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Boletim Criminal Comentado–novembro 2018 (semana 5) 1 CAO-Crim Boletim Criminal Comentado - novembro 2018 (semana 5) Mário Luiz Sarrubbo Subprocurador-Geral de Justiça de Políticas Criminais e Institucionais Coordenador do CAO Criminal: Arthur Pinto de Lemos Júnior Assessores: Fernanda Narezi Pimentel Rosa Marcelo Sorrentino Neira Paulo José de Palma Ricardo José Gasques de Almeida Silvares Rogério Sanches Cunha Analista Jurídica Ana Karenina Saura Rodrigues

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Boletim Criminal Comentado–novembro

2018 (semana 5)

1

CAO-Crim

Boletim Criminal Comentado - novembro 2018

(semana 5)

Mário Luiz Sarrubbo

Subprocurador-Geral de Justiça de Políticas Criminais e Institucionais

Coordenador do CAO Criminal:

Arthur Pinto de Lemos Júnior

Assessores: Fernanda Narezi Pimentel Rosa

Marcelo Sorrentino Neira Paulo José de Palma

Ricardo José Gasques de Almeida Silvares

Rogério Sanches Cunha

Analista Jurídica

Ana Karenina Saura Rodrigues

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Boletim Criminal Comentado–novembro

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Sumário

ESTUDOS DO CAOCRIM ........................................................................................................................... 3

Mensagens contidas em celular apreendido. Limites à investigação criminal.....................................3

STF/STJ: decisões de interesse institucional COMENTADAS PELO CAOCRIM ........................... 7

DIREITO PROCESSUAL PENAL:

1-TEMA: O STJ entende que não existe a possibilidade de intervenção de terceiros em

habeas corpus e no respectivo recurso ordinário, por se tratar o HC de meio processual que

não possui partes nem litigantes, mas tem como única função resguardar o direito de

locomoção..........................................................................................................................7

2- TEMA- A medida cautelar de afastamento de função pública não afeta diretamente a liberdade

de locomoção, sendo inviável, por isso, a sua correção por meio de habeas corpus ou de seu recurso

ordinário, salvo se imposta conjuntamente com a prisão preventiva ou outras medidas cautelares

diversas da prisão que possam, de alguma forma, restringir o direito tutelado pela via

mandamental..................................................................................................................................7

3 - TEMA: Inversão da ordem de oitiva de testemunhas inquiridas por precatório não gera

nulidade..........................................................................................................................................9

DIREITO PENAL:

1- PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. VALOR DOS BENS SUBTRAÍDOS SUPERIOR A 10 % (DEZ POR

CENTO) DO SALÁRIO MÍNIMO VIGENTE À ÉPOCA DOS FATOS. INAPLICABILIDADE...........................11

2- TEMA: NATUREZA DO CRIME DO ART 298 DO CP- DELITO FORMAL..............................................12

STF/STJ: Notícias de interesse institucional .......................................................................................... 13

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ESTUDOS DO CAOCRIM

Mensagens contidas em telefone celular apreendido. Limites à investigação criminal.

Em um mundo conectado à velocidade das fibras ópticas, a forma como as pessoas se

comunicam foi transformada, de modo que as correspondências por meio de mensagens

(escritas ou não), há pouco tempo relegada a terceiro plano pela comunicação telefônica,

voltou a ser a grande preferência. Esse fenômeno foi impulsionado pelos avanços tecnológicos

dos aparelhos telefônicos móveis que executam sistema operacional equivalentes a

computadores e permitem acesso à rede mundial de computadores, bem como a troca de

mensagens em tempo real. A forma de se corresponder, portanto, mudou. Os serviços postais

e as cartas deram lugar à transmissão on line e aplicativos que enviam, recebem e armazenam

as mensagens trocadas entre os cidadãos. Essas novas tecnologias vestíveis, que imprimem

mudanças no comportamento humano, desafiam a tipificação de algumas condutas ante a

legislação penal vigente, que muitas vezes não acompanha a evolução da modernidade.

Coloca-se, então, a seguinte questão: comete o crime de atentado ao sigilo das

correspondências em tela a autoridade que realiza buscas nas mensagens correspondidas, isto

é, remetidas e recebidas, contidas em aparelho de telefone móvel (celular)? Renee de Souza,

promotor de Justiça do Mato Grosso, na obra LEIS PENAIS ESPECIAIS, publicada pela Ed.

