educaÇÃo na amÉrica latina: desigualdade e...

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1 EDUCAÇÃO NA AMÉRICA LATINA: DESIGUALDADE E REFORMA EDUCATIVA NO BRASIL, CHILE, MÉXICO E VENEZUELA Débora Villetti Zuck 1 RESUMO: Este estudo tem como objetivo entender a educação na América Latina tomando como referência Brasil, Chile, México e Venezuela. Busca se aproximar destas realidades e apontar aspectos vinculados ao fenômeno educativo nestas latitudes. O procedimento adotado para tanto foi à análise comparada de dados sobre variáveis educacionais, a partir de 1990, diferenciando-os e associando-os, e estabelecendo relações com aspectos sociais, econômicos, políticos e culturais de cada país. Utilizou-se a coleta de dados em distintos organismos que elaboram panoramas sobre a realidade latino-americana e em estatísticas nacionais. A interpretação considerou o contexto histórico e o sentido da educação nesses países, sendo que as reformas dos anos 1990 nortearam alterações nas funções do Estado e das Políticas Educacionais incidindo no objeto pesquisado. O problema educativo latino-americano em suas expressões concretas nestes países, apreendidas em relação ao desenvolvimento dos povos da América Latina e não aos interesses do capital internacional e a resolução de suas crises, tem ainda muitos limites a serem enfrentados e quiçá superados. PALAVRAS-CHAVE: América Latina; Educação; Reforma; Desenvolvimento. INTRODUÇÃO Este estudo objetiva entender a educação na América Latina por meio de uma análise comparada de dados de quatro países: Brasil, Chile, México e Venezuela. Tomando como referência estes países busca, também, se aproximar destas realidades e apontar aspectos vinculados ao fenômeno educativo nestas latitudes. Para tanto, utilizou a coleta de dados em sites de organismos que elaboram panoramas sobre a realidade latino-americana, tais como: a Comissão Econômica para a América Latina e Caribe (CEPAL), a Oficina Regional de Educação para América Latina e Caribe (OREALC) e a Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura (UNESCO), além de estatísticas nacionais dos países. Também foram consultados e estudados documentos oficiais e fontes secundárias sobre o tema. As variáveis consideradas foram: analfabetismo, taxa de escolarização bruta (que desconsidera a idade escolar) e neta (que considera a relação entre idade e ano escolar), 1 Pedagoga; Mestre em Educação; Integrante do Grupo de Pesquisa em Políticas Sociais (GPPS)/Universidade Estadual do Oeste do Paraná (UNIOESTE). E-mail: [email protected]

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EDUCAÇÃO NA AMÉRICA LATINA: DESIGUALDADE E REFORMA

EDUCATIVA NO BRASIL, CHILE, MÉXICO E VENEZUELA

Débora Villetti Zuck1

RESUMO: Este estudo tem como objetivo entender a educação na América Latina tomando como

referência Brasil, Chile, México e Venezuela. Busca se aproximar destas realidades e apontar aspectos

vinculados ao fenômeno educativo nestas latitudes. O procedimento adotado para tanto foi à análise

comparada de dados sobre variáveis educacionais, a partir de 1990, diferenciando-os e associando-os,

e estabelecendo relações com aspectos sociais, econômicos, políticos e culturais de cada país.

Utilizou-se a coleta de dados em distintos organismos que elaboram panoramas sobre a realidade

latino-americana e em estatísticas nacionais. A interpretação considerou o contexto histórico e o

sentido da educação nesses países, sendo que as reformas dos anos 1990 nortearam alterações nas

funções do Estado e das Políticas Educacionais incidindo no objeto pesquisado. O problema educativo

latino-americano em suas expressões concretas nestes países, apreendidas em relação ao

desenvolvimento dos povos da América Latina e não aos interesses do capital internacional e a

resolução de suas crises, tem ainda muitos limites a serem enfrentados e quiçá superados.

PALAVRAS-CHAVE: América Latina; Educação; Reforma; Desenvolvimento.

INTRODUÇÃO

Este estudo objetiva entender a educação na América Latina por meio de uma análise

comparada de dados de quatro países: Brasil, Chile, México e Venezuela. Tomando como

referência estes países busca, também, se aproximar destas realidades e apontar aspectos

vinculados ao fenômeno educativo nestas latitudes.

Para tanto, utilizou a coleta de dados em sites de organismos que elaboram panoramas

sobre a realidade latino-americana, tais como: a Comissão Econômica para a América Latina

e Caribe (CEPAL), a Oficina Regional de Educação para América Latina e Caribe

(OREALC) e a Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura

(UNESCO), além de estatísticas nacionais dos países. Também foram consultados e

estudados documentos oficiais e fontes secundárias sobre o tema.

As variáveis consideradas foram: analfabetismo, taxa de escolarização bruta (que

desconsidera a idade escolar) e neta (que considera a relação entre idade e ano escolar),

1 Pedagoga; Mestre em Educação; Integrante do Grupo de Pesquisa em Políticas Sociais (GPPS)/Universidade

Estadual do Oeste do Paraná (UNIOESTE). E-mail: [email protected]

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repetência e abandono escolar. Também foram incorporadas o gasto público em educação, o

índice do Produto Interno Bruto (PIB) e a população, necessárias para o estabelecimento de

relações mais amplas com o objeto aqui pesquisado.

