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UNIVERSIDADE FEDERAL DE SERGIPE PRÓ-REITORIA DE PÓS-GRADUAÇÃO E PESQUISA NÚCLEO DE PÓS-GRADUAÇÃO EM DESENVOLVIMENTO E MEIO AMBIENTE NÍVEL MESTRADO ÁUREA JACIANE ARAUJO SANTOS A IMPORTÂNCIA DA CONSERVAÇÃO DO MEIO AMBIENTE CULTURAL PARA A CONSTRUÇÃO DE UMA SOCIEDADE SUSTENTÁVEL: O CASO DE LARANJEIRAS/SE SÃO CRISTÓVÃO 2015

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UNIVERSIDADE FEDERAL DE SERGIPE PRÓ-REITORIA DE PÓS-GRADUAÇÃO E PESQUISA

NÚCLEO DE PÓS-GRADUAÇÃO EM DESENVOLVIMENTO E MEIO

AMBIENTE

NÍVEL MESTRADO

ÁUREA JACIANE ARAUJO SANTOS

A IMPORTÂNCIA DA CONSERVAÇÃO DO MEIO

AMBIENTE CULTURAL PARA A CONSTRUÇÃO DE UMA

SOCIEDADE SUSTENTÁVEL: O CASO DE

LARANJEIRAS/SE

SÃO CRISTÓVÃO

2015

UNIVERSIDADE FEDERAL DE SERGIPE

PRÓ-REITORIA DE PÓS-GRADUAÇÃO E PESQUISA

NÚCLEO DE PÓS-GRADUAÇÃO EM DESENVOLVIMENTO E

MEIO AMBIENTE

ÁREA DE CONCENTRAÇÃO: PLANEJAMENTO E GESTÃO AMBIENTAL

NÍVEL MESTRADO

ÁUREA JACIANE ARAUJO SANTOS

A IMPORTÂNCIA DA CONSERVAÇÃO DO MEIO

AMBIENTE CULTURAL PARA A CONSTRUÇÃO DE

UMA SOCIEDADE SUSTENTÁVEL: O CASO DE

LARANJEIRAS/SE

Dissertação apresentada como requisito parcial para

obtenção do título de Mestre, pelo programa de Pós-

graduação em Desenvolvimento e Meio Ambiente da

Universidade Federal de Sergipe.

Orientador: Professor Doutor Evaldo Becker

SÃO CRISTÓVÃO-SERGIPE

2015

FICHA CATALOGRÁFICA ELABORADA PELA BIBLIOTECA CENTRAL UNIVERSIDADE FEDERAL DE SERGIPE

S237i

Santos, Áurea Jaciane Araújo A importância da conservação do meio ambiente cultural para a

construção de uma sociedade sustentável: o caso de Laranjeiras/SE / Áurea Jaciane Araujo Santos; orientador Evaldo Becker. – São Cristóvão, 2015.

136 f.: il.

Dissertação (mestrado em Desenvolvimento e Meio Ambiente) – Universidade Federal de Sergipe, 2015.

1. Desenvolvimento sustentável. 2. Meio ambiente. 3. Desenvolvimento econômico – Aspectos ambientais. 4. Direito ambiental. 5. Patrimônio cultural - Proteção. 6. Laranjeiras (SE). I. Becker, Evaldo, orient. II. Título.

CDU 502.131.1(813.7)

Aos grandes amores da minha vida: Deus, minha

mãe(por tudo que representa), minha irmã e

Anselmo.

AGRADECIMENTOS

Chega ao final mais uma etapa e ao final de cada etapa é preciso parar, respirar, olhar

para trás e lembrar daqueles que no caminho trilhado até aqui contribuíram direta ou

indiretamente. Obrigado Senhor Deus e à espiritualidade amiga! A fé é a força que me move e

sem o Teu amparo eu não iria a lugar algum.

Agradeço também a minha mãe, pelo amor incondicional, pela luta diária. Cada

conquista é mais sua do que minha. Obrigado pela vida, pela educação, pelo caráter! Obrigado

Neiva Cristine, minha amada irmã, pelo incentivo e por sempre acreditar em mim! Obrigado

Anselmo Galvão, pela companhia diária, pelo apoio!

Obrigado a minha família, vocês são a base de tudo! Ao meu orientador, Professor

Doutor Evaldo Becker, obrigado pela confiança em mim depositada. A sua competência fora

imprescindível para a concretização desse trabalho. Ao senhor todo meu respeito e minha

profunda admiração.

Aos amigos da Defensoria Pública da União, obrigado por tudo, pelo apoio, pela

confiança, pelo aprendizado e pelo incentivo contínuo, em especial a Andréa Peretti, Pedro,

Davi, Ricardo, Maricélia, Erivan, Dr. Raimundo, Dra. Patrícia e Dr. Oséas.

Aos professores, funcionários e colegas do PRODEMA, em especial aos Professores

Antônio Carlos, Antônio Vital, Cristiano Ramalho e Professora Maria José e a minha querida

Najó. Agradeço imensamente a contribuição significativa de cada um na construção desse

trabalho.

Enfim, meu muito obrigado a todos, nessas páginas têm um pedaço do meu coração.

“Erguem-se por ali soberbos casarões apalaçados, de dois e três

andares, sólidos como fortalezas, tudo pedra, cal e cabiúna; casarões

que lembram ossaturas de megatérios donde as carnes, o sangue, a

vida para sempre refugiram. Vivem dentro, mesquinhamente,

vergônteas mortiças de famílias fidalgas, de boa prosápia entroncada

na nobiliarquia lusitana. Pelos salões vazios, cujos frisos dourados se

recobrem da pátina dos anos e cujo estuque, lagarteado de fendas,

esboroa à força de goteiras, paira o bafio da morte. Há nas paredes

quadros antigos, crayons, figurando efígies de capitães-mores de barba

em colar. Há sobre os aparadores Luís XV brônzeos candelabros de

dezoito velas, esverdecidos de azinhavre. Mas nem se acendem as

velas, nem se guardam os nomes dos enquadrados – e por tudo se

agruma o bolor râncido da velhice. São os palácios mortos da cidade

morta”.

Monteiro Lobato

RESUMO

Esta pesquisa versa basicamente sobre dois pontos, a conservação do ambiente cultural e o

desenvolvimento do município de Laranjeiras/SE. O objetivo principal é analisar de que

forma a legislação urbanística e ambiental municipal contempla seu patrimônio material e

imaterial no que concerne às questões socioambientais. Pretende-se verificar, se o Direito à

cidade (LEFEBVRE, 2001) é respeitado, de modo a auxiliar na compreensão das questões

relativas à valorização do patrimônio material e imaterial para uma melhor sociabilidade.

Busca-se enfim ampliar o pensamento acerca da dimensão da proteção ambiental através

de uma discussão que demonstra que o ambiente artificial e cultural são tão importantes

quanto o ambiente natural na construção de sociedades sustentáveis. A hipótese é que o

fortalecimento dos laços de identidade constitui a base para a ampliação da visão da

importância do patrimônio cultural e é fator determinante para a perpetuação da cultura

local como um bem a ser conservado de modo que as futuras gerações possam conhecê-la.

E, ao que tudo indica, o legislador municipal no processo de elaboração das leis urbanas de

Laranjeiras, não levou em conta as questões e a complexidade dos problemas

socioambientais da cidade, de modo que estas não respondem de forma eficaz às demandas

concernentes à preservação, conservação e uso deste patrimônio. Justifica-se esse trabalho

como uma forma para comprovar que em se tratando de cidades históricas, a cultura deve

ser sempre o centro das atenções, logo, toda a legislação de uma cidade com riqueza

cultural material e imaterial como Laranjeiras sofre influência direta do seu arcabouço

cultural, visando o desenvolvimento socioambiental. Esta pesquisa se utiliza do método

dialético, considerando a necessidade de abordar os fatos dentro do contexto político,

social e econômico, de modo a favorecer uma interpretação dinâmica e totalizante da

realidade (PEREIRA, 2010). Para alcançar o objetivo, foi feito um levantamento

bibliográfico e documental, além da realização de entrevistas com diversos segmentos no

âmbito municipal, estadual e federal, além de diversas visitas in loco visando conhecer a

realidade social do lugar. Trata-se de uma pesquisa qualitativa, exploratória e descritiva

tendo em vista a problemática apresentada. O texto final foi estruturado em três partes: a

Fundamentação teórica, dividida em 03 (três) capítulos. Em seguida é apresenta a

metodologia utilizada. E por fim, o capítulo final com a compilação de dados coletados e

tratados sobre Laranjeiras/SE e a formação do patrimônio cultural material e imaterial da

cidade ao longo da sua história. Após o que foi possível concluir que os laços de identidade

sem dúvida são a base para a ampliação da visão da importância do patrimônio cultural e é

fator determinante para a perpetuação da cultura local como um bem a ser conservado de

modo que as futuras gerações possam conhecê-la. O que se espera é que os resultados

desta pesquisa contribuam para uma forma abrangente de se pensar a comunidade de

Laranjeiras, de modo que possa se diminuir os contrastes sociais bem como estreitar os

laços entre o povo e seu lugar.

PALAVRAS – CHAVE: Patrimônio cultural; conservação; legislação urbanística e

ambiental.

ABSTRACT

This research versa basically on two points, the conservation of the cultural environment and

the development of the municipality of Laranjeiras/SE. The main objective is to examine how

the municipal urban and environmental legislation contemplates its tangible and intangible

assets with respect to environmental issues. The aim is to verify if the right to the city

(LEFEBVRE, 2008) is respected, in order to assist in the understanding of issues relating to

the valuation of tangible and intangible heritage for a better sociability. The aim is to finally

expand the thinking about the size of environmental protection through a discussion that

demonstrates that the artificial and cultural environment are as important as the natural

environment in the construction of sustainable societies. The hypothesis is that the

strengthening of ties of identity is the basis for the expansion of the vision of the importance

of cultural heritage and is a determining factor for the perpetuation of local culture as an asset

to be preserved so that future generations can meet you. And, it seems, the municipal

legislature in the process of urban laws of Laranjeiras/SE, did not take into account the issues

and the complexity of social and environmental problems of the city, so that they do not

respond effectively to the demands concerning the preservation, conservation and use of this

heritage. Justified this work as a way to prove that when it comes to historic cities, culture

should always be the center of attention, so all laws of a city with rich cultural material and

immaterial as Laranjeiras is under direct influence of its framework cultural, aimed at

environmental development. This research uses the dialectical method, considering the need

to address the facts in the political, social and economic context, in order to promote a

dynamic and totalizing interpretation of reality (PEREIRA, 2010). To achieve the goal, a

bibliographic and documentary survey was conducted, in addition to interviews with several

segments at the municipal, state and federal, and several site visits (of the place) aiming at the

social reality. This is a qualitative, exploratory and descriptive research with a view to appear

problematic. The final text was structured in three parts: Theoretical framework, divided into

three (03) chapters. Next is presents the methodology used. Finally, the final chapter with the

compilation of collected and processed data on Laranjeiras/SE and the formation of the

material and immaterial cultural heritage of the city throughout its history. After which it was

concluded that the undoubtedly identity ties are the basis for the expansion of the vision of the

importance of cultural heritage and is a determining factor for the perpetuation of local culture

as an asset to be preserved so that future generations can meet. The hope is that the results of

this research contribute to a comprehensive way of thinking the community of Laranjeiras, so

that it can reduce social contrasts as well as strengthen ties between the people and place.

WORDS – KEY: Cultural environment; conservation; urban and environmental legislation.

LISTA DE FIGURAS

Figura 1 – Mapa de localização da cidade de Laranjeiras/SE (Map data @2014

Google)..................................................................................................................................... 90

Figura 2 – Matéria veiculada na Gazeta de Vitória/ES (IPHAN, 1989, folha 31)

.................................................................................................................................................. 91

Figura 3 – Igreja da Comandaroba – Laranjeiras/SE (Fotografia -Acervo pessoal)

.................................................................................................................................................. 93

Figura 4 – Gruta da Pedra Furada – Laranjeiras/SE (Fotografia - acervo pessoal)

.................................................................................................................................................. 98

Figura 5 – Fachada do Campus da Universidade Federal de Sergipe – Laranjeiras/SE

(Fotografia - acervo pessoal) ................................................................................................. 101

Figura 6 – Mapa do Conjunto Arquitetônico, paisagístico e urbanístico – Laranjeiras/SE

(IPHAN, 1989, fl.03) ............................................................................................................ 106

Figura 7 – Igreja Presbiteriana de Sergipe (1884) – Laranjeiras/SE (Fotografia - acervo

pessoal) ................................................................................................................................. 106

Figura 8 – Antiga Estação de Trem (2015) – Laranjeiras/SE (Fotografia- acervo pessoal)

............................................................................................................................................... 107

Figura 9 – Altar da Igreja da Comandaroba durante a Semana Santa, com as imagens

cobertas com um pano roxo (2013) – Laranjeiras/SE (Fotografia- acervo pessoal)

............................................................................................................................................... 110

Figura 10 – Festa dos Lambe-sujos e caboclinhos (2014) – Laranjeiras/SE (Fotografia -

Prefeitura Municipal de Laranjeiras) .................................................................................... 112

Figura 11 – Mapa de Macrozoneamento – Laranjeiras/SE (Anexo I- Plano Diretor do

Município) ............................................................................................................................ 118

Figura 12 – Perímetro Urbano – Laranjeiras/SE (Anexo I- Lei complementar nº 18/2008)

.............................................................................................................................................. 120

LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

CF/88- Constituição Federal de 1988

CONAMA - Conselho Nacional do Meio Ambiente

ECO 92- Conferência das Nações Unidas para o Meio ambiente e desenvolvimento

GRAU - Grupo de restauração e renovação arquitetônica e urbana

IBAMA: Instituto Brasileiro do Meio Ambiente

IBGE: Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística

IDH - Índice de Desenvolvimento Humano

IPHAN: Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional

JFSE- Justiça Federal de Sergipe

MPE- Ministério Público Estadual

MPF- Ministério Público Federal

ONU- Organização das Nações Unidades

PDDP- Plano Diretor de Desenvolvimento Participativo

SE- Sergipe

SUBPAC - Subsecretaria do Patrimônio Cultural do estado de Sergipe

SNUC- Sistema Nacional de Unidades de Conservação

SPU- Superintendência do Patrimônio da União

UNESCO - Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura.

SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO................................................................................................................... 14

FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA ....................................................................................... 18

2. MEIO AMBIENTE E DESENVOLVIMENTO: DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS ÀS

POLÍTICAS PÚBLICAS ........................................................................................................ 18

2.1 Homem x natureza: mudança de paradigma .............................................................. 18

2.2 A ética ambiental: a relação delicada entre o homem e a natureza ............................ 24

2.3 Socioambientalismo: eis que surge um novo conceito .............................................. 29

2.4 Políticas públicas ........................................................................................................ 33

3. BASE LEGAL .................................................................................................................... 37

3.1 A CONSTRUÇÃO DO DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO ................................. 37

3.2 A CARTA MAGNA DE 1988: A CONSTITUIÇÃO CIDADÃ E O MEIO AMBIENTE

................................................................................................................................................. 38

3.3 A POLÍTICA DE DESENVOLVIMENTO URBANO COMO PREVISÃO

CONSTITUCIONAL .............................................................................................................. 41

3.4 AS LEIS MUNICIPAIS ANALISADAS NA PESQUISA ............................................ 44

3.4.1 Plano diretor: instrumento básico da política urbana .................................................... 44

3.4.2 Código de edificações .................................................................................................... 47

3.4.3 Uso, ocupação e parcelamento do solo .......................................................................... 47

3.4.4 Código Ambiental municipal ......................................................................................... 48

3.5. A LEGISLAÇÃO BRASILEIRA E A PROTEÇÃO A CULTURA ............................ 48

3.6 O TOMBAMENTO ......................................................................................................... 52

3.7 DANO AO PATRIMÔNIO CULTURAL: CRIME LESIVO AO MEIO AMBIENTE

.................................................................................................................................................. 55

4 PATRIMÔNIO CULTURAL ........................................................................................... 61

4.1 CULTURA: UMA PALAVRA DE AMPLA ABRANGÊNCIA ..................................... 61

4.2 PATRIMÔNIO HISTÓRICO CULTURAL ..................................................................... 64

4.3 CONSERVAR OU PRESERVAR .................................................................................... 68

4.4 CULTURA E LUGAR ..................................................................................................... 71

4.5 DESENVOLVIMENTO VERSUS CULTURA: O DIREITO À CIDADE .................... 75

5 METODOLOGIA .............................................................................................................. 84

5.1 CONSIDERAÇÕES INICIAIS ......................................................................................... 84

5.2 LEVANTAMENTO DE DADOS ................................................................................... 85

5.3 TRATAMENTO DOS DADOS COLETADOS ............................................................... 89

6 RESULTADOS E DISCUSSÕES ................................................................................... 90

6.1 COMEÇANDO DO COMEÇO: A HISTÓRIA DE LARANJEIRAS ............................. 90

6.2 AS RIQUEZAS NATURAIS DE LARANJEIRAS ........................................................ 96

6.3 O DESENVOLVIMENTO URBANO DO MUNICÍPIO ............................................... 99

6.4 O PATRIMÔNIO CULTURAL DE LARANJEIRAS ................................................... 105

6.4.1 O Conjunto arquitetônico da cidade ..................................................................... 105

6.4.2 O patrimônio imaterial ......................................................................................... 109

6.4.3 O arcabouço legislativo da cidade de Laranjeiras: uma análise crítica das leis do

município ...................................................................................................................... 114

7 CONSIDERAÇÕES FINAIS ........................................................................................ 123

REFERÊNCIAS .................................................................................................................127

14

1 INTRODUÇÃO

A presente pesquisa versa basicamente sobre dois pontos, a conservação do ambiente

cultural e o desenvolvimento do município de Laranjeiras/SE. O objetivo principal é analisar

de que forma a legislação urbanística e ambiental municipal contempla seu patrimônio

material e imaterial no que concerne às questões socioambientais. Pretende-se verificar, se o

Direito à cidade (LEFEBVRE, 2001) é respeitado, de modo a auxiliar na compreensão das

questões relativas à valorização do patrimônio material e imaterial para uma melhor

sociabilidade. Busca-se enfim ampliar o pensamento acerca da dimensão da proteção

ambiental através de uma discussão que demonstra que o ambiente artificial e cultural são

tão importantes quanto o ambiente natural na construção de sociedades sustentáveis.

A área de estudo envolverá a zona urbana e os respectivos distritos da cidade de

Laranjeiras/SE, entre os anos de 2013 e 2014. A escolha do município se deu por tratar-se

de um dos mais antigos do país. Sua importância histórica está relacionada com as riquezas

por lá produzidas no Século XIX, que vão desde o conjunto arquitetônico, como pela

grande produção cultural e artística do povo laranjeirense.

No tocante à legislação urbana, analisaremos o Plano diretor participativo e o código

ambiental, sem muitas minúcias serão feitas algumas ponderações acerca da lei de uso,

ocupação e parcelamento do solo e o código de edificações, só por tratarem de leis que

regulamentam algumas diretrizes do Plano Diretor.

Preliminarmente, a análise seria feita apenas com o Plano Diretor da cidade, no

entanto, percebeu-se ao longo da pesquisa que o Plano Diretor da cidade destacava outras

leis como o Código ambiental, o qual por se tratar de norma ambiental deve ser analisado

para a obtenção dos objetivos desse trabalho.

Dessa forma, de todo arcabouço legal do município de Laranjeiras, segue um breve

introito do que seja cada um dos instrumentos analisados (Lei orgânica, Plano Diretor,

Código Ambiental, Lei de uso, ocupação e parcelamento do solo, código de edificações),

todos estes, instrumentos da política urbana, definidos pela Lei nº 10.251/01, o Estatuto da

Cidade, apesar da análise detalhada ser em torno do Plano Diretor e do Código Ambiental.

15

Segundo Martins, (2009, p. 22), “um problema de pesquisa origina-se da inquietação,

da dúvida, da hesitação, da curiosidade sobre uma questão não resolvida. A pesquisa se

inicia pelo problema e é a busca de solução que orienta toda lógica da investigação”.

Dessa maneira, a presente pesquisa caracterizou-se por buscar dados que

respondessem às seguintes questões: 1- Qual a influência do patrimônio cultural da cidade

de Laranjeiras/SE enquanto espaço socioambiental na formação da legislação do

município? 2- Qual a relação das pessoas com a cidade/cultura? 3- Qual a importância do

patrimônio cultural no processo de desenvolvimento de um lugar? 4- Como promover o

desenvolvimento sem destruir as riquezas culturais da cidade?

A hipótese é que o fortalecimento dos laços de identidade constitui a base para a

ampliação da visão da importância do patrimônio cultural e é fator determinante para a

perpetuação da cultura local como um bem a ser conservado de modo que as futuras

gerações possam conhecê-la . E, ao que tudo indica, o legislador municipal no processo de

elaboração das leis urbanas de Laranjeiras, não levou em conta as questões e a complexidade

dos problemas socioambientais da cidade, de modo que estas não respondem de forma eficaz

às demandas concernentes à preservação, conservação e uso deste patrimônio.

Justifica-se esse trabalho como uma forma para comprovar que em se tratando de

cidades históricas, a cultura deve ser sempre o centro das atenções, logo, toda a legislação de

uma cidade com riqueza cultural material e imaterial como Laranjeiras sofre influência direta

do seu arcabouço cultural, visando o desenvolvimento socioambiental. Pretende-se

comprovar que em se tratando de cidades históricas, a cultura deve ser sempre o centro das

atenções, logo, toda a legislação de uma cidade com riqueza cultural material e imaterial

como Laranjeiras sofre influência direta do seu arcabouço cultural, visando o

desenvolvimento socioambiental.

De caráter interdisciplinar, a pesquisa abrangerá diversos aspectos, buscando

correlacionar os que envolvem a relação do homem com o seu ambiente sob vários

enfoques, desde a filosofia, passando pela sociologia, antropologia, direito, dentre outros.

Vale destacar que foi através das disciplinas cursadas que se pode ampliar o olhar acerca

das mais diversas questões ambientais atinentes à pesquisa1.

1 1- Lógica e crítica da investigação científica constitui a base filosófica da presente pesquisa. É

importante analisar que foi através dessa disciplina que se pode conhecer o desenvolvimento ao longo

da história do pensamento científico. Foi uma releitura pessoal da filosofia, até então maculada pelos

preconceitos e pela ignorância face ao total desconhecimento.

16

E por fim, outra grande fonte de aprendizado foram os encontros realizados pelo

grupo de pesquisa Filosofia e Natureza. Fora do curriculum obrigatório e sem o caráter da

cobrança das disciplinas da matriz curricular do curso, participar do grupo proporcionou

um avanço pessoal no campo do conhecimento e da pesquisa. As orientações, as

discussões e principalmente as críticas foram alicerces necessários para assumir uma

postura adequada para quem tem interesses dentro do meio científico. A

multidisciplinaridade própria do curso e todo o caminho percorrido foram ingredientes

necessários para a construção do presente trabalho.

A dissertação será estruturada da seguinte maneira: Fundamentação teórica que está

dividida em 03 (três) capítulos, o capítulo 02 (dois) versa sobre a relação intrínseca entre

meio ambiente e desenvolvimento, no qual são abordados diversos pontos como a relação

homem e natureza ao longo dos séculos e as questões em torno da ética ambiental, bem

como o surgimento do socioambientalismo e as políticas públicas voltadas para a área

ambiental, tendo como embasamento teórico as ideias de (SANTOS, B., 2007),

(DIEGUES, 2001), (SACHS, 2002), (LARRÈRE, 2012), (FOLADORI, 2001),

(ROUSSEAU, 1997), (BECKER, 2012), (SANTOS, A.C., 2012), (SANTILLI, 2005),

dentre outros.

O terceiro capítulo discorre acerca da base legal que subsidiou a discussão aqui

pesquisada, com o ponto de vista da doutrina, das normas e da jurisprudência. Iniciando

com a evolução ao longo do tempo do direito ambiental no Brasil, a importância da

2- Instrumental e técnicas de pesquisa e os seminários integradores foram de suma importância

para a formação de pesquisadora. Foi através das críticas, das leituras e da prática que se aprendeu a

desenvolver uma pesquisa, desde a concepção do projeto até sua execução. Foi uma disciplina

primordial.

3- Sociedade, desenvolvimento e natureza e Cultura Urbana e modos de vida foram disciplinas

que trouxeram uma ampliação do olhar para além do mundo jurídico. O profissional de direito vive

atrelado a leis e esquece-se de olhar ao seu redor, na tentativa de enxergar o que existe para além dos

Códigos. A disciplina foi uma releitura do pensamento já fixado para os mais diversos aspectos que

envolvem a vida em sociedade, a relação entre os homens e a relação entre o homem e a natureza.

4- Desenvolvimento e sustentabilidade é uma reflexão para os fatores que contribuem

diuturnamente para a degradação ambiental. Proporcionou a oportunidade de convívio direto com a

natureza e os maiores problemas enfrentados nesse campo, discutiu-se a economia na visão ecológica

e ajudar a repensar no que consiste de fato o direito à vida.

5- Direito administrativo, constitucionalismo e cidadania foi a abordagem diferenciada do que se

aprende na graduação em Direito. Através de discussões sobre os mais diversos temas político-sociais,

constrói-se um novo modo de ver e pensar acerca das questões que envolvem o homem enquanto

cidadão. Fortemente ligado a questão do Direito a cidade, a disciplina buscou mostrar o poder do

Estado e dos cidadãos que o compõe.

17

Constituição Federal com a proteção conferida ao meio ambiente e constitucionalização da

política de desenvolvimento urbano e por fim uma breve descrição acerca dos instrumentos

legais que serão analisados na pesquisa, dentre os quais merece destaque o Plano Diretor.

Como principais referências, (BRASIL, 1988 e 2001), (AMADO, 2011), (BELTRÃO,

2009), (LEITÃO, 2006), (LEITE, E., 2011), (MEIRELLES, 2011) e (MILARÉ, 2009).

E finalizando a base teórica, o quarto capítulo trata acerca do Patrimônio Cultural,

abordando a abrangência do termo, numa discussão que começa em torno do conceito de

cultura e em seguida sobre patrimônio histórico cultural, fazendo em seguida uma análise

dos termos conservar e preservar, discutindo a correlação entre cultura e lugar e

finalizando com o contraponto entre cultura e desenvolvimento, trazendo à tona o direito à

cidade. Embasam este capítulo a ideia de grandes autores, dentre os quais merecem

destaque (BOLLE, 2000), (LEFEVBRE, 2001), (SANTOS, B., 1982), (EUFRASIO,

1999), (DIDEROT, 2011), (FORTUNA, 2006), (ORTIZ, 1998), dentre outros.

O quinto capítulo apresenta a metodologia utilizada na pesquisa, descrevendo os

caminhos trilhados para que se chegasse aos resultados e discussões que são apresentados

no sexto capítulo. Esse consiste no diagnóstico da situação observada e analisada, através

de uma reflexão crítica. Foi feito o estudo sobre Laranjeiras/SE e a formação do

patrimônio cultural material e imaterial da cidade ao longo da sua história. Buscando

analisar através de todos os dados e informações coletadas de que forma as metodologias

participativas podem ser o caminho para a conservação, revitalização e uso do patrimônio

cultural de Laranjeiras, avaliando as questões urbanas, socioambientais e éticas acerca da

discussão.

18

FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

2. MEIO AMBIENTE E DESENVOLVIMENTO: DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS ÀS

POLÍTICAS PÚBLICAS

2.1. Homem x natureza: mudança de paradigma da mera exploração para o uso racional

O período compreendido entre o século XIX e meados do século XX, foi marcado

pelas maiores tragédias contra a humanidade. O novo personagem da história é o cidadão.

Ou seja, o exercício pleno da cidadania se confunde com o exercício dos mais diversos

direitos, quais sejam políticos, civis e sociais. Os direitos políticos são aqueles que dizem

respeito à participação do cidadão no governo. O modelo brasileiro reconhece o direito à

participação popular, mas com um acesso ainda limitado, o poder conferido pela sociedade

civil ainda é feito através do voto. Os direitos sociais são um dos pilares de sustentação da

dignidade da pessoa humana, uma vez que assegura aos cidadãos em geral o acesso ao

trabalho, à educação, ao salário digno. E por fim, os direitos civis, ou melhor, os direitos

fundamentais à vida, à liberdade, à igualdade e à fraternidade.

Os chamados direitos fundamentais têm sua origem histórica marcada pelos ideais

advindos da Revolução Francesa e surgiram com a ideia de ser uma frente de defesa do

homem em face do poder estatal. Estabelece e ganha reforço nas ideias de Locke e

Rousseau acerca dos direitos naturais do homem. A doutrina dividiu os direitos

fundamentais em três dimensões ou gerações, baseados nos ideais da Revolução Francesa:

liberdade, igualdade e fraternidade.

A primeira dimensão advém principalmente das ideias iluministas na qual a

liberdade é vista como um Direito Natural do homem, como o direito à vida. Segundo

(BECKER, 2008), a liberdade enquanto qualidade inseparável configuraria um dever do

19

homem para consigo mesmo. Ou seja, os direitos de primeira dimensão precedem o

homem e o acompanham por toda sua vida. O pós-guerra vem como o ápice da degradação

do homem, era preciso resgatar o mínimo possível de dignidade que restava após tanta

barbárie, com a garantia mínima de direitos. A segunda dimensão constitui o direito a

igualdade mediante a garantia dos direitos sociais.

E por fim, os direitos de terceira geração embasados na ideia de fraternidade. É

chegado o momento em que não se pensa apenas mais nos direitos individuais do homem,

aqui os direitos tomam outra dimensão e dizem respeito à coletividade. Os direitos da

terceira dimensão são abrangentes, englobam em verdade a liberdade e a igualdade. Aqui o

homem chega à sua plenitude quando redescobre a solidariedade. Ele não pensa apenas

mais em si mesmo, mas, existe um comprometimento do homem consigo mesmo e com o

próximo, mesmo que este próximo seja as futuras gerações. No pensamento de Robert

Alexy, quando o estado assegura os direitos coletivos está impondo a garantia aos direitos

individuais, conforme se depreende no trecho que segue:

Puede considerarse como un bien colectivo el que una sociedad está organizada de

forma tal que en ella pueda vivirse agradable y variadamente y puede, además,

sosternese que el Estado, cuando están asseguradas cosas más fundamentales, está

obligado a crear y conservar este bien colectivo. Pero hay que poner em duda el

que existan derechos individuales para los cuales este bien sea exclusivamente un

médio... Pueden haber casos en los cuales existan buenas razones para dotar al

individuo con derechos, de forma tal que pueda para si o como abogado de la

comunidad imponer bienes colectivos, (ALEXY, 2004, p. 203)

Acerca da ideia anteriormente passada, ao mesmo tempo em que se assegura um

direito coletivo, consequentemente está se assegurando um direito individual, vez que o

objetivo comum de ambos os institutos é assegurar a formação de uma sociedade justa e

igualitária. Dentro dessa linha de pensamento podemos considerar o direito ao ambiente

sadio como um bem de suma importância para a qualidade de vida do homem, mas que se

confunde com o próprio direito à vida. É um direito, o qual não se pode identificar a

titularidade, mas que a garantia de sua eficácia atinge da mesma forma a todos

indistintamente.

Nesse passo, compilando os mais diversos conceitos, entende-se que os direitos

humanos compreendem não apenas normas, mas também valores e princípios com vistas a

assegurar a dignidade da pessoa humana, independente de raça, cor, credo e religião. São

20

direitos elencados em declarações universais, pactos internacionais e convenções, dos

quais merece destaque a Declaração Universal dos Direitos Humanos.

No Brasil, com a promulgação da Constituição de 1988, os direitos fundamentais

tornaram-se garantias constitucionais, elencados nos mais diversos artigos e incisos da

Carta Magna. É assim que, segundo Sachs (2002, p. 47), “desenvolvimento e direitos

humanos alcançaram proeminência na metade do século, como duas ideias-força

destinadas a exorcizar os horrores da Segunda Guerra mundial”. Dentro dessa nova

perspectiva e após todo processo de redemocratização, o Brasil, signatário de tratados de

direitos humanos, em 1988, com a ruptura com o regime militar e o começo de uma nova

perspectiva na sociedade brasileira é que foi promulgada a chamada “Constituição

Cidadã”, que traz já no bojo dos seus primeiros artigos uma série de direitos aos cidadãos

brasileiros (sociais, políticos e civis), os chamados direitos fundamentais.

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza,

garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade

do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos

seguintes:

[...]

§ 2º - Os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros

decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados

internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte. (BRASIL, 1988)

De acordo com Silva (2005, p. 122), “a tarefa fundamental do Estado Democrático

de Direito consiste em superar as desigualdades sociais e regionais e instaurar um regime

democrático que realize a justiça social”. Os direitos fundamentais visam proteger e

garantir à dignidade humana, princípio basilar, que deve ser assegurado a todos,

indistintamente. Constituem um equilíbrio de forças entre o poder estatal e a sociedade

civil. Na verdade, seguindo o pensamento de (SARLET, 2012), pode-se dizer que estes

direitos se constituem como a defesa do cidadão quanto a possíveis arbitrariedades do

Estado. Esse enfrentamento é fruto do pensamento iluminista e das mudanças sociais e

políticas pelas quais passaram a sociedade após a ruptura com o poder real. Atualmente, no

cenário brasileiro, mesmo não vivendo numa monarquia, é preciso que o cidadão tenha

prerrogativas ante o poder estatal, como se pode comprovar no trecho abaixo:

[...] Assumem particular relevo no rol desses direitos, especialmente pela sua notória

inspiração jusnaturalista, os direitos à vida, à liberdade, à propriedade e à igualdade

21

perante a lei. São, posteriormente, complementados por um leque de liberdades,

incluindo as assim denominadas liberdades de expressão coletiva (liberdades de

expressão, imprensa, manifestação, reunião, associação etc.) e pelos direitos de

participação política tais como o direito de voto e a capacidade eleitoral passiva,

revelando de tal sorte, a íntima correlação entre os direitos fundamentais e a

democracia. Também o direito de igualdade, entendido como igualdade formal

(perante a lei) e algumas garantias processuais (devido processo legal, habeas

corpus, direito de petição) se enquadram nesta categoria [...] (SARLET, 2012, p. 47)

Assim, é lícito afirmar que o Brasil sendo considerado um estado democrático de

direito consagra na sua Constituição, princípios fundamentais como a soberania, a

cidadania, a dignidade da pessoa humana, bem como valores sociais do trabalho e da livre

iniciativa e o pluralismo político. É nesse sentido que Marshal afirma que:

A cidadania exige um elo de natureza diferente, um sentimento direto de

participação numa comunidade baseado numa lealdade a uma civilização que é um

patrimônio comum. Compreende a lealdade de homens livres, imbuídos de direitos e

protegidos por uma lei comum. Seu desenvolvimento é estimulado tanto pelo

gôzo(sic) dos mesmos, uma vez adquiridos. (MARSHALL, 1967, p. 84)

Observe-se que a associação de homens livres seria o primeiro passo para uma lei

comum e quiçá uma lei eficaz. Em outras palavras, os homens são livres, eles se juntam,

passam a ter que conviver e por isso precisam estabelecer regras de convivência. Na

mesma linha de pensamento, (BECKER, 2008), acredita que a passagem para o estado de

sociedade, implicaria numa mudança de análise, do homem livre para o homem que a

partir de agora precisa viver sob o julgo de leis.

