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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES
INSTITUTO A VEZ DO MESTRE
PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”
GABRIEL MOREIRA CUNHA NETO
ÉTICA NA GESTÃO DE RECURSOS HUMANOS
Orientadora
Profª: Adélia Maria de Oliveira Araújo
Brasília – DF
2008
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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES
INSTITUTO A VEZ DO MESTRE
PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”
ÉTICA NA GESTÃO DE RECURSOS HUMANOS
OBJETIVOS:
Esta publicação atende a complementação didático-
pedagógica de metodologia da pesquisa e a
produção e desenvolvimento de monografia, para o
curso de pós-graduação. Por Gabriel Moreira Cunha
Neto.
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AGRADECIMENTOS
Ao corpo docente do Instituto “A Vez do Mestre”, à
professora Adélia Maria Oliveira de Araújo pela
revisão dos textos e auxílio na formatação. Aos
alunos e pessoas que, direta e indiretamente,
contribuíram para a confecção desse trabalho
acadêmico e sua constante atualização.
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DEDICATÓRIA
Primeiramente a DEUS, por permitir-me superar
limitações e obstáculos.
Especialmente à minha mãe, Maria Aparecida, que
nunca mediu esforços para proporcionar as
condições necessárias à minha formação, e aos
meus filhos, dádivas de DEUS, que com sua
amizade e companheirismo dão-me forças no dia a
dia.
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RESUMO
Este trabalho teve como objetivo investigar a respeito dos requisitos de ética
necessários ao gestor de recursos humano. Aborda-se aspectos do Cenário atual
nas organizações e algumas definições de Ética, Moral e Princípios Éticos. Bem
como, a “História da ÉTICA”, sua origem e evolução ao longo dos tempos, os
pensamentos de alguns Filósofos; a Ética profissional e sua importância no ambiente
de trabalho; e, por fim a Ética na Gestão dos Recursos Humanos. As informações
utilizadas para o estudo foram obtidas por intermédio de pesquisa bibliográfica, a
partir de consulta em livros e publicações nacionais. Os resultados demonstraram
que a ética é um assunto relevante quando se trata de gestão dos recursos humanos
e principalmente do ambiente de trabalho; considerando que a falta dela gera
conflitos e também pode resultar em prejuízos financeiros e desgaste na imagem da
empresa. Foi constatado também, que os “requisitos necessários ao gestor de
Recursos Humanos” correspondem ao conjunto de regras, conhecimentos, atitudes e
condições essenciais ao indivíduo para assegurar uma convivência harmoniosa na
equipe. Levantaram-se fatores de relevância: informações sobre o tema; conceitos;
razões para a empresa ser ética, criação e implantação do Código de Ética; e,
aspectos relacionados a virtudes básicas profissionais. Buscou-se com o
levantamento e estudo, dados e informações visando esclarecer a importância e o
papel do gestor ético na execução das atividades de recursos humanos e gestão de
pessoas. Os resultados revelaram que a conduta ética dos gestores dignifica a
sociedade e cria novos elementos que seguem tal forma de viver. No entanto, a
busca por um ambiente ético não será pautada em ações isoladas, pois, consiste em
um processo contínuo de aperfeiçoamento, exigindo comprometimento de todos os
empregados da organização, independente do cargo que ocupam.
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METODOLOGIA
Definido o tema e o objetivo da pesquisa, buscou-se identificar em livros e
periódicos, estudiosos com foco em Recursos Humano, Gestão de Pessoas e Ética.
Uma lista de diversos livros que abordavam o assunto foi obtida pesquisando-
se em duas Bibliotecas. As informações utilizadas para o estudo foram obtidas por
pesquisa bibliográfica, a partir de consulta em livros, artigos e periódicos nacionais.
Foi utilizado o método de abordagem dedutivo, ou seja, buscou-se com o
levantamento e estudo, dados e informações visando identificar os requisitos de ética
necessários ao gestor de recursos humanos.
O primeiro passo para a definição do “TEMA” desta monografia foi efetuar um
levantamento sobre os principais conceitos envolvidos na Gestão de Recursos
Humanos.
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SUMÁRIO INTRODUÇÃO 09
CAPÍTULO I – GESTÃO DE RECURSOS HUMANOS
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1.1 Estilos de Gestão
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CAPÍTULO II – CONCEITOS E EVOLUÇÃO HISTÓRICA
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2.1 A Ética e as teorias sobre os princípios éticos
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2.2 Ética e Filosofia 22
2.2.1 Doutrinas Éticas 24
2.3 História e evolução da ética 25
2.31 A pré-história da ética 26
2.3.2 Ética grega 27
2.3.3 Ética cristã medieval 35
2.3.4 A ética moderna 36
2.3.5 Ética pós-moderna 40
2.3.6 Pós-modernidade: moralidade sem código ético 41
2.3.7 Ética contemporânea 48
CAPÍTULO III – A ÉTICA NO CONTEXTO EMPRESARIAL
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3.1 A evolução histórica da ética empresarial
51
3.2 A importância da ética para os profissionais 53
3.2.1 Deveres profissionais 55
3.3 Algumas razões para uma empresa ser ética 56
3.4 Código de Ética 58
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CAPÍTULO IV – ÉTICA E RECURSOS HUMANOS
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4.1 Exigências da função de gestor
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4.2 Papéis explícitos e implícitos 63
4.3 A disponibilidade de escolha 64
4.4 Dependência ou utilidade do emprego: os interesses 67
4.5 Formação e características pessoais 68
4.6 Ética nas atividades de Recursos Humanos 69
4.6.1 Valorização da atuação humana 72
4.6.2 Acesso a dados pessoais 73
4.7 Virtudes básicas profissionais 74
CONCLUSÕES
77
BIBLIOGRAFIA
79
FOLHA DE AVALIAÇÃO
80
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INTRODUÇÃO
A atualidade econômica e a competitividade têm levado as organizações a se
preocuparem com busca constante pela qualidade nas relações interpessoais. É
neste contexto, que as organizações buscam disseminar a cultura da Ética
profissional, juntamente com modelos de gestão de pessoas.
Diante de desafios cada vez mais intensos, emerge a fragilidade dos vínculos
entre pessoas e instituições; o que exige competência organizacional para a solução
dos problemas internos. Assim, as práticas de gestão direcionadas às atividades de
Recursos Humanos, pode representar um choque de conflitos entre os interesses
das organizações e das pessoas que dela fazem parte. Em contrapartida, a Ética
profissional está ligada diretamente à gestão de pessoas e consiste no grande
desafio das organizações: buscar equilíbrio entre o controle da qualidade dos
serviços prestados e as relações interpessoais, bem como fazer do local de trabalho,
um ambiente saudável e evitar processos judiciais resultantes da não observância da
ética no desenvolvimento das atividades e na convivência entre o Gestor e sua
equipe.
O estudo deste tema se apresenta importante, pois os requisitos de ética a um
determinado segmento de gestão, como o de Recursos Humanos, nem sempre é
foco de pesquisas. Os resultados do estudo podem gerar importantes informações
para o surgimento de novos indicadores de promoção da ética nas empresas.
Pretende-se com a pesquisa bibliográfica sobre o assunto, oferecer
informações relevantes sobre o tema. Na prática, objetiva-se proporcionar aos
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gestores, ferramentas para que possam criar Códigos de Ética, considerando a
cultura e os objetivos estratégicos da empresa.
Para tanto, o primeiro passo para identificar critérios de ética é situar o leitor
quanto ao cenário atual das empresas em relação ao Capital Humano nas
organizações; em seguida será vista a história e evolução da ética, visões de
filósofos, etc.; posteriormente, serão tratados aspectos da ética empresarial; e, no
final, a ética virá juntamente com a percepção dos gestores sobre o assunto e as
atividades de Recursos Humanos.
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CAPÍTULO I – GESTÃO DE RECURSOS HUMANOS
Marras (2000), afirma que na década de 20, a função de chefe de pessoal era
vista pelos empregados como ‘de confiança’ do patrão, revestida de poder e com
ações punitivas em nome da empresa. Enquanto a escola clássica operava com
base na força do autocratismo, surge um novo modelo de administração, com base
na mudança das relações entre empregados e trabalhadores. Esse novo modelo
propunha aumentar a produtividade pela eliminação dos conflitos e seus respectivos
custos.
Para Gil (2001), desde meados da década de 80, as empresas vêm sofrendo
desafios organizacionais, como a globalização da economia, evolução das
comunicações, desenvolvimento tecnológico, competitividade etc; que produziram
conseqüências de certa forma dramáticas para seu pessoal.
A forma como vinha sendo desenvolvida a Administração de Recursos
Humanos nas organizações, aliada às novas concepções acerca do papel dos
indivíduos nesse contexto, determinaram sérios questionamentos a partir da década
de 90. Dentre várias críticas, uma das que gerou maior polêmica referia-se
exatamente à terminologia utilizada para designá-la; pois, segundo Gil (2001), se
tratadas como recursos, as pessoas precisam ser administradas, para obter-se delas
o máximo rendimento possível. Conseqüentemente, tendem a ser consideradas
parte do patrimônio da organização. Como tais, passariam a ser reconhecidas como
fornecedoras de conhecimentos, habilidades, capacidade e, sobretudo, o mais
importante aporte para as organizações: a inteligência.
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Para Chiavenato (2001), na década de 90, iniciou-se a Era da Informação com
mudanças rápidas, imprevistas, turbulentas e inesperadas. A tecnologia da
informação trouxe desdobramentos imprevisíveis e transformou o mundo em uma
aldeia global; o que resultou no surgimento de uma competitividade intensa e
complexa entre as organizações.
Dessa forma, o capital financeiro deixou de ser o recurso mais importante,
cedendo lugar ao conhecimento. A antiga Administração de Recursos Humanos deu
lugar à Gestão de Pessoas, onde as pessoas deixam de ser simples recursos
humanos para serem abordadas como seres dotados de inteligência, personalidade,
conhecimentos, habilidades, destrezas, aspirações e percepções singulares. As
pessoas são vistas como os novos parceiros da organização.
1.1 Estilos de Gestão
Vasconcelos (1995), afirma que as novas realidades que estão emergindo das
mudanças observadas no sistema produtivo mundial e nacional vêm redefinindo
traços culturais sedimentados, padrões de comportamento gerencial, estruturas
organizacionais e metodologias de abordagens de questões estratégicas e
operacionais. A competitividade traduzida pelo binômio produtividade e qualidade
torna-se o ponto crítico para a sobrevivência, o crescimento e a perpetuação das
empresas quando seus resultados dependem da qualidade do desempenho dos
seus Recursos Humanos. Assim, a gerência de pessoas passa a ser um componente
indispensável de um desempenho corporativo e vantagem competitiva sustentados.
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Vasconcelos (1995), entende que gestão é o conjunto de práticas
administrativas colocadas em execução pela direção de uma empresa para atingir os
objetivos que ela se tenha fixado. É assim que o estilo de gestão compreende o
estabelecimento das condições de trabalho, a organização do trabalho, a natureza
das relações hierárquicas, o tipo de estruturas organizacionais, os sistemas de
avaliação e controle dos resultados, as políticas em matéria de gestão do pessoal, e
os objetivos, os valores e a filosofia da gestão que o inspiram.
Todo estilo de gestão, segundo Vasconcelos (1995), é influenciado ao mesmo
tempo pelos fatores internos: estratégia, recursos, tipo de pessoal, tecnologia
utilizada, culturas história, tradições, personalidades dos dirigentes, etc.; por fatores
externos: contexto econômico, mundialização, concorrência, ciclo econômico, etc.; e
pelos fatores dominantes: contexto cultural e contexto social (movimentos sociais,
sindicatos, grupos de pressão).
Para Vasconcelos (1995), todos os estilos de gestão possuem dois
componentes:
“Um componente abstrato, prescrito, formal e estático, que eu chamo de modo de gestão prescrito, e um componente concreto, real, informal e dinâmico, o que qualifico de modo de gestão real.” (VASCONCELOS, 1995, p.119)
O estilo de gestão pode ser modificado, pois o método de administração é uma
construção social. Estas modificações, segundo Vasconcelos (1995), podem, antes
de tudo, atingir a organização do trabalho e suas condições. É assim que se pode
agregar novos valores e aprimorar cada tarefa.
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Nesse contexto, o ambiente de trabalho pode modificar e influir sobre a
atuação do ser humano, seja, qual for a função que exerça, mas a conduta só terá
teor ético se for virtuosa em si. Em uma tendência mundial, surge a supervalorização
do dinheiro, para uma superestima ao poder e para incerteza sobre as condutas,
dilapidando princípios morais, diante dessas maiores evidências de conveniência e
egoísmo acentuado, mas nada disto altera a essência da virtude nem a doutrina ética
sem seus axiomas.
Daí, a necessidade de conhecer conceitos, teorias e princípios éticos; assunto
apresentado no próximo capítulo.
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CAPÍTULO II - CONCEITOS E EVOLUÇÃO HISTÓRICA
A palavra Ética é originada do grego ethos, modo de ser, caráter - pelo latim
mos, ou no plural mores - costumes, de onde se derivou a palavra moral. Em
Filosofia, Ética significa o que é bom para o indivíduo e para a sociedade, e seu
estudo contribui para estabelecer a natureza de deveres no relacionamento indivíduo
- sociedade.
Valls (1992), entende a ética como sendo um estudo ou uma reflexão,
científica ou filosófica, e eventualmente até teológica, sobre os costumes ou sobre as
ações humanas. A ética pode ser o estudo das ações ou dos costumes, e pode ser a
própria realização de um tipo de comportamento. Tratando de normas de
comportamentos, deveria chamar-se uma ciência normativa. Se tratar de costumes,
seria uma ciência descritiva. Ou seria uma ciência de tipo mais especulativo, que
tratasse, por exemplo, da questão fundamental da liberdade.
Toffler (1993) refere-se à palavra “ético(a)” conforme a definição do dicionário
Webster’s Seventh New Collegiate Dicionary, onde ética(o) significa “relativo ao que
é bom ou mau e, tendo relação com dever e obrigação moral”. “Moral” é definida
como “relacionada aos princípios de certo e errado”. A ética pode ser interpretada
como um termo genérico que designa aquilo que é freqüentemente descrito como a
"ciência da moralidade", seu significado derivado do grego, quer dizer 'Morada da
Alma', isto é, suscetível de qualificação do ponto de vista do bem e do mal, seja
relativamente à determinada sociedade, seja de modo absoluto. Ser “ético” tornou-se
um rótulo que atribuímos a situações em que parece que algo pode ser ou foi feito de
forma errada. Rotular implica freqüentemente assumir que não somente estamos
conscientes do que queremos dizer, mas que os outros também querem dizer a
mesma coisa quando utilizam o rótulo. Essencial, indispensável, que deve ser feito,
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cumprido, que se requer, absolutamente preciso, que não pode deixar de ser;
forçoso, inevitável, fatal, obrigatório do ponto de vista moral. Define-se “Moral” como
um conjunto de normas, princípios, preceitos, costumes e valores que norteiam o
comportamento do indivíduo no seu grupo social. Moral e ética não devem ser
confundidos: enquanto a moral é normativa, a ética é teórica, e buscando explicar e
justificar os costumes de uma determinada sociedade, bem como fornecer subsídios
para a solução de seus dilemas mais comuns.
