direito civil iii - contratos

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Princípios 1. Introdução: contrato é um acordo de vontades comuns e concordantes, assentado na lei, realizado com o objetivo de adquirir, resguardar, transferir, conservar, modificar ou extinguir direitos. O contrato cria força vinculante e oferece ao credor o direito de ação, para procurar, em juízo, a prestação em es- pécie ou o seu equivalente. 2. Função social do contrato: A função social do contrato serve para limitar a autonomia da vonta- de, quando essa autonomia estiver em confronto com o interesse social e este deva prevalecer (art. 421 do Código Civil). Essa limitação poderá atingir a própria liberdade de não contratar, como ocorre nas hipóteses de contrato obrigatório. Enuncia a regra do art. 421 que o contrato não deve atentar contra o conceito da justiça comutativa, preva- lecendo os princípios condizentes com a ordem pública. Há, portanto, uma conexão direta entre a função social que toda propriedade deve cumprir, princípio existente na Constituição Federal e esse enunciado da lei civil, a permitir a rescisão do con- trato lesivo, anular a avença celebrada em estado de perigo, combater o enriquecimento sem causa etc. O legislador atentou, aqui, para a acepção mais moderna da função do contrato, que não é a de ex- clusivamente atender os interesses das partes con- tratantes, como se ele tivesse existência autônoma, fora do mundo que o cerca. Hoje o contrato é visto como parte de uma realidade maior e como um dos fatores de alteração da realidade social. Essa constatação tem, como conseqüência possibilitar que terceiros, que não são propriamente partes do contrato, possam nele influir, em razão de serem direta ou indiretamente por ele atingidos. 3. Princípio da obrigatoriedade: o ordenamento jurídico estatui que o acordo estipulado regularmen- te tem força obrigatória para os que o celebram. A autonomia da vontade legitima a manifestação das partes, as quais podem livremente estabelecer suas vontades e, uma vez estabelecidas, o contrato torna-se de observância obrigatória. Os limites da autonomia da vontade, entretanto, encontram-se no respeito à ordem pública. O negócio jurídico cons- titui verdadeira lei entre as partes e seu conteúdo não poderá ser alterado – nem mesmo judicialmen- te. Somente poderá ser alterado pelas mesmas vontades que constituíram a obrigação, ou seja, por ambas as vontades, ou no caso de ocorrência de caso fortuito, ou força maior. Todavia admite-se, ex- cepcionalmente, que o contrato tenha este princípio tornado mais fraco, diante do advento de circunstâncias que tornem excessivamente oneroso o cumprimento da obrigação contratual. 4. Princípio consensualista: os contratos, não apenas obrigatoriamente, devem ser cumpridos, mas, como o contrato é uma expressão do acordo de vontade das partes, têm igual força cogente. O contrato nasce do consenso dos interessados, já que a vontade das partes é a entidade geradora. Somente por exceção conserva- ram-se algumas hipóteses de contratos reais e formais, para cuja celebração exige-se a tradição da coisa e a observância de certas formalidades. 5. Princípio da boa-fé objetiva: dispõe o Código Civil, em seu art. 422 que os contratantes são obrigados a guardar, assim, na conclusão do contrato, como em sua execução, os princípios da probidade e boa-fé. Esse princípio é incidente sobre todas as relações jurídicas na sociedade, consubstanciando cláusula geral de ob- servância obrigatória, que contém um conceito jurídico indeterminado, concretizando-se segundo as peculiari- dades do caso concreto. A boa-fé objetiva não respeita o estado mental subjetivo do agente, mas sim ao seu com- portamento em determinada relação jurídica de coope- ração. O seu conteúdo é um padrão de conduta, varian- do de acordo com o tipo de relação existente entre os contratantes. Assim, os contratantes deverão agir com lealdade e confiança recíprocas, fornecendo auxílio uns aos outros, tratando-se com honestidade na prestação de informações e intenções, tanto na formação quanto na execução do contrato. O dever jurídico de abstenção de prejudicar, notório na boa-fé subjetiva, é transforma- do na boa-fé objetiva em dever de cooperar. 6. Autonomia da vontade: é a faculdade que têm as pessoas de firmar livremente os seus contratos. Existe a liberdade de contratar e de não contratar. Esse princípio é um tanto relativo, porque, não existe norma genérica que imponha a uma pessoa a celebração de contratos, a não ser em circunstâncias de extrema excepcionali- dade. A vida em sociedade exige freqüentemente a realização de contratos, que vão desde atos singelos (tomar um café) até atos de bem maior complexidade. Além disso, a liberdade de contratar implica a escolha da pessoa a quem contratar, bem como do tipo de ne- gócio a efetuar. Mas o poder de ação individual também não é absoluto, porque, às vezes, não é possível esco- lher livremente o outro contratante, como no caso dos contratos por adesão ou quando um serviço público é prestado sob a forma de monopólio (por exemplo: para ter-se energia elétrica em residência, existe apenas a possibilidade de contratar com uma única empresa). A liberdade de contratar também reflete o poder de as partes fixarem o conteúdo de cada uma das cláu- sulas do contrato, de acordo com a vontade delas. Porém a lei, normatizando certos contratos, impõe aos contratantes a estrutura legal do espécime con- tratual. Mas isso não impede que as partes também firmem contratos atípicos, conforme estatui o art. 425 do Código Civil. 7. Requisitos de validade dos contratos O primeiro requisito é a capacidade das partes, que devem emitir uma vontade válida. Mas não se re- quer apenas capacidade genérica, cujas restrições constam dos arts. 3º e 4º do Código Civil. É preci- so que as partes tenham aptidão específica para contratar, ou seja, que não tenham restrições para contratar. Somente assim a parte poderá consentir. Quando ao objeto contratual, os requisitos do con- trato são a sua possibilidade física ou jurídica, sua licitude, sua determinação e sua economicidade. Ele é impossível quando é insuscetível de realiza- ção, tanto material quanto juridicamente. Algo pode ser materialmente realizável, mas juridicamente impossível (por exemplo, comprar dois quilos de cocaína para consumo pessoal). O objeto deverá ser também determinado ou, ao menos, determiná- vel, para que a obrigação do devedor tenha sobre o que incidir. Igualmente, a prestação deve ser afe- rível economicamente. Quanto à forma, em regra, os contratos são firmados pelo simples acordo de vontades, independentemente de qualquer maneira que essas revistam. Podem ser verbais, por escrito, expressos ou mesmo tácitos. Excepcionalmente, porém, a lei exige para a eficácia de alguns contra- tos a observância de certa forma. 8. Ineficácia: contrato ineficaz é aquele que deixa de produzir efeitos. A ineficácia pode ser, além de formal ou material, originária ou posterior à forma- ção do contrato. LINK ACADÊMICO 1 Formação do contrato Trata-se da fixação exata do momento em que se dá o acordo das vontades. A declaração poderá ser expressa, por qualquer meio, ou tácita, quando a lei não exigir expressa, conforme o art. 432 do Código. A proposta e a aceitação são requisitos essenciais da formação do contrato e, acerca dessas, existirá a discussão sobre a força obrigatória do contrato, sobre o exato momento em que as vontades são firmadas e, também, sobre o local em que se consi- derará formado o contrato. A primeira fase de formação contratual consiste DIREITO CIVIL CONTRATOS 1

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Page 1: Direito Civil III - Contratos

Princípios

1. Introdução: contrato é um acordo de vontades comuns e concordantes, assentado na lei, realizado com o objetivo de adquirir, resguardar, transferir, conservar, modifi car ou extinguir direitos. O contrato cria força vinculante e oferece ao credor o direito de ação, para procurar, em juízo, a prestação em es-pécie ou o seu equivalente.

2. Função social do contrato: A função social do contrato serve para limitar a autonomia da vonta-de, quando essa autonomia estiver em confronto com o interesse social e este deva prevalecer (art. 421 do Código Civil). Essa limitação poderá atingir a própria liberdade de não contratar, como ocorre nas hipóteses de contrato obrigatório. Enuncia a regra do art. 421 que o contrato não deve atentar contra o conceito da justiça comutativa, preva-lecendo os princípios condizentes com a ordem pública. Há, portanto, uma conexão direta entre a função social que toda propriedade deve cumprir, princípio existente na Constituição Federal e esse enunciado da lei civil, a permitir a rescisão do con-trato lesivo, anular a avença celebrada em estado de perigo, combater o enriquecimento sem causa etc. O legislador atentou, aqui, para a acepção mais moderna da função do contrato, que não é a de ex-clusivamente atender os interesses das partes con-tratantes, como se ele tivesse existência autônoma, fora do mundo que o cerca. Hoje o contrato é visto como parte de uma realidade maior e como um dos fatores de alteração da realidade social. Essa constatação tem, como conseqüência possibilitar que terceiros, que não são propriamente partes do contrato, possam nele infl uir, em razão de serem direta ou indiretamente por ele atingidos.

3. Princípio da obrigatoriedade: o ordenamento jurídico estatui que o acordo estipulado regularmen-te tem força obrigatória para os que o celebram. A autonomia da vontade legitima a manifestação das partes, as quais podem livremente estabelecer suas vontades e, uma vez estabelecidas, o contrato torna-se de observância obrigatória. Os limites da autonomia da vontade, entretanto, encontram-se no respeito à ordem pública. O negócio jurídico cons-titui verdadeira lei entre as partes e seu conteúdo não poderá ser alterado – nem mesmo judicialmen-te. Somente poderá ser alterado pelas mesmas vontades que constituíram a obrigação, ou seja, por ambas as vontades, ou no caso de ocorrência de caso fortuito, ou força maior. Todavia admite-se, ex-cepcionalmente, que o contrato tenha este princípio

tornado mais fraco, diante do advento de circunstâncias que tornem excessivamente oneroso o cumprimento da obrigação contratual.

4. Princípio consensualista: os contratos, não apenas obrigatoriamente, devem ser cumpridos, mas, como o contrato é uma expressão do acordo de vontade das partes, têm igual força cogente. O contrato nasce do consenso dos interessados, já que a vontade das partes é a entidade geradora. Somente por exceção conserva-ram-se algumas hipóteses de contratos reais e formais, para cuja celebração exige-se a tradição da coisa e a observância de certas formalidades.

5. Princípio da boa-fé objetiva: dispõe o Código Civil, em seu art. 422 que os contratantes são obrigados a guardar, assim, na conclusão do contrato, como em sua execução, os princípios da probidade e boa-fé. Esse princípio é incidente sobre todas as relações jurídicas na sociedade, consubstanciando cláusula geral de ob-servância obrigatória, que contém um conceito jurídico indeterminado, concretizando-se segundo as peculiari-dades do caso concreto. A boa-fé objetiva não respeita o estado mental subjetivo do agente, mas sim ao seu com-portamento em determinada relação jurídica de coope-ração. O seu conteúdo é um padrão de conduta, varian-do de acordo com o tipo de relação existente entre os contratantes. Assim, os contratantes deverão agir com lealdade e confi ança recíprocas, fornecendo auxílio uns aos outros, tratando-se com honestidade na prestação de informações e intenções, tanto na formação quanto na execução do contrato. O dever jurídico de abstenção de prejudicar, notório na boa-fé subjetiva, é transforma-do na boa-fé objetiva em dever de cooperar.

6. Autonomia da vontade: é a faculdade que têm as pessoas de fi rmar livremente os seus contratos. Existe a liberdade de contratar e de não contratar. Esse princípio é um tanto relativo, porque, não existe norma genérica que imponha a uma pessoa a celebração de contratos, a não ser em circunstâncias de extrema excepcionali-dade. A vida em sociedade exige freqüentemente a realização de contratos, que vão desde atos singelos (tomar um café) até atos de bem maior complexidade. Além disso, a liberdade de contratar implica a escolha da pessoa a quem contratar, bem como do tipo de ne-gócio a efetuar. Mas o poder de ação individual também não é absoluto, porque, às vezes, não é possível esco-lher livremente o outro contratante, como no caso dos contratos por adesão ou quando um serviço público é prestado sob a forma de monopólio (por exemplo: para ter-se energia elétrica em residência, existe apenas a possibilidade de contratar com uma única empresa). A liberdade de contratar também refl ete o poder de as

partes fi xarem o conteúdo de cada uma das cláu-sulas do contrato, de acordo com a vontade delas. Porém a lei, normatizando certos contratos, impõe aos contratantes a estrutura legal do espécime con-tratual. Mas isso não impede que as partes também fi rmem contratos atípicos, conforme estatui o art. 425 do Código Civil.

