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A navegação consulta e descarregamento dos títulos inseridos nas Bibliotecas Digitais UC Digitalis, UC Pombalina e UC Impactum, pressupõem a aceitação plena e sem reservas dos Termos e Condições de Uso destas Bibliotecas Digitais, disponíveis em https://digitalis.uc.pt/pt-pt/termos. Conforme exposto nos referidos Termos e Condições de Uso, o descarregamento de títulos de acesso restrito requer uma licença válida de autorização devendo o utilizador aceder ao(s) documento(s) a partir de um endereço de IP da instituição detentora da supramencionada licença. Ao utilizador é apenas permitido o descarregamento para uso pessoal, pelo que o emprego do(s) título(s) descarregado(s) para outro fim, designadamente comercial, carece de autorização do respetivo autor ou editor da obra. Na medida em que todas as obras da UC Digitalis se encontram protegidas pelo Código do Direito de Autor e Direitos Conexos e demais legislação aplicável, toda a cópia, parcial ou total, deste documento, nos casos em que é legalmente admitida, deverá conter ou fazer-se acompanhar por este aviso. A Tributação do Comércio Electrónico Autor(es): Pinto, Adérito Vaz Publicado por: Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra URL persistente: URI:http://hdl.handle.net/10316.2/24803 Accessed : 25-Jun-2020 10:07:08 digitalis.uc.pt impactum.uc.pt

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A navegação consulta e descarregamento dos títulos inseridos nas Bibliotecas Digitais UC Digitalis,

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A Tributação do Comércio Electrónico

Autor(es): Pinto, Adérito Vaz

Publicado por: Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra

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BOLETIM DE CIÊNCIAS ECONÓMICAS

COIMBRA

UNIVERSIDADE DE COIMBRAFACULDADE DE DIREITO

VOLUME XLV 2 0 0 2

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A TRIBUTAÇÃO DO COMÉRCIO ELECTRÓNICO 379

A TRIBUTAÇÃODO COMÉRCIO ELECTRÓNICO

“Não é possível que o homem dos nossos diasacredite no Estado em que vive, nem contribua comlealdade e diligência no levantamento dos encargos públi-cos, se a Administração não submeter rigorosamente osseus actos fiscais a uma ordem jurídica que inspire segu-rança nas suas relações com as economias privadas.Quantas vezes a fraude não é senão uma rude e amargareacção para com um estado em que se perdeu a fé?”

BAJUNDA, Fernando Sains de, Os impostos, Editora Salvat deGrandes Temas, Barcelona, 1979, p 33.

1. INTRODUÇÃO

Um tema como o que nos propomos a tratar tem avantagem de “ser novo” e o inconveniente de ser escassaa bibliografia disponível. Dentro da regulação tributária docomércio por via da Internet apenas abordaremos as impo-sições e dentro destas especificamente os impostos sobreo consumo (nomeadamente IVA) e sobre o rendimento.

Comércio electrónico (ou e-comerce), como se refereno Livro Branco para o Comércio Electrónico em Portu-gal, são “todas as formas de transacção comercial que envol-vam organizações ou indivíduos, baseadas no processamentode dados por via electrónica”. No nosso país serão já 10mil as empresas (2,6% das PME) a colocar os seus produ-tos no mercado por esta via, segundo a mesma fonte.

Sendo uma forma virtual de negociar, atinge já umadimensão considerável; Apenas no segmento B2B (comércio

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electrónico entre empresas), estima-se que o volume denegócios se situe no final do corrente ano em 919 biliõesde dólares. No ano 2005, esse volume deverá atingir 8,5triliões de dólares. Estima-se igualmente que sejam já 50milhões os utilizadores regulares da rede para fins comer-ciais1. As trocas por meio de Internet constituem uma novamaneira de negociar que se deve analisar em diversos pla-nos ou segmentos e onde tudo é negociável: casas, car-ros, livros, discos, serviços financeiros, jurídicos, seguros,“know-How”, software, viagens... A questão que se devecolocar é saber-se se as trocas por meio de Internet cons-tituem um facto gerador de incidência impositiva. Talcomo se define na Resolução n.º 94/99 do Conselho deMinistros, fiscalmente, estas transacções devem equiparar-se às tradicionais pelo que as normas e princípios de inci-dência, lançamento, liquidação e cobrança lhe são aplicá-veis. Numa primeira aproximação, o fenómeno impositivoestá associado ao conteúdo da informação e não varia sóporque se transacciona por este meio. Assim, a compra evenda em loja de um livro tributado em IVA, será igual-mente tributado na encomenda electrónica e recepção porcorreio. O mesmo se passará na venda do direito de con-sultar o conteúdo do livro “on-line”? A resposta numa pri-meira aproximação parece dever ser positiva, ficando emaberto o problema da forma de tributar e métodos de con-trolo. Ainda numa primeira aproximação, a imposição nãoestá ligada ao suporte, seja ele papel, CD-rom ou o “bit”,mas ao conteúdo em si.

Não obstante, entre os meios de negociar tradicio-nais e virtuais, havendo analogias há igualmente diferençasque começam pela grande desmaterialização de documen-tos, conteúdos e riqueza bem como a inerente dificuldade________________________

1 Dados recolhidos em ROCHA, Paulo, “Internautes comprammais na Web”, Revista Exame Digital, ano II, ed. 17, 15 Fev., Netcie,S. Paulo, 2001.

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de controlo. Sendo uma característica do Estado o exer-cício efectivo do poder tributário como condição de sobe-rania, em face da crescente democratização da Internet econsequente alargamento do volume de trocas, teme-se aperda de controlo dessa capacidade de arrecadação.

Nestas comunicações há que destacar dois planos. Porum lado há a prestação de um serviço de telecomunicaçõese por outro há o conteúdo dessas comunicações. O for-necimento do acesso à comunicação remota e transferên-cia de dados entre dois terminais ligados à linha telefónica,é em si um facto gerador; trata-se de uma prestação deserviços de telecomunicações (anote-se que se encontra emestudo a viabilidade tecnológica de essa transmissão se fazertambém por cabos eléctricos, por via hertziana e via saté-lite). Aqui o facto gerador está associado a uma actividadeempresarial, a saber, ao fornecimento de tecnologia e ser-viço telefónico, mas não ao conteúdo e volume da trans-missão. O objecto do nosso estudo não incide sobre estefenómeno, mas apenas sobre os conteúdos negociais quese celebram na rede: compras e vendas, arrendamentos, alu-gueres, mútuos, empreitadas, etc. Estes podem assumir duasformas: Uma em que a Internet apenas serve como canalde negociação, conclusão e/ou pagamento do contrato se-guindo-se-lhe uma remessa física (a venda do livro comremessa à cobrança) ou em que o fornecimento do bemse efectua pela própria rede (a venda de um software queé descarregado directamente de um “web site” onde nãohá qualquer materialidade).

2. A ORIGEM E EVOLUÇÃO DA REDE

Aquilo que hoje se designa por Internet, é um sistemamundial de comunicações sem dono, totalmente aberto,que usa como meio de transmissão de dados entre termi-

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nais as linhas telefónicas, proporcionando um conjunto ili-mitado de multiligações a um número aberto de pessoasligadas em rede que comunicam a um custo reduzido, inde-pendentemente da distância2.

Nos Estados Unidos, nos anos 60, no auge da guerrafria, criou-se a ARPA – Advanced Research ProjectsAgency. Tratava-se de um grupo de investigação encarre-gado de conseguir um sistema de comunicação remotoentre terminais de computador a partilhar por estabeleci-mentos de ensino e investigação e como forma de diver-sificar os meios de comunicação militares caso os existentesfossem destruídos por um ataque do bloco de leste. A pri-meira comunicação em rede ocorreu em 1969 e ligou qua-tro computadores em pontos geográficos diferentes. A demo-cratização da rede exigia “auto-estradas” difundidas e elasjá existiam – as linhas telefónicas. Na altura, como aindahoje cada computador pode falar uma língua diferente dosdemais. Criou-se então um aparelho a colocar entre ocomputador e a linha telefónica que comuta a linguagemanalógica das linhas telefónicas em linguagem digital queo computador entende nos “inputs” e o contrário nos“outputs”. É essa a função dos modems (modeladores/des-modeladores).

