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CENTRO UNIVERSITRIO DE BRASLIA - UniCEUB FACULDADE DE CINCIAS JURDICAS E SOCIAIS

DAN DE ARAJO PERCIO MONTEIRO

AS SENTENAS PARCIAIS DE MRITO E O CABIMENTO DA APELAO POR INSTRUMENTO COM A ALTERAO DO CONCEITO DE SENTENA PELA LEI N 11.232/2005.

Braslia 2011

DAN DE ARAJO PERCIO MONTEIRO

AS SENTENAS PARCIAIS DE MRITO E O CABIMENTO DA APELAO POR INSTRUMENTO COM A ALTERAO DO CONCEITO DE SENTENA PELA LEI N 11.232/2005

Monografia apresentada como requisito para concluso do curso de bacharelado em Direito do Centro Universitrio de Braslia. Orientador: Prof. Paulo Gustavo de Medeiros.

Braslia 2011

Agradeo aos meus pais pelo incentivo e crdito. Ao juiz Pedro Luiz Pozza pela pacincia e ajuda durante a elaborao deste trabalho. minha irm pelo debate.

RESUMOA presente monografia trabalha com a alterao do conceito de sentena a partir do advento da Lei n 11.232/2005 e suas repercusses. Ou seja, com essa modificao, visando unificao dos procedimentos, abriu-se a possibilidade de o juiz sentenciar parte da demanda, sem com isso implicar desrespeito ao princpio da unicidade de sentena, uma vez que o mesmo foi extirpado do sistema. Ademais, e a partir da aceitao de tais sentenas, que decidem o mrito da causa sem esgotar a lide, faz-se um estudo do cabimento das apelaes por instrumento, uma vez que no houve alterao do sistema recursal brasileiro. Com isso, ainda a apelao que desafia a sentena, mesmo que parcial. Palavras-chaves: Direito processual civil - sentena contedo sentenas parciais cabimento recursos apelao por instrumento possibilidade.

SUMRIO INTRODUO ................................................................................................... 6 11.1 1.2 1.3 1.4 1.4.1

DECISES JUDICIAIS DE PRIMEIRO GRAU .................................. 9Breve histrico .....................................................................................................9 No cdigo de processo civil .................................................................................9 Deciso interlocutria .......................................................................................10 Sentena ..............................................................................................................11 Sentena parcial de mrito ..............................................................................15

22.1 2.1.1 2.2 2.2.1 2.2.2 2.2.3 2.2.4 2.2.5 2.2.6

ANLISE DOS RECURSOS DE AGRAVO E APELAO ............. 21Agravo ................................................................................................................26 Agravo de instrumento .....................................................................................27 Apelao .............................................................................................................31 Cabimento ........................................................................................................31 Procedimento ...................................................................................................32 Prazo ................................................................................................................33 Efeitos...............................................................................................................33 Preparo ............................................................................................................35 Do recurso adesivo ..........................................................................................35

33.1 3.1.1 3.1.2 3.1.3 3.1.4 3.2 3.2.1 3.2.2

APELAO POR INSTRUMENTO .................................................... 37Pontos contrrios ...............................................................................................38 Taxatividade recursal ......................................................................................38 Responsabilidade pela formao do instrumento ............................................39 Invalidade ou necessidade de repetio dos atos praticados na origem ........40 Nmero excessivo de apelaes por instrumento de um nico processo ........40 Pontos favorveis ...............................................................................................41 Taxatividade recursal ......................................................................................41 Responsabilidade pela formao do instrumento ............................................43

3.2.3

Invalidade ou necessidade de repetio dos atos praticados na origem ........44

3.2.4 Nmero excessivo de apelaes por instrumento decorrentes de um nico processo .........................................................................................................................45 3.3 Anlise crtica ....................................................................................................46

CONCLUSO ................................................................................................... 47 REFERNCIAS ................................................................................................ 50

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INTRODUOA legislao referente s decises judiciais de primeiro grau de jurisdio era h muito ultrapassado, em relao prtica forense. Isso porque, apesar de delimitar de forma clara o conceito de sentena no conseguia no dia a dia uma eficincia perquirida. Sendo assim, foi editada a Lei no 11.232/2005 com o intuito de agilizar o recebimento do direito declarado ao vencedor. Uma vez que na gide da conceituao anterior e, antes de editada a Emenda Constitucional n 45, aps o trnsito em julgado da deciso no processo de conhecimento a parte vencedora era obrigada a ingressar com um novo processo para conseguir receber o que tinha direito. A lei acima citada alterou o conceito de sentena para unificar os procedimentos, permitindo que a parte intentasse o cumprimento de sentena no mesmo processo. Ocorre que, com essa alterao do conceito sentena, a mesma deixou de ser entendida como um ato que punha fim ao processo, ou seja, deixou de ser entendido por um critrio topolgico para ser, agora, um critrio conceitual. Essa mudana tem o fito de densificar os princpios da celeridade processual e da efetividade da Justia. Ademais, o princpio da unicidade de sentena deixou de ser seguido, uma vez que no pe fim ao processo. Com isso, ser que se abriu a possibilidade da prolao de sentenas parciais de mrito? Mas o que so esses institutos? Essas sentenas parciais devem ser utilizadas pelo juiz uma vez que o mesmo no pode mais se responsabilizar pela demora da demanda, ou de parte dela, se a causa j se encontra madura para apreciao? Entretanto, como o juiz e as partes iro se posicionar no processo caso haja um sentena parcial de mrito?

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A partir da utilizao desse novel instituto como se recorrer dele, uma vez que o sistema recursal ptrio no foi modificado, sendo que de sentena cabe apelao e de deciso interlocutria cabe agravo? Caso se mantenha o posicionamento de ser cabvel a apelao, como ser o processamento do mesmo? Haja vista que o pronunciamento judicial s cuidou de parte da demanda, necessitando ainda de decidir outra parte da lide. Essa deciso judicial a chamada tutela de evidncia, isso porque em sua resposta o ru afirma, ou deixa de se manifestar em relao parte da demanda, que o autor detm aquele direito, no criando embarao ao magistrado para prestar a tutela jurisdicional. Em se entendendo como cabvel a apelao e no podendo subir todo o processo que se traz baila o instituto da apelao por instrumento, com o intuito de no contrariar o sistema recursal e mesmo assim dar agilidade e eficincia ao processo. A presente pesquisa tem o escopo de estudar esse novo conceito de sentena e, a partir disso, verificar se houve a possibilidade de prolao de sentenas parciais de mrito e, havendo a possibilidade, se cabvel a apelao por instrumento dessas decises judiciais. Visando avaliar se essa alterao conceitual apta a alterar o dogma processual. Para esse fim, a pesquisa foi desenvolvida utilizando-se da metodologia dogmtica, pois houve a anlise da doutrina, da jurisprudncia e da legislao sobre o tema. No primeiro captulo sero estudadas as decises judiciais de primeiro grau de jurisdio, quais sejam decises interlocutrias e sentenas, sendo que o conceito de sentena analisado antes e depois da Lei n 11.232/2005, e suas implicaes. E, por conta dessa alterao, possibilidade de prolao das sentenas parciais de mrito. No segundo captulo, abordam-se os recursos cabveis das decises judiciais de primeiro grau de jurisdio. Esses recursos, agravo e apelao, so vistos em todas as suas caractersticas e procedimentos, desenvolvendo uma anlise do porqu de sua aplicao ao sistema brasileiro. Abrindo-se a discusso acerca da apelao por instrumento.

8

J no terceiro captulo da monografia, o foco a apelao por instrumento, demonstrando todo o seu processamento na prtica, com uma comparao entre os pontos contrrios e os favorveis sua aplicao.

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11.1

DECISES JUDICIAIS DE PRIMEIRO GRAUBreve histricoPara adentrar na seara dos mecanismos utilizados pelo juiz para falar no

processo, necessrio se faz uma pequena explanao acerca dos modos de resoluo de conflitos. A primeira foi a autotutela que quando aquele que tinha um interesse e queria vlo realizado fazia, atravs da fora, com que aquele que ao seu interesse resistisse acabasse observando-o.1 Em relao autocomposio a tcnica segundo a qual o conflito solucionado por ato das prprias partes, sem emprego de violncia, mediante ajuste de vontades.2 J a heterocomposio pode ser entendida como a tarefa de administrar justia, isto , a tarefa de aplicar o direito objetivo aos casos concretos, dando a cada um o que seu (...), a justia (...) passou a ser exercida, administrada pelo Estado3. Quando o Estado assumiu para si a funo de resolver os conflitos existentes entre os cidados, passando a adotar a forma da heterocomposio ao invs da autotutela ou da autocomposio, teve de criar mecanismos para adequar a nova sistemtica para se fazer representar. Tal representao se d por meio do Juiz, que a personificao do Estado no deslinde do conflito.

1.2

No cdigo de processo civilH no Cdigo de Processo Civil brasileiro ttulo que cuida especificamente

dos atos processuais, dentre os quais esto englobados os atos do juiz. Sendo esse o tema de1

MARINONI, Luiz Guilherme. ARENHART, Srgio Cruz. Curso de processo civil: Processo de conhecimento, v.2. 7. ed. So Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2008. p. 32. 2 NASCIMENTO, Amauri Mascaro. Curso de Direito Processual do Trabalho. 24. ed. So Paulo: Saraiva, 2009. p. 6. 3 TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Processo Penal, v.1. 25. ed. So Paulo: Saraiva, 2003. p. 6.

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estudo, falaremos a seguir dos atos do juiz, matria essa disciplinada na Seo III, do Captulo I, do Ttulo V, do CPC:Seo III Dos Atos do Juiz Art. 162. Os atos do juiz consistiro em sentenas, decises interlocutrias e despachos. 1o Sentena o ato do juiz que implica alguma das situaes previstas nos arts. 267 e 269 desta Lei. 2o Deciso interlocutria o ato pelo qual o juiz, no curso do processo, resolve questo incidente. 3o So despachos todos os demais atos do juiz praticados no processo, de ofcio ou a requerimento da parte, a cujo respeito a lei no estabelece outra forma.

Conforme se pode notar, so basicamente trs tipos de manifestaes proferidas pelo juiz no processo, seja decidindo, seja para impulsionar. Entretanto, deve-se ter em mente que o rol elencado no artigo 162 do CPC, acima transcrito, no taxativo, e sim exemplificativo. Insta salientar que, no presente trabalho, cuidaremos apenas de deciso interlocutria e sentena, isto porque os despachos no geram qualquer celeuma no campo recursal, objeto central da discusso a ser tratada aqui. Outro ponto que se faz esclarecer a inverso da ordem de abordagem de cada ato em si. Por questes didticas, primeiro trataremos das decises interlocutrias para posteriormente nos dedicarmos mais exaustivamente sentena.

1.3

Deciso interlocutriaA deciso interlocutria o pronunciamento com contedo decisrio

prolatado por juiz de primeiro grau fora dos casos dos artigos 267 e 2694. Entende-se como deciso interlocutria o ato do juiz que decide questo incidental no curso do processo.5 Ou seja, toda manifestao do juiz que no se encaixe nas hipteses dos artigos 267 e 269, no curso do processo e possua carter decisrio deciso interlocutria.