7. Requisitos de validade dos contratos

O primeiro requisito é a capacidade das partes, que devem emitir uma vontade válida. Mas não se re-quer apenas capacidade genérica, cujas restrições constam dos arts. 3º e 4º do Código Civil. É preci-so que as partes tenham aptidão específi ca para contratar, ou seja, que não tenham restrições para contratar. Somente assim a parte poderá consentir. Quando ao objeto contratual, os requisitos do con-trato são a sua possibilidade física ou jurídica, sua licitude, sua determinação e sua economicidade. Ele é impossível quando é insuscetível de realiza-ção, tanto material quanto juridicamente. Algo pode ser materialmente realizável, mas juridicamente impossível (por exemplo, comprar dois quilos de cocaína para consumo pessoal). O objeto deverá ser também determinado ou, ao menos, determiná-vel, para que a obrigação do devedor tenha sobre o que incidir. Igualmente, a prestação deve ser afe-rível economicamente. Quanto à forma, em regra, os contratos são fi rmados pelo simples acordo de vontades, independentemente de qualquer maneira que essas revistam. Podem ser verbais, por escrito, expressos ou mesmo tácitos. Excepcionalmente, porém, a lei exige para a efi cácia de alguns contra-tos a observância de certa forma.

8. Inefi cácia: contrato inefi caz é aquele que deixa de produzir efeitos. A inefi cácia pode ser, além de formal ou material, originária ou posterior à forma-ção do contrato. LINK ACADÊMICO 1

Formação do contrato

Trata-se da fi xação exata do momento em que se dá o acordo das vontades. A declaração poderá ser expressa, por qualquer meio, ou tácita, quando a lei não exigir expressa, conforme o art. 432 do Código. A proposta e a aceitação são requisitos essenciais da formação do contrato e, acerca dessas, existirá a discussão sobre a força obrigatória do contrato, sobre o exato momento em que as vontades são fi rmadas e, também, sobre o local em que se consi-derará formado o contrato.A primeira fase de formação contratual consiste

DIREITO CIVIL

CONTRATOS

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nas negociações preliminares, que são conversas prévias, diálogos em que surgem os interesses de cada uma das partes, tendo em vista o contrato fu-turo, mas não há vinculação das pessoas. Embora lhe falte obrigatoriedade, pode surgir responsabili-dade civil para os que participam das negociações preliminares. O fundamento do dever de reparação é o ilícito genérico. Outro momento da formação do contrato é a proposta, que já traz força vinculante (Código Civil, art. 427), não para as partes, uma vez que, ainda neste momento, não há um contrato, mas, para aquele que a faz, denomina-se policitan-te. Trata-se de uma manifestação de vontade, diri-gida por uma pessoa à outra, esperando que esta última a aceite. A proposta deve ser séria e precisa, contendo as linhas estruturais do negócio em vista, para que o contrato possa considerar-se perfeito, da manifestação singela e até simbólica daquele a quem é dirigida. A proposta é uma declaração unilateral de vontade, por parte do proponente e apresentará força vinculante por parte do policitan-te, a não ser que o contrário estiver especifi cado nos termos da própria proposta ou resulte da na-tureza do negócio ou das circunstâncias do caso, conforme os arts. 427 e 428 do Código Civil. Como se nota a proposta é, portanto, um negócio jurídico receptício, que deve precisar todos os elementos do negócio proposto. O proponente (ou policitan-te) não deverá revogar sua proposta por um certo prazo de tempo, a partir do momento em que a fi -zer, sob pena de ressarcir perdas e danos. Essa obrigação subsiste mesmo em havendo incapaci-dade superveniente ou morte do policitante antes da aceitação, a não ser que diversa tenha sido sua intenção ao realizar a proposta. Os arts. 427 e 428, I a IV, estabelecem alguns casos, todavia, em que a proposta deixará de ser obrigatória. O Código Civil disciplinou em seu art. 429 a oferta ao público, estabelecendo que é obrigatória quando contiver os requisitos essenciais ao contrato, salvo se o contrário resultar das circunstâncias ou dos usos. Feita a proposta, que constitui em si mesma um negócio jurídico, o policitante estará vinculado a ela. Reconhece, pois, a lei alguns casos em que a proposta deixa de ser obrigatória: a) se a falta de obrigatoriedade resulta de seus próprios termos; b) ou da natureza do negócio; c) ou das circunstân-cias do caso (Código Civil, art. 427).O próximo momento da formação do contrato é a aceitação. Somente quando o oblato torna-se acei-tante e conjuga a sua vontade com a do proponen-te, a oferta se transforma em contrato. Aceitação é, portanto, a manifestação de vontade expressa ou tácita por parte do destinatário em relação a uma proposta específi ca, feita dentro do prazo e aderindo a todos os termos da oferta, o que tor-na o contrato defi nitivamente concluído desde que chegue, em tempo hábil, ao conhecimento do proponente. Não há, salvo nos contratos formais, requisito especial para a aceitação. A aceitação tácita ocorre quando, não chegando a tempo a recusa, o negócio for daqueles em que não seja costume a aceitação expressa ou o proponente a tiver dispensado (art. 432 do CC). Para que se dê o contrato, a aceitação tem de ser oportuna, sob pena de já não encontrar proposta fi rme: quando feita fora do prazo, ou contendo modifi cações, ou

restrições aos termos da proposta, não gera contrato, mas importa nova proposta (Código Civil, art. 431) que o primitivo proponente, à sua vez, tem o direito de acei-tar ou de não aceitar.Dando o aceitante a resposta em tempo oportuno, o contrato estará perfeito. Se a proposta negocial for entre presentes, poder-se-á estipular ou não um prazo para a aceitação. Se não houver prazo, a aceitação deverá ser manifestada imediatamente e, se houver prazo, é preciso que se dê dentro desse limite. Se o contrato for entre ausentes, existindo prazo, este deverá ser obser-vado; mas é possível que a resposta chegue tarde ao proponente, por circunstância imprevista e estranha à vontade de seu emitente. Neste caso, o proponente tem o dever de comunicar o fato, imediatamente, ao aceitan-te, sob pena de responder por perdas e danos (Código Civil, art. 430). No entanto, se o ofertante não estipulou qualquer prazo, a aceitação deverá ser manifestada em tempo sufi ciente para chegar a resposta ao conheci-mento do proponente.Admite, ainda, a lei a retratação do aceitante, desde que chegue antes desta ou simultaneamente com ela ao conhecimento do proponente (Código Civil, artigo 433). É lugar de celebração do contrato aquele em que o impulso inicial teve origem, reputando-se celebrado no lugar em que for proposto (Código Civil, art. 435). Se houver contratantes residentes em países diversos, a Lei de Introdução ao Código Civil estabelece que a obrigação resultante do contrato reputa-se concluída no lugar em que residir o proponente (art. 9º, § 2º). LINK ACADÊMICO 2

Relatividade dos contratos

1. Contratos em favor de terceiro: ocorre quando uma pessoa (estipulante) convenciona com outra (promiten-te) uma obrigação, em que a prestação será cumprida em favor de outra pessoa (benefi ciário). No momento da formação contratual, a manifestação de vontade esta-belece-se entre o estipulante e o promitente. O consen-timento do benefi ciário não é necessário à constituição do contrato, e, por conseguinte, à criação de vantagens em seu proveito. Mas não se pode, todavia, negar ao terceiro a faculdade de recusar a estipulação em seu favor, expressa ou tacitamente. Para a formação da es-tipulação em favor de terceiro exigem-se os requisitos necessários à validade dos contratos em geral - subjeti-vos, objetivos e formais. Cumpre observar, porém, que, se o terceiro é momentaneamente indeterminado, mas passível de identifi cação (determinável), o ato é válido. 1.1. Efeitos do contrato em favor de terceiro: se o promitente fi ca obrigado a prestar algo a um terceiro, mesmo assim continua obrigado em relação ao esti-pulante, que conserva o direito de exigir o cumprimen-to do contrato (Código Civil, art. 436). Pode, ainda, o estipulante substituir o terceiro designado no contrato, independentemente de consentimento do promitente, que deverá cumprir a determinação recebida. Basta, para isso, a declaração unilateral de vontade por ato inter vivos ou causa mortis (Código Civil, art. 438). Na fase de execução contratual, o terceiro assume as ve-zes do credor e, por isso, poderá exigir a obrigação. Embora não seja parte na formação do contrato, pode intervir nele com a sua anuência e, então, é sujeito às condições normais do contrato (Código Civil, art. 436, parágrafo único), enquanto o estipulante o mantiver sem

inovações. Formado o contrato entre estipulante e promitente para benefi ciar o terceiro, fi ca o primei-ro com o poder de substituí-lo. Cabe-lhe, também, a faculdade de exonerar o promitente, salvo se o terceiro fi car com o poder de exigir a prestação (Có-digo Civil, art. 437), valendo a aceitação do terceiro para consolidar o direito, tornando-o irrevogável e defi nitivo. O que estipula em favor de terceiro pode exigir o cumprimento da obrigação (art. 436 do CC).

2. Promessa de fato de terceiro: é um negócio jurídico que tem por objeto a prestação de um fato a ser cumprido por outra pessoa, não participante des-se negócio. Não nasce nenhuma obrigação para o terceiro enquanto ele não der o seu consentimento. Pode-se prometer a prestação de fato do terceiro, mas obviamente não se pode obrigá-lo a executar a prestação prometida. No primeiro momento (for-mação), o devedor primário ajusta uma obrigação com o credor, de quem se torna devedor. O objeto da sua obrigação é conseguir que o terceiro con-sinta em tornar-se devedor de certa prestação. É devedor de uma prestação própria, a qual consiste em obter o consentimento do terceiro. Sua inexe-cução sujeita-o a perdas e danos (Código Civil, art. 439). O parágrafo único desse artigo contém uma exceção à regra do dever de indenizar, por parte do promitente, em caso de recusa por parte do tercei-ro de executar a obrigação. Quando o promitente se obrigar a fato de terceiro que seja seu cônjuge, consubstanciado em ato que, para a sua validade e efi cácia, dependa da autorização do cônjuge, não será obrigado a indenizar o credor, caso tal inde-nização, em razão do regime de bens existentes entre os cônjuges venha a afetar o patrimônio do cônjuge que não consentiu em se obrigar. O Código dispõe, ainda, em seu art. 440, que na hipótese de o terceiro anuir em prestar em favor do credor, ou seja, assumir a obrigação prometida, o promitente, por já ter cumprido a sua obrigação, fi ca exonerado e não responde perante o credor caso haja inadim-plemento do terceiro que veio a se obrigar.

3. Contrato com pessoa a declarar: o Código Civil brasileiro cuida dessa tipologia contratual nos seus arts. 467 a 471. Nesse contrato, as partes contra-tantes estão defi nidas e identifi cadas. O que resta é a pessoa designada a ocupar o lugar de sujeito da relação jurídica assim criada (Código Civil, art. 467). Um dos contratantes reserva-se a faculdade de in-dicar a pessoa que adquirirá, em momento futuro, os direitos e assumirá as obrigações respectivas. A indicação da pessoa deve ser feita no prazo es-tipulado ou , em sua falta, no de cinco dias, para o efeito de declarar se aceita a estipulação (art. 468). Em face de pronunciamento positivo, o terceiro in-dicado, toma o lugar da parte contratante. O pará-grafo único do art. 468 institui que a aceitação se dará obrigatoriamente com a mesma forma prevista para a celebração inicial do contrato. Uma vez ma-nifestada, considera-se que, ao adquirir os direitos e assumir as obrigações, a pessoa esteve presente como parte contratante desde a data do contrato, conforme estabelece o art. 469 do Código Civil. Se o nomeado aceita na forma e nas condições esta-belecidas nos arts.468 e 469, adquire os direitos e assume as obrigações. Substitui, na titularidade das

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relações jurídicas, o contratante que o indicou. Se não aceita, nem por isso o contrato perde sua efi -cácia. Continua válido, subsistindo apenas entre os contraentes originários (art. 470, I), se não houver indicação de pessoa teoricamente nomeada ou se o nomeado se recusar ao cumprimento do contrato. O mesmo ocorrerá se, no prazo estipulado ou legal, não for feita a indicação, assim como se a pessoa nomeada era insolvente, independentemente de o outro contratante conhecer ou não a insolvência no momento da indicação (art. 470, II, e 471).