A evolução passou nos anos 70 e 80 pela criação deredes autónomas em escolas, edifícios até à altura em queestas sub-redes foram ligadas entre si – daí que a Internetseja uma rede de redes.

A circulação da informação tem por base algoritmosde encaminhamento que funcionam como um endereçoe algoritmos de transmissão aos quais cabe transportar amensagem desde o ponto de emissão até ao destino que-rido, procurando o caminho mais curto e eficiente, repar-________________________

2 Definição desenvolvida a partir da apresentada em http://FEDE-RAL NETWORKINS COUNCIL, www.i-biznet.com.br/intg/intg20000930153406.aspconsultada a 7 de Junho de 2001 às 10h30.

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tindo e encaminhando cada parte da mensagem por canaisdiferentes se for caso disso(sistema de comunicação porpacotes)3.

A rede atravessa fronteiras geográficas, sociais e polí-ticas, permitindo a circulação da riqueza desmaterializadade um qualquer ponto do mundo para outro instantanea-mente. As vantagens económicas apresentadas são vastas,desde o baixo custo de comunicação, redução nos custosde produção e armazenagem, maior eficiência na gestãode stocks, abolição de intermediários, etc. Também apre-senta problemas: a segurança e confidencialidade dos dadosintroduzidos no sistema, fiabilidade nos meios de paga-mento, protecção dos direitos de autor (alguns destes pro-blemas já encontram resposta na UE no âmbito da Direc-tiva 2000/31/CE a ser transposta até 17 de Janeiro de2003 pelos Estados Membros), fuga às imposições.

A vertente comercial da rede enquanto meio que per-mite colocar produtos no mercado surge a partir de 1989.

3. A NOVA FORMA DE NEGOCIAR

O homem, ser social por natureza, carece de viverorganizadamente por imperativos de convivência, sobrevi-vência e desenvolvimento; essa necessidade tem o seu custo.No passado liberal reduzia-se às valências de organizaçãodas estruturas comunitárias, de defesa e justiça. Alargaram-se entretanto e continuam a alargar-se à medida que seenriquece o conceito de bem estar, fértil em necessidadesque se entende dever ser o estado a satisfazer. Este só o

________________________

3 BRUNNER, Laurel e JERETIC, Toran, Internet para principiantes,publicações D. Quixote, Lisboa, 1998, pp 4 a 52 e também em www.i-biznet.com.br/intg/intg20001003220914.asp consultada a 7 de Junho de2001 às 11H00.

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pode fazer aumentando as receitas, sendo certo que o im-posto pode ter outras finalidades tais como indução decomportamentos, redistribuição da riqueza (a extrafiscali-dade)4.

A fiscalidade é por isso a base da soberania das nações;sem receitas o Estado não pode pôr em prática as suaspolíticas.

A Internet, podendo ela própria ser um negócio ésobretudo um canal de negócios, uma forma de colocarprodutos no mercado. Não se sobrepõe à “velha econo-mia”, pois não substitui as fabricas e indústrias. Abre ape-nas um vasto mercado onde os operadores económicos seencontram e transaccionam.

O termo comércio electrónico é amplo. Abrange dife-rentes modelos ou segmentos de negociação, consoante acategoria dos operadores em presença e o sentido das tran-sacções que se efectuam. Fala-se assim em:

B2B – Business-to-BusinessB2C – Business-to-ConsumerB2E – Business-to-EmployeeB2A – Business-to-AdministrationA2B – Administration-to-BusinessC2B – Consumer-to-BusinessC2C – Consumer-to-Consumer, etc5

Os problemas fiscais são diferentes consoante o seg-mento em causa, pelo que não pode ser objectivo destamonografia esgotar o tema. Essencialmente debruçar-nos-emos sobre as vertentes B2B e B2C.________________________

4 MESTRES, Magin Pout, Os impostos, Editora Salvat de Gran-des Temas, Barcelona, 1979 pp 8 a 31.

5 ANTUNES, Francisco, “Comércio Electrónico: Ter valor...ounão ter nada”, Infoeuropa – Boletim informativo do Euro Info CentreAlgarve, nº 33 – ed. Especial, dezembro, 2000, p 16.

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Se por um lado o estado de evolução da comuni-dade internacional exige cada vez mais políticas fiscais con-certadas, a base do problema reside em que esta rede deredes não tem uma entidade que a controle, nem o sis-tema de circulação da informação permite um controlo efi-caz; não tem um dono, nem um regulador, não conhecebarreiras físicas, elimina intermediários que antes se inter-punham entre operadores; a desmaterialização da riquezae documentos vem colocar novos desafios às administra-ções tributárias pois uma das consequências do comércioelectrónico é desde logo a dificuldade em controlar as tran-sacções e determinar o estado credor do imposto.

4. O DIREITO DA ELECTRÓNICA

A regulamentação fiscal do comércio electrónico insere--se numa realidade mais vasta que hoje é, senão já umramo de direito instituído, pelo menos em emergência –o Direito das Telecomunicações e como sub-ramo deste,temos o direito da electrónica. Como já se disse, os supor-tes electrónicos estão a levar a níveis nunca vistos adesmaterialização da riqueza. Tanto que com o acesso aocomputador o trabalho da Administração fiscal cada vezdeixa mais de ser uma actividade burocrática e inspectivade documentos para ser substituída por pedidos de acessoa bases de dados.

Do direito electrónico com relevância fiscal é impor-tante referir o DL 290-D/99 de 2 de Agosto relativo àValidade, Eficácia e Valor Probatório de Documentos Elec-trónicos e Assinatura Digital; Lei n.º 67/98 de 26 de outu-bro – Lei de Protecção de Dados Pessoais e DL 375/99de 18 de Setembro que define o Regime Aplicável à Fac-tura Electrónica e sua equiparação com a de papel. Háainda a assinalar as Resoluções do Conselho de Ministros

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n.º 115/98 de 1 de Setembro que criou a Iniciativa Na-cional para o Comércio Electrónico e nº 94/99 de 25 deAgosto que desenvolveu e actualizou a anterior. NestasResoluções estabelecem-se os princípios gerais de regula-mentação desta forma de comerciar. Aí se define que aintervenção do Estado tem caracter subsidiário em relaçãoà iniciativa privada à qual cabe desenvolver o e-comerce aomesmo tempo que aponta alguma legislação que carece deser reformulada nomeadamente quanto à protecção do con-sumidor, protecção de dados, etc.

Em matéria fiscal consagrou três grandes princípiosorientadores transpondo o que já se fixou internacional-mente no âmbito da OCDE, a saber:

1. Princípio da neutralidade no sentido de que qual-quer transacção electrónica é tributada de igual forma quea transacção tradicional em loja. Proíbe qualquer tratamentopositivo ou negativo excepcional. No entanto, como setrata de um meio global de fazer negócios, qualquer legis-lação a adoptar terá que assentar na cooperação interna-cional sob pena de se criarem duplas tributações ou fenó-menos de concorrência fiscal, distorcendo o mercado. Paraque a neutralidade seja absoluta exige métodos de com-bate à evasão eficazes.

A neutralidade implica não só a tributação igual docomércio electrónico incluindo ao nível dos controlos adua-neiros, mas também a proibição de se criarem novos im-postos (tais como sobre a quantidade de bits transmitidos)6.

2. Princípio da Subsidariedade ou intervenção residualdo Estado que se reflecte em evitar excesso de regulamen-tação e consequentemente permitir um rápido floresci-mento deste canal de negócios. Minimizar as restrições tem________________________

6 ALTAMIRO, Alejandro, “La tributación Directa ante el comer-cio electrónico y la fiscalización de las operaciones desarrolladas a tra-vés de Internet”, Revista de Ciencia e Técnica Fiscal, nº 397, Lisboa, 2000,pp 43 e 44.

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sido também a palavra de ordem internacional. No âmbitoda OMC e do seu antecessor (GATT) discute-se sobre asupressão de todas as barreiras à circulação comercial o quenos leva a uma curiosa conclusão: é que se por um ladoos Estados proclamam querer eliminar progressivamente asbarreiras alfandegárias, por outro essas barreiras são neces-sárias não só para obter receitas como fundamentalmentepara proteger os produtores internos no caso de estes seremmenos concorrenciais.

