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2019 GENÉTICA Prof. Dr. Alexis Trott

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Page 1: Genética - UNIASSELVI

2019

Genética

Prof. Dr. Alexis Trott

Page 2: Genética - UNIASSELVI

Copyright © UNIASSELVI 2019

Elaboração:

Prof. Dr. Alexis Trott

Revisão, Diagramação e Produção:

Centro Universitário Leonardo da Vinci – UNIASSELVI

Ficha catalográfica elaborada na fonte pela Biblioteca Dante Alighieri

UNIASSELVI – Indaial.

Impresso por:

T858g

Trott, Alexis

Genética. / Alexis Trott. – Indaial: UNIASSELVI, 2019.

213 p.; il.

ISBN 978-85-515-0261-7

1.Genética - Brasil. II. Centro Universitário Leonardo Da Vinci.

CDD 575.1

Page 3: Genética - UNIASSELVI

III

apresentaçãoOlá, acadêmico! Vamos iniciar os estudos do Livro de Estudos de

Genética. Este livro está dividido em três unidades e tem o intuito de apresentar e reforçar diferentes temas de Genética. As pesquisas em Genética têm avançado rapidamente, pois atualmente dispomos de técnicas extremamente avançadas para os estudos do DNA, RNA e proteínas. Este livro procura aliar os conceitos fundamentais da Genética e as novas informações obtidas por pesquisas avançadas.

Assim, este livro traz conteúdos de Genética gerais para você estar bem preparado para o Enade e também para o campo profissional desejado. Podemos começar esta fantástica viagem pelo universo da Genética?

Na primeira unidade, estudaremos os princípios da hereditariedade, com foco na Genética Clássica. Uma base sólida é fundamental para o entendimento dos avanços atuais em Genética. Nesta unidade, estudaremos as leis de Mendel e suas extensões, bem como as bases cromossômicas do Mendelismo e o Mapeamento Gênico.

A segunda unidade nos traz os conhecimentos acerca da Genética Molecular, desde a estrutura dos ácidos nucleicos, passando pelo dogma central da Genética Molecular, até as técnicas e principais avanços no campo da engenharia genética.

Caro acadêmico, a partir destes conhecimentos, poderemos estudar, na terceira unidade, a genética humana e médica. Neste segmento do livro, abordaremos as questões genéticas pertinentes à espécie humana, bem como os estudos das doenças genéticas e seus diagnósticos. Abordaremos ainda os aspectos éticos concernentes aos estudos, procedimentos e pesquisas neste importante campo da ciência.

Esperamos que este estudo possa auxiliá-lo na compreensão da genética em seus variados temas. Desta forma, você estará preparado para o Enade e para as suas futuras atividades profissionais, principalmente na área de Ciências Biológicas e Saúde.

Bons estudos!

Prof. Dr. Alexis Trott, Ph.D.

Page 4: Genética - UNIASSELVI

IV

Você já me conhece das outras disciplinas? Não? É calouro? Enfim, tanto para você que está chegando agora à UNIASSELVI quanto para você que já é veterano, há novidades em nosso material.

Na Educação a Distância, o livro impresso, entregue a todos os acadêmicos desde 2005, é o material base da disciplina. A partir de 2017, nossos livros estão de visual novo, com um formato mais prático, que cabe na bolsa e facilita a leitura.

O conteúdo continua na íntegra, mas a estrutura interna foi aperfeiçoada com nova diagramação no texto, aproveitando ao máximo o espaço da página, o que também contribui para diminuir a extração de árvores para produção de folhas de papel, por exemplo.

Assim, a UNIASSELVI, preocupando-se com o impacto de nossas ações sobre o ambiente, apresenta também este livro no formato digital. Assim, você, acadêmico, tem a possibilidade de estudá-lo com versatilidade nas telas do celular, tablet ou computador. Eu mesmo, UNI, ganhei um novo layout, você me verá frequentemente e surgirei para apresentar dicas de vídeos e outras fontes de conhecimento que complementam o assunto em questão.

Todos esses ajustes foram pensados a partir de relatos que recebemos nas pesquisas institucionais sobre os materiais impressos, para que você, nossa maior prioridade, possa continuar seus estudos com um material de qualidade.

Aproveito o momento para convidá-lo para um bate-papo sobre o Exame Nacional de Desempenho de Estudantes – ENADE. Bons estudos!

NOTA

Olá acadêmico! Para melhorar a qualidade dos materiais ofertados a você e dinamizar ainda mais os seus estudos, a Uniasselvi disponibiliza materiais que possuem o código QR Code, que é um código que permite que você acesse um conteúdo interativo relacionado ao tema que você está estudando. Para utilizar essa ferramenta, acesse as lojas de aplicativos e baixe um leitor de QR Code. Depois, é só aproveitar mais essa facilidade para aprimorar seus estudos!

UNI

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VII

UNIDADE 1 – PRINCÍPIOS DA HEREDITARIEDADE ................................................................. 1

TÓPICO 1 – LEIS DE MENDEL ............................................................................................................ 31 INTRODUÇÃO ..................................................................................................................................... 32 CRUZAMENTOS MONO-HÍBRIDOS – DOMINÂNCIA E SEGREGAÇÃO ......................... 43 CRUZAMENTOS DI-HÍBRIDOS – DISTRIBUIÇÃO INDEPENDENTE ................................ 7RESUMO DO TÓPICO 1........................................................................................................................ 12AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................. 13

TÓPICO 2 – EXTENSÕES DO MENDELISMO ................................................................................ 151 INTRODUÇÃO ..................................................................................................................................... 152 DOMINÂNCIA INCOMPLETA E CODOMINÂNCIA ................................................................ 153 ALELOS MÚLTIPLOS ......................................................................................................................... 174 GENÉTICA QUANTITATIVA ........................................................................................................... 185 A RELAÇÃO ENTRE OS GENES E AS PROTEÍNAS ................................................................... 206 EFEITOS AMBIENTAIS NA EXPRESSÃO DOS GENES ............................................................ 207 PENETRÂNCIA E EXPRESSIVIDADE ............................................................................................ 218 INTERAÇÕES GÊNICAS ................................................................................................................... 229 EPISTASIA ............................................................................................................................................. 2310 PLEIOTROPIA .................................................................................................................................... 2511 ENDOGAMIA ..................................................................................................................................... 26RESUMO DO TÓPICO 2........................................................................................................................ 28AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................. 29

TÓPICO 3 – BASES CROMOSSÔMICAS DO MENDELISMO .................................................... 311 INTRODUÇÃO ..................................................................................................................................... 312 OS CROMOSSOMOS ......................................................................................................................... 313 GENES LIGADOS AO SEXO EM HUMANOS .............................................................................. 334 DETERMINAÇÃO DO SEXO ............................................................................................................ 355 COMPENSAÇÃO DE DOSE DE GENES LIGADOS AO X ......................................................... 376 POLIPLOIDIA E ANEUPLOIDIA ..................................................................................................... 377 ALTERAÇÕES ESTRUTURAIS DOS CROMOSSOMOS .......................................................... 38RESUMO DO TÓPICO 3........................................................................................................................ 43AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................. 45

TÓPICO 4 – MAPAS CROMOSSÔMICOS ........................................................................................ 471 INTRODUÇÃO ..................................................................................................................................... 472 LIGAÇÃO, RECOMBINAÇÃO E CROSSING-OVER ................................................................... 473 MAPEAMENTO CROMOSSÔMICO .............................................................................................. 484 MAPEAMENTO CITOGENÉTICO .................................................................................................. 515 RECOMBINAÇÃO E EVOLUÇÃO ................................................................................................... 52LEITURA COMPLEMENTAR ............................................................................................................... 54RESUMO DO TÓPICO 4........................................................................................................................ 56AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................. 58

sumário

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VIII

UNIDADE 2 – GENÉTICA MOLECULAR ......................................................................................... 59

TÓPICO 1 – OS ÁCIDOS NUCLEICOS E A CROMATINA........................................................... 611 INTRODUÇÃO ..................................................................................................................................... 612 ESTRUTURA E FUNÇÃO DOS ÁCIDOS NUCLEICOS .............................................................. 623 ESTRUTURA CROMOSSÔMICA EM PROCARIOTOS E EUCARIOTOS ............................. 724 GENES E GENOMAS .......................................................................................................................... 765 ELEMENTOS GENÉTICOS MÓVEIS .............................................................................................. 79RESUMO DO TÓPICO 1........................................................................................................................ 81AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................. 83

TÓPICO 2 – TRANSMISSÃO E MANUTENÇÃO DA INFORMAÇÃO GENÉTICA .............. 851 INTRODUÇÃO ..................................................................................................................................... 852 REPLICAÇÃO DO DNA ..................................................................................................................... 863 TRANSCRIÇÃO E PROCESSAMENTO DE RNA ........................................................................ 964 TRADUÇÃO E O CÓDIGO GENÉTICO ......................................................................................... 1055 MUTAÇÃO E REPARO DO DNA ..................................................................................................... 1126 CONTROLE DA EXPRESSÃO GÊNICA EM PROCARIOTOS .................................................. 1167 CONTROLE DA EXPRESSÃO GÊNICA EM EUCARIOTOS ..................................................... 1198 GENÔMICA E O PROJETO GENOMA HUMANO ..................................................................... 121RESUMO DO TÓPICO 2........................................................................................................................ 122AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................. 124

TÓPICO 3 – TÉCNICAS DE BIOLOGIA MOLECULAR ................................................................ 1271 INTRODUÇÃO ..................................................................................................................................... 1272 IDENTIFICAÇÃO, AMPLIFICAÇÃO E CLONAGEM DE GENES ........................................... 1283 BIBLIOTECAS DE DNA ..................................................................................................................... 1384 BIOINFORMÁTICA ............................................................................................................................ 139LEITURA COMPLEMENTAR ............................................................................................................... 141RESUMO DO TÓPICO 3........................................................................................................................ 147AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................. 148

UNIDADE 3 – GENÉTICA MÉDICA .................................................................................................. 151

TÓPICO 1 – HERANÇA E DOENÇAS GENÉTICAS EM HUMANOS ........................................ 1531 INTRODUÇÃO ..................................................................................................................................... 1532 HERANÇA GENÉTICA ....................................................................................................................... 1533 DOENÇAS GENÉTICAS EM HUMANOS ..................................................................................... 157RESUMO DO TÓPICO 1........................................................................................................................ 162AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................. 163

TÓPICO 2 – CITOGENÉTICA HUMANA ......................................................................................... 1651 INTRODUÇÃO ..................................................................................................................................... 1652 CITOGENÉTICA HUMANA ............................................................................................................. 1653 MITOSE – DIVISÃO CELULAR EQUACIONAL .......................................................................... 1674 MEIOSE – DIVISÃO CELULAR REDUCIONAL ......................................................................... 1695 CROMOSSOMOPATIAS .................................................................................................................... 171RESUMO DO TÓPICO 2........................................................................................................................ 182AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................. 183

TÓPICO 3 – GENÉTICA MÉDICA NA ERA DA GENÔMICA ..................................................... 1851 INTRODUÇÃO ..................................................................................................................................... 185

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IX

2 BASES GENÉTICAS DO CÂNCER .................................................................................................. 1863 TERAPIA GÊNICA ............................................................................................................................... 1914 FARMACOGENÔMICA E NUTRIGENÔMICA ........................................................................... 1935 DIAGNÓSTICOS MOLECULARES DE DOENÇAS GENÉTICAS ........................................... 1946 HEREDOGRAMAS .............................................................................................................................. 1997 ÉTICA E GENÉTICA ............................................................................................................................ 2028 DIVERSIDADE DO GENOMA E EVOLUÇÃO ............................................................................. 203LEITURA COMPLEMENTAR ............................................................................................................... 205RESUMO DO TÓPICO 3........................................................................................................................ 207AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................. 209REFERÊNCIAS ......................................................................................................................................... 213

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UNIDADE 1

PRINCÍPIOS DA HEREDITARIEDADE

OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM

PLANO DE ESTUDOS

A partir do estudo desta unidade, você deverá ser capaz de:

• compreender as bases da genética clássica;

• fornecer as condições necessárias para analisar, através dos princípios básicos da Genética, o porquê das semelhanças e das diferenças entre os indivíduos em cruzamentos experimentais, em famílias e nas populações;

• possibilitar o desenvolvimento do raciocínio crítico e interpretação do de-senvolvimento científico na área da genética.

Esta unidade está dividida em quatro tópicos. No decorrer da unidade você encontrará autoatividades com o objetivo de reforçar o conteúdo apresentado.

TÓPICO 1 – LEIS DE MENDEL

TÓPICO 2 – EXTENSÕES DE MENDELISMO

TÓPICO 3 – BASES CROMOSSÔMICAS DE MENDELISMO

TÓPICO 4 – MAPAS CROMOSSÔMICOS

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TÓPICO 1UNIDADE 1

LEIS DE MENDEL

1 INTRODUÇÃOA origem da genética está baseada nos trabalhos de Gregor Mendel

(1822-1844), um monge austríaco do século XIX. Mendel estudou a herança de diferentes características em ervilhas, cultivadas em um jardim do mosteiro onde vivia. A redescoberta dos trabalhos de Mendel, no século XX, deflagrou uma série de estudos sobre a genética de animais, vegetais e de microrganismos, sendo que hoje compreendemos os fatores hereditários responsáveis por nossas características, os chamados genes.

A herança genética sempre despertou muita curiosidade, e as descobertas científicas sobre os genomas de diferentes organismos têm apresentado um importante impacto na sociedade atual. Os padrões de herança genética e o funcionamento do genoma podem explicar a determinação das características dos indivíduos, e também ajudar a entender outras questões, como a origem da vida.

Com o desenvolvimento das técnicas de Biologia Molecular e manipulação genética, atualmente temos um desenvolvimento científico e tecnológico admirável, que nos influencia enormemente, como na saúde, por exemplo. Os assuntos em genética podem ser muitas vezes polêmicos, entretanto, é evidente que os benefícios proporcionados por essas descobertas e pelos avanços tecnológicos são mais importantes que as polêmicas levantadas, embora os aspectos éticos sejam considerados extremamente importantes em tal desenvolvimento. Todo o conhecimento em genética, obtido por mais de cem anos, tem gerado uma revolução no modo de vida atual de nossa sociedade. A expectativa atual é que a capacidade de interferir no genoma celular possa se tornar realidade em processos de terapia na Medicina, sendo que novas e promissoras abordagens de terapia gênica podem revolucionar a área da saúde.

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UNIDADE 1 | PRINCÍPIOS DA HEREDITARIEDADE

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2 CRUZAMENTOS MONO-HÍBRIDOS – DOMINÂNCIA E SEGREGAÇÃO

Caro acadêmico, primeiramente, devemos entender que Mendel, em seus estudos com ervilhas, trabalhou com uma característica de cada vez, evitando desorientação com as possíveis combinações de resultados que poderiam surgir ao considerar várias características ao mesmo tempo.

Em um experimento, Mendel realizou a fertilização cruzada, ou cruzamento, de ervilhas altas e anãs para investigar a herança da altura (Figura 1). Gregor Mendel retirou as anteras de uma variedade e depositou pólen da outra variedade sobre seu estigma, órgão na parte superior do pistilo que conduz ao ovário. As sementes produzidas pelos cruzamentos foram cultivadas, produzindo híbridos uniformemente altos. Mendel observou, portanto, o aparente desaparecimento da característica anã na prole do cruzamento, pois todas as plantas híbridas eram altas. A fim de analisar a constituição hereditária desses híbridos altos, Mendel promoveu a autofertilização nos mesmos. Ao examinar a prole resultante da autofertilização dos híbridos altos, constatou a presença de plantas altas e anãs. Das 1.064 ervilhas da prole, 787 eram altas e 277 eram anãs, uma razão aproximada de 3:1. Portanto, Mendel observou o reaparecimento da característica anã. As plantas híbridas produzidas no cruzamento das variedades alta e anã eram capazes de produzir plantas anãs. Mendel deduziu que esses híbridos tinham um fator genético latente para nanismo, mascarado pela expressão de outro fator para a altura elevada, e considerou que o fator latente era recessivo e que o fator expresso era dominante. Também inferiu que esses fatores recessivo e dominante se separaram quando as plantas híbridas se reproduziram, explicando o reaparecimento da característica anã na geração seguinte.

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TÓPICO 1 | LEIS DE MENDEL

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FIGURA 1 – CRUZAMENTOS DE MENDEL PARA VARIEDADES ALTA E ANÃ DE ERVILHAS

FONTE: Snustad, Simmon (2017, s. p. )

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UNIDADE 1 | PRINCÍPIOS DA HEREDITARIEDADE

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Mendel fez outros experimentos para estudar a herança de seis outras características: textura da semente, cor da semente, formato da vagem, cor da vagem, cor da flor e posição da flor. Em cada cruzamento mono-híbrido, Mendel observou que apenas uma das duas características contrastantes aparecia nos híbridos e que a autofertilização desses híbridos produzia dois tipos de prole, apresentando novamente as características do cruzamento mono-híbrido, sempre em uma razão de 3:1, por exemplo, ao estudar a textura das sementes, os híbridos por autofertilização apresentaram um resultado com 5.474 lisas e 1.850 rugosas, totalizando 7.324 ervilhas. Assim, cada característica estudada por Mendel parecia ser controlada por um fator hereditário existente em duas formas, uma dominante e outra recessiva. Esses fatores agora são denominados genes. As formas dominante e recessiva dos genes são denominadas alelos, ou seja, os alelos são formas alternativas de um gene.

As variedades geneticamente puras, alta e anã, são homozigotas para diferentes alelos de um gene que controla a altura da planta. O alelo recessivo para o nanismo é simbolizado por d; o alelo para a altura elevada é dominante e simbolizado pela letra maiúscula D. Portanto, as linhagens de ervilhas alta e anã são simbolizadas por DD e dd, respectivamente, sendo ambos homozigotos, pois apresentam o mesmo alelo (Figura 2). Um indivíduo com ambos os alelos (Dd) é dito heterozigoto. A constituição alélica de cada linhagem é seu genótipo. No entanto, a aparência de cada linhagem, alta ou anã, é seu fenótipo.

FIGURA 2 – REPRESENTAÇÃO DO CRUZAMENTO ENTRE ERVILHAS ALTAS E ANÃS

FONTE: Snustad, Simmon (2017, s.p. )

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TÓPICO 1 | LEIS DE MENDEL

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Como linhagens parentais, as ervilhas alta e anã constituem a geração P. A prole híbrida é denominada primeira geração filial, ou F1. Como cada genitor contribui igualmente para a prole, o genótipo das plantas F1 é Dd, ou seja, são heterozigotas para os alelos do gene que controla a altura. O fenótipo é igual ao da linhagem parental DD, porque D é dominante em relação a d. Durante a meiose, na produção dos gametas, as plantas da F1 produzem dois tipos de gametas, D e d, em iguais proporções, ou um processo de segregação de alelos.

Depois da autofertilização, os dois tipos de gametas produzidos por heterozigotos podem se unir de todas as maneiras possíveis. Assim, eles produzem quatro tipos de zigotos (DD, Dd, dD e dd). Entretanto, D é dominante sobre d, e três desses genótipos têm o mesmo fenótipo. Desta forma, na geração denominada F2, as plantas são altas ou anãs, em uma razão de 3:1.

Caro acadêmico, os resultados observados por Mendel podem ser explicados da seguinte forma:

• Cada indivíduo possui um par de alelos responsável pelo aparecimento de uma determinada característica.

• Os alelos são recebidos dos indivíduos paterno e materno, sendo que cada um contribui com um alelo.

• Quando um indivíduo apresenta dois alelos diferentes, pode ocorrer o aparecimento de uma única característica (alelo dominante) e a outra não (alelo recessivo). Estamos falando do princípio da dominância: em um heterozigoto, um alelo pode ocultar a presença de outro. Alguns alelos determinam o fenótipo, mesmo quando estão presentes em cópia única.

• Na formação dos gametas, os alelos aparecem em dose simples, em que cada gameta apresenta apenas um alelo. No processo de segregação, em um heterozigoto, dois alelos diferentes segregam-se um do outro durante a formação dos gametas.

Esta última conclusão é conhecida como primeira lei de Mendel. Cada caráter é condicionado por um par de alelos segregados na formação dos gametas.

3 CRUZAMENTOS DI-HÍBRIDOS – DISTRIBUIÇÃO INDEPENDENTE

Prezado acadêmico, Mendel foi mais longe em seus estudos e também fez experimentos com plantas que diferiam em duas características. Gregor Mendel cruzou plantas que produziam sementes amarelas e lisas com plantas que produziam sementes verdes e rugosas, o que chamamos agora de cruzamento di-híbrido, pois envolve duas características (Figura 3). Ele queria descobrir se a herança das duas características da semente, cor e textura, era independente ou não. A geração F1 mostrou apenas sementes amarelas e lisas, portanto, os alelos para

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UNIDADE 1 | PRINCÍPIOS DA HEREDITARIEDADE

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essas duas características eram dominantes. Mendel permitiu a autofertilização destas plantas e classificou as sementes da F2 segundo o fenótipo, observando-se uma clara distribuição fenotípica de 9:3;3;1, como pode ser verificado na Figura 3.

FIGURA 3 – CRUZAMENTOS ENTRE ERVILHAS DE SEMENTES AMARELAS E LISAS E ERVILHAS DE SEMENTES VERDES E RUGOSAS

FONTE: Snustad, Simmon (2017, s. p. )

As quatro classes fenotípicas na F2 representam todas as combinações possíveis das características de cor e textura. As quatro classes têm a seguinte razão aproximada:

• 9 amarelas e lisas• 3 verdes e lisas• 3 amarelas e rugosas• 1 verde e rugosa

O que ficou claro neste estudo de Mendel é que cada característica era controlada por um gene diferente com dois alelos, e os dois genes tinham herança independente. Agora, acadêmico, podemos analisar os resultados desse cruzamento di-híbrido, designando cada gene por uma letra (Figura 4). Os dois alelos do gene da cor da semente são g (verde) e G (amarela), e os alelos do gene da textura da semente são w (rugosa) e W (lisa). As linhagens parentais devem ser duplamente homozigotas, ou seja, plantas com sementes amarelas e lisas são GG WW e plantas com sementes verdes e rugosas são gg ww. Os gametas haploides produzidos por uma planta diploide contêm uma cópia de cada gene, como já vimos anteriormente no cruzamento mono-híbrido. Desta forma, os gametas de uma planta GG WW contêm obrigatoriamente os alelos G e W. Já uma planta gg ww apresenta gametas com os alelos g e w. A fertilização cruzada desses dois tipos de gametas gera híbridos F1 duplamente heterozigotos (Gg Ww), e o fenótipo de sementes amarelas e lisas indica que os alelos G e W são dominantes.

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TÓPICO 1 | LEIS DE MENDEL

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O princípio da segregação independente prevê que os híbridos da F1 produzam gametas com quatro genótipos diferentes: G W, G w, g W e g w, com a mesma frequência. Considerando tal pressuposto, a autofertilização na F1 produz um conjunto de 16 genótipos zigóticos. Podemos verificar os possíveis zigotos por combinação sistemática dos gametas, como mostra a Figura 4.

FIGURA 4 – REPRESENTAÇÃO DO CRUZAMENTO DI-HÍBRIDO DE MENDEL

FONTE: Snustad, Simmon (2017, s. p.)

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UNIDADE 1 | PRINCÍPIOS DA HEREDITARIEDADE

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Prezado acadêmico, a partir desses estudos, foi enunciada a segunda lei de Mendel ou lei da segregação independente. Ao considerar um cruzamento, envolvendo duas ou mais características, os alelos de ambos os genes são segregados de forma independente durante a formação dos gametas que se recombinam ao acaso e formam todas as combinações possíveis na geração de zigotos.

Caso se conheça a base genética de uma característica, pode-se usar os princípios de Mendel para prever os resultados dos cruzamentos. Quando temos que analisar uma situação, envolvendo um ou dois genes, é possível incluir todos os gametas e combiná-los para gerar arranjos de genótipos zigóticos. Pode-se, ainda, usar o Princípio da Dominância para determinar os fenótipos associados. Esse procedimento é conhecido como método do quadrado de Punnett. Nós o utilizamos para analisar o resultado zigótico do cruzamento com híbridos da F1 de sementes amarelas e lisas de Mendel (Figura 4).

Em situações mais complexas com mais de dois genes, torna-se, no entanto, mais complicado e trabalhoso utilizar o método de Punnett. Um método alternativo e mais rápido que o método do quadrado de Punnett baseia-se no princípio da probabilidade. Na segregação de Mendel, quando um heterozigoto produz gametas; metade deles contém um alelo e metade, o outro. Deste modo, a probabilidade de que determinado gameta apresente o alelo dominante é de 50% (1/2), e a probabilidade de que contenha o alelo recessivo também é de 50% (1/2). Essas probabilidades são as frequências de ambos os gametas produzidos pelo heterozigoto. Nesse cruzamento, os gametas serão combinados aleatoriamente para produzir a geração seguinte.

Caro acadêmico, para ilustrar e entendermos melhor uma análise por probabilidades, vamos verificar um cruzamento entre heterozigotos para um determinado gene, Aa × Aa (Figura 5). A chance de que o zigoto seja AA é simplesmente a probabilidade de que cada um dos dois gametas que se unem contenha A, ou (1/2) × (1/2) = (1/4). A chance de um homozigoto aa também é de ¼, pois o princípio é o mesmo. No entanto, a chance de um heterozigoto Aa é de 1/2 porque existem dois modos de produzir um heterozigoto, pois A pode vir do gameta feminino e o alelo recessivo a pode vir do gameta masculino, ou vice-versa. A chance de ocorrência de cada um desses eventos é de um quarto, e a probabilidade total de que um filho seja heterozigoto é (1/4) + (1/4) = (1/2).

Portanto, caro acadêmico, obtemos a seguinte distribuição de probabilidade dos genótipos obtidos por cruzamento de Aa × Aa:

AA = ¼Aa = ½AA = ¼

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TÓPICO 1 | LEIS DE MENDEL

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FIGURA 5 – CRUZAMENTO APRESENTANDO O MÉTODO DA PROBABILIDADE NO CONTEXTO DE UM QUADRADO DE PUNNETT

FONTE: Snustad, Simmon (2017, s. p.)

A frequência de cada genótipo do cruzamento é obtida a partir das frequências no quadrado de Punnett que, por sua vez, são obtidas por multiplicação das frequências dos dois tipos de gametas produzidos pelos genitores heterozigotos.

Page 22: Genética - UNIASSELVI

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Neste tópico, você aprendeu que:

• Mendel estudou a herança de diferentes características em ervilhas, sendo que cada característica é controlada por um gene diferente e seus alelos.

• A partir de seus achados científicos, Mendel postulou que os alelos de um gene são dominantes ou recessivos, que os diferentes alelos de um gene segregam-se durante a formação dos gametas e que os alelos de diferentes genes são distribuídos de modo independente.

• Através da utilização do quadrado de Punnett podemos prever o resultado de um cruzamento, verificando os genótipos produzidos.

Quando analisamos cruzamentos com a participação de mais de dois genes, o método da probabilidade para prever o resultado de um cruzamento é mais indicado.

RESUMO DO TÓPICO 1

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1 Determine as proporções genotípicas e fenotípicas resultantes dos cruzamentos propostos a seguir. (“a” é o alelo recessivo para albinismo, já “A” é o alelo normal para pigmentação da pele).

a) Aa x Aa.b) Aa x aa. c) AA x aa. d) AA x AA. e) aa x aa. 2 Ao afirmarmos que um gameta é heterozigoto para um determinado gene,

estamos claramente cometendo um erro. Por que tal afirmação é incorreta?

3 Ao considerar dois genes transmitidos de forma independente, herança dominante e bialelismo, num cruzamento di-híbrido entre dois indivíduos duplo heterozigotos, teremos como resultado a proporção fenotípica de:

a) ( ) 1:2:1b) ( ) 1:2:2:1c) ( ) 1:3:3:1d) ( ) 3:9:3e) ( ) 9:3:3:1

4 A fibrose cística e a miopia são causadas por genes autossômicos recessivos. Uma mulher míope e normal para fibrose cística casa-se com um homem normal para ambas as características, porém filho de pai míope. A primeira criança nascida foi uma menina de visão normal, mas com fibrose cística. Considerando que a probabilidade de um casal ter uma menina é de ½, defina a probabilidade de o casal ter outra menina, porém normal para ambas as características.

a) ( ) 3/8. b) ( ) 1/4. c) ( ) 3/16. d) ( ) 3/4. e) ( ) 1/8.

AUTOATIVIDADE

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TÓPICO 2

EXTENSÕES DO MENDELISMO

UNIDADE 1

1 INTRODUÇÃOCaro acadêmico, os trabalhos de Mendel apresentaram resultados,

mostrando que os genes podem existir em formas alternativas, e cada forma alternativa nós chamamos de alelo. Para cada uma das características estudadas em ervilhas, Mendel identificou dois alelos, um dominante e o outro recessivo. Entretanto, as pesquisas subsequentes aos experimentos de Mendel mostraram que os genes podem apresentar mais de dois alelos em determinados casos, e cada alelo pode ter um efeito diferente no fenótipo.

Mendel estabeleceu, em 1865, os princípios básicos da hereditariedade, o que resultou na primeira e segunda Lei de Mendel. Segundo as regras mendelianas clássicas, cada caráter seria governado por um gene e cada gene teria dois alelos, um de efeito dominante e o outro recessivo. Na geração F2 isso resultaria em uma proporção fenotípica clássica de 3:1. No entanto, se dois caracteres mendelianos fossem estudados em conjunto, na F2 teríamos uma proporção fenotípica 9:3:3:1. Com os novos estudos, mostrou-se que as proporções mendelianas clássicas não eram únicas.

Portanto acadêmico, dessa forma, podemos entender que o termo extensão à genética mendeliana se refere aos padrões de herança que complementam aqueles que foram descobertos por Gregor Mendel, e vamos estudar os mesmos a partir de agora.

2 DOMINÂNCIA INCOMPLETA E CODOMINÂNCIA

Quando um organismo apresenta um genótipo heterozigoto para um determinado gene, o fenótipo apresentado é conferido pelo alelo dominante, considerando um padrão de herança dominante. Um alelo é dominante se tiver o mesmo efeito fenotípico em heterozigotos e homozigotos. No entanto, em alguns casos, o heterozigoto tem fenótipo diferente dos dois homozigotos. Um exemplo disso é quando temos uma dominância incompleta de um alelo sobre outro, originando a cor da flor boca-de-leão, Antirrhinum majus. As variedades

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vermelha e branca são homozigotas para diferentes alelos de um gene para cor. Ao cruzarmos tais variedades, uma planta heterozigota com flores cor-de-rosa é produzida. Nesse caso, caro acadêmico, temos o alelo para cor vermelha W com dominância incompleta em relação ao alelo para cor branca w. Entendemos que a intensidade da pigmentação nessa espécie depende da quantidade de um produto especificado produzido pelo alelo W do gene da cor (Figura 6). Considerando que o alelo W especifica a produção desse produto e o alelo w não, homozigotos WW terão o dobro do produto em relação a heterozigotos Ww e, claro, cor mais intensa. Nesse caso, podemos dizer que o alelo parcialmente dominante W é semidominante.

FIGURA 6 – DOMINÂNCIA INCOMPLETA NA EXPRESSÃO DO FENÓTIPO DA COR DA FLOR BOCA-DE-LEÃO

FONTE: Snustad, Simmon (2017, s. p.)

Caro acadêmico, podemos também imaginar que os dois alelos de um determinado gene se expressem em um heterozigoto? Caso tenha pensado positivamente, você está correto. Chamamos de codominância quando um heterozigoto tem características observadas nos dois homozigotos associados. Como exemplos, temos os tipos sanguíneos humanos, antígenos presentes nas células vermelhas do sangue, identificados por testes do tipo antígeno-anticorpo. Os anticorpos, produzidos pelo sistema imune, reconhecem antígenos específicos. Quando estudamos o sistema MN em humanos, observamos que o soro anti-M reconhece apenas o antígeno M em células sanguíneas, já o soro anti-N reconhece apenas o antígeno N nessas células. Quando ocorre a reação antígeno-anticorpo no teste de tipagem sanguínea, as células aglomeram-se em uma reação de aglutinação. Portanto, a análise de aglutinação das células com diferentes soros possibilita a identificação dos antígenos presentes e, portanto, o tipo sanguíneo. O sistema MN em humanos, em que temos a produção de antígenos M e N, é determinado por um gene com dois alelos. Homozigotos para o alelo M produzem apenas o antígeno M e homozigotos para o alelo N, somente o antígeno N. No entanto, heterozigotos para os dois alelos produzem os dois tipos de antígenos, sendo codominantes. Os alelos codominantes são representados por sobrescritos no símbolo do gene. Deste modo, o alelo do antígeno M é LM e o alelo do antígeno N é LN. O L é uma

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TÓPICO 2 | EXTENSÕES DO MENDELISMO

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homenagem a Karl Landsteiner (1868-1943), o descobridor da tipagem sanguínea. Resumindo, observamos o seguinte:

Genótipo Tipo Sanguíneo LM LM MLM LN MNLN LN N

3 ALELOS MÚLTIPLOS

A partir de diferentes estudos em genética, foram identificados vários genes que apresentam mais de dois alelos como forma alternativa dos mesmos. Vamos estudar aqui dois exemplos clássicos de alelos múltiplos: alelos múltiplos que controlam a cor da pelagem em coelhos e o sistema ABO, em humanos.

Um exemplo muito conhecido de um gene com alelos múltiplos é o que determina a cor da pelagem em coelhos. O gene determinante da cor apresenta os seguintes alelos e fenótipos:

• Ca (albino)• Ch (himalaio)• Cch (chinchila)• C+ (selvagem ou aguti)

Na condição homozigota, cada alelo tem um efeito característico sobre a cor da pelagem. Como a maioria dos coelhos em populações selvagens é homozigota para o alelo C+, ele é denominado tipo selvagem, mas também é denominado de aguti. Os quatro alelos do gene C em coelhos podem ser combinados para produzir diferentes heterozigotos. Esses heterozigotos tornam possível estudar as relações de dominância entre os alelos. O alelo selvagem é totalmente dominante em relação a todos os outros alelos na série; o alelo chinchila é dominante em relação aos alelos himalaia e albino, e o alelo himalaia é dominante em relação ao alelo albino. Portanto, entre esses alelos ocorre interação de dominância, como segue: C+ > Cch > Ch > Ca.

Caro acadêmico, a seguir podemos verificar os possíveis genótipos para cada tipo de pelagem em coelhos.

Genótipo Fenótipo

C+C+, C+Cch, C+Ch, C+Ca Selvagem ou aguti

CchCch, CchCh, CchCa Chinchila

ChCh e ChCa Himalaia

CaCa Albino

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Outro exemplo de alelos múltiplos vem do gene responsável pelo sistema ABO em humanos. A tipagem sanguínea do sistema ABO envolve reações imunológicas. Os tipos A, B, AB e O são identificados pelo teste de uma amostra de sangue com diferentes soros. Um soro detecta o antígeno A e outro, o antígeno B. Quando as hemácias têm apenas o antígeno A, o sangue é tipo A; quando têm apenas o antígeno B, o sangue é tipo B. Quando os dois antígenos estão presentes, o sangue é tipo AB, e quando não há antígeno, é tipo O. O gene responsável pela produção dos antígenos A e B é designado pela letra I, apresentando três alelos: IA, IB e i. O alelo IA produz do antígeno A e o alelo IB a produção do antígeno B, no entanto, o alelo i não especifica antígeno. A partir dos três alelos já descritos, temos seis genótipos possíveis e quatro fenótipos – os tipos sanguíneos A, B, AB e O. No sistema ABO, os alelos IA e IB são codominantes, pois ambos são expressos nos heterozigotos IAIB, e o alelo i é recessivo em relação aos alelos IA e IB.

Prezado acadêmico, vamos resumir as informações sobre a genética do sistema ABO, no esquema a seguir:

Genótipo Fenótipo (Tipo Sanguíneo) Antígeno A Antígeno BIAIA e IAi A Sim NãoIBIB e IBi B Não Sim

IAIB AB Sim Simii O Não Não

4 GENÉTICA QUANTITATIVA

A herança quantitativa ou poligênica é um tipo de interação gênica na qual dois ou mais genes apresentam seus efeitos somados, em relação a uma determinada característica, gerando fenótipos com diferentes intensidades. Fatores genéticos e ambientais influenciam as características quantitativas. O biólogo Wilhelm Johannsen (1857-1927) realizou um experimento genético, demonstrando que a variação de uma característica quantitativa é causada por uma combinação de fatores genéticos e ambientais. Seus estudos envolveram o peso de sementes de feijão, Phaseolus vulgaris. As plantas estudadas apresentavam sementes com peso entre 150 mg a 900 mg. Johannsen definiu linhagens de sementes nesse intervalo e manteve cada linhagem por autofertilização durante várias gerações. A possibilidade de definir linhagens de feijão com diferentes pesos característicos das sementes indicava que grande parte da explicação da variação dessa característica é causada por diferenças genéticas. Entretanto, o pesquisador observou que o peso das sementes também variava dentro de cada linhagem, mesmo sendo pura. Essa variação residual não era causada por diferenças genéticas, porque cada linha era resultado de endocruzamento sistemático para torná-la homozigota para seus genes, sendo que a causa de tal variação residual só poderia ser por influência de fatores ambientais não controlados.

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Caro acadêmico, o pesquisador Herman Nilsson-Ehle (1873-1949), dinamarquês, nos mostrou que o componente genético da herança quantitativa inclui a contribuição de vários genes diferentes. Nilsson-Ehle estudou a variação da cor em grãos de trigo, cruzando duas variedades, uma branca e uma com grãos vermelhos bem escuros. O resultado observado na F1 foi um fenótipo vermelho intermediário. A autofertilização da F1 produziu uma F2 com sete classes diferentes, cujas cores variavam do branco ao vermelho-escuro. O número de classes da F2 e a proporção fenotípica observada por Nilsson-Ehle sugeriram que três genes de distribuição independente participavam da determinação da cor do grão, e que os alelos para grãos vermelhos contribuíam para a intensidade do pigmento de forma aditiva (Gráfico 1). Deste modo, temos o genótipo do genitor de grãos brancos como aa bb cc, e o genótipo do genitor de grãos vermelhos como AA BB CC. O genótipo da F1 seria heterozigoto Aa Bb Cc e a F2 teria vários genótipos com diferentes números de alelos responsáveis pelo efeito aditivo na pigmentação. Cada classe fenotípica na F2 teria um número diferente de alelos que contribuem para a pigmentação.

GRÁFICO 1 – HERANÇA DA COR DOS GRÃOS EM TRIGO

FONTE: Snustad, Simmon (2017, s. p.)

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O número de fenótipos que podem ser encontrados em um caso de herança poligênica depende do número de pares de alelos envolvidos, que chamamos n. Número de fenótipos = 2n + 1.

Em nosso caso de grãos de trigo com três pares de alelos, sete fenótipos distintos podem ser encontrados, como visto no Gráfico 1. Cada grupo de indivíduos que expressam o mesmo fenótipo constitui uma classe fenotípica.

5 A RELAÇÃO ENTRE OS GENES E AS PROTEÍNAS

Com o desenvolvimento dos estudos em genética e também de biologia molecular, ficou evidente que os organismos contêm muitos genes diferentes e que os mesmos podem apresentar múltiplos alelos.

No entanto, caro acadêmico, você já se perguntou como um gene pode influenciar um traço como a cor dos olhos, a altura, o peso e a cor da pele?

Os primeiros geneticistas não tinham resposta para essa pergunta. No entanto, com o avanço dos estudos científicos, atualmente sabemos que boa parte dos genes codifica para proteínas, ou seja, produz proteínas que, de alguma forma, estão envolvidas com os fenótipos. As proteínas são macromoléculas constituídas por uma cadeia linear de aminoácidos, sendo que cada tipo de proteína apresenta uma sequência específica de aminoácidos. Durante a síntese proteica, os aminoácidos se unem por meio de ligações do tipo amida, também denominadas ligações peptídicas. A união de dois aminoácidos produz um dipeptídeo; já três aminoácidos unidos por ligações peptídicas criam um tripeptídeo; com mais de quatro aminoácidos na cadeia, a molécula recebe o nome de polipeptídeo. Já um polipeptídeo com aproximadamente 100 resíduos de aminoácidos na cadeia é chamado de proteína. Algumas proteínas, chamadas enzimas, atuam como catalisadores em reações bioquímicas, já outras formam hormônios, anticorpos, antígenos, neurotransmissores, outras formam os componentes estruturais das células, os músculos, e ainda outras são responsáveis pelo transporte de moléculas, como o oxigênio.

6 EFEITOS AMBIENTAIS NA EXPRESSÃO DOS GENES

Caro acadêmico, será que o ambiente pode influenciar na expressão dos genes e, por consequência, também no fenótipo?

Uma série de pesquisas tem demonstrado que o ambiente pode influenciar a expressão gênica. Vários fatores ambientais podem influenciar os fenótipos, inclusive a alimentação, sendo que a área da nutrigenômica tem se desenvolvido a passos largos. Os benefícios do consumo de determinados alimentos fizeram surgir o conceito de alimentos funcionais, sendo que tais alimentos podem afetar beneficamente as funções corporais, gerando bem-estar e redução do risco de doenças.

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As análises dos mecanismos associados à influência dos alimentos na biologia e na saúde mostram que moléculas bioativas, presentes em determinados alimentos, possuem a capacidade de modular aspectos genômicos, bioquímicos e fisiológicos dos organismos. Em nível genômico, os principais efeitos destas moléculas envolvem a regulação diferencial na expressão de genes e modulação epigenética.

Tais evidências deram origem à genômica nutricional representada pelas suas duas abordagens: a nutrigenética e a nutrigenômica. A nutrigenética estuda a interação dos alimentos com variações genéticas individuais que poderiam, por exemplo, reduzir o risco de determinados tipos de doenças. Por outro lado, a nutrigenômica investiga a influência da nutrição na dinâmica estrutural do genoma (efeitos epigenéticos e genoprotetores) e na modulação de genes.

