apostila ciências humanas - unesp

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  • 7/25/2019 Apostila Cincias Humanas - UNESP

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    CINCIASHUMANASFILOSOFIA, GEOGRAFIA, HISTRIAESOCIOLOGIA

    Cadernos dos Cursinhos Pr-Universitrios da UNESP

    A F M

    M G M ME

    Volume 4

    L L A

    M G M MO

  • 7/25/2019 Apostila Cincias Humanas - UNESP

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    CADERNOSDOSCURSINHOSPR-UNIVERSITRIOSDAUNESP

    Volume 4

    ANTONIOFRANCISCOMARQUESMARIADAGRAAMELLOMAGNONI

    E

    S P2016

    CINCIASHUMANASFILOSOFIA, GEOGRAFIA, HISTRIAESOCIOLOGIA

    LORIZALACERDADEALMEIDAMARIADAGRAAMELLOMAGNONI

    O

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    Realizao

    Pr-Reitoria de Extenso PROEXRua Quirino de Andrade, 215 10 andarSo Paulo, CEP 01049-010 SPTel (11) 5627-0264

    ReitorJulio Cezar Durigan

    Vice-reitoraMarilza Vieira Cunha Rudge

    Pr-reitora de Extenso UniversitriaMaringela Spotti Lopes Fujita

    Pr-reitora de PesquisaMaria Jos Soares Mendes Giannini

    Pr-reitor de GraduaoLaurence Duarte Colvara

    Pr-reitor de Ps-GraduaoEduardo Kokubun

    Pr-reitor de AdministraoCarlos Antonio Gamero

    Secretria GeralMaria Dalva Silva Pagotto

    Chefe de GabineteRoberval Daiton Vieira

    Produo planejada pelo Projeto "Inovao nos pro-cessos de gesto e pedaggico dos Cursos Pr-Vesti-bulares da Unesp"

    Diagramao e capaEdevaldo Donizeti dos Santos

    Reviso ortogrfica e normalizao

    lide FeresRony Farto PereiraMaria Luzinete Euclides

    Impresso e acabamento: Grfica FCL/Araraquara

    Conselho Editorial da PROEX - UnespProfa. Dra. Mrcia Pereira da Silva (FCHS/Franca)Prof. Dr. Cludio Csar de Paiva (FCL/Araraquara)Prof. Dr. Eduardo Galhardo (FCL/Assis)Prof. Dr. Jos Arnaldo Frutuoso Roveda (CE/Sorocaba)Profa. Dra. Rosane Michelli de Castro (FFC/Marlia)Profa. Dra. Maria Cndida Soares Del Masso (FFC/Marlia)

    Prof. Dr. Sebastio Souza Lemes (FCL/Araraquara)

    Coordenao geralProfa. Dra. Maringela Spotti Lopes Fujita

    Editores da ColeoProf. Dr. Antonio Francisco MarquesProfa. Dra. Maria da Graa Mello Magnoni

    Loriza Lacerda de Almeida (organizao)Maria da Graa Mello Magnoni (organizao)

    ColaboradoresFilosofiaEli Vagner Francisco RodriguesGeografiaMaria da Graa Mello Magnoni

    Wellington dos Santos FigueiredoHistriaMaria da Graa Mello Magnoni

    Woltaire MattozinhoSociologiaDbora Correa de SiqueiraDiogo Alfonso GarciaLoureno Magnoni JuniorMaria da Graa Mello Magnoni

    C569 Cincias humanas : losoa, geograa, histria e sociologia /

    Loriza Lacerda de Almeida, Maria da Graa Mello Magnoni,

    organizadores. So Paulo : Cultura Acadmica, 2016.

    150 p. : il. - (Cadernos dos cursinhos pr-universitrios da Unesp ;

    v. 4)

    ISBN 978-85-7983-730-2

    ISBN 978-85-7983-729-6 (Coleo)

    1. Filosoa. 2. Geograa. 3. Histria. 4. Sociologia. 5. Ensino

    mdio. 6. Universidades e faculdades Vestibular. I. Almeida,

    Loriza Lacerda de. II. Magnoni, Maria da Graa Mello. III. Srie.

    CDD 001.3

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    Pr-Reitoria de Extenso PROEX

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    PREFCIO

    A ideia de construo dos contedos disciplinares dos 4 cadernos que compem oconjunto do material didtico a ser utilizado pelos Cursinhos Pr-Universitrios1surgiu desdeo incio da gesto, em 2013, durante proveitosas discusses em reunies com os professores eestudantes na condio, respectivamente, de coordenadores e tutores. Havia, naquela ocasio,uma grande preocupao com relao disponibilidade do material didtico de um ano vigentepara um prximo ano, considerando-se a proviso oramentria. Alm disso, havia um desejodos envolvidos por contedos que mais se aproximassem do contexto social e educacional doscursistas provenientes da escola pblica e de famlias de baixa renda, para promover, de modomais abrangente, a incluso em um contexto de aquisio e de construo de conhecimentos

    necessrios ao ingresso em cursos de graduao ou no mercado de trabalho, mediante partici-pao em concursos.

    O grande desafio da existncia dos Cursinhos Pr-Universitrios da Unesp sempre foia oferta do material didtico com os contedos disciplinares necessrios, de um lado, para faci-litar o processo comunicativo entre professor e cursista na sala de aula e, de outro, para orientara aprendizagem do cursista fora da sala de aula. Portanto, o material didtico o instrumentoque orienta o processo de aquisio e construo do conhecimento dos cursistas dos CursinhosPr-Universitrios, em um curto perodo de tempo, com finalidade definida de ingresso emconcursos e, ainda, a fim de propiciar sua incluso. Nesse sentido, discutiu-se a viabilidade

    de a Unesp construir material didtico prprio, dadas as caractersticas nicas de distribuioregional multicampus e da evoluo histrica de seus Cursinhos Pr-Universitrios, atualmenteSubprograma de extenso Cursinhos Pr-Universitrios da Unesp, do programa de extensoPrograma Unesp de cursinhos, divulgao, orientao e informao profissional.

    Antes de sua concretizao, essa discusso levou em considerao resultados de ou-tras iniciativas da Pr-Reitoria de Extenso - PROEX - na tentativa de realizar parcerias comeditoras comerciais e de organizaes no governamentais, dedicadas a cursinhos populares ecomunitrios, que, aps negociaes, revelaram impossibilidade de execuo.

    A proposta de construo do material didtico, aps debates, foi acolhida por Grupo

    de Pesquisa da Faculdade de Cincias do Cmpus de Bauru, com insero e experincia nacoordenao de Cursinho Pr-Universitrio, o qual elaborou o Projeto de produo, manu-teno e atualizao de material didtico-pedaggico.

    O Projeto, coordenado pela Pr-Reitoria de Extenso Universitria e elaborado pe-los Professores Doutores Antonio Francisco Marques e Maria da Graa Mello Magnoni, da

    1 Atualmente, existem 26 Cursinhos Pr-Universitrios Unesp e 4 Cursinhos em convnios com Prefeituras, em funcionamento,localizados em 22 cidades do interior paulista, junto a Unidades Universitrias da Unesp. O modelo implantado atende a alunosregulares e egressos da rede pblica de ensino e oferece aulas ministradas por graduandos dos diversos cursos da Unesp bolsistase voluntrios , que visam a suprir lacunas de formao de alunos regulares do 3 ano e egressos do ensino mdio, com vistas aoferecer reforo de ensino e preparo para o ingresso e permanncia na universidade. Para isso, a Unesp, por meio da Pr-Reitoriade Extenso Universitria, mantm um Programa Institucional com bolsas de extenso universitria para alunos de seus cursos degraduao atuarem como tutores de ensino.

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    Pr-Reitoria de Extenso PROEX

    Faculdade de Cincias do Campus de Bauru, foi concebido com o objetivo de organizar, ade-quar e disponibilizar cadernos com os contedos curriculares das diversas reas do conheci-mento para as atividades pedaggicas nos cursinhos pr-universitrios da Unesp, nas seguintesreas do conhecimento: Linguagens e cdigos, Matemtica, Cincias Humanas, Cinciasda Natureza e Caderno de Apoio textos e atividades dos Cursinhos Pr- Universitrios da

    UNESP.No ano de 2015, foram construdos os contedos das reas de conhecimento que

    resultaram na publicao destes 5 cadernos, cujos ttulos so de mesma denominao das reasde conhecimento. Para atualizao dos contedos, est prevista a execuo da 2 etapa do pro-jeto, a qual permitir a incluso, atualizao e reformulao dos contedos para publicao doscadernos, em 2016.

    No restam dvidas de que a publicao destes Cadernos representa um passo dadode grande relevncia para o aprimoramento dos Cursinhos Pr-Universitrios mas, tambm,de alta responsabilidade social, porquanto dever influenciar a incluso, conforme preconiza a

    Poltica Nacional Extenso e Poltica de Extenso da Unesp.Dessa forma, os cadernos sero o instrumento principal da poltica pedaggica do

    Subprograma de Extenso Cursinhos Pr-Universitrios da Unesp, com a proposta de unifi-car a orientao pedaggica dos 26 Cursinhos Pr-Universitrios e, ao mesmo tempo, dar visi-bilidade a essa importante ao de extenso universitria de grande espectro e impacto social,no interior do Estado de So Paulo que, smj, nica no Brasil entre as IES.

    Pela atuao dos Professores Antonio Francisco Marques e Maria da Graa M.Magnoni, autores e colaboradores, agradecemos o empenho, esforo e dedicao, ao assumirema responsabilidade de criao dos Cadernos que, decisivamente, eleva o patamar de qualidadeno atendimento das demandas pelos Cursinhos.

    Faz-se mister destacar o apoio incondicional da Reitoria da Unesp, nas pessoas doProf. Dr. Julio Cezar Durigan, Reitor, e Prof Dr Marilza Vieira Cunha Rudge, Vice-Reitora,na idealizao e fortalecimento dos Cursinhos Pr-Universitrios, o que facilitou a conduo detodos os trabalhos de organizao da publicao.

    Finalmente, preciso salientar a valiosa atuao dos Cursinhos Pr-Universitriosna extenso universitria da Unesp, com resultados de impacto na transformao da realidadesocial da comunidade externa Universidade.

    Maringela Spotti Lopes FujitaPr-Reitora de Extenso Universitria da Unesp

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    Pr-Reitoria de Extenso PROEX

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    APRESENTAO

    MATERIALDIDTICOPEDAGGICODOSCURSOSPR-UNIVERSITRIOSDAUNESP

    O Projeto Cursinhos Pr-Universitrios da UNESP, organizado e desenvolvidopela UNESP, desde o ano de 1987, almeja proporcionar oportunidade de educao s classespopulares e aos oriundos do ensino pblico. Os cursos so oferecidos aos interessados com resi-dncia nas cidades onde se localizam os Campus da Universidade e do seu entorno. O objetivoprimeiro colaborar com a incluso desses grupos sociais no ensino superior, que tem umatradio elitista, principalmente nas Universidades pblicas.

