controle social do gasto pÚblico: estudo de caso do

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Artigo original Poliarquia- Revista de Estudos Políticos e Sociais do Centro Universitário UNIEURO UNIEURO, Brasília, v. 1, n. 2, jul./dez. 2009. Recebido em: 17/5/2009 Revisado em: 28/6/2009 Aprovado em: 14/7/2009 CONTROLE SOCIAL DO GASTO PÚBLICO: ESTUDO DE CASO DO ORÇAMENTO PARTICIPATIVO (OP) DE UBERLÂNDIA (MG) – 2001-2006 FERRARI, Marcilio Marquesini 1 Resumo: Este artigo objetivou avaliar a metodologia do orçamento participativo (OP) no Município de Uberlândia em dois momentos históricos distintos: o primeiro entre 2001 e 2004, proposto pelo Governo Zaire Rezende (PMDB) e o segundo, organizado pela própria sociedade (2005- 2006) via Fórum Permanente do Orçamento Participativo. Percebe-se que para a consolidação do controle social do Estado via orçamento público e a efetivação de políticas públicas construídas via participação popular no Município de Uberlândia passa sobretudo pela vontade política dos governantes em publicizar o orçamento e efetivar aquilo que chama-se de “espaço público não estatal” inaugurado pela metodologia do orçamento participativo. Palavras Chaves: orçamento público; orçamento participativo; controle social do gasto público; participação popular. INTRODUÇÃO A construção do orçamento público no Brasil tem sua história marcada mais pelo distanciamento do que pela aproximação entre os poderes constituídos (mais notadamente Executivo e Legislativo) e a Sociedade Civil Organizada. O orçamento público é para além de um documento legal, a expressão de como cada governante irá realizar as ações em um determinado período. Revela, sobretudo as opções de cada governante para as diversas áreas de atuação das políticas públicas. Por sua vez, a prática orçamentária no Brasil concebe a máxima de que o orçamento público é apenas uma peça de “ficção” servindo a interesses de poucas pessoas ou grupos organizados que “sabem demandar” e pautar os governos com sua orientação política e ideológica expressas nos números do orçamento. Assim, Ferrari (2004, p.48) afirma que: 1 Economista. Especialista em Gestão em Movimentos Sociais e Políticas Públicas. Mestrando em Ciência Política no Centro Universitário Unieuro.

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Artigo original Poliarquia- Revista de Estudos Políticos e Sociais do Centro Universitário UNIEURO UNIEURO, Brasília, v. 1, n. 2, jul./dez. 2009.

Recebido em: 17/5/2009

Revisado em: 28/6/2009

Aprovado em: 14/7/2009

CONTROLE SOCIAL DO GASTO PÚBLICO: ESTUDO DE CASO DO

ORÇAMENTO PARTICIPATIVO (OP) DE UBERLÂNDIA (MG) – 2001-2006

FERRARI, Marcilio Marquesini1

Resumo: Este artigo objetivou avaliar a metodologia do orçamento participativo (OP) no Município de Uberlândia em dois momentos históricos distintos: o primeiro entre 2001 e 2004, proposto pelo Governo Zaire Rezende (PMDB) e o segundo, organizado pela própria sociedade (2005-2006) via Fórum Permanente do Orçamento Participativo. Percebe-se que para a consolidação do controle social do Estado via orçamento público e a efetivação de políticas públicas construídas via participação popular no Município de Uberlândia passa sobretudo pela vontade política dos governantes em publicizar o orçamento e efetivar aquilo que chama-se de “espaço público não estatal” inaugurado pela metodologia do orçamento participativo. Palavras Chaves: orçamento público; orçamento participativo; controle social do gasto público; participação popular. INTRODUÇÃO

A construção do orçamento público no Brasil tem sua história marcada mais pelo

distanciamento do que pela aproximação entre os poderes constituídos (mais notadamente

Executivo e Legislativo) e a Sociedade Civil Organizada.

O orçamento público é para além de um documento legal, a expressão de como cada

governante irá realizar as ações em um determinado período. Revela, sobretudo as opções de

cada governante para as diversas áreas de atuação das políticas públicas.

Por sua vez, a prática orçamentária no Brasil concebe a máxima de que o orçamento

público é apenas uma peça de “ficção” servindo a interesses de poucas pessoas ou grupos

organizados que “sabem demandar” e pautar os governos com sua orientação política e

ideológica expressas nos números do orçamento.

Assim, Ferrari (2004, p.48) afirma que:

1 Economista. Especialista em Gestão em Movimentos Sociais e Políticas Públicas. Mestrando em Ciência Política no Centro Universitário Unieuro.

Artigo original Poliarquia- Revista de Estudos Políticos e Sociais do Centro Universitário UNIEURO UNIEURO, Brasília, v. 1, n. 2, jul./dez. 2009.

o orçamento público no Brasil sempre serviu à parcela da sociedade mais organizada economicamente e ideologicamente. Isso tem um impacto importante para a sociedade. Ora, uma vez que o orçamento público responde essencialmente às “necessidades” de uma parcela menor da sociedade, o mesmo não cumprirá suas funções determinadas pela Constituição Federal de 1988 qual seja a redução das desigualdades inter-regionais segundo critério populacional.2 Outro ponto a ser destacado é justamente o fato de que as administrações públicas brasileiras não têm interesse em divulgar os dados presentes no orçamento público, transformando-o em uma peça intocável.

Além disso, percebe-se que o distanciamento entre governantes e governados

manifestado após os respectivos pleitos eleitorais é reafirmado inclusive no tocante a como se

dá a gestão dos recursos públicos previstos no orçamento público. Nesse sentido percebe-se

que também na história da construção do orçamento público do Município de Uberlândia

(MG) prevalece o conservadorismo e a centralização de informações no Poder Executivo

Municipal.

Um contraponto a esse tradicionalismo foi, sem sombra de dúvida, a experiência do

do Município de Uberlândia (MG), praticado no período de 2001-2004 pelo governo Zaire

Rezende (PMDB).

O objetivo desse estudo é publicizar e avaliar a metodologia do orçamento

participativo de Uberlândia em dois momentos distintos: o primeiro no governo Zaire

Rezende (PMDB) no período de 2001-2004, e o segundo, organizado pela própria sociedade,

via Fórum Permanente do Orçamento Participativo de Uberlândia, no período de 2005-2006.

Ressalta-se que o segundo momento é um marco na história da construção do

orçamento participativo (OP) no mundo haja vista que não se tem notícia da continuidade da

metodologia pela própria população quando da eliminação da proposta de forma oficial pelo

governante.

O artigo ora apresentado detalha a metodologia do orçamento participativo (OP) de

Uberlândia (MG) no governo Zaire Rezende (PMDB) e publiciza um resultado de “pesquisa”

de campo realizado pelo autor, no ano de 2004 em algumas plenárias públicas do orçamento

participativo (OP)3 Além disso também trata da experiência do Fórum Permanente do

2 Ver Constituição Federal de 1988, artigo 165, § 6o. 3 O autor foi funcionário da Secretaria Municipal de Planejamento Participativo à época da aplicação dos questionários. Iniciou sua militância nos movimentos sociais a partir de sua participação enquanto delegado suplente da região I do Orçamento Participativo e depois conselheiro titular da mesma região. Os questionários tentavam avaliar a percepção do chamado “público do OP de Uberlândia”. Seu conteúdo foi baseado em pesquisas realizadas em outros Municípios que praticaram o OP tais como Porto Alegre (RS) e Belo Horizonte (MG). Ressalta-se que tais resultados são

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Orçamento Participativo, articulação de delegados (as), conselheiros (as) e ex-funcionários da

Secretaria Municipal do Planejamento Participativo na tentativa de permanecer com a

metodologia, de forma organizada pela sociedade.

A metodologia para a construção do artigo partiu da observação empírica do autor e

principalmente a partir de análise de fontes primárias (jornais, entrevistas) sobre o orçamento

participativo (OP) do Município de Uberlândia nas duas fases de estudo (2001-2004 e 2005-

2006). Também utilizou-se fontes secundárias mais notadamente para fundamentar

teoricamente conceitos tratados no decorrer do artigo.

A temática controle social do gasto público tem sua relevância na medida em que

busca refletir a partir de experiências práticas tais como o orçamento participativo (OP), até

que ponto ou em que medida os governos estão dispostos a compartilhar as decisões

orçamentárias, centrais na administração pública moderna.

Admitir que o controle social do gasto público é essencial para a administração

pública seja ela em qualquer nível da federação, avança na construção de alternativas para o

tradicionalismo político e centralização de decisões presentes em grande parte das

administrações públicas brasileiras.

O Município de Uberlândia, situado no Triângulo Mineiro, com aproximadamente

600.000 habitantes segundo informações do sítio virtual do Jornal o Correio, tem sua história

política marcada pela consolidação política nos governos de grupos ditos conservadores.

Admite-se nesse estudo o conservadorismo como um conjunto de ações, pensamentos e

intervenções políticas que ampliam o distanciamento entre os cidadãos e governantes por

acreditar, do ponto de vista ideológico, que quanto mais distante a população estiver do centro

decisório do poder, mais fácil é a tomada de decisão, ainda que a mesma seja feita por poucas

pessoas.

Entende-se neste estudo que não há dicotomia entre a representação formal e a

participação popular direta. Pelo contrário, quanto mais próximo a população estiver do

centro decisório do poder, maiores condições terá de avaliar a gestão em curso. Por sua vez,

os governantes terão condições de corrigir rumos

inéditos, uma vez que, com a saída do Prefeito Zaire Rezende (PMDB) da Prefeitura, a metodologia foi extinta do ponto de vista institucional, e as informações coletadas pelo autor, somente agora foram tabuladas por ocasião deste artigo.

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Assim, os resultados apresentados refletem como é difícil o controle social do gasto

público no Município de Uberlândia e principalmente como é incipiente a organização

popular em torno da temática do orçamento público.

I – ORÇAMENTO PARTICIPATIVO (OP) E CONTROLE SOCIAL DO GASTO

PÚBLICO.

Há muito se discute no Brasil a importância da participação popular para o efetivo

controle das ações do Estado. Outrossim, é assaz importante considerar o papel desenvolvido

pelos diversos movimentos sociais brasileiros para a publicização e participação direta nas

finanças públicas em qualquer esfera da federação.

A partir dos anos 80 do século XX, o Brasil viveu a efervescência de diversos

movimentos sociais. Tal fato, fruto inclusive das articulações em torno da democratização do

Estado em plena ditadura, fez com que diversos direitos antes rechaçados pelo Estado

brasileiro, fossem incluídos na nova Constituição Federal de 1988.

O orçamento participativo pode ser definido como uma metodologia de construção do

orçamento público4 que prevê o compartilhamento de informações e decisões por parte do

governante com a comunidade. Tal compartilhamento é feito por uma metodologia específica

que prevê a participação popular em diversas fases. Ferrari (2004) afirma que:

As experiências originárias de orçamento participativo datam do final da década de 70 do século XX e início da década de 80 do mesmo século. Em meados de 1970, o Brasil vivia sob o clima de redemocratização. Tal clima somente foi possível graças a luta (armada inclusive) de diversos militantes de partidos políticos de esquerda ou entidades sociais, tais como a Igreja. A oposição ao regime militar crescia a cada dia e a abertura do regime seria fruto da luta de diversos cidadãos e cidadãs comprometidos com a livre manifestação do pensamento e das posições políticas. As experiências originárias de orçamento participativo surgiram justamente nesta época5. (FERRARI, 2004, p.49)

A partir do início da década de 90 do século XX, diversas administrações municipais

propuseram a construção do orçamento público de forma compartilhada com a população por

meio de uma metodologia que alia democracia representativa e democracia direta, sem, 4 Entende-se por orçamento público o documento que reflete de um lado as receitas, ou seja, a origem dos recursos públicos e por outro lado as despesas. Não será foco deste artigo o processo orçamentário e nem o ciclo orçamentário por não se tratar do objeto do estudo. Para maiores informações consultar Ferrari (2004) 5 Ainda segundo o autor, pode-se citar como exemplos de tais experiências o Município de Lages (SC), Vila Velha (ES) e Uberlândia (MG) na primeira administração de Zaire Rezende (1982-1988). (Ver Ferrari, 2004)

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sobretudo, desrespeitar ou até mesmo sobrepor aos ciclo e processo orçamentários

tradicionais. Nasce então o orçamento participativo como enfrentamento à ausência de

democracia em administrações municipais. Segundo Pontual (2000, p. 67-68)

(...) no sistema denominado Orçamento Participativo, não são apenas os técnicos e governantes que, a portas fechadas, tomam decisões sobre a arrecadação e os gastos públicos. É a população, através de um sistema de debates e consultas, quem define valores de receita e despesa e decide onde serão feitos os investimentos, quais as prioridades e quais as obras e ações a serem desenvolvidas pelos governos. Os cidadãos participam do processo através de organizações sociais ou individualmente. O Orçamento Participativo é uma modalidade de gestão pública fundada na participação direta da população nas diversas fases que compõem a elaboração e execução do orçamento público municipal, especialmente na indicação das prioridades para a alocação de recursos de investimentos. (PONTUAL, 2000, p 67-68)

Diversos Municípios praticaram ou ainda praticam até o ano de 2008 o orçamento

participativo (OP) tais como Belo Horizonte (MG), Porto Alegre (RS), Caxias dos Sul (RS),

Campinas (SP), Chapecó (SC), Goiânia (GO), Tapejara (RS), Belém (PA), Betim (MG),

Contagem (MG), Sacramento (MG), Patrocínio (MG), São Paulo (SP), Santo André (SP).