Caro acadêmico, para ilustrar as questões alimentares com as doenças humanas, vamos tratar brevemente da fenilcetonúria (PKU). As pesquisas genéticas humanas oferecem um exemplo da influência do ambiente físico no fenótipo. A fenilcetonúria (PKU) é um distúrbio recessivo do metabolismo dos aminoácidos. Lactentes homozigotos para o alelo mutante acumulam no encéfalo substâncias tóxicas que podem afetar o desenvolvimento encefálico e assim comprometer a capacidade mental. A PKU está relacionada com um aminoácido específico, a fenilalanina, ingerida na alimentação. Embora não seja tóxica, a fenilalanina é metabolizada em outras substâncias tóxicas. Lactentes com PKU alimentados com dieta normal ingerem fenilalanina, ocorrendo as manifestações graves da doença. Entretanto, lactentes que seguem dietas com restrição de fenilalanina podem crescer sem comprometimento mental grave. A doença pode ser diagnosticada em recém-nascidos, sendo possível reduzir seu impacto a partir da restrição de fenilalanina. Tal exemplo nos mostra como é possível manipular um fator ambiental, como neste caso em que a dieta altera um fenótipo, podendo provocar uma tragédia pessoal.

O ambiente biológico também pode influenciar a expressão fenotípica dos genes. A calvície em seres humanos é um exemplo, em que o fator biológico relevante é o sexo. A calvície prematura é causada por um alelo com expressão diferente em homens e mulheres. Tanto os homens homozigotos quanto heterozigotos para esse alelo desenvolvem a calvície, mas somente as mulheres homozigotas têm essa tendência. A expressão desse alelo provavelmente é desencadeada pelo hormônio testosterona.

7 PENETRÂNCIA E EXPRESSIVIDADE

Caro acadêmico, nem sempre os indivíduos apresentam um determinado fenótipo, mesmo apresentando o genótipo apropriado. Nesse caso, diz-se que o traço tem penetrância incompleta. Um exemplo em seres humanos é a polidactilia, ou seja, presença de dedos extranumerários nas mãos e nos pés. Esse distúrbio é causado por uma mutação dominante que se manifesta em parte de seus portadores.

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UNIDADE 1 | PRINCÍPIOS DA HEREDITARIEDADE

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Quando tratamos de expressividade, vemos que a manifestação de uma característica não é uniforme entre os indivíduos que a apresentam. A mutação dominante Lobe associada ao olho em Drosophila é um exemplo, e o fenótipo associado a essa mutação pode variar muito. Algumas moscas heterozigotas apresentam pequenos olhos compostos, enquanto outras têm olhos grandes e lobulados. Neste sentido, podemos afirmar que a mutação Lobe tem expressividade variável.

Caro acadêmico, tanto a expressividade variável como a penetrância incompleta indicam que a expressão dos genes está sujeita a considerável modulação. Atualmente, entendemos que essa modulação se deve a fatores ambientais e genéticos. A comprovação desses fatores vem das pesquisas que mostram que dois ou mais genes podem afetar uma determinada característica.

8 INTERAÇÕES GÊNICAS

Caro acadêmico, os primeiros estudos mostrando que uma característica pode ser influenciada por mais de um gene foram realizados por Bateson (1861-1926) e Punnett (1875-1967) em experimentos com galinhas. Os estudos envolveram o formato da crista, sendo que a raça Wyandotte tem crista rosa, a Brahma tem crista ervilha e a Leghorn tem crista simples. Cruzamentos entre as raças Wyandotte e Brahma produzem indivíduos com outro tipo de crista, chamada noz. As análises dos resultados mostraram que o tipo de crista em galinhas é determinado por dois genes de distribuição independente, R e P, ambos com dois alelos. A raça Wyandotte, com crista rosa, tem o genótipo RR pp e a raça Brahma, com crista ervilha, rr PP. Já os híbridos dessas duas variedades na F1 são Rr Pp e o fenótipo é de crista noz. O intercruzamento desses híbridos gera os quatro tipos de crista na F2: noz em 9/16 (R- P-), rosa em 3/16 (R- pp), ervilha em 3/16 (rr P-) e simples em 1/16 (rr pp). Portanto, a raça Leghorn, que tem a crista simples, é homozigota para os dois alelos recessivos. Vejamos os resultados da F2 na Tabela 1:

RP Rp rP rpRP RRPP

NozRRPpNoz

RrPPNoz

RrPpNoz

Rp RRPpNoz

RRppRosa

RrPpNoz

RrppRosa

rP RrPPNoz

Rr PpNoz

rrPPErvilha

rrPpErvilha

rp RrPpNoz

RrppRosa

rrPpErvilha

rrppSimples

TABELA 1 – QUADRADO DE PUNNETT

FONTE: O autor

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TÓPICO 2 | EXTENSÕES DO MENDELISMO

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Podemos observar, então, que as pesquisas de Bateson e Punnett mostram que dois genes de distribuição independente podem afetar uma determinada característica. Diferentes combinações dos alelos de ambos os genes produzem diferentes fenótipos, o que deve ocorrer devido às interações bioquímicas de seus produtos gênicos.

9 EPISTASIA

Caro acadêmico, nos casos de epistasia, temos pelo menos dois genes influenciando uma determinada característica, em que um alelo de um deles prevalece no fenótipo. Quando um alelo tem esse efeito, afirmamos que o mesmo é epistático em relação aos outros genes participantes. Um exemplo clássico envolve genes que participam da pigmentação do olho em Drosophila. Quando uma mosca é homozigota para um alelo nulo em um desses genes, a rota bioquímica de síntese do pigmento pode ser bloqueada, levando a anormalidades da cor do olho do indivíduo. Portanto, tal alelo anula a expressão dos outros genes, mascarando suas contribuições fenotípicas.

Outro exemplo de epistasia é observado na determinação da cor das flores na ervilha-de-cheiro, Lathyrus odoratus. As flores dessa planta são roxas quando têm o pigmento antocianina ou brancas em sua ausência. Ao cruzarmos plantas híbridas, temos uma F2 numa razão de nove plantas de flores roxas para sete plantas de flores brancas (Figura 7). Os resultados podem ser explicados, propondo que dois genes de distribuição independente, C e P, participam da síntese de antocianina e que cada gene tem um alelo recessivo que impede a produção do pigmento. Desta forma, é necessário um alelo dominante de cada gene para a síntese do pigmento antocianina. Neste trabalho de Bateson e Punnett, ficou estabelecido que cada alelo recessivo é epistático em relação ao alelo dominante do outro gene. Se os alelos dominantes de cada gene não estiverem presentes, a biossíntese é bloqueada e não há produção de antocianina.

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FIGURA 7 – CONTROLE GENÉTICO DA COR DAS FLORES EM ERVILHAS-DE-CHEIRO

FONTE: Snustad, Simmon (2017, s. p.)

Podemos resumir a F2 da Figura 8 da seguinte forma:C- P- (Flores roxas) = 9/16C-pp, ccP-, ccpp (Flores brancas) = 7/16

Caro acadêmico, podemos ter diferentes razões fenotípicas a partir dos genótipos obtidos na F2, considerando o cruzamento di-híbrido AaBb X AaBb e o tipo de epistasia (Quadro 1).

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TÓPICO 2 | EXTENSÕES DO MENDELISMO

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AABB AABb AaBB AaBb AAbb Aabb aaBB aaBb aabbA e B

incompletamente dominantes

1 2 2 4 1 2 1 2 1

A incompletamente

e B completamente

dominante

3 6 1 2 3 1

A e B completamente

dominantes (Razão

clássica com quatro classes

fenotípicas)

9 3 3 1

aa epistático sobre B e b (Epistasia recessiva)

9 3 4

A epistático sobre B e b; bb epistático sobre A e a (Epistasia

dominante e recessiva)

13 (12 mais a classe genotípica aabb) 3 -

aa epistático sobre B e b; bb epistático sobre A e a (Epistasia recessiva dupla)

9 7

A epistático sobre B e b; B

epistático sobre A e a (Epistasia

dominante Dupla)

15 1

QUADRO 1 – EXEMPLOS DE RAZÕES FENOTÍPICAS DE F2

FONTE: O autor

10 PLEIOTROPIA

Caro acadêmico, neste momento, vamos entender o que significa pleiotropia. Quando temos um gene influenciando diferentes fenótipos, diz-se que é pleiotrópico. A pleiotropia funciona de forma inversa à interação gênica. Na pleiotropia, um único gene atua na manifestação de vários caracteres. Em termos moleculares e bioquímicos, podemos dizer que o gene produz apenas uma enzima, mas sua presença ou ausência tem várias consequências. Uma condição pleiotrópica clássica é a fenilcetonúria (PKU), doença causada por um alelo

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recessivo do gene que produz a enzima fenilalanina hidroxilase. A deficiência na produção desta enzima impede a transformação do aminoácido fenilalanina em tirosina (Figura 8).

O efeito primário de mutações recessivas nesse gene é causar o acúmulo de fenilpiruvato, que compete com o piruvato pela entrada na mitocôndria, restringindo a produção de ATP a partir de glicose, o único substrato oxidável para o cérebro, gerando disfunções neurológicas graves. No entanto, essas mutações também interferem na síntese do pigmento melanina, clareando a pele e os pelos. Os exames bioquímicos mostram ainda que o sangue e a urina de pacientes com PKU contêm substâncias raras ou ausentes em indivíduos normais. Essa série de efeitos fenotípicos é típica da maioria dos genes e consequência de interconexões entre as vias bioquímicas que eles controlam através da produção de enzimas.

FIGURA 8 – NA PKU, O AMINOÁCIDO FENILALANINA NÃO PODE SER CONVERTIDO EM TIROSINA

FONTE: Marzzoco (2015, p. 241)

11 ENDOGAMIA

Na endogamia, temos o cruzamento de indivíduos aparentados em virtude de um ancestral comum. O cruzamento entre parentes é denominado cruzamento consanguíneo, termo do latim que significa “do mesmo sangue”. A reprodução endogâmica é rara em populações humanas, e a incidência depende da cultura e etnia das populações. As restrições ocorrem, pois a endogamia tende a produzir mais crianças doentes e debilitadas que em um casamento de indivíduos sem parentesco, havendo maior chance de que filhos de um casamento consanguíneo sejam homozigotos para um alelo recessivo prejudicial. No entanto, em certas culturas, como no Egito antigo, por exemplo, a linhagem real era perpetuada por casamentos entre irmãos, provavelmente para preservar a “pureza” do sangue real.

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Os casamentos consanguíneos em populações humanas de certa forma colaboraram na análise de distúrbios genéticos causados por alelos recessivos. Muitos estudos em genética humana foram baseados na análise de casamentos consanguíneos, principalmente em grupos socialmente fechados, como a comunidade Amish, nos Estados Unidos. Os efeitos da endogamia também são evidentes em espécies experimentais, nas quais é possível promover o cruzamento consanguíneo, geração após geração, para criar uma linhagem endogâmica. Tais linhagens são puras geneticamente, porém, muitas vezes são menos vigorosas, gerando o que chamamos de perda endogâmica. Nas plantas em que a autofertilização é possível, podem-se criar linhagens altamente endogâmicas por autofertilização. No milho, por exemplo, as plantas endogâmicas são baixas e produzem espigas pequenas com poucos grãos. As plantas geradas por cruzamentos entre duas linhagens endogâmicas diferentes são heterozigotas para muitos genes, apresentando maior vigor, o que chamamos de vigor híbrido, ou heterose. Tal prática para produzir prole heterozigota de alto rendimento tornou-se padrão no melhoramento vegetal.

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RESUMO DO TÓPICO 2

Neste tópico, você aprendeu que:

• Um alelo é dominante se tiver o mesmo efeito fenotípico em heterozigotos e homozigotos. No entanto, em alguns casos, o heterozigoto tem fenótipo diferente dos dois homozigotos, havendo dominância incompleta.

• Chamamos de codominância quando um heterozigoto tem características observadas nos dois homozigotos associados.

• Diferentes estudos em genética identificaram vários genes que apresentam mais de dois alelos como forma alternativa dos mesmos. O sistema sanguíneo ABO, em humanos, é um exemplo clássico de alelos múltiplos.

• A herança quantitativa ou poligênica é um tipo de interação gênica na qual dois ou mais genes apresentam seus efeitos somados, em relação a uma determinada característica. Fatores genéticos e ambientais influenciam as características quantitativas.

• Atualmente sabemos que boa parte dos genes codifica para proteínas, ou seja, produz proteínas que, de alguma forma, estão envolvidas com os fenótipos.

• Muitas pesquisas têm demonstrado que o ambiente pode influenciar a expressão gênica.

• Tanto a expressividade variável como a penetrância incompleta indicam que a expressão dos genes está sujeita a considerável modulação. Atualmente, entendemos que essa modulação se deve a fatores ambientais e genéticos.

• Dois genes de distribuição independente podem afetar uma determinada característica. Diferentes combinações dos alelos de ambos os genes produzem diferentes fenótipos, o que deve ocorrer devido às interações bioquímicas de seus produtos gênicos.

• Nos casos de epistasia, temos pelo menos dois genes influenciando uma determinada característica, em que um alelo de um deles prevalece no fenótipo.

• A pleiotropia funciona de forma inversa à interação gênica. Na pleiotropia, um único gene atua na manifestação de vários caracteres. Em termos moleculares e bioquímicos, podemos dizer que o gene produz apenas uma enzima, mas sua presença ou ausência tem várias consequências.

• Na endogamia, temos o cruzamento de indivíduos aparentados em virtude de um ancestral comum. O cruzamento entre parentes é denominado cruzamento consanguíneo.

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1 (ENADE Biologia, 2008)Os componentes do sistema imune envolvem, além de células, proteínas circulantes, sendo diversos deles utilizados para a identificação de tipos celulares e para a obtenção de informações genéticas. Considerando aspectos gerais da Imunologia, é correto:FONTE: <https://bit.ly/2OxlORO>. Acesso em: 18 set. 2018.

a) ( ) Apenas linfócitos e neutrófilos apresentam antígenos de superfície e, por esse motivo, são células capazes de produzir anticorpos.

b) ( ) A tipagem sanguínea do sistema ABO envolve reações imunológicas e pode ser utilizada para a obtenção de informações genéticas sobre indivíduos.

c) ( ) Diferentes tipos celulares de um mesmo indivíduo não podem ser diferenciados por marcadores imunológicos, pois os marcadores de superfície dessas células ligam-se aos mesmos anticorpos.

d) ( ) A região FV (fração variável) de cada anticorpo presente em um conjunto de anticorpos, obtidos do plasma de um único indivíduo, apresenta a mesma sequência de aminoácidos.

e) ( ) A reação de fixação do complemento permite a análise de ligação das fitas complementares de DNA dos anticorpos.

2 Em um determinado dia, nasceram quatro bebês em uma maternidade. Com base nos grupos sanguíneos (sistema ABO) das crianças e dos casais de pais, identifique os pais da cada bebê.

(A) Neonato 1 Sangue tipo A ( ) Casal 1 A e AB(B) Neonato 2 Sangue tipo B ( ) Casal 2 A e O (C) Neonato 3 Sangue tipo AB ( ) Casal 3 AB e O(D) Neonato 4 Sangue tipo O ( ) Casal 4 O e O

3 Explique a seguinte notação referente aos alelos do sistema ABO: IA=IB › i.

4 Defina brevemente os seguintes termos:

a) Pleiotropia: b) Endogamia: c) Penetrância: d) Expressividade: e) Epistasia:

AUTOATIVIDADE

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5 (ENADE Biologia, 2008) A poluição em ambientes aquáticos pode ser evidenciada com a utilização de uma linhagem transgênica do peixe paulistinha (Danio rerio). Essa linhagem apresenta um gene da luciferase, originário de uma água-viva, que é ativado em resposta a determinados poluentes. Em situação experimental, o peixe vivo muda de cor na presença do poluente e depois, ao ser colocado em água limpa, volta à coloração original e pode ser reutilizado inúmeras vezes. Com relação ao fenômeno descrito no texto, é correto afirmar que a mudança na coloração do peixe:FONTE: CARVAN, M. J. et al. Transgenic zebrafish as sentinels for aquatic pollution. In: Annals of the New York Academy of Sciences, 919133-47, 2000. Disponível em: < https://djalmasantos.wordpress.com/2015/10/19/testes-de-biotecnologia-v/>. Acesso em: 18 set. 2018.

a) ( ) Decorre de alterações em moléculas de RNA que não chegam a afetar os genes do animal.

b) ( ) É um fenômeno que ocorre com frequência em animais transgênicos, mesmo que estes não tenham o gene da luciferase.

c) ( ) Decorre da ação de genes constitutivos que são ativados por fatores ambientais.

d) ( ) É um exemplo de como fatores ambientais podem regular o funcionamento de um gene.

e) ( ) É o resultado de eventos mutacionais, como quebras cromossômicas ou alterações gênicas.

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TÓPICO 3

BASES CROMOSSÔMICAS DO

MENDELISMO

UNIDADE 1

1 INTRODUÇÃOCaro acadêmico, para entendermos melhor a importância da genética

para as Ciências Biológicas, Medicina e áreas afins, temos que compreender a natureza do genoma e dos cromossomos. Devemos conhecer a estrutura e a composição dos cromossomos, em que momento do ciclo celular tais estruturas surgem, podendo ser observados por microscopia, e qual a sua importância nos processos de divisão celular e recombinação genética. Podemos estudar o número e a estrutura dos cromossomos por coloração das células em divisão.

Cada espécie possui um complemento cromossômico, ou seja, um cariótipo característico, considerando número e morfologia dos cromossomos. Os genes estão dispostos nos cromossomos, apresentando uma posição precisa nos mesmos, denominada de locus. O estudo dos cromossomos, da sua estrutura, da sua composição e da sua hereditariedade é conhecido como citogenética.

A citogenética originou-se pela pesquisa de vários biólogos do século XX que descobriram os cromossomos e observaram seu comportamento durante a divisão celular. Tais observações prosperaram a partir do surgimento de microscópios modernos e de melhores procedimentos de coloração dos cromossomos. Atualmente, caro acadêmico, observamos a aplicação de importantes conhecimentos citogenéticos, principalmente na medicina, sendo utilizados para identificar a associação entre doenças e anormalidades cromossômicas, como o cromossomo Philadelphia, no caso da Leucemia Mielóide Crônica.

2 OS CROMOSSOMOS

Primeiramente, acadêmico, temos que deixar claro que os cromossomos são característicos dos núcleos de todas as células. Os cromossomos foram descobertos no século XIX pelo citologista alemão W. Waldeyer (1836-1921).

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UNIDADE 1 | PRINCÍPIOS DA HEREDITARIEDADE

Para observarmos adequadamente os cromossomos, devemos utilizar corantes nas células em divisão, como a coloração Giemsa, por exemplo. Neste período celular, a cromatina formada por ácido desoxirriboncléico (DNA), ácido ribonucléico (RNA) e proteínas, como as histonas, atinge sua máxima compactação, formando cromossomos bem definidos, que podem ser classificados como metacêntricos, submetacêntricos e acrocêntricos, de acordo com a posição do centrômero (Figura 9). Os braços curtos e longos dos cromossomos são denominados de p e q, respectivamente. Durante a interfase, entre as divisões celulares, os cromossomos não são observados, pois na interfase a cromatina apresenta-se frouxamente espiralada ou compactada, como uma rede difusa e filamentosa. No núcleo interfásico, algumas regiões da cromatina apresentam coloração mais escura que outras. As regiões claras ou eucromatina são regiões menos condensadas, já as regiões escuras são a heterocromatina, regiões mais condensadas.

FIGURA 9 – ESTRUTURA DOS CROMOSSOMOS

FONTE: Maluf (2011, p. 21)

O número de cromossomos de uma espécie é quase sempre um múltiplo par de um número básico. O número básico de cromossomos define um conjunto cromossômico denominado genoma haploide, variando de acordo com a espécie. A maioria das células somáticas contém duas unidades de cada cromossomo desse conjunto e, portanto, é diploide (2n). As células que têm quatro unidades de cada cromossomo são tetraploides (4n). O número de cromossomos não está necessariamente relacionado com o tamanho nem com a complexidade biológica de um organismo.

As células somáticas humanas apresentam um complemento cromossômico diploide (2n) de 46 cromossomos, com 22 pares de autossomos e um par sexual, XX em mulheres e XY em homens (Figura 10). X E Y são os cromossomos sexuais, já os autossomos são divididos em grupos e numerados:

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TÓPICO 3 | BASES CROMOSSÔMICAS DO MENDELISMO

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• GRUPO A (PARES DE CROMOSSOMOS 1, 2 E 3).• GRUPO B (PARES DE CROMOSSOMOS 4 E 5).• GRUPO C (PARES DE 6 A 12).• GRUPO D (PARES DE CROMOSSOMOS 13, 14 E 15).• GRUPO E (PARES DE CROMOSSOMOS 16, 17 E 18).• GRUPO F (PARES 19 E 20).• GRUPO G (PARES 21 E 22).

Já as células reprodutivas são haploides (n) com 23 cromossomos, 22 autossomos e um cromossomo sexual, sempre um X em gametas femininos, e X ou Y em gametas masculinos. Exceção a isso são os hepatócitos tetraploides (4n) com 92 cromossomos, observados durante a regeneração hepática.

FIGURA 10 – CARIÓTIPO HUMANO DE UM HOMEM (46, XY)

FONTE: Guerra (1989, p. 6)

3 GENES LIGADOS AO SEXO EM HUMANOS

Caro acadêmico, na espécie humana, os traços recessivos ligados ao X são identificados com muito mais facilidade que as características autossômicas recessivas, pois é suficiente que um homem herde um alelo recessivo ligado ao X para mostrar um traço ligado ao X, lembre-se de que os homens são XY; no entanto, a mulher precisa herdar dois, pois é XX. Deste modo, várias doenças causadas por alelos recessivos, com loci (plural de locus) no cromossomo sexual X, são mais comuns em homens, como a hemofilia, por exemplo.

Indivíduos com hemofilia A ou clássica não produzem o fator VIII de coagulação sanguínea, cujo gene está localizado na extremidade do braço longo do cromossomo X (porção Xq28). Os ferimentos de hemofílicos geram sangramentos

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UNIDADE 1 | PRINCÍPIOS DA HEREDITARIEDADE

que devem ser interrompidos por transfusão de fator de coagulação. O quadro clínico da hemofilia A é marcado pela recorrência de hemorragias, principalmente em articulações e músculos. Casos mais graves envolvem hemorragias internas e do sistema nervoso central. A hemofilia A é o principal tipo de hemofilia em seres humanos, sendo causada por uma mutação recessiva ligada ao X, afetando quase que exclusivamente os homens, que herdam a mutação das mães heterozigotas. Eles, por sua vez, podem transmitir a mutação para as filhas, que geralmente não têm hemofilia porque herdam um alelo selvagem das mães. Os homens afetados nunca transmitem o alelo mutante para a prole do sexo masculino, pois aos filhos são transmitidos os cromossomos Y.

Um caso famoso de hemofilia ligada ao X ocorreu na família imperial russa no início do século XX. O czar Nicolau e a czarina Alexandra tiveram quatro filhas e um filho, Alexis, que era hemofílico. O alelo recessivo para a doença de Alexis, ligado ao X, foi transmitido por sua mãe, portadora heterozigota, não doente.

Durante muito tempo a hemofilia foi uma doença fatal, sendo que os doentes morriam antes dos 20 anos de idade. Atualmente, tal quadro sofreu expressiva alteração em razão dos tratamentos eficazes, e os hemofílicos, de uma forma geral, podem desenvolver uma vida mais saudável.

Caro acadêmico, com relação ao cromossomo Y, sabemos que o Projeto Genoma Humano identificou alguns genes, porém em número inferior aos demais cromossomos. Vários genes no cromossomo Y humano são necessários à fertilidade masculina. Mutações em determinados genes do Y interferem na capacidade reprodutiva do homem, ou seja, a possibilidade de transmissão da mutação para a próxima geração é pequena ou nula. O gene SRY (Sex Determining Region in chromosome Y) é o gene determinante do sexo no cromossomo Y, sendo a sua presença o fator fundamental na ativação da diferenciação sexual masculina no embrião. O gene SRY humano está localizado próximo à região pseudoautossomal do braço curto do cromossomo Y. A presença do cromossomo Y é reconhecida como fator determinante do desenvolvimento gonadal masculino em humanos desde a década de 1950, quando se iniciaram estudos sobre alterações cromossômicas.

Alguns genes estão presentes tanto no cromossomo X quanto no Y, geralmente próximos às extremidades dos braços curtos. Os alelos desses genes não seguem um padrão de herança ligado ao X ou Y, sendo transmitidos igualmente das mães e dos pais para a prole, como ocorre com os genes autossômicos e, por conseguinte, são denominados genes pseudoautossômicos. No sexo masculino, as regiões que contêm tais genes estão envolvidas com o pareamento entre os cromossomos X e Y.

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TÓPICO 3 | BASES CROMOSSÔMICAS DO MENDELISMO

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4 DETERMINAÇÃO DO SEXO

Caro acadêmico, em humanos, sabemos que as mulheres são XX e os homens XY. Em seres humanos e outros mamíferos placentários, o sexo masculino é determinado pela presença do cromossomo Y. Este efeito dominante do cromossomo Y manifesta-se no início do desenvolvimento embrionário, proporcionando a transformação das gônadas primordiais em testículos. Quando formados, os testículos secretam testosterona, um hormônio andrógeno que estimula o desenvolvimento de características sexuais secundárias masculinas.

As pesquisas científicas sobre determinação do sexo mostraram que havia a produção de um fator determinante testicular (TDF), fundamental para a diferenciação das gônadas primordiais em testículos. Este determinante é o produto do gene SRY, cujo locus foi mapeado próximo à região pseudoautossômica no braço curto do cromossomo Y (Figura 11).

Prezado acadêmico, a incrível descoberta de SRY ocorreu pela identificação de indivíduos cujo sexo era incompatível com a constituição cromossômica (homens XX e mulheres XY). Nestes estudos, observou-se que vários homens XX apresentavam um pequeno segmento do cromossomo Y inserido em um dos cromossomos X, com certeza, portando um gene responsável pelo sexo masculino. Também foi constatado que mulheres XY tinham um cromossomo Y incompleto, com ausência de um segmento do cromossomo Y que correspondia ao fragmento presente em homens XX. Desta forma, ficou claro que determinado segmento do cromossomo Y era necessário para o desenvolvimento masculino. As análises moleculares identificaram o gene SRY no segmento determinante do sexo masculino no cromossomo Y.

A partir da expressão gênica de SRY e formação dos testículos, a secreção de testosterona inicia o desenvolvimento de características sexuais masculinas. A testosterona é um hormônio que se liga a receptores em muitos tipos de células, deste modo, inicia todo o processo de diferenciação celular e ao desenvolvimento de características claramente masculinas. Então, acadêmico, podemos entender facilmente que na ausência da sinalização de testosterona, essas características não surgirão, sendo que o indivíduo se desenvolverá como mulher.

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UNIDADE 1 | PRINCÍPIOS DA HEREDITARIEDADE

FIGURA 11 – DETERMINAÇÃO DO SEXO EM SERES HUMANOS

FONTE: Snustad, Simmon (2017, s. p.)

Outro quadro atípico bem entendido é a incapacidade de produzir o receptor de testosterona, ou seja, há produção do hormônio testosterona, mas não de seus receptores celulares. Indivíduos XY com essa deficiência bioquímica desenvolvem-se inicialmente como homens. Entretanto, a testosterona não pode transmitir o sinal de desenvolvimento nas células-alvo, e os indivíduos que não têm receptor deste hormônio fundamental desenvolvem características sexuais femininas. No entanto, não são formados ovários e, portanto, tais indivíduos são estéreis. Essa síndrome é chamada de insensibilidade a andrógenos. A ausência do receptor de testosterona ocorre por uma mutação no gene AR, ligado ao cromossomo X.

Prezado acadêmico, o cromossomo Y de Drosophila não influencia a determinação do sexo, como ocorre em humanos. O sexo da mosca é determinado pela razão entre o número de cromossomos X e de autossomos. As moscas diploides normais têm um par de cromossomos sexuais, XX ou XY, e três pares de autossomos. Cada conjunto haploide de autossomos é designado com a letra A. Sempre que a razão entre X e A for igual a 1,0 ou maior, a mosca será fêmea. Entretanto, sempre que a razão for igual a 0,5 ou menor, a mosca será macho. As moscas com razão X:A entre 0,5 e 1,0 desenvolvem características de ambos os sexos. O cromossomo Y é necessário à fertilidade masculina. Resumindo, uma

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TÓPICO 3 | BASES CROMOSSÔMICAS DO MENDELISMO

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mosca normal XX e diploide AA tem a razão X:A igual a um, sendo uma fêmea. Uma mosca com um X e diploide AA apresentará uma razão X:A igual a 0,5 e será um macho. Neste caso, estando o Y presente, a mosca será um macho normal e fértil.

Tanto em Drosophila quanto em humanos, os machos produzem gametas diferentes, apresentando um cromossomo sexual X ou Y, sendo denominados de sexo heterogamético, e as fêmeas que apresentam apenas gametas com X são o sexo homogamético. No entanto, em aves, borboletas e alguns répteis o inverso é verdadeiro. Nestas espécies, temos os machos como o sexo homogamético, com dois cromossomos sexuais denominados ZZ. Já as fêmeas são heterogaméticas, apresentando os cromossomos sexuais Z e W.

5 COMPENSAÇÃO DE DOSE DE GENES LIGADOS AO X

O desenvolvimento de qualquer indivíduo depende de um sensível equilíbrio do número de genes, além de um sofisticado controle de sua expressão. Variações dessa condição podem causar fenótipos anormais e até a morte. Neste sentido, caro acadêmico, é interessante e até surpreendente que muitas espécies tenham um sistema de determinação do sexo baseado em fêmeas com dois cromossomos X e machos com apenas um.

Então devemos nos perguntar: como promover o balanço gênico nas espécies em que a fêmea tem dois cromossomos X e os machos apenas um? Os estudos têm demonstrado mecanismos para resolver tal questão, mas o principal, observado em nossa espécie, por exemplo, envolve a inativação de um cromossomo X em cada célula diploide do organismo das fêmeas. Durante o desenvolvimento embrionário, um dos dois cromossomos X é aleatoriamente inativado em cada célula e seus genes deixam de ser expressos. Portanto, tivemos a evolução de um mecanismo epigenético de compensação de dose denominado de inativação do cromossomo X.

6 POLIPLOIDIA E ANEUPLOIDIA

O balanço gênico e o controle da expressão gênica são fundamentais para o desenvolvimento e o funcionamento perfeito de um organismo. Os fenótipos de muitos organismos são afetados por variações no número de cromossomos em suas células, pois ocorre variação no número de genes, alteração em sua expressão e também na produção de proteínas.

Essas diferenças numéricas são descritas como variações da ploidia

do organismo quando temos variação em conjuntos inteiros de cromossomos, entretanto, os indivíduos que apresentam deficiência ou excesso de um determinado cromossomo são aneuploides. Organismos com conjuntos completos de cromossomos são euploides, podendo apresentar conjuntos

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UNIDADE 1 | PRINCÍPIOS DA HEREDITARIEDADE

adicionais de cromossomos, sendo denominados de poliploides. Desta forma, podemos caracterizar os indivíduos como haploides (n cromossomos) quando apresentam um conjunto de cromossomos, de diploides quando apresentam dois conjuntos básicos de cromossomos, ou seja, 2n cromossomos; como triploides, com três conjuntos (3n cromossomos); tetraploides, com quatro conjuntos (4n), e assim sucessivamente. A espécie humana, por exemplo, apresenta células diploides normais com 2N = 46 cromossomos. Seres humanos poliploides são totalmente inviáveis e normalmente são abortados espontaneamente, como os triploides com 2N = 69, por exemplo.

A poliploidia é bastante comum em vegetais, mas muito rara em animais. Metade dos gêneros conhecidos de vegetais contém espécies poliploides. Um efeito da poliploidia é o aumento do tamanho da célula, o que gera aumento geral de tamanho do organismo. As plantas poliploides tendem ser maiores e mais robustas que as diploides da mesma espécie. As plantas poliploides podem produzir sementes e frutos maiores, portanto, apresentam grande interesse agrícola, como no caso do café, batata, banana, morango, trigo, algodão, além de plantas ornamentais.

Entretanto, caro acadêmico, as alterações numéricas de cromossomos podem envolver um determinado cromossomo, neste caso, estamos tratando de uma aneuploidia, em que os organismos sofrem um desequilíbrio genético específico de um único cromossomo. A cromossomopatia ou doença cujo quadro clínico é explicado por um desequilíbrio na constituição cromossômica, mais conhecida e mais comum em seres humanos é a síndrome de Down, causada por trissomia do cromossomo 21, ou seja, os indivíduos apresentam três cromossomos número 21, sendo que o cariótipo 47, XX, + 21 ou 47, XY, + 21 está presente em mais de 90% dos casos da síndrome.

Já uma monossomia ocorre quando há ausência de um cromossomo. Em seres humanos, só existe uma monossomia viável, o cariótipo de mulheres 45, X0, ou síndrome de Turner. Esses indivíduos têm um só cromossomo X, mas apresentam um complemento diploide de autossomos. Cabe salientar que possuem ovários rudimentares e são quase sempre estéreis. A ausência de um cromossomo X, como na síndrome de Turner, pode apresentar efeitos severos, mas a presença de cromossomos X extranumerários, como em indivíduos 47, XXX, pode ter seus efeitos reduzidos devido à compensação de dose por inativação de dois cromossomos X, ficando apenas um X ativo em cada célula.

7 ALTERAÇÕES ESTRUTURAIS DOS CROMOSSOMOS

Caro acadêmico, as alterações cromossômicas, porém, não ocorrem somente em nível numérico. Os cromossomos também podem sofrer alterações estruturais, podendo levar a mudanças de fenótipo, inviabilizar células e organismos ou promover o desenvolvimento de diferentes patologias.

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TÓPICO 3 | BASES CROMOSSÔMICAS DO MENDELISMO

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As anormalidades cromossômicas estruturais ocorrem devido a quebras cromossômicas, produzindo deleções, inversões, duplicações, translocações, além da formação de isocromossomos ou cromossomos em anel.

• Deleções: a perda de um segmento cromossômico é denominada deleção. As deleções podem ser detectadas por técnicas citogenéticas de bandeamento em cromossomos corados. Um exemplo clássico em humanos é a síndrome do miado do gato, também conhecida como cri-du-chat. Essa síndrome é causada por deleção no braço curto do cromossomo 5. Indivíduos portadores da deleção têm o cariótipo 46 del(5)(p14), ou seja, deleção na região 14 do braço curto (p) de um dos cromossomos 5. Esses indivíduos podem apresentar grave comprometimento mental e físico, já o choro característico, semelhante ao miado de gato, deu nome à síndrome.

• Inversões: Nas inversões, um segmento cromossômico quebrado é reinserido no cromossomo, porém de forma invertida, girando 180°. Como consequência, ocorre uma inversão da ordem dos genes no segmento cromossômico envolvido. As inversões podem ocorrer a partir de quebras cromossômicas induzidas por radiações ionizantes ou cisalhamento mecânico. Entretanto, há evidências de inversões por atividade de elementos transponíveis, também conhecidos como transposons, ou seja, sequências de DNA capazes de mudar de posição no cromossomo. As inversões podem ainda ser classificadas em pericêntricas ou paracêntricas. As pericêntricas incluem o centrômero do cromossomo, mudando a sua posição, já as inversões paracêntricas não envolvem os centrômeros (Figura 12).

FONTE: Regateiro (2003, p. 275 )

FIGURA 12 – INVERSÕES PARACÊNTRICAS E PERICÊNTRICAS. INVERSÕES PERICÊNTRICAS INCLUEM O CENTRÔMERO

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UNIDADE 1 | PRINCÍPIOS DA HEREDITARIEDADE

• Duplicações: a duplicação ocorre quando há um segmento cromossômico extra, que pode fazer parte de um cromossomo ou pode constituir um novo cromossomo separado.

• Translocações: elas ocorrem quando um fragmento de um cromossomo se desprende e se liga a outro cromossomo, não homólogo, havendo a transferência dos genes de um cromossomo para outro. A troca de fragmentos de dois cromossomos não homólogos é denominada translocação recíproca, e pode ocorrer por influências ambientais, como exposição à radiação e a agentes químicos.

Um caso clássico na espécie humana é a formação do cromossomo Philadelphia, causando Leucemia Mieloide Crônica (LMC). O evento genético que ocorre na LMC é a translocação recíproca entre os cromossomos 9 e 22, t(9;22) (q34;q11) nas células-tronco hematopoiéticas, proporcionando a formação do cromossomo Philadelphia (Ph; 22q-) (Figuras 13 e 14). O resultado desta translocação é a geração do gene híbrido, quimérico, BCR-ABL1, produzindo um transcrito ativo BCR-ABL no cromossomo rearranjado Philadelphia (Ph), codificando uma oncoproteína que apresenta elevada atividade tirosina quinase, sendo responsável pela grande maioria dos efeitos clínicos na LMC.

Os cromossomos não homólogos podem também se fundir unindo-se pelas regiões centroméricas, evento denominado de translocação robertsoniana, em homenagem ao citologista F. W. Robertson (1816-1853). A fusão de dois cromossomos acrocêntricos produz um cromossomo metacêntrico e os braços curtos dos cromossomos envolvidos são perdidos (Figura 15).

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TÓPICO 3 | BASES CROMOSSÔMICAS DO MENDELISMO

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FIGURA 13 – CARIÓTIPO 46, XY, T(9;22) (Q34;Q11.2) COM AS SETAS EVIDENCIANDO O CROMOSSOMO PHILADELPHIA (PH), 22Q- E O SEU DERIVATIVO 9Q+

Ph

FONTE: O autor

FIGURA 14 – FORMAÇÃO DO GENE BCR-ABL NO CROMOSSOMO PHILADELPHIA (PH)

FONTE:< https://www.cancer.gov/publications/dictionaries/cancer-terms/def/bcr-abl-fusion-gene>. Acesso em: 29 agosto 2015.

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UNIDADE 1 | PRINCÍPIOS DA HEREDITARIEDADE

• Isocromossomos: um isocromossomo apresenta deleção de um braço e duplicação de outro.

• Cromossomo em anel: surge quando as extremidades (telômeros) de um cromossomo são perdidas, e as suas extremidades sem telômeros ligam-se, originando um cromossomo em anel.

FIGURA 15 – TRANSLOCAÇÃO ROBERTSONIANA

FONTE: Snustad, Simmon (2017, s.p. )

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RESUMO DO TÓPICO 3

Neste tópico, você aprendeu que:

• Durante a divisão celular, a cromatina formada por ácido desoxirriboncléico (DNA), ácido ribonucléico (RNA) e proteínas, atinge a sua máxima compactação, formando cromossomos bem definidos.

• Os cromossomos podem ser classificados como metacêntricos, submetacêntricos e acrocêntricos, de acordo com a posição do centrômero.

• As células somáticas humanas apresentam um complemento cromossômico diploide (2n) de 46 cromossomos, com 22 pares de autossomos e um par sexual, XX em mulheres e XY em homens.

• Uma série de doenças causadas por alelos recessivos, com loci no cromossomo sexual X, são mais comuns em homens, como a hemofilia, por exemplo.

• Vários genes no cromossomo Y humano são necessários à fertilidade masculina.

• O gene SRY (Sex Determining Region in chromosome Y) é o gene determinante do sexo no cromossomo Y, sendo a sua presença o fator fundamental na ativação da diferenciação sexual masculina no embrião.

• Em seres humanos e outros mamíferos placentários, o sexo masculino é determinado pela presença do cromossomo Y.

• O efeito dominante do cromossomo Y manifesta-se no início do desenvolvimento embrionário, proporcionando a transformação das gônadas primordiais em testículos, que secretam testosterona.

• O cromossomo Y de Drosophila não influencia a determinação do sexo, como ocorre em humanos. O sexo da mosca é determinado sim pela razão entre o número de cromossomos X e de autossomos.

• Em aves, borboletas e alguns répteis, temos os machos como o sexo homogamético, com dois cromossomos sexuais denominados ZZ. Já as fêmeas são heterogaméticas, apresentando os cromossomos sexuais Z e W.

• Organismos com conjuntos completos de cromossomos são euploides, podendo apresentar conjuntos adicionais de cromossomos, sendo denominados de poliploides.

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• A espécie humana, por exemplo, apresenta células diploides normais com 2N = 46 cromossomos. Seres humanos poliploides são totalmente inviáveis e normalmente são abortados espontaneamente, como os triploides com 2N = 69.

• A poliploidia é bastante comum em vegetais, mas muito rara em animais. Metade dos gêneros conhecidos de vegetais contém espécies poliploides.

• As alterações numéricas de cromossomos podem envolver um determinado cromossomo, neste caso, estamos tratando de uma aneuploidia.

• A cromossomopatia mais conhecida e mais comum em seres humanos é a síndrome de Down, causada por trissomia do cromossomo 21, ou seja, os indivíduos apresentam três cromossomos número 21, apresentando cariótipo 47, XX, + 21 ou 47, XY, + 21.

• Uma monossomia ocorre quando há ausência de um cromossomo. Em seres humanos, só existe uma monossomia viável, o cariótipo de mulheres 45, X0, ou síndrome de Turner.

• As anormalidades cromossômicas estruturais ocorrem devido a quebras

cromossômicas, produzindo deleções, inversões, duplicações, translocações, além da formação de isocromossomos ou cromossomos em anel.

• A perda de um segmento cromossômico é denominada deleção. Um exemplo clássico em humanos é a síndrome do miado do gato ou cri-du-chat, causada por deleção no braço curto do cromossomo 5.

• Nas inversões, um segmento cromossômico quebrado é reinserido no cromossomo, porém de forma invertida, girando cerca de 180°.

• As translocações ocorrem quando um fragmento de um cromossomo se desprende e se liga a outro cromossomo.

• Na espécie humana, a formação do cromossomo Philadelphia causa Leucemia Mieloide Crônica (LMC). O evento genético que ocorre na LMC é a translocação recíproca entre os cromossomos 9 e 22, t(9;22) (q34;q11), resultando na formação do cromossomo Philadelphia (Ph; 22q-).

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1 Na espécie humana, o número diploide de cromossomos é 46. Quantos cromossomos são encontrados nos neurônios, espermatozoides, células epidérmicas e óvulos, respectivamente?

a) ( ) 46, 23, 23, 46. b) ( ) 46, 22 ,22, 46. c) ( ) 23, 23, 23, 46. d) ( ) 46, 23, 46, 23. e) ( ) 23, 46, 23, 46.

2 A alteração citogenética mais comum na leucemia mieloide crônica é:

a) ( ) Cromossomo Philadelphia. b) ( ) t(15,21). c) ( ) t(14,21). d) ( ) Trissomia do cromossomo 12. e) ( ) Monossomia do cromossomo 5.