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SOUZA, Bernardo Pimentel. Dos recursos e dos processos nos tribunais. 4. ed. So Paulo: Saraiva, 2007, p. 157. 5 SILVA, Ovdio Arajo Baptista. Curso de Processo Civil. Volume 1 Processo de conhecimento. 5. ed. So Paulo: Revista dos Tribunais, 2000. p. 201.

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O entendimento acima esposado se deve a alterao do conceito de sentena trazida pela Lei n 11.232/2005 - a qual mudou, substancialmente, o entendimento de sentena. Desta forma, restou para a deciso interlocutria, por escolha do legislador ptrio, uma definio por excluso, ou seja, todo ato do juiz em primeira instncia que no sentena, mas possui carter decisrio. A definio lanada pelo cdigo serve precipuamente para saber qual o recurso cabvel contra o ato praticado pelo juiz. Ademais, o prprio cdigo determina quais os recursos cabveis para cada pronunciamento jurisdicional. Apesar de temerria a prtica de restrio em conceitos determinados, a mesma se mostra til, uma vez que impede a possibilidade de interpretaes polissmicas dadas pelos juristas ao caso concreto.6 Outro ponto que merece destaque que tal pronunciamento s tem carter de deciso interlocutria quando realizado no curso do processo, no existindo se o processo estiver acabado. Deve-se ter em mente, tambm, que tais decises preparam a causa para que o magistrado possa sentenciar a questo.7 H de repisar que, com o advento da Lei n 11.232/2005, algumas decises interlocutrias decidem o mrito da questo. Nesse sentido que a doutrina entende que essas decises seriam sentenas parciais de mrito8, tal problemtica ser aprofundado mais a frente.

1.4

SentenaSentena o ato do Estado-juiz por excelncia, ou seja, o ato pelo qual o

juiz corporifica a funo jurisdicional. Isto porque por meio desse ato que o mesmo decide a quem pertence o direito ali posto.

6

FILHO. Vicente Greco. Direito Processual Civil Brasileiro: Atos processuais a Recursos e Processos nos Tribunais. 2. v. 16. ed. So Paulo: Saraiva, 2003. p. 14. 7 MARINONI. Luiz Guilherme. MITIDIERO, Daniel. Cdigo de Processo Civil Comentado artigo por artigo. So Paulo: Revista dos Tribunais, 2008. p. 195. 8 MARINONI. Luiz Guilherme. MITIDIERO, Daniel. Cdigo de Processo Civil Comentado artigo por artigo. So Paulo: Revista dos Tribunais, 2008. p. 195.

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Possui um peso diferenciado uma vez que a responsabilidade maior do que a dos outros atos. Visto o carter decisrio o qual se reveste alterar a vida da sociedade, ante a caracterstica de pacificao social do processo. Tendo em mente que sentena , por excelncia, um ato de exerccio da funo jurisdicional, imperioso se fazer algumas reflexes sobre o conceito positivado pelo legislador de 1973. Apesar da latente evoluo, o conceito definido no englobava de forma satisfatria os casos concretos para a sociedade contempornea, certo que nenhum conceito tem tal pretenso. Contudo, por fora do expresso no primitivo artigo 162 do CPC, sentena era o ato pelo qual o juiz pe termo ao processo, decidindo ou no o mrito da causa. Ou seja, na vigncia de tal conceituao independia o contedo do pronunciamento, bastando simplesmente que tal pronunciamento estivesse localizado ao final do processo, utilizava-se um critrio topolgico para a conceituao, forma muito criticada pela doutrina uma vez que o proferimento da sentena no colocava fim ao processo por possibilidade de interposio dos recursos. Fazendo com que se encerrassem os meios de manifestao por parte do juiz. A conceituao j era criticada pelo fato de ter em seu bojo interpretaes contraditrias para a definio de um instituto, matrias essas que deveriam ser cuidadas pelos doutrinadores e no pelo legislador. Ademais, refora-se esta tese a observncia de que o ordenamento jurdico reflete, ainda que tardiamente, a sociedade em que estabelecido, nada mais justo do que a adequao dos institutos aos mecanismos e direitos decorrentes das novas relaes existentes. Baseando a interpretao do processo como um sistema necessrio se reputa o ensinamento de Marinoni para quem: preciso enxergar a verdadeira razo de ser dos procedimentos, dos provimentos e dos seus meios de execuo, para que se deixe de lado o apego despropositado s classificaes feitas a partir de conceitos baseados em realidades processuais que serviam a direitos de pocas passadas. Pensar que as classificaes no devem ser alteradas o mesmo que supor que os

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direitos de hoje so os mesmos do que os direitos de cem anos atrs e que, por esta razo, a realidade processual, e assim as classificaes que nela se baseiam, podem ser congeladas no tempo.9

Expoente dessa corrente, Bellinetti afirma:O conceito formal do art. 162 do CPC, j anteriormente citado, no o melhor, devendo ser expurgado do ordenamento, somente passando a vigorar aquele que diz ser a sentena o ato pelo qual se decide um litgio material autnomo, independente de encerrar o processo.10

Fundando-se em tal conceituao e visando a uma maior celeridade entre a deciso acerca de quem possui o direito e a real efetivao de tal direito que houve, com o advento da Lei n 11.232/2005, uma profunda alterao no enunciado de sentena. Tal mudana trouxe a baila o chamado processo sincrtico que pode ser melhor entendido nas palavras de Barbosa Moreira:[...]O novo processo sincrtico Convico assente nos meios jurdicos a de que a novidade capital introduzida pela Lei n. 11.232, de 22.11.05, consiste na juno das atividades jurisdicionais cognitiva e executiva, eliminando-se a diferenciao formal entre o processo de conhecimento e o de execuo, ressalvadas as hipteses do art. 475-N, pargrafo nico, do Cdigo de Processo Civil e a de ser devedora a Fazenda Pblica. Em vez de dois processos sucessivos, teremos um s, no qual se sucedero, ao longo de duas fases, mais praticamente sem soluo de continuidade, os atos de uma e de outra espcie.11

Com essa nova onda processual, a da sincretizao dos procedimentos, o antigo conceito de sentena no mais servia. Dado que, aceitar a sentena como o ato do juiz que pe fim ao processo feriria de morte a unio procedimental. Sendo esse o norte, que se alterou o 1, do art. 162, passando sentena a ser o ato do juiz que implica algumas das situaes previstas nos artigos 267 e 269 desta Lei.

9

MARINONI. Luiz Guilherme. O custo e o tempo do processo civil brasileiro. disponvel em: , acessado em 05 de out. de 2010. 10 BELLINETTI, Luiz Fernando. Sentena Civil: perspectivas conceituais no ordenamento jurdico brasileiro.So Paulo: Revista dos Tribunais, 1994. p.151-152. 11 MOREIRA, Jos Carlos Barbosa. Cumprimento e Execuo de Sentena: Necessidade Esclarecimentos Conceituais. Revista Magister de Direito Civil e Processual Civil. Magister, n. 13, 2006, p. 19

14

A sentena difere de sistema jurdico para sistema jurdico, visto ser um mecanismo de ordenao do regime, nesse sentido de Lucca deve-se ter em mente que o conceito de sentena jurdico-positivo, definido pelo legislador de acordo com os objetivos a serem perseguidos. Varia, portanto, de ordenamento para ordenamento.12 De acordo com Vicente Greco Filho:A definio legal conceitua sentena como a deciso terminativa, ou seja, aquela que pe fim ao processo, com ou sem julgamento de mrito. Na concepo doutrinria, sentena, em princpio, a deciso de mrito, ou seja, a que define ou resolve a lide, principal ou incidental. A sentena, portanto, no plano conceitual a terminativa definitiva...13

Contudo, com a entrada em vigor da supramencionada lei, sentena se transformou para agilizar a execuo do julgado. Conforme se verifica nas palavras de Vicente Grego Filho, transcritas abaixo:A alterao teve em mira compatibilizar o conceito s alteraes na execuo (Lei n. 11.232/2005), eliminando o processo de execuo para os ttulos judiciais, substituindo-o pelo cumprimento da sentena, sem necessidade de novo processo, adotando, pois, a chamada execuo per officium judicis, como fase executria do processo global, conhecimento e execuo em procedimento continuado...14

Nota-se assim, que a alterao teve o fito de mudar o entendimento acerca da execuo do julgado e a partir da o que se entendia por sentena. Isto porque, antes ela se baseava por sua finalidade e, assim era tida como marco final do processo. Agora, deve ser entendida por seu contedo, sendo classificada a partir dos arts. 267 e 269 do CPC, ou seja, caso haja algum pronunciamento judicial consubstanciado nos referidos diplomas estar-se- diante de uma sentena. Tal tese defendida por Eduardo Kochenborger Scarparo e por Marcus Vincius Rios Gonalves, quando os mesmos afirmam, respectivamente:A interpretao mais adequada face ao texto dos novos dispositivos conduz a outra abrangncia do conceito de sentena. Houve a quebra do critrio12

DE LUCCA, Rodrigo Ramina. Antecipao da tutela da parcela incontroversa do mrito e o conceito de sentena. Disponvel em: , acessado em 03 mar. 2010. 13 GRECO FILHO, Vicente. Direito processual civil brasileiro. v. 2, So Paulo: Saraiva. 2003. p.15 14 GRECO FILHO, Vicente. Direito processual civil brasileiro. v. 2, So Paulo: Saraiva. 2007. p.15

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topolgico para a sua conceituao. A adoo do critrio substancial mostrase percuciente para a acolhida, pelo processo brasileiro, de decises definitivas (sujeitas a coisa julgada) e no extintivas sequer da fase cognitiva do processo.15 Com a nova redao do art. 162, pargrafo 1, a aptido de extinguir o processo deixou de ser caracterstica essencial da sentena, que existir quando o juiz resolver o mrito, na forma do art. 269, ainda que, com isso, o processo no se extinga.16

Partindo-se, assim, da classificao por seu contedo e no mais por sua finalidade, criou-se no sistema ptrio a possibilidade de haver mais de uma sentena dentro de um mesmo processo, so as chamadas sentenas parciais, instituto comum no direito italiano. Nesse sentindo, Rodrigo Strobel Pinto, se no regime anterior era admissvel a prolao de apenas uma sentena em cada processo; na atual sistemtica possvel o proferimento de inmeras17.

1.4.1 Sentena parcial de mritoMas o que so essas sentenas parciais de mrito? Tais sentenas no ferem o princpio da unicidade da sentena? Pode haver sentenas parciais sem ser de mrito? Sentena parcial de mrito aquela que implica alguma das hipteses dos artigos 267 e 269, sem que enfrente todo o mrito posto ao crivo do Judicirio. O entendimento atualmente pacificado no Superior Tribunal de Justia de que no h trnsito em julgado parcial18, posicionamento que se sagrou vencedor no julgamento do REsp 404.777-DF. Sendo o posicionamento at ento em sentido contrrio, o de poder haver trnsito em julgado parcial.19 Entretanto, no toda doutrina que entende tal ato como sentena. Para muitos se trata de mera deciso interlocutria, isto porque no h o encerramento da prestao jurisdicional de primeiro grau.

