sociologia da educação - uniasselvi

222
2018 SOCIOLOGIA DA EDUCAÇÃO Profª. Ana Cláudia Moser Prof. Márcio José Cubiak

Upload: others

Post on 16-Oct-2021

12 views

Category:

Documents


1 download

TRANSCRIPT

Page 1: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

2018

Sociologia da Educação

Profª. Ana Cláudia MoserProf. Márcio José Cubiak

Page 2: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

Copyright © UNIASSELVI 2018

Elaboração:

Profª. Ana Cláudia Moser

Prof. Márcio José Cubiak

Revisão, Diagramação e Produção:

Centro Universitário Leonardo da Vinci – UNIASSELVI

Ficha catalográfica elaborada na fonte pela Biblioteca Dante Alighieri

UNIASSELVI – Indaial.

306.43M899s Moser, Ana Cláudia

Sociologia da educação / Ana Cláudia Moser, Márcio José Cubiak – Indaial: UNIASSELVI, 2018.

211 p.; il.

ISBN 978-85-515-0165-8

1. Sociologia – Brasil2. Educação – SociologiaI. Cubiak, Márcio JoséII. Centro Universitário Leonardo da Vinci

Page 3: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

III

aprESEntação

“A educação é a arma mais poderosa que podemosusar para mudar o mundo”.

Nelson Mandela

Prezado acadêmico! Iniciaremos agora mais uma etapa de sua jornada de formação com a disciplina Sociologia da Educação. Através dos estudos desta disciplina, você será apresentado a um conjunto de conceitos de teorias que contribuirão para ampliar seus conhecimentos acerca das relações sociais que envolvem educação e sociedade, bem como contribuirão para apresentar a você formas diferentes para analisar e compreender os fenômenos educacionais dos processos mais amplos de socialização à educação escolar.

Na Unidade 1 dedicaremos nossos esforços a compreender como se constroem os problemas sociológicos, a escola e a educação como campos de estudo da sociologia. Partindo desse cenário, apresentaremos as relações entre sociedade e educação e o desenvolvimento das teorias que formaram o campo da Sociologia da Educação. Na sequência, apresentaremos as discussões que dão conta das noções de sala de aula, dos sujeitos da educação e das relações entre sociedade e cultura.

O panorama das teorias sociológicas que abordam elementos fundamentais para a Sociologia da Educação será apresentado na Unidade 2. Nesta unidade, você conhecerá as reflexões sobre educação e sociedade nas teorias dos clássicos: Augusto Comte, Émile Durkheim, Karl Marx e Max Weber; e dos contemporâneos: Talcott Parsons, Antônio Gramsci, Louis Althusser, Karl Mannheim, Norbert Elias, Michel Foucault e Anthony Giddens. Além destas teorias, apresentaremos o desenvolvimento teórico da Sociologia da Educação no Brasil.

Na Unidade 3 serão abordados temas relevantes para a Sociologia da Educação, como as questões que envolvem estudos culturais, pós-colonialismo, Estado, instituições sociais, desigualdade social-escolar, violência, trabalho e tecnologias.

Os autores

Page 4: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

IV

Você já me conhece das outras disciplinas? Não? É calouro? Enfim, tanto para você que está chegando agora à UNIASSELVI quanto para você que já é veterano, há novidades em nosso material.

Na Educação a Distância, o livro impresso, entregue a todos os acadêmicos desde 2005, é o material base da disciplina. A partir de 2017, nossos livros estão de visual novo, com um formato mais prático, que cabe na bolsa e facilita a leitura.

O conteúdo continua na íntegra, mas a estrutura interna foi aperfeiçoada com nova diagramação no texto, aproveitando ao máximo o espaço da página, o que também contribui para diminuir a extração de árvores para produção de folhas de papel, por exemplo.

Assim, a UNIASSELVI, preocupando-se com o impacto de nossas ações sobre o ambiente, apresenta também este livro no formato digital. Assim, você, acadêmico, tem a possibilidade de estudá-lo com versatilidade nas telas do celular, tablet ou computador. Eu mesmo, UNI, ganhei um novo layout, você me verá frequentemente e surgirei para apresentar dicas de vídeos e outras fontes de conhecimento que complementam o assunto em questão.

Todos esses ajustes foram pensados a partir de relatos que recebemos nas pesquisas institucionais sobre os materiais impressos, para que você, nossa maior prioridade, possa continuar seus estudos com um material de qualidade.

Aproveito o momento para convidá-lo para um bate-papo sobre o Exame Nacional de Desempenho de Estudantes – ENADE. Bons estudos!

NOTA

Page 5: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

V

Page 6: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

VI

Page 7: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

VII

UNIDADE 1 - RELAÇÕES ENTRE SOCIOLOGIA, SOCIEDADE E EDUCAÇÃO .................1

TÓPICO 1 - O OLHAR DA SOCIOLOGIA SOBRE SOCIEDADE, ESCOLA E EDUCAÇÃO ...............................................................................................31 INTRODUÇÃO ...................................................................................................................................32 PROBLEMAS SOCIOLÓGICOS .....................................................................................................33 MÉTODOS E PROBLEMAS SOCIOLÓGICOS ...........................................................................74 ESCOLA E EDUCAÇÃO COMO CAMPOS DA SOCIOLOGIA ..............................................15LEITURA COMPLEMENTAR .............................................................................................................22RESUMO DO TÓPICO 1......................................................................................................................25AUTOATIVIDADE ...............................................................................................................................26

TÓPICO 2 - AS CONTRIBUIÇÕES DA SOCIOLOGIA DA EDUCAÇÃO ...............................291 INTRODUÇÃO ...................................................................................................................................292 A SOCIOLOGIA E A SOCIEDADE ................................................................................................293 O QUE É A SOCIOLOGIA DA EDUCAÇÃO? .............................................................................35LEITURA COMPLEMENTAR .............................................................................................................40RESUMO DO TÓPICO 2......................................................................................................................42AUTOATIVIDADE ...............................................................................................................................43

TÓPICO 3 - OS DESDOBRAMENTOS DAS CONTRIBUIÇÕES DA SOCIOLOGIA DA EDUCAÇÃO NA COMPREENSÃO DOS SUJEITOS E DA CULTURA NA EDUCAÇÃO.........................................................451 INTRODUÇÃO ...................................................................................................................................452 SALA DE AULA E SUJEITOS DA EDUCAÇÃO..........................................................................453 SOCIEDADE E CULTURA ...............................................................................................................53LEITURA COMPLEMENTAR .............................................................................................................58RESUMO DO TÓPICO 3......................................................................................................................60AUTOATIVIDADE ...............................................................................................................................61

UNIDADE 2 - PERCURSOS TEÓRICOS DA SOCIOLOGIA DA EDUCAÇÃO .....................63

TÓPICO 1 - PRIMEIRA GERAÇÃO DE SOCIÓLOGOS: DURKHEIM, MARX E WEBER ...................................................................................651 INTRODUÇÃO ...................................................................................................................................652 ÉMILE DURKHEIM ...........................................................................................................................66

2.1 DURKHEIM E A EDUCAÇÃO ....................................................................................................723 KARL MARX (1818-1883) ..................................................................................................................74

3.1 MARX E A EDUCAÇÃO ..............................................................................................................784 MAX WEBER (1864-1920) ..................................................................................................................81

4.1 A SOCIOLOGIA COMPREENSIVA DE WEBER ......................................................................824.2 WEBER E A EDUCAÇÃO ............................................................................................................87

RESUMO DO TÓPICO 1......................................................................................................................90AUTOATIVIDADE ...............................................................................................................................91

Sumário

Page 8: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

VIII

TÓPICO 2 - GERAÇÃO DA PRIMEIRA METADE DO SÉCULO XX: MANNHEIM, PARSONS, ELIAS, GRAMSCI, ESCOLA DE FRANKFURT, HABERMAS E ALTHUSSER ......................................................931 INTRODUÇÃO ...................................................................................................................................932 KARL MANNHEIM: PLANEJAMENTO E TÉCNICA SOCIAL ...............................................93

2.1 TALCOTT PARSONS: AÇÃO E SISTEMA SOCIAL ................................................................962.2 NORBERT ELIAS: CONTRIBUIÇÕES DA SOCIOLOGIA PROCESSUAL PARA A EDUCAÇÃO ........................................................................................992.3 ANTONIO GRAMSCI: HEGEMONIA E EDUCAÇÃO HUMANÍSTICA ............................1012.5 ESCOLA DE FRANKFURT: A TEORIA CRÍTICA E AS CONTRIBUIÇÕES DE ADORNO PARA A SOCIOLOGIA DA EDUCAÇÃO .......................................................1052.4 JURGEN HABERMAS: RACIONALIZAÇÃO E AÇÃO COMUNICATIVA ........................1072.5 LOUIS ALTHUSSER: IDELOGIA E APARELHOS IDEOLÓGICOS DE ESTADO ..............110

LEITURA COMPLEMENTAR .............................................................................................................113RESUMO DO TÓPICO 2......................................................................................................................119AUTOATIVIDADE ...............................................................................................................................120

TÓPICO 3 - GERAÇÃO DA SEGUNDA METADE DO SÉCULO XX: BOURDIEU, HABERMAS E GIDDENS ....................................................................1231 INTRODUÇÃO ...................................................................................................................................1232 PIERRE BOURDIEU ...........................................................................................................................123

2.1 ELEMENTOS PARA PENSAR A EDUCAÇÃO EM BOURDIEU ..........................................1262.2 JÜRGEN HABERMAS: RACIONALIZAÇÃO E AÇÃO COMUNICATIVA ........................1292.3 ANTHONY GIDDENS ..................................................................................................................134

LEITURA COMPLEMENTAR .............................................................................................................141RESUMO DO TÓPICO 3......................................................................................................................143AUTOATIVIDADE ...............................................................................................................................144

UNIDADE 3 - A SOCIOLOGIA DA EDUCAÇÃO NA CONTEMPORANEIDADE ...............147

TÓPICO 1 - ESTUDOS CULTURAIS, MULTICULTURALISMO E EDUCAÇÃO ..................1491 INTRODUÇÃO ...................................................................................................................................1492 ESTUDOS CULTURAIS E AS SUAS RELAÇÕES COM A EDUCAÇÃO ...............................150

2.1 OS ESTUDOS CULTURAIS ..........................................................................................................1503 CONTRIBUIÇÕES DOS ESTUDOS CULTURAIS PARA O CAMPO DA EDUCAÇÃO ................................................................................................................1584 MULTICULTURALISMO E EDUCAÇÃO .....................................................................................160LEITURA COMPLEMENTAR .............................................................................................................166RESUMO DO TÓPICO 1......................................................................................................................169AUTOATIVIDADE ...............................................................................................................................170

TÓPICO 2 - A SOCIOLOGIA DA EDUCAÇÃO NO BRASIL .....................................................1711 INTRODUÇÃO ...................................................................................................................................1712 TEORIAS E PESQUISAS SOBRE EDUCAÇÃO NO BRASIL ..................................................1713 CONTRIBUIÇÕES DE FLORESTAN FERNANDES PARA A SOCIOLOGIA DA EDUCAÇÃO NO BRASIL ............................................................................1734 AS CONTRIBUIÇÕES DE FERNANDO DE AZEVEDO PARA A COMPREENSÃO DA EDUCAÇÃO COMO FATO SOCIAL ...................................................1745 AS CONTRIBUIÇÕES DAS TEORIAS MARXISTAS NA SOCIOLOGIA DA EDUCAÇÃO BRASILEIRA ......................................................................................................1766 EDUCAÇÃO E REPRODUÇÃO SOCIAL: O CASO DAS DESIGUALDADES SOCIAIS E A EDUCAÇÃO NO BRASIL ......................................................................................177

Page 9: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

IX

LEITURA COMPLEMENTAR .............................................................................................................181RESUMO DO TÓPICO 2......................................................................................................................188AUTOATIVIDADE ...............................................................................................................................189

TÓPICO 3 - TEMAS DA SOCIOLOGIA DA EDUCAÇÃO ..........................................................1911 INTRODUÇÃO ...................................................................................................................................1912 A RELAÇÃO EDUCAÇÃO E TECNOLOGIA ...............................................................................191

2.1 AVANÇOS E DESAFIOS DO ENSINO DE SOCIOLOGIA NA EDUCAÇÃO BÁSICA .....196RESUMO DO TÓPICO 3......................................................................................................................200AUTOATIVIDADE ...............................................................................................................................201REFERÊNCIAS .......................................................................................................................................203

Page 10: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

X

Page 11: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

1

UNIDADE 1

RELAÇÕES ENTRE SOCIOLOGIA, SOCIEDADE E EDUCAÇÃO

OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM

PLANO DE ESTUDOS

Esta unidade tem por objetivos:

• compreender a construção dos problemas sociológicos;

• analisar a escola e educação como campos de estudo da sociologia;

• apresentar o contexto do desenvolvimento da Sociologia da Educação;

• conhecer as relações entre sociedade, educação e escola;

• analisar as relações entre sala de aula e os sujeitos da educação;

• compreender as relações entre sociedade e cultura.

A primeira unidade está dividida em três tópicos. Ao fim de cada um deles, você encontrará um resumo dos conteúdos e autoatividades que contribuirão para a reflexão e análise dos temas abordados.

TÓPICO 1 – O OLHAR DA SOCIOLOGIA SOBRE SOCIEDADE, ESCOLA E EDUCAÇÃO

TÓPICO 2 – AS CONTRIBUIÇÕES DA SOCIOLOGIA DA EDUCAÇÃO

TÓPICO 3 – OS DESDOBRAMENTOS DAS CONTRIBUIÇÕES DA SOCIO-LOGIA DA EDUCAÇÃO NA COMPREENSÃO DOS SUJEI-TOS E DA CULTURA NA EDUCAÇÃO

Page 12: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

2

Page 13: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

3

TÓPICO 1UNIDADE 1

O OLHAR DA SOCIOLOGIA SOBRE

SOCIEDADE, ESCOLA E EDUCAÇÃO

1 INTRODUÇÃO

O primeiro tópico da Unidade 1 apresentará a você o contexto de desenvolvimento da Sociologia, as formas de construção dos problemas sociológicos e as teorias produzidas para analisar esses questionamentos. A educação e a escola como objetos de estudo da Sociologia também ganham espaço nesse tópico. O objetivo central é proporcionar ferramentas teóricas que permitam a você relembrar como a Sociologia constrói seus objetos e como o desenvolvimento da Sociologia como ciência levou à compreensão das relações entre sociedade e educação.

2 PROBLEMAS SOCIOLÓGICOS

Nesta primeira etapa de seu livro de estudos, vamos apresentar algumas noções introdutórias e básicas para a compreensão da Sociologia. Tratar desta disciplina implica adentrar o universo das ciências sociais, do qual ela faz parte.

Newton Freire-Maia (1998, p. 24) diz que a ciência é um “[...] conjunto de descrições, interpretações, teorias, leis, modelos etc., visando ao conhecimento de uma parcela da realidade” pelo emprego de “metodologia especial”, a metodologia científica. No modelo atual de ciência, o seu resultado deve ser a produção de conhecimento reconhecido. Este tipo de conhecimento “distingue-se por um grau de certeza alto, desfrutando assim de uma posição privilegiada com relação aos demais tipos de conhecimento” (CHIBENI, 2004, p. 1).FONTE: FREIRE-MAIA (1998); CHIBENI (2004)

DICAS

As ciências sociais representam uma parte do campo científico no interior da ciência. E como se divide a ciência? Não é possível encontrar um consenso sobre esta identificação, sempre dependendo da posição do cientista. Para as

Page 14: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

UNIDADE 1 | RELAÇÕES ENTRE SOCIOLOGIA, SOCIEDADE E EDUCAÇÃO

4

autoras Lakatos e Marconi (1995), é possível perceber a classificação da ciência entre ciências formais e as factuais.

As primeiras são focadas no estudo de ideias, de situações abstratas, sem necessariamente ter relações com a realidade, utilizando a lógica, fórmulas e teoremas para comprovar suas hipóteses.

As segundas se referem às ciências dedicadas aos fatos naturais e sociais, recorrendo às observações e experimentações. Seus resultados e suas hipóteses, quase sempre, são provisórios.

Como podemos perceber, as ciências sociais são classificadas como factuais. Observe a figura a seguir:

FIGURA 1 - CLASSIFICAÇÃO DA CIÊNCIA DE ACORDO COM LAKATOS E MARCONI

FONTE: Disponível em: <https://livrepensamento.com/2013/08/19/sobre-porque-a-ciencia-e-a-unica-forma-de-conhecimento-que-vale-a-pena/>. Acesso em: 22 fev. 2018.

CIÊNCIAS

FACTUAIS

SOCIAIS

NATURAIS

Lógica

FísicaQuímica

DireitoEconomia

Sociologia

Política

Biologia e outros

Antropologia Cultural

Psicologia Social

MatemáticaFORMAIS

Mas, como perceber as Ciências Sociais? Esse conjunto de disciplinas científicas se volta aos fenômenos sociais – coletivos ou individuais. Quer dizer, o objeto das ciências sociais ou humanas é o homem na sociedade. Elas são disciplinas autônomas, mas estão em complexo inter-relacionamento entre si, havendo certa complementaridade (LAKATOS, 1990).

Para o professor Pérsio Santos de Oliveira (2001), as ciências sociais pesquisam e estudam o comportamento humano social e suas várias formas de organização. Seus objetivos se voltam à ampliação do conhecimento sobre o ser humano em suas interações sociais, contribuindo para um entendimento ampliado das sociedades e seus processos sociais.

Page 15: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

TÓPICO 1 | O OLHAR DA SOCIOLOGIA SOBRE SOCIEDADE, ESCOLA E EDUCAÇÃO

5

E a Sociologia? Como dissemos, ela é uma das ciências sociais. Como as demais disciplinas desse campo, seu interesse está nos fenômenos e processos sociais. Mas o que lhe torna específica?

Ressaltamos duas formas de caracterizar e definir a Sociologia. Falamos de seu objeto – sociedade, interações, comportamentos – e a maneira pela qual percebe este objeto, empregando um olhar científico. Os autores que discutem o que é a Sociologia, qual seu papel e objeto de estudo enfatizam essas duas dimensões quando escrevem sobre esta disciplina. A Sociologia é o que é, possui uma identidade própria, em razão de seu objeto e de seus métodos empregados.

Neste sentido, Pérsio Santos de Oliveira (2001) escreveu que a Sociologia estuda as relações sociais e as maneiras pelas quais nos associamos a partir das interações sociais. Ela abrangeria, ainda, o estudo da divisão dos grupos sociais, das dinâmicas de mudanças sociais e dos processos de competição, cooperação e conflitos presentes nas sociedades, porém, não é um consenso sociológico aquilo que se considera como o essencial nessas relações, se é a sociedade ou o indivíduo. Isto é, se as interações, relações ou estruturas sociais, ou as ações ou comportamento social e individual. Para o sociólogo inglês Anthony Giddens (2004, p. 24):

A Sociologia é o estudo da vida social humana, dos grupos e das sociedades. [...] seu objeto de estudo é o nosso próprio comportamento. A abrangência do estudo sociológico é extremamente vasta, incluindo desde a análise de encontros ocasionais entre indivíduos na rua até a investigação de processos sociais globais.

Como indicou Zygmunt Bauman (2010, p. 26), “[...] a Sociologia pensa de

forma relacional para nos situar em redes de relações sociais”. O que quer dizer relacional? Tem a ver com relação, contato, interação, associação. Por meio deste olhar relacional, a Sociologia promoveu um encontro entre indivíduo e sociedade, sem necessariamente enfatizar um ou outro, mas sim, as suas redes ou teias de relações, fundamentadas na interdependência.

Mas o comportamento e as instituições sociais são variados e historicamente localizados. A interação social se desenrola no plano da vida concreta, real. E para analisá-la e compreendê-la é preciso realizar um exercício de conceitualização teórica; a partir disto, é possível manejar conceitos-chave para entender os sistemas sociais (GIDDENS, 2004). Neste sentido, a natureza da Sociologia e do conhecimento sociológico é complexa. Numa situação de interação social se fazem presentes uma série de variações e combinações possíveis de pensamento e de ação social e de maneira simultânea.

Além disso, existe uma série de instituições sociais que concorrem e requerem a atenção do indivíduo, interferindo na sua forma de pensar e agir. As causas dos fenômenos sociais e suas relações com os meios e os fins das ações individuais e coletivas também estão sujeitas a essa pressão multidimensional. Não existem causas únicas.

Page 16: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

UNIDADE 1 | RELAÇÕES ENTRE SOCIOLOGIA, SOCIEDADE E EDUCAÇÃO

6

Desta forma, a Sociologia produz “um comentário permanente das experiências surgidas em relações sociais e uma interpretação dessas experiências com referência aos outros e às circunstâncias sociais em que as pessoas se encontram” (BAUMAN, 2010, p. 285). Ela é um olhar disciplinado para como as pessoas, instituições ou fenômenos sociais procedem no cotidiano, resultando na produção de esquemas, de “mapas” teóricos que estão além de experiências individuais e sociais, isto é, não se confundem com uma opinião.

É neste sentido que ressaltamos a dimensão científica da Sociologia. Destarte, para além desse olhar para as interações, comportamentos, processos e fenômenos sociais, ela tem um caráter científico, como já dissemos. Por isso, podemos pensar a Sociologia como um conjunto de conceitos, de técnicas e de métodos de investigação produzidos para explicar a vida social (MARTINS, 1994).

Raymond Aron (1999, p. 7) diz que:

A Sociologia é o estudo, que pretende ser científico, do social enquanto social, seja no nível elementar das relações interpessoais, seja no nível macroscópico de vastos conjuntos, como as classes, as nações, as civilizações, ou, para empregar a expressão corrente, as sociedades globais.

Para este autor, a Sociologia se volta a aspectos micro ou macro do comportamento e da vida social, sendo diferente do senso comum em razão dos métodos e abordagens científicos que podem ser empregados. Ainda em relação a essa dimensão da Sociologia, outro sociólogo, Zygmunt Bauman (2010, p. 11), escreveu que ela é: “[...] uma prática disciplinada, dotada de um conjunto próprio de questões nas quais aborda o estudo da sociedade e das relações sociais. [...]. Mas, também, representa considerável corpo de conhecimento acumulado ao longo de sua história”. Portanto, a Sociologia é um campo autônomo de estudos estruturado em torno de modelos teóricos, abordagens e métodos de pesquisa. Isso implica reconhecer que a Sociologia é uma ciência que não tem um enfoque apenas, uma única via, sendo marcada pela diversidade. Para a professora Eva Maria Lakatos (1990, p. 22-23), a Sociologia é o estudo:

científico das relações sociais, das formas de associação, destacando-se os caracteres gerais comuns a todas as classes de fenômenos sociais, fenômenos que se produzem nas relações de grupos entre seres humanos. Estuda o homem e o meio humano em suas interações recíprocas. A Sociologia não é normativa, nem emite juízos de valor sobre os tipos de associação e relações estudados, pois se baseia em estudos objetivos que melhor podem revelar a verdadeira natureza dos fenômenos sociais.

Assim, entre seu objeto e método, a Sociologia deve ser encarada como “estudo do homem e do universo sociocultural tomando como e em suas inter-relações analisando os diversos fenômenos sociais” (LAKATOS, 1990, p. 24). Portanto, a Sociologia capta uma imagem mais ampla sobre “porque somos como somos e porque agimos como agimos” (GIDDENS, 2004, p. 24). Tais práticas dependem dos hábitos e modos de vida adotados pelos indivíduos. Não só eles

Page 17: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

TÓPICO 1 | O OLHAR DA SOCIOLOGIA SOBRE SOCIEDADE, ESCOLA E EDUCAÇÃO

7

as “utilizam” em sua atividade, como também essas práticas de vida constituem a própria atividade (GIDDENS, 2004).

É fundamental entender que em sociedade as pessoas interagem em contextos de intensas relações sociais interdependentes. Daí, tendemos à rotinização e padronização das nossas condutas através de mecanismos de socialização. Toda atividade humana é sujeita à rotinização, a partir de sua repetição e padronização na vida diária, seja comportamental ou institucional (BERGER, 1976). Da mesma forma, tudo aquilo que se relaciona à dimensão humana social e cultural não pode ser reduzido em sua complexidade. As condutas e os valores humanos possuem múltiplas dimensões e podem ser estudados a partir de distintos pontos de vista. Eles não são fixos e cada vez mais permeados por contextos transnacionais.

Em sua trajetória, é possível perceber que a Sociologia se volta o tempo todo para os problemas que o homem enfrenta no dia a dia de sua vida em sociedade (TOMAZI, 1993, p. 15), sendo uma espécie de ciência da crise. Mas a natureza da Sociologia envolve um processo metodológico que resulta em olhar além das fachadas e do senso comum. Essa perspectiva envolve a suspensão do mundo ordinário para pensá-lo em termos relacionais, processuais e históricos (BURKE, 2003). Dito de outra forma: o conhecimento sociológico não se confunde com o senso comum, com opinião.

E é a respeito dos métodos e da natureza do conhecimento sociológico que as páginas seguintes se ocupam.

3 MÉTODOS E PROBLEMAS SOCIOLÓGICOS

Anthony Giddens (2004, p. 510) ressalta que a Sociologia é um “esforço científico, envolve métodos sistemáticos de investigação empírica, análise de dados e avaliação à luz de evidências e argumentos lógicos”. Como se percebe, é um trabalho realizado em distintas etapas a partir da escolha de um objeto de interesse até sua publicação e discussão.

A natureza da Sociologia está no tipo de conhecimento produzido pelo emprego de métodos científicos sobre seu objeto de estudo. E para compreender como se realiza a prática sociológica, é importante certa intimidade com a sua linguagem, empregando adequadamente as categorias. O prisma sociológico procura constituir panoramas amplos, abertos e emancipados da existência diária. Ela tem um DNA muito característico da modernidade ocidental, um viés crítico do cotidiano na direção da compreensão das interações e inter-relações humanas (BERGER, 1976).

As Ciências Sociais, e a Sociologia em particular, surgem num ambiente estimulado por ideias evolucionistas e positivistas de ciência. A inspiração para os métodos que foram definidos para o trabalho e a perspectiva sociológica

Page 18: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

UNIDADE 1 | RELAÇÕES ENTRE SOCIOLOGIA, SOCIEDADE E EDUCAÇÃO

8

foram aqueles que eram empregados pelas Ciências Naturais, como a Biologia. O resultado foi a incorporação de algumas premissas elementares para a pesquisa com caráter científico. Os primeiros sociólogos, pela tarefa que possuíam de estabelecer as bases da disciplina, se ocuparam de traçar os objetivos e fronteiras desse novo campo que emergiu no século XIX. A neutralidade e a objetividade se tornaram regras metodológicas e posturas esperadas por parte do sociólogo.

Evolucionismo 1. Nome genérico das diversas doutrinas ou teorias filosóficas que utilizaram o transformismo biológico ou que se desenvolveram apoiadas nele. O que têm em comum é o fato de constituírem um relativismo orientado no tempo para um absoluto incognoscível (Spencer) ou místico (Teilhard de Chardin).2. Concepção biológica segundo a qual todas as espécies derivam umas das outras por um processo de transformação natural. 3. Doutrina filosófica segundo a qual a evolução constitui a lei geral dos seres (matéria, vida, espírito e sociedades), capaz de reger, por conseguinte, tanto as ciências quanto a própria moral.4. Para Charles Darwin (1809-1882), célebre por ter criado a teoria segundo a qual "a luta pela vida e a seleção natural são consideradas como os mecanismos essenciais da evolução dos seres vivos", é a ideia de seleção natural que se encontra no cerne da questão da evolução: os organismos vivos formam populações denominadas espécies e apresentam "variações": graças a essas variações, certos indivíduos são melhor "adaptados" a seu meio e engendram uma descendência mais numerosa. A seleção natural designa o conjunto dos mecanismos que fazem a triagem entre os melhores indivíduos: assim, graças à “luta pela vida, as populações evoluem lentamente, isto é, se transformam e se diversificam produzindo formas cada vez mais complexas” (p. 70).

Positivismo (fr. positivisme) I. Sistema filosófico formulado por Augusto Comte, tendo como núcleo sua teoria dos três *estados, segundo a qual o espírito humano, ou seja, a sociedade, a cultura, passa por três etapas: a teológica, a metafísica e a positiva. As chamadas ciências positivas surgem apenas quando a humanidade atinge a terceira etapa, sua maioridade, rompendo com as anteriores. Para Comte, as ciências se ordenaram hierarquicamente da seguinte forma: matemática, astronomia, física, química, biologia, sociologia; cada uma tomando por base a anterior e atingindo um nível mais elevado de complexidade. A finalidade última do sistema é política: organizar a sociedade cientificamente com base nos princípios estabelecidos pelas ciências positivas.

2. Em um sentido mais amplo, um tanto vago, o termo "positivismo" designa várias doutrinas filosóficas do séc. XIX, como as de Stuart Mill, Spencer, Mach e outros, que se caracterizam pela valorização de um método empirista e quantitativo, pela defesa da experiência sensível como fonte principal do conhecimento, pela hostilidade em relação ao *idealismo, e pela consideração das ciências empírico-formais como paradigmas de cientificidade e modelos para as demais ciências. Contemporaneamente, muitas doutrinas filosóficas e científicas são consideradas "positivistas" por possuírem algumas dessas características, tendo este termo adquirido uma conotação negativa nesta aplicação (p. 153).

FONTE: Marcondes e Japiassu (2001)

DICAS

Page 19: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

TÓPICO 1 | O OLHAR DA SOCIOLOGIA SOBRE SOCIEDADE, ESCOLA E EDUCAÇÃO

9

Para os positivistas, como Auguste Comte e Émile Durkheim, por exemplo, a sociedade era regida por leis gerais que podiam ser apreendidas de maneira objetiva, isto é, tornada uma coisa, um objeto, percebida como externa à própria sociedade. Para isso, era fundamental a postura da neutralidade científica:

Significa que a concepção positivista é aquela que afirma a necessidade e a possibilidade de uma ciência social completamente desligada de qualquer vínculo com as classes sociais, com as posições políticas, os valores morais, as ideologias, as utopias, as visões de mundo. Todo esse conjunto de elementos ideológicos, em seu sentido amplo, deve ser eliminado da ciência social (LÖWY, 1985, p. 39).

Portanto, para a corrente sociológica do positivismo, o sociólogo deve despir-se de si mesmo, de sua subjetividade, deixar de lado suas origens e experiências para dedicar-se objetivamente ao fato social estudado. Ele deve se empenhar em mostrar a realidade da maneira mais fidedigna possível. O pesquisador deve emancipar-se de suas pré-noções, sobrando apenas o indivíduo-cientista.

Ainda do ponto de vista da Sociologia clássica, outra contribuição pioneira foi dada por Max Weber em sua Sociologia compreensiva. Criticando o pressuposto positivista da neutralidade, ele vai questionar esse exercício de abstração de si que o sociólogo deveria realizar para as suas investigações em torno do objeto estudado. Para Weber, a própria realidade já seria uma construção social, impregnada de valores, portanto, a Ciência não estava livre dessas cargas subjetivas (WEBER, 2001).

Com isso, podemos deduzir que as pesquisas de caráter científico sempre realizam e têm início com uma seleção e recorte de determinadas dimensões da realidade. Quando você, acadêmico, define o seu objeto de estudo, o curso universitário que irá cursar, escolhe aquele que você conhece e lhe dá satisfação. Ao definir o objeto de um Trabalho de Conclusão de Curso, por exemplo, não nos dedicamos a pesquisar aquilo que nos é desconhecido ou desinteressante. Nós fazemos escolhas com base em nossos valores.

Essas escolhas devem ser trabalhadas cientificamente. Para isso, empregamos as abordagens e métodos. Eles são a base e o fundamento para dar início à reflexão sistemática sobre determinados problemas sociológicos. E entre a escolha e o problema sociológico, precisamos ter em mente que este não se confunde com um problema social.

Qual é a diferença entre um problema sociológico e um problema social?

No interior desse espaço social, um problema sociológico liga-se a uma extensa rede relacional de profissionais e outros problemas já elaborados. Ao modelar seu objeto e problemática sociológica, o pesquisador precisa observar essa

Page 20: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

UNIDADE 1 | RELAÇÕES ENTRE SOCIOLOGIA, SOCIEDADE E EDUCAÇÃO

10

bagagem de problemas anteriores. Isso porque os problemas não estão isolados, mas, antes, articulados com o trabalho contínuo da Sociologia. Em alguns casos, ao ler os trabalhos de seus pares, o sociólogo pode descobrir ou prestar atenção para diferentes pontos de vista sobre o seu objeto de estudo (GIDDENS, 2004).

Um problema social pressupõe a existência de um esforço anterior, de um ‘trabalho social’ voltado ao seu reconhecimento e legitimação. Esses problemas existem em relação a contextos sociais e históricos específicos, variando conforme as épocas e regiões, podendo desaparecer. Para que seja considerado relevante, não basta que um problema afete a vida de grupos, é fundamental que ele ganhe dimensão pública. A partir de então, ele pode ser assumido pelo agente estatal, que desenvolve iniciativas visando mitigá-lo na forma de políticas (LENOIR, 1998).

Por exemplo, o analfabetismo é um problema social. Mas um sociólogo não pode, nem quer saber tudo acerca do analfabetismo. Ele delimita seu interesse. O pesquisador, ao voltar-se para um problema, não está buscando a sua solução, apesar de que o resultado de sua pesquisa possa contribuir para tal.

Desta forma, o problema sociológico de uma pesquisa deve fazer o papel de fio condutor da pesquisa, a questão inicial deve ajudar a progredir nas leituras e na coleta de dados exploratória. Para tanto, ele deve transformar esse problema em uma questão com a qual o pesquisador tentará expressar o mais precisamente possível o que ele busca conhecer, elucidar, compreender melhor (QUIVY; CHAMPEGAUDT, 1998).

O que é o método? Segundo Lakatos e Marconi (1995, p. 83), trata-se de:

[...] um conjunto das atividades sistemáticas e racionais que, com maior segurança e economia, permite alcançar o objetivo – conhecimento válido e verdadeiro –, traçando o caminho a ser seguido, detectando erros e auxiliando as decisões do cientista.

E existe um método comum compartilhado pela Sociologia? Segundo Lakatos e Marconi (1990), os procedimentos próprios das Ciências Sociais são variados. Em razão dessa amplitude, os autores sugerem pensar a questão dos métodos a partir de dois níveis:

1) Métodos de abordagem2) Métodos de procedimento.

Qual é a diferença entre eles? O primeiro é a abordagem de nível mais amplo de uma pesquisa. É um recurso de abstração macro a respeito dos fenômenos sociais. Vejamos o quadro a seguir:

Page 21: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

TÓPICO 1 | O OLHAR DA SOCIOLOGIA SOBRE SOCIEDADE, ESCOLA E EDUCAÇÃO

11

QUADRO 1 - EXEMPLOS DE MÉTODOS DE ABORDAGEM

MÉTODO DESCRIÇÃO

Indutivo

A aproximação dos fenômenos caminha geralmente para planos cada vez mais abrangentes, indo das constatações mais particulares às leis e teorias (conexão ascendente). Exemplo de Método Indutivo:

A ave 1 tem duas asasA ave 2 tem duas asasA ave 3 tem duas asasA ave n tem duas asas Conclusão: toda ave tem duas asas

FONTE: Disponível em: <https://goo.gl/pmQx3E>. Acesso em: 22 fev. 2018.

Dedutivo

Ele parte das teorias e leis, na maioria das vezes prediz a ocorrência dos fenômenos particulares (conexão descendente).Exemplo de Método Dedutivo:

Todo homem é mortalPedro é homemLogo, Pedro é mortal

FONTE: Disponível em: <https://goo.gl/vcqCdu>. Acesso em: 22 fev. 2018.

Hipotético-dedutivo

Ele se inicia pela percepção de uma lacuna nos conhecimentos, acerca da qual formula hipóteses e, pelo processo de inferência dedutiva, testa a predição da ocorrência de fenômenos abrangidos pela hipótese.Exemplo de Método Hipotético-Dedutivo:

- Toca o despertador e o dia está escuro;- Hipótese de causa: amanheceu e o sol está encoberto;- Efetivo secundário: se o sol está encoberto, é possível que haja

chuva;- Teste do efeito secundário: estende-se a mão. Se molhar, a

hipótese é válida, se não molhar, busca-se outra hipótese: - o relógio está certo? - apenas há nuvens e não está chovendo? - falseamento da hipótese válida: há algo ou alguém jogando

água na minha mão, (ar condicionado, lavagem)?- A hipótese continuará válida enquanto resistir aos testes.

FONTE: Disponível em: <https://image.slidesharecdn.com/16-omtodo-cientfico-111015210455-phpapp02/95/16-o-mtodo-cientfico-21-728.jpg?-cb=1318712731>. Acesso em: 22 fev. 2018.

Page 22: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

UNIDADE 1 | RELAÇÕES ENTRE SOCIOLOGIA, SOCIEDADE E EDUCAÇÃO

12

Dialético

Procura analisar o mundo dos fenômenos através de sua ação recíproca, da contradição inerente ao fenômeno e da mudança dialética que ocorre na natureza e na sociedade.Exemplo de Método Dialético:

FONTE: Disponível em: <https://goo.gl/HHH8cb>. Acesso em: 22 fev. 2018.

- Ideia Inicial;- Pergunta.

- Junção Das Ideias ;

- Conclusão.- Nova Ideia;- Resposta.

SínteseTese

Antítese

FONTE: Lakatos e Marconi (2001, p. 116)

QUADRO 2 - EXEMPLOS DE MÉTODOS DE PROCEDIMENTO

O segundo indica os procedimentos que serão empregados para viabilizar a pesquisa. São operações mais concretas de uma investigação, com finalidade mais restrita em termos de explicação geral dos fenômenos.

MÉTODO DESCRIÇÃO

Histórico

“[...] o método histórico consiste em investigar acontecimentos, processos e instituições do passado para verificar a sua influência na sociedade de hoje, pois as instituições alcançaram sua forma atual através de alterações de suas partes componentes, ao longo do tempo, influenciadas pelo contexto cultural particular de cada época” (LAKATOS; MARCONI, 2001, p. 107).

Exemplo do Método Histórico:

Para compreender a noção atual de família e parentesco, pesquisa-se no passado os diferentes elementos constitutivos dos vários tipos de família e as fases de sua evolução social;

FONTE: Disponível em: <https://goo.gl/soX56J>. Acesso em: 22 fev. 2018.

Page 23: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

TÓPICO 1 | O OLHAR DA SOCIOLOGIA SOBRE SOCIEDADE, ESCOLA E EDUCAÇÃO

13

Comparativo

“[...] este método realiza Comparações, com a finalidade de verificar similitudes e explicar divergências. O método comparativo é usado tanto para comparações de grupos no presente, no passado, ou entre os existentes e os do passado, quanto entre sociedades de iguais ou de diferentes estágios de desenvolvimento” (LAKATOS; MARCONI, 2001, p. 107).

Exemplo de Método Comparativo:

Modo de vida rural e urbana no Estado de São Paulo; características sociais da colonização portuguesa e espanhola na América Latina.

FONTE: Disponível em: <https://goo.gl/dUUqAw>. Acesso em: 22 fev. 2018.

Monográfico

“Partindo do princípio de que qualquer caso que se estude em profundidade pode ser considerado representativo de muitos outros ou até de todos os casos semelhantes, o método monográfico consiste no estudo de determinados indivíduos, profissões, condições, instituições, grupos ou comunidades, com a finalidade de obter generalizações” (LAKATOS; MARCONI, 2001, p. 108).

Exemplo de Método Monográfico:

Estudo de delinquentes juvenis; da mão de obra volante; do papel social da mulher [PRESOTTO, Zélia Maria Neves]

FONTE: Disponível em: <https://goo.gl/sLVB7e>. Acesso em: 22 fev. 2018.

Estatístico

“[...] o método estatístico significa redução de fenômenos sociológicos, políticos, econômicos etc. a termos quantitativos e a manipulação estatística, que permite comprovar as relações dos fenômenos entre si, e obter generalizações sobre sua natureza, ocorrência ou significado” (LAKATOS; MARCONI, 2001, p. 108).

Exemplo do Método Estatístico:

Verificar a correlação entre nível de escolaridade e número de filhos; pesquisar as classes sociais dos estudantes universitários.

FONTE: Disponível em: <https://goo.gl/CfZgCo>. Acesso em: 22 fev. 2018.

Page 24: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

UNIDADE 1 | RELAÇÕES ENTRE SOCIOLOGIA, SOCIEDADE E EDUCAÇÃO

14

Tipológico

De inspiração weberiana, “Apresenta certas semelhanças com o método comparativo. Ao comparar fenômenos sociais complexos, o pesquisador cria tipos ou modelos ideais, construídos a partir da análise de aspectos essenciais do fenômeno. A característica principal do tipo ideal é não existir na realidade, mas servir de modelo para a análise e compreensão de casos concretos, realmente existentes” (LAKATOS; MARCONI, 2001, p. 109).

Exemplo de Método Tipológico:

Estudo de todos os tipos de governo democrático, do presente e do passado, para estabelecer as características típicas ideais da democracia.

Fonte: Disponível em: <https://goo.gl/BUVmoS>. Acesso em: 22 fev. 2018.

Funcionalista

Utilizado pelo antropólogo Bronislaw Malinowski, “o método funcionalista estuda a sociedade do ponto de vista da função de suas unidades, isto é, como um sistema organizado de atividades” (LAKATOS; MARCONI, 2001, p. 110).

Exemplo do Método Funcionalista:

Análise das principais diferenciações de funções que devem existir num pequeno grupo isolado, para que o mesmo sobreviva; averiguação da função dos usos e costumes no sentido de assegurar a identidade cultural de um grupo.

FONTE: Disponível em: <https://goo.gl/DVT2WH>. Acesso em: 22 fev. 2018.

Estruturalista

Desenvolvido por Lévi-Strauss. O método parte da investigação de um fenômeno concreto, eleva-se a seguir ao nível do abstrato, por intermédio da constituição de um modelo que represente o objeto de estudo, retornando por fim ao concreto, dessa vez como uma realidade estruturada e relacionada com a experiência do sujeito social. [...] o método estruturalista caminha do concreto para o abstrato e vice-versa, dispondo, na segunda etapa, de um modelo para analisar a realidade concreta dos diversos fenômenos” (p. 111).

Exemplo do Método Estruturalista:

Estudo das relações sociais e a posição que estas determinam para os indivíduos e os grupos, com a finalidade de construir um modelo que passa a retratar a estrutura social onde ocorrem tais relações.

FONTE: Disponível em: <https://goo.gl/UJkDEM>. Acesso em: 22 fev. 2018.

FONTE: Lakatos e Marconi (2001)

Page 25: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

TÓPICO 1 | O OLHAR DA SOCIOLOGIA SOBRE SOCIEDADE, ESCOLA E EDUCAÇÃO

15

Vale indicar outra distinção importante para as Ciências Sociais, no tocante ao aspecto metodológico. Trata-se do enfoque de uma pesquisa. Como dissemos, uma investigação na área da Ciência Política parte de um método mais geral, a sua abordagem. E para a realização da pesquisa, existe uma outra diferenciação que implica escolhas na definição dos métodos de procedimento. Esses enfoques são o quantitativo e o qualitativo.

Segundo a pesquisadora Maria Cecília de Souza Minayo (2001), a pesquisa qualitativa “responde a questões muito particulares”. Se interessa pelo que não pode ser reduzido a quantidades. Aborda a qualidade dos fenômenos, trabalhando

o universo de significados, motivos, aspirações, crenças, valores e atitudes, o que corresponde a um espaço mais profundo das relações, dos processos e dos fenômenos que não podem ser reduzidos à operacionalização de variáveis. Este enfoque “aprofunda-se no mundo dos significados das ações e relações humanas, um lado não perceptível e não captável em equações, médias e estatísticas (MINAYO, p. 22-23).

A pesquisa quantitativa se interessa mais pela quantidade. Para João José Saraiva da Fonseca (2002), os resultados da pesquisa quantitativa podem ser quantificados. Trabalha-se com amostras grandes e consideradas representativas da população, “os resultados são tomados como se constituíssem um retrato real de toda a população alvo da pesquisa” (FONSECA, 2002, p. 20). Tem interesse na objetividade. Influenciada pelo positivismo, considera que a realidade só pode ser compreendida com base na análise de dados brutos, recolhidos com o auxílio de instrumentos padronizados e neutros (FONSECA, 2002).

Para finalizar, indicamos a reflexão de Anthony Giddens (2004) a respeito dessa falta de homogeneidade na Sociologia. Ele argumenta que essa falta de unidade e sua imagem caótica não depõem contra a Sociologia, que se ocupa dos indivíduos em sociedades. Pelas características do objeto da Sociologia, a lógica das ciências naturais impede uma perspectiva mais ampla e, também, mais restrita dos fenômenos sociais. Sendo o comportamento humano multifacetado, é bastante improvável que fosse entendido em suas dinâmicas tomando apenas um único tipo de análise. Da mesma forma, a variedade de visões sociológicas estimula a capacidade imaginativa que é essencial ao trabalho do sociólogo. Outro desdobramento positivo desta variedade é a reflexão constante dos dilemas teóricos elementares do seu objeto.

4 ESCOLA E EDUCAÇÃO COMO CAMPOS DA SOCIOLOGIA

Prezado acadêmico! Considerando o exposto no tópico anterior, vamos buscar compreender as relações estabelecidas entre a Sociologia e a educação considerando tanto a educação como a escola como campos de estudo.

Page 26: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

UNIDADE 1 | RELAÇÕES ENTRE SOCIOLOGIA, SOCIEDADE E EDUCAÇÃO

16

Inicialmente, vamos relembrar que o objetivo da Sociologia reside na compreensão das relações sociais, e as possibilidades de realizar tal tarefa podem partir de análises micro ou macro. Por essa razão, vamos nos deparar com diferentes caminhos para analisar as relações entre escola, educação e sociedade. Em alguns desses caminhos, autores procuram partir de fenômenos sociais específicos para compreender as relações sociais, e em outros casos buscam compreender a influência exercida pela sociedade em relações específicas.

Tendo em vista essas características das análises sociais, nos deparamos aqui com dois campos de estudo da Sociologia: escola e educação. Como a sociedade é formada por um emaranhado de relações sociais – incluindo interações e disputas –, é fundamental que ao refletir sobre a educação e escola como campos de estudo, fiquemos atentos para não reduzir essas categorias a espaços isolados. Não podemos colocá-los em caixinhas fechadas sem receber e/ou exercer influência em relação às demais relações sociais, mas sim buscar compreendê-los como elementos integrantes da sociedade e que exercem grande influência em nossas vidas.

Nesse contexto, muitos estudos da Sociologia da Educação recorrem ao conceito de reprodução social para dar conta das dinâmicas referentes à escola e à educação. Por reprodução social entendemos os meios pelos quais são produzidas e reproduzidas as relações sociais. Em outras palavras, a reprodução social representa a forma pela qual a sociedade reproduz as relações que mantêm as estruturas sociais já existentes.

A escola contribui para a reprodução social na medida em que são compartilhados conteúdos, normas e valores que permitem a inserção do indivíduo na vida em sociedade, e, ao fazer isso, reproduz os papéis, hierarquias e desigualdades presentes na estrutura social.

A reprodução social merece atenção nesse momento, pois os trabalhos desenvolvidos nesse sentido marcaram o início da produção sistemática de conhecimento no campo da Sociologia da Educação. É importante considerar, ao vislumbrar escola e educação como campos da sociologia, o reconhecimento dos esforços, especialmente a partir do século XX, que levaram sociólogos como Pierre Bourdieu a compreender o domínio da escola nas relações que configuram a reprodução social. Esses estudos identificaram como a reprodução social nas escolas foi fundamental para a compreensão dos processos de socialização dos jovens (SPOSITO, 2003).

IMPORTANTE

Page 27: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

TÓPICO 1 | O OLHAR DA SOCIOLOGIA SOBRE SOCIEDADE, ESCOLA E EDUCAÇÃO

17

Prezado acadêmico! Você já parou para pensar na influência que a educação exerce sobre sua vida? Nas diferentes possibilidades de aprender e ensinar com as quais você teve contato ao longo de sua história? Na relevância do papel desempenhado pelas escolas que você frequentou ao longo de sua vida escolar? Ou ainda, na relevância da educação e da escola para a sociedade?

Como descrevemos até o momento, essas questões e outras tantas fazem parte das reflexões acadêmicas que buscam analisar as múltiplas relações sociais que influenciam e que exercem influência sobre a educação. Sobre a educação como processo de socialização e sobre a educação escolar.

É importante levar em consideração que a educação, inicialmente relacionada à escola, se desenvolve em outros espaços sociais. Ocorre ao longo de nossa vida, afinal estamos sempre aprendendo e, especialmente com as crianças, ocorre em todo momento em que elas, em contato com outros sujeitos, incorporam padrões de comportamento. Outros pontos importantes para compreender a escola e a educação como campos da Sociologia: a educação difere no tempo e no espaço e a educação representa os esforços para a socialização das gerações futuras.

Quando nos referimos às diversas representações de educação, afirmamos que, ao longo da história, observamos diferentes processos ligados à educação, da mesma forma que em diferentes sociedades também observamos diferentes formas de educar. Além disso, podemos identificar diferentes formas de educar dentro de uma sociedade. Em outras palavras: não existe uma única educação. Contudo, devemos destacar uma característica comum nas formas de educação: todas buscam moldar o indivíduo para os padrões sociais vigentes. A concepção da educação como socialização remete à noção do sujeito como ser social. Nesse sentido, é através da educação que nos submetemos às regras, hierarquias e padrões sociais para viver em grupo (PILETTI, 2004).

Na próxima unidade esses temas serão abordados de forma mais detalhada a partir dos estudos das teorias de Pierre Bourdieu sobre a educação.

Na próxima unidade, esses temas serão abordados de forma mais detalhada a partir dos estudos das teorias de Émile Durkheim sobre a educação, bem como das diversas teorias desenvolvidas no âmbito das Ciências Sociais, que nos auxiliam na compreensão da educação em nossa sociedade.

ESTUDOS FUTUROS

ESTUDOS FUTUROS

Page 28: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

UNIDADE 1 | RELAÇÕES ENTRE SOCIOLOGIA, SOCIEDADE E EDUCAÇÃO

18

É possível sintetizar os esforços para a compreensão da educação em nossa sociedade – sem ambição de abranger a totalidade – diferenciando as abordagens clássicas e as abordagens contemporâneas. Nas abordagens tradicionais da Sociologia da Educação, a escola e a família são responsáveis pela integração do indivíduo à sociedade e, por esta razão, a socialização possui centralidade. Já nas análises contemporâneas, a centralidade muda de foco para a integração de normas e culturas dominantes e para outras funções da escola, como os processos de seleção e aprendizagem (BARRÉRE; SEMBEL, 2006).

Mesmo não havendo uma única forma de educar, a educação escolar é fundamental para a concretização do processo de socialização e para a conformação dos padrões sociais. Por esta razão, a escola é um espaço importante para o desenvolvimento de tal tarefa. Nesse contexto, é natural questionar o papel da escola e suas representações na sociedade, como podemos observar na tirinha da personagem Mafalda:

FIGURA 2 - REFLEXÃO SOBRE O PAPEL DA ESCOLA

FONTE: Disponível em: <http://1.bp.blogspot.com/_PFSjpW_RCHU/THUwN3EKM5I/AAAAAAAAAD8/JlQFtCskRhw/s1600/MAFA.jpg>. Acesso em: 22 jan. 2018.

Page 29: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

TÓPICO 1 | O OLHAR DA SOCIOLOGIA SOBRE SOCIEDADE, ESCOLA E EDUCAÇÃO

19

Outra possibilidade de distinguir os trabalhos resultantes dos estudos da Sociologia da Educação são as categorias de análise: a escola como categoria analítica e a escola como unidade empírica. Essa diferenciação é importante para compreendermos que o estudo sociológico da escola possui relevância mesmo quando não é objeto de estudo empírico. E também é importante considerar a influência dos fatores externos nas escolas quando ela se torna unidade empírica de um estudo (SPOSITO, 2003).

As diferentes funções da escola também merecem nossa atenção:

A escola, como uma das instituições mais importantes do contexto social, carrega importantes funções, dentre as quais podemos destacar a política, organizacional e formativa, pois cabe a essa instituição o papel de educar os cidadãos. Isto significa dizer que o projeto educacional de uma escola deve visar, dentre outros objetivos, transmitir o conjunto de valores de uma determinada cultura. Isso possibilita uma coesão e sincronia entre os indivíduos de uma sociedade de modo a haver um consenso no julgamento moral das ações cotidianas (ROBLE, 2008, p. 17).

Aqui resgatamos o reconhecimento de que na escola se desenvolvem dois processos fundamentais para a sociedade, o compartilhamento dos saberes acumulados através das gerações, especialmente na expectativa da inclusão futura no mercado de trabalho, e a formação de um espaço de convivência com outros indivíduos.

Além disso, a escola é uma instituição que regula a vida coletiva.

A escola, por exemplo, além de ser um espaço da teoria e da prática pedagógica, é, antes, um local de convivência coletiva. Assim, até mesmo essas teorias e práticas pedagógicas precisam compreender as bases das relações entre os homens para poder melhor orientar as ações referentes ao cotidiano escolar (ROBLE, 2008, p. 7).

O espaço da convivência pública se dá na escola. É na escola que se desenrola grande parte de nossas lembranças da infância, isto porque nosso primeiro contato com a sociedade sem o amparo de nossa família se dá na escola. Enquanto na família, esfera privada, contamos com o apoio e aceitação, na escola, esfera pública, percebemos que é necessário formar nossos espaços e a viver em conjunto, bem como compreendemos que precisamos interagir com a hierarquia social já estabelecida (ROBLE, 2008).

Prezado acadêmico! Vale aqui atentar para os conceitos de esfera pública e privada. Assim como outros conceitos sociológicos, as noções de público e privado recebem contornos diferentes de acordo com as interpretações de diferentes autores, porém, de maneira geral, a noção de esfera privada diz respeito a espaços de interação restritos e de certa liberdade, por exemplo, o espaço da casa e as relações familiares, como também a noção de trabalho e empresas com fins lucrativos no âmbito do capitalismo. Já a noção de público remete à variedade de interações sociais, como as relações estabelecidas na escola, na política e com o Estado.

Page 30: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

UNIDADE 1 | RELAÇÕES ENTRE SOCIOLOGIA, SOCIEDADE E EDUCAÇÃO

20

A escola, entendida como espaço físico institucionalizado para a educação formal, também é espaço da educação informal e da educação não formal. E como podem se desenvolver ações de educação não formal nas escolas? Através das formas institucionalizadas de participação, como conselhos, fóruns e assembleias. No Brasil, essas instâncias de participação ainda são pouco articuladas. Na maioria das vezes, organizadas pela gestão da escola, que elabora pautas, agenda as reuniões etc. Então como, nesse contexto, ocorre a educação não formal?

O caráter educativo que essa participação adquire, quando ela ocorre em movimentos sociais comunitários, organizados em função de causas públicas, prepara os indivíduos para atuarem como representantes da sociedade civil organizada. E os colegiados escolares são uma dessas instâncias (GOHN, 2006, p. 33).

Dessa forma, entendemos como educação formal as atividades educacionais desenvolvidas no contexto do sistema educacional – desde a Educação Infantil ao Ensino Superior – submetidas à legislação vigente e desenvolvidas no âmbito das políticas públicas educacionais. Já a educação não formal remete a outros processos de socialização que ocorrem, por exemplo, na família, onde são socializadas normas, valores e aspectos culturais fundamentais para a vida em sociedade.

Para compreender e/ou relembrar as noções de público e privado na teoria sociológica, leia o artigo: “Esfera pública e esfera privada: uma comparação entre Hannah Arendt e Jürgen Habermas”, de Lucas Correia Carvalho.

Resumo: Este artigo discute e compara as noções de esfera privada e esfera pública em Hannah Arendt e Jürgen Habermas, tomando como base as concepções de práxis política e ação comunicativa, respectivamente. Nesse sentido, os diferentes diagnósticos dos autores referentes à esfera pública na sociedade contemporânea, “declínio” para Arendt e “mudança estrutural” para Habermas, indicam, simultaneamente a esse processo, a interferência de uma racionalidade técnica de adequação meio e fins na práxis política e na ação comunicativa.

FONTE: CARVALHO, Lucas Correia. Esfera pública e esfera privada: uma comparação entre Hannah Arendt e Jürgen Habermas. Revista Habitus: revista eletrônica dos alunos de graduação em Ciências Sociais – IFCS/UFRJ, Rio de Janeiro, v. 6, n. 1, p. 38-52, dez. 2008. Semestral. Disponível em: http://www.habitus.ifcs.ufrj.br/. Acesso em: 14 fev. 2018.

DICAS

Page 31: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

TÓPICO 1 | O OLHAR DA SOCIOLOGIA SOBRE SOCIEDADE, ESCOLA E EDUCAÇÃO

21

Como vimos até aqui, a escola e a educação são campos de estudo da Sociologia e as análises desenvolvidas nesses trabalhos contribuem para ampliar nossa reflexão a respeito das relações entre educação e sociedade. Os questionamentos levantados são variados e dizem respeito desde questões mais amplas até questões específicas das formas de socialização e do cotidiano escolar. Bem como, questionam o papel da educação para a manutenção ou transformação da estrutura social.

Para conhecer mais sobre as discussões realizadas a partir das noções de educação formal e não formal, leia o artigo intitulado “O papel da educação formal e informal: educação na escola e na sociedade”, de Rosane Kloh Biesdorf.

Resumo: A educação informal sempre ocupou um papel fundamental na sociedade, é ela que norteia o bom relacionamento entre os indivíduos. Já a educação formal possui a função de preparar o educando para atuar efetivamente junto à sociedade, para tanto oferece o conhecimento científico. Na atualidade, percebe-se que a educação informal parece pouco importar, a família está deixando que a escola eduque os seus filhos, já a escola está limitada e não preparada para esta função. O educador está preparado apenas para atuar no processo de ensino-aprendizagem, quando este se depara com atos de indisciplina em sala de aula, sente-se limitado, e seu trabalho é fortemente prejudicado. Educandos, com problemas de relacionamento e indisciplina em sala de aula, são frutos de uma sociedade onde a família está repassando à escola o papel de educar, estabelecer limites, já a escola não está preparada e não possui autoridade para tal ato.

Fonte: BIESDORF, Rosane Kloh. O papel da educação formal e informal: educação na escola e na sociedade. Itinerarius Reflectionis, [S.l.], v. 7, n. 2, p. DOI 10.5216/rir.v1i10.1148, ago. 2011. ISSN 1807-9342. Disponível em: <https://www.revistas.ufg.br/rir/article/view/20432>. Acesso em: 14 fev. 2018.

Entre os muros da escola (2009) – Direção: Laurent CantetFrançois Marin (François Bégaudeau) trabalha como professor de língua francesa em uma escola de Ensino Médio, localizada na periferia de Paris. Ele e seus colegas de ensino buscam apoio mútuo na difícil tarefa de fazer com que os alunos aprendam algo ao longo do ano letivo. François busca estimular seus alunos, mas o descaso e a falta de educação são grandes complicadores.

FONTE: Disponível em: <http://www.adorocinema.com/filmes/filme-58151/>. Acesso em: 23 jan. 2018.

Escritores da liberdade (2007) – Direção: Richard La GraveneseUma jovem e idealista professora chega a uma escola de um bairro pobre, que está corrompida pela agressividade e violência. Os alunos se mostram rebeldes e sem vontade de aprender, e há entre eles uma constante tensão racial. Assim, para fazer com que os alunos aprendam e também falem mais de suas complicadas vidas, a professora Gruwell (Hilary Swank) lança mão de métodos diferentes de ensino. Aos poucos, os alunos vão retomando a confiança em si mesmos, aceitando mais o conhecimento, e reconhecendo valores como a tolerância e o respeito ao próximo.

DICAS

DICAS

Page 32: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

UNIDADE 1 | RELAÇÕES ENTRE SOCIOLOGIA, SOCIEDADE E EDUCAÇÃO

22

Escola

[...] Vamos tentar entrar nessa instituição e analisar como se dão – em alguns casos, como deveriam ser – as relações entre os públicos escolares e as comunidades que a escola atende.

Em alguns momentos veremos nela mais que ensino e instrução. Veremos educação, no sentido atribuído por Durkheim: uma geração adulta efetivamente educando novas gerações para o trabalho e para a vida. Em outros momentos veremos muita instrução e ensino, mas pouca educação. Em outros veremos omissão e em outros, ainda, pura e simplesmente deseducação. Ou alguém acha que pode ser chamada de instituição educacional uma escola que vende diplomas?

Primeiramente, vamos olhar para a escola e entendê-la em suas relações de trabalho. Posteriormente, vamos olhar para o os públicos escolares e como se dão as relações entre eles e entre eles e a sociedade mais ampla. Por último, perguntaremos pelo lugar da escola na estrutura social e dos profissionais do ensino na educação, isto é, como a escola constitui ou não uma instância educadora e como os professores se constituem – ou deveriam se constituir – como mediadores culturais na escola.

Você trabalha ou estuda?

Observe como, de modo geral, as pessoas se referem à escola em relação ao trabalho. Certamente você mesmo já perguntou a alguém ou alguém já perguntou a você: “você trabalha ou só estuda?” Pode ser que, em resposta, você possa dizer que só “trabalha” ou só “estuda”. Pode ser, também, que você diga que o batente é mais pesado: “trabalha” e “estuda”. É até possível que você conheça aquela pergunta de gosto mais que duvidoso que circula amplamente em tom de brincadeira séria: “a sua mãe não trabalha, só dá aulas?”

É curioso como o senso comum formulou entre nós uma concepção de “estudo” como não trabalho, o que não é difícil entender. A palavra “trabalho’ vem do latim vulgar trípãlíãre, que é o mesmo que torturar com o trípãlíum, que quer dizer instrumento de tortura. O sentido original da palavra “trabalho”, portanto, diz respeito ao sofrimento, ao castigo, à tortura. Mas nós encontramos

Merlí (2015) – Criado por Héctor Lozano (2015).Merlí Bergeron (Francesc Orella) é um professor de filosofia nada convencional, que precisa reorganizar sua vida pessoal enquanto tenta de todas as formas mostrar para as pessoas a importância da filosofia. Para alguns parentes e colegas de trabalho, no entanto, ele é motivo de escândalo. Para seus alunos e seu filho gay, Merlí é uma inspiração.

