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Acórdãos STA Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo Processo: 01249/16 Data do Acordão: 20-06-2017 Tribunal: 1 SECÇÃO Relator: JOSÉ VELOSO Descritores: PROCESSO ARBITRAL IMPUGNAÇÃO SENTENÇA ARTICULADO SUPERVENIENTE PRINCÍPIO DO CONTRADITÓRIO PROVA Sumário: I - A «sentença arbitral» só pode ser anulada pelo tribunal estadual competente com algum dos motivos ditos nas alíneas do artigo 46º, nº3, da LAV; II - Esses motivos não permitem censurar, ou sindicar, no âmbito da respectiva «impugnação da sentença arbitral», o mérito tanto da decisão final como das decisões interlocutórias proferidas no processo arbitral; III - A impugnação da sentença arbitral junto do TCA funciona como apreciação em 2º grau de jurisdição, configurando uma apelação com particularidades, que lhe advêm da fixação legal de uma fase própria; IV - Não se mostra admissível, por regra, apresentar nessa apelação articulados supervenientes, que são próprios de uma tramitação em 1º grau de jurisdição; V - O processo arbitral, não obstante decorrer sob os signos da flexibilidade e da informalidade, está imperativamente sujeito aos «princípios» da igualdade de tratamento e do contraditório, que se mostram essenciais para a manutenção das dimensões inalienáveis do direito de acesso aos tribunais e ao processo equitativo; VI - A violação de qualquer desses «princípios fundamentais» constitui causa de pedir da impugnação da sentença ou acórdão arbitral; VII - O princípio fundamental da igualdade processual impõe um tratamento não discriminatório das partes, de modo que qualquer delas não se veja impedida, sem fundamento, de exercer um direito legítimo; VIII - O princípio do contraditório traduz-se, fundamentalmente, no direito de a parte, em qualquer fase do processo, «influenciar a decisão», e, no plano da prova, exige que às partes seja, em igualdade, facultada a proposição de todos os meios probatórios «potencialmente relevantes para apurar a realidade dos factos da causa»; IX - O direito à prova surge, assim, como uma «dimensão ineliminável do direito ao processo equitativo», e densifica-se no direito de oferecer e produzir provas, controlar as provas do adversário, e discretear sobre o valor de umas e outras, nos Acordão do Supremo Tribunal Administrativo http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/172... 1 de 42 03/07/17, 11:34

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Acórdãos STAAcórdão do Supremo Tribunal Administrativo

Processo: 01249/16Data do Acordão: 20-06-2017Tribunal: 1 SECÇÃORelator: JOSÉ VELOSODescritores: PROCESSO ARBITRAL

IMPUGNAÇÃOSENTENÇAARTICULADO SUPERVENIENTEPRINCÍPIO DO CONTRADITÓRIOPROVA

Sumário: I - A «sentença arbitral» só pode ser anulada pelo tribunalestadual competente com algum dos motivos ditos nas alíneasdo artigo 46º, nº3, da LAV;II - Esses motivos não permitem censurar, ou sindicar, noâmbito da respectiva «impugnação da sentença arbitral», omérito tanto da decisão final como das decisões interlocutóriasproferidas no processo arbitral;III - A impugnação da sentença arbitral junto do TCA funcionacomo apreciação em 2º grau de jurisdição, configurando umaapelação com particularidades, que lhe advêm da fixação legalde uma fase própria;IV - Não se mostra admissível, por regra, apresentar nessaapelação articulados supervenientes, que são próprios de umatramitação em 1º grau de jurisdição;V - O processo arbitral, não obstante decorrer sob os signos daflexibilidade e da informalidade, está imperativamente sujeitoaos «princípios» da igualdade de tratamento e do contraditório,que se mostram essenciais para a manutenção das dimensõesinalienáveis do direito de acesso aos tribunais e ao processoequitativo;VI - A violação de qualquer desses «princípios fundamentais»constitui causa de pedir da impugnação da sentença ouacórdão arbitral;VII - O princípio fundamental da igualdade processual impõeum tratamento não discriminatório das partes, de modo quequalquer delas não se veja impedida, sem fundamento, deexercer um direito legítimo;VIII - O princípio do contraditório traduz-se, fundamentalmente,no direito de a parte, em qualquer fase do processo,«influenciar a decisão», e, no plano da prova, exige que àspartes seja, em igualdade, facultada a proposição de todos osmeios probatórios «potencialmente relevantes para apurar arealidade dos factos da causa»;IX - O direito à prova surge, assim, como uma «dimensãoineliminável do direito ao processo equitativo», e densifica-seno direito de oferecer e produzir provas, controlar as provas doadversário, e discretear sobre o valor de umas e outras, nos

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termos previstos na lei;X - O «direito à produção de prova» não implica que, sob penade sair violado o princípio do contraditório, devam ser sempreadmitidas pelo respectivo julgador arbitral todas as diligênciasde prova requeridas pelas partes e permitidas pelo direito.XI - O «princípio da essencialidade» - alínea a) do artigo 46º daLAV - traduz-se na exigência de que a violação dos ditosprincípios fundamentais interfira de forma decisiva oudeterminante «na decisão do objecto da causa». Só estaviolação, assim relevante, pode constituir «causa de anulaçãoda sentença arbitral»;XII - A «essencialidade», no caso de alegada omissão deprova, há-de aferir-se à luz de um juízo de prognose póstuma:saber se o novo acórdão, decorrente da eventual anulação doprimeiro - para cumprimento da produção da prova omitida - seria ou nãosusceptível de favorecer quem pediu a anulação.

Nº Convencional: JSTA000P22003Nº do Documento: SA12017062001249Data de Entrada: 13-01-2017Recorrente: MUNICÍPIO DE BARCELOSRecorrido 1: A............, SA E OUTROSVotação: UNANIMIDADE

Aditamento:

Texto Integral

Texto Integral: I. Relatório1. O MUNICÍPIO DE BARCELOS [MB] vem interpor «recurso derevista» do acórdão proferido pelo Tribunal CentralAdministrativo Norte [TCAN], em 17.06.2016, que julgouimprocedente a «impugnação da sentença arbitral» que intentaracontra as sociedades A…………, S.A., B…………, S.A., C…………,S.A., e D…………, S.A. [artigo 46º da Lei da Arbitragem Voluntária (LAV)

aprovada pela Lei nº63/2011, de 14.12].

Culmina o recurso de revista formulando as seguintes«conclusões»:

1- Deverá o presente recurso ser admitido, porquanto contende comuma questão de elevada relevância jurídica e social cuja apreciação poreste Supremo Tribunal se impõe nos termos e para os efeitos do artigo150º nº1 do CPTA;

2- Propõe-se demonstrar que não tem aplicação a limitação constantedo referido normativo, mas antes se justifica a excepcionalidade de umareapreciação superior, atenta a importância fundamental da situaçãoora em crise e, bem assim, a necessidade do seu esclarecimento parauma melhor aplicação do direito;

3- Nestes termos, cumpre atender que a excepcionalidade daadmissibilidade dos recursos interpostos das decisões proferidas peloTCA para o STA aplicar-se-á na sua plenitude quando estes últimos

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decidam em «segunda instância». Urge, portanto, aferir se a decisão deque ora se recorre se encontra englobada na previsão da 1ª parte doartigo 150º, nº1, do CPTA;

4- Ora, estes autos foram iniciados com o requerimento inicial, no qualo Município autor, aqui recorrente, peticionou a anulação da decisãoproferida pelo Tribunal Arbitral em 27 de Março de 2014. Não seconformando com a decisão final proferida por aquele tribunal,entendendo terem sido violados princípios fundamentais com influênciadecisiva na resolução do litígio, o aqui recorrente lançou mão doexpediente previsto no artigo 46º da Lei da Arbitragem Voluntária [LAVaprovada pela Lei nº63/2012, de 14.12, impulsionando a tramitação de uma «acção deanulação», versando sobre a decisão arbitral];

5- Conforme já esclareceu o STA em acórdão datado de 08.11.2012,proferido no âmbito do processo nº0538/12, embora aí se alcanceconclusão inversa à aqui defendida, dever-se-á entender que a«decisão sobre anulação de decisão arbitral não é susceptível de sereconduzir ao contexto das instâncias, o qual faz sentido para aorganização dos tribunais estaduais, mas não para o processo e osrecursos proferidos em tribunal arbitral regulado pela LAV»;

6- Neste sentido, sempre se diga que estando o Tribunal Arbitral fora daOrganização Judiciária Estadual, não poderá este ser reconduzido aoconceito de instância, razão pela qual se considera que o acórdão orarecorrido, porque proferido no âmbito de uma «acção de anulação dedecisão arbitral», não poderá ser entendido como decisão proferida emsegunda instância;

7- Disso mesmo deu já conta o STA, em acórdão datado de 30 de Junhode 2016, proferido no âmbito do processo nº1/12.6BCPRT, aopreceituar que «Efectivamente, quando estabelece que da decisãoarbitral cabem para o Tribunal da Relação os mesmos recursos quecaberiam da sentença proferida pelo tribunal de comarca, a LAV nãoestá a restringir expressamente o direito ao recurso, suprimindo apossibilidade de impugnação da decisão da Relação junto do STJ, masapenas a equiparar, para efeitos de recurso, a sentença arbitral àsentença judicial de 1ª instância»;

8- Ainda no mesmo aresto sufraga que «considerando-se que aarbitragem voluntária constitui modo de resolução jurisdicional deconflitos que conduz a uma decisão com valor jurisdicional equiparadaà sentença judicial de 1ª instância, e sujeita ao mesmo sistema derecursório, na ausência de disposição legal expressa que o exclua,conclui-se que o acórdão recorrido poderia ser, como foi objecto derecurso excepcional de revista [...]». Assim sendo, como é, ter-se-á deconcluir que o presente recurso não se encontra abrangido pelalimitação constante do artigo 150º, nº1 do CPTA, antes devendo a suaadmissibilidade aferir-se pelas regras gerais sobre admissibilidade dosrecursos;

9- Aliás, ainda no seguimento da argumentação até aqui expendida -não se poder reconduzir o presente caso ao conceito de instâncias - a interpretaçãoda norma constante do artigo 150º, nº1 do CPTA no sentido em que

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estaria vedado o recurso da decisão do Tribunal Central Administrativosobre a acção de impugnação de decisão do tribunal arbitral, por seruma decisão proferida em primeira instância, sempre enfermaria deinconstitucionalidade por violação do artigo 20º e 268º, nº4, daConstituição da República Portuguesa, por não estar garantido oprincípio da tutela jurisdicional efectiva e acesso aos tribunais. Nestamedida, deve, pois, o presente recurso ser admitido como revista com ofundamento no disposto no artigo 46º da LAV e artigos 140º e 150º, nº1,a contrário, do CPTA;

10- Em complemento do acima exposto, atente-se que o presenterecurso tem por objecto uma questão de elevada relevância jurídicacujo tratamento reclama a intervenção de uma instância superior. Sobreo conceito de relevância jurídica, a jurisprudência tem firmado que serátoda aquela que seja dotada de especial complexidade, oucomplexidade superior ao comum, seja por força operações exegéticasa efectuar, ou pelo enquadramento normativo especialmente intricado,ou pela necessidade de concatenar diversos regimes legais ouinstitutos jurídicos, ou quando o tratamento da matéria tem suscitadodúvidas sérias na jurisprudência ou na doutrina [ver AC STA de 16.12.2009,

Rº01206/09; AC STA de 19.09.2016, Rº0664/12];

11- Relativamente à complexidade dispôs o Supremo Tribunal deJustiça em acórdão datado de 16 de Dezembro de 2009, proferido noâmbito do processo nº01206/09, que uma questão seriamanifestamente complexa quando a subsunção jurídica impusesse umimportante e detalhado exercício de exegese, um largo debate peladoutrina e jurisprudência com o objectivo de se obter um consenso emtermos de vir a servir de orientação quer para as pessoas que possamter interesse jurídico ou profissional na resolução da questão, a fim detomarem conhecimento da provável interpretação com que poderãocontar das normas aplicáveis, quer para as instâncias, por forma aobter-se uma melhor aplicação do direito;

12- No caso sub judice, a questão cuja apreciação foi suscitada e sobrea qual recaiu a decisão de que agora se recorre prende-se com o factode, no decurso do processo arbitral, ter sido indeferido um pedido deprodução de prova, num segmento relativo à factualidade sobre a qualassenta a tese apresentada pela defesa, prejudicando de formainjustificada a apreciação do mérito de um dos seus argumentoscentrais, com consequências evidentes na decisão que foi proferida,consubstanciando-se, assim, na decisão arbitral, violação dos princípiosda igualdade e do contraditório constantes nas alíneas b) e c) do nº1 doartigo 30º da LAV. Ora, o tribunal recorrido entendeu que a recusa deprodução de prova requerida pelo aqui recorrente não seria passível derepresentar violação aos princípios da igualdade e contraditório apta afundamentar a anulação da decisão arbitral;

13- Nestes termos, a questão que cumpre colocar a esta instânciasuperior é a de saber se o entendimento segundo o qual a imposiçãode restrições à produção de meios de prova, no âmbito de processoarbitral, salvaguarda o princípio de igualdade e o princípio docontraditório constantes das alíneas b) e c) do nº1 do artigo 30º da LAV

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ou se, pelo contrário, como defende o aqui recorrente, a produção deprova requerida, em sede de processo arbitral, não pode serrestringida, quando necessária para a descoberta da verdade deelementos essenciais para a boa decisão da causa, nos termos doartigo 30º, nº1, da LAV;

14- Afigura-se, pois, uma questão cujo grau de relevância jurídica ecomplexidade são passíveis de justificar a admissibilidade desterecurso, nos termos e para os efeitos do artigo 150º, nº1, do CPTA. Nofundo, trata-se de questão que convoca a determinação e alcance deprincípios que formam o travejamento estrutural do processo,designadamente os princípios da igualdade e do contraditório;

15- A lei exige ainda que a questão a apreciar seja dotada derelevância social fundamental. Nesta matéria, a jurisprudência temestabelecido que aqui se incluem questões com contornos indiciadoresde que a solução pode ser um paradigma ou orientação para seapreciarem outros casos ou situações que revelem uma especialcapacidade de repercussão social, em que a utilidade da decisãoextravasa os limites do caso concreto das partes envolvidas no litígio.Entende-se unanimemente que a questão deve importar «realização deinteresses comunitários de grande relevo». Cumpre, pois, avançarsumariamente com uma descrição da factualidade subjacente àquestão de cuja apreciação se recorre, por forma a clarificar o realimpacto que a decisão a proferir revestirá;

