atividade fisica e diabetes mellitus

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 347 Peluso CC et al./ Diabetes Clínica 05 (2001) 347~349 Diabetes Clínica 04 (2001) 347~349 ATUALIZAÇÃO Atividade física e diabetes mellitus  Nora Mercuri*, Viviana Arrechea* *Cenexa Centro de Endocrinologia experimental y aplicada - Buenos Aires - Argentina   Diabetes Clínica  Jornal Mult idisciplinar do Diabetes e das Patologias Associadas A atividade física é um fator importante do tratamen- to do diabetes mellitus, e contribui para melhorar a qua- lidade de vida do portador de diabetes. Mais ainda, atu- ando preventivamente e implantando um programa de  promoção da atividade física, dieta sã e equilibrada, as- sistência médica, educação do paciente e da equipe sa- nitária, pode se reduzir significativamente a incidência do diabetes do tipo 2 e das complicações associadas. Segundo um estudo de Helmrich et al., o risco de di- abetes do tipo 2 aumenta à medida que aumenta o IMC (índice de massa corporal), e, ao contrario, quando au- menta a intensidade e/ou a duração da atividade física, expressa em consumo calórico semanal, esse risco di- minui, especialmente em pacientes com risco elevado de diabetes. T al como ocorre em pessoas não diabéticas, a prática regular de exercício pode produzir importantes benefí- cios a curto, médio e longo prazo. Esses benefícios es- tão enumerados na Tab ela seguinte. Tabela 1 - Benefícios da atividade física a curto, médio e longo  prazo Aumenta o consumo da glicose. Diminui a concentração basal e pós-prandial da insulina. Aumenta a resposta dos tecidos à insulina. Melhora os níveis da hemoglobina glicosilada. Melhora o perfil lipídico: - d iminui os trigl ic eríde os. - aumenta a co nc en tr ão de HDL- co le st er ol . - dimi nui leve ment e a concent ração de LDL- coles ter ol. Contribui a diminuir a pressão arterial. Endereço para correspondên cia: UNLP-CONICET Calles 60 y 120 – 4to piso Facultad de Ciências Médicas, 1900 – La Plata – Buenos Aires – Argentina, E-mail: gagliardino@infovia.com.ar Aumenta o gasto energético: - fa vo re ce a red ão do pe so co rp or al . - di mi nui a massa total de gord ur a. - pr es er va e aumenta a massa muscular. Melhora o funcionamento do sistema cardiovascular. Aumenta a força e elasticidade muscular. Promove uma sensação de bem-estar e melhora a qualidade de vida. Dentre os benefícios a curto prazo, o aumento do con- sumo de glicose como combustível por parte do múscu- lo em atividade, contribui para o controle da glicemia. O efeito hipoglicemiante do exercício pode se prolon- gar por horas e até dias após o fim de exercício. Esta resposta metabólica normal pode ser alterada durante os estados de extrema deficiência de insulina ou excesso da mesma, o que é responsável por um risco maior de hipoglicemia e/ou hiperglicemia e ocorrência de cetoa- cidose. Por essa razão, a prescrição de atividade física para melhorar o controle glicêmico em pacientes portadores de diabetes do tipo 1 (insulino-dependentes) foi motivo de discussão e controvérsias entre especialistas. O que é certo é que o uso freqüente de técnicas de auto-monitorização glicêmica e a implantação de insu- linoterapia intensificada permitem ao paciente portador de diabetes do tipo 1 desenvolver estratégias e ajustes no consumo de carboidratos e doses de insulina, para  poder participar de maneira mais segura em programa de atividade física. Por outro lado, a prescrição de atividade física em  paciente portador de diabetes do tipo 2 não apresenta

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Peluso CC et al./ Diabetes Clnica 05 (2001) 347~349

Diabetes Clnica

347

Jornal Multidisciplinar do Diabetes e das Patologias Associadas

Diabetes Clnica 04 (2001) 347~349

ATUALIZAO

Atividade fsica e diabetes mellitusNora Mercuri*, Viviana Arrechea**Cenexa Centro de Endocrinologia experimental y aplicada - Buenos Aires - Argentina

