pela saúde dos bebês prematuros - unespciencia.com.br · senhora do patrocínio (2014),...

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Medicina Medicina e placentário. Desde que foram regulamen- tados nos Estados Unidos e na Europa, nos anos 1990, esses locais receberam cerca de 700 mil unidades de sangue de cordão um- bilical doadas com o consentimento de mães saudáveis. Esse material é armazenado após um processo de criopreservação, no qual cé- lulas ou tecidos são preservados por meio de congelamento a temperaturas muito baixas (geralmente -196ºC). A criação dos bancos de sangue de cordão umbilical e placentário – que podem ser pú- blicos ou privados – contribuiu muito para aumentar a disponibilidade de doações de células-tronco hematopoiéticas. No entanto, suas atividades apresentam problemas, espe- cialmente pelo alto custo para coleta, proces- samento e armazenamento do material, além de baixo número de transplantes realizados a partir do acervo armazenado. Além disso, o O Brasil integra uma rede mundial de bancos de sangue de cordão umbili- cal e placentário, que são destinados a coleta, processamento e criopreservação de células- tronco hematopoiéticas para transplante. Ao serem transplantadas, essas células-tronco induzem a produção de células saudáveis pe- la medula óssea, importantes no combate a diversas doenças, como leucemia aguda, leu- cemia mieloide crônica, linfomas, anemias graves e congênitas, entre outras. Um projeto que reúne equipes da Unesp e da Unicamp busca otimizar as atividades exercidas por esses bancos de sangue, pos- sibilitando que eles sejam também a fonte para a produção e fornecimento de produtos de grande relevância para o tratamento de recém-nascidos prematuros. Atualmente, em todo o mundo, existem mais de 100 bancos de sangue de cordão umbilical PROJETO BUSCA OTIMIZAR USO DE BANCOS DE SANGUE DE CORDãO UMBILICAL E PLACENTáRIO PARA GERAR PRODUTOS QUE COMBATEM MALES COMO ANEMIA EM RECéM- NASCIDOS Pela saúde dos bebês prematuros sucesso do transplante de células-tronco he- matopoiéticas depende do número de células coletadas, que muitas vezes é inferior ao ne- cessário para realização do transplante. Por isso, uma expressiva parcela desse valio- so recurso sanguíneo costuma ser descartada, embora tenha potencial para permitir outros usos. Por ser rico em células e componentes proteicos, esse material há anos vem sendo aplicado em diversos processos terapêuticos, como na hemoterapia, terapia celular e me- dicina regenerativa. REDE BRASILCORD No Brasil, existem 13 bancos públicos, que integram da Rede BrasilCord. Com financia- mento da Fapesp, o projeto conjunto da Unesp e da Unicamp tem como objetivo receber o material que não é utilizado pelos bancos dessa rede, promovendo o processamento, a validação e a garantia de qualidade dos componentes celulares e proteicos obtidos. De acordo com suas características, esses componentes po- dem ser destinados ao tratamento de recém- nascidos de extremo baixo peso internados em unidades de terapia intensiva, por meio de transfusões de sangue. O projeto tem como coordenadoras Elenice Deffune, médica hemoterapeuta e professora do Departamento de Urologia da Faculdade de Medicina (FM), câmpus da Unesp em Botuca- tu, e Ângela Cristina Malheiros Luzo, diretora médica do Serviço de Transfusão e Banco de Sangue de Cordão Umbilical e Placentário do Hemocentro de Campinas, da Unicamp. Integrante do projeto, Mariane Aparecida Risso concluiu em agosto de 2018 seu Mestrado Profissional em Pesquisa e Desenvolvimen- to – Biotecnologia Médica na FMB/Unesp, voltado para o controle de qualidade do con- © Pixelistanbul/iStock 26 ANDRé LOUZAS UNESPCIÊNCIA | MARÇO 2019 27 MARÇO 2019 | UNESPCIÊNCIA

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Page 1: Pela saúde dos bebês prematuros - unespciencia.com.br · Senhora do Patrocínio (2014), Especialista em Hemoterapia pelo Programa de aprimoramento Profissional da fMB – unesp/Botucatu

MedicinaMedicina

e placentário. Desde que foram regulamen-tados nos Estados Unidos e na Europa, nos anos 1990, esses locais receberam cerca de 700 mil unidades de sangue de cordão um-bilical doadas com o consentimento de mães saudáveis. Esse material é armazenado após um processo de criopreservação, no qual cé-lulas ou tecidos são preservados por meio de congelamento a temperaturas muito baixas (geralmente -196ºC).