16- Em termos sintéticos, está na base do presente recurso umacondenação do Município de Barcelos, aqui recorrente, por decisãoproferida por tribunal arbitral, a pagar às ora recorridas o montante de8.600.000.00 Euros;

17- Apontando a violação dos princípios da igualdade de tratamento econtraditório, princípios fundamentais referidos no nº1 do artigo 30º daLAV, intentou o ora recorrente uma acção de anulação no TCAN, tendoeste julgado improcedente a referida impugnação;

18- Cumpre, porém, ter presente que a matéria em discussão envolvequestões relacionadas com um contrato de parceria celebrado entre oente público e as entidades privadas recorridas, acarretando amovimentação de avultados montantes pertencentes ao erário público,o que justifica, desde logo, que se considere como de importânciafundamental;

19- Assim entendeu, a título exemplificativo, este STA em acórdão de21.10.2014, proferido no âmbito do processo nº0991/14, no âmbito doqual determinou «É de admitir revista, em sede da apreciaçãopreliminar a que se reporta o artigo 150º, nº4, do CPTA, se está sobrecurso acórdão do Tribunal Central Administrativo que julgouimprocedente acção de anulação de decisão de tribunal arbitral quecondenou município a pagamento de várias dezenas de milhões deeuros em matéria atinente ao serviço essencial do fornecimento deágua, e se está, ainda, em discussão a própria existência da figura dorecurso de revista excepcional para este tipo de casos»;

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20- Daqui se retira igualmente a clara necessidade da admissão dopresente recurso, pugnando por uma melhor aplicação do direito,atendendo à possibilidade de repetição da questão num númeroindeterminado de casos futuros, sobretudo atendendo ao númeroavultado de parcerias público-privadas celebradas nos últimos anos;

21- Uma vez que se desconhece que sobre tal matéria tenha versadodecisão superior, surge, assim, clara, a necessidade de garantir auniformização do direito em matérias importantes tratadas pelasinstâncias de forma pouco consistente. Revela-se útil a intervenção doSTA, na qualidade de órgão de regulação do sistema, no esclarecimentode problemas de elevado grau de dificuldade e de indiscutível nobrezadogmática, que não foram ainda objecto de tratamento jurisprudencialnem doutrinal adequado;

22- A admissão da presente revista é, em suma, dada a importância,relevo e complexidade, controvertibilidade e novidade dos problemascuja resolução convoca, claramente necessária a uma melhor aplicaçãodo direito;

23- Ademais, deverá o presente recurso de revista ter efeito suspensivoda decisão recorrida, conforme sobejamente comina o artigo 143º, nº1,do CPTA. No caso em apreço, efeito diverso nem seria de consideraratentos os interesses em presença. Isto porque, segundo um juízo deproporcionalidade, os danos que resultariam para o interesse público,decorrentes da exequibilidade de uma decisão tão penosa para o eráriopúblico, ainda não consolidada e susceptível de ser anulada, sempre semostrariam superiores àqueles que as recorridas padecerão, em virtudeda atribuição do referido efeito suspensivo [artigo 141º, nº5, 1ª parte do CPTA,

a contrario sensu];

24- Aliás, entendimento diferente só seria admissível se, nos termos dodisposto no artigo 141º, nº4, do CPTA, o tribunal determinasse adopçãode providências adequadas a evitar ou minorar esses danos eimpusesse a prestação, pelas interessadas, no caso as recorridas, degarantia destinada a responder pelos mesmos. Nestes termos, e amenos que o tribunal entenda que devem as recorridas prestar areferida garantia, dever-se-á aplicar ao presente recurso a regra geral,segundo a qual este terá efeitos suspensivos da decisão recorrida;

25- Sobre o mérito do recurso, mostra-se essencial fazer uma breveincursão sobre os termos em que o processo - decisão final - se visaimpugnar decorreu, por forma a evidenciar os vícios que a inquinam;

26- Conforme consta do requerimento inicial que deu origem aospresentes autos, o Município autor, aqui recorrente, deduziuimpugnação, pedindo a anulação da decisão proferida pelo TribunalArbitral a 27 de Março de 2014, melhor identificada nos autos,porquanto esta padecia de ilegalidades consubstanciadas na violaçãodos princípios da igualdade de tratamento e do contraditório previstasnas alíneas d) e c) do nº1 do artigo 30º da LAV;

27- Embora reconheça implicitamente a verificação de pressupostos defacto que fundamentam a pretensão do Município ora recorrente, o

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Tribunal Central Administrativo julgou improcedente a referidaimpugnação, confirmando a decisão arbitral;

28- Cumpre, assim, apontar os fundamentos que sustentam a tese doMunicípio na acção de anulação, confrontando-os com os argumentosexpendidos na decisão recorrida, por forma a demonstrar as razões dadiscordância para com o indeferimento da sua pretensão;

29- Assim, atente-se que, a 11 de Dezembro de 2012, foi o TribunalArbitral constituído com o propósito de dirimir o conflito relativo aocontrato de parceria celebrado entre as partes e formalizado através do«Acordo de Accionistas, de cooperação técnica económica efinanceira», outorgado a 08 de Junho de 2009;

30- No âmbito do referido acordo, estabeleceu-se no ponto 26.2 quequalquer questão, dúvida, ou controvérsia objecto de divergência entreas partes deveria ser submetida a Tribunal Arbitral a funcionar e decidirde acordo com as regras fixadas nas alíneas do mesmo ponto. Aoabrigo desta regra de atribuição de competência arbitral, as sociedadesrés nos autos, ora recorridas, impulsionaram a constituição do TribunalArbitral, por carta remetida ao Município recorrente datada de 12 deOutubro de 2012;

31- Pretendiam as aqui recorridas a declaração de «incumprimento, porparte do Município de Barcelos das obrigações para si resultantes doaludido Acordo de Accionistas, de cooperação técnica, económica efinanceira, na sequência da celebração do contrato de constituição dasociedade E............, SA, e responsabilidade por danos resultantesdesse mesmo incumprimento»;

32- Estabilizado o objecto do litígio, o tribunal ficou constituído a01.12.2012, conforme dá conta a respectiva «Acta de instalação». Parao que particularmente importa para a economia do presente processo,as requerentes, aqui recorridas, peticionaram no processo arbitral:

c) [Ser] «Declarada a resolução do contrato de parceria celebrado entre as partes eforma na constituição da sociedade E............, SA, devendo esta ser dissolvida eliquidada, e condenando-se o Município, por força do seu incumprimento do ACORDO,a pagar às requerentes a quantia total de 18.389.818€, acrescidos dos juros vincendosdesde a citação até integral pagamento;

SEM PRESCINDIR,

E apenas a título subsidiário, sempre deverá o Município requerido, por força do seuenriquecimento ilegítimo e sem causa, à custa das requerentes, ser condenado a pagaràs mesmas a quantia global de 11.049.317€, igualmente acrescida de juros vincendosdesde a citação e até integral pagamento»;

O seu petitório ancorou-se no seguinte acervo argumentativo:

f) O Município incumpriu as suas obrigações no que diz respeito a:

- Ser possuidor/proprietário dos imóveis necessários à operacionalização da parceria;

- Constituir os direitos de superfície sobre os mesmos;

- Pugnar pelo licenciamento das construções realizadas para o fim a que se destinam;

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- Celebrar os contratos de arrendamento;

g) Tal incumprimento impediu a sociedade criada em execução do contrato de parceria[E............ SA] de gerar qualquer tipo de receita, bloqueando a sua actividade;

h) Tal situação constitui uma violação do Acordo de Accionistas por parte do Municípiode Barcelos que não só causou danos às ali requerentes, como tornou completamenteinviável a manutenção da parceria;

i) Motivo pelo qual assistiria às ali requerentes o direito de requerer a resolução docontrato de parceria celebrado formalizado na constituição da sociedade E............ SA ena celebração do Acordo de Accionistas;

j) Tal resolução implicaria o ressarcimento dos danos alegadamente sofridos pelos alirequerentes no valor global de 18.389.818€, referente a:

1 - Custos das quatro obras efectivamente concluídas [incluindo o respectivo valor, arevisão de preço e os juros moratórios vencidos] que ascendem a 7.189.847€;

2 - Custos com diversas outras obras que as ali requerentes teriam iniciado em devidotempo com a legítima preocupação de não colocarem de algum modo, em causa oescrupuloso cumprimento da calendarização definida no âmbito da parceria [incluindo osrespectivos valores facturados, as revisões de preços e os juros moratórios vencidos],que ascendem a 181.751€;

3 - Suprimentos realizados e não reembolsados, e respectivos juros de mora vencidos,que ascendem a 84.411€;

4 - Diversas despesas de carácter operacional - tais como impostos, água, electricidade,entre outros, que as ali Requerentes teriam suportado por conta da E............, SA, demodo a [tentarem] evitar a suspensão das suas funções básicas diárias e, bem assim, aincursão em contingências fiscais, que ascendem a 25.487€;

5 - Custos com estudos e projectos que ascendem a 164.350€;

6 - Custos de estrutura no montante total de 3.403.471€, que os parceiros privadosalegadamente haviam dimensionado, tendo em conta as características das obras emperspectiva - que incluíam as empreitadas adjudicadas pela E............, SA - e quealegadamente tiveram de suportar, por não terem podido repercutir nas obras previstasno âmbito daquela parceria público-privada e

7 - A título de lucros cessantes e perdas de ganho, a quantia de 6.320.731€;

Neste seguimento, em reconvenção, peticionou o Município de Barcelos a declaraçãoda «resolução do Contrato de Parceria celebrado entre as partes, por incumprimentocontratual das Autoras Reconvindas»;

33- Face à argumentação apresentada pelas requerentes, orarecorridas, o Município, ora recorrente, explicou que os pedidos poraquelas formulados não poderiam proceder pelas seguintes razões:

h) As autoras requerem a condenação do Município em quantias respeitantes à revisãode preços e juros atinentes a quatro obras de empreitada realizadas para a sociedade«E............, SA». O dono da obra de tais empreitadas não foi o Município de Barcelos,mas sim a «E............», pelo que o referido processo padeceria de uma excepçãodilatória de ilegitimidade passiva [alínea a) do artigo 494º do CPC], devendo conduzir àabsolvição da instância do Município demandado;

i) As autoras requereram a condenação do Município na devolução das quantias porestas supostamente entregues à «E............, SA» a título de suprimentos e respectivosjuros. Tais suprimentos terão sido aprovados pelos órgãos sociais da «E............» e taisvalores terão dado entrada na contabilidade e cofres daquela sociedade e não da

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demandada, pelo que se invocou a excepção dilatória da ilegitimidade passiva [alínea a)do artigo 494º do CPC], devendo conduzir à absolvição da instância do Municípiodemandado;

j) Não se verifica qualquer incumprimento dos contratos celebrados entre as partes nosreferidos autos que seja imputável ao Município demandado;

k) Ao contrário, existe incumprimento imputável às autoras;

l) A falta de visto do Tribunal de Contas é uma causa impeditiva da execução doscontratos em causa nos autos;

m) As consequências a tirar dos factos referidos nas três alíneas anteriores sempredependerá da decisão que o Tribunal de Contas vier a tomar quanto à concessão ourecusa do visto;

n) Em qualquer dos casos, as autoras não têm qualquer direito aos lucros cessantesque alegam;

34- No que particularmente importava aos autos de impugnação, postoque as autoras, ora recorridas, não alegaram os trabalhos por sirealizados e o custo que com eles tiveram de suportar, no âmbito dosautos do processo arbitral, defendia o Município aqui recorrente quenada lhes seria de atribuir a esse título. No que diz respeito a esteconcreto aspecto - custo suportado com os trabalhos realizados - em sede deresposta, as ora recorridas alegaram que o custo suportado com aexecução das referidas obras seria o constante das facturas juntas comaquela peça processual. Ora, o busílis do litígio prendia-se exactamentecom a veracidade/validade das facturas mencionadas;

35- Pronunciando-se sobre esses documentos, o Município aquirecorrente impugnou o seu teor, argumentando que os desconhecia,uma vez que, pese embora soubesse que haviam sido emitidasfacturas, igualmente havia chegado ao seu conhecimento que asmesmas teriam sido anuladas pelas próprias recorridas, através daemissão das correspondentes notas de crédito. Por esta razão, cotejoua sua veracidade, requerendo a realização de prova pericial sobre aescrita das demandantes, uma vez que, naquelas circunstâncias, seriainconcebível que servissem como prova para a formação da convicçãodo tribunal acerca do custo dos trabalhos realizados;

36- Assim, o acórdão arbitral, cuja anulação foi peticionada peloMunicípio ora recorrente junto do Tribunal Central Administrativo,determinou:

- A resolução do contrato de parceria celebrado entre as partes, formalizado naconstituição da sociedade E............ SA, devendo esta ser dissolvida e liquidada;

- A condenação do Município demandado, segundo critérios de equidade a pagar àsdemandantes a quantia de 8.600.000, a título de ressarcimento e indemnização peloscustos inerentes a execução dos trabalhos de construção das quatro obras executadase de outras obras iniciadas e não concluídas, e pelos suprimentos realizados e nãoreembolsados e juros correspondentes ao período de tempo decorrido;

- A condenação a título de ressarcimento aos custos associados ao redimensionamentoda estrutura e demais custos suportados pelas demandantes pelo facto do seuenvolvimento na parceria;

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37- O acórdão arbitral determinou, ainda, julgar improcedentes ospedidos indemnizatórios deduzidos pelas demandantes, a título deressarcimento e indemnização por despesas de carácter operacionalalegadamente suportadas por conta da sociedade E............, SA, porcustos relacionados com estudos e projectos, bem como a título deressarcimento por lucros cessantes e perdas de ganhos decorrentes dofacto de não virem a ser executadas as obras inicialmente previstas noâmbito da parceria;

38- Dado que as partes assumiram, no Acordo de Accionistas [cláusulas

26ª, 2, alínea f)], que da decisão do Tribunal Arbitral não caberia recurso,não caberá ao recorrente apreciar ou discutir, nesta ou noutra sede, omérito da decisão impugnada que, relativamente à adequação aodireito constituído, do ponto de vista da substância, é decisãoconsolidada;

39- Todavia, não será de negligenciar o modo como tribunal arbitralversou sobre as excepções suscitadas acerca da legitimidade daspartes intervenientes no processo arbitral e, bem assim, o tratamentoque o Tribunal Central concedeu à questão aflorada pelo Município aquirecorrente, relativamente à idoneidade de um dos árbitros. Saliente-se,sobretudo nesta sede que, mal andou o Tribunal Central naargumentação que expendeu e na conclusão que tirou a propósito daviolação dos princípios da igualdade e do contraditório no decurso doreferido processo;

