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Boletim Criminal Comentado–agosto 2018 (semana 4) 1 CAO-Crim Boletim Criminal Comentado - agosto 2018 (semana 4) Mário Luiz Sarrubbo Subprocurador-Geral de Justiça de Políticas Criminais e Institucionais Coordenador do CAO Criminal: Arthur Pinto de Lemos Júnior Assessores: Fernanda Narezi Pimentel Rosa Marcelo Sorrentino Neira Paulo José de Palma Ricardo José Gasques de Almeida Silvares Rogério Sanches Cunha Analista Jurídica Ana Karenina Saura Rodrigues

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Boletim Criminal Comentado–agosto 2018 (semana 4)

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CAO-Crim

Boletim Criminal Comentado - agosto 2018

(semana 4)

Mário Luiz Sarrubbo

Subprocurador-Geral de Justiça de Políticas Criminais e Institucionais

Coordenador do CAO Criminal:

Arthur Pinto de Lemos Júnior

Assessores: Fernanda Narezi Pimentel Rosa

Marcelo Sorrentino Neira Paulo José de Palma

Ricardo José Gasques de Almeida Silvares

Rogério Sanches Cunha

Analista Jurídica

Ana Karenina Saura Rodrigues

Boletim Criminal Comentado–agosto 2018 (semana 4)

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Sumário

ESTUDOS DO CAOCRIM .......................................................................................................................... 3

1 - Protocolo de Istambul, o combate à tortura e sua aplicação prática nas audiências de

custódia......................................................................................................................................3

2 – O uso da RECLAMAÇÃO como forma de assegurar decisão emanada dos Tribunais de

Justiça......................................................................................................................................................6

STF/STJ: decisões de interesse institucional COMENTADAS PELO CAOCRIM ...................................... 7

PROCESSO PENAL:

1 - TEMA: AÇÃO PENAL - Análise da necessidade ou não de descrição minuciosa e individualizada da

ação de cada agente, nos crimes de autoria

coletiva....................................................................................................................................................7

2 – Tema: EXECUÇÃO PENAL - A prática de falta grave interrompe a contagem do prazo para a obtenção

do benefício da progressão de regime....................................................................................................8

DIREITO PENAL:

1- Tema: TORTURA - STJ: Tortura-prova dispensa comprovação de sofrimento

intenso.....................................................................................................................................................9

2-Tema: TIPICIDADE - Furto famélico e o princípio da insignificância.....................................................10

STF/STJ: Notícias de interesse institucional ........................................................................................ 11

Boletim Criminal Comentado–agosto 2018 (semana 4)

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ESTUDOS DO CAOCRIM

1 - Protocolo de Istambul, o combate à tortura e sua aplicação prática nas audiências de

custódia.

A Constituição Federal de 1988 consagra como direito fundamental a vedação à tortura.

Dispõe, com efeito, o art. 5º, inc. III, que “ninguém será submetido a tortura nem a tratamento

desumano ou degradante”. Com fundamento nesta disposição constitucional, a Lei 12.847/13

instituiu o Sistema Nacional de Prevenção e Combate à Tortura, regido pelos princípios da

proteção da dignidade da pessoa humana, da universalidade, da objetividade, da igualdade,

da imparcialidade, da não seletividade e da não discriminação (art. 4º). Este sistema de

proteção tem o objetivo de fortalecer a prevenção e o combate à tortura por meio de

articulação e atuação cooperativa de seus integrantes permitindo a troca de informações e o

intercâmbio de boas práticas.

O sistema brasileiro de proteção vem na esteira de um intenso movimento internacional de

repúdio à tortura, surgido após a Segunda Guerra Mundial e por meio do qual se aprovaram

diversos tratados e convenções, alguns ratificados pelo Brasil.

Os esforços engendrados para combater a tortura podem ser vistos, por exemplo, na edição

do Manual para a Investigação e Documentação Eficazes da Tortura e Outras Penas ou

Tratamentos Cruéis, Desumanos ou Degradantes (Protocolo de Istambul), elaborado a partir

de pesquisas desenvolvidas por dezenas de cientistas das áreas do direito, da medicina e de

direitos humanos provenientes de quinze países. O manual tem o propósito de servir de

referência internacional para avaliar os casos relatados de tortura.