    A partir de 2006, a Universidade Estadual Paulista (UNESP) criou um amplo pro-grama de extenso, aglutinando os cursinhos pr-vestibulares j existentes na instituio e osnovos projetos organizados nas unidades universitrias distribudas pelo Estado de So Paulo.Com o Convnio entre a UNESP e o Governo do Estado (Convnio n 002/2007-SEES), porintermdio da Secretaria de Ensino Superior, houve a ampliao e fortalecimento do ProjetoCurso Pr-Vestibular: uma iniciativa democrtica de alcance social, o qual passou a atender acerca de quatro mil jovens egressos da escola pblica, distribudos em 22 municpios do Estadode So Paulo, em 26 cursinhos da Universidade.

    Com o objetivo de avaliar as atividades dos cursinhos, a Pr-Reitoria de ExtensoUniversitria (PROEX) mantm constante acompanhamento do Projeto, por meio de con-sultas, questionrios, contatos via telefone e por e-mail, alm da organizao de seminrios eencontros de coordenadores e professores-bolsistas.

    Durante o desenvolvimento do projeto, a oferta de vagas foi sendo paulatinamenteampliada, bem como o envolvimento de bolsistas e voluntrios; ademais, algumas Unidadesda UNESP estabeleceram parcerias com Prefeituras, visando ao incremento de oferta de vagas,como So Jos dos Campos, Bauru e Ilha Solteira.

    A Universidade tem destinado recursos para bolsas dos monitores das aulas (alunos

    da graduao), para o material didtico de apoio aos alunos e de custeio das atividades de or-ganizao e execuo dos cursos.

    Em 2015, a Pr-Reitoria de Extenso fez proposta de elaborao do material didticopela prpria Universidade, com a finalidade de organizar, adequar e disponibilizar cadernoscom os contedos curriculares das diversas reas do conhecimento para as atividades pedag-gicas nos cursinhos pr-universitrios da UNESP. Os cadernos foram produzidos a partir daestrutura curricular definida pelos documentos oficiais Diretrizes Curriculares Nacionais Geraispara a Educao Bsica, Diretrizes Curriculares Nacionais para o Ensino Mdio, Currculo doEnsino Mdio do Estado de So Paulo e Orientaes Curriculares para o Ensino Mdio. Nesta pri-

    meira edio, o guia de orientao dos temas para a equipe de autores foi a Matriz de Referncia

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    Pr-Reitoria de Extenso PROEX

    do ENEM (Exame Nacional do Ensino Mdio). Os quatro (04) cadernos contemplam objetosde conhecimento associados s Matrizes de Referncia das seguintes reas do conhecimento:

    Caderno 1: Linguagens e Cdigos - Lngua portuguesa e Lngua inglesa

    Caderno 2: Matemtica Matemtica

    Caderno 3: Cincias da Natureza Biologia, Fsica e Qumica

    Caderno 4: Cincias Humanas Filosofia, Histria, Geografia e Sociologia

    Caderno 5: Caderno de Apoio

    O Caderno de Apoio textos e atividades dos Cursinhos Pr- Universitrios daUNESP disponibiliza acervo composto por textos, testes, vdeos, imagens, temas e sites refe-rentes aos conceitos e contedos das diferentes reas do conhecimento abordados no EnsinoMdio com o objetivo de complementar os temas desenvolvidos nos Cadernos da Coleo:Caderno 1 Linguagens e Cdigos, Caderno 2 Matemtica, Caderno 3 - Cincias daNatureza, Caderno 4 Cincias Humanas.

    O material produzido possui as suas limitaes, no contemplando todos os conte-dos das reas de estudo. Entretanto, deve-se considerar, em primeiro lugar, que os alunos quese encontram na sala dos cursos pr-universitrios j trazem uma bagagem, limitada para algunse mais ampla para outros, dos contedos do ensino mdio, ou mesmo fundamental, cursadosnos cursos regulares desses nveis de ensino. Em segundo lugar, o tempo disponvel para o estu-do, por esses alunos, de dez a doze meses, de modo que as apostilas em uso acabavam sendosubutilizadas. Em terceiro lugar, o material o ponto de partida de um projeto o qual poder

    e dever ser ampliado e aperfeioado, nos prximos anos, tanto do ponto de vista quantitativocomo qualitativo, com base nas avaliaes dos prprios usurios e dos autores que tiverem inte-resse de dar continuidade produo do material. Do ponto de vista qualitativo, por exemplo,ser uma oportunidade para se buscar uma abordagem mais interdisciplinar para os contedosapresentados. E, por ltimo, uma considerao relevante a ser feita que o material produzidopassa a ser de propriedade da Universidade Estadual Paulista Jlio de Mesquita Filho, que,alm de reproduzi-lo impresso, ir coloc-lo disponvel onlinepara acesso a quem possa inte-ressar, seja na rea de influncia da UNESP, seja no resto do pas, para todos os interessados noENEM e nos vestibulares que esto se moldando s Diretrizes Curriculares Nacionais.

    A Universidade no desconsidera as mudanas necessrias ao ensino em todos osnveis, para que possam proporcionar s crianas, jovens e adultos a formao para compre-ender a realidade social, econmica, poltica, cultural e do mundo do trabalho, a fim de nelainserir-se e atuar de forma tica e competente, tcnica e politicamente, visando a contribuirpara a transformao da sociedade, em funo dos interesses sociais e coletivos. Nesse contexto,o Cursinho Pr-Vestibulares tem a inteno de cooperar com os jovens e adultos que sofreramas consequncias da excluso de uma escola bsica de qualidade social, no sentido de propiciarcontedos e metodologias que lhes permitam no s ter a possibilidade de participao nosvestibulares das universidades pblicas e outras, como o acesso a muitos dos conhecimentosque possivelmente lhes tenham sido negligenciados ou aligeirados, de sorte a ter uma pers-

    pectiva mais crtica e participativa como cidados. Os cursinhos pr-universitrios constituem

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    situaes emergenciais enquanto o Estado e a sociedade brasileira no forem capazes de garantiruma educao bsica de qualidade para todos.

    Tendo em vista a realidade concreta do Ensino Mdio e os desafios que representa aospoderes pblicos, a Universidade Estadual Paulista organiza aes em prol do fortalecimentodo Cursinho Pr-Universitrio, na inteno de cumprir com coerncia as suas responsabilida-des pblicas expressas atravs dos objetivos de permanente criao e transmisso do saber e dacultura, devendo criar, preservar, organizar e transmitir o saber e a cultura por meio do ensino,da pesquisa e da extenso, privilegiar e estimular a atividade intelectual e a reflexo continu-ada sobre a sociedade brasileira, defendendo e promovendo a cidadania, os direitos humanose a justia social e promover atividades de extenso e de articulao com a comunidade(Estatuto da UNESP, CAP. I, Art. 2)2. Isto se faz de modo concreto, quando se favorece oingresso equitativo nos seus cursos, a todos os grupos sociais.

    Os ltimos dados apresentados na Sntese de Indicadores Sociais (SIS), pelo InstitutoBrasileiro de Geografia e Estatstica (IBGE), apontam que, nos ltimos dez anos (2004 a 2014),

    houve uma reduo do percentual dos 20% mais ricos da populao nas instituies de ensinosuperior pblico, de 54%, em 2004, para 36% dos alunos, e um aumento de 1,2% para 7,6%dos alunos oriundos dos 20% da populao mais pobre3. A defasagem, ainda, entre um grupoe outro, de quase cinco vezes, com o agravante de que os mais pobres acabam tendo acessoapenas aos cursos menos concorridos. Enfim, criar mecanismos como este (os cursinhos) eoutros, como as cotas, de incluso dos alunos das escolas bsicas pblicas na Universidade vemcolaborar, por um lado, para a construo de uma sociedade equitativa, menos excludente,elitista, desigual e injusta. E, por outro, garante a legitimidade da prpria universidade pblica,no contexto da sociedade paulista e brasileira.

    Antonio Francisco Marques

    Maria da Graa Mello Magnoni

    2UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA. Estatuto da UNESP.So Paulo, 2015. Disponvel em: . Acesso em: 4 dez. 2015.

    3INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATSTICA. Sntese de indicadores sociais:uma anlise das condies devida da populao brasileira. Rio de Janeiro, 2014. Disponvel em: . Acesso em: 4 dez. 2015.

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    SUMRIO

    Introduo .............................................................................................. 11

    1. FILOSOFIA

    1.1 Cidadania e democracia na Antiguidade ........................................... 131.2 Estado e direitos do cidado a partir da Idade Moderna; democracia direta, indireta e representativa ......................................................... 141.3 Revolues sociais e polticas na Europa Moderna ............................ 171.4 A luta pela conquista de direitos pelos cidados: direitos civis, humanos,

    polticos e sociais .............................................................................. 181.5 Direitos sociais nas Constituies brasileiras ..................................... 20

    1.6 Vida urbana: redes e hierarquia nas cidades, pobreza e segregaoespacial............................................................................................. 231.7 O desenvolvimento do pensamento liberal na sociedade capitalista e seus

    crticos nos sculos XIX e XX ........................................................... 231.8 Polticas afirmativas ........................................................................... 24

    2. GEOGRAFIA

    2.1 Base estrutural da geografia .............................................................. 272.2 As caractersticas climticas do territrio brasileiro ........................... 372.3 As questes ambientais contemporneas: mudana climtica, ilhas de calor, efeito estufa, chuva cida e a destruio da camada de oznio ........... 422.4 Estrutura interna da Terra ................................................................ 472.5 Estruturas do solo e do relevo agentes internos e externos

    modeladores do relevo ...................................................................... 502.6 Formao territorial brasileira. As regies brasileiras. Polticas de reordenamento territorial ................................................................. 562.7 Origem e evoluo do conceito de sustentabilidade .......................... 632.8 Os grandes domnios de vegetao no Brasil e no mundo ................. 68

    2.9 Situao geral da atmosfera e classificao climtica .......................... 76

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    3. HISTRIA

    3.1 A atuao dos grupos sociais e os grandes processos revolucionriosdo sculo XX. Revoluo Bolchevique, Revoluo Chinesa eRevoluo Cubana ........................................................................... 89

    3.2 A revoluo industrial ...................................................................... 923.3 Diferentes formas de organizao da produo: escravagismo antigo, feudalismo, capitalismo, socialismos ................................................. 953.4 Ditadura do Estado Novo (1937-1945)............................................ 993.5 Economia agroexportadora brasileira: complexo aucareiro; a minerao

    no perodo colonial; a economia cafeeira, a borracha na Amaznia ... 1033.6 Geopoltica e conflitos entre os sculos XIX e XX. Imperialismo, a ocupao

    da sia e da frica, as Guerras Mundiais e a Guerra Fria ................. 1073.7 Conflitos Poltico-Culturais ps-Guerra Fria, reorganizao poltica internacional e os organismos multilaterais nos sculos XX e XXI ... 114

    3.8 Vida Urbana: redes e hierarquias nas cidades, pobreza e segregao espacial ........................................................................... 116

    4. SOCIOLOGIA

    4.1 A conquista da Amrica.................................................................... 1194.2 Cultura material e imaterial; patrimnio e diversidade

    cultural no Brasil .............................................................................. 122

    4.3 Histria dos povos indgenas e a formao sociocultural brasileira .... 1264.4 Histria cultural dos povos africanos ................................................ 1294.5 A luta dos negros no Brasil e o negro na formao da sociedade brasileira 1324.6 Transformaes na estrutura produtiva no sculo XX: o fordismo, o

    toyotismo, as novas tcnicas de produo e seus impactos................. 1334.7 A globalizao e as novas tecnologias de telecomunicao e suas

    consequncias econmicas, polticas e sociais.................................... 143

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    Filosoa 11

    Pr-Reitoria de Extenso PROEX

    Ird

    Com a presente edio do Caderno Cincias Humanas,inauguramos uma nova erana produo de material para os cursinhos pr-universitrios da UNESP, porque deixamos paratrs um histrico de aquisio de produtos-padro disponveis no mercado, para a elaboraode produtos prprios, com chancela institucional. Esta realizao atende a um antigo sonho doprojeto, de que os docentes da prpria instituio possam colaborar com a produo de saberesnecessrios aos exames seletivos.