40- Destarte, atente-se em duas questões prévias: da legitimidade daspartes e da idoneidade do árbitro;

41- No caso vertente, as autoras pretenderam obter pagamento dopreço de 4 empreitadas que alegadamente teriam realizado para asociedade E............, SA, na execução de contratos supostamente comesta celebrados sob a sua direcção e fiscalização. Almejavam ainda asautoras receber as quantias respeitantes à revisão de preços relativosàquelas empreitadas, bem como os juros alegadamente devidos pelamora do pagamento de tais quantias;

42- Ora, da própria matéria alegada pelas autoras resulta que a posiçãode dono de obra naquelas empreitadas é a sociedade «E............, SA»,sendo a posição de empreiteiras assumida pelas sociedades autorasnesses autos, confinando-se as pretensões acima referidas à execuçãodos contratos de empreitadas alegadamente estabelecidos entre asautoras e a E............, SA, daqui resulta que o Município, aquirecorrente, não sendo parte naqueles contratos, através deles nãoassumiu qualquer obrigação de prover ao seu cumprimento, pelo que,se quantias houvesse em dívida para com as autoras, ora recorridas,tais quantias apenas à E............, SA, competiria pagar. Face aoexposto, facilmente se depreende que seria, pois, a E............ que asautoras deveriam ter demandado;

43- Visavam, ainda, as autoras, verem devolvidas as quantias queprestaram à E............, SA, a título de suprimentos, aprovados pelosórgãos sociais desta sociedade e que teriam dado entrada na suacontabilidade, para além dos juros alegadamente devidos pera

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prestação daqueles suprimentos. No entanto, também neste caso euma vez mais, a única beneficiária da prestação alegada pelas autorasfoi a sociedade E............, SA, e não o Município réu, aqui recorrente,pelo que a este não poderá ser exigida a devolução de qualquerquantia que não recebeu, e isto, note-se, segundo as próprias autorasalegaram;

44- Quer num caso - preço devido pelas empreitadas alegadamente executadas -quer noutro - prestação dos suprimentos - porque o Município não é directobeneficiário, nem interveniente nos respectivos contratos que deramorigem a essas prestações, mesmo que se provassem os factos queintegram a causa de pedir, nenhum prejuízo decorreria daí para oMunicípio demandado, pelo que este não teria qualquer interesse emcontradizer na referida demanda, devendo como tal, ter sidoconsiderado parte ilegítima nos termos do disposto no artigo 26º doCPC;

45- Por outro lado, atente-se ainda que pretendiam as autoras, aquirecorridas, através daquela acção, responsabilizar o réu Município pornão ter celebrado contratos de arrendamento dos equipamentosresultantes das empreitadas acima referidas, assacando-lheresponsabilidades por não ter constituído direitos de superfície.Segundo as próprias autoras alegaram, tanto no caso dos contratos dearrendamento, como no caso da constituição dos direitos de superfície,a contraparte do Município de Barcelos nesses contratos seria asociedade E............, SA, pelo que, o credor daquelas obrigações, casoexistissem, seria a sociedade E............, SA, e não as autoras noprocesso arbitral, razão pela qual estas nunca seriam beneficiárias deum eventual cumprimento das referidas obrigações ou dasconsequências que decorreriam do seu incumprimento;

46- Nesta medida, no que respeita às pretensões formuladas em tornoda alegada falta de celebração destes contratos, não retirariam asautoras qualquer utilidade, pelo que não tinham qualquer interesse emdemandar nos autos, e, como tal, eram parte ilegítima na formulaçãodaquelas pretensões;

47- Assim, tanto a ilegitimidade activa como a passiva constituiexcepção dilatória - artigo 577º, alínea e), CPC - devendo conduzir àabsolvição do Município demandando da instância - artigo 493º, nº2, do

mesmo diploma;

48- No caso, não cuidou o Tribunal Central de se debruçar na suadecisão sobre a questão da ilegitimidade das partes. Não obstante afalta de pressupostos processuais e consequente verificação deexcepções dilatórias, ao abrigo do disposto no nº3 do artigo 46º da LAV,não ser causa idónea a potenciar a anulação de uma decisão arbitral,imponha-se ao Tribunal Central ter sempre em presença tal questão,sobretudo quando instado a empreender uma análise sobre a bondadeglobal de um processo, cuja decisão se visa anular;

MAS MAIS:

49- No decurso da acção de anulação que culminou com a decisão de

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que ora se recorre, tomou o Município conhecimento de factospassíveis de colocar em causa a idoneidade do árbitro por si nomeado.Disso mesmo deu conta ao Tribunal Central, através de articuladosuperveniente datado de Junho de 2015, no âmbito do qual peticionoua anulação da decisão arbitral com fundamento no ponto iv da alínea a)do nº3 do artigo 46º da LAV;

50- Comunicou, assim, o Município que no dia 1 de Julho de 2014 haviarecebido um e-mail do Dr. F…………, com timbre do escritório dasociedade de Advogados ………, ………, ……… e Associados,Sociedade de Advogados, sociedade a que pertencia o árbitro por sinomeado. Acontece que o Dr. F………… estabelece, desde 2008,relações comerciais com as sociedades A…………, SA, e com asociedade B…………, SA, tendo iniciado o seu percurso na referidasociedade de advogados em 2013;

51- Ora, o facto de pertencer à mesma sociedade de advogados doárbitro por si nomeado fez, naturalmente, ao Município recear pela suaindependência e sua imparcialidade. Sobre esta factualidade, asrecorridas pronunciaram-se sustentando a inadmissibilidade dorequerimento, porquanto deveria ter sido apresentado na resposta àsexcepções, alegando ainda a falta de fundamento da argumentação doaqui recorrente;

52- Instado a pronunciar-se, o TCAN entendeu ser o referidorequerimento inadmissível, porque superveniente, argumentando aindaque não havia ficado provado que o Dr. F………… teria sido mandatáriodas sociedades em causa, apenas se apurando que o mesmo haviaprestado serviços na qualidade de consultor;

53- Ora, no caso em apreço, o conhecimento da ligação do Dr. ………ao Dr. F………… só chegou ao Município através de um e-mail enviadoa 31 de Julho de 2014, no qual constava um papel timbrado da ………,………, ……… e Associados, Sociedade de Advogados, emrepresentação das aqui recorridas;

54- Na posse de tal informação, o Município usou do expedienteconstante do artigo 588º, nº1 do CPC, nos termos do qual se autorizaque em articulado posterior ou em novo articulado, as partes possamlevar ao conhecimento do tribunal factos constitutivos, modificativos ouextintivos do direito cujo conhecimento lhes tenha chegadosupervenientemente;

55- Pese embora se compreendam os fundamentos exarados nadecisão recorrida a propósito da restrição temporal à dedução deargumentos susceptíveis de anulação de uma decisão arbitral impostapelo artigo 46º, nº6 da LAV, sempre se diga que tal preceito, serestritivamente interpretado nos termos em que o foi, inevitavelmenteconduzirá à violação de princípios fundantes de todo o sistema deresolução alternativa de litígios, como o da independência eimparcialidade dos julgadores;

56- Apesar da pouca atenção que a LAV dá à questão daindependência e da imparcialidade do árbitro ou árbitros - dado que se

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limita a remeter para o regime dos impedimentos e escusas estabelecidas no processocivil para os juízes - não é fácil negar que logo a própria realidade e asexigências da vida postulam que se pense a independência como amais irrenunciável característica do julgar e, portanto, também dafunção arbitral [artigo 10º, nºs 1 e 2, da LAV];

57- De facto, o exercício da função jurisdicional, ainda que por umtribunal não estadual, não é concebível sem árbitro independente eimparcial: a imparcialidade do tribunal arbitral constitui um requisitofundamental de um processo justo ou equitativo. Dito de outra forma:num Estado de Direito, a partir do momento em que o árbitro assumeesse status, o de «juiz-árbitro», a sua actividade judicial encontrar-se-áestritamente conexionada com a prossecução de um processoequitativo, na formulação constante do artigo 20º, nº4 da CRP;

58- Deste modo, a independência e imparcialidade dos árbitros constituigarantia do exercício legítimo do direito das partes, mormente doprincípio do contraditório e da obtenção de decisão em conformidadecom as regras de direito. No caso vertente, não ficou provado que oárbitro designado pelo demandado Município no processo arbitralexercia funções de advocacia na sociedade de advogados ondetambém exerce a sua actividade o advogado mandatário dassociedades aqui recorridas, no decurso do processo arbitral;

59- Ainda assim, na óptica do ora recorrente não se olvidará que existeum risco sério de terem sido criadas condições que lançam umaindelével suspeita sobre a actuação do árbitro em prol dos interessesdas recorridas. A proximidade que resulta das relações profissionaisexistentes entre aqueles dois advogados, lança fundadas dúvidas sobreuma possível dependência do árbitro em relação aos interesses daparte contrária que conduzem, de forma suficientemente objectivada, aexistência de circunstâncias que enquadram nas «fundadas dúvidas» aque se alude nos nºs 1 e 3 do artigo 13º da LAV;

60- Posto isto, o árbitro nomeado pelo Município, aqui recorrente,deveria ter sido recusado para integrar o Tribunal Arbitral que proferiu aacção nos autos. Por outro lado, nos termos do ponto iv da alínea a) donº3 do artigo 46º da LAV, a decisão será anulada quando a parte quefaz o pedido demonstre, para além do mais que «A composição dotribunal arbitral ou o processo arbitral [...] não foram conformes com apresente lei […]»;

61- A influência decisiva na decisão arbitral é revelada pelo facto doMunicípio ter sido obrigado a indemnizar as ora recorridas de acordocom critérios de equidade, o que significa que o «quantum»indemnizatório foi fixado pelo prudente arbítrio dos membros do arbitral.Assim sendo, o recurso a critérios de equidade exige umaindependência reforçada dos árbitros, pois que foi o prudente arbítriodestes, não a lei, que fixou critérios e o montante da indemnizaçãosuportada pelo Município. Não se verificando a existência destaindependência, naturalmente se coloca em causa a própria decisão derecorrer a critérios de equidade para a fixação do «quantum»indemnizatório, assim como a definição dos critérios adoptados;

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62- Exigia-se, assim, ao TCAN que diligenciasse no sentido de obterum cabal esclarecimento da questão, atenta a importância que terárevestido na composição final do litígio. Ao invés de uma pronúncia decariz iminentemente formal, imponha-se que cuidasse de apurar aligação que o árbitro nomeado pelo Município directa ou indirectamentepudesse ter com as recorridas, assim clarificando se o processodecorreu dentro dos trâmites legais, respeitando os princípios de um«fair trail»;

63- Em face da factualidade exposta, uma vez confirmada a tese doMunicípio, cumprir-lhe-ia, nestes termos, anular a decisão arbitral comfundamento no disposto no ponto iv da alínea a) do nº3 do artigo 46º daLAV;

SEM PRESCINDIR,

64- Permite o artigo 46º da LAV o recurso à via judicial para anulaçãoda sentença arbitral desde que se verifique, entre outros, o seguintefundamento:

«Houve no processo violação de alguns dos princípios fundamentais referidos no nº1 doartigo 30º com influência decisiva na resolução do litígio» [artigo 46º, nº3 a), ii]. De facto,estabelece o artigo 30º da LAV, os princípios e regras a que deve obedecer o processoarbitral, entre os quais, com relevância na instância anulatória e para o presenterecurso, se destacam:

b) As partes são tratadas com igualdade e deve ser-lhes dada uma oportunidaderazoável de fazerem valer os seus direitos, por escrito ou oralmente, antes de serproferida a sentença final;

d) Em todas as fases do processo é garantida a observância do princípio do

contraditório, salvas as excepções previstas na presente lei»;

65- Urge, pois, atentar nos trâmites em que se desenvolveu o processoarbitral que culminou na prolação da decisão por cuja anulação sepugna, demonstrando em que medida foram os princípios da igualdadee do contraditório violados, analisando de que forma a decisão do TCAN

sobre eles versou;

66- Assim, conforme se aflorou supra, as demandantes, aqui recorridas,deduziram na sua petição inicial um pedido de declaração de resoluçãodo contrato de parceria celebrado entre as partes, formalizado naconstituição da sociedade E............, SA, peticionando que seja estadissolvida e liquidada e o Município demandado, aqui recorrente,condenado, por força do alegado incumprimento das obrigaçõesassumidas no âmbito do referido contrato, a pagar às demandantes aquantia total de 18.389.818€. Tal montante foi pelas demandantesjustificado como resultando da soma de várias parcelas, entre as quais,e para o que aqui releva, uma parcela de 7.189.947€, a título deressarcimento e indemnização pelos custos decorrentes da execuçãodos trabalhos de construção de quatro obras alegadamente concluídasno âmbito da dita parceira, incluindo o respectivo valor, a revisão depreços e os juros moratórios vencidos;

67- Ora, na contestação, o Município demandando argumentou que asdemandantes não alegaram quais os custos por si suportados com a

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construção dos quatro equipamentos e nunca apresentaram as facturascorrespondentes às obras supostamente realizadas, pelo que requereu,a final da sua peça processual, a notificação das autoras para queprocedessem à junção aos autos dessas mesmas facturas. Nesteseguimento, em resposta à reconvenção, as autoras vieram juntar aosreferidos autos quatro facturas alegadamente correspondentes às obrassupostamente efectuadas;

68- Sucede, porém, que o Município ali demandando tomouconhecimento, no âmbito de uma inspecção fiscal, em data posterior àelaboração da contestação, que as facturas respeitantes aos trabalhosrealizados foram, de facto, emitidas, mas posteriormente anuladasatravés da emissão de notas de crédito pelas próprias demandantes;

69- Em face do exposto, facilmente se concluiria que as ditas facturasjuntas aos autos haviam perdido o seu valor probatório, até porque aemissão das notas de crédito pelas demandantes corroborava oentendimento segundo o qual o valor inscrito nas mesmas não seria odevido;

70- Tal informação foi transmitida pelo Município ao Tribunal Arbitral porrequerimento datado de 13.05.2013, no âmbito do qual, em face dadúvida criada, requereu o exame a escrita das demandantes, nostermos do artigo 43º do Código Comercial para comprovação dos factosaí alegados;