A ética, segundo Toffler (1993), também não deve ser confundida com a lei,
embora com certa freqüência a lei tenha como base princípios éticos. Ao contrário do
que ocorre com a lei, nenhum indivíduo pode ser compelido, pelo Estado ou por
outros indivíduos, a cumprir as normas éticas, nem sofrer qualquer sanção pela
desobediência a estas; por outro lado, a lei pode ser omissa quanto a questões
abrangidas no escopo da ética.
Para Sá (2001), em seu sentido de maior amplitude, a Ética tem sido
entendida como a ciência da conduta humana perante o ser e seus semelhantes.
Envolve, pois, os estudos de aprovação ou desaprovação da ação dos homens e a
consideração de valor como equivalente de uma medição do que é real e
voluntarioso no campo das ações virtuosas. Encara a virtude como prática do bem e
esta como a promotora da felicidade dos seres, quer individualmente, quer
coletivamente, mas também avalia os desempenhos humanos em relação às normas
comportamentais pertinentes. Avalia a vontade e o desempenho virtuoso do ser em
face de suas intenções e atuações, quer relativos à própria pessoa, quer em face da
comunidade em que se insere.
Srour (2005) afirma que a ética é uma disciplina teórica, um corpo de
conhecimentos, a exemplo das disciplinas como a biologia, a medicina, a economia,
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a engenharia, a sociologia, o direito, a psicologia ou a astronomia. Trata-se de uma
reflexão sistemática de abrangência enciclopédica. Esse entendimento, não é
universal, e, as variadas acepções atribuídas ao conceito, provocam inúmeros mal-
entendidos. Para o autor, a confusão maior diz respeito à identificação da ética com
seu objeto de estudo:
“E qual é este? A moralidade, os fenômenos morais, os fatos sociais regulados por normas morais ou submetidos a avaliações morais. Naturalmente, tanto as regras de comportamento como os juízos sobre o bem e o mal, o certo e o errado, o justo e o injusto, o virtuoso e o vicioso, o legítimo e o ilegítimo, são socialmente convencionados e partilhados. Esses padrões morais correspondem a fenômenos históricos que distinguem, primeira facie, os bons dos maus costumes. São, pois, padrões culturais.”(SROUR,2005,p.306)
É possível rastrear na etimologia razões atenuantes para esse baralhamento
que a força do uso consagra. Ética vem do grego – ethos – que significa distinto,
disposição, modo de ser adquirido; enquanto moral vem do latin – mos ou mores –
costumes, maneiras de agir, normas adquiridas por hábito. Ambas as categorias
referem-se ao conjunto de costumes tradicionais de uma sociedade, a obrigações
sociais e, por conseguinte, a fenômenos de natureza histórica; não ao resultado de
reflexões sistemáticas. Eis aí, portanto, um terreno fértil para que os dois termos
sejam tratados como sinônimos. (SROUR, 2005, p.307)
Segundo Srour (2005), a falta de distinção, todavia, vai além da equivalência
estabelecida entre a ética e a moral: costuma-se também dizer que tal ou qual sujeito
é “ético”, tal ou qual organização é “ética”. A acepção do conceito, aqui, remete a um
valor cultural específico – o de integridade, de seriedade ou de probidade. Mas o que
é ser íntegro?
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“É um sujeito de bem, de caráter, decente e confiável, uma pessoa de “boa vontade”. É ser alguém que conduz com honestidade, lealdade, idoneidade, veracidade ou transparência e que, além de obedecer às leis, respeita o próximo. Em última instância, a integridade qualifica o agente social que pratica os ‘bons costumes’, semeia confiança ao seu redor e angaria credibilidade pessoal. De modo que a pecha de ‘falta de ética’ significa falta de escrúpulos, quebra de confiança ou lesão ao bem comum. Vale lembrar, então, que a integridade pessoal contrasta com o oportunismo interesseiro, da mesma forma que a integridade pública se contrapõe à corrupção ou à apropriação de bens organizacionais em proveito próprio.” (SROUR, 2005, p.307)
Srour (2005), diante da indagação: por que ocorrem tais confusões
semânticas? Para o autor, muitas razões poderiam ser alinhadas. No contexto
brasileiro, encontramos um denominador comum: o termo moral foi em boa parte
desmoralizado ou seu uso tornou-se rançoso. Um motivo curioso, de somenos
importância e quase folclórico, poderia ser citado. Durante o regime outoritário-
militar, cursos de educação moral e cívica foram introduzidos, visando a formar o
caráter das crianças e dos jovens. Os ensinamentos, embora edificantes, foram
considerados em geral enfadonhos, ufanistas e pouco eficazes. Quando consultados
a respeito da matéria, os alunos que se pretendia moldar exibiam um misto de
desinteresse e de galhofa. Em poucos anos, a disciplina deixou de ser levada a
sério, tornando-se motivo de pilhéria, o que desvirtuou os objetivos de sua instituição.
Outra razão pela qual se evita o termo moral tem raízes no passado remoto: os
países latinos expõem aos olhos mais avisados uma duplicidade moral à semelhança
da dupla face de Janus – um sistema de normas morais para uso público, de caráter
oficial, e um sistema para uso privado, de caráter oficioso. Um dos efeitos mais
diretos dessa hibridez é o falso moralismo ou o moralismo hipócrita, ou seja:
enquanto manifestações públicas dos agentes sociais são enfaticamente
escrupulosas, num claro tributo ao rigorismo, as observações tecidas no círculo
íntimo são laxistas e entoam hinos, à leniência moral e a um cinismo miúdo que
incentiva a adoção de condutas transgressoras. Vive-se, assim, na mais absoluta
ambigüidade – roupa limpa por fora, roupa suja por baixo.
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2.1 A Ética e as teorias sobre os princípios éticos
Para Moreira (1999), a palavra ética possui dois significados principais:
disciplina integrante da ciência da filosofia e conjunto de regras. Como parte da
filosofia, a ética é o estudo das avaliações do ser humano em relação às suas
condutas ou às dos outros. Essas avaliações são feitas sob a ótica do bem e do mal,
de acordo com um critério que geralmente é ditado pela moral.
Como conjunto de regras, a ética é o rol dos conceitos aplicáveis às ações
humanas, que fazem delas atitudes compatíveis com a concepção geral do bem e da
moral. Os conceitos éticos são extraídos da experiência e do conhecimento da
humanidade. Há pelo menos cinco teorias a respeito da formação dos conceitos
éticos.
Segundo Moreira (1999) a teoria do fundamentalismo propõe que os conceitos
éticos sejam obtidos de uma fonte externa ao ser humano, a qual pode ser um livro
como a Bíblia, um conjunto de preceitos adotados por um grupo, ou até mesmo outro
ser humano. Críticos costumam dar ênfase ao fato de que ela não permite que o ser
humano encontre o certo ou errado por si mesmo.
A teoria do utilitarismo propõe que o conceito ético seja elaborado com base
no critério do maior bem para a sociedade como um todo. Onde em uma
circunstância na qual o maior bem beneficie poucos, em contraposição ao bem
menor que possa ser feito a muitos, a primeira atitude deverá ser a escolhida.
Críticos destacam a dificuldade de se aquilatar em cada caso o “bem maior para a
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sociedade” e expressam o desagrado pela submissão da moral a uma regra
matemática. (MOREIRA, 2002, p. 22)
A teoria do dever ético, defendida por Emanuel Kant (1724-1804) propõe que
o conceito ético seja extraído do fato de que cada um deve se comportar de acordo
com princípios universais. Um exemplo seria o dever de cumprir com um
compromisso assumido. É um princípio universal aquele que determina a quem
assume uma obrigação o dever de cumpri-la.
Kant, de acordo com Moreira (1999), propôs, também, que os conceitos éticos
sejam alcançados pela aplicação de duas regras:
- Qualquer conduta aceita como padrão ético deve valer para todos os que se encontrem na mesma situação, sem exceções;
- Só se deve exigir dos outros o que exigimos de nós mesmos. (MOREIRA, 1999, p. 22)
Para Moreira (1999), a crítica da teoria kantiana fundamenta-se na dificuldade
de alcançar um consenso sobre quais sejam os princípios universais.
A teoria contratualista parte do pressuposto de que o ser humano assumiu
com seus semelhantes a obrigação de se comportar de acordo com as regras
morais, para poder conviver em sociedade. Os conceitos éticos seriam extraídos,
portanto, das regras morais que conduzissem à perpetuação da sociedade, da paz e
da harmonia do grupo social.
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A principal crítica a tal teoria fundamenta-se na mutabilidade das regras
morais aplicáveis a certos grupos sociais. Com base nessa teoria, dizem os seus
críticos, um grupo de criminosos que possui apenas uma moral própria teria as suas
ações legitimadas sob o ponto de vista ético.
A última teoria informadora dos princípios éticos é a do relativismo, segundo a
qual cada pessoa deveria decidir sobre o que é ou não ético, com base nas suas
próprias convicções e na sua própria concepção sobre o bem e o mal. Assim sendo,
o que é ético para um pode não ser para outro. A crítica a essa teoria é idêntica
àquela feita em relação à anterior: ela pode ser usada para justificar ações que não
são compatíveis com a concepção coletiva de moral.
O estudo de todas essas teorias, segundo Moreira (1999), revela que os
conceitos ou preceitos éticos precisam ser elaborados tendo em conta todas elas,
mas sem se ater a uma em especial. Todavia, cada conceito ético, para ser aceito
como tal, precisa claramente encontrar guarida em pelo menos uma teoria.
O objetivo de uma teoria da ética é determinar o que é bom, tanto para o
indivíduo como para a sociedade como um todo. Os filósofos antigos adotaram
diversas posições na definição do que é bom, sobre como lidar com as prioridades
em conflito dos indivíduos versus o todo, sobre a universalidade dos princípios éticos
versus a "ética de situação". Nesta o que está certo depende das circunstâncias e
não de uma qualquer lei geral. E sobre se a bondade é determinada pelos resultados
da ação ou pelos meios pelos quais os resultados são alcançados.
O homem vive em sociedade, convive com outros homens e, portanto, cabe-
lhe pensar e responder à seguinte pergunta: “Como devo agir perante os outros?”.
Trata-se de uma pergunta fácil de ser formulada, mas difícil de ser respondida. Ora,
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esta é a questão central da Moral e da Ética. Enfim, a ética é julgamento do caráter
moral de uma determinada pessoa.
2.2 Ética e Filosofia
Segundo o dicionário de filosofia, ética é a ciência que tem como objeto os
juízos de valor que distinguem entre o bem e o mal. Historicamente, o senso comum
trata moral e ética como sinônimos, mas, desde E. Kant, no século do Iluminismo, a
ética é considerada superior à moral.
Para Moreira (1999), a moral é historicamente datada e suas normas e
sanções mudam de acordo com as transformações da sociedade, sempre refletindo
a visão do mundo e os interesses das elites. Basta recordar as manifestações dos
senhores escravocratas, dos primeiros capitães da indústria e dos tecnocratas das
grandes empresas, hoje, supostamente racionais e ideologicamente neutros, ao
justificarem a pobreza e a desigualdade. Enquanto a moral é particularista,
profundamente vinculada e identificada com grupos religiosos, nacionalistas, étnicos,
políticos ou classistas, a ética tem conteúdo universal e parte do princípio da
igualdade dos seres humanos e de seus direitos inalienáveis à paz, ao bem-estar e à
felicidade, individual e coletiva. Suas manifestações concretas são a cooperação e a
solidariedade numa organização social pluralista e de democracia participativa.
A ética postula um código de conduta para a comunidade de indivíduos que
exige um comportamento baseado em valores consentido e praticado em dimensões
universais. O cerne da ética universal transcende a todos os outros sistemas de
crenças e valores, como síntese da consciência humana, ciente da preciosidade de
todas as formas de vida humana e dos direitos dos indivíduos à liberdade e
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felicidade. Para alguns filósofos da Antiguidade e os profetas bíblicos, a ética seria
instituída pelo comportamento virtuoso, em conformidade com a natureza dos atores
sociais e dos fins buscados por eles. Postularam que o ser humano seria, por
natureza, um ser racional, cuja virtude se manifesta pela razão que comanda as
paixões. Essa virtude seria o efeito da potencialidade da natureza humana desde
que a razão comande as paixões e oriente a vontade, pois só o ignorante é violento,
passional e vicioso.
Moreira (1999), afirma que em filosofia, o comportamento ético é aquele que é
considerado bom, e, sobre a bondade, os antigos diziam que: o que é bom para a
leoa, não pode ser bom à gazela. E, o que é bom à gazela, fatalmente não será bom
à leoa. Este é um dilema ético típico.
Para Shour (2005), como disciplina teórica, a ética sempre fez parte da
filosofia e sempre definiu seu objeto de estudo como sendo a moral, o dever fazer, a
qualificação do bem e do mal, a melhor forma de agir coletivamente. Neste enfoque
milenar, a ética avalia os costumes, convalida-os ou reprova-os, diz quais ações
sociais são moralmente válidas e quais não o são. De maneira que, a ética filosófica
corresponde a um discurso racional de base especulativa. Tende a estabelecer
princípios constantes e universalmente válidos de valorização e de condução da
vida. Define o bem moral como o ideal do melhor agir ou do melhor ser. E tem
procurado as fontes da moral nas divindades, na natureza ou no pensamento
racional.
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2.2.1 Doutrinas Éticas
As Doutrinas Éticas fundamentais nascem e se desenvolvem em diferentes
épocas e sociedades como respostas aos problemas básicos apresentados pelas
relações entre os homens, e, em particular, pelo seu comportamento moral efetivo.
Por isto, existe uma estreita vinculação entre os conceitos morais e a conseguinte, as
doutrinas éticas não podem ser consideradas isoladamente, mas dentro de um
processo de mudança e de sucessão que constitui propriamente a sua história.
Ética e história, portanto, relacionam-se duplamente com a vida social e com a
sua própria história, já que cada doutrina está em conexão com as anteriores
tomando posição contra elas ou integrando alguns problemas e soluções
precedentes e também com as doutrinas posteriores prolongando-se ou
enriquecendo-se nelas. Em toda moral efetiva se elaboram certos princípios, valores
ou normas. Mudando radicalmente a vida social, muda também a vida moral. Os
princípios, valores ou normas encarnados nela entram em crise e exigem a sua
justificação ou a sua substituição por outros.
Surge então a necessidade de novas reflexões ou de uma nova teoria moral,
pois os conceitos valores e normas vigentes se tornaram problemáticos. Assim se
explica a aparição e sucessão de doutrinas éticas fundamentais em conexão com a
mudança e a sucessão de estruturas sociais, e, dentro delas, da via moral.
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2.3 História e evolução da Ética
Estima-se que os estudos sobre ética tenham sido iniciados com filósofos
gregos, há 25 séculos. Hoje o assunto ultrapassa os limites da filosofia e alcança
pesquisadores de diversos ramos do conhecimento.
