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SISTEMA DE SELEÇÃO UNIFICADA:
DEMOCRATIZAÇÃO DO ACESSO AO ENSINO SUPERIOR?
Tânia Gracieli Vega Incerti1
Vanessa dos Santos Tavares
RESUMO: O direito à educação para todos os cidadãos encontra-se formalizado em vários aparatos
legais, dentre eles: a Declaração Universal dos Direitos Humanos, a Constituição Federal do Brasil de
1988, e a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. No entanto, o acesso ao Ensino Superior,
desde sua origem, sempre foi considerado como privilégio de poucos, especialmente, das elites
sociais. Em 2010, o Ministério da Educação institui o Sistema de Seleção Unificada, Sisu, que por
meio das notas obtidas no Exame Nacional de Ensino Médio, possibilita ao candidato concorrer a uma
vaga em Instituições de Ensino Superior em todo o país. Neste contexto, esse trabalho se desenvolve
em duas partes, a primeira delineia-se na busca de referencial teórico/histórico especialmente nos
autores Saviani (1987), Yarzábal (2002), Vasconcelos (2003) e Gisi (2003; 2004; 2006), os quais nos
fornecem subsídios históricos das políticas educacionais bem como fundamentos para discussão sobre
Educação e democracia. Na segunda parte, pesquisamos dados quantitativos do Sisu no período de
2010 a 2014. Para tanto, recorremos aos dados disponibilizados na página eletrônica do Sisu e no
Portal MEC e, com base nos dados obtidos, discute-se se a crescente oferta de vagas caracteriza a
democratização do acesso ao Ensino Superior.
PALAVRAS-CHAVE: Democratização; Ensino Superior; Sistema de Seleção Unificada.
INTRODUÇÃO
A história do Ensino Superior no Brasil é parte integrante de um contexto
socioeconômico e, desde seu início, no Colégio dos Jesuítas, na Bahia, já evidenciava que esta
educação seria reservada para as elites sociais (GISI, 2006).
No ano de 1931, o Decreto nº 19.851, trata da organização do ensino superior no
Brasil, e cria possibilidades para o desenvolvimento do Ensino Superior. Anos depois, em
1937, após a implantação do Estado Novo, a educação passou a ser uma estratégia para
resolver questões sociais (GISI, 2006). Com a promulgação da Lei de Diretrizes e Bases da
Educação Nacional, LDB nº 9394/96, o direito à educação é garantido para todo cidadão
brasileiro e o ensino superior ganha mais espaço.
Neste trabalho discutiremos o acesso ao ensino superior. Para tanto, é necessário que
destaquemos a importância e necessidade deste nível de ensino para o desenvolvimento humano e
1 Instituto Federal do Paraná, IFPR. E-mail: [email protected]
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social. A educação permanente não é apenas um desejo, a educação, como aponta Vasconcelos
(2003) é uma questão de realização pessoal e de sobrevivência no mundo do trabalho.
Desta forma, acredita-se que seja de extrema importância que as políticas públicas
voltadas para a educação tenham um investimento prioritário em todos os níveis de ensino, assim,
A educação direito fundamental de todo cidadão, constitui importante questão estratégica
para o desenvolvimento nacional e as instituições de ensino superior devem, portanto, estar
comprometidas com essa missão. Para que a justiça social enfim se faça neste país, a
educação deverá, necessariamente, ser assumida como prioridade, além de ser projetada
como o caminho privilegiado para o alcance do desejável desenvolvimento de nossa
sociedade. (VASCONCELOS, 2003 p. 83)
A educação constitui-se com um direito do cidadão e é dever do Estado e da família
provê-lo devendo ser proporcionado a todos. Ela encontra-se preconizada em diversos
aparatos legais, tais como Declaração dos direitos Humanos, Constituição Federal e Lei de
Diretrizes e Bases da Educação Nacional.
Em conformidade com a Constituição Federal de 1988, a educação é um direito
inalienável, fundamental e universal. Recorrendo a esse instrumento legal, encontramos no
artigo 205:
A educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada
com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo
para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho (BRASIL, 1998).
A legislação brasileira reconhece ainda que a educação é uma dimensão da vida social que
não se restringe ao ensino formal, escolarizado. No entanto, é a forma institucional da educação
que promove o acesso amplo ao legado cultural e ao conhecimento social e universalmente
produzido pela humanidade. Para que a educação alcance suas finalidades e cumpra sua função
social, torna-se imprescindível que o ensino formal seja ofertado com qualidade.
