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ÁREA TEMÁTICA: ENSINO DE ADMINISTRAÇÃO VALORES PESSOAIS E TIPOS MOTIVACIONAIS: UM ESTUDO COM FUTUROS ADMINISTRADORES DE UMA REGIÃO METROPOLITANA DO NORDESTE BRASILEIRO AUTORES JOELMA SOARES DA SILVA Universidade Estadual do Ceará [email protected] FRANCISCO ROBERTO PINTO Universidade Estadual do Ceará [email protected] JAKCILENE DIAS ROCHA Universidade Estadual do Ceará [email protected] LEONARDO VICTOR DE SÁ PINHEIRO Universidade Estadual do Ceará [email protected] RESUMO Os valores pessoais têm sido alvo de diversas pesquisas, principalmente por sua intrínseca relação com o comportamento humano. O objetivo deste trabalho é verificar a hierarquia de valores pessoais e dos tipos motivacionais dos estudantes do curso Administração. Para consecução de tal objetivo foi realizada uma pesquisa de natureza quantitativa através da aplicação de questionário estruturado composto pelo Schwartz Value Survey (SVS) e por questões sócio-demográficas. Os dados foram trabalhados com o software SPSS (Statistical Package for the Social Sciences) versão 18.0, módulos de estatística descritiva e análise de variância (ANOVA). Os resultados alcançados apontam que a hierarquia dos valores encontrada na pesquisa se configura de forma semelhante à que foi encontrada por Tamayo (2007b). Por outro lado, a importância encontrada para alguns tipos motivacionais se revelou de forma diferente da encontrada pelo autor. Neste estudo, “benevolência”, “autodeterminação” e “conformidade” aparecem como os tipos motivacionais mais relevantes, invertendo a hierarquia encontrada por Tamayo (2007b). Verificou-se também que existe diferença significativa de percepção entre homens e mulheres em relação aos valores pessoais. Quanto ao tipo motivacional, apenas “benevolência” apareceu com diferença estatisticamente significante. Palavras-chaves: Valores pessoais, Tipos motivacionais, Futuros administradores.

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ÁREA TEMÁTICA: ENSINO DE ADMINISTRAÇÃO

VALORES PESSOAIS E TIPOS MOTIVACIONAIS: UM ESTUDO COM FUTUROS ADMINISTRADORES DE UMA REGIÃO METROPOLITANA DO NORDESTE BRASILEIRO

AUTORES JOELMA SOARES DA SILVA Universidade Estadual do Ceará [email protected] FRANCISCO ROBERTO PINTO Universidade Estadual do Ceará [email protected] JAKCILENE DIAS ROCHA Universidade Estadual do Ceará [email protected] LEONARDO VICTOR DE SÁ PINHEIRO Universidade Estadual do Ceará [email protected]

RESUMO Os valores pessoais têm sido alvo de diversas pesquisas, principalmente por sua intrínseca relação com o comportamento humano. O objetivo deste trabalho é verificar a hierarquia de valores pessoais e dos tipos motivacionais dos estudantes do curso Administração. Para consecução de tal objetivo foi realizada uma pesquisa de natureza quantitativa através da aplicação de questionário estruturado composto pelo Schwartz Value Survey (SVS) e por questões sócio-demográficas. Os dados foram trabalhados com o software SPSS (Statistical Package for the Social Sciences) versão 18.0, módulos de estatística descritiva e análise de variância (ANOVA). Os resultados alcançados apontam que a hierarquia dos valores encontrada na pesquisa se configura de forma semelhante à que foi encontrada por Tamayo (2007b). Por outro lado, a importância encontrada para alguns tipos motivacionais se revelou de forma diferente da encontrada pelo autor. Neste estudo, “benevolência”, “autodeterminação” e “conformidade” aparecem como os tipos motivacionais mais relevantes, invertendo a hierarquia encontrada por Tamayo (2007b). Verificou-se também que existe diferença significativa de percepção entre homens e mulheres em relação aos valores pessoais. Quanto ao tipo motivacional, apenas “benevolência” apareceu com diferença estatisticamente significante.