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SCARPARO, Eduardo Kochenborger. Sentenas Parciais? Consideraes a partir da reforma do art. 162, 1., do CPC. In: Revista do Processo, RePro 148, ano 32 junho 2007, Revista dos Tribunais. p.161 16 GONALVES, Marcus Vincius Rios. A sentena volta a ser conceituada pelo contedo, e no pela aptido de encerrar o processo em primeiro grau. So Paulo: Saraiva. 2010. 6 ed. vol. 2. p. 02. 17 PINTO, Rodrigo Strobel. A 3 Etapa da Reforma Processual Civil e a Nova Sistemtica Recursal. In Revista de Processo, n. 137. So Paulo: Revista dos Tribunais, 2006. 18 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIA. 2 Turma. RESP n 404.777-DF. Relator: FRANCISCO PEANHA MARTINS. Braslia, DF, 21 de nov. de 2002. DJU de 09/06/2003. 19 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIA. 5 Turma. RESP n 331.888-RS. Relator: JOS ARNALDO DA FONSECA. Braslia, DF. 07 de nov. de 2002. DJU de 02/12/2002.

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Tal entendimento embasado no argumento de que com a alterao do cdigo, o legislador abriu a possibilidade de haver decises interlocutrias que decidem definitivamente o mrito da lide, sem, contudo poderem ser chamadas de sentena.20 Contudo, sero considerados tais pronunciamentos como verdadeiras sentenas, e mais, sentenas parciais. Rompendo, com isso, com o princpio da unicidade que norteava as diretrizes do processo civil ptrio, apesar de no disciplinado expressamente em qualquer dispositivo legal. Tal rompimento j podia ser visto, de forma incipiente, com o advento da Lei n 10.444/2002, uma vez que a mesma possibilitou a antecipao da tutela na hiptese de algum dos pedidos requeridos ser incontroverso, no necessitando assim de dilao probatria. Sendo, inclusive, tal tese defendida por Daniel Mitidiero:Essa circunstncia possibilita que se conceba sentenas parciais de mrito ao longo do procedimento, j que a sentena no mais, normativamente, o ato do juiz que extingue o processo. Pense-se, por exemplo, na deciso que define parcialmente o mrito da causa (art. 273, 6, CPC)21

O referido princpio determinava que para cada processo s poderia haver um pronunciamento judicial que decidisse toda a causa, mesmo possuindo vrios captulos. Isso em virtude, principalmente, da definio de sentena anterior Lei n 11.232/2005. de se revelar que o supramencionado instituto no sofrera mitigao, com a possibilidade de antecipao dos efeitos da tutela. Sendo certo que agora o legislador praticamente fulminou esse preceito. Feitas as consideraes acima, necessrio fazer alguns esclarecimentos acerca das sentenas parciais.

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MARINONI. Luiz Guilherme. MITIDIERO, Daniel. Cdigo de Processo Civil Comentado artigo por artigo. So Paulo: Revista dos Tribunais, 2008. p. 195 21 OLIVEIRA, Carlos Alberto Alvaro de (coord.). A nova execuo: comentrios Lei n 11.232, de 22 de dezembro de 2005. Rio de Janeiro: Forense, 2006. p. 08

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Sentenas parciais so pronunciamentos judiciais com verdadeiro contedo de sentena sem, com isso, exaurir toda a prestao jurisdicional. Isto porque ainda prescindem de dilao probatria os outros pedidos do processo.22 Uma definio muito bem lanada sobre sentena parcial dada por Felipe Camilo DallAlba, qual seja: a sentena parcial tem por caracterstica a possibilidade de decidir definitivamente umas das aes cumuladas, ou seja, um dos pedidos esto prontos para serem julgados, inexistindo razo para procrastinar sua resoluo.23 Impende ressaltar que, com a prolao dessas sentenas, os pedidos, por elas decididos, podem se revestir da coisa julgada material, no prescindido de confirmao por meio de outro pronunciamento, sendo certo que basta a no manifestao por parte do perdedor para que o mesmo transite em julgado, podendo inclusive ser alvo de cumprimento de sentena. Importante frisar que h, por parte da doutrina, resistncia aceitao da sentena parcial, pois nestes casos o recurso desafivel seria o da apelao, mas como se imaginar uma apelao de parte do mrito, sem com isso obstar o andamento do processo.24 Apesar da tentativa de esvaziamento e a mantena dos dogmas processuais, cada vez maior a aderncia possibilidade de prolao das sentenas parciais de mrito, tudo com o fito de cumprir o preceito constitucional de prestar a funo jurisdicional em um tempo razovel. Uma vez que no se mostra justa e eficiente a possibilidade de um processo se arrastar anos a fio, na busca de uma elucubrao de algum pedido que necessite de uma maior demonstrao do direito, enquanto outros j se mostram maduros de apreciao e, qui, de julgamento.

22

GONALVES, Jos Wilson. O recurso adequado para as sentenas parciais de mrito. Disponvel em: , acessado em: 20 de abr. de 2010. 23 DALLALBA, Felipe Camilo: Sentenas parciais de mrito: sua aplicao na praxe forense brasileira. Porto Alegre: Revista da Ajuris n 99, Ano XXXII, 2005, p. 366. 24 AYOUB, Luiz Roberto. PELLEGRINO, Antnio Pedro. A sentena parcial. Disponvel em: , acessado em 05 de out. de 2010.

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O ponto de maior destaque para a aceitao destas sentenas a celeridade na resposta judicial aos problemas postos tutela do Judicirio. Antes mesmo de ser aceita a utilizao da mesma, j era assente na doutrina a preocupao de uma resposta s lides de forma eficiente e eficaz. At porque sempre houve, por parte da doutrina, uma preocupao com a celeridade processual e a segurana jurdica, sendo certo que com o advento da lei em comento, o legislador privilegiou a celeridade, ante a demora em se efetivar a prestao jurisdicional. Importante frisar que esse instituto s tem relevncia quando h cumulao de pedidos e, mais, quando os mesmos so interdependentes. Ou seja, apesar de surgirem pelo mesmo fato, no guardam a mesma necessidade probatria para ser provado. Outro ponto de relevo o fato de ser possvel, com o advento da Lei n 11.232, as sentenas parciais de mrito, uma vez que na vigncia do conceito anterior j era possvel proferir sentenas parciais, sem ser meritrias. Essas sentenas so, por exemplo, aquelas quando o juiz no despacho saneador reconhece a ilegitimidade de uma das partes, ou quando no prprio saneador h o reconhecimento de prescrio ou decadncia de parte do pedido prosseguindo em relao ao restante. Nesses casos os recursos cabveis, expressamente no cdigo procedimental brasileiro, o agravo. Ser que realmente no so meritrias? No seria este um embrio das sentenas parciais de mrito conquanto admitidas sobre a denominao de deciso interlocutria? Isto porque em relao possibilidade jurdica do pedido, a que probe o prosseguimento do feito aquela facilmente detectvel, ou seja, to cristalina que no h cogitar a movimentao da mquina administrativa do Estado por uma medida intil, junte-se a isso a ausncia ou permisso em lei expressa do pedido.25 e 26

25

SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIA. 3 Turma. RESP n 909.968-DF. Relator: ARI PARGENDLER. Braslia, DF, 04 de abr. de 2008. DJU de 17/04/2008. 26 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIA. 6 Turma. RO n 81-SP. Relator: OG FERNANDES. Braslia, DF, 19 de mai. de 2009. DJU de 15/06/2009.

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Outro ponto de relevo o fato de j existir, em nosso ordenamento jurdico, sentenas parciais de mrito quais sejam: a) a primeira sentena em processos de prestao de contas; b) sentena nos casos de consignao; c) sentenas pendentes de liquidao. No primeiro caso o juzo decide primeiramente se devida ou no a prestao de contas. Com isso, no h um enfrentamento profundo do mrito cabendo esse aprofundamento em sentenas posteriores, no se fazendo necessrio o pronunciamento em um primeiro momento, s necessitando saber se devida ou no a obrigao de prestao de contas. Conforme o pargrafo 2, do artigo 915, do cdigo procedimental ptrio:Art. 915. Aquele que pretender exigir a prestao de contas requerer a citao do ru para, no prazo de 5 (cinco) dias, as apresentar ou contestar a ao. 1o Prestadas as contas, ter o autor 5 (cinco) dias para dizer sobre elas; havendo necessidade de produzir provas, o juiz designar audincia de instruo e julgamento; em caso contrrio, proferir desde logo a sentena. 2o Se o ru no contestar a ao ou no negar a obrigao de prestar contas, observar-se- o disposto no art. 330; a sentena, que julgar procedente a ao, condenar o ru a prestar as contas no prazo de 48 (quarenta e oito) horas, sob pena de no Ihe ser lcito impugnar as que o autor apresentar.

No segundo caso, a Ao de Consignao fundada em dvida sob quem apto a receber a sentena proferida pelo magistrado, tambm, parcial, isto porque em um primeiro momento ele decidir se a dvida pertinente e assim liberar ou no o devedor/autor. Tal caso tem previso no artigo 898, do CPC:Art. 898. Quando a consignao se fundar em dvida sobre quem deva legitimamente receber, no comparecendo nenhum pretendente, converterse- o depsito em arrecadao de bens de ausentes; comparecendo apenas um, o juiz decidir de plano; comparecendo mais de um, o juiz declarar efetuado o depsito e extinta a obrigao, continuando o processo a correr unicamente entre os credores; caso em que se observar o procedimento ordinrio.

Mais um caso para corroborar a utilizao das sentenas parciais acontece com as sentenas pendentes de liquidao. A qual em um primeiro momento o juiz sentencia no sentido de esclarecer a quem cabe o direito pleiteado e, aps determina a forma que se liquidar esse direito, a fim de encerrar a discusso meritria. Sendo que, apesar de se referir ao mrito tal pronunciamento, a doutrina entende ser atacvel essa segunda por agravo.

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Tal possibilidade surgiu com o advento da Lei n 11.232/2005, que instituiu os casos de liquidao da sentena, no captulo IX, do Cdigo de Processo Civil. Com a tese e os exemplos acima expostos a utilizao de sentenas parciais de mrito mostrou-se plenamente possvel. Contudo, a grande celeuma se situa em saber qual o recurso cabvel de tais atos do juiz, isto depende se o entendimento pela deciso interlocutria ou sentena. Isto porque, caso se entenda como deciso interlocutria o recurso cabvel o agravo, em regra retido, isto devido Lei n 11.187/2005. Em posio diametralmente oposta, se o posicionamento o de defender como sentena, insofismavelmente que o recurso cabvel a apelao, com todas as suas caractersticas e implicaes. No caso de se aceitar a apelao como se processar tal recurso sendo que parte do pedido ainda necessita de dilao probatria.