A atividade fsica um fator importante do tratamento do diabetes mellitus, e contribui para melhorar a qualidade de vida do portador de diabetes. Mais ainda, atuando preventivamente e implantando um programa de promoo da atividade fsica, dieta s e equilibrada, assistncia mdica, educao do paciente e da equipe sanitria, pode se reduzir significativamente a incidncia do diabetes do tipo 2 e das complicaes associadas. Segundo um estudo de Helmrich et al., o risco de diabetes do tipo 2 aumenta medida que aumenta o IMC (ndice de massa corporal), e, ao contrario, quando aumenta a intensidade e/ou a durao da atividade fsica, expressa em consumo calrico semanal, esse risco diminui, especialmente em pacientes com risco elevado de diabetes. Tal como ocorre em pessoas no diabticas, a prtica regular de exerccio pode produzir importantes benefcios a curto, mdio e longo prazo. Esses benefcios esto enumerados na Tabela seguinte.Tabela 1 - Benefcios da atividade fsica a curto, mdio e longo prazo Aumenta o consumo da glicose. Diminui a concentrao basal e ps-prandial da insulina. Aumenta a resposta dos tecidos insulina. Melhora os nveis da hemoglobina glicosilada. Melhora o perfil lipdico: diminui os triglicerdeos. aumenta a concentrao de HDL-colesterol. diminui levemente a concentrao de LDL-colesterol. Contribui a diminuir a presso arterial.

Aumenta o gasto energtico: favorece a reduo do peso corporal. diminui a massa total de gordura. preserva e aumenta a massa muscular. Melhora o funcionamento do sistema cardiovascular. Aumenta a fora e elasticidade muscular. Promove uma sensao de bem-estar e melhora a qualidade de vida.

Dentre os benefcios a curto prazo, o aumento do consumo de glicose como combustvel por parte do msculo em atividade, contribui para o controle da glicemia. O efeito hipoglicemiante do exerccio pode se prolongar por horas e at dias aps o fim de exerccio. Esta resposta metablica normal pode ser alterada durante os estados de extrema deficincia de insulina ou excesso da mesma, o que responsvel por um risco maior de hipoglicemia e/ou hiperglicemia e ocorrncia de cetoacidose. Por essa razo, a prescrio de atividade fsica para melhorar o controle glicmico em pacientes portadores de diabetes do tipo 1 (insulino-dependentes) foi motivo de discusso e controvrsias entre especialistas. O que certo que o uso freqente de tcnicas de auto-monitorizao glicmica e a implantao de insulinoterapia intensificada permitem ao paciente portador de diabetes do tipo 1 desenvolver estratgias e ajustes no consumo de carboidratos e doses de insulina, para poder participar de maneira mais segura em programa de atividade fsica. Por outro lado, a prescrio de atividade fsica em paciente portador de diabetes do tipo 2 no apresenta

Endereo para correspondncia: UNLP-CONICET Calles 60 y 120 4to piso Facultad de Cincias Mdicas, 1900 La Plata Buenos Aires Argentina, E-mail: [email protected]