Ao focar a discussão pública no orçamento tendo em vista a ampliação tanto da

discussão quanto da deliberação por parte da população, esses municípios estão conseguindo

a cada dia que passa ampliar as discussões públicas sobre o orçamento municipal. O que é

mais fascinante nas experiências de participação popular orçamentária é que para decidir não

é preciso ser membro de alguma associação urbana ou rural, ou muito menos ser filiado a

algum partido político: o que importa é ser morador da cidade, ou seja, não é necessário

nenhuma “característica especial” ou “representação prévia” para que as pessoas possam

participar dessa forma de gestão dos recursos públicos.

Diversas metodologias são adotadas para adequar a proposta de democratização do

orçamento público à realidade local, o que suscita a afirmar que a metodologia é flexível, não

se tratando em hipótese alguma de uma “camisa de força” ou “receituário” pronto a ser

aplicado de homogeneamente em diversas localidades com diversas realidades diferentes

umas das outras.

O que se decide é justamente a aplicação dos recursos públicos presentes no

orçamento público. Privilegia-se neste caso o espaço público, as negociações públicas, as

demandas populares encaminhadas de forma legítima nos espaços “criados” com o orçamento

participativo. Santos (2003) salienta que

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O OP é um processo de tomada de decisões baseado em regras gerais e em critérios de justiça distributiva, discutidos e aprovados por órgãos institucionais regulares de participação, nos quais as classes populares têm representação majoritária. As comunidades onde elas vivem e se organizam são reconhecidas como tendo direitos coletivos urbanos que legitimam as suas reivindicações e exigências, e também a sua participação nas decisões tomadas para lhes responder. (SANTOS, 2003, p. 512)

Dessa forma afirma-se que metodologia do orçamento participativo traz à baila as

seguintes características:

a) discussão de critérios públicos de distribuição de recursos orçamentários.

b) criação de uma instância de participação popular municipal (Conselho do

Orçamento Participativo) e regional (eleição de delegados regionais do OP);

c) compartilhamento das decisões entre governo e sociedade;

d) elaboração de propostas populares ao orçamento público e em alguns casos até

mesmo ao Plano Plurianual de Governo;

e) formação de novas lideranças comunitárias o que revela o caráter pedagógico do

processo;

f) adequação da máquina pública à nova realidade do orçamento participativo (OP);

g) controle social das deliberações populares na execução orçamentária.

Sendo assim, entende-se que as práticas do chamado orçamento participativo

inauguram uma nova agenda para os municípios que o praticam composta não só pela

publicização dos dados orçamentários mas principalmente pelo compartilhamento de decisões

centrais para qualquer administração municipal.

Além disso, as experiências, salvo características inerentes a cada Município,

contribuem para a prática do controle social do gasto público, compreendido por toda e

qualquer ação que tenha por objetivo acompanhar e fiscalizar a atuação do Poder Executivo,

em qualquer de seus níveis.

Basicamente, pode-se, de acordo com Pires (2004) situar o controle social do gasto

público em duas vertentes de análise quais sejam: a) ligada aos instrumentos tradicionais da

democracia representativa; b) ligada aos instrumentos de participação direta da população nos

negócios públicos, sendo o orçamento participativo seu exemplo mais praticado.

Ao analisar a importância do controle social do gasto público e mais especificamente

em relação ao orçamento público, Pires (2004, p. 5) afirma que:

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As propostas para seu controle estão presentes no discurso e nas práticas de todas as correntes do pensamento econômico e da ação política. Seja para ampliar as possibilidades de atendimento das demandas sociais (no discurso mais à esquerda), seja para evitar gastos exagerados que terminam ampliando a carga tributária e reduzindo a capacidade de investimento privado (no discurso mais à direita), o controle dos gastos públicos é uma reivindicação muito presente no cenário do início do século XXI, lançando desafios políticos e técnicos que estão recebendo uma profusão de respostas, embora a prática ainda não esteja sendo plenamente atingida por elas.

Dessa forma não é menos momentoso a discussão sobre como, quando, onde e por

quanto se utilizam os recursos públicos presentes nos orçamentos das diversas esferas

governamentais. Não é novidade para ninguém que quanto maior a transparência dos atos

governamentais, maior será a possibilidade de que a população possa de forma eficaz

controlar socialmente as ações dos (as) governantes (as).

Ainda utilizando-se das contribuições de Pires (2004), para o efetivo controle social

do gasto público o autor propõe alguns requisitos básicos, quais sejam, técnicos, legais,

cognitivos e políticos. Por requisitos técnicos o autor define todos os procedimentos internos

a máquina pública para a elaboração da proposta orçamentária. Como o orçamento público é

elaborado a partir de diversos instrumentos técnicos oriundos das mais diferentes ciências

(Economia, Contabilidade, Administração, Direito), sua elaboração requer cada vez mais

agentes políticos capazes de definir com certo grau de certeza o conteúdo orçamentário. O

autor advoga que a decisão coerente sobre como definir o conteúdo orçamentário:

exige de quem a toma o domínio de técnicas de escolha de fins alternativos levando em conta a fidelidade para com os eleitores, a compatibilização dos interesses desses com opositores, além de competência de gestão financeira. (PIRES, 2004, p.19-20)

No tocante aos requisitos legais os mesmos estão ligados a qualidade das leis e normas

constitucionais. Assim:

Na linha de que todas as decisões e ações do governo devem estar amparadas pela constitucionalidade e pela legalidade, há que se transformar as técnicas e práticas orçamentárias e a gestão do endividamento público em algo previsto e previsível no conjunto da legislação, com isso transformando-as em formas de agir legitimadas pela vontade popular emanada da democracia representativa, mais facilmente suscetíveis de avaliação e responsabilização. (PIRES, 2004, p. 21)

Em relação aos requisitos cognitivos, os mesmos são definidos como a capacidade dos

grupos administrativos de lidar com o dia a dia da rotina orçamentária. Mesmo existindo leis

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consolidadas, normas bem definidas, nada garante que os grupos envolvidos na elaboração

dos orçamentos tenham condições de elaborar as propostas aliando a técnica e a política.

Sobre isso, o autor afirma sobre a necessidade de (...) indivíduos, grupos, instituições,

organizações, departamentos, agências, políticos e partidos dentro dos governos estarem

preparados para utilização dos instrumentos orçamentários, o que exige formação/treinamento

comportamental, gerencial e operacional (PIRES, 2004, p. 22).

Finalmente, os requisitos políticos definidos como os mais importantes para o controle

social do gasto público compreendem a vontade política de governantes para que o controle

social exista de fato, deixando sua condição reivindicatória para ser pauta da agenda do

Estado. Assim,

Sem que haja vontade política para construir uma correlação de forças que pelo menos dê o impulso inicial à adoção de controles sociais dos gastos públicos, os demais requisitos (técnicos, legais e cognitivos) não só não se apresentam como correm o risco de, apresentando-se, sofrer oposição capaz de inviabiliza-los. A existência de instituições da sociedade civil e de organizações não governamentais destinadas a forçar a transparência nas finanças públicas comprova que a possibilidade de ocorrência de situações como essa é uma tendência, caso nada seja feito no sentido contrário. (PIRES, 2004, p. 23)

Destarte, as próximas seções tratarão justamente de como deu-se a experiência do

orçamento participativo (OP) de Uberlândia em uma conjuntura política adversa à

democratização das relações entre o Estado e Sociedade, culminando na extinção da proposta

por parte do Governo Municipal e na tentativa de resistência por parte da Sociedade civil

adepta à metodologia.

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II - A EXPERIÊNCIA DO ORÇAMENTO PARTICIPATIVO (OP) DE UBERLÂNDIA NO

GOVERNO ZAIRE REZENDE (2001-2004)

II.1 - Origens da proposta

Localizada no Triângulo Mineiro a oeste do Estado de Minas Gerais (Mapa 1),

Uberlândia possui 585.262 habitantes (IBGE, 2005), distribuída numa superfície de

aproximadamente 4.115 Km2, constitui-se em uma cidade de médio porte com expressiva área

de polarização.

A cidade de Uberlândia possui área de área de 4.115,9 km² e uma população de

608.369 habitantes. Pelos Critérios IBGE, Uberlândia possui 18% da população categorizado

com classes D e E com renda até R$ 485,00, e uma população de 53% de Classe C com renda

até R$ 1194,00 (Fonte IBOPE Mídia, com dados atualizados).

“No Estado de Minas Gerais, Uberlândia é um dos principais municípios geradores

de renda, sendo que, em 2003, ficou em 3º (terceiro) lugar e, nos anos anteriores (1999 –

2002), ficou em 4º (quarto) lugar perdendo apenas para Belo Horizonte, Betim e Contagem.

Em 2004, ocupou o 4º (quarto) lugar. O PIB de Uberlândia apresentou um crescimento de

77,21%, no período de 1999 a 2004. O PIB de Minas Gerais, neste mesmo período, cresceu

77,61%, e o PIB do Brasil apresentou um crescimento de 81,41%.” (Fonte: Painel de

Informações Municipais, Cepes; 2007) No tocante à participação dos setores de atividade

econômica no PIB Municipal temos a seguinte situação conforme visualizamos a seguir:

De acordo com informações extraídas do Centro de Pesquisas e Estudos Sócio

Econômicos da UFU (CEPES) no tocante ao PIB Municipal Uberlândia tem o seguinte

comportamento:

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Percebe-se a grande predominância do setor de serviços em relação aos outros

setores que compõem o PIB municipal (agropecuária, indústrias, outros), o que coloca

Uberlândia como uma das cidades onde a prestação de serviços se acentua no correr da sua

história.

No tocante ao mercado de trabalho formal, de acordo com informações do CEPES-

UFU temos a seguinte situação: percebe-se uma grande participação do setor de serviço na

geração de postos de trabalho formal. O setor da construção civil e agropecuária, segundo a

fonte consultada, “se destacam ao apresentar uma queda de participação relativa na geração

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de postos de trabalho, em relação ao total de empregados no ano” (Fonte: Painel de

informações municipais, Cepes, 2007)

Pode-se visualizar mais detalhadamente este comportamento pela tabela que se segue:

Entre 1982 e 1988 Zaire Rezende (PMDB) administrou Uberlândia e iniciou uma das

experiências precursoras do orçamento participativo. De acordo com Ferrari (2005)

Na primeira experiência de participação popular no Governo Municipal, nossa cidade contou com a introdução da Democracia Participativa6 por meio do estímulo à criação das Associações de Moradores de Bairro e Creches Comunitárias. A população na época participava de reuniões com os membros das Associações de Moradores de Bairro e o Prefeito para que as reivindicações fossem viabilizadas pela Prefeitura (FERRARI, 2005, p. 276)

A experiência conseguiu, à época inverter prioridades e principalmente construir

equipamentos públicos que ainda hoje são referência no Município. Entre 1989 a 2000

Uberlândia foi governada por grupos conservadores7 liderados pelo Partido Progressista,

Partido da Frente Liberal e Partido da Social Democracia Brasileira.

A participação popular para aqueles governos significava o atrelamento amplo e

irrestrito de entidades aos respectivos governos via orçamento público. “Ser” Presidente de

Associação de Moradores era um bom negócio: contato direto com secretários e obras nos

6 Democracia Participativa pode ser entendida como o compartilhamento das ações dos governantes com a Sociedade sem, em hipótese alguma, sobrepor às atribuições da Democracia Representativa. 7 Por grupos conservadores admite-se neste artigo os grupos políticos uberlandenses que têm como prática cotidiana enquanto mandatários, o distanciamento entre a população e o centro decisório do governo, ausência de transparência nas relações entre Prefeitura e Sociedade.

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locais onde os Presidentes das Associações escolhessem; status de liderança comunitária com

relevado destaque, e não menos importante o contato direto nas bases comunitárias.

A proposta de construção do orçamento participativo (OP) em Uberlândia foi

inclusive sugerida pela própria população nas reuniões que antecederam a elaboração do

Plano de Governo. Na oportunidade a população constatava que a Prefeitura não estava aberta

para o povo, e que era importante a democratização dos espaços públicos principalmente no

interior da própria Prefeitura.

O Programa de Governo previa a participação popular nas definições do orçamento

público e do planejamento governamental através da construção do planejamento

participativo definido pelo compartilhamento de ações e responsabilidade entre todos os

setores governamentais existentes e a população.