Por meio do procedimento metodológico adotado, a análise comparada, foi possível à

diferenciação e a associação das variáveis, a partir dos anos 1990, e por meio da análise

sistêmica o estabelecimento de relações com aspectos sociais, econômicos, políticos e

culturais de cada país. O que remete a interpretá-los considerando o contexto histórico e o

sentido da educação em cada país, tendo por nexo as reformas dos anos 1990 que nortearam

alterações nas funções do Estado e das Políticas Educacionais que incidem no objeto, pois

esses países adotaram proposições e reorganizaram seus sistemas educativos na perspectiva de

“alcançar o desenvolvimento”, resultando em mais desigualdade educativa.

Algumas considerações sobre a América Latina

A América Latina se constituiu em um conjunto de países da América do Sul,

Central, México e o Caribe que evocam diferenças, contrastes e antagonismos em relação à

América do Norte.

A América Latina tem fronteiras instáveis, elementos culturais fluidos, étnicos, mescla

cultural de povos, indígenas, afro-descendentes. Tem nações diferentes, todas com

desenvolvimento capitalista dependente, umas com padrão relativamente importantes, outras

com processos industriais incipientes, países com concentrações urbanas elevadas e com

população rural, além de diferenças populacionais, desigualdades de PIB, países com

população originária, com idioma e cultura específicas. Assim, podemos abordá-la desde um

panorama geográfico, histórico, social, cultural, político e econômico.

Conforme Ribeiro (1986), além das desigualdades geográficas, costeiras, montanhosas

ou dos pampas, entre cordilheiras e florestas, o continente se rompe em nacionalidades

singulares, povos desconhecidos, mais solitários, pois desde a colonização as sociedades

latino-americanas coexistiram sem conviver, relacionando-se para fora das fronteiras.

No plano étnico há habitantes autóctones na Guatemala, Bolívia, Peru, Equador, áreas

da Colômbia e do México, etnias tribais no Paraguai, Brasil, Chile e Venezuela e, também,

afrodescendentes no Brasil, Antilhas, Venezuela, Colômbia, Guiana e Peru, entre outros. Há

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uma miscigenação, uma mescla de povos. No plano linguístico e cultural, os contrastes mais

visíveis são entre os luso-americanos, no Brasil, e hispano-americanos, congregando os

demais países, e uma não homogeneidade com ibero-americanos ou britânico, além da

existência de línguas indígenas.

Conforme Tavares (2010) a história dos povos originários foi descartada pelos

colonizadores como barbárie, selvageria, ignorância, pois não estavam dispostos a qualquer

“encontro de culturas”. A formação dos nossos povos é marcada pelo subjugo da sociedade

pré-existente a metrópole, paralisando da cultura original e convertendo a população em

trabalho submisso, um “conjunto de povos intencionalmente constituídos por atos e vontades

alheios a eles mesmos” (RIBEIRO, 1986, p.77).

As nações latino-americanas são produtos da “expansão da civilização ocidental”, de um

colonialismo organizado e sistemático que adquire sua forma mais complexa no pós emancipação

nacional e persiste com a evolução do capitalismo e a incapacidade destes países impedirem sua

incorporação dependente ao espaço econômico, cultural e político das nações capitalistas centrais

(FERNANDES, 1999), pois a independência política das colônias não rompe com a

subordinação econômica (MARINI, 1991). E “os países, ao não romperem previamente com os

moldes de [...] dependência, integram suas respectivas servidões”. (GALEANO, 2004, p. 271).

Para mudar essa realidade precisamos começar a vê-la como é, assumi-la.

Conforme Gullar (2004, p. 378) “Nós, latino-americanos somos todos irmãos [...] não

porque seja o mesmo sangue que no corpo levamos: o que é o mesmo é o modo como o

derramamos.” Somos o “resultado tanto de un específico desarrollo interno [processos

industriais importantes ou incipientes] como del lugar que cada formación ocupa en el seno

del sistema (CUEVAS, [19--]a, p. 39). Ocupamos um lugar diferenciado na divisão

internacional do trabalho, pois à América Latina não coube a função de produzir ciência e

tecnologia, mas de consumidor e fornecedor de riquezas/extração de matérias-primas para

impulsionar a produção (FERNANDES, 1981), e nesse caso, a educação não se constituiu

como elemento importante. É o sentimento de superação das condições reais nas quais

padecem os povos latino-americanos, atravessados pela dependência, que deve se fazer

unitário entre os povos dessas nações.

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A reforma na América Latina nos anos 1990

Como região periférica do capitalismo mundial, os países da América Latina tem seu

desenvolvimento atrelado à divisão internacional do trabalho. Nos anos 1950 os Estados

latino-americanos assumem a função de principais agentes do desenvolvimento, que se daria

promovendo a industrialização, com cunho nacionalista, porém a articulação do Estado ao

capital internacional o torna associado, abrindo as economias latino-americanas, nas décadas

seguintes, ao capital internacional. Com a crise no final dos anos de 1970 e 1980, a educação

é apontada como possibilidade de superação das dificuldades encontradas, como possibilidade

de desenvolvimento. Foi o momento em que os países buscaram financiamento externo o que

contribuiu para seu endividamento.