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ANLISE DOS RECURSOS DE AGRAVO E APELAOA palavra recurso tem sua origem no latim, mais precisamente na palavra

recursus, que, em uma anlise etimolgica, d uma idia de voltar o curso, caminho. Com isso, tem-se a idia de que recurso a tentativa de volta do caminho at ento empregado, na tentativa de suprir qualquer falha ou impreciso.27 e 28 Se o termo significa uma volta ao caminho o conceito - que deve refletir o sistema jurdico a que est adstrito - tambm deve refletir a busca pela volta no intuito de aperfeioar a resposta jurisdicional. Logo, recurso pode ser entendido como a medida judicial que tem por objetivo impugnar uma deciso, reformando-a, anulando-a ou integrando-a, submetendo a questo ao prprio rgo prolator ou a rgo superior.29 Contudo, tal definio no esgota seu significado, isto porque algumas peculiaridades que a diferenciam de outros meios de impugnao de decises no estariam refletidas, quais sejam: Voluntariedade ningum obrigado a interpor recurso de deciso desfavorvel a seu interesse. Sendo este ponto que a diferencia do reexame necessrio, isto porque esse obrigatrio, enquanto aquele depende nica e exclusivamente da parte. O direito a interpor recurso uma faculdade das partes, ou seja, as mesmas no esto obrigadas a interpor tal medida pelo simples fato de verem vencida sua pretenso. J no caso de reexame necessrio, a Unio no possui tal liberalidade, sendo dever de ofcio do magistrado em proporcionar o re-exame da matria, com base no artigo 475 do Cdigo Procedimental ptrio.27

MIRANDA, Gilson Delgado. PIZZOL, Patricia Miranda. Recursos no Processo Civil. So Paulo: Atlas, 2006. 5. ed. p.1. 28 ALVIM, Jos Eduardo Carreira. Teoria geral do processo. Rio de Janeiro: Forense, 2007. 11. ed. p. 309. 29 BORGES, Marcos Afonso. Recursos Cveis. Goinia: AB Editora, 2000. 3. ed. p. 3.

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Mesmo processo o recurso deve ser interposto dentro do mesmo processo no qual foi proferida a deciso impugnvel, seja na mesma instncia, seja em grau superior de jurisdio. Nesse aspecto que se diferencia recurso das aes autnomas de impugnao. Como bem ressalta Flvio Cheim Jorge acerca da continuidade da ao do processo em relao ao recurso:[...] possvel observar que o recurso uma forma de renovar o exerccio do direito de ao em uma fase seguinte do procedimento. Caracteriza-se, pois, como uma extenso do direito de ao e de defesa em grau, de regra, hierarquicamente superior.30

Acrescendo esses aspectos, podemos definir recurso como espcie voluntria de impugnao de deciso, o qual deve ser manejado no mesmo processo, visando reforma, invalidao, anulao ou integrao da mesma, sendo que tal apreciao se dar pela mesma instncia prolatora ou por uma de superior grau de jurisdio. O recurso, no ordenamento ptrio, tem como fundamento a segurana jurdica, a qual se divide em duas razes: uma a possibilidade de erro quando do proferimento da deciso e a outra a necessidade que o homem tem em no se conformar com algo desfavorvel.31 A primeira razo se baseia no fato de que os juzes, por mais que sejam altamente capacitados, so seres humanos e assim passveis de erros. O que se busca afastar a incidncia de vcios que porventura possam existir na deciso impugnada. A segunda razo decorre da personalidade humana em no se contentar com aes, atitudes, que vo de encontro com seus interesses. E sendo assim, no se aquietam at se sentirem satisfatoriamente respondidos em suas dvidas e anseios. Aqui em uma viso mais antropolgica do sistema.

30

JORGE. Flvio Cheim. Teoria geral dos recursos cveis. 3. ed. rev., ampl. e atual. com a reforma processual 2006/2007. So Paulo: Revista dos Tribunais, 2007. p. 49. 31 JORGE. Flvio Cheim. Teoria geral dos recursos cveis. 3. ed. rev., ampl. e atual. com a reforma processual 2006/2007. So Paulo: Revista dos Tribunais, 2007. p. 19.

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Outras caractersticas que advm com o conceito trazido lume que o recurso uma indignao a algum ato do juiz. Ou seja, no se dirige outra parte, mas a algum pronunciamento do juiz, com o fim especfico de ser revertido em proveito da parte que a requereu. Com a conceituao do instituto do recurso, percebe-se que, para que seja til e eficaz sua utilizao, necessrios se fazem graus distintos de julgamento para rever o pronunciamento judicial. Com isso, apercebe-se a existncia de dois graus da jurisdio, que, apesar de ser una, assim entendida como ser a mesma em todo territrio nacional para todo o sistema, se divide em competncias, que nada mais do que uma parcela da jurisdio que deve ser efetivamente exercida por um rgo ou um grupo de rgos do Poder Judicirio32. O presente trabalho se afilia tese defendida por Marcos Afonso Borges33, de existir apenas dois graus de jurisdio, sendo o primeiro composto pelo juiz e o segundo pelo tribunal a qual o mesmo pertence. No entrando nessa classificao o Superior Tribunal de Justia e o Supremo Tribunal Federal. Tal excluso dos tribunais superiores se explica, pois esses tribunais extraordinrios no fazem uma anlise integral do processo, s sendo possvel aos mesmos analisar a matria posta ao seu crivo, no sendo permitido adentrar em outras matrias que, embora se refiram ao processo, no foram mencionados no recurso. Pois, o fim precpuo destes tribunais de zelar por uma congruncia de entendimento seja da Constituio, seja de lei infraconstitucional. Com isso, no h porque adentrar na investigao dos fatos, at porque no far diferena para o entendimento da contradio. Sendo que os pronunciamentos s podero ser dados aps deciso de outro tribunal, conforme artigo 102, cabea e inciso III, bem como o artigo 105, inciso III. Sendo assim, possvel crer que trs so os pressupostos dos recursos. So eles: existncia, subjetivo e objetivo. O primeiro se refere ao duplo grau de jurisdio, ou seja,

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MARINONI, Luiz Guilherme. ARENHART, Srgio Cruz. Curso de processo civil: Processo de conhecimento, v.2. 7. ed. So Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2008. p. 37 33 BORGES, Marcos Afonso. Recursos Cveis. Goinia: AB Editora, 2000. 3. ed. p. 4.

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para que haja uma apreciao profunda do processo, com o fim de aperfeioar o pronunciamento, preciso a existncia de um grau superior quele que proferiu o ato. O subjetivo se refere pessoa que est intentando o recurso, ou seja, a parte que se sentiu lesada, ou no totalmente satisfeita com a deciso. J o objetivo o ligado ao prprio instituto recursal, ou seja, para que seja cabvel o recurso, obrigatrio que o ato que se est recorrendo seja passvel de recorrer, deve tambm ser adequado o meio utilizado, bem como se intentado dentro do prazo estabelecido para tal.34 Ultrapassada esta fase, importante mencionar os efeitos que os recursos podem ter, so eles: suspensivo, devolutivo, expansivo, translativo e substitutivo. O primeiro obsta que a deciso produza seus efeitos imediatamente35, postergando a anlise da matria, est relacionada com a eficcia da deciso36. O efeito devolutivo o que devolve ao tribunal a possibilidade de reapreciao da matria da lide, em regra limitando-se a extenso do recurso37. o efeito principal de todos os recursos, uma vez o prprio instituto j uma consequncia lgica desse efeito. Em relao ao efeito expansivo, o fundamento jurdico est na norma insculpida nos artigos 267, pargrafo 3 e 301, pargrafo 4, ambos do CPC, nos dizeres de Luiz Henrique Barbante Franz38. Isto porque, em referidos artigos, est a possibilidade do conhecimento de ofcio pelo Juzo de matria no versada nos pronunciamentos anteriores. Ademais, tal efeito refere-se possibilidade do aproveitamento por outras partes, se no a recorrente, do julgamento, como o caso de haver na lide litisconsortes em que o acolhimento dos termos do recurso aproveita aos demais, o chamado efeito expansivo subjetivo.

34 35

BORGES, Marcos Afonso. Recursos Cveis. Goinia: AB Editora, 2000. ed. 3. p. 4 e 5. DIDIER JUNIOR, Fredie. DA CUNHA, Leonardo Jos Carneiro. Curso de Direito Processual Civil: meios de impugnao s decises judiciais e processo nos tribunais. Salvador: JusPodivm, 2009. v. 3. ed. 7. p. 81. 36 MIRANDA, Gilson Delgado. PIZZOL, Patricia Miranda. Recursos no Processo Civil. So Paulo: Atlas, 2006. 5. ed. p. 35. 37 ALVIM, Jos Eduardo Carreira. Teoria geral do processo. Rio de Janeiro: Forense, 2007. 11 ed. p. 321. 38 FRANZ, Lus Henrique Barbante. Agravo frente aos pronunciamentos de primeiro grau no processo civil. Curitiba: Juru, 2005. 3 ed. p. 121.

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H a possibilidade do efeito expansivo objetivo, sendo que este pode ser de ordem interna, acolhimento de preliminar, ou de ordem externa, quando h o provimento de apelao sendo que o processo estava com execuo provisria do julgado. Por conceituao doutrinria, o quarto efeito possvel para os recursos um desdobramento do efeito devolutivo. Isto porque, o efeito translativo refere-se profundidade a qual o tribunal poder adentrar no exame da matria, sem com isso ferir o brocado tantum devolutum quantum appellatum. Tal efeito a possibilidade do tribunal poder apreciar uma questo fora dos limites impostos pelo recurso.39 O efeito substitutivo acontece quando o pronunciamento do tribunal, quando acolhedor dos termos do recurso, tem o condo de substituir o pronunciamento do juiz a quo40. Ou seja, a partir da publicao, a parte, caso queira recorrer, dever atacar os termos do Acrdo e no mais da deciso, em sentido amplo. Os recursos esto previstos no Ttulo X, captulo I do Cdigo de Processo Civil, mais especificamente no artigo 496:Art. 496. So cabveis os seguintes recursos: I - apelao; II - agravo; III - embargos infringentes; IV - embargos de declarao; V - recurso ordinrio; VI - recurso especial; VII - recurso extraordinrio; VIII - embargos de divergncia em recurso especial e em recurso extraordinrio.

Nesta pesquisa s sero abordados os dois primeiros recursos, apelao e agravo, uma vez que so os cabveis para impugnar pronunciamentos dos juzes em primeiro grau de jurisdio, e que com a alterao do conceito de sentena, tm relevncia ao tema.

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DIDIER JUNIOR, Fredie. DA CUNHA, Leonardo Jos Carneiro. Curso de Direito Processual Civil: meios de impugnao s decises judiciais e processo nos tribunais. Salvador: JusPodivm, 2009. v. 3. 7 ed. p. 85. 40 FRANZ, Lus Henrique Barbante. Agravo frente aos pronunciamentos de primeiro grau no processo civil. Curitiba: Juru, 2005. 3 ed. p. 125.

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2.1

AgravoO recurso de agravo foi previsto, quando da criao do CPC de 1973, para

atacar as decises interlocutrias41, ou seja, os pronunciamentos com carter decisrio de questes incidentais no curso do processo42. de se notar que o agravo o recurso mais tradicional no direito brasileiro, tendo previso nas Ordenaes Afonsinas e, at os dias atuais sendo utilizados por todo o sistema jurdico. um instrumento cabvel em qualquer procedimento positivado no direito brasileiro, bastando para tanto que a parte que a interponha rena os requisitos necessrios, sem esquecer, contudo, do prazo para tanto. O principal efeito deste recurso o devolutivo uma vez que, por ocasio da positivao pelo legislador originrio de 1973, tal recurso no deveria influenciar o processo no 1 grau43. Sendo certo que, quando da interposio do referido instituto processual, o mesmo devolve ao tribunal somente a matria impugnada. Apesar de no ter, em regra, efeito suspensivo, o mesmo pode ser requerido pelo agravante, caso haja o preenchimento dos requisitos periculum in mora e fumus boni iuris, que ser analisado pelo relator quando do recebimento do recurso 44. Mas essa possibilidade de atribuio de efeito suspensivo a agravo, prevista no artigo 527, III do CPC, s pode acontecer na modalidade de agravo de instrumento, tipo que ser delineado mais a frente. O agravo tem sua previso insculpida no artigo 522 do CPC:Das decises interlocutrias caber agravo, no prazo de 10 (dez) dias, na forma retida, salvo quando se tratar de deciso suscetvel de causar parte leso grave e de difcil reparao, bem como nos casos de inadmisso da41

MARINONI, Luiz Guilherme. ARENHART, Srgio Cruz. Curso de processo civil: Processo de conhecimento, v.2. 7. ed. So Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2008. p. 542. 42 BORGES, Marcos Afonso. Recursos Cveis. Goinia: AB Editora, 2000. 3. ed. p. 23. 43 WAMBIER, Teresa Arruda Alvim. Os agravos no CPC brasileiro. So Paulo: Revista dos Tribunais, 2000. 3. ed. p. 215. 44 MARINONI, Luiz Guilherme. ARENHART, Srgio Cruz. Curso de processo civil: Processo de conhecimento, v.2. 7. ed. So Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2008. p. 545.

