processo de melhoria contínua em uma indústria do setor de vestuário

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PROCESSO DE MELHORIA CONTÍNUA EM UMA INDÚSTRIA DO SETOR DE VESTUÁRIO Francisco Rodrigues Lima Junior (EESC-USP) [email protected] Mariana Braga Lopes (UEM) [email protected] Julia Monteiro Soares (UEM) [email protected] Edwin Cardoza (UEM) [email protected] Rodrigo Lanzoni Fracarolli (UEM) [email protected] Mediante as transformações econômicas que acarretaram na necessidade das empresas de buscar alta competitividade no mercado em prol de sua sobrevivência, algumas organizações passaram a focar na melhoria contínua de seus processos como meioo de prover a gestão da qualidade na organização e alcançar maiores parcelas de mercado. Neste sentido, o principal objetivo do trabalho é apresentar uma pesquisa-ação realizada em uma empresa de médio porte do setor de confecção, na qual foi diagnosticada a necessidade de implantar práticas de gestão da qualidade e fortalecer o esforço pela melhoria contínua dos processos produtivos. As ações de melhoria foram planejadas, implantadas e avaliadas por colaboradores da empresa e pela equipe de um projeto de extensão universitária, sendo que as ações de melhoria incluem a realização de treinamentos, a elaboração de catálogo de não-conformidades, implantação de mecanismos de controle da qualidade, avaliação de desempenho, dentre outras. Ao final da pesquisa, constatou-se que as práticas de qualidade implantadas reduziram a quantidade de não conformidades produzidas e contribuíram para o aumento da eficiência do setor de Revisão Final da empresa. Além disso, acredita-se que a estrutura de cooperação desenvolvida entre os atores da governança do aglomerado industrial regional para intervenção na empresa tenha contribuído positivamente para realização deste trabalho. Palavras-chaves: Melhoria Contínua, Gestão da Qualidade, Indústria de Confecção XXXI ENCONTRO NACIONAL DE ENGENHARIA DE PRODUCAO Inovação Tecnológica e Propriedade Intelectual: Desafios da Engenharia de Produção na Consolidação do Brasil no Cenário Econômico Mundial Belo Horizonte, MG, Brasil, 04 a 07 de outubro de 2011.

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PROCESSO DE MELHORIA CONTÍNUA

EM UMA INDÚSTRIA DO SETOR DE

VESTUÁRIO

Francisco Rodrigues Lima Junior (EESC-USP)

[email protected]

Mariana Braga Lopes (UEM)

[email protected]

Julia Monteiro Soares (UEM)

[email protected]

Edwin Cardoza (UEM)

[email protected]

Rodrigo Lanzoni Fracarolli (UEM)

[email protected]

Mediante as transformações econômicas que acarretaram na

necessidade das empresas de buscar alta competitividade no mercado

em prol de sua sobrevivência, algumas organizações passaram a focar

na melhoria contínua de seus processos como meioo de prover a gestão

da qualidade na organização e alcançar maiores parcelas de mercado.

Neste sentido, o principal objetivo do trabalho é apresentar uma

pesquisa-ação realizada em uma empresa de médio porte do setor de

confecção, na qual foi diagnosticada a necessidade de implantar

práticas de gestão da qualidade e fortalecer o esforço pela melhoria

contínua dos processos produtivos. As ações de melhoria foram

planejadas, implantadas e avaliadas por colaboradores da empresa e

pela equipe de um projeto de extensão universitária, sendo que as

ações de melhoria incluem a realização de treinamentos, a elaboração

de catálogo de não-conformidades, implantação de mecanismos de

controle da qualidade, avaliação de desempenho, dentre outras. Ao

final da pesquisa, constatou-se que as práticas de qualidade

implantadas reduziram a quantidade de não conformidades produzidas

e contribuíram para o aumento da eficiência do setor de Revisão Final

da empresa. Além disso, acredita-se que a estrutura de cooperação

desenvolvida entre os atores da governança do aglomerado industrial

regional para intervenção na empresa tenha contribuído positivamente

para realização deste trabalho.

Palavras-chaves: Melhoria Contínua, Gestão da Qualidade, Indústria

de Confecção

XXXI ENCONTRO NACIONAL DE ENGENHARIA DE PRODUCAO Inovação Tecnológica e Propriedade Intelectual: Desafios da Engenharia de Produção na Consolidação do Brasil no

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1. Introdução

Em meio à rápida evolução da globalização dos mercados, mudanças dinâmicas estão sendo

incrementadas no nível de estratégico das organizações, as quais estão direcionando esforços

rumo à otimização de suas práticas de gestão (JUNG; WANG, 2006). Nem todas as

organizações podem escolher e implementar o mesmo conjunto de práticas de gestão, mesmo

que estas estejam sedimentadas e venham garantido sucesso em outros ambientes. A

capacidade de identificar o que está mudando no ambiente e responder de forma proativa por

meio de esforços de melhoria contínua tem sido vista como um elemento-chave necessário à

sobrevivência e sucesso das empresas (BROWN; EISENHARDT, 2000; HAMEL, 2000).