Com a crise, vinculada ao novo princípio de acumulação flexível e a incapacidade dos

países pagarem suas dívidas, fez-se necessário ajustes estruturais, redirecionando a economia

para fora, como previa a globalização, que afetou o ciclo da modernização vivido até então.

Nesse contexto emergem as reformas dos anos 1990 a fim de controlar a situação e no intuito

de crescimento. Alguns aspectos indicavam esse caminho: reorientação do gasto público, o

Estado deveria transferir funções, liberar o comércio, rompendo com a política protecionista,

e a privatização como estratégia importante, seguindo medidas neoliberais.

Na primeira geração da reforma o objetivo era desmontar o Estado, reduzi-lo e, para

isso, privatizar, descentralizar e transferir responsabilidades aos governos locais, para

desmantelar o sistema público. Porém, indicou a necessidade de uma segunda geração de

reformas visando reconstruí-lo, reformando o aparato estatal e suas instituições, associando-o

ao desenvolvimento, transformando-o em agente de desenvolvimento, melhorando seu

desempenho via gestão (OSZLAK, 1999).

A Reforma Educativa é parte dessa reforma. O argumento central em relação ao

problema do sistema educativo latino-americano estaria na forma de gestão, os sistemas eram

ineficientes de modo que era preciso descentralizar, transferir funções, custos e avaliar os

resultados (centralizado) para se verificar os ganhos educativos, melhorando a eficiência e a

eficácia do sistema via reformas institucionais.

Sua origem está ligada ao consenso de Washington que estabelece diretrizes aos países

periféricos numa concepção de educação como variável de desenvolvimento. Havia baixa

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cobertura educativa, acreditava-se que haveria mais desenvolvimento por meio de mais

capital humano, via expansão da cobertura educativa, adquirindo competências necessárias e

uma cultura mínima compartilhada por todos.

A vinculação entre desenvolvimento e educação não é neutra, nem desprovida de

interesses de classe e supre objetivos específicos, num contexto determinado.

A realidade latino-americana: Brasil, Chile, México e Venezuela

América Latina e o Caribe tem aproximadamente 616 milhões de habitantes, isto é,

cerca de 8.5% da população mundial (CEPAL, 2013). O Brasil é o país mais populoso e a

tendência de crescimento exige uma ampliação dos serviços sociais.

Quadro 1 - População total ANO/PAÍS BRASIL CHILE MÉXICO VENEZUELA

1990 149.690 13.179 84.002 19.731

2000 174.719 15.398 99.684 24.296

2004 185.053 16.098 103.228 26.104

2008 195.138 16.770 107.677 27.912

2013* 199.985 17.063 119.321 30.390

Fonte: CEPAL (2008); *CEPAL (2013).

O PIB latino-americano somou 5.70 milhões de dólares, em 2012, destes sendo mais

da metade apenas de dois países: 2.24 do Brasil e 1.18 do México.

Quadro 2 - PIB total por milhões de dólares (a preços correntes de mercado) ANO/PAÍS BRASIL CHILE MÉXICO VENEZUELA

1994 559.800,2 55.674,0 520.370,0 108.561,4

1999 617.869,8 72.251,6 597.359,3 112.982,0

2004 716.709,3 87.879,2 676.445,3 120.458,2

2008* 1.653.535,1 179.626,7 1.101.275,3 315.600,2

2012* 2.249.090,9 268.313,7 1.181.633,4 381.286,2

Fonte: CEPAL (2008); *CEPAL (2013).

Quadro 3 - PIB por habitante ANO/PAÍS BRASIL CHILE MÉXICO VENEZUELA

1994 3.508,6 3.930,9 5.765,5 5.031,1

1999 3.588,9 4.750,6 6.075,2 4.738,4

2004 3.873,0 5.459,0 6.552,9 4.614,6

2008* 8.622,8 10.670,7 9.784,5 11.223,3

2012* 11.334,8 15.372,2 10.014,1 12.733,9

Fonte: CEPAL (2008); *CEPAL (2013).

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No México, o baixo crescimento do PIB total se deve ao débil comportamento da

economia dos Estados Unidos, da qual a mexicana é profundamente dependente. Segundo

informação da CEPAL, devido ao tamanho de seu PIB, a economia mexicana seria a segunda,

abaixo apenas do Brasil. Se considerado o ingresso per capita, é a quarta economia latino-

americana, atrás do Chile e acima do Brasil (IE, s/d a). Mas, embora o aumento progressivo

do PIB per capita, em 2012, 28.2% da população da América Latina vivia na pobreza e

11.3% em extrema pobreza (CEPAL, 2013).

Como se pode observar no quadro abaixo, há uma queda progressiva na taxa de

crescimento da população desses países, o que vem sendo caracterizado como uma

oportunidade de bônus demográfico, que repercute no equilíbrio entre a população em idade

produtiva e em idade dependente (crianças e idosos). O bônus demográfico se dá devido à

desaceleração da fecundidade, com certa redução da população em cada país, o que possibilita

condições singulares a serem aproveitadas. No que diz respeito às Políticas Educacionais pode

ser um momento decisivo para os governos adequarem a infraestrutura e garantir a

universalização do acesso e qualidade à educação, pois haverá uma pressão menor na

educação primária e secundária.

