimento.
Nos últimos quinze anos a demanda de gás natural cresceu em todos os países
estudados, principalmente porque as indústrias nacionais passaram a substituir o uso de
derivados de petróleo pelo gás natural. Outra explicação para o aumento da demanda de
gás natural é a sua flexibilidade: esta fonte pode ser usada tanto pelas indústrias como
pelo setor de transportes e igualmente como fonte de energia termelétrica. O gás também
é bastante usado pelo Chile e pela Argentina como fonte de calefação.
A América do Sul, devido ao seu volume de reservas e ao aumento da demanda, pode
aumentar expressivamente a sua integração energética baseada nesta fonte. Forte de sua
capacidade de expansão nas décadas futuras, analisaremos a seguir as políticas
energéticas do gás em cinco países da América do Sul através do método SWOT.
2. Análise SWOT das estratégias ligadas ao gás natural em cinco países sul-
americanos
A análise SWOT é comumente utilizada como ferramenta de planejamento estratégico
de empresas. No setor energético, algumas cidades já utilizaram este método, como a
cidade de Jaén, na Espanha. A análise SWOT é uma ferramenta inicial usada como uma
maneira de tomar consciência das suas dificuldades atuais e dos desafios futuros nos
âmbitos internos e externos (TERRADOS et.al. 2007). Outras ferramentas devem ser
usadas daí em diante.
No caso das estratégias energéticas baseadas no gás natural, trataremos de forma
sucinta dos problemas enfrentados pelos cinco países listados e suas estratégias para
superá-los no caso da integração energética regional.
A seguir, realizaremos as matrizes SWOT de cada país e teceremos comentários logo
em seguida.
2.1 Brasil:
Positivo Negativo
Inte
rno
Forças
- Diversidade de fontes energéticas
- Descoberta de reservas de gás na área
do pré-sal
- Demanda interna em alta (+ 17% entre
2004 e 2008)
- Gasoduto ligando as jazidas da Bolívia
até os centros industriais do Brasil, com
capacidade de transporte de 30 MM
m³/dia.
Fraquezas
-Baixa participação do gás na oferta interna
nacional (9%)
-Falta de infra-estrutura, rede interna de
gasodutos bastante reduzida.
- Baixa capacidade de regaseificação, se
opção de GNL.
-Alto custo de exploração das reservas
recém-descobertas
S
W
Exte
rno
Oportunidades
-Exportação de tecnologia, produtos e
serviços energéticos.
- A Petrobras, com sua expansão
internacional e com sua capacidade
financeira, poderá financiar projetos de
gasodutos com a finalidade de trazer mais
segurança energética para o país.
Ameaças
- Instabilidades políticas dos países
exportadores.
- Alta dependência de importação de um só
país: Bolívia.
Figura 1 – Análise SWOT da política do gás do Brasil
A política energética brasileira procura estimular o uso do gás natural nas indústrias,
nos transportes e nas termelétricas. Hoje o GN representa cerca de 9% da oferta interna
de energia no Brasil (MME 2010b), mas a tendência é de aumento da demanda, com a
construção de novas termelétricas e de novos gasodutos4. Para suprir esta demanda, o
Ministério de Minas e Energia (MME 2010a) considera que as principais fontes serão a
maior produção de gás nacional, a importação do gás boliviano através do gasoduto
Bolívia-Brasil e do GNL importado.
Apesar do aumento da produção nacional, a importação do GN através do gasoduto
Bolívia-Brasil continuará sendo primordial para os grandes centros industriais,
principalmente aqueles localizados na região Sul do país. Além disso, quanto maior os
investimentos em transportes, em exploração de novas jazidas e na construção de na
distribuição, maior será a oferta de produtos. É por isso que o Brasil procura, através da
integração regional, o respeito dos contratos já firmados e de segurança jurídica a seus
investimentos.
2.2 Argentina:
4 Porém, por uma série de fatores que não serão explorados neste artigo, a tarifa de gás natural praticada no
Brasil é uma das mais altas do mundo. Cf. http://noticiasmineracao.mining.com/2010/02/18/custo-do-gas-reduz-competitividade-da-industria-e-revolta-empresarios/
T O
Positivo Negativo
Inte
rno
Forças
- reservas comprovadas de 370 bilhões
m³
- produção atual em torno de 115 MM
m³/dia
- extensa rede de gasodutos: 50% das
transações por gasodutos da região
passam pela Argentina.