Na região noroeste do Paraná está localizado o segundo maior Arranjo Produtivo Local (APL)

do setor do vestuário do Brasil, o qual é composto por mais de 1.200 empresas, sendo 98,4%

destas pequenas ou médias empresas, gerando cerca de 20 mil empregos diretos e 80 mil

indiretos (TRINTIN, 2007). Segundo Barreto (1997), na indústria de confecção brasileira o

que se encontra é o improviso, visto que pessoas sem nenhum conhecimento técnico e

também de supervisão costumam comandar e coordenar as Pequenas e Médias Empresas

(PMEs), sendo que nem sempre conseguem se adequar às normas exigidas e implantar

métodos efetivos de gestão. Diante de tal panorama, membros de um grupo de pesquisa em

engenharia da qualidade desenvolveram um projeto de extensão universitária com a finalidade

de promover a melhoria contínua e contribuir para o aumento da competitividade das PMEs

do APL do vestuário da região de Maringá e Cianorte-PR. Durante 24 meses, o projeto atuou

em 30 empresas nas áreas de gestão da qualidade, produção e ergonomia. Todavia, este

trabalho contempla o caso de intervenção somente em uma das empresas atendidas pela

equipe do projeto.

Neste contexto, este trabalho tem a finalidade de apresentar o processo de implantação de

práticas de melhoria de contínua em uma empresa de médio porte do setor do vestuário, o

qual provém da identificação de necessidades da empresa, a qual foi realizada por meio de um

diagnóstico prévio aplicado pela equipe do projeto. São destacadas as ações realizadas para

promover a melhoria da qualidade na empresa: treinamentos, planejamento e implantação de

práticas de qualidade e avaliação de desempenho.

Quanto à estrutura do trabalho, a Seção 2 apresenta a metodologia para condução das

atividades de pesquisa, a Seção 3 traz uma revisão da literatura sobre gestão da qualidade e

sobre melhoria contínua. Já a Seção 4 contempla a planejamento de atividades para

desenvolvimento da pesquisa-ação realizada, apresentando o mecanismo de atuação do

projeto, informações sobre empresa e diagnóstico realizado, enquanto a Seção 5 descreve o

desdobramento do processe de melhoria contínua e os resultados alcançados. Por fim, a Seção

6 apresenta as considerações finais sobre este trabalho e sugestões de trabalhos futuros.

2. Metodologia

O método utilizado para desenvolvimento deste trabalho foi composto por pesquisa

bibliográfica e pesquisa-ação. A pesquisa bibliográfica abordou tópicos relacionados à gestão

da qualidade e melhoria contínua, tendo o intuito de apoiar as macro atividades componentes

da pesquisa-ação, as quais foram realizadas na empresa.

De acordo com Thiollent (1997), a pesquisa-ação é um tipo de pesquisa com base empírica

que é concebida e realizada em estreita associação com uma ação ou com a resolução de um

problema coletivo, na qual os pesquisadores e participantes representativos da situação ou do

problema estão envolvidos de modo cooperativo ou participativo. As macro atividades

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componentes da pesquisa-ação são listadas no Quadro 01 e o desdobramento das mesmas é

descrito detalhadamente nas Seções 4 e 5.

Atividades Jun Jul Ago Set Out Nov

1. Diagnóstico de necessidades

2. Desenvolvimento do Plano de Ação

3. Implantação das Ações

4. Avaliação dos Resultados

Quadro 1 – Cronograma para condução da Pesquisa-ação

Conforme mostrado no Quadro 1, a primeira macro atividade consistiu na aplicação de um

diagnóstico de necessidades e oportunidades de melhoria na empresa, o qual foi realizado por

meio de entrevistas semi-estruturadas e observação in loco. A partir do diagnóstico, um Plano

de Ação foi desenvolvido e continuamente incrementadovalidado junto com colaboradores da

empresa. Posteriormente, as ações de melhoria do plano foram implantadas e sua efetividade

foi avaliada por meio de indicadores de desempenho.

3. Revisão da literatura

3.1 Gestão da Qualidade

A literatura sobre gestão da qualidade é composta principalmente por estudos de caso,

evidências anedóticas e medidas prescritivas atribuídas por especialistas reconhecidos no

campos da qualidade, sendo que seus alicerces nos trabalhos dos chamados gurus da

qualidade (Deming, Juran, Taguchi e Crosby). A gestão da qualidade está no auge de uma

progressiva transformação, já que esta que evoluiu por meio de diferentes abordagens, tais

como “Qualidade por Inspeção”, “Controle Estatístico da Qualidade”, “Garantia da

Qualidade” e “Gerenciamento da Qualidade Total” (TQM). Estas transformações apontam

para uma mudança fundamental que vai além da qualidade dos produtos ou serviços e se

concentra na melhoria da qualidade como uma filosofia implantada por meio de conjunto de

práticas cotidianas (PRYBUTOK; RAMASESH, 2006). Não existe um conceito universal

capaz de definir qualidade. Para Juran qualidade significa adequação ao uso, enquanto para

Deming significa atender e, se possível, exceder as expectativas do consumidor. Para Crosby,

qualidade significa atender às especificações (COSTA; EPPRECHT; CARPINETTI, 2004).