LINK ACADÊMICO 3

Vícios Redibitórios

Vício redibitório é o defeito oculto contido na coisa objeto de contrato comutativo, tornando-a imprópria ao uso a que se destina ou lhe prejudicando sen-sivelmente o valor, conforme o art. 441 do Código Civil. Recebida a coisa que contenha vício ou defeito oculto, pode o comprador rejeitá-la, redibindo o contrato. Não é obrigado a manter o negócio e con-servar a coisa que não se preste à sua fi nalidade ou esteja depreciada. E, dessa forma, ambas as partes voltam ao “statu quo ante”. O comprador devolverá o bem ou o colocará à disposição do vendedor. E este terá de restituir o preço, mais as despesas do contrato. Pode acontecer que a coisa, embora portadora do vício oculto, ainda tenha utilidade para o adquirente, mas não seja de seu interesse nem de sua conve-niência. Sendo assim, o adquirente pode recusá-la, devolvendo-a ao alienante por via da ação redibi-tória. Em tal caso, faculta-lhe a lei outra ação, a estimatória ou de abatimento de preço (actio aes-

timatoria ou quanti minoris), pela qual o adquirente, conservando a coisa defeituosa, reclama seja o seu preço reduzido naquilo em que o defeito oculto a depreciou, para que não o pague por inteiro ou, se já o tiver feito, para que obtenha restituição parcial do despendido (art. 442). Esse direito do adquirente está sujeito a um prazo de decadência, que varia conforme se trate de coisa imóvel (um ano, art. 445 do Código Civil) ou de coisa móvel (30 dias, art. 445). Trata-se mesmo de decadência, porque o direito é condicionado ao exercício dentro de prazo legal e, por essa razão, não pode ser interrompido. O Código determinou expressamente no art. 446 que os prazos para a invocação de vício redibitório não correm na constância de cláusula de garantia. O início da contagem do prazo para o exercício da redibição dá-se a partir do fi m da garantia, não im-portando o momento em que o vício se apresentou. Esse prazo é, portanto, um reforço e chega mesmo a ser mais do que a responsabilidade pelo vício oculto, porque abrange a segurança de bom fun-cionamento. LINK ACADÊMICO 4

Evicção

1. Evicção: é a perda da coisa, por força da sen-tença judicial, que atribui essa mesma coisa a uma outra pessoa, por ela ter direito anterior ao contrato estabelecido. Não se trata, como nos vícios redibi-tórios, de defeito da coisa, mas sim de defeito no próprio direito.

2. Evicção parcial: em sendo a evicção parcial, mas considerável, abre-se ao adquirente uma alternativa: re-solução do contrato ou restituição parcial do preço. Na primeira hipótese, tudo se passa como se fosse evicção total, com a diferença apenas de que o adquirente lhe devolve a parte remanescente do bem. Na segunda, optando pela conservação da coisa e abatimento do preço, o adquirente tem direito a que o alienante lhe restitua parte do preço, correspondente ao desfalque sofrido (Código Civil, artigo 455). Manda a lei (Código Civil, parágrafo único do art. 450) que a importância do desfalque seja calculada na proporção do valor dela ao tempo em que se evenceu.

LINK ACADÊMICO 5

Extinção dos contratos

1. Resilição contratual: é dissolução do vínculo con-tratual, mediante atuação das mesmas vontades que o criou, por ato lícito das partes. Pode ser bilateral ou unilateral. Resilição bilateral ou distrato, como o art. 472 do Código denomina essa fi gura jurídica, é a declaração de vontade das partes contratantes, no sentido oposto ao que havia gerado o vínculo. Deve ser realizada pela mesma forma exigida por lei para contratar. Resilição unilateral é a extinção promovida pela denúncia de uma das partes. A lei determina a atração da forma (Código Civil, artigo 472), estabele-cendo que se faça pela mesma forma exigida pela lei para contratar. A forma do distrato não deve necessa-riamente obedecer à que foi adotada no contrato, mas, sim, a que a lei exige. Dessa forma, se um contrato de compra e venda que tem por objeto um bem móvel foi celebrado por instrumento público, ele poderá se extin-guir por distrato celebrado por instrumento particular.A resilição unilateral constitui-se exceção. Um dos efei-tos do princípio da obrigatoriedade do contrato é, pre-cisamente, a alienação da liberdade dos contratantes: nenhum deles, pode romper o vínculo, em princípio, sem a anuência do outro. Por tal motivo é que o art. 473 do Código, somente em casos excepcionais, ad-mite que um contrato cesse pela manifestação de von-tade de apenas uma das partes. O comodato, o man-dato, o depósito, pela sua própria natureza, admitem a resilição unilateral. Os contratos de execução continu-ada, quando ajustados por prazo indeterminado, com-portam a cessação mediante um instituto denominado denúncia, que é a vontade de rescindir o contrato sem motivo, expressada por um dos contratantes. Assim ocorre no fornecimento continuado de mercadorias ou em alguns tipos de locação. O parágrafo único do art. 473 do Código determina que, de acordo com a natureza do contrato, se uma das partes houver feito investimentos consideráveis para a sua execução, a denúncia unilateral só produzirá efeito depois de trans-corrido prazo compatível com a natureza e o vulto dos investimentos. Caberá ao juiz determinar, com a ajuda da perícia técnica se necessário, o prazo em que fi ca suspenso o direito de a parte resilir unilateralmente o contrato, sem qualquer motivação específi ca. O crité-rio legal é o de proporcionar à parte, prejudicada pela resilição unilateral, a obtenção do objetivo previsto no contrato, de acordo com a sua natureza e dos investi-mentos realizados.2. Resolução contratual: é a dissolução do contrato em conseqüência de ter alguma falta de uma das partes em

relação ao cumprimento de sua obrigação. Assim, a outra parte, lesada pelo inadimplemento, pode re-querer a resolução do contrato com perdas e danos (Código Civil, art. 475). O art. 474 do Código, aliás, dispõe que a condição resolutiva tácita depende de interpelação judicial, com fi xação de prazo para que a parte faltosa efetue a prestação que lhe compete, sob pena de resolver-se o contrato e, somente após esse prazo, é que poderá ser pleiteada a resolução. Pronunciado o rompimento do vínculo contratual, estendem-se os efeitos do ato desfeito, com sujeição do inadimplente ao princípio da reparação, que,na forma da regra comum, deve compreender o dano emergente e o lucro cessante. Isso ocorre quando houver cláusula resolutiva tácita no contrato. Haven-do cláusula expressa e deixando o contratante de cumprir a obrigação na forma e no tempo ajustado, resolve-se o contrato automaticamente, sem neces-sidade de interpelação do faltoso (Código Civil, arts. 474 e 128).

3. “Exceptio non adimpleti contractus”: é a de-fesa oponível pelo contratante demandado contra o co-contratante inadimplente, alegando que o deman-dado se recusa à sua prestação, por não ter aquele que reclama dado cumprimento à parte que lhe cabe (Código Civil, art. 476). O Código, em seu art. 477, outorgou ao contratante que tiver de fazer a sua prestação em primeiro lugar o direito de recusá-la se, depois de concluído o contrato, sobrevier ao ou-tro contratante alteração nas condições econômicas, capaz de comprometer ou tornar duvidosa a presta-ção a que se obrigou. É claro que a medida é excep-cional, pois que, ajustadas prestações combinadas, não justifi ca a recusa pelo fato de não haver ainda prestado o outro. Desde que saiba ou tenha razões plausíveis de presumir (protesto de título, pedido de moratória ou de concordata etc.), que a diminuição patrimonial do outro faça duvidar da contraprestação esperada, cessará o pagamento ou reterá a execu-ção, até que se lhe dê a solução devida ou a garantia sufi ciente de que será efetivada no momento oportu-no. Não há predeterminação de garantia, podendo ser de qualquer natureza, real ou fi dejussória. Mas é necessário que se trate de garantia bastante. Uma vez prestada essa, a exceção caduca e a prestação suspensa deverá ser cumprida.

4. Resolução por onerosidade excessiva: se hou-ver ocorrido modifi cação profunda nas condições objetivas da execução contratual, em relação às existentes no momento da celebração, imprevisíveis naquele momento e geradoras de onerosidade ex-cessiva para um dos contratantes, proporcionando ao outro um lucro desarrazoado, cabe ao prejudi-cado insurgir-se e recusar a prestação. É mister a ocorrência de um acontecimento extraordinário, que tenha modifi cado o ambiente objetivo, de forma que o cumprimento do contrato implique, em si mesmo, o enriquecimento de um e empobrecimento do outro. Para que se possa invocar a resolução por onerosi-dade excessiva é necessário que ocorram requisitos de apuração certa, explicitados no art. 478 do Código Civil: a) vigência de um contrato de execução diferi-da ou continuada; b) alteração radical das condições econômicas objetivas no momento da execução, em confronto com o ambiente objetivo no da celebração;

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c) onerosidade excessiva para um dos contratantes e benefício exagerado para o outro; d) imprevisibili-dade daquela modifi cação. Nunca haverá lugar para a aplicação da teoria da imprevisão naqueles casos em que a onerosidade excessiva provém de aconte-cimento normal e não do imprevisto, como ainda nos contratos aleatórios, em que o ganho e a perda não podem estar sujeitos a um valor predeterminado. LINK ACADÊMICO 6

Compra e venda

1. Introdução: o contrato de compra e venda é defi nido pelo artigo 481 do Código Civil. Trata-se de um contrato em que uma pessoa (denominada vendedor) se obriga a transferir à outra (comprador) o domínio de uma coisa corpórea ou incorpórea, mediante o pagamento de certo preço em dinheiro, existindo igualmente a possibilidade de o paga-mento dar-se a partir de um valor fi duciário corres-pondente. A compra e venda não opera, segundo o nosso Código, a transmissão do domínio (art. 1.268, CC). Existem obrigações recíprocas para cada uma das partes: para o vendedor, a obrigação é transferir o domínio da coisa. Já para o compra-dor, a principal obrigação consiste na entrega do preço. O contrato de compra e venda confere às partes nele envolvidas um direito pessoal gerador da transferência do domínio. Os efeitos produzidos restringem-se, assim, à esfera meramente obriga-cional, sem que ocorra a transferência de poderes de proprietário. Portanto é necessária a ocorrência de um procedimento complementar capaz de pos-sibilitar ao comprador um modo de adquirir a pro-priedade, qual seja, a tradição (entrega). Portanto pode-se dizer que o contrato, por si só, é inábil para gerar a translação da propriedade, embora seja sua uma causa determinante. É preciso rea-lizar atos cujo efeito translatício a lei reconhece: a tradição da coisa, se se tratar de móvel ou a ins-crição do título aquisitivo no registro, se for imóvel o seu objeto (arts. 1.245 e 1.246, CC). Além dessa observação, que é básica, nota-se que o contrato de compra e venda pode ter, por objeto, bens de toda natureza: corpóreos, compreendendo imóveis, móveis, semoventes, como ainda os incorpóreos. Importante ressaltar que a tradição, como instituto capaz de consagrar o objetivo principal do contrato de compra e venda, destina sua aplicação somente se à coisa for móvel. Assim sendo, diante de um contrato dessa espécie em que seu objeto seja um bem imóvel, cabe a menção de que a transferência da sua propriedade somente se dará com o compe-tente registro do bem junto ao Cartório de Registro de Imóveis.A lei considera esse contrato obrigatório e perfeito, desde que as partes acordem no objeto e no preço (Código Civil, art.482). Se ocorrer uma condição, esta se fará presente na elaboração do vínculo, suspendendo os efeitos do consentimento mani-festado ou resolvendo o contrato, conforme seja suspensiva ou resolutiva. É preciso que o objeto exista, ao menos em princí-pio, pois a inexistência do objeto implica, em tese, prejuízo à formação do contrato, já que este, forço-samente, precisa ter sobre o que incidir. Venda de coisa inexistente é nula. Isso não signifi ca, entretan-

