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Boletim Criminal Comentado–julho 2018 (semana 3) 1 CAO-Crim Boletim Criminal Comentado - julho 2018 (semana 3) Mário Luiz Sarrubbo Subprocurador-Geral de Justiça de Políticas Criminais e Institucionais Coordenador do CAO Criminal: Arthur Pinto de Lemos Júnior Assessores: Fernanda Narezi Pimentel Rosa Marcelo Sorrentino Neira Paulo José de Palma Ricardo José Gasques de Almeida Silvares Rogério Sanches Cunha Analista Jurídica Ana Karenina Saura Rodrigues

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Boletim Criminal Comentado–julho 2018

(semana 3)

1

CAO-Crim

Boletim Criminal Comentado - julho 2018

(semana 3)

Mário Luiz Sarrubbo

Subprocurador-Geral de Justiça de Políticas Criminais e Institucionais

Coordenador do CAO Criminal:

Arthur Pinto de Lemos Júnior

Assessores: Fernanda Narezi Pimentel Rosa

Marcelo Sorrentino Neira Paulo José de Palma

Ricardo José Gasques de Almeida Silvares

Rogério Sanches Cunha

Analista Jurídica

Ana Karenina Saura Rodrigues

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(semana 3)

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Sumário

ESTUDOS DO CAOCRIM ............................................................................................................. 3

1 – Pedido ministerial de reparação do dano à vítima: momento processual para o

requerimento.............................................................................................................................3

2 - Crimes envolvendo carregamento fraudulento de bilhete único, tendo como vítima órgãos

como SPTrans e CPTM................................................................................................................4

STF/STJ: decisões de interesse institucional COMENTADAS PELO CAOCRIM ......................... 6

DIREITO PROCESSUAL PENAL....................................................................................................6

1-Tema PROVAS - STJ: É legal a prova com material genético descartado, ainda que não tenha

havido consentimento do investigado.......................................................................................6

DIREITO PENAL..........................................................................................................................8

1-Tema APLICAÇÃO DE PENA - STJ: Danos psicológicos na vítima autorizam o aumento da

pena-base e dispensa perícia.....................................................................................................8

2 - Tema: analogia no Direito Penal e a jurisprudência do STJ...................................................9

STF/STJ: Notícias de interesse institucional ............................................................................ 11

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ESTUDOS DO CAOCRIM

1 – Pedido ministerial de reparação do dano à vítima: momento processual para o

requerimento

O CAOCRIM, provocado pelo I. Procurador de Justiça MILTON THEODORO GUIMARÃES FILHO,

neste capítulo do Boletim, discorre não apenas sobre a importância de os colegas pleitearem,

na seara criminal, valor mínimo para reparação dos danos causados pela infração, mas

também sobre o momento oportuno para se fazer o pedido. De acordo com o procurador de

Justiça, esses pedidos, ora não constam no processo, ora são formulados de forma

extemporânea, prejudicando a atuação ministerial em segundo grau na importante tutela da

vítima.

Pela atual redação do art. 387, IV, CPP cumpre ao juiz, na sentença condenatória, fixar valor

mínimo para reparação dos danos causados pela infração, considerando os prejuízos sofridos

pelo.

Não se desconsidera a existência de acórdãos admitindo o pedido a qualquer tempo (ou até

mesmo dispensando pedido expresso), como, por exemplo, o TJ/RS:

“Especificamente à fixação do montante indenizatório, pelo sentenciante, nada mais fez do

que observar o disposto no art. 387 do CPP, que tornou aquela medida integrante do ato

condenatório, como o são a imposição de pena, a consideração de circunstâncias agravantes

e atenuantes e tudo o mais que deva ser levado em conta na sua fixação; a aplicação de

eventual interdição de direitos e medidas de segurança; a determinação de publicação do

‘decisum’ e fundamentação acerca de manutenção ou imposição de prisão preventiva ou de

outra medida cautelar. Como efeito da condenação, a ausência de pedido expresso na peça

vestibular, ou discussão a respeito, no decorrer do feito, não obsta sua imposição, assim como

a ausência de discussão acerca dos demais efeitos do ato condenatório, como a imposição de

pena, por exemplo, não impossibilita sua aplicação” (TJRS – Ap. n° 70055000954, Rel.