Já empossado, o Prefeito Zaire Rezende criou a Secretaria Municipal de Planejamento

Participativo (SMPP) com o intuito de possibilitar para a Sociedade de Uberlândia a

construção coletiva do planejamento participativo em todos os órgãos de Governo. A

Secretaria Municipal de Planejamento Participativo (SMPP) teve durante os quatro anos de

existência8 as tarefas de organizar o orçamento participativo e construir no interior do

Governo o planejamento participativo.

A seguir detalharemos toda a metodologia implantada no orçamento participativo

(OP) de Uberlândia durante o período de 2001 a 2004.

II.2 Metodologia do orçamento participativo (OP) de Uberlândia

A proposta do Planejamento Participativo no Governo Zaire Rezende (PMDB)

iniciou-se através da criação do Fórum Governamental9 com o intuito de dinamizar as diversas

ações do Poder Executivo. Por meio do PES (Planejamento Estratégico Situacional)10 a

Secretaria Municipal de Planejamento Participativo (SMPP) propôs ações estratégicas para

que o Governo pudesse cumprir seu Programa.

8 Após a posse do novo Prefeito de Uberlândia, Odelmo Leão Carneiro (PP) no ano de 2005 a SMPP foi extinta. 9 O Fórum Governamental foi proposto no início do Governo Zaire Rezende (2001-2004) sendo composto por Secretários, assessores, diretores dos órgãos da Administração Indireta e o Prefeito. 10 Planejamento Estratégico Situacional é uma metodologia de Planejamento criada pelo Economista chileno Carlus Matus. Para maiores informações consultar Huertas (1995).

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Além disso, a metodologia do planejamento participativo foi difundida para diversas

entidades sociais tais como associações de moradores, sindicatos, movimentos de luta pela

terra, organizações não governamentais, etc.

O orçamento participativo (OP) de Uberlândia pautou-se pela participação ampla e

irrestrita dos cidadãos, movimentos sociais e entidades organizadas de Uberlândia no intuito

de inverter prioridades orçamentárias por meio da participação direta da população e pela

negociação pública entre cidadãos e Governo. Por inversão de prioridades orçamentárias

considera-se a execução de obras e serviços que privilegiem a maior parte da população.

A metodologia do orçamento participativo (OP) previa a realização de plenárias

públicas populares com a participação do Governo e a Sociedade com a finalidade de

possibilitar a intervenção direta dos cidadãos na elaboração e execução orçamentárias.

Também contou, para além das discussões nas regiões e distritos do Município com a

participação de Jovens no chamado orçamento participativo (OP) JOVEM que envolveu mais

de 1500 jovens do Município para a intervenção na construção do orçamento público

municipal11.

Para a adoção do orçamento participativo (OP) em Uberlândia foi importante a

percepção de que somente os instrumentos já consolidados da democracia representativa não

eram suficientes para a efetivação do controle social do Estado. Dessa forma, o Governo Zaire

Rezende (PMDB), ao propor o orçamento participativo possibilitou em Uberlândia a

construção de um novo espaço de participação popular composto por diversos setores da

Sociedade que por sua vez, fizeram o debate público da peça orçamentária municipal.

Para a realização do orçamento participativo (OP) de Uberlândia foi necessária a (re)

divisão do Município em novas regiões para que as plenárias do orçamento participativo (OP)

tivessem maior participação e intervenção das comunidades. A divisão regional levou em

consideração a existência dos equipamentos públicos, história dos movimentos sociais e a

proximidade dos bairros componentes. Após a divisão, o Município de Uberlândia passou a

contar com 18 regiões do orçamento participativo (OP) e 4 distritos12 rurais. A figura 2

demonstra a divisão regional do orçamento participativo (OP) de Uberlândia

11 O OP JOVEM não será detalhado neste estudo por opção do autor. 12

Os distritos rurais são: Martinésia, Miraporanga, Cruzeiro dos Peixotos e Tapuirama.

Artigo original Poliarquia- Revista de Estudos Políticos e Sociais do Centro Universitário UNIEURO UNIEURO, Brasília, v. 1, n. 2, jul./dez. 2009.

. A Tabela que se segue demonstra todas as regiões do orçamento participativo (OP)

de Uberlândia:

Tabela 2 - Composição das regiões do orçamento participativo (OP) de Uberlândia (2001 a 2003)

REGIÃO BAIRROS

A Morumbi , São Franscisco de Assis, Prosperidade, Dom Almir, Alvorada,Marielza, Olhos D´agua, Tenda dos Morenos, Parque das Andorinhas, Joana Dárc e Chácaras

próximo ao Rio Araguari

B Tocantis , Guarani, Talismã, Dona Zulmira Norte, Taiaman (Aruanan), Parque Maravilha, Morada do Sol, Jockey Camping, Assentamento Rio das Pedras

C Martins, Daniel Fonseca, Osvaldo Resende D São Jorge , Granada, Laranjeiras, Santa Luzia, Buritis, Paineiras, Viviane,

Seringueiras, São Gabriel, Jd. Gravatas, Comunidade da Floresta do Lobo e Chácaras do Balsamo

E Custodio Pereira, Umuarama, Novo Horizonte F Luizote, Mansour, Jd. Patrícia, D. Zulmira (Sul), Nosso Lar, Santo Antonio, Chácaras

Oliveira e Beira Rio G Patrimônio , Jd. Karaíba, Morada da Colina, Copacabana, Shopping Park, H Nossa Senhora das Graças,Liberdade, Esperança, Gramado, Sta Rosa, Cruzeiro do sul,

Minas Gerais, Marta Helena, Chácaras Val Paraíso, I Pacaembu, Jd América, Maravilha, Maria Rezende, Sta Rosa, Satélite Oliveira J Lagoinha, Pampulha e Saraiva, Carajás, Lagoinha, Leão XIII, Ozanan, Santa Maria,

Vigilato Pereira, Xangrilá

Figura 2 – Mapa das Regiões do OP de Uberlândia (MG)

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L Aclimação e Ipanema I e II, Jd Califórnia, Mansões Aeroporto, Morada dos Pássaros, Quintas do Bosque

M Planalto, Jaraguá, São Lucas, Sto Inácio, Jd Ipanema e Nova Uberlândia, Chácaras Tubalina, Cidade Jardim, Tancredo Neves

N Brasil, Bom Jesus, N.S. Aparecida O Canaã, Morada Nova, Panorama e Bela Vista, Chácaras Eldorado, Sto Antonio, Jd.

Holanda, Chácaras Babilônia, Chácaras Douradinho, Comunidade da Escola Municipal Costa e Silva, Comunidade da Escola Municipal Leandro José de Oliveira,

Comunidade da Escola Municipal Babilônia P Tibery Q Roosevelt, Jd. Brasília, São José, Bairro Industrial, R Centro, Fundinho, Cazeca, Lídice, Tabajaras S Santa Mônica, Segismundo Pereira, Jd. Finotti, Progresso

Fonte: Prefeitura Municipal de Uberlândia (2001)

A metodologia também contemplava a realização de plenárias temáticas13 com o

objetivo de discutir temas gerais do Município e contemplar a participação de setores que de

alguma maneira, não tiveram condições de participar das plenárias regionais.

A metodologia do orçamento participativo (OP) de Uberlândia foi se modificando de

acordo com o tempo. Entre 2001 e 2003 o ciclo contava com Plenárias Informativas,

Reuniões Intermediárias, Plenárias Deliberativas, Plenárias de Prestação de Contas (somente

em 2001). A figura abaixo nos mostra com detalhes cada fase da metodologia do orçamento

participativo (OP) de Uberlândia naquele período:

13

Entre 2001 e 2002 as plenárias temáticas foram: Saúde e Assistência Social; Cultura e Comunicação Social; Segurança Pública, Justiça e Cidadania; Circulação e Transporte; Reforma do Estado Local; Desenvolvimento Econômico, Geração de Emprego e Tributação. A partir de 2003 as Plenárias Temáticas foram: Educação, Esporte e Lazer; Saúde e Assistência Social; Direitos Humanos e Combate à Violência; Organização do Espaço Municipal; Desenvolvimento Local e Distribuição de Renda; Cultura e Comunicação Social; Qualidade no Serviço Público Municipal.

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Figura 3 – Metodologia do orçamento participativo (OP) de Uberlândia

Metodologia do OP de Uberlândia 2001 - 2003

* Apresentação da Metodologia

do OP

* Apresentação dos números da LOA

* Reinvindicações Populares

* Eleições dos delegados do OP

Reuniões

Intermediárias

Plenárias

Informativas

* Análise das reinvindicações

* Criação do Fórum de Delegados

* Montagem da Matriz de Prioridades

* Mobilização para a Plenária

Deliberativa

Plenárias

Deliberativas

* Votação da Matriz de Prioridades

* Votação da chapa de conselheiros

* Prestação de contas do trabalho

dos delegados

* Divulgação do ato de posse do

COP

Solenidade de

entrega da LOA

* Entrega da Proposta de LOA na

Câmara Municipal com a presença

de conselheiros, delegados e

membros de associações de

moradores de bairro.

Acompanhamento da

votação da LOA na

Câmara Municipal

* Mobilização dos Conselheiros

do OP e acompanhamento do

conteúdo das emendas

orçamentárias à LOA juntamente

com a negociação de emendas

com os vereadores.

Na fase deliberativa14 a população elegeu seus conselheiros diretamente nas

plenárias públicas. Para efetivar qualquer candidatura, o Regimento Interno do COP

(Conselho do Orçamento Participativo) determina que cada chapa se inscreva de forma

completa, ou seja, deverá ser composta por 2 conselheiros titulares e 2 conselheiros suplentes.

Quando houver mais de uma chapa completa inscrita é aplicado o critério de

proporcionalidade para composição de uma chapa. O critério pode ser visto logo abaixo:

14 A partir de 2004 a eleição dos conselheiros do OP ocorreu nas plenárias unificadas.

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Tabela 3 - Critério de desempate de chapas inscritas

Fonte: REGIMENTO INTERNO DO COP DE UBERLÂNDIA (2001)

A aplicação do critério de proporcionalidade era simples: quanto mais votos a chapa

conseguia na plenária, mais representantes teria direito na composição da nova chapa.

Percebemos então, que neste caso, não há vencedores ou derrotados: há uma composição de

mais de uma chapa regional para que toda a diversidade presente naquele momento esteja

contemplada no Conselho do Orçamento Participativo (COP).

No que se refere às suas principais atribuições, de acordo com seu Regimento o

COP (Conselho do Orçamento Participativo) deveria dentre se responsabilizar por:

a) apreciar, posicionar frente a várias questões em que pese o Plano Plurianual de Governo a ser enviado à Câmara Municipal de Vereadores no primeiro ano de cada mandato, a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) a ser enviada anualmente à Câmara Municipal de Vereadores e o Planejamento Estratégico Situacional (PES) do Governo; b) apreciar, posicionar-se, alterar, no todo ou em parte, bem como propor aspectos totais ou parciais da política tributária e de arrecadação do poder público municipal; c) acompanhar a execução do orçamento anual e fiscalizar o cumprimento do Plano de Investimentos e Serviços; as aplicações dos recursos extra-orçamentários, tais como os fundos municipais; d) analisar a prestação de contas do governo no final de cada exercício; e) instituir Comissões de Fiscalização do Orçamento (Comforças) e apreciar seus relatórios (REGIMENTO INTERNO DO COP; 2001, p.01)

Internamente, o COP (Conselho do Orçamento Participativo) se organizava da

seguinte maneira: Coordenação Executiva, Fórum de Delegados, Secretaria Executiva do

Conselho, COMFORÇA (Comissão de Fiscalização do Orçamento).

No ano de 2001, o Conselho do Orçamento Participativo (COP) teve como uma de

suas tarefas intervir no Plano Plurianual (PPA) e na Lei Orçamentária Anual (LOA). Tal

momento foi de grande valia e aprendizado tanto para o Governo quanto para o Conselho uma

PERCENTUAL DE VOTOS NÚMERO DE TITULARES E SUPLENTES

75,1% dos votos 2 (dois) titulares e 2 (dois) suplentes

62,6%a 75% dos votos 2 (dois) titulares e 1 (um) suplente

55,1%a 62,5 dos votos 2 (dois) titulares

45,0%a 55,0% dos votos 1 (um) titular e 1 (um) suplente

37,6%a 44,9% dos votos 2 (dois) suplentes

25,0%a 37,5% dos votos 1(um) suplente

24,9% ou menos votos Não elege titular ou suplente

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vez que até aquele momento, não se tinha registro em Uberlândia de um processo de

construção pública envolvendo um Conselho popular na intervenção direta no processo

orçamentário municipal (Plano Plurianual, Lei de Diretrizes Orçamentárias e Lei

Orçamentária Anual).

Para as definições de prioridades dentro do orçamento participativo (OP) de

Uberlândia foi levado em consideração a discussão ampla das necessidades regionais e a

capacidade financeira do Município. Dessa forma, após as plenárias do orçamento

participativo (OP), o COP (Conselho do Orçamento Participativo) pode elaborar uma

proposta de intervenção no PPA (Plano Plurianual) 2002-2005, de forma democrática e

transparente a partir das prioridades discutidas nas plenárias.