71- Ora, sobre o requerido recaiu a decisão constante do DespachoSaneador proferido em 8 de Novembro de 2013, nos termos da qual, sedeterminou que «entretanto, se, até ao final da audiência dejulgamento, e nomeadamente na sequência do referido pedido deinformação à E............ SA, e da informação que venha a ser prestada,o Tribunal vier a encontrar fundamento sério para ordenar a realizaçãode qualquer outra diligência de prova, será então considerada essapossibilidade, depois de ouvidas as partes». Registando-se, desdelogo, neste trecho a relutância do tribunal em ordenar a diligênciaprobatória requerida pelo demandado aqui recorrente;

72- Não se conformando e entendendo tratar-se de uma diligênciaessencial à boa decisão da causa, o Município demandado pronunciou-se por requerimento constante a folhas 1049 dos autos [do Tribunal

Arbitral], argumentando que «a realização da perícia à escrita dasdemandantes entende o demandado que esta deve ser ordenada arealizar de imediato em paralelo com a realização da audiência ejulgamento com vista a que esta perícia não venha a atrasar a prolaçãodo acórdão»; Sobre tal requerimento, não se debruçou,autonomamente, o Tribunal Arbitral, tendo-se pronunciado apenas, noinício da audiência final, «releg[ando] para mais tarde a decisão sobre orequerimento da prova pericial do demandando»;

73- Acontece que, no decurso da sessão de julgamento do dia27.11.2013, procederam as demandadas à junção de novosdocumentos relacionados com a temática, tendo uma vez mais oMunicípio exposto que «resulta do exposto que os documentos agorajuntos reforçam a necessidade da realização da requerida perícia à

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escrita das demandadas, com o intuito de se poder apurar se asfacturas juntas com o articulado de resposta foram efectivamenteemitidas e, caso o tenham sido, se forem ou não anuladas» e, nestasequência, «reforça-se o já requerido que, quanto a realização daperícia à escrita das demandantes entende o demandado que estadeve ser ordenada e realizada de imediato em paralelo com arealização da audiência e julgamento com vista a que esta perícia nãovenha a atrasar a prolação do acórdão». Uma vez mais, o tribunal nãoacedeu;

74- Por requerimento constante de folha 1462 dos autos [do processo

arbitral], no qual o ali demandado pretendeu juntar dois documentos queanexou a esse requerimento, acrescentou que «o teor dos documentosagora juntos é mais um indício que permite por em causa a emissãodas facturas invocadas pelas demandantes, nos presentes autos, ou aeventual anulação daquelas reforçando a necessidade da perícia àescrita das demandantes insistentemente já requerida pelodemandado»;

75- O tribunal permaneceu inerte até que, por despacho datado de13.01.2014, indeferiu o requerimento da prova pericial às contas dasdemandantes, solicitada pelo demandado, por entender que não eranecessária, face à prova produzida nos autos, para o esclarecimentodas questões pertinentes ao julgamento da causa. Não seconformando, pronunciou-se o Município demandado sobre o teordaquele despacho por requerimento constante de folhas 1644 eseguintes, nos termos do qual argumentou que tal decisão potenciaria acriação de uma situação de desigualdade, por lhe estar a ser coarctadaa única forma possível de abalar a validade dos documentos juntospelas demandantes nas quais estas estribam o alegado valor queatribuem às obras;

76- Aliás, nas suas alegações de direito, o demandado, aqui recorrente,vincou «Como se vê as demandantes não alegaram o valor das obras realizadas, nemtão pouco, em que consistiram essas obras.

Limitaram-se a articular a existência de deliberações dos órgãos sociais da E............,SA, que procederam a alterações aos valores dos orçamentos para obras apresentadaspelas Demandantes em sede de concurso público.

Assim, atendendo ao princípio do dispositivo e do contraditório estaria este tribunalimpedido de se pronunciar sobre as obras realizadas e seus valores.

Nesta medida, a determinação de existência de alterações orçamentais é absolutamenteirrelevante, pois o que importaria era saber, não a previsão do valor das obrasconstantes dos orçamentos ou suas alterações, mas sim o valor efectivo e real dasobras realizadas, o que implica concretizar que obras são essas, o que como se viu nãofoi feito.

Por outro lado, em sede de resposta, as demandantes limitaram-se a juntar as facturasque seriam as respeitantes a esses trabalhos, facturas essas que o demandandoimpugnou, alegando que as mesmas teriam sido anuladas pelas próprias demandantes.

O demandado requereu perícia à escrita das demandantes para tentar demonstrar queaquelas facturas haviam sido anuladas.

Encontram-se junto aos autos três documentos relevantes sobre esta matéria: um

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constituído por cópia de uma carta subscrita pela contabilista da E............, SA,afirmando não ter conhecimento daquelas facturas; os outros dois são relatórios deinspecção fiscal que não fazem qualquer referência às facturas juntas com a respostadas demandantes como documentos nºs 7 a 11, mas sim a outras que estas nãojuntaram.

Por outro lado, as testemunhas ouvidas ou não tinham conhecimento sobre esta matériaou confirmaram que efectivamente aquelas facturas foram anuladas pelas própriasdemandantes.

Assim, nunca aquelas facturas seriam documentos para fazer prova dos valores dasobras efectuada pelas demandantes.

A única conclusão que se poderá retirar, pois, é que não existem nos autos elementosque permitam determinar quais as obras concretamente executadas e, menos ainda, ovalor destas»;

77- Pese embora a argumentação do Município aqui recorrente, oTribunal Arbitral proferiu que decisão final determinando que: «Nasequência do despacho saneador, o Tribunal oficiou para que a sociedade E............,SA, informasse se da sua contabilidade constam as facturas em causa ou, sendo casodisso, outras que tenham sido reemitidas em sua substituição. A resposta obtida foiafirmativa.

Este elemento foi, para o tribunal, suficiente para esclarecer a questão no sentido deque, efectivamente, as facturas em causa constam da contabilidade da E............, SA, eque as facturas anuladas por motivo do IVA foram substituídas. Isto foi corroborado pelodepoimento das testemunhas ……… e ……….

Durante a audiência de julgamento, o demando pretendeu, entretanto, extrair dodepoimento de uma das testemunhas fundamento para abalar a credibilidade da provadocumental produzida, tendo vindo, nesse sentido, a juntar dois documentos e arequerer a audição de mais duas testemunhas. Essa pretensão foi, no entanto,indeferida pelo Tribunal, por considerar que, tendo as testemunhas em causa sidooferecidas pelo demandando este não produziu prova de ter efectuado diligências nosentido de poder apresenta-las e não ter conseguido faze-lo, e que não justificavaproceder a respectiva audição, por iniciativa do próprio Tribunal, por tal não se mostrarnecessário para a descoberta da verdade quanto ao ponto em discussão.

O Tribunal considerou, assim, provado, o alegado pelas demandantes, que as facturasjuntas como documentos nºs 7 a 11 com a resposta à contestação, estão devidamentecontabilizadas na sociedade E............, SA, e que as facturas emitidas pelas requerenteB………… que foram objecto de emissão de notas de crédito por forma a validar o seucorrecto e adequado regime de IVA, foram posteriormente reemitidas e entregues nareferida sociedade. E, portanto, que não havia fundamento que justificasse ordenar arealização de uma perícia dirigida a examinar a escrita das demandantes»;

78- Entendeu, assim, o tribunal que o valor invocado pelasdemandantes para as obras alegadamente executadas era o correcto,ainda que admitisse como hipótese que essas obras pudessem nãoestar completamente concluídas e reconhecendo que as própriaspartes assumiram que esse valor era excessivo;

79- Ora, em boa verdade se diga que a decisão do pleito mereciamelhor argumentação, impondo-se a realização de todas as diligênciasprobatórias tendentes a apurar os prejuízos alegados pelasdemandantes nos autos do processo Arbitral e, nomeadamente, no queao caso dos autos importava, à determinação do valor das obrassupostamente executadas. De facto, a tese em confronto era simples elinear: ao tribunal pedia-se que usasse de toda a diligência para apurar

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o valor das referidas obras, sobretudo porque tal questão se reveloufundamental para a fiação do montante indemnizatório em que odemandado veio a ser condenado;

80- Assim, perante a posição em que as partes se encontravam, nãobastava ao tribunal, para cumprir o princípio do contraditório, apenasconhecer da argumentação de uma e de outra;

81- Para o cumprimento cabal daquele princípio exigia-se que cadauma das partes, para além dos argumentos, pudesse produzir a provanecessária, para que, na posse de todas as informações e elementosessenciais para a definição do sentido da decisão, o tribunal sepudesse pronunciar. O que não sucedeu;

82- Acresce ainda considerar que incumbe ao tribunal tramitar todo oprocesso com respeito pela igualdade das partes. O que significa queno domínio da produção de prova, pela importância que assume, aspartes devem ter exactamente o mesmo tratamento;

83- Assim, ao não permitir a produção de prova neste segmento, otribunal prejudicou de forma injustificada a apreciação do mérito de umdos argumentos centrais da defesa do Município, com consequênciasevidentes na decisão proferida. Instado a pronunciar-se sobre ainvocada violação dos princípios da igualdade e do contraditório nodecurso do processo arbitral, o TCAN argumentou que: «No que se refere aoprincípio da igualdade, não vemos como possa o mesmo ter sido violado. As partestiveram a mesma oportunidade de discutir os meios de prova e pronunciarem-se sobreos mesmos. Não é pelo facto de, fundamentadamente, se ter indeferido um meio deprova, como seja o pericial, que se pode concluir que foi violado o princípio da igualdadedas partes.

[…]

Por seu lado, no caso em apreço, a decisão arbitral determinou a indemnização a pagarpelo requerente através da equidade. Ou seja, as facturas em causa, apesar derelevantes, porque foram um ponto de partida para a decisão, não podem serconsideradas como a única fonte em que os árbitros se fundamentaram para decidircomo decidiram.

[…]

O indeferimento da perícia, até porque as facturas não foram elemento decisivo e únicopara a decisão da causa, não pode acarretar eventual violação dos princípios docontraditório e da igualdade das partes, até porque esse indeferimento não pode serassociado a uma eventual influência decisiva na causa»;

84- Ora, salvo o devido respeito, não poderá o recorrente concordarcom tal argumentação quando aplicada ao caso concreto. Apesar doprocesso arbitral decorrer sob os signos de flexibilidade e deinformalidade, a sua sujeição imperativa, designadamente, aosprincípios da igualdade, da audiência e do contraditório afigura-seessencial para a manutenção das dimensões inelimináveis do direito deacesso aos tribunais e ao processo equitativo;

85- Como é evidente, não basta assegurar a qualquer interessado oacesso à justiça, sendo necessário que o processo a que se acedeapresente, quanto à sua própria estrutura, garantias de justiça. Tão

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indispensável como assegurar o direito de acesso ao direito e tutelajurisdicional efectiva, é, por exemplo, garantir àquele que recorre aostribunais - a qualquer tribunal - um julgamento por um órgão imparcial, emplena igualdade de partes, o direito ao contraditório, duração razoávelda acção, a publicidade do processo e a efectivação de um direito àprova;

86- Posto isto, resulta indubitável que «O direito à prova constituidimensão ineliminável do direito ao processo equitativo, que, por suavez, constitui parte integrante do princípio material da igualdade». Nocaso, o Tribunal Arbitral indeferiu ao demandado Município, aquirecorrente, uma diligência probatória essencial para apurar daveracidade e consequente validade de um dos elementos fundantespara a determinação do «quantum» indemnizatório em que aquele viriaa ser condenado;

87- Apesar de inúmeras vezes instado a promover a produção deprova, consubstanciada num exame pericial à escrita dasdemandantes, sempre o tribunal protelou no tempo a prolação dedecisão definitiva sobre o petitório, acabando mesmo por o indeferir emaudiência final;

88- No caso sub judice, o interesse que para a questão representava arealização da referida diligência imponha decisão distinta. Acresce que,nunca às demandantes, aqui recorridas, foi estabelecido qualquer tipode limitação da prova a produzir. Já ao impugnante, sem razão válidajustificativa, o tribunal constituído indeferiu sucessiva e repetidamente apretensão da realização da perícia requerida, o que, pelo deficitprobatório, teve influência decisiva no desfecho da acção, dado que,como literalmente é referido na decisão preferida pelo Tribunal Arbitral,o valor alegado pelas demandantes para a execução das obras foilevado como referência para a fixação da indemnização em que veio aser condenado o demandado;

89- Ora, igualdade processual significa um tratamento nãodiscriminatório das partes, de modo a que não se veja qualquer delas,sem fundamento válido, impedida de exercer um direito legítimo. Noque a este ponto diz respeito, urge ter em conta que os actos deprocesso - de qualquer processo - têm uma finalidade inegável: assegurar ajusta decisão da causa. Acontece que nenhuma decisão se terá porconscienciosa e justa se não tiver sido convenientemente instruída ediscutida;

90- Como bem alertou o Tribunal da Relação de Coimbra, em acórdãodatado de 21.04.2015, proferido no âmbito do processonº3486/12.7TBLRA.C1, «o fim geral dos actos de processo estásatisfeito se as diligências, actos e formalidades que se praticaramgarantem a instrução, a discussão e o julgamento regular do pleito: pelocontrário, o dito fim mostrar-se-á prejudicado se se praticaram - ou

omitiram - actos que comprometem o conhecimento regular da causa e,portanto, designadamente, a instrução dela»;

91- No caso vertente, ao impedir o exercício de diligência de prova nostermos supra descritos, e dada a sua essencialidade para uma correcta

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discussão da causa, o tribunal prejudicou significativamente a prolaçãode uma boa decisão. O tribunal impediu a realização da referidadiligência em manifesta violação do princípio da igualdade entre aspartes. Facto que é tanto mais evidente, quando se atenta que àsdemandantes nunca foi obstaculizado o exercício de qualquer direito;

92- Note-se que a igualdade a que se reporta o artigo 30º, b), da LAV, étambém uma igualdade substancial que opera como um princípioestruturante do Direito Processual Civil que, naturalmente, surge comouma decorrência lógica da equiparação entre as partes. Ora, só umprocesso com tratamento igual entre as partes será equitativo e,portanto, justo, conforme decorre do artigo 14º, nº1 do PactoInternacional sobre os Direitos Civis e Políticos e do artigo 6º daConvenção Europeia dos Direitos do Homem;

93- Poder-se-á, então, concluir que ao não permitir a produção deprova nos termos descritos, o tribunal violou o princípio da igualdade nasua noção mais ampla, legitimando a anulação da sua decisão;