Fraquezas
- a privatização do setor (começo dos anos
1990) não foi seguida de uma pauta de
investimentos em exploração robusta, o que
causou uma extração acelerada das jazidas
já conhecidas. Poucas áreas foram
descobertas e exploradas desde então.
- Atualmente, em razão da diferença entre
oferta e demanda, a Argentina se torna um
importador net de gás, principalmente da
Bolívia.
Exte
rno
Oportunidades
- a integração regional poderá contribuir
à diversificação da oferta de GN, com o
gás venezuelano se tornando mais
atrativo.
- a integração regional pode impulsionar
as empresas e consórcios argentinos a
atuar com mais vigor no âmbito regional.
Ameaças
- o controle dos preços internos do gás
diminui a atração de investimentos externos
no setor e ameaça a exportação.
- se a integração regional se concretizar as
tarifas de gás vão aumentar para os
consumidores argentinos, em razão da
concorrência e do menor controle estatal
neste tema.
Figura 2 – Análise SWOT da política do gás da Argentina
A Argentina vive uma situação paradoxal. Antigamente exportadora de gás natural
ao Chile (77% do total das exportações), ao Uruguai (5%) e ao Brasil (18%) (KOZULJ
2008), atualmente o país deve importar uma parte de seu consumo em gás através dos
gasodutos oriundos da Bolívia. Os argentinos consomem cerca de 46% de gás em seu
consumo energético final5.
Esta situação pode ser explicada pela velocidade da extração do gás argentino
comparado ao nível de reservas provadas após a abertura deste setor à privatização. Esta
intensa extração tinha como destino as exportações, bem como o atendimento da geração
elétrica (KOZULJ 2008). Hoje, o setor do gás na Argentina é dominado por duas empresas
de transporte, oito distribuidoras. O upstream é dominado pela YPF-Repsol, com 75% do
mercado, além de Petrobras, Total e PECOM. O downstream é dominado por estas
mesmas empresas, além da Esso e da Shell.
5 O consumo de gás na Argentina foi de 44,5 bilhões de m³ no ano de 2008, e as importações foram de mais
de 3,3 bilhões de m³. Dados respectivos da BRITISH PETROLEUM 2010 e da U.S. ENERGY 2010.
T
O
S
W
Outra questão complicada no caso argentino são as tarifas de gás. Atualmente o
nível de preços do gás na Argentina é um dos mais baixos da América do Sul, já que esses
preços foram congelados quando do fim da paridade dólar-peso e da crise econômica de
2001. A consequência dessa diferença de preços entre o mercado nacional e a cotação
internacional é que, com o aumento das importações e com o aumento da integração
regional, os preços vão aumentar de maneira dramática aos consumidores argentinos.
2.3 Chile:
Positivo Negativo
Inte
rno
Forças
- alta capacidade de refino de
hidrocarbonetos e boa estrutura de
terminais regaseificação de GNL
- várias possibilidades de energias
alternativas em seu território: eólica na
Patagônia, geotermia, biomassa, solar...
Fraquezas
- Penúria de hidrocarbonetos em seu
território, importa 90% da sua demanda de
gás, carvão e petróleo;
- opções renováveis ainda custam caro
Exte
rno
Oportunidades
- O Brasil pode se tornar um parceiro de
peso do Chile, pois aquele país possui
pouca capacidade de refino e de
regaseificação.
- A entrada da Venezuela como o grande
fornecedor de gás na América do Sul
pode ser vantajosa para o Chile.
Ameaças
- alta dependência do gás argentino
- quebras unilaterais dos contratos da parte
argentina
- a contenda histórica com a Bolívia
(“nenhuma molécula de gás”) impede a
diversificação de suas importações de gás
natural vindas da América do Sul
Figura 3 – Análise SWOT da política do gás do Chile
A política energética do Chile não possui muitas alternativas em se tratando de
fontes energéticas “convencionais”. Apesar de ter uma rede consistente de oleodutos e
gasodutos, o Chile sofre com a falta de segurança no abastecimento. A situação histórica
complicada com a Bolívia impede a importação de gás deste país e as dificuldades de
reserva e de abastecimento atuais da Argentina não garantem uma segurança energética.