Organizado em seis capítulos, em linhas gerais o manual estabelece as normas internacionais

aplicáveis no combate à tortura, faz referência à ética dos profissionais nas áreas jurídica e

médica, institui princípios para os inquéritos sobre a prática de tortura, traça considerações

gerais sobre as entrevistas com pessoas que alegam ter sido vítimas e traz inúmeras diretrizes

para a constatação de sintomas físicos e psicológicos de tratamento cruel, desumano ou

degradante.

Para facilitar a apreensão dos indícios físicos, proporcionar o tratamento adequado à vítima e

viabilizar a devida punição do autor, a apuração de casos suspeitos de tortura deve ser iniciada

tão brevemente quanto possível, razão pela qual os ordenamentos jurídicos nacionais devem

estabelecer mecanismos que permitam a pronta investigação.

Boletim Criminal Comentado–agosto 2018 (semana 4)

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No caso do Brasil, o instrumento adequado para essa finalidade é a audiência de custódia,

disciplinada na Resolução n. 213/2015 do Conselho Nacional de Justiça e em normas internas

de tribunais.

A audiência de custódia (ou de apresentação), tem, na realidade, dupla finalidade: de

proteção, a fim de tutelar a integridade física do preso, e de constatação, aquilatando, de

acordo com as circunstâncias do caso concreto, a necessidade de ser mantida a prisão do

autuado.

Trata-se, no que concerne à primeira finalidade, de cautela que atende, basicamente, à

Convenção Americana de Direitos Humanos (art. 7.5), a impor a apresentação do preso a um

juiz ou autoridade que exerça função assemelhada, legalmente constituída. No mesmo

sentido, o art. 9.3 do Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos de Nova York.

Com a audiência de custódia assegura-se prévia entrevista entre o preso e seu advogado ou,

à falta deste, um defensor público. Após a formulação de perguntas de cunho pessoal,

referentes à “qualificação, condições pessoais, tais como estado civil, grau de alfabetização,

meios de vida ou profissão, local da residência, lugar onde exerce sua atividade, e, ainda, sobre

as circunstâncias objetivas da sua prisão”, sem adentrar o mérito dos fatos em si, é concedida

a palavra ao Ministério Público e à defesa.

Os textos internacionais acima referidos não estabelecem um prazo determinado para a

realização da audiência de custódia. Utilizando expressões abertas, indicam, contudo,

imediatidade. No Brasil, a Resolução 213 do CNJ estabelece um prazo de vinte e quatro horas

da comunicação do flagrante.

Por meio desse procedimento, em que o preso é ouvido sobre as circunstâncias da prisão

quase imediatamente após sua ocorrência, é possível averiguar prontamente a prática de

abusos físicos ou psicológicos, e para tanto o Protocolo de Istambul pode ser de grande valia,

guardadas, evidentemente, as devidas proporções, pois este documento estabelece diretrizes

abrangentes para a apuração da tortura, o que obviamente não ocorre no momento da

audiência de custódia, na qual apenas podem ser obtidos indícios que em seguida levarão à

efetiva apuração.

Mas há elementos no Protocolo de Istambul segundo os quais pode se guiar o juiz no

momento em que o preso lhe é apresentado. O capítulo 4, por exemplo, estabelece as

condições gerais para as entrevistas com quem alega ter sido torturado, considerando a

situação peculiar de quem foi submetido a tratamento desumano e que nem sempre

consegue expor com facilidade a terceiros a violência por que passou (assim como ocorre com

vítimas de crimes sexuais). No parágrafo 134, dispõe o protocolo:

Boletim Criminal Comentado–agosto 2018 (semana 4)

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“A obtenção de informação é certamente importante, mas a pessoa entrevistada é-o ainda

mais e ouvir é mais importante do que fazer perguntas. Se o entrevistador se limita a formular

perguntas, apenas obterá respostas. Para o recluso, pode ser mais importante falar acerca da

família do que da tortura. Há que ter em conta este aspecto, pelo que deverá ser

disponibilizado algum tempo para a discussão de questões pessoais. A tortura,

particularmente de natureza sexual, é um assunto muito íntimo e poderá não ser abordado

antes da segunda visita ou mesmo mais tarde. Os indivíduos não devem ser forçados a falar

sobre qualquer forma de tortura se não se sentirem à-vontade para o fazer.”

