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Arlindo Ugulino Netto – PATOLOGIA – MEDICINA P4 – 2009.1

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FAMENE NETTO, Arlindo Ugulino. PATOLOGIA

INFLAMAÇÃO AGUDA (Profº Raimundo Sales)

A inflamação é uma reação complexa a vários agentes nocivos, como os microrganismos e células danificadas, geralmente necróticas, que consiste de respostas vasculares, migração e ativação de leucócitos e reações sistêmicas. A principal característica do processo inflamatório é, portanto, a reação dos vasos sanguíneos, que leva ao acúmulo de fluido e leucócitos nos tecidos extravasculares. A resposta inflamatória está intimamente associada a um processo de reparo. O processo inflamatório é responsável por destruir, diluir ou isolar o agente nocivo, além de desencadear uma série de eventos que tentam curar e reconstruir o tecido danificado. Durante a fase de reparação, o tecido danificado é substituído por meio da regeneração de células parenquimatosas nativas, pelo preenchimento com tecido fibroso (cicatrização) ou, como é comum, por uma combinação desses dois processos. A inflamação é fundamentalmente um mecanismo de defesa do organismo, cujo objetivo final é a eliminação da causa inicial da lesão celular e das conseqüências de tal lesão. Entretanto, a inflamação e o reparo podem ser potencialmente prejudiciais: a última fase do processo inflamatório consiste em lesão tecidual e necrose, o que não condiz em um resultado satisfatório. Por este motivo, existe o comércio farmacêutico dos medicamentos antiinflamatórios, os quais devem agir, preferencialmente, nesta última fase danosa, controlando as sequelas danosas da inflamação sem interferir em seus efeitos benéficos. A resposta inflamatória consiste em dois componentes principais: uma reação vascular e uma reação celular (neutrófilos, monócitos, eosinófilos, basófilos e plaquetas). A inflamação pode ser classificada ainda em aguda e crônica. A inflamação aguda se inicia rapidamente (em alguns segundos ou minutos) e tem uma duração relativamente curta, de alguns minutos a várias horas ou alguns dias. Suas principais características são a exsudação de fluido e proteínas plasmáticas (edema) e a migração de leucócitos, predominantemente de neutrófilos. A inflamação crônica tem uma duração maior e está histologicamente associada à presença de linfócitos e macrófagos, à proliferação de vasos sanguíneos, fibrose e necrose tissular. Não é obrigado a evolução de uma inflamação aguda para uma fase crônica. As reações vasculares e celulares da inflamação aguda e da crônica são mediadas por fatores químicos derivados de proteínas ou células plasmáticas e são produzidos ou ativados pelo estímulo inflamatório. Neste capítulo, será dada ênfase ao mecanismo da inflamação aguda. HISTÓRICO Apesar de as características clínicas da inflamação serem descritas em papiros egípcios (datados de aproximadamente 3000 a.C.), Celso, um escritor romano do século I d.C., foi o primeiro a listar os quatro sinais cardinais da inflamação (Sinais Cardinais de Celso): rubor (hiperemia), tumor (edema), calor (aumento da temperatura local) e dor (algia). Esses sinais são tipicamente mais proeminentes na inflamação aguda do que na crônica. Um quinto sinal clínico (sinal de Virchow), a perda da função, foi posteriormente adicionado por Virchow. Apenas no período do renascimento, em 1793, o cirurgião escocês John Hunter notou que a inflamação não é uma doença, mas uma resposta benéfica e inespecífica do organismo que tem o intuito de debelar a permanência do hospedeiro nocivo. NOÇÕES GERAIS SOBRE INFLAMAÇÃO AGUDA Clinicamente, o a resposta inflamatória aguda é inespecífica, ou seja, para qualquer que seja o agente causador, o processo é esterotipado (podendo variar apenas de intensidade). A inflamação aguda é uma resposta rápida a um agente nocivo encarregada de levar mediadores da defesa do hospedeiro (leucócitos e proteínas plasmáticas) ao local da lesão. A inflamação aguda possui três fases principais: (1) alterações no calibre vascular, que levam a um aumento no fluxo sanguíneo; (2) alterações estruturais na microcirculação, que permitem que proteínas plasmáticas e leucócitos deixem a circulação; (3) emigração dos leucócitos da microcirculação, seu acúmulo no foco de lesão e sua ativação para eliminar o agente nocivo.

