universidade do vale do itajaÍ – univali centro de ...siaibib01.univali.br/pdf/guilherme damiani...

61
1 UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE EDUCAÇÃO SUPERIOR – CES VII CURSO DE DIREITO NÚCLEO DE PRÁTICA JURÍDICA COORDENAÇÃO DE MONOGRAFIA RESPONSABILIDADE CIVIL DO CONDOMÍNIO EDILÍCIO EM FURTO OU DANO DE VEÍCULO Monografia apresentada como requisito parcial para obtenção do grau de bacharel em Direito na Universidade do Vale do Itajaí. ACADÊMICO: GUILHERME DAMIANI NUNES São José (SC), maio de 2007.

Upload: builiem

Post on 13-Dec-2018

213 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

Page 1: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Guilherme Damiani Nunes.pdf · UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE EDUCAÇÃO SUPERIOR

1

UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE EDUCAÇÃO SUPERIOR – CES VII CURSO DE DIREITO NÚCLEO DE PRÁTICA JURÍDICA COORDENAÇÃO DE MONOGRAFIA

RESPONSABILIDADE CIVIL DO CONDOMÍNIO EDILÍCIO EM FURTO OU DANO DE VEÍCULO

Monografia apresentada como requisito parcial para obtenção do grau de bacharel em Direito na Universidade do Vale do Itajaí. ACADÊMICO: GUILHERME DAMIANI NUNES

São José (SC), maio de 2007.

Page 2: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Guilherme Damiani Nunes.pdf · UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE EDUCAÇÃO SUPERIOR

2

UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE EDUCAÇÃO SUPERIOR – CES VII CURSO DE DIREITO NÚCLEO DE PRÁTICA JURÍDICA COORDENAÇÃO DE MONOGRAFIA

RESPONSABILIDADE CIVIL DO CONDOMÍNIO EDILÍCIO EM FURTO OU

DANO DE VEÍCULO

Monografia apresentada como requisito parcial para obtenção do grau de Bacharel em Direito, sob orientação da Professora MSc. Rosangela Barreto Laus

ACADÊMICO: GUILHERME DAMIANI NUNES

São José (SC), maio de 2007.

Page 3: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Guilherme Damiani Nunes.pdf · UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE EDUCAÇÃO SUPERIOR

3

UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE EDUCAÇÃO SUPERIOR – CES VII CURSO DE DIREITO NÚCLEO DE PRÁTICA JURÍDICA COORDENAÇÃO DE MONOGRAFIA

RESPONSABILIDADE CIVIL DO CONDOMÍNIO EDILÍCIO EM FURTO OU DANO DE VEÍCULO

GUILHERME DAMIANI NUNES

A presente monografia foi aprovada como requisito para a obtenção do grau de bacharel em Direito no curso de Direito na Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI. São José, 11 junho de 2007.

Banca Examinadora:

_______________________________________________________ Profa. MSc. Rosângela Barretos Laus - Orientadora

_______________________________________________________ Prof. MSc. Márcio Roberto Harguer - Membro

_______________________________________________________ Prof. Esp. Carlos Alberto Luz Gonçalves - Membro

Page 4: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Guilherme Damiani Nunes.pdf · UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE EDUCAÇÃO SUPERIOR

4

Dedico esta pesquisa monográfica aos meus

pais, Valeci Nunes Filho e Neusa Rosane

Damiani Nunes, ao meu irmão Eduardo

Damiani Nunes (in memórian) e a toda minha

família

Page 5: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Guilherme Damiani Nunes.pdf · UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE EDUCAÇÃO SUPERIOR

5

AGRADECIMENTOS

Agradeço aos meus pais, acima de tudo pelo que eles representam na minha vida,

e pelos incentivos, apoio e compreensão tidos em todos os momentos.

Ao meu irmão que de certa maneira me influenciou a fazer o curso de Direito.

À minha família por estar sempre presente.

A todos os meus amigos, em especial à Angélica, que muito me ajudou durante a

realização do trabalho, a Carol e Alessandre que me emprestaram muitos livros.

A minha orientadora e amiga Rosângela Barretos Laus, pela atenção, dedicação,

incentivo e orientação.

À Universidade do Vale do Itajaí e ao Tribunal de Justiça de Santa Catarina que

disponibilizaram alguns livros utilizados para a conclusão da pesquisa.

Enfim a todos que direta ou indiretamente ajudaram para que este trabalho fosse

concretizado.

Page 6: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Guilherme Damiani Nunes.pdf · UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE EDUCAÇÃO SUPERIOR

6

Não é o desafio com que nos deparamos que determina quem somos e o que estamos nos tornando, mas a maneira com que respondemos ao desafio. (Henfil) O Homem é do tamanho do seu sonho. (Fernando Pessoa)

Page 7: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Guilherme Damiani Nunes.pdf · UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE EDUCAÇÃO SUPERIOR

7

SUMÁRIO

RESUMO .......................................................................................................................... IX

INTRODUÇÃO................................................................................................................. 10

1 CONDOMÍNIO EDILÍCIO........................................................................................... 12

1.1 HISTÓRICO................................................................................................................. 12

1.2 PROPRIEDADE........................................................................................................... 14

1.3 CONCEITUAÇÃO E NATUREZA DOS CONDOMÍNIOS ......................................... 15

1.4 INSTITUIÇÃO DO CONDOMÍNIO ............................................................................ 19

1.5 CONVENÇÃO DE CONDOMÍNIO ............................................................................. 20

1.6 DOS CONDÔMINOS E DO SÍNDICO ........................................................................ 22

1.6.1 Direitos e deveres dos condôminos............................................................................. 22

1.6.2 Das atribuições do síndico.......................................................................................... 22

2 RESPONSABILIDADE CIVIL .................................................................................... 24

2.1 DELINEAMENTOS HISTÓRICOS ............................................................................. 24

2.2 CONCEITUAÇÃO ....................................................................................................... 27

2.3 ATO ILÍCITO COMO PRESSUPOSTO DA RESPONSABILIDADE CIVIL.................29

2.3.1 O duplo aspecto da ilicitude ....................................................................................... 30

2.3.2 Ato ilícito stricto sensu e ato ilícito lato sensu ........................................................... 31

2.4 RESPONSABILIDADE SUBJETIVA E OBJETIVA ................................................... 32

2.4.1 RESPONSABILIDADE CIVIL SUBJETIVA E SEUS PRESSUPOSTOS ................. 33

2.4.2 RESPONSABILIDADE OBJETIVA E SEUS PRESSUPOSTOS .............................. 36

3 RESPONSABILIDADE CIVIL DO CONDOMÍNIO .................................................. 39

3.1 NATUREZA DA RESPONSABILIDADE CIVIL DO CONDOMÍNIO........................ 39

3.1.1 Responsabilidade contratual e Responsabilidade extracontratual ................................ 39

3.1.2 Responsabilidade extracontratual por ato próprio ....................................................... 42

3.1.3 Responsabilidade extracontratual por ato de terceiro .................................................. 43

3.1.4 Responsabilidade extracontratual pelo fato da coisa ................................................... 45

3.2 A RESPONSABILIDADE DO CONDOMÍNIO POR DANO CAUSADO A VEÍCULO

DE CONDÔMINO ............................................................................................................. 46

3.2.1 Convenção do condomínio: direito dos condôminos de disciplinar suas relações……. 47

3.2.2 A contratação de sistemas de segurança e de vigilância ............................................. 48

Page 8: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Guilherme Damiani Nunes.pdf · UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE EDUCAÇÃO SUPERIOR

8

3.3 OS ENTENDIMENTOS JURISPRUDENCIAL E DOUTRINÁRIO SOBRE A

RESPONSABILIDADE DO CONDOMÍNIO POR FURTO OU DANO À VEÍCULO....... 49

3.3.1 Das decisões favoráveis.............................................................................................. 49

3.3.2 Das decisões desfavoráveis......................................................................................... 53

CONSIDERAÇÕES FINAIS............................................................................................ 55

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ............................................................................. 58

Page 9: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Guilherme Damiani Nunes.pdf · UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE EDUCAÇÃO SUPERIOR

9

RESUMO

A presente monografia objetiva verificar se é possível responsabilizar civilmente o condomínio edilício em furto ou dano causados aos veículos estacionados nas suas dependências. A responsabilidade civil consiste na obrigação de indenizar, decorrente de um prejuízo causado a outrem. Primeiramente, buscou-se definir as concepções do condomínio edilício, a sua natureza jurídica, a lei que o regulamenta, como é instituído, o que é e para que serve a Convenção. Apontou-se também, conceitos pertinentes à responsabilidade civil, a sua evolução, os seus pressupostos e principais elementos, para ao final da pesquisa discutir a responsabilidade civil do condomínio edilício e obter-se a confirmação da hipótese, sendo que nem sempre o condomínio é obrigado a indenizar. Analisou-se na doutrina e jurisprudência que abordam o tema, uma série de fatores e circunstâncias. E apesar de ainda haver controvérsias, verificou-se que o condomínio será responsabilizado quando ocorrer o dano, se preencher algumas condições, sejam elas, se este oferecer serviços de vigilância e guarda do veículo, ou estiver expressamente descrito na convenção ou regimento interno a cláusula de indenizar, no entanto, este entendimento não é pacífico na doutrina e jurisprudência. Palavras-chave: responsabilidade civil, condomínio edilício, indenização

Page 10: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Guilherme Damiani Nunes.pdf · UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE EDUCAÇÃO SUPERIOR

10

INTRODUÇÃO

O homem sempre enfrentou os mais diversos desafios. Um deles atualmente

parece ser o da crise habitacional. Com o crescimento demográfico e o aumento da população

é cada vez mais comum, a construção de prédios e edifícios, principalmente nos grandes

centros urbanos, pois assim há um melhor aproveitamento econômico do solo.

Dentre os inúmeros temas possíveis de serem pesquisados na esfera jurídica foi

escolhido como objeto central do trabalho, tendo como embasamento teórico as doutrinas e

jurisprudências, a responsabilidade civil do condomínio edilício em dano ou furto de veículos

ocorridos dentro da área de estacionamento condominial.

O presente tema foi escolhido para o estudo, em virtude da grande controvérsia

que gira em torno de se admitir ou não a responsabilização do condomínio. E os casos de

furtos e danos ocorridos em automóveis, nas suas dependências, já não são singulares, tem se

acentuado o número de casos. Assim, o tema em referência traz uma reflexão sobre as

transformações da sociedade atual em razão da vida em condomínio.

Por isso, este estudo tem por objetivo buscar os parâmetros essenciais para que se

configure a responsabilização do condomínio e dessa forma, tentar melhor esclarecer esta

questão.

Também, como objetivo específico do estudo será feita uma abordagem do

condomínio edilício e da responsabilidade civil, visando a fundamentação e outros suportes

para a compreensão do objeto pesquisado, além de pesquisa e análise das decisões

jurisprudenciais, principalmente, mas não exclusivamente, do Tribunal de Justiça de Santa

Catarina.

A responsabilidade civil é um dos temas mais discutidos pela doutrina e pela

jurisprudência, e é de interesse e relevância para a sociedade como um todo, pelas

conseqüências que pode gerar numa lide, quando invocada. É também um assunto que vem

evoluindo desde o século passado, e em virtude disso, agora vem se observando um

desprendimento da responsabilização baseada apenas na culpa. Essa nova idéia de

responsabilidade vem fundada, principalmente, na teoria do risco da atividade, na qual cada

um deverá responder pelos eventuais danos causados a outrem em decorrência da sua

atividade.

Através do método indutivo de abordagem, serão analisadas as divergências

existentes acerca do tema, e os dados coletados serão interpretados.

Page 11: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Guilherme Damiani Nunes.pdf · UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE EDUCAÇÃO SUPERIOR

11

Desse modo, para tornar mais didático, o presente trabalho foi dividido em três

capítulos. No primeiro é abordado o condomínio edilício, os antecedentes históricos, seu

conceito e natureza jurídica, como se dá a sua instituição, o que é e para que serve a

convenção, para assim compreender e fundamentar todo o fenômeno pesquisado.

Em seqüência, no segundo capítulo, é desenvolvido um conceito acerca da noção

geral de responsabilidade civil. Analisa-se a sua origem, que remonta ao Direito Romano, o

qual é base do ordenamento pátrio, passando pelo Código de Napoleão, até chegar aos dias

atuais. A partir das definições e dos pressupostos da responsabilidade civil, e também da

análise das classificações doutrinárias existentes, procura-se aclarar o tema, para melhor

configurar, logo em seguida, o tipo de responsabilização que o condomínio edilício terá

perante eventuais danos ou furtos ocorridos nas suas dependências.

Após assentadas as bases dos institutos do condomínio e da responsabilidade civil,

passa-se, no terceiro capítulo, ao estudo da responsabilização do condomínio por danos ou

furtos de veículos ocorridos nas dependências das suas garagens. No início, procura-se definir

a natureza jurídica, e são analisadas as responsabilidades contratuais e extracontratuais.

Relativamente a responsabilidade extracontratual, observa-se as por ato próprio, por ato de

terceiro e pelo fato da coisa. Em seguida, aborda-se as disposições contidas na convenção e a

contratação de sistemas de segurança.

Ainda, no mesmo capítulo, traz-se as divergências doutrinárias e jurisprudenciais

dentro da matéria e aborda-se, entendimentos jurisprudenciais e doutrinários, com os

fundamentos das correntes que são favoráveis e as contrárias à responsabilização, mostrando

o embasamento de cada uma.

Por derradeiro e para finalizar, traça-se as considerações sobre todo o fenômeno

estudado.

Page 12: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Guilherme Damiani Nunes.pdf · UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE EDUCAÇÃO SUPERIOR

12

1 CONDOMÍNIO EDILÍCIO

1.1 HISTÓRICO

O condomínio edilício, conforme MALUF1, surgiu após a I Grande Guerra, em

detrimento da crise habitacional e outros fatores sócio-econômicos. Ensina ainda, que os

traços deste tipo de propriedade podem ser observados desde o começo da civilização.

Também MEZZARI2, ao abordar o tema, afirma que a propriedade horizontal

existe desde os primórdios da civilização. Expõe que a destruição ocasionada pela I Guerra

Mundial, a explosão demográfica, o êxodo rural, dentre outros fatores, colaboraram para o

surgimento dos grandes edifícios e junto com eles o condomínio.

O Código Civil brasileiro de 1916 não tratou do condomínio edilício. No Brasil,

essa modalidade de condomínio surgiu, de fato, através do Decreto nº 5.481/28. Antes do

decreto, conforme ressalta MONTEIRO3, esta espécie de condomínio era regulada, por

analogia, pelas regras do condomínio geral e pelos usos e bons costumes.

O decreto de 1928, determinava exigências, tais como: as construções de mais de

cinco andares, com, no mínimo, três peças por apartamento e, além disso, exigia que fossem

averbados no Registro de Imóveis. Essa legislação era falha, motivo pelo qual, foi modificada

pelo Decreto nº 5.234/43 e posteriormente pela Lei nº 285/48. A sua principal mudança,

segundo MEZZARI4, decorreram do fato de que as edificações passaram “de cinco para três

e, depois, para dois o número de pavimentos do prédio para que sobre ele se pudesse instituir

o condomínio especial”.

Como a população brasileira estava crescendo e com ela os condomínios em

edificações, via-se a necessidade de uma legislação mais complexa a respeito do assunto, em

razão das inúmeras lacunas existentes na lei anterior. Assim, em 1964 ocorreu a promulgação

da Lei nº 4.591, ou seja, a Lei de Condomínios e Incorporações.

Esta lei tratou de dois conteúdos diferentes, a saber: o condomínio especial e a

figura do incorporador. A respeito disso, RODRIGUES5 pondera:

1 MALUF, Carlos Aberto Dabus. O Condomínio Edilício no novo Código Civil. 2.ed. São Paulo: Saraiva, 2004. p. 1. 2 MEZZARI, Mário Pazutti. Condomínio e incorporação no registro de imóveis. 2. ed. Porto Alegre: Norton, 2002. p. 25-26. 3 MONTEIRO, Washington de Barros. Curso de Direito Civil: direito das coisas. 37. ed. São Paulo: Saraiva, 2003. p. 222. 4 MEZZARI, Mário Pazutti. Condomínio e incorporação no registro de imóveis, p. 32. 5 RODRIGUES, Silvio. Direito Civil: direito das coisas. 27. ed. São Paulo: Saraiva, 2002. p. 209.

Page 13: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Guilherme Damiani Nunes.pdf · UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE EDUCAÇÃO SUPERIOR

13

A Lei 4.591/64 compõe-se de dois títulos: o primeiro cuida do condomínio em edificações propriamente dito, definindo-o, disciplinado sua constituição e sua administração, tratando enfim de sua vida como instituição autônoma; o segundo – e isso constitui importante inovação da lei – trata das incorporações e da figura do incorporador, regulando não apenas os direitos e deveres deste, como também os principais problemas jurídicos decorrentes das construções de prédios destinados a condomínios em edificações.

Nota-se, pelo exposto acima, que inovações significativas foram introduzidas com

o advento da Lei nº 4.591/64. Traça regras relativas a sua constituição, administração; regula

os direitos e deveres da incorporação e do incorporador, além de vislumbrar a problemática

jurídica a ser enfrentada em decorrência da propriedade em comum.

Importante ainda mencionar que a lei em comento, passou a permitir a construção

de condomínio edilício a toda edificação de um ou de vários pavimentos, além de não

estabelecer limite ao número de peças por unidade.

Não obstante tais alterações, salienta-se que parte da Lei 4.591/64 foi modificada

pela Lei nº 4.864/65 e, que segundo AVVAD6, passou-se a denominá-la de “Lei de Estímulo

à Construção Civil, marcando a introdução de ambos os institutos, incorporação e

condomínio, no sistema jurídico do país”.

