micro e pequenas empresas dificuldades e atrativos...

2
M I C R O E P E Q U E N A S E M P R E S A S 20 por Thiago Romero Dificuldades e atrativos presentes na exportação Empresas de pequeno porte têm papel fundamental na economia brasileira, seja pela contribuição significativa no Produto Interno Bruto (PIB), na geração de novos empregos ou no preenchimento de lacu- nas de mercado deixadas pelas grandes empresas. Mas, quando a questão é comércio exterior, micro e peque- nas empresas (MPE) têm baixa participação do ponto de vista financeiro: apesar de sete mil MPE´s brasileiras, aproximada- mente, exportarem seus produtos e processos, de um total de 11,2 mil companhias exportadoras em todo o país, elas detêm apenas 2,4% do total de recursos movimentados em exportações, que foi de US$ 118 bilhões em 2005, considerando também as médias e grandes empresas. Em países desenvolvi- dos, a participação das MPE´s che- ga a mais de 40% do volume total de recursos exportados. O principal entrave que expli- ca essa baixa participação é a polí- tica cambial brasileira, afirma o consultor em administração de empresas, Fernando Martinson Ruiz, que defendeu, recentemen- te, dissertação de mestrado sobre o tema, na Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade (FEA) da Universidade de São Paulo (USP). "Muitas vezes o problema não são as taxas des- favoráveis, mas a instabilidade das cota- ções e do mercado, que dificulta ao expor- tador traçar suas estratégias no longo prazo", explica. Excesso de burocracia aduaneira e dificuldades logísticas para o transpor- te de mercadorias, incluindo deficiên- cias em portos, estradas e aeroportos, vêm em seguida. A falta de políticas governamentais de incentivo à exporta- ção e a dificuldade de obtenção de cré- dito foram o quarto e o quinto obstácu- los apontados como de maior importância. "O Brasil possui cer- ca de 5 milhões de empresas em atividade, sendo que mais de 90% são micro e pequenas, exportado- ras ou não", garante Ruiz. "Apesar desse cenário refletir em um gran- de número de micro e pequenas empresas exportadoras, infeliz- mente o volume de recursos expor- tados é irrisório perto das grandes companhias nacionais", ressalta. Para o economista Fernando Ribeiro, da Fundação Centro de Estudos do Comércio Exterior (Funcex), porém, a baixa participa- ção financeira das MPE´s não é reflexo da quantidade de produtos exportados ou de preços baratos ou caros. "O grande problema é o valor médio exportado por cada fir- ma, que é muito baixo. Isto porque, na maioria dos casos, as firmas não se mantêm muito tempo na expor- CÂMBIO INSTÁVEL, EXCESSO DE BUROCRACIA E DIFICULDADES LOGÍSTICAS SÃO AS PRINCIPAIS BARREIRAS NA CONQUISTA DO MERCADO EXTERNO

Upload: others

Post on 26-May-2020

0 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

Page 1: MICRO E PEQUENAS EMPRESAS Dificuldades e atrativos ...inovacao.scielo.br/pdf/inov/v2n5/a10v02n5.pdfdito foram o quarto e o quinto obstácu-los apontados como de maior importância

M I C R O E P E Q U E N A S E M P R E S A S

2 0

por Thiago Romero

Dificuldades e atrativos presentes na exportação

Empresas de pequeno porte têm papelfundamental na economia brasileira, sejapela contribuição significativa no ProdutoInterno Bruto (PIB), na geração de novosempregos ou no preenchimento de lacu-nas de mercado deixadas pelas grandesempresas. Mas, quando a questão écomércio exterior, micro e peque-nas empresas (MPE) têm baixaparticipação do ponto de vistafinanceiro: apesar de sete milMPE´s brasileiras, aproximada-mente, exportarem seus produtose processos, de um total de 11,2 milcompanhias exportadoras em todoo país, elas detêm apenas 2,4% dototal de recursos movimentadosem exportações, que foi de US$ 118bilhões em 2005, considerandotambém as médias e grandesempresas. Em países desenvolvi-dos, a participação das MPE´s che-ga a mais de 40% do volume totalde recursos exportados.

O principal entrave que expli-ca essa baixa participação é a polí-tica cambial brasileira, afirma oconsultor em administração deempresas, Fernando MartinsonRuiz, que defendeu, recentemen-te, dissertação de mestrado sobreo tema, na Faculdade de Economia,

Administração e Contabilidade (FEA) daUniversidade de São Paulo (USP). "Muitasvezes o problema não são as taxas des-favoráveis, mas a instabilidade das cota-ções e do mercado, que dificulta ao expor-tador traçar suas estratégias no longoprazo", explica.

Excesso de burocracia aduaneira edificuldades logísticas para o transpor-te de mercadorias, incluindo deficiên-cias em portos, estradas e aeroportos,vêm em seguida. A falta de políticasgovernamentais de incentivo à exporta-ção e a dificuldade de obtenção de cré-dito foram o quarto e o quinto obstácu-

los apontados como de maiorimportância. "O Brasil possui cer-ca de 5 milhões de empresas ematividade, sendo que mais de 90%são micro e pequenas, exportado-ras ou não", garante Ruiz. "Apesardesse cenário refletir em um gran-de número de micro e pequenasempresas exportadoras, infeliz-mente o volume de recursos expor-tados é irrisório perto das grandescompanhias nacionais", ressalta.