94- No que ao princípio do contraditório respeita, cumpre ter presenteque este não se projecta apenas em «ouvir» antes de decidir. Ocontraditório implica que o tribunal tenha que decidir com todos oselementos que tenha, ou poderia ter, ao seu dispor, nomeadamenteelementos de prova que, dentro das regras estabelecidas, as parteslevem para o processo;

95- Era, assim, necessário para cumprir de forma cabal este princípioque cada uma das partes, para além dos argumentos, pudesse produzira prova necessária, para que, na posse de todas as informações eelementos essenciais para a definição do sentido da decisão, o tribunalse pudesse pronunciar. É que o princípio do contraditório - audiatur et

altera pars - enquanto princípio estruturante do processo civil - que é umprocesso com estrutura polémica ou dialéctica, revestindo a forma de um debate oudiscussão entre as partes - exige que se dê a cada uma delas apossibilidade de «deduzir as suas razões [de facto e de direito]», de«oferecer as suas provas», de «controlar as provas do adversário» e de«discretear sobre o valor e resultados de umas e outras»;

96- Na verdade, o princípio concede às partes «a possibilidade deinfluenciarem a formação da decisão na parte relativa à matéria defacto [alegação, instrução e conclusões de facto passíveis de serem extraídas dessas

alegação e produção de prova] e em sede de julgamento de direito,encontrando-se legalmente consagrado na nossa legislação processualcivil nos artigos 3º [em geral e na vertente da proibição de decisão-surpresa] e 4º[na vertente específica da alegação dos factos da causa];

97. No caso sub judice, não foi dada ao Município, ora recorrente, aoportunidade de abalar a argumentação apresentada pelasdemandantes. Pese embora as referidas facturas não tenham sido aúnica fonte em que os árbitros se fundamentaram para decidir comodecidiram, o facto é que as informações nestas constantes foramverdadeiramente essenciais na definição do «quantum» em que seconsubstanciou a decisão condenatória. Nestes termos, afigurava-secrucial que ao Município fosse concedida a oportunidade de verificar a

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sua veracidade através da produção de prova pericial. O que nãoaconteceu;

98- Ora, como bem esclareceu o STJ em acórdão datado de24.06.2004, proferido no âmbito do processo 04B2190, a propósito doindeferimento de diligência probatória, «A essencialidade da omissãoem causa para a decisão que foi proferida há-de aferir-se, face aosfactos assentes, à luz de um juízo de prognose póstuma, perante aperspectiva de saber se o novo acórdão decorrente da anulação doprimeiro para cumprimento da audição das partes seria ou nãosusceptível de favorecer a parte que pretende a anulabilidade»;

99- Em concreto, caso a informação resultante da prova pericialefectuada à escrita das demandantes revelasse, como suspeitava oMunicípio, que a contabilidade da E............, SA, havia sido adulterada eos custos das supostas obras hiperbolizados, seguramente os árbitrosdecidiriam diferentemente;

100- Não obstante a indemnização a pagar pelo Município tivesse sidodeterminada por recurso à equidade, foram para o tribunalfundamentais as balizas estabelecidas pelos montantes - cuja veracidade

se contesta - alegados pelas demandantes. Surge, assim, a equidadecomo expediente apto «a colmatar as incertezas do material probatório,bem como a temperar o rigor de certos resultados de pura subsunçãojurídica, na procura da justa composição do litígio, fazendo apelo adados de razoabilidade e equilíbrio, tal como de normalidade,proporção e adequação às circunstâncias concretas, sem cair noarbítrio ou na mera superação da falta de prova de factos quepudessem ser provados»;

101- Assim, uma vez recolhidos todos os elementos probatórios, aequidade permite alcançar aquilo que pode ser a solução mais justa nocaso concreto, o que só é possível quando, respeitando os princípiosda igualdade e do contraditório, for dada a oportunidade às partes deproduzir toda a prova que entenderem essencial;

102- Acontece que, no caso, o tribunal decidiu indeferir o pedido dorecorrente, não obstante este ter repetidamente pugnado pelanecessidade da realização da peritagem, tendo os árbitros decididoapenas com os elementos disponíveis, excluindo do seu itercognoscitivo as conclusões que se pudessem vir a extrair da realizaçãoda perícia. Conclui-se, assim, que a exclusão de tais elementos fez otribunal incorrer em violação do princípio do contraditório, violando odisposto no artigo 30º, b), da LAV;

103- Acresce, a final, considerar que, no caso concreto, a ofensa deprincípios estruturantes como sejam a igualdade e contraditóriointerferiu, de forma decisiva e determinante, na decisão do objecto dacausa;

104- A violação de tais princípios consubstanciou-se, assim, naomissão da produção de uma prova sujeita à livre apreciação dosárbitros e que, segundo juízo de prognose, provavelmente potenciaria amodificação da decisão da questão de facto e, correspondentemente, a

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alteração da decisão final da causa arbitral;

105- Face ao exposto, não se concebe o sentido da decisão proferidapelo TCAN, ora recorrida, pelo que nesta sede se pugna, uma vez mais,pela anulação da decisão arbitral, nos termos conjugados dos artigos46º, nº3, a) ii), e 30º, nº1, a) e b), da LAV».

Termina pedindo a revogação do acórdão recorrido, bem comoo julgamento de procedência da «impugnação da sentença[acórdão] arbitral».

2. As sociedades recorridas contra-alegaram, em conjunto, econcluíram assim:

A) Veio o recorrente, interpor recurso de revista, nos termos do artigo150º, nº1, CPTA, para este Venerando Tribunal, do douto acórdão doTCAN, de 17.06.2016, que julgou improcedente a impugnação dedecisão arbitral, peticionando a revogação do acórdão recorrido eprocedência da referida acção de impugnação;

B) Porém, a título prévio, entendem as ora recorridas que o presenterecurso excepcional de revista - sendo o próprio - não será admissível àluz do artigo 150º, nº1, do CPTA, devendo ser recusada a sua admissão;

C) Porquanto não estamos perante questão de importânciafundamental, dada a sua relevância jurídica ou social nem a admissãodeste recurso é necessária para uma melhor aplicação do direito;

D) Consideramos que nenhum dos fundamentos invocados, bem assimnenhuma das questões que estão a ser discutidas nesta sede sãoquestões «juridicamente complexas», de relevância jurídica ou socialfundamentais ou que a sua discussão contribua para uma melhoraplicação do direito;

E) Pelo que carece, assim, de fundamento legal o presente pedidoformulado pelo Município e o presente recurso, requerendo-se, desdejá, a V. Exas. se dignem negar provimento ao mesmo;

F) Mesmo que assim não se entendesse - o que apenas se admite por cautela

de patrocínio e sem conceder minimamente - este recurso sempre seriaclaramente improcedente, porque o douto acórdão ora recorrido nãoviolou, de forma alguma, regras ou princípios fundamentais;

G) A nível do julgamento da questão da ilegitimidade das partes, bemandou o TCAN em não tomar conhecimento desta questão;

H) Porque as acções que visam a impugnação/anulação de decisõesarbitrais seguem os termos do artigo 46º, nº3, da LAV, sendo certo queeste artigo prevê fundamentos taxativos para este pedido de anulação;

I) E tal como salienta, e bem, o douto tribunal recorrido, de entre oelenco de fundamentos para apresentar pedido de anulação não está oconhecimento de excepções, isso seria entrar no mérito da acção;

J) Por outro lado, veio o recorrente alegar que no decurso da acção de

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anulação tomou o Município conhecimento de factos passíveis decolocar em causa a idoneidade do árbitro por si nomeado;

K) Acompanhamos o douto tribunal ao ter julgado inadmissível oarticulado superveniente do recorrente em 03.06.2015, quandoalegadamente se reporta a factos que ocorreram cerca de um anoantes da sua apresentação, ou seja, em Agosto/Setembro de 2014;

L) Bem andou o TCAN ao determinar que, ainda assim, nunca severificaria uma situação de inidoneidade, por falta de prova para o efeitoe julgou tal questão improcedente;

M) Também veio alegar o recorrente que o TCAN andou mal na decisãoque tomou referente à suposta violação dos princípios da igualdade econtraditório por ter sido negada a realização da perícia àescrita/contabilidade das recorridas, em sede de arbitragem;

N) No entanto, veremos que tal imputação carece, em absoluto, desentido e fundamento legal, por várias ordens de razão!

O) Em primeiro lugar, note-se que, ao longo de todo o processo dearbitragem, nunca o recorrente invocou a violação de quaisquerprincípios, entre os quais, os que ora invoca;

P) O recorrente, ao longo de todo o processo, não só nunca deduziuqualquer incidente de violação de um qualquer direito fundamentalcomo, de resto, não podia fazê-lo, pela simples razão de que não houvequalquer violação, muito menos, do princípio da igualdade ou docontraditório;

Q) O indeferimento da realização de prova pericial não consubstancia,nem pode, por si só, consubstanciar uma violação do princípio docontraditório ou da igualdade;

R) Nunca existiu, pois, qualquer violação dos princípios estatuídos noartigo 30º da LAV, nem sequer são alegados factos susceptíveis de osintegrar como de resto competiria ao recorrente;

S) Conforme referido, para além de invocar e demonstrar a violação deum direito fundamental, é necessário que o autor alegue e demonstreque aquilo que alega tem influência decisiva na resolução do conflito,nos termos da alínea ii), do nº3, do artigo 46º. Sendo certo que, o ónusde alegar e demonstrar tal requisito caberia ao recorrente;

T) A verdade é que o exame à escrita das recorridas e que fundamentaa acção da anulação, seria, como é, uma diligência absolutamenteinútil!

U) Estão em causa as facturas emitidas pelas recorridas no âmbito daexecução dos trabalhos da empreitada. Ambas as partes requereramos meios probatórios tidos por necessários;

V) O douto Tribunal Arbitral, no despacho saneador, decidiu que aprova pericial à contabilidade das recorridas e bem assim, às facturasemitidas, seria desnecessária, tendo dado oportunidade às partes para

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se pronunciarem sobre este sentido de decisão. Fundamentou taldecisão de indeferimento, o que demonstra que não houve violação dequalquer princípio de igualdade ou do contraditório;

W) Por outro lado, como bem salientou o douto acórdão recorrido, arealização [ou não] desta perícia em nada iria influenciar a decisão final,na medida em que o indeferimento de um meio de prova não é, por sisó, idóneo a que se possa considerar que foram violados tais princípios;

X) Pelo que acompanhamos, em tudo, o decidido pelo tribunalrecorrido, devendo o presente recurso ser julgado improcedentetambém nesta parte, mantendo-se o acórdão.

Terminam pedindo a «não admissão» do recurso de revista, eem todo o caso o seu «não provimento».

3. Porém, o recurso de revista foi «admitido» - pela formaçãoprevista no artigo 150º, nº5, do CPTA.

4. O Ministério Público pronunciou-se pelo não provimento dorecurso de revista - artigo 146º, nº1, do CPTA aplicável, ou seja, o CPTA na

versão anterior ao DL nº214-G/2015, de 02.10].

5. Cumpridos que foram os «vistos» legais, cumpre apreciar edecidir a revista.

II. De Facto

São os seguintes os factos que foram dados como provados:

1- Na sequência de concurso público lançado para o efeito, foicelebrado entre as partes uma «Parceria», sob a forma de contrato desociedade, constituída em 18.05.2009, por escritura pública, pela qualfoi constituída a sociedade «E............, SA», com um capital social de50.000,00€, titulado por 50.000 acções, sendo as requeridas no seuconjunto titulares de 51% do capital social e o Município requerentedetentor de acções correspondentes aos restantes 49%;

2- Como forma de contratualizar as obrigações decorrentes doconcurso público, foi celebrado entre as partes um acordo deaccionistas, de cooperação técnica, económica e financeira, com datade 08.06.2009 [folhas 144 e seguintes];

3- Consta do «Acordo» o seguinte: «…26.1 As partes comprometem-se aenvidar os seus melhores esforços no sentido de solucionar amigavelmente qualquerdúvida, controvérsia ou questão emergente desse Acordo. 26.2 Tal não sendo possívela questão objecto da divergência será submetida a um tribunal arbitral, que funcionará edecidirá, de acordo com as seguintes regras:…f) o tribunal arbitral poderá decidirsegundo a equidade, e as suas decisões terão força vinculativa em relação às partes,que se comprometem a submeter-se ao que for decidido no processo arbitralindependentemente de homologação judicial, não havendo recurso da decisãoarbitral…»;

4- Foi constituído Tribunal Arbitral em 11.12.2012, por impulso dassociedades requeridas;

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5- Na contestação, o requerente tinha requerido que as actuaisrequeridas fossem notificadas para juntarem aos autos as facturas comfundamento nas quais reclamam o pagamento das verbascorrespondentes às obras que teriam efectuado;

6- Na resposta à contestação as requeridas juntaram as facturas comodocumentos 7 a 11, tendo referido no referido documento «que as facturasrespeitantes aos trabalhos realizados, descritos nos presentes autos, vieram de facto aserem emitidas, e posteriormente anuladas através de notas de crédito», tendorequerido exame à escrita das requeridas, nos temos do disposto noartigo 43º do Código Comercial;

7- Foi realizada audiência preliminar tendo sido emitido DespachoSaneador onde foi decidido:

«... Com efeito, vimos já que o pedido deduzido pelas demandantesnão se dirige a exigir o cumprimento de prestações a realizar pelasociedade E............, SA. Como sintetizam no artigo 500º da resposta àcontestação as demandantes, no essencial, alegam, na presenteacção, que o demandado não cumpriu as obrigações que sobre sialegadamente recairiam de «(i) adquirir os terrenos alvo de intervenção e integrá-los no domínio privado do Município; (ii) constituir direitos de superfície sobre essesterrenos a favor da sociedade E............, SA, e (iii) celebrar com esta contratos dearrendamento sobre os equipamentos advenientes das obras executadas, pagamentoas rendas devidas». É nisto que se traduz o alegado «incumprimento do

ACORDO» em que as demandantes sustentam o seu pedido deresolução do contrato de parceria formado com o demandado, ecorrespondente indemnização. Ora, sendo nestes termos que seconfigura a pretensão dos demandantes, é manifesta a legitimidadepassiva do demandado na presente acção «...IV... Em face do alegado otribunal considera não haver, pelo menos de momento, fundamento que justifiqueordenar a realização de uma perícia dirigida a examinar a escrita das Demandantes...»;