Platão sugere é a idéia de que Sócrates fazia filosofia nas praças de Atenas,
quer seja com os seus oponentes, os sofistas, quer seja com os seus discípulos ou
concidadãos. A postura primeira daquele que é exaltado como o modelo do
verdadeiro filósofo é resumida na famosa expressão: “só sei que nada sei” e por isso
mesmo, pergunta. Como observaremos o campo sobre o qual versará as
investigações socráticas, é o campo do agir humano, por isso perguntava: o que é a
coragem? O que é a amizade? O que é o bem? O que é a justiça? O que é a
fortaleza? Seus interlocutores respondiam dizendo serem virtudes? Sócrates voltava
a perguntar? O que é a virtude? Respondiam os interlocutores: é agir de acordo com
o bem. Ao que Sócrates perguntava: que é o bem? Para muitos autores, com tal
postura, Sócrates inaugurou a ética. Se assim o é, tal postura é indicadora de várias
perspectivas para delimitação do campo próprio deste conhecimento.
A origem da palavra ética vem do grego “ethos”, que quer dizer o modo de
ser, o caráter. Os romanos traduziram o “ethos” grego, para o latim “mos”, que quer
dizer costume, de onde vem a palavra moral. Tanto “ethos” com “mos” indicam um
tipo de comportamento propriamente humano que não é natural, o homem não nasce
com ele como se fosse um instinto, mas que é adquirido ou conquistado por hábito.
Portanto, ética e moral, pela própria etimologia, diz respeito a uma realidade humana
que é construída histórica e socialmente a partir das relações coletivas dos seres
humanos na sociedade onde nascem e vivem.
26
No dia-a-dia não se faz distinção entre ética e moral, as duas palavras são
usadas como sinônimos. Mas os estudiosos da questão fazem uma distinção entre
as duas palavras, sendo a Moral definida como o conjunto de normas, princípios,
preceitos, costumes, valores que norteiam o comportamento do indivíduo no seu
grupo social e a ética definida como a teoria, o conhecimento ou a ciência do
comportamento moral, que busca explicar, compreender, justificar e criticar a moral
ou as morais de uma sociedade. A ética é filosófica e científica e a moral é
normativa.
Considera-se que a primeira apresentação sistemática da Ética encontra-se
em Aristóteles, porque teria sido ele o primeiro autor a buscar os princípios da ação
humana por via de uma reflexão acerca da diferença entre conhecimento teórico e
conhecimento prático. Foi levado a essa distinção pela constatação de que o saber
relacionado às coisas humanas não seria susceptível de demonstração teórica, tal
como ocorre na Física e na Matemática.
2.3.1 A Pré-história da ética
Na pré-história, o ser humano aprendeu a lutar pela sua sobrevivência em um
ambiente aparentemente hostil, onde as feras se matavam em busca de alimentos.
Era o que se conhece por "lei da selva", onde o mais forte elimina o que lhe é inferior
para devorá-lo ou para não ameaçar a sua existência. Até os dias de hoje, quando
queremos nos referir a uma determinada situação em que não há regras para o
convívio social, falamos que ali reina a "lei da selva", ou seja, não há leis, não há
organização.
27
O que se pode observar é que, na pré-história, realmente, o ser humano vivia
em estado de luta e defesa pela sobrevivência contra os animais que lhe eram
superiores em força e contra os intempéries mesmo da natureza.
Os principais sinais do ethos podem ser buscados na Grécia arcaica. A ética
já estava presente nos poemas de Homero, Hesíodo, Tirteu e Sólon. Homero serviu
de modelo a Aristóteles e outros gregos de sua época. Em toda a Gréciaclássica e
helenística, a poesia homérica foi lida, decorada e tomada como padrão estético e
ético 2. Werner Jaeger descreve bem a presença da ética já em Homero, não só no
uso da areté para referir-se às qualidades morais ou espirituais, mas principalmente
na caracterização dos seus personagens, nos seus hábitos e na convivência entre
eles. Algumas das virtudes que Aristóteles irá relacionar na EN são exaltadas no
herói principal da Odisséia que detém, acima da valentia, a prudência e a astúcia.
2.3.2 Ética Grega
Na Ética Grega, os problemas são objetos de uma atenção especial na
filosofia grega, exatamente quando se democratiza a via política da antiga Grécia e
particularmente de Atenas. Ao naturalismo dos filósofos do primeiro período (os pré-
socráticos), sucede uma preocupação com os problemas do homem, e, sobretudo,
com os problemas políticos e morais.
Para Vasquez (2004), as novas condições que se apresentam no século V
(a.n.e) em muitas cidades gregas – e especialmente em Atenas – com o triunfo da
democracia escravista sobre o domínio da velha aristocracia, com a democratização
da vida política, com a criação de novas instituições eletivas e com o
desenvolvimento de uma intensa vida pública, deram origem à filosofia política e
moral. As idéias de Sócrates, Platão e Aristóteles neste campo estão relacionadas
28
com a existência de uma comunidade democrática limitada e local (o Estado-cidade
ou polis), ao passo que a filosofia dos estóicos e dos epicuristas surge quando este
tipo de organização social já caducou e a relação entre o indivíduo e a comunidade
se apresenta em outros termos.
Para Sócrates, o saber fundamental é o saber a respeito do homem –
“conhece-te a ti mesmo”. Portanto, segundo Vasquez (2004), a ética socrática é
racionalista, onde é possível encontrar uma concepção do bem (como felicidade da
alma) e do bom (como o útil para a felicidade); a tese da virtude (capacidade radical
e última do homem) – como conhecimento, e do vício como ignorância (quem age
mal é porque ignora o bem; por conseguinte, ninguém faz o mal voluntariamente); e,
a tese de origem sofista, segundo a qual a virtude pode ser transmitida e ensinada.
Resumindo, para Sócrates, bondade, conhecimento e felicidade se entrelaçam
estreitamente. O homem age retamente quando conhece o bem e, conhecendo-o,
não pode deixar de praticá-lo; por outro lado, aspirando o bem, sente-se dono de si
mesmo e, por conseguinte, é feliz.
Como Sócrates é o fundador da ciência em geral, mediante a doutrina do
conceito, assim é o fundador, em particular da ciência moral, mediante a doutrina de
que eticidade significa racionalidade, ação racional. Virtude é inteligência, razão,
ciência, não sentimento, rotina, costume, tradição, lei positiva, opinião comum. Tudo
isto tem que ser criticado, superado, subindo até à razão, não descendo até à
animalidade - como ensinavam os sofistas. É sabido que Sócrates levava a
importância da razão para a ação moral até àquele intelectualismo que, identificando
conhecimento e virtude - bem como ignorância e vício - tornava impossível o livre
arbítrio. Entretanto, como a gnosiologia socrática carece de uma especificação
lógica, precisa - afora a teoria geral de que a ciência está nos conceitos - assim a
ética socrática carece de um conteúdo racional, pela ausência de uma metafísica. Se
o fim do homem for o bem - realizando-se o bem mediante a virtude, e a virtude
29
mediante o conhecimento - Sócrates não sabe, nem pode precisar este bem, esta
felicidade, precisamente porque lhe falta uma metafísica. Traçou, todavia, o itinerário,
que será percorrido por Platão e acabado, enfim, por Aristóteles. Estes dois filósofos,
partindo dos pressupostos socráticos, desenvolverão uma gnosiologia acabada, uma
grande metafísica e, logo, uma moral.
Para Sócrates a Moral é a parte culminante da sua filosofia. O filósofo ensina
o bem pensar para bem viver. O meio único de alcançar a felicidade ou semelhança
com Deus, fim supremo do homem, é a prática da virtude. A virtude adquiri-se com a
sabedoria ou, antes, com ela se identifica. Esta doutrina, uma das mais
características da moral socrática, é conseqüência natural do erro psicológico de não
distinguir a vontade da inteligência. Conclusão: grandeza moral e penetração
especulativa, virtude e ciência, ignorância e vício são sinônimos. "Se músico é o que
sabe música, pedreiro o que sabe edificar, justo será o que sabe a justiça".
Sócrates reconhece também, acima das leis mutáveis e escritas, a existência
de uma lei natural - independente do arbítrio humano, universal, fonte primordial de
todo direito positivo, expressão da vontade divina promulgada pela voz interna da
consciência. Sublime nos lineamentos gerais de sua ética, Sócrates, em prática,
sugere quase sempre a utilidade como motivo e estímulo da virtude. Esta feição
utilitarista empana-lhe a beleza moral do sistema.
30
Vasquez (2004), cita que a ética de Platão depende intimamente, como a sua
política:
a) da sua concepção metafísica (dualismo do mundo sensível e do mundo das idéias permanentes, eternas, perfeitas e imutáveis, que constituem a verdadeira realidade e têm como cume a Idéia do Bem, divindade, artífice ou demiurgo do mundo;
b) da sua doutrina da alma (princípio que anima ou move o homem e consta de três partes: razão, vontade ou ânimo, e apetite; a razão que contempla e quer racionalmente é a parte superior, e o apetite, relacionando com as necessidades corporais, é a inferior). (VASQUEZ, 2004, p. 57)
Pela razão, como faculdade superior e característica do homem, a alma se
eleva – mediante a contemplação – ao mundo das idéias. Seu fim último é purificar
ou libertar-se da matéria para contemplar o que realmente é e sobretudo, a Idéia do
Bem. Para alcançar esta purificação, é preciso praticar várias virtudes, que
correspondem a cada uma das partes da alma e consistem no seu funcionamento
perfeito: a virtude da razão é a prudência; a da vontade ou ânimo, a fortaleza; e a do
apetite, a temperança. Estas virtudes guiam ou refreiam uma parte da alma. A
harmonia entre as diversas partes constitui a quarta virtude, ou justiça.
Segundo Platão, o indivíduo por si só não pode aproximar-se da perfeição,
tornando-se necessário o Estado ou Comunidade política. O homem é bom enquanto
bom cidadão. A idéia do homem se realiza somente na comunidade. A ética
desemboca necessariamente na política.
Para Vasquez (2004), para Aristóteles, a idéia não existe separada dos
indivíduos concretos, que são o único existente real; a idéia existe somente nos
seres individuais. Mas no ser individual, é preciso distinguir o que é atualmente e o
31
que tende a ser (ou seja, o ato e a potência: o grão é planta em potência e a planta –
como ato – é a realização definitiva da potência). A mudança universal é a passagem
incessante da potência ao ato. Existe somente um ser que é ato puro, sem potência:
Deus. Também o homem deve realizar com seu esforço o que é potência, para
realizar-se como ser humano. A ética de Aristóteles, como a de Platão, está unida à
filosofia política, já que para ele – como para seu mestre – a comunidade social e
política é o meio necessário da moral. Somente nela pode realizar-se o ideal da vida
teórica na qual se baseia a felicidade. O homem enquanto tal só pode viver na
cidade ou polis; é, por natureza, um animal político, ou seja, social. Somente os
deuses ou os animais não têm necessidade da comunidade política para viver; o
homem, entretanto, deve necessariamente viver em sociedade. Por conseguinte, não
pode levar uma moral como indivíduo isolado, mas como membro da comunidade.
Por sua vez, porém, a vida moral não é um fim em si mesmo, mas condição ou meio
para uma vida verdadeiramente humana: a vida teórica na qual consiste a felicidade.
Toda a filosofia clássica greco-romana apontava sempre de forma essencial
para a convivência harmoniosa entre os homens, tendo levado os antigos a
pensarem formas de conquistarem tal prática. Isto levou Aristóteles, por exemplo, a
construir o conceito de cidadania com base no “homem coletivo”, educado para o
hábito da ética. A ética tal como a entendemos hoje, tinha no pensamento aristotélico
uma divisão: a ética, que corresponde à generosidade e à esperança, e a dianoética,
que corresponde à sabedoria intelectual, à filosofia. O que Aristóteles pretendia era
mostrar que a filosofia como puro conhecimento só podia fornecer aos homens
virtude se fosse praticada, quer dizer que a filosofia só se realizava na medida em
que se conseguisse praticar generosamente o hábito da virtude coletiva, levando o
homem a conquistar a felicidade, bem supremo da alma. Portanto temos aqui dois
fundamentos da futura filosofia: práxis (prática) e realização humana plena no
coletivo. Diferentemente do pensamento de seus antecessores ilustres, o
pensamento socrático-platônico, a virtude não é mais um fim em si mesmo, mas se
32
realiza pela felicidade de todos cidadãos. Claro, e aqui está uma certa confusão
muito comum, a educação é um processo coletivo de construção individual.
Individual, não solitária. Este processo coletivo é a práxis, o hábito prático da ética
visando o melhor para a comunidade, o seu bem comum. E mais: esta prática ética
que visa à convivência da coletividade – que no limite deve possibilitar a
sobrevivência de todos -, construída pela práxis educacional e realizada pela práxis
da generosa convivência, não está ainda assegurada porquanto cabe ao homem, em
última análise, optar pelo justo ético.
Aqui está, quiçá, a maior influência sobre a Ética da Personalidade de
Kierkegaard: a opção ética pelo justo, de acordo com o bem comum. Logo, essa
responsabilidade social que deriva dessa Paidéia, essa Ética da Responsabilidade
aristotélica irá impregnar posteriormente outras filosofias. No entanto, a grande
diferença para o filósofo dinamarquês, é que a opção pela ética deriva de um diálogo
quase ontológico do “Ser” consigo mesmo. Não que fatores exteriores não tenham
influência sobre esse “diálogo” introspectivo, mas aqui existe uma racionalidade
acima de qualquer experiência, que em Kierkegaard vai transformar-se mais tarde na
exigência da noção divina de pecado, enquanto que no filósofo grego da antiguidade,
essa opção ética é uma construção da práxis educacional em conformidade com as
necessidades de convívio e sobrevivência da coletividade. Assim, enquanto
Kierkegaard se vê obrigado, em seu puro racionalismo, a aceitar o idealismo
metafísico de Deus como forma de equacionar a origem e a justificação do correto,
do decente, do justo, do bem, Aristóteles acaba apelando para a lei dos homens
como artifício de determinação desses valores desejáveis, enfim, uma concepção
que o leva à política como essência da condição humana, a partir da qual, num misto
de democracia e aristocracia, poderiam os homens discernir o mais desejável para a
boa conduta e convívio coletivos.
33
Como se vê, de Aristóteles a filosofia de Kierkegaard herdou a noção de
“opção”, esse momento humanizante que o filósofo dinamarquês vai chamar de
“salto”, e que compõe a base da sua Ética da Personalidade. Mas a Desobediência
da Ética da Personalidade, ainda que capte fundamentalmente esta opção, este
salto, esta escolha, no aspecto jurídico da necessidade da lei como instrumento de
coação à prática do interesse coletivo ético, vê, exatamente na lei, o perigo de uma
não-ética e, em conseqüência, a impossibilidade de uma Paidéia, uma educação que
efetivamente crie o hábito da conduta ética. Daí a necessidade, muitas vezes, da
desobediência para que o Ser possa fazer jus à sua escolha pela ética.
Em uma sociedade imaginada como plenamente democrática, onde
governantes são despojados de vilanias e soberba pessoal, onde os direitos naturais
dos cidadãos devem ser respeitados pela polis, onde a participação popular na
elaboração das leis e onde os juízes são acompanhados de perto pelo cidadão,
eleitos por ele e por ele destituídos, em uma sociedade assim, como Aristóteles
pretendia inaugurar sua filosofia, a penetração da lei e sua capacidade de coerção
educacional para o hábito ético a partir do que todos consideram como o bem
comum, não apresenta problemas de princípio, e dificilmente se pode negar que, se
fosse este o caso, a lei deveria ser mesmo soberana.