3. Principio da prevalência da substância sobre a formao que faz entrar em crise os conceitos clássicos dos requi-sitos de forma dos contratos. Para efeitos fiscais conta oconteúdo material do negócio e não a denominação quelhe foi atribuída pelas partes.

5. A REGULAMENTAÇÃO INTERNACIONALQUE EXISTE

As transacções pela Internet, além de terem que sediferenciar quanto aos segmentos também se diferenciamquanto ao seu caracter geográfico. Nas transacções inter-nas o problema que se põe é apenas de fiscalização; se atransacção é internacional, se aumentam as dificuldades defiscalização também é preciso saber com exactidão comoe onde deve ocorrer a tributação. É neste âmbito que secolocam novos desafios aos critérios de tributação docomércio internacional definidos desde de 1947 no seiodo GATT. No âmbito dos tratados de Marraqueche queconcluíram o Uruguai Roud em 1994 o comércio elec-trónico ficou com tratamento equivalente à contratação àdistância7. Bem se vê qual a fragilidade desta construção:________________________

7 GOYOS, Duval de Noronha, A regulamentação internacional docomercio electrónico in www.noronhaadvogados.com.br/art39dtp.htm consultadoa 25 de Maio de 2001 às 15H00.

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a eficácia da regulamentação das “vendas à distância” exigeuma entrega material; não se previu a expansão das tran-sacções a bens intangíveis tais como o “download” de umsoftware directamente da Internet, de música, de livros, fil-mes, tecnologia, serviços financeiros, de acessoria e acon-selhamento, consultoria jurídica, etc, etc, em que o paga-mento pode ser igualmente electrónico. São situações quenão se enquadram na regulamentação das “vendas à dis-tância” e sobre as quais há um vazio legal na legislaçãofiscal. É esta “desregulamentação” que, atendendo àtipicidade das normas fiscais, impede inclusivamente a suaaplicação analógica e inviabiliza a tributação; e é nestasituação que nos encontramos hoje, plasmada numa decla-ração de 1997 da OMC onde se afirma que a título tran-sitório se opta por não tributar as transacções electrónicasde bens imateriais8, posição reafirmada na ConferênciaMinisterial de Seatle (EUA) na Ronda do Milénio, talcomo já se antevia num documento de 1998 do Comitéde Assuntos Fiscais da OCDE argumentando-se que o livrecomércio pela Internet é condição da própria expansão darede.

Esta situação é do interesse dos países desenvolvidosmas conta com a oposição do mundo subdesenvolvido semque tenha merecido vencimento. É uma opção deliberadaque se justifica por impossibilidade prática de fiscalizaçãoe como estímulo ao crescimento do e-comerce e que semanterá pelo menos até à próxima reunião da Conferên-cia Ministerial. A regulamentação internacional cinge-se porisso às questões obrigacionais, documentos electrónicos,assinatura digital, direitos de autor, protecção do consu-midor, privacidade. Esta situação sofre algumas alteraçõesna UE como adiante veremos.

________________________

8 GOYOS, Duval de Noronha, ob. cit..

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No documento da OCDE de 98 a que fizemos refe-rência fixaram-se as bases fiscais internacionais do e-comerce.Aí se recomenda que qualquer regulamentação futura teráque passar por uma cooperação ou consulta mútua entreos Estados para evitar quer a dupla tributação quer a con-corrência fiscal negativa entre jurisdições. Também ali sefixaram os princípios da intervenção estatal subsidiária, neu-tralidade, eficiência, certeza, simplicidade, segurança, rejei-ção de qualquer limitação à circulação de conteúdos, de queo fornecimento de produtos digitalizados não deve ser tra-tada como fornecimento de bens materiais e se opta pela nãotributação; na tributação do consumo como princípio geralesta deverá ocorrer no lugar onde o consumo tem lugar9.

6. DEFINIÇÃO DE COMÉRCIO ELECTRÓNICOE PROBLEMAS FUNDAMENTAIS QUE SELEVANTAM

A Internet além do negócio que ela própria repre-senta é no fundo apenas um canal onde se fazem negó-cios com características próprias como o não conhecerfronteiras o que a universaliza. Nessa medida também aregulamentação jurídica impositiva terá que pensar-se doponto de vista internacional10. A primeira consequência detudo o que se tem dito é o risco de erosão do poder tri-butário do Estado e os conflitos que surgem para deter-minar qual é a jurisdição credora do imposto (suponha-se

________________________

9 O documento em causa: Electronic Commerce: Taxation FrameworkConditions, apresentado em Ottawa em 1998 e pode ser consultado emwww.oecd.org/daf/fa/e_com/public_release.htm visto a 15 de Maio de 2001às 18h00.

10 MARTINS, Inês Gaudra da Silva, “Direitos e Deveres no novomundo da comunicação – da comunicação clássica à electrónica”, StvdiaIvridica, nº 40, Coimbra, 1999, p.118.

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uma empresa com sede na Holanda, que tem uma uni-dade fabril na Alemanha tem uma loja virtual num com-putador em Espanha, ligado a um servidor português.Onde é devido o Imposto pelas vendas da loja?).

Qualquer incursão sobre o tema, exige previamentesaber do que falamos. Adoptamos aqui a seguinte defini-ção para comércio electrónico ou e-comerce: é a capa-cidade para realizar operações comerciais, transac-cionando qualquer tipo de bens ou serviços entredois ou mais sujeitos situados na mesma ou emdiferentes jurisdições, utilizando para tal terminaisque permitem aceder e intervir na Internet11.

Os problemas que iremos abordar nesta monografiasão essencialmente três:

1) Qual a jurisdição credora do imposto?2) Como se fiscaliza?3) Quais as imposições aplicáveis a esta forma de co-

merciar?

6.1. Qual a jurisdição credora do imposto?

Dada a natureza internacional da Internet qual ouquais as jurisdições tributárias onde é devido imposto?

A deslocalização de sujeitos passivos para jurisdiçõesde baixa tributação aliada ao anonimato permitido pela cir-culação on line e à falta de capacidade efectiva de fiscali-zação, são factores que podem num futuro próximo pôrem causa a base das imposições atendendo às expectativasde forte crescimento das transacções por esta via.________________________

11 Esta definição tem por base a oferecida pelo Departamentodo Tesouro dos Estados Unidos citada em ALTAMIRO, Alejandro, ob.cit., p 15, que alteramos em certos pontos nomeadamente quanto aosmeios de acesso à rede que hoje não tem que ser necessariamente ocomputador; Com efeito é já suficiente um telemóvel, a televisão, etc.

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Suponhamos no caso da empresa holandesa acima refe-rida que a encomenda é feita na sua web page. Há pelomenos 4 jurisdições que têm um ponto de contacto impor-tante com a transacção pelo que potencialmente podemas 4 reclamar imposto sobre o consumo.

A Internet apresenta a espantosa facilidade de em segun-dos se sair de um país e entrar noutro e aí comprar ouvender. Para já surge como segura a ideia avançada pelaOCDE que qualquer regulamentação tributária num país,só terá eficácia se tomada num quadro de cooperação inter-nacional a qual em primeiro lugar terá de definir de entreas jurisdições que entram em contacto com a operação,um ponto que se privilegiará a cuja jurisdição será devidoo imposto. A OCDE como se viu, tem apontado que esseprivilegiamento deve recair sobre o lugar de consumo12.Esta opção de tributar no local de consumo em detrimentoda fonte de proveniência do bem justifica-se pela dificul-dade e até impossibilidade de determinar com rigor a fonteda utilidade, para além de que a fonte de um produtocomplexo podem ser várias. Sobre este ponto AlejandroAltamiro discorda em se desprezar completamente o lugaronde a riqueza se gerou, não só por ser um critério comconsolidação internacional mas também porque os proble-mas apontados ao critério das fontes, também se podemverificar quanto ao lugar de consumo13. Parece-nos ter esteautor razão no que diz nomeadamente para evitar vazioslegais.

Qualquer regulamentação não pode passar por se cer-cear o acesso à rede, por ex. limitando-a às fronteiras deum país pois tal representaria uma “interrupção de comu-

________________________

12 Electronic Commerce: Taxation Framework Conditions, apresenta-do em Ottawa em 1998 e pode ser consultado em www.oecd.org/daf/fa/e_com/public_release.htm, consultada a 15 de Maio de 2001 às 18h00.