Dentro desse contexto, passa a vigorar dentre as preocupações do homem, as

questões relativas ao meio ambiente. A ideia equivocada de que os recursos naturais são

infindáveis, fomentou um modelo de exploração sem preocupação com consequências

futuras, onde predominava uma cultura de colonização altamente exploradora

(FERNANDES, 2009). Uma mudança de paradigmas urgia. Era preciso romper com

modelos exclusivos de exploração capitalista e passar a perceber que em se tratando de

questões ambientais, o homem não podia ser mero espectador, este precisava ser inserido

como um sujeito não só de deveres, mas antes de tudo, portador de direitos. É no final dos

anos 60 e na década de 70, que surge o que Diegues (2001, p. 39) chama de “proposta do

desenvolvimento sustentado”, reconhecendo como base do crescimento o meio ambiente e

22

passando a se pensar nas principais estratégias que viessem a proporcionar para os países

subdesenvolvidos crescimento, mas ao mesmo tempo resistência às crises econômicas.

A Conferência das Nações Unidas sobre o Ambiente Humano, de 1972, ocorrida em

Estocolmo, colocou o meio ambiente na agenda internacional. Ela foi precedida pelo

encontro Founex, de 1971, implementado pelos organizadores da Conferência de

Estocolmo para discutir, pela primeira vez, as dependências entre o desenvolvimento

e o meio ambiente, e foi seguida de uma série de encontros e relatórios

internacionais que culminaram, vinte anos depois, com o Encontro da Terra no Rio

de Janeiro. (SACHS, 2002, p. 48)

A proposta de (DIEGUES, 2001), era de uma estruturação das sociedades em

termos de sustentabilidade própria, segundo suas tradições culturais, seus parâmetros e sua

composição étnica específica. Na verdade um chamado à mudança de paradigmas. A

natureza, em todos esses modelos, era considerada como um elemento imutável, fonte

inesgotável de matéria-prima, e não como um sistema vivo com processos e funções

próprias [...] (DIEGUES, 2001, p. 42) e era essa concepção que precisava ser mudada

urgentemente.

Ponto bem visível quando Diegues (2001, p. 52), faz um contraponto entre

“Desenvolvimento” e “Sociedade sustentável” e afirma que o conceito de “sociedades

sustentáveis” é mais adequado do que “desenvolvimento sustentado”, na medida em que

“possibilita a cada uma delas definir seus padrões de produção e consumo, bem como o de

bem-estar a partir de sua cultura, de seu desenvolvimento histórico e de seu ambiente

natural”. Em que pese a preocupação central trazida por (DIEGUES, 2001), está no

conjunto de preocupações sobre as relações entre homem e natureza e dos homens entre si.

A questão é válida e atual, o que leva a necessidade de se criar novas utopias para o

século XXI, pensando na “diversidade de sociedades sustentáveis, com opções econômicas

e tecnológicas diferenciadas, voltadas principalmente para o “desenvolvimento harmonioso

das pessoas” e de suas relações com o mundo natural” (DIEGUES, 2001, p. 55).

A proposta é semelhante ao modelo de quebra do pensamento hegemônico de

Boaventura Sousa Santos (2007), no livro Renovar a teoria crítica e reinventar a

emancipação social. Ou seja, o que os dois autores trazem é a necessidade de se romper

com o pensamento dominante, mas já ultrapassado, é mudar a forma de pensar e

consequentemente a de agir frente às novas necessidades que surgem.

23

Agora, o foco da atenção concentra-se tanto na relação das forças produtivas com as

forças sociais, como com a natureza. A preocupação com a degradação do fator

humano é estendida ao meio ambiente que agora é percebido como uma base de

recursos finitos que estabelece severos limites a um crescimento econômico

contínuo e à própria reprodução da espécie humana. (LEIS, 1999, p. 121)

Destaque-se que o Brasil, colonizado por Portugal, mantém em suas raízes a cultura

altamente predadora e exploratória, mas em contrapartida, a sensibilização para a finitude

dos recursos naturais urge no chamamento a mudança de atitude imediata, de modo a

evitar catástrofes irremediáveis. No pensamento de Becker e Becker (2014), a ação

antrópica é que potencializa o efeito das catástrofes, “tudo que fazemos repercute de

alguma maneira sobre o mundo em que vivemos (2014, p. 120). E é este pensamento

crítico que precisa ser desenvolvido pela sociedade. O ambiente saudável e equilibrado é

um direito, mas antes de tudo dever de todos manter a sua incolumidade e isso passa

basicamente pela mudança de hábitos, dentre os quais o uso racional daquilo que a

natureza nos oferece.

Importante destacar que o objetivo dessa pesquisa não é defender um retrocesso,

um retorno à vida pré-histórica. Muito pelo contrário, defende-se o desenvolvimento que

assegure a garantia de meio ambiente ecologicamente equilibrado e isso depende única e

exclusivamente do homem e de suas atitudes. E quando se fala em homem, não está aqui a

se tratar apenas daqueles que nos representam politicamente. Não, ao se tratar de

conservação ambiental a igualdade de ação atinge todos os homens. Nesse sentido, forçoso

comentar acerca do que diz Rousseau na Carta ao Senhor Voltaire, da responsabilidade

dos próprios homens em produzir suas desgraças. Destaca ainda a ambição que nos torna

egoístas, materialistas e cegos, onde a única luz enxerga-se nos bens materiais. Trazendo a

discussão do autor em questão aos dias atuais, podemos entender que a medida que a sede

de consumo do homem aumenta, mais ele compromete o seu futuro e das futuras gerações,

produzindo como anteriormente dito, as suas próprias tragédias.

Utilizando o pensamento de (SACHS, 2002), podemos dizer que não se pode

equacionar conservação com a opção de “não-uso” dos recursos naturais e sim com o uso

racional para atender as necessidades. Tal ideia fica clara em passagens como esta na qual

o autor propõe que:

24

[...] De modo geral, o objetivo deveria ser o do estabelecimento de um

aproveitamento racional e ecologicamente sustentável da natureza em benefício das

populações locais, levando-as a incorporar a preocupação com a conservação da

biodiversidade aos seus próprios interesses, como um componente de estratégia de

desenvolvimento. Daí a necessidade de se adotar padrões negociados e contratuais

de gestão da biodiversidade. (SACHS, 2002, p. 53)

O caminho mais apropriado para consolidar a conservação do meio ambiente, o

desenvolvimento sustentável e o respeito à diversidade cultural dos povos é justamente

tornar esses atores sociais como os mais importantes personagens do contexto,

responsáveis diretos pela preservação do meio em que vivem. O Princípio 1 da Declaração

do Rio de Janeiro sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento traz em seu enunciado a

seguinte definição:

[...] Os seres humanos constituem o centro das preocupações relacionadas com o

desenvolvimento sustentável. Têm direito a uma vida saudável e produtiva, em

harmonia com a natureza. [...] (UNITED NATIONS, 1992)

Ao se falar em uso racional, subentende-se que é preciso haver um acordo implícito

entre o homem e a natureza. Ou seja, é preciso redefinir essa relação, estabelecendo um

contrato ético ou o contrato natural, conforme definido na obra de mesmo nome de Michel

Serres. A seguir, a discussão acerca dessa relação entre o homem e seu ambiente.

2.2 A ética ambiental: a relação delicada entre o homem e a natureza

Durante muito tempo, grosso modo, a preocupação ambiental de um modo geral, tanto

por parte do povo, como do poder público se resumia a criação e mantença de parques e

reservas ecológicas. A maior parte da população, alheia ao processo de degradação ambiental

que crescia ao seu redor enxergava que a preservação ambiental referia-se apenas a plantas e

animais silvestres ou selvagens. O homem criava em seu imaginário os espaços que

legalmente deveriam ser protegidos e meio que assinava um atestado que funcionava como

uma “auto-liberação” inconsciente de que já tinha feito a sua parte. Não existia o

compromisso e nem a sensibilização de ser o homem parte integrante da natureza e a medida

que a voracidade humana contribui para sua destruição, automaticamente está promovendo a

sua própria destruição.

25

A natureza por muito tempo se apresentou assim: como o que está fora, o exterior,

de onde se poderia extrair, que se poderia transformar, onde se poderia depositar o

que se tinha em excesso. A humanidade, as “placas físicas” de homens, ocupam a

terra inteira, não resta nenhuma reserva, nenhuma exterioridade. Globalidade rima

com fragilidade. “Nossa potência coletiva atinge os limites de nosso hábitat global”

(SERRES, 1990, p. 54).(LARRÈRE, 2012, p. 18)

Com o passar dos anos, as questões ambientais tiveram seus contextos ampliados para

o que realmente importava. Dentre os equívocos estava não inserir o homem no contexto

ambiente, como se este não fosse um ser integrante da natureza e sim um ser superior pela sua

capacidade de raciocínio e que a degradação ambiental era consequência dos avanços

tecnológicos, como se nada tivesse com todo esse processo.

Essas ideias foram molas propulsoras para uma degradação ambiental crescente.

Objetivando o estabelecimento de uma relação harmoniosa entre homem e natureza, Michel

Serres traz à tona a necessidade de se estabelecer um contrato natural, o qual seria uma

espécie de acordo entre o homem e a natureza. Vale falar do conceito de contrato no mundo

jurídico que é um acordo de vontade das partes. Talvez fosse difícil pensar em como a

natureza poderia manifestar sua vontade expressamente a fim de se estabelecer um contrato

com o homem.

Mas, conforme (CARSON, 2010) a natureza tem também seu modo de se manifestar,

não através de palavras ou de escritos, mas através de mudanças que vão ocorrendo, muitas

vezes passando despercebidas aos olhos dos homens, que ocupados em demasiado com seus

interesses materiais não percebem que existe um clamor implícito de pare, olhe e pense. Em

seu texto “A atualidade do Contrato Natural”, Larrère examina o conceito proposto pelo autor

francês e escreve:

As afirmações sobre o contrato natural, sobre a natureza tornada sujeito são melhor

compreendidas quando nos damos conta que a natureza para Serres, é o melhor que

a ciências diz dela em um determinado momento. O que caracteriza a natureza,

atualmente, é sua globalidade, o conjunto de suas relações científicas e técnicas, que

a liga com o mundo e desenha a configuração. Porque elas fazem testemunhas os

objetos, as ciências não são somente um discurso sobre o mundo, elas estabelecem

uma relação com a natureza, elas fazem dela uma parceria. (LARRÈRE, 2012, p. 24)

Discutir o papel do homem nesse processo é fundamental, mas não é tarefa das mais

fáceis. A definição biológica do homem é estabelecedora da sua forma de se relacionar com a

natureza. De acordo com (FOLADORI, 2001) é necessário comparar o homem com os demais

26

seres vivos para explicar como as necessidades humanas são as responsáveis pela definição

cultural. Ou seja, à medida que os seres se desenvolvem, são necessárias funções novas,

gerando necessidades diferentes, seja de mobilidade, alimentação, etc., criando sempre um

novo desafio para aquela espécie. Ainda dentro da linha de raciocínio do autor, a principal

especificidade humana é a capacidade de pensar, que faz com que os homens imponham

condições artificiais com o intuito de modificar a natureza.

A ambição do homem é sem dúvida a maior responsável pelos processos de degradação

ambiental. Para (BECKER, 2012, p. 55), “O problema da ação humana é seu desregramento,

o amor pelo poder e pelo domínio acaba gerando monstros”.

Não satisfeito em produzir o necessário, produz-se o supérfluo e é esse excesso que

contribuirá para a modificação do espaço em que se vive em total dissonância ao processo de

desenvolvimento da natureza, que é mais sábia e gradativa em suas mudanças. Para

(ROUSSEAU, 1997), o homem é um ser insaciável, quanto mais ele tem, mais ele quer e

acaba por perder sua liberdade, tornando-se escravo de si mesmo. Afirma ainda que “é preciso

que a consciência de nossa responsabilidade seja equivalente ao potencial possuído pelo

homem contemporâneo, de causar danos, seja aos contemporâneos, à natureza extrínseca ao

homem, ou mesmo às futuras gerações” (BECKER, 2012, p. 57).

Nenhuma ética anterior vira-se obrigada a considerar a condição global da vida

humana e o futuro distante, inclusive a existência da espécie. O fato de que hoje eles

estejam em jogo exige, numa palavra, uma nova concepção de direitos e deveres,

para a qual nenhuma ética e metafísica antiga pode sequer oferecer os princípios,

quanto mais uma doutrina acabada. (JONAS, 2006, p. 41)

A proposta de (ROUSSEAU, 1997) e (JONAS, 2006) é de que os avanços devem ser

feitos, mas não podem ser realizados de forma impensada, irresponsável, é preciso que haja

ética na conduta humana. Essa ética consistiria no uso racional da natureza, de maneira que

outrora às futuras gerações tenham o mesmo direito dos seus predecessores. É o homem,

único responsável pelo mal ou pelo bem que lhes acontece. Destaque ainda que na Carta ao

Senhor Voltaire sobre a Providência, Rousseau chama-nos a uma análise mais meticulosa dos

fatos que acontecem. Ele não descarta que nos sensibilizemos diante das tragédias, mas que

tenhamos diante delas um olhar crítico e que seja capaz de visualizar quem de fato deu causa

ao acontecimento. O homem sempre se considerou um Deus e assim capaz de promover

mudanças a seu bel-prazer, como se pudesse prever todas as consequências. O domínio da

27

natureza está incluído nesse rol de controle humano, mas vez ou outra, e porque não dizer

quase sempre, a resposta sempre vem em proporção ao estrago feito pelo homem.

A ética diz respeito, justamente, à razão de agir e ao modo de agir. Ela está ligada

aos valores que cada um estabelece para si mesmo e para o outro, numa relação

entre meios e fins. Nesse sentido, há certas perguntas que o cientista não pode deixar

de fazer-se em caso de dúvida: “O resultado daquilo que faço trará benefícios para

todos ou para uma pequena minoria?” Será que o resultado só a mim beneficiará?

“Estou pondo meu conhecimento a serviço do desenvolvimento da humanidade ou

de uma ideologia, um partido ou, simplesmente, de uma instituição que só visa a

certos fins, como o lucro, por exemplo?” (SANTOS, A.C., 2012, p. 38)

Merece destaque ainda a ideia proposta por Serres e comentada por (LARRÈRE, 2012),

de que a natureza e o homem são um só, um é parte integrante do outro, atribuindo

responsabilidades aos homens no que concerne ao ambiente, justamente pela sua capacidade

de raciocínio. Considerando ainda que a natureza que outrora fora vista como algoz, hoje é

vítima, o que custa ao homem entender que a partir do momento em que se vitimiza a

natureza, a vítima em potencial será ele próprio que terá que arcar com as consequências da

sua intempérie. Haveria o estabelecimento do que ele chama de contrato natural.

A ideia básica seria de que fosse estabelecida uma regra, na qual os homens retiram da

natureza, de forma sensata o que precisam. Se outrora fora necessário estabelecer um Contrato

Social (ROUSSEAU, 2002), para organizar a vida entre os homens, nada mais justo que se

estabeleça um Contrato Natural, este entre o homem e a natureza. Ou seja, o homem deixa o

papel de mero predador/consumidor, e passa a ser antes de tudo aquele que conserva

pensando no futuro, desde quando usa a natureza de forma racional.

Faz-se necessária uma mudança de atitude frente a estes seres (natureza e gerações

futuras) que até o momento não podem requerer direitos mas em relação aos quais não

podemos negar certos deveres. A relação deixa de ser exploratória/predatória e passa a ser

equilibrada/consciente. Isso faria com que ao invés de esgotar os recursos naturais e provocar

mudanças desastrosas no meio natural, o homem passe a assegurar o mesmo direito de

usufruir que teve às futuras gerações. É a redescoberta da solidariedade, a formação de uma

cadeia conservacionista ininterrupta.

Face à este frágil equilíbrio que se estabelece entre o homem e o ambiente em que vive,

requer-se uma mudança em relação às éticas tradicionais, que devem agora incluir aspectos

que foram por muito tempo negligenciados. É preciso atentar para a ética ambiental. Segundo

(SANTOS, A.C., 2012, p. 38), “a ética ambiental, que é um ramo da ética aplicada, vai

28

perguntar-se sobre a relação entre os homens e o meio ambiente, ou seja, o conjunto de seres

vivos e inanimados que existem no planeta”.

Ainda de acordo com (SANTOS, A.C., 2012), a discussão da ética ambiental gira em

torno do papel do homem na natureza, destacando o antropocentrismo, biocentrismo e

zoocentrismo. Entre as quais a diferença está em o que ou quem se torna o centro, qual seja, o

homem, a vida ou os animais, respectivamente.

Particularmente, com base nas leituras e nos estudos realizados durante esta pesquisa, o

termo mais adequado para se tratar de meio ambiente, seria o biocentrismo. Há correntes

ainda que prefiram o termo “ecocentrismo”, do qual se depreende do prefixo “eco” o

sinônimo de casa/habitat, logo grosso modo, o centro das preocupações seria o habitat.

Dentro desse contexto, importante trazer a baila algumas correntes antropológicas que

contribuem para o estudo da relação homem/natureza, quais sejam: Ecologia cultural,

antropologia ecológica, etnociência e a antropologia neomarxista ou econômica.

Para (DIEGUES, 2002, p. 77), a ecologia cultural seria a corrente “que estuda os

processos adaptativos por meio dos quais as sociedades são afetadas por ajustes básicos, e

através deles o homem utiliza o meio ambiente”. Já a antropologia ecológica seria a corrente

que “ao contrário da ecologia cultural toma como unidade de análise as populações humanas

em seus parâmetros demográficos, não os grupos sociais em suas características culturais”

(DIEGUES, 2002, p. 78). Ainda segundo o mesmo autor, a etnociência seria a “que parte da

linguística para estudar o conhecimento das populações humanas sobre os processos naturais,

tentando descobrir a lógica subjacente ao conhecimento humano do mundo natural, as

taxonomias e classificações totais” (DIEGUES, 2002, p. 79).

Finalmente, a antropologia neomarxista (ou econômica) através dos seus representantes,

teria a função de contribuir “para a análise das relações entre as sociedades chamadas

“primitivas” e seu ambiente” (DIEGUES, 2002, p. 80).

Ante todo o exposto, a conclusão mais lógica é que o homem enquanto ser integrante da

natureza, ao conservá-la assegura tanto seus direitos como cumpre com deveres para consigo

mesmo e para com as outras espécies de seres vivos sejam estes animais ou vegetais, em face

da sua primazia ante sua capacidade de pensar, o homem chama para si uma responsabilidade

pelo bom uso dos recursos naturais e do ambiente em que vive. Logo, independente da teoria

a ser adotada, haverá sempre imputada ao homem à responsabilidade por seus atos lesivos.

29

2.3 Socioambientalismo: eis que surge um novo conceito

Nesse novo contexto histórico, o homem é agora sujeito portador de direitos e

deveres, pode-se dizer que pelo simples fato de existir o ser humano já é titular de direitos

naturais e inalienáveis, os chamados direitos fundamentais. Direitos intimamente ligados à

formação do cidadão.

[...] a liberdade e a participação não levam automaticamente, ou rapidamente, à resolução de

problemas sociais. Isto quer dizer que a cidadania inclui várias dimensões e que algumas

podem estar presentes sem as outras. Uma cidadania plena, que combine liberdade,

participação e igualdade para todos é um ideal desenvolvido no Ocidente e talvez inatingível.

Mas ele tem servido de parâmetro para o julgamento da qualidade da cidadania em cada país e

em cada momento histórico [...] (CARVALHO, 2001, p. 8-9)

Doutrinariamente os direitos fundamentais foram divididos em gerações ou

dimensões (liberdade (1ª dimensão), igualdade (2ª dimensão) e fraternidade (3ª dimensão)),

levando-se em conta que seu surgimento se deu de forma gradativa, conforme a demanda

de cada época e como já explicado no capítulo anterior. Sendo de caráter elucidativo, os

esclarecimentos do Ministro Celso de Melo, em julgamento de um Mandado de Segurança

que pleiteava a anulação de ato expropriatório, pela falta de provas no tocante a notificação

pessoal do expropriado, como garantia do devido processo legal, demonstrando a força dos

direitos fundamentais como um ponto de equilíbrio entre o cidadão e o por Estatal:

[...] enquanto os direitos de primeira geração (direitos civis e políticos) – que

compreendem as liberdades clássicas, negativas ou formais – realçam o princípio da

liberdade e os direitos de segunda geração (direitos econômicos, sociais e culturais)

– que se identificam com as liberdades positivas, reais ou concretas – acentuam o

princípio da igualdade, os direitos de terceira geração, que materializam poderes de

titularidade coletiva atribuídos genericamente a todas as formações sociais,

consagram o princípio da solidariedade e constituem um momento importante no

processo de desenvolvimento, expansão e reconhecimento dos direitos humanos,

caracterizados enquanto valores fundamentais indisponíveis, pela nota de uma

essencial inexauribilidade. [...] (LAFER apud MELLO, 1995, p. 23)

No meio de todo esse processo de politização e organização é que acontece em

1972, a Conferência de Estocolmo, que é o primeiro grande debate mundial sobre o meio

ambiente, é um marco para o novo pensamento, no qual se associa a necessidade de

desenvolvimento econômico e social, o socioambientalismo, ou seja, as políticas

ambientais só surtirão efeitos mediante um trabalho conjunto e integrado da sociedade, no

30

qual a sensibilização das comunidades locais é que será o meio mais eficiente de se

conservar o ambiente.

Não era mais suficiente pensar em um novo modelo de desenvolvimento. Era

possível aqui visualizar que o modo de produção exclusivamente exploratório findaria em

esgotamento total dos recursos naturais. Em pauta, o homem versus natureza e uma

preocupação o futuro das próximas gerações. Os documentos oficiais que instauram as

relações entre as diversas nações e destas com o meio ambiente começam a integrar na sua

redação a necessária preocupação com o meio circundante.

O homem é ao mesmo tempo criatura e criador do meio ambiente, que lhe dá

sustento físico e lhe oferece a oportunidade de desenvolver-se intelectual, moral,

social e espiritualmente. A longa e difícil evolução da raça humana no planeta

levou-a a um estágio em que, com o rápido progresso da Ciência e da Tecnologia,

conquistou o poder de transformar de inúmeras maneiras e em escala sem

precedentes o meio ambiente. Natural ou criado pelo homem, é o meio ambiente

essencial para o bem-estar e para gozo dos direitos humanos fundamentais, até

mesmo o direito à própria vida. (ONU, 1972)

Da Convenção de 1972, foram extraídos 23 (vinte e três) princípios com o objetivo

de orientar a humanidade no tocante às reais necessidades “para a preservação e melhoria

do ambiente humano” (ONU, 1972), pensando nas presentes e futuras gerações,

destacando já em seu Princípio 1(um), os direitos fundamentais e as suas três dimensões. O

Brasil teve pouca ou quase nenhuma participação, mas os reflexos trouxeram algumas

mudanças para o país, como a criação de uma Secretaria de Meio Ambiente. Mas é com a

ruptura com o regime militar e processo de instauração da democracia que o

socioambientalismo no país começa a ganhar força já na década de 80, principalmente com

a edição da Lei nº 6980/81, que implementa a Política Nacional do Meio Ambiente. A lei

em questão define em seu artigo 2º o chamado desenvolvimento sustentável:

A Política Nacional do Meio Ambiente tem por objetivo a preservação, melhoria e

recuperação da qualidade ambiental propícia à vida, visando assegurar, no País,

condições ao desenvolvimento sócio-econômico, aos interesses da segurança

nacional e à proteção da dignidade da vida humana. (BRASIL, 1981)

Em outras palavras, o homem é parte integrante do ambiente e a sua correta relação

com ele é que poderá assegurar que as futuras gerações possam também usufruir de um

meio ambiente sadio e ecologicamente equilibrado. No pensamento de Diegues (2001), é a

31

partir da estruturação das próprias sociedades segundo suas tradições culturais, seus

parâmetros e sua composição étnica específica que se chegará a uma sustentabilidade

própria.

Fazendo um contraponto entre “Desenvolvimento” e “Sociedade sustentável”,

Diegues (2001, p. 52-53), traz um novo conceito: “sociedades sustentáveis” representando

a possibilidade das próprias comunidades, localmente, definirem seus padrões de produção

e consumo, bem como as questões que envolvam bem-estar a partir de sua cultura, de seu

desenvolvimento histórico e de seu ambiente natural.

A ideia mestra de Diegues (2002) é que o isolamento como forma de preservação

da cultura não funciona. Ou seja, a proposta preservacionista, emergida de teóricos norte-

americanos é o total isolamento da natureza em relação ao homem. São criadas áreas,

dessas áreas são retirados inclusive os moradores nativos, ou as chamadas comunidades

tradicionais, sob a alegação de que supostamente a natureza funciona sozinha. No entanto,

a natureza muda e o modo do homem lidar com ela também. Então entendemos que ela

não pode ficar isolada, alheia ao processo de desenvolvimento da sociedade. É preciso que

exista harmonização entre a diversidade ecológica e a diversidade cultural. Essa outra

vertente seria o conservacionismo, através do qual se descarta a opção do não-uso,

substituindo-o pelo uso racional. Em termos mais objetivos, preservar aqui seria sinônimo

de estagnar, parar e conservar, seria permitir o uso, mas de forma estratégica,

sensibilizados da finitude dos recursos naturais e ainda mais, devemos está ciente que a

medida que afetamos o meio ambiente, as próprias vítimas somos nós. Em suma, a prática

conservacionista na visão de (DIEGUES, 2002) requer uma mudança de concepção do

homem com relação a natureza.

O maior problema a ser enfrentado são os paradigmas enraizados na mentalidade do

próprio homem e difíceis de quebrar. Adotar a prática preservacionista é como uma auto-

isenção de responsabilidade com a degradação ambiental. Isola-se uma área que deve ser

protegida e inconscientemente se produz a sensação de que do lado de fora não precisa se

preocupar tanto assim. Entendemos os parques e reservas como uma versão atual da “Arca

de Noé”, no entanto, diferentemente da Arca, o homem fica fora do contexto. O que não

queremos dizer aqui, que sejamos contra a criação de espaços protegidos. Corroborando

com nosso pensamento, a seguinte afirmação de Diegues (2002, p. 99) “se pode pensar na

criação de áreas protegidas como espaços territoriais onde a necessidade de uma relação

32

harmoniosa entre homem e natureza é afirmada positivamente, não de forma excludente

como hoje prevê a legislação de parques e reservas”.

O socioambientalismo nasceu, portanto, baseado no pressuposto de que as políticas

públicas ambientais só teriam eficácia social e sustentabilidade política se

incluíssem as comunidades locais e promovessem uma repartição socialmente justa

e equitativa dos benefícios derivados da exploração dos recursos naturais.

(SANTILLI, 2005, p. 35)

De acordo com Santilli (2005), o sociomabientalismo está diretamente ligado ao

processo de redemocratização do país, tendo três importantes marcos, quais sejam, o fim

do regime militar, a Constituição de 1988 e a ECO 92.

No entanto, ainda se via pouca sensibilidade dos movimentos sociais e movimentos

sindicais no tocante às causas ambientais. Santos, A. D. (2005, p. 29) considera que “a

relação entre a agenda ambiental e os movimentos sociais revela tensões e contradições”.

No entanto, a busca pelo fortalecimento dos movimentos sociais, proporciona o caminho

para o diálogo.

Merece destaque, o movimento social dos seringueiros, liderados por Chico

Mendes, que em 1988, recebeu o Prêmio Global 500, concedido pela ONU àqueles que se

destacam na defesa do meio ambiente (SANTILLI, 2005). Eles combatiam o modelo

predatório de exploração, herança advinda ainda dos tempos da colonização do país e que

se perpetuou ao longo dos anos. “O extrativismo foi “redescoberto como uma atividade

não-predatória, uma possível via de valorização econômica da Amazônia”, e passou a ser

exaltado como alternativa ao impacto ambiental devastador provocado pelos projetos

desenvolvimentistas” (SANTILLI, 2005, p. 32).

O socioambientalismo se apresenta como uma nova concepção na abordagem da

questão ambiental e como paradigma jurídico mais apto a promover a proteção da

sociobiodiversidade. Promove a conjugação dos fatores estritamente ambientais e de

caráter técnico com o seu contexto social, econômico, cultural, étnico e político.

Reconhece os saberes e os fazeres populares, suas construções culturais sobre o seu

ambiente, como fatores determinantes no trato jurídico dos conflitos jurídico-

ambientais e como fontes de construção e renovação do Direito Ambiental.

(CAVEDON, 2007)

33

Sem dúvida um dos pontos mais importantes na defesa do meio ambiente é a

sensibilização dos atores de que existe uma responsabilidade recíproca e contínua de todos

para com o ambiente que ocupam, seja ele natural ou artificial.

2.4 Políticas públicas

Um típico direito de terceira geração é o expresso no artigo 225 da Constituição

Federal que prevê em seu caput que “todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente

equilibrado” (BRASIL, 1988). O direito aqui ultrapassa os limites da individualidade e

contempla toda a coletividade. A sua titularidade não pertence a uma só pessoa e sim a

todos indistintamente. Logo, se já é difícil de assegurar direitos individuais, mais

complicado ainda, é garantir os direitos difusos.

Uma das formas de se garantir a efetividade dos direitos fundamentais está na

promoção e implementação de políticas públicas adequadas.

[..] políticas públicas são programas de ação governamental visando a coordenar os

meios à disposição do Estado e as atividades privadas, para a realização de objetivos

socialmente relevantes e politicamente determinados. As políticas públicas podem

ser entendidas como o conjunto de planos e programas de ação governamental

voltados à intervenção no domínio social, por meio dos quais são traçadas as

diretrizes e metas a serem fomentadas pelo Estado, sobretudo na implementação dos

objetivos e direitos fundamentais dispostos na Constituição [...] (BUCCI, 2002, p.

259)

Comparato (1997, p. 18), dá a seguinte definição: “as políticas públicas são

programas de ação governamental”. Têm objetivos amplos em benefício da coletividade,

dentre os quais merecem destaque a melhoria de condições sociais, econômicas e políticas.

[...] política pública é a soma das atividades dos governos, que agem diretamente ou

através de delegação, e que influenciam a vida dos cidadãos. (PETERS apud

SOUZA, 2006, p. 5)

A Constituição de 1988 formou um sistema político em cadeia, da qual fazem parte

diversos atores, onde se pode considerar que o Governo exercerá a função de produtor e o

povo o receptor em potencial. Segundo Lopes (2008), até sua implementação, as políticas

34

públicas passam por um processo de formulação que abrange cinco fases, que vão desde a

formação da agenda ou seleção de prioridades até a fase de avaliação pós-implementação.

“Na prática estas fases se interligam entre si, de tal forma que essa separação se dá mais

para facilitar a compreensão do processo” (LOPES, 2008, p. 10).

De fato, a definição de agenda, segundo Souza (2006), vem quando as pessoas de

maneira geral se sensibilizam para um determinado problema.

O modelo de arenas sociais vê a política pública como uma iniciativa dos chamados

empreendedores políticos ou de políticas públicas. Isto porque, para que uma

determinada circunstância ou evento se transforme em um problema, é preciso que

as pessoas se convençam de que algo precisa ser feito. É quando os policy makers

do governo passam a prestar atenção em algumas questões e a ignorar outras.

(SOUZA, 2006, p. 13)

Ainda na história do Brasil, sem dúvida, a Constituição de 1988, intitulada de

“Constituição cidadã”, constitui um marco da cidadania, vez que, passa a assegurar dentre

tantos direitos, a participação social na vida política brasileira. Em muitos casos a

implementação de políticas públicas estava pautada na criação de conselhos estaduais e

municipais.

A Constituição de 1988 carrega a tensão entre a democracia representativa e a

democracia direta, e o resultado desse embate é um texto constitucional que

consagra a representação, mas, ao mesmo tempo, abre margem à elaboração de

mecanismos para o exercício da democracia direta. (SANTOS, A.D., 2005, p. 37)

O fortalecimento dos movimentos sociais constitui um importante aspecto no que

concerne às políticas públicas e o processo de globalização agrava ainda mais a situação

tendo em vista que os olhos do mundo começam a se voltar para os grandes problemas

sociais e isso passa a ser um fator altamente decisório.

Seguindo o pensamento de Milaré (2009), cabe aqui uma reflexão acerca das

formas de instituição das políticas públicas que podem se dar através de lei ou através de

decreto. Aparentemente o senso comum pode considerar que não existe diferença. O certo

é que apesar de serem atos normativos, a lei se diferencia do decreto por funções e força

diferentes, principalmente no tocante ás suas origens.