Palavras-chaves: Valores pessoais, Tipos motivacionais, Futuros administradores.

ABSTRACT

Personal values have been the subject of several studies, mainly because of its intrinsic relationship to human behavior. The objective of this study is to test the hierarchy of personal values and motivational types of students on the course of Directors. To achieve this goal we carried out a quantitative survey by a structured questionnaire composed of the Schwartz Value Survey (SVS) and demographic questions. The data were processed with the software SPSS (Statistical Package for the Social Sciences) version 18.0, modules descriptive statistics and analysis of variance (ANOVA). The results indicate that the hierarchy of values found in the survey is configured similarly to that found by Tamayo (2007b). On the other hand, the importance for some motivational types found proved so different from that found by the author. In this study, "benevolence", "self" and "conformity" appear as the most important motivational types, reversing the hierarchy found by Tamayo (2007b). There was also significant difference of perception between men and women in relation to personal values. As for the motivational type, only "grace" come up with a statistically significant difference.

Key-Words: Personal values, Motivational types, Future managers.

1. INTRODUÇÃO

Existe, nos últimos tempos, uma amplitude de publicações que abordam os valores pessoais como sendo relevante para a compreensão de comportamentos. Segundo Porto e Tamayo (2005), os valores beneficiam o aparecimento de comportamentos adaptativos a ambientes mutáveis e aumentam a flexibilidade do indivíduo para enfrentar ambientes novos, sem a necessidade de especificar uma resposta comportamental para cada situação.

Em um de seus muitos estudos sobre valores, Schwartz (2006) defende que os valores funcionam como um padrão de juízo, que justifica as ações do indivíduo e que são desenvolvidos a partir das suas experiências sociais. Por consequência dos estudos de valores pessoais, têm-se os tipos motivacionais. Estes, por sua vez, são operacionalmente conceituados como fatores que são compostos por diversos valores que apresentam similaridade do ponto de vista do conteúdo motivacional (TAMAYO, 2007).

Quanto ao desenvolvimento dos futuros gestores, Chanlat (1996) acredita que existe uma considerável crítica sobre o ensino e a formação do administrador no mundo, haja vista o elevado grau de especialização, o etnocentrismo, a incultura, a ausência de consciência histórica, além da inaptidão para comunicar ou interagir nos programas e no comportamento dos estudantes.

A importância de se estudar o comportamento dos alunos do curso de Administração deve-se ao fato destes estarem sendo preparados para serem futuros gestores, podendo influenciar de forma significativa nos rumos das organizações, conforme seus valores e comportamentos. Diante disso, o conhecimento dos valores pessoais e dos tipos motivacionais dos futuros administradores faz-se importante pelo potencial subsídio em contribuir para um melhor entendimento do comportamento nas organizações.

2. PROBLEMA E OBJETIVO DO TRABALHO

Diante do exposto anteriormente, este estudo visa responder o seguinte

questionamento: quais valores pessoais são considerados relevantes pelos futuros Administradores? Definiu-se como objetivo geral deste trabalho verificar a hierarquia de valores pessoais e dos tipos motivacionais dos estudantes do curso de Administração.

Para o alcance do objetivo proposto, este artigo está estruturado em cinco partes: introdução seguida do problema e objetivo do trabalho;a terceira parte é composta da revisão bibliográfica, composta pelo estudo de valores, a teoria de valores de Schwartz e da hierarquia axiológica dos valores humanos; a quarta parte traz a metodologia adotada no trabalho; a quinta parte trata da análise dos resultados e por fim, têm-se as considerações finais.

3 REVISÃO BIBLIOGRÁFICA

A literatura base revisada para a fundamentação deste trabalho encontra-se organizada mediante a exploração de dois aspectos-chave para a compreensão das análises e discussões, como segue. A necessidade de se trabalhar esses conceitos proporciona uma maior maturidade para as bases teóricas e conhecimento das habilidades importantes no âmbito empresarial e acadêmico.

3.1 O Estudo de Valores

Não é incomum a literatura referenciar valores pessoais relacionando-os aos mais diversos contextos, seja às relações familiares, a uma determinada cultura ou ao ambiente organizacional. Para compreender comportamentos e relações sociais, é necessário entender não somente seu conceito e significado, mas também sua influência na vida das pessoas.

