anÁlise dos princÍpios do processo de design da...

66
- CENTRO UNIVERSITÁRIO RITTER DOS REIS PRÓ-REITORIA PESQUISA, PÓS-GRADUAÇÃO E EXTENSÃO PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM DESIGN MESTRADO EM DESIGN ANÁLISE DOS PRINCÍPIOS DO PROCESSO DE DESIGN DA PINTURA DE PETER PAUL RUBENS: O CASO DA OBRA “O RAPTO DAS FILHAS DE LEUCIPO”. PAULO ALARIO D´AVILA ORIENTADOR: Prof. Dr. Vinicius Gadis Ribeiro PORTO ALEGRE RS 2012

Upload: vuongdiep

Post on 02-Nov-2018

216 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

Page 1: ANÁLISE DOS PRINCÍPIOS DO PROCESSO DE DESIGN DA …biblioteca.uniritter.edu.br/imagens/035UNR89/0000B6/0000B66F.pdf · 2 paulo alario d´avila anÁlise dos princÍpios do processo

-

CENTRO UNIVERSITÁRIO RITTER DOS REIS

PRÓ-REITORIA PESQUISA, PÓS-GRADUAÇÃO E EXTENSÃO

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM DESIGN

MESTRADO EM DESIGN

ANÁLISE DOS PRINCÍPIOS DO PROCESSO DE DESIGN DA PINTURA DE PETER PAUL RUBENS: O CASO DA OBRA

“O RAPTO DAS FILHAS DE LEUCIPO”.

PAULO ALARIO D´AVILA

ORIENTADOR: Prof. Dr. Vinicius Gadis Ribeiro

PORTO ALEGRE – RS

2012

Page 2: ANÁLISE DOS PRINCÍPIOS DO PROCESSO DE DESIGN DA …biblioteca.uniritter.edu.br/imagens/035UNR89/0000B6/0000B66F.pdf · 2 paulo alario d´avila anÁlise dos princÍpios do processo

2

PAULO ALARIO D´AVILA

ANÁLISE DOS PRINCÍPIOS DO PROCESSO DE DESIGN DA PINTURA DE PETER PAUL RUBENS: O CASO DA OBRA

“O RAPTO DAS FILHAS DE LEUCIPO”.

Trabalho de conclusão defendido e aprovado como requisito parcial para a

obtenção de título de Mestre em Design pela banca examinadora constituída por:

__________________________________

Professora Doutora Raquel Rodrigues

__________________________________

Professor Doutor Guilherme Correa Meyer

__________________________________

Professor Doutor Vinicius Gadis Ribeiro

Page 3: ANÁLISE DOS PRINCÍPIOS DO PROCESSO DE DESIGN DA …biblioteca.uniritter.edu.br/imagens/035UNR89/0000B6/0000B66F.pdf · 2 paulo alario d´avila anÁlise dos princÍpios do processo

3

PORTO ALEGRE – RS

2012

D259d D´Avila, Paulo Alario

Análise dos Princípios do Processo de Design da Pintura de

Peter Paul Rubens: O Caso da Obra “O rapto das Filhas de Leucipo”. / Paulo Alario d´Avila. – 2012.

65 f. ; 30 cm.

Dissertação (mestrado) – Centro Universitário Ritter dos Reis, Faculdade de Design, Porto Alegre, 2012.

Orientador: Prof. Dr. Vinicius Gadis Ribeiro.

1. Design de Produto. 2.Desenvolimento de Produto. 3. Arte Barroca. 4. Paul Rubens I. Título. II. Vinicius Gadis Ribeiro

CDU 658.512.2

Ficha catalográfica elaborada no Setor de Processamento Técnico da Biblioteca

Dr. Romeu Ritter dos Reis

Page 4: ANÁLISE DOS PRINCÍPIOS DO PROCESSO DE DESIGN DA …biblioteca.uniritter.edu.br/imagens/035UNR89/0000B6/0000B66F.pdf · 2 paulo alario d´avila anÁlise dos princÍpios do processo

4

DEDICATÓRIA

Nossa motivação em retornar os bancos acadêmicos em idade madura

consistiu em uma energia interna com a qual, buscamos a superação de barreiras.

Aprender, conhecer e obter respostas às questões que sempre estiveram presentes

no decorrer de nossa vida pessoal e profissional e não obtivemos tempo e condições

de esclarecê-las, foi o alvo desta aprendizagem.

Temos ainda claro em nossa memória um desenho realizado por nós aos

quatro anos de idade, talvez tenha sido a primeira vez que nos demos conta de ter

representado graficamente alguma coisa. Era uma pessoa de perfil, desenhada em

um pequeno quadro negro. Talvez não fosse tão nítida ou detalhada, mas com

certeza já eram as linhas que formariam o desenho de um rosto. Deste momento em

diante, desenhamos, desenhamos por toda a infância, adolescência e idade adulta,

a ponto de escolhermos uma profissão em que a expressão principal é o desenho.

Nesse sentido, concluímos que aprendemos a registrar graficamente os

sentimentos, muito antes de escrever ou ler. Estamos habituados com o ato de

desenhar, porque sempre o fizemos de diversas formas, épocas ou funções. Dai

tiramos o nosso sustento e realizamos os nossos sonhos. Temos a convicção de o

que desenho é criação do espírito, é forma de expressar os sentimento. A escolha

deste tema tem duas intenções: de homenagear e a de conhecer mais

profundamente este companheiro que sempre esteve em nossa vida: o DESENHO.

Dedico esta produção acadêmica primeiramente aos

meus pais, que além de me proporcionar este mestrado, me

fizeram a acreditar que poderia voltar a estudar após tantos

anos. A esposa, filhas, genros e os meus maravilhosos netos.

Page 5: ANÁLISE DOS PRINCÍPIOS DO PROCESSO DE DESIGN DA …biblioteca.uniritter.edu.br/imagens/035UNR89/0000B6/0000B66F.pdf · 2 paulo alario d´avila anÁlise dos princÍpios do processo

5

AGRADECIMENTO

Aos professores, em especial Luiz Vidal Gomes, Ligia Medeiros

e Vinicius Gadis Ribeiro.

Ao meu amigo e colega Mestre em Educação Hércules de

Araújo Meneses.

A minha irmã Pedagoga Lúcia d´Avila Vieira

Ao meu orientador Prof. Vinicius Gadis Ribeiro.

Vivemos um período impar de nossa vida onde nossa

aprendizagem foi acrescida, enriquecida pelo conhecimento e

experiências de pessoas que fizeram parte desta caminhada. A

estes, afirmo que são responsáveis pela visão que hoje temos

sobre o design, que aprendemos e entendemos que temos

mais a aprender, condição esta que agora temos o propósito de

alcançar. A vocês nossa pessoal gratidão.

Page 6: ANÁLISE DOS PRINCÍPIOS DO PROCESSO DE DESIGN DA …biblioteca.uniritter.edu.br/imagens/035UNR89/0000B6/0000B66F.pdf · 2 paulo alario d´avila anÁlise dos princÍpios do processo

6

RESUMO

O presente trabalho analisa a pintura de Peter Paul Rubens – considerando como

caso para estudo a pintura “O Rapto das Filhas de Leucipo” -, baseando-se nos

conceitos, nas peculiaridades, nos reflexos e nas semelhanças com um processo de

design. A abordagem metodológica utilizada foi à avaliação qualitativa e os métodos

de analise da obra (Estruturalista, Sociológico, Iconológico e Formalista) para

pesquisar os aspectos formais e técnicos. O presente trabalho contextualiza esta

obra, assim como o estudo dos princípios universais e dos elementos estruturais do

seu desenho e compara o processo de design empregado por Rubens, com o

processo proposto por Gui Bonsiepe em seu livro Metodologia Experimental.

Palavras-chave: elementos do design, desenho artístico, desenho de produto, obra

de Rubens.

Page 7: ANÁLISE DOS PRINCÍPIOS DO PROCESSO DE DESIGN DA …biblioteca.uniritter.edu.br/imagens/035UNR89/0000B6/0000B66F.pdf · 2 paulo alario d´avila anÁlise dos princÍpios do processo

7

ABSTRACT

The present study analyzes the painting by Peter Paul Rubens - as a case study

considering the painting "The Rape of the Daughters of Leucippus" - based on the

concepts, the peculiarities, reflexes and the similarities with the design process. The

methodological approach was qualitative evaluation and analysis methods of work

(Structuralist, Sociological, Iconological and Formalist) to search formal and technical

aspects. This paper contextualizes this work, as well as the study of universal

principles and structural elements of its design and compares the design process

employed by Rubens, with the process proposed by Gui Bonsiepe in his book

Experimental Methodology.

Keywords: design elements, artistic drawing, product design, Rubens’ work.

Page 8: ANÁLISE DOS PRINCÍPIOS DO PROCESSO DE DESIGN DA …biblioteca.uniritter.edu.br/imagens/035UNR89/0000B6/0000B66F.pdf · 2 paulo alario d´avila anÁlise dos princÍpios do processo

8

Sumário

RESUMO......................................................................................................................6

ABSTRACT..................................................................................................................7

Lista de Figuras............................................................................................................9

Lista de Obras............................................................................................................10

INTRODUÇÃO...........................................................................................................11

2 CONCEITOS EM DESIGN......................................................................................12

2.1 Desenho e Produto-Aspectos históricos......................................................16

2.2 Design...............................................................................................................17

2.3 Desenho............................................................................................................19

2.4 Poduto..............................................................................................................20

2.5 Projeto..............................................................................................................21

2.6 Linguagem Visual............................................................................................21

2.7 Produção..........................................................................................................22

2.8 Processo de design.........................................................................................23

3 ASPECTOS HISTÓRICOS......................................................................................26

3.1 Rubens, o barroco e o contexto europeu.....................................................26

3.2 Origens de Peter Paul Rubens.......................................................................27

3.3 A Obra de Rubens...........................................................................................29

4 MÉTODOS DA ANÁLISE DE UMA OBRA DE ARTE.............................................38

4.1Elemetos Universais do Desenho...................................................................47

4.2 Elementos Estruturais....................................................................................50

4.2.1 Superfície.......................................................................................................50

4.2.2 A linha.............................................................................................................51

4.3 Elementos Dinâmicos.....................................................................................56

4.3.1 Volume...........................................................................................................57

4.3.2 Cor..................................................................................................................58

4.3.3 Luz..................................................................................................................61

5 CONCLUSÃO.........................................................................................................62

REFERÊNCIAS................................................... ......................................................65

Page 9: ANÁLISE DOS PRINCÍPIOS DO PROCESSO DE DESIGN DA …biblioteca.uniritter.edu.br/imagens/035UNR89/0000B6/0000B66F.pdf · 2 paulo alario d´avila anÁlise dos princÍpios do processo

9

Lista de Figuras

Figura 1- Metodologia Projetual de Gui Bonsiepe.............................................24

Figura 2 - Simulação do processo de Design desenvolvido por Rubens.......42-4

Figura 3 – Demonstrativo do Processo de Design Rubeniano em relação a Metodologia Projetual de Gui Bonsiepe............................................................45

Figura 4 – Detalhes dos Rostos........................................................................48

Figura 5 – Vestimentas em cor vermelha..........................................................49

Figura 6 – Linhas horizontais............................................................................53

Figura 7 – Linhas verticais................................................................................54

Figura 8 – Linhas curvas...................................................................................55

Figura 9 – Linhas diagonais..............................................................................56

Figura 10 – Torso..............................................................................................57

Figura 11– Aplicação das cores........................................................................60

Page 10: ANÁLISE DOS PRINCÍPIOS DO PROCESSO DE DESIGN DA …biblioteca.uniritter.edu.br/imagens/035UNR89/0000B6/0000B66F.pdf · 2 paulo alario d´avila anÁlise dos princÍpios do processo

10

Lista de Obras

Obra 1 – O rapto das filhas de Leucipo (1616-1619) ............................................... 14

Obra 2 – Retrato equestre do Duque de Lerma (1603) ............................................. 28

Obra 3 – Uma dança Camponesa (1636-1640) ....................................................... 30

Obra 4 – A fuga para o Egito (1614) ........................................................................ 31

Obra 5 – Encargo de Cristo a Pedro (1614) ............................................................. 31

Obra 6 – Detalhe de A chegada de Maria de Médici, em Marselha (1622-1625) ..... 32

Obra 7 – Levantamento da Cruz (1610) ................................................................... 33

Obra 8 – Deposição (1612) ...................................................................................... 34

Obra 9 – Rapto das Filhas de Leucipo (1616-1619) ................................................. 35

Obra 10 – Paisagem com arco-íris (1635-1640) ...................................................... 36

Page 11: ANÁLISE DOS PRINCÍPIOS DO PROCESSO DE DESIGN DA …biblioteca.uniritter.edu.br/imagens/035UNR89/0000B6/0000B66F.pdf · 2 paulo alario d´avila anÁlise dos princÍpios do processo

11

INTRODUÇÃO

O design é uma atividade técnica que tem como um de seus objetivos

elaborar e configurar um produto. Qualquer que seja a representação da sua forma

deverá comunicar a intenção do criador ao usuário. Este processo é que torna um

desenho em produto, para isto o desenhador transforma a realidade que se lhe

apresenta. Nesse processo ocorre a substituição das formas existentes da natureza,

conforme refere Ostrower,(2004,p.314): “Neste sentido, ao dar forma à imagem, o

artista é obrigado a deformar, por necessidade, substituirá as formas existentes na

natureza e seus contextos, por outras “formas humanas,” por assim dizer”. O

processo se concretiza na medida em que a obra sensibiliza e desperta reação

positiva ou negativa no apreciador. O desenho invade os mais variados campos e

áreas de atuação, uma vez que é utilizado nos mais diferentes segmentos

profissionais e em diversos contextos. O desenho é elemento básico e estruturante

de uma obra ou produto, representando graficamente forma e conteúdo. Está

presente na história da humanidade desde tempos imemoriais conforme ensina

Ferreira:

Se retrocedermos no tempo, verificaremos que o homem, desde

remota existência, já se utilizava do desenho como um dos seus

processos de domínio do mundo concreto, ou seja, “dar formas às

coisas”, O processo em si de dar formas às coisas não mudou muito,

pois aquilo que agora é diferente se deve ao mundo como são

produzidos. O que no começo era pedra transformou-se com o

passar dos anos, em bronze, em ferro e em aço. O produto da

criação sensível do pensamento toma forma e se expressa de

diferentes maneiras, através da pintura, escultura, gravura, do

desenho etc conforme materiais e técnicas utilizadas. (FERREIRA,

1980, p.25)

O ser humano, em certo momento de sua existência, para dar

prosseguimento a sua evolução necessitou sair do estado primitivo. Gombrich (1972,

p.20) observa esse “estado primitivo” não porque o ser humano era mais simples do

que nós1 na atualidade mas por que estavam mais próximos do estado donde, em

dado momento, emergiu toda a humanidade.