Segundo Moraes (2010, p. 654) “o procedimento de elaboração de uma lei é o mais

completo e o mais amplo, servindo de paradigma para a análise e elaboração das demais

35

espécies normativas”. A lei para entrar em vigor precisa passar pela aprovação do

legislativo e do executivo, ou seja, o projeto de lei é discutido e aprovado pelos

parlamentares e depois sancionado pelo Presidente da república. De modo diverso, o

decreto não precisa de aprovação do legislativo, requer apenas a elaboração e aprovação

por parte do executivo, ou seja, ele não é submetido ao processo legislativo o que o torna

hierarquicamente inferior às leis (MILARÉ, 2009). Pode-se afirmar inclusive que existe

hierarquia entre eles, as leis sejam elas complementar ou ordinária estariam num patamar

acima do decreto.

Em se tratando de problemas ambientais se pode observar que estes não são uma

novidade das décadas de 70 e 80, mas é a partir de marcos acontecidos nesse período que o

mundo, de certa forma, começa a se sensibilizar de que os recursos naturais não são

infindáveis e que se não se fizer algo, em pouco tempo haverá um colapso sem

precedentes.

No pensamento de Sachs (2009, p. 282), “toda cidade é um ecossistema. Portanto,

dispõe de um potencial de recursos desperdiçados, mal utilizados, latentes, que é preciso

valorizar em benefício das populações. Consoante o pensamento de Santos, A.D. (2005),

as políticas públicas na área ambiental, surgem como reflexo das transformações pelas

quais passou a sociedade brasileira nas últimas décadas, principalmente pela influência do

socioambientalismo.

Na política ambiental brasileira, assim como em outros setores, têm-se estabelecido

instâncias coletivas de tomada de decisão, como o Conselho Nacional do Meio

Ambiente (CONAMA), conselhos estaduais e municipais do meio ambiente,

comitês de bacias, conselhos consultivos de unidades de conservação ambiental,

entre outras. Eles são aqui considerados como espaços públicos socioambientais nos

quais questões e problemas de interesse público são tematizados segundo as

prioridades e demandas dos atores sociais, do Estado ou do setor privado.

(SANTOS, A.D., 2005, p. 34-35).

A proteção ambiental, após a previsão constitucional, passou a compor o arcabouço

jurídico brasileiro, através de uma série de leis que discorriam sobre a matéria. Vale a

ressalva de que com isso não se pretende afirmar que apenas leis sejam suficientes para

assegurar a proteção ambiental, mas constitui um fator importante no conjunto da gestão

ambiental, principalmente no tocante aos pleitos da sociedade civil organizada.

36

Santos, A. D. (2005), considera que a Constituição de 1988 universalizou a

construção de espaços públicos para a discussão dos mais diversos problemas sociais, mas

destaca também uma desigualdade de forças nesse contexto para a sociedade civil.

Outro ponto que merece ser lembrado é a criação da Agenda 21. Talvez um

importante marco para a consolidação do pensamento da necessidade de agir localmente,

reforçando a ideia de que o homem que vive naquele lugar é o principal responsável pela

conservação do mesmo, principal ator no processo de desenvolvimento sustentável local,

como exercício pleno da cidadania.

A política do ambientalismo não deve então entender-se como referida apenas a

determinados objetivos, já que a complexidade dos mesmos levou os atores a ter que

envolver-se também na produção dos meios (técnicos, políticos e culturais, em

sentido amplo) para sua realização. Deve ficar claro que decidir uma política

ambiental supõe mais do que escolher meios técnicos, supõe também a imposição de

certos valores e ideias sobre o que está certo ou errado. Uma política sobre poluição

leva, por exemplo, a ter que decidir sobre complexos problemas políticos-éticos de

justiça distributiva. (LEIS, 1999, p. 125-126)

De tudo que já foi exposto neste capítulo o que se pode ver é que urge uma

mudança de paradigma na relação homem e natureza. Não é mais possível que o ser

humano viva alheio ao que está acontecendo em termos de degradação ambiental como se

fosse mero espectador. Antes de tudo, necessário que o homem se reconheça como parte

integrante da natureza e assim promova uma imediata mudança de atitude na tentativa de

tentar conter as consequências dos erros que vêm sendo cometidos há muito tempo.

Adiante, passaremos a analisar o arcabouço jurídico pertinente a matéria no Brasil,

buscando equalizar a base legal em apoio àqueles que já mudaram seus conceitos e

estabeleceram uma relação amistosa com o ambiente e ao mesmo tempo uma fonte de

prevenção e repressão para àqueles que ainda necessitam da coercitividade legal como

meio sensibilizador de eficácia impositiva.

37

3. BASE LEGAL

3.1. A CONSTRUÇÃO DO DIREITO AMBIENTAL BRASILEIRO

No Brasil a proteção legal do meio ambiente é relativamente nova. Apesar de ainda

no tempo do Brasil (colônia e império) alguns atos legais parecerem com preocupações

ambientais, nada mais eram do que receio dos membros da Coroa Portuguesa em deixar

esvaírem-se as riquezas naturais que por aqui encontraram.

O fato é que só a partir da década de 30, com o processo crescente de

industrialização e a preocupação mundial com os direitos humanos que as questões

ambientais passam a ser suscitadas no Brasil. Merece destaque a Constituição de 1934, que

no seu artigo 10, estabelece a competência concorrente entre a União e os Estados para

“proteger as belezas naturais e os monumentos de valor histórico ou artístico” (BRASIL,

1934).

Foi em 1934 também que foi editado o Código das Águas e em 1937 o Decreto-lei

nº 25 acerca da proteção do patrimônio histórico cultural, do qual será falado em detalhes

ainda neste capítulo. Em 1948 é criada a Fundação Brasileira para a Conservação da

Natureza(IBAMA, ?). Mas de fato só após a Conferência das Nações Unidas para o

Ambiente Humano, realizada em 1972, é que se pode falar em medidas de fato adotadas

pelo Brasil com relação a preservação do meio ambiente brasileiro.

Para perceber o salto do ambientalismo a partir de Estocolmo-72, pode-se comparar

o número de países que tinham programas ambientais antes e depois da conferência.

Em 1971, apenas 12 países contavam com agências estatais para cuidar do meio

ambiente. Dez anos depois, mais de 140 países tinham criado órgãos administrativos

nessa área. (LEIS,1999, p. 131)

Em 1973, foi criada a Secretaria Especial do Meio Ambiente (SANTILLI, 2005).

Destaque-se que não se tratava de um órgão que fosse trabalhar em defesa do meio

ambiente, mas seu objetivo maior era poder falar sobre as questões ambientais com a

população, numa tentativa de despertar da consciência pública. O passo mais significativo

viria 8 (oito) anos depois com a Lei nº 6938/81, que institui a Política Nacional do Meio

Ambiente (BRASIL, 1981). E quatro anos mais tarde, a Lei nº 7347/85, a qual “disciplina a

ação civil pública de responsabilidade por danos causados ao meio-ambiente, ao

38

consumidor, a bens e direitos de valor artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico”

(BRASIL, 1985).

Foi só em 1981, com a edição da Lei da Política Nacional do Meio Ambiente, que a

avaliação de impacto ambiental e o licenciamento de atividades efetiva ou

potencialmente poluidoras se tornaram legalmente obrigatórios. Foi também a

primeira lei a conferir legitimidade ao Ministério Público para promover a

responsabilidade civil e criminal por danos ambientais, embora só em 1985 o

Ministério Público tenha passado a contar com um instrumento processual eficiente

para responsabilizar civilmente os autores de danos ambientais, com a edição da Lei

nº 7347/85, que cria a ação civil pública. (SANTILLI, 2005, p. 29)

Em 1988, a Constituição Federal, passa a trazer em seu texto, a proteção ao meio

ambiente em um capítulo dedicado a este fim. Destaca-se ainda, a criação do Instituto

Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis – IBAMA e a

Conferência da ONU sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento (ECO-92), que acontece

em 1992, no Rio de Janeiro. (SANTILLI, 2005). Tais instituições ajudaram a

instrumentalizar as decisões em prol do meio ambiente e forneceram subsídios para punir

os crimes contra a natureza, sendo de importância singular nas ações de preservação e

conservação do ambiente no Brasil. Apesar de uma atuação ainda deficitária,

principalmente pelo número mínimo de funcionários face a dimensão do país, pode-se

dizer que apesar de não ser um serviço de excelência, as suas atuações têm sido eficientes

nas atividades de proteção das matas (fauna e flora), rios, mares e de todos os recursos

naturais existentes no território nacional.

3.2. A CARTA MAGNA DE 1988: A CONSTITUIÇÃO CIDADÃ E O MEIO

AMBIENTE

Signatário de tratados de direitos humanos, em 05 de outubro, após a ruptura com o

regime militar e o começo de uma nova perspectiva na sociedade brasileira é que foi

promulgada a chamada “Constituição Cidadã”, que traz já no bojo dos seus primeiros

artigos uma série de direitos aos cidadãos brasileiros (sociais, políticos e civis), a qual

dedica um capítulo inteiro ao meio ambiente.

A constitucionalização do ambiente, ou seja, a elevação das normas de proteção

ambiental ao status constitucional é considerada uma tendência mundial irreversível,

39

dado o crescente número de nações que passaram a incluir em suas respectivas

Cartas normas de tal natureza. Nesse contexto, a Constituição Federal do Brasil de

1988 é reconhecida internacionalmente como merecedora de elogios quanto à

preocupação ambiental que ostenta. De fato, a Carta de 1988 apresenta uma série de

preceitos quanto a tutela ambiental, seja de forma fragmentada em diversos

capítulos, seja em um capítulo específico do meio ambiente. (BELTRÃO, 2009, p.

60)

Antes de adentrar na análise do artigo 225, da Constituição Federal, vale destacar

que o mesmo se refere ao meio ambiente no Brasil, em que pese a redundância do nome

que associa dois sinônimos, meio e ambiente, merece destaque o artigo 3º da Lei nº

6938/81, que traz a definição para o direito brasileiro, do que seja o meio ambiente

constitucionalmente protegido.

Art. 3º, I - meio ambiente, o conjunto de condições, leis, influências e interações de

ordem física, química e biológica, que permite, abriga e rege a vida em todas as suas

formas. (BRASIL, 1981)

Já dentre tantos pontos importantes no artigo 225, da CF/88, um que deve ser

ressaltado é que ao mesmo tempo em que ele reconhece o direito ao meio ambiente

ecologicamente equilibrado, ele também impõe o dever de conservá-lo e preservá-lo para às

presentes e futuras gerações. Talvez a mensagem mais importante do referencial legal em

comento: a atribuição de um direito que ao mesmo tempo encerra um dever a toda

coletividade.

Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de

uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder

Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e

futuras gerações. (BRASIL, 1988)

É ponto de destaque também, que a Carta Magna de 1988, além de dedicar um

capítulo exclusivo para o meio ambiente, a tutela ambiental também está presente em

diversos outros artigos, o que denota a importância do meio como ponto definidor do

princípio da dignidade da pessoa, consagrado no Artigo 1º, III, CF/88 (BRASIL, 1988).

Com base nessas informações, doutrinariamente o meio ambiente foi classificado

em 03 aspectos: o natural, o artificial e o cultural (BELTRÃO, 2009). Alguns teóricos e

doutrinadores falam em meio ambiente do trabalho e outros já passam a incluir também o

40

patrimônio genético, no entanto muitos entendem que o primeiro está inserido no meio

ambiente artificial e o segundo no natural (AMADO, 2011).

O meio ambiente cultural “consiste nas intervenções humanas, materiais ou

imateriais, que possuem um especial valor cultural, referente à identidade, à ação, à

memória dos diferentes grupos formadores da nacionalidade ou sociedade brasileiras”

(BELTRÃO, 2009, p. 25).

Segundo Milaré (2009) a Constituição federal consagra inequivocamente o

princípio do desenvolvimento sustentável, ou seja, quando se fala em proteção ambiental,

busca-se não só conservar a fauna, a flora, o ar, a atmosfera, mas também todas as

alterações físicas, químicas e biológicas feitas. Distancia-se daquele pensamento de

crescimento econômico e desenvolvimento zero e passa-se a adotar uma nova postura, que

é o equilíbrio entre o desenvolvimento e a conservação. O artigo 225 da Constituição

Federal de 1988 se relaciona diretamente com outros tantos artigos constantes da Carta

Magna.

[...] a necessidade de se procurar um equilíbrio ou harmonia entre os fatores sociais,

ambientais e econômicos e exigir-lhes proporção adequada e racional, sempre em

busca da qualidade de vida, principalmente no ambiente urbano, que o homem

moderno escolheu para viver. (MILARÉ, 2009, p. 541)

Em se tratando de matéria ambiental, o município pode suplementar a legislação

federal e estadual, dividindo a competência com a União e os estados, conforme se segue:

Art. 23. É competência comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos

Municípios:

I - zelar pela guarda da Constituição, das leis e das instituições democráticas e

conservar o patrimônio público; (...)

III - proteger os documentos, as obras e outros bens de valor histórico, artístico e

cultural, os monumentos, as paisagens naturais notáveis e os sítios arqueológicos;

(...)

IV - impedir a evasão, a destruição e a descaracterização de obras de arte e de outros

bens de valor histórico, artístico ou cultural; (...)

VI - proteger o meio ambiente e combater a poluição em qualquer de suas formas;

VII - preservar as florestas, a fauna e a flora; (BRASIL, 1988)

Volta-se aqui, ao pensamento difundido pela Agenda 21, de que se deve pensar

globalmente, mas as ações têm que ser locais. Vale o parêntese aqui, para destacar que se

acredita que em matéria ambiental deva haver um trabalho integrado entre várias

41

secretarias municipais. Estas não devem trabalhar isoladamente, uma vez que os resultados

obtidos podem vir a ser desastrosos no que se refere à proteção ambiental do lugar.

3.3. A POLÍTICA DE DESENVOLVIMENTO URBANO COMO PREVISÃO

CONSTITUCIONAL

No Brasil, o processo de urbanização foi acelerado pelas políticas

desenvolvimentistas do governo de Juscelino Kubitscheck, com a intensificação do

processo de industrialização a partir de 1956, mas só com a Constituição Federal de 1988 é

que a política urbana passou a ter previsão constitucional.

Em se tratando de matéria de desenvolvimento e meio ambiente, cerne desta

pesquisa, não se poderia deixar de fora o capítulo II da Constituição de 1988, o qual

estabelece a política de desenvolvimento urbano no Brasil nos seus artigos 182 e 183.

O artigo 182 traz o objetivo da política de desenvolvimento urbano, atribuindo ao

Poder municipal a sua execução.

Art. 182. A política de desenvolvimento urbano, executada pelo Poder Público

municipal, conforme diretrizes gerais fixadas em lei têm por objetivo ordenar o

pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e garantir o bem- estar de seus

habitantes. (BRASIL, 1988)

Do artigo lido anteriormente, vale destacar o princípio da função social, tão

mencionado e debatido no direito brasileiro. Para Diniz (1998, p. 613), “função social

consiste na atividade e papéis exercidos por indivíduos ou grupos sociais, com o escopo de

obter o atendimento de necessidades específicas”. Ou seja, quando se fala em

desenvolvimento urbano, diversos aspectos devem estar atrelados a ele, um desses é o

princípio da função social.

O § 1º do artigo 182 da Constituição Federal afirma que: “ O plano diretor,

aprovado pela Câmara Municipal, obrigatório para cidades com mais de vinte mil

habitantes, é o instrumento básico da política de desenvolvimento e de expansão urbana.”

(BRASIL, 1988)

A previsão do Plano Diretor é norteada por princípios constitucionais fundamentais,

como “a função social da propriedade, o desenvolvimento sustentável, as funções sociais

42

da cidade, o princípio da igualdade e da justiça social e o princípio da participação

popular” (BRASIL, 2001). Segundo Meirelles (2011, p. 115), “o plano diretor ou plano

diretor de desenvolvimento integrado”, como era chamado antes, é definido da seguinte

maneira:

[...] é o complexo de normas legais e diretrizes técnicas para o desenvolvimento

global e constante do Município, sob os aspectos físico, social, econômico e

administrativo, desejado pela comunidade local. Deve ser a expressão das aspirações

dos munícipes quanto ao progresso do território municipal no seu conjunto cidade-

campo. É o instrumento técnico-legal definidor dos objetivos de cada

Municipalidade e, por isso mesmo, com supremacia sobre os outros, para orientar

toda atividade da Administração e dos administrados nas realizações públicas e

particulares que interessem ou afetem a coletividade. (MEIRELLES, 2011, p. 115)

O parágrafo 2º do artigo 182 da Carta Magna brasileira enaltece a função social da

propriedade bem como as punições arbitradas pelo Estado para o não cumprimento desse

princípio. Vejamos: “A propriedade urbana cumpre sua função social quando atende às

exigências fundamentais de ordenação da cidade expressas no plano diretor.” (BRASIL,

1988). Dando continuidade à proteção ao princípio da função social da propriedade o

artigo 183, estabelece os critérios para a ação de usucapião urbana.

Art. 183. Aquele que possuir como sua área urbana de até duzentos e cinqüenta

metros quadrados, por cinco anos, ininterruptamente e sem oposição, utilizando-a

para sua moradia ou de sua família, adquirir-lhe-á o domínio, desde que não seja

proprietário de outro imóvel urbano ou rural. (BRASIL, 1988)

No entanto, os artigos 182 e 183 da Constituição Federal só foram regulamentados

em 2001, ou seja, 13 (treze) anos depois de promulgada a Carta Magna, quando entrou em

vigor a Lei Federal nº 10.257, popularmente conhecida como Estatuto da Cidade.

Dentre tantas coisas, a Lei 10.257/01 estabeleceu parâmetros e diretrizes gerais da

política e gestão urbana no Brasil, que devem ser aplicados pela União, Estados e

principalmente pelos municípios.

O município é o ente federativo principal responsável em promover a política

urbana visando ao desenvolvimento das funções sociais da cidade, de modo a garantir que

a propriedade urbana cumpra sua função social.

43

A Constituição estabeleceu competência privativa para legislar sobre assuntos de

interesse local além de promover o ordenamento territorial, mediante planejamento e

controle do uso, parcelamento e da ocupação do solo urbano, conforme artigo 30, I, II e

VII.

Art. 30. Compete aos Municípios:

I - legislar sobre assuntos de interesse local;

II - suplementar a legislação federal e a estadual no que couber;

VIII - promover, no que couber, adequado ordenamento territorial, mediante

planejamento e controle do uso, do parcelamento e da ocupação do solo urbano;

(BRASIL, 1988)

A preservação do meio ambiente e a garantia do direito à cidades sustentáveis

também estão explícitas em alguns dos artigos da Lei nº 10251/2001:

[...] Art. 2º- A política urbana tem por objetivo ordenar o pleno desenvolvimento das

funções sociais da cidade e da propriedade urbana, mediante as seguintes diretrizes

gerais:

I – garantia do direito a cidades sustentáveis, entendido como o direito à terra

urbana, à moradia, ao saneamento ambiental, à infra-estrutura urbana, o transporte e

aos serviços públicos, ao trabalho e ao lazer, para as presentes e futuras gerações;

[...]

XII – proteção, preservação e recuperação do meio ambiente natural e construído, do

patrimônio cultural, histórico, artístico, paisagístico e arqueológico; (BRASIL,

2001)

Outro ponto que merece total atenção nas previsões legais do Estatuto da Cidade,

diz respeito ao Direito de Preempção. Segundo Meirelles (2011, p. 171), “preempção

significa preferência”. No entanto vale destacar que essa preferência nãoé exercida de forma

arbitrária. A Administração pública tem sim preferência, mas em situações que devem estar

devidamente explicitadas no Plano Diretor da cidade. Um dos pontos importantes a ser

analisado nessa pesquisa, dada a riqueza cultural do município de Laranjeiras e os inúmeros

casarões que constituem o patrimônio edificado da cidade.

Art. 26. O direito de preempção será exercido sempre que o Poder Público necessitar

de áreas para:

[...]

VI – criação de espaços públicos de lazer e áreas verdes;

VII – criação de unidades de conservação ou proteção de outras áreas de interesse

ambiental;

44

VIII – proteção de áreas de interesse histórico, cultural ou paisagístico; (BRASIL,

2001)

A urbanização se dá quando determinado lugar passa a perder as características

rurais e passa a ter características urbanas, por isso, a importância do município nesse

aspecto, vez que é este ente federativo o principal responsável pelo processo de

desenvolvimento urbano local. Por este motivo, é que o objetivo principal desta pesquisa é

analisar de que forma a legislação urbanística e ambiental municipal contempla seu

patrimônio material e imaterial no que concerne às questões socioambientais.

No próximo tópico serão apresentadas, através de uma breve análise, as leis

municipais que foram objeto de estudo no presente trabalho.

3.4. AS LEIS MUNICIPAIS ANALISADAS NA PESQUISA

3.4.1 Plano diretor: instrumento básico da política urbana

Em quase todos os estados brasileiros, a expressão “plano diretor” refere-se a um

plano abrangente e sem vinculação jurídica. Tem casos que ele trata de todos os aspectos

da gestão urbana, em outros apenas de aspectos urbanísticos. Ao longo dos anos ele

recebeu diversas outras denominações populares como “plano de desenvolvimento local

integrado”, “plano urbanístico básico”, “plano estratégico”, “plano piloto” e “plano diretor

de desenvolvimento urbano”.

De acordo com Pinto (2006), existem três grandes modelos internacionais de

planejamento urbano, o norte-americano, o europeu continental e o britânico. Ainda

segundo o autor, o modelo brasileiro tradicional segue o modelo norte-americano.

[...] Uma leitura atenta do artigo 182 permite concluir que o plano diretor

constitucional não é o máster plan norte-americano, mas o plano urbano europeu

continental. O § 1º do art. 182, associa o cumprimento da função social da

propriedade ao atendimento do plano diretor. No mesmo sentido, o parágrafo 4º,

atribui ao plano diretor a fixação do “adequado aproveitamento” do solo urbano,

com base no qual se pode estabelecer seu parcelamento ou edificação compulsórios.

(PINTO, 2006, p. 340)

Por força da previsão constitucional, o Plano diretor só seria obrigatório nas cidades

com mais de 20.000 (vinte mil) habitantes, no entanto, deve ser elaborado por todo e

45

qualquer município independente da quantidade de habitantes, tendo em vista que se trata

de parâmetro para que se possa verificar se a propriedade urbana estaria cumprindo ou não

a sua função social.

Uma das peculiaridades do Plano Diretor é a necessidade da participação da

comunidade e da aprovação pelo legislativo municipal. O processo de elaboração do Plano

Diretor está previsto nos artigos 39 a 42, da Lei 10.257/01, conhecida como Estatuto da

Cidade, conforme transcritos abaixo:

Art. 39. A propriedade urbana cumpre sua função social quando atende às

exigências fundamentais de ordenação da cidade expressas no plano diretor,

assegurando o atendimento das necessidades dos cidadãos quanto à qualidade de

vida, à justiça social e ao desenvolvimento das atividades econômicas, respeitadas as

diretrizes previstas no art. 2º desta Lei. (BRASIL, 2001)

O Plano Diretor de uma cidade deve também prever a outorga onerosa do direito de

construir, as operações urbanas consorciadas, o direito de preempção, a transferência do

direito de construir e as Zonas Especiais de Interesse Social (MEIRELLES, 2011).

Vale destacar um dos requisitos obrigatórios na elaboração do Plano Diretor é a

realização de audiências públicas no Executivo municipal, não só no processo de

elaboração, como também no processo de implementação, respeitando o chamado espaço

público de discussões, uma das conquistas advindas de movimentos sociais. O legislador se

preocupou efetivamente em preservar a participação popular. Afinal de contas está se

definindo metas que dizem respeito à população em geral e que assegurem uma sadia

qualidade de vida, respeitando o Princípio da Dignidade da pessoa humana.

Essas audiências públicas também são obrigatórias no âmbito do legislativo

municipal durante o processo de aprovação pela Câmara Municipal. As audiências públicas

não são uma faculdade, são obrigatórias, única e simplesmente pela previsão no Estatuto

da cidade. Destaque-se que a não realização pode representar um vício processual por

desrespeito ao princípio constitucional da participação popular. No processo legislativo,

constituem condição de validação da edição da lei, sendo que a sua ausência gera um vício

formal (MEIRELLES, 2011).

No mais, é importante deixar claro que além da participação popular assegurada

constitucionalmente, o direito à informação, oriundo do princípio da publicidade, garante

aos cidadãos brasileiros, acesso a todos os atos e documentos da Administração pública.

46

Além de ser obrigatório nas cidades com mais de vinte mil habitantes (BASIL,

1988), também existe a obrigatoriedade para cidades com menos de vinte mil habitantes

(BRASIL, 2001), mas integrantes de regiões metropolitanas e aglomerações urbanas, de

áreas de interesse turístico, ou inseridas na área de influência de empreendimentos ou

atividades com significativo impacto ambiental de âmbito regional ou nacional.

Para os municípios que não estão sob nenhuma dessas características, só será

obrigatório se houver a pretensão de utilizar instrumentos da edificação ou parcelamento

compulsório, do imposto sobre a propriedade progressivo no tempo e a desapropriação

para fins de reforma urbana, bem como a outorga do direito de construir (BRASIL, 1988).

Ressaltando que nos municípios onde existe a obrigatoriedade, a não existência do Plano

Diretor resultará na impossibilidade da Administração Pública de exercer essas faculdades.

Destaque-se ainda que além da implementação, o Plano Diretor precisa ser revisto a cada

10 (dez) anos. Isso porque as cidades se expandem, evoluem e as necessidades passam a

serem outras, necessitando assim uma revisão de quais são e quais serão as prioridades.

Do ponto de vista de Rolnik et all (2001, p. 43), o plano diretor deve explicitar qual

o objetivo da política urbana, através do chamado “macrozoneamento”, ou seja, “a divisão

do território em unidades territoriais que expressem o destino que o município pretende dar

às diferentes áreas da cidade”.

Apesar de toda importância e toda legislação regulamentadora, pouco se tem

observado acerca de eficácia real dos planos diretores. Para Rolnik et all (2001, p. 43),

“passadas pelo menos duas décadas de prática de elaboração de Planos Diretores segundo

o receituário tecnocrático, parece evidente a falência do planejamento urbano em produzir

cidades equilibradas e de acordo com as normas”. Já Leitão (2006, p. 321), questiona a

eficácia dos Planos diretores no Brasil, levantando três pontos como causa: “a imprecisão

conceitual, o desconhecimento ou a negação da diversidade dos municípios brasileiros e a

minimização da importância das características e vícios culturais presentes na gestão da

coisa pública brasileira”.

[...] Ao Estatuto da Cidade caberia estabelecer diretrizes gerais para a política

urbana, isto é, oferecer o estatuto jurídico que permitisse às prefeituras definirem

instrumentos próprios capazes de enfrentar questões urbanísticas sempre polêmicas,

a exemplo da função social da propriedade, das condições de preservação do

patrimônio, ou da conservação de valores ambientais, quer naturais, quer

construídos.” (LEITÃO, 2006, p. 328-329)

47

Mesmo diante das controvérsias, a preocupação com o planejamento urbano é de

suma importância, não só das autoridades, mas principalmente para as pessoas que vivem

nas cidades. Hoje, grandes centros sofrem as consequências do crescimento desordenado,

talvez seja ainda possível corrigir isso em municípios em pleno desenvolvimento,

adequando o novo ao já existente, modernizando, mas sem desprezar a história local, mais

do que critérios para construção, se faz de suma importância a definição de critérios de

conservação e uso, dos espaços socioambientais.

3.4.2 Código de edificações

Pode também ser chamado de Código de obras. E como o próprio nome já diz, é um

código de teor técnico, que define normas técnicas para as construções a serem realizadas

naquele município. Segundo Meirelles (2011, p. 216), o “Código de obras deve estabelecer

as condições de apresentação dos projetos de edificação”, daquele município.

No Código de obras só cabem normas técnicas da construção, ou seja, requisitos de

estrutura e composição da obra, segundo a sua natureza e destinação. Bem por isso,

deve o Código diversificar as exigências para cada tipo de obra, visando a adequar a

construção aos fins a que é destinada: residência, indústria, comércio, escritórios e

outros usos especiais. Em última análise, o Código de Obras só deverá conter

imposições estruturais da construção, visando a propiciar segurança e funcionalidade

a cada obra individualmente considerada. (MEIRELLES, 2011, p. 216-217)

3.4.3 Uso, ocupação e parcelamento do solo

No Brasil, o parcelamento do solo urbano é regulamentado pela Lei nº 6766/79. É

uma lei municipal que objetiva o estabelecimento de regras para uso e ocupação do solo.

Em verdade, trata-se de uma lei municipal que irá definir acerca de locais e melhor forma

de uso do território municipal, regulamentando previsões do Plano Diretor municipal.

O controle do uso do solo urbano apresenta-se como das mais prementes

necessidades em nossos dias, em que o fenômeno da urbanização dominou todos os

povos e degradou as cidades mais humanas, dificultando a vida de seus moradores,

pela redução dos espaços habitáveis, pela deficiência de transportes coletivos, pela

insuficiência dos equipamentos comunitários, pela promiscuidade do comércio e da

indústria com áreas de residência e de lazer. (MEIRELLES, 2011, p. 127)

48

3.4.4 Código Ambiental municipal

É o arcabouço legal que regula as ações do Município com relação à preservação,

conservação, defesa, melhoria, recuperação e controle do meio ambiente ecologicamente

equilibrado, de acordo com a previsão constitucional e as leis federais, estaduais que tratem

sobre as questões ambientais. O Código ambiental deve também respeitar as previsões

contidas na Lei orgânica municipal, no Plano Diretor e na lei de uso, ocupação e parcelamento

do solo.

3.5. A LEGISLAÇÃO BRASILEIRA E A PROTEÇÃO À CULTURA

O primeiro gesto considerado como defesa do patrimônio histórico no Brasil foi em

1742, quando o Conde de Galveias, então vice-rei do Brasil, em carta ao governador de

Pernambuco, opôs-se à transformação do Palácio das Duas Torres, construído no período

Nassau em Recife. Depois, apenas em 1922, ouviu-se falar em preservacionismo2 de bens

culturais, com a criação do Museu Histórico Nacional, até que em 1933, mediante um decreto

que atendia uma série de solicitações de intelectuais mineiros, que Ouro Preto passou a ser a

primeira cidade a ser preservada3 no Brasil (SOUZA FILHO, 2006).

A primeira Constituição brasileira a fazer referência à proteção dos bens culturais

imóveis foi a de 1934, o texto ainda não era o ideal, mas era o começo. Na verdade a maior

preocupação do legislador aqui foi de proteger a evasão das obras de arte e não

propriamente proteger a cultura brasileira.

A Constituição de 1934 abriu a possibilidade de o Estado impedir a evasão de obras

de arte, texto tampouco repetido pelas demais constituições brasileiras. É bem

verdade que esta limitação à propriedade privada expressa constitucionalmente passa

a ser desnecessária, porque cada uma das próximas Constituições, de 1937, 1946 e

1967, a emenda de 1969, e a de 1988, colocam outros e maiores limites a

propriedade: o bem público, em 1937, o bem-estar-social, nas demais,afastando-se

cada vez mais do conceito de propriedade absoluta e retirando a inatingibilidade da

2 Em capítulo posterior, foi aberto um tópico para esclarecer acerca da diferença entre preservação e

conservação. Nesse capítulo, muitas vezes serão vistas as palavras preservar e conservar, mas na maioria as duas

estão sendo tratadas como se fossem sinônimos, sem qualquer diferenciação. Elas foram mantidas dessa forma,

em respeito aos autores das referências utilizadas, o que não quer dizer que a autora da pesquisa concorde com a

utilização.

3 Idem item 2.

49

propriedade privada, passando a dar importância cada vez maior ao princípio da

supremacia do interesse público sobre o privado. (SOUZA FILHO, 2006, p. 61)

Merece destaque que nessa época havia um Ministério no Brasil que ocupava as

pastas da educação e da cultura, realidade que se configurou durante muitos anos. E foi a

reestruturação feita nesse ministério por Gustavo Capanema, que possibilita a criação de

institutos e serviços culturais e “para dar consistência ao serviço criado, submete a

apreciação do Presidente Vargas, o anteprojeto de lei que define o conceito e a proteção do

patrimônio histórico e artístico do país” (SOUZA FILHO, 2006, p. 59).

A Constituição de 1937 reduzia a cultura aos bens edificados, aos monumentos.

Segundo Souza Filho (2006, p. 61), “da Constituição de 1937 até a emenda de 1969, bens

culturais e naturais são tratados de forma conjunta, com destaque sempre para os bens

culturais”. Em novembro de 1937, o Decreto-Lei nº 25, torna-se o primeiro instrumento

legal no país destinado a organizar a proteção do patrimônio histórico e cultural. Vejamos

qual é a definição de patrimônio na própria letra do decreto supracitado:

Art. 1º Constitue(sic) o patrimônio histórico e artístico nacional o conjunto dos bens

móveis e imóveis existentes no país e cuja conservação seja de interesse(sic)

público, quer por sua vinculação a fatos memoráveis da história do Brasil, quer por

seu excepcional valor arqueológico ou etnográfico, bibliográfico ou artístico. (...)

(BRASIL, 1937)

Foi também em 1937, fruto da reestruturação feita por Capanema, que através da Lei

nº 378, fora criado o SPHAN, hoje IPHAN (Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico

Nacional). Um organismo federal de proteção ao patrimônio, e sua criação foi tida como “o

início do despertar de uma vontade que datava do século XVII em proteger os monumentos

históricos” (IPHAN, 2012). É também no governo Vargas, que se institui o princípio do

tombamento de bens integrantes do patrimônio cultural nacional (LEITE, E., 2011).

Em 1958, o decreto nº 44851, promulga o protocolo relativo à Convenção da Haia de

1954, para a Proteção de Bens Culturais em Caso de Conflito Armado, sendo o mesmo

ratificado em 2006, através do decreto 5760, após novo protocolo celebrado na Haia, em

26/03/1999. Em 1969, mesmo sob a égide do regime militar, o Estado já reconhecia a sua

obrigação de conservar45 o patrimônio histórico.

4 Idem item 2.

50

A contribuição do período militar brasileiro para a preservação dos bens culturais

nas Constituições outorgadas foi acrescentar a proteção aos sítios arqueológicos, que

são uma especialidade das obras ou monumentos históricos. Por ser uma

especialidade, as modernas legislações têm dado atenção cuidadosa às jazidas

arqueológicas, porque nem sempre já estão descobertas, e os critérios de escavação,

preservação, pesquisa e utilização devem obedecer à disciplina e ciência próprias.