Atualmente, no direito brasileiro, o condomínio edilício é regido pela Lei nº

10.406/02, que instituiu o Código Civil. Por esse diploma legal e, pelas disposições dos

artigos 1.331 à 1.358, revogou-se a parte relativa à condomínio edilício, até então disciplinado

pela Lei nº 4.591/64, mantendo-se vigente, ainda sob a égide da Lei 4.591/64, as regras

referentes às incorporações.

Por oportuno, cabe, neste estágio do presente trabalho, abordar, em breve síntese,

o instituto da propriedade, por se tratar de matéria de suma importância para o

desenvolvimento deste trabalho.

1.2 PROPRIEDADE

6 AVVAD, Pedro Elias. Condomínio em edificações no novo Código Civil comentado. Rio de Janeiro: Renovar, 2004. p. 12.

Page 14: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Guilherme Damiani Nunes.pdf · UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE EDUCAÇÃO SUPERIOR

14

É de bom alvitre abrir um parêntese e esclarecer, mesmo que de maneira geral,

alguns conceitos sobre propriedade, visto que o condomínio na verdade é uma propriedade em

comum. Quer dizer, a propriedade exercida por mais de uma pessoa.

O artigo 1.225, I, do Código Civil descreve a propriedade como sendo um direito

real. Entende-se por direito real, aquele absoluto, oponível contra todos, exclusivo, que na

definição de RODRIGUES PEREIRA7 “é o que afeta a coisa direta e imediatamente, sob

todos ou sob certos respeitos, e a segue em poder de quem quer que a detenha.”

A teoria clássica e mais acolhida no ordenamento jurídico brasileiro, caracteriza

os direitos reais pela existência de três elementos: o titular da coisa, a coisa e a “inflexão

imediata do sujeito ativo sobre a coisa”, e descreve o direito real como sendo uma relação

jurídica entre a coisa e o homem8.

Desse modo, apresenta-se conceitos de propriedade singular. Assim, para WALD9

a propriedade é

[…] o mais amplo dos direitos reais, abrangendo a coisa em todos os seus aspectos. É o direito perpétuo de usar gozar e dispor de determinado bem, excluindo todos os terceiros de qualquer ingerência no mesmo.

Do mesmo modo, GOMES10 assegura que a propriedade “é o direito complexo,

perpétuo, exclusivo, pelo qual uma coisa fica submetida à vontade de uma pessoa, com as limitações

da lei”.

Enfim, a propriedade é um direito real, exclusivo, que vincula o bem ao

proprietário, e este possui dentro dos limites impostos pela lei o direito de usar, gozar e dispor

da coisa.

O Código Civil não conceitua propriedade, apenas descreve, no artigo 1.228, os

poderes atribuídos ao proprietário que, outros não são, senão o de usar, gozar, dispor e reaver

a coisa de quem a possua injustamente ou a detenha.

No que tange ao uso, este não significa que o proprietário obrigatoriamente

precise ocupar o bem, vez que o mesmo poderá ser ocupado por terceiros ou até ser deixado

vazio.

Já em relação à fruição, o proprietário, conforme VENOSA11, pode extrair do bem

benefícios e vantagens e até mesmo transferir a posse a terceiro sem qualquer interferência

dos outros condôminos. Prossegue ainda o mencionado doutrinador, que

7 PEREIRA, Lafayette Rodrigues. Direito das Coisas. 1. ed. atual. Campinas: Russel Editores, 2003. p. 25-26. 8 Cf. DINIZ, Maria Helena. Direito Civil Brasileiro: Direito das Coisas 18. ed. São Paulo: Saraiva, 2002. p. 12. 9 WALD, Arnoldo. Direito das Coisas.10. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1995. p. 98. 10 GOMES, Orlando. Direitos reais. 13. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1998. p. 97. .

Page 15: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Guilherme Damiani Nunes.pdf · UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE EDUCAÇÃO SUPERIOR

15

A faculdade de dispor envolve o poder de consumir o bem, alterar-lhe sua substância, aliená-lo ou grava-lo. É o poder mais abrangente, pois quem pode dispor da coisa dela também pode usar e gozar.

Exposto o conceito de propriedade tem-se uma maior noção do que seja

condomínio, já que uma diferença entre os dois, é que o condomínio é um direito coletivo de

propriedade, de um bem comum, ao mesmo tempo. E nos condomínios edilícios existe tanto a

propriedade individual, ou unidades autônomas quanto a propriedade coletiva. Na primeira, o

proprietário é o titular exclusivo e único, já na segunda todos os condomínios são donos e

podem desfrutar.

Feitas tais observações, retorna-se ao tema relativo a condomínio edilício, por

tratar-se do objeto central deste trabalho e, dada a necessidade de discorrer sobre a sua

conceituação e natureza jurídica.

1.3 CONCEITUAÇÃO E NATUREZA DOS CONDOMÍNIOS

A palavra condomínio vem do latim, tem origem em con + domínio, e significa

propriedade comum12.

Segundo RODRIGUES13, ocorre o condomínio quando dois ou mais sujeitos

ativos exercem o direito de propriedade, de sorte que, em face de terceiros o comunheiro atua

como proprietário exclusivo e ordinário, mas em face dos seus consortes os direitos são

equivalentes. Ressalta, ainda, que no uso da propriedade comum, nenhum dos condôminos

poderá invadir a área do interesse alheio.

Para J. M. Othon Sidou, citado por SOUZA, condomínio é:

[…] a propriedade em comum; compropriedade, na qual cada comproprietário pode usar livremente a coisa conforme seu destino, e exercer todos os direitos compatíveis com a indivisão, reinvidicá-la de terceiro e alhear ou gravar a respectiva parte indivisa14.

11 VENOSA, Silvio de Salvo. Direito Civil: direitos reais. 6. ed. v. 5. São Paulo: Atlas, 2006. p. 163. 12 FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Novo dicionário Aurélio da língua portuguesa. 3. ed. Curitiba: Positivo, 2004. p. 519. 13 RODRIGUES, Silvio. Direito Civil: direito das coisas. p. 195-196. 14Apud SOUZA, Agnaldo Celino. Condomínio em Edifícios: Manual do condômino. 3. ed. São Paulo: Atlas, 2001, p. 20.

Page 16: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Guilherme Damiani Nunes.pdf · UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE EDUCAÇÃO SUPERIOR

16

Na concepção de PEREIRA15, ter-se-á condomínio “quando a mesma coisa

pertence a mais de uma pessoa, cabendo a cada uma delas igual direito, idealmente, sobre o

todo e cada uma das partes”.

Dentre as espécies de condomínio16 destaca-se o condomínio edilício. Vale

ressaltar, antes de tudo, que os autores não chegaram a uma posição única ao tentar defini-lo,

a começar pela denominação.

De acordo com VENOSA17 a doutrina nacional e estrangeira faz menção a este

tipo de condomínio como propriedade horizontal, propriedade em planos horizontais,

condomínio sui generis, condomínio edilício. No entanto é pacífico entre os doutrinadores

que se trata de uma modalidade especial de condomínio.

O condomínio sui generis é composto pela reunião de diversas pessoas, que têm a

intenção de manter um número de bens para uso comum.

Na concepção de PEREIRA este tipo de condomínio se divide em dois tipos de

direitos reais de propriedade: a parte comum e a parte exclusiva dos condôminos. Expressa tal

entendimento com as seguintes palavras:

Propriedade individual, exclusiva, sobre a unidade autônoma, subordinada embora a sérias restrições[...] Condomínio sobre o solo, sobre os elevadores do edifício, sobre a caixa-d’água, sobre o saguão da entrada, sobre as partes enfim que interessam ao prédio como unidade arquitetônica.[...] A nosso ver há uma compropriedade e uma propriedade individual, que vivem juntas […]18

Na mesma esteira, DINIZ19 considera que na propriedade horizontal,

denominação adotada anteriormente ao advento do Código Civil, para designar o condomínio

edilício, há mais de um direito, sendo um de propriedade distinta e exclusiva e o outro

forçadamente comum. Observa ainda a doutrinadora que neste tipo de condomínio “tudo que

não for objeto de propriedade exclusiva pertence em condomínio aos donos dos apartamentos,

por ser complemento indispensável da propriedade de cada um”.

15 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de direito civil, 19. ed., v.4. São Paulo: Forense, 2005, p. 160. 16 Cita-se as duas espécies de condomínio, sejam elas, o condomínio tradicional ou ordinário e o condomínio edilício. 17 VENOSA, Silvio de Salvo. Direito Civil: direitos reais. 6. ed. São Paulo: Atlas, 2006. p. 335. 18 PEREIRA Caio Mario da Silva. Condomínio e Incorporações. 10.ed. Rio de Janeiro: Forense, 2000. p. 90. 19 DINIZ, Maria Helena. Direito Civil Brasileiro: Direito das Coisas. 2002, p. 200-201.

Page 17: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Guilherme Damiani Nunes.pdf · UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE EDUCAÇÃO SUPERIOR

17

Os direitos dos condôminos sobre a propriedade exclusiva, bem como sobre as

partes comuns, são inseparáveis, ou seja, indivisíveis, portanto não podem ser transferidos

separadamente20.

Atualmente, a matéria relativa à condomínio edilício é disciplinada pelo Código

Civil, no Livro III – Do Direito das Coisas, em seu Título III – Da Propriedade. O legislador

civil destinou o Capítulo VII para dispor sobre o condomínio edilício e, disciplina nos artigos

1.331 à 1.358 regras sobre as construções de um ou mais pavimento, composta de áreas

comuns e exclusivas dos condôminos.

Tema complexo a ser enfrentado refere-se a natureza jurídica dos condomínios,

especificamente, do condomínio edilício. A dificuldade da questão reside em enquadrá-lo ou

não, na categoria de pessoa jurídica como um ente personalizado. Certo é, que até o presente

momento, os doutrinadores não conseguiram fixar a sua natureza jurídica.

Nesse sentido pontifica SOUZA:

[…] a doutrina ainda não unificou entendimento a respeito, vislumbrou uma teoria que possa ser abraçada pela maioria dos juristas, o condomínio em edificações continua sendo direito real sui generis, mais se parecendo uma quase pessoa jurídica21.

Seguindo a linha de raciocínio da grande maioria dos doutrinadores, AVVAD22,

não considera a propriedade horizontal como sendo pessoa jurídica, pois falta-lhe os

requisitos necessários, como o affectio societatis e a definição legal que atribui essa qualidade

jurídica ao conjunto de condôminos e proprietários de uma mesma edificação.

Do mesmo modo, SOUZA23 defende não ser possível considerar o condomínio

como pessoa jurídica. Falta-lhe, autonomia, requisito essencial para definição legal. O

condomínio, apregoa o autor, “institui-se para organizar uma situação patrimonial expressiva

de um conjunto de direitos individuais e coletivos”.

Some-se o entendimento de VENOSA ao ponderar que ao condomínio faltam os

requisitos caracterizadores de uma pessoa jurídica, embora reconheça que existem outras

entidades com muitas das características de pessoas jurídica, sem que a elas lhe sejam

conferidas personalidade jurídica. Justamente por tal circunstância afirma que o condomínio

20 Cf. PEREIRA Caio Mario da Silva. Condomínio e Incorporações. p. 93. 21 SOUZA, Agnaldo Celino. Condomínio em Edifícios: Manual do condômino, p. 23. 22 AVVAD, Pedro Elias. Condomínio em edificações no novo Código Civil comentado. p. 24. 23 SOUZA, Agnaldo Celino. Condomínio em Edifícios: Manual do condômino, p. 23.

Page 18: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Guilherme Damiani Nunes.pdf · UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE EDUCAÇÃO SUPERIOR

18

de edifícios caracteriza-se por possuir “personificação anômala”, o que equivale a dizer, ter

personalidade restrita24.

É de salientar que a legislação civil considera o condomínio edilício um grupo

anômalo, sem personalidade jurídica definida, todavia, pode comprar, pagar, assumir

compromissos, contratar, recolher tributos e até ser parte ré ou autora de um processo. Enfim,

agir como sujeito de direito.

Esse é o posicionamento de KARPAT25 quando menciona que:

[ …] o condomínio tem capacidade de Direito Material e pode ter unidade autônoma registrada em seu nome: possui realidade jurídica para ingressar em juízo em seu nome próprio.

Já para MONTEIRO26, o atual Código Civil não aproveitou a oportunidade de

atribuir personalidade jurídica aos condomínios. Na concepção do autor, seria melhor o

condomínio possuir esta personalidade, pois assim participaria mais do mundo jurídico.

Assim expõe:

A nova lei perdeu a oportunidade de dar personalidade jurídica ao condomínio, tão necessária a esse instituto, que dela precisa para poder interagir com maior desenvoltura no mundo jurídico, principalmente no que tange à aquisição de bens imóveis que se possam incorporar ao prédio já existente. Como caso concreto podemos apontar, por exemplo, a impossibilidade da compra, em nome do condomínio, de terreno contíguo para ampliar as vagas de garagem, pela falta de personalidade jurídica, obrigando os próprios condôminos, se quiserem, a adquirir em seu nome a propriedade, o que muitas vezes inviabiliza o negócio.

É de se concluir que a dificuldade em se estabelecer a natureza jurídica do

condomínio edilício, confunde-se com a idéia de sujeito de direito, vez que no conceito de

sujeito de direito encontram-se as pessoas e algumas entidades27. Assim, o conceito de sujeito

de direito é mais amplo que o de pessoa, pois, nem todos os sujeitos são personalizados. Nem

todos os titulares de direitos e obrigações são dotados de personalidade jurídica e, nesta

situação encontra-se o condomínio edilício. Um ente despersonalizado, é bem verdade, mas

sujeito com capacidade de adquirir direitos e contrair obrigações, além de poder estar em

juízo como demandante ou demandado.

24 Cf. VENOSA, Silvio de Salvo. Direito Civil: direitos reais. p. 338. 25 KARPAT, Gabriel. Condomínios: orientação & prática. 7. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2002. p. 38. 26 MONTEIRO, Washington de Barros. Curso de Direito Civil: direito das coisas. p. 224. 27 Cita-se algumas entidades que atuam com as características de pessoa jurídica, mas que a lei não atribui personalidade jurídica, como por exemplo, o espólio, o consórcio, a massa falida, dentre outras.

Page 19: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Guilherme Damiani Nunes.pdf · UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE EDUCAÇÃO SUPERIOR

19

1.4 INSTITUIÇÃO DO CONDOMÍNIO

O condomínio em edificações pode ser instituído, segundo VENOSA28, de várias

maneiras, como em ato entre vivos ou em testamento, obrigatoriamente com transcrição no

Cartório de Registro de Imóveis. Do registro deve constar a individualização de cada unidade,

a determinação da fração ideal atribuída a cada uma relativamente ao terreno e partes comuns,

e o fim a que se destinam.

Nessa linha de raciocínio é correto afirmar que, a instituição é o ato com que o

condomínio se inicia e, é sempre um ato de vontade.

AVVAD29, por sua vez, pondera que o condomínio é instituído por um ato que

“institucionaliza a propriedade como condomínio especial, dando origem à conceituação das ‘partes’

da edificação que se constituem ‘propriedade exclusiva’ e das ‘partes’ que são ‘propriedade comum’”.

O Código Civil pátrio ao disciplinar a matéria de instituição por ato inter vivos ou

mortis causa, assim dispõe:

Art. 1.332. Institui-se o condomínio edilício por ato entre vivos ou testamento, registrado no Cartório de Registro de Imóveis, devendo constar daquele ato, além do disposto em lei especial: I – a discriminação e individualização das unidades de propriedade exclusiva, estremadas uma das outras e das partes comuns; II – a determinação da fração ideal atribuída a cada unidade, relativamente ao terreno e partes comuns; III - o fim a que as unidades se destinam.

A própria lei no caput do artigo supra citado, impõe que a instituição se realize

através do Registro de Imóveis, para que se projete o efeito erga omnes, ou seja, para que sua

eficácia seja oponível contra todos.

Para RODRIGUES30 o ato de instituição pode ser constituído sobre o prédio por

construir ou sobre o prédio construído. Observa que caberá ao proprietário a responsabilidade

de instituir o condomínio sobre prédio construído. Contudo, ao incorporador cabe inscrevê-lo

no Registro de Imóveis.

Vale, portanto, observar que, o ato oficial de instituição de condomínio tem o

propósito de imprimir eficácia erga omnes à convenção celebrada. Assim, é a convenção que

estabelece os direitos e obrigações dos condôminos.

28 Cf. VENOSA, Silvio de Salvo. Direito Civil: direitos reais. p. 341-342. 29 AVVAD, Pedro Elias. Condomínio em edificações no novo Código Civil comentado. p. 56. 30 Cf. RODRIGUES, Silvio. Direito Civil: direito das coisas. p. 213.

Page 20: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Guilherme Damiani Nunes.pdf · UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE EDUCAÇÃO SUPERIOR

20

1.5 CONVENÇÃO DE CONDOMÍNIO

Convenção de condomínio, nos ensinamentos de RODRIGUES31 é o instrumento

que evidencia os direitos e obrigações dos condôminos, ou seja, através deste instrumento o

condômino pode pleitear os seus direitos, tanto em juízo quanto fora dele.

Conforme preceitua o artigo 1.334, da Lei nº 10.406/02 (Código Civil), a

convenção determina e, também, faculta aos condôminos estipularem outras normas que

regulamentem o convívio entre eles.