Quadro 4 – Taxa de crescimento da população ANO/PAÍS BRASIL* CHILE** MÉXICO* VENEZUELA***

1980-1985 2.1 1.6 2.2 2.2

1990-1995 1.5 1.6 1.8 2.0

2000-2005 1.2 1.2 1.4 1.8

2010-2015**** 0.78 0.84 1.1 1.4

Fonte: *UNESCO/OREALC (2008); **CEPAL (2002); ***CEPAL (2008); ****CEPAL (2013).

No México, por exemplo, entre 1980 e 2000, a população aumentou pouco mais de 20

milhões de habitantes. Há um bônus demográfico, pois a população em idade laboral, 15-49

anos, é 53.7% do total. Agregando os que têm 50-64 anos, os que são laboralmente ativos são

um total de 62.2% de população, pois somente 4.7% da população tem 65 anos ou mais e

33.2% tem menos de 15 anos (IE, s/d a).

As despesas de governo nestes países como porcentagem do PIB, em 2012, foi no

Brasil 40.0, no Chile 23.3, no México 27.3 e na Venezuela 45.4. Deste total, em relação ao

gasto público que é direcionado à educação, temos um grande obstáculo a ser superado por

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esses países em direção à cobertura e a qualidade educacional, pois há muito a avançar quanto

ao financiamento da educação.

Quadro 5 - Gasto público em educação como porcentagem do Produto Nacional Bruto (PNB) ANO/PAÍS BRASIL CHILE MÉXICO VENEZUELA

1994 1,7 3,1 4,7 5,2

1999 4,0 4,0 4,5 -

2004 4,1 3,9 5,5 -

2006* 4,1 3,6 5,6 3,7

2010** 5,8 4,2 5,3 -

Fonte: CEPAL (2008); * UNESCO (2009); **CEPAL (2013).

A média do gasto público em educação na América Latina e Caribe como

porcentagem do PIB, em 2012, foi de 5%. O Brasil, assim como o México, destinaram pouco

mais que isso, mas não alcançaram 6%, enquanto o Chile atingiu apenas 4.2%. Em relação à

Venezuela acrescenta-se que, em 2009, era de 6.9% uma alteração significativa (CEPAL,

2013). Vale mencionar que, subjacente ao investimento em educação há classes sociais

antagônicas que competem, tencionando os recursos para áreas afins aos seus interesses. E

embora o relativo aumento das últimas décadas, o gasto público em educação está longe das

recomendações dos organismos internacionais, cuja meta é 8% do PIB, e de alcançar a

transformação produtiva com equidade que tem como eixo a educação e o conhecimento,

proposta pela CEPAL.

Conforme Oszlak (1999), a implantação das políticas neoliberais impacta na

reestruturação do aparato institucional, o que, por sua vez, repercute na educação dos países

latino-americanos, que reformaram seus sistemas e implementaram a sua maneira as reformas

de modo a cumprir com o consenso de Washington e as metas definidas em Jomtien. Nesse

contexto, se expressa uma deterioração, uma precarização da educação, ao mesmo tempo em

que se busca universalizar a educação básica. O Estado passa a ser o gerenciador da educação

e descentraliza a oferta educacional para as esferas municipais e estaduais.

A Conferência Mundial de Educação para Todos em Jomtien, Tailândia, em 1990,

apresentou relatórios que evidenciaram índices alarmantes de analfabetismo, entre eles no

Brasil e no México e denunciou o descaso com o ensino fundamental (primário). A partir daí,

os países signatários da sua declaração, como os citados acima, se comprometeram em

reformular suas Políticas Educacionais, tendo por eixo central a educação básica (em alguns

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países inclui o fundamental e médio) de qualidade à crianças, jovens e adultos, ou seja, vencer

o analfabetismo e universalizar o ensino fundamental, num momento em que teriam, também,

que reduzir os gastos.

Como se observa no quadro abaixo, a população analfabeta nos países estudados

continua razoavelmente alta. O Brasil ainda tem a maior taxa de analfabetos de 15 anos ou

mais, seguido do México, da Venezuela e do Chile.

Quadro 6 – População analfabeta de 15 anos ou mais de ambos os sexos

Fonte: CEPAL (2008).

O Chile possui a menor taxa nos anos 1990, bem como nos anos seguintes. Isso se deve a

situação política e econômica anterior do país, particularmente nos anos 1960 e 1970 pois, para

Schwartzman (2007), esse período marca uma fase de profundas reformas educacionais chilenas,

com ampliação do ensino fundamental obrigatório, revisão de currículos, reorganização do

sistema escolar com início de um planejamento a longo prazo. Por isso, o Chile chega quase

universaliza a educação no final dos anos 1960, o que o Brasil só atingirá nos anos 2001.

Enquanto a maior parte da América Latina vivia ditaduras, nos anos 1970 o Chile passava

por um amplo processo de mobilização popular, com o governo popular de Allende, que supunha

reformas de cunho socialista no interior do sistema capitalista, nacionalizando a produção

econômica. Na educação, desenvolveu a Escola Nacional Unificada, com influência de

organizações sindicais e políticas. Esse processo foi interrompido pelo golpe de Estado em 1973

com a ditadura de Pinochet, mas o Chile desfruta nas décadas seguintes os resultados do

investimento em educação. Com a ditadura a educação sofre os efeitos das medidas neoliberais e

vai sendo transferida do Estado para a iniciativa privada (SCHWARTZMAN, 2007).