A criação dos bancos de sangue de cordão umbilical e placentário – que podem ser pú-blicos ou privados – contribuiu muito para aumentar a disponibilidade de doações de células-tronco hematopoiéticas. No entanto, suas atividades apresentam problemas, espe-cialmente pelo alto custo para coleta, proces-samento e armazenamento do material, além de baixo número de transplantes realizados a partir do acervo armazenado. Além disso, o

O Brasil integra uma rede mundial de bancos de sangue de cordão umbili-

cal e placentário, que são destinados a coleta, processamento e criopreservação de células-tronco hematopoiéticas para transplante. Ao serem transplantadas, essas células-tronco induzem a produção de células saudáveis pe-la medula óssea, importantes no combate a diversas doenças, como leucemia aguda, leu-cemia mieloide crônica, linfomas, anemias graves e congênitas, entre outras.

Um projeto que reúne equipes da Unesp e da Unicamp busca otimizar as atividades exercidas por esses bancos de sangue, pos-sibilitando que eles sejam também a fonte para a produção e fornecimento de produtos de grande relevância para o tratamento de recém-nascidos prematuros.

Atualmente, em todo o mundo, existem mais de 100 bancos de sangue de cordão umbilical

PrOjetO busca OtiMizar usO de bancOs de sangue de cOrdãO uMbilical e PlacentáriO Para gerar PrOdutOs que cOMbateM Males cOMO aneMia eM recéM-nascidOs

Pela saúde dos bebês prematurossucesso do transplante de células-tronco he-matopoiéticas depende do número de células coletadas, que muitas vezes é inferior ao ne-cessário para realização do transplante.

Por isso, uma expressiva parcela desse valio-so recurso sanguíneo costuma ser descartada, embora tenha potencial para permitir outros usos. Por ser rico em células e componentes proteicos, esse material há anos vem sendo aplicado em diversos processos terapêuticos, como na hemoterapia, terapia celular e me-dicina regenerativa.

rede brasilcOrdNo Brasil, existem 13 bancos públicos, que integram da Rede BrasilCord. Com financia-mento da Fapesp, o projeto conjunto da Unesp e da Unicamp tem como objetivo receber o material que não é utilizado pelos bancos dessa rede, promovendo o processamento, a validação

e a garantia de qualidade dos componentes celulares e proteicos obtidos. De acordo com suas características, esses componentes po-dem ser destinados ao tratamento de recém-nascidos de extremo baixo peso internados em unidades de terapia intensiva, por meio de transfusões de sangue.

O projeto tem como coordenadoras Elenice Deffune, médica hemoterapeuta e professora do Departamento de Urologia da Faculdade de Medicina (FM), câmpus da Unesp em Botuca-tu, e Ângela Cristina Malheiros Luzo, diretora médica do Serviço de Transfusão e Banco de Sangue de Cordão Umbilical e Placentário do Hemocentro de Campinas, da Unicamp.

Integrante do projeto, Mariane Aparecida Risso concluiu em agosto de 2018 seu Mestrado Profissional em Pesquisa e Desenvolvimen-to – Biotecnologia Médica na FMB/Unesp, voltado para o controle de qualidade do con-

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UnesPCiênCia | março 2019 27março 2019 | UnesPCiênCia

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Medicina

Primeiro transPlante de sangUe do Cordão

UmbiliCal do mUndo

eliane gluckman (a dir.), Md, que realizou o primeiro transplante de sangue do cordão umbilical do mundo em 1988, recebeu o primeiro prêmio cba lifetime achievement. apresentando o prêmio estava o sr. Matthew Farrow (ao centro) que, aos 5 anos, foi seu paciente para esse transplante de sangue do cordão umbilical.

como lembrança do trigésimo aniversário do evento, a dra. gluckman recebeu uma litografia emoldurada com ilustrações das faces das pessoas que estavam diretamente envolvidas no primeiro transplante. todos presentes na cerimônia:

Hal broxmeyer, Phd, da escola de Medicina da universidade de indiana, foi um dos primeiros a propor o sangue do cordão umbilical como uma excelente fonte de células estaminais e progenitoras para transplante

arleen auerbach, Phd, um renomado pesquisador da universidade rockefeller que descreveu pela primeira vez as mutações responsáveis pela anemia de Fanconi e que confirmou que o irmão de Matthew era saudável e um par idêntico ao Hla

joanne Kurtzberg (a esq. na foto), Md, médica pediatra de Matthew.