Os principais assuntos relacionados a este tema e constantemente abordados pela literatura

são benchmarking (ZAIRI, 1992), feedback dos clientes (DESTATNIK, 1992), gerenciamento

just-in-time (JIT) (SCHONBERGER, 1982), liderança (CROSBY, 1979; DEMING, 1982),

planejamento (JURAN, 1962), gerenciamento por processos (JURAN, 1962; DEMING,

1982), controle de processos (ISHIKAWA, 1985; JURAN, 1962), sistemas e políticas de

qualidade (CROSBY, 1979; FEIGENBAUM, 1961; JURAN, 1962), gerenciamento de

fornecedores (CROSBY, 1979; DEMING, 1982), trabalho em equipe (ISHIKAWA, 1985;

JOINER, 1986), treinamentos (DEMING, 1982; FEIGENBAUM, 1961), e filosofia “zero

defeito” (CROSBY, 1979).

Enquanto estratégia competitiva, a gestão da qualidade parte do princípio de que a conquista e

manutenção dos mercados dependem diretamente de foco no cliente, devendo-se conhecer as

expectativas dos mesmos, além de oferecer valor ao mercado. Ou seja, uma organização deve

ser capaz de conhecer os requisitos dos clientes e desta forma incluí-los no processo de

gestão, possibilitando o melhoramento de processos, modificações nos produtos e outras

mudanças nas operações da empresa em prol da conformidade com as necessidades de

mercado identificadas (AHIRE et al., 1996; CARPINETTI, 2010).

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O estudo de Tarí, Molina e Cartejón (2007) mostrou que algumas relações diretas e indiretas

entre o elementos componentes do processo de gerenciamento da qualidade podem ser

generalizadas. Dentre as principais constatações da pesquisa realizada por estes autores, na

qual se utilizou de vários outros estudos, notou-se que os líderes desempenham um papel

fundamental como condutores de programas de gestão da qualidade, ajudando na definição de

metas, no investimento nas pessoas, na criação de um contexto de aprendizagem e no

desenvolvimento de relações cooperativas com os clientes. Além disso, destacou-se o papel

do gerenciamento das informações com o propóstio de apoiar a gestão da qualidade, o qual,

por meio da análise de dados relacionados ao desempenho do negócio e de aspectos

financeiros, é capaz de identificar as prioridades de melhoria na organização.

Outros agentes importantes no processo de gerenciamento da qualidade são os colaboradores,

fornecedores e usuários dentro do ambiente organizacional, os quais devem agir de forma

integrada, estimulando o envolvimento e o comprometimento de todos com o

desenvolvimento de atividades contínuas para melhoria dos processos e produtos. Além disso,

é necessária uma visão sistêmica de todos os processos de negócio da empresa, podendo

subdividir tais processos em subprocessos, atividades e tarefas. Nesse cenário, identificam-se

os princípios para a gestão da qualidade, sendo que o relacionamento entre tais princípios é

mostrado na Figura 1 (CARPINETTI, 2010; CARVALHO; PALADINI, 2006).

Figura 1 – Relacionamento entre princípios de Gestão da Qualidade. Fonte: CARPINETTI (2010, pg. 33).

Por meio da Figura 1, pode-se notar que os principais pilares da gestão da qualidade estão

relacionados à gestão de pessoas: liderança e comprometimento/ envolvimento. O

envolvimento das pessoas no esforço pela qualidade historicamente gera efeitos consistentes,

amplos, criativos e costumam gerar notáveis efeitos multiplicadores. Embora o investimento

seja elevado, o retorno é muito significativo, salvo que os recursos humanos são os que mais

exigem investimentos, mais esforço e mais tempo para gerar resultados (CARVALHO;

PALADINI, 2006). Todo o patrimônio intelectual de uma empresa está em seus

colaboradores e o constante processo de aprendizado dinâmico a que o mesmo está

submetido. Além da necessidade de treinamentos e capacitação, é necessária experiência

acumulada durante os anos de permanência em uma empresa. Neste sentido, o índice de

rotatividade de pessoas pode ser considerado como um indicador chave sobre as políticas e

práticas de recursos humanos. As pessoas fazem a cultura da empresa e esse é um processo de

anos. Uma empresa com alta rotatividade não poderá ter uma cultura definida e muito menos

estável (FAIMA, 2007).

Quando os colaboradores conhecem os conceitos e ferramentas da qualidade, esses podem

entender as preocupações da qualidade, o que direciona para melhorias subseqüentes. Ou seja,

técnicas e ferramentas como diagramas de causa e efeito, diagrama de Paretto, dentre outros,

podem ajudar os colaboradores a monitorar as variações da qualidade e identificar pontos de

melhoria (PRYBUTOK; RAMASESH, 2006). Tais ferramentas podem ser usadas

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sistematicamente para melhorar os processos, já que o gerenciamento efetivo dos processos

tem efeito direto no desempenho da qualidade por meio da redução de variabilidade

(DEMING, 1982). No entanto, a otimização de partes do processo produtivo não implica a

otimização do todo, mas não deixa de ser uma forma de evoluir para o conceito correto da

qualidade. De fato, estratégias bem sucedidas em um contexto podem falhar em outro

ambiente. Métodos que geraram resultados atraentes em um momento podem se tornar

inadequados rapidamente (CARVALHO; PALADINI, 2006)

Com a finalidade de garantir a efetividade das práticas de gestão da qualidade no contexto

organizacional, é necessário o estabelecimento de uma cultura de qualidade interna, sendo

esta basicamente constituída pelas regras estabelecidas dentro de uma empresa e as atitudes de

seus membros durante a rotina de trabalho. A ausência de uma cultura de qualidade pode

fazer fracassar qualquer plano estratégico que venha a ser definido. Por outro lado, o

desenvolvimento de uma cultura de qualidade se configura como estratégia efetiva sobre a

concorrência, já que este é um processo que leva anos e, portanto, não pode ser replicado

rapidamente por uma empresa concorrente (FAIMA, 2007).