13 ALTAMIRO, Alejandro, ob. cit., p.47.

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nicações sem barreiras, sendo uma importante e intolerá-vel restrição à liberdade de comunicação”14, em Portugalprotegido como Direito Fundamental de primeira ordemdo art. 37º n.º 1 e 2 CRP.

Dito de outro modo, o e-comerce vem pôr ainda maisem causa a territorialidade dos impostos segundo o qual“cada Estado considera-se competente para tributar toda amatéria colectável que tenha consigo um qualquer pontode contacto”15, nomeadamente quando em causa estão alivre circulação de capitais e serviços. Como bem notaLeite de Campos a Internet não é apenas uma rede decomunicações que permite recolher e emitir dados, é elaprópria um gigantesco mercado onde se encontram ope-radores16.

No âmbito da União Europeia já se deram algunspassos no que diz respeito ao IVA numa proposta deDirectiva que pretende alterar a actual sexta Directiva so-bre o IVA – DIR 77/388/CEE que adiante se verá commais pormenor. Aí propõe-se o seguinte modelo práticode tributação em sede de IVA:

– Tratando-se de transacções de bens tangíveis, aplica--se o regime actual da sexta Directiva.

– Tratando-se de bens intangíveis os fornecimentospassam a ser tratados como prestações de serviços. Aqui:

– Relativamente a serviços prestados por um opera-dor estabelecido fora da UE a um destinatário

________________________

14 Como já se decidiu judicialmente em vários países como EUA,Argentina, conforme referido por ALTAMIRO, Alejandro, ob. cit., p.18e 19.

15 CAMPOS, Diogo Leite de, “A Internet e o princípio da terri-torialidade dos impostos”, Revista da Ordem dos Advogados (ROA), ano58, Jul., Lisboa, 1998, p 639.

16 CAMPOS, Diogo Leite de ob. cit., p. 641.

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estabelecido na UE, o lugar da tributação será odo destino.

– Se o fornecedor estiver estabelecido na UE e o des-tinatário estiver estabelecido fora da UE, o lugarda tributação é o do destinatário e como tal a pres-tação em causa não está sujeita a qualquer tributa-ção na UE.

– Se um operador da UE prestar serviços a outro queseja sujeito passivo de IVA estabelecido noutro Es-tado Membro, será devido imposto no lugar ondeo destinatário estiver estabelecido.

– Se o mesmo operador prestar serviços a um parti-cular ou a um não sujeito passivo estabelecido nou-tro Estado Membro, será devido imposto no lugaronde o prestador se encontra estabelecido.

Um outro problema a ter em conta em transacçõesdeslocalizadas por natureza, prende-se com a concorrênciafiscal entre as jurisdições pois a Internet potencia forte-mente a liberdade de circulação dos factores de produçãoentre diferentes jurisdições.

Sabe-se hoje que não é difícil nem caro constituiruma empresa num qualquer ponto do mundo sem nuncalá ir assim como abrir e movimentar contas bancárias. Issoleva a que facilmente se possam deslocar de jurisdição acti-vidades tributáveis o que constitui uma externalidade a terem conta pelos diferentes Estados na definição da sua po-lítica Fiscal. A consequência é a diminuição “das basestributáveis, distorcendo padrões de comércio e investimento,minando a equidade, neutralidade e aceitação social dossistemas fiscais”17. A Internet ao permitir métodos de ges-tão conjuntos a partir de vários pontos do mundo (por________________________

17 OCDE, Tax Avoidance and Evasion, in www.oecd.org/daf/fa/EVASION/EVASION.HTM consultado a 22 de Maio de 2001 às

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exemplo por videoconferência) introduz igualmente fragi-lidades ao conceito de residência (o art 2º nº 3 CRICconsidera residente a entidade com sede ou direcção efec-tiva em Portugal o que é um conceito inoperatório paraa situação descrita).

6.2. Como se fiscaliza?

Sobre a fiscalização, há também que distinguir as duasvertentes: O comércio electrónico indirecto no qual secontrata on-line mas a que se segue a entrega físicada mercadoria e o comércio electrónico directo que com-preende as transacções e entrega em tempo real on-linemediante envio de dados, download de música, software,transferência de fundos, operações de bolsa, etc18 e é nestasegunda vertente que os problemas de fiscalização mais sefazem sentir dadas as maiores facilidades de os contribuin-tes se subtraírem com êxito à imposição.

6.2.1 A INTERNET COMO FACTOR DE POTEN-CIAÇÃO DA SUBTRACÇÃO ÀS IMPOSIÇÕES

A subtracção às imposições pode ocorrer na nossaperspectiva de duas formas: legal ou ilegalmente.

Ocorre ilegalmente quando o contribuinte pratica actosilícitos, falsificando documentos, contas, negoceia clan-destinamente, etc (fraude fiscal). Ocorre licitamente nasseguintes situações: quando é propósito do legislador quenão se pague imposto ou se pague menos, estabelecendo

17H30 e ver ainda OCDE, Harmful Tax Competition: An Emerging GlobalIssue, Paris, 1998. De referir que a OCDE se encontra em negociaçõescom diferentes estados de regime fiscal privilegiado para por cobro àdeslocalização fictícia de actividades para imputação de lucros

18 CAMPOS, Diogo Leite de, ob. cit., p 641.

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isenções, deduções específicas e à colecta, abatimentos, re-porte de prejuízos, zonas francas e off-shore, etc ou quando,atendendo aos princípios da legalidade e tipicidade dosimpostos que impedem a sua aplicação analógica, o con-tribuinte realiza um negócio não previsto numa norma fis-cal ou quando o contribuinte procede a uma reduçãocontabilística do lucro tributável19. Estas possibilidadeslegais de subtracção não podem ser usadas de forma abusivae ela ocorre quando, se fazem certos negócios reais (nãosimulados), mas com anomalias porque têm como fimúltimo ou principal a distracção da aplicação das normastributárias. Estas práticas abusivas do direito à poupançafiscal são conhecidas e reprimidas pela lei – arts. 57º e ssCIRC, 4º CIRS e 38º LGT. Esta última estabelece umaclausula geral antiabuso, sancionando tais negócios com aineficácia jurídica; sem por em causa o princípio geral daliberdade contratual e do direito de cada um actuar damaneira que melhor corresponda aos seus interesses, essaactuação não pode no entanto elidir a carga fiscal medi-ante o uso anormal das formas de contratar usuais com opropósito de colocar as transacções fora da incidência fis-cal. Se estas práticas não fossem reprimidas era o próprioprincípio da igualdade tributária que ficaria posto em causa.Estes problemas põem-se com especial interesse no comér-cio electrónico e foi motivo para o legislador nacional einternacional ter proclamado como um dos princípiosorientadores o da prevalência da substância sobre a forma,i. é, perante uma prática que é legal mas se suspeita serabusiva, atender-se-á ao conteúdo económico da transac-ção e não á forma jurídica que lhe é dada pelas partes.

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19 Sobre os dois últimos pontos para mais desenvolvimentosSANCHES, J. L. Saldanha, A Quantificação da Obrigação Tributária – Deve-res de Cooperação, Autoavaliação e Avaliação Administrativa, LEX, Lisboa,2000.

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Nesta sequência, suponhamos o empresário A que fa-brica calçado tendo uma unidade fabril em Trás-os-Mon-tes. Constitui uma holding de controlo numa jurisdição debaixa tributação com a finalidade de lhe imputar lucros.

Dadas as dificuldades de obter a cooperação dessespaíses aliado ao forte sigilo bancário que ali vigora, tem-se assistido a um movimento generalizado internacional deadiantar a tributação sobre as sociedades de controlo estran-geiras até ao momento em que distribuam os rendimen-tos aos seus accionistas, passando a ser estes os sujeitos pas-sivos do imposto e não as sociedades de controlo pelolucro que obtenham nas actividades desenvolvidas no país.Isto ocorrerá quando os nacionais de um Estado contro-lam ou detêm uma parcela significativa dessa sociedadeestrangeira, que essa sociedade esteja a coberto de umajurisdição fiscal privilegiada e quando a existência dessasociedade se destine única ou principalmente a evitar a tri-butação nacional.