Schwartz (2006) defende que os valores funcionam como um padrão de juízo, que justifica as ações do indivíduo e que são desenvolvidos a partir das suas experiências sociais. Em sentido mais amplo, atuam como princípios norteadores da vida do homem (SCHWARTZ, 2005). Os valores são preditores do comportamento e das atitudes das pessoas e podem estar relacionados a focos específicos da vida de cada um. (PORTO e TAMAYO, 2005a; ROS, 2006).

O valores pessoais também podem ser compreendidos como as concepções que o indivíduo possui sobre o desejável. Concepções estas que, por serem transsituacionais, guiam a forma como os atores sociais selecionam seu comportamento, avaliam pessoas e explicam suas ações (FERNANDES, 2009). Tamayo e Porto (2005) corroboram com o mesmo pensamento ao salientarem a relação estreita entre valores e comportamento. Percebe-se, portanto, que os autores são unânimes em afirmar que as pessoas possuem uma estrutura de valores que orienta sua vida de maneira geral. Ressalta-se ainda que esta estrutura não é concreta, mas ampla e inclusiva.

O estudo dos valores humanos desperta interesse das mais diversas áreas, como a Antropologia (KLUCKHOHN, 1951), Sociologia (MASLOW, 1954, WILLIAMS, 1968) e Psicologia (ROCKEACH, 1973), sob perspectivas diferentes. Várias teorias foram desenvolvidas para estudar o tema, mas a obra de Rockeach (1973) foi, sem dúvida, uma das mais relevantes no desenvolvimento das pesquisas. Este autor foi o primeiro a sistematizar a medição de valores humanos, possibilitando aplicações em diversos contextos da ação humana (PORTO, 2005), bem como sua obra serviu como precursora para o modelo desenvolvido por Schwartz (1992, 2005).

O Rockeach Values Survey (RVS) ou Inventário de Valores de Rockeach (IVR), foi traduzido e adaptado no Brasil por Günther (1981). O instrumento é composto de 36 itens distribuídos em duas listas de 18 valores cada, diferenciadas em valores terminais e instrumentais, e definidos por uma frase curta.

Segundo Tamayo (2007a) a principal deficiência da escala está na sua construção. Os critérios utilizados por Rockeach foram pouco adequados, pois os valores terminais foram delimitados a partir da literatura e de entrevistas com amostra de 100 adultos que evocavam valores americanos. Desta forma, o autor obteve várias centenas de valores; em seguida, eliminou os sinônimos e valores muito específicos. Quanto aos valores instrumentais, foram definidos a partir de uma lista de 555 traços de personalidade proposta por Anderson (1968). Tamayo (2007a) ainda considera as fontes limitadas, questiona a relação entre os valores e afirma que estes dificilmente representam uma amostra dos valores humanos.

Diante do exposto, o Rockeach Values Survey (RVS) foi importante para as pesquisas nacionais, pois até 1986 não existiam estudos sobre os valores dos brasileiros ou ao menos com amostras compostas por sujeitos brasileiros (TAMAYO, 2007a). Embora Tamayo (2007a) acredite que o RVS contém limitações oriundas da construção da escala, enquanto Porto (2005) afirma que o RVS ainda é utilizado em pesquisas, principalmente porque é relativamente econômico por conter apenas 36 itens com resultados ricos, e é adaptável às mais variadas necessidades, além de ter servido de base para os estudos de Schwartz.

3.2 A Teoria de Valores de Schwartz

O instrumento para avaliação dos valores desenvolvido por Schwartz (1992), denominado Schwartz Value Survey (SVS), apresenta estrutura do tipo fatorial e avalia os valores de acordo com os tipos motivacionais propostos na teoria. A proposta é uma teoria unificadora para o campo da motivação humana, uma maneira de organizar as diferentes necessidades, motivos e objetivos propostos em outras teorias (SCHUWARTZ, 2005). Percebe-se que o modelo engloba aspectos da estrutura psicológica humana, os quais são fundamentais e, presumivelmente, comuns a toda humanidade. Existe, portanto, uma relação dinâmica entre os valores e os tipos motivacionais (TAMAYO, 2007a).

