análise crítica ao modelo de auto avaliação das be

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1 Introdução A literatura internacional sustentada em trabalhos de investigação em torno das bibliotecas escolares tem demonstrado de forma inequívoca, o contributo muito positivo que estas podem dar em prol das aprendizagens, do sucesso educativo e da promoção da aprendizagem ao longo da vida. O actual Modelo de Auto-avaliação das Bibliotecas Escolares surge neste contexto de investigação e foi construído a partir da análise efectuada a outros modelos já existentes, tomando em consideração a realidade da escola portuguesa. Este modelo pretende constituir-se como um instrumento regulador, de melhoria contínua da qualidade, ao mesmo tempo que aponta para uma reflexão orientada para a mudança, constituindo-se como um meio indispensável de qualificação das BEs e das próprias escolas, no cumprimento da sua missão e dos seus objectivos. Em suma, é importante que “cada escola conheça o impacto das actividades realizadas pela e com a BE no processo de ensino e na aprendizagem, bem como o grau de eficiência e de eficácia dos serviços prestados e de satisfação dos utilizadores da BE” Modelo de Auto-avaliação (Novembro de 2009). 1- O Modelo enquanto instrumento pedagógico e de melhoria - Conceitos implicados Este modelo enquanto o instrumento pedagógico tem subjacente o conceito de eficácia, na medida em que pretende determinar não só o impacto da BE nas aprendizagens dos alunos como também a sua influência ao nível do funcionamento geral da escola e dos benefícios trazidos à Comunidade Educativa. Pretende-se que a partir dos resultados obtidos se possa delinear planos de desenvolvimento realistas, definindo objectivos e prioridades que possam conduzir à mudança (estabelecendo factores críticos de sucesso, determinado pontos fortes e fracos e dando sugestões de melhoria). Ao conceito de eficácia associa-se também o de valor, uma vez que se pretende aferir até que ponto os investimentos feitos em recursos humanos e materiais nas BEs estão a surtir efeitos no âmbito do sucesso educativo dos alunos e ainda que contributos são dados pela BE, de modo a que a escola atinja as suas metas e objectivos. De acordo com Cram (1999): “[…] libraries have no inherent objective value. Value is (subjectively) assigned and is related to perception of actual or potential Análise Crítica ao Modelo de Auto-Avaliação das Bibliotecas Escolares

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Page 1: AnáLise CríTica Ao Modelo De Auto AvaliaçãO Das Be

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Introdução

A literatura internacional sustentada em trabalhos de investigação em torno das

bibliotecas escolares tem demonstrado de forma inequívoca, o contributo muito

positivo que estas podem dar em prol das aprendizagens, do sucesso educativo e da

promoção da aprendizagem ao longo da vida. O actual Modelo de Auto-avaliação das

Bibliotecas Escolares surge neste contexto de investigação e foi construído a partir da

análise efectuada a outros modelos já existentes, tomando em consideração a

realidade da escola portuguesa. Este modelo pretende constituir-se como um

instrumento regulador, de melhoria contínua da qualidade, ao mesmo tempo que

aponta para uma reflexão orientada para a mudança, constituindo-se como um meio

indispensável de qualificação das BEs e das próprias escolas, no cumprimento da sua

missão e dos seus objectivos.

Em suma, é importante que “cada escola conheça o impacto das actividades

realizadas pela e com a BE no processo de ensino e na aprendizagem, bem como o

grau de eficiência e de eficácia dos serviços prestados e de satisfação dos utilizadores

da BE” Modelo de Auto-avaliação (Novembro de 2009).

1- O Modelo enquanto instrumento pedagógico e de melhoria - Conceitos

implicados

Este modelo enquanto o instrumento pedagógico tem subjacente o conceito de

eficácia, na medida em que pretende determinar não só o impacto da BE nas

aprendizagens dos alunos como também a sua influência ao nível do funcionamento

geral da escola e dos benefícios trazidos à Comunidade Educativa. Pretende-se que a

partir dos resultados obtidos se possa delinear planos de desenvolvimento realistas,

definindo objectivos e prioridades que possam conduzir à mudança (estabelecendo

factores críticos de sucesso, determinado pontos fortes e fracos e dando sugestões de

melhoria).

Ao conceito de eficácia associa-se também o de valor, uma vez que se

pretende aferir até que ponto os investimentos feitos em recursos humanos e materiais

nas BEs estão a surtir efeitos no âmbito do sucesso educativo dos alunos e ainda que

contributos são dados pela BE, de modo a que a escola atinja as suas metas e

objectivos. De acordo com Cram (1999): “[…] libraries have no inherent objective

value. Value is (subjectively) assigned and is related to perception of actual or potential

Análise Crítica ao Modelo de Auto-Avaliação das Bibliotecas Escolares

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benefit. Rather, libraries create value by leveraging intangible assets in such a way as

to add value and create benefits. They do not manage value. They manage processes

and activities and they make decisions that might lead to production of value to the

users of the library and to the parent organization”. (pág. 5 do Texto da Sessão da

Formação).