Nesse aspecto, a convenção é própria de cada condomínio, ela pode inserir

normas que não sobreponham e nem conflitem com a lei. A esse respeito VENOSA32 afirma:

A convenção pode criar, por exemplo, um Conselho Disciplinar e estabelecer regras de uso das partes comuns etc. As disposições do Código, aparentemente mais simétricas incluem tudo que de mais sensível e mais importante deve constar da convenção. Tendo em vista o rumo que as questões condominiais têm tomado, bem como o sistema de penalidades trazido pelo novo Código, é importante que na convenção sejam estabelecidas as sanções a que estarão sujeitos os transgressores das regras condominiais, bem como o procedimento para sua imposição, este, mais apropriadamente, constante do regulamento.

Na mesma linha de raciocínio, PEREIRA33explica o porquê da importância de se

estabelecer a convenção do condomínio e, ensina:

Os problemas decorrentes da vizinhança próxima, a necessidade de regulamentar o comportamento dos que se utilizam dos apartamentos e usam as partes comuns, o resguardo do patrimônio coletivo, a imprescindibilidade de se coibir a conduta desrespeitosa aos direitos recíprocos dos co-proprietários, a desconformidade de padrões de educação destes, a conveniência de se estabelecer um regime harmônico de relações que elimine ou reduza ao mínimo as zonas de atritos implicam na instituição de um estatuto disciplinar das relações internas dos condôminos, ou convenção do condomínio.

A convenção, não vincula apenas os condôminos, mas também pessoas estranhas

que adentrem no edifício. Desse modo, as regras estabelecidas pela convenção devem ser

respeitadas e funcionam como uma norma interna e todos que ali estão devem estar sujeitos a

elas, sejam inquilinos, condôminos, ou terceiros34.

Apesar de parecer um contrato, porque nasce de um acordo de vontades, na

verdade, a Convenção se assemelha mais à lei, pois tem natureza normativa. Por isso, afirma

31 Cf. RODRIGUES, Silvio. Direito Civil: direito das coisas. p. 214. 32 VENOSA, Silvio de Salvo. Direito Civil: direitos reais. p. 345-346. 33 PEREIRA Caio Mario da Silva. Condomínio e Incorporações. p. 123. 34 Cf. SOUZA, Agnaldo Celino. Condomínio em Edifícios: Manual do condômino. p. 59.

Page 21: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Guilherme Damiani Nunes.pdf · UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE EDUCAÇÃO SUPERIOR

21

PEREIRA35, o seu efeito e a sua validade é ampliada, subordinando não apenas aos que a

assinaram, mas também, a todas as pessoas que utilizam o condomínio.

Diferente não é o posicionamento de AVVAD36 quanto ao caráter normativo da

Convenção de condomínio, vez que a compreende como:

[…] um contrato coletivo de natureza normativa, por isso que submete ao seu comando todos aqueles que assumirem alguma posição jurídica, em relação à propriedade autônoma, a que a lei atribua qualificação para sujeitar-se às normas convencionais. (grifo no original)

Reafirmando os ensinamentos dos autores supracitados MEZZARI37 pondera que

os doutrinadores são unânimes em acolher que a Convenção de condomínio tem uma natureza

especial. Diz o autor:

Na origem, tem natureza convencional – que pode ser tácita ou expressa - , devido à sua formação por acordo de vontade ou por adesão dos adquirentes. No entanto, após atingida sua eficácia plena, ela passa a se constituir em ato normativo, mas aproximando da lei do que do contrato.

Assim, a Convenção de condomínio não se confunde com os contratos devido à

sua natureza normativa e institucional38.

De conformidade com a regra do artigo 1.333, do Código Civil, a obediência à

determinados requisitos são necessários à constituição da convenção. Primeiramente deve ser

aprovada por titulares de pelo menos dois terços das frações ideais e, conseqüentemente, para

ter caráter erga omnes, isto é, para ser oponível a terceiros, a inscrição no Cartório de Registro

de Imóveis torna-se imprescindível.

Há que se concluir que a Convenção do condomínio trata, além das formas de

gestão, dos direitos e deveres do condomínio. Por isso, a inserção de normas específicas são

de suma importância para determinar o dever jurídico de ações e omissões da entidade

condominial. Desse modo, pode-se dizer que a Convenção Condominial é a “lei”que regula as

relações dos condôminos entre si e, destes, perante terceiros.

35 PEREIRA Caio Mario da Silva. Condomínio e Incorporações. p. 125. 36 AVVAD, Pedro Elias. Condomínio em edificações no novo Código Civil comentado. p. 62. 37 MEZZARI, Mário Pazutti. Condomínio e incorporação no registro de imóveis. p. 312. 38 LOPES, João Batista. Condomínio. 6. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1997. p. 73.

Page 22: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Guilherme Damiani Nunes.pdf · UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE EDUCAÇÃO SUPERIOR

22

1.6 DOS CONDÔMINOS E DO SÍNDICO

1.6.1 Direitos e deveres dos condôminos

A harmonia social, quando se leva uma vida em sociedade só é obtida através da

existência de direitos e deveres, o respeito a essas normas que se estabelecem é o que

possibilita a convivência. E no condomínio edilício não é diferente, pelo contrário, por ser

uma comunidade restrita os condôminos devem respeitar os seus direitos e deveres.

O condômino, como demonstra o artigo 1.335 do Código Civil39, possui direitos

perante a propriedade individual bem como à propriedade coletiva. Nesse sentido, o citado

dispositivo legal, assegura aos condôminos o direito de usar, fruir e livremente dispor de suas

unidades, assim como, de usar das partes comuns e de votar nas deliberações assembleares,

desde que esteja quites com as taxas condominiais.

Vale lembrar que ao lado dos direitos, figuram as obrigações e, nas relações

condominiais, o condômino deve cumprir com sua obrigação de contribuir para as despesas

condominiais. Além disso, o proprietário de determinada unidade condominial tem o dever de

respeitar a propriedade em comum, não realizando obras que comprometam a segurança da

edificação ou que venham a alterar a forma externa da co-propriedade. Deve, em síntese,

utilizar a sua propriedade privada de forma a não prejudicar a propriedade comum40.

Ademais, a finalidade do edifício bem como as suas restrições são instituídas pela

convenção41, da qual decorre as regras gerais de direitos e obrigações dos moradores no

intuito de salvaguardar seu patrimônio.

1.6.2 Das atribuições do Síndico

O síndico é a pessoa física ou jurídica que gerencia os interesses e negócios do

condomínio e pode ser ou não morador do prédio, é ele quem o representa tanto em juízo

quanto fora dele, ou seja, é ele que responde pelo condomínio42.

39 BRASIL. Código Civil. “Art. 1.335. São direitos dos condôminos. I – usar, fruir e livremente dispor das suas unidades; II – usar das partes comuns, conforme a sua destinação, e contanto que não exclua a utilização dos demais compossuidores; III – votar nas deliberações da assembléia e delas participar, estando quite”. 40 BRASIL. Código Civil. “Art. 1.336. São deveres do condômino: I - contribuir para as despesas do condomínio na proporção das suas frações ideais, salvo disposição em contrário na convenção; II - não realizar obras que comprometam a segurança da edificação; III - não alterar a forma e a cor da fachada, das partes e esquadrias externas; IV - dar às suas partes a mesma destinação que tem a edificação, e não as utilizar de maneira prejudicial ao sossego, salubridade e segurança dos possuidores, ou aos bons costumes. 41 Cf. MALUF, Carlos Aberto Dabus. O Condomínio Edilício no novo Código Civil. p. 68. 42 Cf. MALUF, Carlos Aberto Dabus. O Condomínio Edilício no novo Código Civil. p. 107.

Page 23: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Guilherme Damiani Nunes.pdf · UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE EDUCAÇÃO SUPERIOR

23

A esse respeito FERREIRA43 assevera que o síndico é a “pessoa escolhida pelos

condôminos para tratar dos interesses e da administração do imóvel.” Assim sendo, é eleito

pelos condôminos, em assembléia geral, para administrar o bem jurídico denominado

condomínio.

Por isso a lei civil44 confere ao síndico uma série de atribuições, das quais cabe,

para o objetivo do presente trabalho, destacar o dever de “representar, ativa e passivamente, o

condomínio, praticando, em juízo ou fora dele, os atos necessários à defesa dos interesses

comuns” e, de “diligenciar a conservação e a guarda das partes comuns e zelar pela prestação

de serviços que interessem aos possuidores”.

Consoante se depreende do acima exposto, a norma legal impõe ao síndico

obrigações e responsabilidades, tanto nas funções de cunho administrativo como

representativa, vez que é ele quem trata dos interesses dos moradores em condomínio.

Na observação de SOUZA45, o síndico, em razão da sua função, tem o dever de

garantir a segurança do ambiente coletivo, a conservação das áreas comuns e o bom

funcionamento dos serviços. Se se omite ou não realiza de forma adequada alguma dessas

funções, pode responder civilmente pelos atos de omissão.

Há ainda que se considerar que no comportalhamento de propriedade e,

conseqüentemente, na administração para a proteção da mesma, medidas de segurança devem

ser implementadas para a proteção da propriedade em comum. Especialmente, nos dias atuais

as pessoas, estão constantemente sujeitas a sofrer ações danosas em seu patrimônio. Os

sistemas jurídicos prevêem a reparação do dano em favor daquele que foi lesado.

Por isso, passa-se a abordar, no capítulo a seguir, o instituto da responsabilidade

civil, para na derradeira parte deste trabalho, analisá-la sob o prisma da responsabilidade civil

do condomínio na reparação de dano causado à propriedade individual de condômino.

43 FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Novo dicionário Aurélio da língua portuguesa. 2004. p. 1851. 44 BRASIL. Código Civil. “Art. 1.348. Compete ao síndico: I - convocar a assembléia dos condôminos; II - representar, ativa e passivamente, o condomínio, praticando, em juízo ou fora dele, os atos necessários à defesa dos interesses comuns; III - dar imediato conhecimento à assembléia da existência de procedimento judicial ou administrativo, de interesse do condomínio; IV - cumprir e fazer cumprir a convenção, o regimento interno e as determinações da assembléia; V - diligenciar a conservação e a guarda das partes comuns e zelar pela prestação dos serviços que interessem aos possuidores; VI - elaborar o orçamento da receita e da despesa relativa a cada ano; VII - cobrar dos condôminos as suas contribuições, bem como impor e cobrar as multas devidas; VIII - prestar contas à assembléia, anualmente e quando exigidas; IX - realizar o seguro da edificação”. 45 Cf. SOUZA, Agnaldo Celino. Condomínio em Edifícios: Manual do condômino. p. 123.

Page 24: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Guilherme Damiani Nunes.pdf · UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE EDUCAÇÃO SUPERIOR

24

2 RESPONSABILIDADE CIVIL

2.1 DELINEAMENTO HISTÓRICO

Para dar início ao estudo da responsabilidade, cabe remontar historicamente as

noções que antecederam e deram origem ao que hoje denomina-se responsabilidade civil.

Também se faz necessária uma análise dos elementos componentes da sua estrutura, para que

a compreensão acerca do tema desenvolva-se de maneira adequada.

A importância deste assunto dentro do direito pode ser medida através dos

inúmeros termos que podem ser usados para referir-se à responsabilidade civil. Assim

MONTENEGRO46 ressalta que:

[…] essa diversidade de linguagem provém ora dos três sistemas doutrinários que têm inspirado o desenvolvimento da matéria, ou seja, o francês (dèlits e quase dèlits; acte illicite, faute, responsabilité), o alemão (Unerlaubte Handlungen, Haftung, Schadenersatzrecht), o inglês (torts, liability, responsability), ora da escolha da natureza dos fenômenos postos a foco.

Citado doutrinador lembra, ainda, que “o conceito de responsabilidade deflui de

uma síntese unitária de submissão às conseqüências desfavoráveis dos próprios atos”47.

VENOSA48 complementa a idéia ao afirmar que:

O termo responsabilidade, embora com sentidos próximos e semelhantes, é utilizado para designar várias situações no campo jurídico. A responsabilidade, em sentido amplo, encerra a noção em virtude da qual se atribui a um sujeito o dever de assumir as conseqüências de um evento ou de uma ação. (...) Na responsabilidade civil, o que interessa saber é a responsabilidade que reflete na obrigação de indenizar.

Voltando o tempo, aos primórdios da civilização, perceber-se que é inerente à

natureza humana reprimir qualquer mal causado de forma injusta a outrem. Inicialmente, a

forma de repressão utilizada pela sociedade primitiva era uma reação imediata e violenta ao

mal causado injustamente.

Esta forma primária de reparação ao dano causado foi chamada de vingança

privada. Retratava o sentimento de justiça, uma maneira de reparar o dano causado49. O

46 MONTENEGRO, Antônio Lindnergh C. Responsabilidade Civil. 2. ed. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 1996, p. 3. 47 MONTENEGRO, Antônio Lindnergh C. Responsabilidade Civil, p. 3. 48 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil: responsabilidade civil. 2. ed. São Paulo: Atlas, 2002, p. 12.

Page 25: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Guilherme Damiani Nunes.pdf · UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE EDUCAÇÃO SUPERIOR

25

elemento culpa, nessa época, era sequer cogitado, e ainda, inexistiam regras e limitações do

Estado, ou seja, o direito ainda não se fazia presente.

Ressalte-se, por oportuno, a famosa lei de Talião, a qual enunciava “olho por olho,

dente por dente”, e que foi uma evolução desta chamada “vingança privada”. Era a punição do

mal causado com o próprio mal. PEREIRA dá exemplos da idéia de reparação do dano nas

mais antigas civilizações, ao asseverar que

[…] vem do ordenamento mesopotâmico, como do Código de Hamurabi, a idéia de punir o dano, instituindo contra o causador um sofrimento igual; não destoa o código de Manu, nem difere essencialmente o antigo direito Hebreu50.

Segundo Fréderic Girard, é sabido que o direito brasileiro contemporâneo

encontra suas mais importantes estruturas no direito romano. Em razão disso, não se pode

deixar de analisar a evolução da noção de responsabilidade civil dentro deste sistema. Afirma

que a vingança privada dominava a idéia primitiva de punição a alguém que causasse

injustamente um mal a outrem. Até aí, as idéias de responsabilidade civil e penal encontram-

se fundidas, quase sem nenhuma diferença entre elas. Evoluída essa noção, aparecem então as

idéias de composição voluntária, as composições legais e a reparação em que o Estado

também se mostra como interessado em reprimir danos causados contra os particulares51.

Importa ressaltar que a figura da responsabilidade civil, como se tem hoje, não

chegou a ser plenamente desenvolvida dentro do ordenamento romano. Não houve uma

distinção clara entra as idéias de punição e reparação, como ocorre nos dias atuais. No

entanto, nas palavras de VENOSA, a Lex Aquilia

[…] é o divisor de águas da responsabilidade civil. Esse diploma, de uso restrito a princípio, atinge dimensão ampla na época de Justiniano, como remédio jurídico de caráter geral; como considera o ato ilícito uma figura autônoma, surge, desse modo, a moderna concepção da responsabilidade extracontratual. O sistema romano de responsabilidade extrai da interpretação da lex aquilia o princípio pelo qual se pune a culpa por danos injustamente provocados, independentemente de relação obrigacional preexistente52.

Não restam dúvidas que o advento da Lex Aquilia contribuiu de maneira

fundamental para o desenvolvimento do conceito de responsabilidade civil.

A esse respeito pontifica PEREIRA:

49Cf. MONTENEGRO, Antônio Lindnergh C. Responsabilidade Civil. p. 3. 50 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Responsabilidade Civil, 9. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1998, p. 1. 51 Apud PEREIRA, Caio Mário da Silva. Responsabilidade Civil, p. 2-3. 52 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil: responsabilidade civil, p.17-18.

Page 26: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Guilherme Damiani Nunes.pdf · UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE EDUCAÇÃO SUPERIOR

26

[…] tão grande revolução que a ela se prende a denominação de aquiliana para designar-se a responsabilidade extracontratual em oposição à contratual. Foi um marco tão acentuado, que a ela se atribui a origem do elemento “culpa” como fundamental na reparação do dano. O agente não seria responsabilizado se inexistisse a culpa. A Lex Aquilia,bem assim a conseqüente actio ex lege Aquilia, tem sido destacada pelos romanistas e civilistas, em matéria atinente à responsabilidade civil53.

No entanto, cumpre ressaltar que a Lex Aquilia era essencialmente casuística, e

admitia-se a sua aplicação, e conseqüentemente, a responsabilização, apenas nos casos ali

previstos.

Considerando, ainda, a importância da Lex Aquilia, PEREIRA54, citando José

Carlos Moreira Alves, manifesta-se acerca da discussão doutrinária quanto a presença ou não

da idéia de culpa dentro dela. Diz tratar-se de elemento fundamental para a reparação do dano.

Afirma filiar-se a corrente daqueles que sustentam a presença do elemento culpa na Lex

Aquilia, tendo em vista a necessidade da determinação de três elementos para caracterizar a

responsabilização: “a) damnum, ou lesão na coisa; b) iniuria,ou ato contrário ou direito; c)

culpa, quando o dano resultava de ato positivo do agente praticado com dolo ou culpa”.

Porém, PEREIRA55 assegura que foi a partir do Código de Napoleão que o

conceito de responsabilidade passou a ser aperfeiçoado e desenvolvido nas linhas que se têm

atualmente. O referido diploma assim dispôs em seu artigo 1.382: Tout fait quelconque de

l´homme, qui cause à autrui um dommage, oblige celui par la faute duquel il est arrivé, à le

réparer56.