    No se trata de tarefa corriqueira, to pouco fcil de ser realizada, tendo em vista quea produo acadmica, tpica da universidade, se volta a outras modalidades, comopapers, ar-

    tigos cientficos, projetos de pesquisa, relatrios, resenhas, os quais ensejam mtodos de traba-lho bastante especficos. Certamente, a produo de material instrucional uma das demandasque temos, mas importante dizer que impe desafios novos, especialmente pela especificidadedos temas, ou seja, h necessidade de se conhecer um outro universo o do vestibular , parapoder elaborar materiais adequados a essa finalidade. Ademais, esses contedos devem estararticulados com o pblico usurio do material - os egressos da rede pblica de ensino, que jtransitaram pelos contedos, mas que agora devem perceber que eles sero exigidos em provasbastante complexas, com muitas horas de durao, que solicitam pensamento rpido e objeti-vo, ao mesmo tempo em que contemplam a reflexo, contextualizao e a articulao entre si,em busca da inter e transdisciplinaridade.

    No nossa tarefa aqui fazer a anlise do sistema de educao pblica, alis, muitobem tratada por autores renomados em nosso pas, mas no podemos deixar de destacar quemuitos egressos apresentam dificuldades para acompanhar as aulas dos cursinhos, o que implicaa exigncia de um material didtico que supere ou minimize essa condio. No h receitasou modelos previamente conhecidos, mas teremos, sim, que testar nosso material e fazer asadequaes que nosso pblico exigir, tanto na elaborao dos contedos, na formulao deexerccios, como na forma de apresentar os mesmos, ou seja, pensar as estratgias didtico-pe-daggicas no um tema ausente no contexto dessa produo.

    Assim, teremos desafios futuros ainda a superar, uma vez que se pretende atenderde forma eficiente s demandas apresentadas pelos alunos da rede de ensino, os quais buscamos cursinhos da UNESP, na expectativa de superar limitaes, relembrar o que j foi estudadoe se preparar para as fases de seleo, por meio do vestibular, e atingir o objetivo precpuo docursinho, que a obteno de uma vaga em curso de graduao.

    Obviamente, o que consta no caderno aqui apresentado se refere aos itens previstospara as provas vestibulares, todavia, sabemos que se pode apresentar de variadas maneiras e comdiferentes abordagens, com vistas a um melhor aproveitamento do que exposto no materiale nas aulas. Este parece ser o desafio central: focalizar contedos que sejam significativos paraos alunos, sem menosprezar as exigncias da produo acadmica, ao mesmo tempo em que omaterial atende s necessidades, de forma leve e sem a rigidez dos cadernos clssicos de cursinho

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    Pr-Reitoria de Extenso PROEX

    pr-universitrio. As revises certamente sero necessrias, assim como melhoras na apresenta-o, porm, isso vir com o tempo e a experimentao.

    Outro aspecto importante a se destacar se refere, de forma mais direta, s CinciasHumanas,objeto deste caderno. A importncia do conhecimento na rea das humanidadestem sido referida pelos vestibulares, medida que as questes na rea de conhecimentos gerais eatualidades, alm das disciplinas especficas, so propostas com relativo grau de complexidade.Recentemente, foram novamente includas as disciplinas sociologia e filosofia, no currculo doensino mdio, o que demonstra que h um reconhecimento de sua pertinncia nas avaliaesde nossos estudantes. De outro lado, sabe-se que, com todas as mudanas que ocorrem nasrelaes sociais, polticas e econmicas, no seria razovel deixar esses contedos de fora, o quedificultaria sobremaneira a anlise dos tempos atuais.

    A atualizao do conhecimento passa, hoje, necessariamente, pelas novas tecnologiasde informao. Nesse sentido, buscamos adequar os contedos linguagem direta, objetiva,das novas mdias, sem abrir mo do rigor na busca de fontes confiveis para fundamentar as in-

    formaes e anlises desenvolvidas nos textos. Cientes de que os alunos denominados nativosdigitais estruturam sua formao como leitores com forte influncia dessas tecnologias, pro-curamos ampliar e aprofundar certos temas sociolgicos e filosficos, com base em perspectivascientficas mais caractersticas do discurso acadmico universitrio.

    A importncia da formao sociolgico-humanstica amplamente destacada nosdias de hoje e valorizada at mesmo pelo discurso corporativo, que se v, de diversas formas, in-fluenciado pelo fenmeno da globalizao. A necessidade de adaptao dos atores econmicosa diferentes culturas aponta para a importncia da formao cultural baseada na compreensohistrica e cultural mais ampla e que, necessariamente, enfatiza a formao sociolgica e filo-

    sfica. A ampliao da cultura de direitos civis e a afirmao das minorias, no contexto hist-rico contemporneo, confirmam a tendncia de uma cultura que no pode mais abrir mo daperspectiva tica e histrica. Fica, assim, evidenciada a relevncia da formao ligada s cinciashumanas, no nvel mdio e universitrio.

    Em nome da equipe de elaborao dos textos, desejamos que sua finalidade seja al-canada e que os resultados sejam plenos de xito.

    Loriza Lacerda de Almeida

    Eli Vagner Francisco RodriguesMaria da Graa M. Magnoni

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    Filosoa 13

    Pr-Reitoria de Extenso PROEX

    1 FILOSOFIA

    1.1 CIDADANIAEDEMOCRACIANAANTIGUIDADE

    A palavra democraciase tornou muito comum nos debates e nas definies atuaisdo cenrio poltico. Nos dias de hoje, a maioria dos pases baseia sua estrutura de governo emprincpios democrticos. O termo democracia, no entanto, no possui o mesmo significado emtodos os perodos histricos. A democracia como regime poltico surgiu na Grcia antiga, nacidade de Atenas, por volta do ano 502 AC. Clstenes, aps uma srie de disputas polticas ba-seadas em um regime denominado Tirania, no qual o poder continuava na mesma famlia, porsucesso, instituiu uma diviso da populao em Demos. Nessa diviso, considerava-se cidadoqualquer ateniense maior de 18 anos que tivesse prestado servio militar e que fosse homemlivre. Esses cidados deveriam manifestar fidelidade ao demos, isto , ao seu grupo social, parauma participao nos assuntos pblicos. Tal princpio foi criticado por filsofos e pelos aristo-cratas, que no viam em um sistema baseado no poder popular algo benfico para os interessesda cidade. Todavia, os princpios de isonomia(igualdade de poder) e isagoria (direito palavra)agradaram a boa parte dos atenienses. No incio, esse sistema previa um sorteio para a repre-sentatividade popular, isto , qualquer um poderia ser sorteado para defender os interesses deseu demo. Isso evitaria o concurso de polticos profissionais que, treinados nas artes retricas,

    ganhassem as discusses polticas.A noo de cidadania tambm no a mesma em perodos diferentes da histria.

    Hoje, com a cultura de direitos bastante difundida, temos uma noo de cidadania, a qual nose pode comparar com a ideia de cidadania da Idade Antiga. A ideia de cidadania, na Grcia,estava baseada na vinculao do cidado a umapolis. Os laos eram determinados por famlia.Importante destacar que a noo de liberdade era um atributo e um requisito para o exercciodessa cidadania. O cidado podia opinar sobre os destinos da cidade, mas ser cidado no eraalgo universal, isto , no era direito de todos. Pricles instituiu algumas mudanas e concedeucidadania aos metecos(estrangeiros). O que constatamos, hoje, o mesmo que os prprios gre-gos, atravs de seus filsofos, puderam tambm concluir: que a democracia necessita sempre deaperfeioamentos. Na Grcia antiga, a democracia apresentou j suas fragilidades, seja na defesados reais interesses das comunidades, seja na fundamentao de seus princpios filosficos.

    A ideia de democracia vem necessariamente aliada ideia de liberdade de expresso ede defesa de teses polticas em pblico. Uma das questes que os filsofos levantavam, na anti-ga Grcia, era sobre o problema da manipulao da verdade pelos discursos. A arte da retricae da persuaso seria uma ferramenta, se no uma arma, para o exerccio de poder ou para opredomnio de uma ideia sobre outra. Esse problema foi exemplarmente discutido por Plato eAristteles, em suas disputas com os chamados sofistas, os quais eram especialistas em retrica(tcnica de discursar e convencer as pessoas das mais variadas teses), verdadeiros professores de

    persuaso. Segundo alguns sofistas, a verdade poderia ser defendida de vrios pontos de vista.

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    Isso acabou levando acusao de que os sofistas estavam mais interessados em convencer doque chegar realmente verdade das coisas. Se pensarmos no mundo da variedade de ideiaspolticas e aplicarmos esse princpio, teremos claramente uma fragilizao do poder efetivo dademocracia de representar a vontade popular, porque ela pode ser um instrumento de afirma-o de interesses de classes e grupos polticos. O problema dos sofistas acompanha a democra-

    cia desde os tempos antigos at os dias de hoje. Criada para diminuir as tenses polticas quepoderiam gerar revoltas populares entre os gregos, a democracia se viu tambm envolvida nesseprocesso de disputa de poder por interesses diversos.

    A repblica romana foi herdeira do pensamento poltico dos gregos, herana que senota no s na poltica, mas na cultura em geral. Tendo baseado seus princpios de poder no sena-do e em instituies denominadas assembleias populares, como a curiata, a centuriata, a tribunapopulie a tribunaplebis, a repblica romana tinha princpios democrticos, mas tambm apresen-tava diferenas em relao nossa moderna concepo de democracia baseada em critrios maisuniversalistas. Nas assembleias populares romanas, por exemplo, os ricos tinham mais poder de

    voto, pois votavam em grupos diferenciados por propriedade. Quem elegia os cnsules e pretoresera a assembleia centuriata. O senado no apresentava diretamente eleitos do povo, na verdade,era constitudo por ex-magistrados, o que se poderia designar como uma elite poltica.