LEITURA COMPLEMENTAR

Page 33: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

TÓPICO 1 | O OLHAR DA SOCIOLOGIA SOBRE SOCIEDADE, ESCOLA E EDUCAÇÃO

23

essa visão de trabalho como sofrimento e castigo também na matriz religiosa da cultura judaico-cristã. Afinal, não está nas Sagradas Escrituras a descrição de que Deus, por punição ou pelo pecado, condenou sua criatura a ganhar o pão com o suor do próprio rosto?

Já a palavra “escola” vulgarmente conhecida como lugar onde se “estuda”, tem sentido bem diferente. Originária do latim schola, que por sua vez deriva do grego scholé, escola significava ócio dedicado ao estudo, ocupação literária. Ou seja, somente podia ir para a escola ou dedicar-se ao cultivo do espírito quem fosse ocioso, isto é, aquele que estivesse livre do trípãlíum.

O tempo passou e a concepção de “trabalho” mudou radicalmente. Do sentido original de sofrimento e castigo ficou a crítica marxista à forma alienada de trabalho no sistema capitalista. Foi com a ética calvinista, a partir da Reforma Protestante, no século XVI, que começou a haver um deslocamento do sentido original de punição e tortura para uma concepção de trabalho como vocação, esforço e recompensa. Para os calvinistas, a recompensa do trabalho incessante e da riqueza acumulada pelo trabalho era o Reino dos Céus. O trabalho, dizia Calvino, dignifica e enobrece o homem, e o resultado do trabalho bem realizado poderia ser indício de manifestação da graça divina. Ao trabalho, portanto, porque o ócio é o maior dos pecados!

Entretanto, apesar de a escola moderna ter nascido temporaneamente à afirmação do calvinismo na Europa, de essa escola ter se constituído como um espaço de disciplina, organização e método, ela não se livrou do entendimento original de lugar do ócio, o avesso do trabalho. Entre nós essa imagem é ainda muito forte, inclusive porque até recentemente a escola era lugar apenas daqueles que não precisavam investir grande parte do seu tempo na provisão de subsistência e porque é frágil a nossa herança calvinista. Quais são as implicações disso?

Em primeiro lugar, deve-se ter clareza de que os exercícios de reflexão, produção e sistematização e conhecimento são trabalho, e trabalho pesado, trabalho intelectual-braçal! Como ainda é frágil essa percepção, prevalece entre nós uma sumária desvalorização do trabalho pedagógico como trabalho intelectual produtivo. Podemos observar que há um paradoxo no debate sobre a educação e escola no Brasil manifesto num amplo discurso que diz valorizar a educação como instrumento fundamental de reconstrução social, mas num contexto de intensa precarização das condições de trabalho docente, de desvalorização do professor como profissional da educação, de uma cultura escolar assentada na concepção de magistério como sacerdócio, tudo isso combinado com um brutal estado de desigualdades sociais e econômicas.

Em segundo lugar, é preciso desvincular a produção de conhecimento dos usos imediatos que dele são feitos. É forte entre nós uma visão impregnada de um pragmatismo mecanicista que não vê sentido em se ocupar com questões que não se ligam ao imediatamente vivido. No mundo das sociedades sem escolas a educação está voltada para o atendimento das necessidades imediatas, mas as

Page 34: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

UNIDADE 1 | RELAÇÕES ENTRE SOCIOLOGIA, SOCIEDADE E EDUCAÇÃO

24

sociedades modernas exigem mais que a solução de problemas imediatos. Quanto maior o espaço de mobilidade geográfica (trânsito entre ambientes diferentes) e de mobilidade social (trânsito entre diferentes esferas sociais), menor é o domínio do tipo de questão que cada qual vai enfrentar logo adiante. No mundo globalizado, esses problemas estão sempre se renovando e a reflexão sistemática é a única forma de se preparar para enfrentá-los. Nesse contexto, a produção e sistematização de conhecimento não podem ficar restritas às necessidades imediatas, o que resultaria inevitavelmente no seu empobrecimento, reduzido a mera informação mercadológica, instrumento utilitário das ações conjunturais.

Em terceiro lugar, é forçoso reconhecer que o trabalho é ação e reflexão sobre a natureza e sobre nós mesmos. Ora concentramos os componentes do trabalho nas atividades físicas e mecânicas, ora os concentramos nos elementos intelectuais, ou ainda, acumulamos as duas dimensões do trabalho. Não se pode diminuir a importância do trabalho intelectual para o entendimento das complexas teias de relações que se estabelecem no mundo moderno. Compreender essas teias não é apenas entender como as ideias se relacionam, mas sobretudo entender qual é o mundo do qual essas ideias brotam e como elas podem ou não exercer influências nele.

FONTE: SOUZA, João Valdir Alves de. Introdução à sociologia da educação. Belo Horizonte: Autêntica Editora, 2015.

Page 35: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

25

Nesse tópico você estudou que:

• A Sociologia é um dos campos das Ciências Sociais.

• A Sociologia se ocupa de pensar e refletir sobre as relações sociais e as maneiras de interação, associação, conflito e mudança nas sociedades e entre os indivíduos. Ela é um olhar científico, metodológico e relacional a respeito da dimensão social dos grupos humanos.

• Para realizar suas investigações, a Sociologia emprega métodos científicos, voltados a delimitar o interesse do sociólogo e do seu objeto de pesquisa. Isso implica em distinguir a natureza do conhecimento sociológico do senso comum.

• Escola e educação são campos da Sociologia, porém não podem ser considerados isoladamente. É necessário compreender a influência da educação e da escola na formação dos indivíduos e na estrutura social e as influências dos fatores externos sobre a escola e a educação.

• A escola representa o espaço mais comum da educação, porém não é o único. A educação está presente em outros espaços sociais, nas diferentes formas de socialização.

• A educação pode ser analisada através de teorias tradicionais com foco na socialização e através das teorias tradicionais com foco na socialização, e através das teorias contemporâneas com a incorporação de discussões acerca da integração de normas e culturas e das funções da escola.

• A escola pode ser entendida como categoria analítica ou como unidade empírica. Essa diferenciação é fundamental para atender à relevância do estudo sociológico da escola.

RESUMO DO TÓPICO 1

Page 36: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

26

1 A afirmação “não existe uma única educação” remete à compreensão da diversidade de atores e processos envolvidos na educação. Além disso, remete à compreensão da diversidade da educação em diferentes tempos e espaços. Partindo desse princípio, assinale a alternativa correta:

a) ( ) As diferentes formas de educação têm em comum a formação do indivíduo para se adequar à sociedade.

b) ( ) Cada período histórico é representado por diferentes objetivos e padrões estabelecidos através da educação.

c) ( ) O objetivo da educação varia em cada sociedade, porém as formas de educar se repetem.

d) ( ) A noção de socialização representa uma categoria analítica oposta à de educação em todas as sociedades.

2 A escola é considerada uma das instituições de maior relevância na sociedade, pois apresenta funções política, organizacional e formativa e recai sobre ela a responsabilidade de educar os cidadãos para a vida em sociedade através da transmissão do conjunto de valores de uma determinada cultura. Considerando esse contexto, assinale as sentenças com V para verdadeiras e F para falsas:

( ) A transmissão de valores contribuiu para a coesão e sincronia dos indivíduos na sociedade.

( ) Ao educar os cidadãos, a escola se concentra na formação para o mercado de trabalho, deixando outras relações em segundo plano.

( ) Através das ações desenvolvidas na escola é formado um consenso coletivo para o julgamento de questões morais.

( ) A escola é espaço da teoria e da prática pedagógica e também um local da convivência coletiva.

Agora assinale a alternativa que representa a alternativa correta:

a) ( ) F – F – V – F.b) ( ) V – F – V – V.c) ( ) F – V – F – F.d) ( ) V – V – F – V.

3 A produção do conhecimento sociológico exige o emprego de métodos científicos. Uma das primeiras tarefas no processo de investigação é definir e delimitar o problema sociológico. Este, por sua vez, não se confunde com um problema social. Em relação a essa discussão, associe os itens, utilizando o código a seguir:

AUTOATIVIDADE

Page 37: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

27

I – Problema sociológico.II – Problema social.

( ) Diz respeito a uma estratégia, delimitando um fio condutor que permite a progressão das etapas exigidas pela investigação científica.

( ) Diz respeito menos ao objetivo de encontrar soluções para os problemas do que a questão dos resultados planejados e produzidos.

( ) Diz respeito a um esforço ou trabalho social de construção coletiva voltada a chamar a atenção de autoridades e atores sociais de uma comunidade.

Agora, assinale a sequência que apresenta a alternativa CORRETA:

a) ( ) II, I e II.b) ( ) I, I e II.c) ( ) I, II e I.d) ( ) II, II e I.

Page 38: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

28

Page 39: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

29

TÓPICO 2

AS CONTRIBUIÇÕES DA

SOCIOLOGIA DA EDUCAÇÃO

UNIDADE 1

1 INTRODUÇÃO

O segundo tópico será dedicado à apresentação dos caminhos percorridos pela Sociologia da Educação como campo do saber. Nossa ambição, nesse material, é apresentar a você, prezado acadêmico, enfoques teóricos, partindo da Sociologia da Educação que contribuam para a sua formação acadêmica e futura atuação profissional. Por esta razão, apresentaremos o cenário das investigações no âmbito da educação e algumas teorias que contribuíram para a formação desse campo do saber.

2 A SOCIOLOGIA E A SOCIEDADE

Aquilo que se concebe como sociedade depende do tipo de abordagem e enfoque sociológico. Já comentamos que esta ciência não possui uma unidade teórica, nem mesmo metodológica. Seria possível, até mesmo, falar em sociologias, no plural. Isso resultou em conceitos e destaques diferenciados para caracterizar a sociedade.

Do ponto de vista da Sociologia clássica, o papel da sociedade está em direta relação com outra categoria elementar: a de indivíduo. De certa forma, essa discussão sobre a força da sociedade ou do indivíduo foi e ainda é um dos motores da Sociologia. Trata-se de uma discussão complexa, representando um dos aspectos mais importantes da Sociologia.

Em relação a esta dicotomia, segundo a Sociologia pioneira, podemos indicar a existência de duas maneiras iniciais de perceber a sociedade: uma perspectiva holista e outra, individualista. Na primeira, encontramos autores como Auguste Comte, Émile Durkheim e Karl Marx; na segunda, o exemplo é Max Weber. Mas, o que significam estes dois termos?

Primeiro, eles representam dois paradigmas. O que significa isso?

Page 40: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

UNIDADE 1 | RELAÇÕES ENTRE SOCIOLOGIA, SOCIEDADE E EDUCAÇÃO

30

Desta explicação inicial, voltamos à questão do que é a sociedade para a Sociologia clássica. Tomando esses paradigmas, podemos indicar que para Durkheim, Comte e Marx, a sociedade prevalecia sobre o indivíduo. Para Weber, no entanto, o indivíduo teria um papel ativo, percebido a partir de um enfoque individualista em que a sociedade se relacionava com os indivíduos, mas estes não eram “invisíveis”. Vamos explicar mais detalhadamente. Trata-se do paradigma holista.

O paradigma holista

Auguste Comte (1798-1857) percebia a sociedade a partir de um modelo mecânico, em que as partes dessa mecânica se encaixam e permitem o seu funcionamento. Mas uma forma mais adequada seria a de pensar a sociedade como um organismo que pode tanto ser saudável como doente. A articulação funcional dessas partes interdependentes é o que determinaria a saúde-doença das sociedades. Elas seriam constituídas por núcleos permanentes, como a família e a propriedade, que devem promover o progresso.

Entender racionalmente a sociedade implicava, na perspectiva positivista, apontar intervenções ou reformas sociais para a boa saúde do organismo ‘sociedade’. A Sociologia deveria apontar soluções para os dilemas e problemas sociais que afetavam a funcionalidade e a ordem das sociedades, que levariam à desordem, ao conflito e revolução. A Sociologia daquela época tinha uma função mais ideológica ou intervencionista. Auguste Comte pensou a aplicação dos conhecimentos positivos na resolução de conflitos e na reorganização e reforma das sociedades.

A ideia da Sociologia comteana era de intervenção social. A imagem de uma sociedade em transformação levou Comte a indicar, através de sua reflexão, formas para superar tais problemas e reorganizar a sociedade. Ele procurou conciliar, em sua proposta política de reforma social, elementos da política conservadora, como a defesa da ordem, e da corrente liberal ou progressista, como a necessidade de progresso (MARCONDES; JAPIASSU, 2001).

Um paradigma é uma categoria que nos auxilia a pensar a história e as dinâmicas da ciência. De acordo com um dos conceitos mais conhecidos, elaborado por Thomas Kuhn, ele pode ser entendido como tipos de “realizações científicas universalmente reconhecidas que, por um certo tempo, fornecem problemas e soluções-modelo para uma comunidade de profissionais” (KUHN, 1997, p. 13). Noutras palavras, os paradigmas científicos representam modelos que se tornaram referências básicas no interior de um campo da ciência. Por este caminho, o holismo e o individualismo metodológico representaram modelos para a produção do conhecimento sociológico (KUHN, 1997).

DICAS

Page 41: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

TÓPICO 2 | AS CONTRIBUIÇÕES DA SOCIOLOGIA DA EDUCAÇÃO

31

Para dar conta dessa complexidade, Comte dividiu a Sociologia em dois campos de estudo: a estática e a dinâmica social.

- A sociologia da estática social se debruça sobre a ordem e a coesão das sociedades. Procura investigar aquilo que mantém as sociedades unidas. Se interessa pelo estudo do consenso social, apontando os elementos que o determinam.

- A sociologia das dinâmicas sociais se volta para as mudanças e os progressos sociais em torno das leis gerais das sociedades. Se volta para as diversas etapas do desenvolvimento histórico, voltando-se para as causas das mudanças sociais (COMTE, 1988).

Émile Durkheim (1858-1917) foi influenciado por ideias de Comte e de sua filosofia positivista. A partir de sua sociologia, como Durkheim entendia o indivíduo e a sociedade? A pergunta que Durkheim tenta responder é sobre como é possível a sociedade? Para nos debruçarmos na sua obra e ideia de método sociológico, devemos entender que o indivíduo só pode ser explicado pela sua inserção numa sociedade. E esta prescinde do indivíduo, já que quando este nasce encontra a sociedade "pronta". Ou, conforme ressaltou Raymond Aron (1999, p. 464), "[...] o indivíduo nasce da sociedade, e não a sociedade nasce do indivíduo”. O indivíduo perde-se no interior dessa totalidade social. Ela antecede e é independente do indivíduo.

A sociedade pode ser percebida como um grande organismo social que deve funcionar corretamente. Esta ideia de organismo mostra o impacto das ciências naturais no vocabulário e linguagem da Sociologia naquele período do século XIX e início do XX. Da mesma forma, as sociedades eram realidades que podiam ser apreendidas objetivamente, empregando métodos adequados. Ou, nas palavras de Durkheim, ela "considera os fatos sociais como explicáveis naturalmente" (DURKHEIM, 2007, p. 21).

Para explicar a coesão na sociedade moderna, ele elabora a distinção entre solidariedade mecânica e orgânica. As primeiras estão ligadas às sociedades com menor divisão social do trabalho, ao passo que as segundas resultam da ampliação da interdependência social e da diferenciação.

A solidariedade mecânica é típica de sociedades mais homogêneas e que têm uma consciência coletiva mais coercitiva, exercendo maior pressão sobre o indivíduo com regras mais rígidas. Na solidariedade orgânica, a consciência coletiva é menos totalizante e mais fragmentada. A pressão sobre o indivíduo é mais difusa e as regras e normas tendem a ser mais sutis. Nestas sociedades, a divisão social do trabalho e a diferenciação entre as formas de associação e os indivíduos são mais heterogêneas.

DICAS

Page 42: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

UNIDADE 1 | RELAÇÕES ENTRE SOCIOLOGIA, SOCIEDADE E EDUCAÇÃO

32

Podemos pensar esses padrões de solidariedade relacionados às divisões mais simples ou complexas como molduras sociais, que procuram atirar o indivíduo ao seu interior, estruturando assim tanto a sociedade como a ação do indivíduo. Ela é um componente vital nas interações sociais. Através das instituições e dos fatos sociais, os padrões de solidariedade indicam o grau de pressão dos constrangimentos externos sobre o indivíduo. A solidariedade enquadra o indivíduo a uma moral.

Em seu viés positivista, Durkheim construiu uma visão evolucionista das sociedades de onde as primeiras eram estruturadas pelo clã, tribo ou hordas, formas igualitárias simples de organização e associação. A partir da maior diversidade de tarefas e funções internas, do aumento das populações, é necessária maior coordenação entre as formas de interação social. Nas sociedades modernas, este tipo de relacionamento social tendia a estimular uma maior liberdade ao indivíduo.

Karl Marx (1818-1883) nunca teve a autoconsciência de sua condição de sociólogo como tinham Comte, Durkheim e Weber. Mesmo assim é considerado um sociólogo cuja obra foi impactante na sua época, promovendo uma nova maneira de pensar as relações sociais. Marx entendeu que a sociedade prevalecia sobre os indivíduos, sendo fundamental para a ação individual. Interpretando essas relações a partir de uma dimensão econômica, ele escavou as características da nascente sociedade capitalista de sua época, investigando suas bases. Marx considerava que não se pode pensar a relação indivíduo-sociedade separadamente das condições materiais em que essas relações se apoiam. Ainda estamos, portanto, no universo do paradigma holista (ARON, 1999; TOMAZI, 1993).

Segundo Aron (1999), o pensamento de Marx é uma análise e uma compreensão da sociedade capitalista no seu funcionamento atual, na sua estrutura presente e no seu devir necessário. Em Marx, as condições materiais de toda a sociedade condicionam as demais relações sociais. Em outras palavras, para viver, os homens têm que, inicialmente, transformar a natureza, ou seja, comer, construir abrigos, fabricar utensílios etc., sem o que não poderiam existir como seres vivos. Por isso, o estudo de qualquer sociedade deveria partir justamente das relações sociais que os homens estabelecem entre si para utilizar os meios de produção e transformar a natureza (TOMAZI, 1993).

Um conceito importante para entender as bases econômicas do capitalismo é a de classe social. Segundo Marx, a sociedade capitalista estava dividida entre burgueses (proprietários dos meios de produção) e os proletários (trabalhadores assalariados). Ao comparar a sociedade capitalista com as anteriores, Marx entendeu que a história das sociedades é, também, a história da luta de classes. Assim, as condições materiais das sociedades exercem importante e decisiva força sobre a ação dos indivíduos e dos grupos sociais dentro de um determinado sistema de relações sociais (ARON, 1999; MARX, 1985).

Page 43: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

TÓPICO 2 | AS CONTRIBUIÇÕES DA SOCIOLOGIA DA EDUCAÇÃO

33

Paradigma individualista

Para Max Weber (1864-1920), o foco da Sociologia estava na relação que o indivíduo e a sua ação estabelecem com o conjunto das instituições que compõem uma sociedade (FREUND, 1987). Não haveria uma oposição entre sociedade e indivíduo, porém, a sociedade não estava acima, nem era superior ao indivíduo. Ela deveria ser percebida como o conjunto de ações dos indivíduos em situação de relações sociais, uma espécie de teia que ligava os indivíduos entre si. Aqui temos um exemplo do paradigma individualista.

A sua Sociologia dava foco ao processo de compreensão da ação social. Weber criticou a ideia da sociedade como uma ‘coisa’ que poderia ser objetivamente analisada, como sugeriu Durkheim. Para Weber, o destaque estava nas dimensões subjetivas dessas relações e intenções individuais.

A sua preocupação enquanto sociólogo estava em compreender a ação social individual. Essa ênfase no indivíduo torna sua Sociologia distinta da maneira como os nomes anteriormente estudados. Enquanto para Marx, Durkheim e Comte a Sociedade era o foco, Weber deu relevância ao papel dos valores na construção dos sentidos de uma ação, de uma escolha. Para ele, as pessoas seriam capazes de interpretar suas realidades sociais, de atribuir um “sentido subjetivo” a determinados aspectos delas e de empreender ações independentes (KALBERG 2010).

Vinculadas ao pensamento sociológico weberiano, como os tipos ideais, este alemão indicou três formas de sociedades que podiam ser encontradas ao longo da história: a tradicional, a carismática e a racional-burocrática.

Apontamos brevemente alguns sociólogos clássicos e suas abordagens a respeito da sociedade. Mas, ressaltamos que estas são atualmente pontos de partida para a reflexão. Tais olhares clássicos foram postos à crítica ou revisão pelas gerações seguintes de sociólogos. Isso porque, no caso das Ciências Sociais, e da Sociologia, a discussão epistemológica é elementar. Faz parte da própria dinâmica e reflexividade da Sociologia ocupar-se de seus sentidos, limites e dilemas. Neste sentido, aquilo que era relevante no momento do surgimento da Sociologia é, em muitos casos, algo ultrapassado, epistemologicamente criticado ou refutado. A Sociologia clássica difere, portanto, da Sociologia contemporânea.

A Sociologia desenvolvida nos seus primórdios e a das últimas décadas podem ser diferentes entre si, mas estão fortemente inter-relacionadas. As abordagens clássicas ainda orientam as reflexões sobre a sociedade. Mas, num mundo em constante movimento, receberam contribuições e críticas que renovaram ou ampliaram seus fundamentos. O olhar que os sociólogos pioneiros ou contemporâneos lançaram para a sociedade e os tipos de preocupações que orientaram sua curiosidade científica estão localizados nos quadros sociais de mudanças percebidas.

Page 44: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

UNIDADE 1 | RELAÇÕES ENTRE SOCIOLOGIA, SOCIEDADE E EDUCAÇÃO

34

As sociedades e a educação

Os autores clássicos da Sociologia se ocuparam de pensar o papel da educação no interior das sociedades. Desse pensamento clássico, podemos pensar a educação como uma atividade básica de qualquer sociedade humana. Ela diz respeito a uma questão até mesmo de sobrevivência dos grupos sociais, pois, através dela, ocorrem os necessários processos de socialização e de integração dos indivíduos nos valores e nos modos de ser, pensar e agir desses grupos (OLIVEIRA, 1998).

Atualmente, temos um processo educativo que difere substancialmente dos primeiros modelos que foram utilizados pelas sociedades humanas. De uma maneira geral, podemos dividir esses processos em educação assistemática/informal e sistemática/formal. Essa classificação se dá em razão de diferenças quanto aos recursos empregados, quanto à própria sistematização e maneira de transmissão dos conhecimentos. Indica, também, uma separação temporal, uma vez que a educação assistemática está ligada a grupos humanos mais simples e tradicionais (tribos, clãs, comunidades tradicionais etc.), ao passo que a educação sistemática se vincula à própria ideia de racionalidade moderna.

E qual é a diferença entre estes dois modelos? Segundo Pérsio Santos de Oliveira (2001, p. 164-165), a educação assistemática:

[...] é a que acontece, no correr da vida diária, pelo aprendizado das tarefas normais de cada grupo social, pela observação do comportamento dos mais velhos, pela convivência entre os membros de uma sociedade. É realizada sem qualquer plano, sem local ou hora determinada. Todas as pessoas, todos os grupos, todas as sociedades participam.

A educação sistemática, por sua vez, está vinculada às sociedades urbanas, industriais ou também conhecidas como sociedades complexas.

A divisão do trabalho e a extrema especialização exigem das crianças a passagem pela escola, onde recebem educação formal e sistemática. Esta é, portanto, a que é dada nas escolas e visa apenas a transmissão de determinados conhecimentos, técnicas ou modos de vida. É uma forma seletiva de educação. Dentro da cultura, escolhem-se certos elementos considerados essenciais ou mais necessários para serem transmitidos na escola, por pessoas especializadas (OLIVEIRA, 2001, p. 165).

Na primeira situação, as pessoas e integrantes de um determinado grupo – principalmente, as mais velhas e adultas – participam quase que integralmente dos processos educativos. Na segunda, temos a educação como algo especializado, ligado aos valores dominantes nas ciências em geral, nas dinâmicas culturais de um país e nos processos de racionalização da vida social.

A principal questão que devemos observar é que as duas formas de educação não são excludentes. A educação assistemática, todavia, foi relegada a outras instituições sociais, como a família, ao passo que a educação sistemática foi direcionada às escolas e às universidades.

DICAS

Page 45: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

TÓPICO 2 | AS CONTRIBUIÇÕES DA SOCIOLOGIA DA EDUCAÇÃO

35

3 O QUE É A SOCIOLOGIA DA EDUCAÇÃO?

Tendo como ponto de partida as teorias sociais elaboradas ao longo do tempo, podemos afirmar que a Sociologia da Educação propõe a investigação a partir de duas questões norteadoras: como a sociedade forma os cidadãos e como a escola se relaciona com a estratificação social expressando e reproduzindo as desigualdades sociais? (BERRÉRE, SEMBEL, 2006).

Caro acadêmico! Aproveite esse momento para refletir sobre as questões apresentadas observando a charge a seguir. Procure relembrar suas experiências e os relatos e análises sobre a educação a que você já teve contato. Se possível, compartilhe com seus colegas suas reflexões.

FIGURA 3 - ESCOLA, FORMAÇÃO E ESTRATIFICAÇÃO

FONTE: Disponível em: <http://www.marcelo.sabbatini.com/educacao-em-charges-2/>. Acesso em: 23 jan. 2018.

Seguindo no sentido de elucidar tais questionamentos, a Sociologia da Educação busca aliar as teorias e pesquisas elaboradas por especialistas às experiências dos atores sociais para compreender um sistema educacional cada vez mais complexo (BERRÉRE, SEMBEL, 2006).

Nesse sentido, também podemos afirmar que a Sociologia da Educação propõe a investigação da educação enquanto instituição e como processo educativo presente em todas as sociedades. A perspectiva da educação enquanto instituição se deve à sua constituição enquanto necessidade e atividade humana. Nesse sentido, constitui um conjunto de normas, regras, valores e atitudes que

Page 46: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

UNIDADE 1 | RELAÇÕES ENTRE SOCIOLOGIA, SOCIEDADE E EDUCAÇÃO

36

compõem a estrutura social. Enquanto processo educativo, por sua vez, representa o caráter não institucionalizado da educação que toma espaço nas diferentes sociedades (BONETI, 2008).

Se, por um lado, a educação é um campo de estudo da Sociologia, não podemos esquecer o que a Sociologia representa para a educação. Na medida em que os estudos e teorias elaborados nessa área do saber nos permitem compreender a educação como fenômeno social e elucidar as relações entre educação e sociedade (BONETI, 2008).

Caro acadêmico! Como mostramos acima, não há uma única forma de investigar a natureza das relações entre educação e sociedade e, por consequência, não encontraremos uma única teoria que dá conta de todos os desdobramentos dessa relação.

Para pensar a educação no contexto da sociedade moderna e da produção teórica da Sociologia, precisamos ter em mente que os processos culturais colocam sob a responsabilidade das ciências as explicações para o mundo. A educação passa a deixar de lado valores religiosos e refletir valores baseados na ciência (NERY, 2013).

No desenvolvimento da sociedade industrial, a escola passa a ser responsabilidade da escola. Desloca-se o centro da educação da família e da igreja (sociedade feudal) para a escola (sociedade capitalista). Transformam-se os atores pedagógicos e a estrutura de ensino para formar um número cada vez maior de indivíduos. A escola passa a preparar o indivíduo para se adequar ao sistema social (NERY, 2013).

Para aprofundar seus estudos sobre essa temática, faça a leitura complementar do Tópico 2: Relação entre o nascer de uma ciência e de uma instituição social e as mudanças na estrutura social.

IMPORTANTE

Ao longo da história da Sociologia nos deparamos com diferentes propostas teórico-metodológicas que elucidaram aspectos relevantes da relação entre educação e sociedade. Apresentaremos a seguir exemplos de teorias que abordaram aspectos da relação educação e sociedade.

Page 47: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

TÓPICO 2 | AS CONTRIBUIÇÕES DA SOCIOLOGIA DA EDUCAÇÃO

37

A proposta aqui não é esgotar as teorias sobre sociedade e educação, mas apresentar a você reflexões que instiguem outros olhares sobre a educação a partir da perspectiva sociológica.

IMPORTANTE

De modo geral, quando se busca estabelecer certo ordenamento nas teorias sociais que se debruçam sobre a educação, inicialmente nos deparamos com as elaborações de Émile Durkheim. Ao propor uma análise da sociedade a partir do conceito de fatos sociais (e do método positivista), ele nos mostrou a educação como socialização. Para Durkheim, a educação é responsável pela socialização, processo pelo qual os mais jovens aprendem normas, costumes e valores que os permitirão o convívio social, ou seja, a sociedade determina o comportamento do indivíduo, e a educação – como socialização – contribui para essa determinação.

A educação, nessa concepção, garante o vínculo social que estabelecemos com outros sujeitos.

É isso que permite viver em sociedade, é isso que permite que a sociedade viva em nós e é isso que permite à sociedade continuar viva: sermos iguais e diferentes ao mesmo tempo. Só a educação pela qual passamos é capaz de nos fazer assim. E é por isso que a educação é um processo social (RODRIGUES, 2007, p. 29).

A contribuição de Karl Marx para elucidar a relação entre educação e sociedade remete às questões ligadas aos condicionantes das relações sociais no desenvolvimento do capitalismo e a formação (e lutas) das classes sociais. Ao desenvolver sua teoria, Marx nos apresenta o trabalho como elemento central para compreender as relações sociais e a formação das classes sociais e, consequentemente, da desigualdade entre as classes, e mostra como as relações entre os homens se dão a partir da ideologia. A ideologia dominante garante a manutenção do sistema social.

Na sociedade descrita por Marx a educação não é um processo único, na medida em que é influenciada pela luta de classes. Isso significa que a educação da classe dominante é diferente da educação oferecida à classe dominada – aos filhos dos trabalhadores. Como nos mostra Rodrigues (2007, p. 42), para Marx e Friedrich Engels, não há uma educação geral: “Conforme o conteúdo de classe ao qual estiver exposta, ela pode ser uma educação para a alienação ou uma educação para a emancipação”.

Max Weber, por sua vez, apresentou uma premissa diferente da determinação social sobre o indivíduo proposta por Durkheim e Marx. Weber

Page 48: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

UNIDADE 1 | RELAÇÕES ENTRE SOCIOLOGIA, SOCIEDADE E EDUCAÇÃO

38

elaborou sua teoria social considerando que a sociedade não é algo exterior ao indivíduo, mas que é formada no contexto das interações entre os indivíduos. Logo, sua sociologia buscou compreender o sentido da ação social.

Na sociologia weberiana a educação pode ser entendida no processo de racionalização e de burocratização da sociedade:

[…] a racionalização e a burocratização alteraram radicalmente os modos de educar. E alteraram também o status, o reconhecimento e o acesso a bens materiais por parte dos indivíduos que se submetem à educação sistemática. Educar no sentido da racionalização passou a ser fundamental para o Estado, porque ele precisa de um direito racional e de uma burocracia montada em moldes racionais. Educar no sentido da racionalização também passou a ser fundamental para a empresa capitalista, pois ela se pauta pela lógica do lucro, do cálculo de custos e benefícios, e precisa de profissionais treinados para isso (RODRIGUES, 2007, p. 65).

No século XX se desenvolveram uma série de explicações impulsionadas pelas transformações sociais que buscaram compreender novas formas de organização do sistema escolar e, também, atualizar o pensamento elaborado pelos autores clássicos no passado.

No contexto social do pós-guerra ganham destaque as contribuições dos funcionalistas, especialmente de Talcott Parsons, entre as décadas de 1950 e 1960. Objetivando identificar o fundamento de uma nova ordem social, ele analisou as variáveis que condicionariam o funcionamento dos sistemas escolares (SPOSITO, 2003).

A partir dos anos 1960 desenvolveu-se um conjunto de análises críticas que, mais tarde, ficaram conhecidas como Sociologia da Educação. Nesse cenário ganharam destaque as obras de Pierre Bourdieu e Louis Althusser.

Bourdieu se dedicou a compreender a educação, inicialmente, a partir da teoria de Durkheim e do estruturalismo e, posteriormente, incorporando contribuições marxistas e weberianas. Podemos destacar nas análises de Bourdieu a noção de violência simbólica como imposição da concepção cultural das classes dominantes sobre toda a sociedade através da educação.

Nesse sentido, a educação – ensino institucionalizado – representa um processo que molda os indivíduos para a reprodução das condições que mantêm as classes dominantes no poder, pois

Na medida em que o educando interioriza os princípios culturais que lhe são impostos pelo sistema de ensino – de tal modo que, ao mesmo depois de ter terminada sua formação escolar, ele os tenha incorporado aos seus próprios valores e seja capaz de transmiti-los aos demais – Bourdieu diz que ele adquiriu um habitus (RODRIGUES, 2007, p. 74).

Page 49: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

TÓPICO 2 | AS CONTRIBUIÇÕES DA SOCIOLOGIA DA EDUCAÇÃO

39

A abordagem de Althusser foi elaborada por uma perspectiva do marxismo estruturalista buscando demonstrar como as desigualdades sociais vivenciadas no capitalismo se expressam também nas escolas e conformam desigualdades escolares (SPOSITO, 2003).

Outras análises que ganharam destaque no universo da Sociologia da Educação foram as elaboradas por Antônio Gramsci, ao desenvolver a atualização do pensamento marxista ao capitalismo europeu do século XX. Sua análise propõe uma compreensão do poder para além do Estado, afirmando que nas sociedades ocidentais o poder está presente na trama das relações sociais.

Tendo em vista a presença do poder na multiplicidade das relações sociais, considera a necessidade de promover a transformação social através da transformação no campo das ideias. Essa transformação se dá na luta pela hegemonia, na qual lutam os que procuram manter a ordem social estabelecida e aqueles que buscam estabelecer uma nova hegemonia.

Na luta pela hegemonia agem os intelectuais, divididos por ele em intelectuais orgânicos e intelectuais tradicionais, que contribuem para a manutenção da estrutura social e das relações de poder. Esses intelectuais são formados nas escolas:

Quer dizer, para vir a ser um dia um intelectual orgânico ou um intelectual tradicional e desempenhar funções de organização da cultura, o indivíduo precisa passar por uma formação escolar que lhe dê acesso especial a esta cultura. Daí que Gramsci tem se preocupado com as características do sistema escolar de seu tempo (RODRIGUES, 2007, p. 78).

Enquanto Gramsci desenvolveu seu pensamento a partir da teoria de Marx, Karl Mannheim desenvolveu suas explicações a partir da teoria de Max Weber. Essas explicações foram elaboradas tendo como ponto de partida os tipos de educação de Weber na busca pela compreensão do pensamento das pessoas. Em sua concepção, se, por um lado, o excesso de racionalidade levou a uma espécie de crise no sistema educacional, por outro, a democratização permitiu a expansão de novas ideias.

Apontou através de seus estudos a centralidade da Sociologia para a compreensão da educação, na medida em que se desenvolveu o processo de racionalização da vida e da necessidade de um processo educacional em que os sujeitos estejam conscientes do contexto social que os cerca:

Portanto, para este autor, nem os objetivos do processo educacional nem as metas que ele visa podem ser concebidos sem a consideração do contexto social, pois eles são socialmente orientados. As perguntas que a Sociologia obriga a fazer, lembra ele, são, portanto: Quem ensina quem?; Para qual sociedade?; Quando e como ensina? (RODRIGUES, 2007, p. 82).

Page 50: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

UNIDADE 1 | RELAÇÕES ENTRE SOCIOLOGIA, SOCIEDADE E EDUCAÇÃO

40

Nos anos de 1970, um novo conjunto de teorias marca uma nova fase na Sociologia da Educação. Nesse contexto podemos destacar a Nova Sociologia da Educação na Inglaterra, através dos estudos sobre currículo e linguagem desenvolvidos por Michael Young e Basil Bernstein. Ao longo dos anos de 1980 ganharam espaço as análises interacionistas e etnográficas, dando ênfase para as características dos métodos de ensino e aprendizagem, a seleção dos conteúdos e as formas de interação nas salas de aula, as relações de poder que, para além das desigualdades estruturais, incorporam aspectos étnicos e de gênero (SPOSITO, 2003).

Prezado acadêmico! Esse panorama dos estudos da Sociologia da Educação pode parecer confuso em uma primeira leitura, mas fique tranquilo. Essas teorias serão apresentadas com maior detalhamento nas Unidades 2 e 3 deste material, afinal, buscamos aqui apresentar a você, de forma sintética, as diferentes possibilidades de compreensão da educação através da Sociologia.

Na Unidade 2 abordaremos essas teorias com maior profundidade, bem como apresentaremos outras contribuições teóricas da Sociologia da Educação.

ESTUDOS FUTUROS

LEITURA COMPLEMENTAR

Relação entre o nascer de uma ciência e de uma instituição social e as mudanças na estrutura social

Para pensarmos a Sociologia da Educação, devemos pensar e compreender o contexto histórico e fundamental da Sociologia como ciência. Esta surgiu no século XIX, como uma resposta intelectual para os problemas que a sociedade estava apresentando. Nesse sentido, temos elementos importantes para considerar. Um deles é, justamente, a significação do século XVIII para o surgimento da Sociologia como ciência. Esse século é o período em que temos a presença de uma dupla revolução: a Revolução Industrial, de caráter econômico e social, e a Revolução Francesa, de caráter eminentemente político, por meio da qual a burguesia, como classe social, toma o poder na França e expande-se para todo o mundo, internalizando-se.

Outro elemento a considerar é que os processos dessas duas revoluções são significativos, porque foram a força motriz da consolidação do modo de produção capitalista, que tem como característica básica a posse privada dos meios de produção. Afirma Meksenas (2005, p. 29):

Page 51: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

TÓPICO 2 | AS CONTRIBUIÇÕES DA SOCIOLOGIA DA EDUCAÇÃO

41

Esse modo de produção que se originou do comércio e da manufatura foi responsável pelo desenvolvimento de novas invenções, técnicas, aumento das atividades produtivas, dando origem à moderna indústria. A intensa urbanização do nosso século é fruto desse processo e o aparecimento de classes sociais também o é. Agora, sob a sociedade capitalista, a fonte de riquezas não é mais a terra, mas sim a propriedade de fábricas, máquinas, bancos, isto é, a propriedade dos meios de produção. Assim, os poucos proprietários dos meios de produção se constituem na classe empresarial (burguesia) enquanto uma imensa maioria de pessoas não proprietárias se constitui na classe trabalhadora (proletariado), que, para sobreviver, troca sua capacidade de trabalho por salário.

Ou seja, tudo o que uma sociedade necessita para produzir seus bens é controle privado, posse particular de uma minoria – os detentores dos meios de produção. Esse aspecto é de fundamental importância, na medida em que essa transformação no contexto das sociedades contemporâneas, principalmente das sociedades do mundo ocidental, fez com que a sociedade se tornasse um problema, existindo muitas questões de ordem social para serem resolvidas. Então, no século XIX surge a Sociologia como uma resposta intelectual para os problemas que a sociedade estava a apresentar.

Temos assim, a partir do século XIX, notadamente em 1839, ano em que Augusto Comte nomeou sociologia a então física social, o surgimento de uma ciência com objeto e métodos de investigação, que buscaria responder às principais questões que se apresentavam no universo social da época. Era uma sociedade marcada por contradições, consequentemente por crises de caráter econômico, político e também cultural; era uma sociedade em que se percebia a vigência do conflito. Outro não poderia ser o contexto de surgimento da Sociologia, como dissemos anteriormente.

Podemos verificar que a Sociologia, em seu primeiro momento, tinha um caráter conservador, na medida em que se encontrava preocupada com a ordem que se perde com o advento do modo de produção capitalista. Nesse sentido, a grande preocupação era com o restabelecimento da antiga ordem. Segundo Meksenas (2005, p. 29, podemos afirmar que a Sociologia é fruto de uma época, de uma nova organização social, de uma transformação social. A nova ordem social está instaurada; portanto, é necessário ser explicada, entendida.

FONTE: NERY, Maria Clara Ramos. Sociologia da educação. Curitiba: InterSaberes, 2013, s.p.

Page 52: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

42

RESUMO DO TÓPICO 2

Neste tópico você aprendeu que:

• A sociedade e suas formas de estratificação e classificação social foram objetos da Sociologia desde o surgimento desta disciplina. Essa preocupação era a central na reflexão dos clássicos, como Comte, Marx e Durkheim, que pensaram a sociedade dentro de um paradigma holista, e Weber, que é um exemplo de paradigma individualista.

• Para Comte, Marx e Durkheim, a sociedade prevalecia sobre os indivíduos, que determinavam os comportamentos, ações, normas e punições para os transgressores. No outro polo, Weber indicou sua preocupação para o indivíduo e sua ação dotada de sentido, prevalecendo o indivíduo sobre a sociedade.

• Do ponto de vista clássico da Sociologia, podemos pensar a relação entre sociedade e educação como sendo assistemática e sistemática. A primeira forma se liga às sociedades mais simples, ao passo que a sistemática se vincula ao próprio surgimento das escolas.

• As teorias produzidas a partir da Sociologia da Educação procuram investigar a educação enquanto instituição e a educação enquanto processo educativo.

• As contribuições das teorias clássicas permitiram o desenvolvimento das análises sobre educação. A teoria social de Émile Durkheim foi fundamental para o desenvolvimento da Sociologia da Educação ao compreender a educação como socialização. As contribuições de Karl Marx nos mostraram como a educação é influenciada pelos condicionantes do capitalismo, como a luta de classes. E Max Weber apresentou em sua teoria a educação no contexto da burocratização e racionalização da sociedade.

• Nas abordagens contemporâneas podemos destacar as teorias de Pierre Bourdieu com a noção de reprodução social, de Louis Althusser e sua análise das influências das desigualdades sociais, de Antônio Gramsci com as análises do poder nas relações sociais e de Karl Mannheim com o desenvolvimento da racionalização e da burocracia.

Page 53: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

43

1 A Sociologia da Educação representa um conjunto de teorias que, ao explicar questões referentes à sociedade, elucidaram aspectos importantes da educação. Entre as teorias mais conhecidas estão as teorias clássicas de Durkheim, Marx e Weber e uma diversidade de autores contemporâneos que procuraram atualizar as teorias clássicas, como Gramsci, Althusser e Mannheim. Considerando essas teorias, assinale as sentenças com V para as verdadeiras e F para as falsas.

( ) Gramsci procurou compreender o funcionamento dos sistemas escolares.( ) Durkheim se dedicou às análises da educação como socialização.( ) Althusser buscou demonstrar a influência das desigualdades sociais na

educação.( ) Marx mostrou a presença da racionalização e burocratização na educação.

Agora assinale a alternativa que representa a sequência correta:

a) ( ) V – V – F – V.b) ( ) F – F – V – V.c) ( ) V – V – F – F.d) ( ) F – V – V – F.

2 Os conhecimentos produzidos a partir da perspectiva da Sociologia da Educação partem de diferentes proposições, pois não há uma única teoria ou metodologia que seja capaz de abarcar todas as dimensões dos fenômenos sociais ligados à educação, tampouco seja capaz de realizar todos os questionamentos referentes a esse universo. Entre as possibilidades de investigação, podemos destacar aquelas que se dedicam a compreender a educação enquanto instituição e aquelas que se dedicam a compreender a educação como processo educativo integrado à sociedade. Partindo das proposições desses conjuntos de investigação, analise as sentenças a seguir:

I – Educação enquanto instituição remente a aspectos da necessidade e atividade humana.II – Enquanto instituição, a educação compõe uma esfera independente da estrutura social.III – A educação como atividade humana representa a presença de processos educativos em espaços diversos da sociedade.IV – Como atividade humana, a educação é responsável pela transmissão de um conjunto de normas, valores e atitudes.

Agora assinale a alternativa que representa a sequência correta:

AUTOATIVIDADE

Page 54: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

44

a) ( ) As sentenças I, III e IV estão corretas.b) ( ) As sentenças III e IV estão corretas.c) ( ) As sentenças II e III estão corretas.d) ( ) As sentenças I, II e III estão corretas.

3 A Sociologia Clássica abordou como problema sociológico central as relações macro entre indivíduo e sociedade. Podemos apontar o paradigma holista, que incluiu autores como Comte, Marx e Durkheim. A respeito da visão destes autores da sociedade, associe os itens, utilizando o código a seguir:

I – Auguste Comte.II – Karl Marx.III – Émile Durkheim.

( ) Este sociólogo clássico construiu uma visão evolucionista das sociedades, de onde as primeiras eram estruturadas pelo clã, tribo ou hordas, formas igualitárias simples de organização e associação.

( ) Este sociólogo clássico percebia a sociedade a partir de um modelo mecânico, onde as partes dela se encaixam e permitem o seu funcionamento, sendo como um organismo que pode tanto ser saudável como doente.

( ) Este sociólogo clássico considerava que não se pode pensar a relação indivíduo-sociedade separadamente das condições materiais em que vivem, sendo que estas condicionam as relações sociais.

Assinale a alternativa que apresenta a sequência CORRETA:

a) ( ) II, I e III.b) ( ) III, I e II.c) ( ) III, II e I.d) ( ) I, III e II.

Page 55: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

45

TÓPICO 3

OS DESDOBRAMENTOS DAS CONTRIBUIÇÕES DA

SOCIOLOGIA DA EDUCAÇÃO NA COMPREENSÃO

DOS SUJEITOS E DA CULTURA NA EDUCAÇÃO

UNIDADE 1

1 INTRODUÇÃO

Neste tópico nos dedicaremos à compreensão de aspectos relevantes para a análise da sala de aula e dos sujeitos da educação através das abordagens da Sociologia da Educação. Com destaque para a percepção da diversidade de relações vivenciadas no espaço da sala de aula e da relevância de observarmos o espaço físico como representação das relações sociais e espaço de interações e contradições.

Outra temática apresentada nesse tópico diz respeito aos desdobramentos da Sociologia da Educação em relação à compreensão das interfaces entre cultura e educação. Buscamos, assim, resgatar as noções de cultura para, através delas, compreender as relações e desafios que envolvem os sujeitos na escola e nos processos educativos mais amplos, como a socialização.

2 SALA DE AULA E SUJEITOS DA EDUCAÇÃO

Por que dedicamos nosso olhar e nossas análises ao espaço da sala de aula? Quando analisamos as vivências no interior das salas de aula, podemos vislumbrar como se dão as relações entre alunos e professores, como essas relações são influenciadas pelo mundo exterior: pela organização escolar, pela gestão, pelas políticas públicas, pela estrutura social, entre outros. Na sala de aula se conformam expectativas e se desenvolvem ações a partir do relacionamento entre os alunos da turma e entre alunos e professores.

Os estudos que passaram a considerar as relações entre alunos e professores trazendo luz para os alunos enquanto sujeitos remetem à década de 1950. No período, o desenvolvimento teórico foi dedicado à compreensão dessas relações para além das formas institucionalizadas. Em outras palavras, a relação entre professores e alunos vai além do processo de ensino e aprendizagem. Nesse contexto ganhou espaço a concepção de que questões externas à escola exercem influência sobre as relações desenvolvidas dentro desse espaço.

Page 56: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

46

UNIDADE 1 | RELAÇÕES ENTRE SOCIOLOGIA, SOCIEDADE E EDUCAÇÃO

Esse cenário permitiu o desenvolvimento de investigações tendo o aluno como objeto, contemplando a noção de que não se nasce aluno, mas torna-se aluno. E, afinal das contas, o que isso significa? Através desses estudos foi possível compreender três pressupostos, vamos a eles?

Em primeiro lugar, a diferenciação entre ensino e aprendizagem e o uso da noção de trabalho escolar como aquele que é realizado por crianças e jovens; em segundo, a mudança na forma de compreender a relação de expectativas entre alunos e professores, pois o trabalho do aluno vai além das exigências presentes nas regras institucionais e o reconhecimento das percepções dos alunos formadas em outras formas de socialização, como a família, e a influência de questões sociais, étnicas e de gênero; e, por fim, o reconhecimento da infância e adolescência como fases específicas no ciclo da vida e dos estudos desenvolvidos sobre essas etapas específicas (SPOSITO, 2003).

Prezado acadêmico! Você já deve ter se deparado em algum momento com uma história de sucesso envolvendo um professor e/ou gestor que foi capaz de transformar a realidade de um aluno, de uma escola ou até de uma comunidade através da educação, certo?

Vamos conhecer um desses exemplos?

A Escola da Ponte

"A escola não é um edifício, são as pessoas", diz idealizador da Escola da Ponte

A aprendizagem não depende de edifício, salas de aula, quadro ou giz. Não precisa sequer de aulas no modelo tradicional. A escola é feita de pessoas e é nessas pessoas que todo o sistema de educação deve focar. Este conceito educacional, que mais parece utopia, vem sendo colocado em prática em escolas no Brasil e no restante do mundo. O professor José Francisco de Almeida Pacheco é um dos que mostrou que é possível educar de maneira inovadora e inclusive melhorar indicadores educacionais com esses métodos. Ele é o idealizador da chamada Escola da Ponte, em Portugal, um projeto educacional que tem como base uma escola sem séries, sem prova e focada na autonomia e protagonismo do aluno. Pacheco é português, mas acredita que é do Brasil que partirão as ideias que poderão transformar a educação no mundo.

[…]

Agência Brasil: O que é necessário para se ter uma educação de qualidade?

José Pacheco: O que é preciso é acesso à informação e um mediador chamado professor. Quando falamos em escola pensamos no edifício, a escola não é um edifício, a escola são as pessoas. O que uma criança em idade escolar aprende dentro do edifício da escola que não pode aprender fora dela? Não perca muito tempo pensando. Nada. No Brasil,

UNI

Page 57: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

TÓPICO 3 | OS DESDOBRAMENTOS DAS CONT. DA SOC. DA EDU. NA COMP. DOS SUJEITOS E DA CULTURA NA EDUCAÇÃO

47

As transformações que levaram à construção da história de sucesso da Escola da Ponte são muitas, porém aqui vamos atentar para um elemento entre elas: a organização da escola e da sala de aula. Isso mesmo, a organização do espaço físico da escola. O ambiente escolar exerce influência significativa sobre o processo de ensino e aprendizagem.

Alguns aspectos merecem destaque quando nos dedicamos a compreender a sala de aula como objeto de estudo. Iniciamos com a organização da classe. Caro acadêmico! Você já observou uma sala de aula considerando a seguinte questão: Esse espaço promove autonomia ou opressão?

Como nos mostra Esteban (2006, p. 8), existe a idealização de um modelo de sala aula.

Uma dentre tantas possíveis, que escolho por me parecer expressão do que, com muita frequência, se apresenta como sala de aula desejável. Lugar de ordem, portanto, com papéis e processos definidos no qual transitam professores, professoras, que ensinam, e alunos, alunas que aprendem.

Essa descrição remete a um retrato comum quando imaginamos uma sala de aula. Porém, será esse o único modelo possível? Será esse o retrato cotidiano das salas de aula Brasil afora? Se parece com o retrato das salas de aula pelas quais você, acadêmico, passou ao longo de sua vida escolar? A descrição da ordem da sala com papéis definidos é usualmente o padrão considerado ideal, mas deixa escapar inúmeras representações reais das vivências escolares.

Observe com atenção as imagens a seguir. A disposição das carteiras, o lugar dos alunos e o lugar do professor incentivam o desenvolvimento da autonomia? Ou contribuem para um contexto de opressão?

o [antropólogo e educador] Tião Rocha fez uma escola debaixo de uma mangueira, que nem edifício tem. Há cursos a distância, que nem edifício têm. Então, por que temos que pensar que todos têm que ir para lá? Pior do que isso, em muitas áreas rurais fecham-se escolas e os alunos levantam-se às 4 horas da manhã, com sono, para entrar no ônibus, para andar três horas, por caminho de terra, para receber quatro horas de aula e voltar. A fortuna que se gasta em compra, com manutenção, combustível,  seguro, pagamento ao motorista etc., às vezes, leva quase metade do orçamento da educação.

Leia a entrevista na íntegra no portal Agência Brasil.

Fonte: Agência Brasil. Disponível em: <http://agenciabrasil.ebc.com.br/educacao/noti-cia/2016-04/escola-nao-e-um-edificio-sao-pessoas-diz-idealizador-da-escola-da-ponte>. Acesso em: 8 jan. 2018.

Page 58: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

48

UNIDADE 1 | RELAÇÕES ENTRE SOCIOLOGIA, SOCIEDADE E EDUCAÇÃO

FIGURA 4 - DIFERENTES FORMAS DE ORGANIZAÇÃO DAS CARTEIRAS NA SALA DE AULA

FONTE: Disponível em: <http://portaldoprofessor.mec.gov.br/fichaTecnicaAula.html?aula=20281>. Acesso em: 8 jan. 2018.

Nas imagens acima podemos identificar padrões diferentes. O padrão em que as carteiras estão dispostas em fileiras e o padrão em que as carteiras estão organizadas em grupos ou em um semicírculo (ou formato em U).

O padrão com a disposição em fileiras e o professor em posição de destaque em relação aos alunos é o padrão mais comum em nossas salas de aula. Com essa disposição se constrói uma visão de unidade e ordem, se delimita o foco de atenção da turma no professor e se espera que os alunos sigam nessa posição e atentos ao professor.

Page 59: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

TÓPICO 3 | OS DESDOBRAMENTOS DAS CONT. DA SOC. DA EDU. NA COMP. DOS SUJEITOS E DA CULTURA NA EDUCAÇÃO

49

Dentro dessa organização tradicional, geralmente se espera que os alunos permaneçam imóveis em suas carteiras, realizando individualmente o trabalho que lhes é imposto pelo professor. Esse pode movimentar-se pela sala de aula, entre as fileiras, controlando e supervisionando os alunos. Essa organização física da sala de aula resulta de uma concepção de educação centralizada no professor - um ser superior, investido de autoridade, a quem cabe tomar as decisões e impor um sistema de trabalho. Aos alunos cabe ouvir o professor, fazer o que lhes é exigido e, nas provas, devolver a matéria exatamente como a receberam. O resultado parece ser o individualismo, a passividade e a submissão dos alunos (PILETTI, 2004, p. 11).

São diversos os elementos que dificultam o desenvolvimento da autonomia e do pensamento crítico dos alunos nesse cenário. A necessidade de permanecerem imóveis e na posição de ouvintes desencoraja a construção de um diálogo com o professor e com os colegas, elemento que contribui para a construção do conhecimento e para a valorização dos saberes dos alunos.

O foco no desenvolvimento de atividades individuais e autoridade do professor como detentor único do saber leva, em diversas situações, à construção de obstáculos para o desenvolvimento da solidariedade e da criatividade.

A repetição dos conteúdos exatamente da forma como foram passados não contribui para o desenvolvimento de competências e habilidades necessárias para seu desenvolvimento pessoal e – futuramente – profissional.

Considerando as características expostas acima, identificamos formas amplamente utilizadas na rotina das escolas que representam práticas contraditórias aos objetivos propostos nas políticas públicas e nos projetos político-pedagógicos (PPP) de cada escola. Nos textos das políticas e dos PPP destacam-se o desenvolvimento da autonomia, da criticidade, da capacidade de trabalhar em grupo, da valorização dos saberes dos alunos e da valorização das especificidades da comunidade, porém as práticas pedagógicas que se desenvolvem no cotidiano de grande parte das escolas contribuem para a formação de sujeitos bem diferentes do proposto em seus objetivos.

Contudo, a disposição em fileiras não é a única forma possível de organizar o espaço físico da sala de aula. Nas imagens mostradas anteriormente identificamos o segundo tipo de distribuição das carteiras, seja em grupos ou em semicírculo, contribuem para mudar a relação entre os alunos – incentivando a cooperação e o diálogo – e entre alunos e professor – que passa a circular entre os alunos numa posição que contribui para a representação do papel de orientador.

Essas duas disposições espaciais de sala de aula, em vez de reprimir, estimulam a comunicação entre os alunos, o trabalho cooperativo e a participação do professor de igual para igual com os educandos, como alguém que, tendo mais experiência, pode orientar a aprendizagem. Aqui os objetivos da educação parecem ser a solidariedade, a participação e a independência dos alunos. Mais do que a unidade de pontos de vista, que coincide com o ponto de vista do professor e é análoga à unidade física da sala de aula, organizações alternativas aqui propostas favorecem o desenvolvimento da pluralidade de ideias, da discussão, da compreensão do aluno como sujeito da própria educação (PILETTI, 2004, p. 11-12).

Page 60: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

50

UNIDADE 1 | RELAÇÕES ENTRE SOCIOLOGIA, SOCIEDADE E EDUCAÇÃO

Destacamos aqui a relevância de observar o espaço da sala de aula como o espaço de expressão das relações sociais. Compreendendo que não são apenas carteiras, fileiras ou posições, mas são representações das expectativas em relação ao papel que deverá ser desenvolvido por cada sujeito enquanto estiver na escola. Dessa forma, a organização da sala de aula pode contribuir para a consolidação de práticas de caráter opressor ou para desenvolver a autonomia, o pensamento crítico e a solidariedade.

Um segundo elemento que devemos considerar quando falamos sobre a sala de aula é o tempo. A divisão do tempo se expressa de variadas formas no contexto escolar, desde o calendário escolar ao tempo destinado às atividades propostas pelo professor.

O calendário escolar define os dias letivos, as férias, os bimestres/trimestres/semestres. Cada escola organiza a distribuição das atividades nos dias letivos: turnos (matutino, vespertino, noturno, integral), tempo das aulas (sem troca de professor ou com troca de professor), tempo de recreio (tempo dentro e fora da sala de aula). Cada professor organiza o tempo para o desenvolvimento de cada atividade dentro da sala de aula. Ou seja, cria-se uma rotina escolar.

Tantas divisões de períodos em parte de tempo distintos e dedicados a atividades diversas podem acarretar uma certa rotinização do trabalho escolar. Este torna-se mais ou menos automático, tanto para o professor quanto para os alunos, e o resultado parece ser um excesso de formalismo em que a aprendizagem e a formação das pessoas, objetivos primeiros da atividade escolar, são deixados em segundo plano. Resta a impressão de que se dá mais importância ao cumprimento dos ritos estabelecidos – horários de entrada e saída, pontos a serem ensinados, posição dos alunos na sala, etc. – do que à educação propriamente dita (PILETTI, 2004, p. 13).

Nesse cenário é imprescindível estarmos atentos para essas palavras de Piletti (2004): a rotina é capaz de se sobrepor à educação. O risco de naturalizar esses processos é deixar o propósito de estar em sala de aula de lado. O objetivo da escola e, consequentemente, o por que estar em sala de aula é a educação, é a construção do conhecimento. Não se fala aqui em ignorar a rotina ou a organização dos processos escolares, mas sim de estar atento para que o foco siga na educação, no processo de ensino e aprendizagem.

Outro motivo para dedicarmos atenção em relação à rotinização do trabalho escolar é à liberdade do professor.

Essa rotinização e essa ritualização das atividades de sala de aula podem chegar ao ponto de tolher toda e qualquer liberdade dos alunos e do próprio professor. Este já recebe a matéria apostilada, com seus respectivos exercícios, tudo planejado para o tempo de aula, 45 ou 50 minutos. Ou limita-se a reproduzir, muitas vezes em forma de ditado, a matéria tal qual está no livro didático. A discussão de dúvidas ou de outros assuntos trazidos pelos alunos acarreta “perda de tempo” com o consequente término do período de aula sem que a matéria apostilada ou do manual tenha sido transmitida integralmente.

Page 61: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

TÓPICO 3 | OS DESDOBRAMENTOS DAS CONT. DA SOC. DA EDU. NA COMP. DOS SUJEITOS E DA CULTURA NA EDUCAÇÃO

51

O professor é advertido para o fato de não cumprir o programa. Nestes exemplos, verifica-se a ritualização completa do ensino: o professor é transformado em “maquininha de ensinar”, que atua por controle remoto, e os alunos são tratados como meros receptores de informações. A educação, enquanto formação humana, não tem vez na escola (PILETTI, 2004, p. 13).

Vamos destacar aqui que o risco de transformar a educação em uma forma de opressão não está somente na organização da disposição da sala de aula, mas também da submissão de alunos e professores ao tempo. É preciso seguir à risca o plano da aula nos 45 ou 50 minutos previstos, é preciso “vencer” o conteúdo proposto no plano de curso. Com esses objetivos tão claros, corre-se o risco de perder pelo caminho momentos importantes de aprendizado ao sanar dúvidas, ao trocar experiências, ao buscar compreender o tempo dos alunos e da turma. Mais uma vez, é preciso estar atento para que o foco siga na educação.

Por que dedicamos nossos olhares e atenção a esses elementos presentes na sala de aula? Porque é na sala de aula, no contexto descrito até aqui, que se desenvolvem diversas relações sociais. Vamos refletir agora sobre as relações entre os sujeitos que estão dispostos na organização das carteiras? Considerar os diálogos que ocorrem, ou não, nos tempos determinados pela rotina escolar?

Pois bem, podemos levantar mais uma questão sobre o espaço da sala de aula: qual espaço ocupa a diversidade entre espaços e rotinas tão bem delimitados? Aqui chegamos a outro aspecto da educação revelado pela sala de aula: a normatização da diferença.

Atentemos para as palavras de Esteban (2006, p. 8):

Na sala de aula há, necessariamente, diálogos entre os diferentes com suas diferenças. Diálogos atravessados por consensos, confrontos, acordos, conflitos. Diálogos buscados; diálogos que não se deseja travar, diálogos que se prefere esquecer; diálogos que as palavras não são capazes de mediar; diálogos interrompidos/constituídos por intensos ruídos, por longos silêncios, por breves olhares, por gestos contraditórios. Diálogos monológicos e assim tecidos por muitos outros diálogos.