A tendência de relacionar a reparação apenas a casos especiais começa a

desaparecer, e a noção de dano passou a ter um enfoque muito maior. Juntando-se a esse

dispositivo do código francês, os enunciados do artigos 1.384 a 1.386, inauguram a primeira

noção de responsabilidade fora do princípio subjetivo de culpa57.

O direito brasileiro, influenciado especialmente pelas idéias do Código Civil

Francês, calcou a responsabilidade civil na idéia da culpa, consoante se constata pelo

enunciado do artigo 159 do Código Civil de 1916, in verbis:

Art. 159. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito, ou causar prejuízo a outrem, fica obrigado a reparar o dano.

53 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Responsabilidade Civil, p. 3-4. 54 Apud PEREIRA, Caio Mário da Silva. Responsabilidade Civil. p. 5- 6. 55 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Responsabilidade Civil, p. 6. 56 Qualquer ato do homem que cause dano a outrem obriga-o, por essa falta, a repará-lo. [ Tradução livre]. 57 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Responsabilidade Civil, p. 6.

Page 27: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Guilherme Damiani Nunes.pdf · UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE EDUCAÇÃO SUPERIOR

27

Percebe-se, portanto, que a responsabilidade expressa naquele diploma, além de

fundar-se na culpa, também admitia a sua presunção e, somente nos casos expressamente

previstos em lei admitia-se a responsabilidade de indenizar, sem a indagação de culpa,

também chamada de responsabilidade objetiva58.

O Código Civil atual também consagrou a responsabilização subjetiva em

decorrência de ato ilícito, no artigo 186. A regra, praticamente manteve a mesma redação do

antigo diploma, acrescentando, contudo, a reparação ao dano moral59.

As tendências atuais de responsabilização civil variam conforme o

desenvolvimento da sociedade. Assim, a teoria da responsabilidade transcendeu os limites da

culpa e, firmou-se no dever de reparação do dano60. A partir de então, o Código Civil passou a

adotar, mediante previsão legal expressa ou de risco da atividade do agente, a

responsabilidade civil objetiva.

2.2 CONCEITUAÇÃO

A palavra responsabilidade tem origem em respondere, na acepção de assegurar,

afiançar. “É a obrigação por parte de alguém, de responder por alguma coisa resultante de

negócio jurídico ou ato ilícito”61.

É esse também o entendimento de DINIZ ao explicitar que:

[…] a responsabilidade é uma obrigação de reparar um dano, seja por decorrer de uma culpa ou de outra circunstância legal que a justifique, como a culpa presumida, ou por uma circunstância meramente objetiva62.

Mister ressaltar, antes de tudo, que a doutrina civilista não adota uma posição

única ao tentar definir a responsabilidade civil. Para PEREIRA63, alguns, de maneira

equivocada, procuram assentar o conceito no próprio vocábulo de responsabilidade,

atribuindo à responsabilidade civil o mesmo significado de obrigação. É o que destaca:

58 Cf. MONTENEGRO, Antônio Lindnergh C. Responsabilidade Civil. p. 8. 59 BRASIL. Lei n. 10.406, de 10 de janeiro de 2002. “Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.” 60 Cf. PEREIRA, Caio Mário da Silva. Responsabilidade civil, p. 7-11. 61 SIDOU, J. M. Othon. Dicionário jurídico: Academia Brasileira de Letras Jurídicas. 8. ed. rev. amp. e atual. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2003 p. 465. 62 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro. v. 3, 4. ed. amp. e atual. de acordo com o novo código civil. São Paulo: Saraiva, 2002 p. 39. 63 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Responsabilidade Civil, p. 7.

Page 28: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Guilherme Damiani Nunes.pdf · UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE EDUCAÇÃO SUPERIOR

28

[…] alguns incidem no defeito condenado pela lógica, de definir usando o mesmo vocábulo a ser definido, e dizem que a ‘responsabilidade’ consiste em ‘responder’, […]. Outros estabelecem na conceituação de responsabilidade a alusão a uma das causas do dever de reparação, atribuindo-a ao fato culposo do agente; outros, ainda, preferem não conceituar.

Para CAVALIERI FILHO64, obrigação distingue-se de responsbilidade. Nesse

sentido observa que: “Obrigação é sempre um dever jurídico originário; responsabilidade é

um dever jurídico sucessivo, conseqüente à violação do primeiro”.

NORONHA65 analisa o termo obrigação sobre múltiplos significados, mas, fixa-

se no sentido restrito ou técnico que lhe é atribuído. Concebe que o direito das obrigações

disciplina “as relações de intercâmbio de bens entre as pessoas e de prestação de serviços”, o

que denomina de “obrigações negociais”, a de “reparação de danos que umas pessoas causem

a outras” denominado-a “responsabilidade civil geral, ou em sentido estrito” e, ainda, o

“enriquecimento sem causa” que resulta na obrigação de uma pessoa devolver ao seu

respectivo titular, benefícios que obteve, indevidamente, “com o aproveitamento de bens ou

direitos de outras pessoas”.

Sem dúvida, não se deve confundir obrigação com responsabilidade, pois,

segundo GAGLIANO66, a relação jurídica obrigacional afasta qualquer espécie de direito

subjetivo, alcançando somente os de conteúdo econômico.

Obrigação, no sentido estrito, corresponde a um dever que tem o sujeito passivo

de satisfazer uma prestação positiva ou negativa em favor do credor, enquanto que configura-

se a responsabilidade quando há inadimplemento da prestação pactuado pelo devedor67.

Feitas tais observações a respeito das categorias obrigação e responsabilidade,

interessa abordar o conceito da responsabilidade civil.

Concebe NORONHA68 que a responsabilidade civil decorre da obrigação de

reparar danos, sejam eles “causados à pessoa ou ao patrimônio de outrem, ou danos causados

a interesses coletivos, ou transindividuais, sejam eles difusos, sejam coletivos strictu sensu”.

Caracteriza-a, sob dois aspectos, um amplo e outro restrito.

64 CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de responsabilidade civil. 3. ed. São Paulo: Malheiros, 2003. p. 24. 65 Cf. NORONHA, Fernando. Direito das obrigações: fundamentos do direito das obrigações: introdução à responsabilidade civil. São Paulo, Saraiva, 2003, p.8. 66 Cf. GAGLIANO, Pablo Stolze. PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de direito civil: Obrigações, v.2. São Paulo:Saraiva, 2002, p.4. 67 Cf. GAGLIANO, Pablo Stolze. PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de direito civil: Obrigações, p. 11. 68 NORONHA, Fernando. Direito das obrigações: fundamentos do direito das obrigações: introdução à responsabilidade civil. São Paulo, Saraiva, 2003, p.429.

Page 29: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Guilherme Damiani Nunes.pdf · UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE EDUCAÇÃO SUPERIOR

29

A acepção ampla, diz o autor, “consiste na obrigação de reparar quaisquer danos

antijuricamente causados a outrem” e, em sentido estrito, a obrigação também consiste na

reparação de danos antijurídicos69 resultantes de violação, ainda que não culposa70.

STOCO71, por sua vez, ensina que:

[…] a responsabilidade civil traduz a obrigação da pessoa física ou jurídica ofensora de reparar o dano causado por conduta que viola um dever jurídico preexistente de não lesionar – neminem laedere – implícito ou expresso na lei.

Em apertada síntese, pode-se concluir que a responsabilidade civil surge a partir

de um dano causado a um bem juridicamente tutelado e que uma pessoa tem o dever jurídico

de responder pela violação a esse bem jurídico.

Mas, antes de principiar a abordagem da responsabilidade civil, deve-se traçar

breves considerações a respeito de ato ilícito.

2.3 O ATO ILÍCITO COMO PRESSUPOSTO DA RESPONSABILIDADE CIVIL

O ato ilícito é considerado o principal elemento da responsabilidade civil, pois é

tido como o fato gerador da responsabilidade civil subjetiva. Acentua PEREIRA que “os

fatos humanos compreendem especificamente o conceito genérico de ato jurídico, que

abrange todo comportamento apto a gerar efeitos jurídicos”72.

A doutrina tem reconhecido a dificuldade em conceituar o ato ilícito. No entanto,

dentre as diversas definições criadas, é possível observar elementos comuns, como a ligação

entre o conceito de ato ilícito e o conceito de culpa.

Entretanto, com isso, criou-se uma dificuldade, pois seguindo este raciocínio,

quando não houvesse culpa não haveria ato ilícito. E assim, ao tratar de responsabilidade

objetiva, a qual não se cogita culpa, encontrar-se-ia uma enorme lacuna.

69 Os termos “antijurídico” ou “ilícito” compartam designações diversas. Ilícito ou ilicitude, na acepção ampla, significa uma ação que contraria comandos legais e, portanto, exige conduta dolosa ou culposa, enquanto que antijurídico ou antijuridicidade, significa que o fato humano decorrente de ação, omissão ou até mesmo de fato natural, ofende direitos de outrem de modo contrário ao ordenamento jurídico. Cf. NORONHA, Fernando. Direito das obrigações: fundamentos do direito das obrigações: introdução à responsabilidade civil, p.470-471. 70 Cf. NORONHA, Fernando. Direito das obrigações: fundamentos do direito das obrigações: introdução à responsabilidade civil, p. 431. 71 STOCO, Rui. Tratado de responsabilidade civil: com comentários ao Código Civil de 2002. 6. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2004. p. 119. 72 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Responsabilidade Civil. p. 28.

Page 30: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Guilherme Damiani Nunes.pdf · UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE EDUCAÇÃO SUPERIOR

30

Para tentar superar esta dificuldade, uma parte dos autores, assim como

CAVALIERI FILHO73, sustenta que a “responsabilidade subjetiva sempre estaria ligada a um

ilícito, ao passo que a responsabilidade objetiva estaria ligada a um comportamento lícito.”

Ressalte-se, entretanto, que não é possível configurar, em todos os casos de

responsabilidade objetiva, o ato lícito. Existem casos em que ocorre a violação de um dever

jurídico, em sede de responsabilidade objetiva. Ademais, são poucos os casos de indenização

por ato lícito, ficando estas restritas aos casos expressamente previstos em lei.

Sem discrepar da posição acima explicitada, NORONHA74 esclarece que a

responsabilidade civil contempla diversos casos em que uma pessoa tenha de “reparar danos

causados a outrem, mesmo sem existir qualquer culpa”. Essa é a que se designa de

“responsabilidade objetiva, ou pelo risco”, enquanto que a modalidade de responsabilidade

civil subjetiva, ou culposa, decorre da prática de atos ilícitos.

Por tudo isso, para se compreender o âmbito de abrangência da responsabilidade

civil, deve-se ter sempre presente que ela objetiva reparar todos os danos causados a terceiros

e que contrariem o ordenamento, de modo a afetar “negativamente situações que eram

juridicamente tuteladas”75.

Há, todavia, alguns aspectos que devem ser considerados para compreender o ato

ilícito. Esses aspectos serão abordados no próximo tópico.

2.3.1 O duplo aspecto da ilicitude

A ilicitude pode ser considerada segundo dois aspectos: um aspecto objetivo e

outro aspecto subjetivo. No primeiro, leva-se apenas em conta a conduta do agente, o fato em

si, e seu resultado nocivo. É constatada a violação de uma norma jurídica, resultante da

contrariedade ao direito76.

Já no aspecto subjetivo, a conduta tida como ilícita sofre uma valoração, e a

“ilicitude só atinge sua plenitude quando a conduta contrária ao valor que a norma visa a

atingir (ilicitude objetiva) decorre da vontade do agente; ou, em outras palavras, quando o

comportamento objetivamente ilícito for também culposo.”77

73 CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de responsabilidade civil. p. 30. 74 Cf. NORONHA, Fernando. Direito das obrigações: fundamentos do direito das obrigações: introdução à responsabilidade civil, p. 433-434. 75 Cf. NORONHA, Fernando. Direito das obrigações: fundamentos do direito das obrigações: introdução à responsabilidade civil, p. 443. 76 Cf. STOCO, Rui. Tratado de responsabilidade civil: com comentários ao Código Civil de 2002, p. 30-31. 77 CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de responsabilidade civil. p. 31.

Page 31: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Guilherme Damiani Nunes.pdf · UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE EDUCAÇÃO SUPERIOR

31

Note-se, ainda, que ato ilícito contempla âmbitos de abrangência, um no sentido

restrito – stricto sensu – e, outro no sentido amplo – lato sensu –. Tema que se tratará a

seguir.

2.3.2 Ato ilícito stricto sensu e ato ilícito lato sensu

A responsabilidade civil surge a partir de um conjunto de pressupostos que, ao

interagirem, fazem surgir a obrigação de indenizar.

Consoante CAVALIERI FILHO78, “em sentido estrito, o ato ilícito é o conjunto

de pressupostos da responsabilidade” fundamentados na culpa, no dano e no nexo de

causalidade. Enquanto que o ato ilícito em sentido amplo decorre da conduta humana que

viola uma norma jurídica, uma conduta contrária ao direito, que não leva em conta qualquer

aspecto subjetivo. É a manifestação humana contrária ao direito.

A concepção de NORONHA, quanto aos requisitos ou pressupostos da

responsabilidade civil, é mais ampla do que a maioria da doutrina e jurisprudência. Identifica

cinco pressupostos para a responsabilidade civil, que são: “dano, cabimento no âmbito de

proteção de uma norma, fato gerador, nexo de causalidade e nexo de imputação”.

E, esclarece:

O fato causador da responsabilidade terá, assim, de ser antijurídico e deverá poder ser imputado a alguém; o dano, por sua vez, há de ser efetivo e deverá ter sido causado pelo fato gerador; além disso (e este será o último requisito), o dano deverá constituir lesão de um dos bens que a ordem jurídica queria proteger79.

O Código Civil de 1916 consagrava, em seu artigo 159, a teoria subjetiva. Os

casos de responsabilidade objetiva eram tratados, expressamente em alguns artigos

específicos. Já o diploma atual abrange tanto a teoria objetiva (artigo 927, parágrafo único)

quanto a teoria subjetiva (artigos 927, caput, 186 e 187). A primeira aplicada nas relações

entre o indivíduo e o Estado ou determinado grupo, e a segunda incidindo nas relações

interindividuais.

O ato ilícito será sempre uma conduta, um comportamento humano. E, quando se

tratar de responsabilidade subjetiva, a culpa se fará presente entre seus elementos. Mas no

78 CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de responsabilidade civil. p. 32. 79 Cf. NORONHA, Fernando. Direito das obrigações: fundamentos do direito das obrigações: introdução à responsabilidade civil, p. 469.

Page 32: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Guilherme Damiani Nunes.pdf · UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE EDUCAÇÃO SUPERIOR

32

caso da responsabilidade objetiva, o ato ilícito, em sentido amplo, será suficiente para a

configuração desta responsabilização.

É possível então concluir que apenas a prática de uma conduta que venha a

prejudicar outrem não basta para ensejar qualquer tipo de indenização. Faz-se necessária a

violação de um dever jurídico pré-existente, mister, então, que exista a ilicitude.

A partir dessa idéia, passa-se a abordar, no tópico seguinte, as modalidades de

responsabilidade civil, a subjetiva e a objetiva.

2.4 RESPONSABILIDADE CIVIL SUBJETIVA E OBJETIVA

De acordo com a doutrina predominante, a responsabilidade civil classifica-se em

duas modalidades: a responsabilidade subjetiva e a responsabilidade objetiva. A presença da

culpa, como fator que levou à causa do dano, será o elemento que vai distinguir entre estas

duas espécies de responsabilidade.

Em primeiro lugar, não se pode olvidar que o ordenamento jurídico prescreve

alguns casos em que a reparação será obrigatória, independente da existência de culpa. Mas

estes são casos previstos expressamente pelo legislador. De acordo com PEREIRA, “não será

sempre que a reparação do dano se abstrairá do conceito de culpa, porém quando o autorizar a

ordem jurídica positiva” 80.

Partindo daí, verifica-se a presença dos três componentes da responsabilidade

civil: a conduta, a violação de uma norma e uma reação (sanção).

MONTENEGRO81, neste sentido, ensina que “comprovada a existência desses

requisitos em um dado caso, surge um vínculo de direito por força do qual o prejudicado

assume a posição de credor e o ofensor a de devedor, em outras palavras, a responsabilidade

civil.”

Assim, a responsabilidade civil tem como base dois princípios norteadores: o da

culpa e o do risco. Nos casos de responsabilidade subjetiva tem-se a culpa como pressuposto.

Em não havendo culpa, não há responsabilidade. Enquanto que o risco é o princípio que

prepondera na responsabilidade objetiva, porque a lei impõe a certas pessoas, em situações

específicas, a reparação de um dano cometido sem culpa.

80 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de direito civil. Contratos – Declaração unilateral de vontade e Responsabilidade civil. 11. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2003. p. 562. 81 MONTENEGRO, Antônio Lindnergh C. Responsabilidade Civil. p. 8.

Page 33: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Guilherme Damiani Nunes.pdf · UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE EDUCAÇÃO SUPERIOR

33

Entretanto, a doutrina para uma melhor compreensão do fenômeno jurídico,

costuma classificar a responsabilidade civil em contratual e extracontratual.

É sabido que quando uma pessoa viola um dever jurídico, em sentido amplo,

produz um dano a outrem e, como conseqüência fica obrigado a reparar o dano causado, isto

é, tem o dever de indenizar. Neste caso, o transgressor de um dever de conduta, pontifica

VENOSA82, “com ou sem contrato, pode ser obrigado a ressarcir o dano. O dever violado

deve ser o ponto de partida, não importando se dentro ou fora de uma relação contratual”.