Juspodivm (pp 261-264), explica a questão dividindo a análise em duas situações distintas:

celular não apreendido e celular apreendido pela autoridade pública.

No caso do aparelho de celular não apreendido, isto é, caso a autoridade pública busque obter

as correspondências contidas em um celular de que não tenha a posse, mediante, por

exemplo, a instalação de um software capaz de realizar transferência de arquivos, ela deve

representar por um mandado judicial para tanto, sob pena de atentar contra a inviolabilidade

de correspondência. Nesse caso, o próprio art. 7º, III, da Lei 12.965/14 (Marco Civil da

Internet) assegura ao usuário o direito à inviolabilidade e ao sigilo de suas comunicações

privadas armazenadas, salvo por ordem judicial[1].

Ao contrário, no caso de buscas realizadas em um aparelho celular apreendido licitamente,

não haverá crime de atentado ao sigilo de correspondência. Insta inicialmente esclarecer que

inexiste, nesses casos, sigilo telefônico propriamente dito protegido pelo artigo 5º, XII, da

Constituição, que se refere à comunicação em si, e não aos dados já armazenados. Essa norma

e a Lei 9.296/1996 resguardam as conversas ocorridas em tempo real, não as que

aconteceram no passado.

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Partindo desse ponto, registre-se que a apreensão de objetos pela autoridade pública, em

meio a uma atividade oficial e legítima, autoriza que eles sejam analisados, ou periciados, a

fim de constatar sua ligação com o ilícito em apuração, seja para identificar provas da infração,

seja para a própria defesa do cidadão. Essa é a teleologia do art. 240, § 1º, do CPP, o qual

indica explicitamente que o objeto apreendido deverá servir para essas finalidades[2].

Ocorre que a apreensão de bens nem sempre necessita de mandado judicial uma vez que a

administração pública, no exercício do poder de polícia e ante a autoexecutoriedade de seus

atos, pode, de per se, impor restrição a direitos individuais.

Com a precisão que lhe é inerente, ensina José dos Santos Carvalho Filho: “outro ponto a

considerar é o de que a autoexecutoriedade não depende de autorização de qualquer outro

Poder, desde que a lei autorize o administrador a praticar o ato de forma imediata. Assim,

acertada a decisão segundo a qual, no exercício de poder de polícia administrativa, não

depende a Administração da intervenção de outro poder para torná-lo efetivo. Quando a lei

autoriza o exercício do poder de polícia com autoexecutoriedade, é porque se faz necessária

a proteção de determinado interesse coletivo.”[3]

Em se tratando de ato da polícia judiciária, a apreensão vem expressamente autorizada pelo

art. 6º do CPP, que impõe à autoridade policial o dever de apreender os objetos que tiverem

relação com o fato, colher todas as provas que servirem para o esclarecimento do fato e suas

circunstâncias, além de determinar, se for caso, que se proceda a quaisquer outras perícias.

Por isso, o Supremo Tribunal Federal, no HC 91.867/PA, de relatoria do ministro Gilmar

Mendes, decidiu que não violava o princípio da intimidade o fato de o policial acessar a lista

de telefones no celular de um indivíduo. Embora o precedente não se refira expressamente

ao conteúdo das correspondências contidas no aparelho, serve para demonstrar que, após a

apreensão regular do aparelho, é legítima ao Estado a verificação de seu conteúdo.[4]

Assim sendo, havendo regular apreensão de um aparelho celular pela autoridade pública[5],

não configura atentado ao sigilo da correspondência do cidadão a análise das mensagens

recebidas e enviadas nele contidas[6]. Parece-nos aqui aplicável a lógica de que quem pode o

mais, pode o menos. Se a apreensão de determinado objeto é feita regularmente pela atuação

investigatória estatal, é lícita uma análise técnica e pericial do objeto apreendido.

Embora se referindo à busca e apreensão, e seguindo essa teleologia, o STJ já decidiu que “se

o telefone celular foi apreendido em busca e apreensão determinada por decisão judicial, não

há óbice para que a autoridade policial acesse o conteúdo armazenado no aparelho, inclusive

as conversas do WhatsApp. Para a análise e a utilização desses dados armazenados no celular,

não é necessária nova autorização judicial. A ordem de busca e apreensão determinada já é

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suficiente para permitir o acesso aos dados dos aparelhos celulares apreendidos” (STJ. 5ª

Turma. RHC 77.232/SC, Rel. Min. Felix Fischer, julgado em 03/10/2017).