1. Alteração vascular e do fluxo: são os primeiros sinais evidentes no foco inflamatório, no intuito de aumentar o fluxo sanguíneo local para aumentar, deste modo, a demanda de células inflamatórias. Esta fase é guiada, praticamente, pela liberação de histamina e serotonina.

2. Aumento da permeabilidade vascular: a dilatação do vaso gera um aumento na permeabilidade vascular daquela região acometida pelo processo inflamatório. Além da ação da histamina e da serotonina, está fase é caracterizada pela ação das proteínas do complemento (C3a e C5a).

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3. Exsudação leucocitária: processo pelo qual os leucócitos (mais especificamente, nesta fase inicial, o polimorfonuclear neutrófilo) realizam a marginação, rolamento, adesão e diapedese (migração) para alcançar o tecido inflamado. Toda esta fase é guiada pela ação das selectinas, integrinas e fatores quimiotáticos.

OBS: A inflamação aguda é, portanto, um evento vasculo-exsudativo. O extravasamento de fluido, proteínas e células sanguíneas dos sistema vascular para o tecido intersticial ou as cavidades corporais é chamado de exsudação. Um exsudato é um fluido inflamatório extravascular que possui alta concentração de proteínas e fragmentos celulares (aprensentando alta densidade). Por outro lado, um transudato é um fluido com pequeno teor protéico (sendo que a maior parte é composta por albumina) e de baixa densidade. Ele é essencialmente um ultrafiltrado do plasma sanguíneo através da parede vascular sem que haja um aumento na permeabilidade vascular. O edema significa um excesso de fluido no interstício ou nas cavidades serosas; ele pode ser um exsudato ou um transudato. O pus, ou exsudato purulento, é um exsudato rico em leucócitos (neutrófilos, em sua maioria), fragmentos de células mortas e, em muitos casos, microrganismos. ESTÍMULOS PARA A INFLAMAÇÃO AGUDA As reações inflamatórias agudas são desencadeadas por vários estímulos:

� Infecções e toxinas microbianas; � Trauma (contuso ou penetrante); � Agentes físicos e químicos (lesão térmica, queimaduras ou congelamento; radiação; etc) � Necrose tissular; � Corpos estranhos; � Reações imunológicas (também chamadas de reações de hipersensibilidade)

ALTERAÇÕES VASCULARES Por definição, a inflamação é a reposta de um tecido vivo vascularizado a uma agressão. No caso da inflamação aguda, seriam os fenômenos vasculares que acontecem nas primeiras horas da inflamação. Já que os dois principais mecanismos da defesa do hospedeiro contra os microrganismos (anticorpos e leucócitos) se encontram normalmente na corrente sanguínea, os fenômenos vasculares desempenham um papel de extrema importância na inflamação aguda. As alterações vasculares da inflamação aguda acontecem por meio dos seguintes fenômenos:

• Alterações no fluxo e calibre vasculares (alterações hemodinâmicas): essas alterações se iniciam logo após a lesão e se desenvolvem em graus variáveis dependendo de sua gravidade. As alterações são as seguintes: vasodilatação (o que leva a um aumento focal do fluxo sanguíneo, gerando o calor e o rubor) induzida por fatores como a histamina, serotonina, leucotrienos e neuropeptídeo substância P; aumento da viscosidade sanguínea (devido a maior presença de hemácias na região); acúmulo de leucócitos (especialmente neutrófilos) na região.

• Aumento da permeabilidade vascular (extravasamento vascular): o aumento da permeabilidade vascular, levando ao extravasamento de fluido rico em proteínas (exsudato) para o tecido extravascular, é uma característica fundamental da inflamação aguda. A vasodilatação (que aumenta o espaço entre as células endoteliais) e a perda de proteínas do plasma (reduzindo a pressão osmótica no fluido intravascular e aumentando no fluido intersticial) são dois fatores que acarretam no extravasamento acentuado de fluido dos vasos, levando ao seu acúmulo no interstício, caracterizando o edema.

• Exsudação leucocitária: são os eventos celulares que compõem a inflamação aguda. Os leucócitos são as células da linhagem branca sanguíena, ou seja: linfócitos, monócitos (que em nível intersticial, passa a ser chamado de macrófago), polimorfonucleares (neutrófilos, acidófilos e basófilos). A primeira célula a se envolver no processo inflamatório agudo é o polimorfonuclear neutrófilo. Os eventos celulares serão detalhados logo a seguir.