A existência ou não de uma obrigação pré-existente, decorrente de um contrato,

por exemplo, é que vai ser o marco divisor destas duas espécies de responsabilidade. Se

houver, então, relação obrigacional anterior, provinda de um contrato, restará configurada a

responsabilidade civil contratual. Mas se, pelo contrário, o dever de indenizar surgir sem que

exista qualquer relação obrigacional entre as partes, teremos a responsabilidade civil

extracontratual.

A respeito do assunto ensina CAVALIERI FILHO83:

Se preexiste um vínculo obrigacional, e o dever de indenizar é conseqüência do inadimplemento, temos a responsabilidade contratual, também chamada de ilícito contratual ou relativo; se esse dever surge em virtude de lesão a direito subjetivo, sem que entre o ofensor e a vítima preexista qualquer relação jurídica que o possibilite, temos a responsabilidade extracontratual, também chamada de ilícito aquiliano ou absoluto.

Frise-se aqui que, por vezes, torna-se difícil configurar a existência ou não de uma

relação obrigacional, pois a presença de um contrato não se mostra de forma tão clara.

Existem casos em que se questiona a presença da referida relação obrigacional pré-existente.

Porém, tanto na responsabilidade contratual quanto na extracontratual, configura-se a violação

de um dever jurídico anterior. A diferença apenas reside na presença ou não deste dever em

uma relação obrigacional, como em um contrato.

2.4.1 Responsabilidade subjetiva e seus pressupostos

Na responsabilidade subjetiva, também denominada de responsabilidade por atos

ilícitos ou aquiliana, o lesado só será indenizado se provar que o agente teve culpa no evento

danoso. Assim, a prova da culpa, compreendendo-se esta como categoria abrangente do dolo,

passa a ser esta o pressuposto necessário do dano a ser indenizado.

82 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil: responsabilidade civil, p. 20. 83 CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de responsabilidade civil, p 37.

Page 34: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Guilherme Damiani Nunes.pdf · UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE EDUCAÇÃO SUPERIOR

34

Nesse sentido pontifica PEREIRA84: “o ressarcimento do prejuízo não tem como

fundamento um fato qualquer do homem; tem cabida quando o agente procede com culpa”.

Assim, responsabilidade subjetiva, ou culposa, que também recebe a denominação

de responsabilidade civil por atos ilícitos, ou aquiliana é, a obrigação, segundo NORONHA85

de:

[…] reparar danos causados por ações ou omissões intencionais (ou seja, dolosas), imperitas, negligentes ou imprudentes (isto é, culposas), que violem diretos alheios. É ela que constitui o regime-regra da responsabilidade civil, como está claro no art. 927, caput, do Código Civil.

Coloca-se, então, segundo o Código Civil, o conceito de responsabilidade

subjetiva:

Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo.

Pode-se observar, portanto, que não haverá responsabilização enquanto não

comprovada a culpa do agente, e segundo o artigo 186, do mesmo diploma legal, o ato ilícito

tem como elementos a ação ou omissão voluntária, a negligência ou imprudência, em violar

direito e causar dano a terceiro, ainda que este dano seja exclusivamente moral.

Diante disso, pode-se destacar os chamados pressupostos da responsabilidade

civil subjetiva, quais sejam: a conduta culposa, o nexo causal e o dano.

O primeiro deles caracteriza-se pela culpa ou dolo do agente. Nas palavras de

VENOSA86, a culpa em sentido amplo “ é a inobservância de um dever que o agente devia

conhecer e observar”. Por isso a noção de culpa não pode ser afastada do conceito de dever.

Para MONTENEGRO87, “a culpa – lato sensu – equivale ao dolo e vem a ser a

prática de um fato danoso, do qual o agente tinha o conhecimento e a intenção de perpetrá-

lo”.

Atualmente, a doutrina converge para o entendimento de que o conceito de dolo

alargou-se e, nessa dimensão, o dolo caracteriza-se como um conduta antijurídica

independente de ter ou não o agente o propósito de prejudicar. PEREIRA88 assegura que a

doutrina abandonou “a noção de animus nocendi (ânimo de prejudicar)”e, passou a aceitar

“que a sua tipificação delimita-se no procedimento danoso, com a consciência do resultado.

84 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Responsabilidade Civil, p. 32. 85 NORONHA, Fernando. Direito das obrigações: fundamentos do direito das obrigações: introdução à responsabilidade civil, p. 484. 86 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil: responsabilidade civil. p. 21. 87 MONTENEGRO, Antônio Lindnergh C. Responsabilidade Civil. p.20. 88 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Responsabilidade Civil. p. 66.

Page 35: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Guilherme Damiani Nunes.pdf · UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE EDUCAÇÃO SUPERIOR

35

A culpa stricto senso é definida por MONTENEGRO como a falta de diligência,

ou seja, a negligência e a imprudência. O dano se dá em razão de uma conduta em que o

agente ignorava o resultado lesivo, ou ainda, mesmo que a ação ou omissão não seja prevista,

sua conduta se revela negligente ou imprudente89.

Em resumo, a responsabilidade subjetiva nasce de atos ilícitos, cujas ações

ofendem direitos alheios e são, segundo NORONHA90, “proibidas pela ordem jurídica e

imputáveis a uma pessoa de quem se possa afirmar ter procedido culposamente ou mesmo de

forma intencional”. E o autor, diz ainda que dentro da responsabilidade subjetiva é possível

distinguir subdivisões para a categoria culpa: “a responsabilidade civil por mera culpa, ou

anormal, e aquela que só surge quando houver uma conduta dolosa ou culpa grave”.

Contudo, não é objetivo deste trabalho descer a esse nível de profundidade.

Dentro das espécies de culpa, entende-se como importante à construção do presente trabalho,

abrodar, mesmo que brevemente, a culpa contratual, decorrente de um contrato pactuado

antes da ocorrência do dano, e a culpa extracontratual, a qual é originada de outras relações

que não as contratuais.

Nesse sentido, reputa-se importante, transcrever lição de MONTENEGRO91

quanto a evolução do pensamento jurídico a respeito da responsabilidade contratual e

extracontratual e a relação com a culpa. Diz o autor:

[…] no direito clássico já se desenvolvia tendência entre os juristas para colocar o estudo da responsabilidade contratual e extracontratual em plano unitário, sabido que o fundamento comum de ambas era o dano. Contudo, no campo legislativo sempre prevaleceu a tese dualista. Os códigos civis, de um modo geral, disciplinam em esferas distintas as duas responsabilidades. Na verdade, a prática forense tem mostrado a necessidade da diversificação, sobretudo em matéria de prova e de liquidação do dano.

Outro elemento da responsabilidade civil que interessa ser analisado é o nexo

causal, também indispensável para a responsabilização, e conseqüente indenização. Em

relação ao nexo de causalidade entre o dano e o comportamento do agente, PEREIRA92

observa que:

[…] não basta que o agente haja procedido contra direito, isto é, não se define a responsabilidade pelo fato de cometer um ‘erro de conduta’; não basta que a vítima sofra um ‘dano’, que é o elemento objetivo do dever de indenizar, pois se não houver um prejuízo a conduta antijurídica não gera

89 Cf. MONTENEGRO, Antônio Lindnergh C. Responsabilidade Civil. p. 21. 90 NORONHA, Fernando. Direito das obrigações: fundamentos do direito das obrigações: introdução à responsabilidade civil, p. 485. 91 MONTENEGRO, Antônio Lindnergh C. Responsabilidade Civil. p. 9. 92 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Responsabilidade Civil. p. 75.

Page 36: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Guilherme Damiani Nunes.pdf · UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE EDUCAÇÃO SUPERIOR

36

obrigação ressarcitória. É necessário se estabeleça uma relação de causalidade entre a injuridicidade da ação e o mal causado.

O nexo causal é o elo que existe entre o dano e a ação ou omissão que o causou.

CAVALIERI FILHO93 menciona que o nexo causal é a rigor:

[…] a primeira questão a ser enfrentada na solução de qualquer caso envolvendo responsabilidade civil. Antes de decidirmos se o agente agiu ou não com culpa teremos que apurar se ele deu causa ao resultado.

Desta forma, tem-se que o nexo causal é indispensável para que a conduta gere

algum tipo de conseqüência, no plano indenizatório, para o seu agente. É necessário que se

estabeleça um liame entre a ação ou omissão do agente e o dano.

O dano é o derradeiro pressuposto da responsabilidade civil a ser analisado. É um

elemento fundamental dentro da responsabilidade, e quase que a totalidade da doutrina o

aceita como um pressuposto essencial. “Onde inexistir um dano”, afirma PEREIRA94 citando

Henri Lalou95, “não há que se falar em responsabilidade”.

Para definir dano, opta-se, neste trabalho, por acolher a definição de NORONHA

ao referir que:

Dano é o prejuízo, de natureza individual ou coletiva, econômico ou não-econômico, resultante de ato ou fato antijurídico que viole qualquer valor inerente à pessoa humana, ou ainda coisa do mundo externo que seja juridicamente tutelada.

Assim, pode-se dizer que dano é o prejuízo que resulta de uma lesão a um direito

e, a certeza e a atualidade do dano são fundamentais à responsabilização.

Conceituada a responsabilidade subjetiva e os elementos lhe dão origem, aborda-

se a seguir a outra modalidade de responsabilidade civil que é a responsabilidade objetiva.

2.4.2 Responsabilidade objetiva e seus pressupostos

O Código Civil adota, diante de previsão legal expressa ou em decorrência de

atividade de risco, a responsabilidade civil objetiva que a doutrina costuma denominar de

responsabilidade civil objetiva, ou pelo risco96

93 CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de responsabilidade civil. p. 65. 94 Apud, PEREIRA, Caio Mário da Silva. Responsabilidade Civil. p. 38. 95 No francês, conforme consta da obra de Caio Mario da Silva Pereira, citada na nota acima, ao transcrever as palavras originais de Henri Lalou: “Pás de préjudice, pás de responsabilitá civile”. 96 Cf. NORONHA, Fernando. Direito das obrigações: fundamentos do direito das obrigações: introdução à responsabilidade civil, p. 485-486.

Page 37: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Guilherme Damiani Nunes.pdf · UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE EDUCAÇÃO SUPERIOR

37

Leia-se o preceito do artigo 927, parágrafo único, do Código Civil, o qual, na

opinião de NORONHA97 é a verdadeira “cláusula geral”da responsabilidade objetiva:

Art. 927. […] Parágrafo único. Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem.

Nesta espécie de responsabilidade, são levados em consideração apenas o dano e o

nexo causal. O elemento culpa se mostra dispensável, conforme ensina CAVALIERI

FILHO98:

Na responsabilidade objetiva teremos uma conduta ilícita, o dano e o nexo causal. Só não será necessário o elemento culpa, razão pela qual fala-se em responsabilidade independentemente de culpa. Esta pode ou não existir, mas será sempre irrelevante para a configuração do dever de indenizar. Indispensável será a relação de causalidade [...]

A teoria da responsabilidade objetiva surgiu em face da dificuldade de se provar a

culpa. Cumpre ressaltar, entretanto, que esta evolução, da responsabilidade subjetiva para a

objetiva, não foi assim tão rápida. A atenção foi então desviada da culpa, e na busca de um

novo fundamento para a responsabilidade, foi desenvolvida a chamada teoria do risco.

Na definição de CAVALIERI FILHO99, “risco é perigo, é probabilidade de dano,

importando, isso, dizer que aquele que exerce uma atividade perigosa deve-lhe assumir os

riscos e reparar o dano dela decorrente.”

Segundo a teoria do risco, não importa se o autor agiu ou não com culpa; todo e

qualquer prejuízo causado pela sua conduta deverá ser reparado. Por óbvio, o nexo causal

deve se fazer presente. No entanto, é dispensado qualquer juízo de valor a respeito da culpa

do agente.

A partir desta concepção, assegura VENOSA100 que surgiram várias teorias acerca

de modalidades de risco: teorias do risco proveito, do risco criado e do risco integral101.

97 Cf. NORONHA, Fernando. Direito das obrigações: fundamentos do direito das obrigações: introdução à responsabilidade civil, p. 487. 98 CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de responsabilidade civil. p. 143. 99 CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de responsabilidade civil. p. 145. 100 Cf. VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil: responsabilidade civil. p. 16. 101 A teoria do risco proveito defende a idéia do risco criado a partir de uma determinada atividade. Aquele que através de uma atividade, cria um risco, é responsável e deve arcar com a indenização, se algum dano em decorrência disto for gerado. A teoria do risco criado prescinde de qualquer conceito de culpa. É considerado, principalmente, o fato danoso. E, por fim, pela teoria do risco integral, o agente será responsabilizado, independentemente, do chamado nexo causal. Até mesmo nas situações em que se configura a culpa exclusiva da vítima, fato de terceiro, caso fortuito e força maior, o dever de indenizar se fará presente. Esta modalidade só é aplicada em casos excepcionais. Cf. CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de responsabilidade civil. p. 148.

Page 38: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Guilherme Damiani Nunes.pdf · UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE EDUCAÇÃO SUPERIOR

38

Entretanto, seja qual for a adjetivação que lhe seja conferida, o que importa é a

essência do risco e, não a quantificação do mesmo. Quer dizer, quando a prova da culpa, em

situações socialmente relevantes, for um fardo difícil para a vítima, a lei opta por dispensá-la,

o que leva a crer, admite-se a presunção de culpa absoluta102.

Por tudo isso, pode-se dizer que o dever de indenizar em sede de responsabilidade

objetiva, também funda-se na violação de um dever jurídico, traduzido como dever de

segurança.103

Observou-se neste capítulo o instituto da responsabilidade civil com ênfase na sua

conceituação, pressupostos e modalidades. Entende-se que a importância da análise desses

elementos constituem a base para verificar se é possível imputar ou não ao ente condomínio,

responsabilidade civil em decorrência de dano causado a veículo de condômino guardado em

suas dependências.

Este é o tema que se passa a enfrentar na terceira e última parte deste trabalho.

102 Cf. NORONHA, Fernando. Direito das obrigações: fundamentos do direito das obrigações: introdução à responsabilidade civil, p. 485. 103 Cf. CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de responsabilidade civil. p. 148.

Page 39: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Guilherme Damiani Nunes.pdf · UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE EDUCAÇÃO SUPERIOR

39

3 RESPONSABILIDADE CIVIL DO CONDOMÍNIO

3.1 NATUREZA DA RESPONSABILIDADE CIVIL DO CONDOMÍNIO

No presente capítulo objetiva-se discorrer a respeito da natureza da

responsabilidade civil do condomínio em decorrência de dano causado em veículo de

propriedade de condômino e, mantido em área comum do prédio – garagem coberta ou pátio

interno.

Dessa forma, para que se possa constatar a possibilidade ou não de

responsabilização do condomínio, inicia-se por tratar, em linhas gerais, da responsabilidade

contratual e extracontratual e, posteriormente, identificar a natureza jurídica da

responsabilidade desse ente despersonalizado.

3.1.1 Responsabilidade Contratual e Responsabilidade Extracontratual

É sabido que alguém, ao violar um dever jurídico, e em razão disso produz um

dano a outrem, ficará obrigado a indenizar. Em ampla acepção, o dever jurídico “dependa ou

não da vontade humana, estabelece sempre um vinculum juris, de que se gera a necessidade

jurídica de ser cumprido aquilo a que se é obrigado”104.

Para VENOSA105, “quem transgride um dever de conduta, com ou sem contrato,

pode ser obrigado a ressarcir o dano. O dever violado deve ser o ponto de partida, não

importando se dentro ou fora de uma relação contratual”.

Assim, o dever jurídico tanto advém de contrato, como decorre do respeito aos

princípios da ordem jurídica, em razão dos quais se estabelece a obrigação de não ofender

direito alheio.

A doutrina divide, para melhor compreensão, a responsabilidade civil em

responsabilidade contratual e responsabilidade extracontratual. A existência ou não de uma

obrigação pré-existente, decorrente de um contrato, por exemplo, é que vai ser o marco

divisor destas duas espécies de responsabilidade.

104 DE PLÁCIDO E SILVA. Vocabulário Jurídico, v. II, 3. ed. São Paulo: Forense, 1973, p. 523. 105 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil: responsabilidade civil. p. 20.

Page 40: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Guilherme Damiani Nunes.pdf · UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE EDUCAÇÃO SUPERIOR

40

O indivíduo que, ao descumprir uma obrigação contratual, causa dano a outrem,

tem o dever de repará-lo. Assim é a responsabilidade contratual; ela deriva de um contrato,

que nas palavras de BELIVAQUIA106 “é o acordo de vontades para o fim de adquirir,

resguardar, modificar ou extinguir direitos”.

Na responsabilidade contratual há uma relação jurídica entre as partes, pois o

contrato cria um vínculo jurídico; então, se esta convenção for violada e houver o

descumprimento de alguma obrigação contratualmente assumida, o prejudicado pode pleitear

ou não a reparação da parte que a lesou.

O Código Civil107 ao prever regra atinente ao inadimplemento contratual,

prescreve que o não cumprimento da obrigação acarreta a responsabilidade de indenizar,

respondendo o devedor por perdas e danos, acrescidos de juros, correção monetária e

honorários advocatícios.

Então, quando o devedor não cumpre a obrigação ou quando a cumpre

imperfeitamente ocorre o inadimplemento. Nessa hipótese, se houver relação obrigacional

anterior, provinda de um contrato, restará configurada a responsabilidade civil108.

Pode ocorrer, todavia, que o dever de indenizar decorra da inexistência de

qualquer relação obrigacional entre as partes. Nesse caso, a responsabilidade deriva de

infração ao dever legal (dever de conduta), daí, diz-se que a responsabilidade é extracontratual

ou aquiliana.