Fala-se em “visita” porque este trecho vem na esteira de outro que trata de visitas oficiais a

centros de detenção. Nada impede, no entanto, que essa técnica seja seguida pelo juiz que

note sinais de agressão no preso levado à audiência de custódia

Há também outros elementos que podem auxiliar bastante na obtenção de dados indicativos

de tortura, como, por exemplo, a indagação a respeito de circunstâncias da detenção (data,

local, duração, condições, etc.) antes de adentrar em detalhes sobre eventuais agressões. E,

sobre estas, há questões específicas que não só podem facilitar a obtenção de informações

como também servem para apurar a fidedignidade do que está sendo relatado. Veja-se, por

exemplo, o parágrafo 139:

“Ao recolher informação sobre tortura e maus tratos, deve ter-se cuidado ao sugerir formas

de maus tratos a que a pessoa possa ter sido sujeita, uma vez que a pessoa pode ser tentada

a distorcer os factos. A resposta negativa a perguntas sobre diversas formas de tortura pode,

contudo, ajudar a estabelecer a credibilidade do testemunho. As questões devem ser

formuladas de forma a obter um relato coerente do sucedido. Eis algumas sugestões de

perguntas a colocar: Onde ocorreram os maus tratos, quando e durante quanto tempo? Foi

vendado? Antes de passar à descrição dos métodos empregues, tome nota das pessoas

presentes (com os respectivos nomes e posições). Descreva a sala ou outro local em causa. Que

objectos viu? Se possível, descreva em detalhe cada um dos objectos de tortura; no caso de

tortura eléctrica, indique a voltagem, aparelho, número e forma dos eléctrodos. Inquira acerca

do vestuário usado, se alguém se despiu ou mudou de roupa. Tome nota de tudo quanto tenha

sido dito durante o interrogatório, nomeadamente injúrias e insultos à vítima e conversas dos

torcionários entre si.”

É claro que na audiência de custódia não é necessário que o juiz se debruce sobre tantos

detalhes, mas a partir dessas diretrizes podem ser formuladas questões compatíveis com as

limitações próprias daquele ato judicial.

Vemos, portanto, que não obstante o propósito do Protocolo de Istambul seja estabelecer um

sistema abrangente, completo para apuração de relatos de tortura, alguns de seus elementos

Boletim Criminal Comentado–agosto 2018 (semana 4)

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podem inspirar já na audiência de custódia a adoção das primeiras providências contra o

abuso de autoridade, medida de extrema importância e de muita utilidade para que se coíbam

atos dessa natureza.

2 – O uso da RECLAMAÇÃO como forma de assegurar decisão emanada dos Tribunais de

Justiça.

A medida judicial da Reclamação tem previsão constitucional e foi disciplinada no novo CPC

(arts. 988 e ss), aplicado subsidiariamente ao CPP.

A Reclamação tem por objetivo: I - preservar a competência do tribunal; II - garantir a

autoridade das decisões do tribunal; III – garantir a observância de enunciado de súmula

vinculante e de decisão do Supremo Tribunal Federal em controle concentrado de

constitucionalidade; IV – garantir a observância de acórdão proferido em julgamento de

incidente de resolução de demandas repetitivas ou de incidente de assunção de competência

(art. 988 do CPC).

Apesar de quase sempre lembrada na doutrina como importante instrumento à preservação

de decisões dos Tribunais Superiores, a Reclamação pode ser proposta perante qualquer

tribunal, e seu julgamento compete ao órgão jurisdicional cuja competência se busca

preservar ou cuja autoridade se pretenda garantir.