Fabianne Breton Baisch, j. 11.09.2013).

Contudo, o Tribunal de Justiça de São Paulo, em diversos julgados, vem exigindo que o valor

a ser eventualmente fixado pelo juiz, em caso de condenação, conste expressamente da

denúncia ou queixa, a fim de que o réu tenha condições de rebater pontualmente essa

pretensão.

“Insta observar que a condenação dos apelantes a reparar os danos dos ofendidos deve ser

afastada, posto que como não houve pedido expresso na denúncia de valor mínimo de

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indenização, não é devida a reparação dos danos causados pela infração prevista no artigo

387, inciso IV, do Código de Processo Penal, nos moldes do determinado na r. decisão

recorrida (Nesse sentido: Apelação Criminal nº 0001420-13.2010.8.26.0318, Rel. Des. Nuevo

Campos, julgado em 04/10/2012)” (TJSP – Apelação nº 0054898-42.2008.8.26.0564. Rel.

Nelson Fonseca Junior, j. 12.12.2013).

“Como não houve requerimento de reparação de danos pelas partes ofendidas e entendendo

não ser devido o arbitramento de ofício pelo Juiz, revogo a indenização fixada na r. sentença

monocrática, sem prejuízo de que as partes possam requerê-la no Juízo Cível” (TJSP –

Apelação nº 0034465-65.2012.8.26.0050, Rel. Paulo Rossi, j. 11.12.2013).

No mesmo sentido vem decidindo o STJ:

“Este Superior Tribunal, em relação à fixação de valor mínimo de indenização a título de danos

morais, nos termos do art. 387, IV, do Código de Processo Penal, entende que se faz

indispensável o pedido expresso do ofendido ou do Ministério Público, este firmado ainda na

denúncia, sob pena de violação ao princípio da ampla defesa” (STJ – AgRg no REsp n. 1626962-

MS – Rel. Sebastião Reis Júnior , j, 06.12.2016, DJe 16.12.2016).

“Este Tribunal sufragou o entendimento de que deve haver pedido expresso e formal, feito

pelo parquet ou pelo ofendido, para que seja fixado na sentença o valor mínimo de reparação

dos danos causados à vítima, a fim de que seja oportunizado ao réu o contraditório e sob pena

de violação ao princípio da ampla defesa” (STJ – AgRg no AREsp n° 389234-DF, Rel. Maria

Thereza de Assis Moura, j. 08.10.2013, DJe 17.10.2013).

O TRF da 4a. Região editou Súmula na mesma linha:

Súmula 131: “Para que o juiz possa fixar o valor mínimo para a reparação dos danos causados

pela infração, é necessário que a denúncia contenha pedido expresso nesse sentido ou que

controvérsia desta natureza tenha sido submetida ao contraditório da instrução criminal”.

2 - Crimes envolvendo carregamento fraudulento de bilhete único, tendo como vítima

órgãos como SPTrans e CPTM.

Provocados pela 3a. Promotoria de Justiça da Barra Funda, foi encaminhado ao CAOCRIM o

estudo da tipicidade dos comportamentos envolvidos em fraudes no carregamento de bilhete

único de transporte.

Em apertada síntese, a situação colocada tem, basicamente, três personagens:

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“A”: na posse de bilhete verdadeiro, mas sem crédito, mediante o uso de software ilegal,

fraudulentamente recarrega o ingresso, gerando prejuízo para as empresas de transporte.

“B”: na posse dos bilhetes fraudulentamente carregados, expõe à venda.

“C”: usuário do sistema de transporte, adquire de “B” o bilhete, mais barato do que aquele

vendido nos sítios oficiais.

Diante desse quadro, analisando com atenção a conduta de cada agente implicado no evento,

o CAOCRIM concluiu o que segue:

Por primeiro, descartamos existir em qualquer das condutas acima o crime de furto. Não

existe subtração de coisa alheia móvel. A empresa de transporte (ou a Prefeitura), induzida

em erro, deixa de se locupletar em razão de artifício empregado pelo agente.