Após a entrega do PPA (Plano Plurianual) na Câmara, o COP (Conselho do

Orçamento Participativo) passou a elaborar propostas e consolidar uma agenda de negociação

com o Governo para a inclusão de prioridades no projeto de Lei Orçamentária Anual

encaminhada para a Câmara de Vereadores. O processo de negociação foi marcado por

diversas discussões entre o Conselho do Orçamento Participativo (COP) e Secretários

Municipais no intuito de contemplar o maior número de prioridades populares. Após a

negociação, o COP (Conselho do Orçamento Participativo) passou a focar suas ações no

processo de tramitação da LOA (Lei Orçamentária Anual) na Câmara Municipal.

Esse processo foi extremamente tenso. Após analisar as proposições de emendas dos

vereadores para a LOA (Lei Orçamentária Anual) 2002, a COMFORÇA (Comissão de

Fiscalização do Orçamento)115 avaliou que diversas emendas inviabilizavam a execução

orçamentária do ano de 2002 e muitas delas inclusive não respeitavam as determinações da

Constituição Federal de 1988. Dessa maneira, a COMFORÇA 1 (Comissão de Fiscalização

do Orçamento)encaminhou para a Câmara Municipal um relatório sugerindo a retirada de

diversas emendas com as justificações para tal retirada.

No ano de 2002, além das plenárias do orçamento participativo (OP), o Conselho do

Orçamento Participativo (COP) teve como tarefa principal a consolidação das COMFORÇA

(Comissão de Fiscalização do Orçamento), que de acordo com o regimento interno do

Conselho do Orçamento Participativo (COP), têm o papel de acompanhar o andamento das

obras e serviços do orçamento participativo (OP) em cada região. A idéia de se formar as

15 Comissão de Fiscalização do Orçamento com atribuição específica de acompanhar a tramitação da LOA na Câmara. A partir de 2002, a COMFORÇA 1 passou a ser chamada de COMFORÇA Câmara.

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COMFORÇA (Comissão de Fiscalização do Orçamento) partiu da experiência exitosa do

Município de Belo Horizonte (MG) que idealizou a existência e funcionamento das

COMFORÇA (Comissão de Fiscalização do Orçamento) em sua metodologia de OP.

As atividades das COMFORÇA (Comissão de Fiscalização do Orçamento) eram,

sobretudo ligadas ao dia a dia da esfera governamental. Inicialmente existiram, por parte de

alguns setores governamentais, certas resistências ao reunirem-se com os membros da

comunidade, o que permitiu ao Conselho atuar tanto na fiscalização quanto no esclarecimento

de suas funções para alguns setores governamentais. Mas ainda assim, percebemos que tanto

o volume quanto o conteúdo das discussões presentes no interior das COMFORÇA

(Comissão de Fiscalização do Orçamento) puderam criar no Governo uma abertura para a

fiscalização de obras e serviços.

Em relação à votação do Orçamento na Câmara, os vereadores, já precavidos não

responderam aos inúmeros ofícios encaminhados pelo Conselho do Orçamento Participativo

(COP) solicitando cópias das emendas orçamentárias. Tal ato confirma toda a aversão à

participação popular no Orçamento Público presente na Câmara Municipal de Uberlândia na

legislatura 2001-2004.

Em 2003, o Conselho do Orçamento Participativo (COP), apresentou uma oficina

no III Fórum Social Mundial, em Porto Alegre (RS), onde discutiu sua experiência e

compartilhou-a com diversos Municípios praticantes do orçamento participativo (OP) no

Brasil e no Mundo.

As plenárias do orçamento participativo (OP) ocorreram com uma redução de

participação. Isso, aliado às contradições internas do Governo, fez com que após o ciclo do

ano de 2003 a metodologia para o ano de 2004 fosse modificada para facilitar o trabalho do

Conselho do Orçamento Participativo (COP) conforme dito anteriormente.

Também no ano de 2003 foi introduzido no segundo semestre a realização do curso

Prefeito por um dia (elaborado pelo IBASE16) para conselheiros, delegados do orçamento

participativo (OP), lideranças comunitárias. No total, participaram do curso cerca de 200

pessoas de todas as regiões do orçamento participativo (OP).

As atividades de 2004 contaram com diversas novidades para o Conselho do

Orçamento Participativo: elaboração de propostas para a LDO (Lei de Diretrizes

16 Instituto Brasileiro de Análises Sócio Econômicas. O Curso Prefeito Por Um dia é de livre acesso podendo se adquirido pelo sítio virtual www.ibase.org.br

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Orçamentárias) de 2005, novo formato das plenárias do orçamento participativo (OP),

participação no I Fórum Social do Triângulo Mineiro (FSTM), proposição de uma

representação no Ministério Público contra a reserva orçamentária praticada pela Câmara

Municipal. Além disso, as atividades anteriores do Conselho (elaboração de propostas para a

LOA (Lei Orçamentária Anual), fiscalização de obras e serviços) continuaram normalmente.

No que se refere à LDO (Lei de Diretrizes Orçamentárias) 2005 o Conselho do

Orçamento Participativo (COP) elaborou pela primeira vez desde 2001 uma proposta de

intervenção baseada em discussões que visavam a inclusão de diretrizes orçamentárias ainda

não contempladas nos anos anteriores.

Em relação à nova metodologia, o novo ciclo do orçamento participativo (OP)

contou com a realização de plenárias unificadas em vez de plenárias informativas e

deliberativas. Também foi incluída a realização de reuniões preparatórias que antecediam as

plenárias unificadas para a devida explicação da nova metodologia e mobilização social de

todo o Município.

A participação do Conselho do Orçamento Participativo (COP) no I FSTM precedeu

de uma mobilização interna que visava dois objetivos quais sejam, a realização de uma oficina

sobre o orçamento participativo (OP) de Uberlândia e a articulação dos participantes do I

FSTM para a assinatura de uma representação que foi encaminhada ao Ministério Público

contra a reserva orçamentária praticada pela Câmara de Vereadores.

De forma mais explicativa, a Câmara Municipal de Uberlândia por meio de uma

emenda inconstitucional ao projeto de LDO (Lei de Diretrizes Orçamentárias) dos anos de

2003 e 2004 reservou uma parcela de 0,75% do orçamento público para a distribuição entre

entidades sociais de acordo com critérios próprios. Isso significava que a Câmara Municipal

poderia distribuir entre as entidades escolhidas cerca de R$ 1,5 milhão sem nenhum tipo de

análise dos Conselhos Setoriais envolvidos ou até mesmo da Sociedade como um todo.

A argumentação básica do Conselho do Orçamento Participativo (COP) na

representação fundamentou-se no fato de que a Câmara Municipal já executava a parcela

máxima do orçamento público prevista na Constituição Federal de 1988 (5% das receitas, no

caso de Uberlândia). Logo a Câmara executaria 5,75% do Orçamento Público.

Além disso, muitas entidades “escolhidas” pelos vereadores representavam parcela

significativa de redutos eleitorais de diversas nuances: associações de moradores de bairro

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liga de futsal, liga de truco, liga de Karatê, clube dos passarinheiros, escolas privadas, clubes

privados, etc.

O Poder Judiciário por sua vez se manifestou favoravelmente ao manifesto

encabeçado pelo Conselho do Orçamento Participativo (COP) suspendendo a transferência de

recursos orçamentários para todas as entidades. O fato repercutiu tanto na imprensa local

quanto na imprensa nacional17. Os vereadores, transferiram a responsabilidade pela suspensão

da transferência dos recursos públicos para as entidades escolhidas ao Conselho do

Orçamento Participativo (COP), mesmo após a manifestação da Justiça.

O episódio acima descrito demonstrou mais uma vez a relação clientelística

praticada pela Câmara Municipal de Uberlândia em relação às suas bases: utilização de

recursos públicos para obtenção de dividendos eleitorais. Ao comparar a “lista” de entidades

selecionadas, o Conselho do Orçamento Participativo (COP) percebeu que a grande maioria

era presidida por assessores (as) dos vereadores, prova cabal do clientelismo descrito.

Fica claro que a relação entre Conselho do Orçamento Participativo (COP) e

Câmara sempre foi conflituosa. Não houve por parte da maioria dos vereadores na legislatura

de 2001 a 2004, a compreensão de que o orçamento público não é somente um instrumento

para “uso” exclusivo dos técnicos da Prefeitura e dos vereadores e sim de toda a Sociedade,

que é quem contribui para a formação do orçamento.

Nos quatro primeiros anos do orçamento participativo (OP) de Uberlândia foram

eleitos mais de 500 delegados (as) do orçamento participativo (OP), 228 conselheiros (as) do

orçamento participativo (OP), e participaram ativamente das plenárias públicas mais de

40.000 cidadãos. Participaram também das plenárias diversas entidades sociais tais como

Associações de moradores de bairro, Associações de Amigos de Bairro, Associações

Femininas, Associações de Comércio, Sindicatos, Partidos Políticos, Conselhos Municipais,

Conselhos Distritais de saúde, grupos culturais, grupos afro-descendentes, Organizações não-

governamentais, pastorais, etc.

No ano de 2004, após a avaliação tanto do COP (Conselho do Orçamento

Participativo) quanto do governo de que era necessário a otimização do ciclo do orçamento

participativo (OP) objetivando a concretização de obras não concluídas foi introduzida o ciclo

unificado do orçamento participativo (OP) conforme podemos observar na figura que se

segue:

17 A divulgação do escândalo foi tamanha que a reportagem foi pauta de abertura do Jornal Nacional, da Rede Globo.

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Figura 4 - Plenárias Unificadas do Orçamento Participativo 2004/2005

Com a nova metodologia, as Plenárias Informativas foram suprimidas assim como

as reuniões intermediárias. A partir de 2004, as plenárias unificadas definiriam em um só

momento, os conselheiros, delegados, prioridades regionais.

No que se refere às obras e serviços realizados pelo Governo oriundas do processo do

orçamento participativo o quadro que se segue detalha uma relação de obras e serviços

realizadas no período de 2001 a 2004 em Uberlândia:

Plenárias

Unificadas

Reuniões

preparatórias

Delegados e conselheiros analisam as prioridades dos anos anteriores Construção de uma proposta de matriz orçamentária para votação na Plenária Unificada Planejamento da Mobilização da Região

Planejamento da Mobilização da

Região

Prestação de contas do governo Intervenções populares Eleição dos delegados do OP Votação da matriz orçamentária Eleição dos conselheiros do OP

Planejamento da Mobilização da

Região

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II.3 Resultados da pesquisa de campo.

Ainda como funcionário da extinta Secretaria Municipal de Planejamento

Participativo (SMPP) no ano de 2004, o autor do artigo ora apresentado propôs à equipe do

orçamento participativo (OP) a aplicação de um questionário cujo objetivo era avaliar

especificamente a metodologia do orçamento participativo (OP) de Uberlândia. A construção

do questionário levou em consideração outras pesquisas realizadas em outros Municípios

onde existia o orçamento participativo (OP), com ênfase em Porto Alegre, cuja pesquisa foi

realizada pela Prefeitura Municipal em parceria com a ONG Cidade18.

No ano de 2004 participaram 4.392 pessoas nas Plenárias Unificadas do orçamento

participativo (OP). Deste total, foram entrevistadas 148 pessoas, o que representa 3,37% do

universo, sendo distribuídas em três plenárias regionais e uma temática.

Alertamos para as possíveis fragilidades da pesquisa quanto a quantidade da

“amostra”, porém tal fragilidade pode ser minimizada pelo valor histórico das respostas e por

se tratar de uma pesquisa cujo foco era a metodologia do orçamento participativo (OP) de

Uberlândia19.

Em relação ao sexo, temos um comportamento interessante, a maioria dos

participantes que responderam ao questionário são mulheres20 perfazendo 57,43% do total da

“amostra” onde os homens ficaram com 42,57% conforme podemos visualizar na tabela que

se segue:

18 Quem é o Público do Orçamento Participativo 2000. Prefeitura de Porto Alegre/ ONG Cidade, 2002 19 A decisão de se focar a metodologia do OP nos questionários partiu à época da constatação interna da SMPP que outras informações sobre o chamado “público do OP” tais como renda, idade, raça, filiação partidária, etc já eram objeto de pesquisa de outros (as) pesquisadores (as) tais como Silva (2003), Godoi (2005) de diversas instituições de ensino. Logo, privilegiou-se a avaliação da metodologia do OP. 20 Silva e Ramires (2003) em sua pesquisa de campo nas plenárias do OP verificaram algo semelhante: 51,45% mulheres e 48,55% de homens. Ainda que por razões metodológicas não possamos fazer uma comparação com ambas as pesquisas (a amostra de Silva e Ramires (2003) era superior a deste estudo e realizada em mais plenárias ) percebe-se que as mulheres participavam ativamente das plenárias do OP.