3 Defina as seguintes alterações cromossômicas estruturais, relacionando com uma doença causada pelas mesmas.

• Translocação recíproca: • Deleção:

4 Explique a importância do cromossomo Y na determinação do sexo na espécie humana e em Drosophila.

AUTOATIVIDADE

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TÓPICO 4

MAPAS CROMOSSÔMICOS

UNIDADE 1

1 INTRODUÇÃOCaro acadêmico, os mapas cromossômicos atuais surgiram a partir

de vários estudos citogenéticos. O pesquisador Thomas H. Morgan (1866-1945) embasou tais estudos ao demonstrar que o gene para os olhos brancos em Drosophila apresentava seu locus no cromossomo X. Estudos adicionais de colaboradores de Morgan demonstraram que outros genes estavam localizados no X de Drosophila, por exemplo, formando um mapa para este cromossomo.

Quando tratamos de mapeamento do genoma, estamos estudando a localização dos genes nos cromossomos e o conhecimento das distâncias físicas e genéticas que os separam, bem como o sequenciamento do DNA.

Atualmente, estamos diante de precisos mapas cromossômicos em diferentes espécies. O projeto genoma humano (PGH) teve como objetivo identificar todos os genes responsáveis por nossas características normais e patológicas. Os mapas cromossômicos e o sequenciamento do genoma humano podem permitir, por exemplo, a prevenção e o diagnóstico precoce de enfermidades. Muitas patologias com causa genética podem vir a ser tratadas em nível molecular. Já é possível detectar, no pré-natal, a quais doenças o indivíduo está mais vulnerável.

2 LIGAÇÃO, RECOMBINAÇÃO E CROSSING-OVER

O método de mapeamento dos cromossomos foi desenvolvido por Alfred H. Sturtevant (1891-1970), um acadêmico de graduação que trabalhava no laboratório de Morgan. Para tal, Sturtevant utilizou análises de dados de cruzamentos experimentais em Drosophila.

O mapeamento de Sturtevant foi baseado no princípio de que genes situados no mesmo cromossomo devem ser herdados juntos, pois estão fisicamente ligados e devem seguir unidos durante a meiose. Esse fenômeno é denominado ligação (linkage). Morgan e seus alunos acreditavam que os genes estivessem organizados de forma linear nos cromossomos.

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UNIDADE 1 | PRINCÍPIOS DA HEREDITARIEDADE

No entanto, sabemos que a ligação não é absoluta. Os dados experimentais dos primeiros geneticistas mostravam que genes no mesmo cromossomo poderiam ser separados durante a meiose, ou seja, na divisão celular de formação de gametas, e que novas combinações de genes poderiam ocorrer. Neste caso, haveria então pareamento dos cromossomos homólogos e uma troca física de material genético, recombinando os genes. Os pontos de cruzamento foram denominados de quiasma, e o processo de troca entre cromossomos pareados de crossing-over. Desta forma, a recombinação, ou seja, separação de genes ligados e a formação de novas combinações gênicas é uma consequência do crossing-over.

Os gametas recombinantes são produzidos pelo crossing-over entre cromossomos homólogos, havendo permuta física entre os cromossomos na prófase da primeira divisão meiótica, após pareamento dos cromossomos duplicados (Figura 16). Embora haja quatro cromátides homólogas, somente duas participam do crossing-over em um ponto específico. Cada cromátide é quebrada no local da permuta, e os fragmentos se ligam novamente, produzindo recombinantes. Caro acadêmico, devemos ressaltar que apenas duas cromátides participam da permuta em determinado ponto. Entretanto, pode haver permuta das outras duas cromátides em outro local.

FIGURA 16 – CROSSING-OVER. RECOMBINAÇÃO ENTRE CROMOSSOMOS HOMÓLOGOS

FONTE: Snustad, Simmon (2017, s. p. )

3 MAPEAMENTO CROMOSSÔMICO

Caro acadêmico, para entendermos a técnica de mapeamento, vamos considerar o cruzamento-teste da Figura 19. As fêmeas de Drosophila de tipo selvagem foram cruzadas com machos homozigotos para duas mutações autossômicas – vestigial (vg), que produz asas curtas, e black (b), que produz corpo preto.

Todas as moscas da F1 tinham asas longas e corpos cinza, pois os alelos selvagens vg+ e b+ são dominantes. Em seguida, fez-se o cruzamento-teste das fêmeas da F1 com machos de corpo preto e asas curtas, e a prole da F2 foi analisada.

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TÓPICO 4 | MAPAS CROMOSSÔMICOS

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Como resultado, temos quatro classes fenotípicas, duas mais frequentes e duas menos. As classes de alta frequência apresentam o mesmo fenótipo dos pais, e as classes menos frequentes têm fenótipo recombinante. Considerando os resultados da F2, podemos verificar que os genes vestigial e black estão ligados porque os recombinantes são pouco frequentes na prole total. Portanto, é obrigatório que esses genes estejam no mesmo cromossomo, ou seja, não são herdados de forma independente. Para determinar a distância entre os genes, é preciso estimar a frequência dos recombinantes na F2, sendo que cada mosca recombinante herdou um cromossomo apresentando crossing-over entre vg e b.

O resultado apresenta que 18% dos cromossomos isolados da meiose tinham um crossing-over entre vg e b. Os geneticistas chamam a unidade de mapa de centiMorgan, abreviado como cM, em homenagem a T. H. Morgan. Portanto, podemos dizer que vg e b estão distantes 18 cM. Note que a distância no mapa é igual à frequência de recombinação, escrita na forma de porcentagem.

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UNIDADE 1 | PRINCÍPIOS DA HEREDITARIEDADE

FIGURA 17 – RESULTADOS NA F2 DE DOIS GENES LIGADOS, VG E B, EM DROSOPHILA.

FONTE: Adaptado de Snustad, Simmon (2017, s.p.)

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TÓPICO 4 | MAPAS CROMOSSÔMICOS

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Na Figura 17 os resultados na F2 a partir de cruzamento-teste das fêmeas da F1com machos de corpo preto e asas curtas, ou seja, homozigotos recessivos, apresentam 820 não recombinantes e 180 recombinantes. A frequência de recombinantes é obtida, dividindo o número de recombinantes pelo número total de indivíduos, assim sendo, temos 180/1000 = 0,18.

Prezado aluno, espera-se que os cromossomos maiores apresentem mais crossing-overs que os curtos. Entretanto, alguns segmentos de um cromossomo são mais propensos ao crossing-over que outros. Desta forma, podemos perceber que as distâncias no mapa genético não correspondem exatamente às distâncias físicas no mapa citológico do cromossomo.

Está muito claro que a probabilidade de ocorrer crossing-over perto das extremidades de um cromossomo ou próximo do centrômero é reduzida. Portanto, temos essas regiões mais condensadas no mapa genético. Regiões com maior frequência de crossing-overs estão expandidas.

Resumindo, não existe uma relação uniforme entre distância física e genética dos genes em um cromossomo, mas os mapas genéticos e citológicos de um cromossomo são colineares. O mapeamento pelos estudos de recombinação revela a ordem correta dos genes ao longo de um cromossomo, no entanto, não mostra as distâncias físicas verdadeiras.

4 MAPEAMENTO CITOGENÉTICO

O mapeamento realizado pelos estudos de recombinação identifica as posições relativas dos genes, usando a frequência de crossing-over como medida de distância, porém, caro acadêmico, não possibilita a localização de genes com relação a pontos de referência, como as bandas cromossômicas.

Para a localização mais precisa dos genes, pode-se realizar estudos de efeitos fenotípicos dos rearranjos cromossômicos, como deleções e duplicações. Tais rearranjos podem ser identificados e, assim, se correlacionar seus efeitos fenotípicos a determinadas regiões de um cromossomo.

Deleções e duplicações foram muito úteis para a localização dos genes nos mapas citológicos dos cromossomos de Drosophila. No mapeamento por deleção, temos a perda de um segmento cromossômico que apresenta um alelo selvagem, revelando uma mutação recessiva, ou seja, aparecendo o fenótipo de um alelo recessivo presente no homólogo sem a deleção. Essa deleção localiza esse gene dentro dos limites da deleção.

Também podemos usar duplicações para identificar a localização citológica dos genes. Neste caso, pesquisamos uma duplicação que mascara o fenótipo de uma mutação recessiva. Uma duplicação que cobre uma mutação recessiva contém obrigatoriamente uma cópia de tipo selvagem do gene mutante.

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UNIDADE 1 | PRINCÍPIOS DA HEREDITARIEDADE

A análise de ligação gênica na espécie humana envolve a obtenção de dados de heredogramas. Entretanto, os dados podem ser limitados ou incompletos. Atualmente, graças aos métodos de biologia molecular, podemos analisar a herança de dezenas de marcadores moleculares, envolvendo diferentes loci, no mesmo conjunto de heredogramas, o que possibilita uma grande capacidade de detectar a ligação e de estabelecer mapas cromossômicos detalhados.

5 RECOMBINAÇÃO E EVOLUÇÃO

As mutações podem gerar problemas para a sobrevivência dos organismos, que acabam sendo eliminados por seleção natural. Entretanto, nem todas as mutações são prejudiciais e deletérias para os portadores.

A mutação é a base de toda a variabilidade genética, e se constitui na

matéria-prima para a evolução. A recombinação rearranja essa variabilidade e a seleção natural preserva as combinações mais bem adaptadas ao ambiente. Sem mutação e recombinação, os genes seriam sempre iguais e os organismos não poderiam evoluir.

Se é verdade que a mutação é a fonte primária da variabilidade genética, também é verdade que a recombinação gênica é importante na reorganização entre os diferentes alelos e genes dos seres vivos. A evolução seria extremamente lenta se não houvesse um meio de reunir as mutações de diferentes indivíduos. A mutação e a recombinação proporcionam o surgimento de organismos mais bem adaptados ao ambiente.

Caro acadêmico, as mutações e a recombinação gênica, como o crossing-over, agem em conjunto. A mutação modifica o DNA, e a recombinação proporciona o estabelecimento de várias combinações genéticas. A estabilidade genética é fundamental para a vida em curto prazo, mas considerando períodos de tempo mais longos, podemos ter uma dependência da variabilidade genética.

Importante também é entender que a molécula de DNA pode sofrer rearranjos, gerando novas combinações de genes em um determinado genoma, ou ainda promover a alteração da expressão dos mesmos. Tais rearranjos do DNA são realizados pela recombinação genética homóloga, como crossing-over na meiose e sítio-específica, em que não é necessária extensa homologia do DNA.

Caro acadêmico, as diferentes combinações de genes geradas por recombinação podem, porém, ser impedidas por rearranjos dos cromossomos, como inversões. O crossing-over geralmente é inibido nas regiões onde ocorrem rearranjos, por desorganizar o pareamento dos cromossomos, reduzindo a frequência de recombinações.

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TÓPICO 4 | MAPAS CROMOSSÔMICOS

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A supressão da recombinação foi importante na evolução dos cromossomos sexuais em mamíferos. As evidências partem de estudos com uma série de genes compartilhados pelos cromossomos humanos X e Y, pois ocupam posições diferentes nestes cromossomos X e Y, o que deve ter ocorrido por inversões durante a evolução.

Devemos salientar ainda que as sequências desses genes divergiram em diferentes graus ao longo do tempo, sendo que algumas regiões tiveram a recombinação suprimida por diferentes períodos durante a evolução.

Os pesquisadores atualmente entendem que os cromossomos X e Y se originaram de um par de autossomos, e uma inversão no que se tornaria o cromossomo Y causou uma supressão regional da recombinação entre X e Y. Em humanos, outras inversões suprimiram a recombinação entre várias regiões nos cromossomos X e Y. No entanto, genes ativos foram preservados no cromossomo X, mas no cromossomo Y houve degeneração da maioria dos genes por efeito de mutações. Deste modo, o cromossomo Y passou a apresentar menos genes ativos que o X, arranjados em ordem diferente.

DICAS

Prezado acadêmico, assista ao filme Gattaca – Experiência Genética. O filme envolve uma série de aspectos éticos extremamente importantes relacionados à Genética Humana, considerando o presente e um futuro não muito distante. FONTE: <https://www.youtube.com/watch?v=mV40nDD7gDk>. Acesso em: 18 set. 2018

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UNIDADE 1 | PRINCÍPIOS DA HEREDITARIEDADE

LEITURA COMPLEMENTAR

Iremos, enfim, curar doenças genéticas?

Alexandro Cézar Faleiro

Há muito tempo, pesquisadores de diversas áreas buscam desenvolver uma metodologia capaz de corrigir erros no material genético humano. No entanto, manipular o nosso DNA não é tão simples quanto nos filmes de ficção científica, afinal existem vários mecanismos envolvidos no armazenamento, na regulação da expressão e na correção da nossa informação genética.

Mesmo assim, ao longo dos anos, desde que Watson, Crick, Franklin e Wilkins desvendaram a estrutura do DNA, várias pesquisas foram desenvolvidas com a finalidade de curar doenças ocasionadas por genes não funcionais ou que levam à síntese de uma proteína alterada. Como exemplo podemos citar o albinismo, a diabetes, a fibrose cística, entre outras.

A fibrose cística (ou micoviscidose) é uma doença grave que afeta principalmente o pulmão, pâncreas e o sistema digestório e, até o momento, é incurável. Caracteriza-se pela produção de um muco muitas vezes mais espesso que aquele produzido normalmente pelo organismo, favorecendo o acúmulo de bactérias e, consequentemente, a ocorrência de inflamações e infecções; nos pulmões, além da possibilidade de infecção, o muco dificulta muito a respiração, prejudicando a qualidade de vida. Atualmente, o diagnóstico precoce associado a um tratamento multidisciplinar adequado é capaz, não apenas, de aumentar a expectativa de vida, mas também, melhorar a qualidade de vida das pessoas.

Durante algum tempo, pesquisadores tentaram desenvolver uma terapia gênica para a fibrose cística, porém, sem sucesso. Recentemente, um grupo de cientistas ingleses obteve um resultado, embora modesto, bastante promissor. Utilizando-se de um vetor não-viral, a terapia foi administrada através de nebulização (método semelhante a uma inalação), de forma que o gene modificado alcançasse as células pulmonares. Ainda há muito que se fazer, mas um importante passo foi dado. O estudo pode ser acessado no site da revista THE LANCET Respiratory Medicine.

Atualmente, a técnica que está roubando cena é denominada CRISPR/Cas9 (pronuncia-se Crisper-cás-nove e significa Clustered Regularly Interspaced Short Palindromic Repeats — Repetições Palindrômicas Curtas Agrupadas e Regularmente Interespaçadas) e a Cas9 é a principal nuclease envolvida e tem como função cortar o DNA. Esse mecanismo é utilizado por bactérias para combater infecções virais (sim, existem vírus capazes de infectar bactérias, denominados bacteriófagos). Essa técnica permite cortar regiões específicas do

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TÓPICO 4 | MAPAS CROMOSSÔMICOS

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DNA e corrigir o erro, é o que se chama de edição do DNA. Para que isso seja possível, é necessário fornecer à Cas9 uma molécula de RNA (RNA guia) que contém a sequência correta e, a partir daí, cortar a dupla-fita de DNA para que ocorra a inserção. As aplicações dessas técnicas são amplas e variadas, podendo ser usada para:

• Combate à malária, através da edição de genes no mosquito transmissor, causando a esterilidade do mesmo;

• Combate à poluição usando microrganismos modificados capazes de digerir vários tipos de poluentes;

• Melhoramento de plantas cultivadas, conferindo maior resistência a pragas e/ou alterações climáticas;

• Cura de doenças genéticas humanas. É possível, ainda, manipular genes de embriões para que os bebês nasçam

geneticamente favorecidos, ou seja, melhorados geneticamente. Assim, seria possível termos bebês que nasçam com maior aptidão física ou com a cor dos olhos escolhida pelos pais; porém, com base nos princípios da Bioética, esse tipo de situação não é aceitável, não devendo ocorrer a manipulação ou edição do DNA com essa finalidade.

Temos, ainda, um longo caminho a ser percorrido, tanto no que refere a própria técnica quanto nas discussões éticas que a envolvem, mas, o fato é que estamos, sim, caminhando para a cura, se não de todas, de grande parte das doenças genéticas e, consequentemente, para melhor qualidade de vida das pessoas que convivem com essas doenças.

FONTE: <http://docente.unemat.br/acfaleiro/crispr/>. Acesso em: 18 set. 2018.

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RESUMO DO TÓPICO 4

Neste tópico, você aprendeu que:

• Os mapas cromossômicos e o sequenciamento do genoma humano podem permitir a prevenção e o diagnóstico precoce de enfermidades, bem como vir a ser tratadas em nível molecular.

• O início do desenvolvimento do mapeamento cromossômico foi baseado no princípio de que genes situados no mesmo cromossomo devem ser herdados juntos, pois estão fisicamente ligados e seguem unidos durante a meiose. Esse fenômeno é denominado de ligação (linkage).

• No entanto, sabemos que a ligação não é absoluta. Os genes do mesmo cromossomo podem ser separados durante a meiose, e novas combinações de genes podem surgir. Há pareamento dos cromossomos homólogos e uma troca física de material genético recombinando os genes. Os pontos de cruzamento são denominados de quiasma, e o processo de troca entre cromossomos pareados de crossing-over.

• Os geneticistas chamam a unidade de mapa de centiMorgan, abreviado como cM, em homenagem a T. H. Morgan.

• Alguns segmentos de um cromossomo são mais propensos ao crossing-over que outros. Desta forma, podemos perceber que as distâncias no mapa genético não correspondem exatamente às distâncias físicas no mapa citológico do cromossomo.

• A probabilidade de ocorrer crossing-over perto das extremidades de um cromossomo ou próximo do centrômero é reduzida.

• Para a localização mais precisa dos genes, pode-se realizar estudos de efeitos fenotípicos dos rearranjos cromossômicos, como deleções e duplicações.

• A análise de ligação gênica na espécie humana envolve a obtenção de dados de heredogramas. Graças aos métodos de biologia molecular, podemos analisar a herança de dezenas de marcadores moleculares, envolvendo diferentes loci, no mesmo conjunto de heredogramas, o que possibilita uma grande capacidade de detectar a ligação e de estabelecer mapas cromossômicos detalhados.

• As mutações podem gerar problemas para a sobrevivência dos organismos, que acabam sendo eliminados por seleção natural. Entretanto, nem todas as mutações são prejudiciais.

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• A mutação é a base de toda a variabilidade genética e se constitui na matéria-prima para a evolução. A recombinação rearranja essa variabilidade e a seleção natural preserva as combinações mais bem adaptadas ao ambiente.

• Os rearranjos do DNA são realizados pela recombinação genética homóloga, como crossing-over na meiose e sítio-específica, em que não é necessária extensa homologia do DNA.

• As diferentes combinações de genes geradas por recombinação podem ser impedidas por rearranjos dos cromossomos, como inversões. O crossing-over geralmente é inibido nas regiões onde ocorrem rearranjos.

• A supressão da recombinação foi importante na evolução dos cromossomos sexuais em mamíferos.

• Os cromossomos X e Y podem ter se originado de um par de autossomos, e uma inversão no que se tornaria o cromossomo Y causou uma supressão regional da recombinação entre X e Y.

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AUTOATIVIDADE

1 (ENADE Biologia, 2011)

As endonucleases de restrição são utilizadas para a obtenção de fragmentos de DNA que contêm os genes. A obtenção do gene D, tendo como base o mapa acima, seria possível por digestão com:FONTE: < https://bit.ly/2MDTyuZ>. Acesso em: 18 set. 2018.

a) ( ) BglII. b) ( ) SalI. c) ( ) BamHI. d) ( ) BamHI + SalI. e) ( ) BglII + SalI.

2 Os genes W e R apresentam loci no mesmo cromossomo, sendo a distância entre eles de 17 cM. A frequência de gametas WR e wr formados por um indivíduo WR/wr é de:

a) ( ) 8,5%b) ( ) 17%c) ( ) 34%d) ( ) 41,5%e) ( ) 83%

3 Um indivíduo com genótipo ainda não determinado gerou os seguintes gametas:

5% AB; 45% Ab; 45% aB; 5% ab. Baseado nestas informações, responda:

a) Quais desses gametas são parentais e quais são recombinantes? b) Qual o genótipo do indivíduo? c) Qual a taxa de recombinação?d) Qual a distância dos loci A e B no mapa genético?

4 Correlacione mutação, recombinação, crossing-over e evolução das espécies.

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UNIDADE 2

GENÉTICA MOLECULAR

OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM

PLANO DE ESTUDOS

A partir do estudo desta unidade, você deverá ser capaz de:

• compreender as bases da Genética Molecular;

• proporcionar ao acadêmico conhecimentos da estrutura molecular do material genético e dos processos celulares nos quais ele está envolvido, considerando os aspectos relacionados ao fluxo da informação gênica;

• entender, do ponto de vista teórico, como funcionam e são aplicadas as Técnicas de Biologia Molecular, fornecendo as condições necessárias para analisar e discutir os aspectos éticos envolvidos;

• possibilitar o desenvolvimento do raciocínio crítico e interpretação do de-senvolvimento científico na área da Genética Molecular.

Esta unidade está dividida em três tópicos. No decorrer da unidade você encontrará autoatividades com o objetivo de reforçar o conteúdo apresentado.

TÓPICO 1 - OS ÁCIDOS NUCLEICOS E A CROMATINA

TÓPICO 2 - TRANSMISSÃO E MANUTENÇÃO DA INFORMAÇÃO GENÉTICA

TÓPICO 3 - TÉCNICAS DE BIOLOGIA MOLECULAR

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TÓPICO 1

OS ÁCIDOS NUCLEICOS E A

CROMATINA

UNIDADE 2

1 INTRODUÇÃOEm 1869, Johann Friedrich Miescher, um jovem suíço estudante de

Medicina, isolou a partir de leucócitos uma substância ácida, rica em nitrogênio e fósforo, a qual chamou de “nucleína”. A existência de cadeias polinucleotídicas, o principal componente do material ácido da nucleína de Miescher, só foi documentada nos anos 1940. Contudo, o papel dos ácidos nucleicos no armazenamento e na transmissão de informações genéticas só foi confirmado em 1944, e a estrutura em dupla-hélice do DNA foi descoberta em 1953, por Watson (1928) e Crick (1916-2004).

A função do DNA, ou seja, armazenar a informação genética ao longo de sequências de quatro bases nitrogenadas (A, T, C e G), foi atribuída por muito tempo às proteínas. Cromossomos são compostos por ácidos nucleicos e proteínas, mas desde a década de 1940 os resultados de experimentos indicaram claramente que as informações genéticas são armazenadas em ácidos nucleicos, não em proteínas.

Entretanto, é importante salientar, caro acadêmico, que há dois tipos de ácidos nucleicos: o ácido desoxirribonucleico (DNA) e o ácido ribonucleico (RNA). As moléculas de DNA e o RNA são a base da hereditariedade. Com relação ao RNA, existem várias classes desta molécula, e os estudos científicos revelaram a sua participação fundamental na fisiologia das células.

Com os achados científicos de que o DNA é a matéria-prima dos genes, entendemos que todos os genes têm praticamente a mesma estrutura tridimensional; as diferenças estão relacionadas principalmente com a sequência das quatro bases nitrogenadas. Contudo, o RNA, quimicamente muito semelhante ao DNA, apresenta grandes diferenças em sua estrutura e propriedades físico-químicas, relacionadas à grande variedade de funções celulares desempenhadas, como o transporte de informação genética e a catálise de reações, bem como no controle da expressão gênica. Deste modo, o RNA tem sido apontado como a macromolécula primordial no processo de origem da vida.

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UNIDADE 2 | GENÉTICA MOLECULAR

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2 ESTRUTURA E FUNÇÃO DOS ÁCIDOS NUCLEICOS

Os ácidos nucleicos (DNA e RNA) são polímeros, ou seja, macromoléculas constituídas por subunidades repetidas, os nucleotídeos. Cada nucleotídeo é constituído por grupamentos fosfato, um açúcar com cinco átomos de carbono, ou pentose, e um composto nitrogenado cíclico chamado base (Figura 1). Já uma base nitrogenada ligada a um açúcar apenas, forma um nucleosídeo, sem grupamentos fosfato.

FIGURA 1 - ESTRUTURA DE NUCLEOTÍDEOS

FONTE: Zaha (2012, p. 61)

No DNA, a pentose é a 2-desoxirribose (ácido desoxirribonucleico), já no RNA, o açúcar é a ribose (ácido ribonucleico). Como pode ser verificado na Figura 2, a desoxirribose apresenta no carbono 2 um grupamento OH, e a ribose um hidrogênio.

FIGURA 2 - PENTOSES: RIBOSE (RNA) E DESOXIRRIBOSE (DNA)

FONTE: Zaha (2012, p. 61)

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TÓPICO 1 | OS ÁCIDOS NUCLEICOS E A CROMATINA

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Quatro bases diferentes são encontradas no DNA: adenina (A), guanina (G), tiamina (T) e citosina (C). O RNA geralmente também contém adenina, guanina e citosina, mas tem uma base diferente, uracila (U), no lugar da timina. A adenina e a guanina são bases de anel duplo chamadas purinas; a citosina, a timina e a uracila são bases de anel simples chamadas pirimidinas. Portanto, tanto o DNA quanto o RNA têm quatro diferentes nucleotídeos: dois nucleotídeos purínicos e dois nucleotídeos pirimidínicos (Figura 3).

FIGURA 3 – NUCLEOTÍDEOS FORMADORES DO DNA: (A) ADENILATO; (B) GUANILATO; (C) CITIDINILATO E (D) TIMIDINILATO. (E) LIGAÇÃO GLICOSÍDICA E LIGAÇÃO ÉSTER

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UNIDADE 2 | GENÉTICA MOLECULAR

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FONTE: Menck e Sluys (2017, s.p.)

A ligação química que une os átomos de nitrogênio das bases ao carbono 1’ da desoxirribose é a N-glicosídica. A adição de um ou mais grupos fosfato ao carbono 5’ do nucleosídeo dá origem ao nucleotídeo. Portanto, o nucleosídeo é formado por uma ligação N-glicosídica entre o açúcar e a base, já o nucleotídeo é formado por uma ligação fosfodiéster entre o açúcar e o fosfato. Nas moléculas de DNA e RNA, os nucleotídeos são unidos em longas cadeias. O RNA geralmente é um polímero unifilamentar, entretanto, o DNA é uma molécula bifilamentar.

Os nucleotídeos são ligados entre si por ligações fosfodiéster, formando cadeias polinucleotídicas, tanto para DNA como para o RNA. As ligações são estabelecidas entre o grupo hidroxila ligado ao carbono 3’ de um nucleotídeo com o grupo fosfato que, por sua vez, está ligado ao carbono 5’ de outro nucleotídeo (Figura 4). Este padrão confere às cadeias polinucleotídicas uma propriedade de grande importância, a direcionalidade. O primeiro nucleotídeo da cadeia apresenta uma extremidade 5’ com um grupamento fosfato, e o nucleotídeo da extremidade 3’ terá um grupamento hidroxílico, portanto, a fita de DNA ou de RNA apresenta uma orientação 5’ → 3’.

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TÓPICO 1 | OS ÁCIDOS NUCLEICOS E A CROMATINA

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FIGURA 4 - REPRESENTAÇÃO DE UMA FITA SIMPLES DE DNA, ORIENTAÇÃO 5’ → 3’.

FONTE: Zaha (2012, p. 21)

Em 1953, James Watson e Francis Crick propuseram um modelo de dupla hélice para o DNA, onde as duas fitas se enrolam em torno do eixo da hélice (Figura 5). As ligações fosfodiéster em ambas as fitas do DNA estão em direções opostas, ou seja, as fitas são antiparalelas, uma está na direção 5’→ 3’ e a outra na direção 3’→ 5’ (Figura 6). Ao longo de uma dupla-hélice de DNA, as ligações fosfodiéster de um filamento vão de um carbono 3’ de um nucleotídeo a um carbono 5’ do nucleotídeo adjacente, enquanto no filamento complementar seguem de um carbono 5’ para um carbono 3’. Tal padrão de polaridade dos filamentos complementares é importante na replicação, transcrição e recombinação do DNA.

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UNIDADE 2 | GENÉTICA MOLECULAR

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FIGURA 5 - DUPLA HÉLICE DE DNA

FONTE: Snustad e Simmons (2017, p. 202)

O pareamento entre as bases nitrogenadas de ambas as fitas é fundamental para estrutura da molécula de DNA. Como podemos ver na Figura 6, caro acadêmico, o pareamento entre as bases sempre ocorre entre adenina e timina (AT) e entre citosina e guanina (CG), através de pontes de hidrogênio. Podemos observar, claramente, que entre A e T temos duas pontes de hidrogênio e entre C e G são produzidas três ligações ponte de hidrogênio.

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FIGURA 6 - (A) REPRESENTAÇÃO PLANAR DA DUPLA FITA DE DNA. (B) FORMA PLANAR DOS PAREAMENTOS ENTRE AS BASES NITROGENADAS

FONTE: Zaha (2012, p. 23)

Caro acadêmico, observe que ao conhecermos a sequência de bases de um dos filamentos de uma dupla-hélice de DNA, também sabemos a sequência de bases do outro filamento, devido ao pareamento específico de bases (AT e CG). Lembrando que os dois filamentos de uma dupla-hélice de DNA são complementares, por exemplo, a sequência 5’– CATCAG – 3’ em uma cadeia corresponde a uma sequência complementar 3’ – GTAGTC – 5’ de outra cadeia. A complementaridade dos filamentos da dupla-hélice torna o DNA adequado para armazenar e transmitir as informações genéticas entre as gerações.

Como podemos ver na Figura 5, os pares de bases no DNA são empilhados com uma distância de 0,34 nm e 10 pares de bases por volta (360°) da dupla-hélice.

A estabilidade das hélices duplas de DNA é consequência, em parte, do grande número de pontes de hidrogênio entre os pares de bases, mas também ocorre pela hidrofobicidade dos nucleotídeos que apresentam baixa solubilidade em água. Já o fosfato e a desoxirribose são moléculas altamente polares que podem interagir fortemente com moléculas de água. Portanto, na estrutura

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UNIDADE 2 | GENÉTICA MOLECULAR

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tridimensional do DNA, o fosfato e a desoxirribose estão mais expostos à água, já as bases nitrogenadas se encontram no interior da dupla hélice, apresentando contato reduzido com a água. O centro hidrofóbico de pares de bases empilhados contribui bastante para a estabilidade das moléculas de DNA presentes nos protoplasmas aquosos das células vivas.

O modelo espacial mostra também que os dois sulcos ou cavidades laterais de uma dupla-hélice de DNA não são idênticos, sendo que o sulco maior é muito mais largo que o sulco menor (Figura 7). Muitas proteínas ligam-se ao DNA através destas cavidades, como as proteínas reguladoras da expressão gênica, por exemplo. Um aspecto relacionado aos sulcos maior e menor é que nessas regiões as bases nitrogenadas podem estar mais expostas, o que possibilita interações com proteínas que reconhecem sequências específicas do DNA.

FIGURA 7 - CAVIDADES MAIOR E MENOR DA DUPLA HÉLICE DE DNA

FONTE: Zaha (2012, p. 22)

Prezado acadêmico, a dupla-hélice do DNA, tomando como base o modelo descrito por Watson-Crick, é denominada de forma B. No tipo B, a dupla-hélice é voltada para a direita e cada par de bases está torcido sobre o par inferior por aproximadamente 36°. Assim, considera-se que uma estrutura

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com o empilhamento de dez pares de bases corresponde a uma torção de 360°, e, portanto, a uma volta completa da dupla-hélice. Em diferentes condições físico-químicas, o DNA pode assumir outras configurações distintas do tipo B (Figura 8). Em condições de baixa umidade, as fibras do DNA podem apresentar o tipo A, que tem maior número de pares de bases (11 pares no tipo A contra 10,5 pares no tipo B) a cada volta da hélice, apresentando um diâmetro maior que o tipo B. Assim como o tipo B, o A também está voltado para a direita. O sulco maior do tipo A é mais profundo e mais estreito que a estrutura correspondente no B. Entretanto, o sulco menor do tipo A é mais largo e raso que o sulco menor do tipo B. Acredita-se que o tipo A do DNA pode ser importante em determinados complexos de DNA-proteína e durante a formação de híbridos DNA-RNA durante a transcrição gênica. Finalmente, algumas sequências de DNA no tipo B podem transitar para o tipo Z, onde o DNA tem uma aparência de zigue-zague, por isso o uso da letra Z. A diferença mais contundente é a mudança de orientação da volta à direita para a volta à esquerda. Regiões do DNA que apresentam resíduos de purinas alternados com resíduos de pirimidinas são mais suscetíveis a sofrer essas transições. O DNA em Z aparece mais alongado, com 12 pares de bases por volta. Tem sido sugerido que o DNA do tipo Z ocorre durante a transcrição, absorvendo parte do superenrolamento do DNA que ocorre durante tal evento.

FONTE: Zaha (2012, p. 30)

FIGURA 8 - TIPOS DE DNA (A, B E Z)

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UNIDADE 2 | GENÉTICA MOLECULAR

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Caro acadêmico, vamos tratar agora, de forma mais específica, das moléculas de RNA. Muitas das considerações anteriores sobre a estrutura do DNA são também válidas para o RNA. O RNA é um ácido nucleico, e por isso também é um polímero de nucleotídeos. Assim como o DNA, o polímero do RNA é mantido por ligações fosfodiéster entre nucleotídeos adjacentes (Figura 9). No entanto, em vez de uma 2’-desoxirribose, o RNA contém uma ribose. Como vimos anteriormente, os dois açúcares diferem em apenas um átomo de oxigênio que faz parte da hidroxila na posição 2’ da ribose. Essa sutil diferença resulta em drásticas consequências na estabilidade dos ácidos nucleicos. A presença do grupo hidroxila altera profundamente a estabilidade do RNA ao tornar esse polímero suscetível à hidrólise catalisada por base. O DNA, por não ter essa hidroxila, é mais estável. Essas características parecem ter favorecido a seleção do DNA como molécula armazenadora da informação genética ao longo da história evolutiva dos seres vivos.

A molécula de RNA pode interagir com proteínas, DNA e com outras moléculas de RNA. Tais moléculas podem catalisar reações como as enzimas e, além disso, armazenar informação genética como o DNA. A partir dessas descobertas, criou-se a hipótese do “mundo do RNA”, onde o RNA seria a molécula primordial, evoluindo para diferentes funções, como no controle da expressão gênica.

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TÓPICO 1 | OS ÁCIDOS NUCLEICOS E A CROMATINA

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FIGURA 9 - FITA SIMPLES DE RNA

FONTE: Zaha (2012, p. 33)

Caro estudante, RNA apresenta diversas funções bem estabelecidas, e pode ser classificado como: RNA mensageiro, que funciona como um intermediário da informação genética desde o gene até a molécula efetora (proteínas); o RNA transportador, que atua como um adaptador entre os códons do RNA mensageiro e os aminoácidos; e o RNA ribossômico, que desempenha papel estrutural nos ribossomos, importante para a síntese proteica; além do papel catalítico, discutido anteriormente.

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No entanto, recentemente, novos papéis para o RNA foram revelados, como os de percepção de estado metabólico, sinalização e regulação da expressão gênica realizados por riboswitches. Além disso, podemos destacar ainda a função de regulação da expressão gênica por meio de microRNAs. Portanto, caro estudante, devido a essa alta versatilidade funcional, foi proposto que o RNA seria a molécula primordial, a partir da qual a vida evoluiu. Segundo essa hipótese, em um determinado momento na história da vida, todas as células tinham o RNA como material genético “Mundo de RNA”.

3 ESTRUTURA CROMOSSÔMICA EM PROCARIOTOS E EUCARIOTOS

Primeiramente, caro acadêmico, devemos salientar que na maioria dos vírus e procariotos, os genes estão presentes em um único cromossomo, que consiste em uma só molécula de ácido nucleico, RNA ou DNA. Os menores vírus de RNA conhecidos têm apenas alguns genes, por exemplo, a molécula única de RNA no genoma do bacteriófago MS2 é constituída de 3.569 nucleotídeos e contém quatro genes. Já o genoma do bacteriófago ΦX174 é uma molécula unifilamentar de DNA com 5.386 nucleotídeos de comprimento, que contém 11 genes. Entretanto, os maiores vírus de DNA, como o bacteriófago T2 (DNA bifilamentar), apresentam cerca de 150 genes.

Os genomas de procariotos são muito maiores que os dos vírus, podendo variar entre 2 milhões a mais de 5 milhões de pares de bases de DNA. Escherichia coli, por exemplo, bactéria muito utilizada em pesquisas, tem 4,6 milhões de pares de bases. Os números de genes desses organismos vão de 2.000 a 5.000. Em geral, os genes têm loci em um único cromossomo, mas, algumas vezes, há um segundo cromossomo, como em Vibrio cholerae, microrganismo que causa a doença gastrintestinal cólera. Muitos procariotos também apresentam um ou muitos tipos de plasmídios, um tipo de DNA acessório em bactérias, em geral contendo pequeno número de genes.

A circunferência total da molécula circular de DNA existente no cromossomo da bactéria Escherichia coli é de cerca de 1.500 mm. Como cada E. coli tem diâmetro de apenas 1 a 2 mm, a grande molécula de DNA existente em cada bactéria precisa existir em uma configuração condensada. O genoma compactado é o estado funcional de um cromossomo bacteriano. Desta forma, a grande molécula de DNA em um cromossomo de E. coli é organizada em 50 a 100 domínios ou alças, sendo que RNA e proteína são componentes do genoma compactado das bactérias (Figura 10).

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FIGURA 10 - COMPACTAÇÃO DO DNA EM BACTÉRIAS. (A) MASSA DE DNA ENROLADO DE FORMA ALEATÓRIA. (B) DNA INTERAGINDO COM PROTEÍNAS FORMANDO ALÇAS

FONTE: Zaha (2012, p. 39)

No entanto, caro acadêmico, células eucarióticas contêm vários cromossomos, cada qual com uma quantidade considerável e maior de DNA do que um cromossomo procariótico, e sempre associado a uma notável quantidade de proteína, principalmente as histonas. Cromossomos eucarióticos são, portanto, mais complexos estruturalmente do que os procarióticos. No ciclo celular, durante a interfase, os cromossomos são imperceptíveis, mas durante a metáfase da meiose ou da mitose, ou seja, durante a divisão celular, ficam claramente visíveis, pois ocorre compactação da cromatina (DNA, proteínas e RNA) formando cromossomos.

A análise química da cromatina mostra ser constituída principalmente de DNA e proteínas, com menos RNA. As proteínas são as denominadas histonas e as denominadas proteínas cromossômicas não histônicas. As histonas desempenham um papel estrutural importante na cromatina. Estão presentes na cromatina de todos os eucariotos em quantidade equivalente à quantidade de DNA. Os eucariotos apresentam cinco tipos diferentes de histonas, chamados H1, H2a, H2b, H3 e H4. Essas proteínas são encontradas em quase todos os tipos de células. Existem algumas exceções, sobretudo em alguns gametas masculinos, nas quais as histonas são substituídas por outra classe de proteínas, as protaminas. No entanto, as histonas foram muito conservadas durante a evolução, demonstrando sua função essencial na compactação do genoma eucariótico. O alto nível de conservação evolutiva das histonas H2a, H2b, H3 e H4 até mesmo em espécies muito divergentes indica de forma contundente que essas proteínas são fundamentais no empacotamento do DNA, além de uma participação na regulação da expressão gênica, pois modificações químicas das histonas podem

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alterar a estrutura do cromossomo, alterando o nível de expressão dos genes presentes na cromatina modificada. No entanto, as proteínas cromossômicas não histônicas estão envolvidas com a regulação da expressão de genes específicos.

A unidade estrutural básica de compactação da cromatina eucariótica é uma partícula nucleoproteica, formada por DNA e histonas, denominada de nucleossomo. Cada nucleossomo eucariótico é composto por um octâmero proteico, formado por duas cópias das histonas H2A, H2B, H3 e H4, além de DNA suficiente para duas voltas sobre o octâmero. Externamente ao complexo, está ligada a histona H1 (Figura 11). Os filamentos que conectam nucleossomos adjacentes são ligadores de DNA, e o tamanho do DNA ligador varia muito de acordo com a espécie e com o tipo celular.

Os dados sugerem ainda que o nucleossomo completo contém duas voltas completas de DNA (um trecho de DNA com 166 pares de nucleotídeos de comprimento) na superfície do octâmero de histonas.

FIGURA 11 - NUCLEOSSOMO. (A) CERNE. (B) COMPLETO

FONTE: Snustad e Simmons (2017, p. 2010)

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In vivo, há clara interação dos nucleossomos, gerando uma condensação em fibras de cromatina de 30 nm. Os cromossomos eucarióticos são condensados ao máximo na metáfase da mitose ou da meiose, o que proporciona a segregação desses cromossomos durante a divisão celular. A estrutura total desses cromossomos altamente condensados é organizada em torno do cerne central das proteínas cromossômicas não histonas. Esse cerne, chamado esqueleto, pode ser visto em micrografias eletrônicas de cromossomos metafásicos isolados dos quais as histonas foram removidas (Figura 12). O esqueleto proteico é cercado de um enorme halo de DNA.

Na compactação da cromatina, portanto, temos o primeiro nível de empacotamento do DNA na formação de nucleossomos, produzindo uma fibra de cromatina interfásica com 11 nm de diâmetro, com a participação de um octâmero de histonas. O segundo nível de condensação é o dobramento adicional da fibra do nucleossomo de 11 nm em uma fibra de cromatina de 30 nm. Posteriormente, as proteínas cromossômicas não histônicas formam um arcabouço que participa da condensação da fibra de cromatina de 30 nm em cromossomos metafásicos (Figura 13).

FONTE: Snustad e Simmons (2017, p. 2013)

FIGURA 12 - MICROGRAFIA ELETRÔNICA DE UM CROMOSSOMO METAFÁSICO HUMANO DO QUAL AS HISTONAS FORAM REMOVIDAS

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FIGURA 13 - COMPACTAÇÃO DA CROMATINA NA FORMAÇÃO DOS CROMOSSOMOS

FONTE: Snustad e Simmons (2017, p. 2013)

4 GENES E GENOMAS

Os procariotos apresentam uma estrutura genômica relativamente simples. Os genes procarióticos são compostos por uma região codificadora e por regiões regulatórias (Figura 14). Podem ter a sua ordem no cromossomo conservada entre espécies aparentadas e alguns grupos de genes podem estar organizados em operons (Figura 15). Os genomas procarióticos normalmente se apresentam como um único cromossomo circular. No entanto, há espécies com mais de um cromossomo, ou mesmo moléculas lineares. As bactérias podem ainda apresentar plasmídios, ou seja, moléculas de DNA circulares extracromossomais, com capacidade de replicação autônoma, que apresentam genes para bacteriocinas e genes envolvidos no metabolismo de antibióticos.