(SOUZA FILHO, 2006, p. 63)

Tanto assim, que foi editada a Emenda Constitucional nº 01, a qual modifica o art.

180, da Constituição de 1967, impondo a responsabilidade do amparo à cultura como um

dever do poder público.

Art. 180. O amparo à cultura é dever do Estado.

Parágrafo único. Ficam sob a proteção especial do Poder Público os documentos, as

obras e os locais de valor histórico ou artístico, os monumentos e as paisagens

naturais notáveis, bem como as jazidas arqueológicas. (BRASIL, 1967)

Mas só em meados da década de 70 é que os assuntos ligados à preservação6 do

patrimônio histórico passaram a ser discutidos com a população em geral. E em 1988, a

Constituição Federal em seu artigo 216, constitucionaliza a proteção ao patrimônio cultural

brasileiro. Destaque-se que a proteção constitucional não é apenas para os bens imóveis,

para a cultura material, estende-se também ao patrimônio imaterial, constituindo um

importante avanço no processo de proteção das riquezas culturais brasileiras.

Art. 216. Constituem patrimônio cultural brasileiro os bens de natureza material e

imaterial, tomados individualmente ou em conjunto, portadores de referência à

identidade, à ação, à memória dos diferentes grupos formadores da sociedade

brasileira, nos quais se incluem:

I - as formas de expressão;

II - os modos de criar, fazer e viver;

III - as criações científicas, artísticas e tecnológicas;

IV - as obras, objetos, documentos, edificações e demais espaços destinados às

manifestações artístico-culturais;

V - os conjuntos urbanos e sítios de valor histórico, paisagístico, artístico,

arqueológico, paleontológico, ecológico e científico. (BRASIL, 1988)

5 Idem item 2.

6 Idem item 2.

51

De acordo com Milaré (2009, p. 264), a Carta Magna de 1988, diferentemente da

Constituição de 1934, “abraçou os mais modernos conceitos científicos sobre a matéria”.

Assim, o patrimônio cultural é brasileiro e não regional ou municipal, incluindo bens

tangíveis (edifícios, obras de arte) e intangíveis (conhecimentos técnicos)

considerados individualmente e em conjunto; não se trata somente daqueles eruditos

e excepcionais, pois basta que tais bens sejam portadores de referência à identidade,

à ação, à memória dos diferentes grupos que formam a sociedade brasileira.

(MILARÉ, 2009, p. 264)

Vale observar, que assim como o artigo 225, da Constituição Federal impõe à

administração pública e à coletividade defender e preservar7 o meio ambiente equilibrado. Da

mesma forma o § 1º, do artigo 216, ao mesmo tempo em que impõe o dever de promover e

proteger o patrimônio cultural brasileiro ao Poder Público, também faz a mesma imposição à

comunidade. Fato que reforça, ser imprescindível a participação popular no processo de

preservação cultural.

§ 1º - O Poder Público, com a colaboração da comunidade, promoverá e protegerá o

patrimônio cultural brasileiro, por meio de inventários, registros, vigilância,

tombamento e desapropriação, e de outras formas de acautelamento e preservação.

(BRASIL, 1988)

Não resta dúvida ao se afirmar que a Constituição de 1988 representou grande avanço

na proteção legal aos chamados direitos difusos, principalmente no tocante ao meio ambiente

e às questões culturais. Tal é o que afirma Santilli, na seguinte citação do livro

Socioambientalismo e novos direitos:

Indubitalvemente, a Constituição de 1988 representou um marco e um grande

avanço na proteção jurídica ao meio ambiente. Tanto a biodiversidade- os processos

ecológicos, as espécies e ecossistemas – quanto a sociodiversidade são protegidas

constitucionalmente, adotando o paradigma socioambiental. A Constituição seguiu

uma orientação claramente multicultural e pluriétnica, reconhecendo direitos

coletivos a povos indígenas e quilombolas, e assegurando-lhes direitos territoriais

especiais. (SANTILLI, 2005, p. 41-42)

7 Idem item 2.

52

3.6 O TOMBAMENTO

Instrumento aliado no processo de preservação8 cultural, principalmente do patrimônio

edificado o tombamento está legalmente previsto no § 1º, do art. 216, da Constituição Federal:

§ 1º - O Poder Público, com a colaboração da comunidade, promoverá e protegerá o

patrimônio cultural brasileiro, por meio de inventários, registros, vigilância,

tombamento e desapropriação, e de outras formas de acautelamento e preservação.

(BRASL, 1988)

O vocábulo tombamento vem do verbo tombar, significa inventariar, registrar ou

inscrever bens. É uma palavra de origem portuguesa, usada no sentido de registrar algo

(BASTOS apud SCARIOT, 2012). Meirelles, (2011, p. 153) define tombamento como sendo

“a declaração pelo Poder Público do valor histórico, artístico, paisagístico, turístico, cultural

ou científico de coisas ou locais, que, por essa razão, devam ser preservados, de acordo com a

inscrição em livro próprio.”

No ordenamento jurídico brasileiro, o tombamento está regulamentado nos

capítulos II e III, do Decreto lei nº 25 de 30 de novembro de 1937:

Art. 5º O tombamento dos bens pertencentes à União, aos Estados e aos Municípios se fará

de ofício, por ordem do diretor do Serviço do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, mas

deverá ser notificado à entidade a quem pertencer, ou sob cuja guarda estiver a coisa tombada,

afim de produzir os necessários efeitos.

Art. 6º O tombamento de coisa pertencente à pessoa (sic) natural ou à pessoôa(sic) jurídica de

direito privado se fará voluntária ou compulsóriamente(sic). [...] (BRASIL, 1937)

O instituto do tombamento é um ato administrativo, através do qual a

Administração Pública intervém na propriedade privada através do exercício do seu poder

de polícia. Frisando que, como a Constituição legitima para o tombamento o “poder

público”, tanto a União, os Estados, Distrito Federal e municípios podem dispor a esse

respeito, sendo que, no âmbito federal a responsabilidade é do IPHAN- Instituto do

Patrimônio Histórico e Artístico Nacional. Já na esfera estadual e municipal, a

responsabilidade cai sobre o respectivo órgão criado para esse fim (MEIRELLES, 2011).

8 Idem item 2.

53

DOS EFEITOS DO TOMBAMENTO

Art. 11. As coisas tombadas, que pertençam à União, aos Estados ou aos

Municípios, inalienáveis por natureza, só poderão ser transferidas de uma à outra das

referidas entidades.

Parágrafo único. Feita a transferência, dela deve o adquirente dar imediato

conhecimento ao Serviço do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional.

[...]

Art. 13. O tombamento definitivo dos bens de propriedade particular será, por

iniciativa do órgão competente do Serviço do Patrimônio Histórico e Artístico

Nacional, transcrito para os devidos efeitos em livro a cargo dos oficiais do registro

de imóveis e averbado ao lado da transcrição do domínio. [...] (BRASIL, 1937)

Se o tombamento atinge determinado bem, segundo o pensamento de Meirelles

(2011), acarreta uma restrição individual, onde há apenas redução dos direitos do

proprietário ou a imposição de encargos. No entanto, também pode atingir a coletividade,

gerando a obrigação do respeito a padrões urbanísticos ou arquitetônicos, acarretando

assim, uma limitação geral. Importante ressaltar que tombar não é desapropriar.

Art. 17. As coisas tombadas não poderão, em caso nenhum ser destruidas,

demolidas ou mutiladas, (GRIFOU-SE) nem, sem prévia autorização especial do

Serviço do Patrimônio Histórico e Artistico Nacional, ser reparadas, pintadas ou

restauradas, sob pena de multa de cincoenta(sic) por cento do dano causado.

[...]

Art. 21. Os atentados cometidos contra os bens de que trata o art. 1º desta lei são

equiparados aos cometidos contra o patrimônio nacional. (BRASIL, 1937)

No tombamento a propriedade do bem não é alterada. A administração apenas

intervém no sentido de proibir o particular de fazer alterações que venham a destruir ou

descaracterizar o bem tombado (MEIRELLES, 2011). O objetivo é apenas o de garantir

que serão mantidas as características originais que a edificação possuía na data do

tombamento.

As coisas tombadas, embora permaneçam no domínio e posse dos seus proprietários,

não poderão, em caso algum, ser demolidas, destruídas ou mutiladas, nem pintadas

ou reparadas, sem prévia autorização do IPHAN, sob pena de multa de 50% do dano

causado (art. 17). (MEIRELES, 2011, p. 156)

54

Em que pese, a principal finalidade do tombamento é preservar9 algo, que tanto

pode ser bens materiais, móveis ou imóveis, não havendo uniformidade na doutrina no que

diz respeito a sua natureza jurídica.

A doutrina não é pacífica quanto à natureza jurídica do tombamento, entendendo

alguns que se trata de simples limitação administrativa, e outros que ele configura

uma servidão administrativa, exatamente pelo fato de gerar um direito à

indenização, na medida dos danos ou das restrições impostas à propriedade.

(MEIRELLES, 2011, p. 154)

De acordo com Meirelles (2011), o tombamento para ser efetivado necessário um

procedimento administrativo, respeitando o princípio do devido processo legal, tendo em

vista a intervenção no direito de propriedade do administrado. Um dos primeiros atos do

procedimento é a notificação do proprietário, dando-lhe a oportunidade de defesa.

Importante frisar que qualquer nulidade no procedimento pode ser pronunciada pelo

Judiciário, tornando nulo o tombamento.

O tombamento realiza-se através de um procedimento administrativo não vinculado,

que conduz ao ato final de inscrição do bem num dos Livros de Tombo. Nesse

procedimento deve ser notificado o proprietário do bem a ser tombado, dando-se-lhe

oportunidade de defesa na forma da lei. Nulo será o tombamento efetivado sem

atendimento das imposições legais e regulamentares, pois que, acarretando restrições

ao exercício do direito de propriedade, há que se observar o devido processo legal

para sua formalização, e essa nulidade pode ser pronunciada pelo Judiciário, na ação

cabível, em que serão apreciadas tanto a legalidade dos motivos quanto a

regularidade do procedimento administrativo em exame. O Tribunal de Justiça de

São Paulo já concedeu mandado de segurança contra o tombamento de imóvel que,

comprovadamente, não apresentava valor histórico ou cultural, configurando o fato

evidente desvio de poder da Administração. (MEIRELES, 2011, p. 153-154)

Identificado o bem pelo órgão competente e aberto o processo de tombamento, até

a decisão final a preservação daquele bem já estará assegurada. Após o tombamento

definitivo, somente caberá recurso ao Presidente da República, que poderá cancelá-lo, até

mesmo de ofício.

A abertura do processo de tombamento, por deliberação do órgão transformar-se em

abuso de poder, corrigível por via judicial.

9 Nesse contexto na opinião da autora deveria estar a palavra conservar. No entanto, em se tratando de

tombamento a palavra mais adequada é preservar. Ou seja, preservar é como se quisesse congelar o objeto, para

que o tempo não o destrua, já a conservação, seria promover o uso racional pela população.

55

Feito o tombamento definitivo, caberá recurso ao Presidente da República, para o

cancelamento, na forma estabelecida pelo artigo único do Decreto-lei 3.866, de

29.11.1941. Esse cancelamento, aliás, pode ser determinado até mesmo de ofício,

“atendendo a motivos de interesse público”, como diz o mencionado artigo. Não é

de se louvar o poder discricionário que se concedeu a Presidente da República em

matéria histórica e artística, sobrepondo-se seu juízo individual ao do colegiado do

IPHAN, a quem incumbe competente, assegura a preservação do bem até a decisão

final, a ser proferida dentro de 60 dias, ficando sustada desde logo qualquer

modificação ou destruição. (MEIRELES, 2011, P. 155-156)

No que diz respeito à indenização, vale salientar que nem todo processo de

tombamento gera esse direito. Doutrinariamente analisando, a indenização é necessária vez

que as condições impostas acarretam despesas extras para os proprietários e resulta

interdição de uso ou depreciam seu valor econômico, face às restrições impostas.

Art. 5º. Consideram-se casos de utilidade pública:

[...]

k) a preservação e conservação dos monumentos históricos, e artísticos, isolados ou

integrados em conjuntos urbanos ou rurais, bem como as medidas necessárias a

manter-lhes e realçar-lhes os aspectos mais valiosos ou característicos e, ainda, a

proteção de paisagens e locais particularmente dotados pela natureza; (BRASIL,

1941)

No entanto, apesar de toda essa legislação, ainda existem situações em que o poder

público se omite. Nesses casos, necessário se faz a intervenção do Ministério Público

através de Ação Civil Pública ou através de cidadãos com Ação Popular, fazendo com que

o Poder Judiciário determine que o poder público passe a proteger aquele bem. Esse

procedimento também pode ser adotado, nos casos em que a Administração inicia o

processo de tombamento e não finaliza, afetando o direito de propriedade do particular,

lesando o patrimônio individual.

Vale salientar ainda que estão também sujeitos ao tombamento bens móveis,

alimentos, bens imateriais como as danças, rituais religiosos. Aqui impende registrar a

existência desse tipo de tombamento no patrimônio cultural de Laranjeiras, o que será

avaliado mais minuciosamente em capítulo posterior.

3.7 DANO AO PATRIMÔNIO CULTURAL: CRIME LESIVO AO MEIO AMBIENTE

Geralmente quando se fala em crime ambiental, o pensamento automaticamente se

reporta a danos causados a flora, a fauna, aos rios, oceanos. No entanto, os bens culturais

56

também são protegidos de possíveis danos pela legislação ambiental. Importante alertar,

que anteriormente, nessa mesma pesquisa fora apresentada a subdivisão doutrinária de

quando se fala em meio ambiente, para lembrar: artificial, natural e cultural.

Merece destaque que o Código Penal, uma lei editada em 1940 e em vigor até hoje,

trazia a proteção ambiental ainda que de maneira bem sutil. Os artigos de 163 à 167,

tratavam acerca do dano. Dentre os quais destaca-se a introdução ou abandono de animais

em propriedade alheia, onde a punição não era pelo abandono do bicho, mas pelo dano que

viesse a ser causado pelo mesmo na propriedade alheia. Incluía também o dano em coisa

de valor artístico, arqueológico ou histórico. Salientando aqui, que o artigo previa a

proteção apenas aos bens tombados. E por fim, o artigo 166, do livro penal, que previa a

punição para a alteração de lugar especialmente protegido por lei, ou seja, aqui o bem

jurídico protegido é o patrimônio que tanto pode ser público ou privado, devendo para a

consumação do crime existir a alteração do aspecto paisagístico do bem. Vale frisar que o

Código Penal deixa brechas a impunidade, principalmente quando existe uma valoração

subjetiva para considerar que de fato tenha havido o crime e este seja passível de punição

pelo estado-jurisdicional.

Art. 165 - Destruir, inutilizar ou deteriorar coisa tombada pela autoridade

competente em virtude de valor artístico, arqueológico ou histórico:

Pena - detenção, de seis meses a dois anos, e multa.

Art. 166 - Alterar, sem licença da autoridade competente, o aspecto de local

especialmente protegido por lei:

Pena - detenção, de um mês a um ano, ou multa. (BRASIL, 1940)

A imputação de responsabilidade criminal aos danos causados ao meio ambiente vem

da própria Constituição de 1988, do seu artigo 225, § 3º. Ressalvando que, as punições nas

esferas administrativas e penais, não eximem o responsável de reparar os danos causados.

Art. 225 [...] § 3º - As condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente

sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e

administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos causados.

(BRASIL, 1988)

Em verdade, a Constituição de 1988, apenas ampliou a abrangência das condutas

lesivas ao meio ambiente, vez que, muito antes dessa data, outras leis no ordenamento

jurídico brasileiro tratavam da questão ambiental.

57

A ampla proposta constitucional de criar um sistema de responsabilização com

relação ao meio ambiente, com uma maior e mais efetiva abrangência, tem razão de

ser na própria realidade da degradação ambiental do País. Pois, na mesma proporção

de riqueza e diversidade do meio ambiente no extenso território brasileiro e seus

ricos biomas naturais, também são as práticas lesivas contra o meio ambiente que se

multiplicam na sua abrangência, violência e impunidade, práticas criminosas

alimentadas m sua cultura social e econômica de desrespeito, desconsideração e

exploração agressiva do meio ambiente, e em uma indiferença e omissão do Poder

Público na sua proteção. (PADILHA, 2010, p. 297-298)

Mesmo com todo o aparato constitucional, só dez anos depois, em 13/02/1998, é

sancionada a Lei nº 9605, chamada de Lei dos Crimes ambientais. É importante ressaltar

que essa lei não revogou nenhuma lei anterior que tratasse sobre crimes ou contravenções

penais, como também não restringiu ao legislador que continuasse a produzir leis voltadas

à punição dos crimes ambientais. Considera-se que esse talvez seja um dos grandes

problemas no ordenamento jurídico brasileiro: o excesso de leis, pouca efetividade e

objetividade para aplicação de penas de modo a assegurar que seja realmente punido o

autor de qualquer crime. O fato é que o crime ambiental não atinge apenas o bem protegido

e sim a todos indistintamente. A lei que pune crimes ambientais é relativamente recente no

ordenamento jurídico, advinda como regulamentação ao direito constitucional expresso no

artigo 225 da Constituição Federal. Se voltarmos ao capítulo anterior, podemos bem

relacionar esse problema na punição ineficaz do crime ambiental com a necessidade de

mudança de paradigma que se propõe na relação homem e natureza.

As leis não funcionam isoladamente, eles são parte do contexto social e sua eficácia

não depende apenas de Juízes ou de normas mais rígidas, depende mesmo da certeza de

que haverá punição para o cometimento daquele crime, o que na maioria das vezes não

ocorre no Brasil, uma vez que nosso direito penal é garantista, situação da qual se

aproveitam aqueles que querem viver da impunidade. Vale ressaltar que não estamos aqui

afirmando que a lei de crimes ambientais é inútil. De maneira alguma, a lei em questão

representa um passo importantíssimo na prevenção e repressão da degradação ambiental,

mas isso também não quer dizer que por si só seja perfeita a ponto de não merecer críticas.

O trato aos crimes contra o meio ambiente exigem adequações dada a sua abrangência e

dimensão, conforme se depreende do trecho abaixo:

[...] o tratamento jurídico do meio ambiente, em qualquer área, exige adaptações

necessárias à amplitude de seu próprio conceito e abrangência, pois o meio ambiente

não possui sequer conceito definitivo, dada a sua multidisciplinaridade, e realmente,

58

nem mesmo a norma penal poderá definir todos os elementos da matéria ambiental.

É preciso que o Direito Penal encontre seu caminho de eficácia para lidar com a

criminalização das condutas lesivas ao meio ambiente, mesmo que ele quebre

paradigmas e tradições jurídicas clássicas que, entretanto, não atendam à

necessidade de criminalização da degradação ambiental. (PADILHA, 2010, p. 299)

Um dos pontos fortes da lei 9605/98, é o reconhecimento da responsabilidade

criminal das pessoas jurídicas. Em matéria ambiental considera-se isso como um grande

avanço legislativo, tendo em vista que muitas vezes, o crime ambiental é cometido por

grandes empresas, principalmente no tocante a possibilidade de se atribuir penas, tais como

aplicação de multa, pena restritiva de direitos e prestação de serviço comunitário, que

podem ajudar a inibir esta prática criminal. Em termos de dosimetria da pena, a valoração

será feita com base no dano causado ao meio ambiente, afastando assim o princípio da

culpabilidade como nos casos em que o agente é pessoa física.

Para esta pesquisa, merece destaque o Capítulo II, da seção IV desta Lei, que trata

acerca dos crimes contra o ordenamento urbano e o patrimônio cultural nos artigos 62 à 65.

Segundo Souza Filho (2006, p. 79), “a lei reconhece que os bens culturais fazem parte do

que se chama Direito Ambiental e, portanto, reconhece que meio ambiente não é apenas a

proteção da natureza, mas também o ambiente urbano e, com ele o ambiente cultural”.

Art. 62. Destruir, inutilizar ou deteriorar:

I - bem especialmente protegido por lei, ato administrativo ou decisão judicial;

II - arquivo, registro, museu, biblioteca, pinacoteca, instalação científica ou similar

protegido por lei, ato administrativo ou decisão judicial:

Pena - reclusão, de um a três anos, e multa. (BRASIL, 1998)

A grande conquista do artigo 62 é a ampliação do alcance da proteção, vez que, se

antes a proteção atingia só os bens tombados, agora existe uma maior abrangência,

incluindo a proteção por lei, ato administrativo ou decisão judicial. E o artigo 63, traz a

punição àqueles que venham a alterar algum bem protegido.

Art. 63. Alterar o aspecto ou estrutura de edificação ou local especialmente

protegido por lei, ato administrativo ou decisão judicial, em razão de seu valor

paisagístico, ecológico, turístico, artístico, histórico, cultural, religioso,

arqueológico, etnográfico ou monumental, sem autorização da autoridade

competente ou em desacordo com a concedida:

Pena - reclusão, de um a três anos, e multa. (BRASIL, 1998)

59

O artigo 64 se coaduna muito bem com a lei de uso e ocupação do solo e o código

de obras dos municípios, lembrando que são leis que complementam ou regulamentam

diretrizes do Plano Diretor. Ou seja, feito o zoneamento, a cidade terá lugares protegidos e

lugares onde se permitirá construir. Essas áreas serão protegidas, não importando se tal

fato se dê por conta de um bem artificial ou natural.

No tocante ao artigo 165, Souza Filho (2006), considera-o problema, por entender

que dá ensejo a uma censura cultural a quem pichar ou grafitar edificação ou monumento

urbano, tendo em vista que por não esclarecer a forma de pichação, o tipo de tinta e até a

pichação em prédio não protegido abre margem para diversas interpretações.

Art. 65. Pichar ou por outro meio conspurcar edificação ou monumento urbano:

Pena - detenção, de 3 (três) meses a 1 (um) ano, e multa. § 1o Se o ato for realizado

em monumento ou coisa tombada em virtude do seu valor artístico, arqueológico ou

histórico, a pena é de 6 (seis) meses a 1 (um) ano de detenção e multa.

§ 2o Não constitui crime a prática de grafite realizada com o objetivo de valorizar o

patrimônio público ou privado mediante manifestação artística, desde que

consentida pelo proprietário e, quando couber, pelo locatário ou arrendatário do bem

privado e, no caso de bem público, com a autorização do órgão competente e a

observância das posturas municipais e das normas editadas pelos órgãos

governamentais responsáveis pela preservação e conservação do patrimônio

histórico e artístico nacional. (BRASIL, 1998).

O mais importante nesse contexto é o aparato legal que hoje gira em torno da

proteção a cultura no país. Destaque-se que aparentemente parece pouco, mas na verdade é

muito, tendo em vista os avanços alcançados desde o Decreto nº 25/37, até a presente data.

Merece ainda ser ponderada a questão da aplicação das penas, que muitas vezes,

quando a condenação é inferior a três anos, isso permite a realização de transação penal.

Ou seja, é concedida ao condenado a possibilidade de conversão em pena restritiva de

direitos, prestação de serviço comunitário dentre outros, destacando uma vez mais que,

independente da esfera penal, os danos também serão reparados na esfera cível.

A competência para processar e julgar esses processos vai depender da localização,

o tipo de bem, a sua propriedade a depender do caso é da justiça estadual comum ou da

Justiça Federal.

60

Terminado o estudo acerca da legislação que embasou o conteúdo da pesquisa,

passamos a uma análise sobre Patrimônio cultural e a amplitude e abrangência do termo.

61

4. PATRIMÔNIO CULTURAL

4.1 CULTURA: UMA PALAVRA DE AMPLA ABRANGÊNCIA

Um dos pontos de maior destaque e importância da presente pesquisa é a discussão

acerca do conceito de cultura. Segundo Leite, E. (2011, p. 26), a palavra cultura tem

origem latina e vem do verbo colere, que significa cultivar. Acredita-se que a cultura tem

relação com a identidade da pessoa, com aquilo com que ela se identifica, se afiniza,

compactua. Ser parte de uma cultura, depende preliminarmente em se auto-reconhecer

membro daquele grupo social.

A questão da identidade é assim semi-fictícia e semi-necessária. Para quem a

formula, apresenta-se sempre como uma ficção necessária. Se a resposta é obtida, o

seu êxito mede-se pela intensidade da consciência de que a questão fora, desde o

início, uma necessidade fictícia. É, pois, crucial conhecer quem pergunta pela

identidade, em que condições, contra quem, com que propósitos e com que

resultados. (SANTOS, B., 1994, p. 32)

Na França iluminista, o sentido de cultura estava ligado ao estado de espírito

vinculado com a instrução, o que associava o significado à ideia de evolução, progresso,

educação, de acordo com Cuche (2002, p. 21), “a cultura, para eles, é a soma dos saberem

acumulados e transmitidos pela humanidade, considerada como totalidade, ao longo de sua

história”.

Para Reisewitz (2004, p. 85), cultura é “tanto aquilo que forma o ser humano, como

o produto dessa formação, num vaivém contínuo, pois aquilo que é produto novamente vai

ser fonte e influenciar uma nova formação e assim, ad infinitum”. Esta definição mostra o

caráter dinâmico e não estático da cultura.

Em que pese, a cultura na visão antropológica é um processo contínuo de

construção, onde o homem é o principal ator não existe um roteiro pré-determinado, ou

seja, as coisas vão acontecendo gradativamente, espontaneamente, sem que haja

acontecimentos intencionais, seria um processo interacional que acontece naturalmente.

Na dimensão antropológica, a cultura se produz através da interação social dos

indivíduos, que elaboram seus modos de pensar e sentir, constroem seus valores,

62

manejam suas identidades e diferenças e estabelecem suas rotinas. Desta forma, cada

indivíduo ergue à sua volta, e em função de determinações de tipo diverso, pequenos

mundos de sentido que lhe permitem uma relativa estabilidade. (BOTELHO, 2001,

p. 02)

Já na visão sociológica existe um padrão que é compartilhado, com a nítida

intenção de perpetuá-lo. Não é algo que acontece despretensiosamente.

Por sua vez, a dimensão sociológica não se constitui no plano do cotidiano do

indivíduo, mas sim em âmbito especializado: é uma produção elaborada com a

intenção explícita de construir determinados sentidos e de alcançar algum tipo de

público, através de meios específicos de expressão. Para que essa intenção se realize,

ela depende de um conjunto de fatores que propiciem, ao indivíduo, condições de

desenvolvimento e de aperfeiçoamento de seus talentos, da mesma forma que

depende de canais que lhe permitam expressá-los. (BOTELHO, 2001, p. 02)

As noções de cultura tanto sociológica como a antropológica, segundo Botelho

(2001) têm o mesmo peso quando se trata de políticas públicas, o que não descarta a

importância da distinção apresentada pelas duas vertentes.

A variedade das vivências humanas faz com que cada cultura seja o resultado de

uma história particular, incluindo as relações com outras culturas e as possibilidades

de movimentação em direção ao futuro. A discussão sobre cultura está muito ligada

à constatação da diversidade e às forças sociais que movem a cidade. (CASTELLS

apud LEITE, 2011, p. 27)

O longo período que vai de 1789 a 1914, segundo Ortiz (1998), foi um período

marcado por rupturas e descontinuidade, intitulado pelo autor de “Dois séculos”, que vai

da Revolução Francesa até sua metade e o outro que se inicia com a Revolução Industrial e

no qual merece destaque o ritmo histórico que deve ser levado em consideração ao se

discutir cultura, considerando de suma importância marcar estas diferenças, tendo em vista

que elas constituem o quadro social em que a problemática cultural se manifesta.

A constituição da nação requer a emergência de uma consciência que solde os

franceses no interior de um mesmo território. Neste sentido, a consolidação de uma

memória coletiva nacional é um produto recente da História. O primeiro desafio que

o Estado-nação enfrenta diz respeito a sua unidade lingüística; a realização de sua

organicidade implica uma luta sistemática contra os dialetos regionais. (ORTIZ,

1998, p. 39)

63

O pensamento de Ortiz (1998, p. 36) é que “as transformações estruturais pelas

quais passa a sociedade induzem ao desaparecimento de toda uma cultura tradicional”, ou

seja, a própria ideia de sociabilidade coletiva entra em crise.

Na reflexão que faz acerca das culturas tradicionais Ortiz (1998) sublinha a

constituição do estado francês, ressalvando que aqui não se refere ao sentido político

administrativo e sim a formação da nação francesa, no sentido de passar a existir uma

unidade mental e cultural dos habitantes que passavam a aderir às leis do Estado.

As culturas nacionais, enquanto substâncias, são uma criação do século XIX, são,

como vimos, o produto histórico de uma tensão entre universalismo e particularismo

gerido pelo Estado. O papel do Estado é dúplice: por um lado, diferencia a cultura

do território nacional face ao exterior; por outro lado, promove a homogeneidade

cultural no interior do território nacional. (SANTOS, B., 1994, p. 47)

A ideia de cultura está intimamente ligada com a identidade de um povo. É um

sentimento coletivo, que liga uns aos outros invisivelmente, mas de maneira sólida, que é o

que faz com que aquela cultura se perpetue.

Lendas ou crenças, festas ou jogos, costumes ou tradições- esses fenômenos não

dizem nada por si mesmos, eles apenas o dizem enquanto parte de uma cultura, a

qual não pode ser entendida sem referência à realidade social de que faz parte à

história de sua sociedade. O fato de que as tradições de uma cultura possam ser

identificáveis não quer dizer que não se transformem, que não tenham sua dinâmica.

Nada do que é cultural pode ser estanque, porque a cultura faz parte de uma

realidade, na qual a mudança é um aspecto fundamental. (SANTOS apud LEITE,

2011, p. 28)

No entanto, manter esses laços vivos não quer dizer que eles devam permanecer

estagnados, é preciso reconhecer que a cultura precisa do seu caráter dinâmico e esse

caráter é imprescindível para mantê-la viva. Considera (SANTOS, B., 1994, p. 49) que

para “uma cultura que verdadeiramente nunca coube num espaço único, às identificações

culturais que daí derivam tendem a auto-canibalizar-se”. A cultura não se perde no tempo

quando acompanha a evolução da história.

64

4.2 PATRIMÔNIO HISTÓRICO CULTURAL

A palavra patrimônio por si só, já se mostra interessante pela sua formação, qual seja,

a união de dois termos, uma de origem no latim e outro de origem grega. O termo “Pater”

significa pai, paterno, em termos mais amplo, os antepassados e o “nomos” origina-se do

grego e se relaciona à lei, usos e costumes relacionados a um grupo social (BIAZZO

FILHO, 2013). No dicionário de língua portuguesa patrimônio significa “herança paterna,

bem que vem de família, riqueza” (XIMENES, 2000, p. 705).

Em 1982, foi realizada no México, a Conferência Mundial da UNESCO sobre

Patrimônio Cultural, na qual foi produzida uma declaração, que dentre outras coisas traz

uma definição de patrimônio cultural.

O patrimônio cultural de um povo compreende as obras de seus artistas, arquitetos,

músicos, escritores e sábios, assim como as criações anônimas surgidas da alma

popular e o conjunto de valores que dão sentido à vida. Ou seja, as obras materiais e

não materiais que expressam a criatividade desse povo: a língua, os ritos, as crenças,

os lugares e monumentos históricos, a cultura, as obras de arte e os arquivos e

bibliotecas. (UNESCO, 1985)

No Brasil, a definição oficial de Patrimônio cultural, está no artigo 216 da

Constituição de 1988. Merece destaque que a Carta Magna brasileira é abrangente e

contempla tanto o patrimônio material quanto o imaterial. O texto constitucional deixa de

contemplar apenas os monumentos históricos e passa a reconhecer todo o arcabouço cultural

brasileiro, em respeito a sua diversidade cultural. Vejamos a confirmação do que vimos

falando na própria letra do artigo em tela.

Art. 216. Constituem patrimônio cultural brasileiro os bens de natureza material e

imaterial, tomados individualmente ou em conjunto, portadores de referência à

identidade, à ação, à memória dos diferentes grupos formadores da sociedade

brasileira, nos quais se incluem:

I - as formas de expressão;

II - os modos de criar, fazer e viver;

III - as criações científicas, artísticas e tecnológicas;

IV - as obras, objetos, documentos, edificações e demais espaços destinados às

manifestações artístico-culturais;

V - os conjuntos urbanos e sítios de valor histórico, paisagístico, artístico,

arqueológico, paleontológico, ecológico e científico. (BRASIL, 1988)

65

De acordo com Varine-Boham apud Lemos (2006, p. 8-10), o Patrimônio Cultural

divide-se em três grandes categorias de elementos. Primeiro a categoria dos recursos

naturais, do meio ambiente; segundo, a categoria do conhecimento, das técnicas, do saber e

do saber fazer e o terceiro, considerada como a categoria mais importante, “os chamados

bens culturais que englobam toda sorte de coisas, objetos, artefatos e construções obtidas a

partir do meio ambiente e do saber fazer”.

Já consoante Milaré (2009, p. 264), a Constituição de 1988 diferentemente da

Constituição de 1934, “abraçou os mais modernos conceitos científicos sobre a matéria”.

[...] o patrimônio cultural é brasileiro e não regional ou municipal, incluindo bens

tangíveis (edifícios, obras de arte) e intangíveis (conhecimentos técnicos)

considerados individualmente e em conjunto; não se trata somente daqueles eruditos

e excepcionais, pois basta que tais bens sejam portadores de referência à identidade,

à ação, à memória dos diferentes grupos que formam a sociedade brasileira.

(MILARÉ, 2009, p. 264)

Levando em conta todos os conceitos, o patrimônio cultural se confunde com a

história do povo, tem ligação com fatos, lugares, memória. Talvez a mais importante

conquista e abrangência vem da ampliação de patrimônio histórico e artístico para patrimônio

cultural, cuja titularidade é do povo brasileiro.