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Medicina

mento do sangue em hemácias, plaquetas (cé-lulas do sangue produzidas pela medula óssea e responsáveis pela coagulação sanguínea) e plasma (parte líquida do sangue). Isso envolve processos como centrifugação e congelamen-to do material. Entre os hemocomponentes estão o concentrado de hemácias, o concen-trado de plaquetas e plasma rico em fatores de crescimento, que, depois de sua validação – que abrange desde o processamento até o controle de qualidade dos hemocomponen-tes –, poderão ser usados em tratamentos de recém-nascidos prematuros.

O sangue de cordão umbilical e placentá-rio é considerado um material nobre por suas características imunológicas, infecciosas e por conter o mesmo tipo de hemoglobina de receptores recém-nascidos, isto é, hemoglo-bina fetal. “O aproveitamento desse material tornaria o custo dos bancos da Rede Brasil-Cord mais razoável e a manutenção de sua infraestrutura mais lógica, dentro do contex-to de assistência à saúde brasileira”, afirma a professora Elenice.

centrado de hemácias de doadores de sangue adultos. Paralelamente ao mestrado, Mariane desenvolveu um estudo retrospectivo sobre o aproveitamento e a desqualificação de bolsas de sangue de cordão umbilical e placentário colhidos pela Rede BrasilCord.

Em setembro do ano passado, Mariane apresentou essa análise no Congresso Inter-nacional de Sangue do Cordão, Cord Blood Connect, realizado em Miami Beach, Flórida, nos Estados Unidos. O trabalho teve grande repercussão e foi publicado numa edição es-pecial da revista Stem Cell Translational Me-dicine, que tem fator de impacto 4,00, conjun-tamente com os outros resumos apresentados no evento.

A participação no congresso foi uma expe-riência marcante para a pós-graduanda. “Esse evento foi o primeiro encontro internacional voltado para a conexão dos pesquisadores dos bancos de sangue de cordão umbilical e pla-centário, reunindo participantes de mais de 30 países”, comenta. “O aprimoramento da utilização desses bancos de sangue hoje é

Dra. ElEnicE DEffunEconcluiu o doutorado em immunologie – université de Paris Vi (Pierre et Marie curie) em 1992. atualmente é Professora assistente Doutora da unesp, na disciplina de Hemoterapia. É responsável pelo laboratório de Engenharia celular do Hemocentro de Botucatu

Dra. ÂngEla luzoDiretora do Serviço de Transfusão e do laboratório de Processamento celular (Banco de Sangue de cordão umbilical e laboratório de criopreservação de células Tronco Hematopoiéticas) do Hemocentro campinas/unicaMP. Profa. de Pós-graduação em ciências da cirurgia da fcM unicamp

MarianE aParEciDa riSSoBiomédica pelo centro universitário nossa Senhora do Patrocínio (2014), Especialista em Hemoterapia pelo Programa de aprimoramento Profissional da fMB – unesp/Botucatu (2017) e Mestre em Pesquisa e Desenvolvimento – Biotecnologia Médica, fMB/unesp (2018)

uma questão muito relevante em nosso se-tor”, ressalta Mariane, que atualmente reali-za seu doutorado na Unicamp, focalizando o processamento e o controle de qualidade de concentrado de hemácias do sangue de cordão umbilical e placentário.

iMPOrtância dOs HeMOcOMPOnentesRecém-nascidos prematuros apresentam pro-blemas como a anemia da prematuridade, com complicações que podem ser resolvidas rapi-damente por meio de transfusões sanguíneas. O tratamento desses bebês pode ser realiza-do, por exemplo, com o uso de concentrados de hemácias (células responsáveis pela cor vermelha do sangue e muito importantes na oxigenação celular dos tecidos do corpo), que é obtido pelo processamento do sangue de cordão umbilical e placentário.

O projeto coordenado por Elenice e Ângela está promovendo o processamento de hemo-componentes, que são produtos gerados indi-vidualmente nos serviços de hemoterapia, a partir do sangue total, obtidos pelo fraciona-

PartiCiPantes do Projeto

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