    Como vimos, hoje, quando falamos em democracia, pensamos mais em um governorepresentativo, de um estado democrtico de direito e de garantias de liberdades individuais, oque se distancia em vrios aspectos da democracia antiga. Para os antigos, era muito mais difcilreconhecer a ideia de livre-arbtrio e de espao privado, como imaginamos nos dias de hoje. Nosignifica dizer que os gregos e romanos no tinham esses anseios, contudo, reconhece-se que taisdireitos no eram totalmente desenvolvidos, como vieram a ser na chamada Idade Moderna.

    1.2 ESTADOEDIREITOSDOCIDADOAPARTIRDAIDADEMODERNA; DEMOCRACIADIRETA,INDIRETAEREPRESENTATIVA

    O ESTADOMODERNO

    O Estado Moderno resultado de diversas transformaes polticas ocorridas a partirdo declnio do sistema feudal e do surgimento e fortalecimento de estados nacionais. Para en-tendermos a formao do pensamento poltico da Idade Moderna e os conceitos de democraciadireta e indireta e representativa, temos que iniciar pela transio da Idade Mdia para Idade

    Moderna.Sabemos que os processos de mudana de uma poca para outra na histria no aconte-

    cem de maneira rpida, na verdade, sempre so explicados por um nmero grande de eventos im-portantes. No caso da passagem da Idade Mdia para a Idade Moderna, a crise do chamado mo-delo feudal, a expanso martima, o Renascimento e a Reforma Protestante foram acontecimentosque contriburam para o nascimento de novas tendncias econmicas, culturais e polticas.

    As relaes polticas na Idade Mdia eram determinadas por instituies pouco fle-xveis no estabelecimento da participao popular. Alm disso, o territrio europeu era muitofragmentado pela existncia dos feudos, os quais possuam um comandado prprio exercido

    por um senhor feudal ou por um nobre. Pode-se afirmar que cada feudo representava, do

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    ponto de vista do poder, um ncleo separado. Nesse contexto, no existia uma moeda comumou padres de pesos e medidas e tambm era muito difusa a realidade dos idiomas. A descen-tralizao poltica, por esses fatores, era uma caracterstica da Idade Mdia. Com o declnio daestrutura feudal e de sua estrutura rural, comea a haver um crescimento maior do comrcio.No primeiro momento, o comerciante estranho sociedade feudal. Mas a circulao finan-

    ceira cresceu, sobretudo, pela necessidade de trocar produtos excedentes. Surge a tendncia detroca de servios por dinheiro.

    Para entendermos o estado moderno, devemos ainda contemplar outro fator, este denatureza poltica o absolutismo.

    O ABSOLUTISMO

    O absolutismo um regime poltico fundamentado no poder exercido por uma pes-soa, cujos poderes so absolutos, da o nome absolutismo. O absolutismo foi um regime que

    teve sua efetivao principalmente no perodo entre os sculos XVI e XVIII, na Europa. Nesseregime, os monarcas tinham plenos poderes de criar leis sem aprovao da sociedade, alm deexercerem uma interferncia econmica marcada pela criao de impostos e tributos, a fim definanciar seus projetos de poder e mesmo suas guerras, motivadas por sucesso e relaes con-flituosas com outros reinos. Tais conflitos estavam mais ligados aos interesses de uma nobrezado que aos da maioria da populao. Ser a partir do desgaste desse regime e de suas relaespolticas e econmicas que surgiro as caractersticas sociais as quais daro origem ao estadomoderno.

    Seguindo as tendncias de mudanas econmicas, a expanso do comrcio causou

    a desorganizao do sistema feudal. A classe social que representava esses interesses de moder-nizao e mudana era a burguesia, que se tornou cada vez mais rica e, consequentemente,poderosa politicamente. A burguesia vai estabelecer seus interesses no terreno poltico e seusinteresses incluam, necessariamente, uma nova organizao poltica.

    Essa nova organizao deveria, para atender a tais anseios, ser mais estvel e baseadanuma ordem jurdica que fundamentasse seus direitos de ampliao do comrcio de representa-o poltica e de direitos civis. As guerras interminveis atrapalhavam o comrcio, a quantidadede impostos sobre as mercadorias atravancava a circulao, o nmero de moedas dificultava atroca. O que a burguesia necessitava era de uma verdadeira revoluo poltica.

    O Estado moderno se forma, ento, como uma espcie de organizao poltica querepresenta novos interesses polticos e marca o final da era feudal e o incio da modernidade.Desde o sculo XVII, o Estado configurou-se como nica alternativa de organizao polti-ca. Ainda assim, cada cultura poltica desenvolveu as instituies estatais de maneira diversa,dependendo das particularidades prprias de cada tradio. Em decorrncia, as instituiesdependem no s da estrutura dada pelo ordenamento jurdico do Estado, mas tambm dacultura poltica da sociedade, representada pelos valores e ideias sociais compartilhadas entreos membros, ou seja, os cdigos de conduta que geralmente no esto escritos e os quais com-plementam as regras formais. Isso ocorre porque, ainda que as regras possam ser as mesmas,

    os mecanismos de cumprimento obrigatrio, a forma com que se exerce a obrigatoriedade, asnormas de conduta e os modelos subjetivos dos atores no o so. No presente artigo, analisare-

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    mos os principais modelos de Estado de ocidente, a partir de quatro culturas polticas (inglesa,francesa, estadunidense e latino-americana), com o objetivo de mostrar costumes e tradiespolticas diversas, que influem at hoje nos diferentes Estados.

    O ESTADOLIBERALO Estado Liberal o verdadeiro desdobramento da separao entre o pblico e o

    privado. No absolutismo, predominava o interesse de um monarca ou at mesmo da nobreza.A revoluo da burguesia imps uma nova forma de Estado. Em 1787, a primeira Constituioliberal foi promulgada, os princpios que a fundamentavam eram a liberdade, a igualdade e afraternidade; dois anos depois, esses princpios foram consagrados pela Revoluo Francesade 1789. Sobre a Revoluo Francesa, paira at hoje a aura de uma mudana significativa nasrelaes de poder na Europa.

    A Revoluo Francesa representa todo um perodo de agitao poltica que instituiu

    os ideais de renovao da burguesia. A monarquia absolutista caiu em trs anos do processo re-volucionrio. Privilgios feudais, aristocrticos e religiosos foram atacados por grupos polticosradicais.

    O Parlamento de Paris defende o princpio de um homem, um voto e a duplica-o dos representantes do Terceiro Estado. As relaes de poder podem ser representadas pornmeros, desde que esses nmeros sejam representantes de pessoas com votos e voz. Vejamos,portanto, o que ocorreu com o poder. Sero eleitos, na Frana, 291 deputados para a reuniodo Primeiro Estado (Clero), 270 para a do Segundo Estado (Nobreza), e 578 deputados para areunio do Terceiro Estado (burguesia e pequenos proprietrios). Uma relao numrica que j

    diz muito do que realmente mudou, no novo regime.

    DEMOCRACIADIRETA, INDIRETAEREPRESENTATIVA

    Existem diferenas importantes entre os tipos de democracia que existiram na his-tria, por isso, h, pelo menos, trs tipos de democracia: a democracia direta, a democraciaindireta e a democracia representativa.

    Na democracia direta, o cidado pode votar e expressar sua opinio sem ter interme-dirios. Por esse motivo, essa espcie de democracia tem mais chances de ocorrer sem maiores

    problemas, em populaes e territrios pequenos. Como vivemos em agrupamentos humanoscada vez mais populosos, a maioria dos governos democrticos utiliza um tipo de democraciaindireta. A forma de democracia mais exercida no mundo moderno a democracia representa-tiva, na qual as decises polticas no so tomadas diretamente pelos cidados, mas por repre-sentantes eleitos pelos cidados.

    Os representantes dos cidados tm direito a voto e representam a vontade daquelesque os elegeram. Isso, obviamente, em tese, pois as opinies e interesses dos cidados podemse distanciar da leitura que o representante faz do contexto poltico. Todavia, um princpio ficagarantido, nesse processo, eleio dos representantes para as assembleias, cmaras e parlamen-

    tos de uma nao. Pode-se, tambm, nesse sistema poltico, acontecer referendos e plebiscitos,

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    nos quais os cidados votam sobre um assunto especfico que seja de interesse pblico. O quesempre deve ocorrer, nesse processo a garantia de liberdade de escolha e expresso. Portanto,o estado moderno pode ser caracterizado como um estado de direitos, isto , ele se fundamentana representatividade e no direito de escolha do cidado. Note que a palavra cidadania s fazsentido nesse contexto.

    1.3 REVOLUESSOCIAISEPOLTICASNAEUROPAMODERNA

    Para entendermos as revolues sociais e polticas, na Europa moderna, temos quefazer referncia aos movimentos intelectuais que determinaram a ideologia de fundo dessasrevolues. O ILUMINISMO certamente figura entre os movimentos de ideias que levarama uma maior conscientizao do papel poltico dos povos, no sentido de serem os agentes dasmudanas sociais e polticas.

    A Crtica ao Absolutismo era um dos princpios que orientavam os iluministas, pois

    a ideia de liberdade e representatividade estava em franca oposio com o sistema absolutista.Paralela luta poltica, uma ideia que cresceu em popularidade, principalmente nos sculosXVIII e XIX, foi o princpio de que a cincia uma forma privilegiada de explicar as coisas.Nesse sentido os intelectuais e cientistas criticavam o dogmatismo do conhecimento religioso ea intolerncia religiosa, em vrios aspectos. Deve-se notar que as revolues na Idade Modernano foram somente polticas, mas tambm intelectuais e cientficas, o que um pouco mais tardedaria origem revoluo industrial, por exemplo.

    Um evento importante para a histria das ideias foi a elaborao, por parte de Diderote DAlembert, da primeira enciclopdia no sculo XVIII, smbolo das modernas mudanas no

    conhecimento e no estabelecimento da autoridade de filosofia e da cincia frente ao autorita-rismo e dogmatismo da religio e do estado. Os tericos do Iluminismo fundamentaram o quepodemos denominar ideologia das revolues. Montesquieu, por exemplo, defendia a divisodo poder baseado nos poderes Executivo, Legislativo e Judicirio. Voltaire fez a defesa da liber-dade de expresso e do pensamento, pilares das modernas concepes de democracia. Rousseauescreve o Contrato social, que introduz a ideia de uma bilateralidade na relao de dever e direitoentre o estado e o indivduo, entre governados e governante.

    REVOLUESINGLESASSCULOXVII

    No sculo XVII, acontece na Inglaterra um claro antagonismo entre a Coroa e oParlamento. O conflito de interesses polticos se efetivou com a polaridade entre a dinastiaStuart, a qual defendia o absolutismo, e a burguesia local, que era partidria do liberalismo.Sabemos que os sistemas absolutistas possuam caractersticas que no agradavam aos ideaiseconmicos e polticos da classe burguesa.