OBS²: Modelo de Starling. Sabe-se que o sangue que chega na microcirculação pelo lado arterial (arteríolas) apresenta cerca de 32 mmHg em pressão oncótica, sendo maior que a pressão hidrostática do fluido intersticial. Neste

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momento, a tendência do líquido vascular é de sair do vaso. Já na região venosa da microcirculação (vênulas), como a pressão oncótica é muito menor que a pressão hidrostática, a tendência do líquido é voltar à luz do vaso. O restante que não retornou, é drenado pela circulação linfática. EVENTOS CELULARES (EXTRAVASAMENTO DE LEUCÓCITOS E FAGOCITOSE) Uma das funções mais essenciais da inflamação é o encaminhamento de leucócitos à área lesada e a ativação que desempenham suas funções normais de defesa do hospedeiro. A sequência de eventos na jornada dos leucócitos do lúmen vascular para o tecido intersticial (extravasamento ou exsudação leucocitária: mecanismo pelo qual os polimorfonucleares deixam o capilar para atingir o foco inflamatório), pode ser dividida nas seguintes etapas:

1. No lúmen, por meio da emissão de moléculas sinalizadoras pelas células endoteliais, os polimorfonucleares passam pelas seguintes etapas: marginação, rolamento (processo induzido pelas selectinas, que garantem uma maior eficácia neste processo) e adesão ao endotélio (mediado pelas integrinas). Vale salientar que o endotélio vascular normalmente não prende as células circulantes nem impede sua passagem. Porém, na inflamação, o endotélio precisa ser ativado para permitir que ele se ligue aos leucócitos, sendo este o passo inicial para que depois eles saiam dos vasos;

2. Trasmigração (diapedese) através do endotélio; 3. Migração nos tecidos intersticiais em direção ao

estímulo quimiotático. MARGINAÇÃO, ROLAMENTO, ADESÃO E TRANSMIGRAÇÃO LEUCOCITÁRIA No sangue que flui normalmente através das vênulas, os eritrócitos estão confinados a uma coluna axial central, deslocando os leucócitos na direção da parede vascular. Como logo no início da inflamação ocorre uma diminuição da velocidade do fluxo sanguíneo (estase), as condições hemodinâmicas mudam e aumenta o número de leucócitos na periferia do fluxo, próximo à superfície vascular. Esse processo de acúmulo dos leucócitos é chamado de marginação. Subsequentemente, os leucócitos, inicialmente uma pequena quantidade seguida de um grande aumento desse número, vão rolando aos saltos pelo endotélio, aderindo transitoriamente a ele (processo chamado de rolamento) e finalmente param em um determinado ponto, onde aderem firmemente (processo chamado de adesão). O endotélio pode ficar virtualmente coberto de leucócitos, o que é chamado de pavimentação. A adesão leucocitária e a transmigração são reguladas principalmente pela ligação de moléculas de adesão complementares no leucócito e na superfície endotelial, e pelos mediadores químicos (quimiotoxinas e determinadas citocinas) que afetam esses processos modulando a expressão na superfície ou a avidez dessas moléculas de adesão. Os receptores de adesão envolvidos pertencem a quatro famílias moleculares: as selectinas (P-selectina, E-selectina); a superfamília das imunoglobulinas (ICAM-1 e VCAM-1); as integrinas (glicoproteínas como a Mac-1 e VLA-4); e as glicoproteínas semelhantes à mucina (como o heparan sulfato).