No que diz respeito ao “A”, a sua conduta se subsume ao disposto no art. 171 do CP, podendo

incidir, a depender da vítima, a causa de aumento do §3o, inviabilizando, assim, o benefício do

art. 89 da Lei n. 9.099/95.

Já com relação ao “B”, caso não exista prova de que concorreu para o comportamento de “A”,

sua conduta se ajusta ao art. 180, §1o., do CP, lembrando que o §2o. do mesmo artigo equipara

à atividade comercial, para efeito do parágrafo anterior, qualquer forma de comércio irregular

ou clandestino, inclusive o exercício em residência (redação dada pela Lei nº 9.426, de 1996).

Com relação ao “C”, se o sujeito simplesmente adquire o cartão de origem espúria, comete

receptação simples. Mas se, eventualmente, leva seu próprio cartão para ser carregado

mediante fraude, deve também responder por estelionato.

Por fim, como é sabido, no crime de receptação dolosa, a prova do conhecimento da

procedência criminosa adquirida ou recebida via de regra é difícil. Sendo a aquisição ou

recebimento da res geralmente feita na clandestinidade, a prova testemunhal é missão árdua.

E sendo a negativa dos réus, quanto ao conhecimento da origem da coisa, uma constante, de

grande valia a prova indiciária, que no caso, é bastante e suficiente para alicerçar o édito

condenatório. Não se alegue que com tal meio de prova não é possível estear uma

condenação. Segundo estão acordes a doutrina e a jurisprudência, os indícios, desde que

concordantes com outras provas colhidas, se constituem em meios idôneos de prova, e,

consequentemente, bastante para autorizar a condenação da prática de um crime. Para José

Frederico Marques: “O valor probante dos indícios e presunções, no sistema de livre

convencimento que o Código adota, é em tudo igual ao das provas diretas” (in Elementos de

Direito Processual Penal, Forense, 2ª ed. 1965, Vol. II, pg. 368).

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STF/STJ: decisões de interesse institucional COMENTADAS PELO CAOCRIM

DIREITO PROCESSUAL PENAL:

1-Tema PROVAS - STJ: É legal a prova com material genético descartado, ainda que não

tenha havido consentimento do investigado

COMENTÁRIOS DO CAO-CRIM

Com o advento da lei 12.654/12, tornou-se possível a identificação criminal por meio da coleta

de material biológico para a obtenção do perfil genético do agente, se a identificação for

essencial às investigações policiais, segundo despacho da autoridade judiciária competente,

que deve decidir de ofício ou mediante representação da autoridade policial, do Ministério

Público ou da defesa.

Esta forma de identificação criminal foi concebida sobretudo para subsidiar investigações

criminais nas quais o contato pessoal pode deixar vestígios genéticos do autor do crime no

corpo da vítima ou mesmo no local em que ocorrem os fatos. E, considerando o fato de que o

perfil genético deve ser armazenado em banco de dados específico, a identificação serve para

facilitar investigações futuras, em que o DNA colhido na investigação pode ser cruzado com

os dados armazenados.

Para muitos, a inovação é inconstitucional porque prestigia o direito penal do autor

(remontando ao conceito de “criminoso nato” de Enrico Ferri), fere a segurança jurídica –

desequilibrando a balança da punição x garantias – e é campo fértil para abusos.

Parece-nos, no entanto, que a medida é salutar quando se pensa num Estado que deve ser

eficiente no combate à crescente criminalidade (garantismo positivo), sem desconsiderar as

garantias do cidadão (garantismo negativo). Criticamos, apenas, aqueles que se pronunciam

interpretando a lei no sentido de ser obrigatório o fornecimento do material pelo agente. Isso

nos parece inconstitucional e inconvencional, pois a todos é assegurado o direito de não

produzir prova contra si (nemo tenetur se detegere). Logo, deve o Estado, através de métodos

não invasivos (salvo se o investigado concordar com tais procedimentos) colher material

desprendido do corpo do investigado para servir à identificação genética. O Estado não está

impedido de usar vestígios para colher material útil na identificação do indivíduo; não há

nenhum obstáculo para sua apreensão e verificação (ou análise ou exame), pois são partes do

corpo humano (vivo) que já não pertencem a ele. Logo, todas podem ser apreendidas e

submetidas a exame normalmente, sem nenhum tipo de consentimento do agente ou da

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vítima (ex: exame do DNA da saliva que se achava nos cigarros fumados e jogados fora pelo

condenado).