    REVOLUOFRANCESA

    A Frana, antes da Revoluo, estava sob um regime absolutista. O poder estavaconcentrado nas mos dos reis, os quais determinavam seus interesses e alianas, sobretudo com

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    o Clero e a nobreza, que, por sua vez, recebiam de bom grado os benefcios da proximidadecom o poder. Uma das vantagens de que usufruam era a iseno de impostos e uma vida eminegvel descompasso com a situao de pobreza do povo.

    Por outro lado, os camponeses e burgueses pagavam impostos e no viam, de fato,retornos significativos por parte do governo. O clima de descontentamento e revolta no afe-tava somente os intelectuais, porm, era evidente e real no seio da sociedade. O incitamento ao revolucionria ps fim ao regime absolutista, a partir de uma srie de eventos que se segui-ram, com a inteno de minar as foras de represso do estado. O pice desse movimento foi aQueda da Bastilha, a priso poltica do governo absolutista e, nesse sentido, o smbolo maiordo absolutismo naquele contexto. A Revoluo Francesa foi um dos acontecimentos de maiorrelevncia e influncia, na histria da humanidade, pois os ideais de liberdade, representativida-de poltica e de igualdade de direitos se transformaram em um modelo fundador de instituiespolticas, por todo o mundo ocidental. Hoje, os reflexos dessas ideias se fazem notar por todo omundo. A moderna democracia liberal tem seu nascimento nas revolues da Idade Moderna.

    Destaca-se, tambm, nesse contexto histrico global, a revoluo americana, a qual comeoucomo uma guerra da Independncia dos EUA em relao Gr-Bretanha e se configurou comoum movimento emancipador das colnias inglesas na Amrica do Norte, uma vez que as col-nias estavam submetidas a cobranas de impostos considerados injustos.

    As manifestaes contrrias relao comercial entre a Gr-Bretanha e as colniasculminaram em um movimento de independncia. A base das reivindicaes de mudanas eraconstituda de princpios democrticos.

    Surge um movimento denominado Filhos da Liberdade, formado por trabalhadores.Esse grupo foi formado com a inteno de proteger os direitos dos colonos e protestar contra

    os impostos do governo britnico. Na Festa do Ch de Boston, em 1773, esse grupo ficou maisrelevante no cenrio de protestos. O governo britnico reprimiu vrios protestos, o que ocasio-nou uma reao, nas colnias, que levaria Revoluo.

    Em 1787, votou-se a Constituio dos EUA, a qual efetivava o princpio da separa-o dos poderes, formulado por Locke e Montesquieu.

    As revolues sociais e polticas da Idade Moderna prepararam, de certa maneira, oterreno das mudanas significativas que ocorreriam nos sculos XIX e XX, a industrializao, osurgimento do capitalismo e a consolidao de princpios polticos republicanos e, no campoeconmico e social, o advento de conflitos gerados pela estrutura do capitalismo. Essas mudan-

    as daro origem, a partir da metade do sculo XX, a uma polarizao poltico-ideolgica entreduas concepes de sociedade a sociedade capitalista e o bloco socialista.

    1.4 A LUTA PELA CONQUISTA DE DIREITOS PELOS CIDADOS: DIREITOS CIVIS, HUMANOS,POLTICOSESOCIAIS

    A luta pelos direitos dos cidados pode ser representada historicamente, desde aAntiguidade, pelas revoltas dos povos contra as esferas de poder da poca, como no caso daquelesque foram escravizados por imprios. Talvez, na memria cultural do ocidente, fruto, muitas ve-

    zes, mais do impacto de signos cinematogrficos do que efetivamente de nosso conhecimento da

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    histria, o modelo de revolta de um povo contra a opresso seja a imagem do povo judeu contrao imprio egpcio. Figura ainda em nossa memria a revolta de Spartacus, no imprio romano.Porm, a luta por direitos dos povos no registro de uma concepo moderna de cidadania se dsobretudo a partir da Revoluo Francesa. Isso no significa que no houve movimentos de liber-tao e reivindicaes, anteriormente. O que ocorre, desde o alastramento das ideias de liberdade

    e representatividade dentro de um sistema de bilateralidade, isto , em contextos em que o estadopossui obrigaes em relao ao indivduo e vice-versa, acontece com mais realidade a partir daIdade Moderna e de sua concepo de estado representativo de direito. Com o estopim revolucio-nrio de 1789, as instituies passaram a ser pensadas como edifcios polticos que representaminteresses, os quais devem trazer o princpio da justia social. No haveria justia social sem queos direitos civis fossem garantidos, nas modernas sociedades. Contudo, esse contexto ainda exibemuitas injustias e desigualdades. Podemos citar os movimentos por emancipao das colnias,os movimentos de libertao racial e o movimento operrio, como exemplos das lutas que se tra-varam nos campos polticos e jurdicos, nos sculos XIX e XX.

    A INDEPENDNCIAAMERICANAEAREVOLUOFRANCESA

    O artigo I da Declarao que o povo da Virgnia publicou, em 1776, enfatiza quetodos os seres humanos so, pela sua natureza, igualmente livres e independentes, e possuemcertos direitos inatos, dos quais, ao entrarem no estado de sociedade, no podem, por nenhumtipo de pacto, privar ou despojar sua posteridade; nomeadamente, a fruio da vida e da liber-dade, com os meios de adquirir e possuir a propriedade de bens, bem como de procurar e obtera felicidade e a segurana. Podemos afirmar que os direitos humanos nasceram a partir dessedocumento. importante notar que ele introduz a ideia de que os homens so vocacionados,

    por natureza, ao aperfeioamento de si mesmos.A Declarao de Independncia dos Estados Unidos vai posteriormente reafirmar os

    princpios de defesa da dignidade da pessoa humana.

    Na Revoluo Francesa, veremos que a liberdade e a igualdade dos homens so reafir-madas: os homens nascem e permanecem livres e iguais em direitos (Declarao dos Direitosdo Homem e do Cidado, de 1789, art. 1).

    Surge uma democracia diferente da democracia grega, na qual o demosera composto,em sua grande maioria, por camponeses e arteses, e no pela burguesia, obviamente.

    Na Amrica do Norte e na Frana, a democracia foi criada, pode-se afirmar, pelaburguesia, para fazer frente aos privilgios do antigo regime, ou seja, o clero e a nobreza.

    No obstante isso, a unidade democrtica alcanada foi resultado de duas revolu-es, em dois continentes diferentes. A Revoluo Americana queria a restaurao das fran-quias e cidadania americana. Na Revoluo Francesa, aconteceu uma mudana radical de vidaem sociedade, culturalmente e politicamente, um marco zero at no calendrio.

    A poca do terror representa um retrocesso dessas ideias, pois sabemos que os direitoshumanos foram amplamente violados, em nome de posies e disputas pelo poder poltico.Porm, de reconhecimento geral que houve avanos no sentido de distribuio maior dopoder ao povo, o que de maneira direta atinge e amplia a observao dos direitos humanos.

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    A PRIMEIRAFASEDAINTERNACIONALIZAODOSDIREITOSHUMANOS

    Esta fase vai do meio do sculo XIX at a Segunda Guerra e, nela, so trs os impor-tantes fatores:

    (1) Os direitos humanitrios.

    (2) A luta contra o escravismo.

    (3) Os direitos dos trabalhadores assalariados no capitalismo.

    A Conveno de Genebra de 1864 visava a diminuir o sofrimento em guerras e pri-ses blicas. A Cruz Vermelha objetivava melhorar as condies de tratamento dos prisioneirosde guerra.

    Na luta contra a escravatura, o Ato Geral da Conferncia de Bruxelas, de 1890, ins-titui regras contra o trfico de escravos.

    A Organizao Internacional do Trabalho, em 1919, visava proteo do trabalha-dor assalariado, no capitalismo.

    Todas essas medidas, pactos, leis e convenes foram de fundamental importnciapara a afirmao histrica dos direitos humanos, porque, uma vez estabelecido em documentosinternacionais um avano nessa rea, dificilmente a humanidade, ento alcanada por tais mu-danas e garantias, retroagir em tais garantias.

    A EVOLUODOSDIREITOSHUMANOSAPARTIRDE1945

    A Segunda Guerra Mundial levou a humanidade europeia a extremos nunca vistos nahistria. O genocdio nazista e a amplitude do conflito trouxeram problemas e discusses queprovocaram, depois do horror do holocausto, novas necessidades e medidas para a conteno epreveno de violaes aos direitos humanos. Em 10 de dezembro de 1948, a ONU aprova umdocumento referente nova situao. Afirma tambm novas espcies de direitos humanos, queforam os direitos dos povos e direitos da humanidade. Posteriormente, reconheceu-se a preser-vao de stios e monumentos do patrimnio mundial, posse das riquezas e equilbrio ecolgico.

    1.5 DIREITOSSOCIAISNASCONSTITUIESBRASILEIRAS

    A Constituio brasileira prev direitos e deveres individuais e coletivos aos cidados.Se seguirmos a srie principal de artigos constitucionais, podemos destacar, em primeiro lugar,o Art. 5, o qual afirma: Todos so iguais perante a lei, sem distino de qualquer natureza,garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no Pas a inviolabilidade do direito vida, liberdade, igualdade, segurana e propriedade.

    Um avano da Constituio de 1988 pode ser constatado no item que diz que ho-mens e mulheres so iguais em direitos e obrigaes, nos termos dessa Constituio, e queningum ser obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa, seno em virtude de lei.

    Os direitos humanos so, em boa medida, garantidos pela Constituio, pois cons-tam de nossa carta magna os seguintes direitos: ningum ser submetido tortura nem a tra-

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    tamento desumano ou degradante; livre a manifestao do pensamento e inviolvel a li-berdade de conscincia e de crena, sendo assegurado o livre exerccio dos cultos religiosos egarantida, na forma da lei, a proteo aos locais de culto e a suas liturgias. Este ltimo item temsido bastante discutido pela sociedade brasileira, j que as redes sociais e algumas manifestaespopulares apresentaram sinais evidentes de intolerncia religiosa.

    Se observarmos a Constituio, veremos ainda que ela determina que ningum deveser privado de direitos por motivo de crena religiosa ou de convico filosfica ou poltica,salvo se as invocar para eximir-se de obrigao legal a todos imposta e recusar-se a cumprirprestao alternativa, fixada em lei. Esse direito ao livre pensamento se complementa com umtpico sobre a manifestao intelectual.

    Sobre a manifestao intelectual, a Constituio determina que deva ser livre, tanto aexpresso da atividade intelectual como a artstica, cientfica e de comunicao, independente-mente de censura ou licena. Esse item importante, pois reconhece a possibilidade de crticaao prprio governo, garantindo, assim, um dos princpios democrticos mais importantes para

    a efetivao da justia.Os direitos individuais so garantidos, ainda, pela prescrio de inviolabilidade da

    intimidade, da vida privada, da honra e da imagem das pessoas, assegurado o direito a indeni-zao pelo dano material ou moral decorrente de sua violao.