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apelao e nos relativos aos efeitos em que a apelao recebida, quando ser sua interposio por instrumento.

Conforme se verifica da leitura do referido artigo a regra geral de interposio do agravo em sua forma retida, contudo no esse o cerne do problema aqui ventilado. Mas sim o agravo de instrumento que vem gerando conflito na doutrina em relao ao tema aqui abordado. Sendo assim, passamos anlise de referido instituto.

2.1.1 Agravo de instrumentoO agravo do instrumento o recurso cabvel das decises interlocutrias, porm s possvel o seu manejo caso haja uma urgncia nessa medida, ou seja, o referido recurso tem cabimento quando a parte busca uma resposta rpida da Justia, mas tal resposta pode prejudicar seu direito caso no seja apreciado de imediato seu pedido, ademais tal recurso tambm tem a inteno de obstar que a deciso produza seus efeitos legais.45 Questo importante a trazida por Luiz Henrique Barbante Franz quando da conceituao do referido recurso, qual seja:[...] o agravo de instrumento modalidade recursal interposta diretamente no tribunal competente, possuindo o efeito devolutivo como regra (podendo, entretanto, ter efeito suspensivo para preservar sua efetividade), voltado para o deslinde das questes diversas da sentena, que tenham contedo decisrio capaz de causar gravame.46

Aps atenta leitura da conceituao acima nota-se que as decises aptas a sofrer o desafio do agravo de instrumento so aquelas que no se prestam a decidir o mrito, mas apenas questes incidentes. Limita-se normalmente ao efeito devolutivo, o qual leva ao reexame apenas da deciso proferida pelo tribunal. Pode, entretanto, ser concedido efeito suspensivo a fim de eliminar o risco de danos srios e irreparveis ou de reparao problemtica (art. 558), desde que haja relevante fundamentao.

45

FRANZ, Lus Henrique Barbante. Agravo frente aos pronunciamentos de primeiro grau no processo civil. Curitiba: Juru, 2005. 3 ed. p. 156. 46 FRANZ, Lus Henrique Barbante. Agravo frente aos pronunciamentos de primeiro grau no processo civil. Curitiba: Juru, 2005. 3 ed. p. 157.

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Contudo, no so apenas nos casos supramencionados que tem lugar o Agravo de Instrumento, possvel tambm quando o juiz inadmitir a apelao ou em relao ao efeito atribudo Apelao pelo juzo a quo47. 2.1.1.1 Procedimento O recurso interposto diretamente no tribunal, no necessitando assim que os autos subam para apreciao do recurso, revelando o carter primordial de no interromper o andamento do processo. Importante regra prevista no CPC a do artigo 526, que impe ao agravante, no prazo de 3 (trs) dias, requerer a juntada ao processo na 1 instncia, de cpia da petio do agravo de instrumento interposto e do comprovante de interposio, bem como a relao de documentos que foram anexados ao recurso, sob pena de inadmissibilidade do recurso, desde que o agravado requeira e comprove o descumprimento por parte do agravante. A expresso instrumento expressa essa desnecessidade de interromper o andamento do processo para que seja julgado o recurso. Isto porque se forma um instrumento, que nada mais do que cpia de certas peas que a lei determine como obrigatrias para instruir o referido recurso. O instrumento forma um processo parte, composto pelas razes e contrarrazes dos litigantes e cpias necessrias compreenso e julgamento da impugnao. Ser processado fora dos autos da deciso impugnada, pois os autos no sobem juntamente com o recurso. A previso desse recurso est nos artigos 524 e 525 do CPC e nas alneas que determinam quais so as peas obrigatrias para o conhecimento e de outras que a parte julgar necessrias para o real entendimento dos fatos. So peas obrigatrias a cpia da deciso agravada, da certido de intimao da deciso, das procuraes outorgadas aos advogados do agravante e do agravado e o comprovante de pagamento da custas. Sendo que devem ser anexadas ao recurso no momento de sua interposio, no se admitindo a juntada posterior, nesse sentido importante ensinamento provm de Teresa Arruda Alvim:47

DIDIER JUNIOR, Fredie. DA CUNHA, Leonardo Jos Carneiro. Curso de Direito Processual Civil: meios de impugnao s decises judiciais e processo nos tribunais. Salvador: JusPodivm, 2009. v. 3. ed. 7. p.152.

29

Interposto o recurso, no se mais admitir a juntada de peas ou razes, mesmo que se esteja, ainda, dentro do prazo. Presume-se, com a apresentao do recurso no 2 dia, por exemplo, que a parte tenha aberto mo do resto do prazo, configurando-se precluso consumativa: o recurso j ter sido interposto, e mal interposto.48

2.1.1.2

Prazo O prazo para interposio do Agravo de instrumento o mesmo do Agravo

Retido, qual seja, 10 (dez) dias. Sendo que tal prazo comea a fluir quando da publicao da deciso que ser impugnada ou quando a parte tomar cincia da mesma. Para tal modalidade, diferentemente do Agravo Retido, deve haver o recolhimento de custas que deve ser comprovado quando do protocolo do recurso no tribunal. Caso no seja comprovado o pagamento o recurso no ser conhecido por falta de pressuposto extrnseco, estando assim deserto o mesmo. Aps o recebimento do recurso o mesmo ser distribudo a um relator que ter 5 (cinco) hipteses procedimentais, conforme incisos do artigo 527 do CPC: I poder negar seguimento caso o recurso seja manifestamente inadmissvel, improcedente, prejudicado ou em confronto com smula ou com jurisprudncia dominante do respectivo tribunal, do STF, ou do STJ; II poder converter o agravo de instrumento em retido, quando no vislumbrado os motivos ensejadores da interposio do instrumento, no caracterizando grave prejuzo ao agravante, sendo que mandar remeter os autos ao juiz da causa; III poder atribuir efeito suspensivo ao recurso, nos casos de priso civil, adjudicao, remio de bens, levantamento de dinheiro sem cauo idnea e em outros casos dos quais possa resultar leso grave e de difcil reparao, ou deferir, em antecipao de tutela, total ou parcialmente, a pretenso recursal, comunicando ao juiz essa deciso;48

WAMBIER, Teresa Arruda Alvim. Os agravos no CPC brasileiro. So Paulo: Revista dos Tribunais, 2000. 3. ed. p. 191.

30

IV poder requisitar informaes ao juiz da causa; V poder mandar intimar o agravado para que responda aos termos do recurso, no mesmo prazo. Depois de intimado o agravado, o relator requerir, em um prazo mximo de 30 (trinta) dias, dia para julgamento, com base no artigo 528 do cdigo procedimental brasileiro. Como assentado por Luiz Guilherme Marinoni, nos recursos de agravo no h o revisor do recurso, como acontece na apelao, mas apenas vogais, que votaro com respaldo no relatrio dado pelo relator do processo. Contudo, no quer dizer que o vogal no possa pedir vista dos autos para uma anlise mais perfunctria da causa.49 Ponto que diferencia o agravo de instrumento da apelao a impossibilidade de sustentao oral quando do julgamento do recurso. No processo proveniente de agravo de instrumento no existe a possibilidade de sustentao oral dos advogados das partes, concorde expressamente previsto no artigo 554 do CPC. presente, no recurso de agravo, a possibilidade de retratao pelo magistrado a quo, ou seja, quando da interposio do agravo de instrumento o juiz, caso entenda estar configurado algum erro em seu pronunciamento, pode se retratar e alterar a deciso guerreada, essa alterao est prevista no artigo 529 do CPC. Caracterstica nica do recurso de agravo o fato de quando houver alguma afronta a texto infraconstitucional ou constitucional que os recursos cabveis, Especial e Extraordinrio, ficaro sobrestados at deciso final, norma essa insculpida no pargrafo 3 do artigo 542, do CPC.

49

MARINONI, Luiz Guilherme. ARENHART, Srgio Cruz. Curso de processo civil: Processo de conhecimento, v.2. 7. ed. So Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2008. p. 553.

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2.2

ApelaoO recurso de apelao o recurso por excelncia50, ordinrio51, o primeiro

recurso previsto no Cdigo de Processo Civil, servindo de base, no que couber, para todos os outros recursos. de cognio ampla porquanto permite que se impugne a ilegalidade ou a injustia da sentena, bem como propicia o reexame de toda a prova produzida no processo.

2.2.1 Cabimento o recurso por meio do qual se desafia uma sentena, ou seja, um pronunciamento de juiz de primeiro grau de jurisdio com carter decisrio, que tenha ou no resolvido o mrito, ou concedido ou negado uma tutela postulada, levando a causa a um reexame dos autos por um colegiado, com vistas a reformar, anular, ou completar tal pronunciamento. O cabimento deste instituto est previsto no artigo 513 do CPC, que afirma que sempre que houver uma sentena o recurso apto a impugn-lo a apelao. Importante lembrar que tal recurso tem utilidade em todos os procedimentos previstos no CPC: ordinrio, cautelar ou executrio. O presente recurso, tambm, s tem cabimento contra pronunciamento de juiz de primeiro grau de jurisdio, no havendo possibilidade de interposio do mesmo contra decises monocrticas de desembargadores e acrdos. Caracterizando, quando interposto, erro grosseiro no se admitindo a aplicao do princpio da fungibilidade recursal. At porque existem outros mecanismos para se desafiar decises monocrticas e acrdos.52 A grande celeuma que se tem em torno deste recurso advm da alterao de seu conceito com a Lei n 11.232/2005, que determinou que sentena, agora, todo o pronunciamento do juiz que implique alguma das hipteses previstas nos artigos 267 e 269.

50

DIDIER JUNIOR, Fredie. DA CUNHA, Leonardo Jos Carneiro. Curso de Direito Processual Civil: meios de impugnao s decises judiciais e processo nos tribunais. Salvador: JusPodivm, 2009. v. 3. ed. 7. p. 97. 51 MIRANDA, Gilson Delgado. PIZZOL, Patricia Miranda. Recursos no Processo Civil. So Paulo: Atlas, 2006. 5. ed. p.52. 52 SOUZA, Bernardo Pimentel. Dos recursos e dos processos nos tribunais. So Paulo: Saraiva, 2007, 4. ed. p. 161.