1 Os seus processos de pensamentos são, com frequência, mais complicados do que os nossos.

Page 12: ANÁLISE DOS PRINCÍPIOS DO PROCESSO DE DESIGN DA …biblioteca.uniritter.edu.br/imagens/035UNR89/0000B6/0000B66F.pdf · 2 paulo alario d´avila anÁlise dos princÍpios do processo

12

O homem buscou caminhos, inicialmente através de ações espontâneas,

para satisfazer as suas próprias necessidades. Assim, construiu abrigos, cobriu o

seu corpo com vestimentas, elaborou suas armas. O fato da descoberta do fogo

alterou totalmente a sua vida, além de modificar a forma de alimentação e,

consequentemente, o seu metabolismo, estrutura corpórea e química orgânica. O

uso do fogo propiciou ainda o início da era do metal. Gradativamente o homem

começou a registrar as suas experiências. Inicialmente o fez de forma incipiente e

rudimentar, mas aos pouco foi qualificando os esse registros, primeiramente

executados em cavernas e terrenos ao ar livre. Conforme passava o tempo os

desenhos adquiriram formas e novas funções, tornando-se uma fonte de

comunicação entre os homens, tão importante com a própria escrita, conforme

Azevedo (1998, p.8), “ O design surge no mundo quando o homem começa a fazer

suas primeiras ferramentas, e o designer na medida em que continua a lidar com

as ferramentas”; naquele momento o homem buscava detalhar mais os seus

desenhos, ainda que estivessem ausentes as noções de perspectiva e movimento.

Somente na era medieval o desenho ganha um novo elemento que revoluciona a

percepção da imagem através do surgimento da perspectiva, definida como a

representação tridimensional (altura, largura, comprimento) numa superfície plana. A

perspectiva destaca o lugar ocupado pelo observador, denominado de ponto de

vista (PV) e o ponto para onde as linhas convergem no infinito, denominado de

ponto de fuga (PF).

Quando o desenho passou a ser feito em telas de madeira e papiro e,

posteriormente, em papel, foi-lhe possibilitado ser visto por um número maior de

pessoas, tanto pela mobilidade quanto possibilidades de exposição. As informações

foram disseminadas e o conhecimento individual passava a ser coletivo pela

possibilidade de deslocamento. Este desenho trazia uma proposta inovadora não só

nas formas, cores, proporções e medidas, mas sugeria também o comportamento da

sociedade naquele momento, mostrando um mundo novo resumido num espaço

determinado. Inicialmente, não havia a intencionalidade de regras ou fórmulas na

feitura de um desenho. Os créditos de sistematização devem-se aos artistas que,

aos poucos, foram registrando e desenhando, representando em seus trabalhos o

desenvolvimento social e político de sua época, ao mesmo tempo que entendiam e

consagravam a melhor técnica para realizar esse feito. Desta maneira nas obras dos

artistas renascentistas e barrocos, o espectador passou a fazer parte do desenho,

Page 13: ANÁLISE DOS PRINCÍPIOS DO PROCESSO DE DESIGN DA …biblioteca.uniritter.edu.br/imagens/035UNR89/0000B6/0000B66F.pdf · 2 paulo alario d´avila anÁlise dos princÍpios do processo

13

através da forte e intensa comunicação desses dois estilos. O que se segue em

termos de desenho passa obrigatoriamente pelos elementos como volumes, planos,

sombras, luzes, planos, linhas, cores - fatores estes que embasaram a história do

desenho. Deste momento em diante, o homem historicamente fez a síntese de sua

trajetória de vida, registrando o seu conhecimento, com talento e criatividade através

da expressão gráfica, alinhando-a gradativamente a um processo de design e,

consequentemente, aos estágios de um projeto. O presente estudo, sob o título de

ANÁLISE DOS PRINCÍPIOS DO PROCESSO DE DESIGN DA PINTURA DE

PETER PAUL RUBENS: O CASO DA OBRA “O RAPTO DAS FILHAS DE LEUCIPO”

visa destacar, entre outras variáveis, essa forma de comunicar uma ideia através da

utilização de todos esses elementos. A obra especificada será identificada neste

trabalho como decorrente de um projeto em design, sendo seu estudo analisado e

apresentado nos capítulos que se seguem, a saber: o capítulo dois será dedicado

aos conceitos em design; o capitulo três levanta o referencial teórico considerando

os aspectos históricos do autor e da sua obra e o capítulo quatro aborda a

metodologia para análise do estudo de caso e os aspectos gerais do desenho.

A escolha do tema está embasada em quatro fatores: o talento do artista, a

sua importância no barroco, o seu profundo conhecimento de arte e a forma de

produção suas obras, criando um processo de design inovador.

O quadro “O Rapto das filhas de Leucípo” é uma pintura que data de 1618,

tendo sido escolhido entre o vasto acervo da obra de Peter Paul Rubens, por sua

intensidade dramática, vigor e características barrocas, além da representação

criativa da história mitológica nele contida:

Tudo é movimento e ação: os cavalos empinam e resfolegam, enquanto os

dois Dióscuros (filhos de Zeus) agarram suas presas. As contrastantes

superfícies de armadura, tecido, crina e carne feminina, em cada curva e

cada dobra perfeitamente descritas, dão ao quadro texturas

maravilhosamente tácteis. Rubens obteve neste quadro um equilíbrio de

simetria magnífica. A esmaecida carne branca das mulheres,

cuidadosamente destacadas no quadro, forma uma massa de luz ao centro,

enquanto as duas figuras masculinas e seus cavalos, cada qual seguro por

um putto (criança nua na arte renascentista), formam massas mais escuras

a cada lado das mulheres. (ANDERSON, 1997, p.30).

Page 14: ANÁLISE DOS PRINCÍPIOS DO PROCESSO DE DESIGN DA …biblioteca.uniritter.edu.br/imagens/035UNR89/0000B6/0000B66F.pdf · 2 paulo alario d´avila anÁlise dos princÍpios do processo

14

Nesta obra fica definitivamente caracterizada a sensualidade, marcada por

traços vigorosos e o contorno exuberante dos corpos femininos, o que caracterizara

suas composições mitológicas. O quadro contém, em sua configuração, princípios

universais desenho e elementos estruturantes os quais serão objeto de estudo, a

seguir.

Obra 1 – O rapto das filhas de Leucipo (1616-1619)

Fonte: ANDERSON, 1997, p.31.

Sensualidade, dramatização e técnica são componentes que caracterizam o

estilo barroco. Monterado (1968, p.192) diz que “a arte barroca representa o

momento mais harmônico das atividades artísticas europeias. Todos os povos

concentram para a obra comum, trocam-se mestres e teorias.”

É ainda o autor quem afirma que

Page 15: ANÁLISE DOS PRINCÍPIOS DO PROCESSO DE DESIGN DA …biblioteca.uniritter.edu.br/imagens/035UNR89/0000B6/0000B66F.pdf · 2 paulo alario d´avila anÁlise dos princÍpios do processo

15

A obra de Rubens constitui o mais vasto mundo de forma que um pintor já

criou. Um quadro dele é uma sucessão de movimentos, que atravessam o

espaço entoam o espaço em torvelinho, prolongado o ímpeto além da

moldura. Trata-se de típica composição barroca, como um instantâneo

colhido no tumulto da vida (MONTERADO, 1968, p.196).

Na obra em análise, é representada a lenda de dois irmãos: Castor e Pólux,

filhos de Zeus, também conhecidos como Dióscuros, que crescem juntos, nutrindo

grande afeto um pelo outro. Os dois entram em combate com os irmãos gêmeos

messênios Idas e Liceu ao tentarem raptar as filhas de Leucipo, Hilária e Febe, de

quem são noivos. Conta a lenda que no combate Idas desfere golpe de lança fatal

matando Castor. Pólux suplica a Zeus que devolva a vida ao irmão que lhes propõe

que a solução seria que os dois irmãos compartilhassem a mesma vida, alternando-

se um dia de vida e outro de morte para cada um deles o que foi aceito. Tamanha

prova de amor fraternal motivou a Zeus a celebrá-la na Constelação de Gêmeos,

onde não poderiam mais ser separados nem pela morte (BULFINCH, 2002, p.186 s).

A compreensão da lenda remete ao entendimento do quadro, que por sua

vez, revela o seu conteúdo sob a visão rubeniana, através da sua técnica inovadora

para a época.

Uma obra de arte pode suscitar as mais diversas reações, mas é

medianamente compreensível que as características técnicas escapem aos

apreciadores não iniciados. O presente estudo, inicialmente, propõe-se a apresentar

os princípios universais do desenho, bem como os elementos do desenho como

forma de viabilizar uma maior compreensão da obra. Assim, o estudo torna-se

elemento que permite que iniciados e leigos compreendam melhor os recursos e

inovações que o artista utilizou para expressar o momento auge do conflito descrito

na lenda. Da sua técnica, não apenas surgiu uma obra, como também foram

empregados princípios de uma nova escola de arte, o que este trabalho tem a visão

de destacar.

Nesse sentido, Ostrower (2004) refere-se de forma inspiradora sobre a

concepção de arte. A autora, entre outros temas, descreve seu encontro com um

grupo de operários para os quais apresentar o mundo das artes, mostrando e

explicando-lhes os elementos que compõem um desenho. Essa experiência,

segundo a autora, permitiu que aquele grupo de pessoas ficasse mais receptivo,

Page 16: ANÁLISE DOS PRINCÍPIOS DO PROCESSO DE DESIGN DA …biblioteca.uniritter.edu.br/imagens/035UNR89/0000B6/0000B66F.pdf · 2 paulo alario d´avila anÁlise dos princÍpios do processo

16

mais sensibilizado, acrescentando-lhe um componente de inserção subjetivo pela

proximidade com “a linguagem” utilizada na obra de arte e, de sua aceitação ou não.

Semelhante inspiração toma esse trabalho em relação ao quadro de Rubens que

será o objeto da análise, na perspectiva de apresentar os recursos inovadores dos

quais fez uso e que se tornaram característicos do barroco.

Aliando os conteúdos sobre os elementos do desenho, pode-se avançar na

análise da obra como um produto, resultante de um processo de design impetrado

pelo artista. É Rubens quem, talvez pioneiramente, sentiu a necessidade de produzir

obras de arte e viver da respectiva comercialização desta forma, tornando-a um

produto para mercado. O mesmo tornou tal situação tão caracterizada que, nos

últimos anos de sua vida, através de seu atelier e grupo de artistas, produziu mais

de dois mil quadros, destacando o seu nome entre os mais produtivos da história

das artes.

2 CONCEITOS EM DESIGN

Não é possível conhecer temas específicos sem familiarizar-se com os

conceitos básicos do referido conteúdo. Assim, na sequência serem identificados

alguns conceitos que permitirão o entendimento dos vocábulos no sentido que aqui

são referidos e pelos quais são entendidos no universo do tema em pauta. Não terão

uma abordagem exaustiva, mas a adequada ao estudo realizado.

2.1 Desenho e Produto- Aspectos históricos

Por volta de 1750 da era cristã, na Inglaterra, eclodiu a primeira Revolução

Industrial, motivada por fatores sociais, tecnológicos, culturais, ideológicos, alterando

definitivamente a história da humanidade (VICENTINO, 2009, p.288 et seq.). Estes

acontecimentos históricos obrigavam o homem a ter um novo olhar sobre o mundo,

criar novas bases sobre a lógica da sua época. A economia feudal da Idade Média,

baseada na agricultura, foi substituída por uma economia de produção industrial. A

energia física do trabalhador passou a ser utilizada na automação. As ferramentas

foram trocadas pelas máquinas. Desta forma, houve uma aceleração na produção,

pois o que era artesanal passou a ser confeccionado em linha de montagem

Page 17: ANÁLISE DOS PRINCÍPIOS DO PROCESSO DE DESIGN DA …biblioteca.uniritter.edu.br/imagens/035UNR89/0000B6/0000B66F.pdf · 2 paulo alario d´avila anÁlise dos princÍpios do processo

17

industrial, visando agilidade e menor custo. Ao apagar das luzes do século XIX e

início do século XX a necessidade de distinguir-se a forma e os traços plásticos dos

produtos tornou-se um fator primordial. Neste contexto o ”design”, adquire uma nova

conotação, era necessário responder as demandas da indústria. Observa-se que a

transformação da época medieval para moderna, se dá na consciência humana,

resultando na grande revolução intelectual iniciada no século XV, consolidando-se

no século XVIII, através dos grandes pensadores, cientistas e artistas, responsáveis

pela superação do saber teórico e científico ao prático.

2.2 Design

Design é um tema complexo que por si só exige um grau de afinidade para se

dar a conhecer. O conceito de design remete a ideia de projeto mas também a

complexidade das formas, cores e inserção no mundo das comunicações entre

indivíduos, ganhando conotações utilitárias, comerciais e artísticas, entre outras

variáveis.