A descrição da autora sobre a diversidade de diálogos nos leva a refletir sobre as formas de naturalizar comportamentos considerados normais ou, ainda esperados, e, por consequência, constituir um processo educacional que ao normatizar a diferença exclui sujeitos, práticas, culturas. A normatização pode levar ao desenvolvimento de tensões e conflitos na sala de aula. Nesse ponto chegamos a situações que ganham contornos opostos aos esperados em um ambiente que deveria promover o aprendizado de todos:

Page 62: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

52

UNIDADE 1 | RELAÇÕES ENTRE SOCIOLOGIA, SOCIEDADE E EDUCAÇÃO

Ainda nesses casos observamos a representação negativa da diferença. Nas salas de aula a diferença é vista como algo a ser retificado, normatizado, ou seja, algo que não cabe no espaço escolar: “a diferença adquire um valor negativo, devendo, portanto, ser eliminada para proporcionar um desenvolvimento satisfatório dos sujeitos e suas relações, necessário à aprendizagem dos conteúdos escolares, em especial daqueles que configuram o currículo oculto” (ESTEBAN, 2006, p. 9).

A escola também precisa ser entendida no contexto do trabalho. Vamos

retomar a discussão apresentada no Tópico 2: no senso comum, a escola – como espaço da educação – ocupa uma esfera social diferente, até oposta, daquela destinada ao trabalho.

Quem nunca ouviu o questionamento: Você trabalha ou só estuda/dá aula? Nessa questão fica explícita uma visão que separa o trabalho do estudo e da escola. Mesmo diante das mudanças na concepção de trabalho ao longo do tempo, a contraposição escola x trabalho permanece.

Entretanto, apesar de a escola moderna ter nascido contemporaneamente à afirmação do calvinismo na Europa, de essa escola ter se constituído como um espaço de disciplina, organização e método, ela não se livrou do entendimento original de lugar do ócio, o avesso ao trabalho. Entre nós essa imagem ainda é muito forte, inclusive porque até recentemente a escola era lugar apenas daqueles que não precisavam investir grande parte do seu tempo na provisão da subsistência e porque é frágil nossa herança calvinista (SOUZA, 2015, p. 105).

Essa visão desvaloriza o trabalho pedagógico. Reflexão, produção e sistematização de saberes são tarefas que exigem esforço e dedicação, são formas de trabalho intelectual-braçal. Este ponto nos leva a um paradoxo presente nas concepções de educação comuns aos brasileiros, pois a educação é considerada o caminho para a superação dos desafios sociais estruturais, enquanto é extremamente precária em termos de condições de trabalho (SOUZA, 2015).

É fundamental desvincular a produção do conhecimento da solução imediata de problemas. A produção do conhecimento nas sociedades modernas não pode estar ligada somente a questões imediatas. No contexto da globalização é essencial a produção sistemática de conhecimento. Outro esforço fundamental é o de reflexão sobre a natureza e sobre nós mesmos. Não se pode negar como é fundamental comprender as complexas relações do mundo moderno (SOUZA, 2015).

Para aprofundar essa dicussão, retome a Leitura Complementar do Tópico 1: Escola.

IMPORTANTE

Page 63: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

TÓPICO 3 | OS DESDOBRAMENTOS DAS CONT. DA SOC. DA EDU. NA COMP. DOS SUJEITOS E DA CULTURA NA EDUCAÇÃO

53

Por fim, pela perspectiva do homem como ser histórico, a educação é entendida como um processo. As noções de ensinar e aprender passam a considerar as relações de poder presentes na sociedade e também passam a conceber a educação como critério político: “Em nosas práticas educativas, saibamos nós explicitá-las ou não, sempre expressamos as visões de ser humano e de educação que temos” (PEREIRA, 2012, p. 26).

As relações entre trabalho e educação nas sociedades industriais remetem à concepção da produção da existência humana através do trabalho. Para que a realização humana ocorra através do trabalho é preciso educar o indivíduo. Educá-lo tanto para o mundo, quanto para o trabalho (PEREIRA, 2012).

3 SOCIEDADE E CULTURA

Discutimos em outros momentos que a sociedade é um dos objetos mais centrais da Sociologia. Esse produto humano pode ser percebido como “formas de vida dos membros”, [...] um sistema de inter-relações que conecta os indivíduos uns com os outros” (GIDDENS, 2004). Essa categoria expressa, ainda, uma dicotomia, apontando sempre para o indivíduo.

Uma forma de explorar essa relação, ora próxima ora distante, é através do conceito de cultura. Trata-se de uma noção que surgiu junto à Antropologia, sendo apropriada e ressignificada pela Sociologia.

Da mesma maneira, a cultura é elementar para os estudos na área da Sociologia da Educação. O motivo é que a cultura, sendo a expressão material e imaterial das potencialidades humanas, ela é fortemente relacionada com os processos de produção, manutenção, reprodução e transformação social. A educação, portanto, assume um papel preponderante nos processos de socialização e transmissão das heranças culturais de todos os grupos humanos.

Prezado acadêmico! O desenvolvimento da sociedade industrial e a constante ampliação da divisão do trabalho levaram à construção da educação escolar. Esses aspectos serão discutidos mais adiante neste livro.

ESTUDOS FUTUROS

Page 64: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

54

UNIDADE 1 | RELAÇÕES ENTRE SOCIOLOGIA, SOCIEDADE E EDUCAÇÃO

Atualmente, a cultura é uma das expressões mais empregadas por sociólogos, antropólogos, políticos, movimentos sociais etc., nos propondo um importante cenário contemporâneo. De acordo com Williams (2007), a palavra cultura, da antiguidade até meados do século XV, ligava-se à expressão latina colere, vinculada a habitar, cultivar, proteger, venerar. Este período que vai até o século XV é marcado pela separação conceitual de certas palavras que se confundiam com cultura, ao passo que a própria palavra “cultura” vai se ligando, exclusivamente, à ideia de cultivo e atenção.

Naquele momento da história, a cultura se apresentava como substantivo de um processo, noção que começou a ser transformada em um substantivo independente a partir do século XVI. Isto porque o foco, então, passou do “crescimento natural” para o desenvolvimento humano, coletivo e individual. O processo diz respeito ao hábito de cultivar a admiração pelo belo, a refletir sobre estética e modos de vida que resultam num indivíduo “erudito”, cujo espírito foi se modelando a partir do contato com determinados bens, materiais e simbólicos, considerados eruditos (WILLIAMS, 2007).

A partir da modernidade a cultura apareceu, em países como França e Inglaterra, mais como um vocábulo que sintetiza a “encarnação última do espírito ilustrado”, historicamente localizado entre os séculos XVII a XIX, em que a cultura aparecia, também, como um substantivo de civilização. Para os franceses e ingleses, “A cultura é a soma dos saberes acumulados e transmitidos pela humanidade, considerada como totalidade, ao longo de sua história” (CUCHE, 1999, p. 21). Tal visão sugeria a cultura como o resultado de um espírito educado e cultivado, com bases nos ideais iluministas do progresso e da razão. A cultura, assim como a civilização, arrancaria a humanidade da ignorância.

Para os alemães, a cultura foi delimitada de maneira distinta, como o “conjunto de características artísticas, intelectuais e morais que constituem o patrimônio de uma nação, considerado como adquirido definitivamente e

Existe uma polissemia de significados em torno do conceito de cultura e essa multiplicidade das definições acompanha a diversidade de interesses institucionais. Mas, também, existem alguns consensos, dos quais podemos indicar:

a) Recusa do determinismo biológico; b) Recusa do determinismo geográfico; c) Cultura é uma construção histórica a partir da existência de relações entre os grupos

humanos, sendo apreendida socialmente, carregando significados, convenções, mentefatos e artefatos que tornam inteligível a vida em grupo;

d) A percepção de que a cultura tem natureza dinâmica, mutável e plural e; e) A pluralidade e a diversidade cultural não se compadecem de lógicas hierarquizantes,

sendo esses resultados do etnocentrismo (não há cultura melhor ou pior).

FONTE: Os autores

DICAS

Page 65: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

TÓPICO 3 | OS DESDOBRAMENTOS DAS CONT. DA SOC. DA EDU. NA COMP. DOS SUJEITOS E DA CULTURA NA EDUCAÇÃO

55

fundador de sua unidade” (CUCHE, 1999, p. 28). Nesta perspectiva, cultura é o repertório simbólico que faz uma nação ser única, apontando sua originalidade e genialidade, ressaltando uma perspectiva particularista.

De acordo com Michel de Certeau, a cultura é “[...] todo complexo que inclui os saberes, as crenças, as artes, a moral, as leis, os costumes e outras tantas capacidades adquiridas pelo homem enquanto membro da sociedade” (CERTEAU, 1995, p. 141).

Em meio a essas visões históricas, podemos indicar a discussão de Terry Eagleton (2005), que partindo das reflexões de Raymond Williams (2007, p. 29), sintetiza três grandes “versões” de cultura, que nortearam a reflexão nesta pesquisa: a cultura enquanto modo de vida, artes e crítica utópica.

[...] na primeira variação importante da palavra cultura é a crítica anticapitalista, e a segunda um estreitamento e, concomitantemente, uma pluralização da noção a um modo de vida total, a terceira é a sua gradual especialização às artes.

Mas, o que devemos apreender dessa discussão etimológica?

Que a cultura está ligada aos grupos humanos e suas características, dependendo de laços sociais e das dinâmicas de socialização, próprias de cada sociedade. Destaca-se a importância e a ligação da cultura com as instituições sociais e das normas e valores comuns e compartilhados. Diferente de outros animais, o ser humano tem a capacidade de criar cultura, de transmiti-la às próximas gerações, assegurando a sua reprodução.

O homem, que por meio das interações recíprocas cria um sem-número de instituições, organizações e fenômenos sociais, ao nascer, já encontra o grupo estruturado com uma quantidade incontável de valores, normas, costumes, etc. E pela transmissão cultural aprende a viver em sociedade, transformando-se de um animal da espécie humana em um ser humano culturalmente definido (DIAS, 2005, p. 119).

Sociedades sem cultura não existem! O entendimento a respeito dos grupos, comunidades e sociedades passa pela compreensão das culturas que lhes são específicas. Mesmo que atualmente sentimos o peso da globalização cultural e das ideias de uma sociedade global que impactam a vida individual e social, encontramos características que estão ligadas à história das sociedades e dos seus territórios.

Não foi à toa que na década de 1960 cultura relacionou-se com outros fenômenos típicos da época, como a ascensão de reivindicações de corte identitário no impulso dos movimentos sociais de gênero, ecológico, pacifistas, muitos deles referindo-se a si próprios como minorias culturais. Foi neste período (1960) que ocorreu o que Stuart Hall (1997) chama de a “centralidade da cultura”, indicando um crescente interesse pela cultura junto às Ciências Sociais (“epistemológica”), mas, também, para os movimentos sociais (“substantiva"). O que isso significa? Segundo Hall (1997, p. 21):

Page 66: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

56

UNIDADE 1 | RELAÇÕES ENTRE SOCIOLOGIA, SOCIEDADE E EDUCAÇÃO

Primeiro, consideramos a expansão substantiva da cultura — sua crescente centralidade nos processos globais de formação e mudança, sua penetração na vida cotidiana e seu papel constitutivo e localizado na formação de identidades e subjetividades. Então nos voltamos à centralidade epistemológica da cultura – sua posição constitutiva nas humanidades e nas ciências sociais de hoje e as modificações na teorização e na análise relacionadas à – virada cultural ‖. Procuramos rever o que significa a afirmação trazida por esta – virada ‖ conceitual de que cada prática social ocorre – no interior da cultural.

Neste sentido, a cultura aparece como elemento constitutivo de muitos processos sociais, não apenas a sua aparência. A cultura passou a ser, de maneira geral, como construção histórica apreendida socialmente, carregando hierarquias, significados, relações de poder, convenções, mentefatos e artefatos que tornam inteligível a vida em grupo, sendo mutável, plural e carregada de relações de poder. É construída e reconstruída socialmente, através das relações sociais, sendo que sua transformação corresponde a um movimento complexo entre interior e exterior de um grupo, território ou sociedade.

Outro autor, George Yúdice (2006), aponta para a transformação da cultura num recurso, um tipo de instrumento performativo e de poder simbólico mobilizado na persecução de objetivos diversos por atores distintos. Desta forma, as reivindicações de cidadania, muitas vezes, possuem teor cultural ou beneficiam-se do discurso cultural.

O pesquisador Albino Rubim (2007) destaca movimentos de ampliação dos usos possíveis da cultura. Aponta fenômenos, entre outros, como o de politização da cultura, resultado das dinâmicas de democratização das sociedades ocidentais, primeiramente na Europa e EUA, em que a cultura passou a ser fonte de legitimação social para a disputa da hegemonia na sociedade, vide os discursos nacionalistas; a mercantilização da cultura representa outro movimento fundamental para entender as dinâmicas culturais da contemporaneidade, pois o avanço do capitalismo sobre a produção e circulação de bens simbólicos resulta num capitalismo do tipo que incorpora e agrega a cultura como valor de troca e; mais recentemente, o fenômeno da culturalização da política, com a reivindicação de territorialidades múltiplas, marcadas por processos originados nas relações conflitantes entre globalização e contextos locais, nas quais as demandas de movimentos sociais (e suas práticas, comportamentos e sociabilidade) possuem teor cultural, produzindo agendas políticas que são incorporadas pelos partidos políticos, pelo Estado e pelo mercado.

Neste sentido, a cultura possui um valor simbólico que se apresenta como recurso para promover a inclusão social, para requalificar centros urbanos, para potencializar o turismo, para contribuir com a redefinição e requalificação do desenvolvimento etc., para melhorar a educação, como bandeira em greves, disputas identitárias e outras lutas sociais. Ela tornou-se um conceito estratégico central para a definição de identidades e de alteridades no mundo contemporâneo, um recurso para a afirmação da diferença e da exigência do seu reconhecimento e um campo de lutas e de contradições. A “cultura será, assim, encarada não

Page 67: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

TÓPICO 3 | OS DESDOBRAMENTOS DAS CONT. DA SOC. DA EDU. NA COMP. DOS SUJEITOS E DA CULTURA NA EDUCAÇÃO

57

como uma esfera num conjunto de esferas e práticas diferenciadas, mas como um terreno em que a política, a cultura e o econômico formam uma dinâmica inseparável” (SANTOS, 2003, p. 35).

Desta forma, é possível abordar a cultura e a relação com a educação e a escola de forma muito diversificada. É importante refletir sobre a cultura na escola, de forma a “[...] examinar nos estabelecimentos escolares as características ou manifestações socioculturais específicas ou a diversidade e as diferenças étnico-culturais marcantes entre o corpo docente e discente” (DAYRELL, 1999, p. 21).

Podemos explorar a dimensão da cultura escolar, tomada como:

[...] conjunto de normas que definem conhecimentos a ensinar e condutas a inculcar; ou ainda, um conjunto de práticas que permitem a transmissão de conhecimentos e a incorporação de comportamentos, normas e práticas, coordenadas a finalidades (religiosas, sociopolíticas ou simplesmente de socialização) que podem variar segundo as épocas históricas (JULIA, 2001, p. 10).

São muitas as perspectivas capazes de se tornarem objeto e problema sociológico. Alguns dos desdobramentos da relação cultura, educação, escola e seus atores serão discutidas nas unidades a seguir.

Os estudantes que derrubaram a reestruturação das escolas de São Paulo

Como os estudantes de São Paulo, inspirados na revolta secundarista do Chile, usaram a reorganização da rede escolar para impor uma derrota ao governo Geraldo Alckmin.

FLÁVIA YURI OSHIMA E VINICIUS GORCZESKI O estopim foi o atraso do passe estudantil. Não era a primeira vez. Estudantes secundaristas revoltados com o governo foram às ruas. A passeata tomou corpo. A polícia reprimiu. Foram, então, para dentro de suas próprias escolas. Não para ter aula. Mas para protestar. O passe escolar era só um detalhe a essa altura. A pauta se ampliara para tudo o que tivesse impacto na educação.

Assim também começou A Rebelião dos Pinguins, a maior revolta estudantil da história do Chile. Entre abril e outubro de 2006, 1 milhão de estudantes (com o uniforme escolar “de pinguim”, que consiste em camisa branca com colete preto) invadiram as ruas e tomaram as escolas do país. O movimento derrubou o ministro da Educação, o da Segurança e alterou uma série de regras da educação do país, de forma sem precedentes.

FONTE: Disponível em: <http://epoca.globo.com/tempo/noticia/2015/12/os-estudantes-que-derrubaram-reestruturacao-das-escolas-de-sao-paulo.html>. Acesso em: 23 fev. 2018.

DICAS

Page 68: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

58

UNIDADE 1 | RELAÇÕES ENTRE SOCIOLOGIA, SOCIEDADE E EDUCAÇÃO

Os profissionais do ensino como mediadores culturais na escola

O que a discussão sobre essas acepções da cultura nos diz sobre o trabalho dos professores na escola? Segundo Forquin, quando se fala da função de transmissão cultural da educação que cabe mais precisamente à escola, é preciso verificar duas coisas.

A primeira, é que a acepção tradicional é “demasiado unilateral”, por supor que existe um componente valorativo unificador da cultura tomada como sinônimo de erudição. Em outras palavras, é como se existisse um único modelo de cultura que a escola deveria impor a todos indistintamente. A segunda, é que a acepção descritiva é demasiado genérica, por não supor nenhuma referência a partir da qual se pudesse mobilizar as pessoas para avançarem em relação ao seu próprio nível cultural. É como se houvesse um vale-tudo em que todos os bens culturais pudessem ser tomados como se tivessem o mesmo valor.

Ora, diz Forquin, “é preciso reconhecer que sempre, e por toda a parte, a educação implica um esforço voluntário com vistas a conferir aos indivíduos (ou ajudar os indivíduos a adquirir) as qualidades, competências, disposições, que se têm por [...] desejáveis, e que para isso nem todos os componentes da cultura no sentindo sociológico são de igual utilidade, de igual valor” (FORQUIN, 1993, p. 11). Isso significa que, quando uma instituição, como a escola, está a serviço da transmissão cultural, é preciso que certos aspectos da cultura sejam reconhecidos como mais relevantes que outros para que possam ocupar um lugar privilegiado como objeto de ensino.

Mas é exatamente aí que residem problemas fundamentais, que serão apenas apontados por enquanto. Quem define o que é mais relevante para compor os currículos e os respectivos conteúdos que se ensinam nas escolas? Que relações de poder se estabelecem entre aqueles que definem a constituição das redes de escolarização? Que possibilidades e limites têm os praticantes no interior das estruturas sociais, sobretudo numa sociedade tão marcada pela desigualdade como a nossa? Qual é o papel dos professores nessa relação?

Questões como essas não têm respostas fáceis, mas não há dúvida de que é nesse momento que deve ser valorizado o papel do professor como mediador cultural na escola. Ele deve ter capacidade para analisar criticamente não apenas os conteúdos que ensina, mas o próprio lugar da escola no contexto das relações sociais mais amplas. Como se vê, não é uma tarefa fácil para o professor. Dele se espera que, além de dominar bem os conteúdos que cabem à escola difundir, seja capaz de ter clareza do significado mais amplo da sua ação pedagógica.

Pode-se supor que os instrumentos dos quais se lança mão para formar os profissionais da educação os legitimam, também, perante a sociedade, para tomar as decisões acerca do que deve e do que não deve ser ensinado nas escolas.

LEITURA COMPLEMENTAR

Page 69: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

TÓPICO 3 | OS DESDOBRAMENTOS DAS CONT. DA SOC. DA EDU. NA COMP. DOS SUJEITOS E DA CULTURA NA EDUCAÇÃO

59

Mas isso significaria poder supor, também, que haveria meios de se estabelecer um consenso quanto à escola ideal, se a da República, a confessional (escolas religiosas) ou a empresa educacional privada. Longe, entretanto, de se encontrar aí qualquer consenso quanto à legitimidade dos especialistas do ensino e à eficácia das redes de escolarização, o amplo debate pedagógico não deixa escapar qualquer postura que não se submeta ao crivo da crítica.

Portanto, mesmo reconhecendo e respeitando como legítimas (quase) todas as manifestações culturais, cabe aos profissionais do ensino recortar e selecionar aquilo que pode ser considerado mais relevante para ser ensinado nas escolas. Isso, porém, não deriva de um posicionamento neutro no interior das escolas, são as relações sociais, que são perpassadas de interesses econômicos, sociais, políticos, culturais e ideológicos. Quanto maior a diversidade cultural, maiores os desafios da educação e, por conseguinte, dos profissionais que se ocupam dela.

FONTE: SOUZA, João Valdir Alves de. Introdução à sociologia da educação. Belo Horizonte: Autêntica Editora, 2015.

Page 70: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

60

RESUMO DO TÓPICO 3

Neste tópico você aprendeu que:

• As análises dedicadas aos aspectos da educação na sala de aula permitiram a compreensão da organização do espaço físico, do tempo e das relações sociais presentes nas escolas.

• As relações sociais presentes na sala de aula devem levar em consideração as implicações dos diversos contextos sociais e a multiplicidade dos sujeitos.

• A cultura é um importante conceito para inúmeros campos das ciências humanas. Surgida na antropologia, a sociologia tem empregado de diversas formas essa categoria para acessar o universo das relações sociedade-indivíduo. Da mesma forma, a cultura é empregada no subcampo da Sociologia da Educação, dando ênfase aos atores envolvidos no processo educativo e suas manifestações culturais.

Page 71: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

61

1 A sala de aula é um dos espaços de desenvolvimento da educação escolar. Nela se desenvolvem as relações entre professor e aluno, nela são aplicadas as diversas metodologias do processo de ensino e aprendizagem e, também, na sala de aula podemos observar o desenrolar de múltiplas relações sociais. Nesse contexto, não podemos esquecer o espaço físico da escola e das representações das relações sociais explícitas nesse espaço. Considerando o espaço físico da sala de aula, assinale a alternativa correta:

a) ( ) As salas de aula podem ser organizadas de diferentes maneiras, porém a disposição em fileiras é ideal para o aprendizado.

b) ( ) O espaço físico representa as expectativas em relação aos papéis dos professores e alunos.

c) ( ) O processo de ensino e aprendizagem promove a autonomia independentemente de características como o espaço físico.

d) ( ) A promoção da solidariedade é o fator crucial na escolha dos espaços físicos das escolas.

2 As questões que se referem à sala de aula e aos sujeitos que a ocupam também dizem respeito ao universo do trabalho. Nesse contexto, destacamos a expectativa em relação à finalidade da produção do conhecimento subentendida à lógica produtiva de nossa sociedade. Partindo desse pressuposto, analise as sentenças a seguir:

I – A produção do conhecimento na sociedade moderna leva à autonomia do sujeito.

II – A globalização levou à produção sistemática do conhecimento.III – O conhecimento produzido é direcionado à solução imediata de

problemas.IV – O ato de produzir conhecimento é amplamente voltado à reflexão sobre

nós mesmos.

Agora assinale a alternativa que representa a sequência correta:

a) ( ) As sentenças I e II são verdadeiras.b) ( ) As sentenças II, III e IV são verdadeiras.c) ( ) As sentenças II e III são verdadeiras.d) ( ) As sentenças III e IV são verdadeiras.

3 A cultura é um conceito fundamental para entender as dinâmicas sociais. Neste sentido, o interesse pela cultura não está restrito a pesquisadores ou acadêmicos. Ela ganhou destaque e importância também no mundo da política. Acerca dos movimentos de politização da cultura e culturalização da política, relacione os itens a seguir, utilizando o código a seguir:

AUTOATIVIDADE

Page 72: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

62

I – Culturalização da política.II – Politização da cultura.

( ) A cultura passou a ser fonte de legitimação social nas lutas sociais.( ) A cultura entrou na agenda de políticas públicas dos governos nacionais.( ) A cultura aparece nos discursos para melhorar a qualidade do

desenvolvimento.( ) A cultura passou a ser um recurso importante para as mobilizações

sociais.

Assinale a alternativa que apresenta a sequência CORRETA:

a) ( ) II, I, I, II.b) ( ) II, II, I, II.c) ( ) I, I, II, I.d) ( ) II, I, II, I.

Page 73: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

63

UNIDADE 2

PERCURSOS TEÓRICOS DA SOCIOLOGIA DA EDUCAÇÃO

OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM

PLANO DE ESTUDOS

Esta unidade tem por objetivos:

• compreender os percursos teóricos da teoria social e suas contribuições para a Sociologia da Educação;

• apresentar o contexto do desenvolvimento e consolidação da Sociologia da Educação;

• conhecer as contribuições de diferentes abordagens sociológicas para a compreensão da relação entre educação e sociedade;

• analisar as diferentes possibilidades de abordagens teórico-metodológi-cas para compreensão dos fenômenos sociais ligados à educação

A segunda unidade está dividida em três tópicos e ao fim de cada tópico você encontrará um resumo dos conteúdos e autoatividades que contri-buirão para a reflexão e análise dos conteúdos abordados.

TÓPICO 1 – PRIMEIRA GERAÇÃO DE SOCIÓLOGOS: DURKHEIM, MARX E WEBER

TÓPICO 2 – GERAÇÃO DA PRIMEIRA METADE DO SÉCULO XX: MANNHEIM, PARSONS, ELIAS, GRAMSCI, ESCOLA DE FRANKFURT, HABERMAS E ALTHUSSER

TÓPICO 3 – GERAÇÃO DA SEGUNDA METADE DO SÉCULO XX: BOURDIEU, FOUCAULT E GIDDENS

Page 74: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

64

Page 75: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

65

TÓPICO 1

PRIMEIRA GERAÇÃO DE SOCIÓLOGOS:

DURKHEIM, MARX E WEBER

UNIDADE 2

1 INTRODUÇÃO

Na Unidade 1, ao situar alguns sociólogos pioneiros, discutimos as suas contribuições como sendo clássicas. Noutra ponta, indicamos que existiriam sociologias contemporâneas. A intenção era destacar algumas diferenças entre os primeiros e os atuais sociólogos. Tais diferenças incluem o cenário da época em que viveram, os temas e objetos de estudos e os métodos e instrumentos de investigação.

Na Unidade 2, adentramos propriamente o campo da Sociologia da Educação, apresentando e sistematizando autores clássicos e contemporâneos. Mas, como é complexo traçar uma linha, apresentamos agora estes nomes a partir do conceito de geração. Para isso nos apropriamos do conceito de geração construído pelo sociólogo húngaro Karl Manheim.

Uma geração traz a ideia de um vínculo geracional, de pessoas nascidas numa mesma época, que cresceram e se educaram nas mesmas décadas e experimentaram dilemas e cenários sociais razoavelmente comuns. Em alguns casos, esses indivíduos se associam e formam grupos ou movimentos geracionais. Disso resulta uma consciência comum e uma potencialidade de lidar e refletir sobre temas similares. Elas captam possíveis mudanças e descontinuidades, trazendo-as para o nível da experiência individual. Elas podem romper com as gerações anteriores, incentivando a mudança. Assim, uma geração é marcada por forte identidade histórica, partilhando ideias, conceitos, cenários e desafios sociais (MANHEIM, 1976; WELLER, 2010; SARMENTO, 2005).

Desta maneira, os primeiros sociólogos que abordamos nas próximas páginas podem ser pensados como a primeira geração de sociólogos. Nela, estudamos Émile Durkheim, Karl Marx e Max Weber. Eles nasceram e viveram parte de sua vida no século XIX, momento de rupturas com o mundo da tradição e de ascensão da vida moderna. O historiador inglês Eric Hobsbawm (1989) considera o século XIX repleto de transformações ou novidades. Além dos ecos das revoluções científicas, industriais e políticas percebidas em países europeus, o avanço da tecnologia promoveu uma intensa onda de otimismo no progresso.

Page 76: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

UNIDADE 2 | PERCURSOS TEÓRICOS DA SOCIOLOGIA DA EDUCAÇÃO

66

Foi um século cheio de certezas e verdades, quase todas atualmente abaladas ou sob suspeita. E, com isso, acontecem modificações coletivas e individuais de base política, material e psicológica, correlatas com a ascensão do modo de vida urbano, a degradação ambiental e a massificação das experiências sociais. As bases culturais das sociedades sofreram impactos desestruturantes e reestruturantes: pode-se indicar a secularização das pessoas e sociedades; a democratização da educação e ciência e o surgimento da cultura de massas (SZTOMPKA, 1998).

Vejamos o significado dos conceitos de secularização e de cultura de massas.

O primeiro se refere ao declínio do papel e centralidade da religião ou do pensamento mágico diante da autonomia das diversas esferas da vida social, onde a religião perde força e autoridade sobre a vida privada e cotidiana (PIERUCCI, 1998). Sobre o processo de secularização, Max Weber (1991) – como veremos nas próximas páginas – relacionou esse processo à desmagificação do mundo pela força da racionalidade e da razão.

Cultura de massas é um conceito mais moderno no âmbito da reflexão sociológica. Liga-se ao tema da Escola de Frankfurt, cujas características são discutidas ainda nesta Unidade 2. Em termos gerais, ‘cultura de massas’ é a:

[...] produção industrial de um universo muito grande de produtos que abrange setores como a moda, o lazer no sentido mais amplo incluindo os esportes, o cinema, a imprensa escrita, falada e televisionada, os espetáculos públicos, a literatura, a música, enfim, um número muito grande de eventos e produtos que influenciam e caracterizam o atual estilo de vida do homem contemporâneo no meio urbano-industrial (CALDAS, 1987, p. 16).

Tem origem com o avanço do capitalismo e dos meios de comunicação como um grande e rentável negócio ao longo do século XX e da massificação de bens e produtos diversos.

DICAS

2 ÉMILE DURKHEIM

Tratamos agora de um importante clássico nos dias de hoje. Se Auguste Comte geralmente é lembrado pela ciência positiva e as discussões iniciais sobre o objeto da sociologia, Émile Durkheim elaborou algumas das bases do trabalho do sociólogo. Trata-se de uma paternidade compartilhada entre ambos.

Page 77: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

TÓPICO 1 | PRIMEIRA GERAÇÃO DE SOCIÓLOGOS: DURKHEIM, MARX E WEBER

67

FIGURA 1 - ÉMILE DURKHEIM

FONTE: Dispoinível em: <https://goo.gl/xcW2xF>. Acesso em: 1 mar. 2018.

Como característico desses pioneiros da Sociologia, viveu e sentiu as transformações em torno da expansão do capitalismo e a ampliação dos conflitos entre o capital e os trabalhadores, o colonialismo europeu e o crescimento das cidades. Da mesma forma, ele assistiu à I Guerra Mundial explodir, em meio ao crescimento e intensificação das relações entre as nações europeias, morrendo antes de terminar esta guerra. Além disso, a França – que era seu país – viu-se entre guerras e dívidas com a Alemanha, o divórcio era adotado, a educação laica era oficializada pelo Estado, tornando-se obrigatória para crianças entre seis e 13 anos.

Neste período, o cenário intelectual era bastante agitado. Foi um momento de lutas pela posição de estabelecer os limites da disciplina. Foi, também, o momento em que a sociologia foi incorporada às universidades, sendo ofertada na forma de disciplina. Inclusive, Durkheim foi o primeiro professor da Cátedra de Sociologia na Universidade de Sorbonne, na França, única no país naquela ocasião, em 1902. Suas reflexões sobre a sociologia e seus métodos ganharam respeito e legitimidade no final do século XIX.

Todas essas manifestações da mudança social foram analisadas nas suas investigações e seu olhar sobre a relação indivíduo e sociedade e sobre a sociologia e seus métodos. Em termos gerais, para Émile Durkheim se deve partir de que a sociologia não toma partido nas situações sociais, mas ocupa-se das causas dos fenômenos sociais.

Page 78: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

UNIDADE 2 | PERCURSOS TEÓRICOS DA SOCIOLOGIA DA EDUCAÇÃO

68

E como Durkheim percebia a sociologia?

[...] é ela própria uma ciência distinta e autônoma e a noção de especificidade da realidade social é de tal modo necessária ao sociólogo que só uma cultura especialmente sociológica pode prepará-lo para a compreensão dos fatos sociais. Pensamos que este progresso é o mais importante dos que restam à sociologia compreender (DURKHEIM, 2007, p. 154).

A categoria de FATOS SOCIAIS indica muito da visão deste sociólogo

sobre a sociedade. Eles surgem das relações de associação entre os indivíduos. Para existir um fato social é necessário que também exista uma organização coletiva. Um fato social é algo comum a todos. E eles possuem um poder de coerção, em virtude do qual estes fatos se impõem como norma à existência individual. Um FATO SOCIAL é:

[....] toda maneira de fazer, fixada ou não, suscetível de exercer sobre o indivíduo uma coerção exterior; ou ainda, toda maneira de fazer que é geral na extensão de uma sociedade dada e, ao mesmo tempo, possui uma existência própria, independentemente de suas manifestações individuais" (2007, p. 13).

Os fatos sociais possuem a propriedade de existir fora das consciências individuais, apresentando-se objetivamente como maneiras de agir, pensar e sentir exteriores ao indivíduo. E que exemplos podemos dar? As regras jurídicas; educação; criminalidade; formas de se vestir; moralidade coletiva; língua; regras de trânsito; casamento; família; todos são fatos sociais, na perspectiva de Durkheim.

Para o sociólogo francês, os fatos sociais possuem três características:

COERÇÃO SOCIAL EXTERIORIDADE GENERALIDADE

Pode ser direta ou in-direta. Mecanismos ex--ternos impostos aos indivíduos e sobre sua conduta. Ela assume a forma de sanções.

Exemplo: usar uniforme na escola.

Eles não dependem da vontade dos indivíduos, nem são por eles estabe-lecidos. Existem exter-namente, atuando sobre os indivíduos.

Exemplo: usar roupas.

Eles se apresentam de maneira generalizada na sociedade, sendo re-correntes à maioria dos grupos sociais.

Exemplo: obedecer a uma lei.

QUADRO 1 - FATOS SOCIAIS NA PERSPECTIVA DE DURKHEIM

FONTE: Durkheim (2007)

Page 79: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

TÓPICO 1 | PRIMEIRA GERAÇÃO DE SOCIÓLOGOS: DURKHEIM, MARX E WEBER

69

Para estudar os fenômenos sociais, o sociólogo deve pensar o fato social como uma "coisa", como "objeto", ressaltando os caracteres exteriores que lhe são comuns. De acordo com o francês, é objeto "tudo o que é dado, tudo o que se oferece, ou antes, se impõe à observação. Tratar dos fenômenos como coisas é tratá-los na qualidade de data que constituem o ponto de partida da ciência" (DURKHEIM, 2007, p. 100).

Assim, Durkheim indica que o princípio da sociologia é ocupar-se dos

fatos sociais. Mas, o que significa tomarmos os fatos sociais por "coisas"?

[...] reconhece-se principalmente uma coisa pelo sinal de que não pode ser modificada por um simples decreto da vontade. Não que ela seja refratária a qualquer modificação. Mas, para produzir uma mudança nela, não basta querer, é preciso além disso um esforço mais ou menos laborioso, devido à resistência que ela nos opõe e que nem sempre, aliás, pode ser vencida. Ora, vimos que os fatos sociais têm essa propriedade. Longe de serem um produto de nossa vontade, eles a determinam de fora; são como moldes nos quais somos obrigados a vazar nossas ações (2007, p. 29).

Para Durkheim, sociologia deveria considerar os fatos sociais isolados das manifestações individuais, apontando para a generalidade dos fenômenos. Para isso, é necessário empregar um método objetivo, percebendo os fatos sociais como coisas. Esse método deve ser sociológico, apesar de influenciado pelas ciências naturais. Quer dizer, as causas dos fatos sociais devem ser encontradas e explicadas pela dimensão social (DURKHEIM, 2007).

A partir de sua sociologia, como Durkheim entendia o indivíduo e a sociedade? Para nos debruçarmos na sua obra e ideia de método sociológico devemos entender que o indivíduo só pode ser explicado pela sua inserção numa sociedade. E esta prescinde do indivíduo, já que quando este nasce encontra a sociedade "pronta". Ou, conforme ressaltou Raymond Aron (2008, p. 464), "[...] o indivíduo nasce da sociedade, e não a sociedade nasce do indivíduo”. O indivíduo perde-se no interior dessa totalidade social. Ela antecede e é independente do indivíduo.

A sociedade pode ser percebida como um grande organismo social que deve funcionar corretamente. Esta ideia de organismo mostra o impacto das ciências naturais no vocabulário e linguagem da sociologia naquele período do século XIX e início do XX. Da mesma forma, as sociedades eram realidades que podiam ser apreendidas objetivamente, empregando métodos adequados. Ou, nas palavras de Durkheim, ela "considera os fatos sociais como explicáveis naturalmente" (DURKHEIM, 2007).

DICAS

Page 80: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

UNIDADE 2 | PERCURSOS TEÓRICOS DA SOCIOLOGIA DA EDUCAÇÃO

70

Mas a sociedade não era somente a pura soma e adição de indivíduos. Para Durkheim, ela é um sistema de inter-relação de formas de associações. O que é característico deste sociólogo é que a consciência coletiva não pode ser deduzida tão somente através da consciência individual. A força do coletivo sempre prevalece sobre o indivíduo, exercendo pressão social na forma de um conjunto de sanções. Daí que a sociologia deve privilegiar a análise do social, não do individual (DURKHEIM, 2007).

Daí, podemos pensar Émile Durkheim como um sociólogo preocupado com o consenso social e com a funcionalidade e normalidade das sociedades. Encontramos uma sociologia que, numa perspectiva positivista, tratou de como as sociedades permanecem unidas. Ele elabora diversos conceitos para tanto, como consciência coletiva, representações coletivas, solidariedade, enfocando o universo das interações sociais. Ele reflete sobre a normalidade e patologia nas sociedades modernas, amparando-se em métodos sociológicos que ele conformou ou aperfeiçoou. Ainda no espírito positivo, Durkheim (como seu colega Comte) ocupava-se das especificidades do reino social, objeto da sociologia.

Outro aspecto importante que se desdobra dessa visão de sociologia é sua preocupação com aquilo que gera solidariedade nas sociedades. A pergunta que Durkheim tenta responder é sobre como é possível a sociedade?

Uma primeira forma de responder a essa questão é através de seu conceito de CONSCIÊNCIA COLETIVA. De acordo com Durkheim, em A divisão do trabalho social (2012), essa categoria “indica o conjunto de crenças e dos sentimentos comuns à média dos membros de uma sociedade, forma um sistema determinado que tem vida própria. A esses fenômenos ele dá o nome de consciência coletiva”. É a moral vigente numa sociedade.

Podemos vê-la como as regras, normas e comportamentos que orientam a conduta dos indivíduos. Ela é uma espécie de crivo, de juízo social, estabelecendo padrões adequados para as interações. É a força coletiva que se exerce continuamente sobre um indivíduo para viver de acordo com as normas da sociedade na qual está inserido.

Um segundo aspecto importante sobre o qual Durkheim se debruçou para entender como as sociedades são possíveis reside nas dinâmicas da divisão do trabalho, cujo objetivo é o de integrar o corpo social, assegurar-lhe a unidade. As sociedades mais simples, tradicionais, como as tribos e os clãs, possuíam baixa divisão do trabalho. Já no caso da sociedade moderna, há a especialização das funções sociais, a expansão do capitalismo alargou a divisão do trabalho, resultando em sociedades internamente mais diferenciadas.

E essa divisão do trabalho não é específica do mundo econômico: ela se encontra em outras áreas da sociedade, como nas funções políticas, administrativas, judiciárias, artísticas, científicas, entre outras. Ela contribui para a própria organização da sociedade (QUINTANEIRO, 2003).

Page 81: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

TÓPICO 1 | PRIMEIRA GERAÇÃO DE SOCIÓLOGOS: DURKHEIM, MARX E WEBER

71

Disso resultam seus conceitos de SOLIDARIEDADE MECÂNICA E ORGÂNICA. As primeiras estão ligadas às sociedades com menor divisão social do trabalho, ao passo que as segundas resultam da ampliação da interdependência social e da diferenciação.

A SOLIDARIEDADE MECÂNICA é típica de sociedades mais homogêneas e que têm uma consciência coletiva mais coercitiva, exercendo maior pressão sobre o indivíduo com regras mais rígidas.

Já em relação à SOLIDARIEDADE ORGÂNICA a consciência coletiva é menos totalizante e mais fragmentada. A pressão sobre o indivíduo é mais difusa e as regras e normas tendem a ser mais sutis. Nestas sociedades, a divisão social do trabalho e a diferenciação entre as formas de associação e os indivíduos são mais heterogêneas.

QUADRO 2 - TIPOS DE SOLIDARIEDADE EM ÉMILE DURKHEIM

FONTE: Disponível em: <http://cafecomsociologia.com/wp-content/uploads/2011/01/Captura-de-Tela-2016-09-20-%C3%A0s-13.41.06.png>. Acesso em: 22 mar. 2018.

Tipos de Solidariedade, segundo E. Durkheim

MECÂNICA ORGÂNICA

Sociedade simples Sociedades complexas

As funções sociais dos indivíduos são semelhantes

As funções sociais dos indivíduos são especializadas e interdependentes

Não há significativa divisão social do trabalho

A divisão social do trabalho é bastante complexa

Predomínio de mecanismo de coerção imediata, violenta e punitiva

Predomínio de mecanismos de coerção formais, exercido de forma mediada

Predomínio do Direito punitivo Predomínio do Direito restitutivo

Sociedades economicamente simples Sociedade economicamente complexas

Podemos pensar esses padrões de solidariedade relacionados às divisões mais simples ou complexas como molduras sociais, que procuram atirar o indivíduo ao seu interior, estruturando assim tanto a sociedade como a ação do indivíduo. Ela é um componente vital nas interações sociais. Através das instituições e dos fatos sociais, os padrões de solidariedade indicam o grau de pressão dos constrangimentos externos sobre o indivíduo. A solidariedade enquadra o indivíduo a uma moral.

Em seu viés positivista, Durkheim construiu uma visão evolucionista das sociedades de onde as primeiras eram estruturadas pelo clã, tribo ou hordas, formas igualitárias simples de organização e associação. A partir da

Page 82: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

UNIDADE 2 | PERCURSOS TEÓRICOS DA SOCIOLOGIA DA EDUCAÇÃO

72

maior diversidade de tarefas e funções internas, do aumento das populações, é necessária maior coordenação entre as formas de interação social. Nas sociedades modernas, este tipo de relacionamento social tendia a estimular uma maior liberdade ao indivíduo.

Daí, também, a importância de Émile Durkheim para a Educação. Isso porque ele destacou que a Educação é fato social básico para a manutenção da coesão das sociedades. Segundo Durkheim (2007, p. 48), toda a educação “consiste num esforço contínuo para impor às crianças maneiras de ver, de sentir e de agir às quais elas não chegariam espontaneamente".

2.1 DURKHEIM E A EDUCAÇÃO

Durkheim se orientou pelos seus estudos e pesquisas sobre o ensino francês. Ele foi defensor de uma educação laica e pública, sob responsabilidade do Estado. Naquela época, a educação pública ainda era um fenômeno em gestação. Segundo o sociólogo, esse papel de destaque para o Estado se deve em função de que:

[...] se a sociedade não estiver sempre presente e vigilante, para obrigar a ação pedagógica a exercer-se em sentido social, essa se porá ao serviço de interesses particulares e a grande alma da pátria se dividirá, esfacelando-se numa multidão incoerente de pequenas almas fragmentárias, em conflito umas com as outras [...] (DURKHEIM, 1978, p. 48).

Como este sociólogo entendia a educação? Dos nossos três sociólogos da primeira geração, é aquele que mais se envolveu e publicou obras e textos ligados diretamente à educação. Para o francês Durkheim, a educação é:

A ação exercida pelas gerações adultas sobre as gerações que não se encontram ainda preparadas para a vida social; tem por objeto suscitar e desenvolver, na criança, certo número de estados físicos, intelectuais e morais, reclamados pela sociedade política no seu conjunto e pelo meio especial a que a criança, particularmente, se destine (DURKHEIM, 1978, p. 41).

A educação, apesar de ser um fato social, não é percebida socialmente como uma coerção. As sociedades a percebem como uma função natural. Por meio da educação, as sociedades reproduzem as representações sociais mais importantes para manter a unidade grupal. Essas representações são internalizadas pelos alunos. Neste sentido, a educação tem um papel moralizador muito poderoso. Na perspectiva durkheimiana, a educação é o processo que nos ‘ensina’ as formas e regras de convívio social.

Em sua análise sobre a educação ao longo dos tempos, Durkheim (1978) distinguiu três fases principais da teoria e da prática educacional a partir da Idade Média, são elas:

Page 83: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

TÓPICO 1 | PRIMEIRA GERAÇÃO DE SOCIÓLOGOS: DURKHEIM, MARX E WEBER

73

(a) A FASE ESCOLÁSTICA, que vai do século XII à Renascença, na qual são estabelecidas as bases do sistema educacional moderno, com as primeiras escolas, faculdades, universidades, além de um sistema de exames e diplomas.

(b) A FASE HUMANISTA, surgida a partir da desintegração do cristianismo como sistema moral unitário, que se estende até meados do século XVIII, marcada por novos ideais educativos em oposição aos valores religiosos tradicionais.

(c) A FASE REALISTA, que compreende o período posterior às revoluções liberais, nas quais se dá a introdução de ideias seculares e científicas que, gradualmente, passam a integrar os currículos escolares.

Voltando à definição de Educação em Durkheim, o sociólogo entendia que desde os primeiros tempos da sua vida, mandamos as crianças a comer, a dormir e a beber a horas regulares. “Coagimo-la à limpeza, à calma, à obediência; mais tarde, coagimo-la a ter em conta os outros, a respeitar os usos, as conveniências, a trabalhar, etc.” (DURKHEIM, 2007, p. 89).

Por esse caminho, a educação é uma “ação deliberada” de uma geração mais velha e socialmente preparada sobre uma geração mais jovem, visando fornecer a esta os elementos morais e comportamentais necessários para a vida em sociedade.

Segundo Lopes (2012), Durkheim e sua sociologia indicavam que a

criança pertencia ao domínio das paixões e habita entre os selvagens, havendo um fosso profundo entre ela e os adultos. Neste sentido é preciso instigar a obediência que o dispositivo pedagógico transforma em espírito de disciplina, onde as tendências das crianças são vigiadas, medidas, avaliadas, instigadas e fortalecidas aos moldes do adulto civilizado.

O ser social é criado no indivíduo justamente pela educação, já que não nasce com o indivíduo, já que é um produto social. Assim, cada nova geração é uma “tábula rasa” a ser moldada pela sociedade, via educação, que “cria no homem um ser novo” (DURKHEIM, 1978, p. 42).

Para o autor, a educação também “deve conduzir-nos a ultrapassar a natureza individual: só sob esta condição, a criança tornar-se-á um homem. Ora, não podemos elevar-nos acima de nós mesmos, senão por esforço mais ou menos penoso” (DURKHEIM, 1978, p. 42). Para ele, não existe “nada em nossa natureza congênita que nos predisponha a tornar-nos, necessariamente, servidores de divindades, ou de emblemas simbólicos da sociedade, que nos leve a render-lhes culto, a nos privarmos em seu proveito ou em sua honra” (DURKHEIM, 1978, p. 42). Por isso, a educação também estava voltada à criação de um ser novo, “entre os cidadãos, uma comunhão de ideias e de sentimentos sem os quais qualquer sociedade é impossível” (DURKHEIM, 1978, p. 61).

Page 84: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

UNIDADE 2 | PERCURSOS TEÓRICOS DA SOCIOLOGIA DA EDUCAÇÃO

74

A educação, neste sentido, nas sociedades de solidariedade orgânica, de alta divisão social do trabalho, tem um papel de mediação entre as relações indivíduo-sociedade em torno de duas funções: homogeneizadora e diferenciadora. Ao mesmo tempo em que a educação atua na integração permanente de novos cidadãos, ela é central enquanto motor (e reprodutor) de diferenciação social.

Em tempos atuais, a educação apresenta suas faces mais dinâmicas. Isso porque, de acordo com a complexidade da organização da sociedade em que ocorre, a educação está ligada à criação da diversidade humana necessária para o funcionamento da cooperação social. Ela não é um fenômeno estático, parado. Era um fato e uma instituição social determinante na sociedade moderna, e, por isso mesmo, relacionada a uma ampliação crescente da grande divisão social do trabalho.

3 KARL MARX (1818-1883) Karl Marx foi e continua sendo uma figura histórica cuja herança promove

controversas e polêmicas. Marx escreveu do ponto de vista da economia política, da história e da filosofia.

Suas ideias começaram a ser legitimadas e reconhecidas somente depois de sua morte. Ele não se enxergava um sociólogo, porque esse profissional ainda não existia (foi com Auguste Comte que o termo foi criado). Sua construção intelectual foi trazida à disciplina por sociólogos, especialmente, graças a originalidade empregada por Marx na análise das relações sociais das sociedades modernas.

FIGURA 2 - KARL MARX

Diante disso, como sintetizar a contribuição de Marx para a sociologia? Apesar da enorme dificuldade inerente a um pensador complexo e com uma obra extensa, vamos indicar algumas ideias mais fundamentais, especialmente, o ângulo de sua análise da sociedade moderna. E, então, articular com os aspectos ligados à educação.

FONTE: Disponível em: <https://goo.gl/Qi66HP>. Acesso em: 22 mar. 2018.

Page 85: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

TÓPICO 1 | PRIMEIRA GERAÇÃO DE SOCIÓLOGOS: DURKHEIM, MARX E WEBER

75

Seja no período em que viveu ou nos dias atuais, Marx é um ‘espectro’ causador de simpatias e antipatias. E qual é a razão disso? Sem apontar respostas simplificadoras, temos a impressão de que seja pelo tipo específico de olhar a respeito da sociedade moderna, observada e analisada por meio do método materialista-dialético.

Por isso, o conjunto da obra de Karl Marx não se restringe ao campo da sociologia apenas, mas abrange ainda sobretudo os campos da história, da ciência política e da economia. “O pensamento de Marx desenvolve-se a partir do contato com a obra dos economistas ingleses como Adam Smith e David Ricardo, e da ruptura com o pensamento hegeliano e com a tradição idealista da filosofia alemã” (MARCONDES; JAPIASSU, 2001, p. 126).

Partindo deste universo científico plural, uma das contribuições decisivas de Marx foi a maneira como observou a sociedade e suas relações. Ele quebrou uma tradição metafísica, isto é, aquelas explicações filosóficas. Marx trouxe a explicação da sociedade para as suas bases materiais, rompendo com a filosofia do mundo da especulação e das essências universais.

Para o metafísico, as coisas e suas imagens no pensamento, os conceitos, são objetos isolados de investigação, objetos fixos, imóveis, observados um após o outro, cada qual por si, como algo determinado e perene. O metafísico pensa em toda uma série de antíteses desconexas: para ele, há apenas o sim e o não e, quando sai desses moldes, encontra somente uma fonte de transtornos e confusão. [...], não reflete sobre sua gênese e sua caducidade; concentrado em suas condições estáticas, não percebe a sua dinâmica; obcecado pelas árvores, não consegue ver o bosque (ENGELS, 1990, p. 20-21).

A tradição filosófica dominante na Europa até o início da modernidade

pressupunha a existência, além do mundo sensível e histórico, de uma outra dimensão mais real e povoada de substâncias ou de essências imutáveis que seriam os verdadeiros objetos do conhecimento (QUINTANEIRO, 2003, p. 25-26).

Para produzir esse rompimento, Marx construiu e empregou o método Materialista histórico. Tratava-se de algo inovador, no sentido de que era uma análise da práxis, das dinâmicas e movimentos da História. Este foi empregado como método analítico e uma perspectiva dialética das sociedades, com base nas contradições e mudanças que elas permitiam.

Page 86: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

UNIDADE 2 | PERCURSOS TEÓRICOS DA SOCIOLOGIA DA EDUCAÇÃO

76

Marx procurou refletir sobre as características da Modernidade. E por meio de seu método, ele destacou a ascensão da burguesia e do capitalismo como eixo desse momento. Mas, em cada período da história percebeu um modo específico de produção que orientou e determinou as forças sociais e produtivas.

A história de todas as sociedades que existiram até nossos dias tem sido a história das lutas de classes. Homem livre e escravo, patrício e plebeu, barão e servo, mestre de corporação e companheiro, numa palavra, opressores e oprimidos, em constante oposição, têm vivido numa guerra ininterrupta, ora franca, ora disfarçada; uma guerra que terminou sempre, ou por uma transformação revolucionária, da sociedade inteira, ou pela destruição das duas classes em luta (MARX; ENGELS, 1998, p. 7).

A burguesia aparecera como classe no deslocamento e passagem do

mundo feudal para o moderno, porém, o ápice de sua luta pela hegemonia se deu com a Revolução Francesa e Revolução Industrial. O advento das condições modernas para o modo de produção capitalista na França e Inglaterra alçou a luta de classes, observada nas lutas das ligas na Inglaterra e nas questões fundiárias. Na Alemanha, quando o modo de produção capitalista chegou à maturidade, depois da França e Inglaterra, o proletariado já possuía uma consciência teórica de classe mais decidida do que a burguesia alemã. As questões do proletariado ganharam adesões entre os mais rigorosos científicos.

A sociedade burguesa moderna, que brotou das ruínas da sociedade feudal, não aboliu os antagonismos de classe. Não fez senão substituir novas classes. Daí a existência de uma luta de classes, tendo como antagonistas burgueses e proletários (MARX; ENGELS, 1998).

O materialismo histórico percebe as relações sociais como determinadas pela satisfação das necessidades da vida humana, não sendo apenas uma forma, dentre outras, da atividade humana, mas a condição fundamental de toda a história. Para os materialistas, essas relações são a base de todo estudo sobre o homem, sua vida social e sua expressão cultural. Grande parte das obras de Marx foi escrita em colaboração com Engels, sendo por vezes difícil separar as ideias de um e as de outro (MARCONDES; JAPIASSU, 2001, p. 126).

O modo dialético de pensar não procura nos objetos de sua investigação essências eternas, fixas e independentes. Se há uma essência na realidade objetiva ou subjetiva, esta é dinâmica, contraditória, relacional, ou seja, o que for, contanto que não imutável, eterna, etc., como a vê a metafísica (SCHAEFER, 1985, p. 40-41).

O materialismo histórico e dialético marxista se pretende, ao mesmo tempo, como método de análise teórica, como de ação prática política, voltada à superação da sociedade de classes capitalista. Na perspectiva marxista, essa análise dialética tornaria transparente as relações, os processos e as estruturas capitalistas (IANNI, 1996).

DICAS

Page 87: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

TÓPICO 1 | PRIMEIRA GERAÇÃO DE SOCIÓLOGOS: DURKHEIM, MARX E WEBER

77

O capitalismo, na visão marxista, é um sistema de mercantilização universal e de produção de mais-valia.

O sistema capitalista é aquele no qual se aboliu da maneira mais completa possível a produção com vistas à criação de valores de uso imediato, para o consumo do produtor: a riqueza só existe agora como processo social que se expressa no entrelaçamento da produção e da circulação (MARX, 1998, p. 573).

Desta forma, as duas características que distinguem o capitalismo de outros modos de produção residem justamente nesses dois elementos. Ele está voltado à transformação da natureza em mercadorias, inclusive o próprio trabalhador; e volta-se à acumulação através do mecanismo da mais-valia. Segundo Hilton & Japiassu (2001, p.124), a mais-valia é um:

Conceito fundamental utilizado por Marx para sublinhar a exploração imposta ao proletariado pelo proprietário dos meios de produção: a força de trabalho dos operários é o único valor de uso capaz de multiplicar o valor. Ao vender sua força de trabalho ao empregador, em troca de um salário, ela se torna um valor da troca como qualquer outra mercadoria: "o valor da força de trabalho é determinado pela quantidade de trabalho necessária à sua produção".

DICAS

A luta de classes seria superada com a vitória política e revolucionária dos proletários, com o surgimento do comunismo. Por meio do trabalho, o ser humano põe “em movimento as forças naturais pertencentes à sua corporeidade: seus braços e pernas, cabeça e mãos”, e assim, atuando “sobre a natureza externa e modificando-a por meio desse movimento, ele modifica, ao mesmo tempo, sua própria natureza” (MARX, 1998, p. 149).

Fica claro que Marx privilegiou as relações econômicas das sociedades. Todavia, ele não reduz os fenômenos sociais a esta dimensão. Para ele, as relações econômicas e políticas estão intimamente determinadas, engendrando antagonismos e estruturando a própria sociedade (IANNI, 1996).

As relações sociais deveriam ser procuradas e entendidas à luz das relações de produção de determinada época. Disse este autor que a história é exatamente a história da transformação ininterrupta das formas de objetivação que moldam a existência do homem (MARX; ENGELS, 1998). Disso se destaca a importância da categoria trabalho para este autor.

Page 88: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

UNIDADE 2 | PERCURSOS TEÓRICOS DA SOCIOLOGIA DA EDUCAÇÃO

78

Filme: O Jovem Karl Marx (2017).Produção: França. Bélgica, Alemanha.

Sinopse: Aos 26 anos, Karl Marx embarca com a mulher, Jenny, para o exílio. Em Paris, eles conhecem Friedrich Engels, filho do dono de uma fábrica e que estudou o nascimento do proletariado inglês. Engels traz a Marx a peça que faltava para o quebra-cabeça de sua visão de mundo. Juntos, em meio à censura, greves e agitação política, eles vão liderar uma completa transformação política e social do mundo.

FONTE: Disponível em: <http://www.itaucinemas.com.br/filme/o-jovem-karl-marx>.

DICAS

Segundo Marx e Engels, o trabalho é um elemento fundamental no processo de humanização. É transformação criativa. Por meio do trabalho, o ser humano põe “em movimento as forças naturais pertencentes à sua corporeidade: seus braços e pernas, cabeça e mãos”, e assim, atuando “sobre a natureza externa e modificando-a por meio desse movimento, ele modifica, ao mesmo tempo, sua própria natureza” (MARX, 1998, p. 149).

Karl Marx, como se percebe de sua análise materialista das relações capitalistas, destacou a categoria de trabalho, essencial para entender como se desnuda o capitalismo e suas dinâmicas de expansão e acumulação. No capitalismo, o trabalho tornou-se alienante. Como característica do capitalismo, o trabalho assalariado “constitui uma condição necessária para a formação de capital e se mantém como premissa necessária e permanente da produção capitalista” (MARX, 1998, p. 73).

3.1 MARX E A EDUCAÇÃO

Karl Marx não escreveu diretamente sobre a educação. Todavia, dentro do método dialético de análise da sociedade e das suas bases materiais, a educação foi objeto de discussão em alguns textos deste autor. Porém, pela importância de Marx no cenário intelectual e político em todo o mundo, essas reflexões estimularam novas, o que levou à produção de um interessante campo de análise marxista para a Educação.

A sociedade capitalista é contraditória. A dominação da burguesia é realizada por meio da base material, mas, também, da base intelectual das sociedades. Neste sentido, a educação carrega em si a própria contradição inerente às relações sociais capitalistas. Ela não é uma educação neutra, estando principalmente a serviço da reprodução do capital.

Page 89: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

TÓPICO 1 | PRIMEIRA GERAÇÃO DE SOCIÓLOGOS: DURKHEIM, MARX E WEBER

79

Além disso, tomando a sociologia proposta por Marx, teve origem uma série de categorias relevantes para explicar a sociedade que ainda possuem destaque no cenário intelectual. Como discutimos anteriormente, conceitos como classe social, capitalismo, luta de classes são empregados por inúmeros autores em suas investigações. No caso da educação, conforme Moacir Gadotti (2000, p. 10):

As categorias ‘contradição’, ‘determinação’, ‘reprodução’, ‘mudança’, ‘trabalho’, práxis’, ‘necessidade’, ‘possibilidade’ aparecem frequente-mente na literatura pedagógica contemporânea, sinalizando já uma perspectiva da educação, a perspectiva da pedagogia da práxis. [...] A dialética constitui-se, até hoje, no paradigma mais consistente para analisar o fenômeno da Educação. [...].

Mas, em quais obras ou textos Marx escreveu sobre a educação? Podemos citar algumas obras ou textos onde é possível encontrar referências à educação, nas seguintes obras e textos de Karl Marx:

- O capital, 1867.- Teses sobre Feuerbach, 1845.- Manifesto do Partido Comunista, 1848.- Instruções aos delegados do Conselho Central Provisório da Associação

Internacional dos Trabalhadores, de 1868.- Crítica ao Programa de Gotha, 1875.

E o que Marx escreveu sobre a educação? Em primeiro lugar, existe uma relação entre a educação e a bases das relações sociais capitalistas. Pensar a educação e a escola é encontrar uma instituição que repassa os valores dominantes para os seus operários, que os reproduzem ou não. A escola e a educação estavam a serviço da reprodução das ideologias burguesas e da sua divisão social do trabalho. Neste sentido, Marx e Engels eram contrários à educação conduzida pelo Estado ou pela Igreja, apesar de defender a escola pública. Eles escrevem que era “preciso rejeitar peremptoriamente uma ‘educação popular a cargo do Estado’ [...] É preciso antes banir toda a influência sobre a escola, tanto de parte do governo quanto da Igreja” (MARX, 2006, p. 127).

O que nos leva a destacar um segundo ponto em relação ao pensamento de

Marx com a educação? Trata-se de sua visão de união do trabalho produtivo com a educação. Como dissemos, Marx pensava o trabalho como atividade vital do ser humano e que, sob o modo de produção capitalista, tornou-se uma mercadoria através da qual o trabalhador apenas assegura os meios de sua sobrevivência e reprodução. Desta maneira, o trabalhador se via cada vez mais distanciado, estranho e alienado dos meios de produção, aparecendo o trabalho como forçoso ou uma obrigação, tornando o trabalhador infeliz.

Do ponto de vista da educação burguesa, os sistemas de ensino e as escolas reproduziam essas contradições, por meio de uma educação unilateral, voltada apenas às necessidades da divisão social do trabalho e da geração de mais-valia. A educação capitalista, conforme Nildo Viana (2004, p. 11), “buscaria domesticar a força de trabalho e prepará-la para o trabalho no processo de produção capitalista, visando ao preparo técnico e disciplinar”.

Page 90: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

UNIDADE 2 | PERCURSOS TEÓRICOS DA SOCIOLOGIA DA EDUCAÇÃO

80

Por isso Marx destaca a formação politécnica e a formação omnilateral, articulando mais do que a união de instrução e trabalho, mas, sim, a instrução enquanto elemento da crítica da forma histórica que o trabalho assumiu, ganhando um contorno revolucionário. A educação em Marx tinha três papéis essenciais:

Por educação nós entendemos três coisas:1) Educação mental.2) Educação corporal, tal qual é produzida pelos exercícios ginásticos e militares.3) Educação tecnológica, abrangendo os princípios gerais e científicos de todos os processos de produção e, ao mesmo tempo, iniciando as crianças e os adolescentes na manipulação dos instrumentos elementares de todos os ramos da indústria. A divisão das crianças e dos adolescentes em três categorias, de 9 a 18 anos, deve compreender um curso graduado e progressivo para a sua educação intelectual, corporal e politécnica. Os custos destas escolas politécnicas devem ser em parte cobertos pela venda das suas próprias produções (MARX, 1978, p. 223).