O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística IBGE realizou uma pesquisa em 2012
e apresenta que, em 10 anos, o percentual de brasileiros com diploma universitário passou de
4,4% para 7,9%. No entanto, cabe destacar que são apenas 15 de cada 100 jovens de 18 a 24
anos na educação superior. (RISTOFF, 2013).
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OBJETIVOS
Este trabalho tem por objetivos principais:
- Discutir a democratização do acesso ao ensino superior e a crescente oferta de vagas
por meio do Sistema de Seleção Unificada, Sisu , e;
- Levantar dados quantitativos do Sisu no período de 2010 a 2014.
PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS
Esta pesquisa é de caráter qualitativo e quantitativo. Para alcançar os objetivos propostos,
a pesquisa foi desenvolvida em duas partes. Na primeira parte recorremos aos referenciais
teóricos, em bibliografias acerca dos temas políticos educacionais, educação e democratização.
Na segunda parte desta pesquisa buscamos dados do Sistema de Seleção Unificada no período de
2010 – 2014. Para tanto, recorremos aos dados disponibilizados na página eletrônica do Sisu e no
Portal MEC. Os dados foram organizados em tabelas e gráficos.
O SISTEMA DE SELEÇÃO UNIFICADA
Inicialmente, este trabalho foi motivado pelo fato de trabalharmos em uma instituição
de ensino superior, a qual adere ao Sistema de Seleção Unificada como forma de ingresso ao
Ensino Superior. Ao realizar pesquisa nos periódicos da CAPES, observou-se que não há
estudos específicos sobre o Sisu e seus impactos na sociedade. Dessa forma, foi-nos um
desafio levantarmos as questões que se apresentam ao longo deste texto.
Na implantação do Ensino Superior no Brasil, o ensino era apenas para poucos das
classes elitizadas. Para superar este cenário, as políticas educacionais, vem fazendo esforço
significativo na tentativa de ampliar e democratizar o acesso ao ensino superior.
Nesse sentido, o Ministério da Educação, em janeiro de 2010, instituiu o Sistema de
Seleção Unificado – Sisu. Conforme a Portaria Normativa nº 21 de 05 de novembro de 2012,
o Sisu é um sistema informatizado, gerenciado pelo Ministério da Educação, que seleciona
candidatos, mediante as notas obtidas no Exame Nacional do Ensino Médio - ENEM, para
ocupação de vagas em cursos superiores de graduação em Instituições Públicas.
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Duas vezes por ano é publicado Edital do Sisu de chamada para inscrições de candidatos,
conforme vagas disponíveis nas instituições públicas de ensino superior.2 O procedimento para
inscrições e acompanhamento é feito pela página eletrônica do Sisu, as vagas são preenchidas
conforme a classificação do candidato, de acordo com as notas obtidas no ENEM.
Ao se inscrever no Sisu, o candidato escolhe uma ou duas das instituições
participantes, podendo eleger até dois cursos (1ª e 2ª opção) aos quais irá concorrer a uma
vaga. A própria página do Sisu informa que durante as inscrições, o candidato pode alterar as
opções. Tendo em vista essa dinâmica é possível identificarmos que, caso o sistema não tenha
um controle efetivo, o estudante está sujeito a possibilidade de incoerências optando por um
curso ao qual não tem real interesse, o que pode gerar a hipótese de aumento no número de
estudantes evadidos nas Instituições Públicas de Ensino Superior.
Por meio das opções de reserva de vagas das ações afirmativas, o candidato tem a
possibilidade de concorrer a vagas, seguindo as definições contidas na Portaria que institui o Sisu:
Art. 20. Os estudantes que optarem por concorrer às vagas reservadas em decorrência do
disposto na Lei nº 12.711, de 2012, e regulamentação em vigor, serão classificados dentro
de cada um dos seguintes grupos e subgrupos de inscritos:
I - estudantes egressos de escola pública, com renda familiar bruta igual ou inferior a 1,5
(um vírgula cinco) salário-mínimo per capita:
a) que se autodeclararam pretos, pardos ou indígenas;
b) que não se autodeclararam pretos, pardos ou indígenas.