3.2 Melhoria contínua

Um dos assuntos mais discutidos na literatura de gestão da qualidade é a melhoria contínua, o

que pode ser justificado pelo fato de que se as políticas e sistemas de uma empresa se

tornassem estáticos ao longo do tempo, estes deixariam de refletir efetivamente sobre as

necessidades competitivas da organização em questão. Por definição, a melhoria contínua se

apresenta como um esforço contínuo e sistemático para melhorar as operações do dia-a-dia

com o objetivo de manter a organização competitiva e sustentar a rentabilidade

(SOMASUNDARAM; BADIRU, 1992). O processo de melhoria contínua requer um esforço

de análise da situação atual, visando o planejamento e a implementação de ações de melhoria,

sendo de fundamental importância uma abordagem científica que promova a tomada de

decisão baseada em dados e fatos (AMARATUNGA; BALDRY; SARSHAR, 2001).

O conjunto de vantagens decorrentes do desenvolvimento e implementação de melhorias no

processo produtivo parte da minimização dos efeitos negativos das ações de controle, ou seja,

não se deve ater ao controle ou à fiscalização do que está ocorrendo, mas sim desenvolver

algum tipo de inovação, por menor que esta seja. A avaliação da efetividade das ações de

melhoria é crucial, mas o controle constante de tudo que é produzido (inspeção em massa)

deve ser evitado (CARVALHO; PALADINI, 2006). Uma rotina de inspeção 100% para

aprimorar a qualidade equivale a planejar defeitos, reconhecendo que o processo não está

capacitado a satisfazer às especificações (DEMING, 1982).

Segundo Foreman (1990), o processo de melhoria contínua é baseado em cinco princípios

fundamentais: (1) O cliente deve estar satisfeito; (2) Tudo pode ser melhorado; (3) Cada

problema identificado no processo é uma oportunidade para melhorar; (4) Um esforço

contínuo é necessário para que todos possam ajudar a alcançar as principais metas do negócio,

sendo estas relacionadas à melhoria da qualidade, custo e entrega; e (5) Uma abordagem

sistemática para avaliação dos processos produz melhores resultados do que uma abordagem

assistemática.

O feedback de informações é essencial para a melhoria contínua. Em um ambiente fabril, isto

significa que deve ser instituído o acesso às informações de controle de qualidade por partes

dos colaboradores do chão de fábrica, e não somente pelos inspetores da qualidade, já que não

possuem responsabilidade direta sobre a fabricação de produtos. Logo, é importante fornecer

aos colaboradores do chão de fábrica informações em tempo real para corrigir ou prevenir as

não conformidades (BROCKA; BROCKA, 1996).

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Tão importante quanto desenvolver planos de melhoria e objetivos a serem alcançados em

curto e médio prazo é poder medir o avanço para estes objetivos de maneira precisa (FAIMA,

2007). Presley, Whitman e Liles (1997) acrescentam que durante o processo de implantação

de ações de melhoria é necessário estabelecer um sistema de resposta e controle, o qual deve

ter a capacidade de mostrar se os objetivos estabelecidos estão sendo plenamente alcançados.

Deve-se destacar a importância de conhecer quais são os indicadores de desempenho

mencionados, qual é a razão de sua importância e de que forma os mesmos estão evoluindo

(FAIMA, 2007). Carvalho e Paladini (2006) afirmam que há a necessidade de definir os

indicadores de desempenho em bases quantitativas, já que os mesmos estimulam as pessoas a

pensar e agir de forma objetiva, salvo que elementos subjetivos não são suficientes pra definir

um conjunto de indicadores e mensurar o progresso de ações de melhoria.

Não existe consenso em relação a um framework normativo que se constitua como base para a

melhoria contínua da qualidade, fazendo com que exista uma ausência de modelos práticos

que sejam úteis para o monitoramento desses programas nas organizações (PRYBUTOK;

RAMASESH, 2006).

4. Planejamento das atividades de Pesquisa

Esta seção apresenta as atividades executadas que tornaram possível a realização da pesquisa-

ação, contextualizando quanto ao mecanismo de atuação para condução deste trabalho,

apresentando informações da empresa, as oportunidades de melhoria identificadas durante o

diagnóstico realizado, descrevendo também cada uma das atividades propostas e implantadas

na empresa.

4.1 Apresentação do projeto e da Empresa

O PROJVEST é um projeto de extensão universitária que teve a finalidade de promover a

melhoria contínua nas áreas de gestão da qualidade, produção e ergonomia em 30 empresas

do setor de vestuário no Arranjo Produtivo Local de Maringá e Cianorte-PR durante 24

meses. A sistemática de atuação do projeto é apresentada na Figura 2.

Figura 2 – Sistemática de atuação do PROJVEST

Conforme ilustrado na Figura 2, inicialmente foi desenvolvida uma estrutura de cooperação

entre o PROJVEST (Universidade), empresas e órgãos da governança do APL, tais como o

Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (SEBRAE) e Sindicatos do

Vestuário de Maringá e Cianorte. Posteriormente, a equipe do PROJVEST, composta por

pesquisadores (professores, graduandos e engenheiros de produção), recebeu capacitação em

temas relacionados às atividades a serem desenvolvidas nas empresas e foi iniciado um

trabalho de intervenção nas empresas participantes do projeto.