to, que somente possa haver contrato que verse sobre coisa já conhecida e caracterizada no momento da ce-lebração. O contrato poderá incidir sobre coisa futura, o qual fi ca defi nido como condicional, que se resolve caso a coisa não tenha existência, mas que se reputa perfei-to, desde a data da celebração, com o implemento da condição. Ou, então, fi ca identifi cado como contrato ale-atório, válido como negócio jurídico e, devido ao preço, ainda que nada venha a existir (Código Civil, art. 458), pois, nesse caso, é objeto da venda a expectativa e não, por si só, a coisa ou sua transferência. O art. 483 do Código admite expressamente que a compra e a venda possa ter por objeto coisa atual ou futura, dispondo que, nesse último caso, o contrato fi ca sem efeito, se o objeto não vier a existir, salvo se a intenção das partes era de concluir contrato aleatório.Gerando uma obrigação de dar, o contrato de compra e venda terá de incidir sobre uma coisa caracterizada por seus elementos identifi cadores. O seu objeto necessa-riamente deverá ser determinado. Isso não quer dizer que deverá ser rigorosa a determinação e no momento exato do ajuste: se a coisa for determinável, isto é, sus-cetível de individualização no momento da execução, o contrato tem condições de existência. Nessa qualidade da coisa interfere a venda sob amostra, protótipo ou modelo, que é aquela em que o vendedor exibe ao comprador uma pequena porção da coisa, ou seu protótipo, ou modelo, assegurando-lhe que o objeto a ser entregue deva ter as suas qualidades (Código Ci-vil, art.484). É uma espécie de determinação, por via de confronto com a amostra, protótipo ou modelo exibido. Conferindo-o e verifi cando-o, o comprador, no momento da entrega, tem a faculdade de rejeitá-la, se não guar-dar exata correspondência com a amostra. O parágrafo único do art.484 faz ainda prevalecer a amostra, o pro-tótipo ou o modelo sobre a descrição que tiver sido feita sobre o objeto, no contrato, caso exista diferença entre eles, optando claramente por proteger o comprador, na certeza de que a visualização da amostra, do protótipo ou do modelo, é elemento fundamental na formação da vontade na fase da celebração do contrato.Ademais, para que haja compra e venda, a coisa há de ser disponível ou estar no comércio. Em caso contrário, não haverá compra e venda, porque a sua inalienabili-dade impossibilita a transmissão ao comprador. A indis-ponibilidade pode ser natural, quando a coisa é insusce-tível de apropriação; legal, quando a coisa está fora do comércio por imposição da lei; e voluntária, quando re-sulta de uma declaração de vontade por ato entre vivos (doação) ou “causa mortis” (testamento). Sempre que a coisa for inalienável, o contrato de compra e venda não pode tê-la por objeto, sob pena de inefi cácia. E não bas-ta que a coisa seja disponível. É preciso que ela possa ser transferida ao comprador. Se a coisa já pertencer ao comprador, não poderá ser vendida a ele; e, se perten-cer não ao vendedor, mas a terceiro, a venda também não se concretiza.1.1. Características:

a) Bilateralidade: esta é caracterizada por conta da criação de obrigações para os contratantes, os quais, em caráter posterior, serão credores e devedores; b)

Onerosidade: nesse caso, a onerosidade implica a característica de ambos os contratantes auferirem van-tagens de cunho patrimonial. Vale ressaltar que deve haver um equilíbrio envolvendo tais vantagens; c) Co-

mutatividade: esta advém da existência de um objeti-vo certo e seguro na realização do contrato, como se

percebe na grande maioria dos contratos no Direito Civil; d) Aleatoriedade: nessa característica, o ob-jeto do contrato encontra-se vinculado à ocorrência de um evento futuro e incerto, em que não se pode antecipar o seu montante. Exemplo: alienação de coisa futura em que um dos contratantes toma para si o risco, caso nada venha a ser produzido, embo-ra permaneça o dever do pagamento. Vide artigos 458 e 459, do Código Civil; e) Consensualidade e

Solenidade: em casos como os contratos consen-suais em que, através do mútuo consentimento de ambos os contratantes, temos o aperfeiçoamento do contrato. Por sua vez, a solenidade descreve a necessidade de o contrato de compra e venda possuir uma forma específi ca por força de lei, para gerar seus efeitos. Tal solenidade é constatada na aquisição de imóveis em que a escritura pública mostra-se necessária. Vide arts. 108 e 215 do Có-digo Civil; f) Translatividade do domínio: nesse caso, o contrato de compra e venda passa a as-sumir um importante papel, como sendo um título hábil para a aquisição do domínio, o qual se aper-feiçoa somente com a tradição ou registro do bem, este último no caso de bens imóveis.1.2. Elementos constitutivos:

a) Consentimento: é preciso capacidade genéri-ca para praticar os atos da vida civil. Os absoluta ou relativamente incapazes só poderão contratar devidamente representados ou assistidos pelos re-presentantes legais, sob pena de nulidade ou anu-labilidade do negócio; a pessoa também precisará de legitimação para contratar, por isso há restrições quanto às pessoas casadas, que necessitam da anuência do cônjuge para a compra e venda de imóveis (exceto no regime de separação total de bens), b) Preço: constitui importante elemento des-se tipo de contrato, sendo que o mesmo deve ser estabelecido em dinheiro, sob pena de estabelecer-se um contrato de troca e não de compra e venda. A fi xação do preço, porém, pode ocorrer por parte de terceiro, além da fi xação baseada no próprio mercado ou bolsa, de acordo com os artigos 485 e 486, do Código Civil. Contudo, tal fi xação pode não se dar por puro arbítrio de uma das partes, não se alcançando nesse caso, o equilíbrio almejado no contrato de compra e venda. Não querendo ou não podendo os contratantes determinar o preço, é lícito convencionar sua fi xação por um terceiro (Código Civil, art. 485) que não é propriamente um avalia-dor da coisa, porém um árbitro escolhido pelos in-teressados, os quais não têm o direito de repudiar a sua deliberação, mas têm o dever de acatar sua estimativa. Também será válida a venda, se dei-xado o preço à taxa do mercado ou da Bolsa, de um certo dia e lugar (Código Civil, art. 486). Se a cotação variar no mesmo dia escolhido, tomar-se-á por base na média nessa data, caso as partes não tenham convencionado de forma diversa, por apli-cação analógica do parágrafo único do art.488 do Código. São acessórios do preço as despesas que se têm de fazer para a realização e execução do contrato. Em princípio, deixa-se ao sabor da von-tade dos interessados. Na sua falta, competem ao comprador as despesas de escritura e registro e, ao vendedor, as da tradição (Código Civil, art. 490). A ausência de estipulação do preço nem sempre leva à inexistência do contrato de compra e venda

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por falta de um dos seus elementos essenciais. O art. 488 do Código admite a interpretação do con-trato de compra e venda sem preço ou de qualquer critério para a sua fi xação, como se as partes se tivessem sujeitado ao preço corrente nas vendas habituais do vendedor; c) Coisa: é o principal elemento desse tipo de contrato, também chamada de res, sendo caracte-rizado como objeto individuado da compra e venda, a qual pode recair sobre todas as coisas que não estejam fora do comércio, além de serem dotadas da possibilidade de apropriação e de serem legal-mente alienáveis, conforme acima já aludido.1.3. Conseqüências jurídicas: existe o dever atri-buído ao vendedor de efetuar a entrega da coisa, acrescida de todos os seus acessórios. Tal entrega, no entanto, implica não somente a tradição da coisa vendida, como também o domínio do bem, inclusi-ve com a competente conservação do mesmo até a data de sua efetiva entrega. Importante ressalva deve ser feita no tocante a esta entrega, acompa-nhada do respectivo pagamento do preço ajustado. Nesse sentido, caso o pagamento seja estipulado a prazo e, antes dele, ocorrer a insolvência do adquirente da mercadoria, o vendedor pode não efetuar a entrega do bem, até que seu preço seja devidamente quitado. Cabe ainda ao vendedor, por conta de eventuais transtornos sofridos, exigir que o adquirente preste caução do bem, como forma de garantia do contrato anteriormente fi rmado.A legislação impõe ao vendedor o dever de garantia em relação ao produto (coisa, bem), fornecido ao adquirente, principalmente diante da existência de certos vícios tais como os redibitórios e os aparen-tes. É do vendedor a responsabilidade oriunda dos riscos e despesas, uma vez que, até o momento em que se efetiva a tradição (no caso de bens mó-veis), ou a transcrição (bens imóveis), o bem ainda permanece em seu poder. Sendo assim, ocorrendo a deterioração, ao comprador é possibilitada a re-solução do contrato, aceitação da coisa no estado em que a mesma se encontrar, com o respectivo abatimento no preço (culpa do alienante) e pode-rá, ainda, pleitear, em juízo, uma indenização por perdas e danos.Existe, ainda, a possibilidade de o devedor (alienan-te) tomar para si os frutos ou os melhoramentos ob-tidos com os acessórios da coisa vendida antes da tradição do respectivo bem. Quando a venda recair sobre uma universalidade de bens, o vendedor será responsável por defeito oculto referente ao conjunto de coisas, não ocorrendo a possibilidade de se res-ponsabilizar de forma individual.Por parte do comprador, a este cabe o direito de recusar a coisa vendida mediante amostra, por não ter sido a mesma entregue nas condições prome-tidas no contrato. Nos contratos que envolvam a aquisição de terras, ressalta-se o direito do adqui-rente de exigir uma complementação da área, obje-to do contrato, nos casos em que se constatar uma falta de correspondência entre a área encontrada pelo possível comprador e as dimensões realmente apresentadas. Ocorrendo tal fato, a atitude a ser praticada pelo comprador, consistirá em pleitear a rescisão do negócio ou o abatimento do preço.Importante conseqüência jurídica pode ser mencio-nada no que corresponde à exoneração do adqui-

rente de imóvel, que exibir certidão negativa de débito fi scal, vinculado ao bem adquirido. Nesse aspecto, apre-sentado tal documento, o imóvel estará desobrigado para sua conseqüente comercialização. Por fi m, temos como nulidade de pleno direito quando, nos contratos de compra e venda de bens móveis ou imóveis, são fi xadas cláusulas que vinculem o pagamento de prestações, acarretando uma relação de consumo. Sendo assim, ao se estabelecer cláusulas que impliquem a perda total das prestações pagas em benefício do credor, caracteri-zada estará a nulidade anteriormente mencionada.1.3.1. Promessa de compra e venda: pode ser bila-teral ou unilateral. Gera uma obrigação de fazer, que se executa mediante a outorga do contrato defi nitivo. A prestação a que as partes estão obrigadas é o fato da realização da compra e venda. Pode assumir tanto a for-ma pública como a particular, conforme expressamente admite o art. 462 do Código. Uma das partes contratan-tes poderá propor a execução coativa ao contrato de promessa de compra e venda, permitida por lei, inde-pendentemente da forma utilizada pelas partes no con-trato preliminar (art. 464 do Código). No nosso direito, a promessa unilateral de comprar é lícita e possível, mas pouco usada. A promessa de vender, por ter suscitado numerosos problemas, é mais rica de soluções, não es-tando os princípios que compõem a sua teoria perfeita-mente discutidos. É o caso da opção. A opção pratica-se na vida mercantil, quando um comerciante ou fornece-dor se compromete a vender mercadoria a uma pessoa determinada, mediante preço assentado em base fi xada e dentro de certo prazo. O que constitui a tônica desse negócio jurídico é a criação, para o promitente, de uma obrigação (de comprar ou de vender), enquanto a outra parte fi ca com a liberdade de contratar. O Código inseriu no parágrafo único do seu art. 513 um prazo máximo de decadência dentro do qual pode vigorar o direito de pre-ferência, que é de 180 (cento e oitenta) dias, se a coisa for móvel, e 2 (dois) anos, se imóvel, contados da data do contrato de compra e venda. Diante dessa nova regra legal, que tem a natureza de norma cogente, o compra-dor está livre para revender o bem, sem observar o di-reito de preferência do vendedor, uma vez transcorridos esses prazos, conforme a natureza do objeto.A promessa bilateral de compra e venda pode ser irre-tratável ou sujeita a arrependimento. Quando irretratável e constar de registro público, gera direito real. Há impli-cações de natureza fi scal, acompanhando a promessa irretratável, como foi o caso de recolhimento do imposto sobre o lucro imobiliário. Fica sempre ressalvada aos contratantes a faculdade de se arrependerem, mediante as condições estipuladas, como seja a perda do sinal, o pagamento da remuneração pela utilização da coisa ou a perda das prestações pagas a título de indenização pelo uso etc. Sendo irretratável e constando de regis-tro público, dá nascimento ao direito real e submete o promitente vendedor à execução coativa (Código Civil, arts.463 e 464), obrigando o juiz a outorgar a escritura defi nitiva, sob pena de valer a sentença como suprimen-to do ato não realizado.Mediante promessa de compra e venda, em que não se pactuou arrependimento, celebrada por instrumento público ou particular e registrada no Cartório de Registro de Imóveis, o promitente comprador adquire direito real à aquisição do imóvel, confome dispõe o art. 1.417 do CC. Ademais, o promitente comprador, titular de direito real, poderá exigir do promitente vendedor ou de tercei-ros, a quem os direitos deste forem concedidos, a outor-