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Tabela 4 - Distribuição de freqüências absolutas e relativas, segundo sexo - 2004

Casos %

Homem 63 42,57

Mulher 85 57,43

Total 148 100

Importante destacar que a participação das mulheres nas plenárias do orçamento

participativo (OP) era bem destacada, não apenas pelos números mencionados, mas

principalmente pelas intervenções públicas durante as plenárias e inclusive pela participação

nos espaços de representação existentes no processo, ratificando a condição de sujeitas da

construção de suas próprias histórias.

Em relação ao grupo que se identifica na sociedade, percebemos que dos participantes

entrevistados a grande parcela não se identifica com nenhum grupo (participação individual),

sendo seguido por membros de Associações de moradores de Bairro (35 casos) e delegados

(as)/conselheiros (as) do orçamento participativo (OP) ( 20 casos) respectivamente. Na

seqüência estão os grupos conselho distrital de saúde (17 casos), grupo religioso (14 casos) e

entidade governamental com 13 casos.

Percebe-se também que muitas pessoas responderam mais de uma alternativa o que

indica a existência de representação múltipla em organizações comunitárias. As informações

podem ser observadas na tabela que se segue:

Tabela 5 – Com qual grupo está na plenária/reunião do orçamento participativo (OP)? Tipo de organização casos Tipo de organização casos

Associação de moradores 35 Entidade de classe 6

Conselho Distrital de Saúde 17 Conselho Distrital Rural 1

Associação de Amigos de Bairro 5 Entidade governamental 13

Delegado(a)/conselheiro(a) do OP 20 Creches 8

Clube de mães 3 Organização Não-governamental 9

Grupo cultural 3 Partido Político 9

Grupo Religioso 14 Individual 50

Entidade de classe 6 Não respondeu 6

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Conselho Distrital Rural 1 Não sabe 0

Outro. Qual? 1

Total 207

Em relação aos motivos que cada pessoa participava das plenárias do orçamento

participativo (OP) de Uberlândia a tabela que se segue aponta que a maioria dos casos (65)

participa para ajudar a comunidade, sendo seguido por 51 casos de pessoas que participavam

das plenárias para exercer a sua cidadania. Em terceiro lugar com 40 casos, está a opção “para

resolver demandas da comunidade”.

Podemos se não afirmar com exatidão, mas pelo menos apontar que o sentimento

“coletivo” supera as demandas imediatas e pragmáticas dos(as) entrevistados, o que nos faz

crer que para além das obras e construções que são necessárias e legítimas o orçamento

participativo (OP) avança na construção de sujeitos conscientes de seu papel na sociedade, ou

seja, cidadãos ativos.

Tabela 6 – Motivos para participar nas plenárias do orçamento participativo (OP) de

Uberlândia, 2004

Opções Casos

Ajudar a comunidade 65

Exercer a cidadania 51 Para resolver as demandas da

comunidade 40

OP é democrático 18

Reforçar a Participação 27

Outros motivos 8

Total 209

Quando questionados sobre a participação em plenárias anteriores do orçamento

participativo (OP) de Uberlândia percebe-se um comportamento interessante qual seja, a

maioria dos (as) entrevistados (as) participou pela primeira vez das plenárias do orçamento

participativo (OP), conforme figura que se segue:

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Pela figura anterior, 64 pessoas (43,24%) participaram das plenárias do orçamento

participativo (OP) em anos anteriores contra 84 (56,76%) que disseram nunca ter participado

de plenárias do orçamento participativo (OP) de Uberlândia. Tal resultado pode ser encarado

sob duas perspectivas: a) a Secretaria Municipal de Planejamento Participativo (SMPP) focou

na mobilização social do ano de 2004 grupos que ainda não haviam participado das plenárias

do orçamento participativo (OP) de Uberlândia e b) descrédito do governo (e

consequentemente do OP) junto à sociedade21.

Se perguntado (a) em qual plenária do orçamento participativo (OP) costuma

participar, ainda que a “amostra” se refira a três regiões e uma temática e ainda que a

“amostra” seja composta consideravelmente por pessoas que participavam pela primeira vez

das plenárias do orçamento participativo (OP), percebe-se que há uma distribuição

interessante de participação nas três possibilidades que existiam à época conforme explicitado

na tabela que se segue:

21 Nas considerações finais deste artigo faremos uma reflexão sobre a composição do governo Zaire Rezende (PMDB) na gestão 2001-2004 e consequentemente os desgastes enfrentados pelo OP durante esse período

Figura 5 - Nível de participação em plenárias

anteriores do OP de Uberlândia. 2004

Sim Não

Artigo original Poliarquia- Revista de Estudos Políticos e Sociais do Centro Universitário UNIEURO UNIEURO, Brasília, v. 1, n. 2, jul./dez. 2009.

Tabela 7 – Nível de participação em reuniões/plenárias do orçamento participativo

(OP) de Uberlândia, 2004

Opções Casos %

Somente na região 25 16,89

Na região, distrito e temática 21 14,19

Na região e temática 23 15,54

Somente na temática 2 1,35

Somente na distrital 0 0,00

Na distrital e na temática 3 2,03

Primeira vez que participa 59 39,86

Não respondeu 15 10,14

Total 148 100,00

Ainda que a participação somente nas regionais lidere as respostas dos que já

participaram das plenárias do orçamento participativo (OP) com 16,89% é interessante

destacar o resultado da opção “na região, distrito e temática” que obteve 14,19 % bem

próximo da opção “na região e temática” com 15, 54%.

Também foram avaliados os meios de divulgação das plenárias do orçamento

participativo (OP) daquele ano. Tais informações podem ser visualizadas na tabela que se

segue:

Tabela 8 - Meios de informação sobre as plenárias do orçamento participativo (OP) de

Uberlândia, 2004 Opções casos

Associação de moradores 26

Delegado (a) ou conselheiro(a) 24

Amigo, vizinho ou parente 25

Representante de Prefeitura 39

Escola 12

Cartazes, Jornais da Prefeitura 21

Outra entidade 8

Outros meios 7

não respondeu 2

Total 164

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A opção “representante da prefeitura” lidera a lista com 39 casos, o que reforça de

certa maneira o trabalho de mobilização social implementado pela Secretaria Municipal de

Planejamento Participativo (SMPP) durante aquele ano. Um pouco atrás encontra-se a opção

“associação de moradores” com 26 casos, seguido de perto pela opção “amigo, vizinho ou

parente” e a opção “delegado(a) ou conselheiro (a)” com 25 e 24 casos respectivamente. O

meio de comunicação “cartazes, jornais da Prefeitura” ficou com 21 casos reforçando mais

uma vez o trabalho de mobilização social da Secretaria Municipal de Planejamento

Participativo (SMPP) naquele ano.

Foram elaboradas algumas perguntas sobre o processo de funcionamento do

orçamento participativo (OP) a fim de identificar até que ponto ou em que medida os (as)

participantes conheciam a metodologia proposta.

Nessa perspectiva, a figura a seguir trata do nível de conhecimento no orçamento

participativo (OP) de Uberlândia:

Os dados da tabela acima indicam que apenas 73 pessoas (49,32%) conheciam o ciclo

do orçamento participativo (OP) naquele ano e que 71 pessoas (47,97%).

Figura 6 - Participação relativa segundo

conhecimento das regras do OP de Uberlândia -

2004

49,32 47,97

2,70

0

10

20

30

40

50

60

Sim Não Não respondeu

Artigo original Poliarquia- Revista de Estudos Políticos e Sociais do Centro Universitário UNIEURO UNIEURO, Brasília, v. 1, n. 2, jul./dez. 2009.

Foi perguntado aos participantes se os(as) mesmos(as) haviam sido eleitos(as)

delegados(as) e/ou conselheiros(as) do orçamento participativo (OP) nos anos anteriores.

Pelos dados expressos na figura que se segue percebe-se que a grande maioria dos casos (77)

não foram eleitos em nenhuma instância de representação do orçamento participativo (OP) de

Uberlândia entre 2001 e 2004. Em segundo lugar ficou a opção “não respondeu” com

expressivos 43 casos e por fim apenas 28 casos se declararam representantes do orçamento

participativo (OP) em anos anteriores.

Quando se trata de perguntar aos participantes se a região já foi beneficiada pelo

orçamento participativo (OP) temos o seguinte comportamento: 38,51% dos casos afirmar já

terem sido beneficiados de alguma forma pelo orçamento participativo (OP), 29,05%

afirmaram não terem sido beneficiados. Ao somar-se as opções não sabe (20,95 % ) e não

respondeu (11,49%) temos ainda um resultado inferior ao das pessoas beneficiadas pelo

orçamento participativo (OP).

28

77

43

0

10

20

30

40

50

60

70

80

90

Sim Não Não respondeu

Figura 7 – Distribuição absoluta dos eleitos nas plenárias do OP de Uberlândia - 2004

Artigo original Poliarquia- Revista de Estudos Políticos e Sociais do Centro Universitário UNIEURO UNIEURO, Brasília, v. 1, n. 2, jul./dez. 2009.

Tabela 9 – Distribuição das freqüências absolutas e relativas segundo os beneficiados

com obras e serviços do orçamento participativo (OP) de Uberlândia - 2004

Opções casos %

Sim 57 38,51

Não 43 29,05

Não sabe 31 20,95

Não respondeu 17 11,49

Total 148 100

Sobre o poder de decisão do orçamento participativo (OP) de Uberlândia, percebe-se

pelos dados da tabela que se segue que a opção “poucas vezes/às vezes” se destaca das outras

opções com 29,05% dos casos sendo seguida de perto pela opção “na maioria das vezes/quase

sempre” com 28,38%. As pessoas que não sabem manifestaram esta opção por 31 vezes em

termos absolutos. Curiosamente as opções “sempre” e “nunca” tiveram o mesmo

comportamento, ficando com 7,43%.

Tabela 10 – Distribuição de freqüências absolutas e relativas de acordo com o poder

de decisão do orçamento participativo (OP) de Uberlândia - 2004

Opções casos %

Sempre 11 7,43

Na maioria das vezes/quase sempre 42 28,38

Poucas vezes/às vezes 43 29,05

Nunca 11 7,43

Não sabe 31 20,95

Não respondeu 10 6,76

Total 148 100,00

Artigo original Poliarquia- Revista de Estudos Políticos e Sociais do Centro Universitário UNIEURO UNIEURO, Brasília, v. 1, n. 2, jul./dez. 2009.

Também se tentou captar como os (as) participantes entrevistados (as) consideravam

as obras e serviços do orçamento participativo (OP). Como constata-se na figura que se segue,

para 77,70 % dos (as) entrevistados (as) as obras e serviços do orçamento participativo (OP)

são “conquistas populares”, seguido bem de longe por “concessão do Prefeito/Secretário”

(9,46%) e “concessão do vereador” (6,76%). Somando-se as opções “concessão do

Prefeito/Secretário”, “concessão do vereador” e “não respondeu” (22,30%) ainda assim há um

grande distanciamento entre a opção “conquistas populares” (diferença de 55,4%). O

resultado surpreende não pelo significado político do orçamento participativo (OP), mas sim

pelas dificuldades pelas quais a metodologia enfrentou durante o governo.

Uma outra questão foi feita no sentido de tentar captar quais as transformações entre a

relação da Prefeitura Municipal de Uberlândia e a Sociedade após a adoção do orçamento

participativo (OP) como pode-se acompanhar a seguir:

Figura 8 - Nível de participação relativa segundo como

considera as obras do OP de Uberlândia (%)- 2004

77,70

9,46 6,76 6,08

0,00

10,00

20,00

30,00

40,00

50,00

60,00

70,00

80,00

90,00

Conquistas populares Concessão do

Prefeito/secretário

Concessão do

vereador

Não respondeu

Artigo original Poliarquia- Revista de Estudos Políticos e Sociais do Centro Universitário UNIEURO UNIEURO, Brasília, v. 1, n. 2, jul./dez. 2009.

Pela figura anterior, a grande maioria dos (as) entrevistados (as) 66,22 % (98 casos)

afirmaram que a Prefeitura se tornou mais transparente após o orçamento participativo (OP),

contra apenas 10,14% (15 casos) que afirmaram o contrário. Não sabem e não respondeu

correspondem a respectivamente 14,86 %( 22 casos ) e 8,78 % (13 casos). Essa percepção é

importante para entendermos que ainda que a experiência do orçamento participativo (OP)

tenha sofrido diversas oposições dentro e fora do governo, a metodologia é uma forma de

publicizar o Estado e tornar mais transparente a sua relação com a Sociedade.

Importante ressaltar o papel desempenhado no período pela Secretaria Municipal de

Planejamento Participativo (SMPP) no sentido de politizar o orçamento público em um

Município que não tem em sua história, a prática de tornar pública as relações entre

governantes e governados.

Por fim a pesquisa tentou captar a visão que os (as) participantes têm da Câmara

Municipal de Uberlândia e sua relação com o orçamento participativo (OP). Nas duas tabelas

que se seguem visualiza-se informações relevantes que respondem as seguintes questões: qual

o papel da Câmara Municipal de Vereadores e qual a repercussão do orçamento participativo

(OP) na Câmara Municipal de Vereadores.