[...] a cultura de um dado grupo social não é nunca uma essência. É uma auto-

criação, uma negociação de sentidos que ocorre no sistema mundial e que, como tal,

não é compreensível sem a análise da trajetória histórica e da posição desse grupo no

sistema mundial. (SANTOS, B., 1993, p. 43)

Verifica-se que os termos se confundem, mas para esta pesquisa mais cabível a

abrangência do termo patrimônio cultural ao invés da relativização da palavra histórico. Cabe

destacar também que apesar da diversidade cultural regional existente no Brasil, não há que se

falar em divisão de culturas, mas em unificação como forma de fortalecimento da identidade

nacional.

[...] o bem que compõe o chamado patrimônio cultural traduz a história de um povo,

a sua formação, cultura e, portanto, os próprios elementos identificadores de sua

cidadania, que constitui princípio fundamental norteador da República Federativa do

Brasil. (FIORILLO, 2009. p. 22)

66

Reportando-se ao conceito de patrimônio histórico, Meirelles (2011), entende que este

abrangeria todos os bens, móveis e imóveis, feitos pelo homem ou obras da natureza, tanto do

passado como contemporâneas, condicionando sua conservação ao interesse público e a

vinculação a fatos memoráveis da história pátria, ou por seu excepcional valor artístico,

arqueológico, etnográfico, bibliográfico ou ambiental.

Patrimônio histórico. A expressão designa um bem destinado ao usufruto de uma

comunidade que se ampliou a dimensões planetárias, constituído pela acumulação

contínua de uma diversidade de objetos que se congregam por seu passado comum:

obras e obras-primas das belas-artes e das artes aplicadas, trabalhos e produtos e

todos os saberes e “savoir-faire” dos seres humanos. Em nossa sociedade errante,

constantemente transformada pela mobilidade e ubiquidade de seu presente,

“patrimônio histórico”, tornou-se uma das palavras-chave da tribo midiática. Ela

remete a uma instituição e a uma mentalidade. (CHOAY, 2006, p. 11)

Impende destacar também que dentro do contexto da pesquisa, não cabe apenas falar

em vínculo com fatos memoráveis da história da pátria. Acredita-se que o valor do patrimônio

a ser conservado, seja ele material ou imaterial independe de sua ligação aos fatos

anteriormente reportados. Bastando para ser considerado patrimônio cultural daquele local, o

vínculo de identificação entre o bem e/ou o fato, com o grupo social de determinada

comunidade, considerando que, este vínculo justamente é que será determinante para a

perpetuação do bem cultural.

Torna-se claro que a descontextualização e a recontextualização das identidades são

elementos contraditórios do mesmo processo histórico, o que, mais uma vez, põe

fim às veleidades evolucionistas da versão liberal da

modernidade. A coexistência articulada destas contradições não deve, no entanto, ser

entendida de modo funcionalista. Representam relações sociais

conflituais protagonizadas por atores individuais e coletivos que se constituem

historicamente em processos de lutas cujos resultados não são determináveis a

priori. (SANTOS, B., 1994, p. 42)

A distinção entre patrimônio cultural material e imaterial é um ponto imprescindível.

Desse ponto de vista, entende-se que talvez pela sua concretude, seja mais fácil se identificar

e conservar o patrimônio material, mas nem por isso, este pode ser considerado mais

importante que o patrimônio imaterial. O homem identifica melhor aquilo que está edificado,

aquilo que é palpável, mas isso não torna mais importante a cultura material.

67

[...] conjunto de bens culturais classificados segundo sua natureza: arqueológico,

paisagístico e etnográfico; histórico; belas artes; e das artes aplicadas. Eles estão

divididos em bens imóveis como os núcleos urbanos, sítios arqueológicos e

paisagísticos e bens individuais; e móveis como coleções arqueológicas, acervos

museológicos, documentais, bibliográficos, arquivísticos, videográficos, fotográficos

e cinematográficos. (IPHAN, 2012?)

É possível que esta preferência também tenha conotação um tanto racista. Ao analisar

o decreto nº 25/37, vem de uma época totalmente diferente da que se vive hoje. A abolição da

escravatura infelizmente, ainda era página recente na história do país, apesar da diversidade

racial, os negros estavam à margem da sociedade, os índios sequer tinham lugar nas cidades.

Por isso, valor econômico mesmo só tinha o patrimônio oriundo da cultura dita branca, ou

melhor, burguesa, que era composto basicamente de edificações e obras de arte.

O conceito de cultura estava ligado, primordialmente, aos bens móveis ou imóveis.

A proteção do chamado patrimônio cultural resumia-se a tombamentos e inscrições

de obras de arte que, ou eram belas, sob o conceito de beleza de um grupo de

tecnocratas, ou traduziam fatos marcantes da história do Brasil, sob o critério

meramente empírico, sem qualquer fundamento científico e, juntando-se a isto, a

ausência de mecanismos para a proteção do patrimônio cultural do povo, da massa,

dos grupos marginalizados. (RODRIGUES, 2006, p. 8)

A Declaração do México, documento oriundo da Conferência Mundial da UNESCO

sobre Patrimônio Cultural, realizada em 1982, mais que uma valoração a produção, traz os

artistas como os atores principais da expressão patrimônio cultural:

O patrimônio cultural de um povo compreende as obras de seus artistas, arquitetos,

músicos, escritores e sábios, assim como as criações anônimas surgidas da alma

popular e o conjunto de valores que dão sentido à vida. (GRIFOU-SE) Ou seja, as

obras materiais e não materiais que expressam a criatividade desse povo: a língua, os

ritos, as crenças, os lugares e monumentos históricos, a cultura, as obras de arte e os

arquivos e bibliotecas. (UNESCO,1985)

O problema é que enquanto a cultura dita dos brancos, tem monumentos

arquitetônicos espalhados por todo território nacional, os negros (quilombolas) e índios que

viviam neste país foram marginalizados assim como suas manifestações culturais. O artigo

216 da Constituição Federal é um grande marco no processo de preservação da história

brasileira em seu sentido amplo, respeitando a diversidade que identifica esta nação,

68

principalmente no tocante à cultura imaterial, devido a sua fragilidade. Nesse ponto, a

Constituição de 1988 merece destaque, vez que consagra a diversidade racial no Brasil,

reconhecendo o lugar de direito dos negros e índios.

A expressão patrimônio cultural brasileiro consagra o entendimento de que nele

estaria inserido o patrimônio cultural brasileiro consagra o entendimento de que nele

estaria inserido o patrimônio cultural como um todo, seja de interesse da União, dos

estados ou dos municípios. Tem-se, na verdade, um patrimônio cultural no sentido

da universalidade. [...] Nesse sentido, é que se deve compreender o conceito legal de

patrimônio entendido como um todo orgânico, cuja unidade expressa a identidade do

país e cuja significação é tanto maior quanto o sentimento do povo em relação a sua

cidadania. (SILVA apud RODRIGUES, 2006, p. 12)

Segundo Beltrão (2009, p. 25), o meio ambiente cultural “consiste nas intervenções

humanas, materiais ou imateriais, que possuem um especial valor cultural, referente à

identidade, à ação, à memória dos diferentes grupos formadores da nacionalidade ou

sociedade brasileiras”.

A seguir passamos a uma reflexão sobre os termos conservar e preservar.

4.3 CONSERVAR OU PRESERVAR: A NECESSÁRIA DISTINÇÃO

Quando se fala em questões atinentes ao meio ambiente, se faz importante precisar a

distinção entre conservar e preservar. A palavra “preservar” vem do latim “praeservare” que

significa observar previamente, prever Drumond (2006, p. 108). Na língua portuguesa,

preservar significa, “resguardar” (XIMENES, 2000, p. 752). Quando se fala preservar, em

matéria ambiental, quer se dizer: manter intocado.

No entanto entende-se que nem sempre o isolamento pode ser a forma mais correta de

não degradação do meio ambiente e a segurança que as futuras gerações poderão ter acesso a

ele. O entendimento é que uma relação equilibrada entre o homem e a natureza seja a forma

mais adequada de mantê-lo vivo, pensamento que faz surgir o que se chama de

conservacionismo. A palavra conservar, segundo Ximenes (2000, p. 246) significa “manter,

resistir ao tempo”.

Preliminarmente as duas palavras parecem sinônimos, mas sua diferenciação será

destacada a partir da relação que o homem exercer dentro do seu ambiente. Para Diegues

69

(2002, p. 77), “reside na interação homem-natureza um dos pontos que diferenciam as várias

correntes no que diz respeito à cultura”.

Logo, se a ideia for o preservacionismo, a intervenção do homem será praticamente

nula. Este procurará manter aquela coisa intocada, da maneira mais natural possível. Segundo

(LARRÈRE, 2012), o preservacionismo corresponde ao pensamento do século XIX, quando

se pensou em proteger a natureza isolando-a em parques e mantendo esses inertes ao processo

de desenvolvimento. No entanto esqueceram que os homens também são seres naturais,

segundo a autora (2012, p. 17), “a humanidade não é somente sujeito, ela é também uma

força”. E é baseado nessa força que entra a ideia do conservacionismo, no qual, o próprio

homem, enquanto ator principal desse processo buscará meios em que possa usar o ambiente

em que vive da forma mais racional possível.

Diegues (2002, p. 83), cita Dasmann, que considera que são as “sociedades

interligadas a uma economia global, de alto consumo e poder de transformação da natureza,

que causam grande desperdício de recursos naturais”. Manter intocado torna o bem estagnado

e a cultura não é estática, seu caráter é dinâmico e daí a necessidade que passe por

transformações que funcionarão como adequações necessárias à perpetuação da identidade

daquele grupo com determinado bem, seja ele material ou imaterial. Mas esse pensamento não

é uniforme. Vejamos o que nos diz Lemos acerca da questão que vimos examinando:

[...] será mais fácil a manutenção de nossa identidade cultural se soubermos

controlar os processos de evolução que fatalmente se desenvolvem mercê de

alterações inevitáveis no campo do saber fazer. Neste controle esta implícito registro

dos vários estágios que passamos. Aqui registrar é sinônimo de preservar, de guardar

para amanhã informações ligadas a relações entre elementos culturais que não têm

garantias de permanência. (LEMOS, 2006, p. 27)

Na segunda metade do século XIX, segundo Diegues (2002), foi grande a criação de

áreas de proteção, os chamados parques e reservas. Isso porque a revolução industrial trouxe o

ônus do crescimento desordenado das cidades e a destruição acelerada do meio ambiente.

Naquele momento, dentro daquele contexto, o ideal foi providenciar áreas em que se

mantivesse a natureza intocada, na verdade uma espécie de demarcação foi criada, liberando o

homem a destruir o que não estivesse dentro daquele eixo criado.

Apesar do despertar do homem para a finitude dos recursos naturais, se em tese houve

uma modificação na forma de pensar, na prática, o homem continua sendo o principal ator no

70

processo contínuo de degradação do ambiente. Papel importante nesse processo, como

exemplo, são as chamadas comunidades tradicionais, ou seja, aqueles povos que vivem em

contato constante com natureza, chegam a retirar dela a sua subsistência, mas adotam uma

relação de cumplicidade com o meio natural e conseguem mantê-lo vivo e útil. Nesse sentido,

utilizando o pensamento de Sachs (2002), não se pode equacionar conservação com a opção

de “não-uso” dos recursos naturais e sim com o uso racional para atender as necessidades.

[...] De modo geral, o objetivo deveria ser o do estabelecimento de um

aproveitamento racional e ecologicamente sustentável da natureza em benefício das

populações locais, levando-as a incorporar a preocupação com a conservação da

biodiversidade aos seus próprios interesses, como um componente de estratégia de

desenvolvimento. Daí a necessidade de se adotar padrões negociados e contratuais

de gestão da biodiversidade. (SACHS, 2002, p. 53)

De outra vertente, quando se fala em meio ambiente artificial, geralmente o termo

mais ouvido é o de preservação. Criou-se o costume que a história para ser mantida viva deve

estar sob a égide do tombamento, sob a guarda dos museus. Estamos longe aqui de discordar

desta prática que tem sido realmente eficaz no sentido de guardar em segurança, mas

questiona-se se ao invés da prática preservacionista, talvez a prática conservacionista não

trouxesse resultados mais eficazes no sentido de manter viva a história se associada com o

caráter dinâmico próprio da cultura, de modo a evitar que as cidades se tornem mortas, como

aconteceu com Atenas.

A Atenas moderna não tem mais nada em comum com a cidade arcaica, coberta,

absorvida, desmesuradamente estendida. Os monumentos e os lugares (ágora,

acrópole) que permitem encontrar a Grécia antiga não representam mais do que um

local de peregrinação estética e de consumo turístico. (LEFEBVRE, 2001, p. 17)

Entende Lefebvre (2001), que estes lugares sobrevivem graças a uma troca que os

fazem ter um duplo papel, o do lugar que se vende e o lugar que se consome. De certa forma

são atribuídos dois tipos de valor aos lugares. O valor de uso e o valor de troca, como se

refere (LEFEBVRE, 2001). Ou seja, valor de uso tem relação com o sentimento das pessoas e

valor de compra ou de troca, o valor como produto de mercado. O valor de uso é aquele

ligado ao sentimento desenvolvido com relação ao lugar, tem relação com a identidade das

pessoas que vivem em determinado espaço. Já o valor de troca é o valor pecuniário que a

exploração daquele lugar pode ter, ou seja, aquele atribuído ao lugar de acordo com intenções

71

na sua concepção. Criam espaços voltados exclusivamente a atrair o olhar de investidores,

mas, descarta o sentimento das pessoas que ali vivem. Muitas vezes esses espaços passam por

tantas modificações que pouco interessa àquele que nasceu e sempre viveu na localidade. Em

matéria cultural, acredita-se que o manter vivo só se dá quando o homem entende seu papel

conservacionista.

Acredita-se que existe um grande equívoco em achar que a sensibilização surge de

maneira controlada, como se fosse uma mercadoria que se coloca numa prateleira para ser

comprada ou não pelo consumidor. No caso da cultura, é preciso que exista a identificação, o

sentimento, por isso que se entende que as práticas conservacionistas surtiriam um efeito mais

promissor do que a prática comum preservacionista.

4.4 CULTURA E LUGAR

No ano 2000, com a edição da Lei nº 9985, Lei do Sistema Nacional de Unidades de

Conservação- SNUC foi estabelecido no seu artigo 2º um conceito para as chamadas

comunidades tradicionais. No entanto, foi um conceito extremamente criticado e foi vetado,

por impor condições, principalmente na questão relativa à delimitação do território como

necessário a caracterização de determinado grupo como comunidade tradicional. Um dos

principais erros foi a redução dos territórios tradicionais apenas à localização geográfica,

desprezando o que existe de mais importante, o auto-reconhecimento da comunidade de

determinado espaço como de fato o seu lugar.

[...] Um elemento importante na relação entre populações tradicionais e a natureza é

a noção de território que pode ser definido como uma porção da natureza e espaço

sobre o qual uma sociedade determinada reivindica e garante a todos, ou uma parte

de seus membros, direitos estáveis de acesso, controle ou uso sobre a totalidade ou

parte dos recursos naturais aí existentes que ela deseja ou é capaz de utilizar[...]

(GODELIER apud DIEGUES, 2002, p. 84)

Sete anos depois o Decreto nº 6040/2007, em seu artigo 3º, traz um novo conceito de

Povos e comunidades tradicionais, como uma tentativa de delimitar a subjetividade de um

conceito de enorme abrangência. Pensamento que também predominou ao se definir

territórios tradicionais, trazendo a cultura como um dos pilares. Para as comunidades e povos

72

tradicionais o território tem uma simbologia muito grande, existe uma identidade com o lugar,

uma interação simbiótica.

Art. 3º [...]

II - Territórios Tradicionais: os espaços necessários a reprodução cultural, social e

econômica dos povos e comunidades tradicionais, sejam eles utilizados de forma

permanente ou temporária, observado, no que diz respeito aos povos indígenas e

quilombolas, respectivamente, o que dispõem os arts. 231 da Constituição e 68 do

Ato das Disposições Constitucionais Transitórias e demais regulamentações;

(BRASIL, 2007)

A importância do lugar tem características que vão além da definição de espaços

geográficos. A relação do povo que vive em determinado espaço e seu lugar tem ligação que

envolve sentimentos, identidade e é aí que surgem os territórios. Foi através da geografia

chamada de humanística que o lugar passou a ter contornos diferentes aos olhos da ciência.

Segundo Santos, M. (2006, p. 216), “cada lugar, irrecusavelmente imerso numa comunhão

com o mundo, torna-se exponencialmente diferente dos demais”. E essa diferenciação é feita

individualmente ou através da formação de grupos.

As pessoas têm uma reação emotiva diante dos lugares em que vivem, que

percorrem regularmente ou que visitam eventualmente. Alguns lhe agradam, lhes

parecem agradáveis, acolhedores ou calorosos; outros os seduzem por sua beleza,

pela impressão de calma e de harmonia que deles emana ou pela força das emoções

que eles suscitam. (CLAVAL, 2010, p. 39)

Urge mencionar que ao tratar de cultura é imprescindível a ligação do homem com o

lugar em que se vive. Essa ligação é quem vai definir a relação das pessoas que ali vivem com

o seu contexto cultural e é justamente essa ligação que culturalmente formará um lugar, ao

qual tem-se como sinônimo de território. Nas palavras de Foucault (2008), a soberania

depende de uma boa situação dentro do território e soberano é um território com boa

disposição espacial. Nesse pensamento a cidade iria aquém dos limites geográficos. Ela seria

formada acima de tudo por uma ligação afetiva abstrata entre aqueles que ali vivem e

permitem que aos poucos seja maximizado o que tem de positivo ou negativo. Ou seja, dentro

de um mesmo espaço, existiria um controle abstrato, que não seria um controle das pessoas

em si, mas das suas vidas enquanto membros daquela comunidade. Nas minúcias cotidianas,

estariam implícitas formas de controle que ditariam os caminhos para os quais deve ser

conduzido aquele grupo de pessoas.

73

Assim haveria aqui, acreditamos uma diferença entre a visão de Foucault (2008) e da

de Santos, M. (2006). Diferença não na forma espacial de território, mas talvez na forma

conceitual. Enquanto o primeiro restringe, o segundo amplia o sentido do termo território.

Não é incomum encontrarmos pessoas que apesar de terem nascido e sido criadas em

determinado lugar, não terem nenhuma identificação com aquela cultura ou não se sentirem

parte pertencente àquele grupo social. A ligação afetiva-social é intrínseca e independe de

fatores externos é questão de identificação. Por isso a crítica quanto a relacionar patrimônio

histórico cultural com fatos memoráveis ligados a um povo. É uma delimitação que

compromete o verdadeiro sentido do que aqui é pesquisado. Esclarecendo tal pensamento,

acredita-se que o significado cultural independe dos grandes acontecimentos.

É assim que, da mesma forma que uma grande edificação representa a cultura de

determinado grupo, essa mesma edificação pode não representar ou não ter nenhuma

simbologia para outro grupo. A construção do lugar de cada um é formada por edificações,

pela natureza e até mesmo e principalmente pelas pessoas, é processo único e próprio de cada

um.

De acordo com Claval (2010, p. 41), a reação que as pessoas apresentam em relação

ao lugar em que vivem é inseparável dos seres que ali se encontram, “um único ser falta e

tudo fica deserto”. Isso se resume ao processo de construção do “habitat” de cada ser humano.

O lugar é o quadro de uma referência pragmática ao mundo, do qual lhe vêm

solicitações e ordens precisas de ações condicionadas, mas é também o teatro

insubstituível das paixões humanas, responsáveis, através da ação comunicativa,

pelas mais diversas manifestações da espontaneidade e da criatividade. (SANTOS,

M., 2006, p. 218)

Segundo Rogério Leite (2004), o conceito de espaço é mais abrangente que o de lugar,

o que não significaria atribuir fronteiras rígidas ao lugar e a dinâmica da mudança histórica ao

espaço, isso porque os aspectos mais perenes da vida social são guardados nos lugares. E nos

tempos em que se vive de mensagens instantâneas, há de se convir que o apreço a memória

reste também comprometido. Se as pessoas não têm mais tempo de compartilharem suas

experiências, de viverem os lugares, dificilmente desenvolverão uma ligação afetiva com

determinado espaço, o que compromete de fato, a perpetuação de uma cultura. E talvez seja o

imediatismo, a principal causa do que se chama de falta de memória.

74

Interessante pensamento nesse sentido de Pierre Nora (1989), para o qual a dinâmica

da história hoje em dia se dá em face da medida em que os fatos acontecem. Ou seja, a

história tem sido reduzida a notícia do minuto e rapidamente substituída pela noticia seguinte,

donde intrinsecamente passamos a absorver a ideia de que cultura, memória estão atrelados a

fatos dos nossos antepassados e que ficam guardados nos museus, nos arquivos e vez em

quando podem ser visitados, confundindo-se erroneamente memória com história. Sendo que,

a história teria ligação direta com os fatos passados, no entanto, a memória teria um sentido

abstrato, ligado ao sentir.

History’s goal and ambition is not to exalt but to annihilate what has in reality taken

place. A generalized critical history would no doubt preserve some museums, some

medallions and monuments – that is to say, the materials necessary for its work- but

it would empty them of what, to us, would make them lieux de memoire. In the end,

a society living wholly under the sign of history could not, any more than could a

traditional society, conceive such for anchoring its memory10. (NORA, 1989, p. 3)

Ainda dentro desse contexto, caberia salientar que o lugar tem vínculo com a

existência daquela pessoa e influencia diretamente todas as relações do homem em toda sua

vida, por isso mesmo que quando se trata de cultura, não pode existir delimitação no seu

conceito, é preciso analisar a relação do homem com o próprio homem, a relação com a

natureza e acima de tudo a relação com seu lugar. Consoante Santos, M. (2006), um lugar se

torna sede de alienação para o homem, quando a memória daquele local lhe é estranha ante

um espaço desconhecido, o qual não ajudou a criar e tampouco conhece a história.

O modo como essas práticas sociais criam seus nexos identitários com os lugares

sociais colide muitas vezes com as formulações abrangentes das políticas oficiais de

cultura. A tradição mais uma vez parece encurralada pela complexificação e

diferenciação social quando se observam as tensões da política como ação

simbólica, que pretende restabelecer as relações tradicionais, no âmbito da nação,

entre identidade e lugar. As políticas de patrimônio cultural destacam-se,

justamente, por terem a pretensão de reconstituir os nexos constitutivos da tradição

para a vida em uma sociedade nacional. (LEITE, R., 2004, p. 39)

10 O objetivo e a ambição da história não é exaltar, mas modificar o ocorrido. Uma crítica generalizada da

história preservaria alguns museus, algumas medalhas e monumento- o que diriam ser material necessário para

seu trabalho- mas seriam objetos vazios para nós, que não representariam os lugares de memória. No fim, a

sociedade que vivesse inteiramente sob a influência da história, não teria de fato lugares para ancorar sua

memória.

75

Apesar de tudo que foi dito, não existe dúvida quanto à relação do lugar com a cultura.

Mas é preciso que se fique atento e que não se despreze a construção que se faz dentro de

espaços com a intenção de formar lugares. É nesse sentido que Milton Santos, (2006) afirma

que existem espaços intencionalmente concebidos, intencionalmente fabricados e

intencionalmente localizados, os quais aspiram uma perfeição maior que a da própria

natureza.

Segundo o pensamento de Nora (1989, p. 6), “these lieux de memoire are

fundamentally remains, the ultimate embodiments of a memorial consciousness that has

barely survived in a historical age that calls out for memory because it has abandoned it”11.

Isso explica a situação de muitos lugares especialmente criados para o turismo

cultural, os quais são de grande representatividade para aqueles que vêm de fora e busca

conhecê-lo, e ao mesmo tempo, independente desse valor de mercado, acaba sendo

considerado de pouca valia, para aqueles que apesar de viverem naquele lugar, não se

identificam com a forma com que se apresenta a cultura nativa daquele grupo social. É nesse

sentido que Milton Santos (2005, p. 255), escreve que é o uso do território, e não o território

em si mesmo, que faz dele objeto da análise social.

São espaços montados artificialmente e que se não fosse pelo cenário arquitetado nada

significaria. A memória em sendo afetiva, não necessita de estátuas, fotografias, como causa,

estas seriam apenas consequências, a concretude daquilo que existe na abstração, a

materialização do sentimento.

4.5 DESENVOLVIMENTO VERSUS CULTURA: O DIREITO À CIDADE

Atrelado ao conceito de desenvolvimento está também o conceito de urbanização.

Grosso modo, o conceito “urbanização” pode ser considerado como sendo o processo que se

dá quando determinado lugar passa a perder as características rurais e passa a ter

características urbanas. Talvez a maior alavanca mundial para o processo de urbanização

tenha sido a industrialização, (LEFEVBRE, 2001), chega a utilizar o termo “sociedade

industrial” para definir a “sociedade moderna”.

11 Estes lieux de mémoire são fundamentalmente restos, remanescente da memória que quase não sobreviveu à

história porque foram abandonados.

76

Segundo Santos, B. (1982, p. 34), as transformações da cidade estiveram sempre

relacionadas com as transformações do campo e o desenvolvimento do capitalismo como

fenômeno iminentemente urbano, acabou por subordinar o campo à cidade. O processo de

desenvolvimento urbano é muito mais que um processo de crescimento econômico, seria um

processo complexo com mudanças nas características culturais dos locais.

Um exemplo desse processo é Chicago, que em menos de 50 (cinquenta) anos passa

de um lugar insignificante para a segunda maior cidade norte-americana. Segundo, Eufrasio

(1999), ao analisar o crescimento rápido de Chicago, considera que o desenvolvimento das

ferrovias foi decisivo para este processo, tendo em vista que a cidade que era um grande

entroncamento de linhas tornou-se um grande centro comercial do meio-oeste.

Ainda de acordo com Eufrasio (1999), o fato da produção de todos os bens

manufaturados dos Estados Unidos se concentrar em Chicago, atraiu imigrantes de toda parte

do mundo, principalmente uma elite que contribuiu para o desenvolvimento da escola de

Chicago de arquitetura, que “não somente contribuiu com o arranha-céu para a civilização

urbana americana como também criou o primeiro estilo arquitetônico urbano coerente e

próprio do continente” (BULMER apud EUFRÁSIO, 1999, p. 28-29).

O grande problema é que as mudanças nos aspectos físicos das cidades,

principalmente numa escala de tempo pequena, como no exemplo de Chicago, trazem bônus,

mas também trazem ônus. Vale aqui a ideia de Diderot (2011, p. 119), que em pleno século

XVIII, já lembrava que a corrupção e os vícios nascem e crescem com o nascimento e

crescimento das cidades.

Considera Lefevbre (2001, p. 11-12), que a Cidade preexiste à industrialização e já

tem uma poderosa realidade, “a própria cidade é uma obra, e esta característica contrasta com

a orientação irreversível na direção do dinheiro, na direção do comércio, na direção das

trocas, na direção dos produtos”.

Para alguns, a cidade seria uma área urbanizada, para outros o termo "cidade"

designaria uma entidade político-administrativa. De acordo com (CARLOS, 2013, p. 67), a

cidade, enquanto realização humana é um fazer intenso, ininterrupto, “a cidade tem a

dimensão do humano, refletindo e reproduzindo-se através do movimento da vida, de um

modo de vida, de um tempo específico que tem na base o processo de constituição do

humano. Para Rousseau (2002), a cidade seria “a pessoa pública, formada assim pela união de

77

todas as outras”. Ou seja, a cidade seria um ente produzido através de uma associação de

vontades, na qual a essência seria o acordo de obediência e liberdade inerente a todos eles.

[...] ao invés da pessoa particular de cada contratante, esse ato de associação produz

um corpo moral e coletivo, composto de tantos membros quanto a assembléia de

vozes, o qual recebe desse mesmo ato sua unidade, seu eu comum, sua vida e sua

vontade. (ROUSSEAU, [1762] 2002, p. 26)

De acordo com Freitag (2006, p. 23), as cidades são formações históricas próprias,

cada uma com sua individualidade. Já Lefebvre (2001), considera que a cidade ultrapassa os

limites da geografia, ela é construída estabelecendo uma relação entre a sua história e as

transformações pelas quais passou, seria a Cidade sinônimo de cultura.

O duplo processo de industrialização e de urbanização perde todo seu sentido se não

se concebe a sociedade urbana como objetivo e finalidade da industrialização, se se

subordina a vida urbana ao crescimento industrial... A industrialização produz a

urbanização inicialmente de modo negativo... A sociedade urbana começa sobre as

ruínas da cidade antiga e da sua vizinhança agrária... (LEFEBVRE, 2001, p. 137)

Freitag (2006, p. 115) citando Sassen, afirma que o estudo urbano traz o alerta de que

a vida urbana tem sido perigosamente alterada pelos funcionários das firmas multinacionais,

que chegam as cidades colonizando-as virtualmente.

A estrutura física da cidade representa uma figura geométrica, motivo pelo qual para

Park, citado por Eufrasio (1999) no livro Estrutura Urbana e ecologia humana, os processos

inevitáveis da natureza humana têm um caráter difícil de controlar, fazendo com que esta

assuma uma organização que não é nem intencionada e nem controlada. Fato que de acordo

com Carlos (2013, p. 69) provoca mudanças cada vez mais rápidas e profundas, alterando o

ritmo de vida, a relação das pessoas e até mesmo os valores.

[...] o que antes era um mero agregado de pessoas, uma expressão geográfica de

concentração da população, “se torna vizinhança, uma localidade com sentimentos,

tradições e uma história próprios”, e de algum modo, dentro de cada vizinhança, “se

mantém a continuidade dos processos históricos”, o passado se impõe sobre o

presente e a vida de cada uma se altera com certa força e ritmos próprios, com certa

independência do círculo maior de vida e dos interesses em seu redor. (EUFRASIO,

1999, p. 51)

78

É a concepção ecológica da estrutura urbana. Segundo Eufrásio (1999, p. 46) existem

duas linhas de ênfase no estudo da organização espacial da cidade. Uma linha que identifica

as forças da dinâmica espacial e descreve seu movimento real até a recriação do quadro

espacial e a linha que ressalta os aspectos da estrutura espacial que se configura num conjunto

definido de categorias de áreas diferenciadas da cidade num determinado momento. Essas

duas concepções são baseadas nos estudos de Robert Park, um importante sociólogo urbano

norte americano e do sociólogo canadense Ernest Burgess, respectivamente.

Observe-se que na linha dos estudos de Park, a cidade deveria ser pensada como uma

instituição, sendo algo além do simples aglomerado de pessoas ou uma entidade coletiva. Ou

seja, a cidade abrange um todo, o conjunto entre esse ente coletivo, e toda estrutura física.

Segundo Eufrasio (1999), Robert Park sustentaria que a cidade possui uma organização física

e uma moral, o que fará que adiante, o mero aglomerado de pessoas, venha a se tornar uma

localidade com sentimentos, tradições e histórias próprias. Já do ponto de vista dos estudos

de Burgess, existiria uma cooperação mútua que faz com que a cidade exista, mas ao mesmo

tempo existiria uma competição, que é o que mantém a cidade como um organismo vivo,

através das interações entre as forças sociais e econômicas. Pensamento este que se aproxima

em parte com o de Lefebvre (2001), quando este entende que a cidade não pode ser vista

como um sistema fechado,vez que estas interações sociais possibilitariam a abertura de

inúmeras outras possibilidades.

Em verdade, de tudo que fora lido até agora, concordamos com a assertiva de que a

cidade é um organismo vivo, produto das interações morais, que produzem as cooperações

competitivas descritas por Ernest Burgess. Corroborando com essa ideia, podemos remontar a

Rousseau (2002) na Carta ao Senhor Voltaire sobre a Providência, quando este atribui ao

homem a responsabilidade por suas próprias desgraças. Sem dúvida razão assiste ao

renomado pensador, vez que a ambição e o egoísmo oriundos da natureza humana são as

principais causas para os problemas enfrentados por toda sociedade. Os homens estabelecem

distâncias morais, convertidas em preconceitos e que servem como justificativa para o

processo de segregação interna existente dentro de toda e qualquer cidade. Segundo

(EUFRÁSIO, 1999, p. 56), as cidades “mostram o bem e o mal da natureza humana em

excesso”.

Destaque-se que essa suposta sociabilidade que segrega o grande grupo em pequenos

grupos nesse aspecto se confunde com etnicidade, na medida em que a intimidade é

desenvolvida dentro desses pequenos grupos dos quais são excluídos os que podem ser

79

chamados de intrusos, por não possuírem as características que se exige para que estes sejam

“socialmente” aceitos. E existe atualmente uma grande preocupação em se ser aceito

socialmente, o que leva as pessoas a se fecharem em pequenos grupos sociais por medo da

rejeição, formando um círculo vicioso que entendemos assim, extinguir a possibilidade de

pensar esse grupo como uma sociedade política ampla e soberana. São bem recebidos apenas

aqueles que compactuam dos mesmos gostos, dos mesmos pensamentos. A maior

consequência disso é a promoção de um afastamento cada vez maior entre os homens

inseridos numa mesma sociedade o que leva a falta de elo entre eles, mola propulsora da

unicidade.

Se no plano efetivo da história o reconhecimento das diferenças é importante, no

plano filosófico especulativo- o qual instaura um dever ser e a possibilidade mesma

de critica às desigualdades- reconhecer uma “natureza comum”, constituída pela

liberdade, igualdade e pela bondade originais é decisivo. (GARCIA, 1999, p. 54)

Olhando num plano mais amplo, ao longo da história podemos observar que o mundo

se constitui num misto cultural e por essa mera observação podemos ainda compreender que a

fonte da desigualdade entre os homens é o próprio homem (GARCIA, 1999).

Ao se pensar no desenvolvimento das cidades, estas questões ligadas à natureza

humana não podem ser excluídas, pois o homem é a base, nada se desenvolve se o homem

não se desenvolver também, o problema é que a voracidade humana atropela os demais

processos internos de conhecimento a si mesmo. Isso prejudica muito os estudos que são

feitos acerca do processo desenvolvimentista. De acordo com Fortuna (2006, p. 11) a

preocupação desenvolvimentista é que faz com que se ofusque ou se perca a análise das

cidades. Trata-se de um processo tanto mais gravoso para a sub-disciplina sociológica quanto

ocorre à contra-ciclo.