Há, contudo, decisão recente do Superior Tribunal de Justiça, em que se entendeu necessária

a obtenção de mandado judicial para a devassa das conversas contidas no aparelho celular

apreendido (REsp 1.727.266/SC, j. 05/06/2018). De acordo com o entendimento da ministra

Laurita Vaz – relatora do recurso –, a medida decretada tem natureza híbrida, um misto entre

interceptação telefônica e quebra de sigilo de dados. Mas, considerando as características

próprias do sistema interceptado e as consequências advindas da hibridez, a inexistência de

disciplina legal impede que se admita este meio de prova.

Segundo o tribunal, não seria possível equiparar integralmente a medida à intercepção

telefônica porque o acesso ao aplicativo permite não somente a obtenção irrestrita de toda a

comunicação anterior como também possibilita que o agente público interfira na

comunicação entre os usuários – inclusive excluindo mensagens –, o que não é possível no

monitoramento de conversas telefônicas, que são apenas ouvidas e gravadas. Esta

possibilidade de interferência e de manipulação dificulta – quando não impossibilita – que o

investigado exerça o contraditório sobre a prova colhida e demonstre, por exemplo, que não

se trata de algo integral e que determinados trechos da comunicação foram retirados do

contexto. Por isso, concluiu-se:

“Cumpre assinalar, portanto, que o caso dos autos difere da situação, com legalidade

amplamente reconhecida pelo Superior Tribunal de Justiça, em que, a exemplo de conversas

mantidas por e-mail, ocorre autorização judicial para a obtenção, sem espelhamento, de

conversas já registradas no aplicativo WhatsApp, com o propósito de periciar seu conteúdo”.

[1] Art. 7º O acesso à internet é essencial ao exercício da cidadania e ao usuário são assegurados os seguintes direitos:

I – Inviolabilidade da intimidade e da vida privada, sua proteção e indenização pelo dano material ou moral decorrente de

sua violação;

II – inviolabilidade E sigilo do fluxo de suas comunicações pela internet, salvo por ordem judicial, na forma da lei;

III – inviolabilidade e sigilo de suas comunicações privadas armazenadas, salvo por ordem judicial;

(…).

[2] Dispõe o art. 240.

“A busca será domiciliar ou pessoal.

§ 1º Proceder-se-á à busca domiciliar, quando fundadas razões a autorizarem, para:

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a) prender criminosos;

b) apreender coisas achadas ou obtidas por meios criminosos;

c) apreender instrumentos de falsificação ou de contrafação e objetos falsificados ou contrafeitos;

d) apreender armas e munições, instrumentos utilizados na prática de crime ou destinados a fim delituoso;

e) descobrir objetos necessários à prova de infração ou à defesa do réu;

f) apreender cartas, abertas ou não, destinadas ao acusado ou em seu poder, quando haja suspeita de que o conhecimento

do seu conteúdo possa ser útil à elucidação do fato;

g) apreender pessoas vítimas de crimes;

h) colher qualquer elemento de convicção”.

[3] CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. 31ª ed. Rio de Janeiro: Lumem Juris. 2017. p. 91.

[4] Vejamos, naquilo que importa ao presente estudo, como foi lavrada a decisão do Pretório Excelso: “Ilicitude da prova

produzida durante o inquérito policial – violação de registros telefônicos de corréu, executor do crime, sem autorização

judicial. 2.1. Suposta ilegalidade decorrente do fato de os policiais, após a prisão em flagrante do corréu, terem realizado a

análise dos últimos registros telefônicos dos dois aparelhos celulares apreendidos. Não ocorrência. 2.2. Não se confundem

comunicação telefônica e registros telefônicos, que recebem, inclusive, proteção jurídica distinta. Não se pode interpretar a

cláusula do artigo 5º, XII, da CF, no sentido de proteção aos dados enquanto registro, depósito registral. A proteção

constitucional é da comunicação de dados e não dos dados. 2.3 Art. 6º do CPP: dever da autoridade policial de proceder à

coleta do material comprobatório da prática da infração penal. Ao proceder à pesquisa na agenda eletrônica dos aparelhos

devidamente apreendidos, meio material indireto de prova, a autoridade policial, cumprindo o seu mister, buscou,

unicamente, colher elementos de informação hábeis a esclarecer a autoria e a materialidade do delito (dessa análise logrou

encontrar ligações entre o executor do homicídio e o ora paciente). Verificação que permitiu a orientação inicial da linha

investigatória a ser adotada, bem como possibilitou concluir que os aparelhos seriam relevantes para a investigação” (HC

91867, Rel. Min. Gilmar Mendes, 2ª T., j. 24/04/2012, Dje-185,19-09-2012).