No entanto, é inconcebível imaginarmos que vivemos em sociedades deste
teor. Pelo contrário, a realidade histórica sempre demonstrou o quanto os homens
não conseguiram jamais chegar sequer perto desta utopia. Em condições
exatamente contrárias ao imaginário aristotélico, onde os interesses pessoais dos
governantes submissos aos interesses dos que os elegeram, o alijamento
compulsório das massas da vida política aliada a uma apatia endêmica dos cidadãos
em relação a questões mais relevantes da administração de sua comunidade,
particularmente em uma determinada ordem de desenvolvimento econômico-social a
partir do século XVIII, o capitalismo, e mesmo nas utopias dos capitalismos de
34
Estado, os chamados socialismos reais, o que se coloca a olhos vistos é a lei como
instrumento de soberba, poder, dominação e exploração do homem pelo homem.
Neste insofismável contexto acreditar que a lei possa criar a ética contumaz de
acordo com as necessidades coletivas é ficar-se cego para a plenitude da
desigualdade real que se espalha mundo afora. Seja em uma visão mais orgânica
como a teoria dos Aparelhos Ideológicos de Estado (Althusser), seja em uma
concepção mais relativista da Microfísica do Poder (Foucault), o que se encontra em
termos jurídicos é a lei e o ordenamento jurídico tendenciosamente a favor de uma
determinada ordem que, a não ser por pura maldade, não pode ser confundida com
a sociedade ideal de Aristóteles.
É por isso, que a Desobediência da Ética da Personalidade não pode ser
confundida com esta Ética da Responsabilidade, que mesmo antes de Rousseau o
pensamento grego já havia desenhado como ideal humano. Não que seu princípio
não seja importante, mas há que salientar o divórcio entre o que a lei pretende e o
que é desejável e decente; o divórcio entre o que a lei muitas vezes almeja e o que
efetivamente o jurídico realiza. A Desobediência da Ética rejeita a lei injusta,
imprópria, interesseira, que não provém do coletivo e não atende às necessidades
desse coletivo; repudia e resiste à decisão do jurídico que avilta o interesse popular
de justiça e eqüidade.
Assim como em Aristóteles, Rousseau retoma o “homem político” (politikon
zoon) e cria o conceito de Vontade Geral (volonté générale). Muita confusão ainda
paira sobre a obra de Rousseau, não sem motivo, pois sua obra tem tanto de
genialidade como de controvérsia. Podemos citar pelo menos dois dos contra-sensos
mais comuns: a idéia do “bom selvagem” ou o mito da volta a uma natureza humana
idílica pré-propriedade, e a comparação da “vontade geral” com o conceito de “voto
majoritário”. A Desobediência da Ética da Personalidade não vê qualquer
possibilidade dos homens construírem a sobrevivência coletiva a partir de
35
retrocessos históricos, nem para a construção de utopias reconstrutivas de um
“estado de natureza” harmonioso, nem tão pouco a construção de uma “vontade
geral” que não parta da opção individual pela ética e pela desobediência cívica que
dela possa se fazer necessária. Elucidar estes dois pontos em Rousseau é agora o
nosso propósito.
A ética, nas obras Aristotélicas, é considerada como uma parte ou um capítulo
da política, que antecede a própria política. Ela diz respeito ao indivíduo, enquanto a
política considera o homem na sua dimensão social.
2.3.3 Ética Cristã Medieval
Na ética cristã Medieval, o cristianismo se eleva sobre as ruínas da sociedade
antiga; depois de uma longa e sofrida luta, transforma-se na religião oficial de Roma
(séc. IV) e termina por impor o seu domínio durante dez séculos. Ruindo o mundo
antigo, a escravidão cede o seu lugar ao regime de servidão e, sobre a base deste,
organiza-se a sociedade medieval como um sistema de dependências e de
vassalagens que lhe confere um aspecto estratificado e hierárquico. Nesta
sociedade, caracterizada também pela sua profunda fragmentação econômica e
política, devida à existência de uma multidão de feudos, a religião garante uma certa
unidade social, porque a política está na dependência dela e a Igreja – como
instituição que vela pela defesa da religião – exerce plenamente um poder espiritual
e monopoliza toda a vida intelectual. A moral concreta, efetiva e a ética – como
doutrina moral – estão impregnada também, de um conteúdo religioso que
encontramos em todas as manifestações da vida medieval.
36
2.3.4 A Ética Moderna
Vasquez (2004) entende por moderna a ética dominante desde o século XVI
até começo do século XIX. Embora não seja fácil reduzir as múltiplas e variadas
doutrinas éticas deste período a um denominador comum, Vasquez (2004), destaca
a sua tendência antropocêntrica – em contraste com a ética teocêntrica e teológica
da Idade Média – que atinge o seu ponto culminante na ética de Kant.
A ética moderna se cultiva na nova sociedade que sucede à sociedade feudal
da Idade Média e se caracteriza por uma série de mudanças em todas as ordens. Na
economia, incrementaram-se consideravelmente as forças produtivas em relação
com o desenvolvimento científico que se concretiza na constituição da ciência
moderna (Galileu e Newton) e se desenvolvem as relações capitalistas de produção;
na ordem social, se fortalece uma nova classe social – a burguesia – que se
preocupa com estender o seu poder econômico e luta para impor a sua hegemonia
política por meio de uma série de revoluções (na Holanda, Inglaterra e França); no
plano estatal, desaparece a fragmentação da sociedade feudal – com a sua multidão
de pequenos Estados – e se criam os grandes Estados Modernos, únicos e
centralizados. É preciso assinalar, contudo, que esta transformação social não
possui um caráter uniforme e que com ela coexiste o atraso político e econômico de
outros países (como Alemanha e Itália), que somente no século XIX conseguem
realizar a sua unidade nacional.
Na ordem espiritual, a religião deixa de ser a forma ideológica dominante e a
Igreja Católica perde a sua função de guia.
37
Kant no terreno do conhecimento, sustenta que, não é o sujeito que gira ao
redor do objeto, mas ao contrário. O que o sujeito conhece é o produto de sua
consciência. E a mesma coisa se verifica na moral: o sujeito – a consciência moral –
dá a si mesmo a sua própria lei. O homem como sujeito cognoscente ou moral é
ativo, criador e está no centro tanto do conhecimento quanto da moral. Este filósofo
toma como ponto de partida da sua ética o fato da moralidade. É um fato indiscutível,
certamente, que o homem se sente responsável pelos seus atos e tem consciência
do seu dever. Mas esta consciência obriga a supor que o homem é livre. Pois bem,
dado que o homem como sujeito empírico é determinado casualmente e a razão
teórica nos diz que não pode ser livre, é preciso admitir então, como um postulado da
razão prática, a existência de um mundo da liberdade ao qual pertence o homem
como ser moral.
Para Vasquez (2004), a ética kantiana é uma ética formal e autônoma. Por ser
puramente formal, tem de postular um dever para todos os homens,
independentemente da sua situação social e seja qual for o seu conteúdo concreto.
Por ser autônoma, e opor-se assim, às normas heterônomas nas quais a lei que rege
a consciência vem de fora, aparece como a culminação da tendência antropocêntrica
iniciada no Renascimento, em oposição à ética medieval. Finalmente, por conceber o
comportamento moral como pertencente a um sujeito autônomo e livre, atiço e
criador, Kant é o ponto de partida de uma filosofia e de uma ética na qual o homem
se define antes de tudo como ser ativo, produtor ou criador.
A Ética de Spinoza, escrita no século XVII, propõe uma cosmovisão integrada
e afirmativa do ser humano e da Natureza como pura afirmação criadora, infinita e
eterna, mesmo em suas destruições. A partir disto, Spinoza faz a crítica das culturas
fundadas na exclusão e na negação das diferenças que são inspiradas em paixões
tristes e idéias inadequadas, sendo sua matriz o ódio. Na obra "Ética", Spinoza
constrói um modelo analítico aplicado ao desvendamento do Ser do Homem e de
38
seu Mundo. Os fundamentos da Ética se formulam a partir do Conhecimento da
Natureza Naturante, infinita e eternamente criadora, da qual derivam as naturezas
naturadas, ou os mundos finitos com seus princípios, matérias, processos e agentes
específicos.
A Ética de Spinoza é, também, um tratado de psicologia natural que analisa
profundamente o comportamento e a consciência humana e o jogo das paixões e
ilusões que os constituem, bem como, o potencial intensivo e criador que pode ser
liberado a partir dessa condição humana através do conhecimento e da ação
transformadora que fazem parte de sua essência natural. Ele inaugura uma
metafísica natural e imanente contra as reduções e limites do racionalismo
transcendente católico e do materialismo científico positivista nascente. Essa
metafísica da Natureza, que constitui a filosofia de Spinoza é, ainda, muito pouco
conhecida e explorada como merecia sê-lo. A força atual dessa filosofia vem do fato
de que seu método de conhecimento do comportamento humano e social pode dar
conta de muitos problemas urgentes das ciências humanas contemporâneas e de
suas relações necessárias com a Filosofia. O perigo das ciências humanas tem sido,
por um lado, cair em fragmentações especializadas cegas e de outro, lançar-se em
ecletismos infecundos e indisciplinados, onde acaba por imperar o jogo das opiniões,
ao invés de discussões sérias de método e fundamentação.
A metodologia espinozista pode dar conta das tarefas científico-humanas do
positivismo (cientificismo) moderno, desembaraçando-se dos limites, dogmas e
desconhecimentos das correntes materialistas, realistas e objetivistas. O
positivismo, incipiente na época de Spinoza, elaborou uma cosmovisão realista,
"objetiva", de acordo com as representações do mundo que surgiam com o advento
da Sociedade Moderna. Isto é, representações de uma consciência social
determinada que possuía como referência uma realidade histórica relativa,
exprimindo interesses e crenças particulares, não universais, de grupos e classes
39
sociais em vias de se tornarem dominantes, tendo que combater contra as estruturas
das antigas sociedades aristocráticas.
Portanto, para garantir o pleno advento dos dogmas realistas e científicos
nascentes, era necessário excluir todo saber que extrapolasse os horizontes da
realidade social nascente, principalmente, o saber da filosofia e, também, os saberes
milenares das múltiplas e ricas culturas que antecederam à chamada Modernidade
e/ou continuaram, precariamente, a existir com ela.
As idéias que se desdobram do sistema deste filósofo, são o seu mundo
próprio, a sua substância própria, que Spinoza chamou ÉTICA e que trata dos fatos
morais, dos vaIores hierárquicos, da vida e da conduta moral. Praticamente, o
moralista começa tropeçando com uma grande dificuldade. Pois, como qualquer
outro investigador naturalista, não distingue, propriamente, o Bem do Mal em si
mesmos, assim como todo o reino dos valores estéticos e morais.
Convence-se, por outro lado, de que tal transposição dos valores morais até o
plano das simples representações humanas, há um longo caminho a percorrer, para
que se possa depois estabelecer os fundamentos do ato moral. Entretanto, para o
homem que aqui nos ocupa o espírito, as coisas não se deram por esse modo. Ele
não se inclinou nunca ao mais fácil e nunca foi também ágil, quer na sua vida, quer
no seu pensamento.
40
2.3.5 Ética Pós-moderna
Nietzsche, no século XIX, por uma via própria (a Genealogia), critica os
valores e poderes sociais que se fundamentam em afetos negativos, tais como,
culpa, ressentimento e medo originados a partir de uma vontade de negação
denominada niilismo, a qual gera ilusões, preconceitos e confusões causais e,
infelizmente, impregnam, até mesmo, a ciência, a filosofia e as artes modernas. Com
seu método genealógico, Nietzsche faz a análise dos períodos de constituição
histórica e pré-histórica do comportamento e da cultura humana, analisando o
surgimento inter-relacionado e interativo da linguagem, do pensamento, da
consciência autônoma individual, do direito, dos costumes e da ética. Fazendo sua
análise genealógica vir até à Modernidade, Nietzsche mostra um triunfo provisório de
uma cultura niilista, isto é, fundada na negação. Contra essa cultura, Nietzsche funda
uma filosofia envolvendo uma teoria das forças vivas e da Vontade criadora e a
teoria cósmica do Eterno Retorno.
A genealogia de Nietzsche é a responsável pela maior revolução
epistemológica dentro das ciências humanas do Século XX e, também, dentro das
artes, registrando-se em pesquisas filosóficas, científicas e estéticas. Consiste em
uma metodologia de análise, que busca descobrir sob os acontecimentos históricos
as forças sociais e naturais que os produzem. Fazendo a genealogia da história
humana, desde a pré-história, Nietzsche descreve o perfil das forças históricas e
culturais cujos combates e combinações resultaram na formação da Cultura
Moderna. A genealogia de Nietzsche inspirou diversas pesquisas na filosofia, na
psicologia, na psicanálise, sociologia, no direito e nas artes do século XX. Um dos
maiores herdeiros e renovadores do método genealógico de Nietzsche, foi Michel
Foucault, filósofo francês, da última metade do século passado. Foucault
revolucionou a metodologia e a fundamentação das pesquisas em epistemologia,
história, ciências sociais e políticas, psicologia e direito, em obras como "Vigiar e
41
Punir", "A História da Loucura", "As Palavras e as Coisas", "A Arqueologia do Saber"
e outras. Outro grande filósofo da última metade do Século XX, seguidor da
genealogia, foi Gilles Deleuze que retomou, também, a filosofia de Spinoza,
aplicando-a aos problemas humanos, sócio-culturais, existenciais e metafísicos
tratados em suas obras. Ambos os métodos filosóficos podem ser de importância
decisiva na resolução dos sérios problemas sociais, humanos e ambientais que
surgem nos incipientes horizontes inter, trans e multidisciplinares do Século XXI.
2.3.6 Pós-modernidade: moralidade sem código ético
Para Bauman (1997), no tempo em que nos confrontamos com escolhas de
magnitude sem precedentes e conseqüências potencialmente desastrosas, não mais
esperamos a sabedoria dos legisladores ou a perspicácia dos filósofos para nos
levantar de uma vez por todas da ambivalência moral e da incerteza de decisão.
Suspeitamos que a verdade da questão seja oposta ao que se nos disse. É a
sociedade, é sua existência contínua e seu bem-estar, que se tornam possíveis pela
competência moral de seus membros – e não vice-versa. Mais exatamente, como
Alan Wolfe o expressa, a moralidade é a prática “negociada entre agentes instruídos
capazes de crescimento, de um lado, e uma cultura capaz de mudança, de outro”.
Antes que reiterar que não haveria indivíduos morais se não pelo trabalho de
treinamento e exercício realizado pela sociedade, vamos rumo à compreensão de
que deve ser a capacidade moral dos seres humanos que os faz tão exímiamente
capazes de formar sociedades e assegurar contra todos os contratempos sua
sobrevivência – feliz ou menos feliz.