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dvidas e hoje, junto com a per- Grfico 1 da de peso, uma das indicaes das mais apropriadas para corrigir a resistncia insulina e controlar a glicemia nesse tipo de diabetes (que representa 90% dos casos), ainda mais se est associado obesidade. Por outro lado, no diabetes do tipo 2 cujo tratamento est baseado s em dieta, raramente o exerccio gera hipo ou hiperglicemia. Os benefcios a mdio e longo prazo, da prtica regular de atividade fsica, contribuem para diminuir os fatores de risco para o desenvolvimento da doena cardioobesidade, a vascular (aumentado no paciente *No caso desugerido deveprtica diria recomendada ** O tempo ser acrescentado de 5-10 minutos de exerccios de portador de diabetes), atravs das alongamento e mobilidade articular antes e aps a atividade principal. seguintes alteraes: melhora do O tipo de atividade indicada de natureza aerbica, perfil lipdico, contribuio para a normalizao da presque envolve grandes grupos musculares e pode ser manso arterial, aumento da circulao colateral, diminuio tida por um tempo prolongado. No momento da seleda freqncia cardaca no repouso e durante o exerccio. o, essencial respeitar os gostos e interesses dos paciNo mais, independentemente das alteraes fisiolgicas entes, aumentando assim a aderncia ao programa. que acompanham o exerccio, tambm ocorrem alteraApesar do que foram reportados aumentos significaes comportamentais que favorecem o cuidado e o autotivos da tolerncia glicose e da ao da insulina em controle por parte do paciente, e conseqentemente conpessoas que realizam um vigoroso programa de treinatribuem para melhorar sua qualidade de vida. mento, o exerccio de intensidade menor (50% da freqncia cardaca mxima) pode produzir benefcios imComo manejar a atividade fsica em pacientes portantes e melhorar a condio fsica dos pacientes seportadores de diabetes dentrios com estado fsico debilitado, quando praticado com freqncia semanal maior. Essa ltima recomenComo os outros elementos do tratamento, a atividadao vlida tambm no caso da obesidade, pela qual de fsica deve ser prescrita de maneira individual para ser prescrita a prtica diria de exerccio, na medida do evitar riscos e otimizar os benefcios. O tipo, freqnpossvel. cia, intensidade e durao do exerccio recomendado O risco de diabetes do tipo 2 aumenta na medida que depender da idade, do grau de treinamento anterior e aumenta o IMC, e, na medida que aumenta a intensidado controle metablico, durao do diabetes, e presena de/durao da atividade fsica expressa em consumo de complicaes especficas da doena. calrico semanal, esse risco diminui. Geralmente, o gasto Por isso, antes de iniciar a prtica sistemtica da atienergtico deveria ser de 900 a 1500 calorias/semana, vidade fsica, o paciente portador de diabetes deve subpara obter benefcios metablicos e cardiovasculares. meter-se a exame clnico geral (fundo de olho, presen geralmente aceito que a durao da atividade no a de neuropatia, osteoartrite, etc) e cardiovascular, indeve ser inferior a 20 minutos para os exerccios contcluindo na medida do possvel uma prova de esforo nuos e no deve ultrapassar 60 minutos para o mesmo (ergometria). exerccio. O exerccio prolongado apresenta grandes O ajuste na prescrio do exerccio ser mais eficaz se vantagens, mas aumenta tambm o risco de hipogliceos esforos forem coordenados por: o paciente, a famlia, mia e, por isso, necessita um melhor controle. o mdico e sua equipe de colaboradores. A educao em A prtica do tipo de atividade fsica descrita com uma diabetes, que permite ao paciente combinar corretamente freqncia inferior a 2 vezes por semana no fornece dieta, dosagem de insulina e hipoglicemiantes orais com benefcios significativos ao nvel metablico e cardioo exerccio, diminui notavelmente os riscos de hipoglicevascular. mia e/ou hiperglicemia ps-exerccio. No Grfico 1, foram listados exemplos de atividades A atividade fsica prescrita em pacientes portadores preferenciais, sem contra-indicaes em pacientes adulde diabetes deveria reunir as caractersticas descritas no tos sedentrios. A mudana mais importante antes de Grfico 1.