Esta tese foi encampada pelo STJ, que negou a ordem em habeas corpus impetrado pela

Defensoria Pública de Minas Gerais, cuja pretensão residia no desentranhamento de prova

pericial colhida a partir de copo e colher de plástico utilizados por um homem denunciado por

homicídio triplamente qualificado, estupro e extorsão (o número do habeas corpus não foi

divulgado porque o feito corre em sigilo).

Argumentava a Defensoria que o agente havia se negado a fornecer o material genético para

a realização de exame pericial, razão pela qual a colheita do material a partir de utensílios

utilizados por ele quando já estava preso violou seus direitos constitucionais à intimidade e à

não autoincriminação.

Para o ministro Reynaldo Soares da Fonseca, no entanto, o direito de não produzir prova

contra o próprio interesse existe para evitar que agentes estatais constranjam física ou

moralmente alguém para contribuir ativamente para a investigação. Mas, no caso julgado, a

partir do momento em que dispensou os utensílios usados, o investigado deixou de ter

controle sobre o material genético neles contido. Destacou o ministro que não se permite a

colheita à força – mediante violência física ou moral –, mas, se promovida sobre um material

abandonado, não há ilegalidade, pois trata-se, em última análise, de objeto público.

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DIREITO PENAL:

1-Tema APLICAÇÃO DE PENA - STJ: Danos psicológicos na vítima autorizam o aumento da

pena-base e dispensa perícia

COMENTÁRIOS DO CAO-CRIM

Diz o art. 59 do Código Penal:

“O juiz, atendendo à culpabilidade, aos antecedentes, à conduta social, à personalidade do

agente, aos motivos, às circunstâncias e consequências do crime, bem como ao

comportamento da vítima, estabelecerá, conforme seja necessário e suficiente para

reprovação e prevenção do crime: I - as penas aplicáveis dentre as cominadas; II - a quantidade

de pena aplicável, dentro dos limites previstos; III - o regime inicial de cumprimento da pena

privativa de liberdade; IV - a substituição da pena privativa da liberdade aplicada, por outra

espécie de pena, se cabível”.

O dispositivo em exame estabelece as circunstâncias judiciais sobre as quais o magistrado

procede à primeira fase de aplicação da pena (a segunda se dá sobre as circunstâncias

agravantes e atenuantes; a terceira, sobre as causas de aumento e de diminuição).

Dentre as circunstâncias judiciais, temos as consequências do crime, nem sempre explorada

pelos operadores do Direito no caso concreto. Em resumo, consequências do crime espelham

os efeitos decorrentes da infração penal, seus resultados, particularmente para a vítima, para

sua família ou para a coletividade. Dessa forma, se um roubo é cometido com violência que

provoca na vítima lesão corporal leve, o juiz deve exasperar a pena porque as consequências

são mais severas do que num roubo cometido apenas com grave ameaça; um atropelamento

culposo em que a vítima sofre lesão leve deve ter pena menor do que um em que a vítima

sofre lesão gravíssima e se torna permanentemente incapacitada de se locomover.

Com base nas consequências do crime, o STJ admitiu o aumento da pena-base num caso em

que a vítima sofreu danos psicológicos. O Tribunal denegou a ordem em habeas corpus

impetrado por um condenado por estupro de vulnerável que pretendia a redução de sua pena

porque os alegados danos psicológicos não haviam sido demonstrados por exame pericial (o

número do habeas corpus não foi divulgado porque o feito corre em sigilo).

Para o ministro Jorge Mussi, relator, a análise do dano psicológico causado na vítima não

pressupõe exame pericial. Cabe ao magistrado analisar as circunstâncias para aplicar a pena

adequada à repressão e à prevenção do delito.