A maioria dos procariotos apresenta genomas entre 2 e 5 Mb, com moléculas compactas apresentando quase 1 gene/Kb, regiões intergênicas curtas e poucas sequências repetidas. Em termos evolutivos, os genomas procarióticos apresentam certa tendência à instabilidade e à desorganização.

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FIGURA 14 - REPRESENTAÇÃO DA ESTRUTURA E EXPRESSÃO DE UM GENE PROCARIÓTICO

FONTE: Zaha (2012, p. 59)

FIGURA 15 - ESTRUTURA DE UM OPERON

FONTE: Zaha (2012, p. 70)

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A comparação de genomas de organismos tão distintos como procariotos, eucariotos unicelulares e eucariotos multicelulares tem revelado certa correlação entre a complexidade do genoma e a complexidade do organismo ao qual esse genoma pertence. Tal correlação, no entanto, é bastante sutil e observada apenas em espécies distantes filogeneticamente. Muito se debate sobre o chamado “paradoxo do valor C”. O valor C refere-se à quantidade de DNA, expresso em pares de bases, de um genoma haploide, sendo importante enfatizar que não parece existir correlação geral entre o tamanho do genoma e a complexidade da espécie. Muitas espécies de planta, por exemplo, têm um genoma bem maior que o genoma humano.

De modo geral, os genomas eucarióticos são maiores que os genomas procarióticos em termos de valor C, pois apresentam um número maior de genes, maior proporção de DNA não codificador, como as sequências repetitivas (STRs, repetições curtas em série utilizadas para a identificação de indivíduos são um exemplo) e maior número de sequências regulatórias. Podemos destacar ainda que são organizados em múltiplos cromossomos e apresentam processos de transcrição e tradução separados fisicamente dentro da célula.

Com relação à estrutura gênica, os eucariotos apresentam uma característica fundamental, seus genes contêm sequências internas chamadas de íntrons, as quais são removidas no RNA mensageiro (mRNA) por um processo chamado splicing. Portanto, tais regiões não são expressas, sendo que as regiões que produzirão as proteínas são os exons (Figura 16).

Nos transcritos primários de genes nucleares, as únicas sequências totalmente conservadas de diferentes íntrons são as sequências dinucleotídicas nas extremidades dos íntrons, a saber:

Exon – GT.... Intron......AG - Exon

As células eucarióticas apresentam mais de um genoma, pois há o genoma nuclear, localizado no núcleo celular e organizado em cromossomos lineares, e também o genoma mitocondrial, resultante da origem endossimbiótica dessa organela. Além do genoma mitocondrial, as plantas também têm o genoma dos cloroplastos.

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FIGURA 16 - REPRESENTAÇÃO DA ESTRUTURA E EXPRESSÃO DE UM GENE EUCARIÓTICO

FONTE: Zaha (2012, p. 87)

5 ELEMENTOS GENÉTICOS MÓVEIS

Os elementos de transposição, ou transposons, são sequências de DNA com a habilidade de se movimentar de uma posição para outra no genoma. Eles apresentam diferentes estruturas e modos de mobilização. A capacidade de mobilização, movimento dentro dos genomas de eucariotos e procariotos, pode acarretar em mutações e rearranjos cromossômicos, com consequências adaptativas, neutras ou deletérias.

Uma importante característica dos elementos de transposição é a presença, em sua sequência nucleotídica, de genes que codificam as proteínas necessárias à sua transposição. A maioria deles apresenta também terminações repetidas, as quais podem ser diretas ou invertidas. São regiões de reconhecimento importantes no momento da transposição. Os transposons estão presentes nos genomas como elementos autônomos, ou seja, têm a capacidade de codificar enzimas necessárias para a sua transposição (enzima transposase), e como não autônomos, apresentam mutações na sua região codificante e, consequentemente,

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não produzem transposase. No entanto, um elemento não autônomo pode ser mobilizado pela ação da enzima produzida por um elemento autônomo, por meio do reconhecimento de suas terminações repetidas.

Os elementos transponíveis são divididos em duas grandes classes, de acordo com seu modo de transposição: os retrotransposons, que se transpõem por meio de um RNA intermediário, usado como molde, e os transposons de DNA que se movem diretamente a partir de uma molécula de DNA. Retroelementos têm intermediários de RNA e dependem de transcriptase reversa.

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RESUMO DO TÓPICO 1

Neste tópico, você aprendeu que:

• O papel dos ácidos nucleicos no armazenamento e na transmissão de informações genéticas foi confirmado em 1944, e a estrutura em dupla-hélice do DNA foi descoberta em 1953, por Watson e Crick.

• Há dois tipos de ácidos nucleicos: o ácido desoxirribonucleico (DNA) e o ácido ribonucleico (RNA). As moléculas de DNA e o RNA são a base da hereditariedade.

• O RNA apresenta grandes diferenças em sua estrutura e propriedades físico-químicas, relacionadas à grande variedade de funções celulares desempenhadas, como o transporte de informação genética e a catálise de reações, bem como no controle da expressão gênica. Deste modo, o RNA tem sido apontado como a macromolécula primordial no processo de origem da vida.

• Os ácidos nucleicos (DNA e RNA) são polímeros, ou seja, macromoléculas constituídas por subunidades repetidas, os nucleotídeos.

• O nucleotídeo é constituído por grupamentos fosfato, um açúcar com cinco átomos de carbono, ou pentose, e um composto nitrogenado cíclico chamado base.

• Nas moléculas de DNA e RNA, os nucleotídeos são unidos em longas cadeias.

• O RNA geralmente é um polímero unifilamentar, entretanto, o DNA é uma molécula bifilamentar.

• Os nucleotídeos são ligados entre si por ligações fosfodiéster, formando cadeias polinucleotídicas, com uma orientação 5’ → 3’.

• Em 1953, James Watson e Francis Crick propuseram um modelo de dupla hélice para o DNA, onde as duas fitas se enrolam em torno do eixo da hélice.

• As ligações fosfodiéster em ambas as fitas do DNA estão em direções opostas, ou seja, as fitas são antiparalelas, uma está na direção 5’ → 3’ e a outra na direção 3’ → 5’.

• Durante a divisão celular em eucariotos, ocorre compactação da cromatina (DNA, proteínas e RNA), formando cromossomos.

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• A unidade estrutural básica de compactação da cromatina eucariótica é uma partícula nucleoproteica, formada por DNA e histonas, denominada de nucleossomo.

• Cada nucleossomo eucariótico é composto por um octâmero proteico, formado por duas cópias das histonas H2A, H2B, H3 e H4, além de DNA suficiente para duas voltas sobre o octâmero. Externamente ao complexo, está ligada a histona H1.

• Os procariotos apresentam uma estrutura genômica relativamente simples.

• O valor C refere-se à quantidade de DNA, expresso em pares de bases, de um genoma haploide, sendo importante enfatizar que não parece existir correlação geral entre o tamanho do genoma e a complexidade da espécie.

• Com relação à estrutura gênica, os eucariotos apresentam exons e íntrons.

• Os elementos transponíveis são divididos em duas grandes classes, de acordo com seu modo de transposição: os retrotransposons, que se transpõem por meio de um RNA intermediário, usado como molde, e os transposons de DNA que se movem diretamente a partir de uma molécula de DNA.

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AUTOATIVIDADE

1 (ENADE, 2005) Em 1953, Watson e Crick propuseram o modelo da dupla hélice para a estrutura do DNA. Resultou do corpo de conhecimentos desenvolvidos a partir dessa proposta:

a) ( ) o mapeamento dos genes nos cromossomos.b) ( ) o estabelecimento das leis da herança genética.c) ( ) a produção de vacinas contra doenças virais e bacterianas.d) ( ) o desenvolvimento de quimioterápicos para o tratamento do câncer. e) ( ) a produção de hormônio recombinante para o tratamento do nanismo.

2 (ENADE, 2008) Há sete anos, em uma cidade da região rural do sul do país, foi registrado o desaparecimento de uma criança de dois anos de idade que brincava no quintal de sua casa. Durante as investigações, foram encontrados vestígios biológicos no local do desaparecimento, que foram coletados e submetidos a análises de biologia forense, que revelaram a presença de sangue humano, contendo vários tipos celulares, como hemácias, neutrófilos e linfócitos, além de contaminação com células animais de outra espécie. Além desses exames, foram realizados estudos de vínculo genético entre as amostras de sangue humano encontradas no local do desaparecimento e as dos pais biológicos da criança desaparecida. Recentemente, foi encontrada uma criança de nove anos de idade que apresenta um sinal na pele muito semelhante ao da criança desaparecida. Foram colhidas amostras de sangue e realizadas análises comparativas com o material obtido sete anos atrás, que confirmaram tratar-se da mesma pessoa. Considerando-se o texto apresentado, qual das opções a seguir traz uma afirmação correta acerca das aplicações do DNA como marcador para estudos taxonômico-sistemáticos?

a) ( ) Para que se possa identificar a espécie à qual pertencem as células contaminantes coletadas no local do desaparecimento, é necessário realizar o sequenciamento completo do genoma de tais células.

b) ( ) Caso as células contaminantes encontradas sejam de uma espécie animal que pertença, como os seres humanos, à família dos hominídeos, a alta similaridade entre os genomas impedirá a identificação mais detalhada das células contaminantes.

c) ( ) A obtenção de perfil genético baseado na análise de STR (repetições curtas em série) é uma das estratégias utilizadas para a identificação de indivíduos, e pode ser aplicada mesmo na presença de células contaminantes.

d) ( ) Para que se possa determinar a distância evolutiva entre amostras obtidas de dois organismos, de forma a se determinar se são de espécies diferentes, é necessário analisar os tipos de bases nitrogenadas encontradas no DNA, independentemente de sua distribuição no polímero.

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e) ( ) A identificação da criança com base em padrões de DNA é baseada no fenômeno de deriva genética, um tipo de variação que é atribuída a pressões seletivas e a eventos dependentes de características hereditárias.

3 (Questão adaptada, ENADE, 2008) A observação das formas atuais de vida demonstra que até mesmo o mais simples dos seres vivos com organização celular é um sistema complexo, no qual se destacam duas classes de moléculas: as proteínas e os ácidos nucleicos. É possível imaginar que, nos oceanos primitivos, existiam sistemas organizados de reações enzimáticas, do tipo coacervados. Mas como esses sistemas se perpetuariam e evoluiriam sem um código genético? Os ácidos nucleicos também poderiam ter surgido nas condições da Terra primitiva. Mas como formariam um sistema complexo e organizado sem interagir com o aparato protéico/enzimático? A total interdependência entre essas moléculas essenciais remete a uma das principais questões ligadas à origem da vida, que poderia ser comparada ao dilema do ovo e da galinha. Considerando que as hipóteses acerca da origem da vida na Terra mencionadas no texto apresentado não são as únicas, responda: o que surgiu primeiro, os ácidos nucleicos ou as proteínas?

FONTE: ANDRADE, L. A. e SILVA, E. P. O que é vida? In: Ciência Hoje, v. 32, n.º 191, 2003, p. 16-23 (com adaptações).

a) ( ) O DNA pode ter sido o precursor dos demais compostos, pois estoca e replica informação genética, é dotado de atividade catalítica e é facilmente degradado por hidrólise, o que facilita a reutilização de seus monômeros e, portanto, a colonização da Terra com polímeros primordiais de DNA.

b) ( ) Existe a possibilidade de o RNA ter sido o precursor das demais moléculas, visto que certas sequências de RNA são capazes de acelerar reações químicas e, além disso, mostraram capacidade de fazer cópias de si mesmas, além de armazenarem informação genética.

c) ( ) A favor da hipótese de que as proteínas desempenharam papel central na origem da vida, incluem-se estudos como o que mostrou a possibilidade de que aminoácidos tivessem se originado, sem a intervenção de seres vivos, a partir de uma atmosfera constituída de gases como metano, nitrogênio e oxigênio e de vapor d’água.

d) ( ) Admitindo-se a possibilidade de a Terra primitiva conter nucleotídeos livres, o calor poderia ter sido a fonte de energia disponível para a formação de ligações covalentes entre eles, com a consequente formação de proteinoides, que, por sua vez, deram origem a microsferas, estruturas que poderiam ser precursoras das células primitivas.

e) ( ) O estudo de aminoácidos que contêm grupos tiol (tioésteres) fornece argumentos a favor da precedência de proteínas na origem da vida, entre os quais se incluem a abundância de sulfeto de hidrogênio (H2S) no ambiente primitivo e a alta concentração de oxigênio na atmosfera primitiva, que favoreceria a respiração aeróbica.

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TÓPICO 2

TRANSMISSÃO E MANUTENÇÃO DA

INFORMAÇÃO GENÉTICA

UNIDADE 2

1 INTRODUÇÃOPrezado acadêmico, neste tópico nós vamos estudar a replicação do DNA,

o fluxo da informação gênica, desde a molécula do DNA até a produção de proteínas, além de mutações e o reparo do DNA.

A replicação, ou duplicação do genoma, é um processo fundamental para que as células-filhas, tanto em procariotos como em eucariotos, recebam o material genético completo, durante a divisão celular. Para que todas as células mantenham o mesmo material genético, todo o genoma deve ser precisamente replicado antes da divisão celular. A replicação do ácido desoxirribonucleico (DNA) é um evento crucial para que as células se multipliquem e se perpetuem. A cada divisão celular, todo o genoma da célula precisa ser duplicado no momento certo, e apenas uma vez.

No entanto, erros na síntese de DNA podem ocorrer ao longo da replicação. Além disso, o DNA está sujeito à ação de agentes físicos e químicos, assim como produtos endógenos do próprio metabolismo celular, que podem provocar mutações. Neste sentido, durante o processo evolutivo, foram estabelecidos sofisticados mecanismos de reparo de DNA que atuam na proteção do genoma, de modo a garantir sua sobrevivência e estabilidade. Diferentes processos de reparo do DNA também serão estudados neste tópico.

Resumidamente, pode-se dizer que a informação genética está contida no ácido desoxirribonucleico (DNA) e no ácido ribonucleico (RNA) como um arranjo sequencial de bases nitrogenadas. Considerando o dogma central da biologia, vemos que a informação genética flui do DNA para o RNA mensageiro e daí para as proteínas. Portanto, estudaremos como cada sequência de DNA codifica uma sequência de RNA e, por sua vez, como ocorre a produção de uma proteína.

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2 REPLICAÇÃO DO DNA

A replicação, ou duplicação do genoma, é um processo essencial, tanto em procariotos como em eucariotos, para que as células recebam o material genético completo na divisão celular. A regulação da replicação do DNA é um evento crucial para que as células dos organismos se multipliquem e se perpetuem. A cada ciclo celular, o genoma precisa ser duplicado completamente, de modo que as células-filhas tenham o mesmo material genético das células que as originaram, sem erros. Além disso, durante um ciclo celular, todo o DNA nuclear deve ser duplicado apenas uma vez e, posteriormente, dividido igualmente em duas células-filhas. Quando as bactérias (procariotos) estão crescendo em meios ricos, a replicação de DNA é ininterrupta durante todo o ciclo celular. Em eucariotos, a replicação do DNA ocorre ao longo da fase S (síntese do DNA), e a segregação do DNA replicado durante a fase M (Mitose). Um correto ciclo celular (G1 → S (Síntese do DNA) → G2 → M → G1) é importante para a manutenção da viabilidade das células, podendo prevenir a instabilidade genética, que pode levar a patologias. Lembrando que uma célula diploide pode ter sua quantidade de DNA duplicada no período S da interfase e, posteriormente, passar pela meiose, originando células-filhas com metade da quantidade de DNA (células haploides).

O processo replicativo do DNA tem início em regiões específicas da molécula, denominadas de origem de replicação, onde ocorre abertura da dupla-fita de DNA, originando uma forquilha de replicação (Figura 17). A replicação inicia na origem e prossegue sequencialmente ao longo da fita de DNA, em uma ou em ambas as direções, até o término, formando uma bolha de replicação. Na replicação unidirecional, uma forquilha replicativa parte da origem e segue replicando o DNA em uma única direção, entretanto, na replicação bidirecional, duas forquilhas deixam a origem replicando o DNA em direções opostas, como pode ser visto na Figura 17.

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FIGURA 17 - REPLICAÇÃO DO DNA

FONTE: Zaha (2012, p. 112)

Considere na Figura 17: (A) replicação gerando duas novas moléculas de dna; (B) replicação unidirecional; (C) replicação bidirecional; (D) replicação a partir de duas origens;(E) as forquilhas 2 e 3 se encontram, gerando a fusão das bolhas.

Em procariotos, cujo genoma é relativamente reduzido, uma origem de replicação é suficiente para dar início ao processo replicativo. Obviamente, em eucariotos, que apresentam genomas muito grandes, uma replicação mais rápida é necessária, sendo alcançada por meio da iniciação da síntese de DNA em muitas origens de replicação, de um modo praticamente simultâneo. Para que a replicação ocorra rapidamente, os maiores cromossomos dos genomas eucarióticos precisam ativar milhares de origens de replicação ao mesmo tempo.

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Um segmento de DNA cuja replicação ocorra a partir de uma origem de replicação é denominado replicon. Em procariotos, normalmente o cromossomo inteiro é um replicon, já em eucariotos estão presentes vários replicons.

Caro acadêmico, vamos estudar agora alguns princípios básicos da replicação comuns a procariotos e eucariotos.

Em 1958, Matthew Meselson (1933) e Franklin Stahl (1929) demonstraram que a replicação do cromossomo é semiconservativa. Os dois filamentos complementares da dupla-hélice de DNA ficam separados na forquilha de replicação, e cada fita de DNA guia a síntese de um novo filamento complementar (Figura 18). A sequência de bases em cada filamento parental é usada como molde. A timina, por exemplo, no filamento parental serve de molde para a incorporação de adenina no filamento complementar nascente, e vice-versa. Já uma citosina serve de molde para a incorporação na fita recém-sintetizada para a incorporação de uma guanina, e vice-versa. Devemos salientar ainda, caro acadêmico, que a nova fita de DNA é sintetizada no sentido 5’ → 3’, sobre uma fita molde, parental, 3’ → 5’, pois lembre que o DNA é uma dupla-fita antiparalela (Figura 18). As duas moléculas novas de DNA devem apresentar as duas fitas com orientação invertida, como pode ser claramente observado na Figura 18.

O processo replicativo envolve muitas proteínas e enzimas, como a DNA polimerase, enzima responsável pela síntese de DNA, a primase, responsável pela síntese de primers, as proteínas de reconhecimento das origens, as enzimas helicases, que se movem ao longo do DNA e separam as fitas de DNA, as enzimas topoisomerases, que aliviam a tensão gerada na estrutura da dupla-hélice do DNA e as proteínas que se ligam a fitas simples de DNA, estabilizando as fitas separadas.

A replicação da molécula de DNA é um processo que pode ser dividido em três etapas principais: início, elongação e término.

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FIGURA 18 - REPLICAÇÃO DO DNA. ANTIPARALELISMO, SEMICONSERVAÇÃO E COMPLEMENTARIDADE DE BASES

FONTE: Zaha (2012, p. 113)

Prezado acadêmico, vamos tratar agora do início da replicação e o reconhecimento por proteínas de uma origem de replicação.

A estrutura das origens de replicação é bem diversificada entre os diferentes organismos. No entanto, a origem de replicação em E. coli é bem conhecida, e o seu reconhecimento e ativação são bem compreendidos. Portanto, caro acadêmico, vamos estudar a origem de replicação desta bactéria, a partir de agora.

A origem de replicação de E. coli no cromossomo circular é chamada de OriC e engloba uma região de 245 pb. A OriC apresenta cinco sítios de 9 pb que são reconhecidos por uma proteína iniciadora e três repetições de 13 pb, ricas em bases AT (Figura 19). Nos eucariotos, as origens de replicação da levedura Saccharomyces cerevisiae são as mais bem caracterizadas. Elas são denominadas sequências autônomas de replicação (ARS), e são regiões do DNA ricas em pares de base AT. Todas as ARS têm sequência consenso de cerca de 11 pb, rica em AT. Nos eucariotos, de uma forma geral, estudos mostram que as origens de replicação são ricas em AT e se localizam em sítios específicos do DNA, sendo ativadas em momentos específicos durante a fase S do ciclo celular.

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FIGURA 19 - ORIGEM DE REPLICAÇÃO ORIC EM E. COLI

FONTE: Menck e Sluys (2017, s.p.)

Em E. coli, pelo menos nove proteínas diferentes participam da etapa de início da síntese de DNA, formando um complexo pré-replicativo (Figura 20). O reconhecimento de OriC ocorre pela proteína iniciadora DnaA, que se liga aos cinco sítios de 9 pb. Esse complexo com aproximadamente 20 proteínas de DnaA é envolvido pelo DNA, promovendo uma curvatura na dupla-fita de DNA, promovendo a separação das fitas do DNA nas regiões repetidas de 13pb. Com a formação da bolha no DNA, o processo segue para a etapa seguinte, atraindo as proteínas de replicação: a DNA helicase DnaB e seu cofator DnaC. São formados dois complexos DnaB-DnaC, cada um contendo um monômero de DnaC associado a um hexâmero de DnaB. DnaC hidrolisa ATP, liberando cada hexâmero DnaB associado a uma forquilha de replicação, para se mover e atuar como helicase, separando as fitas de DNA bidirecionalmente. Outras proteínas participam do processo, como a DNA girase, que alivia a torção das fitas de DNA causadas pela abertura das fitas de DNA e as SSB que estabilizam as fitas simples de DNA separadas. A proteína HU estimula a formação da forquilha de replicação. A DnaB também ativa uma DnaG primase, que sintetiza os RNAs iniciadores (primers) para a etapa de síntese do DNA.

Para que uma origem seja utilizada na replicação somente uma vez a cada ciclo celular, no caso de OriC, ocorre a metilação da adenina na posição N6 de seus sítios GATC presentes nas repetições de 13 pb, em ambas as fitas do DNA. Após a replicação do DNA, a nova fita sintetizada não é metilada, já a fita antiga está metilada, o que resulta em um DNA hemimetilado. A origem OriC hemimetilada é detectada pela proteína SeqA que se liga aos sítios GATC, reduzindo a taxa de metilação desse sítio. SeqA também previne a associação da DnaA em OriC, evitando o reinício de um novo ciclo de replicação.

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FIGURA 20 - RECONHECIMENTO DE ORIC EM E. COLI

FONTE: Menck e Sluys (2017, s.p.)

Prezado acadêmico, após o reconhecimento das origens de replicação, tanto em procariotos como em eucariotos, as duas fitas do DNA são replicadas, com a separação contínua das duas fitas do DNA à medida que as novas cadeias de DNA são sintetizadas. A forquilha de replicação se move continuamente em direção à região do DNA fita-dupla ainda não replicado. Além da DNA polimerase, várias proteínas são recrutadas na forquilha de replicação, formando o replissomo.

As DNA polimerases têm baixa capacidade para separar as fitas de DNA dupla-hélice. Esse processo é catalisado por DNA helicase, quebrando as pontes de hidrogênio que mantêm as duas fitas de DNA unidas. As proteínas responsáveis por manter as fitas simples de DNA separadas são as SSB em bactérias, ou RPA (Replication Protein A) em eucariotos.

Existe também a necessidade de um iniciador para o começo da polimerização da nova fita. As primases são enzimas que produzem tais iniciadores (primers). Em eucariotos e em muitas bactérias, os iniciadores são fragmentos de RNA sintetizados em diferentes locais da forquilha de replicação (Figura 21).

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FIGURA 21 - NECESSIDADES DE MOLDE E INICIADOR DAS DNA POLIMERASES

FONTE: Snustad e Simmons (2017, p. 241)

As enzimas DNA polimerases são responsáveis por estabelecer a ligação entre dois nucleotídeos, chamada de ligação fosfodiéster. Essa ligação caracteriza-se pela união do grupo hidroxila (OH), que está ligado ao carbono 3’ da pentose de um nucleotídeo, com o grupo fosfato do nucleotídeo seguinte da cadeia de DNA. As DNA polimerases sempre promovem a extensão da nova fita de DNA pela adição de nucleotídeos na extremidade 3’-OH livre de uma cadeia em crescimento.

A síntese do DNA ocorre concomitantemente nas duas fitas parentais. Como a adição de nucleotídeos é feita sempre no sentido 5’-3’ pelas DNA polimerases, uma das fitas novas é sintetizada de maneira contínua (fita 3’-5’ como molde), e a outra será sintetizada de modo descontínuo (fita 5’-3’ como molde). Portanto, a replicação do DNA é semidescontínua (Figura 22).

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FIGURA 22 - A REPLICAÇÃO É SEMIDESCONTÍNUA

FONTE: Snustad e Simmons (2017, p. 235)

A síntese da fita descontínua ocorre por repetidas etapas de iniciação, elongação e junção de pequenas cadeias nascentes de DNA, denominadas de fragmentos de Okazaki, pela enzima DNA ligase (Figura 23).

FIGURA 23 - FORQUILHA DE REPLICAÇÃO MOSTRANDO A FITA CONTÍNUA E DESCONTÍNUA

FONTE: Menck e Sluys (2017, s.p.)

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À medida que a forquilha de replicação se abre, os iniciadores de RNA são sintetizados pela primase e a fita de DNA é alongada pelas DNA polimerases. Na bactéria E. coli, a DNA polimerase III é a principal enzima envolvida na replicação. No entanto, a DNA polimerase I remove o iniciador de RNA utilizado no início da síntese do DNA. Em eucariotos, as principais enzimas envolvidas na duplicação do genoma cromossômico são as DNA pol δ, DNA pol ε e DNA pol α: primase, associada à enzima primase, atuando na síntese do primer.

A maquinaria replicativa que se move ao longo da molécula de DNA em uma forquilha de replicação é o replissomo. O replissomo contém a holoenzima DNA polimerase III, sendo que um centro catalítico replica o filamento contínuo e um segundo centro catalítico replica o filamento descontínuo. Para que os dois centros catalíticos da holoenzima polimerase III sintetizem tanto o filamento líder, contínuo, quanto o filamento descontínuo, acredita-se que este forme uma alça que se estende do primossomo até o segundo centro catalítico da DNA polimerase III (Figura 24).

FIGURA 24 - COORDENAÇÃO DA SÍNTESE DE DNA NA FITA CONTÍNUA E DESCONTÍNUA

FONTE: Zaha (2012, p. 127)

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Uma vez que as origens de replicação são ativadas e as forquilhas de replicação são formadas, elas progridem na molécula de DNA até que todo o cromossomo (ou molécula de DNA) seja inteiramente duplicado.

Em bactérias, o genoma é replicado a partir de uma única origem de replicação. A forquilha de replicação é aberta e avança de forma bidirecional. Deste modo, duas forquilhas de replicação originadas no mesmo ponto avançam ao longo do DNA circular em direções opostas até se encontrarem do outro lado da molécula. O sítio de terminação é definido pela presença de sequências específicas de terminação.

Todas as DNA-polimerases conhecidas promovem a síntese somente na direção 5’→ 3’ a partir de primer de RNA ou DNA. Quando o primer do final do cromossomo é removido da fita descontínua, essa região de 8 a 12 nucleotídeos não é replicada porque não existe uma extremidade 3’-OH livre onde as DNA polimerases consigam se ligar e preencher a lacuna referente ao iniciador. Deste modo, caro estudante, a cada replicação do cromossomo linear, haveria redução do tamanho de uma das fitas do DNA.

Claro que há solução para este dilema. A maioria das células eucariotas utiliza uma estratégia para replicar as porções finais de seus cromossomos: os telômeros, que são formados por sequências in tandem simples ricas em T-G, considerando que a sequência dos telômeros de humanos é TTAGGG. Os telômeros conferem estabilidade aos cromossomos lineares. Além disso, também atuam como uma origem de replicação especializada que possibilita a replicação das extremidades dos cromossomos. Entretanto, a maquinaria que atua nessa origem de replicação não é a mesma das origens de replicação no restante do genoma; os telômeros recrutam DNA polimerases especializadas chamadas telomerase (Figura 25).

A enzima telomerase é uma ribonucleoproteína com atividade de transcriptase reversa. Como todas as DNA polimerases, estende a extremidade 3’ da fita de DNA. No entanto, a telomerase não necessita de um molde externo de DNA para realizar síntese de DNA: ela alonga a extremidade 3’-OH de determinada sequência de DNA de fita simples, utilizando o seu próprio RNA como fita molde. Assim, a telomerase atua na extremidade 3’ do telômero e estende apenas uma das fitas do DNA, formando sequências teloméricas de fita simples. A outra fita de DNA é estendida pela maquinaria geral de replicação.

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FIGURA 25 - REPLICAÇÃO DOS TELÔMEROS PELA TELOMERASE

FONTE: Menck e Sluys (2017, s.p.)

3 TRANSCRIÇÃO E PROCESSAMENTO DE RNA

Caro acadêmico, de acordo com o dogma central da biologia molecular, as informações genéticas fluem de DNA para DNA na replicação e de DNA para RNA na expressão gênica (Figura 26). Entretanto, na replicação de um retrovírus (vírus de RNA), as informações genéticas são transmitidas primeiramente para o DNA, através de uma transcriptase reversa e, posteriormente, para o RNA. Na produção das proteínas, primeiramente ocorre a transcrição, ou seja, a transferência das informações genéticas do DNA para o RNA e, posteriormente, a tradução, ou seja, a transferência de informações do RNA para as proteínas.

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FIGURA 26 - FLUXO DE INFORMAÇÕES GENÉTICAS DE ACORDO COM O DOGMA CENTRAL DA BIOLOGIA MOLECULAR

FONTE: Snustad e Simmons (2017, p. 261)

Durante a transcrição, um filamento de DNA em um gene é usado como molde para sintetizar um filamento complementar de RNA, denominado transcrito gênico, por exemplo, na Figura 26, o filamento de DNA que contém a sequência AAA de nucleotídeos é usado como molde para produzir a sequência complementar UUU no transcrito de RNA.

As moléculas de RNA que serão traduzidas em proteínas nos ribossomos são denominadas de RNA mensageiros (mRNA). Em procariotos, o produto da transcrição normalmente equivale à molécula de mRNA. Em eucariotos, é preciso processar os transcritos primários por excisão de íntrons e modificação de ambas as terminações antes que possam ser traduzidos, portanto, os transcritos primários são precursores dos mRNAs e, por isso, são denominados pré-mRNAs (Figura 27).

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A maioria dos genes nucleares, em eucariotos, contém sequências não codificadoras entre as sequências expressas, denominadas exons. As sequências completas desses genes interrompidos são transcritas em pré-mRNA, e, em seguida, as sequências de íntrons, não codificadoras, são removidas por splicing.

No entanto, caro acadêmico, na transcrição, além da produção de RNA mensageiros, temos também a síntese de RNA transportadores (tRNA), pequenas moléculas de RNA que atuam como adaptadores entre aminoácidos e os códons no mRNA durante a tradução, de RNA ribossômicos (rRNA), componentes estruturais e catalíticos dos ribossomos, de pequenos RNA nucleares (snRNA), componentes estruturais dos espliceossomos na realização do splicing, e os microRNA (miRNA), RNAs unifilamentares curtos, com 20 a 22 nucleotídeos, que bloqueiam a expressão de mRNA complementares, causando sua degradação ou reprimindo sua tradução.

Os cinco tipos de RNAs aqui descritos, ou seja, mRNA, tRNA, rRNA, snRNA e miRNA, são produzidos por transcrição. Ao contrário dos mRNA, que especificam polipeptídios, os produtos finais dos genes de tRNA, rRNA, snRNA e miRNA são moléculas de RNA, ou seja, não são traduzidos.

FIGURA 27- EXPRESSÃO GÊNICA EM PROCARIOTOS (A) E EUCARIOTOS (B)

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FONTE: Snustad e Simmons (2017, p. 262)

Na síntese de RNA são utilizados os precursores trifosfatos de ribonucleosídeos e só um filamento de DNA é usado como molde para a síntese de uma cadeia de RNA complementar, sendo que é possível iniciar novas cadeias de RNA sem necessidade de um filamento iniciador preexistente, ou primer. A molécula de RNA produzida será complementar e antiparalela ao filamento-molde de DNA e idêntica, exceto pela presença de uracila em vez de timina, ao filamento não molde de DNA, ou filamento codificante (Figura 28). Se a molécula de RNA for um mRNA, ela especificará aminoácidos no produto gênico proteico. Também são chamadas de filamentos sense de RNA porque as sequências de nucleotídeos “fazem sentido” já que especificam sequências de aminoácidos nas proteínas. Uma molécula de RNA complementar a um mRNA é denominada RNA antisense.

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FIGURA 28 - SÍNTESE DE RNA A PARTIR DE UMA FITA DE DNA

FONTE: Snustad e Simmons (2017, p. 265)

A síntese de cadeias de RNA ocorre no sentido 5' → 3', com o acréscimo de ribonucleotídeos ao grupo 3'-hidroxila na extremidade da cadeia (Figura 29). A reação é catalisada por enzimas chamadas RNA polimerases, que mantêm as fitas de DNA separadas ao longo da síntese do RNA.

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FIGURA 29 - ALONGAMENTO DA CADEIA DE RNA CATALISADA POR RNA POLIMERASE

FONTE: Snustad e Simmons (2017, p. 265)

As RNA polimerases ligam-se a sequências específicas no DNA chamadas promotores, adjacentes aos genes, e com a atividade de proteínas denominadas fatores de transcrição, iniciam a síntese de moléculas de RNA nos locais de início da transcrição, próximo aos promotores, mais complexos em eucariotos do que em procariotos. Uma única RNA polimerase efetua as transcrições nos procariotos, enquanto os eucariotos têm cinco RNA polimerases diferentes, cada uma delas responsável pela síntese de uma classe de RNA. A síntese de RNA ocorre em uma bolha de transcrição (Figura 30), e sequência nucleotídica de uma molécula de RNA é complementar à do filamento-molde de DNA, lembrando que a uracila substitui a timina. Portanto, é possível determinar a origem dos transcritos de RNA pelo estudo da sua hibridização com o DNA.

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FIGURA 30 - BOLHA DE TRANSCRIÇÃO

FONTE: Zaha (2012, p. 207)

Os nucleotídeos nas unidades de transcrição e adjacentes a elas são numerados com relação ao local de iniciação do transcrito (designado +1). Os pares de bases que precedem o local de iniciação recebem prefixos negativos (–), já aqueles que sucedem o local de iniciação recebem prefixos positivos (+).

A RNA polimerase de E. coli contém quatro polipeptídios distintos. A composição da molécula de RNA polimerase completa, a holoenzima, é α2ββ’σ. Uma subunidade, o fator sigma (σ) participa apenas da iniciação da transcrição; não tem função no alongamento da cadeia. A subunidade sigma da RNA polimerase medeia a ligação aos promotores no DNA. Muitos promotores de E. coli foram sequenciados e duas sequências curtas são conservadas. Os pontos médios das duas sequências conservadas estão aproximadamente 10 e 35 pares de nucleotídeos, respectivamente, antes do local de iniciação da transcrição (Figura 31). Portanto, elas são denominadas sequência –10 e sequência –35, respectivamente. A sequência consenso –10 é TATAAT, chamada de TATA Box, já a sequência consenso –35 é TTGACA.

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FIGURA 31 - (A) CONVENÇÕES USADAS NA TRANSCRIÇÃO. ELEMENTOS DE UM PROMOTOR EM E.COLI

FONTE: Zaha (2012, p. 212)

O término das cadeias de RNA ocorre quando a RNA polimerase encontra um sinal de término, liberando a molécula de RNA nascente. Existem dois tipos de terminadores de transcrição em E. coli. Um tipo só leva ao término na presença de uma proteína chamada rho (ρ), ou seja, terminadores rho-dependentes. Com a ligação desta proteína ao RNA, ocorre o fim da transcrição. No entanto, há ainda terminadores rho-independentes, que contêm uma região rica em GC seguida por seis ou mais pares de bases AT (Figura 32), havendo a formação de um grampo.

Em eucariotos, o RNA é sintetizado no núcleo, e a maior parte do RNA que codifica proteínas tem de ser transportada até o citoplasma para tradução nos ribossomos. Os eucariotos têm cinco RNA polimerases diferentes, e cada enzima catalisa a transcrição de uma classe específica de genes. Existem pelo menos três RNA polimerases nucleares, denominadas I, II e III, em todos os eucariotos, além de RNA polimerases presentes em mitocôndrias e cloroplastos. A RNA polimerase I localiza-se no nucléolo e transcreve os genes dos rRNA 28S e 18S. As RNA polimerases II e III são distribuídas no nucleoplasma. A RNA polimerase III sintetiza pequenos RNA não codificantes, envolvidos na regulação gênica, no processamento de outros RNA e na tradução, entre eles o rRNA 5S e os tRNA. A RNA polimerase II responde pela maior diversidade de transcritos. Todos os hnRNA (RNA nucleares heterogêneos) que compreendem os mRNA ainda não processados e diversos RNA não codificantes, são sintetizados pela RNA polimerase II.

Em eucariotos, os transcritos primários de genes que codificam polipeptídios são processados, ou seja, passam por três modificações importantes antes de serem transportados até o citoplasma para tradução (Figura 33).

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• Caps de 7-metilguanosina são acrescentados às extremidades 5' dos transcritos.• Caudas poli(A) são acrescentadas às extremidades 3' dos transcritos. • Os íntrons são cortados dos transcritos.

O cap 5’ na maior parte do mRNA eucariótico é um resíduo de 7-metilguanosina unido ao nucleosídeo inicial do transcrito por uma ligação de fosfato 5'–5'. A cauda poli(A) 3’ é um trecho de poliadenosina com 20 a 200 nucleotídeos de comprimento.

FIGURA 32 - MECANISMO DE TÉRMINO RHO-INDEPENDENTE DA TRANSCRIÇÃO

FONTE: Snustad e Simmons (2017, p. 270)

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FIGURA 33 - PROCESSAMENTO DO PRÉ-MRNA EM EUCARIOTOS

FONTE: Snustad e Simmons (2017, p. 272)

4 TRADUÇÃO E O CÓDIGO GENÉTICO

A tradução ocorre nos ribossomos, estruturas macromoleculares complexas localizadas no citoplasma. Participam da tradução o mRNA, o rRNA, fazendo parte da estrutura de cada ribossomo, e tRNA, que atuam como adaptadores, mediando a incorporação dos aminoácidos apropriados nos polipeptídios em resposta a sequências nucleotídicas específicas no mRNA.

Os aminoácidos são anexados às moléculas corretas de tRNA pelas aminoacil-tRNA sintetases, um grupo de enzimas ativadoras, que adiciona os aminoácidos corretos a seus tRNAs específicos, formando os aminoacil-tRNAs. A sequência nucleotídica de uma molécula de mRNA é traduzida na sequência correta de aminoácidos segundo o código genético (Figura 34). Cada mRNA é traduzido simultaneamente por vários ribossomos, com consequente formação de um polirribossomo ou polissomo.

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FIGURA 34 - CÓDIGO GENÉTICO. HÁ MAIS DE UM CÓDON POSSÍVEL CODIFICANDO PARA UM DETERMINADO AMINOÁCIDO

FONTE: Snustad e Simmons (2017, p. 313)

A unidade codificadora fundamental é denominada de códon, apresentando três nucleotídeos, sendo que há 64 códons possíveis, e 61 deles codificam os 20 aminoácidos existentes, como observado na Figura 34, pois três códons são terminadores. Portanto, alguns aminoácidos são codificados por mais de um códon. O códon AUG é iniciador e codifica metionina, já os códons UAA, UAG e UGA são códons de terminação, e não codificam aminoácidos.

A sequência dos códons no mRNA é lida de sua extremidade 5' para sua extremidade 3', e o início da sequência de codificação estabelece a matriz de leitura. Alterações na sequência do mRNA podem mudar também a sequência dos códons, produzindo proteínas diferentes ou, até mesmo, interromper a síntese proteica. Caro acadêmico, estude detidamente a Figura 35. Observe que uma segunda alteração na sequência do gene, como a deleção de um nucleotídeo, pode restaurar a fase de leitura, minimizando os efeitos da primeira mutação e restabelecendo total ou parcialmente o fenótipo selvagem.

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FIGURA 35 - SÍNTESE PROTEICA E A FASE DE LEITURA DE UM GENE

FONTE: Snustad e Simmons (2017, p. 311)

As proteínas são sintetizadas nos ribossomos, tanto em procariotos como em eucariotos, sendo constituídos por proteínas e RNA. Os ribossomos apresentam duas subunidades, uma grande e outra pequena, que se dissociam quando a tradução de uma molécula de mRNA é concluída e se reassociam no início da tradução. O ribossomo de procariotos tem um tamanho de 70S (Subunidades 30S e 50S), já os ribossomos de eucariotos são maiores, geralmente cerca de 80S (Subunidades 40S e 60S).

Os ribossomos são fundamentais para a síntese proteica, assim como o mRNA, mas a tradução requer outra classe de moléculas de RNA, o RNA transportador (tRNA) (Figura 36). O tRNA transportador se liga ao aminoácido

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pelo braço aceptor, mais precisamente ao nucleotídeo da extremidade, portando uma adenina (extremidade 3’), em que apresenta a sequência conservada CCA. Apresenta ainda o braço do anti-códon, sendo que o códon do mRNA interage com o anti-códon do tRNA durante a tradução.

Neste sentido, no ribossomo, um determinado tRNA, portando um

aminoácido específico, interage através de seu anti-códon com o códon correspondente no mRNA, por pareamento de bases, inserindo corretamente na cadeia polipeptídica crescente, através de uma ligação peptídica, o aminoácido codificado pelo códon do RNA mensageiro.

FIGURA 36 - ESTRUTURA DOS tRNAS

FONTE: Zaha (2012, p. 259)

Considere na Figura 36:(A) na extremidade 3’ há ligação com aminoácido (AA). Também há o

pareamento entre códon/anti-códon do tRNA. (B) estrutura terciária de um tRNA.

Cada ribossomo tem três locais de ligação ao tRNA (Figura 37). O local A ou aminoacil liga-se ao aminoacil-tRNA recebido, o tRNA que leva o próximo aminoácido a ser acrescentado à cadeia polipeptídica em crescimento. O local P ou peptidil liga-se ao tRNA que está ligado ao polipeptídio em crescimento. O local E ou de saída (exit) liga-se ao tRNA sem aminoácido que está saindo.