A intervenção nas empresas foi iniciada por meio de um diagnóstico de necessidades e

oportunidades de melhoria e, em seguida, foram implantadas ações de melhoria em cada uma

das organizações segundo as necessidades constatadas, avaliando ainda os resultados das

ações implantadas. Para facilitar a intervenção em um grande número de empresas, foi criada

uma estrutura de Módulos de Intervenção, tais como Melhoria Contínua, Ferramentas da

Qualidade, Programa 5’S, Planejamento e Controle da Produção, Métodos de determinação de

Layout físico, entre outros, sendo que cada um destes é formado por uma sequência de

atividades que fomentam a melhoria contínua nas empresas por meio da capacitação de

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recursos humanos, aplicação de ferramentas de gestão, dentre outros.

Conforme citado anteriormente, este trabalho se limita a descrever as atividades realizadas

somente em uma empresa,. Tal empresa foi fundada em 1993, é de médio porte, possui cerca

de 250 e vem se posicionando como uma das mais conceituadas empresas do mercado

promocional brasileiro. Seu objetivo inicial foi a fabricação de camisetas promocionais

confeccionadas em malha 100% algodão, com o intuito de evidenciar e promover marcas,

produtos e serviços oferecidos por “empresas-clientes”. Entretanto, no decorrer dos anos, a

empresa diversificou sua linha de produtos com o objetivo de obter maior competitividade no

mercado promocional e hoje comercializa camisetas promocionais, peças para grandes

magazines e uniformes profissionais. Os setores produtivos estão divididos em Corte,

Estamparia e Costura, sendo que as atividades de bordado e algumas atividades de costura são

executadas por empresas terceiras.

4.2 Diagnóstico de necessidades

O diagnóstico de necessidades da empresa e oportunidades de melhoria foi realizado por meio

da observação in loco e utilização de um roteiro de entrevistas semi-estruturado que abordou

questões relacionadas à gestão da qualidade, produção e ergonomia na empresa. Foram

entrevistados o diretor do setor de Recursos Humanos e a diretora do setor de Qualidade, além

de conversas informais com colaboradores de alguns setores produtivos.

De acordo com as informações obtidas, a empresa carecia urgentemente de práticas efetivas

de gestão da qualidade. Desde sua fundação, muitos esforços estiveram direcionados para o

aumento da produtividade por meio da diminuição dos tempos de produção, além de

fidelização dos clientes por meio do cumprimento dos prazos de entrega. Tal estratégia se

justificava na segmentação de mercado atendida pela empresa, a qual, segundo a empresa,

interessava-se principalmente pelo baixo custo dos produtos e menores prazos de entrega

oferecidos que pela conformidade dos produtos. Desta forma, durante muitos anos a empresa

entregava às “empresas-clientes” quantidades significativas de peças não conformes.

No entanto, no decorrer dos anos as principais “empresas-clientes” passaram a exigir produtos

com qualidade e, neste novo cenário, a empresa passou a enfrentar problemas como

cancelamento de pedidos, perda de “empresas-clientes”, devolução de lotes, entre outros

agravantes.

Em 2008, a empresa decidiu criar um setor de Qualidade e 2 colaboradores foram contratados

para compor o setor, sendo que estes deveriam desenvolver um trabalho direto com as 16

colaboradoras que atuavam como revisoras ao final de cada uma das células do setor de

Costura, as quais compunham um setor designado Revisão. Todavia, as atividades dos demais

colaboradores do setor de Qualidade não foram bem definidas e os mecanismos adotados

inicialmente para controle de não conformidades não se mostravam suficientemente efetivos.

As ocorrências de não conformidades diminuíram, mas as perdas de mercado decorrentes da

falta de qualidade dos produtos continuavam a ocorrer. Após o diagnóstico, a equipe do

PROJVEST realizou uma reunião com a direção da empresa e o setor de Qualidade,

apresentando uma proposta que contemplava uma análise das atividades atuais do setor de

Qualidade em prol de uma possível reestruturação e a aplicação de treinamentos para alguns

colaboradores. A proposta foi aprovada e, em uma segunda reunião, foi iniciada a elaboração

de um Plano de Ação conjuntamente com o setor de Qualidade.

4.3 Elaboração do Plano de Ação

O Plano de Ação elaborado pode ser visto como um documento que definiu um conjunto de

atividades de melhoria, seus respectivos prazos e colaboradores envolvidos na execução

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destas, com a finalidade de atingir os objetivos da proposta inicial apresentada pelo

PROJVEST, promovendo os princípios da gestão da qualidade na empresa. É importante

destacar que o caso desta empresa foi uma situação atípica para a equipe do PROJVEST, já

que nenhum dos 13 Módulos de Intervenção utilizados em outras empresas poderia atender às

necessidades desta. No entanto, algumas atividades dos Módulos de Intervenção “Ferramentas

da Qualidade” e “Melhoria Contínua” foram selecionadas para compor o Plano de Ação

elaborado. De forma sintética, as atividades componentes do Plano de Ação são apresentadas

no Quadro 2 e descritas nas subseções posteriores.