Na versão utilizada no Brasil, foram acrescidos quatro valores característicos da cultura local antes de proceder à validação. No Brasil, o SVS engloba valores transculturais e valores brasileiros, perfazendo um total de 61 valores distribuídos em 10 tipos motivacionais: Autodeterminação, Estimulação, Hedonismo, Realização, Poder, Segurança, Conforto, Tradição, Benevolência e Universalismo, alocados em duas dimensões bipolares: Auto-promoção versus Auto-transcedência e Abertura à Mudança versus Conservação (PORTO; TAMAYO, 2007), conforme Figura 1, a seguir:

Figura 1: Estrutura Teórica entre a relação de valores

Fonte: Tinoco et al (2010)

Schwartz (2005) define cada um dos dez tipos motivacionais de acordo com o objetivo que eles expressam, como segue:

1. Auto-determinação: pensamento e ação independente – escolher, criar, explorar.

Derivada de necessidades orgânicas por controle e dominância.

2. Estimulação: excitação novidade, desafio na vida. É derivada da necessidade orgânica de variedade e estimulação.

3. Hedonismo: prazer ou gratificação sensual. Derivado de necessidades orgânicas e do prazer associado à sua satisfação.

4. Realização: sucesso pessoal por meio de demonstração de competência de acordo com os padrões sociais. Sucesso aprovado socialmente (influência, bem-sucedido, ambicioso).

5. Poder: status social e prestígio, controle ou domínio sobre pessoas e recursos. 6. Segurança: segurança, harmonia e estabilidade da sociedade, dos relacionamentos e de si

mesmo. 7. Conformidade: restrição e ações, inclinações e impulsos que tendem a incomodar outras

pessoas e que violam expectativas ou normas sociais. 8. Tradição: respeito, compromisso e aceitação dos costumes e ideias da cultura ou religião

de um indivíduo. 9. Benevolência: preservar e fortalecer o bem-estar daqueles com que o contato pessoal do

indivíduo é mais frequente. 10. Universalismo: compreensão, agradecimento, tolerância e proteção do bem estar de

todas as pessoas e da natureza. É importante diferenciar os objetivos entre os tipos motivacionais “realização” e

“poder”: Tanto o poder quanto a realização focam em estima social. Entretanto, valores de realização (por exemplo, bem-sucedido, ambicioso), enfatizam a demonstração ativa de performance bem sucedida em interações concretas, enquanto os valores de poder (por exemplo, autoridade e saúde) enfatizam a consecução ou manutenção de uma posição dominante dentro do sistema social mais geral (SCHWARTZ, 2005, p.25).

A distinção principal entre “conformidade” e “tradição” está, sobretudo, no tipo de

subordinação. O foco dos valores de “conformidade” está naqueles com os quais o indivíduo tem contato direto, como professores e pais, entre outros. Os valores de “tradição” são mais abstratos, pois dizem respeito à subordinação aos costumes e ideias religiosas, entre outras. No que concerne aos valores de “benevolência”, é importante ressaltar que sua principal diferenciação está na base motivacional, pois enquanto os valores de “conformidade” promovem cooperação para evitar resultados negativos, os valores de “benevolência” têm uma motivação interiorizada para tal comportamento (SCHWARTZ, 2005).

A estrutura apresentada na Figura 1 foi idealizada de forma a traduzir a ideia da estrutura de relações de valores. Alguns pares de tipos motivacionais são complementares e outros competem entre si. O fato é que em situações diferentes um indivíduo poderá apresentar valores antagônicos. Além disso, a concepção de forma circular implica a interação entre os dez tipos motivacionais (SCHWARTZ, 2005).

Anos depois, Schwartz construiu um segundo instrumento para avaliação de valores pessoais, o Portrait Value Questionnaire (PVQ). O PVQ é menos abstrato que o SVS e, em consequência, mais adaptado para crianças, adolescentes e para pessoas com baixo nível de escolaridade. Campos e Porto (2010) ressaltam que os modelos de valores desenvolvido por Schwartz (1992, 2005) traduz as necessidades em valores específicos.