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QUIMIOTAXIA Após o extravasamento, os leucócitos migram nos tecidos em direção ao local da lesão por um processo chamado de quimiotaxia, cuja definição mais simples é a locomoção ao longo de um gradiente químico gerado por mediadores produzidos no processo inflamatório. Tanto substancias exógenas quanto endógenas podem agir como quimiotáticos. Os agentes exógenos mais comuns são os produtos bacterianos (como os peptídeos que possuem o N-formil-metionina terminal; outros são de natureza lipídica). Agentes quimiotáticos endógenos, que serão abordados detalhadamente mais adiante, incluem vários mediadores químicos, como: componentes do sistema complemento (ver OBS³ mais adiante), especialmente o C5a e C3a; produtos da via da lipoxigenase, especialmente o leucotrieno B4 (LTB4); e citocinas, especialmente as que pertencem à família das quimiocinas (como o IL-8, por exemplo). Todos os agentes quimiotáticos mencionados se unem a receptores específicos ligados à proteína G (GPCRs), que atravessam a membrana sete vezes, na superfície dos leucócitos. Os sinais iniciados por esses receptores resultam no recrutamento das proteínas G e na ativação de várias moléculas efetoras, incluindo a fosfolipase C (PLCγ) e a fosfoinositol-3 cinase (PI3K). A PLCγ e a PI3K atuam no fosfolipídio inositol da membrana e geram mensageiros lipídicos secundários que aumentao o cálcio citosólico e ativam pequenas GTPases (da família Rac/Rho/cdc42), responsáveis, entre outras funções, por induzir a polimerização da actina do citoesqueleto celular. Desta maneira, os leucócitos são capazes de se locomover estendendo pseudópodes até o foco inflamatório. OBS³: O sistema complemento é um grupo de 20 proteínas (e os produtos de suas clivagens) que são encontradas em maior concentração no plasma. Este sistema será mais detalhado na seção Mediadores Químicos da Inflamação. Dentre as proteínas, existem as chamadas C5 e C3, que são clivadas em C5b e C5a, e C3b e C3a. As proteínas C5a e C3a são anáfilotoxinas que promovem fenômenos vasculares (induzindo a liberação de histamina, realizando vasodilatação) além de serem fortes agentes quimiotáticos para neutrófilos, monócitos, eosionófilos e basófilos. OBS4: O ácido úrico (produto do metabolismo das purinas) é um cristal que tem a capacidade de ativar o sistema complemento. Isso significa que o ácido úrico é capaz de desencadear todo aquele processo da cascata de ativação das proteínas do complemento, inclusive a função quimiotática de alguns de seus produtos, recrutando células inflamatórias para a região. Como os polimorfonucleares não apresentam uricases, eles não são capazes de destruir este cristal, o qual passa a se depositar gradativamente no organismo, geralmente nas regiões articulares e tendinosas, caracterizando o quadro clínico conhecido como atrite gotasa (ou, simplesmente, gota). ATIVAÇÃO LEUCOCITÁRIA Mircorganismos, produtos de células necróticas, complexos antígeno-anticorpo e citocinas, incluindo os fatores quimiotáticos, induzem várias respostas nos leucócitos que são parte de suas funções de defesa (neutrófilo e monócito/macrófago) e são incluídos sob a rubrica de ativação linfocitária. A ativação leucocitária resulta de várias vias de sinalização iniciadas nos leucócitos, gerando um aumento na concentração de Ca2+ no citosol e na ativação de enzimas como a proteíno-cinase C e a fosfolipase A2. As respostas funcionais induzidas na ativação dos leucócitos incluem:

� Produção de metabólitos do ácido araquidônico (resultante da ativação da fosfolipase A2 e do cálcio intracelular).

� Desgranulação e secreção de enzimas lisossomais e ativação do surto oxidativo; � Secreção de citocinas, que amplificam e regulam as reações inflamatórias; � Modulação das moléculas de adesão leucocitária.

OBS5: Os leucócitos apresentam vários receptores de superfície que estão envolvidos em sua ativação: receptores Toll-like (desempenham um papel essencial na resposta celular aos lipopolissacarídeos bacterianos e nucleotídios); vários receptores ligados à proteína G que atravessam a membrana sete vezes e reconhecem os microrganismos e alguns mediadores produzidos em reposta a infecções e lesão tecidual; receptores expressos por células fagocíticas para as citocinas que são produzidas durante a resposta imunológica; receptores para as opsoninas que promovem a fagocitose de microrganismos cobertos por diversas proteínas e encaminham os sinais que ativam a fagocitose. FAGOCITOSE A fagocitose e a liberação de enzimas pelos neutrófilos e macrófagos são responsáveis pela eliminação de agentes nocivos, constituindo, assim, dois dos maiores benefícios derivados do acúmulo de leucócitos no foco inflamatório. A fagocitose envolve três etapas distintas, mas relacionadas entre si:

• Reconhecimento e ligação: apesar de os neutrófilos e os macrófagos serem capazes de capturar bactérias e materiais estranhos sem a ligação de receptores específicos, a fagocitose de microrganismos e células mortas é tipicamente iniciada pelo reconhecimento das partículas por receptores expressos na superfície dos leucócitos (como os receptores de manose, açúcar que constitui moléculas encontradas na parede celular das bactérias). A eficácia da fagocitose é extremamente aumentada quando o organismo está opsonizado por

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proteínas específicas (opsoninas, como o C5a e C3a) para as quais as células fagocitárias expressam receptores de alta afinidade.