ga da escritura defi nitiva de compra e venda, con-forme o que se dispuser no instrumento preliminar. E, se houver recusa, poderá requerer ao Judiciário a adjudicação do imóvel (art. 1.418, CC). 1.4. Cláusulas especiais no contrato de compra

e venda

1.4.1. Retrovenda: é a cláusula em que o vende-dor se reserva o direito de reaver, em certo prazo, o imóvel anteriormente alienado, restituindo ao com-prador o preço recebido, acrescido das despesas por ele realizadas durante o período de resgate ocorrendo, para tanto, uma necessidade de expres-sa previsão por escrito. Se “B”, em função de difi cul-dades fi nanceiras, não querendo perder seu imóvel, vende o mesmo para “C” estabelecendo, por escrito em contrato, que irá comprar o imóvel novamente transcorrido certo período de tempo, restituindo o preço inicialmente pago, acrescido das despesas feitas pelo comprador do mesmo. Seu objeto é tão-somente a venda imobiliária. O vendedor tem a fa-culdade de retrato por prazo de decadência limitado a três anos (Código Civil, art.505), improrrogáveis, a bem da segurança da propriedade, que seria afe-tada, caso pudesse estipular por prazo prolongado e, mais ainda, se por tempo indeterminado. Dentro do prazo, pode a coisa ser resgatada, cabendo a ação respectiva ao próprio vendedor e aos seus herdeiros, legatários ou condôminos (Código Civil, art.507). Se duas ou mais pessoas tiverem o direito de recobrar a mesma coisa, e só uma o exercer, poderá o comprador intimar as outras para que ma-nifestem o seu acordo e, se não o houver, não fi ca o adquirente obrigado a admitir o retrato parcial: ou o interessado entra com a importância global e resga-ta a integralidade do imóvel, ou caducará o direito de todos (Código Civil, art.508). A ação pode ser intentada contra o comprador ou seus herdeiros, bem como contra o terceiro adquirente, ainda que este ignore a cláusula de retrovenda (Código Civil, art. 507), porque esta integra a própria alienação, imprimindo-lhe o caráter condicional. O comprador recebe de volta o preço que pagou, acrescido das despesas feitas. Tem direito, ainda, a ser reembol-sado das quantias que tiver empregado no imóvel com autorização escrita do vendedor, bem como, mesmo sem autorização, as que tiver desembol-sado para a realização de benfeitorias necessárias (Código Civil, art. 505). O vendedor somente read-quire o domínio e a posse do objeto da retrovenda com o pagamento do valor integral devido ao com-prador (Código Civil, art.506).1.4.2. Venda a contento: é aquela que se realiza sob a condição de só se tornar perfeita e obrigató-ria, após declaração do comprador, de que a coisa lhe é agradável, de que ela o contenta. O negócio apenas se consuma a critério do comprador, inde-pendentemente da qualidade da coisa. Qualquer que seja o seu objeto, o contrato de compra e venda comporta esta cláusula, que abrange muito especialmente a compra de gêneros que se costu-mam experimentar antes de aceitos (Código Civil, art. 509). Em nenhuma hipótese pode ser presu-mida, devendo ser expressa. O Código de 2002 inseriu em seu art.510 uma regra prevendo que a venda sujeita a prova presume-se feita sob condi-ção suspensiva de que a coisa tenha as qualidades asseguradas pelo vendedor e seja idônea para o

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fi m a que se destina. Enquanto não ocorrer a mani-festação concordante do adquirente, mesmo diante da presença da tradição, o domínio permanece com o alienante, o qual fi ca responsável também pelas perdas que, porventura, tenham ocorrido em rela-ção ao objeto. Não tendo sido adquirido o domínio pelo comprador, antes da ocorrência da condição, é caracterizado como um mero comodatário, sendo que suas obrigações no contrato equiparam-se às de um comodatário, nos termos do artigo 511, do Código Civil. Não havendo prazo estipulado para a declaração do comprador, o vendedor terá o direito de intimá-lo, judicial ou extrajudicialmente, para que o faça em prazo improrrogável (art. 512, CC).1.4.3. Preempção ou preferência: é o negócio em que o comprador de uma coisa se obriga para com o vendedor a preferi-lo, em igualdade de condições, caso venha a vendê-la. A citada defi nição advém do artigo 513 do novo Código Civil, que cuida da matéria de forma completa. O direito de preferência somente se emergirá quando o comprador tiver a intenção de revender a coisa comprada. Caso o comprador decidir pela conservação da coisa por período indefi nido, ninguém poderá convencê-lo do contrário. Decidindo o devedor promover a aliena-ção da coisa, este deverá informar o credor sobre a intenção de venda, comunicando ao mesmo as condições encontradas para que o credor venha a manifestar e exercer o seu propósito envolvendo a preempção ou preferência. Por conta do artigo 515 do CC, o credor deve estar disposto a pagar o preço ajustado. Não o fazendo, este perderá o di-reito de preferência estabelecido com a inserção da cláusula em comento. Temos ainda a fi xação, por conta da lei (artigo 516), de prazo decadencial para exercício do direito de preferência. Vale lembrar que este prazo é de 03 dias para coisas móveis e de 60 dias, para imóveis, contados a partir do momento em que o comprador comunica o respectivo ven-dedor. A preferência reunirá alguns requisitos que juridicamente a caracterizam: a) é personalíssima, no sentido de que somente pode exercê-la o pró-prio vendedor, que não o transmite nem por ato inter

vivos nem causa mortis (Código Civil, art. 520); b) somente tem lugar na compra e venda, descaben-do ajustá-la a qualquer outra espécie de contrato, mesmo que próximo da venda, como é a permuta; c) o direito de prelação somente pode ser exercido na hipótese de pretender o comprador vender a própria coisa ou dá-la em pagamento, sendo ilícita a sua avença para qualquer outro tipo de venda; d) pode ser pactuada para a venda de qualquer bem, corpóreo ou incorpóreo, móvel ou imóvel. O Código inseriu no parágrafo único do seu art. 513 um prazo máximo de decadência dentro do qual pode vigorar o direito de preferência, que é de 180 dias, se a coi-sa for móvel e 2 anos, se imóvel, contados da data do contrato de compra e venda.O exercício da preferência, uma vez pretendida a revenda pelo comprador no prazo menor que os estabelecidos no parágrafo único do art. 513, está subordinado a um prazo de decadência, que pode ser fi xado pelo comprador na notifi cação encami-nhada ao vendedor (art. 516). É evidente que o comprador deve conceder ao vendedor um prazo razoável para que possa pensar em exercer ou não o seu direito de preferência. Em caso de abu-

so, deve o juiz intervir e considerar nula a notifi cação. Caso o comprador não fi xe prazo, a lei o estipula: se for móvel, três dias e, se imóvel, 60 dias, contados da data da notifi cação do vendedor com os termos da ofer-ta recebida (Código Civil, art. 516). O comprador res-ponderá por perdas e danos se alienar a coisa sem ter dado ao vendedor ciência do preço e das vantagens que oferecem pela coisa. O adquirente, se houver agido de má-fé, responderá solidariamente. Prevê o Código Civil igualmente a retrocessão, que consiste no dever impos-to ao poder desapropriante oferecer ao desapropriado o imóvel, pelo mesmo preço por que o foi, caso não lhe dê o destino previsto no decreto expropriatório (art. 519).Quando o direito de preferência for estipulado a favor de dois ou mais indivíduos em comum, só pode ser exer-cido em relação à coisa no seu todo. Se alguma das pessoas a quem ele diga respeito poder ou não exercer esse direito, poderão as demais utilizá-lo mesmo assim.1.4.4. Reserva de domínio: ocorre quando se estipula, através de contrato de compra e venda, em regra de coisa móvel infungível, que o vendedor reserva para si a sua propriedade, até o momento em que se realiza o pagamento integral do preço, de acordo com o disposto no artigo 521 do CC. A venda, com pacto de reserva de domínio, está sujeita à forma escrita e terá de ser feita a sua inscrição no registro de títulos e documen-tos do domicílio do comprador, para ter efi cácia contra terceiros (Código Civil, art. 522). Só assim é oponível à cláusula contra todos e permitido ao vendedor perseguir a própria coisa, de cuja posse despojará o terceiro ad-quirente, para nela reintegrar-se. O pacto de reserva de domínio pode ser estipulado adjeto à compra e venda de coisa móvel não fungível, que se individua por ca-racteres discriminativos próprios (art. 523 do Código). O Código somente o admite tendo como objeto bens de caracterização perfeita, que possam ser extremados de outros congêneres. O conceito, portanto, é o de individu-alização da coisa. Se esta puder ser feita por qualquer modo, pode a coisa ser objeto de venda com reserva de domínio. Na dúvida sobre a individuação do bem que eventualmente esteja na posse de terceiro, o Código de-termina que o juiz decida em favor do terceiro adquirente de boa-fé.1.4.5. Venda sobre documento: trata-se de uma cláu-sula que substitui a tradição da coisa pela entrega de um título que a represente, conforme disciplina dos arts. 529 a 532 do CC. Ajustado o contrato de venda sobre documentos, também chamada venda contra documen-tos (porque o pagamento se faz contra a apresentação dos documentos), considera-se cumprida a obrigação de entregar o vendedor a coisa vendida (tradição), uma vez colocada a documentação nas mãos do comprador ou confi ada sua entrega a pessoa física ou jurídica. Substituída a tradição real pela tradição fi cta, vigora a presunção de que o vendedor se desincumbiu de seu dever contratual, competindo ao comprador efetuar o pagamento (Código Civil, art. 529). Estando em ordem os documentos exigidos pelo contrato ou pelos usos, considera-se que a coisa vendida corresponde à des-crição do contrato e conserva as qualidades nele asse-guradas. Portanto não lhe cabe recusar o pagamento, a pretexto da qualidade ou do defeito da coisa vendida, a não ser que já tenha sido comprovado o defeito (pa-rágrafo único do art. 529). A venda sobre documentos opera alteração nos princípios que disciplinam a tradição da coisa vendida. Por essa razão, o pagamento deve ser efetuado contra a entrega dos documentos. O art. 530

preferiu dizer na data e no lugar da entrega. Sem esta, o comprador pode reter o pagamento. Portan-to sua efetivação dar-se-á no lugar e no momento em que o comprador os receber. É lícita a conven-ção de lugar diverso. Tem o comprador o arbítrio de recusar o pagamento se a documentação não estiver em ordem. Procedendo, entretanto, de má-fé o vendedor, que já tem prévia ciência de danos sofridos pela coisa vendida, não pode descarregar no comprador os riscos da coisa, a pretexto de havê-la segurado (art. 531). Pode ocorrer e tornou-se habitual na vida mercantil que a documentação seja entregue por intermédio de instituição fi nancei-ra. Nesse caso, a operação de venda é geminada ao contrato de crédito documentado. Na sua execu-ção, credenciado pelo comprador, o banco assume o encargo de efetuar a entrega da documentação ao comprador, obrigando-se a pagar ao vendedor o preço, ao lhe serem confi ados os documentos (art. 532). É uma operação de fi nanciamento, concerta-da com o comprador. Entregues os documentos ao banco, a este cabe verifi car a sua exatidão. Estan-do corretos, paga-se pelo débito do comprador. O vendedor sai do circuito, cabendo ao banco receber o preço diretamente do comprador. Não tem o ban-co o dever de verifi car a coisa vendida nem respon-de perante o comprador senão pela regularidade do documento (art. 532).

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Outros contratosem espécie

1. Troca ou permuta: é o contrato pelo qual as par-tes se obrigam a dar uma coisa por outra que não seja dinheiro. Esse contrato tem diversas caracte-rísticas comuns em relação aos contratos como um todo: bilateralidade, onerosidade, comutatividade, translatividade de propriedade (título aquisitivo), ca-paz de gerar, para cada um dos contratados, a obri-gação de transferir para o outro o domínio da coisa objeto de sua prestação, de forma comercial, sendo que, em caráter excepcional, ocorra a necessidade de forma solene. É anulável a troca de valores de-siguais entre ascendentes e descendentes, sem o consentimento expresso dos demais descendentes e do cônjuge do alienante, salvo se casado no regi-me da separação absoluta de bens. Cada um dos contratantes pagará por metade das despesas com o instrumento da troca. E cada um deles concorrerá com a metade das despesas, necessárias ao ins-trumento da troca, compreendendo-se no vocábulo despesas todos os gastos, inclusive de natureza fi scal (Código Civil, art. 533, I).