A relevância dos estudos de Schwartz se dá, sobretudo, por ele ter sido o primeiro a idealizar uma estrutura de valores baseada na motivação subjacente a cada um deles, ou seja, o que diferencia um valor de outro é o tipo de motivação que ele expressa (TAMAYO, 2007a).

4 METODOLOGIA

O presente estudo é de natureza quantitativa que segundo Beuren (2008, p.92) “caracteriza-se pelo emprego de instrumentos estatísticos, tanto na coleta como no tratamento dos dados”. Segundo Vergara (2009), a metodologia pode ser definida quanto aos fins e quanto aos meios. Quanto aos fins, esta pesquisa pode ser definida como exploratória, pois se trata de uma área na qual há pouco conhecimento acumulado e sistematizado, bem como descritiva, haja vista que será exposto as características de determinada população. Quanto aos meios o presente artigo caracteriza-se como pesquisa bibliográfica e de campo.

A amostra utilizada é de natureza aleatória e probabilística, tendo sido calculada por aplicação da fórmula de Barbetta (2004). Participaram da pesquisa 350 estudantes do curso de Administração de duas universidades públicas localizadas em uma região metropolitana do Nordeste brasileiro, tendo sido excluídos sete questionários por preenchimento incorreto. A pesquisa foi realizada no mês de outubro de 2010.

Foi utilizado como instrumento de pesquisa um questionário estruturado dividido em duas partes. A primeira parte apresenta a escala SVS (SCHWARTA, 1992), composta de 61 itens, traduzida e validada por Tamayo e Schwartz (1993). As questões foram aplicadas através de uma escala tipo Likert, de 9 pontos, onde -1 corresponde a “oposto aos meus valores” e 7 corresponde a “valores de suprema importância”.

O SVS avalia os valores que são agrupados em 10 tipos motivacionais (Auto-determinação, Estimulação, Hedonismo, Realização, Poder, Segurança, Conformidade, Tradição, Benevolência e Universalismo) e duas dimensões bipolares antagônicos (Auto-transcedência / Auto-promoção e Abertura à mudança/Conservadorismo) propostos por Schwartz (1994).

Além dessas questões, foram incluídas outras de natureza sócio-demográfica, tais como gênero, idade, estado civil para caracterização dos respondentes. Os questionários foram aplicados em salas de aula por três pesquisadores que davam instruções sobre como respondê-los. Estes intervieram o mínimo possível no processo de aplicação, dando apenas explicações quando solicitados, evitando emitir significados diferentes daqueles atribuídos pelos respondentes. Cada sujeito gastou em média 15 minutos para finalizar o preenchimento do questionário.

Os dados foram trabalhados com o software SPSS (Statistical Package for the Social Sciences) versão 18.0, módulos de estatística descritiva e análise de variância (ANOVA). A hierarquização dos valores e dos tipos motivacionais foi resultante da hierarquia das médias encontradas com os resultados da pesquisa. A análise de variância foi realizada com o intuito de verificar as diferenças de percepções entre homens e mulheres no que se refere aos valores pessoais e tipos motivacionais. 5 ANÁLISE DOS RESULTADOS

A análise preliminar dos resultados revelou que, quanto ao gênero, 54% dos entrevistados eram do sexo masculino e 46% do feminino, com idade média de 22 anos. No tocante ao estado civil, observou-se que 90,9% dos indivíduos declararam-se solteiros enquanto 9,1% eram casados ou separados.

As médias dos valores que formam o SVS foram verificadas, tendo em vista analisar a hierarquia dos valores (TAMAYO, 2007b) dos futuros Admnistradores. Os resultados encontrados demonstraram que, no geral, a hierarquia evidenciada foi bastante similar às elucidadas na pesquisa realizada por Tamayo (2007b), como pode ser verificado na Tabela 1 a

seguir.