A ditadura de Pinochet acentuou as bases do neoliberalismo no Chile, a educação foi

municipalizada e privatizada, o sistema educacional foi deteriorado e houve estancamento da

matrícula, entre outros aspectos (IE, s/d b). Nos anos 1980 o sistema era basicamente privado e o

Estado subsidiava a demanda de 89% dos alunos. Mais de 50% dos alunos estão em escolas

ANO/PAÍS BRASIL CHILE MÉXICO VENEZUELA

1990 18,0 6,0 12,7 11,1

2000 13,1 4,2 8,8 7,5

2005 11,1 3,5 7,4 6,0

2010 9,6 2,9 6,2 4,8

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municipalizadas, cerca de 30% em escolas particulares subvencionadas, 9% em escolas particulares

totalmente pagos e o restante em instituições educativas que estão em posse de corporações.

As reformas buscavam combinar critérios de descentralização e competência por

recursos via programas de melhoramento da qualidade e equidade da educação, novos

instrumentos de informação e avaliação de programas e instituições e a abertura da escola a

empresas. No Chile, em 1996, a partir do informe da Comisión Nacional de Modernización de

La Educación, a reforma educacional reafirma as iniciativas e programas em marcha desde o

Programa de Mejoramiento de la Calidad y Equidad de la Educación Básica iniciado em

1990 e incorpora outros (IE, s/d b).

Por sua vez, o processo privatizador da educação mexicana também se constituiu na

descentralização e transferência de responsabilidade da administração da educação primária

(IE, s/d a). Tanto no modelo chileno de municipalização, como no mexicano de

estadualização, faltam mecanismos efetivos de participação local.

No Brasil, o Plano Diretor da Reforma do Aparelho do Estado delineou os contornos

da gestão estatal frente à nova racionalidade econômica. A reforma iniciada em 1995 contou,

inclusive, com a criação do Ministério da Administração Federal e Reforma do Estado

(MARE) que, em 1999, foi integrado ao Ministério de Planejamento. A reforma educativa

também remeteu responsabilidades da União para os entes federados, e o alcance da

universalização do ensino fundamental, etapa julgada pelo Banco Mundial suficiente para

preparar a mão-de-obra para o mercado e melhor qualificar o país no Índice de

Desenvolvimento Humano (IE, s/d c). O Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino

Fundamental e de Valorização do Magistério (FUNDEF), instituído em 1996, foi o principal

mecanismo de regulação da municipalização, implementado para redistribuir os recursos

financeiros em todo o país, objetivando a universalização do ensino fundamental.

A Venezuela, assim como o Chile, viveu nos anos 1960 e 1970 um processo de

massificação da escola pública, segundo Casanova (2008), ligado à migração da população do

campo para a cidade e a organização populacional frente às novas demandas postas pela

urbanização, sendo possível incorporar a população em idade escolar à escola. No entanto, teve

um corte desses investimentos em 1980, quando o país adotou pacotes de ajustes estruturais.

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Outro aspecto importante é o nível de estudo dos responsáveis da família, o capital

cultural, que no Chile contribuiu para uma valorização da educação em todas as classes, e

levou as famílias das classes populares a desempenharem um esforço para manter seus filhos

na escola privada o que na Venezuela não aconteceu.

Conforme Núñez (2005 apud MUÑOZ; MORALES; DÍAZ, 2007), dentro do processo de

Reforma do Estado venezuelano, iniciado em 1989, a Reforma Educativa estabelecia a necessidade

de reformular a Política Educacional, adequando os conteúdos curriculares, caracterizando-os como

aberto e flexível. Tratava-se de uma reestruturação educativa acadêmico-pedagógica para adequá-la

as exigências dos setores estratégicos do país, de acordo com as mudanças mundiais. Os objetivos

da Reforma Educacional foram delineados no marco da Comissão Presidencial para a Reforma do

Estado (COPRE, 1992 apud BONILLA-MOLINA, 2004).

Na Venezuela, nos anos 1990, com as políticas neoliberais, a educação apresentava

problemas crônicos, tais como: deficientes índices de cobertura e baixa qualidade, falta de

capacidade física instalada para atender a demanda requerida; deterioração por falta de infra-

estrutura escolar; deficiência de dotação e carência de textos e instrumentos escolares

(VENEZUELA, 2006). Frente a esses fatos é proposto, em 1999, o germe do sistema

educativo bolivariano, ou seja, um sistema de educação à parte do convencional para atender

a população historicamente excluída, e para ajudar no processo de mudanças vivido pelo país.

É possível inferir que houve uma retração das taxas referentes à população analfabeta,

no período em questão e após. Contudo, o analfabetismo diminuiu pouco em termos

proporcionais e considerando o aumento da população. A Venezuela erradica o analfabetismo

em 2005 por meio das Missões Educativas, pois de acordo com a UNESCO, um território é

declarado livre de analfabetismo com a taxa máxima de 4%, pois a erradicação absoluta é

quase impossível, devido ao chamado limite de “analfabetos irredutíveis” (pessoas que

resistem ao processo de alfabetização), no qual a Venezuela chegou a 0,10% o percentual de

analfabetos (VENEZUELA, 2008).