A verdade provável é que escolhas morais sejam de fato escolhas, e dilemas
sejam de fato dilemas, e não os efeitos temporais e corrigíveis da fraqueza,
ignorância ou estupidez humanas. Os temas não têm soluções predeterminadas nem
42
as encruzilhadas direções intrinsecamente preferenciais. Não há princípios fixos que
se possam aprender, memorizar e desenvolver para escapar de situações sem bom
resultado e poupar-se do amargo gosto posterior (chame-o de escrúpulos, culpa, ou
pecado) que vêm sem pedir na esteira das decisões tomadas ou realizadas. A
realidade humana é confusa e ambígua, e também as decisões morais,
diversamente dos princípios filosóficos éticos abstratos, são ambivalentes. É nesse
tipo de mundo que devemos viver; e todavia, como que desafiando aos filósofos
angustiados que não conseguem conceber moralidade “sem princípios”, moralidade
sem fundamentações, demonstramos dia a dia que podemos viver, ou aprender a
viver, ou tentar viver num mundo desse tipo, embora poucos de nós estejamos
preparados para expressar, no caso de sermos interrogados, quais seriam os
princípios que nos guiam, e ainda menos tenham ouvido falar das “fundamentações”
que, como se supõe, não poderíamos dispensar para ser bons e gentis em nossas
relações recíprocas.
Saber que isso é a verdade, ou apenas intuí-lo, ou continuar como se o
soubesse, é ser pós-moderno. De acordo com Bauman (1997), a pós-modernidade,
pode-se dizer, é a modernidade sem ilusões (o oposto disso é que a modernidade é
a pós-modernidade que recusa aceitar sua própria verdade). As ilusões em questão
concentram-se na crença de que a “confusão” do mundo humano não passa de
estado temporário e reparável, a ser substituído mais cedo ou mais tarde pelo
domínio ordenado e sistemático da razão. A verdade em questão é que a “confusão”
permanecera, o que quer que façamos ou saibamos, que as pequenas ordens ou
“sistemas” que cinzelamos no mundo são frágeis, temporários, e tão arbitrários e no
fim tão contingentes como suas alternativas.
A pós-modernidade, também pode-se dizer, traz o “reencantamento” do
mundo depois da moderna luta, longa e seríssima, se bem que no fim inconclusiva,
para desencantá-lo (ou, mais exatamente, a resistência ao desencatamento, quase
43
nunca posta para dormir, foi continuamente o “espinho pós-moderno” na carne da
modernidade). A desconfiança na espontaneidade humana, nos impulsos e nas
inclinações resistentes a predição e justificação racional foi quase substituída pela
desconfiança na razão não-emocional e calculadora. Restituiu-se dignidade às
emoções; legitimidade às “inexplicáveis”, e mesmo irracionais, simpatias e lealdades
que não se podem “explicar” em termos de utilidade e propósito. Funções,
manifestas ou latentes, não são febrilmente buscadas para tudo o que as pessoas
fazem a outros a e si próprias. O mundo pós-moderno é mundo em que o mistério
não é mais estrangeiro mal tolerado à espera da ordem de deportação. Neste
mundo, podem acontecer coisas que não têm nenhuma causa que as faça
necessárias; e as pessoas fazem coisas que dificilmente passariam no teste de um
propósito calculável, e nem se diga “racional”. O medo do vazio, aquele medo
(segundo Teodoro Adorno) muito forte de efeitos psicológicos da Ilustração moderna,
foi embotado e enfraquecido (embora nunca inteiramente abrandado). Aprendemos a
viver com eventos e atos que não só são ainda-não-explicados, mas, por tudo o que
sabemos sobre o que nunca saberemos, inexplicáveis. Alguns de nós, até mesmo
diriam que são tais eventos e atos que constituem a casca dura e irremovível do
predicamento humano. Aprendemos de novo a respeitar a ambigüidade, a ter
consideração pelas emoções humanas, a apreciar ações em propósito e
recompensas calculáveis. Aceitamos que nem todas as ações, e particularmente
nem todas entre as mais importantes das ações, precisam justificar-se e explicar-se
para serem dignas de nossa estima.
Para uma mente moderna, esses sentimentos pós-modernos representam
perigo mortal para a convivência humana. Bauman (1997), primeiro difama e
degrada os atos humanos que só têm “paixões” e inclinações espontâneas por
causa, a mente moderna fica amedrontada pela perspectiva de “desregramento” da
conduta humana, de viver sem código ético rigoroso e abrangente, de apostar na
intuição moral humana e na capacidade humana de negociar o modo e os usos do
44
viver juntos – antes que buscar apoio nas normas jurídicas e despersonalidades
amparadas por poderes coercitivos. Um resíduo suficiente de sentimentos modernos
foi-nos transmitido a todos nós por treinamento, de forma que todos participamos,
ocasionalmente, ou até certo ponto, desses medos angústias.
A aceitação da contingência e do respeito pela ambigüidade não são fáceis;
não há razão para depreciar seus custos psicológicos. E, no entanto, a margem clara
dessa nuvem particular é incomumente densa. O reencantamento pós-moderno do
mundo traz a oportunidade de encarar a capacidade moral humana sem rebuços, tal
como é realmente, sem disfarces e sem deformações; de readmiti-la no mundo
humano vindo de seu exílio moderno; de restaurá-la em seus direitos e sua
dignidade; de apagar a memória de difamação, o estigma deixado pelas
desconfianças modernas. Não que o mundo se tornará em conseqüência
necessariamente melhor ou mais habitável. Mas haverá ensejo de se chegar a
termos com as proclividades ásperas e elásticas que ele evidentemente não
conseguiu eliminar, e de começar daí. Talvez começar daí, de preferência a declarar
esse começo nulo e vazio, até venha a tornar a esperança de um mundo mais
humano mais realista, e isso em razão de sua modéstia. (BAUMAN, 1997, p. 43)
Tirar a moralidade de couraça rígida dos códigos éticos artificialmente
construídos, ou abandonar a ambição de mantê-la aí, significa repersonalizá-la.
Costumava-se considerar as paixões humanas demais errantes e volúveis, e demais
séria a tarefa de tornar segura a convivência humana, para confiar a sorte da
coexistência humana às capacidades morais das pessoas humanas. Bauman (1997),
conclui que o que chegamos a entender agora é que essa sorte pode ser confiada a
pouco menos; ou antes que só se pode cuidar adequadamente dessa sorte, ou seja,
todo o cuidado dispensado e planejado provar-se-ia irrealista ou, pior ainda,
contraprodutivo, se o modo de proceder no cuidado levar em conta a moralidade
pessoal e sua teimosa presença. O que estamos aprendendo, e aprendendo
45
duramente, é que a moralidade pessoal é que torna a negociação ética e o consenso
possíveis, e não vice-versa. A moralidade pessoal certamente não garantiria o
sucesso dessas negociações. Pode até torná-las mais difíceis e acrescentar
obstáculos ao percurso, mas os caminhos não estarão mais marcados pela
intimidação. É mais provável que ela faça algum acordo que pode se comprovar
inconclusivo, temporário e destituído de aceitação universal. Mas sabemos agora
que é esse precisamente o estado em que as coisas se acham, onde nos achamos,
e que poderíamos pretender outra coisa somente arriscando nossa postura ereta.
Repersonalizar a moralidade significa fazer voltar a responsabilidade moral da
linha do fim, para a qual foi exilada, para o ponto de partida, onde ela se acha em
casa, do processo ético. Bauman (1997), constata com uma mistura de apreensão e
esperança – que a não ser que a responsabilidade moral esteja “desde o começo”
enraizada de alguma forma no próprio modo de nós humanos sermos, nunca será
suscitada em fase posterior, por generoso e elevado seja o esforço. Sentimos
simpatia instintiva para com lembretes, como o que redigiu P. F. Strawson faz mais
de vinte anos de que a pergunta: “Qual é o interesse do indivíduo na moralidade?”,
“não se responde mencionando os interesses gerais na existência de alguns
sistemas de exigências socialmente sancionadas”, embora não mais estejamos
seguros de que a pergunta sobre “interesse na moralidade” deva ser feita afinal;
suspeitamos que seja uma espécie de pergunta fraudulenta que adquire por
preempção sua resposta. Também, pode-se crer que todas as substituições – como
responsabilidades funcionais ou processuais – não passam de substitutivos estéreis,
inconfiáveis e moralmente duvidosos, mesmo que instrumentalmente eficientes.
Todos eles embotam, em vez de reforçar a responsabilidade pessoal – o último
suporte e esperança da moralidade. Com atraso chegamos a apreciar a sugestão de
Vladimir Jankélévictch de que da mesma forma que o cogito torna o total ceticismo
inválido, deve-se considerar o fato da “intimidade moral” como “a última instância”, da
qual “é impossível apelar, a não ser por má-fé”; “Nada substitui essa anuência íntima
46
da alma inteira – nem a anuência superficial que adere a palavras, nem uma
autoridade transcendente que exige que ela, ela própria, seja crida pela consciência
para fazer-se admitida”.
Primeiro deslegitimar ou eliminar impulsos morais e emoções, e depois tentar
reconstruir o edifício da ética a partir de argumentos cuidadosamente purificados de
meios-tons emocionais e liberados de todos os laços com a intimidade humana não
processada, é equivalente, para usar a memorável metáfora de Harold Garfinkel, a
dizer que, se pudéssemos tirar as paredes laterais, veríamos melhor o que apóia o
teto. É o “fato bruto” primário e originário do impulso moral, da responsabilidade
moral, da intimidade moral que fornece a matéria da qual se faz a moralidade da
convivência humana. Após séculos de tentativas de provar o contrário, uma vez mais
se nos parece impossível eliminar o “mistério da moralidade dentro de mim” (Kant).
Bauman (1997), cita a afirmação de Michael S. Pritchard, expressando estado de
ânimo largamente partilhado:
Podemos ensaiar ir para fora de nós e tentar sem paixão sustentar essas proposições [éticas] a partir de um ponto de vista externo e objetivo. Todavia, como observa Strawson, nenhuma dessas tentativas ainda teve sucesso, e com boa razão. Se a justificação externa requer que nos afastemos imaginativamente de nossos sentimentos morais de forma que os possamos visualizar “objetivamente”, que recursos poderemos invocar para conduzir o exame? Para fazer justiça ao assunto, devemos usar d e nossas sensibilidades morais, inclusive, como eles fazem, de nossos sentimentos. Não há nenhum território neutro. Para ser de uso prático para nós, a filosofia moral deve ser uma “tarefa interna’, por muito que se possa desejar o contrário. (BAUMAN, 1997, p. 45)
47
Na medida em que a obsessão moderna pela ausência de propósito e
utilidade e a suspeição igualmente obsessiva de todas as coisas autotélicas, ou seja,
que pretendem ser seus próprios fins, e não meios para qualquer outra a não ser
para si mesmas, desaparecem, a moralidade retém a oportunidade de chegar
finalmente ao que lhe é próprio. Segundo Bauman (1997), ela pode parar de ser
induzida ou forçada a apresentar suas credenciais; a justificar seu direito de existir
apontando o benefício que traz para a sobrevivência, posição ou felicidade pessoal.
Esta é um ensejo seminal, uma vez que – como veremos mais tarde – a pergunta:
“Por que devo ser moral?”, é o fim senão o começo da posição moral, uma posição
que (bastante semelhante à Gemeinschaft de Tönnies) existe só no estado an sich,
dura só enquanto não sabe de sua presença moral e não se coisifica como objeto de
análise, nem se sujeita a avaliação em termos de padrões que não são os seus. Se
se aproveita a oportunidade, a moralidade ficará livre para admitir, ou, antes, não
precisa absolutamente conceder acanhadamente. Sua não-racionalidade; seu ser
sua própria razão, tanto necessária como suficiente. E será bom isso, visto que
nenhum impulso moral pode sobreviver, e nem se diga, emergir incólume do teste
ácido da utilidade ou do proveito. E visto que toda imoralidade começa pela
exigência desse teste – da parte do sujeito moral, ou do objeto de seu impulso moral,
ou de ambos. (BAUMAN, 1997, p. 46)
48
2.3.7 Ética Contemporânea
Vasquez (2004) inclui na ética contemporânea não só as doutrinas éticas
atuais, mas também aquelas que, embora tenham surgido no século XIX, continuam
exercendo o seu influxo em nossos dias. Tal é o caso das idéias de Kierkegaard,
Stirner ou Marx.
As doutrinas éticas posteriores a Kant e Hegel surgem num mundo social que,
depois da Revolução de 1789, não só conheceu a instauração de uma ordem social
que se apresenta conforme à natureza racional do homem, mas também uma
sociedade na qual afloram e se aguçam as contradições profundas que explodirão
nas revoluções sociais do século XVIII, bem como o Estado hegeliano, encarnação
da razão universal, revelam na realidade burguesa uma profunda irracionalidade. A
ética contemporânea surge, igualmente, numa época de contínuos progressos
científicos e técnicos e de um imenso desenvolvimento das forças produtoras, que
acabarão por questionar a própria existência da humanidade, dada a ameaça que
seus usos destruidores acarretam. Finalmente, a ética contemporânea, segundo
Vasqéz (2004), na sua fase mais recente, não só conhece um novo sistema social –
o socialismo, mas também um processo de descolonização e, paralelamente a ele,
uma reavaliação de comportamentos, princípios e heranças que não se enquadram
no legado ocidental tradicional.
No plano filosófico, a ética contemporânea se apresenta em suas origens
como uma reação contra o formalismo e o racionalismo abstrato kantiano, sobretudo
contra a forma absoluta que este adquire em Hegel. Na filosofia hegeliana, chega a
seu apogeu a concepção kantiana do sujeito soberano, ativo e livre; mas, em Hegel,
o sujeito é a Idéia, Razão ou Espírito Absoluto, que é a totalidade do real, incluindo o
próprio homem como um seu atributo. A sua atividade moral não é senão uma fase
49
de desenvolvimento do Espírito ou um meio pelo qual o Espírito – como verdadeiro
sujeito – se manifesta e se realiza.
50
CAPÍTULO III – A ÉTICA NO CONTEXTO EMPRESARIAL
Observada em tese, em seu sentido geral, a profissão, como exercício
habitual de uma tarefa, a serviço de outras pessoas, insere-se no complexo da
sociedade como uma atividade específica. Trazendo tal prática benefícios recíprocos
a quem pratica e a quem recebe o fruto do trabalho, também exige, nessas relações,
a preservação de uma conduta condizente com os princípios éticos específicos.
No mundo em que vivemos geralmente ocorrem fatos que são frutos de
influências que ferem a ética em virtude de forças de diversas naturezas. Assim Sá
(2000), ressalta que tais fatos podem oferecer um exterior ético, porém, na essência,
não são condutas que contribuem para a virtude, nem são aceitáveis, pois são
derivados da força de capitais, de poderes, dificultando a liberdade individual ou
ameaçando a integridade dos indivíduos, não sendo conhecimentos constituídos pela
verdade.
Para Sá (2001), o grupamento de profissionais que exercem o mesmo ofício
termina por criar as distintas classes profissionais e também a conduta pertinente.
Existem aspectos claros de observação do comportamento, nas diversas esferas em
que ele se processa: perante o conhecimento, perante o cliente, perante o colega,
perante a classe, perante a sociedade, perante a pátria, perante a própria
humanidade como conceito global. A consideração ética, sendo relativa, também
hoje se analise do ponto de vista da necessidade de uma conduta de efeitos amplos,
globais, mesmo diante de povos que possuem tradições e costumes diferentes. O
valor profissional deve acompanhar-se de um valor ético para que exista uma integral
imagem de qualidade.
51
Quando só existe a competência técnica e científica e não existe uma
conduta virtuosa, a tendência é de que o conceito, no campo do trabalho, possa
abalar-se, notadamente em profissões que lidam com maiores riscos. A profissão,
segundo Sá (2001), que pode enobrecer pela ação correta e competente, pode
também ensejar a desmoralização, através da conduta inconveniente, com a quebra
de princípios éticos.