Uma zona de baixa tributação segundo a OCDE “éuma jurisdição que se torna activamente disponível paraevitar a tributação que de outro modo seria devida empaíses de impostos relativamente mais elevados” os quaisapresentam em regra as seguintes características:

– Impostos baixos ou nulos sobre os rendimentos decapital

– Sigilo bancário e comercial elevado– Falta de controlo sobre depósitos bancários em

moeda estrangeira– Tecnologias de comunicação muito evoluídas– Que não sejam partes em convenções internacio-

nais para evitar dupla tributação ou se mostrem indis-poníveis para trocar informação

– Sistemas políticos estáveisEm Portugal entende-se que uma empresa estrangeira

a operar cá está instalada numa jurisdição fiscal privilegiada

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quando a taxa efectiva de tributação a que fica sujeita nesseEstado é igual ou inferior a 60% da taxa de IRC a queficaria submetida em Portugal.

É tipicamente uma forma de evitar a tributação nacio-nal sobre o rendimento, a constituição de empresas subsi-diárias sediadas numa jurisdição fiscal privilegiada destina-da exclusivamente à compra de produtos à empresa decontrolo sediada em Portugal para os revender em qual-quer parte do mundo e inclusivamente em Portugal (naprática pode suceder que um comprador que more na ruaao lado da empresa, compre pela Internet à subsidiáriadaquela instalada numa zona franca). Nestes casos recor-re-se à figura do adiantamento tributário.

Esta construção não é imune a certas críticas das quaisse destacam duas:

– Desde logo porque é fácil aos investidores desen-caminharem os rendimentos recebidos dessas sociedades.Basta para isso abrirem contas bancárias em bancos de paí-ses onde o sigilo bancário seja forte e mobilizar a partirdaí os rendimentos obtidos.

– Mais que isso sucede não raras vezes que os paísesque criticam ferozmente as jurisdições de baixa tributação,são os primeiros interessados na sua existência para tor-narem mais competitivas as suas exportações; é exemplotípico os Estados Unidos conforme provou a União Euro-peia no seio da OMC20.

No âmbito da sexta Directiva sobre o IVA na UEpara dissuadir a fraude e o abuso estabelecem-se gravosaspenalizações por incumprimento das obrigações, a dívidafiscal é exigível em qualquer Estado Membro e os pro-

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20 Nesse sentido GUERREIRO, Tiago Caiado, As normas anti-abusogerais e especiais e o comércio electrónico. Algumas considerações, emwww.gesbanha.pt/fisc/tribut.htm consultado dia 23 de Maio de 2001 às 14h30.

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prietários e gestores podem ser responsabilizados civil epenalmente pelas dívidas.

6.2.2 PODE O ISP SER CONVERTIDO EM AGENTEDE INFORMAÇÃO FISCAL?

Outra questão de interesse que se levanta neste capí-tulo é a seguinte: um estado enquanto sujeito activo darelação jurídica tributária, pode exigir ao ISP (InternetService Providor) informações sobre o conteúdo das comu-nicações dos seus clientes para controlo fiscal?

A resposta parece-nos ter que ser negativa. Essencial-mente porque o provedor de acesso não é sujeito passivoda relação tributária nos negócios jurídicos celebradospelos seus clientes; í, é, o facto gerador de que o ISP édevedor é apenas relacionado com os serviços de teleco-municações que presta dando e mantendo o acesso àInternet. Serviços de telecomunicações conforme se defi-ne no art. 2º da Lei de Bases das Telecomunicações - LBT(Lei nº 91/97 de 1 de Agosto), é a “transmissão, recep-ção ou emissão de sinais, representando símbolos, escrita,imagens, sons ou informações de qualquer natureza porfios, por sistemas ópticas, por meios radioeléctricos ou poroutros sistemas electromagnéticos”. Os ISP especializaram-se na prestação de serviços de telemática ou processamentocomputacional de dados à distância que é em si uma acti-vidade económica.

Mas não são devedores de qualquer imposição rela-cionada com o conteúdo das comunicações de som, imageme dados dos seus clientes. É certo que a administração fiscalpode elevar à categoria de agente de informação certasentidades que, em virtude das funções que exercem têmum acesso privilegiado à informação, podendo facultá-la aofisco com o propósito de fiscalização. Há no entanto que

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atender a que, circula na rede toda a espécie de informa-ção e tecnicamente não é hoje possível separar o que éinformação comercial com relevância fiscal, da que não é,nomeadamente da informação que diga respeito à esferade privacidade das pessoas. Na verdade, a forma correntede encomenda, seja enviando um e-mail a partir de umaconta de correio electrónico, seja acedendo a um web sitedo vendedor e aí utilizar links que permitem encomendar,deve considerar-se como vulgar correspondência, ficandoo seu conteúdo coberto pelo respectivo sigilo, apenas sepodendo quebrar nos casos já hoje tipificados, nomeada-mente para efeitos de escuta (art. 187º n.º 1 CPP). Nestestermos a conclusão não pode ser outra que a não validadede transformar o ISP em agente de informação fiscal21.

À mesma conclusão nos parece ter que chegar quandofor tecnicamente possível assegurar uma separação dos con-teúdos que possam interessar fiscalmente. É que os ISPprestam materialmente um serviço de comunicações talcomo se define na LBT e estarão sempre a coberto dorespectivo sigilo.

6.3. Que tipo de imposições são de aplicar aocomércio electrónico: problemas conexos

A Internet está a levar a níveis nunca antes vistos aglobalização das economias, alargando os mercados e aconcorrência. Paradoxalmente constitui uma nova oportu-nidade para as economias periféricas e PME dada a elimi-nação das distâncias geográficas como factor de influênciana decisão de compra. Para qualquer empresa o mercadopotencial passa a ser assim todo o mundo com acesso àrede passando a ter ao seu alcance mercado que antes nãotinha.________________________

21 Nesse sentido ALTAMIRO, Alejandro, ob. cit., p 38 e 39

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O grande desafio que se coloca às administrações fis-cais é maximizar o potencial comercial da Internet semque isso leve à erosão das bases tributárias, atendendo aocomplexo sistema de garantias que qualquer modelo decontrolo tem que respeitar22, sendo certo que em si, a redeé ingovernada e em crescimento constante, estando emtodo o lado mas sem ter um nexo territorial claro comqualquer estado.

***

Neste âmbito surge um conjunto importante de pro-blemas com que as administrações fiscais de debatem:

a) Já nos referimos atrás à concorrência fiscal. A deci-são de localização de investimento, actividade e empregosão sensíveis à carga fiscal. A fácil mobilidade da riquezapõe agora em concorrência soberanias. Os agentes econó-micos podem inclusivamente separar os elementos tributá-rios, localizando cada um deles onde o regime fiscal formais favorável, pondo em causa a equidade e a eficáciados sistemas fiscais23.

b) Nos meios de pagamento, o surgimento do dinheiroelectrónico permite hoje efectuar pagamentos em qualquerparte do mundo sem um suporte tangível incluindo semcartão de crédito. Com efeito, é hoje possível abrir umaconta bancária em qualquer país por via electrónica e ope-rar a partir dela; nem se pense que estas hipóteses são mera-mente académicas. Sobre essas contas só as jurisdições dessespaíses têm controlo. Face a isto, poder-se-ia advogar a sim-ples abolição do sigilo bancário. Só que a eficácia destamedida depende da adesão de um conjunto muito vastode países o que está muito longe de ocorrer (sendo certo________________________

22 ALTAMIRO, Alejandro, ob. cit., p 30.23 COMISSÃO EUROPEIA, A política Fiscal da UE, Serviço de

Publicações Oficiais, Luxemburgo, 2000, p 9.

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que no seio da OCDE vários Estados considerados “para-ísos fiscais” estão a assumir alguns compromissos impor-tantes de controlo), além de exigir que cada jurisdição dis-ponha de uma base de dados que centralize todos os movi-mentos bancários, suficientemente potente para registarmilhões de operações de muito baixo valor.

A existência de contas bancárias no estrangeiro movi-mentáveis 24 horas por dia, apaga em definitivo qualquerrasto sobre negócios não documentados.

c) Outro problema posto às administrações fiscais éo anonimato permitido pela rede o que põe em causa ossistemas de retenção na fonte, o cumprimento de obriga-ções declarativas, etc.