Design é um projeto elaborado com um fim determinado. É uma produção

gráfica com caráter técnico, cientifico e artístico com o objetivo de configurar um

produto. Ensina Montenegro que

possui os sentidos de designar, indicar, representar, marcar, ordenar,

dispor, regular; pode significar invento, PLANEJAMENTO, PROJETO,

CONFIGURAÇÃO, se diferenciando da palavra drawing (desenho); indica

ainda disciplina de caráter INDISCIPLINAR, de natureza abrangente e

flexível, passível de diferentes interpretações. (MONTENEGRO, 2008,

p.187)

Design, afirmou Löbach (2001. p.13), “é o processo de adaptação do

Ambiente ‘artificial’ às necessidades físicas e psíquicas dos homens na sociedade.”

Conforme esta afirmação entende-se que o design é um meio de resolver os

problemas humanos, adaptando e atendendo às relações e necessidades do

homem.

Page 18: ANÁLISE DOS PRINCÍPIOS DO PROCESSO DE DESIGN DA …biblioteca.uniritter.edu.br/imagens/035UNR89/0000B6/0000B66F.pdf · 2 paulo alario d´avila anÁlise dos princÍpios do processo

18

Deane (1975, passim), atribui aos desenhadores - tanto nas civilizações

clássicas, como os renascentistas, barrocos, das fases da industrialização até os

nossos dias, a comunicação de suas ideias, materializadas em suas obras. Este

parece ser é o princípio básico do desenho que persiste, não importando a época ou

forma, mas sim o conteúdo que o artista quer comunicar. O resultado desta ação

intelectual pode-se chamar de produto e qualquer que seja, tanto artístico como

técnico, estrutura-se no mesmo princípio de satisfazer o homem dentro de sua

proposta de vida. Nesse sentido observa-se que autores como Miguel Ângelo,

Rubens, Walter, William Morris materializaram suas ideias, traçando os limites que

são essenciais para a percepção da forma.

É Löbach quem evidencia que o design é uma ideia expressa em

“,um projeto ou um plano para a solução de um problema determinado. O

design consistiria então na corporificação desta ideia para, com a ajuda dos

meios correspondentes, permitir a sua transmissão aos outros. Já que

nossa linguagem não é suficiente para tal, a confecção de croqui, projetos,

amostras, modelos constitui o meio de tornar visualmente perceptível a

solução de um problema”. (LÖBACH, 2001.p.16).

O design é uma forma obtida através da idealização, concepção ou

configuração de alguma coisa criada com um uso direcionado. É uma ação

estratégica que muitas vezes mescla a técnica e a arte. É uma produção gráfica com

caráter técnico, cientifico e artístico para configurar um produto. O termo em inglês

design é de origem latina designo.

O processo de design comunica visualmente utilizando imagens e textos, esta

ação envolve inúmeras habilidades como a criação de imagens e formas, pelas

quais se geram produtos. O design existe desde que o homem pintou em cavernas

em pedras pela primeiramente vez, até os dias da hoje globalmente. Este processo

a partir da Revolução Industrial, conta com fatores técnicos e estéticos para

estabelecer os parâmetros sociais, pelo os quais definem uma finalidade real e

especifica para o uso pelo ser humano, buscando atender necessidades visando o

bem estar e conforto individual ou coletivo. Neste contexto,

Considerando a diversificação das possibilidades de atuação (com a

ampliação do campo- lighting design, design de moda, design de joia são

Page 19: ANÁLISE DOS PRINCÍPIOS DO PROCESSO DE DESIGN DA …biblioteca.uniritter.edu.br/imagens/035UNR89/0000B6/0000B66F.pdf · 2 paulo alario d´avila anÁlise dos princÍpios do processo

19

alguns exemplos) e ainda sua natureza interdisciplinar, podemos dizer que

o design possui vários papeis e funções, e se constitui como um leque de

atividades que exigem interação, interlocução e parceria com vários sujeitos

e sua visão de mundo. (MONTENEGRO, 2008, p.188)

Conforme a citação pode-se dizer que inúmeros objetos podem ser

projetados e produzidos em nome de mais conforto para a vida atual, desta forma

observa-se que o design esta presente em inúmeras ações, exercendo uma

importância vital no mundo de hoje.

Cabe salientar que o design é também uma profissão, cujo profissional é o

designer, responsável e especialista em projetar um determinado tipo de coisa.

Atualmente as especializações mais comuns são o design de produto, design visual,

design de moda e o design de interiores.

2.3 Desenho

O desenho é uma manifestação gráfica elaborada por um desenhador, a qual

ele apresenta segundo a sua própria visão da realidade. Pode ser conceituado

como:

Representação/interpretação de temas concretos ou abstrato (do mundo

material e mental dos homens) por meios de formas, linhas, pontos e

manchas. Ato de gravar imagens em algum tipo de suporte, superfície,

utilizando objetos, instrumentos, ferramentas e/ou partes do corpo humano,

através de movimentos articulados projetado em um plano (real ou virtual)

que tornam visível uma totalidade espacial com um determinado

equilíbrio.[...]Essas representações/imagens podem se dar por objetos

diversos(artístico, lúdicos, científicos, técnicos, terapêuticos etc.), e

possuem forma e conteúdo expressivos, determinados pelo caráter,

dinâmico ou estético, do movimento visual articulado no espaço

(MONTENEGRO, 2008, p.28).

Estes registros foram surgindo naturalmente de acordo com as finalidades

almejadas. Estudiosa da arte, OSTROWER (2004, p. 53) refere que, “a linguagem

visual é algo surpreendente, que há muitos vocábulos e elementos expressivos

capazes de compor o processo artístico através das linguagens visuais: a linha, a

Page 20: ANÁLISE DOS PRINCÍPIOS DO PROCESSO DE DESIGN DA …biblioteca.uniritter.edu.br/imagens/035UNR89/0000B6/0000B66F.pdf · 2 paulo alario d´avila anÁlise dos princÍpios do processo

20

superfície, o volume, a luz a cor”. Afirma que estes elementos se diluem no todo da

obra, criando assim uma composição artística.

2.4 Produto

Produto é o fruto de um projeto o qual resultou em uma forma final de

material ou gráfico visual. O seu êxito está relacionado com a utilidade, identidade e

facilidade de compreensão. Nele deverão estar contidas informações do tempo

presente e passado e o motivo de sua inclusão no cotidiano, bem como as suas

aspirações futuras como produto. É importante ter-se a dimensão do que irá se

originar, saber-se quais as aspirações e expectativas dos futuros usuários em

relação ao mesmo. Conforme MARCHI (2009), a criação de um objeto é feita para

cumprir uma necessidade funcional. Para o autor “fazer design é humanizar, ter

habilidades de traduzir a realidade, resgatar, valores tradicionais e resenhar o novo.

É trabalhar sobre a história: presente, passado e futuro”.

Como exemplo de

produtos podemos ter: carros, cadeiras, canetas, estação de trabalho,

programas de computador, todos destinados ao uso direto. Como produtos

de comunicação visual, ou de uso indireto, podemos ter com exemplos:

cartazes, folhetos, revistas, livros, embalagem, sinalização, identidade

corporativa, sites na internet. Como exemplos de ação em design, podemos

ter: participação em atividade comunitária, sistema organizacional de

empresa, imagem institucional (FARBIARZ, 2008, p.137).

Os produtos de design industrializados e tecnológicos, assim como os

produtos artesanais produzidos de forma não industrializadas, têm o objetivo de

chegar ao consumidor. Conforme Coelho (2008), na configuração de um produto, a

questão da presença da tecnologia não é determinante para a sua classificação,

pois produtos artesanais podem ser produzidos em larga escala para produção

industrial. Também a materialidade não é determinante para a classificação dos

mesmos, visto que, entre os produtos de consumos, além dos concretos, palpáveis e

de uso, existem os de consumo visual. Entende o autor que “a qualidade que

configura um produto de design é a sua possibilidade de consumo por um

determinado público, a partir de seu desenvolvimento enquanto projeto de design”.

Page 21: ANÁLISE DOS PRINCÍPIOS DO PROCESSO DE DESIGN DA …biblioteca.uniritter.edu.br/imagens/035UNR89/0000B6/0000B66F.pdf · 2 paulo alario d´avila anÁlise dos princÍpios do processo

21

2.5 Projeto

Um projeto, via de regra, prevê a realização de um determinado serviço, a

obtenção de determinado resultado ou criação de um produto. Dessa maneira,

implica em um espaço de tempo, com previsão de início e término. Essa mesma

previsão remete a necessidade ou existência de um planejamento, execução e

controle. Esses elementos são apontados, entre outros, pela guia PMBOK (Project

Management Body of Knowledge) do Project Management Institute, 2008.

Projeto, em relação ao tema deste estudo, implica no reconhecimento dos

elementos e especificações das partes de um objeto a ser desenhado. Pode ser

definido como:

Conjunto de definições necessárias à execução de qualquer coisa, seja um

objeto, seja um imóvel, ou até um intangível. Definindo também por sua

distinção daquilo a ser executado, por precedê-lo, a noção de projeto se

delineia e se intensifica a partir da dissociação entre pensamento e

realização, advinda dos primeiros momentos da Revolução Industrial e

intensificada durante o século XVIII (LEITE, 2008, p.271).

É ainda Leite quem ensina que em relação à noção de projeto

implica seu reconhecimento simultâneo como um processo e como um

resultado. Embora proceda a realização da coisa a que se refere, ao

mesmo tempo à noção de projeto se confunde com a própria coisa. É tão

possível reconhecer um projeto no conjunto de desenhos e especificações

que originam a execução de um objeto, como, esse mesmo objeto, poder se

referir a seu projeto como o conjunto das relações formais e funcionais ali

evidentes( LEITE, 2008, p.272).

2.6 Linguagem visual

A linguagem visual resulta da combinação dos elementos de um desenho que

se comunicam visualmente gerando uma forma e um significado.

Page 22: ANÁLISE DOS PRINCÍPIOS DO PROCESSO DE DESIGN DA …biblioteca.uniritter.edu.br/imagens/035UNR89/0000B6/0000B66F.pdf · 2 paulo alario d´avila anÁlise dos princÍpios do processo

22

Uma imagem quando criada traz em sua configuração uma ideia expressa.

Tanto quanto as ideias verbalizadas elas podem ser visualizadas formando “seu

conceito num contexto espacial, não linear”. Uma pintura ou uma planta

arquitetônica exemplificam a linguagem, que neste caso, é explicitada com a linha,

forma, cor, proporção, escala ângulos, espaço entre outros variáveis que compõem

os elementos da arte e dos princípios do design.

Segundo Dondis, “as técnicas de configuração ou manipulação dos elementos

visuais são os agentes no processo de comunicação visual; é através de suas

energias que o caráter de uma solução visual adquire forma” (DONDIS, 2000,p.24).

No design e nas artes os elementos que configuram um desenho representam

o conteúdo deste objeto variando a sua percepção e uso de acordo com o tempo e

situação social que estão inseridas. Ao executar uma obra o design deverá dispor

suas ideias de forma clara, compreensível e organizada. Desta forma entende-se

que a Linguagem Visual é constituída por símbolos gráficos que geram sentimentos

em quem observa a imagem criada pelo projetista.

2.7 Produção

O termo produção indica a existência de alguma coisa que foi criada ou

gerada. A palavra deriva-se do latim “producere” que significa “fazer aparecer.” É a

atuação do homem sobre a natureza, obtendo-se através de um processo produtivo

um produto, com a finalidade de satisfazer as necessidades dos homens. Esta

atividade profissional inventa, imagina ou configura um objeto, a ser executado.

Ao produzir uma forma organizada, confronta-se com uma questão: se o

seu trabalho é original ou se ele compartilha a mesma forma com as

demais do seu gênero. Esta questão é relevante para o designer, pois na

sociedade industrial a estagnação é uma verdade recorrente, isto é, o

desenho dos objetos volta-se mais para a padronização, reduzindo a forma

dos objetos ao mesmo gênero, a um só tipo ou espécie, unificado e

simplificado, um padrão ou modelo preestabelecido (CIPINIUK, 2008,

p.105).

Segundo Coelho (2008), na sociedade contemporânea a produção é

suplantada por uma questão maior que é a cultura da sociedade contemporânea que

Page 23: ANÁLISE DOS PRINCÍPIOS DO PROCESSO DE DESIGN DA …biblioteca.uniritter.edu.br/imagens/035UNR89/0000B6/0000B66F.pdf · 2 paulo alario d´avila anÁlise dos princÍpios do processo

23

tende a incluir tudo em modelos consagrado, excluindo a variedade. Portanto o

desenhador deverá buscar em suas invenções ou apenas realizar o projeto de suas

obras buscando a individualidade. Observa-se que na história da humanidade as

formas mais bem sucedidas são frutos de cruzamentos múltiplos através de um jogo

de ambivalência, que tem como objetivo principal atender ao público.

2.8 Processo do design

Observa-se que os objetos que nos cercam, criados pelo homem como as

roupas, os elétricos domésticos, as embalagens etc. para chegarem aos usuários,

foram precedido por um processo de design. Forty (2007, p.12) diz que design na

linguagem cotidiana tem dois significados: um se refere à aparência das coisas e o

outro a preparação para produção industrial, porém seria equivoco seguir tratando

os dois conceitos separados, a palavra transmite os dois significados, pois “a

aparência das coisas é, no sentido mais amplo, uma consequência das condições

de sua produção.” Neste sentido, afirma o autor:

O design torna-se necessário como uma atividade separada da produção

assim que um único artífice deixa de ser responsável por todos os estágios

da manufatura, da concepção à venda. Em muitas indústrias, essa mudança

organizacional ocorreu no século XVIII; em poucas atividades se podem ver

de modo tão claro o surgimento do design especialista e a importância

atribuída ao seu trabalho como na produção da cerâmica de Josiah

Wedgwood. Embora não tenha sido o primeiro mestre ceramista a distinguir

entre as tarefas de projetar vasos e de fazê-los, ele atribuía mais valor ao

trabalho dos designers do que outros fabricantes. (FORTY, 2007, p.48)

Tomaremos o exemplo do processo de design do ceramista inglês Josiah

Wedgwood (1730 a 1795), que pioneiramente transformou a arte manual da

execução de sua cerâmica em uma pequena indústria. A marca Josiah Wedgwood

and Sons, ainda hoje é uma das marcas inglesas mais conhecidas do mundo.