• Captura: a ligação de uma partícula ao receptor de um leucócito fagocitário inicia o processo de fagocitose: extensões do citoplasma (pseudópodes) se estendem em torno da partícula até engolfá-la em um fagossomo criado pela membrana plasmática da célula.

• Morte e degradação: a destruição do microrganismo é desempenhada em grande parte por mecanismos dependentes de oxigênio. A fagocitose estimula o surto de consumo de oxigênio, glicogenólise, aumento da oxidação da glicose e a produção de intermediários reativos do oxigênio (espécies reativas do O2). Depois que os microrganismos são mortos, eles são degradados dentro dos fagolisossomos pelas hidrolases armazenadas nos lisossomos.

TÉRMINO DA RESPOSTA INFLAMATÓRIA É de se esperar que um sistema de defesa do hospedeiro tão potente, com sua capacidade inerente de causar dano tecidual, precise de um controle rígido para minimizar o dano. Em parte, a inflamação diminui simplesmente porque os seus mediadores têm uma meia-vida curta, são degradados após serem liberados e são produzidos em surtos rápidos, somente enquanto o estímulo persiste. Além disso, vários sinais que atuam ativamente para terminar a reação são produzidos (como os derivados do ácido araquidônico, lipoxinas antiinflamatórias). MEDIADORES QUÍMICOS DA INFLAMAÇÃO Os mediadores se originam de proteínas plasmáticas ou de células envolvidas no processo inflamatório. Os mediadores derivados do plasma (como as proteínas do complemento, as cininas, etc) estão presentes no plasma na forma de precursores que devem ser ativados, geralmente por meio de uma série de clivagens proteolíticas. Os mediadores derivados de células normalmente estão armazenados em grânulos intracelulares que precisam ser secretados (como a histamina nos grânulos dos mastócitos) ou são sintetizados de novo (prostaglandinas, citocinas) em resposta a um estímulo. A produção de mediadores ativos é desencadeada por produtos microbianos ou por proteínas do hospedeiro, tais como as proteínas do complemento. A maioria dos mediadores desempenha sua atividade biológica ligando-se, inicialmente, a receptores específicos nas células alvo. Já outros, possuem atividade enzimática direta (como as proteases lisossomais). Um mediador pode, por si só, estimular a liberação de outros mediadores pelas células-alvo. Uma vez ativados e liberados pelas células, a maioria desses mediadores têm uma meia vida curta. OBS6: A maioria dos mediadores tem o potencial para causar efeitos danosos. AMINAS VASOATIVAS As duas aminas, histamina e serotonina, são especialmente importantes pois são armazenadas nas células, estando entre os primeiros mediadores a serem liberados durante a inflamação.

• Histamina: está distribuída por todos os tecidos, sendo que os mastócitos são sua fonte principal. A histamina pré-formada está presente nos grânulos dos mastócitos e é liberada pela desgranulação dessas células em resposta a vários estímulos: lesão física como trauma, frio ou calor; reações imunológicas envolvendo a ligação de anticorpos aos mastócitos; pelos fragmentos do complemento chamados de anafilatoxinas (C3a e C5a); proteínas leucocitárias que liberam histamina; neuropeptídeos (como a substancia P); e citocinas (IL-1 e IL-8).

• Serotonina (5-hidroxitriptamina): é um mediador vaso-ativo pré-formado com ações semelhantes às da histamina. Está presente nas plaquetas e nas células enterocromafins. A liberação de serotonina (e histamina) das plaquetas é estimulada quando ocorre a agregação plaquetária após o contato com colágeno, trombina, difosfato de adenosina (ADP) e complexo antígeno-anticorpo.