Ação Responsável Jul Ago Set Out Nov

1. Definir funções da qualidade na

empresa

Equipe de Qualidade e Diretores

da empresa

2. Revisar os mecanismos de controle de

qualidade na empresa

Equipe do PROJVEST e Equipe

de Qualidade

3. Treinar colaboradores Equipe do PROJVEST e Equipe

de Qualidade

4. Desenvolver e implantar práticas de

qualidade

Equipe do PROJVEST e Equipe

de Qualidade

5. Avaliar os resultados alcançados Equipe do PROJVEST e Equipe

de Qualidade

Quadro 2 – Atividades do Plano de Ação para intervenção na empresa

5. Desdobramento do Processo de Melhoria Contínua: Implantação e Avaliação dos

Resultados

5.1 Definição das funções da qualidade na empresa

Após a realização de reuniões e sessões de brainstorming envolvendo a equipe do projeto,

setor de Qualidade e diretoria da empresa, foi estabelecido que a principal função da

qualidade no contexto da empresa, dadas as necessidades imediatas, era a prevenção de não

conformidades. A partir disso, a equipe do PROJVEST e do setor de Qualidade identificaram

e implantaram algumas práticas em prol da prevenção das não conformidades, as quais

promoveram integração com os setores de Recursos Humanos, Corte, Estamparia, Costura e

PPCP (Planejamento, Programação e Controle da Produção). Tais práticas serão descritas nas

próximas subseções.

5.2 Revisão dos mecanismos de controle de qualidade na empresa

Durante a revisão dos mecanismos de controle de qualidade utilizados pela empresa,

observou-se que existiam duas práticas de controle de qualidade na empresa: a revisão de

matéria-prima (malha) por meio da máquina de revisão de tecidos, e após o processo de

costura, a revisão por parte das colaboradoras do setor de Revisão (“revisoras”), o qual era

responsável por verificar todas as peças confeccionadas e separar as que não estavam em

conformidade com as especificações, classificando em “segunda qualidade” ou “conserto”. A

cada hora as respectivas quantidades de não conformidades eram registradas em uma ficha e,

ao final do turno de trabalho, a líder do setor de Revisão (“inspetora da qualidade”) analisava

todas as peças não conformes que foram separadas e as classificava de acordo com o processo

que originou o defeito. Por exemplo, se ocorreu uma estampa falhada, a não conformidade é

classificada como “Estamparia”. Em seguida, as não conformidades eram lançadas no sistema

computacional integrado da empresa (ERP).

As informações registradas no sistema ERP permitiam apenas verificar a quantidade de não

conformidades ocorridas em determinado período, identificando-os por processo produtivo de

origem. Consequentemente, estes dados raramente eram utilizados pela empresa, já que não

identificavam o tipo de falha ocorrida e acabavam por dificultar a tomada de decisão baseada

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em fatos. Outro fator crítico era que muitas peças não conformes ocorriam no início do

processo produtivo (setores de Corte e Estamparia) e só eram separadas durante a revisão

final (após o processo de costura), o que acarretava em desperdícios de tempo, recursos

humanos e materiais. Além disso, frequentemente eram encontradas peças não conformes na

“Dobração/ Expedição”, as quais haviam sido aprovadas pela “Revisão”, sinalizando ainda

mais a necessidade de mudanças nos mecanismos de controle de qualidade da empresa.

Após a análise dos mecanismos de controle de qualidade utilizados até então, realizou-se um

brainstorming no qual foi decido que o controle da qualidade deveria atuar nos setores de

Corte, Estamparia e Costura e que a eficiência do setor de Revisão deveria ser avaliada. Além

disso, apontou-se a necessidade de criar um mecanismo que fosse capaz de identificar e

quantificar o tipo de não conformidades produzidas em cada setor, a qual seria posteriormente

atendida pela criação de catálogos de não conformidades.

A primeira atividade de melhoria implantada foi designada “inspeção educativa”, já que nesta

os lotes não seriam reprovados, mas analisados de modo a identificar e atuar sobre as não

conformidades. Para isso, uma “inspetora de qualidade” foi contratada para acompanhar os

setores de Corte, Estamparia e Costura, sendo que a mesma recebeu treinamentos sobre o

processo produtivo da empresa e, após 1 mês, passou a coletar amostras aleatorias (10% do

total dos lotes) e registrá-las em uma nova ficha de controle implantada, a “Ficha de

Inspeção”, a qual passou a conter informações usadas para determinação dos indicadores de

não conformidades produzidas por cada um dos setores. Esta mesma ficha foi adotada pelas

“revisoras”, as quais inspecionam 100% das peças produzidas ao final de setor de Costura.

Em seguida, foi implantada a “Folha de Verificação”, a qual passou a ser preenchida pela

líder do setor de Revisão e tinha o objetivo de avaliar a eficiência deste processo. A cada dia a

líder do setor inspecionava 20 peças aprovadas por cada uma revisoras e registrava na “Ficha

de Verificação” as não conformidades encontradas. Os dados passaram a ser registrados

posteriormente em uma planilha eletrônica, podendo ser extraídas informações quanto ao tipo

de não conformidades que foram aprovados pela revisão, bem como suas respectivas

quantidades, possibilitando também a extratificação das informações por turno de trabalho,

por “revisora”, por ordem de produção ou por períodos de tempo.