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2.2.2 ProcedimentoO procedimento da Apelao est previsto no artigo 514 do CPC, qual seja, a petio deve ser dirigida ao juiz da causa para que o mesmo receba o recurso em seus legais efeitos, aps abre-se vista dos autos outra parte para ento encaminhar os autos ao tribunal para julgamento:Art. 514. A apelao, interposta por petio dirigida ao juiz, conter: I - os nomes e a qualificao das partes; II - os fundamentos de fato e de direito; III - o pedido de nova deciso.

Apesar de a interposio ser feita em primeiro grau de jurisdio, o juzo a quo no tem competncia para adentrar o mrito do recurso e assim rever a sentena proferida, s podendo fazer um juzo de admissibilidade recursal. Ou seja, s poder verificar se os requisitos necessrios para se admitir a continuidade do recurso esto presentes ou no e, definir em quais efeitos ser admitida a apelao.53 S h dois casos de retratao por parte do juiz a primeira quando h o proferimento de sentena liminar, que est prevista no artigo 285-A, pargrafo 1, que quando h um indeferimento da petio inicial de plano, ou seja, por j ter indeferido totalmente diversas causas com os mesmos fatos o juiz formou uma base slida para negar de plano os pedidos. A segunda quando a causa se referir a procedimento do Estatuto da Criana e do Adolescente. A Lei 11.276/2006 trouxe um importante impedimento de interposio da Apelao, tal fato acontece quando a sentena estiver de acordo com smula do STJ ou do STF, a chamada smula impeditiva de recurso, que visa a obstar o abarrotamento dos tribunais com questes reiteradamente decididas e pacificadas nos tribunais ptrios. Esse indeferimento pronunciado pelo relator do recurso Em caso de inadmisso no juzo a quo, o apelante poder interpor Agravo de instrumento como forma de destrancar o recurso e fazer com que o tribunal analise, conforme artigo 522 do CPC.

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DIDIER JUNIOR, Fredie. DA CUNHA, Leonardo Jos Carneiro. Curso de Direito Processual Civil: meios de impugnao s decises judiciais e processo nos tribunais. Salvador: JusPodivm, 2009. v. 3. ed. 7. p. 129.

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Aps receber as contrarrazes apelao o juiz poder rever sua posio acerca do recebimento do recurso e negar-lhe seguimento no prazo de 5 (cinco) dias, previso esta no artigo 518, pargrafo 2 do CPC. Cabendo nesse caso o agravo de instrumento do artigo 522 do CPC. Quando esto presentes todos os pressupostos de admissibilidade do recurso o mesmo enviado ao tribunal que o distribuir a um relator, sendo que no caso da apelao, alm do relator h o chamado revisor, regra insculpida no artigo 551 do CPC, e ser julgada por uma turma com composio de 3 (trs) membros. Quando do julgamento pela turma da apelao os advogados das partes podem fazer uma sustentao oral de suas razes, com o fito de possibilitar a ampla defesa de seus clientes, o que prev o artigo 554 do CPC. Essa outra diferenciao em relao ao agravo de instrumento, uma vez que nesse no h essa possibilidade. Outra regra diferenciadora da apelao para o agravo que em caso de interposio dos Recursos Especiais e Extraordinrios.

2.2.3 PrazoComo tem um rito diferente, logicamente, tem um prazo para interposio tambm diferenciado em relao ao Agravo de Instrumento. O prazo est previsto no artigo 508 do CPC, que de 15 (quinze) dias, contados da publicao da sentena, ou da cincia por parte do recorrente da sentena que ser impugnada. O prazo para a interposio dos recursos visa dar uma segurana jurdica s decises judiciais, com a conseqente materializao da coisa julgada, caso as partes se mantenham inertes em relao ao pronunciamento. Com isso, pretendeu, o legislador, favorecer a concretizao do direito decidido na lide, para que o vencedor possa, ultrapassado o tempo necessrio, poder cobrar sua pretenso frente a outra parte.

2.2.4 EfeitosConforme acima exposto o recurso de Apelao em regra recebido no duplo efeito, suspensivo e devolutivo, podendo em alguns casos ter apenas o devolutivo como efeito. Os casos em que so recebidos apenas com um efeito so os estabelecidos nos incisos

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do artigo 520 do CPC, quais sejam, quando a sentena desafiada a) homologar a diviso ou demarcao; b) condenar prestao de alimentos; c) decidir processo cautelar; d) rejeitar liminarmente embargos execuo ou julg-los improcedentes; e) julgar procedente o pedido de instituio de arbitragem; f) confirmar a antecipao dos efeitos da tutela. O efeito devolutivo da Apelao significa que o tribunal que ir julgar o recurso poder apreciar toda a matria impugnada pelo recorrente, mesmo que suas razes no digam respeito a toda a matria dos autos. Entretanto, o tribunal por fora da profundidade do efeito devolutivo pode adentrar matria no apreciada na sentena, ou que no tenha sido suscitada no recurso, isso por previso expressa nos artigos 515 e 516 Cdigo de Buzaid. O efeito suspensivo previsto para esse recurso impede com que haja o trnsito em julgado da sentena, isso no quer dizer que o efeito suspensivo se refira a noexecutoriedade dos efeitos da sentena, mas mais alm. Isto porque existem sentenas que no tem carga condenatria, sendo meramente declaratrias ou constitutivas, no implicando assim um fazer ou no fazer do sucumbente.54 Apesar do artigo 520 prever apenas o efeito devolutivo para a Apelao, pode o recorrente, demonstrando que caso no seja atribudo o efeito suspensivo sofrer leso grave ou se difcil reparao55, poder pleite-lo. Um princpio de suma importncia o da reforma para piorar ou como nominado pela doutrina reformatio in pejus, que determina que o recurso interposto no pode piorar a situao da parte que interps o mesmo. Necessrio se faz o esclarecimento acerca deste princpio, isto porque alguns estudiosos podem ver um desrespeito do referido princpio quando o recurso de uma das partes piora a situao da outra, nesse caso no h uma reforma para pior da sentena contra a parte que recorreu. H casos em que ambas as partes interpem seus recursos sendo apenas um deles provido, nesse caso no h reformatio in pejus, pois a parte que foi sucumbente teve sua situao piorada por ocasio do recurso da outra parte e no por conta de seu recurso.

54 55

APRIGLIANO, Ricardo de Carvalho. A apelao e seus efeitos. So Paulo: Atlas, 2003. p. 224. MIRANDA, Gilson Delgado. PIZZOL, Patricia Miranda. Recursos no Processo Civil. So Paulo: Atlas, 2006. 5. ed. p. 73.

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2.2.5 PreparoO preparo devido, tambm, na Apelao sendo que sua falta de preparo acarreta a desero do recurso56, indeferindo-o de plano. O preparo so as custas que a parte est obrigada a pagar para custear o prosseguimento do recurso, tendo previso no artigo 519 do CPC. Tal artigo prev a possibilidade de mitigao da desero caso a parte consiga provar justo impedimento para no realizar o recolhimento das custas e anex-las quando interpuser o recurso, fixando prazo razovel para que a parte cumpra esse requisito. A prova de seu recolhimento deve ser apresentada quando da interposio do recurso no juzo a quo (art. 511). possvel, tambm, parte recorrente ser intimada complementar o valor pago a ttulo de preparo, em um prazo de 5 (cinco) dias, caso esse recolhimento tenha sido a menor, mas no podendo ser o valor recolhido nfimo, pois assim estaria caracterizada a desero do recurso, previso no pargrafo segundo do artigo 511 do CPC.57 Existem, entretanto, algumas partes que so isentas do recolhimento do preparo, seja em razo da condio econmica, seja em razo da prpria pessoa. Ou seja, quando da interposio dos recursos as partes elencadas no pargrafo primeiro do artigo 511 do CPC, no necessitam de pagar o valor do preparo, contudo no esto impedidas de faz-lo caso queiram, sem com isso caracterizar a desero do recurso.

2.2.6 Do recurso adesivoOutro ponto de divergncia entre a apelao e o agravo de instrumento a possibilidade de se recorrer de forma adesiva. Esta forma de recorrer acontece quando ao mesmo tempo as partes foram vencedoras e perdedoras em partes da lide, ou seja, quando o pedido foi julgado parcialmente procedente, gerando direitos e deveres para os dois lados. A previso da possibilidade e da forma que se opera tal recurso est insculpida no artigo 500 do Cdigo Procedimental ptrio, abaixo transcrito:Art. 500. Cada parte interpor o recurso, independentemente, no prazo e observadas as exigncias legais. Sendo, porm, vencidos autor e ru, ao56

JORGE, Flvio Cheim. Apelao cvel: teoria geral e admissibilidade. So Paulo: Revista dos Tribunais, 2002. 2 ed. p. 197. 57 APRIGLIANO, Ricardo de Carvalho. A Apelao e Seus Efeitos. So Paulo: Atlas, 2003, p. 37.

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recurso interposto por qualquer deles poder aderir a outra parte. O recurso adesivo fica subordinado ao recurso principal e se rege pelas disposies seguintes: I - ser interposto perante a autoridade competente para admitir o recurso principal, no prazo de que a parte dispe para responder; II - ser admissvel na apelao, nos embargos infringentes, no recurso extraordinrio e no recurso especial; III - no ser conhecido, se houver desistncia do recurso principal, ou se for ele declarado inadmissvel ou deserto. Pargrafo nico. Ao recurso adesivo se aplicam as mesmas regras do recurso independente, quanto s condies de admissibilidade, preparo e julgamento no tribunal superior.

Com isso, caso a parte se sinta satisfeita, em termos, com o pronunciamento dado pelo juiz, no ir recorrer protelando assim a satisfao do direito. Contudo, caso a outra parte recorra, abre-se a oportunidade de recorrer de forma adesiva, desde que respeite o prazo para tanto, qual seja, o prazo que ter para responder dever apresentar as contrarrazes e as suas razes do recurso adesivo.58

58

SANTOS, Moacyr Amaral. Primeiras Linhas de Direito Processual Civil. So Paula: Saraiva, 1990, 3 vol. 11 ed. p. 102/103.

37

3

APELAO POR INSTRUMENTOA pergunta que ficou por ser respondida acerca de qual recurso cabvel de

sentena parcial de mrito, sendo que tal sentena julga a lide de forma parcial. Com isso, que parte da doutrina processualista entende ser possvel a interposio da Apelao por Instrumento, ou em autos apartados. Conforme se passar a discorrer, tal modalidade recursal tem por base uma maior celeridade na prestao jurisdicional, sem com isso comprometer o interesse da parte e o princpio constitucional da razovel durao do processo. Princpio esse, institudo por fora da Emenda Constitucional n 45, quando incluiu o inciso LXXVIII, do artigo 5, abaixo transcrito:LXXVIII - a todos, no mbito judicial e administrativo, so assegurados a razovel durao do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitao.

O bem da verdade, a aplicao de tal modalidade de recurso visa a dar uma melhor garantia da efetivao do direito pelo jurisconsulto, isto porque h de assegurar a cumprimento de princpios fulcrais no sistema processual vigente no pas. Nesse sentido Srgio Gilberto Porto:Assim, neste momento, na ponderao dos interesses em jogo, recomendvel a prtica do uso de sentena parcial, vez que atende a idia de outorgar maior celeridade e efetividade prestao jurisdicional, ainda que apenas sobre parcela de eventual lide. Julgamento desta ndole desafia recurso de apelao, na medida em que este representa a forma mais segura de preservar as garantias constitucionais da ampla defesa e do devido processo legal (5, LIV e LV, CF), circunstncia de duvidosa incidncia na hiptese de agravo, face sua disciplina atual. Afora, evidentemente, as dificuldades decorrentes do mesmo vir a ser interposto contra deciso de cunho definitivo.59

59

PORTO, Srgio Gilberto. A Nova Definio Legal de Sentena: propsito e consequncias. Disponvel em: , acessado em: 20 de abr. de 2010.