Observa-se que Josiah tinha a intenção de ter sucesso e lucro em sua atividade

profissional; para isto necessitava produzir e vender mais, aumentando o lucro

unitário. Desta forma estruturou suas ideias em três condições para obter o sucesso

pretendido: a) a venda por encomenda, criando vitrines com suas obras e

posteriormente mostruários e catálogos, evitando mobilização de grande capital em

seu negocio, b) a uniformidade dos produtos e fidelidade com as peças que

apresentava em seus mostruários. Para atender esta demanda houve a necessidade

Page 24: ANÁLISE DOS PRINCÍPIOS DO PROCESSO DE DESIGN DA …biblioteca.uniritter.edu.br/imagens/035UNR89/0000B6/0000B66F.pdf · 2 paulo alario d´avila anÁlise dos princÍpios do processo

24

criação de novas tecnologias, principalmente na uniformidade da cor da cerâmica e

desenhos e ornamentos. c) A requalificação dos homens com a divisão do trabalho

em mais estágios. Ensinar os funcionários a aumentar o seu padrão de qualidade

controlada por supervisores.

O modelo de Gui Bonsiepe oportuniza visualizar estágios e/ou etapas de um

projeto sobre o qual nos debruçaremos a seguir.

Figura 1 – Metodologia Projetual de Gui Bonsiepe

PROBLEMATIZAÇÃO

ANÁLISE

DEFINIÇÃO DO PROBLEMA

ANTEPROJETO GERAÇÃO DE ALTERNATIVAS

PROJETO

Fonte Gui Bonsiepe , 1984 .pag.35

Page 25: ANÁLISE DOS PRINCÍPIOS DO PROCESSO DE DESIGN DA …biblioteca.uniritter.edu.br/imagens/035UNR89/0000B6/0000B66F.pdf · 2 paulo alario d´avila anÁlise dos princÍpios do processo

25

A Metodologia Projetual, afirma Bonsiepe (1984, p. 35) não deve ser vista

como uma receita acabada, que chega a um determinado resultado, mas como uma

técnica que tem certa “probabilidade de sucesso”[...]“cuja melhor maneira de

assimilar seus conhecimentos, é através da execução concreta de exercícios”.

A concepção de processo que norteia o autor se apoia na visão básica:

situação inicial (entrada), processo de transformação (“caixa preta”) e situação final

(saída).

Na Fase Problematização identifica-se a situação ou coisa que deve ser

melhorada, os fatores essenciais e influentes do problema. Na Fase Análise ocorrem

a) Análise Sincrônica (“serve para reconhecer o “universo” do produto e evitar

reinvenções. A comparação e a crítica dos produtos requer a formulação de critérios

comuns, sendo conveniente incluir informações sobre preço, materiais e processo

de fabricação”), b) Análise Diacrônica (“o registro histórico das mutações do produto

no transcurso do tempo”), c) Análise das características de uso do produto

(“detectando pontos negativos e criticáveis, documentando fotograficamente os

detalhes problemáticos”) d) Análise Funcional (“reconhecer e compreender as

características de uso do produto, incluindo aspectos ergonômicos (macro análise) e

as funções técnico-físicas de cada componente ou subsistema do

produto(microanálise”), e) Análise Estrutural (“serve para reconhecer e compreender

tipos e número de componentes, subsistemas, princípios de montagem, tipologia de

uniões e tipo de carcaça de um produto) e f) Análise Morfológica (“reconhecer e

compreender a estrutura formal (concepção formal) de um produto, sua composição,

elementos geométricos, e suas transições, informações obre acabamento cromático

e tratamento de superfície”) (BONSIEPE, 1984, p.34 et seq.).

Na Fase Definição de Problema o autor relaciona: a) a estruturação do

problema, listando os requisitos funcionais e os parâmetros condicionantes

(materiais, processos, preços) incluindo estimativa de tempo para as etapas e dos

recursos humanos necessários, estabelecendo prioridades (requisitos

incondicionais, desejáveis, opcionais..), b) determinação de “pesos” (hierarquização

através da elaboração de matriz de prioridades, indicando uma interação positiva,

neutra ou negativa), e c) formulação do projeto detalhado (BONSIEPE, 1984, p.43).

Na Fase Anteprojeto Geração de Alternativas Bonsiepe relaciona a)

brainstorming ortodoxo, b) brainstorming construtivo/destrutivo (“para filtrar os pontos

Page 26: ANÁLISE DOS PRINCÍPIOS DO PROCESSO DE DESIGN DA …biblioteca.uniritter.edu.br/imagens/035UNR89/0000B6/0000B66F.pdf · 2 paulo alario d´avila anÁlise dos princÍpios do processo

26

fracos da etapa anterior”) c) método 365 ( técnica que consiste em três propostas

feitas por participante, que são trocadas com os demais que acrescentam outra três

e assim sucessivamente até que todos os formulários iniciais tenham passado por

todos participantes), d) sinética (“busca de analogias, método de transformação”), ,

e) caixa morfológica (“técnicas heurísticas de buscas, serve para cobrir o universo

de possíveis soluções, através da combinação de componentes e subsistemas”) e f)

criação sistemática de variantes (“serve para cobrir o universo de possíveis

soluções, identificando princípios básicos combinando-os”) (BONSIEPE, 1984, p.44).

3 ASPECTOS HISTÓRICOS

A seguir apresenta-se breve histórico sobre a vida e obra de Rubens e sua

relação com o barroco. Distingue-se desse contexto no trabalho do autor, enquanto

projetista, a formulação e uso incipiente, ainda que de forma empírica, de conceitos

que redundarão em princípios universais do desenho.

3.1 Rubens, o barroco e o contexto europeu.

A origem da arte barroca iniciou no século XVI com os acontecimentos da

Rema Protestante que contestou a doutrina Católica, seguindo-se pelo século XVII,

caracterizado como o período das grandes mudanças da Idade Moderna. Fatos este

que se expandiram p o r muitos países da Europa e posteriormente na América. A

Igreja Católica, assim como o Protestantismo, mesmo sendo movimentos religiosos

também influenciaram a cultura europeia. Gombrich afirma

divisão da Europa num campo católico e outro protestante afetou até a arte

de pequenos países como a Holanda. A região meridional dos Países

Baixos, que hoje se chama Bélgica permaneceu católica, e vimos como

Ruben, em Antuérpia, recebeu inúmeras encomendas das igrejas, príncipes

e reis, para pintar grandes telas que glorificassem os seus poderios.

(GOMBRICH, 1972. P.325)

O barroco sofre influência das mudanças religiosas que aconteciam por toda

a Europa e países vizinhos. Eram contrários a doutrina católica os países

setentrionais como a Holanda, parte da Espanha, Alemanha e Inglaterra e

permaneciam sob influência católica a Itália e parte da Espanha. Desta forma, o

Page 27: ANÁLISE DOS PRINCÍPIOS DO PROCESSO DE DESIGN DA …biblioteca.uniritter.edu.br/imagens/035UNR89/0000B6/0000B66F.pdf · 2 paulo alario d´avila anÁlise dos princÍpios do processo

27

barroco adquire características diferentes nas diversas regiões Europeias. Na Itália

surge pela mãos de grandes artitas, onde pintores como Caravaggio, Tinttoreto e

Andréa Pozzo, introduziram nos seus quadros a luz como se vê, o fundo do quadro

escuro, expressividade e perspectiva de forma arrojada. Na Espanha pintores como

El Greco e Velázquez foram influenciados pelo barroco Italiano, principalmente no

uso da luz, mas tendo como características próprias o realismo e domínio da

técnica. Nos Países Baixos a pintura barroca dividiu-se em dois modos: a) na

Bélgica se caracteriza pela expressividade emocional e os movimentos dos

elementos dinâmicos do desenho; b) na Holanda o barroco apresenta cenas do

cotidiano da vida e do mundo do trabalho, com austeridade e simplicidade, porém

ricas em contrastes de luzes e sombras, penumbras, tons e meios-tons e

luminosidade. Ainda assim, há aspectos comuns às obras desse período: o

predomínio da emoção sobre a razão, luminosidade, contraste, movimentos e a

expressão dos sentimentos. Os temas são variados: religiosos, mitológicos,

bucólicos e retratos.

Estes fatos propiciaram o surgimento de pintores importantes para a história

da arte. Neste contexto, Rubens desenvolveu sua obra, a ponto de ser intitulado

“Príncipe dos Pintores” e “Pintor dos Príncipes”. Era Belga, teve uma formação

clássica, estudou a fundo os grandes mestres renascentistas Italianos visando

qualificar a sua pintura. Foi um pintor importante na Espanha e pintou tanto para

igreja Católica como para a Protestante e ainda realizou trabalhos para as cortes e

burguesia da Europa. Tornou-se um artista conhecido em toda a Europa trabalhando

com competência para as diversas culturas da época. (Anderson, 2005; Gombrich,

1972; Monterado, 1968).

3.2 Origens de Peter Paul Rubens

No ano de 1577, na cidade de Flamenga Siegen, na Vestfália, Alemanha,

nasce Rubens. Seu pai, Jan Rubens, mal visto por ser considerado um calvinista

tinha sido obrigado a deixar a Antuérpia católica - então sob o domínio da Espanha -

indo viver na Vestfália. Em 1587, com a morte de seu pai, sua mãe e os filhos

retornam a Antuérpia, local de origem da família, na Bélgica.

Page 28: ANÁLISE DOS PRINCÍPIOS DO PROCESSO DE DESIGN DA …biblioteca.uniritter.edu.br/imagens/035UNR89/0000B6/0000B66F.pdf · 2 paulo alario d´avila anÁlise dos princÍpios do processo

28

Peter Paul desde muito cedo demonstrava vocação pelas artes, tendo certeza

de sua futura profissão como pintor. Inicialmente, religioso desde muito cedo,

embasou sua arte em cenas religiosas, porém mais tarde retratou também obras

associadas a contrarreforma católica. Com 15 anos, tornou-se aprendiz de pintores

como Adam van Noort, Tobias Verhaeght - e, finalmente, Otto van Veen, que

exerceu grande influência sobre toda a sua obra. Por aconselhamento de Otto Van

Veen, foi à Itália conhecer e estudar pintura. Recebeu o titulo de Mestre pela

Corporação dos Pintores da Antuérpia: esta honraria o habilitava a exercer a

profissão de pintor. Com a encomenda do Cardeal da Áustria, deu inicio as pinturas

em igrejas e retratos da aristocracia e burguesia. Em 1600 chegou a Veneza, onde

teve o primeiro contato com a pintura dos grandes mestres renascentista italianos.

Após, foi para Mântua, tornando-se pintor da corte de Vincente Gonzaga – Duque de

Mântua. Este trabalho possibilitou-lhe estudar e aprimorar a sua arte em Florença,

Milão, Gênova e principalmente em Roma onde passou um bom tempo estudando

as pinturas de Michelangelo na Capela Sistina. Em 1603 foi para a Espanha em

Madri, como embaixador na corte de Filipe III. Rubens passou a viver na corte em

ambiente que favorecia o desenvolvimento de sua arte, iniciando as séries de

grandes encomendas de seus quadros. Para o primeiro-ministro Duque de Lerma,

pintou o famoso retrato equestre reproduzido na figura seguinte.

Obra 2 – Retrato equestre do Duque de Lerma (1603)

Fonte: ANDERSON, 1997, p.9

Page 29: ANÁLISE DOS PRINCÍPIOS DO PROCESSO DE DESIGN DA …biblioteca.uniritter.edu.br/imagens/035UNR89/0000B6/0000B66F.pdf · 2 paulo alario d´avila anÁlise dos princÍpios do processo

29

Assumiu o cargo de pintor da corte junto aos governantes espanhóis dos

Países Baixos, tornando-se amigo da Arquiduquesa Isabel - filha de Filipe II da

Espanha, a única regente dos Países Baixos e mecenas do artista. Nesta ocasião

casou-se com Isabel de Brant, a primera esposa de Peter Paul Rubens. Ela era filha

de Janeiro Brant, um alto funcionário do município de Antuérpia e Moy Clare,

solidificando sua posição como um artista famoso e bem sucedido profissional e

socialmente.

Rubens não só inspirou os grandes artistas que se seguiram, mas alavancou

e participou de suas carreiras como no caso de Brueghel, Van Dyck e o jovem Diego

Rodriguez da Silva y Velázques. Em 1622, em Paris, executou no Palácio de

Luxemburgo duas grandes galerias, pinturas decorativas as quais seriam

consideradas obras espetaculares. Desenhou a série de tapeçaria sobre a história

de Constantino, o Grande, para o rei Luís XIII da França. As atividades

internacionais no período de 1628 a 1630 eram intensas, sendo apontado como um

dos principais articuladores da paz entre a Inglaterra e Espanha. Recebeu o grau de

mestre honorário de Cavaleiro do Artista-diplomata e da Universidade de

Cambridge.