A respeito do assunto ensina CAVALIERI FILHO109:

Se preexiste um vínculo obrigacional, e o dever de indenizar é conseqüência do inadimplemento, temos a responsabilidade contratual, também chamada de ilícito contratual ou relativo; se esse dever surge em virtude de lesão a direito subjetivo, sem que entre o ofensor e a vítima preexista qualquer relação jurídica que o possibilite, temos a responsabilidade extracontratual, também chamada de ilícito aquiliano ou absoluto.

Portanto, a responsabilidade extracontratual ou aquiliana110 advém de um ato

ilícito, ou seja, quando o sujeito viola um dever legal.

106 Apud RODRIGUES, Silvio. Direito civil: dos contratos e das declarações unilaterais da vontade. 30. ed São Paulo: Saraiva, 2004, p. 9. 107 BRASIL. Lei n. 10.406/2002. “Art. 389. Não cumprida a obrigação, responde o devedor por perdas e danos, mais juros e atualização monetária segundo índices oficiais regularmente estabelecidos, e honorários de advogado”. 108 Cf. RÉGIS, Mário Luiz Delgado. In Novo Código Civil comentado. Ricardo Fiuza (coordenador). São Paulo: Sariava, 2002, p.348. 109 CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de responsabilidade civil. p 37. 110 O Professor Fernando Noronha adverte que só é apropriado utilizar as designações de responsabilidade aquiliana e por atos ilícitos “quando, com elas, se quiser designar a modalidade de responsabilidade civil dita

Page 41: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Guilherme Damiani Nunes.pdf · UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE EDUCAÇÃO SUPERIOR

41

DINIZ111 define este tipo de responsabilidade como sendo:

[…] a resultante de violação legal, ou seja, da lesão de um direito subjetivo, ou melhor, da infração ao dever jurídico geral de abstenção atinente aos direitos reais ou de personalidade, sem que haja nenhum vínculo contratual entre o lesante e lesado.

Registre-se, porém, que a responsabilidade contratual e a extracontratual

distinguem-se por alguns fatores. Observa GONÇALVES112 que na primeira – a contratual –,

“o inadimplemento presume-se culposo” cabendo ao lesado apenas demonstrar que a

prestação não foi cumprida, enquanto que na extracontratual, o ônus de provar a culpa ou dolo

do causador do dano, cabe ao lesado. Aduz, ainda, que a contratual “tem origem na

convenção” e a extracontratual “a tem na inobservância do dever genérico de não lesar outrem

(neminem laedere)”.

Entretanto, na atualidade, a teoria da responsabilidade civil, de acordo com a

concepção de SILVA113, transcende o limite da culpa e firma-se no dever de reparar o dano.

Desse modo, vale destacar que a conseqüência da infração ao dever legal e ao dever

contratual é uma só: a obrigação de ressarcir o prejuízo causado.

O Código Civil pátrio distinguiu as duas espécies de responsabilidade. Sob o

título “Dos Atos Ilícitos” fixou a regra de responsabilidade extracontratual nos artigos 186 e

187114 e, a obrigação de indenizar encontra-se esculpida na regra do artigo 927, do mesmo

diploma legal, nesses termos:

Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo. Parágrafo único. Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem.

Em relação a disciplina da responsabilidade contratual, “como conseqüência da

inexecução das obrigações”, a regra a ser aplicada é a do artigo 389, anteriormente transcrito

em nota de rodapé.

subjetiva, ou culposa”. NORONHA, Fernando. Direito das obrigações: fundamentos do direito das obrigações: introdução à responsabilidade civil, v.1, p. 434. 111 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil: responsabilidade civil. 7.v. 17 ed. São Paulo: Saraiva, 2003 p. 459. 112 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito das obrigações: parte especial, responsabilidade civil, tomo II, p. 13. 113 Cf. SILVA, Regina Beatriz Tavares da. In Novo Código Civil comentado. Ricardo Fiuza (coordenador). São Paulo: Saraiva, 2002, p. 819. 114 BRASIL. Lei n. 10.406/02. “Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito”. Segundo o “Art. 187. Também comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo, excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes”.

Page 42: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Guilherme Damiani Nunes.pdf · UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE EDUCAÇÃO SUPERIOR

42

Frise-se, contudo, que por vezes, torna-se difícil configurar a existência ou não de

uma relação obrigacional, pois a presença de um contrato não se mostra de forma tão clara.

Tecidos tais esclarecimentos, cuida-se, agora, de caracterizar a natureza da

responsabilidade civil do condomínio no caso de furto ou danos causados em veículos

estacionados nas garagens de edifício. A questão é controversa, tanto para a doutrina como

para a jurisprudência. Assim, se a convenção assume expressamente o dever de guarda e

vigilância a fim de indenizar danos e furtos sofridos pelos condôminos, entende-se que aí

configura-se a responsabilidade contratual, pois o inadimplemento contratual acarreta a

responsabilidade de indenizar as perdas e danos. Caso contrário, a responsabilidade é

extracontratual pois deriva de infração ao dever legal e, “o elemento objetivo da culpa é o

dever violado” 115.

Portanto, é factível concluir não ser possível precisar a natureza da

responsabilidade civil do condomínio em matéria de furto ou dano em veículo estacionado na

área comum.

A sua natureza, contratual ou extracontratual, somente poderá ser determinada a

partir da existência de cláusula expressa no Regimento Interno ou na Convenção,

responsabilizando ou isentando o condomínio de responsabilidade. No primeiro caso, não há

dúvida, a responsabilidade é contratual. Todavia, a simples menção à isenção, não configura

excludente de responsabilidade, no caso de restar evidenciado que o condomínio mantém

sistema de vigilância ou de segurança financiado pelos moradores. Nesta hipótese, configura-

se a responsabilidade extracontratual.

3.1.2.Responsabilidade Extracontratual por Ato Próprio

A responsabilidade extracontratual por ato próprio, como o próprio nome indica,

deriva de uma ação pessoal, em que o lesante viola o direito de outrem, causando prejuízo,

seja por ato culposo ou doloso e, em razão disso é conveniente que deva reparar esse

prejuízo116. Esta obrigação de indenizar concretiza-se quando o autor do ato ilícito por ação

ou omissão, transgredir um dever legal, contratual ou social117.

115 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito das obrigações: parte especial, responsabilidade civil, tomo II, p. 21. 116 Cf. DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil: responsabilidade civil. p. 461. 117 Cf. RODRIGUES, Silvio. Direito civil: responsabilidade civil. 20. ed. 4.v. São Paulo: Saraiva, 2003. p. 19.

Page 43: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Guilherme Damiani Nunes.pdf · UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE EDUCAÇÃO SUPERIOR

43

A fundamentação legal para a responsabilidade por ato próprio encontra-se

prevista nos artigos 186 e 927 do Código Civil, já transcritos. Apenas para relembrar, o artigo

186 conceitua o ato ilícito, e o 927 estabelece a quem o pratica, a obrigação de restaurar o

dano causado.

Em matéria de culpa extracontratual, o dever jurídico, consiste no cumprimento da

lei, dever este implícito na regra do artigo 186, que também indica alguns pressupostos

necessários para que ocorra a responsabilidade civil, tais como: a ação ou omissão do agente,

a relação de causalidade, a ofensa, isto é, a violação de direito e o prejuízo sofrido pela vítima.

Assim, quando a responsabilidade decorre de ato próprio, há a chamada

responsabilidade direta, e a indireta, é aquela que decorre de ato ou fato alheio à sua vontade,

mas que de alguma forma está sob sua proteção e vigilância e é o que será analisado no

próximo item.

3.1.3 Responsabilidade Extracontratual por Ato de Terceiro

O direito brasileiro possibilita que um sujeito responda civilmente por ato ilícito

de terceiro, desde que os dois tenham uma ligação jurídica, legal ou contratual118. Neste caso

existem dois agentes: o que causou o dano e o que responderá pela reparação.

Em princípio, a responsabilidade é individual119, respondendo pelo pagamento da

indenização aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, causou

prejuízo a terceiro120.

Contudo, existem situações em que o agente responde por ato de terceiro.

Segundo NORONHA121, há “hipóteses, muito freqüentes na vida real, em que se é

responsável por ações ou omissões de outras pessoas e até por danos causados por coisas ou

animais”.

Imagine-se que um condomínio contrate funcionários direcionados à proteção do

mesmo, vindo a ocorrer dano nos veículos estacionados, o condomínio arcará com o prejuízo,

118 Cf. GAGLIANO, Pablo Stolze. PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de direito civil: Obrigações, p. 147. 119 BRASIL. Lei n. 10.406/02. “Art. 942. Os bens do responsável pela ofensa ou violação do direito de outrem ficam sujeitos à reparação do dano causado; e, se a ofensa tiver mais de um autor, todos responderão solidariamente pela reparação. […]”. 120 Cf. GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito das obrigações: parte especial: responsabilidade civil, tomo II, p.31. 121 NORONHA, Fernando. Direito das obrigações: fundamentos do direito das obrigações: introduçãi à responsabilidade civil, v.1, p. 491.

Page 44: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Guilherme Damiani Nunes.pdf · UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE EDUCAÇÃO SUPERIOR

44

pois é dever de vigilância. Se a pessoa que está sob a direção do condomínio, no caso o

empregado, não vigiar de forma adequada, haverá a responsabilidade do condomínio por

infração dos deveres de vigilância, por culpa in vigilando do funcionário. E se o condomínio

fez uma má escolha de empregados ou prepostos122, será ele responsabilizado por culpa in

eligendo (culpa na escolha)123.

Assim, o ato ilícito pode ser praticado pelo próprio imputado, classificando-se a

responsabilidade civil como direta, ou, por terceiro que esteja sob a sua esfera jurídica, a

responsabilidade é indireta124.

No caso de terceiro não zelar pela segurança do condomínio, o empregador

também pode ser responsabilizado civilmente pela reparação. É o que dispõe o artigo 932,

inciso III, do Código Civil, nestes termos:

Art. 932. São também responsáveis pela reparação civil: […] III - o empregador ou comitente, por seus empregados, serviçais e prepostos, no exercício do trabalho que lhes competir, ou em razão dele; […].

Observe-se, portanto, que este artigo aplica o princípio da solidariedade,

obrigando pela reparação do dano, tanto o agente que o causou como o responsável por ele.

E, ainda, na responsabilidade civil indireta, em razão da regra do artigo 933 que se

transcreve a seguir, foi adotada pelo legislador civil pátrio a responsabilidade objetiva, “que

prescinde da culpa e se satisfaz apenas com o dano e o nexo de causalidade”125.

Art. 933. As pessoas indicadas nos incisos I a V do artigo antecedente, ainda que não haja culpa de sua parte, responderão pelos atos praticados pelos terceiros ali referidos.

Ensina GAGLIANO126 que pela dicção do inciso III, do artigo em comento, há a

existência de um negócio jurídico celebrado entre o sujeito responsabilizado e o autor material

do dano, praticando este último a conduta lesiva, “no exerício do trabalho que lhes competer,

ou em razão dele”.

Como se vê, a responsabilização da pessoa por via indireta, só será necessária para

caracterizar a responsabilidade como subjetiva ou objetiva. No caso da responsabilidade do 122 Entende-se por preposto, a pessoa que exerce “uma atividade no interesse e sob o poder de controle de outra”. Contudo, “o preposto dintingue-se do empregado pelo fato de este ser subordinado juridicamente ao patrão”. NORONHA, Fernando. Direito das obrigações: fundamentos do direito das obrigações: introduçãi à responsabilidade civil, v.1, p. 492. 123 Cf. DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil: responsabilidade civil. p. 474. 124 Cf. SILVA, Regina Beatriz Tavares da. In Novo Código Civil comentado. Ricardo Fiuza (coordenador), p. 828. 125 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito das obrigações: parte especial: responsabilidade civil, tomo II, p.31. 126 GAGLIANO, Pablo Stolze. PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de direito civil: Obrigações, p. 160.

Page 45: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Guilherme Damiani Nunes.pdf · UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE EDUCAÇÃO SUPERIOR

45

condomínio por dano causado em veículo de condômino guardado em área comum, é

tipicamente objetiva127.

Nesse sentido, colhe-se trecho do Recurso Cível n. 4.326, do Tribunal de Justiça

de Santa Catarina:

Por isso, objetiva é a responsabilidade do condomínio, pois no momento em que contrata vigilância e porteiro com guarita localizada na entrada e saída de veículos, assume o risco de resguardar e vigiar os bens móveis deixados em seu interior128.

Logo, pela interpretação dos dispositivos legais supracitados e do entendimento

jurisprudencial em destaque, leva a crer que o condomínio ao contratar o empregado que tinha

o dever de vigiar, mas age com negligência ou imprudência, fica obrigado a ressarcir, por ato

de terceiro.

3.1.4 Responsabilidade Extracontratual pelo Fato da Coisa

Até aqui se viu a responsabilização civil em decorrência de atitudes humanas, no

entanto, também é possível que as coisas possam provocar prejuízos. Assim, há a

responsabilidade por fato da coisa quando ocorrer sem a conduta direta do dono ou de seu

preposto. Logicamente, que os danos causados pela coisa, tem que ser ressarcidos pelo sujeito

que a detém no poder de comando129. Entretanto, NORONHA130 assevera que a

responsabilidade pelo fato de coisa, “é normalmente objetiva”.

O Código Civil em seu artigo 937 dispõe que: “O dono de edifício ou construção

responde pelos danos que resultarem de sua ruína, se esta provier de falta de reparos, cuja

necessidade fosse manifesta”.

Numa interpretação extensiva para a questão de condomínio, objeto deste

trabalho, entende-se que o condomínio é responsabilizado por obter uma conduta culposa, em

127 Cf. NORONHA, Fernando. Direito das obrigações: fundamentos do direito das obrigações: introduçãi à responsabilidade civil, v.1, p. 493. 128 BRASIL. SANTA CATARINA, Tribunal de Justiça. Ementa: Ação de Indenização por furto – veículo estacionado nas dependências do condomínio garagem pago para salvaguardar automóveis – inexistência de prova em contrário – conjunto probatório favorável ao autor – Falhas nas medidas de segurança – Ônus probandi do réu – Violação do bem jurídico protegido – Dever de indenizar – Provimento Parcial. In Recurso Cível n. 4.326. Relator: Juíza Rejane Andersen. Data Decisão: 17/03/2005. 129 Cf. GAGLIANO, Pablo Stolze. PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de direito civil: Obrigações, p. 169. 130 NORONHA, Fernando. Direito das obrigações: fundamentos do direito das obrigações: introduçãi à responsabilidade civil, v.1, p. 493.

Page 46: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Guilherme Damiani Nunes.pdf · UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE EDUCAÇÃO SUPERIOR

46

razão de não restaurar a parte danificada do edifício que vir a despencar e causar prejuízo a

outrem. Pode-se dizer neste caso que o condomínio foi omisso, negligente ou imprudente131.

Neste sentido, veja-se a ementa de acórdão do Tribunal de Justiça do Estado do

Rio Grande do Sul:

EMENTA: RESPONSABILIDADE CIVIL. FATO DA COISA. QUEDA ABRUPTA DE PORTÃO DE CONDOMÍNIO, POR FALHA DO SISTEMA ELETRÔNICO. ATINGIMENTO DO AUTOMÓVEL DO AUTOR. DANOS MATERIAIS. RESPONSABILIDADE DO CONDOMÍNIO CONFIGURADA. SENTENÇA CONFIRMADA PELOS PRÓPRIOS FUNDAMENTOS132.

No caso do acórdão acima, o condomínio não tomou as devidas precauções de

manutenção do portão eletrônico, vindo a danificar o bem de outrem. Em vista disso o

magistrado decidiu pelo ressarcimento do dano causado, buscando restaurar o status quo ante

do automóvel.

O proprietário é o guardião da coisa, neste caso o prédio, e este tem o dever de

segurança. Uma interpretação justa e certa do art. 937 in fine é a de Aguiar Dias citado por

CAVALIERI FILHO133, ao afirmar: “A prova de que a falta de reparos era manifesta decorre

da própria circunstância de haver ruído o edifício ou construção: tanto necessitava de reparos,

que ruiu”.

A regra insculpida no artigo 937 não busca a culpabilidade do dono, apenas

imputa a ele a responsabilidade, já que o mesmo deveria cuidar do que lhe pertence,

caracterizando assim a responsabilidade objetiva134. Mas há exceções, como por exemplo, se

o dono provar que o prejuízo adveio da culpa exclusiva da vítima, de caso fortuito ou força

maior, que são as causas excludentes da responsabilidade135.

3.2 A RESPONSABILIDADE DO CONDOMÍNIO POR DANO CAUSADO A VEÍCULO

DE CONDÔMINO

131 Cf. DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil: responsabilidade civil. 7.v. 17.ed. São Paulo: Saraiva, 2003. p. 488. 132 BRASIL. RIO GRANDE DO SUL, Tribunal de Justiça. Recurso cível n. 71000854273. Relator: Eugênio Facchini Neto. Data da Decisão: 20/06/2006. 133 Apud. CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de responsabilidade civil. p. 228. 134 Cf. GAGLIANO, Pablo Stolze. PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de direito civil: Obrigações, p. 178. 135 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil: responsabilidade civil, p. 37.

Page 47: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Guilherme Damiani Nunes.pdf · UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE EDUCAÇÃO SUPERIOR

47

Um dos problemas sofridos pelo síndico e condôminos nos edifícios residenciais é

no que diz respeito à garagem. Hoje em dia, o automóvel é um bem patrimonial muito

presente na vida das pessoas. E, quando dentro do edifício ocorre dano ou o furto desse bem,

pode-se pleitear juridicamente o ressarcimento pelo prejuízo ocorrido? É o que se observará

nos próximos itens.