A Figura 3 apresenta a nova configuração dos mecanismos de controle da qualidade após a

implantação das ações de melhorias descritas nesta subseção. A figura mostra o local em que

a ação de controle é executada, o documento utilizado, o tipo de inspeção e o responsável,

sendo que a ordenação está de acordo com o fluxo do processo produtivo da empresa.

Figura 3 – Novos mecanismos de controle de qualidade da empresa seguindo o fluxo produtivo

5.3 Treinamento dos colaboradores

Com a finalidade de assegurar que inspeção de peças seja fiel aos atributos de qualidade

desejáveis para as peças produzidas, foi proposto e realizado um treinamento para as

“revisoras”. O treinamento foi realizado de forma coletiva e, após este, foi realizado um

treinamento individual.

Durante a elaboração do treinamento coletivo, foi discutido qual o método mais adequado

para fazer a inspeção e uma das revisoras foi convidada a simular tal atividade para uma

filmagem. O treinamento coletivo abordou a importância da qualidade para a indústria, exibiu

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o vídeo que apresentava um novo método a ser adotado para a atividade de revisão, mostrou

exemplos de não conformidades que não devem prosseguir pelo fluxo produtivo e ressaltou

quais são as principais partes da peça a serem inspecionadas.

Já o treinamento individual foi realizado por dois colaboradores do setor de Qualidade junto a

cada uma das revisoras. Neste, as revisoras tiveram que reproduzir o processo de inspeção e

esclarecer as possíveis dúvidas quanto ao novo método de realização da atividade.

5.4 Desenvolvimento e implantação de outras ações de melhoria

Dentre as demais ações de melhoria realizadas em prol da qualidade, pode-se citar a

elaboração de catálogos de não conformidades, a criação de um setor específico para as

revisoras do setor de Costura e o levantamento preliminar de custos da não qualidade.

O catálogo de não conformidades consiste em uma pasta que lista as possíveis não

conformidades para cada setor e tem por objetivo a definição de parâmetros de qualidade a

serem utilizados pelos colaboradores. Para sua elaboração, foram estudados os tipos de falhas

possíveis nos processos de Corte, Estamparia e Costura, codificando cada uma destas e

realizando um registro fotográfico das peças que possuíam tais não conformidades. Portanto,

o catálogo ilustra cada uma das não conformidades, com uma breve descrição e um código de

referência. Cada setor recebeu seu respectivo catálogo e, com este recurso, espera-se que tais

parâmetros sejam utilizados na tomada de decisão para aprovação dos lotes de peças no setor,

ao invés da decisão pela simples intuição, o que comumente acontecia na empresa. A Figura 4

mostra parte do catálogo de não conformidades do setor de Costura.

Figura 4 – Catálogo de não conformidades do setor de Costura

A criação de um setor específico para as revisoras do setor de Costura foi necessária

mediante a ocorrência de diversas falhas acometidas na aprovação de peças não conformes, as

quais deveriam ser devolvidas à célula de origem no setor de Costura. Tais falhas aconteciam

porque as revisoras estavam alocadas ao final de cada célula do setor de Costura e isto inibia a

devolução imediata das peças não conformes às células de origem, uma vez que as operadoras

de máquinas de costura se demonstravam insatisfeitas cada vez que uma peça era devolvida e

alguns conflitos ocorriam no setor. A realocação das inspetoras resolveu o problema, já que a

identidade da revisora responsável pela inspeção passou a ser desconhecida pelas operadoras

de máquina de costura e, a partir de então, as peças não conformes têm sido devolvidas às

células de origem. As revisoras passariam a receber comissão salarial pela quantidade peças

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revisadas corretamente ao invés de receberem o “prêmio de produção” de acordo com a célula

de costura na qual estavam alocadas.

Já o levantamento preliminar de custos da não qualidade foi realizado por meio do

acompanhamento de um único lote no setor produtivo. Durante o acompanhamento, foram

levantados a quantidade de peças não conformes produzidas em cada setor e o total de peças

perdidas durante a produção, as quais são repostas ao longo do processo produtivo. A partir

destas informações e de custos com retrabalho estimados, foi calculado o custo da não

qualidade para um único pedido. A finalidade deste estudo preliminar foi quantificar os custos

da “não qualidade das peças” e apresentar tais informações à direção da empresa para que a

mesma autorize a realização de estudos mais detalhados sobre o problema.

5.5 Avaliação das atividades realizadas

O principal mecanismo utilizado para avaliação da efetividade das ações foi o uso de

indicadores de desempenho. Os indicadores de desempenho se limitaram a obter a

porcentagem de não conformidades produzidas por setor e a medir a eficiência do processo de

revisão final, salvo que a empresa carecia de mecanismos (softwares e pessoas) para facilitar a

coleta e a manipulação de uma massa maior de dados. Os indicadores foram obtidos por meio

da extração dos dados das “Fichas de Inspeção” e posterior inserção manual destes em uma

planilha eletrônica. A Tabela 1 apresenta a porcentagem de não conformidades produzidas

nos setores de Corte, Estamparia e Costura durante parte do período em que as ações de

melhoria foram realizadas.