3.1 A evolução histórica da ética empresarial
Inicialmente, na economia de troca das sociedades primitivas e antigas, não
havia lucro e nem empresa. A ética de tais relacionamentos era limitada pelas
relações de poder entre as partes e pelas eventuais necessidades prementes de
obtenção de certos bens ou artigos. O advento do conceito de lucro como finalidade
das operações econômicas representou uma dificuldade para a moral. Os
pensadores estavam acostumados com a realidade da economia de troca, na qual se
assumiam valores idênticos para os bens intercambiados. De acordo com Moreira
(2002), em função disso, consideraram inicialmente o lucro como um acréscimo
indevido, sob o prisma da moralidade.
No século XVII, Adam Smith conseguiu demonstrar que o lucro não é um
acréscimo indevido, mas um vetor de distribuição de renda e de promoção do bem-
estar social. Com isso, logrou expor pela primeira vez a compatibilidade entre ética e
a atividade lucrativa. A primeira tentativa formal de impor um comportamento ético à
empresa foi a encíclica Rerum Novarum, do Papa Leão XIII. Nela foram expostos
princípios éticos aplicáveis aos relacionamentos entre a empresa e seus
empregados. Esses princípios valorizaram o respeito aos direitos e à dignidade dos
trabalhadores.
52
Em 1890, nos Estados Unidos da América, entrou em vigor a lei denominada
Sherman Act, a qual passou a proteger a sociedade contra acordos entre empresas,
contrários ou restritivos da livre concorrência. Outras leis se seguiram nessa matéria.
Ainda nos Estados Unidos, foi promulgada no começo do século XX a Lei Clayton,
alterada na década de 30 pela emenda Pattman-Robinson. Essa lei complementou a
Sherman Act, proibindo a prática de discriminação de preços por parte de uma
empresa em relação aos seus clientes.
Segundo Moreira (2002), foi somente na segunda metade do século XX que o
assunto ética empresarial de fato ganhou relevância. No ano de 1972 a Organização
das Nações Unidas realizou em Estocolmo, Suécia, a Conferência Internacional
Sobre o Meio Ambiente. O evento serviu para alertar todos os segmentos sociais,
inclusive as empresas sobre a necessidade de se preservar e proteger o planeta.
Depois dessa Conferência, quase todos os países do mundo adotaram ou
reforçaram as suas leis, subordinando a atividade econômica à proteção do meio
ambiente. Em 1977 o Congresso norte-americano aprovou uma lei relativa à ética
empresarial, que chamou a atenção do mundo. Ela foi denominada “Foreign Corrupt
Practices Act”. Essa lei passou a proibir e a estabelecer penalidades para pessoas
ou organizações que oferecessem subornos a autoridades estrangeiras, para obter
negócios ou contratos.
No Brasil muitos aspectos da ética empresarial também mereceram
regulamentação em textos legais. A nossa lei que reprimiu o abuso de poder
econômico e as práticas anticoncorrências foi a 4.137 de 1962. Recentemente, ela
foi modificada pela Lei nº 8.884 de 1993. Nas áreas de proteção ao trabalho,
proteção ao ambiente, proteção ao cliente consumidor e muitas outras, a legislação
brasileira possui textos específicos, os quais não têm se multiplicado nos últimos
anos.
53
Tanto no Brasil como em outros países, as leis, regulamentos e principalmente
as decisões judiciais têm sido no sentido de exigir das empresas um comportamento
ético em todos os seus relacionamentos. Para motivá-las a seguir a ética, pelo
estímulo aos seus instintos egoísticos, alguns países têm permitido que os seus
tribunais imponham condenações milionárias às empresas infratoras.
Atualmente, a preocupação com a ética empresarial, em todo o mundo, é de
tal monta que, segundo Moreira (2002), podemos afirmar estar vivendo uma nova
era. A Era da Ética.
3.2 A importância da Ética para os profissionais
A empresa é uma organização cujo objetivo final é o lucro. Para Moreira
(2002), A ética empresarial é o comportamento da empresa – entidade lucrativa –
quando ela age de conformidade com os princípios morais e as regras do bem
proceder, aceitas pela coletividade: as regras éticas.
A ética empresarial pode ser entendida como um valor da organização que
assegura sua sobrevivência, sua reputação e, conseqüentemente, seus bons
resultados. Para Moreira (2002), a ética empresarial é "o comportamento da
empresa- entidade lucrativa - quando ela age de conformidade com os princípios
morais e as regras do bem proceder aceitas pela coletividade: as regras éticas." No
campo do trabalho, a ética tem sido cada vez mais exigida, provavelmente porque a
humanidade evoluía em tecnologia, mas não conseguiu se desenvolver na mesma
proporção naquilo que se refere à elevação de espírito.
54
Não é possível definir uma fórmula matemática que nos responda, com toda
certeza, qual deve ser a atitude ética diante das circunstâncias que a vida
profissional nos impõe, mas na dúvida, decida-se pelo correto. Segundo o filósofo
alemão Kant, a única coisa certa em qualquer situação é a “boa vontade”, que
podemos entender também como boa intenção. A atitude ética vai determinar como
um profissional trata os outros profissionais no ambiente de trabalho, os
consumidores de seus serviços: clientes internos e externos entre outros membros
da comunidade em geral. A conduta do profissional inevitavelmente repercutirá na
maneira como ele mesmo será tratado pelos demais e isso formará uma boa ou má
imagem profissional.
Para Moreira (2002), as falhas éticas no ambiente de trabalho muitas vezes
ocorrem por desconhecimento, por ingenuidade, por alienação e por descuido. Ou
seja, nem sempre as essas falhas estão associadas ao mau caráter do profissional.
Na maioria dos esquemas de corrupção pessoas desavisadas são usadas vítimas.
Além disso, em muitas situações a pessoa pode se envolver em problemas éticos
sem dimensionar o resultado futuro de sua conduta inapropriada. Aplicar a ética nas
profissões é considerado um fator importantíssimo para assegurar a sobrevivência
das organizações, inclusive de pequenas e grandes empresas. Percebe-se a
necessidade de promover comportamentos éticos, visando crescimento nas relações
entre funcionários e clientes. A ética na empresa visa garantir que os funcionários
saibam lidar com determinadas situações e que a convivência no ambiente de
trabalho seja agradável. Desse modo, é relevante ter consciência de que toda a
sociedade vai se beneficiar pela ética aplicada dentro da empresa, bem como os
clientes, os fornecedores, os sócios, os funcionários, o governo, etc.. Se a empresa
agir dentro dos padrões éticos, ela só tende a crescer, desde a sua estrutura em si,
como aqueles que a compõem.
55
Farah (2004), acredita que para tornar ética uma organização é necessário
mudar a cultura. O núcleo da cultura corporativa é seu sistema de valores. Mudar a
cultura da organização para torná-la ética, significa, portanto, mudar a hierarquia dos
valores corporativos no sentido de conferir primazia aos valores morais.
3.2.1 Deveres profissionais
Para Sá (2001), todas as capacidades necessárias ou exigíveis para o
desempenho eficaz da profissão são deveres éticos. Sendo o propósito do exercício
profissional a prestação de uma utilidade a terceiros, onde todas as qualidades
pertinentes à satisfação da necessidade, de quem requer a tarefa, passam a ser uma
obrigação perante o desempenho. Logo, um complexo de deveres envolve a vida
profissional, sob os ângulos da conduta a ser seguida para a execução de um
trabalho. Esses deveres impõem-se e passam a governar a ação do indivíduo
perante seu cliente, seu grupo, seus colegas, a sociedade, o Estado e especialmente
perante sua própria conformação mental e espiritual.
Distinguem-se, pois, os valores nas tarefas e também a importância destas em
face da conduta humana observável perante a execução. Uma vez eleito o trabalho
que desempenhará com habitualidade, o ser se compromete com todo um agregado
de deveres éticos, pertinentes e compatíveis com a escolha da tarefa a ser
desempenhada. Existem aspectos de uma objetividade, volvida ao trabalho, que
apresenta particularidades próprias e também peculiares a cada especialização, ou
seja, há um complexo de valores pertinentes a cada profissão. (SÁ, 2001, p.146)
56
3.3 Algumas razões para uma empresa ser ética
Caravantes (1991) destaca o pensamento de alguns filósofos, de que
nenhuma consideração ética tem sentido senão dentro de um sistema coerente, que
inclua:
a) pressupostos relativos à natureza do mundo ou ao contexto dentro do qual se esteja atuando;
b) noções sobre a natureza do Homem, sua capacidade e suas limitações;
c) alguma noção de propósito, que conceda significado às ações próprias que se realize, bem como ao reforço cooperativo feito com as demais pessoas. (CARAVANTES, 1991, p. 96)
Nesse contexto, Toffler (1993) afirma que “responsabilidade” é um conceito
crítico relacionado à tomada de decisões gerenciais e, particularmente, à tomada de
decisões éticas. É a ligação entre gerente, trabalho e organização.
Para Moreira (2002), o comportamento ético por parte da empresa é esperado
e exigido pela sociedade. Ela é a única forma de obtenção de lucro com respaldo
moral. Esta impõe que a empresa aja com ética em todos os seus relacionamentos,
especialmente com clientes, fornecedores, competidores e seu mercado,
empregados, governo e público em geral.
Ao estabelecer como regra e praticar uma conduta ética, a empresa coloca-se
em posição de exigir o mesmo de seus empregados e administradores. Desse modo,
pode cobrar-lhes maior lealdade e dedicação. O ato de emprestar o seu trabalho a
uma organização que age com ética constitui-se para o empregado em uma
57
compensação abstrata, de valor incalculável. Para Moreira (2002), uma empresa
ética incorre em custos menores do que uma antiética. A atuação com ética faz com
que os direitos de terceiros sejam respeitados pela empresa. Com isso, o lucro
gerado para o acionista não fica sujeito a contingências futuras, como por exemplo,
condenações por procedimentos indevidos. Os procedimentos éticos facilitam e
solidificam os laços de parceria empresarial, quer com clientes, quer com
fornecedores, quer, ainda com sócios efetivos ou potenciais. Isso ocorre em função
do respeito que um agente ético gera em seus parceiros.
Farah (2004), considera que a empresa ética é aquela que possui uma cultura
ética. A conduta da organização é fortemente influenciada por sua cultura. O núcleo
da cultura corporativa é seus sistemas de valores. A cultura ética contém valores
morais claros que recebem máxima prioridade dentro da organização, de modo
consistente e uniforme. Em uma organização com forte cultura ética, os valores
morais estão arraigados e largamente disseminados. Essa organização sustentará
firmemente a conduta moral de seus empregados.
Em contrapartida, a organização antiética possui uma cultura cujo lema
implícito é “vencer a qualquer custo”. Esse tipo de organização possui uma cultura
corporativa que não se preocupa com questões morais. Para Farah (2004), o valor
dominante é o lucro. A cultura corporativa baseia-se na ambição e no desprezo pelas
leis morais da sociedade. A ética é apenas um meio para obter lucro ou para formar
uma imagem favorável da empresa. Clientes, fornecedores, funcionários, acionistas
e o público em geral não são respeitados, mas usados ao máximo para gerar lucros.
A prática é cumprir um dever ético somente se isso for economicamente vantajoso.
Isso significa que os valores morais estão subordinados aos valores econômicos.
Essa subordinação pode ser visualizada imaginando-se uma pirâmide com os
valores econômicos no topo e os valores morais na base.
58
3.4 Código de Ética
O termo Código, deriva do latim codex, tirado de caudex (tronco de árvore),
primitivamente, significa tábua ou prancha que passou a designar toda espécie de
coleção de escritos sobre determinados assuntos. Na terminologia jurídica, significa
coleção de leis. Termo que se aplica a todo conjunto de leis elaboradas por
autoridades competentes, normalmente pelo Poder Legislativo, reunidas num só
corpo e destinadas a reger a matéria, que faz parte, ou que é objeto de um ramo do
Direito.
Para Sá (2000), o Código de Ética representa o instrumento regulador, com o
propósito de estabelecer linhas ideais éticas de condutas de um indivíduo perante
seu grupo e o todo social. É uma espécie de contrato de classe onde os órgãos de
fiscalização do exercício passam a controlar a execução de tal peça magna.
Ao decidir adotar a postura ética em seus relacionamentos, Moreira (2002),
defende que a empresa deve fazer constar sua determinação de um documento
interno, com denominação de Código de Ética:
O Código de Ética tem a missão de padronizar e formalizar o entendimento da organização empresarial em seus diversos relacionamentos e operações. A existência do Código de Ética evita que os julgamentos subjetivos deturpem, impeçam ou restrinjam a aplicação plena dos princípios. (MOREIRA, 2002, p.33)
Assim, as pessoas que integram uma organização possuem formações
culturais e científicas diferentes, experiências sociais diferentes e opiniões diferentes
sobre os fatos da vida.
59
O Código de Ética é um instrumento criado para orientar o desempenho de
empresas em suas ações e na interação com seu diversificado público. Para a
concretização deste relacionamento, é necessário que a empresa desenvolva o
conteúdo do seu código de ética com clareza e objetividade, facilitando a
compreensão dos seus funcionários.
Segundo Sá (2002), a implantação do código de ética interno, confronta com a
concorrência anti-ética de forma positiva, diminuindo os conflitos interpessoais, posto
que nele existe disciplina evitando assim que se macule o bom nome e o conceito
social de uma categoria.
Além disso, o Código de Ética, quando adotado, implantado de forma correta e
regularmente obedecido, pode constituir uma prova legal da determinação da
administração da empresa, de seguir os preceitos nele refletidos e, de acordo com
Moreira (2002), tem os objetivos: de envolver a empresa na decisão de adotar a ética
como padrão de conduta; motivar a adoção do maior número possível de princípios
éticos; permitir que os profissionais que integram a empresa meditem sobre os
princípios éticos a cada uma das suas atividades e a cada grupo de relacionamento
da organização; promover a criação do Código de Ética e sua adoção pelo grupo de
profissionais que forma a empresa, como uma realidade coletiva; fazer com que o
Código de Ética seja reconhecido como expressão da cultura do grupo e nunca tido
como um texto imposto.
A maioria das profissões têm o seu próprio código de ética profissional, que é
um conjunto de normas de cumprimento obrigatório, derivadas da ética,
frequentemente incorporados à lei pública. Para Moreira (2002), nesses casos, os
princípios éticos passam a ter força de lei; note-se que, mesmo nos casos em que
60
esses códigos não estão incorporados à lei, seu estudo tem alta probabilidade de
exercer influência, por exemplo, em julgamentos nos quais se discutam fatos
relativos à conduta profissional. Ademais, o seu não cumprimento pode resultar em
sanções executadas pela sociedade profissional, como censura pública e suspensão
temporária ou definitiva do direito de exercer a profissão.
Para Moreira (2002), as decisões de fazer com que a empresa adote
princípios éticos, aprove e siga um Código de Ética devem ser tomadas pelo seu
mais alto nível de decisão. A escolha dos princípios e a redação deve ser uma
atribuição coletiva dos empregados e da administração. O Código de Ética dever ser
o mais específico possível tanto em relação aos princípios como às atividades típicas
da empresa, resultando em uma linguagem clara e objetiva.