As pessoas com quem se está a negociar são efecti-vamente quem afirmam ser? É a dúvida que se coloca tantoem vendedores como em compradores. Neste campo estãoem implementação sistemas que oferecem graus de certeza,confiança e segurança razoáveis, nomeadamente recorrendoà assinatura digital, hoje considerado o método de identi-ficação mais seguro, entre nós regulado pelo DL 290-D/99de 2 de Agosto.

A assinatura digital, quando aposta num documentoelectrónico atribui-lhe o valor probatório de um documentoparticular assinado (art.º 2º n.º 2 e 3 do diploma citado)possibilitando ao utente verificar a autenticidade da origemdos dados, bem como a sua integridade, i. é, se não foramentretanto alterados. A assinatura digital, no estado actualde conhecimentos, é feita com recursos a técnicas cripto-gráficas algorítmicas, cuja base de cifragem e decifragemrecorre a um sistema de dupla chave (uma pública e umaprivada) assimétrica, em que uma mensagem codificadacom uma chave pública só pode ser descodificada com acorrespondente chave privada do destinatário e vice versa24.A autenticidade da identificação do signatário de uma assi-

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natura digital é obtida com base num sistema de certifi-cação por entidades certificadoras credenciadas pelo Estado(art. 3º nº 2 e 3 e art. 9º diploma citado), a qual funcio-na como um terceiro elemento de confiança que cria eassina certificados digitais os quais são a base de identifi-cação digital e consequente segurança nas transacções elec-trónicas em redes abertas25.

Fiscalmente ocorre aqui um processo semelhante àcategoria dogmática dos crimes sem vítima; sendo certoque é do interesse dos operadores conhecerem com quemcontratam, outros há em que os riscos ou o encontro deinteresses compensa e então é o anonimato querido deli-beradamente que “conspira contra a fiscalização tributá-ria”26.

d) Um terceiro grande problema reside na desmate-rialização da riqueza e da documentação. Tratando-se debens tangíveis, aquando da expedição, têm de ser acom-panhados das competentes guias. No entanto tratando-sede bens intangíveis, não há um mínimo de materialidadea acompanhá-los. O art. 98º n.º 5 CIRC obriga as empre-sas a guardar a documentação contabilística por 10 anos,só que, como nota Alejandro Altamiro “esta exigência estáadaptada a um mundo de papeis mas é inaplicável ao mundovirtual”27 que existe mas não existe na realidade sensitivaem que o único registo que existirá é electrónico e logomais facilmente ocultável e adulterável.

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24 CARNEIRO, Henrique José e outros, As leis do comércio elec-trónico, Edições do Centro Atlântico, Lisboa, 2000, p 13 e ss.

25 Para explicações técnicas mais detalhadas, pode consultar-se oweb site da Certipor, uma empresa certificadora em www.certipor.pt con-sultado dia 22 de Maio de 2001 às 19H00.

26 ALTAMIRO, Alejandro, ob. cit., p 34.27 ALTAMIRO, Alejandro, ob. cit., p 35.

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Sobre este ponto, o D.L. 375/99 de 18 Setembroequipara a factura electrónica à de papel em que o valorprobatório depende da aposição nesta de uma assinaturadigital, além de que os interessados na sua utilizaçãodevem previamente obter autorização da Direcção-Geraldos Impostos.

Este diploma, veio a ser regulamentado pelo DecretoRegulamentar n.º 16/2000 de 2 de Outubro e os formu-lários e modelos para solicitar a autorização foram apro-vadas pela Portaria 52/2002 de 12 de Janeiro do Ministé-rio das Finanças.

Esta legislação veio permitir a digitalização integral docircuito comercial e tenta ajustar o controlo fiscal estabe-lecendo um princípio geral de livre exigibilidade de acessoàs bases de dados e material informático da empresa (a recusade acesso conduz à revogação automática da licença de uti-lização da factura electrónica) e exige ainda a manuten-ção dos registos por 5 anos.

e) No que ao IVA diz respeito um dos factores dasua eficácia é a auto-fiscalização que o sistema de inter-mediação permite. No e-comerce o encontro entre produ-tor e vendedor é imediato com a vantagem de eliminardo preço final os lucros dos intermediários. Mas, elimi-nando-se os intermediários fica posta em causa a colabo-ração preciosa (e gratuita!) que estes têm prestado aos Esta-dos, funcionando, entre outras coisas, como seus fiscais.

Visto este conjunto de problemas preliminares que secolocam, vejamos agora as implicações que e comércioelectrónico pode ter nas diferentes imposições de acordocom as limitações que traçamos, restringindo-nos aosimpostos indirecto de tipo IVA e aos impostos sobre orendimento.

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7. A APLICAÇÃO DO IVA AO COMÉRCIOELECTRÓNICO

Também aqui o problema centra-se nas transacçõessobre bens intangíveis. Aos restantes como já se frisou aplica--se o regime dos contratos à distância entre nós reguladopelo DL 143/2001 de 26 de Abril em vigor a partir de26 de Junho, revogando o DL 272/87.

O problema está mais uma vez nos bens intangíveise a questão tem que ser analisada sempre do ponto devista da União Europeia e aí deparamos com a dificul-dade já vista, da inaplicabilidade do IVA aos fornecimen-tos vindos do exterior. Analisemos as seguintes situaçõeshipotéticas que retratam o estado actual da situação:

Caso 1: um particular ou um sujeito passivo sem di-reito a dedução (bancos por ex.) português, encomendaum livro por Internet a uma livraria do Reino Unido.O IVA é pago no Reino Unido desde que o volume denegócios anual da livraria com Portugal não exceda certomontante. Se o exceder já será pago em Portugal.

Caso 2: Se em vez de comprar o livro em papelcomprar o direito a fazer um download de um ficheiro como conteúdo do mesmo livro, trata-se de uma prestação deserviços.

Caso 3: Na mesma transacção se o cliente é um su-jeito passivo de IVA com direito a dedução, aplica-se oregime das transacções intracomunitárias e o IVA é pago cá.

Caso 4: se a livraria é de fora da UE e fornece umbem tangível e o comprador é sujeito passivo de IVA éeste último o devedor de IVA na UE.

Caso 5: Se o mesmo bem for intangível então já setrata de uma prestação de serviços e não é devido qual-quer imposto na UE (art. 9º nº1 da Sexta Directiva so-bre o IVA – DIR 77/388/CEE).

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Caso 6: Mas se o vendedor estiver na UE, já deveIVA nas exportações quer seja por venda de bens tangí-veis quer por prestações de serviços28, o que bem se vê éum regime consideravelmente distorcedor da concorrênciae com prejuízo para os operadores da UE.

É neste cenário que surgiu uma proposta de altera-ção à sexta Directiva em estudo desde 1997. No âmbitodos trabalhos preparatórios chegou-se à conclusão que alegislação existente era suficiente para garantir a tributa-ção do comércio electrónico indirecto, i. é, aquela em queà encomenda feita pela Internet se seguirá a expedição damercadoria; recebem o normal tratamento das vendas àdistância em que os bens adquiridos em países terceirossão tributados aduaneiramente à entrada na União e as expor-tações são tributadas à taxa zero de IVA. Nas transacçõesintracomunitárias, nos fornecimentos a consumidores finaisa tributação é feita ou no estado do vendedor ou do com-prador consoante a importância em causa. O problema estánas transacções de bens intangíveis.

Sobre isto o ECOFIN reunido em 1998, tendo porbase as propostas da Comissão adoptou três importantesprincípios que condicionaram o desenvolvimento posteriorda matéria, a saber:

- O principio da neutralidade fiscal já visto atrás nainfluência que teve na resolução do Conselho de Minis-tro português de 1999.

- As prestações de bens digitais devem considerar-seprestações de serviços para efeitos de IVA.

- As importações de bens digitais por consumidoresfinais devem ficar sujeitas a IVA tal como as importaçõesde bens tangíveis.________________________

28 Estes e outros casos vêm exaustivamente analisados em: A apli-cação do IVA ao comércio electrónico, em www.gesbanha.pt/fisc/tribut.htm,por nós consultado dia 23 de Maio de 2001 às 14h30.

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Na mesma altura a OCDE no documento atrás ana-lisado fixou o principio da tributação no lugar onde oconsumo tem lugar afirmando igualmente que o forneci-mento de produtos digitais são prestações de serviços e nãoprestação de bens dada a sua completa desmaterialidade.