    O cidado tem direito a se defender at mesmo das foras do estado, visto que a casa asilo inviolvel do indivduo, ningum nela podendo penetrar sem consentimento do mora-dor, salvo em caso de flagrante delito ou desastre, para prestar socorro ou, durante o dia, pordeterminao judicial.

    Nossa comunicao particular, que hoje to ligada aos meios eletrnicos, garanti-da na sua inviolabilidade e sigilo da correspondncia e das comunicaes telegrficas, de dadose das comunicaes telefnicas, salvo, no ltimo caso, por ordem judicial, nas hipteses e naforma que a lei estabelecer para fins de investigao criminal ou instruo processual penal.

    Em tese, todos so livres para o exerccio de qualquer trabalho, ofcio ou profisso,atendidas as qualificaes profissionais que a lei fixar. Alm disso, assegurado a todos o acesso informao e resguardado o sigilo da fonte, quando necessrio ao exerccio profissional.

    O direito de ir e vir, to difundido e citado at pelos cidados, garantido pela lei,a qual determina que livre a locomoo no territrio nacional, em tempo de paz, podendo

    qualquer pessoa, nos termos da lei, nele entrar, permanecer ou dele sair com seus bens.Quanto organizao social, todos podem reunir-se pacificamente, sem armas, em

    locais abertos ao pblico, independentemente de autorizao, desde que no frustrem outrareunio anteriormente convocada para o mesmo local, sendo apenas exigido prvio aviso autoridade competente.

    Podemos destacar tambm o direito de propriedade, o qual garante ao cidado queos bens adquiridos como fruto de seu trabalho ou de capital acumulado por famlia devem serrespeitados pela sociedade e pelo estado, sendo vedada a expropriao dos bens do indivduo.

    Esta longa, mas no completa lista de direitos, pode nos dar uma ideia dos avanosque a humanidade e especificamente o Brasil, neste caso, conseguiu com relao a perodos

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    pregressos da nossa histria. O perodo colonial foi marcado por injustias sociais evidentes,que, em muitos casos, tiveram o amparo das leis. O que se nota, desde a Constituio de 1988, um acirramento dos princpios democrticos, mas, ao mesmo tempo, ainda, uma forte desi-gualdade econmica que vem sendo enfrentada pelos governos recentes. O que se percebe, emanlises sociolgicas e econmicas, que os direitos sociais devem vir acompanhados de ganhos

    econmico-sociais. O pleno estabelecimento da justia social e da sociedade de direitos passanecessariamente pela colocao social dos cidados.

    DIREITOPREVIDNCIASOCIAL

    Uma funo do Estado prevista pela Constituio brasileira que deve ser destacadaainda o direito previdncia social. Esta garante a segurana social, por meio de um regime decontribuio previdenciria efetuada pelo indivduo, gerando alguma segurana a seus depen-dentes, em caso de doena, invalidez ou morte. Paralelamente a esse direito, temos o direito

    assistncia social. Essa garantia de seguridade social deve ser prestada queles que no dispemde recursos financeiros para o mnimo de existncia digna, que seriam aqueles grupos de cida-dos menos favorecidos economicamente.

    1.6 VIDAURBANA: REDESEHIERARQUIANASCIDADES, POBREZAESEGREGAOESPACIAL

    Existe, na vida urbana, uma clara imagem da desigualdade social. A especulaoimobiliria tende a determinar os rumos do crescimento das cidades, no sentido da valorizaode espaos privilegiados em acessibilidade e conforto ambiental e at de recursos naturais. A

    interferncia do capital imobilirio na configurao das cidades modernas no somente umfenmeno brasileiro. O que agrava a situao, no Brasil, , em alguns casos, a falta de planeja-mento estatal das cidades e a desigualdade de condies de aquisio de imveis, por parte dapopulao. Tais fatores, aliados escalada da violncia urbana, originaram uma tendncia deisolamento social por parte daqueles que possuem recursos para viver em condomnios, parale-lamente ao crescimento de bolses caracterizados por moradias precrias, como as favelas, porexemplo. Por um lado, v-se uma crescente tendncia de isolamento da chamada classe mdiaalta e, por outro, uma precarizao da moradia das classes economicamente desfavorecidas.Como resultado desse processo de crescimento urbano, surge um modelo de cidade divididaem regies de ampla valorizao imobiliria e regies caracterizadas por franca desvalorizao

    cultural e territorial. Esse panorama cria tambm culturas locais, as quais se opem no convviosocial. A expressoperiferiasignifica, hoje, mais do que uma regio da cidade, mas alude a umanoo de pertencimento cultural e at de afirmao cultural. Nessa lgica afirmativa, alguns seconsideram de um lado da cidade e outros de outro lado. Parece haver uma tendncia de iso-lamento crescente. Os condomnios fechados representariam, nesse contexto, o local da classemdia, tendo os shoppings centerscomo o lugar de fluxo e passeio. E a periferia, isolada destemundo de consumo mais sofisticado e estruturado. s classes perifricas estariam disponveis osantigos centros comerciais, alguns em decadncia, localizados nas partes centrais e mais antigasdas cidades. O fenmeno de ascenso econmica da classe C, ocorrido na sociedade brasileiranas ltimas dcadas, criou um conflito cultural representado pelo maior afluxo das classes C eD aos shoppings centers, antes frequentados, em sua maioria, pelas classes A e B. Os jovens de

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    classe C e D que adentraram no universo do consumo e procuraram seu espao nos centroscomerciais at ento vedados a eles provocaram a reao dos estabelecimentos, na forma derepresso ao convvio desses grupos nos shoppings centers. A lgica desses eventos recentes nosd uma viso da desigualdade e da intolerncia que existe em nosso meio social.

    A diviso espacial da cidade, provocada pela especulao imobiliria e pela desigual-dade social, se soma diviso de espaos de convvio, evidenciada nos locais de lazer e nasmanifestaes culturais de afirmao. No entanto, o mundo do consumo, que supostamente direito de todos, cria um choque de comportamentos e de identidades em locais de afluxocomercial. A precarizao dos centros comerciais mais centrais das cidades e a consequenteconcorrncia pelos novos focos de consumo mostram os benefcios do crescimento econmico,todavia, demonstram tambm graves problemas sociais de desigualdade e convvio cultural.

    Parece razovel que o estado, no estabelecimento de polticas que promovam a justiasocial, pode e deve pensar o planejamento das cidades, no sentido de promover a integraosocial e no se submeter ao capital imobilirio especulativo, o qual dita uma separao de inte-

    resses e beneficia somente aqueles que possuem mais recursos.

    1.7 O DESENVOLVIMENTO DO PENSAMENTO LIBERAL NA SOCIEDADE CAPITALISTA E SEUSCRTICOSNOSSCULOSXIX EXX

    O liberalismo se caracteriza por ser uma doutrina poltica que concebe o Estadocom poderes e funes limitados, diferentemente do Estado absolutista e do Estado chamadodo bem-estar social. O Estado liberal fruto de um pensamento liberal, que tem como fun-damento algumas teses de John Locke (1632-1704), na obra Dois tratados do governo civil, do

    final do sculo XVII. Nessa obra, Locke faz uma crtica ao Estado absolutista e ideia de esco-lha divina do rei, comeando por definir o que seriam os objetivos de um governo civil. ParaLocke, existem naturalmente no homem a liberdade e a igualdade, contudo, as aes humanasacabam por subverter essa condio. O contrato social seria um meio de estabelecer a igualdadede direitos e a liberdade dos cidados. Alm dos direitos relacionados com a liberdade e com aigualdade os homens, segundo Locke, os homens teriam direito a bens e este seria tambm, umdireito natural do ser humano. Locke afirma que a propriedade seria uma instituio anterior sociedade. Esse ponto posteriormente causou muita polmica e at hoje questionado. Se odireito propriedade um direito anterior ao estado, este no poderia retirar dos cidados suaspropriedades. A desapropriao no seria uma prerrogativa do estado. O homem, na concepode Locke, seria naturalmente livre e, consequentemente, ele seria proprietrio de sua prpriapessoa e de seu prprio trabalho e bens materiais, o que seria um direito natural, isto , anterior formao do estado e da sociedade.

    Para garantir esses direitos, seria preciso fazer um contrato social. Um contrato social um estabelecimento bilateral, entre o estado, que representa a sociedade, e o indivduo, ouseja, um pacto entre os indivduos para determinar que o Estado seja o comando poltico, coma prerrogativa de preservar e defender os direitos individuais dos homens, que, como vimos,so direitos naturais, quer dizer, anteriores ao prprio estado. A preservao desses direitos papel do estado e no a supresso desses direitos. No liberalismo, o estado deve proteger o

    indivduo dos outros indivduos, garantindo a propriedade a cada um. O estado seria a garantia

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    de meus direitos. O aspecto de garantia de propriedade de bens individuais levou ideia deindividualismo liberal, a qual ser muito atacada pelas correntes crticas ao liberalismo. O senti-mento de propriedade individual poderia conduzir a sociedade a um sectarismo e luta desigual,na defesa da propriedade e dos meios de produo geradores da riqueza. No obstante essascrticas, o liberalismo, sobretudo o de Locke, ter influncia no pensamento do sculo XVIII e

    na formao poltica dos estados, nessa poca e at hoje. A Declarao dos Direitos dos EstadosUnidos (1776) e a Revoluo Francesa (1789) so exemplos dessa influncia.

    Pode-se afirmar que o individualismo uma consequncia direta da formao e estru-tura filosfica do Estado Liberal. Podemos associar, sem sombra de dvidas, a influncia dessesprincpios ao desenvolvimento do capitalismo. Os princpios jurdicos da sociedade capitalistaesto baseados no pensamento liberal, sobretudo no princpio do direito propriedade.

    Essa constatao leva alguns crticos a questionar se a liberdade e igualdade real-mente se efetivam, no capitalismo. O Estado liberal deve garantir a defesa da liberdade, masele pode promover a igualdade? Essa questo est na base de toda a disputa ideolgica que se

    viu, nos sculos XIX e XX, e ainda atual, isto , seria o liberalismo poltico realmente justo,enquanto princpio ordenador de uma sociedade? O pensamento marxista representa a maiore mais elaborada reao a essa questo. Segundo Marx, as contradies do capitalismo teriamsua superao definitiva atravs da instituio de outro modelo de estado, no o liberal. A classetrabalhadora deveria conduzir um processo revolucionrio em direo mudana na estruturado Estado, com a instalao de uma ditadura do proletariado.