A EDUCAÇÃO POLITÉCNICA foi a forma que o alemão empregou para articular essas duas noções, trabalho e educação, rompendo com a educação voltada apenas para a preparação de mão de obra. Para Marx e Engels (1983, p. 60), a combinação do trabalho produtivo pago com a educação mental, os exercícios corporais e a aprendizagem politécnica, deveria elevar “a classe operária bem acima do nível das classes burguesa e aristocrática”.

OMNILATERALIDADE

[...] Embora não haja em Marx uma definição precisa do conceito de omnilateralidade, é verdade que o autor a ela se refere sempre como a ruptura com o homem limitado da sociedade capitalista. Essa ruptura deve ser ampla e radical, isto é, deve atingir uma gama muito variada de aspectos da formação do ser social, portanto, com expressões nos campos da moral, da ética, do fazer prático, da criação intelectual, artística, da afetividade, da sensibilidade, da emoção, etc. Essa ruptura não implica, todavia, a compreensão de uma formação de indivíduos geniais, mas, antes, de homens que se afirmam historicamente, que se reconhecem mutuamente em sua liberdade e submetem as relações sociais a um controle coletivo, que superam a separação entre trabalho manual e intelectual e, especialmente, superam a mesquinhez, o individualismo e os preconceitos da vida social burguesa.

O homem omnilateral não se define pelo que sabe, domina, gosta, conhece, muito menos pelo que possui, mas pela sua ampla abertura e disponibilidade para saber, dominar, gostar, conhecer coisas, pessoas, enfim, realidades – as mais diversas. O homem omnilateral é aquele que se define não propriamente pela riqueza do que o preenche, mas pela riqueza do que lhe falta e se torna absolutamente indispensável e imprescindível para o seu ser: a realidade exterior, natural e social criada pelo trabalho humano como manifestação humana livre.[...]

FONTE: Disponível em: <http://www.epsjv.fiocruz.br/dicionario/verbetes/omn.html>.

DICAS

Page 91: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

TÓPICO 1 | PRIMEIRA GERAÇÃO DE SOCIÓLOGOS: DURKHEIM, MARX E WEBER

81

Os principais vetores da concepção marxista de educação são:

1. Educação pública, gratuita, obrigatória e única para todas as crianças e jovens, de forma a romper com o monopólio por parte da burguesia da cultura, do conhecimento.

2. A combinação da educação (incluindo-se aí a educação intelectual, corporal e tecnológica) com a produção material com o propósito de superar o hiato historicamente produzido entre trabalho manual (execução, técnica) e trabalho intelectual (concepção, ciência) e, com isso, proporcionar a todos uma compreensão integral do processo produtivo.

A formação omnilateral (isto é, multilateral, integral) da personalidade de forma a tornar o ser humano capaz de produzir e fruir ciência, arte, técnica.

A integração recíproca da escola à sociedade com o propósito de superar o estranhamento entre as práticas educativas e as demais práticas sociais.

FONTE: Disponível em: <http://www.epsjv.fiocruz.br/dicionario/verbetes/edupol.html>. Acesso em: 22 mar. 2018.

Max Weber

Este alemão, nascido em Erfurt no ano de 1864, foi um filósofo, jurista, economista e, nos últimos anos de sua vida, sociólogo. Como nossos outros dois clássicos aprofundados (Durkheim e Marx), Weber viveu esse período conturbado e de grandes mudanças sociais ocorridas no século XIX. Morreu em 1920, após presenciar a violência e destruição da I Guerra Mundial.

Weber era proveniente de uma família bastante apegada ao protestantismo. Seu pai, Max Weber, era jurista e político, tendo laços e relações que faziam de sua residência espaço de visitas ilustres, de intelectuais, políticos, artistas, figuras que participaram da infância e juventude de Weber, o sociólogo. Sua mãe, Helene Weber, foi responsável por acompanhar sua educação protestante. Casou-se com Marianne Weber, feminista e também socióloga, em 1893. Um fato interessante é que no início de sua atividade intelectual e acadêmica, Weber não se dedicava à sociologia, cujo interesse foi reorientado intensamente somente a partir de 1910. Após sua morte, em 1920, Marianne Weber escreveu sua biografia, um documento importante sobre esse personagem da trajetória sociológica.

DICAS

DICAS

4 MAX WEBER (1864-1920)

Vamos aprofundar a discussão sobre os clássicos da sociologia e suas visões a respeito da educação e da escola. Partimos para o universo da sociologia compreensiva de Max Weber.

Page 92: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

UNIDADE 2 | PERCURSOS TEÓRICOS DA SOCIOLOGIA DA EDUCAÇÃO

82

Apesar de não ter sido seu interesse principal, Weber pensou de uma maneira menos direta os fenômenos da educação e a escola. Mas, para entender essa contribuição, é necessário compreender a análise weberiana desse mundo moderno racional e burocrático. Isto é, sua visão sobre a escola-educação não está divorciada da perspectiva sociológica original configurada por Max Weber.

4.1 A SOCIOLOGIA COMPREENSIVA DE WEBER

O nome de Max Weber está entre os principais responsáveis pela formação do pensamento sociológico, sobretudo do ponto de vista metodológico e de uma epistemologia das Ciências Sociais. Segundo sua visão, era elementar que a sociologia tivesse um modelo de explicação próprio, diferente do das ciências naturais (MARCONDES; JAPIASSU, 2001).

Essa formação familiar teve impacto na construção intelectual de Weber, influenciando sua perspectiva sociológica. É quase um senso comum considerá-lo um pensador pessimista. Esta visão sobre o conjunto de sua obra sociológica é resultado da análise que ele empreendeu do mundo moderno, cuja principal característica era a racionalização.

FONTE: Cohn (1977)

FIGURA 3 - MAX WEBER

FONTE: Disponível em: <https://goo.gl/H8FQqs>. Acesso em: 1 mar. 2018.

Page 93: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

TÓPICO 1 | PRIMEIRA GERAÇÃO DE SOCIÓLOGOS: DURKHEIM, MARX E WEBER

83

A sua sociologia tinha por objetivo a pesquisa científica em torno do significado cultural das estruturas sociais da vida humana e das suas formas de organização históricas. O sociólogo considerava que uma ação significativa era bastante complexa, envolvendo uma expectativa em relação ao comportamento de o ator atribuir sentido a sua conduta.

Por isso, então, a sociologia deveria se ocupar com a ação social, voltando-se para as atividades significativas das pessoas que ecoam e reverberam em outros indivíduos e nas próprias instituições. Podemos pensá-lo como o sociólogo interessado nas ações e valores dos indivíduos.

[...] Sociologia (no sentido aqui entendido desta palavra empregada com tantos significados diversos) significa: uma ciência que pretende compreender interpretativamente a ação social e assim explicá-la causalmente em seu curso e seus efeitos (WEBER, 1991, p. 3).

A sociologia de Weber tinha interesse na COMPREENSÃO da ação social. Por isso dissemos ‘sociologia compreensiva’. Mas, o que significa esse conceito neste autor?

‘Compreensão’ significa em todos esses casos: apreensão interpretativa do sentido ou da conexão de sentido: a) efetivamente visado no caso individual (na consideração histórica), ou b) visando em média e aproximadamente (na consideração sociológica em massa, ou c) o sentido ou conexão de sentido a ser construído cientificamente (como ‘ideal-típico’) para o tipo puro (tipo ideal) de um fenômeno frequente (WEBER, 1991, p. 6).

Caberia ao sociólogo não explicar, mas interpretar e compreender o sentido dessas ações. Segundo Weber (1991), para estabelecer uma ação significativa, o indivíduo deveria se orientar pelos comportamentos dos outros, exigindo interação e contato. Caberia ao sociólogo compreender o ponto de vista da ação e de quem a executou (KALBERG, 2010).

E como Weber pensou a AÇÃO SOCIAL? Primeiro, devemos entender que seu interesse estava voltado à ação significativa, quer dizer, dotada de sentido e significado. Ações repetitivas ou não refletidas não eram consideradas em seus estudos. A ação de uma pessoa se organiza em relação social, isto é, em sociedade e associação. Para Raymond Aron (2008, p. 803), “[...] há uma relação social quando o sentido de cada ator, de um grupo de atores que age, se relaciona com a atividade do outro, de modo que suas ações são mutuamente orientadas" (ARON, 2008, p. 803).

Mas, para Max Weber, a ação social significava uma “ação que, quanto ao sentido visado pelo agente ou os agentes, se refere ao comportamento de outros, orientando-se por este em seu curso” (WEBER, 1991, p. 3).

Page 94: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

UNIDADE 2 | PERCURSOS TEÓRICOS DA SOCIOLOGIA DA EDUCAÇÃO

84

Weber tinha o interesse em desenvolver técnicas e recursos que pudessem fazer a sociologia progredir como ciência. Para isso, Weber desenvolveu uma série de conceitos – tipos ideais – que orientaram a sua reflexão (FREUND, 2003; ARON, 2008).

Mas, o que é um tipo ideal?

A ação social se orienta pelas ações dos outros, passadas, presentes ou futuras. Esses ‘outros’ podem ser pessoas, grupos, associações conhecidos ou desconhecidos. A ação só é social quando ela está orientada em razão da expectativa das reações dos outros envolvidos numa relação social (WEBER, 1991).

Na sua análise sobre a ação social dotada de significado, Max Weber estruturou quatro tipos de ações, que procuram indicar e exemplificar:

DICAS

FONTE: Disponível em: <https://goo.gl/DLAekP>. Acesso em: 11 mar. 2018.

Típología das ações socíaís

Ação racional com relação valores: Esta associada à fidelidade aos valores individuais (ético/religioso),aos

princípios do indivíduo.

Ação emacíonal/afetíva: é definida por uma reação emocional ou humor do suj eito.

Açõo Tradícional: aquele estabelecido pela crença nos hábitos e/ou costumes.

Ação racíonal com relação a fíns: determinada pelo calculo racional previamente definido;obj etivo.

Vamos a alguns exemplos das ações sociais weberianas.

FONTE: Disponível em: <https://goo.gl/t4wS8g>. Acesso em: 19 fev. 2018.

Ação TradicionalRelaxar aos Domingos A utilização de talheres

Ação AfetivaComemorar a vitória de um time Mãe maltrata seu filho ao corrigi-lo

Ação Racional com Relação a valores

Ir a Igreja A escolha de um partido político

Ação Racional com Relação a Fins

Transações econômicas Buscar uma aprovação em um concurso

Page 95: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

TÓPICO 1 | PRIMEIRA GERAÇÃO DE SOCIÓLOGOS: DURKHEIM, MARX E WEBER

85

FIGURA 4 - TRÊS TIPOS DE DOMINAÇÃO EM WEBER

O TIPO IDEAL pode ser entendido como recurso empregado ao longo da investigação visando auxiliar o sociólogo na construção de hipóteses. São construções teóricas ou hipóteses explicativas que destacam certos aspectos de uma realidade. É um exercício de abstração e de seleção, cuja intenção é procurar e evidenciar repetições e padrões, singularizando-o e procurando conexões e causas. Ele se refere, então, a um modelo formulado pelo investigador (WEBER, 1991).

A partir deste recurso, Weber construiu uma série de tipos ideais voltados a sua compreensão sociológica. Essa intenção tinha um forte empenho em compreender o mundo moderno. Um deles e muito relevante é o de dominação. Segundo Weber (1991), as pessoas vinculam-se a relações de autoridade e subordinação que nem sempre são fisicamente violentas. Elas são legitimadas pela obediência que é construída a partir das relações de poder. Weber formulou três tipos de dominação.

São exemplos de tipos ideais o partido político, a dominação ou o capitalismo. Tomando a educação como exemplo, entendemos, de uma maneira geral, o que ela seja no Brasil ou na China. Tanto lá como aqui, ela possui certos traços destacados. Mas, como um tipo ideal não é um conceito geral, Weber recomendaria traçar o tipo brasileiro e chinês de educação. Assim, o tipo ideal auxilia a traçar comparações, indicar características mais próprias de algo em estudo.

FONTE: Weber (1991)

DICAS

Dominação Carismática Dominação Tradicional Dominação Legal

Tipos puros: profeta, herói guerreiro, grande demagogo

Vínculo entre dominador e dominado: devoção afe-tiva (irracionalidade)

Dependência do senhor em relação ao seu qua-dro administrativo

Tipo puro: dominação patriarcal

Vínculo entre domina-dor e dominado: fideli-dade

Estrutura puramente patriarcal: sultanato, despotismos / súditos

Estrutura estamental: império da honra

Tipo puro: burocracia

Tipo superior: profissional

Vínculo entre dominador e dominado: disciplina (racionalidade)

Dominação não apenas burocrática, apesar de predominar a burocracia

Page 96: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

UNIDADE 2 | PERCURSOS TEÓRICOS DA SOCIOLOGIA DA EDUCAÇÃO

86

Dissemos que Weber orientava seu olhar sociológico para a compreensão dos fenômenos individuais e coletivos da sociedade moderna. Em sua obra, a racionalização apareceu como uma marca das sociedades ocidentais modernas, que impulsionaram a imagem de uma ciência e técnica cujo foco era a previsão e o controle (WEBER, 1991). Segundo Julien Freund, a racionalização foi concebida como:

[...] resultado da especialização científica e da diferenciação técnica. Consiste na organização da vida, por divisão e coordenação de diversas atividades com base em um estudo preciso das relações entre os homens, com seus instrumentos e meios, com vistas à maior eficácia e rendimento" (FREUND, 2003, p. 19).

Como consequência da difusão da ideia de racionalização, Weber (1991) indicou o fenômeno do "desencantamento do mundo", resultando na perda de sentidos e de explicações místicas, religiosas ou mágicas do mundo. A ideia de desencantamento e “desmagificação” do mundo pela ciência e as engrenagens da racionalidade dão um tom negativo às análises weberianas da época moderna. Do ponto de vista identitário, as implicações foram muitas. A modernidade está ligada ao que se conhece por “desencantamento” (desmagificação) do mundo, isto é, quando “os valores do mundo foram racionalizados e sublimados em termos de suas próprias leis” (WEBER, 1982, p. 274).

Significa principalmente, portanto, que não há forças misteriosas incalculáveis, mas que podemos, em princípio, dominar todas as coisas pelo cálculo. Isto significa que o mundo foi desencantado. Já não precisamos recorrer aos meios mágicos para dominar ou implorar aos espíritos, como fazia o selvagem, para quem esses poderes misteriosos existiam. Os meios técnicos e os cálculos realizam o serviço (WEBER, 1982, p. 165).

Neste mundo racionalizante, o sagrado, ou excepcional, desapareceu, expulso pelos homens. Neste mundo material, desencantado, a religião tem de se retirar para a intimidade da consciência, ou escapar para além de um deus transcendente e um destino individual depois da existência terrena (ARON, 2008).

Outra face da racionalização foi a burocratização das sociedades ocidentais. A burocracia se situa ao nível da dominação racional-legal, comum às nossas

Caráter unipessoal, mas torna-se cotidiana quan-do converte-se para d. tradicional; o quadro ad-ministrativo passa a legal ou estamental; ocorre a sucessão

Dominação patriarcal: chefe da parentela / fun-cionário doméstico

Há burocracias eletivas e corporações colegiadas

FONTE: Disponível em: <http://slideplayer.com.br/slide/3127718/11/images/6/Max+Weber+e+os+tr%-C3%AAs+tipos+puros+de+domina%C3%A7%C3%A3o+leg%C3%ADtima.jpg>. Acesso em: 22 mar. 2018.

Page 97: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

TÓPICO 1 | PRIMEIRA GERAÇÃO DE SOCIÓLOGOS: DURKHEIM, MARX E WEBER

87

sociedades modernas. A burocracia moderna é um tipo de dominação, mas não é total, já que os cargos mais elevados são sempre políticos, não burocráticos.

A dominação burocrática significa socialmente: (1) a tendência de nivelamento através da possibilidade de recrutamento dos mais qualificados profissionalmente. (2) Tendência à plutocratização justificando uma formação profissional mais longa (durando o maior tempo possível — frequentemente até o final da trintena). (3) A dominação da impessoalidade formalista SINE IRA ET STUDIO, sem ódio e sem paixão, ou seja, sem “amor”, sem “entusiasmo”, submetida tão-somente à pressão do dever estrito. Sem consideração das pessoas, formalismo igual para todos, isto é, para todos os interessados que se encontrem na mesma situação de fato. Assim conduz sem ofício o funcionário ideal (WEBER, 1991, p. 179-180).

Agora vejamos como essa sociologia weberiana percebia a educação e como esta abordagem pode ser útil à sociologia da educação.

4.2 WEBER E A EDUCAÇÃO

Como Max Weber pensava a educação? Dentro dos aspectos de sua sociologia compreensiva, Weber refletiu em alguns textos e obras sobre a educação na sociedade moderna. Aqui temos um elemento fundamental para Weber: o mundo moderno.

Neste autor, indicamos duas entradas possíveis no tema da educação. Em primeiro lugar, indicamos sua tipologia de educação, conforme seus estudos sobre a China antiga. Existe um exercício de construção de tipos ideais, por meio dos quais ele pensou a educação como uma importante dimensão na socialização dos indivíduos em sociedade.

Da mesma forma, os sistemas de ensino modernos precisavam preparar indivíduos para assumir funções no Estado e no comando da burocracia.

A Educação sistemática, na análise de Weber, tornou-se um “conjunto” de conteúdos e regras direcionadas para a qualificação de pessoas que demonstrassem reais possibilidades de gerenciar o Estado, as empresas e a política, de maneira “racional”. A Educação, segundo o modelo ideal weberiano, é socialmente conduzida a três tipos de finalidades:1. Despertar o carisma (não estabelece exatamente uma pedagogia, pelo fato de não se destinar a pessoas simples, mas tão somente àquelas com capacidade de demonstrar qualidades excepcionais: características dos heróis guerreiros da antiguidade e do mundo medieval, que eram educados para adquirir uma “nova alma”, renascer);2. Preparar o aluno para uma conduta de vida (Weber chama de pedagogia do cultivo, pois propõe-se a formar o homem culto, cujo ideal de cultura seja condicionado ao meio social para o qual está sendo preparado, implicando sua preparação para algumas formas de comportamento);

Page 98: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

UNIDADE 2 | PERCURSOS TEÓRICOS DA SOCIOLOGIA DA EDUCAÇÃO

88

3. Transmitir conhecimento especializado (pedagogia do treinamento: que ocorre com a racionalização da vida social, o aumento do processo de burocratização do aparelho estatal, dominação política e do corporativismo capitalista privado. Neste processo, a educação deixa gradualmente de ter como objetivo a formação do homem para o exercício da cidadania no contexto social, mas para formar o especialista funcional que o capital precisa) (WEBER, 1982, p. 482).

Weber entende a educação como um conceito amplo; em suas obras,

encontramos considerações sobre a educação religiosa, a educação familiar, a educação filosófica, a educação carismática, a educação literária, a educação política e a educação especializada. Dentro desse sentido, a educação se tornou um espaço de estratificação social, onde a racionalização e a burocratização alteraram radicalmente o modo de educar e o status que é o reconhecimento e o acesso a bens materiais por parte dos indivíduos que se submetem à educação (RODRIGUES, 2001).

Por esse caminho, em Weber (2004), a educação é um recurso que promove a seleção social e possui fins diferentes de acordo com a forma de dominação existente numa referida sociedade. Vale ressaltar que a dominação ocorre em diferentes instituições, inclusive na escola. O que nos leva a outra entrada possível numa Sociologia da Educação com base em Weber. Ou, como disse o autor: “Naturalmente, essas certidões ou diplomas fortalecem o 'elemento estamental' na posição do funcionário” (WEBER, 1982, p. 233).

Os diplomas, certificados e títulos tornam-se recursos de poder, voltados a

[...] as pretensões de serem admitidas em círculos que seguem “códigos de honra”, pretensões de remuneração “respeitável” ao invés da remuneração pelo trabalho realizado, pretensões de progresso garantido e pensões na velhice e, acima de tudo, pretensões de monopolizar cargos social e economicamente vantajosos (WEBER, 1982, p. 172).

A escola pode ser vista como uma organização burocrática. Numa organização desse tipo, as rotinas, os manuais, as leis, os estatutos e as técnicas legitimam e dão base para a ação dos funcionários. Estes são escolhidos a partir de critérios que são definidos em concursos e formas controladas de acesso. Da mesma maneira, a organização burocrática possibilitava a sintonização dos diversos setores, agilizando os trabalhos.

Em segundo lugar, a conexão íntima entre sua visão e análise do mundo moderno e dos seus eixos determinantes de ação, como a racionalização. A Escola Moderna deu origem ao tipo de educação sistemática, voltada não apenas a socializar e integrar os indivíduos, mas prepará-los para exercer essa racionalidade em suas possibilidades presentes e futuras no interior do capitalismo. Portanto, a educação moderna tratava de potencializar não um indivíduo abstrato, mas um tipo específico, racional e capitalista, voltado à crescente racionalização e divisão social do trabalho.

Page 99: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

TÓPICO 1 | PRIMEIRA GERAÇÃO DE SOCIÓLOGOS: DURKHEIM, MARX E WEBER

89

Aqui voltamos com a discussão sobre o desencantamento do mundo, essa tese weberiana importante de sua sociologia. A ciência ocidental moderna teve como principal consequência o “desencantamento do mundo” (WEBER, 2002, p. 97). O que isso significa? Que o mundo tornou as explicações racionais, lógicas, possíveis de verificação e demonstração, dando pouco lugar para as explicações místicas, sobrenaturais, religiosas. Da mesma forma, o Estado moderno seria um agrupamento de dominação que apresenta caráter institucional e que procurou monopolizar, nos limites de domínio e que, tendo esse objetivo, reuniu nas mãos dos dirigentes os meios materiais de gestão (p. 62). Por este motivo é que Weber entende que o Estado moderno é todo fundamentado no modelo racional.

Por esse caminho, a Sociologia de Weber nos permite entender a presença da especialização no cenário de nossa vida atual. A educação moderna, sistemática, é voltada a treinar os estudantes a realizar tarefas consideradas úteis às instituições públicas e privadas, repassando conhecimento especializado, parcial, fragmentado. Tratava-se, portanto, de um treinamento racional e especializado, reforçando outras dimensões racionalizadas da sociedade e atuando como formadora de estratificação social. O capitalismo moderno educaria e criaria para si mesmo os sujeitos econômicos de que necessita (WEBER, 2004). No caminho inverso, diminuíram os espaços de ação de indivíduos ou grupos e instituições no sentido da educação como formação humana mais geral.

Page 100: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

90

RESUMO DO TÓPICO 1

Neste tópico você estudou que:

• O Tópico 1 tratou da relação entre a sociologia e a educação na perspectiva dos sociólogos da primeira geração, também conhecidos como clássicos, dando ênfase a Émile Durkheim, Karl Marx e Max Weber.

• Foram sociólogos que viveram e escreveram ao longo do século XIX, tendo vivido as fortes mudanças sociais provocadas pela Revolução Francesa e Revolução Industrial, pelo capitalismo e o crescimento da urbanização. Ao mesmo tempo, assistiam ao declínio da tradição e a emergência da Modernidade.

• Émile Durkheim foi o sociólogo da primeira geração que mais diretamente tratou do tema da educação. Ele a percebia como um fato social e uma instituição social central para a socialização e integração das novas gerações e da difusão da moral social. Ele defendia uma escola pública e laica.

• Karl Marx não tratou diretamente da educação, mas em diversos textos discutiu o seu papel numa sociedade capitalista, a partir do seu método materialista-histórico e da dialética. Para Marx, a educação burguesa não estava voltada à ampliação da capacidade humana. Ele defendia a escola pública, laica e articulada com o trabalho.

• Max Weber indicou interessantes caminhos para pensar a relação entre sociologia e educação. Através de seu método compreensivo, ele indicou que a educação na Modernidade era uma tarefa especializada, burocratizada e refletia os valores das classes dominantes.

Page 101: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

91

AUTOATIVIDADE

1 Karl Marx não tratou diretamente da educação. Mas, em diversos textos, discutiu o seu papel numa sociedade capitalista, a partir do seu método materialista-histórico e da dialética. Para Marx, a educação burguesa não estava voltada à ampliação da capacidade humana. Ele defendia a escola pública, laica e articulada com o trabalho. Um conceito importante da reflexão de Marx é sobre a educação num perfil omnilateral. A respeito da educação omnilateral, analise as afirmativas a seguir, indicando a alternativa CORRETA:

a) ( ) A educação omnilateral indica a escola como uma organização burocrática, organizando as rotinas, as leis, os estatutos e as técnicas que legitimam e dão base para a ação dos funcionários.

b) ( ) A educação omnilateral tem um sentido multilateral e integral, estando voltada ao estímulo da personalidade de forma a tornar o ser humano capaz de produzir e fruir ciência, arte, técnica.

c) ( ) A educação omnilateral significa que educação é uma “ação deliberada” de uma geração mais velha e socialmente preparada sobre uma geração mais jovem, fornecendo os elementos morais para a vida em sociedade.

d) ( ) A educação omnilateral indica o peso da ideologia na escola, percebendo-a como um aparelho ideológico que exerce influência nas formas de pensar e agir dos indivíduos, sejam alunos ou profissionais.

2 Émile Durkheim foi o sociólogo da primeira geração que mais diretamente tratou do tema da educação. Ele a percebia como um fato social e uma instituição social central para a integração das novas gerações e da difusão da moral social. A respeito de como Durkheim percebia a educação, analise as afirmativas a seguir, indicando a alternativa CORRETA:

a) ( ) A educação moderna tratava de potencializar não um indivíduo abstrato, mas um tipo específico, racional e capitalista, voltado à crescente racionalização e divisão social do trabalho e para assumir postos na administração.

b) ( ) Educação e a escola repassam os valores dominantes para os seus operários, que os reproduzem ou não, estando elas a serviço da reprodução das ideologias burguesas e da sua divisão social do trabalho.

c) ( ) A educação é uma “ação deliberada” de uma geração mais velha e socialmente preparada sobre uma geração mais jovem, visando fornecer a esta os elementos morais e comportamentais necessários para a vida em sociedade.

d) ( ) Educação é a principal força de desenvolvimento no que se refere ao capital humano e capital social, aparecendo como o mais importante investimento público no sentido de estimular a eficiência e a coesão social.

Page 102: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

92

3 Max Weber é um dos sociólogos pioneiros. Sua reflexão sobre o papel da educação nas sociedades modernas acompanha a produção sociológica weberiana que enfatizava os aspectos racionalizantes do mundo moderno. A respeito da educação moderna no cenário de racionalização proposto por Weber, analise as afirmativas a seguir, indicando a alternativa CORRETA:

a) ( ) A educação moderna reproduz as contradições da sociedade em geral, favorecendo o desempenho escolar de certos alunos familiarizados com os conteúdos e códigos escolares, cultivados por famílias previamente socializadas nesses valores.

b) ( ) A educação moderna é sistemática, sendo voltada a treinar os estudantes a realizar tarefas consideradas úteis às instituições públicas e privadas, repassando conhecimento especializado, parcial, fragmentado.

c) ( ) A educação moderna, por meio de seus sistemas de ensino e das escolas, está voltada apenas às necessidades da divisão social do trabalho e da geração de mais-valia, ampliando o capitalismo.

d) ( ) A educação moderna consiste num esforço contínuo e sem pausas para impor às crianças e jovens as maneiras de ver, de sentir e de agir às quais elas não chegariam espontaneamente.

Page 103: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

93

TÓPICO 2

GERAÇÃO DA PRIMEIRA METADE DO SÉCULO XX:

MANNHEIM, PARSONS, ELIAS, GRAMSCI, ESCOLA DE

FRANKFURT, HABERMAS E ALTHUSSER

UNIDADE 2

1 INTRODUÇÃO

De uma maneira intermediária, focamos numa geração de sociólogos que nascem no século XIX, mas que se lançaram ao estudo das sociedades ao longo da primeira parte do século XX. Chamamos esses sociólogos de geração da primeira metade do século XX.

O contexto histórico envolvendo o grupo de pensadores que integram a chamada geração da primeira metade do século XX é marcado por intensas tensões sociais decorrentes da Primeira e da Segunda Guerra Mundial. Na obra de Hobsbawn sobre o século XX (A era dos extremos), esse período foi descrito como a era da catástrofe que combinou a calamidade imposta pelas guerras que envolveram as grandes potências mundiais e, consequentemente, abalaram as estruturas do que se entendia até então como civilização; da ascensão econômica dos EUA, da Revolução Russa; da crise de 1929 e uma nova configuração das grandes forças mundiais (HOBSBAWN,1995).

Consideramos, então, estudos desenvolvidos e fortemente influenciados por esse cenário social para apresentar a seleção de contribuições para a sociologia da educação, que você acompanhará a seguir. Lembramos que nossa ambição aqui não é esgotar as teorias sociais do período ou descrever com profundidade os estudos desenvolvidos, mas sim apresentar a você, prezado acadêmico, contribuições para a sociologia da educação a partir da teoria social da primeira metade do século XX.

2 KARL MANNHEIM: PLANEJAMENTO E TÉCNICA SOCIAL

Inicialmente é importante lembrar que assim como outros sociólogos que se dedicaram à compreensão das relações entre educação e sociedade, Mannheim reconhece as influências exercidas pela sociedade na escola e, também, as influências da escola para a sociedade.

A sociologia de Karl Mannheim (1893-1947), inspirada na teoria de Weber, tem como foco uma proposta de intervenção através de um planejamento racional:

Page 104: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

UNIDADE 2 | PERCURSOS TEÓRICOS DA SOCIOLOGIA DA EDUCAÇÃO

94

Para que essa intervenção racional possa ocorrer, Mannheim defende a ideia de que haja nas sociedades modernas um planejamento democrático que possibilite a coordenação racional de diferentes técnicas sociais, como a educação, a administração, a propaganda etc. (PILETTI; PRAXEDES, 2010, p. 44).

Nesse sentido, a educação é considerada pelo autor como uma técnica social que deverá ser utilizada na elaboração racional do planejamento democrático. Através da educação, assim como da administração e da propaganda, será possível intervir nas sociedades modernas.

A teoria de Mannheim sobre a educação foi apresentada na Unidade 1. Aproveite esse momento para relembrar seus estudos.

NOTA

Então, o que seriam as técnicas sociais? Na concepção de Mannheim, as técnicas sociais são meios para exercer um controle social adequado e métodos para influenciar o comportamento do indivíduo, visando à integração do indivíduo aos padrões de interação e organização sociais (PILETTI; PRAXEDES, 2010).

Seguindo pela compreensão da educação como técnica social, “[...] a educação é caracterizada por ele como uma possibilidade de desenvolvimento e construção do equilíbrio social, em que, contudo, seja transformada em uma técnica de manipulação dos grupos sociais” (PILETTI; PRAXEDES, 2010, p. 44).

Mannheim preocupava-se com as mudanças e transformações das escolas para adaptação aos padrões das sociedades modernas e com o planejamento dos processos de socialização das novas gerações para adequação à sociedade planificada. E afirmava que a função da escola em uma nova sociedade é fundamental devido à diminuição do protagonismo da família e da comunidade nos processos de educação (PILETTI; PRAXEDES, 2010).

Na concepção de Mannheim é necessário não somente explicar o que é a educação, mas também o que a educação pretende ser.

A definição do que é educação envolve a análise de técnicas, e a definição de suas metas refere-se a uma determinação de valores que ajuda a decidir, entre outras coisas, quais métodos devem ser usados. Dessa maneira, ao mencionar a diferença entre uma discussão de métodos educacionais e metas educacionais, desejo também acentuar as relações recíprocas entre ambos (MANNHEIM; STEWART, 1972, p. 30-31).

Page 105: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

TÓPICO 2 | GERAÇÃO DA PRI. MET. DO SÉC. XX: MANNHEIM, PARSONS, ELIAS, GRAMSCI, ESC. FRANKFURT, HABERMAS E ALTHUSSER

95

Ao elaborar a distinção e as relações entre métodos e metas, Mannheim descreve desafios nas escolhas e decisões tomadas por professores no que diz respeito à influência da educação no indivíduo, aos limites de atuação do professor e ao significado da educação.

Quando dizemos que tencionamos ensinar um conjunto de ideias a crianças, enfrentamos imediatamente o problema de ordenar essas ideias com alguma precisão e as nossas razões para apresentá-las. Em segundo lugar, defrontamos também com o problema da escolha dos meios pelos quais apresentaremos as ideias. E, em terceiro lugar, cumpre-nos considerar qual o efeito que podem ter, tanto o método de apresentar ideias quanto as próprias ideias. Significará o educar uma inculcação ou doutrinação firme e definitiva ou envolverá apenas uma orientação? Talvez seja uma coisa ou outra em diferentes ocasiões. Temos em mente a forma desejada na qual esperamos que cresça o organismo, ou damos destaque ao próprio crescimento, seja qual for o caminho escolhido pelo aluno dentro dos limites da sociedade? (MANNHEIM; STEWART, 1972, p. 31).

Agora que sabemos a função atribuída para a escola em uma nova sociedade e os questionamentos levantados por ele a respeito dos métodos e metas, podemos nos questionar sobre a função que o sociólogo atribui para a escola na sociedade moderna. Pois bem, podemos identificar três funções para a escola: transmissão de informações, formação dos sujeitos e formação para o mercado de trabalho.

A TRANSMISSÃO DE INFORMAÇÕES diz respeito à seleção e compartilhamento de conteúdos culturais e técnicos compartilhados com as novas gerações para possibilitar sua adequação à ordem social. A FORMAÇÃO DE SUJEITOS decorre da necessidade de formar indivíduos com valores e atitudes que incentivem a busca por conhecimento para a vida em sociedade. E a FORMAÇÃO PARA O MERCADO DE TRABALHO representa a necessidade de desenvolver comportamentos e adquirir conhecimentos que permitam a inserção no mercado de trabalho (PILETTI; PRAXEDES, 2010).

E a sociologia? Quais contribuições a teoria social pode oferecer para a compreensão dos processos educativos? Para Mannheim (1976), a sociologia na busca pela compreensão da sociedade moderna elabora reflexões que auxiliam a problematização das influências sociais exercidas sobre os sujeitos através das instituições.

[...] A Sociologia também está ligada ao estudo da educação porque trata do funcionamento da sociedade em particular. É importantíssimo reconhecer esse tipo de influência que uma sociedade exerce sobre seus membros através de suas instituições e situações que elas criam. (MANNHEIM; STEWART, 1972, p. 30-31).

Para além de uma visão restrita da educação no espaço escolar e no contexto da sala de aula, Mannheim destaca o caráter social da educação.

Page 106: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

UNIDADE 2 | PERCURSOS TEÓRICOS DA SOCIOLOGIA DA EDUCAÇÃO

96

A educação, tal e qual ocorre nas escolas e outras instituições, é sobretudo um assunto social. É um processo dinâmico, baseado na plasticidade da natureza humana e que colima a seleção de experiências sociais e pessoais para apresentação concentrada. Quando nos referimos ao estudo da educação tendemos a pensar que ele deveria ocupar-se apenas das técnicas da sala de aula, mas não é assim. A sala de aula e os assuntos nela ensinados são, é claro, vitalmente importantes, mas além disso, também nos interessa a aprendizagem, tal como a compreende cada um de nós, e todas as influências educacionais que participam da formação dos meios a que cada pessoa reage (MANNHEIM; STEWART, 1972, p. 31).

Em outras palavras, é essencial a dedicação em compreender fenômenos, relações e hierarquias estabelecidos no espaço da escola, contudo não podemos considerá-la como um espaço fechado dos métodos e das técnicas. É fundamental dedicar ao percurso educativo e à forma como os indivíduos se transformam nesse processo.

É fundamental dedicar ao percurso educativo e à forma como os indivíduos se transformam nesse processo.

De maneira geral, destacamos as contribuições de Mannheim no sentido do desenvolvimento de um planejamento racional capaz de promover um processo de democratização. A educação é entendida como técnica social com capacidade de conduzir a sociedade para o equilíbrio. Nesse sentido, a função da escola se concentra na formação dos indivíduos através da transmissão de informações.

2.1 TALCOTT PARSONS: AÇÃO E SISTEMA SOCIAL

As contribuições da teoria funcionalista para a sociologia da educação podem ser consideradas como representantes das análises que fazem uso da noção de sistema social. Compreendendo a sociedade como um conjunto de elementos interdependentes que formam uma estrutura complexa.

Para Mannheim (1976), a filosofia, a psicologia e a sociologia apresentam contribuições essenciais para a compreensão da educação, pois a educação molda o indivíduo tanto para se adequar à sociedade, quanto para a construção da autonomia.

NOTA

Page 107: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

TÓPICO 2 | GERAÇÃO DA PRI. MET. DO SÉC. XX: MANNHEIM, PARSONS, ELIAS, GRAMSCI, ESC. FRANKFURT, HABERMAS E ALTHUSSER

97

A teoria de Parsons sobre a educação foi apresentada na Unidade 1. Aproveite esse momento para relembrar seus estudos.

Funcionalismo Parsons considera que as sociedades estão estruturadas com base em quatro sistemas: o cultural, o social, o da personalidade e o do organismo, este nos aspectos que se relacionam ao comportamento (PARSONS, 1951). O sistema cultural tem como unidade básica de análise o significado. A ação humana não é possível sem sistemas simbólicos relativamente estáveis, ou seja, sem valores compartilhados que, entre outras coisas, definem o que é bom e mau, certo e errado, inferior e superior etc. Tais valores são internalizados através da socialização, ou seja, do processo pelo qual as pessoas se preparam para exercer papéis na sociedade e se integram à vida social (LEVY, 1965). Desta forma, a socialização – que inclui em seu bojo a educação formal – é uma poderosa força integrativa da sociedade.

O sistema social, por sua vez, inclui uma pluralidade de indivíduos que interagem entre si. Como tais indivíduos desempenham papéis sociais, eles são chamados atores. Os atores atuam num "palco", ou seja, num ambiente, que delimita a situação onde a interação ocorre. A relação dos atores com as situações é definida e mediatizada pelos símbolos compartilhados do sistema cultural. Os atores são motivados por uma tendência a otimizar as gratificações que recebem. Por exemplo, as pessoas numa festa desempenham papéis sociais, agem de acordo com determinados valores e se comunicam através de símbolos que têm significados comuns. O "palco" pode ser um clube. No entanto, o sistema social pode incluir, como atores, grupos e não só indivíduos, a exemplo dos países membros da Organização das Nações Unidas.

Já o sistema de personalidade tem no ator individual sua unidade básica. Os indivíduos têm suas próprias necessidades, atitudes e motivações, como a motivação no sentido de maximizar suas gratificações.

Por fim, o organismo, em seus aspectos que se relacionam ao comportamento, inclui o organismo biológico propriamente dito (que permite a interação social) e o meio físico em que o organismo vive.

FONTE: GOMES, Candido A. C. Enfoques teóricos da sociologia da educação. Disponível em: <http://bibliotecadigital.fgv.br/ojs/index.php/fe/article/viewFile/60672/58911>. Acesso em: 9 mar. 2018.

NOTA

NOTA

Talcott Parsons (1902-1979) é considerado o principal representante do funcionalismo. O sociólogo ficou conhecido por afirmar que as estruturas sociais são formadas pelos sistemas: cultural, social, personalidade e organismo e por diferenciar as sociedades tradicionais e modernas através de um processo contínuo e gradual de mudança (GOMES, 1983).

Page 108: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

UNIDADE 2 | PERCURSOS TEÓRICOS DA SOCIOLOGIA DA EDUCAÇÃO

98

O entendimento da socialização como processo de aprendizagem está presente na obra do sociólogo:

A aprendizagem dos padrões de comportamento característico da cultura adulta requer novos tipos de generalização, incluindo símbolos tirados de situações particulares e que se referem à classes de objetos por meio da linguagem [...] Para aprender tais generalizações, devem ser substituídas as fixações particulares, essenciais nas etapas iniciais do desenvolvimento. [...] concorda-se em considerar que o desenvolvimento da identificação com os objetos dos adultos seja um mecanismo essencial no processo de socialização (PARSONS apud CASTRO; DIAS, 2005, p. 228).

Logo, o processo de socialização através do compartilhamento de novas generalizações para substituir as generalizações particulares permite adequar o indivíduo para convivência no mundo adulto. É fundamental para a socialização esse processo de identificação com as referências que fazem sentido para os adultos.

Como se dá a apropriação das novas generalizações? “Para o presente propósito, a característica mais significativa da identificação consiste em que a criança aceite os valores do adulto nos contextos apropriados, isto é, o que o adulto quer para a criança, esta chega a querer para si mesma” (PARSONS apud CASTRO; DIAS, 2005, p. 228).

É importante considerar que parte significativa dos estudos do funcionalismo se dedicou às questões relativas à educação. Afinal, “o funcionalismo enfatiza a integração social e a educação é um dos sistemas integradores responsáveis pela socialização” (GOMES, 1983, p. 17).

Para compreendermos as análises de Parsons é importante relembrar os conceitos de ação social e sistema social presentes em sua teoria:

A ação consiste em estruturas e processos através dos quais os seres humanos formam intenções significativas e, com maior ou menor êxito, as executam em situações concretas. A palavra “significativa” supõe o nível simbólico ou cultural de representação e referência. Consideradas em conjunto, as intenções e a implementação implicam uma disposição do sistema de ação – individual e coletivo – para modificar sua relação com sua situação e ambiente numa direção desejada.

O ponto de partida fundamental é conceito de sistemas sociais de ação [...] A interação de atores individuais ocorre sob tais condições que é possível tratar desse processo de interação como um sistema, no sentido científico, e submetê-lo à mesma ordem de análise teórica que, com êxito, é aplicada aos outros tipos de sistema em outras ciências.

FONTE: CASTRO, Ana Maria de; DIAS, Edmundo Fernandes de. Introdução ao pensamento sociológico: Durkheim, Weber, Marx e Parsons. 18. ed. São Paulo: Centauro, 2005.

IMPORTANTE

Page 109: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

TÓPICO 2 | GERAÇÃO DA PRI. MET. DO SÉC. XX: MANNHEIM, PARSONS, ELIAS, GRAMSCI, ESC. FRANKFURT, HABERMAS E ALTHUSSER

99

Considerando a relevância do processo de socialização para o sistema social, Parsons nos mostra, ao elaborar a teoria funcionalista da estratificação social, que a sala de aula é um espaço no qual são moldadas as personalidades no âmbito técnico e motivacional para cumprirem seu papel na sociedade.

A sala de aula desenvolve nos indivíduos cometimento à implementação dos valores sociais e ao desempenho de tipos específicos de papéis na estrutura social. Desenvolve também a competência ou as habilidades necessárias aos papéis individuais. Além disso, a sala de aula institucionaliza uma progressiva diferenciação de status em bases não biológicas, ou seja, fundamentada no aproveitamento dos alunos. Em consequência, a sala de aula deve ser considerada como uma agência de alocação de mão de obra (GOMES, 1983, p. 18).

Essa visão corresponde à crença na educação como propulsora de uma sociedade democrática baseada na meritocracia e na competência técnica. A realização é o elemento-chave nessa sociedade: o status é conferido pela realização e não por atributos. A sociedade teria uma base justa considerando a seleção dos mais capazes. Os papéis sociais se tornam complexos e as habilidades devem ser desenvolvidas através da educação formal. Dessa forma, “os mais motivados e preparados preencherão as posições mais altas” (GOMES, 1983, p. 18).

Nesse sentido, temos a função da socialização, que “pode ser resumida como o desenvolvimento dos comprometimentos e capacidades do indivíduo, que são pré-requisitos fundamentais de seu futuro desempenho de papéis” (PARSONS apud CASTRO; DIAS, 2005, p. 228).

Enfatizamos aqui a contribuição de Parsons para uma análise funcionalista da sociedade compreendendo a educação como parte do sistema social responsável pela socialização. Cabe à educação moldar os sujeitos para se adequarem aos padrões sociais (técnicos e morais) no contexto de um processo de seleção social baseado na meritocracia.

2.2 NORBERT ELIAS: CONTRIBUIÇÕES DA SOCIOLOGIA PROCESSUAL PARA A EDUCAÇÃO

A sociologia de Norbert Elias (1897-1990), conhecida como sociologia processual, nos permite desenvolver um olhar sociológico sobre os processos civilizatórios. Ao analisar o desenvolvimento desse processo, buscou a superação da polaridade entre indivíduo e sociedade presente nas abordagens clássicas. Como Elias analisou a sociedade sem fazer uso da polarização indivíduo e sociedade? Através da compreensão dos aspectos dinâmicos das relações sociais. Dedicou-se ao estudo de temas variados pela perspectiva do conjunto das relações sociais e da interdependência dessas relações.

Para realizar tal tarefa ele fez uso de dois conceitos pelos quais ficou conhecido: configuração ou figuração e habitus. Esses conceitos permitiram ao autor demonstrar que há uma determinação social, porém também existem

Page 110: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

UNIDADE 2 | PERCURSOS TEÓRICOS DA SOCIOLOGIA DA EDUCAÇÃO

100

relações de interdependência que formam configurações sociais. Nem todas as nossas ações são propositais, ao tempo que o habitus representa a formação de padrões repetidos e esperados dos indivíduos (NERY, 2013).

A compreensão do conceito de figuração utilizado por Elias é fundamental para nos apropriarmos de suas análises. Nas palavras de Ribeiro (2010, p. 165): [...] as figurações são redes de interdependência humanas moldadas por formas estruturais específicas, porém flexíveis e sujeitas a constantes transformações. Podemos considerar, por exemplo, escolas, exércitos, famílias, nações como figurações sociais específicas. Essas redes de interdependência são constituídas pelos indivíduos que se ligam, voluntária e involuntariamente, por meio de suas inclinações e necessidades. Um argumento básico, porém eficaz, é que as pessoas precisam viver em sociedade para sobreviver, tanto individualmente, como em grupo.

IMPORTANTE

Você já deve se perguntar: Elias se dedicou à temática da educação? Como posso fazer uso dessa abordagem para compreender a educação? Pois bem, vamos lá! Elias não desenvolveu uma teoria específica sobre a educação, muitos manuais de Sociologia da Educação não costumam apresentar o autor e suas obras como contribuições nesse campo. Contudo, estudiosos da educação identificaram contribuições significativas da sociologia processual de Elias para o estudo do campo.

Nas palavras de Nery (2013, p. 134):

A sociologia processual de Elias possibilita a realização de uma análise de caráter psicossociológico, que será sempre necessária para que possamos abordar os processos educativos e a própria função social da educação no contexto das sociedades contemporâneas. A abrangência de sua abordagem sociológica pode nos permitir compreender a escola, ou a instituição escolar, como estrutura que abriga personalidades individuais e, como estas estão em relação de interdependência, é possível compreender também a formação de uma segunda natureza que pode estar a influenciar maneiras de pensar, de sentir, de agir e padrões comportamentais em processos interativos, como é o processo educacional.

Vamos destacar alguns pontos importantes nesse sentido: primeiramente, a contribuição de Elias no propósito de olhar a educação como processo e sua função na medida em que vê a relação entre personalidade e estrutura social. Os esforços para entender as relações de interdependência favorecem a compreensão da educação na complexidade das sociedades atuais. Em segundo lugar, o entendimento da escola (instituição) enquanto estrutura que comporta a diversidade dos sujeitos. Abre-se aqui a possibilidade de atentar para a influência da escola no comportamento dos indivíduos ao conformar saberes, práticas e valores.

Page 111: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

TÓPICO 2 | GERAÇÃO DA PRI. MET. DO SÉC. XX: MANNHEIM, PARSONS, ELIAS, GRAMSCI, ESC. FRANKFURT, HABERMAS E ALTHUSSER

101

Ainda no campo da educação, as formas de apropriação da cultura também são contempladas pelas análises do processo civilizatório de Elias. A apropriação da cultura pode ser considerada no sentido dos modos de leitura e na relação dos indivíduos com os livros. Outro ponto diz respeito à referência dos bens simbólicos no espaço social e nos processos em que ações de constrangimento fazem parte do processo de socialização. A noção de civilização faz referência a uma pedagogia do comportamento para adequação social, aprendemos boas maneiras como aprendemos gramática e ortografia (LEÃO, 2007).

A compreensão das relações estabelecidas no condicionamento do sujeito também integram as análises de Elias, contribuindo para reflexões acerca do ser professor. Nos escritos do sociólogo, os sujeitos representam seus papéis nas relações sociais influenciados por relações de força, por exemplo, as relações construídas entre professor, alunos, pais, gestão etc. Dessa forma, para analisar o que é ser professor devemos considerar essas relações de forças que envolvem questões políticas, religiosas, educacionais e familiares que exercem influência sobre a educação (HUNGER et al., 2011).

A teoria elaborada por Elias nos leva a diferentes reflexões quando direcionamos nosso olhar para a educação. Destacamos aqui a reflexão a respeito da relação entre personalidade e estrutura, do reconhecimento das diversidades, das formas de apropriação dos bens culturais no processo civilizatório e também nas relações de poder no contexto escolar.

2.3 ANTONIO GRAMSCI: HEGEMONIA E EDUCAÇÃO HUMANÍSTICA

Antonio Gramsci (1891-1937) ficou conhecido por seus posicionamentos políticos de caráter marxista revolucionário que o levaram a elaborar uma análise original sobre a educação. Tanto do ponto de vista de uma crítica à educação no capitalismo, quanto da proposição de uma educação para o socialismo.

Cabe aqui uma breve menção ao contexto histórico no qual Gramsci desenvolveu sua abordagem, afinal sua obra mais conhecida, Cadernos do Cárcere, é formada pelo conjunto de anotações produzidas por ele enquanto preso político do fascismo italiano. Logo, o cenário observado e vivenciado por ele foi do período entre a Primeira e a Segunda Guerra. Em decorrência de seu posicionamento político, se dedicou ao projeto de sociedade socialista.

A proposição de uma escola unitária afirma a necessidade de humanizar os processos educacionais. Defende uma educação humanista voltada para uma sociedade igualitária e livre.

Considerando a crítica elaborada pelo sociólogo e a proposição de outra forma de educação, qual seria a função da escola? Segundo ele, a escola é

Page 112: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

UNIDADE 2 | PERCURSOS TEÓRICOS DA SOCIOLOGIA DA EDUCAÇÃO

102

responsável pela formação dos indivíduos que desempenham funções intelectuais na sociedade.

Sobre os intelectuais, afirma que existem dois tipos: os tradicionais e os orgânicos:

As sociedades modernas capitalistas necessitam na sua época – e as sociedades socialistas necessitarão no futuro – que sejam formados trabalhadores intelectuais orgânicos, com competência organizativa e administrativa, hábeis no emprego das novas tecnologias, e não mais um trabalhador intelectual tradicional formado em um ensino retórico, por meio da pedagogia dos jesuítas que valorizava a aprendizagem do grego e do latim (PILETTI; PRAXEDES, 2010, p. 62. Grifo nosso).

As transformações sociais implicam a necessidade de adaptação do sistema escolar. Esse fato não é algo novo, pois quando pensamos na escola como responsável pela socialização ou quando vislumbramos a escola pela perspectiva da reprodução social, fica evidente que mudanças sociais significam mudanças na escola.

Prezado acadêmico! Vamos parar um instante para verificar as experiências escolares que conhecemos? A escola mudou, porém não mudou na mesma velocidade que a sociedade. Vamos pensar em um exemplo desse processo: os alunos que estão em fase escolar nesse momento histórico são nativos digitais. Entretanto, muitos de seus professores não tiveram contato com tecnologias como computadores, internet e smartphones durante a maior parte de suas vidas. Muitos até hoje não incorporaram essas tecnologias a suas rotinas de trabalho.

Não estamos aqui fazendo a defesa ou condenando o uso das tecnologias em sala aula, estamos mostrando um exemplo do descompasso entre a escola e a sociedade. E, também, dos reflexos da desigualdade social nas escolas. Parte significativa dos estudantes brasileiros passa o tempo fora de escola interagindo com recursos tecnológicos bem diferentes e avançados em relação àqueles encontrados em seus ambientes escolares. Outra parte, por sua vez, mesmo fazendo parte de uma geração de nativos digitais, não tem acesso às tecnologias.

Em outras palavras, a escola não tem sido capaz de desenvolver competências e habilidades que permitam ao sujeito a inserção competitiva no mercado de trabalho e, muitas vezes, sequer proporciona aos seus alunos o

A teoria de Gramsci sobre a educação foi apresentada na Unidade 1. Aproveite esse momento para relembrar seus estudos.

NOTA

Page 113: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

TÓPICO 2 | GERAÇÃO DA PRI. MET. DO SÉC. XX: MANNHEIM, PARSONS, ELIAS, GRAMSCI, ESC. FRANKFURT, HABERMAS E ALTHUSSER

103

acesso às tecnologias. Como nos mostra Gramsci, é preciso formar intelectuais orgânicos, sujeitos capazes de se adequar à organização social e transformar a sociedade.

Nesse contexto, Gramsci comenta sobre o processo de especialização dos indivíduos que ocorre na escola:

Nas sociedades modernas, a organização escolar é responsável pelo aprofundamento e pela ampliação da “intelectualidade de cada indivíduo”, multiplicando e aperfeiçoando as funções intelectuais e direcionando-as para algum tipo de especialização. É por meio da escola que se formam os intelectuais que irão realizar atividades mais complexas, e isso pode ser atestado pelo grau de especialização das várias escolas, bem como por sua hierarquização. Segundo Gramsci, a complexidade da vida cultural e civilizatória de uma sociedade é representada pela diversificação das instituições escolares nela existentes (PILETTI; PRAXEDES, 2010, p. 63).

A especialização das atividades, fundamental para a organização da sociedade moderna, é moldada na escola. Ao receber a educação escolar, o indivíduo passa a desenvolver múltiplas atividades voltadas para o desempenho de uma função especializada na sociedade. A necessidade de tornar complexa a formação dos indivíduos para corresponderem às expectativas sociais levou à ampliação da especialidade e da hierarquia na escola.

Ainda a respeito da especialização, ela representa uma expressão da diversidade cultural e civilizatória das sociedades. Quanto maior for o grau de complexidade de uma sociedade, maior será a diversificação das instituições escolares.

Ao analisar as escolas de seu tempo, Gramsci percebeu uma crise na educação, pois as escolas técnicas possuíam maior prestígio em relação às escolas voltadas para uma formação ampla de seus alunos. O questionamento de Gramsci expõe o seguinte paradoxo: nas sociedades industriais avançadas as escolas estão voltadas para a formação técnica, fato que contribui para a manutenção das estruturas de produção e, como consequência, contribui para a permanência e reprodução das desigualdades sociais (PILETTI; PRAXEDES, 2010).

Para superar essa realidade, propôs uma reunificação da educação. Uma escola capaz de formar na teoria e na prática. Ou seja, reconhecendo o valor da formação ampla e da profissionalização. Sem a necessidade de aprofundar um modelo em detrimento de outro (PILETTI; PRAXEDES, 2010).

A educação, no contexto da teoria de Gramsci, contribui para a construção da hegemonia política:

As instituições educativas, a família, as igrejas, as organizações culturais fazem parte da sociedade civil e podem educar para a submissão aos dominantes ou para a construção de uma crítica à hegemonia que comanda a sociedade e a construção de uma nova hegemonia, uma vez que difundem uma concepção de mundo, ou ideologia favorável ou desfavorável aos poderosos (PILETTI; PRAXEDES, 2010, p. 64).

Page 114: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

UNIDADE 2 | PERCURSOS TEÓRICOS DA SOCIOLOGIA DA EDUCAÇÃO

104

A contribuição para a hegemonia reside na capacidade das instituições educativas de moldar o comportamento e a ação dos indivíduos para adequação à estruturas sociais estabelecidas ou para criticá-las e construir uma nova hegemonia. Ou seja, a escola é capaz de contribuir para a manutenção das relações sociais existentes ou para sua transformação.

Qual seria então a função da escola? Para Gramsci, a função da escola é a reprodução da ideologia dominante.

A função educacional da escola é exatamente essa difusão da ideologia das classes dominantes pelos intelectuais tradicionais. Mas isso não impede – ao contrário, até favorece – que as classes subalternas formulem para si a estratégia que Gramsci denomina “guerra de posições”, a fim de se contrapor à hegemonia das classes dominantes, por meio da construção de uma nova hegemonia política e cultural, para a qual os intelectuais orgânicos atuariam na formulação e na difusão de uma ideologia portadora de uma nova concepção de sociedade (PILETTI; PRAXEDES, 2010, p. 65).

Em outras palavras, a função da escola é reproduzir a ideologia dominante, porém isso não significa que a escola é incapaz de levar a transformações. Ao compreender como a reprodução ideológica se dá através da educação é possível elaborar uma contra-hegemonia capaz de transformar a estrutura social.

Ganharam destaque para nossos estudos as contribuições de Gramsci que colocam luz sobre a formação dos intelectuais e a construção das formas de hegemonia e contra-hegemonia. Bem como, sobre o entendimento da função da escola como espaço para a reprodução da ideologia dominante.

O conceito de hegemonia de Grasmci contribui para compreender a função da escola, como nos mostra em seu trabalho Jesus (1985, p. 2-3):

A “hegemonia’ é escolhida como a categoria que vai permitir resolver as contradições fundamentais existentes na superestrutura, conforme a teoria de Grasmci, tanto em nível de dominantes, quanto em nível de dominados. Manter ou modificar a superestrutura implicará o exercício da “hegemonia”, onde a função educativa se torna importante e imprescindível. Falar em hegemonia implica simultaneamente as questões da educação e cultura e da “sociedade civil” em sua relação principal com a sociedade política ou o Estado. A “hegemonia”, se é capacidade de “direção” cultural ou ideológica de uma classe sobre o conjunto da sociedade, é também direção de “dominação” entre dirigentes e dirigidos, responsável pela formação de um grupo orgânico e coeso em torno de princípios e necessidades defendidos pela classe dominante [...] Assim toda relação pedagógica é hegemônica, então a educação só tem sentido integrada ao processo de transformação da sociedade, presente à totalidade histórica e cooperando no processo de incorporação de novos grupos e de indivíduos ao processo hegemônico.

IMPORTANTE

Page 115: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

TÓPICO 2 | GERAÇÃO DA PRI. MET. DO SÉC. XX: MANNHEIM, PARSONS, ELIAS, GRAMSCI, ESC. FRANKFURT, HABERMAS E ALTHUSSER

105

2.5 ESCOLA DE FRANKFURT: A TEORIA CRÍTICA E AS CONTRIBUIÇÕES DE ADORNO PARA A SOCIOLOGIA DA EDUCAÇÃO

A teoria crítica ficou conhecida como o conjunto de pesquisas elaboradas por teóricos marxistas na Alemanha a partir da década de 1920. Entre eles destacamos as contribuições de Max Horkeimer (1895-1973), Hebert Marcuse (1898-1979), Theodor Adorno (1903-1969), Walter Benjamin (1892-1940) e Jürgen Habermas (1929-). Os trabalhos desses intelectuais levantaram discussões a respeito de temas relacionados a aspectos filosóficos, sociais, culturais, estéticos e psicológicos.

Entre as temáticas desenvolvidas pela teoria crítica que colaboram para as reflexões sobre a educação estão: 1) a função educativa da reflexão e do ato de repensar; 2) a questão da emancipação em relação à crítica aos poderes estabelecidos; 3) a desbarbarização social através da educação e da escolarização baseadas na autocrítica; 4) o reconhecimento das experiências sombrias da história visando iluminar o presente e a criação de uma resistência à violência; e 5) a responsabilidade dos intelectuais com a educação e com os meios de comunicação em massa no sentido da desbarbarização da sociedade (PUCCI, 2001).

Especialmente em referência à desbabarização da sociedade, ganha destaque a reflexão realizada por Adorno em seu artigo Educação depois de Auschwitz. Neste trabalho, a educação representa uma esperança para impedir que os erros do passado se repitam no futuro. Aqui a educação representa o caminho para a emancipação e a autonomia do sujeito.

A educação, para Adorno, é o caminho para construir formas concretas de resistência. Essas formas podem se desenvolver na educação, na formação cultural e até em formas adequadas de uso dos meios de comunicação – ainda que a crítica à indústria cultural se faça presente em suas obras. É fundamental que as estratégias educacionais sejam direcionadas à emancipação e ao combate do autoritarismo (SANTIAGO, 2005).

Outra questão que ganha espaço na teoria crítica são as contribuições de Adorno a respeito da técnica. Sabe-se que o desenvolvimento tecnológico avançou de forma significativa e, por essa razão, as reflexões de Adorno contribuem para a compreensão desse fenômeno.

A lei da pura funcionalidade apaga a história constituinte de cada objeto, coisifica as pessoas, transforma-as em máquinas, em que a precisão, o tempo veloz, a utilidade imediata, são os elementos que contam e têm valor nas relações sociais. E o processo educacional, amparado pelas mais modernas invenções que invadem a escola e as salas de aulas, é direcionado na formação dessas novas virtudes, funcionais e utilitárias, que a implantação das novas tecnologias educacionais impõe aos docentes e discentes. A experiência formativa, resultante de um tempo de maturação, sem pressa, que exige recolhimento, silêncio, afinidade eletiva com os objetos, empobrece-se paulatinamente pelo seu anacronismo, por não produzir coisas úteis para formação e para o mercado (PUCCI, 2001, p. 14).

Page 116: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

UNIDADE 2 | PERCURSOS TEÓRICOS DA SOCIOLOGIA DA EDUCAÇÃO

106

É importante considerar com atenção a descrição de Adorno para o processo que transforma pessoas em coisas. Afinal, estamos condicionados à lógica produtiva. A educação, consequentemente, está subordinada a essa mesma lógica. A tecnologia ganha espaço na escola e os currículos e metodologias se voltam à formação de competências e habilidades que proporcionem a adequação dos alunos aos novos critérios sociais. O tempo do percurso formativo já não corresponde à velocidade exigida pela modernidade. É como se a escola – da forma como conhecíamos – e a sociedade não caminhassem no mesmo compasso.