A responsabilidade final pelo conhecimento e cumprimentos dos princípios
constantes no Código de Ética deve ser atribuída a todos e a cada um dos
empregados. As sanções mínimas e máximas a que estarão sujeitos os violadores
dos princípios devem constar expressamente no Código. (MOREIRA, 2002, p. 186)
61
CAPÍTULO IV - ÉTICA E RECURSOS HUMANOS
A gestão de pessoas passa por importantes transformações, em
conseqüência da exigência do mercado por profissionais qualificados,
descentralização das decisões, trabalho cooperativo e constante melhoria dos
processos organizacionais e impactos gerados pela adoção de novos produtos e
serviços tecnológicos. Os profissionais precisam estar motivados e incentivados, em
um ambiente organizacional sadio, que estimule o aprendizado e a criatividade.
Diante de estudos com gerentes para definir a palavra ética, Toffler (1993)
percebeu várias visões diferentes:
“Ética é o conjunto dos princípios morais fundamentais do certo e errado. “São regras – regras de comportamento.” “Significa integridade; tem de partir de dentro (do indivíduo).” “O significado mais apropriado para a ética é: estar de acordo com os padrões de uma dada profissão ou grupo. Portanto, qualquer grupo determina seus próprios padrões éticos e então vive ou não de acordo com eles.” (TOFLLER,1993, p. 1)
Objetivos de lucro muito rígidos e cenários de alto estresse, de acordo com
Nash (1993), são motivadores poderosos para ausência de ética nas relações entre
empregados e chefia.
Segundo Toffler (1993), um dos fatores que afetam a maneira que as pessoas
vivenciam a ética no trabalho é a percepção de si mesmas em seus empregos. Estas
percepções enfocam as exigências da tarefa, as percepções sobre o papel
desempenhado, a disponibilidade de escolha e o interesse pelo trabalho.
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4.1 Exigências da função de gestor
Apesar de nenhuma organização projetar cargos que incluam tarefas ou
atividades antiéticas, algumas vezes as exigências feitas para que o trabalho se
desenvolva podem, potencialmente, criar dilemas éticos. Em pouquíssimos casos a
descrição de cargo especifica como o trabalho deve ser feito; normalmente, a
descrição restringe-se ao que deve ser feito. Sabe-se que um bom gestor conhece
como usar sua influência para motivar e responder às necessidades e estilos de
diferentes pessoas. No entanto, não é difícil imaginar um gestor, sob a pressão de
uma data limite de um mercado altamente competitivo, enfrentando pessoas
indisciplinadas de sua própria equipe e utilizando táticas eticamente questionáveis
para conseguir o que ele quer de seu pessoal.
Toffler (1993), cita como sendo uma das preocupações mais freqüentes das
atividades de gestão – “avaliar o desempenho dos subordinados” – pode criar o
potencial para uma atividade antiética em determinadas circunstâncias. Por exemplo,
para combater avaliações “inchadas” (onde todos são classificados como
“excelentes”, o gestor parecerá bom ou receberá uma porcentagem maior na
gratificação por mérito), muitas empresas estão instituindo uma forçada distribuição
estatística de avaliação, em forma de sino. Tal distribuição exige que uma
determinada porcentagem dos subordinados de um gestor seja classificada no nível
mais baixo, merecendo ou não. Em oposição a isso, gestores que não acreditam que
o indicador de um bom ”gestor” é um bom subordinado, tendem a classificar alguns
funcionários medíocres, até mesmo incompetentes, como eficientes.
Um outro aspecto das exigências da tarefa, que afeta particularmente o ter de
lidar com dilemas éticos, é o grau de autonomia e flexibilidade que os gestores
possuem para realizar seu trabalho. Por exemplo, Toffler (1993) cita o problema do
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sofisticado sistema informatizado que resultou na demissão dos funcionários extras.
A falta de habilidade do gestor para questionar, desafiar e alterar a informação que
ele sabia ser incorreta, levou-o a participar de uma atividade que ele sentiu não ser
ética, a saber, a constatação de que pessoas seriam demitidas assim que o erro no
sistema fosse descoberto. A descrição de seu cargo não permitia outro caminho. O
modo como os trabalhos são delineados podem exercer um impacto crítico (positivo
ou negativo) sobre a quão eticamente eficiente um gestor pode ser.
4.2 Papéis explícitos e implícitos
No contexto organizacional, Toffler (1993) enfatiza a palavra “papel”, que
refere-se às atividades, às responsabilidades e ao nível de autoridade especificados
na descrição formal do cargo. Assim, quando os gerentes falam em detalhe sobre o
que fazem em seu trabalho, entretanto, descrevem um papel “implícito”, que é
diferente do papel “explícito” da descrição do cargo. Falam sobre responsabilidades
intrínsecas e sobre atividades que consideram como parte dos papéis que não são
escritos nem formalmente verbalizados. Além dos mais, reconhecem que não estão
sozinhos ao carregar expectativas implícitas sobre si próprio no trabalho. Uma das
definições de “papel” utilizadas por sociólogos é: “um conjunto de expectativas, que
qualquer um possui, relativo a uma posição ou pessoa” (Biddle e Thomas, 1966).
Muitos gerentes estão conscientes de que as outras pessoas com quem trabalham –
superiores, pares, subordinados, sem mencionar aqueles externos à esfera
profissional, como os membros da família, amigos etc. – possuem crenças implícitas
e expectativas em relação ao que engloba o trabalho do gerente. A presença de
expectativas múltiplas em relação ao papel foi reconhecida há vários anos como
sendo a causa do estresse. Mas isso adquire uma importância maior quanto
consideramos os possíveis efeitos das várias expectativas sobre o papel, quanto à
criação e à forma de lidar com problemas éticos. Diferenças na crença sobre o que o
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emprego engloba, podem levar às diferentes interpretações dos eventos e do papel
do gerente em relação a esses eventos.
Toffler (1993), conclui que diferentes expectativas podem resultar até em
diferentes raciocínios sobre se uma situação é ou não ética. Por exemplo, gerentes
de matrizes podem esperar que a confidencialidade de certas informações seja
mantida pelos superiores a quem reportam. Porém, um destes superiores pode
interpretar que o papel do gerente envolve uma lealdade mais forte em relação a
este mesmo e, portanto, espera um vazamento de informações do “outro lado”. A
questão não é se está certo ou errado passar certas informações adiante, mas se os
gerentes e seus superiores vêem o papel do gerente de modos diferentes. Para o
superior, compartilhar informação é “parte do trabalho”; para o gerente, pode ser um
“dilema ético”.
4.3 A disponibilidade de escolha
A escolha resume-se em uma questão simples; eu sou livre para escolher o
que vou fazer ou devo fazer o que alguém quer que eu faça? A questão da escolha é
uma preocupação central dos gerentes que enfrentam dilemas gerados por um
superior. Em parte devido às nossas crenças culturais a respeito de obediência à
autoridade, com as “punições” que antecipamos caso não cumpramos algo, e em
parte porque muitas organizações não oferecem mecanismos – e proteções – para o
questionamento ou desafio à autoridade, muitos gerentes sentem-se como se “não
tivessem escolha” quando induzidos à ação por um superior.
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Toffler (1993) enfatiza a expressão “sentem-se” porque acredita que devemos
distinguir as situações nas quais há realmente pouca ou nenhuma escolha para o
gerente, porque as sanções organizacionais são severas e/ou as reivindicações dos
acionistas são fortes, de situações em que existe a oportunidade de escolher uma
ação, mas o gerente pensa que não possui o poder para fazê-lo. Ou seja,
obviamente, em quase todas as situações organizacionais alguém pode pensar que
os gerentes realmente escolhem se devem ou não agir e o que farão. Mas, em várias
situações, as conseqüências de não seguir as ordens são tão suficientemente
severas – perda do emprego, de possibilidade de promoção – que um observador
concordaria que um gerente em tal posição não tem escolha, a não ser agir conforme
as ordens ou correr o risco de sofrer maiores conseqüências. Existe um argumento
que diz que o indivíduo de sólida fibra moral reconhecerá a escolha mais difícil e
tomará o caminho moral, isto é, recusar-se-á a agir, se tal ação não corresponder
aos seus padrões morais, não importando as conseqüências. Como muitos sabem,
há outros grupos importantes, como a família, cujas necessidades afetam os
gerentes nestas situações. Então, a atitude adequada que um gerente moral deveria
tomar pode se tornar um assunto de disputa entre pessoas decentes. Portanto, há
situações em que um gerente sob ordens superiores pode dizer: “Eu não tenho
escolha”.
Para Toffler (1993), esse tipo de situação é diferente daquelas em que os
gerentes pensam que não têm escolha. Apesar de não querer ir tão longe a ponto de
sugerir que tais pessoas seguirão cegamente a autoridade, acreditando que devem
fazê-lo, independentemente das conseqüências, muitos gerentes realmente recebem
as ordens do superior como sendo “obrigados a fazer”, sem considerar que podem
questionar, desafiar ou criativamente executar estas ordens, de um modo que lhes
pareçam “corretas”.
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Ambas as preocupações sobre a questão da escolha são muito importantes
na gerência e ainda mais importantes no gerenciamento de situações éticas.
Certamente, a implementação de uma estratégia corporativa bem planejada, com
passos cuidadosamente executados, lógicos e táticos, requer que o indivíduo não
exercite “a escolha” sempre que sinta vontade. Mas, as organizações que
culturalmente mandam uma rígida adesão à autoridade ou que não oferecem meios
para seu questionamento e os gerentes se sentem brecados, devendo fazer tudo o
que lhes é mandado, contribuem para a criação e para o gerenciamento inadequado
de dilemas éticos.
Segundo Toffler (1993), quando falamos sobre escolha e a vontade de
desafiar a autoridade, também estamos fazendo alusão à questão do risco pessoal.
O risco pode variar do ódio temporário de um colega de trabalho à perda de
emprego. Muitos gerentes reconhecem que agir, em uma situação que consideram
“ética”, representa correr riscos. A maioria dos gerentes está desejando assumir este
risco. Mas a personalidade individual, circunstâncias familiares e outras coisas
determinam quanto uma pessoa deseja se arriscar. Gerentes que são chefes de
família e têm crianças pequenas, ou filhos em idade universitária, por exemplo,
provavelmente têm mais medo de se atirarem a uma situação difícil do que seus
colegas, mais jovens e sem compromissos. É claro que existe um risco atrelado à
escolha de não escolher, e este é o risco da consciência pesada, por ter permitido
que uma situação eticamente questionável passasse incontestada.
67
4.4 Dependência ou utilidade do emprego: os interesses
De acordo com os estudos de Toffler (1993), os gerentes vêem seus
empregos sob várias perspectivas: preocupam-se com quanto de seu trabalho
coincide com os seus interesses básicos; quanto de sua atividade lhes dá satisfação;
também são influenciados pelo grau de utilidade e/ou o de dependência que eles
sentem devido à segurança proporcionada pelo emprego.
As percepções dos gerentes a respeito destes fatores podem afetar o modo
como lidam com questões éticas que surgem no trabalho. Se este emprego é tão
cativante que seria doloroso perdê-lo; se o trabalho é visto com sendo criticamente
importante para o desenvolvimento da carreira profissional do gerente, ou se a perda
do emprego é uma ameaça à sua segurança financeira, os riscos de cada ação
podem se tornar desconfortavelmente altos. Quando os riscos se revelam tão altos
que a perda é quase inevitável, os gerentes freqüentemente medem e pesam as
conseqüências de cada ação, até um limite em que se pode chegar a dois resultados
improdutivos: paralisia ou comportamento antiético.
Isso não sugere que um gerente altamente responsável e totalmente
“compromissado” seja menos ético ou mais paralisado que seus colegas envolvidos
apensas casualmente. Os gerente que amam seu trabalho, consideram-no
desafiador e cativante, e são felizes no escritório. São as pessoas que muitos de nós
consideramos irrepreensíveis. Mas, o medo da perda do emprego que ele tanto
valoriza, por qualquer motivo, pode tornar particularmente difícil para o gerente agir
de forma responsável em uma situação com conseqüências ameaçadoras.
68
Apesar de não haver nada significativo nisso, é importante ponderar como os
sentimentos positivos ou negativos a respeito de uma área do trabalho podem
permitir o desenvolvimento de situações éticas e podem influenciar as habilidades
dos gerentes para resolvê-las eficazmente.
Dos vários problemas éticos discutidos com os gerentes, 32% eram
relacionados com avaliação desempenho e suas conseqüências (contratação,
demissão, promoção ou rebaixamento). O mesmo tema – e muitas vezes as mesmas
palavras – seguiram a história: “Eu odeio dar uma resposta negativa”; “Esta é a única
parte do meu trabalho de que eu não gosto”. Por outro lado, é claro, as pessoas
trabalham mais nas coisas que gostam para garantir que fiquem bem-feitas.
(TOFFLER, 1993)
4.5 Formação e características pessoais
A forma como os gerentes reagem aos dilemas – éticos ou não – é certamente
influenciada por fatores ligados à sua formação anterior e por seus traços e
características pessoais.
Para Toffler (1993), um gerente criado por pai dominante e bem-sucedido
pode reagir à autoridade de forma distinta daqueles cujos pais tiveram um trabalho
duro em uma linha de montagem. O gerente que freqüentou uma escola anti-racista
pode olhar uma ação afirmativa de modo diferente do gerente que freqüentou
escolas só de brancos, ou só de meninas, ou daquele que freqüentou
acampamentos de verão racial e etnicamente equilibrados. O executivo cujo pai
aplicou-lhe uma punição, porque ambos concordaram haver uma transgressão,
dizendo que o espancaria com um pedaço de pau, depois mandando o filho procurar
69
um pedaço de pau do “tamanho certo” (e, mais tarde, não o espancando), pode lidar
com o subordinados de forma diferente daquele cujos pais o puniam pela proibição
de assistir à televisão e ler revistas de humor. A seção “O Gerente ‘Público’ e a
Pessoa Privada” tratará em detalhes da formação individual do gerente.
Toffler (1993, p. 22) apresenta os fatores que afetam o surgimento e
gerenciamento de dilemas éticos em organizações, no Quadro 1, a seguir:
Fatores Organizacionais Fatores Individuais
Políticas, regras, Procedimentos
As percepções do gerente sobre seu trabalho ( Requisitos da atividade - Papéis explícitos e implícitos - Disponibilidade de escolha -
Dependência/utilidade do trabalho - Gostos e desgostos)
CulturaSistemas
"Como fazemos as coisas por aqui"Formação e características pessoais
Responsabilidade
FATORES QUE AFETAM O SURGIMENTO E GERENCIAMENTO DE DILEMAS ÉTICOS EM ORGANIZAÇÕES
Quadro 1 – Fatores que afetam o surgimento de gerenciamento de dilemas éticos em organizações.
Fonte: Toffler (1993, p. 22).
4.6 Ética nas atividades de Recursos Humanos
Nash (1993), afirma que, deve-se reconhecer que as abordagens gerenciais
padrão para a solução de problemas e para a motivação estão deixando de manter
vivos os padrões básicos morais e os objetivos maiores de uma sociedade capitalista
nos ambientes sociais e competitivos mudados nos dias de hoje.