2. Doação: é o contrato em que uma pessoa, por liberalidade, transfere do seu patrimônio bem ou vantagem para o de outra, que os aceita. São suas principais características a unilateralidade, envolvendo a prestação de uma só das partes, o que não ocorre nos contratos bilaterais; gratuidade, inspirado no propósito de fazer uma liberalidade; consensualidade, aperfeiçoando-se pela conjunção das vontades do doador e do donatário; solenidade, já que a lei impõe ao contrato de doação a forma escrita, a não ser que se trate de bens móveis, de pequeno valor, quando a simples tradição mostra-

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se sufi ciente. A aceitação constitui fator para o aper-feiçoamento do contrato de doação, caracterizado pela manifestação de concordância da vontade do donatário. Essa aceitação pode ser expressa ou tácita, existindo casos em que a mesma ainda é considerada como presumida. Essa aceitação pre-sumida pode ser abordada nos casos abrangendo o incapaz ou sua formação pelos pais nos casos do nascituro. Não são consideradas doação certas atri-buições gratuitas que se costumam fazer por oca-sião de serviços prestados (gorjetas, gratifi cações) ou no cumprimento de deveres ou desempenho de costumes sociais (esmolas, donativos por ocasião de datas festivas ou cerimônias religiosas), não su-jeitas às normas disciplinares da doação. 2.1. Requisitos:

a) Capacidade ativa: a mesma requerida para os contratos em geral. Algumas restrições estabeleci-das para outras espécies não vigoram nesta, como é o caso do ascendente que não necessita do acordo dos demais para doar a um descendente, ao contrário do que ocorre na compra e venda e na permuta, presumindo-se adiantamento de legítima doação levada a efeito de pai a fi lho ou entre cônju-ges (Código Civil, artigo 544). O marido e a mulher podem doar com outorga recíproca, nos mesmos casos e condições de outras alienações de bens. A doação, todavia, do cônjuge adúltero ao seu cúmplice é proibida e conseqüentemente anulável (Código Civil, art. 550). As doações de um cônjuge ao outro não são proibidas. Não serão, contudo, lí-citas quando contrariarem a índole do regime, como ocorre no da comunhão universal, em que não tem sentido em razão da comunidade de interesses. É possível a doação por mandatário, desde que o doador nomeie, no instrumento, o donatário ou dê ao procurador a liberdade de escolha de um entre os que designar. O menor não pode doar. O tutor e o curador não podem doar bens do tutelado ou curatelado nem dar a autorização, porque a lei lhes confi a a administração dos bens, porém lhes nega a sua disposição (Código Civil, art. 1.749, II, e 1.781).b) Capacidade passiva: existe para todos aque-les que podem praticar os atos da vida civil e, por exceção, justifi cada pelo caráter benéfi co do ato: o nascituro (art. 542), embora não possa exprimir validamente a vontade; pessoa indeterminada e não identifi cada, como é o caso de fi lhos a ainda serem tidos por determinado casal (art. 546). Às pessoas jurídicas de direito privado é lícito aceitar doações. As de direito público, federais, estaduais ou municipais poderão aceitá-las na forma e em obediência ao critério determinado pelas disposi-ções especiais.c) Consentimento: a manifestação convergente das vontades do doador e do donatário. O acordo é expresso quando o donatário declara, por qualquer veículo de manifestação volitiva, que aceita os bens ou vantagens ofertados pelo doador. Mas poderá ser tácito, quando se pode inferir de uma conduta adotada pelo donatário. Será presumido quando fi xar o doador ao donatário um prazo (art. 539), para que declare se aceita ou não a liberalidade: presumir-se-á o consentimento e conseqüentemen-te a perfeição do contrato, se, dentro nele, não for recusada a doação, uma vez que seja esta pura e simples; e ao revés, o silêncio fará presumir a

recusa se for aquela gravada de encargo. Já fi cto é o consentimento para a doação ao incapaz. O Código (art. 543) dispensa a aceitação do absolutamente incapaz nas doações puras. d) Objeto: não há restrições objetivas à doação. Todo bem comercializável pode ser doado: imóveis, móveis corpóreos, móveis incorpóreos, universalidades, direitos patrimoniais não acessórios. Todavia é proibida a doa-ção universal, isto é, aquela que compreende a totali-dade dos bens do doador (art. 548), a não ser que este reserve renda sufi ciente para subsistência. É igualmen-te proibida a doação inofi ciosa (art. 549), ou seja, a de bens que excedam a parte que o doador, no momento da liberdade, possa dispor em testamento.2.2. Classifi cação:

1) Doação pura é aquela que envolve a mutação do bem no propósito de favorecer o donatário, sem que nada lhe seja exigido e sem subordinar-se a qualquer condição ou motivação;2) Doação modal é a que contém imposição de um dever ao donatário, o qual tem de cumpri-lo nas mãos do próprio doador, na de certa pessoa ou de alguém indeterminado. O encargo adere substancialmente ao contrato. Se é nulo, contamina a própria doação, salvo se, do conjunto de circunstâncias, esta puder conhecer-se destacada ou independente daquele. 3) Doação remuneratória é aquela que se efetua com o propósito de recompensar serviços recebidos, pelos quais o donatário não se tornara credor de uma pres-tação exigível juridicamente. Na doação remuneratória existe uma liberalidade, em recompensa de um favor ou serviço, recebido pelo doador.4) Doação condicional ocorre quando a doação se su-bordina a uma condição, suspensiva ou resolutiva, em decorrência de um fato, mesmo que dependente da von-tade do donatário, como um casamento, uma viagem, o êxito em uma competição esportiva ou intelectual etc.5) Doação a termo é aquela em que a doação se dá com um termo fi nal ou inicial. 6) Doação de pais a fi lhos e de um cônjuge a outro ocorre quando se adianta, mesmo que em parte, direitos da sucessão legítima.7) Doação conjuntiva é aquela feita em comum a mais de uma pessoa, sendo distribuída igualmente entre os diversos donatários, salvo se o contrário fi cou estabele-cido em contrato. 2.3. Efeitos da doação: a doação não transfere, por si só, o domínio; faz-se necessária a tradição real para os móveis ou inscrição para os imóveis. A doação gera efeitos obrigatórios e não reais. Ela é em regra marca-da, também, pela irrevogabilidade. Feita a doação em comum a mais de uma pessoa, presume-se ter o doador distribuído entre elas e em partes iguais a coisa doada, salvo se, no contrário, resultar do contrato (Código Ci-vil, art. 551). Se forem os donatários marido e mulher, a lei institui uma substituição recíproca, estatuindo que, com a morte de um deles, não se passa o bem a seus herdeiros, mas subsiste, na totalidade, a doação para o cônjuge supérstite, como um direito de acrescer (Códi-go Civil, parágrafo único do art. 551). Se a doação for feita em forma de prestação periódica ao benefi ciado (Código Civil, art. 545), constituirá em obrigação que se extingue com a morte do benefi ciário ou com a morte do donatário. Os herdeiros do doador não são obrigados a mantê-la, salvo se o contrário se dispuser. Na falta de tal estipulação, considera-se nova doação da parte dos sucessores, se estes deliberarem manter a liberalidade.

O doador pode reservar para si o usufruto vitalício ou temporário da coisa doada. Se for universal a doação, não prevalecerá sem a reserva de renda. O usufruto poderá atingir a totalidade da coisa doada ou somente uma parte dela. O doador pode estipu-lar que os bens doados voltem ao seu patrimônio, se o donatário morrer antes dele (Código Civil, art. 547). Essa cláusula de reversão não pode ser pre-sumida e não pode ser determinada em benefício de outra pessoa. O doador não é sujeito a juros mo-ratórios e não responde pela evicção ou pelo vício redibitório, salvo se tiver expressamente assumido os riscos ou, em caso de evicção, a doação tiver sido efetivada para casamento com certa e deter-minada pessoa, (Código Civil, art. 552). Exceção a esse último comentário, é disposição contratual em sentido diverso. Não deixa de constituir liberalidade a doação remuneratória ou a modal naquilo em que o valor da coisa doada exceder o valor dos serviços remunerados ou o encargo imposto e, como tal, tem de ser tratada.2.4. Invalidade da doação: é nula a doação por incapacidade absoluta do doador, por ilicitude ou impossibilidade absoluta de objeto, por desobedi-ência à forma prescrita (instrumento público, para os imóveis de valor superior ao equivalente a 30 salários mínimos; instrumento público ou particular, para os móveis; tradição imediata, para as doações verbais de pequeno porte). Também é nula a doa-ção universal sem a reserva de usufruto ou renda sufi ciente para a subsistência do doador. Não pode-rá o doador sublimar a garantia patrimonial devida aos seus credores. A lei impõe que o doador res-guarde as legítimas de seus herdeiros necessários (descendentes, ascendentes, cônjuge). Como por ato de última vontade não é possível dispor senão de metade da herança (Código Civil, art. 1.789), a doação não poderá ultrapassar a meação disponí-vel. A doação feita pelo cônjuge adúltero ao cúm-plice é anulável. A legitimidade para anular o ato é do cônjuge prejudicado ou seus herdeiros necessá-rios, até dois anos depois de dissolvida a sociedade conjugal (Código Civil, art. 550).2.5. Revogação da doação: como todo negócio jurídico, a doação é nula por falta dos pressupos-tos legais essenciais e é anulável por defeito de vontade ou por defeito social. Como todo negócio jurídico, a doação resolve-se por uma causa super-veniente e determinante de sua cessação. A lei se refere às causas específi cas, que são a ingratidão do donatário e o descumprimento de en-cargo. Em qualquer desses casos, não quer a esta-bilidade econômica manter em estado de pendência indefi nida a possibilidade de desfazimento do ato e, por isso, fi xa um prazo de decadência ânuo, a con-tar de quando chegue ao conhecimento do doador o fato que a autorizar e de ter sido o donatário o seu autor (art. 559). Os dois requisitos para o início da contagem do prazo são cumulativos. Se o doador tem ciência do fato, mas desconhece a autoria, o prazo somente começa a fl uir a partir do momento do conhecimento também da autoria do fato pelo donatário. Não permite a qualquer, mesmo que tenha inte-resse imediato, promover a revogação, senão ao próprio doador, que só ele tem a legitimação res-pectiva. A ação somente pode ser iniciada contra

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o donatário, em pessoa. Se, porém, qualquer das partes falecer após a propositura da ação (Código Civil, art. 560), esta poderá continuar com os her-deiros do doador contra o donatário, ou com o pri-meiro contra os herdeiros do segundo, ou com os sucessores de um contra os do outro. É, portanto, personalíssima, em nosso direito, a faculdade de pedir a revogação, ao contrário de outros sistemas.Em seguimento, desdobrando-os nos dois itens seguintes, veremos em que consiste o descumpri-mento do encargo e a ingratidão.a) Revogação por descumprimento do encargo: pode o doador estipular encargo ao donatário para com ele próprio, para com terceiro ou no interesse geral. E o donatário, pelo fato de só aceitar a libera-lidade, obriga-se ao seu cumprimento. A obrigação resultante do encargo imposto e aceito é juridica-mente exigível pelo próprio doador, bem como pelo terceiro benefi ciário ou pelo órgão do Ministério Pú-blico no caso de ser de interesse geral.Não se contentando a lei com esta sanção, creden-cia ainda o doador com a faculdade personalíssima de promover, por ação própria, a revogação da li-beralidade, com fundamento no inadimplemento do benefi ciário. Para tanto, é mister que seja o donatário constituído em mora, mediante interpela-ção. Sua situação equivale à de um contratante em inadimplemento culposo, que gera uma condição resolutiva tácita, equiparável ao que acontece com os demais contratos. A doação modal, sem perder a natureza própria de liberalidade, aproxima-se dos contratos bilateriais (Código Civil, art. 555). b) Ingratidão do donatário: pode o doador revo-gar a doação por ingratidão do donatário, tomada a expressão não no seu sentido vulgar, mas em acep-ção técnica, compreensiva de fatos que traduzam atentado do favorecido contra a integridade física ou moral do doador. Ao contrário do direito alemão, em que a ingratidão consiste em falta grave gene-ricamente considerada e praticada pelo donatário contra o doador ou seus parentes mais próximos, no nosso, a lei enumera taxativamente as hipóteses - numerus clausus. Tem, pois, esta revogação cará-ter de pena, e somente cabe nos expressos termos da defi nição legal (Código Civil, arts. 557 e 558). Os casos especifi cados na norma são os seguintes:I) Atentado contra a vida do doador, seu cônjuge, ascendente, descendente, ainda que adotivo, ou ir-mão, ou cometimento de crime de homicídio doloso contra eles. Somente a tentativa ou a consumação de homicídio doloso o caracteriza, porque a au-sência da intenção no delito culposo exclui aquela deplorável insensibilidade moral que a lei civil quer punir. Também não se compreende a falta de cuida-dos e de assistência. Por outro lado, a absolvição do acusado no juízo criminal, por qualquer das es-cusativas de criminalidade, apagando o delito, ilide a ação revocatória, que não poderá mais vingar.O art. 561 do Código atribui aos herdeiros do doador a legitimidade para a ação de revogação, excluindo tal legitimidade, no entanto, se o doador tiver per-doado o donatário antes de falecer. Esse perdão tem que ser inequívoco. Não necessita, porém, ser reduzido a escrito. A sua prova pode ser efetivada por qualquer meio admitido em lei, na medida em que não há exigência de forma especial.II) Ofensa física contra o doador, seu cônjuge, as-