Nº Valor Média σ Nº Valor Média σ1 Harmonia Interior 6,24 1,392 31 Prestativo 5,09 1,7482 Sentido da Vida 6,02 1,553 32 Que Goza a Vida 5,06 1,9763 Trabalho 6,00 1,451 33 Igualdade 5,03 1,9514 Saudável 5,99 1,465 34 Uma Vida Espiritual 5,01 2,1675 Segurança Familiar 5,97 1,624 35 Autodisciplina 5,01 1,9136 Amizade Verdadeira 5,96 1,473 36 Obediente 4,97 1,8127 Liberdade 5,92 1,526 37 Preservador da Minha Imagem Pública 4,92 1,9078 Leal 5,84 1,470 38 Ciente dos meus Limites 4,88 1,9149 Honesto 5,83 1,563 39 Ordem Social 4,87 1,79910 Capaz 5,82 1,512 40 Uma Vida Excitante 4,85 1,91911 Auto-respeito 5,76 1,581 41 Reconhecimento Social 4,85 1,89012 Respeito para com os pais 5,75 1,562 42 Indulgente 4,81 1,93613 Sabedoria 5,73 1,548 43 Curioso 4,77 1,88314 Auto-determinado 5,64 1,509 44 Senso de Pertencer 4,77 1,94115 Bem Sucedido 5,64 1,528 45 Aberto 4,66 1,93016 Um mundo em paz 5,59 1,865 46 Esperto 4,65 1,96917 Limpo 5,59 1,626 47 Uma Vida Variada 4,64 3,43518 Inteligente 5,56 1,623 48 Protetor do Ambiente 4,52 1,88519 Justiça Social 5,47 1,754 49 União com a Natureza 4,51 1,93320 Responsável 5,45 1,679 50 Segurança Nacional 4,42 2,03121 Privacidade 5,38 1,779 51 Influente 4,41 1,96422 Independente 5,37 1,767 52 Ambicioso 4,20 2,26323 Amor Maduro 5,29 1,798 53 Riquezas 4,16 1,93724 Sonhador 5,28 1,796 54 Moderado 4,12 2,17125 Prazer 5,27 1,884 55 Vaidade 4,05 2,01926 Polidez 5,27 1,769 56 Um Mundo de Beleza 3,97 2,18527 Humilde 5,16 1,747 57 Audacioso 3,91 2,16428 Auto-Indulgência 5,14 1,792 58 Devoto 3,71 2,60029 Criatividade 5,11 1,747 59 Autoridade 3,71 2,06730 Retribuição de Favores 5,10 1,832 60 Respeito pela Tradição 3,39 2,233

61 Poder Social 2,93 2,228Fonte: Dados da Pesquisa

Tabela 1 - Hierarquia de Valores

Os valores de “harmonia interior”, “sentido da vida”, “trabalho”, “saudável”, “segurança familiar”, “amizade verdadeira”, “liberdade”, “leal” e “honesto” apresentaram as médias mais elevadas, corroborando com os resultados encontrados por Tamayo (2007b).

Por sua vez, os valores “segurança nacional”, “influente”, “ambicioso”, “riquezas”, “moderado”, “vaidade”, “um mundo de beleza”, “audacioso”, “devoto”, “autoridade”, “respeito pela tradição” e “poder social” obtiveram as menores médias apresentadas na hierarquia. As baixas médias encontradas são correspondentes aos achados também na pesquisa de Tamayo (2007b), localizando-se tais valores na extremidade inferior da tabela.

Tendo como base os valores caracterizados como tipicamente da cultura brasileira – trabalho, sonhador, vaidade e esperto – foi possível verificar que, similarmente à pesquisa de Tamayo (2007b), o valor “trabalho” apresentou uma das médias mais elevadas do SVS, sendo seguido pelo valor “sonhador”. Por outro lado, os valores “vaidade” e “esperto” se apresentaram em ordem de prioridade oposta à encontrada na pesquisa do autor citado.

No presente estudo, o valor “esperto” mostrou-se mais importante do que o valor “vaidade”, o que pode demonstrar uma maior valorização dos futuros gestores em relação à característica nacional de driblar obstáculos para obter os objetivos desejados.