A estes conceitos junta-se o conceito evidence-based practice, o qual valoriza

a recolha e tratamento sistemático de evidências quantitativas e qualitativas,

como forma de aferir e melhorar o impacto da BE no tocante às aprendizagens dos

alunos. Citando R.Tood, “…school libraries need to systematically collect evidence that

shows how their practices impact student achievement; the development of deep

knowledge and understanding; and the competencies and skills for thinking, living, and

working.” (pág.3 do Texto da Sessão da Formação. A avaliação passa centrar-se na

projecção de alterações qualitativas operadas nos conhecimentos e valores dos

utilizadores e por consequência nas mais-valias que estes trazem à escola e à

aprendizagem. Investem-se assim, em práticas de pesquisa-acção que pretendem

estabelecer a relação entre os processos e o impacto ou valor que originam.

2- Pertinência da existência de um Modelo de Avaliação para as bibliotecas

escolares

“Tradicionalmente, o impacto das bibliotecas aferia-se através da relação

directa entre os inputs (colecção existente, staff, verba gasta com o funcionamento da

biblioteca escolar...) e os outputs (número de empréstimos, número de visitas, sessões

realizadas pela equipa...). No entanto, a relação custo/ eficiência foi, nos últimos

tempos, ultrapassada pela necessidade de medir o impacto, os benefícios que os

utilizadores retiram do seu contacto e uso dos serviços” (pág. 4 do Texto da Sessão de

Formação). Com efeito, tratava-se de uma prática pouco sistemática (não se avaliava

o impacto da BE ao nível das aprendizagens) e a avaliação era pouco ajustada às

novas exigências da sociedade da informação e do conhecimento e à nova missão

das bibliotecas escolares como centros de aprendizagem.

Hoje, pretende-se que a avaliação se centre, essencialmente, no impacto

qualitativo da biblioteca, ou seja, na aferição das modificações positivas que o seu

funcionamento tem nas atitudes, valores e conhecimento dos utilizadores. Tomando

em consideração os resultados do serviço prestado vai-se aferir não sobre a sua

eficiência mas sobre a sua eficácia.

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De acordo com a autora, Sarah McNicol, existem várias razões para que se

implemente um modelo de auto-avaliação: fomenta a auto-reflexão que está na base

do conhecimento necessário à condução de objectivos; é importante porque a escola

necessita de demonstrar que está no bom caminho, que está a realizar um bom

trabalho e que a auto-avaliação é parte integrante do desenvolvimento da própria

escola. Acresce que a avaliação externa, interna e a auto-avalição da BE não se

excluem umas às outras, ao invés são complementares umas às outras.

3- Organização estrutural e funcional. Adequação e constrangimentos

Embora o modelo se baseie no Modelo de Auto-Avaliação das Bibliotecas

Escolares Inglesas, naturalmente com adaptações, procura tomar em atenção as

especificidades das bibliotecas escolares e do sistema de ensino Português. Podemos

constatar a partir da sua análise que este deverá adaptar-se à realidade de cada

situação com base no contexto interno e externo da Biblioteca Escolar,

nomeadamente a escola/Agrupamento onde se insere.

O modelo abrange quatro domínios fundamentais para uma Biblioteca efectiva e

de qualidade, com áreas essenciais ao cumprimento dos pressupostos e objectivos

que suportam a sua acção no processo educativo, os quais estão organizados da

seguinte forma:

A. Apoio ao Desenvolvimento Curricular

A.1 Articulação curricular da BE com as estruturas pedagógicas e os docentes

A.2. Desenvolvimento da literacia da informação

B. Leitura e Literacias

C. Projectos, Parcerias e Actividades Livres e de Abertura à Comunidade

C.1. Apoio a actividades livres, extra-curriculares e de enriquecimento curricular

C.2. Projectos e parcerias

D. Gestão da Biblioteca Escolar

D.1. Articulação da BE com a Escola/ Agrupamento. Acesso e serviços prestados pela

BE

D.2. Condições humanas e materiais para a prestação dos serviços

D.3. Gestão da colecção/da informação

Estes domínios estão estruturados por sua vez, numa grelha de quatro

colunas, cuja leitura horizontal se inicia nos indicadores dos vários domínios,

operacionalizados em factores críticos de sucesso e com exemplos a partir dos

quais se poderá fazer a recolha de evidências. A recolha das evidências deve ser

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feita de modo sistemático e em fontes diversas tais como: Projecto Educativo ou Plano

de Acção, registos diversos, materiais produzidos pela biblioteca, estatísticas,

trabalhos realizados e instrumentos específicos da recolha de dados para o auto ‐

avaliação. Para cada indicador, existe uma coluna à direita com sugestões/exemplos

para a implementação de acções para melhoria. Isto é, acções para melhorar os

aspectos necessários à optimização da Biblioteca Escolar. No final de cada domínio

ou subdomínio, surge uma tabela de escalas de avaliação qualitativa com perfis de

desempenho (do fraco ao Excelente).