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Para Toffler (1993), são muitas vezes citadas como fonte de preocupações
éticas as atividades relacionadas com: avaliação de desempenho, resultando em
decisões de contratação, demissão, promoção e rebaixamento; criação e
administração de políticas e sistemas de pessoal, por exemplo, de políticas de
invalidez ou de sistemas de gratificação; e gerenciamento de relacionamentos no
trabalho. Estes problemas ocorreram em todos os níveis da organização e não eram
específicos de uma função em particular.
Segundo Moreira (2002), as relações com os empregados materializam-se
nas chamadas Decisões de Trabalho, as quais são tomadas pela empresa em
relação a uma pessoa para: recrutá-la ao selecioná-la, contratá-la, remunerá-la,
designar-lhe as funções ou tarefas, promovê-las, transferi-la, treiná-la, removê-la de
cargo ou função, demiti-la, aposentá-la.
Moreira (2002), afirma que uma contratação será ética quando:
Ø “decorrer de uma necessidade real do contratante, seja para substituir profissional demitido, promovido ou transferido, seja para atender a expansões ou reorganizações;
Ø o processo seletivo adotado for o normalmente praticado pela contratante para aquele tipo de cargo ou função, ou seja, não pode ser um procedimento dirigido;
Ø o empregado for escolhido em decorrência das suas características pessoais e das habilidades profissionais integradas ao seu patrimônio intelectual e não por ser detentor de informação sobre as atividades do concorrente.” (MOREIRA, 2002, p.106)
Quanto ao respeito à privacidade, Moreira (2002), cita os deveres que a
empresa ética e seus gestores devem observar:
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Ø Abster-se de revelar correspondências e telefonemas pessoais do empregado;
Ø Abster-se de investigar a vida particular do empregado, por qualquer outro meio que não seja o da consulta aos bancos de dados públicos, nos quais o empregado possa ter acesso e requerer eventuais retificações;
Ø Abster-se de interferir na vida pessoal do empregado, em qualquer dos seus relacionamentos, quer seja familiar, social, religioso, esportivo ou político. (MOREIRA, p. 147, 2002)
Segundo Moreira (2002), para que as suas Decisões de Trabalho sejam
éticas, a empresa deverá observar os seguintes princípios:
Ø “cumprir integralmente a lei, acordos, convenções e contratos, inclusive respeitando integralmente os direitos de cidadania do empregado, principalmente: sua liberdade, mesmo a liberdade de escolha do emprego; sua privacidade, mesmo a de comunicação; seu direito ao contraditório e à ampla defesa em qualquer procedimento instaurado contra ele; seu direito à imagem e reputação.
Ø observar o princípio da igualdade, garantindo tratamento
idêntico para os que se encontram em situações equivalentes ou similares: sem discriminações e nem proteções indevidas.
Ø motivar as pessoas a viverem e serem felizes em outros
ambientes, além do trabalho: família, amigos, escola, grupos voltados para fins específicos, etc.).
Ø manter um ambiente de criatividade e engrandecimento
profissional. Ø não permitir práticas abusivas contra os empregados, como
assédio sexual, arrogância, maus tratos ou agressões. Ø seguir os padrões mais elevados de proteção à saúde e
segurança dos empregados. Ø seguir critérios de avaliações de desempenhos objetivos,
profissionais e justos. Ø abster-se de impor ou sugerir a fornecedores, distribuidores
e outros parceiros a contratação de pessoas ou a negação de trabalho a pessoas.
72
Ø não permitir que preconceitos ou discriminações possam interferir em quaisquer decisões de emprego: seleção, admissão, promoção, remuneração ou demissão.” (MOREIRA, 2002, p. 134)
Para Moreira (2002), os principais preconceitos conhecidos e que não podem
ocorrer nas Decisões de Trabalho são:
Ø “de raça, que geralmente é exercido contra as pessoas negras ou de origem asiática;
Ø de origem, geralmente exercido contra os africanos, nacionais de países da América Latina e asiáticos;
Ø de sexo, normalmente praticado contra as mulheres e pessoas que apresentam orientação sexual diversa do seu aparelho biológico;
Ø de idade, discriminando as pessoas com mais de 40 anos; Ø contra pessoas portadoras de deficiências físicas; Ø contra pessoas portadoras de doenças transmissíveis,
como a Aids; Ø contra pessoas que possuem vícios de consumo de droga e
álcool.” (MOREIRA, 2002, p. 135)
4.6.1 Valorização da atuação humana
O princípio ético em relação a esse assunto, para Moreira (2002), determina
que a empresa atenda às necessidades imateriais do trabalhador como ser humano,
principalmente as seguintes:
Ø adquirir novos conhecimentos; Ø desenvolver-se profissionalmente; Ø superar os seus próprios limites de criatividade, conhecimento, concentração, produtividade e outros; Ø obter uma satisfação imaterial com o trabalho, resultante do seu desempenho norteado por elevados padrões de qualidade e excelência; Ø obter o reconhecimento e o crédito imaterial pelos seus feitos e contribuições. (MOREIRA, 2002, p.140)
73
4.6.2 Acesso a dados pessoais
Os princípios éticos aplicáveis ao assunto, segundo Moreira (2002),
determinam que a empresa exponha sempre a verdade ao empregado e que,
permita-lhe o acesso às informações que lhe dizem respeito e/ou à sua carreira,
principalmente avaliações de desempenho.
Podem surgir problemas com o cumprimento dos princípios acima,
especialmente em situações de estudo de reorganização da estrutura societária ou
administrativa, com extinção de cargos; encerramento de linhas de produtos, de
estabelecimentos ou de atividades, com a extinção de cargos; alienação de controle
societário da organização, ou a possível eliminação de cargos ou funções, ou
substituição de pessoas.
Para Moreira (2002), nesses casos, a ética determina que a empresa deva
comunicar ao empregado a possibilidade de perda do emprego, tão logo esteja legal
e contratualmente autorizada a fazê-lo. Pode haver casos em que o sigilo se aplique
até o momento de fechamento do negócio.
Nestas circunstâncias, a empresa deveria compensar o empregado com o
mínimo de garantia de emprego ou indenização equivalente. Poderia arcar com as
despesas na contratação de uma empresa especializada para identificar outra
oportunidade de emprego.
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4.7 Virtudes básicas profissionais
Deve-se reconhecer que as abordagens gerenciais padrão para a solução de
problemas e para a motivação estão deixando de manter vivos os padrões básicos
morais e os objetivos maiores de uma sociedade capitalista nos ambientes sociais e
competitivos mudados dos dias de hoje.
Segundo SÁ (2000), a profissão, pois, que pode enobrecer pela ação correta e
competente, pode também ensejar a desmoralização, através da conduta
inconveniente, com a quebra de princípios éticos. Virtudes básicas profissionais são
aquelas indispensáveis, sem as quais não se consegue a realização de um exercício
ético competente, seja qual for a natureza do serviço prestado.Tais virtudes devem
formar a consciência ética estrutural, os alicerces do caráter e, em conjunto
habilitarem o profissional ao êxito em seu desempenho.
Sá (2001) cita o zelo como sendo uma importante virtude na tarefa
profissional, por tratar-se de uma responsabilidade individual, ou seja, fundamentada
na relação entre o sujeito e o objeto de trabalho: pela qualidade do serviço mede-se
a qualidade do profissional.
A divisão do trabalho, em si, não é um mal, mas, opostamente, um bem social;
o que é mal, entretanto, é dividir sem zelo ou atribuir responsabilidades de execução
a quem não tem ainda amadurecimento e competência para produzir com
qualidade. (SÁ, 2001, p. 186)
A honestidade situa-se como uma compatível prática do bem com a
confiança depositada por terceiros em alguém. A desonestidade, por sua vez, é
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exatamente a transgressão ao direito de terceiros, deriva dos: abuso de confiança,
indução maliciosa, arbitrariedade, pressão ou outro fator que venha a trais ou subtrair
algo que tenha sido confiado. A virtude do sigilo, diz respeito aos segredos das
pessoas, dos negócios, das instituições, é protegido legalmente, pois trata-se de algo
muito importante; eticamente, o sigilo assume o papel de algo que é confiado e cuja
preservação de silêncio é obrigatória. (SÁ, 2001, p. 196)
Para a virtude da competência, segundo Sá (2001), é considerado o
conhecimento da ciência, da tecnologia, das técnicas e práticas profissionais é
condição essencial para a prestação de um serviço de boa qualidade. Eticamente, é
preciso que se tenha consciência de que se instruir é o caminho para bem servir e
que se desejamos evitar danos a terceiros, na prestação de serviços, é preciso que
nos habilitemos a prestá-los. Os males que a incompetência têm causado à
humanidade são muito grandes.
Sá (2001), afirma que o erro, na conduta, não está em não ter conhecimento,
mas em ter consciência de que dele não se dispõe e mesmo assim aceitar uma
tarefa.
Na vida profissional é preciso manter o exercício da tolerância e
perseverança, embora com a habilidade necessária para que não se percam a
personalidade e a autoridade de exercício de função e que nunca devem ser
cedidas, para que seja garantida a eficácia. (SÁ, 2001, p. 210)
Eticamente faz-se necessário exercer a virtude do coleguismo e que se
fundamente na fraternidade profissional, com absoluta solidariedade, desde também,
que esta se exerça dentro dos preceitos da moral e do direito. Isto exige que nos
interessemos pelos problemas dos colegas como se nossos fossem e que tenhamos,
76
para com eles, atitudes de lealdade, sinceridade, honestidade, cooperação,
compreensão, tolerância, cordialmente, em suma, tudo que o amor fraterno
verdadeiro pode produzir dentro de práticas virtuosas. (SÁ, 2001, p. 214)
Sá (2001), cita outras virtudes:
Ø “Ética e remuneração - toda remuneração deve ter em conta utilidade , qualidade, quantidade, temporalidade, espacialidade e ambientalidade do serviço, assim como as possibilidades das partes. Ø Ética da resposta - quando a questão é profissional, relevante é a responsabilidade da resposta. O respeito pela pergunta dever ser coerente com sua responsabilidade. Seja qual for a resposta, todavia, ela deve existir sempre.” (SÁ, 2001, p. 228)
Nash (1993), cita quatro traços essenciais de caráter: habilidade para
reconhecer e articular a ética de um problema; coragem pessoal para não
racionalizar a má ética; um respeito inato pelos outros; e, por último, o valor pessoal
derivado do comportamento ético.
Vasconcelos (1995) cita vários autores que estudam sobre os processos de
aprendizagem nas organizações, onde o impulso por aprender é criativo e produtivo,
resultando no desenvolvimento das disciplinas: raciocínio sistêmico, domínio
pessoal, modelos mentais, objetivo comum e aprendizado em grupo.
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CONCLUSÕES
Este estudo teve como objetivo principal mostrar os “Requisitos de Ética
necessários ao gestor de Recursos Humanos”, no desempenho de suas atribuições
profissionais.
Para tal realizou-se pesquisa bibliográfica sobre o tema proposto, onde foi
possível verificar que o exemplo da conduta ética dos líderes dignifica a sociedade e
cria novos elementos que seguem tal forma de viver, pois a tomam como paradigma.
A imagem da virtude, corporificada em pessoas, leva outras a seguirem o caminho
da conduta perfeita.
Neste contexto a ética se apresenta indispensável ao profissional, porque na
ação humana “o fazer” e “o agir” estão interligados. O fazer diz respeito à
competência, à eficiência que todo profissional deve possuir para exercer bem a sua
profissão. O agir se refere à conduta do profissional, ao conjunto de atitudes que
deve assumir no desempenho de sua profissão.
Foi constatado que os “requisitos necessários ao gestor de Recursos
Humanos” correspondem ao conjunto de regras, conhecimentos e condições
essenciais ao indivíduo para administrar uma empresa. Assim, cada pessoa tem sua
própria ética, uma vez que há sempre alguns impulsos imediatos que serão
refreados em favor de outros objetivos considerados “maiores” ou de longo prazo, os
quais moderam a ação de cada um. Esses objetivos de longo prazo correspondem
ao elemento que proporciona uma sensação de significado à nossa existência. Optar
por ser ético, portanto, é optar por dar algum significado à nossa própria existência.
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Assim, foi possível concluir a importância estratégica que os ativos imateriais
adquirem na sociedade da informação e na economia do conhecimento. De fato, não
se define mais o valor das empresas apenas e tão-somente pelo pesos de seus
ativos materiais; avaliam-se também os ativos intangíveis: a reputação e o
comportamento dos seus gestores com as equipes. Nesse contexto a ética significa
algo muito próximo da “autodisciplina” e, autodisciplina vem sendo há muito tempo
identificada por estudiosos do tema, como uma das qualidades necessárias a todos
os gestores.
Quanto à contribuição do estudo para as organizações públicas e particulares,
foi possível identificar algumas virtudes essenciais aos gestores de recursos
humanos, sem as quais não seria possível o exercício de suas atribuições
profissionais.
O estudo pode ser considerado como uma possível ferramenta para aproximar
gestores das suas equipes e proporcionar reflexão no momento da implantação de
treinamentos para gestores e quando da criação de um Código de Ética nas
organizações.
Espera-se que este trabalho possa fornecer elementos que enriqueçam as
ações de gestão de pessoas e sua relação com a identificação de requisitos de
éticas necessários aos gestores e demais profissionais envolvidos com recursos
humanos, estimulando a produção técnica e científica sobre o assunto e que possa
também dar algumas contribuições, como o surgimento de novos indicadores de
ética nas relações interpessoais dentro do ambiente de trabalho.
79
BIBLIOGRAFIA
BAUMAN, Zygmunt. Ética Pós-moderna. São Paulo: Paulus, 1997. CHIAVENATO, I. Desempenho humano nas empresas: como desenhar cargos e avaliar o desempenho. São Paulo-SP: Atlas, 2001. FARAH, Flavio. Ética na Gestão de Pessoas: uma visão prática. São Paulo-SP: Edições Inteligentes, 2004. GIL, A.C. Gestão de Pessoas: enfoque nos papéis profissionais. São Paulo-SP: Atlas, 2001a. MARRAS, J.P. Administração de Recursos Humanos: do operacional ao estratégico. São Paulo-SP: Futura, 2001. MOREIRA, Joaquim Manhães. A Ética Empresarial no Brasil. São Paulo: Pioneira, 2002. NASH, Laura L. Ética nas empresas. São Paulo-SP: Makron Books, 1993. SÁ, Antonio Lopes. Ética profissional. São Paulo-SP: Atlas, 2000. ______Ética profissional. São Paulo-SP: Atlas, 2001. SROUR, Robert Henry. Poder, Cultura e ética nas organizações: o desafio das formas de gestão. Rio de Janeiro: Elsevier, 2005. VALLS, Álvaro L. M. O que é Ética. 5ª ed. São Paulo-SP: Brasiliense, 1992. VÁSQUEZ, Adolfo Sánchez. Ética. Trad. Joel Dell’ Anna. 25ª ed. Rio de Janeiro-RJ: Civilização Brasileira, 2004 TOFFLER, Barbara Ley. Ética no Trabalho: Tomando decisões difíceis no mundo competitivo dos negócios. São Paulo-SP: Makron Books, 1993.
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FOLHA DE AVALIAÇÃO
Nome da Instituição: UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES
Título da Monografia: ÉTICA NA GESTÃO DE RECURSOS HUMANOS
Autor: GABRIEL MOREIRA CUNHA NETO
Data da entrega: 2008
Avaliado por: ___________________________________________ Conceito:
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Conceito Final: ________