8- Com data de 27.03.2014 foi proferida decisão arbitral no processoarbitral onde se concluiu: 1º Declarar a resolução do contrato de parceriacelebrado entre as partes e formalizado na constituição da sociedade E............, SA,devendo esta ser dissolvida e liquidada; 2° Condenar o demandado, segundo critériosde equidade, a pagar às demandantes a quantia de 8.600.000,00€ [oito milhões eseiscentos mil euros], a título de ressarcimento e indemnização pelos custos inerentes àexecução dos trabalhos de construção das quatro obras executadas e de outras obrasiniciadas e não concluídas, e pelos suprimentos realizados e não reembolsados, e juroscorrespondentes ao período de tempo decorrido; e a título de ressarcimento dos custosassociados ao redimensionamento da estrutura e demais custos suportados pelasDemandantes pelo facto do seu envolvimento na parceria; 3° julgar improcedentes ospedidos indemnizatórios deduzidos pelas demandantes a título de ressarcimento eindemnização por despesas de carácter operacional alegadamente suportadas porconta da sociedade E............ e por custos alegadamente suportados com estudos eprojectos, assim como a título de ressarcimento por lucros cessantes e perdas deganhos decorrentes do facto de não virem a ser executadas todas as obras inicialmenteprevistas no âmbito da parceria;

9- Consta da decisão o seguinte: «5.1 Pedido de realização de exame da escritadas demandantes: ...Na sequência do Despacho Saneador, o tribunal oficiou para que asociedade E............, SA, informasse se da sua contabilidade constam as facturas emcausa, ou, sendo caso disso, outras que tenham sido reemitidas em sua substituição. Aresposta obtida foi afirmativa. Este elemento foi para o tribunal suficiente para esclarecera questão no sentido de que, efectivamente as facturas em causa constam dacontabilidade da E............, SA, e que as facturas anuladas por motivo de IVA foram

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substituídas. Isto foi corroborado pelo depoimento das testemunhas ……… e ……….Durante a audiência de julgamento, o demandado pretendeu, entretanto, extrair dodepoimento de uma das testemunhas fundamento para abalar a credibilidade da provadocumental produzida, tendo vindo, nesse sentido, a juntar dois documentos e arequerer a audição de mais duas testemunhas. Essa pretensão foi, no entanto,indeferida pelo tribunal, por considerar que, tendo as testemunhas em causa sidooferecidas pelo demandado, ….tribunal considerou, assim, provado o alegado pelasdemandantes, de que as facturas juntas como documentos 7 a 11 com a resposta àcontestação, estão devidamente contabilizadas na sociedade E............ e que asfacturas emitidas pela requerente B………… que foram objecto de emissão de notas decrédito por forma a validar o seu correcto e adequado regime de IVA, foramposteriormente reemitidas e entregues na referida sociedade. E, portanto, que não haviafundamento que justificasse ordenar a realização de uma perícia dirigida a examinar aescrita das demandantes»;

10- Com data de 06.06.2014 reuniu-se a Assembleia Geral dasociedade E............, SA, tendo-se decidido pela dissolução, liquidaçãoe partilha dos bens da E............, SA [folhas 137 e seguintes].

III. De Direito

1. As sociedades ora recorridas «peticionaram» no «processoarbitral» - intentado ao abrigo do ponto 26.2 do «Acordo» que celebraram com o

Município de Barcelos em 08.06.2009 - que fosse reconhecido oincumprimento pelo demandado - MUNICÍPIO DE BARCELOS -das obrigações para si resultantes do Acordo de accionistas, decooperação técnica, económica e financeira - outorgado em 08.06.2009- na sequência da constituição da sociedade E............, SA, e opagamento dos danos resultantes do mesmo.

E, por via disso, visavam a resolução do contrato de parceria quefoi celebrado, e tinha sido formalizado através da constituiçãoda dita sociedade, a qual deveria ser dissolvida e liquidada,condenando-se o demandado a pagar-lhes a quantia global de18.389.818,00€ acrescida de juros vincendos desde a citaçãoaté seu integral pagamento - a «quantia global» peticionada desdobra-se em«custos de quatro obras efectivamente concluídas» [7.189.847,00]; «custos de obrasiniciadas mas não concluídas» [181.751,00€]; «suprimentos realizados e nãoreembolsados» [84.411,00€]; «despesas de carácter opcional realizadas por conta dasociedade E............, SA» [25.487,00€]; «custos com estudos e projectos»[164.350,00€]; «custos de estrutura» [3.403.471,00€]; e «lucros cessantes e perdas deganho» [6.320.731,00€].

Subsidiariamente pretendiam, agora ao abrigo do«enriquecimento sem causa», que o demandado lhes pagassea quantia global de 11.049.317,00€, igualmente acrescida dejuros vincendos desde a citação até integral pagamento.

O MUNICÍPIO DE BARCELOS, em reconvenção peticionou aresolução do contrato de parceria celebrado, mas porincumprimento das sociedades reconvindas.

Por decisão arbitral de 27.03.2014, foi determinada a resoluçãodo dito contrato de parceria, formalizado na constituição daE............, SA, devendo esta ser dissolvida e liquidada, bem como

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foi condenado o município, «segundo critérios de equidade», apagar às sociedades autoras a quantia global de 8.600.000,00€a título de ressarcimento e indemnização pelos custos inerentesà execução dos trabalhos de construção das quatro obrasexecutadas, e de outras iniciadas mas não concluídas, e pelossuprimentos realizados, e não reembolsados, e juros de moracorrespondentes ao período de tempo decorrido.

A mesma decisão arbitral «julgou improcedentes» os pedidosde indemnização relativos a despesas de carácter operacionalsuportadas por conta da sociedade «E............, SA», a custosrelacionados com estudos e projectos, e a lucros cessantes eperdas de ganhos decorrentes da não execução das obrasprevistas no âmbito da parceria.

2. Descontente com esta decisão arbitral, o MUNICÍPIO DEBARCELOS impugnou-a junto do TCAN, pedindo a sua anulaçãocom base no artigo 46º, nº3, alínea a) [ii], com referência aoartigo 30º, nº1 alíneas b) e c), da LAV, isto é, por alegadaviolação dos princípios fundamentais da igualdade detratamento e contraditório com influência decisiva na resoluçãodo litígio.

Por acórdão de 17.06.2016, o TCAN julgou improcedente essaimpugnação.

3. É deste acórdão judicial, do TCAN, que vem interposto opresente recurso de revista, e novamente pelo MUNICÍPIO DEBARCELOS.

Nele, são apontados ao acórdão do TCAN três «erros dejulgamento de direito», os dois primeiros relativos à decisão dasquestões sobre ilegitimidade das partes, e inidoneidade de umárbitro [ver conclusões 39ª a 63ª], e o terceiro sobre a questão daviolação dos princípios fundamentais da igualdade de tratamento econtraditório [ver conclusões 64ª a 105ª].

Avancemos, pois, na sua apreciação e decisão.

4. Alega o recorrente MUNICÍPIO DE BARCELOS que submeteuao tribunal arbitral a apreciação das excepções de ilegitimidadepassiva e activa, que foram, por ele, julgadas improcedentes.

Explica que, tanto no caso do preço devido pelas empreitadasexecutadas como no da prestação de suprimentos o directointeressado não é ele, município, mas a sociedade E............, SA.Razão pela qual deve ser absolvido da instância como partepassiva ilegítima [artigo 26º, 493º, nº2, do CPC].

E, ainda, que a eventual credora da obrigação de celebração

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dos «contratos de arrendamento» de equipamentos resultantesdas ditas empreitadas, bem como da «constituição de direitosde superfície» é a sociedade E............, SA, não as sociedadesautoras. Razão pela qual devem ser consideradas partesactivas ilegítimas [artigo 26º do CPC].

Uma vez que o TCAN decidiu não apreciar tais questões, sobreilegitimidade das partes, por entender que não integravam oelenco de «causas de anulação» da decisão arbitral constantedo nº3 do artigo 46º da LAV, defende o recorrente que estadecisão jurídica é errada.

Alega também, o município recorrente, que suscitou perante oTCAN, através de articulado superveniente, a questão da«inidoneidade» do árbitro por si nomeado [Dr. ………], e que, nessabase, solicitou a esse tribunal judicial a anulação da decisãoarbitral com fundamento no artigo 46º, nº3, alínea a) [iv], da LAV.

Uma vez que o TCAN não admitiu esse articuladosuperveniente, por considerá-lo extemporâneo, defende omunicípio recorrente que o mesmo deveria ter sido admitido, edeveria o TCAN diligenciar no sentido de esclarecer cabalmenteessa questão, dada a sua importância para um fair trail.

5. A questão da ilegitimidade das partes foi suscitada noprocesso arbitral pelo aí demandado - MUNICÍPIO DE BARCELOS - emostra-se decidida no despacho saneador nos seguintestermos [ver folhas 1015 a 1017 do processo arbitral]:

[…]

«Na contestação, alega o demandado que as demandantes pretendem,através da presente acção, responsabilizar o demandado por não tercelebrado contratos de arrendamento e assacar-lhe responsabilidadespor não ter constituído direitos de superfície, quando, a ser issoverdade, credora de tais obrigações não eram as demandantes, mas asociedade E............, SA. As demandantes não teriam, assim, interesseem demandar e, como tal, seriam parte ilegítima na formulaçãodaquelas pretensões.

Não lhe assiste, porém, razão.

Na verdade, o que as demandantes pedem, na presente acção, é queseja declarada a resolução do contrato de parceria celebrado entre aspartes e formalizado na constituição da sociedade E............, SA,devendo esta ser dissolvida e liquidada, e condenando-se o Município,por força do seu incumprimento do ACORDO, a pagar às requerentes aquantia total de 18.389.818 euros, acrescida de juros vincendos desdea citação até integral pagamento.

O pedido das demandantes sustenta-se, na verdade, na alegação deincumprimento, por parte do demandado, das obrigações por ele

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assumidas perante as demandantes no Acordo de accionistas, decooperação técnica, económica e financeira que, um e outrasformaram, com a sociedade E............, SA, e que esteve na base deuma relação de parceria que as demandantes pretendem verdissolvida.

É, por isso, manifesta a legitimidade das demandantes para apropositura da presente acção.

[…]

Na contestação, alega ainda o demandado que as demandantespretendem através da presente acção obter o pagamento de quatroempreitadas que alegadamente teriam realizado para a sociedadeE............ SA, assim como receber as quantias respeitantes à revisão depreços relativos àquelas empreitadas e, bem assim, os jurosalegadamente devidos pela mora do pagamento daquelas quantias. Porconseguinte, se quantias há que estão em dívida para com as autoras,tais quantias apenas à E............, SA, cometeria pagar, pelo que aacção deveria ter sido proposta contra esta entidade. Por outro lado, asdemandantes pretenderiam, também, ver devolvidas quantias queprestaram à E............ SA, a título de suprimentos o que tambémdeveriam exigir em acção proposta contra esta entidade, e não contra oMunicípio de Barcelos. O demandante não teria, assim, interesse emcontradizer a presente demanda, devendo, como tal, ser consideradoparte ilegítima.

Mas também quanto a este ponto não assiste razão ao demandado.

Com efeito, vimos já que o pedido deduzido pelas demandantes não sedirige a exigir o cumprimento de prestações a realizar pela sociedadeE............, SA. Como sintetizam no artigo 500º da resposta àcontestação, as demandantes, no essencial, alegam, na presenteacção, que o demandado não cumpriu as obrigações que sobre sialegadamente recairiam de [i] adquirir os terrenos alvo de intervenção eintegrá-los no domínio privado do Município; [ii] constituir direitos desuperfície sobre esses terrenos a favor da sociedade E............, SA, e[iii] celebrar com esta contratos de arrendamento sobre osequipamentos advenientes das obras executadas, pagando as rendasdevidas.

É nisto que se traduz o alegado incumprimento do ACORDO em que asdemandantes sustentam o seu pedido de resolução do contrato deparceria firmado com o demandado, e a correspondente indemnização.

Ora, sendo nestes termos que se configura a pretensão dasdemandantes, é manifesta a legitimidade passiva do demandado napresente acção».

[…]

Relativamente a esta questão da «ilegitimidade das partes», denovo suscitada pelo agora autor, MUNICÍPIO DE BARCELOS, emsede de impugnação da decisão arbitral, o TCAN, depois de

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citar os nºs 3, 4 e 9, do artigo 46º da LAV, e trechos de doisarestos do STJ [AC do STJ de 24.10.2006, Rº06B2366; e AC do STJ de

07.06.2011, Rº3442/07.7], julgou-a improcedente com estefundamento:

[…]

«No elenco do citado nº3 do artigo 46º não vem referida a apreciaçãodas excepções invocadas no processo arbitral. Como já referimos, asquestões que o tribunal pode conhecer em processo de anulação estãotaxativamente referidas no nº3 do artigo 46º, não constando do mesmoo conhecimento das excepções. Ou seja, não pode este tribunalsindicar a decisão recorrida quanto às excepções conhecidas uma vezque lhe está vedado tal conhecimento. Era estarmos a entrar no méritoda acção. […]. De acrescentar ainda que as excepções em causa foramconhecidas no despacho saneador não tendo o requerente deduzido deimediato oposição às mesmas nos termos do nº4 do artigo 46º paraagora poder vir a impugná-las».

[…]

E este julgamento está fundamentalmente correcto.

Na verdade, a sentença arbitral só pode ser anulada pelo tribunalestadual competente, diz o artigo 46º nº3 da LAV, com algum dosmotivos indicados nas suas alíneas. Isto significa que essesmotivos constituem causas de pedir, típicas e únicas, daimpugnação judicial do acórdão arbitral visando a sua anulação.

Ora, a consideração atenta dessas várias «causas de pedir»,leva-nos a concluir que todas elas se reportam à relaçãoprocessual de arbitragem, e não à relação substantiva aípleiteada, ou às suas decisões interlocutórias. E por via dissonão é permitido censurar, ou sindicar, no âmbito da impugnaçãodo acórdão arbitral - prevista no artigo 46º da LAV - o mérito tantoda decisão final como das decisões interlocutórias proferidas aolongo do processo.

Essa censura, e as questões que a densificam, apenas podeser feita no âmbito do recurso interposto da decisão arbitral finalpara o tribunal estadual, no caso, obviamente, dessa decisãofinal ser susceptível de recurso [ver artigo 39º, nº4, da LAV].

Deste modo, a decisão do TCAN, ora sob censura, estácorrecta. Mas dissemos, acima, fundamentalmente correcta poruma única razão. É que o nº4, do artigo 46º, da LAV, referidonessa decisão, não é chamado ao caso, pois não estamosperante qualquer desrespeito de disposição da LAV que as partespossam derrogar ou perante qualquer condição enunciada naconvenção de arbitragem.