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Porm, no toda a doutrina que coaduna com essa forma recursal, sendo assim vrias so as crticas feitas mesma. Com isso, passaremos a analisar as principais crticas a respeito da utilizao da apelao por instrumento das sentenas parciais.

3.1

Pontos contrriosA doutrina que nega possibilidade de cabimento da apelao por

instrumento se baseia em quatro crticas estruturais, quais sejam: a) taxatividade recursal; b) responsabilidade pela formao do instrumento; c) invalidade ou necessidade de repetio dos atos praticados na origem; d) nmero excessivo de apelaes por instrumento decorrentes de um nico processo.

3.1.1 Taxatividade recursalA primeira grande crtica est relacionada ao princpio da taxatividade recursal, isto porque os defensores da inaplicabilidade deste recurso afirmam que no h em nosso ordenamento jurdico a previso legal da apelao por instrumento. Isso pode ser visto quando Haroldo Serrano de Andrade tece comentrios mudana do conceito de sentena devido Lei n 11.232 de 2005, o mesmo afrima:O primeiro bice para que se adote essa medida diz com o princpio da taxatividade dos recursos amplamente difundido no direito brasileiro e incorporado pelos artigos 496 do CPC e 893 da CLT a exigir que os mecanismos recursais sejam institudos por lei federal (art. 22, I da CF). A simples omisso normativa em torno dessa suposta criao j seria suficiente, por si s, para repeli-la de pronto.60

Como bem afirma o advogado, o princpio da taxatividade deve ser seguido para uma segurana jurdica do sistema. Isto porque, apesar da alterao do conceito de sentena, no houve, prima facea, alterao do sistema recursal brasileiro. Com isso, no pode os cientistas jurdicos adequar a uma nova realidade institutos jurdicos sequer previstos. Ainda em relao utilizao da apelao por instrumento e o princpio da taxatividade recursal, prevista no artigo 496 do CPC, Jorge de Oliveira Vargas tece comentrios a respeito: Existe ainda o argumento de que a subida da apelao, por traslado,60

DE ANDRADE, Haroldo Serrano. Uma releitura da sentena e o "apelo por instrumento". Disponvel em: , acessado em 07 de mar. de 2008.

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caracterizaria um novo tipo de recurso, qual seja o de apelao por instrumento, o que iria ferir o princpio da tipicidade dos recursos. 61 A ttulo de elucubrao o princpio da taxatividade determina que s possa ser chamado de recurso aqueles institutos expressamente previstos por lei federal.62 Ademais, tal princpio um dos mais importantes do sistema jurdico ptrio. Isto porque atravs dele que outros princpios so observados, tais como a segurana jurdica, da ampla defesa e do contraditrio e o do direito de petio, todos constitucionalmente previstos. Com isso, a utilizao da apelao por instrumento feriria como um todo o sistema jurdico ptrio, no apenas o da taxatividade recursal.

3.1.2 Responsabilidade pela formao do instrumentoNo caso de utilizao da apelao por instrumento tormenta que surge acerca da responsabilidade pela formao do instrumento. Isto porque, como no h norma a respeito que discipline tal instituto, os operadores do direito no teriam como saber quem o responsvel por extrair cpia do processo.63 Esse ponto por si s j seria suficiente para fulminar a possibilidade de utilizao desse tipo recursal. Assim, por no poder onerar a parte com nus que lei no prev tal recurso deve ser rechaado de plano. Isto para obstaculizar, por qualquer das partes, a alegao de desrespeito ampla defesa e contraditrio, uma vez que no pode o judicirio de forma unilateral fazer incidir normas parte as quais no estejam previstas em lei.

61

VARGAS, Jorge de Oliveira. O novo conceito de sentena e o recurso daquela que no extingue o processo: apelao ou agravo de instrumento? So Paulo: Revista dos Tribunais, RePro 148, ano 32, junho 2007. p. 117. 62 MARINONI, Luiz Guilherme. ARENHART, Srgio Cruz. Curso de processo civil: Processo de conhecimento, v.2. 7. ed. So Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2008. p. 510. 63 MILMAN, Fabio. O novo conceito legal de sentena e suas repercusses recursais: primeiras experincias com a apelao por instrumento. So Paulo: Revista dos Tribunais, RePro 150, v. 32, ago. 2007, p. 169.

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3.1.3 Invalidade ou necessidade de repetio dos atos praticados na origemNesse caso de provimento da apelao por instrumento pelo tribunal, alguns atos que foram praticados na origem teriam sua eficcia perdida, invalidando os mesmos.64 Esse outro ponto que a doutrina utiliza para abalar o cabimento da apelao por instrumento. Essa crtica visa a diminuir o grau de incerteza e frustrao que se teria com a invalidao de atos praticados no decorrer do processo, antes ou durante o julgamento da apelao por instrumento. Sendo certo, que as partes ficariam cada vez mais descrentes da eficincia e eficcia da justia. Ademais, em alguns casos atos teriam de ser repetidos visando um esclarecimento ou compreenso da questo posta a crivo do judicirio, sem com isso prolongar imotivadamente o curso do processo. Junge-se a esse entendimento o carter definitivo que as sentenas possuem, acarretando a interposio de recurso com um grau de interferncia na lide muito maior que meras decises interlocutrias.

3.1.4 Nmero excessivo de apelaes por instrumento de um nico processoComo muito bem colocado por Fabio Milman, grande parcela dos crticos da apelao por instrumento, no intuito de desacreditar referido instituto, como ltima tentativa de extirpar a possibilidade, alega que com a recepo da sentena parcial de mrito e o desafio de apelao por instrumento estaria por abarrotar o judicirio com inmeros recursos, cada qual com uma parcela da demanda.65 Essa crtica feita com o intuito de garantir a preservao do princpio da unicidade da sentena, ou seja, para cada processo s poderia existir uma sentena capaz de decidir a lide de forma uma e nica. Outrossim, a possibilidade de cingir a resoluo da lide dificultaria o reconhecimento do incio do prazo para a ao rescisria, uma vez que no se saberia ao certo quando o prazo comearia a correr, se dependeria de cada parte da demanda ou se por outro lado da ltima deciso que julga a lide?64

MILMAN, Fabio. O novo conceito legal de sentena e suas repercusses recursais: primeiras experincias com a apelao por instrumento. So Paulo: Revista dos Tribunais, RePro 150, v. 32, ago. 2007, p. 170. 65 MILMAN, Fabio. O novo conceito legal de sentena e suas repercusses recursais: primeiras experincias com a apelao por instrumento. So Paulo: Revista dos Tribunais, RePro 150, v. 32, ago. 2007, p. 170.

41

Parece que a jurisprudncia ainda no muito assente nesse sentido, havendo nos tribunais do pas grande discusso a respeito do incio da contagem do prazo para ao rescisria.

3.2

Pontos favorveisEm outra esteira a doutrina defensora da possibilidade de utilizao da

apelao por instrumento rebate os argumentos da doutrina que critica a possibilidade, sem com isso deixar de colocar outros argumentos a favor. Com isso, sero colocados os argumentos favorveis em relao : a) taxatividade recursal; b) responsabilidade pela formao do instrumento; c) invalidade ou necessidade de repetio dos atos praticados na origem; d) nmero excessivo de apelaes por instrumento decorrentes de um nico processo.

3.2.1 Taxatividade recursalDiferentemente do que tenta crer a doutrina contrria, os doutrinadores favorveis afirmam na verdade no h a utilizao de um recurso novo, mas simplesmente de um adendo feito ao recurso, dogmaticamente, utilizado. Isto porque todas as caractersticas de apelao so preservadas, com a simples diferenciao de que no feito no prprio processo, mas sim em autos apartados (instrumento). A diferena da apelao que est elencada no artigo 496 do CPC e a por instrumento reside na elaborao de um instrumento para possibilitar o julgamento do recurso pelo tribunal, conforme exposto por Luiz Roberto Ayoub e Antnio Pedro Pellegrino: assinale-se que a apelao por instrumento no consiste em um novo recurso. Trata-se, sem embargo, do recurso de apelao acrescido, contudo, de um detalhe, a saber: a sua remessa ao segundo grau realizada na forma de um instrumento prprio.66 Outro defensor do no desrespeito ao princpio da taxatividade recursal Jos Maria Rosa Tesheiner, uma vez que o mesmo afirma que o que subiria seria o

66

AYOUB, Luiz Roberto. PELLEGRINO, Antnio Pedro. A sentena parcial. So Paulo: Revista de Arbitragem e Mediao, v.6, n. 22, jul./set. 2009, p. 52.

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instrumento formado na origem para viabilizar o julgamento do tribunal e demais instncias que porventura possam chegar tal recurso.67 Fabio Milman tambm tem posicionamento parecido quando defende que no existe criao de novo recurso, mas sim a apelao tal qual concebida pelo Cdigo de Processo Civil e mais, afirma que o que se agrega ao ritual ortodoxo a remessa do recurso na forma de fotocpias em caderno prprio, condio que em nada descaracteriza a apelao.68 Ademais, essa modalidade recursal no novidade em nosso sistema jurdico, tendo, inclusive, previso expressa no Cdigo de Processo Penal. Apesar de l ser restrito a um caso especfico, nada impede que possa ser utilizada adequando-se aos princpios do processo civil. A previso est elencada no pargrafo 1 do artigo 601, transcrito in verbis a seguir:Art. 601. Findos os prazos para razes, os autos sero remetidos instncia superior, com as razes ou sem elas, no prazo de 5 (cinco) dias, salvo no caso do art. 603, segunda parte, em que o prazo ser de trinta dias. 1o Se houver mais de um ru, e no houverem todos sido julgados, ou no tiverem todos apelado, caber ao apelante promover extrao do traslado dos autos, o qual dever ser remetido instncia superior no prazo de trinta dias, contado da data da entrega das ltimas razes de apelao, ou do vencimento do prazo para a apresentao das do apelado.

Com isso, remediado est o problema quanto a previso do mesmo, sendo que no caso de utilizao pelos processualistas civilistas, no o ser para o caso de rus, mas sim de sentenas parciais de mrito, respeitando-se assim o sistema recursal, que possui previso de que o recurso que desafia sentena a apelao e no o agravo. Outro ponto favorvel que a redao do artigo 496 do CPC no prev as espcies de agravo, sendo simplesmente dito agravo, mutatis mutandi, esse mesmo

67

TESHEINER, Jos Maria Rosa (coord.). Nova sistemtica processual civil. Caxias do Sul: Plenum, 2. ed., 2006, p.44. 68 MILMAN, Fabio. O novo conceito legal de sentena e suas repercusses recursais: primeiras experincias com a apelao por instrumento. So Paulo: Revista dos Tribunais, RePro 150, v. 32, ago. 2007, p. 169.

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entendimento pode ser aqui empregado. Com isso a apelao por instrumento seria uma espcie do gnero apelao, ali exposto.