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FIGURA 37 - SÍTIOS A, P E E NO RIBOSSOMO

FONTE: Zaha (2012, p. 256)

A síntese de polipeptídios é iniciada por um tRNA especial, designado tRNAfMet, em resposta a um códon de iniciação da tradução AUG. Portanto, os polipeptídios começam com metionina durante a síntese, mas pode ser clivada posteriormente de muitos polipeptídios.

Outro tRNA de metionina, tRNAMet, responde a códons de metionina internos no mRNA. A ligação do ribossomo ao mRNA, em procariotos, depende do pareamento de bases entre uma sequência nucleotídica da extremidade 3' do rRNA 16S, pertencente ao ribossomo, com uma região na extremidade 5' da molécula de mRNA, contendo um trecho conservado 5’-AGGAGG-3’, além do códon de iniciação AUG, conhecida como RBS (Ribosome Binding Site).

Em eucariotos, o ribossomo também se liga na extremidade 5’ do mRNA, no entanto, o reconhecimento do mRNA, pelo ribossomo, ocorre pela presença de Cap e do códon iniciador AUG no RNA mensageiro processado. Assim como os procariotos, os eucariotos contêm um tRNA iniciador especial, tRNAiMet (“i” de iniciador), mas o grupo amino do metionil-tRNAiMet não é formilado.

O alongamento da cadeia polipeptídica é basicamente igual em procariotos e eucariotos. A ligação de um novo aminoácido ao polipeptídio em crescimento ocorre pela ligação de um aminoacil-tRNA ao local A do ribossomo, com transferência da cadeia de polipeptídio em crescimento do tRNA no local P para o tRNA no local A, pela formação de uma nova ligação peptídica, e translocação do ribossomo ao longo do mRNA, para posicionar o próximo códon no local A (Figura 38). O polipeptídio-tRNA nascente e o tRNA sem aminoácido são translocados dos locais A e P para os locais P e E, respectivamente. Essas três etapas são repetidas durante todo o processo de alongamento.

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FIGURA 38 - (A) SÍNTESE PROTEICA AO LONGO DO MRNA. (B) VÁRIOS RIBOSSOMOS SINTETIZANDO PROTEÍNAS SIMULTANEAMENTE

FONTE: Adaptado de Snustad e Simmons (2017, p. 317)

FONTE: Zaha (2012, p. 264)

O término da tradução ocorre quando um dos três códons de término da cadeia (UAA, UAG ou UGA) entra no sítio A do ribossomo (Figura 39). Esses três códons de término podem ser reconhecidos por proteínas solúveis chamadas fatores de liberação (RF). O processo é concluído pela liberação da molécula de mRNA do ribossomo e dissociação do ribossomo em suas subunidades. As subunidades ribossômicas podem iniciar outro ciclo de síntese proteica, caso seja necessário.

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FIGURA 39 - TÉRMINO DA SÍNTESE PROTEICA

FONTE: Snustad e Simmons (2017, p. 317)

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5 MUTAÇÃO E REPARO DO DNA

O termo mutação refere-se à modificação do material genético. Um indivíduo que apresenta um novo fenótipo resultante da uma mutação é um mutante. Em organismos multicelulares, uma mutação pode ocorrer em qualquer célula e em qualquer estágio durante o desenvolvimento. As mutações germinativas ocorrem nas células da linhagem reprodutiva e podem ser transmitidas para a geração seguinte, e as mutações somáticas, nas células somáticas, podem estar implicadas no desenvolvimento de muitos tipos de câncer.

As mutações espontâneas são aquelas que acontecem sem uma causa conhecida. Podem ser realmente espontâneas ou resultantes de erros durante a replicação do DNA, ou ainda surgirem por agentes desconhecidos do ambiente.

Mutações induzidas são aquelas que resultam de exposição a agentes físicos e químicos que provoquem alterações no DNA. Os mutágenos incluem irradiações ionizantes, luz UV e muitas substâncias químicas.

A mutação de um gene de tipo selvagem que produz um fenótipo mutante é denominada mutação direta. Quando uma segunda mutação restaura o fenótipo original, o processo é denominado reversão ou mutação reversa. A reversão pode ocorrer por retromutação, uma segunda mutação, ocorrida no mesmo local gênico que a primeira, restaurando original do gene, ou por mutação supressora, uma segunda mutação em local diferente do genoma, que anula os efeitos da primeira mutação. As mutações supressoras podem ocorrer em locais diferentes no mesmo gene da mutação original ou em loci diferentes, até mesmo em cromossomos distintos.

A maioria das mutações que têm efeitos fenotípicos evidentes são deletérias e recessivas. No entanto, algumas mutações no DNA alteram um aminoácido na proteína, sem mudança no fenótipo, já outras não alteram o aminoácido, pois devemos lembrar que há mais de um códon possível para determinados aminoácidos, como pode ser visto na Figura 34 (Código genético).

Watson e Crick sempre destacaram que as estruturas das bases no DNA não são estáticas, pois os hidrogênios podem passar de uma posição para outra em uma base nitrogenada. Essas oscilações químicas são as modificações tautoméricas. Embora raras, as modificações tautoméricas são importantes no metabolismo do DNA porque algumas delas modificam o potencial de pareamento das bases. Tais mutações implicam na substituição de uma purina em um filamento de DNA por outra purina e a substituição de uma pirimidina no filamento complementar por outra pirimidina. Essas substituições de pares de bases são as transições. As substituições de pares de bases em que há troca de uma purina por uma pirimidina e vice-versa são as transversões.

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Outro tipo de mutação ocorre por acréscimo ou deleção de um nucleotídeo, ou mutação SNP, também chamada de mutação de ponto. As mutações podem envolver um ou mais pares de bases. Acréscimos e deleções que ocorrem nas regiões codificadoras dos genes podem alterar a matriz de leitura, sendo conhecidas como frameshift, como visto na Figura 35.

Muitos organismos sofrem mutações pela presença de transposons, pois a inserção de um transposon em um gene frequentemente torna tal gene inativo. Se o gene codificar um produto importante, é provável que o fenótipo seja mutante. Já sabemos que muitos dos mutantes clássicos do milho, de Drosophila, de Eschericha coli e de outros organismos foram criados pela inserção de transposons.

Por fim, um outro tipo de mutação ocorre pela expansão de sequências repetidas em série (em tandem). Essas repetições estão dispersas em todo o genoma humano. A quantidade de cópias das repetições de três pares de nucleotídios, ou seja, repetições de trinucleotídios, pode aumentar e causar doenças hereditárias em seres humanos, como no caso das Ataxias Espinocerebelares (expansão CAG), na síndrome do X frágil (CGG) e na doença de Huntington (CAG).

Caro acadêmico, as mutações, porém, podem ser importantes no processo evolutivo, gerando variabilidade genética. No entanto, podem ser prejudiciais, como no caso de causarem câncer. Neste sentido, os diferentes mecanismos de reparo surgidos em organismos, de bactérias a seres humanos, é uma prova da importância de se manterem as mutações em nível baixo, por exemplo, as células procarióticas apresentam mecanismos de reparo de defeitos no DNA, como reparo por fotorreativação, reparo por excisão, reparo de erros de pareamento, reparo pós-replicação, e o sistema de reparo SOS. Os mamíferos também apresentam todos os mecanismos de reparo aqui citados, exceto a fotorreativação. Em seres humanos, distúrbios hereditários como o xeroderma pigmentoso mostram as graves consequências dos defeitos no sistema de reparo do DNA.

O reparo por fotorreativação do DNA em bactérias é executado pela enzima DNA fotoliase, ativada pela luz. Quando o DNA é exposto à luz UV, dímeros de pirimidina, como a timina, por exemplo, são produzidos por ligações cruzadas covalentes. A enzima fotoliase reconhece os dímeros de timina no DNA, liga-se a eles e usa a energia da luz para clivar as ligações cruzadas (Figura 40). A fotoliase pode se ligar aos dímeros de timina no DNA sem a presença da luz, mas só catalisa a clivagem das ligações cruzadas com a energia obtida da luz visível, especificamente da luz azul.

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FIGURA 40 - REPARO POR FOTORREATIVAÇÃO

FONTE: Snustad e Simmons (2017, p. 350)

O reparo por excisão do DNA lesado ocorre pela ação de uma endonuclease de reparo do DNA que reconhece a(s) base(s) lesada(s) no DNA, promovendo a sua excisão. Posteriormente, uma DNA polimerase preenche o espaço, usando como molde o filamento complementar, e a enzima DNA ligase une os segmentos.

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Os sistemas de reparo por excisão de base removem bases anormais ou quimicamente modificadas do DNA, por ação de DNA glicosilases, enquanto as vias de reparo por excisão de nucleotídeos removem defeitos maiores, como os dímeros de timina.

As glicosilases clivam a ligação glicosídica entre a base anormal e a 2-desoxirribose, criando sítios apurínicos ou apirimidínicos. Tais sítios são reconhecidos por enzimas chamadas AP endonucleases que, com as fosfodiesterases, excisam os grupos de açúcar-fosfato. A DNA polimerase então substitui o nucleotídeo faltante de acordo com a base do filamento complementar, e a ligase encerra o processo (Figura 41).

O reparo por excisão de nucleotídeos remove lesões maiores, como dímeros de timina. Nesse caso, uma nuclease de excisão específica faz cortes nos dois lados dos nucleotídeos danificados e excisa um oligonucleotídeo, contendo a lesão no DNA. A atividade da exonuclease em E. coli requer os produtos de três genes, uvrA, uvrB e uvrC.

Várias DNA polimerases têm papéis cruciais em vários processos de reparo do DNA durante a replicação, graças à ação de exonuclease 3′ → 5′ inerente às DNA polimerases para revisar filamentos de DNA durante sua síntese. Entretanto, outra via de reparo do DNA após a replicação, o reparo de erros de pareamento, reforça essa revisão durante a replicação. O sistema de reparo faz distinção por meio da identificação do filamento-molde, que contém a sequência nucleotídica original, e do filamento recém-sintetizado, que contém uma base incorporada de forma errada. Em E. coli, o reparo de erros de pareamento requer os produtos de quatro genes, mutH, mutL, mutS e mutU. Homólogos das proteínas MutS e MutL da bactéria foram identificados em fungos, vegetais e mamíferos.

Quando a mutação envolve as duas fitas de DNA, a molécula de DNA danificada é reparada por um processo de reparo dependente de recombinação entre cromossomos homólogos, mediado pelo produto do gene recA. A proteína RecA, necessária para recombinação homóloga proporciona a troca de filamentos únicos entre as duplas-hélices homólogas.

Os sistemas de reparo do DNA são muito precisos. No entanto, quando agentes mutagênicos causam danos graves ao DNA das células de E. coli, elas tomam algumas medidas drásticas, apresentando uma resposta SOS, na qual há síntese de uma série completa de proteínas de reparo, recombinação e replicação do DNA. Duas dessas proteínas, codificadas pelos genes umuC e umuD são subunidades da DNA polimerase V, enzima que catalisa a replicação do DNA em regiões lesadas dos cromossomos. A DNA polimerase V possibilita o prosseguimento da replicação através dos segmentos lesados dos filamentos-molde, embora não seja possível replicar com precisão as sequências nucleotídicas na região lesada. Duas proteínas reguladoras LexA e RecA controlam a resposta SOS, sendo sintetizadas em baixos níveis na célula sem danos no DNA. A partir da ocorrência de muitos danos no DNA, o nível de expressão dos genes SOS, como recA, lexA, umuC, umuD e outros, aumenta e o sistema de reparo propenso a erro é ativado.

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FIGURA 41 - REPARO POR EXCISÃO DE BASE

FONTE: Zaha (2012, p. 149)

6 CONTROLE DA EXPRESSÃO GÊNICA EM PROCARIOTOS

Prezado acadêmico, neste item, vamos estudar o controle da expressão em procariotos e eucariotos.

Primeiramente, vamos estudar a regulação nos procariotos. Estes organismos têm notável capacidade de adaptação a diversas condições ambientais. Essa adaptabilidade depende de sua capacidade de ativar e desativar uma série de genes de acordo com as necessidades celulares. A expressão gênica em procariotos pode ocorrer em níveis diferentes, como transcrição, tradução e pós-tradução.

O controle transcricional exercido pelos fatores sigma, subunidade da DNA-polimerase de procariotos que reconhece os promotores a fim de iniciar a transcrição, é um nível extremamente importante na regulação gênica. Deste modo, um gene cujo promotor depende de um determinado fator sigma para reconhecimento pela RNA-polimerase, apenas é transcrito quando esse fator estiver disponível. Há vários fatores sigma descritos, sendo que a maioria dos

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genes é regulada pelo sigma 70. No entanto, quando uma célula de E. coli é exposta a altas temperaturas, por exemplo, há a produção de sigma 32 que reconhece os promotores dos genes de choque térmico.

Caro estudante, a regulação gênica que ocorre em operons, no entanto, pode ser bem complexa, e merece nossa atenção. Nos operons, a transcrição de um conjunto de genes estruturais contíguos é regulada por dois elementos controladores. Um dos elementos, o gene repressor, codifica um repressor que se liga ao segundo elemento, o operador. O operador é sempre contíguo aos genes estruturais cuja expressão regula. Alguns operons, como o operon da lactose, contêm vários operadores. A transcrição é iniciada em promotores localizados ao lado das regiões codificadoras de genes estruturais. A ligação do repressor ao operador causa um impedimento estérico da transcrição dos genes estruturais no operon pela RNA polimerase. As regiões operadoras são contíguas com as regiões promotoras. A unidade completa, que inclui os genes estruturais, o operador e o promotor, é denominada operon.

O operon lac é induzível e controlado negativamente; os genes lacZ, lacY e lacA só são expressos na presença de lactose. O gene regulador de lac, designado gene I, codifica um repressor com 360 aminoácidos. Na ausência de indutor, o repressor liga-se aos operadores lac, o que, por sua vez, impede a RNA polimerase de catalisar a transcrição dos três genes estruturais (Figura 42). Algumas moléculas dos produtos dos genes lacZ, lacY e lacA são sintetizadas no estado não induzido, o que garante um baixo nível de atividade enzimática. Essa atividade é essencial para indução do operon lac, pois o indutor do operon, a alolactose, é derivado da lactose em uma reação catalisada por β-galactosidase. Uma vez formada, a alolactose liga-se ao repressor, fazendo com que o repressor seja liberado do operador. Dessa maneira, a alolactose induz a transcrição dos genes estruturais lacZ, lacY e lacA.

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FIGURA 42 - CONTROLE DO OPERON LAC. A E B MOSTRAM O CONTROLE NEGATIVO DO OPERON. (C) CONTROLE POSITIVO POR INDUÇÃO DA PROTEÍNA CAP (CAP/CAMP)

FONTE: Zaha (2012, p. 283)

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A presença de glicose impede a indução do operon lac. Esse fenômeno, denominado repressão catabólica, garante que a glicose seja metabolizada quando presente, em detrimento de outras fontes de energia menos eficientes.

A repressão catabólica do operon lac e de vários outros operons é mediada por uma proteína regulatória chamada CAP e uma pequena molécula efetora chamada AMP cíclico. O promotor lac tem dois locais de ligação, um para RNA polimerase e outro para o complexo CAP/cAMP, que se liga no promotor lac para que haja indução do operon. Assim, o complexo CAP/cAMP exerce controle positivo sobre a transcrição do operon lac e o efeito é contrário ao da ligação do repressor a um operador. Quando há pouca glicose, os níveis de cAMP aumentam e o complexo CAP/cAMP se liga ao DNA, estimulando a ligação da RNA-polimerase ao operon e aumentando a síntese dos genes constitutivos do operon lac, com o objetivo de quebrar a lactose como fonte alternativa de energia.

7 CONTROLE DA EXPRESSÃO GÊNICA EM EUCARIOTOS

Caro estudante, o controle da expressão gênica em eucariotos ocorre em diversos níveis e tem uma regulação peculiar a cada tipo celular, estado fisiológico e de desenvolvimento. Essa regulação pode se dar nos níveis de início da transcrição, do processamento do mRNA, no seu transporte para o citoplasma, na tradução da mensagem em proteína e ainda na regulação da atividade e degradação do produto gênico.

Em eucariotos, os genes estão no interior da cromatina, estando geralmente em um estado silencioso, devendo ser expostos para que sejam acessíveis a proteínas ativadores de transcrição (Fatores transcricionais) e à RNA polimerase para serem transcritos. Fatores de transcrição, como a proteína de ligação ao TATA Box dos promotores (TBP), são importantes na regulação da transcrição, sendo que diversos fatores de transcrição podem se ligar aos promotores dos genes e aos enhancers, controlando a expressão gênica.

Genes em regiões de DNA metilado são menos transcritos, enquanto a acetilação de histonas favorece a transcrição. Tanto o remodelamento da cromatina como a ligação de fatores de transcrição ao DNA são necessários para que os genes sejam devidamente expressos. A ação dos fatores de remodelamento é responsável por promover que os ativadores encontrem seus sítios de ligação ao DNA, recrutando ou ativando o complexo de transcrição (Figura 43).

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FIGURA 43 - VISÃO GERAL DAS REGIÕES DO DNA E DOS FATORES NECESSÁRIOS PARA A ATIVAÇÃO DA EXPRESSÃO DE UM GENE EUCARIOTO

FONTE: Menck e Sluys (2017, s.p.)

O processo de splicing alternativo, em que diferentes possibilidades de retirada dos íntrons produzem RNAs maduros diferentes, também se constitui em um mecanismo importante na regulação da expressão de genes eucarióticos, pois proteínas diferentes são produzidas a partir de um único gene (Figura 44).

Por fim, a ação de RNAs de interferência (RNAi) pode regular a expressão gênica em eucariotos, por exemplo, os miRNAs são RNAs unifilamentares curtos, com 20 a 22 nucleotídeos, que bloqueiam a expressão de mRNA complementar, causando sua degradação ou reprimindo sua tradução.

FIGURA 44 - SPLICING ALTERNATIVO. PRODUÇÃO DE DUAS PROTEÍNAS DIFERENTES (CALCITONINA E CGRP) A PARTIR DE UM

MESMO GENE. EXONS FORAM NUMERADOS DE 1 A 6

FONTE: Zaha (2012, p. 248)

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8 GENÔMICA E O PROJETO GENOMA HUMANO

Os cientistas têm usado o termo genoma durante décadas para denominar um conjunto completo de cromossomos de um organismo. Já o termo genômica é relativamente novo, sendo criado em 1986 por Thomas Roderick para denominar a função de mapear, sequenciar e analisar as funções de genomas inteiros. À medida que surgiram mapas e sequências mais detalhados dos genomas, essa função foi sendo dividida em genômica estrutural (o estudo da estrutura do genoma), genômica funcional (o estudo da função do genoma) e genômica comparativa (o estudo da evolução e da diversidade do genoma).

A genômica funcional inclui análises do transcriptoma, o conjunto completo de RNA transcritos de um genoma, e do proteoma, o conjunto completo de proteínas codificadas por um genoma. O genoma humano também foi sequenciado, utilizando o DNA de indivíduos diferentes. Assim, temos hoje o conhecimento de quanto o DNA de um ser humano difere do DNA de outro ser humano.

As genômicas funcional e comparativa avançaram exponencialmente e novas tecnologias permitem aos pesquisadores monitorar a expressão de todos os genes em um genoma simultaneamente.

Como as tecnologias de DNA recombinante e sequenciamento de DNA avançaram na década de 1980, os cientistas passaram a discutir a possibilidade de sequenciamento de todos os 3,2 bilhões de pares de nucleotídeos no genoma humano. Essas discussões levaram ao lançamento do Projeto Genoma Humano (Human Genome Project), em 1990. Os objetivos do Projeto Genoma Humano foram mapear todos os genes humanos, construir um mapa físico detalhado de todo o genoma humano e determinar a sequência nucleotídica dos 24 cromossomos humanos até 2005. Esse grande projeto foi um esforço mundial, através da criação da Organização Genoma Humano (HUGO, Human Genome Organization) para coordenar essa tarefa em todo o mundo.

Em 1992 já foram publicados mapas físicos completos de cromossomos Y e 21. A primeira sequência de um cromossomo humano (cromossomo 22) foi publicada em 1999, seguida pela sequência do cromossomo 21, em 2000. Posteriormente, devido à intervenção do governo dos EUA, os projetos privado e público de sequenciamento genômico aceitaram publicar os primeiros esboços do genoma humano, simultaneamente. Procederam a publicação de dois artigos, um na revista Science e outro na revista Nature, em 2001. Em 2003, o projeto foi concluído, sendo que se estima que o genoma humano apresente cerca de 20.000 genes. O maior gene humano, chamado DMD, tem 2,4 milhões de pb, 79 exons e codifica a distrofina, uma proteína envolvida na distrofia muscular de Duchenne.

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RESUMO DO TÓPICO 2

Neste tópico, você aprendeu que:

• A cada ciclo celular, o genoma precisa ser duplicado completamente, de modo que as células-filhas tenham o mesmo material genético das células que as originaram.

• A origem de replicação de E. coli no cromossomo circular é chamada de OriC e engloba uma região de 245 pb.

• Para ocorrer a replicação, há a necessidade de um iniciador para o começo da polimerização da nova fita. As primases são enzimas que produzem tais iniciadores (primers).

• A maquinaria replicativa que se move ao longo da molécula de DNA em uma forquilha de replicação é o replissomo,

• A replicação do DNA ocorre de forma semiconservativa e semidescontínua.

• A maioria das células eucariotas utiliza uma estratégia para replicar as porções finais de seus cromossomos: os telômeros.

• A transcrição, realizada por RNA-polimerase, produz mRNA, tRNA, rRNA, snRNA e miRNA.

• Em eucariotos, é preciso processar os transcritos primários por excisão de íntrons e modificação de ambas as terminações, antes que possam ser traduzidos.

• De acordo com o dogma central da biologia molecular, as informações genéticas fluem do DNA para o DNA, durante a replicação, e do DNA para o RNA, com posterior síntese de proteínas, durante a expressão gênica.

• A síntese de cadeias de RNA ocorre no sentido 5' → 3', com o acréscimo de ribonucleotídios ao grupo 3'-hidroxila na extremidade da cadeia.

• Os ribossomos são fundamentais para a síntese proteica, assim como o mRNA, mas a tradução requer outra classe de moléculas de RNA, o RNA transportador (tRNA).

• O término da tradução ocorre quando um dos três códons de término da cadeia (UAA, UAG ou UGA) entra no sítio A do ribossomo.

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• As mutações espontâneas são aquelas que acontecem sem uma causa conhecida. • Mutações induzidas são aquelas que resultam de exposição a agentes físicos e

químicos que provoquem alterações no DNA.

• Os sistemas de reparo do DNA são muito precisos. No entanto, quando agentes mutagênicos causam danos graves ao DNA das células de E. coli, elas tomam algumas medidas drásticas, apresentando uma resposta SOS.

• Em procariotos, um gene cujo promotor depende de um determinado fator sigma para reconhecimento pela RNA-polimerase, apenas é transcrito quando esse fator estiver disponível.

• Em eucariotos, os genes estão no interior da cromatina, estando geralmente em um estado silencioso, devendo ser expostos para que sejam acessíveis a proteínas ativadoras de transcrição (Fatores transcricionais) e à RNA polimerase para serem transcritos.

• O termo genômica é relativamente novo, sendo criado para denominar a função de mapear, sequenciar e analisar as funções de genomas inteiros.

• Os objetivos do Projeto Genoma Humano foram mapear todos os genes humanos, construir um mapa físico detalhado de todo o genoma humano e determinar a sequência nucleotídica dos 24 cromossomos humanos.

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AUTOATIVIDADE

1 (ENADE, 2011) A figura a seguir representa variações na quantidade de DNA ao longo do ciclo de vida de uma célula. (X = unidade arbitrária de DNA por célula).

A análise do gráfico revela que:

a) ( ) as fases 1, 2 e 3 representam os períodos G1, S e G2, que resumem todo o ciclo vital de uma célula.

b) ( ) as fases 1, 2 e 3 representam o período em que a célula se encontra em interfase, e as fases 4, 5, 6 e 7, subsequentes, são características da célula em divisão mitótica, quando, ao final, ocorre redução à metade da quantidade de DNA na célula.

c) ( ) as fases de 1 a 5 representam a meiose I, enquanto a meiose II está representada pelas fases 6 e 7.

d) ( ) a célula representada no gráfico é uma célula diploide que teve a quantidade de seu DNA duplicada no período S da interfase (fase 2) e, posteriormente, passou pelas fases da meiose, originando células filhas com metade da quantidade de DNA (fase 7, células haploides).

e) ( ) a fase 3 é caracterizada por um período em que não há variação na quantidade de DNA na célula, portanto, essa fase representa uma célula durante os períodos da mitose: prófase, metáfase e anáfase.

2 (ENADE, 2014) A persistência de grande fração de elementos transponíveis em alguns genomas eucariotos (44% do genoma humano) é consistente com a ideia de que eles exercem um papel importante na modulação do genoma durante o processo evolutivo. A diversificação de genes e seus produtos é um fator importante na evolução das espécies e os elementos transponíveis podem atuar de várias formas. Considerando o texto apresentado, avalie as afirmações a seguir.

I- O movimento de um elemento transponível pode propiciar sua inserção no meio de uma sequência codificadora de proteína e inibir a produção do transcrito normal do gene.

II- Os elementos transponíveis de sequencias semelhantes distribuídos no genoma facilitam a recombinação entre cromossomos diferentes, aproximando regiões homólogas e, assim, possibilitando o crossing-over.

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III- A maioria dos eventos de recombinação são benéficos, causando translocações cromossômicas e outras mudanças que, ao longo do tempo, resultam em vantagens adaptativas.

É correto o que se afirma em:

FONTE: REECE, J.B. et al. Biology. 9 ed. São Francisco: Benjamin Cummings, 2011 (adaptado).

a) ( ) I, apenas.b) ( ) III, apenas.c) ( ) I e II, apenas.d) ( ) II e III, apenas.e) ( ) I, II e III.

3 (ENADE, 2017) A técnica de edição genética conhecida como CRISPR (repetições palindrômicas curtas agrupadas e regularmente interespaçadas) tem sido observada com entusiasmo pela comunidade científica. Nessa técnica, o genoma de uma célula pode ser modificado em pontos específicos com grande precisão. Uma enzima associada a uma molécula de RNA-guia identifica um ponto alvo no genoma, clivando-o para a remoção ou a inserção de uma sequência de nucleotídeos. Com relação às informações apresentadas, avalie as seguintes asserções e a relação proposta entre elas.

I- A edição de genomas em células somáticas pode representar uma alternativa viável em terapias gênicas, entretanto deve ser utilizada com cautela.

PORQUE

II- A edição de sequências genômicas pode provocar o surgimento de efeitos não previstos (off target), como a alteração da expressão de genes relacionados a outras funções.

A respeito dessas asserções, assinale a alternativa CORRETA:

FONTE: Suzuki, K., et al. In vivo genome editing via CRISPR/Cas9 mediated homology-independent targeted integration. Nature. n. 540, p. 144-149, 2016 (adaptado).

a) ( ) As asserções I e II são proposições verdadeiras, e a II é uma justificativa correta da I.

b) ( ) As asserções I e II são proposições verdadeiras, mas a II não é uma justificativa correta da I.

c) ( ) A asserção I é uma proposição verdadeira, e a II é uma proposição falsa.d) ( ) A asserção I é uma proposição falsa, e a II é uma proposição verdadeira.e) ( ) As asserções I e II são proposições falsas.

4 Qual é a sequência de bases no mRNA a partir da seguinte sequência de DNA-molde 3'-TAC TGC AGA CAA GTC-5'? Indique a sequência de aminoácidos a partir da tradução deste mRNA.

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TÓPICO 3

TÉCNICAS DE BIOLOGIA

MOLECULAR

UNIDADE 2

1 INTRODUÇÃOCaro acadêmico, neste tópico serão abordados os fundamentos das

principais técnicas de biologia molecular. A partir da década de 1970, uma verdadeira revolução nos permitiu compreender melhor a estrutura e a função dos ácidos nucleicos, e atualmente é comum isolar e estudar um determinado segmento de DNA. Esses avanços deram origem à disciplina de Biologia Molecular, que nada mais é que a incorporação de metodologias de bioquímica e biofísica ao estudo da genética. Atualmente, diferentes metodologias moleculares são rotineiras em laboratórios de pesquisa, bem como em investigações clínicas e forenses.

O grande desenvolvimento de técnicas de biologia molecular e de bioinformática tem proporcionado grandes avanços para as áreas da saúde e ciências biológicas, promovendo uma verdadeira revolução na biologia moderna. Os métodos de manipulação de DNA, RNA e proteínas in vitro envolvem o uso de enzimas purificadas, oriundas de diversos organismos, tais como DNA polimerases, DNA ligases e nucleases, enzimas que podem ser purificadas em grandes quantidades e usadas para manipular DNA in vitro, além de uma série de reagentes e equipamentos fundamentais para os estudos na área.

Vamos estudar aqui as metodologias básicas de manipulação do DNA, que tornam possível a separação e a clonagem de fragmentos de DNA ou cDNA, bem como as metodologias que permitem a amplificação e o sequenciamento de DNA, assim como os estudos da expressão gênica e algumas aplicações práticas, como a identificação humana por meio da análise de DNA.

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UNIDADE 2 | GENÉTICA MOLECULAR

2 IDENTIFICAÇÃO, AMPLIFICAÇÃO E CLONAGEM DE GENES

Caro acadêmico, como você imagina que cientistas podem produzir insulina humana ou hormônio do crescimento em E. coli? Então, através de técnicas de biologia molecular, foi possível combinar a sequência codificadora do gene do hormônio do crescimento humano ou da insulina humana a sequências de DNA bacteriano que possibilitam a expressão destes genes em bactérias.

Os genes foram clonados em bactérias para que houvesse a produção das proteínas de interesse. Atualmente, a síntese de diferentes proteínas humanas é amplamente realizada em bactérias ou células eucarióticas.

A capacidade de amplificar um gene é fundamental para produção em bactérias de uma proteína humana, como o hormônio de crescimento humano, utilizado no tratamento de indivíduos que não produzem essa importante proteína. Chamamos a amplificação de uma sequência específica de DNA de clonagem de DNA. O processo de clonagem replica um segmento de DNA muitas vezes, gerando um grande número de cópias idênticas. Nesse sentido, podemos replicar a sequência de DNA de interesse em células vivas, inserindo-a em um plasmídio bacteriano ou no DNA de um bacteriófago in vitro, introduzindo a mesma em uma célula hospedeira apropriada, que pode replicá-la. O plasmídio ou o cromossomo do fago utilizado nessa técnica é chamado vetor de clonagem. Um outro método para clonagem de uma sequência de DNA é a utilização da técnica denominada reação da cadeia de polimerase (PCR), a fim de replicar a sequência in vitro. Esse procedimento tornou-se uma ferramenta poderosa na clonagem de DNA, mas só pode ser utilizado quando se conhecem as sequências nucleotídicas que flanqueiam a sequência de DNA de interesse.

A técnica de DNA recombinante tornou-se possível graças à descoberta das endonucleases de restrição, produzidas por bactérias, que fazem cortes internos nas moléculas de DNA, possibilitando a inserção de segmentos de DNA de interesse em vetores de clonagem (figura a seguir).

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TÓPICO 3 | TÉCNICAS DE BIOLOGIA MOLECULAR

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FIGURA 45 - MECANISMO DE AÇÃO DE ENZIMAS DE RESTRIÇÃO. SÍTIOS DE RECONHECIMENTO E CLIVAGENS PROMOVIDAS NO DNA PELAS ENZIMAS ECORI, PSTI E SMAI

FONTE: Menck e Sluys (2017, cap. 3

As endonucleases de restrição são sítio-específicas, ou seja, clivam as moléculas de DNA apenas em sítios específicos de restrição. As endonucleases de restrição geralmente reconhecem sequências de DNA palindrômicas. Várias enzimas de restrição são produzidas por diferentes microrganismos para sítios de DNA específicos. A função biológica das enzimas de restrição é proteger o material genético das bactérias, clivando possíveis DNAs exógenos, advindos de outra espécie ou DNA viral. A endonuclease de restrição cliva DNA seja qual for a origem da molécula, como o DNA de um vírus, de uma bactéria, de espécies vegetais, de humano ou qualquer outro DNA, desde que contenha a sequência reconhecida por ela.

Agora, prezado acadêmico, veja a Figura 46, que apresenta uma molécula de DNA recombinante contendo fragmentos de DNA de duas origens diferentes. A capacidade dos geneticistas de construir tais moléculas de DNA recombinante revolucionou a biologia molecular. Entretanto, para que uma molécula de DNA

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UNIDADE 2 | GENÉTICA MOLECULAR

recombinante seja útil, precisa ser amplificada por replicação em uma célula. A capacidade de replicação é uma característica essencial de todos os vetores de clonagem, sendo plasmídio ou bacteriófago. O vetor de clonagem deve apresentar uma origem de replicação, um gene marcador selecionável dominante, geralmente um gene que confere resistência a fármacos à célula hospedeira e um local de clivagem para endonuclease de restrição. Os vetores de clonagem atuais contêm um sítio de clonagem múltipla, denominado polylinker.

FIGURA 46 - CONSTRUÇÃO DE MOLÉCULAS DE DNA RECOMBINANTES IN VITRO

FONTE: Snustad e Simmons (2017, p. 372)

Mas, caro acadêmico, alguns genes eucarióticos são muito grandes, exigindo vetores de clonagem que os suportem. As pesquisas com grandes genes e cromossomos é possível quando se usam vetores que aceitam grandes insertos de DNA, como BAC (cromossoma artificial bacteriano), PAC (cromossoma artificial P1) e YAC (cromossoma artificial de levedura).

Prezado acadêmico, agora vamos estudar a reação em cadeia da polimerase (PCR). Atualmente, temos as sequências nucleotídicas completas de muitos genomas, inclusive do genoma humano, disponíveis no GenBank. A partir disso, podemos estudar diferentes genes por amplificação de DNA in vitro, e a sequência de DNA de interesse pode ser amplificada em apenas algumas horas, através da PCR. O uso desse procedimento requer apenas o conhecimento de sequências nucleotídicas curtas que flanqueiam a sequência de interesse. Na PCR, oligonucleotídios sintéticos (primers de DNA) complementares a

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TÓPICO 3 | TÉCNICAS DE BIOLOGIA MOLECULAR

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sequências conhecidas iniciam a amplificação enzimática da sequência de DNA. Esse procedimento para amplificação das sequências de DNA foi desenvolvido por Kary Mullis, que ganhou o Prêmio Nobel de Química em 1993.

A PCR tem três etapas, cada uma delas repetida muitas vezes (Figura 47). Inicialmente, o DNA genômico que contém a sequência a ser amplificada é desnaturado por aquecimento à temperatura de 92°C a 95°C por cerca de 30 segundos. Posteriormente temos o anelamento dos primers em local específico do DNA genômico desnaturado, mediante incubação em temperatura que pode variar entre 50°C e 65°C, por um minuto. A temperatura ideal de anelamento depende da composição de bases do iniciador. Finalmente, a DNA polimerase é usada para replicar o segmento de DNA entre os locais complementares aos iniciadores oligonucleotídicos. O iniciador oferece a 3′-OH livre necessária para extensão da fita de DNA covalente, e o DNA genômico desnaturado desempenha a função de molde necessária. A polimerização geralmente é realizada a 72°C durante um minuto. Os produtos do primeiro ciclo de replicação são desnaturados, pareados com iniciadores oligonucleotídicos e replicados novamente com a DNA polimerase. O procedimento é repetido muitas vezes até que seja alcançado o nível de amplificação desejado. Depois de 30 ciclos de amplificação, haverá mais de um bilhão de cópias da sequência de DNA. A descoberta da DNA polimerase termoestável na bactéria termofílica Thermus aquaticus proporcionou um grande avanço na amplificação do DNA por PCR. A Taq polimerase (polimerase de T. aquaticus) mantém a atividade durante a etapa de desnaturação por calor.

A PCR tem muitas aplicações, pois permite que os cientistas obtenham dados estruturais definitivos sobre genes e sequências de DNA quando há pouco DNA. Uma aplicação importante é no diagnóstico de doenças humanas hereditárias, inclusive em casos de diagnóstico pré-natal, nos quais o DNA fetal disponível é limitado. São várias as aplicações possíveis, como em casos forenses de identificação de pessoas pelo DNA isolado de amostras pequenas de tecido. Utilizando-se a PCR, é possível identificar as sequências de DNA em reduzidas quantidades de DNA isoladas de sangue, sêmen ou cabelo humanos, por exemplo.

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FIGURA 47 - TÉCNICA DA REAÇÃO EM CADEIA DA POLIMERASE (PCR)

FONTE: Menck e Sluys (2017, s.p.)

A enzima transcriptase reversa catalisa a síntese de filamentos de DNA complementares aos moldes de RNA, sendo utilizada em pesquisas para sintetizar filamentos de cDNA. Então, os filamentos de DNA produzidos podem ser convertidos em DNA bifilamentar. Posteriormente, as moléculas de DNA produzidas podem ser amplificadas por PCR.

Os produtos de amplificação por PCR podem ser analisados por eletroforese em géis de agarose ou de poliacrilamida. Nesta técnica, os fragmentos de DNA com carga negativa são submetidos a uma carga elétrica e correm ao longo de um gel em direção ao polo positivo, sendo separados por tamanho, pois os fragmentos menores se deslocam mais rapidamente ao longo da malha do gel. De modo geral, a eletroforese torna possível separar fragmentos de DNA na faixa

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de 10 pb até 50 Kpb. Para a separação de fragmentos maiores, podemos trabalhar com gel de agarose. No entanto, quando a amostra de DNA a ser analisada é composta por fragmentos pequenos, utiliza-se a poliacrilamida. Nesse caso, o gel é composto por uma mistura de dois monômeros: acrilamida e bisacrilamida, o que torna possível identificar diferenças de apenas um nucleotídeo entre diferentes amostras, o que é bastante útil, por exemplo, para o sequenciamento de DNA. Marcadores de pares de bases também devem ser utilizados com o objetivo de quantificarmos o tamanho dos fragmentos de DNA (Figura 48).

FIGURA 48 - ELETROFORESE EM GEL DE AGAROSE. (A). CORRIDA ELETROFORÉTICA HORIZONTAL DE DNA E RNA. (B) VISUALIZAÇÃO SOB LUZ ULTRAVIOLETA DE FRAGMENTOS

DE DNA

FONTE: Menck e Sluys (2017, s.p.)

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A técnica de PCR também possibilitou a identificação de indivíduos a partir de amostras de baixa qualidade e/ou contendo quantidades mínimas de DNA, o que é útil na identificação de criminosos a partir de amostras obtidas em cenas de crime. Através da análise de polimorfismos de sequências repetidas, como STRs (Repetições curtas em tandem), podemos identificar criminosos, ou ainda descartar ou confirmar paternidade (Figura 49).

FIGURA 49 - ANÁLISE PARA DETERMINAÇÃO DE PATERNIDADE

FONTE: Menck e Sluys (2017, s.p.)

Atualmente também trabalhamos com PCR em tempo real, o qual utiliza equipamentos que amplificam e quantificam o produto de amplificação ao mesmo tempo. A alta sensibilidade do método possibilita que os produtos sejam detectados na fase exponencial de amplificação. Nessa fase, quanto maior a quantidade de molde, menos ciclos de amplificação serão necessários para desenvolver uma quantidade detectável de produto. A quantificação do DNA é baseada na análise de um gráfico de amplificação que compara número de ciclos versus intensidade de fluorescência. As análises quantitativas do PCR em

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tempo real podem ser usadas para confirmar dados de variação de expressão de genes, como os obtidos em estudos de microarranjos de DNA, em pesquisas de transcriptoma.

Na técnica de microarranjos de DNA se utiliza o princípio de hibridação de ácidos nucleicos, que evoluiu a partir das técnicas de Southern e Northern blot para tornar possível a análise da expressão gênica global de uma célula. Assim, fragmentos de praticamente todos os genes conhecidos de um organismo são imobilizados em uma lâmina. São usados DNAs obtidos a partir de uma biblioteca de cDNA do organismo de interesse. Amostras de cDNA total de células são marcadas com moléculas fluorescentes, os fluoróforos, sendo que as moléculas de cDNA presentes na amostra funcionam como sondas, hibridando por complementariedade na posição correspondente na lâmina. A intensidade de fluorescência emitida em cada posição da lâmina nos indica a quantidade de moléculas de cDNA presentes e, consequentemente, o número de transcritos de cada um dos genes.

A técnica de Southern blot citada anteriormente detecta sequências de DNA em amostras separadas por eletroforese. Esta técnica tornou possível a detecção e a identificação de um gene de interesse em uma amostra de DNA. Inicialmente, é necessário cortar o DNA pelo tratamento com enzimas de restrição, obtendo-se fragmentos de DNA que podem ser separados em um gel de agarose. Posteriormente, o gel é submerso em solução alcalina para desnaturação do DNA. Então ocorre a transferência do DNA para uma membrana de náilon ou membrana de hibridação, que é incubada com a sonda, contendo o DNA correspondente à região de interesse, possibilitando a hibridação da sonda com o DNA de sequência idêntica. Após o surgimento da técnica de Southern blot, foram desenvolvidas modificações que possibilitaram a realização de estudos semelhantes em amostras de mRNA, surgindo o Northern blot, muito usado em pesquisas de expressão gênica. Já a técnica de Western blot refere-se à detecção de proteínas.

Caro estudante, agora vamos tratar de sequenciamento do DNA. O método de sequenciamento mais usado até o momento foi desenvolvido por Frederick Sanger (1918-2013), com a utilização de DNA polimerase. Durante o sequenciamento de DNA de Sanger, são adicionados didesoxirribonucleotídeos (ddNTP) às reações de síntese de DNA. Eles são diferentes dos desoxirribonucleotídeos por apresentarem uma substituição do grupo 3’-OH por um hidrogênio. Portanto, quando incorporados em uma fita de DNA, impedem que a síntese de DNA continue, por não terem grupo 3’-OH livre. O método utiliza quatro reações diferentes de polimerização de DNA, sendo que cada uma dessas reações contém desoxirribonucleotídeos normais (dNTP) e um dos quatro didesoxirribonucleotídeos misturados ao fragmento de DNA que se deseja sequenciar, além de um iniciador marcado radioativamente em 5’, e uma DNA polimerase. A DNA polimerase começa a incorporar os nucleotídeos na síntese de uma fita complementar, mas eventualmente incorporará o ddATP, causando a

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interrupção da síntese. O resultado dessas reações é uma coleção de fragmentos de tamanhos diferentes, todos eles terminados por incorporação de um ddNTP. As reações são submetidas à eletroforese em gel de poliacrilamida, e as bandas do gel reveladas por autorradiografia, sendo possível determinar a sequência de nucleotídeos do DNA estudado (Figura 50).