Em 1626 Isabella Brant morre. Ruben casa-se novamente em 1630 com

Hélèna Fourment. Nos últimos dez anos de sua vida, de 1630 a 1640 comprou uma

propriedade rural situada no sul de Antuérpia, onde, profissionalmente, projeta e

executa o ciclo da mitologia e paisagens. Aos pouco é obrigado a deixar a pintura,

acometido por artrite. Rubens faleceu em 1640, rico e bem sucedido, deixando um

importante legado para o mundo das artes, em especial a arte barroca. (Anderson,

2005; Gombrich-E, 1972; Monterado, 1968)

2.3 A Obra de Rubens

Um dos mais expressivos e vibrantes pintores de toda a história da arte,

Rubens pertence ao seleto grupo de artistas classificado como os grandes mestres

da pintura de todos os tempos: “O estilo envolvia uma rica e muitas vezes

surpreendente e emotiva mistura de cor, luz, e movimento”. (ANDERSON, 1997.p.4 )

Esta afirmação torna-se visível na tela seguinte:

Page 30: ANÁLISE DOS PRINCÍPIOS DO PROCESSO DE DESIGN DA …biblioteca.uniritter.edu.br/imagens/035UNR89/0000B6/0000B66F.pdf · 2 paulo alario d´avila anÁlise dos princÍpios do processo

30

Obra 3 – Uma dança Camponesa (1636-1640)

Fonte: ANDERSON, 1997, p.72

Tal técnica destacou o pintor não só junto a sua comunidade, mas granjeou-

lhe reconhecimento em terras distantes. Foi aclamado como o grande artista do na

Europa católica nos séculos XVII e XVIII, não deixando de influir igualmente nos

países protestantes como a Inglaterra e Países Baixos. Tinha consciência desse

bom nome e do que ele representava diante de outros artistas e de seu público

consumidor, tendo escrito em certa ocasião: “Meu talento é tal, que nenhuma tarefa,

por maior que seja em tamanho jamais superou a minha coragem”. Esta coragem

aliada ao arrojo, dramaticidade e uma grande qualidade técnica definem a sua vida e

obra. Esta qualificação técnica torna-se intensa pelo fato de que Rubens alicerçou

sua obra em um profundo estudo e na pesquisa dos grandes pintores mestres da

história da arte, sem ter, aparentemente, aderido a algum movimento ou grupo

especificamente.

Page 31: ANÁLISE DOS PRINCÍPIOS DO PROCESSO DE DESIGN DA …biblioteca.uniritter.edu.br/imagens/035UNR89/0000B6/0000B66F.pdf · 2 paulo alario d´avila anÁlise dos princÍpios do processo

31

Obra 4 – A fuga para o Egito (1614)

Fonte: Anderson 1614, p. 25

Obra 5 – Encargo de Cristo a Pedro (1614)

Fonte: Anderson, p.26

Page 32: ANÁLISE DOS PRINCÍPIOS DO PROCESSO DE DESIGN DA …biblioteca.uniritter.edu.br/imagens/035UNR89/0000B6/0000B66F.pdf · 2 paulo alario d´avila anÁlise dos princÍpios do processo

32

Estas duas telas, assim como a seguinte, demonstram a influência dos

grandes mestres, tais como Caravaggio, Michelangelo, Leonardo da Vinci e Ticiano.

Obra 6 – Detalhe de A chegada de Maria de Médici, em Marselha (1622-1625)

Fonte: ANDERSON, 1997. p.41

Em todas as fases de sua carreira artística, observa-se habilidade de

expressar os conteúdos através da desenvoltura de suas pinceladas, assim como a

liberdade com que abordava as temáticas de suas telas. Apesar de ser tido como

mestre nos gêneros retrato, composição religiosa e paisagem foram, sobretudo, a

sensualidade e o dinamismo das cenas mitológicas que fizeram da pintura de

Rubens o símbolo da exuberância. Observa-se, na composição de seus quadros,

todos os tipos de linhas, planos, cores, matizes e luz. As figuras humanas

apresentam uma nova postura com o corpo em torção e o rosto inclinado para traz

com a boca semiaberta - características estas até então não utilizadas pelos artistas

renascentistas, definindo um desenho com muito movimento e dramaticidade, um

novo estilo: o barroco. Desta forma, foi fonte de inspiração e influência para os

artistas de gerações futuras, contribuindo definitivamente para a estruturação e

história do desenho.

Em 1608 foi nomeado pintor da corte dos arquiduques da Áustria, da casa de

Habsburgo, A partir do ano de 1609, iniciou uma série de importantes trabalhos com

base num jogo de diagonais tipicamente barroco. Estas diagonais caracterizaram e

Page 33: ANÁLISE DOS PRINCÍPIOS DO PROCESSO DE DESIGN DA …biblioteca.uniritter.edu.br/imagens/035UNR89/0000B6/0000B66F.pdf · 2 paulo alario d´avila anÁlise dos princÍpios do processo

33

distinguiram-no dos demais pintores e converteu-o no principal pintor flamengo. Das

obras dessa fase destacam-se as telas monumentais "Levantamento da cruz" (1610)

e "Deposição" (1612), realizadas, respectivamente, para a igreja de Santa Valburga

e a catedral de Antuérpia.

Obra 7 – Levantamento da Cruz (1610)

Fonte: ANDERSON, 1997. p.19

Page 34: ANÁLISE DOS PRINCÍPIOS DO PROCESSO DE DESIGN DA …biblioteca.uniritter.edu.br/imagens/035UNR89/0000B6/0000B66F.pdf · 2 paulo alario d´avila anÁlise dos princÍpios do processo

34

Obra 8 – Deposição (1612)

2

Famoso, com um padrão de vida até então inusitado para um artista e

proprietário de um ateliê - no qual trabalhariam pintores como Antoon van Dyck e

Jacob Jordaens - , Rubens mandou construir uma luxuosa residência, na qual juntou

esplêndida coleção de objetos antigos que reunira durante sua permanência em

Roma. No ano de 1619 concluiu o "Rapto das filhas de Leucipo" já marcado pela

sensualidade e pelo contorno exuberante dos corpos femininos que caracterizariam

suas composições mitológicas.

2 Disponível em www.trabel.com/antwerp/antwerp-paintingscathedral.htm

Page 35: ANÁLISE DOS PRINCÍPIOS DO PROCESSO DE DESIGN DA …biblioteca.uniritter.edu.br/imagens/035UNR89/0000B6/0000B66F.pdf · 2 paulo alario d´avila anÁlise dos princÍpios do processo

35

Obra 9 – Rapto das Filhas de Leucipo (1616-1619)

Fonte: ANDERSON, 1997, p.31

Nessa época, adotou uma palheta mais clara e uma pincelada leve e

espontânea, que tendiam a ressaltar a cor e não o contorno, e que predominariam

em toda a sua obra posterior. É desse período a série "Vida de Maria de Médici",

conjunto de telas monumentais realizadas entre 1622 e 1625 para o palácio de

Luxemburgo de Paris e mais tarde transferidas para o Museu do Louvre. Nesta

Page 36: ANÁLISE DOS PRINCÍPIOS DO PROCESSO DE DESIGN DA …biblioteca.uniritter.edu.br/imagens/035UNR89/0000B6/0000B66F.pdf · 2 paulo alario d´avila anÁlise dos princÍpios do processo

36

época outro conjunto de telas foi realizado, destinado à igreja de São Carlos

Borromeu de Antuérpia, desapareceu na sua quase totalidade num incêndio, em

1718.

As composições mitológicas - Ninfas e sátiros, As três graças, O jardim do

amor, Quermesse e O Rapto das filhas de Leucipo - são talvez as mais conhecidas

e as que melhor definem seu estilo pela riqueza cromática, a composição ao mesmo

tempo dinâmica e equilibrada e a diluição das linhas.

Nestas obras, destacam-se os retratos de sua mulher, em que revela

sensibilidade e penetração psicológicas muito superiores às demonstradas nos

retratos tradicionais que realizou para a corte.

No final de sua carreira, refletia uma serena melancolia em suas telas nas

paisagens tardias como, por exemplo, no quadro “Paisagem com Arco-íris”. Criando

passagens, com um tom lírico e nebuloso sendo considerado precursor de certos

aspectos do estilo rococó do século XVIII.

Obra 10 – Paisagem com arco-íris (1635-1640)

Fonte: ANDERSON, 1997, p.63

Ao observar a personalidade e o conjunto da obra de Rubens, depreende-se

que, aquele momento circunstancial da vida do artista e da humanidade,

Page 37: ANÁLISE DOS PRINCÍPIOS DO PROCESSO DE DESIGN DA …biblioteca.uniritter.edu.br/imagens/035UNR89/0000B6/0000B66F.pdf · 2 paulo alario d´avila anÁlise dos princÍpios do processo

37

caracterizou-se como sendo um divisor de toda a história da pintura. Ele trouxe na

sua arte os legados dos renascentistas como Miguel Ângelo, Rafael, Leonardo da

Vinci e naturalistas como Carracci e Caravaggio, os quais estudou profundamente.

O conhecimento clássico adquirido, aliado ao grande talento e espírito

inovador e criativo do artista, possibilita o surgimento de um novo estilo: o Barroco.

O barroco aborda temas similares ao Renascimento, porém com mais dinamismo,

contrastes mais fortes, maior dramaticidade, exuberância, realismo e uma tendência

ao decorativo.

As mudanças introduzidas pelo novo espírito originaram um profundo respeito

pelas conquistas das gerações anteriores e, nas novas, um desejo de superá-las

com a criação de obras originais - em um contexto social e cultural que já se havia

modificado profundamente em relação ao período anterior. O que se segue são

épocas de extrema riqueza artística, pois o Barroco atinge o seu esplendor. Vários

grandes artistas surgiram influenciado por Rubens, como Rembrandt e Goya, entre

outros.

Nesta fase da história, já havia a comunicação entre os continentes, surgindo

grandes obras também na América. Com facilidade, descortinou-se o futuro da arte,

pois o Barroco lançou o seu legado às gerações futuras, influenciando não só a

pintura mais também o arquitetura e escultura, estilos como e movimentos com o

Rococó e o Impressionismo. Por tudo isto, Peter Paul Rubens foi um dos mais

importantes artistas da História da Arte, sendo pioneiro na forma de produzir suas

obras. Deixou para a posteridade um legado de muita arte e expressão do mais puro

Barroco, de forma sincera e verdadeiramente vivida. (Anderson, 2005; Gombrich,

1972; Monterado, 1968).

Page 38: ANÁLISE DOS PRINCÍPIOS DO PROCESSO DE DESIGN DA …biblioteca.uniritter.edu.br/imagens/035UNR89/0000B6/0000B66F.pdf · 2 paulo alario d´avila anÁlise dos princÍpios do processo

38

4. MÉTODOS DA ANÁLISE DE UMA OBRA DE ARTE

A obra de arte é fruto do seu tempo, mesmo que retratando tempos idos ou

futuristas ela é criada com materiais do seu tempo, com as influências socioculturais

próprias de sua época, de acordo com parâmetros e técnicas de determinada

escola, refletindo, em última análise, a realidade concebida pela visão do artista ou a

que ele deseja repassar – intencional ou não - num processo de criação.

A visão de um iniciado no mundo das artes poderá buscar tais elementos num

processo de interação com a obra, fazendo uma “leitura espaço-temporal” da

mesma, ajustando-a ao grau de seus conhecimentos o que, talvez, escape a um

leigo, que se ocupe com outras formas da intercomunicação com a referida e

hipotética obra, tais como cores, emoções, associações etc .

O livro “Guia da História da Arte” (ARGAN e FAGIOLO, 1992) descreve quatro

métodos de análise de uma obra de arte; são eles: o método formalista, sociológico,

iconológico e estruturalista. Vejamos como se aplicam à análise realizada nesta

dissertação.

O Método Formalista tem como ponto de partida a teoria da pura-visualidade

que se caracteriza por criar um sistema de representação global da realidade, a

partir da consciência do artista, onde as formas têm um conteúdo significativo

próprio, presentes independentemente do tema da obra. As figuras podem formar

um conjunto central, dispostas como um volume sólido piramidal, por exemplo,

contrastando com um vazio atmosférico de fundo. As linhas dos contornos dessas

figuras são levadas a se harmonizarem com as linhas da paisagem, com o efeito de

relevo sendo feito com a graduação uniforme do claro-escuro. Mais adiante

retomaremos estes conceitos destacando algumas destas características em relação

a obra de Rubens, em especial a objeto de nosso estudo.

No plano teórico Konrad Fiedler é o expoente máximo e no plano da aplicação

histórica destaca-se Heinrich Wölfflin, que afirma que a arte possui dois grandes

rumos antagônicos: a representação e a expressão, ou ainda, o clássico e o não-

clássico, a arte do mundo mediterrânico e a arte do mundo nórdico. A representação

tem a realidade como modelo que a arte imita. Wölfflin “procurou reduzir os sistemas

de sinais representativos a categorias fundamentais: linear e pictórico, superfície e

profundidade, forma fechada e forma aberta, multiplicidade e unidade, clareza e não-

Page 39: ANÁLISE DOS PRINCÍPIOS DO PROCESSO DE DESIGN DA …biblioteca.uniritter.edu.br/imagens/035UNR89/0000B6/0000B66F.pdf · 2 paulo alario d´avila anÁlise dos princÍpios do processo

39

clareza”. A expressão, por sua vez representa a “indistinção e a identificação do

dinamismo da vida com o dinamismo do cosmo [...] a tensão entre o homem e um

ambiente indefinido, suspeito ou hostil”. Para Alois Riegel, anota Bonsiepe, “a

simbologia na morfologia dos adornos reflete uma inuição do espaço e do tempo

próprio do mesmo grupo étnico e dependente do tipo de experiência vivida”

(BONSIEPE, 1984, p.43).

A análise pelo método formalista situa a obra na época, contexto e categoria,

evidenciando a composição do quadro e os elementos dinâmicos, estáticos e

princípios do desenho.

Segundo o Método Sociológico “a obra de arte produz-se no interior de uma

sociedade e de uma sua situação histórica especifica” (ARGAN, 1992, p.36).Ele

ocupa-se com a fruição das obras de arte, e, por conseguinte, da avaliação

econômica, do mercado artístico (encomenda, avaliação e remuneração), do

“mecenato”, da colecionação, da crítica e influência no gosto do público, tendo

especial atenção com a maneira pela qual a obra de arte é solicitada e adquirida

pelo poder econômico constituído, quer religioso, político etc. Distingue o autor que

em determinados momentos

a obra surge condicionada pelos centros de poder, reduzindo-se a uma mera

operação técnica, em outros momentos os artistas parecem ser os únicos

responsáveis pela produção artística e pela respectiva função no sistema

cultural [...] ora alinhados com os operários manuais, ora elevados à categoria

de artesãos qualificados, reconhecidos como profissionais liberais ou mesmo

como intelectuais nivelados com os literatos e os cientistas (ARGAN,

1992, p.36).