PROTEÍNAS PLASMÁTICAS

• Sistema complemento: é um conjunto de 20 proteínas (e seus produtos de clivagem) encontradas em maior concentração no plasma. É um sistema que atua tanto na resposta imune inata quanto na adquirida. As proteínas do complemento estão presentes no plasma na sua forma inativa, e são numeradas de C1 a C9. Muitas delas, quando ativadas, tornam-se proteínas proteolíticas que clivam outras proteínas do complemento, formando, assim, uma cascata capaz de gerar enorme amplificação enzimática. A etapa crítica no desenvolvimento das funções biológicas do complemento é a ativação do terceiro (e mais abundante) componente, o C3. A clivagem de C3 pode ser feita por três vias: a via clássica, que é desencadeada por fixação de C1 a um complexo antígeno-anticorpo (IgM e IgG); a via alternativa, que pode ser desencadeada por moléculas da superfície bacteriana, polissacarídios complexos, veneno de cobra e outras substâncias, na ausência de anticorpos; e a via da lecitina, na qual a lecitina plasmática que liga manose se une a

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carboidratos nos microrganismos e ativa C1 diretamente. Independente da via envolvida nas etapas iniciais da ativação do complemento, todas levam à formação de uma enzima ativa chamada C3 convertase, que quebra a C3 em dois fragmentos funcionalmente distintos: C3a e C3b. O C3a é liberado e o C3b se liga covalentemente à célula ou molécula onde o complemento está sendo ativado. O C3b, então, liga a fragmentos gerados anteriormente para formar a C5 convertase, que cliva C5 em C5a e C5b. O fragmento C5b remanescente se liga aos componentes posteriores (C6 – 9), culminando com a formação do chamado complexo de ataque à membrana (MAC, composto de várias moléculas de C9). Além da lise celular por meio do MAC, tem-se ainda os efeitos dos fragmentos proteolíticos formados pela ativação desse sistema:

� Fenômenos vasculares. C3a, C5a e, em menor extensão, C4a, são produtos da clivagem dos componentes correspondentes do complemento que estimulam a liberação de histaminas pelos mastócitos, aumentando, assim, a permeabilidade vascular e causando vasodilatação. Por esta ação, elas são chamadas de anafilatoxinas (por terem efeitos semelhantes aos mediadores do mastócitos envolvidos na reação anafilática). O C5a também ativa a via da lipoxigenase do metabolismo do ácido araquidônico nos neutrófilos e monócitos.

� Adesão, quimiotaxia e ativação dos leucócitos. O C5a (e o C3a) é um agente quimiotático potente para os neutrófilos, monócitos, eosinófilos e basófilos.

� Opsonização e fagocitose. O C3b e o produto de sua clivagem (iC3b), quando fixados a parede bacteriana, agem como opsoninas que facilitam a fagocitose por neutrófilos e macrófagos, os quais apresentam receptores de superfície para esses fragmentos do complemento.

• Sistema das cininas: o sistema das cininas gera peptídeos vasoativos a partir de proteínas plasmáticas. A

ativação deste sistema resulta na liberação da bradicinina, um nonapeptídeo vasoativo que aumenta a permeabilidade vascular e causa contração do músculo liso, dilatação de vasos sanguíneos e dor quando injetada na pele.

• Sistema da coagulação: este sistema e a inflamação são processos que estão intimamente relacionados. O sistema da coagulação está dividido em duas vias (a via intrínseca e a via extrínseca) que convergem, culminando na formação da fibrina. A trombina, enzima que cliva fibrinogênio, é a principal ligação entre o sistema da coagulação e a inflamação.

METABÓLITOS DO ÁCIDO ARAQUIDÔNICO: PROSTAGLANDINAS, LEUCOTRIENOS E LIPOXINAS Quando as células são ativadas por diversos estímulos, os lipídios em suas membranas são rapidamente remodelados para gerar mediadores lipídicos biologicamente ativos, os quais funcionam como sinais intracelulares ou extracelulares que afetam diversos processos biológicos, incluindo a inflamação e a homeostasia. O ácido araquidônico é um ácido graxo poliinsaturado contendo 20 átomos de carbono (ácido 5,8,11,14-eicosatetraenóico) derivado da dieta ou da conversão do ácido graxo essencial, ácido linoléico. Ele não se encontra livre na célula, mas na forma esterificada de fosfolipídio de membrana, sendo liberado desta forma quando sofre a ação da fosfolipase A2, que pode ser ativada por fatores físicos, químicos e mecânicos ou por outros mediadores (como a C5a). Os metabólitos do ácido araquidônico (também chamados de eicosanóides) são sintetizados por duas classes de enzimas: as cicloxigenases (gerando prostaglandinas e tromboxanos) e as lipoxigenases (leucotrienos e lipoxinas). Estes eicosanóides se unem aos receptores ligados à proteína G de vários tipos celulares e podem mediar virtualmente cada passo da inflamação. A cicloxigenase e a lipoxigenase produzem mediadores diferentes a partir do ácido araquidônico:

• Via da cicloxigenase: iniciada por duas enzimas diferentes (COX-1: constitutivamente expressa; e a COX-2: enzima cuja produção é induzida pelo processo inflamatório; admite-se ainda a COX-3: presente no centro termoregulador do hipotálamo), leva a geração das prostaglandinas. As mais importantes no processo inflamatório são PGE2, PGD2, PGF2α, PGI2 (prostaciclina) e a TxA2 (tromboxano). Note que o número indicado em cada representação significa o número de ligações duplas no composto.