3.2.1 Convenção do Condomínio: direito dos condôminos de disciplinar suas relações

Como já mencionado no capítulo 1 do presente trabalho, o condomínio pode

incluir em sua convenção outras normas e disposições além das estipuladas no Código

Civil136, desde que não conflitem com a lei.

Para se eximir da reparação de dano causado em veículos estacionados nas suas

dependências, muitas vezes os condôminos determinam na convenção a cláusula excludente

de indenizar, o que para muitos doutrinadores desobriga o edifício da responsabilização.

Sobre o assunto, J. Nascimento e Niske Gondo citados por STOCO137 afirmam

que compete à convenção estabelecer as situações “peculiares” do condomínio e o mesmo não

responde por danos causados aos automóveis se a própria convenção expressamente isentá-lo

da obrigação de ressarcir.

O posicionamento do Superior Tribunal de Justiça sobre essa matéria, exarada em

decisão de Recurso Especial, já estabeleceu que: “Lícito aos condôminos estabelecer não ser

devida indenização, pelo condomínio, em virtude de danos ocorridos por veículos

estacionados na garagem do edifício138”.

Todavia, percebe-se que o entendimento sobre o tema sucita divergências.

Magistrados do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, orientam-se no sentido de admitir

responsabilização do condomínio, não obstante a existência de cláusula excludente de

responsabilidade. Tal cláusula pode não ser aplicável na hipótese do condomínio manter

sistema de segurança. É desse teor o voto que se extraí da decisão:

[…] muito embora originalmente exista cláusula expressa inserida no Regimento Interno do Condomínio que isenta a responsbilidade do condomínio por danos nos automóveis […], verifica-se que os condôminos optaram por manter serviço de vigilância, financiado pelos moradores […] e guarita que tem o controle de entrada e saída dos veículos […]. Ora, diante

136 O artigo 1.334 já foi anteriormente transcrito. 137 STOCO, Rui. Responsabilidade civil e sua interpretação jurisprudencial. 4.ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1999. p. 358. 138 BRASIL. SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. Recurso Especial n. 10.285, Relator: Min. Nilson Naves. Data do Julgamento: 05/11/1991.

Page 48: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Guilherme Damiani Nunes.pdf · UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE EDUCAÇÃO SUPERIOR

48

disso, não há, então, como o condomínio esquivar-se da obrigação de indenizar, mesmo porque os condôminos pagam os serviços de vigilância e o seguro, os quais são responsáveis pela vigilância e pagamento do prêmio em caso de sinistro, respectivamente139.

Vê-se, por essa decisão, que cláusula constante em Regimento Interno ou

Convenção que isenta a responsabilidade do condomínio de indenizar dano causado em

veículo ou por furto do mesmo, deve ser interpretada com reservas. A despeito dessa

disposição, é possível sustentar a não aplicação desta quando o condomínio mantém sistema

de segurança monitorada ou vigilantes contratados.

Esse é o tema que será enfrentado a seguir.

3.2.2 A Contratação de Sistemas de Segurança e de Vigilância

Aspecto importante para saber se há ou não a responsabilização do condomínio, é

verificar se o mesmo dispõe de sistemas de segurança e vigilância.

Tendo o condomínio aparato destinado à guarda e vigilância dos bens e, mesmo

assim ocorrendo o dano ou furto, o entendimento orienta-se no sentido de admitir a

negligência do agente contratado para o serviço de zelar pela propriedade particular dos

condôminos. Nesse caso, existe a responsabilidade do condomínio, uma vez que os

condôminos têm despesas extras com os pagamentos de salários dos vigias e/ou pelos

aparelhos de proteção. Nesse sentido argumenta OLIVEIRA140:

As decisões têm caminhado na direção da responsabilidade civil do condomínio em indenizar o condômino proprietário do veículo furtado, desde que ofereça o serviço de manobristas, vigia, guarda ou porteiro, encarregados de zelar pela segurança. Outro requisito é de que o condômino vítima contribua para o pagamento dos custos gerados por tal segurança.

Portanto, se o edifício mantém guarda, vigilante ou sistema de segurança

monitorada com o fim específico de proteção dos veículos estacionados em garagens, resta

configurado que este possui a obrigação da guarda do bem e, em ocorrendo o dano, o

proprietário do veículo deve ser indenizado pelo prejuízo sofrido.

139 BRASIL. SANTA CATARINA, Tribunal de Justiça. Recurso Cível n. 4.326. Relator: Juíza Rejane Andersen. Data Decisão: 17/03/2005. 140 OLIVEIRA, Mariza Santos Abrahão. OLIVEIRA, Frederico Abrahão. Manual do Condomínio em Edifícios. 2. ed. Porto Alegre: Sagra Luzatto, 1996. p.42.

Page 49: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Guilherme Damiani Nunes.pdf · UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE EDUCAÇÃO SUPERIOR

49

Não se quer, com isso, afirmar que o tema da responsabilidade civil do

condomínio pela guarda de veículos e a conseqüente reparação do dano é pacífica no

entendimento dos pretórios pátrios. Tal afirmação deve ser temperada com a questão dos

sistemas de segurança, dos serviços de vigilância e, mais, o nexo de causalidade, que é

pressuposto da obrigação de indenizar.

É com esta intenção que se passa a evidenciar o entendimento dos juízes dos

tribunais pátrios.

3.3 OS ENTENDIMENTOS JURISPRUDENCIAL E DOUTRINÁRIO SOBRE A

RESPONSABILIDADE DO CONDOMÍNIO POR FURTO OU DANO À VEÍCULO

No que tange a situação específica – Condomínio Edilício e a Responsabilidade

por Furto ou Dano em Veículo deixado na garagem –, consoante já se afirmou, essa questão

não apresenta uma posição pacificada pela doutrina e, nem tampouco pela jurisprudência. Por

isso, o tema tem gerado certa controvérsia.

Enquanto parte da jurisprudência entende que deve haver a responsabilização

quando se verificar algumas condições protetivas, outro é o posicionamento daqueles que

defendem a não responsabilização. É com o objetivo de conhecer o entendimento de correntes

favoráveis e desfavoráveis à responsabilidade civil do condomínio, que se analisa, a partir de

alguns julgados e posições doutrinárias, esta série de fatores e circunstâncias.

3.3.1 Das Decisões Favoráveis

Sob determinadas hipóteses entendem os magistrados que o condomínio é

responsável pela reparação de dano ou furto de veículo ocorrido em seu estacionamento141.

Assim restou decidida a Apelação Cível do Tribunal de Justiça de Santa Catarina:

RESPONSABILIDADE CIVIL. CONDOMÍNIO. FURTO DE AUTOMÓVEL. OBRIGAÇÃO DE INDENIZAR. RECURSO DESPROVIDO. Dispondo o condomínio de vigia, o furto de veículo estacionado na garagem, em pleno horário de labor do citado preposto, revela evidente descuido ou negligência deste, e, destarte, a conseqüente obrigação de indenizar.142

141 Nesse sentido, veja-se a Súmula 130 do Superior Tribunal de Justiça. “A empresa responde, perante o cliente, pela reparação de dano ou furto de veículo ocorridos em seu estacionamento”. 142 BRASIL. SANTA CATARINA, Tribunal de Justiça. Apelação cível n. 98.002475-7. Relator: Des. Newton Trisotto. Data da Decisão: 28/04/1998.

Page 50: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Guilherme Damiani Nunes.pdf · UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE EDUCAÇÃO SUPERIOR

50

Igual argumento encontra-se no julgamento da Apelação Cível n. 98.008799-6, de

relatoria do Desembargador Carlos Prudêncio, cuja ementa transcreve-se a seguir:

RESPONSABILIDADE CIVIL. FURTO DE VEÍCULO EM GARAGEM DE CONDOMÍNIO. ROTATIVIDADE E COLETIVIDADE NA GUARDA DO VEÍCULO. VIGIA E ZELADORES CONSTANTES. DEVER DE VIGILÂNCIA. OBRIGAÇÃO DE INDENIZAR. RECURSO DESPROVIDO. PRECEDENTES143.

Os recursos impetrados pelos condomínios restaram improvidos, pois os

julgadores entenderam que nestes casos, eles [os condomínios] tinham o dever de guarda e

vigilância dos veículos ali estacionados, uma vez que possuíam empregados ou prepostos,

para o desempenho da atividade de vigilância. Manteve-se, portanto, a decisão do juiz

singular.

Extrai-se do voto:

Consoante majoritário entendimento dos Tribunais, mesmo inexistindo o contrato expresso de depósito do veículo ao estabelecimento, quando o estacionamento é gratuito, é dever deste, no caso, o condomínio, que recebe o automóvel, guardá-lo com segurança e restitui-lo ao proprietário, ainda mais quando o mesmo dispõe de vigias e zeladores constantes e as garagens são coletivas e rotativas. Ora, no caso vertente, é notório que o edifício oferece garagem com o fim de fornecer mais comodidade a seus moradores, havendo, mesmo que implicitamente, uma contraprestação por parte da pessoa que lá deixa seu veículo.144

Ao oferecer serviço de vigilância e mecanismos de segurança, o condomínio

transmite ao condômino a presunção de que o seu bem será ali conservado e garantido contra

possíveis danos.

Consoante as decisões acima destacadas, a responsabilidade de indenizar existe,

visto que o condomínio mantém o dever de guarda e vigilância, não importando sequer, se o

mesmo dispõe em seu Regimento Interno ou Convenção cláusula de não indenizar, pois

houve a negligência de algum empregado em facilitar o furto do veículo145.

Corroborando com este entendimento STOCO146 em sua obra, afirma que:

[…] se há no condomínio empregados encarregados de proteger e vigiar os veículos ali estacionados, e é causado dano a algum deles, tem sim o condomínio o dever de indenizar, visto que esta situação caracteriza a culpa in vigilando, pelo descuido de quem era responsável pela guarda do bem.

143 BRASIL. SANTA CATARINA, Tribunal de Justiça. Apelação cível n. 98.008799-6. Relator: Des. Carlos Prudêncio. Data da Decisão:13/10/1998. 144 BRASIL. SANTA CATARINA, Tribunal de Justiça. Apelação cível n. 98.008779-6. Relator: Des. Carlos Prudêncio. Data da Decisão:13/10/1998. 145 SANTA CATARINA, Tribunal de Justiça. Apelação cível n. 44.324. Relator: Des. Álvaro Wandelli. Data da Decisão: 06/09/1994. 146 STOCO, Rui. Responsabilidade civil e sua interpretação jurisprudencial p. 358.

Page 51: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Guilherme Damiani Nunes.pdf · UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE EDUCAÇÃO SUPERIOR

51

Em vista disso, para que o condomínio se responsabilize, é preciso que exista

dentro dele determinadas medidas de segurança, e que por negligência de alguém responsável,

a segurança vem a falhar. Pensa-se que esta situação enquadra-se na modalidade de

responsabilidade civil objetiva, ou pelo risco, causada por “fato de outrem”.

Na esteira desse pensamento, busca-se em NORONHA a lição de que a

responsabilidade civil objetiva:

[…] nasce da prática de fatos meramente antijurídicos, geralmente relacionados com determinadas atividades (e por isso ainda sendo riscos de atividades) normalmente desenvolvidas pelo autor do dano. […] a antijuridicidade é dado de natureza objetiva: existe sempre que o fato (ação , omissão, fato natural) ofende direitos alheios de modo contrário ao direito, independentemente de qualquer juízo de censura que porventura também posa estar presente e ser referido a alguém.

O mesmo argumento é invocado pela juíza de segundo grau, Rejane Andersen, em

Recurso Cível n. 4.326, da Capital (Foro Distrital do Continente), já citado, que justifica a

imputação de ressarcimento de prejuízo causado a morador que teve seu veículo furtado do

interior do condomínio, o qual mantinha, inclusive, seguro custeado pelos comunheiros. É

este o teor da ementa e de trechos isolados do acórdão:

AÇÃO DE RESSARCIMENTO DE DANOS - FURTO DE VEÍCULO DO INTERIOR DE GARAGEM DE CONDOMÍNIO - SERVIÇO DE VIGILÂNCIA E CONTRATO DE SEGURO - ADOÇÃO DE MEDIDAS PARA GARANTIR SEGURANÇA PAGAS PELOS CONDÔMINOS - CONJUNTO PROBATÓRIO FAVORÁVEL AO RECORRENTE - FALHAS NAS MEDIDAS DE SEGURANÇA - VIOLAÇÃO DO BEM JURÍDICO PROTEGIDO - DEVER DE INDENIZAR - SENTENÇA REFORMADA - RECURSO CONHECIDO E PROVIDO.

Esta situação fática trata de reclamação aforada junto a Secretaria do Juizado

Especial Cível, contra o condomínio do qual o autor é morador e, que teve como alegação o

fato do condomínio além de possuir esquema de vigilância realizada por funcionários, ainda

possuía seguro contratado com empresa seguradora, cuja cobertura incluía “guarda de veículo

cobertura simples”.

Do voto do relator extrai-se:

A inspeção realizada após o furto do veículo do recorrente constatou que há ‘Vigilância do Condomínio no horário 08:00 às 18:00 por funcionários e das 18:00 às 08:00 horas por empresa contratada Seguridade Serviços de Segurança Ltda, sendo que das 00:00 hrs às 06:00 hrs são dois vigilantes, 1 fixo na portaria e o outro realizando rondas no interior do condomínio.’ […], em consonância com os termos contratados […]. Além disso, o Condomínio firmou Contrato de Seguro com a Seguradora […], cuja cobertura incluía ‘Guarda de Veículos Cobertura Simples’. […]

Page 52: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Guilherme Damiani Nunes.pdf · UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE EDUCAÇÃO SUPERIOR

52

Assim, a adoção de medidas de segurança pelo condomínio, repassada aos condôminos, gera a responsabilidade daquele, porquanto houve falha nas medidas de segurança, por culpa do síndico ou de algum preposto, representados no caso dos autos pela vigilância ou pela seguradora.

Acrescente-se, por fim, na seara de posturas favoráveis à responsabilização dos

condomínios em relação aos objetos que ficam sob sua guarda, a decisão da 2ª. Turma

Recursal dos Juizados Especiais Cíveis e Criminais, do Tribunal de Justiça do Distrito

Federal, que encontrou resistência no seio de seus próprios integrantes, acabando por dar

provimento ao recurso147. Nesse sentido, leia-se trecho de voto discordante:

Entendo que em relação aos objetos que ficam sob a guarda do condomínio tem que haver responsabilização por parte do mesmo. Realmente, a convenção está contrariando a lei, porque até em estacionamento de supermercado há a obrigatoriedade de pagar os prejuízos, quanto mais dentro de uma garagem fechada de um condomínio.

É de se reconhecer, com apoio nas decisões e entendimentos acima transcritos,

que juízes brasileiros, imbuídos do sentimento de justiça, tem invocado, por vezes, a

exigência de um aparato para vigiar, guardar o bem do condômino, por outras,

independentemente de cláusula expressa em Convenção Condominial, a proteção à

propriedade, sustentando, dessa forma, que há responsabilidade do condomínio em indenizar

o condômino lesado pelo prejuízo causado em veículos estacionados nas suas dependências.

147 BRASIL. DISTRITO FEDERAL. Tribunal de Justiça. EMENTA: CIVIL. RESPONSABILIDADE DO CONDOMÍNIO POR FURTO DE BICICLETA OCORRIDO EM SUA GARAGEM. PRELIMINARES REJEITADAS. ARTIGOS 5º. E 41 DA LEI 9099/95. INCONTROVÉRSIA QUANTO AO FURTO. PRESUNÇÃO DE VERACIDADE DO FATO NÃO IMPUGNADO. INEXISTÊNCIA DE QUE SEJA O RECURSO CLASSIFICADO COMO “INOMINADO”. MÉRITO. CONVEÇÃO CONDOMINIAL. AUSÊNCIA DE CLÁUSULA EXPRESSA QUE PREVEJA A RESPONSABILIDADE DO CONDOMÍNIO EM CASO DE FURTO OCORRIDO EM ÁREAS DE USO COMUM, INCLUSIVE GARAGEM. REGRA GERAL A SER OBSERVADA, MAS QUE, NA HIPÓTESE SUB JUDICE, É DE SER TIDA COMO INOPERANTE TENDO EM CONTA DELIBERAÇÕES POSTERIORES ESTABELECIDAS PELOS CONDÔMINOS. RECURSO CONHECIDO E, POR MAIORIA, PROVIDO. 1. Conforme previsão do artigo 5º. da Lei 9099/95, o juiz tem liberdade para determinar as provas a serem produzidas, para apreciá-las e para dar especial valor às regras de experiência comum ou técnica. 2. O artigo 2º., da Lei 9099/95 privilegia especialmente os princípios da simplicidade, informalidade e economia processual, não exigindo que o recurso interposto seja conhecido por inominado. Ademais, como não se obriga que as partes sejam assistidas por Advogado, a formalidade cede à intenção da razoável duração do processo, eficiência e simplicidade. 3. Conquanto seja a vida em condomínio disciplinada, notadamente, pela sua convenção e conquanto não estabelelça aquele instrumento ser de sua responsabilidade indenizar os moradores por prejuízos decorrentes de atos ilícitos praticados em suas dependências comuns, tem-se que a decisão dos condôminos de disponibilizar local específico e previamente determinado para o depósito de bicicletas, as quais deveriam ser guardadas, resulta na assunção do dever de vigilância sobre os bens autorizados a ali estar. Responsabilidade de fato assumida e que dispensa a existência de cláusula expressa que eleve a coletividade condominial à condição de garante dos danos suportados pelo Apelante. 4. Recurso conhecido e que, por maioria, se dá provimento. (TJDF, ACJ – Apelação Cível no Juizado Especial n.2006.07.1.014.944-4, Rel. Juiz : Alfeu Machado. Data da Decisão: 12/12/2006.