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2 – Tema: Analogia no Direito Penal e a jurisprudência do STJ

Representada em latim pelos brocardos ubi eadem ratio ibi idem jus (onde houver o mesmo

fundamento haverá o mesmo direito), ou ubi eadem legis ratio ibi eadem dispositio (onde

impera a mesma razão deve prevalecer a mesma decisão), a analogia consiste no complexo

de meios dos quais se vale o intérprete para suprir a lacuna do direito positivo e integrá-lo

com elementos buscados no próprio Direito. Nesta ótica, seu fundamento é sempre a

inexistência de uma disposição precisa de lei que alcance o caso concreto.

Embora a regra seja a da vedação do emprego da analogia no âmbito penal (em respeito ao

princípio da reserva legal), a doutrina é uníssona ao permitir este recurso integrativo desde

que estejam presentes dois requisitos: a) certeza de que sua aplicação será favorável ao réu

(in bonam partem); b) existência de uma efetiva lacuna legal a ser preenchida. Em síntese, o

emprego da analogia no Direito Penal somente é permitido a favor do réu, jamais em seu

prejuízo, seja criando tipos incriminadores, seja agravando as penas dos que já existem.

A analogia é objeto recorrente de decisões tomadas pelo Superior Tribunal de Justiça. Há

situações em que o tribunal a admite, assim como há outras em que a repele sob o argumento

de que sua incidência é prejudicial ao agente. Dentre os julgamentos proferidos, o CAO-CRIM

destaca os seguintes:

1) O efeito da condenação consistente em perda de cargo, função pública ou mandato eletivo

não se aplica contra o agente aposentado para cassar o benefício: “1. O art. 92 do Código

Penal apresenta hipóteses estreitas de penalidade, entre as quais não se encontra a perda

da aposentadoria e, por se tratar de norma penal punitiva, não admite analogia in malam

partem” (AgInt no REsp 1.529.620/DF, j. 20/09/2016).

2) A mãe e representante legal da vítima menor de idade não pode ser sujeito ativo dos crimes

de falso testemunho e de corrupção ativa de testemunha, pois a lei lhe veda esse papel

processual: “Se o próprio legislador, em clara hipótese de interpretação autêntica, definiu ele

mesmo o conceito de testemunha (art. 415 do Código de Processo Civil⁄1973 e art. 288 do

Código Civil), não cabe ao julgador se afastar dessa definição, para nela inserir aqueles a que

a Lei vedou figurarem como testemunhas, mormente em se tratando de verificação de

abrangência de norma incriminadora, em cuja interpretação é vedada a analogia in malam

partem” (REsp 1.549.417/MG, j. 23/08/2016).

3) Não se aplica multa por litigância de má-fé no processo penal, pois seu código de regência

não estabelece essa forma de punição: “A jurisprudência desta Corte não admite a imposição

de multa por litigância de má-fé na seara penal, por considerar que sua aplicação constitui

analogia in malam partem, sem contar que a imposição de tal multa não prevista

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expressamente no Processo Penal, implicaria em prejuízo para o réu na medida em

que inibiria a atuação do defensor. Precedentes” (AgRg nos EDcl nos EAREsp 316.129/SC, j.

25/05/2016).

4) Equipara-se ao tráfico de drogas (art. 33, § 1º, da Lei nº 11.343/06) a importação do fruto

da planta cannabis sativa porque, embora não contenha tetrahidrocannabinol (THC), é

destinado à produção da planta, que por sua vez é produzida para se transformar em

entorpecente, “e sua importação clandestina amolda-se ao tipo penal insculpido no artigo 33,

§ 1º, da Lei n. 11.343⁄2006 sem que se possa falar em interpretação extensiva ou analogia in

malam partem, tampouco em desclassificação para o delito de contrabando, dada

a especialidade da norma que criminaliza a importação de matéria prima para a preparação

de substância entorpecente” (AgRg no REsp 1.609.752/SP, j. 23/08/2016).

5) O art. 302 da Lei nº 9.503/97 contém uma causa de aumento de pena para as situações em

que o homicídio culposo é cometido sem que o agente tenha permissão para dirigir ou carteira

de habilitação. Para o STJ, não é possível aplicar a majorante se, embora seja habilitado, o

agente esteja com a habilitação vencida: “No Direito Penal, não se admite a analogia in malam

partem, de modo que não se pode inserir no rol das circunstâncias que agravam a pena (art.