    Este seria um regime ditatorial, que assumiria a propriedade dos meios de produo,para efetuar a distribuio igualitria das riquezas produzidas na sociedade. Uma sociedadeigualitria surgiria desse processo. Aprimorando-se os mecanismos de distribuio, a igualdade

    seria igualmente aprimorada e efetivada. O que previa esse processo era que um governo prole-trio acabaria dando origem a uma sociedade comunista e, nela, o Estado e as propriedades se-riam, ao longo de um processo econmico e poltico, extintas. Nesse sentido, podemos concluirque o princpio da propriedade privada defendida por Locke e pelo liberalismo negado pelacrtica ao pensamento liberal e sociedade capitalista, desenvolvida pelo pensamento marxista.

    1.8 POLTICASAFIRMATIVAS

    Aes polticas afirmativas so polticas especficas adotadas pelos estados nacionais que

    dirigem recursos da Unio em benefcio de pessoas que seriam pertencentes a grupos discrimi-nados culturalmente e vitimados pela excluso socioeconmica, no passado ou no presente. Umexemplo claro dessa situao social so os negros e ndios. H, na histria do Brasil, a partir dosistema escravocrata, aes que dificultaram em grande medida a ascenso social dessas etnias emesmo sua afirmao cultural, a qual foi e ainda objeto de preconceito e violncia social.

    Essas medidas do estado tm como objetivo combater, alm das discriminaes t-nicas, as raciais, as religiosas, as de gnero ou as de casta. As medidas, ou polticas afirmativas,visam a aumentar a participao de minorias no processo poltico, acentuar o acesso educaoe ao emprego, bem como reconhecer o importante papel dessas culturas na formao da iden-

    tidade cultural brasileira.

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    As polticas de ao afirmativa so direcionadas para o aumento da contratao demembros desses grupos, nas reas relacionadas aos concursos pblicos e na educao pblica,atravs de metas, cotas, bnus ou fundos de estmulo e bolsas de estudo. Alm dessas polticas,o governo brasileiro tem criado linhas de emprstimos para custear a educao daqueles queno conseguem acesso ao ensino pblico superior.

    Em suma, as polticas afirmativas cobrem aspectos de desigualdade social e cultural,na promoo tanto da igualdade cultural de acesso quanto de direitos bsicos de cidadania,implementando o reconhecimento e a valorizao tnica e cultural.

    As aes afirmativas so polticas antidiscriminatrias em si mesmas e pretendemcriar, alm dos incentivos legais, uma cultura de valorizao tnica e cultural. Nesse sentido,elas possuem uma dupla funo cultural: a de estabelecer um mnimo de igualdade nas opor-tunidades sociais e a de criar uma conscientizao sobre os problemas histricos dessas etnias egrupos sociais, os quais esto implicados na identidade desses cidados.

    Os debates sobre as cotas nas universidades pblicas tem mobilizado vrios segmen-tos sociais e criado um ambiente de discusso, no qual as diversas vozes interessadas nessas po-lticas afirmativas podem se fazer ouvir. Desse debate surge uma conscincia da complexidadedos problemas enfrentados por etnias que sofreram e sofrem discriminao, no somente depessoas, mas tambm de instituies ligadas represso social. A precarizao social que essesgrupos enfrentaram, historicamente, criou associaes interpretativas arraigadas na cultura bra-sileira que efetivam o preconceito e naturalizam a discriminao como algo normal. O trabalhode conscientizao cultural de toda uma populao passa, nesse sentido, por aes governamen-tais que buscam melhorar as relaes entre etnias, religies e grupos sociais, no Brasil.

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    2 GEOGRAFIA

    2.1 BASEESTRUTURALDAGEOGRAFIA

    Quando eu era jovem o meu sonho era tornar-se gegrafo. Entretanto, antes de ingressar nocurso superior, quando trabalhei num escritrio, numa atividade que envolvia consumidoresde diversas partes, comecei a pensar mais profundamente sobre essa questo e conclu que essadisciplina deve ser extremamente complexa e difcil. Aps alguma relutncia, acabei optandopelo estudo da Fsica.

    Albert Einstein

    O homem mora na Geografia, e nela, o gerador dos tributos na nao. Ignorar a Geografia ignorar o prprio homem e suas necessidades vitais.Ulisses Guimares

    Ignorar a geografia uma atitude irresponsvel. Ela to importante para os negcios e apoltica domstica quanto para as decises militares e de poltica exterior.Gilbert Grasvenor, presidente da Sociedade Nacional de Geografia dos Estados Unidos

    A poltica de um Estado est em sua geografia.Napoleo Bonaparte

    Muitos ainda pensam que a geografia no passa de uma disciplina descritiva, que fornece descri-es neutras ou desinteressadas sobre o mundo: o clima do sul da sia, o relevo da Europa, osfusos horrios da Rssia etc. Contudo, a despeito das aparncias, a geografia no um saber semutilidade [...] Na verdade, ela til para a vida prtica e interessa bastante a todos os cidados.Pois a geografia serve, em primeiro lugar, para fazer a guerra. Isso no significa que ela s sirvapara conduzir operaes militares. Ela serve tambm para organizar territrios, para o exercciodo poder (do Estado, por exemplo) sobre o espao, para que as pessoas aprendam a se organizarno espao para nela atuar.

    Yves Lacoste

    A Geografia a cincia que estuda a organizao do espao pelo Homem, se preo-cupando com este e suas relaes entre si e com a natureza. Nessas relaes, cria cultura e criatambm um espao diferenciado que chamamos de espao geogrfico ou segunda natureza.

    Segundo o gegrafo Ruy Moreira (2007, p. 41-42),O espao surge na histria da organizao territorial dada pelo homem relao ao seu meio.Dois acontecimentos balizam o incio dessa histria. Atuando desde ento como as determi-nantes da relao estvel do homem com seu espao. A descoberta do fogo a primeira. A daagricultura o segundo.O fogo o dado seminal. O uso do fogo leva o homem a tornar-se um ser ubquo na superfcieterrestre. Com o fogo ele aprende a controlar o meio (o fogo serve para o preparo dos alimentose para a fabricao de armas e utenslios) e a dominar os territrios (serve para o ataque e adefesa, para iluminar o acampamento e para renovar a vegetao atravs da queimada). A daagricultura o dado integrador. Com a agricultura, o homem d outra arrumao espacial natureza (atravs da domesticao das plantas e dos animais) e assim cria os territrios (atravsda guarda organizada das provises em silos e celeiros, da apropriao intencional dos solos e dagua, do ordenamento dos caminhos e das localizaes).

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    Da combinao do fogo e da agricultura vem a instalao dos primeiros ncleos de povoamen-to. Os polos germinativos de que emergem as civilizaes.

    A complexa teia de relaes entre os homens, entre estes e a natureza e entre os ele-mentos que a compem constitui-se o objeto de estudo da Geografia, isto , tudo aquilo que

    podemos visualizar, sentir a textura, fotografar, mapear, enfim, as manifestaes concretas danatureza e da sociedade.

    Os conceitos que formam a base estrutural da cincia geogrfica so:

    CONCEPO NORTEADORA ELEMENTOS DE APROFUNDAMENTO

    Conjunto indissocivel de sistemas de objetivos (redestcnicas, prdios, ruas) e de sistemas de aes (organi-zao do trabalho, produo, circulao, consumo demercadorias, relaes familiares e cotidianas) que pro-cura revelar as prticas sociais dos diferentes grupos quenele produzem, lutam, sonham, vivem e fazem a vidacaminhar. (Milton Santos)

    O espao perceptvel, sensvel, porm, extremamentedifcil de ser limitado, quer por dinmica, quer pela vi-vncia de elementos novos e elementos de permanncia.

    Apesar de sua complexidade, ele apresenta elementos da

    unicidade. Interferem nos mesmos valores, que so atri-budos pelo prprio ser humano e que resultam numadistino entre o espao absoluto cartesiano umacoisa em si mesmo, independente; e um espao relacio-nal que apresenta sentido (valor), quando confrontadoa outros espaos e outros objetos.

    Quadro 1: Espao Geogrfico

    CONCEPO NORTEADORA ELEMENTOS DE APROFUNDAMENTO

    Unidade visvel do arranjo espacial, alcanado por nossaviso.

    Contm elementos impostos pelo homem, por meiode seu trabalho, de sua cultura e de sua emoo. Nelase desenvolve a vida social e, dessa forma, ela pode seridentificada informalmente apenas, mediante a percep-o, mas tambm pode ser identificada e analisada demaneira formal, de modo seletivo e organizado; e nes-te ltimo sentido que a paisagem se compe como umelemento conceitual de interesse da Geografia.

    Quadro 2: Paisagem

    CONCEPO NORTEADORA ELEMENTOS DE APROFUNDAMENTO

    Poro do espao definida pelas relaes de poder, pas-sando, assim, da delimitao natural e econmica paraa de divisa social.O grupo que se apropria de um territrio ou se organizasobre ele cria relao de territorialidade, que se consti-tui em outro importante conceito da Geografia. Ela sedefine como a relao entre os agentes sociais polticos eeconmicos, interferindo na gesto do espao.

    A delimitao do territrio a delimitao das relaesde poder, domnio e apropriao nele instaladas. , por-tanto uma poro concreta. O territrio pode, assim,transcender uma unidade poltica, o mesmo acontecen-do com o processo de territorialidade, sendo que esteno se traduz por uma simples expresso cartogrfica,mas se manifesta sob as relaes variadas, desde as maissimples at as mais complexas.

    Quadro 3: Territrio

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    CONCEPO NORTEADORA ELEMENTOS DE APROFUNDAMENTO

    Distinguem-se dois tipos ou duas vises bsicas: a escalacartogrfica e a escala geogrfica. A primeira delas , a

    priori, uma relao matemtica que implica uma relaonumrica entre a realidade concreta e a realidade repre-sentada cartograficamente.No caso da escala geogrfica, trata-se de uma viso re-lativa a elementos componentes do espao geogrfico,tomada a partir de um direcionamento do olhar cien-tfico: uma escala de anlise que procura responder aosproblemas referentes distribuio dos fenmenos.

    Para a escala geogrfica, essencial estabelecer os valo-res numricos entre o fato representado e a dimensoreal do fato ocorrente. No entanto, essa relao podepressupor a escolha de um grau de detalhamento que

    implique a incluso de fatos mais ou menos visveis,dentro de um processo seletivo que considere graus deimportncia para o processo de representao.No caso da escala geogrfica, o que comanda a seleodos fatos a ordem de sua importncia, no contexto dotema que est sendo trabalhado. H, nesse caso, umaseleo efetiva dos fatos, a partir dos diversos nveis deanlise, que j se tentou agrupar em unidades, o quepode ser discutvel.

    Quadro 4: Escala

    CONCEPO NORTEADORA ELEMENTOS DE APROFUNDAMENTO

    Poro do espao aproprivel para a vida, que vivido,reconhecido e cria identidade.

    Guarda em si mesmo as noes de densidade tcnica,comunicacional, informacional e normativa. Guar-da em si a dimenso da vida, como tempo passado epresente. nele que ocorrem as relaes de consenso,conflito, dominao e resistncia. nele que se d a re-cuperao da vida. o espao com o qual o indivduose identifica mais diretamente.