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FIGURA 50 - SEQUENCIAMENTO DE DNA PELO MÉTODO DE SANGER. APENAS A REAÇÃO COM DDATP É APRESENTADA

FONTE: Menck e Sluys(2017, s.p.)

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Ao considerarmos o sequenciamento de nova geração e a obtenção de dados em larga escala, podemos trabalhar com a ideia de uma tecnologia capaz de sequenciar o genoma humano inteiro em questão de poucos dias. Neste sentido, temos a perspectiva de uma medicina individualizada, a partir do conhecimento das predisposições genéticas de cada indivíduo. No entanto, temos que entender que muitos dilemas éticos deverão ser encarados quando essas metodologias se encontrarem largamente disponíveis.

3 BIBLIOTECAS DE DNA

Um conjunto de clones de DNA que contém um determinado genoma é uma biblioteca de DNA genômico. Muitas vezes, cromossomos de um organismo são isolados e utilizados para criar bibliotecas de DNA para cromossomos específicos, o que facilita a pesquisa de um gene sabidamente localizado em determinado cromossomo. Um método alternativo à clonagem gênica restringe a pesquisa de um gene às sequências de DNA transcritas em cópias de mRNA. Os retrovírus de RNA codificam a transcriptase reversa, enzima catalisadora da síntese de moléculas de DNA complementares (cDNA) a moldes de RNA unifilamentares. O cDNA bifilamentar pode ser clonado em vetores plasmidiais e, a partir do mRNA, os geneticistas são capazes de construir bibliotecas de cDNA que contêm apenas as regiões codificadoras dos genes expressos de um organismo.

As bibliotecas de DNA genômico são preparadas por isolamento de todo o DNA de um organismo, digestão do DNA por endonuclease de restrição e inserção dos fragmentos de restrição em vetor de clonagem apropriado. Com a utilização de enzima de restrição, os fragmentos de restrição podem ser ligados diretamente dentro de moléculas de DNA de vetores cortados pela mesma enzima. Posteriormente, é preciso introduzir DNA recombinante em células hospedeiras para amplificação por replicação in vivo. Uma boa biblioteca de DNA genômico contém praticamente todas as sequências de DNA do genoma de interesse.

Grande parte dos grandes genomas de animais e vegetais não codifica proteínas. Portanto, é melhor identificar os genes expressos empregando bibliotecas de DNA complementar (cDNA). Como a maioria das moléculas de mRNA contém caudas poli(A) 3′, pode-se usar oligômeros poli(T) para iniciar a síntese de filamentos complementares de DNA por transcriptase reversa. Os dúplex de RNA–DNA são convertidos em moléculas de DNA bifilamentares pelas ações de uma ribonuclease, uma DNA polimerase e DNA ligase. Por fim, os cDNAs bifilamentares podem ser inseridos em vetores de clonagem.

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4 BIOINFORMÁTICA

Caro estudante, a Biologia passa por uma revolução causada por métodos de geração e análise de dados em grande escala. Transformar esses dados em informação e conhecimento é o principal objetivo da bioinformática. A bioinformática é uma área muito dinâmica, na qual surgem diariamente novas ferramentas, metodologias e bases de dados.

Faz mais de uma década da conclusão do Projeto Genoma Humano, e biólogos, biomédicos e médicos, bem como a sociedade, vivem hoje uma revolução do conhecimento biológico, desencadeada pela introdução de métodos automáticos de geração de dados em larga escala, com o desenvolvimento de novos algoritmos computacionais de análise, gerenciamento e de distribuição de dados.

Com o avanço na geração de informações biológicas, surgiram bases de dados para a deposição, organização e apresentação dessas informações. Atualmente, vários bancos de dados são mantidos por diferentes organizações e empresas, podendo ser acessados e utilizados via internet, por exemplo.

Dentre esses, destacam-se alguns dos repositórios que permanecem como referência: O NCBI (National Center for Biotechnology Information); o PubMed, repositório que compreende mais de 25 milhões de títulos científicos relacionados a trabalhos do MEDLINE; o OMIM (Online Mendelian Inheritance in Man); o Gene, banco de dados que reúne todas as informações associadas a um determinado gene; o EBI (European Bioinformatics Institute); o KEGG (Kyoto Encyclopedia of Genes and Genomes); o PDB (Protein Data Bank); o Mendel (Sistema de busca de sequências genômicas ou exomas associados a doenças); bem como o EXPASY, que reúne uma série de ferramentas computacionais e possibilita que o usuário navegue por diversos repositórios de dados.

Atualmente, o sequenciamento de genomas se tornou uma rotina em muitos laboratórios de genética. A dificuldade metodológica para sequenciar moléculas de DNA está superada, sendo que o grande desafio de hoje é armazenar, organizar e processar as sequências geradas. O maior desafio durante o processo de sequenciamento de um genoma completo é a organização linear das leituras obtidas, pois há uma grande similaridade entre diferentes regiões do mesmo genoma, algo que ocorre em praticamente todos os organismos. De qualquer forma, há duas abordagens que podem ser usadas para realizar a montagem de tais leituras: a montagem de novo do genoma e a montagem guiada por um genoma de referência.

Os métodos baseados em sequências de referência requerem menos memória e capacidade de processamento computacional, no entanto, dependem da disponibilidade de uma sequência genômica apropriada contra a qual as leituras são alinhadas e depois montadas. Em relação aos métodos de montagem

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de novo, os principais algoritmos de montagem baseiam-se na busca por regiões de sobreposição entre as sequências. Para que essa sobreposição ocorra, os protocolos de sequenciamento incluem passos que fragmentam o DNA de modo aleatório, objetivando uma distribuição uniforme de fragmentos ao longo do genoma sequenciado.

Posteriormente à montagem de um genoma, começam os registros dos genes, de suas regiões transcritas, regiões reguladoras e polimórficas. Dependendo do organismo, o processo de anotação pode ser bastante complexo. Localizar um determinado gene em uma sequência genômica deveria ser algo simples, pois um gene apresenta, no início de sua região codificadora (ORF, open reading frame) um códon inicial (ATG) e, no seu final, um códon de parada ou terminal (TAA, TAG ou TGA). Considerando genomas bacterianos, a tarefa é relativamente simples, a qual pode ser realizada com ferramentas computacionais, como os programas Glimmer e GeneMark. Mas identificar as ORF em genomas de eucariotos é um processo difícil, pois a maioria dos genes apresenta íntrons. Mesmo no genoma humano ainda não conhecemos o número exato de genes. Portanto, em genomas de eucariotos, identificar as ORF, exons e íntrons é um processo bastante difícil. Alguns algoritmos que funcionam muito bem, visando esse objetivo, são: GenScan, TWINSCAN, NSCAN e JIGSAW.

Uma estratégia utilizada é a de fazer uma anotação manual de genomas. A iniciativa mais importante é a chamada ENCODE (Encyclopedia of DNA Elements). O ENCODE é um consórcio formado por diversos grupos de pesquisa que tem o objetivo de registrar todos os elementos funcionais presentes no genoma humano.

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LEITURA COMPLEMENTAR

Os mecanismos do envelhecimento

Marcos Pivetta e Ricardo Zorzetto

Estudos com células e organismos vivos identificam fenômenos genéticos e moleculares associados ao declínio físico e mental

Nunca um número tão grande de pessoas viveu tanto. Dos bebês que nascem hoje, mais da metade deve completar 65 anos e viver quase duas décadas a mais do que as pessoas nascidas em meados do século passado. O aumento da longevidade da população mundial e a redução da fertilidade estão fazendo o mundo envelhecer rapidamente. Projeções do documento Developing in an ageing world, publicado em 2007 pela Organização das Nações Unidas (ONU), indicam que em 2050 haverá cerca de 2 bilhões de pessoas com 60 anos ou mais no planeta (22% do total) – em 2005 eram 670 milhões, ou 10% da população.

O aumento da expectativa de vida também traz problemas. Um deles é o aumento rápido da proporção de idosos em muitos países – entre eles, o Brasil. Na França, passaram-se quase 150 anos para que o número relativo de idosos subisse de 10% para 20% da população. Nesse tempo, o país enriqueceu e melhorou as condições de vida das pessoas. China, Brasil e Índia passarão por algo semelhante em 25 anos (ver gráfico).

Hoje há 26 milhões de idosos (12,5% da população) no Brasil. Segundo projeções do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), os idosos serão 29% em 2050, quando esse grupo somará 66 milhões de indivíduos. “O Brasil está envelhecendo na contramão”, afirma o médico e epidemiologista carioca Alexandre Kalache, que dirigiu por 13 anos o Programa Global de Envelhecimento e Saúde da Organização Mundial da Saúde (OMS) e hoje preside a seção brasileira do International Longevity Centre (ILC), uma organização sem fins lucrativos que investiga o envelhecimento populacional e estratégias de adaptação dos países à chamada revolução da terceira idade. “Já temos problemas de saúde, emprego, educação, saneamento e também teremos de lidar com uma população formada por um grande número de idosos”.

As doenças associadas ao envelhecimento devem se tornar mais comuns, ao mesmo tempo que mais gente viverá com saúde por mais tempo, mudando o panorama laboral, que exigirá mais flexibilidade e capacidade de adaptação de pessoas, empresas e Estado. “As cidades terão de se preparar para esse novo cenário, criando políticas de moradia, transporte, participação social, trabalho e educação que levem em consideração o idoso”, alerta o epidemiologista.

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Em paralelo a essas mudanças, ocorreu ao longo do último século um avanço jamais visto na compreensão das causas do envelhecimento. Uma busca simples com as palavras-chave ageing ou aging em uma das maiores e mais importantes bases de artigos científicos na área da saúde, o Pubmed, encontra cerca de 384 mil papers sobre o assunto publicados de 1925 a 2016.

Em uma revisão publicada em 2013 na revista Cell intitulada The hallmarks of aging, pesquisadores da Espanha e da França apresentam uma síntese do que se sabe sobre os mecanismos celulares e moleculares – as causas mais profundas – do envelhecimento. Esta reportagem revisita os principais tópicos do assunto e apresenta avanços, inclusive com a participação de brasileiros.

Os genes e o tempo

Uma “boa genética” é talvez o fator biológico mais associado à longevidade. Experimentos envolvendo a manipulação de genes estenderam de forma significativa o tempo de vida de organismos considerados modelos, como leveduras, moscas, vermes e até mamíferos. A intervenção molecular foi bem-sucedida no verme Caenorhabditis elegans, um nematoide com 1 milímetro de comprimento cujo genoma foi sequenciado em 1998. Em vez de durar duas ou três semanas, o verme passou a viver de 145 a 190 dias depois que alguns de seus genes foram alterados. Com o camundongo (Mus musculus), talvez o melhor amigo de laboratório do ser humano, os resultados são mais modestos, mas igualmente positivos. Intervenções no genoma prolongam em um ano a longevidade do roedor, que é de quase dois anos.

Esses resultados levam alguns biólogos moleculares e geneticistas a defender a ideia de que a senescência é um processo dotado de plasticidade, controlável em certa medida. “Podemos acelerar ou retardar o envelhecimento nos animais”, diz o biólogo português João Pedro Magalhães, chefe do Grupo de Genômica Integrada do Envelhecimento da Universidade de Liverpool, na Inglaterra. “O próximo passo é fazer isso no ser humano”. Segundo Magalhães, os estudos com organismos-modelo já identificaram uns dois mil genes capazes de regular o envelhecimento.

Uma das estratégias dessa busca por viver mais e melhor é procurar mecanismos celulares e moleculares associados a uma boa velhice em quem é extremamente longevo. Magalhães coordenou em 2015 o sequenciamento do genoma da baleia-da-groenlândia (Balaena mysticetus), o mamífero mais resiliente à passagem do tempo. Com 18 metros de comprimento e 100 toneladas, esse cetáceo do Ártico pode ter em seu DNA pistas sobre como contornar o câncer e sobreviver por dois séculos. O trabalho, publicado na Cell Reports, mostra alterações em um gene ligado à termorregulação, que pode ser importante para entender o baixo metabolismo do animal. Um ritmo mais lento pode explicar como um mamífero tão grande vive três vezes mais que o homem.

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O DNA dos indivíduos mais longevos de nossa própria espécie também pode ser fonte de informações úteis para combater doenças associadas à velhice e conter o avanço dos ponteiros do relógio biológico. Essa é a expectativa de projetos ambiciosos como o Wellderly, conduzido desde 2007 pelo Instituto de Pesquisa Scripps, da Califórnia. Em 2016, foram publicados os primeiros resultados de peso do projeto, que sequenciou o genoma completo de 600 idosos saudáveis (sem doenças crônicas), com idade entre 80 e 105 anos, e comparou com o de 1.500 adultos mais jovens.

A diferença mais significativa é que os participantes do Wellderly apresentavam um risco genético menor de desenvolver problemas cognitivos. Em alguns idosos saudáveis, foram identificadas variantes (versões) do gene COL25A1 que lhes dariam proteção contra a doença de Alzheimer. Eles também tinham uma propensão pequena a desenvolver problemas cardíacos, embora o risco genético de tumores, diabetes tipo 2 e derrames fosse igual ao do grupo de controle.

“Foi surpreendente não ver diferença no risco genético para o desenvolvimento de cânceres”, comenta Ali Torkamani, diretor de Informática de Genoma e de Descoberta de Drogas do Scripps. “Sabemos também que há doenças genéticas que influenciam a velocidade do envelhecimento, geralmente acelerando-o. Mas, no geral, o envelhecimento é um processo complexo”.

O Centro de Pesquisa sobre o Genoma Humano e Células-Tronco (CEGH-CEL) da Universidade de São Paulo (USP) coordena um projeto que caminha para ser um Wellderly brasileiro, com duas populações de idosos. A primeira inclui mais de 1.300 residentes na cidade de São Paulo que tinham mais de 60 anos quando participaram do levantamento epidemiológico Saúde, Bem-estar e Envelhecimento (Sabe), realizado desde 1999 pela Faculdade de Saúde Pública da USP. A segunda, o estudo 80+, abrange a análise do DNA de cerca de 130 octogenários, todos com boa saúde.

Os pesquisadores da USP sequenciaram o exoma, a parte do genoma que codifica proteínas, dos idosos do Sabe. Os primeiros resultados, de 609 participantes, foram publicados em março de 2017 na revista Human Mutation e evidenciaram a singular mistura de populações (negro, índio e europeu) que caracteriza o Brasil. Foram encontradas 207 mil variantes genéticas que nunca tinham sido descritas nos bancos internacionais de dados moleculares. “Isso mostra a importância de produzirmos estudos com a nossa população”, comenta a geneticista Mayana Zatz, coautora do estudo e coordenadora do CEGH-CEL, um dos Centros de Pesquisa, Inovação e Difusão (Cepid) financiados pela FAPESP. Cada idoso tinha 300 alterações em média, a maioria inofensiva. Apenas sete indivíduos apresentaram mutações associadas a doenças, em geral algum câncer.

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Nas próximas semanas, o geneticista Michel Naslavsky, do centro da USP, viaja aos Estados Unidos para sequenciar o genoma de 1.300 idosos do Sabe e do 80+. “Será um trabalho demorado”, conta Naslavsky, primeiro autor do estudo na Human Mutation. Os dados produzidos pelo CEGH-CEL estão disponíveis na página do Arquivo Brasileiro Online de Mutações (ABraOM).

Formas de proteger o DNA

A corrente majoritária de biólogos e bioquímicos aceita hoje a ideia de que os organismos envelhecem e morrem porque, com o tempo, suas células perdem a capacidade de desempenhar funções, definham e morrem mais depressa do que conseguem ser repostas.

A todo momento, reações químicas no organismo, além de fenômenos ambientais, podem causar lesões na molécula de DNA. Experimentos feitos nos anos 1970 pelo bioquímico sueco Tomas Lindahl mostraram que o DNA de uma célula humana sofre 10 mil pequenas alterações espontâneas por dia, quase uma a cada 10 segundos. Nos 3,6 bilhões de anos de existência de vida no planeta surgiram proteínas que auxiliam o material genético a se manter íntegro, permitindo às células produzirem cópias perfeitas de si mesmas e continuar a existir.

Como nada é perfeito, os mecanismos de reparo também falham. Em um estudo com camundongos publicado em 2007 na Nature, pesquisadores dos Estados Unidos e da Holanda comprovaram que, com o tempo, as células-tronco acumulam defeitos genéticos e perdem a capacidade de se reproduzir e manter os tecidos íntegros e em funcionamento. Estudos posteriores mostraram que o mesmo ocorre com células humanas, inclusive em síndromes marcadas por envelhecimento acelerado, como a progéria.

No Instituto de Ciências Biomédicas da USP, o biólogo molecular Carlos Menck e sua equipe investigam a causa das alterações genéticas que impedem o reparo adequado do material genético. Há alguns anos, eles acompanham pessoas com a doença hereditária xeroderma pigmentosum (ver Pesquisa FAPESP nº 199). Expostas ao sol, elas desenvolvem câncer de pele muito facilmente porque suas células não consertam os danos causados pela radiação ultravioleta. Algumas podem também apresentar problemas neurológicos e outros sintomas parecidos com os observados nas síndromes de envelhecimento acelerado, que em alguns casos leva à morte no primeiro ano de vida. Falhas nesses mesmos genes levam ao atraso no desenvolvimento físico e mental característicos da síndrome de Cockayne.

Anos atrás Menck iniciou uma colaboração com um ex-aluno, o biólogo brasileiro Alysson Muotri, da Universidade da Califórnia em San Diego, para estudar os fenômenos que poderiam acometer os neurônios dessas pessoas. Com a adição de compostos químicos, eles induziram células da pele de pessoas com síndrome de Cockayne a regredirem ao estágio de células-tronco – essas células

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são capazes de originar outros tecidos. Depois, as estimularam a se transformarem em neurônios e viram que eles formavam conexões irregulares com outras células. “Os defeitos observados nos neurônios criados em laboratório explicariam, ao menos parcialmente, a origem dos problemas neurológicos desses indivíduos”, conta Muotri, um dos autores do artigo publicado em 2016 na revista Human Molecular Genetics.

Menck e Muotri também verificaram que esses neurônios acumulavam espécies reativas de oxigênio, ou radicais livres, compostos contendo uma forma de oxigênio que interage facilmente com o DNA e as proteínas, danificando-os. Eles suspeitam que a produção se dê em versões defeituosas das mitocôndrias, responsáveis pela produção de energia nas células. “Acreditamos que esse seja o link com a progéria, uma vez que níveis elevados de espécies reativas de oxigênio já foram relacionados ao envelhecimento”, diz Muotri. “Agora estamos tentando reverter esse quadro usando compostos antioxidantes”.

Na USP, Menck trabalha para amplificar os danos que as espécies reativas de oxigênio causam no material genético de pessoas com síndrome de Cockayne e tentar descobrir qual parte da maquinaria celular esses danos emperram. Caso se confirme que essa estratégia reproduz o que ocorre em pessoas com síndrome de Cockayne, Menck e Muotri terão em mãos um modelo de envelhecimento acelerado, útil para compreender o que ocorre com pessoas saudáveis.

Problemas com o reparo de DNA também ocorrem em outras enfermidades características do envelhecimento, como a doença de Alzheimer, mais frequente depois dos 80 anos. Na USP em Ribeirão Preto, a geneticista Elza Sakamoto Hojo e sua equipe vêm analisando a eficiência do reparo do DNA em pessoas com e sem Alzheimer. Eles coletaram amostras de sangue de 13 pessoas com idade entre 65 e 90 anos com a doença (e de 14 sem) e submeteram as células a concentrações elevadas de espécies reativas de oxigênio – usaram água oxigenada –, situação semelhante à que deve ocorrer no organismo em condições de estresse. Em um artigo publicado em 2013 no International Journal of Molecular Sciences, o grupo mostra que as células das pessoas com Alzheimer levaram três vezes mais tempo para se recuperar do banho de radicais livres do que as dos idosos saudáveis.

Telômeros encurtados

Durante a vida da célula, os danos genéticos não ocorrem igualmente ao longo da molécula de DNA. Eles parecem atingir com mais frequência suas duas extremidades, regiões conhecidas como telômeros. Atribui-se a esses segmentos de material genético a função de proteger o restante da fita de DNA – alguns comparam o seu papel com o da ponta plástica do cadarço dos sapatos. Cada vez que o material genético duplica e a célula se divide, os telômeros encolhem 2%. Só uma enzima, a telomerase, é capaz de recuperar o comprimento dos telômeros. Nos mamíferos, porém, a maioria das células adultas não produz telomerase, geralmente sintetizada pelas células-tronco. Com capacidade restrita de recuperação, os telômeros encurtam com a idade. Pesquisadores da

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Universidade Harvard, nos Estados Unidos, já demonstraram que é possível encompridar os telômeros artificialmente, introduzindo nas células cópias extras do gene da telomerase. Essa estratégia, no entanto, pode ser arriscada, uma vez que alguns tumores se tornam malignos depois de reativar a produção da enzima telomerase.

Em algumas enfermidades, o encurtamento dos telômeros é mais rápido. Uma delas é a disqueratose congênita, uma doença rara marcada pela dificuldade de produzir células do sangue, da pele e do tecido pulmonar e que pode levar a um envelhecimento acelerado como na progéria. Há algum tempo se sabe que quem tem disqueratose apresenta um encurtamento acentuado dos telômeros. O biólogo brasileiro Luis Francisco Batista, ex-aluno de Menck e professor na Washington University em Saint Louis, Estados Unidos, confirmou a causa: falhas no funcionamento da telomerase.

A partir de células da pele de pessoas com disqueratose, ele gerou células-tronco e verificou que a doença é mais grave quanto maior a incapacidade de produzir telomerase ativa. Desde esse resultado, publicado em 2011 na revista Nature, Batista se dedica a estudar como a falta de telomerase e o encurtamento dos telômeros afetam o estoque de células-tronco dos tecidos. “Estamos tentando conhecer a cadeia de eventos que ocorre em seguida”, conta Batista.

FONTE:<http://revistapesquisa.fapesp.br/2017/04/18/os-mecanismos-do-envelhecimento/>. Acesso em: 25 set. 2018.

DICAS

Prezado acadêmico, aprofunde e atualize sempre seus conhecimentos em Genética Molecular através de artigos científicos. Seguem sugestões de sites para que você possa realizar suas pesquisas:

• PUBMED. Disponíveis em: <https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/>. Acesso em: 28 set. 2018.

• SciELO. Disponível em: <http://www.scielo.org/php/index.php?lang=pt>. Acesso em: 28 set. 2018.

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RESUMO DO TÓPICO 3

Neste tópico, você aprendeu que:

• A técnica de DNA recombinante tornou-se possível graças à descoberta das endonucleases de restrição, produzidas por bactérias, que fazem cortes internos nas moléculas de DNA, possibilitando a inserção de segmentos de DNA de interesse em vetores de clonagem.

• Podemos estudar diferentes genes por amplificação de DNA in vitro, e a sequência de DNA de interesse pode ser amplificada em apenas algumas horas, através da PCR.

• A técnica de PCR possibilitou a identificação de indivíduos a partir de amostras de baixa qualidade e/ou contendo quantidades mínimas de DNA, o que é útil na identificação de criminosos a partir de amostras obtidas em cenas de crime.

• Através da análise de polimorfismos de sequências repetidas, como STRs (Repetições curtas em tandem), podemos identificar criminosos, ou ainda descartar ou confirmar paternidade.

• Um conjunto de clones de DNA que contém um determinado genoma é uma biblioteca de DNA genômico.

• A bioinformática é uma área muito dinâmica, na qual surgem diariamente novas ferramentas, metodologias e bases de dados.

• Com o avanço na geração de informações biológicas, surgiram bases de dados para a deposição, organização e apresentação dessas informações.

• Ao considerarmos o sequenciamento de nova geração e a obtenção de dados em larga escala, podemos trabalhar com a ideia de uma tecnologia capaz de sequenciar o genoma humano inteiro em questão de poucos dias. Neste sentido, temos a perspectiva de uma medicina individualizada, a partir do conhecimento das predisposições genéticas de cada indivíduo.

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1 (ENADE, 2008) Há sete anos, em uma cidade da região rural do sul do país, foi registrado o desaparecimento de uma criança de dois anos de idade que brincava no quintal de sua casa. Durante as investigações, foram encontrados vestígios biológicos no local do desaparecimento, que foram coletados e submetidos a análises de biologia forense, que revelaram a presença de sangue humano contendo vários tipos celulares, como hemácias, neutrófilos e linfócitos, além de contaminação com células animais de outra espécie. Além desses exames, foram realizados estudos de vínculo genético entre as amostras de sangue humano encontradas no local do desaparecimento e as dos pais biológicos da criança desaparecida. Recentemente, foi encontrada uma criança de nove anos de idade que apresenta um sinal na pele muito semelhante ao da criança desaparecida. Foram colhidas amostras de sangue e realizadas análises comparativas com o material obtido sete anos atrás, que confirmaram tratar-se da mesma pessoa. Considere que, para realizar as análises descritas no texto, estivessem disponíveis no laboratório de biologia forense as técnicas de PCR (reação em cadeia da polimerase), eletroforese e sequenciamento automático de DNA, indicadas para analisar marcadores genéticos dos tipos SNPs (polimorfismo de nucleotídeo único) do DNA mitocondrial, STR (repetições curtas em série) nucleares e SNPs nucleares. Acerca desse assunto, assinale a alternativa CORRETA:

a) ( ) Caso a amostra contenha apenas hemácias, a análise de marcadores genéticos SNPs do DNA mitocondrial não poderá ser utilizada.

b) ( ) Para que se possa usar a técnica de PCR, é necessário acrescentar ao sistema microrganismos que secretem a enzima DNA polimerase.

c) ( ) Para a obtenção de um perfil genético individual, é necessária a análise de regiões genômicas do tipo STRs que apresentem repetições de sequências maiores que 1.024 bases.

d) ( ) Para se realizar a PCR, deve-se, antes, separar a amostra por eletroforese e/ou sequenciamento automático.

e) ( ) As técnicas mencionadas são independentes e, portanto, não podem ser combinadas entre si.

2 (ENADE, 2017) Uma ferramenta computacional, denominada Mendel (MD), em homenagem a Gregor Mendel, pode auxiliar no diagnóstico de alterações genéticas. Por meio de seu navegador, o pesquisador faz upload de sequências completas do genoma ou frações que codificam genes (exomas) de seus pacientes. Então, o programa analisa essas informações e as cruza com dados disponíveis em bancos de dados genéticos referentes a diferentes sequências genômicas ou exomas associados a doenças genéticas. Assim, essa plataforma gera uma lista de mutações que podem ser as responsáveis pela doença investigada.

AUTOATIVIDADE

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A partir das informações apresentadas, avalie as asserções a seguir e a relação entre elas.

I- As estratégias de sequenciamento de ácidos nucleicos de alta performance (high throughput) permitem a geração de grande quantidade de dados referentes a sequências codificadoras, podendo favorecer a investigação e o diagnóstico de distúrbios mendelianos humanos.

PORQUE

II- O sequenciamento de genomas completos ou de exomas fornece informações sobre variantes genéticas que, em comparação às existentes em bancos de dados, são utilizadas para predizer a atividade gênica no organismo.

A respeito dessas asserções, assinale a alternativa CORRETA:

FONTE: CARDENAS, R. et al. Mendel, MD: A user-friendly open-source webtool for analyzing WES and WGS in the diagnosis of patients with Mendelian disorders. Plos Computational Biology, v.6, n. 13, 2017 (adaptado).

a) ( ) As asserções I e II são proposições verdadeiras, e a II é uma justificativa correta da I.

b) ( ) As asserções I e II são proposições verdadeiras, mas a II não é uma justificativa correta da I.

c) ( ) A asserção I é uma proposição verdadeira, e a II é uma proposição falsa.d) ( ) A asserção I é uma proposição falsa, e a II é uma proposição verdadeira.e) ( ) As asserções I e II são proposições falsas.

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UNIDADE 3

GENÉTICA MÉDICA

OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM

PLANO DE ESTUDOS

A partir do estudo desta unidade, você deverá ser capaz de:

• Entender as bases da Genética Humana e Médica.

• Compreender, com base nos conhecimentos obtidos nas unidades 1 e 2, as questões genéticas pertinentes à espécie humana.

• Estudar algumas doenças genéticas humanas e seus diagnósticos.

• Discutir os aspectos éticos concernentes aos estudos, procedimentos e pesquisas neste importante campo da ciência.

Esta unidade está dividida em três tópicos. No decorrer da unidade você encontrará autoatividades com o objetivo de reforçar o conteúdo apresentado.

TÓPICO 1 - HERANÇA E DOENÇAS GENÉTICAS EM HUMANOS

TÓPICO 2 - CITOGENÉTICA HUMANA

TÓPICO 3 - GENÉTICA MÉDICA NA ERA DA GENÔMICA

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TÓPICO 1

HERANÇA E DOENÇAS GENÉTICAS EM HUMANOS

UNIDADE 3

1 INTRODUÇÃOPrezado acadêmico! Neste tópico vamos discutir os princípios básicos

de herança e os mecanismos associados às doenças genéticas humanas. Há diferentes doenças cujo componente genético é o principal fator desencadeante das alterações clínicas, apresentando um padrão de herança mendeliano, as decorrentes de alterações cromossômicas, mas há também as doenças com um padrão de herança multifatorial, envolvendo fatores genéticos e ambientais.

Com o desenvolvimento exponencial nos campos da genética humana e da biologia molecular, houve avanços significativos também na genética médica. Com o avanço das tecnologias de DNA recombinante e sequenciamento de DNA, foi estabelecido o grande projeto de sequenciamento do genoma humano, possibilitando, por exemplo, o mapeamento preciso dos genes e o conhecimento apurado de suas sequências. A partir do Projeto Genoma Humano, passamos a compreender melhor o funcionamento do nosso genoma, seus genes, controle da expressão e a etiologia de várias patologias.

Felizmente, nos últimos anos, com o avanço da medicina e a melhora das condições sociais e sanitárias, observamos uma redução na incidência de doenças neonatais de causas especificamente ambientais. Entretanto, em decorrência disso, observamos hoje um aumento relativo das doenças neonatais de causas genéticas. Além disso, salientamos que a expectativa de vida tem aumentado sensivelmente, levando a um aumento significativo da incidência de doenças de início tardio que dependem de fatores genéticos, como a doença de Alzheimer.

2 HERANÇA GENÉTICA

Prezado acadêmico, entendemos que os fatores genéticos influenciam na manifestação e no prognóstico clínico da maioria das doenças humanas, mesmo nas multifatoriais. A constituição genética de um indivíduo pode ser importante para o desenvolvimento e progressão de doenças como as infecciosas, casos de malária e Síndrome da Imunodeficiência Adquirida (AIDS), além de doenças

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UNIDADE 3 | GENÉTICA MÉDICA

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crônicas como as cardiovasculares, doenças respiratórias, hipertensão, câncer, diabetes e doenças metabólicas. Desse modo, fica claro que a genética se tornou um tema fundamental na medicina atual.

Normalmente, o surgimento de uma doença humana depende de fatores genéticos e ambientais. Entretanto, quando temos uma contribuição preponderantemente genética, estamos diante de doenças genéticas causadas por mutações em um determinado gene, como nos casos de ataxias espinocerebelares, hemofilia, anemia falciforme, fibrose cística, fenilcetonúria, distrofia muscular de Duchenne, síndrome de Crouzon, doença de Huntington, doença de Tay-Sachs, doença de Gaucher etc., e as doenças causadas por alterações cromossômicas, como a Síndrome de Down, cri-du-chat e a Leucemia Mieloide Crônica.

À medida que a contribuição dos fatores ambientais é mais significativa, a influência de fatores genéticos acaba reduzindo, como em diversos tipos de cânceres, doença de Alzheimer, epilepsia, asma, além de muitas outras, sendo classificadas como doenças multifatoriais. Mas cabe salientar aqui que a estimativa da importância relativa dos fatores genéticos e ambientais na determinação de uma doença não é simples de se estabelecer, pois as doenças multifatoriais ocorrem pela combinação de múltiplos fatores ambientais e mutações em vários genes (Figura 1).

Tanto a altura dos indivíduos quanto a pressão arterial são exemplos de fenótipos que variam entre os indivíduos de uma população apresentando uma distribuição contínua, sendo que essa variabilidade depende de componentes genéticos. Para as características que apresentam uma variação contínua na população, temos o modelo multifatorial de herança. Nestes casos, a variabilidade fenotípica é atribuída pela contribuição aditiva de vários loci (Gráfico 1), cujo efeito sobre o fenótipo depende também de fatores ambientais. Um bom exemplo disto é a estatura de indivíduos de uma população que apresenta uma distribuição normal, fato este oriundo da contribuição de vários genes e dos hábitos dos indivíduos, como a nutrição e as atividades físicas.

Às doenças comuns que não segregam em um modelo de herança mendeliana, atribuímos o modelo de herança multifatorial. Desta forma, temos uma distribuição contínua quanto à suscetibilidade à doença e há a presença de um limiar, de onde parte a manifestação da doença.

Portanto, existe uma quantidade mínima de fatores ambientais e genéticos para que a doença seja desenvolvida, sendo que ela não surge nos indivíduos em que estes fatores não alcancem o limiar.

Os fatores ambientais que podem aumentar o risco de um indivíduo manifestar uma doença são os de risco e podem ter origem na dieta, estilo de vida, estresse, poluentes etc. Os elementos genéticos também são bastante variáveis, como a presença ou não de determinados polimorfismos genéticos nos indivíduos.

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TÓPICO 1 | HERANÇA E DOENÇAS GENÉTICAS EM HUMANOS

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Os gêmeos podem ser estudados com a finalidade de investigar a participação do genótipo na variação fenotípica dos indivíduos. Os fatores do ambiente que afetam as diferenças em gêmeos monozigóticos (idênticos, gerados por um único zigoto) são comparáveis aos que afetam as diferenças nos gêmeos dizigóticos, oriundos de dois zigotos. O valor das diferenças intra-par nos dois tipos de gêmeos pode servir para estimar a importância relativa do genótipo e do ambiente na determinação dos caracteres. Deste modo, temos a avaliação da concordância ou discordância do fenótipo em questão em pares de gêmeos monozigóticos idênticos (que compartilham grande parte do material genético) e em gêmeos dizigóticos fraternos (que compartilham 50% do material genético). Por exemplo: a taxa de concordância para esquizofrenia em gêmeos idênticos é ao redor de 50% e para gêmeos dizigóticos é da ordem de 12%. Portanto, temos componentes genéticos e ambientais na etiologia desta doença. O estudo de gêmeos cresceu muito com o desenvolvimento da genética humana, sendo denominado de Gemelologia.

FIGURA 1 - GRADIENTE DE CONTRIBUIÇÃO ENTRE FATORES GENÉTICOS E AMBIENTAIS PARA A DETERMINAÇÃO DE DOENÇAS HUMANAS

FONTE: Menck e Sluys (2017, s.p.)

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GRÁFICO 1 – FENÓTIPO COM VARIAÇÃO CONTÍNUA EM UMA POPULAÇÃO

FONTE: Menck e Sluys (2017, s.p.)

A) Distribuição de uma característica hipotética em uma população, com valor médio de 100 unidades. Um alelo em letra maiúscula acrescenta cinco unidades ao valor da característica, e cada alelo em minúscula reduz cinco unidades. B) A característica pode ser determinada por 1, 2, 3 ou múltiplos genes, assumindo gradativamente a forma de uma curva de Gauss.

As doenças genéticas raras podem apresentar um padrão de herança mendeliano muito característico e previsível em uma genealogia, pois envolvem mutações em um determinado gene. Essas mutações podem ser alterações em apenas um alelo quando temos um padrão de herança dominante ou em dois alelos, dentro de um padrão recessivo. Os genes associados a essas doenças podem estar localizados em um autossomo, na herança autossômica ou no cromossomo X, na herança ligada ao sexo.

Atualmente, estima-se que do total de genes humanos, mutações em 11% deles podem causar doenças genéticas de herança mendeliana. Apesar do grande avanço na identificação da etiologia de doenças genéticas humanas, ainda falta estabelecer a relação causativa entre gene e doença em cerca de 50% dos casos. O número de doenças com causas genéticas conhecidas é quase o dobro do número de genes que, quando mutados, podem provocar uma doença, ou seja, diferentes mutações no mesmo gene podem causar diferentes doenças, o que é conhecido por heterogeneidade alélica.

Cerca de 89% das patologias com padrão de herança mendeliana apresentam manifestação clínica em idade pediátrica, apenas 10% manifestam-se após a puberdade e 1% após o término do período reprodutivo. Estas doenças apresentam baixa prevalência, mas normalmente são muito graves, sendo fundamental a prevenção de novos casos através de aconselhamento genético para as famílias com afetados, sendo assim possível avaliar se há risco de recorrência da doença na família. O aconselhamento genético é um processo bastante elaborado que envolve confirmação de diagnóstico, avaliação sobre a necessidade de testes genéticos, orientação de prognóstico clínico e estimativa de riscos, envolvendo toda a família.

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TÓPICO 1 | HERANÇA E DOENÇAS GENÉTICAS EM HUMANOS

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3 DOENÇAS GENÉTICAS EM HUMANOS

Prezado acadêmico, algumas doenças genéticas podem ter um padrão de herança autossômico dominante, ou seja, basta apresentar um alelo mutado para desenvolver a doença, portanto os afetados podem ser heterozigotos. A presença de mutação nos dois alelos (homozigose para o alelo mutado) é muito rara. A acondroplasia, uma forma de nanismo, é um caso clássico deste padrão de herança. A maioria dos afetados tem a mutação p.Gly380Arg, ou seja, substituição de uma glicina por uma arginina na posição 380 da proteína. Indivíduos com apenas um alelo mutado do gene FGFR3 apresentam déficit de crescimento. FGFR3 é uma proteína que funciona como um receptor de membrana celular, agindo como um regulador negativo do crescimento dos ossos longos, inibindo a proliferação de condrócitos na epífise desses ossos, aumentando a substituição dessas células por osteoblastos e osteócitos, responsáveis pela mineralização. A proteína FGFR3 alterada funciona de forma constitutiva, ocorrendo ativação prematura do processo de ossificação. Mutações que geram atividade proteica exacerbada ou que levam à aquisição de uma nova função proteica são chamadas mutações de ganho de função.

Caro acadêmico, as ataxias espinocerebelares ou SCAs também apresentam um padrão de herança autossômico dominante. Constituem um grupo complexo de doenças neurodegenerativas que atingem o cerebelo e suas principais conexões. Frequentemente fatais, as SCAs são herdadas de modo vertical, manifestam-se geralmente na vida adulta e apresentam grande heterogeneidade clínica. Os pacientes acometidos pelas SCAs apresentam vários achados neurológicos provenientes do comprometimento cerebelar e das vias aferentes e eferentes, tais como a disartria, a dismetria, o nistagmo, o tremor de intenção, a decomposição de movimentos, a disdiadococinesia, a ataxia axial, podendo haver ainda alterações nos gânglios da base, no tronco cerebral, na medula espinhal, nos nervos ópticos, na retina e nos nervos periféricos. As diversas SCAs compartilhariam o mesmo tipo de mutação denominada mutação dinâmica, é caracterizada por uma expansão de nucleotídeos. As SCAs apresentam uma expansão CAG na região codificante dos respectivos genes, a qual codifica um segmento de poliglutamina. As exceções, até o momento, são a SCA8 e a SCA10, sendo que a SCA8 é causada pela expansão do trinucleotídeo CTG e a SCA10 pela expansão do pentanucleotídeo ATTCT.

Quanto à herança autossômica recessiva, podemos citar a fibrose cística (FC), que apresenta a maior prevalência em populações de origem europeia. Esta patologia se caracteriza pela ocorrência de suor salgado, infecções respiratórias recorrentes e infertilidade no sexo masculino. Os pais dos indivíduos acometidos pela FC são clinicamente normais, mas portadores de um alelo com a mutação (heterozigotos). Neste sentido, o risco de que pais heterozigotos tenham um filho com a doença é de 25%. A fibrose cística tem incidência de 1:2.000 indivíduos em populações europeias, e a frequência de heterozigotos é de 1:20. A doença é causada por mutações no gene CFTR (do inglês, cystic fibrosis transmembrane conductance regulator) que se localiza no cromossomo 7, sendo dividido em 27 éxons, numerados de 1 a 24 com subdivisões “a” e “b” para os exons 6, 14 e 17, levando à perda de função da proteína (Figura 2).

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UNIDADE 3 | GENÉTICA MÉDICA

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FIGURA 2 - ESTRUTURAS DO GENE CF E SEU PRODUTO, A PROTEÍNA CFTR

FONTE: Snustad e Simmons (2017, s.p.)

A expressão de CFTR em células epiteliais está bem descrita e a função do CFTR nestas células está relacionada à fisiopatologia da FC. A proteína codificada pelo gene CFTR funciona como um canal que realiza o transporte do íon cloro através da membrana apical e o interior das células epiteliais dos pulmões, intestino, pâncreas, glândulas sudoríparas e alguns outros órgãos. Até o momento, mais de 1900 mutações foram identificadas no gene CFTR, sendo que a mutação ∆F508 (Phe508del) é a mais frequente entre os pacientes de FC, presente em cerca de 70% dos casos, dependendo da população analisada. Em algumas populações, é possível identificar facilmente todas as mutações do gene CFTR presentes nos pacientes. A mutação delta F508 (∆F508) ocorre devido à deleção de três bases no éxon 10, resultando na perda do aminoácido fenilalanina (Phe) na

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TÓPICO 1 | HERANÇA E DOENÇAS GENÉTICAS EM HUMANOS

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posição 508 da proteína produzida, acarretando deficiência no seu dobramento e, posteriormente, degradação no retículo endoplasmático. No Brasil, a frequência dessa mutação não é tão elevada devido, provavelmente, à miscigenação.

Caro acadêmico, é importante distinguir as formas autossômicas (dominantes ou recessivas) daquelas ligadas ao cromossomo X. As formas autossômicas dominantes diferem das ligadas ao X, pois os homens acometidos pela doença podem transmiti-la para os descendentes de ambos os sexos. Já nas formas ligadas ao X, um homem acometido pela doença a transmite somente para suas filhas. Um exemplo clássico de doença ligada ao X é a distrofia muscular do tipo Duchenne (DMD), que acomete 1:7.000 nascidos vivos, sendo causada por mutações no gene da distrofina, que perde sua função. A patologia caracteriza-se por uma fraqueza muscular progressiva que costuma manifestar-se aos três anos de idade. Os meninos têm uma sobrevida reduzida e eles não se reproduzem, pois a doença é geneticamente letal, ou seja, os afetados não deixam descendentes e o valor adaptativo é considerado zero. A doença atinge basicamente o sexo masculino, no entanto, há alguns casos de mulheres com uma forma mais branda. Nesses casos, a presença dos sinais clínicos está associada ao desvio de inativação dos cromossomos X. Nas mulheres com distrofia muscular, o cromossomo X com a mutação no gene da DMD está predominantemente ativo no tecido muscular.