[...] a moderna cultura urbana que é cada vez mais uma cultura de velocidade e de

instantaneidade adversa à história e à memória dos lugares, contraria o espaço-

tempo de encontro público e vê o cidadão como ser em contínuo movimento

dirigindo-se sem interrupção a um destino pré-estabelecido. (FORTUNA, 2006, p.

5)

Criou-se uma falsa generalização mundial, na qual se ocidentaliza o oriente e vice

versa, mas que, de certa forma ao invés de agregar produz mais segregação. É vendida a

imagem que tudo está sendo globalizado, mas em verdade o que existe por trás é uma

80

tentativa implícita de se levar o produto cultural de um lugar para outro, sem respeitar a

realidade local do receptor desse produto. Para Garcia (1999), ao citar a crítica ao

cosmopolitismo feita por Rousseau, é evidente que existe uma ilusão quando se acredita que a

transposição do modo de vida de uma sociedade para outra é algo que extermine as

diferenças. Em outras palavras isso que se chama de teoria da convergência, ou seja, os

processos através dos quais se impõe a cultura de um local em outro, geralmente esses lugares

destino são os que estão em desenvolvimento ou subdesenvolvidos. No entanto, esse processo

ao invés de agregar, provoca mais segregação ao tempo em que exclui do polo receptor a

população local. Segundo (FORTUNA, 2006, p. 13), as simbioses teóricas estão sendo

abertas no campo das questões urbanas de cidades, tanto no domínio sociológico e político

como nos processos econômicos e urbanísticos e a consequência para essa chamada teoria da

convergência seria o progresso que chega, mas, também traz pobreza, drogas e

criminalização.

Uma das preocupações de Lefebvre (2001), é considerar que existe alienação na

forma como se estuda a cidade, vez que resumem os seus problemas a questões espaciais,

desconsiderando seus inúmeros contextos. Para Carlos (2013, p. 23), o uso diferenciado da

cidade, demonstra que este espaço se constrói e se reproduz de forma desigual e contraditória,

“a desigualdade espacial é produto da desigualdade social”.

A cidade não é apenas uma linguagem, mas uma prática. Ninguém portanto, e não

tememos repeti-lo, ressaltando-o, está habilitado a pronunciar esta síntese, a

anunciá-la. Não mais o sociólogo ou o “animador” do que o arquiteto, o economista,

o demógrafo, o linguista, o semiólogo. Ninguém tem nem o poder e nem o direito de

fazê-lo. Talvez apenas o filósofo tenha esse direito, isto se a filosofia, no decorrer

dos séculos, não tivesse mostrado sua incapacidade de atingir realidades concretas

(ainda que ela sempre tenha objetivado a totalidade e levantando as questões globais

e gerais). Apenas uma práxis, em condições a serem determinadas, pode se

encarregar da possibilidade e da exigência de uma síntese, da orientação na direção

desse objetivo: a reunião daquilo que se acha disperso, dissociado, separado, e isso

sob a forma da simultaneidade e dos encontros. (LEFEBVRE, 2001, p. 101-102)

Pensamento similar ao de Fortuna (2002, p. 20), que acredita que a cidade do futuro

próximo deverá ser construída como uma cidade nova. Uma cidade que corrija os principais

erros da cidade de hoje e se mostre uma cidade justa, imaginativa, ecológica, tão compacta

como policêntrica, com memória e sentido de lugar, de fácil contacto social, culturalmente

diversa e, acima de tudo, uma cidade bela (FORTUNA, 2002, p. 20). Interessante apresentar

81

que de acordo com Bolle (2000, p. 29), o poder da metrópole está no mercado consumista,

local no qual existe espaço tanto para a circulação de mercadorias como para o consumidor

envolto numa atmosfera de luxo. Esse mesmo lugar de desejos é o cenário ideal para despertar

outras visões da cidade, como o contraste entre a burguesia e a realidade vivida pela classe

operária.

Para Freitag (2006, p. 21-23), a questão monetária, valores abstratos, a

comercialização e a possibilidade de tudo ter um preço, até mesmo o amor, influenciam na

mente das pessoas que vivem na cidade, e cria um novo valor na história mundial do espírito.

Nos dias atuais na cidade, as pessoas vivem como se estivessem num grande hotel, segundo

Park apud Eufrásio (1999, p. 54-56) se mantêm cordiais, mas estabelecem relações fortuitas

ao passo em anulam qualquer possibilidade de intimidade através de distâncias morais

mentalmente estabelecidas.

Já Fortuna (2006) considera que existe uma contradição entre a cidade como espaço

libertador com vínculos e interações fortes, em oposição com a cidade responsável pelo

desaparecimento do que teria sido a comunidade pré-urbana, destroçada agora por uma

individuação excessiva, realidade que foi mal acautelada pela sociologia urbana.

Os espaços sociais de proximidade relacional não são deste modo, espaços de

fechamento individualista e de “solidão” comunicativa (FORTUNA, 2006, p. 2), mas essas

alterações sofridas interferem tanto no modo como se vive como no modo em que se

interpreta.

A participação pública dos cidadãos, grupos e movimentos sociais surge

condicionada e, perante os efeitos sensíveis da globalização da economia, da cultura

e da comunicação, o espaço público das cidades surge pautado pelos desígnios da

massificação e da estetização dos consumos, do mesmo modo que o planejamento

urbano e mesmo numerosas imagens identitárias e promocionais das cidades passam

a sujeitar-se à lógica do mercado. É a chamada colonização do espaço público

urbano. (FORTUNA, 2002, p. 7)

Utilizando uma concepção restrita, poderia se considerar que a retração do espaço

público deve-se a incoerência de modelos de planejamento arquitetônico e urbanístico,

Fortuna (2006), considera não apenas esse o motivo, mas também a desurbanização e a

desvitalização dos lugares e das interações sociais.

82

[...] a moderna cultura urbana que é cada vez mais uma cultura de velocidade e de

instantaneidade adversa à história e à memória dos lugares, contraria o espaço-

tempo de encontro público e vê o cidadão como ser em contínuo movimento

dirigindo-se sem interrupção a um destino pré-estabelecido. (FORTUNA, 2006, p.

5)

A necessidade da revisão epistêmica, segundo Fortuna (2006), reforçará a

compreensão dos quotidianos urbanos e das diversas expressões culturais da vida na cidade.

Alertando, que a teoria da convergência despreza universos urbanos não ocidentais,

produzindo uma retórica exclusivista, incongruente com a chamada globalização. A teoria

renovada deverá equacionar o mundo urbano na sua globalidade, impondo-se um dever de

convergi-las e torná-las aptas para um projeto e uma narrativa global (FORTUNA, 2006, p.

16-17).

A afirmação moderna da cidade como entidade autônoma, política, econômica,

administrativa e cultural, é uma longa história de tensões e conflitualidades. Na

cidade medieval e barroca, por exemplo, este quadro de tensões coloca a cidade em

manifesta oposição àquilo que hoje designamos por “campo”. “Os ares da cidade

libertam”, esse velho aforismo da Alemanha pré-moderna é elucidativo deste

conflito, pois, nele, a cidade representa a liberdade e emancipação política e social a

que aspiram os camponeses. (FORTUNA, 2002, p. 2)

É importante também salientar que para Fortuna (2002), a cidade é eminentemente

excludente: repele e subalterniza os grupos sociais vulneráveis que “ofendem a frágil

sensibilidade do olhar burguês”, o que leva a morte simbólica de uma parte da cidade onde

estão os mais frágeis, pobres e incultos, e enaltece a outra, a dos mais ricos, cultos e

poderosos, considerando ainda que “a cidade substituiu o seu conflito com o campo e o rural

pelo conflito consigo própria” (FORTUNA, 2002, p. 4).

Como pressuposto, Fortuna (2002, p. 7-8) traz a chamada “crise” do espaço público

das cidades, resultante da lógica cultural contemporânea que acentua, de um lado, o reino do

individualismo e da domesticidade e, de outro lado, a cultura do movimento e da velocidade.

As transformações socioeconômicas assinaladas desde os tempos da cidade estariam ligadas

com a questão dos espaços públicos urbanos.

Necessitamos, para tanto, de assegurar um requisito fundamental: é preciso que o

redesenvolvimento cultural das cidades e dos seus espaços resulte de uma

conferência alargada de consenso participado que se debruce sobre o lugar e o

significado do tempo e do espaço na cidade, para o que se torna essencial pôr em

confronto as visões díspares do que antes designei por cidade e “não”-cidade e as

83

suas respectivas leituras e sentidos desta relação espácio-temporal. Se esta é a

hipótese, a contra-hipótese traduz-se no facto de, perante a impossibilidade desta

conferência de consenso, a cidade, em vez de diversa, permanecer sujeita a

intervenções medíocres, ou à arrogância e à insensibilidade de muitos profissionais

das terceiras culturas, ou ao utilitarismo de muitos investimentos e usos dos seus

espaços públicos. Ou mesmo a tudo isso simultaneamente. (FORTUNA, 2002, p.

156-157).

O direito à cidade é o direito de ser cidadão. Segundo Diderot (2011, p. 121), constitui

o direito de participar dos privilégios que são comuns a todos os cidadãos. Em tese, a

existência da cidade pressupõe a regras intrínsecas estabelecidas para regular a convivência

social. Desses grupos que se formam em torno de um ideário comum têm-se as cidades.

De acordo com Lefebvre (2011, p. 111), o fato de habitar aqui ou ali comporta a

recepção, a adoção, a transmissão de um determinado sistema. A própria ontologia da cidade

moderna (fragmentações e incoerências políticas, sociais e culturais) é o que dificulta a

instituição de ações que abranjam o redesenvolvimento cultural das cidades. Fortuna (2002, p.

19), considera, nesse sentido, que o espaço público bem sucedido é um espaço público que

além do seu sentido estético, se revela inteligível, abstrato e não apenas funcional, mas, ao

mesmo tempo, suficientemente definido e explícito, de modo a promover a

intersubjectividade da cidade.

Com base nas análises teóricas apresentadas ao longo desta dissertação, adentraremos

agora na análise mais detida dos processos de urbanização da cidade Laranjeiras. Antes de

passarmos aos resultados e discussões será apresentada a metodologia utilizada na pesquisa

bem como o caminho trilhado para a obtenção das informações coletadas e das considerações

que a partir de então foram feitas.

84

5 METODOLOGIA

5.1 CONSIDERAÇÕES INICIAIS

Tendo em vista a problemática a ser diagnosticada, o método utilizado foi o

dialético, considerando a necessidade de abordar os fatos dentro do contexto político,

social e econômico.

Baseado na dialética de Hegel, “é um método de interpretação dinâmica e

totalizante da realidade” Pereira (2010, p.80). Ou seja, muito mais que simples análise da

legislação do município de Laranjeiras/SE, o trabalho exigiu um estudo acerca da história

da cidade, desde sua fundação aos tempos atuais, bem como da maneira como suas leis

foram construídas e as influências sofridas ao longo do processo.

Impende salientar que a interpretação é atividade cotidiana na vida do operador do

direito. Assim, impossível dissociar a formação profissional do pesquisador durante a

execução da pesquisa. A interpretação é “função atribuída ao exegeta, que buscará o real

significado dos termos constitucionais” Lenza (2010, p. 129). Em que pese à hermenêutica

dentre tantas outras coisas, leva em consideração todo o contexto no qual se insere a

norma, para que se identifique o seu real significado.

Em geral, a interpretação significa a exposição do verdadeiro significado do material

apresentado, em relação aos objetivos propostos e ao tema. Esclarece não só o

significado do material apresentado, em relação aos objetivos propostos e ao tema.

Esclarece não só o significado do material, mas também faz ilações mais amplas dos

dados discutidos. (LAKATOS, 2010, p. 152)

Quanto à forma de abordagem, a pesquisa foi qualitativa. Pereira (2010, p. 71),

afirma que este tipo de pesquisa traz “um vínculo indissociável entre o mundo objetivo e a

subjetividade do sujeito que não pode ser traduzida em números”. Ainda segundo o autor:

A interpretação dos fenômenos e a atribuição de significados são básicas no

processo de pesquisa qualitativa. Não requerem o uso de métodos e técnicas

estatísticas. O ambiente natural é a fonte direta para a coleta de dados e o

pesquisador é o instrumento-chave. É descritiva. Os pesquisadores tendem a

analisar seus dados intuitivamente. O processo e seu significado são os focos

principais de abordagem. (PEREIRA, 2010, p. 71)

85

Quanto aos objetivos, a pesquisa foi exploratória e descritiva. Exploratória no

sentido de buscar maior familiaridade com o problema e descritiva com a finalidade de

levantar as opiniões, atitudes e crenças de determinado grupo Gil (2009, p. 41-42). Ou seja,

não bastava conhecer a legislação da cidade de Laranjeiras. Foi preciso conhecer também a

realidade vivenciada pelo povo que lá vive e as pessoas que circulam na cidade e a sua

respectiva interação com a cultura do lugar.

Os estudos exploratórios são como realizar uma viagem a um lugar desconhecido,

do qual não conhecemos nada nem lemos nenhum livro a respeito do qual

possuímos uma rápida ideia oferecida por terceiros. Ao chegar ao local, não

sabemos que lugares visitar, a qual museu ir, onde comer bem, como são as pessoas;

em outras palavras, desconhecemos tudo do lugar. A primeira coisa que temos a

fazer é explorar: perguntar sobre tudo, pedir ao taxista ou ao motorista do ônibus que

nos deixe próximo ao hotel em que estamos hospedados e, por fim, tentar encontrar

pessoas que nos pareçam simpáticas. (COLLADO, 2006, p. 99)

5.2 LEVANTAMENTO DE DADOS

A primeira fase da pesquisa foi o levantamento bibliográfico e documental. o

levantamento bibliográfico se fez extremamente necessário tendo em vista a necessidade

de conhecer os fundamentos teóricos acerca da temática tratada na pesquisa, desde a

questão da proteção ambiental, passando por todo processo de conhecimento dos diversos

conceitos a serem abordados na construção da dissertação final, tais como o conceito de

socioambiental, cidade sustentável, o direito à cidade, dentre tantos outros abordados ao

longo dos capítulos.

Assim, tão logo identificadas as obras à serem estudadas, iniciou-se o processo de

fichamento, separando de cada obra o que seria interessante utilizar como referencial

teórico da presente pesquisa.

A pesquisa bibliográfica é um excelente meio de formação científica quando

realizada independentemente – análise teórica- ou como parte indispensável de

qualquer trabalho científico, visando à construção da plataforma teórica do estudo.

(MARTINS, 2009, p. 54)

Passada essa fase de identificação das obras pesquisadas, estas começaram a ser

separadas em grupos de acordo com os temas que estavam sendo discutidos em casa

capítulo da revisão de literatura. Foi utilizada a classificação básica, separando para cada

tópico à ser analisado as obras primárias, secundárias e terciárias. Vale lembrar que à

86

medida que o trabalho ia avançando, muitas dessas obras ganhavam novo posicionamento

e classificação de acordo com o desenvolvimento do texto revisor.

Já o levantamento documental deu-se em face de necessidade de conhecer todo o

aparato legal do município, para de fato encontrar no ordenamento jurídico municipal as

leis que importavam na pesquisa. Foi assim, que de todo arcabouço jurídico, decidiu-se

trabalhar com os seguintes dispositivos legais do município: a Lei orgânica, o Plano diretor

participativo, a lei de uso, ocupação e parcelamento do solo, o código de edificações e o

código ambiental.

Ainda no levantamento documental, foi possível encontrar outros documentos, que

também foram utilizados, mas para os quais não houve uma analise profunda, em face de a

pesquisa ter como foco principal, a legislação municipal. Um dos principais documentos

encontrados foi o estudo completo feito pelo Instituto do Patrimônio Histórico Nacional-

IPHAN para realizar o tombamento do sítio arquitetônico na década de 1990.

Após coleta de todo material, chegou a hora de voltar a Laranjeiras onde foram

aplicadas entrevistas semiestruturadas. O objetivo dessas entrevistas não foi obter dados

estatísticos ligados a números. Elas fizeram parte enquanto complemento do trabalho

observacional.

A entrevista é uma técnica de pesquisa para coleta de informações, dados e

evidências cujo objetivo básico é entender e compreender o significado que

entrevistados atribuem a questões e situações, em contextos que não foram

estruturados anteriormente, com base nas suposições e conjecturas do pesquisador.

(MARTINS, 2009, p. 88)

Foi assim que as entrevistas consistiram numa avaliação diagnóstica, com o

objetivo de confrontar os documentos e as observações com a percepção dos entrevistados,

buscando chegar o mais próximo possível do que se pode chamar de verdade dos fatos.

Inicialmente, o público alvo para esta entrevista eram membros da administração

pública direta e indireta (União, estado, município), população que vive em Laranjeiras,

pessoas que trabalham e/ou estudam na cidade, bem como autoridades ligadas ao poder

judiciário. No entanto, à medida que o trabalho foi sendo desenvolvido e algumas

dificuldades foram surgindo, precisou-se fazer alguns ajustes.

87

Dessa forma, o primeiro grupo a ser entrevistado seria da população de Laranjeiras,

fosse ela nativa ou pessoas que apesar de não terem nascido na cidade, vivem lá. A

primeira dificuldade encontrada foi de conseguir pessoas que se interessassem em

responder com o que se chama de boa vontade. Em quase uma semana, num trabalho

árduo, conseguiu-se apenas 6 (seis entrevistas). Assim, diante do tempo escasso, pensou-se

em contratar um Instituto de pesquisa especializado para aplicação dos questionários, mas

após profunda reflexão, se as entrevistas se dessem dessa maneira, não alcançariam seu

objetivo maior que era a interação entre o pesquisador e os pesquisados, item essencial

para as pesquisas nas ciências sociais.

Outro ponto negativo foi o baixo grau de informação das pessoas, que remetem ao

medo, a falta de interesse e principalmente a timidez. Em que pese, vale destacar que a

conversa com o potencial entrevistado transcorria muito bem, até o anúncio de que se

desejava fazer algumas perguntas para uma pesquisa. As poucas pessoas que se dispuseram

a responder tinham interesses políticos.

Assim, foi possível perceber que na cidade existem dois grupos políticos rivais e

que a rivalidade passa para a população, o que fazia com que, aqueles que são a favor do

prefeito atual se posicionassem como se tudo fosse muito bom e que ruim era na outra

gestão. Já aqueles que atualmente se diziam da oposição criticavam a gestão atual e trazia o

saudosismo da gestão anterior, fato que prejudicava e comprometia o objetivo das

entrevistas, conforme já mencionado anteriormente.

Dessa maneira, foi preciso reestruturar a pesquisa de campo. Então, direcionamos

primeiro questionários para algumas secretarias municipais, escolhidas de acordo com as

suas respectivas pastas e a importância no contexto da pesquisa.

Com esse parâmetro buscamos as informações com a Secretaria de Infraestrutura,

onde se buscou conhecer quais as preocupações no que concerne projetar o futuro da

cidade sem causar danos ao patrimônio cultural. Foi através dessa Secretaria que se

conseguiu o acesso a boa parte da legislação municipal analisada na pesquisa.

Como se trata de bens ambientais e de importância cultural foram incluídas também

a Secretaria Municipal de Meio Ambiente e a Secretaria de Cultura. Foi incluída também a

Secretaria de Turismo, tendo em vista que o valor de mercado do patrimônio cultural

também é discutido e também a Secretaria de Educação municipal, pela sua importância na

formação das crianças e jovens da cidade.

88

Com os dados de todas essas secretarias, foi a vez de entrevistar o prefeito. No

entanto, após mais de um mês, apenas as Secretarias de Infraestrutura e Cultura

responderam ao questionário. As demais e o prefeito preferiram se omitir.

Com relação específica à Administração Pública o objetivo foi buscar os dados

acerca das leis existentes na cidade e as ações que estavam em andamento no sentido de

assegurar o desenvolvimento urbano da cidade, mas ao mesmo tempo conservar o

patrimônio cultural.

Aqui também, outro ponto que se fez imprescindível foi buscar saber se existia

abertura do poder público para a gestão participativa e como se dava a participação popular

nesse processo. A principal intenção era oportunizar a todos estes entes que se

pronunciassem e apresentassem dificuldades, realizações que fossem de encontro ou a

favor da realidade observada.

Fora do contexto municipal, foram também incluídas nas entrevistas, a

Subsecretaria do Patrimônio Cultural do estado de Sergipe- SUBPAC e o Instituto do

Patrimônio Histórico e Artístico Nacional – IPHAN. Na SUBPAC, foi informado

verbalmente que eles não tinham dados estatísticos com relação ao município de

Laranjeiras e que as suas atividades estavam bem mais voltadas para o sítio histórico de

São Cristóvão. Foi pedido um tempo para responder o questionário e até a finalização da

pesquisa, este não fora devolvido.

Inicialmente não fazia parte do projeto, mas aconteceram fatos relacionados a

Segurança Pública no município de Laranjeiras, que culminaram com o fechamento

temporário do Campus Universitário da Universidade Federal de Sergipe. Por este motivo,

foi preciso incluir também no trabalho a correlação entre o desenvolvimento urbano e a

crescente violência, bem como, buscou-se estabelecer uma relação que envolve o contexto

cultural, o turismo e a violência. Os dados foram colhidos informalmente com a Secretaria

de Segurança Pública do Estado e também foram ouvidos alguns professores da

Universidade Federal, dentre os quais merecem destaque a participação da professora MSC

Verônica Nunes, do departamento de Museologia e o Professor Doutor Márcio da Costa

Pereira, coordenador do Escritório Modelo de Arquitetura.

Conhecidos esses pontos, foi necessário também conhecer atuação e o papel dos

representantes do Poder judiciário, principalmente o Ministério Público Estadual e o

Ministério Público Federal. Isso, principalmente no que tange o papel de fiscal das leis e as

89

ações realizadas para garantir o seu fiel cumprimento, incluídas também as questões

relacionadas à violência tanto contra as pessoas como contra o patrimônio da cidade.

5.3 TRATAMENTO DOS DADOS COLETADOS

Coletado todo esse material teve a início a fase de análise de conteúdo, com a

chamada descrição analítica, que segundo (MARTINS, 2009, p. 99) estudo aprofundado do

material, orientado pelas hipóteses e referencial teórico. Impende aqui salientar que com os

dados obtidos foi preciso mais que uma análise, necessária também à interpretação de

todos aqueles dados e a sua relação com o referencial teórico já analisado e interpretado.

A fase final consistiu na consolidação de todos os dados coletados, com as

respectivas conclusões, análises e recomendações após a interpretação dentro de todo

contexto, associando-os de modo a entender o valor do patrimônio cultural da cidade desde

a concepção de suas leis até a sua vivência prática cotidiana, identificando quais as

possíveis soluções para que a história do lugar se mantenha conservada para as futuras

gerações.

O trabalho foi dividido em três fases principais: a primeira fase foi a exploratória,

através do levantamento documental, bibliográfico e do trabalho observacional em campo

incluindo aqui as entrevistas realizadas. A segunda fase caracterizou-se pela compilação

dos dados coletados (bibliográfico, documental e observacional). A terceira e última fase, a

descritiva, relatando o problema e identificando se há correlação direta, ampla e

satisfatória, considerando-se o patrimônio histórico cultural existente e dispositivos legais

constantes no ordenamento jurídico municipal de Laranjeiras, buscando ainda, identificar

consequências dessa correlação e apresentando possíveis soluções.

90

6 RESULTADOS E DISCUSSÕES

6.1 COMEÇANDO DO COMEÇO: A HISTÓRIA DE LARANJEIRAS

Laranjeiras é um município do Estado de Sergipe, com uma área territorial de 162,280

Km², situado cerca de 18 km de distância da capital, Aracaju. Hoje possui população estimada

de 28.835 habitantes (IBGE, 2014).

Foi considerada uma das principais cidades do Estado e de acordo com projeto de lei

encaminhado à casa civil do estado de Sergipe, Laranjeiras será incluída na região

metropolitana de Aracaju (SERGIPE, 2013), o que será um marco para o desenvolvimento da

cidade.

Figura 6.1.1 – Mapa de localização – Laranjeiras/SE (Map data @2014 Google)

Segundo (SANTOS, L. e OLIVA, 1998, p. 17), somente conhecendo o patrimônio

cultural de uma comunidade, podemos entender um pouco o que ela é. De fato, a riqueza do

patrimônio cultural de Laranjeiras fez com que fosse intitulada “Atenas de Sergipe” e

chamada de “Museu a céu aberto”, em matéria que circulou na Gazeta de Vitória-ES (IPHAN,

1989).

Um passeio por suas ruas permite uma viagem no tempo, através das suas construções

que traduzem a imponência da arquitetura colonial de origem portuguesa, além de vasto

patrimônio cultural imaterial, composto por elementos da cultura negra, portuguesa e

indígena, o que faz com que seus folguedos estejam entre os mais importantes do Brasil

(LARANJEIRAS, 2014).

91

Figura 6.1.2 – Matéria veiculada na Gazeta de Vitória/ES (IPHAN, 1989, folha 31)

Seu conjunto arquitetônico urbanístico e paisagístico foi tombado definitivamente, em

1997. A Universidade Federal de Sergipe instalou um Campus na cidade, em 2007 e o projeto

Monumenta do Governo Federal também atua na cidade.

O cerne da pesquisa versa basicamente sobre dois pontos, o processo de

desenvolvimento do município de Laranjeiras e a preservação do seu patrimônio cultural.

Logo ao tratar de tais temas o primeiro ponto é conhecer a história, vez que, conhecendo o

passado, entende-se o presente e pode-se fazer projeções para o futuro. Os portugueses

chegaram ao Brasil em 1500, mas a colonização nas terras sergipanas só se iniciou em 1590,

com o capitão-mor Cristóvão de Barros, que promoveu a morte de muitos índios e escravizou

outros tantos. Nesse período a mata atlântica cobria todo litoral e avançava quase 40 km para

o interior. Mas destaque mesmo era a existência de 08 (oito) rios navegáveis, que foram

importantes vias de comunicação e transporte (SANTOS, L. e OLIVA, 1998).

A capitania de Sergipe chegou ao final do século XVIII, contando com uma cidade,

São Cristóvão, que funcionava como Capital e mais quatro povoações: Laranjeiras,

Pacatuba, Japaratuba e São Pedro (Porto da Folha). A maioria da população de

55.600 habitantes que vivia em Sergipe no fim do século XVIII encontrava-se

dispersa pelas fazendas, sítios e engenhos e formava uma sociedade de caráter

essencialmente rural. (SANTOS, L. e OLIVA, 1998, p. 46)

92

A distribuição de terras no então chamado Vale do Cotinguiba começou na primeira

metade do século XVI. Acredita-se que cerca de 24 sesmarias foram distribuídas na região

entre o período de 1594 à 1623, mas o povoamento não se iniciou de imediato. Os primeiros

habitantes em 1606 construíram um pequeno porto fluvial, o qual fora chamado de Porto das

Laranjeiras, devido a muitas Laranjeiras que existiam na região (GRAU, 1975).

Em 1637, o povoado foi invadido pelos holandeses, o que deixou um rastro de

destruição, mas 08 anos depois, o domínio das terras fora retomado pelos portugueses que

prosseguiram com seu projeto de colonização (SANTOS, L. e OLIVA, 1998).

É importante também destacar, a colonização a qual foi submetida à América, em

especial o Brasil. Portugal nunca foi exemplo de nação produtora, aliás, considerado por

muitos como a periferia da Europa, talvez um estereótipo criado em consequência do seu

passado. O fato é que as colonizações por aqui realizadas tinham características exploradoras,

os portugueses encontraram um território extremamente rico em termos de recursos naturais e

se dispuseram a desbravá-lo e conquistá-lo a qualquer custo, primeiro com a dominação dos

povos que aqui viviam, os índios e segundo com a exploração dos escravos trazidos

principalmente da África.

Em termos sociológicos, os fundamentos legais e políticos dessa dominação colonial

exigiam uma ordem social em que os interesses das Coroas e dos colonizadores

pudessem ser institucionalmente preservados, incrementados e reforçados, sem

outras considerações. Isso foi conseguido pela transplantação dos padrões ibéricos

de estrutura social, adaptados aos trabalhos forçados dos nativos ou à escravidão (de

nativos, africanos ou mestiços). (FERNANDES, 2009, p. 23)

Só depois da expulsão dos holandeses, é que de fato começou-se o povoamento

humano na região que hoje é Laranjeiras, que se tornou centro da colonização, graças à

posição geográfica e o pequeno porto (GRAU, 1975).

Vale destacar que a partir da metade do século XIX, poucas as vilas concentravam

mais da metade das unidades produtoras de açúcar, dentre as quais, Laranjeiras (SANTOS, L.

e OLIVA, 1998), época também em que a população no território do Cotinguiba passou a ser

constituída basicamente por portugueses e escravos. No entanto, apesar de existir

povoamento, não existiam povoados, estas pessoas habitavam sítios e fazendas, que se

mantinham a certa distância dos outros (GRAU, 1975).

93

No sítio de Laranjeiras, circundado de numerosas colinas que o envolvem e à

margem do rio francamente navegável- o que facilitava o correto desempenho da

natura tendência portuguesa para as comunicações por via aquática-, não é de

surpreender que aí, no início do século XVII, tivesse existido um agrupamento

humano pequeno, com poucas casas e habitantes, mas já configurando o início de

uma ocupação do solo, ainda que de forma incipiente. É a etapa da Laranjeiras porto

[...] GRAU, 1975, p. 14-15)

De suma importância foi a chegada das Companhias de Jesus, que começaram suas

construções no povoado em 1701. Merecendo destaque a Igreja da Comandaroba, que foi

construída entre os anos de 1731 e 1734, para servir de residência para os Jesuítas, hoje

tombada pelo IPHAN. Obra de suma importância, tendo em vista que foi ao redor dessa

igreja que de fato começou a aparecer os primeiros moradores, que vinham em busca da

segurança e do conforto espiritual, começando assim a formar a pequena vila (GRAU, 1975).

Figura 6.1.3 – Igreja da Comandaroba – Laranjeiras/SE (Acervo pessoal)

Dois fatores importantes contribuíram para que Laranjeiras passasse a existir: a

presença da Igreja e o Porto Regional. Logo, a feira existente por lá começava a destacar o

povoado, agora já conhecido como Povoado das Laranjeiras. Segundo (GRAU, 1975), mesmo

ainda com poucas casas, o fortalecimento comercial, fez perceber que o pequeno lugar

94

começava a se desenvolver e aos poucos passou a fazer parte do cenário político, econômico,

social e cultural de Sergipe.

O século XIX é considerado o século de ouro para o lugar. Em 1848, Laranjeiras foi

elevada à cidade e com o comércio cada vez mais ascendente passou a atrair para a cidade

uma sociedade mais rica, o que fora acentuada com o advento do capitalismo e a chegada da

ferrovia.

É de se destacar também que a região era formada em sua maior parte pelos senhores

dos engenhos, cujos filhos eram encaminhados a Recife, Rio de Janeiro e Salvador para

estudarem, o que contribuiu para a formação de uma sociedade mais politizada e culta, por

outro lado. A outra grande parte daqueles que habitavam a cidade eram escravos, que com a

Lei Áurea ficaram livres, sendo que alguns permaneceram nos engenhos, outros se juntaram

aos já refugiados nos quilombos que cercavam o lugar e outros passaram a viver na cidade,

mas de forma marginal (GRAU, 1975).

De acordo com (SANTOS, L. e OLIVA, 1998), a luta republicana no estado começou

em 1888 e foi em Laranjeiras que o movimento ganhou força, com a fundação do partido

Republicano. Como consequência, a região do Cotinguiba ganhou força.

O processo de desenvolvimento acontecido em Laranjeiras entre 1590 e 1888, traz

informações de suma importância. Primeiro o processo de exploração advindo dos

portugueses, provido do jogo de interesses pelas riquezas do lugar, depois a chegada do Porto

e dos jesuítas, cruciais para a formação da cidade, sem contar com o crescimento da economia

açucareira e a multiplicação de engenhos em toda região. Laranjeiras tinha tudo e por muito

tempo foi um dos lugares mais prósperos do Estado de Sergipe.

Apesar da distância cultural, viu-se em Laranjeiras um processo de desenvolvimento

como o de Chicago, retratada por (EUFRASIO, 1999). Aqui, a chegada da ferrovia, o porto e

a feira foram preponderantes, responsáveis diretos pela distribuição das riquezas e lá o

desenvolvimento das ferrovias ajudou a que se tornasse um grande centro comercial do meio-

oeste norte-americano, atraindo imigrantes de toda parte do mundo.

É evidente que Laranjeiras com o passar do tempo não manteve o ritmo de

crescimento de Chicago e sua importância dentro do estado de Sergipe se dá mais pelo valor

cultural do que pelo desenvolvimento trazido pelo comércio ou pela indústria.

Vale aqui também lembrar o pensamento de (SANTOS, B., 1982), apresentado no

capítulo 3 (item 3.5) que destaca a subordinação da cidade com relação às transformações

sofridas no campo. Outro ponto de suma importância nesse processo de desenvolvimento de

um local diz respeito à formação cultural da sociedade laranjeirense. Veja-se que as pessoas

95

atraídas para o lugar possuíam um poder aquisitivo maior e isso fazia com que os filhos

pudessem estudar fora e consequentemente havia o aumento de uma classe de intelectuais, o

que motivou a discussão política na região, na época fora criado o jornal O Laranjeirense, que

temos mais tarde passou a se chamar de O republicano.

Consoante o pensamento de Lefebvre (2001, p.54), “se considerarmos a cidade como

obra de certos “agentes” históricos e sociais, isto leva a distinguir a ação e o resultado, o

grupo e seu produto” e era isso que se via na cidade e no que ela produzia.

No entanto, segundo (SANTOS, L. e OLIVA, 1988), a crise açucareira foi agravada

pela abolição da escravatura o que só veio agravar ainda mais a situação. Destaque para

Fausto Cardoso, Felisberto Freire, Baltazar Goes e Silvio Romero, intelectuais da época que

organizaram em Laranjeiras uma escola para alfabetizar ex-escravos. O que foi apenas um

paliativo, vez que em nada alterou a situação da população negra que ali vivia que, continuava

vivendo em condição de miserabilidade, a maioria sem trabalho, fato que ensejou no

aparecimento de camadas pobres da sociedade laranjeirense.