II - estudantes egressos de escolas públicas, independentemente de renda, nos termos do
inciso II do art. 14 da Portaria Normativa MEC nº 18, de 2012:
a) que se autodeclararam pretos, pardos ou indígenas;
b) que não se autodeclararam pretos, pardos ou indígenas. (BRASIL,2012 Portaria
Normativa nº 21 de 05 de novembro de 2012)
Nesse contexto, percebe-se a preocupação do Ministério da Educação em democratizar
o acesso ao Ensino Superior. Nesse contexto, Saviani (1987) contribui com a discussão sobre
o processo de democratização. O autor aponta que um projeto democrático necessita cuidar
daquilo que é específico da escola, trata-se
Da luta contra a seletividade, a discriminação e o rebaixamento do ensino das camadas
populares. Lutar contra a marginalidade, através da escola, significa engajar-se no esforço
para garantir aos trabalhadores um ensino da melhor qualidade possível nas condições
históricas atuais. (SAVIANI, 1987, p.36)
2 Instituições Públicas de Ensino Superior abrangem as Universidades Federais, Universidade Tecnológica
Federal do Paraná, Institutos Federais de Educação Ciência e Tecnologia e Centros Federais de Educação
Profissional e Tecnológica.
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No entanto, o próprio direcionamento das ações do Sisu está na contramão da proposta
de Saviani. Esse autor pressupõe que um ensino melhor não deveria ser qualquer ensino ou
qualquer curso senão aquele que realmente o sujeito sonha.
Além de poder optar por dois cursos distintos, o candidato pode ainda concorrer à
vagas em qualquer estado brasileiro. Assim, é possível pensar nas dificuldades que um
estudante pode enfrentar frente ao desafio de morar em outro estado e nos percalços de
ingressar em um curso de 2ª opção. Este fator leva-nos a acreditar que os índices de evasão
podem crescer ao longo dos anos.
Durante o período de inscrições, o Sisu atualiza as notas de corte na página eletrônica.
Dessa forma, se a nota que o candidato obteve no ENEM não for o suficiente para ingressar
no curso que o candidato realmente deseja, o candidato altera a opção para outro curso, o que
evidencia a forte tendência de inserir o estudante em um curso superior, engrossando o
número de estudantes nas graduações.
Diante desse cenário, reforça-se a ideia apontada por Vasconcellos (2013), quando
coloca que o sistema educacional prioriza os números, com a única finalidade de obter
recursos para a educação. No contexto no qual está inserido o Sisu, não há espaço para
garantia qualidade da educação, o que há é um espaço para a inserção do candidato em um
curso superior sem levar em conta suas reais necessidades.
Todo o processo de mudança vivenciado pela Educação Superior provocou um
reordenamento no papel social desempenhado pela mesma. Para esta discussão, teremos por
base a definição de Educação Superior apresentada na Conferência Mundial de Educação
Superior realizada em Paris, em 1998:
A educação superior é vista como uma ferramenta fundamental para abrir espaços de
solidariedade inteligente e responsável, desenvolver valores culturais, reconstruir o tecido
social, reestruturar o Estado e contribuir para melhorar a qualidade de vida da maioria dos
habitantes da área. (YARZÄBAL, 2002, p.96)
O ensino superior sofreu fortes influências de transformações sociais, governamentais
e educacionais ocorridas no continente nas últimas décadas, tais como Reforma do Estado,
globalização, neoliberalismo, muitas destas impostas por conjunturas internacionais.
Yarzábal (2002, p. 39) enumera cinco consequências destas influências, vivenciadas
atualmente pelo ensino superior: “a) considerável expansão quantitativa; b) aumento da oferta
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privada; c) diversificação institucional; d) severa restrição do gasto público em educação; e e)
acentuada assimetria da internacionalização”.
Ao explicar o fator de expansão quantitativa, Yarzábal (2002) relaciona ao aumento
ocorrido nas últimas décadas no que diz respeito ao número de estudantes, de professores, de
pessoal administrativo e também de instituições de educação superior, o que segundo alguns
estudos, foi impulsionado fundamentalmente devido ao crescimento demográfico e ao
aumento da cobertura dos outros níveis do sistema educativo. Ainda, o mesmo autor aponta
outros elementos que contribuíram para esta expansão tais como: a concentração das
populações em grandes cidades; a inserção da mulher no mercado de trabalho, a expansão
gradual da educação básica e secundaria; a necessidade de novas qualificações e habilidades
para a indústria moderna e o mercado.