[5] Segundo Renato Brasileiro, “Para que a apreensão seja considerada lícita, há de se ficar atento aos requisitos da medida

cautelar de busca pessoal e de busca domiciliar. A busca pessoal independe de prévia autorização judicial quando realizada

sobre o indivíduo que está sendo preso, quando houver fundada suspeita de que a pessoa esteja na posse de arma proibida

ou de objetos ou papéis que constituam o corpo de delito, assim como na hipótese de cumprimento de mandado de busca

domiciliar (CPP, art. 244) ” (LIMA, Renato Brasileiro de. Manual de Processo Penal. 3ª ed. Salvador: Juspodivm. 2015. p. 131).

[6] Já decidiu a 2ª Câmara Criminal do TJ-MT pela possibilidade de vasculha em celular apreendido: “Embora existente

autorização judicial nos autos para a interceptação telefônica, o acesso aos dados do aplicativo WhatsAppexistente no

aparelho celular da vítima, apreendido durante a prisão em flagrante delito, não consubstancia quebra de sigilo das

comunicações via telefone, que exige prévia autorização judicial, mas, trata-se, sim, de mera extração de dados de objeto

apreendido relacionado ao crime, nos termos do art. 6º II e III, do CPP. (HC 79845/2016, Des. Rondon Bassil Dower Filho, 2ª

Câmara Criminal, j. 29/06/2016, DJE 05/07/2016).

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STF/STJ: decisões de interesse institucional COMENTADAS PELO CAOCRIM

DIREITO PROCESSUAL PENAL:

1-TEMA: O STJ entende que não existe a possibilidade de intervenção de terceiros em

habeas corpus e no respectivo recurso ordinário, por se tratar o HC de meio processual que

não possui partes nem litigantes, mas tem como única função resguardar o direito de

locomoção.

STJ- PESQUISA PRONTA

Pesquise sobre este tema na base de Acórdãos do STJ: Possibilidade ou não de intervenção de

terceiros em habeas corpus

COMENTÁRIOS DO CAO-CRIM

O art. 654 CPP permite, em tese, que qualquer pessoa maneje o habeas corpus, ainda que não

conte com a autorização do paciente. Essa amplitude acaba por conferir ao HC a característica

de verdadeira ação popular (actio popularis), no sentido de que a qualquer um se defere a

legitimidade para manejar o pedido, não se revestindo, assim, “de faculdade dependente de

capacidade política, civil ou processual”, segundo informa Pontes de Miranda, em notável

obra que dedicou ao tema (História e prática do habeas corpus, 3ª. ed. Rio de Janeiro: José

Konfino, 1955).

Contudo, para STJ e STF, essa amplitude acima demonstrada não possibilita a intervenção de

terceiros no habeas corpus, seja na condição de amicus curiae ou como assistente de

acusação, por se tratar de ação constitucional que objetiva garantir a liberdade de

locomoção dos pacientes (STJ – HC n. 411123-RJ - Rel. Sebastião Reis Junior, j. 06.03.2018, DJe

22.06.2018).

2- TEMA- A medida cautelar de afastamento de função pública não afeta diretamente a

liberdade de locomoção, sendo inviável, por isso, a sua correção por meio de habeas corpus

ou de seu recurso ordinário, salvo se imposta conjuntamente com a prisão preventiva ou

outras medidas cautelares diversas da prisão que possam, de alguma forma, restringir o

direito tutelado pela via mandamental.