Apesar de acreditar que o modelo de Auto-Avaliação poderá ser uma oportunidade

para a escola/Agrupamento reconhecer o contributo que a BE pode dar ao ensino/

aprendizagem e ao sucesso educativo dos alunos considero, no entanto, que a sua

exaustiva sistematização e organização de evidências representa, uma excessiva

sobrecarga de trabalho para o Professor Bibliotecário, retirando-lhe tempo à realização

de outras tarefas de organização, gestão e dinamização de actividades, principalmente

quando os recursos humanos são escassos. No que concerne aos Perfis de

Desempenho, saliento a propósito a grande quantidade de itens nos subdomínios a

avaliar em cada domínio e consequente agregação na determinação do perfil de

desempenho. Saliento também a dificuldade em determinar com precisão o nível de

desempenho em função da escala apresentada, dado que deveria existir o nível de

Muito Bom entre o Bom e o Excelente, para além ainda de que o grau de exigência

deste último, é praticamente impossível de atingir.

4- Integração/ Aplicação à realidade da escola

Tal como já foi referido anteriormente, é importante que a integração/aplicação

do modelo de Auto ‐ Avaliação pressuponha alguma flexibilidade e adaptabilidade

à realidade e tipologia da escola/Agrupamento. Todas as suas estruturas

pedagógicas e de gestão devem ser mobilizados pelo professor bibliotecário de

modo a implementar um processo de avaliação contínuo. A implementação do

modelo vai obrigar como tal, a uma intensa agenda de trabalhos por parte do

professor bibliotecário, o qual deverá motivar e reunir com todos os implicados no

processo. Tomando como referência o texto desta acção, a integração/aplicação

do modelo de Auto-Avaliação vai exigir precisamente, uma metodologia de

sensibilização e de readiness, que requer:

1. A mobilização da equipa para a necessidade de fazer diagnósticos/ avaliar o

impacto e o valor da BE na escola que serve;

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2. Jornadas formativas para a equipa e para outros na escola. Definição precisa

de conceitos e processos. Realização de um processo de formação/ acção.

3. A comunicação constante com a Direcção Executiva, justificando a

necessidade e o valor da implementação do processo de avaliação.

4. A apresentação e discussão do processo no Conselho Pedagógico.

5. Aproximação/ diálogo com departamentos e professores. Criação e difusão de

informação/ calendarização sobre o processo e sobre o contributo de cada um

no processo.

O desenvolvimento deste processo poderá suscitar, no entanto, algumas

dificuldades uma vez que a BE vai precisar também da colaboração dos docentes, ao

nível do preenchimento de alguns documentos para a recolha e sistematização de

evidências. Esta preocupação está associada ao facto dos docentes, em geral,

apresentarem sinais de cansaço e de desânimo, os quais estão associados

nomeadamente, ao facto de se desdobrarem constantemente em inúmeras reuniões e

de estarem excessivamente sobrecarregados com o preenchimento dos mais diversos

documentos, conjuntamente com todas as tarefas inerentes ao desenvolvimento da

sua actividade docente.

Em suma, a motivação, sensibilização, formação e compreensão vão ser, sem

dúvida, factores primordiais na mobilização de todos aqueles que intervêm neste

processo e a Biblioteca Escolar/Equipa vai ter que saber impor-se, de modo a poder

conquistar um espaço privilegiado, fulcral no seio da escola/Agrupamento onde está

inserida.

5- Competências do professor bibliotecário e estratégias implicadas na sua

aplicação

De acordo com os textos da unidade, as competências do professor

bibliotecário implicadas na aplicação do modelo de auto-avaliação são as

seguintes:

Ser um comunicador efectivo no seio da instituição;

Ser proactivo;

Saber exercer influência junto de professores e do órgão directivo;

Ser útil, relevante e considerado pelos outros membros da comunidade

educativa;

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Ser observador e investigativo

Ser capaz de ver o todo - “the big picture”;

Saber estabelecer prioridades;

Realizar uma abordagem construtiva aos problemas e à realidade;

Ser gestor de serviços de aprendizagem no seio da escola;

Saber gerir recursos no sentido lato do termo;

Ser promotor dos serviços e dos recursos;

Ser tutor, professor e um avaliador de recursos, com o objectivo de apoiar e

contribuir para as aprendizagens;

Saber gerir e avaliar de acordo com a missão e objectivos da escola;

Saber trabalhar com departamentos e colegas.

Como se pode constatar são muitas as competências que o professor

bibliotecário deve evidenciar. Todas elas serão, decerto, muito úteis para que o

processo de Auto-Avaliação se faça da melhor forma. Cabe a ele identificar pontos

críticos, estabelecer relações e intercepções e analisar o impacto originado pelas

várias situações. O professor bibliotecário deverá ser ainda um líder, capaz de pensar,

de gerir estrategicamente, de promover uma cultura de avaliação e de divulgação dos

seus resultados.

Conclusão

Enfim, a responsabilidade de implementação do modelo de Auto-Avaliação da

BE por parte do professor bibliotecário é, sem dúvida, grande mas se for partilhada e

abraçada pelos demais elementos da equipa da BE e se este conseguir contar com a

colaboração da comunidade educativa, em geral, o desenvolvimento do processo e os

resultados pretendidos poderão tornar-se uma realidade.

A Formanda

Ana Maria Palma