    Quadro 5: Lugar

    CONCEPO NORTEADORA ELEMENTOS DE APROFUNDAMENTO

    O fato gerador o processo de globalizao, que corres-ponde a uma etapa do processo de implementao denovas tecnologias, as quais acabaram por criar a interco-municao entre os lugares em tempo simultneo. Parasua ocorrncia, torna-se fundamental a apreenso dastcnicas pelo ser humano e a expresso das redes, queno se restringem comunicao, mas englobam todos

    os sistemas de conexo entre os lugares.

    A globalizao basicamente assegurada pela imple-mentao de novas tecnologias de comunicao e infor-mao, isto , de novas redes tcnicas que permitem acirculao de ideias, mensagens, pessoas e mercadorias,num ritmo acelerado, criando a interconexo dos luga-res em tempo simultneo.

    Quadro 6: Globalizao, Tcnicas e Redes

    A- REDE

    toda infraestrutura, permitindo o transporte de matria, de energia ou informao,que se inscreve sobre um territrio caracterizado pela topologia dos seus pontos de acesso oupontos terminais, seus arcos de transmisso, seus ns de bifurcao ou de comunicao. Mas arede tambm social e poltica, pelas pessoas, mensagens e valores que a frequentam.

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    A organizao do espao geogrfico, atravs das redes, eliminou a necessidade de fixaras atividades polticas, econmicas e at terroristas, em determinados lugares. Isso vale para ogrande nmero de atividades que podem ser executadas a partir de qualquer parte do mundo,bastando que esses locais estejam conectados. O espao geogrfico hoje tende a se tornar ummeio tcnico-cientfico-informacional, impregnado pela trade cincia, tcnica e informao, o

    que resulta em uma nova dinmica territorial (SANTOS, 1994). At h pouco tempo, a super-fcie do planeta era utilizada de acordo com divises produzidas pela natureza ou pela histria,chamadas de regies. Essas regies correspondiam base da vida econmica, cultural e poltica.Atualmente, devido ao processo das tcnicas e das comunicaes, a esse territrio se sobrepeum territrio das redes que, em primeira anlise, fornece a impresso de ser uma realidadevirtual. Porm, ao contrrio do que se possa imaginar, no se trata de um espao virtual. Para osocilogo espanhol Manuel Castells (2002, p. 565), redes constituem a nova morfologia socialde nossas sociedades e a difuso da lgica de redes modifica de forma substancial a operao eos resultados dos processos produtivos e de experincia, poder e cultura.

    Assim, as redes so realidades concretas, formadas por pontos interligados, que ten-dem se a espalhar por toda a superfcie mundial, ainda que com desigual densidade, conformeos continentes e pases. Milton Santos (1996, p. 215) afirma que a existncia das redes inse-parvel da questo do poder. Essas redes se constituem na base da modernidade e na condionecessria para a plena realizao da economia global. Elas formam o veculo que possibilitao fluxo das informaes, que hoje o mecanismo vital da globalizao. Ruy Moreira (2006)salienta que a organizao em rede vai mudando a forma de contedo dos espaos, deixando-ossimultaneamente mais fluidos, de maneira que as distncias perdem seu sentido fsico diantedo novo contedo social do espao. Antes de mais nada, preciso se estar inserido num lugar,para se estar inserido na geopoltica da rede. Uma vez localizado na rede, pode-se da puxar a

    informao, disputar-se primazias e ento integrar-se ao jogo do poder.

    B- NATUREZA

    So mltiplos elementos criados por uma dinmica prpria e que interagem entre si(exemplos: rios, oceanos, florestas, vulces, montanhas, animais, homens etc.).

    C- SOCIEDADE

    Conjunto de pessoas interagindo entre si, buscando seus meios de sobrevivncia econstruindo suas culturas.

    D- CULTURA

    Conjunto de tcnicas, normas, crenas, ideias, formas de organizao social, mani-festaes artsticas, costumes, lnguas etc., que surgem e se desenvolvem por intermdio dasexperincias de grupos humanos em determinado meio ambiente.

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    E- TRABALHO

    Ao desencadeada pelo homem para produzir os seus objetos, construir sua morada,atender s suas mais variadas necessidades.

    A PERIODIZAODOESPAO

    Milton Santos (1996) explica que a histria do meio geogrfico pode ser dividida emtrs etapas: o meio natural, o meio tcnico (perodo de emergncia do espao mecanizado) e omeio tcnico-cientfico-informacional.

    F- MEIONATURAL

    Quando tudo era meio natural, o homem escolhia da natureza aquelas suas par-

    tes ou aspectos considerados fundamentais ao exerccio da vida, valorizando, diferentemente,segundo os lugares e as culturas, essas condies naturais que constituam a base material daexistncia do grupo. Esse meio natural generalizado era utilizado pelo homem sem grandestransformaes. As tcnicas e o trabalho se casavam com as ddivas da natureza, com a qual serelacionavam sem outra mediao. Nesse perodo, os sistemas tcnicos no tinham existnciaautnoma.

    G- MEIOTCNICO

    O perodo tcnico v a emergncia do espao mecanizado. Os objetos que formam omeio no so, apenas, objetos culturais; eles so culturais e tcnicos, ao mesmo tempo. Quantoao espao, o componente material crescentemente formado do natural e do artificial.Contudo, o nmero e a qualidade de artefatos variam. As reas, os espaos, as regies, os pasespassam a se distinguir em funo da extenso e da densidade da substituio, neles, dos objetosnaturais e dos objetos culturais por objetos tcnicos.

    Com o advento da cincia, criaram-se as condies para a inveno de mquinasque modificaram, radicalmente e com muita rapidez, o modo de vida no planeta. A tecnologiaadquiriu um papel cada vez mais importante. O conjunto das tecnologias envolvidas no pro-cesso de fabricao de mercadorias, produo de energia e circulao de pessoas foi resultadoda aplicao prtica dos conhecimentos cientficos.

    H- MEIOTCNICO-CIENTFICO-INFORMACIONAL

    um meio geogrfico onde o territrio inclui obrigatoriamente cincia, tecnologia einformao. a nova face do espao e do tempo. onde se instalam as atividades hegemnicas,aquelas que tm relaes mais longnquas e participam do comrcio internacional, fazendocom que determinados lugares se tornem mundiais. Caracteriza o meio geogrfico da globali-zao capitalista, o qual se distingue dos perodos anteriores, em virtude da crescente interao

    entre a cincia e a tcnica.

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    Mudanas tecnolgicas ao longo do tempo

    Perodo Comunicao Energia Meios

    Pr-agrcola Linguagem oral e pict-

    rica

    Fogo

    Animais Instrumentos primitivos

    Agrcola Escrita Imprensa

    Trao animal Plvora

    Charrua (arado grande deferro)

    Industrial

    Telgrafo Telefone Fongrafo Rdio Cinema

    Mquina a vapor Eletricidade

    Ao Mquinas avanadas Estradas de ferro Veculos motorizados

    Atual

    Televiso

    Satlite Computador Sistemas multimdias

    Fisso atmica

    Baterias eltricas Laser

    Transporte supersnico einterplanetrio

    Materiais sintticos

    Microeletrnica Informtica Robtica Biotecnologia

    Quadro 7: Mudanas tecnolgicas ao longo do tempo

    Fonte: Adaptado de SANTOS, 1996, p. 140 e de LUCCI et al., 2005, p.7.

    TEXTOSCOMPLEMENTARES

    ESPAOGEOGRFICOEPAISAGEMNuma paisagem podem ser observados edifcios, reas cultivadas, ruas, ferrovias,

    igrejas, aeroportos, veculos, enfim, vrios objetos construdos e modificados pela sociedade hu-mana ao longo da Histria, alm das formas naturais (animais e plantas em geral) e as prpriaspessoas.A paisagem geogrfica aquilo que se v (o conjunto dos elementos materiais) e sepercebe (sons, cheiros, movimentos) num determinado momento, num certo trecho do espao.

    O gegrafo Milton Santos definiu paisagem como o domnio do visvel, aquilo quea vista abarca. No formada apenas de volumes, mas tambm de cores, movimentos, odores,sons, etc. [...] A dimenso da paisagem a dimenso da percepo, o que chega aos sentidos.

    (Metamorfose do espao habitado. 4. ed. So Paulo: Hucitec, 1996, p. 61 e 62).A simples observao da paisagem no nos traz explicaes sobre as funes de cada

    uma das edificaes, a organizao do sistema de produo, as tecnologias empregadas, as rela-es comerciais, as relaes de trabalho, a organizao poltica e social, etc.

    Ao considerarmos os elementos materiais, as funes das edificaes, as sociedades, asrelaes e as estruturas econmicas sociais e polticas, estamos tratando do espao geogrficoe no apenas da paisagem. O espao geogrfico , portanto, o conjunto de elementos materiais(naturais e construdos) sob permanente ao da sociedade, que o modifica e o organiza pormeio do trabalho e das diversas relaes econmicas, sociais e polticas.

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    A estrutura (paisagem) e o uso do espao, alm dos impactos nele produzidos, sotemas interligados da Geografia. A anlise desses elementos permite entender como os grupossociais operam na paisagem, desenvolvem relaes de trabalho e interagem entre si, com outrosgrupos e com o ambiente.

    Fonte: LUCCI, Elian Alabi et al. Territrio e sociedade no mundo globalizado: geografia geral e do Brasil. So Paulo:

    Saraiva, 2005. p. 12.

    REPRODUOESPACIALEESTRUTURASDERELAO

    Se observarmos uma quadra de futebol de salo, notamos que o arranjo do terrenoreproduz as regras desse esporte. Basta aproveitarmos a mesma quadra e nela sobrepormos oarranjo espacial do futebol de salo, do vlei, do basquete ou do handebol uns sobre os outros,cada qual com leis prprias, para notarmos que o arranjo espacial de um diferir do outrono terreno. Diferir porque o arranjo espacial ao se confundir com as regras do jogo, segue asregras de cada um dos esportes citados. Se fossem as mesmas as leis para todos eles, o arranjoseria um s.

    Naturalmente que a transposio do exemplo da quadra de esportes para o que ocor-re com a formao espacial implica alguns cuidados, como de resto deve acontecer com asanalogias. No se trata de uma diferena de escalas, apenas, mas de natureza qualitativamentedistinta entre a quadra e a formao espacial, embora possamos falar da quadra como de umaformao espacial. Mas as regras do esporte so regras simples e quase mecnicas, com intuitosde repeties de jogadas de reduzidas margens de variaes. As leis de uma formao econmi-co-social so de uma ordem de grande complexidade, porque se referem a movimentos deter-minados historicamente. Confundindo-se com estruturas complexas enquadradas no tempo

    histrico, e no no tempo sideral como o da quadra, a formao espacial tem uma estruturacomplexa e submetida ao tempo histrico.

    Fonte: MOREIRA, Ruy. Pensar e ser em geografia: ensaios de histria, epistemologia e ontologia do espao geogrfi-co. So Paulo: Ed. Contexto, 2007. p. 70.

    IMPORTNC