O Método sociológico estuda e distingue a gênese da obra de arte e sua

existência na realidade social. Sua aplicação permite identificar a inserção da obra

de Rubens dentro da sociedade Europeia nos século XVII e XVIII e do barroco,

relacionando a estrutura e a forma de sua obra assim como os hábitos, costumes da

corte, burguesia, religiosidade, bem como as questões de produção e

comercialização dessas mesmas obras. Segundo Antal Hauser (apud ARGAN e

FAGIOLO, 1992), a relação entre arte e sociedade esta na estrutura de forma e nos

sistemas representativos da obra.

Page 40: ANÁLISE DOS PRINCÍPIOS DO PROCESSO DE DESIGN DA …biblioteca.uniritter.edu.br/imagens/035UNR89/0000B6/0000B66F.pdf · 2 paulo alario d´avila anÁlise dos princÍpios do processo

40

O Método Iconológico, por sua vez, parte da premissa que, decorrentes da

atividade artística, impulsos do inconsciente individual e coletivo estão presentes na

obra de arte. Foi instaurado por A.Warburg e desenvolvido por E.Panofsky. Nele o

que conta é a imagem, que tem significado próprio.

Ainda que na atividade artística seja essencial a imaginação há na história

das artes a sedimentação de determinadas imagens, criando imagens-memória que

faz parte do inconsciente coletivo, consagradas, por exemplo, em diversos temas,

mormente os religiosos, mesmo que assuma significados diversos:.Maria é uma

moça jovem com o filho, Jesus um homem barbado etc. Nesse sentido, permite uma

análise dos processo de fruição e de recuperação mais extensos do que se faz no

método sociológico, se ocupando com não apenas com a repetição das imagens,

mas com as mutações, com as associações e novos significados.

Nesse sentido, assevera Argan que “a história da arte, sob o ponto de vista

iconológico, é a história da transmissão, da transmutação das imagens [...] o que faz

dele um método histórico”(ARGAN, 1992, p. 38).

A obra de Rubens estabelece novos parâmetros para as imagens, situações

estas que serão destacadas a frente.

O Método Estruturalista, ainda em fase experimental, segundo o autor, tem

espaço especial no campo da arquitetura voltando suas pesquisas para a unidade

mínima constitutiva do ato artístico. Ensina Argan (Op.cit.,1992, p.40)que o método

estuda “a decifração rigorosa dos sinais (semilogia) mediante a determinação dos

códigos corretos”. Sendo os sinais “significantes” a questão da arte está incluída na

da comunicação, mantendo aberto o debate sobre a possibilidade ou legitimidade de

distinguir a mensagem estética da puramente informativa.

Naturalmente que a aplicação metodológica remete à ação do expert. Neste

estudo pretende-se atingir o grau de exemplificação e detalhamento a partir dos

elementos universais, estruturais e dinâmicos do desenho que faremos no capítulo a

seguir.

A obra de arte eleita “O Rapto das Filhas de Leucípo” será posta mais

próxima do leitor, traduzindo-lhe os elementos que constituem a essência do produto

artístico e da mensagem nela contida. Evidenciar-se-á a presença de tais elementos

Page 41: ANÁLISE DOS PRINCÍPIOS DO PROCESSO DE DESIGN DA …biblioteca.uniritter.edu.br/imagens/035UNR89/0000B6/0000B66F.pdf · 2 paulo alario d´avila anÁlise dos princÍpios do processo

41

no desenho de Rubens decorrentes de uma ação projetada pela o artista o que

constituiu-se naqueles tempos em um efetivo processo de design.

Rubens preocupou-se com a realização de suas obras, criando uma forma de

trabalho até então inédita para um artista plástico. Agregou ao seu talento um

profundo e criterioso estudo da história da arte e pintura, ampliando o seus

conhecimentos e cultura estudando minuciosamente as obras dos grandes

clássicos; criou um estilo próprio com elementos originais e inconfundíveis; buscou

clientes certos para os seus quadros; adquiriu em sua época na Europa status de

grande artista; em sua casa na Antuérpia criou o seu próprio estúdio; valeu-se de

discípulos e ajudantes para a realização de seus trabalhos; viveu e adquiriu

patrimônio através da arte. Os grandes artistas que antecederam a Rubens, como

Miguel Ângelo, Rafael, Leonardo da Vinci e Caravaggio, entre outros, apesar do

grande talento, apenas sobreviviam de sua arte. Para eles o ganho financeiro não

era consequência de suas obras. Viviam e trabalhavam à margem das cortes, Igreja

ou famílias de posse, porém produzindo para elas, em troca do próprio sustento.

Após a fase de Rubens o panorama não se alterou muito, outros grandes artistas

que surgiram não obtiveram em vida os frutos seu talento. Vincent Van Gogh, para

exemplificar, não conseguia vender seus quadros e assim como ele outros artistas

sobreviviam em péssimas condições nos bairros boêmios de Paris ou outras

cidades, marginalizados.

A necessidade de Rubens ao criar um local específico para a produção de

suas obras tinha como objetivo racionalizar a execução de seus quadros, frente ao

grande número de encomendas. Este local não era meramente um atelier ou

estúdio, possuía características próprias, sendo um local espaçoso e equipado para

a realização dos trabalhos. Juntamente com seus ajudantes e alunos desenvolveu

um sistema de produção de arte até então inédita para um pintor. A informalidade

das criações e a falta de métodos para a execução de obras muito comum entre os

artistas da época, foi substituída por rotinas que rendiam uma produção compatível

com a demanda dos trabalhos. Primeiramente o artista em contato com o cliente,

tomava ciência das suas pretensões criando pequenos esboços entorno do tema,

mostrados ao cliente, dando-lhe uma ideia sobre o futuro produto. Estes desenhos

sendo aprovados eram desenvolvidos com o auxílio dos ajudantes. Eram

confeccionados inúmeros desenhos na escala definitiva, até se chegar ao um

produto que o artista julgava satisfatório. A próxima etapa era a inclusão das cores,

Page 42: ANÁLISE DOS PRINCÍPIOS DO PROCESSO DE DESIGN DA …biblioteca.uniritter.edu.br/imagens/035UNR89/0000B6/0000B66F.pdf · 2 paulo alario d´avila anÁlise dos princÍpios do processo

42

etapa em que havia o envolvimento direto do artista. Para finalizar Rubens dava os

acabamentos finais. Este sistema que foi mais tarde comparado a uma fábrica. Além

da agilidade a obra era direcionada especificamente para um cliente. A aplicação de

determinadas técnicas atualmente empregadas de forma planejada, já estavam

presentes na obra de Rubens. O desenho abaixo é uma simulação do processo de

design desenvolvido por Rubens para execução de suas obras em seu estúdio na

casa da Antuérpia. (Anderson, 2005)

Figura 2 – Simulação do processo de Design desenvolvido por Rubens

Criação do quadro

Captação do cliente Entendimento das

expectativas do cliente Divisão do trabalho em

etapas

Etapa 1

Esboço do desenho do quadro e apresentação ao cliente para aprovação.

Etapa 2 Desenho do quadro com

auxílio dos alunos e ajudantes

Page 43: ANÁLISE DOS PRINCÍPIOS DO PROCESSO DE DESIGN DA …biblioteca.uniritter.edu.br/imagens/035UNR89/0000B6/0000B66F.pdf · 2 paulo alario d´avila anÁlise dos princÍpios do processo

43

Etapa 3 Pintura

Trabalho re alizado com ajudantes e discípulos

Page 44: ANÁLISE DOS PRINCÍPIOS DO PROCESSO DE DESIGN DA …biblioteca.uniritter.edu.br/imagens/035UNR89/0000B6/0000B66F.pdf · 2 paulo alario d´avila anÁlise dos princÍpios do processo

44

Fonte: Desenhos realizados Paulo d´Avila

Na medida em que identificam-se essas etapas no processo de design de Rubens é viável buscar as semelhanças existentes com a Metologia Projetual de Bonsiepe, o que será feito a seguir.

Produto final

“O Rapto das Filhas de Leucípo”

Page 45: ANÁLISE DOS PRINCÍPIOS DO PROCESSO DE DESIGN DA …biblioteca.uniritter.edu.br/imagens/035UNR89/0000B6/0000B66F.pdf · 2 paulo alario d´avila anÁlise dos princÍpios do processo

45

Figura 3 – Demonstrativo do Processo de Design Rubeniano

em relação a Metodologia Projetual de Gui Bonsiepe

Estabelecimento do programa de necessidades

Estabelecimento de um programa através do processo intelectual do artista, a qual definiu:

o conteúdo a ideia geral da obra.

Definição do problema

O conteúdo a ideia em conjunto com os elementos do design e técnica as ser utilizada, configuraram e definiram o primeiro esboço da obra.

Anteprojeto

A execução do desenho do anteprojeto visualiza as etapas descritas acima. Apresentação ao cliente, com vista e aprovação.

Geração de alternativas

Supervisão de Rubens

Divisão o trabalho em etapas;

Qualificação os ajudantes e discípulos;

Desenvolvimento

Esboço

Anteprojeto

Desenho

Colorido

Finalização e acabamentos finais da obra

Page 46: ANÁLISE DOS PRINCÍPIOS DO PROCESSO DE DESIGN DA …biblioteca.uniritter.edu.br/imagens/035UNR89/0000B6/0000B66F.pdf · 2 paulo alario d´avila anÁlise dos princÍpios do processo

46

Projeto

Obra final o quadro

“O RAPTO DAS FILHAS DE LEUCIPO”.

Fonte Gui Bonsipe , 1984 .pag.35

A base dessa atividade artística é o desenho. O desenho é uma manifestação

gráfica que sensibiliza e desperta reação ao ser apreciado como uma obra. O artista

cria e transforma a realidade que se lhe apresenta, como ensina Ostrower:

Queira o artista ou não, quaisquer que seja as formas produzidas por ele

resultarão necessariamente num processo de distanciamento da natureza.

Neste sentido, ao dar forma à imagem, o artista é obrigado a deformar. Por

necessidade, substituirá as formas existentes na natureza e seus contextos

por outras “formas humanas” por assim dizer. Também criará novos

contextos formais, cuja extensão e equilíbrio irão servir de padrão de

referências à própria intepretação das formas articuladas pelo artista.

(OSTROWER, 2004,p.314).

O desenho invade os mais variados campos e áreas de atuação, uma vez que

é utilizado nos mais diferentes segmentos profissionais e em diversos contextos. A

arte do desenho ganha extrema importância a partir do Renascimento e das

pesquisas realizadas por Leonardo da Vinci, quando registra através de desenhos a

giz as suas descobertas. Por essa razão, as academias, nos séculos XVI, XVII e

XVIII fazem do desenho uma disciplina obrigatória para o aprimoramento da

atividade artística. Estudiosa da arte, Ostrower (2004, p. 53) refere que, “a

linguagem visual é algo surpreendente, que há muitos vocábulos e elementos

expressivos capazes de compor o processo artístico através das linguagens visuais:

a linha, a superfície, o volume, a luz a cor”. Afirma que estes elementos se diluem no

todo da obra, criando assim uma composição artística. A análise da proposta em

relação ao desenho O rapto das filhas de Leucipo será dividida em três

segmentos: no primeiro, os elementos universais do desenho, no segundo

estruturantes do desenho: linha e superfície; e, no terceiro, os elementos dinâmicos:

o volume, a luz e a cor.

Page 47: ANÁLISE DOS PRINCÍPIOS DO PROCESSO DE DESIGN DA …biblioteca.uniritter.edu.br/imagens/035UNR89/0000B6/0000B66F.pdf · 2 paulo alario d´avila anÁlise dos princÍpios do processo

47

A seguir nos debruçaremos sobre as estruturas que formam o desenho.

4.1 Elementos Universais do Desenho

O design abrange uma gama enorme de conhecimentos tornando-o por

excelência multidisciplinar. Sob a denominação de princípios Lidwell, Holden e Butler

(2010, p.12) esclarecem que agruparam “leis, diretrizes, tendências humanas e

considerações gerais do desenho” que normalmente estão espalhadas em muitas

disciplinas diferentes, “considerando diversos fatores, incluindo utilidade, grau de

aplicação inadequada ou compreensão indevida e força das evidências” - sem

esgotar, no entanto, nos 125 princípios que compilaram o número de princípios

relevantes do design.

Para os autores referidos, a aplicação dos princípios estabelecidos do Design

aumenta a probabilidade de êxito de um projeto. Tais princípios podem ser definidos

como

ferramenta para aprimorar o seu conhecimento interdisciplinar e seu

conhecimento sobre design, realizar brainstorming e geração de ideias pra

os problemas de design e refrescar sua memória sobre os princípios

empregados esporadicamente (LIDWELL, HOLDEN E BUTLER, 2010,

p.13).

Considerando a variedade de exemplos e áreas de abrangência, vamos

explorar aqueles princípios de design que mais se aproximam do nosso tema, como

forma de fundamentação técnica do trabalho. Nesse sentido, classificado na obra

entre os princípios que influenciam a maneira de como o design é percebido,

destacamos:

a) Razão entre rosto e corpo

Quando a imagem de uma pessoa ressalta o rosto, esse ocupando a maior

parte da imagem,

“concentram a atenção nos atributos intelectuais e de personalidade da

pessoa. As imagens, por sua vez, com baixa razão entre rosto e corpo

(corpo ocupa maior parte da imagem) convergem a atenção para as

Page 48: ANÁLISE DOS PRINCÍPIOS DO PROCESSO DE DESIGN DA …biblioteca.uniritter.edu.br/imagens/035UNR89/0000B6/0000B66F.pdf · 2 paulo alario d´avila anÁlise dos princÍpios do processo

48

qualidades físicas e sensuais da pessoa” (LIDWELL, HOLDEN E BUTLER,

2010, p.88).

Consideramos que as anotações produzidas ao longo desse trabalho

referente ao biótipo dos personagens da obra de Rubens se aproximam desse

conceito.