Page 53: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Guilherme Damiani Nunes.pdf · UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE EDUCAÇÃO SUPERIOR

53

3.3.2 Das Decisões Desfavoráveis

Abordadas as posições favoráveis à responsabilização civil do condomínio pela

reparação de dano, necessário se faz destacar algumas posições doutrinárias e decisões

pretorianas que reconhecem como indevida a indenização a favor de morador, na situação em

comento.

Quando a Convenção condominial ou o Regimento Interno contém cláusula

expressa de não indenizar, magistrados e doutrinadores têm como argumento exonerar o

condomínio da obrigação de indenizar o prejuízo.

Manifestando-se a respeito do assunto, MACHADO148 pontifica:

Se elas contiverem uma cláusula de exclusão de responsabilidade do condomínio, ou se tiver havido assembléia que tenha deliberado sobre tal assunto e os condôminos tenham deliberado que nesse caso e nos futuros não haveria qualquer tipo de indenização, certamente não será o condomínio compelido a efetuar a indenização.

No mesmo sentido, colhe-se do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, a seguinte

decisão:

RESPONSABILIDADE CIVIL – CONDOMÍNIO -FURTO DE AUTOMÓVEL EM GARAGEM OU ESTACIONAMENTO DE EDIFÍCIO - CONVENÇÃO COM CLÁUSULA EXONERATIVA DA OBRIGAÇÃO DE INDENIZAR - IMPROCEDÊNCIA DO PEDIDO - SENTENÇA CONFIRMADA149

Claro está com tal decisão, que o relator afasta uma possível falta de cautela do

condomínio na guarda de veículos colocados em espaço reservado para essa específica

finalidade. Firma seu convencimento em estipulação exonerativa da obrigação de indenizar.

Aliás, ressaltando o fato do condomínio não assumir obrigação de indenizar por

furto de veículos estacionados em área de garagem, quando não houver cláusula de indenizar,

firmou entendimento a Segunda Seção do Superior Tribunal de Justiça, em sede de Embargos

de Divergência em Recurso Especial No. 268.699 – SP (2001/0162675), j. em 08-03-2006,

em acórdão de lavra do Min. Ari Pargendler:

RESPONSABILIDADE CIVIL. CONDOMINIO. FURTO DE MOTOCICLETA. GARAGEM. NÃO HÁ RESPONSABILIDADE DO CONDOMÍNIO SE ESTE NÃO ASSUMIU EXPRESSAMENTE EM SUA CONVENÇÃO A OBRIGAÇÃO DE INDENIZAR OS DANOS SOFRIDOS PELOS CONDÔMINOS, DECORRETOS DE ATOS

148 MACHADO, João Ferreira. JÚNIOR, José Antônio Tavares Administrar um condomínio. Goiânia: AB, 1998, p.44. 149 SANTA CATARINA, Tribunal de Justiça. Apelação cível n. 41.625. Relator: Des. Napoleão Amarante. Data da Decisão: 24/05/1994.

Page 54: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Guilherme Damiani Nunes.pdf · UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE EDUCAÇÃO SUPERIOR

54

ILÍCITOS OCORRIDOS NAS ÁREAS COMUNS DO PRÉDIO. PRECEDENTE. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO.

Como se vê, ao apreciar a hipótese de furto em condomínio, o julgador, alarga

sobremaneira a isenção de responsabilidade do condomínio, para somente ter como

responsável a comunidade se expressamente previsto o encargo nas regras internas.

Firma argumento no fato de que se a convenção estabelece cláusula de não

indenizar, não há como impor a responsabilidade do condomínio, ainda que exista esquema de

segurança e vigilância, pois tal esquema não desqualifica a força da regra livremente pactuada

pelos condôminos.

Fortalecendo os entendimentos jurisprudenciais, acima expostos, SOUZA150 em

sua obra, assegura:

O condomínio eximir-se-á da responsabilidade principalmente se não existe garagista encarregado da vigilância permanente, ou ainda, se as chaves dos veículos ficarem em poder dos próprios condôminos. Também se isentará da responsabilidade se constar da convenção cláusula excludente ou se não houver culpa dos empregados do prédio.

Por todos esses posicionamentos, acredita-se que a controvérsia gerada pela

possibilidade de responsabilizar o condomínio pelo ressarcimento de danos ou furtos

ocorridos a veículos estacionados em seu interior, restou presente.

Contudo, é prudente que se tenha cautela ao analisar os argumentos dos tribunais

pátrios, pois em determinadas situações é reconhecida a obrigação do condomínio de

indenizar o prejuízo sofrido pelo condômino, se este possuir esquema de segurança ou

vigilância especializada. Neste caso, entende-se que se trata de responsabilidade objetiva.

De outro norte, tem-se assente, tanto por parte da doutrina como da

jurisprudência, que se as normas internas do condomínio afastarem a responsabilidade deste

em reparar o dano em cláusula expressa, afasta-se a obrigação de indenizar o condômino

lesado. Daí a convenção assume a natureza contratual.

150 SOUZA, Agnaldo Celino. Condomínio em Edifícios: Manual do condômino. p. 106.

Page 55: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Guilherme Damiani Nunes.pdf · UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE EDUCAÇÃO SUPERIOR

55

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Pelo presente trabalho, procurou-se analisar a responsabilização do condomínio

edilício, por eventuais furtos e danos ocorridos nos veículos estacionados nas suas

dependências. Também procurou-se esclarecer qual a natureza jurídica desta

responsabilidade.

Nos últimos anos, o rápido crescimento populacional e tecnológico se mostrou

evidente no mundo todo. E junto com tal fenômeno, alguns problemas que antes não existiam,

passaram a fazer parte da vida cotidiana.Há poucas décadas, no Brasil, o número de furtos de

veículos não se mostrava tão assustador quanto atualmente. Da mesma forma o número de

edifícios também cresceu de maneira tão desenfreada nesses últimos anos que hoje em dia os

grandes centros urbanos estão carregados desses gigantes de concreto.

Em vista disso, o assunto tratado neste trabalho é uma matéria relativamente nova

dentro do direito. Porém, apesar de nova, o tema vem sendo, muitas vezes, discutido pelos

tribunais pátrios, com resultados diversos, dependendo de uma posição mais tradicional ou

mais moderna dos julgadores.

Inicialmente, discorreu-se sobre o condomínio edilício, partindo-se do histórico e

para melhor entendê-lo, conceituou-se a propriedade, entendendo-se esta como sendo um

direito real, exclusivo, que vincula o bem ao proprietário, e este possui dentro dos limites

impostos pela lei o direito de usar, gozar e dispor da coisa. Só depois então se definiu esta

espécie de condomínio, uma vez que tratar-se de propriedade em comum.

Além disso, quanto a sua natureza jurídica, concluiu-se ser o condomínio edilício

um ente despersonalizado, porém tendo a possibilidade de adquirir direitos e assumir

obrigações, e ainda, pode estar em juízo e figurar, na ação, tanto como autor quanto réu.

A instituição legal do condomínio é o ato com que o condomínio se inicia e, é

sempre um ato de vontade e tem como pressuposto legal o registro no Cartório de Registro de

Imóveis, para que se projete o efeito erga omnes, ou seja, para que sua eficácia seja oponível

contra todos.

Por sua vez, a Convenção condominial é o instrumento que evidencia os direitos e

obrigações dos condôminos, e a sua importância para o condomínio. Dispõe a respeito dos

direitos e deveres dos condôminos, assim como especifica as atribuições do síndico, de

conformidade com as disposições do artigo 1.348 do Código Civil pátrio.

As bases da responsabilidade civil, fundada na culpa, inspirada pelo Código

Napoleônico que, por sua vez, traduz o pensamento do direito romano, foi introduzida no

Page 56: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Guilherme Damiani Nunes.pdf · UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE EDUCAÇÃO SUPERIOR

56

ordenamento jurídico brasileiro pelo legislador civil de 1916, conforme dispõe o artigo 159

daquele diploma legal.

Contudo, a sociedade evoluiu e as tendências da responsabilização civil foram,

também, sendo modificadas. E assim, chega-se ao diploma civil vigente – Código Civil de

2002, o qual consagra a responsabilização subjetiva, fundada na culpa, mas também admite a

responsabilidade objetiva, sem culpa, em casos expressamente previstos por lei.

Assim, o elemento principal da responsabilidade civil é o ato ilícito, considerado o

fato gerador da responsabilização. E tal ilicitude se dá em seu duplo aspecto, quer dizer, pode

fundar-se no aspecto objetivo e no aspecto subjetivo. O primeiro, considerando apenas a

conduta do agente, o fato em si e o resultado nocivo. O segundo, valorando também a conduta

tida como ilícita, quando o comportamento ilícito for, também, culposo.

Constatou-se que uma forma de classificar a responsabilidade civil estabelece a

presença ou não da culpa como fator que leva ao dano. Assim, quando a culpa se faz presente,

tem-se a responsabilidade civil subjetiva. Todavia, quando este elemento não se apresenta,

está-se diante da responsabilidade civil objetiva.

Desse modo, verificou-se a adoção da primeira teoria no direito brasileiro,

expressa no artigo 186 do Código Civil brasileiro, enquanto que a segunda teoria, baseada

principalmente no risco, é refletida em casos expressos em lei, principalmente quando a teoria

subjetiva não consegue atender às novas situações trazidas pela evolução social.

Por fim, com fulcro nas definições acerca dos dois institutos, quais sejam, do

condomínio edilício e da responsabilidade civil, as questões suscitadas no presente estudo e

que ensejaram os questionamento sobre a existência ou não da obrigação do condomínio

edilício em reparar danos sofridos nas suas dependências, levam em consideração uma série

de fatores e circunstâncias.

A começar pela natureza jurídica da responsabilidade civil do condomínio,

chegou-se, então, às noções de responsabilidade contratual e responsabilidade extracontratual.

A primeira decorre de uma obrigação preexistente, e a segunda surge sem que exista nenhuma

relação obrigacional anterior entre as partes. No entanto, observou-se que, muitas vezes, não

se mostra clara a configuração de uma relação obrigacional anterior, dificultando a

identificação da existência um dever jurídico anterior, como um contrato, por exemplo.

No que diz respeito à natureza deste tipo de responsabilidade foi possível concluir

que não é precisa, nem tão pouco certa, podendo ser contratual ou extracontratual, e uma das

formas de ser determinada é pela existência de cláusula expressa no regimento interno ou na

convenção, sendo neste caso a responsabilidade contratual.

Page 57: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Guilherme Damiani Nunes.pdf · UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE EDUCAÇÃO SUPERIOR

57

Ainda sobre a responsabilidade extracontratual, analisou-se, a responsabilidade

por ato próprio, que deriva de uma ação pessoal, por ato de terceiro, quando uma pessoa

responde por ações ou omissões de outra pessoa, desde que os dois tenham uma ligação

jurídica, legal ou contratual, e pelo fato da coisa, ou seja, quando ocorrer sem a conduta direta

do dono ou de seu preposto, sendo que o mesmo deveria cuidar da coisa.

Na seqüência foi abordado o tema em si, ou seja, a responsabilidade do

condomínio por dano causado a veículo de condômino. Para isso discorreu-se sobre o direito

dos condôminos de disciplinar suas relações, e percebeu-se que por si só a cláusula de não

indenizar, não exime o condomínio do ressarcimento, faltam-lhe outros requisitos, como o

que foi destacado em seguida, ou seja, a contratação de sistemas de segurança e vigilância.

Por fim, analisou-se o entendimento jurisprudencial e doutrinário acerca do tema

em questão, com as decisões favoráveis e as desfavoráveis. Alguns dos argumentos utilizados

pelos magistrados e doutrinadores favoráveis à responsabilização, é que disponibilizando o

condomínio de aparatos designados para a proteção e guarda dos veículos, bem como de

vigias encarregados de zelar, há a responsabilidade de indenizar o condômino lesado, até

mesmo se estiver expressamente descrito na convenção ou regimento interno, a cláusula

excludente de indenização. Nestes casos é imanente ao condomínio o dever de guarda e

vigilância dos automóveis lá estacionados e o mesmo há de assumir os riscos,

responsabilizando-se por qualquer evento danoso ocorrido. Por outro lado, em

posicionamento contrário a responsabilização, os argumentos empregados são que se a

convenção estabelece cláusula de não indenizar, não há como impor a responsabilidade do

condomínio, ainda que exista esquema de segurança e vigilância, pois tal esquema não

desqualifica a força da regra livremente constituída pelos condôminos.

Page 58: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Guilherme Damiani Nunes.pdf · UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE EDUCAÇÃO SUPERIOR

58

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

AVVAD, Pedro Elias. Condomínio em edificações no novo Código Civil comentado. Rio de

Janeiro: Renovar, 2004.

BRASIL. Lei n. 10.406, de 10 de janeiro de 2002.

CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de responsabilidade civil. 3. ed. São Paulo:

Malheiros, 2003.

DE PLÁCIDO E SILVA. Vocabulário Jurídico, v. II, 3. ed. São Paulo: Forense, 1973.

DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro. v. 3, 4. ed. amp. e atual. de acordo

com o novo código civil. São Paulo: Saraiva, 2002.

_____________. Curso de direito civil: responsabilidade civil. 7.v. 17 ed. São Paulo: Saraiva,

2003.

_____________. Direito Civil Brasileiro: Direito das Coisas 18. ed. São Paulo: Saraiva,

2002.

FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Novo dicionário Aurélio da língua portuguesa. 3.

ed. Curitiba: Positivo, 2004.

GAGLIANO, Pablo Stolze. PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de direito civil:

Obrigações, v.2. São Paulo:Saraiva, 2002.

GOMES, Orlando. Direitos reais. 13. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1998.

GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito das obrigações: parte especial, responsabilidade

civil. Coleção Sinopse Jurídica, tomo II. São Paulo: Saraiva, 2007.

KARPAT, Gabriel. Condomínios: orientação & prática. 7. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2002.

Page 59: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Guilherme Damiani Nunes.pdf · UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE EDUCAÇÃO SUPERIOR

59

LOPES, João Batista. Condomínio. 6. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1997.

MACHADO, João Ferreira. JÚNIOR, José Antônio Tavares Administrar um condomínio.

Goiânia: AB, 1998.

MALUF, Carlos Aberto Dabus. O Condomínio Edilício no novo Código Civil. 2.ed. São

Paulo: Saraiva, 2004.

MEZZARI, Mário Pazutti. Condomínio e incorporação no registro de imóveis. 2. ed. Porto

Alegre: Norton, 2002.

MONTEIRO, Washington de Barros. Curso de Direito Civil: direito das coisas. 37. ed. São

Paulo: Saraiva, 2003.

MONTENEGRO, Antônio Lindnergh C. Responsabilidade Civil. 2. ed. Rio de Janeiro:

Lúmen Júris, 1996.

NORONHA, Fernando. Direito das obrigações: fundamentos do direito das obrigações:

introdução à responsabilidade civil. São Paulo, Saraiva, 2003.

OLIVEIRA, Mariza Santos Abrahão. OLIVEIRA, Frederico Abrahão. Manual do

Condomínio em Edifícios. 2. ed. Porto Alegre: Sagra Luzatto, 1996.

PEREIRA Caio Mario da Silva. Condomínio e Incorporações. 10.ed. Rio de Janeiro: Forense,

2000.

______________. Instituições de direito civil, 19. ed., v.4. São Paulo: Forense, 2005.

_____________. Instituições de direito civil. Contratos – Declaração unilateral de vontade e

Responsabilidade civil. 11. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2003.

_____________. Responsabilidade Civil, 9. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1998.

Page 60: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Guilherme Damiani Nunes.pdf · UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE EDUCAÇÃO SUPERIOR

60

PEREIRA, Lafayette Rodrigues. Direito das Coisas. 1. ed. atual. Campinas: Russel Editores,

2003.

RÉGIS, Mário Luiz Delgado. In Novo Código Civil comentado. Ricardo Fiuza (coordenador).

São Paulo: Saraiva, 2002.

RODRIGUES, Silvio. Direito civil: dos contratos e das declarações unilaterais da vontade.

30. ed São Paulo: Saraiva, 2004.

_____________. Direito Civil: direito das coisas. 27. ed. São Paulo: Saraiva, 2002.

_____________. Direito civil: responsabilidade civil. 20. ed. 4.v. São Paulo: Saraiva, 2003.

SIDOU, J. M. Othon. Dicionário jurídico: Academia Brasileira de Letras Jurídicas. 8. ed. rev.

amp. e atual. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2003.

SILVA, Regina Beatriz Tavares da. In Novo Código Civil comentado. Ricardo Fiuza

(coordenador). São Paulo: Saraiva, 2002.

SOUZA, Agnaldo Celino. Condomínio em Edifícios: Manual do condômino. 3. ed. São Paulo:

Atlas, 2001.

STOCO, Rui. Responsabilidade civil e sua interpretação jurisprudencial. 4.ed. São Paulo:

Revista dos Tribunais, 1999.

______________. Tratado de responsabilidade civil: com comentários ao Código Civil de

2002. 6. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2004.

VENOSA, Silvio de Salvo. Direito Civil: direitos reais. 6. ed. São Paulo: Atlas, 2006.

_____________. Direito Civil: responsabilidade civil. 2. ed. São Paulo: Atlas, 2002.

WALD, Arnoldo. Direito das Coisas.10. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1995.

Page 61: UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE ...siaibib01.univali.br/pdf/Guilherme Damiani Nunes.pdf · UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE EDUCAÇÃO SUPERIOR

61