STJ- PESQUISA PRONTA

Pesquise sobre este tema na base de Acórdãos do STJ: Viabilidade ou não de impetração de

habeas corpus para obstar o afastamento ou a perda do exercício de função pública

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COMENTÁRIOS DO CAO-CRIM

Conforme bem anotado pelo Ministro Celso de Mello, “a ação penal de habeas corpus,

enquanto instrumento de ativação da jurisdição constitucional das liberdades, configura um

poderoso meio de cessação do injusto constrangimento ao estado de liberdade de locomoção

física das pessoas. Se essa liberdade não se expõe a qualquer tipo de cerceamento, e se o

direito de ir, vir ou permanecer sequer se revela ameaçado, nada justifica – por não estar em

causa a liberdade de locomoção física – o emprego do remédio heroico do habeas corpus”

(HC nº 86878-SP, Rel. Min. Celso de Mello, j. em 25.10.2005, DJ de 04.11.2005). São vários os

precedentes nos Tribunais Superiores não admitindo discussão em HC:

a) liberação de veículo

“Insurgindo-se o impetrante-paciente quanto à apreensão de veículo de sua propriedade, não

se vislumbra na impetração pressuposto básico e lógico inerente a este tipo de ação, vale

dizer, ameaça ou violação ao direito ambulatorial, o que, conseqüentemente, leva à conclusão

de que a via eleita é imprópria ao fim colimado” (STJ – HC n° 9855- SP- Rel. Fernando

Gonçalves, j. 21.09.1999, DJ 11.10.1999, p. 89).

b) trancamento de inquérito civil

“O habeas corpus não é a via adequada ao pleito de trancamento de inquérito civil, tendo em

vista a inexistência de ameaça ou violação à liberdade de locomoção dos investigados, já que

se destina à apuração de infrações passíveis de sanções administrativas ou civis. Precedentes”

(STJ – RHC n° 34329-RJ, Rel. Jorge Mussi, j. 23.04.2013, DJe 08.05.2013)”.

“O Ministério Público, como órgão de defesa dos interesses individuais e sociais indisponíveis

(CF, art. 127), tem competência para instaurar inquérito policial para investigar a prática de

atos abusivos, susceptíveis de causar lesão a tais interesses coletivos. A instauração de tal

procedimento não provoca qualquer constrangimento ilegal ao direito de locomoção,

revelando-se, por isso, impróprio o uso do habeas-corpus para coibir eventuais irregularidades

a ele atribuídos” (STJ – REsp n° 192837-RJ – Rel. Vicente Leal, j. 18.10.2001, DJ 30.06.2003, p.

320).

c) redução da pena de multa

“O mandamus se presta a sanar ilegalidade ou abuso de poder que resulte em coação ou

ameaça à liberdade de locomoção. Não cabe, nesta via estreita do writ, revolvimento fático-

probatório a ensejar a redução do valor relativo à pena de prestação pecuniária aplicada ao

paciente” (Precedentes)” (STJ – HC n° 221785-RJ, Rel. Maria Thereza de Assis Moura, j.

15.08.2013, DJe 26.08.2013).

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d) cancelamento de registros criminais

PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. PEDIDO DE CANCELAMENTO DE REGISTROS CRIMINAIS

INFORMATIZADOS NO INSTITUTO DE IDENTIFICAÇÃO RICARDO GUMBLETON DAUNT.

INEXISTÊNCIA DE ILEGALIDADE OU ABUSO DE PODER SANÁVEL PELA VIA DO HABEAS CORPUS

– ”Não se vislumbrando, in casu, qualquer restrição ao direito de Ir e vir do paciente, não há

que se falar em ilegalidade e abuso de poder sanável pela via do habeas corpus” (STJ – HC n°

106417-SP, Rel. Alderita Ramos de Oliveira, j. 18.06.2013, DJe 01.07.2013).

e) procedimento verificatório do ECA

FORNECIMENTO DE BEBIDA ALCÓOLICA A MENOR. INSTAURAÇÃO DE PROCEDIMENTO

VERIFICATÓRIO – “A instauração de procedimento administrativo verificatório, que não tem

o condão de causar ameaça ou violação ao direito ambulatorial do Recorrente, não é

suscetível de análise na via do habeas corpus” (STJ – RHC n° 32239-SP, Rel. Laurita Vaz, j.

06.08.2013, DJe 13.08.2013).

Seguindo o mesmo espírito, a medida cautelar de afastamento de função pública não afeta

diretamente a liberdade de locomoção, sendo inviável, por isso, a sua correção por meio de

habeas corpus ou de seu recurso ordinário, salvo se imposta conjuntamente com a prisão

preventiva ou outras medidas cautelares diversas da prisão que possam, de alguma forma,

restringir o direito tutelado pela via mandamental (AgRg no HC 442539/PB).