Mês Setor

Corte Estamparia Costura

Agosto 9,96% 21,10% 25, 66%

Setembro 7,35% 12,72% 11,01%

Outubro 7,19% 8,06% 8,56%

Tabela 1 – Porcentagem de não conformidades nos setores de Corte, Estamparia e Costura da Empresa

A porcentagem de peças não conformes provenientes do setor de corte reduziu, porém em

baixa proporção. Houve uma redução de 2,38% no período de agosto a outubro de 2010.

Nota-se uma redução satisfatória na porcentagem de peças não conformes no setor de

Estamparia, reduzindo cerca de 13,04% desde o início da implantação das ações. Por fim, o

setor de Costura obteve uma redução bastante significativa no percentual de peças não

conformes, diminuindo em cerca de 17,1% a ocorrência de não conformidades.

Quanto à eficiência do setor de Revisão, a Figura 5 apresenta a evolução dos indicadores

relativos à eficiência do mesmo, sendo que estes dados são oriundos da “Ficha de

Verificação” e foram coletados pela líder do setor.

Figura 5 – Indicadores de eficiência do setor de Revisão

Conforme ilustra a Figura 5, a eficiência do setor de Revisão aumentou em 8,67% desde o

início da implentação das ações até o mês de outubro, o que pode ser considerado como um

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resultado satisfatório. O bom desempenho do setor de Costura parece estar associado ao

aumento da eficiência das colaboradoras da Revisão, pois, ao se sentirem avaliadas, as

revisoras passaram a ser mais eficientes em suas atividades, ou seja, passaram a devolver mais

peças não conformes para as células de costura, o que afeta diretamente a produtividade das

operadoras de máquina de costura, já que estas recebem bonificações salariais proporcionais à

quantidade de peças produzidas (peças conformes e também peças não conformes).

Consequentemente, as colaboradoras do setor de Costura passaram a se ater mais ao

cumprimento dos requisitos de qualidade das peças com a finalidade de evitar retrabalhos, os

quais passaram a afetar negativamente o valor de suas respectivas bonificações salariais, dado

o aumento de peças devolvidas ao setor.

6. Considerações Finais

Apesar das dificuldades encontradas durante o desenvolvimento da pesquisa-ação na empresa,

pode-se afirmar que as ações realizadas contribuíram para a diminuição da quantidade de não

conformidades produzidas e para o aumento de eficiência das revisoras. A inspeção de peças

por amostragem nos setores, os treinamentos realizados, a elaboração dos catálogos de não

conformidades, a contratação de uma inspetora da qualidade, a atribuição de responsáveis por

lotes aprovados na Revisão e a mensuração de eficiência no setor geraram resultados

satisfatórios, mas não suficientes para resolver os diversos problemas de qualidade da

empresa. De maneira geral, os colaboradores dos setores produtivos envolvidos nas ações de

melhoria estão mais atentos em atender os requisitos de qualidade das peças. Além disso, a

empresa já consegue obter informações mais exatas relacionadas à qualidade dos produtos e

processos, as quais podem ser usadas na tomada de decisão.

Durante a realização da pesquisa-ação, a equipe do PROJVEST encontrou dificuldades

relacionadas à falta de apoio da direção da empresa, a qual buscava soluções de curto prazo e

pouco considerava qualquer proposta de melhoria para médio e longo prazos que exigisse

investimentos financeiros. Além disso, a falta de integração do departamento de Recursos

Humanos da empresa com o setor de Qualidade também foi impecílio para o desenvolvimento

das atividades, já que no mês de outubro este departamento iniciou a “Campanha pela

Qualidade” na empresa por meio da contratação de consultores externos para realização de

palestras sobre conceitos teóricos da qualidade, não tendo sido solicitado o envolvimento do

setor de Qualidade e informações referentes às ações de melhorias que vinham sendo

implantadas. Constata-se que aparentemente a direção da empresa enxerga o setor de

Qualidade apenas como um órgão fiscalizador, e não como um setor capaz de promover

capacitação dos colaboradores, desenvolver competências internas, levantar e solucionar

problemas relacionados aos processos produtivos.

A equipe do PROJVEST e o setor de Qualidade identificaram algumas oportunidades de

melhoria para trabalhos futuros nesta empresa, tais como realização de treinamentos para

todos os funcionários sobre práticas de qualidade, contratação e capacitação de mais

funcionários para o setor de qualidade, automatização do mecanismo de coleta de dados de

não conformidades, revisão da política de bonificação das operadoras de costura, estudos

detalhados sobre as perdas decorrentes da produção de não conformidades e criação de grupos

de melhoria contínua que envolvam funcionários de todos os setores.

Por fim, acredita-se que os bons resultados obtidos no estudo de caso demonstram a

importância da interação e cooperação entre pesquisadores de universidades, empresas e

órgãos de governança local do aglomerado industrial, já que tal estrutura de cooperação foi

essencial para a inserção de práticas de melhoria contínua nas empresas em que o projeto

atuou, para formação de agentes de inovação e qualificação da mão-de-obra local. Espera-se

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que trabalhos semelhantes possam ser desenvolvidos pelas universidades por meio do apoio

do Estado, das empresas e dos atores da governança local do aglomerado, já que ainda há uma

carência muito grande de esforços direcionados para a promoção da melhoria contínua nas

PMEs da região.

A equipe do PROJVEST agradece à Fundação Araucária pelos recursos financeiros

concedidos para a realização desta pesquisa.

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