Já a Síndrome de Rett, diferentemente da DMD, é um distúrbio que ocorre quase exclusivamente no sexo feminino. As meninas acometidas se tornam espásticas, atáxicas e desenvolvem demência. A Síndrome de Rett é causada por mutações no gene MECP2, localizado no cromossomo X, que codifica uma proteína de ligação ao DNA. Grande parte das mutações de novo, ou seja, uma nova mutação, tem origem paterna, o que explica parcialmente porque a maior parte dos casos é do sexo feminino. Sendo assim, as novas mutações no gene citado acima surgem mais frequentemente no cromossomo X dos homens, que são passados somente às filhas, pois os meninos devem receber o Y dos pais.

Veja, caro acadêmico, que interessante o próximo caso de doença genética. A mesma deleção na região do braço longo do cromossomo 15, del(15)(q11-q13), é encontrada em pacientes com duas síndromes distintas, a Síndrome de Prader-Willi e a Síndrome de Angelman. A Síndrome de Prader-Willi é caracterizada por obesidade, baixa estatura, mãos e pés pequenos, hipogonadismo, déficit cognitivo leve, hiperfagia e comportamento obsessivo-compulsivo. A Síndrome de Angelman é definida por face típica, microcefalia, baixa estatura, epilepsia e déficit cognitivo. Os estudos identificaram que a deleção na Prader-Willi sempre ocorre no cromossomo de origem paterna, enquanto que a deleção na síndrome de Angelman sempre acontece no cromossomo de origem materna. Portanto, os indivíduos com a Síndrome de Prader-Willi têm somente a região q11-q13 do cromossomo 15 de origem materna, enquanto os portadores da Síndrome de Angelman têm essa região exclusivamente de origem paterna. Os aspectos clínicos e genéticos aqui descritos sugeriram que genes localizados em 15q11-q13 no cromossomo de origem materna são expressos diferentemente daqueles que

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UNIDADE 3 | GENÉTICA MÉDICA

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ocupam o mesmo locus no cromossomo de origem paterna. Boa parte dos genes da referida região é expressa tanto no alelo paterno como no materno, entretanto alguns genes são expressos de forma exclusiva no alelo materno ou paterno, fenômeno conhecido como imprinting genômico.

Do ponto de vista das causas genéticas de determinadas doenças, podemos estudar outra doença interessante nesse sentido, a de Crohn. A doença de Crohn é uma doença inflamatória, autoimune que envolve o trato gastrintestinal, levando a diarreias e dores abdominais, afetando homens e mulheres. Alterações em pelo menos oito genes estão associadas a um aumento de risco de manifestação da doença, mas nenhuma delas é definitiva para sabermos se o indivíduo irá desenvolver os sintomas, entretanto, tais polimorfismos aumentam as chances de um indivíduo desenvolver a doença quando presentes. Veja o cariograma apresentado na Figura 3.

FIGURA 3 – CARIOGRAMA: CARIÓTIPO HAPLOIDE MASCULINO

FONTE: Menck e Sluys (2017, s.p.)

As setas indicam as regiões cromossômicas com polimorfismos associados à Doença de Crohn.

Cerca de 20% das pessoas com doença de Crohn têm parentes acometidos pela patologia. Parentes em primeiro grau de pacientes com essa doença têm um aumento de 10 vezes no risco de a desenvolverem. Um dado interessante é que determinados fatores podem contribuir para aumentar o risco, como presença de outras doenças autoimunes, como psoríase e esclerose múltipla, além do tabagismo e do tratamento hormonal contraceptivo.

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TÓPICO 1 | HERANÇA E DOENÇAS GENÉTICAS EM HUMANOS

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Considerando agora os distúrbios mitocondriais em humanos, temos que lembrar que são herdados de modo materno, pois o ovócito humano contém o DNA mitocondrial que é transmitido para a prole, já o DNA mitocondrial do espermatozoide não é repassado. Deleções no DNA mitocondrial podem levar à Síndrome de Kearns-Sayre, caracterizada por oftalmoplegia, degeneração pigmentar da retina, síndrome cerebelar e parada cardíaca. Muitos casos desta doença ocorrem por deleções espontâneas no DNA mitocondrial durante a embriogênese, ao invés de transmissão materna. Já a Neuropatia Óptica de Leber é herdada maternalmente com penetrância aumentada em homens. A cegueira de progressão rápida ocorre por degeneração do nervo óptico. Várias mutações do DNA mitocondrial foram descritas para esta doença. Já algumas mutações de ponto em genes mitocondriais que codificam moléculas de tRNA resultam nos distúrbios MELAS e MERRF.

O desenvolvimento da genômica tem sido fantástico. O sequenciamento das regiões codificadoras do genoma humano, ou sequenciamento do exoma, está ficando cada vez mais acessível. O sequenciamento do exoma humano pode ser capaz de trazer grandes avanços na pesquisa em genética humana e médica. No entanto, as questões éticas envolvem decisões de quando e em quais situações o sequenciamento deve ser indicado, pois seria um teste preditivo revelando mutações patogênicas associadas a doenças neurodegenerativas, por exemplo, sem perspectiva atual de tratamento eficaz.

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Neste tópico, você aprendeu que:

• A constituição genética de um indivíduo pode ser importante para o desenvolvimento e para a progressão de doenças.

• Normalmente, o surgimento de uma doença humana depende de fatores genéticos e ambientais.

• Quando temos uma contribuição preponderantemente genética, estamos diante de doenças genéticas causadas por mutações em um determinado gene.

• À medida que a contribuição dos fatores ambientais é mais significativa, a influência de fatores genéticos acaba reduzindo, sendo que estas doenças são classificadas como multifatoriais.

• Algumas doenças genéticas podem ter um padrão de herança autossômico dominante, ou seja, basta apresentar um alelo mutado para desenvolver a doença.

• Nas doenças com padrão de herança recessivo, os pais dos indivíduos acometidos podem ser clinicamente normais, mas portadores de um alelo com a mutação (heterozigotos).

• Nas doenças com padrão de herança ligado ao cromossomo X, um homem acometido pela doença a transmite somente para suas filhas.

• Os distúrbios mitocondriais são herdados de modo materno, pois a prole herda apenas o DNA mitocondrial do ovócito.

• Os gêmeos podem ser estudados com a finalidade de investigar a participação do genótipo na variação fenotípica.

RESUMO DO TÓPICO 1

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1 (ENADE, 2009) Leia o trecho: Embora as estimativas variem, a taxa de concordância para esquizofrenia em gêmeos idênticos é ao redor de 50% e, para gêmeos dizigóticos, é da ordem de 12%, sendo significativamente maior que o 1% de risco da população geral.

FONTE: BARBOSA DA SILVA, R. C, 2006. (Adaptado).

Considerando-se esses dados da pesquisa sobre a etiologia genética da esquizofrenia, é CORRETO afirmar que:a) ( ) A esquizofrenia se deve ao acaso, já que a chance de um irmão

monozigótico desenvolver o transtorno é de 50%, se o outro for portador. b) ( ) O ambiente pode proteger o indivíduo do desenvolvimento desse

transtorno, uma vez que apenas 1% da população o desenvolve. c) ( ) O componente genético existe, mas também ocorre a participação

do componente ambiental na esquizofrenia, pois 50% dos gêmeos monozigóticos desenvolvem o transtorno se o outro for portador.

d) ( ) O fato de 12% dos gêmeos dizigóticos desenvolverem igualmente o transtorno demonstra o peso dos fatores psicológicos familiares no transtorno.

e) ( ) Os resultados, ao variar em 50% para gêmeos monozigóticos, 12% para gêmeos dizigóticos e apenas 1% para a população em geral, demonstram a ausência de relação entre o ambiente e os fatores genéticos.

AUTOATIVIDADE

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TÓPICO 2

CITOGENÉTICA HUMANA

UNIDADE 3

1 INTRODUÇÃOCaro acadêmico, na citogenética, cientistas estudam o número e a estrutura

dos cromossomos por coloração das células em divisão com diferentes corantes, seguida por análise microscópica. A citogenética teve origem em pesquisas que descobriram os cromossomos e observaram seu comportamento durante a mitose e a meiose. As pesquisas em citogenética se desenvolveram com a evolução da microscopia e a coloração dos cromossomos.

Com a descoberta de que os genes estavam localizados nos cromossomos, houve o crescimento do interesse na área de citogenética, levando a importantes estudos sobre o número e a estrutura dos mesmos. Atualmente, temos ampla aplicação dos conhecimentos citogenéticos principalmente na medicina, pois podemos identificar as anormalidades cromossômicas a associá-las a doenças, como no caso do cromossomo Philadelphia, no diagnóstico da Leucemia Mieloide Crônica.

Neste tópico estudaremos os importantes processos de divisão celular, mitose e meiose, destacando a consequência da não disjunção cromossômica, que pode ocorrer tanto na divisão de células somáticas durante a mitose, bem como na divisão reducional meiótica, na produção de gametas. Abordaremos, ainda, as principais cromossomopatias autossômicas, como a Síndrome de Down, as aneuploidias relacionadas aos cromossomos sexuais, como no caso da Síndrome de Turner, além da Síndrome de cri-du-chat, causada por deleção de um segmento cromossômico.

2 CITOGENÉTICA HUMANA

Para as análises citogenéticas são utilizadas células em divisão mitótica, em metáfase. Em humanos, leucócitos podem ser coletados do sangue periférico, separados das hemácias e cultivados. Os leucócitos ficam em suspensão e, pela ação mitogênica da fitohemaglutinina, estes se multiplicam. Em seguida, a divisão celular é interrompida na metáfase da mitose, fase em que os cromossomos são melhor visualizados pela utilização de colchicina, que impede a formação do fuso acromático, e posterior coloração com Giemsa. Antes de serem corados

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UNIDADE 3 | GENÉTICA MÉDICA

com Giemsa, os cromossomos podem ser tratados com tripsina, uma enzima que remove algumas proteínas associadas aos cromossomos. O corante Giemsa interage com as proteínas restantes, que se distribuem de modo característico ao longo do comprimento de cada cromossomo. O resultado é um padrão reproduzível de bandas.

No entanto, a técnica de citogenética molecular conhecida por FISH (Fluorescent In Situ Hybridization), mais avançada, cria imagens coloridas dos cromossomos pelo tratamento das dispersões cromossômicas com sondas de DNA marcadas por fluorescência. Em condições adequadas, a sonda de DNA se liga ao DNA cromossômico, cuja sequência é complementar à dele. Essa ligação marca o DNA cromossômico com o corante fluorescente presente no fragmento de DNA (Figuras 4 e 5).

FIGURA 4 - TÉCNICA DE FISH

FONTE: Snustad e Simmons (2017, s.p.).

Técnica de Fish – os centrômeros, além três pares de cromossomos, estão evidenciados.

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TÓPICO 2 | CITOGENÉTICA HUMANA

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FIGURA 5 - TÉCNICA DE FISH. CARIÓTIPO HUMANO 46, XX

FONTE: Snustad e Simmons (2017, s.p.).

3 MITOSE – DIVISÃO CELULAR EQUACIONAL

A distribuição organizada de cromossomos duplicados na célula-mãe para as células-filhas é o principal objetivo da mitose. Cada cromossomo da célula-mãe é duplicado na fase S do ciclo celular eucariótico, antes do início da mitose. Durante a mitose, há a condensação da cromatina evidenciando os cromossomos individuais, sendo que após a divisão celular, os cromossomos descondensam-se novamente durante a interfase. Quando a mitose inicia, já houve duplicação de todos os cromossomos. Os filamentos duplos denominados cromátides-irmãs, por sua vez, permanecem intimamente associados uns aos outros, unidos pelo centrômero do cromossomo. A distribuição de cromossomos duplicados entre as células-filhas é organizada pelos microtúbulos do fuso acromático formados por tubulina, que se fixam aos cromossomos e os deslocam dentro da célula-mãe em divisão.

O início da formação do fuso e a condensação de cromossomos duplicados marcam o primeiro estágio da mitose, a prófase (Figura 6). O nucléolo, uma região que participa da síntese de RNA no núcleo, desaparece. A fixação dos microtúbulos do fuso nos cinetócoros, na região do centrômero, indica o início da metáfase da mitose. Nesta fase, os cromossomos duplicados ficam centralizados em um plano único no meio da célula. Esse plano equatorial é denominado placa metafásica. O alinhamento das cromátides-irmãs é crucial para a distribuição igual e exata do material genético entre as células-filhas. As cromátides-irmãs de cromossomos duplicados separam-se durante a anáfase. Os microtúbulos

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UNIDADE 3 | GENÉTICA MÉDICA

se encurtam e as cromátides-irmãs são movimentadas em direção a polos opostos da célula. As cromátides-irmãs separadas passam a ser denominadas de cromossomos novamente. Cada conjunto de cromossomos nas células-filhas é envolvido por uma membrana formando novos núcleos, durante a telófase da mitose. Quando a mitose termina, as duas células-filhas são separadas pela formação de membranas entre elas em um processo denominado de citocinese. As células-filhas produzidas pela divisão de uma célula-mãe são geneticamente idênticas, pois apresentam um conjunto completo de cromossomos.

No entanto, erros podem ocorrer durante a mitose, sendo que uma cromátide pode separar-se do fuso mitótico e não ser incorporada a uma das células-filhas ou as duas cromátides-irmãs podem se dirigir a um mesmo polo, havendo um aumento do número de cromossomos em uma das células-filhas, evento que conhecemos por não disjunção mitótica. Inclusive, durante a divisão reducional meiótica, na formação de gametas haploides, a não disjunção meiótica leva à formação de gametas desbalanceados, ou seja, com cromossomos a mais ou a menos que, se forem fecundados, originam um indivíduo apresentando um complemento cromossômico 2N alterado, como no caso da Síndrome de Down.

FIGURA 6 - DIVISÃO CELULAR MITÓTICA

FONTE: Snustad e Simmons (2017, s.p.).

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Então, caro acadêmico, na formação dos gametas deve haver uma redução pela metade no número de cromossomos, de 2N para N (células haploides), o que ocorre graças à meiose.

4 MEIOSE – DIVISÃO CELULAR REDUCIONAL

A meiose é a divisão celular que reduz o estado diploide para o estado haploide, isto é, reduz pela metade o número de cromossomos de uma célula, formando os gametas com N cromossomos. Ela é fundamental, pois do contrário, o número de cromossomos dos organismos seria duplicado a cada geração, uma situação insustentável. As células somáticas humanas têm 23 pares de cromossomos. Cada par é diferente do outro e diferentes pares de cromossomos têm diferentes conjuntos de genes, sendo que os membros de um par são denominados cromossomos homólogos. Os cromossomos homólogos têm conjuntos iguais de genes, embora possam ter diferentes alelos. Os cromossomos de pares diferentes são denominados heterólogos.

A redução pela metade do número de cromossomos ocorre de maneira que cada uma das células haploides formadas receba exatamente um membro de cada par de cromossomos. O processo de meiose ocorre através de duas divisões celulares, já a mitose é realizada por uma divisão (Figura 7). A duplicação cromossômica associada à síntese de DNA ocorre antes da divisão inicial (duplicação cromossômica → divisão meiótica I → divisão meiótica II). Normalmente, representamos a quantidade haploide de DNA como c, sendo que esses eventos duplicam a quantidade de DNA (de 2c para 4c) durante a síntese de DNA (fase S), reduzem pela metade (de 4c para 2c) na divisão I e reduzem de 2c para c na meiose II. De forma geral, temos uma célula inicial 2N que ao final da meiose gera quatro células haploides (N).

FIGURA 7 - MITOSE E MEIOSE

FONTE: Snustad e Simmons (2017, s.p.).

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As meioses I e II podem ser divididas de acordo com a Figura 8. Como pode ser observado na figura, ao final da meiose I temos a segregação dos cromossomos homólogos e ao final da meiose II temos a separação das cromátides-irmãs.

Portanto, a meiose II é muito semelhante à mitose, pois ocorre a separação de cromátides-irmãs em ambas. No entanto, os produtos da meiose são quatro gametas haploides e os da mitose são duas células somáticas diploides. Ao contrário dos produtos da mitose, as células produzidas na meiose II não são geneticamente idênticas. Devemos ainda lembrar que em caso de ocorrer não disjunção na meiose I ou II, haverá a formação de gametas desbalanceados, como podemos observar na Figura 9.

A recombinação cromossômica, ou crossing-over, que ocorre durante a prófase I (paquíteno) da meiose I, apresenta uma formação estrutural complexa que proporciona a troca de segmentos entre os cromossomos homólogos. As cromátides-irmãs de cada homólogo pareiam formando uma estrutura que possibilita a recombinação, gerando maior variabilidade genética.

FIGURA 9 - MEIOSE. O CROSSING-OVER OCORRE NO PAQUÍTENO (PRÓFASE I)

FONTE: Snustad e Simmons (2017, s.p.).

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FIGURA 10 - NÃO DISJUNÇÃO MEIÓTICA I E II COM FORMAÇÃO DE GAMETAS DESBALANCEADOS. NO EXEMPLO, UM GAMETA NORMAL APRESENTA UM CROMOSSOMO

FONTE: Snustad e Simmons (2017, s.p.).

5 CROMOSSOMOPATIAS

Uma aneuploidia é a alteração numérica de parte do genoma, geralmente a alteração envolvendo um único cromossomo. Indivíduos que têm um cromossomo a mais, um cromossomo a menos ou uma combinação dessas anomalias são aneuploides. Um organismo com ausência de um cromossomo é hipoploide, no entanto, se apresentar um cromossomo a mais é hiperploide.

A anormalidade cromossômica mais conhecida e comum em seres humanos é a Síndrome de Down causada pela trissomia do cromossomo 21. O cariótipo da Figura 11 apresenta 47 cromossomos, evidenciando um cromossomo 21 extra (47, XX, +21). As pessoas com Síndrome de Down apresentam baixa estatura, hipermobilidade articular, crânio largo, narinas amplas, língua grande com sulcos característicos, mãos curtas e largas com prega simiesca, além de um comprometimento mental. A expectativa de vida dos indivíduos com Síndrome de Down é menor que a média e quase sempre desenvolvem doença de Alzheimer.

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UNIDADE 3 | GENÉTICA MÉDICA

FIGURA 11 - SÍNDROME DE DOWN. (A): UMA MENINA COM SÍNDROME DE DOWN. (B): CARIÓTIPO MOSTRANDO TRISSOMIA DO CROMOSSOMO 21 (47, XX, +21)

FONTE: Snustad e Simmons (2017, s.p.)

A trissomia do 21 pode ser causada por não disjunção deste cromossomo na meiose I ou II, como poderá ser observado na Figura 12. O evento de não disjunção pode ocorrer no progenitor masculino ou feminino. No entanto, é mais provável que ocorra no sexo feminino, sendo que a frequência de não disjunção aumenta com a idade materna. Nas mulheres com menos de 25 anos, o risco de ter um filho com Down é de 1 em 1.500, enquanto nas mulheres de 40 anos é de 1 em 100 (Tabela 1). O risco aumentado pode ser explicado pelo envelhecimento dos gametas femininos. Nas mulheres a meiose começa no feto, mas só haverá conclusão após possível fertilização do ovócito, permanecendo na prófase I por longo tempo. Quanto maior for a duração da prófase, maior é a chance de que não haja disjunção subsequente dos cromossomos.

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TABELA 1 - RISCO DE OCORRÊNCIA DE SÍNDROME DE DOWN DE ACORDO COM A IDADE MATERNA

FIGURA 12 - ORIGEM DA SÍNDROME DE DOWN. NÃO DISJUNÇÃO MEIÓTICA DO CROMOSSOMO 21

FONTE: Menck e Sluys (2017, s.p.).

FONTE: Snustad e Simmons (2017, s.p.).

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Em 1% a 2% dos casos os indivíduos com Síndrome de Down apresentam mosaicismo, ou seja, uma linhagem celular trissômica 21 e uma linhagem celular normal, com 46 cromossomos. Um erro que ocorre após a formação do zigoto. Dependendo da proporção entre as células normais e afetadas, há variabilidade fenotípica nos afetados, que podem apresentar um quadro mais leve.

Em 4% dos pacientes com Síndrome de Down a causa é a translocação robertsoniana que ocorre entre os cromossomos 21 e 14. Neste caso, o afetado possui 46 cromossomos, pois o terceiro representante do cromossomo 21 está ligado a outro cromossomo acrocêntrico, com frequência, o cromossomo 14 (Figura 13). As características fenotípicas nesse caso não diferem da trissomia livre do cromossomo 21.

FIGURA 13 - (A): SÍNDROME DE DOWN POR TRANSLOCAÇÃO ROBERTSONIANAS ENTRE OS CROMOSSOMOS 14 E 21 [46,XY,ROB(14Q;21Q)]. (B): FORMAÇÃO DE GAMETAS POR UM

PORTADOR DE TRANSLOCAÇÃO EQUILIBRADA ENTRE OS CROMOSSOMOS 14 E 21

FONTE: Menck e Sluys (2017, s.p.)

No entanto, algumas trissomias geram síndromes muito severas, como a Síndrome de Patau ou trissomia do 13 (Figuras 14 e 15), e a Síndrome de Edwards, ou trissomia do 18 (Figuras 16 e 17). Tais síndromes são raras e os indivíduos afetados apresentam anormalidades graves, morrendo nas primeiras semanas de vida.

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TÓPICO 2 | CITOGENÉTICA HUMANA

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FIGURA 14 – SÍNDROME DE PATAU (TRISSOMIA DO CROMOSSOMO 13). CARIÓTIPO DE UM MENINO - 47, XY, +13

FIGURA 15 – SÍNDROME DE PATAU

FONTE: Borges-Osório (2013, pág. 130)

FONTE: Borges-Osório (2013, pág. 130)

Foto de crianças com microcefalia, orelhas malformadas com baixa implantação, fissura labial, microftalmia, unhas estreitas e hiperconvexas, escroto anormal, calcanhar proeminente, lesões no couro cabeludo e alterações nos dedos das mãos.

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UNIDADE 3 | GENÉTICA MÉDICA

FIGURA 16 – SÍNDROME DE EDWARDS (TRISSOMIA DO CROMOSSOMO 18). CARIÓTIPO DE UMA MENINA - 47, XX, +18

FONTE: Borges-Osório (2013, pág.129)

FIGURA 17 – SÍNDROME DE PATAU

FONTE: Borges-Osório (2013, pág. 129).

Foto de crianças com orelhas malformadas e com baixa implantação, boca pequena, dedos das mãos superpostos e hipertonia nas mãos e pernas.

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TÓPICO 2 | CITOGENÉTICA HUMANA

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No entanto, caro acadêmico, trissomia do cromossomo sexual X também é observada em humanos, com um cariótipo triplo-X (47, XXX). Nestes indivíduos femininos, pois não há cromossomo Y, dois cromossomos X são inativados reduzindo a dose do cromossomo X, podendo haver um leve comprometimento mental e diminuição da fertilidade.

O cariótipo 47, XXY da Síndrome de Klinefelter também é uma trissomia viável em seres humanos (Figuras 18 e 19). As anormalidades associadas a este distúrbio incluem testículos pequenos, mamas aumentadas, membros longos, genuvalgo e menor desenvolvimento dos pelos corporais. O cariótipo XXY representa cerca de 75% dos casos de Síndrome de Klinefelter, havendo ainda cariótipos como XXYY, XXXY, XXXYY, XXXXY, XXXXYY e XXXXXY. O cariótipo 47, XYY também é uma trissomia viável, sendo que os indivíduos são do sexo masculino e não apresentam uma síndrome com características constantes.

FIGURA 18 – SÍNDROME DE KLINEFELTER. CARIÓTIPO - 47, XXY

FONTE: Borges-Osório (2013, pág. 136)

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UNIDADE 3 | GENÉTICA MÉDICA

FIGURA 19 – SÍNDROME DE KLINEFELTER

FONTE: Borges-Osório (2013, pág. 136)

Fotos de pacientes com estatura elevada, membros superiores longos, corpo eunucoide, pênis pequeno, escassa pilosidade, distribuição pubiana com padrão feminino e ginecomastia.

Prezado acadêmico, a única monossomia viável em humanos apresenta o cariótipo 45, X, característico da Síndrome de Turner (Figuras 20 e 21). Os indivíduos 45, X podem se originar de ovócitos ou espermatozoides sem um cromossomo sexual ou da perda de um cromossomo sexual na mitose após a fertilização (Figura 22). O fenótipo é feminino, mas normalmente são estéreis, apresentando baixa estatura, pescoço alado, deficiência auditiva e anormalidades cardiovasculares. Interessantemente, muitos indivíduos com Síndrome de Turner são mosaicos somáticos, com células apresentando 45, X e 46, XX. O mosaicismo do cariótipo surge quando há perda de um cromossomo X durante o desenvolvimento de um zigoto 46, XX.

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TÓPICO 2 | CITOGENÉTICA HUMANA

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FIGURA 20 – SÍNDROME DE TURNER. CARIÓTIPO - 45, X

FIGURA 21 – SÍNDROME DE TURNER

FONTE: Borges-Osório (2013, pág. 135)

FONTE: Borges-Osório (2013, pág. 135)

Fotos de pacientes com pescoço alado, baixa implantação de cabelos na nuca, face triangular, hipertelorismos ocular e mamilar, tórax em barril, mamas pouco desenvolvidas e cubitus valgus.

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UNIDADE 3 | GENÉTICA MÉDICA

Mas, caro estudante, você já se perguntou por que indivíduos com Síndrome de Turner, com o mesmo número de cromossomos X ativos que as mulheres XX normais, têm anormalidades fenotípicas? A resposta vem dos estudos de genômica, mostrando que um pequeno número de genes permanece ativo nos dois cromossomos X em mulheres 46, XX normais, sendo necessários em dose dupla para o desenvolvimento apropriado do organismo. O mais interessante é que alguns desses genes ligados ao X também estão presentes no cromossomo Y, explicando por que os homens XY crescem e se desenvolvem normalmente.

FIGURA 22 - SÍNDROME DE TURNER. ORIGEM DO CARIÓTIPO NA FERTILIZAÇÃO (A) OU NA CLIVAGEM APÓS A FERTILIZAÇÃO (B)

FONTE: Snustad e Simmons (2017, s.p.).

De uma forma geral, as aneuploidias em seres humanos são letais no período embrionário, mostrando a importância da dose correta dos genes no desenvolvimento dos organismos. Deste modo, os seres humanos não toleram muitos tipos de desequilíbrio cromossômico.

A perda de um segmento cromossômico é denominada deleção. Um exemplo clássico é a síndrome do miado do gato ou cri-du-chat (do francês, miado de gato) em seres humanos (Figura 23). O distúrbio é causado por deleção no braço curto (p) de um dos cromossomos 5, cariótipo 46 del(5)(p14), com ausência de bandas na região 14. Os indivíduos acometidos por esse distúrbio podem apresentar grave comprometimento mental e físico. A denominação “miado do gato” vem do choro característico das crianças.

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TÓPICO 2 | CITOGENÉTICA HUMANA

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FIGURA 23 - CARIÓTIPO DE MULHER COM SÍNDROME CRI-DU-CHAT 46 XX DEL(5)(P14). DELEÇÃO DO BRAÇO CURTO DE UM DOS CROMOSSOMOS 5

FONTE: Snustad e Simmons (2017, s.p.).

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Neste tópico, você aprendeu que:

• Para as análises citogenéticas são utilizadas células em divisão mitótica, em metáfase.

• A técnica de citogenética molecular conhecida por FISH (Fluorescent In Situ Hybridization) gera imagens coloridas dos cromossomos pelo tratamento das dispersões cromossômicas com sondas de DNA, marcadas por fluorescência.

• A anormalidade cromossômica mais conhecida e comum em seres humanos é a Síndrome de Down, causada pela trissomia do cromossomo 21.

• A trissomia do 21 pode ser causada por não disjunção deste cromossomo na meiose I ou II, durante a formação do gameta.

• A distribuição organizada de cromossomos duplicados na célula-mãe para as células-filhas é o principal objetivo da mitose.

• A meiose é a divisão celular que reduz o estado diploide para o estado haploide, isto é, reduz pela metade o número de cromossomos de uma célula, formando os gametas com N cromossomos.

• No caso de ocorrer não disjunção na meiose I ou II, haverá a formação de gametas desbalanceados.

• A recombinação cromossômica, ou crossing-over, ocorre durante a prófase I (paquíteno) da meiose I.

• A única monossomia viável em humanos apresenta o cariótipo 45, X, característico da Síndrome de Turner.

• A síndrome do miado do gato ou cri-du-chat é causada por deleção no braço curto (p) de um dos cromossomos 5, cariótipo 46 del(5)(p14).

RESUMO DO TÓPICO 2

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AUTOATIVIDADE

1 (ENADE, 2010) O gráfico a seguir reflete a incidência de uma das aneuploidias mais frequentes entre os seres humanos, que determina a ocorrência de Síndrome de Down. Os portadores dessa síndrome possuem células que contêm uma alteração no número de cromossomos, decorrente de um erro durante o processo de meiose. Na atualidade, muitos casais buscam clínicas de aconselhamento genético com o intuito de conhecer o padrão cromossômico de seus filhos antes do nascimento, com base nos resultados obtidos por modernas técnicas de análise cromossômica.

FONTE: GRIFFITHS et al. Introdução à genética. 8. ed. Guanabara Koogan, 2005.

A partir dessas informações, assinale a alternativa CORRETA: a) ( ) A avaliação dos cromossomos fetais por exames específicos em células

obtidas por amniocentese, cordocentese ou punção de vilosidades coriônicas pode revelar a trissomia do cromossomo 21 e é recurso a ser sugerido pelos médicos geneticistas a mulheres com idade avançada que sintam necessidade desse tipo de avaliação pré-natal de seus filhos, mas não a mulheres jovens que não apresentam fenômenos de não disjunção.

b) ( ) A avaliação dos cromossomos fetais por exames específicos em células obtidas por amniocentese, cordocentese ou punção de vilosidades coriônicas pode revelar a trissomia do cromossomo 21 e é recurso a ser sugerido pelos médicos geneticistas a mulheres jovens ou com idade avançada que sintam necessidade desse tipo de avaliação pré-natal de seus filhos.

c) ( ) A segregação cromossômica anormal observada na Síndrome de Down é influenciada positivamente pela idade avançada da mãe, mas nessas mulheres são observados outros fatores de risco para a síndrome que já se encontram bem estabelecidos, como o metabolismo anormal do folato

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e a mutação 677 (C→T) no gene da metilenotetrahidrofolato redutase. A somatória desses dois fatores é condição necessária para a ocorrência da alteração cromossômica.

d) ( ) A segregação cromossômica anormal observada na Síndrome de Down não é influenciada positivamente pela idade avançada da mãe, pois outros fatores de risco para a síndrome que já se encontram bem estabelecidos, como o metabolismo anormal do folato e a mutação 677 (C→T) no gene da metilenotetrahidrofolato redutase, são fundamentais na indução do erro médico que determina a alteração cromossômica.

e) ( ) A avaliação dos cromossomos fetais para revelar a trissomia do cromossomo 21 por exames específicos em células obtidas por amniocentese, cordocentese ou punção de vilosidades coriônicas requer a análise simultânea do metabolismo do folato, pois a alteração dessa via metabólica é determinante da não disjunção cromossômica.

2 Defina as alterações cromossômicas para os seguintes casos:

Síndrome de Down:

Síndrome de Patau:

Síndrome de Edwards:

Síndrome de Turner:

Síndrome de Klinefelter:

Cri-du-chat:

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TÓPICO 3

GENÉTICA MÉDICA NA ERA DA

GENÔMICA

UNIDADE 3

1 INTRODUÇÃOPrezado acadêmico, com o rápido e impressionante desenvolvimento

da genética humana e médica, além das técnicas de biologia molecular, houve avanços significativos também na compreensão do funcionamento do genoma, na etiologia de diversas doenças genéticas, além de possibilitar os mais avançados diagnósticos moleculares e proporcionar, por análise de polimorfismos genéticos em diferentes regiões do genoma, estudos de predisposição a doenças, longevidade e comportamento humanos.

Com o avanço das tecnologias de DNA recombinante e sequenciamento de DNA, foi estabelecido e concluído o projeto de sequenciamento do genoma humano, possibilitando, por exemplo, o mapeamento preciso dos genes e o conhecimento acurado de suas sequências. Graças a este projeto, hoje compreendemos melhor o funcionamento do nosso genoma, seus genes, controle da expressão e a etiologia de várias patologias.

Os avanços da genética molecular estão fornecendo novos métodos de detecção de genes mutantes nos indivíduos e os exames diagnósticos com base na análise do DNA nuclear, além do mitocondrial, já estão disponíveis. Atualmente, laboratórios podem detectar, a partir de uma amostra de sangue ou material colhido da bochecha com swab, um alelo mutante do gene BRCA1, que causa forte predisposição de seus portadores ao câncer de mama e de ovário. As mulheres portadoras de alelo mutado para este gene podem ser aconselhadas a fazer uma mastectomia para evitar o câncer. Portanto, a aplicação dessas novas tecnologias de genética molecular pode levantar questões difíceis para as pessoas envolvidas, bem como gerar temas éticos de discussão.

Quanto mais a engenharia genética progredir, mais se terá condições de manipular o genoma humano e as discussões éticas a respeito devem ganhar ênfase ao longo de seu desenvolvimento. Assim, o avanço nas pesquisas em direção à manipulação do genoma tem dois lados, pois traz benefícios fantásticos, como a cura das doenças, mas pode ter usos indevidos. Inclusive, pode ocorrer a disseminação descontrolada de clínicas de terapia gênica e o surgimento de um mercado negro na produção de embriões humanos manipulados.

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UNIDADE 3 | GENÉTICA MÉDICA

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Finalmente, caro estudante, salientamos que as análises de genética molecular fazem parte da rotina em diversas situações. Atualmente, observamos muitos testes de paternidade sendo realizados, além de análises de comprovação de culpa ou de acusados, garantia de reclamação de herança e identificação de cadáveres, sendo que provas baseadas em análise do DNA são apresentadas em diversos tribunais.

2 BASES GENÉTICAS DO CÂNCER

O câncer é um descontrole das células do organismo, principalmente dos mecanismos que regulam a divisão no ciclo celular, proliferando de modo anormal, não respondendo aos diferentes mecanismos de controle. Um dos primeiros mecanismos identificados no estudo da carcinogênese foi a ausência de resposta das células tumorais aos sistemas que normalmente controlam o ciclo celular. O ciclo celular é controlado por ciclinas, CKI, CDK, fosfatases e fatores de transcrição. Esse descontrole ocorre devido aos oncogenes e à deficiência de expressão dos genes supressores tumorais. No câncer, temos o mau funcionamento de genes responsáveis pelo controle de eventos celulares fundamentais, como reparo do DNA, sinalização celular, proliferação, migração, apoptose (morte celular programada) e interação com outras células, decorrente de alterações no DNA, como as mutações herdadas ou adquiridas ao longo da vida em células específicas capazes de iniciar o processo tumoral.

A maioria dos casos de câncer é do tipo esporádico. Em cerca de 20 a 30% dos pacientes estão os casos com história familiar. De 5 a 10% de todos os casos de câncer decorrem da existência de alterações genéticas herdadas que conferem maior predisposição ao desenvolvimento de tumores, o que pode ser observado clinicamente nas síndromes hereditárias de predisposição ao câncer. A importância desta identificação reside na possibilidade de oferecer aconselhamento genético apropriado. No tratamento para a eliminação do câncer são realizadas terapias como cirurgia, radioterapia e quimioterapia, tanto citotóxica quanto alvo-específica. O câncer pode ser estudado em modelos in vitro, em animais e em testes clínicos em pacientes.

No câncer se estabelece um estado hiperproliferativo de um ou mais tipos celulares, que podem invadir tecidos adjacentes e originar metástases, sendo que as células tumorais podem se disseminar pelo organismo tanto pelo sistema circulatório sanguíneo quanto pelo sistema linfático. As neoplasias malignas e benignas podem se originar em praticamente todos os órgãos e tecidos humanos, decorrentes de alterações genéticas e epigenéticas com influências ambientais.

Mas, caro acadêmico, devemos lembrar alguns conceitos fundamentais ao tratarmos de câncer. Mutação se refere à alteração gênica, já neoplasia é qualquer crescimento celular anormal e câncer ou tumor maligno (em oposição ao tumor benigno) se caracteriza pela invasão do tecido adjacente ou entrada na circulação

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TÓPICO 3 | GENÉTICA MÉDICA NA ERA DA GENÔMICA

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sanguínea ou linfática, impossibilitando muitas vezes uma completa ressecção cirúrgica. Quando o câncer se espalha para outros locais do corpo além do local onde começou, temos um processo denominado metástase. A Figura 24 apresenta uma visão do início e do desenvolvimento de um tumor sólido. Lembrando que a probabilidade de ocorrer uma mutação oncogênica (MO), que contribui para o desenvolvimento do câncer, é muito menor do que a de ocorrer uma mutação não oncogênica (MNO).

FIGURA 24 - FORMAÇÃO DO CÂNCER

FONTE: Menck e Sluys (2017, s.p.).

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UNIDADE 3 | GENÉTICA MÉDICA

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Os oncogenes são ativados na carcinogênese e normalmente funcionam de forma dominante, já os genes supressores tumorais são inativados na carcinogênese e normalmente funcionam de maneira recessiva. As pesquisas de oncogenômica têm identificado os genes alterados em tumores malignos e muitos deles fazem parte de famílias gênicas como a RAS, representada pelos genes H-RAS, K-RAS e N-RAS. Como exemplo de oncogenes podemos citar MYC, K-RAS, RET e como genes supressores de tumor, temos os bem conhecidos TP53, BRCA1, BRCA2 e RB1. Os estudos mostram que mutações de ganho de função podem ocorrer em genes supressores tumorais e mutações de perda de função podem ocorrer em oncogenes.

Por definição, um oncogene tem a sua atividade relacionada com o desenvolvimento do câncer. Essa atividade do oncogene passa por uma maior expressão do gene ou menor degradação proteica, por uma mutação ativadora (de ganho de função) ou pela síntese de uma proteína quimérica ativadora que envolva pelo menos um proto-oncogene como no caso da Leucemia Mieloide Crônica, onde o gene quimérico BCR-ABL produz uma proteína quimérica que leva à leucemia. Um proto-oncogene nada mais é que um gene que pode ser transformado em um oncogene, estimulando a proliferação celular e inibindo a apoptose. Podem se transformar em oncogenes por mutações espontâneas, mutações pontuais, translocações cromossômicas, inserção de DNA viral ou amplificação gênica, atuando de forma dominante. O produto de BCR-ABL acaba realizando alterações importantes em vias regulatórias intracelulares, levando a célula à instabilidade genômica e prejudicando o andamento do ciclo celular. Lembrando que na Leucemia Mieloide Crônica temos uma translocação recíproca entre os cromossomos 9 e 22 que justapõe o proto-oncogene ABL (cromossomo 9) com o gene BCR (cromossomo 22), formando o cromossomo Philadelphia, locus do gene híbrido BCR-AB, como estudado previamente na Unidade 1.

Outras translocações cromossômicas levam a leucemias em humanos, como pode ser visto na Tabela 2.

TABELA 2 – TRANSLOCAÇÕES CROMOSSÔMICAS ASSOCIADAS COM LEUCEMIAS EM HUMANOS

FONTE: Pasternak (2002, pág. 377)

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TÓPICO 3 | GENÉTICA MÉDICA NA ERA DA GENÔMICA

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Mas, caro estudante, quando falamos em genes supressores, estamos nos referindo a genes que costumam ser inativados durante a formação tumoral. Em condições normais, têm funções como bloqueio do ciclo celular e ativação de apoptose. Vários genes ligados ao câncer envolvidos no reparo do DNA e em vias de sinalização, como XPA, XPC, FANCA, ATM e CHK1, são caracterizados como genes de manutenção. Já os genes envolvidos no controle do ciclo celular, como CDK e CKI e na regulação de sua sinalização (PTEN e NF1) são denominados de genes protetores. Entretanto, acadêmico, o gene TP53 atua em várias frentes antitumorais, sendo amplamente estudado.

O gene supressor tumoral TP53, que codifica a proteína p53, tem papel fundamental na regulação do ciclo celular, na apoptose e no reparo do DNA, sendo que mutações no gene TP53 são encontradas em mais de 50% dos tumores humanos. O gene TP53 está localizado no braço curto do cromossomo 17 (17 p13) e é composto de 11 exons. Os principais sinais que levam à ativação da p53 são o dano ao DNA e a sinalização oncogênica, estando sob controle transcricional de diversos fatores de transcrição. A proteína p53 leva à indução da transcrição de vários genes envolvidos na inibição do ciclo celular, como p21 e à indução de apoptose, como BAX, PUMA e receptor FAS. A proteína p53 regula vários processos, sendo considerada uma das proteínas mais pleiotrópicas conhecidas.

O câncer de mama é o principal câncer que atinge a população feminina no mundo, com maior taxa de incidência e mortalidade, sendo que de 5% a 10% de todos os casos são relacionados à herança de mutações genéticas. A história familiar de câncer de mama é um fator de risco para o surgimento da doença, sendo que alterações nos genes supressores tumorais BRCA1 e BRCA2 aumentam o risco, pois estão relacionados à maior prevalência de carcinoma mamário e ovariano. Quando o teste genético confirma que uma mulher apresenta alterações nestes genes, muitos médicos sugerem a mastectomia ou retirada total das mamas.

O BRCA1 localiza-se no braço longo do cromossomo 17 na posição 21 (17q21) e a sua principal função é a reparação do DNA na recombinação homóloga, reparo por excisão de nucleotí deos (REN) e na regulação do ciclo celular, sendo expresso quando há uma instabilidade genômica mediada por estrogênio. O BRCA2 (locus 13q12.3) tem a função de reparar as quebras na dupla fita de DNA, através da interação com a RAD51.

Caro acadêmico, de forma muito interessante, identificou-se recentemente que vários RNA não codificantes (ncRNA) estão envolvidos em diferentes etapas do processo carcinogênico. Os ncRNA também podem atuar como genes supressores tumorais ou oncogenes, desempenhando atividades como proliferação celular, diferenciação e apoptose. Aqui, podemos citar os microRNA (miRNA), curtas moléculas de RNA, que apresentam seus efeitos regulatórios, ligando-se à região não traduzida de RNA mensageiros-alvo.