O posicionamento dos professores em relação ao uso das tecnologias também deve ser observado:

Os professores e os formadores de professores têm nas tecnologias educacionais um instrumental extraordinário para potencializar a educação de seus alunos e devem ser competentes ao máximo no conhecimento e na utilização desse instrumental. Ao mesmo tempo, devem superar a postura laudatória do uso das tecnologias mais avançadas e ter acuidade e a percepção das virtudes específicas que estão subjacentes à essa utilização e desenvolver atividades outras que busquem compensar as falhas e os prejuízos causados por elas (PUCCI, 2001, p. 15).

Em outras palavras, é necessário estar atento para fazer proveito das tecnologias e integrá-las ao processo pedagógico, bem como para suprir as necessidades que não são contempladas com o uso desses recursos.

A educação na visão de Adorno se desenvolve no terreno complexo entre o ato de moldar indivíduos e transmitir conhecimento:

[...] gostaria de apresentar a minha concepção inicial de educação. Evidentemente não a assim chamada modelagem de pessoas, porque não temos o direito de modelar pessoas a partir do seu exterior; mas também não a mera transmissão de conhecimentos, cuja característica de coisa morta já foi mais do que destacada, mas a produção de uma consciência verdadeira. Isto seria inclusive da maior importância política; sua ideia, se é permitido dizer assim, é uma exigência política. Isto é: uma democracia com o dever de não apenas funcionar, mas operar conforme seu conceito, a pessoas emancipadas. Uma democracia efetiva só pode ser imaginada enquanto uma sociedade de quem é emancipado (ADORNO, 1995, p. 14).

Nesse sentido, o propósito da educação reside no desenvolvimento da emancipação para que se garanta a existência da democracia. Isto porque não há democracia de fato sem a emancipação dos indivíduos.

Page 117: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

TÓPICO 2 | GERAÇÃO DA PRI. MET. DO SÉC. XX: MANNHEIM, PARSONS, ELIAS, GRAMSCI, ESC. FRANKFURT, HABERMAS E ALTHUSSER

107

Entre o complexo conjunto de teorias desenvolvidas a partir da Escola de Frankfurt, apontamos com destaque para as análises de Adorno no contexto do desenvolvimento tecnológico e suas relações com as mudanças sociais e, consequentemente, as novas configurações estabelecidas no espaço escolar. Assim como a afirmação do caráter político da educação na direção da emancipação.

2.4 JURGEN HABERMAS: RACIONALIZAÇÃO E AÇÃO COMUNICATIVA

Jurgen Habermas (1929-) parte dos estudos da teoria crítica elaborados por Adorno e Horckeimer na Escola de Frankurt para apresentar suas análises da educação com sua teoria da ação comunicativa.

Para Habermas é importante refletir sobre a relação intersubjetiva dos sujeitos através do diálogo: “Nesse processo, segundo a reflexão habermesiana, a ação educativa pode prestar a contribuição de socializar as novas gerações para a construção de identidades de acordo com padrões éticos de convivência e solidariedade” (PILETTI; PRAXEDES, 2010, p. 97).

O conceito de esclarecimento desenvolvido pela teoria crítica da Escola de Frankfurt foi retomado por Habermas. Lembramos que a noção de esclarecimento representa o desencantamento do mundo produzido pela emancipação do sujeito em relação ao pensamento mítico.

Emancipação e autonomia para Adorno

Para Adorno, quando a educação não é capaz de possibilitar a autonomia dos indivíduos ela se torna um perigoso instrumento de manipulação. [...] Permanecer na menoridade, portanto, é não querer assumir a própria condição racional, ou seja, é aceitar ser movido pelos costumes e tradições. A autonomia, ao contrário, é sinônimo da liberdade, e, desse modo, permite que os caminhos sejam guiados pela reflexão, e não por quaisquer formas de autoritarismo condicionado. [...] Desenvolver a autonomia é ser capaz de acabar com os discursos coletivistas (ou individualistas), como se a escola fosse uma fábrica em que todos devessem seguir as ordens do diretor ou do encarregado. Como nos lembra Adorno, um dos riscos a que a educação está sujeita, sobretudo nos estabelecimentos de ensino, é a manutenção de discursos coletivistas. A educação tem uma função política altamente importante. [...] Este papel faz com que ela se volte para a destruição das ideologias vigentes e proporcione uma reflexão crítica sobre a própria realidade na qual está inserida.

Fonte: ZAMBEL, Luciana; LASTÓRIA, Luiz Antônio Nabuco. Educação e emancipação em T. W. Adorno: contribuições para a formação de professores. Revista Ibero-Americana de Estudos em Educação, v. 11, n. 4, p. 2205-2218, 2016. Disponível em: <http://seer.fclar.unesp.br/iberoamericana/article/viewFile/8794/6054>. Acesso em: 21 fev. 2018.

IMPORTANTE

Page 118: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

UNIDADE 2 | PERCURSOS TEÓRICOS DA SOCIOLOGIA DA EDUCAÇÃO

108

O processo que decorre da racionalização da filosofia e da ciência conduz a um mundo administrado. Nesse processo, o esclarecimento se torna positivismo e ideologia produzindo progresso tecnológico. Contudo, o progresso tecnológico não chega à mesma proporção para todos e acaba por promover desigualdades sociais. Essas desigualdades, por sua vez, decorrem da apropriação dos avanços da produção material pela classe dominante. Ao mesmo tempo em que desenvolve as forças produtivas, acaba anulando os indivíduos que se tornem meras partes do sistema (PILETTI; PRAXEDES, 2010).

O processo de socialização representa as formas de adequação dos indivíduos aos padrões da ordem social, pois para atender às exigências do mercado, os indivíduos se submetem a processos nos quais são moldados para atender às demandas de mercado. Nesse sentido, não sobra espaço para a emancipação (PILETTI; PRAXEDES, 2010).

Nesse âmbito atua a ação pedagógica: para permitir a adequação dos indivíduos às inovações tecnológicas visando ao desempenho eficiente no mercado de trabalho. Com essa ação as inovações transformam as formas de produzir, porém reforçam os padrões de desigualdades entre as classes sociais.

Na visão da teoria crítica, as tecnologias são centrais ao reduzir “a necessidade de força de trabalho e são utilizadas pelas classes proprietárias do capital como mais um meio para submeter a massa de trabalhadores, transformados em excedentes e rebaixados a uma condição de objeto do sistema administrativo” (PILETTI; PRAXEDES, 2010, p. 98).

Logo, além de não deixar espaço para o desenvolvimento da autonomia, o desenvolvimento tecnológico evidencia a hierarquia social, pois reduz cada vez mais a necessidade de força de trabalho. Sem a necessidade da força de trabalho, o trabalhador se torna uma espécie de excedente no processo produtivo, assumindo o papel de objeto.

A formação da identidade é abordada por Habermas como elemento educativo:

[...] a formação das identidades é um processo social que depende do contato e das características físicas, cognitivas, afetivas, sexuais, culturais e étnicas dos seres humanos envolvidos em situações educativas [...] Assim, as diferenças expressam-se nos contatos entre identidades distintas umas das outras em circunstâncias sociais determinas (PILETTI; PRAXEDES, 2010, p. 102).

Além disso, o desenvolvimento da identidade é entendido como um processo de aprendizagem de determinadas competências: competência linguística para a comunicação; competência cognitiva para apropriação dos saberes essenciais para viver em sociedade; e a competência de interação para convívio em grupo e participação nas relações sociais. Nos processos educativos essas três dimensões devem ser desenvolvidas igualmente (PILETTI; PRAXEDES, 2010).

Page 119: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

TÓPICO 2 | GERAÇÃO DA PRI. MET. DO SÉC. XX: MANNHEIM, PARSONS, ELIAS, GRAMSCI, ESC. FRANKFURT, HABERMAS E ALTHUSSER

109

Por fim, trazemos a noção de agir comunicativo, entendido como:

[...] agir comunicativo é orientado para o acordo intersubjetivo e depende da emissão de um discurso com “pretensões de validade” do qual fazem parte, em resumo, a compreensibilidade da expressão simbólica do emissor pelo receptor, um presumido conteúdo de verdade na mensagem veiculada e a veridicidade de intenção do autor. A pretensão de validade é o que torna possível a compreensão mútua entre os sujeitos, podendo levar à formação de uma racionalidade que resulte em um agir e interagir consensual. A linguagem é o meio para o acordo intersubjetivo, uma vez que medeia o processo de interação que visa o entendimento. É a aprendizagem de convicções morais, de um saber prático e do agir comunicativo que possibilita o aprendizado e a prática da regulamentação consensual dos conflitos de ação, que, por sua vez, levam à integração social fundada na “identidade do Eu” e na identidade coletiva (PILETTI; PRAXEDES, 2010, p. 103).

O agir comunicativo representa uma forma de comunicação desenvolvida a partir de um acordo intersubjetivo, isso significa que para o sucesso da comunicação é necessária a compreensão da informação compartilhada, presunção de verdade e a intenção de verdade por parte do ator que transmite essa informação. O fato de se assumir a validade permite que a interação seja bem-sucedida. A linguagem é o meio pelo qual as informações são compartilhadas e permite o acordo intersubjetivo. A aprendizagem conjunta dos valores morais, dos conhecimentos práticos e da regulação dos conflitos que levam à integração social.

A ação comunicativa para Habermas

O conceito de razão comunicativa de Habermas pressupõe, portanto, uma diferenciação entre os mundos objetivo, social e subjetivo. Esta diferenciação, segundo ele, é que distingue o pensamento moderno do modo de pensar mítico. Ao contrário do último, o primeiro assume que as interpretações variam com relação à realidade social e natural e que as crenças e valores variam em relação ao mundo objetivo e social.

Outra consequência deste conceito é que ele pressupõe o abandono da relação cognitiva sujeito-objeto por um procedimento cognitivo de natureza intersubjetiva, numa relação sujeito-outro sujeito e que só é possível com a progressiva descentração de nossa visão egocêntrica de mundo. [...] Em síntese, podemos dizer então que, para Habermas, a ação comunicativa surge como uma interação de, no mínimo dois sujeitos, capazes de falar e agir, que estabelecem relações interpessoais com o objetivo de alcançar uma compreensão sobre a situação em que ocorre a interação e sobre os respectivos planos de ação com vistas a coordenar suas ações pela via do entendimento.

FONTE: PINTO, José Marcelino de Rezende. A teoria da ação comunicativa de Jürgen Habermas: conceitos básicos e possibilidades de aplicação à administração escolar. Paidéia (Ribeirão Preto), Ribeirão Preto, n. 8-9, p. 77-96, Aug. 1995. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0103-863X1995000100007&lng=en&nrm=iso>. Acesso em: 21 fev. 2018.

IMPORTANTE

Page 120: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

UNIDADE 2 | PERCURSOS TEÓRICOS DA SOCIOLOGIA DA EDUCAÇÃO

110

Na obra de Habermas se destacou a retomada da noção de esclarecimento no sentido da compreensão crítica da realidade que cerca o sujeito, permitindo sua emancipação; das discussões a respeito da adequação dos indivíduos para o mercado de trabalho no contexto da ampliação constante das inovações tecnológicas e, também, das contribuições da noção de agir comunicativo para a compreensão da relação entre linguagem, a educação e a integração social.

2.5 LOUIS ALTHUSSER: IDELOGIA E APARELHOS IDEOLÓGICOS DE ESTADO

Louis Althusser (1918-1990) recorreu ao pensamento teórico de Marx para mostrar como a escola é responsável por promover a aceitação das formas de dominação e de exploração no contexto capitalista. Em sua teoria dos aparelhos ideológicos de Estado ele destacou processos que levaram à estruturação da educação escolar nas sociedades modernas.

Como Althusser descreve os Aparelhos ideológicos de estado? Vamos às palavras do sociólogo:

Que são os aparelhos ideológicos de Estado (AIE)? Não se confundem com o aparelho (repressivo) de Estado. Lembremos que na teoria marxista, o Aparelho de Estado (AE) compreende: o governo, a administração, o exército, a polícia, os tribunais, as prisões etc., que constituem aquilo a que chamaremos a partir de agora o Aparelho Repressivo de Estado. Repressivo indica que o Aparelho de Estado em questão “funciona pela violência” – pelo menos no limite (porque a repressão, por exemplo administrativa, pode revestir formas não físicas). Designamos por aparelhos ideológicos de Estado um certo número de realidades que se apresentam ao observador imediato sob a forma de instituições distintas e especializadas. Propomos uma lista empírica destas realidades [...] podemos desde já considerar como Aparelhos Ideológicos de Estado as instituições seguintes (a ordem pela qual enunciamos não tem qualquer significado particular):

- O AIE religioso (o sistema das diferentes igrejas),- O AIE escolar (o sistema das diferentes escolas públicas e particulares),- O AIE familiar,- O AIE jurídico,- O AIE político (o sistema político de que fazem parte os diferentes partidos),- O AIE sindical,- O AIE da informação (imprensa, rádio-televisão etc.),- O AIE cultural (letras, belas artes, desportos etc.).

FONTE: ALTHUSSER, 1974, p. 43-44.

IMPORTANTE

Page 121: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

TÓPICO 2 | GERAÇÃO DA PRI. MET. DO SÉC. XX: MANNHEIM, PARSONS, ELIAS, GRAMSCI, ESC. FRANKFURT, HABERMAS E ALTHUSSER

111

Na compreensão de Althusser, educação escolar

[...] difunde as ideologias que formam as concepções e práticas dos sujeitos em sociedade, contribuindo, assim, para a reprodução das relações sociais de produção, uma vez que torna inevitável e até “natural” a divisão em classes sociais, e determinando a posição de cada ser humano na engrenagem da produção capitalista, como patrão, administrador ou operário braçal (PILETTI; PRAXEDES, 2010, p. 69).

Nesse sentido, compreende a educação como elemento central para a manutenção e naturalização das relações de exploração presentes no sistema capitalista. É na escola que o indivíduo aprende conteúdos fundamentais para a interação social e no mercado de trabalho, mas também contribui para a manutenção das relações de classe. O indivíduo aprende o necessário para desempenhar uma função específica na sociedade: patrão ou empregado, por exemplo.

Questiona a forma como a escola ensina, além dos conteúdos, um padrão disciplinar que permite a adequação do indivíduo ao sistema. A escola forma para o desenvolvimento das atividades nas diferentes profissões e para naturalizar as relações sociais existentes.

Althusser defende que a aprendizagem escolar – além das competências de leitura, escrita e cálculo, das técnicas e da chamada cultura humanística segmentada de acordo com a camada social a que pertencem os educandos, se virão a ser trabalhadores ou dirigentes, por exemplo – é destinada ao ensino do respeito à ordem social, que se inicia com o aprendizado das regras de conduta, da moral dominante e das leis do Estado, segundo preceitos que interessam às classes dominantes (PILETTI; PRAXEDES, 2010, p. 69).

Devemos atentar para a forma como Althusser mostra a influência das classes sociais na educação escolar. Ao longo de sua vida escolar, o indivíduo será moldado para exercer o papel de dominante ou dominado no contexto das relações de classe. Uma das formas pelas quais se dá esse processo é no aprendizado das normas de conduta que naturalizam as desigualdades.

Outro ponto importante para a compreensão da teoria dos aparelhos ideológicos de Estado é a ideologia. A ideologia permite a manutenção e a reprodução da estrutura social. Por esta razão, promove a aceitação das desigualdades e a formação dos indivíduos para ocuparem posições no mercado de trabalho. Ao ocuparem esses postos, os indivíduos estão preparados com competência técnica e disciplina, aceitam a hierarquia do mercado de trabalho e incorporam o lucro como objetivo. Uma forma de entender a ideologia é compreendê-la como a forma como entendemos o funcionamento do mundo social, nosso lugar nele e como devemos agir nesse mundo (PILETTI; PRAXEDES, 2010).

Page 122: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

UNIDADE 2 | PERCURSOS TEÓRICOS DA SOCIOLOGIA DA EDUCAÇÃO

112

A escola, como aparelho ideológico, exerce influência nas formas de pensar e agir dos indivíduos:

[...] difundem as ideologias que reproduzem as relações sociais de produção, quando os agentes incorporam e colocam em prática tais ideologias. Para Althusser, em síntese, as condutas práticas são orientadas por ideologias que formam as nossas ideias. Toda prática é resultado da ideologia que seu autor interiorizou no inconsciente por meio da experiência na vida familiar, nas escolas, fábricas, igrejas, etc. Sempre agimos de acordo com uma ideologia, quer sejamos favoráveis ou contrários à sociedade capitalista ou a determinada religião. É a ideologia que dá um significado aparentemente coerente para uma decisão que tomamos (PILETTI; PRAXEDES, 2010, p. 71).

A ideologia é tão importante porque ela está presente em nossas ações, mesmo quando não nos apercebemos de sua influência. Está presente na interiorização de experiências em espaços como a família, a igreja, a escola ou a fábrica. Além disso, é a ideologia, em seus diferentes contextos, que dá significado para nossas ações.

O conceito de ideologia assume diferentes concepções de acordo com a teoria em que é aplicado. De forma usual, faz referência a um conjunto de ideias nas esferas econômica, política ou social. Na teoria de Althusser, o conceito de Ideologia faz referência às ideias que contribuem para manter e reproduzir a estrutura social. Além disso, o conceito contribui para sua crítica ao capitalismo, pois demonstra como a classe dominante – através da ideologia – exerce influência sobre a forma como os indivíduos são preparados para integrar a sociedade e desempenhar papéis específicos na hierarquia social.

A ideologia, para um Althusser profundamente influenciado pelo pensamento de Antonio Gramsci, é um meio para formar consciências dos seres humanos na vida em sociedade, e não apenas uma falsa consciência ou ilusão (PILETTI; PRAXEDES, 2010, p. 71).

IMPORTANTE

IMPORTANTE

A forma como Althusser diferencia a violência dos aparelhos repressivos de Estado para os aparelhos ideológicos de Estado evidencia os processos pelos quais as instituições contribuem para manter a ordem social. Nesse contexto,

Page 123: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

TÓPICO 2 | GERAÇÃO DA PRI. MET. DO SÉC. XX: MANNHEIM, PARSONS, ELIAS, GRAMSCI, ESC. FRANKFURT, HABERMAS E ALTHUSSER

113

[...] a escola seria constituída no aparelho ideológico responsável pela difusão da ideologia que possibilita a construção de uma hegemonia da burguesia nas sociedades capitalistas, tomando o lugar que cabia à Igreja Católica na ordem social feudal [...] a escola funciona como um aparelho ideológico do Estado, uma vez que contribui decisivamente para a manutenção das relações sociais de produção que garantem a exploração dos trabalhadores pela classe capitalista (PILETTI; PRAXEDES, 2010, p. 71).

Cabe aqui destacar mais uma vez o papel da escola para a manutenção da estrutura social ao condicionar ideologicamente os indivíduos para que incorporem as normas e condutas pertinentes à ordem social.

Como aparelho ideológico de Estado a escola não é única, porém tem protagonismo no que diz respeito à forma como molda comportamentos desde a infância:

Embora cada aparelho ideológico, como igrejas, sindicatos e meios de comunicação, por exemplo, desempenhe uma função que lhe é peculiar, cabe à escola o papel dominante nas sociedades capitalistas, pois, desde a mais tenra idade das crianças, vai lhes incutindo os valores próprios das classes dominantes [...] (PILETTI; PRAXEDES, 2010, p. 72).

Em outras palavras, a escola é a instituição responsável por orientar as crianças e adolescentes para que exerçam sua função no sistema de produção. Ao realizar essa tarefa compartilha informações que moldam o entendimento que o indivíduo tem do mundo e, consequentemente, sua ação.

A compreensão da escola como aparelho ideológico de Estado é desenvolvida com ênfase nos trabalhos de Althusser conduzindo a uma interpretação do fenômeno educacional no sentido da reprodução da ideologia dominante e da manutenção das estruturas sociais.

LEITURA COMPLEMENTAR

Zygmunt Bauman: entrevista sobre a educação. Desafios pedagógicos e modernidade líquida

Alba PorchedduTradução: Neide Luzia de Rezende e Marcello Bulgarelli Zygmunt Bauman (Polônia, 1925). Sociólogo, catedrático emérito de

Sociologia nas Universidades de Leeds e Varsóvia, autor de diversos ensaios, entre os quais se encontram: Globalização: as consequências humanas (1999), Vida para consumo: a transformação das pessoas em mercadoria (2008), Em busca da política (2000), Modernidade líquida (2001), Vidas desperdiçadas (2005). Seus trabalhos contribuíram para a edificação de um complexo e completo instrumental conceitual em torno da sociedade

Page 124: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

UNIDADE 2 | PERCURSOS TEÓRICOS DA SOCIOLOGIA DA EDUCAÇÃO

114

moderna. Embora seja frequentemente mencionado como um pensador "pós-moderno", seus livros não representam uma visão entusiasmada do pós-modernismo; aliás, ele se distancia da separação dicotômica modernidade versus pós-modernidade, argumentando que ambas as configurações coexistem como os lados de uma mesma moeda. Para dar conta desse fenômeno, cunhou os conceitos de "modernidade sólida" e "modernidade líquida".

[...]

P.: Das suas reflexões sobre educação parece emergir a tese de que a prática educativa deve abandonar os modelos fortemente estruturados, em favor de um processo formativo aberto. É possível projetar uma intervenção formativa sem poder determinar desde o início objetivos didáticos e educacionais precisos?R.: Desde que os antigos sábios gregos inventaram a noção de Paideia foi preciso mais de dois mil anos para transformar a ideia de "educação permanente", de oxímoro (contradição dos termos) em pleonasmo (do tipo "manteiga amanteigada", "ferro metálico"...). Entretanto, a atestação dessa notável transformação ocorreu recentemente – nos últimos dez anos – sob o impacto da mudança acelerada do ambiente social no qual os protagonistas principais da educação (tanto professores como educandos) deviam agir.

Contemporaneamente, também em outros setores, mas com a mesma modalidade acelerada, surgiram outras mudanças.

Para os mísseis balísticos, no momento em que começam a "se mover", a direção e a distância de sua viagem já são decididas pela forma e pela posição do canhão; pela quantidade de pólvora no projétil, é possível calcular, com margem mínima ou inexistente de erro, o ponto de aterrissagem, ou até mesmo alterá-lo, modificando a posição do canhão ou a quantidade de pólvora do disparo. Essa propriedade dos mísseis balísticos os torna armas ideais para se utilizar em caso de uma guerra de posição, ou quando os alvos se encontram entrincheirados ou nos bunkers e os mísseis são os únicos corpos em movimento.

As mesmas qualidades os tornam entretanto também inúteis uma vez que os alvos começam a se mover, tornando-se invisíveis às armas, sobretudo quando esses alvos se movem mais rapidamente do que os mísseis podem "voar" e, ainda mais, se se movem de um modo irregular ou imprevisível, que desnorteiam todos os cálculos preliminares da trajetória requerida. É então necessário um míssil inteligente, que possa modificar a sua direção em voo com base na evolução dos eventos, que possa individualizar imediatamente os movimentos dos alvos, aprender tudo o que for necessário sobre a direção e a velocidade real do alvo e identificar, a partir das informações recolhidas, o ponto para o qual direcionar a sua trajetória. Durante a viagem, esses mísseis inteligentes não podem interromper, muito menos finalizar, a coleta e a elaboração das informações, já que os alvos continuam a se mover e a modificar suas direções e velocidades, e o ponto de encontro observado deve ser constantemente atualizado e retificado.

Podemos dizer que os mísseis inteligentes seguem a estratégia da "racionalidade instrumental", entendida na sua versão líquida, fluida; isto significa que se abandona o pressuposto de que o objetivo seja estabelecido, fixo

Page 125: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

TÓPICO 2 | GERAÇÃO DA PRI. MET. DO SÉC. XX: MANNHEIM, PARSONS, ELIAS, GRAMSCI, ESC. FRANKFURT, HABERMAS E ALTHUSSER

115

e irremovível durante toda a duração do lançamento e que portanto devem ser calculados e manipulados somente os instrumentos de voo. Também a utilização de mísseis ainda mais inteligentes não será limitada a alvos preestabelecidos, mas a alvos escolhidos no ar. Tais mísseis serão sobretudo guiados considerando-se o máximo que podem atingir dadas suas capacidades técnicas e o número de alvos que potencialmente podem acertar de acordo com seu equipamento. Em suma, podemos dizer que este seria justamente o caso contrário à "racionalidade instrumental": os alvos são selecionados com os mísseis no ar e são os meios disponíveis que decidirão qual será, ao final, a "meta" a se escolher. [...]

Os mísseis inteligentes, portanto, diferentemente dos velhos artefatos balísticos, aprendem no ar. Assim, devem ser inicialmente dotados da capacidade de aprender e de aprender de modo rápido. Isso é óbvio. O que é menos evidente, se bem que não menos importante dentro de uma rápida capacidade de aprendizagem, é todavia a capacidade de esquecer instantaneamente o que se aprendeu antes. Os mísseis inteligentes não seriam inteligentes se não fossem capazes de "mudar de ideia", ou de revogar as "decisões" precedentes, sem pensar duas vezes e sem remorsos... Não deveriam se preocupar com as informações adquiridas e por nenhuma razão deveriam desenvolver um hábito comportamental sugerido pelas informações. Todas as informações obtidas "envelhecem" rapidamente e ao invés de fornecerem um guia confiável, podem desviar do caminho se não forem prontamente ignoradas. Aquilo que os "cérebros" dos mísseis inteligentes não devem nunca esquecer é que o conhecimento adquirido é eminentemente eliminável, somente eficaz até uma nova ordem e útil apenas temporariamente, e que a demonstração do sucesso está em não deixar escapar o momento em que o conhecimento adquirido não é mais útil e deve ser eliminado, esquecido e substituído.

Deixe-me extrair desse exemplo muito articulado a seguinte consideração: os filósofos da educação da era sólido-moderna consideravam os professores como lançadores dos mísseis balísticos e os instruíam sobre como se assegurar que seus produtos seguissem rigorosamente na rota preestabelecida, determinada desde o início pela quantidade de movimentos do lançamento. E não é de se surpreender, visto que os mísseis balísticos eram, durante a primeira fase da era moderna, a invenção tecnológica humana mais avançada. Estes serviram impecavelmente a quem quisesse conquistar e governar o mundo, como declarou Hilaire Belloc referindo-se aos nativos africanos. "Qualquer coisa que ocorra temos a metralhadora Maxim e eles não a têm" (a metralhadora Maxim era uma arma capaz de lançar um grande número de projéteis balísticos em pouco tempo e era muito eficaz, mas somente se se possuía um grande número de projéteis).

Em realidade, essa visão da tarefa do professor e do destino do aluno é muito anterior à ideia de "míssil balístico" e da era moderna que a inventou - como diz um antigo provérbio chinês de mais de dois mil anos antes do advento da modernidade mas ainda citado pela Comissão Europeia em apoio ao programa Lifelong Learning, no limiar do século XXI: "Quando planejas por um ano, semeias o grão. Quando planejas por uma década, plantas árvores. Quando planejas por uma vida inteira, formas e educas as pessoas".

Page 126: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

UNIDADE 2 | PERCURSOS TEÓRICOS DA SOCIOLOGIA DA EDUCAÇÃO

116

Somente com o advento dos tempos líquido-modernos a antiga sabedoria perdeu seu valor pragmático e as pessoas envolvidas no âmbito da aprendizagem e da promoção da aprendizagem, âmbito conhecido com o nome de "educação", têm deslocado sua atenção dos mísseis balísticos para aqueles inteligentes.

A educação e a aprendizagem no ambiente líquido-moderno, para ser úteis, devem ser contínuas e durar toda a vida. Nenhum outro tipo de educação e/ou aprendizagem é concebível; a "formação" do próprio eu, ou da personalidade, é impensável de qualquer outro modo que não seja aquele contínuo e perpetuamente incompleto.[...]

P.: O senhor falou de "comercialização da educação em curso" e do diálogo já quase exclusivo do mundo da formação com o mundo do trabalho e com as dinâmicas econômicas. As inquietações dos pedagogos quanto a esse cenário emergem em todos os âmbitos da pesquisa acadêmica. Essas inquietações se referem à questão da necessidade de mudança da abordagem educativa diante da liquefação dos modelos de referência, e também ao problema da "individualização" da questão pedagógica, fenômeno que ganha sempre maior terreno. Em que sentido e como é possível que a educação se reduza a ser quase exclusivamente "formação para o trabalho" inclusive no nível das diretivas europeias?R.: As inquietações têm fundamento. É simples traçar as extraordinárias afinidades entre a abordagem utilizada pela Comissão Europeia e as intenções e demandas declaradas abertamente por autores que escreveram explicitamente em nome e em prol dos executivos de empresas. Estes seguem com algumas modificações o modelo de raciocínio exemplificado por um compêndio muito popular e influente no pensamento empresarial (Fombrun, Tichy, Devana, 1984), segundo o qual o objetivo da educação é o de "desenvolver trabalhadores, ou seja, aumentar sua cota atual de trabalho e prepará-los para as tarefas que poderão desenvolver no futuro." Esse desenvolvimento deve sempre ser determinado pela "individualização das competências necessárias e pela gestão ativa do aprendizado do trabalhador para um futuro a longo prazo, em relação com estratégias empresariais explícitas". Raili Moilanen (2004), depois de ter analisado os conteúdos dos documentos submetidos à Terceira Conferência Internacional de Pesquisa sobre o Trabalho e a Aprendizagem que representavam o ponto de vista dos trabalhadores, conclui que "o aprendizado e o desenvolvimento parecem ser importantes para as organizações sobretudo por razões de eficácia e competitividade", enquanto "o ponto de vista do ser humano como tal parece não ser importante".[...]

Os apelos ao papel central do desenvolvimento dos recursos humanos (Human Resources Development) baseados na "individualização das competências necessárias para o mercado de trabalho" foram feitos inúmeras vezes antes com exemplar coerência; com regularidade igualmente monótona os gerentes dos "recursos humanos" não conseguiam antecipar quais seriam as "exigências" do "mercado de trabalho" no momento em que a "força de trabalho" tivesse completado a formação e estivesse presumivelmente pronta para o emprego. Os desenvolvimentos imprevistos da demanda do mercado não são facilmente prognosticáveis, tanto que os especialistas de previsões não são ingênuos e os seus prognósticos são

Page 127: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

TÓPICO 2 | GERAÇÃO DA PRI. MET. DO SÉC. XX: MANNHEIM, PARSONS, ELIAS, GRAMSCI, ESC. FRANKFURT, HABERMAS E ALTHUSSER

117

metodologicamente previstos. Os erros de previsão da demanda do mercado causam terror e provavelmente representam o mal incurável de todas as "previsões científicas" das progressões sociais; mas nesse caso, em que as perspectivas de vida humana estão em risco, juízos errados são extraordinariamente nocivos. Confiar os esforços pessoais em prol da imposição e do desenvolvimento de si mesmo a visões essencialmente imprevisíveis - e assim declaradamente pouco confiáveis – das exigências futuras do mercado mutável e caótico, faz pressagiar um grande sofrimento humano associado a frustração, esperanças vãs e vida desperdiçada. Os cálculos preventivos do "poder humano" requerem uma autoridade que não possuem, fazem promessas que não podem manter e consequentemente assumem responsabilidades que não podem sustentar.

Provavelmente, tudo isso ocorre também porque os programas de "educação permanente" tendem a ser remanejados, imperceptivelmente e sem explicações explícitas, exaltando-se a "aprendizagem permanente". Isso se torna portanto um "auxílio" às responsabilidades associadas à seleção e à aquisição das competências e, em particular, associadas às consequências das escolhas erradas por aqueles que são parte receptora dos "mercados de trabalho", notoriamente fluidos e mutáveis. Borg e Mayo estão no caminho certo quando concluem que ...nestes tempos rigorosamente neoliberais, a noção de aprendizagem autogestionada se presta a um discurso que consente ao Estado a renúncia de sua responsabilidade de fornecer a educação de qualidade que cada cidadão de uma sociedade democrática tem o direito de possuir.

Deixe-me ainda evidenciar que essa não é a primeira nem a última função que o Estado gostaria de eliminar de bom grado do reino da política e, consequentemente, das suas responsabilidades. Deixe-me acrescentar ainda que a ênfase mutável, que se desloca da categoria da "educação" para a de '"aprendizagem", está em harmonia com uma outra tendência, comum entre os empresários contemporâneos: a inclinação a descarregar sobre as costas dos trabalhadores todas as suas responsabilidades, mas sobretudo os efeitos negativos e, mais geralmente, a responsabilidade do "fracassado crescimento da mudança".

Dada a contínua convergência desses dois caminhos tempestuosos que dirigem, na era líquido-moderna, as relações de poder e a estratégia de domínio, as perspectivas de retomada do percurso controvertido e errático do desenvolvimento do mercado, bem como aquelas de cálculos mais realistas para os "recursos humanos" são escassas na melhor das hipóteses e, mais provavelmente, nulas. No ambiente líquido-moderno, a "incerteza produzida" é o instrumento de domínio mais importante quando a política de precarização, usando o termo de Pierre Bourdieu (um conceito que se refere às manobras resultantes da situação em que os sujeitos se tornam mais inseguros e vulneráveis e por isso ainda menos previsíveis e controláveis), se torna rapidamente o núcleo da estratégia de domínio. O mercado e a "planificação da vida" são antitéticos e uma vez que a política se deixa guiar pela "economia", entendida como jogo livre das forças de mercado, o equilíbrio do poder entre os dois se desloca decididamente em direção ao primeiro.

Page 128: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

UNIDADE 2 | PERCURSOS TEÓRICOS DA SOCIOLOGIA DA EDUCAÇÃO

118

Tudo isso não é de bom augúrio para a "concessão dos poderes aos cidadãos", definido pela Comissão Europeia como o objetivo principal da educação permamente. Segundo o consenso geral, a "outorga dos poderes" (expressão utilizada nas atuais bases de dados e intercambiável por "autorização") se obtém quando as pessoas adquirem a capacidade de controlar, ou ao menos de influir sobre as forças individuais, políticas, econômicas e sociais que poderiam incidir no curso de suas vidas. Para dizer francamente, uma "autorização" autêntica requer não apenas a aquisição das capacidades que consentiriam em fazer parte do jogo criado por outros, mas também a aquisição de poderes tais que permitam influenciar os objetivos, os lugares e as regras do jogo. Obviamente, falamos de capacidades não apenas individuais mas também sociais.

FONTE: PORCHEDDU, Alba. Zygmunt Bauman: entrevista sobre a educação. Desafios pedagógicos e modernidade líquida. Cad. Pesqui.,  São Paulo,  v. 39, n. 137, p. 661-684, Aug. 2009. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0100-15742009000200016&lng=en&nrm=iso>. Acesso em: 22 fev. 2018.

Page 129: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

119

RESUMO DO TÓPICO 2

• As teorias apresentadas nesse tópico foram desenvolvidas no contexto social da primeira metade do século XX e marcadas pelas consequências dos grandes conflitos mundiais, da crise econômica e da polarização das potências mundiais.

• Karl Mannheim apresenta a educação como técnica social, ou seja, identifica na educação uma forma de controle social visando moldar o comportamento individual para integração aos padrões sociais.

• Talcott Parsons desenvolve uma análise social que vê na educação um sistema de integração que busca, através da socialização, o equilíbrio social baseado na democracia e na meritocracia.

• A sociologia de Norbert Elias, especialmente através dos estudos sobre a civilização e figuração, permitem a análise da formação da personalidade e adequação do sujeito ao contexto social, assim como a respeito do controle social exercido pelo processo civilizatório.

• O conceito de hegemonia e as análises da educação no capitalismo elaboradas por Antonio Gramsci abordam o processo de reprodução das ideologias dominantes através da educação e o papel exercido por ela na manutenção das estruturas desiguais de poder econômico e social na sociedade capitalista.

• As contribuições de Adorno acerca da relação entre educação e emancipação, dos desdobramentos do desenvolvimento tecnológico para as transformações sociais e para os processos de socialização desenvolvidos no espaço escolar se destacaram entre o conjunto de estudos desenvolvidos no âmbito da Escola da Frankfurt.

• Habermas retoma os estudos desenvolvidos por colegas da Escola de Frankfurt para compreender o processo de socialização das novas gerações através da educação, dando destaque para a noção de esclarecimento e de agir comunicativo.

• A escola como Aparelho Ideológico de Estado foi objeto de estudo de Louis Althusser. Como resultado, o sociólogo apresentou uma análise da educação como responsável pela adequação dos indivíduos à sua posição esperada no capitalismo.

Page 130: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

120

AUTOATIVIDADE

1 As abordagens da sociologia desenvolvidas na Escola de Frankfurt apresentam contribuições significativas para a compreensão do papel da educação na sociedade capitalista e os desdobramentos da influência do capitalismo sobre o contexto escolar. Sobre essas abordagens, assinale a alternativa correta:

a) ( ) Destacam o papel da educação enquanto sistema que promove a integração social.

b) ( ) Evidenciam a educação responsável por verificar o caráter emancipatório da educação no capitalismo.

c) ( ) Descrevem o caráter político da educação como promotora da autonomia dos indivíduos.

d) ( ) Apresentam uma crítica ao uso de inovações tecnológicas por professores e alunos no ambiente escolar.

2 Podemos identificar elementos comuns nas abordagens de autores como Gramsci, Habermas e Althusser quando considerando que ambos retomaram reflexões de Karl Marx para analisar a sociedade de seu tempo e elaborar uma crítica à educação no contexto do capitalismo. Considerando esses pensadores, analise as sentenças fazendo uso do código a seguir:

I – GramsciII – HabermasIII – Althusser

( ) A escola é um Aparelho Ideológico de Estado que busca moldar o comportamento dos sujeitos para inserção na estrutura social.

( ) O agir comunicativo promove a aprendizagem de valores morais, de conhecimentos práticos e da regulação de conflitos.

( ) A educação é um elemento central para a naturalização das relações sociais de exploração no capitalismo.

( ) A educação deve ser defendida em sua forma humanística voltada para a promoção da democracia e da liberdade.

Agora assinale a alternativa que corresponde à sequência correta:

a) ( ) III – II – III – I.b) ( ) II – I – I – III.c) ( ) I – III – III – II.d) ( ) II – II – I – III.

3 As influências do pensamento clássico de Max Weber podem ser identificadas nas teorias de Mannheim, Parsons e Elias indicando a presença de discussões que dão conta da análise da ação social em diferentes contextos e as formas de socialização para adequação ao sistema social. Partindo dessa referência comum, analise as afirmações a seguir:

Page 131: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

121

( ) Para Mannheim, a função da escola se tornaria cada dia mais essencial com a diminuição do protagonismo da família na sociedade moderna.

( ) Parsons se dedicou a analisar a ação individual dos sujeitos ao longo do processo de socialização.

( ) A sociologia processual de Elias contribuiu para os estudos da relação entre personalidade e estrutura social.

( ) Mannheim considerava a educação como uma técnica social, ou seja, um meio para exercer o controle social sobre os indivíduos.

Agora assinale a alternativa que apresenta a sequência correta:

a) ( ) F – F – V – V.b) ( ) F – V – F – F.c) ( ) V – V – F – F.d) ( ) V – F – V – V.

Page 132: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

122

Page 133: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

123

TÓPICO 3

GERAÇÃO DA SEGUNDA METADE DO SÉCULO XX:

BOURDIEU, HABERMAS E GIDDENS

UNIDADE 2

1 INTRODUÇÃO

Contemporaneamente, novos autores e novas abordagens contribuíram para a própria redefinição deste campo, seus limites e objetos. Aqui, abordamos as visões clássicas, construídas entre o século XIX e XX. Elas ainda orientam as reflexões sobre a sociedade. Mas, desde então, receberam contribuições e críticas que renovaram ou ampliaram seus fundamentos. Novamente são sociólogos que se formaram e iniciaram suas trajetórias a partir dos anos 1950-1960, portanto, podemos indicá-los como sendo da geração da segunda metade do século XX. Aqui, estudamos Pierre Bourdieu, Jürgen Habermas e Anthony Giddens.

Eles viveram e enfrentaram os problemas sociológicos nascidos da globalização, do avanço do capitalismo financeiro, do crescimento do poder da mídia e da indústria cultural, o fim do colonialismo, da importância dos movimentos sociais, entre outros fenômenos que promoveram radicais mudanças sociais. Nasceram durante ou logo ao final da Segunda Guerra Mundial, experimentando dilemas que surgiram desse evento dramático.

É desta forma que destacamos essas gerações. A maneira como esses nomes discutiram o papel da Sociologia e da Educação no interior das sociedades traz em comum as experiências vividas. Disso resulta uma variedade de olhares para o fenômeno da educação.

2 PIERRE BOURDIEU

Pierre Bourdieu nasceu em Denguin, na França, em 1902. Sociólogo mundialmente conhecido, Bourdieu iniciou suas reflexões e publicações a partir de 1960 em colaboração com outros autores. Esse francês tinha origens camponesas e humildes, iniciando seus estudos nos anos 1950.

O conjunto de sua obra é vasto, tendo repercussão na sociologia, na antropologia, nas artes, na história e na educação. Sua produção intelectual é longa, complexa e polêmica, sendo um autor cuja leitura e releitura merecem toda a atenção. Sem sombra de dúvidas, foi um autor clássico no universo das ciências sociais. O sociólogo francês morreu em 2002.

Page 134: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

124

UNIDADE 2 | PERCURSOS TEÓRICOS DA SOCIOLOGIA DA EDUCAÇÃO

Pierre Bourdieu produziu uma sociologia original num cenário marcado por perspectivas sociológicas que enquadravam a ação dos indivíduos e dos grupos em dois polos – objetivista e subjetivista –, Bourdieu elaborou uma nova entrada possível, por meio do conhecimento praxiológico. Ao mesmo tempo em que se orientava pela obra de autores clássicos, especialmente, Émile Durkheim, Max Weber e Karl Marx – Pierre Bourdieu realizou um exame crítico das teorias propostas por estes autores, daí a sua originalidade.

Sociologia Objetivista – Subjetivista, o conhecimento praxiológico e Habitus:

Em meio a estas duas perspectivas, Pierre Bourdieu propõe um modelo alternativo, baseado numa sociologia reflexiva e no conhecimento praxiológico. Segundo o autor, o conhecimento praxiológico:

[…] tem por objeto não apenas o sistema das relações objetivas que o modo de conhecimento objetivista constrói, mas também as relações dialéticas entre estas estruturas objetivas e as disposições estruturadas pelas quais elas se atualizam e que tendem a reproduzi-las, vale dizer duplo processo de interiorização da exterioridade e de exteriorização da interioridade […] (BOURDIEU, 1992, p. 39).

A partir deste recurso, Bourdieu elaborou um conceito fundamental para a sociologia, inclusive para os dias atuais: HABITUS. Esse conceito procurava distanciar-se desses dois paradigmas dominantes que eram comuns à sua época. Segundo o autor, o HABITUS torna possível a prática dos agentes, mas, também, as relações sociais que tornam possível essa ação, ligando-se aos processos de “interiorização” e “exteriorização” nas figurações indivíduo-sociedade. Isto é, trata-se das formas e maneiras configuradas de adequação entre a força do social e a ação do agente em um campo com instituições objetivadas. Inclui sistemas de classificação sociais sustentando-se a partir e através desses mesmos “esquemas generativos” que, dentro de um campo de força específico, dão margem a escolhas e as ações dos agentes (BOURDIEU, 2005).

O HABITUS encontra-se “depositado nos corpos e mentes de agentes sob a forma de uma matriz durável de práticas e representações” segundo as condições e posições do indivíduo no meio de um campo, operando “abaixo do nível da linguagem e da consciência reflexiva” (BOURDIEU, 2005).

Desta forma, ele é tanto individual quanto social, onde os indivíduos internalizam as representações objetivas tomando como referência sua posição nos campos sociais e seus recursos e capitais à disposição, num ciclo de reprodução simbólica, sem “existência de um maestro”.

O HABITUS traduz, dessa forma, estilos de vida, julgamentos políticos, morais e estéticos, além de ser também um meio de ação que permite criar ou desenvolver estratégias individuais ou coletivas (BOURDIEU, 1989).

DICAS

Page 135: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

TÓPICO 3 | GERAÇÃO DA SEGUNDA METADE DO SÉCULO XX: BOURDIEU, HABERMAS E GIDDENS

125

Como entender o papel da Sociologia para Pierre Bourdieu? Que relação o conjunto de sua obra mantém com a educação?

Apesar da dificuldade de responder à primeira questão, procuramos nas próximas páginas destacar algumas das principais reflexões bourdiesianas e os conceitos por ele elaborados. Já com relação à segunda pergunta, foco deste material, podemos indicar que a trajetória de Pierre Bourdieu começou justamente com dois estudos clássicos sobre a educação e o sistema de ensino da França: primeiro, em 1964, publicou ‘Os herdeiros’, em parceria com Jean-Claude Passeron; esta dupla também publicou um clássico da Sociologia da Educação em 1970, intitulado ‘A reprodução’.

Pierre Bourdieu pensava a sociedade em torno da ideia de campos. O que é um campo? Novamente, a utilização deste recurso se apresentou como uma alternativa analítica para a oposição ao subjetivismo e o objetivismo no interior das disputas teóricas nas ciências sociais, que ou ampliam em demasia o papel do agente ou reduzem a mero reflexo da sociedade (BOURDIEU, 1989).

Os indivíduos estão fortemente vinculados aos universos sociais que partilham. E o que são esses universos senão os campos sociais? Bourdieu (2011) nomeou-os como espaços de relações que têm o poder de construir realidades relacionais de sentido acerca do mundo. É um instrumento analítico de pesquisa visando delimitar esses territórios relativamente autônomos por onde circulam agentes, instituições, regras, normas, poderes determinados. No seu interior, os agentes disputam o monopólio de saberes específicos, acionando estratégias de assimilação, legitimação e de exclusão desferidas em lutas simbólicas pela produção das crenças e das regras. Assim, cada campo possui suas próprias instâncias de consagração. Elas são, portanto, variadas e sempre relacionadas diretamente com o que põe em movimento no jogo jogado.

O que é um campo social? Podemos percebê-lo como um espaço não necessariamente material, mas de relações sociais entre agentes e instituições diversas. A partir de Bourdieu, um campo social é uma rede de relações objetivas construindo um espaço estruturado a partir de posições de poder e disputas simbólicas (BOURDIEU, 2003; 2004). Em outras palavras, um campo social pode ser observado pela sua singularidade e autonomia em relação a outros campos, como econômico, ou o político, existindo e fazendo sentido senão “relacionalmente, por meio do jogo de oposições e distinções”, diz Bourdieu (2003, p. 27).

Esse microcosmo é dotado de suas próprias leis (BOURDIEU, 2004), sendo relativamente autônomo porque ainda supõe que obedeça a leis sociais do macrocosmo, isto é, do mundo social. Porém, o grau de sua autonomia depende do volume e estrutura de capital acumulado pelos agentes e, portanto, pelo próprio campo. Quanto mais dependente dos outros campos, menor sua capacidade de “refração”. Neste sentido, a autonomia indica a capacidade de refratar essas externalidades em maior ou menor grau, a ponto de mitigar essas interferências (BOURDIEU, 2004).

No interior de “campo de forças”, existe uma luta concorrencial pelo monopólio e domínio sobre o próprio campo, aquilo que faz parte ou não. Em

Page 136: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

126

UNIDADE 2 | PERCURSOS TEÓRICOS DA SOCIOLOGIA DA EDUCAÇÃO

outras palavras, trata-se de uma luta simbólica pela produção das crenças e das regras do campo, assim como pela definição de suas fronteiras. Como cada campo é relativamente autônomo, ele estabelece suas próprias instâncias de consagração.

O grau de sua autonomia depende do volume de capital e poder acumulado pelos agentes e, portanto, pelo próprio campo. Para poder participar das dinâmicas do campo, o agente precisa mobilizar os seus capitais disponíveis, sejam eles o capital econômico, o capital cultural/informacional, social ou simbólico. A primeira modalidade diz respeito ao patrimônio, bens, dinheiro e riqueza que um agente dispõe para si. O segundo relaciona-se com o aspecto utilitário relacionado à posse de determinadas informações, aos gostos e atividades culturais (OLINTO, 1996, p. 24), podendo ser “incorporado” ou “institucionalizado”. O capital social diz respeito à pose de redes de relações e acessos duráveis de interconhecimento (BOURDIEU, 2008). O capital simbólico é o acúmulo positivo dos outros capitais (THIRY-CHERQUES, 2006), ligado ao prestígio e à autoridade.

Isso implica que cada agente no interior de um campo está ligado aos capitais e acúmulo de poder que possui. Isto define sua posição – dominante ou dominado – no interior desse espaço social. Segundo Bourdieu, o poder indica processos onde um agente, uma instituição com acúmulo dos diferentes tipos de capital, tem a capacidade de tornar-se hegemônico, através das quais relações de força são atualizadas em relações de sentido, de cognição, de reconhecimento e de comunicação (THIRY-CHERQUES, 2006, p. 119).

Deste viés, um campo pode ser observado pela sua singularidade e autonomia em relação a outros campos, como econômico, ou o político. Um campo existe e faz sentido apenas “relacionalmente, por meio do jogo de oposições e distinções”, diz Bourdieu (2003). Para o autor, os campos possuem três características principais: autonomia relativa; capacidade de retradução do mundo social exterior e; uma lógica própria que faz com que os limites e a definição do campo sejam objeto de conflito e de lutas. Isso faz com que os campos tenham condições de criar suas formas de reprodução.

O campo é um microcosmo dotado de suas próprias leis (BOURDIEU, 20040). É relativamente autônomo porque ainda supõe que obedeça a leis sociais do macrocosmo, isto é, do mundo social. O grau de autonomia de um campo vai depender do volume e estrutura de capital dominante acumulado pelos agentes e, portanto, pelo próprio campo. O campo é um espaço social de interdependência mútua entre diversos agentes e instituições. Mas isso não quer dizer que um campo não está sujeito a interferências externas que possam modificar as relações internas.

O sociólogo Pierre Bourdieu pensava a educação como um desses

campos sociais.

2.1 ELEMENTOS PARA PENSAR A EDUCAÇÃO EM BOURDIEU

As suas pesquisas e livros (no contexto de nosso livro de estudos, as obras ‘Os herdeiros’ e ‘A Reprodução’, principalmente) evidenciam a falta de coerência do discurso igualitário existente em torno da Escola e aquilo que os dados e

Page 137: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

TÓPICO 3 | GERAÇÃO DA SEGUNDA METADE DO SÉCULO XX: BOURDIEU, HABERMAS E GIDDENS

127

informações coletadas traziam. A partir destas obras, voltar-se para o universo da Educação e da Escola era adentrar o terreno da reprodução das desigualdades sociais e da dominação da elite.

A produção intelectual de Pierre Bourdieu dos anos 1960 representou uma crítica original e fundamentada para o problema das desigualdades escolares. Até o momento em que escreveu suas pesquisas sobre educação, as ciências sociais nesse campo se orientavam por uma visão positivista da educação e de seu papel na sociedade (NOGUEIRA; NOGUEIRA, 2002).

De acordo com Cláudio Marques Martins Nogueira e Maria Alice Nogueira, essa perspectiva dava um destaque otimista, em que a Educação e a escolarização tinham um papel “central no duplo processo de superação do atraso econômico, do autoritarismo e dos privilégios [...] e de construção de uma nova sociedade, justa (meritocrática) e democrática (fundamentada na autonomia individual” (NOGUEIRA; NOGUEIRA, 2002, p. 16).

Em “Os herdeiros”, Pierre Bourdieu, em parceria com Passeron, desloca a discussão até então existente em torno do tema da educação. Ali foi denunciada a precariedade das políticas de democratização de acesso preconizadas pelo sistema francês de ensino. Eles colocaram em xeque os discursos de que a educação francesa oferecia bases igualitárias para todos os seus estudantes. Como resultado, a escola tratava diferentes de forma igual, onde os estudantes tinham oportunidades diferentes, a depender da sua origem familiar e pertencimento a uma classe social (VALLE, 2013).

FIGURA 5 - PIERRE BOURDIEU

FONTE: Disponível em: <https://goo.gl/PA7Pz6>. Acesso em: 1 mar. 2018.

Page 138: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

128

UNIDADE 2 | PERCURSOS TEÓRICOS DA SOCIOLOGIA DA EDUCAÇÃO

Em “A Reprodução: elementos para uma teoria do ensino”, também escrita em parceria com Jean-Claude Passeron, e publicada em 1970, aprofundaram a reflexão sobre o funcionamento do sistema de ensino francês (VALLE, 2013).

As análises de Bourdieu e Passeron demonstraram que o desempenho

escolar não dependia somente dos dons dos alunos, mas, principalmente, da origem social dos alunos segundo sua classe social, etnia, sexo, entre outros. A posse de capital cultural favoreceria o desempenho escolar de certos alunos devido à familiaridade e proximidade com os conteúdos e códigos escolares, cultivados por famílias previamente socializadas nesses valores (NOGUEIRA; NOGUEIRA, 2002).

“O ator da Sociologia da Educação de Bourdieu não é nem o indivíduo isolado, consciente e reflexivo, nem o sujeito determinado, mecanicamente submetido às condições em que ele age” (NOGUEIRA; NOGUEIRA, 2002, p. 21).

Uma das teses centrais da Sociologia de Bourdieu é a de que os alunos não são indivíduos abstratos que competem em condições relativamente igualitárias na escola, mas atores socialmente constituídos que trazem, em larga medida incorporada, uma bagagem social e cultural diferenciada e mais ou menos rentável no mercado escolar. O grau variado de sucesso alcançado pelos alunos [...] não poderia ser explicado por seus dons pessoais –, [...] mas por sua origem social, que os colocaria em condições mais ou menos favoráveis diante das exigências – escolares (NOGUEIRA; NOGUEIRA, 2002, p. 18).

Dentro da visão positivista da educação, as pessoas tinham as mesmas chances, competindo dentro do sistema de ensino em condições iguais. Aqueles que se destacavam, seguiam para o ensino superior. A escola era um espaço ‘neutro’, uma instituição voltada à difusão do conhecimento racional, selecionando seus alunos com base em critérios também racionais (NOGUEIRA; NOGUEIRA, 2002). A escola transmite a cultura dominante dando uma cara de ‘cultura universal’, reafirmando privilégios da elite (VALLE, 2013).

As reflexões resultantes dessa obra impactaram as teses da meritocracia escolar, isto é, de que apenas o empenho do estudante e sua originalidade ao tratar dos assuntos estudados bastavam por si mesmos (VALLE, 2013). Os estudantes de origem burguesa (os herdeiros) aderem mais fortemente à ideologia do dom, no seu próprio dom. São beneficiados pelo capital cultural herdado do meio familiar, empregando-o no ambiente escolar. Para as classes desfavorecidas, os seus filhos devem assimilar uma cultura que lhes é estranha, distante de sua classe social de origem ou com que estão pouco familiarizados. Os conteúdos e exames aparecem mais como obstáculos (VALLE, 2013).

Bourdieu nos oferece “um novo modo de interpretação da escola e da educação”, indicando que, ao contrário do discurso otimista, o que se verificava na prática e na realidade era que ambas eram instituições de reprodução e legitimação das desigualdades sociais por meio da qual “se mantém e se legitimam privilégios sociais” (NOGUEIRA; NOGUEIRA, 2002, p. 17).

Page 139: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

TÓPICO 3 | GERAÇÃO DA SEGUNDA METADE DO SÉCULO XX: BOURDIEU, HABERMAS E GIDDENS

129

Neste sentido, o fracasso escolar “não é uma disfunção do sistema de ensino, mas está implicitamente ligado a ele, sendo “socialmente necessário num sistema encerrado em relações de dominação” (VALLE, 2013, p. 423).

A leitura de suas obras nos indicam que as “desigualdades sociais são multiplicadas pela escola (conservadora), perenizando uma verdadeira aristocracia escolar, que tende a desenvolver estratégias de auto(re)produção” (VALLE, 2013, p. 426).

Comentando a obra de Bourdieu, Ione Ribeiro Valle (2013, p. 417) diz que “ao pôr em prática uma série de mecanismos de seleção e de classificação, a escola distancia os detentores de capital herdado dos que não o possuem”, a educação e a escola reforçariam e reproduziriam as diferenças sociais, culturais e educacionais de origem. As reflexões de Bourdieu e Passeron evidenciaram a distância entre aquilo que era a realidade escolar e os princípios que orientavam as políticas de educação.

Segundo Pierre Bourdieu, o poder exercido no Sistema de Ensino é um tipo de poder simbólico, isto é, um tipo de “poder invisível que só pode se exercer com a cumplicidade daqueles que não querem saber que a ele se submetem ou mesmo que o exercem” (BOURDIEU, 1977, p. 31). Dessa reflexão, Bourdieu (1977) discorre sobre o papel da educação como um espaço de imposições arbitrárias, um tipo de violência simbólica.

A violência simbólica indica aquelas ideias e comportamentos impostos aos indivíduos no cotidiano de suas relações sociais. São ideias arbitrárias, mas, como no caso da educação, dissimulados pelo seu reconhecimento no mundo moderno. Na lógica de Boudieu, a violência simbólica legitima os discursos e valores dominantes, dissimulando-os como ‘naturais’. Um exemplo disso é a relação entre conhecimento científico e popular. Na lógica atual, o saber produzido pelas ciências tem mais valor e reconhecimento que aqueles ligados ao senso comum, que são desvalorizados. Assim, e pensando a sua discussão sobre herança familiar no sucesso escolar, as classes populares têm maior dificuldades de lidar com o conhecimento escolar, uma vez que este se encontra mais distante e estranho em seu cotidiano. A classe dominante, por seu turno, em razão de sua íntima relação com o HABITUS escolar e acadêmico, tem maiores chances de sucesso.

2.2 JÜRGEN HABERMAS: RACIONALIZAÇÃO E AÇÃO COMUNICATIVA

Jürgen Habermas parte dos estudos da teoria crítica elaborados por Adorno e Horckheimer na Escola de Frankurt para apresentar suas análises da educação com sua teoria da ação comunicativa. Jürgen Habermas, filósofo e sociólogo alemão nascido em 1929, fala da Modernidade como um projeto. E mais, um projeto inacabado. Para o autor, a Modernidade incorpora eventos como a Reforma Protestante, o Iluminismo e a Revolução Francesa. Esses eventos dão início à Modernidade europeia.

Page 140: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

130

UNIDADE 2 | PERCURSOS TEÓRICOS DA SOCIOLOGIA DA EDUCAÇÃO

Jürgen Habermas nasceu na cidade de Düsseldorf, na Alemanha, curiosamente no mesmo ano em que foi fundada a Escola de Frankfurt, 1929.

Em 1954, aos 25 anos, graduou-se com o trabalho intitulado “O absoluto e a História, sobre Schelling”. Ainda no mesmo ano Habermas tornou-se assistente de Adorno, a quem assistiria durante os próximos cinco anos, até 1959, no Instituto de Pesquisa Social de Frankfurt, a chamada Escola de Frankfurt.

Aos 31 anos, Habermas passou a lecionar Filosofia em Heidelberg e em 1961 publicou a famosa obra “Entre a filosofia e a ciência – o marxismo como crítica”, inserida em “O estudante e a política”. Jürgen Habermas passou, então, a lecionar Filosofia e Sociologia na Universidade de Frankfurt.

Várias obras e artigos foram publicados pelo filósofo nos anos seguintes, entre os quais se destacam: Evolução estrutural da vida pública, em 1962; a famosa Teoria e práxis, em 1963; Lógica das ciências sociais, em 1967; e Técnica e ciência como Ideologia, e Conhecimento e interesse, ambas em 1968.

Em 1968 Habermas mudou-se para Nova York e tornou-se professor da New York School for Social Research. Mas já em 1972 mudou-se novamente, desta vez para Starnberg, assumindo a direção do Instituto Max-Planck. Contudo, em 1983 Habermas tornou, novamente, a lecionar na Universidade de Frankfurt.

DICAS

FIGURA 6 - JÜRGEN HABERMAS

FONTE: Disponível em: <https://goo.gl/zX5tQ6>. Acesso em: 1 mar. 2018.

Page 141: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

TÓPICO 3 | GERAÇÃO DA SEGUNDA METADE DO SÉCULO XX: BOURDIEU, HABERMAS E GIDDENS

131

A modernidade abrange, assim, as transformações ocorridas no “Ocidente” nas várias dimensões da vida em sociedade entre os séculos XVIII-XX. Com base nesses processos, os filósofos, intelectuais e cientistas promoveram nesse período um salto nas ciências, ao mesmo tempo em que estimularam uma noção de ética universal e não particular de uma única sociedade (mesmo que, no fim, estas reforçavam a visão do mundo a partir de um olhar europeu). Essa perspectiva de Aufklärung (Iluminismo) propunha a ciência em benefício da organização racional da vida e da liberdade (HABERMAS, 1992).

A Modernidade de Habermas refere-se às mudanças e novas formações sociais específicas desses tempos modernos. É quando fica mais observável a existência de uma “consciência” acerca das diferenças com o passado e sua história, instituições e mentalidades. Mais importante, ainda, a Modernidade está fortemente apegada à centralidade que a razão ocupou nesses séculos passados e a sua promessa de futuro glorioso para as civilizações.

É a razão – racionalidade ocidental que representa a Modernidade. Além disso, os princípios da ciência moderna estavam sendo estruturados para servir de instrumentos conceituais voltados ao controle e domínio da natureza. Isso resultou na ampliação do poder das forças produtivas pela via do progresso técnico (HABERMAS, 1968). O conceito de esclarecimento desenvolvido pela teoria crítica da Escola de Frankfurt foi retomado por Habermas. Lembramos que a noção de esclarecimento representa o desencantamento do mundo produzido pela emancipação do sujeito em relação ao pensamento mítico.

O processo que decorre da racionalização da filosofia e da ciência conduz a um mundo administrado. Nesse processo, o esclarecimento se torna positivismo e ideologia produzindo progresso tecnológico. Contudo, o progresso tecnológico não chega à mesma proporção para todos e acaba por promover desigualdades sociais. Essas desigualdades, por sua vez, decorrem da apropriação dos avanços da produção material pela classe dominante. Ao mesmo tempo em que desenvolve as forças produtivas, acaba anulando os indivíduos que se tornam meras partes do sistema (PILETTI; PRAXEDES, 2010).