cendente, descendente, ainda que adotivo, ou irmão. Mesmo que não tenha havido atentado contra a vida, só a agressão física é sufi ciente para autorizar a revo-gação. Não exige a lei civil seja o agressor condenado, criminalmente. Basta fundamentar a existência de ofen-sa física devidamente comprovada, a crueldade corporal apurada.III) A injúria e a calúnia contra o doador, seu cônjuge, ascendente, descendente, ainda que adotivo, ou irmão, nos termos em que estes delitos são defi nidos na lei pe-nal, constituem, à sua vez, fatos autorizadores da revo-gação, por trazerem atentado contra a integridade moral do doador (calúnia, art.138, e injúria, art.140, ambos do Código Penal).IV) Finalmente, a lei considera ingratidão a recusa de alimentos ao doador, pressupondo que os reveses da vida lhe tenham imposto esta necessidade. Mas, para que se confi gure tal hipótese de ingratidão, é mister que concorram três requisitos. O primeiro é poder ministrá-los ao donatário, sem sacrifício da própria subsistência e de seus familiares; o segundo é ser devedor deles o donatário, por faltarem os parentes mais próximos do doador; o terceiro é a recusa do donatário, o que pres-supõe solicitação, pois não seria razoável a imposição da penalidade, na insciência, por parte do obrigado, de estar o doador em necessidade.Proferida a sentença revogadora, produz efeitos “ex nunc”, isto é, a partir da data da citação do réu. Até en-tão, é um possuidor de boa-fé e um proprietário legítimo. Tem, portanto, direito aos frutos até aquele momento percebidos, respondendo pelos posteriores ou seu equivalente. Como conseqüência da sentença, deverá restituir em espécie a coisa doada e, se não for possível, indenizar, não pelo valor do tempo da doação, nem do momento da sentença, porém por um termo médio. Na hipótese de o bem objeto da doação tiver sido alienado a terceiro antes da citação, não pode o doador reivindicar o bem, cabendo-lhe apenas indenização por perdas e danos do donatário (Código Civil, art. 563). O objetivo aqui é proteger o terceiro de boa-fé.Não são suscetíveis também de revogação por ingrati-dão aquelas doações que não são liberalidade pura. Ex-cluem-se, portanto, (Código Civil, art.564): as remunera-tórias, porque pressupõem a recompensa de um serviço recebido pelo doador; as modais, porque a imposição de encargo ao donatário sujeita-o a uma obrigação cujo descumprimento traz a revogação como conseqüência e, se o cumpre, quita-se com o doador. Não são susce-tíveis, também, de revogação por ingratidão as doações realizadas em cumprimento de obrigação natural.Mas, em nenhum caso, é lícito renunciar, por antecipa-ção, à faculdade de revogar a doação por ingratidão do donatário, porque se trata de direito instituído com cará-ter de ordem pública. O doador tem a liberdade de não usar dele. Mas não tem a de abrir mão de fazê-lo, por antecipação (Código Civil, art. 556).

3. Locação de Coisas: é o contrato pelo qual uma pes-soa se obriga a ceder temporariamente o uso e o gozo de uma coisa não fungível, mediante remuneração. As partes são chamadas locador, ou senhorio, ou arrenda-dor; e locatário, ou inquilino, ou arrendatário. Trata-se de um contrato pessoal, bilateral, oneroso, consensual e de execução sucessiva. O Código Civil regulou somente a locação de coisas que não sejam imóveis regulados pela Lei do Inquilinato (Lei nº 8.245/91) ou pelo Esta-tuto da Terra (Lei nº 4.504/64) que não foram por ele

revogados.4. Prestação de serviços: é o contrato em que uma das partes se obriga para com a outra a fornecer-lhe a prestação de sua atividade, mediante remune-ração. Do contrato de prestação de serviços, antes conceituador de toda forma de prestação de ativida-de remunerada, adveio o contrato de trabalho, que pressupõe a não-eventualidade, a onerosidade, e a subordinação. O direito do trabalho, porém, não aboliu a prestação civil de serviços. Ao revés, sub-sistem ambas as espécies contratuais, com vida autônoma. Para a prestação de serviços, regulada no Código Civil, foram destinadas as hipóteses resi-duais, que não caracterizem o contrato de trabalho e que não estejam reguladas por leis especiais, tais como as que regem a atividade dos funcionários públicos (Código Civil, art. 593).

5. Empreitada: é o acordo no qual uma das partes (empreiteiro) se obriga, sem subordinação jurídica (senão confi gurará contrato de emprego, regido pelo direito do trabalho), a realizar certo trabalho para a outra (dono da obra), com material próprio ou por este fornecido, mediante remuneração glo-bal ou proporcional ao trabalho executado.A lei especifi ca duas espécies de empreitada: a de mão-de-obra, na qual o empreiteiro apenas parti-cipa com o seu trabalho e aquela em que fornece também os materiais necessários à sua execução (Código Civil, art. 610). No silêncio do contrato, a presunção é a de a empreitada ser apenas de mão-de-obra.

6. Empréstimo: sob a denominação genérica de empréstimo, existem as fi guras contratuais do co-modato e do mútuo, que exprimem a mesma idéia de utilização de coisa alheia acompanhada do de-ver de restituição, porém se diferenciam pela natu-reza, pela celebração e pelos seus efeitos. 6.1. Comodato: é o empréstimo gratuito de coi-sas não fungíveis (Código Civil, art. 579), ou seja, o contrato pelo qual uma pessoa entrega à outra, gratuitamente, coisa não fungível, para que a utilize e depois restitua. Trata-se de um contrato unilateral, porque gera obrigações somente para o comodatá-rio; gratuito, porque somente o comodatário aufere proveitos ou vantagens. Caso seja estipulada retri-buição ou contraprestação, desfi gura-se esse con-trato, passando a ser aluguel, caso se estipule em dinheiro ou alguma outra forma de contrato atípico; real, porque se forma pela tradição da coisa; pode não ser essencialmente celebrado em caráter de pessoalidade, embora habitualmente traduza um favorecimento pessoal. O comodato não exige for-ma solene da declaração de vontade. No comodato apenas o comodatário se benefi cia. Se o comodato for, porém, conveniente (como no caso de facilitar a conservação da própria coisa), terá condições de existência e validade, uma vez que preceda autori-zação especial do dono ou, se for este incapaz, do juiz (Código Civil, art. 580).No tocante aos requisitos subjetivos deste contrato, observa-se que os administradores de bens alheios, especialmente de incapazes (tutores e curadores), não podem dá-los em comodato. Não é preciso que o comodante seja proprietário. Basta que, por

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direito, o mesmo uso que pretende emprestar lhe pertença. Poderá ser comodada qualquer coisa não fungível, móvel ou imóvel. Coisa fungível não pode ser objeto de comodato, e sim de mútuo, porque a sua caracterização pelo gênero e pela qualidade é incompatível com a restituição em espécie. Excep-cionalmente, admite-se que, por contrato, as partes ajustem a infungibilidade de coisas naturalmente fungíveis. O comodatário recebe a coisa tal qual se acha, sem que exista para o comodante a obriga-ção de pô-la em estado de servir, nem de repará-la.É um contrato temporário, em regra. O comodan-te tem a faculdade de reclamar a coisa a qualquer tempo, se for de duração indeterminada. Ajustado o contrato a prazo certo, deve este ser respeitado, salvo se o comodante, demonstrando, em juízo, a sua necessidade urgente e imprevista, vier a ser autorizado a antecipar sua recuperação (Código Civil, art. 581). 6.2. Mútuo: é o contrato pelo qual uma das partes transfere uma coisa fungível a outra, obrigando-se a restituir coisa do mesmo gênero, da mesma quali-dade e na mesma quantidade. É, portanto, diferente do comodato, que realiza apenas a cessão de uso: o mútuo exige a transferência da propriedade mes-ma, por não se conciliar a conservação da coisa com a faculdade de consumi-la, sem a qual perde-ria este empréstimo a sua utilidade econômica.É um contratoa) Real: a tradição do objeto é o primeiro ato de sua execução e a condição jurídica da restituição;b) Unilateral: somente o mutuário contrai obriga-ções, uma vez que o mutuante somente deve en-tregar a coisa, ato que, nos contratos ditos reais, integra a sua constituição;c) Gratuito: na ausência de estipulação presume-se a gratuidade. A retribuição não é incompatível com a unilateralidade, porque, ajustados os juros, quem por eles responde é a mesma parte a quem incumbem as demais obrigações;d) Temporário, por ser da sua essência a restitui-ção da coisa;e) Translatício do domínio, porque opera para o mutuário a transferência da propriedade da coisa emprestada.

7. Depósito: é o contrato pelo qual uma pessoa (depositário) recebe um objeto móvel para guardar, até que o depositante o reclame (Código Civil, art. 627). Trata-se de um contrato:a) Real: o depósito somente se perfaz com a tradi-ção efetiva da coisa;b) Gratuito: ainda assim, as partes podem estipular que o depositário seja gratifi cado. A presunção de gratuidade deixa de existir, se o depósito resultar de atividade negocial ou se o depositário o praticar por profi ssão (Código Civil, artigo 628);c) Temporário: o depositário tem de devolver a coi-sa no momento em que lhe for pedida.

8. Mandato: é o contrato pelo qual uma pessoa (mandatário) recebe poderes de outra (mandante) para, em seu nome, praticar atos jurídicos ou admi-nistrar interesses (Código Civil, art. 653). O Código Civil dedicou um capítulo especial à representação, na sua Parte Geral, arts. 115 a 120, pondo fi m ao equívoco de aliar-se a idéia de representação à de

mandato o que não é correto, já que este é apenas uma das formas daquela. Não nos deteremos no conceito e nas espécies de representação. Limitamo-nos a aqui assinalar que o mandato, como representação conven-cional, permite que o mandatário emita a sua declaração de vontade, dele representante, adquirindo direito e as-sumindo obrigações que percutem na esfera jurídica do representado.Quanto à natureza jurídica do ato para o qual o manda-tário é investido de poderes, apenas negócios jurídicos, patrimoniais ou não, podem ser praticados. Essa era a orientação incontestável, antes de 2002; mas, pelo dis-posto no art. 653 do Código Civil brasileiro, que não alude a negócio jurídico, nosso direito admite que tam-bém outros posam nele estar compreendidos, e não somente os negócios jurídicos.O mandato é:a) Consensual: que se perfaz pelo só acordo de von-tades e pode ser verbal ou escrito, por instrumento pú-blico ou particular;b) Gratuito por natureza, embora não o seja essen-cialmente. No direito brasileiro, considera-se o manda-to gratuito, quando não se estipula remuneração, salvo nos casos de ter, como objeto, algo que o mandatário tem como ofício ou profi ssão lucrativa (advogado, des-pachante, corretor), em que vigora a presunção contrá-ria de onerosidade. Nessas hipóteses, faltando acordo sobre a quantia devida e não sendo esta fi xada por lei, o valor será determinado pelos usos do lugar ou, na falta destes, caberá arbitramento pelo juiz, o qual levará em consideração a natureza do serviço, a sua complexidade e duração, o proveito obtido etc. (Código Civil, art. 658); c) Intuitu personae, celebrando-se especialmente em consideração ao mandatário. Traduz, mais do que qualquer outra fi gura jurídica, uma expressão fi duciá-ria, já que o seu pressuposto fundamental é a confi an-ça que o gera;d) Bilateral, com obrigações tanto para o mandatário (Código Civil, art. 667) quanto para o mandante (art. 675), cabendo, com precisão, distinguir o oneroso, que é sempre bilateral, do gratuito, que é normalmente unilateral, uma vez que os deveres de ressarcimento de danos e reembolso de despesas são eventuais e subseqüentes à formação do contrato;e) Preparatório, em razão de não esgotar a intenção das partes, habilitando o mandatário para a prática de atos subseqüentes que nele não estão compreendi-dos;f) Revogável, salvo as hipóteses previstas expressa-mente no Código (arts. 683 a 686, parágrafo único).