Para o economista FernandoRibeiro, da Fundação Centro deEstudos do Comércio Exterior(Funcex), porém, a baixa participa-ção financeira das MPE´s não éreflexo da quantidade de produtosexportados ou de preços baratosou caros. "O grande problema é ovalor médio exportado por cada fir-ma, que é muito baixo. Isto porque,na maioria dos casos, as firmas nãose mantêm muito tempo na expor-

CÂMBIO INSTÁVEL, EXCESSO DE BUROCRACIA E DIFICULDADES LOGÍSTICAS SÃO AS PRINCIPAIS BARREIRAS NA CONQUISTA DO MERCADO EXTERNO

inova20-21exporta.qxd 10/5/2006 3:40 PM Page 2

Page 2: MICRO E PEQUENAS EMPRESAS Dificuldades e atrativos ...inovacao.scielo.br/pdf/inov/v2n5/a10v02n5.pdfdito foram o quarto e o quinto obstácu-los apontados como de maior importância

2 1

mente para isso", conclui o economistada Funcex.

Em seu mestrado, Fernando Ruizutilizou a definição usada pelo Sebraee pela Funcex, para classificar as empre-sas: micro são aquelas com menos de20 funcionários e com um volume deexportação anual menor que US$ 300mil; pequena empresa tem menos de100 funcionários e receitas anuais comexportação menores que US$ 2,5milhões. As empresas estudadas são dotipo industrial, uma vez que as micro epequenas empresas não-industriais oude serviços contribuem ainda menospara o comércio exterior. Sua partici-pação não chega a 1% do total de recur-sos exportados no país.

Foram analisadas informações obti-das em entrevistas com 102 micro epequenos empresários do estado de SãoPaulo, de várias áreas e que exportamcom freqüência. Além disso, o pesquisa-dor realizou um levantamento em pro-fundidade em nove empresas dos seto-res têxtil, calçadista e de equipamentos

odontológicos. Outros dadosforam colhidos a partir deuma revisão detalhada de arti-gos e obras publicadas.

MOTIVAÇÃO PARA EXPORTARAlém dos obstáculos, o

pesquisador da USP listoutambém as principais moti-vações para exportar, combase em depoimentos de diri-gentes das empresas. A prin-cipal delas é a perspectiva deelevar as margens de lucro.Escoar o excedente internode produtos no mercado inter-nacional e diversificar clien-tes são razões que aparecemem seguida. Além disso, "man-ter clientes no exterior paracompensar as vendas quan-

do o mercado interno estiver desfavorá-vel" foi um dos comentários feito por umentrevistado, que traduz bem o pensa-mento dos micro e pequenos empresá-rios analisados. "Por outro lado, a maio-ria das MPE´s não dá importância àsmotivações estruturais como fator deci-sivo para o comércio exterior, tais comoa possibilidade de aprendizado com osprocessos envolvidos na exportação,valorização da marca e da imagem glo-bal da empresa e melhoria de qualidadedos produtos e serviços oferecidos", afir-ma Ruiz.

Outro aspecto destacado pelo pes-quisador foi a falta de conhecimentosobre os procedimentos para exportar."Alguns micro e pequenos empresáriosnão sabem, por exemplo, quais são osdocumentos necessários e acabam res-ponsabilizando o governo e o excessode burocracia pela falta de oportunida-des. Exportar pode ser muito mais sim-ples do que eles imaginam e, quanto maiso empresário exporta, menos barreirasvão surgindo devido ao grande aprendi-zado que se adquire", conclui.

tação e, portanto, não conseguem aumen-tar de forma significativa os volumes derecursos exportados", explica Ribeiro,responsável pela elaboração do boletim"Desempenho Exportador das Micro ePequenas Empresas Industriais Brasi-leiras", publicado pelo Serviço Brasileirode Apoio às Micro e Pequenas Empresas(Sebrae).

Ele aponta a falta de planejamentocomo outra barreira relevante às expor-tações. "Pelo menos 50% das MPE´s quese iniciam na exportação em um deter-minado ano deixam de exportar já noano seguinte. Após cinco anos, então,apenas 20% delas continuam exportan-do", lamenta Ribeiro. Para ele, muitasMPE`s se iniciam nas exportações pormotivos oportunistas, como um câmbioexcepcionalmente bom ou a fraqueza dademanda interna. "Quando as condiçõesse modificam, elas deixam de exportar.Isto é um claro sinal de falta de planeja-mento para enfrentar o mercado exter-no, ou seja, a maioria das MPE´s que ten-ta exportar não se prepara adequada-

Manoel F. F. Souza/

Codesp

Navio atracado no terminal de

contêineres da SantosBrasil, margem

esquerda do porto de Santos

inova20-21exporta.qxd 10/5/2006 3:40 PM Page 3