Ainda de acordo com (SANTOS, L. e OLIVA, 1988), paralelamente a crise nos

engenhos, Aracaju, através de seu comércio, fábricas de tecido e do emprego público,

contribuiu para que viesse a se tornar a capital do Estado. Assim, a crise no campo

intensificou a migração das pessoas para as cidades, principalmente grandes proprietários que

começaram a transferir suas residências para a capital, tanto para educar seus filhos como para

aproveitarem as comodidades oferecidas pela vida urbana.

Grau (1975, p. I), destaca que a riqueza do passado de Laranjeiras, contrasta com a

presente pobreza. Das informações anteriores, o que se pode ver é que com a mudança da

capital para Aracaju, as pessoas mais abastadas financeiramente deixaram Laranjeiras. A

população da cidade, outrora formada por intelectuais e pensadores, mudou seu perfil para

uma sociedade formada por ex-escravos, quilombolas e pessoas de outras camadas mais

baixas.

De acordo com Lefvbvre (2001, p. 28), “a destruição prática e teórica (ideológica) da

cidade não pode ser feita, aliás, sem deixar um vazio enorme. Sem contar com os problemas

administrativos e outros cada vez mais difíceis de resolverem”.

E foi o que aconteceu com a cidade. As pessoas mais abastadas financeiramente e

consequentemente ou coincidentemente as que detinham maior grau de instrução mudaram-se

da cidade e deixaram um grande vazio. Os que lá ficaram em sua maioria eram pessoas das

classes sociais de menor poder aquisitivo. Destaque-se que boa parte sem emprego, sem

96

moradia. Isso acarreta uma série de problemas futuros para o lugar. Laranjeiras se tornou uma

cidade morta (LOBATO, 2012).

Os ricos são dois ou três forretas, coronéis da Briosa, com cem apólices a render no

Rio; e os sinecuturistas acarrapatados ao orçamento: juiz, coletor, delegado. O resto

é a “mob”: velhos mestiços de miserável descendência, roídos de opilação e álcool;

famílias decaídas, a viverem misteriosamente umas, outras à custa do parco auxílio

enviado de fora por um filho mais audacioso que emigrou. “Boa gente”, que vive de

aparas. (LOBATO, 2012, p. 2)

Hoje a população residente é formada pela maioria de mulheres e cerca de pouco mais

que 20.000 habitantes da cidade são alfabetizados (IBGE, 2014), ressaltando que estes dados

correspondem a pessoas que sabem pelo menos assinar o nome. A cidade possui a rede

escolar formada por unidades municipais e estaduais, sendo apenas uma escola de Ensino

Médio. Segundo o (IBGE, 2014), no ano de 2012, estavam regularmente matriculados em

escolas do nível fundamental e médio 6.390 alunos.

6.2 AS RIQUEZAS NATURAIS DE LARANJEIRAS

Laranjeiras é um município localizado na região do Vale do Cotinguiba e incluído na

Zona da Mata, mas a cobertura vegetal remanescente da Mata Atlântica, atualmente na maior

parte foi substituída por plantações comerciais de cana-de-açúcar e côco, e de subsistência de

mandioca, milho e outros. Está inserido na bacia do Rio Sergipe, banhado diretamente pelo

seu afluente, o Rio Cotinguiba (GRAU, 1975).

A maior riqueza natural da cidade é Rio. Quando do começo da formação do

povoado, o rio foi utilizado para vários fins, principalmente para a pesca e navegação.

Visualmente pode-se ver a degradação pela qual fora submetido ao longo dos anos. Merece

destaque a informação de que a cidade fora construída em função do rio e que hoje, por ação

do próprio homem, o rio, está poluído e sua vazão reduzida a ponto de não mais permitir a

navegação como ocorria no século passado.

As praças e ruas alinham-se, obedecendo praticamente ao traçado do vale fluvial.

Observe-se a disposição da Av. Municipal, Trapiche, Pça. Samuel de Oliveira, Pça.

da República, Rua Pereira Lobo, Pça. Josino Menezes e Pça. Dr. Bragança, que

constituem o centro da cidade e que foi instalado sobre um terraço meandrado do

Cotinguiba, parcialmente ocupando o leito maior daquele rio. (GRAU, 1975, p.13)

97

Ainda existe na cidade um remanescente mínimo de manguezal, praticamente todo

destruído pela ação do homem, que ocupou de forma irregular e desordenada a área. Segundo

(GRAU, 1975), o mangue fora circundado por modestas moradias. Destaque-se que esse

estudo fora feito 40 anos atrás, hoje a ação antrópica praticamente extinguiu a vegetação

nativa.

Segundo a Secretaria de Infraestrutura municipal, já foi executada a primeira etapa da

obra de revitalização do Rio Cotinguiba, com a finalidade precípua de aumentar o leito do Rio

até o trecho da Universidade Federal para evitar com isso transbordamento em períodos de

chuvas intensas. Ainda sem previsão para começar a segunda etapa desse processo. A

Secretaria de Cultura informou que existe um projeto em andamento da construção de uma

orla margeando o rio na área urbana e limpeza do seu leito.

No meio ambiente natural encontram-se também formações geomorfológicas, das

quais merece destaque a Gruta da Pedra Furada, formação rochosa de pedra calcária,

localizada no povoado Machado. O acesso é relativamente difícil e por estar isolado de

moradias, sem vigilância social nenhuma, torna-se perigoso. Em visita ao local, o que se

observou foi uma área abandonada, nada de exótico, a não ser o mito popular, de que o local,

teria sido usada por nativos na época da colonização como rota de fuga. Contam os moradores

que existiria supostamente um túnel que levaria até a Igreja da Comandaroba, mas não foi

encontrado nenhum dado que comprove realmente a existência da passagem, o local foi

tombado em 1990 pelo Governo do Estado de Sergipe.

Outro destaque também é a Gruta da Matriana, situada na Vila do Faleiro, considerada

Patrimônio cultural, vez que teria sido utilizada por padres como refúgio para orações, desde

1795. Como as duas Grutas e o Rio são tombados como Patrimônio Cultural do Estado e

constam do Inventário Nacional de Referências Culturais em Laranjeiras, realizado pelo

IPHAN, em 2007, quando da entrevista, fora questionado se existia algum trabalho realizado

em parceria entre o IPHAN e os órgãos ambientais (federais, estaduais e/ou municipais), no

sentido de preservar esses bens ambientais Culturais, sendo respondido que isso seria

competência do Governo do Estado, já que o decreto de tombamento foi do executivo

estadual. Verbalmente a Subsecretaria do Patrimônio Cultural do Estado-SUBPAC informou

que não tem nenhum projeto nesse sentido, mas não devolveram o questionário escrito

respondido. Cabe destacar que em dezembro de 2014, o Governador do Estado de Sergipe,

assinou decreto que extinguiu a Subsecretaria do Patrimônio (SUBPAC), incorporando suas

atividades à competência da Secretaria Estadual de Turismo (SECTUR).

98

A Administração Estadual do Meio Ambiente - ADEMA também não tem nenhum

trabalho voltado para a preservação dos bens naturais em Laranjeiras. Pelas informações

colhidas, o órgão ambiental estadual atua mais como órgão licenciador e fiscalizador.

A Secretaria de Infraestrutura Municipal destacou como relevante o projeto concluído

de urbanização da orla do Rio e a Secretaria de Cultura considerou que até o momento a única

ação do município em relação a gruta da pedra furada, é um trabalho de fiscalização a não

depredação realizado pelos guias de turismo, e que em breve estarão sendo desenvolvidas.

Figura 6.2.1 – Gruta da Pedra Furada – Laranjeiras/SE (acervo pessoal)

Interessante observar, que segundo o contexto histórico, Laranjeiras se formou em

torno do Rio Cotinguiba, mas não desenvolveu pelo rio uma relação geralmente comum em

populações tradicionais que vivem essa proximidade com o bem natural. Ao que parece,

infelizmente a população não possui uma identidade com o rio. Conversando com moradores,

principalmente os com menos de 50 anos de idade, se percebe nitidamente que não faria

diferença se existisse ou não o rio. Alguns comentam que “um dia o Imperador chegou na

cidade pelo rio”, mas parece mais uma frase já pronta do que realmente um sentimento de

orgulho advindo da riqueza natural que existe na cidade, refletindo bem o pensamento de

99

(CARSON, 2010), apresentado no capítulo I deste trabalho, no item que trata acerca da ética

ambiental.

O que se vê na relação da população laranjeirense no tocante a seus bens ambientais

naturais é que não existe cautela no modo como lidar com o meio ambiente. Entende-se

também que as ações dos poderes públicos tem mais haver com um embelezamento visando o

potencial turístico do lugar do que uma preocupação realmente efetiva em recuperar de fato os

bens naturais daquele lugar.

6.3 O DESENVOLVIMENTO URBANO DO MUNICÍPIO

A Constituição Federal (BRASIL, 1988), reconheceu o município como ente

federativo, o que lhe garantiu plena autonomia. Em que pese, a Carta Magna brasileira

estabeleceu também que dentre os entes federativos, o município é o principal responsável em

promover política urbana, visando sempre o desenvolvimento das funções sociais da cidade.

Dentre os inúmeros compromissos firmados na Conferência das Nações Unidas para o

meio ambiente e desenvolvimento, mundialmente conhecida como Rio 92, estava o

fortalecimento das ações locais como fator determinante para o alcance dos objetivos

permeados pela Agenda 21(ONU, 1992[1995]).

28.1. As autoridades locais constroem, operam e mantêm a infra-estrutura

econômica, social e ambiental, supervisionam os processos de planejamento,

estabelecem as políticas e regulamentações ambientais locais e contribuem para a

implementação de políticas ambientais nacionais e subnacionais. Como nível de

governo mais próximo do povo, desempenham um papel essencial na educação,

mobilização e resposta ao público, em favor de um desenvolvimento sustentável.

(ONU, 1992[1995], p. 381)

Para falar do desenvolvimento de uma cidade como Laranjeiras não se pode dissociar

do patrimônio cultural existente. Existem dois conceitos básicos para se entender a relação

das pessoas com o lugar que vive, denominados por (LEFEBVRE, 2001), como valor de uso e

valor de troca, considerando que existem locais de consumo e o consumo do local, situação

que se adéqua perfeitamente ao município de Laranjeiras.

A renda per capita na zona rural em 2010 foi estimada em R$ 191, 00 (cento e noventa

e um reais) e na zona urbana, aproximadamente R$ 225, 00 (duzentos e vinte e cinco reais). A

economia local é oriunda da agricultura e pecuária, comércio e da indústria.

100

Calculado com base em três pilares, quais sejam, saúde, educação e renda, em 2010, o

Índice de Desenvolvimento Humano-IDH do município era de 0,642, média que está abaixo

do mesmo indicador no estado como um todo que é de 0,742 (IBGE, 2014).

Na economia da cidade, destaca-se hoje a presença de duas grandes fábricas de

renome internacional, uma de cimento e uma de fertilizantes. O grande impacto ambiental da

presença dessas fábricas é a poluição causada nas imediações e a exploração de minérios. As

fábricas foram instaladas a certa distância da Zona Urbana da cidade, mas o crescimento

desordenado e irregular acabou levando pessoas a viverem nas proximidades.

Na coleta de dados, em entrevista direcionada à Secretaria de Infraestrutura municipal,

fora perguntado qual o ônus e bônus trazidos pela industrialização no município, sendo

respondido que o ônus é a poluição causada nas imediações da fábrica, bem como as

explosões de pedreiras e o bônus seria tanto os empregos que são gerados como o produto

derivado da arrecadação de tributos destinado a melhorias para população.

A Secretaria de Meio Ambiente não respondeu o questionário acerca de informações

sobre parcerias visando à compensação direta ou indireta, por possíveis danos ao meio

ambiente causados por estes estabelecimentos. Segundo o IPHAN, existe uma parceria que

envolve a SUBPAC, a Prefeitura de Laranjeiras e a Votorantim (fábrica de cimento) no

Projeto denominado de Dia do patrimônio, desde 2011. O projeto compreende um conjunto

de ações educativas, realizadas junto a comunidade escolar do município, através de

atividades diversas, nas quais são reunidos alunos, pais, professores e comunidade. Dentre as

atividades a serem realizadas destacam-se o Cinema na escola, oficinas de desenhos, espaços

para brincadeiras tradicionais. No final de cada edição do projeto, as escolas são

contempladas com kits de materiais que permitirão que as atividades permaneçam sendo

desenvolvidas no cotidiano da Unidade de Ensino. Toda execução do projeto, incluindo as

atividades são registradas através de imagens em vídeo feitas por uma equipe especializada,

com o objetivo de futuramente virar um documentário.

No tocante aos empregos gerados, não visualizei nada de significante em termos de

geração de empregos e renda de forma direta. A maioria dos funcionários das fábricas é de

fora e em grande parte nem moram na cidade. Os que moram, não são nativos, mas

funcionários de terceirizadas, que vivem em alojamentos mantidos pelas próprias empresas.

Outro ponto o qual destaco é que apesar da imponência de duas empresas de grande porte

presentes na cidade, o retorno é pouco visível. Um exemplo é a desativação da linha férrea,

importante instrumento na logística de transporte da produção. Hoje esse transporte é feito

101

pela via terrestre em muitos trechos e se utiliza também o porto de Sergipe. Pode ser que a

arrecadação seja de fato usada e contribua para melhorias na cidade, mas pouco foi visto de

mudanças significativas em quase dois anos de observação. O que se presenciou foi uma

população extremamente carente em todos os sentidos. No processo de desenvolvimento de

Laranjeiras, se vê claramente o que (LEFEBVRE, 2001), chama de circuito frágil. Em que

pese, um tipo de urbanização que pode se romper a cada instante, pela falta de

industrialização ou com pouca industrialização. A cidade tende a crescer diante dessas

perspectivas, inclusive atrai mais pessoas para o lugar, existe muita especulação, mas o

crescimento não vai adiante.

E acredita-se que a cidade não cresceu em outros aspectos, não evoluiu, logo

permanece a mesma lógica do século XIX, que a partir do momento em que se melhora o

poder aquisitivo, deixa-se de viver na cidade e passa a morar em um lugar maior,

principalmente pela proximidade com Aracaju. Em 2007, outro importante acontecimento

impactou uma possível alavancada no desenvolvimento da cidade: a implantação do Campus

da Universidade Federal de Sergipe. Segundo Nunes e Nogueira (2009, p. 11), “a instalação

do Campus de Laranjeiras veio preencher uma lacuna na formação de profissionais nas áreas

de Arquitetura, arqueologia, dança, música e teatro”.

Figura 6.3.1 – Fachada do Campus da Universidade Federal de Sergipe – Laranjeiras/SE (acervo pessoal)

102

Segundo o Professor Doutor Marcio Pereira12, “Laranjeiras é uma cidade dormitório

com extrema dependência de Aracaju e a implantação da UFS na cidade poderá incrementar

as atividades do setor de serviços e alavancar a divulgação da cultura local. Além disso,

poderá impactar, através das ações de extensão, na melhoria dos indicadores sociais”. Para a

Professora MSC Verônica Nunes13, “o Campus vai atrair um público mais jovem que, muitas

vezes não conhecia a cidade e, terá um contato direto com a sua população, seus monumentos

e sua cultura. Numa relação de troca, com perdas e ganhos para ambas as partes”.

Destaque para uma parceria entre a Universidade e o poder público municipal

objetivando o desenvolvimento de projetos de arquitetura, paisagismo e urbanismo para

colaborar no desenvolvimento da cidade, o qual inclui assistência técnica para a moradia da

população de baixa renda da cidade, bem como a existência de um projeto de extensão

chamado de “Boas práticas na construção civil: pintura e revestimentos cerâmicos” com o

objetivo de capacitar moradores da cidade com minicursos ministrados pelos professores e

alunos. A Universidade mantém ainda parceria com o IPHAN.

Com tudo isso não se observou uma interação entre a população da cidade e o

Campus. Existe uma barreira invisível, conceitual que aquele espaço não pertence a

comunidade local e entende-se que isso é algo que precisa ser rompido por atividades da

própria Instituição de ensino.

Dentre desse contexto, é de suma importância reportar-se a um fato que ocorreu que

trouxe a visibilidade essa distancia e ensejou uma nova discussão acerca da presença do

Campus na cidade. Em maio de 2014, alunos e professores decretaram greve por falta de

segurança e as atividades do Campus foram suspensas. É consenso que o processo de

desenvolvimento traz coisas boas, mas também traz coisas negativas e uma das coisas

negativas é o aumento da violência.

As cidades passam a atrair mais pessoas como é o caso de Laranjeiras em que a

instalação do Campus aumentou e muito a circulação de pessoas na cidade. Por outro lado,

como anteriormente já fora demonstrado, a população de Laranjeiras em termos gerais é de

poder aquisitivo baixo, os frequentadores do Campus, já pertencem a classe média.

Admitindo-se ou não, existe um processo de afronta inconsciente com aqueles que vivem de

12 Coordenador do Escritório Modelo do curso de arquitetura da Universidade Federal de Sergipe, professor do

magistério superior com dedicação exclusiva, vinculado ao DAU- Departamento de Arquitetura e Urbanismo-

Campus- Laranjeiras em resposta a uma das questões apresentadas na Entrevista de coleta de dados da pesquisa.

13 Professora da Universidade Federal de Sergipe há 22 anos, atualmente vinculada ao Departamento de

Museologia- Campus- Laranjeiras, em resposta a uma das questões apresentadas na Entrevista de coleta de dados

da pesquisa.

103

fato naquele lugar, que continuam vivendo de forma precária muito aquém com a realidade

ideal.

Mas em que pese essa barreira é preciso também alertar que o fato já mencionado,

demonstra uma falência da segurança pública no Estado, isso porque o aumento da violência

não se deu apenas em Laranjeiras, mas se mostrou crescente em todo estado. Segundo

Fonseca et all (2013, p. 11-14), no estado de Sergipe o índice de homicídios para cada 100

mil habitantes era de 28,12%, em 2010. Esse número aumentou para 30,42% casos. Segundo

mesmo estudo, Laranjeiras em 2010, era a 15ª cidade mais violenta do estado, com um índice

maior que o de Nossa Senhora do Socorro e Aracaju, que tiveram o crescimento populacional

e o desenvolvimento urbano muito mais acentuado, não sendo justificativa plausível a

tentativa de imputar à presença do Campus o aumento na violência.

No estudo da violência é necessário que causas potenciais sejam buscadas,

relacionadas não apenas a alterações da sociedade, mas a alterações de um conjunto

de fatores, onde se incluem os de localização relativa e vizinhança, que facilitam a

interação de fatores que, direta ou indiretamente associados, podem favorecer a

ocorrência de atos de violência. (FONSECA et all, 2013, p. 4)

Se existem responsabilidades, estas cabem ao Poder público estadual, responsável pela

segurança pública, mas isso impacta em outros problemas, como a falta de policiamento

ostensivo, que não é feito, em virtude do número baixo de efetivos e a falta de infraestrutura.

No entanto, acredita-se também, que deve partir da comunidade acadêmica a tentativa

de tentar promover maior interação da comunidade laranjeirense com o mundo que existe

dentro da Universidade.

Em se tratando de geração de empregos e renda, se observou que o comércio da cidade

não é expressivo, ele serve apenas para atender algumas demandas da população, no entanto a

proximidade de Aracaju faz com que essa renda seja transferida para lá.

Talvez o grande potencial gerador de renda e empregos para o município seja a

exploração do turismo, transformando a cidade de acordo com o seu valor de troca. Mas

segundo Leite, E. (2011, p. 44), a comercialização excessiva da cultura acaba criando uma

caricatura estereotipada na comunidade que participa desse meio.

O turismo cultural pode gerar renda para os municípios e, também, a manutenção da

cultura nas comunidades. Pode produzir melhoria na autoestima da comunidade e,

consequentemente, melhoria da qualidade de vida da população local. Essa

experiência dos habitantes pode ser incluída como um subproduto muito interessante

104

aos circuitos culturais turísticos. Nem sempre, contudo, a comunidade se dá conta da

importância de suas práticas e de seus saberes específicos. (LEITE, E., 2011, p. 34)

No entanto, observando a cidade, pode-se ver que apesar do potencial, falta muito

coisa para que Laranjeiras possa de fato vir a tornar-se um destino turístico. Não existe

controvérsia de que a cidade de fato tem suas riquezas culturais e pode-se observar que a

Prefeitura tem feito um trabalho ostensivo de divulgação do lugar. Mas não é só isso que faz

com que a cidade desperte o interesse de turistas. Em termos de infraestrutura o município

deixa muito a desejar. Aqui vale novamente retomar um ponto que já foi objeto da discussão,

a proximidade que cria a dependência de Laranjeiras em relação à Aracaju.

No que diz respeito ao acesso à cidade, é bem fácil. Laranjeiras está localizada às

margens da BR 101, entre Sergipe e Alagoas, num trecho inclusive já duplicado. Para o

visitante que tem condução própria, chegar até o município é feito sem nenhum grande

problema, apesar da falta de placas ao longo da estrada que indiquem a proximidade da

entrada, se desavisados é possível que passe despercebido.

Já para o visitante que pretenda ir à cidade através do transporte público, este deverá ir

para Aracaju e de lá pegar outra condução até o município. Essa ligação intermunicipal é feita

por uma cooperativa que atua em boa parte do estado. Os ônibus são precários, velhos, sujos e

sem nenhum tipo de conforto. Causa uma péssima impressão em qualquer visitante,

principalmente os turistas advindos de outros países e do sul-sudeste do Brasil.

Sem contar que nem sempre em Aracaju, na chamada Rodoviária Nova14 tem horários

diversos para Laranjeiras, ou seja, o turista vindo de outro estado desembarcaria

obrigatoriamente na Rodoviária Nova e teria que ir para a Rodoviária Velha se não quisesse

esperar longo tempo por outro horário. As pessoas ainda enfrentam constantes assaltos,

principalmente nos horários em que estão viajando estudantes para as atividades do Campus

universitário em Laranjeiras.

Outra opção e bem mais usada pela população, são as lotações, essas são feitas por

carros pequenos de particulares, transportando passageiros de forma irregular. Merece

destaque aqui que apesar de ser uma situação corriqueira e de conhecimento de todos, apesar

14 Em Aracaju, atualmente existem dois terminais rodoviários. Um que recebe o fluxo de transporte interestadual

e intermunicipal chamado popularmente de Rodoviária Nova, que fica na Avenida Tancredo Neves, na entrada

da cidade via BR 235. E o outro terminal, fica no Centro da cidade e recebe exclusivamente ônibus do transporte

intermunicipal, chamado popularmente de Rodoviária Velha.

105

da irregularidade, a atividade não é coibida pelas autoridades, até mesmo porque o transporte

regular não seria suficiente e nem tampouco eficaz.

No tocante, a hospedagem, mais uma vez é importante destacar a dependência com

relação à Aracaju. Não existem hotéis ou pousadas, no máximo algumas repúblicas ou

pensionatos, montados na maioria das vezes pelos próprios alunos da Universidade.

Na questão de alimentação, apenas dois estabelecimentos têm condição de atender os

visitantes com o mínimo necessário, o que se considera muito pouco para uma cidade com o

potencial turístico de Laranjeiras. A Secretaria de Turismo não devolveu o questionário

respondido.

Apesar de todos os problemas, vale a pena conhecer Laranjeiras e através de suas ruas

viajar pela história do país. A cidade tem um clima de interior que se mistura com a

imponência de sua arquitetura e torna o passeio agradabilíssimo

6.4 O PATRIMÔNIO CULTURAL DE LARANJEIRAS

6.4.1 O Conjunto arquitetônico da cidade

Ao todo, o município de Laranjeiras possui mais de 90 bens culturais devidamente

inventariados (IPHAN, 2007). Vale a ressalva que a riqueza cultural de Laranjeiras não se

compõe apenas de bens materiais, seu patrimônio imaterial é tão grande quanto.

No entanto, o patrimônio imaterial é cada vez mais comprometido com o passar dos

tempos, tendo em vista que são repassados de pai para filho e infelizmente, muita coisa se

perde na transmissão dos saberes ou os filhos não possuem uma identificação com aquilo que

outrora foi de suma importância para os seus antepassados. Alerta o (IPHAN, 2007) que “a

ausências de dados pormenorizados, chama a atenção para o descaso no passado com os bens

culturais”. O primeiro tombamento do patrimônio edificado de Laranjeiras foi promovido

pelo Governo Estadual ainda na década de 70.

Em 1984, através do projeto de lei nº 3476, o então Deputado Federal Francisco

Guimarães Rollemberg requer a elevação da cidade a Monumento Nacional. No entanto, o

processo de tombamento só se iniciou de fato em 1989 e o Decreto de Tombamento só se deu

em 1997.

106

Figura 6.4.1.1 – Mapa do Conjunto Arquitetônico,paisagístico e urbanístico – Laranjeiras/SE (IPHAN, 1989,

fl.03)

Segundo Silva e Nogueira (2009, p. 45), “existiria uma problemática na discussão do

que propriamente uma aceitação comum”, no que diz respeito ao tombamento do patrimônio

arquitetônico de Laranjeiras, se tomado por base o que determinava o Decreto-lei nº 25/37, já

discutido no capítulo acerca da base legal desse trabalho. Isso porque, considera Silva e

Nogueira (2009), o conjunto arquitetônico de Laranjeiras não seria puramente colonial, com

traços da presença dos jesuítas e suas obras, mas traria também presença do neoclassicismo e

do ecletismo, os quais não foram inseridos no texto legal do decreto anteriormente

mencionado. Ressaltam ainda que “outro aspecto, seriam as intermináveis modificações

empreendidas através do tempo nas edificações” (SILVA E NOGUEIRA, 2009, p. 46).

Figura 6.4.1.2 – Igreja Presbiteriana de Sergipe (1884) – Laranjeiras/SE (acervo pessoal)

107

Voltando a discussão entre preservacionismo e conservacionismo, o que se pode

observar na cidade é que a preocupação com o preservar se sobrepõe ao conservar. A

interação da comunidade com o seu patrimônio é muito frágil. A sensação passada é que

aquelas pessoas desconhecem o valor do Conjunto arquitetônico da cidade. Repetem quase

que maquinalmente que tudo aquilo é importante para a cidade, mas não sabem responder

porque é importante para elas, justamente porque são educadas apenas para preservar mas não

lhes é passado que elas fazem parte daquele contexto.

Vale um parêntese aqui para uma situação curiosa. Durante a pesquisa, tomamos

conhecimento que quando do tombamento do sítio arquitetônico da cidade, a comunidade

teria se manifestado acerca da possível inclusão da antiga estação de trem da cidade.

Solicitação que não foi atendida. Consideramos que a Estação de trem é um dos locais onde

de fato havia grande identificação do povo laranjeirense, por ser um espaço democrático na

história da cidade. Pelas estações de trem passam muitas histórias e vez ou outra, foi possível

ao conversar com algum morador mais velho, ouvi histórias saudosistas de quem já embarcou

na estação para fazer uma viagem para São Paulo que chegava a durar quase um mês.

Infelizmente o local hoje é apenas ruínas.

Figura 6.4.2.1 – Antiga Estação de Trem em ruínas (2015) – Laranjeiras/SE (acervo pessoal)

Outro ponto importante é que muitos dos casarões, principalmente os que estão mais

próximos da margem do rio não tem a propriedade regulada perante a Superintendência do

108

Patrimônio da União-SPU e o processo para a regularização é burocrático e necessita de

elementos que muitas vezes são inviabilizados pelo baixo poder aquisitivo do atual possuidor.

Destaque-se que em alguns desses casos o possuidor intenta regularizar a propriedade, mas

porque visa o recebimento de indenização pela relativização da propriedade que pode vir a ser

feita pela União Federal em caso de tombamento, casos em que se percebe também o

reconhecimento do chamado valor de troca (LEFEBVRE, 2001).

Outro dado importante, diz respeito do trabalho do Ministério Público Federal-MPF,

como órgão fiscalizador da lei, no sentido de manter incólume o Patrimônio edificado da

cidade de Laranjeiras. Atualmente existem em trâmite perante a Justiça Federal de Sergipe,

quase 10 (dez) demandas que tratam acerca da restauração de bens imóveis tombados.

Em algumas, o Instituto do Patrimônio Histórico Nacional- IPHAN, figura como réu, e

em outras como autor, em Ação Civil Pública que tem como objeto a recuperação ou obras de

reparos emergenciais em bens imóveis tombados na cidade e em alguns casos contra

proprietários que promovem reformas que comprometem o bem ambiental.

Segundo o IPHAN15, a despeito de todo trabalho que vem a ser feito pelo órgão na

cidade, existem alguns entraves encontrados, principalmente no que diz respeito a

identificação do proprietário do imóvel, conforme anteriormente já relatado.

Observa-se ainda que essas ações são muito demoradas e isso pode vir a comprometer

a obtenção de um resultado eficaz, vez que o decurso do tempo pode ser fatal.

Cite-se como exemplo a demanda tombada sob o nº 0003883-04.2011.4.05.8500, em

tramite na 1ª Vara Federal da Seção Judiciária de Sergipe. Ainda na esfera administrativa, em

2007, o Ministério Público Estadual-MPE, por não ter a competência legal em virtude de se

tratar de bem tombado por Decreto Federal, apresenta denúncia junto ao Ministério Público

Federal, da necessidade de intervenção em uma edificação abandonada, o antigo Teatro de

Laranjeiras, “por apresentar destacamentos de material de parede e deslocamentos horizontais

de alvenaria, com alto grau de deterioração” (JFSE, 2011).

Ainda em 2007, fora instaurado processo administrativo junto ao IPHAN, este órgão

esbarrando nas dificuldades legais no tocante a interferência na propriedade privada, apesar de

inúmeras diligências nada de concreto pode fazer por não ter conseguido identificar quem de

fato era proprietário do imóvel. Assim, passados 04 anos sem nenhuma providência eficaz, foi

ajuizada a ação civil pública.

15 Resposta a questionamento feito na entrevista de coleta de dados com os responsáveis pelo órgão

109

Em julho de 2012, o IPHAN foi condenado “a apresentar, no prazo de 60 (sessenta)

dias, o projeto de volumetria do imóvel, bem como concluir a execução da respectiva obra no

prazo sucessivo de 180 (cento e oitenta) dias” (JFSE, 2011). A juíza sentenciante arbitrou

ainda uma multa diária de R$ 1.000,00 (mil reais) em caso de descumprimento. No entanto,

até a presente data, a demanda continua em curso. Algumas obrigações já foram cumpridas

pela autarquia, mas aguarda-se ainda a comprovação do cumprimento total da obrigação de

fazer imputada.

Ainda merece ser ressalvado que apesar de não estarem incluídos no Conjunto

Arquitetônico da cidade tombado pelo Governo Federal em 1997, existem lugares que tem

importância cultural de alto valor e que diretamente ligada às heranças africanas, como por

exemplo, o Terreiro Filhos de Obá, o terceiro mais antigo do país, fundados por escravos de

origem Nagô (IPHAN, 2007), tombado pelo Governo Estadual desde 1988.

Essa questão da origem dos fundadores do terreno é de suma importância dentro

dessas instituições, representa a força do terreiro, o tipo de trabalho que eles realizam.

O estabelecimento de vínculo estreito com a África e o convívio com os africanos

são maneiras de proclamar conhecimento do segredo dos cultos, força e assim

legitimar-se perante o segmento afro-brasileiro local onde orixá é tido como mais

forte que o caboclo. (DANTAS, 1982, p. 26)

Fazem parte ainda da lista de lugares com valor cultural da cidade de Laranjeiras, a

Casa de Farinha, o cemitério da Mussuca, o Rio Cotinguiba, do qual foi falado e a o lugar

onde realizado a Feira e o antigo Porto do Quaresma (IPHAN, 2007).

Porto da Quaresma é antigo porto utilizado na navegação de cabotagem e transporte

de passageiros. É utilizado por grupos folclóricos com uma das paradas obrigatórias

de seus trajetos, a exemplo da Chegança Almirante Tamandaré o combate entre

Lambe-sujos e Caboclinho., além de ser local de embarque e desembarque da Festa

de Bom Jesus dos Navegantes. (IPHAN, 2007, p. 33)

6.4.2 O patrimônio imaterial

Constitui parte importante da construção da identidade de qualquer grupo social, o seu

patrimônio imaterial. Em verdade, talvez a representação mais verossímil de determinada

comunidade venha através das suas expressões culturais imateriais, conforme já foi visto no

capítulo próprio da fundamentação teórica. Vale frisar que não está aqui se diminuindo ou

110

rechaçando a importância do patrimônio material, mas conforme observação já elencada nessa

pesquisa, nem sempre aquilo que se considera Monumento histórico, representa de fato a

identidade cultural de um povo.

Conforme já visto ao longo deste trabalho, a sociedade laranjeirense é bastante

miscigenada, isso torna o seu patrimônio imaterial de uma riqueza inigualável, com elementos

da cultura portuguesa, negra e indígena, construindo o que podemos denominar da identidade

desse povo. O IPHAN, entre os anos de 2007 e 2010 realizou o Inventário Nacional das

Referências Culturais de Laranjeiras. Constam 60 bens referenciados, mas nenhum ainda

tombado. Segundo a historiadora do IPHAN, o inventário seria um estudo preliminar com

esta finalidade.

Destaque-se que os bens da cultura imaterial de Laranjeiras são também de uma

diversidade imensa, assim divididos: celebrações que englobam em sua maioria rituais

religiosos, como por exemplo: A festa do bom Jesus dos Navegantes, a Festa dos Santos Reis

e a Semana Santa, representando a cultura dos então denominados brancos e A festa do Preto

Velho, o Ibeji e o Corte do Inhame, representando a cultura negra, dentre tantas outras

celebrações (IPHAN, 2007). Grande parte dos bens culturais imateriais de Laranjeiras

inventariados como celebrações, tem alguma vinculação religiosa e aqui merece destaque os

rituais existentes na Igreja católica que tem ainda grande força na cidade e também os cultos

africanos nos inúmeros terreiros.