Assim ocorreu na comarca de Itu/SP. O promotor de Justiça, Alexandre Augusto Ricci de Souza,

num processo crime movido contra 27 traficantes de drogas, que tiveram suas prisões

preventivas mantidas por decisão do TJSP, foi cientificado da ordem do juiz de 1o. grau, que

concedeu liberdade provisória para 21 dos acusados. O colega comunicou o CAOCRIM que

logo acionou a Subprocuradoria-Geral de Políticas Criminais. Foi, então, impetrada

Reclamação junto ao TJSP, buscando suspender a ordem de soltura. No dia 22 de agosto, o

Desembargador Paiva Coutinho, com fulcro no art. 989, II, do CPC, suspendeu, liminarmente,

a decisão do juiz de Itu, até o julgamento final da Reclamação impetrada pela PGJ. Para ler a

Reclamação da PGJ e a decisão do TJ, clique aqui:

http://www.mpsp.mp.br/portal/page/portal/Criminal/Noticias_CAO_Criminal/!PORTAL.wwpob_pag

e.pdf

http://www.mpsp.mp.br/portal/page/portal/Criminal/Noticias_CAO_Criminal/TJSP-

RECLAMA%C3%87%C3%83O%20document%20(41).pdf .

Boletim Criminal Comentado–agosto 2018 (semana 4)

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STF/STJ: decisões de interesse institucional COMENTADAS PELO CAOCRIM

DIREITO PROCESSUAL PENAL:

1-Tema: AÇÃO PENAL - Análise da necessidade ou não de descrição minuciosa e

individualizada da ação de cada agente, nos crimes de autoria coletiva (PESQUISA PRONTA)

COMENTÁRIOS DO CAO-CRIM

A denúncia importa em uma narrativa do fato, com todas suas circunstâncias e características,

devendo apontar, objetiva e subjetivamente, o fato delituoso em si, bem como a pessoa que

o praticou (quis), os meios que empregos (quibus auxiliis), o mal que produziu (quid), os

motivos que o determinaram a isso (cur), a maneira porque o praticou (quo modo), o lugar

onde o praticou (quando).

Sabendo-se que o acusado se defende dos fatos contidos na inicial (e não da qualificação legal

a eles atribuída), a precisa exposição do ocorrido mostra-se fundamental, na medida em que

propicia ao réu o mais amplo exercício de sua ampla defesa. Ademais, somente por meio dessa

narrativa poderá o juiz avaliar, desde logo e ainda que sem maior profundidade, se o fato

constitui crime, cabendo, caso não o seja, a sua rejeição “in limine”, por falta de justa causa

para o exercício da ação penal (art. 395, inc. III do CPP).

A narrativa nem deve ser extremamente sintética e, tampouco, caudalosa em citações

enfadonhas e desnecessárias. Deve buscar o meio termo adequado que permita a exposição

dos fatos com clareza e sem prejuízo à defesa do acusado.

Contudo, de autoria coletiva, a doutrina e a jurisprudência têm abrandado o rigor do disposto

no art. 41 do Código de Processo Penal, dada a natureza dessas infrações, uma vez que nem

sempre é possível, na fase de formulação da peça acusatória, realizar uma descrição detalhada

da atuação de cada um dos indiciados, de forma que se tem admitido um relato mais

generalizado do comportamento tido como delituoso. Não há como se exigir que a denúncia

narre minuciosamente todos os detalhes do delito supostamente cometido, tendo em vista

que inúmeras outras questões importantes somente serão elucidadas durante a fase

instrutória e eventualmente até em favor do próprio acusado. Nesse sentido, aliás, copiosa a

jurisprudência do STJ, como se percebe pesquisa disponibilizada pela Corte.

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2 – Tema: EXECUÇÃO PENAL - A prática de falta grave interrompe a contagem do prazo para

a obtenção do benefício da progressão de regime.

Nos termos do art. 112 da Lei nº 7.210/84, admite-se a progressão de regime se o condenado

houver cumprido ao menos um sexto da pena no regime anterior e ostentar bom

comportamento carcerário, comprovado pelo diretor do estabelecimento. A fração de um

sexto é afastada nos casos de crimes hediondos e equiparados, em que a progressão ocorre

após o cumprimento de dois quintos da pena, se primário o condenado, ou de três quintos,

se reincidente.

Há, todavia, discussão a respeito dos efeitos que a prática da falta grave opera no prazo de

progressão de regime, ou seja, se há ou não interrupção.