3.2.2 Responsabilidade pela formao do instrumentoNo que concerne a responsabilidade pela formao do instrumento a soluo pode se dividir em duas possibilidades, quais sejam: i a responsabilidade correria pelo recorrente, nesse caso utilizando a regra estabelecida para o agravo de instrumento, ou ii a responsabilidade recairia no juzo prolator da sentena. A primeira hiptese tem por base o artigo 525 do CPC, que disciplina a formao do instrumento para o agravo, sendo certo que a documentao que serviria para instruir esses autos apartados seria aqueles necessrios ao deslinde da causa de forma menos tormentosa, como bem coloca na passagem Fabio Milman:Tambm se poderia pensar na adoo do critrio que preside a composio documental do agravo de instrumento (art. 525 do CPC), cumprindo ao apelante fazer acompanhar as razes recursais de cpias suficientes para verificao, pelo rgo ad quem, do contedo e forma da deciso apelada, da tempestividade do emprego do meio de inconformidade (respectiva certido de intimao) e das procuraes outorgadas [...], cuidando, conforme seu interesse, de tambm acostar reproduo de outras peas imprescindveis compreenso do que quer ver rediscutido e novamente decidido.69

A segunda hiptese dada pelo magistrado Pedro Pozza, quando do julgamento do processo tombado sob o n 001/10522529864, o mesmo afirma que como no h regra expressa nesse sentido a tarefa deve ser feita pela sua escrivania, isto para no onerar qualquer das partes caso queiram recorrer. Sendo que ficou consignado que a tarefa ficaria por conta do prprio juzo, sendo exposto expressamente na sentena que deveria formar autos suplementares para tanto:Interposto o apelo, devero ser formados autos suplementares, com cpias das peas de fls. 2/69 [...], procedendo-se a novo registro no sistema Themis

69

MILMAN, Fabio. O novo conceito legal de sentena e suas repercusses recursais: primeiras experincias com a apelao por instrumento. So Paulo: Revista dos Tribunais, RePro 150, v. 32, ago. 2007, p. 169.

44

(ainda no preparado para julgamento parcial de prosseguimento do feito em relao aos danos morais.70

mrito),

para

Qualquer que for a hiptese adotada necessrio se far uma alterao legislativa visando a determinar a quem incumbe a responsabilidade pela formao. Contudo, ante a dinamicidade do direito, o Judicirio no pode esperar uma reforma legislativa que na maioria das vezes demora anos a fio. Com isso, a jurisprudncia e a doutrina devem cuidar dessa temtica.

3.2.3 Invalidade ou necessidade de repetio dos atos praticados na origemA doutrina que defende o cabimento de apelao por instrumento de sentena parcial de mrito, contrape a crtica feita em relao a invalidade ou necessidade de repetio dos atos praticados na origem com um argumento simples, mas de um sapincia sacal. Ora, no apenas com o provimento da apelao que pode haver a invalidade ou repetio de atos praticados na origem, esse o mesmo fim quando do provimento de qualquer outro recurso.71 Isto porque, na maioria dos recursos o que se pretende a invalidao ou aprimoramento do pronunciamento. da natureza do recurso. Com isso, no h bice utilizao, por uma eventual invalidao de atos, pois com isso melhor seria restringir a utilizao dos recursos, ou ento extirp-los de uma vez por toda do sistema jurdico. Sendo assim carece de fundamento lgico e jurdico essa crtica, no constituindo por si s um embargo na aceitao de apelao por instrumento. Esse o entendimento da doutrina defensora.

70

Processo n001/1.05.2267650-6, Juiz Prolator Pedro Luiz Pozza, 5 Vara da Fazenda Pblica do Foro Central, julgado em 14/03/2006, DJ em 16/03/2006, disponvel em Acessado em 18 dez. 2009. 71 MILMAN, Fabio. O novo conceito legal de sentena e suas repercusses recursais: primeiras experincias com a apelao por instrumento. So Paulo: Editora Revista dos Tribunais, RePro 150, v. 32, ago. 2007, p. 169.

45

3.2.4 Nmero excessivo de apelaes por instrumento decorrentes de um nico processoA ltima crtica que rebatida diz respeito ao excessivo nmero de apelaes que poderiam ser interpostas contra as sentenas parciais de mrito, gerando assim um abarrotamento de servio ao tribunal. Ocorre que sero tantos os recursos em um mesmo processo quantos forem as insatisfaes das partes pelos pronunciamentos. Com isso, no h falar em um nmero excessivo de apelaes por instrumento, pois direito da parte recorrer das decises que entender erradas. Outrossim, o respeito ao princpio da economia processual muito maior quando h inmeros recursos decorrentes de um nico processo do que inmeros recursos de inmeros processos, at porque vrias etapas podem ser aproveitadas. Sendo mais racional a interposio de vrios recursos quantos forem as insatisfaes, como defendido por Ricardo de Oliveira Silva Filho.72 Insta salientar, que o caso de utilizao da sentena parcial de mrito se d quando h a cumulao de aes em um nico processo, por isso que pode ocorrer um nmero indefinido de apelaes de instrumento, pois vrias so as demandas dentro de um nico procedimento. No se cogitando assim limitar a defesa do interesse da parte, com o fim de diminuir o trabalho do tribunal. At porque esse sem aquele no teria sequer funo, sendo irrelevante sua atuao sem o desgosto daquele ante o pronunciamento dos juzos de primeiro grau. Com isso, no pode servir de embargo a desculpa de aumento de trabalho, ainda mais quando no verdade, visto o trabalho que o tribunal ir ter quando do julgamento seja de embargos ou de agravos, sem prejudicar o regular andamento do processo.

72

SILVA FILHO, Ricardo de Oliveira. A sentena parcial de mrito e o processo civil moderno. Porto Alegre: Revista da AJURIS, n 108, dez. de 2007, p. 296.

46

3.3

Anlise crticaApesar do entendimento ao descabimento da utilizao da apelao por

instrumento das sentenas parciais de mrito, extreme de dvida que plenamente plausvel a aceitao dessa espcie recursal para tais pronunciamentos. Junge-se, s defesas feitas, o fato do judicirio ter comeado um processo de digitalizao e virtualizao do processo, com vistas a dar uma maior celeridade ao processo, visando ao cumprimento do princpio da razovel durao do processo, densificado em nosso sistema pela Emenda Constitucional n 45. Outro fato que com a alterao do conceito de sentena e de todas as chamadas ondas processuais, no houve nenhuma que alterou o sistema recursal de modo a modificar o entendimento acerca de qual recurso desafia o tipo de deciso. Continuando a vigorar a apelao de sentena (artigo 513 do CPC), e o agravo de deciso interlocutria (artigo 522 do CPC).

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CONCLUSOVerificou-se que com a alterao do conceito de sentena, implementada pela Lei n 11.232/2005, a mesma deixou de ser conceituada pela sua localizao no processo, passando a ser entendida pelo seu contedo. Com isso, deixou-se de entender sentena por um critrio topolgico, sendo assim vrios pronunciamentos que antes possuam carter de deciso interlocutria passaram a serem sentenas, mesmo no encerrando uma fase processual. Ocorre que com essa mudana de paradigma, um princpio a muito consolidado no processo civil brasileiro foi mitigado, chegando ao ponto de no mais ser compatvel com o sistema processual hodierno, qual seja, o da unicidade da sentena. Ou seja, no mais obrigatrio que o juiz decida toda a lide de uma nica vez, podendo fracionar o julgamento conforme os pedidos vo se tornando incontroversos no decorrer da marcha processual. Tal alterao legislativa teve o fim de unificar, ou como nomeado pela doutrina sincretizar os processos de conhecimento e execuo, para tornar mais clere e eficaz o recebimento do direito pela parte a que faz jus. Uma vez que no sistema anterior a parte deveria esperar o trnsito em julgado da sentena que condenava a outra parte ao pagamento e, na posse desse ttulo judicial, ingressar com um novo processo tendo de passar por todos os trmites de um processo, tais como: nova petio inicial, citao, prazo para contestar, etc... Aps a mudana do conceito de sentena e tendo como norte a EC n 45, no que tange razovel durao do processo, os magistrados no devem, nem podem esperar que todos os pedidos se tornem incontroversos para prestar a funo jurisdicional, devendo sempre que possvel, resolver a lide mesmo que de forma parcial. Esse entendimento defendido por ser uma forma mais eficiente de prestao jurisdicional, uma vez que a caracterizao de sentena gera uma srie de

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implicaes, como, a formao de coisa julgada e a possibilidade de execuo do julgado imediatamente. Ocorre que a partir da aceitao das sentenas parciais de mrito outro problema que surge acerca do sistema recursal. Isto porque, em nenhum momento houve alterao do mesmo, com isso ainda norma expressa de que das sentenas o recurso cabvel a apelao. Entretanto, como interpor uma apelao de parte da lide, sendo que ainda depende de dilao probatria os outros pedidos. Uma parcela da doutrina, a qual se filiou esse trabalho, lana o cabimento, nesses casos, de apelao por instrumento. Essa espcie de recurso, nada mais do que a prpria apelao s que com a formao de um instrumento, para no tumultuar o processo. Para refutar qualquer argumento contrrio, necessrio expor que em nenhum momento se est ferindo o princpio da taxatividade, uma vez que no se trata de um recurso novo, mas sim uma forma diferente de utilizao da apelao. Tambm, no h falar em descabimento uma vez que no existe previso de responsabilidade pela formao do instrumento, sendo que para isso pode-se utilizar a norma a respeito do agravo de instrumento, ou seja, quem for interpor a apelao est responsvel pela sua regular formao. Ou, em ltima instncia, como no h regramento expresso, o juzo determinaria quais seriam as peas para a formao do instrumento. Restou demonstrado, tambm, que a crtica acerca da invalidao ou repetio de atos j praticados, no merece guarida uma vez que a utilizao de recursos visa o aperfeioamento e/ou anulao dos pronunciamentos judiciais. Com isso, no se pode utilizar uma caracterstica prpria do instituto para interferir em sua utilizao. Outrossim, com o manejo do agravo de instrumento tambm h a possibilidade de se anular, invalidar ou de se refazer atos j praticados. Por fim no h problema algum em haver inmeras apelaes por instrumento de um mesmo processo, isto porque caso no fosse interposto apelao, seria feito por meio do agravo, gerando a mesma carga de trabalho para o tribunal. At porque, a

49

unio de inmeros pedidos interdependentes em um mesmo processo, visa a uma economia processual, uma vez que no se far necessrio a repetio de vrios atos idnticos para diversos processos, tais como a citao, decises interlocutrias e contestao. Em ltima anlise, esse tema est em voga neste instante devido discusso do projeto do novo CPC, o qual, para pacificar os entendimentos, poder ter incluindo em sua redao o cabimento de apelao por instrumento das sentenas parciais de mrito, apesar da no previsibilidade atualmente.

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REFERNCIASALVIM, Jos Eduardo Carreira. Teoria geral do processo. Rio de Janeiro: Forense, 2007. 11. ed. APRIGLIANO, Ricardo de Carvalho. A apelao e seus efeitos. So Paulo: Atlas, 2003. AYOUB, Luiz Roberto; PELLEGRINO, Antnio Pedro. A sentena parcial. Disponvel em: , acessado em 5 de out. de 2010. AYOUB, Luiz Roberto. PELLEGRINO, Antnio Ped