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Mas mutações de ponto também são alterações no DNA identificadas no processo de carcinogênese. Ocorrem normalmente após um erro da DNA polimerase na replicação ou por reação das bases do DNA com agentes químicos. O exemplo mais bem descrito de mutação pontual oncogênica é no gene RAS que transforma a proteína Ras, envolvida na sinalização intracelular, em constitutivamente ativada e oncogênica.

Por fim, é importante ressaltar que o fenótipo tumoral também pode ser transmitido por modificações epigenéticas. As principais alterações epigenéticas envolvidas na carcinogênese são a metilação do DNA e as modificações de histonas. Nas células tumorais, podemos ter hipometilação do genoma ou hipermetilação nos promotores de determinados genes. Em tumores, hipermetilação é mais frequentemente do que hipometilação. A metilação em regiões ricas em CG pode ocorrer em genes de diferentes funções, como supressão do tumor (BRCA1), reparo do DNA, invasão e metástase.

As modificações de histonas podem ocorrer por acetilação, por exemplo. A acetilação de histonas intensifica a transcrição, sendo controlada por duas famílias de enzimas: as histonas-acetiltransferases (HAT) e as desacetilases de histonas (HDAC). As HAT são catalisadoras da adição de um grupo acetil às histonas, funcionando como coativadoras da transcrição, e as HDAC removem os grupos acetil, causando repressão. Deste modo, podemos observar que a acetilação das histonas é regulada por um balanço entre a atividade das HAT e HDAC. A atividade alterada das HAT e HDAC tem sido identificada em diversos tipos de tumores e constitui um importante alvo terapêutico.

O reparo do DNA é um processo fundamental para evitar o surgimento de tumores, assim como a apoptose. O mecanismo de apoptose, um processo de morte celular programada, é essencial para o desenvolvimento e a manutenção de todos os indivíduos. Na apoptose, o citoesqueleto é destruído, o DNA é fragmentado e a membrana nuclear é degradada. A partir disso, ocorre fagocitose da célula pelos macrófagos teciduais. Todos esses processos requerem energia, com utilização de ATP.

Danos no DNA podem ser reparados por diferentes mecanismos de reparo do DNA, e pacientes com xeroderma pigmentoso (XP), os quais apresentam mutações em proteínas de reparo, têm uma incidência maior de câncer. A apoptose é um mecanismo de morte celular programada de grande eficiência, que pode ser induzido por estímulos como danos no DNA e estresse celular. Dessa forma, uma célula com acúmulo de mutações encerra seu ciclo, reduzindo a chance de surgirem novas células tumorais.

A célula pode ter ainda uma parada permanente no ciclo celular, denominada senescência. Trata-se de um processo metabólico ativo que induz a uma parada na maioria das vezes irreversível. A senescência pode ser replicativa ou induzida por oncogenes ou estresse. A senescência replicativa ocorre

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principalmente em razão do encurtamento telomérico. O encurtamento dos telômeros ativa a sinalização de reparo de DNA e, por meio de p53 e várias CKI, induz a senescência. Em células somáticas normais a atividade da telomerase é baixa ou inexiste, fato que promove o encurtamento dos telômeros de forma progressiva, ao longo das divisões celulares, funcionando como um relógio celular. Por outro lado, células germinativas e as pluripotentes apresentam telomerase ativa.

3 TERAPIA GÊNICA

A terapia gênica ocorre por transferência de material genético DNA ou RNA, denominado de transgene, para as células-alvo, visando a cura ou melhora do quadro clínico de uma patologia. São comumente utilizadas técnicas físicas (biobalística), químicas (lipossomos) e biológicas (vetores virais) para realizar o processo. A transferência gênica pode ser realizada in vivo ou ex vivo. Os maiores desafios para a técnica obter sucesso são a transdução eficiente das células-alvo e a resposta imune deflagrada pelo vetor ou pela expressão do transgene. Grandes investimentos são necessários para o desenvolvimento de vetores eficientes. A medicina moderna, com o advento da biologia molecular, tem na terapia gênica uma técnica em ascensão. Ela consiste na inserção de genes funcionais em células que apresentem genes defeituosos, de modo a substituir ou inativar genes disfuncionais, com benefício terapêutico ao paciente. Estamos falando de medicina moderna, porém, muitas dificuldades na utilização dessa técnica mostram que há um longo caminho para a terapia gênica.

Em seres humanos, as células reprodutivas são produzidas por uma linhagem celular específica e diferente das células somáticas. Deste modo, mesmo com a terapia gênica de células somáticas, o gene defeituoso ainda existe nas células da linhagem germinativa do paciente e pode ser transmitido para seus descendentes. A terapia gênica da linhagem reprodutiva não foi posta em prática em humanos. Nas terapias gênicas de células somáticas atuais, algumas células do próprio paciente podem ser retiradas, reparadas e reimplantadas nele. Genes de tipo selvagem devem ser introduzidos e expressos em células homozigotas ou hemizigotas para um alelo mutante.

Em muitos casos de terapia gênica, são utilizados vírus como vetores para inserir o gene selvagem nas células. No caso de vetores retrovirais, o transgene selvagem é integrado com o DNA do retrovírus ao genoma da célula hospedeira, assim o transgene é transmitido para todas as células descendentes na linhagem da célula afetada. Quando são utilizados adenovírus que não são capazes de integrar o seu DNA ao cromossomo da célula hospedeira, a presença dos transgenes nestas células é transitória, pois a replicação dos genomas desses vírus é autônoma e eles só persistem até que o sistema imune elimine os vírus com as células infectadas. A vantagem dos adenovírus é que não há indução de mutações possivelmente prejudiciais durante a etapa de integração. Mas há também desvantagens, como a expressão transitória do transgene apenas

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enquanto persistir a infecção viral, além da reação imune a esses vírus que pode ocorrer nos indivíduos tratados, causada por exposição prévia ao mesmo vírus ou a vírus semelhantes. Nas tentativas iniciais de tratar a fibrose cística por terapia gênica, os pacientes inalavam um adenovírus com o gene CF, mas não houve sucesso devido à resposta imune dos indivíduos tratados.

Para ser aplicada, a terapia gênica humana deve estar de acordo com as diretrizes rigorosas do National Institutes of Health (NIH), nos EUA, e cumprir várias exigências, sendo que o gene tem que ser clonado e bem-caracterizado, deve haver um método eficaz de administração do gene, os riscos da terapia gênica para o paciente devem ser mínimos, não pode haver outros métodos de tratamento da doença e deve haver ainda experimentos preliminares com modelos animais ou células humanas, indicando a possibilidade de sucesso.

Alguns protocolos de terapia gênica vêm sendo testados com resultados interessantes, como o tratamento de crianças com uma forma de cegueira congênita conhecida como amaurose congênita de Leber tipo II e o tratamento da doença de Canavan, uma patologia neurodegenerativa. Todos os protocolos atuais são procedimentos de acréscimo de genes, não havendo substituição. No entanto, protocolos nesse sentido estão sendo desenvolvidos e são conhecidos por transferência gênica direcionada.

Prezado acadêmico, você conhece as vacinas de DNA? As vacinas de DNA recombinante surgiram devido aos avanços biotecnológicos. A informação genética, responsável pela codificação de antígenos com aplicação vacinal, é clonada e propagada em um determinado organismo. Alguns aspectos de modulação da resposta imune das vacinas de DNA recombinante as tornaram importantes para o desenvolvimento de vacinas com características terapêuticas. Não estamos tratando apenas de vacina, mas sim de uma forma alternativa de desenvolver imunoterapias, disponibilizadas por técnicas de DNA recombinante na pesquisa de vacinas. As vacinas terapêuticas podem combater as doenças nos pacientes. Desta forma, a definição de vacina terapêutica se confunde com o conceito de terapia gênica, principalmente ao utilizarmos vacinas de DNA recombinante para inserir informação genética nas células do hospedeiro com o objetivo de gerar uma resposta imunológica favorável, a fim de reverter o quadro patológico. Normalmente, essa metodologia não estimula no indivíduo tratado reações autoimunes e de tolerância.

A vacina de DNA apresenta-se como uma eficiente tecnologia que pode ser utilizada no desenvolvimento de vacinas contra agentes infecciosos, doenças autoimunes, cânceres e alergias. Compreende a inoculação de um vetor plasmidial em células eucarióticas para a produção do antígeno de interesse. No núcleo celular, ocorre a transcrição do segmento de DNA de interesse e o mRNA segue para o citoplasma onde ocorre a tradução de cópias da proteína recombinante. A expressão endógena do antígeno pelas células transfectadas com o vetor gera tanto uma resposta imune humoral com a produção de anticorpos específicos, como uma resposta celular com indução de linfócitos T citotóxicos.

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4 FARMACOGENÔMICA E NUTRIGENÔMICA

Prezado acadêmico, será que todos nós respondemos da mesma forma a um determinado tratamento para uma doença específica? Ao recebermos um determinado tratamento com dose equivalente de uma mesma medicação, alguns indivíduos não apresentam qualquer resposta, outros manifestam efeitos colaterais graves e, no entanto, há aqueles que respondem muito bem, com remissão completa do quadro clínico. Infelizmente, muitas vezes, não há como prever a resposta clínica a uma determinada droga. Neste sentido, a farmacogenômica, em amplo desenvolvimento, traz grandes perspectivas à medicina personalizada.

O termo medicina personalizada envolve a caracterização fenotípica e

genotípica do indivíduo, incluindo dados sociodemográficos, ambientais e de constituição genética, na estimativa da predisposição individual para uma doença e na definição de estratégias preventivas e terapêuticas.

Caro estudante, as pesquisas têm objetivado definir polimorfismos genéticos como marcadores genômicos para prever a resposta às drogas. Outro aspecto importante da farmacogenômica é a possibilidade de identificar genes que são regulados por drogas. Vários tratamentos atuais foram descobertos por experiência clínica, havendo desconhecimento de seu preciso mecanismo de ação.

Com o desenvolvimento da genômica podemos ter genes como alvos terapêuticos para o desenvolvimento de novas classes de drogas, com melhores resultados e, seguramente, menos efeitos colaterais. Futuramente, os médicos deverão ter conhecimentos de farmacogenômica para poder prescrever as drogas ideais para seus pacientes. Há grande potencial de individualizar o tratamento farmacológico e de descobrir novos alvos terapêuticos para o desenvolvimento de novas classes de drogas.

Sobre a nutrigenômica, caro estudante, vamos conceituar nutrigenômica e nutrigenética, que estão intimamente associadas, entretanto, seguem uma abordagem diferente. A nutrigenômica estuda a influência dos nutrientes no genoma, ou seja, como os nutrientes podem interferir na expressão gênica, afetar vias e o controle homeostático. Já a nutrigenética tem como objetivo compreender como a constituição genética de um indivíduo coordena a sua resposta à alimentação. A nutrigenética estuda o efeito da variação genética na interação entre dieta e doenças, incorporando estudos de polimorfismos gênicos a respostas diferenciais aos nutrientes.

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5 DIAGNÓSTICOS MOLECULARES DE DOENÇAS GENÉTICAS

Quando um determinado gene é clonado, sequenciado e as mutações causadoras do distúrbio são conhecidas, geralmente é possível desenvolver testes moleculares para identificar os alelos mutantes e diagnosticar a patologia.

Os testes moleculares podem ser feitos a partir de pequenas quantidades de DNA com o auxílio da PCR para amplificar o segmento de DNA de interesse. Deste modo, os diagnósticos podem ser feitos no período pré-natal, em células fetais obtidas por amniocentese ou biopsia coriônica, ou ainda em uma única célula de um pré-embrião produzido por fertilização in vitro.

Alguns diagnósticos moleculares podem ser realizados pela simples verificação da presença ou ausência de um sítio de clivagem por uma enzima de restrição específica. No caso da anemia falciforme, a mutação causadora exclui um sítio de clivagem para a enzima de restrição MstII, sendo possível distinguir o alelo HbS (falciforme) do alelo da β-globina normal (HbA) por meio da síntese de primers complementares às sequências de DNA que flanqueiam a mutação falciforme para realizar a sua amplificação por PCR (Figura 25). O DNA amplificado a partir da PCR pode ser tratado com a enzima MstII e os produtos obtidos podem ser separados por eletroforese em gel de agarose e corados com brometo de etídio. Se o DNA amplificado for clivado por MstII com produção de dois fragmentos visualizados por duas bandas no gel de agarose, contém o alelo HbA. Se não for clivado, contém o alelo HbS com apenas uma banda no gel. Se o indivíduo for heterozigoto, metade dos fragmentos amplificados será clivada e a outra metade não será, sendo que o resultado no gel de agarose apresentará três bandas.

Nos distúrbios hereditários, como nas ataxias espinocerebelares (SCA), doença de Huntington e síndrome do X frágil, resultantes de uma expansão de repetição trinucleotídica, como a expansão CAG nas SCAs, podemos usar PCR e eletroforese em gel de agarose e acrilamida para detectar os alelos mutantes. Outros tipos de mutações podem ser detectados pelo uso de sondas de DNA. Já o sequenciamento de alelos dos diferentes genes de um indivíduo pode ser utilizado com notáveis resultados, objetivando o diagnóstico molecular de doenças. Os diagnósticos moleculares de doenças humanas contribuem muito para o aconselhamento genético, disponibilizando informações muito importantes para as famílias acometidas por patologias genéticas.

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FIGURA 25 - A MUTAÇÃO QUE PRODUZ O ALELO DA B-GLOBINA FALCIFORME (HBBS OU HBS) A PARTIR DO ALELO DA B-GLOBINA NORMAL (HBBA OU HBA) ELIMINA UM LOCAL DE

CLIVAGEM MSTI

FONTE: Snustad e Simmons (2017, s.p.)

As ataxias espinocerebelares autossômicas dominantes, ou SCAs, constituem um grupo complexo de doenças neurodegenerativas que atingem o cerebelo e suas principais conexões, por exemplo, a Ataxia de Machado-Joseph (SCA3), a ataxia espinocerebelar dominante mais frequente em nosso país. Normalmente fatais, as SCAs são herdadas de modo vertical, manifestam-se geralmente na vida adulta e apresentam grande heterogeneidade clínica. Em determinadas famílias, principalmente em famílias grandes onde várias pessoas manifestam os sintomas de uma determinada SCA, ocorre uma ampla gama de variação dos sintomas. A história familiar é consistente com a herança autossômica dominante de um único gene principal, mas os fenótipos resultantes são individualmente tão heterogêneos que não poderiam ser extrapolados para

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servirem de critério diagnóstico para outros casos. As pesquisas sobre as causas das SCAs apontam para os mesmos processos moleculares, as quais compartilhariam a mesma mutação, denominada mutação dinâmica e caracterizada por uma expansão de nucleotídeos. No caso das SCAs, uma boa parte delas apresenta uma expansão CAG na região codificante dos respectivos genes, a qual codifica um segmento de poliglutamina. Como exceções, temos a SCA8 e a SCA10, sendo que a SCA8 é causada pela expansão do trinucleotídeo CTG e a SCA10 pela expansão do pentanucleotídeo ATTCT. Através da amplificação por PCR das regiões de repetições trinucleotídicas, com posterior análise dos fragmentos gerados em géis de agarose e poliacrilamida, podemos diagnosticar a presença de alelos expandidos, além de quantificar o número de repetições CAG nos alelos normais e alterados, como no caso de SCA1 (Figura 26).

FIGURA 26 - DETECÇÃO DE ALELOS NORMAIS E EXPANDIDOS NA SCA1

21 3

FONTE: O autor

Na figura anterior verificamos a amplificação por PCR da região de interesse do gene SCA1 analisada em gel de agarose. Coluna 1: amostra de DNA de um paciente SCA1 positivo apresentando um alelo expandido (expansão CAG) representado pela banda mais alta; colunas 2 e 3: pacientes com alelos normais, sem a segunda banda mais alta que está presente somente no paciente 1, acometido por SCA1.

A ataxia espinocerebelar tipo 1 (SCA1) é uma doença neurodegenerativa progressiva herdada de forma autossômica dominante e caracterizada por ataxia, disartria, oftalmoparese e um grau variável de amiotrofia e neuropatia, sendo que as manifestações clínicas normalmente aparecem a partir da terceira ou quarta década de vida. As neuropatologias incluem perda neuronal severa no cerebelo e bulbo, bem como degeneração das vias espinocerebelares. A SCA1 se caracteriza por progressiva perda de coordenação, deterioração motora e degeneração das células de Purkinje do cerebelo via espinocerebelar e bulbo. A SCA1 é causada pela expansão de trinucleotídeos CAG no locus 6p22-p23. O número de repetições varia de 6 a 39 em alelos normais e de 40 a 83 nos alelos mutados. A SCA1 foi

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descrita em famílias de diferentes origens geográficas e étnicas, sendo mais comumente encontrada entre descendentes de italianos e de europeus orientais. Além dessas populações, a SCA1 é a forma predominante entre as SCAs em algumas regiões do Japão.

A ataxia espinocerebelar tipo 2 (SCA2) caracteriza-se principalmente por lentidão dos movimentos sacádicos e hiporeflexia. Ataxia de marcha progressiva, déficit cognitivo, oftalmoplegia, disfagia, disartria, dismetria e tremores também são observados em pacientes com SCA2. Em determinados pacientes, o início da doença é mais precoce, em torno dos 17 anos, por exemplo, sendo mais grave a evolução da doença. Já outros apresentam início mais tardio, 50 anos, por exemplo. A SCA2 é uma doença neurodegenerativa causada pela expansão de trinucleotídeos CAG no locus mapeado no cromossomo 12q23-24.1. Os alelos normais apresentam entre 14 e 31 repetições CAG, enquanto que os alelos mutantes apresentam entre 35 e 59 repetições. No entanto, 32 ou 33 repetições do trinucleotídeo CAG podem ser suficientes para causar a doença. O fenômeno da antecipação foi estabelecido em casos de SCA2, ou seja, há uma correlação inversa entre idade de início e o tamanho das repetições CAG. O gene da SCA2 produz a proteína denominada ataxina-2. Quando mutado, este gene origina uma proteína alterada, causando neurodegeneração.

A ataxia espinocerebelar tipo 3 ou Doença de Machado-Joseph (MJD) é uma doença neurodegenerativa caracterizada por ataxia cerebelar, oftalmoplegia e nistagmo, podendo-se encontrar ainda um quadro de demência, dor nas articulações e músculos. Significante correlação inversa entre idade de início das manifestações clínicas e o tamanho da repetição expandida de CAG foi observada também em MJD. O gene da MJD foi localizado no cromossomo 14q32.1, sendo identificado primeiramente em famílias japonesas. O mapeamento foi confirmado em estudos com pacientes portugueses, norte-americanos e brasileiros, sendo a SCA mais frequente no Brasil. O gene para a MJD apresenta uma região com repetições do trinucleotídeo CAG. Os indivíduos normais apresentam de 12 a 37 repetições CAG, enquanto os indivíduos afetados apresentam alelos com 61 a 84 repetições.

A SCA6 é caracterizada clinicamente por uma ataxia lenta e progressiva, além de disartria. A maior parte dos casos de ataxias cerebelares, na população do Japão, são diagnosticados como SCA6. A SCA6 é uma doença causada pela expansão de trinucleotídeos CAG no locus 19p13, tendo como característica a morte seletiva e progressiva das células de Purkinje, que conduz a uma ataxia progressiva. A mutação na SCA6 consiste de uma expansão de trinucleotídeos CAG no gene CACNA1A, o qual codifica a subunidade alfa 1A do canal de cálcio neuronal presente em todo o encéfalo. Nos alelos normais, o número de repetições CAG varia de 4 a 20 vezes, enquanto que nos alelos expandidos esse número aumenta de 21 até 29 repetições.

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A SCA7 foi diagnosticada em populações de origens geográficas diferentes, como países europeus, africanos, além dos Estados Unidos, Brasil, Israel e Coreia do Sul. Entretanto, a frequência de expansões no gene da SCA7 na África do Sul representa uma das mais altas para estas expansões estudadas em qualquer país. O gene da SCA7 está localizado no locus 3p12-p12.1 apresentando uma repetição CAG expandida em indivíduos afetados. Os achados para SCA7 são a disartria, a oftalmoparesia, a hiperreflexia, o sinal de Babinski, a espasticidade e a redução da sensibilidade vibratória. O fenômeno da antecipação, ou seja, uma correlação inversa entre idade de início e o tamanho das repetições CAG, é bastante importante nesta ataxia. Os alelos expandidos apresentam de 36 a 306 repetições CAG, enquanto que os alelos normais variam de 4 a 35 repetições.

A doença de Huntington (DH) é uma doença genética causada por mutação autossômica dominante no gene HTT. As pessoas com DH sofrem neurodegeneração progressiva e não há tratamento. A DH é causada por uma mutação no gene que codifica uma proteína chamada huntingtina (Htt). Esta mutação produz uma forma alterada da proteína que causa morte de neurônios em determinadas regiões do cérebro. A DH é uma doença rara que afeta 1 em cada 10.000 pessoas na maioria dos países europeus. Como ocorre nas Ataxias Espinocerebelares, devido à idade de início avançada da doença, a maioria dos pacientes com DH pode ter filhos apresentando 50% de chance de ter a doença. O gene HTT foi um dos primeiros genes que comprovadamente estavam ligados a um polimorfismo de comprimento de fragmento de restrição (RFLP), pois era cossegregado com um sítio RFLP mapeado na extremidade do braço curto do cromossomo 4. Esse gene contém uma repetição de trinucleotídio, (CAG)n, apresentando até 35 repetições em alelos normais e mais de 39 repetições CAG em alelos mutados, codificando um segmento expandido de poliglutamina na terminação amino da proteína. A região poliglutamina alongada promove o acúmulo de agregados da proteína huntingtina nas células encefálicas. Como ocorre normalmente em SCAs, o fenômeno da antecipação também é observado na doença de Huntington.

Dada a disponibilidade de diagnósticos moleculares para detecção de expansões CAG nas Ataxias Espinocerebelares e também para a Doença de Huntington, os indivíduos em risco de transmitir o gene anômalo para seus filhos conseguem saber se são portadores antes de ter filhos. Um filho com genitor heterozigoto tem 50% de chance de ter o gene mutado. Se o teste for negativo, a pessoa pode ter filhos sem risco de transmitir a mutação. Se o teste for positivo, o casal pode ponderar sobre a fertilização in vitro e testes de DNA em pré-embriões antes da implantação. No entanto, normalmente são testados para as referidas mutações apenas indivíduos sintomáticos. Do ponto de vista ético, é muito discutível analisar assintomáticos para presença ou ausência de alelos expandidos, pois um indivíduo sem qualquer manifestação clínica da doença poderia receber um diagnóstico indicando a presença de uma mutação, que futuramente levaria ao desenvolvimento de uma patologia neurodegenerativa, sem cura. Quais seriam as perspectivas de vida deste indivíduo assintomático a partir desta nova realidade imposta por esse teste preditivo? Caro acadêmico, o que você pensa a respeito?

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6 HEREDOGRAMAS

Os heredogramas são diagramas que apresentam as relações entre os membros de uma família. Nos heredogramas são utilizados quadrados para representar o sexo masculino e círculos para o sexo feminino. A linha horizontal que une um círculo e um quadrado representa o cruzamento. Os filhos são apresentados sempre abaixo dos pais, iniciando com o primogênito à esquerda (Figura 27).

Normalmente, os indivíduos acometidos por determinada patologia são marcados por um sombreado (Figura 28). As gerações são indicadas por algarismos romanos e indivíduos específicos de uma geração são designados por algarismos arábicos.

Prezado acadêmico, para entender melhor a disposição e importância de heredogramas, analise a Figura 29 com o caso mais famoso de hemofilia ligada ao X que ocorreu na família imperial russa no início do século 20. O czar Nicolau e a czarina Alexandra tiveram quatro filhas, além do menino Alexis, que era hemofílico (Figura 29, indivíduo V10). A mutação ligada ao X responsável pela hemofilia de Alexis foi transmitida pela mãe, portadora heterozigota. Alexandra era neta da rainha Vitória da Grã-Bretanha, também portadora da mutação, que transmitiu o alelo mutante para três dos nove filhos, são eles: Alice, mãe de Alexandra; Beatriz, com dois filhos com hemofilia e Leopoldo, que tinha a doença. É mais fácil identificar as características causadas por alelos dominantes, pois todo membro familiar que tem o alelo dominante manifesta o fenótipo. Já as características com padrão de herança recessiva podem ser mais complicadas de identificar, pois podem ocorrer em indivíduos cujos genitores não são afetados. Geralmente, são analisados os dados de várias gerações no heredograma para acompanhar a transmissão de um alelo recessivo.

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FIGURA 27 - HEREDOGRAMAS HUMANOS

FONTE: Snustad e Simmons (2017, s.p.).

A) Convenções do heredograma. B) Herança de uma característica dominante. C) Herança de uma característica recessiva.

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FIGURA 28 - HEREDOGRAMA DE UMA FAMÍLIA COM PREDISPOSIÇÃO HEREDITÁRIA AO CÂNCER

FIGURA 29 - HEMOFILIA NAS FAMÍLIAS REAIS EUROPEIAS

FONTE: Menck e Sluys (2017, s.p.)

Família hipotética com múltiplos casos de câncer de mama e de ovário em que foi identificada uma mutação herdada no gene BRCA1. A seta indica a primeira pessoa da família atendida e investigada (probando). Dx = idade ao diagnóstico de câncer.

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FONTE: Snustad e Simmons (2017, s.p.)

A) A família imperial russa do czar Nicolau II. B) Hemofilia ligada ao X nas famílias reais da Europa. Através de casamento consanguíneo, o alelo mutante para hemofilia foi transmitido da família real britânica para as famílias reais alemã, russa e espanhola. Indivíduo hemofílico V 10 - Alexis (família real russa).

7 ÉTICA E GENÉTICA

As doenças genéticas, geralmente, são doenças incuráveis, sendo que apenas algumas têm tratamento. Estas doenças apresentam alguns dilemas éticos:

• Devemos diagnosticar doenças sem cura?• Devemos realizar testes preditivos em indivíduos assintomáticos?• É eticamente adequado realizar diagnósticos em pacientes com possibilidade

de doenças degenerativas de início tardio?

A terapia gênica pode ser um tratamento eficaz no caso de doenças genéticas, mas só é utilizada para tratar doenças genéticas em células somáticas. O objetivo é provocar uma alteração no DNA do portador da doença, através da utilização de um vetor, que pode ser um adenovírus ou ainda um retrovírus.

A terapia gênica de células germinativas baseia-se na alteração de células reprodutivas (óvulos e espermatozoides). No entanto, há várias questões éticas envolvidas nestes procedimentos. Esta se baseia na alteração genética de um embrião, seja na fase de pré-implantação ou antes da fertilização, nos próprios gametas. Assim, a técnica muda o genoma do indivíduo antes mesmo do seu nascimento. A partir dos efeitos genéticos destas possíveis modificações, surgem debates éticos, a favor e contra.

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DICAS

Caro acadêmico, você defende a autonomia dos pais na busca das melhores tecnologias para obtenção de filhos sadios? Defende a manipulação genética em gametas ou embriões? Pense a respeito deste tema tão polêmico e assista ao filme GATTACA. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=mV40nDD7gDk>.

De qualquer forma, algumas diretrizes podem ser propostas no sentido de orientar as ações na área da genética humana. Por exemplo, o aconselhamento genético não deve ser diretivo, a confidencialidade das informações genéticas deve ser mantida, a privacidade de um indivíduo deve ser protegida de terceiros institucionais e o diagnóstico pré-natal deve ser realizado somente por razões relevantes.

8 DIVERSIDADE DO GENOMA E EVOLUÇÃO

Na área da genética evolutiva, buscamos analisar como a composição genética das populações muda ao longo do tempo. Nesse sentido, podemos classificar um gene como polimórfico se ele varia dentro de uma espécie, ou monomórfico, quando o locus não apresenta variação e é idêntico em indivíduos da mesma espécie. Esses padrões realmente são encontrados nos genomas e os estudos na espécie humana mostram que a cada 800 nucleotídeos sequenciados em um indivíduo, um deles é variável. Quando são feitas comparações entre o genoma humano e o do chimpanzé, observa-se que 1/100 dos nucleotídeos são divergentes.

A genética populacional está baseada nos estudos de frequências alélicas. Cada gene do genoma existe em diferentes possibilidades alélicas e, naturalmente, um indivíduo diploide é homozigoto ou heterozigoto. Em uma população, é possível calcular as frequências dos diferentes tipos de homozigotos e heterozigotos. A partir dessas frequências, podemos estimar a frequência de cada alelo de um gene. Tais análises são a base para a genética de populações.

Diferentes processos explicam a origem dos padrões de polimorfismo e divergência. Há os processos genéticos, como a mutação e a duplicação gênica, que produzem variação genética, e os processos demográficos, como a deriva genética e a migração. A deriva genética é um processo de mudança na composição genética de uma população que ocorre de forma aleatória, não havendo seleção natural. Já a migração pode gerar variação em uma população pelo influxo de imigrantes, trazendo novas variantes genéticas. É importante salientar que por meio destes processos as populações evoluem, mesmo que não ocorra a seleção natural.

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UNIDADE 3 | GENÉTICA MÉDICA

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Mas a composição genética da população também pode ser estabelecida pela seleção natural, já que as probabilidades de um alelo variar de frequência dependem do modo com que ele contribui para as chances de sobrevivência e reprodução dos indivíduos. Mutações vantajosas tendem a se tornar mais frequentes, pois aumentam as chances de sobrevivência e de reprodução de seu portador.

DICAS

Prezado acadêmico, visite sites especializados em Genética Humana e Médica, assim você poderá aprofundar seus conhecimentos, além de buscar oportunidades na área. Acesse:<https://www.genome.gov/10000464/online-genetics-education-resources/>.<https://www.sbg.org.br/>.<http://www.sbgm.org.br/>.

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TÓPICO 3 | GENÉTICA MÉDICA NA ERA DA GENÔMICA

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LEITURA COMPLEMENTAR

Limites da manipulação genética

Lygia Pereira

Nos últimos anos, a possibilidade de manipulação genética de seres humanos se tornou tecnicamente real, o que levou à publicação de vários manifestos da comunidade científica internacional contra o uso da técnica em embriões, óvulos e espermatozoides humanos. Não aceitamos alterações genéticas que possam ser transmitidas às próximas gerações. Apesar disso, no mês passado, cientistas chineses publicaram um trabalho descrevendo a criação de embriões humanos geneticamente modificados! Abrimos a Caixa de Pandora?

Ainda não. Os pesquisadores chineses só testaram quão segura a técnica é de fato em embriões humanos — afinal, se um dia pudéssemos, por exemplo, corrigir a mutação no gene do câncer de mama da Angelina Jolie, interromperíamos a herança maldita do mal, que vinha desde sua avó e os filhos da atriz não correriam nenhum risco de herdar a doença (seus filhos biológicos possuem 50% de chance de terem herdado a mutação da mãe...).

Se temos algo a ganhar com a técnica, não vale a pena testá-la? Sim, mas existe uma linha muito tênue entre ousadia e irresponsabilidade e o desenvolvimento científico não pode cruzá-la. Assim, para ficar do lado de cá dessa fronteira, foram usados embriões defeituosos de fertilização in vitro. Neles foram injetadas pequenas moléculas construídas para consertar um gene que, quando “mutado”, causa uma forma grave de anemia. Dos 54 embriões analisados, somente quatro tinham o gene corrigido... Além disso, eles também tinham alterações genéticas em outros locais não planejados do genoma — ou seja, a tal molécula muitas vezes erra o alvo... Em resumo, o trabalho demonstrou que a técnica de edição de genoma é ineficiente e insegura para se utilizar em embriões humanos — exatamente o que a comunidade científica previa e argumentava para que esse procedimento não fosse feito em embriões humanos. O que não significa que as pesquisas nesse sentido devam ser interrompidas. Se tivéssemos proibido as pesquisas em transplante cardíaco em 1968, quando 80% dos pacientes transplantados morriam, nunca teríamos tornado o procedimento uma realidade que hoje em dia salva muitas vidas. Cientistas seguirão aprimorando a técnica para torná-la mais eficiente e segura. Porém, essas pesquisas devem ser conduzidas de forma absolutamente ética — aliás, todas as pesquisas devem ser conduzidas assim; mas, quando envolvem embriões humanos, mais ainda.

E enquanto nós, cientistas, resolvemos os aspectos técnicos, conclamamos legistas, psicólogos, sociólogos e a população em geral para discutir as vantagens e os riscos de usar a tecnologia de edição do genoma em seres humanos. Para pesquisa ou para evitar doenças como câncer e Alzheimer? Sim. E para que o bebê nasça com olhos azuis, mais inteligente, mais alto? Em que situações permitiremos sua aplicação?

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Um cenário que há 15 anos era ficção científica agora é tão real que devemos discuti-lo urgentemente. No Brasil, já estamos precavidos: a Lei de Biossegurança de 2005 proíbe “engenharia genética em célula germinal humana, zigoto humano e embrião humano”. Talvez um dia tenhamos que rever o texto para considerar casos específicos em que essa engenharia genética possa ser feita. Mas, por enquanto, estamos protegidos dos Mengeles de plantão — que orgulho!

FONTE: <https://oglobo.globo.com/opiniao/limites-da-manipulacao-genetica-16125529>. Acesso em: 21 set. 2018.

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Neste tópico, você aprendeu que:

• O câncer é um descontrole das células do organismo, principalmente dos mecanismos que regulam a divisão no ciclo celular, proliferando de modo anormal, não respondendo aos diferentes mecanismos de controle.

• Os oncogenes são ativados na carcinogênese e normalmente funcionam de forma dominante, já os genes supressores tumorais são inativados na carcinogênese e normalmente funcionam de maneira recessiva.

• A terapia gênica ocorre por transferência de material genético, DNA ou RNA, denominado de transgene, para as células-alvo, visando à cura ou melhora do quadro clínico de uma patologia.

• Muitas vezes, não há como prever a resposta clínica a uma determinada droga. Neste sentido, a farmacogenômica traz grandes perspectivas à medicina personalizada.

• O termo medicina personalizada envolve a caracterização fenotípica e genotípica do indivíduo, incluindo dados sociodemográficos, ambientais e constituição genética, na estimativa da predisposição individual para uma doença e na definição de estratégias preventivas e terapêuticas.

• Um aspecto importante da farmacogenômica é a possibilidade de identificar genes que são regulados por drogas.

• A nutrigenômica estuda a influência dos nutrientes no genoma, ou seja, como os nutrientes podem interferir na expressão gênica, afetar vias e o controle homeostático.

• A nutrigenética tem como objetivo compreender como a constituição genética de um indivíduo coordena a sua resposta à alimentação.

• Quando um determinado gene é clonado, sequenciado e as mutações causadoras do distúrbio são conhecidas, geralmente é possível desenvolver testes moleculares para identificar os alelos mutantes e diagnosticar a patologia.

• Os testes moleculares podem ser feitos a partir de pequenas quantidades de DNA com o auxílio da PCR para amplificar o segmento de DNA de interesse.

• Os heredogramas são diagramas que apresentam as relações entre os membros de uma família.

RESUMO DO TÓPICO 3

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• A terapia gênica pode ser um tratamento eficaz no caso de doenças genéticas, mas só é utilizada para tratar doenças genéticas em células somáticas.

• Os estudos de polimorfismos no genoma humano mostram que a cada 800 nucleotídeos sequenciados em um indivíduo, um deles é variável.

• A vacina de DNA apresenta-se como uma eficiente tecnologia que pode ser utilizada no desenvolvimento de vacinas contra agentes infecciosos, doenças autoimunes, câncer e alergias.

• As análises de genética molecular fazem parte da rotina em diversas situações. Atualmente, observamos muitos testes de paternidade sendo realizados, além de análises de comprovação de culpa ou de acusados, garantia de reclamação de herança e identificação de cadáveres.

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AUTOATIVIDADE

1 (ENADE, 2011) Uma das funções essenciais da divisão celular em eucariotos complexos é a de repor células que morrem. Nos seres humanos, bilhões de células morrem todos os dias e, basicamente, a morte celular pode ocorrer por dois processos morfologicamente distintos: necrose e apoptose. Considerando que a distinção entre eles é de especial importância no diagnóstico de doenças, avalie as afirmações abaixo:

I- Na apoptose os restos celulares são fagocitados pelos macrófagos teciduais. II- Como processos ativos, tanto a apoptose quanto a necrose requerem

reservas de ATP. III- Na necrose ocorre extravasamento de substâncias contidas nas células, o

que resulta em um processo inflamatório. IV- Tanto o mecanismo de necrose como o da apoptose envolvem a degradação

do DNA e das proteínas celulares.

É CORRETO apenas o que se afirma em: a) ( ) I. b) ( ) II. c) ( ) I e III. d) ( ) II e IV. e) ( ) III e IV.

2 (ENADE, 2007 - questão adaptada) As endonucleases de restrição são enzimas que reconhecem uma sequência específica de nucleotídeos do DNA e o clivam em um ponto determinado. O emprego dessas enzimas no diagnóstico de doenças infecciosas, neoplásicas e hereditárias vem crescendo dia a dia e está preconizado em alguns programas de saúde pública do Governo Federal. O esquema abaixo mostra a sequência de bases reconhecida pela enzima Dde I, seu ponto de corte (representado pela seta) e dois fragmentos de DNA a serem examinados.

CT ↓ NAG – sequência reconhecida pela DdeI (N= nucleotídeo qualquer) Fragmento A= ...ACT CCT GAG GAG ... + Dde I Fragmento S= ...ACT CCT GTG GAG ... + Dde I

Considerando a especificidade da enzima e os fragmentos em estudo e sabendo que o fragmento “A” é o normal e o fragmento “S” representa uma mutação, qual a representação do resultado da corrida eletroforética dos fragmentos resultantes da digestão do DNA de um indivíduo normal e de um doente, ambos homozigotos?

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a) ( ) Normal = 1 banda; doente = 1 banda. b) ( ) Normal = 1 banda; doente = 2 bandas. c) ( ) Normal = 2 bandas; doente = 1 banda. d) ( ) Normal = 2 bandas; doente = 2 bandas. e) ( ) Não é possível diferenciar a mutação nestes fragmentos.

3 (ENADE, 2013) As sequências não codificantes e altamente polimórficas no DNA funcionam como impressões digitais e permitem identificar o indivíduo, bem como sua origem. Nessa característica de individualidade e hereditariedade baseiam-se as provas científicas de paternidade utilizadas no cotidiano forense brasileiro.

Com base na interpretação da eletroforese da imagem anterior, avalie as afirmações seguintes. I- Nessa corrida de eletroforese é possível observar a variabilidade na

sequência de DNA entre os indivíduos. II- O indivíduo F3 não possui parentesco com nenhum dos indivíduos

testados. III- A investigação genética pode excluir a possibilidade de paternidade,

como observado em relação ao indivíduo F1. IV- É excluída a paternidade do suposto pai em relação ao indivíduo F2.

É CORRETO apenas o que se afirma em:a) ( ) I e II. b) ( ) I e III. c) ( ) III e IV.

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d) ( ) I, II e IV. e) ( ) II, III e IV

4 (ENADE, 2013) A vacina baseada na tecnologia do DNA recombinante envolve a transferência do gene que codifica a proteína imunogênica, clonado em vetor de expressão, para células eucarióticas. Ao final do século XX, diferentes vetores que expressam genes em células de mamíferos foram desenvolvidos, bem como novos métodos de transferência gênica direta.

Acerca da metodologia de construção do DNA recombinante, avalie as afirmações a seguir. I- Um vetor ideal deve ser de fácil produção e direcionar a resposta imune

para células de imunidade específica (adaptativa). II- Essa metodologia permite que o DNA se autoreplique no indivíduo, sem

expressão gênica por um período prolongado. III- A referida metodologia não estimula no indivíduo reações autoimunes e

de tolerância.

É CORRETO o que se afirma em:a) ( ) II, apenas. b) ( ) III, apenas. c) ( ) I e II, apenas. d) ( ) I e III, apenas. e) ( ) I, II e III.

5 (ENADE, 2013) Há alguns meses, uma paciente submeteu-se a uma adenomastectomia bilateral preventiva com reconstrução das mamas com próteses. Essa indicação foi feita analisando-se seu histórico familiar e genético. Sua mãe e tia faleceram antes dos 50 anos com neoplasia maligna. Ao exame laboratorial observou-se que a paciente é portadora de um gene relacionado à maior prevalência de carcinoma mamário, ovariano e outros. Nos casos de câncer de mama, a chance de desenvolver a neoplasia maligna é próxima de 85%.

A respeito da situação descrita, assinale a opção que apresenta o nome do gene, o cromossoma no qual está localizado, o modo como é ativado e a classificação, em relação à distribuição na população, para as pacientes que expressam esse gene. a) ( ) p53; translocação (8,13), câncer familiar. b) ( ) RB; deleção do braço curto do cromossoma 28, câncer familiar. c) ( ) Cromossoma Filadélfia; translocação (13,22); câncer hereditário. d) ( ) BRCA1; deleção do braço curto do cromossoma 17; câncer hereditário. e) ( ) Her2Neu; amplificação do braço longo do cromossoma 21; câncer

familiar.

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REFERÊNCIAS

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GUERRA, M. Introdução à citogenética geral. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 1989.

HAMMER, G. D.; MCPHEE, S. J. Fisiopatologia da doença: uma introdução à medicina clínica. 7. ed. Porto Alegre: AMGH, 2016.

KIERSZENBAUM, A. L. Histologia e biologia celular: uma Introdução à patologia. 4. ed. Rio de Janeiro: Elsevier, 2016.

LEWIN, B. Genes IX. Porto Alegre: Editora Artes Médicas, 2009.

MALUF, S. W. Citogenética humana. Porto Alegre: Artmed, 2011.

MARZZOCO, A. Bioquímica básica. 4. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2015.

MENCK, C. F. M. Genética molecular básica: dos genes aos genomas. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2017.

PASTERNAK, J. J. Genética Molecular Humana. 1. ed. São Paulo: Manole, 2002.

REGATEIRO, F. Manual de genética médica. Coimbra: Imprensa da Universidade de Coimbra, 2003.

SNUSTAD, D. Peter; SIMMON, Michel J. Fundamentos de genética. 7. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2017.

THOMPSON, James S.; THOMPSON, Margaret W. Genética médica. 8. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2016.

ZAHA, A. Biologia molecular básica. 4. ed. Porto Alegre: Artmed, 2012.