Figura 4 – Detalhes dos rostos

b) Boa continuidade

É um dos princípios da percepção da Gestalt. Os elementos alinhados são

percebidos como pertencentes a um único grupo em relação aos que estejam em

desalinho, quer estejam num contínuo linear ou circular. Este princípio também

explica que a interpretação menos abrupta é dominante. Assim, ressaltam os

autores

“A capacidade de identificar os corretamente os objetos depende

principalmente da percepção dos cantos e das curvas fortes que compõem

a forma [...] a boa continuidade leva o olho a prosseguir ao longo dos

segmentos visíveis [...] à medida que o ângulo de interrupção se torna mais

agudo, os elementos passam a ser percebidos como menos relacionados”

(LIDWELL, HOLDEN E BUTLER, 2010, p.116).

Page 49: ANÁLISE DOS PRINCÍPIOS DO PROCESSO DE DESIGN DA …biblioteca.uniritter.edu.br/imagens/035UNR89/0000B6/0000B66F.pdf · 2 paulo alario d´avila anÁlise dos princÍpios do processo

49

c) Efeito Vermelho

Os autores apresentam inúmeros exemplos sugerindo que o vermelho tem

função de comunicar a fertilidade das fêmeas e a dominação dos machos no reino

animal. As mulheres aumentam o apelo sexual com tonalidades vermelhas e os

homens destacam-se na sua condição de dominantes, agressivos e intimidadores.

(LIDWELL, HOLDEN E BUTLER, 2010, p.202).

Figura 4 – Vestimentas em cor vermelha

d) Projeção Tridimensional

A visão dos seres humanos evoluiu para enxergar o mundo

tridimensionalmente que ocorrem com o uso de efeitos de profundidade:

- Interposição: são apresentados dois objetos superpostos, dando a sensação

de que o sobreposto esteja mais próximo em relação ao qual se sobrepõe.

- Tamanho: dois objetos semelhantes com tamanhos diferentes apresentados

em conjunto levam a perceber-se o de tamanho menor como estando mais distante.

Page 50: ANÁLISE DOS PRINCÍPIOS DO PROCESSO DE DESIGN DA …biblioteca.uniritter.edu.br/imagens/035UNR89/0000B6/0000B66F.pdf · 2 paulo alario d´avila anÁlise dos princÍpios do processo

50

- Elevação: quando dois objetos são mostrados em posições verticais

diferentes, o mais elevado é visto como mais distante.

- Perspectiva linear: se duas linhas verticais convergem próximas aos seus

pontos superiores, as pontas convergentes são vistas como mais distantes do que

as divergentes.

- Gradiente de textura: quando a textura de uma superfície varia de

densidade, as áreas de maior densidade são vistas como as mais distantes.

- Sombreado: as áreas sombreadas são vistas como mais distantes da fonte

de luz e vice-versa.

- Perspectiva atmosférica: os objetos mais azuis ou mais borrados são vistos

como mais distantes em relação aos demais (LIDWELL, HOLDEN E BUTLER, 2010,

p.238).

A aplicação de determinadas técnicas - atualmente empregadas de forma

planejada – já eram encontradas em obras de Rubens, como já destacado

anteriormente.

Outros elementos, entretanto, são fundamentais para que possamos analisar

adequadamente uma obra. Seus elementos funcionam como um processo de

aprendizagem de uma nova língua, um novo método de expressão, de

comunicação. Por isso mesmo veremos a seguir, primeiramente os elementos

estruturais e, depois, os dinâmicos, pelos quais o artista comunica sua percepção

dos acontecimentos, exterioriza sua mensagem.

4.2 Elementos Estruturais

Com base nas definições abaixo, serão identificados os elementos estruturais

do desenho na obra O rapto das filhas de Leucipo, de Rubens .

4.2.1 A superfície

A parte visual de uma área que define um elemento no espaço é a superfície.

É a medida que compreende extensão, comprimento e largura dos corpos. “Na

organização espacial de superfície percebemos as duas dimensões altura e largura.

Essas são de tal maneira integradas que uma não pode ser vista sem a outra”.

(OSTROWER, 2004, p.59).

Page 51: ANÁLISE DOS PRINCÍPIOS DO PROCESSO DE DESIGN DA …biblioteca.uniritter.edu.br/imagens/035UNR89/0000B6/0000B66F.pdf · 2 paulo alario d´avila anÁlise dos princÍpios do processo

51

Também pode ser a área a extensão da face. O artista expressa e comunica a

sua mensagem no espaço visual plano, que está compreendido entre linhas. No

caso de Rubens, em especial do quadro em avaliação, observa-se que a distribuição

dos elementos dá-se de forma equilibrada, pois nada está em desarmonia. As

figuras principais que compõem a cena são as figuras femininas, (Hilária e Febe),

que estão no centro do desenho e no plano de frente do quadro. As figuras

masculinas (Castor e Pólux) estão em segundo plano, portanto há aí, a primeira

superposição no quadro, seguindo-se em planos sucessivos com os cavalos, os

puttos (as crianças nuas), paisagem e por fim, o céu. Estas superfícies em

superposição cria um efeito de aprofundamento no desenho. Ostrower (2004, p. 69)

diz que cada superposição estabelece, por instante, a profundidade, que em seguida

se desfaz nas passagens, onde o espaço se torna plano e é reincorporado à

superfície. Já os espaços desta obra aparecem de forma plana. Os movimentos

visuais do conteúdo da tela, como a sequência dos elementos, figuras humanas,

animais, céu, paisagem de fundo e o clima da cena representado por gestos

vigorosos, criam a necessária situação de profundidade das superfícies. As figuras

possuem hierarquia e escalas diferenciadas, Hilária, Febe, Castor e Pólux dominam

o espaço, porém, a força, o vigor dos animais e os outros elementos são

significativos para visão e o impacto que o artista quis comunicar. À superfícies do

quadro é o campo de energia criados pelo artista.

4.2.2 A linha

A linha é um elemento imaginário que, quando produzido pelo artista, torna-se

real. Ela estabelece as dimensões: altura, largura e profundidade. As linha são

horizontais, verticais, curvas ou diagonais. “A linha (cada segmento linear) cria,

essencialmente, uma dimensão no espaço. Ela é vista como portadora de

movimento direcional.” (OSTROWER, 2004, p.55).

As linhas estabelecem uma dimensão no espaço composto por altura largura

e profundidade. Ela configura um espaço linear e direcional, com a possibilidade de

modular o seu movimento. As linhas se tornam fato físico, pois preservam

características de origem mental imaginária. Ao comparar linhas com cores, observa-

se o clima expressivo. A linha tem uma ambiência intelectual, por outro lado a cor

evoca repouso, quietude, calma e paz, além da sensualidade. As linhas horizontais

Page 52: ANÁLISE DOS PRINCÍPIOS DO PROCESSO DE DESIGN DA …biblioteca.uniritter.edu.br/imagens/035UNR89/0000B6/0000B66F.pdf · 2 paulo alario d´avila anÁlise dos princÍpios do processo

52

se opõem às verticais (estáticas), e as linhas diagonais e curvas (dinâmicas) se

opõem as duas primeiras, criando assim um módulo de composição dinâmica. Essa

referência é importante para a compreensão do desenho de Rubens, visto que ele

sempre utilizou linhas em diversas direções para compor seus desenhos.

A seguir mostraremos a incidência destas linhas presentes no quadro de

Rubens, associadas a outros elementos do desenho e da linguagem pictórica.

A linha horizontal (estática) é uma linha imaginária paralela ao horizonte e

perpendicular à vertical. No caso dos desenhos de Rubens, observa-se a utilização

horizontal juntamente com a vertical, estruturando os desenhos. Intui que o

espectador visualize os movimentos no plano horizontal, desta forma, produzindo

um sentimento de expansão da profundidade e alargamento das laterais. Do ponto

de vista psicológico, exerce sentimentos de calma e tranquilidade.

Page 53: ANÁLISE DOS PRINCÍPIOS DO PROCESSO DE DESIGN DA …biblioteca.uniritter.edu.br/imagens/035UNR89/0000B6/0000B66F.pdf · 2 paulo alario d´avila anÁlise dos princÍpios do processo

53

Figura 6 – Linhas horizontais

A linha vertical (estática) é alinhada como a direção da força da gravidade e

prumo e, consequentemente, perpendicular ao horizonte, indicando movimentos de

esforço, energia, firmeza, segurança e virilidade.

Page 54: ANÁLISE DOS PRINCÍPIOS DO PROCESSO DE DESIGN DA …biblioteca.uniritter.edu.br/imagens/035UNR89/0000B6/0000B66F.pdf · 2 paulo alario d´avila anÁlise dos princÍpios do processo

54

Figura 7 – Linhas verticais

As linhas curvas (dinâmica) dão a impressão de movimento e dinamismo. São

linhas representadas sem compromisso com a simetria do quadro. No caso do

quadro avaliado, estas linhas estão na parte central do desenho, com o propósito de

estabelecer movimentos bruscos, transmitindo a ideia de que os homens estão

arrancando as mulheres, conforme a história do rapto.

Page 55: ANÁLISE DOS PRINCÍPIOS DO PROCESSO DE DESIGN DA …biblioteca.uniritter.edu.br/imagens/035UNR89/0000B6/0000B66F.pdf · 2 paulo alario d´avila anÁlise dos princÍpios do processo

55

Figura 8 – Linhas curvas

A linha diagonal (dinâmica) é dramática, por excelência, sendo uma das

principais características de Rubens, que tornaram os seus quadros inconfundíveis.

Suas relações com o meio sugerem, primeiramente, o desequilíbrio. Opõem-se à

gravidade, pois não tem o equilíbrio energético da linha vertical. A diagonal é

dramaticidade, sugere inquietação e esforço.

Page 56: ANÁLISE DOS PRINCÍPIOS DO PROCESSO DE DESIGN DA …biblioteca.uniritter.edu.br/imagens/035UNR89/0000B6/0000B66F.pdf · 2 paulo alario d´avila anÁlise dos princÍpios do processo

56

Figura 9 – Linhas diagonais

4.3 Elementos Dinâmicos

Os elementos dinâmicos que configuram um produto são determinantes para

o entendimento de um produto. A cor, luz e volume são estes elementos, que

ultrapassam a estrutura bidimensional. Ao observarmos uma imagem de um produto,

entenderemos a função exata e importância que cada um deles ocupa em uma

Page 57: ANÁLISE DOS PRINCÍPIOS DO PROCESSO DE DESIGN DA …biblioteca.uniritter.edu.br/imagens/035UNR89/0000B6/0000B66F.pdf · 2 paulo alario d´avila anÁlise dos princÍpios do processo

57

composição. Estes elementos reunidos formam uma obra, que não é nada mais que

a comunicação entre o artista e o espectador.

4.3.1 Volume

O volume é o efeito em que o espaço plano se torna profundo, efeito virtual

esse produzido pela incidência da luz e sombra. No dizer do autor “quando vistas em

conjunto com horizontais e verticais, as linhas diagonais introduzem a dimensão da

profundidade” (OSTROWER, 2004, p.71).

É comum ouvir-se pessoas comentarem quando apreciam uma obra de arte

que parece que a figura está saltando para fora do quadro. Inconscientemente estão

se referindo ao volume que o artista desenhou para compor aquela cena. Rubens

utiliza em seus desenhos constantemente os volumes para destacar as figuras, do

contexto geral do desenho. Abaixo em destaque um detalhe do corpo de duas irmãs

que estava sofrendo o rapto, no quadro O Rapto das Filhas de Leucipo. A postura

inclinada para frente do quadro em direção ao expectador ilustra as colocações

acima

Figura 10 - Torso

Page 58: ANÁLISE DOS PRINCÍPIOS DO PROCESSO DE DESIGN DA …biblioteca.uniritter.edu.br/imagens/035UNR89/0000B6/0000B66F.pdf · 2 paulo alario d´avila anÁlise dos princÍpios do processo

58

4.3.2 Cor

A cor é inerente ao modo de como o ser humano vê o mundo. Está presente

em tudo em que é visivel decorrente do fenômeno da luz. A parcela de luz refletida

que não é absorvida pelo pigmento é a cor. A cor é percebida através da visão. Esta

percepção é importante para a compreensão de um ambiente. Para o ser humano a

cor esta incorporada ao seu cotidiano, não pertence ao mundo fisico e sim a

estímulos físicos por ação de uma atividade cerebral.

Salienta Lichtenstein nesse sentido que

o prazer da cor é de certo modo um prazer dos olhos; chega mesmo

a sê-lo no mais alto grau. Mas na medida em que ele nasce do

espetáculo da carne, exprime-se logo à primeira vista sob forma de

um desejo de tocar. Diante dos quadros dos grandes coloristas, o

espectador tem a impressão de que seus olhos são dedos.

( LICHTENSTEIN, 1994, p.20)

A cor é figura ornamental e ilusória, ela fascina espectador através do seu

colorido. Platão afirma que os oradores e pintores são “lançadores de poeira nos

olhos”, técnicos da ornamentação e disfarce, todos estes mestres são os mestres da

cor. Ensina Ostrower:

A cor se caracteriza pela carga de sensualidade que lhe é inerente.

Ao vê-la diante de nos, sensual, é que podemos dar-nos conta do

quanto nosso conhecimento anterior, através das informações

verbais, fora intelectuais. Isto acontece com todas as pessoas e em

todos os casos. Por maior que seja a nossa experiência prática, uma

coisa é imaginar cores e outra, completamente diferente, é percebê-

las. Na verdade todas as cores são excitantes, não só o vermelho.

Há uma excitação dos sentidos, que é própria da cor e que não

existe em nenhum outro elemento visual. (OSTROWER, 2004, p.103)

O entendimento das cores independe de classificação, dos cruzamentos de

tons ou nomes de centenas de cores. O que importa é o sentido em que uma cor se

tornará expressivo. Com as cores básicas é possível estabelecer-se todas as

relações das cores. O elemento expressivo cor abordado neste capitulo, é

Page 59: ANÁLISE DOS PRINCÍPIOS DO PROCESSO DE DESIGN DA …biblioteca.uniritter.edu.br/imagens/035UNR89/0000B6/0000B66F.pdf · 2 paulo alario d´avila anÁlise dos princÍpios do processo

59

extremamente relevante por ter características próprias na arte barroca.