É por isso que uma integração energética mais desenvolvida na América do Sul
poderia ser altamente vantajosa para o Chile. Se esta integração não se consolidar, o Chile
deverá investir ainda mais no GNL vindo da Ásia, o que encarece o custo industrial e a
tarifa dos consumidores. Outra opção seria o investimento massivo em energias
S W
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renováveis, mas o Estado é quem deverá financiar esses projetos, já que os preços deste
tipo de energia continuam sendo pouco atrativos para a iniciativa privada.
2.4 Bolívia
Positivo Negativo
Inte
rno
Forças
- Abundantes reservas de GN (reservas
provadas: 710 bilhões m³ em 2009)
- Tem como vizinhos três países que
representam dois terços da demanda de
gás natural na região (Argentina, Brasil,
Chile)
- Produção: em torno de 43 MM m³/dia6,
demanda interna: 8,9 MMm³/dia,
exportações: cerca de 35 MM m³/dia.
Fraquezas
- Localização geográfica distante dos
principais centros consumidores sul-
americanos, o que exige gasodutos longos e
caros.
- A sua posição geográfica sem costa
marítima dificulta a exportação para outros
continentes.
- Falta de acesso ao gás natural pela
população boliviana: apenas 5% da
população urbana possui gás canalizado.
Exte
rno
Oportunidades
- Grande potencial de atração de
investimentos para a expansão da
estrutura de produção e de transporte da
parte de Petrobras e das companhias
nacionais do Chile e da Argentina, devido
à demanda existente.
- Diversificação das exportações: para a
Argentina, para o Uruguai...
Ameaças
- Extrema dependência da exportação ao
Brasil (destinação de cerca de 80% do gás
boliviano).
- Busca de alternativas exteriores ao gás
boliviano (exemplos: GNL, expansão da
capacidade de produção doméstica, entrada
da Venezuela na cena sul-americana).
- A querela com o Chile impede a expansão
de sua carteira de consumidores.
Figura 4 – Análise SWOT da política do gás da Bolívia
A Bolívia é o grande exportador de gás da América do Sul. Este país produz cerca
de 43 milhões de m³ de gás por dia, e utiliza somente 9 milhões de m³ de gás por dia, todo
o resto sendo exportado ao Brasil e à Argentina. Suas reservas provadas se elevavam a
710 bilhões de m³ ao fim de 2009 (BRITISH PETROLEUM 2010), o que permitirá a
exploração destas reservas por pelo menos cinco décadas (idem).
A economia boliviana é extremamente dependente de sua indústria de
hidrocarbonetos, e depende das receitas deste setor para os programas governamentais e
6 Segundo o Ministério da Energia da Bolívia, dados de julho de 2010.
S W
T O
para movimentar a economia doméstica. Este país não possui uma verdadeira política
energética de diversificação da matriz ou de eficiência energética e, apesar da mudança na
lei dos hidrocarbonetos em 2006 e do aumento da receita para o governo boliviano, pouco
se fez para melhorar as condições de acesso ao gás à população, tanto urbana quanto
rural.
No caso boliviano, pouco se pode ver da relação entre política energética e
integração regional, pois a primeira é praticamente inexistente. Podemos dizer, apesar
disso, que a Bolívia procura dar à integração regional um viés político, seguindo as ideias
da ALBA (Aliança Bolivariana para as Américas, iniciativa que reúne a Bolívia, a
Venezuela, o Equador e cinco países da América Central e Caribe).
2.5 Venezuela:
Positivo Negativo
Inte
rno
Forças
- grandes reservas de gás e de petróleo
- país geograficamente bem localizado
para a venda de hidrocarbonetos aos
Estados Unidos
- altas receitas advindas dos
hidrocarbonetos: alta capacidade de
financiamento de obras energéticas
Fraquezas
- cerca de 90% de suas reservas de gás
estão atreladas às de petróleo
- Gás pouco aproveitado fora do setor
petrolífero, necessidade de importar gás da
Colômbia.
- país geograficamente localizado longe dos
centros consumidores da América do
Sul.