� O TxA2, um potente agente de agregação plaquetária e vasoconstrictor, é instável e rapidamente convertido na sua forma inativa (TxB2).

� A prostaciclina (PGI2) é um vasodilatador e um potente inibidor da agregação plaquetária; também potencializa o aumento da permeabilidade e o efeito quimiotático de outros mediadores.

� As prostaglandinas também estão envolvidas na patogenia da dor e da febre. A PGE2 causa hiperalgesia, pois torna a pele sensível ao estímulos dolorosos.

� A PGD2, junto a PGE2 e PGF2α, causa vasodilatação e aumenta a permeabilidade das vênulas pós-capilares, potencializando, assim, o edema.

OBS5: Vale salientar, entretanto, que a COX-1 é responsável não somente pela produção de prostaglandinas envolvidas na inflamação, mas também atua na homeostasia (como no balanço hidroeletrolítico nos rins e do tônus vascular basal). Por outro lado, a COX-2 só estimula a produção de prostaglandinas envolvidas na reação inflamatória.

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Os antiinflamatórios não-esteroidais agem no intuito de inibir essas duas enzimas, ou seja, são inibidores da cicloxigenase (como a aspirina). Seria interessante, portanto, o uso de inibidores seletivos da COX-2, para evitar a inibição da COX-1, importante no processo de homeostasia.

• Via da lipoxigenase: os produtos iniciais são gerados por três lipoxigenases diferentes que só estão presentes em algumas células. A 5-lipoxigenase (5-LO) é a enzima predominante nos neutrófilos. Os leucotrienos, além de potentes agentes quimiotáticos e ativadores das respostas dos neutrófilos, são muito mais potentes do que a histamina com relação ao aumento da permeabilidade vascular e broncoespasmo.

FATOR DE ATIVAÇÃO DAS PLAQUETAS (PAF) O PAF é outro mediador bioativo derivado dos fosfolipídios que exerce suas ações através de um receptor ligado a uma única proteína G e seus efeitos são regulados por uma família de PAF acetil-hidrolases. Vários tipos celulares, incluindo plaquetas, basófilos (e mastócitos), neutrófilos, monócitos/macrófagos e células endoteliais, podem produzir PAF. Além da estimulação das plaquetas, o PAF causa vasoconstrição e broncodilatação. Ele também causa um aumento da adesão leucocitária no endotélio (aumentando a agregação dos leucócitos mediadas pelas integrinas), quimiotaxia, desgranulação e surto oxidativo. Assim, o PAF pode desencadear a maioria dos principais acontecimentos da inflamação. CITOCINAS E QUIMIOCINAS As citocinas são proteínas produzidas por vários tipos celulares (principalmente linfócitos e macrófagos ativados, mas também células do endotélio) que modulam a função de outros tipos celulares.

• Fator de Necrose Tumoral (TNF) e Interleucina-1 (IL-1): são duas principais citocinas que participam do processo inflamatório. Elas são produzidas principalmente pelos macrófagos ativados. A secreção de TNF e IL-1 pode ser estimulada por endotoxina e outros produtos microbianos, complexos imunes, lesão física e vários tipos de estímulos inflamatórios. No endotélio, eles induzem a síntese de moléculas de adesão endotelial e mediadores químicos, incluindo outras citocinas e quimiocinas, fatores de crescimento, eicosanóides e óxido nítrico (NO). A IL-1 e o TNF (assim como o IL-6) induzem as respostas sistêmicas da fase aguda associadas a infecções ou traumas (como febre, perda de apetite, sono de ondas lentas, etc).

• Quimiocinas: são uma família de proteínas pequenas que agem primariamente como quimiotáticos para tipos específicos de leucócitos. As quimiocinas exercem sua atividade ligando-se a receptores transmembrana ligados à proteína G.