66,22

10,1414,86

8,78

0

10

20

30

40

50

60

70

Sim Não Não sabe Não respondeu

Figura 9 – Participação relativa (%) segundo a transparência da Prefeitura após o OP de Uberlândia - 2004

Artigo original Poliarquia- Revista de Estudos Políticos e Sociais do Centro Universitário UNIEURO UNIEURO, Brasília, v. 1, n. 2, jul./dez. 2009.

Tabela 11 – Distribuição absoluta segundo função da Câmara Municipal de

Vereadores – Uberlândia – 2004*

Opções casos

Atender demandas da comunidade 27

Propor e votar leis 69

Discutir e votar o orçamento 43

Formular políticas públicas 13

Outro papel 4

Não sabe 17

Não respondeu 4

Total 177 * a questão aceitava mais de uma resposta

Pelos dados acima, a opção “propor e votar leis” lidera com 69 casos, sendo seguida

não tão de perto pela opção “discutir e votar o orçamento” com 43 casos e pela opção

“atender demandas da comunidade” com 27 casos. A opção “ não sabe”ficou em quaro lugar

com 17 casos. A opção “formular políticas públicas” ficou em quinto lugar com 13 casos

seguida em situação de empate com as opções “outro papel” e “não respondeu” com 4 casos

respectivamente. Ainda que na sociedade tenha-se uma percepção “consensuada” de que o

Poder Legislativo Municipal atue prioritariamente na resolução de demandas particulares,

para os participantes entrevistados o papel da Câmara é elevado ao papel original do Poder

Legislativo.

Por fim foi questionado aos participantes qual a repercussão do orçamento

participativo (OP) para a Câmara de vereadores do Município de Uberlândia. Tais

informações são visualizadas na tabela que se segue:

Artigo original Poliarquia- Revista de Estudos Políticos e Sociais do Centro Universitário UNIEURO UNIEURO, Brasília, v. 1, n. 2, jul./dez. 2009.

Tabela 12 – Distribuição absoluta e relativa segundo a repercussão do orçamento

participativo (OP) na Câmara Municipal de Vereadores – Uberlândia - 2004

Opção casos %

Favorece a atuação da Câmara 81 54,73

Prejudica a atuação da Câmara de Vereadores 2 1,35

Não interfere em nada 15 10,14

Outra opinião 5 3,38

Não sabe 34 22,97

Não respondeu 11 7,43

Total 148 100,00

Pelos dados acima percebe-se que 81 casos acreditam que o orçamento participativo

(OP) “favorece a atuação na Câmara”, sendo o seu oposto (opção “prejudica a atuação da

Câmara de Vereadores) com apenas 2 casos. 15 casos consideravam que o orçamento

participativo (OP) não interferia em nada em relação a atuação da Câmara Municipal.

A pesquisa apesar de suas limitações apontou ainda que de forma incipiente o

comportamento e a avaliação da metodologia do orçamento participativo (OP) no Município

de Uberlândia no ano de 2004. Tentou-se avaliar para além da metodologia do OP em suas

características básicas a relação do orçamento participativo (OP) com a Câmara Municipal e

principalmente a percepção popular sobre o significado do orçamento participativo (OP) em

nas dimensões material, comunitária e política.

A próxima seção é dedicada exclusivamente pelo relato e reflexão das ações do Fórum

Permanente do Orçamento Participativo (FPOP) durante os anos de 2005 e 2006.

Artigo original Poliarquia- Revista de Estudos Políticos e Sociais do Centro Universitário UNIEURO UNIEURO, Brasília, v. 1, n. 2, jul./dez. 2009.

III – A ORGANIZAÇÃO DO ORÇAMENTO PARTICIPATIVO (OP) DE UBERLÂNDIA

PELA PRÓPRIA SOCIEDADE: A RESISTÊNCIA DO FÓRUM PERMANENTE DO

ORÇAMENTO PARTICIPATIVO DE UBERLÂNDIA (FPOP)

A seção que ora se apresenta destina-se a tratar especificamente da construção do

Fórum Permanente do Orçamento Participativo (FPOP) que durante os anos de 2005 e 2006

organizou as plenárias do orçamento participativo (OP) de Uberlândia.

Nas eleições de 2004, o então candidato Odelmo Leão Carneiro (PP) venceu o pleito

municipal no segundo turno. Em 2005, apoiado por grande parte da mídia privada, o governo

Odelmo iniciou seu mandato sob um céu de brigadeiro: ampla maioria na Câmara Municipal,

oposição esfacelada e desorganizada, país em recuperação econômica, movimentos sociais

silenciosos.

A composição do governo deu-se de acordo com a tradição política do grupo que o

lidera, sendo formado em grande parte por representantes de entidades empresariais, setor

imobiliário, lideranças comunitárias “seduzidas” pelo acesso fácil ao poder.

O modelo de gestão traçado para os quatro anos tem como característica básica a

centralização das ações no governante, a focalização em realização de grandes obras de

investimento (arena do Sabiazinho, ampliação de UAIs sem a contratação efetiva de

funcionários, o projeto pré-metrô, dentre outras).

No que se refere à relação do governo com sociedade a receita não teve grandes

adicionais: completa ausência ao estímulo do empoderamento social (que é absolutamente

coerente com a prática de seu grupo político), cooptação dos conselhos setoriais existentes,

desarticulação dos conselhos distritais de saúde, fim do orçamento participativo.

Após a vitória do candidato Odelmo Leão Carneiro (PP) nas eleições municipais de

200422, alguns funcionários da então ainda existente Secretaria Municipal de Planejamento

Participativo juntamente com conselheiros (as) e delegados (as) do orçamento participativo

(OP) propuseram a permanência da metodologia do orçamento participativo (OP) a partir da

própria organização comunitária.

22 A data de fundação do FPOP foi o dia 10 de dezembro de 2004. (Ferrari, 2005)

Artigo original Poliarquia- Revista de Estudos Políticos e Sociais do Centro Universitário UNIEURO UNIEURO, Brasília, v. 1, n. 2, jul./dez. 2009.

Segundo Ferrari (2005):

O ano de 2005 começou com a mudança de Governo. Após vencer as eleições de 2004, o Prefeito eleito Odelmo Leão Carneiro (PP), montou sua equipe sob a perspectiva da realização de um “choque de gestão” composto pela redução da máquina administrativa em todos os níveis por meio de uma lei delegada aprovada pela Câmara Municipal. No tocante ao OP, o governo Odelmo extinguiu a Secretaria Municipal de Planejamento Participativo e conseqüentemente o OP enquanto proposição governamental. Ao perceber isso ainda no ano de 2004, a Coordenação do Conselho do Orçamento Participativo, encaminhou uma proposta para todo o Conselho de criação do Fórum Permanente do Orçamento Participativo de Uberlândia (FPOP). Baseado na experiência do Município do Rio de Janeiro, o FPOP é composto por entidades e cidadãos uberlandenses que acreditam no controle social do orçamento via participação direta. (Ferrari; 2005, p.285)

De caráter autogestionário, ou seja, os próprios participantes que tomavam as decisões

de forma igualitária em todos os momentos necessários, o FPOP (Fórum Permanente do

Orçamento Participativo de Uberlândia) elaborou uma carta de princípios cujo conteúdo

deixa claro os objetivos e principalmente a percepção do grupo sobre o ciclo orçamentário

municipal. Segundo a carta,

O Fórum será permanente, pois a execução orçamentária inicia-se em 1o. de janeiro e termina em 31 de dezembro. O Fórum, de caráter apartidário, será composto por cidadãos e entidades sociais defensoras da publicização orçamentária e da transparência da gestão pública. Fiscalizar o Orçamento não é tarefa para poucas pessoas. A cada dia que passa percebemos a importância da sociedade controlar os recursos que são da própria população, pois é ela que contribui para a formação do Orçamento por meio dos impostos e taxas. (CARTA DE ADESAO AO FPOP, 2005)

Em relação à composição do FPOP (Fórum Permanente do Orçamento Participativo

de Uberlândia) e atribuições, as mesmas podem ser observadas na figura que se segue:

Artigo original Poliarquia- Revista de Estudos Políticos e Sociais do Centro Universitário UNIEURO UNIEURO, Brasília, v. 1, n. 2, jul./dez. 2009.

Figura 10 – Composição e atribuições iniciais do FPOP

Já no dia 21 de março de 2005 o FPOP (Fórum Permanente do Orçamento Participativo

de Uberlândia) realizou uma audiência com o Prefeito Odelmo Leão Carneiro (PP) para

comunicar oficialmente a permanência da metodologia do orçamento participativo (OP) pela

organização comunitária. Segundo o relatório de atividades do FPOP (Fórum Permanente do

Orçamento Participativo de Uberlândia) ,

Foram relevados assuntos relacionados á transparência do Orçamento Público e a realização de plenárias públicas do Orçamento participativo no ano de 2005. O prefeito, entretanto, ponderou que a realização das plenárias do Orçamento participativo não seria necessária uma vez que as informações sobre o orçamento estarão presentes na página eletrônica da prefeitura, via internet. Os membros do FPOP ressaltaram ainda a importância das COMFORÇAS – Comissão de

Artigo original Poliarquia- Revista de Estudos Políticos e Sociais do Centro Universitário UNIEURO UNIEURO, Brasília, v. 1, n. 2, jul./dez. 2009.

Fiscalização do Orçamento participativo, instituída pelo Conselho do Orçamento Participativo – COP, com o objetivo de fiscalizar os gastos públicos. Novamente o prefeito não se comprometeu em facilitar ações de fiscalização do orçamento em seu mandato. Foi ressaltado pelos membros do OP que “MUDOU O PREFEITO, MAS O ORÇAMENTO PARTICIPATIVO CONTINUA” (RELATORIO DE ATIVIDADES DO FPOP, 2005; 02)

Assim em 2005 o FPOP (Fórum Permanente do Orçamento Participativo de

Uberlândia) realizou 16 plenárias populares23 nas regiões do OP. Em cada plenária foram

discutidas as seguintes questões:

a) publicização do orçamento municipal (receitas e despesas);

b) avaliação das primeiras medidas do governo municipal24;

c) escolha dos conselheiros e delegados do orçamento participativo (OP);

d) levantamento de reivindicações populares regionais para o orçamento de 2006

Após a coleta das reivindicações o próximo passo foi elaborar juntamente com os

mandatos que apoiavam a iniciativa25 propostas de requerimentos e emendas ao projeto do

PPA (Plano Plurianual) e LOA (Lei Orçamentária Anual) que foram encaminhadas

respectivamente ao Poder Executivo e Legislativo.

Antes da votação do projeto de PPA (Plano Plurianual) 2006-2009, porém o FPOP

(Fórum Permanente do Orçamento Participativo de Uberlândia) realizou um ato político na

Câmara de Vereadores: no dia 06 de dezembro de 2005 mobilizou cerca de 60 pessoas sendo

37 entidades sociais representadas e militantes, além da Universidade Federal de Uberlândia.

O ato, chamado, “Café da manhã do FPOP” objetivava sensibilizar os vereadores pela

importância do conteúdo das emendas populares que visavam, sobretudo a inversão de

prioridades sociais orçamentárias, ou seja, o orçamento público seria destinado em sua grande

parte às camadas menos favorecidas de Uberlândia.

23 As plenárias foram realizadas em escolas, igrejas, associações de bairro, etc.Em anexo, consta o material de divulgação das plenárias do OP 2005/2006 24 Basicamente foram, lei delegada (onde o Legislativo delegou amplos poderes para o Executivo atuar em áreas que são de âmbito do Poder Legislativo – ressalta-se que somente com ampla maioria o Poder Executivo poderia aprovar isso no Legislativo, aprovação de dispositivo que permite ao Prefeito remanejar 25% das rubricas no orçamento de 2005, anulação dos concursos públicos realizados pela administração anterior, fim da Secretaria de Planejamento Participativo) 25 Aniceto Ferreira (PT), Elismar Prado (PT) e Fernando Rezende (PMDB). Após as eleições de 2006, Elismar Prado (PT) elege-se Deputado Federal e assume em seu lugar Delfino Rodrigues (PT) que passa a integrar a frente de apoio ao FPOP na Câmara.

Artigo original Poliarquia- Revista de Estudos Políticos e Sociais do Centro Universitário UNIEURO UNIEURO, Brasília, v. 1, n. 2, jul./dez. 2009.

O resultado foi imediato: a Câmara Municipal antecipa a leitura do projeto de PPA

(Plano Plurianual) para aquele mesmo dia, em sessão extraordinária, à tarde, sendo que a

previsão original de discussão do projeto era para uma semana após o Café da Manhã.