Há quem sustente que a inexistência de disposição legal que determine a interrupção do prazo

obsta esse efeito, a exemplo do que ocorre no livramento condicional (súmula nº 441). Dessa

forma, embora seja possível considerar a falta grave na análise dos requisitos subjetivos para

a progressão, não se justifica o reinício da contagem do prazo para a concessão do benefício.

Há, no entanto, outra orientação que defende a interrupção do prazo em decorrência de

interpretação sistemática do art. 112 da Lei de Execução Penal. Se o condenado cumpre pena

em regime aberto ou semiaberto e comete a falta grave, a punição consiste na regressão de

regime, que, uma vez operada, provoca a recontagem do prazo. Se o condenado que cometeu

a falta cumpre a pena em regime fechado, não é possível regredir, restando apenas a

interrupção do prazo para a progressão, pois, caso isso não ocorra, a falta simplesmente não

será punida, o que, em última análise, pode permitir que o condenado requeira a progressão

com base no cumprimento do requisito objetivo logo em seguida à prática da infração

disciplinar.

Adotando a segunda orientação, decidiu o STF: “Uma vez cometida falta grave no curso do

cumprimento da pena em regime fechado, tem-se a fixação de novo termo inicial para

progredir – inteligência da Lei de Execução Penal” (HC 114.494/SP, j. 28/11/2017). Com a

mesma fundamentação, o STJ firmou a tese e editou a súmula nº 534.

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DIREITO PENAL:

1- Tema: TORTURA -STJ: Tortura-prova dispensa comprovação de sofrimento intenso

COMENTÁRIOS DO CAO-CRIM

O art. 1º da Lei 9.455/97 pune a tortura em dois incisos. O inciso I, na alínea a, tipifica a

denominada tortura-prova, consistente em constranger alguém com emprego de violência ou

grave ameaça, causando-lhe sofrimento físico ou mental, com o fim de obter informação,

declaração ou confissão da vítima ou de terceira pessoa. Já o inciso II trata da tortura-castigo,

consistente em submeter alguém, sob sua guarda, poder ou autoridade, com emprego de

violência ou grave ameaça, a intenso sofrimento físico ou mental, como forma de aplicar

castigo pessoal ou medida de caráter preventivo.

Na primeira figura, na qual age o torturador com o fim de obter informação, declaração ou

confissão da vítima ou de terceira pessoa, a consumação se dá com o constrangimento

causador de sofrimento à vítima, dispensando-se a efetiva obtenção da informação almejada.

A segunda figura se diferencia da anterior porque se refere a intenso sofrimento físico ou

mental. Esta expressão não pode ser desprezada, pois engloba a ideia de um sofrimento atroz,

martirizante, insuportável, que, no caso concreto, desperta certa dificuldade de aferição, mas

que, evidentemente, deve estar presente para que se considere caracterizado o crime.

Nota-se, pois, que as duas condutas se diferenciam pela intensidade do sofrimento causado,

dispensado na primeira. Por esta razão, o STJ reformou decisão do Tribunal de Justiça do Pará,

que, em apelação, havia desclassificado a conduta para lesão corporal leve.

No caso julgado, policiais militares haviam sido acusados de espancar três assaltantes para

que confessassem a autoria do roubo e prestassem informações sobre o local onde havia

objetos de interesse para a apuração do delito. Os agentes foram condenados por tortura,

mas apelaram. O Tribunal de Justiça do Pará, apesar de reconhecer a violência empregada e

o sofrimento causado às vítimas, e de admitir que isso se deu para obter a confissão,

considerou que a conduta deveria ser classificada como lesão corporal leve, e não como

tortura, em virtude de não ter sido demonstrado o caráter “martirizante” ou de “extrema

crueldade”, “capaz de causar à vítima atroz sofrimento físico, verdadeiro suplício”.