No tocante aos tipos motivacionais, verificou-se que “benevolência”, que tem como principal intenção o bem-estar da família e das pessoas íntimas, obteve a maior média, colocando-se no topo da hierarquia dos tipos motivacionais dos futuros gestores, conforme

demonstra a Tabela 2 seguinte. Este tipo motivacional é composto pelos valores “prestativo”, “honesto”, “indulgente”, “leal”, “responsável”, “trabalho”, “vida espiritual”, “sentido da vida”, “amor maduro” e “amizade verdadeira”.

A segunda posição encontrada na hierarquia dos tipos motivacionais dos sujeitos pesquisados foi “auto-determinação”, que enfatiza a liberdade de pensamento e de opções. Este tipo de motivação é composto pelos valores “curioso”, “criatividade”, “liberdade”, “auto-respeito”, “privacidade”, “auto-determinado” e “independente”.

Os tipos motivacionais “estimulação”, com média 4,47; “tradição”, com média 4,23; e “poder social”, com média 4,12, obtiveram as menores médias, ficando nas posições inferiores da hierarquia motivacional. Esses achados corroboram com o estudo de Tamayo (2007b) que também encontrou a mesma hierarquia para esses tipos motivacionais.

O tipo motivacional “estimulação” é composto pelos valores “audacioso”, “uma vida variada” e “uma vida excitante”. Por sua vez, o tipo motivacional “tradição” é constituído dos valores “ciente dos meus limites”, “devoto”, “humilde”, “respeito pela tradição” e “moderado”. O tipo motivacional “poder” é composto pelos valores “poder social”, “autoridade”, “riquezas”, “preservador”, “vaidade” e “reconhecimento social”.

Tipo Motivacional Média σBenevolência 5,52 1,06Autodeterminação 5,41 1,12Conformidade 5,24 1,26Segurança 5,24 1,08Hedonismo 5,15 1,54Universalismo 5,08 1,14Realização 5,03 1,23Estimulação 4,47 1,85Tradição 4,23 1,38Podersocial 4,12 1,34Fonte: Dados da Pesquisa

Tabela 2 - Hierarquia dos Tipos Motivacionais

Ao realizar a ANOVA para verificar a existência de diferenças de médias entre homens e mulheres em relação à percepção sobre os valores e aos tipos motivacionais, constatou-se diferença significativa de médias entre os respondentes masculinos e femininos.

O gênero feminino demonstrou dar maior importância aos valores “vida espiritual”, “sentido da vida”, “amor maduro”, “inteligente”, “devoto” e “limpo”. Por outro lado, o gênero masculino evidenciou uma maior relevância para os valores “autoridade”, “ambicioso”, “audacioso” e “esperto”, quando comparados ao feminino, conforme Tabela 3 a seguir:

Valores Pessoais Média

Homens σMédia

Mulheres σ F Sig.VIDA ESPIRITUAL 4,65 2,33 5,44 1,87 11,68 ,00SENTIDO DA VIDA 5,85 1,66 6,21 1,39 4,69 ,03AMOR MADURO 5,02 1,865 5,63 1,65 10,04 ,00AUTORIDADE 3,95 2,043 3,45 2,06 5,11 ,02AMBICIOSO 4,44 2,249 3,93 2,26 4,33 ,04AUDACIOSO 4,13 2,106 3,63 2,2 4,69 ,03INTELIGENTE 5,41 1,726 5,76 1,47 3,97 ,04ESPERTO 4,86 1,872 4,41 2,05 4,49 ,03DEVOTO 3,39 2,721 4,08 2,4 6,22 ,01LIMPO 5,39 1,683 5,82 1,53 6,26 ,01Fonte: Dados da Pesquisa

Tabela 3 - ANOVA – Valores Pessoais x Gênero

Em relação aos tipos motivacionais, apenas o de benevolência demonstrou diferença significativa de percepção, tendo o gênero feminino dado maior relevância a este tipo motivacional do que o masculino, conforme Tabela 4.

Tipo Motivacional

Média Homens σ

Média Mulheres σ F Sig.