Figura 6.4.2.2 – Altar da Igreja da Comandaroba durante a Semana Santa,com as imagens cobertas com um

pano roxo (2013) – Laranjeiras/SE (acervo pessoal)

111

Como formas de expressão tem-se a Micareme, o Guerreiro, o Cacumbi, o Samba de

côco, a Taieira e o Encontro Cultural de Laranjeiras, dentre outros, dos quais merece ser

falado pela sua peculiaridade é a respeito do Homem que preparou o próprio enterro, no qual,

um senhor nativo da cidade, conhecido como Sr. Nivaldo, preparou e realizou o próprio

enterro (IPHAN, 2007).

Seu Nivaldo diz “querer muito bem à morte”, e tendo sido criado sem pai e mãe, diz

gostar muito do ambiente do cemitério. O caixão foi feito por um marceneiro

chamado Senhor Raimundo sob encomenda. No dia do feito, segundo Seu Nil, mais

de duas mil pessoas compareceram. Seu Nil saiu de casa dentro do caixão, sem a

tampa, sendo levado por alguns amigos que iam cantando as músicas que Seu Nil

mais gostava. Eram músicas do Lambe-Sujo x Caboclinhos, do carnaval, entre

outras. No cemitério, o coveiro o ajudou a sair do caixão, e logo depois as pessoas

cantaram “Parabéns pra você”. (IPHAN, 2007, p. 20)

Dentre as formas de expressão, um evento que atrai diversos olhares e talvez hoje, um

dos que tenha maior importância reconhecido pela comunidade local é a Festa dos Lambe

sujos e caboclinhos que ocorre no mês de outubro e retrata uma luta entre brancos, negros e

índios. Aqui vale o pensamento de LEITE, E. (2011, p. 69), quando afirma que “a consciência

que atribui poder aos bens culturais não surge do dia para a noite, nem apenas com a

participação do Governo”. De fato, das manifestações culturais observadas, aquela que de fato

o povo participa é a Festa dos Lambe-sujo e caboclinhos. Existe uma aceitação da

comunidade.

É fato que não uma aceitação unânime e existe algum rechaçamento por parte de

pessoas que se sentem incomodadas, tendo em vista que faz parte da tradição que os lambe-

sujos sujem as pessoas que estão assistindo. Importante ressaltar que a Prefeitura Municipal

no ano de 2014, desenvolveu uma campanha na qual tentava sensibilizar aos participantes que

evitasse importunar aqueles que apenas observam a festa, como meros espectadores, sem

querer propriamente fazer parte do movimento (LARANJEIRAS, 2014).

De acordo com a Secretaria de Cultura municipal, objetivo maior da campanha foi

mostrar aos jovens a importância de conhecer a fundo essa festa folclórica que vem sofrendo

distorções quanto a sua história e sua verdadeira essência16. A festa representa a invasão dos

escravos na cidade para saquearem bens dos brancos, e a atuação dos índios, ora contratados

16 Informação obtida na entrevista de coleta de dados realizada com o Secretario Municipal de Cultura, Sr.

Evanilson Calazans.

112

por estes brancos para promoverem a sua defesa, o que acarretava numa batalha entre os

lambe-sujos (negros) e os caboclinhos (índios) (IPHAN, 2007).

Figura 6.4.2.3 – Festa dos Lambe-sujos e caboclinhos (2014) – Laranjeiras/SE (Prefeitura Municipal de

Laranjeiras)

Apesar da tentativa em se manter a tradição cultural, alguns pontos foram verificados

que tendem a no futuro comprometerem a perpetuação de algumas manifestações. Segundo o

IPHAN (2007), “alguns participantes consideram que a Festa dos Lambe sujos e caboclinhos

vem perdendo características primordiais, como a descaracterização da indumentária, inclusão

de pessoas a esmo como figuras”. Observou-se também que em virtudes de divergências

internas entre os líderes do movimento em 2014, foi preciso uma intermediação que envolveu

esforços da Prefeitura Municipal e do Ministério Público a fim de assegurar que a festa não

fosse prejudicada (LARANJEIRAS, 2014).

Considera-se muito delicada a questão, principalmente no tocante a interferência do

pode Estatal em manifestações culturais para resolver desestruturações internas entre

membros, o que pode vir, futuramente a comprometer seriamente a conservação de tão

importante movimento cultural da cidade.

Nesse contexto das formas de expressão, merece destaque ainda o Encontro Artístico e

Cultural, que ocorre anualmente no mês de janeiro, desde 1976 e que reúne nomes

expressivos e diversos pesquisadores da área na cidade, tendo como ponto alto a Festa dos

Santos Reis, classificada como uma celebração.

O encontro ocorre anualmente na primeira semana do mês de janeiro. Talvez seja a

semana em que a cidade encontre-se dentro do ideal, ou melhor, aparentando “o dever-ser”.

As ruas ficam tomadas pela Cultura, movimento intenso de pessoas, de manifestações

113

culturais, todos os espaços são aproveitados de alguma forma. Importante salientar que o

encontro não trata apenas da cultura de Laranjeiras, mas da cultura do Estado de Sergipe. São

diversas as manifestações. Mas vale ressaltar que aqui também é o momento ideal para se

visualizar o paradoxo observado na cidade, no tocante a sua população e a identificação da

cultura local. Durante toda essa semana a presença de pesquisadores, turistas, interessados no

tema é enorme. Todos buscam aproveitar o máximo do que acontece. No entanto, a população

da cidade não participa do Encontro Cultural de fato. Paralelo ao evento, a Prefeitura promove

uma festa com shows de artistas nacionais e é aonde o povo laranjeirense foca a sua atenção.

Ou seja, se de um lado estão pesquisadores tentando perpetuar a cultura do lugar, do outro,

está o próprio povo nativo como se não fosse parte integrante do contexto. Fora anunciado

durante o 40º encontro, acontecido em janeiro/2015, que a Secretaria de Cultura municipal

tinha interesse em tornar frequente, saraus que aconteceram no coreto da praça municipal, o

que desde já almejamos que seja verdade.

Fazem parte também do inventário de referências culturais (IPHAN, 2007), os ofícios

e os modos de fazer, dentre os quais, o aguadeiro, a cerâmica, a renda irlandesa, o ponto de

cruz, a pesca e a fabricação de farinha. Vale frisar que não são atividades tipicamente

laranjeirense, nem tampouco exclusivas, mas que compõem também a história da cidade e por

isso fazem parte dos seus bens imateriais.

Alguns objetos também fazem parte das referências culturais de Laranjeiras, dentre os

quais só não tem caráter religioso, o órgão de tubos. Os demais são imagens de santo da Igreja

católica, como a Imagem do Senhor dos Passos, o Sagrado Coração de Jesus e a imagem de

Nossa Senhora das Dores (IPHAN, 2007). Aqui, vale destacar também o órgão de tubos que

fica na Igreja do Sagrado Coração de Jesus. Um objeto belíssimo, mas em torno do qual

consta a história que muitos escravos sofreram bastantes maus-tratos para que o órgão fosse

mantido limpo e afinado. Esse tipo de informação gera até certo desprezo pelo objeto. Isso

porque a maioria da população é composta de descendentes desses escravos, ou seja, por mais

belo e valioso que seja o objeto, é complicado para alguém saber do sofrimento advindo das

chicotadas a qual fora submetido um antepassado só para manter um órgão usufruído na

época apenas pelos senhores brancos que podiam frequentar as igrejas católicas.

De tudo que foi exposto, não resta dúvida quanto à riqueza cultural de Laranjeiras e a

importância para a formação da identidade do povo laranjeirense.

Atualmente, pelo menos duas secretarias municipais (Educação e Assistência social),

realizam trabalhos no sentido de conservar a cultura imaterial da cidade junto à população,

114

principalmente junto às crianças em idade escolar. Uma ação educativa denominada de ”Mais

Cultura” procura promover a interação de jovens e crianças com os mestres da cultura

popular, levando-os às escolas públicas para apresentar aos alunos a história da cultura da

cidade.

6.4.3 O arcabouço legislativo da cidade de Laranjeiras: uma análise crítica das leis do

município

O principal instrumento legislativo do município de Laranjeiras é a Lei Orgânica. É

uma lei com características especiais quanto à sua edição, vez que segue ditames da

Constituição Federal e Estadual e sua aprovação e respectivas alterações só podem ser feitas

com a aprovação da maioria de dois terços dos membros da Câmara Municipal. A lei orgânica

de Laranjeiras atualmente em vigor é de 1990 e foi alterada em 2009. No entanto, conforme já

esclarecido na metodologia da presente pesquisa, para este trabalho será feita a análise do

Plano Diretor Participativo-PDP e as leis que o regulamentam (Código de Edificações, a Lei

de uso, ocupação e parcelamento do solo) e o Código ambiental do município.

Prática corriqueira em muitos municípios brasileiros, o anteprojeto do Plano Diretor,

do Código Ambiental, Código de Edificações, a Lei de uso, ocupação e parcelamento do solo,

foram feitos por uma empresa de consultoria especializada, com sede em Brasília. Geralmente

são anteprojetos que apresentam diversas falhas, porque na maioria das vezes, são genéricos.

A elaboração é técnica e o profissional apesar de ter a competência acadêmica para tal intento,

desconhece a realidade do município e acaba por criar uma generalidade na lei que pode vir a

comprometer especificidades do lugar. Em Sergipe, a mesma empresa que elaborou o plano

diretor de Laranjeiras também o fez em São Cristóvão, Indiaroba e Santa Luzia do Itanhi

(TECHNUM, 2013).

Conforme já debatido no referencial teórico da pesquisa, a participação popular é

obrigatória na elaboração do plano diretor das cidades. Das pessoas perguntadas acerca de

participação em audiências públicas para tratar do assunto, nenhuma se lembrava de ter

participado, algumas nunca nem tinham ouvido falar em Plano Diretor. A administração

municipal diz ter havido audiências públicas em todos os povoados entre os anos de 2007 e

2008.

115

O plano diretor participativo do município de Laranjeiras foi instituído pela Lei

Complementar nº 16/2008. O artigo 1º da referida lei, traz as diretrizes estabelecidas pela

Constituição Federal de 1988 e o Estatuto da cidade de 2001, buscando o desenvolvimento

sustentável da cidade. Os artigos 2º ao 6º estabelecem as diretrizes para uma gestão municipal

eficaz, nos quais pode se ver claramente a generalidade sugerida acima e repete coisas que já

estão previstas no Estatuto da cidade. O excesso de regulamentação no Brasil, talvez seja um

de seus maiores entraves. Vemos leis que são prolixas, que repetem coisas que já estão

asseguradas em outros instrumentos legais com plena eficácia para o município.

Art. 2º O Plano Diretor Participativo de Laranjeiras é o instrumento básico de

política urbana, engloba todo o território do Município, e tem as seguintes diretrizes:

I. Tornar-se um marco regulatório da política e da gestão democrática;

II. Contemplar os anseios da população do município, na busca incessante pelo

desenvolvimento e pela melhor qualidade de vida para todos; (LARANJEIRAS,

2008)

Observe-se que a previsão se confunde com o que diz no § 1º do artigo 182 e o dito no

artigo 225, ambos da Constituição Federal, ou seja, não seria necessária essa previsão, porque

a Carta Magna do Brasil já trouxe essas previsões. Os capítulos III e IV do Plano Diretor de

Laranjeiras, talvez sejam os que mais interessam a este trabalho por tratarem acerca da

Política de Desenvolvimento Sustentável e a Política ambiental do município, nos artigos que

vão do 7º ao 13º.

Aqui já merece uma ressalva, porque separar a política ambiental da política do

desenvolvimento sustentável, pela própria matéria elas se confundem. Falar em políticas

ambientais presume-se a necessidade de se estabelecer o desenvolvimento sustentável,

buscando a criação de uma sociedade sustentável, conceito de (DIEGUES, 2001).

Art. 7º A Política de Desenvolvimento Sustentável tem por objetivo ações

articuladas para o desenvolvimento econômico do município com ênfase no turismo

cultural, na valorização da cultura local, no desenvolvimento da agricultura

sustentável, na indústria e no acesso dos cidadãos do município à educação

profissional. (LARANJEIRAS, 2008)

Apesar da denominação do capítulo III ser “Da Política do Desenvolvimento

Sustentável”, essa poderia ser substituída pela Política de Desenvolvimento do Turismo. É de

se reconhecer, que os artigos que vão do 7º ao 10º estabelecem medidas de desenvolvimento

116

do turismo na cidade. Considere-se que o turismo é uma grande alavanca para Laranjeiras,

mas a política de desenvolvimento sustentável é bem mais que isso. É preciso oferecer o

crescimento com base em três vieses: o aspecto social, o aspecto econômico e o aspecto

ambiental, pilares que compõem do tripé da sustentabilidade.

A valorização da cultura e preservação dos bens culturais é importante, mas a cidade

ainda carece de mais. Seguindo o pensamento de Lefebvre (2001, p. 106),”impossível

considerar a hipótese de reconstituição da cidade antiga; possível apenas encarar a construção

de uma nova cidade, sobre novas bases, numa outra escala, em outras condições, numa outra

sociedade”.

Já o capítulo IV da Política Ambiental, traz uma série de dispositivos “em aberto”, ou

seja, ele não traz o problema e a solução, traz o problema e define que uma nova lei irá

regulamentar aquele preceito. Outro ponto interessante é o Parágrafo único, do artigo 12, que

prevê a elaboração do Código Ambiental em até um ano, no entanto, como foram

encomendados juntos, quando da votação do Plano Diretor, o código ambiental já se

encontrava pronto também.

Parágrafo único. O Plano Ambiental Municipal será elaborado no prazo de até 1

(um) ano contado a partir da publicação desta Lei, através de lei específica e

encaminhado à Câmara de Vereadores para tramitação. (LARANJEIRAS, 2008)

Em seguida, o Plano Diretor desvirtuando-se de sua função, começa a tratar de

diversos assuntos, como saúde, educação, cultura e esporte e até de assistência social.

Voltando para a definição de Plano Diretor na Constituição Federal, este seria o principal

instrumento da política de desenvolvimento e de expansão urbana, no qual deveriam constar

questões norteadoras do ordenamento da cidade.

Logo, se tomarmos por base a Constituição Federal, deveria está elencados no texto

questões como saneamento básico, moradia, mobilidade urbana e as questões de ordenação

urbana da cidade. E não assuntos como o amparo à velhice e à criança abandonada, como

pode se vê da leitura do artigo 20 e seus três incisos.

Art. 20 A Política de Assistência Social e Segurança Pública de Laranjeiras tem por

objetivo a elaboração do Plano Municipal de Assistência Social de Laranjeiras, que

leve em consideração:

I. A integração do indivíduo ao mercado de trabalho e ao meio social;

II. O amparo à velhice e à criança abandonada;

117

III. A integração das comunidades carentes. (LARANJEIRAS, 2008)

Extremamente prolixo, pode-se encontrar no plano diretor da cidade, até o

estabelecimento da competência da segurança pública municipal à secretaria de assistência

social.

Art. 22 A Política de Assistência Social e Segurança Pública de Laranjeiras é

atribuição da Secretaria de Assistência Social. (LARANJEIRAS, 2008)

Os artigos de 23 a 51 são os que mais coadunam com a finalidade do Plano Diretor,

estabelecendo a Política Urbana e rural do município. Alguns itens que já poderiam estar

descritos no próprio PDDP, transferem a regulamentação para outras leis, como o uso,

ocupação e parcelamento do solo e definição do perímetro urbano.

Alguma coisa que deveriam ter sido tratadas no capítulo acerca do desenvolvimento

sustentável ou da política ambiental também aparece nesse título, como a “Recuperação e

preservação da vegetação das elevações do entorno do centro histórico, visando à preservação

da paisagem” (art. 24, V, LARANJEIRAS, 2008).

Nesses artigos está definido o macrozoneamento, ou melhor, o artigo 26 diz “o

município de Laranjeiras é constituído de Zona Rural e Zona Urbana, conforme apresentado

no Anexo I – Mapa de Macrozoneamento do Município de Laranjeiras” (LARANJEIRAS,

2008).

Figura 6.4.3.1 – Mapa de Macrozoneamento – Laranjeiras/SE (Anexo I- Plano Diretor do Município)

118

Nesse conjunto de artigos, merece destaque o Zoneamento da Zona Urbana, a qual

para nos fins da lei estudada foi dividida em Zona Urbana de Uso Controlado, Zona Urbana

de Consolidação, Zona Urbana de Dinamização, Zona Urbana de Dinamização, Zona Urbana

de Expansão, Zona Urbana Industrial e Zona Urbana de Proteção Ambiental.

Observe-se que de acordo com a temática proposta nessa pesquisa e as definições

apresentadas no PDDP do município a Zona Urbana de uso controlado e a zona de proteção

ambiental deveriam ter correlação, visto que, a zona de uso controlado inclui os bens culturais

imóveis, que conforme visto anteriormente são também bens de proteção ambiental.

A zona de proteção ambiental foi reduzida nesta lei apenas as Áreas de Preservação

permanente que se encaixem no estabelecido na Resolução do CONAMA nº 303, restringindo

completamente o seu uso. Entende-se que a área de proteção ambiental deva incluir não só as

áreas de preservação permanente como também áreas de uso controlado, buscando conservar

com a ajuda da própria população.

Os artigos que vão do 63 ao 81, trata acerca dos instrumentos da Política urbana e

diga-se de passagem são na prática uma réplica do que já estabelece o Estatuto da Cidade,

inclusive definindo ações que serão pautadas na Lei nº 10257/01. Prevê ainda com base no

estatuto da cidade a outorga onerosa do direito de construir, o direito de preempção, a

transferência do direito de construir e as Zonas Especiais de Interesse Social.

Art. 64 A fim de garantir a função social da propriedade aos imóveis não edificados,

subutilizados ou não utilizados na sede municipal, a Prefeitura Municipal aplicará o

parcelamento e edificação compulsórios de acordo com as definições contidas na Lei

10.257, de 10 de julho de 2001. (LARANJEIRAS, 2008)

Os artigos 82 e 83 tratam acerca da implantação de uma Política Habitacional no

município. E os artigos de 84 e 85 tratam acerca da Conservação do Patrimônio, tão genérico

como quase todo Plano Diretor.

Art. 84 A Conservação do Patrimônio Histórico e Cultural construído em

Laranjeiras tem por objetivo valorizar e destacar o ambiente urbano sem limitar os

espaços para a sociedade. (LARANJEIRAS, 2008)

119

Da análise completa do Plano Diretor de Laranjeiras, o que se verifica é que trata-se de

um plano extremamente abrangente e sem vinculação jurídica precisa, o que significa dizer

que a interpretação dos seus dispositivos abrem margens que contribuem de forma negativa

no sentido de não fazer se cumprir a lei, porque ela não foi suficientemente clara, recursos

bastante utilizados nas teses de defesa no mundo jurídico.

O Plano diretor de Laranjeiras trata quase que genericamente de todos os aspectos da

gestão urbana e não só aspectos que envolvam a política urbana. Grosso modo, o Plano

existente na cidade poderia ser aplicado em qualquer outra cidade e não é suficiente para

atender as especificidades do município de Laranjeiras principalmente no tocante a questões

socioambientais. É visível que quem elaborou ignorou ou desconhecia questões que urgiam na

cidade, apresentando um plano com erros básicos e evidentes.

Talvez o maior erro na implementação dos planos diretores tenha sido a pressão

advinda da obrigatoriedade que previa sanções como não repasse de recursos. Isso fez com

que os municípios buscassem atender a exigência da lei, mas sem de fato empenharem-se em

utilizar o recurso legal para elaboração de um verdadeiro planejamento urbano.

Quando o Estatuto da cidade prevê a participação popular no processo de elaboração

do plano está querendo assegurar que os anseios das comunidades sejam ouvidos. Observou-

se que a equipe técnica que elaborou o Plano Diretor de Laranjeiras realmente dispunha de

recursos humanos profissionais do mais alto gabarito, incluindo arquitetos e urbanistas,

geógrafos, advogado, engenheiros.

Mas esbarrou numa questão, ao trazer uma empresa de Brasília, a realidade da

comunidade a ser retratada na lei difere e muito da realidade da comunidade de onde vieram

os técnicos e acredita-se que justamente seja fator negativo é o fato da equipe que elabora o

anteprojeto não conhecer a realidade social da cidade, o que faz com que se produzam leis

imponentes na técnica, mas que deixam a desejar na prática.

No pensamento de Garcia (1999, p. 104), “os enunciados que instituem a Cidade ideal

não devem desconhecer as cidades reais que os homens produziram: é a condição de viver nas

sociedades concretas que obriga a pensar no estatuto da boa cidade...”.

Aqui temos uma situação reproduzida por Claudio Boeira Garcia quando trata de Paris

e Genebra. Trazendo para a realidade da pesquisa e utilizando a mesma linha do referido autor

considera-se que “a produção do universal no plano concreto das diferenças e desigualdades é

uma ilusão (1999, p.105). Ou seja, a análise de cada caso concreto mostrará que existem

120

peculiaridades que não permite que o geral sirva para todas as partes. A realidade de cada

lugar diverge justamente pelo seu contexto histórico, político, econômico e social.

O plano diretor deve estabelecer diretrizes e estas devem ser carregadas de clareza e

objetividade, para que facilitem a sua aplicação. Dentro dessa perspectiva é que se inicia o

estudo das leis que complementam o Plano Diretor de Laranjeiras, responsáveis diretas por

regulamentar as diretrizes anteriormente mencionadas. A Lei complementar nº 18/2008 é uma

lei básica de apenas 03 (três artigos) que através de uma poligonal define o perímetro urbano

da cidade.

Figura 6.4.3.2 – Perímetro Urbano – Laranjeiras/SE (Anexo I- Lei complementar nº 18/2008)

A Lei nº 30/09 traz o código de edificações do município. O principal ponto a ser

observado é que a lei praticamente ignora o Patrimônio arquitetônico da cidade. Percebe-se

que existe o desconhecimento de que além do Conjunto arquitetônico tombado existem

construções que possuem valor cultural na cidade e a lei não traz essas minúcias, acredita-se

que deixando o encargo para as leis federais, o que pode ser um risco a incolumidade desse

patrimônio, tendo em vista que a fiscalização local, exercida pelo município surte mais efeito.

A Lei nº 28/09 dispõe sobre o uso e ocupação do solo urbano do Município de

Laranjeiras. Do 1º ao 44º artigo, a referida lei reproduz os artigos acerca do zoneamento

urbano do município já elencados no Plano Diretor. E nos artigos seguintes define a

121

hierarquização do sistema viário, finalizando com a descrição das infrações e aas respectivas

penalidades. Para os fins desta pesquisa, os comentários acerca do zoneamento já foram

anteriormente elencados.

A Lei nº 29/09, dispõe sobre o parcelamento do solo urbano e vem a ser uma

complementação da lei de uso e ocupação. Apesar de constar um capítulo que trata de

requisitos urbanísticos e ambientais para parcelamento do solo urbano, a referida lei segue os

ditames do plano diretor, sem apresentar nada de extraordinário que seja interessante

mencionar. Como por exemplo, a proibição de parcelamento em área ambientalmente

protegida.

Art. 74. Não será permitido o parcelamento do solo:

VI – em áreas de preservação ecológica, definidas em legislação federal, estadual e

municipal; (LARANJEIRAS, 2009)

O Código ambiental foi instituído pela Lei complementar nº 31/2009. É um dos

instrumentos legais que muito interessam a essa pesquisa. Mas assim como o Plano Diretor, o

que se percebeu foi um código genérico tanto quanto, principalmente quando fala nas licenças

ambientais, nos relatórios de impacto, o que se pode perceber é que a lei ambiental do

município não atende em nada as necessidades da população local como um todo.

Dentre as observações cabe falar acerca do artigo 2º traz uma série de definições que

devem ser usados para fins desta Lei. Para corroborar a análise de que as leis do município

foram elaboradas de forma genérica, merece destaque o inciso VI do artigo em comento que

trata acerca de mar territorial como recurso ambiental do município, já que o caput do artigo,

como dito acima dispõe de conceitos para essa lei especificamente. Logo, em se tratando do

município de Laranjeiras, já que esta não se encontra na costa e não é banhada pelo mar, não

há que se falar em mar territorial e sim em águas interiores, que se referem a lagos e rios.

Art. 2º Para fins desta Lei, considera-se: VI – Recursos ambientais: a atmosfera, as águas interiores, superficiais ou

subterrâneas, os

estuários, o mar territorial, o solo, o subsolo, a fauna e a flora; (LARANJEIRAS,

2009)

122

Até o artigo 4º o que se pode ver é uma réplica da Lei nº 6938/81, que instituiu a

Política Nacional do Meio ambiente. A Lei cria também o Subsistema de Gestão ambiental. A

Secretaria do Meio Ambiente foi devidamente contactada, foi oficiada conforme pediu a

Secretária Municipal e até o fechamento da coleta de dados, mesmo com diversos emails

reiterando a solicitação, não devolveu o questionário respondido com as informações acerca

do trabalho que vem sendo realizado pela Secretaria, o que se lamenta, pela falta de

informação oficial, se realmente esse subsistema de fato funciona e cumpre seu papel legal.

Cabe a ressalva, que o Código ambiental deveria trazer diversas regulamentações,

mas, o que se observou até então, foi que o referido código traz muitas definições:

DAS ÁREAS DE PROTEÇÃO DE MANANCIAIS

Art. 38 Constituem-se em Áreas de Proteção de Mananciais as áreas à montante

dos locais de captação para abastecimento de água potável.

Parágrafo único. As áreas a que se refere este artigo são sujeitas ao regime jurídico

especial e regidas por legislação específica, cabendo ao município sua delimitação.

(LARANJEIRAS, 2009)

Observe-se que a Lei define o que são áreas de proteção de mananciais e deixa em

aberto se existem essas áreas, imputando ao município a delimitação.

A lei ambiental do município é quase inútil, vez que está condicionada a

regulamentação posterior, processo característico da burocratização desnecessária que

impera no Brasil. As leis poderiam ser mais objetivas, mais concisas e mais claras, para

que de fato atingissem seus objetivos. Mas, na verdade é que existe por trás dessa realidade

a predominância de interesses econômicos. Os planos diretores foram elaborados única e

exclusivamente para atender a exigência legal imposta pelo Estatuto da Cidade. Assim,

com receio de serem prejudicados no repasse de verbas federais muitos municípios

correram em providenciar o seu instrumento legal da política urbana sem muito

conhecimento da importância desse instrumento, corroborando com a hipótese levantada

no início da pesquisa de que o legislador municipal no processo de elaboração das leis

urbanas de Laranjeiras, não levou em conta as questões e a complexidade dos problemas

socioambientais da cidade, de modo que estas não respondem de forma eficaz às demandas

concernentes à preservação, conservação e uso deste patrimônio.

123

7 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Ao iniciar a presente pesquisa, o objetivo era analisar até que ponto as questões

socioambientais referentes ao patrimônio histórico cultural influenciavam na legislação

urbana do município de Laranjeiras/SE e de que forma a legislação urbana contemplava o seu

patrimônio material e imaterial no que concerne às questões socioambientais, respeitando o

chamado Direito à cidade.

A metodologia proposta permitiu que ao longo de quase dois anos fosse possível

construir conceitos-bases que se tornaram diretrizes na análise supramencionada. A

preocupação era assegurar o cumprimento do proposto inicialmente, mantendo a

impessoalidade, adquirindo conhecimentos necessários, mas que trouxeram como desafio

evitar estabelecer preconceitos.

No tocante a escolha do município, melhor não poderia ter sido. A riqueza cultural de

Laranjeiras e a sua história fascinam a qualquer pesquisador. A cidade tem a capacidade de

produzir contextos propícios à pesquisa científica, foi uma oportunidade única de viajar no

tempo e através da reconstrução do passado, foi possível entender questões, como se a medida

que se avançava fosse colocada uma nova peça num imenso quebra-cabeças.

Ao final desse trabalho, dois pontos precisam ser levados em conta, primeiro, a

carência em que se vive aquele povo e segundo a vontade de poder de alguma forma, mesmo

que singela, contribuir para a melhoria da qualidade de vida daquela gente. Pessoas que vivem

numa sociedade paradoxal, adornados pelas riquezas culturais, mas mergulhados numa

realidade social desfavorecida de tal modo, que confronta diretamente com essa riqueza.

No tocante à legislação urbana Laranjeiras tem um verdadeiro arcabouço jurídico, no

entanto o que se viu, foi uma legislação prolixa e sem muita eficácia, vez que distante da

realidade social do município.

São textos legais genéricos, elaborados por empresas completamente alheias à

realidade local, onde a tecnicidade impera, se sobrepondo ao quadro social da cidade, a

exemplo do Plano diretor, que restringe a política de desenvolvimento sustentável apenas a

investimentos no turismo local. Não se discorda que o turismo seja um gerador de renda, mas

a cidade precisa ser sustentável primeiro para seus próprios habitantes, até mesmo como

forma de atrair o olhar do turista.

124

Utilizando o pensamento de Fortuna (2002, p. 19), já mencionado no referencial

teórico, o espaço público bem sucedido é um espaço público que além do seu sentido estético,

se revela inteligível, abstrato e não apenas funcional, mas, ao mesmo tempo, suficientemente

definido e explícito, de modo a promover a intersubjectividade da cidade. O que não acontece

de fato com Laranjeiras.

Consoante o pensamento de (LEFEBVRE, 2001), os arquitetos estabeleceram e

dogmatizaram um conjunto de significações, traduzidas como função, forma e estrutura. Onde

se elabora não “a partir das significações vividas e percebidas porque aqueles que habitam,

mas pelo simples fato de habitar, por eles interpretado” (2001, p. 111).

A cidade é reinventada para se atender o interesse daqueles que pensam apenas

tecnicamente e esquecem-se de pensar naqueles que ali vivem, no seu modo de sentir e

vivenciar o seu lugar.

Laranjeiras é uma cidade que sempre teve cultura, que sempre produziu cultura e isso

deve ser respeitado. Não apenas querendo vender um produto de consumo.

As necessidades sociais têm um fundamento antropológico, opostas e

complementares, compreendem a necessidade de segurança e a de abertura, a

necessidade de certeza e a necessidade de aventura, a da organização do trabalho e

a do jogo, as necessidades de previsibilidade e do imprevisto, de unidade e de

diferença, de isolamento e de encontro, de trocas e investimentos, de

independência (e mesmo de solidão) e de comunicação, de imediaticidade e de

perspectiva a longo prazo. (LEFEBVRE, 2001, p. 105)

Diante do tratamento que vêm recebendo não é de assustar que se entenda porque

alguns têm rejeitado a presença da Universidade. São mais uma vez consequências dos

paradoxos enfrentados pela população laranjeirense, tão cerceados de tudo e obrigados a

conviverem com pessoas que usam o que lhe pertencem da forma que seria muito difícil

também virem a usar. Consoante pensamento de Lefebvre (2001, p. 13), “os violentos

contrastes entre a riqueza e a pobreza, os conflitos entre os poderosos e os oprimidos não

impedem nem o apego à Cidade, nem a contribuição ativa para a beleza da obra. ”

A história da cidade mostra isso. Desde a exploração da mão de obra escrava pelos

senhores de engenho até a abolição da escravidão que concedeu a liberdade, mas os colocou

como indigentes. A luta de classes que sempre existiu. Consoante o pensamento de Diderot

(2011), o direito a cidade é o direito de participar de todos os privilégios, sem exclusões.

125

O tempo passou mas as consequências ainda são vistas nos dias atuais. A população

rica, os intelectuais mudaram-se da cidade e os remanescentes foram àquelas pessoas de

baixo poder aquisitivo que viviam a mercê da própria sorte. E mesmo que em proporções

diferentes, hoje isso ainda existe. Nas palavras de (NORA, 1989), Laranjeiras é lugar de

história mas um lugar sem memória, justamente pela disparidade entre a riqueza cultural e a

situação econômica social.

Como respostas às questões que nortearam a pesquisa, a conclusão que se tem e sem

maiores dúvidas, é que o patrimônio cultural da cidade de Laranjeiras/SE, não é um espaço

socioambiental e sua influencia na legislação do município se resume a investimento no

turismo, não existindo nada na legislação que impulsione a comunidade local a fazer uso do

equipamento que dispõe.

As pessoas não se identificam com o patrimônio material da sua cidade justamente

porque não tem a opção de uso, aprenderam mecanicamente a preservar e não a conservar,

ou seja, mantém-se um patrimônio edificado morto.

No que concerne à cultura imaterial, existe maior identificação das pessoas, talvez

justificado que a maioria das tradições mantidas são ligados a herança cultural dos negros,

fato que é diferente no patrimônio material, herança da cultura branca.

O patrimônio cultural é a história daquele povo e isso não pode em momento algum

ser rechaçado. A promoção do desenvolvimento sem destruir as riquezas culturais da cidade

só será possível a partir do momento em que o povo de Laranjeiras seja sensibilizado através

de ações efetivas das formas de uso racional, assegurando que tudo aquilo que se usufrui

hoje, é finito e pode acabar amanhã, inclusive a cultura.

Os laços de identidade sem dúvida são a base para a ampliação da visão da

importância do patrimônio cultural e é fator determinante para perpetuação da cultura local

como um bem a ser conservado de modo que as futuras gerações possam conhecê-la.

Ainda balizando-se na hipótese elencada, entende-se que de fato, em se tratando de

cidades históricas, a cultura deve ser sempre o centro das atenções e a participação popular,

força predominante para que se pense em leis que propiciem o desenvolvimento

socioambiental.

A sugestão é que a legislação urbana do município seja totalmente revisada de modo

a atender ao que de fato se propõe, sendo construída ali no dia a dia, sem o tecnicismo

exacerbado dessas empresas.

126

O Plano diretor não é nada de tão complicado, o que faz a complexidade dele são os

agentes políticos, justamente por não terem metas e princípios que norteiem o

desenvolvimento sustentável, ou melhor, a criação de cidades sustentáveis.

Para trabalhos futuros, há muito ainda a se discutir dentro desta temática e de tantas

outras que envolvem a sociedade laranjeirense. Acreditamos que a principal delas talvez

possa acontecer através de um estudo interdisciplinar que busque entender as pessoas dentro

do contexto social em que estão inseridas. Esperamos que de alguma forma as reflexões aqui

expressas possam colaborar para pensar ainda e mais uma vez os rumos possíveis e

desejáveis da cidade de Laranjeiras.

127

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