Por fim, em 1994, Habermas aposentou-se, porém sem nunca deixar de contribuir para o arcabouço do conhecimento através de contínuas palestras, obras publicadas e outros trabalhos.

Autor de vasta obra, que compreende hermenêutica jurídica; críticas ferrenhas ao positivismo em sua expressão resultante, o tecnicismo; análise do marxismo e muitos outros temas, Jürgen Habermas é representante da segunda fase da Escola de Frankfurt.

FONTE: Disponível em: <http://intervox.nce.ufrj.br/~ballin/habermas.doc>. Acesso em: 1 mar. 2018.

Page 142: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

132

UNIDADE 2 | PERCURSOS TEÓRICOS DA SOCIOLOGIA DA EDUCAÇÃO

Para compreender com mais propriedade a racionalização constante no projeto da Modernidade, Habermas utiliza-se de dois conceitos que auxiliam na definição e diferenciação da sociedade: SISTEMA e MUNDO DA VIDA.

O SISTEMA indica uma complementaridade com o mundo vivido, ligando-se às maneiras e formas de reprodução da vida material, isto é, ao trabalho, dinheiro, o poder etc. Nele, predomina a razão instrumental, técnica.

Já o MUNDO VIVIDO é a maneira como nós percebemos a realidade, a existência individual e comum. Aqui, predomina a razão comunicativa.

Para Habermas é importante refletir sobre a relação intersubjetiva dos sujeitos através do diálogo: “Nesse processo, segundo a reflexão habermesiana, a ação educativa pode prestar a contribuição de socializar as novas gerações para a construção de identidades de acordo com padrões éticos de convivência e solidariedade” (PILETTI; PRAXEDES, 2010, p. 97).

O processo de socialização representa as formas de adequação dos indivíduos aos padrões da ordem social, pois para atender às exigências do mercado os indivíduos se submetem a processos nos quais são moldados para atender às demandas de mercado. Nesse sentido, não sobra espaço para a emancipação (PILETTI; PRAXEDES, 2010).

Nesse âmbito é que atua a ação pedagógica: para permitir a adequação dos indivíduos às inovações tecnológicas visando desempenho eficiente no mercado de trabalho. Com essa ação as inovações transformam as formas de produzir, porém reforçam os padrões de desigualdades entre as classes sociais. Na visão da teoria crítica, as tecnologias são centrais ao reduzir:

[...] a necessidade de força de trabalho e são utilizadas pelas classes proprietárias do capital como mais um meio para submeter a massa de trabalhadores, transformados em excedentes e rebaixados a uma condição de objeto do sistema administrativo (PILETTI; PRAXEDES, 2010, p. 98).

Logo, além de não deixar espaço para o desenvolvimento da autonomia, o desenvolvimento tecnológico evidencia a hierarquia social, pois reduz cada vez mais a necessidade de força de trabalho. Sem a necessidade da força de trabalho, o trabalhador se torna uma espécie de excedente no processo produtivo, assumindo o papel de objeto.

A formação da identidade é abordada por Habermas como elemento educativo.

FONTE: Habermas (1992)

Page 143: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

TÓPICO 3 | GERAÇÃO DA SEGUNDA METADE DO SÉCULO XX: BOURDIEU, HABERMAS E GIDDENS

133

[...] a formação das identidades é um processo social que depende do contato e das características físicas, cognitivas, afetivas, sexuais, culturais e étnicas dos seres humanos envolvidos em situações educativas [...]. Assim, as diferenças expressam-se nos contatos entre identidades distintas umas das outras em circunstâncias sociais determinadas (PILETTI; PRAXEDES, 2010, p. 102).

Além disso, o desenvolvimento da identidade é entendido como um processo de aprendizagem de determinadas competências: competência linguística para a comunicação; competência cognitiva para apropriação dos saberes essenciais para viver em sociedade; e a competência de interação para convívio em grupo e participação nas relações sociais. Nos processos educativos, essas três dimensões devem ser desenvolvidas igualmente (PILETTI; PRAXEDES, 2010).

Por fim, trazemos a noção de agir comunicativo entendido como:

[...] agir comunicativo é orientado para o acordo intersubjetivo e depende da emissão de um discurso com “pretensões de validade” do qual fazem parte, em resumo, a compreensibilidade da expressão simbólica do emissor pelo receptor, um presumido conteúdo de verdade na mensagem veiculada e a veridicidade de intenção do autor. A pretensão de validade é o que torna possível a compreensão mútua entre os sujeitos, podendo levar à formação de uma racionalidade que resulte em um agir e interagir consensual. A linguagem é o meio para o acordo intersubjetivo, uma vez que medeia o processo de interação que visa o entendimento. É a aprendizagem de convicções morais, de um saber prático e do agir comunicativo que possibilita o aprendizado e a prática da regulamentação consensual dos conflitos de ação, que, por sua vez, levam à integração social fundada na “identidade do Eu” e na identidade coletiva (PILETTI; PRAXEDES, 2010, p. 103).

O agir comunicativo representa uma forma de comunicação desenvolvida a partir de um acordo intersubjetivo, isso significa que para o sucesso da comunicação é necessária a compreensão da informação compartilhada, presunção de verdade e a intenção de verdade por parte do ator que transmite essa informação. O fato de se assumir a validade permite que a interação seja bem-sucedida. A linguagem é o meio pelo qual as informações são compartilhadas e permite o acordo intersubjetivo. A aprendizagem conjunta dos valores morais, dos conhecimentos práticos e da regulação dos conflitos que levam à integração social.

A grande questão é que a Modernidade criou uma disjunção entre sistema e mundo da vida e é em torno disso que Habermas constrói sua Teoria da Ação Comunicativa. Com a predominância da economia e do Estado, ocorreu que a “razão instrumental” tornou hegemônica, balizando as relações sociais. Ele fala em desengate do sistema e do mundo da vida. A eficácia torna-se um fim em si próprio, desvinculado de qualquer contexto. Desta maneira, as forças econômicas e do Estado parecem ser naturais. A razão deixa de ser instrumento de crítica para se tornar poder e acumulação de capitais.

Page 144: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

134

UNIDADE 2 | PERCURSOS TEÓRICOS DA SOCIOLOGIA DA EDUCAÇÃO

Na obra de Habermas se destacou a retomada da noção de esclarecimento no sentido da compreensão crítica da realidade que cerca o sujeito, permitindo sua emancipação. Das discussões a respeito da adequação dos indivíduos para o mercado de trabalho no contexto da ampliação constante das inovações tecnológicas. E, também, das contribuições da noção de agir comunicativo para a compreensão da relação entre linguagem, a educação e a integração social.

2.3 ANTHONY GIDDENS

Anthony Giddens (1938) é um sociólogo e professor britânico, reconhecido por sua Teoria da Estruturação e por sua visão holística das sociedades modernas. Foi um dos pioneiros do conceito de Terceira Via. Ele nasceu em Edmonton, em Londres, Inglaterra, no dia 18 de janeiro de 1938, está vivo e ativo intelectualmente em nossos dias. É um dos sociólogos vivos mais conhecidos e debatidos atualmente mundo afora em razão de suas análises institucionais da Modernidade.

Para José Maurício Domingues (2001), Giddens é um dos autores que, a partir dos anos 1970, tentaram realizar uma síntese na teoria sociológica entre as tendências anteriores que enfatizavam a ação e o sujeito (subjetivismo) ou o

A ação comunicativa para Habermas

O conceito de razão comunicativa de Habermas pressupõe, portanto, uma diferenciação entre os mundos objetivo, social e subjetivo. Esta diferenciação, segundo ele, é que distingue o pensamento moderno do modo de pensar mítico. Ao contrário do último, o primeiro assume que as interpretações variam com relação à realidade social e natural e que as crenças e valores variam em relação ao mundo objetivo e social.

Outra consequência deste conceito é que ele pressupõe o abandono da relação cognitiva sujeito-objeto por um procedimento cognitivo de natureza intersubjetiva, numa relação sujeito-outro sujeito e que só é possível com a progressiva descentração de nossa visão egocêntrica de mundo. [...] Em síntese, podemos dizer então que, para Habermas, a ação comunicativa surge como uma interação de, no mínimo dois sujeitos, capazes de falar e agir, que estabelecem relações interpessoais com o objetivo de alcançar uma compreensão sobre a situação em que ocorre a interação e sobre os respectivos planos de ação com vistas a coordenar suas ações pela via do entendimento.

FONTE: PINTO, José Marcelino de Rezende. A teoria da ação comunicativa de Jürgen Habermas: conceitos básicos e possibilidades de aplicação à administração escolar. Paideia (Ribeirão Preto), Ribeirão Preto, n. 8-9, p. 77-96, Aug. 1995. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0103-863X1995000100007&lng=en&nrm=iso>. Acesso em: 21 fev. 2018.

IMPORTANTE

Page 145: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

TÓPICO 3 | GERAÇÃO DA SEGUNDA METADE DO SÉCULO XX: BOURDIEU, HABERMAS E GIDDENS

135

sistema e a estrutura (objetivismo). Ele tentou fazer uma síntese em torno de teorias sociológicas clássicas. De acordo com Groppo e Martins (2001, p. 218), na Teoria da Estruturação:

Os atores sociais, nesta teoria, são considerados sempre como reflexivos, ou seja, eles podem mudar seu comportamento a qualquer momento, gestando um processo contínuo de “estruturação”. Tais atores seriam sempre hábeis na vida prática social, mesmo sem conhecer mais profunda e conceitualmente toda a realidade (de modo análogo ao uso que todos fazemos da linguagem, mesmo sem conhecer ou dominar todas as regras da língua), pois se trata da consciência prática. Enfim, é muito importante em sua teorização a noção de “consequências não intencionais da ação” dos sujeitos.

Quais são as principais ideias de Giddens a respeito do mundo moderno? Para ele, a Modernidade é um período ao desenvolvimento do Ocidente. Para Giddens (2002, p. 21):

[...] o termo "modernidade" num sentido muito geral para referir-me às instituições e modos de comportamento estabelecidos pela primeira vez na Europa depois do feudalismo, mas que no século XX se tornaram mundiais em seu impacto. A "modernidade" pode ser entendida como aproximadamente equivalente ao "mundo industrializado" desde que se reconheça que o industrialismo não é sua única dimensão institucional.

Giddens desenvolve, em suas obras, formas diversas de análises

institucionais da Modernidade, daí resultando nessa distinção. Mas isso não reduz as contribuições do britânico. Para o autor, as consequências da modernidade estão se tornando mais radicalizadas e universais como nunca antes. Os modos de vida estimulados pelas forças da modernidade desvencilharam os indivíduos e grupos sociais de todos os tipos tradicionais de ordem social, de uma maneira inédita, sem precedentes. Além disso, a modernidade produz certas formas sociais distintas, das quais a mais importante é o estado-nação (GIDDENS, 2002, p. 21).

Segundo o autor, a modernidade é composta de algumas dimensões analíticas. O capitalismo é uma força fundamental da Modernidade. Segundo Giddens (1991, p. 61), “o capitalismo é um sistema de produção de mercadorias, centrado sobre a relação entre a propriedade privada do capital e o trabalho assalariado sem posse de propriedade, esta relação formando o eixo principal de um sistema de classes”. Intimamente relacionado ao capitalismo, temos o industrialismo, caracterizado como o uso de fontes inanimadas de energia material na produção de bens utilizando máquinas para a produção. Uma terceira dimensão da Modernidade são os aparatos de vigilância. Num mundo reflexivo e complexo, a vigilância sobre os indivíduos tornou-se direta e indireta e bastante diferente das sociedades tradicionais. Por fim, o controle dos meios de violência, associado à concentração e centralização unitária do poder do Estado-nação moderno dentro de seu território. Todas essas dimensões afetam a produção social da identidade e da diferença.

Page 146: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

136

UNIDADE 2 | PERCURSOS TEÓRICOS DA SOCIOLOGIA DA EDUCAÇÃO

Giddens (1991) aponta que a Modernidade, através dos movimentos de suas dimensões, produziu descontinuidades. Elas são a base da própria Modernidade. Nesse processo, as ideias de “lugar” e “espaço” “são gradualmente destruídas por um cada vez maior conceito de tempo universal”. O resultado é o desencaixe do “espaço-tempo”, representando mecanismos que deslocam as relações sociais de seus lugares específicos, recombinando-as através de grandes distâncias no tempo e no espaço. As interações sociais são separadas das particularidades do lugar. Quer dizer, o local está cada vez mais subordinado às dinâmicas do global.

As descontinuidades que Giddens aponta são: “o ritmo de mudança que a modernidade põe em movimento; ao escopo da mudança, isto é, ao seu alcance global e; a natureza intrínseca das instituições modernas”, quer dizer, específicas de nossa época (GIDDENS, 1991, p. 14-15).

Desta forma, as descontinuidades provocadas pela Modernidade são

reforçadas por mecanismos de desencaixe. Para Giddens (2002), esses mecanismos servem para “desqualificar aspectos da vida cotidiana”, estendendo-se até às próprias relações sociais e às intimidades do eu. Elas deslocalizam nossa vida. Tiram nossa autonomia, já que para relacionar-se socialmente utilizamos esses mecanismos.

Vigilância(Controle da informação

e supervisão social)

Industrialismo(Transformação da natureza: desenvolvimento

do "ambiente criado")

Capitalismo(Acumulação de

capital no contexto de trabalho e mercados de produtos competitivos)

Poder militar(Controle dos meios de violência no contexto da

industralização da guerra)

FIGURA 7 - DIMENSÕES DA MODERNIDADE SEGUNDO GIDDENS

FONTE: Guiddens (1991)

Page 147: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

TÓPICO 3 | GERAÇÃO DA SEGUNDA METADE DO SÉCULO XX: BOURDIEU, HABERMAS E GIDDENS

137

Anthony Giddens aponta para dois tipos de mecanismos de desencaixe: “as fichas simbólicas” e os “sistemas peritos” (1991). Os primeiros dizem respeito aos meios de troca que têm um valor padrão, sendo intercambiáveis. É o exemplo do dinheiro. Com dólares em sua carteira, você pode deslocar-se pelo mundo, não depende de viver apenas nos Estados Unidos. Os “sistemas peritos” são formas especializadas resultantes da ciência e da tecnologia. A TV a cabo, por exemplo, em que você assiste a notícias em tempo real de todos os cantos do planeta.

Giddens (1991) aponta a reflexividade da vida social específica da modernidade, estando essa na própria base da reprodução do sistema. Esta indicaria que “as práticas sociais são constantemente examinadas e reformadas à luz da informação renovada sobre estas próprias práticas, alterando assim constitutivamente seu caráter”. Num sentido mais direto, a reflexividade institucionaliza o princípio da dúvida radical e insiste em que todo conhecimento tome a forma de hipótese, isto é, seja verificado, examinado, testado (GIDDENS, 1991, p. 10).

A modernidade altera radicalmente a natureza da vida social cotidiana e afeta os aspectos mais pessoais de nossa existência. É aquela situação: a crise econômica europeia de nossa época não afeta apenas a vida de um europeu. Em razão da conexão entre as diversas partes do globo, lugares centrais ou periféricos são atingidos, mesmo que em diferentes proporções.

Segundo Giddens (1991; 2002), a modernidade deve ser entendida em um nível institucional, isto é, mais macro. Todavia, as transformações introduzidas pelas instituições modernas se entrelaçam de maneira direta com a vida individual e, portanto, com o eu. Influências globalizantes de um lado e disposições pessoais de outro.

[...] surgimento de novos mecanismos de autoidentidade que são constituídos pelas instituições da modernidade, mas que também as constituem. O eu não é uma entidade passiva, determinada por influências externas; ao forjar suas autoidentidades, independente de quão locais sejam os contextos específicos da ação, os indivíduos contribuem para (e promovem diretamente) as influências sociais que são globais em suas consequências e implicações. [...] o eu, como os contextos institucionais mais amplos em que existe, tem que ser construído reflexivamente (GIDDENS, 2002, p. 9-11).

Você já ouviu que não se deve parar de aprender, de se informar nunca! Faz parte da reflexividade analisar nossas profissões, buscar novas ideias, inovar. Ser criativo. Os ambientes de reflexividade impactam a conformação do eu, ao passo que o eu, como os contextos institucionais mais amplos que existem, tem que “ser construído reflexivamente” (GIDDENS, 1991, p. 10). Ou, perguntas do tipo "como devo viver? Como agir? O que fazer?” têm de ser respondidas cotidianamente, gerando respostas na forma de comportamentos, roupas, comida (GIDDENS, 2002, p. 20-21). Para o sociólogo britânico:

Page 148: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

138

UNIDADE 2 | PERCURSOS TEÓRICOS DA SOCIOLOGIA DA EDUCAÇÃO

O projeto reflexivo do eu, que consiste em manter narrativas biográficas coerentes, embora continuamente revisadas, tem lugar no contexto de múltipla escolha filtrada por sistemas abstratos. Na vida social moderna, a noção de estilo de vida assume um significado particular. Quanto mais a tradição perde seu domínio, e quanto mais a vida diária é reconstituída em termos do jogo dialético entre o local e o global, tanto mais os indivíduos são forçados a escolher um estilo de vida a partir de uma diversidade de opções (GIDDENS, 2002, p. 12-13).

Pense você: muito difícil imaginar que uma pessoa comum que viveu a Idade Média tivesse “projetos de vida”. Nós, por sua vez, a cada final de ano “avaliamos nossos projetos” ou pontuamos novos. Na nossa época, o planejamento estratégico da vida assume especial importância. Como os padrões do estilo de vida, os planos de vida de um tipo ou de outro são como que concomitantes inevitáveis das formas sociais pós-tradicionais (GIDDENS, 2002, p. 19).

E o que seria esse “eu”, essa autoidentidade? Para Giddens (2002, p. 54):

A autoidentidade não é um traço distintivo, ou mesmo uma pluralidade de traços, possuído pelo indivíduo. É o eu compreendido reflexivamente pela pessoa em termos de sua biografia. A identidade ainda supõe a continuidade no tempo e no espaço: mas a autoidentidade é essa continuidade reflexivamente interpretada pelo agente. Isso inclui o componente cognitivo da pessoidade [personhood]. Ser uma "pessoa" não é apenas ser um ator reflexivo, mas ter o conceito de uma pessoa (enquanto aplicável ao eu e aos outros). O que se entende por "pessoa" certamente varia nas diferentes culturas, embora haja elementos dessa noção que são comuns a todas elas. A capacidade de usar "eu" em contextos diferentes, característica de toda cultura conhecida, é o traço mais fundamental das concepções reflexivas da pessoidade.

Esse “eu”, essa “autoidentidade” é encarnada, possui uma dimensão corporal. Nos ambientes de alta reflexividade, o corpo também é alvo de uma tentativa de controle “mais ativo”. Ele passa a ser acompanhado, reflexivamente monitorado, alinhando-se com os estilos de vida. Para Giddens (2002, p. 57), o corpo é experimentado como um modo prático de enfrentar situações e eventos exteriores, não sendo algo passivo.

A alta modernidade em Anthony Giddens.

Para Anthony Giddens (1991) a modernidade não acabou, estando agora radicalizada na alta modernidade.

A alta modernidade é caracterizada pelo ceticismo generalizado juntamente à razão providencial, em conjunto com o reconhecimento de que a ciência e a tecnologia têm dois gumes, criando novos parâmetros de risco e perigo ao mesmo tempo em que oferecem possibilidades benéficas para a humanidade. Quer dizer, é uma época de incertezas globais.

FONTE: Disponível em: <http://www.ecoprofile.se/db/images/post15894.jpg>. Acesso em: 23 mar. 2018.

Page 149: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

TÓPICO 3 | GERAÇÃO DA SEGUNDA METADE DO SÉCULO XX: BOURDIEU, HABERMAS E GIDDENS

139

E quais são as ideias principais de Anthony Giddens em relação à educação? Sua visão a respeito da educação está intimamente vinculada à sua visão de ‘reflexividade”. Segundo o autor:

A educação é um conceito mais amplo do que o ensino escolar formal, e também pode deixar de ser considerado um estágio de preparação que antecede o ingresso do indivíduo no mercado de trabalho. À medida que muda a tecnologia, mudam as habilidades, e mesmo se a educação for vista a partir de um ponto de vista puramente vocacional – como capaz de proporcionar habilidades relevantes para o trabalho – a maioria dos observadores concorda que, no futuro, os indivíduos precisarão de uma educação que se estenda por toda a vida. (GIDDENS, 2001c, p. 421).

Conforme discutimos anteriormente, Giddens não percebe o atual momento de profundas transformações sociais como algo negativo, a ser combatido. Nesse mundo destradicionalizado, o indivíduo pode e deve se beneficiar da atual ‘reflexividade’. Muitas vezes, nossa época é qualificada como era do conhecimento, resultando em sociedades do conhecimento. Ao invés do tradicional modelo industrial, as dinâmicas de nosso presente disponibilizam uma série de informações. Estas são distribuídas pelos meios de comunicação, pela internet, pela educação. Giddens indica que as pessoas devem se beneficiar desse fluxo de informações e atuar no mundo a partir dele, captando suas oportunidades, melhorando a democracia etc.

Na teoria de Giddens, os indivíduos possuem um destaque fundamental.

Eles, a par desse mundo reflexivo, são capazes de lidar e controlar – mais ou menos – suas atividades em distintas situações. Neste sentido, para o sociólogo inglês, a educação tem esse papel: de contribuir decisivamente para exercitar a reflexividade nos indivíduos e coletividades, lidando com saberes e conhecimentos em seu cotidiano. Daí as escolas e as universidades são algumas instituições responsáveis por esse treino. Mas não são as únicas. Por isso, Giddens (2001c, p. 422) enfatiza o aprendizado.

A ideia de uma educação – que implica a transmissão estruturada do conhecimento dentro de uma instituição formal – vem dando passagem a uma noção mais ampla de “aprendizado” que ocorre em uma diversidade de ambientes. O deslocamento da “educação” para o “aprendizado” não é irrelevante. Os aprendizes são atores sociais curiosos, ativos, que podem extrair insights de uma multiplicidade de fontes, não apenas dentro de um cenário institucional. A ênfase sobre o aprendizado reconhece que as habilidades e o conhecimento podem ser adquiridos por meio de todos os tipos de contato – com amigos e vizinhos, em seminários e museus, em conversas no bar da esquina, através da internet e outros meios de comunicação, e assim por diante.

As ideias e sociologias de Giddens reverberaram na política. Em torno dele e de outros intelectuais, consolidou-se a ideia da Terceira Via. Dentro desse grupo, que procurou sintetizar ideias liberais e sociais de economia e política, a Educação virou uma espécie de discurso comum.

Page 150: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

140

UNIDADE 2 | PERCURSOS TEÓRICOS DA SOCIOLOGIA DA EDUCAÇÃO

Educação e treinamento tornaram-se o novo mantra para os políticos socialdemocratas. Numa expressão famosa, Tony Blair descreve suas três principais prioridades no governo como ‘educação, educação, educação’. A necessidade de melhores qualificações educacionais e de treinamento em habilidades é evidente na maioria dos países industrializados, particularmente no que diz respeito aos grupos mais pobres. Quem poderia negar que uma população bem-formada é desejável para qualquer sociedade? O investimento em educação é um imperativo do governo hoje, como uma base essencial da ‘redistribuição de possibilidades’ (GIDDENS, 2001a, p. 119).

TERCEIRA VIA

Desde o final dos anos 1990, a Terceira Via vem sendo o principal discurso político-ideológico a referendar a práxis hegemônica das elites dominantes e dirigentes do capitalismo global. Trata-se de um renovado discurso que flexibiliza alguns dos dogmas do neoliberalismo predominante até então, o que nos permite chamá-lo de “neoliberalismo de Terceira Via”. Um de seus traços mais paradoxais é o de ter sido abraçado, como discurso e/ou programa político, por alguns dos principais partidos e governos ditos de “esquerda” ou progressistas, a começar pelo Novo Trabalhismo Inglês e o governo de Tony Blair. Esta metamorfose intrigante das forças da esquerda “moderada”, assumindo discursos e práticas da direita neoliberal, ainda que em um tom heterodoxo, como Terceira Via, é o assunto inicialmente discutido neste texto (GROPPO; MARTINS, 2008, p. 216).

FONTE: Groppo e Martins (2008)

DICAS

Para ele, a educação era a principal força de desenvolvimento no que se refere ao capital humano e capital social (recorde a discussão que fizemos em Bourdieu e os tipos de capitais). Segundo Giddens, a educação seria “o principal investimento público que pode estimular a eficiência e a coesão social” (GIDDENS, 2001b, p. 78). Neste cenário:

A nova economia do conhecimento não triunfou completamente, mas está a ponto de conseguir tal vitória. Em combinação com os aspectos mais amplos da globalização, ela assinala uma transição importante na natureza da atividade econômica. [...] Sociedades ou regiões inteiras podem passar de agrárias para uma economia do conhecimento sem atravessar uma fase de industrialização ao velho estilo (GIDDENS, 2001b, p. 74-75).

Por isso, em nosso mundo globalizado e reflexivo, a educação teria de acompanhar tais mudanças, se concentrando em capacidades que os indivíduos podem empregar e desenvolver ao longo da vida, numa lógica de aprendizagem contínua, sem estar restrito à escola ou à universidade.

Page 151: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

TÓPICO 3 | GERAÇÃO DA SEGUNDA METADE DO SÉCULO XX: BOURDIEU, HABERMAS E GIDDENS

141

Mészáros: a educação para além do capital

As pesquisas educacionais contemporâneas de inspiração marxista contam também com a obra já consolidada, mas ainda em construção, do filósofo húngaro István Mészáros (1930-). Ao publicar livro e viajar para dar conferências em vários países, entre eles o Brasil, Mészáros difunde a sua abordagem crítica das formas de educação alienantes das sociedades capitalistas e propõe uma perspectiva política socialista “para além do capital”.

A obra de Mészáros vem se constituindo em um referencial importante para a abordagem marxista na pesquisa educacional. Combinando a pesquisa filosófica com a defesa de uma perspectiva política socialista, sua concepção educativa parte da crítica à educação voltada para os interesses das classes dominantes do capitalismo, para propor uma educação “para além do capital”. Para Mészáros (1981, p. 261), “a tarefa de transcender as relações sociais de produção capitalistas, alienadas, deve ser concebida na estrutura global de uma estratégia educacional socialista”.

A pesquisa em sociologia da educação pode apropriar-se da obra de Mészáros, a qual apresnta aos pesquisadores uma perspectiva que considera a educação uma dimensão do ser social, inserida no conjunto da vida social, e não um fator isolado próprio de uma fase específica de formação dos membros da sociedade, ou processos de educação formal promovidos nas instituições escolares. Assim analisada, a educação deve ser tanto pesquisada como projetada, visando à construção de uma forma de sociabilidade livre de alienação, e não a perpetuação do domínio do capital e das sociedades capitalistas. “Por isso que é necessário romper com a lógica do capital se quisermos contemplar a criação de uma alternativa educacional significativamente diferente”, propõe Mészáros (2005, p. 27), uma alternativa que supere a concepção segundo a qual a educação deve ser tratada como um serviço e vendida no mercado como qualquer outra mercadoria, com o objetivo de qualificar os indivíduos para o trabalho nas organizações capitalistas.

A “lógica do capital” a que se refere o filósofo foi extensamente estudada na clássica obra Para além do capital – Rumo a uma teoria da transição, na qual a sociedade capitalista é entendida como um sistema socioeconômico baseado na relação social de alienação que separa o trabalho, realizado diretamente pelos trabalhadores, do controle administrativo e político, realizado pelas classes dominantes e seus representantes sobre o trabalho, graças à sustentação legal, administrativa e policial que o Estado garante para a manutenção da divisão hierárquica do trabalho. Para Mészáros, a sociedade capitalista foi formada historicamente pelo capital, pelo trabalho e pelo Estado, que se combinam em uma totalidade social complexa com a qual os seres humanos devem contribuir direta ou indiretamente para a acumulação capitalista. O sistema se constitui de modo a controlar as variáveis produtivas que lhe garantirão a reprodução

LEITURA COMPLEMENTAR

Page 152: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

142

UNIDADE 2 | PERCURSOS TEÓRICOS DA SOCIOLOGIA DA EDUCAÇÃO

ampliada do capital, englobando, para tanto, desde as pequenas empresas até as corporações de empresas transnacionais em um sistema metabólico que gera sempre um maior fortalecimento dos que em si já são mais fortes, causando a alienação dos trabalhadores, transformados em meros objetos do sistema econômico (ANTUNES, 2002, p. 17).

Educação, competência técnica e valores

Os processos educacionais nas sociedades capitalistas destinam-se a reproduzir as competências necessárias para o funcionamento das empresas e também os valores individualistas, consumistas, competitivos e hierárquicos que orientam os indivíduos na vida cotidiana. Mészáros denomina esse processo de “interiorização” pelos indivíduos das pressões exteriores das sociedades de mercado, tornando-os seres alienados em seus sentidos físicos e mentais, pois se voltam para a preocupação individualista com o “ter”, ou seja, com a posse de propriedades, e não com o cultivo do seu “ser” por meio da convivênvia e do desenvolvimento livre de seus sentidos. Segundo a concepção crítica de Mészáros (2005, p. 35), a educação promovida pelos sistemas escolares nas sociedades capitalistas produz e transmite aqueles saberes que, uma vez colocados em prática pelos trabalhadores educados no sistema, contribuem para a reprodução ampliada do capital. Esses sistemas também difundem as ideologias que legitimam os interesses dominantes, ao promover a substituição dos trabalhadores à ordem hierárquica das organizações capitalistas.

Manifestando uma influência recebida do pensamento de Gramsci, Mészáros defende também que, nesse processo de interiorização de competências técnicas e valores, “os indivíduos contribuem para a manutenção de uma concepção de mundo e para a manutenção de uma forma específica de intercâmbio social, que corresponde àquela concepção de mundo” (MÉSZÁROS, 1981, p. 260).

Uma sociologia da educação baseada no referencial téorico proposto por Mészáros orienta a investigação de valores e habilidades que contribuem para a manutenção da dependência do trabalho ao capital, tanto nos processos educativos informais como por meio da educação escolar. A investigação evidencia, assim, como a educação se torna profundamente problemática sob o capitalismo, pois contribui para a desumanização dos seres humanos. Para tanto, identifica e critica as concepções educativas e os mecanismos práticos com os quais os processos educativos se subordinam à racionalidade da lógica da competição pelo lucro e pela propriedade nas sociedades capitalistas.

Mas a sociologia da educação pode também investigar as alternativas propostas para a superação da divisão hieráquica do trabalho e da dependência do trabalho em relação ao capital, com uma “progressiva devolução às pessoas dos poderes alienados de decisão política” (MÉSZÁROS, 2002, p. 30), tendo em vista a construção de um sistema de controle social que instaure uma sociedade igualitária.

FONTE: Disponível em: <https://docslide.com.br/documents/meszaros-istvan-para-alem-do-capital-rumo-a-uma-teoria-da-transicao.html>. Acesso em 19 abr. 2018.

Page 153: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

143

RESUMO DO TÓPICO 3

• Neste tópico, estudamos os sociólogos que indicamos como partes da geração da segunda metade do século XX, destacando Pierre Bourdieu, Jürgen Habermas e Anthony Giddens.

• Pierre Bourdieu é um autor muito importante no campo da Sociologia da Educação. Suas reflexões, em conjunto com Passeron, promoveram uma ruptura metodológica e teórica em torno de como a educação era concebida. Eles enfatizaram aspectos como a falsa neutralidade da escola e seu papel na reprodução dos discursos dominantes e das desigualdades estruturais das sociedades.

• Jürgen Habermas retoma os estudos desenvolvidos por colegas da Escola de Frankfurt para compreender o processo de socialização das novas gerações através da educação, dando destaque para a noção de esclarecimento e de agir comunicativo.

• Anthony Giddens, sociólogo inglês, é conhecido por sua Teoria da Estruturação Social e pelas suas análises institucionais da Modernidade. Em sua discussão sobre a educação, ele destaca o papel da reflexividade no atual contexto social de relações globais.

Page 154: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

144

1 Entre os autores discutidos nos tópicos 2 e 3, podemos identificar elementos comuns nas abordagens de autores como Gramsci, Habermas e Althusser quando considerando que ambos retomaram reflexões de Karl Marx para analisar a sociedade de seu tempo e elaborar uma crítica à educação no contexto do capitalismo. Considerando esses pensadores, analise as sentenças fazendo uso do código a seguir:

I – GramsciII – HabermasIII – Althusser

( ) A escola é um Aparelho Ideológico de Estado que busca moldar o comportamento dos sujeitos para inserção na estrutura social.

( ) O agir comunicativo promove a aprendizagem de valores morais, de conhecimentos práticos e da regulação de conflitos.

( ) A educação é um elemento central para a naturalização das relações sociais de exploração no capitalismo.

( ) A educação deve ser defendida em sua forma humanística voltada para a promoção da democracia e da liberdade.

Agora assinale a alternativa que corresponde à sequência CORRETA:

a) ( ) III – II – III – I.b) ( ) II – I – I – III.c) ( ) I – III – III – II.d) ( ) II – II – I – III.

2 Pierre Bourdieu é um dos mais destacados sociólogos no campo da Educação. Sua postura face às questões escolares produziu uma revolução na maneira como se tratava a educação e suas relações com a sociedade. Sobre o pensamento de Bourdieu em relação à educação, assinale a alternativa CORRETA:

a) ( ) Pierre Bourdieu é considerado um dos principais teóricos da Sociologia Contemporânea, ao pensar a escola como um Aparelho Ideológico de Estado, dando sequência na discussão realizada por Louis Althusser.

b) ( ) Pierre Bourdieu pode ser considerado um dos principais teóricos da Sociologia da Educação, porque em suas análises ele aponta a importância do afeto e do carinho na criação das crianças, pensando cada menino e menina como uma flor em um jardim.

c) ( ) Pierre Bourdieu pode ser considerado um dos principais teóricos da Sociologia da Educação porque possuiu uma visão extremamente crítica do sistema escolar francês, denunciando seu caráter reprodutor dos valores dominantes.

AUTOATIVIDADE

Page 155: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

145

3 (ENADE, 2017, questão modificada). O sociólogo Anthony Giddens é um dos pensadores que têm se dedicado ao debate das características e mudanças das sociedades na contemporaneidade, buscando compreender qual é a pertinência do conceito de modernidade para analisá-las. Ao refletir sobre os aspectos institucionais e epistemológicos da modernidade, o autor problematiza algumas leituras dominantes sobre o tema na sociologia, a fim de compreender as intensas transformações nas sociedades contemporâneas. A partir dessa contextualização, avalie as afirmações a seguir, relativas ao pensamento de Giddens sobre as sociedades contemporâneas e o conceito de modernidade.

I – Giddens defende que os tempos atuais não podem ser considerados como ‘pós-modernos’, mas como um período no qual as consequências da modernidade têm se tornado mais radicalizadas e universalizadas.II – Segundo o autor, a modernidade caracteriza-se pela relação de proximidade e unicidade entre o tempo e o espaço, que possibilita a reprodução, em caráter global, de fórmulas de mediação e do registro do tempo.III – Esse autor afirma que a modernidade se caracteriza pela constante reflexão sobre as práticas sociais, examinadas e reformadas à luz de informação renovada, o que altera seu caráter, em um processo que ele chama de reflexividade.

Assinale a alternativa que apresenta a sequência CORRETA:

a) ( ) I e II.b) ( ) II e III.c) ( ) I e III.d) ( ) I.

Page 156: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

146

Page 157: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

147

UNIDADE 3

A SOCIOLOGIA DA EDUCAÇÃO NA CONTEMPORANEIDADE

OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM

PLANO DE ESTUDOS

Esta unidade tem por objetivos:

• discutir a presença dos Estudos Culturais e do Multiculturalismo no cam-po da educação;

• apresentar o contexto do desenvolvimento da Sociologia da Educação no Brasil;

• analisar as relações entre sociedade, educação e escola a partir de temas da sociologia da Educação;

A Unidade 3 está dividida em três tópicos e ao fim de cada um deles você encontrará um resumo dos conteúdos e questões de autoatividade que contribuirão para a reflexão e análise dos conteúdos abordados.

TÓPICO 1 – ESTUDOS CULTURAIS, MULTICULTURALISMO E EDUCAÇÃO

TÓPICO 2 – A SOCIOLOGIA DA EDUCAÇÃO NO BRASIL

TÓPICO 3 – TEMAS DA SOCIOLOGIA DA EDUCAÇÃO

Page 158: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

148

Page 159: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

149

TÓPICO 1

ESTUDOS CULTURAIS,

MULTICULTURALISMO E EDUCAÇÃO

UNIDADE 3

1 INTRODUÇÃO

A intenção deste tópico é abordar alguns fenômenos contemporâneos de interesse sociológico e com repercussões no campo da educação. Para dar conta deste interesse, indicamos duas formações teóricas e políticas que se desenvolveram ao longo das últimas oito décadas: os estudos culturais e o multiculturalismo.

São duas respostas intelectuais e de luta política frente a questões trazidas pelas grandes mudanças sociais experimentadas ao longo do século XX. Uma dessas mudanças está ligada às transformações de sentido da palavra cultura, bem como suas implicações no campo das disputas sociais e econômicas. Da mesma forma, a realidade de duas guerras mundiais, que alteraram o mapa da geopolítica do poder, e os efeitos da globalização, estimularam que a partir de 1960 ocorre um movimento que deu centralidade à dimensão da cultura no contexto das sociedades.

Uma das mais impactantes é a sua aproximação com a política. A territorialização da cultura por parte da política, e vice-versa, a partir dos profundos deslocamentos conceituais que ocorreram no último século e no início deste, resultou na ampliação dos usos possíveis da cultura, considerada agora importante recurso mobilizado por uma infinidade de agentes sociais, públicos, privados e estatais, urbanos, rurais ou tradicionais para os mais diversos fins e justificativas.

Neste sentido, as propostas e respostas teóricas apontadas por essas duas formações intelectuais e políticas reverberam na educação. Como vimos na Unidade 2, inúmeras foram as contribuições que retiraram o véu de neutralidade tanto da educação quanto das instituições escolares. Pesquisas como as levadas a cabo por Pierre Bourdieu e J. Passeron indicaram quão desiguais são os processos educacionais, a partir do caso francês. Além de desiguais, esses mecanismos tinham ainda o poder de apagar a diferença.

Assim, os estudos culturais e o multiculturalismo se debruçaram sobre os processos e os produtos culturais, a recepção das mensagens das mídias de massa, bem como, da produção social das identidades e da diferença.

Page 160: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

UNIDADE 3 | A SOCIOLOGIA DA EDUCAÇÃO NA CONTEMPORANEIDADE

150

2 ESTUDOS CULTURAIS E AS SUAS RELAÇÕES COM A EDUCAÇÃO

Dentro da proposta de discutir temas atuais e relacionados à Sociologia da Educação, exploramos duas disciplinas que contribuíram para a reorientação do olhar sobre os processos da educação: os Estudos Culturais e os Estudos Pós-coloniais.

Essas duas disciplinas são maneiras de pensar as relações sociais, o indivíduo, a sociedade e as novas configurações globais que surgiram no século XX. Os Estudos Culturais apareceram entre as décadas de 1940 e 1950, ao passo que os Estudos Pós-coloniais tiveram relevância a partir dos anos 1960.

Estes campos de pesquisa e de investigação surgiram como respostas aos

movimentos de mudanças globais e que transformaram as relações sociais.

Trata-se de um período bastante intenso do século XX. A década de 1950 assistiu ao avanço da indústria cultural e da cultura de massas, enquanto os anos 1960 consolidaram a independência de inúmeros países na África e Ásia de países europeus. É neste cenário que estas linhas de pesquisas surgiram no interior de campos como a Sociologia, a Literatura, a História e/ou a Antropologia.

2.1 OS ESTUDOS CULTURAIS

O que são os Estudos Culturais (EC)? Qual é a sua origem e foco de interesse? O que representa esse movimento intelectual para as Ciências Humanas e Sociais? São questões sobre as quais procuramos dar algumas pistas para uma reflexão adequada.

Os EC representam um movimento ou uma formação teórica, intelectual e política que agregou alguns autores em torno da discussão a respeito da cultura e das produções culturais no interior da sociedade inglesa. Têm origem no Reino Unido a partir de alguns autores que se tornaram conhecidos como os ‘fundadores’ dos EC, a saber:

- Raymond Williams: Cultura e sociedade (Culture and society, 1780-1950, publicado em 1958).

- Richard Hoggart: Os usos da literatura (The uses of literacy, publicado em 1957).- Edward E. Thompson: A formação da classe operária inglesa (The making of

English working class, 1963).

Page 161: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

TÓPICO 1 | ESTUDOS CULTURAIS, MULTICULTURALISMO E EDUCAÇÃO

151

Os três fundadores dos EC e suas primeiras reflexões.

DICAS

FIGURA 1 - RICHARD HOGGART (1918-2014)

FONTE: Disponível em: <https://goo.gl/gQhCyE>. Acesso em: 28 mar. 2018.

Na pesquisa realizada por Hoggart, o foco de atenção recai sobre materiais culturais, antes desprezados, da cultura popular e dos meios de comunicação de massa, através de metodologia qualitativa. Esse trabalho inaugura o olhar de que no âmbito popular não existe apenas submissão, mas também resistência, o que, mais tarde, será recuperado pelos estudos de audiência dos meios massivos. Tratando da vida cultural da classe trabalhadora, transparece nesse texto um tom nostálgico em relação a uma cultura orgânica dessa classe.

FIGURA 2 - RAYMOND WILLIAMS (1921-1988)

FONTE: Disponível em: <https://goo.gl/w7EnJ5>. Acesso em: 28 mar. 2018.

Page 162: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

UNIDADE 3 | A SOCIOLOGIA DA EDUCAÇÃO NA CONTEMPORANEIDADE

152

A contribuição teórica de Williams é fundamental para os Estudos Culturais a partir de Culture and Society (1958). Através de um olhar diferenciado sobre a história literária, ele mostra que cultura é uma categoria-chave que conecta a análise literária com a investigação social. Seu livro The Long Revolution (1961) avança na demonstração da intensidade do debate contemporâneo sobre o impacto cultural dos meios massivos, mostrando um certo pessimismo em relação à cultura popular e aos próprios meios de comunicação.

FIGURA 3 - EDWARD THOMPSON (1924-1993)

FONTE: Disponível em: <https://goo.gl/X7zEm5>. Acesso em: 28 mar. 2018.

Em relação à contribuição de Thompson, pode-se dizer que ele influencia o desenvolvimento da história social britânica de dentro da tradição marxista. Para ambos, Williams e Thompson, cultura era uma rede vívida de práticas e relações que constituíam a vida cotidiana, dentro da qual o papel do indivíduo estava em primeiro plano. Mas, de certa forma, Thompson resistia ao entendimento de cultura enquanto uma forma de vida global. Em vez disso, preferia entendê-la enquanto um enfrentamento entre modos de vida diferentes.

FONTE: Escosteguy (1998)

O cenário que deu origem aos EC é marcado por alterações experimentadas pela sociedade inglesa do pós-Segunda Guerra Mundial, com o fim do colonialismo britânico e nas modificações das estruturas de classes sociais. As suas primeiras pesquisas e publicações têm início no final dos anos 1950, sendo incorporados às universidades britânicas nos anos 1960, a partir do Centro para Estudos Culturais Contemporâneos (Centre for Contemporary Cultural Studies - CCCS), da Universidade de Birmingham (CEVASCO, 2003; ESCOSTEGUY, 2001). Dentro do ambiente universitário, o principal foco de interesse dos EC foram:

As relações entre a cultura contemporânea e a sociedade, isto é, suas formas culturais, instituições e práticas culturais, assim como suas relações com a sociedade e as mudanças sociais, vão compor o eixo principal de observação do CCCS (ESCOSTEGUY, 2003, p. 27).

Page 163: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

TÓPICO 1 | ESTUDOS CULTURAIS, MULTICULTURALISMO E EDUCAÇÃO

153

Estes autores e obras deram início a um campo teórico hoje em expansão, abrindo uma nova perspectiva em torno da percepção sobre as relações entre cultura e sociedade. Os EC, neste sentido, indicam uma posição teórica que:

[...] se distingue por pensar as características da arte e da sociedade em conjunto, não como aspectos que devem ser relacionados, mas como processos que têm diferentes maneiras de se materializar, na sociedade e na arte. Os projetos artísticos e intelectuais são constituídos pelos processos sociais, mas, também, constituem esses processos na medida em que lhe dão forma (CEVASCO, 2003, p. 64).

Os EC não configuram uma “disciplina”, mas uma área onde diferentes disciplinas interagem, estudando aspectos culturais da sociedade. Podem ser vistos como um campo de estudos em que diversas disciplinas se interseccionam no estudo de aspectos culturais da sociedade contemporânea, constituindo um trabalho historicamente determinado (ESCOSTEGUY, 2003).

Segundo Renato Ortiz (2004, p. 121), os EC se caracterizam por sua dimensão multidisciplinar, a quebra das fronteiras tradicionalmente estabelecidas nos departamentos e nas universidades. O interesse central dos estudos culturais é perceber as intersecções entre as estruturas sociais e as formas e práticas culturais (ESCOSTEGUY, 2003).

Ainda nesse sentido, os EC podem ser percebidos como um campo de estudos que trata “especialmente das análises que abordam as relações entre comunicação e cultura” (ESCOSTEGUY, 2001, p. 20). Desta forma, os estudos ligados aos EC procuram refletir sobre a “cultura midiática, incluindo tanto os meios, os produtos e as práticas culturais – ou seja, referem-se tanto à natureza e à forma dos produtos simbólicos quanto ao circuito de produção, distribuição e consumo (p. 22).

De acordo com Raymond Williams (1969), os Estudos Culturais preocupam-se com o nível micro das relações sociais, isto é, com as práticas e produções culturais manifestas, requerendo, na sua abordagem global, observar os meios materiais de produção cultural e as suas ligações com as formas culturais concretas.

Os EC, como dissemos, mostraram-se um empreendimento teórico original a seu tempo. Segundo Escosteguy (2001, p. 19), eles representam “uma tendência importante da crítica cultural”, questionando as relações entre cultura e sociedade, criticando as perspectivas elitistas de cultura. Estas visões criticadas estabeleciam “hierarquias entre formas e práticas culturais, estabelecidas a partir de oposições como cultura ‘alta’ ou ‘superior’ e ‘baixa’ ou ‘inferior’”. Os EC britânicos, então, se aproximaram da cultura dos “de baixo”, enfatizando, principalmente, a cultura popular.

Page 164: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

UNIDADE 3 | A SOCIOLOGIA DA EDUCAÇÃO NA CONTEMPORANEIDADE

154

O que os EC ingleses nos indicaram foi uma centralidade para a cultura no interior das sociedades. Eles procuraram se afastar ou criticar as perspectivas que pensavam a cultura em termos abstratos ou ligados somente ao cultivo do espírito, que apenas reforçariam as ligações entre cultura e civilização. Neste sentido, a cultura aparece nos EC como um fenômeno complexo e heterogêneo, não restrito à herança e à tradição recebidas de gerações passadas. A cultura foi percebida como uma dimensão fundamental das sociedades e da realidade social, carregada de relações de poder e de onde os indivíduos e grupos sociais modificam constantemente o seu sentido.

Cultura popular

A cultura popular nos indica inúmeros fenômenos, manifestações e expressões de cunho cultural que têm origem nos segmentos populares, isto é, no povo. Tem um caráter espontâneo e é resultado das interações entre diversos grupos populares, estando associada ao conhecimento popular, ao senso comum. Geralmente, representa expressões cujos produtores se encontram na parte de baixo das estruturas sociais e econômicas das sociedades. É encontrada em todos os países. No caso brasileiro, pela sua formação social, podemos perceber inúmeras expressões populares, como o carnaval, o samba, o nosso folclore, as festas populares e religiosas, danças e gastronomia.

De uma maneira geral, está em oposição à “cultura erudita” ou “alta cultura”, associada à cultura universal, legitimada e difundida por instituições como o Estado e a escola. Os produtos da alta cultura estão ligados ao universo das camadas sociais dominantes, consideradas ‘superiores’ à cultura popular.

DICAS

FIGURA 4 - FESTA JUNINA, EXEMPLO DE CULTURA POPULAR BRASILEIRA

FONTE: Disponível em: <https://goo.gl/4NdQoL>. Acesso em: 28 mar. 2018.

Page 165: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

TÓPICO 1 | ESTUDOS CULTURAIS, MULTICULTURALISMO E EDUCAÇÃO

155

O deslocamento principal ficou caracterizado pelo fato de que não é mais através da dicotomia Cultura Erudita versus Cultura de Massas que se desenvolve o debate cultural, mas sim numa esfera mais política, a da produção das identidades e das relações de poder.

Os EC contribuíram para mudar uma perspectiva de consumo cultural passivo. Os temas tratados pelos EC se caracterizaram por enfatizar a atividade humana e sua produção ativa da cultura. A consequência desse debate foi “a revisão dos cânones estéticos ou mesmo de identidades regionais e nacionais que se apresentam como universais ao negarem ou encobrirem determinações de raça, gênero e classe” (ESCOSTEGUY, 2003, p. 47).

Neste sentido, a cultura aparece como elemento constitutivo de muitos processos sociais, não apenas a sua aparência. Não foi à toa que nos anos 1950-1960 a cultura se relaciona com outros fenômenos típicos da época, como a ascensão de reivindicações de corte identitário no impulso dos movimentos sociais de gênero, ecológico, pacifistas, muitos deles referindo-se a si próprios como minorias culturais.

FIGURA 5 - CULTURA, ESTUDOS CULTURAIS, CULTURA MATERIAL E COTIDIANA

FONTE: Disponível em: <https://i.ytimg.com/vi/YMJVkkikI2I/maxresdefault.jpg>. Acesso em: 28 mar. 2018.

Page 166: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

UNIDADE 3 | A SOCIOLOGIA DA EDUCAÇÃO NA CONTEMPORANEIDADE

156

CULTURA, SOCIEDADE E OS ESTUDOS CULTURAIS

A palavra cultura e aquilo que ela indica e significa vêm se modificando ao longo do tempo. As primeiras referências à cultura não possuíam os sentidos que atualmente mais empregamos. Até o século XVI, a cultura era percebida como algo ligado ao cultivo da terra ou a habitar um espaço, tendo origem na palavra latina ‘colere’.

A partir do século XVIII, a cultura passou a ser percebida, também, na forma de uma metáfora para indicar o cultivo de mente e do espírito a partir do estudo e da reflexão e consumo de produtos culturais elevados. Ao mesmo tempo, nessa época, a cultura se aproximou da definição de ‘civilização’. Somente os povos civilizados possuíam cultura, por exemplo. Assim, ao final do século XVIII, cultura tinha o sentido de cultivo (como de tomates), mas, também, para “designar um processo geral de progresso intelectual e espiritual tanto na esfera pessoal quanto social (CEVASCO, 2003, p. 9).

Durante o século XIX, a cultura passou por novos sentidos, especialmente, a partir da contribuição da Antropologia. Foi nessa disciplina que apareceu o primeiro conceito científico de cultura, elaborado por Edward Tylor em 1871, que definiu a cultura como “um todo complexo que inclui conhecimentos, crenças, arte, moral, leis, costumes ou qualquer outra capacidade ou hábitos adquiridos pelo homem como membro de uma sociedade” (TYLOR, 1871 apud LARAIA, 1986, p. 25). Tylor entendia a cultura como um fenômeno natural, e como tal poderia ser analisado sistematicamente, visando à formulação de leis que explicassem sua gênese e transmissão. Com isso, a cultura, além dos significados anteriormente indicados, passou a ter uma perspectiva que se tornou crítica, num ambiente de aceleradas mudanças sociais (CEVASCO, 2003).

Já no século XX, a cultura passou a ser associada, ainda, a um campo autônomo das sociedades, ligando-se ao universo das Artes. Incluem-se nesses sentidos os produtos culturais como obras visuais, musicais, literárias etc. Para Loïc Wacquant (2005), o campo artístico é “esta arena particular, ou espaço estruturado de posições e tomadas de posição, onde indivíduos e instituições competem pelo monopólio sobre a autoridade artística à medida que esta se autonomiza dos poderes econômicos, políticos e burocráticos” (p. 117). O campo artístico representa um “campo de força” que tem determinado monopólio sobre saberes específicos, acionando estratégias de legitimação e de rompimento, mas sempre de assimilação por esta “rede de determinações objetivas”. Assim, para entender a lógica de funcionamento do campo de produção cultural é necessário identificar quais poderes são acionados e questionados, que estruturas e instituições são criadas, conservadas ou desmanteladas, bem como trajetórias artísticas individuais reforçam ou contestam posições dentro do campo.

Já nos anos 1960, em pleno século XX, a cultura ganhou centralidade, sendo percebida cada vez mais como “culturas”, no plural, influenciadas pelos meios de comunicação, pelas dinâmicas da globalização ou pelos padrões de mudanças identitárias. Neste cenário, os Estudos Culturais aparecem como fundamentais para essa mudança e centralidade da cultura, onde, “a Cultura, com maiúscula, é substituída por culturas no plural. O foco não é mais a conciliação de todos nem a luta por uma cultura em comum, mas as disputas entre as diferentes identidades nacionais, étnicas, sexuais ou regionais” (CEVASCO, 2003, p. 24).

FONTE: Cevasco (2001); Laraia (1986)

DICAS

Page 167: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

TÓPICO 1 | ESTUDOS CULTURAIS, MULTICULTURALISMO E EDUCAÇÃO

157

Todavia, mesmo que Williams, Hogart e Thompson tenham trabalhado juntos em instituições e projetos educacionais e de abordarem aspectos ligados às relações “cultura e sociedade’, os EC não possuem uma direção teórica única, nem mesmo, um único objeto de estudo. Como indicou Cevasco (2003, p. 64), os EC se “caracterizam pela polêmica e pela falta de direções consagradas”.

Atualmente, as pesquisas que se intitulam EC têm crescido mundo afora. Depois de emergir no Reino Unido e de ter uma importante recepção nos EUA, hoje é possível encontrar investigações nessa linha em todos os continentes e países, como é o caso da América Latina e do Brasil.

Segundo Cevasco (2003), o mundo presente é marcado pela mercantilização de suas relações sociais, onde a vida em sociedade está cada vez mais dominada pela mercadoria e pelas técnicas de marketing. Diante desse avanço dos meios de comunicação e da indústria cultural, ocorreu a homogeneização, a padronização de valores e produtos culturais, tornados mercadorias apropriadas pelos mercados. Dentro deste contexto, o entendimento de como os produtos culturais modelam e informam as identidades sociais, os EC aparecem como um importante “projeto intelectual às modificações que marcam a sociedade contemporânea dos meios de comunicação de massa” (CEVASCO, 2003, p. 166).

Meios de comunicação de massa, produtos culturais e a indústria cultural

“Indústria cultural” é um termo cuja origem está na Escola de Frankfurt, nas figuras de Theodor Adorno e Max Horkheimer, na obra “Dialética do esclarecimento”.

É fruto da estandardização de bens e objetos ditos culturais, através de sua massificação utilizando-se de mecanismos de tipo racional, da organização empresarial, de distribuição desses produtos.

Conforme Teixeira Coelho (1993, p. 6), existem fortes vínculos entre os conceitos de "Indústria cultural, os meios de comunicação de massa, e a cultura de massa, expressões hoje comuns e que fazem parte obrigatória de todo discurso sobre esta área”. A televisão e o rádio foram fundamentais.

FONTE: Coelho (1993); Adorno e Horkheimer (1985)

DICAS

Page 168: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

UNIDADE 3 | A SOCIOLOGIA DA EDUCAÇÃO NA CONTEMPORANEIDADE

158

A América Latina é um espaço de heterogeneidades culturais, pluralidades étnicas, diversidades econômicas, experiências diferentes e desigualdades estruturais. Num universo multicultural, os Estudos Culturais se consolidam nesta parte do globo a partir dos anos 1980-1990. Os principais nomes ligados aos EC na América Latina são os pesquisadores Jesús Martín-Barbero e Néstor García Canclini. Os EC latino-americanos se desenvolvem a partir do espaço acadêmico, no interior das universidades. Apesar de consolidados, a posição desses estudos – se comparada com a sua inserção nos EUA e Europa – é precária, ligando-se a linhas de pesquisas em programas de mestrado e de doutorado. O foco das suas investigações se direcionou para os meios de comunicação e para os aspectos da cultura popular. Em tempos mais recentes, os EC latino-americanos se aproximaram dos estudos de gênero e da construção social das identidades (ESCOSTEGUY, 2003).

No Brasil, o campo dos EC se consolidou apenas em 1990. Mas, pensando o contexto universitário brasileiro e a inserção das ciências sociais, foi somente a partir de 1930 que Sociologia ou Antropologia, por exemplo, foram integradas às nossas universidades. Não compunham uma área disciplinar, estavam ligadas aos núcleos centrais da produção dos EC – Inglaterra e EUA – e com algum diálogo com os EC latino-americanos (ORTIZ, 2004).

Discutidas as bases e premissas elementares para o entendimento dos Estudos Culturais, passamos agora a discutir outra linha teórica ou formação intelectual ligada ao próprio desenvolvimento dos Estudos Culturais: Os Estudos Pós-coloniais.

3 CONTRIBUIÇÕES DOS ESTUDOS CULTURAIS PARA O CAMPO DA EDUCAÇÃO

Na história dos Estudos Culturais britânicos aparece desde o princípio o tema da Educação. Aliás, eles ganham contornos a partir de um experimento de esquerda voltado à educação de adultos. Por meio da Worker´s Education Association (WEA), Hoggart, Williams e Thompson lecionaram para grupos de trabalhadores por meio de um projeto didático experimental, interdisciplinar e carregado de engajamento político. Segundo Cevasco (2003, p. 62):

A WEA defendia uma educação pública e igualitária que promulgasse os valores de uma cultura em comum, em contraposição aos esforços elitistas dos adeptos de uma cultura de minoria [...]. Parte importante dessa iniciativa era pensar uma nova consciência social e uma nova civilização que influísse a classe trabalhadora como um todo. [...] e a educação era a ocasião de troca entre intelectuais e trabalhadores, cada um educando o outro [...].

Mas o papel dos Estudos Culturais na educação não se resume a este experimento associativo de cunho pedagógico. Os temas propostos pelos EC no

Page 169: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

TÓPICO 1 | ESTUDOS CULTURAIS, MULTICULTURALISMO E EDUCAÇÃO

159

tocante ao papel da cultura na vida social, dos produtos culturais e dos meios de comunicação, bem como da questão identitária, tornaram-se importantes linhas de pesquisa no interior da educação.

Vejamos o caso da identidade e da diferença.

FIGURA 6 - EDUCAÇÃO, DIVERSIDADE E INCLUSÃO

FONTE: Disponível em: <https://escolapt.files.wordpress.com/2015/06/educac3a-7c3a3oinclusiva1.png>. Acesso em: 29 mar. 2018.

Do ponto de vista da produção social das identidades e das diferenças, os EC foram bastante produtivos. Como indicou Stuart Hall (2014), somos herdeiros de um tipo de identidade social unificada e estável. Esse formato de identidade se confundia, também, com uma espécie de identidade nacional. No entanto, as dinâmicas atuais têm levado à fragmentação das identidades experimentadas pelos indivíduos, ganhando outros contornos.

Neste sentido, atualmente, a percepção é de que todas as identidades seriam “contingentes às condições históricas, sociais, culturais, políticas” (BURITY, 1997, p. 139-140). As identidades essencialistas, por sua vez, são “não contemporâneas com o seu tempo e fazem mal aos corpos dos que as carregam” (BURITY, 1997, p. 145).

Denys Cuche, em “A noção de cultura nas ciências sociais” (1997), afirma que a identidade de um indivíduo é uma construção que se elabora em uma relação que opõe um grupo aos outros grupos:

Page 170: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

UNIDADE 3 | A SOCIOLOGIA DA EDUCAÇÃO NA CONTEMPORANEIDADE

160

[...] se caracteriza pelo conjunto de suas vinculações em um sistema social: vinculado a uma classe sexual, a uma classe de idade, a uma classe social, a uma nação, etc. A identidade permite que o indivíduo se localize em um sistema social e seja localizado socialmente (CUCHE, 1997, p. 177).

Para Cuche (1997, p. 183), “não há identidade em si, nem mesmo

unicamente para si, ela existe sempre em relação a uma outra”, portanto, a identidade não pode ser concebida como fechada em si, uma unidade essencial.

O que queremos dizer quando argumentamos que as identidades têm origem em processos sociais de produção e diferenciação de sentidos? A produção social e a percepção de identidades estão vinculadas às condições sociais, simbólicas e materiais em que se inserem os indivíduos e grupos (WOODWARD, 2015).

Um elemento importante nesse processo social de identidades é a diferença. A produção social da identidade é marcada pela diferença, sustentada pela exclusão dos diferentes, sendo sustentada e reproduzida pela linguagem e por meio de símbolos (WOODWARD, 2015). Mas, o que é a diferença dentro desse jogo que é produção e identificação que é a identidade da gente?

Em geral, consideramos a diferença como um produto derivado da identidade. Nesta perspectiva, a identidade é a referência, é o ponto original relativamente ao qual se define a diferença. Isso reflete a tendência a tomar aquilo que somos como sendo norma pela qual descrevemos ou avaliamos aquilo que não somos. [...]. Numa visão mais radical [...] considerar a diferença não simplesmente como resultado de um processo, mas como o processo mesmo pelo qual tanto a identidade quanto a diferença são produzidas. [...] como ato ou processo de diferenciação (SILVA, 2015, p. 76).

Desta forma, os EC contribuíram para problematizar as visões tradicionais que eram direcionadas aos agentes escolares, como professores, estudantes e comunidades. Essas discussões abriram espaço e privilegiaram as relações e interações que se estabeleciam no ambiente e na cultura escolar. Proporcionou debater as inúmeras identidades geracionais, de gênero ou étnicas que são percebidas na Escola, principalmente a pública.

4 MULTICULTURALISMO E EDUCAÇÃO

Embalados pelos Estudos Culturais e Pós-coloniais, que levaram a outro nível as discussões sobre o papel e o significado das culturas, foram investigadas as relações entre estas formações teóricas e o campo da educação. No bojo desses movimentos intelectuais, emergiu o conceito de MULTICULTURALISMO, bastante relevante e pertinente para a pesquisa na educação.