3 - TEMA: Inversão da ordem de oitiva de testemunhas inquiridas por carta precatória não

gera nulidade

DECISÃO DO STJ- Publicado em notícias do STJ no dia 29/11/2018

Não há nulidade quando as testemunhas de defesa são ouvidas antes das de acusação, na

hipótese em que a inquirição é feita por carta precatória. Reafirmando esse entendimento do

Superior Tribunal de Justiça (STJ), o ministro Sebastião Reis Júnior negou provimento a recurso

em habeas corpus no qual se alegava constrangimento ilegal decorrente da inversão da prova

testemunhal.

Os três recorrentes foram denunciados pelo Ministério Público de São Paulo por fraudes em

licitações praticadas contra o município de Pitangueiras (SP), com base no artigo 90 da Lei

8.666/93 e nos artigos 288 e 312 do Código Penal.

Após a citação, os acusados apresentaram defesa prévia, e a audiência de instrução para a

oitiva das testemunhas foi marcada para 13 de junho. Em seguida, o juízo determinou a

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expedição de carta precatória para a inquirição de testemunha de acusação, na comarca de

Guariba (SP), em 28 de junho. A defesa, então, requereu a mudança na ordem das datas, o

que foi indeferido.

Os acusados impetraram habeas corpus alegando vício processual, mas o Tribunal de Justiça

de São Paulo entendeu que não houve prejuízo às partes e negou o pedido.

Em recurso ao STJ, a defesa argumentou que a decisão feriu o artigo 400 do Código de

Processo Penal (CPP), uma vez que o dispositivo prevê que as testemunhas de acusação

devem ser ouvidas antes das de defesa, para assegurar o devido processo legal e a ordem

lógica do contraditório penal.

Pediu ainda, em liminar, o sobrestamento da ação até o julgamento final do recurso no STJ, o

que foi indeferido.

COMENTÁRIOS DO CAO-CRIM

Alerta o §1º. do art. 222 do CPP que expedição da precatória não suspenderá a instrução

criminal. A razão deste dispositivo é evitar que, em atitude pouco escrupulosa, a parte arrole

inúmeras testemunhas de fora, em locais diversos deste país continental, como forma de

ganhar tempo e, assim, ensejar eventual prescrição ou mesmo excesso de prazo na conclusão

do feito, que culminaria com a soltura do réu.

De sorte que, expedida a carta precatória, não se suspende o andamento da instrução

criminal. Como bem decidiu o STJ, havendo a necessidade de se ouvir testemunha de acusação

e defesa por meio de carta precatória, excepciona-se a imposição de observância a ordem de

oitiva: primeiro, a da acusação e, depois, a da defesa. Leia a decisão.

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DIREITO PENAL:

1- PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. VALOR DOS BENS SUBTRAÍDOS SUPERIOR A 10 % (DEZ

POR CENTO) DO SALÁRIO MÍNIMO VIGENTE À ÉPOCA DOS FATOS. INAPLICABILIDADE

STJ- HC 439.750/SP, Rel. Ministro FELIX FISCHER, QUINTA TURMA, julgado em 19/04/2018,

DJe 26/04/2018

EMENTA

PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO DE RECURSO ORDINÁRIO. NÃO

CABIMENTO. FURTO QUALIFICADO. PRISÃO PREVENTIVA. GARANTIA DA ORDEM PÚBLICA.

FUNDADO RECEIO DE REITERAÇÃO DELITIVA. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. VALOR DOS

BENS SUBTRAÍDOS SUPERIOR A 10 % (DEZ POR CENTO) DO SALÁRIO MÍNIMO VIGENTE À

ÉPOCA DOS FATOS. INAPLICABILIDADE. PRISÃO DOMICILIAR. MATÉRIA NÃO ANALISADA

PELAS INSTÂNCIAS PRECEDENTES. SUPRESSÃO DE INSTÂNCIA. HABEAS CORPUS NÃO

CONHECIDO.

(...)

IV - Na hipótese dos autos, o valor dos bens subtraídos (que correspondem a mais de 20% do

salário mínimo vigente à época do fato) ultrapassa o limite jurisprudencialmente fixado como

parâmetro para a aplicação do princípio da insignificância, que é de 10% (dez por cento) do

salário mínimo vigente à época do fato (precedentes).