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iniciar um programa formal, a aquisio de hbitos de vida fisicamente ativos (caminhar ou andar de bicicleta, subir e descer as escadas, realizar atividades domsticas e de lazer necessitando movimentos) o que, no final do dia, resulta em um gasto energtico notvel. Para os pacientes que apresentam contra-indicaes temporrias para realizar atividades fsicas aerbicas (portadores de hipertenso arterial no controlada ou cardiomiopatia), ou com outro elemento de tratamento, deve se recomendar a prtica de tcnicas de relaxamento e movimentos suaves do tipo yoga. Elas tm a propriedade de desenvolver a capacidade de relaxamento psicofsico e diminuir a atividade simptico-adrenrgica, o que pode contribuir no controle metablico e da presso arterial, especialmente em pacientes portadores de diabetes tipo 2. Toda sesso de atividade fsica deve comear e terminar com um perodo de 5 a 10 minutos de exerccios aerbicos de baixa intensidade, alongamento e mobilidade articular para reduzir o risco de complicaes cardacas e leses msculo-esquelticas. Recomendaes para o paciente - Escolher uma atividade fsica a seu gosto e impor se a prtica regular da atividade fsica escolhida. - Evitar metas inatingveis. Aumentar progressivamente a durao da atividade e a intensidade do esforo. - Praticar diariamente pelo menos durante 20-30 minutos, ou 3 a 4 vezes por semana durante 45-60 minutos. - Comear a sesso com exerccios de alongamento e movimentos articulares. Repetir no fim da sesso. - Se voc nunca praticou atividade fsica programada, comece por aumentar a atividades dirias que faz habitualmente, como caminhar, subir e descer escadas, etc. - Interromper o exerccio ante sinais de hipoglicemia, dor no peito ou respirao sibilante. - O sapato utilizado deve ser confortvel e as meias de algodo. Examine diariamente os seus ps. - Beber uma quantidade maior de lquido sem calorias nem cafena, como gua, antes, durante e aps a atividade fsica. - Se quiser conhecer a intensidade do esforo realizado, controle a sua freqncia cardaca imediatamente aps o fim do exerccio. - No esquea de levar acar para a sesso de atividade fsica. - Se voc caminha, corre ou anda de bicicleta, evite as interrupes durante o tempo proposto. Recomendaes para a equipe de sade - Determinar se o paciente sedentrio, ativo ou treinado.

- Realizar um exame clnico geral (fundo de olho, presena de neuropatia, osteoartrite) e cardiovascular incluindo uma prova de esforo (ergometria) antes de recomendar ao paciente o tipo, intensidade e durao da atividade fsica. - Selecionar junto com o paciente atividades que sejam de seu gosto e recomendar especialmente ao sedentrio ou obeso realizar atividades em grupo ou na companhia de outras pessoas. Assim diminui o risco de desero. - Ensinar o paciente (se no sabe) a realizar auto-monitorizao glicmica e recomendar faz-la antes do incio da sesso de atividade fsica, porque: a Se glicemia > 300mg/dl ou em presena de corpos cetnicos, adiar a prtica do exerccio. b Se a glicemia est dentro os limites normais, ou ante uma hipoglicemia, ingerir carboidratos extras antes do exerccio (de acordo com a sua intensidade e durao). Em regra geral, consumir 10-20 gramas de carboidratos por cada 30 minutos de atividade moderada. - Para diminuir o risco de hipoglicemia se o paciente recebe insulina ou sulfonilurias: a Estimar a intensidade e durao da atividade fsica. b No caso de uso de hipoglicemiantes orais, pode diminuir ou suspender a dose prevista antes do exerccio. c No caso de uso de insulina, fazer a aplicao mais de uma hora antes do exerccio e diminuir a dose que produz o pico no momento da atividade. d Se a atividade for superior ao normal, recomende o controle da glicemia durante a noite, porque pode ser necessrio diminuir a dose de insulina ou de hipoglicemiante noturno. - Se desejar verificar o efeito do exerccio sobre a glicemia, recomende ao paciente controla-la a partir de meiahora aps o fim da atividade. - Ensinar o paciente a controlar sua freqncia cardaca. Referncias1. Nora Mercuri, Daniel Assad. La prctica de actividad fsica en personas con diabetes tipo 2. Diabetes tipo 2 no insulinodependiente: su diagnstico, control y tratamiento. Sociedad Argentina de Diabetes (SAD), 69-80, 1998. American Diabetes Association: Diabetes mellitus and Exercise (position Statement). Diabetes Care, 24;(1), jan 2001. Susan P Helmrich et al. Physical activity and reduced occurrence of non-insulin-dependent diabetes mellitus. New England Journal of Medicine. 1991;325(3):147-152. The Health Professionals Guide to Diabetes and Exercice. N Rudeman, JT Devlin (eds). American Diabetes Association. Clinical Education Series, 1995.

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