Em relação ao analfabetismo jovem de 15 a 24 anos, conforme a tabela a seguir, o

Brasil apresenta uma situação diferente dos demais países, ao passo que Chile, México e

Venezuela têm índices decrescentes de analfabetismo jovem.

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Quadro 7 - Analfabetismo jovem/dos 15 aos 24 anos

Fonte: OREALC (2007); *CEPAL (2013).

Mas, a população analfabeta total, considerando ambos os sexos, no Brasil é de 8,7, no

Chile 3,3, no México 7,5 e na Venezuela 3,9, bem acima do grupo por idade considerado

acima (CEPAL, 2013).

Entende-se que os parcos alcances obtidos ocorreram por conta de opções e posturas

dos governos e que a tarefa empreendida depende do direcionamento do financiamento à

educação. Porém, os países referenciados nesse estudo mesclam interesses nacionais a

externos e se adaptam aos interesses do capital internacional, com a produção de

consumidores que dominem os códigos da modernidade, de mão-de-obra barata ou mesmo de

intelectuais para atuar no âmbito externo. Além disso, em relação ao gasto público em

educação, este está atrelado à contenção dos gastos sociais, a obrigação de investir parte do

PIB para o pagamento dos juros e serviços da dívida. As Políticas Educacionais, como parte

das Políticas Sociais, são ações efetivas do Estado burguês para manutenção do sistema

capitalista, e objeto de disputa, tensão e articulação dos trabalhadores. A ampliação dos

recursos sociais, e dentre eles os educacionais, é um dos aspectos que integram a luta.

A educação nos países estudados: desigualdade e reforma

A Reforma Educativa na América Latina, a partir de 1990, tomou a pauta das agendas

nacionais. Os países se incumbiram de solucionar ou amenizar os problemas de seus sistemas

educativos, como partícipes de acordos e declarações a nível mundial ou pela contração de

financiamento de organismos internacionais. Os esforços se concentraram em ampliar o

acesso à educação, que era um problema latente.

Quadro 8 – Taxa bruta de escolaridade por nível

8.1 - Primária ANO/PAÍS BRASIL CHILE MÉXICO VENEZUELA

1950 39.3 74 53 51.1

1960 59.7 88.7 70.1 83.5

1975 85.5 90 98.5 84.5

ANO/PAÍS BRASIL CHILE MÉXICO VENEZUELA

2004 3,5 1,0 2,5 3,5

2005 3,9 0,8 2,3 1,4

2012* 1,4 0,6 1.0 1,2

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8.2 - Secundária

8.3 Superior ANO/PAÍS BRASIL CHILE MÉXICO VENEZUELA

1950 0.9 1.6 1.6 1.3

1960 1.5 4 2.6 4.3

1975 9.4 16.2 9.6 19.8

Fonte: NASSIF et. al. (apud CASANOVA, 2008).

Com o esforço em possibilitar o acesso, principalmente no ensino fundamental, houve

uma ampliação da matrícula, como pode ser observado abaixo.

Quadro 9 – Taxa neta de matrícula por nível

9.1 – Matrícula no primeiro nível de ensino ANO/PAÍS BRASIL CHILE MÉXICO VENEZUELA

1994 89,7 86,2 100,0 81,9

1999 91,3 99,1 97,4 85,6

2004 94,7 90,0 97,9 91,7

2008 99,2 89,7 100,0 91,3

2011* - 93,1 95,6 92,4

9.2 – Matrícula no segundo nível de ensino ANO/PAÍS BRASIL CHILE MÉXICO VENEZUELA

1994 19,5 53,7 48,8 19,2

1999 65,7 - 55,4 47,5

2004 77,7 - 66,6 61,2

2008 - - - -

2011* - 84,7 67,3 72,6

9.3 – Matrícula no terceiro nível de ensino ANO/PAÍS BRASIL CHILE MÉXICO VENEZUELA

1994 11,3 27,4 14,3 28,5

1999 14,5 37,7 18,2 -

2004 23,8 43,0 24,3 41,2

2008 - - - -

2011* - 70,5** 27,7** -

Fonte: CEPAL (2008); *CEPAL (2013); **Taxa bruta de matrícula.

ANO/PAÍS BRASIL CHILE MÉXICO VENEZUELA

1950 5.7 10.7 2.7 3

1960 9.5 21.5 10 17.7

1975 19.6 47.2 30.2 31.9

13

Conforme cálculos do Instituto de Estatística da UNESCO, em 2011, a média latino-

americana e caribenha foi 93,8 para o primeiro nível de ensino, 76,1 para o segundo e 42,3

para o terceiro (CEPAL, 2013).

As taxas netas de matrícula do México apresentam uma cobertura universal na

escolaridade primária em relação aos demais países, o que o leva a políticas focadas no ensino

médio. O Chile centra seu esforço em aumentar o tempo dos estudantes no processo

educativo, inclusive propondo a obrigatoriedade da educação infantil, assim, um aspecto da

reforma educacional anos últimos anos nesse país é a extensão da jornada escolar, a Jornada

Escolar Completa (JEC) com 38 horas aula na educação primária e 42 na secundária. Em

2002 63% dos estabelecimentos e 33% dos alunos estava neste sistema (IE, s/d b).