Page 171: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

TÓPICO 1 | ESTUDOS CULTURAIS, MULTICULTURALISMO E EDUCAÇÃO

161

O multiculturalismo se destaca como uma das preocupações dos Estudos Culturais. A multiplicidade de culturas e a pluralidade de identidades, em face de relações de poder assimétricas, geram a necessidade de questionar e desafiar práticas silenciadoras de identidades culturais. Particularmente, as questões de racismos, machismos, preconceitos e discriminações, tão importantes para a escola e o currículo, só podem ser analisadas produtivamente sob uma perspectiva que leve em conta as contribuições dos Estudos Culturais (SILVA; BRANDIM, 2008, p. 62).

O que é o multiculturalismo? O multiculturalismo tem origem nas lutas sociais dos movimentos negros e de gênero nos EUA. Noutras palavras, a origem e o conceito de multiculturalismo estão relacionados “com a política das diferenças e com o surgimento das lutas sociais contra as sociedades racistas, sexistas e classistas” (TORRES, 2001, p. 196).

Procurando caracterizar o que é multiculturalismo, Stuart Hall (2003, p. 52) indica que:

Multicultural é um termo qualificativo. Descreve as características sociais e os problemas de governabilidade apresentados por qualquer sociedade na qual diferentes comunidades culturais convivem e tentam construir uma vida em comum, ao mesmo tempo em que retêm algo de sua identidade “original”. Em contrapartida, o termo “multiculturalismo” é substantivo. Refere-se às estratégias e políticas adotadas para governar ou administrar problemas de diversidade e multiplicidade gerados pelas sociedades multiculturais.

Para a compreensão do multiculturalismo, é necessário saber que este campo de estudos surge num ambiente social permeado pela proliferação de identidades, marcado ainda pelas inúmeras dimensões da globalização, principalmente, a globalização econômica e cultural. O impacto dessas transformações no cotidiano das sociedades mundo afora foi desigual. Em países e regiões mais pobres, no desenrolar de guerras e crises diversas, milhares de pessoas e de culturas foram deslocadas de seus territórios, tornando-se refugiados. Essas situações colocaram culturas em aproximação ou enfrentamento. Todo esse contexto, ainda, se deu num momento de profusão de produtos culturais pelos mais diversos meios de comunicação contemporâneos.

Quer dizer, o multiculturalismo emerge num cenário de centralidade das culturas e na afirmação de diferenças nas explicações a respeito das sociedades e suas relações sociais e de poder. O multiculturalismo e suas implicações teóricas e políticas serviram para unir grupos étnicos e raciais, porém, hoje, abrangem outras formas de diversidade (classe, gênero e sexualidade). Através dele, se procurou enfatizar a opressão como multidimensional, ocorrendo na interseção das raças, etnicidade, classes, gêneros, sexualidades, religiões, entre outros (GESTRADO, 2018).

O multiculturalismo, então, pode ser visto como um movimento tanto teórico como político em torno da ênfase na diversidade e pluralidade cultural

Page 172: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

UNIDADE 3 | A SOCIOLOGIA DA EDUCAÇÃO NA CONTEMPORANEIDADE

162

e identitária. Enquanto luta política, o multiculturalismo é associado a contextos das lutas levadas a cabo por grupos culturalmente oprimidos. Seu sentido político atira-se contra o etnocentrismo, o xenofobismo, a segregação e a violência identitária em torno da cidadania e democracia (SILVA; BRANDIM, 2008).

Como campo teórico, o multiculturalismo:

[...] questiona os conhecimentos produzidos e transmitidos pelas instituições escolares, evidenciando etnocentrismos e estereótipos criados pelos grupos sociais dominantes, silenciadores de outras visões de mundo. Busca, ainda, construir e conquistar espaços para que essas vozes se manifestem, recuperando histórias e desafiando a lógica dos discursos culturais hegemônicos. Os estudos sobre os fenômenos culturais partem da necessidade de compreensão dos mecanismos de poder que regulam e autorizam certos discursos e outros não, contribuindo para fortalecer certas identidades culturais em detrimento de outras (SILVA; BRANDIM, 2008, p. 61).

No avanço do debate multicultural, constatou-se a existência de inúmeros “multiculturalismos possíveis” ou vertentes. Hall (2003, p. 53) identifica várias concepções diferentes de multiculturalismo na atualidade: o conservador, o liberal, o pluralista, o comercial, o corporativo e o crítico. Vejamos o quadro a seguir:

QUADRO 1 - VERTENTES DO MULTICULTURALISMO SEGUNDO STUART HALL

FONTE: Hall (2003)

VERTENTES MULTICULTURALISMO

Conservador Ênfase na assimilação da diferença às tradições e costumes da maioria. A minoria é deslegitimada.

Liberal Tolerância dos diferentes grupos culturais de forma igual à sociedade majoritária.

Pluralista A diferença convive separadamente, dentro de uma ordem nacional.

Corporativo A diversidade/diferença deve ser administrada, a fim de que as diferenças minoritárias não sejam problema para a cultura majoritária.

Comercial A diferença cultural é percebida como uma necessidade a ser tratada pelo mercado.

Crítico Enfatiza as relações de poder, o privilégio, a hierarquia das opressões e os movimentos de resistência.

Page 173: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

TÓPICO 1 | ESTUDOS CULTURAIS, MULTICULTURALISMO E EDUCAÇÃO

163

E qual sua inserção no Brasil e nos países da América Latina? Os estudos multiculturais tiveram boa recepção e desenvolvimento em nossa região. E por quê? Em nosso caso latino-americano e brasileiro, estamos marcados por contextos nacionais repletos de diversidade étnica e cultural, herança do passado autóctone e colonial. Grupos indígenas e comunidades de afrodescendentes, todavia, sofreram e ainda sofrem diversos tipos de violências, físicas e simbólicas. E devemos levar em consideração o passado escravocrata, onde o elemento não branco foi aprisionado e teve negada sua humanidade, porém, este passado colonial violento contra povos nativos, africanos e afrodescendentes continua presente ainda hoje nas persistentes estruturas sociais, como é o caso de nosso país. Preconceito racial ou étnico, exclusão social e violência estatal se cruzam, atingindo em cheio essas populações.

De acordo com Praxedes (2004), as nossas sociedades atuais são marcadas pela diversidade e pluralidade, isto é, podem ser observadas como cultural, social e economicamente heterogêneas. Neste sentido, o multiculturalismo, em suas versões mais críticas, está em rota de colisão com a chamada “epistemologia monocultural” (SEMPRINI, 1997), cujo horizonte foi uma visão eurocêntrica, onde certas nações europeias e seus processos civilizadores representavam a civilização e a modernidade. Qual foi o impacto disso na educação?

Primeiramente, neste cenário de pluralidade e heterogeneidade social e cultural, os processos educacionais demandam tomar consciência dessas diferenças. Isso traz implicações aos currículos, à formação dos professores e ao

Vejamos alguns conceitos importantes:

Assimilação: processo social em virtude do qual indivíduos e grupos diferentes aceitam e adquirem padrões comportamentais, tradição, sentimentos e atitudes de outra parte. É um ajustamento interno e indício da integração sociocultural, ocorrendo principalmente nas populações que reúnem grupos diferentes. Em vez de apenas diminuir, pode terminar com o conflito.

Aculturação: processo pelo qual duas ou mais culturas diferentes, entrando em contato contínuo, originam mudanças importantes em uma delas ou em ambas.

Quando dois ou mais grupos entram em contato direto e contínuo, geralmente ocorrem mudanças culturais nos grupos, pois verifica-se a transmissão de traços culturais de uma sociedade para outra. Alguns traços são rejeitados e outros aceitos, incorporando-se, frequentemente com alterações significativas, à cultura resultante. É a fusão de culturas diversas, dando origem a uma nova cultura.

FONTE: Disponível em: <http://eebdomjoaquim.blogspot.com.br/2009/04/dicionario-sociologico-basico.html>. Acesso em: 24 abr. 2018.

DICAS

Page 174: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

UNIDADE 3 | A SOCIOLOGIA DA EDUCAÇÃO NA CONTEMPORANEIDADE

164

cotidiano das escolas, por exemplo. Como afirma Candau (2002, p. 58), a “existência de uma enorme pluralidade cultural” implica a “necessidade de trabalhá-la pedagogicamente”. E dessa constatação surgem questões fundamentais, como as apontadas por Gonçalves e Silva (2000, p. 62):

como lidar com a diversidade cultural em sala de aula? É possível escapar de um modelo monocultural de ensino? Poderão professores incluir a equidade de oportunidades educacionais entre seus objetivos? Como socializar, através do currículo e de procedimentos de ensino, para atuar em uma sociedade multicultural?

O multiculturalismo na educação e nos processos escolares procura dar

respostas aos desafios postos por esse cenário de diversidade, enfatizando as identidades como uma porta de reconhecimento da pluralidade no contexto escolar (MOREIRA; CÂMARA, 2008). Segundo Praxedes (2004):

[...] a escola é um espaço público para a convivência fora da vida privada, íntima, familiar. Ao nos capacitarmos para a convivência participativa na escola, participamos de um processo de aprendizagem que também nos ensina como atuar no restante da vida social.

Partindo das reflexões propostas por Philippe Perrenoud (2001) de que a educação e a escola estão investindo contra as diferenças culturais, num processo de ocultamento e generalização de preconceitos, ao invés de expor e dar espaço às diferenças, como pensar a ação multicultural na educação?

Segundo Ana Canen e Ângela Oliveira (2002), a educação multicultural pode ser vista a partir de duas dimensões:

a) A equidade educacional, com a valorização da cultura dos atores escolares, principalmente, os alunos e seus familiares, investindo contra a ideologia do fracasso escolar.

b) A quebra de preconceitos para aqueles que são observados e estereotipados como ‘diferentes’, voltado à superação futura das situações de desrespeito à pluralidade cultural e a valorização das diferenças.

Como nos indica Praxedes (2004), a escola que respeita a diferença é uma escola pluralista que ensina a viver em uma sociedade que também é heterogênea. Como indicou Fleuri (2003), a noção multicultural pode ser percebida como uma categoria descritiva, analítica, sociológica ou histórica para explicar e destacar a relação entre diferentes grupos sociais. A escola pública, pela sua condição democratizante, é um espaço social de encontro desses grupos que precisam conviver. A percepção e a reflexão crítica em torno da maneira como são discutidas a diversidade na escola, num sentido multicultural, devem ser sustentadas por uma proposta de “educação para a alteridade”, reconhecendo os direitos dos grupos sociais distintos.

Uma educação com enfoque plural de cultura não se restringe apenas a apreender o caráter de várias culturas, nem tolerar sua existência. Deve,

Page 175: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

TÓPICO 1 | ESTUDOS CULTURAIS, MULTICULTURALISMO E EDUCAÇÃO

165

principalmente, compreender os sentidos culturais dos diferentes grupos num olhar relativista, assumindo o olhar nativo para o entendimento de seus padrões culturais.

Multiculturalismo no filme “Crash: no limite” (2004)

DICAS

FIGURA 7 - CRASH, MATERIAL DO FILME

FONTE: Disponível em: <http://image.tmdb.org/t/p/w342/6N-JceWhDI7j78JgesTkpI3aPeGA.jpg>. Acesso em: 24 abr. 2018.

FONTE: Disponível em: <https://pt.wikipedia.org/wiki/Crash_(2004>. Acesso em: 24 abr. 2018.

"Em Los Angeles ninguém te toca. Estamos sempre atrás do metal e do vidro. Acho que sentimos tanta falta desse toque, que batemos uns nos outros, só para sentir alguma coisa". (Frase de Crash). Partindo de tal premissa, Crash é um filme que demonstra o retrato de uma sociedade marcada pelo preconceito. Este, no entanto, não é refletido na ingênua fórmula preto-branco, mas antes é demonstrado como uma realidade multicolorida e complexa: negros, brancos, muçulmanos, latinos, pobres, ricos.Tudo começa a partir do roubo de um carro de uma mulher rica. A partir de então, uma série de incidentes acaba por aproximar habitantes de diversas origens étnicas e classes sociais de Los Angeles: um veterano policial racista e seu jovem parceiro passivo em relação às suas atitudes, um detetive negro e seu irmão traficante de carros roubados, um bem-sucedido diretor de cinema negro que finge ser budista para não ter exposta sua origem afrodescendente, um imigrante persa que possui um pequeno comércio que vive sendo assaltado, um trabalhador latino que luta para sustentar sua família.Todos estão lá como peões num intrincado tabuleiro de emoções que afloram conforme eles se encontram, ou melhor, se esbarram no acaso da vida do dia a dia. Nesses encontros, os personagens tomam consciência de quem realmente são e a maneira como conduzem suas vidas, muitas vezes, patéticas. O sentimento que serve de fio condutor é o racismo presente nos Estados Unidos da América do Norte.

Page 176: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

UNIDADE 3 | A SOCIOLOGIA DA EDUCAÇÃO NA CONTEMPORANEIDADE

166

LEITURA COMPLEMENTAR

O Estado e o multiculturalismo

Livio Sansone

No Brasil, o debate sobre o multiculturalismo tem sido o palco de distância entre discurso e prática social. Precisamos contextualizar tal discurso, histórica e sociologicamente. Uma forma de fazer isso é analisar como este fenômeno surgiu enquanto ideal de sociedade em alguns países europeus, que há muito tempo estão tentando lidar com diferença étnica, racial e cultural a partir de um conjunto de medidas públicas. Nas considerações sobre o multiculturalismo e o Brasil, é importante aproveitar tanto o debate como o olhar "de fora", sem reduzir a reflexão, comparando apenas Estados Unidos e Brasil. Interessa enfocar os países europeus que receberam uma forte imigração, sobretudo a partir do segundo pós-guerra, as assim chamadas sociedades multiculturais, nas quais existe uma relação orgânica entre discursos, leis e práticas multiculturais. Refiro-me concretamente a Alemanha, França, Bélgica, Holanda e Inglaterra. Nesses países, na base do multiculturalismo encontram-se três fontes clássicas.

PACTO SOCIAL: Em primeiro lugar, há o pacto social – o compromisso do Estado e parte das elites de cuidar dos excluídos e dos pobres. Nesse sentido, se pensa os pobres – as categorias de excluídos – como passíveis de medidas legislativas particulares, como redistribuição de renda, mas num processo de incorporação seletiva de uma parte dos pobres. Nem todos os pobres podem e devem ser ajudados, somente aqueles que se submetem às regras do convívio estabelecidas pelo pacto social. Na Holanda, o primeiro seguro-desemprego foi instituído em 1522 e logo foi preciso definir quem era digno de recebê-lo. Para isso, instituíram-se direitos especiais, mesmo dentro do contexto da legislação universalista. O objetivo substancial era – e ainda é – prevenir ou, pelo menos, administrar o conflito.

PASSADO COLONIAL: A segunda fonte importante é o passado colonial. Nesse sentido, pode-se falar de diferentes estilos de colonialismo: a) o sistema britânico do indirect rule, ou governo indireto; b) o sistema das sociedades plurais, por exemplo, a do Império holandês, que se baseia na existência de um direito étnico. Assim, no Suriname, até os anos 1930, o direito civil e, em alguns casos, o penal variavam segundo o grupo étnico. Um sistema não muito diferente valia na África do Sul sob o regime do apartheid – não por acaso, uma palavra holandesa; e c) no extremo oposto, existia a versão do colonialismo do Império francês, que era baseada na noção de francité, de universalismo na "boca do fuzil" e na atratividade de uma ocidentalização possível, embora a altos custos (ou duras penas), para uma parcela da população "nativa". Práticas e teorias divergiam em muitos casos e todo colonialismo, pelo menos na África, em algum momento lançou mão de ambos os tipos de domínio, o direto e o indireto.

Page 177: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

TÓPICO 1 | ESTUDOS CULTURAIS, MULTICULTURALISMO E EDUCAÇÃO

167

Todos esses estilos de colonialismo previam a institucionalização de algum tipo de etnicidade dos direitos e deveres, embora muitas vezes associados a um discurso de igualdade e de respeito à diferença. De qualquer forma, os três estilos levaram a hábitos étnicos e culturais, e a consensos que se mostraram tenazes e capazes de influenciar bastante a época pós-colonial. Nos últimos anos, porém, esses sistemas estão sendo colocados em discussão pelo contexto de internacionalização que altera a relação entre colônia e metrópole a partir das grandes migrações e da globalização das culturas. Nas últimas duas ou três décadas, é a colônia que vem à metrópole e, ao mesmo tempo, a metrópole permanece na colônia, até se enraizando nela mais ainda. Nunca se falou tanto o holandês no Suriname e o francês no Mali como hoje em dia.

REGIONALISMO: A terceira fonte clássica é a tradição que diz respeito às formas de se lidar com as diferenças étnicas e regionais internas desses países europeus. Trata-se do assim dito "regionalismo" de alguns países que se afirmam como Estados-nação na Europa a partir de um compromisso com as diferenças culturais regionalizadas, redistribuindo recursos e poder político para minorias e "colônias" internas. Refiro-me aos catalães, bascos, bretões, galeses, sardos, corsos etc.

É evidente que nem todo país da Europa é atingido da mesma forma por esses três fenômenos: pacto social, passado colonial e regionalismo. Um determinado país pode dar prova de generosidade e tolerância com relação ao pacto social, mas não ao regionalismo. E vice-versa.

O Conselho da Europa, num esforço de pragmatismo e postura ecumênica, optou por dividir, de outra forma, os países europeus com relação à multiculturalidade, salientando o fator variedade. Por um lado, haveria os países nos quais a nacionalidade é vista como o começo da integração, como a França e, por outro lado, países, como a Alemanha, onde a nacionalidade é vista como o resultado final do processo de integração. Na Alemanha, Suíça e França, a ênfase seria na cidadania, enquanto na Holanda, Suécia, Noruega e Dinamarca, no pluralismo cultural. A Inglaterra é um caso à parte, pois a ênfase não é no pluralismo cultural, mas na luta contra o racismo. Nesse sentido, a Inglaterra é o único país europeu onde as agências governamentais falam de relações raciais, em lugar de relações interétnicas.

De qualquer forma, em todos esses países, a diversidade étnica, resultado da imigração, apresentou-se como um choque porque colocou em discussão o pacto social. Nesse sentido, a imigração de massa tem tido um efeito quase revolucionário sobre a realidade social dos países em questão.

Depois da Segunda Guerra Mundial, nos países analisados, a Inglaterra foi a que primeiro recebeu uma imigração maciça, já a partir dos anos 1940 e 1950. Nesse país, já no final dos anos 1960 chega à idade adulta a "segunda geração" de descendentes de imigrantes do pós-guerra – os filhos dos trabalhadores contratados no Caribe anglófono. Na Holanda, somente em 1978 o governo

Page 178: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

UNIDADE 3 | A SOCIOLOGIA DA EDUCAÇÃO NA CONTEMPORANEIDADE

168

reconhece, pela primeira vez, que o país é de imigração. Na França, isso se dá nos anos 1980, com Mitterand. E, no final dos anos 1990, na Alemanha, finalmente, a legislação é alterada para permitir a dupla nacionalidade.

O PAPEL DA ESCOLA PÚBLICA: Além de se tratar de países com culturas distintas, é preciso acrescentar que, hoje, as políticas que dizem respeito à diferença etnocultural mostram, em cada país, com relação ao passado e as três fontes clássicas mencionadas antes, tanto continuidade como descontinuidade. Um forte elemento de continuidade depende do "enraizamento" do multiculturalismo na história do Estado social e do ensino obrigatório. Se o serviço público é o âmbito em que se experimentam medidas em prol de minorias, como quotas, programas de treinamento e planos de carreira, a escola pública é o palco principal do discurso pró-diversidade do multiculturalismo. Sobretudo na Holanda, na Alemanha e na Inglaterra, os respectivos ministérios da Educação investiram muito dinheiro e recursos na implementação de medidas multiculturalistas, implementando políticas afins nas escolas e estimulando os professores a formarem uma visão de mundo um pouco mais tolerante e cosmopolita do que antes (embora com princípios discutíveis, nos quais as culturas de maioria e minoria coexistem em estilo mosaico ou patchwork). Na maior parte dos casos, trata-se de um esforço feito com grande seriedade. Nesses cinco países – Holanda, França, Alemanha, Inglaterra e Bélgica – o Estado gerencia as medidas e articula os discursos acerca do multiculturalismo. De fato, este surge como vontade e resposta do Estado, muitas vezes até contra os interesses da iniciativa privada. Hoje, a efetivação do multiculturalismo está, muitas vezes, colocada em discussão pela própria crise da máquina estatal, característica desta época nos cinco países mencionados. Embora, neles, o Estado continue muito presente nas políticas sociais e não pareça estar transformando-se em uma máquina punitiva com relação à pobreza – ao contrário do que parece acontecer nos Estados Unidos –, seu poder de intervenção é severamente afetado pelos cortes dos gastos públicos e a privatização de serviços.

Os efeitos das medidas e práticas multiculturalistas, ademais, são diferenciados. Podem ser um, com relação aos trabalhadores imigrados, outro, com relação às minorias originárias das ex-colônias – que, na maioria dos casos, estão mais familiarizadas com a língua, a religião e a cultura da metrópole – e ainda um terceiro, no caso das minorias regionais. Assim, um país pode ser generosamente multicultural com uma minoria e pouco tolerante com uma outra.

Finalizando, hoje a integração dos "estrangeiros" nesses países se dá em um contexto mais fluido com relação ao passado, definido por cidades e regiões mais do que por Estados, e caracterizado tanto pela hétero quanto pela homogeneização cultural.

FONTE: SANSONE, Livio. O Estado e o multiculturalismo. Cienc. Cult. São Paulo, v. 57, n. 3, p. 4-5, Sept.  2005. Disponível em: <http://cienciaecultura.bvs.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0009-67252005000300002&lng=en&nrm=iso>. Acesso em: 29 mar.  2018.

Page 179: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

169

Neste tópico, você viu:

• Os Estudos Culturais surgiram no Reino Unido nos anos 1950, articulando autores que colocaram em destaque as práticas e as produções culturais, bem como a recepção e significado desses materiais no interior de uma sociedade. Como resultado dos esforços intelectuais, a própria noção de cultura foi problematizada e renovada pelos Estudos Culturais.

• Os Estudos Culturais preocupam-se com o nível micro das relações sociais, isto é, com as práticas e produções culturais manifestas, requerendo, na sua abordagem global, observar os meios materiais de produção cultural e as suas ligações com as formas culturais concretas.

• Os temas propostos pelos EC no tocante ao papel da cultura na vida social, dos produtos culturais e dos meios de comunicação, bem como da questão identitária, tornaram-se importantes linhas de pesquisa no interior da educação.

• No multiculturalismo, a noção multicultural pode ser percebida como uma categoria descritiva, analítica, sociológica ou histórica para explicar e destacar a relação entre diferentes grupos sociais e suas lutas sociais contra a desigualdade social e a exclusão e violência cultural. Tiveram início a partir das lutas sociais dos movimentos negros e de gênero nos EUA nos anos 1960.

• O multiculturalismo emerge num cenário de centralidade das culturas e na afirmação de diferenças nas explicações a respeito das sociedades e suas relações sociais e de poder.

• Do ponto de vista das relações entre a educação e multiculturalismo, essa perspectiva prioriza as relações entre as diferentes culturas e identidades no interior da escola e dos processos educacionais mais gerais. Estimula o reconhecimento e a afirmação da diferença e critica a ideia de uma educação e escola monocultural.

RESUMO DO TÓPICO 1

Page 180: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

170

AUTOATIVIDADE

1 O multiculturalismo, em suas relações com a educação, estimula uma nova postura por parte da escola e dos sistemas de ensino, por meio de um discurso de teor cultural. A respeito da ênfase na dimensão cultural proposta pelo multiculturalismo, analise as sentenças a seguir, indicando a alternativa CORRETA:

a) ( ) O multiculturalismo, em geral, visa estimular a tolerância em relação às diferenças, voltando-se a assimilar essas populações diferentes.

b) ( ) O multiculturalismo pressupõe a crítica às relações de poder e às hierarquias sociais do ponto de vista da identidade e da diferença.

c) ( ) O multiculturalismo é um termo surgido para explicar as lógicas do mercado no tratamento dispensado aos diferentes grupos sociais.

d) ( ) O multiculturalismo indica uma forma de luta social exclusiva dos grupos sociais minoritários, que se esforçam em subir na vida.

2 Os Estudos Culturais (EC) promoveram importantes alterações do ponto de vista teórico para o papel da cultura, dos produtos e produtores culturais nas sociedades. Deslizando entre questões surgidas do avanço dos meios de comunicação, os EC modificaram o sentido da cultura, especialmente, no tocante a:

a) ( ) Os Estudos Culturais contribuíram para viabilizar o sistema colonial inglês, voltando sua atenção para grupos e culturas localizadas na Ásia e na África.

b) ( ) Os Estudos Culturais contribuíram para um novo olhar para os meios de comunicação e seus efeitos na realidade, por meio do conceito de Indústria Cultural.

c) ( ) Os Estudos Culturais contribuíram decisivamente para abalar a visão tradicional que dividia a cultura entre “Alta Cultura” e “Cultura Popular”, legitimando esta última.

d) ( ) Os Estudos Culturais contribuíram para mudar a educação britânica, por meio da criação de centenas de escolas noturnas voltadas à educação de jovens e adultos.

Page 181: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

171

TÓPICO 2

A SOCIOLOGIA DA EDUCAÇÃO

NO BRASIL

UNIDADE 3

1 INTRODUÇÃO

Prezado acadêmico! Depois de conhecermos um conjunto de teorias representativas na Sociologia da Educação elaboradas por pesquisadores originários dos países desenvolvidos, chegou o momento de olharmos com maior atenção para as especificidades da educação brasileira.

Inicialmente lembremo-nos da noção de reprodução social apresentada por Bourdieu. No caso brasileiro a educação reproduzirá as relações, hierarquias, padrões e comportamentos presentes em nossa estrutura social. Entre essas características destacamos as desigualdades sociais e as formas como a educação é simultaneamente afetada e reprodutora das desigualdades.

2 TEORIAS E PESQUISAS SOBRE EDUCAÇÃO NO BRASIL

As pesquisas no campo da sociologia da educação ganharam espaço na academia brasileira com a formação dos programas de pós-graduação. Inicialmente, as pesquisas desenvolvidas na primeira metade do século XX apresentavam forte influência do positivismo e, com o passar do tempo, através do desenvolvimento da autonomia no campo teórico, passaram a incorporar outras influências (BRANDÃO, 2001).

Podemos destacar nas décadas de 1950 e 1960 o desenvolvimento de estudos voltados para a função da escola e sua relação com a estratificação, com a burocracia e com o planejamento. Bem como uma contribuição considerada atual para a época na análise da relação entre educação escolar e desenvolvimento econômico. Além disso, é importante perceber a influência microssociológica da Escola de Chicago (BRANDÃO, 2001).

Nas décadas de 1960 e 1970, a produção da sociologia da educação desenvolveu trabalhos focados na influência da estratificação social sobre a estrutura escolar. Entre os pesquisadores que desenvolveram essas pesquisas – mostrando o caráter antidemocrático de nossas escolas – através da análise de dados demográficos e indicadores socioeconômicos estão Anísio Teixeira, Florestan Fernandes e J. Roberto Moreira (BRANDÃO, 2001).

Page 182: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

172

UNIDADE 3 | A SOCIOLOGIA DA EDUCAÇÃO NA CONTEMPORANEIDADE

Vale destacar a influência da ditadura militar nesse período, que levou à redução na produção da sociologia da educação e ao aumento da produção com caráter ensaístico e teórico. O foco se encontrava na administração escolar, no planejamento escolar e na tecnologia educacional (BRANDÃO, 2001).

No âmbito da sociologia da educação, entretanto, a obra de maior impacto, na perspectiva macroteórica, foi Educação e Desenvolvimento Social no Brasil (CUNHA, 1975). Cunha trabalha simultaneamente dados e indicadores econômicos e educacionais para contestar a tese de Carlos Langoni de que a concentração de renda no período militar teria ocorrido por deficiências de escolarização da população. Numa análise inspirada, entre outros, na perspectiva de Bourdieu e Passeron, traça um quadro dos mais completos sobre as características da escola brasileira e da política educacional implantada pelo regime militar a partir do final da década de 1960 (CAMPOS, 2001, p. 160). 

O estudo acima referido intitulado O fracasso escolar: o estado do conhecimento sobe evasão e repetência no ensino de 1º grau no Brasil (1971-1981), de autoria de Anna Maria Bianchini Baeta, Any Dutra Coelho da Rocha e Zaia Brandão, pode ser encontrado no site do Inep.

NOTA

NOTA

Na década de 1980 foi desenvolvido o primeiro estado da arte sobre evasão e repetência no Brasil a pedido do Instituto Nacional de Estudos Pedagógicos (Inep). Esse relatório foi elaborado buscando uma perspectiva que dê conta de analisar o contexto socioeconômico e político para além do fatalismo e incorporando a noção de totalidade (BRANDÃO, 2001).

Ao longo da década de 1980, as pesquisas passaram por uma transformação no sentido da crítica ao positivismo e ao caráter genérico das enquetes estatísticas (surveys). Consideravam-se os resultados dessas pesquisas distantes da realidade dos desafios das salas de aula. Por esta razão ganharam força estudos de caso, observação participante e demais estratégias qualitativas de pesquisa, fazendo com que etnografias, histórias de vida e entrevistas em profundidade dominassem a pesquisa em educação, demonstrando a preferência por abordagens microssociais. Já os debates das últimas décadas no contexto da adoção de políticas neoliberais e aprofundamento das políticas de democratização têm conduzido a pesquisas que elaborem uma ligação entre pesquisas macro e microssociais (BRANDÃO, 2001).

Page 183: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

TÓPICO 2 | A SOCIOLOGIA DA EDUCAÇÃO NO BRASIL

173

3 CONTRIBUIÇÕES DE FLORESTAN FERNANDES PARA A SOCIOLOGIA DA EDUCAÇÃO NO BRASIL

No que se refere aos aspectos profissionais do ensino de sociologia, Fernandes levantou questões resultantes de sua prática como professor, especialmente da cadeira Sociologia I na Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras da Universidade de São Paulo (USP). Partindo da sua vivência, diferenciou os objetivos da pesquisa como fazer crescer o saber, e do ensino, como fazer crescer o aluno. Essa distinção evidencia uma crítica à organização de conteúdos baseadas em escolhas arbitrárias dos professores, afinal é preciso estar atento para o caráter pedagógico dos processos de ensino e aprendizagem, para além das escolhas dos professores.

Segundo Saviani (1996, p, 73), ao definir a essência da educação pode-se observar, na concepção de Florestan, a educação como “transformação interna dos sujeitos pela incorporação de elementos que não são dados naturalmente e nem adquiridos espontaneamente, mas que, uma vez incorporados pela mediação da ação educativa, passam a operar como se fossem naturais”.

Essa definição remete ao que Florestan chamou de segunda natureza humana, na qual se confundem o professor e o sociólogo, e o levou a entender a educação no sentido da segunda natureza de Gramsci e de habitus de Bourdieu. Através desses conceitos, a educação ganha contornos de ação que produz a humanidade (SAVIANI, 1996).

Para conhecer da obra de Florestan Fernandes, assista ao documentário Florestan Fernandes – O mestre. A história do engraxate, garçom, professor, deputado, constituinte, que fez da vida uma verdadeira aula. Este documentário recebeu, em 2004, o Prêmio Vladimir Herzog, a mais importante premiação jornalística da área de direitos humanos do país.

FONTE: Disponível em: <goo.gl/sRKYS6>. Acesso em: 23 mar. 2018.

DICAS

Outro ponto da relação entre a sociologia e a educação elaborado por Fernandes diz respeito à importância da pesquisa para o desenvolvimento da sociologia. A realização da pesquisa científica possui influência significativa na formação profissional e, consequentemente, no ensino (SAVIANI, 1996).

Page 184: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

174

UNIDADE 3 | A SOCIOLOGIA DA EDUCAÇÃO NA CONTEMPORANEIDADE

Ao longo da década de 1950 e 1960, Fernandes elaborou uma série de estudos sobre a educação no Brasil. Entre as preocupações presentes nessas obras estão: i) a esperança em relação à transformação do sistema de ensino em relação à vida política nacional, a criação de condições para a consolidação da democracia e de efeitos socializadores uniformes através do ajustamento social; ii) a ciência aplicada e a educação como fatores sociais construtivos, a racionalidade na mudança cultural espontânea e a racionalidade na mudança social controlada, essas análises caracterizarão o dilema educacional brasileiro; e iii) uma análise extensa da relação entre educação e sociedade no Brasil entre as décadas de 1940 e 1960 (SAVIANI, 1996).

Dilema educacional brasileiro foi a forma como Florestan Fernandes descreveu a determinação do subdesenvolvimento que leva à necessidade de intervenção na educação e, também, as consequências dessa intervenção para o sistema educacional. Nesse sentido, o sistema educacional de ensino é formado por instituições deficientes que necessitam de intensas transformações, porém não há meios e intervenção suficientes para dar conta dessa necessidade (SAVIANI, 1996).

NOTA

Entre as contribuições de Fernandes para a sociologia brasileira podemos destacar:

A sociologia da educação brasileira realizada por Florestan Fernandes a partir dos anos 1950 enfatiza uma crítica severa ao privilégio social dos grupos que têm acesso ao ensino de qualidade, e por isso não possibilita o desenvolvimento econômico e político-democrático do país (PILETTI; PRAXEDES, 2010, p. 159).

Considerando essa análise, fica evidente a compreensão da educação como elemento no processo de reprodução social, ou seja, a estrutura social desigual exerce influência significativa sobre a organização dos sistemas de ensino, inviabilizando não somente a melhoria da qualidade da educação em si, como também tornando obstáculo para o desenvolvimento econômico e para a consolidação da democracia.

4 AS CONTRIBUIÇÕES DE FERNANDO DE AZEVEDO PARA A COMPREENSÃO DA EDUCAÇÃO COMO FATO SOCIAL

As contribuições da Sociologia da Educação elaboradas por Fernando de Azevedo foram responsáveis por introduzir no debate teórico brasileiro a teoria de Émile Durkheim, especialmente em relação às análises pertinentes à Sociologia da Educação.

Page 185: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

TÓPICO 2 | A SOCIOLOGIA DA EDUCAÇÃO NO BRASIL

175

Foi responsável pela inserção da Sociologia no currículo das escolas normais do Estado de São Paulo. Em seu entendimento, o ensino da Sociologia permitiria a formação de professores com base científica sólida para compreender e analisar fatos sociais racionalmente interligados. Além disso, a compreensão das instituições e dos fatos sociais promoveria o entendimento da questão educacional (PILETTI; PRAXEDES, 2010).

Seu embasamento na teoria de Durkheim fica evidente quando trata da natureza sociológica dos fenômenos educacionais. Ao realizar essa análise, se dedica ao estudo dos fatos e instituições educacionais e sua função para a educação:

A pesquisa em sociologia educacional deveria priorizar a instituição social escola, sua estrutura interna e as relações entre os grupos sociais que se dão em seu interior, sem descuidar do estudo das relações entre a escola e a sociedade, e do grau em que as teorias pedagógicas são adequadas para a nossa sociedade e influenciadas pela economia (PILETTI; PRAXEDES, 2010, p. 152).

Considerando a metodologia usada por Azevedo para compreender os fenômenos educacionais, fica evidente a influência do pensamento de Durkheim. Afinal, a análise das instituições e de sua função na sociedade permitiu ao sociólogo compreender o desenvolvimento e a organização da educação brasileira, sem perder de vista as influências externas.

Além da análise inspirada em Durkheim, Azevedo ficou conhecido pela reforma educacional que promoveu no Distrito Federal entre 1927 e 1930, com foco na instrução primária e nas escolas normais. Buscou modernizar o sistema de ensino travando uma batalha contra os interesses dos poderosos no Conselho Municipal – por esta razão chegou a sofrer um atentado.

Para conhecer mais sobre a contribuição de Fernando de Azevedo para a educação, assista ao documentário GRANDES EDUCADORES – Anísio Teixeira, Lourenço Filho, Fernando de Azevedo.

Documentário conta um pouco da história dos precursores do movimento da Escola Nova no Brasil e que estiveram à frente das principais reformas educacionais do país. Quer mediante suas produções em Psicologia, Pedagogia, Sociologia e Filosofia, quer pela participação direta nas políticas públicas (criação do MEC, universidades, Institutos de Educação e a CAPES), os três “cardeais” da Educação Brasileira transformaram e consolidaram o sistema educacional no país. O programa é conduzido pela Prof.ª Diana Vidal.

FONTE: Disponível em: <goo.gl/mBmXHP>. Aceso em: 23 mar. 2018.

DICAS

Page 186: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

176

UNIDADE 3 | A SOCIOLOGIA DA EDUCAÇÃO NA CONTEMPORANEIDADE

Quais foram então os princípios dessa reforma que levou a debates tão acalorados? Vamos a eles: "[...] escola única, não uniforme, mas adaptada ao meio; escola do trabalho, ao mesmo tempo conteúdo curricular e método pedagógico; e escola-comunidade ou escola do trabalho em cooperação" (PILETTI; PRAXEDES, 2010, p. 153).

Considerando os esforços de sua Sociologia da Educação e das propostas da reforma educacional, podemos destacar quatro grandes contribuições de Azevedo para a educação: a reforma do ensino no sentido da primeira tentativa de modernização do sistema educacional brasileiro; o Manifesto dos Pioneiros da Educação, documento elaborado a muitas mãos e que representa até os dias de hoje legitimidade nos debates educacionais; a publicação da obra Cultura brasileira, que se tornou um marco para a compreensão das transformações culturais no país, e seu protagonismo na criação da Universidade de São Paulo, referência na produção acadêmica no Brasil.

5 AS CONTRIBUIÇÕES DAS TEORIAS MARXISTAS NA SOCIOLOGIA DA EDUCAÇÃO BRASILEIRA

As teorias marxistas ganharam destaque no desenvolvimento das teorias da Sociologia da Educação nas últimas décadas em nosso país. Inicialmente é essencial ter em mente que não existe uma só vertente marxista. A diversidade das análises realizadas nesse âmbito é uma das características marcantes do pensamento marxista sobre a educação.

Considerando o desenvolvimento histórico das pesquisas nessa área, podemos destacar as publicações na década de 1930, de Paschoal Lemme, a respeito do ensino de adultos; as obras publicadas nas décadas de 1940 e 1950 por Caio Prado Júnior analisando a sociedade brasileira pela ótica marxista, e também a publicação em 1957 da análise da literatura nacional de Antonio Candido; e o estudo sistemático das obras de Marx capitaneado a partir de 1958 por intelectuais como José Artur Giannoti e Roberto Schwartz (PILETTI; PRAXEDES, 2010).

Vale lembrar que apesar do desmonte causado pela ditadura militar ao realizar reforma no ensino superior, visando ao desenvolvimento econômico através da intervenção estatal e da internacionalização, além da aposentadoria compulsória de vários professores que desenvolviam estudos na área, foi possível observar uma descentralização das produções. Ou seja, mesmo diante do regime militar, seguiram sendo produzidos estudos marxistas que davam conta de temas como movimentos sociais, vida política, tendências ideológicas e dependência, por exemplo (PILETTI; PRAXEDES, 2010).

A fim de sintetizarmos tais contribuições, podemos identificar, no quadro a seguir, três vertentes da análise marxista da educação, que tomaram formas a partir da década de 1970:

Page 187: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

TÓPICO 2 | A SOCIOLOGIA DA EDUCAÇÃO NO BRASIL

177

QUADRO 2 – TRÊS VERTENTES DA ANÁLISE MARXISTA

Demerval Saviani Carlos Cury Moacir Gadotti Luiz Antonio Cunha

Barbara Freitag

Pedagogia Progressista Pedagogia crítico-social dos conteúdos.

Concepção dialética da educação.

Tendência crítico-repro-dutivista.

Metodologia dialética Abordagem dos fenôme-nos educacionais em ter-mos histórico-críticos.

Realização de uma edu-cação e pedagogia base-adas no marxismo.

Incorporação da meto-dologia marxista através da mediação das inter-pretações de Baudelot, Establet, Gramsci e Al-thusser.

FONTE: Adaptado de Piletti e Praxedes (2010) 

6 EDUCAÇÃO E REPRODUÇÃO SOCIAL: O CASO DAS DESIGUALDADES SOCIAIS E A EDUCAÇÃO NO BRASIL

Vamos refletir sobre a determinação das desigualdades sociais sobre a educação: qual é a situação das escolas públicas no país? O que representa em termos de mobilidade social a escolaridade no Brasil? O que nos mostram os dados de fracasso e evasão escolar?

Prezado acadêmico! Antes de iniciarmos nossa análise das questões relativas às desigualdades sociais, pare um momento e analise a charge a seguir. Reflita sobre a realidade da maioria das crianças e jovens que estão nesse momento nas escolas brasileiras.

FIGURA 8 - EDUCAÇÃO E DESIGUALDADES SOCIAIS 

FONTE: Disponível em: <goo.gl/iEWm7N>. Acesso em: 23 mar. 2018. 

Page 188: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

178

UNIDADE 3 | A SOCIOLOGIA DA EDUCAÇÃO NA CONTEMPORANEIDADE

De maneira geral, as desigualdades sociais levam à desqualificação de indivíduos e grupos. Esse fato é justificado por um dos principais problemas da educação brasileira: o fracasso escolar. Esse fracasso persiste mesmo no que entendemos por era digital, ou seja, o fracasso escolar persiste diante da existência de uma variedade sem precedentes de recursos tecnológicos que contribuem para a educação (NERY, 2003).

Nery (2013) segue sua reflexão questionando: como o fracasso persiste com tantas oportunidades disponíveis? E afirma que o fracasso persiste porque configura um problema estrutural resultante da reprodução da estrutural social. Parte significativa da população brasileira não tem acesso a recursos como o computador em casa. Além disso, apresenta uma forte relação com a estrutura familiar. A forma como os pais veem a educação impacta na relação dos filhos com a escola, assim como a falta de condições materiais está ligada a questões relativas não só ao fracasso, mas também à evasão.

Falamos do fracasso escolar relacionado à estrutura social e à estrutura familiar, porém é fundamental resgatarmos outro ator que exerce papel de protagonista em muitas discussões sobre os problemas educacionais no Brasil: o Estado. Historicamente a educação pública recebeu montantes insuficientes de investimento estatal, formando o cenário que conhecemos hoje, com pouca infraestrutura, professores mal pagos e estudantes desmotivados.

A falta de investimentos compromete o desenvolvimento:

O Brasil ainda é um dos países que menos investe no setor, considerando-se outros países latino-americanos. No contexto da atualidade, as escolas públicas não estão recebendo investimentos suficientes, funcionando em condições precárias. Se associamos educação a desenvolvimento, podemos verificar que, levando em conta os investimentos feitos em educação no Brasil, ainda estamos carecendo de melhor aproveitamento dos recursos produzidos socialmente, de políticas públicas que priorizem o universo educacional e que permitam o acesso à instituição escolar por parte de considerável contingente da população brasileira (NERY, 2013, p. 153).

Os filhos dos trabalhadores, no contexto da sociedade brasileira, muito cedo deixam seus estudos para se integrarem ao mercado de trabalho. Foi também por essa razão que foram criados os denominados ensinos supletivos. O objetivo era atender às necessidades dos segmentos sociais subalternos da população, já que os segmentos dominantes não tinham e não têm essa necessidade específica (NERY, 2013, p. 154).

IMPORTANTE

Page 189: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

TÓPICO 2 | A SOCIOLOGIA DA EDUCAÇÃO NO BRASIL

179

Em outras palavras, a falta de investimentos é acompanhada pela falta de comprometimento em relação ao uso eficiente dos gastos públicos. Além de baixos, os investimentos não são alocados de forma a promover melhorias significativas no sistema educacional. As políticas públicas da educação seguem pelo mesmo caminho, na medida em que não são capazes de promover transformações significativas na qualidade da educação. E, por fim, o ideal de acesso universal à educação pública e de qualidade ainda está distante de ser a realidade de todos os brasileiros.

Nesse cenário, mais uma vez observamos o distanciamento entre os mais ricos e os mais pobres, afinal, a escola que cada um frequenta é muito diferente da frequentada pelo outro. Aqui chegamos a mais um ponto importante sobre a educação no Brasil: a crença na educação como forma de promover a mobilidade social.

No contexto de uma sociedade marcadamente excludente como a nossa, as determinações da estrutura socioeconômica da população são fatores contribuintes para um certo grau de declínio da educação, em especial no ensino fundamental [...] parece não haver vontade política de melhorar substancialmente o sistema educacional brasileiro, fato contraditório no contexto de um mundo globalizado em que a qualificação é essencial. Podemos perguntar então: Como teremos profissionais devidamente qualificados na sociedade se o ensino fundamental não é atendido em suas necessidades mais básicas pelo Estado? (NERY, 2013, p. 157).

O questionamento levantado pela autora nos faz refletir sobre as implicações das características apresentadas até aqui como determinantes da estrutura social excludente que forma nossa sociedade. Faz-nos refletir ainda mais ao chamar atenção para a aparentemente fraca atuação e articulação política no sentido de qualificar o sistema educacional e ao trazer para luz os desafios da qualificação profissional diante da falta de recursos e suas consequências na educação básica.

Prezado acadêmico! Leia atentamente o texto da reportagem a seguir que mostrava em 2013 um comparativo da taxa de evasão escolar do Brasil com outros países. Considere as reflexões elaboradas até o momento e busque identificar os fatores sociais que influenciaram os índices de evasão escolar. 

Brasil tem 3ª maior taxa de evasão escolar entre 100 países, diz Pnud 

Um a cada quatro alunos que inicia o ensino fundamental no Brasil abandona a escola antes de completar a última série. É o que indica o Relatório de Desenvolvimento 2012, divulgado nesta quinta-feira (14) pelo Pnud (Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento). Com a taxa de 24,3%, o Brasil tem a terceira maior taxa de abandono escolar entre os 100 países com maior IDH (Índice de Desenvolvimento Humano), só atrás da Bósnia

NOTA

Page 190: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

180

UNIDADE 3 | A SOCIOLOGIA DA EDUCAÇÃO NA CONTEMPORANEIDADE

Como então acreditar numa educação que promove a mobilidade social quando a educação está reproduzindo uma estrutura desigual e excludente? Na prática, o acesso ao ensino básico não é capaz de garantir mudanças significativas na vida das camadas mais baixas de nossa sociedade. No cenário de competição do mercado de trabalho, a educação pública, em grande parte das situações, não faz frente à educação privada, por exemplo, no caso dos exames de seleção das universidades públicas.

Desigualdades, fracasso, investimentos, mobilidade, será que não estamos nos esquecendo de outra característica importante da sociedade brasileira presente na educação? As desigualdades sociais e raciais conformam diversas formas de preconceito nas escolas.

A segregação social, racial e educacional integra o contexto escolar.

Herzegovina (26,8%) e das ilhas de São Cristovam e Névis, no Caribe (26,5%). Na América Latina, só Guatemala (35,2%) e Nicarágua (51,6%) têm taxas de evasão superiores. Não foi divulgado o índice do Haiti. No relatório, o organismo da ONU sugere que o país adote "políticas educacionais ambiciosas" para mudar essa situação, por causa do envelhecimento da população brasileira, que deve se intensificar nas próximas décadas e reduzir o percentual de trabalhadores ativos. 

O documento divulgado nesta quinta-feira (14) mostra que apesar de ter avançado nas últimas duas décadas, o Brasil ainda tem um IDH menor que a média dos países da América Latina e Caribe. O país está na posição 85ª do ranking, que leva em conta a expectativa de vida, o acesso ao conhecimento e a renda per capita. 

Anos de estudo: o relatório do Pnud também revelou que o Brasil tem a menor média de anos de estudo entre os países da América do Sul. Segundo dados de 2010, a escolaridade média do brasileiro era de 7,2 anos – mesma taxa do Suriname – enquanto são esperados 14,2 anos. No continente, quem lidera esse índice é o Chile, com 9,7 anos de estudo por habitante, seguido da Argentina, com 9,3 anos, e da Bolívia, com 9,2 anos.  

Os dados de escolaridade são contestados pelo Ministério da Educação. Por meio de nota, o Inep (Instituto de Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira) afirmou que o censo do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) de 2011 aponta uma escolaridade média de 7,4 anos por habitante, o que deixaria o país à frente da Colômbia e do Suriname.  

O instituto alega que o Pnud desconsidera 4,56 milhões de crianças de 5 anos matriculadas na pré-escola e em classes de alfabetização, o que elevaria a expectativa de anos estudados no país para 16,7. 

FONTE: Disponível em: <https://educacao.uol.com.br/noticias/2013/03/14/brasil-tem-3-maior-taxa-de-evasao-escolar-entre-100-paises-diz-pnud.htm>. Acesso em: 7 fev. 2018.

Page 191: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

TÓPICO 2 | A SOCIOLOGIA DA EDUCAÇÃO NO BRASIL

181

A escola, de certa forma, [...] reproduz o que se encontra presente no contexto da estrutura social. Há preconceitos fortes em nossa sociedade com relação à pobreza; parece que temos no imaginário coletivo uma associação entre miséria e criminalidade. Esse tipo de preconceito perpassa as paredes das salas de aula. O mesmo podemos falar em relação ao preconceito racial, que é presente no Brasil de forma sub-reptícia, que é velado, mas se manifesta em muitas formas de expressão, como em piadas relacionadas aos negros. Em suma, não vivemos em uma democracia racial e, segundo autores da sociologia da educação, esse fato se expressa fundamentalmente nos indicadores sociais do país, em especial aqueles que dizem respeito à educação e à remuneração salarial. Há também profundas diferenças de gênero, principalmente no que concerne à remuneração pelo trabalho. São fatores, repetimos, que perpassam as paredes das salas de aula (NERY, 2013, p. 159).

Mais uma vez é preciso relembrar que a escola não consiste em um espaço isolado das relações sociais e, especialmente, das relações de poder que determinam a hierarquia social. Muito pelo contrário, expressões da questão social, vivenciadas em diferentes cenários sociais, também estão presentes na escola.

Desse modo, também nas escolas são vivenciadas situações que expressam formas de segregação social, como aquelas decorrentes das visões sobre violência e criminalidade, especialmente nas escolas de periferia, vistas, muitas vezes, como inferiores às demais; da segregação racial em suas mais variadas expressões – inclusive nas veladas; e também nas questões de gênero expressas, por exemplo, na menor remuneração recebida pelas mulheres nos ambientes de trabalho.

LEITURA COMPLEMENTAR

EDUCAÇÃO NA E PARA A DEMOCRACIA NO BRASIL: CONSIDERAÇÕES A PARTIR DE J. DEWEY E J. HABERMAS

Guilherme Perez Cabral

Modernidade, democracia e educação na Constituição de 1988

A Constituição Federal de 1988 integra as linhas do projeto emancipatório da modernidade. Apreendendo o ser humano como valor-fonte da experiência jurídica (LAFER, 1988, p. 19), resguarda duas ideias fundamentais do direito moderno: a soberania do povo e os direitos humanos (HABERMAS, 2012a, p. 133).

A primeira delas é afirmada logo no dispositivo inaugural, após a instituição da República Federativa do Brasil como Estado Democrático de Direito: todo o poder emana do povo, sendo por ele exercido diretamente ou por representantes eleitos. O texto rompe, dessa maneira, com a tradição constitucional brasileira que, desde 1934, restringia a democracia ao modelo representativo de exercício do poder em nome do povo. Estabelece, em seu lugar, o regime democrático semidireto. Combina a representação — com a eleição

Page 192: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

182

UNIDADE 3 | A SOCIOLOGIA DA EDUCAÇÃO NA CONTEMPORANEIDADE

periódica de representantes — e mecanismos de participação direta na definição de políticas, destacando, aqui, a iniciativa popular de projetos de lei, o plebiscito e o referendo (BENEVIDES, 2003, p. 18-19).

O Estado Democrático de Direito, assim concebido, é alicerçado, então, em vigoroso sistema de direitos. Incorpora, de forma robusta, as três dimensões dos direitos humanos, afirmados na modernidade, reconhecendo extensas propriedades que constituem o ser humano como pessoa. Assegura direitos e liberdades individuais (vida, privacidade, propriedade, igualdade, liberdade de pensamento e de expressão, dentre outros). Garante direitos sociais à saúde, moradia, trabalho, educação, etc. Protege direitos transindividuais à preservação da cultura, ao desenvolvimento científico e tecnológico, ao meio ambiente equilibrado. Estabelece os direitos de participação política.

Projeta-se a emancipação, que, ambientada na democracia e apoiada nos direitos fundamentais, resguarda a formação racional da pessoa, assegurando-lhe, ao mesmo tempo, para sua constituição plena, como sujeito histórico capaz, a participação na vida social e política. Direciona, destarte, uma práxis de autolegislação, na qual os sujeitos de direito movem-se num medium jurídico do qual são, também, autores (HABERMAS, 2012a, 159).

A educação, como direito social fundamental, adquire papel destacado, sendo tratada com grande desvelo na Constituição. Visa, nos termos do Art. 205, ao pleno desenvolvimento da pessoa, à qualificação para o trabalho e ao preparo para o exercício da cidadania, voltando-se, ante esse último escopo, à promoção da experiência democrática (RANIERI, 2009, p. 380). No âmbito do Estado Democrático de Direito, está prevista, constitucionalmente, a educação para a democracia.

A inexperiência da democracia no Brasil

O projeto constitucional, porém, é arremessado no curso de uma história de inexperiência da democracia. Contrapõe-se aos 20 anos de ditadura militar que, mais uma vez, institucionalizara relações autoritárias entre o Estado e a sociedade, renovando padrões de interação pautados no não diálogo, na repressão, no emprego imediato da violência.

Não obstante o inegável valor como “marco jurídico da transição democrática, bem como da institucionalização dos direitos humanos no país” (PIOVESAN, 2003, p. 328), a Constituição não pode antecipar a vida social ainda não experimentada. A experiência da democracia e dos direitos humanos não se promulga com leis.

O Brasil tem vivenciado progressos significativos nos campos econômico, social e político. Ocupa a posição de sétima maior economia do mundo. Experimentou sensíveis avanços no campo dos direitos fundamentais, elevados ao status de política pública, com os Planos Nacionais de Direitos Humanos (PIOVESAN, 2003, p. 346). Atualiza inegável estabilização dos procedimentos político-eleitorais, não tendo sido acometido, até agora, por tentativas golpistas de usurpação do poder.

Page 193: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

TÓPICO 2 | A SOCIOLOGIA DA EDUCAÇÃO NO BRASIL

183

Porém, a democracia brasileira sofre, ainda, em sua incipiente experiência, com graves e históricos problemas.

De um lado, o reconhecimento do amplo rol de direitos é contraposto à facticidade de sua ineficácia e sistemático desrespeito. O país carrega os infortúnios da aguda desigualdade e exclusão social; da extrema pobreza; da violência; da oferta inadequada de serviços públicos como saúde, saneamento básico e educação.

De outro, na vivência política, prevalece o patronato governamental, que persiste sobranceiro e alheio à sociedade civil (FAORO, 1995, p. 739 e 747). A colagem patrimonialista ao poder e seu exercício não dialógico, com traços populistas e paternalistas, mais ou menos acentuados (CARVALHO, 2010, p. 221), renovam a antipatia à ampliação e ao fortalecimento dos procedimentos democráticos. Vivemos menos a horizontalidade da linguagem, mais a formalidade democrática, coabitando com padrões de conduta unilateralizados e verticalizados. O esvaziamento da esfera pública reduz a participação política ao exercício isolado do voto, decaída no eleitorismo. O poder que emana do povo permanece a ele ligado, muito mais, na retórica política cínica e autolegitimadora, dele se descolando, em seu exercício irresponsável pelos agentes governamentais (WEFFORT, 1984, p. 53; MOISÉS, 1995, p. 35; BENEVIDES, 2003, p. 25).

Faz-se presente o dilema legitimatório que opõe à “fraqueza da sociedade civil e da esfera pública” a primazia do poder ilegítimo, delas desvinculado, de modo que a comunicação pública segue o fluxo invertido (HABERMAS, 2011, p. 121-122).

Num ciclo vicioso, a sociedade brasileira experiencia um processo perverso. A precariedade dos direitos humanos, intimamente ligada à inexperiência da democracia, prejudica o enriquecimento da experiência democrática. Prejudica, assim, a experiência que, alicerçada nos direitos humanos, constitui, ao mesmo tempo, o mecanismo fundamental para o reconhecimento, ampliação e concretização desses direitos.

Eis o lugar do qual se fala, a ambiência sobrecarregada de tarefas democratizantes herdadas do passado “inexaurível, pesado, sufocante” (FAORO, 1995, p. 748). É nela que se vive e revive os sentidos jurídico-constitucionais, construindo em versões discursivas os objetos sobre os quais se discorre (HESPANHA, 2009, p. 657; BITTAR, 2010, p. 142).

Contudo, se a inexperiência que conforma e empobrece o conteúdo da democracia, no Brasil, é fruto de um continuum histórico-cultural, a experiência enriquecida, na moldura jurídico-constitucional de 1988, também pode ser. Ainda que sem metanarrativa a predizer ou determinar o sentido da história.

A democracia, como prática que “não foge à história” (HABERMAS, 2011, p. 122), depende, fundamentalmente, da atuação dos sujeitos históricos. A questão que se coloca é a da medida de nossa impotência. Em que ponto deve alquebrar-nos em conformismo; até que ponto desautoriza ao movimento crítico em direção a uma experiência melhor.

[...]

Page 194: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

184

UNIDADE 3 | A SOCIOLOGIA DA EDUCAÇÃO NA CONTEMPORANEIDADE

Diretrizes de uma educação na e para a democracia no Brasil

No cenário em que aos exigentes pressupostos comunicativos opõe-se a inexperiência democrática, aclara-se a significância da educação como mecanismo fundamental, embora não exclusivo, para a consolidação da democracia.

A democracia está indissociavelmente vinculada a processos de aprendizagem que precisam ser atualizados em sua própria experiência, com todos seus vícios e imperfeições.

O fim do “tempo das revoluções sistêmicas” (BAUMAN, 2001, p. 12) sinaliza a abertura da filosofia aos ensinamentos da psicologia social: não se pode mais negligenciar a força das experiências na formação dos hábitos de pensar, agir e conviver, por meio dos quais tais experiências podem ser transformadas, recorrendo-se justamente aos aprendizados e instrumentos por meio dela construídos. É temerário insistir, sem mais, na crença em transformações profundas e de uma só vez, criando a nova ordem social, a partir de uma tabula rasa (DEWEY, 1991, p. 162).

Não dá para pensar em democracia, sem a educação. E pensar a educação para a democracia é pensar a educação na democracia.

Para sua fundamentação, a pedagogia progressiva de Dewey e a filosofia social habermasiana oferecem importantes contribuições. É bem verdade que Habermas não possui uma reflexão acabada sobre o assunto. No entanto, a teoria do agir comunicativo e a releitura do processo de desenvolvimento da consciência moral, à luz de uma ética do discurso, permitem a referência, sem nenhum desconforto, a uma pedagogia da ação comunicativa (BOUFLEUER, 2001). E aludidos elementos justificadores de uma proposta educacional por ele não afirmada diretamente, aproximam-se significativamente do pensamento deweyano, onde se encontram mais profundas e diretas reflexões sobre o tema.

Sob esse referencial, toma-se a educação como o processo de constituição social da individualidade, orientado ao desenvolvimento pleno da pessoa, no desenrolar experiencial e no desabrochar intelectual e moral, a partir de sua reflexão e interação no mundo.

Remete ao crescimento que tem lugar na contínua ampliação e enriquecimento das experiências, reciprocamente referidas ao mundo subjetivo do educando e ao universo exterior, nele refletido. Na interação com o ambiente, mediada pela linguagem, o sujeito reorganiza permanentemente seus recursos intelectuais. Pode expandir e aprofundar o significado de suas experiências. Pode, então, desenvolver a habilidade de um melhor controle, aproveitamento e direção do curso das experiências subsequentes, em termos comunicativos, cognitivos e morais (DEWEY, 1916, p. 63, 89 e 90).

Pode, enfim, desenvolver competências e hábitos de pensar, agir e conviver, dispondo-se ao discurso como instância de solução de problemas enfrentados no percurso experiencial e de construção cooperativa do saber. Em termos morais, o educando atravessa a heteronomia convencional e alcança o

Page 195: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

TÓPICO 2 | A SOCIOLOGIA DA EDUCAÇÃO NO BRASIL

185

estágio da autonomia pós-convencional, referido à práxis discursiva. Capacita-se, enfim, à intersubjetividade que marca a experiência democrática.

A educação adquire, portanto, um sentido bastante ampliado, referida ao tecido inesgotável de experiências comunicativas que compõem a vida (TEIXEIRA, 1980, p. 115). De acordo com a Lei de Diretrizes e Bases, o terceiro Plano Nacional de Direitos Humanos e o Plano Nacional de Educação em Direitos Humanos, abrange os processos formativos que ocorrem em todos os âmbitos da convivência: na vida familiar e privada; no trabalho; no envolvimento em movimentos populares e em associações da sociedade civil; na atuação política, na vida cultural; no lazer; e, também, na escola.

A experiência educativa, com tal significação, concebida sob a perspectiva da filosofia social dos dois autores, abrange as seguintes diretrizes:

• Educação dialógica. A perspectiva comunicativa da formação da personalidade e da construção do saber e da moral demanda que a experiência educativa, tal como a democrática, assuma, como paradigma, o discurso.

É a partir da experiência renovada do diálogo, em condições cada vez mais efetivas e plenas de sentido, que o sujeito em crescimento pode, internalizando-a, habilitar-se e habituar-se à sua práxis competente.

Dificilmente aprenderemos a conversar a partir de uma experiência imunizada contra o discurso. O diálogo — que, na vida democrática, assume a forma da participação cidadã — não pode ser ensinado e institucionalizado, a partir de um sentido não experimentado.