Mesmo havendo aumento na expansão de escolarização superior, os resultados quanto
ao número médio desta escolarização são poucos significativos. Este fator, leva-nos a
acreditar que é pelo baixo investimento do Estado no setor educativo, bem como, coloca em
discussão a qualidade da educação.
CRESCENTE OFERTA DE VAGAS
Nos últimos anos, o Ministério da Educação dispõe de políticas voltadas para a
diminuição das desigualdades que historicamente fazem parte da educação e da sociedade
brasileira. Nesse sentido, uma das metas do Plano Nacional de Educação, aponta como um
dos objetivos a viabilização do acesso de mais brasileiros ao ensino superior (Parecer Pl nº
8.035/2010).
Conforme dados obtidos na página do MEC, os cursos com maior número de vagas
são os de Engenharias, para os quais, no primeiro semestre de 2014 totalizavam 24.868 vagas
ofertadas em todo o Brasil. No entanto, não há registro de acompanhamento destes estudantes,
o que reforça a ideia de necessidade de acompanhamento para a garantia da permanência
destes estudantes no Ensino Superior.
Foi realizada coleta de dados na página eletrônica do Sistema único de Seleção,
considerando o primeiro semestre de cada ano. Conforme observa-se na tabela 1, há um
expressivo crescimento das ofertas pelo Sisu.
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Tabela 1: Cenário de ofertas de vagas no Brasil (2010- 2014)3
Ano Vagas ofertadas Instituições Públicas de
Ensino Superior
2010 47.900 53
2011 83.125 83
2012 108.552 95
2013 129.279 101
2014 171.401 115
No primeiro ano em que o sistema foi implantado, apenas 53 instituições
aderiram ao Sisu como forma de seleção de candidatos para ingresso em um curso de
graduação. Ao todo foram 793,9 mil estudantes que realizaraminscrições para concorrer às
47.900 vagas. Ao longo de quatro anos de implantação do sistema, o cenário modificou-se,
houve um aumento de vagas, de instituições e de candidatos.
Gráfico 01: Vagas ofertadas no Sisu (2010-2014)
3 Neste trabalho, serão considerados os dados referentes ao primeiro semestre de cada ano.
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Entre os anos de 2010 a 2014, houve um crescimento de 357,83%, nas vagas para
estudantes, este fator caracteriza uma das metas do PNE, de tornar mais acessível o ingresso
ao Ensino Superior (gráfico 01). Observa-se ainda que, a quantidade de Instituições públicas
que aderem ao Sisu também é crescente, como mostra o gráfico 02.
Gráfico 02: Quantidade de IES que ofertam vagas pelo Sisu
No ano de 2010, de acordo com os dados obtidos no Sisu,793,9 mil candidatos se
inscreveram no Sisu. No primeiro semestre de 2014, este número saltou para 2.327.651
inscritos. Em quatro anos de implantação do Sisu a procura por vagas em cursos de graduação
subiu em 314, conforme mostra o gráfico 03.
Com isso, é possível perceber que o brasileiro tem buscado o Ensino Superior, o que
reforça a ideia de Yarzäbal (2002), quando aponta que este nível de ensino é vislumbrado
como possibilidade de melhoria da qualidade de vida. São pessoas de diversas classes sociais,
etnia, raça, trabalhadores em geral. São filhos e filhas da sociedade “que se fazem presentes
nas escolas públicas e que exigem o acesso às universidades”. (ARROYO, 2012, p. 09)
Segundo Arroyo (2012), os jovens que chegam à universidade nos dias atuais, são
jovens que carregam em suas mochilas a segregação e as formas precárias das escolas de onde
vieram, mas que exigem e reconhecem o seu direito à educação e à cultura.
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Gráfico 03: Quantidade de inscritos no Sisu
Ao realizar análises dos dados, observa-se a necessidade de um acompanhamento
tanto no que se refere a garantia do acesso, mas sobretudo, na garantia da permanência e
qualidade do Ensino Superior ofertado no Brasil. Preocupa-nos, enquanto profissionais da
educação, que estes números deixem de ser apenas dados e possam, de fato, caracterizar um
processo democrático ao qual possa contribuir para o desenvolvimento de uma sociedade
mais crítica e participativa nos processos políticos de nosso país.
CONCLUSÕES
Ao recorrermos a nossa Constituição Federativa encontramos no artigo 205 que: “A
educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a
colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o
exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho”.