9. Contrato de transporte: é aquele pelo qual alguém mediante retribuição se obriga a receber pessoas ou coisas (animadas ou inanimadas) e levá-las até o lugar do destino, com segurança, presteza e conforto (Códi-go Civil, art. 730).

10. Seguro: é o contrato por via do qual uma das par-tes (segurador) se obriga para com a outra (segurado), mediante o recebimento de um prêmio, a garantir in-teresse legítimo desta, relativo a pessoa ou a coisa, contra riscos futuros predeterminados (Código Civil, art. 757). Compete privativamente à União legislar so-bre seguros (Constituição de 1988, art. 22, nº VII). Não obstante a variedade de espécies, predomina, em nos-so direito positivo, o conceito unitário do seguro, segun-

do o qual há um só contrato que se multiplica em vários ramos ou subespécies, construídos sempre em torno da idéia de dano (patrimonial ou moral), cujo ressarcimento ou compensação o segurado vai buscar, mediante o pagamento de prestações, ao contrário do conceito dualista que separa os de natureza ressarcitória (seguros de danos) daquele em que está presente apenas o elemento aleatório (seguro de vida), sem a intenção indenizatória ou visando a uma capitalização.O instrumento escrito é elemento de prova, susce-tível de suprimento por outros meios. O elemento comprobatório da celebração do contrato, quando não há a emissão de apólice ou bilhete de segu-ro, previsto no art. 758 do Código é o pagamento do prêmio. O Código admite a recondução tácita do contrato pelo mesmo prazo, apenas por uma vez. Caso as partes queiram prorrogá-lo por mais tempo terão que manifestar expressamente a sua vontade neste sentido (art. 774). O objetivo da lei é impedir que o segurado tenha o seu contrato indefi nidamente prorrogado, sem que manifeste expressamente essa vontade.

11. Jogo e Aposta: jogo é o contrato em que duas ou mais pessoas prometem, entre si, pagar certa soma àquele que lograr um resultado favorável de um acontecimento incerto; aposta é o contrato em que duas ou mais pessoas prometem, entre si, pa-gar certa soma àquele cuja opinião prevalecer em razão de um acontecimento incerto. Ambos são contratos aleatórios; ambos colocam nas mãos do acaso a decisão de sua vitória recíproca. Mas, enquanto no jogo há propósito de distração ou ga-nho e participação dos contendores, na aposta há o sentido de uma afi rmação a par de uma atitude de mera expectativa.

12. Fiança: é o negócio jurídico com o objetivo de oferecer ao credor uma segurança de pagamento, além daquela genérica situada no patrimônio do devedor. Pode efetivar-se mediante a separação de um bem determinado, móvel ou imóvel, com o encargo de responder o bem gravado ou o seu rendimento pela solução da obrigação (penhor, hipoteca, anticrese), casos em que fi ca estabele-cido um ônus sobre a própria coisa, constituindo espécie de garantia real, por isso mesmo perti-nentes aos direitos reais. Como garantia pessoal, ora resulta do acordo livremente ajustado (fi ança convencional), ora emana do comando da lei (fi an-ça legal), ora provém de imposição do juiz (fi ança judicial). A estas últimas não nos referiremos, mas à primeira, que defi niremos como o contrato por via do qual uma pessoa garante satisfazer o credor uma obrigação assumida pelo devedor, caso este não a cumpra (Código Civil, art. 818).É um contrato: a) Unilateral, porque gera obriga-ções somente para o fi ador; b) Gratuito, porque cria vantagens para uma só das partes, nenhum benefício auferindo o fi ador; c) Intuitu Personae, porque ajustado em função da confi ança de que desfruta o fi ador; d) Acessório, como todo con-trato de garantia, porque pressupõe sempre a existência de obrigação principal, seja esta de na-tureza convencional, seja de natureza legal.Não se deve confundir fi ança e aval. Ambos são

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Page 10: Direito Civil III - Contratos

tipos de garantia pessoal, mas, enquanto a fi ança

é uma garantia fi dejussória ampla e hábil a aceder

a qualquer espécie de obrigação, convencional,

legal ou judicial, o aval é restrito aos débitos sub-

metidos aos princípios cambiários. Em razão da

velocidade dos títulos desta espécie, não está o

aval sujeito às restrições de que padece a fi ança,

no tocante à outorga do outro cônjuge. Nos seus

efeitos também difere, gerando o aval responsabi-

lidade sempre solidária, ao contrário da fi ança, que

pode sê-lo, ou não. LINK ACADÊMICO 8

Declarações unilaterais de vontade

1. Promessa de recompensa: ocorre quando

alguém, por anúncio público, oferece recompen-

sa a quem desempenhe certa prestação, e está

obrigado a pagá-la, quer o candidato haja proce-

dido com o propósito de disputá-la ou não. A pu-

blicidade tanto pode ser a difusão pela imprensa

quanto resultar de proclamas ou pregões de viva

voz ou radiodifundidos, televisionados, por mídia

eletrônica etc. O agente vincula-se em razão da

vontade declarada, bastando, portanto, que seja

ela externada por qualquer veículo. É declaração

endereçada a qualquer anônimo, determinando-se

o sujeito ativo da relação obrigacional no momento

em que se verifi ca o preenchimento dos requisitos

de exigibilidade da prestação.

A promessa é obrigatória a partir do momento em

que se torne pública; poderá, todavia, ser objeto

de declaração contrária de vontade, desde que o

promitente ressalve, em qualquer tempo, o direito

de revogá-la. Caso o faça, no entanto, a lei garante

ao candidato de boa-fé o direito ao ressarcimen-

to das despesas em que tiver incorrido (Código

Civil, parágrafo único do art. 856). Fixado prazo,

presume-se ter o anunciante renunciado ao direito

de retirá-la, até o seu escoamento.

2. Gestão de negócios: uma pessoa realiza atos

no interesse de outra, como se fosse seu represen-

tante, embora não investido dos poderes respecti-

vos, arrogando-se, assim, a qualidade de gestor

de negócios alheios. Assim, a gestão de negócios

é a administração ofi ciosa de interesses alheios.

Há uma ingerência na esfera jurídica alheia, que

deixa de ser ilícita, porque inspirada no propósito

de bem servir e de ser útil ao dono e porque reali-

zada segundo a vontade presumível deste (Código

Civil, art. 861). Se a iniciar o gestor contra vontade

presumível do dono do negócio, responderá pelo

fortuito, a não ser se prove que o dano adviria

ainda que se tivesse abstido e, se o proveito for

inferior aos prejuízos, poderá o dono exigir que o

gestor restitua as coisas ao estado anterior ou o

indenize da diferença (Código Civil, art. 863). Mas,

se tiver havido intervenção contra a vontade ma-

nifesta do dono, já não há gestão, ao contrário do que

enganosamente menciona o art. 862 do Código Civil,

porém ato ilícito, com aplicação dos preceitos a estes

atinentes.

Para que uma atuação possa conceituar-se como ges-

tão de negócios, é necessária a verifi cação de certos

pressupostos de fato: a) tratar-se de negócio alheio,

porque, se for próprio, é pura administração; b) proce-

der o gestor ao interesse do proprietário ou segundo a

sua vontade, seja real ou presumida; c) trazer a inten-

ção de agir proveitosamente para o dono; d) agir ofi cio-

samente, pois que, se tiver havido uma delegação, é

mandato; e) limitar-se a ação do gestor a atos de natu-

reza patrimonial (negócios), uma vez que os de nature-

za diferente exigem sempre a outorga de poderes.

3. Enriquecimento sem causa: dá-se quando alguém

tira proveito injustifi cado por fato de outrem, surgindo,

portanto, o direito de obter do benefi ciário indevido

aquilo que verdadeiramente compete à pessoa que

foi lesada. O sistema jurídico não admite, assim, que

alguém obtenha um proveito econômico às custas de

outrem, sem que esse proveito decorra de uma causa

juridicamente reconhecida. A causa para todo e qual-

quer enriquecimento não só deve existir originariamen-

te, como também deve subsistir, já que o desapareci-

mento superveniente da causa do enriquecimento de

uma pessoa, às custas de outra, também repugna ao

sistema (Código Civil, art. 885). O art. 884 do Código

Civil obriga aquele que, sem justa causa, enriquecer-se

à custa de outrem, a restituir o indevidamente auferido.

Note-se que não incluiu o Código como elemento de

confi guração do enriquecimento sem causa; a neces-

sidade de a outra parte empobrecer com o enriqueci-

mento do benefi ciado. Para que o enriquecimento se

causa se confi gure, é preciso que o proveito obtido por

sua atividade ou por sua causa tenha sido ilegitima-

mente apropriado pelo benefi ciado, sem que o lesado

possa por qualquer outro meio obter o benefício dela

decorrente. Não caberá restituição por enriquecimen-

to sem causa se a lei conferir à pessoa lesada outros

meios para se ressarcir do prejuízo sofrido (Código

Civil, art. 886).

4. Pagamento indevido: é uma espécie de enriqueci-

mento ilícito, por decorrer de uma prestação feita por

alguém com o intuito de obter extinção de uma obri-

gação erroneamente pressuposta, gerando, a quem

recebeu, o dever legal de restituir. Todo aquele que

recebeu o que não lhe era devido, fi ca obrigado a res-

tituir; obrigação que incumbe àquele que recebe dívida

condicional antes de cumprida a condição. Àquele que

voluntariamente pagou o indevido incumbe a prova de

tê-lo feito por erro. Aos frutos, acessões, benfeitorias

e deteriorações sobrevindas à coisa, dada em paga-

mento indevido, aplica-se o disposto no Código sobre o

possuidor de boa-fé ou de má-fé, conforme o caso. Se

aquele que, indevidamente, recebeu um imóvel o tiver

alienado em boa-fé, por título oneroso, responde so-

mente pela quantia recebida; mas, se agiu de má-

fé, além do valor do imóvel, responde por perdas

e danos. Se o imóvel foi alienado por título gratuito

ou se, alienado por título oneroso, o terceiro adqui-

rente agiu de má-fé, cabe ao que pagou por erro o

direito de reivindicação.

Ficará isento de restituir pagamento indevido

aquele que, recebendo-o como parte de dívida

verdadeira, inutilizou o título, deixou prescrever a

pretensão ou abriu mão das garantias que assegu-

ravam seu direito; mas aquele que pagou dispõe

de ação regressiva contra o verdadeiro devedor e

seu fi ador. Se o pagamento indevido tiver consisti-

do no desempenho de obrigação de fazer ou para

eximir-se da obrigação de não fazer, aquele que

recebeu a prestação fi ca na obrigação de indeni-

zar o que a cumpriu, na medida do lucro obtido.

Não se pode repetir o que se pagou para solver

dívida prescrita ou cumprir obrigação judicialmente

inexigível. Não terá direito à repetição aquele que

deu alguma coisa para obter fi m ilícito, imoral, ou

proibido por lei. O que se deu reverterá em favor

de estabelecimento local de benefi cência, a crité-

rio do juiz.

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A coleção Guia Acadêmico é o ponto de partida dos estudos das disciplinas dos cursos de gradu-ação, devendo ser complementada com o mate-rial disponível nos Links e com a leitura de livros didáticos.

Civil - Contratos – 2ª edição - 2009

Autor:

Rodrigo Martiniano Tardeli, Bacharel em Direito pela Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mes-quita Filho” - UNESP; Pós-graduado em Direito Civil e Direito Processual Civil pela Universidade de Franca - UNIFRAN; Mestrando em História do Direito pelo Departamento de Direito Civil da Fa-culdade de Direito da Universidade de São Paulo - USP; Professor dos Cursos de Graduação em Di-reito da Universidade Nove de Julho - UNINOVE e da Fundação Armando Álvares Penteado - FAAP; Consultor Jurídico em São Paulo.

A coleção Guia Acadêmico é uma publicação da Memes Tecnologia Educacional Ltda. São Paulo-SP.

Endereço eletrônico: www.memesjuridico.com.br

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