O STJ, contudo, considerou indevida a exigência de que o sofrimento físico imposto pelos

policiais para que os assaltantes confessassem fosse insuportável, exatamente porque a figura

da tortura-prova não tem os mesmos elementos da tortura-castigo. Apontou, a respeito, o

ministro Rogerio Schietti Cruz:

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“diversamente do previsto no tipo do inciso II do artigo 1º da Lei 9.455/97, definido pela

doutrina como tortura-pena ou tortura-castigo, a qual requer intenso sofrimento físico ou

mental, a tortura-prova, do inciso I, alínea ‘a’, não traz o tormento como requisito do

sofrimento causado à vítima. Basta que a conduta haja sido praticada com o fim de obter

informação, declaração ou confissão da vítima ou de terceira pessoa e que haja causado

sofrimento físico ou mental, independentemente de sua gravidade ou sua intensidade”. (REsp

nº 1.580.470/PA, j. 24/08/2018).

2-Tema: TIPICIDADE - Furto famélico e o princípio da insignificância

INFORMATIVO 911 STF - SEGUNDA TURMA

A Segunda Turma deu provimento a agravo regimental para conceder a ordem de “habeas

corpus” a fim de absolver paciente da acusação de furto qualificado pelo concurso de agentes,

aplicando a tese do princípio da insignificância.

COMENTÁRIOS DO CAO-CRIM

Para o colegiado, como regra, a habitualidade delitiva específica é um parâmetro que afasta

a análise do valor do bem jurídico tutelado para fins de aplicação do princípio da bagatela.

Excepcionalmente, no entanto, as peculiaridades do caso concreto podem justificar a exclusão

dessa restrição, com base na ideia da proporcionalidade em sentido concreto.

Foi a situação colocada em julgamento, mais precisamente, furto de um galo, quatro galinhas

caipiras, uma galinha garnizé e três quilos de feijão, bens avaliados em pouco mais de cem

reais. O valor dos bens é inexpressivo e não houve emprego de violência. Conclui-se pela

mínima ofensividade da conduta, ausência de periculosidade social da ação, reduzido grau de

reprovabilidade do comportamento e inexpressividade da lesão jurídica provocada.

Mesmo constando em desfavor do paciente outra ação penal instaurada por igual conduta,

ainda em trâmite, o STF trabalhou com a atipicidade material do furto famélico.

A excepcionalidade também se justificou, de acordo com a Corte, por se tratar de

hipossuficiente (HC 141440 AgR/MG, rel. Min. Dias Toffoli, julgamento em 14.8.2018).

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STF/STJ: Notícias de interesse institucional

Notícias STF 20 de agosto de 2018 1- Ministro nega recurso em HC de acusado de planejar morte de advogada em Pernambuco Clique aqui para ler a íntegra da notícia 2- Mantida condenação de ex-diretor de Serviços Públicos de Paraguaçu Paulista (SP) Clique aqui para ler a íntegra da notícia 3- Ministro Gilmar Mendes nega pedido de revogação de prisão de Sérgio Cabral Clique aqui para ler a íntegra da notícia 4- Negado habeas corpus a réu denunciado por matar a esposa por asfixia Clique aqui para ler a íntegra da notícia 21 de agosto de 2018 5- 2ª Turma suspende execução das penas de José Dirceu e Genu até julgamento de recursos pelo STJ Clique aqui para ler a íntegra da notícia 6- 2ª Turma determina arquivamento de inquérito contra deputado Rodrigo Garcia (DEM/SP) Clique aqui para ler a íntegra da notícia 7- Suspenso julgamento de habeas corpus de empresário investigado na Operação Câmbio Desligo Clique aqui para ler a íntegra da notícia

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22 de agosto de 2018 8-Mantida prisão de acusado por disparos que derrubaram helicóptero da PM no Rio de Janeiro Clique aqui para ler a íntegra da notícia 9- Negada liberdade a ex-vereador acusado de matar radialista na Paraíba Clique aqui para ler a íntegra da notícia Notícias STJ 21 de agosto de 2018

10-Venda sem nota de produtos estrangeiros permitidos é caso para a Justiça Federal

Clique aqui para ler a íntegra da notícia

23 de agosto de 2018

11-Quinta Turma nega habeas corpus ao ex-deputado distrital Rogério Ulysses

Clique aqui para ler a íntegra da notícia

24 de agosto de 2018

12-Restabelecida sentença que condenou policiais militares por tortura qualificada contra

assaltantes

Clique aqui para ler a íntegra da notícia