A aprendizagem há de se constituir na bilateralidade e à horizontalidade do diálogo, favorecendo uma perspectiva existencial participante, de todos os envolvidos, na medida de suas capacidades, no âmbito de um processo linguístico e hermenêutico compartilhado, em que são renovados, corrigidos e enriquecidos os sentidos das situações intersubjetivamente vivenciadas.

Note-se, ademais, que, ao se realizar no discurso, a educação que se abriu à intersubjetividade tem de se abrir, também, à interdisciplinaridade. Fixa-se o diálogo interdisciplinar como premissa filosófica e princípio da organização didático-pedagógica. Referido ao saber partilhado pelos participantes da comunicação, aparece, sob essa perspectiva, como mecanismo emancipador das “grades de disciplinas” que não conversam entre si, da cartesiana degeneração pela singularização (HABERMAS, 2003, p. 32-33; HABERMAS, 2009, p. 96).

• Desenvolvimento da capacidade cognitiva. Os potenciais racionais vinculados à comunicação não se realizam sem o crescimento cognitivo da pessoa que conversa. Em Dewey, isso corresponde ao desenvolvimento dos hábitos reflexivos do pensar, na linha da atitude científica, que propugna: o pensamento solucionador de problemas, de modo ativo e metódico, na condição de participante na práxis da busca cooperativa da verdade (MEAD, 1992, p. 308; JOAS, 1993, p. 19 e 20; DEWEY, 1989, p. 111). A inteligência, enfim, refere-se menos à quantidade de informações depositadas na mente do educando; mais à sua habilidade de resolver as dificuldades presentes em sua experiência.

Page 196: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

186

UNIDADE 3 | A SOCIOLOGIA DA EDUCAÇÃO NA CONTEMPORANEIDADE

Para tanto, acompanhando a perspectiva que passa por Dewey, Piaget, Kohlberg, até ser assimilada por Habermas, o crescimento cognitivo é apreendido construtivamente, no âmbito de uma aprendizagem baseada em problemas: um “processo de solução de problemas no qual o sujeito que aprende está ativamente envolvido” (HABERMAS, 2003, p. 50).

Nele, as estruturas do pensamento se desenvolvem e se lapidam, na medida em que são sobrecarregados por problemas na experiência. Os recursos intelectuais adquiridos e aperfeiçoados em cada experiência alteram o olhar do sujeito sobre as experiências ulteriores, cada vez mais complexas. Doravante, ele se depara com novos objetos e problemas, antes não percebidos e que impõem, novamente, o reajustamento de suas perspectivas e estruturas cognitivas. Requerem novas capacidades, novos conhecimentos, cujo desenvolvimento, a partir de seu exercício, faz reiniciar, continuamente, o processo de crescimento cognitivo e de reconstrução do universo experiencial (DEWEY, 2004, p. 51; DEWEY, 2010, p. 76).

• Desenvolvimento da consciência moral. O desenvolvimento da capacidade intelectual e da competência e da disposição comunicativa, a partir do diálogo direcionado — com o pensar reflexivo — para solução de problemas, conflui ao processo de desenvolvimento moral, sob a abordagem cognitivista.

O crescimento moral é compreendido como um crescimento cognitivo que capacita e habitua o sujeito, num estágio pós-convencional, ao discurso prático sobre o valor da conduta humana. Conforme o modelo proposto por Dewey e incorporado por Habermas, na revisita a Kohlberg, corresponde a um percurso incerto composto de três estágios. Primeiro, a amoralidade pré-convencional da criança. Distinguindo, no mundo exterior em construção, o outro com quem interage, ela avança, aqui, ao ponto de conseguir coordenar sua ação na concretude da relação eu-tu, sem a percepção, porém, do mundo social em que estão inseridos. No estágio convencional, o sujeito ingressa no mundo social, internalizando e participando heteronomamente de seus valores e perspectivas. Finalmente, com o continuum experiencial de reconstrução de seus recursos mentais, a pessoa pode atingir o estágio pós-convencional da consciência moral. Distanciando-se das convenções em que se constituiu, assume, perante elas, um olhar hipotético e crítico. A moralidade descola-se das instituições internalizadas pela criança e passa a radicar procedimentalmente no discurso. Somente nele pode ser resgatada a pretensão justiça das normas sociais (FREITAG, 1989, p. 36; HABERMAS, 2003, p. 156 e 195; DEWEY, 2008, p. 12).

Em Dewey e em Habermas, a autonomia moral-cognitiva, projetada pelo iluminismo, é fruto de um processo de aprendizagem. E aparece como a participação competente na intersubjetividade da linguagem em que a moralidade, tal como a verdade, é racionalmente construída (DEWEY, 1980, p. 29 e 39; HABERMAS, 2003, p. 197). Dá, assim, o sentido diretivo da educação para a democracia.

• A participação da sociedade civil na educação. A experiência educativa, por tudo isso, não pode ser tragada pelo sistema político e, com isso, coordenada pela mediação do poder, contaminada e direcionada pelas pressões e interesses

Page 197: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

TÓPICO 2 | A SOCIOLOGIA DA EDUCAÇÃO NO BRASIL

187

do aparelho governamental. Também não pode, por outro lado extremo, ser assimilada pela estrutura do mercado e, decodificada pelo meio dinheiro, reduzida a propriedade privada da empresa capitalista, meio para a obtenção de lucro (BOUFLEUER, 2001, p. 90; HABERMAS, 2007, p. 278; HABERMAS, 2012c, p. 330 e 587).

Nesse sentido, sobressai a atuação fundamental da sociedade civil, concebida como a base comunicativa que precede e direciona o sistema político-institucional, sem se confundir com a sociedade econômica. Cumpre-lhe, assim, além de prestar o ensino, diretamente, por meio de associações “não estatais e não econômicas”, atuar, em qualquer caso, na formulação e implantação da legislação e das políticas públicas, promovendo a “estruturação pedagógica” da educação nacional (HABERMAS, 2011, p. 22; HABERMAS, 2012c, p. 667).

Considerações finais

À luz da filosofia social de Dewey e de Habermas, a experiência educativa consolida a democracia na medida em que promove o crescimento cognitivo e moral da pessoa, no ambiente do discurso.

Concebida a experiência democrática como forma de vida racional e moralmente autônoma, sob o discurso, a educação que promove, dialogicamente, o pleno desenvolvimento da pessoa, não se distingue daquela que prepara para o exercício da cidadania. É educação na e para a democracia, ligando indissociavelmente os objetivos previstos na Constituição. É formação para a emancipação.

Trata-se, de qualquer forma, de experiências – a educação e a democracia – que, recusando meta-histórias, não tem metagarantias de êxito. Em sua incompletude dinâmica, são potencialmente transformadoras. Mas são, também, inevitavelmente arriscadas, delicadas, falíveis. Por isso, um desafio a ser enfrentado.

FONTE: CABRAL, Guilherme Perez. Educação na e para a democracia no Brasil: Considerações a partir de J. Dewey e J. Habermas. Educ. Soc. Campinas, v. 37, nº 136, p. 873,889, jul.-set., 2016. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0101-73302016000300873&lng=en&nrm=iso>. Acesso em: 7 mar. 2018. 

Page 198: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

188

Neste tópico, você viu:

• As pesquisas em Sociologia da Educação no Brasil foram marcadas por teorias micro e macrossociológicas, variando de acordo com o contexto social e científico de cada período. Nos últimos anos observa-se a influência das políticas neoliberais e das políticas de democratização que levaram à ligação entre as análises micro e macrossociológicas.

• A produção teórica e a trajetória profissional fazem de Florestan Fernandes um marco para a Sociologia brasileira, bem como para a compreensão da educação à luz da teoria social. Nesse cenário ganha destaque a compreensão da educação como segunda natureza elaborada pelo sociólogo.

• As contribuições de Fernando de Azevedo representam um marco na introdução das análises educacionais elaboradas a partir da teoria de Émile Durkheim, especialmente na análise da educação com foco na escola como instituição e nas propostas de reforma educacional.

• A educação brasileira, especialmente a educação pública, configura um grande desafio social. Da forma como está constituída, representa um espaço de reprodução social no qual as desigualdades sociais afloram e, em grande medida, são reproduzidas. Esse processo é resultado de diversos fatores, como a estrutura social desigual e a falta de investimentos e, ao mesmo tempo, contribuem para tornar cada vez mais onerosos os projetos de mudança.

RESUMO DO TÓPICO 2

Page 199: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

189

AUTOATIVIDADE

1 A produção teórica da Sociologia da Educação, no Brasil, ficou marcada nas décadas de 1960 e 1970 por dois elementos: pela análise da influência da estratificação escolar sobre a escola e pela ditadura militar, contudo, diante de contexto social tão conflitante, os estudos ganharam novos contornos. Sobre os estudos desenvolvidos nesse período, assinale a alternativa correta:

a) ( ) As análises da Sociologia da Educação produziram um número maior de estudos no período da ditatura militar.

b) ( ) Pesquisas realizadas por Anísio Teixeira, Florestan Fernandes e J. Roberto Moreira fundamentaram os princípios da educação no governo militar.

c) ( ) As pesquisas ensaísticas e teóricas tinham foco na administração escolar, no planejamento e na tecnologia educacional.

d) ( ) O período foi marcado pela crítica ao uso de dados demográficos e indicadores socioeconômicos na Sociologia da Educação.

2 O termo fracasso escolar se faz presente em parte significativa das discussões realizadas na Sociologia da Educação, especialmente quando analisamos indicadores como índices de aprovação/reprovação e outros que revelam aspectos referentes à qualidade da educação em nosso país. Nesse contexto, o Estado é considerado um ator protagonista devido às características da educação em nosso país. Sobre esse aspecto, analise as sentenças a seguir, assinalando V para verdadeiras e F para falsas:

( ) A falta de investimentos, de infraestrutura e os baixos salários dos professores no Brasil são consequências da atuação do Estado.

( ) O Estado brasileiro, ainda que invista pouco na educação, é um dos países que mais destina investimentos públicos para as escolas.

( ) A falta de investimentos vem acompanhada da baixa eficácia no uso do dinheiro público destinado à educação.

( ) É possível afirmar que, diante do contexto desfavorável, se faz necessário pensar a superação do fracasso escolar independentemente do investimento estatal.

Agora assinale a alternativa que apresenta a sequência CORRETA:

a) ( ) V – F – V – F. b) ( ) F – V – F – V. c) ( ) F – F – V – V. d) ( ) V – V – F – F.

Page 200: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

190

3 A educação na concepção de Florestan Fernandes é entendida como um processo de transformação dos sujeitos a partir dos elementos que não são percebidos naturalmente, mas incorporados através da ação educativa. Considerando a concepção de educação de Florestan Fernandes, assinale a alternativa CORRETA:

a) ( ) O sociólogo faz uso dos conceitos de segunda natureza de Gramsci e de habitus de Bourdieu para explicar como a educação produz a humanidade.

b) ( ) O processo de construção do saber decorre da imposição de saberes incorporados naturalmente pelo sujeito através da socialização.

c) ( ) A noção de educação como segunda natureza foi amplamente criticada por Florestan Fernandes em suas obras.

d) ( ) A educação, segundo Florestan Fernandes, só pode ser concebida quando os elementos adquiridos na ação pedagógica não são naturalizados pelo sujeito.

Page 201: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

191

TÓPICO 3

TEMAS DA SOCIOLOGIA DA EDUCAÇÃO

UNIDADE 3

1 INTRODUÇÃO

Prezado acadêmico! A relação entre educação e tecnologia promove intensos debates e uma ampla possibilidade de teorias e conceitos que nos auxiliam a compreender a implicação dessa relação a partir do contexto da Sociologia da Educação. Nosso propósito aqui não é apresentar um estado da arte das pesquisas sobre essa temática, buscamos apresentar um conjunto de reflexões que incentive sua reflexão a respeito dessa relação.

Para iniciarmos nossas reflexões, vamos partir das implicações da globalização para as transformações sociais e, consequentemente, para a educação. Quando consideramos os reflexos da globalização na sociedade, é fundamental recordar de aspectos econômicos, políticos, sociais e culturais que sofreram intensa influência da superação das fronteiras nacionais.

2 A RELAÇÃO EDUCAÇÃO E TECNOLOGIA

Essas transformações implicam em novos recursos que ganham espaço nas escolas, como as tecnologias; em influências internacionais em temas como currículo e avaliação; em novos contornos para a noção de preparação para o trabalho; e, de modo geral, percebe-se uma mudança em relação à expectativa social a respeito da função da escola e da educação básica e superior.

Globalização  

A globalização já foi analisada de muitas maneiras. O aspecto central de todas as abordagens atuais é a concepção de que muitos dos mais importantes problemas contemporâneos não podem ser estudados adequadamente no nível dos Estados nacionais, ou seja, em termos de sociedade nacional ou de relações internacionais. Em vez disso, precisam ser teorizados como processos globalizantes (transnacionais) que ultrapassam o nível do Estado-nação. É útil distinguir a globalização geral (genérica) de sua atual forma predominante (globalização capitalista) e de formas alternativas. 

A globalização genérica pode ser definida por quatro fenômenos que emergiram ou se intensificaram desde meados do século XX: 

NOTA

Page 202: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

UNIDADE 3 | A SOCIOLOGIA DA EDUCAÇÃO NA CONTEMPORANEIDADE

192

Agora, olhando para as implicações dessas transformações na educação, vamos destacar quatro pontos a partir da perspectiva de Moreira e Kramer (2007): a flexibilidade da educação, a influência do neoliberalismo, a homogeneização cultural e o uso das tecnologias da informação e comunicação (TICs).

A flexibilidade da educação faz referência a mudanças no cotidiano do sistema escolar no sentido do uso de novas tecnologias e da preparação para o mundo do trabalho. Espera-se dos professores o uso de recursos e metodologias ligados à tecnologia, e dos alunos se espera adequação aos padrões do universo corporativo atual para inserção no mercado de trabalho.

A influência do neoliberalismo diz respeito ao espaço tomado pela lógica empresarial no contexto educacional. A influência de organismos internacionais na avaliação do sistema de ensino e, consequentemente, nos currículos e metodologias. A educação passa a ser entendida como um negócio. O propósito é adequar o sistema de ensino à lógica das grandes corporações.

A homogeneização cultural leva à construção de um tipo de conhecimento oficial através do controle simbólico do conhecimento. Devido às questões apresentadas acima (flexibilidade e neoliberalismo), caminha-se para uma espécie de unificação do currículo através de políticas curriculares semelhantes dentro de sistemas nacionais e internacionais.

Todo esse processo é permeado no contexto escolar pelo uso das tecnologias da informação e comunicação, chamadas de TICs. É comum a atribuição das TICs como caminho para a modernização e qualificação do ensino. Por vezes, parece que as tecnologias exercem uma espécie de mágica capaz de atualizar e adequar a educação aos padrões sociais vigentes. Além disso, observa-se uma crença de que o uso das TICs permitirá a consolidação da chamada sociedade da informação ou sociedade do conhecimento.

A) A revolução eletrônica, que transformou a base tecnológica e o escopo global dos meios de comunicação de massa e grande parte da infraestrutura material do mundo atual. B) A descolonização da maior parte da África, Ásia e Caribe, com impactos importantes sobre as atividades econômicas e culturais transfronteiriças e sobre as formas de migração e pós-colonialismo. C) A criação de espaços sociais transnacionais.D) Formas qualitativamente novas de cosmopolitismo, que permitem que pessoas e grupos construam múltiplas identidades. 

Essas características da globalização genérica se manifestam mais claramente na predominância da globalização do capitalismo, que tem sido estudada de muitas maneiras, mediante concepções divergentes, como as abordagens dos sistemas-mundo, e da cultura, da política, da sociedade e do capitalismo globais. 

FONTE: SKLAIR, Leslie. Globalização. In: SCOTT, John (Org.). Sociologia: conceitos-chave. Rio de Janeiro: Zahar, 2010. 

Page 203: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

TÓPICO 3 | TEMAS DA SOCIOLOGIA DA EDUCAÇÃO

193

Sociedade da informação e sociedade do conhecimento 

Sociedade da informação 

Na década passada, “sociedade da informação” foi, sem dúvida, a expressão que se consagrou como o termo hegemônico, não porque expresse necessariamente uma clareza teórica, mas graças ao batismo que recebeu nas políticas oficiais dos países mais desenvolvidos e a glorificação que significou ter uma Cúpula Mundial dedicada à sua honra.  

Os antecedentes do termo, contudo, datam de décadas anteriores. Em 1973, o sociólogo estadunidense Daniel Bell introduziu a noção da “sociedade de informação” em seu livro O advento da sociedade pós-industrial [1]. Neste livro, ele formula que o eixo principal desta sociedade será o conhecimento teórico e adverte que os serviços baseados no conhecimento terão de se converter na estrutura central da nova economia e de uma sociedade sustentada na informação, onde as ideologias serão supérfluas. 

Esta expressão reaparece com força nos anos 1990, no contexto do desenvolvimento da Internet e das TIC. A partir de 1995, foi incluída na agenda das reuniões do G7 (depois, G8, onde se reúnem os chefes de Estado ou governos das nações mais poderosas do planeta). Foi abordada em fóruns da Comunidade Europeia e da OCDE (os 30 países mais desenvolvidos do mundo) e foi adotada pelo governo dos Estados Unidos, assim como por várias agências das Nações Unidas e pelo Banco Mundial. Tudo isso com uma grande repercussão mediática. A partir de 1998, foi escolhida, primeiro na União Internacional de Telecomunicações e, depois, na ONU para nome da Cúpula Mundial programada para 2003 e 2005. 

Neste contexto, o conceito de “sociedade da informação” como construção política e ideológica se desenvolveu das mãos da globalização neoliberal, cuja principal meta foi acelerar a instauração de um mercado mundial aberto e “autorregulado”. Política que contou com a estreita colaboração de organismos multilaterais como a Organização Mundial do Comércio (OMC), o Fundo Monetário Internacional (FMI) e o Banco Mundial, para que os países fracos abandonem as regulamentações nacionais ou medidas protecionistas que “desencorajassem” o investimento; tudo isso com o conhecido resultado da escandalosa intensificação dos abismos entre ricos e pobres no mundo. 

Na verdade, no final do século, quando a maioria dos países desenvolvidos já havia adotado políticas de desenvolvimento da infraestrutura das TIC, ocorre o espetacular auge do mercado de ações da indústria das comunicações. Entretanto, os mercados do Norte começam a se saturar. Assim, intensificam-se as pressões com relação aos países em desenvolvimento para que deixem a via livre ao investimento das empresas de telecomunicações e informática em busca de novos mercados para absorver seus excedentes de lucros. Neste contexto convocado pela CMSI, esse panorama se modifica, entretanto, uma vez que a bolha do mercado de ações estoura, a partir do ano 2000. No entanto, esta realidade e o papel-chave que as tecnologias da comunicação desempenharam na aceleração da globalização econômica, sua imagem pública, estão mais associados aos aspectos mais “amigáveis” da globalização, como a Internet, a telefonia celular e internacional, a TV via satélite etc. Assim, a sociedade da informação assumiu a função de “embaixadora da boa vontade” da globalização, cujos “benefícios” poderiam estar ao alcance de todos, se pelo menos fosse possível diminuir o “abismo digital.” [2] 

NOTA

Page 204: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

UNIDADE 3 | A SOCIOLOGIA DA EDUCAÇÃO NA CONTEMPORANEIDADE

194

Nesse contexto é fundamental considerar o espaço da diversidade diante da constante imposição de padrões sociais e culturais.

Não se suprimem formas antigas de diversidade cultural por meio de condições tecnológicas avançadas. A expansão uniformizada de aparatos tecnológicos não elimina a diversidade das relações sociais entre indivíduos, assim como das relações desses indivíduos com o conhecimento, com o dinheiro e com seus corpos. Tampouco propicia o desaparecimento de desigualdades econômicas. Assim, as diferenças, as desigualdades, as divergências e as discrepâncias persistem. É nesse panorama que a fetichização das novas tecnologias, na sociedade e na educação, insiste em perdurar (MOREIRA; KRAMER, 2007, p. 1043).

Sociedade do conhecimento  

A noção de “sociedade do conhecimento” (knowledge society) surgiu no final da década de 1990. É empregada, particularmente, nos meios acadêmicos como alternativa que alguns preferem a “sociedade da informação”. 

A UNESCO, em particular, adotou o termo “sociedade do conhecimento” ou sua variante “sociedades do saber” dentro de suas políticas institucionais. Desenvolveu uma reflexão em torno do assunto que busca incorporar uma concepção mais integral, não ligada apenas à dimensão econômica. Por exemplo, Abdul Waheed Khan (subdiretor-geral da UNESCO para Comunicação e Informação) escreve [3]: “A Sociedade da Informação é a pedra angular das sociedades do conhecimento. O conceito de “sociedade da informação”, a meu ver, está relacionado à ideia da “inovação tecnológica”, enquanto o conceito de “sociedades do conhecimento” inclui uma dimensão de transformação social, cultural, econômica, política e institucional, assim como uma perspectiva mais pluralista e de desenvolvimento. O conceito de “sociedades do conhecimento” é preferível ao da “sociedade da informação”, já que expressa melhor a complexidade e o dinamismo das mudanças que estão ocorrendo. [...] o conhecimento em questão não só é importante para o crescimento econômico, mas também para fortalecer e desenvolver todos os setores da sociedade”. 

Um detalhe neste debate, que apenas diz respeito aos idiomas latinos, é a distinção entre “conhecimento” ou “saber” (em inglês, ambos são traduzidos como “knowledge society”). A noção de “saberes” implica certezas mais precisas ou práticas, enquanto que conhecimento abarca uma compreensão mais global ou analítica. André Gorz considera que os conhecimentos se referem aos “conteúdos formalizados, objetivados, que não podem, por definição, pertencer às pessoas... O saber está feito de experiências e práticas que se tornaram evidências intuitivas e costumes” [4]. Para Gorz, a “inteligência” abarca toda a gama de capacidades que permite combinar saberes com conhecimento. Sugere, então, que “knowledge society” seja traduzida por “sociedade da inteligência”.

Em todo caso, geralmente, neste contexto, utiliza-se indistintamente sociedade do conhecimento e do saber, embora em espanhol, pelo menos, conhecimento pareça ser mais comum. 

FONTE: AMBROSI, A.; PEUGEOT, V.; PIMIENTA, D. (Coord) Desafios de palavras: enfoques multiculturais sobre as sociedades da informação. Caen-France: C & F Éditions, 2005. Disponível em: <http://vecam.org/article591.html>. Acesso em: 23 mar. 2018.

Page 205: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

TÓPICO 3 | TEMAS DA SOCIOLOGIA DA EDUCAÇÃO

195

Outro aspecto importante a ser considerado nesse contexto diz respeito à relação entre educação, tecnologia e poder. A escola representa uma forma de exercício de poder referente aos saberes e tecnologias que medeiam professores, alunos e conteúdos (KENSKI, 2015).

Os indivíduos buscam na escola um espaço onde encontrarão conhecimentos que permitam a adequação às mudanças cada vez mais frequentes e velozes que ocorrem em nossa sociedade. A escola realiza a seleção dos conteúdos considerados socialmente relevantes para o exercício e atualização profissional. Além disso, a socialização das novas tecnologias também se dá através da educação (KENSKI, 2015).

Cabe resgatar aqui o papel central que a ciência e tecnologia desempenham em nossa sociedade. Nesse contexto de intensa produção tecnológica observa-se a crença na ciência e na tecnologia como formas de superar problemas sociais e promover o desenvolvimento econômico e social. A consequência desse processo pode ser verificada no cientificismo que leva à supervalorização da ciência e à crença no mito da neutralidade científica.

Para compreender esse cenário é essencial ainda destacar a função ideológica de dominação da ciência e da tecnologia. Como nos mostram Santos e Mortimer (2002), essa reflexão foi elaborada por Habermas e Marcuse ao demonstrarem como a ciência e técnica legitimam a dominação, pois essas metodologias levam à dominação da natureza e, na medida em que ampliam sua eficácia, permitem a dominação do homem sobre o homem.

Cabe ainda destacar os processos de resistência à padronização comprometida com os valores não hegemônicos (KENSKI, 2015). Nesse universo ganham destaque as lutas em defesa da escola pública de qualidade que procuram levantar discussões a respeito de temáticas como a tecnologia e garantir a educação como direito de todos e dever do Estado.

Nesse emaranhado de relações e influências é fundamental considerar de forma crítica os discursos prontos a respeito da incorporação das TICs na educação e, ao mesmo tempo, compreender que as transformações nas formas de produção, de comunicação e na socialização capitaneadas pelas tecnologias são parte da sociedade – enquanto objeto de estudo da Sociologia – e da educação tanto em relação à socialização, quanto em relação à expectativa da formação de jovens preparados para inserção no mercado de trabalho.

Page 206: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

UNIDADE 3 | A SOCIOLOGIA DA EDUCAÇÃO NA CONTEMPORANEIDADE

196

2.1 AVANÇOS E DESAFIOS DO ENSINO DE SOCIOLOGIA NA EDUCAÇÃO BÁSICA

A consolidação do ensino de Sociologia na Educação Básica é fato recente na história da educação brasileira. Diversos são os desafios diante da tarefa de ensinar Sociologia para jovens nas escolas: a formação dos professores – boa parte dos professores de Sociologia não é habilitada na área –, a presença da disciplina apenas na etapa do Ensino Médio e com pouca carga horária em relação às demais disciplinas do currículo, as opções limitadas de material didático, a dificuldade do entendimento, por parte da comunidade escolar, da relevância da disciplina, entre outros.

Contudo, prezado acadêmico, esses desafios não devem formar imperativos que justifiquem a baixa qualidade no ensino de Sociologia. Observaremos também uma série de avanços – conquistados na busca pela qualificação do ensino da Sociologia –, como a legislação que prevê o ensino da disciplina na educação básica, a expansão dos cursos de licenciatura em Sociologia e Ciências Sociais pelo país, a tímida, mas crescente, produção de materiais didáticos.

Dito de outra forma, o reconhecimento desses fatores que configuram desafios conduziu avanços e nos auxiliará no desenvolvimento de nossa prática pedagógica e contribuirão a longo prazo no fortalecimento e qualificação do ensino de Sociologia na Educação Básica.

Para compreender esses desafios, vale lembrar três aspectos apresentados por Guimarães Neto et al. (2002), ao refletirem sobre a contribuição do ensino da Sociologia para a formação do cidadão.

O primeiro aspecto diz respeito à formação da Sociologia enquanto ciência. O campo sociológico é marcado pela multiplicidade de debates e interpretações que desafiam a conformação de campos específicos como o ensino da disciplina. Nesse contexto reside a necessidade de buscar a objetividade, no sentido de entender os conteúdos ensinados na Sociologia como conhecimento científico e a vigilância epistemológica, buscando o processo de criar estranhamentos e familiarizar-se com o estranho (GUIMARÃES NETO et al., 2012).

Vigilância epistemológica é o nome dado por Bourdieu et al. (2000) ao exercício de constante revisita a seus conceitos e métodos que cabe ao sociólogo realizar em nome da objetividade de sua análise. Também é algo importante de se fazer em qualquer exercício de ensino, na medida em que ensinar é algo que não se viabiliza senão nas condições de diálogo e da reflexão mútua que envolve professor e alunos. Da parte do professor, é fundamental que se mantenha na condição de um eterno aprendiz, evitando, assim, o engessamento das ideias e a obsolescência dos métodos de ensino (GUIMARÃES NETO et al., 2012, p. 17). 

NOTA

Page 207: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

TÓPICO 3 | TEMAS DA SOCIOLOGIA DA EDUCAÇÃO

197

O segundo aspecto remete à formação da Sociologia enquanto profissão. Decorrente da necessidade de compreender os desafios impostos pelas consequências das revoluções no século XIX, a Sociologia analisa, explica e, em alguma medida, propõe soluções à questão social.

Disso resulta que a Sociologia nunca foi apenas um saber. Além de ser uma área do conhecimento comprometida em sua natureza com a efetividade de suas descobertas, hoje bastante consolidada como um importante campo da ciência, a Sociologia também se qualifica como profissão multifacetada, cujo exercício abrange vários nichos metodológicos e, como tal, permite que a sociedade construa diferentes noções e reputações associadas ao trabalho do sociólogo (GUIMARÃES NETO et al., 2012, p. 18).

Nesse universo desvendado pela análise sociológica da realidade podemos encontrar sociólogos atuando em diversas áreas, como nos setores público e privado – inclusive no terceiro setor, em ONGs, por exemplo –, na área de planejamento e gestão de políticas públicas e, principalmente, na educação. Nesse campo sociólogo atuam como professores na Educação Básica, no Ensino Superior e também na academia, produzindo análises sociológicas, como na área da Sociologia da Educação.

Além disso, observa-se no campo de trabalho da Sociologia um fenômeno chamado de concorrência interprofissional. Esse tipo de concorrência ocorre porque se estende a profissionais formados em outras áreas, mas que ocupam postos de trabalho nas áreas descritas acima porque aliam sua formação ao desenvolvimento dessas tarefas (GUIMARÃES NETO et al., 2012).

Esse fato é resultado da interdisciplinaridade característica da Sociologia.

Toda essa longa experiência de diversidade, complexidade e interdisciplinaridade proporciona à Sociologia um lugar privilegiado para o exercício da mediação educativa. O que, doravante, chamamos de imaginação sociológica abrange modos de ler o emaranhado de situações relacionais que nos envolve cotidianamente de grande aplicabilidade na educação do indivíduo e de grupos que queremos preparar para enfrentar, de forma consciente e fundamentada, os desafios de nosso tempo (GUIMARÃES NETO et al., 2012, p. 20-21).

E, por fim, o terceiro aspecto faz referência à Sociologia como disciplina. Desde o curso criado por Émile Durkheim, na França, em 1887, até os dias de hoje, foi um longo percurso que tomou diferentes formatos até sua afirmação atual nos currículos escolares da Educação Básica e do Ensino Superior. Em termos de conteúdo, a Sociologia, da forma como a vemos nos currículos, é responsável juntamente com a Filosofia de garantir o caráter humanístico da educação e, também, de contextualizar a produção acadêmica, configurando uma espécie de conteúdo complementar à iniciação científica (GUIMARÃES NETO et al., 2012).

Prezado acadêmico! É fundamental compreender, apesar de ser tradição nos currículos do Ensino Superior, na Educação Básica, a realidade é diferente. Podemos verificar, desde o século XIX com Ruy Barbosa, tentativas de criar a

Page 208: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

UNIDADE 3 | A SOCIOLOGIA DA EDUCAÇÃO NA CONTEMPORANEIDADE

198

disciplina, o que não garantiu o sucesso ou a continuidade de sua existência. Verificamos também várias idas e vindas da disciplina no currículo escolar e também diversas construções equivocadas em relação ao conteúdo que a disciplina se propõe a contemplar.

Na República Velha, de forma mais precisa na era Vargas, a influência positivista levou o aporte moral da Sociologia para a disciplina Educação Moral e Cívica.

Essa proposta, que atingiu seu apogeu no Estado Novo, não nos parece nem um pouco adequada ao que realmente se pode esperar dos conteúdos ministrados por uma disciplina como essa. Assim confundida com o lado moral e cívico do positivismo, a Sociologia fez alguma história em nossos currículos passados, figurando predominantemente como disciplina optativa, o que inclusive aparece na primeira Lei de Diretrizes e Bases da Educação, LDB n. 4.024/61 (GUIMARÃES NETO et al., 2012, p. 22).

Na ditatura seguinte observa-se uma mudança na forma como a disciplina é considerada tanto pelo poder público, quanto pela opinião pública. De disciplina responsável por ensinar a moralidade, passa a ser combatida pelo caráter militante e pela presença, em todo mundo, do desenvolvimento da vertente marxista entre os anos 1950 e 1970. Nesse contexto, a disciplina permanece "de fora" do currículo do Ensino Médio (GUIMARÃES NETO et al., 2012).

O processo de redemocratização levou então às tentativas de reinserção da Sociologia no ensino básico.

A partir da abertura política e da retomada do caminho da democracia, começam longas discussões que resultam na nova LDB, a Lei n. 9.394/96, ao mesmo tempo que amadurece a proposta de obrigatoriedade da Sociologia como disciplina no Ensino Médio. Isto porque essa Lei determina, no artigo 36, § 1º, inciso III, que "ao fim do Ensino Médio, o educando deve apresentar domínio de conhecimentos de Filosofia e Sociologia necessários ao exercício da cidadania". Contudo, somente 12 anos depois, período em que se deu um grande debate sobre a real necessidade de se introduzir a disciplina na matriz curricular de Ensino Médio, foi sancionada a Lei n. 11.684, que alterou o artigo 36 da LDB vigente e trouxe, definitivamente, a disciplina para as escolas (GUIMARÃES NETO et al., 2012, p. 22-23).

Porém, como mencionamos anteriormente, a obrigatoriedade do ensino de Sociologia ainda representa um grande desafio quando se consideram elementos como a formação de professores na área, a produção de materiais didáticos e o reconhecimento da relevância do ensino de Sociologia no Ensino Médio – especialmente em tempos de extrema valorização do caráter técnico e profissionalizante do Ensino Médio.

A questão da cidadania é essencial para refletirmos sobre o conteúdo a ser contemplado pela Sociologia no Ensino Médio.

Page 209: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

TÓPICO 3 | TEMAS DA SOCIOLOGIA DA EDUCAÇÃO

199

Como mencionado, legalmente, a Sociologia no Ensino Médio deve se orientar contemplando conhecimentos necessários para o exercício da cidadania. Segundo a visão iluminista que funda e institui a concepção de cidadania, ser cidadão, mais que estar contido na sociedade, é, fundamentalmente, contê-la, no sentido de que o indivíduo só pode se sintonizar com essas necessidades de uma sociedade na medida em que toma consciência do todo que faz parte (GUIMARÃES NETO et al., 2012, p. 23).

De modo geral, a luta pela presença da Sociologia se confunde com a luta pela democracia e pelo direito à cidadania no decorrer da história brasileira. Como ciência da sociedade, a Sociologia sofreu com suas transformações e com os constantes golpes à democracia em nosso país. Entretanto, o ensino de Sociologia segue vital para a garantia da formação crítica e autônoma de nossa juventude.

Page 210: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

200

Neste tópico, você viu:

• Os desdobramentos da globalização marcaram de diferentes formas a estrutura social e, no que diz respeito à relação entre tecnologia e educação, conduziram processos de flexibilidade da educação, incorporação da agenda neoliberal nas práticas e currículos, a homogeneização cultural e o uso e a fé nas TICs como promotoras de educação de qualidade.

• Os avanços e desafios do ensino de Sociologia no Brasil foram marcados de forma significativa pela constante luta pela democracia em nosso país e são marcados pela busca da objetividade na Sociologia, pela profissionalização da Sociologia como profissão e pela consolidação da Sociologia como disciplina no Ensino Superior e na Educação Básica.

RESUMO DO TÓPICO 3

Page 211: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

201

AUTOATIVIDADE

1 Os desafios que configuram o ensino de Sociologia no Brasil são diversos e decorrem de múltiplos fatores que podemos compreender analisando a história da Sociologia no país. De maneira geral, podemos destacar três elementos que nos auxiliam na compreensão desse processo: a constituição da Sociologia como ciência, a Sociologia como profissão e a Sociologia como disciplina. Considerando esse contexto, classifique as sentenças usando o seguinte código:

I – Sociologia como ciência. II – Sociologia como profissão. III – Sociologia como disciplina.

( ) A redemocratização brasileira levantou a discussão a respeito do ensino de Sociologia na educação básica.

( ) O sociólogo pode atuar em diferentes áreas dos setores público e privado, porém a área com maior presença desses profissionais é na educação.

( ) A Sociologia no contexto dos currículos é responsável por promover a autonomia e o pensamento crítico, fundamentais para o exercício da cidadania.

( ) A vigilância epistemológica marca a busca pela objetividade na produção científica no campo da Sociologia.

Agora assinale a sequência CORRETA:

a) ( ) II – I – III – I. b) ( ) I – II – III – II. c) ( ) III – I – III – II. d) ( ) III – II – III – I. 2 Os debates a respeito da relação entre educação e tecnologia ganham diferentes contornos de acordo com as questões observadas, contudo podemos destacar quatro aspectos: a flexibilidade da educação, a influência do neoliberalismo, a homogeneização cultural e o uso das tecnologias da informação e comunicação (TICs). Considerando esses debates, classifique as sentenças fazendo uso do código a seguir:

I – Flexibilidade da educação. II – Influência neoliberal. III – Homogeneização cultural. IV – Uso das TICs. ( ) As TICs são consideradas ferramentas para a modernização e qualificação

do ensino.

Page 212: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

202

( ) O uso de novas tecnologias e a preparação para o mundo do trabalho levam à adequação em relação aos padrões corporativos.

( ) Fazer uso das tecnologias impõe uma flexibilização das atividades desenvolvidas na escola visando a preparação para o trabalho.

( ) Observa-se um processo de unificação do currículo visando a construção de um conhecimento oficial adequado às expectativas do mercado de trabalho.

Agora assinale a alternativa que apresenta a sequência CORRETA:

a) ( ) II – III – IV – I. b) ( ) IV – II – I – III. c) ( ) I – II – III – IV. d) ( ) III – IV – II – I.

Page 213: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

203

REFERÊNCIAS

ADORNO, Thedor. Educação e emancipação. Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1995.

ADORNO, Theodor W; HORKHEIMER, Max. Dialética do esclarecimento: fragmentos filosóficos. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1985.

ALTHUSSER, Louis. Ideologia e aparelhos ideológicos do estado. Lisboa: Editorial Presença, 1974.

ARAIA, Roque de Barros. Cultura um conceito antropológico. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed. 1986.

ARON, Raymond. As etapas do pensamento sociológico. Martins fontes: São Paulo, 2008.

ARON, Raymond. As etapas do pensamento sociológico. 5. ed. São Paulo: Martins Fontes, 1999.

BAUMAN, Zygmunt; MAY, Tim. Aprendendo a pensar com a sociologia. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 10. ed., 2010.

BERGER, Peter I. Perspectivas sociológicas – uma visão humanística. Petrópolis: Vozes, 3. ed. 1976.

BERRÉRE, Anne; SEMBEL, Nicolas. Sociologia da escola. São Paulo: Edições Loyola, 2006.

BONETI, Lindomar Wessler. Sociologia da educação. Curitiba: Camões, 2008.

BOTTOMORE, Tom B. Introdução à sociologia. 9. ed. Rio de Janeiro: Guanabara, 1987.

BOURDIEU, Pierre. A economia das trocas simbólicas. São Paulo: Perspectiva, 2005.

BOURDIEU, Pierre. A distinção: crítica social do julgamento. São Paulo: EDUSP; Porto Alegre: Zouk, 2008.

BOURDIEU, Pierre. O poder simbólico. Tradução de Fernando Tomaz. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 1989.

BOURDIEU, Pierre; PASSERON, Jean-Claude. A reprodução: elementos para uma teoria do sistema de ensino. Rio de Janeiro: F. Alves, 1975.

BURKE, Peter. Uma história social do conhecimento: de Gutenberg a Diderot. 1. ed. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2003.

Page 214: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

204

CALDAS, Waldenyr. O que todo cidadão precisa saber sobre a cultura de massa política de comunicações. São Paulo: Global, 1987.

CANDAU, Vera Maria Ferrão. Sociedade, cotidiano escolar e cultura(s): uma aproximação. Educ. Soc., Campinas, v. 23, n. 79, p. 125-161, Aug. 2002. Available from <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0101-73302002000300008&lng=en&nrm=iso>. Acesso em: 28 mar. 2018.

CANEN, Ana; OLIVEIRA, Angela M. A. de. Multiculturalismo e currículo em ação: um estudo de caso. Rev. Bras. Educ., Rio de Janeiro, n. 21, p. 61-74, Dec. 2002 . Available from <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1413-24782002000300006&lng=en&nrm=iso>. Acesso em: 1 maio 2018.

CASTRO, Ana Maria de; DIAS, Edmundo Fernandes de. Introdução ao pensamento sociológico: Durkheim, Weber, Marx e Parsons. 18. ed. São Paulo: Centauro, 2005.

CERTEAU, M. A cultura no plural. 2. ed. São Paulo: Papirus, 1995.

CEVASCO, Maria Eliza. As dez lições sobre os estudos culturais. São Paulo: Boitempo Editorial, 2003.

CHIBENI, S. S. O que é ciência? Campinas: Unicamp, 2004.

COELHO, Teixeira. O que é indústria cultural. Col. Primeiros passos, 8, 16. ed. São Paulo: Brasiliense, 1996.

COHN, Gabriel. Sociologia: para ler os clássicos. Rio de Janeiro: Livros Técnicos e Científicos, 1977.

COMTE, Auguste. Curso de filosofia positiva. São Paulo: Nova Cultural, 1988.

CUCHE, Dennys. A noção de cultura nas ciências sociais. Bauru: EDUSC, 1999.

CUCHE, Denys. A noção de cultura nas ciências sociais. Bauru: EDUSC, 1999.

DAYRELL, J. Múltiplos olhares sobre educação e cultura. Belo Horizonte: UFMG, 1999. DIAS, Reinaldo. Introdução à sociologia. São Paulo: Pearson Prentice Hall, 2005.

DOMINGUES, José Maurício. Estruturismo e estruturação: Bourdieu e Giddens. In: Teorias sociológicas no século XX. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2001, cap. 4, p. 55-69.

DURKHEIM, Émile. As regras do método sociológico. 3. ed. Traduzido por Paulo Neves. São Paulo: Martins Fontes, 2007.

Page 215: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

205

DURKHEIM, Émile. Da divisão do trabalho social; as regras do método sociológico; o suicídio; as formas elementares da vida religiosa. Seleção de textos de José Arthur Giannotti; tradução de Carlos Alberto Ribeiro de Moura. Os Pensadores – 2. ed. São Paulo: Abril Cultural, 1983.

EAGLETON, Terry. A ideia de cultura. São Paulo: Ed. Unesp, 2005.

ENGELS, Friedrich. Anti-Dühring. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1990.

ESCOSTEGUY, Ana C. D. Cartografias dos estudos culturais: uma versão latino-americana. Belo Horizonte: Ed. Autêntica, 2001.

ESCOSTEGUY, Ana C. D. Uma introdução aos estudos culturais. Revista FAMECOS. n. 9, Porto Alegre, dezembro de 1998.

ESTEBAN, Maria Teresa, Sala de Aula – dos lugares fixos aos entrelugares fluidos. Revista Portuguesa de Educação [on-line] 2006, 19. Disponível em: <http://www.redalyc.org/articulo.oa?id=37419202>. Acesso em: 9 jan. 2017.

FLEURI, Reinaldo Matias. Intercultura e educação. In: Revista Brasileira de Educação, nº 23. Maio/Jun/Jul/Ago, 2003. p. 16-35.

FONSECA, João José Saraiva da. Metodologia da pesquisa científica. Fortaleza: UEC, 2002.

FREIRE-MAIA, Newton. A ciência por dentro. 5. ed. Rio de Janeiro: Vozes, 1998.

FREUND, Julien. Sociologia de Max Weber. 5. edição. Rio de Janeiro: Forense Universitária: 2003.

FREUND, Julien. Sociologia de Max Weber. 4. ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1987.

GADOTTI, Moacir. Perspectivas atuais da educação. Porto Alegre: Artes Médicas; 2000.

GESTRADO. (2018). Disponível em: <http://www.gestrado.net.br/?pg=dicionario-verbetes&id=141>. Acesso em: 2 maio 2018.

GIDDENS, Anthony. A terceira via: reflexões sobre o impasse político atual e o futuro da socialdemocracia. 4. ed. Rio de Janeiro: Record, 2001a.

GIDDENS, Anthony. A terceira via e seus críticos. Rio de Janeiro: Record, 2001b

GIDDENS, Anthony. As consequências da modernidade. São Paulo: Editora Unesp, 1991.

GIDDENS, Anthony. Educação. In: Sociologia. 4. ed. Porto Alegre: Artmed, 2001c, p. 396-424.

Page 216: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

206

GIDDENS, Anthony. Modernidade e identidade. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2002.

GIDDENS, Anthony. Sociologia. 4. ed. rev. e atual. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 2004.

GOHN, Maria da Glória. Educação não formal, participação da sociedade civil e estruturas colegiadas nas escolas. Ensaio: aval. pol. públ. Educ., Rio de Janeiro, v. 14, n. 50, p. 27-38, jan./mar. 2006. Disponível em: <http://www.scielo.br/pdf/ensaio/v14n50/30405/>. Acesso em: 16 jan. 2018.

GOMES, Candido A. C. Enfoques teóricos em sociologia da educação. I- O paradigma do consenso. Forum educ. Rio de Janeiro, abr./jun. 1983. Disponível em: <http://bibliotecadigital.fgv.br/ojs/index.php/fe/article/viewFile/60672/58911>. Acesso em: 21 fev. 2018.

GONÇALVES, Luiz Alberto Oliveira; SILVA, Petronilha Beatriz Gonçalves. O jogo das diferenças: o multiculturalismo e seus contextos. Belo Horizonte: Autêntica, 2000.

GROPPO, Luís António; MARTINS, Marcos Francisco. Terceira Via e políticas educacionais: um novo mantra para a educação. Revista Brasileira de Política e Administração da Educação – Periódico científico editado pela ANPAE, [S.l.], v. 24, n. 2, mar. 2011. ISSN 2447-4193. Disponível em: <http://seer.ufrgs.br/index.php/rbpae/article/view/19251>. Acesso em: 1 mar. 2018.

GUIMARÃES NETO, Euclides; ASSIS, Marco Arcanjo de; GUIMARÃES, José Luiz Braga. Educar pela sociologia: contribuições para a formação do cidadão. Belo Horizonte: RHJ, 2012.

GUIMARÃES NETO, Euclides; ASSIS, Marcos Arcanjo de; GUIMARÃES, José Luis Braga. Educar pela sociologia: contribuições para a formação do cidadão. Belo Horizonte: RHJ, 2002.

HABERMAS, J.: Modernidade – um projeto inacabado. In: ARANTES, O.; ARANTES, P.: Um ponto cego no projeto moderno de Jürgen Habermas. SP. Brasiliense. 1992.

HABERMAS, Jürgen. Técnica e ciência como ideologia. Tradução de Artur Morão. Lisboa: Edições 70, 1968.

HALL, Stuart. A centralidade da cultura: notas sobre as revoluções culturais do nosso tempo. Educação & Realidade, Porto Alegre, v. 22, n. 2, p. 15-46, jul./dez. 1997.

HALL, Stuart. A identidade cultural na pós-modernidade. Rio de Janeiro: DP&A, 1999.

HALL, Stuart. A questão multicultural. In: Da diáspora. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2003.

Page 217: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

207

HALL, Stuart. Quem precisa da identidade? In: T. T. da Silva (Ed.), Identidade e diferença: a perspectiva dos estudos culturais. 3. ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 2015.HOBSBAWM, Eric J. Era dos extremos: o breve século XX:1914-1991. São Paulo: Companhia das Letras, 1995.

HOBSBAWM, Eric J. A era dos impérios: 1875-1914. 2. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1989.

HUNGER, Dagmar; ROSSI, Fernanda; SOUZA NETO, Samuel de. A teoria de Norbert Elias: uma análise do ser professor. Educ. Pesqui., São Paulo, v. 37, n. 4, p. 697-710, Dec. 2011. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1517- Acesso em: 22 fev 2018.

IANNI, Octávio. A era do globalismo. 2. ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1996.

JAPIASSU e MARCONDES. Dicionário de filosofia. 3. ed. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2001.

JAPIASSU, Hilton; MARCONDES, Danilo. Dicionário básico de filosofia. 3. ed. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2001.

JESUS, Antonio Tavares de. A educação como hegemonia no pensamento de Antonio Gramsci. Dissertação de mestrado. Campinas, SP: [s. n.], 1985. Disponível em: http://repositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/252657/1/Jesus_AntonioTavaresde_M.pdf. Acesso em 15 fev. 2018.

JULIA, D. A cultura escolar como objeto histórico. In: Revista Brasileira de História da Educação, Campinas, n. 1, p. 09-44, jan./jun. 2001.

KALBERG, Stephen. Max Weber: uma introdução. Rio de Janeiro: Zahar, 2010.

KENSKI, Vani Moreira. Educação e tecnologias: o novo ritmo da informação [livro eletrônico]. Campinas, SP: Papirus, 2015.

KUHN, Thomas S. A estrutura das revoluções científicas. 5. ed. São Paulo: Perspectiva, 1997.

LAKATOS, E. M.; MARCONI, M. A. Metodologia científica. 2. ed. São Paulo: Atlas, 1995.

LAKATOS, Eva Maria; MARCONI, Marina de Andrade. Sociologia geral. 6. ed., rev. e ampl. São Paulo: Atlas, 1990.

LARAIA, Roque de Barros. Cultura: um conceito antropológico. Zahar. Rio de Janeiro, 1986.

LEÃO, Andréa Borges Leão. Norbert Elias & a educação. Belo Horizonte: Autêntica, 2007.

Page 218: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

208

LENOIR, Remi. Objeto sociológico e problema social. In: CHAMPAGNE, Patrick; LENOIR, Remi; MERLLIÉ, Dominique; PINTO, Louis. Iniciação à prática sociológica. Petrópolis: Vozes, 1998. p. 50-106.

LOPES, Paula. Educação, sociologia da educação e teorias sociológicas clássicas: Marx, Durkheim e Weber. Universidade de Lisboa, 2012.

LOWY, Michael. Ideologias e ciência social: elementos para uma análise marxista. São Paulo: Cortez Ed., 1985.

MANNHEIM, Karl. Funções das gerações novas. In: Pereira, L.; Foracchi, M. M. Educação e Sociedade. São Paulo: Companhia Editora Nacional, 1976.

MANNHEM, Karl; STEWART, W. A. C. Introdução à sociologia da educação. São Paulo: Cultrix, 1972.

MARTINS, Carlos B. (Carlos Benedito). O que é sociologia. 44. ed. São Paulo: Brasiliense, 1994.

MARX, K.; ENGELS, F. Manifesto comunista. São Paulo: Boitempo, 1998.

MARX, K.; ENGELS, F. Textos sobre educação e ensino. São Paulo: Moraes, 1983.

Marx, Karl. Crítica da educação e do ensino. Lisboa: Moraes, 1978.

MARX, Karl. O capital: crítica da economia política. 2. ed. São Paulo: Nova Cultural, 1985. 3 v.

MINAYO, Maria Cecília de Souza (Org.). Pesquisa social. Teoria, método e criatividade. 18 ed. Petrópolis: Vozes, 2001.

MOREIRA, A. F. B.; CÂMARA, M. J. Reflexões sobre currículo e identidade: implicações para a prática pedagógica. In: MOREIRA, Antônio Flávio; CANDAU, Vera Maria (Org.). Multiculturalismo: diferenças culturais e práticas pedagógicas. Petrópolis: Vozes, 2008. p. 38- 66.

NERY, Maria Clara Ramos. Sociologia da educação [livro eletrônico]. Curitiba: InterSaberes, 2013.

NOGUEIRA, Cláudio Marques Martins; NOGUEIRA, Maria Alice. A sociologia da educação de Pierre Bourdieu: limites e contribuições. Educ. Soc., Campinas, v. 23, n. 78, p. 15-35, Apr. 2002. Available from <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0101-73302002000200003&lng=en&nrm=iso>. Acesso em: 20 fev. 2018.

OLIVEIRA, Pérsio Santos. Introdução à sociologia. 20. ed. São Paulo: Moderna, 2001.

ORTIZ, Renato. Estudos culturais. Tempo soc., São Paulo, v. 16, n. 1, p. 119-127, June 2004. Available from: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0103-20702004000100007&lng=en&nrm=iso>. Acesso em: 27 mar. 2018.

Page 219: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

209

PEREIRA, Maria de Fátima Rodrigues. Trabalho e educação: uma perspectiva histórica [livro eletrônico]. Curitiba: InterSaberes, 2012.

PERRENOUD, Philippe. A pedagogia na escola das diferenças: fragmentos de uma sociologia do fracasso. Porto Alegre: Artmed, 2001.

PIERUCCI, Antônio Flávio. Secularização em Max Weber: Da contemporânea serventia de voltarmos a acessar aquele velho sentido. Rev. bras. Ci. Soc., São Paulo, v. 13, n. 37, p. 43-73, June 1998. Available from <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0102-69091998000200003&lng=en&nrm=iso>. Acesso em: 20 mar. 2018.

PILETTI, Nelson. Sociologia da educação. São Paulo: Editora Ática, 2004.

PILETTI, Nelson; PRAXEDES, Walter. Sociologia da educação. São Paulo: Ática, 2010.

PINTO, José Marcelino de Rezende. A teoria da ação comunicativa de Jürgen Habermas: conceitos básicos e possibilidades de aplicação à administração escolar. Paideia (Ribeirão Preto), Ribeirão Preto, n. 8-9, p. 77-96, Aug. 1995. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0103-863X1995000100007&lng=en&nrm=iso>. Acesso em: 21 fev. 2018.

PORCHEDDU, Alba. Zygmunt Bauman: entrevista sobre a educação. Desafios pedagógicos e modernidade líquida. Cad. Pesqui., São Paulo, v. 39, n. 137, p. 661-684, Aug. 2009. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0100-15742009000200016&lng=en&nrm=iso>. Acesso em: 22 fev. 2018.

PRAXEDES, Walter. A diversidade humana na escola: reconhecimento, multiculturalismo e tolerância. Revista Espaço Acadêmico. Nº 42, Ano IV, nov., 2004. Disponível em: Acesso em: 28 mar. 2018.

PUCCI, Bruno. Teoria crítica e educação: contribuições da teoria crítica para a formação do professor. Espaço Pedagógico, v. 8, p. 13-30, 2001. Disponível em: <http://www.unimep.br/~bpucci/teoria-critica-e-educacao.pdf>. Acesso em: 19 fev. 2018.

QUINTANEIRO, Tânia; BARBOSA, Maria L. de; OLIVEIRA, Márcia G. M. de. Um toque de clássicos: MARX, DURKHEIM, WEBER, 2. ed. Belo Horizonte: UFMG, 2003.

QUIVY, Raymond; COMPENHOUDT, Luc van. Manual de investigação em ciências sociais. 2. ed. Lisboa: Gradiva, 1998.

RIBEIRO, Luci Silva. Processo e figuração: um estudo sobre a sociologia de Norbert Elias. Tese (doutorado). Campinas, SP: [s. n.], 2010.

ROBLE, Odilon. Escola e sociedade. Curitiba: IESDE Brasil S. A., 2008.

RODRIGUES, Alberto Tosi. Sociologia da educação. Rio de Janeiro: Lamparina, 2007.

Page 220: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

210

RODRIGUES, Neidson. Educação: da formação humana à construção do sujeito ético. Educ. Soc., Campinas, v. 22, n. 76, p. 232-257, Oct. 2001. Available from <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0101-73302001000300013&lng=en&nrm=iso>. Access on: 20 mar. 2018.

RUBIM, Antônio Albino Canelas. Políticas culturais: entre o possível e o impossível. In: Nussbaumer, Gisele Marchiori (Org.). Teorias e políticas da cultura: visões multidisciplinares. Salvador: EDUFBA, 2007.

SANTIAGO, Homero. Adorno, Auschwitz e a esperança na educação. Cadernos de Ética e Filosofia Política 6, 1/2005, pp. 111-122. Disponível em: <http://bib.praxis.ufsc.br:8080/xmlui/bitstream/handle/praxis/362/adorno.pdf?sequence=1>. Acesso em: 23 fev. 2018.

SANTOS, Boaventura de Sousa. Reconhecer para libertar: os caminhos do cosmopolitismo multicultural. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2003.

SANTOS, Wildson Luiz Pereira dos; MORTIMER, Eduardo Fleury. Uma análise de pressupostos teóricos da abordagem C-T-S (Ciência - Tecnologia - Sociedade) no contexto da educação brasileira. ENSAIO - Pesquisa em Educação em Ciências. Volume 2/Número 2 - Dezembro 2002. Disponível em: <http://ufpa.br/ensinofts/artigos2/wildsoneduardo.pdf>. Acesso em: 27 abr. 2018.

SANTOS, Wildson Luiz Pereira dos; MORTIMER, Eduardo Fleury. Uma análise de pressupostos teóricos da abordagem C-T-S (Ciência – Tecnologia – Sociedade) no contexto da educação brasileira. Ensaio Pesquisa em Educação em Ciências, vol. 2, núm. 2, dez. 2000, pp. 1-23. Disponível em: <http://www.redalyc.org/pdf/1295/129518326002.pdf>. Acesso em: 19 mar. 2018.

SARMENTO, Manuel Jacinto. Gerações e alteridade: interrogações a partir da sociologia da infância. Educ. Soc., Campinas, v. 26, n. 91, p. 361-378, Aug. 2005. Available from: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0101-73302005000200003&lng=en&nrm=iso>. Access on: 20 mar. 2018.

SAVIANI, Demerval. Florestan Fernandes e a educação. Estudos Avançados 10 (26), 1996. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0103-40141996000100013>. Acesso em: 8 mar. 2018.

SCHAEFER, Sérgio. A lógica dialética: um estudo da obra filosófica de Caio Prado Júnior. Porto Alegre, Movimento, 1985.

SEMPRINI, Andréa. Multiculturalismo. Bauru: Edusc, 1999.

SEMPRINI, Andrea. Multiculturalismo. Tradução de Laureano Pelegrin. São Paulo: EDUSC, 1999.

SILVA, Maria José Albuquerque da; BRANDIM, Maria Rejane Lima. Multiculturalismo e educação: em defesa da diversidade cultural. Diversa: Ano I, nº 1, pp. 51-66, jan./jun. 2008.

Page 221: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

211

Silva, T. T. da. A produção social da identidade e da diferença. In T. T. da Silva (Ed.), Identidade e diferença: a perspectiva dos estudos culturais. 3. ed. Petrópolis, RJ: Vozes. 2004, p. 73-102.

SILVA, Tomaz Tadeu da (Org.). Identidade e diferença. A perspectiva dos Estudos Culturais. Petrópolis, Vozes, 2007.

SKLAIR, Leslie. Globalização. In: SCOTT, John (Org.). Sociologia: conceitos-chave. Rio de Janeiro: Zahar, 2010

SOUZA, João Valdir Alves de. Introdução à sociologia da educação. Belo Horizonte: Autêntica Editora, 2015.

SPOSITO, Marilia Pontes. Uma perspectiva não escolar no estudo sociológico da escola. REVISTA USP, São Paulo, n. 57, p. 210-226, março/maio 2003.

SZTOMPKA, Piotr. A sociologia da mudança social. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1998.

THIRY-CHERQUES, Hermano Roberto. Pierre Bourdieu: a teoria na prática. Rev. Adm. Pública, Rio de Janeiro, v. 40, n. 1, p. 27-53, Feb. 2006. Available from: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0034-76122006000100003&lng=en&nrm=iso>. Access on: 20 mar. 2018.

TOMAZI, Nelson Dacio et al. Iniciação à sociologia. São Paulo: Atual, 1993.Torres, Carlos Alberto. Democracia, Educação e Multiculturalismo. Petrópolis: Ed. Vozes, 2001.

TORRES, Carlos Alberto. Multiculturalismo. In: Democracia, educação e multiculturalismo: dilemas da cidadania em um mundo globalizado. Petrópolis – RJ: Vozes, 2001. p. 195-245.

VALLE, I. R. O lugar da educação (escolar) na sociologia de Pierre Bourdieu. Rev. Diálogo Educ., Curitiba, v. 13, n. 38, p. 411-437, jan./abr. 2013. Disponível em: <http://www2.pucpr.br/reol/pb/index.php/dialogo?dd1=7629&dd99=view&dd98=pb>. Acesso em: 20 fev. 2018.

VIANA, Nildo. Marx e a educação. Estudos (Goiânia), Goiânia, v. 31, n. 3, p. 543-566, 2004.

WACQUANT, Loïc. Mapear o campo artístico. Sociologia, problemas e práticas, Oeiras, n. 48, p. 115-121, maio, 2005. Disponível em: <http://www.scielo.mec.pt/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0873-65292005000200008&lng=pt&nrm=iso>. Acessos em: 29 mar. 2018.

WEBER, Max. A “objetividade” do conhecimento na ciência social e na ciência política, In: Metodologia das ciências sociais. 4. ed. São Paulo: Editora da Universidade Estadual de Campinas, 2001.

Page 222: Sociologia da Educação - UNIASSELVI

212

WEBER, Max. A ética protestante e o “espírito” do capitalismo. São Paulo: Companhia das letras, 2004.

WEBER, Max. A objetividade do conhecimento na ciência social e na ciência política. In: Metodologia das ciências sociais. 4. ed. São Paulo: Editora da Universidade Estadual de Campinas, 2001.

WEBER, Max. Conceitos básicos de sociologia. São Paulo: Centauro, 2002.

WEBER, Max. Economia e sociedade: fundamentos da sociologia compreensiva. Editora Universidade de Brasília, 1991. v. 1.

WEBER, Max. Ensaios de sociologia. 5. ed. Rio de Janeiro: Zahar, 1982.

WELLER, Wivian. A atualidade do conceito de gerações de Karl Mannheim. Soc. estado. Brasília, v. 25, n. 2, p. 205-224, Aug. 2010. Available from: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0102-69922010000200004&lng=en&nrm=iso>. Access on: 17 Apr. 2018.

WILLIAMS, Raymond. Cultura e sociedade: 1780-1950. São Paulo: Comp. Ed. Nacional, 1969.

WILLIAMS, Raymond. Palavras-chave: um vocabulário de cultura e sociedade.1. ed. São Paulo: Boitempo, 2007.

WOODWARD, Kathryn. Identidade e diferença: uma introdução teórica e conceitual. In: SILVA, Tomaz Tadeu da; WOODWARD, Kathryin; HALL, Stuart. Identidade e diferença. 15. ed. Petrópolis: Vozes, 2015.

YÚDICE, George. A conveniência da cultura: usos da cultura na era global. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2006. p. 615.

ZAMBEL, Luciana; LASTÓRIA, Luiz Antônio Nabuco. Educação e emancipação em T. W. Adorno: contribuições para a formação de professores. Revista Ibero-Americana de Estudos em Educação, v. 11, n. 4, p. 2205-2218, 2016. Disponível em: <http://seer.fclar.unesp.br/iberoamericana/article/viewFile/8794/6054>. Acesso em: 21 fev. 2018.