Habeas Corpus não conhecido.

Esta jurisprudência foi incluída a pedido do Setor de Recursos Criminais Extraordinários e

Especiais.

COMENTÁRIOS DO CAO-CRIM

Sabendo que o Direito Penal só deve ser aproveitado quando estritamente necessário

(princípio da intervenção mínima), a sua aplicação fica condicionada ao fracasso das demais

esferas de controle e à existência de relevante lesão ou perigo de lesão ao bem juridicamente

tutelado. Dentro desse espírito, discute-se o princípio da insignificância.

Como alertado no boletim #1 de setembro, tanto STF quanto STJ têm reconhecido com

frequência o princípio da insignificância, mas estabelecem alguns requisitos necessários. São

eles: a) mínima ofensividade da conduta do agente; b) ausência de periculosidade social da

ação; c) reduzido grau de reprovabilidade do comportamento; d) inexpressividade da lesão

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jurídica causada. Esses vetores são rigorosamente observados pelo Setor do art. 28 CPP da

Procuradoria-Geral de Justiça.

No que se refere ao quarto vetor, relativo à intensidade da afetação do bem jurídico, só há

atipicidade material quando a lesão ou perigo forem de tal forma inexpressivos que não põem

em risco a incolumidade do bem. Pode-se citar, a título de ilustração, o entendimento atual

do STJ no sentido de impedir o reconhecimento da insignificância quando o valor do bem

jurídico ultrapassa a 10% (dez por cento) do salário mínimo vigente ao tempo do fato.

2- TEMA: NATUREZA DO CRIME DO ART 298 DO CP- DELITO FORMAL

STJ- RECURSO ESPECIAL Nº 1.758.681 – SP

EMENTA

RECURSO ESPECIAL. PENAL E PROCESSO PENAL. ART. 298 DO CÓDIGO PENAL. FALSIFICAÇÃO

DE DOCUMENTO PARTICULAR. DELITO DE NATUREZA FORMAL. PERIGO ABSTRATO.

DESNECESSÁRIA AFERIÇÃO DO EFETIVO POTENCIAL LESIVO. RECURSO ESPECIAL PROVIDO.

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Esta jurisprudência foi incluída a pedido do Setor de Recursos Criminais Extraordinários e

Especiais.

COMENTÁRIOS DO CAO-CRIM

O crime do art. 298 do CP (falsificação de documento particular), a exemplo do art. 297

(falsificação de documento público), consuma-se quando praticada uma das ações nucleares

previstas no tipo (falsificação ou alteração), potencialmente lesiva.

Desse modo, é irrelevante que o agente faça uso do documento que produziu ou alterou. De

acordo com entendimento pacificado no STJ, o crime é formal, de perigo abstrato.

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Boletim Criminal Comentado–novembro

2018 (semana 5)

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STF/STJ: Notícias de interesse institucional

Notícias STF 26 de novembro de 2018 1- Liminar suspende ação penal contra médico denunciado por tortura durante regime militar Clique aqui para ler a íntegra da notícia 2- Rejeitado habeas corpus que buscava encerrar ação penal contra nadador norte-americano Ryan Lochte Clique aqui para ler a íntegra da notícia 3- Mantida na 1ª instância investigação contra o senador Fernando Bezerra Clique aqui para ler a íntegra da notícia 4- Mantida prisão preventiva de condenado por homicídio qualificado em acidente de trânsito Clique aqui para ler a íntegra da notícia 27 de novembro de 2018

5- 2ª Turma concede habeas corpus a inimputável mantido sob regime de internação após

prescrição penal

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28 de novembro de 2018

6- Plenário suspende julgamento sobre indulto natalino concedido pelo presidente Temer

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29 de novembro de 2018

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7- Julgamento sobre indulto natalino prossegue nesta quinta-feira (29) no STF

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Notícias STJ

26 de novembro de 2018

8- Quinta Turma nega pronúncia de réu denunciado apenas com base em provas do

inquérito

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27 de novembro de 2018

9- Sexta Turma nega pedido do empresário Eike Batista e mantém processo por crime de

insider trading na Justiça Federal

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28 de novembro de 2018

10- Habeas corpus não é instrumento adequado para discutir alteração na situação

financeira do alimentante

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