Exte
rno
Oportunidades
- Possibilidade de ser o grande investidor
público de obras de infra-estrutura
energética na América do Sul
- Contrariamente ao petróleo, o gás
venezuelano não sofre restrições na
exploração por parte de empresas
estrangeiras.
- PDVSA tem bom conhecimento e boa
posição em certos mercados exteriores:
refinarias, transporte e venda nos Estados
Unidos, no Caribe e na Europa.
- Através de associações com as
companhias nacionais sul-americanas, a
PDVSA assegura uma participação nestes
novos mercados: Brasil, Argentina,
Uruguai, Bolívia, Equador...
Ameaças
- Sua participação à OPEP impede uma
maior extração de gás para servir à América
do Sul (em razão da imposição da OPEP de
uma cota máxima de extração de petróleo).
- Suas propostas de Gasoduto do Sul e
PetroAmérica geram dúvidas e
desconfianças na maioria dos países da
América do Sul.
S W
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Figura 5 – Análise SWOT da política do gás da Venezuela
A Venezuela, apesar de suas reservas consideráveis de petróleo e gás, deve
importar gás colombiano através de um gasoduto. Isto se explica pela natureza das
reservas de gás venezuelanas, as quais 90% estão associadas ao petróleo (GUERRA
2008). Além disso, PDVSA não tem experiência na extração de gás offshore, e é por isso
que este setor procura atrair empresas privadas e públicas internacionais. Jiménez Guerra
observa ainda que se investimentos rápidos não forem feitos, a Venezuela vai se tornar
ainda mais dependente da importação nos próximos anos.
Apesar de suas reservas e das propostas para aumentar a integração energética
latino-americana, a Venezuela não conseguiu obter apoio total aos seus projetos, devido a
diversos aspectos, tanto técnicos como políticos.
Os países sul-americanos mais desenvolvidos, bem como as empresas energéticas
estrangeiras, não apreciam o tratamento extremamente político dado pela Venezuela ao
tema energético, tanto nos assuntos domésticos como internacionais. O fato de ministro da
Energia ser igualmente o presidente da PDVSA gera dúvidas quanto à independência
destas duas instituições, além de dificultar qualquer atividade desvinculada do poder
político venezuelano.
3. Considerações finais
Pudemos constatar ao longo deste artigo que as políticas energéticas nacionais influem
de maneira decisiva na vontade e no estilo de se realizar uma integração energética
regional, principalmente se analisamos as políticas dos países mais desenvolvidos da
região.
O economista argentino Roberto Kozulj (2008) constata que as grandes assimetrias
econômicas, territoriais e culturais são obstáculos reais à integração regional, além das
diferenças de cultura e de interesses.
Com relação a este último tópico, a análise das políticas públicas ligadas ao gás
demonstra que os países que possuem um setor energético altamente internacionalizado
demandam uma integração regional que assegure tanto a segurança do abastecimento
quanto a segurança jurídica das transações. Além disso, vários setores conexos
aproveitam a expansão da atividade energética para a entrada ou a consolidação em
novos, como é o caso das empreiteiras e serviços de engenharia brasileiros, por exemplo.
Já os exportadores de hidrocarbonetos procuram dar um viés mais político à
integração regional, enfatizando que as receitas advindas deste setor são primordiais para
as economias nacionais e que estas fontes energéticas são parte integrante da soberania
nacional.
O uso do método SWOT teve o mérito de nos mostrar sinteticamente a situação atual e
as perspectivas de curto prazo para as políticas ligadas ao gás em cinco países da
América do Sul. Porém, este método deve ser acompanhado de outras ferramentas que
permitam ao pesquisador de aprofundar todos os quesitos observados.
A nossa escolha em utilizar o método SWOT para tratarmos das políticas do gás e da
integração regional reside no fato de oferecer um novo ângulo de análise comparado à
linha tradicional dos autores que tratam deste tema. Acreditamos que o simples fato de um
superávit das reservas de gás comparadas ao consumo não são suficientes para lançar
uma integração regional, como argumenta a maioria dos trabalhos. No fim das contas,
poucos autores abordam o tema da integração através dos interesses dos atores internos,
das possibilidades físicas, técnicas e econômicas de cada país.
4. Bibliografia
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