Benevolência 5,41 1,116 5,67 0,98 5,06 ,025Fonte: Dados da pesquisa

Tabela 4 - ANOVA – Tipos Motivacionais x Gênero

6. CONSIDERAÇÕES FINAIS

As investigações realizadas demonstraram que os valores considerados mais importantes para os futuros administradores são aqueles que remetem ao sentimento de paz consigo mesmo, de propósito na vida, trabalho, possuir boa saúde física e mental, proteção para a família, amigos próximos, liberdade, lealdade e, por fim, honestidade.

A preferência principal pelos valores referentes ao tipo motivacional de “benevolência” - “sentido da vida”, “trabalho”, “amizade verdadeira”, “lealdade” e “honestidade” - demonstra uma tendência relacionada ao tipo motivacional de segunda ordem denominado de “auto-transcendência” (SCHWARTZ, 1992), que se referem à motivação do indivíduo em ignorar suas preocupações egoístas e promover o bem-estar dos outros e da natureza. Diante disso, faz-se importante ressaltar que os seis valores -“harmonia interior”, “trabalho”, “saudável”, “amizade verdadeira”, “liberdade” e “honesto”- identificados por Tamayo (2007b) como extremos também demonstraram relevância na hierarquia de valores dos estudantes de Administração, acrescentando-se, ainda, os valores de sentido na vida, segurança familiar e lealdade, que também apresentaram médias elevadas.

Constatou-se que a importância relacionada a alguns tipos motivacionais deu-se de forma diferente das encontradas por Tamayo (2007b). O tipo motivacional de “benevolência” apresentou, conforme comentado anteriormente, a maior média, sendo seguido por “autodeterminação”. Essa hierarquia, por sua vez, encontra-se de forma invertida nos estudos de Tamayo (2007b) que identificou uma maior valorização do pensamento independente e criatividade - “auto-transcendência” - sendo seguido pela preocupação com o bem estar das outras pessoas - “benevolência”. Curiosamente, o tipo motivacional de “conformidade” apresentou-se na terceira posição hierárquica valorizada pelos estudantes. Essa preferência pode sugerir que os futuros gestores possuem tendência a se comportarem de acordo com as normas da sociedade, não valorizando, por sua vez, uma vida estimulante e cheia de novidade como pode ser demonstrado pela baixa média obtida pelo tipo motivacional de “estimulação”. Corroborando com isso, o tipo motivacional de “segurança” aparece logo em seguida ao de “conformidade”, o que demonstra uma preferência pela integridade de pessoas e de grupos com quem se identificam.

Verificou-se, ainda, que o sentimento de prazer e senso pessoal de gratificação, representados pelo tipo motivacional de “hedonismo”, ocupam o mesmo nível hierárquico apresentado na pesquisa de Tamayo (2007b). Ainda corroborando com a pesquisa do autor, os tipos motivacionais identificados como de menor prioridade, foram os relacionados à motivação pelo respeito aos usos e costumes dos antepassados - “tradição”- e os que demonstram a necessidade de influenciar e controlar as pessoas a procura de um status social - “poder”.

Constatou-se que as mulheres demonstraram, de forma significativa, maior relevância aos valores direcionados a “uma vida espiritual”, “sentido da vida”, “amor maduro”, “inteligente”, “devoto” e “limpo”, enquanto os homens foram mais enfáticos aos

valores de “autoridade”, “ambicioso”, “audacioso” e “esperto”. Essas diferenças de percepções também foram constatadas em relação ao tipo motivacional de “benevolência”, demonstrando maior importância para o gênero feminino do que para o masculino.

As hierarquias encontradas, assim como as diferenças entre os gêneros demonstram aspectos importantes de compreensão do comportamento relacionado aos estudantes de Administração, podendo proporcionar um direcionamento de ações na esfera profissional e acadêmica desses futuros gestores. A presente pesquisa pode servir como subsídio para novas investigações sobre a hierarquia de valores e tipos motivacionais. Para um maior entendimento das hierarquias evidenciadas neste estudo, torna-se importante a aplicação do instrumento com diferentes amostras formadas por estudantes de outras regiões geográficas, diferentes cursos e instituições de ensino superior.

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