E com este esclarecimento, é, assim, de manter a decisão do

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TCAN no tocante à questão da «ilegitimidade das partes»suscitada, novamente, pelo Município de Barcelos.

6. A questão da idoneidade do árbitro por si mesmo nomeado [Dr.

………] foi suscitada pelo ora recorrente - MUNICÍPIO DE BARCELOS -já no decurso desta acção impugnatória, através de umarticulado superveniente.

E foi a seguinte a decisão proferida, a respeito, pelo TCAN:

[…]

«O requerente veio, com o articulado de folhas 208 e seguintes,sustentar que ocorreram factos supervenientes e que levariam a queestivesse em causa também a idoneidade do árbitro por si nomeado,razão pela qual para além do alegado na petição inicial, devia oacórdão ser anulado com fundamento no disposto no ponto [iv] daalínea a) do nº3 do artigo 46º da LAV. Refere que no dia 1 de Julho de2014 recebeu um email do Dr. F…………, com timbre do escritório dasociedade de Advogados ………, ………, ……… e Associados,Sociedade de Advogados, sociedade esta a que pertencia o seu árbitro.O Dr. F………… desde 2008 que teria relações com as sociedadesA…………, SA, e B…………, SA. Teria entrado na sociedade deadvogados em causa em 2013. O facto de pertencer à sociedade deadvogados em que exerce também a advocacia o Dr. F…………, fazrecear pela independência e isenção do seu árbitro.

Em Agosto de 2014 o Município requerente solicitou informações aoseu árbitro sobre as relações existentes com o Dr. F………… [folha 225

dos autos], tendo recebido resposta a 4 de Setembro de 2014 [folha 227].

Os requeridos vieram responder ao articulado supervenientesustentando que o mesmo não é admissível porque deveria ter sidoapresentado na resposta às excepções, uma vez que foi o primeiroarticulado após o alegado conhecimento dos factos supervenientes.Vêm ainda sustentar que não procedem as alegações do requerentepor manifesta falta de fundamento.

Apreciando, desde já, este articulado superveniente, tem de se concluirque o mesmo não pode proceder.

De acordo com o nº6 do artigo 46º da LAV, as partes têm sessenta diaspara solicitar junto do tribunal estadual competente a anulação dadecisão arbitral. Ou seja, têm sessenta dias para deduzir osargumentos por que consideram que ocorreu alguma dasirregularidades referidas no nº3 do artigo 46º e que a proceder levam àanulação da decisão recorrida.

Ora, se assim é, se supervenientemente […] teve conhecimento dealgum facto, ou factos, que possam levar à anulação da decisão, temque ter o mesmo prazo para apresentação do articulado em causa. Éque, a não ser assim, então poder-se-ia dar o caso de que o requerenteestaria sempre em tempo para alegar factos supervenientes e quepudessem levar à anulação da decisão arbitral. Ora, não é esta a

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solução pretendida pela lei. De notar que no caso em apreço orequerente teve conhecimento dos factos supervenientes que vemalegar, e como refere, em 31 de Julho de 2014. Em Agosto do mesmoano pede esclarecimentos ao seu árbitro e recebe os esclarecimentosem Setembro de 2014. Apenas em 3 de Junho de 2015 [folha 207], vemapresentar articulado superveniente, devendo assim concluir-se, pelasrazões expostas, que o mesmo não é admissível».

[…]

Não obstante esta «conclusão», o TCAN acrescentou quemesmo que assim não fosse, a pretensão do requerente -veiculada no articulado superveniente - sempre teria de ser julgadaimprocedente. Analisou-a nesse sentido. Porém, a final,decidiu-se pela não admissão do articulado superveniente, e nãopela sua improcedência.

Como vemos, o Município de Barcelos, enquanto impugnante dadecisão arbitral, pretendeu, através de «articuladosuperveniente», acrescentar à causa de pedir inicial - violaçãodos princípios fundamentais da igualdade de tratamento e contraditório- uma outra, a alegadamente prevista no ponto iv), da alínea a),do nº3 do artigo 46º da LAV [A sentença arbitral pode ser anulada pelotribunal estadual competente se a parte que faz o pedido demonstrar que «Acomposição do tribunal arbitral ou o processo arbitral não foram conformes com aconvenção das partes, a menos que esta convenção contrarie uma disposição dapresente lei que as partes não possam derrogar ou, na falta de uma tal convenção, quenão foram conformes com a presente lei e, em qualquer dos casos, que essa

desconformidade teve influência decisiva na resolução do litígio»], com referênciaao que é disposto no artigo 9º, nº3, da mesma lei [Os árbitros devem

ser independentes e imparciais].

Fê-lo, mais de um ano após ter «apresentado» no tribunalestadual o pedido de anulação do acórdão arbitral, e cerca desete meses após ter juntado aos autos o seu articuladoresposta [ver folhas 2, 198 e 207 dos autos].

Como vimos, o TCAN considerou «inadmissível» aapresentação do «articulado superveniente», com ofundamento que consta do trecho transcrito do acórdão.

Decidiu bem, mas não pelas razões que apresenta.

Na verdade, a LAV não configura o meio processual em que setramita o pedido de anulação da sentença arbitral como acção,mas como «impugnação» [ver título do Capítulo VII da LAV], fixa-lhetramitação própria [artigo 46º nº2 da LAV], em que se prevê, a nívelde articulados, apenas o requerimento inicial com oferecimentode prova, oposição ao pedido com oferecimento de prova, aresposta a eventuais excepções por parte do requerente, aprodução de prova e, a partir daí, diz a LAV, «Segue-se a tramitaçãodo recurso de apelação, com as necessárias adaptações».

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O ETAF, no seu artigo 37º, alínea b), confere competência aostribunais centrais administrativos, mais concretamente àssecções de contencioso administrativo, para conhecer «Dosrecursos de decisões proferidas por tribunal arbitral sobre matérias decontencioso administrativo, salvo o disposto em lei especial».

Não há dúvida, pois, de que a lei, não apenas a LAV mastambém, no âmbito da jurisdição administrativa o ETAF, tratam aimpugnação da decisão arbitral «para o TCA» não como uma«acção», em que este tribunal funcionaria como primeiro graude jurisdição, mas como recurso de apelação, comparticularidades, é certo, mas em que o TCA funciona comosegundo grau de jurisdição. É isto, aliás, que vem sendoultimamente dito por este Supremo Tribunal [a título exemplificativo ver

AC STA de 08.09.2011, Rº0664/09; e AC STA de 13.10.2016, Rº0744/16], e é esteentendimento que subjaz, obviamente, ao recebimento dopresente recurso como «revista» pela formação prevista no nº5do artigo 150º do CPTA [ver ponto 3 do «Relatório» supra].

Aqui chegados, uma conclusão se impõe: configurando aimpugnação da decisão arbitral junto do TCA uma pronúncia em2º grau de jurisdição, com natureza de recurso de apelação,embora com particularidades resultantes da fixação legal de umafase própria, não se mostra admissível a possibilidade de nelaenxertar algo que é própria da acção tramitada em 1ª instância,como a junção de articulados supervenientes.

De todo o modo, sublinhe-se só a título complementar, factossupervenientes são tanto «os ocorridos posteriormente ao termo dosprazos marcados nos artigos precedentes [são os artigos relativos à

«contestação», «reconvenção», e «réplica»] como os factos anteriores de que aparte só tenha conhecimento depois de findarem esses prazos,devendo neste caso produzir-se prova da superveniência» [588º, nº2, do

CPC]. Ora, no presente caso, tendo o requerente tidoconhecimento dos pertinentes factos [folha 227 dos autos] antes daapresentação da resposta, e, por isso, antes do encerramentoda fase dos articulados, nunca seria possível estarmos perantefactos supervenientes quer no sentido objectivo quer no sentidosubjectivo.

Impõe-se confirmar, portanto, e por estas razões, a decisão denão admissão do articulado superveniente apresentado peloMUNICÍPIO DE BARCELOS. Torna-se inútil, assim, proceder àapreciação do restante conteúdo que a título subsidiário integra adecisão do TCAN.

7. Alega o MUNICÍPIO DE BARCELOS, e de formaparticularmente enfática, que o TCAN errou ao decidir que adecisão arbitral não violou os princípios fundamentais daigualdade de tratamento das partes e do contraditório [artigo 46º,

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nº3, alínea a) [ii], com referência ao artigo 30º, nº1 alíneas b) e c), da LAV].

Esta violação terá a ver com a decisão proferida pelo TribunalArbitral acerca do requerimento formulado pelo aí demandado -MUNICÍPIO DE BARCELOS - para que fosse ordenado o «exame àescrita das demandantes, nos termos do artigo 43º do CódigoComercial» [O artigo 42º do Código Comercial, sob a epígrafe de «Exibição judicialda escrituração mercantil», diz: «A exibição judicial da escrituração mercantil e dosdocumentos a ela relativos, só pode ser ordenada a favor dos interessados, emquestões de sucessão universal, comunhão ou sociedade e no caso de insolvência»; e oartigo seguinte, o 43º, sob a epígrafe de «Exame da escrituração e documentos», diz:«1- Fora dos casos previstos no artigo anterior, só pode proceder-se a exame daescrituração e dos documentos dos comerciantes, a instâncias da parte ouoficiosamente, quando a pessoa a quem pertençam tenha interesse ou responsabilidadena questão em que tal apresentação for exigida. 2- O exame da escrituração e dosdocumentos do comerciante ocorre no domicílio profissional ou sede deste, em suapresença, e é limitado à averiguação e extracção dos elementos que tenham relaçãocom a questão»].

Vejamos o surgimento e evoluir desta questão, recorrendo aorelato da mesma, feito pelo próprio Tribunal Arbitral, nodespacho saneador [ponto IV]:

[…]

«No termo da contestação […] o demandado requereu que asdemandantes fossem notificadas para proceder à junção aos autos dasfacturas com fundamento nas quais reclamam o pagamento das verbascorrespondentes às obras que alegadamente efectuaram. Na respostaà contestação, as demandantes juntaram essas facturas, comodocumentos nºs 7 a 11.

Em resposta, o demandado veio, no entanto, alegar que, em dataposterior à elaboração da contestação, veio a tomar conhecimento, noâmbito de inspecção fiscal realizada às demandantes, que as facturasrespeitantes aos trabalhos realizados, descritos nos presentes autos,vieram de facto a ser emitidas, e posteriormente anuladas através denotas de crédito. E, com esse fundamento, requereu exame à escritadas demandantes, nos termos do disposto no artigo 43º do CódigoComercial.

As demandantes responderam qualificando a diligência requerida comomeramente dilatória, com o argumento de que as referidas facturasestão todas devidamente contabilizadas e que as facturas emitidas pelarequerente B…………, que foram, efectivamente, objecto de emissãode notas de crédito por forma a validar o seu correcto e adequadoregime de IVA, foram posteriormente reemitidas e entregues nasociedade E............, SA.

E, de seguida, sempre em sede de saneador, o Tribunal arbitraldecidiu assim:

«Em face do alegado, o Tribunal considera não haver, pelo menos demomento, fundamento que justifique ordenar a realização de umaperícia dirigida a examinar a escrita das demandantes. Na verdade,

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apenas estão em causa as facturas juntas como documentos 7 a 11, e,em relação essas facturas, o que as demandantes alegam é que,mesmo na parte em que foram objecto de emissão de notas de crédito,elas foram posteriormente reemitidas e entregues na sociedadeE............, SA, pelo que constam da respectiva contabilidade. Afigura-se, por isso, mais útil e expedito oficiar para que a sociedade E............,SA, informe se da sua contabilidade constam as facturas em causa, ou,sendo caso disso, outras que tenham sido reemitidas em suasubstituição - possibilidade que o Tribunal submete, para pronúncia, àapreciação das partes. Entretanto, se até ao final da audiência dejulgamento, e nomeadamente na sequência do referido pedido deinformação à E............, SA, e da informação que venha a ser prestada,o Tribunal vier a encontrar fundamento sério para ordenar a realizaçãode qualquer outra diligência de prova, será então considerada apossibilidade, depois de ouvidas as partes» [volume II do PA, a folhas 1019].

Da acta da sessão de audiência de julgamento realizada peloTribunal Arbitral a 13.01.2014 [volume III do PA, a folhas 1613], consta oseguinte:

[…]

«De seguida, o Sr. Árbitro Presidente focou a questão pendente sobreas facturas enviadas pela B………… à E............, tendo dado a palavraaos ilustres mandatários das partes para que expressassem o seuentendimento sobre a questão.

No final da conversa com as partes, o Sr. Árbitro Presidente proferiu oseguinte despacho: O Tribunal indefere o requerimento de provapericial às contas das demandantes solicitada pelo demandado, porentender que ela não é necessária, face à prova produzida nos autos,para esclarecimento das questões pertinentes ao julgamento dacausa».

[…]

E, no acórdão arbitral, proferido a 27.03.2014, diz-se, a talrespeito, o seguinte [volume IV do PA, a folhas 1895 e 1896]:

[…]

«Na sequência do Despacho Saneador, o Tribunal oficiou para que asociedade E............, SA, informasse se da sua contabilidade constamas facturas em causa, ou, sendo caso disso, outras que tenham sidoreemitidas em sua substituição. A resposta obtida foi afirmativa.

Este elemento foi, para o Tribunal, suficiente para esclarecer a questãono sentido de que, efectivamente, as facturas em causa constam dacontabilidade da E............, SA, e que as facturas anuladas por motivode IVA foram substituídas. Isto foi corroborado pelo depoimento dastestemunhas ……… e ……….

Durante a audiência de julgamento, o demandado pretendeu,entretanto, extrair do depoimento de uma das testemunhas fundamentopara abalar a credibilidade da prova documental produzida, tendo

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vindo, nesse sentido, a juntar dois documentos e a requerer a audiçãode mais duas testemunhas. Essa pretensão foi, no entanto, indeferidapelo Tribunal, por considerar que, tendo as testemunhas em causa sidooferecidas pelo demandado, este não produziu prova de ter efectuadodiligências no sentido de poder apresenta-las e não ter conseguidofazê-lo, e que não se justificava proceder à respectiva audição, poriniciativa do Tribunal, por tal não se mostrar necessário para adescoberta da verdade quanto ao ponto em discussão.

O Tribunal considerou, assim, provado o alegado pelas demandantes,de que as facturas juntas como documentos nºs 7 a 11, com a respostaà contestação, estão devidamente contabilizadas na sociedadeE............, e que as facturas emitidas pela requerente B………… queforam objecto de emissão de notas de crédito por forma a validar o seucorrecto e adequado regime de IVA, foram posteriormente reemitidas eentregues na referida sociedade. E, portanto, que não haviafundamento que justificasse ordenar a realização de uma períciadirigida a examinar a escrita das demandantes».