A proposta de alteração foi adoptada na sequência doConselho Europeu de Lisboa de 23 e 24 de Março de2000, e pretende adequar o regime do IVA a todas astransacções pela Internet. Esta proposta de Directiva – Doc.500PC0349/02 de 7 de Junho de 200029 pretende alteraro sexta Directiva sobre o IVA (DIR 77/388/CEE) e temcomo objectivo genérico sujeitar a IVA os fornecimentosvindos do exterior da UE e isentar a exportação.

Como já atrás se disse, atendendo aos princípios dalegalidade e taxatividade das normas fiscais não se previana Sexta Directiva o tipo de transacções intangíveis que aInternet permite e de que se tem vindo a falar, o queleva à seguinte conclusão: Se esses fornecimentos se ope-rarem intracomunitariamente ou para o exterior são trata-dos como normais prestações de serviços, sujeitos a IVA,no entanto se os mesmos fornecimentos vierem do exte-rior da UE já não ficam sujeitos a qualquer tributação, jus-tamente porque nada está previsto no Direito Comunitá-rio. Numa palavra, hoje nenhuma tributação incide sobreas prestações de serviços por fornecedores exteriores à UEa consumidores finais desta. Mas já são tributadas as pres-tações de serviços feitas por operadores da UE a adqui-rentes de países terceiros30.

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29 O qual pode ser consultado em www.europa.eu.int/eur-lex/pt/com/dat/2000/pt_500pc0349_02.html - a versão em causa foi consul-tada a 20 de Maio de 2001 às 17H30.

30 Estes problemas estão equacionados no Doc. XXI/98/0359 de3 de Abril de 1998 em http://europa.eu.int/comm/dgs/taxation_customs/por nós consultado a 20 de Maio de 2001 às 19H00.

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É este o quadro actual distorcedor do mercado quea proposta de Directiva pretende alterar, dando a essasprestações de bens digitais o mesmo tratamento fiscal queé dado às prestações de bens tangíveis, fazendo incidirsobre elas as taxas normais de IVA. Não sem antes referirque qualquer solução definitiva carece de um consensointernacional para evitar a dupla tributação e a não tribu-tação involuntária, motivo pelo qual a proposta não deixade ter em conta os princípios definidos do documentoorientador da OCDE31 os quais contam hoje com umaalargada base de apoio em todo o mundo por Estados,Organizações Internacionais e empresas. Essas alteraçõespropostas traduzem-se num conjunto de soluções eminen-temente práticas.

Assente-se desde já e em definitivo que a prestaçãode bens digitais deve considerar-se uma prestação de ser-viços para efeitos fiscais. Propõe-se como principio geralque se passe a cobrar IVA a todas os serviços prestadosquer por operadores da União ou de fora dela passando aincidência a recair em todos os casos sobre o destinatáriodo bem e a jurisdição credora do imposto é aquela ondeo adquirente tem estabelecimento estável, exerce a sua acti-vidade económica ou onde tem domicílio ou residênciahabitual. Concretizando:

– aplica-se o sistema de autoliquidação nos casos emque o adquirente é um sujeito passivo, sendo eleo único obrigado ao imposto.

– Se se tratar de particulares ou sujeitos passivos semdireito a dedução, aplicam-se as regras já hoje emvigor no âmbito da Sexta Directiva: Se o prestadorde serviços for de fora da UE e o volume de negó-

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31 O documento em causa é o que a trás se analisou, Electroniccommerce: Taxation Framework Conditions in www.ocde.org/daf/fa/e_com/ottawa.htm, consultada a 15 de Maio de 2001 às 18h00.

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cios anual não exceda 100 mil EUR com a uniãoé devedor o destinatário da prestação à jurisdiçãoonde resida. Se exceder, o prestador terá que regis-tar-se num Estado-Membro, cumprindo todas asobrigações fiscais daí decorrentes pois passará a terna UE um estabelecimento estável (conforme a pro-posta de alteração do art. 24º da Sexta Directiva).A este propósito introduzem-se um conjunto demedidas simplificadoras, por exemplo bastando regis-tar-se num único Estado-Membro, de cumprir asobrigações fiscais por via electrónica, incluindo ascontabilísticas, etc.

– Quanto às prestações de bens digitais por fornece-dores da UE ao exterior, são tributadas à taxa zerode IVA, tal como as exportações de bens tangíveisem geral.

Incluem-se nas novas regras actividades tão variadascomo o fornecimento de som e imagem, software, trata-mento de dados e outros serviços informáticos tais comoa criação de web pages, actividades culturais, artísticas,desportivas, científicas, docentes, recreativas e similares, etc.Mas não há prestação de serviços para este efeito quandoexista um suporte físico, tais como disquetes, cassetes, CD,CD-ROM, DVD, etc32.

Este conjunto de propostas é no entanto susceptívelde alguns reparos: exige que seja o fornecedor de bensou prestador de serviços a determinar se o estatuto fiscaldo cliente está ou não abrangido pela jurisdição da uniãoou não; as medidas de combate à fraude ficarão compro-

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32 Estas medidas encontram-se explicitadas com grande porme-nor por PRICEWATERHOUSECOOPERS, Breve comentário à proposta deDirectiva sobre a tributação do comércio electrónico, em www.inforfisco.pt/notas_enquadramento/ne_01.htm consultado a 15 de Maio de 2001 às 18h30.

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metidas pelo abandono do cartão de crédito como meiode pagamento além de já de si, o acesso à relação de paga-mentos com cartões levante grandes problemas à investi-gação fiscal; as diferenças de carga fiscal entre os EstadosMembros pode constituir um entrave à sã concorrência(hoje as taxas de IVA variam de 15% no Luxemburgo a25% na Dinamarca) e levanta também problemas de con-corrência fiscal entre os Estados dado as empresas doexterior da União poderem escolher livremente o EstadoMembro onde querem registar-se e cumprir obrigações fis-cais.

8. A TRIBUTAÇÃO DO RENDIMENTO DERI-VADO DO COMÉRCIO ELECTRÓNICO

Os métodos de fiscalização das imposições sobre osrendimentos, estão pensadas para um mundo físico, dospapeis, desde a origem ao destino dos capitais. Seguindoas linhas traçadas pelo relatório da OCDE e as conclusõesda conferência de Torku de 1999 e da cimeira do milé-nio de Ottawa, as primeiras necessidades legislativascentram-se nos momentos da incidência e determinação damatéria colectável.

Na generalidade dos países e também em Portugal étributado o rendimento de residentes e de não residentespelos ganhos obtidos nessa jurisdição (art. 14/1 CIRS eart. 3º n.º 1 e 2 e art. 4º n.º 2 e 3 CIRC) e os proble-mas de dupla tributação resolvem-se com recurso a con-venções internacionais.

A primeira dificuldade a resolver é como qualificar orendimento obtido com a venda de produtos pela Internet.Supondo que A compra um livro pela rede a partir dapágina que uma livraria tem na Internet, aguardando a suaentrega em casa, o lucro que a livraria vai auferir é nor-

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malmente tributado como rendimento derivado de umaactividade comercial.

Já se o que vende é o direito a que o cliente façaum download do conteúdo do livro para o seu computa-dor ou se o autoriza a descarregar um software, o rendi-mento que obterá pode ser teoricamente de três tipos33:

– Um rendimento de propriedade industrial (royalties)havendo obrigação de proceder a retenção na fonte

– Um rendimento comercial normal– ou um rendimento derivado de uma prestação de

serviços e neste caso igualmente sujeito a retenção na fonte.

Sem haver jurisprudência assente somos da opinião deMiguel Teixeira de Abreu34, segundo o qual, tudo depen-derá da finalidade e da operação concreta e estaremos pe-rante uma prestação de serviços sempre que o objecto sejaum bem intangível (como no capítulo anterior se definiu).Se envolver um elemento físico, será uma venda de bensnormal. Se a transmissão envolver a transferência dos direi-tos inerentes à exploração, trata-se de propriedade indus-trial e o rendimento assim obtido deverá ser contabilizadocomo um “royalty”.