A Venezuela, desde 1999, segue num contexto de transformações que rompem com o

neoliberalismo, incentivada pela participação popular. Com relação à educação infantil, no

sistema de ensino convencional, em 1998, apenas 44.7% das crianças em idade escolar se

encontravam matriculadas. Com o desenvolvimento do Proyecto Simoncito, esse percentual

foi ampliado no ano escolar de 2005-2006 para 60.6%. Na educação primária a taxa de

escolaridade, em 1991, era de 95.1%, mas com a cobrança da matrícula nas escolas públicas

essa taxa baixou para 89.7%. Devido a uma das primeiras medidas tomadas pelo governo

bolivariano, em 1999, proibindo a cobrança, entre outros aspectos, a taxa de escolaridade na

Escuela Bolivariana, em 2005-2006, foi de 99.5%. Em relação à educação secundária a taxa

de acesso, em 1998, era 27.3% e por conta dos Liceos Bolivarianos e das Escolas Técnicas

Robisonianas, em 2006, alcançou 50%. E no ensino superior o país deu um salto, no ano

letivo 1998-1999 a cobertura educativa era de 21,8 e para 2009-2010 a taxa bruta de matrícula

foi de 83% (VENEZUELA, 2008; AVN, 2010).

Isso sinaliza a relevância política da educação nos governos Chávez, articulada ao

projeto social e econômico de desenvolvimento endógeno, para contribuir com o processo da

revolução bolivariana.

Os dados expressos nos últimos quadros demonstram uma expansão no interior do

primeiro nível, também presente no segundo e terceiro nível, porém em percentuais bem

inferiores, estão longe de alcançar a universalização do acesso, pois a cobertura insuficiente

na secundária e superior indica que há muitas pessoas em idade escolar que estão fora do

14

sistema. Evidencia-se um afunilamento na cobertura do sistema educativo, que é maior no

nível inicial e diminui até chegar ao terceiro nível. Essa questão poderia se vincular a evasão

ou a repetência, mas o que o se destaca em relação ao ensino superior, por exemplo, supõe

que se considere quem está ingressando no terceiro nível.

A pressão da classe média é um aspecto a ser considerado para o aumento das taxas de

matrícula. Conforme Saes (2005), ao analisar a situação brasileira, ela pressiona o Estado porque

quer uma escola de qualidade como possibilidade de ascensão social e porque assim conserva seu

capital educativo e se reproduz enquanto classe, para que seus filhos não sejam trabalhadores

manuais. E não porque quer a universalização da educação para a sociedade como um todo.

A classe média protege o monopólio escolar. Até o início do século XX, há uma

expansão fácil da cobertura escolar, ligada a expansão da classe média e, posteriormente, uma

discriminação educativa. Se antes impulsionou a expansão, a partir de 1980 faz um

movimento distinto. A discussão da qualidade escamoteia a questão da classe média

conservadora, de que a educação não é para todos, pois se abrir para todos deixa em suspense

a questão da qualidade, expressa no afunilamento ligada à evolução da classe média.

A elitização do ensino, de acesso restrito às camadas populares, tem como pano de

fundo a questão de desenvolvimento e do avanço tecnológico do país, de formar as camadas

que darão direção a esse processo e de manter a maioria da massa em condições que sejam de

uma cultura mínima comum.

A escola dual, na sociedade atual, é expressão da desigualdade educativa, e reproduz a

desigualdade de classe. A fragmentação do sistema educativo leva a refletir sobre a qualidade

de educação e sua realização conforme a classe social. Há, ainda, uma desigualdade na

acumulação do capital educativo, devido às formas de oferta da educação dentro de um

território e a distribuição dos recursos que prioriza determinadas regiões em detrimento a

outras (metrópoles x periferia, zonas rurais e de fronteira).

Mas, se a ampliação do acesso nos anos iniciais é resultado da pressão da classe média, por

outro lado, também provocará sua saída da escola pública, deslocando-se para a iniciativa privada

em razão da precarização do ensino, a falta de condições necessárias, de financiamento e

secundarização dos conteúdos. Esse fenômeno é semelhante nos demais países estudados.

15

As Reformas Educativas contribuem para que os indivíduos apenas se adaptem a essa

sociedade e as transformações no mundo do trabalho. Para Duarte (2009), as pedagogia do

aprender a aprender, e das competências, visam à adaptação do indivíduo ao seu meio social,

e não a apropriação do conhecimento científico e a sua utilização para a transformação social.

Há o esvaziamento dos conteúdos na escola, uma redução às necessidades do cotidiano, o que

gera o empobrecimento do conteúdo.

Porém, a universalização não pode ser negada, ela se realizou nas condições possíveis,

e a partir dela, do contingente da classe trabalhadora na escola, novas lutas devem ser

travadas, como em relação à qualidade associada à quantidade, ou seja, sem atribuir a

responsabilidade pela deterioração e debilidade da educação a massificação, supondo a escola

elitizada de qualidade. Há muitos limites que devem ser superados, entre eles, também está à

porcentagem de repetentes e de abandono escolar.