Em artigo veiculado no Jornal Correio, Silva e Neves (2005) afirmam,

Nesse primeiro ano participaram mais de 500 pessoas que levantaram 228 prioridades em 16 Plenárias do Orçamento Participativo para a cidade de Uberlândia. Essas prioridades foram encaminhadas ao Legislativo, pelos vereadores que apóiam esta iniciativa popular (Fernando Rezende , Aniceto Ferreira e Elismar Prado. Como resultados das Plenárias do Orçamento Participativo de 2005, o Fórum Permanente do Orçamento Participativo protocolou em setembro 117 requerimentos, que são demandas da população que já eram previstas no orçamento de 2005, mas não vinham sendo realizadas pela administração. Enquanto ao PPA (Plano Plurianual) que diz respeito ao conjunto de programas e ações a serem desenvolvidas pelo Poder Executivo ao longo dos próximos quatro anos foram protocoladas 16 emendas, já para LOA (Lei Orçamentária Anual) que detalha os investimentos e custeio para ano de 2006 foram protocoladas dez emendas, somando um total de 26 emendas apresentadas. Neste sentido, o FPOP garante a participação na discussão e na priorização dos gastos do orçamento público, um princípio preconizado pela Constituição Federal, pela Lei de Responsabilidade Fiscal e pelo Estatuto das Cidades, revelando-se como um instrumento fundamental para o exercício da democracia e da cidadania em Uberlândia. Espera-se que essas emendas sejam apreciadas pelos nobres vereadores da Câmara Municipal e que a população seja ouvida em relação às mesmas. (Silva e Neves; 2005: 02)

Ressalta-se que nesse processo o FPOP (Fórum Permanente do Orçamento

Participativo de Uberlândia) encaminhou uma quantidade de emendas superior ao somatório

de toda Câmara Municipal. Para além do ponto de vista quantitativo, qualitativamente as

emendas encaminhadas tinham um significado central para o PPA (Plano Plurianual) 2006-

2009: enfrentavam de frente suas debilidades no tocante à políticas públicas de inclusão

social.

Das emendas elaboradas pelo FPOP (Fórum Permanente do Orçamento Participativo

de Uberlândia) ao projeto de PPA (Plano Plurianual) 2006-2009 destacam-se:

a) possibilitar a participação ampla e irrestrita dos cidadãos uberlandenses na

fase de elaboração por parte do Poder Executivo dos projetos de Lei de Diretrizes

Orçamentárias e Lei Orçamentária Anual de que trata o PPA (Plano Plurianual) 2006 a

2009;

Artigo original Poliarquia- Revista de Estudos Políticos e Sociais do Centro Universitário UNIEURO UNIEURO, Brasília, v. 1, n. 2, jul./dez. 2009.

b) detalhamento para cada exercício, das metas físicas e os valores dos

programas e ações constantes no PPA (Plano Plurianual) internamente à Lei

Orçamentária Anual de cada exercício;

c) garantia de recursos para o Banco do Povo;

d) recursos para realização da obra de drenagem pluvial do bairro Morumbi;

e) construção de poliesportivos;

f) reforma e ampliação de escolas municipais;

g) revitalização do córrego buritizinho;

h) construção de passarelas;

i) recursos para o Campus Municipal de Educação Especial;

j) apoio e incentivo à construção de cooperativas de habitação popular;

l) realização da II Conferência Municipal das Juventudes;

m) construção e manutenção de um restaurante popular;

n) implementação do IPTU Progressivo no tempo;

O processo de tramitação das emendas na Câmara foi tumultuado: a base de

sustentação do governo Odelmo vetou todas as emendas argumentando que todas eram

impertinentes e ilegais. Tal comportamento foi explicitado até mesmo na imprensa pelo Jornal

Correio:

A base do governo "patrolou" a oposição ontem, no plenário da Câmara de Uberlândia, durante as discussões e votações do Plano Plurianual (PPA) para o período 2006 a 2009 e da Lei Orçamentária Anual (LOA) para o ano que vem. O orçamento de R$ 575 milhões e os interesses de aproximadamente 600 mil pessoas não foram suficientes para que as vaidades políticas dessem lugar a um trabalho organizado e sem encenações. Depois de mais de quatro horas de exaustivas discussões, desentendimentos, ataques e defesas, os projetos foram aprovados. O PPA recebeu 16 votos favoráveis e 2 contrários e a LOA obteve 14 votos a favor e 4 contra. Em ambas as votações, houve uma ausência. Se fosse uma partida de futebol, podia-se considerar uma goleada o que a bancada aliada fez em plenário com a minoria de vereadores que se demonstrou insatisfeita com os projetos. (JORNAL CORREIO; 2005, 03)

A antecipação das votações expôs a preocupação do Executivo com a mobilização

popular principalmente àquelas organizadas pelo FPOP (Fórum Permanente do Orçamento

Artigo original Poliarquia- Revista de Estudos Políticos e Sociais do Centro Universitário UNIEURO UNIEURO, Brasília, v. 1, n. 2, jul./dez. 2009.

Participativo de Uberlândia) em torno das várias emendas apresentadas à Câmara, originadas

a partir das Plenárias do Orçamento Participativo realizada em 2005 pelo Fórum Permanente

do Orçamento Participativo. As emendas, além de serem fruto das Plenárias Públicas, iam de

encontro com várias demandas de lideranças populares que estavam representadas na

solenidade que, inclusive, haviam se comprometido com a mobilização das as bases para

pressionar os vereadores antes e no dia da votação das referidas emendas.

O balanço das atividades do FPOP (Fórum Permanente do Orçamento Participativo

de Uberlândia) pode ser observado no quadro que se segue:

Quadro 2 – Balanço das ações do FPOP em Uberlândia no ano de 2005

Ação

Eleição de 26 conselheiros populares, 26 suplentes e 30 delegados que irão compor

o Conselho do Orçamento Participativo – COP

Participação de mais de 500 pessoas em Plenárias Públicas do Orçamento

Participativo, que votaram as prioridades para PPA de 2006 a 2009 para LOA (Lei

Orçamentária Anual)

Publicização dos atos do Poder Executivo

Elaboração de 228 reivindicações nas plenárias de 2005, sendo que 119 foram

transformadas em requerimentos e apresentadas aos vereadores.

30 reivindicações foram apresentadas aos vereadores

20 reivindicações foram apresentadas aos vereadores

Realização do curso “Elaboração do PPA” ministrado pelo FPOP para lideranças

comunitárias

Participação ativa do FPOP no Programa de Formação Continuada em Educação,

Cultura, Saúde Populares da UFU.

Participação e apresentação de oficina no II Fórum Social do Triângulo Mineiro

Participação na Comissão Popular do Plano Diretor

Participação na etapa estadual da Conferência das Cidades em Belo Horizonte

Participação em reunião anual do Fórum Brasil do Orçamento

Artigo original Poliarquia- Revista de Estudos Políticos e Sociais do Centro Universitário UNIEURO UNIEURO, Brasília, v. 1, n. 2, jul./dez. 2009.

Em 2006 o FPOP (Fórum Permanente do Orçamento Participativo de Uberlândia)

focou, para além da elaboração de propostas a LDO (Lei de Diretrizes Orçamentárias) e LOA

(Lei Orçamentária Anual), participar do processo de elaboração do Plano Diretor. Tal como

no processo orçamentário, o Plano Diretor foi construído sem a participação efetiva da

população uberlandense.

Em 2007 o FPOP (Fórum Permanente do Orçamento Participativo de Uberlândia)

continuou a elaborar emendas para LDO (Lei de Diretrizes Orçamentárias) e LOA (Lei

Orçamentária Anual). A Câmara teve o mesmo comportamento: veto amplo e irrestrito às

propostas populares. Além disso, enquanto uma das demandas populares históricas, o FPOP

(Fórum Permanente do Orçamento Participativo de Uberlândia) participa do movimento

contra o mau cheio causado por diversas empresas no Município. Tal movimento teve como

resultado a elaboração e aprovação de uma lei municipal complementar que dispõe sobre a

política de proteção, controle e conservação do meio ambiente.

Curiosamente mas não por acaso, o Governo Odelmo Leão Carneiro (PP), ainda que

seja veemente contrário ao orçamento participativo, realiza obras e serviços que foram

reivindicações e/ou emendas encaminhadas pelo FPOP (Fórum Permanente do Orçamento

Participativo de Uberlândia). Como exemplo podemos citar:

a) aumento do número de salas de aula na escola Municipal do bairro Shopping

Park,

b) construção da escola municipal no bairro Morumbi,

c) construção de escola municipal de educação infantil do bairro Morumbi,

d) asfaltamento do bairro Shopping Park,

e) início da drenagem pluvial do bairro Morumbi

Esse movimento do Governo Odelmo Leão Carneiro (PP) sucita-nos à seguinte

reflexão: ainda que do ponto de vista de governo o orçamento participativo (OP) não seja bem

quisto, o trabalho desempenhado pelo FPOP (Fórum Permanente do Orçamento Participativo

de Uberlândia) serviu e serve ainda para que na execução orçamentária seja pautada também

pelas reivindicações/emendas populares oriundas do FPOP (Fórum Permanente do Orçamento

Participativo de Uberlândia) , ou seja, o orçamento participativo (OP) e a articulação do FPOP

(Fórum Permanente do Orçamento Participativo de Uberlândia) não são interessantes para a

Artigo original Poliarquia- Revista de Estudos Políticos e Sociais do Centro Universitário UNIEURO UNIEURO, Brasília, v. 1, n. 2, jul./dez. 2009.

agenda governamental, porém o resultado deste trabalho é importante, mas em uma outra

perspectiva, qual seja a de encarar tais obras como benesses e obras do Governo e não fruto

da articulação de parte da Sociedade em torno do orçamento público.

Ainda que exista um modelo de governo conservador e autoritário, a experiência do

FPOP (Fórum Permanente do Orçamento Participativo de Uberlândia) é exemplo claro que,

apesar das dificuldades é possível senão controlar socialmente o orçamento público, pelo

menos resistir e organizar coletivamente a construção de propostas populares ao PPA (Plano

Plurianual), LDO (Lei de Diretrizes Orçamentárias) e LOA (Lei Orçamentária Anual) do

Município.

Ressalta-se ainda que como todas as relações sociais, a existência de disputa de poder

torna-se evidente em ambas experiências do orçamento participativo. Nesse sentido, cabe

neste momento, obtendo contribuições de Foucault (1984) sobre o conceito de poder,

discorrer minimamente (sem grandes pretensões de encerrar a discussão sobre a temática)

sobre o que vem a ser o poder. Para o autor, o conceito trata das relações de forças existentes

na sociedade e como a mesma se comporta a partir da existência dessa relação. Delauze traz

indagações sobre o conceito foucaultiano de poder, como se pode observar a partir da citação

abaixo:

O que é poder? A definição de Foucault parece bem simples: o poder é uma relação de forças, ou melhor, toda relação de forças é uma relação de poder. Compreendemos primeiramente que o poder não é uma forma, por exemplo, a forma-Estado; e que a relação de poder não se estabelece entre duas formas, como o saber. Em segundo lugar, a força não está nunca no singular, ela tem como característica essencial estar em relação com outras forças, de forma que toda força já é relação, isto é, poder: a força não tem objeto nem sujeito a não ser a força”. Ou, “... dirá Foucault que o poder remete a uma ‘microfísica’. Com a condição de não entendermos o ‘micro’ como uma simples miniaturização das formas visíveis ou enunciáveis, mas como um outro domínio, um novo tipo de relações, uma dimensão de pensamento irredutível ao saber: ligações móveis e não-localizáveis.26

Assim, em todo o processo de construção do orçamento participativo (OP) seja pelo

Governo Zaire Rezende (2001-2004) seja pela própria Sociedade (2005-2006) as relações de

força, ou melhor as relações de poder estiveram presentes em todos os momentos sendo

26 24 DELEUZE, G. As estratégias ou o não estratificado: o pensamento do lado de fora (poder). In: ___.

Foucault. (Trad. Cláudia S. Martins). São Paulo: Brasiliense, 1988, p.78 e 100.

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favoráveis ao controle social do gasto público enquanto a proposta era originada pelo governo

e desfavoráveis quando organizada pela própria sociedade.

IV – CONSIDERAÇÕES FINAIS

Este estudo não esgota a discussão sobre a experiência do orçamento participativo de

Uberlândia (MG). Também, não aprofunda nos conflitos internos do orçamento participativo

no período de 2001 a 2004 no interior do governo Zaire Rezende (PMDB), pois o foco era

justamente publicizar os resultados de pesquisa de campo, analisando a metodologia do

orçamento participativo (OP) e a experiência do FPOP (Fórum Permanente do Orçamento

Participativo de Uberlândia).

Os dados discutidos no estudo indicam, apesar das limitações da pesquisa, que o

orçamento participativo (OP) enquanto metodologia de gestão de recursos públicos é bem

avaliado pela Sociedade. Também ressalta que, do ponto de vista metodológico a proposta

avança no controle social do Estado pelos cidadãos permitindo uma nova concepção da

relação política em todo o processo orçamentário.

Entender que a construção do controle social do gasto público no Município de

Uberlândia passa, sobretudo pela consolidação de espaços públicos e de uma nova cultura

política é salutar para avaliar os avanços e limites da experiência em questão.