Neste mesmo aparato legal, no artigo 206 encontram-se delimitados os princípios que
regem o ensino, dentre eles: “I – Igualdade de condições para o acesso e permanência na escola”
Assim, mesmo não estando explícito, entendemos que para a garantia do “exercício da
cidadania e qualificação para o trabalho”, sem o acesso, permanência e conclusão do ensino
superior, esta determinação será difícil de ser atingida, já que vivemos em uma sociedade
globalizada de constantes transformações e grandes inovações tecnológicas responsáveis por
uma imensa mudança no que diz respeito à sociedade, à escola e ao mundo do trabalho
(BAUMAN, 2011).
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O acesso à educação superior é abordado na Lei de Diretrizes e Bases da Educação de
1996 (LDB), em especial, no artigo 44, inciso II, ao tratar dos cursos e programas que
compõem esta modalidade de ensino. Ao referir-se aos cursos de graduação indica que estes
são: “[...] abertos a candidatos que tenham concluído o ensino médio ou equivalente e tenham
sido classificados em processo seletivo” (Brasil, 1996).
A partir da indicação contida na LDB, abre-se a possibilidade de que para acessar a
educação superior o candidato não necessariamente precise prestar vestibular. Sobre esse processo
de seleção, de acordo com vários autores, seu surgimento se deu objetivamente para limitar o
acesso, já que havia mais candidatos do que as vagas disponíveis para o ensino superior.
O processo de vestibular tem sido considerado um dos grandes culpados da exclusão
na educação e de exercer efeitos danosos sobre o sistema de ensino. Gisi (2004, p. 43)
adiciona a isto o fato de que “[...]muitos alunos são excluídos já no decorrer da sua trajetória
na educação básica, o que ocorre é que isso é evidenciado no momento da educação superior.”
Para que possamos tecer algumas considerações é importante que retomemos o
conceito de democracia, para tal, teremos por base Coutinho (2000) citado por Zainko (2003,
p. 51) o qual define que:
A democracia só realizará seu valor universal no Brasil se essas grandes massas de
excluídos forem incorporadas ao processo social como autênticos protagonistas. Só pode
haver democracia para as grandes massas da população se elas forem capazes de se
organizar, de expressar seus anseios e de obter efetivamente conquistas sociais, culturais e
políticas no valor universal sobretudo porque é um permanente desafio. Nunca poderemos
chegar a um ponto que nos permita dizer que a democracia está acabada. A democracia é
um processo que devemos conceber como em permanente construção.
Após esta breve conceituação, retomamos um aspecto importante na questão da
democratização do ensino superior, esse diz respeito ao fato de que observamos
constantemente que há uma dicotomia entre a igualdade formal, instituída por lei, e a
igualdade material, vivenciada cotidianamente. Os direitos, legalmente, são os mesmos para
todos, porém, nem todos possuem condições de exercê-lo. Este aspecto é observado quando
pensamos no acesso às políticas públicas, e para não perdermos o enfoque deste trabalho,
especialmente o acesso à educação superior.
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Ainda que no decorrer deste trabalho, visualizemos que o Sisu propicia uma
crescente oferta de vagas ao ensino superior, nos questionamos: Esse acesso representa um
processo de democratização?
Acredita-se que, para que se garanta o acesso, não podemos pensar educação superior
descolada dos demais níveis de educação, ou seja, a fundamental e a secundaria. Assim, pensamos
que o investimento governamental deve priorizar a educação em todos os seus níveis.
A busca pela redução das desigualdades socioeconômicas faz parte do processo de
democratização da educação e da própria sociedade. Entretanto, esse não se pode efetivar
apenas no acesso à educação gratuita. Torna-se necessária a criação de mecanismos que
viabilizem a permanência e a conclusão de curso dos que nela ingressam, reduzindo os efeitos
das desigualdades apresentadas por um conjunto de estudantes provenientes de segmentos
sociais cada vez mais pauperizados e que apresentam dificuldades concretas de prosseguirem
sua vida acadêmica com sucesso.
Acordando com Zainko (2003, p.55), acreditamos que “[...] não basta a expansão
quantitativa do número de vagas, pois estas frequentemente promovem uma democratização às
avessas, sem garantia de permanência do aluno e de pertinência social do processo de formação.”
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BAUMAN, Zygmunt. Modernidade Líquida. Tradução: Plínio Dentzien. Rio de Janeiro: Zahar,
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