Quadro 10 – Taxa de repetência no ensino fundamental ANO/PAÍS BRASIL CHILE MÉXICO VENEZUELA

1990/1991 33.2 7.8 9.4 -

1997/1998 21.3 - 7.0 10.3

2001 21.5 2.8 5.7 7.7

2004 20.5 2.5 4.9 7.5

Fonte: UNESCO (2005; 2008).

O Brasil apresenta a taxa mais alta de repetência no ensino fundamental, bem acima

dos outros países estudados. Há uma fragilidade no sistema, pois ao lado da universalização, a

repetência se mantém e repercute na taxa de abandono escolar, que também é alta. Análises

evidenciam que o fracasso escolar, expresso na forma de evasão e repetência, tem a pior

situação nos anos iniciais (1º e 2º) entre alunos oriundos da classe trabalhadora (KLEIN,

2002) e, posteriormente (5º e 6º), que seriam os pontos críticos. Algo semelhante acontece no

Chile, que diminuiu a repetência, mas que o problema persiste entre os anos iniciais e finais

no ensino fundamental.

Quadro 11 – Taxa de abandono escolar (jovens de 15 a 19 anos) ANO/PAÍS BRASIL CHILE MÉXICO VENEZUELA

1990 45,9 26,8 37,9 39,6

2000 - 17 45 -

2002 25 - 41 31

2007 21,2 12,2 - 19,7

Fonte: CEPAL (2002).

16

O Brasil tinha as piores taxas em 1990, e apesar do esforço seguem altas. A maior

incidência era verificada em regiões pobres e em situações nas quais o abandono da escola

está vinculado à ajuda aos pais a prover a renda. Programas como de Erradicação do Trabalho

Infantil, destinado às crianças vítimas da exploração do trabalho, e o Bolsa Família, de

transferência de renda as que estão em situação de vulnerabilidade social ou extrema pobreza

conforme o número de filhos matriculados nas escolas e condicionado a frequência,

contribuíram para amenizar a evasão.

Saes (2005) esclarece que os filhos dos trabalhadores manuais são desde cedo

suscetíveis de serem inseridos no mundo do trabalho como uma forma de reprodução material

da unidade familiar, por isso há uma desvalorização da escola por essa classe, uma vez que

ela desvia a criança do tempo destinado ao trabalho e, portanto, empobrece a família. Com

isso, a evasão, como consequência do fracasso escolar das crianças pobres, não é encarado

como algo revoltante entre pais e alunos.

O abandono está atrelado à desigualdade educativa e ao fator familiar que, conforme

Gajardo (2000), contribui para manter as crianças na escola. Portanto, essa última variável

analisada, embora sua redução significativa, ainda requer o esforço educativo dos países.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A educação latino-americana é expressão da realidade nestas latitudes, que precisa ser

apreendida em seus elementos pormenores. A desigualdade educativa no Brasil, Chile,

México e Venezuela reflete as condições próprias que se desenvolveram em cada uma das

formações sociais mencionadas, com suas particularidades e aproximações, como em relação

à influência da reforma educativa da década de 1990. Argumentava-se que o problema

educativo na América Latina era a gestão, os sistemas eram ineficientes, sendo preciso

descentralizar e transferir responsabilidades, incrementar o acesso, num contexto de restrições

e cortes sociais.

Gajardo (2000) conclui, em seu balanço das Reformas Educativas dos anos 1990 nos

países da América Latina, que houveram alguns avanços, mas poucos resultados. Isso porque

sua situação em relação aos países centrais os leva a efetivar as reformas de acordo com

interesses que lhe são externos. Além da imposição dos organismos multilaterais há a

17

conivência da burguesia local a internacional, o desenvolvimento a serviço dos interesses do

capital internacional e de superação de suas crises.

O Chile foi o primeiro a incorporar a reforma, já na ditadura de Pinochet, com uma estrutura

polarizada. O México conserva forte presença do Estado na educação. O Brasil de certa forma tem

retomado à função do Estado, mas expressa grande desigualdade educativa. A Venezuela, por outro

lado, tem efetivado um conceito que rompe com a reforma do Estado, com o projeto revolucionário

bolivariano na sociedade e na educação. Mas, poucos países latino-americanos tem perseguido

estabelecer negociações mais soberanas ou romper com o instituído, a desigualdade social e

combinada perpetua a exploração. Portanto, há uma tarefa para a América Latina que está em

definir uma via de desenvolvimento e seus desdobramentos, entendendo a educação dos povos

latino-americanos como elemento integrante do social.

Por conseguinte, cabe frisar que a educação deve ser entendida enquanto todo, e em relação

a outras totalidades, assim, a universalização do acesso, sozinha, não efetivará as proposições

almejadas em relação ao desenvolvimento. Os dados expressam realidades peculiares e

aproximações nos quatro países e os impactos das reformas na América Latina, limites da escola e

problemas que persistem, como é o caso do analfabetismo, da qualidade, do financiamento.

Considerando a situação da região em relação aos países centrais, é possível compreender a

inviabilidade de uma cooperação entre eles, nossa condição de desenvolvimento, dependente,

determina (com níveis de mediação e contradição) a educação, e não o contrário.

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