[…]

O ora recorrente - MUNICÍPIO DE BARCELOS - insiste que foiilegalmente impedido pelo Tribunal arbitral de produzir a provapericial, consistente no exame à escrita das demandantes, nostermos do artigo 43º do Código Comercial, na medida em que esseimpedimento desrespeita os princípios da igualdade de tratamentode ambas as partes e o princípio do contraditório.

Explica que no domínio da produção de provas as partes devem terexactamente o mesmo tratamento, e que ele foi tratado demodo desigual relativamente às demandantes. É que, a estas,nunca foi imposta qualquer «limitação da prova a produzir»,enquanto ao demandado, «sem razão válida justificativa», otribunal indeferiu a produção da prova pericial de exame àescrita das demandantes.

Além disso, alega, o cumprimento cabal do princípio docontraditório exigia que o tribunal lhe permitisse produzir a provanecessária à defesa do seu argumento central, precisamente odo questionamento dos valores das obras alegadamenteexecutadas pelas demandantes para a sociedade E............, SA[7.189.947,00€ - referente a custos das obras, revisão de preços, e juros devidos pela

mora no seu pagamento], uma vez que a anulação das facturas e asubsequente emissão das notas de crédito lhe suscita dúvidassobre a correcção dos valores facturados.

8. O TCAN, no acórdão ora recorrido, julgou improcedente estaquestão.

Argumentou que «No que se refere à violação do princípio daigualdade, não vemos como possa o mesmo ter sido violado. As partestiveram a mesma oportunidade de discutir os meios de prova e

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pronunciarem-se sobre os mesmos. Não é pelo facto de,fundamentadamente, se ter indeferido um meio de prova, como seja opericial, que se pode concluir que foi violado o princípio da igualdadedas partes.

[…]

«Por seu lado, no caso em apreço, a decisão arbitral determinou aindemnização a pagar pelo requerente através da equidade. Ou seja,as facturas em causa, apesar de relevantes, porque foram um ponto departida para a decisão, não podem ser consideradas como a únicafonte em que os árbitros se fundamentaram para decidir comodecidiram. Aliás, é referido na decisão arbitral que se consideram osmontantes referidos nas facturas como excessivos. Ou seja, oindeferimento da perícia, até porque as facturas não foram elementodecisivo e único para a decisão em causa, não pode acarretar eventualviolação dos princípios do contraditório e da igualdade das partes, atéporque esse indeferimento não pode ser associado a uma eventualinfluência decisiva na causa».

[…]

9. Os artigos da LAV chamados à colação para resolver estaquestão são estes:

Artigo 30º - sobre os «Princípios e regras do processo arbitral» - «1- O processoarbitral deve sempre respeitar os seguintes princípios fundamentais: a)O demandado é citado para se defender; b) As partes são tratadas comigualdade e deve ser-lhes dada uma oportunidade razoável de fazeremvaler os seus direitos, por escrito ou oralmente, antes de ser proferida asentença final; c) Em todas as fases do processo é garantida aobservância do princípio do contraditório, salvas as excepçõesprevistas na presente lei. 2- As partes podem, até à aceitação doprimeiro árbitro, acordar sobre as regras do processo a observar naarbitragem, com respeito pelos princípios fundamentais consignados nonúmero anterior do presente artigo e pelas demais normas imperativasconstantes desta lei. 3- Não existindo tal acordo das partes e na falta dedisposições aplicáveis na presente lei, o tribunal arbitral pode conduzira arbitragem do modo que considerar apropriado, definindo as regrasprocessuais que entender adequadas, devendo, se for esse o caso,explicitar que considera subsidiariamente aplicável o disposto na lei querege o processo perante o tribunal estadual competente. 4- Os poderesconferidos ao tribunal arbitral compreendem o de determinar aadmissibilidade, pertinência e valor de qualquer prova produzida ou aproduzir. […]».

Artigo 46º - «Pedido de anulação» - «[…] 3- A sentença arbitral só pode seranulada pelo tribunal estadual competente se: a) A parte que faz opedido demonstrar que: […] ii) Houve no processo violação de algunsdos princípio fundamentais referidos no nº1 do artigo 30º com influênciadecisiva na resolução do litígio; […]».

Do citado artigo 30º, mormente dos seus nºs 2, 3 e 4, ressumaque o processo arbitral, não obstante decorrer sob os signos da

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flexibilidade e da informalidade, está imperativamente sujeitoaos princípios da igualdade e do contraditório, que se mostramessenciais para a manutenção das dimensões inalienáveis dodireito de acesso aos tribunais e ao processo equitativo. É queo acesso à justiça exige também que o processo a que seacede dê garantias de justiça.

Por isso, a violação de qualquer desses princípiosfundamentais constitui «causa de pedir» da impugnação dasentença ou acórdão arbitral, nos termos do citado nº3 do artigo46º da LAV.

O princípio da igualdade - consagrado no artigo 13º da CRP - impõe otratamento igual das «situações de facto iguais», e o tratamentodiverso das «situações de facto diferentes». Não proíbe que sefaçam distinções, proíbe, sim, as discriminações ou o arbítrio,isto é, proíbe diferenças de tratamento «sem fundamentomaterial bastante», sem «qualquer justificação razoável».

Igualdade processual significa, portanto, um tratamento nãodiscriminatório das partes, de modo que qualquer delas não seveja impedida, sem fundamento, de exercer um direito legítimo.

Em sede processual, é dada ao tribunal a incumbência depromover a igualdade substancial entre as partes no processo[artigos 6º do CPTA e 4º do CPC], as quais devem «gozar de estatutoprocessual idêntico sempre que a posição no processo sejaequiparável», e beneficiar de «idênticas oportunidades paraalcançarem uma justiça substancial, traduzida na justa composição dolitígio, em conformidade com o direito aplicável e com a realidade dosfactos, apurada no processo sem restrições ou limitações indevidas»[Lopes do Rego in Comentário ao Código de Processo Civil, 2ª edição, 2004, página36].

O princípio do contraditório - também de cariz constitucional, enquantointegrador do princípio do Estado de direito democrático e do acesso à justiça [artigos 2º

e 20º da CRP] - é também princípio estruturante do processo, etraduz-se, fundamentalmente, no direito de a parte, em qualquerfase do processo, «influenciar a decisão» [artigo 3º do CPC], e, noplano da prova, «exige que às partes seja, em igualdade, facultada aproposição de todos os meios probatórios potencialmente relevantespara o apuramento da realidade dos factos [principais e instrumentais] dacausa […]» [José Lebre de Freitas, in Introdução ao Processo Civil, 1996, páginas 98

e 99].

O direito à prova surge, assim, como uma «dimensãoineliminável do direito ao processo equitativo», que, por seuturno, constitui parte integrante do princípio material daigualdade. E densifica-se no «direito de oferecer e produzirprovas, controlar as provas do adversário, e discretear sobre o

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valor de umas e outras, nos termos previstos na lei».

Mas o «direito à produção de prova» não implica que, sob penade sair violado o princípio do contraditório, devam ser sempreadmitidas pelo respectivo julgador todas as diligências de provarequeridas pelas partes e permitidas pelo direito. E isto está bempatente, em sede de «processo arbitral», no citado nº4 do artigo30º da LAV. Mostra-se possível, pois, introduzir limitações aesse direito, desde que não sejam arbitrárias oudesproporcionadas, e se mostrem justificadas pelodesenvolvimento e teor do caso concreto.

Do ponto citado da alínea a) do artigo 46º da LAV, emerge,também, o princípio da essencialidade, que no caso se traduz naexigência de que a violação dos ditos princípios fundamentaisinterfira de forma decisiva ou determinante «na decisão doobjecto da causa». Só esta violação, assim relevante, podeconstituir «causa de anulação da sentença arbitral».

10. Como vemos, a questão cuja apreciação foi suscitada esobre a qual recaiu a decisão recorrida, surge pelo facto de, nodecurso do processo arbitral, ter sido indeferido, nos termossupra relatados, um pedido de produção de prova - exame à escrita

das demandantes «nos termos do artigo 43º do Código Comercial» - formuladopelo Município demandado, visando, em sede de contraprova,abalar os valores documentados em facturas apresentadaspelas demandantes e relativas a obras executadas.

No acórdão arbitral [ponto 8 da resposta ao «Guião de Prova», volume IV do PA,

a folhas 1902], diz-se a propósito dos respectivos «factos» - «Custosdas quatro obras efectivamente concluídas [incluindo o respectivo valor, a revisão de

preços, e os juros moratórios vencidos], que ascendem a 7.189.847,00€» - e sua«prova», o seguinte:

[…]

«As demandantes juntaram aos autos facturas respeitantes a essasobras [ver documentos nºs 7 a 11, juntos com a resposta á contestação]. Estetribunal já se pronunciou sobre as questões suscitadas a respeitodestas facturas. E a verdade é que o respectivo valor corresponde aodos orçamentos que, como vimos em resposta ao quesito anterior, bemmais do que meros orçamentos, parecem ter envolvido a assunção,pelas partes, do preço a pagar pelas obras em causa, sem prejuízo deulterior acerto de contas nas obras seguintes [ver acta do Conselho deAdministração da E............, SA, de 02.09.2010, documento nº15 junto com a petiçãoinicial]. O referido valor deve ser, por isso, adoptado como ponto dereferência para a determinação do montante dos custos da realizaçãodas quatro obras executadas, embora sem deixar de se reconhecer queas próprias partes reconheceram que ele era excessivo, pelo quedeveria ser compensado em obras subsequentes».

[…]

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A causa submetida ao Tribunal Arbitral foi decidida segundo aequidade, por isso mesmo os valores constantes das facturasforam por ele usados - como diz o acórdão - «como ponto de referênciapara a determinação do montante dos custos…». E a verdade é quea constatação da natureza da decisão arbitral, que partiu dodireito positivo, sim, mas o ultrapassou mediante apelo acritérios de razoabilidade e bom senso, relativiza, também, oextremo rigor de contas que o demandante pretende obter como exame à escrita das sociedades demandantes, feita nostermos do artigo 43º do Código Comercial. É que não podemosolvidar que os valores se referem a obras efectivamenteexecutadas, orçamentadas, facturadas, e mais, a valores que jáestiveram sob o crivo de uma inspecção fiscal que levou,inclusivamente, à substituição de algumas das facturas pornotas de crédito.

Compreende-se, pois, que o Tribunal Arbitral, depois de nodespacho saneador ter relegado a decisão definitiva sobre apertinência da produção da prova pericial em causa para depoisde receber a «informação» a solicitar à E............ SA, sobre aspertinentes facturas, e só no caso de encontrar fundamento sériopara o efeito, tenha decidido - em face dos «documentos» juntospor essa sociedade, e dos vários depoimentos de testemunha queesclareceram dúvidas sobre a razão da anulação de algumas dasfacturas - na última sessão do julgamento, «indeferir»fundamentadamente o requerimento de exame à escrita dasdemandantes.

O exercício deste poder de indeferimento mostra-seperfeitamente enquadrado no âmbito do nº4 do artigo 30º daLAV, e não se traduz, cremos, numa decisão ao arrepio dosprincípios da igualdade de tratamento das partes econtraditório.

Desde logo, porque não se vislumbra no processo arbitral, nemo ora recorrente a invoca, qualquer situação factual igual a estamas referente às demandantes. E tanto basta para que nãopossa funcionar, no caso, a exigência de tratamento igualreclamada pelo Município demandado. Se o Tribunal Arbitraladmitiu todas as provas, documentais e pessoais, solicitadaspelas demandantes, e indeferiu a dita prova pericial solicitadapelo demandado, fê-lo ao abrigo do poder que lhe é concedidopor lei [artigo 30º nº4 da LAV], norteado pela necessidade e pelapertinência de produção da prova, em situações que apenassão iguais enquanto pretensões probatórias.

Não se constata, neste procedimento, qualquer laivo dediscriminação ou arbítrio por parte do Tribunal Arbitral. O diferentetratamento que o recorrente esgrime mais não é do que o

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exercício do poder do Tribunal Arbitral, quanto à admissão deprovas, exercício esse alicerçado em «fundamento materialbastante e numa justificação razoável». Não se mostrandonecessária e pertinente para a decisão da causa o exame àescrita das demandantes [artigo 43º do Código Comercial], não pode odemandado, a todo o custo, querer produzir esse tipo de prova -inutilia truncat. Certamente que poderia discordar da apreciaçãofeita pelo Tribunal quanto a tal necessidade e pertinênciaatravés de recurso da respectiva decisão, se houvesse lugar aele, o que não pode é distorcer a situação para a violação daigualdade e do contraditório.

Em jeito de resumo, diremos que não resulta do caso que tenhahavido alguma discriminação, do aí demandado, na aplicaçãodas regras de produção de prova. Nem que, no mesmocircunstancialismo, tenha sido deferida igual pretensão das aídemandantes, e que, portanto, se utilizaram regras diversassem justificação.

Além disso, há a essencialidade da invocada omissão de prova.Esta há-de aferir-se à luz de um juízo de prognose póstuma:perante a perspectiva de saber se o novo acórdão, decorrenteda anulação deste primeiro - para cumprimento da produção da prova

omitida - seria ou não susceptível de favorecer quem pediu aanulabilidade. Ou seja, saber se, caso o exame à escrita dasdemandantes fosse realizado, se deverá admitir, como plausívelou provável, a modificação da decisão da questão de facto, e,consequentemente, a alteração da decisão final da causaarbitral.

Ora, atendendo à já salientada natureza da decisão - proferidasegundo a equidade - e aos contornos assentes do caso, que nosdizem que as obras em causa foram executadas e que osvalores reclamados - relativos a custos, a revisão de preços e a juros de mora -não foram pagos e correspondem aos acordados pelas partes,é certo que não se perspectiva como plausível, ou provável,qualquer alteração da dita decisão final arbitral.

11. Resulta do que deixamos exposto, que deverão ser julgadasimprocedentes as várias questões suscitadas pelo recorrente,e, em conformidade, ser negado provimento a este recurso derevista, com a manutenção do acórdão recorrido.

Assim se decidirá.

IV. Decisão

Nestes termos, decidimos negar provimento a este re curso derevista, e, em conformidade, manter na ordem jurídi ca o acórdãorecorrido.

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Custas pelo recorrente.

Lisboa, 20 de Junho de 2017. – José Augusto Araújo Veloso(relator) – Ana Paula Soares Leite Martins Portela – Jorge ArturMadeira dos Santos.

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