Já nos referimos atrás à questão da fragilidade que sofreo conceito de “residência”, mas também o de “estabele-cimento estável” para efeitos do art 4º CIRC: um web sitesuportado por um computador em Portugal é um estabe-lecimento estável? E se é um computador portátil? Nestecaso, arriscaremos a seguinte resposta: Deve atender-se aoprovedor de acesso. Se o web site utilizar um ISP Portu-

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33 Esta divisão é feita por Glória Teixeira.34 ABREU, Manuel Teixeira de, “Efeitos fiscais da utilização da

Internet em sede de imposto sobre o rendimento”, Fiscalidade – Re-vista de Direito e Gestão Fiscal, nº 2, Instituto Superior de Gestão, 2000,p. 29.

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guês e além disso permitir fazer encomendas é de consi-derar que se trata de um estabelecimento estável em Por-tugal.

Situação diferente sucede quando o fornecedor estran-geiro envia um CD-ROM a clientes em Portugal con-tendo um software relativo a um catálogo de vendas, quese actualiza on-line através do web-site da empresa e quepermita inclusivamente fazer encomendas, ficando a em-presa estrangeira adstrita a certos fornecimentos, então oseu cliente em Portugal deve equipara-se a um agente35.

Face à solução proposta pode argumentar-se que sea empresa tem um computador instalado em Portugalligado por um servidor estrangeiro então não há imposi-ção. E assim nos parece ter que ser, se nada mais ligue aempresa a Portugal. Neste caso, tudo se passará para aadministração tributária portuguesa como se o cliente por-tuguês se desloque ao estrangeiro e compre lá. Não háum vínculo suficientemente consistente com a jurisdiçãoportuguesa, como nos parece que já há se o servidor forportuguês e o conceito de estabelecimento estável está asso-ciado ao exercício de uma actividade com um mínimo deestabilidade (tal como se define no art. 5º do Model taxConvention da OCDE) o que não se confunde com anecessidade de ali constituir uma empresa.

Na solução proposta o web site não é só um depósitode informação, como páginas publicitárias que são auxi-liares do negócio principal; para se considerar estabeleci-mento estável terá que servir como plataforma comercial.Mesmo que se exijam impostos locais sobre a propagandanão é suficiente para se tratar de um estabelecimento.O imposto assim devido não é diferente do devido pelacolagem de cartazes, out-doors, etc

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35 ABREU, Manuel Teixeira de, ob. Cit., p. 31 e nota 10.

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Um outro problema está no seguinte: Suponhamosuma multinacional com sucursais em Portugal. A Internetabre possibilidades grandes de gestão, cooperação e traba-lho conjunto. Logo mais facilmente o conglomerado actuacomo uma única empresa sendo difícil determinar comexactidão qual o lucro imputável ao estabelecimento emPortugal, a não ser recorrendo a técnicas de rendimentopresumido. Na prática as situações são elucidativas da ero-são das bases tributáveis sobre o rendimento a que aInternet pode levar num futuro próximo. Suponhamos umatransacção comercial em que a empresa A com sede edirecção efectiva nos Estados Unidos produz calçado e gastana produção de cada par 50 uc. Vende-os no seu estabe-lecimento estável em Portugal onde gasta em publicidade50 uc e vende cada par a 150 uc. Será tributada em 25uc de lucro nos Estados Unidos e 25 uc em Portugal.

Já se a mesma empresa apenas vende por Internet apartir de um web site situado nos Estados Unidos paraPortugal, onde gasta as mesmas 50 uc em publicidade, as50 uc de lucro obtido são integralmente tributadas nosEstados Unidos porque não tem em Portugal qualquerestabelecimento estável36.

9. CONCLUSÃO

– A aplicação das imposições exige a definição pré-via da base pessoal e real de incidência, estabelecimentodo nexo de causalidade entre o rendimento obtido e a suaimputação aquele contribuinte e a capacidade efectiva dea administração fiscal aplicar coercivamente o imposto.

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36 A base do exemplo dado encontra-se em www.gesbanha.pt/fisc/tribut.htm consultado dia 23 de Maio de 2001 às 14h30.

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– Não é difícil apurar alguns problemas que nesta sedeas redes de Internet e intranets colocam: fácil deslocalizaçãodas transacções para qualquer parte do mundo, eliminam-seintermediários, a eficácia da fiscalização fica seriamentecomprometida, o anonimato permitido pela rede é total,o acesso a jurisdições de baixa tributação torna-se ins-tantâneo, etc. Bem vistas as coisas os problemas que selevantam, são não tanto de criação de novas leis, masantes de aplicação das existentes pois muitos dos proble-mas que já existiam ficam agora agravados e, por outrolado, de fiscalização, dadas as facilidades de evasão poten-ciadas por esta nova maneira de comerciar.

– A emergência do problema implica contenção dasadministrações fiscais nas soluções com que avancem querpara não atrofiarem o normal desenvolvimento do comér-cio electrónico, que tem vantagens evidentes para eco-nomias periféricas como a portuguesa e porque qualquerdecisão impositiva unilateral pode levar à fuga de capitaispara outras jurisdições ou à dissimulação das transacções,facilmente conseguida pelo anonimato permitido, a ausênciade fronteiras e a falta de uma entidade de controlo sobrea rede.

Qualquer solução impositiva terá por isso que passarpor um quadro de consenso internacional

– As administrações fiscais não podem converter osISP em agentes de informação dado que os conteúdos dascomunicações operadas por esta via equiparam-se à cor-respondência ficando a coberto do respectivo sigílo.

– Impõe-se a standartização de regras de registo nosdiferentes países para efeitos de IVA, bem como das regrasaplicáveis aos documentos electrónicos.

– Nos impostos sobre o consumo, afigura-se-nos neces-sária a adopção das directrizes da OCDE e da UE sobreo IVA, nomeadamente passando a cobrança a fazer-se nopaís onde ocorre o consumo. Nesta sede, há quem pro-

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ponha que o pagamento do imposto seja feito medianteretenções na fonte a efectuar pelos bancos com base nospagamento. Cremos no entanto que para além de ter queser o Estado a pagar esse serviço aos bancos, facilmentese iludiria o sistema bastando para tal efectuar os pagamen-tos a partir de contas bancárias situadas no estrangeiro.

– Nos impostos directos sobre o rendimento o pro-blema central consiste em se saber qual o país onde o ren-dimento se produz ou qual a parte que ali deve ser tri-butado.

– O princípio da neutralidade fiscal assume aqui espe-cial importância. O comércio electrónico não deve ser tra-tado privilegiada ou desprivilegiadamente em relação aocomércio tradicional sob pena de se distorcer o mercado.

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Proposta de alteração à Sexta Directiva sobre IVA da UE emwww.europa.eu.int/eur-lex/pt/com/dat/2000/pt_500pc0349_02.html -a versão em causa foi consultada a 20 de Maio de 2001 às 17H30.

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ABREVIATURAS

CIRC – Código do Imposto Sobre o Rendimento de Pessoas Colec-tivas

CIRS – Código do Imposto Sobre o Rendimento de Pessoas Singu-lares

CPP – Código de Processo PenalCRP – Constituição da República PortuguesaECOFIN – Conselho de Ministros das Finanças da União EuropeiaEUR – EuroGATT – General Agreement on Tariffs and TradeISP – Internet Service Provider ou fornecedor de acesso que permite

ligar um computador ou um conjunto de computadores àInternet.

IVA – Imposto sobre o Valor AcrescentadoLGT – Lei Geral TributáriaOCDE – Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econó-

micoOMC/TWO – Organização Mundial do ComércioPME – Pequenas e Médias EmpresasUC – Unidade de contaUE – União Europeia

GLOSSÁRIO DE TERMOS

ARPANET – Advanced Research Project Agency Network. Foi o primeiroantepassado da Internet que serviu para testar as teorias e software quehoje se utilizam.

ASSINATURA DIGITAL – Equivalente electrónico da assinatura manual.Baseia-se numa técnica de cifragem de dois códigos; permite identi-ficar o emissor e a integridade da mensagem.

BIT – Sistema binário de 0 e 1 usado pelos computadores.DOWNLOAD – Ou descarregamento. Consiste em transferir um ficheiro

de um computador remoto para o nosso computador.E-COMERCE – Comércio Electrónico.E-MAIL – Electronic Mail ou conta de correio electrónico que permite

enviar e receber correspondência electrónica.INTERNET – É um conjunto de redes interligadas com cobertura quase

mundialLINK – Dispositivo de multiligação.WEB SITE – Página de Internet.

Adérito Vaz Pinto