Se por um lado, houvesse um Governo que, propusesse o efetivo controle social dos

gastos públicos via orçamento participativo (Governo Zaire Rezende – PMDB), ainda que

internamente sofresse várias contradições políticas e diversos erros táticos e estratégicos de

condução, por outro a Câmara Municipal não deu ouvidos à organização popular que surgia

no Município com o intuito de compartilhar poder, compartilhar responsabilidades e

efetivamente participar das decisões que realmente importavam no Município, ou seja,

aquelas vinculadas ao orçamento público.

Observou-se que em Uberlândia há uma resistência clara ao controle social do gasto

público, seja ele proposto por Governo, no caso Governo Zaire Rezende (2001-2004), seja

proposto pela Sociedade (proposto pelo FPOP). Tal resistência, socialmente construída, revela

que a disputa política pelos recursos públicos impressas na peça orçamentária se manifesta

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tanto pela atuação do Legislativo em se opor publicamente ao orçamento participativo quanto

pela postura do Poder Executivo a partir de 2005 em extinguir o orçamento participativo (OP)

e não reconhecer a organização popular em torno do orçamento público.

A relação entre Governo e Sociedade após 2005 está sendo marcada pelas seguintes

características:

a) governo centralizador que não aceita compartilhar ações e nem mesmo debater

publicamente os programas e projetos municipais, tais como o próprio Plano Plurianual e

Plano Diretor por exemplo;

b) cooptação de parte dos setores organizados da sociedade com ênfase a inúmeros

presidentes de associações de moradores de bairros que curiosamente no governo anterior

criticavam o orçamento participativo (OP) e agora estão “satisfeitos” com a posição de

destaque no governo municipal;

c) autoritarismo explícito na relação entre governo e sociedade expresso pelas

declarações públicas de diversos secretários ao responderem aos poucos e valorosos críticos

do governo.

Basicamente estas três características culminaram naquilo que o autor deste estudo

entende como o silêncio de grande parte dos movimentos sociais uberlandenses. Esse silêncio

construído nem sempre de forma sutil, revela a baixa combatividade dos movimentos sociais

uberlandenses e explica em parte a pouca adesão dos mesmos movimentos ao Fórum

Permanente do Orçamento Participativo. Posicionar-se publicamente sobre qualquer ação do

governo Odelmo Leão Carneiro (PP), significa dentre outras questões, remar contra a maré do

pragmatismo político tão comum nos tempos de hoje.

O silêncio de grande parte dos movimentos sociais uberlandenses em relação ao

governo Odelmo Leão Carneiro (PP) é uma derrota para o controle social do gasto público,

pois sem mobilização social, sem articulação política em torno das questões orçamentárias,

sem acúmulo e construção de novas lideranças comunitárias corroboram para que as políticas

públicas não tenham sequer uma avaliação adequada num cenário avesso à participação

popular.

Gohn (1997) ao analisar as teorias dos movimentos sociais e mais precisamente as

características dos movimentos sociais nos anos 90 do século XX, afirma algo que corrobora

com as afirmações anteriores:

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Em resumo: o novo padrão de ser humano que a mídia e alguns analistas têm desenhado, com condições de sobreviver e ter sucesso na sociedade do novo século que se aproxima, seria um tipo semelhante aos dos novos militantes/atores dos movimentos dos anos 90. Com interesses um tanto quanto difusos e indeterminados, bem informados (ainda que de forma um tanto superficial) – sobre os principais assuntos da agenda social e político-cultural; com predisposição para o trabalho coletivo com fins determinados. Não se trata de uma disposição filantrópica ou humanista, nem exclusivamente ideológico-partidária, mas uma disposição meio que racionalista e utilitarista: os interesses do meu grupo, da minha empresa, etc. não se trata também de um engajamento a questões externas ao cotidiano vivido. Basta que se fique atento, observando as mudanças tecnológicas contínuas, adaptando-se continuamente com elas e a elas; deve-se ainda observar os pontos de inflexão que geram as mudanças, encontrar rapidamente seu papel e seu lugar na nova seqüência e no novo cenário. A Grove (1996) denominou este novo tipo de ser humano de “paranóico”, num livro que, escrito segundo receituário liberal, vê como saída para o homem neste final de século a competição e a busca contínua da requalificação no trabalho, como os únicos parâmetros seguros numa era dominada pelas incertezas. (Gohn; 1997, p. 341-342)

Além das indicações anteriores, este estudo revela que:

a) diversas conquistas foram fruto da participação popular via orçamento

participativo no período de 2001-2004 em Uberlândia;

b) somente o orçamento participativo em Uberlândia não é capaz de reduzir o

tradicionalismo e clientelismo políticos ligados ao processo orçamentário

municipal, uma vez que, tais características estão arraigadas na sociedade

uberlandense e pouco mais de quatro anos de experiência de orçamento

participativo (OP) são insuficientes para uma transformação tão profunda e

definitiva na cultura política municipal;

c) a resistência do FPOP (Fórum Permanente do Orçamento Participativo de

Uberlândia) na realização do orçamento participativo (OP) em Uberlândia é

referência para outras cidades na medida em que o FPOP (Fórum

Permanente do Orçamento Participativo de Uberlândia) pautou e pauta,

apesar das dificuldades, a construção pública e participativa do orçamento

municipal;

d) os atuais mandatários municipais vêem como ameaça o controle social do

gasto público via orçamento participativo, na medida em que no Legislativo

rejeitam as emendas populares e no Executivo, oportunisticamente, realiza

obras e serviços oriundos das discussões do FPOP (Fórum Permanente do

Orçamento Participativo de Uberlândia) junto à comunidade;

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Para além das reivindicações populares, o orçamento participativo é um processo de

construção pública e democrática que aproxima governantes de governados para a

compreensão das causas dos problemas enfrentados pelo Município. Também pode-se afirmar

que a experiência de orçamento participativo consolida a construção de um novo espaço de

intervenção pública, organizada, pactuada por critérios de distribuição de recursos, mas que

infelizmente no Município de Uberlândia está longe de ser atingido.

IV – REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

CONSELHO DO ORÇAMENTO PARTICIPATIVO DE UBERLÂNDIA. Regimento Interno do COP. Uberlândia, 2001. JORNAL CORREIO. Orçamento é aprovado sem emendas: Comissão rejeitou todas as propostas da oposição e a maioria endossou. Disponível em : www.jornalcorreio.com.br Data de acesso: dez. 2005 FERRARI, Marcílio M. O orçamento participativo como contraponto aos modelos tradicionais de orçamento público. 2004. 161 p. Monografia (Graduação em Ciências Econômicas) – Instituto de Economia, Universidade Federal de Uberlândia, 2004.

________. Construindo o orçamento participativo de Uberlândia – MG. Cadernos de Pesquisa do CDHIS. Revista do Programa de Pós Graduação em História. Uberlândia, no. 33, p.276-286, jun. 2006, edição especial 2005

FORUM PERMANENTE DO ORÇAMENTO PARTICIPATIVO. Carta de Adesão.

Disponível em www.fpop.blogspot.com. Data de acesso: 21 de jan. 2005

________. Relatório de atividades do FPOP. Disponível em www.fpop.blogspot.com. Data de

acesso: 18 fev. 2006

GOHN, Maria da G. Teorias dos movimentos sociais: paradigmas clássicos e

contemporâneos. São Paulo: Loyola. 2002, 3 ed. 348 p.

PIRES, Valdemir. Controle social dos gastos públicos: quadro atual e perspectivas no Brasil. Disponível em http://www.pires.pro.br/documentos/controlesocialdogastopublico_quadroatualeperspectivasnobrasil26922.pdf. Acesso em: 21 set. 2006

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SILVA, Mario A.; RAMIRES, Júlio C. Perfil dos participantes do orçamento participativo de Uberlândia. In: II SIMPÓSIO REGIONAL DE GEOGRAFIA “PERSPECTIVAS PARA O CERRADO NO SÉCULO XXI”, 2, 2003, Uberlândia, Anais... Uberlândia: Instituto de Geografia da Universidade Federal de Uberlândia, 2003, p. 1-15 SILVA, Mario A., NEVES, Natalia de S. Orçamento Público. Disponível em www.fpop.blogspot.com. Data de acesso: 15 de abril de 2005 PONTUAL, Pedro de C. O Processo Educativo no Orçamento Participativo: aprendizados dos atores da Sociedade Civil e do Estado. 2000. 270 p. Tese de Doutorado PUC-SP, 1999. PREFEITURA MUNICIPAL DE PORTO ALEGRE; CENTRO DE ASSESSORIA E ESTUDOS URBANOS. Quem é o público do orçamento participativo – 2000. Porto Alegre, 2002, 61p. SANTOS, Boaventura de.(org) Democratizar a democracia: os caminhos da democracia participativa. 2. ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2003. 678p. p. 455-545

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Anexos

Cartaz do FPOP

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Panfletos de divulgação das plenárias do OP 2005

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Questionário aplicado nas plenárias do OP no ano de 2004

Prefeitura Municipal de Uberlândia Secretaria Municipal de Planejamento Participativo

Pesquisa de opinião direta com os participantes das plenárias do OP. Ano de 2004. Responsável Secretaria Municipal de Planejamento Participativo (SMPP): ____________ Estagiário: __________________ Perguntas: 1) Qual o seu sexo? ( ) Masculino ( ) Feminino 2) Com que grupo está na plenária /reunião do OP? ( ) Associação de moradores ( ) Conselho Distrital de Saúde ( ) Associação de Amigos do bairro ( ) Delegado/conselheiro do OP ( ) Clube de mães ( ) Grupo Cultural ( ) Grupo religioso ( ) Entidade de classe ( ) conselho distrital rural ( ) entidade governamental ( ) creches ( ) organização não governamental ( ) partido político ( ) individual ( ) não respondeu ( ) não sabe ( ) outro. Qual?_______ 3) por que participa das plenárias do orçamento participativo? ( ) ajudar a comunidade ( ) para resolver as demandas da comunidade ( ) exercer a cidadania ( ) OP é democrático ( ) reforçar a participação ( ) outros motivos 4) Participou das plenárias/reuniões do OP em anos anteriores? ( ) Sim ( ) Não ( ) Não respondeu 5) Em qual ano compareceu? ( ) 2001 ( ) 2002 ( ) 2003 ( ) 2004 6) Qual plenária/reunião que costuma participar? ( ) somente na região ( ) na região, distrito e temática? ( ) Na região, distrito e temática ( ) na região e temática ( ) somente na temática ( ) somente na distrital ( ) na distrital e temática ( ) primeira vez que participa ( ) não respondeu 7) como foi informado da plenária/reunião do OP? ( ) Associação de moradores ( )delegado ou conselheiro do OP ( ) amigo, vizinho ou parente ( ) representante da prefeitura ( ) escola ( ) cartazes, jornais da prefeitura ( ) outra entidade ( ) outros meios. Qual? _______ ( ) não respondeu

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8) Já foi eleito delegado ou conselheiro? ( ) sim ( ) não ( ) não respondeu 9) você conhece o funcionamento do OP? ( ) conhece ( ) não conhece ( ) não respondeu 10) Você costuma falar nas reuniões/plenárias do OP? ( ) na maioria ( ) em algumas ( ) em poucas ( ) nunca ( ) primeira vez que participa 11) Em qual reunião costuma falar? ( ) plenárias do OP ( ) assembléias intermediárias/preparatórias ( ) conselho do OP ( ) outro tipo de reunião 12) Sua região/bairro já foi beneficiado pelo OP? ( )Sim ( )Não ( ) não sabe ( ) não respondeu 13) Existe poder de decisão do OP nas realizações do Governo? ( ) sempre ( ) na maioria das vezes/quase sempre ( ) poucas vezes/às vezes ( ) nunca ( ) não sabe ( ) não respondeu 14) Você está satisfeito com a prestação de contas da Prefeitura? ( ) Parcialmente ( ) insatisfatória ( ) satisfatória ( ) não respondeu ( ) não sabe 15) Nas plenárias/reuniões, o ciclo do OP é bem explicado? ( ) sim ( ) não ( ) às vezes ( ) não sabe ( ) não respondeu 16) Qual o papel da Câmara de vereadores? ( ) atender demandas de pessoas ( ) propor e votar leis ( ) discutir e votar o orçamento ( ) formular políticas públicas ( ) outro papel ( ) não sabe ( ) não respondeu 17) Qual a repercussão/efeito do OP na atuação da câmara de vereadores? ( ) favorece a atuação da Câmara ( ) prejudica a atuação da Câmara de vereadores ( ) não interfere em nada ( ) outra opinião ( ) não sabe ( ) não respondeu 18) como melhorar a divulgação das plenárias/reuniões do OP? ______________________________________________________________________ 19) com o op, a prefeitura se tornou mais transparente? ( ) sim ( ) não ( ) não sabe ( ) não respondeu 20) como você considera as obras do op? ( ) conquistas populares ( ) concessão do prefeito/secretario ( ) concessão do vereador