Observamos que na pintura de Rubens, encontram-se exemplo do uso deste

elemento. Abaixo será apresentada a conceituação das cores e a relação no quadro

O Rapto das Filhas de Leucipo.

4.3.2.1 Cores primárias

As três cores classificadas como primárias são o azul, vermelho e o amarelo,

são distintas entre si. A mistura dessas cores em quantidades iguais, produz o preto

e cinza escuro.

4.3.2.2 Cores secundárias

As cores secundárias são construídas através de mistura de duas cores

primárias. São elas a laranja, a verde e a violeta,

4.3.2.3 Cores terciárias

São todas as outras cores, independentemente de serem compostas ou não

por outras cores, como o marrom, branco, preto, cinza etc.

4.3.2.4 Tonalidades

São as cores que fazem parte da mesma família. Exemplificando: os diversos

tons de azul, do claro ao escuro, ou as cores que tenham o mesmo valor cromático

com o vermelho e um grená-escuro ou verde e verde musgo.

4.3.2.5 Cores quentes e frias

São consideradas cores frias o azul e suas camadas, sendo relacionado com

o céu, gelo e frio. As cores quentes têm como base o amarelo e o vermelho

relacionadas com o sol, calor, sangue e fogo.

Page 60: ANÁLISE DOS PRINCÍPIOS DO PROCESSO DE DESIGN DA …biblioteca.uniritter.edu.br/imagens/035UNR89/0000B6/0000B66F.pdf · 2 paulo alario d´avila anÁlise dos princÍpios do processo

60

Figura 11 – Aplicação das cores

São usadas cores frias no

plano de fundo.

Diversos tons

derivados de uma cor.

Cores quentes

são usadas na

cena

dramática,

pessoas,

vestes e

iluminação.

Cores terciárias estão

situadas no plano de apoio

ao plano principal.

As cores primárias e secundárias não estão visíveis, mas participam

do colorido do quadro com suas tonalidades.

Page 61: ANÁLISE DOS PRINCÍPIOS DO PROCESSO DE DESIGN DA …biblioteca.uniritter.edu.br/imagens/035UNR89/0000B6/0000B66F.pdf · 2 paulo alario d´avila anÁlise dos princÍpios do processo

61

4.3.3 Luz

O desenho se apresenta na forma como se vê a natureza. As luzes e as

sombras são os elementos que dão volume e realismo. Estes elementos diferenciam

um desenho plano formado com simples linhas, e um desenho artístico com volume.

Quando se aplica luz e sombra a uma forma, chega-se à sensação de volume, ou

seja, a de três dimensões: largura, altura, profundidade. A Luz e sombra

produzem a luminosidade e claridade. São os contrastes característicos da arte

barroca. As composições elaboradas por Rubens eram planejadas prevendo estes

contrastes. No quadro em análise observa-se as áreas claras e escuras se

destacando umas das outras, criando áreas próximas e mais distantes.

Page 62: ANÁLISE DOS PRINCÍPIOS DO PROCESSO DE DESIGN DA …biblioteca.uniritter.edu.br/imagens/035UNR89/0000B6/0000B66F.pdf · 2 paulo alario d´avila anÁlise dos princÍpios do processo

62

5 CONCLUSÃO

Certamente não ficaram esgotados nem de longe aqui nenhum dos temas

abordados. Mesmos os conceitos, as teorias e métodos apresentados não foram

vistos a exaustão, uma vez que tínhamos como limiar, talvez pretensiosamente, a

possibilidade de manter o estudo da temática estabelecendo um diálogo entre a

abordagem técnica e a compreensão do leigo, de modo geral, influenciado pela

experiência de Faiga Ostrower, ao levar a arte aos operários, comentada no primeiro

capítulo.

Foram apresentados os conceitos de desenho, design, produto, projeto,

linguagem visual, produção e processo de design com dupla perspectiva, ou seja,

primeiro propor um grau de nivelação, ajustando o sentido destes vocábulos a um

entendimento comum e em segundo lugar oportunizar o contato com esse conteúdo

a todos aqueles que não têm familiaridade com os mesmos ou os entendem de

modo diverso.

Identificamos na história das artes Peter Paul Rubens como o artista que

representava adequadamente momentos diversos do nosso estudo, tais como o

talento como artista; a utilização de determinados conceitos e técnicas que mais

tarde integraram os chamados elementos universais do desenho, bem como os

elementos estruturantes e os elementos dinâmicos; a formatação do processo de

criação e design, concebendo relações inovadoras diante da possibilidade do cliente

não apenas solicitar uma obra mas também ver, previamente, como ela estava

sendo projetada, através de um croqui e poder sugerir alterações na concepção da

mesma; a estruturação de uma linha de produção, através da constituição de

equipes trabalhando em diferentes obras, sediadas num mesmo local sob sua

orientação; a criação dos elementos artísticos de uma nova escola: o barroco e, por

fim, manter a si e sua família, em rica propriedade, bem como as equipes de

ajudantes com os ganhos do mercado da arte. Tais condições o destacam

sobremaneira de outros artistas que, talvez, tenham se limitado ao campo da fazer

arte. E, por outro lado, mostram a relação de sua atuação com outras áreas do

conhecimento, tais como o trato com o cliente, trabalhos em equipe, trabalho sob

supervisão, processo de produção em escala, administração de recursos etc.

Page 63: ANÁLISE DOS PRINCÍPIOS DO PROCESSO DE DESIGN DA …biblioteca.uniritter.edu.br/imagens/035UNR89/0000B6/0000B66F.pdf · 2 paulo alario d´avila anÁlise dos princÍpios do processo

63

O resumo quis demonstrar o que foi a atividade impar desse artista e como foi

conhecendo e estudando as diferentes escolas, aproveitou as oportunidades e

soube constituir-se em referência tanto por suas qualidades pessoais, quanto por

seus dotes artísticos. Por vezes, tão empolgado que ficamos com essas

constatações, quase não deixamos de tecer loas a essa trajetória, esquecendo dos

limites do trabalho acadêmico.

Aliando os conteúdos sobre os elementos do desenho presentes no Capítulo

quarto, pode-se avançar na análise da obra como um produto, resultante de um

processo de design impetrado pelo artista. É Rubens quem, talvez pioneiramente,

produziu obras de arte e viveu da respectiva comercialização, efetivando-as como

produtos de consumo destinados ao mercado de obras de arte. O mesmo tornou tal

situação tão caracterizada que, nos últimos anos de sua vida, através de seu atelier

e grupo de artistas, produziu mais de dois mil quadros, destacando o seu nome

entre os mais produtivos da história das artes.

A obra ruberiana registrou as condições sociais e culturais de sua época, em

diversos segmentos. Colocada como objetos esteticamente elaborados postos no

mercado atravessaram o tempo, assumindo valores diversos, porém constituem

legado histórico expressivo porque identificadora de importante escola de arte; por

resultarem da aplicação de conceitos e técnicas que contribuíram com as futuras

gerações de artistas e mesmo tangenciando outros domínios do conhecimento

humano, quando nem de longe se falava de interdisciplinaridade.

A identificação do processo de design que fazemos em Rubens não serviu na

sua época para ditar formas de interação com o mercado. Depois dele muitos outros

artistas não conseguiram granjear reconhecimento em vida ou viver unicamente de

sua arte. Isso, contudo, não retira a possibilidade dos ensinamentos que a

observação e a reflexão, isentas possam obter.

A lição sobre a constituição de um produto advinda do ceramista inglês Josiah

Wedgwood ficou perfeitamente delineada no processo rubeniano desenvolvido em

sua casa na Antuérpia, reafirmando a condição de processo de design e de produto

presentes em seu trabalho, mais precisamente ao realizar a venda por encomenda,

manter a qualidade e uniformidade dos produtos e a requalificação dos obreiros e

colaboradores com a divisão do trabalho em diferentes estágios.

Page 64: ANÁLISE DOS PRINCÍPIOS DO PROCESSO DE DESIGN DA …biblioteca.uniritter.edu.br/imagens/035UNR89/0000B6/0000B66F.pdf · 2 paulo alario d´avila anÁlise dos princÍpios do processo

64

Outros artistas poderão ter tido produções expressivas e importantes, porém,

não da forma como Rubens concebeu o seu processo de design conforme é

apresentado anteriormente em franca consonância com o processo proposto por

Bonsiepe: o pedido da obra, o esboço e planejamento com a inclusão do cliente, as

diferentes equipes de trabalho em um espaço específico sob sua orientação, e, por

fim, viver e manter-se economicamente em decorrência desse trabalho.

Ao longo desse estudo não deixamos de manifestar nossa posição em relação

à obra de arte como produto, decorrente, inclusive, de um processo de design.

Nesse sentido, Peter Paulo Rubens foi um achado e um efetivo companheiro. Nele

encontramos os exemplos confirmativos. Nele se expressam as condições que dão

contas da relação de mercado.

Seria interessante avaliar as leis de mercado, as condições de mercado e

como se estrutura o mercado das artes? No mundo, no Brasil, no Rio Grande do

Sul? Talvez, mas isso também seria um outro trabalho acadêmico.

A obra “O Rapto das Filhas de Leucípo” serviu para homenagear o autor, mas

também para a identificação dos elementos estruturantes, dos elementos dinâmicos

e elementos universais do desenho os quais estão presentes na obra e se tornaram

referenciais a partir de então. Ela foi concebida dentro de um contexto que compõe

um momento específico da trajetória rubeniana.

Acreditamos que, mesmo sendo um produto e, portanto tenha que em algum

momento considerar as questões de mercado, ele deve ter a componente da

emoção, da técnica e do talento contido na sua estrutura e imagem que representar.

Page 65: ANÁLISE DOS PRINCÍPIOS DO PROCESSO DE DESIGN DA …biblioteca.uniritter.edu.br/imagens/035UNR89/0000B6/0000B66F.pdf · 2 paulo alario d´avila anÁlise dos princÍpios do processo

65

REFERÊNCIAS

ANDERSON, Janice. Vida e obra de Rubens. Tradução: Bazán Fani Baratz. Rio de Janeiro:Ediouro,1997.

ARGAN, Guilio - FAGIOLO, Maurizo. Guia da História da Arte. Lisboa:Estampa, 1992.

BONSIEPE, Gui. Teoria y Prática del Diseño Industrial. Barcelona:Milán, 1975.

BONSIEPE Gui. coordenação; KELLENER, Petra - POESSNECKER, Holger. Metodologia Experimental: Desenho Industrial/ Brasília:CNPq, 1984.

BULFINCH, Thomas. O livro de ouro da mitologia - histórias de deuses e heróis. Rio de Janeiro:Ediouro, 2008.

COELHO, Luiz Antônio. Organizador: LEITE, Souza de João- MONTENEGRO, Luciana- FARBIARZ, Alexandre- CIPINIUK, Alberto. Conceitos-chaves em design. Rio de Janeiro:PUC-Rio.Novas Ideias, 2008.

DEANE, Phyllis. A Revolução Industrial. 3º edição. Tradução: Meton Porto Gadelha. Rio de Janeiro:Zahar, 1975.

CROSS, Nigel. Engineerinig Design Methods: Strategies for Product Design. New York: John Wiley & Sons, LTD, 2000

DENIS, Rafael, Cardoso. Uma Introdução à História do Design. São Paulo: Edgard Blücher, 2000 .

DONDIS, Doni. Sintaxe da Linguagem Visual. São Paulo:Martins Fontes, 2000.

FERREIRA, P. Francisco Manuel. Introdução ao Desenho Industrial. Rio de Janeiro: Convênio CNI-SESI/DN, 1980.

FORTY, Adriam. Objetos do Desejo: designe e sociedade desde 1750. Tradução: Pedro Maia Soares. São Paulo:Cosac Naify, 2007.

GOMBRICH-E H. História da Arte.Tradução: Álvaro Cabral. São Paulo: Círculo do Livro,1972.

GOMES, Negreiros Vidal Luiz. Criatividade PROJETO<DESENHO>PRODUTO: Santa Maria:SCHDS, 2004.

GOMES, Negreiros Vidal Luiz. Criatividade &Desenho: Porto Alegre:SCHDS, 2011.

HOLLIS, Richard. Desenho Gráfico, uma história concisa: São Paulo:Martins Fontes. 2005.

LE CORBUSIER. Por uma Arquitetura: São Paulo:Perspectiva,1989.

Page 66: ANÁLISE DOS PRINCÍPIOS DO PROCESSO DE DESIGN DA …biblioteca.uniritter.edu.br/imagens/035UNR89/0000B6/0000B66F.pdf · 2 paulo alario d´avila anÁlise dos princÍpios do processo

66

LICHTENSTEIN, Jaqueline. A cor eloquente: Tradução Maria Elizabeth Chaves de Mello e Maria Helena de Mello Rouanet. São Paulo:Siciliano,1994.

LIDWELL, William-BUTLER, Jill- HOLDEN, Kristina. Princípios Universais do Desenho.1 ed.Tradução: Francisco Araujo da Costa. Ed. Porto Alegre: Bookman, 2011.

LÖBACH, Bernd. Desenho Industrial. Tradução: CAMP, Van Fready: São Paulo: Blücher, 2001.

MARCHI, Salette. Design, Múltiplos Enfoques. Santa Maria:Centro Universitário Franciscano, 2009.

MONTERADO, Lucas de. História da Arte. São Paulo:São Paulo, 1968.

OSTROWER, Fayga. Universos da Arte. 24 ed. Rio de Janeiro:Elsevier, 2004.

SALVINI, Roberto- MONTI, Raffaele- COLLOBI, Licia- PALLUCCHIANTI, Anna-MELLINI, Gian. Pinacoteca de Munique. São Paulo:Melhoramentos, 1968.

WEILL, Alain. O Desenho Gráfico: Tradução Eliana Aguiar: Rio de Janeiro: Objetiva, 2010.

WILLIAMS, I. Trevor. História das invenções do machado de pedra às tecnologias da informação. Tradução: Cristina Antunes. Belo Horizonte: Gutenberg, 2009.

VICENTINO, Claudio. História Geral. 10 ed. São Paulo:Scipione, 2009.