ÓXIDO NÍTRICO O NO, um mediador pleiotrópico da inflamação, foi descoberto como um fator liberado pelas células endoteliais que causava vasodilatação, relaxando o músculo liso vascular, e foi, consequentemente, chamado de fator de relaxamento derivado do epitélio (FRED). O NO é sintetizado a partir da L-arginina pela enzima óxido nítrico sintase (NOS) e desempenha um papel importante nos componentes vascular e celular das reações inflamatórias. Ele é um potente vasodilatador devido a sua ação no músculo liso vascular. Além disso, o NO reduz a agregação plaquetária. Assim, a produção de NO é um mecanismo compensatório endógeno que reduz as respostas inflamatórias. Ocorrem anormalidades na produção endotelial de NO na aterosclerose, no diabetes e na hipertensão. RADICAIS LIVRES DERIVADOS DO OXIGÊNIO Os radicais livres derivados do oxigênio podem ser liberados pelos leucócitos no meio extracelular após a exposição a microrganismos, quimiocinas e complexos imunes, ou após uma provocação fagocitária. A liberação desses potentes radicais livres pode ser danosa para o hospedeiro. Elas estão implicados nas seguintes reações:

� Lesão à célula endotelial com o consequente aumento da permeabilidade vascular; � Inativação de antiprotease; � Lesão de outros tipos de célula.

NEUROPEPTÍDIOS Os neuropeptídios, assim como as aminas vasoativas e os eicosanóides discutidos anteriormente, participam na deflagração e propagação da resposta inflamatória. Os pequenos peptídeos, como a substância P e a neurocinina A, pertencem a uma família de neuropeptídeos traquicininas produzidas no sistema nervoso central e periférico. A substância P tem muitas funções biológicas, incluindo a transmissão de sinais dolorosos, regulação da pressão sanguínea, estimulação da secreção pelas células endócrinas e aumento da permeabilidade vascular.

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Arlindo Ugulino Netto – PATOLOGIA – MEDICINA P4 – 2009.1

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EFEITOS SISTÊMICOS DA INFLAMAÇÃO Os efeitos sistêmicos da inflamação ocorrem por decorrência das reatividades dos fatores exógenos agressores com os mecanismo de defesa do corpo como também por liberação das próprias citocinas endógenas, bem como o produto do seu metabolismo. Os efeitos sistêmicos incluem, entre outros:

• Febre causada pela liberação de IL-1, IL-2, IL-6 e Fator de Necrose Tumoral (FNT), considerados agente pirogênicos endógenos. IL-1 e FNT interagem com receptores vasculares nos centros termoreguladores do hipotálamo, induzindo a ação da cicloxigenase-3 (COX-3), que quebra ácido araquidônico em prostaglandina E2 (PGE2), resultando na estimulação dos nervos autonômicos, vasoconstricção dos vasos cutâneos e retenção de calor na forma de febre.

• Leucocitose que ocorre devido a dois fatores: (1) liberação acelerada de células medulares, induzida por IL-1 e FNT; e (2) proliferação dos precursores na medula óssea por fatores estimulantes de colônia (FEC);

• Elaboração de proteínas de fase aguda pelo fígado (por exemplo: proteína C reativa, amilóide A) induzida pela liberação de IL-1, FNT e IL-6;

• Outras reações de fase aguda como sonolência, perda de apetite, hipotensão e lipólise. RESULTADOS DA INFLAMAÇÃO AGUDA

� Resolução completa: o próprio processo inflamatório foi capaz de destruir o agente nocivo e, por conseguinte, o processo foi atenuado por substâncias cujas funções se remetem para tais fins (como o NO). Neste caso, o exsudato que eventualmente surgiu na região do foco inflamatório é reabsorvido e a área lesada é restaurada. Este caso, portanto, ocorre normalmente quando a lesão é limitada, de curta duração ou quando houver pouca destruição tissular e as células parenquimatosas danificadas podem ser regeneradas.

� Cicatrização pela substituição do tecido conjuntivo: ocorre após uma destruição tecidual considerável, quando a lesão inflamatória envolve tecidos incapazes de ser regenerar, ou quando existe um abundante exsudato de fibrina.

� Formação de abscesso: coleção localizada de secreção purulenta, células necrosadas, neutrófilos e o microrganismo morto que desencadeou o processo.

� Progressão tecidual a inflamação crônica: a transição de aguda para crônica ocorre quando não há uma resolução da resposta inflamatória aguda devido à persistência do agente nocivo ou a alguma interferência com o processo normal de cicatrização.