302, § 1º) também o fato de o agente cometer homicídio culposo na direção de veículo

automotor com carteira de habilitação vencida” (HC 226.128/TO, j. 07/04/2016).

6) O art. 327, § 2º, do Código Penal estabelece, para os crimes funcionais, uma causa de

aumento de pena quando o autor for ocupante de cargos em comissão ou de função de

direção ou assessoramento de órgão da administração direta, sociedade de economia mista,

empresa pública ou fundação instituída pelo poder público. O STJ decidiu que os ocupantes

de cargos eletivos não podem ter a pena aumentada porque não foram incluídos

expressamente no rol do dispositivo legal: “A norma penal incriminadora não admite a

analogia in malam partem. Se o dispositivo não incluiu, no rol daqueles que terão suas penas

majoradas em 1⁄3, os ocupantes de cargos político-eletivos, como o de vereador, não é

possível fazer incidir a causa de aumento do art. 327, § 2º, do Código Penal tão só em função

de o delito ter sido praticado no exercício da função” (REsp 1.244.377/PR, j. 03/04/2014).

7) Não se aplica a agravante genérica do art. 61, inciso II, e, do Código Penal quando o crime

é cometido contra companheiro, pois a lei faz expressa menção apenas ao cônjuge (REsp

1.201.880/RS, j. 07/05/2013).

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STF/STJ: Notícias de interesse institucional

Notícias STF 16 de julho de 2018 1-Mantida prisão de ex-gerente da Petrobras condenado na Operação Lava-Jato Clique aqui para ler a íntegra da notícia 18 de julho de 2018 2-Rejeitado recurso de ex-prefeito de Campo Grande (MS) condenado por corrupção passiva Clique aqui para ler a íntegra da notícia 19 de julho de 2018 3-Mantida prisão preventiva de acusado de homicídio motivado por disputa sindical no interior paulista Clique aqui para ler a íntegra da notícia 4-Ministro rejeita trâmite de HC impetrado por cidadão em nome do ex-presidente Lula Clique aqui para ler a íntegra da notícia 5-Revogada prisão preventiva de acusado de tráfico de pequena quantidade de droga Clique aqui para ler a íntegra da notícia Notícias STJ 16 de julho de 2018 6-Policial denunciado por integrar organização criminosa em São Gonçalo (RJ) continua preso

Clique aqui para ler a íntegra da notícia

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7- Presidente do STJ concede liminar para afastar hediondez em tráfico privilegiado de

drogas

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17 de julho de 2018

8-Ministra determina soltura de réu preso com base em enunciado contrário à

jurisprudência

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9- Mantida prisão preventiva de homem acusado de tentar matar quatro policiais

Clique aqui para ler a íntegra da notícia

18 de julho de 2018

10-Negado pedido de liberdade de Eduardo Cunha no processo da condenação no caso do

Porto Maravilha

Clique aqui para ler a íntegra da notícia

11-Ex-diretor do grupo OAS condenado na Operação Lava Jato tem prisão mantida

Clique aqui para ler a íntegra da notícia

12-Advogado acusado de manter oficina de armas de fogo em casa permanece preso

Clique aqui para ler a íntegra da notícia

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13-Pedido de liberdade ao ex-presidente Lula é negado liminarmente pelo ministro

Humberto Martins

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19 de julho de 2018

14-Suspensa aplicação de falta grave que não foi objeto de procedimento administrativo

disciplinar

Clique aqui para ler a íntegra da notícia

15-Exercício da função de flanelinha sem registro não configura contravenção penal

Clique aqui para ler a íntegra da notícia

16-Presidente julga prejudicado pedido da PGR sobre habeas corpus de Lula

Clique aqui para ler a íntegra da notícia

17-STJ mantém prisão do ex-secretário de Transportes de SP por desvio de verbas nas obras

do Rodoanel Mário Covas

Clique aqui para ler a íntegra da notícia

18-Humberto Martins nega pedido para ex-presidente conceder entrevistas dentro da prisão

Clique aqui para ler a íntegra da notícia

20 de julho de 2018

19-Deputado do Amazonas condenado por abuso de poder econômico tem negado pedido

de suspensão de execução da pena